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- A VIDA DIVINA (SRI AUROBINDO) -- Capitulo del XXI al

XXVIII
Capítulo XXI

A ASCENSÃO DA VIDA

Que o caminho da Palavra conduza os deuses para as Águas pelo trabalho da Mente…[1] Oh Chama,
tu vais ao oceano do Céu, até os deuses; tu fazes que encontrem-se juntos, os deuses dos planos, as
águas que estão no reino da luz por cima do sol e as águas que habitam abaixo[2].

O Senhor do Deleite conquista o terceiro estado; mantêm e governa unidos a Alma da


universalidade; como um falcão, como um milano, toma assento sobre a nave e a eleva, descobridor
da Luz, manifesta o quarto estado e tende ao oceano pois é o agitador destas águas [3] .

Três vezes Vishnu andou e manteve seu pé levantado do pó primeiro; três passos deu, o Guardião, o
Invencível, e desde o além sustenta suas leis. Investiga as atividades de Vishnu e contempla de onde
manifestou suas leis. Esse é seu passo supremo visto sempre pelos videntes como um olho estendido
no céu; que o iluminado, o desperto acende em uma chama resplandescente, inclusive o passo
supremo de Vishnu.....[4]

Rig Veda.

Temos visto que assim como a dividida Mente mortal, progenitora da limitação, a
ignorância e as dualidades, é só uma obscura figura da supramente, da auto-
luminosa Consciência divina em seus primeiros tratos com a aparente negação de si,
desde a qual começa nosso cosmos, de igual maneira a Vida, --(na medida que
emerge em nosso universo material, uma energia da divisora Mente subconsciente,
submergida, aprisionada na Matéria, a Vida como progenitora da morte, a fome e a
incapacidade)--, é só uma obscura figura da divina Força supraconsciente cujos
termos supremos são imortalidade, deleite satisfeito e onipotência. Esta relação fixa
a natureza desse grande processo cósmico do que somos parte; determina os
primeiros termos, meios e últimos de nossa evolução. Os primeiros termos da Vida
são a divisão, uma subconsciente vontade conduzida-pela-força, que se apresenta
não como vontade senão como mudo pressão da energia física, e a impotência de
uma sujeição inerte à forças mecânicas que governam o intercâmbio entre a forma e
seu entorno. Esta inconsciência e esta cega mas potente ação da Energia são o
modelo do universo material tal como o cientista o vê e esta sua visão das coisas se
estende e muda por completo as bases da existência; é a consciência da Matéria e o
tipo realizado de vida material. Mas intervêm um novo equilíbrio, um novo jogo de
termos que aumenta em proporção conforme a Vida se libera desta forma e começa
a evoluir para a Mente consciente; pois os termos meios da Vida são morte e
devorar-se mutuamente, fome e desejo consciente, o sentido de um espaço e
capacidade limitados, e a luta por crescer, expandir, conquistar e possuir. Estes três
termos são a base desse estado de evolução que a teoria darwiniana primeiro
clarificou para o conhecimento humano. Pois o fenómeno da morte implica em si
uma luta por sobreviver, dado que a morte é só o termo negativo no que a Vida se
esconde de si e tenta a seu próprio ser positivo para que busca a imortalidade. O
fenômeno da fome e o desejo implica uma luta em prol de um estado de satisfação
e seguridade, dado que o desejo é só o estímulo pelo que a Vida tenta a seu próprio
ser positivo a elevar-se da negação de sua insatisfeita fome até a possessão plena
do deleite da existência. O fenômeno da capacidade limitada implica luta em prol da
expansão, do domínio e a possessão, --a possessão do eu e a conquista do entorno-
-, dado que limitação e defeito são só a negação pelo que a Vida tenta a sua próprio
ser positivo para que vá em posse da perfeição da qual é eternamente capaz. A luta
pela vida não só é luta por sobreviver, também é luta pela possessão e a perfeição,
dado que agarrando-se ao entorno em maior ou menor grau, mediante auto-
adaptação a ele ou adaptando-o a si mesmo mediante sua aceitação e conciliação
ou por sua conquista e câmbio, pode assegurar-se a sobrevivência, e igualmente é
certo que só uma perfeição cada vez maior pode assegurar uma continua
permanência, uma sobrevivência duradoura. Esta é a verdade que o darwinismo
procurou expressar com a fórmula da sobrevivência dos mais aptos.
Mas assim como a mente científica procuro estender a Vida o princípio mecânico
apropriado à existência e ocultou a consciência mecânica na Matéria, sem ver que
havia ingressado um novo princípio cuja razão mesma de ser é submeter a si
mesmo o mecânico, de igual maneira a fórmula darwiniana foi usada para estender
com demasiada amplitude o princípio agressivo da Vida, o egoísmo vital do
indivíduo, o instinto e processo de auto-preservação, auto-afirmação e vida
agressiva. Pois estes dois primeiros estados da Vida contêm em si mesmos as
sementes de um novo princípio e de outro estado que deve crescer em proporção a
como la Mente evoluciona a partir de la matéria através da fórmula vital dentro de
sua própria lei. E estas coisas devem mudar mas todavia quando assim como a Vida
evolui para cima em posse da Mente, de igual maneira a Mente evolui para cima em
posse da Supramente ou Espírito. Precisamente porque a luta pela sobrevivência, o
impulso em posse da permanência, está contraposto pela lei da morte, a vida
individual está compelida, e usada, para assegurar a permanência muito mais para
sua espécie que para si mesma; mas isto não pode fazer-se sem a cooperação dos
demais; e o princípio de cooperação e mútua ajuda, o desejo dos demais, o desejo
da esposa, do filho, do amigo e auxiliador, do grupo associado, da prática de
associação, da união e intercâmbio conscientes são as sementes à partir das quais
floresce o princípio do amor. Admitamos que o amor seja a princípio só um
estendido egoísmo e que este aspecto de estendido egoísmo persista e domine,
como ainda persiste e domina nas etapas superiores da evolução: com tudo, na
medida em que a mente evolui e se descobre cada vez mais, chega pela experiência
da vida, do amor e da mútua ajuda a perceber que o indivíduo natural é um termo
menor do ser e existe pelo universal. Uma vez que se descobre isto —como des‐
cobre inevitavelmente o homem ao ser mental— seu destino está determinado; pois
alcançou o ponto em que a Mente pode começar a abrir-se à verdade de que há
algo além dela; desde esse momento sua evolução, ainda que obscura e lenta, em
posse desse algo superior, em posse do Espírito, em posse da supramente, em
posse do super-homem, está inevitavelmente pré-determinada.
Portanto, a Vida está pré-destinada por sua própria natureza a um terceiro estado,
um terceiro jogo de termos de sua auto-expressão. Se examinamos esta ascensão
da Vida veremos que os últimos ter mos de sua evolução real, os termos do que
temos chamado seu terceiro estado, devem necessariamente ser, em aparência, a
precisa contradição e oposto, ainda que de fato sejam a precisa realização e
transfiguração de suas primeiras condições. A Vida começa com as extremas
divisões e rigorosas formas da Matéria, e desta rigorosa divisão, o átomo, que é a
base de toda forma material, é o modelo preciso. O átomo está à parte de todos os
demais inclusive em sua união com eles, rejeita a morte e a dissolução sob qualquer
força ordinária e é o modelo físico do ego separado que define sua existência contra
o princípio da fusão na Natureza. Mas a unidade é tão forte princípio na Natureza
como a divisão; é certamente o princípio mestre do que a divisão é só um termo
subordinado, e para o princípio da unidade toda forma dividida deve, portanto,
subordinar-se, de um modo ou outro, por necessidade mecânica, por compulsão,
por assentimento ou por indução. Portanto, se a Natureza para seus próprios fins, a
fim de ter principalmente uma base firme para suas combinações e uma fixada
semente das formas, permite ao átomo resistir ordinariamente o processo de fusão
por dissolução, ela o compele a submeter-se ao processo de fusão por agregação; o
átomo, ao ser o agregado primeiro, é também a base primeira das unidades
agregadas.
Quando a Vida alcança seu segundo estado, o que reconhecemos como
vitalidade, toma a dianteira o fenômeno contrário e a base física do ego vital é
obrigada a consentir a dissolução. Seus componentes são desagregados de modo
que os elementos de uma vida podem usar-se para entrar na formação elemental de
outras vidas. A extensão na qual reina esta lei na Natureza não há sido ainda
plenamente reconhecida e certamente não pode sê-lo até que tenhamos uma
ciência da vida mental e da existência espiritual tão sólida como nossa atual ciência
da vida física e da existência da Matéria. Com tudo podemos ver amplamente que
não só os elementos de nosso corpo físico, senão também os de nosso mais sutil ser
vital, de nossa energia-vital, de nosso desejo-energia, de nossos poderes, desejos e
paixões, entram durante nossa vida e depois de nossa morte na existência-vital dos
demais. Um antigo conhecimento oculto nos diz que temos tanto uma estrutura vital
como física e esta também é dissolvida após a morte e se presta para a constituição
de outros corpos vitais; nossas energias vitais, enquanto vivemos, se misturam
continua mente com as energias de outros seres. Uma lei parecida governa as
relações mutuas de nossa vida mental com a vida mental de outras criaturas
pensantes. Há uma constante dissolução e dispersão, e uma reconstrução efetuada
pelo choque de mente sobre mente com um constante intercâmbio e fusão de
elementos. Intercâmbio, intercalados e fusão de ser com ser, é o processo mesmo
da vida, uma lei de sua existência.
Temos então dos princípios na Vida: a necessidade ou a vontade do ego
separado de sobreviver em sua distinção e conservar sua identidade, e a compulsão
imposta pela Natureza de fundir-se com os demais. No mundo físico ela faz grande
ênfase sobre o primeiro impulso; pois necessita criar estáveis formas separa das,
dado que seu primeiro e realmente seu mais difícil problema consiste em criar e
manter para ela qualquer coisa dessa índole como separativa sobrevivência de
individualidade e uma forma estável para ele no incessante fluxo e movimento da
Energia e na unidade do infinito. Portanto, na vida atômica, a forma individual
persiste como a base e assegura, mediante sua agregação com outros, a existência
mais ou menos prolongada das formas agregadas que serão a base de
individualizações vitais e mentais. Mas tão pronto a Natureza assegurou suficiente
firmeza a este respeito para o seguro manejo de suas últimas operações, inverte o
processo; a forma individual perece e a vida agregada se beneficia com os
elementos da forma que se dissolve dessa maneira. No entanto, esta não pode ser a
última etapa; essa só pode alcançar-se quando se harmonizem os dois princípios,
quando o indivíduo possa persistir na consciência de sua individualidade e com tudo
fundir-se com os demais sem alteração do preservador equilíbrio nem interrupção da
sobrevivência.
Os termos do problema pressupõe, o pleno emergir da Mente; pois na vitalidade
sem mente consciente não pode haver equação, senão só um temporal equilíbrio
instável que culmina na morte do corpo, a dissolução do indivíduo e a dispersão de
seus elementos na universalidade. A natureza da Vida física proíbe a idéia de uma
forma individual que possua o mesmo poder inerente de persistência e, portanto, de
continuada existência individual como os átomos de que está composta. Só um ser
mental, sustentado pelo nó psíquico dentro do qual se expressa ou começa a
expressar a alma secreta, pode esperançosamente persistir mediante seu poder de
vincular o passado ao futuro em uma corrente de continuidade que a desagregação
da forma pode quebrar na memória física sem necessidade de que se rompa no ser
mental e que, inclusive mediante um eventual desenvolvimento, pode estender uma
ponte sobre a brecha da memória física, criada pela morte e o nascimento do corpo.
Tal como é, no imperfeito desenvolvimento atual da mente corporizada, o ser
mental é consciente na massa de um passado e um futuro que se estendem além da
vida do corpo; toma consciência de um passado individual, de vidas individuais que
criaram a sua e das quais ele é um desenvolvimento e modificada reprodução e de
futuras vidas individuais que ele cria à partir de si; é consciente também de uma
agregada vida passada e futura através da qual sua própria continuidade corre como
uma de suas fibras. Isto que é evidente para a ciência física nos termos da herança,
chega a ser de outro modo evidente para a alma em evolução detrás do ser mental
nos termos da personalidade persistente. O ser mental que expressa esta alma-
consciência é, portanto, o nó do indivíduo persistente e da persistente vida agregada
com outros indivíduos; nele sua união e harmonia se tornam possíveis.
A associação com o amor como seu princípio secreto e seu emergente cume é o
modelo, o poder desta nova relação e, portanto, o princípio condutor do
desenvolvimento no terceiro estado da vida. A preservação consciente da
individualidade junto com a conscientemente aceitada necessidade e desejo de
intercâmbio, auto-entrega e fusão com outros indivíduos, é necessária para o
funcionamento do princípio do amor; pois se fica abolida, a atividade do amor cessa,
qualquer que seja o lugar que tome. A realização do amor por inteira auto-imolação,
inclusive com uma ilusão de auto-aniquilação, é, por certo, uma idéia e um impulso
no ser mental, mas aponta a um desenvolvimento além deste terceiro estado da
Vida. Este terceiro estado é uma condição na que progressivamente nos ele vamos
além da luta pela vida consistente em devorar-se mutuamente e na sobrevivência
dos mais aptos para essa luta; pois cada vez há mais sobrevivência por mútua ajuda
e auto-aperfeiçoamento me diante adaptação mútua, intercâmbio e fusão. A Vida é
auto-afirmação de ser, inclusive desenvolvimento e sobrevivência do ego, mais de
um ser que necessita de outros seres, um ego que procura encontrar e incluir outros
egos e ser incluído na vida destes. Os indivíduos e os agregados (grupos de
indivíduos), que desenvolvem primordialmente a lei de associação e a lei de amor,
de ajuda comum, bondade, afeto, camaradagem, unidade, que harmonizam mais
exitosamente a sobrevivência e mútua auto-entrega, o grupo que aumentam
indivíduo e vice-versa, e o indivíduo que aumenta o individuo e o grupo que faz o
próprio com outro grupo, mediante intercâmbio mútuo, serão os mais aptos para a
sobrevivência neste estado terciário da evolução.
Este desenvolvimento é significativo do muito crescente predomínio da Mente[5]que
progressivamente impõe seu própria lei cada vez mais sobre a existência material.
Pois a mente por sua maior sutileza não necessita devorar para assimilar, possuir e
crescer; quanto mais da, mais recebe e cresce; e quanto mais se funde nos demais,
estes mais se fundem nela, incrementando assim o âmbito de sua ser. A vida física
se esvazia quando dá demasiado e se arruína quando devora demasiado; mas ainda
que a Mente em proporção a como se inclina sobre a lei da Matéria sofre a mesma
limitação, com tudo, no outro lado, em proporção a como cresce em sua própria lei,
tende a vencer esta limitada, e em proporção a como vence a limitação material,
dando e recebendo, chega a ser uma só. Pois em sua ascensão cresce em posse da
regra de unidade consciente na diferenciação que é a lei divina do manifesto
Satchitananda.
O segundo termo do estado original da vida é a vontade subconsciente que no
estado secundário se converte em fome e desejo consciente, —fome e desejo, a
primeira semente da mente consciente--. O crescimento dentro do terceiro estado
da vida pelo princípio de associação, o crescimento do amor, não deixa sem efeito a
lei do desejo, senão que mais a transforma e realiza. O amor é em sua natureza o
desejo de dar-se aos demais e receber aos demais em intercâmbio; é comércio
entre ser e ser: A vida física não deseja dar-se, só deseja receber. É certo que está
compelida a dar-se, pois a vida que só recebe e não dá deve tornar-se estéril,
murchar e perecer, —(se é que essa classe de vida é possível aqui ou em qualquer
mundo)--; mas está compelida, sem querê-lo, e obedece ao impulso subconsciente
da Natureza (Força Consciente criadora dos mundos) sem participar consciente
mente nele. Inclusive quando o amor intervêm, ao princípio a auto -entrega todavia
conserva em alto grau o caráter mecânico da vontade subconsciente no átomo. O
amor mesmo a princípio obedece à lei da fome e desfruta o receber e retirar dos
outros, mais que o dar-se e render-se aos demais, que admite principalmente como
preço necessário para obter a coisa que deseja. Mas aqui não chegou ainda a sua
verdadeira natureza; sua verdadeira lei é estabelecer um comércio igual em que o
de dar- se é iguala ao receber e armazenar, ao fim, a converter-se em ainda maior;
mas isso ocorre quando se lança além de si mesmo, na pressão da chama física para
alcançar a realização da completa unidade e, portanto, devem realizar aqueles que
pareciam tão distintos, aquele que lhe pareceu (não-eu) como um ser (eu) maior e
querido que sua própria individualidade. Em sua origem-vital, a lei do amor é o
impulso de realizar-se e alcançados a si mesmo nos demais e pelos demais, de
enriquecer-se enriquecendo, de possuir r ser possuído pois sem ser possuído não se
possui a si mesmo por completo.
A incapacidade inerte da existência atômica de possuir-se, a sujeição do indivíduo
material ao (não-eu), pertence ao primeiro estado da vida. A consciência da
limitação e a luta por possuir, por dominar o ser (eu) e aos demais (não-eu), é o
modelo do estado secundário. Aqui também o desenvolvimento até o terceiro estado
traz uma transformação dos termos originais dentro de uma realização e uma
harmonia que repete os termos enquanto aparentemente os contradiz. Advêm,
através da associação e do amor um reconhecimento dos demais (não-eu) como ser
(eu) maior e, portanto, uma submissão conscientemente aceitada a sua lei e
necessidade que realiza o crescente impulso da vida de grupo a absorver o
indivíduo; e há uma possessão novamente, por parte do indivíduo, da vida dos
demais como a sua própria e de tudo o que há de dar-se-lhe como seu próprio, que
realiza o impulso oposto da possessão individual. Esta relação de mutualidade entre
o indivíduo e o mundo em que vive não pode expressar-se, completar-se nem
assegurar-se a menos que se estabeleça a mesma relação entre indivíduo e
indivíduo e entre grupo e grupo. Tudo o difícil esforço do homem em prol da
harmonização da auto- afirmação e da liberdade, pela que se possui a si mesmo,
com a associação e amor, fraternidade, camaradagem, nas que se entrega aos
demais, --(seus ideais de harmonioso equilíbrio, justiça, mutualidade, igualdade pelo
que cria um equilíbrio dos dois opostos)--, são em realidade uma tentativa
inevitavelemente Pré-determinado em seus lineamentos para resolver o problema
original da Natureza, o problema da Vida mesma, mediante a resolução do conflito
entre os dois opostos que se apresentam nos fundamentos mesmos da Vida na
Matéria. a resolução é tentada pelo princípio superior da Mente que só pode achar o
caminho para a harmonia buscada, ainda que a harmonia mesma só possa achar-se
em um Poder todavia além de nós.
Pois, se os dados com que temos partido são corretos, o fim do caminho, a meta
mesma só pode ser alcançada pela Mente indo além de Si mesma dentro disso que
está além da Mente, dado que de Isso (a Mente) é só um termo inferior e um
instrumento primeiramente para o descenso na forma e a individualidade, e
secundariamente para o reascensão à realidade que a forma corporizada e a
individualidade representam. Portanto, a solução perfeita do problema da Vida não
é possível realizá-la por associação, intercâmbio nem conveniências só do amor ou
através da lei da mente e do coração . Deve chegar por um quarto estado da vida
no que a eterna unidade dos muitos se realiza através do espírito e o fundamento
consciente de todas as operações da vida não mente mas na divisão do corpo, nem
em as paixões e fomes da vitalidade, nem nas agrupadoras e imperfeitas harmonias
da mente, nem em una combinação de todos estes, senão na unidade e liberdade
do Espírito.

,
[1] X 30, 1.

[2] II, 22, 3.

[3] IX, 96, 18, 19.

[4] I. 22. 17-21.

[5] Do que aqui se fala é da mente tal como atua diretamente na vida, no ser vital, através do coração. O
amor -o princípio relativo, no seu absoluto-, é um princípio da vida, não da mente, mas pode possuir-se e
deslocar-se até a permanência só quando a mente alcança sua própria. O que se chama amor do corpo e
partes vitais é, principal mente, uma forma de fome sem permanência
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Capítulo XXII
O PROBLEMA DA VIDA
Isto é o que é chamado a Vida universal.

Taittiriya Upanishad[1]
O Senhor está assentado no coração de todos os seres girando todos os seres montados
sobre uma maquinaria, mediante sua Maya.

Gita[2]
Quem conhece a Verdade, o Conhecimento, a Infinitude que é Brahman, desfrutará com o
todo-sábio Brahman todos os objetos do desejo.

Taittiriya Upanishad[3]
Como temos visto, a Vida é a implementação, sob certas circunstâncias cósmicas, de
uma Força-Consciente que é em sua própria natureza infinita, absoluta, não-travada,
inalienavelmente dona de sua própria unidade e bem-aventurança, a Força-
Consciente de Satchitananda. A circunstância central deste processo cósmico, --(na
medida em que difere em suas aparências da pureza da Existência infinita e da auto-
possessão da Energia indivisível)--, é a divisora faculdade da Mente obscurecida pela
ignorância. Assim resulta que desde esta dividida ação, de uma Força não dividida, a
aparição de dualidades, oposições, e aparentes negações da natureza de
Satchitananda que existem como uma duradoura realidade para a mente, mas só
como um fenômeno que representa mal uma múltipla Realidade para a divina
Consciência cósmica oculta detrás do véu da mente. Daqui que o mundo assuma a
aparência de um conflito de opostas verdades, cada uma buscando realizar-se, cada
uma com direito a realização, e portanto de uma massa de problemas e mistérios
que hão de resolver-se porque detrás de toda esta confusão está a oculta Verdade e
Unidade que pressiona para a solução e, mediante a solução para sua própria
desvelada manifestação no mundo.
Esta solução a mente há de buscá-la, mais não a mente só; há de ser uma
solução na Vida, no ato de ser igualmente na consciência de ser. A Consciência
como Força criou o movimento-do-mundo e seus problemas; a Consciência como
Força há de resolver os problemas que criou e levar o movimento-do-mundo à
inevitável realização de seu sentido secreto e de sua Verdade evolutiva. Mas esta
Vida tomou sucessivamente três aparências. A primeira é material, —(uma
consciência submergida está oculta em sua superficial ação expressiva e formas
representativas da força; pois a consciência mesma desaparece da vista no ato e se
perde na forma)--. A segunda é vital, —uma emergente consciência que é semi-
aparente como poder da vida e processo do crescimento, da atividade e da
decadência da forma, que está semi-liberada de sua prisão original, que chegou a
ser vibrante no poder, como vital desejo e satisfação ou repulsão, mas ao princípio
não totalmente e logo só imperfeitamente vibrante na luz como conhecimento de
sua própria auto-existência e de seu entorno)-. A terceira é mental, —uma
consciência emergida reflete o fato da vida como sentido mental e sensível
percepção e idéia, enquanto que como uma nova idéia procura chegar a ser um fato
da vida, modifica o interno e trata de modificar satisfatoriamente a existência
externa do ser). Aqui, na mente, a consciência se libera de sua prisão no ato e na
forma de sua própria força; mas todavia não é dona do ato e da forma porquê
emergiu como uma consciência individual e, portanto, é consciente só de um
movimento fragmentário de suas próprias atividades totais.
Toda a cruz e dificuldade da vida humana reside ali. O homem é este ser mental,
esta consciência mental que atua como força mental, consciente em um sentido da
força universal e da vida da qual ele é uma parte mas, devido a que ele não tem
conhecimento de sua universalidade nem sequer da totalidade de seu próprio ser,
resulta incapaz de encarar seja a vida em geral, seja já sua própria vida em um
realmente efetivo e vitorioso movimento de domínio. Busca conhecer a Matéria a fim
de ser dono do entorno material, conhecer a Vida a fim de ser dono da existência
vital, conhecer a Mente a fim de ser dono do grande movimento obscuro da
mentalidade na que ele não é só um jorro de luz da auto-consciência como o animal,
senão também cada vez mais uma chama de crescente conhecimento. Busca assim
conhecer-se para ser dono de si mesmo, conhecer o mundo para ser dono do
mundo. Este é o valor da existência nele, a necessidade da Consciência que ele é, o
impulso da Força que é sua vida, a secreta vontade de Satchitananda que aparece
como o indivíduo em um mundo no que Ele se expressa e contudo parece negar a Si
Mesmo. Falar as condições sob as quais se satisfaz este impulso interior é o
problema que o homem sempre deve lutar por resolver e ao que está compelido
pela natureza mesma de sua própria existência e pela Deidade assentada dentro
dele; e até que o problema se resolva e se satisfaça o impulso, a espécie humana
não pode descansar de seu trabalho. O homem deve realizar-se satisfazendo o
Divino dentro dele mesmo ou deve produzir a partir dele mesmo um ser novo e
maior que seja mais capaz de satisfazê-lo. Ou melhor, deve chegar a ser uma divina
humanidade, ou mais, dar lugar ao Super-homem.
Isto resulta da lógica mesma das coisas porque, --(a não ser a consciência
mental do homem a completamente iluminada consciência emergida por inteiro do
obscurecimento da Matéria senão só um término progressivo no grande emergir)--,
a linha da criação evolutiva na que ele apareceu não pode deter-se donde está
agora, senão que deve seguir seja já além de seu próprio estado atual ou seja já
além dele como espécie se ele mesmo não tem a força para ir mais adiante. A idéia
mental que procura converter-se em fato da vida deve continuar até converter-se na
Verdade total da existência, liberando-se de suas sucessivas envolturas, revelada e
progressivamente realizada na luz da consciência e gozosamente realizada no poder;
pois em e através destes dois termos do poder e da luz, a Existência se manifesta,
porque a existência é em sua natureza Consciência e Força; mas o terceiro termo no
que estes, seus dois componentes, se encontram, se converte em um só e em
última instância se realizam, é o satisfatório Deleite da auto-existência. Para uma
vida evolutiva como a nossa, esta inevitável culminação deve necessariamente
significar o encontro do ser (Eu) que estava contido na semente de seu próprio
nascimento e, com esse auto-encontro, se completa o labor iniciado à partir das
potencialidades depositadas no movimento da Força-Consciente desde que esta vida
tomou sua elevação. A potencialidade assim contida em nossa existência humana é
Satchitananda realizando-se a Si mesmo em certa harmonia e unificação da vida
individual e a universal de modo que a humanidade expressará, em uma consciência
comum, em um movimento comum do poder e em um deleite comum, ao Algo
transcendente que se plasmou dentro desta forma das coisas.
Toda vida depende para sua natureza do equilíbrio fundamental de sua própria
consciência constituinte; pois assim como é a Consciência, assim será a Força. Onde
a Consciência é infinita, una, transcendente de seus atos e formas, inclusive quando
os abarca e conforma, quando as organiza e executa, como é a consciência de
Satchitananda, assim será a Força, infinita em seu alcance, una em suas obras,
transcendente em seu poder e auto-conhecimento. Onde a Consciência é como a da
Natureza material, --(submergida, auto-esquecida, seguindo o rumo de sua própria
Força sem parecer sabê-lo, inclusive ainda que pela natureza mesma da relação
eterna entre os dois termos realmente determina o rumo que segue)--, assim será a
Força; será um monstruoso movimento do Inerte e Inconsciente, desconhecedor do
que contêm, que parece realizar-se mecanicamente por uma sorte de acidente
inexorável, uma inevitavelmente feliz probabilidade, ainda que todo esse tempo em
realidade obedeça infalivelmente à lei do Correto e da Verdade fixada a esse efeito
mediante a vontade do Celestial Ser-Consciente oculto dentro de seu movimento.
Onde a Consciência está dividida em si mesma, como na Mente, limitando-se em
múltiplos centros, pondo cada um a realizar-se sem conhecimento do que sucede
nos outros centros e de suas relações com os outros, consciente das coisas e forças
em sua aparente divisão e oposição umas com outras mas não em sua real Unidade,
tal será a Força: será uma vida como a que somos e vemos a nosso redor; será um
choque e entrelaçamento de vidas individuais que buscam cada uma sua própria
realização sem conhecer sua relação com os demais, uma conflituosa e difícil
adaptação de forças divididas e opostas ou diferentes e, na mentalidade, uma
mescla, um chocar e lutar, e uma insegura combinação de idéias divididas e opostas
ou divergentes que não podem nem chegar ao conhecimento de sua mútua
necessidade nem tomar seu lugar como elementos dessa Unidade detrás, a qual
está expressando-se através delas e na que devem cessar suas discórdias. Mas
donde a Consciência está em possessão da diversidade e da unidade e a última
contêm e governa à primeira, donde é consciente simultaneamente da Lei, da
Verdade e do Correto do Todo, e da Lei, a Verdade e o Correto do indivíduo e
ambos chegam a ser harmonizados conscientemente em uma mútua unidade, donde
a natureza total da consciência é o Uno que se conhece como os Muitos e os Muitos
que se conhecem como o Um, ali a Força também será da mesma natureza: será
uma Vida que conscientemente obedece à lei da Unidade e realiza cada coisa na
diversidade de acordo a sua regra e função apropriadas; será uma vida na que todos
os indivíduos vivam ao mesmo tempo em si mesmos e unido para o outro como um
só Ser consciente em muitas almas, um só poder da Consciência em muitas mentes,
uma só força atuando em muitas vidas, uma só realidade do Deleite realizando-se
em muitos corações e corpos.
A primeira destas quatro posições, a fonte de toda esta progressiva relação entre a
Consciência e a Força, é seu equilíbrio no ser de Satchitananda donde são um só;
pois ali a Força é consciência do ser estruturando-se sem cessar jamais de ser
consciência e a Consciência é analogamente Força luminosa do ser eternamente
consciente de si mesma e de seu próprio Deleite, sem cessar jamais de ser este
poder de completa luz e auto-possessão. A segunda relação é a da Natureza
material; é o equilíbrio do ser no universo material que é a grande negação de
Satchitananda por parte Dele Mesmo: pois aqui está a aparente separação completa
de Força e Consciência, o enganoso milagre do todo-governante e infalível
Inconsciente que é só a máscara, mas que o conhecimento moderno confundiu com
o rosto real da Deidade cósmica. A terceira relação é o equilíbrio do ser na Mente e
na Vida que vemos emergindo à partir desta negação, perturbada por ela, lutando
—(sem possibilidade alguma de cessar por submissão, mas também sem nenhum
claro conhecimento nem instinto de uma solução vitoriosa), contra os mil e um
problemas que implica esta perplexa aparição do homem, --o semi-potente ser
consciente--, à partir da onipotente Inconsciência do universo material. A quarta
relação é o equilíbrio do ser na Supramente: é a existência realizada que
eventualmente resolverá todo este complexo problema criado pela parcial afirmação
que emerge à partir da negação total; e é necessário que se resolva do único modo
possível, mediante a completa afirmação que realize tudo o que estava ali
secretamente contido na potencialidade e proposto no fato da evolução detrás da
máscara da grande negação. Essa é a vida real do Homem real, para a que esta vida
parcial e esta parcial humanidade irrealizada tende com O perfeito Conhecimento e
guia no denominado Inconsciente dentro de nós, mas em nossas partes conscientes
unicamente com uma obscura e pungente previsão, com fragmentos de realização,
com vislumbres do ideal, com desejos de revelação e inspiração no poeta e no
profeta, no vidente e no que busca transcender, no místico e no pensador, nos
grandes intelectos e nas grandes almas da humanidade.
Dos dados que agora temos diante de nós podemos ver que as dificuldades que
surgem do imperfeito equilíbrio da Consciência e a Força no homem em seu atual
estado da mente e da vida, são principalmente três. Primeira, é consciente só de
uma pequena parte de seu ser; sua mentalidade superficial, sua vida superficial, seu
físico ser superficial é tudo quanto conhece e disto não conhece tudo; debaixo está
a oculta agitação de seu subconsciente e sua subliminal mente, de seus impulsos-
vitais subconscientes e subliminares, de sua corporeidade subconsciente, toda essa
grande parte dele que não conhece nem pode governar, senão que mais conhece-o
e governa-o. Pois, ao ser a existência, a consciência e a força são uma só coisa, só
podemos ter algum poder real sobre uma parte apreciável de nossa existência se
nos identificamos com ela mediante auto-conhecimento; o resto, deve ser
governado por sua própria consciência que é subliminal para nossa mente, vida e
corpo superficiais. E contudo, ao ser ambos são um só movimento e não dois
movimentos separados, a maior e mais potente parte de nós deve governar e
determinar na massa a menor menos poderosa; portanto estamos governados pelo
subconsciente e o subliminal inclusive em nossa existência consciente, e em nosso
auto-domínio e auto-direção só somos instrumentos do que nos parece o
Inconsciente dentro de nós.
Isto é o que assinalou a antiga sabedoria quando disse que o homem se imagina
como o realizador do trabalho mediante seu livre arbítrio, mas em realidade a
Natureza determina todas suas obras e inclusive o sábio está obrigado a seguir sua
própria Natureza. Mas dado que a Natureza é a força criadora da consciência do Ser
dentro de nós, que está mascarado por Seu próprio movimento inverso e aparente
negação Dele Mesmo, chamaram, a esse movimento criador inverso de Sua
consciência, Maya ou Poder-Ilusão do Senhor e disseram que todas as existências
são o girar como sobre uma máquina mediante Sua Maya pelo Senhor que mora no
coração de todas as existências. É evidente então que só pelo homem, que de tal
modo supera à mente para chegar a ser um no auto-conhecimento com o Senhor,
pode chegar a ser dono de seu próprio ser. E dado que isto não é possível na
inconsciência nem no subconsciente mesmo, dado que não pode obter-se proveito
de afundar-nos em nossas profundidades em posse do Inconsciente, é só
internando-nos donde o Senhor mora e ascendendo até o que todavia é supra-
consciente para nós, até a Supramente, que esta unidade pode estabelecer-se por
completo. Pois ali, na Maya superior e divina está o conhecimento consciente em
sua lei e verdade, do que trabalha no subconsciente mediante a Maya inferior sob as
condições da Negação que busca converter-se em Afirmação. Pois esta Natureza
inferior estrutura o que se quer e conhece essa Natureza superior. A Ilusão-Poder do
conhecimento divino no mundo, que cria aparências, está governada pela Verdade-
Poder do mesmo conhecimento que conhece a verdade detrás das aparências e
mantêm finalizada para nós a Afirmação em posse da qual trabalham. O Homem
parcial e aparente descobrirá aqui o Homem perfeito e real, capaz de um ser
inteiramente auto-consciente por sua plena unida com este Auto-existente que é o
senhor onisciente de Sua própria evolução e procissão cósmicas.
A segunda dificuldade é que o homem está separado em sua mente, sua vida, seu
corpo, do universal e, portanto, inclusive como não se conhece a si mesmo, é
igualmente e ainda mais incapaz de conhecer às criaturas-semelhantes. Mediante
inferências, teorias, observações e certa capacidade imperfeita de simpatia, forma
uma tosca construção mental a cerca de seus semelhantes; mas isto não é
conhecimento. O conhecimiento pode só chegar por meio da identidade consciente,
pois isso é o único conhecimento verdadeiro, -a existência consciente de si mesma--.
Sabemos o que somos na medida em que temos plena consciência de nós, o resto
está oculto; de igual maneira podemos em realidade chegar a conhecer aquilo com
o que nós chegamos a ser um em nossa consciência, mas só na medida em que
possamos chegar a ser um com ele. Se os meios do conhecimento são indiretos e
imperfeitos, o conhecimento obtido será também indireto e imperfeito. Capacitar-
nos-á para elaborar com uma certa precária torpeza mas todavia bastante
perfeitamente desde nosso ponto de vista mental, certos limitados objetivos
práticos, necessidades, conveniências, uma certa imperfeita e insegura harmonia de
nossas relações com o que conhecemos; mas só mediante uma unidade consciente
com ele podemos chegar a uma relação perfeita. Portanto devemos chegar a uma
consciente unidade com nossos seres-semelhantes e não meramente à simpatia
criada pelo amor ou a compreensão criada pelo conhecimento mental que sempre
serão o conhecimento de sua existência superficial e portanto imperfeita em si e
sujeita à negação e à frustração pela erupção do desconhecido e não-dominado
desde o subconsciente ou o subliminal neles e em nós. Mas esta unidade consciente
só pode estabelecer-se ingressando naquilo no que somos um só com eles, o
universal; e a plenitude do universal existe conscientemente só no que é supra-
consciente para nós, na Supramente: pois aqui em nosso ser normal a maior parte
do mesmo é subconsciente e, portanto, não pode possuir-se neste normal equilíbrio
de mente, vida e cOrpo. A natureza consciente inferior está escravizada ao ego em
todas suas atividades, encadeada triplamente ao poste da individualidade
diferenciada. A Supramente só rege a unidade na diversidade.
A terceira dificuldade é a divisão entre a força e a consciência na existência
evolutiva. Primeiro existe a divisão que foi criada pela evolução mesma em suas três
sucessivas formações de Matéria, Vida e Mente, cada uma com sua própria lei de
atividade. A Vida está em guerra com o corpo; trata de forçá-lo a satisfazer os
desejos, impulsos, satisfações e demandas vitais desde sua limitada capacidade, que
só poderíam ser possíveis para um corpo imortal e divino; e o corpo, escravizado e
tiranizado, sofre e está em constante muda revolta contra as demandas que lhe
apresenta a Vida. A Mente está em guerra com ambos: às vezes ajuda a Vida contra
o Corpo, outras restringe a urgência vital e procura proteger a estrutura corporal dos
desejos, paixões e envoltas energias vitais; também busca possuir a Vida e despejar
sua energia para os fins da mente, até os máximos deleites da própria atividade
mental, para a satisfação de objetivos mentais, estéticos e emocionais, e para sua
realização na existência humana; e a Vida também se acha escravizada,
equivocadamente empregada e em frequente insurreição contra o ignorante tirano
semi-sábio assentado sobre ela. Esta é a guerra de nossos membros que a mente
não pode resolver satisfatoriamente pois há de tratar um problema insolúvel para
ela, a aspiração de um ser imortal em uma vida e corpo mortais. Pode só chegar a
uma larga sucessão de compromissos e concluir em um abandono do problema, seja
já como materialista, mediante submissão à mortalidade de nosso ser aparente, ou
como o asceta e o fundamentalista religioso, mediante a renúncia e condenação da
vida terrena e pelo retiro em posse de mais felizes e cômodos campos da existência.
Mas a verdadeira solução reside em encontrar o princípio além da Mente, do qual a
Imortalidade é a lei, e em conquistar mediante ela a mortalidade de nossa
existência.
Mas existe também esta fundamental divisão interior entre a força da Natureza e o
ser consciente que é a causa original desta incapacidade. Ali não só há uma divisão
entre ser mental, vital e físico, senão que, a sua vez, cada um deles, está dividido
contra si. A capacidade do corpo é menor que a capacidade da alma instintiva ou ser
consciente, o Purusha físico dentro dela; a capacitada da força vital é menor que a
capacidade da alma impulsiva, o consciente ser vital, Purusha dentro dela; a
capacidade da energia mental é menor que a capacidade da alma intelectual e
emocional, o Purusha mental dentro dela. Pois a alma é a consciência interior que
aspira a sua completa auto-realização e, portanto, sempre excede a formação
individual do momento, e a Força que tornou seu equilíbrio na formação é sempre
empurrada por sua alma para o que é anormal para o equilíbrio, transcendente dele;
empurrada dessa maneira, constantemente, tem demasiados transtornos para
responder, ainda mais para evoluir da atual a uma capacidade maior. Ao tratar de
satisfazer as demandas desta alma tríplece, se distrai e se deixa levar até colocar
instinto contra instinto, impulso contra impulso, emoção contra emoção, idéia contra
idéia, satisfazendo isto, negando aquilo, logo arrependendo-se e retornando ao fato,
ajustando, compensando, reajustando ad infinitum mas sem chegar a princípio
algum de unidade. E na mente novamente o poder-consciente, que há de
harmonizar e unir, está não só limitado em seu conhecimento e em sua vontade,
senão que também o conhecimento e a vontade estão separados e muitas vezes em
discórdia. O princípio da unidade está acima na supramente; pois só ali a unidade é
consciente de todas as diversidades; pois só ali o conhecimento e a vontade são
iguais e em perfeita harmonia; só ali a Consciência e a Força alcançam a sua divina
equação.
O homem, em proporção a como se desenvolve dentro de um ser auto-consciente e
verdadeiramente pensante, chega a ser agudamente consciente de toda esta
discórdia e separação em suas partes e busca chegar a uma harmonia de sua
mente, vida e corpo; uma harmonia de seu conhecimento, vontade e emoção; uma
harmonia de todos seus membros. Às vezes este desejo se detém na conquista de
um trabalhoso compromisso que trará consigo relativa paz; mas o compromisso só
pode ser um alto no caminho, dado que a Deidade interior não se satisfará
eventualmente com menos que uma perfeita harmonia que combine em si mesma o
desenvolvimento integral de nossas multilaterais potencialidades. Menos que isto
seria uma evasão do problema, não sua solução, ou só uma temporária solução
prevista como lugar de descanso para a alma e seu auto-alargamento e ascenção
contínuos. Tal perfeita harmonia demandaria como tERMs essenciais uma
mentalidade perfeita, um jogo perfeito da força vital, uma existência física perfeita.
Mas onde, no radicalmente imperfeito, encontraremos o princípio e poder da
perfeição? A mente enraizada na divisão e na limitação não pode proporcionar-nos-o
e tão pouco o podem a vida nem o corpo que são a energia e a estrutura da mente
divisora e limitadora. O princípio e poder da perfeição estão ali no subconsciente
mas envolvidos no tegumento ou véu da Maya inferior, uma muda premunição que
emerge como um irrealizado ideal; no supra-consciente eles –o princípio e o poder
da perfeição--, esperam, abertos, eternamente realizados, mas, ainda separados de
nós pelo véu de nossa auto-ignorância. É acima, então, e não no nosso atual
equilíbrio nem debaixo dele mesmo, que devemos buscar o poder e conhecimento
reconciliadores.
De igual modo, o homem, na medida que evolui, torna-se agudamente consciente
da discórdia e ignorância que governam suas relações com o mundo, agudamente
intolerante a esse respeito, cada vez mais enquistado em posse de um princípio de
harmonia, paz, alegria e unidade. Isto também só pode chegar-lhe desde cima. Pois
só desenvolvendo uma mente que tenha o conhecimento da mente dos demais
como de si mesma, livre de nossa mútua ignorância e má interpretação, uma
vontade que sinta e se unifique com a vontade dos demais, um coração emocional
que contenha as emoções dos demais como próprias, uma força-vital que sinta as
energias dos demais e as aceite para si e busque satisfazê-las como próprias, e um
corpo que não seja muro de prisão nem defesa contra o mundo, --(senão tudo isto
sobre a lei de uma Luz e uma Verdade que transcendam as aberrações e erros, o
muito pecado e falsidade de nossas mentes, vontades, emoções e energias-vitais e
também dos demais)--, só assim a vida do homem pode espiritual e praticamente
chegar a ser uma só com a de seus seres-semelhantes e recobrar o indivíduo seu
próprio ser (eu) universal. O subconsciente tem esta vida do Todo e o supra-
consciente a tem, mas sob condições que necessitam nosso movimento ascendente.
Mas não para o Deus oculto no “inconsciente oceano onde a obscuridade está
envolvida dentro da obscuridade”,[4] senão para o Deus que mora no mar da eterna
luz[5]; no éter supremo de nosso ser, está o ímpeto original que levou para cima a
evolutiva alma ao modelo de nossa humanidade.
Portanto, a menos que a espécie caia a um lado do caminho e deixe a vitória a
outras e novas criações da inquieta e produtiva Mãe, deve aspirar a esta ascensão,
conduzida certamente através do amor, da iluminação mental e do impulso vital de
possessão de si e auto-entrega, mas conduzindo mais além à unidade supramental
que as transcende e realiza; no fundamento da vida humana sobre a realização
supramental da unidade consciente com o Uno e com todos em nosso ser e em
todos seus membros, a humanidade deve buscar seu bem e salvação finais. E isto é
o que temos descrito como o quarto estado da Vida em sua ascensão para a
Deidade.
[1] II, 3.

[2] XVIII, 61.

[3] II, 1.

[4] Rig Veda, X, 129, 3.

[5] As Águas que estão no reino da luz por cima do Sol e aquelas que moram debaixo. Rig Veda, III, 22, 3.
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pítulo XXIII
DUPLA ALMA NO HOMEM
Purusha, eu interior, não maior que o tamanho do polegar de uma mão.

Katha Upanishad[1][1]

Swetaswatara Upanishad[2][2]

Aquele que conhece este Eu que é o que come o mel da existência e o senhor dela que é e
será, desde então não se oprime.

Katha Upanishad[3][3]
De que terá pesar, como será enganado quem vê a Unidade por toda a parte?

Isha Upanisha[4][4]
Quem encontrou a bem-aventurança do Eterno, nada teme.

Taittiriya Upanishad[5][5]
Descobrimos que o primeiro estado da Vida se caracteriza por um mudo e
inconsciente impulso ou estímulo, uma força de alguma vontade envolvida na
existência material ou atômica, não livre nem dona de si ou de suas obras ou
resultados, senão possuída por inteiro pelo movimento universal em que surge como
a escura e não formada semente da individualidade. A raiz do segundo estado é o
desejo, a ânsia de possuir ainda que limitada na capacidade; ou ímpeto, o surto do
terceiro é o Amor que busca possuir e ser possuído, receber e dar-se; a fina flor do
quarto, seu signo de perfeição, o concebemos como o puro e pleno emergir da
vontade original, a iluminada realização do desejo intermediário, a elevada e
profunda satisfação do consciente intercâmbio de Amor mediante a unificação do
estado do possuidor e o possuído na divina unidade das almas que é o fundamento
da existência supramental. Se examinamos com cuidado estes termos veremos que
são formas e etapas da busca da alma em posse do deleite individual e universal das
coisas; a ascensão da Vida é em sua natureza a ascensão do divino deleite nas
coisas desde sua muda concepção na Matéria, através das vicissitudes e oposições,
até sua luminosa consumação no Espírito.
Ao ser o mundo o que é, e não pode ser de outro modo. Pois o mundo é uma
mascarada forma de Satchitananda, e a natureza da consciência de Satchitananda e,
portanto, a coisa na que Sua força deve sempre achar-se e alcançar-se é a divina
Bem-aventurança, um onipresente auto-deleite. Dado que a Vida é uma energia de
Sua força-consciente, o segredo de todos seus movimentos deve ser um oculto
deleite inerente a todas as cosas que é de uma vez causa, motivo e objeto de suas
atividades; e se por razão da egoísta divisão se perde esse deleite, se o tem detrás
de um véu, se o representa como seu próprio oposto, inclusive se o ser está‐
mascarado na morte, a consciência figure como o inconsciente e a força se simule
sob o disfarce da incapacidade, então, o que vive não pode ser satisfeito, não pode
nem descansar do movimento nem cumprir o movimento a não ser que se afirme
neste deleite universal que é, de uma vez, o secreto deleite total de seu próprio ser,
e o original todo-abarcante, todo-informante, todo-ascendente deleite do tras‐
cendente e imanente Satchitananda. Ir na procura do deleite é, portanto, o
fundamental impulso e o sentido da Vida, encontrá-lo, possuí-lo e realizá-lo é seu
motivo total.
Mas onde está em nós este princípio de Deleite? Através de que termo de nosso ser
se manifesta e realiza na ação do cosmos como o princípio da Força-Consciente
manifesta e usa a Vida para seu termo cósmico e o princípio da Supramente
manifesta e usa a Mente? Temos distinguido um quádruplo princípio do divino Ser
criador do universo, —Existência, Força-Consciente, Bem-aventurança e
Supramente--. A Supermente, o temos visto, é onipresente no cosmos material, mas
velada; está detrás do fenômeno real das coisas, e ocultamente se expressa ali. Mas
usa em sua atuação a seu próprio termo subordinado, a Mente. A divina
Consciência-Força é onipresente no cosmos material, mas velada, opera
secretamente detrás dos fenômenos reais das coisas, e se expresa ali
característicamente através de seu próprio termo subordinado, a Vida. E, ainda que
não temos examinado ainda separadamente o princípio da Matéria, contudo,
podemos ver que a divina Todo--existência também está onipresente no cosmos
material, mas velada, oculta detrás do fenômeno real das coisas, e se manifesta ali
inicialmente através de seu próprio termo subordinado, Substância, Forma de ser,
ou Matéria. Logo, de modo igual, o princípio da divina Bem-aventurança deve ser
onipresente no cosmos, por certo velado e possuindo-se detrás do fenômeno real
das coisas, mas ainda manifestado em nós através de algum princípio subordinado
seu próprio no que se oculta e mediante o qual deve ser encontrado e concretizado
na ação do universo.
Esse termo é algo em nós que às vezes denominados, em um sentido especial, a
alma, —(vale dizer, o princípio psíquico que não é a vida nem a mente, muito menos
o corpo, mas que tem em si mesmo a abertura e florescimento da essência de todos
estes até seu próprio deleite peculiar do ser (eu), para a luz, para o amor, para a
alegria e a beleza, e até uma refinada pureza do ser)--. No entanto, de fato há uma
dupla alma ou termo psíquico em nós, assim como todo outroprincípio cósmico em
nós é também duplo. Poius temos duas mentes: a mente superficial de nosso
expressado ego evolutivo, a mentalidade superficial criada por nós em nosso
emergir a partir da Matéria, e uma mente subliminal não impedida por nossa real
vida mental e suas estritas limitações, algo grande, potente e luminoso, o verdadeiro
ser mental que está detrás da forma superficial da personalidade mental e que
confundimos com nós mesmos. De modo que também temos duas vidas: uma
externa, envolvida no corpo físico, ligada por sua passada evolução na Matéria, que
vive, nasceu e morrerá; a outra, uma força subliminal de vida que não está
encerrada entre os estreitos limites de nosso nascimento e morte físicos, senão que
é nosso verdadeiro ser vital detrás de la forma de vida que ignorantemente
tomamos por nossa existência real. Inclusive no que diga respeito a nosso ser existe
esta dualidade; pois detrás de nosso corpo temos uma mais sutil existência material
que provê a substância não só de nossa envoltura física senão também da vital e
mental e portanto nossa substância real está sustentando esta forma física a que
erroneamente imaginamos como corpo íntegro de nosso espírito. Assim mesmo
temos em nós uma dupla entidade psíquica, a alma-de-desejo superficial que
trabalha em nossos desejos vitais, nossas emoções, faculdade estética e busca
mental de poder, conhecimento e felicidade, e uma subliminal entidade psíquica, um
puro poder de luz, amor, alegria e refinada essência do ser que é nossa verdadeira
alma detrás da forma externa de existência psíquica, que tão muitas vezes
dignificamos com o nome. Quando chega à superfície algum reflexo desta maior e
mais pura entidade psíquica dizemos de um homem: tem alma, e quando está
ausente em sua vida psíquica externa dizemos dele: não tem alma.
As formas externas de nosso ser são as de nossa pequena existência egoísta; as
subliminais são as formações de nossa maior individualidade verdadeira. Portanto
estas são essa parte oculta de nosso ser na que nossa individualidade está próxima
a nossa universalidade, a toca, está em constante relação e comércio com ela. A
mente subliminal em nós está aberta ao conhecimento universal da Mente cósmica,
a vida subliminal em nós está aberta à força universal da Vida cósmica, o físico
subliminal em nós está aberto à força-formação universal da Matéria cósmica; os
grossos muros que dividem destas coisas nossa superficial mente, vida e corpo, e
que a Natureza há de atravessar com demasiada dificuldade, tão imperfeitamente e
com tão múltiplos artifícios psíquicos desajeitados, são ali, no subliminal, só um
rarificado meio de separação e comunicação simultâneas. Assim mesmo, a alma
subliminal em nós está aberta ao deleite universal como a alma cósmica leva em sua
própria existência, na existência das miríades de almas que a representam e nas
operações da mente, a vida e a matéria pelas que a Natureza se presta a seu jogo e
desenvolvimento; mas deste deleite cósmico a alma superficial é separada por
muros egoístas de grande espessura que por certo contam com portas de ingresso,
mas ao transpô-las os contatos do divino Deleite cósmico se empequenecem,
deformam e chega a mascarar-se como seus próprios opostos.
Desprende-se que nesta superfície ou alma-de-desejo não há verdadeira vida-de-
alma, senão uma deformação psíquica e equivocada recepção do contato das coisas.
A enfermidade do mundo consiste em que o indivíduo não pode achar sua alma real,
e a causa-raiz desta enfermidade é novamente que não pode encontrar em seu
externo abarcar das coisas a alma real do mundo no que vive. Busca encontrar ali a
essência do ser, a essência do poder, a essência da existência-consciente, a
essência do deleite, mas em seu lugar recebe uma multidão de contatos e
impressões contraditórios. Se pudesse encontrar essa essência, se pudesse
encontrar também o único universal ser, poder, existência consciente e deleite
inclusive neste enredo de contatos e impressões, as contradições do que parecem –
esses contatos e impressões contraditórias-- se reconciliariam na unidade e
harmonia da Verdade que nos alcança nestes contatos. Ao mesmo tempo ele
encontraria sua própria alma verdadeira e através dela seu verdadeiro ser (eu),
porque a alma verdadeira é a delegada de seu ser (eu) e seu ser (eu) e o ser (eu)
do mundo são um só. Mas isto ele não o pode fazer devido à egoísta ignorância do
pensamento na mente, do coração da emoção, do sentido que responde ao contato
das coisas, não com um valente e afetuoso abraço do mundo, senão com um fluxo
de avanços e retrocessos, de cautas aproximações ou impacientes escapes e
carrancudos ou descontentes, ou assustados ou dobras irritadas conforme a como o
contacto lhe agrade ou desagrade, lhe conforte ou alarme, lhe satisfaça ou lhe
descontente. É a alma-de-desejo que por sua equivocada recepção da vida se
converte na causa de uma tripla má interpretação da rasa, o deleite nas coisas, de
modo que, em lugar de figurar-se a pura alegria essencial do ser, chega a traduzir-
se desigualmente nos três termos de prazer, dor e indiferença.
Temos visto, quando consideramos o Deleite da Existência em suas relações com o
mundo, que não há absoluta nem essencial validade em nossos padrões de prazer,
dor e indiferença, que estão determinados por enteiro pela subjetividade da
consciência receptiva e que o grau de prazer e dor pode elevar-se a um máximo ou
comprimir-se a um mínimo, a inclusive apagar-se por completo em sua aparente
natureza. O pracer pode converter-se em dor ou a dor em prazer porque em sua
realidade secreta são a mesma coisa reproduzida de um modo distinto nas
sensações e emoções. A indiferença é, ou melhor. a inatenção da alma-de-desejo
superficial em sua mente, sensações, emoções e desejos enquanto a rasa das
coisas, ou melhor, sua incapacidade para receber e responder a este, ou melhor,
sua rejeição de dar qualquer resposta superficial, ou, também, sua repressão e
subjugação do prazer e a dor mediante a vontade dentro de um neutro matiz de
inaceitação. Em todos estes casos o que sucede é que existe uma positiva rejeição
ou negativa improvidência ou incapacidade de interpretar ou de qualquer modo
representar positivamente na superfície algo que é ainda subliminalmente activo.
Pois, assim como agora sabemos por observação e experimentação psicológicas que
a mente subliminal recebe e recorda todos aqueles contatos das coisas que a mente
superficial ignora, de igual maneira descobriremos também que a alma subliminal
responde à rasa, ou essência na experiência, destas coisas, que a alma-de-desejo
superficial rejeita por desgosto ou negativa, ou ignora por neutra inaceitação. O
auto-conhecimento é impossível a não ser que vamos atrás de nossa existência
superficial, --(que é mero resultado de seletivas experiências externas, uma
ressonância imperfeita ou uma apressada, incompetente e fragmentária tradução de
um pouco do muito que somos)--, a menos que vamos atrás desta existência
superficial e lancemos nosso prumo no subconsciente e nos abramos ao
supraconsciente para assim conhecer sua relação com nosso ser superficial. Pois
entre estas três coisas nossa existência se move e encontra nelas sua totalidade. O
supraconsciente em nós é um só com o ser (eu) e a alma do mundo, e não está
governado por diversidade fenomênica alguma; portanto, possui a verdade das
coisas e o deleite das coisas em sua plenitude. O subconsciente, assim chamado,[6]
[6] nessa luminosa cabeça de si mesmo que chamamos o subliminal, é, pelo
contrário, não um verdadeiro possuidor senão um instrumento da experiência; não é
na prática, um com a alma e ser (eu) do mundo, mas está aberto a ele através de
sua experiência-do-mundo. A alma subliminal é consciente interiormente da rasa das
coisas e tem um igual deleite em todos os contatos; é também consciente dos
valores e modelos da alma-de-desejo superficial e recebe em sua própria superfície
os correspondentes contatos de prazer, dor e indiferença, mas recebe um igual
deleite em tudo. Em outras palavras nossa alma real interior recebe gozo de todas
suas experiências, delas extrai fortaleza, prazer e conhecimento, mediante elas
cresce em seu provisionamento e em sua plenitude. Esta alma real em nós é a que
compele a retirada da mente-de-desejo enquanto a levar e inclusive buscar e achar
prazer no que é dolorosa para ela, a rejeitar o que lhe resulta prazeroso, a modificar
ou inclusive inverter seus valores, a igualar as coisas em indiferença ou a igualá-las
em alegria, a alegria da variedade da existência. E isto o faz porque está impelida
pelo universal a desenvolver-se por todo gênero de experiência de modo de assim
crescer na Natureza. Do contrário, se só vivêssemos pela alma-de-desejo superficial,
não mudaríamos nem avançaríamos mais que a planta ou a pedra em sua
imobilidade ou em sua rotina de existência, porque a vida não é superficialmente
consciente, a alma secreta das coisas não tem todavia instrumento pelo qual possa
resgatar a vida à partir da fixa e restringida gama dentro da que nasceu. A alma-de-
desejo, abandonada a si mesma, seguiria circulando nas mesmos pistas para
sempre.
Segundo a opinião das antigas filosofias, o prazer e a dor são inseparáveis como a
verdade intelectual e a falsidade, o poder e a incapacidade, e o nascimento e a
morte; portanto o único modo de escapar deles seria uma total indiferença, uma
branca resposta às excitações do eu-do-mundo. Mas um conhecimento psicológico
mais sutil nos demonstra que este enfoque baseado tão só nos fatos superficiais da
existência, em realidade não esgota as soluções do problema. É possível, trazendo a
alma real à superficie, substituir os padrões egoístas do prazer e a dor por um igual
e todo-abarcante deleite pessoal-impessoal. O amante da Natureza faz isto quando
goza com todas as coisas da Natureza universalmente, sem admitir repulsão ou me‐
do, ou mero gosto ou desgosto, percebendo a beleza no que para outros parece
baixo e insignificante, vazio e salvarem, terrível e repelente. O artista e o poeta
fazem isto quando buscam a rasa do universal desde a emoção estética ou desde a
linha física ou desde a forma mental da belleza ou desde o sentido e poder interiores
desfrutando igualmente daquilo do que o homem comum foge e daquilo ao que está
apegado por um sentido de prazer. O buscador de conhecimento, o amante-de-Deus
que acha o objeto de seu amor por toda parte, o homem espiritual, o intelectual, o
sensual, o esteta, todos fazem isto a seu modo e devem fazê-lo se acharão
abraçadas ao Conhecimento, à Beleza, à Alegria ou à Divinidade que buscam. É só
nas partes donde o pequeno ego é usualmente demasiado forte para nós, é só em
nossa alegria e sofrimento emocionais ou físicos, em nosso prazer e dor da vida,
ante os quais a alma-de-desejo em nós é débil e covarde por completo, que a
aplicação do princípio divino chega a ser supremamente difícil e parece para muitos
impossível ou inclusive monstruosa e repelente, Aqui a ignorância do ego retrocede
desde o principio de impessoalidae que ainda se aplica sem demasiada dificuldade
na Ciência, a Arte e inclusive em certo gênero de imperfeita vida espiritual porque ali
a regra da impessoalidade não ataca aqueles desejos abrigados pela alma superficial
nem aqueles valores do desejo fixados pela mente superficial na que nossa vida
externa está mais vitalmente interessada. No mais livre e superior movimento exige-
nos só uma limitada e especializada equanimidade e impersonalidade apropiada a
um campo particular da consciência e da atividade enquanto a base egoísta de
nossa vida prática permanece em nós; nos movimentos inferiores, o fundamento
total de nossa vida há de transformar-se a fim de dar lugar à impessoalidade, e isto
a alma-de-desejo o acha impossível.
A alma verdadeira secreta em nós -(subliminal, dizemos, mas a palavra é
inapropriada, pois esta presença não está situada debaixo do umbral da mente
desperta, senão que muito mais arde no templo do mais recôndito coração detrás da
espessa tela de uma mente, vida e corpo ignorantes, não subliminal, senão atrás do
véu)--, esta velada entidade psíquica é a chama de Deus sempre acesa dentro de
nós, inestinguível inclusive por essa densa inconsciência que obscurece nossa
natureza externa ignorante de algum espiritual ser interior. É uma chama nascida do
Divino e, luminosa habitante da Ignorância, cresce nesta para que possa volta-la
para o Conhecimento. É o oculto Testemunho e Controle, o Guia escondido, é
o Daemon de Sócrates, a luz interior ou voz interior do místico. É o durável e
imperecível em nós de um nascimento a otro, intocável pela morte, a decadência ou
a corrupção, uma indestrutível chispa do Divino. Não sendo não-nascido Ser-em-si
ou Atman, --(pois o Ser-em-si, inclusive presidindo sobre a existência do indivíduo
está consciente sempre de sua universalidade e transcendência)--, no entanto, é seu
delegado nas formas da Natureza, a alma individual, caitya purusa,
sustentando
mente, vida e corpo, permanecendo atrás do ser mental, do vital e do sutil-físico em
nós e contemplando e aproveitando seu desenvolvimento e experiência. Estes outros
poderes-pessoais no homem, estes seres de seu ser, estão também velados em sua
verdadeira entidade, mas exercem personalidades temporárias que compõem nossa
individualidade externa e cuja combinada ação e aparência superficiais formam o
estado que chamamos nós mesmos: esta mais recôndita entidade também, tomando
forma em nós como a Pessoa psíquica, apresenta uma personalidade psíquica que
muda, cresce e se desenvolve de vida em vida; pois esta é a viajante entre
nascimento e morte, e entre morte e nascimento, nossas partes naturais só são sua
múltipla e mutável vestimenta. O ser psíquico pode ao princípio exercer somente
uma oculta, parcial e indireta ação através da mente, da vida e do corpo, dado que
estas são as partes da Natureza que hão de desenvolver-se como seus instrumentos
de auto-expressão, que está largamente confinada por sua evolução. Com a missão
de conduzir o homem que está na Ignorância para a luz da Consciência Divina, toma
a essência de toda experiência na Ignorância para formar um núcleo de alma-
crescendo na natureza; o resto destila-o como material para o futuro crescimento
dos instrumentos que há de usar até que estejam prontos para ser luminosa
instrumentação do Divino. Esta secreta entidade psíquica é a verdadeira Consciência
original em nós, mais profunda que a elaborada e convencional consciência do
moralista, pois é a que sempre aponta para a Verdade, o Correto e a Beleza, para o
Amor e a Harmonia e tudo o que é possibilidade divina em nós, e persiste até que
estas coisas chegamm a ser a maior necessidade de nossa natureza. É a
personalidade psíquica em nós que floresce como o santo, o sábio, o vidente;
quando alcança sua força plena, despeja o ser até o Conhecimento do Ser-em-si e
do Divino, para a verdade suprema, o Bem Supremo, a Beleza, Amor e Bem-
aventurança supremos, as alturas e grandezas divinas, e nos abre o contato da
espiritual simpatia, universalidade, unidade. Pelo contrário, onde a personalidade
psíquica é débil, bruta ou mal desenvolvida, as partes ye movimentos mais finos em
nós carecem ou são pobres de caráter e poder, ainda que a mente seja forte e
brilhante, o coração das emoções vitais duro, forte e dominante, a força-vital,
dominadora e exitosa, a existência corporal, rica e afortunada, e um aparente
senhor e vencedor. É então a alma-de-desejo exterior, a entidade pseudo-psíquica,
a que reina e confundimos suas más interpretações da sugestão e aspiração
psíquicas, suas idéias e ideais, seus desejos e anseios com a verdadeira alma-
substancial e a riqueza da experiência espiritual.[7][7] Se a secreta Pessoa psíquica
pode seguir avançando e, substituindo a alma-de-desejo, governar aberta e
inteiramente e não só parcialmente e atrás do véu esta externa natureza de mente,
vida e corpo, então estes podem moldar-se em imagens da alma do que é
verdadeiro, correto e belo e, finalmente, a natureza toda possa voltar-se para o real
objetivo da vida, a suprema vitória, a ascensão à existência espiritual.
Mas poderia parecer que, ao colocar à frente a esta entidade psíquica, a esta
verdadeira alma em nós, e dar-lhe ali o mando e governo, obtemos a realização
total de nosso ser natural de modo que possamos buscar e também abrir as portas
do reino do Espírito. E melhor poderia raciocinar-se que não há necessidade de
intervenção alguma de superior Verdade-Consciência ou princípio da Supramente
para ajudar-nos a alcançar o estado divino ou a perfeição divina. Contudo, ainda que
a transformação psíquica é uma condição necessária da transformação total de
nossa existência, não é tudo quanto é necessário para a maior mudança espiritual.
Em primeiro lugar, dado que esta é a alma individual na Natureza, pode abrir-se aos
mais divinos âmbitos ocultos de nosso ser, e receber e refletir sua luz, poder e
experiência, mas também temos necessidade de outra transformação que derive do
alto para possuir nosso ser (eu) em sua universalidade e transcendência. o ser
psíquico em certa etapa poderia contentar-se com criar uma formação de verdade,
bem e beleza e estacionar-se ali; em uma etapa anterior poderia submeter-se
passivamente ao ser-do-mundo, um espelho da existência universal, da consciência,
do poder, do deleite, mas sem ser seu participante ou possuidor pleno. Ainda que
mais próxima e estremecidamente unida à consciência cósmica no conhecimento, a
emoção e inclusive na apreciação através dos sentidos, poderia converter-se em
puramente receptora e passiva, afastada do domínio e a ação no mundo; ou, uma
com o Ser-em-si estático atrás do cosmos, mas separada interiormente do
movimento-do-mundo, perdendo sua individualidade em sua Fonte, poderia retornar
a essa Fonte e não ter nem a vontade nem o poder para o que foi sua missão última
aqui, conduzir a natureza também para sua divina realização. Pois o ser psíquico
chegou à Natureza procedente do Ser-em-si, do Divino, e pode retornar da Natu‐
raleza ao Divino silencioso através do silêncio do Ser-em-si e de uma suprema
imobilidade espiritual. Outra vez, uma porção eterna do Divino,[8][8] --(esta parte é
pela lei do Infinito inseparável de seu Todo Divino, esta parte é certamente ela
mesma esse Todo, excepto em sua aparência frontal, sua separativa auto-
experiência frontal)--, pode despertar a essa realidade e fundir-se nela até a
extinção aparente ou ao menos até a união da existência individual. Aqui, um
pequeno núcleo, na massa de nossa Natureza ignorante, descrito no Upanishad
como não maior que um polegar humano, pode, por influxo espiritual, alargar-se e
abarcar o mundo inteiro com o coração e a mente em íntima comunhão ou unidade.
Ou pode chegar a ser consciente de seu eterno Companheiro e escolher viver para
sempre em Sua presença, em imperecível união de unidade como o amante eterno
com o eterno Amado, que de todas as experiências espirituais é a mais intensa em
beleza e êxtase. Todos estes são grandes e esplêndidas conquistas de nosso
espiritual auto-descobrimento, mas não são necessariamente o fim último e inteira
consumação; é possível mais.
Pois estas são conquistas da mente espiritual do homem; são movimentos dessa
mente que vai além de si, mas em seu próprio plano, nos esplendores do Espírito. A
mente, inclusive em seus estados supremos, muito além de nossa mentalidade
atual, atua todavia em sua natureza por divisão; toma os aspectos do Eterno e trata
cada aspecto como se fosse a verdade total do Ser Eterno e pode encontrar em
cada um sua própria perfeita realização. Inclusive os erige em opostos e cria uma
escala total destes opostos, o Silêncio do Divino e a Dinâmica divina, o imóvel
Brahman afastado da existência, sem qualidades, e o ativo Brahman com
qualidades, Senhor da existência, Ser e Devir, a Pessoa Divina e uma pura Existência
impessoal; pode então separar-se de um e submergir-se no outro como única
Verdade perdurável da existência. Pode considerar a Pessoa como a única Realidade
ou o Impessoal como o único certo; pode considerar ao Amante como o único meio
de expressão do Amor; ou ao amor como a única possível auto-expressão do
Amante; pode ver os seres como os únicos poderes pessoais de uma Existência
impessoal ou à existência impessoal como o único estado do Ser único, a Pessoa
Infinita. Sua conquista espiritual, sua rota de passo para o objetivo supremo se
guirá estas linhas divisórias. Mas além deste movimento da Mente espiritual, está a
superior experiência da Supramente Verdade-Consciência; ali estes opostos
desaparecem e estas parcialidades se abandonam na rica totalidade de uma
suprema e integral realização do Ser eterno. Este é o objetivo que temos concebido,
a consumação de nossa existência aqui pela ascensão a Verdade-Consciência
supramental e seu descenso em nossa natureza. A transformação psíquica após
surgir na mudança espiritual há de completar-se, integrar-se, superar-se e elevar-se
mediante uma transformação supramental que a ascenda para o cume do esforço
ascendente.
Tal como entre os outros termos divididos e opostos do Ser manifestado, de igual
maneira só uma consciência-energia supramental poderia estabelecer uma perfeita
harmonia entre estas dois termos -aparentemente opostos devido à Ignorância— do
estado do espírito e do dinamismo do mundo, em nossa existência corporizada. Na
Ignorância, a Natureza centra a ordem de seus movimentos psicológicos, no entorno
do secreto ser (eu) espiritual, senão de seu substituto, o ego-princípio: certo
egocentrismo é a base sobre a que ligamos juntas nossas experiências e relações
em meio de complexos contatos, contradições, dualidades e incoerências do mundo
em que vivemos; este egocentrismo é nossa rocha de segurança frente ao cósmico
e o infinito, nossa defesa. Mas em nossa mudança espiritual temos de abster-nos
desta defesa; o ego há de desvanecer-se, a pessoa se encontra dissolvida em uma
vasta impessoalidade, e nesta impessoalidade a princípio não está a chave de um
ordenado dinamismo da ação. Um resultado muito comum consiste em que um está
dividido em duas partes do ser, a espiritual por dentro, a natural por fora; em una
está a divina realização assentada em uma perfeita liberdade interior, mas a parte
natural segue com a velha ação da Natureza, continua mediante um movimento
mecânico de energias passadas, seu já transmitido impulso. Inclusive, se há uma
total dissolução da pessoa limitada e da velha ordem egocêntrico, a natureza
externa pode converter-se no campo de uma aparente incoerência, ainda que todo o
interior seja luminoso com o Ser (Eu). Dessa maneira devemos abertamente inertes
e inativos, movidos por circunstâncias ou forças mas não móveis-por-si-mesmos,[1]
[9]

[1][9] jadavat.

inclusive ainda que a consciência esteja iluminada interiormente, ou como uma


criança ainda que por dentro tenha pleno auto-conhecimento,[1][10] ou como
alguém inconsequente enquanto a pensamento e impulso ainda que internamente
tenha completa calma e serenidade,[1][11] ou como a alma selvagem e
desordenada ainda que interiormente exista a pureza e equilíbrio do Espírito. [2][12]
Ou se há um ordenado dinamismo na natureza externa, pode ser uma
continuação da ego-ação superficial presenciada mas não aceitada pelo ser
interior, ou um dinamismo mental que não expresse perfeitamente a realização
espiritual interior; pois não há equivalência entre a ação da mente e o estado do
espírito. Inclusive no melhor caso, donde há um intuitivo guia da Luz desde dentro,
a natureza de sua expressão no dinamismo da ação deve estar marcada com as
imperfeições da mente, da vida e do corpo, um Rei com ministros incapazes, um
Conhecimento expressado nos valores da Ignorância. Só o descenso da Supramente
com sua perfeita unidade de Verdade-Conhecimento e Verdade-Vontade pode
estabelecer, tanto na existência exterior como na interior, a harmonia do Espírito;
pois só ela pode por inteiro mudar os valores da Ignorância pelos valores do
Conhecimento.
[1][11] unmattavat.

[2][12] pisacávat.

[1][10] bálavat.

[2][11] unmattavat.

[3][12] pisacávat.

[1][10] bálavat.

[2][11] unmattavat.

[3][12] pisacávat.

Na realização de nosso ser psíquico, igualmente que na consumação de nossas


partes de mente e vida, está a relação disso com sua fonte divina, sua
correspondente verdade na Realidade Suprema, que é o movimento indispensável;
e, tanto aqui como ali, é mediante o poder da Supramente que pode ser feita com
uma integridade absoluta, uma intimidade que chega a ser uma autêntica
identidade; pois é a Supramente a que vincula os hemisférios superior e inferior da
Existência Única. Na Supramente está a Luz integradora, a Força consumadora, a
ampla entrada dentro do supremo Ananda; o ser psíquico elevado por essa Luz e
Força pode unir-se com o Deleite original da existência desde o que veio: vencer as
dualidades de dor e prazer, liberar a mente, a vida e o corpo de todo medo e
sobrecolhimento, pode reestabelecer os contatos da existência no mundo dentro dos
termos da Divina Ananda.

[1][1] IV, 12.

[2][2] VI, 17.

[3][3] IV, 5.

[4][4] Vers. 7.

[5][5] II, 9.

[6][6] O
subconsciente real é uma inferior consciência diminuída próxima ao Inconsciente; o subliminal é uma
consciência maior que nossa existência superficial. Mas ambos pertencem ao reino interior de nosso ser do qual
nada conhece nossa superfície, de modo que ambos estão entremeados em nossa concepção comum e modo de
expressar-nos.

[7][7] Apalavra “psíquico” em nosso ordinário modo de expressão se usa muitas vezes com relação a esta alma-de-
desejo que a verdadeira alma psíquica. Também se usa inadequadamente com respeito a fenômenos psicológicos
e outros, de carácter anormal ou supranormal, que em realidade estão conectados com a mente interior, o ser
vital interior, o ser sutil físico subliminal em nós e de nenhum modo são operações diretas da psiquê. Fenômenos
tais como materialização e desmaterialização também se incluem, ainda que se estabelece, evidentemente não são
ação-de-alma e não deizam luz alguma sobre a natureza ou existência da entidade psíquica, senão que muito mais
são uma ação anormal de uma sutil energia física oculta que intervêm no ordinário estado do denso corpo das
coisas, reduzindo-a a sua própria condição sutil e reconstituindo-a novamente nos termos da densa matéria.
[8][8] Gita, XV, 7.

[9][9] jadavat.

[10][10] bálavat.
[11][11] unmattavat.

[12][12] pisacávat.

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Capítulo XXIV
MATÉRIA

Atingiu o conhecimento de que a Matéria é o Brahman.

Taittiriya Upanishad[1]

Temos agora a segurança racional de que a Vida não é um sonho inexplicável nem
um mal impossível que contudo chegou a ser um fato doloroso, senão uma
poderosa pulsação da divina Todo-Existência. Vemos algo de seu fundamento e seu
princípio, contemplamos sua elevada potencialidade e divino afloramento último.
Mas há um princípio debaixo de todos os demais que não temos ainda considerado
suficientemente: o princípio da Matéria sobre o qual a Vida se acha como sobre um
pedestal ou desde o que evolui como a forma de uma árvore de múltiplos ramos ou
faz à partir da encapsulada semente. A mente, a vida e o corpo do homem
dependem deste princípio físico, e se o afloramento da Vida é resultado da
Consciência emergindo na Mente, expandindo-se, elevando-se em busca de sua
própria verdade na grandeza da existência supramental, contudo parece também
estar condicionada por esta caixa do corpo e por este fundamento da Matéria. A
importância do corpo é óbvia; é porque desenvolveu ou recebeu um corpo e um
cérebro capazes de receber e brindar uma progressiva iluminação mental que o
homem vem se elevando acima do animal. Igualmente, só pode ser, mediante o
desenvolvimento de um corpo ou, ao menos, o funcionamento do instrumento físico
capaz de receber e brindar uma iluminação ainda maior, que se eleve acima de si
mesmo e realize, não meramente no pensamento e em seu ser interno senão na
vida, uma humanidade perfeitamente divina. Do contrário se elimina a promessa da
Vida, anula-se seu significado e o ser terreno só pode realizar o Satchitananda
abolindo-se, livrando de si a mente, a vida e o corpo, e retornando ao puro Infinito,
ou também, pode ser que o homem não seja o instrumento divino, existe um
preciso limite para o poder conscientemente progressivo que lhe distingue de todas
as outras existências terrestres e, assim como ele as substituiu à frente das coisas,
de igual modo outro deve eventualmente substitui-lo e assumir sua herança.
Parece certamente que o corpo é, desde o princípio, a grande dificuldade da alma,
seu contínuo tropeço e obstáculo. Portanto o ansioso buscador da realização
espiritual lança seu proclame contra o corpo e seu desgosto-mundano escolhe este
princípio do mundo por sobre todas as outras coisas como especial objeto de
abominação. O corpo é o obscuro peso que não pode levar; seu obstinado material
tosco é a obsessão que lhe conduz a entregar-se á vida ascética. Para
desembaraçar-se daquele foi tão longe que até negou sua existência e a realidade
do universo material. A maioria das religiões maldisseram a Matéria e converteram-
na à rejeição ou a um resignado sofrimento temporal da vida física em prova da
verdade religiosa e da espiritualidade. Os credos mais antigos, mais pacientes, mais
meditativamente profundos, livres do contato da tortura e febril impaciência da alma
sob o peso da Idade de Ferro, não efetuaram esta formidável divisão; reconheceram
a Terra como Mãe e ao Céu como Pai, acordando-lhes igual amor e reverência; mas
seus antigos mistérios são obscuros e insondáveis para nossa visão das coisas,
materialista ou espiritual, contentando-se com cortar o nó gordiano do problema da
existência com um golpe decisivo, aceitando escapar até uma bem-aventurança
eterna ou um fim de aniquilação eterna ou de eterna quietude.
A disputa não começa realmente com nosso despertar diante de nossas
possibilidades espirituais; começa com a aparição da vida mesma e sua luta por
estabelecer suas atividades e suas permanentes agregações da forma vivente contra
a força da inércia, contra a força da inconsciência, contra a força da desagregação
atômica que são, no princípio material, o nó da grande Negação. A Vida está em
guerra constante com a Matéria e a batalha parece sempre culminar com a aparente
derrota da Vida e nesse colapso que se soma no princípio material que chamamos
morte. A discórdia se aprofunda com a aparição da Mente; pois a Mente tem sua
própria disputa com ambos, com a Vida e com a Matéria; está em constante guerra
com suas limitações, em constante submissão e revolta contra a tosquedade e
inércia de uma e as paixões e sofrimentos da outra; e a batalha parece
eventualmente voltar-se, ainda que não com muita segurança, para uma vitória
parcial e custosa para a Mente na que conquista, reprime ou inclusive mata os
desejos vitais, desequilibra a força física e deforma o equilíbrio do corpo em
benefício de uma atitude mental maior e um ser moral superior. É nesta luta que
surge a impaciência da Vida, o desgosto do corpo e a dobra de ambos para uma
pura existência mental e moral. Quando o homem desperta a uma existência além
da Mente, leva consigo este princípio de discórdia. A Mente, o Corpo e a Vida são
condenados como a trindade do mundo, a carne e o demônio. A Mente é também
proclamada como fonte de todo nosso mal; se declara a guerra entre o espírito e
seus instrumentos, e se busca a vitória do Habitante espiritual como evasão de sua
estreita residência, uma rejeição da mente, da vida e do corpo, e um retiro dentro
de suas próprias infinitudes. O mundo é uma discórdia e resolveremos melhor suas
perplexidades levando o princípio da discórdia mesma para sua possibilidade ex‐
trema, para uma erradicação e segregação final.
Mas estas derrotas e vitórias são só aparentes, esta solução não é solução senão
escapar ao problema. A Vida não é realmente derrotada pela Matéria; efetua um
compromisso usando a morte para a continuação da vida. A Mente não é realmente
vitoriosa sobre a Vida e a Matéria, senão que só alcançou um desenvolvimento
imperfeito de algumas de suas potencialidades a custa de outras que estão ligadas
às irrealizadas ou rejeitadas possibilidades de seu melhor emprego da vida e do
corpo. A alma individual não conquistou a triplicidade inferior, senão só renunciou
seu reclame a respeito, escapando desde a obra empreendida pelo espírito quando
pela primeira vez se lançou dentro da forma do universo. O problema continua
porque o labor do Divino no universo prossegue, mas sem nenhuma solução
satisfatória do problema nem conquista vitoriosa do labor. Portanto, dado que nosso
ponto de apoio é que Satchitananda é o princípio, o meio e o fim, e que essa luta e
discórdia não podem ser princípios eternos e fundamentais em Seu ser senão que,
por sua existência mesma implicam o labor em prol de uma solução perfeita e uma
completa vitória, devemos buscar essa solução em uma real vitória da Vida sobre a
Matéria através do livre e perfeito uso do corpo pela Vida, em uma real vitória da
Mente sobre a Vida e a Matéria através de um livre e perfeito uso da força-vital e a
forma pela Mente, e em uma real vitória do Espírito sobre a triplicidade através de
uma livre e perfeita ocupação da mente, da vida e do corpo pelo espírito consciente;
segundo tenhamos estruturado esta última conquista, se tornam possíveis as outras.
Finalmente, então podemos ver como estas conquistas podem ser possíveis por
completo ou integralmente, devemos descobrir a realidade da Matéria, assim como,
buscando o conhecimento fundamental, temos descoberto a realidade da Mente, da
Alma e da Vida.
Em certo sentido a Matéria é irreal e não-existente; vale dizer, nosso atual
conhecimento, idéia e experiência da Matéria não é verdade, senão simplesmente
um fenômeno de relação particular entre nossos sentidos e a todo-existência na que
nos movemos. Quando a Ciência descobre que a Matéria se resolve dentro das
formas da Energia, sustenta uma verdade universal e fundamental; e quando a
filosofia descobre que a Matéria só existe como aparência substancial diante a
consciência e que a realidade única é o Espírito ou o puro Ser consciente, sustenta
uma verdade maior, mais completa e inclusive mais fundamental. Mais ainda
subsiste a questão de por que a Energia há de tomar a forma da Matéria e não de
meras correntes-força ou por quê isso que é realmente Espírito há de admitir o
fenômeno da Matéria e não descansar nos estados, veleidades e alegrias do espírito.
Isto, se diz, é obra da Mente ou melhor, --dado que o Pensamento evidentemente
não cria diretamente ou nem sequer percebe a forma material das coisas--, é obra
do Sentido; a mente-sentido cria as formas que parece perceber e a mente-
pensamento trabalha sobre as formas que a mente-sentido lhe apresenta. Mas,
evidentemente, a corporizada mente individual não é a criadora do fenômeno da
Matéria; a existência-terrena não pode ser resultado da mente humana que, a sua
vez, é resultado da existência-terrena. Se dissemos que o mundo só existe em
nossas mentes, expressamos um não-fato e uma confusão; pois o mundo material
existiu antes que o homem estivesse sobre a terra e seguirá existindo se o homem
desaparecesse da terra ou inclusive ainda que nossa mente individual se extinguisse
no Infinito. Devemos concluir então que existe uma Mente universal,
[2] subconsciente para nós na forma do universo ou supraconsciente em seu
espírito, que criou essa forma para morar nela. E dado que o criador deve haver
precedido e deve superar sua criação, isto realmente implica uma Mente supra‐
consciente que, mediante a instrumentação de um sentido universal cria em si a
relação de forma com forma e constitui o ritmo do universo material. Mas isto tão
pouco é a solução completa; nos diz que a Matéria é uma criação da Consciência
mas não explica como a Consciência chegou a criar a Matéria como base de suas
atividades cósmicas.
Entenderemos melhor se nos remontamos, de uma vez, ao princípio original das
coisas. A existência é, em sua atividade, uma Força-Consciente que apresenta as
obras de sua força a sua consciência como formas de seu próprio ser. Dado que a
Força é só a ação do único só-existente Ser-Consciente, resulta que não pode ser
senão forma desse Ser-Consciente. A Substância ou Matéria, então, é somente uma
forma do Espírito. A aparência que esta forma do Espírito assume para nossos
sentidos se deve a essa ação divisora da Mente desde a que temos podido deduzir
consistentemente o fenômeno total do universo. Sabemos agora que a Vida é uma
ação da Força-Consciente da qual as formas materiais são o resultado; a Vida
envolvida nessas formas, aparecendo nelas primeiro como força inconsciente, evolui
e trás de regresso dentro da manifestação como Mente à consciência que é o ser
(eu) real da força e que nunca deixou de existir nela, inclusive quando não se
manifesta. Sabemos também que a Mente é um poder inferior do original
Conhecimento consciente ou Supramente, um poder para o qual a Vida atua como
energia instrumental; pois, descendendo através da Supramente, a Consciência ou
Chit se representa como a Mente, e a Força da consciência ou Tapas se representa
como a Vida. A Mente, por sua separação de sua própria realidade superior na
Supramente, dá à Vida a aparência de divisão e, por sua anterior involução em sua
própria Força-Vital, vem a ser subconsciente na Vida e assim dá aparência externa
de uma força inconsciente a suas atividades materiais. Portanto, a inconsciência, a
inércia e a desagregação atômica da Matéria deve ter sua origem nesta todo-
divisora e auto-involutiva ação da Mente pela qual nosso universo veio a ser. Assim
como a Mente é só uma ação final da Supramente no descenso até a criação, e a
Vida uma ação da Força-Consciente que trabalha nas condições da Ignorância criada
por este descenso da Mente, de igual maneira a Matéria, como a conhecemos, é só
a forma final assumida pelo ser consciente como o resultado desse trabalho. A
Matéria é substãncia do único ser-consciente fenomenicamente dividido dentro de si
pela ação de uma Mente universal,[3] --divisão que a mente individual repete e
alberga mas que não anula nem diminui a unidade do Espírito nem a unidade da
Energia nem a real unidade da Matéria.
Mas qual é a razão desta divisão fenomênica e pragmática de uma Existência
indivisível? E porque a Mente há de levar o princípio da multiplicidade até seu
potencial extremo, o qual só pode cumprir-se mediante separação e divisão. Para
fazer isso deve, precipitando-se na Vida a criar formas para o Múltiplo, dar o
principio universal do Ser a aparência de uma substância densa e material em lugar
de uma substância pura ou sutil. Deve, vale dizer, dar-lhe a aparência da substância
que se oferece ao contato da Mente como coisa ou objeto estáveis em uma
duradoura multiplicidade de objetos e não de substância que se oferece ao contato
da consciência pura como algo de sua própria eterna e pura existência erealidade ou
ao sentido sutil como um princípio de forma plástica que expressa livremente o ser
consciente. O contato da mente com seu objeto cria o que chamamos sentido, mas
aqui há de ser um obscuro sentido exteriorizado que há de assegurar-se da
realidade do que contata. O descenso da substância pura á susbtancia material
segue então, inevitavelmente, no descenso de Satchitananda através da supramente
à mente e a vida. É um resultado necessário da vontade que o primeiro método
desta experiência inferior da existência seja a multiplicidade do ser e uma
consciência das coisas desde separados centros da consciência,. Se voltamos à base
espiritual das coisas, a substância em sua completa pureza se resolve dentro do
puro ser consciente, auto-existente, inerentemente auto-conhecedor por identidade,
mas que ainda não volte sobre si sua consciência como objeto. A Supermente
preserva este auto-conhecer por identidade como sua susbtância do auto-
conhecimento e sua luz de auto-criação, mas para essa criação se apresenta o Ser
diante si como o sujeito-objeto único e múltiplo de sua própria consciência ativa. O
Ser como objeto é mantido ali em um supremo conhecimento que pode, por
compreensão, ver ambos como um objeto de cognição dentro de si e
subjetivamente como o mesmo, mas pode também e simultâneamente, por
apreensão, projetá-lo como objeto (ou objetos) de cognição dentro da circunferência
de sua consciência, não diferente de si, parte de seu ser, mas uma parte (ou partes)
separadas de si, -vale dizer, do centro de visão no que o Ser se concentra como o
Conhecedor, Testemunho ou Purusha--. Temos visto que desde esta apreensora
consciência surge o movimento da Mente, o movimento pelo qual o indivíduo
conhecedor considera uma forma de seu próprio ser universal como distinta a ele;
mas na Mente divina existe, imediata ou mais simultaneamente, outro movimento
ou lado inverso do mesmo movimento, um ato de união no ser que remedia esta
divisão fenomênica impedindo-lhe que se converta, inclusive por um momento tão
só em real para o conhecedor. Este ato de união consciente é o que está repre‐
sentado de outro modo na Mente divisora obtusa, ignorantemente, muito
externamente como contato na consciência entre os seres divididos e os objetos
separados, e conosco este contacto na consciência dividida está representado
primordialmente pelo princípio do sentido. Sobre esta base do sentido, sobre este
contato da união sujeita à divisão, a ação do pensamento-mente se descobre e
prepara para retornar a um princípio superior de união no que a divisão se torna
sujeita à unidade e subordinada. A substância, então, tal como a conhecemos,
substância material, é a forma na que a Mente, atuando através do sentido, contata
o Ser consciente do qual ela mesma é movimento do conhecimento.
Mas a Mente por sua natureza mesma tende a conhecer e sentir a substância do
ser-consciente, não em sua unidade ou totalidade senão pelo princípio da divisão.
Vê-o, por assim dizê-lo, em pontos infinitesimais que associa juntos a fim de
alcançar a uma totalidade, e dentro destes pontos-de-visão e associações a Mente
cósmica se lança e mora neles. Morando dessa maneira, criadora por sua força
inerente como agente da Real-Idéia, obrigada por sua própria natureza á conversão
de todas suas percepções em energia vital, como o Todo-Existente converte todos
Seus auto-aspectos em variada energia de Sua criadora Força da consciência, a
Mente cósmica torna estes seus múltiplos pontos-de-vista da existência universal,
em pontos de apoio da Vida universal; torna-os na Matéria dentro das formas do ser
atômico imbuído da vida que as forja e governado pela mente e vontade que
colocam em ação a formação. Ao mesmo tempo, as existências atômicas que forma
desse modo devem, pela lei mesma de seu ser, tender a associar-se, a agregar-se; e
cada um destes agregados também, imbuído da vida oculta que forma e da mente e
vontade ocultas que as colocam em ação, leva consigo uma ficção de individual
existência separada. Cada objeto ou existência individual dessa índole é sustentado,
segundo que sua mente seja implícita ou explicita, manifesta ou não-manifesta, por
seu ego mecânico de força, no que o querer-ser é mudo e prisioneiro mas não o
menos poderoso, ou por seu mental ego auto-conhecedor no que o querer-ser é
liberado, consciente, separadamente ativo.
Dessa maneira, a causa da existência atômica não é nenhuma lei eterna e
original da Matéria eterna e original, senão a natureza da ação da Mente cósmica. A
Matéria é uma criação, e para sua criação foi necessária como ponto de partida ou
base o infinitesimal, uma fragmentação extrema do Infinito. O éter pode existir e
existe como um suporte intangível, quase espiritual da Matéria, mas como fenômeno
não parece, ao menos para nosso atual conhecimento, que se possa materialmente
detectar. Subdividamos o agregado visível ou átomo formal em átomos essenciais,
diminuindo-o no mais infinitesimal pó do ser, e todavia, devido à natureza da Mente
e da Vida que os formam, alcançaremos a alguma rasa existência atômica, talvez
instável mas sempre reconstituindo-se no eterno fluxo da força, de modo
fenomênico, e não em uma mera extensão não-atômica incapaz de conteúdo. A
não-atômica extensão da substância, extensão que não é agregação, a coexistência
distinta da que tem lugar por distribuição no espaço, são realidades da existência
pura, da pura substância; são um conhecimento da supramente e um princípio de
seu dinamismo, não um conceito criador da Mente divisora, ainda que a Mente pode
tomar consciência deles atrás de suas obras, São a realidade que subjaz na Matéria,
mas não o fenômeno que chamamos Materia. A Mente, a Vida e a Matéria mesma
podem ser uma só com essa pura existência e extensão conscientes em sua
realidade estática, mas não operar mediante essa unidade em sua dinâmica ação,
auto-percepção e auto-formação.
Portanto, alcançamos a esta verdade da Matéria de que existe uma conceptiva
auto-extensão do ser que se estrutura no universo como substancia ou objeto da
consciência, e que a Mente e Vida cósmica representam em sua ação criadora
através da divisão atõmica e a agregação como a coisa que chamamos Matéria. mas
esta Matéria, como a Mente e a Vida, é ainda Ser ou Brahman em sua ação auto-
criadora. É uma forma da força do Ser consciente, uma forma dada pela Mente e
realizada pela Vida. Tem dentro de si, como sua própria realidade, a consciência
oculta de si, envolvida e absorta no resultado de sua própria auto-formação e,
portanto, auto-esquecida. E por mais bruta e vazia de sentido que nos pareça, é
contudo, para a secreta experiência da consciência oculta dentro dessa Matéria,
deleite do ser oferecendo-se a esta consciência secreta como objeto de sensação a
fim de atrair a esse deus oculto fora de seu isolamento. o Ser se manifesta como
substância, a força do Ser se plasma na forma, em uma figurada auto-representação
da auto-consciência secreta, o deleite oferecendo-se a sua própria consciência como
um objeto, —o que é estão senão Satchidananda? A Matéria é Satchitananda
representado diante Sua própria experiência mental como base formal do
conhecimento objetivo, da ação e do deleite da existência--.

[1] III, 2.

[2] A Mente, como a conhecemos, cria só em um sentido relativo e instrumental; tem um ilimitado poder de
combinação, mas seus motivos e formas criadoras lhe chegam de cima: todas as formas criadas têm sua
base no Infinito acima da Mente, a Vida e a Matéria, e aqui estão representadas, reconstruídas —muito
comumente mal construídas— do infinitesimal. Seu fundamento está acima, suas ramificações abaixo, diz o
Rig Veda. A Mente supraconsciente de que falamos poderia chamar-se melhor de Sobremente e habita na
ordem hierárquica dos poderes do Espírito, uma zona que depende diretamente da consciência
supramental.

[3] A Mente se usa aqui em seu sentido mais exato, incluindo a operação de um poder da Sobremente que
está mais próximo à supramental Verdade-Consciência e que é a fonte primeira da criação da Ignorância.
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Capítulo XXV
O NÓ DA MATÉRIA
Não posso viajar à Verdade do luminoso Senhor pela força nem pela dualidade... Quem são os
que protegem o fundamento da falsidade? Quem são os guardiões da palavra irreal?

Naquele então a existência não era tão pouco a não-existência, o mundo-médio não era nem o
Éter nem o que está além. Que cobria tudo? Onde estava? Onde se refugiava? Que era esse
oceano denso e profundo? A morte não era nem a imortalidade nem o conhecimento do dia e a
noite. Aquele Um vivia sem alento pela lei de si mesmo, não havia nada mais, nada além. no
princípio a Obscuridade estava escondida por obscuridade, tudo isto era um oceano de
inconsciência. Quando o ser universal foi ocultado pela fragmentação, pela grandeza de sua
energia Aquele Um nasceu. Isso se moveu ao princípio como desejo interior, que foi a primeira
semente da mente. Os videntes da Verdade descobriram a construção do ser no não-ser pela
vontade no coração e pelo pensamento; seu raio se estendeu horizontalmente; mas o que
havia abaixo, o que havia acima? Ali estavam os Semeadores da semente, estavam as
Grandezas, estava a lei de si mesmo debaixo, estava a Vontade acima.

Rig Veda[1]

Então, se a conclusão a la que temos alcançado é correcta, —e não é possível outra


segundo os dados sobre os que trabalhamos—, a profunda divisão que a experiência
prática e o prolongado hábito da mente criaram entre Espírito e Matéria já não têm
realidade fundamental alguma. O mundo é uma unidade diferenciada, uma unidade
múltipla, não uma constante tentativa de compromisso entre eternas dissonâncias,
não uma eterna luta entre irreconciliáveis opostos. Seu fundamento e princípio é
uma inalienável unidade geradora de variedade infinita; uma constante reconciliação
aparece como seu real caráter, atrás da divisão e luta aparentes, combinando todas
as possíveis diferenças para vastos fins em uma secreta Consciência e Vontade que
sempre é uma só e dona de toda sua complexa ação; devemos, portanto, ter por
certo que uma realização da emergente Vontade e Consciência e uma harmonia
triunfante deve ser sua conclusão. A substância é a forma de si mesma na que
trabalha, e dessa substância se a Matéria é um extremo, o Espírito é o outro. Ambos
são um: o Espírito é a alma e a realidade do que sentimos como Matéria; a Matéria
é uma forma e corpo do que percebemos como Espírito.
Certamente, há uma vasta diferença prática e sobre essa diferença estão fundados a
indivisível série total e os sempre-ascendentes graus da existência-do-mundo. A
substância, temos dito, é existência consciente que se apresenta ao sentido como
objeto de modo que, sobre a base de qualquer sentido-relação que se estabeleça,
pode proceder a obra da formação-do-mundo e da progressão cósmica. Mas ali não
é necessário uma só base, só um princípio fundamental de relação imutável criada
entre sentido e substância; pelo contrário, há uma série ascendente e evolutiva.‐
Sabemos de outra substância na que a mente pura trabalha como seu meio natural
e que é muito mais sutil, mais flexível, mais plástica que qualquer coisa que nosso
sentido físico possa conceber como matéria. Podemos falar de uma substância da
mente porque chegamos a ser conscientes de um meio mais sutil no que as formas
surgem e a ação tem lugar; podemos falar também de uma substância de pura
energia-vital dinâmica diferente das mais sutis formas da substância material e suas
correntes-de-força físicamente sensíveis. O Espírito mesmo é pura substância del ser
apresentando-se como um objeto não já ao sentido físico, vital ou mental, senão à
luz de um puro conhecimento espiritual e perceptivo no que o sujeito se converte
em seu próprio objeto, quer dizer, no que o Intemporal e o Inespacial tem
consciência de si em uma pura auto-extensão espiritualmente auto-conceptiva como
base e matéria prima de toda existência. Além deste fundamento está la desaparição
de toda diferenciação consciente entre sujeito e objeto em uma absoluta identidade,
e ali já não podemos falar de Substância.
Portanto, é uma diferença puramente conceitual, –uma espiritual, não uma
conceitual diferença mental--, que culmina em uma distinção prática, que cria a
série que descende desde o Espírito através da Mente à Materia e que ascende outra
vez desde a Matéria através da Mente ao Espírito. Mas a real unidade não é nunca
suprimida, e, quando regressamos à original e integral visão das coisas, vemos que
nunca jamais se apequena ou desequilibra, nem nas mais brutas densidades da
Matéria. O Brahman é não só a causa, o poder sustentador e o princípio morador do
universo, é também sua matéria e sua única matéria. A Matéria também é Brahman,
e não é nenhuma outra coisa que Brahman ou diferente dele. Se em verdade a
Matéria se segregara do Espírito, isto não seria assim; mas é, como temos visto, só
uma forma final e aspecto objetivo da Existência divina contudo Deus sempre está
presente nela e atrás dela. Assim como esta Matéria aparentemente tosca e inerte
está por toda parte e sempre imbuída da poderosa força dinâmica da Vida, assim
como esta Vida dinâmica mas aparentemente inconsciente guarda em segredo
dentro dela uma inaparente Mente sempre-trabalhando, de cujas operações ocultas
é a manifesta energia, assim como esta Mente ignorante, não-iluminada e saudosa é
sustentada e guiada soberanamente no corpo viviente por seu próprio eu real, a
Supramente, que está ali por igual na Matéria não-mentalizada, assim toda a Matéria
igualmente que toda a Vida, Mente e Supramente são só modos do Brahman, o
Eterno, o Espírito, Satchitananda, que não só mora em todas elas senão que é todas
estas coisas ainda que nenhuma delas é Seu ser absoluto.
Mas ainda fica esta diferença conceitual e distinção prática, e nisso, inclusive se a
Matéria não se separa realmente do Espírito, contudo aparece com tal definição
prática de ser separada, é tão diferente, inclusive tão contrária em sua lei, a vida
material parece em tão grande medida ser a negação de toda existência espiritual
que sua rejeição bem poderia parecer o único atalho para acabar com a dificuldade,
-como indevidavelmente ocorre; mas um atalho ou qualquer redução não é a
solução—. Ainda ali, na Matéria radica indudavelmente a questão essencial; isso
suscita o obstáculo: pois devido à Matéria a Vida é bruta, limitada e afligida pela
morte e a dor, devido à Matéria a Mente é mais que semi-cega, com as asas
cortadas, com sues pés atados a um estreito suporte e refreada da vastidão e
liberdade acima da qual é consciente. Mas o tanto, o buscador espiritual exclusivo
está justificado em seu ponto de vista se, desgostado com o barro da Matéria,
perturbado pela tosquedade animal da Vida ou impaciente pela auto-aprisionada
estreiteza e baixa visão da Mente, se determina a separar-se dela por completo e
retornar por inação e silêncio à imóvel liberdade do Espírito. Mas esse não é o único
ponto de vista e, devido a que há sido sustentado ou glorificado sublimemente com
brilhantes e dourados exemplos, não necessitamos considerá-lo como a integral e
última sabedoria. Melhor, liberando-nos de toda paixão e rebeldia, vejamos o que
significa esta ordem divina do universal, e, enquanto a este grande nó e
emaranhado da Matéria que nega o Espírito, procuremos descobrir e separar suas
farpas, para assim afrouxá-lo com a solução e não cortá-lo com a violência.
Devemos expressar a dificuldade, primeiro a oposição, inteiramente, agudamente,
exageradamente, se é necessário, melhor que de maneira menor, e buscar a
solução.
Em primeiro lugar, então, a oposição fundamental que a Matéria oferece ao Espírito
consiste em que é a culminação do princípio da Ignorância. Aqui a Consciência se
perdeu e se esqueceu em uma forma de suas obras, como um homem pode
esquecer em extrema absorção não só quem é ele senão inclusive que existe, con‐
vrtendo-se momentaneamente só no trabalho que se efetua e a força que está
fazendo-o. O Espírito auto-luminoso, infinitamente conhecedor de si atrás de todas
as obras da força e seu domínio, parece haver desaparecido aqui e não existir para
nada; talvez está em algum lado, mas aqui Ele parece haver deixado só uma bruta e
inconsciente Força material que cria e destrói eternamente sem conhecer-se ou sem
saber o que cria ou por que o cria ou por que destrói o que uma vez criou; não sabe
pois não tem mente; não se preocupa, pois não tem coração. E se essa não é a
verdade real inclusive do universo material, se atrás de todo este falso fenômeno há
uma Mente, uma Vontade e algo maior que a Mente ou a Vontade mental, com tudo
esta é um obscuro semblante que o universo material mesmo apresenta como uma
verdade à consciência que emerge nele à partir de sua noite; e se não fosse verdade
senão mentira, contudo é a mentira mais efetiva, pois determina as condições de
nossa existência fenomênica e acossa a toda nossa aspiração e esforço.
Pois isto é o monstruoso, o terrível e sem misericordioso milagre do universo
material que emerge desta não-Mente, mente, ou várias mentes, que se encontram
lutando debilmente pela luz, individualmente desamparadas, um tanto menos
desamparadas quando, em defensa própria, associam sua debilidade individual em
meio da gigantesca Ignorância que é a lei do universo. À partir desta sem afeto
Inconsciência e dentro de sua rigorosa jurisdição há nascido os corações, ou
aspiram, e são torturados e sangrados sob o peso da cega e insensível crueldade
desta férrea existência, uma crueldade que assenta sua lei sobre eles e se torna
sensível no sentimento deles, brutal, feroz, horrível. Mas, depois de todo, que é,
atrás das aparências, este aparente mistério? Podemos ver que é a Consciência que
se há perdido regressando outra vez a si mesma, emergindo de seu gigantesco
auto-esquecimento, lentamente, penosamente, como uma Vida que poderia ser
sensível, semi-sensível, obscuramente sensível, totalmente sensível e finalmente
lutando por ser mais que sensível, a ser de novo divinamente auto-consciente, livre,
infinita, imortal. Mas atua para isto sob uma lei que é o oposto destas coisas, sob as
condições da Matéria, vale dizer, contra o aferrar-se da Ignorância. Os movimentos
que há de seguir, os instrumentos que há de usar os apresenta e prepara esta tosca
e dividida Matéria, impondo, a cada passo, ignorância e limitação.
Pois a segunda oposição fundamental que a Matéria oferece ao Espírito, é esta que
é a culminação da escravidão à Lei mecânica e opõe a todo o que procura liberar-se
uma colossal Inércia. Não é que a Matéria mesma seja inerte; é muito mais um
movimento infinito, uma força inconcebível, uma ação ilimitada, cujos movimentos
grandiosos são tema de nossa constante admiração. Mas enquanto o Espírito é livre,
dono de si e de suas obras, não obrigado por elas, criador da lei e não sujeito a ela,
esta Matéria gigantesca está rigorosamente encadeada por uma fixa e mecânica Lei
que lhe é imposta, que não entende nem jamais concebeu e que se estrutura
inconscientemente como uma máquina funcionando sem saber quem a criou,
mediante que procedimento e com que fim. E quando a Vida desperta e busca
impor-se sobre a forma física e a força material, e usar todas as coisas segundo sua
própria vontade e para sua própria necessidade, quando a mente desperta e busca
conhecer o quem, por que e como de si mesma e de todas as coisas e, sobretudo,
usar seu conhecimento para a imposição de sua própria lei mai livre e de sua auto-
guiadora ação sobre as coisas, a Natureza material parece ceder, inclusive aprovar e
auxiliar, ainda que sob uma luta, com repulsa e só até certo ponto. Mas além desse
ponto apresenta uma obstinada inércia, obstrução, negação e inclusive persuade à
Vida e a Mente que não podem ir mais adiante, que não podem prosseguir até o fim
sua vitória parcial. A Vida luta por alargar-se, prolongar-se e triunfar; mas quando
busca amplitude e imortalidade totais, encontra a férrea obstrução da Matéria e se
descobre ligada à estreitza e a morte. A Mente busca ajudar a vida e cumprir seu
próprio impulso de abarcar todo o conhecimento, de converter-se em luz plena, de
possuir a verdade e ser a verdade, de respaldar o amor e e alegria, e ser amor e
alegria; mas sempre está o desvio, o erro e a tosquedade dos materiais instintos-
vitais e a negação e obstrução do sentido material e dos instrumentos físicos. O erro
sempre vai em posse de seu conhecimento, a obscuridade é inseparável
companheira e transfundo de sua luz; a verdade é buscada exitosamente e,
contudo, quando se a agarra, cessa de ser verdade e a busca há de continuar; o
amor está ali mas não pode satisfazer-se, a alegria está ali mas não pode justificar-
se; cada qual arrasta como se fossem cadeias ou projeta como se fossem sombras,
seus próprios opostos, ira e ódio e indiferença, saciedade e pesar e dor. A inércia
com a que responde a Matéria às demandas da Mente e a Vida, impede a conquista
da Ignorância e da Força bruta que é o poder da ignorância.
E quando buscamos saber por que isto é assim, vemos que o bom êxito desta
inércia e obstrução se deve ao terceiro poder da Matéria; pois a terceira oposição
fundamental que a Matéria oferece ao Espírito é esta que é a culminação do
princípio da divisão e a luta. Certamente indivisível na realidade, a divisibilidade é a
base total da ação desde a qual parece sempre proibido partir; pois seus dois únicos
métodos de união são a agregação de unidades ou uma assimilação que implica a
destruição de uma unidade por parte de outra; e ambos métodos de união são uma
confissão de eterna divisão, dado que o primeiro antes associa que unifica e por seu
princípio mesmo admite a constante possibilidade e, portanto, a necessidade última
de dissociação, de dissolução. Ambos métodos repousam sobre a morte, em um
como um meio, no outro como uma condição de vida. Eambos pressupõem como a
condição da existência-mundana uma constante luta das unidades divididas, uma
com outra, cada qual lutando por manter-se, por necessidade sua associação, por
compelir ou destruir o que lhe resiste, por reunir e devorar aos demais como sua
comida, mas em si mesma compelida a alçar-se contra a compulsão e a fugir dela,
da destruição e da assimilação por ser devorada. Quando o princípio vital manifesta
suas atividades na Matéria, encontra ali só esta base para todas suas atividades e é
compelido a inclinar-se diante o julgo; há de aceitar a lei da morte, do desejo e da
limitação, e essa constante luta por devorar, possuir, dominar que temos visto
constitui o primeiro aspecto da Vida. E quando o princípio mental se manifesta na
Matéria, há de aceitar do molde e material em que trabalha o mesmo princípio de
limitação, de busca sem encontro seguro, a mesma associação e dissociação
constantes de suas conquistas e dos componentes de suas obras, de modo que o
conhecimento obtido pelo homem, o ser mental, jamais parece ser final ou livre de
dúvida e negação, e todo seu labor parece condenado a mover-se em um ritmo de
ação e reação e de fazer e desfazer, em ciclos de criação e breve preservação e
larga destruição sem progresso certo nem seguro.
Em especial e mais fatalmente, a ignorância, inércia e divisão da Matéria impõem
sobre a existência vital e mental que emergem nela, a lei da dor e o sofrimento, e o
desassossego da insatisfação com seu estado de divisão, inércia e ignorância. A
ignorância certamente não traria a dor da insatisfação se a consciência mental fosse
inteiramente ignorante, se ficasse satisfeita com sua caparazón de costumes sem ter
consciência de sua própria ignorância ou do oceano infinito da consciência e o
conhecimento pelo que vive rodeada; mas precisamente é a isto ao que desperta a
Consciência que emerge na Matéria, primeiro a sua ignorância do mundo no que
vive e que há de conhecer e dominar a fim de ser feliz; segundo, à esterilidade e
limitação últimas deste conhecimento, à escassez e insegurança do poder e a
felicidade que traz, e ao ter noção de uma consciência infinita, de um conhecimento,
de um ser verdadeiro no que só há de encontrar-se uma felicidade vitoriosa e
infinita. E a obstrução da inércia não traria consigo desassossego e insatisfação se a
sensibilidade vital que emerge na Matéria fosse inerte por completo; se satisfizesse-
se com sua limitada existência semiconsciente, desconhecedora do poder infinito e a
existência imortal em que vive como parte e contudo separada dela; ou se nada
tivesse dentro de si que a levara a esforçar-se para participar realmente nessa infini‐
tude e imortalidade. Mas isto é precisamente o que toda vida tende a buscar e sentir
desde o princípio, sua insegurança e a necessidade, e a luta pela persistência, pela
auto-preservação; finalmente desperta à limitação de sua existência e começa a
sentir o impulso para a grandeza e a persistência, para o infinito e o eterno.
E quando no homem a vida se torna totalmente auto-consciente, esta inevitável
luta, esforço e aspiração alcançam seu ponto culminante e a dor e a discórdia do
mundo se tornam finalmente demasiado notoriamente sensíveis como para tolerá-
los com contentamento. O homem pode durante longo tempo aquietar-se
procurando satisfazer-se com suas limitações ou reduzindo sua luta a um domínio tal
como o que pode alcançar sobre este mundo material em que vive, algum triunfo
mental e físico de seu conhecimento progressivo sobre suas inconscientes
estabilidades, de suas pequenas e concentradas vontade e poder conscientes sobre
suas monstruosas forças manejadas-inertemente. Mas aqui também encontra a
limitação, a pobre impossibilidade conclusiva dos máximos resultados que pode
conquistar e está obrigado a olhar além. O finito não pode ficar permanentemente
satisfeito enquanto não seja consciente, de uma finitude maior que a própria ou
mais, de uma infinitude além de si, às que possa aspirar e se o finito pudesse assim
satisfazer-se, contudo o ser aparentemente finito que sente em realidade ser infinito
ou sente meramente a presença, ou o impulso e acicate de um infinito em seu
interior, jamais pode satisfazer-se até que ambos se reconciliem, até que Isso esteja
possuído por ele, e ele seja possuído por Isso, em qualquer grau ou maneira. O
homem é essa infinitude de aparência finita e não pode falhar em alcançar a uma
busca em posse do Infinito. O homem é o primeiro filho da terra que chega a ser
vagamente consciente de Deus dentro dele, de sua imortalidade ou de sua
necessidade de imortalidade, e esse conhecimento é um chicote que impele e uma
cruz de crucificação até que é capaz de convertê-lo em fonte de luz, alegria e poder
infinitos.
Este desenvolvimento progressivo, esta crescente manifestação da divina
Consciência e Força, Conhecimento e Vontade que se perdeu na ignorância e inércia
da Matéria, bem poderia ser uma feliz florescência prosseguindo desde a alegria
para uma maior e, finalmente, infinita alegria se não fosse pelo princípio da rígida
divisão da que partiu a Matéria. O encerrar-se do indivíduo em sua própria
consciência pessoal de separada e limitada mente, vida e corpo impede o que, de
outro modo, seria a natural lei de nosso desenvolvimento. Introduz no corpo a lei de
atração e repulsão, de defesa e ataque, de discórdia e dor. Pois para o ser cada
corpo é uma limitada força-consciente, se sente exposto ao ataque, impacto,
forçado contato de outra limitada força-consciente ou de forças universais, e donde
se sente interferido ou incapaz de harmonizar o contacto e a consciência receptora,
sofre desassossego e dor, é atraído ou repelido, há de defender-se ou atacar; se lhe
reclama constantemente suportar o que não quer ou não é capaz de sofrer. Dentro
do emocional e do sentido-mente a lei de divisão traz as mesmas reações com os
valores superiores de pesar e alegria, amor e ódio, opressão e depressão, todos
projetados dentro dos termos do desejo, e mediante o desejo projetados em tensão
e esforço, e mediante a tensão se projetam em excesso e defeito de força,
incapacidade, o ritmo de conquista e contrariedade, possessão e dobra, uma luta
constante e transtorno e incomodidade. Dentro da mente como um todo, em lugar
de uma lei divina de mais estreita verdade que flui para uma verdade maior, em
lugar de uma luz menor que se eleva para uma luz mais vasta, em lugar de uma
vontade inferior submetida a uma superior vontade transformadora, em lugar de
uma menor satisfação que progride para uma satisfação mais nobre e mais
completa, traz similares dualidades de verdade seguida por erro, de luz seguida por
obscuridade, de poder seguido por incapacidade, de prazer de perseguir e alcançar
seguido por dor de rejeição e de insatisfação até o que se alcança; a mente encara
sua própria aflição junto com a aflição da vida e o corpo e toma consciência do triplo
defeito e insuficiência de nosso ser natural. Tudo isto significa a negação de Ananda,
a negação da trindade de Satchitananda e, portanto, se a negação é insuperável, a
futilidade da existência; pois a existência, ao lançar-se no jogo da consciência e da
força, deve buscar esse movimento não meramente para si, senão também pela
satisfação no jogo, e se não é possível achar real satisfação no jogo, deve
obviamente abandonar-se finalmente, como uma vã intenção, um erro colossal, um
delírio do espírito auto-encarnando.
Esta é a base total da teoria pessimista do mundo, —pode considerar-se otimista
enquanto aos mundos e estados além, mas pessimista enquanto à vida terrena e
destino do ser mental em seus tratos com o universo material—. Pois afirma que,
dado que a natureza mesma da existência material é a divisão e a semente mesma
da mente corporizada é la auto-limitação, a ignorancia e o egoísmo, buscar a
satisfação do espírito sobre a terra ou buscar um resultado ou propósito divino e
culminação para o jogo-do-mundo é vaidade e engano; só em um céu do Espírito e
não no mundo, ou só na verdadeira quietude do Espírito e não em suas atividades
fenomênicas, podemos reunir a existência e a consciência com o divino auto-deleite.
O Infinito só pode recuperar-se rejeitando como um erro e um passo em falso sua
tentativa de encontrar-se no finito. Tão pouco o emergir da consciência mental no
universo material pode trazer consigo promessa alguma de uma divina realização.
Pois o princípio da divisão não é apropriado à Matéria senão à Mente; a Matéria é só
uma ilusão da Mente na qual a Mente introduz sua própria regra de divisão e
ignorância. Portanto, dentro desta ilusão a Mente só pode achar-se a si mesma; só
pode viajar entre os três termos da existência dividida que criou: não pode achar ali
a unidade do Espírito nem a verdade da existência espiritual.
Agora bem, é verdade que o princípio da divisão na Matéria só pode ser uma criação
da Mente dividida que se precipitou na existência material; pois essa existência
material não tem auto-ser, não é o fenômeno original senão só uma forma criada
por uma força-Vital todo-divisora que estrutura as concepções de uma Mente todo-
divisora. Estruturando o ser dentro destas aparências da ignorância, inércia e divisão
da Matéria, a Mente divisora se perdeu e aprisionado em uma masmorra de seu
próprio edifício, se sujeita com cadeias que ela mesma forjou. E se é verdade que a
Mente divisora é o primeiro princípio da criação, então deve ser também a conquista
última possível na criação, e o ser mental lutando de maneira vã com a Vida e a
Matéria, vencendo-as só para ser vencido por elas, repetindo eternamente um
infrutuoso ciclo, deve ser a última e suprema palavra da existência cósmica. Mas
essa consequência não procede se, pelo contrário, é o Espírito imortal e infinito que
se há velado no denso manto da substância material, quem trabalha ali mediante o
supremo poder criador da Supramente, permitindo as divisões da Mente e o reino do
princípio inferior ou material só como condições iniciais de certo jogo evolutivo do
Um nos Muitos. Se, em outras palavras, não é meramente um ser mental que está
escondido nas formas do universo, senão o infinito Ser, Conhecimento, Vontade, que
emerge desde a Matéria primeiro como Vida, logo como Mente, com o resto de si
ainda não revelado, então o emergir da consciência desde o aparentemente
Inconsciente deve ter outro termo mais completo; já não é impossível a aparição de
um supramental ser espiritual que imponha em suas obras mentais, vitais e
corporais, uma lei superior à da Mente divisora. Pelo contrário, é a natural e
inevitável conclusão da natureza da existência cósmica.
Esse ser supramental, como temos visto, liberaria a mente do nó de sua dividida
existência e usaria a individualização da mente como simplesmente uma útil ação
subordinada da todo-abarcadora Supramente; e ela liberaria a vida também do nó
de sua dividida existência e usaria a individualização da vida como simplesmente
uma útil ação subordinada da única Força-Consciente que realiza seu ser e alegria
em uma diversificada unidade. Há alguma razão pela que não liberaria também a
existência corporal da atual lei de morte, divisão e mútuo devorar-se, e usaria a
individualização do corpo como meramente um útil subordinado da única divina
Existência-Consciente, posta em serviço para a alegria do Infinito no finito? Ou por
que este espírito não seria livre em uma soberana ocupação da forma,
conscientemente imortal ainda na mudança de seu vestido de Matéria, possuído de
seu auto-deleite em um mundo sujeito à lei da unidade, o amor e a beleza? E se o
homem é o habitante da existência terrestre, através do qual pode finalmente
produzir-se essa transformação do mental no supramental? Não é possível que
possa ele desenvolver, igualmente que uma mente divina e uma vida divina,
também um corpo divino? Ou, se a frase parece demasiado surpreendente para
nossas atuais concepções limitadas da potencialidade humana, não pode ele em seu
desenvolvimento de seu verdadeiro ser e de sua luz, alegria e poder, alcançar a um
uso divino da mente, a vida e o corpo, pelo qual o descenso do Espírito na forma se
justifique, a sua vez, tanto no humano como no divino?
O único que pode criar obstáculo no caminho dessa última possibilidade terrestre é
se nossa atual visão da Matéria e suas leis representam a única relação possível
entre sentido e substância, entre o Divino como sujeito conhecedor e o Divino como
objeto de conhecimento, ou se, ao ser possíveis outras relações, contudo não são
possíveis de nenhum modo aqui, senão que devem buscar-se em superiores planos
da existência. Nesse caso, é além dos céus que devemos buscar nossa íntegra
realização divina, como o afirmam as religiões, e sua outra afirmação do reino de
Deus ou do reino do perfeito sobre a terra deve fazer-se a um lado como ilusão.
Aqui só podemos perseguir ou alcançar uma interna preparação ou vitória e,
havendo liberado a mente, a vida e a alma por dentro, devemos voltar-nos, desde o
não-conquistado e inconquistável princípio material, desde uma não-regenerada e
intratável terra, a buscar por toda parte nossa divina substância. No entanto, não há
razão para que aceitemos esta limitadora conclusão. Com toda segurança há ainda
outros estados inclusive de Matéria mesma; há induvidavelmente uma série
ascendente das divinas gradações da substância; existe a possibilidade do ser mate‐
rial, de transfigurar-se através da aceitação de uma lei superior à própria que,
contudo, é a sua própria pois está ali sempre latente e potencial em seus próprios
segredos.

[1] V, 12, 2, 4; X, 129, 1-5.


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Capítulo XXVI
A SÉRIE ASCENDENTE DA SUBSTÂNCIA
Há um eu que é de a essência da Matéria —há outro eu interior da Vida que completa o
primeiro¾ há outro eu interior da Mente —há outro eu interior da Verdade-Conhecimento— há
outro eu interior de Bem-aventurança.

Taittiriya Upanishad[1]

Eles ascendem a Indra como uma escada. Na medida em que um sobe cume após cume, se
torna claro o muito que ainda resta por fazer. Indra traz a consciência Disso como meta.

Como um falcão, como um milano Ele se pousa sobre a Nave e a eleva; em Seu jato de
movimento Ele descobre os Raios, pois marcha portando suas armas: cliva o oceano agita as
águas; um grande Rei. Ele declara o quarto estado. Como um mortal que purifica seu corpo,
como um cabalo-de-guerra que galopa à conquista de riquezas, Ele flui chamando através de
toda a envoltura[2] e entra nestes vasos.

Rig Veda[3]

Se consideramos o que mais representa a nós a materialidade da Matéria, veremos


que é seu aspecto de solidez, de ser tangível, de resistência crescente, de firme
resposta ao contato com a Sensação. A substância parece mais certamente material
e real em proporção a como nos apresenta uma sólida resistência e em virtude
dessa resistência, uma durabilidade da forma sensível na que nossa consciência
poda morar; em proporção a como resulta mais sutil, menos densamente resistente
e menos duradouramente percebido pelo sentido, nos parece menos material. Este
atitude de nossa consciência ordinária para com a Matéria é símbolo do objeto
essencial para o qual há sido criada a Matéria. A substância mora dentro do estado
material a fim de poder apresentar-se à consciência, à qual tem que entregar com
ele imagens duradouras, firmemente apreensíveis sobre as que a mente possa
apoiar e basear suas operações e às que a Vida possa manejar, com ao menos, uma
relativa segurança de permanência na forma sobre a que opera. Portanto, na antiga
fórmula Védica, a Terra, modelo dos estados mais sólidos de substância, foi aceitada
como o nome simbólico do princípio material. Por isso também o tato ou contato é
para nós a base essencial de Sensação; todos os outros sentidos físicos, gosto,
olfato, ouvido, vista, se baseiam em uma série de contatos cada vez mais sutis e
indiretos entre o perceptivo e o percebido. Igualmente, na classificação Sankhya dos
cinco estados elementais da Substância desde o éter à terra, vemos que sua
característica é uma constante progressão desde o mais sutil até o menos sutil de
modo que na cúspide temos as vibrações sutis do etéreo e na base a densidade
mais grossa da elemental condição terrena ou sólida. A Matéria, portanto, é a última
etapa conhecida por nós no progresso da pura substancia para uma base de relação
cósmica, na que a primeira palavra não será espírito senão forma, e forma em seu
máximo desenvolvimento possível de concentração, resistência, imagem
duradoramente densa, mútua impenetrabilidade, —o ponto culminante da distinção,
separação e divisão—. Esta é a intenção e caráter do universo material; é a fórmula
da consumada divisibilidade.
Se há, como deve existir na natureza das coisas, uma série ascendente na escala da
substância desde a Matéria até o Espírito, ela deve estar marcada por uma
progressiva diminuição destas capacidades mais características do principio físico e
um progressivo incremento das características opostas que nos conduzirão à fórmula
da pura auto-extensão espiritual. Isto é como dizer que devem estar marcadas por
cada vez menor escravidão à forma, por cada vez maior sutileza e flexibilidade de
substância e força; por cada vez maior inter-fusão, interpenetração, poder de
assimilação, poder de intercâmbio, poder de variação, transmutação e unificação.
Afastando-nos da durabilidade da forma marchar-nos para a eternidade da essência;
afastando-nos de nosso equilíbrio na persistente separação e resistência da Matéria
física, nos acercamos ao supremo equilíbrio divino na infinitude, unidade e
indivisibilidade do Espírito. Entre a tosca substância densa e a pura substância do
espírito esta deve ser a fundamental antinomia. Na Matéria, Chit ou a Força-
Consciente se concentra cada vez mais para resistir e impor-se diante das outras
massas da mesma Força-Consciente; na substância do Espírito, a pura consciência
se imagina livremente em sua sensação de si mesma com uma indivisibilidade
essencial e um constante intercâmbio unificador como fórmula básica inclusive do
mais diversificado jogo de sua própria Força. Entre estes dois pólos existe a
possibilidade de uma gradação infinita.
Estas considerações resultam de grande importância quando consideramos a
possível relação entre a vida divina e a mente divina da alma humana aperfeiçoada
e o muito denso e aparentemente não-divino corpo ou forma do ser físico em que
atualmente moramos. Essa forma é resultado de certa relação fixa existente ente
sensação e substância, desde a qual começou o universo material. Mas assim como
esta relação não é a única relação possível, de igual modo essa forma não é a única
forma possível. A vida e a mente podem manifestar-se em outra relação com a
substância e estruturar diferentes leis físicas, hábitos distintos e maiores, inclusive
uma distinta substância do corpo com uma mais livre ação da sensação, mais livre
ação da vida, mais livre ação da mente. Morte, divisão, mútua resistência e exclusão
entre as massas corporizadas da mesma força-vital consciente são a fórmula de
nossa existência física; a estreita limitação do jogo dos sentidos, a determinação
dentro de um pequeno círculo do campo, duração e poder das obras-vitais, o
obscurecimento, o pouco convincente movimento, o interrompido e restringido
funcionamento da mente são o julgo que essa fórmula expressada no corpo animal
há imposto sobre os princípios superiores. Mas estas coisas não são o único ritmo
possível da Natureza cósmica. Há estados superiores, há mundos superiores, e se
por qualquer progresso do homem e por qualquer liberação de nossa substância
desde suas atuais imperfeições, a lei daqueles pudesse impor-se nesta forma e
instrumento sensíveis de nosso ser, então pode existir inclusive aqui uma atuação
física da mente e do sentido divinos, uma tarefa física da vida divina na estrutura
humana e também na evolução sobre a terra de algo que podemos chamar, um
corpo divinamente humano. O corpo do homem também pode algum dia obter sua
transfiguração; a Mãe-Terra também pode revelar em nós sua deidade.
Inclusive dentro da fórmula do cosmos físico há uma série ascendente na escala da
Matéria que nos conduz do mais denso ao menos denso, do menos sutil ao mais
sutil. De onde alcançamos o termo supremo dessa série, a mais supra-etérea
sutileza da substância material ou formulação da Força, que está mais além? Não é
um Nihil, não é um vazio; pois não existe uma coisa tal como vazio absoluto ou
nulidade real e o que chamamos por esse nome é simplesmente algo que está mais
além da captação de nosso sentido, nossa mente ou nossa consciência mais sutil.
Tão pouco é verdade que além não há nada, o que alguma substância etérea da
Matéria é o princípio eterno; pois sabemos que a Matéria e a Força material são só
um resultado último de uma Substância pura e uma Força pura nas que a
consciência está luminosamente auto-consciente e auto-possuidora e não como na
Matéria perdida em si mesma em um sonho inconsciente e em um movimento
inerte. Que há então entre esta substância material e essa substância pura? Pois não
saltamos de uma à outra, não passamos a um tempo do inconsciente à consciência
absoluta. Devem haver e há toda uma evolução de graus entre a substância
inconsciente e a auto-extensão completamente auto-consciente, igualmente que
entre o princípio da Matéria e o princípio do Espírito.
Todos quantos sondaram estes abismos estão dispostos a testemunhar o fato de
que há uma série de formulações (formas) cada vez mais sutis da substância, que
escapam e vão mais além da fórmula do universo material. Sem aprofundar em
assuntos que são demasiado ocultos e difíceis para nossa atual investigação,
podemos dizer, aderindo-nos ao sistema sobre o que nos temos baseado, que estas
gradações da substância, --em um importante aspecto de sua formulação em séries-
-, podem ver-se, como se correspondem, com a ascendente série de Matéria, Vida,
Mente, Supramente e essa outra divina triplicidade superior de Satchitananda. Em
outras palavras, descobrimos que a substância em sua ascensão, se baseia em cada
um destes princípios e se torna sucessivamente um veículo característico para a
dominante auto-expressão cósmica em cada uma de suas séries ascendentes.
Aqui, no mundo material, tudo se funda na fórmula da substância material. A
Sensação, a Vida, o Pensamento se baseiam sobre o que os antigos chamaram
Poder-Terra, partem dele, acatam suas leis, acomodam suas atuações a este
princípio fundamental, se limitam por suas possibilidades e, se desenvolveram
outras, inclusive nesse desenvolvimento hão de ter em conta a fórmula original, sua
finalidade e sua exigência sobre a evolução divina. A sensação trabalha através dos
instrumentos físicos, a vida através do sistema-nervoso físico e os órgãos vitais, a
mente há de construir suas operações sobre uma base corporal, usando uma
instrumentação material, ainda em suas atividades mentais puras há de tomar os
dados assim derivados como campo e como o material sobre os quais trabalha. Não
é preciso que na natureza essencial da mente, da sensação, da vida, tenham de
limitar-se assim: pois os órgãos-sensoriais físicos não são os criadores das
percepções-sensorias, senão que eles mesmos são a criação, os instrumentos e aqui
uma conveniência necessária da sensação cósmica; o sistema nervoso e os órgãos
vitais não são os criadores da ação e reação da vida, senão que eles mesmos são a
criação, os instrumentos e aqui uma necessária conveniência da força-vital cósmica;
o cérebro não é o criador do pensamento, senão que ele mesmo é a criação, o
instrumento e aqui uma necessária conveniência da Mente cósmica. A necessidade
então não é absoluta, senão teleológica; é o resultado de uma divina Vontade
cósmica no universo material que propende a projetar aqui uma relação física entre
a sensação e seu objeto, estabelece aqui uma fórmula material e lei da Força-
Consciente e cria mediante ela as imagens físicas do Ser-Consciente para servir de
fato inicial, dominante e determinante do mundo em que vivemos. Não é uma lei
fundamental do ser senão um princípio construtivo requerido pela intenção do
Espírito em ordem a evoluir no mundo da Matéria.
No grau seguinte da substância o fato inicial, dominante e determinante já não é
a força e a forma da substância senão a vida e o desejo consciente. Portanto, o
Mundo além deste plano material deve ser um mundo baseado em uma consciente
Energia vital cósmica, uma força de busca vital e uma força de Desejo e sua auto-
expressão, e não em uma vontade inconsciente ou subconsciente que toma a forma
de uma energia e uma força material. Todas as formas, corpos, forças, movimentos-
vitais, movimentos-sensórios, movimentos-do-pensamento, desenvolvimentos,
culminações, auto-realizações desse Mundo devem ser dominados e determinados
por este fato inicial da Vida-Consciente ao que a Matéria e a Mente devem
submeter-se, devem partir desde ele, basear-se ambas nele, limitar-se ou alargar-se
segundo suas leis, poderes, capacidades, limitações; e se a Mente procura
desenvolver todavia possibilidades superiores, ainda deve ter em conta a fórmula
vital original da força-desejo, sua finalidade e sua exigência enquanto à
manifestação divina.
O mesmo ocorre com as gradações superiores. A seguinte na série deve ser
governada pelo dominante e determinante fator da Mente. A substância deve haver
chegado a ser o bastante sutil e flexível como para assumir as formas que
diretamente lhe impõe a Mente, para acatar suas operações, para subordinar-se a
sua exigência de auto-expressão e auto-realização. As relações de sensação e subs‐
tância devem também ter uma sutileza e flexibilidade correspondentes, e devem ser
determinadas, não pelas relações do órgão físico com o objeto físico, senão da
Mente com a substância mais sutil sobre a qual trabalha. A vida desse Mundo seria
servente da Mente em um sentido do qual nossas débeis operações mentais e
nossas limitadas, toscas e rebeldes faculdades vitais não podem ter uma concepção
adequada. Ali a Mente domina como a fórmula original, sua finalidade prevalece, sua
exigência supera a todas as outras na lei da manifestação divina. Em uma distância
ainda superior, a Supramente —ou, entre médias, os princípios controlados por ela—
ou, mais acima todavia, uma pura Bem-aventurança, um puro Poder Consciente ou
puro Ser substituem à Mente como princípio dominante, e ingressamos naqueles
Âmbitos da existência cósmica que para os antigos videntes Védicos eram os Mun‐
dos da divina existência iluminada e o fundamento do que denominaram
Imortalidade e que mais tarde as religiões indianas imaginaram, em figuras como
Brahmaloka ou Goloka, alguma suprema auto-expressão do Ser como Espírito na
que a alma liberada em sua perfeição suprema possui a infinitude e beatitude da
Deidade eterna.
O princípio que subjaz nesta experiência continuamente ascendente e nesta visão
que se eleva mais além da formulação material das coisas é que toda existência
cósmica é uma harmonia complexa e não conclui com o alcance limitado da
consciência nele que a ordinária mente humana e a vida estão condenados a estar
em prisão. O ser, a consciência, a força, a substância, descendem e ascendem uma
escada de múltiplos degraus, em cada um dos quais o ser tem uma mais vasta auto-
extensão, a consciência uma mais ampla sensação de seu próprio alcance, grandeza
e alegria, a força uma maior intensidade e uma mais rápida e bem-aventurada
capacidade, a substância oferece uma mais sutil, plástica, flutuante e flexível versão
de sua primeira realidade. Pois o mais sutil é também o mais poderoso, ¾um
poderia dizer o mais verdadeiramente concreto--; é menos restringido que o denso,
tem uma maior permanência em seu ser junto com maior potencialidade,
plasticidade e alcance em seu devir. Cada plataforma da ascensão ao cume do ser,
dá à nossa experiência em expansão um plano superior de nossa consciência e um
mundo mais rico para nossa existência.
Mas como afeta esta série ascendente às possibilidades de nossa existência
material? Não as afetaria para nada se cada plano da consciência, cada Mundo da
existência, cada classe de substãncia, cada grau de força cósmica estivesse
segregado por inteiro do que precede e do que lhe segue. Mas a verdade é o
oposto; a manifestação do Espírito é uma complexa trama e no desenho e modelo
de um Princípio entram todos os demais como elementos do todo espiritual. Nosso
Mundo material é o resultado de todos os demais Mundos, pois todos os outros
Princípios descenderam na Matéria para criar o universo físico, e cada partícula do
que chamamos Matéria contêm a todos eles implícitos em si mesma; sua ação
secreta, como já vimos está involvida em cada momento de sua existência e em
todo movimento de sua atividade. E assim como a Matéria é a última palavra do
Descenso Involutivo ao Inconsciente, de igual maneira é também a primeira palavra
da Ascensão; assim como os poderes de todos estes planos, mundos, classes, graus
estão envolvidos na existência material, de igual maneira todos são capazes de
Evolução por e à partir dela. É por esta razão que o ser material não começa e
termina com gases, compostos químicos, forças físicas e movimentos, com
nebulosas, sóis e terras, senão que evolui até o desenvolvimento da vida, evolui até
o desenvolvimento da mente, deve evoluir em seu momento para a supramente e os
graus superiores da existência espiritual. A evolução advêm mediante a incesante
pressão dos planos supra-materiais sobre o material, compelindo à matéria a liberar
de si seus princípios e poderes que, de outro modo, concebivelmente haveriam
dormido aprisionados na rigidez da fórmula material. Isto haveria sido ainda assim
improvável, dado que sua presença ali implica um propósito de liberação; mas ainda
esta necessidade debaixo é em realidade ajudada em grau sumo por uma
semelhante pressão superior.
Esta evolução não pode terminar com a primeira formulação escassa da vida,
mente, supramente, espírito, concedida a esses poderes superiores pelo relutante
poder da Matéria. Pois na medida que evoluem, tal como despertam, tal como
chegam a ser mais ativos e ávidos de suas próprias potencialidades, a pressão sobre
eles dos planos superiores, --uma pressão envolvida na existência e íntima conexão
e interdependência dos Mundos--, deve também crescer em insistência, poder e
efetividade. Estes princípios não só devem manifestar-se desde baixo em um
qualificado e restringido emergir, senão também desde acima deles devem
descender com seu característico poder e plena florescência possível dentro do ser
material; a criatura material deve abrir-se a um jogo cada vez mais amplo de suas
atividades na Matéria, e tudo quanto se necessita é um receptáculo, um meio e
alguns instrumentos aptos. Isso o aporta o corpo, a vida e a consciência do homem.
Certamente, se esse corpo, vida e consciência estivessem limitados às
possibilidades do corpo denso humano, que são todas as que aceitam nossos
sentidos físicos e mentalidade física, haveria um estreitíssimo marco para esta
evolução, e o ser humano não poderia esperar cumprir nada essencialmente maior
que seu próprio alcance. Mas este corpo, como o descobriu a antiga ciência oculta,
não é todavia o todo de nosso ser físico; esta bruta densidade não é toda nossa
substância. O antiquíssimo conhecimento Vedântico nos fala de cinco graus de nosso
ser: o material, o vital, o mental, o ideal e o espiritual ou beatífico, e a cada um
destes graus de nossa alma lhe corresponde ali uma classe de nossa substância,
uma envoltura como se a denominou no antiga linguagem figurativa. Uma psicologia
posterior descobriu que estas cinco envolturas de nossa substância eram o material
dos três corpos, o físico denso, o sutil e o causal, em todos os quais a alma mora
real e simultaneamente, ainda que aqui e agora só somos superficialmente
conscientes do veículo material. Mas é possível também chegar a ser conscientes em
nossos outros corpos e ele constitui de fato levantar o véu entre eles e
consequentemente entre nossas personalidades física, psíquica e ideal que é a causa
daqueles fenômenos “psíquicos” e “ocultos” que na atualidade começam a
examinar-se, ainda que não na proporção desejada e bastante desdenhadamente,
distando muito todavia de ser devidamente explorados. Os antigos Hatha-yogues e
Tântricos da Índia faz muito tempo que reduziram a uma ciência este tema da vida e
corpo humanos superiores. Descobriram seis centros nervosos da vida no corpo
denso, correspondentes aos seis centros da vida e a faculdade mental no sutil, e
também encontraram sutis exercícios físicos mediante os quais estes centros, agora
cerrados, podiam abrir-se, ingressando o homem na vida psíquica superior
apropriada a nossa existência sutil, podendo inclusive destruir-se as obstruções
físicas vitais à experiência do ser ideal e espiritual. Resulta significativo que um
relevante resultado proclamado pelos Hatha-yogues para suas práticas e verificado
em muitos aspectos, fosse um controle da física força-vital que os liberava de alguns
dos hábitos ordinários ou das assim chamadas leis que segundo critério da ciência
oficial são inseparáveis da vida no corpo.
Atrás de todos estes termos da antiga ciência psicofísica está o único grande fato
e lei de nosso ser de que, qualquer que seja seu temporal equilíbrio de forma,
consciência e poder nesta evolução material, detrás dele deve haver, e há, uma
existência maior e verdadeira da qual esta é só o resultado externo e o aspecto
fisicamente sensível. Nossa substância não termina com o corpo físico; este é só o
pedestal terreno, a base terrestre, o ponto de partida material. Assim como atrás de
nossa mentalidade em vigília há âmbitos mais amplos da consciência subconsciente
e supraconsciente dos que às vezes tomamos conhecimento anormalmente, de igual
modo atrás de nosso denso ser físico há outras e mais sutis classes de substância
com uma mais refinada lei e maior poder que sustentam o corpo mais denso e os
quais, mediante nosso ingreso dentro dos âmbitos da consciência pertencentes a
eles podem fazer que se imponha essa lei e poder sobre nossa matéria densa, e
substituir suas mais puras, mais elevadas e mais intensas condições do ser pela
tosquedade e limitação de nossa vida física, impulsos e hábitos atuais. Se isso fosse
assim, então nossa evolução para uma mais nobre existência física não limitada
pelas condições ordinárias do animal nascimento, vida e morte, da difícil alimentação
e facilidade de desordem e enfermidade e sujeição a pobres e insatisfeitos desejos
vitais, deixa de ter a aparência de um sonho e uma quimera e chega a ser uma
possibilidade fundada sobre uma verdade racional e filosófica que está de acordo
com todo o resto que até agora conhecemos, experimentamos ou podemos pensar a
cerca da verdade aberta e secreta de nossa existência.
Assim seria racionalmente; pois a não interrompida série dos Princípios de nosso ser
e sua íntima conexão mútua é demasiado evidente como para que seja possível que
um só deles esteja condenado e segregado enquanto que os demais são capazes de
uma liberação divina. A ascensão do homem desde o físico até o supramental deve
admitir a possibilidade de uma correspondente ascensão nas classes de substância
para esse corpo ideal ou causal que é apropriado para nosso ser supramental, e a
conquista dos princípios inferiores pela supramente e sua liberação deles em uma
vida divina e em uma mentalidade divina devem fazer possível também uma
conquista de nossas limitações físicas mediante o poder e princípio da substãncia
supramental. E isto significa a evolução não só de uma irrestrita consciência, de uma
mente e uma sensação não encerrada nos muros do ego físico ou limitadas à pobre
base do conhecimento oferecido pelos órgãos físicos da sensação, senão um poder-
vital liberado cada vez mais de suas limitações mortais, uma vida física apta para um
habitante divino e, —no sentido nãoo de apego ou de restrição a nossa estrutura
corpórea atual senão de superação da lei do corpo físico¾, a conquista da morte,
uma imortalidade terrena. Pois desde a Bem-aventurança divina, do Deleite original
da existência, o Senhor da Imortalidade chega escanciando o vinho dessa Bem-
aventurança, o Soma místico, nestas vasilhas de mentalizada matéria vivente;
eterno e belo, ele entra nestas envolturas da substância para a integral
transformação do ser e da natureza.

[1] II, 1-5.

[2] O antiquíssimo conhecimento Vedântico nos fala de cinco graus ou planos de nosso ser: o material, o
vital, o mental, o ideal e o espiritual ou beatífico, e a cada um destes graus de nossa alma lhe corresponde
ali uma classe de substância, uma envoltura como se a denominou na antiga linguagem figurativa ou
simbólica.

[3] I; 10, 1,2; IX, 96, 19,20.


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Capítulo XXVII
O SÉTUPLO ACORDE DO SER
Na ignorância de minha mente, perguntei por estes escalões dos Deuses que estão
assentados interiormente. Os oniscientes Deuses recorreram ao Infante de um ano
eteceram em seu entorno sete eixos para confeccionar esta trama.

Rig Veda[1]

Mediante nosso prolixo exame dos sete grandes termos da existência que os
antigos videntes fixaram como o fundamento e sétuplo modo de toda a existência
cósmica, temos discernido as gradações da evolução e da involução, alcançando a
base do conhecimento pela que lutamos. Afirmamos que a origem, o continente, a
realidade inicial e a realidade última de tudo o que está no cosmos é o princípio
triplo da transcendente e infinita Existência, Consciência e Bem-aventurança que a
natureza do Ser divino. A Consciência tem dois aspectos, iluminador e efetivo,
estado e poder de auto-conhecimento, e estado e poder de auto-força, pelos que o
Ser se possui, seja já em sua condição estática ou, seja já em seu movimento
dinâmico; pois em sua ação criadora conhece por auto-conciência onipotente que
tudo está latente nele e produz e governa o universo de suas potencialidades
mediante uma onisciente auto-energia. Esta ação criadora do Todo-existente tem
seu nó (ponto de inflexão) no quarto estado, o princípio intermediário da
Supramente ou Real-Idéia, no que um Conhecimento divino único com auto-
existência e auto-conhecimento e uma substancial Vontade que é perfeitamente
uníssono com esse conhecimento, --pois é, em sua substância e natureza, essa
auto-consciente auto-existência dinâmica na iluminada ação--, desenvolveram
infalivelmente o movimento, a forma e a lei das coisas em correto acordo com sua
Verdade auto-existente e em harmonia com os significados de sua manifestação.
A criação depende de e se move entre o princípio duplo da unidade e a
multiplicidade; é uma múltipla combinação de idéia, força e forma que é a expressão
de uma unidade original, e é uma eterna unidade que é o fundamento e a realidade
dos Mundos múltiplos, fazendo possível seu jogo. Portanto, a Supramente procede
mediante uma dupla faculdade de conhecimento compreensivo e apreensivo;
procedendo desde a unidade essencial até a multiplicidade resultante,
compreendente de todas as coisas em si como a Unidade em seus múltiplos
aspectos e apreendente separadamente de todas as cosas em si como objetos de
sua vontade e conhecimento. E enquanto a seu original auto-conhecimento todas as
coisas são um só ser, uma só consciência, uma só vontade, um só auto-deleite e o
movimento total das coisas, um movimento único e indivisível, procede em sua ação
desde a unidade à multiplicidade (involuída) e desde a multiplicidade à unidade
(evoluindo), criando uma ordenada relação entre elas e uma aparente, mas não
obrigatória realidade de divisão, uma sutil divisão não separadora, ou mais uma
demarcação e determinação dentro do indivisível. A Supramente é a divina Gnose
que cria, governa e sustenta os Mundos: é a Sabedoria secreta que sustenta a
ambos, nosso Conhecimento e nossa Ignorância.
Descobrimos também que a Mente, a Vida e a Matéria são um triplo aspecto destes
princípios superiores que operam, no que a nosso universo diz respeito, em sujeição
ao princípio da Ignorância, ao superficial e aparente auto-esquecimento do Uno em
seu jogo de divisão e multiplicidade. Em realidade, estes três são só poderes
subordinados do quaternário divino: a Mente é um poder subordinado da
Supramente que toma seu lugar no ponto de apoio da divisão, certamente
esquecido aqui da unidade que está atrás ainda que capaz de retornar a ela
mediante a reiluminação pelo Supramental; a Vida é, de modo parecido, um poder
subordinado do aspecto como energia de Satchitananda,é Força que estrutura
criando formas e o jogo da energia consciente, desde o ponto de apoio da divisão
criada pela Mente; a Matéria é a forma da substância do Ser que a existência de
Satchitananda assume quando se submete a esta ação involutiva fenomênica de sua
própria consciência e força.
Além disso, há um quarto princípio que ingressa na manifestação como o nó (nodo)
de mente, vida e corpo, isso que chamamos a alma; mas esta tem dupla aparência,
a frente é a alma-de-desejo que luta pela possessão e deleite das coisas, e, por
atrás, e seja já maior ou esteja já inteiramente oculta pela alma-de-desejo, a
verdadeira entidade psíquica que é o Real receptáculo das experiências do espírito.
E concluímos que este quarto princípio humano é projeção e ação do terceiro
princípio divino de infinita Bem-aventurança, mais uma ação nos termos de nossa
consciência e sob as condições da evolução-da-alma neste mundo. Assim como a
existência do Divino é em sua natureza uma consciência infinita e o auto-poder
dessa consciência, de igual maneira a natureza de sua consciência infinita é pura e
infinita Bem-aventurança; a auto-possessão e o auto-conhecimento são a essência
de seu auto-deleite. O cosmos é também um jogo deste divino auto-deleite e o
deleite desse jogo está inteiramente possuído pelo Universal; mas no indivíduo,
devido à ação dos poderes da ignorância e a divisão, é mantido no ser subliminal e
no ser supraconsciente; falta em nossa superfície e há de ser buscado, encontrado e
possuído mediante o desenvolvimento de nossa consciência individual em posse da
universalidade e da transcendência.

Portanto, se queremos, podemos apresentar oito[2] princípios em lugar de sete, e


então percebemos que nossa existência é uma espécie de refração da existência
divina, em ordem inversa de ascensão e descenso, assim disposto:
Existência
Consciência-Força
Bem-aventurança
Supramente
Mente
Psique
Vida
Matéria
O Divino descende da pura existência através do jogo da Consciência-Força e a
Bem-aventurança e o meio criador da Supramente no ser cósmico, ascendemos da
Matéria através de uma vida, alma e mente que evoluem, e pelo meio iluminador da
supramente, até o ser divino. O nó de ambos, o hemisfério superior e inferior[3],
tem lugar donde a mente e a supramente se encontram com um véu entre elas.
Rasgar o véu é a condição da vida divina na humanidade; pois com essa rasgadura,
mediante o iluminador descenso do superior dentro da natureza do ser inferior e a
forçado ascensão do ser inferior dentro da natureza do superior, a mente pode
recobrar sua divina luz na todo-compreensiva supramente, a alma realizar seu divino
Ser (Eu) na todo-possuidora Ananda toda-bem-aventurado, a vida possuir de novo
seu divino poder no jogo da onipotente Força-Consciente e a Matéria abrir-se a sua
divina liberdade como uma forma da divina Existência. E assim existe alguma meta
para a evolução que ache aqui sua atual coroa e cabeça no ser humano, diferente
de um circular sem objetivo e de uma fuga individual desse girar, se a infinita
potencialidade desta criatura, --(que só aqui se situa entre o Espírito e a Matéria
com o poder de mediar entre ambos)--, tem algum significado distinto do de um
despertar último da ilusão da vida por desespero e desgosto do esforço cósmico e
sua completa renúncia; então, essa luminosa e pujante transfiguração e emergir do
Divino na criatura humana, deve de ser nossa elevada meta e nosso significado
supremo.
Mas antes de que possamos passar às condições psicológicas e práticas sob as
quais tal transfiguração pode modificar-se, desde uma possibilidade essencial a uma
potencialidade dinâmica, temos muito que considerar; pois devemos discernir não só
os princípios essenciais do descenso de Satchitananda na existência cósmica, o qual
já o temos feito, senão também o grande plano de sua ordem aqui e a natureza e
ação do poder manifestado da Força-Consciente que reina sobre as condições sob as
que atualmente existimos. Agora, o que primeiro temos que ver é que os sete ou
oito princípios que examinamos são essenciais para toda a criação cósmica e estão
ali, manifestados ou ainda não manifestados, em nós mesmos, neste “Infante de um
ano” que todavia somos (pois estamos muito longe de ser os adultos da Natureza
evolutiva). A Trindade superior é a fonte e base de toda existência e jogo da
existência, e todo o cosmos deve ser uma expressão e ação de sua realidade
essencial. Nenhum universo pode ser simplesmente uma forma do Ser que há
surgido e se perfile em uma nulidade e vazio absolutos, contrastando frente a uma
vacuidade não-existente. Deve ser, ou uma imagem da existência dentro da
Existência infinita que está além de toda imagem, ou deve ser ela mesma a Todo-
Existência. De fato, quando unificamos nosso ser (eu) com o ser cósmico, vemos
que em realidade é ambas as coisas de uma vez; vale dizer, é o Todo-Existente
figurando-se à partir Dele mesmo em uma infinita série de ritmos em Sua própria
extensão conceptiva Dele Mesmo como Tempo e Espaço. É mais, vemos que esta
ação cósmica ou qualquer ação cósmica é impossível sem o jogo de uma infinita
Força da Existência que produza e regule todas estas formas e movimentos; e que a
Força igualmente pressupõe ou é a ação de uma Consciência infinita, porque em sua
natureza é uma Vontade cósmica que determina todas as relações e as apreende
mediante sua própria modalidade de conhecimento, e não poderia determiná-las e
apreendê-las se não existisse a Consciência compreensiva atrás dessa modalidade
de conhecimento cósmico para originar o tempo que sustentar, fixar e refletir
através dela as relações do Ser na formação evolutiva ou devir de si a que
chamamos um universo.
Finalmente, ao ser a Consciência onisciente e onipotente, em inteira possessão
luminosa de si, e ao ser, tal inteira possessão luminosa necessariamente e em sua
natureza mesma, Bem-aventurança, pois não pode ser nada mais, um extenso auto-
deleite universal deve ser a causa, essência e objeto da existência cósmica. “Si não
existisse”, diz o antigo vidente “este todo-abarcante éter do Deleite da existência em
que moramos, se esse deleite não fosse nosso éter, então ninguém poderia respirar,
ninguém poderia viver”. Esta auto-bem-aventurança pode chegar a ser
subconsciente, aparentemente perdida na superficie, mas não só deve estar ali em
nossas raízes, toda a existência deve ser essencialmente uma busca e intenção de
descobri-la e possuí-la, e na proporção com que l proporci e poseerlante péa criatura
no cosmos se encontra a si mesma, --( seja já em vontade e poder, ou seja já, em
luz e conhecimento, ou melhor, em ser e amplitude, ou finalmente, em amor e
alegria)--, deve despertar a algo do secreto êxtase. A alegria de ser, o deleite da
realização mediante o conhecimento, o arrebatamento da possessão por vontade e
poder ou força criadora, o êxtase de união no amor e na alegria são os termos
supremos da vida em expansão porque são a essência da existência mesma em suas
ocultas raízes como em seus cumes ainda não vistos. Então, aonde quer se
manifeste a existência cósmica, estas três devem estar atrás e dentro dela.
Mas a Existência, Consciência e Bem-aventurança infinitas não necessitam dentro do
ser aparente ou, ao trabalhar assim, não seria o ser cósmico, senão simplesmente
uma infinitude de figuras sem ordem nem relação fixos, se elas não têm ou
desenvolveram e afloram de si mesmas este quarto termo da Supramente, da divina
Gnose. Deve existir em todo cosmos um poder de Conhecimento e de Vontade que
à partir da potencialidade infinita fixe determinadas relações, desenvolva o resultado
à partir da semente, faça vibrar os poderosos ritmos da Lei cósmica e contemple e
governe os mundos como seu imortal e infinito Observador e Regente[4]. Este poder
certamente não é outra coisa que Satchitananda Mesmo; nada cria que no esteja em
sua própria auto-existência, e por essa razão toda Lei cósmica e real é uma coisa
não imposta desde fora, senão desde dentro, todo desenvolvimento é auto-
desenvolvimento, toda semente e resultado são semente de uma Verdade das coisas
e resultado dessa semente determinada à partir de suas potencialidades. Pela
mesma razão nenhuma Lei é absoluta, porque só o infinito é absoluto, e cada coisa
contém dentro de si intermináveis potencialidades muito mais além de sua forma e
curso determinados, que só são determinados através de uma auto-limitação pela
Idéia atuando desde uma infinita liberdade interior. Este poder de auto-limitação é
necessariamente inerente ao ilimitado Todo-Existente. O Infinito não seria o Infinito
se não pudesse assumir uma múltipla finitude; o Absoluto não seria o Absoluto se,
se negasse no conhecimento, poder, vontade e manifestação do ser uma ilimitada
capacidade de auto-determinação. Então, esta Supramente é a Verdade ou Real-
Idéia, inerente a toda força e existência cósmicas, que é necessária, ao seguir sendo
infinita, para determinar, combinar e sustentar uma relação, uma ordem e os
grandes alinhamentos da manifestação. Na linguagem dos Rishis Védicos, assim
como a Existência, Consciência e Bem-aventurança infinitas são os três Nomes
supremos e ocultos do Sem-Nome, de igual modo esta Supramente é o quarto Nom‐
e[5]¾quarto Disso em seu descenso, quarto de nós em nossa ascensão--.
Mas a Mente, a Vida e a Matéria, a trilogia inferior, são assim mesmo indispensáveis
para todo ser cósmico, não necessariamente na forma ou com a ação e condições
que conhecemos na terra ou neste universo material, senão em alguma classe de
ação, contudo luminosa, pujante, sutil. Pois a Mente é essencialmente essa
faculdade da Supramente que mede e limita, que fixa um centro particular e desde
ali contempla o movimento cósmico e suas interações. Admitido isso em um mundo,
plano ou disposição cósmica particulares, a mente não necessita ser limitada, ou
melhor, que o ser que usa a mente como faculdade subordinada não necessita ser
incapaz de ver as coisas desde outros centros ou pontos de referência ou inclusive
desde o Centro real de tudo ou na vastidão de uma auto-difusão universal, contudo
se não é capaz de fixar-se normalmente em seu próprio ponto firme de referência
para certos fins da atividade divina, se existe só a auto-difusão universal ou só os
centros infinitos sem alguma ação determinante ou livremente limitadora para cada
um, então não há cosmos senão unicamente um Ser meditando dentro de Si Mesmo
infinitamente como um criador ou poeta pode meditar livremente, não
plasticamente, antes de proceder a deixar determinado um trabalho de criação. Tal
estado deve existir em algum lugar da escala infinita da existência, mas não é o que
entendemos por um cosmos. Qualquer que seja a ordem que possa haver nele, deve
ser uma espécie de ordem não fixada, não-obrigatória, tal como o que poderia
desenvolver a Supramente antes de que ele tenha procedido aos trabalhos de fixada
evolução, medição e interação das relações. Para essa medição e interação, a Mente
é necessária, ainda que não é necessário que seja consciente de si como algo, senão
uma ação subordinada da Supramente, nem que desenvolva a interação das
relações sobre a base de um auto-aprisionado egoísmo tal como o que vemos ativo
na Natureza terrestre.
Uma vez existente a Mente, seguem a Vida e a Forma da substância; pois a vida é
simplesmente a determinação da força e da ação, da relação e interação da energia
desde múltiplos centros fixos da consciência, —(fixos, não necessariamente em lugar
ou tempo, senão em uma persistente coexistência de seres ou almas-forma do
Eterno sustentando uma harmonia cósmica)--. Essa vida pode diferir muito da vida
tal como a conhecemos ou concebemos, mas essencialmente seria o mesmo
princípio em atividade que aqui vemos representado como vitalidade, ¾(o princípio
ao que os antigos pensadores indianos deram o nome de Vayu ou Prana)--, o
material-vital, a substancial vontade e energia no cosmos compondo dentro de
determinada forma, ação e consciente dinamismo do ser. A substância também
poderia diferir muito de nosso critério e sentido do corpo material, muito mais sutil,
vinculando muito menos rigorosamente em sua lei de auto-divisão e resistência
mútua, e o corpo ou forma poderia ser um instrumento e não uma prisão, ainda que
para a interação cósmica sempre seria necessária alguma determinação da forma e
da substância, inclusive se, se trata tão só de um corpo mental ou algo mais
luminoso todavia, mais sutil, e mais pujante e mais livremente sensitivo que o mais
livre corpo material.
Se segue que onde quer que esteja o Cosmos, ali, --(inclusive se houvesse
inicialmente um só princípio aparente, inclusive se ao começo isso pareceria ser o
único princípio das coisas, e tudo o que pudesse manifestar-se depois no mundo
parecesse ser nada mais que suas formas e resultados e não indispensáveis em si
mesmos para a existência cósmica)--, essa visão frontal oferecida pelo ser seria
somente uma máscara ou aparência ilusória de sua verdade real. Donde se
manifeste um só princípio no cosmos, ali todo o resto deve estar não meramente
presente e passivamente latente, senão secretamente em atividade. Em um Mundo
dado, sua escala e harmonia do ser pode estar abertamente em possessão de todos
os sete princípios em um grau superior ou inferior de atividade; em outro Mundo
dado podem estar todos envolvidos em um só que vem a ser o princípio inicial ou
fundamental da evolução nesse mundo, mas a evolução dos envolvidos ali deve
existir. A evolução do sétuplo poder do ser, a realização de seu sétuplo Nome, deve
ser o destino de qualquer Mundo que aparentemente comece desde a involução de
tudo em um só poder[6]. Portanto, o universo material esteve obrigado na natureza
das coisas a evoluir desde sua oculta vida, uma aparente vida; desde sua oculta
mente, uma mente aparente, e deve na mesma natureza das coisas evoluir desde
sua escondida Supramente, uma Supramente aparente, e do oculto Espírito dentro
dela, a tripla glória de Satchitananda. A única questão é se a terra há de ser cenário
desse emergir, e se a criação humana, --(neste ou em algum outro cenário material,
neste ou em algum outro ciclo das grandes rotações do Tempo)--, há de ser seu
instrumento e seu veículo. Os antigos videntes acreditavam nesta possibilidade do
homem e sustentaram que esse era seu destino divino; o pensador moderno não o
concebe, e si o fizesse, o negaria ou duvidaria. Se tem uma visão do Super-homem,
ou é na figura de incrementados graus de mentalidade ou vitalidade; não admite
outro emergir, ninguém quer ver além destes princípios, pois estes traçaram para
nós, até agora, nosso limite e círculo de conhecimento. Neste mundo progressivo,
com esta criatura humana na qual a chispa divina foi acesa, é possível que a
sabedoria real habite com a aspiração superior melhor que com a negação da
aspiração ou com a esperança que se limita e circunscreve dentro daqueles estreitos
muros de aparente possibilidade que só são nossa casa intermediária de preparação.
Na ordem espiritual das coisas, quanto mais alto projetamos nossa visão e nossa
aspiração, maior é a Verdade que procura descender sobre nós, porque já está ali
dentro de nós e clama por sua liberação da cobertura que a oculta na Natureza
manifestada.

[1] I, 164, 5.

[2] Os videntes Védicos falam dos sete Raios, mas também de oito, nove, dez ou doze.

[3] Parardha y Aparardha.


Isha Upanishad. 8.
[4] O Vidente, o Pensador, Quem vê por toda parte, o Auto-existente.

[5] Turiyam svid, “certo Quarto”, também chamado turlyam dhama, a quarta localização ou equilíbrio da
existência.

[6] Em qualquer mundo dado não é necessário uma involução senão só uma subordinação dos outros princípios
a um só ou sua inclusão em um só; então a evolução não é uma necessidade dessa ordem-do-mundo.
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Capitulo XXVIII
A SUPRAMENTE, A MENTE E A SOBREMENTE MAYA
Há uma Permanente Verdade oculta por uma Verdade onde o Sol desata seus cavalos. Os mil
(raios seus) chegaram juntos ¾ Aquele Uno. Vi a mais gloriosa das Formas dos Deuses.

Rig Veda[1]
O rosto da Verdade está oculto por uma venda dourada; retira-o, oh Sol que Nutre, pela Lei
da Verdade, para que o vejamos. Oh Sol, Oh único Observador, ordena teus raios, reúne-os
juntos— deixa-me ver de ti tua mais feliz forma de todas; esse Ser Consciente por toda
parte, O sou Eu.

Isha Upanishad[2]
A Verdade, o Reto, o Extenso.

Atharva Veda[3]

Chegou a ser ambos verdade e falsidade. Chegou a ser a Verdade, inclusive tudo isto que é.

Taittiriya Upanishad[4]
Fica todavia por aclarar um ponto que deixamos obscuro, o processo da queda na
Ignorância; pois temos visto que na natureza original da Mente, da Vida ou da
Matéria para nada necessita uma queda desde o Conhecimento. Demonstrou-se
certamente que a divisão da consciência é a base da Ignorância, uma divisão da
consciência individual desde o cósmico e o transcendente do qual é contudo uma
parte íntima, inseparável em essência, uma divisão da Mente desde a Verdade
supramental da que deveria ser uma ação subordinada, uma divisão da Vida desde a
Força original da que é uma energia dinamizada, uma divisão da Matéria desde a
Existência original da que é uma forma de substância. Mas ainda há que aclarar
como se produziu esta división no Indivisível, porque peculiar ação auto-diminuidora
ou auto-eliminadora da Consciência-Força no Ser: pois dado que tudo é movimento
dessa Força, só mediante uma ação tal que obscureça sua própria luz e poder
plenos, pôde haver surgido o dinâmico e efetivo fenômeno da Ignorância. Mas este
problema pôde saltar-se para tratá-lo em um mais detido exame do fenômeno dual
do Conhecimento-Ignorância que faz de nossa consciência uma mescla de luz e
obscuridade, uma meia luz entre o pleno dia da Verdade supramental e a noite da
Inconsciência material. Tudo o que é necessário anotar agora é que deve ser em
seu caráter essencial uma concentração exclusiva em um só movimento e estado do
Ser Consciente, que coloca todo o resto da consciência e do ser atrás e vela-o desse
agora parcial conhecimento do movimento único.
Contudo há um aspecto deste problema que deve considerar-se de imediato; é o
abismo criado entre a Mente como a conhecemos e a Verdade-Consciência
supramental da que descobrimos que a Mente em sua origem é um processo
subordinado. Pois este abismo é considerável e, se não há gradações entre os dois
níveis de consciência, --(seja já na involução descendente do Espírito na Matéria ou
na correspondente evolução na Matéria dos ocultos graus que conduzem ao
Espírito)--, uma transição de um ao outro parece ao máximo improvável, se não
impossível. Pois a Mente, como a conocemos, é um poder da Ignorância que busca
a Verdade, que aspira dificultosamente a descobri-la, alcançando só construções e
representações mentais dela em palavras ou em idéias, em formações da mente, em
formações sensórias, —como se tudo o que pudesse conseguir fossem brilhantes ou
obscuras fotografias ou filmes de uma distante Realidade--. A Supramente, pelo
contrário, está em real e natural possessão da Verdade e suas formações são formas
da Realidade, não construções, representações nem imagens indicativas. Sem
dúvida, a Mente evolutiva em nés está obstruída por seu enclausuramento na
obscuridade desta vida e corpo, e o princípio original da Mente em seu descenso
involutivo é uma coisa de maior poder à que não chegamos plenamente, capaz de
atuar com liberdade dentro de sua própria esfera ou âmbito, de levantar construções
mais reveladoras, formações mais minuciosamente inspiradas, mais sutis e significa‐
tivas encarnações nas que a luz da Verdade esteja presente e palpável. Mas todavia
isto não é demasiado provável que seja essencialmente diferente em sua ação
característica, pois também é um movimento na Ignorância, não uma todavia não-
separada porção da Verdade-Consciência. Deve existir em algum lugar da escala
descendente e ascendente do Ser um Intermediário poder e plano de consciência,
talvez algo mais que isso, algo com uma criadora força original, através do qual foi
efetuada a transição involutiva da Mente no Conhecimento à Mente na Ignorância e
através do qual novamente se torna inteligível e possível a evolutiva transição
inversa. Para a transição involutiva esta intervenção é um imperativo lógico, para a
transição evolutiva é uma necessidade prática. Pois na evolução há certamente
transições radicais, desde Energia indeterminada a Matéria organizada, desde
Matéria inanimada a Vida, desde uma Vida subconsciente ou submental a una Vida
perceptiva, sensível e ativa, desde primitiva mentalidade animal a racional Mente
conceitual que observa e governa a Vida e se observa a si mesma também, capaz de
atuar como uma entidade independiente e inclusive de buscar conscientemente a
auto-transcendência; mas estes saltos, ainda que consideráveis, se preparam até
certo ponto com lentas gradações que os tornam concebíveis e factíveis. Não pode
haver brecha tão imensa como a que parece existir entre a Verdade-Consciência
Supramental e a Mente na Ignorância.
Mas se tais gradações intermediárias existem, resulta claro que devem ser
supraconscientes para a mente humana que não parece ter em seu estado normal
ingresso algum nestes graus superiores do ser. O homem é limitado em sua
consciência pela mente e inclusive por um alcance dado ou escala da mente: o que
está debaixo de sua mente, submental ou mental mas inferior a sua escala, lhe
parece em seguida subconsciente ou não discernível da inconsciência completa; o
que está acima para ele é supraconsciente e se inclina quase a considerá-lo como
vazio de conhecimento, uma espécie de luminosa Inconsciência. Assim como está
limitado a uma certa escala de sons ou de cores e o que está por cima ou por
debaixo dessa escala lhe resulta inaudível e invisível ou, ao menos, indistinguível, de
igual maneira ocorre com sua escala de consciência mental, confinada a cada
extremo por uma incapacidade que marca seu limite superior e inferior. Não tem
suficientes meios de comunicação nem sequer com o animal que é seu congênere
mental, ainda que não seu igual, e é capaz de negar-lhe mente ou consciência real
porque suas modalidades são distintas e mais limitadas que aquelas com as que ele
e sua espécie estão familiarizados; pode observar o ser submental desde fora mas
não pode comunicar-se com ele nem ingressar intimamente em sua natureza.
Igualmente o supraconsciente é para ele um livro fechado que só pode estar cheio
de páginas vazias. A primeira vista, então, pareceria como se não tivesse meios de
contato com estas superiores gradações da consciência: de ser assim, não podem
atuar como vínculos ou puentes e sua evolução deve cessar com seu realizado
âmbito mental, sem superá-lo; a Natureza, ao traçar estes limites, há escrito o final
deste elevado esforço.
Mas quando olhamos mais perto, percebemos que esta normalidade é enganosa
e que de fato há diversas direções nas que a mente humana se transcende, vai além
de si mesma, tende para uma auto-superação; estas são precisamente as linhas
necessárias de contato ou veladas ou semi-veladas passagens que a conectam com
graus superiores de consciência do Espírito auto-manifestante. Primeiro, temos
notado o lugar que ocupa a Intuição entre os meios humanos do conhecimento, e a
Intuição é em sua mesma natureza uma projeção da ação característica destes
graus superiores dentro da mente da Ignorância. É certo que na mente humana sua
ação está em grande medida oculta pelas intervenções de nossa inteligência normal;
uma intuição pura é um raro acontecer em nossa atividade mental: pois o que assim
denominamos é geralmente um ponto de conhecimento direto imediatamente
captado e recoberto com material mental, de modo que sirva só como um invisível
ou muito diminuto núcleo de cristalização que, em seu conjunto, é intelectual ou,
dito de outro modo, de caráter mental; ou também o flash da intuição é
rapidamente substituído ou interceptado antes de que tenha a oportunidade de
manifestar-se, por um rápido movimento mental imitativo, por um entendimento ou
percepção imediata ou veloz ou por algum processo do pensamento de rápida
reação que deve sua aparição ao estímulo da intuição que chega mas obstrui seu
ingresso ou a cobre com uma substituta sugestão mental verdadeira ou errônea
ainda que, em qualquer caso, não o autêntico movimento intuitivo. Não obstante, o
fato desta intervenção desde cima, o fato de que atrás de todo nosso pensamento
original ou percepção autêntica das coisas exista um velado, um semi-velado ou um
rápido elemento intuitivo não-velado é suficiente como para estabelecer uma
conexão entre a mente e o que está por cima dela; ela abre una passagem de
comunicação e de entrada nos superiores âmbitos-espirituais. Também está a
tendência da mente a superar a limitação do ego pessoal, a ver as coisas dentro de
certa impessoalidade e universalidade. A impessoalidade é a primeira característica
do ser-em-si cósmico; a universalidade, a não-limitação pelo singular ou limitador
ponto de vista, é a característica da percepção e o conhecimento cósmicos: esta
tendência é, portanto, uma ampliação, ainda que rudimentar, destas restringidas
áreas mentais em posse do cósmico, em posse de uma qualidade que é a mesma
característica dos planos mentais superiores, —(em posse dessa cósmica Mente
supraconsciente que, como temos sugerido, deve ser na natureza das coisas a
original ação-mental da que a nossa é só um processo derivado e inferior)--. Além
disso, não há uma total ausência de penetração desde cima dentro de nossos limites
mentais. Os fenômenos de genialidade são em realidade o resultado de tal
penetração, —sem dúvida velada¾, porque a luz da consciência superior não só
atua dentro de estreitos limites, pelo geral em um campo especial, sem nenhuma
regulada organização separada de suas energias características, frequentemente
muito caprichosamente, muito erroneamente e com uma supranormal ou anormal
governo irresponsável, senão também que ao entrar na mente se submete e se
adapta à substância mental de modo que só é uma modificada ou diminuída
dinâmica que nos alcança, não a plena e original luminosidade divina do que poderia
chamar-se a elevada consciência além de nós. Contudo, os fenômenos de
inspiração, de visão reveladora ou de percepção intuitiva e discernimento intuitivo,
que excedem nossa menos iluminada ou menos poderosa normal ação-mental,
estão ali e sua origem resulta inconfundível. Finalmente, está o extenso e múltiplo
campo da experiência mística e espiritual, e que as portas já estão abertas de par
em par diante à possibilidade de estender nossa consciência além de seus limites
atuales, —(a não ser que por um obscurantismo que recuse investigar ou um apego
a nossos limites de normalidade mental as fechemos ou desviemos das vistas que
abrem-se diante de nós)-. Mas em nossa atual investigação não podemos descuidar
das possibilidades que estes domínios do esforço da humanidade nos aproximam,
nem o adicionado conhecimento de si mesmo e da velada Realidade que é seu dom
para a mente humana, a maior luz que os arma com o dereito de atuar sobre nós e
é o poder inato de sua existência.
Há dois movimentos sucessivos da consciência, difíceis mas acessíveis a nossa
capacidade, pelos que podemos ter acesso às gradações superiores de nossa
existência consciente. Primeiro está um movimento interior pelo que, em lugar de
viver em nossa mente superficial, rompemos o muro existente entre nosso eu
externo e nosso eu agora subliminal; isto pode produzir-se mediante esforço e
disciplina graduais ou mediante uma veemente transição, às vezes por uma vigorosa
ruptura involuntária, (o último de nenhum modo sem risco para a limitada mente
humana acostumada a viver seguramente só dentro de seus limites normais,) mas
de qualquer modo, com risco ou sem ele, a coisa pode realizar-se. O que
descobrimos dentro desta parte secreta de nós mesmos é um ser interior, uma
alma, uma mente interior, uma vida interior, uma interior entidade sutil-física que é
muito maior em suas potencialidades, mais plástica, mais poderosa, mais capaz de
um múltiplo conhecimento e dinamismo que nossa mente, vida e corpo superficiais;
em especial, é capaz de uma direta comunicação com as forças universais,
movimentos, objetos do cosmos, de uma direta sensação e abertura até eles, de
uma direta ação sobre eles e inclusive de uma ampliação de si além dos limites da
mente pessoal, da vida pessoal, do corpo, de modo que se sente, cada vez mais, um
ser universal já não limitado pelos muros de nossa estreita existência mental, vital e
física. Esta ampliação pode estender-se para um ingresso completo dentro da
consciência da Mente cósmica, dentro de uma unidade com a Matéria universal.
Essa, no entanto, é todavia uma identificação bem com uma diminuída verdade
cósmica ou melhor, com a Ignorância cósmica.
Mas uma vez cumprido este ingresso dentro do ser interior, se descobre que o Eu
interior é capaz de uma abertura, de uma ascensão para dentro de coisas além de
nosso atual nível mental; essa é a segunda possibilidade espiritual em nós. O
primeiro e mais ordinário resultado é um descobrimento de um extenso Eu estático
e silencioso que sentimos que é nossa existência real ou nossa básica existência, o
fundamento de todo o demais que somos. Ali pode dar-se, inclusive uma extinção,
um Nirvana de nosso ser ativo e do sentido do eu, dentro de uma Realidade que é
indefinível e inexprimível. Mas assim mesmo podemos advertir que este eu é não só
nosso próprio ser espiritual senão também o eu verdadeiro de todos os demais; se
apresenta então como a verdade subjacente da existência cósmica. É possível
permanecer em um Nirvana de toda la individualidade, deter-se em uma realização
estática ou, considerando o movimento cósmico como um jogo ou ilusão superficiais
impostos sobre o Eu silencioso, ingressar em certo estado supremo, imóvel e
imutável, além do universo. Mas se oferece também outro rasgo menos negativo da
experiência supranormal, também oferecido em si mesmo; pois ali tem lugar um
grande descenso dinâmico de luz, conhecimento, poder,bem-aventurança ou outras
energias supranormais dentro de nosso eu de silêncio, e podemos ascender também
dentro de superiores regiões do Espírito donde seu estado imóvel é o fundamento
daqueles grandes e luminosas energias. Em qualquer caso resulta evidente que nos
elevamos além da mente da Ignorância, dentro de um estado espiritual; mas, no
movimento dinâmico, a maior ação resultante da Consciência-Força pode
apresentar-se, ou bem, simplesmente como uma pura dinâmica espiritual não deter‐
minada em forma alguma em seu caráter, ou melhor, pode revelar um âmbito-
mental no que a mente não seja já ignorante da Realidade,—contudo, não um nível
da supramente, senão derivando da supramental Verdade-Consciência e, todavia,
luminoso com algo de seu conhecimento.
É na última alternativa que descobrimos o segredo que buscamos, o meio da
transição, o passo necessário para uma transformação supramental; pois
percebemos um objetivo gradual de ascensão, uma comunicação com uma luz e
poder de cima cada vez mais profundos e imensos, uma escala de intensidades que
podem considerar-se como tantos escalões na ascensão da Mente ou no descenso
dentro da Mente Disso que está além dela. Fazemo-nos conscientes de um
aguaceiro enorme como um mar, de massas de um conhecimento espontâneo que
assume a natureza do Pensamento mas tem um caráter diferente do processo de
pensamento ao que estamos acostumados; pois aqui não há nada de busca, nem
rastro de construção mental, nem trabalho de especulação ou difícil descobrimento;
é um conhecimento automático e espontâneo derivado de uma Mente Superior que
parece estar em possessão da Verdade e não em busca de realidades ocultas ou
dificultadas. Alguém observa que este Pensamento é muito mais capaz que a mente
de incluir simultaneamente uma massa de conhecimento de um relance; tem um
caráter cósmico, não o selo de um pensamento individual. Além desta Verdade-
Pensamento podemos distinguir um maior instinto de iluminação com um crescente
poder e intensidade e força condutora, uma luminosidade da natureza da Verdade-
Visão com formulação de pensamento como uma atividade menor e dependente. Se
aceitamos a imagem Védica do Sol da Verdade, —uma imagem que nesta expe‐
riência se converte em uma realidade—, podemos comparar a acción da Mente
Superior com um sereno e firme sol brilhando, a energia da Mente Iluminada além
daquela a que podemos comparar com um aguaceiro de massivos flashes de
ardente material-solar. Além todavia, pode encontrar-se um poder ainda maior da
Verdade-Força, uma íntima e exata Verdade-visão, Verdade-pensamento, Verdade-
sensação, Verdade-sentimento, Verdade-ação, às que podemos dar, em um sentido
especial o nome de Intuição; pois ainda que aplicaquemos essa palavra, a falta de
uma melhor, para referir-nos a qualquer modo supra-intelectual de conhecimento
direto, contudo o que realmente conhecemos como intuição é só um movimento
especial de conhecimento auto-existente. Este novo âmbito é sua origem; ensina a
nossas intuições algo de sua própria característica distintiva e é muito claramente
um intermediário de uma maior Verdade-Luz com a que nossa mente não pode
comunicar-se diretamente. Na fonte desta Intuição descobrimos uma supra-
consciente Mente cósmica em direto contato com a Supramental Verdade-
Consciência, uma original intensidade determinante de todos os movimentos
debaixo dela e de todas as energias mentais, —não a Mente como a conhecemos,
senão uma Sobremente que cobre, como com as amplas asas de alguma Sobrealma
criadora, este completo hemisfério inferior do Conhecimento-Ignorância, vincula-o
com a mais grande Verdade-Consciência enquanto que, ao mesmo tempo, com sua
brilhante Frente dourada vela o rosto da maior Verdade a nossa vista, intervindo
com sua torrente de infinitas possibilidades simultaneamente como obstáculo e
como passagem em nossa busca da lei espiritual de nossa existência, seu supremo
objetivo, sua Realidade secreta. Este é então o vínculo oculto que buscávamos; este
é o Poder que, ao mesmo tempo, conecta e divide o supremo Conhecimento e a
cósmica Ignorância.
Em sua natureza e lei, a Sobremente é uma delegada da Consciência-da-
Supramente, sua delegada diante da Ignorância. Ou poderíamos falar dela como
uma dupla protetora, uma tela, através da qual a Supramente pode atuar
indiretamente sobre uma Ignorância cuja obscuridade não pode suportar nem
receber o impacto directo da suprema Luz. Além disso, é mediante a projeção deste
luminoso halo da Sobremente que se torna possível a difusão de uma diminuída luz
na Ignorância e a projeção dessa sombra contrária que devora em si mesma toda a
luz, isto é, a Inconsciência. Pois a Supramente transmite à Sobremente todas suas
realidades, mas lhe deixa formulá-las em um movimento e de acordo com um
conhecimento das coisas que é todavia uma visão da Verdade e, contudo, ao
mesmo tempo, um primeiro gerador da Ignorância. À Supramente e à Sobremente
as divide uma linha que permite uma livre transmissão, faz que o Poder inferior
derive desde o Poder superior tudo o que contêm ou vê, mas automaticamente
compele uma mudança transacional na passagem. A integridade da Supramente
mantêm sempre a verdade essencial das coisas, a verdade total e a verdade de suas
individuais autodeterminações claramente laçadas juntas; mantêm nelas uma
inseparável unidade e entre elas uma íntima interpretação, e uma livre e plena
consciência de uma com a outra: mais na Sobremente esta integridade já não esta
ali. contudo a Sobremente é bem consciente da Verdade essencial das coisas;
abarca a totalidade; usa a auto-determinação individual sem ser limitada por elas:
mas ainda que conhece sua unidade, pode compreendê-la em uma cognição
espiritual, contudo seu movimento dinâmico, ainda que confiando nisso para sua
segurança, não está diretamente determinado por ela. A Energia da Sobremente
procede através de uma ilimitável capacidade de separação e combinação dos
poderes e aspectos da todo-compreensiva Unidade integral e indivisível. Toma cada
Aspecto ou Poder e lhe dá uma ação independente na que adquire uma plena
importância separada e é capaz de estruturar, poderíamos dizer, seu próprio mundo
de criação. Purusha e Prakriti, a Alma Consciente e a Força executiva da Natureza,
são na harmonia supramental uma singular verdade de duplo aspecto, igualmente,
ser e dinâmica da Realidade; não pode haver desequilíbrio nem predomínio de um
sobre o outro. Na Sobremente temos a origem da fissura, a aguda distinção feita
pela filosofia dos Sankhyas na que aparecem como duas entidades independentes,
Prakriti capaz de dominar a Purusha e de nublar sua obscuridade e poder,
reduzindo-o a testemunha e receptor de suas formas e ações, Purusha capaz de
retornar a sua separada existência de morar em uma livre auto-soberania por
renúncia de seu original ultra-encoberto principio material. O mesmo ocorre com os
demais aspectos ou poderes da Realidade Divina, o Um e os Muitos, a Personalidade
Divina e a Impessoalidade Divina, e o resto; cada um é um aspecto e poder da
Realidade única, mas cada um está facultado para atuar como uma entidade
independente totalmente, para alcançar a plenitude das possibilidades de sua
expressão separada e para desenvolver as consequências dinâmicas desta sepa‐
ração. Ao mesmo tempo, na Sobremente esta separação está todavia fundada sobre
a base de uma subjacente unidade implícita; todas as possibilidades de combinação
e relação entre os Poderes e Aspectos separados, todos os intercâmbios e
mutualidades de suas energias estão livremente organizadas e sua realidade é
sempre possível.
Se consideramos os Poderes da Realidade como outras tantas Deidades,
podemos dizer que a Sobremente libera dentro da ação um milhão de Deidades,
cada uma facultada para criar seu próprio mundo, cada mundo capaz de relação,
comunicação e intercâmbio com os demais. No Veda há diferentes formulações da
natureza dos Deuses: se diz que todos são uma só Existência a que os sábios dão
distintos nomes; contudo, cada Deus é adorado como se por si mesmo fosse essa
Existência, um que é todos os demais Deuses juntos ou que os contêm em seu ser;
e cada um, por sua vez, é uma Deidade separada que atua às vezes ao uníssono
com deidades companheiras, às vezes separadamente, às vezes inclusive em
aparente oposição com as outras Deidades da mesma Existência. Na Supramente
tudo isto se manteria unido junto como um harmonizado jogo da Existência única;
na Sobremente cada uma destas três condições poderia ser uma separada ação ou
base de ação e ter seu próprio princípio de desenvolvimento e suas consequências,
e com tudo, cada qual mantêm o poder de combinar-se com os demais em uma
harmonia mais composta. Igualmente que com a Existência Única, o mesmo ocorre
com sua Consciência e Força. A Consciência Única está separada em múltiplas
formas independentes da consciência e do conhecimento; cada uma segue sua
própria linha de verdade que há de realizar. A única Real-idéia total e multilateral
está divida em seus múltiplos lados; cada um se converte em uma Idéia-Força
independente com o poder de realizar-se. A única Consciência-Força é liberada
dentro de seus milhões de forças, e cada uma destas forças tem direito a alcançar
ou assumir, se é preciso, uma hegemonia, ocupando para sua utilidade as demais
forças. Igualmante, o Deleite da Existência é soltado dentro de toda modalidade de
deleites e cada qual leva em si mesmo sua plenitude independente ou extremo
soberano. Dessa maneira, a Sobremente brinda à Única Existência-Consciência-Bem-
aventurança o caráter de uma abundância de possibilidades infinitas que podem
desenvolver-se dentro de uma multidão de mundos ou reunir-se dentro de um só
mundo no que o resultado interminavelmente variável de seu jogo é o determinante
da criação, de seu processo, de seu curso e de sua consequência.
Dado que a Consciência-Força da Existência eterna é a criadora universal, a
natureza de um mundo dado dependerá de qualquer auto-formulação que essa
Consciência expresse nesse mundo. Igualmente, para cada ser individual, sua visão
ou representação para si mesmo do mundo em que vive dependerá do equilíbrio ou
estrutura que essa Consciência haja assumido nele. Nossa humana consciência
mental vê o mundo em seções cortadas pela razão e o sentido, e postas juntas em
uma formação que também é seccional; a casa que constrói está planificada para
acomodar uma ou outra generalizada formulação da Verdade, mas exclui o resto ou
admite alguma só como hóspedes ou dependentes da casa. A Consciência da
Sobremente é global em sua cognição e pode conter juntas qualquer quantidade de
diferenças aparentemente fundamentais em uma reconciliadora visão. Dessa
maneira, a razão mental vê a Pessoa e o Impessoal como opostos: concebe uma
Existência impessoal na que pessoa e personalidade são ficções da Ignorância ou
construções temporárias; ou, pelo contrário, pode ver a Pessoa como a realidade
primária e ao impessoal como uma abstração mental ou somente material ou meio
de manifestação. Para a inteligência da Sobremente estes são Poderes separáveis da
Existência única que podem perseguir sua auto-afirmação independente e também
podem unir juntas suas diferentes modalidades de ação, criando em sua
independência e em sua união diferentes estados de consciência, e o ser que podem
ser todos eles, válido e totalmente capaz de coexistência. Uma existência e
consciência puramente impessoais é certo e possível, mas também o é uma
consciência e existência inteiramente pessoal; o Divino Impessoal, Nirguna
Brahman, e o Divino Pessoal, Saguna Brahman, são aqui iguais e coexistentes
aspectos do Eterno. A impessoalidade pode manifestar-se com uma pessoa
subordinada a ela como uma modalidade de expressão mas, igualmente, a Pessoa
pode ser a realidade com a impessoalidade como modalidade de sua natureza:
ambos aspectos da manifestação se encaram um com outro na infinita variedade da
Existência consciente. As que para a razón mental são diferenças irreconciliáveis se
apresentam diante a inteligência da Sobremente como correlativas coexistentes; as
que para a razão mental são contrárias resultam complementares para a inteligência
da Sobremente. Nossa mente vê que todas as cosas nascem da Matéria ou da
Energia material, existem por ela, retornam a ela; nossa mente conclui que a
Matéria é o fator eterno, a realidade primeira e última, Brahman. Ou vê tudo como
nascido da Força-Vital ou da Mente, existindo pela Vida ou pela Mente, retornando à
Vida ou à Mente universais, e conclui que este mundo é uma criação da Força Vital
cósmica ou de uma cósmica Mente ou Logos. Ou vê o mundo e todas as coisas
como nascidas de, existindo por e retornando à Real-Idéia ou ao Conhecimento-
Vontade do Espírito ou ao Espírito mesmo, e conclui em um critério idealista ou
espiritual do universo. Pode aderir-se a qualquer destes modos de apreciação, mais
para seu normal critério separativo cada um destes modos exclui aos demais. A
consciência da Sobremente percebe que cada critério é verdade da ação do princípio
que erige, pode apreciar que exista uma material fórmula-mundial, uma vital
fórmula-mundial, uma mental fórmula-mundial, uma espiritual fórmula-mundial, e
cada uma pode predominar em um mundo próprio e ao mesmo tempo todas podem
combinar-se em um só mundo como seus poderes constitutivos. A auto-formulação
da Força Consciente na que se baseia nosso mundo como uma aparente
Inconsciência que oculta em si uma suprema Existência-Consciente e contêm juntos
todos os poderes do Ser em seu inconsciente segredo, um mundo de Matéria
universal que se realiza na Vida, na Mente, na Sobremente, na Supermente, no
Espírito, cada um deles por sua vez empregando aos demais como meios de sua
auto-expressão, a Matéria demostrando na visão espiritual haver sido sempre uma
manifestação do Espírito, é para o critério da Sobremente uma criação normal e
facilmente realizável. Em seu poder de originar e no processo de sua execução
dinâmica, a Sobremente é uma organizadora de múltiplas potencialidades da
Existência, cada qual afirmando sua realidade separada mas todas capazes de
vincular-se juntas de muitos modos diferentes mas simultâneos, um mago facultado
para entreter a multi-colorida trama e contexto da manifestação de uma singular
entidade em um complexo universo.
Neste simultâneo desenvolvimento de numerosos Poderes ou Potências
independientes ou combinados não há caos, nem conflito nem queda da Verdade ou
o Conhecimento. A Sobremente é uma criadora de verdades, não de ilusões nem
falsidades: o que se estrutura em qualquer enérgico dinamismo ou movimento
sobremental dado é a verdade do Aspecto, Poder, Idéia, Força, Deleite que se libera
dentro da ação independente, a verdade das consequências de sua realidade nessa
independência. Não há exclusividade afirmando a cada uma como verdade única do
ser ou às demais como verdades inferiores: cada Deus conhece a todos os Deuses e
sua lugar na existência; cada Idéia admite a todas as outras idéias e seu direito a
ser; cada Força concede um lugar a todas as demais forças e sua verdade e
consequências; nenhum deleite da separada existência cumprida ou da separada
experiência nega ou condena o deleite de outra existência ou outra experiência. A
Sobremente é um princípio de Verdade cósmica e seu espírito mesmo é uma vasta e
interminável universalidade; sua energia é um todo-dinamismo igualmente que un
principio de dinamismos separados: es uma espécie de Supramente inferior, ¾ainda
que está concernida predominantemente não com absolutos senão com o que
poderia chamar-se potências dinâmicas ou verdades pragmáticas da Realidade, ou
com absolutos principalmente para seu poder de gerar valores pragmáticos ou
criadores, ainda que, também, suacompreensão das coisas é mais global que
integral, dado que sua totalidade está construída de todos globalmente ou
constituída por independentes realidades separadas que se unem ou coligam, e
ainda que capta a unidade essencial e sente que é base das coisas e que penetra
em sua manifestação, já não é como na Supramente seu íntimo e sempre-presente
segredo, seu dominante conteúdo, o aberto constructor constante do todo
harmônico de sua atividade e natureza.
Se compreendêssemos a diferença desta global Consciência da Sobremente
desde nossa separativa e só imperfeitamente sintética consciência mental,
poderíamos aproximar-nos a ela se comparamos o critério estritamente mental com
o que seria um critério sobremental das atividades em nosso universo material. Para
a Sobremente, por exemplo, todas as religiões seriam verdadeiras como
desenvolvimentos da eterna religião única, todas as filosofias serão válidas, cada
qual em seu próprio campo como afirmação de seu próprio critério universal desde
seu próprio ângulo de visão, todas as teorias políticas com sua prática seriam a
estruturação legitima de uma Idéia-Força com seu direito de aplicação e
desenvolvimento prático no jogo das energias da Natureza. Em nossa consciência
separativa, imperfeitamente visitada por vislumbres de integridade e universalidade,
estas coisas existem como opostos; cada qual reclama ser a verdade e acusa os
demais de erro e falsidade, cada qual se sente impelido a refutar ou destruir aos
demais a fim de ser a única Verdade e vida: no melhor dos casos, cada um reclama
ser superior, admite aos demais só como inferiores expressões-da-verdade. Uma
Inteligência sobremental recusaria manter esta concepção ou este impulso de
exclusividade nem por um momento; permitiria a todos viver como necessários para
o todo ou por cada um em seu lugar no todo ou atribuir a cada um seu campo de
realização ou de esforço. Isto ocorre porque em nós a consciência descendeu por
completo às divisões da Ignorância; a Verdade já não é um Infinito ou um todo
cósmico com múltiplas formulações possíveis, senão uma rígida afirmação que
sustenta qualquer outra afirmação é falsa porque difere dela e está assentada em
outros limites. Em verdade, nossa consciência mental pode alcançar em sua
cognição a uma considerável aproximação em posse de uma total compreensividade
e universalidade, mas organizar isso na ação e na vida parece estar além de seu
poder. A Mente evolutiva, manifesta em indivíduos ou coletividades, projeta uma
multiplicidade de pontos de vista divergentes, divergentes linhas de ação e lhes
permite que se estruturem um junto ao outro, ou em coalisão, ou em certa
intercalação; pode efetuar harmonias seletivas, mas não pode alcançar a um
controle harmônico da verdadeira totalidade. A Mente cósmica deve ter inclusive na
evolutiva Ignorância, como todas as totalidades, uma tal harmonia ainda que só seja
de ordenados acordes e discordâncias; também há nela um subjacente dinamismo
de unidade: mas leva a integridade destas coisas em suas profundidades, talvez em
um substratum de supramente-sobremente, mas não a ensina à Mente individual na
evolução, e não a traz nem a trouxe todavia desde as profundidades à superfície.
Um mundo da Sobremente seria un mundo de harmonia; o mundo da Ignorância no
que vivemos é um mundo de desarmonia e luta.
Contudo podemos reconhecer de imediato na Sobremente a original Maya cósmica,
não Maya de Ignorância senão Maya de Conhecimento, mas contudo um Poder que
há sido possível a Ignorância, inclusive inevitável. Pois se cada princípio despejado
dentro da ação deve seguir sua linha independente e apresentar suas completas
consequências, o princípio de separação deve conceder-se também seu curso
completo e alcançar sua consequência absoluta; este é o descenso inevitável, facilis
descensus , que a Consciência, uma vez que admite o princípio separativo, segue até
entrar por ocultadora fragmentação infinitesimal, tucchyena [5] , dentro da
Inconciencia material, —O Oceano Inconsciente do Rig-Veda—, e se o Uno nasce
disso por sua própria grandeza, está todavia oculto ao princípio por uma fragmentar
existência e consciência separativa que é nossa e na que temos de reunir coisas
juntas para alcançar a um todo. Nesse lento e difícil emergir se dá certa semelhança
de verdade ao dito de Heráclito de que a Guerra é progenitora de todas as coisas;
pois cada idéia, força, consciência separada, ser vivente, pela necessidade mesma
de sua ignorância entra em colisão com os demais e procura viver, crescer e
realizar-se mediante afirmação de si mesmo independiente, não mediante harmonia
com o resto da existência. Contudo ainda está ali a desconhecida Unidade
subjacente que nos compele a lutar lentamente em posse de alguma forma de
harmonia, de interdependência, de concordância de discordâncias, de uma difícil
unidade. Mas é só mediante a evolução em nós dos ocultos poderes
supraconscientes da Verdade cósmica e da Realidade na que eles são um, que a
harmonia e unidade pelas que lutamos podem realizar-se dinamicamente na fibra
mesma de nosso ser e em toda sua auto-expressão e não meramente em tentativas
imperfeitas, construções incompletas, aproximações sempre-em-mudança.Os
âmbitos superiores da Mente espiritual hão de abrir-se sobre nosso ser e consciência
e assim mesmo o que está mais além inclusive da Mente espiritual deve aparecer
em nós se temos de realizar a possibilidade divina de nosso nascimento na
existência cósmica.
A Sobremente, em seu descenso, alcança uma linha que divide a Verdade cósmica
da Ignorância cósmica; é a linha na que se torna possível para a Consciência-Força,
enfatizando a separação de cada movimento independiente criado pela Sobremente
e escondendo ou obscurecendo sua unidade, dividir a Mente mediante uma
exclusiva concentração desde a fonte sobremental. Já houve uma separação similar
da Sobremente desde sua fonte supramental, mas com uma transparência no véu
que permite uma transmissão consciente e mantêm uma certa luminosa relação;
mas aqui o véu é opaco e a transmissão dos motivos da Sobremente à Mente é
oculta e obscura. A Mente separada atua como se fosse um princípio independente,
e cada ser mental, cada idéia mental básica, poder e força, permanece de modo
similar em seu eu separado; se comunica ou combina ou toma contato com os
demais, não o é com a integra universalidade do movimento da Sobremente, sobre
uma base de subjacente unidade, senão como unidades independentes que se unem
para formar um construído todo separado. É por este movimento que ingressamos
desde a Verdade cósmica na Ignorância cósmica. A Mente cósmica, neste nível, sem
dúvida, compreende sua propia unidade, mas não tem consciência de sua própria
fonte e fundamento no Espírito ou só pode compreendê-la pela inteligência, não em
qualquer experiência duradoura; atua em si como se fosse por dereito próprio, e
estrutura o que recebe como material sem comunicação direta com a fonte da qual
o recebe. Suas unidades também atuam em ignorância uma da outra e do todo
cósmico, salvo enquanto ao conhecimento que possam obter por contato e
comunicação, --o sentido básico da identidade e a mútua penetração e compreensão
que deriva dela já não estão ali--. Todas as ações desta Energia da Mente procedem
sobre a base oposta da Ignorância e suas divisões e, ainda que são os resultados de
um certo conhecimento consciente, é um conhecimento parcial, não um verdadeiro
e integral auto-conocimento, nem um verdadeiro e integral conocimento-do-mundo.
Esta característica persiste na Vida e na Matéria sutil e reaparece no denso universo
material que surge da queda final dentro da Incosnciência.
Contudo, assim como em nossa Mente subliminal ou interior, de igual maneira nesta
Mente também fica ainda um maior poder de comunicação e mutualidade, um jogo
mais livre da mentalidade e a sensação de que ele que possui a mente humana, e a
Ignorância não é completa; resulta mais possível uma harmonia consciente, uma
organização interdependente das relações corretas: a Mente não está ainda
perturbada por cegas forças da Vida nem obscurecida pela insensível Matéria. É um
plano da Ignorância, mas não da falsidade ou o erro —ou ao menos a queda na
falsidade e o erro não é todavia inevitável; esta Ignorância é limitativa, mas não
necessariamente falsificadora—. Há limitação de conhecimento, uma organização de
verdades parciais, mas não uma negação ou um oposto da verdade ou o
conhecimento. Esta característica de uma organização de verdades parciais sobre
uma base de conhecimento separativo persiste na Vida e na Matéria sutil, pois a
concentração exclusiva da Consciência-Força que as põe dentro da ação separativa
não corta por inteiro nem cega à Mente desde a Vida nem a Mente e a Vida desde a
Matéria. A completa separação pode ter lugar quando o estado de Inconsciência
haja sido alcançado e nosso mundo de múltipla Ignorância surja dessa tenebrosa
matrix. Estas outras etapas todavia conscientes da involução são certamente
organizações da Força Consciente na que cada qual vive desde seu próprio centro,
continua suas própias possibilidades, e o princípio predominante mesmo, seja
Mente, Vida ou Matéria, estrutura as coisas sobre sua própria base independente;
mas o que se estrutura são verdades de si, não ilususões, nem um enredo de
verdade e falsidade, conhecimento e ignorância. Mas quando por uma exclusiva
concentração sobre a Força e a Forma, a Consciência-Força parece separar
fenomenicamente a Consciência da Força, ou quando absorve a Consciência em um
cego sonho perdido na Forma e na Força, então a Consciência há de lutar para
regressar a si mesma, mediante uma evolução fragmentar que necessita do erro
etorna inevitável a falsidade. Não obstante, estas coisas tão pouco são ilusões
surgidas de uma original Não-Existência; são, diríamos, as inevitáveis verdades de
un mundo nascido à partir da Inconsciência. Pois a Ignorância é ainda em realidade,
um conhecimento em busca de si atrás da original máscara de la Inconsciência;
falha e descobre, seus resultados, naturais e inclusive inevitáveis em sua própria
linha, são a verdadeira consequência da queda —em um sentido, inclusive, o correto
trabalho da recuperação desde a queda—. A Existência que se afunda dentro de
uma aparente Não-Existência, a Consciência dentro de uma aparente Inconsciência,
o Deleite da existência que se afunda dentro de uma extensa insensibilidade
cósmica, são o primeiro resultado da queda e, no retorno desde ela mediante uma
belicosa experiência fragmentária, a interpretação da Consciência dentro dos duais
termos de verdade e falsidade, conhecimento e erro, da Existência dentro dos duais
termos de vida e morte, do Deleite da existência dentro dos duais termos de dor e
prazer, são o processo necessário do trabalho de auto-descobrimento. Uma pura
experiência de Verdade, Conhecimento, Deleite, imperecível existência, seria aqui
uma contradição da verdade das coisas. Só poderia ser de outro modo se todos os
seres fossem na evolução sossegadamente sensíveis aos elementos psíquicos dentro
deles e à Supramente que subjaz nas operações da Natureza: mas aqui chega a 1ei
da Sobremente de cada Força que estrutura suas próprias possibilidades. As
possibilidades naturais de um mundo no que uma Inconsciência original e uma
divisão da consciência são os princípios sobrepostos, seria o emergir das Forças da
Obscuridade impelidas a manter a Ignorância pela que vivem, uma ignorante luta
por conhecer a origem da falsidade e do erro, uma ignorante luta por viver
engendrando o erro e o mal, uma luta egoísta por desfrutar, progenitora de
fragmentárias tais, dores e sofrimentos; estas são, portanto, as inevitábles
características primeiramente implantadas, ainda que não se trate das únicas
possibilidades de nossa existência evolutiva. contudo, devido a que a Não-Existência
é uma Existência oculta, a Inconsciência uma oculta Consciência, a insensibilidade
uma mascarada eadormecida Ananda, estas realidades secretas devem emergir; as
escondidas Sobremente e Supramente devem também, finalmente, realizar-se nesta
organização aparentemente oposta, desde um obscuro Infinito.
Duas coisas fazem que essa culminação seja mais fácil do que poderia ser de outro
modo. A Sobremente no descenso à criação material originou modificações de si
¾especialmente a Intuição com seus penetrantes e luminosos flashes de verdade
iluminando pontos locais e extensos setores de nossa consciência— que podem
aproximar mais nossa compreensão à verdade oculta das coisas e, --abrindo-nos,
primeiro mais amplamente no ser interior e logo como um resultado também no
externo eu superficial--, às mensagens destes âmbitos superiores da consciência;
crescendo neles, podemos assim mesmo chegar a ser seres intuitivos
e sobrementais, não limitados pelo intelecto e a sensação, senão capazes de
umacompreensão mais universal e de um contato direto da verdade em seu mesmo
eu e corpo. De fato, já chegam a nós fleshes iluminadores desde estes âmbitos
superiores, mais esta intervenção é em sua maioria fragmentar, casual ou parcial;
todavia temos que começar a alargar-nos a sua semelhança e organizar em nós o
maior acionar da Verdade de que potencialmente sejamos capazes. Mas, em
segundo lugar, a Sobremente, a Intuição, inclusive a Supramente não só devem ser,
como temos visto, princípios inerentes e involvidos na Inconciencia desde que
surgimos na evolução e inevitavelmente destinados a evoluir, senão que estão
secretamente presentes, ocultos ativamente com flashes do emergir intuitivo na
atividade cósmica da Mente, da Vida e da Matéria. É certo que sua ação está oculta
e, inclusive quando emergem, está modificada pelo meio material, vital e mental em
que trabalham, e não são facilmente reconhecíveis. A Supramente não pode
manifestar-se como Poder Criador no universo desde o princípio, pois se assim o
fizesse, a Ignorância e a Inconsciência seriam impossíveis ou a lenta evolução
necessária mudaria dentro de um cenário de rápida transformação. A cada passo da
energia material podemos ver o selo do inevitável posto por um criador
supramental, em tudo o desenvolvimento da vida e da mente, o jogo das linhas da
possibilidade e sua combinação que é o selo da intervenção da Sobremente. Assim
como a Vida e a Mente foram realizadas na Matéria, de igual modo também, por sua
vez, estes poderes maiores da escondida Deidade devem emergir desde a involução
e sua Luz suprema descender em nós desde o alto.
Uma Vida divina na manifestação é então não só possível como o alto resultado e
resgate de nossa atual vida na Ignorância, senão também, se estas coisas são como
as temos visto, é a consequência e consumação inevitáveis do evolutivo esforço da
natureza.
FIM DO LIVRO UM

[1] V, 62, i.

[2] Vers. 15, 16.

[3] XII, 1, 1.

[4] II, 6.

[5] Rig Veda, X. 129, 3.

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