Sunteți pe pagina 1din 50

série

"O texto de Espiritismo e Política ser á


ESPIRITIZAÇÃO
base para pesquisas, debates e
seminários, abrindo um
quadro amplo
para a reflexão de como o
espiritismo pode e
deve atuar no campo
político e social. Sem comprometer-se
com legendas ou partidos,
mas intervindo a nível de ideias,
o espiritismo está apto a contribuir
para a equação de soluções
Aylton Guido Coimbra Paiva
consistentes aos angustiantes
problemas gerados pelo
progresso, pela urbanização
e pelo contingente
humano que estagia no
ESPIRITISMO
planeta, em busca
soluções definitivas.
E
Neste livro, Aylton Paiva
traz sua parte, o esforço
de seu pensamento.
POLÍTICA
Abre, com isso, uma nova
frente para a participação
espírita no social, no político".

dicesp
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

ESPIRITISMO E POLÍTICA

l. a edição — 1.° ao 3.° milheiro


setembro de 1982

Copyright 1982 by
DICESP — Divulgação Cultural Espírita S/C Editora MEUS AGRADECIMENTOS A
Rua Itororó, 111 — C.G.C. 58.268.228/0001-47
11.100 — Santos — SP — Brasil

Profa Augustinha Luiz Marra do Rio Campo,


Direitos deste livro cedidos pelo autor dedicada confreira, pela paciente revisão
e adequação da linguagem;

Digitalização: PENSE - Pensamento Social Espírita


Maria Eny Rossetini Paiva, amada
www.viasantos.com/pense
esposa, pelas apreciações e sugestões
março de 2009 doutrinárias;

Composição e impressão — Gráfica A Tribuna


Karen e Fabiano, queridos filhos,
Santos pela compreensão que tiveram
ao tirar-lhes momentos de convívio
para que este filho também
pudesse nascer.
Impresso no Brasil
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

A todos aqueles que acreditam no espiritismo


como uma doutrina de libertação
e crescimento espiritual e estão
preocupados com a
aplicação de seus
princípios na
sociedade
humana.
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

"Para nós, a política é a ciência de criar o bem


de todos e nesse princípio nos firmaremos."

Deputado dr. Adolfo Bezerra de Menezes

(Citado por Freitas Nobre em discurso, publi-


cado no Diário do Congresso Nacional, Seção I,
n.° 98, de 29/08/81).
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

ÍNDICE

Apresentação 13
Espiritismo e Política 17
Adoração a Deus como Forma de Participação do
Homem na Sociedade 24
O Trabalho Segundo o Espiritismo 30
Entendimento Espírita sobre a Reprodução 36
A Conservação sob a Análise Espírita 42
O Enfoque Espírita da Destruição 48
A Sociedade na Perspectiva Espírita 53
A Conceituação do Progresso na Doutrina Espírita 58
Espiritismo e Igualdade 64
Espiritismo e Liberdade 72
A Justiça, o Amor e a Caridade na Filosofia
Espírita 77
O Aprimoramento do Ser Humano na Ética
Espírita 83
A Ação Social Espírita 89
Participação Política do Espírita 96
Bibliografia e Referências 100
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

APRESENTAÇÃO

Quando se pensa em política, pressupõe-se,


quase sempre e apenas, a atividade partidária, a
disputa de cargos eletivos, dentro do esquema da
conquista do poder. Todavia, o fato político é
muito mais abrangente. Ele compreende todas
as atividades de relações humanas, de coordena-
ção dos recursos e atendimento das necessidades
das coletividades.
Dentro dessa perspectiva, justifica-se clara-
mente a inquietação sobre as expectativas que
podem advir da interpretação do fato político, a
partir das concepções espíritas. Allan Kardec, na
última parte de "A Gênese" analisa as contribui-
ções espíritas para a renovação social e afirma, em
outras e várias oportunidades, que a destinação
final do espiritismo é influir na sociedade, para
modificá-la.
Isso significa que a Doutrina pretende, ao
longo de sua contribuição, intervir no político,
uma vez que a renovação social implica num com-

13
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

plexo filosófico e prático, este pela modificação dade. Não se pode esquecer que foi na metade
do quadro de relações, legislação e de toda a es- do século 19, quando apareceu "O Livro dos Espí-
trutura de poder. ritos", que se deram os passos marcantes para a
"O Livro dos Espíritos", de Allan Kardec, definição da estrutura biológica e social do ho-
dentro desse conceito, pode ser considerado um mem. Cabia ao espiritismo a tarefa de redifini-lo
livro político, porque abrange, abarca, analisa não espiritualmente. Deveria fazê-lo — e o fez — de
apenas o ser como ser, mas enquanto homem, isto maneira que pudesse enfrentar a argumentação
é, ligado a uma realidade existencial e a uma con- experimental da ciência e do materialismo e supe-
tingência atual, viva, que é a sociedade. Se se rasse o florilégio inconsistente do espiritualismo
preocupa com assuntos trancendentais, como Deus religioso.
e a essência espiritual do homem, dedica longo Para os que têm uma visão ampla da contri-
trecho à compreensão dos fatores morais, que buição de Allan Kardec, é meridiano que ele con-
estão na base das ligações mais profundas no rela- seguiu a difícil proeza de apresentar o homem
cionamento humano. dentro de uma dimensão em que, sem desprezar
Hoje ninguém mais aceita teorias que isolem a tradição espiritualista, ao contrário reforçando-a
o homem do mundo. Este é o local onde está contrapõe-se, com dados e com lógica, ao sim-
a coletividade espiritual, enquanto encarnada e plismo biológico. Conseguiu o Codificador a sín-
o governo dos bens e das condições em que o tese entre as teses niilistas do materialismo e as
indivíduo e a coletividade vivem, as posições de posições alienantes da religião. Mostrando-o como
dominação e submissão, o poder e o arbítrio, a o agente ativo da modificação do ambiente, auto-
liberdade e a participação, são indissociáveis das aperfeiçoando-se, para criar uma sociedade mais
necessidades da criatura. A prova disto é a infor- justa e adequada ao desenvolvimento de suas po-
mação de que, no plano extrafísico, o homem de- tencialidades, o espiritismo conseguiu redifinir o
sencarnado elabora também propostas políticas, homem e sua relação com o mundo. Com o alar-
na organização de comunidades transitórias, com gamento de fronteiras da vida extendem-se os li-
estruturas de poder. mites das potencialidades da criatura.
A codificação do espiritismo foi entregue a Essa concepção do homem e de sua relação
Allan Kardec, um homem que viveu intensamente com o mundo precisa ser transferida para a ação
um período decisivo para o futuro da humani- política, social. Para isso impõe-se a reflexão dos

14 15
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

postulados espíritas a fim de compatibilizá-los


com as realidades sociais. Por tudo isso e porque
1
é preciso falar ao mundo, à sociedade, numa lin-
guagem apropriada e mostrar as fases mais im-
portantes do pensamento espírita, o trabalho de ESPIRITISMO E POLÍTICA
Aylton Paiva se apresenta como uma proposta de-
safiadora. Nela temos as bases para o desenvolvi-
mento de outras contribuições e análises dos pro-
blemas humanos, a partir de uma visão política e
social espírita. O autor fez uma síntese do pensa- Haverá alguma relação entre espiritismo e
mento kardecista, englobando as teses defendi- política?
das pelo Codificador e pelos Espíritos Superiores Esta é uma pergunta que em muitos lugares
acerca das formas do comportamento social do temos lido e para a qual há sempre uma resposta
homem, no passado, no presente e no futuro. negativa: espiritismo nada tem a ver com Polí-
O texto será base para pesquisas, debates e tica. No entanto, tais respostas apressadas e,
seminários, abrindo um quadro amplo para a re- muitas vezes, vazadas em preocupante tom de
flexão de como o espiritismo pode e deve atuar que seja até "um pecado", são frutos de desinfor-
no campo político e social. Sem comprometer-se mação e de preconceitos consagrados.
com legendas ou partidos, mas intervindo a nível Sob o aspecto filosófico, o espiritismo tem a
de ideias, o espiritismo está apto a contribuir para ver e muito com a Política, já que esta deve ser a
a equação de soluções consistentes aos angustian- arte de administrar a sociedade de forma justa.
tes problemas gerados pelo progresso, pela urba- Em sua obra básica, O Livro dos Espíritos, o
nização e pelo contingente humano que estagia espiritismo consagra 405 questões, ou seja, da
no planeta, em busca de soluções definitivas. pergunta n.° 614 a 1018, para tratar das Leis de
Neste livro, Aylton Paiva traz sua parte, o esforço Adoração, Trabalho, Reprodução, Conservação,
de seu pensamento. Abre, com isso, uma nova Destruição, Sociedade, Progresso, Igualdade, Li-
frente para a participação espírita no social, no berdade e Justiça, Amor e Caridade. Tais ques-
político. tões envolvem, portanto, o homem no seu relacio-
JACI RÉGIS namento com o Criador da vida, com o planeta

16 17
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

em que vive, com seus semelhantes, com as socie- sariamente, impõe exercitar a Justiça, o Amor e
dades de que participa. a Caridade.
Logo, sob o aspecto filosófico, o espiritismo Esse entendimento é necessário ao espírita,
apresenta normas políticas. pois, conscientemente ou não, ele tem uma prá-
O que não se deve, nem se pode, é confundir tica política, considerando-se que a própria par-
essa visão política com a política partidária, ou ticipação na sociedade é uma participação polí-
seja, a política aplicada que os homens devem tica.
exercitar nos núcleos, nas agremiações partidárias. O homem, por sua natureza, é um ser social:
Tais partidos são resultantes de ideologias, associa-se aos seus semelhantes para criar os bens
de objetivos, de programas, de estatutos estabele- necessários ao seu desenvolvimento.
cidos em agrupamentos de determinados homens Dentre esses bens, alguns lhe são garantidos
que visam, de uma forma ou de outra, realizar pelo agrupamento doméstico, outros são coloca-
normas políticas ideais, ou seja, pretendem a exe- dos em disponibilidade por outras instituições,
cução na sociedade dos princípios, das normas também por ele criadas, a fim de satisfazerem
apresentadas filosoficamente pela política. suas necessidades de natureza social, econômica,
Assim, jamais o espiritismo, como Doutrina, cultural e religiosa, como a escola, a empresa, o
e o movimento espírita, como prática, poderão clube, a Igreja etc.
dar guarida a um partido político em seu seio, Daí a afirmação de Aristóteles: "O homem
por exemplo: Partido Social Espírita, Partido Es- é um animal político".
pírita Cristão etc. O espiritismo demonstra, também, em sua
Porém, as implicações dos princípios e nor- obra básica, já citada, a necessidade da participa-
mas políticas contidas na Terceira Parte — Das ção do homem na sociedade, pois o homem tem
Leis Morais — de O Livro dos Espíritos, codifi- que progredir, e isolado ele não tem condições
cado por Allan Kardec, são muito amplas e pro- disso, já que seu progresso depende dos bens que
fundas na sociedade humana. lhe são oferecidos pela família, pela escola, pela
Por isso, o espírita deve ser consciente e lú- religião e demais agências sociais. Por isso os
cido na compreensão dessas normas e princípios, homens dependem uns dos outros, foram criados
a fim de que sua participação na sociedade seja para viver em sociedade e não isolados.
consentânea com tal visão política, e que, neces- Assim, as pessoas, as famílias e as instituições
18 19
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

sociais necessitam da paz baseada na justiça, na utilizará sua inteligência e seus conhecimentos
ordem e na segurança e de condições para a rea- para satisfazer suas paixões e seus interesses pes-
lização do bem comum. Para tanto, os homens soais, não se importando em prejudicar seu seme-
associam-se em entidades mais amplas, gerando a lhante e até mesmo destruí-lo.
sociedade política, personificada no Estado que, Somente quando, através do progresso moral,
desta forma, se torna o responsável pelo bem de o homem dominar o orgulho e o egoísmo, ele
todas as pessoas. poderá ampliar sua felicidade na Terra, podendo,
então, desfrutar da paz e da fraternidade.
Ação Espírita e Política Isso só será possível quando os homens con-
siderarem que, como irmãos, devem-se auxiliar
Para progredir, o homem precisa da socie- mutuamente e não o forte e poderoso explorar e
dade. O progresso não é o mesmo para todos, viver às custas do mais fraco (v. A Gênese, Allan
então os mais adiantados devem ajudar o pro- Kardec, cap. XVIII, item 18 e 19).
gresso dos outros por meio do contato social. Na mesma obra, Allan Kardec revela os
Esse auxílio, essa participação é uma ação caracteres daqueles que devem participar da es-
política, embora possa não ser (e na maioria das truturação de uma sociedade justa e amorosa:
vezes não o é) uma ação político-partidária. Para "Cabendo-lhes fundar a era do progresso moral, a
o espírita, essa ação política deve ser sempre ins- nova geração se distingue por inteligência e razão
pirada nos princípios expressos pelo aspecto filo- geralmente precoces, juntas ao sentimento inato
sófico do espiritismo, que o levam a amar e, nesse do bem a crença espiritualista, o que constitui
caso, Amar é desejar o bem; logo, a exteriorização sinal indubitável de certo grau de adiantamento
política do amor é a expressão do querer bem e anterior. Não se comporá exclusivamente de espí-
do agir para o bem de todos. ritos eminentemente superiores, mas dos que, já
Alerta-nos o espiritismo que o progresso inte- tendo progredido, se acham predispostos a assimi-
lectual realizado até o presente, em larga escala, lar todas as ideias progressistas e aptos a secun-
é um grande avanço e assinala uma primeira fase dar o movimento de regeneração". (G.N.)
de desenvolvimento da humanidade, sendo impo- Consequentemente, a ação política dos bons
tente, porém para regenerá-la. Enquanto o homem é um imperativo na hora atual. O espiritismo
estiver dominado pelo orgulho e pelo egoísmo ele (GN — Grifos nossos).

20 21
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

apresenta conceitos claros e precisos para essa trina social espírita, contida em O Livro dos Espí-
atuação. "A nova geração marchará, pois, para ritos, em sua terceira parte.
a realização de todas as ideias humanitárias com-
patíveis com o grau de adiantamento a que hou-
ver chegado. Avançando para o mesmo alvo e
realizando seus objetivos, o espiritismo se encon-
trará com ela no mesmo terreno. Aos homens
progressistas se deparará nas ideias espíritas po-
derosa alavanca e o espiritismo achará, nos novos
homens, espíritos inteiramente dispostos a aco-
lhê-lo". (A Gênese)
O espiritismo não cria a renovação social; a
madureza da humanidade é que fará dessa reno-
vação uma necessidade. Pelo seu poder morali-
zador, por suas tendências progressistas, pela
amplitude de suas vistas, pelas generalidades das
questões que abrange, o espiritismo é mais apto
do que qualquer outra doutrina a secundar o
movimento. Surgiu na hora em que podia ser de
utilidade, visto que também para ele os tempos
são chegados, (in A Gênese, Allan Kardec — g.n.)
Da análise dos conceitos expostos surge clara
a estimulação do espirtismo à participação no
processo político, social, cultural econômico, de
modo a secundar o movimento de regeneração
da sociedade humana em bases de justiça e amor.
Para tal ação é imprescindível que se tome
conhecimento dos princípios e normas da dou-

22 23
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

Para fazer o bem e evitar o mal é necessário


2 procurar extinguir o orgulho, a inveja, o egoísmo,
a vaidade e a prepotência, não só de si mesmo,
como também das instituições e grupos sociais.
Tal conceito de adoração a Deus leva não só
ADORAÇÃO A DEUS COMO FORMA à reforma íntima, ou seja, à auto-educação da pes-
DE PARTICIPAÇÃO DO soa, como à reforma da sociedade em seus pa-
HOMEM NA SOCIEDADE drões de egoísmo e orgulho, em nome dos quais
se justificam as desigualdades e as injustiças.
De conformidade com o conceito espírita de O espiritismo não apresenta um conceito de
adoração, Deus prefere os que o adoram do fundo adoração fundamentado na submissão passiva e
do coração, com sinceridade, fazendo o bem e medrosa do Criador.
evitando o mal, aos que julgam honrá-lo com ceri- Há religiões que se constituem em instru-
mônias que não os tornam melhores para com os mentos dos poderosos do mundo para a manipu-
seus semelhantes. lação das massas, de conformidade com seus inte-
Para se fazer o bem e evitar o mal é neces- resses pessoais ou dos grupos a que pertencem.
sário que o homem seja participante da sociedade A submissão é de suma importância para tais
em que vive, através de ações que preservem os religiões e o maior "pecado" é a desobediência.
próprios direitos naturais, como, também, den- Esse tipo de religião destaca e insiste na fra-
tro de suas possibilidades, defenda os direitos na- queza e impotência do homem diante do seu
turais do seu semelhante. criador. Ao mesmo tempo, revela a importância
Obviamente de nada vale a adoração exte- e a necessidade de seres intermediários (sacerdo-
rior manifesta em rituais e posturas falsas, se o tes e ministros) entre ele e o Criador, fundamen-
comportamento da pessoa motiva-se pelo egoís- tando, assim, toda força e poder da classe sacer-
mo, orgulho, vaidade e prepotência. dotal. Esta, então, alegando poder divino, poderá
A adoração a Deus, no conceito espírita, tem manipular a massa como bem entender: a bene-
uma ação política dentro da sociedade, ou de fício de si própria ou dos poderosos a que geral-
forma mais ampla, no planeta em que se vive: mente se liga.
fazer o bem e evitar o mal. O posicionamento de submissão cria no ho-
24 25
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

mem a dependência total à autoridade, renun- Se uma religião através de seus conceitos
ciando à sua capacidade de amar e raciocinar. inibe a razão e o amor em suas diferentes formas
Essa atitude psicológica pode ser transferida, e expressões, revelando, apenas, aspectos tristes
e geralmente o é, para a submissão absoluta ao da vida, conduzindo o homem ao desprezo de si
Estado, ao partido, à "raça superior", ao "povo mesmo, impondo uma contemplação improdutiva,
eleito". A felicidade pessoal é sacrificada a ideais, não tem valor (questão n.° 657 do L. E.). Para
como a vida eterna, a vida espiritual, o futuro da o espiritismo, não fazer o bem já é um mal, pois
espécie humana, o estado socialista ideal. o ser humano se realiza quando é produtivo no
As ideias passam a ser fins em si mesmas e bem.
não meios para o homem ser feliz. Os fins jus- Em O Livro dos Espíritos, Allan Kardec in-
tificam todos os meios e em nome desses fins as siste quanto à melhor forma de agradar a Deus e
elites religiosas ou governamentais manobram os os espíritos indicam sempre que isso se faz atra-
que a elas se submetem. vés da ação no bem, pela produtividade no amor
O espiritismo ajuda na compreensão das ao semelhante. Mesmo no ato exterior da adora-
limitações humanas e na proteção divina, nunca ção, revelam a atitude psicológica que o deter-
apelando a uma submissão castradora, de inibi- mina, demonstrando a diferença entre a adoração
ção às potencialidade humanas. Pelo contrário, autêntica e a hipocrisia, o agir de forma egoística
demonstra que a oração, ao aproximar a criatura e a ação motivada pelo amor.
do Criador, constitui-se numa possibilidade de Também indicam que a extensão da prece
estudo de si mesma. As boas ações são as melho- ou a sua freqüência de nada valem se a pessoa
res preces, por isso valem os atos mais que a pala- apresenta um mau caráter, se é ciosa, invejosa,
vra de pessoas cujos atos as desdizem. impertinente, sem benevolência e indulgência e
Ser religioso significa principalmente enten- até viciada. Dizem os espíritos que o necessário
der a si e ao seu semelhante, amando-o e amando- não é orar muito, mas orar bem. Não adianta
se ("ama o teu próximo como a ti mesmo"). fazer da prece uma forma de estudo de si mesmas
Segundo o espiritismo, o valor de uma reli- (v. questão n.° 660 do L. E.).
gião, filosofia ou seita, está em promover o cres- O espírita, pois, não deve temer a auto-ana-
cimento, a força, a liberdade àqueles que a seguem lise, nem a crítica, porque sabe que a melhor
ou professam. maneira de se aperfeiçoar é conhecer-se a si mes-

26 27
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

mo; que, quando erra, não ofende a Deus, apenas Deus quer que o homem pense nele, mas não quer
produz reações de efeitos corretivos em si mesmo, que só nele pense, pois que lhe impôs deveres a
quando esse erro não for contrabalançado pela cumprir na Terra. Quem passa todo o tempo na
sua ação no bem no mesmo campo. Portanto, por meditação e na contemplação nada faz de meri-
seus erros, o homem não é um pobre pecador, tório aos olhos de Deus, porque vive uma vida
fraco e desprezível; é, na verdade, um ser que toda pessoal e inútil à humanidade e Deus lhe
ainda está aprendendo viver harmoniosamente pedirá contas do bem que não houver feito". (g.n.)
com as leis do amor e desenvolvendo progressiva- Da mesma forma, a atitude comodista e pas-
mente sua razão. siva, expressa pela omissão diante dos problemas
Por isso, o conceito espírita de adoração in- humanos em estruturas sociais injustas e mate-
funde um profundo respeito pela vida, uma per- rialistas é por eles reprovada. Pois o comodista
manente indagação sobre o universo e o homem ainda que não pratique o mal, dele se aproveita.
um intrínseco amor pelo semelhante. Estimula Portanto, o espírita para não ser omisso e
sempre o aperfeiçoamento e o progresso da pes- assim indiretamente aproveitar-se do mal, deve
soa e da sociedade, através da solidariedade. se esforçar para que o conceito espírita de adora-
Consequentemente, no conceito de adoração ção a Deus seja efetivamente aplicado na socie-
a Deus expresso pelo espiritismo, há todo um dade humana, de forma conveniente, oportuna e
comprometimento de participarão na sociedade, adequada, em consonância com a própria ética
reiteradamente manifestado pelos espíritos a Allan ou moral espírita.
Kardec.
Assim, vemos claramente tal ligação: Deus,
homem e sociedade na questão n.° 657 de O
Livro dos Espíritos.
"Têm, perante Deus, algum mérito os que se
consagram à vida contemplativa, uma vez que
nenhum mal fazem e só em Deus pensam?
— Não, porquanto, se é certo que não fazem
o mal, também o é que não fazem o bem e são
inúteis. Demais, não jazer o bem já é um mal.

28 29
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

e bem-estar, o homem tem que trabalhar, o que o


3 impulsiona ao progresso intelectual.
Portanto, o trabalho é uma forma de profunda
participação do homem no mundo em que vive,
e, especificamente, na sociedade de que faz parte.
O TRABALHO SEGUNDO O ESPIRITISMO Ao trabalhar o homem cria e, conseqüente-
mente, torna-se um agente ativo do Supremo Cria-
dor; revela-se como um co-criador dentro da vida.
Independentemente da sua natureza, jamais ser-
vindo de motivo à humilhação ou à exploração.
"O trabalho é lei da Natureza, por isso mes-
Todas as pessoas, dentro de suas possibilida-
mo que constitui uma necessidade, e a civilização
des, tomam parte na edificação daquilo que se
obriga o homem a trabalhar mais, porque lhe
chama civilização. Através dessa participação é
aumenta as necessidades e os gozos". Assim
que o homem desenvolve sua inteligência.
orientam os espíritos na questão n.° 674 de O
Livro dos Espíritos.
Trabalho: Desenvolvimento Pessoal
Advertem, ainda, na questão seguinte, da
mesma obra que: " . . . o Espírito trabalha, assim
como o corpo. Toda ocupação útil é trabalho". É como pessoa, como espírito eterno e imor-
(g. n . ) . O termo trabalho denomina toda ativi- tal, que o homem está sujeito ao trabalho. O tra-
dade realizada pelo homem, seja intelectual ou balho deve servir, pois, a que o homem possa de-
manual. Por isso, é trabalho humano toda ativi- senvolver-se intelectual e moralmente.
dade que o homem tem capacidade de fazer e Essa é a visão espírita do trabalho e também
possui aptidão para isso, conforme sua natureza. a visão cristã. Constitui postulado da doutrina
Ensina o espiritismo que o trabalho se impõe social espírita, como o é a doutrina social cristã.
ao homem por ser consequência de sua própria O elemento de valoração do trabalho não é
natureza corpórea. Pode ser um instrumento de o tipo do trabalho humano que se realiza, mas o
expiação, mas essencialmente é um meio de de- fato de ser a pessoa que realiza o trabalho com
senvolvimento da inteligência. Para satisfazer a necessidade de desenvolver suas potencialida-
suas necessidades básicas: alimentação, segurança des de conhecimento e amor.

30 31
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

Conclui-se, pois, que o trabalho é para o


homem e não o homem para o trabalho, afastando dade ele deve participar de maneira justa e cria-
assim, moralmente, toda forma de exploração do tiva, jamais dela podendo ser marginalizado.
homem pelo trabalho para satisfazer o interesse A sociedade deve ser organizada de forma a
econômico. O ser humano jamais poderá ser re- que todos possam trabalhar e os que estão doen-
duzido a "instrumento de trabalho". tes ou impossibilitados ao labor recebam desta
A civilização cria multiplicidades de traba- mesma sociedade os meios necessários à sua sub-
lhos; nenhum deles, porém, poderá servir como sistência de maneira justa e digna.
meio de exploração do homem com o objetivo Não adianta dizer ao homem que ele tem o
do lucro, nem ferir sua dignidade como ser hu- dever de trabalhar; é preciso que a sociedade ofe-
mano. Quando isso acontece, surge a pobreza e reça-lhe a oportunidade do trabalho, o que nem
a marginalização, evidenciando flagrante injustiça sempre acontece.
social. O trabalho é um dos alicerces sobre o qual
A doutrina espírita denuncia, de forma ve- se levanta o núcleo familiar e para sua constitui-
emente, tal situação. Esclarece que, todo aquele ção, pois este exige as condições de subsistência:
que tem o poder de mandar é responsável pelo habitação, alimentação, vestuário, educação e
excesso de trabalho que imponha aos que lhe são lazer.
subordinados, abusando da autoridade e trans-
Além disso, o trabalho desenvolve no seio da
gredindo as leis de Deus. família uma ação educativa de zelo, respeito, res-
Na mesma situação encontra-se aquele que ponsabilidade, carinho, enfim de amor.
não explora com excesso de trabalho, mas suga as
Observamos que o trabalho é uma obrigação,
energias do trabalhador com o pagamento irrisó-
um dever, mas também fonte de direitos para o
rio de salários, muitas vezes burlando a própria
trabalhador; direitos esses consagrados, atual-
legislação trabalhista acolhida em todos os países
mente, pela Declaração dos Direitos Humanos.
civilizados.
da Organização das Nações Unidas — ONU.
É preciso que se reconheça a participação do
homem através do trabalho na sociedade, criando É óbvio que a sociedade deve propiciar ao
o bem comum, aumentando o patrimônio da homem o direito de trabalhar, bem como educá-
grande família humana. Por isso. dessa socie- lo para que se equilibre entre a produção e o con-
sumo, a fim de que não seja transformado em ins-
32
33
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

trumento do lucro ou mera engrenagem desper- pios, seja como empregador ou como empregado.
sonalizada na máquina de produção estatal. Qualquer tipo de burla será a negação dos princí-
A dimensão social e espiritual do homem não pios espirituais pelos quais o espiritismo visualiza
pode ser inibida enquanto trabalhador. O tra- o trabalho como indeclinável atividade humana.
balho é seu instrumento de progresso social e es- Se os espíritos orientaram que o limite do tra-
piritual É um componente de sua dinâmica balho é o limite das forças, é óbvio que esse limite
evolutiva. das forças não está ao arbítrio do empregador ou
O espiritismo valoriza o trabalho com uma do doador de trabalho, pois o egoísmo humano
ação social e espiritual, pois o homem dele parti- teria amplo campo de exploração do homem pelo
cipa com seu corpo e espírito, não importando homem, até a exaustão.
seja a atividade chamada manual ou intelectual. Através dos recursos das ciências médicas,
Portanto, nenhum homem, em boas condições físi- sociológica, psicológica, as legislações trabalhis-
cas e mentais, pode ser alijado do trabalho. tas fixam, com relativo equilíbrio, a proporciona-
Considerando-se o trabalho, é indispensável lidade entre o trabalho e o descanso.
que se analise também o repouso. O descanso é No entanto, é indispensável que esses direi-
condição indispensável à recuperação das forças tos estabelecidos pela legislação social dos povos
físicas e refazimento das energias mentais. e proclamados por entidades como Organização
Portanto, é desumano e só pode resultar de das Nações Unidas, Organização Internacional
uma sociedade injusta, a necessidade de ter o do Trabalho, sejam respeitados e defendidos por
homem, muitas vezes, mais de um emprego, sem empregadores e empregados e devidamente tute-
condição do repouso necessário, a fim de prover lados pelos Estados.
a própria subsistência e a da família. Assim ele O espírita, colhendo a informação sobre a
se embrutece e se transforma em um robô de pro- Lei do Trabalho em O Livro dos Espíritos deve
dução agrícola, industrial ou num dente da grande estar atento a que tais princípios doutrinários,
máquina da comercialização. acolhidos pela legislação trabalhista, sejam apli-
Atualmente, o Direito do Trabalho estabe- cados e respeitados.
lece a necessidade do descanso, de forma remu-
nerada.
Não pode o espírita transigir a tais princí-

34 35
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

objetivando a perfeição, não se confundindo isso


4 com intervenções científicas que visem única e
exclusivamente o benefício material, seja do lucro
fácil ou da satisfação de interesses egoísticos.
Os espíritos observam que o homem, mesmo
agindo sob o impulso do egoísmo, realiza seu pro-
ENTENDIMENTO ESPÍRITA gresso, pois está desenvolvendo a inteligência.
SOBRE A REPRODUÇÃO Em sua participação política na sociedade, o
espírita não poderá perder de vista o aspecto ético
ou moral da questão.
A reprodução dos seres vivos é uma lei da Informa a doutrina espírita que tudo o que
natureza sem a qual o mundo corporal desapa- embaraça a natureza em sua marcha é contrá-
receria. rio à lei de Deus, porém será válida a ação huma-
Todavia, em sua participação na vida e na na que, usando a inteligência, vise disciplinar,
sociedade, muitas vezes, o homem precisa regrar harmonizar e concorrer para o aperfeiçoamento
e controlar a reprodução da própria espécie e do homem.
mesmo dos animais e vegetais. Entenderia o Encontramos na questão n.° 693 de O Livro
espiritismo ser contrário à lei da natureza o aper- dos Espíritos: "Deus concedeu ao homem, sobre
feiçoamento das raças, animais e das espécies todos os seres vivos, um poder de que ele deve
vegetais pela ciência? usar, sem abusar. Pode, pois, regular a reprodu-
O entendimento espírita, lançado em O Livro ção, de acordo com as necessidades. Não deve
dos Espíritos, é incisivo no sentido de que tudo opor-se-lhe sem necessidade. A ação inteligente
deve ser feito para se chegar à perfeição. Além do homem é um contrapeso que Deus dispôs para
do mais, esclarece ser o homem instrumento de restabelecer o equilíbrio entre as forças da natu-
que Deus se serve para atingir seus fins. Se a reza e é ainda isso o que o distingue dos animais,
perfeição é o fim a que tende a natureza, ajudar a porque ele obra com desconhecimento de causa.
atingir essa perfeição é proceder de conformidade Mas, os mesmos animais também concorrem para
com as leis divinas. a existência desse equilíbrio, porquanto o instinto
Evidencia-se, assim, que o ser humano deve de destruição que lhes foi dado faz com que, pro-
ter uma participação no fenômeno da reprodução
37
36
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

vendo à própria conservação, obstem ao desenvol- Os espíritos, na já citada obra, dão o casa-
vimento excessivo, quiçá perigoso, das espécies mento como um progresso alcançado pela huma-
animais e vegetais de que se alimentam." nidade. Ao mesmo tempo exortam que sua abo-
O homem em sua participação política, ou lição seria um retrocesso à vida animal.
seja, em sua ação na sociedade, deve agir para o Na análise dessa questão, Allan Kardec escla-
equilíbrio da própria espécie, como da vida que rece que no estado natural há a união livre e oca-
o circunvolve, pois tudo ele deve fazer para che- sional dos sexos. O surgimento do casamento
gar à perfeição e ele é um instrumento do qual representa um dos primeiros progressos da socie-
Deus também se serve. dade humana, pois estabelece a solidariedade
No entanto, o ser humano ainda é imperfeito fraterna.
e, muitas vezes, age apenas para satisfazer seus O casamento é uma instituição que deve ser
instintos e impulsos obstando a reprodução apenas defendida e preservada pelo que apresenta de
para satisfazer a sensualidade. O espiritismo de- importante e necessário ao aprimoramento do ser
monstra que isso revela a predominância do corpo humano no desenvolvimento do Amor.
sobre a alma. O espírita, de forma individual, e o movimen-
É evidente, no entanto, que esse conceito não to espírita, de maneira coletiva, precisam estar
colide com o planejamento familiar, o qual ajuda atentos à defesa dos fundamentos morais que pre-
o homem a assumir a prole com responsabilidade servem a nobre e elevada instituição do casamento.
e zelo, componentes indeclináveis do amor. A título de liberdade levantam-se vozes que pre-
O controle da reprodução não pode visar à gam a sexualidade irresponsável, rebaixando a re-
satisfação de prazeres egoísticos, seja em termos lação sexual humana ao nível do instinto, como se
de exploração da sexualidade no ser humano, seja tal envolvimento físico-psíquico-emocional-senti-
pelo risco de desequilibrar a natureza, em função mental fosse tão simples e fisiológico como matar
do lucro fácil e exorbitante. a sede ou saciar a fome.
A ação espírita de preservação dos laços de
Casamento e Divórcio família não pode ficar limitada às quatro pare-
des do centro espírita, mas deve ser uma partici-
A reprodução no ser humano está ligada à pação na sociedade. Para isso utilizará os meios
tutela do casamento. e instrumentos lícitos e morais, associando-se a

38 39
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

outras instituições e organizações que tenham o e ludibriam o mundo em que vivem. Tal não se
mesmo objetivo. dá, no entanto, com os que se encontram nesse
Assim poderá se contrapor à onda avas- estado por serviço à humanidade, caso em que é
salante de sensualidade que varre os órgãos de meritório. A poligamia é um costume humano
comunicação, como a televisão, a revista, o jor- cuja abolição representa verdadeiro progresso,
nal, o cinema, o teatro e que mantêm a mulher pois o casamento deve se fundamentar na afeição
apenas como um objeto sexual, sob a aparência entre os seres e não apenas na sensualidade.
de libertação. Também não se justifica a poligamia ao ar-
Também considera o espiritismo que a indis- repio da lei em que, numa aparente monogamia,
solubilidade do casamento é uma lei humana con- o ser humano fere a dignidade e o respeito ao seu
trária à própria natureza. cônjuge, buscando às escondidas outro parceiro,
O casamento não pode ser uma prisão e que num comportamento de falsidade, mentira e hipo-
apenas para manter aparências justique sua con- crisia.
tinuidade. O espírita deve dignificar o sexo, preservar o
É evidente que a separação do casal não tem casamento e defender sua constituição onde e
respaldo em objetivos egoísticos, exteriorizados quando necessário.
no sensualismo ou no interesse econômico, pois o
convívio é necessário ao desenvolvimento do
Amor entre o casal e para com os filhos.
Nesse sentido, o relacionamento sexual no
ser humano não é mero instrumento de satisfação
de um instinto, nem pura justificativa do meio de
reprodução. É acima de tudo elevada forma de
exteriorização do amor em que, além da troca de
sensações físicas, desdobram-se elevadas permu-
tas de energias psíquicas.
O espiritismo não justifica o celibato nem a
poligamia. Quanto ao primeiro exorta: os que
agem assim por egoísmo infringem as leis de Deus

40 41
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

5 rém profundos que só os cegos pela ambição e


pelo egoísmo podem desprezar.
O ser humano ainda é imprevidente, pois não
sabe regrar o seu viver. A terra produziria sempre
o necessário, se com o necessário o homem soubes-
A CONSERVAÇÃO SOB A ANÁLISE ESPÍRITA se se contentar. Muitas vezes ele a torna árida e
estéril em virtude de sua imperícia e da exigência
do máximo de produção para satisfazer seu ape-
tite econômico.
Todos os seres vivos possuem o instinto de Com relação aos meios de subsistência, ob-
conservação, qualquer que seja o grau de inteli- servou Allan Kardec que a muitas pessoas falta
gência, pois a vida é necessária ao aperfeiçoa- o indispensável, embora estejam cercadas pela
mento dos seres. Por isso a Terra produz de modo abundância. Qual seria a causa? O espiritismo
a proporcionar o necessário aos que a habitam, indica claramente tratar-se do egoísmo do homem
visto que só o necessário é útil. O supérfluo nunca que não faz o que lhe cumpre no campo da jus-
o é (v. questão n.° 704 de O Livro dos Espíritos). tiça. Também a outros faltam os meios de subsis-
tência por sua própria incúria e imprevidência.
O homem ainda não aprendeu a retirar do
solo apenas o que lhe é necessário. Sua ganância, Ao lado da abundância, no supérfluo, falta o
necessário à massa humana dos marginalizados
traduzida pelo desejo de lucro fácil, leva-o a dila-
na sociedade. Nela encontramos a carência, a
pidar o patrimônio do qual o Senhor da Vida per- doença, a falta de habitação, a escassez de ves-
mitiu-lhe o usufruto. Destrói sem maiores preo- tuário, a ausência de instrução e o trabalho sub-
cupações florestas imensas, polui as fontes e os humano. Essa massa contrasta com a minoria que
rios, contamina os mares. Isso em nome do pro- detém o poder econômico. Tal é a situação em
gresso que, na verdade, mascara a sanha egoística muitas partes do planeta, no chamado Terceiro
de pessoas e grupos que colocam os próprios inte- Mundo. Também o Brasil ainda apresenta esse
resses acima do bem-estar da própria humanidade. aspecto social, na periferia dos grandes centros
O espiritismo apresenta reflexões sobre eco- urbanos e nas regiões sócio-econômicas menos
nomia e agricultura. Ensinamentos simples, po- desenvolvidas.
42 43
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

Há, porém, pessoas que devem a própria


miséria à indolência e à irresponsabilidade. Con- fim de proporcionarem para si o supérfluo, pre-
tudo, mesmo nesses casos, há que se indagar de judicando aqueles a quem falta o necessário, in-
seu histórico psico-social, sua saúde física e men- fringem a Lei Divina e serão responsáveis pelas
tal, bem como a pressão econômica que suporta. privações que houverem provocado aos outros.
Embora a civilização amplie as necessidades, Para o espiritismo, a civilização desenvolve
ela também aumenta as fontes de trabalho e os a moral e conseqüentemente o sentimento da cari-
meios de viver. A ciência e a tecnologia vêm dade que induz os homens a se prestarem apoio
aumentando progressivamente a produção dos recíproco. Aqueles que vivem à custa das priva-
bens e à medida que se aplique a justiça social a ções dos outros, exploram, para si, os recursos da
ninguém faltará o necessário. civilização. De civilizados têm apenas a aparên-
Esclarece o espiritismo que para todos há cia, da mesma forma que muitas pessoas de reli-
um lugar ao sol, mas com a condição de que cada gião só têm a máscara.
um ocupe o seu lugar e não o dos outros. Portanto, a própria lei de conservação con-
A Natureza não pode ser responsável pelos duz o homem à fraternidade, ao amparo mútuo.
defeitos da organização social, nem pelos efeitos O espiritismo não justifica aqueles que vivem da
da ambição e do egoísmo. O uso dos bens da terra exploração do semelhante, que pretendem os be-
é um direito de todos. nefícios da civilização só para si. Aponta-lhes a
Segundo O Livro dos Espíritos, na questão hiprocrisia e a falsidade.
n.° 771, "O uso dos bens da Terra é um direito de
todos os homens. Esse direito é conseqüente da Direito ao Bem-Estar
necessidade de viver".
No entanto, nas organizações sociais injustas O homem não merece censura por desejar
a maioria dos homens é impedida do uso dos bens seu bem-estar. É natural esse desejo. Ele não é
da terra por aqueles que não só usam tais bens condenável, desde que não seja conseguido com
como, ainda, os dilapidam no gasto supérfluo. o prejuízo do outro e não prejudique as forças
Não respeitam o limite das necessidades que a físicas ou morais.
Natureza traçou. Todo ser humano tem direito ao bem-estar.
Aqueles que açambarcam os bens da terra a Logo, está errada e é injusta a sociedade em que
apenas alguns gozam do bem-estar. Também não
44
45
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

está certa para o espiritismo a sociedade que cessidade da participação ativa do homem na so-
elege padrões de felicidade em termos de consu- ciedade, a benefício de seu semelhante. Só aí jus-
mir ("feliz é o que tem dinheiro para comprar") tifica-se a privação, com um fim útil, expressando
e não de SER (desenvolvendo sua capacidade de amor ao próximo.
conhecer e amar), pois apela somente para a satis- O que de importante se realça é a privação,
fação dos impulsos ou instintos. a renúncia, o sacrifício em prol do pobre, do mar-
Para a doutrina espírita não há valor na pri- ginalizado, do injustiçado, do enfermo a se tradu-
vação do bem-estar, na mortificação, no isolacio- zir numa ação social, uma ação política que lhe
nismo religioso uma vez que isso somente inte- reconheça os direitos humanos.
ressa a quem o pratica. Se tais condições impe- O espírita deve, mesmo com sacrifício, agir
dem a pessoa de fazer o bem. elas revelam o conscientemente para que, na sociedade humana,
egoísmo, seja qual for o pretexto que expressem. todos tenham o necessário para o seu progresso.
O sacrifício vale quando é feito a fim de aju- Sabendo que o uso dos bens da Terra é um
dar o próximo, quando nele há um conteúdo de direito de todos os homens, conforme os postula-
amor. dos do espiritismo, o espírita deve participar pe-
los meios lícitos que tenha ao seu dispor para que
A questão n.° 726 de O Livro dos Espíritos
esse direito seja indistintamente aplicado.
orienta: "Supões que se adiantam no caminho do
progresso os que abreviam a vida, mediante rigo-
res sobre-humanos, como o fazem os bonzos, os
faquires e alguns fanáticos de muitas seitas? Por
que de preferência não trabalham pelo bem de
seus semelhantes? Vistam o indigente; consolem
o que chora; trabalhem pelo que está enfermo;
sofram privações para alívio dos infelizes e então
suas vidas serão úteis e, portanto, agradáveis a
Deus. Sofrer alguém voluntariamente, apenas por
seu próprio bem, é egoísmo; sofrer pelos outros é
caridade: tais os preceitos do Cristo".
Desse conceito destaca-se, claramente, a ne-

46 47
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

Toda destruição antes do tempo cria obstáculos


6 ao progresso do princípio inteligente.
Observamos, então, verdadeiro jogo de for-
ças da Natureza para, de forma geralmente sábia,
manter o necessário equilíbrio entre a conserva-
O ENFOQUE ESPÍRITA DA DESTRUIÇÃO ção e a destruição dos seres.
Muitas vezes esse equilíbrio é rompido quan-
do o homem, agindo de uma forma egoísta sobre a
Natureza, destrói os seres de forma inútil e des-
necessária.
A destruição pode, também, ser considerada Quando a destruição ultrapassa os limites que
uma lei da Natureza, porque o que se chama de a necessidade e a segurança estabelecem, aparece
destruição não passa de uma transformação que o domínio da materialização sobre a natureza
tem por fim a renovação e melhoria dos seres espiritual.
vivos. (veja questão n.° 728 de O Livro dos Espí- "Toda destruição que excede os limites da
ritos). necessidade é uma violação da lei de Deus."
Os espíritos procuram mostrar o mecanismo (questão n.° 735 do L. E . ) .
de equilíbrio que preside tal fenômeno ao anali- Entre as formas de destruição, encontram-se
sarem o instinto de destruição dos seres vivos os flagelos. Será possível ao homem afastar os
como desígnios providenciais, já que as criaturas flagelos que o afligem?
são instrumentos de que Deus se serve para atin-
O espiritismo afirma ser possível isso, no en-
gir os fins por ele estabelecidos. Em decorrência
tanto, esclarece que muitos flagelos resultam da
da necessidade de alimentação, os seres vivos des-
imprevidência humana.
troem-se reciprocamente. Com isso atingem-se
dois objetivos: equilíbrio e manutenção na repro- À medida que a ciência e a técnica vão pro-
dução e utilização da matéria que sofreria a des- gredindo, o homem vai podendo dominar os fla-
truição. gelos, isto é, pela pesquisa das causas ele pode
prevenir-se. No entanto, há certos flagelos como
Estabelece, assim, o espiritismo o equilíbrio
terremotos, ciclones, maremotos, quedas baixís-
entre a destruição e a conservação e o importante
simas de temperatura que o ser humano ainda
é que a destruição não se dê antes do tempo.
49
48
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

não pode controlar. A esses ele tem que se sub- humana é imperioso que a justiça se faça junto a
meter, porém ele os agrava por sua negligência. cada um de seus componentes. Também para
Há, pois, necessidade de o homem organizar que haja paz e harmonia entre as nações, é indis-
a sociedade de forma a ser previdente, somando pensável que elas se relacionem sob o pálio da
conhecimentos e experiências, encontrando a so- justiça. Porém, a realidade, atualmente, ainda
lução dos males ao remover as causas. Para isso não é essa. Nações mais desenvolvidas econômica
concorrem a ciência e a técnica. e tecnicamente procuram explorar as nações po-
No entanto, se flagelos como inundações, epi- bres. Tais nações utilizam regras do mercado in-
demais, secas levam a dor e o sofrimento à grande ternacional que lhes propiciam lucros fáceis:
parte das populações, é porque o egoísmo, tradu- estabelecem preços que lhes convém; fixam bar-
zido no privilégio de minorias, impede que re- reiras alfandegárias; importam matéria-prima a
cursos avançados da ciência e da técnica sejam preços aviltantes. Agem de maneira a manter as
aplicados de forma a eliminar ou diminuir seus nações pobres em permanente dependência eco-
danosos e dolorosos efeitos. nômica, política e até mesmo militar.
Quanto aos males que escapam à sua capa- Obviamente, enquanto perdurar tal situação,
cidade de controle, o homem deve utilizar sua a guerra, declarada ou não, permanecerá entre os
inteligência para compreendê-los cada vez mais, povos, pois faltará o elemento essencial à harmo-
a fim de, futuramente, conjurá-los. Deverá tam- nia entre eles — a justiça, consoante a exortação
bém usar a paciência e a compreensão para su- dos espíritos.
portar-lhe os efeitos, evitando agravá-los pela A destruição das criaturas entre si é conde-
revolta e negligência. nável, constitui crime. Para Deus, segundo os
Dentre os flagelos produzidos exclusivamente espíritos, o assassínio constitui grande crime, pois
pelo homem, sobreleva a guerra. quem tira a vida do seu semelhante corta o fio de
O espiritismo diz que a guerra desaparecerá uma existência de expiação ou missão.
da face da Terra quando os homens compreende- A atitude daquele que, no assalto, no roubo,
rem a justiça e praticarem a Lei de Deus. Nessa no desentendimento mata o seu semelhante é tão
época, todos os povos serão irmãos. (v. questão condenável quanto à daquele que não comete
n.° 743 do L. E.). crime ostensivamente, mas rouba as forças de tra-
Para que haja harmonia numa sociedade balho do operário, matando-o aos poucos; que
50 51
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

sonega os recursos dos tributos que devem pro-


ver as necessidades das coletividades.
7
A destruição e a violência não se manifestam
somente de forma física e ostensiva; mais terrível
e perigosas elas são quando se manifestam de A SOCIEDADE NA PERSPECTIVA ESPIRITA
forma sutil e disfarçada provocando o aniquila-
mento e a degradação do meio ambiente em que
o homem vive.
Todas as vezes que o espírita constatar a
destruição da natureza em função do lucro que os A vida social é condição da própria natu-
sistemas econômicos exigem, deverá associar-se reza.
às vozes que clamam contra tal destruição. Deus criou o homem para viver cm socie-
Para isso dará apoio e participação ao par- dade; por isso o homem é dotado dos meios de
tido político, aos movimentos ecológicos, às orga- comunicação.
nizações estudantis e outras que lutam contra a O homem não é um ser perfeito e completo,
destruição desregrada. portanto ele precisa da união social a fim de que
um possa ajudar o outro. Precisando uns dos
outros, os homens foram feitos para viver em so-
ciedade e não insulados.
Não se justifica o isolamento do homem, seja
por pretenso fim religioso (asceta, ermitão etc.),
seja pelo fim egoístico de usufruir os bens mate-
riais sem aborrecimento de ter que se relacionar
com outras pessoas (residir em uma ilha, isolada,
por exemplo).
Àqueles que pretendem viver em absoluta
reclusão, fugindo do pernicioso contacto com o
mundo, advertiram os espíritos que incorriam em
duplo egoísmo.

53
52
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

Toda forma de insulamento que nada pro- desenvolver suas potencialidades e isso ele só pode
duza, que seja inútil, é condenada pelo espiri- fazer vivendo em sociedade e é necessário que a
tismo. sociedade esteja estruturada a fim de que todos
Torna-se evidente que a pessoa tem um com- que a compõem tenham tal possibilidade.
promisso com a sociedade em que vive. Nela deve O progresso do homem, tanto em seu aspecto
participar, dando sua contribuição, de acordo com da vida material quanto da vida espiritual, é uma
suas possibilidades intelectuais e sentimentais. O imposição do Criador da Vida. Ele necessita rela-
espírita, pelo conhecimento que tem da doutrina cionar-se com seu semelhante para criar os bens
social espírita, consubstanciada nas Leis Morais indispensáveis ao seu aprimoramento.
de O Livro dos Espíritos, tem o dever de partici-
par ativa e conscientemente na sociedade em que Esse relacionamento social, no entanto, deve
vive, agindo para que os princípios expressos em ser inspirado pelo amor entre os seres, pela fra-
tais leis se efetivem na sociedade humana. ternidade que implica no exercício da justiça.
Há uma forma de insulamento que o espiri- Desses bens necessários ao seu progresso,
tismo admite: os que saem do mundo para se de- alguns ele colhe na própria família, outros, porém,
dicarem ao trabalho de socorrer os necessitados. ele precisa colher em outras agências: a religião,
Aqueles que assim agem, na verdade se elevam a escola, as associações com fins culturais, artís-
em seu progresso espiritual, pois adquirem duplo ticos, científicos etc. Então ele poderá satisfa-
mérito, superam o egoísmo no gozo material e pra- zer suas necessidades de ordem econômica, social,
ticam o bem, obedientes à lei do trabalho. cultural e espiritual.
Nesse aspecto, os espíritos valorizam duas Por outro lado, o ser humano, a família, as
situações importantes: fazer o bem e obedecer à instituições sociais precisam de paz, justiça e segu-
lei do trabalho. rança a fim de que todos possam progredir, sem
Consequentemente, a omissão e a ociosidade restrições ou discriminações.
que venham a alimentar qualquer tipo de isola- Assinalam os espíritos que os laços de famí-
mento social, produzirão sempre a inutilidade, o lia são importantes na educação do ser humano.
fanatismo ou o egoísmo rotulado de pureza ou Amando o próximo que está mais próximo é que
santidade. o homem se prepara para o exercício do amor
O homem tem necessidade de progredir, de àqueles que lhe estão mais distantes.

54 55
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

Advertem, ainda, que o relaxamento dos laços para que o amai-vos uns aos outros se efetive atra-
familiares será a recrudescência do egoísmo. vés do direito que todo ser humano tem de possuir
Retirando do ser humano a manifestação do o necessário: alimentação, vestuário, casa, saúde,
amor em seu relacionamento, resta apenas o egoís- trabalho, educação, lazer e desenvolvimento espi-
mo, inclusive rebaixando a relação sexual ao puro ritual.
instinto.
O amor faz com que haja a responsabilidade,
o cuidado, o carinho e o zelo de um ser humane
para com o outro. A família é o precioso labora-
tório onde se exercita e se aprimora a sublime ma-
nifestação desse sentimento.
Por isso, os fundamentos morais da família
devem ser preservados, valorizando-se o sexo
como meio de manifestação do amor.
O espírita deve estar atento, à vista dos con-
ceitos espíritas sobre sexo, família, dignidade hu-
mana, para denunciar as ações e movimentos que
subvertam os valores espirituais.
Conclui-se, assim, que o homem não é um
ser independente. Pelo contrário, ele depende de
seu semelhante ao mesmo tempo que é impulsio-
nado ao progresso; por isso impõe-se-lhe a neces-
sidade de aprender a amar o seu próximo e não
explorá-lo física, intelectual e sentimentalmente.
Esse amor deve ser traduzido de forma con-
creta.
Não apenas dar esmola ao pobre e pedir-lhe
paciência, acolher o velho desamparado no asilo,
agasalhar a criança órfã ou abandonada, mas agir

56 57
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

8
cínio, o ser humano adquire a faculdade de esco-
lher. Com isso ele desenvolve seu livre-arbítrio o
que lhe aumenta a responsabilidade dos seus atos.
A CONCEITUAÇÃO DO PROGRESSO O progresso é da própria condição humana,
por isso o homem não pode opor-se-lhe. A ignorân-
NA DOUTRINA ESPIRITA cia e a maldade e até mesmo leis injustas, podem
retardar seu desenvolvimento, mas não anulá-lo.
Quando instituições e leis se tornam incom-
O espiritismo considera o estado natural patíveis com ele, a própria evolução geral se in-
como sendo a infância da humanidade e o seu cumbe de aniquilar tais organizações e revogar
ponto de partida para o desenvolvimento intelec- ordenamentos anacrônicos.
tual e moral.
Assegura tratar-se de um estado transitório Evoluções, Revoluções e Progresso
para o homem, que dele sai em decorrência do
progresso e da civilização. Esclarece, por outro É claro que essa evolução geral é a expres-
lado, que a lei natural rege a humanidade inteira são das forças conscientes e ativas que não se sub-
e o homem se aprimora à medida que melhor a metem à maldade gerada pela ignorância.
compreende e pratica. O progresso é lento, mas a humanidade, de
O próprio homem traz em si os impulsos que forma geral, ou o homem, particularmente, não
o conduzem ao progresso, porém esse progresso podem permanecer indefinidamente na ignorân-
não é simultâneo e idêntico para todos. Por isso; cia porque precisam atingir os fins que lhes foram
assinalados pelo Criador.
aqueles que estão mais adiantados devem auxiliar
o progresso dos outros, através da relação social. Segundo o espiritismo, as revoluções morais,
como as revoluções sociais infiltraram-se nas ideias
Esclarecem os espíritos que o progresso mo-
pouco a pouco. Elas como que germinam durante
ral decorre do progresso intelectual, porém nem
longo tempo e subitamente irrompem desmoro-
sempre a ele se segue. nando instituições, leis e costumes do passado.
O entendimento intelectual torna compre- Nesse conflito entre o passado e o presente
ensível o bem e o mal. Ao desenvolver seu racio- para a construção do futuro, o homem divisa ape -
58 59
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

nas a desordem e a confusão que lhe tocam, no


momento, os interesses materiais. soas esclarecidas, justas e amorosas de maneira a
No entanto, através do próprio mal, Deus que suas ações preponderem sobre a dos maus.
cria o bem. Daí a reforma íntima não ser condição para
isolamento ou alienação, mas compromisso de
As revoluções morais e sociais são condições
união com os outros que têm o mesmo ideal de
para a realização do progresso. São ideias novas,
amor e justiça, agindo deliberada e responsavel-
conceitos novos que se chocam com os existen-
mente a benefício de todos.
tes, os quais já não mais satisfazem as necessida-
des e aspirações. (v. questão n.° 783 do L. E.) Uma sociedade justa se reconhece por seu
desenvolvimento moral. O progresso social não
Encontramos no comentário de Allan Kardec
se mede apenas pelas invenções da ciência ou
à questão n.° 789 de O Livro dos Espíritos, escla-
pelas comodidades materiais oferecidas em ter-
recimento de grande valia sociológica: "A huma-
mos de vestuário e habitação, mas pelo desapa-
nidade progride, por meio dos indivíduos que
recimento dos vícios, da exploração do próprio
pouco a pouco se melhoram e instruem. Quando
ser humano, do egoísmo e do orgulho.
estes preponderam pelo número, tomam a dian-
teira e arrastam os outros. De tempo a tempos, Ao analisar o progresso de duas nações, Allan
surgem no seio dela homens de gênio que lhe dão Kardec assinala algumas características entre uma
impulso; vêm depois, como instrumentos de Deus, e outra a fim de conceituá-las como civilizadas.
os que têm autoridade e, nalguns anos, fazem-na Para ele, civilizada é aquela onde exista menos
adiantar-se de muitos séculos." egoísmo, menos cobiça, e menos orgulho. Onde
Compreende-se, por tudo isso, a importância os hábitos intelectuais e morais sobrepujam os
da participação dos espíritas na sociedade, de uma materiais. Nessa nação haverá mais liberdade de
forma esclarecida e consciente. O espírita precisa inteligência, mais bondade, boa fé, benevolência
conhecer os conceitos e fundamentos da doutrina e generosidade entre seus cidadãos. Consequen-
espírita para, com os meios que lhe sejam pos- temente, nela existirá menos preconceitos de casta
síveis, colocá-los na organização social em que e de nascimento. As leis nenhum privilégio con-
vive. sagram. A justiça não será exercida com parcia-
lidade. O fraco encontra o amparo do forte. A
Para o aprimoramento da sociedade deve-se
vida do homem, suas crenças e opiniões são devi-
trabalhar a fim de aumentar o número das pes-
damente respeitadas. Onde pequeno é o número
60
61
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

dos desgraçados e todo homem de boa vontade lectual e moral da humanidade. Com tal obje-
sabe que não lhe faltará o necessário. tivo devem agir sobre a sociedade humana a fim
É evidente que os valores anteriormente ex- de que haja hábitos espiritualizados, desenvolvi-
postos se constituem em verdadeiros desafios para mento da inteligência, da liberdade, elaboração
implantação em nossa atual sociedade. São metas de leis justas a benefício de todos, amparo ao
do verdadeiro progresso que devem ser alcança- fraco para que ele não seja explorado pelo forte,
das pelas forças do bem. respeito às crenças e opiniões, direito ao neces-
O espiritismo tem sua contribuição para dar, sário a todos (bem comum).
pois basta analisar seus princípios filosóficos para Como fazer isso? Agindo não só no movi-
ver que ele propõe o que a humanidade deseja: mento espírita como, também, de conformidade
o reino da justiça, obstando os abusos que impe- com a vocação e aptidão de cada um, nas organi-
dem o progresso e a moralização das massas. zações e movimentos que, baseados em tais valo-
Disseram os espíritos: "Destruindo o mate- res, procuram estruturar e organizar a sociedade.
rialismo, que é uma das chagas da sociedade, ele
faz que os homens compreendam onde se encon-
tram seus verdadeiros interesses. Deixando a
vida futura de estar velada pela dúvida, o homem
perceberá melhor que por meio do presente lhe é
dado preparar o seu futuro. Abolindo os prejuí-
zos de seitas, castas e cores, ensina aos homens a
grande solidariedade que os há de unir como ir-
mãos". (questão n.° 799 do L.E.)
Ao estabelecer a fraternidade e a solidarie-
dade entre os homens, o espiritismo faz com que
os horizontes do entendimento humano se am-
pliem para muito além do egoísmo e do orgulho.
Como vemos, a proposição espírita da Lei do
Progresso é um intenso e profundo desafio aos
espíritos para que trabalhem pelo progresso inte-

62 63
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

9 Artigo 2.° — (1) — Todo homem tem capa-


cidade para gozar dos direitos e das liberdades
estabelecidas nesta Declaração, sem distinção de
qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua,
religião, opinião pública ou de outra natureza,
ESPIRITISMO E IGUALDADE origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou
qualquer outra condição.
(2) — Não será também feita nenhuma dis-
tinção fundada na condição política, jurídica ou
De conformidade com o disposto na questão internacional do país ou território a que pertença
n.° 803 de O Livro dos Espíritos, perante Deus uma pessoa, quer se trate de um território inde-
todos os homens são iguais, pois todos tendem pendente, sob tutela, sem governo próprio, quer
para o mesmo fim e Deus fez suas leis para todos. sujeito a qualquer outra limitação de soberania."
Anos após a publicação de O Livro dos Observamos que os conceitos estabelecidos
Espíritos, a 18 de abril de 1857, seria aprovada a em O Livro dos Espíritos foram ampla e profun-
Declaração Universal dos Direitos do Homem, em damente reconhecidos pela humanidade, no seu
10 de dezembro de 1948. mais belo texto do pensamento jurídico.
Diz seu preâmbulo: De forma concreta, essa igualdade é reco-
"Considerando que o reconhecimento da dig- nhecida, no Brasil através da Constituição da Re-
nidade inerente a todos os membros da família pública Federativa do Brasil, com a Emenda
humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é Constitucional n.° 1, de 17 de outubro de 1969,
o fundamento da liberdade, da justiça e da paz em seu artigo 153:
do mundo: "A Constituição assegura aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à
Artigo 1.° — Todos os homens nascem livres segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
e iguais em dignidade e direitos. São dotados de § 1.° — Todos são iguais perante a lei, sem
razão e consciência e devem agir em relação uns distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso
aos outros com espíritos de fraternidade. e convicções políticas."
64 65
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

Desigualdade de Aptidões: Desigualdade Social: Obra do Homem


Base para Auxílio Mútuo
A questão n.° 806 da já citada obra explicita
Embora a igualdade natural entre todos os que a desigualdade das condições sociais não é
homens, manifestada pelo espiritismo e reconhe- lei da natureza. "É obra do homem e não de
cida no plano jurídico pela humanidade, é inques- Deus".
tionável a desigualdade das aptidões. Consequentemente, o espírita não deve com-
Esclarecem os espíritos que Deus criou todos pactuar com toda situação que promova a desi-
os seres humanos iguais, no entanto, cada um gualdade entre os homens: a riqueza e a pobreza,
vive há mais ou menos tempo, logo têm mais ou o luxo e a miséria, o elitismo intelectual e a igno-
menos experiências. A diferença entre eles refle- rância. Deve lutar contra o egoísmo e o orgulho,
te justamente a diversidade dos graus de expe- identificando os múltiplos disfarces com que eles
riência que já possuem e da vontade com que se apresentam. Apoiará os movimentos que obje-
ajem. tivem a igualdade dos direitos humanos, reconhe-
Por isso Allan Kardec considerou que a diver- cendo apenas como válida a desigualdade pele
sidade das aptidões entre os homens não se ori- merecimento decorrente do grau de aprimora-
gina da natureza íntima da sua criação, porém da mento intelectual e espiritual.
evolução alcançada pelos espíritos que neles te- Advertiram os espíritos na questão n.° 807
nham encarnado. Deus dotou os seres de facul- de O Livro dos Espíritos: "Merecem anátema! Ai
dades iguais e as diferenças de aptidões servem deles!" ("os que abusam da superioridade de suas
para que espíritos com maior soma de experiên- posições sociais para, em proveito próprio, opri-
cias possam auxiliar o progresso daqueles que mir os fracos"). Alertam, ainda, que se eles esca-
ainda têm menor quantidade de experiências, parem da justiça humana, aguarda-os a Justiça
estabelecendo, assim, o fundamento da caridade Divina, pois serão, por sua vez, oprimidos e re-
que a todos deve unir. encarnarão em uma existência em que sofrerão
tudo aquilo que fizeram os outros sofrerem.
O espiritismo brada veemente contra a
opressão social, demonstrando a necessidade de se
agir por um mundo de Amor e Justiça.

66 67
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

bem-estar que os espíritos propuseram: a possibi-


Bem-Estar para Todos lidade de cada um empregar seu tempo (sua dis-
ponibilidade de vida), como lhe apraza.
Para a doutrina espírita, a desigualdade das Isso não será possível enquanto grande parte
riquezas pode se originar na desigualdade das das pessoas estiver submetida à opressão, à explo-
faculdades, como também pode ser fruto da ve- ração, à injustiça dos que desejam manter ou pos-
lhacaria e do roubo. suir a riqueza o mais depressa possível.
Mesmo a riqueza herdada, nem sempre tem A riqueza, sob o aspecto ético ou moral, ja-
uma origem pura. Pode ter surgido da espolia- mais deverá originar, manter ou estimular a ex-
ção ou da injustiça. Além do mais, ainda que a ploração do homem pelo homem.
origem seja boa, a cobiça da riqueza e o desejo
de possuí-la o mais depressa possível, em detri- Diz o espiritismo: "Os homens se enten-
mento dos outros, não são sentimentos louváveis. derão quando praticarem a lei da justiça". E isso
será possível quando os direitos humanos forem
Considerando a diversidade das faculdades
devidamente respeitados pelas sociedades polí-
intelectuais e os caracteres, isso não é impedi-
ticas em que o homem vive.
mento à igualdade de bem-estar.
Na conceituação espírita, o bem-estar é rela- É verdade que, muitas vezes, a pessoa cai na
tivo e todos poderiam desfrutá-lo se houvesse um miséria por sua própria culpa, no entanto, a socie-
entendimento conveniente, pois o verdadeiro bem- dade tem responsabilidade, pois ela deve velar
estar existe quando a pessoa pode aplicar seu pela educação moral de seus membros e, quase
tempo conforme sua vontade. Assim, ninguém sempre, é a má educação que lhe falseia o crité-
executaria um trabalho para o qual não tem gosto. rio ao invés de oferecer meios educacionais para
Como as aptidões e vocações são diferentes, ne- remover suas más tendências.
nhum trabalho ficaria sem ser feito. Portanto, a influência do meio social é muito
Se a igualdade das riquezas não é possível, grande sobre as pessoas impondo-lhes critérios e
possível é o bem-estar. Logo, é importante que valores materialistas ou espiritualistas, refletindo
cada ser humano tenha as condições mínimas orgulho e egoísmo ou amor e justiça, conforme a
para desenvolver suas potencialidades. Precisa direção que tenha tal sociedade.
ter alimento, abrigo, saúde, educação e lazer. No atual estágio de evolução espiritual, a
Poderá, então, atingir o mais elevado grau de
69
68
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

riqueza, o poder e a miséria constituem provas Isso não permite pensar logicamente numa
pelas quais os espíritos experimentam-se. inversão tão simplista como querem alguns: "O
A miséria pode gerar a revolta, a dependên- pobre de hoje é o rico de ontem". Trata-se de
cia, a indolência facilita a iniciação nos vícios, na uma acomodação injusta diante de uma sociedade
prostituição e na delinquência. A riqueza incita dirigida, ainda, pelo egoísmo e pelo orgulho.
a todos os excessos, torna o homem egoísta, orgu- Acomodação que deturpa o sentido da reencarna-
lhoso, insaciável, explorador, facilitando também ção, conforme o conceito que lhe é dado pelo
a dependência aos vícios. espiritismo.
Portanto, a justiça deve exercer sua tutela a
fim de cada um tenha o que é seu direito.
Não se pode, desta forma, justificar com os
conceitos espíritas .a miséria como sendo apenas
prova ou expiação de espíritos que foram ricos e
poderosos no passado.
A própria evidência sociológica demonstra o
absurdo de tal generalização. O orgulho e o
egoísmo de homens e instituições é que têm ditado
a miséria e a pobreza sobre a face da terra.
Alguns espíritos que fracassaram na prova
da riqueza podem ter escolhido a expiação da
pobreza para se reeducarem, como alguns espíri-
tos podem ter escolhido a provação da riqueza
para exercitar suas aquisições no campo do amor,
da justiça e da humildade.
A miséria sempre foi muito maior do que a
riqueza, em todos os tempos vividos pela huma-
nidade, até a presente época. Os ricos têm sido
minoria e os pobres maioria, numa grande des-
proporção.

70 71
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

10 igualdade. Onde houver uma convivência fra-


terna, exteriorizada em amor e respeito, acatando-
se o direito do próximo, haverá a prática da jus-
tiça e conseqüentemente existirá liberdade.
O egoísmo, que tudo quer para si, e o orgu-
ESPIRITISMO E LIBERDADE
lho, a expressar o desejo de domínio, são inimigos
da liberdade.
Allan Kardec comenta: "A liberdade pres-
supõe confiança mútua. Ora, não pode haver con-
Para o espiritismo, o homem não goza de fiança entre pessoas dominadas pelo sentimento
absoluta liberdade quando vivendo em sociedade, exclusivista da personalidade. Não podendo cada
porque uns precisam dos outros. uma satisfazer-se a si própria senão à custa de
Estando juntos, ainda que dois homens, ha- outrem, todas estarão constantemente em guarda
verá entre eles direitos recíprocos que lhes cum- umas com as outras. Sempre receosas de perderem
pre respeitar. o que chamam seus direitos, a dominação consti-
Também a doutrina espírita condena o do- tui a condição mesma da existência de todas pelo
mínio de um homem pelo outro, por entender que armarão continuamente ciladas à liberdade
contrária à Lei de Deus a sujeição de uma pes- e a coarctarão quanto puderem." (in Obras
soa pela outra. Alerta que a escravidão é um Póstumas, cap. Liberdade, Igualdade e Fraterni-
abuso da força e tende a desaparecer com o dade).
progresso.
O progresso tem-se feito e atualmente a es- Observamos como é importante desenvolver
cravidão está quase abolida sobre a face do a liberdade nas formas individual e coletiva, pois
planeta. Contudo, há formas mais sutis de escra- ela implica em condição de crescimento dentro
vidão: o despotismo no lar, a exploração do tra- da vida. Por outro lado, dois grandes obstáculos
balho humano, o aviltamento do salário do tra- impedem o exercício da liberdade: o egoísmo e o
balhador, a sonegação dos direitos trabalhistas orgulho.
(inclusive à empregada doméstica). O espírita deve combater o orgulho e o egoís-
A liberdade depende da fraternidade e da mo em si mesmo e na sociedade em que vive.

72 73
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

A liberdade não se confunde com devassidão Para o espiritismo, os meios fazem parte dos
que solta as rédeas dos instintos. fins; não se pode pretender o amor, a justiça, a
É importante para o homem o desenvolvi- liberdade, agindo por meios violentos, odiosos, in-
mento de sua capacidade de pensar, pois é atra- justos e coativos.
vés dela que ele poderá conhecer-se a si mesmo Esse conceito de liberdade deve levar o espí-
e ao mundo em que vive. Pelo pensamento o rita à ação para implantar o bem na sociedade em
homem desfruta de liberdade ilimitada, o que que vive para que o mal gradativamente desapa-
deverá ajudá-lo nesse conhecimento. Esse enten- reça. Para isso é preciso atuar conscientemente,
dimento deve amparar-lhe a ação no sentido de, com amor e determinação.
através da liberdade, desenvolver a fraternidade, É de se analisar, também, em termos de liber-
a igualdade, a justiça e o amor. dade que grande parte das pessoas acha-se sub-
Consoante instrução do espiritismo, não se metida à pressão do meio social, às regras e cos-
reconhece a ninguém o direito de pôr embaraços tumes.
à liberdade de consciência. Muitas pessoas assumem vícios porque que-
Alerta, ainda, que constranger os homens a rem agradar à maioria com quem convivem. Ge-
procederem em desacordo com a sua maneira de ralmente levado pela pressão do grupo e a neces-
pensar, é torná-los hipócritas. sidade de sentir-se aceito, o jovem começa a fu-
A liberdade de consciência é uma caracterís- mar, a ingerir bebidas alcoólicas e até a usar os
tica da civilização em seu mais avançado estágio tóxicos. Nestes casos torna-se evidente a neces-
de progresso. sidade de romper com a pressão social.
Todavia, é evidente que uma sociedade para É verdade que muitas vezes os costumes
manter o equilíbrio, a harmonia, e o bem-estar sociais impelem o homem de seguir um caminho
precisa estabelecer normas, leis e regulamentos que essencialmente não é bom para ele, embora
portadores de sanções. A título de respeitar a se submeta pelo chamado respeito humano. Con-
liberdade de consciência não vai-se admitir a pro- tudo, desde que haja uma adesão livre, pelo me-
pagação de ideias e doutrinas prejudiciais à socie- nos em termos de opção, a pessoa assume a res-
dade. Nada se lhes deve opor através da violên- ponsabilidade de seus atos perante as leis de Deus
cia e da força, mas através dos princípios de e arcará com as consequências por suas infrações.
direito. Conclui-se, pois, que a própria convivência

74 75
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

do homem em sociedade impõe-lhe limites à liber-


dade. Tal relacionamento atribui-lhe direitos e
impõe deveres. 11
Portanto, a liberdade não pode ser confundida
com a irresponsabilidade.
Por outro lado, não são justas e cristãs as
organizações sociais que tolhem a liberdade de A JUSTIÇA, O AMOR E A
desenvolvimento do homem. CARIDADE NA FILOSOFIA ESPÍRITA

N ' O Livro dos Espíritos há a informação


de que o sentimento da justiça está na natureza,
pois o homem se revolta à simples ideia de uma
injustiça.
O progresso moral desenvolve esse senti-
mento, mas ele existe em estado latente ou rudi-
mentar nos seres humanos, dependendo do está-
gio evolutivo que já alcançaram. É por isso que,
mesmo em pessoas simples e não intelectualiza-
das muitas vezes se encontram noções claras
sobre a justiça.
Para o espiritismo, justiça é: cada um res-
peitar os direitos dos demais. Também para ele,
duas coisas determinam tais direitos, a lei humana
e a lei natural. Esclarece, no entanto, que as leis
humanas são formuladas de conformidade com
os costumes e caracteres de uma determinada
época e sociedade, por isso são mutáveis. Essas
leis regulam algumas relações sociais, ao passo

76 77
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

que a lei natural rege até mesmo o que ocorre no Por isso o espírita deve estar atento para a
foro da consciência de cada um. prática de tal preceito, como também colaborar
A doutrina espírita declara que a base da para sua divulgação junto à sociedade em que
justiça, segundo a lei natural, está consolidada vive, pelos meios que lhe sejam possíveis.
na afirmação do Cristo: queira cada um para os Vale ressaltar que o relacionamento social
outros o que quereria para si mesmo. traz para o homem determinadas obrigações
O mais amplo sentido da justiça está ins- sendo que umas das primeiras é a de respeitar
culpido na consciência humana que impulsiona o os direitos de seus semelhantes. Quem respeita
ser humano a defender seus direitos, como tam- esses direitos procede com justiça. É justamente
bém a respeitar o direito alheio. pela falta de justiça que há confusão e perturba-
Ao ficar em dúvida quanto à maneira de ção na sociedade humana.
agir para não ser injusto com seu próximo, o ho- Dentre os direitos de que o ser humano dis-
mem deve auscultar a própria consciência e inda- põe destaca o espiritismo que o primeiro de todos
gar-se se gostaria que agissem com ele da mesma é o direito de viver. Isto está fundamentado na
forma. resposta à questão n.° 880 de O Livro dos Espí-
Para Allan Kardec, em todos os tempos e ritos: "Por isso é que ninguém tem o direito de
sob a orientação de todas as crenças, o homem atentar contra a vida de seu semelhante, nem
sempre se esforçou a fim de que prevalecesse o fazer o que quer que possa comprometer-lhe a
seu direito pessoal. No entanto, a religião cristã existência corporal".
tomou o direito pessoal por base do direito do Comprende-se que as afirmações "atentar
próximo. contra a vida" e "comprometer-lhe a existência"
Portanto, o exercício da justiça não exige do são muito amplas, envolvendo tudo aquilo que seja
homem a cultura jurídica ou a formação acadê- prejudicial à vida humana física e espiritual.
mica; basta consultar sua consciência se o que ele Toda ação que atente contra a vida não deve ser
deseja para os outros é o que desejaria para si praticada pelo espírita, bem como a esse tipo de
mesmo. Aplicando tal postulado, facilmente se ação ele deverá se opor, onde observe sua mani-
implantaria a justiça sobre a face da Terra e o festação.
amor seria o clima normal do relacionamento Também o direito de propriedade tem uma
humano. influência muito grande na sociedade humana.
78 79
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

Procurando a correspondência entre o direito dade, o espírita deve estar atento, a fim de que
de viver e o direito de propriedade, o espiritismo não seja injusto e egoísta no mundo em que vive.
propõe: o homem tem o direito de acumular
bens, mas deve fazê-lo em família, como abelha, Verdadeiro Sentido da Caridade
por meio de um trabalho honesto. Deve-se aten-
tar que acumular bens em família implica em res- "Qual o verdadeiro sentido da palavra cari-
tringir bastante o sentido de propriedade, pois em dade, como a entendia Jesus?
família não se pode gerir grandes propriedades e — Benevolência para com todos, indulgên-
muito menos impérios econômicos. cia para as imperfeições dos outros, perdão das
Consequentemente, a acumulação de bens ofensas." (questão n.° 886 do L. E.).
não deve abarcar o supérfluo, nem ser produto O Espiritismo nos diz que o amor e a caridade
da ação egoísta (exploração do próximo) e o tra- completam a lei da justiça, pois quando amamos
balho, gerador dos bens, deve ser honesto. o próximo desejamos fazer-lhe todo o bem que
nos seja possível, da mesma forma como gosta-
Afirma o espiritismo que: "propriedade legí-
ríamos que nos fosse feito. Sob tal enfoque, afir-
tima só é a que foi adquirida sem prejuízo de
mou Jesus: "Amai-vos uns aos outros".
outrem". Em seu comentário, diz Allan Kardec:
Segundo Jesus, a caridade não se restringe à
"Proibindo-nos que façamos aos outros o que não
esmola, ela abrange todo o relacionamento hu-
desejáramos que nos fizessem, a lei do amor e da
mano.
justiça nos proíbe, ipso jacto, a aquisição de bens
por quaisquer meios que lhe sejam contrários". É de se ver a amplitude que, assim, assume
a caridade, impondo para seu aparecimento o
De outra parte, a doutrina espírita não aco- exercício da lei de justiça.
lhe como ilimitado o direito de propriedade. Sub- Depreende-se, pois, que sem justiça não há
mete esse direito à legitimidade e à justiça. Alega caridade.
que a legislação humana é imperfeita e consagra Na questão n.° 888 de O Livro dos Espíritos
muitos direitos convencionais que a lei natural de encontramos: "Condenando-se a pedir esmola, o
justiça reprova, por isso essa legislação está em homem se degrada física e moralmente: embru-
constante modificação. tece-se. Uma sociedade que se baseie na lei de
Com essa visão, sobre o direito de proprie- Deus e na justiça deve prover à vida do fraco,

80 81
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

sem que haja para ele humilhação. Deve assegu-


rar a existência dos que não podem trabalhar,
12
sem lhes deixar a vida à mercê do acaso e da
boa vontade de alguns". (g. n.)
Ressalta, assim, aos espíritas a imperiosidade O APRIMORAMENTO DO SER
de trabalhar para que a sociedade se baseie, cada
vez mais na lei de Deus e na justiça, a fim de que HUMANO NA ÉTICA ESPÍRITA
o direito à vida, à dignidade e ao respeito humano
seja reconhecido a todos indistintamente.
É indispensável que, embasado nos princí- Sendo uma doutrina evolucionista, o espi-
pios espíritas, trabalhe-se para remover as causas ritismo revela a necessidade do aprimoramento
geradoras da miséria, da ignorância e dos vícios. do homem como condição indispensável à sua
Alertam os espíritos que mesmo os que men- própria felicidade. Este aprimoramento tange
digam por própria culpa, poderiam não ter caído tanto à parte intelectual quanto à moral.
em excessos causadores de sua perdição se hou- Se o homem vem se desenvolvendo de forma
vessem recebido uma boa educação moral. admirável quanto à inteligência, o mesmo não
está acontecendo quanto ao sentimento. Por isso,
parece válido que se preocupe com os meios pelos
quais o ser humano possa acelerar seu aprimora-
mento moral. Os empecilhos a essa marcha as-
cencional são os vícios.
Segundo o espiritismo, o pior desses vícios
é o egoísmo. Dele derivam todos os males, pois
como base deles sempre se encontra o egoísmo.
Portanto, é muito importante que se procure com-
batê-lo em suas causas, e a principal é a pessoa
colocar-se como o centro da vida, querendo que
tudo o mais gire em torno dela.
O egoísmo expressando-se através de uma

82 83
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

pessoa, ou de grupos de pessoas, é o sentimento lado, denunciam claramente a necessidade de se


centralizador do interesse próprio em detrimento transformarem as instituições humanas que ge-
dos outros. ram, motivam e estimulam o egoísmo.
O egoísta coloca-se como centro da vida e O procedimento adequado a se intentar essa
do universo. As coisas e os seres devem estar em transformação é a educação no sentido amplo, ou
função dele. Seus interesses prevalecem sobre os seja, a conscientização e prática individual e cole-
demais. A pessoa egoísta não reconhece a igual- tiva dos princípios da justiça, da igualdade, da
dade, a justiça, a liberdade e o amor; para satisfa- liberdade, do amor e da caridade.
zer-se não titubeia em tripudiar sobre o direito Sobre as admiráveis consequências da supe-
do próximo. ração da fase do egoísmo por parte dos homens,
No entanto, o egoísmo não é um mal indivi- previram os espíritos que eles viverão como ir-
dual, embora profundamente alicerçado no inte- mãos, auxiliando-se reciprocamente expressando
resse pessoal. o sentimento de solidariedade. O forte será o
Preocupado com seu enquistamento no ser amparo e não o opressor do fraco. Todos terão o
humano, perquiriu Allan Kardec: "Fundando-se necessário, pois praticarão a lei da justiça.
o egoísmo no sentimento do interesse pessoal, bem
difícil parece extirpá-lo no coração humano. Che- Visão do Futuro
gar-se-á a consegui-lo?
— À medida que os homens se instruem Para que a humanidade atinja tal estágio, o
acerca das coisas espirituais, menos valor dão às espiritismo oferece também sua contribuição.
coisas materiais. Depois, necessário é que se re- Não há dúvida de que a visão futura apre-
formem as instituições humanas que o entretem e sentada constitui importante e sério desafio aos
excitam. Isso depende da educação." (questão homens de boa vontade e dentre estes, aos espí-
nº 914 do L. E. - g.n.). ritas.
A orientação é no sentido de que a compre- O desenvolvimento da solidariedade não per-
ensão da vida espiritual liberta o homem da escra- mitirá a existência de oprimidos, pois ela traz im-
vização às coisas materiais, isto é, elas deixam de plícita a prática da justiça.
ser um fim em si mesmas para se tornarem ins- O espiritismo indica como meio de destruir
trumentos do seu progresso espiritual. Por outro o egoísmo a predominância dos valores morais
84 85
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

sobre os interesses da vida material para o gozo dor, continua a ser a chaga social. É um mal
individualista. No entanto, isso não é fácil, pois real, que se alastra por todo mundo e o do qual
sua influência se prende à matéria, ou mais espe- cada homem é mais ou menos vítima. Cumpre,
cificamente, do instinto de conservação. Como o pois, combatê-lo, como se combate um enfermi-
homem ainda está muito próximo de sua origem dade epidêmica". (Comentário à questão n.° 917
(animal), conforme a explicação evolutiva do do L. E. — g.n.)
espiritismo, essa influência, ainda, é muito grande
É evidente que nesse combate torna-se impe-
sobre ele. Decorrente do estágio evolutivo da
riosa a análise das "chagas da sociedade", ou seja,
parte da humanidade, as leis, a organização social,
de órgãos, de instituições, organizações, sistemas
o próprio conteúdo dos programas educacionais
econômicos e políticos que entretecem e excitam
ajudam a manter esse terrível sentimento.
o egoísmo de forma individual ou coletiva.
O homem deseja ser feliz e para isso procura Mais uma vez fica claro que o aprimora-
remover tudo aquilo que ele identifica como obs- mento do ser humano não pode ser feito apenas
táculo a tal fim. O próprio progresso intelectual com a auto-educação como processo de isola-
é resultante desse objetivo, ampliando-lhe as co- mento e não participação consciente dentro da
modidades no lar, nas viagens, no trabalho, enfim sociedade.
em sua vida social. À medida em que ele identi- Se há virtude no combate ao egoísmo, é pre-
fique no egoísmo uma causa geradora da sua infe- ciso que esta não seja uma postura apenas de
licidade individual e coletiva, ele também pro- exterioridade revelando "aparências". Há virtu-
curará remover esse obstáculo. de quando se consegue romper o egoísmo pelo
É imperioso, pois, que se combata o egoísmo, indo altruísmo.
às causas que o geram no homem e nas instituições. Não se confunda o "amor a si mesmo" com o
egoísmo.
Nessa linha de raciocínio, comenta Allan Aquele que ama a si mesmo tem zelo, cui-
Kardec: "Louvável esforços indubitavelmente se dado, atenção e interesse por si mesmo; deseja o
empregam para fazer que a humanidade pro- próprio crescimento espiritual, esforçando-se por
grida. Os bons sentimentos são animados, esti- desenvolver o amor e a sabedoria. Respeita o
mulados e honrados mais do que em qualquer corpo físico como maravilhoso instrumento que
outra época. Entretanto, o egoísmo, verme roe- Deus lhe concedeu para a vivência no plano físico
86 87
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

a fim de colher experiências que lhe são neces-


sárias. Quem ama a si mesmo tem melhores con- 13
dições de amar o próximo.
Há uma diferença fundamental entre aquele
que ama a si mesmo e o egoísta. Quem ama a si
mesmo procura tudo o que é útil e bom para si, A AÇÃO SOCIAL ESPIRITA
sem prejuízo do seu próximo; o egoísta coloca-se
como o centro da vida e busca tudo para si, mes-
mo em detrimento dos direitos do próximo.
Por todos os conceitos e princípios contidos
em O Livro dos Espíritos, até aqui analisados,
observamos quanto essas ideias regeneradoras
tocam a sociedade humana em sua estrutura, or-
ganização e funcionamento. Conceitos que em
todas as circunstâncias e situações concretizam a
aplicação da verdade, da justiça e do amor.
Há, pois, uma inequívoca contribuição polí-
tica, sob o aspecto filosófico que o espiritismo
oferece à sociedade humana, a fim de que ela se
estruture, organize e funcione em termos de ver-
dade, justiça e amor. Disseram os espíritos:
"Quando bem compreendido, se houver identifi-
cado com os costumes e as crenças, o espiritismo
transformará os hábitos, os usos, as relações so-
ciais". (questão n.° 917 do L. E. — g. n.).
Preocupado com a possível felicidade huma-
na, Allan Kardec questionou: "A felicidade ter-
restre é relativa à posição de cada um. O que
basta para a felicidade de um, constitui a des-
88 89
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

graça de outro. Haverá, contudo, alguma soma resultado do meio onde se acha colocado. Quan-
de felicidade comum a todos os homens?" A do praticar a lei de Deus, terá uma ordem social
resposta dada pelos espíritos, em sua primorosa fundada na justiça e na solidariedade e ele pró-
síntese, encerra não só lúcido esclarecimento, prio também será melhor".
como um grande desafio à efetiva participação Em A Gênese, também de Allan Kardec, en-
dos espíritas para promoção da felicidade, ao contramos no capítulo XVIII, itens 24 e 25: "A
afirmarem: "Com relação à vida material é a nova geração marchará, pois, para a realização de
posse do necessário. Com relação à vida moral, todas as ideias humanitárias compatíveis com o
a consciência tranquila e a fé no futuro". (g. n. grau de adiantamento a que houver chegado.
questão n.° 922 do L. E.). Avançando para o mesmo alvo e realizando seus
Ampliando esclarecimentos na questão n.° objetivos, o espiritismo se encontrará com ela no
927 da mesma obra, aditaram: "Verdadeiramen- mesmo terreno. Aos homens progressistas se de-
te infeliz o homem só o é quando sofre da falta do parará nas ideias espíritas poderosas alavancas e
necessário à vida e à saúde do corpo". o espiritismo achará, nos novos homens, espíritos
É de se entender, então, que o espírita tem inteiramente dispostos a acolhe-lo. Dado esse
uma ação social, pois deve estar atento à prática estado de coisas, que poderão fazer os que enten-
da justiça e do amor a fim de que todos tenham dam de opor-se-lhe?
a posse do necessário e a saúde do corpo, o que O espiritismo não cria a renovação social; a
necessariamente implica em propugnar para que madureza da humanidade é que fará dessa reno-
todos tenham alimentação adequada, vestuário, vação uma necessidade. Pelo seu poder morali-
habitação, educação, assistência médica, remédio, zador, por suas tendências progressistas, pela am-
educação sanitária e até mesmo lazer. plitude de suas vistas, pela generalidade das ques-
Advertiram os espíritos na questão n.° 930 tões que abrange, o espiritismo é mais apto, do
do livro em estudo: "Numa sociedade organi- que qualquer outra doutrina, a secundar o movi-
zada segundo a lei do Cristo, ninguém deve mor- mento de regeneração; por isso é ele contempo-
rer de fome". Adita Allan Kardec: "Com uma râeno desse movimento. Surgiu na hora em que
organização social criteriosa e previdente, ao podia ser de utilidade, visto que também para ele
homem só por sua culpa pode faltar o necessário. os tempos são chegados". (g. n.)
Porém, suas próprias faltas são frequentemente
90 91
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

divíduos, haja 25 bons e 75 maus; destes últimos,


Atuação dos Bons 50 se contam que o são por fraqueza e que seriam
bons, se observassem bons exemplos e, sobretudo,
Portanto, o espírita deve estar atento na con- se tivessem sido bem encaminhados desde a in-
cretização da doutrina espírita na sociedade, fância; dos 25 maus, nem todos serão incorrigí-
apesar dos obstáculos e dificuldades semeados veis.
pelo egoísmo e pelo orgulho de pessoas e grupos.
No estado atual das coisas, os maus estão
No entanto, o próprio espiritismo demonstra
em maioria e ditam a lei aos bons. Suponhamos
a possibilidade e a eficácia dessa ação, conforme
que uma circunstância qualquer opere a conver-
preconiza seu codificador: "Digamos, antes de
são de 50 por cento deles: os bons ficarão em
tudo, que os bons, na Terra, não são absoluta-
maioria e a seu turno ditarão a lei; dos 25 outros
mente tão raros como se julga; que os maus são
francamente maus, muitos sofrerão a influência
numerosos, é infelizmente verdade; o que, porém,
daqueles, restando apenas alguns incorrigíveis sem
faz eles parecerem ainda mais numerosos é que
preponderância". (Obras Póstumas, Allan Kar-
têm mais audácia e sentem que essa audácia lhes
dec, cap. As Aristocracias — g. n.).
é indispensável ao bom êxito. De tal modo, en-
tretanto, compreendem a preponderância do bem, Constatamos, nesse trecho, a imperiosidade
que, não podendo praticá-lo, com ele se mascaram. da participação dos bons na organização da socie-
dade em bases de justiça e amor. Também está
Os bons, ao contrário, não fazem alarde das claro a importância da influência do "meio am-
suas boas qualidades; não se põem em evidência, biente" sobre a maioria e como a melhoria da
donde o parecerem tão pouco numerosos. Pes- sociedade está ligada preponderantemente à ação
quisai, no entanto, os atos íntimos praticados sem social eficaz dos bons. Por íntima necessidade, o
ostentação e, em todas as camadas sociais, depa- espírita a estes deverá estar ligado.
rareis com criaturas de natureza boa e leal em
Porém, como arguto pensador, indagou Allan
número bastante a vos tranquilizar o coração, de
Kardec: "Por que, no mundo, tão amiúde, a in-
maneira a não desesperardes da humanidade.
fluência dos maus sobrepuja a dos bons? A res-
Depois, cumpre também dizê-lo, entre os maus,
posta foi precisa e franca: "Por fraqueza destes.
muitos há que apenas o são por arrastamento e
Os maus são intrigantes e audaciosos, os bons são
que se tornariam bons, desde que submetidos a
tímidos. Quando estes o quiserem, prepondera-
uma influência boa. Admitamos que, em 100 in-
93
92
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

rão". (questão n.° 932 do L. E. — g. n.). Jun- e se constituem nas raízes dos males que, etica-
tamente com outros bons os espíritas devem que- mente, ainda afligem a humanidade.
rer exercer influências que sobrepujem a dos Perquiria Allan Kardec: "Será possível a des-
maus. truição do orgulho e do egoísmo?" Respondere-
Portanto, o espírita tem que participar e mos alto e terminantemente: SIM. Do contrário,
influenciar na sociedade em que vive, procurando forçoso seria determinar um ponto de parada ao
levar às instituições que a estruturam os valores e progresso da humanidade. Que o homem cresce
normas do espiritismo. Isso é uma participação em inteligência, é fato incontestável; terá ele che-
política. Não pode se preocupar apenas com a gado ao ponto culminante, além do qual não possa
reforma íntima, isolando-se em um "oásis de in- ir? Quem ousaria sustentar tão absurda tese?
diferentismo" pela sociedade em que vive. É ver- Progride ele em moralidade? Para responder a
dade que essa ação política conflitará com os inte- esta questão, basta se comparem as épocas de um
resses dos egoístas e orgulhosos, individualmente mesmo país. Por que teria ele atingido o limite
ou em grupos. do progresso moral e não o do progresso intelec-
tual? Sua aspiração por uma melhor ordem de
Assim, essa ação política deve objetivar o coisas é indício da possibilidade de alcançá-la.
bem comum. Aqueles que pretendem o bem não Aos que são progressistas cabe acelerar esse movi-
podem se omitir e essa participação liga-se pro- mento por meio do estudo e da utilização dos
fundamente com a caridade, pois amar é querer meios mais eficientes, (in Obras Póstumas, Allan
o bem. Kardec, cap. Liberdade, Igualdade, Fraternidade
Destarte, a expressão política do amor é que- — último parágrafo).
rer fazer o bem para todos.
A participação do espírita, inclusive do jo-
vem, no processo político, social, cultural e eco-
nômico deve ser consciente e responsável, tendo
como diretriz os princípios e normas contidas em
O Livro dos Espíritos.
Sabemos que é preciso agir contra o egoísmo
e o orgulho que se instalam em pessoas e grupos
94 95
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

14 1.4. apoiar políticos que se dizem espíritas


ou cristãos, mas aprovam as injustiças, as barga-
nhas, a "politicagem" (usar a política partidária
para interesses egoísticos pessoas ou de grupos a
que se ligam);
PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DO ESPIRITA 1.5. participar da política partidária ape-
nas por interesse pessoal, para melhorar a sua vida
e de sua família, divorciado em sua militância
político-partidária dos princípios e normas da
filosofia espírita;
Desta análise sintética dos princípios e fun-
damentos do espiritismo, com base em O Livro 2. COMO O ESPÍRITA DEVE ATUAR
dos Espíritos, e suas correlações com a filosofia, NA POLÍTICA:
sociologia e política e a visão de que o homem 2.1. O espírita pode e deve estudar e refle-
no mundo "é um ser social e consequentemente, xionar sobre os princípios político-filosófico-espí-
um ser político", concluímos: ritas no Centro Espírita, pois eles estão contidos
em O Livro dos Espíritos, Parte Terceira, das
1. COMO O ESPÍRITA NÃO DEVE
Leis Morais;
ATUAR NA POLÍTICA: 2 . 2 . através da análise, do estudo e da re-
1.1. levar a política partidária para den- flexão das normas e princípios acima referidos, o
tro do Centro, das Entidades ou do Movimento espírita deve identificar o egoísmo, o orgulho e a
Espírita; injustiça nas instituições humanas, denunciando-
1.2. utilizar-se de médiuns e dirigentes es- as e agindo para que elas desapareçam da socie-
píritas para apoiar políticos partidários candida- dade humana;
tos a cargos eletivos aos Poderes Executivos e 2 . 3 . confrontar os fundamentos morais e
Legislativo; objetivos do espiritismo com os fundamentos
1.3. catar votos para políticos que, às ve- morais e objetivos dos partidos políticos, verifi-
zes, dão alguma "verbinha" para asilos, creches cando de forma coerente qual ou quais deve
e hospitais, mas cuja conduta política não se afina apoiar e até mesmo participar como membro
com os princípios éticos ou morais do espiritismo; atuante, se tiver vocação para tal;

96 97
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

2 . 4 . participar de organizações e movi- 2 . 7 . participar conscientemente da ação


mentos que propugnem pela Justiça, pelo Amor, política na sociedade, sem relegar o estudo e a
pelo progresso intelectual, moral e físico das pes- reflexão do espiritismo a plano secundário. Pelo
soas. Exemplo: clubes de serviços, sindicato, as- contrário, o estudo e a reflexão dos temas espíritas
sociações de classe, diretório acadêmico, movi- deverão levá-lo a permanente participação, obje-
mentos de respeito e defesa dos direitos huma- tivando-a aplicação concreta do amor e da justiça
nos e t c ; ao ser humano, seja individual ou coletivamente.
2 . 5 . fazer do voto um elevado testemunho
de amor ao próximo;
Considerando que a sociedade humana é
dirigida por políticos que saem das agremiações
partidárias e suas influências podem ajudar ou
atrasar a evolução intelecto-moral da humani-
dade, o voto, realmente, é uma forma de expri-
mir o amor ao próximo e à coletividade.
Deve, pois, analisar se a conduta do candi-
dato político-partidário tem maior ou menor re-
lação com os princípios morais e políticos (as-
pecto filosófico) do espiritismo;
2 . 6 . participar da agremiação partidária,
se tiver vocação para tal, sabendo, no entanto,
da responsabilidade que assume nesse campo, já
que sua militância deve sempre estar voltada
para o interesse do ser humano, em seus aspec-
tos social e espiritual. Para isso, sua ação polí-
tica deverá estar em harmonia com os valores
éticos (morais) do espiritismo que, em última
análise, são fundamentalmente os mesmos do
cristianismo;
98 99
Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita

Capítulo 12: Questões n.°s 893, 913 a 917


Capítulo 13: Questões n.°s 917, 922, 927, 930 e
932
2. KARDEC, Allan. A Gênese, tradução de Guil-
lon Ribeiro. 14. a ed. Editora Federação Espírita Brasileira.
BIBLIOGRAFIA E REFERÊNCIAS
Capítulo 1: Capítulo XVIII, itens 18 e 19, 24, 25
e 28
Capítulo 13: Capítulo XVIII, itens 24 e 25
3. KARDEC, Allan. Obras Póstumas, tradução de
Guillon Ribeiro, 12. a ed. Editora Federação Espírita Bra-
1. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, tra- sileira.
dução de Guillon Ribeiro. 28. a ed. Editora Federação
Espírita Brasileira. Capítulo 8: l. a Parte — Cap. Questões e Pro-
blemas
Capítulo 1: Questões n°.s 768 e 779 a
Capítulo 10: l. Parte — Cap. Liberdade, Igual-
Capítulo 2: Questões n.°s 640, 654, 660, 657 e dade e Fraternidade
919 a
Capítulo 13: l. Parte — Cap. As Aristocracias
Capítulo 3: Questões n.°s 674, 676 e 680 a 685 l. a Parte — Cap. Liberdade, Igual-
Capítulo 4: Questões n.°s 625 a 698 e 701 dade e Fraternidade
Capítulo 5: Questões n.°s 702 a 707, 711, 716 a 4. ROSSETINI PAIVA, Maria Eny. Religião e
719 e 726 Atitudes Psicológicas — Monografia.
Capítulo 6: Questões n.°s 728 e 729, 735, 741,
Capítulo 2
743 e 746
5. CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA FEDE-
Capítulo 7: Questões n.°s 766, 770, 771, 774 e DERATIVA DO BRASIL.
775
Capítulo 9: Artigo 153.
Capítulo 8: Questões n.°s 776, 779 a 783
Capítulo 9: Questões n.°s 803 a 808, 811 a 813,
815 e 816
Capítulo 10: Questões n.°s 825, 829, 833, 836, Digitalização: PENSE - Pensamento Social Espírita
837, 841, 860 e 863 www.viasantos.com/pense
Capítulo 11: Questões n.°s 873, 875 a 877, 880, março de 2009
881, 884, 886, 888
e 889
100 101

S-ar putea să vă placă și