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Espiritismo e Política - Aylton Paiva PENSE - Pensamento Social Espírita
ESPIRITISMO E POLÍTICA
Copyright 1982 by
DICESP — Divulgação Cultural Espírita S/C Editora MEUS AGRADECIMENTOS A
Rua Itororó, 111 — C.G.C. 58.268.228/0001-47
11.100 — Santos — SP — Brasil
ÍNDICE
Apresentação 13
Espiritismo e Política 17
Adoração a Deus como Forma de Participação do
Homem na Sociedade 24
O Trabalho Segundo o Espiritismo 30
Entendimento Espírita sobre a Reprodução 36
A Conservação sob a Análise Espírita 42
O Enfoque Espírita da Destruição 48
A Sociedade na Perspectiva Espírita 53
A Conceituação do Progresso na Doutrina Espírita 58
Espiritismo e Igualdade 64
Espiritismo e Liberdade 72
A Justiça, o Amor e a Caridade na Filosofia
Espírita 77
O Aprimoramento do Ser Humano na Ética
Espírita 83
A Ação Social Espírita 89
Participação Política do Espírita 96
Bibliografia e Referências 100
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APRESENTAÇÃO
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plexo filosófico e prático, este pela modificação dade. Não se pode esquecer que foi na metade
do quadro de relações, legislação e de toda a es- do século 19, quando apareceu "O Livro dos Espí-
trutura de poder. ritos", que se deram os passos marcantes para a
"O Livro dos Espíritos", de Allan Kardec, definição da estrutura biológica e social do ho-
dentro desse conceito, pode ser considerado um mem. Cabia ao espiritismo a tarefa de redifini-lo
livro político, porque abrange, abarca, analisa não espiritualmente. Deveria fazê-lo — e o fez — de
apenas o ser como ser, mas enquanto homem, isto maneira que pudesse enfrentar a argumentação
é, ligado a uma realidade existencial e a uma con- experimental da ciência e do materialismo e supe-
tingência atual, viva, que é a sociedade. Se se rasse o florilégio inconsistente do espiritualismo
preocupa com assuntos trancendentais, como Deus religioso.
e a essência espiritual do homem, dedica longo Para os que têm uma visão ampla da contri-
trecho à compreensão dos fatores morais, que buição de Allan Kardec, é meridiano que ele con-
estão na base das ligações mais profundas no rela- seguiu a difícil proeza de apresentar o homem
cionamento humano. dentro de uma dimensão em que, sem desprezar
Hoje ninguém mais aceita teorias que isolem a tradição espiritualista, ao contrário reforçando-a
o homem do mundo. Este é o local onde está contrapõe-se, com dados e com lógica, ao sim-
a coletividade espiritual, enquanto encarnada e plismo biológico. Conseguiu o Codificador a sín-
o governo dos bens e das condições em que o tese entre as teses niilistas do materialismo e as
indivíduo e a coletividade vivem, as posições de posições alienantes da religião. Mostrando-o como
dominação e submissão, o poder e o arbítrio, a o agente ativo da modificação do ambiente, auto-
liberdade e a participação, são indissociáveis das aperfeiçoando-se, para criar uma sociedade mais
necessidades da criatura. A prova disto é a infor- justa e adequada ao desenvolvimento de suas po-
mação de que, no plano extrafísico, o homem de- tencialidades, o espiritismo conseguiu redifinir o
sencarnado elabora também propostas políticas, homem e sua relação com o mundo. Com o alar-
na organização de comunidades transitórias, com gamento de fronteiras da vida extendem-se os li-
estruturas de poder. mites das potencialidades da criatura.
A codificação do espiritismo foi entregue a Essa concepção do homem e de sua relação
Allan Kardec, um homem que viveu intensamente com o mundo precisa ser transferida para a ação
um período decisivo para o futuro da humani- política, social. Para isso impõe-se a reflexão dos
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em que vive, com seus semelhantes, com as socie- sariamente, impõe exercitar a Justiça, o Amor e
dades de que participa. a Caridade.
Logo, sob o aspecto filosófico, o espiritismo Esse entendimento é necessário ao espírita,
apresenta normas políticas. pois, conscientemente ou não, ele tem uma prá-
O que não se deve, nem se pode, é confundir tica política, considerando-se que a própria par-
essa visão política com a política partidária, ou ticipação na sociedade é uma participação polí-
seja, a política aplicada que os homens devem tica.
exercitar nos núcleos, nas agremiações partidárias. O homem, por sua natureza, é um ser social:
Tais partidos são resultantes de ideologias, associa-se aos seus semelhantes para criar os bens
de objetivos, de programas, de estatutos estabele- necessários ao seu desenvolvimento.
cidos em agrupamentos de determinados homens Dentre esses bens, alguns lhe são garantidos
que visam, de uma forma ou de outra, realizar pelo agrupamento doméstico, outros são coloca-
normas políticas ideais, ou seja, pretendem a exe- dos em disponibilidade por outras instituições,
cução na sociedade dos princípios, das normas também por ele criadas, a fim de satisfazerem
apresentadas filosoficamente pela política. suas necessidades de natureza social, econômica,
Assim, jamais o espiritismo, como Doutrina, cultural e religiosa, como a escola, a empresa, o
e o movimento espírita, como prática, poderão clube, a Igreja etc.
dar guarida a um partido político em seu seio, Daí a afirmação de Aristóteles: "O homem
por exemplo: Partido Social Espírita, Partido Es- é um animal político".
pírita Cristão etc. O espiritismo demonstra, também, em sua
Porém, as implicações dos princípios e nor- obra básica, já citada, a necessidade da participa-
mas políticas contidas na Terceira Parte — Das ção do homem na sociedade, pois o homem tem
Leis Morais — de O Livro dos Espíritos, codifi- que progredir, e isolado ele não tem condições
cado por Allan Kardec, são muito amplas e pro- disso, já que seu progresso depende dos bens que
fundas na sociedade humana. lhe são oferecidos pela família, pela escola, pela
Por isso, o espírita deve ser consciente e lú- religião e demais agências sociais. Por isso os
cido na compreensão dessas normas e princípios, homens dependem uns dos outros, foram criados
a fim de que sua participação na sociedade seja para viver em sociedade e não isolados.
consentânea com tal visão política, e que, neces- Assim, as pessoas, as famílias e as instituições
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sociais necessitam da paz baseada na justiça, na utilizará sua inteligência e seus conhecimentos
ordem e na segurança e de condições para a rea- para satisfazer suas paixões e seus interesses pes-
lização do bem comum. Para tanto, os homens soais, não se importando em prejudicar seu seme-
associam-se em entidades mais amplas, gerando a lhante e até mesmo destruí-lo.
sociedade política, personificada no Estado que, Somente quando, através do progresso moral,
desta forma, se torna o responsável pelo bem de o homem dominar o orgulho e o egoísmo, ele
todas as pessoas. poderá ampliar sua felicidade na Terra, podendo,
então, desfrutar da paz e da fraternidade.
Ação Espírita e Política Isso só será possível quando os homens con-
siderarem que, como irmãos, devem-se auxiliar
Para progredir, o homem precisa da socie- mutuamente e não o forte e poderoso explorar e
dade. O progresso não é o mesmo para todos, viver às custas do mais fraco (v. A Gênese, Allan
então os mais adiantados devem ajudar o pro- Kardec, cap. XVIII, item 18 e 19).
gresso dos outros por meio do contato social. Na mesma obra, Allan Kardec revela os
Esse auxílio, essa participação é uma ação caracteres daqueles que devem participar da es-
política, embora possa não ser (e na maioria das truturação de uma sociedade justa e amorosa:
vezes não o é) uma ação político-partidária. Para "Cabendo-lhes fundar a era do progresso moral, a
o espírita, essa ação política deve ser sempre ins- nova geração se distingue por inteligência e razão
pirada nos princípios expressos pelo aspecto filo- geralmente precoces, juntas ao sentimento inato
sófico do espiritismo, que o levam a amar e, nesse do bem a crença espiritualista, o que constitui
caso, Amar é desejar o bem; logo, a exteriorização sinal indubitável de certo grau de adiantamento
política do amor é a expressão do querer bem e anterior. Não se comporá exclusivamente de espí-
do agir para o bem de todos. ritos eminentemente superiores, mas dos que, já
Alerta-nos o espiritismo que o progresso inte- tendo progredido, se acham predispostos a assimi-
lectual realizado até o presente, em larga escala, lar todas as ideias progressistas e aptos a secun-
é um grande avanço e assinala uma primeira fase dar o movimento de regeneração". (G.N.)
de desenvolvimento da humanidade, sendo impo- Consequentemente, a ação política dos bons
tente, porém para regenerá-la. Enquanto o homem é um imperativo na hora atual. O espiritismo
estiver dominado pelo orgulho e pelo egoísmo ele (GN — Grifos nossos).
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apresenta conceitos claros e precisos para essa trina social espírita, contida em O Livro dos Espí-
atuação. "A nova geração marchará, pois, para ritos, em sua terceira parte.
a realização de todas as ideias humanitárias com-
patíveis com o grau de adiantamento a que hou-
ver chegado. Avançando para o mesmo alvo e
realizando seus objetivos, o espiritismo se encon-
trará com ela no mesmo terreno. Aos homens
progressistas se deparará nas ideias espíritas po-
derosa alavanca e o espiritismo achará, nos novos
homens, espíritos inteiramente dispostos a aco-
lhê-lo". (A Gênese)
O espiritismo não cria a renovação social; a
madureza da humanidade é que fará dessa reno-
vação uma necessidade. Pelo seu poder morali-
zador, por suas tendências progressistas, pela
amplitude de suas vistas, pelas generalidades das
questões que abrange, o espiritismo é mais apto
do que qualquer outra doutrina a secundar o
movimento. Surgiu na hora em que podia ser de
utilidade, visto que também para ele os tempos
são chegados, (in A Gênese, Allan Kardec — g.n.)
Da análise dos conceitos expostos surge clara
a estimulação do espirtismo à participação no
processo político, social, cultural econômico, de
modo a secundar o movimento de regeneração
da sociedade humana em bases de justiça e amor.
Para tal ação é imprescindível que se tome
conhecimento dos princípios e normas da dou-
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mem a dependência total à autoridade, renun- Se uma religião através de seus conceitos
ciando à sua capacidade de amar e raciocinar. inibe a razão e o amor em suas diferentes formas
Essa atitude psicológica pode ser transferida, e expressões, revelando, apenas, aspectos tristes
e geralmente o é, para a submissão absoluta ao da vida, conduzindo o homem ao desprezo de si
Estado, ao partido, à "raça superior", ao "povo mesmo, impondo uma contemplação improdutiva,
eleito". A felicidade pessoal é sacrificada a ideais, não tem valor (questão n.° 657 do L. E.). Para
como a vida eterna, a vida espiritual, o futuro da o espiritismo, não fazer o bem já é um mal, pois
espécie humana, o estado socialista ideal. o ser humano se realiza quando é produtivo no
As ideias passam a ser fins em si mesmas e bem.
não meios para o homem ser feliz. Os fins jus- Em O Livro dos Espíritos, Allan Kardec in-
tificam todos os meios e em nome desses fins as siste quanto à melhor forma de agradar a Deus e
elites religiosas ou governamentais manobram os os espíritos indicam sempre que isso se faz atra-
que a elas se submetem. vés da ação no bem, pela produtividade no amor
O espiritismo ajuda na compreensão das ao semelhante. Mesmo no ato exterior da adora-
limitações humanas e na proteção divina, nunca ção, revelam a atitude psicológica que o deter-
apelando a uma submissão castradora, de inibi- mina, demonstrando a diferença entre a adoração
ção às potencialidade humanas. Pelo contrário, autêntica e a hipocrisia, o agir de forma egoística
demonstra que a oração, ao aproximar a criatura e a ação motivada pelo amor.
do Criador, constitui-se numa possibilidade de Também indicam que a extensão da prece
estudo de si mesma. As boas ações são as melho- ou a sua freqüência de nada valem se a pessoa
res preces, por isso valem os atos mais que a pala- apresenta um mau caráter, se é ciosa, invejosa,
vra de pessoas cujos atos as desdizem. impertinente, sem benevolência e indulgência e
Ser religioso significa principalmente enten- até viciada. Dizem os espíritos que o necessário
der a si e ao seu semelhante, amando-o e amando- não é orar muito, mas orar bem. Não adianta
se ("ama o teu próximo como a ti mesmo"). fazer da prece uma forma de estudo de si mesmas
Segundo o espiritismo, o valor de uma reli- (v. questão n.° 660 do L. E.).
gião, filosofia ou seita, está em promover o cres- O espírita, pois, não deve temer a auto-ana-
cimento, a força, a liberdade àqueles que a seguem lise, nem a crítica, porque sabe que a melhor
ou professam. maneira de se aperfeiçoar é conhecer-se a si mes-
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mo; que, quando erra, não ofende a Deus, apenas Deus quer que o homem pense nele, mas não quer
produz reações de efeitos corretivos em si mesmo, que só nele pense, pois que lhe impôs deveres a
quando esse erro não for contrabalançado pela cumprir na Terra. Quem passa todo o tempo na
sua ação no bem no mesmo campo. Portanto, por meditação e na contemplação nada faz de meri-
seus erros, o homem não é um pobre pecador, tório aos olhos de Deus, porque vive uma vida
fraco e desprezível; é, na verdade, um ser que toda pessoal e inútil à humanidade e Deus lhe
ainda está aprendendo viver harmoniosamente pedirá contas do bem que não houver feito". (g.n.)
com as leis do amor e desenvolvendo progressiva- Da mesma forma, a atitude comodista e pas-
mente sua razão. siva, expressa pela omissão diante dos problemas
Por isso, o conceito espírita de adoração in- humanos em estruturas sociais injustas e mate-
funde um profundo respeito pela vida, uma per- rialistas é por eles reprovada. Pois o comodista
manente indagação sobre o universo e o homem ainda que não pratique o mal, dele se aproveita.
um intrínseco amor pelo semelhante. Estimula Portanto, o espírita para não ser omisso e
sempre o aperfeiçoamento e o progresso da pes- assim indiretamente aproveitar-se do mal, deve
soa e da sociedade, através da solidariedade. se esforçar para que o conceito espírita de adora-
Consequentemente, no conceito de adoração ção a Deus seja efetivamente aplicado na socie-
a Deus expresso pelo espiritismo, há todo um dade humana, de forma conveniente, oportuna e
comprometimento de participarão na sociedade, adequada, em consonância com a própria ética
reiteradamente manifestado pelos espíritos a Allan ou moral espírita.
Kardec.
Assim, vemos claramente tal ligação: Deus,
homem e sociedade na questão n.° 657 de O
Livro dos Espíritos.
"Têm, perante Deus, algum mérito os que se
consagram à vida contemplativa, uma vez que
nenhum mal fazem e só em Deus pensam?
— Não, porquanto, se é certo que não fazem
o mal, também o é que não fazem o bem e são
inúteis. Demais, não jazer o bem já é um mal.
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trumento do lucro ou mera engrenagem desper- pios, seja como empregador ou como empregado.
sonalizada na máquina de produção estatal. Qualquer tipo de burla será a negação dos princí-
A dimensão social e espiritual do homem não pios espirituais pelos quais o espiritismo visualiza
pode ser inibida enquanto trabalhador. O tra- o trabalho como indeclinável atividade humana.
balho é seu instrumento de progresso social e es- Se os espíritos orientaram que o limite do tra-
piritual É um componente de sua dinâmica balho é o limite das forças, é óbvio que esse limite
evolutiva. das forças não está ao arbítrio do empregador ou
O espiritismo valoriza o trabalho com uma do doador de trabalho, pois o egoísmo humano
ação social e espiritual, pois o homem dele parti- teria amplo campo de exploração do homem pelo
cipa com seu corpo e espírito, não importando homem, até a exaustão.
seja a atividade chamada manual ou intelectual. Através dos recursos das ciências médicas,
Portanto, nenhum homem, em boas condições físi- sociológica, psicológica, as legislações trabalhis-
cas e mentais, pode ser alijado do trabalho. tas fixam, com relativo equilíbrio, a proporciona-
Considerando-se o trabalho, é indispensável lidade entre o trabalho e o descanso.
que se analise também o repouso. O descanso é No entanto, é indispensável que esses direi-
condição indispensável à recuperação das forças tos estabelecidos pela legislação social dos povos
físicas e refazimento das energias mentais. e proclamados por entidades como Organização
Portanto, é desumano e só pode resultar de das Nações Unidas, Organização Internacional
uma sociedade injusta, a necessidade de ter o do Trabalho, sejam respeitados e defendidos por
homem, muitas vezes, mais de um emprego, sem empregadores e empregados e devidamente tute-
condição do repouso necessário, a fim de prover lados pelos Estados.
a própria subsistência e a da família. Assim ele O espírita, colhendo a informação sobre a
se embrutece e se transforma em um robô de pro- Lei do Trabalho em O Livro dos Espíritos deve
dução agrícola, industrial ou num dente da grande estar atento a que tais princípios doutrinários,
máquina da comercialização. acolhidos pela legislação trabalhista, sejam apli-
Atualmente, o Direito do Trabalho estabe- cados e respeitados.
lece a necessidade do descanso, de forma remu-
nerada.
Não pode o espírita transigir a tais princí-
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vendo à própria conservação, obstem ao desenvol- Os espíritos, na já citada obra, dão o casa-
vimento excessivo, quiçá perigoso, das espécies mento como um progresso alcançado pela huma-
animais e vegetais de que se alimentam." nidade. Ao mesmo tempo exortam que sua abo-
O homem em sua participação política, ou lição seria um retrocesso à vida animal.
seja, em sua ação na sociedade, deve agir para o Na análise dessa questão, Allan Kardec escla-
equilíbrio da própria espécie, como da vida que rece que no estado natural há a união livre e oca-
o circunvolve, pois tudo ele deve fazer para che- sional dos sexos. O surgimento do casamento
gar à perfeição e ele é um instrumento do qual representa um dos primeiros progressos da socie-
Deus também se serve. dade humana, pois estabelece a solidariedade
No entanto, o ser humano ainda é imperfeito fraterna.
e, muitas vezes, age apenas para satisfazer seus O casamento é uma instituição que deve ser
instintos e impulsos obstando a reprodução apenas defendida e preservada pelo que apresenta de
para satisfazer a sensualidade. O espiritismo de- importante e necessário ao aprimoramento do ser
monstra que isso revela a predominância do corpo humano no desenvolvimento do Amor.
sobre a alma. O espírita, de forma individual, e o movimen-
É evidente, no entanto, que esse conceito não to espírita, de maneira coletiva, precisam estar
colide com o planejamento familiar, o qual ajuda atentos à defesa dos fundamentos morais que pre-
o homem a assumir a prole com responsabilidade servem a nobre e elevada instituição do casamento.
e zelo, componentes indeclináveis do amor. A título de liberdade levantam-se vozes que pre-
O controle da reprodução não pode visar à gam a sexualidade irresponsável, rebaixando a re-
satisfação de prazeres egoísticos, seja em termos lação sexual humana ao nível do instinto, como se
de exploração da sexualidade no ser humano, seja tal envolvimento físico-psíquico-emocional-senti-
pelo risco de desequilibrar a natureza, em função mental fosse tão simples e fisiológico como matar
do lucro fácil e exorbitante. a sede ou saciar a fome.
A ação espírita de preservação dos laços de
Casamento e Divórcio família não pode ficar limitada às quatro pare-
des do centro espírita, mas deve ser uma partici-
A reprodução no ser humano está ligada à pação na sociedade. Para isso utilizará os meios
tutela do casamento. e instrumentos lícitos e morais, associando-se a
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outras instituições e organizações que tenham o e ludibriam o mundo em que vivem. Tal não se
mesmo objetivo. dá, no entanto, com os que se encontram nesse
Assim poderá se contrapor à onda avas- estado por serviço à humanidade, caso em que é
salante de sensualidade que varre os órgãos de meritório. A poligamia é um costume humano
comunicação, como a televisão, a revista, o jor- cuja abolição representa verdadeiro progresso,
nal, o cinema, o teatro e que mantêm a mulher pois o casamento deve se fundamentar na afeição
apenas como um objeto sexual, sob a aparência entre os seres e não apenas na sensualidade.
de libertação. Também não se justifica a poligamia ao ar-
Também considera o espiritismo que a indis- repio da lei em que, numa aparente monogamia,
solubilidade do casamento é uma lei humana con- o ser humano fere a dignidade e o respeito ao seu
trária à própria natureza. cônjuge, buscando às escondidas outro parceiro,
O casamento não pode ser uma prisão e que num comportamento de falsidade, mentira e hipo-
apenas para manter aparências justique sua con- crisia.
tinuidade. O espírita deve dignificar o sexo, preservar o
É evidente que a separação do casal não tem casamento e defender sua constituição onde e
respaldo em objetivos egoísticos, exteriorizados quando necessário.
no sensualismo ou no interesse econômico, pois o
convívio é necessário ao desenvolvimento do
Amor entre o casal e para com os filhos.
Nesse sentido, o relacionamento sexual no
ser humano não é mero instrumento de satisfação
de um instinto, nem pura justificativa do meio de
reprodução. É acima de tudo elevada forma de
exteriorização do amor em que, além da troca de
sensações físicas, desdobram-se elevadas permu-
tas de energias psíquicas.
O espiritismo não justifica o celibato nem a
poligamia. Quanto ao primeiro exorta: os que
agem assim por egoísmo infringem as leis de Deus
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está certa para o espiritismo a sociedade que cessidade da participação ativa do homem na so-
elege padrões de felicidade em termos de consu- ciedade, a benefício de seu semelhante. Só aí jus-
mir ("feliz é o que tem dinheiro para comprar") tifica-se a privação, com um fim útil, expressando
e não de SER (desenvolvendo sua capacidade de amor ao próximo.
conhecer e amar), pois apela somente para a satis- O que de importante se realça é a privação,
fação dos impulsos ou instintos. a renúncia, o sacrifício em prol do pobre, do mar-
Para a doutrina espírita não há valor na pri- ginalizado, do injustiçado, do enfermo a se tradu-
vação do bem-estar, na mortificação, no isolacio- zir numa ação social, uma ação política que lhe
nismo religioso uma vez que isso somente inte- reconheça os direitos humanos.
ressa a quem o pratica. Se tais condições impe- O espírita deve, mesmo com sacrifício, agir
dem a pessoa de fazer o bem. elas revelam o conscientemente para que, na sociedade humana,
egoísmo, seja qual for o pretexto que expressem. todos tenham o necessário para o seu progresso.
O sacrifício vale quando é feito a fim de aju- Sabendo que o uso dos bens da Terra é um
dar o próximo, quando nele há um conteúdo de direito de todos os homens, conforme os postula-
amor. dos do espiritismo, o espírita deve participar pe-
los meios lícitos que tenha ao seu dispor para que
A questão n.° 726 de O Livro dos Espíritos
esse direito seja indistintamente aplicado.
orienta: "Supões que se adiantam no caminho do
progresso os que abreviam a vida, mediante rigo-
res sobre-humanos, como o fazem os bonzos, os
faquires e alguns fanáticos de muitas seitas? Por
que de preferência não trabalham pelo bem de
seus semelhantes? Vistam o indigente; consolem
o que chora; trabalhem pelo que está enfermo;
sofram privações para alívio dos infelizes e então
suas vidas serão úteis e, portanto, agradáveis a
Deus. Sofrer alguém voluntariamente, apenas por
seu próprio bem, é egoísmo; sofrer pelos outros é
caridade: tais os preceitos do Cristo".
Desse conceito destaca-se, claramente, a ne-
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não pode controlar. A esses ele tem que se sub- humana é imperioso que a justiça se faça junto a
meter, porém ele os agrava por sua negligência. cada um de seus componentes. Também para
Há, pois, necessidade de o homem organizar que haja paz e harmonia entre as nações, é indis-
a sociedade de forma a ser previdente, somando pensável que elas se relacionem sob o pálio da
conhecimentos e experiências, encontrando a so- justiça. Porém, a realidade, atualmente, ainda
lução dos males ao remover as causas. Para isso não é essa. Nações mais desenvolvidas econômica
concorrem a ciência e a técnica. e tecnicamente procuram explorar as nações po-
No entanto, se flagelos como inundações, epi- bres. Tais nações utilizam regras do mercado in-
demais, secas levam a dor e o sofrimento à grande ternacional que lhes propiciam lucros fáceis:
parte das populações, é porque o egoísmo, tradu- estabelecem preços que lhes convém; fixam bar-
zido no privilégio de minorias, impede que re- reiras alfandegárias; importam matéria-prima a
cursos avançados da ciência e da técnica sejam preços aviltantes. Agem de maneira a manter as
aplicados de forma a eliminar ou diminuir seus nações pobres em permanente dependência eco-
danosos e dolorosos efeitos. nômica, política e até mesmo militar.
Quanto aos males que escapam à sua capa- Obviamente, enquanto perdurar tal situação,
cidade de controle, o homem deve utilizar sua a guerra, declarada ou não, permanecerá entre os
inteligência para compreendê-los cada vez mais, povos, pois faltará o elemento essencial à harmo-
a fim de, futuramente, conjurá-los. Deverá tam- nia entre eles — a justiça, consoante a exortação
bém usar a paciência e a compreensão para su- dos espíritos.
portar-lhe os efeitos, evitando agravá-los pela A destruição das criaturas entre si é conde-
revolta e negligência. nável, constitui crime. Para Deus, segundo os
Dentre os flagelos produzidos exclusivamente espíritos, o assassínio constitui grande crime, pois
pelo homem, sobreleva a guerra. quem tira a vida do seu semelhante corta o fio de
O espiritismo diz que a guerra desaparecerá uma existência de expiação ou missão.
da face da Terra quando os homens compreende- A atitude daquele que, no assalto, no roubo,
rem a justiça e praticarem a Lei de Deus. Nessa no desentendimento mata o seu semelhante é tão
época, todos os povos serão irmãos. (v. questão condenável quanto à daquele que não comete
n.° 743 do L. E.). crime ostensivamente, mas rouba as forças de tra-
Para que haja harmonia numa sociedade balho do operário, matando-o aos poucos; que
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Toda forma de insulamento que nada pro- desenvolver suas potencialidades e isso ele só pode
duza, que seja inútil, é condenada pelo espiri- fazer vivendo em sociedade e é necessário que a
tismo. sociedade esteja estruturada a fim de que todos
Torna-se evidente que a pessoa tem um com- que a compõem tenham tal possibilidade.
promisso com a sociedade em que vive. Nela deve O progresso do homem, tanto em seu aspecto
participar, dando sua contribuição, de acordo com da vida material quanto da vida espiritual, é uma
suas possibilidades intelectuais e sentimentais. O imposição do Criador da Vida. Ele necessita rela-
espírita, pelo conhecimento que tem da doutrina cionar-se com seu semelhante para criar os bens
social espírita, consubstanciada nas Leis Morais indispensáveis ao seu aprimoramento.
de O Livro dos Espíritos, tem o dever de partici-
par ativa e conscientemente na sociedade em que Esse relacionamento social, no entanto, deve
vive, agindo para que os princípios expressos em ser inspirado pelo amor entre os seres, pela fra-
tais leis se efetivem na sociedade humana. ternidade que implica no exercício da justiça.
Há uma forma de insulamento que o espiri- Desses bens necessários ao seu progresso,
tismo admite: os que saem do mundo para se de- alguns ele colhe na própria família, outros, porém,
dicarem ao trabalho de socorrer os necessitados. ele precisa colher em outras agências: a religião,
Aqueles que assim agem, na verdade se elevam a escola, as associações com fins culturais, artís-
em seu progresso espiritual, pois adquirem duplo ticos, científicos etc. Então ele poderá satisfa-
mérito, superam o egoísmo no gozo material e pra- zer suas necessidades de ordem econômica, social,
ticam o bem, obedientes à lei do trabalho. cultural e espiritual.
Nesse aspecto, os espíritos valorizam duas Por outro lado, o ser humano, a família, as
situações importantes: fazer o bem e obedecer à instituições sociais precisam de paz, justiça e segu-
lei do trabalho. rança a fim de que todos possam progredir, sem
Consequentemente, a omissão e a ociosidade restrições ou discriminações.
que venham a alimentar qualquer tipo de isola- Assinalam os espíritos que os laços de famí-
mento social, produzirão sempre a inutilidade, o lia são importantes na educação do ser humano.
fanatismo ou o egoísmo rotulado de pureza ou Amando o próximo que está mais próximo é que
santidade. o homem se prepara para o exercício do amor
O homem tem necessidade de progredir, de àqueles que lhe estão mais distantes.
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Advertem, ainda, que o relaxamento dos laços para que o amai-vos uns aos outros se efetive atra-
familiares será a recrudescência do egoísmo. vés do direito que todo ser humano tem de possuir
Retirando do ser humano a manifestação do o necessário: alimentação, vestuário, casa, saúde,
amor em seu relacionamento, resta apenas o egoís- trabalho, educação, lazer e desenvolvimento espi-
mo, inclusive rebaixando a relação sexual ao puro ritual.
instinto.
O amor faz com que haja a responsabilidade,
o cuidado, o carinho e o zelo de um ser humane
para com o outro. A família é o precioso labora-
tório onde se exercita e se aprimora a sublime ma-
nifestação desse sentimento.
Por isso, os fundamentos morais da família
devem ser preservados, valorizando-se o sexo
como meio de manifestação do amor.
O espírita deve estar atento, à vista dos con-
ceitos espíritas sobre sexo, família, dignidade hu-
mana, para denunciar as ações e movimentos que
subvertam os valores espirituais.
Conclui-se, assim, que o homem não é um
ser independente. Pelo contrário, ele depende de
seu semelhante ao mesmo tempo que é impulsio-
nado ao progresso; por isso impõe-se-lhe a neces-
sidade de aprender a amar o seu próximo e não
explorá-lo física, intelectual e sentimentalmente.
Esse amor deve ser traduzido de forma con-
creta.
Não apenas dar esmola ao pobre e pedir-lhe
paciência, acolher o velho desamparado no asilo,
agasalhar a criança órfã ou abandonada, mas agir
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cínio, o ser humano adquire a faculdade de esco-
lher. Com isso ele desenvolve seu livre-arbítrio o
que lhe aumenta a responsabilidade dos seus atos.
A CONCEITUAÇÃO DO PROGRESSO O progresso é da própria condição humana,
por isso o homem não pode opor-se-lhe. A ignorân-
NA DOUTRINA ESPIRITA cia e a maldade e até mesmo leis injustas, podem
retardar seu desenvolvimento, mas não anulá-lo.
Quando instituições e leis se tornam incom-
O espiritismo considera o estado natural patíveis com ele, a própria evolução geral se in-
como sendo a infância da humanidade e o seu cumbe de aniquilar tais organizações e revogar
ponto de partida para o desenvolvimento intelec- ordenamentos anacrônicos.
tual e moral.
Assegura tratar-se de um estado transitório Evoluções, Revoluções e Progresso
para o homem, que dele sai em decorrência do
progresso e da civilização. Esclarece, por outro É claro que essa evolução geral é a expres-
lado, que a lei natural rege a humanidade inteira são das forças conscientes e ativas que não se sub-
e o homem se aprimora à medida que melhor a metem à maldade gerada pela ignorância.
compreende e pratica. O progresso é lento, mas a humanidade, de
O próprio homem traz em si os impulsos que forma geral, ou o homem, particularmente, não
o conduzem ao progresso, porém esse progresso podem permanecer indefinidamente na ignorân-
não é simultâneo e idêntico para todos. Por isso; cia porque precisam atingir os fins que lhes foram
assinalados pelo Criador.
aqueles que estão mais adiantados devem auxiliar
o progresso dos outros, através da relação social. Segundo o espiritismo, as revoluções morais,
como as revoluções sociais infiltraram-se nas ideias
Esclarecem os espíritos que o progresso mo-
pouco a pouco. Elas como que germinam durante
ral decorre do progresso intelectual, porém nem
longo tempo e subitamente irrompem desmoro-
sempre a ele se segue. nando instituições, leis e costumes do passado.
O entendimento intelectual torna compre- Nesse conflito entre o passado e o presente
ensível o bem e o mal. Ao desenvolver seu racio- para a construção do futuro, o homem divisa ape -
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dos desgraçados e todo homem de boa vontade lectual e moral da humanidade. Com tal obje-
sabe que não lhe faltará o necessário. tivo devem agir sobre a sociedade humana a fim
É evidente que os valores anteriormente ex- de que haja hábitos espiritualizados, desenvolvi-
postos se constituem em verdadeiros desafios para mento da inteligência, da liberdade, elaboração
implantação em nossa atual sociedade. São metas de leis justas a benefício de todos, amparo ao
do verdadeiro progresso que devem ser alcança- fraco para que ele não seja explorado pelo forte,
das pelas forças do bem. respeito às crenças e opiniões, direito ao neces-
O espiritismo tem sua contribuição para dar, sário a todos (bem comum).
pois basta analisar seus princípios filosóficos para Como fazer isso? Agindo não só no movi-
ver que ele propõe o que a humanidade deseja: mento espírita como, também, de conformidade
o reino da justiça, obstando os abusos que impe- com a vocação e aptidão de cada um, nas organi-
dem o progresso e a moralização das massas. zações e movimentos que, baseados em tais valo-
Disseram os espíritos: "Destruindo o mate- res, procuram estruturar e organizar a sociedade.
rialismo, que é uma das chagas da sociedade, ele
faz que os homens compreendam onde se encon-
tram seus verdadeiros interesses. Deixando a
vida futura de estar velada pela dúvida, o homem
perceberá melhor que por meio do presente lhe é
dado preparar o seu futuro. Abolindo os prejuí-
zos de seitas, castas e cores, ensina aos homens a
grande solidariedade que os há de unir como ir-
mãos". (questão n.° 799 do L.E.)
Ao estabelecer a fraternidade e a solidarie-
dade entre os homens, o espiritismo faz com que
os horizontes do entendimento humano se am-
pliem para muito além do egoísmo e do orgulho.
Como vemos, a proposição espírita da Lei do
Progresso é um intenso e profundo desafio aos
espíritos para que trabalhem pelo progresso inte-
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riqueza, o poder e a miséria constituem provas Isso não permite pensar logicamente numa
pelas quais os espíritos experimentam-se. inversão tão simplista como querem alguns: "O
A miséria pode gerar a revolta, a dependên- pobre de hoje é o rico de ontem". Trata-se de
cia, a indolência facilita a iniciação nos vícios, na uma acomodação injusta diante de uma sociedade
prostituição e na delinquência. A riqueza incita dirigida, ainda, pelo egoísmo e pelo orgulho.
a todos os excessos, torna o homem egoísta, orgu- Acomodação que deturpa o sentido da reencarna-
lhoso, insaciável, explorador, facilitando também ção, conforme o conceito que lhe é dado pelo
a dependência aos vícios. espiritismo.
Portanto, a justiça deve exercer sua tutela a
fim de cada um tenha o que é seu direito.
Não se pode, desta forma, justificar com os
conceitos espíritas .a miséria como sendo apenas
prova ou expiação de espíritos que foram ricos e
poderosos no passado.
A própria evidência sociológica demonstra o
absurdo de tal generalização. O orgulho e o
egoísmo de homens e instituições é que têm ditado
a miséria e a pobreza sobre a face da terra.
Alguns espíritos que fracassaram na prova
da riqueza podem ter escolhido a expiação da
pobreza para se reeducarem, como alguns espíri-
tos podem ter escolhido a provação da riqueza
para exercitar suas aquisições no campo do amor,
da justiça e da humildade.
A miséria sempre foi muito maior do que a
riqueza, em todos os tempos vividos pela huma-
nidade, até a presente época. Os ricos têm sido
minoria e os pobres maioria, numa grande des-
proporção.
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A liberdade não se confunde com devassidão Para o espiritismo, os meios fazem parte dos
que solta as rédeas dos instintos. fins; não se pode pretender o amor, a justiça, a
É importante para o homem o desenvolvi- liberdade, agindo por meios violentos, odiosos, in-
mento de sua capacidade de pensar, pois é atra- justos e coativos.
vés dela que ele poderá conhecer-se a si mesmo Esse conceito de liberdade deve levar o espí-
e ao mundo em que vive. Pelo pensamento o rita à ação para implantar o bem na sociedade em
homem desfruta de liberdade ilimitada, o que que vive para que o mal gradativamente desapa-
deverá ajudá-lo nesse conhecimento. Esse enten- reça. Para isso é preciso atuar conscientemente,
dimento deve amparar-lhe a ação no sentido de, com amor e determinação.
através da liberdade, desenvolver a fraternidade, É de se analisar, também, em termos de liber-
a igualdade, a justiça e o amor. dade que grande parte das pessoas acha-se sub-
Consoante instrução do espiritismo, não se metida à pressão do meio social, às regras e cos-
reconhece a ninguém o direito de pôr embaraços tumes.
à liberdade de consciência. Muitas pessoas assumem vícios porque que-
Alerta, ainda, que constranger os homens a rem agradar à maioria com quem convivem. Ge-
procederem em desacordo com a sua maneira de ralmente levado pela pressão do grupo e a neces-
pensar, é torná-los hipócritas. sidade de sentir-se aceito, o jovem começa a fu-
A liberdade de consciência é uma caracterís- mar, a ingerir bebidas alcoólicas e até a usar os
tica da civilização em seu mais avançado estágio tóxicos. Nestes casos torna-se evidente a neces-
de progresso. sidade de romper com a pressão social.
Todavia, é evidente que uma sociedade para É verdade que muitas vezes os costumes
manter o equilíbrio, a harmonia, e o bem-estar sociais impelem o homem de seguir um caminho
precisa estabelecer normas, leis e regulamentos que essencialmente não é bom para ele, embora
portadores de sanções. A título de respeitar a se submeta pelo chamado respeito humano. Con-
liberdade de consciência não vai-se admitir a pro- tudo, desde que haja uma adesão livre, pelo me-
pagação de ideias e doutrinas prejudiciais à socie- nos em termos de opção, a pessoa assume a res-
dade. Nada se lhes deve opor através da violên- ponsabilidade de seus atos perante as leis de Deus
cia e da força, mas através dos princípios de e arcará com as consequências por suas infrações.
direito. Conclui-se, pois, que a própria convivência
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que a lei natural rege até mesmo o que ocorre no Por isso o espírita deve estar atento para a
foro da consciência de cada um. prática de tal preceito, como também colaborar
A doutrina espírita declara que a base da para sua divulgação junto à sociedade em que
justiça, segundo a lei natural, está consolidada vive, pelos meios que lhe sejam possíveis.
na afirmação do Cristo: queira cada um para os Vale ressaltar que o relacionamento social
outros o que quereria para si mesmo. traz para o homem determinadas obrigações
O mais amplo sentido da justiça está ins- sendo que umas das primeiras é a de respeitar
culpido na consciência humana que impulsiona o os direitos de seus semelhantes. Quem respeita
ser humano a defender seus direitos, como tam- esses direitos procede com justiça. É justamente
bém a respeitar o direito alheio. pela falta de justiça que há confusão e perturba-
Ao ficar em dúvida quanto à maneira de ção na sociedade humana.
agir para não ser injusto com seu próximo, o ho- Dentre os direitos de que o ser humano dis-
mem deve auscultar a própria consciência e inda- põe destaca o espiritismo que o primeiro de todos
gar-se se gostaria que agissem com ele da mesma é o direito de viver. Isto está fundamentado na
forma. resposta à questão n.° 880 de O Livro dos Espí-
Para Allan Kardec, em todos os tempos e ritos: "Por isso é que ninguém tem o direito de
sob a orientação de todas as crenças, o homem atentar contra a vida de seu semelhante, nem
sempre se esforçou a fim de que prevalecesse o fazer o que quer que possa comprometer-lhe a
seu direito pessoal. No entanto, a religião cristã existência corporal".
tomou o direito pessoal por base do direito do Comprende-se que as afirmações "atentar
próximo. contra a vida" e "comprometer-lhe a existência"
Portanto, o exercício da justiça não exige do são muito amplas, envolvendo tudo aquilo que seja
homem a cultura jurídica ou a formação acadê- prejudicial à vida humana física e espiritual.
mica; basta consultar sua consciência se o que ele Toda ação que atente contra a vida não deve ser
deseja para os outros é o que desejaria para si praticada pelo espírita, bem como a esse tipo de
mesmo. Aplicando tal postulado, facilmente se ação ele deverá se opor, onde observe sua mani-
implantaria a justiça sobre a face da Terra e o festação.
amor seria o clima normal do relacionamento Também o direito de propriedade tem uma
humano. influência muito grande na sociedade humana.
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Procurando a correspondência entre o direito dade, o espírita deve estar atento, a fim de que
de viver e o direito de propriedade, o espiritismo não seja injusto e egoísta no mundo em que vive.
propõe: o homem tem o direito de acumular
bens, mas deve fazê-lo em família, como abelha, Verdadeiro Sentido da Caridade
por meio de um trabalho honesto. Deve-se aten-
tar que acumular bens em família implica em res- "Qual o verdadeiro sentido da palavra cari-
tringir bastante o sentido de propriedade, pois em dade, como a entendia Jesus?
família não se pode gerir grandes propriedades e — Benevolência para com todos, indulgên-
muito menos impérios econômicos. cia para as imperfeições dos outros, perdão das
Consequentemente, a acumulação de bens ofensas." (questão n.° 886 do L. E.).
não deve abarcar o supérfluo, nem ser produto O Espiritismo nos diz que o amor e a caridade
da ação egoísta (exploração do próximo) e o tra- completam a lei da justiça, pois quando amamos
balho, gerador dos bens, deve ser honesto. o próximo desejamos fazer-lhe todo o bem que
nos seja possível, da mesma forma como gosta-
Afirma o espiritismo que: "propriedade legí-
ríamos que nos fosse feito. Sob tal enfoque, afir-
tima só é a que foi adquirida sem prejuízo de
mou Jesus: "Amai-vos uns aos outros".
outrem". Em seu comentário, diz Allan Kardec:
Segundo Jesus, a caridade não se restringe à
"Proibindo-nos que façamos aos outros o que não
esmola, ela abrange todo o relacionamento hu-
desejáramos que nos fizessem, a lei do amor e da
mano.
justiça nos proíbe, ipso jacto, a aquisição de bens
por quaisquer meios que lhe sejam contrários". É de se ver a amplitude que, assim, assume
a caridade, impondo para seu aparecimento o
De outra parte, a doutrina espírita não aco- exercício da lei de justiça.
lhe como ilimitado o direito de propriedade. Sub- Depreende-se, pois, que sem justiça não há
mete esse direito à legitimidade e à justiça. Alega caridade.
que a legislação humana é imperfeita e consagra Na questão n.° 888 de O Livro dos Espíritos
muitos direitos convencionais que a lei natural de encontramos: "Condenando-se a pedir esmola, o
justiça reprova, por isso essa legislação está em homem se degrada física e moralmente: embru-
constante modificação. tece-se. Uma sociedade que se baseie na lei de
Com essa visão, sobre o direito de proprie- Deus e na justiça deve prover à vida do fraco,
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sobre os interesses da vida material para o gozo dor, continua a ser a chaga social. É um mal
individualista. No entanto, isso não é fácil, pois real, que se alastra por todo mundo e o do qual
sua influência se prende à matéria, ou mais espe- cada homem é mais ou menos vítima. Cumpre,
cificamente, do instinto de conservação. Como o pois, combatê-lo, como se combate um enfermi-
homem ainda está muito próximo de sua origem dade epidêmica". (Comentário à questão n.° 917
(animal), conforme a explicação evolutiva do do L. E. — g.n.)
espiritismo, essa influência, ainda, é muito grande
É evidente que nesse combate torna-se impe-
sobre ele. Decorrente do estágio evolutivo da
riosa a análise das "chagas da sociedade", ou seja,
parte da humanidade, as leis, a organização social,
de órgãos, de instituições, organizações, sistemas
o próprio conteúdo dos programas educacionais
econômicos e políticos que entretecem e excitam
ajudam a manter esse terrível sentimento.
o egoísmo de forma individual ou coletiva.
O homem deseja ser feliz e para isso procura Mais uma vez fica claro que o aprimora-
remover tudo aquilo que ele identifica como obs- mento do ser humano não pode ser feito apenas
táculo a tal fim. O próprio progresso intelectual com a auto-educação como processo de isola-
é resultante desse objetivo, ampliando-lhe as co- mento e não participação consciente dentro da
modidades no lar, nas viagens, no trabalho, enfim sociedade.
em sua vida social. À medida em que ele identi- Se há virtude no combate ao egoísmo, é pre-
fique no egoísmo uma causa geradora da sua infe- ciso que esta não seja uma postura apenas de
licidade individual e coletiva, ele também pro- exterioridade revelando "aparências". Há virtu-
curará remover esse obstáculo. de quando se consegue romper o egoísmo pelo
É imperioso, pois, que se combata o egoísmo, indo altruísmo.
às causas que o geram no homem e nas instituições. Não se confunda o "amor a si mesmo" com o
egoísmo.
Nessa linha de raciocínio, comenta Allan Aquele que ama a si mesmo tem zelo, cui-
Kardec: "Louvável esforços indubitavelmente se dado, atenção e interesse por si mesmo; deseja o
empregam para fazer que a humanidade pro- próprio crescimento espiritual, esforçando-se por
grida. Os bons sentimentos são animados, esti- desenvolver o amor e a sabedoria. Respeita o
mulados e honrados mais do que em qualquer corpo físico como maravilhoso instrumento que
outra época. Entretanto, o egoísmo, verme roe- Deus lhe concedeu para a vivência no plano físico
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graça de outro. Haverá, contudo, alguma soma resultado do meio onde se acha colocado. Quan-
de felicidade comum a todos os homens?" A do praticar a lei de Deus, terá uma ordem social
resposta dada pelos espíritos, em sua primorosa fundada na justiça e na solidariedade e ele pró-
síntese, encerra não só lúcido esclarecimento, prio também será melhor".
como um grande desafio à efetiva participação Em A Gênese, também de Allan Kardec, en-
dos espíritas para promoção da felicidade, ao contramos no capítulo XVIII, itens 24 e 25: "A
afirmarem: "Com relação à vida material é a nova geração marchará, pois, para a realização de
posse do necessário. Com relação à vida moral, todas as ideias humanitárias compatíveis com o
a consciência tranquila e a fé no futuro". (g. n. grau de adiantamento a que houver chegado.
questão n.° 922 do L. E.). Avançando para o mesmo alvo e realizando seus
Ampliando esclarecimentos na questão n.° objetivos, o espiritismo se encontrará com ela no
927 da mesma obra, aditaram: "Verdadeiramen- mesmo terreno. Aos homens progressistas se de-
te infeliz o homem só o é quando sofre da falta do parará nas ideias espíritas poderosas alavancas e
necessário à vida e à saúde do corpo". o espiritismo achará, nos novos homens, espíritos
É de se entender, então, que o espírita tem inteiramente dispostos a acolhe-lo. Dado esse
uma ação social, pois deve estar atento à prática estado de coisas, que poderão fazer os que enten-
da justiça e do amor a fim de que todos tenham dam de opor-se-lhe?
a posse do necessário e a saúde do corpo, o que O espiritismo não cria a renovação social; a
necessariamente implica em propugnar para que madureza da humanidade é que fará dessa reno-
todos tenham alimentação adequada, vestuário, vação uma necessidade. Pelo seu poder morali-
habitação, educação, assistência médica, remédio, zador, por suas tendências progressistas, pela am-
educação sanitária e até mesmo lazer. plitude de suas vistas, pela generalidade das ques-
Advertiram os espíritos na questão n.° 930 tões que abrange, o espiritismo é mais apto, do
do livro em estudo: "Numa sociedade organi- que qualquer outra doutrina, a secundar o movi-
zada segundo a lei do Cristo, ninguém deve mor- mento de regeneração; por isso é ele contempo-
rer de fome". Adita Allan Kardec: "Com uma râeno desse movimento. Surgiu na hora em que
organização social criteriosa e previdente, ao podia ser de utilidade, visto que também para ele
homem só por sua culpa pode faltar o necessário. os tempos são chegados". (g. n.)
Porém, suas próprias faltas são frequentemente
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rão". (questão n.° 932 do L. E. — g. n.). Jun- e se constituem nas raízes dos males que, etica-
tamente com outros bons os espíritas devem que- mente, ainda afligem a humanidade.
rer exercer influências que sobrepujem a dos Perquiria Allan Kardec: "Será possível a des-
maus. truição do orgulho e do egoísmo?" Respondere-
Portanto, o espírita tem que participar e mos alto e terminantemente: SIM. Do contrário,
influenciar na sociedade em que vive, procurando forçoso seria determinar um ponto de parada ao
levar às instituições que a estruturam os valores e progresso da humanidade. Que o homem cresce
normas do espiritismo. Isso é uma participação em inteligência, é fato incontestável; terá ele che-
política. Não pode se preocupar apenas com a gado ao ponto culminante, além do qual não possa
reforma íntima, isolando-se em um "oásis de in- ir? Quem ousaria sustentar tão absurda tese?
diferentismo" pela sociedade em que vive. É ver- Progride ele em moralidade? Para responder a
dade que essa ação política conflitará com os inte- esta questão, basta se comparem as épocas de um
resses dos egoístas e orgulhosos, individualmente mesmo país. Por que teria ele atingido o limite
ou em grupos. do progresso moral e não o do progresso intelec-
tual? Sua aspiração por uma melhor ordem de
Assim, essa ação política deve objetivar o coisas é indício da possibilidade de alcançá-la.
bem comum. Aqueles que pretendem o bem não Aos que são progressistas cabe acelerar esse movi-
podem se omitir e essa participação liga-se pro- mento por meio do estudo e da utilização dos
fundamente com a caridade, pois amar é querer meios mais eficientes, (in Obras Póstumas, Allan
o bem. Kardec, cap. Liberdade, Igualdade, Fraternidade
Destarte, a expressão política do amor é que- — último parágrafo).
rer fazer o bem para todos.
A participação do espírita, inclusive do jo-
vem, no processo político, social, cultural e eco-
nômico deve ser consciente e responsável, tendo
como diretriz os princípios e normas contidas em
O Livro dos Espíritos.
Sabemos que é preciso agir contra o egoísmo
e o orgulho que se instalam em pessoas e grupos
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