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CICLO DE

ENCONTROS
SOBRE
ACESSIBILIDADE
EM ESPAÇOS
DE EDUCAÇÃO
E CULTURA
Ministério da Cultura,
Instituto Tomie Ohtake,
Cateno e
Cielo

apresentam:

CICLO DE
ENCONTROS
SOBRE
ACESSIBILIDADE
EM ESPAÇOS
DE EDUCAÇÃO
E CULTURA
Mediações acessíveis: ciclo de encontros sobre acessibilidade em
espaços de educação e cultura / Instituto Tomie Ohtake.
São Paulo: Instituto Tomie Ohtake, 2018

Vários autores.

ISBN: 978-85 53190-02-7

1. Acessibilidade  2. Centros culturais  3. Diversidade cultural 


4. Diversidade social  5. Educação – Aspectos socioculturais 
6. Interação social  7. Mediação  8. Museus 
I. Instituto Tomie Ohtake  II. Título

18-16658 CDD-306.446

Índices para catálogo sistemático:


1. Mediações acessíveis: Diversidade cultural: Sociologia   306.446
ÍNDICE

6 Para todos, sem exceção


Felipe Arruda

12 Instituto Tomie Ohtake em rede: cultura, cidade e acesso


Luis Soares, Maiara Paiva e Victor Santos

22 Mediações, reflexões e reconhecimento


Claudio Rubino

29 Um espaço para transver


Andi Rubinstein

33 Bebês nas exposições de arte


Encontros, experiências e compartilhamentos
Diana Tubenchlak

1.  O QUE É ACESSO?


EXPANSÃO DE CONCEITOS NOS EQUIPAMENTOS CULTURAIS

38 Sir Charles e a mediação


Renata Bittencourt

42 Ampliando o acesso
Gabriela Aidar

2.  LGBT E A PROMOÇÃO DA DIVERSIDADE NA CULTURA


DESMISTIFICANDO LUGARES COMUNS

47 Querido diário,
Cássio Rodrigo de Oliveira Silva

54 As diferenças no cotidiano da escola


Paula Beatriz de Souza Cruz

63 These are my hands / Estas são as minhas mãos


Jo Clifford
ÍNDICE

3. TRAMANDO PALAVRAS PARA DESCONSTRUIR BARREIRAS


SENSORIAIS – PESSOAS COM DEFICIÊNCIA VISUAL NAS
PROGRAMAÇÕES CULTURAIS

71 Audiodescrição no projeto Manhãs de História:


Acessibilidade e informação para crianças com e sem deficiência
Lívia Motta

78 Palavras produzem sentido


Camila Alves

4. PRÁTICAS E APROPRIAÇÕES DE ESPAÇOS CULTURAIS CONTRA


AS VULNERABILIDADES SOCIOECONÔMICAS

89 Animando os espaços socioculturais da periferia


Roberto da Silva

93 Um psicólogo social trabalhando em museus:


O público e a questão social
Marcio Farias

98 Culturas
Raphael Escobar

5. DIVERSIDADE INTELECTUAL – CAMINHOS PARA


AS RELAÇÕES COM O SABER

104 Emprego apoiado


Márcia Pessoa

108 Diversidade intelectual – A experiência do deficiente residente


no Museu do Futebol
Ialê Cardoso e Marcelo Continelli

113 Ao ciclo de palestras do Instituto Tomie Ohtake


Mario Paulo Bovino Greggio
6.  PROMOÇÃO DA IDENTIDADE E CULTURAS SURDAS PARA A
REPRESENTATIVIDADE NOS ESPAÇOS CULTURAIS

116 Educadores surdos nos espaços de educação e cultura


Edinho Santos

118 Produções culturais surdas


Hugo Eiji

7.  IDOSOS, PARTILHA DE LEMBRANÇAS E EXPERIÊNCIAS

123 Ações educativas com o público da


terceira idade no MAE/USP
Judith Mader Elazari

126 Fragilidade
Cristiane Tenani Pomeranz

8.  DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES

134 Mediações singulares


Ana Amália Tavares Bastos Barbosa

149 Espaço de diálogo


Liliane Rebelo

153 Deficiência: aprendizagem e superação


Roberta Galasso

158 Desequilíbrio
Marcos Abranches
PARA TODOS, SEM EXCEÇÃO
Felipe Arruda

Desde o surgimento das primeiras instituições museológicas modernas,


há cerca de 300 anos, e mais intensamente a partir de meados do século
XX, os museus vêm passando por transformações importantes quanto ao seu
perfil e papel nas sociedades. Inicialmente dedicados ao colecionismo e à
preservação das obras de arte, em seguida abrindo seus acervos para grupos
específicos, e até os dias atuais de longas filas para adentrar seus espaços, os
museus alcançaram um outro estatuto, de complexidade bem maior.
O progressivo deslocamento da atenção primordial dada às obras de arte
para o foco nos públicos é um dos processos basilares dessa transformação,
que carrega consigo uma série de novas demandas e atribuições
institucionais, ligadas à constituição de espaços de convivência, respeito
e promoção da diversidade, de incentivo à participação das pessoas, de
articulação com outros territórios da cidade e de debate público sobre
pautas sociais – como as questões de identidade, gênero, sexo, raça,
religião, imigração e política. Ou seja, os museus se tornaram espaços de
construção da democracia.
É na esteira desses processos que as práticas educativas, de
mediação e comunicação ganham destaque nos museus e uma
infinidade de novas práticas e estratégias de ampliação, diversificação
e engajamento de públicos surge para amparar as missões
institucionais atentas aos desafios do mundo contemporâneo. Junto
a esse movimento, as questões ligadas à acessibilidade passam a integrar

6 NÚCLEO DE CULTURA E PARTICIPAÇÃO


fortemente as discussões sobre os museus como lugares democráticos,
pois apontam não só as necessidades de adaptação física dos espaços para
pessoas com deficiência, mas também a diluição das barreiras subjetivas e
atitudinais que inibem o amplo acesso das pessoas às instituições de cultura.
Exemplo da atenção dedicada a tais discussões é o encontro anual da
American Alliance of Museums, realizado em St. Louis, nos Estados Unidos,
em maio de 2017, cujo tema foi Diversidade, Equidade, Acessibilidade e
Inclusão nos Museus. O encontro reuniu mais de quatro mil profissionais,
de museus comunitários localizados em bairros remotos do interior do país
ao Smithsonian, maior complexo museológico do mundo: todos eles voltados
às centenas de mesas de debate, workshops e palestras que discutiram como
os museus podem ser espaços mais diversos e acessíveis. Na conferência
de abertura, Haben Girma, a primeira pessoa cega e surda a se formar na
Universidade de Direito de Harvard, terminou sua fala convocando os
cerca de dois mil participantes ali presentes à urgente tarefa das nossas
sociedades: “Devemos lutar até que a diferença não faça mais diferença”.
Imbuídos desse espírito, e alinhados ao entendimento dos papéis
e potenciais de um centro cultural contemporâneo, criamos nosso
Programa de Acessibilidade, realizado desde 20151 pelo Núcleo de
Cultura e Participação do Instituto Tomie Ohtake, que tem como
premissa a combinação entre iniciativas de democratizacão do
acesso às ofertas do Instituto e iniciativas pautadas pela construção
de uma democracia cultural, na qual os públicos não são apenas
receptores passivos das ofertas, mas também contribuem na sua
elaboração e expressam desejos e motivações que determinam o
rumo dos projetos.
Em três anos de programa, mais de 600 ações foram realizadas
no próprio Instituto Tomie Ohtake, em seu entorno no bairro de
Pinheiros, no bairro do Canindé2 e na cidade do Recife3. Todas as ações,
que somadas até hoje contabilizam mais de 25 mil pessoas envolvidas,

para todos, sem exceção Felipe Arruda   7


foram e são voltadas a públicos tradicionalmente não frequentadores do
Instituto Tomie Ohtake, como pessoas com diversos tipos de deficiência
(auditiva, visual, intelectual, neuromotora e múltiplas) e em outras
condições de vulnerabilidade social, como pessoas abrigadas, mães com
filhos pequenos, pessoas vítimas de violência doméstica, jovens em medida
socioeducativa, idosos e outros.
Entre as ações do programa, conduzidas por uma equipe altamente
talentosa e apaixonada4, estão: uma série de contações de história;
atividades sensoriais para bebês, famílias e acompanhantes; oficinas
de arte, moda, fotografia e marcenaria; derivas poéticas pela cidade;
parkour para idosos; desenvolvimento de materiais educativos; formação
para professores; curso de LIBRAS para funcionários; apresentações de
música, dança, teatro e poesia falada; sessões de cinema; recursos de
audiodescrição; intérprete de LIBRAS; audioguias; entre outras.
Uma dessas iniciativas foi o ciclo de seminários Mediações Acessíveis, para
o qual convidamos artistas, professores, gestores de instituições públicas
e privadas e especialistas nos campos da acessibilidade para apresentar
suas pesquisas e refletir sobre o desenvolvimento das práticas acessíveis
nos espaços de cultura e educação. A série de oito encontros, realizados
no Instituto Tomie Ohtake, contou com 21 profissionais convidados, cujas
contribuições atravessaram assuntos tão diversos como a audiodescrição
e a interpretação em LIBRAS como recursos comunicacionais em atividades
educativas e culturais, a psicologia social em museus, a formulação de
políticas públicas para pessoas LGBTQI, o trabalho com pessoas da terceira
idade, a empregabilidade de pessoas com deficiência, a educação sobre sexo
e gênero nas escolas, estudos de caso específicos e outros desdobramentos
do eixo principal de pensamento do ciclo, que é a criação de uma cultura de
ampla acessibilidade em nossa sociedade.
Inicialmente concebido como um processo de formação interna
para os funcionários do Instituto Tomie Ohtake, com foco na equipe

8
de educadores, o ciclo Mediações Acessíveis teve todos os seus
seminários abertos gratuitamente aos públicos, e contou com cerca
de 300 participantes, entre educadores de museus, assistentes
sociais, professores, artistas e interessados no tema em geral.
Esta publicação é resultado desses encontros, reunindo os textos
produzidos por cada um dos profissionais convidados, aos quais
agradecemos imensamente pela contribuição, respondendo de
forma instigante às nossas provocacões, instigando-nos a repensar
temas sobre os quais tínhamos ideias cristalizadas e também rever
nossas práticas institucionais. Este material segue agora para
escolas e espaços de cultura, com distribuição gratuita.
Investir recursos e esforços em iniciativas como a desta publicação,
e mais amplamente no Programa de Acessibilidade do Instituto Tomie
Ohtake, é, para nós, retomando as premissas iniciais deste texto, a
tentativa de atualizar constantemente a cultura e o papel da instituição.
Inseridas na complexidade desafiadora da pós-modernidade, as
instituições culturais devem ser plataformas de pensamento e ação
para as questões contemporâneas (da arte, da cultura, da política,
do social) e, sobretudo, num mundo de globalização homogeneizante
e perda das diversidades, um lugar de encontro, de valorização da
diferença e de garantia dos direitos culturais.
Ainda que muitas vezes sejam objeto de incompreensão ou
descaso, os direitos culturais são essenciais para a formação de
indivíduos livres e de uma real humanidade. A Declaração Universal
dos Direitos Humanos, assim como o Pacto Internacional sobre
os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) - ambos
documentos da Organização das Nações Unidas -, são bem claros
em sua enunciação sobre o direito de todas as pessoas de participar
livremente da vida cultural. Nesse sentido, as instituições devem
orientar suas políticas para a criação das condições que garantam o

para todos, sem exceção   Felipe Arruda   9


acesso irrestrito às suas ofertas e que promovam a participação das
pessoas a partir de seus próprios fins e interesses culturais.
Em um recente debate sobre a gestão de espaços culturais5 e seu
papel no mundo de hoje, a conversa derivou para uma contestação
incisiva do lema positivista presente na bandeira brasileira, que eleva
as palavras ordem e progresso ao posto de ideal nacional. No último
minuto do debate, a uma das debatedoras6, responsável inicialmente
pela crítica ao slogan brasileiro, foi perguntado: qual seria então um
bom lema para nossa bandeira? A resposta inspirada, oferecida após
breves segundos de suspensão, trouxe uma nova palavra, falada na
língua do povo ingaricó: “Tamboro: para todos, sem exceção”.

NOTAS

1 Inicialmente chamado de Manhãs de História, com foco em contações de


histórias para crianças com e sem deficiência, o projeto criado em 2015
desenvolveu nos dois primeiros anos uma ampla série de atividades
dedicadas à acessibilidade, o que o elevou, em 2017, ao status de
Programa de Acessibilidade.

2 Serviços de assistência social do bairro do Canindé, localizado no


distrito do Pari, na borda leste do centro expandido de São Paulo. Região
que abriga comunidades expressivas de nordestinos, bolivianos, diversas
nacionalidades do continente africano, entre outros. Na região foram
mapeados cerca de dez serviços de assistência social a partir do contato
com três destes serviços: Centro de Acolhida Especial para Idosos
Sítio das Alamedas, Casa de Apoio Maria Maria e Instituição de Longa
Permanência para Idosos.

3 O Instituto Tomie Ohtake expandiu pela primeira vez as ações do


Programa de Acessibilidade para fora da sua cidade sede, São Paulo. A
capital pernambucana foi então escolhida para receber ações entre os
dias 20 e 30 de outubro de 2017. Contações de histórias, atividades para
bebês, cursos para professores e palestras sobre acessibilidade foram
realizados gratuitamente em parceria com instituições como a Caixa

10
Cultural Recife, o Cinema da Fundação/Museu, o Museu do Cais do
Sertão e o Paço do Frevo.

4 Oportunidade para agradecer profundamente e expressar minha


admiração pela equipe do Núcleo de Cultura e Participação do Instituto
Tomie Ohtake e colaboradores externos envolvidos, responsáveis por
todo o êxito do Programa: Luis Soares, Claudio Rubino, Maiara Paiva,
Victor Santos, Isadora Borges Brito, Bruna Kury, Bruno Perê, Diana
Tubenchlak, Fernanda Castilhos, Isadora Mellado, Julia Paccola, Kelen
Nascimento, Leonardo Bernardo, Liliana Tavares, Lívia Motta, Luiza De
Carli, Matias Monteiro, Misael Prado, Ricardo Miyada.

5 Debate parte do Laboratório de Gestão de Espaços Culturais, organizado


por Marta Porto, realizado no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc,
em São Paulo, em 19 de abril de 2018.

6 A debatedora era Mariana Varzea, museóloga, mestra em História Social


da Cultura e diretora da Inspirações Ilimitadas Projetos Culturais.

Felipe Arruda
Diretor do Núcleo de Cultura e Participação do
Instituto Tomie Ohtake

para todos, sem exceção   Felipe Arruda   11


INSTITUTO TOMIE OHTAKE EM REDE:
CULTURA, CIDADE E ACESSO

Luis Soares, Maiara Paiva e Victor Santos


Projetos Socioculturais

Os Projetos Socioculturais do Núcleo de Cultura e Participação


do Instituto Tomie Ohtake promovem experiências educativas e uma
programação gratuita em arte e cultura com foco no atendimento
de públicos que não têm garantidos direitos sociais como educação,
saúde, mobilidade urbana, moradia e cultura institucionalizada
– entendida como as expressões, materialidades e simbologias
produzidas pela sociedade e condicionadas por dinâmicas sociais
pelas quais instituições atuam na preservação e criação de discursos
sobre o patrimônio.
Populações às quais os direitos sociais são garantidos de maneira
frágil são vulnerabilizadas por dinâmicas sociais e por instituições
que limitam a ampla participação desses grupos ou indivíduos
na sociedade em que vivem. Tais limitações de atuação social
influenciam negativamente na representatividade dessas pessoas
e atuam de maneira seletiva na construção de discursos sobre o
patrimônio cultural, ou seja, limitam o direito à memória de grande
parte da população, tanto pelo acesso restrito ou precário à cultura
institucionalizada como pela não representação desses grupos
dentro do sistema da Arte.
Atuar em prol do acesso à cultura deve contemplar uma reflexão
sobre a rede de elementos que promovem a exclusão de grupos ou
indivíduos da cidadania completa, lançando às instituições de cultura

12
o desafio de tematizar, por exemplo, acerca do impacto da mobilidade
urbana, moradia e educação sobre o acesso às suas programações:
93% da população brasileira nunca viu uma exposição de arte e 70%
nunca entrou em um museu (pesquisas IPEA 2010).
Segundo pesquisa de hábitos culturais (LEIVA, 2014), 60% dos
usuários das instituições de cultura têm ensino superior e 46% são
das classes A e B. A educação superior é o fator mais significante
entre todas as faixas de renda econômica, resultando em maior
interesse e frequência nas instituições de cultura. De maneira geral,
por frequentadores e não frequentadores, os museus e exposições
de arte são relacionados a espaços de educação e a ausência das
classes populares nas instituições de cultura é relacionada, nessa
pesquisa, à “falta de conhecimento (educação) e à falta de acesso ao
conhecimento (condição socioeconômica)”.
Às instituições de cultura, contudo, cabe refletir não apenas sobre
o aspecto positivo da educação e do acesso a ela, no que museus
e exposições de arte poderiam colaborar, mas também questionar
o caráter negativo da arte e cultura institucionalizada que não
representam a experiência sensível e os conhecimentos de uma
parcela da população. Sem absorver a experiência social popular
em seus patrimônios e discursos, o acesso às instituições de cultura
pode significar, ao menos em parte, a continuidade dos processos de
exclusão, sem garantir o acesso à produção cultural e a preservação
de memória e patrimônio.

MESOPOTÂMIA CULTURAL
Deslocar-se de onde vive até uma instituição de cultura não é uma tarefa
fácil para a maioria dos moradores de São Paulo. Segundo pesquisa do Centro
de Estudos da Metrópole, do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento
(CEBRAP, 2005), o termo “Mesopotâmia Cultural” é certeiro para ilustrar o

Instituto Tomie Ohtake em rede:  cultura, cidade e acesso   13


fato de que quase todos os museus e instituições de cultura estão localizados
entre os rios Tietê e Pinheiros, no centro expandido da cidade. Apesar de ser
uma região com alta densidade demográfica, comporta também os bairros
com os maiores IDH e renda per capita da cidade.

VILA ALBERTINA CARANDIRU

LIMÃO

ÁGUA BRANCA CASA VERDE


VILA GUILHERME
Marginal Tiet
ê

LAPA
BARRA FUNDA BOM RETIRO
PARI

3
ALTO DA LAPA PERDIZES 5
BRÁS

SÃO PAULO
2

VILA MADALENA 4  10


CENTRO

BELA VISTA MOOCA

LIBERDADE
PINHEIROS 6
JARDIM PAULISTA
CAMBUCI

1 9
JARDINS PARAÍSO
Ma
rgin

8
al
Pin
he

IPIRANGA
iro

ITAIM BIBI
7
s

VILA MARIANA
MORUMBI

1 Museu da Imagem e do Som   603.197 6 Masp  288.883

2 Catavento  509.117 7 Museu Afro Brasil   209.0978

3 Pinacoteca Luz  425.575 8 Museu da Casa Brasileira   150.472

4 Museu do Futebol   419.363 9 Casa das Rosas   116.487

5 Museu da Língua Portuguesa   386.798  10 Museu da Imigração   94.781

14
Fonte: Mobilize Brasil
Autor: Mobilize Brasil
Postado em: 14 de setembro de 2016

A ONG Rede Nossa Cidade publicou, em 2017, pesquisa apontando


que a média de renda das famílias, em 25 distritos da periferia de São
Paulo, está abaixo de dois salários mínimos.

MATEMÁTICA DA CULTURA INSTITUCIONALIZADA

transporte + entrada x família de = custo para visitar


4 pessoas um museu
(trazendo lanche
de casa)

média de salário – custo para = acesso nulo ou


em 25 distritos visitar museus precário à cultura
de São Paulo institucional

MUSEUS COMO ESPAÇO PÚBLICO:


LUGAR DE ENCONTRO DA DIVERSIDADE
A Carta de Santiago de 1972, retomada nos últimos anos por
parte das instituições brasileiras de cultura, apresenta os conceitos
de museologia social e museu integral: instituições devem se
tornar conscientes de sua função social relacionada à preservação

Instituto Tomie Ohtake em rede:  cultura, cidade e acesso   15


da memória, considerando a representabilidade da voz dos mais
diversos setores da sociedade na construção do patrimônio que
deve representá-los.

“Cidadania é a cidade construída para o bem comum, não é a


qualidade individual, mas é a possibilidade de todos viverem e se
encontrarem. Nos espaços públicos, ainda é possível esse encontro
dos diferentes, então a cidade que possibilita essas reuniões tem
um sentido importante como metrópole. Em São Paulo, existem
shows públicos, shows de graça (...). Ou seja, na metrópole nem
tudo é bom e nem tudo é ruim, e o que você vai ver em São Paulo
é a possibilidade de todo mundo encontrar um lugar onde pode se
realizar como cidadão. A metrópole é esse lugar”.

A metrópole é rica porque é o lugar da reunião dos diferentes. A


grande metrópole reúne todos, várias culturas, etnias, pessoas que
pensam de forma diferente umas das outras. É isso que torna a
cidade viva, ativa e dinâmica. Porém, ao contrário disso, hoje estamos
vivendo um processo que homogeneíza como consumidores. Os
nossos desejos não são desejos de uma vida em comum, mas de
uma vida individual como consumidor. O exercício de cidadania
passa, então, a ser o exercício de cidadania como consumidor. Mas é
preciso lembrar que nós não somos consumidores, nós somos seres
humanos. A história coletiva se constrói com as histórias individuais.
Liberdade na cidade significa usar a cidade.”

Ana Fani Alessandri Carlos, Revista Sesc digital, 28/04/2018.

ARTICULAÇÃO EM REDE
O acesso à cultura institucional envolve compreender que uma
série de elementos sociais impacta sobre sua dinâmica e, sendo

16
assim, a atuação de uma instituição de cultura sobre o tema deve
privilegiar a atuação em rede.
Os projetos socioculturais do Instituto Tomie Ohtake formulam
parcerias com instituições de educação, assistência social, saúde
e cultura, promovendo diálogos e criando relações que valorizam
a cultura e o empoderamento dos participantes. Privilegia-se a
discussão de conceitos como “território educativo e cultural”:
valorizando as possibilidades culturais dos territórios em que
são realizadas as ações; “pedagogia democrática”: ações
construídas a partir do diálogo e dos interesses dos participantes;
“interdisciplinaridade”: a arte e a cultura como campo expandido
de discussões de todos os aspectos que envolvem a vida; o direito à
cidade e a ativação das instituições de cultura como espaços públicos
e de encontro da diversidade.

Instituto Tomie Ohtake em rede:  cultura, cidade e acesso   17


Em 2017, foram mais de 50 parcerias estabelecidas, cerca de 500
ações realizadas e mais de 15 mil atendimentos em 4 territórios: os
bairros de Pinheiros – e seu entorno – e do Canindé, em São Paulo, e
as cidades de Itapevi e Recife.
Entre as ações destacam-se cursos para professores de escolas
do bairro do Canindé, discutindo o que é ser mulher nesse território
e propondo atividades práticas e teóricas, as quais, entre outros
estímulos para discussão, tiveram obras da exposição Yoko Ono | O
Céu Ainda É Azul, Você Sabe…, que valorizam aspectos da condição
feminina dentro dos trabalhos.
Houve, ainda, um curso de marcenaria envolvendo uma turma
de jovens ouvintes e surdos, com foco na construção de mobiliário
urbano e posterior doação para espaços públicos da cidade; uma
formação em arte, cultura e costura para mulheres em situação
de rua; contação de histórias para crianças sem e com diferentes
deficiências físicas e intelectuais sobre artistas com exposições em
cartaz no Instituto Tomie Ohtake; formações sobre o uso de técnicas
de audiodescrição e contação de histórias como ferramentas
educativas e o trabalho com recursos artísticos para a primeira
infância; oficinas gráficas para jovens em liberdade assistida;
atividades para famílias com bebês de 0 a 18 meses no Instituto
Tomie Ohtake e em diferentes espaços da cidade, como CEIs e Centros
Especializados em Reabilitação da Prefeitura; curso composto por
debates com professores e pesquisadores pautados pelo combate
ao preconceito e discriminação no ambiente escolar infantil;
curso de fotografia para jovens em situação de vulnerabilidade
da cidade de Itapevi; visitas mediadas às exposições em cartaz
no Instituto Tomie Ohtake utilizando a Língua Brasileira de Sinais
(LIBRAS), audiodescrição e objetos táteis, entre outros recursos de
acessibilidade; uma programação cultural composta por atividades

18
de música, teatro, saraus, dança, cinema e oficinas de linguagens
artísticas diversas construída junto aos conviventes de 6 abrigos para
pessoas em situação de rua no bairro do Canindé, em São Paulo.
Esses projetos e ações foram pautados pelas reflexões sobre
acessibilidade às instituições de cultura que culminaram, no Instituto
Tomie Ohtake, no Programa de Acessibilidade 2017 e em uma atuação
transversal em seus outros projetos e ações. Mobilidade, com a linha
Expresso Acesso, atividades em outros territórios e ações extramuros,
como as que aconteceram no Canindé, Itapevi e Recife, e a articulação em
rede e diversidade de parcerias com equipamentos públicos de educação,
saúde, assistência social e cultura, nortearam as ações educativas do
Instituto Tomie Ohtake. A realização do Mediações Acessíveis: Ciclo de
encontros sobre acessibilidade em espaços de educação e cultura e a
publicação que segue pretenderam aprofundar e registrar as discussões
sobre acessibilidade e instituições de cultura durante o ano de 2016.

Instituto Tomie Ohtake em rede:  cultura, cidade e acesso   19


Fotografias: Claudio Rubino, Maiara Paiva,
Ricardo Miyada e Victor Santos.

20
LUIS SOARES
Desenvolve pesquisa sobre estratégias de mediação e
participação de públicos em situação de vulnerabilidade
social em instituições de cultura. Atua com a articulação
de parcerias entre equipamentos culturais e instituições
públicas ou privadas de saúde, educação e assistência social
de modo a articular os conteúdos pedagógicos trabalhados
dentro dessas instituições com a programação oferecida por
equipamentos de cultura. Atualmente coordena o núcleo
de projetos do Núcleo de Cultura e Participação do Instituto
Tomie Ohtake e é coordenador geral do Programa de
Acessibilidade da instituição. Foi colaborador do Museu de
Arte Contemporânea da USP, Pinacoteca e Bienal de Arte de
São Paulo. É ator formado pela Escola de Arte Dramática e
estudou filosofia na Universidade de São Paulo.

MAIARA PAIVA
Formada em Relações Públicas pela Faculdade Cásper
Líbero, atua na área de produção cultural há mais de 10
anos. Foi coordenadora de projetos na Praça Victor Civita
entre 2010 e 2015 e, no Instituto Tomie Ohtake desde 2016,
está à frente da produção de projetos voltados para públicos
em situação de vulnerabilidade.

VICTOR SANTOS
Com formação em geografia e educação pela Universidade de
São Paulo, atua desde 2013 no Instituto Tomie Ohtake como
gestor e produtor cultural. Já tendo atuado na rede pública
e privada de ensino, hoje desenvolve projetos socioculturais
com foco em educação e acessibilidade. Desde 2015 coordena
um projeto de marcenaria para crianças e jovens com foco na
produção de mobiliário urbano.

Instituto Tomie Ohtake em rede:  cultura, cidade e acesso   21


MEDIAÇÕES, REFLEXÕES E
RECONHECIMENTO
Claudio Rubino

Quase tudo pronto para mais uma contação de histórias. Luis


cruza o hall do Instituto Tomie Ohtake em minha direção e diz: “As
crianças chegaram. Você pode recepcioná-las?”
Na sequência, subo as escadas e encontro Lívia, indo em direção ao
grupo que está na porta. Juntos damos boas-vindas para as crianças,
que já começaram a participar da atividade assim que saíram da escola.
Na breve introdução para organização dos grupos, eu e Lívia
realizamos audiodescrição do edifício, um recurso muito importante
para quem não enxerga conhecer a arquitetura do prédio e uma
excelente prática de observação para quem enxerga.
Na sequência, informamos para as crianças que elas irão se
juntar a outras crianças, de outras escolas, outros lugares da cidade,
e que muitas delas não enxergam ou não ouvem ou usam cadeira de
rodas ou, ainda, têm outras formas de observar e entender o mundo.
Elas silenciam durante breves instantes, com semblantes surpresos
que precedem uma cascata de perguntas uníssonas, entre elas as
mais recorrentes: “Mas como? Elas se divertem? Como elas fazem
para brincar? Elas vão entender? Elas são felizes?”
Pausa para a importante reflexão entre elas.
...
Parte da atividade está completa.

22
Sim, devemos falar sobre pessoas com deficiência, diversidade,
vulnerabilidades e outras diferentes características que nos
constituem, sejam elas físicas, sensoriais, comunicacionais, sociais
e de orientação de gênero, etnias ou tudo isso junto e misturado.
Falar sobre questões relacionadas às vulnerabilidades é tornar
visível quem é constantemente negligenciado e excluído do convívio
social, do lazer, do brincar, da educação. Pessoas invisíveis devido a
deficiências sociais que geram e reforçam barreiras físicas, atitudinais
e de comunicação que podem ser desfeitas com o convívio, com a
relação com o outro, as trocas de saberes, paciência e o respeito à
diversidade. Segundo o catedrático espanhol José Gimeno Sacristán1,
o reconhecimento da diversidade e a sua prática são fatores positivos
que conduzem a uma maior abertura para a compreensão do outro e
a sua relação com a natureza, o que, consequentemente, possibilita
melhores condições de relacionamento de tolerância entre as
pessoas e uma maior harmonia social. Pensando assim, espaços
culturais são potentes aliados na construção de relações plurais
entre públicos, fluxos e interesses sociais.
No início da minha trajetória como educador, tentei inúmeras
vezes esconder minha deficiência física no membro superior
esquerdo, mas era praticamente inevitável, pois as crianças (e
adultos também) percebiam e desviavam a atenção para todo
movimento que eu fazia com a minha mão pequena. Muitas vezes
isso me deixava incomodado, pois eu acreditava que era uma
interferência na mediação das visitas em exposições e oficinas de
arte. Com a prática, ao longo dos anos, percebi que na verdade
eu tinha em mãos (literalmente em uma delas) a possibilidade de
ampliar debates que iam além do que era apresentado pelo curador
ou pelas obras expostas - entendi que não somos e nem devemos
ser imparciais na educação, e que minha diferença física poderia

Mediações, reflexões e reconhecimento   Claudio Rubino   23


contribuir com a expansão de conceitos sobre respeito e diversidade.
Passei, então, a falar sobre a minha deficiência nas visitas quando
alguém perguntava, geralmente de modo muito natural e breve, mas
que de alguma forma contribuía para os debates de leitura de arte;
e quase sempre havia outra pessoa que, se não conhecesse pessoas
com deficiência, tinha uma também.
Uma lembrança em particular foi um pouco mais marcante: quando
trabalhava como educador em uma grande exposição2 em São Paulo,
durante o acolhimento e boas-vindas ao grupo antes de entrar nas
salas expositivas, uma das crianças gritou “olha a mãozinha dele! É
igual à do Pedro!” O grupo, que tinha cerca de 20 crianças, se abriu e
Pedro, um menino tímido e pequeno de aproximadamente 7 anos que
estava lá no fundo, correu em minha direção e tocou direto na minha
mão esquerda, pequena e com as mesmas características de síndrome
de Poland3, como a mão direita dele. Tudo ficou em silêncio. Pedro me
abraçou forte e não desgrudou da minha mão na hora seguinte. Passei
uma hora e vinte minutos segurando o choro (meu recorde). Pedro
nunca havia encontrado alguém com a mão como a dele, eu nunca
havia encontrado alguém com a mão como a minha. Nos admiramos,
abraçamos e brincamos: “somos do mesmo planeta!”
Foi nesse dia que eu entendi que a minha deficiência é bem rara,
mas não é única.
Nesse dia eu decidi que minha atuação seria focada na educação
para pessoas com deficiência. Um simples contato fez toda a
diferença para mim e provavelmente para o menino também.
Representatividade importa muito; por isso, obrigado, Pedro! Não
tivemos mais a oportunidade de conversar, mas foi depois de te
conhecer que investiguei as causas da minha deficiência e encontrei
outras pessoas como nós; queria te dizer que alguns são famosos,
como o corredor Fernando Alonso!4

24
Quando crianças e adultos que participaram de ações com e para
pessoas com deficiência e outras vulnerabilidades – como as que
foram promovidas pelo Projeto Manhãs de História5 – compartilham
o mesmo espaço com o objetivo de se relacionar com as diversas
formas da arte, se divertindo, participando de uma história ou
conversando, podemos afirmar que a participação de todos e a
inclusão são possíveis desde que desenvolvidas com recursos,
metodologias e procedimentos apropriados.
Quer ter atenção, sem gritar, das crianças que ouvem e enxergam?
Tente LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais). Elas, na maioria das vezes,
focam toda atenção nos sinais e posição das mãos, quase como se
fosse um jogo. E quando as crianças que ouvem se encontram com
as crianças surdas nas atividades oferecidas pelo Instituto Tomie
Ohtake, elas começam a aprender juntas, entre elas, sem instruções
ou métodos que forcem a interação – pois, como dizia Vygotsky, os
sujeitos se desenvolvem na relação de uns com os outros e seu
meio6. Todos temos as mesmas necessidades de brincar, aprender,
amar, trabalhar e sermos respeitados.
Nos tempos atuais, cultura se define pela pluralidade e pela
diversidade de aspectos e interfaces que compreendem dinâmicas
abertas às transformações e à incorporação constante de valores
novos. A multiplicidade de manifestações culturais, quando
adequadamente apresentada, pode influir positivamente para
um melhor reconhecimento da cultura tanto do passado como da
atualidade, bem como possibilitar ao sujeito uma melhor convivência
e confrontação com a educação, com as produções culturais
inovadoras e com as rupturas próprias das novas linguagens, abrindo
um importante espaço para o estímulo de sua própria produção.

Refletindo e estimulando essas práticas para sociedades mais


heterogêneas, nós que atuamos no Projeto Manhãs de História

Mediações, reflexões e reconhecimento   Claudio Rubino   25


estruturamos um ciclo de palestras direcionado aos educadores
do Instituto Tomie Ohtake, com o objetivo de promover conversas
relacionadas às questões de acesso e vulnerabilidades,
instrumentalizando de modo teórico e prático os profissionais que
estão diretamente em contato com o público.
Entretanto, quando apresentamos internamente a programação
pudemos perceber que os encontros deveriam ser abertos, pois os
convidados trariam debates de extrema importância para instituições
de cultura e educação formal e não formal. Dessa forma, tivemos 300
pessoas que participaram dos encontros realizados no Instituto Tomie
Ohtake entre os meses de abril e novembro de 2016, que abordaram
os temas: O que é acesso? Expansão de conceitos nos equipamentos
culturais; LGBT e a promoção da diversidade na cultura - desmistificando
lugares comuns; Tramando palavras para desconstruir barreiras
sensoriais - pessoas com deficiência visual nas programações culturais;
Práticas e apropriações de espaços culturais contra as vulnerabilidades
socioeconômicas; Diversidade intelectual - caminhos para as relações
com o saber; Promoção da identidade e culturas surdas para a
representatividade nos espaços culturais; Idosos, partilha de lembranças
e experiências; Deficiências múltiplas, capacidades singulares.
Nos encontros do ciclo de palestras e conversas Mediações
Acessíveis foi possível debater conceitos amplificados de experiências
acessíveis em equipamentos culturais por meio de práticas e
recursos de educação inclusiva para que todos tenham acesso à
cultura, às artes e às várias formas de comunicação. Os encontros
tiveram como objetivo colaborar para trocas de experiências e
reflexões entre profissionais da cultura, além de divulgar ações de
acessibilidade cultural realizadas por algumas das mais importantes
instituições do país, considerando o seu entorno e o protagonismo de
representantes dos grupos sociais mencionados.

26
Foram convidados profissionais com experiências acadêmicas e
práticas diretas com os públicos, pessoas com e sem deficiência e
outras vulnerabilidades que desenvolvem ações de arte e educação.
Cada palestrante teve liberdade para escrever um texto com
impressões pessoais, experiências sobre o assunto, reflexões sobre
o tema, referências teóricas e pesquisas científicas que norteiem
leitores desse conteúdo e estimulem a reflexão. A escrita é livre para
quem conhece ou para quem nunca teve contato com esses assuntos.

Além dos textos dos convidados para as mesas de debates, esta


publicação também abarca textos da talentosa contadora de histórias
Andi Rubinstein, da educadora Diana Tubenchlack, que desenvolve
atividades com e para bebês e famílias mostrando a potência de
ações não verbais, e da especialista em audiodescrição Lívia Motta,
que tanto contribui com o projeto por meio de recursos para cegos,
baixa visão e pessoas com deficiência visual nas diversas ações,
além da participação em uma das mesas do ciclo.
As realizações das ações do Projeto Manhãs de História não
seriam possíveis sem a liberdade criativa e confiança de Felipe
Arruda, diretor do Núcleo de Cultura e Participação, as práticas
inclusivas fomentadas pela orientação de Luis Soares, coordenador
de projetos socioculturais, a participação de pessoas que acreditam
e sentem o que fazem, como os educadores da equipe coordenada
por Felipe Tenório e Melina Martinho, ou sem a incrível força de
produção de Maiara Paiva e Victor Santos. Todo o empenho entre
as equipes e a participação do público alçou o Projeto Manhãs de
História à categoria de Programa de Acessibilidade do Instituto Tomie
Ohtake, que nos próximos anos pretende manter e construir mais e
mais ações inclusivas, promovendo acesso em seu amplo sentido.
Boa leitura!

Mediações, reflexões e reconhecimento   Claudio Rubino   27


NOTAS

1 SACRISTÁN, José Gimeno. Currículo e diversidade cultural. Petrópolis:


Vozes, 1995.

2 Exposição Picasso na Oca – uma retrospectiva, São Paulo, 2004.

3 Deficiência rara que afeta a região torácica e é caracterizada pelo


subdesenvolvimento ou ausência do músculo peitoral maior de um lado
do corpo, em alguns casos provocando Sindactilia nas mãos.

4 Fernando Alonso Díaz é um automobilista espanhol, bicampeão mundial


de Fórmula 1 em 2005 e 2006 pela Renault, além de vice-campeão em
2010, 2012 e 2013 pela Ferrari.

5 Inicialmente chamado de Manhãs de História, com foco em contações


de histórias para crianças com e sem deficiência visual, o projeto criado
em 2015 desenvolveu nos dois primeiros anos uma ampla série de
atividades dedicadas à acessibilidade, que o elevou, em 2017, ao status
de Programa de Acessibilidade.

6 VIGOTSKY, Lev Semenovich. A formação social da mente: o desenvolvimento


dos processos psicológicos superiores/L.S. Vigotsky organizadores Michel
Cole.[et al.]; 7ª ed. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 2017.

CLAUDIO RUBINO
Gestor de acessibilidade cultural, licenciado e bacharel em
artes visuais pela Faculdade de Belas Artes de São Paulo, pós-
graduado em educação inclusiva com ênfase em deficiência
física pela UNIFESP. Um dos coordenadores do Projeto Manhãs
de História - Programa de Acessibilidade do Instituto Tomie
Ohtake. Há 18 anos desenvolve trabalhos de arte educação
em museus e equipamentos de cultura com ênfase no
atendimento e planejamento de ações para inclusão física,
comunicacional e sensorial de pessoas com deficiência.

28 NÚCLEO DE CULTURA E PARTICIPAÇÃO


UM ESPAÇO PARA TRANSVER
Andi Rubinstein

Imagine uma montanha de ouro! Você provavelmente nunca viu


uma, mas se já viu uma montanha e conhece o brilho do ouro, sua
imaginação é capaz de juntar as duas experiências e criar, dentro de
você, uma montanha de ouro.
É com essa fala que geralmente inicio meus cursos sobre narração
de histórias; falando sobre o poder da imaginação para transformar
universos possíveis e ver o impossível.
O Projeto Manhãs de História1 foi uma oportunidade de transformar
este universo: de um lado, tínhamos um espaço com exposições de
arte; do outro, crianças com deficiência visual, crianças que vivem
em abrigos, crianças e jovens que não frequentam instituições
de arte. Como juntar esses dois lados que aparentemente não se
encontravam? Como trazer esse público para o museu e fazê-lo fruir
o seu momento?
Transvendo! Imaginando universos possíveis. Fazendo isso
através das histórias.
A proposta era criar e contar uma história, baseada no artista da
exposição em cartaz, para acolher e incluir públicos diversos: em
princípio, crianças com deficiência visual. Crianças videntes também
estariam presentes para que compartilhassem o momento juntas.
Inicialmente, imaginamos2 uma narração de histórias mais
simples, com alguns elementos táteis e olfativos que contribuíssem

Um Espaço para Transver Andi Rubinstein  29  


para a compreensão dos deficientes visuais e com o uso da
audiodescrição para narrar todas as imagens utilizadas. Assim
desenvolvemos uma narração sobre a artista Tomie Ohtake.
Depois desse, vieram novos temas. Cada novo começo trazia uma
nova proposta que ia se abrindo, se desenvolvendo. Passamos de
uma narração de histórias mais simples e delicada para grandes
investimentos tecnológicos usando video mapping em uma parede
curva para falar sobre Joan Miró e video mapping de imersão em
todas as paredes de uma sala para falar sobre Frida Kahlo.
A audiodescrição passou a ser feita por mim ao mesmo tempo em
que narrava a história. Para isso, tive que adaptar tempos verbais
e entender como compor uma narrativa que juntava uma história
acontecida no passado com a descrição das imagens acontecendo
no presente.
Quando achamos que havíamos descoberto a receita, resolvemos
mudar tudo, sair das pequenas salas e ganharmos o espaço do hall,
que atendia a um público muito maior, para as exposições Picasso – mão
erudita, olho selvagem e Os muitos e o um – arte contemporânea brasileira
na coleção de Andrea e José Olympio Pereira.
A cada novo começo, nos deparávamos com o desconhecido e
com a necessidade de mais uma vez transver. Como assim, video
mapping para deficientes visuais? Como assim, legumes que fazem
sons para deficientes auditivos? Sim. A audiodescrição nos mostrava
como narrar as imagens e a interpretação em LIBRAS nos ensinava
de que maneira as possibilidades sonoras seriam “ouvidas” com
mais clareza.
A cada nova etapa, o público também aumentava e se diversificava.
Depois dos deficientes visuais, vieram os deficientes auditivos,
crianças e jovens com paralisia cerebral, adultos e idosos que vivem
em abrigos.

30  
Descobri ao longo do processo que as maneiras de construir uma
narrativa são infinitas. É preciso escolher um ponto de partida, um
fio condutor, e confiar nele, mesmo que ele se transforme ao longo
do caminho. É ele que dá um eixo para as tantas possibilidades; que
vai alinhavando as construções cenográficas, musicais e imagéticas.
Ele é o esqueleto, e como qualquer esqueleto, quanto mais firme e
flexível, mais possibilidades de alcance ele terá.
Por isso, trabalhamos com o fio narrativo ao mesmo tempo em
que discutimos cada passo dessa narração com todos os membros
da equipe. A força da equipe foi o grande poder deste projeto. A
habilidade de ouvir as ideias do outro fez com que crescêssemos
como grupo e tivéssemos a oportunidade de aproveitar os dons
aparentes e escondidos de cada um.
Foi através dessa escuta que descobrimos que alguém podia
tocar castanholas ou fazer acrobacias. E a abertura para receber
esses dons de todos fez com que nossas apresentações ficassem
cada vez mais ricas e com poéticas que jamais poderíamos descobrir
e criar sozinhos.
Quanto ao público, ah, minha maior descoberta foi que o público
é sempre o público. Simples assim. As crianças, com e sem
deficiência, querem se divertir. Estão abertas para o novo, para
aprender, para conhecer. Se vamos até elas com respeito, se lhes
oferecemos alimento de qualidade, elas o recebem com prazer. Não
precisamos fazer uma narração de histórias especial para pessoas
com deficiência. Podemos escolher o fio condutor que faz sentido
para este grupo de pessoas neste determinado momento e encontrar
as maneiras de acolher e incluir públicos diversos.
As crianças com e sem deficiência irão se beneficiar tanto da
oportunidade de ver e ouvir audiodescrição e tradução em LIBRAS
quanto da maravilhosa chance de compartilhar uma experiência com

Um Espaço para Transver Andi Rubinstein  31  


crianças com necessidades diferentes das suas. Isso coloca todos os
nossos problemas e visões de mundo numa outra perspectiva. Isso abre
caminhos para formarmos cidadãos mais fortes e compreensivos neste
mundo.
Saímos de cada uma dessas experiências com a certeza de que
estávamos inaugurando uma nova possibilidade de comunicação com
públicos distantes e que estávamos apresentando arte, diversidade e
cultura para quem quisesse ver.
Como diria o grande poeta Manoel de Barros: “O olho vê, a
lembrança revê e a imaginação transvê. É preciso transver o mundo.”
Que mais projetos, como o Manhãs de História, possam transver o
mundo imaginando novas possibilidades de acessibilidade e inclusão
para vivermos com mais respeito, mais humanidade e mais paz.

NOTAS

1 Inicialmente chamado de Manhãs de História, com foco em contações de


histórias para crianças com e sem deficiência, o projeto criado em 2015
desenvolveu nos dois primeiros anos uma ampla série de atividades
dedicada à acessibilidade que o elevou, em 2017, ao status de Programa
de Acessibilidade.

2 Luis Soares, Victor Santos, Claudio Rubino, Maiara Paiva e Lívia Motta.

ANDI RUBINSTEIN
Contadora de histórias e bonequeira. Ela conta histórias
há mais de 15 anos. Sua arte já a levou a diversas
partes do mundo para compartilhar histórias contadas
e sentidas. Do projeto Manhãs de História, entre tantos
aprendizados, Andi guarda a alegria de ter recebido seu
sinal e de ter tido a oportunidade de trabalhar com uma
equipe focada, alegre e dedicada.

32  
BEBÊS NAS EXPOSIÇÕES DE ARTE
ENCONTROS, EXPERIÊNCIAS E COMPARTILHAMENTOS

Diana Tubenchlak

Chororô! Confusão! Corre-corre para trocar a fralda! A paciência


acabou! Grita de fome! e os vários outros estereótipos de quando se
pensa em um grupo com vários bebês e seus familiares dentro de
uma exposição de arte passam longe do que vem acontecendo nos
encontros do No Colo.
Por aqui temos visto olhinhos que brilham, mãos que descobrem,
sorrisos, muita concentração, cara de curiosidade, ouvidos atentos e
muita, muita harmonia, coletividade e sintonia.
De fato, no planejamento das ações almejávamos isso tudo, mas
é quando nos vemos frente a frente, frente às exposições em cartaz
e frente aos materiais escolhidos para as oficinas, que saberemos
como mais um encontro irá acontecer.
Em cada No Colo mães e pais, que viram seus cotidianos
transformados com a chegada de seus bebês, buscam espaços
de convivência que transmitam segurança e possibilidade de
encontros. Nesse sentido, um espaço de arte e cultura como o
Instituto Tomie Ohtake pode ser um ambiente de troca entre pares
que passam pelos mesmos desafios que chegam junto com a
maternidade e a paternidade.
No Colo é planejado e realizado a partir de alguns pressupostos, são
eles: a relação entre mães, pais e bebês; a multissensorialidade; a inter-
relação entre exposição, mediação e oficina; e a potência pedagógica
dos espaços e materiais.

Bebês nas Exposições de Arte Diana Tubenchlak  33  


Este outro espaço de relação criado para as famílias convida
para um desvio das ações cotidianas e oferece aos pais e mães a
possibilidade de mediar as produções artísticas expostas e aquelas
a serem realizadas pelos próprios bebês. Isso acontece dentro de
uma situação em que se sentem confortáveis, com espaço para
amamentar, com trocador, estacionamento para carrinhos e tudo
mais do que podem precisar.
A multissensorialidade é o cerne de toda a ação; a visita às
exposições conta com vários recursos de acordo com sua temática.
Além disso, temos a presença de música ao vivo. Ao longo do ano
contamos com a presença de Mariana Furquim, Uirá Ozzetti, Cris
Bosh e Danilo Penteado, que tocaram e cantaram um repertório
afinado ao que se via nas mostras.
Os eixos exposição, mediação e oficina estão inter-relacionados, de
modo que cada ação seja pensada de forma ímpar – os materiais de
mediação e das oficinas são escolhidos para cada situação e uma nova
proposta é feita a cada encontro. Para a mediação nas salas expositivas,
uma série de objetos – visores, tecidos, vestuários, entre outros - são
dispostos ao longo da mostra em cartaz, criando um diálogo tátil e visual
com os pequenos visitantes. Em seguida, as oficinas são pensadas de
forma que adultos e bebês passem juntos por experiências em diálogo
com o que foi descoberto. Assim, em Aprendendo com Dorival Caymmi -
civilização praieira os bebês faziam um percurso por elementos vindos
da praia – areia, conchas e pedras. Enquanto isso, os adultos produziam
as “garrafinhas do mar”, que seriam ofertadas aos seus filhos. Já em
cada um dos três encontros da exposição Picasso – mão erudita, olho
selvagem, diferentes oficinas de pintura com tintas artesanais foram
oferecidas, com diversidade de suportes e ferramentas.
A ideia de espaço e material como convites à experiência é
amplamente desenvolvida em todas as ações do No Colo. Acredito

34  
que várias formas de comunicação, além da verbal, podem convidar
os bebês para as propostas artísticas. Dessa forma, o acesso aos
espaços e materiais é organizado com o intuito de criar situações de
autonomia e descobertas para os pequenos visitantes. Em um dos
encontros da exposição sobre Picasso, um varal de fronhas brancas
recheadas de guizos se apresentava ao alcance das pequenas
mãozinhas. No momento em que passavam buchas e escovões
banhados de tintas artesanais nas fronhas, o som do guizo se
revelava e ritmos eram criados.
As ações do No Colo ainda contam com encontros de formação
para educadores do Instituto Tomie Ohtake e para professores de
Educação Infantil das redes pública e privada de ensino. Realizaram-
se também duas itinerâncias com uma proposta de produção de
brinquedos para bebês no Centro de Acolhida para Mulheres e
Crianças Maria Maria, além de uma oficina de pintura com tintas
artesanais na Biblioteca Villa-Lobos.
Por entender a Educação Infantil como indissociável da arte, as
instituições culturais podem potencializar seu papel de laboratório
de experiências artísticas para professores de creches e escolas.
Nesta toada, convidamos esse público para participar do curso Arte
para (ou com) crianças pequenas – Compartilhamento de experiências
do No Colo. Foi um momento em que apresentamos e discutimos os
pressupostos aqui já mencionados, compartilhamos as propostas
artísticas e materiais desenvolvidos especificamente para os bebês
de até 18 meses e debatemos as possibilidades de transposição das
atividades para os locais em que os participantes trabalham.
É importante ressaltar que nesse curso tivemos também a
presença de terapeutas ocupacionais, psicólogas e outras pessoas
que trabalham com tratamento e inclusão de crianças pequenas com
deficiência, o que foi fundamental para aprofundarmos os diálogos

Bebês nas Exposições de Arte Diana Tubenchlak  35  


sobre o papel da arte nos processos inclusivos em diversos espaços
de nossa sociedade.
Desenvolvemos a ideia de que as atividades com bebês nos
espaços de arte e cultura trazem contribuições para a sociedade
nos campos das relações interpessoais, na inclusão de pessoas
com e sem deficiência nos diversos circuitos e nas pesquisas para o
desenvolvimento da Educação Infantil.

DIANA TUBENCHLAK
É educadora, consultora em arte/educação e pesquisa as
inter-relações entre museus de arte e escolas. Mestra
em Artes, sob a linha de pesquisa “Processos artísticos,
experiências educacionais e mediação cultural” no Instituto
de Artes da UNESP, especialista em linguagens artísticas
contemporâneas: ensino/aprendizagem pela Faculdade
Santa Marcelina e licenciada em Educação Artística pela
UERJ. Trabalha com arte/educação em escolas, projetos
sociais, ONGs, museus e espaços culturais desde 2001. Seu
foco de atuação é em mediação em arte contemporânea,
formação de educadores e elaboração de propostas
artísticas para todas as faixas etárias. Idealiza e desenvolve
as ações do No Colo – atividades para bebês e famílias, no
Instituto Tomie Ohtake. Foi palestrante no I Seminário Bebês
no Museu: Experiências (2014), na Casa das Rosas. Realiza
cursos e palestras em diversas instituições culturais e
educacionais.

36  
1.
O QUE É ACESSO?

EXPANSÃO DE
CONCEITOS NOS
EQUIPAMENTOS
CULTURAIS
SIR CHARLES E A MEDIAÇÃO
Renata Bittencourt

A pintura tem mais de dois metros de altura. A dimensão


monumental já convida o olhar para a observação de uma figura
imponente, que reforça sua presença ao se multiplicar por três na
superfície da tela. Costume preto, gola rolê branca, repetindo o tom
dos sapatos desenhados em couro. O casaco vermelho dá mais
amplitude ao corpo e esculpe em cada ângulo dobras e sombras. A
cabeça se volta para diferentes direções em cada enquadramento,
parecendo reconhecer nossa presença. Coroando a cabeça, um
penteado que dá contorno definido aos cabelos crespos.
Escolhi essa pintura1 para tratar da ideia de mediação por ser um
retrato de um indivíduo mas também de uma época, e, sobretudo,
por ser testemunho das intenções de representação de um pintor
também negro como o retratado. Barkley Hendricks escolhe
homenagear um traficante, nem sempre fiel às suas entregas,

38  
atuante nos arredores de Yale, universidade onde estudou. Decide
por um formato de grandes dimensões digno dos reis e rainhas que
a história da arte nos legou. Busca nesse repertório histórico os
nobres retratos do grande Sir Anthony van Dyck, autor de retratos da
nobreza do século XVII, como o homônimo Charles, também portador
de um casaco vermelho. Do autor adota, ainda, a repetição da figura
que vemos no retrato de Henrique II, encontrada também na tradição
de representação das três graças.
O Charles de Hendricks, se não é portador de graça exclusivamente,
certamente é de swag. O termo em inglês pode possivelmente ser
traduzido com alguma liberdade por ginga, manha, e, é claro, charme.
A pintura sugere, pelas referências do vestuário, a década de 1970, em
que, para além das roupas, todo um vocabulário cultural contaminava
as ruas dos Estados Unidos, manifestando as ideias difundidas pelos
movimentos de direitos civis e do Black Power. Desejamos imaginar
Charles a caminhar pelas ruas de um bairro negro americano, exibindo
seu estilo elegante e exuberante. Essa potencial desenvoltura e esse
corpo autônomo, assertivo, que afirma sua presença, devem ser lidos
como corpo político, que desafia a sociedade que quer lhe relegar à
invisibilidade, à subalternidade e à projeção de estereótipos.
O pintor faz chegar até nós algo dessa história na altivez do
personagem, no modo como sua identidade se constrói a partir de
uma estética negra, urbana, popular, de autoafirmação, legível pelos
seus pares. Barkley atua como mediador de sua cultura e de seu
tempo, assumindo para sua obra uma primeira pessoa que identifica
no personagem elementos que atualizam sua herança.
O exemplo nos serve para pensar no papel dos artistas e também
das instituições como mediadores conscientes da existência de um
campo cultural expandido onde coexiste uma multiplicidade de vozes.
Sem este reconhecimento, a história é enviezada, a percepção que

Sir Charles e a Mediação Renata Bittencourt  39  


temos do potencial criativo da sociedade é insuficiente. É no campo
da cultura que as sutilezas que compõem as subjetividades e as
identidades raciais, sexuais, de gênero, de classe e de nacionalidade
emergem como manifestações palatáveis dessas construções. Sem
a observação de obras que expressem diferentes pontos de vista,
origens e sensibilidades, fica prejudicada nossa educação para o
convívio com os indivíduos e grupos considerados diferentes daqueles
que constituem de modo preponderante os corpos técnicos das
instituições ou os públicos que motivam o desenho da programação.
É evidente que a própria meta de diversificação de públicos
demanda uma profunda reflexão nesse sentido. No entanto, o debate
tende a se desenvolver com ênfase na ideia de acesso, ou seja, no
reconhecimento da responsabilidade precípua de oportunizar a novos
públicos o contato com a oferta das instituições culturais. Também
verdadeiro é o fato de que consolidar objetivos vislumbrados por uma
instituição de ampliação do espectro do público a ser impactado deve
levá-la a refletir sobre sua oferta.
Isso também é mediar. Colocar-se no meio, reconhecer o que une
e o que diferencia, adotar uma postura de interesse mútuo, dialogar.

NOTAS

1 Barkley L. Hendricks Sir Charles, ou Willie Harris, 1972 Óleo sobre tela,
213,6 x 182,9 cm National Gallery of Art, Washington D.C.

40   O QUE É ACESSO? EXPANSÃO DE CONCEITOS NOS EQUIPAMENTOS CULTURAIS


RENATA BITTENCOURT
Coordenadora da Unidade de Formação Cultural da
Secretaria de Estado da Cultura, responsável pela gestão
de programas como o Projeto Guri, Fábricas de Cultura,
Oficinas Culturais, SP Escola de Teatro e as escolas de
música Emesp Tom Jobim e Conservatório de Tatuí. Foi
Gerente de Educação do Itaú Cultural entre 2002 e 2012,
onde coordenou, entre outros, o programa nacional Rumos
Educação e o desenvolvimento de peças audiovisuais,
publicações, ações de formação, programação de
espetáculos educativos e atendimento em exposições.
Doutoranda em História da Arte pelo IFCH – Unicamp,
desenvolveu o mestrado na mesma instituição. Foi
Fellow Fulbright no Smithsonian Institution e possui
especializações em Gestão de Projetos Comunicacionais
(ECA-USP) e Estudos de Museus de Arte (MAC-USP).

Sir Charles e a Mediação Renata Bittencourt  41  


AMPLIANDO O ACESSO
Gabriela Aidar

A pergunta que norteou o encontro – O que é acesso? –, tem


diversas possibilidades de resposta, que dependem de experiências e
de abordagens conceituais específicas. Em meu caso particular, uma
possível resposta vem sendo construída ao longo de anos de trabalho
junto a públicos não tradicionalmente frequentadores de equipamentos
oficiais de cultura, como é o caso da Pinacoteca de São Paulo.
Antes de discutir a acessibilidade em museus propriamente, faz-
se relevante compartilhar alguns dados relativos à frequência aos
museus no Brasil. Eles provêm de uma pesquisa1 sobre consumo
cultural feita em 2007 que afirma que 78% dos brasileiros nunca
foram a museus e dentre estes, 83% de pessoas das classes D e E
não frequentam esse tipo de instituição cultural. O que este estudo
nos indica é que a frequência aos museus no país é fortemente
impactada pela classe econômica e também pela escolaridade

42  
dos visitantes. Assim, os grupos excluídos do acesso aos museus
abrangem grupos majoritários da sociedade, em particular aqueles
socialmente vulnerabilizados.2
Em diálogo com esse contexto, utilizamos em nossa prática na
Pinacoteca uma compreensão ampliada da acessibilidade, referindo-
se não apenas à promoção de oportunidades de acesso às pessoas
com deficiência e tampouco nos restringindo às necessidades de
acesso físico. Como vimos, as pessoas com dificuldades de acesso aos
museus brasileiros pertencem a grupos mais amplos da sociedade e
possibilitar o acesso físico não é garantia de acesso ao conhecimento.
Dividimos a acessibilidade aos museus em três aspectos, que
vão desde o mais tangível – o físico –, até aqueles de caráter mais
intangível e subjetivo. O primeiro deles é a promoção de acesso físico,
ou seja, desenvolver sistemas que permitam a circulação e afluxo de
público ao museu por meio da remoção de barreiras físicas ou, por
exemplo, com a liberação do valor do ingresso, que pode favorecer o
acesso a grupos de menor renda.
O segundo é o que chamamos de acesso intelectual, ou desenvolver
a capacidade de compreensão dos discursos expositivos. O fato de
que uma pessoa possa entrar e visitar um museu não garante que
ela vá estabelecer uma conexão intelectual com o que veja nele a fim
de promover o aprendizado. O que não significa, em absoluto, dar
“explicações” sobre as obras de arte (no nosso caso particular), mas
oferecer possibilidades de relação cognitiva entre o visitante e o que
ele observa no museu.
O terceiro e último é o que chamamos de acesso atitudinal, e possui
um caráter mais subjetivo, mas igualmente importante, especialmente
para fins educativos. Ele tem a ver com possibilitar a identificação com
sistemas de produção e fruição da arte, e desenvolver a confiança e
o prazer pela inserção no espaço do museu.3 Assim como observar

Ampliando o Acesso Gabriela Aidar   43  


um objeto no museu não garante sua compreensão, conseguir entrar
nessa instituição também não é garantia de sentir-se à vontade nela,
nem pertencente a seu ambiente e universo temático. É importante
ressaltar que essas três instâncias se sobrepõem durante a visita a
um museu, elas não ocorrem separadamente.
Como forma de articular essas propostas em nossa prática educativa
na Pinacoteca, estruturamos programas que desenvolvem ações a
partir dos perfis e demandas de seus públicos-alvos. Assim, temos uma
série de programas para públicos já frequentadores de museus (como
grupos escolares, professores e visitantes espontâneos) e os Programas
Educativos Inclusivos, voltados aos públicos não tradicionalmente
frequentadores, para os quais desenvolvemos abordagens mais
proativas. São eles: o Programa Educativo para Públicos Especiais,
que atua com pessoas com deficiência física, sensorial e intelectual
e também com pessoas com transtornos mentais; o Programa de
Inclusão Sociocultural, voltado ao desenvolvimento de ações educativas
continuadas com pessoas em situação de vulnerabilidade social, muitas
do entorno do próprio museu; o Programa Meu Museu, que atua com
grupos de pessoas com 60 anos ou mais; e o Programa Consciência
Funcional, voltado ao desenvolvimento de ações com os funcionários do
museu, em particular equipes de atendimento ao público e prestadores
de serviço, como seguranças e profissionais de limpeza.
Conforme indicado em pesquisa sobre percepção da cultura feita pelo
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), “o acesso à cultura
não é apenas sintoma de outras desigualdades, ele mesmo produz
distâncias sociais e culturais4”. Isto aponta para a relação bilateral
entre o acesso às instituições culturais e o combate às situações de
desigualdade social que vivemos tão intensamente no país, indicando-
nos o caráter político de nossa ação ao desenvolvermos projetos de
acessibilidade nos equipamentos em que atuamos.

44   O QUE É ACESSO? EXPANSÃO DE CONCEITOS NOS EQUIPAMENTOS CULTURAIS


NOTAS

1 Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

2 DA SILVA, Frederico Augusto Barbosa. Economia e política cultural:


acesso, emprego e financiamento. Brasília: Ministério da Cultura,
2007. vol. 3. (Coleção Cadernos de Políticas Culturais). Disponível em:
<http://www.cultura.gov.br/documents/10883/38605/cpc-volume-03.
pdf/643124a6-d5ef-4d90-b2db-a1c9c96ae536>. Acesso em: 19/08/2016.

3 CHIOVATTO, Milene; AIDAR, Gabriela; SOARES, Luis Roberto; AMARO,


Danielle Rodrigues. Repensando a acessibilidade em museus: a experiência
do Núcleo de Ação Educativa da Pinacoteca do Estado de São Paulo. In:
SANTOS, Anderson (org.). Diálogos entre arte e público. Acessibilidade
cultural: o que é acessível e para quem? Caderno de textos III. Recife:
Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2010. vol. 3, pp. 18-21.

4 CODES, Ana Luiza Machado, DA SILVA, Frederico Augusto Barbosa,


ARAÚJO, Herton Ellery. SIPS Cultura- Percepções ecultura. In:
SCHIAVINATTO, Fábio (org.) Sistema de indicadores de percepção social
(SIPS). Brasília: Ipea, 2011, p. 143. Disponível em: <http://www.ipea.gov.
br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/livro_sistemaindicadores_
sips_01.pdf>. Acesso em: 31/08/2016.

GABRIELA AIDAR
Graduada em História pela USP, especialista em Estudos
de Museus de Arte pelo MAC/USP e em Museologia pelo
MAE/USP. Obteve o título de Master of Arts in Museum
Studies pela Universidade de Leicester, na Inglaterra, com
revalidação pelo Programa de Mestrado em Museologia
da UNIRIO. Coordenadora dos Programas Educativos
Inclusivos da Pinacoteca de São Paulo.

Ampliando o Acesso Gabriela Aidar   45  


2.
LGBT
E A PROMOÇÃO DA
DIVERSIDADE
NA CULTURA

DESMISTIFICANDO
LUGARES COMUNS
QUERIDO DIÁRIO,
Cássio Rodrigo de Oliveira Silva

Comecei a te escrever porque a psicóloga que a escola me


encaminhou, pelas minhas “diferenças”, falou que você irá me
ajudar! Eu ainda não sei bem como! Não te vejo comigo nas
horas solitárias do recreio, quando fujo pra capela para evitar a
perseguição e as piadinhas dos meninos1! Não te vejo comigo na
hora em que o professor de história faz piadinhas sobre “viado” e a
classe olha pra mim.
Não te vejo comigo quando choro à noite, no escuro do quarto,
baixinho, para que ninguém ouça e venha me perguntar o que ocorreu,
ou quando rezo toda noite pedindo a Deus que me torne menina!
Sabe, diário, não me vejo com alguém do sexo oposto e não
conheço mais ninguém como eu! Será que sou o único no mundo?
Será que sou doente2? Será que irei ficar como esses personagens
gays das novelas? Motivo de riso e chacota? Não me vejo assim.

  47  
Mas os outros me veem assim! Vou dormir... chorar mais um pouco!
23/04/1988.

OI, DIÁRIO,
Fazia tempo, né? Já estou na faculdade e descobri que existem
mais “bichas” como eu... aliás o termo correto é LGBT – lésbicas,
gays, bissexuais, travestis, mulheres transexuais e homens trans.
Também descobri que não é opção, não escolhi ser assim. É
orientação sexual3!
Sabe, teve um rapaz que perguntou se eu era entendido.
Respondi: “Entendido em quê?”. Isso é uma gíria, diário, como ”sair
do armário”. Aliás, já saí do armário. Meus pais já sabem que sou
GAY! Apresentei para eles meu primeiro namorado. Não foi fácil no
começo, mas agora estão aceitando melhor a situação. Não preciso
mais fingir em casa. Agora tenho para onde correr e chorar!
Acredita que comecei a militar? Agora sou ativista em prol dos
direitos LGBT. Participei da primeira Parada do Orgulho LGBT, na
Avenida Paulista. Pode?! E o cinema, então?! Em Thelma & Louise
e em O Segredo de Brokeback Mountain começamos a ver o amor
lésbico e gay sendo representado para além dos estereótipos4. Boa
noite, diário... vou sonhar com o meu Jack Twist <3 16/08/2000.

DIÁRIOOOOO,
A última década foi BABADOOOO! Imagine que eu já penso até
em me aposentar... da militância, claro! Começaram a surgir as
Coordenações de Políticas LGBT, órgãos em Prefeituras, Estados
e União para pautarem as políticas públicas em prol da nossa
cidadania. Começo a me sentir inserido como cidadão.
Tem municípios que já possuem conselhos. Realizamos duas
Conferências Nacionais, precedidas de etapas estaduais e municipais,

48   LGBT E A PROMOÇÃO DA DIVERSIDADE NA CULTURA


onde nossas demandas foram ouvidas e se transformaram em Planos
de Promoção da Cidadania LGBT e Enfrentamento à LGBTfobia5! Nossa!
Para o movimento, estes três compõem o “Tripé da Cidadania LGBT”!
Eu vi, em rede nacional, o Supremo Tribunal Federal (STF)
equiparar a união estável entre casais heterossexuais à de casais
homossexuais. Por conta disso, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
já determinou a todos os cartórios que essas uniões homoafetivas
podem ser convertidas em casamento!
Também tenho visto a adoção de crianças sair com os nomes de
dois pais ou duas mães! Quem diria! Sabe, meu querido diário, a
militância vale a pena! 02/10/2012.

MEU QUERIDO...
Tenho andado triste... sentindo-me como há 30 anos. Será que você
um dia irá poder me ajudar, diário? Tenho visto tantos crimes, tanta
violência, tanta discriminação, tanto conservadorismo disfarçado de
moral e bons costumes! Como a violência pode ser um bom costume?
Conseguiram derrubar o projeto de lei que criminalizava a
LGBTfobia no Brasil. Continuamos apenas com as leis administrativas,
como a Lei Estadual 10.9486, que dispõe sobre as penalidades a
serem aplicadas à prática de discriminação em razão de orientação
sexual e identidade de gênero. 15 anos de lei!
Avançamos, também, em relação ao nome social para travestis,
mulheres transexuais e homens trans, mas o projeto da identidade de
gênero continua parado no Congresso Nacional. Nosso Decreto Estadual
nº 55.588/10, que dispõe sobre o tratamento nominal das pessoas
transexuais e travestis nos órgãos públicos do Estado de São Paulo,
deu frutos. Temos uma Resolução na Secretaria da Administração
Penitenciária e outra na Secretaria da Educação, acompanhada da
Deliberação do Conselho Estadual da Educação nº 125/2014, que afirma

Querido Diário, Cássio Rodrigo de Oliveira Silva  49  


que todas as instituições, vinculadas ao sistema estadual de ensino,
públicas ou privadas, devem respeitar a identidade de gênero e o nome
social de travestis e pessoas transexuais nos registros escolares internos.
Mas mesmo assim me sinto como na letra daquela música:

“Ando devagar porque já tive pressa


E levo esse sorriso porque já chorei demais
Hoje me sinto mais forte, mais feliz, quem sabe?
Só levo a certeza de que muito pouco eu sei
Ou nada sei.
Penso que cumprir a vida seja simplesmente
Compreender a marcha e ir tocando em frente
Como um velho boiadeiro levando a boiada
Eu vou tocando dias pela longa estrada eu vou
Estrada eu sou.
Todo mundo ama um dia todo mundo chora,
Um dia a gente chega, no outro vai embora
Cada um de nós compõe a sua história
Cada ser em si carrega o dom de ser capaz
De ser feliz.
Conhecer as manhas e as manhãs
O sabor das massas e das maçãs
É preciso amor pra poder pulsar,
É preciso paz pra poder sorrir,
É preciso a chuva para florir.”

NOTAS

1 Bullying – termo da língua inglesa (bully = “valentão”) que se refere a


todas as formas de atitudes agressivas, verbais ou físicas, intencionais
e repetitivas, que ocorrem sem motivação evidente e são exercidas
por um ou mais indivíduos, causando dor e angústia, com o objetivo de
intimidar ou agredir outra pessoa sem que esta tenha a possibilidade

50  
ou capacidade de se defender, sendo realizadas dentro de uma relação
desigual de forças ou poder. Há uma tendência de as escolas não
admitirem a ocorrência do bullying entre seus alunos; ou desconhecem
o problema ou se negam a enfrentá-lo. Estão inclusos no bullying
os apelidos pejorativos criados para humilhar os colegas. No Brasil,
uma pesquisa realizada em 2010 com alunos de escolas públicas e
particulares revelou que as humilhações típicas do bullying são comuns
em alunos de 5ª e 6ª séries. As três cidades brasileiras com maior
incidência dessa prática são: Brasília, Belo Horizonte e Curitiba.

2 Homossexualidade X Homossexualismo: A homossexualidade NÃO é


uma DOENÇA. Em 1973, a sociedade Americana de Psiquiatria removeu
o termo “homossexualismo” do manual oficial que lista todos os
distúrbios mentais e emocionais. Em 1975, a sociedade Americana de
Psicologia aprovou uma resolução em apoio àquela decisão.
Em 1990, a Sociedade Americana de Psicologia emitiu resolução
DESAPROVANDO terapias de conversão da homossexualidade para a
heterossexualidade. No Brasil, a Resolução do Conselho Federal de
Psicologia é de 1999.

3 Orientação Sexual X Opção Sexual: NÃO é uma ESCOLHA, então não


é certo referir-se como opção. Seja hetero, homo ou bissexual, esses
termos indicam por quem sentimos o desejo de nos relacionarmos
amorosa, afetiva e sexualmente. QUEM DESEJO! Faz parte dos “Direitos
Sexuais”. Em 1994, durante a Conferência Internacional sobre População
e Desenvolvimento, no Cairo, a Organização das Nações Unidas definiu o
conceito de direitos sexuais e reprodutivos.
Os Direitos Sexuais são os direitos que garantem que toda e qualquer
pessoa pode viver sua vida sexual com prazer e livre de discriminação.
Incluem o direito de viver a sexualidade sem medo, vergonha, culpa,
falsas crenças e outros impedimentos à livre expressão dos desejos;
de escolher o/a parceiro/a sexual sem discriminação e com liberdade
e autonomia para expressar sua orientação sexual se assim desejar;
e de insistir na prática do sexo seguro para prevenir uma gravidez não
planejada e as doenças sexualmente transmissíveis, incluindo o HIV-Aids.
A homossexualidade NÃO é CRIME. Existem 73 países ao redor do mundo

Querido Diário, Cássio Rodrigo de Oliveira Silva  51  


que criminalizam pessoas LGBT. Em alguns a punição vai da prisão
perpétua até a pena de morte.

4 Terminologia – O homossexual masculino deve ser chamado de “gay” e


a homossexual feminina de “lésbica”. Travestis, mulheres transexuais
e homens trans devem ter respeitadas suas identidades de gênero.
Portanto, se a pessoa se apresentar com uma identidade de gênero
feminina, deverá ser tratada como “a”, e se a identidade for masculina,
deverá ser tratada por “o”.

5 A discriminação acontece quando, a partir de um preconceito, tomamos


atitudes diferenciadas e negativas com uma pessoa. No caso de pessoas
LGBT, estas são agredidas verbal e fisicamente, excluídas do convívio
familiar, impedidas de manifestar afeto em público e até assassinadas
simplesmente por se sentirem atraídas afetiva e/ou sexualmente por
pessoas do mesmo sexo/gênero que o seu ou por terem identidade
de gênero que não condiz com seu sexo biológico. Existe muito
preconceito contra a população LGBT, que surge dos mitos construídos
culturalmente a respeito da homossexualidade, da transexualidade e da
travestilidade.
Homofobia – Pode ser definida como o medo, o desprezo, a antipatia,
a aversão ou o ódio irracional aos homossexuais. É o termo geral
normalmente utilizado para se referir ao preconceito e à discriminação
em razão de orientação sexual, contra gays, lésbicas (lesbofobia) ou
bissexuais (bifobia).
Transfobia – Trata-se do preconceito e da discriminação em razão da
identidade de gênero, contra travestis e transexuais. Preconceito é o
julgamento que fazemos sobre uma pessoa, sem conhecê-la, diante
de alguma característica que esta possua. É uma crença ou ideia
preconcebida que temos sobre alguém a partir de rótulos atribuídos
socialmente.

6 Lei Estadual nº 10.948/01 – De acordo com esta lei, ninguém pode ser
exposto/a a vexame, humilhação, constrangimento, ser impedido/a
de acessar locais públicos ou privados, ser cobrado/a com preços ou
serviços diferenciados, ser impedido/a de locar imóveis para qualquer
finalidade, ser demitido/a ou deixar de ser admitido/a em função de

52  
sua orientação sexual ou identidade de gênero. É ainda considerado
discriminação proibir a LGBTs o mesmo tipo de afetividade permitida a
outros/as cidadãos e cidadãs no mesmo local.
A lei pune administrativamente qualquer pessoa ou instituição. Estão
sujeitos a punições: civis, detentores/as de função pública ou militar,
toda organização social e empresa pública ou privada (restaurantes,
escolas, delegacias, postos de saúde, motéis etc.).

CÁSSIO RODRIGO DE OLIVEIRA SILVA


Jornalista formado pela PUC-SP (Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo). Palestrou, em 2006, na I Conferência
Internacional de Direitos Humanos para GLBT, em Montreal
sobre os temas de segurança pública e direitos dos
homossexuais e os movimentos de Paradas do Orgulho como
ação política e social.
Atuou na Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo,
como Assessor de Cultura para Gêneros e Etnias.
Atualmente está à frente da Coordenação de Políticas para a
Diversidade Sexual, da Secretaria da Justiça e da Defesa da
Cidadania, do Governo de São Paulo.

Querido Diário, Cássio Rodrigo de Oliveira Silva  53  


AS DIFERENÇAS NO COTIDIANO DA ESCOLA
Paula Beatriz de Souza Cruz

“[...] o principal é que a sexualidade seja vivida sem traumas e,


penso eu, respeitando os valores éticos que deveriam reger qualquer
relacionamento social, especialmente o respeito pelo outro na sua
diferença que não é a mesma coisa que a aceitação de postulados
moralistas sobre as condutas eróticas ou sexuais, que já não
fazem sentido algum neste final de século que estamos vivendo”
(BARBERO, 2003a, p.12).

Na escola, se um menino, um professor, um diretor, enfim, é


efeminado ou uma menina, uma professora ou uma diretora é
máscula, logo vão sendo estigmatizados e excluídos. Podem nem ser
e, se fossem, deveriam ser respeitados.
Sabemos que o respeito às diferenças, seja em qualquer âmbito,
deveria ser ensinado pela família e pela escola, preparando o

54  
indivíduo para entender e respeitar as diferenças individuais dentro
dos seus limites. Mas sabemos também que isso quase nunca
acontece porque o contrário predomina.
Em meio a tantas dificuldades, a escola pode ser um ambiente
de reflexão sobre diversidade sexual. Ou seja, podemos acreditar
que a escola pode ser um espaço de “cidadanização” plena das
pessoas, e tomar como estudo a questão da homossexualidade/
transexualidade.
É necessário refletir sobre a maneira pela qual diversidade e
gênero são exercidos na escola via observação, por exemplo, de
oficinas, cursos de capacitação sobre o tema e reação dos alunos e
da comunidade. Pensa-se, assim, na separação entre ideal e prática
e na associação com o estudo de bibliografias que protagonizam a
educação com a hipótese de que a escola é um espaço de reflexão
sobre diversidade, orientação sexual e identidade de gênero.
Pretende-se entender que:

• Educar para e pela diversidade, orientação sexual e identidade de


gênero.
• Analisar a metodologia e os conteúdos referentes às
transformações comportamentais vividas pela homossexualidade/
transexualidade.
• Desenvolver o processo didático na educação sexual, através da
metodologia baseada na fundamentação teórica e das reflexões
práticas vivenciadas.
• Contribuir para a construção de uma política LGBTT.
• Perceber que a escola é um espaço de exercício da reflexão sobre
diversidade sexual.
• Conhecer os próprios limites, reconhecendo a complexidade do tema
e exercendo seu papel com dignidade.

AS DIFERENÇAS NO COTIDIANO DA ESCOLA Paula Beatriz de Souza Cruz  55  


• Subsidiar e apoiar o educador para que possa ser o autor da ação
educativa, inclusive da educação sexual através de orientação e ajuda
para o diálogo com os alunos.

Rosely Sayão deixa claro que:

“[...] ninguém vai conseguir livrar-se de todos os seus


preconceitos a respeito da sexualidade; mas é possível aprender
a suspendê-los quando nos relacionamos com as pessoas fora
do âmbito da vida pessoal e íntima. E é esse o princípio mais
importante a nortear as relações dos mestres com seus alunos”
(SAYÃO, 1997, p. 281).

Obviamente é demasiado simplesmente pensar o mundo em


termos de luta entre mocinhos e bandidos ou, se quiser, no caso,
homossexuais e transexuais e seus repressores. Pensar assim seria
incorrer no mesmo erro daqueles que veem a opressão feminina
em termos de um complô masculino. De fato, homens, mulheres,
médicos, legistas e psicoterapeutas fazem parte de um todo que é
maior que a soma dos seus componentes individuais.
Os profissionais de educação, afinal, não constituem um grupo
isolado da sociedade maior. Eles pertencem a várias classes sociais
com as quais compartilham um estilo de vida e preocupações
sociais e, como no resto da população, alguns são homossexuais
e transexuais. E, também, participam ativamente na história da
homossexualidade e transexualidade na educação.
E Paulo Freire lembra que:

“[...] é preciso que a educação esteja em seu conteúdo, em seus


programas e em seus métodos adaptados ao fim que se persegue:
permitir ao homem chegar a ser sujeito, construir-se como pessoa,

56  
transformar o mundo, estabelecer com outros homens relações de
reciprocidade, fazer cultura e história” (FREIRE, 1997, p. 45).

O TRABALHO DOCENTE E AS DIFERENÇAS

“É a disposição das velas e não a força da ventania que determina o


caminho a seguir”. (LUCK, 2011)

O trabalho docente é considerado como “de instrutor, reduzido à


função de transmitir um conjunto de conhecimentos, de habilidades
intelectuais, atitudes e valores que funcionam como geradores da
capacidade de trabalho e, consequentemente, de produção” (SOUZA,
2005, p. 113), tornando, assim, significativas as mudanças na profissão
docente, como a intensificação do trabalho, as demandas para
execução de projetos e avaliação de resultados obtidos nas avaliações
internas e externas que se avolumam com o decorrer das décadas e
a política assistencialista à qual se submetem os docentes. Enquanto
isso, destacam-se as atividades de:

1 Preocupação quanto à necessidade de reafirmação do valor e


da dignidade de todas as pessoas, dentre as diferentes faixas
etárias atendidas, com tudo o que elas implicam, em termos de
características e necessidades que lhes são próprias.
2 Negação ao individualismo como postura do ser no mundo.
3 Valorização da instrumentalização cultural, científica e técnica das
crianças e adolescentes, para atuarem de forma crítica e competente
em sua realidade histórica.
4 A concretização de uma concepção globalizadora da educação
escolar, visando à tradução deste mesmo projeto em metodologias
e estratégias eficazes na atuação dos professores junto aos alunos,

AS DIFERENÇAS NO COTIDIANO DA ESCOLA Paula Beatriz de Souza Cruz  57  


em busca da construção da relação ensino-aprendizagem como o
conhecimento, e nas interações sociais.
5 A proposição de questões que ampliem o entendimento e provoquem
a reflexão acerca do processo pedagógico.
6 A busca de uma ação mais integrada entre Escola e família, com
vistas ao aprimoramento do acompanhamento da vida escolar
dos alunos, indicando, sempre que necessário, o auxílio de outros
profissionais extraescolares.
7 A contribuição e criação de espaços para que esta participação
efetiva se estenda às outras dimensões que constituem o projeto
político-pedagógico.

A viabilização de tais pressupostos exige, dentre outras ações,


uma reflexão constante acerca do atual contexto sócio-histórico
no qual a Escola se insere, bem como de seu papel em termos de
limites e possibilidades de intervenção nesse contexto.
É sabido por todos que sociedades complexas como a nossa,
do tipo industrial “pós-moderna”, comportam análises múltiplas,
dada a inesgotabilidade de aspectos ou facetas que as compõem.
Estamos no início de mais um século, o que, de certa forma, abre
perspectivas de avanço e domínio do homem sobre o seu espaço
natural e cultural, embora observemos, nesta mesma “estrada” que
nos leva ao futuro, o agravamento dos problemas sócio-culturais,
tais como a violência, o consumismo, a competitividade acirrada,
o desemprego e a falta de ética e de referências valorativas nos
diferentes agrupamentos humanos.
Neste caminhar sobre o “fio da navalha” observam-se, no campo
educacional, alguns “ferimentos” historicamente abertos, tais como
a sua desvalorização por parte da sociedade de um modo geral e
do abuso, de um modo particular, do espaço escolar. Ou seja, a não
compreensão quanto à importância do próprio conhecimento escolar

58  
e do papel do professor, além de, via de regra, a perda da noção de
limites e normas de convívio com o espaço físico, com os colegas e
com os profissionais que na escola atuam.
Para os docentes, enfrentar esta situação na perspectiva de
superação destes problemas que impedem a Escola de atingir o seu
ideal de qualidade e formação para a cidadania implica trabalhar
para o resgate do papel da Escola enquanto instituição que é
principal na tarefa de socializar o conhecimento que a humanidade
construiu através dos tempos, sem o qual não se superam as visões
interpretativas mágicas ou ingênuas sobre esta nossa condição atual.
Busca-se, ainda, realizar um trabalho de acompanhamento e
orientação que visa a resgatar a identidade e autoridade do professor,
contribuindo para o aperfeiçoamento de sua competência, entendida
aqui como a qualidade do “saber ser/saber fazer”. Esta competência
envolve boa comunicabilidade e disponibilidade para o relacionamento
interpessoal e construtivo, responsabilidade, organização pessoal,
atualização e domínio dos conhecimentos com os quais vão trabalhar,
bom manejo das situações de aprendizagem, conhecimentos
específicos sobre as faixas etárias sob sua responsabilidade e, por fim,
posicionamento político claro sobre as questões do seu tempo e sobre o
tipo de homem para cuja formação pretende contribuir.
Em relação aos alunos, deve-se trabalhar o sentido da escolarização
e o amadurecimento das qualidades do “ser Estudante-Cidadão”,
entendido aqui como aquele que se disponibiliza para a nem sempre
fácil tarefa de ser sujeito de sua própria formação; ou seja, realizando
com responsabilidade e cuidado aquilo que é proposto, cumprindo com
sua parte nos combinados, sendo crítico numa perspectiva construtiva,
respeitando o espaço físico e as pessoas com as quais se relaciona.
Nesse sentido, as regras, normas ou combinados têm uma função
educativa fundamental. Através do diálogo permanente a Escola

AS DIFERENÇAS NO COTIDIANO DA ESCOLA Paula Beatriz de Souza Cruz  59  


busca possibilitar a sua discussão e elaboração, assim como garantir
com rigor o seu cumprimento. Todo esse esforço visa a modificar o
sentimento de “descrédito” em relação à Escola, mas, principalmente,
a construir as condições favoráveis ao bom desempenho dos alunos.
Deste modo, atuando junto aos alunos, professores e pais, busca-
se garantir o atendimento da especificidade da educação, que, sozinha,
não dá conta de mudar o rumo da história, mas que, necessariamente,
contribui para o processo de amadurecimento da consciência crítica
dos alunos. Entendo que, através do aprimoramento da linguagem, das
ciências (naturais e sociais) e das artes, instrumentalizamos as crianças
e adolescentes para uma compreensão maior e uma atuação mais
crítica em relação a esta sociedade.

GESTÃO: CONSTRUÇÃO DEMOCRÁTICA E AUTÔNOMA

“O preconceito é a categoria do pensamento e do comportamento


cotidianos”. (HELLER, 1985, p. 43)

Um gestor capaz de construir e desenvolver a convivência


democrática na comunidade faz uma viagem para dentro de si
mesmo e se indaga, honestamente, se é o caminho de sua realização
profissional. E o desenvolvimento de habilidades de liderança de um
gestor é pessoal, mas depende de articulações adequadas entre
características pessoais e capacidade de aprender com outros.
Há a necessidade de reconhecer qualidades necessárias dos
gestores como líderes que constroem e desenvolvem a convivência
comunitária, tais como:

1 Seriedade e responsabilidade na execução do trabalho;


2 Disposição para mudança: estímulo a um clima propício à
transformação nos processos de trabalho e na realidade da escola;

60  
3 Dedicação: execução do trabalho com afinco;
4 Espírito de equipe: capacidade de obter resultados em grupos,
gerando satisfação de todos;
5 Pontualidade: preocupação com o cumprimento de horários e prazos;
6 Reconhecimento: valorização do mérito das pessoas e da equipe na
realização das atividades;
7 Cooperação: clima de ajuda mútua entre as pessoas;
8 Flexibilidade: capacidade de adaptação a novas situações;
9 Consideração e preservação dos usos e costumes da organização:
procurar saber as estratégias que deram certo no passado;
10 Preparo para lidar com decisões problemáticas que contrariam
interesses de pessoas, grupos ou entidades;
11 Clareza sobre os motivos que o levaram a assumir o cargo atual e
sobre as expectativas que seus colaboradores dirigem a você;
12 Busca de envolvimento e participação das pessoas ligadas ao
processo decisório.

Percebe-se que para desenvolver o trabalho proposto há diversos


espaços nos quais educadores, professores, alunos, funcionários,
pais de alunos e comunidade possam trocar experiências e realizar
aprendizagens significativas. As pessoas estão enfrentando
situações novas que o mundo não conhecia antes e que não podem
mais ser resolvidas só pela família, pela escola ou por qualquer outra
instituição isoladamente.
O mundo de hoje exige a inserção em outros referenciais de
conhecimento: técnicos, como a informática; éticos, como a
autonomia sobre o corpo; ou ligados à cidadania, como os direitos
humanos e de consumidor, entre outros. É importante desenvolver
reflexões sobre os rumos de nossas vidas e que propiciem o exercício
da autonomia, na qual o cidadão passará de vítima ou de culpado a

AS DIFERENÇAS NO COTIDIANO DA ESCOLA Paula Beatriz de Souza Cruz  61  


mais um aliado no movimento de construção de uma escola e um
mundo melhor.

“A educação não pode concentrar-se em reunir pessoas fazendo-as


aderir a valores comuns. Deve, também, responder à questão: viver
juntos, com que finalidades, para fazer o quê? E dar a cada um, ao
longo de toda a vida, a capacidade de participar, ativamente, num
projeto de sociedade.” (DELORS, 2001, p. 61)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARBERO, G.H. Homossexualidade e identidade diversas: o preconceito que


as acompanha. In: Pulsional . Revista de Psicanálise – Ano X VI nº 7 São
Paulo: Escuta, 2003.

DELORS, J. Educação: Um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da


Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. 6ª Ed. Brasília:
MEC, 2001.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo, Paz e Terra, 1997.

HELLER, Agnes. O cotidiano e a história. 2 ed. Rio de Janeiro, RJ: Paz e


Terra, 1985.

LUCK, Heloísa. Planejamento em Orientação Educacional - 22 ed.


Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

SAYÃO, Rosely, A educação sexual nossa de cada dia. In: Idéias, São Paulo:
FDE, n.28, p. 269-281, 1997.

PAULA BEATRIZ DE SOUZA CRUZ


Especialista em Gestão Educacional pela UNICAMP e em
Docência no Ensino Superior pela Universidade Estácio de Sá,
é Diretora da Escola Estadual Santa Rosa de Lima e professora
na EMEF Maurício Simão, atuando no magistério público há
27 anos. Mulher transexual, negra, militante independente dos
movimentos sociais, políticos, educacionais e culturais LGBT,
participante do Fórum Paulista de Travestis e Transexuais.

62  
THESE ARE MY HANDS
Jo Clifford

THESE ARE MY HANDS

My dad paid for me to have carpentry lessons


Because he thought it would be good for me to make things out of wood
But I couldn’t do that
These hands cannot make things
My dad paid for me to have boxing lessons
Because he thought it would be good for me to learn how to fight
But I couldn’t do that
These hands were not made to hit people.
So instead I burst into tears.
These are my feet
My dad paid for them to be encased in army boots
Which I was supposed to spit and polish
And march up and down in army uniform

  63  
Learn to clean a rifle, point it at a target,
And shoot to kill.
But I couldn’t do that.
These feet were not made for marching.
In here is my brain
My dad wanted me to use it to become a businessman
Or perhaps a diplomat.
But I couldn’t do that.
This brain was not made to exploit or lie…
My poor dad.
I really was not the person that he wanted me to be at all.
So who was I?
This is my face.
For many years it was a man’s face and when I looked in the mirror
I could never believe that it was mine
But then these hands
These hands learnt to hold my children
These hands learnt to comfort them when they were hurt or were afraid
These hands learnt to caress my lover
And give them joy and pleasure.
These hands learnt to communicate my love.
With these hands I learnt to write
With these hands I’ve written almost ninety plays.
So many words. About a million.
About a million words.
No wonder my hands hurt sometimes.
With these legs I was supposed to run fast and defeat my opponents
in football, or in cricket, or in rugby games.
With these legs I was supposed to march like a soldier
And walk like a man erect and strong.
These legs are damaged because for many years
I tried to walk a path that was not my own.
My heart is damaged too. Hurt by shame.

64  
Broken by grief and bitter loss.
My heart is held together by plastic ring
Placed inside a valve to stop it bleeding.
I can only walk because they replaced my hip and knee
I carry the scars
Here. Here. And here.
They are like wounds that I received in battle
The long relentless battle to become my self.
The battle we all must fight some day.
The lines on my face tell of the progress of the fight
Its defeats and victories.
But now when I look in the mirror I don’t see a stranger boy or man
I see myself.
I may not like what I see
The baggy eyes, double chin, thinning hair
All the signs of my aging.
But I know they’re mine.
And when I look in the mirror I wish myself well
Wish myself well on this lifelong journey
The journey I am making towards my own dear self.
One day this heart will be worn out
On that day it will stop beating
And then I’ll know.
Then I’ll know my destination.

Jo Clifford. Edinburgh, 20th October 2016.

These Are My Hands Jo Clifford  65  


TRADUÇÃO

ESTAS SÃO AS MINHAS MÃOS

Estas são as minhas mãos


Meu pai pagou aulas de carpintaria para mim
Porque achou que seria bom se eu produzisse coisas de madeira
Mas eu não pude
Estas mãos não podem produzir coisas
Meu pai pagou aulas de boxe para mim
Porque achou que seria bom se eu aprendesse a lutar
Mas eu não pude
Estas mãos não foram feitas para bater em pessoas.
Então, ao invés, eu caí em prantos.
Estes são os meus pés
Meu pai pagou botas de exército para revesti-los
As quais eu deveria cuspir e polir
E marchar para todos os lados em uniforme de exército
Aprender a limpar um rifle, apontá-lo em direção a um alvo,
E atirar para matar.
Mas eu não pude.
Estes pés não foram feitos para marchar.
Aqui dentro está o meu cérebro
Meu pai queria que eu o usasse para me tornar um homem de negócios
Ou talvez um diplomata.
Mas eu não pude.
Meu cérebro não foi feito para explorar ou mentir.
Meu pobre pai.
Eu realmente não fui a pessoa que ele queria que eu fosse.
Então quem era eu?
Este é o meu rosto.
Por muitos anos foi um rosto de homem e quando eu olhava no espelho
Eu nunca conseguia acreditar que ele era meu

66  
Mas então estas mãos
Estas mãos aprenderam a abraçar minhas crianças
Estas mãos aprenderam a confortá-las quando elas estavam
magoadas ou amedrontadas
Estas mãos aprenderam a acariciar o meu amor
E a dar alegria e prazer.
Estas mãos aprenderam a comunicar o meu amor.
Com estas mãos eu aprendi a escrever
Com estas mãos eu escrevi quase noventa peças.
Tantas palavras. Quase um milhão.
Quase um milhão de palavras.
É de se esperar que minhas mãos doam às vezes.
Com estas pernas eu deveria ter corrido rápido e vencido meus
oponentes em jogos de futebol, ou cricket, ou rugby.
Com estas pernas eu deveria ter marchado como um soldado
E caminhado como um homem ereto e forte.
Estas pernas estão estragadas porque, por muitos anos
Eu tentei andar por um caminho que não era o meu.
Meu coração está estragado também. Magoado pela vergonha.
Partido por luto e perdas amargas.
Meu coração se mantém unido por um anel de plástico
Colocado dentro de uma válvula para que parasse de sangrar.
Eu só posso caminhar porque substituíram minha bacia e meu joelho
Eu carrego as cicatrizes
Aqui. Aqui. E aqui.
Elas são como ferimentos que ganhei em batalha
A longa e implacável batalha para me tornar eu.
A batalha que todos nós devemos lutar um dia.
As linhas do meu rosto falam do progresso da luta
Suas derrotas e vitórias.
Mas agora quando olho no espelho, não vejo um menino ou
homem estranho
Eu vejo eu.

These Are My Hands Jo Clifford  67  


Posso não gostar do que vejo
As olheiras, o queixo gordo, o cabelo que afina
Todos os sinais do meu envelhecimento.
Mas eu sei que são meus.
E quando olho no espelho, eu me desejo o bem
Desejo-me o bem nessa jornada de vida
A jornada que eu faço em direção ao meu querido ser.
Um dia este coração estará cansado
Neste dia, ele vai parar de bater
E então eu saberei.
Então eu saberei meu destino.

Jo Clifford. Edimburgo, 20 de Outubro de 2016.


Tradução Isabela Maia

68  
JO CLIFFORD
Jo Clifford é dramaturga e atriz residente em Edimburgo
na Escócia. Ela escreveu por volta de 80 peças de teatro,
muitas das quais já foram montadas em vários países.
Dessas, vale destacar LOSING VENICE, EVERY ONE, FAUST
e THE TREE OF KNOWLEDGE. GREAT EXPECTATIONS fez de
Jo Clifford a primeira dramaturga abertamente transgênero
a ter um texto de teatro montado no West End de Londres.
Ela apresentou GOSPEL ACCORDING TO JESUS QUEEN OF
HEAVEN [O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu] no
festival Fringe de Edimburgo em 2014 e 2015.
Também neste período a Scottish Opera encenou a opera que
James McMillan criou a partir de seu texto INES DE CASTRO;
sua nova adaptação de DR JEKYLL AND MR HYDE percorre
os palcos do Reino Unido; ANNA KARENINA é montada
no Manchester’s Royal Exchange e o Dundee Rep monta
GREAT EXPECTATIONS (com apresentações também em
Tokyo). Em 2015, Jo escreveu e apresentou na Radio BBC da
Escócia o programa de meia hora TRANSGENDERED LIVES.
Protagonizou o HIGH HEELS AREN’T COMPULSORY, filme
que recebeu o prêmio de público de melhor curta metragem
do festival de cinema SQIFF. Um fato marcante sobre a
importância de Jo Clifford foi ter sido a primeira mulher
transgênero a ser convidada a proferir um discurso feminista
no evento anual Burns Supper em 2016, que celebra a
vida e a obra do poeta escocês Robert Burns. Jo Clifford
proferiu seu discurso no ‘Reply to the Toast to the Lassies’
[Resposta ao Brinde das Mocinhas] na presença da primeira
ministra da Escócia, Nicola Sturgeon. Sua peça EVERY ONE
foi recentemente montada no Battersea Arts Centre, em
Londres, e está em fase de planejamento uma produção
japonesa do mesmo texto. Seu último trabalho – Eve – foi
co-escrito com Chris Goode e produzido pelo National
Theatre of Scotland em 2017. Ela costuma dizer que tem
muito orgulho de ser pai e avó.

These Are My Hands Jo Clifford  69  


3.
TRAMANDO PALAVRAS
PARA DESCONSTRUIR
BARREIRAS
SENSORIAIS

PESSOAS
COM DEFICIÊNCIA
VISUAL NAS
PROGRAMAÇÕES
CULTURAIS
AUDIODESCRIÇÃO NO PROJETO
MANHÃS DE HISTÓRIA
ACESSIBILIDADE E INFORMAÇÃO PARA CRIANÇAS COM
E SEM DEFICIÊNCIA

Lívia Motta

As crianças com e sem defciência vão chegando ao Instituto


Tomie Ohtake. Vêm de escolas, abrigos, instituições ou associações.
Algumas chegam com seus pais. Entram animadas e curiosas,
conversando ou brincando. Os professores tentam organizar, conter
o vozerio. Os pais quase sempre apontam, mostram algum detalhe
que consideram interessante.
E é desde esse primeiro momento de entrada que procuramos
chamar atenção dos grupos para a fachada do Instituto, as muretas de
concreto em curva, o prédio com faixas coloridas e arquitetura inusitada,
a grande escultura em formato de carambola. Dentro, falamos sobre
o balcão de informações, o hall com paredes pink e pretas, o teto com
tubos brancos e vidro que deixa passar a luminosidade, as lojas, livraria,
restaurante, a entrada para o educativo. Quem não enxerga, tem a
oportunidade de conhecer, fica sabendo como é o lugar onde está, como

71  
o espaço está organizado. Quem enxerga, presta atenção, observa mais
detalhadamente, vê outras coisas. Certamente, uma oportunidade de
aprendizagem para todos.
Depois de acomodados, é hora de ouvir a história. Andi Rubinstein,
a contadora de histórias do projeto Manhãs de História, encanta a todos
com o seu jeito peculiar de interagir com as crianças, de se transformar
em personagens que contam, apresentam fatos, informações sobre a
vida e a obra de artistas e conceitos referentes às artes.
Além de Andi, em cada história, outros profissionais também são
convidados a participar e a contribuir para a criação de histórias
surpreendentes ligadas às exposições que acontecem no Instituto
Tomie Ohtake. São músicos, sound designers, videomakers, multimídia
designers, produtores, pesquisadores e outros. A minha contribuição
para o projeto foi inserir a audiodescrição, possibilitando, dessa
forma, o acesso à informação para todos, crianças com deficiência
visual e crianças sem deficiência.
A audiodescrição é uma atividade de mediação linguística, um
recurso de acessibilidade comunicacional e de tecnologia assistiva,
um tipo de tradução que transforma imagens em palavras ampliando
o entendimento de pessoas com deficiência visual em todos os
tipos de espetáculos, eventos e produtos audiovisuais. Além das
pessoas com deficiência visual, também as pessoas com deficiência
intelectual, idosos, autistas, pessoas com déficit de atenção, com
dislexia, crianças e outros públicos podem se beneficiar do recurso.
Em espetáculos como peças de teatro, óperas, musicais, shows e
outros, a caracterização física de personagens, cenários, figurinos,
movimentos, expressões faciais, entrada e saída em cena e as próprias
ações, tudo isso é verbalizado em roteiros previamente elaborados e
chega até a pessoa com deficiência visual por meio de fones de ouvido.
Para isso, são utilizados os mesmos equipamentos da tradução

72   TRAMANDO PALAVRAS PARA DESCONSTRUIR BARREIRAS SENSORIAIS


simultânea: aparelhos receptores e fones de ouvido. O audiodescritor
fica dentro de uma cabine, seguindo um roteiro previamente elaborado,
e as pessoas com deficiência visual na plateia com fones e receptores,
o que não interfere nem atrapalha outros espectadores. Já em filmes,
programas de TV, comerciais e videoclipes, a trilha de audiodescrição
poderá ser gravada e mixada ao som original.
Na contação de histórias, a audiodescrição ajuda na construção
de imagens mentais e faz com que as crianças com deficiência visual
possam visualizar todos os elementos que fazem parte da história.
Chamar a atenção para as ações, para os recursos imagéticos
e cênicos, como projeções, figurinos e mobiliário, usando mais
elementos descritivos durante a contação, certamente, será um
diferencial para todos que participam da atividade.
Os aparelhos, fones e receptores, poderão ou não ser usados.
Se a opção for pela utilização de equipamento de audiodescrição, a
presença de um audiodescritor para traduzir os elementos visuais
será necessária. Entretanto, também é possível que o próprio
contador, ciente da necessidade de fazer chegar a sua arte também
a outros públicos, ele mesmo possa inserir a audiodescrição para
completar a história, verbalizando ações e destacando os elementos
imagéticos, ou seja, transformando imagens em palavras.
Em dois anos de vida do projeto Manhãs de História, as histórias
contadas sobre artistas em exposição no Instituto foram as
seguintes: Tomie Ohtake, Joan Miró, Frida Kahlo e Pablo Picasso.
A última história, que encerrou o ano de 2016, foi sobre arte
contemporânea. Em todas elas, a audiodescrição foi utilizada, com
algumas diferenças, o que discutiremos abaixo.
A história de Tomie Ohtake, intitulada A Cor do Ar, teve a participação
de um músico, e nela foram utilizados os seguintes recursos: painéis
de papel, nos quais a contadora escrevia algumas letras da escrita

AuDIODESCRIçãO NO PROJETO MANHÃS DE HISTÓRIA LíVIA MOTTA  73  


japonesa, o kanji, faixas de tecido, e um grande tubo de plástico
inflado com ar, por onde as crianças passavam e que representava
o mar, indicando a viagem que Tomie fez do Japão para o Brasil. A
audiodescrição das características físicas da contadora e do músico,
os figurinos utilizados e a localização dos dois no espaço, foi feita por
mim antes do início da história. As unidades descritivas foram inseridas
durante a contação, para indicar as ações da contadora e o uso dos
objetos acima citados, sem o uso dos aparelhos. A audiodescrição foi
aberta, ou seja, ouvida por todos. Para isso, contadora de histórias
e audiodescritora trabalharam juntas e à medida que a narrativa foi
sendo construída por uma, também o texto da audiodescrição foi
desenvolvido pela outra, de forma a compor o texto final.
Nessa história, na itinerância do projeto, os aparelhos móveis
de audiodescrição foram utilizados com pessoas idosas residentes
em abrigos. Enfatizo a relevância do recurso para esse público,
pois permite que os idosos, muitos sem acuidade visual e com a
capacidade de atenção diminuída, possam acompanhar o evento
com mais informações e ampliação de entendimento.
Na história O Sonho de Miró, além da trilha sonora executada por
um DJ, houve a participação de multimídia designers e a projeção em
3D foi utilizada, o que permitiu que a contadora entrasse no atelier
do artista, onde estavam muitas telas, algumas pintadas, outras em
branco, molduras vazias, cavaletes, mesas e bancos, cadeiras de
balanço, muitos potes de tinta, pincéis, tapetes espalhados pelo chão.
Sentada em uma cadeira de balanço, Andi aguardava
pacientemente a descrição do ambiente feita por mim. As crianças,
com seus olhinhos atentos, tudo observavam. Alguns adultos
comentaram depois da história que foi interessante observar a
cena pelos olhos de outra pessoa, poder ver melhor com palavras.
Durante a história, ela mesma inseriu a audiodescrição, verbalizando

74  
as ações, usando mais palavras em sua narrativa para fazer com
que as crianças com deficiência visual pudessem acompanhar Miró
pintando um grande pássaro cor-de-rosa com asas bem abertas que
parecia voar no céu, ver o quadro dividindo-se em quatro pedaços, e
o mestre correndo atrás dos pedaços, em uma fantástica interação
da ação com a projeção em 3D.
Em La Casa Azul, a história de dor e superação de Frida Kahlo,
o uso de video mapping, projeção em 3D em uma grande extensão
de parede, proporcionou uma experiência ainda mais interativa e
fascinante para os espectadores, que tiveram a impressão de estar
dentro da casa da artista. A sala da contação foi especialmente
preparada e a entrada era uma reprodução da fachada da Casa
Azul, onde Frida e Diego Rivera viveram por mais de 20 anos, e um
pequeno jardim com cactos, folhagens e flores.
Ao convidar os espectadores para entrar, eu já chamava a atenção
para a fachada, jardim e também para a contadora. Dentro, no amplo
quarto de Frida Kahlo, Andi, com os cabelos presos em tranças no alto
da cabeça e enfeitados com flores, bata branca e saia verde, longa
e rodada, aguardava o público. Preparei as descrições do quarto,
mobiliário, objetos e quadros exibidos por meio da projeção em video
mapping, que foram, então, inseridas no texto narrativo pela própria
contadora. O mesmo aconteceu na história de Picasso, intitulada
Compartimento Secreto, cheia de mistério sobre o desaparecimento de
uma obra. A audiodescrição foi inserida pela própria contadora, com
alguns trechos falados ao microfone pelo apresentador da atividade.
Na última história deste ano, sobre arte contemporânea, como
foram exibidos alguns vídeos curtos de instalações, performances
e videoarte, a audiodescrição destes produtos foi gravada para que
pudessem ser exibidos já com o recurso. Na introdução da história,
o apresentador falou sobre o cenário e sobre a moça de pele clara,

AuDIODESCRIçãO NO PROJETO MANHÃS DE HISTÓRIA LíVIA MOTTA  75  


cabelo azul e cílios longos, que entrava no salão, com vestido preto
curto e botas prateadas de salto altíssimo. Durante, a própria
Mildred, representada por Andi Rubinstein, verbalizava as ações e
descrevia as peças que iam sendo trazidas para o cenário como uma
mesa retangular de madeira clara com o tampo móvel forrado com
toalha de grama sintética. Em algumas sessões, foram usados os
aparelhos móveis de audiodescrição.
A participação no projeto Manhãs de História ampliou e muito
minha experiência como audiodescritora, pois me possibilitou entrar
em contato com profissionais de áreas diversas e com recursos que
transformaram as histórias em momentos ainda mais mágicos. O
desafio foi convencer e mostrar a importância da audiodescrição
para a contadora de história, designers de computação gráfica e
produtores, e conseguir transformar recursos visuais tão inovadores
como video mapping e outros em palavras, de forma a permitir a
participação de crianças com deficiência visual em igualdade de
condições, e ao mesmo tempo manter o ritmo narrativo e o interesse
de todos os outros espectadores.
Verbalizar o universo imagético presente na contação de história
enriquece a narrativa, chama mais a atenção de todas as crianças,
amplia e muito o vocabulário, além de promover a acessibilidade
para as crianças com deficiência visual. Os depoimentos registrados
em vídeo mostram claramente o entendimento das crianças
com deficiência visual e o seu entusiasmo com a atividade; os
detalhes visuais que são mencionados realmente impressionam. A
audiodescrição na contação de histórias é um recurso coadjuvante,
uma complementação. Traduz as imagens, os objetos e figurinos
em palavras, ajuda na construção de imagens mentais, traz cores
e encantamento para a história. Certamente, um diferencial para
todos, com e sem deficiência!

76  
LÍVIA MOTTA
Doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela
PUC de São Paulo. Trabalha como audiodescritora e professora
de cursos de audiodescrição desde 2005, implementando o
recurso em todos os tipos de espetáculos, filmes, eventos
religiosos, acadêmicos e sociais. Coordenou o 1º Curso de
Especialização em Audiodescrição pela UFJF e organizou com
Paulo Romeu Filho o primeiro livro brasileiro sobre o tema:
Audiodescrição: transformando imagens em palavras. Publicou o
livro Audiodescrição na escola: abrindo caminhos para leitura de
mundo, que discute a importância do recurso para alunos com
e sem deficiência.

AUDIODESCRIÇÃO NO PROJETO MANHÃS DE HISTÓRIA Lívia Motta  77  


PALAVRAS PRODUZEM SENTIDO
Camila Araújo Alves

Palavras produzem sentido, criam realidades. Eu creio na força


das palavras, creio que fazemos coisas com as palavras e, também,
que as palavras fazem coisas conosco.
As palavras com que nomeamos o que somos, o que fazemos, o
que pensamos, o que percebemos ou o que sentimos são mais que
simples palavras. E, por isso, as lutas pelas palavras, pelos significados
e pelo controle das palavras, pela imposição de certas palavras e pelo
silenciamento de outras, são lutas em que se joga algo mais do que
simplesmente palavras, algo mais que somente palavras.
No campo da acessibilidade a maneira como empregamos a
palavra deficiência é um dos fatores decisivos para a direção de
qualquer iniciativa que se propõe a trabalhar com esse tema. A
maneira como encaramos a deficiência nos interessa na medida em
que isso define o aspecto político desses trabalhos.

78  
Por séculos a deficiência vem sendo constituída no Ocidente como
sinônimo de déficit e de incapacidade. Tal concepção de deficiência
incorporou-se nas práticas sociais, o que inclui a vivência dos
espaços de arte.
Essa concepção da experiência da deficiência como déficit nos
conduz a um tipo de prática de intervenção no campo da deficiência
visual que instaura uma assimetria entre a deficiência e a eficiência,
lembrando aqui que as palavras são construídas, não são dadas de
antemão. Isto é, muitas das vezes se intervém para restaurar as
perdas que marcam a cegueira, o que coloca as pessoas que veem
numa posição superior de saber sobre aquele que não vê.
Uma intervenção assim ordenada acaba por produzir uma
distribuição assimétrica de eficiência e deficiência, isto é, aquele que
intervém, o faz em nome da eficiência a ser alcançada e aquele que é
“alvo” da intervenção aparece como alguém a quem falta eficiência.
Criar um programa de acessibilidade que produza uma intervenção
simétrica também é um objetivo do meu trabalho.
A meu ver o PesquisarCOM, um método de pesquisa do qual eu
lanço mão no meu trabalho, se contrapõe neste momento a uma
outra metodologia no campo da acessibilidade que vem se tornando
cada vez mais comum: os manuais. Os manuais são orientados para
uma intervenção que se orienta num fazer PARA os outros, que é uma
orientação extremamente importante no campo da acessibilidade,
porém insuficiente para dar conta de todas as suas dimensões.
Tomo aqui esses manuais que estão sendo sistematicamente
criados e distribuídos como uma metodologia de trabalho à medida
que os usos que se fazem deles criam uma realidade no dia a dia do
trabalho com as pessoas com deficiência.
Proponho hoje, aqui, que pensemos para além dos manuais de
acessibilidade que, apesar de serem altamente importantes, são

PALAVRAS PRODUZEM SENTIDO Camila Araújo Alves  79  


insuficientes porque dizem respeito a adaptações arquitetônicas
e informacionais sem questionar as maneiras como vêm sendo
propostas, quando são propostas, experimentações mais estéticas e
expressivas de uma exposição ou de uma determinada obra de arte.
Basta uma informação para garantir o acesso de uma pessoa
a uma obra de arte? A informação é tomada como um elemento
predominante de conhecer. Ter acesso à informação de uma obra
esgota a questão de fruição de um visitante?
Podemos afirmar que a informação não é experiência. E mais,
a informação não deixa lugar para a experiência, ela é quase o
contrário da experiência, quase uma antiexperiência. Por isso a
ênfase contemporânea na informação, em estar informados, e toda
a retórica destinada a constituir-nos como sujeitos informantes e
informados; a informação não faz outra coisa que cancelar nossas
possibilidades de experiência. É preciso separar a experiência da
informação.
Uma boa proposta de acessibilidade é, então, aquela que não se
ocupa somente dos direitos das pessoas com deficiência no que
concerne ao acesso à informação e aos espaços, mas que vai além,
buscando assumir um compromisso estético.
Os manuais, em geral, têm servido como um dispositivo de
informação como garantia de uma trajetória incerta, de uma trajetória
que é feita no encontro COM o outro e não SOBRE ou PARA o outro
somente.
Fato é que os manuais não tratam de histórias, os guias não
tratam de histórias, eles tratam do que está pronto e histórias não
estão prontas. Histórias estão sempre por vir, histórias só se dão
no encontro. Os manuais se dão para antecipar o encontro, surgem
na tentativa de garantir o sucesso de um encontro, por isso eles
não lidam com histórias, não com histórias em movimento. Os

80  
guias e manuais estão sempre diante de histórias cristalizadas,
naturalizadas, histórias únicas.
Assim como as palavras têm força, acredito também que as
histórias têm força e fazem de nós quem nós somos. No caso da
experiência da deficiência, como em outros casos, insistir somente
nas histórias hegemônicas é superficializar essas experiências,
negligenciar muitas outras histórias que constituem a deficiência.
Segundo Chimamanda, uma romancista e feminista nigeriana, a
“única história cria estereótipos”. E o problema com os estereótipos
não é que eles sejam mentira, mas que eles sejam incompletos. Eles
fazem uma história tornar-se a única história.
Neste momento não posso deixar de dizer que todas essas
concepções, desde as mais duais até as reinventadas diariamente,
são concepções que formam as vidas e os modos como todos nos
relacionamos com essa experiência, pessoas com e sem deficiência.
Com história dos sentidos, não seria diferente. O sentido da visão é
considerado o mais apto para a investigação, e é por isso que dizem que
é o sentido que mais prazer nos gera. Sentimos prazer em conhecer
e estudar as coisas. Dizem ainda que é enxergando que percebemos o
discernimento das coisas e também as diferenças.
A visão é também o mais rápido dos sentidos, diriam alguns,
projetando imagens no subconsciente que ficarão na memória para
um fácil e rápido entendimento, com maior fidelidade.
A partir dessas considerações, defendo outra política perceptiva, uma
política metodológica que inclua outros sentidos nos nossos modos
de conhecer, desnaturalizando assim uma hierarquia sensorial que já
existe há séculos. Uma história única a respeito do sentido da visão.
Bom, neste momento, eu pergunto para vocês: O que podemos
pensar depois da Chimamanda sobre a palavra Deficiência?
Que histórias das pessoas com deficiência, tomadas como

PALAVRAS PRODUZEM SENTIDO Camila Araújo Alves  81  


narrativas de resistências, só poderão ser objetivamente
apreendidas por um trabalho que recuse a trivialização da exclusão
social, que rejeite a hegemonia da normalidade, que se deixe
ensinar pelos múltiplos sentidos e lugares da experiência e que,
finalmente, assuma seu papel na abolição do “poder disciplinar da
indiferença”?
O compromisso ético do trabalho que realizo está em alcançar
essa complexidade – ou as várias versões – da vida do outro. Não é
incomum que a história da deficiência seja dada a priori, seja pela via
da literatura, das leis, do cinema e até pelos manuais, como acontece
com frequência na área da cultura e da educação.
Eu me preocupo, neste trabalho, em colher histórias performadas,
histórias que assumam novos valores e novas leituras diante desta
proposta de acessibilidade.
Acrescento que a aposta no experimental como um conceito
indicador para um trabalho de acessibilidade abre um espaço cheio
de possibilidade para que nós, pessoas com e sem deficiência,
possamos ouvir e contar mais e novas histórias a respeito das nossas
experiências.
Tomo o conceito de experimental como sendo a ação que traz novos
valores, novas leituras. Assumir o experimental em um trabalho de
acessibilidade é assumir que uma obra de arte não tem sentido em si,
ou que uma curadoria de uma exposição não garante uma leitura por
parte do visitante, mas é garantir que existe e persiste neste processo
experimental uma positividade, algo esperando para emergir.
Desse modo retomo a ideia de que este trabalho pretende
tornar mais densa a passagem dos visitantes pelo centro cultural,
promovendo novas leituras a partir de novos referenciais.
“Os fios soltos do experimental são energias que brotam para um
número aberto de possibilidades” (OITICICA, Hélio. Experimentar o

82  
Experimental, 1972). No trabalho com a acessibilidade em espaços
culturais há fios soltos num campo de possibilidades: por que não
explorá-los?

A visita acontecia com um grupo de pessoas cegas e com baixa


visão. Seguimos a visita e paramos no segundo cofre. Naquele cofre
todos nós podíamos entrar. Diante da música de um vídeo e somente
com ela seguimos com a mediação e perguntamos: o que se passa
neste cofre? Alguns disseram que era um balé, e era. Grupo Corpo,
era o nome da companhia, dissemos quem era esse grupo. Qual é o
suporte de trabalho de um bailarino? Música? Vamos pensar, alguém
pode dançar sem música? Pode, um outro alguém respondeu... Bom,
então não pode ser esse o único suporte. O palco, disse outra pessoa.
Mas não podemos dançar fora dele, dançar aqui e agora ou dançar
na rua? Podemos... O que não podemos deixar de ter para ser um
bailarino? Um corpo... algum tipo respondeu! Sim, um corpo. Mas
basta um corpo para ser bailarino? Não... Então é preciso o quê?
Treinar, outros disseram. Sim, ensaiar, treinar... Um bailarino nasce
bailarino? Não... Mas alguém disse que nascia com um certo DOM
para a coisa... E uma joia de ouro, sai do rio ou da mina como joia?
Não. E para transformar ouro em joia, é só modular? Sim... Mas será
que o ouro puro é maleável? Sim e não... Duas respostas diferentes...
Em seguida alguém disse... É igual à gente, tem que lapidar. Misturar
com outros metais, esquentar e aí modelar. E o que isso tem a ver
com o trabalho? Um cara disse que o trabalho (que era um vídeo)
mostra como nós somos joias também!!!
(Trecho de relato de campo, novembro 2014)

E o que toda essa discussão tem a ver com um programa de


acessibilidade em museus e centros culturais?
Somos responsáveis pelas escolhas metodológicas que fazemos
para o trabalho que realizamos. Como pensar então em uma

PALAVRAS PRODUZEM SENTIDO Camila Araújo Alves  83  


metodologia que possibilite o surgimento de novas e outras histórias
a respeito das vidas das pessoas com deficiência e, desse modo,
fazer proliferar outras versões para além de um romantismo que por
vezes toma e é tomado pelas pessoas que vivenciam a experiência
da deficiência e, por outro lado, uma visão fatalista, que funda uma
tragédia pessoal na qual as vidas das pessoas com deficiência são
desenhadas.
Pensar em uma metodologia de trabalho implica se comprometer
com os efeitos que ela irá produzir. Pensando nisso, pergunto: que
efeitos e histórias podem produzir um programa de acessibilidade
pautado no uso de manuais e dispositivos que se dedicam
basicamente à informação e que efeitos e histórias podem produzir
um programa de acessibilidade pautado na direção do experimental?
Seguir os modos de ordenar a deficiência no centro cultural,
acompanhar as versões de deficiência feitas cotidianamente, trilhar
pelas bifurcações, pelas variações, eis alguns dos pontos que
norteiam o pesquisar com o outro e não sobre/para o outro.
Interpelar o outro, com deficiência, não como um sujeito dócil,
como um sujeito qualquer, mas, antes, como um expert, como alguém
que pode conosco formular as questões que são interessantes para
um programa de acessibilidade.
Criar dispositivos de intervenção que ativem os outros, que nos
engajem a todos num processo de transformação. Um processo de
transformação parecido com o do OURO no relato acima, que a partir
de encontros com outros metais, novas substâncias, vai ganhando
forma, consistência e podendo se tornar joia ou qualquer outra coisa
que possa estar por vir.
O que é importante que vocês compreendam neste momento é que
esse cultivo e essa capacidade de reagir implicam que nós possamos
nos transformar com o trabalho que fazemos. E que possamos

84  
transformar os nossos referenciais, nos colocar também em questão.
Mediação cultural, como traz Miriam Celeste em seu texto
Memórias para o devir: A mediação cultural como provocação e
contaminação estética (2012), é poder “estar entre muitos”. Aqui,
em parceria com Miriam Celeste, sigo dizendo: a mediação como
um caminho para uma acessibilidade estética é poder “estar entre
muitas histórias”.
Mediar é a ação de transitar, articular. É necessário, cada vez mais,
um trabalho de mediação que ative as sensibilidades impregnadas
na pele da vida (Celeste, 2012).

É pensando em um tipo de trabalho, adequado a quem nos visita,


que em nosso programa de acessibilidade no Centro Cultural Banco
do Brasil RJ desenvolvemos ações que cuidam de servir uma dose
equilibrada entre informação e experimentações que cuidam de uma
ativação das sensibilidades impregnadas na pele da vida.

Recebemos em 2012, na exposição Obsessão Infinita da artista


japonesa Yayoi Kusama no CCBB RJ, uma instalação que criava
em um espaço objetivamente pequeno uma relação com o infinito
através de espelhos nas paredes, um piso e alguns caminhos de
água que refletiam as tantas luzinhas que faziam parte da instalação.
Uma instalação completamente visual, que poderíamos usar de
que maneira: descrevendo? Sim, claro... Dizendo o que ela produzia
em quem via? Também... Mas ficamos pensando... Só isso bastará
para que as pessoas cegas, por exemplo, experimentem em seus
próprios corpos o infinito tratado por Kusama?
Entendendo que apenas a descrição desta instalação seria
insuficiente para produzir um território fértil para uma experiência
estética, criamos, a partir dos conceitos da artista, uma Obsessão
Infinita sonora.

PALAVRAS PRODUZEM SENTIDO Camila Araújo Alves  85  


E como nosso trabalho funcionou? Uma caixa de madeira
quadrada, com uma porta que se fechava sempre que algum
espectador entrasse. Dentro da caixa um microfone, um som e uma
pedaleira de guitarra. Ao falar o que quisesse nesse microfone, a
pedaleira fazia esse som existir por um bom e longo tempo.
Por exemplo, se eu disse Camila, o som dizia: Camila, Camila,
Camila, Ca mi la, Caaa, miiii, laaaa, Caaaaaaa, miiiiiii, laaaaa. Diferente
do eco, a propagação não era somente dos finais das palavras, mas
delas todas. Tínhamos ali uma relação com a profundidade, repetição,
tamanho, que vinha pela força e perda de força do som.
Neste trabalho, os conceitos dessa instalação estavam
sendo perfeitamente considerados, sem que precisássemos
necessariamente, ou só, descrevê-la, reproduzi-la.
Outro dado interessante é que era uma instalação aberta para
todas as pessoas, com e sem deficiência, e interessante para todos,
inclusive para os que já tinham visto a instalação.
Com esse trabalho, foi se construindo um foco na mediação
como um campo expandido para as experiências estéticas, em que
a partir da conexão entre informação e experiência, não a escolha
de uma em detrimento de outra, criamos uma aposta de mediação
que conduziu a acessibilidade para uma experimentação estética.
Aqui se revela também a nossa preocupação em trabalhar com
a mediação cultural não apenas como um pensar sobre as relações
entre sujeito e objeto de arte, mas ampliando a ação mediadora
como uma proposição, uma criação.
E aí se faz necessário, neste momento, pensar que a acessibilidade
não é concebida como um conjunto de ações que teriam como meta
proporcionar o alcance a um conhecimento ou informação a priori,
mas sim pensar a acessibilidade como criação de condições para
a produção de múltiplos sentidos na experiência com a arte. Eis

86  
uma questão que se revela como zona de risco e como instigadora
para a mudança de valores e de parâmetro da mediação ou da
acessibilidade.
Isso que eu estou trazendo tem a ver com uma preocupação
menos com o conhecimento formal que o público vai adquirir sobre
as obras, movimentos e artistas, e mais com a diferença, com os
deslocamentos que a experiência pode despertar.
Nesse sentido, a inserção de pessoas com deficiência em museus
e espaços culturais é um dispositivo transformador tanto de questões
sociais de exclusão e políticas públicas como um analisador para o
funcionamento do espaço do museu.
Apostamos na experimentação estética e no que pode ser
partilhado aqui, como uma dimensão ética e política de se fazer
acessibilidade e, dessa maneira, produzir novas possibilidades de
vida com a arte dentro e fora do museu.
O que uma estratégia inclusiva deve fazer não é só alterar a mídia,
o veículo material da obra. Acima de tudo, deve-se recriar a obra de
arte. O que se tem pela frente é um esforço não só de adaptação,
mas principalmente um esforço de reinvenção.

CAMILA ARAÚJO ALVES


Psicóloga clínica, especializada em terapia corporal
reichiana. Mestre em Acessibilidade Estética, pelo
departamento de Psicologia da Universidade Federal
Fluminense. Atualmente é Coordenadora pedagógica
do Programa Educativo do Centro Cultural Banco do
Brasil. Atua também como consultora em acessibilidade
estética, pensando e criando ferramentas mais inventivas
para tornar os espaços artísticos mais inclusivos e
interessantes para todos, com ou sem deficiência.

PALAVRAS PRODUZEM SENTIDO Camila Araújo Alves  87  


4.
PRÁTICAS E
APROPRIAÇÕES DE
ESPAÇOS CULTURAIS
CONTRA AS
VULNERABILIDADES
SOCIOECONÔMICAS
ANIMANDO OS ESPAÇOS SOCIOCULTURAIS
DA PERIFERIA
Roberto da Silva

A cultura é um dos alicerces da vida de cada indivíduo e da


sociedade. Ela pode ser analisada e refletida a partir das mais
diversas posições e prismas. A animação sociocultural no seu
sentido amplo é realizada, normalmente, pelo educador social e
está voltada para as comunidades e suas necessidades concretas,
direcionando as suas práticas como um espaço de educação e de
desenvolvimento: educação para a vida social, educação para a vida
individual, educação para o desenvolvimento da pessoa humana. A
finalidade de toda animação sociocultural é a humanização, pois
promove os diálogos entre as diversas manifestações culturais
presentes nas comunidades, possibilitando a educação e a formação
dos indivíduos para a vida em sociedade.
As atividades pedagógicas desenvolvidas no contexto da animação
sociocultural pelo educador social reconhecem o valor da cultura

89  
presente nas comunidades locais onde seu trabalho é desenvolvido,
garantindo o espaço e a realização pública de projetos comunitários.
O educador social é animador sociocomunitário, pois promove
ações que integram o social, o educativo e o cultural, sendo agente
de desenvolvimento humano, numa prática libertadora de todos os
envolvidos no processo, sobretudo as pessoas e as comunidades.
Particularmente nos países que sofreram o processo de
colonização branca, ocidental e cristã, tal como o Brasil, a
conscientização, a emancipação, a libertação e a autonomia são
princípios inerentes a qualquer proposta educacional, pois é preciso
ter em conta as matrizes culturais que forjaram os seus povos,
suas identidades e suas estruturas sociais. A exploração econômica
europeia, o extermínio de povos nativos, a escravidão africana,
a imposição da cultura branca, ocidental e cristã em detrimento
das culturas nativas, a negação do status de humanidade a índios
e negros, a odiosa distinção entre filhos legítimos e ilegítimos,
mulheres casadas e concubinas e famílias constituídas ou não por
meio do casamento estão na gênese de todos os nossos estigmas,
preconceitos e discriminações de todos os tipos e estão nas raízes
da imensa desigualdade social que afeta os povos e países vitimados
pela colonização.
As guerras de libertação levadas a cabo em países da América do
Sul, América Central, Caribe e África visavam sim a independência,
mas também a restauração de identidades étnicas, tribais e
culturais suprimidas por séculos de colonização e que justificaram a
emergência de práticas de resistência que deram origem à Educação
Popular, à Educação Social e à Educação Comunitária. Sob essa
perspectiva, a Animação Sociocultural está diretamente relacionada
ao emprego do conhecimento, hábitos, costumes e tradições
populares para os propósitos educativos, especialmente quando nos

90   PRÁTICAS E APROPRIAÇÕES DE ESPAÇOS CULTURAIS


referimos às periferias das grandes cidades, foco de concentração
de pessoas originárias do processo de intensa miscigenação étnica
e racial que ocorreu no Brasil. Usar a cultura para fomentar a
consciência étnica, por exemplo, é o primeiro passo para desenvolver
a consciência histórica, esta desenvolver a consciência política e,
esta sim, impulsionar a ação transformadora, pois é a consciência
política que leva à organização popular, social e comunitária capaz
de desencadear iniciativas com vistas à ampliação das liberdades,
à autonomia e à emancipação de indivíduos, grupos e comunidades.
Este propósito não é incompatível com as diversas tradições da
Animação Sociocultural, pois a própria UNESCO a adota, nos seguintes
termos: “A Animação Sociocultural é um conjunto de práticas sociais
que têm como finalidade estimular a iniciativa, bem como a participação
das comunidades no processo do seu próprio desenvolvimento e na
dinâmica global da vida sociopolítica em que estão integrados”.1
A Animação Sociocultural  colabora para o progresso cultural
da sociedade, seja por ordem tradicional, musical, artesanal, entre
outras. Trabalhando sempre na comunidade, é importante referir
que este técnico [o Animador Sociocultural, Educador Popular, Social
ou Comunitário] prefere esta designação [comunidade] do que o
conceito de sociedade “porque, enquanto intervenção, não afeta “toda
a sociedade”, mas sim grupos ou coletivos inseridos num contexto de
uma “comunidade” específica, num território concreto” (CALVO, 2002).2

NOTAS

1 UNESCO (1995). Comissão Nacional de Moçambique para a UNESCO:


Relatório interno de cooperação intercultural de Moçambique. Documento
não publicado.

2 Calvo, A (2002). La Animación Sociocultural – Una Estrategia educativa


para la participación. Madrid, Alianza Editorial, 2002.

Animando os Espaços Socioculturais da Periferia Roberto da Silva  91  


ROBERTO DA SILVA
Pedagogo graduado pela Universidade Federal de Mato Grosso,
Mestre e Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo.
Atualmente é professor Livre Docente do Departamento de
Administração Escolar e Economia da Educação da Faculdade
de Educação da Universidade de São Paulo.

92  
UM PSICÓLOGO SOCIAL TRABALHANDO EM
MUSEUS: O PÚBLICO E A QUESTÃO SOCIAL
Marcio Farias

Nas últimas décadas os museus vêm se reelaborando, mundo


afora, de maneira a questionarem as bases de seus acervos, os
conceitos que orientam as exposições, a comunicação social, o
papel dos educativos, o público atendido etc. Essas mudanças
acompanham não só as tendências e conflitos no campo da arte
e cultura contemporâneas, mas também a emergência de novas
questões sociais, ou mesmo velhas questões que agora passam a ter
força política e que incidem no cotidiano dessas instituições, como os
debates sobre identidades, gênero e raça. Assim sendo, os postulados
de uma instituição elitista, potencialmente colonial e organizada
em sua origem a partir de referenciais e símbolos escolhidos por
uma elite e seus intelectuais orgânicos – sobretudo levando-se em
conta uma sociedade de matriz colonial e essencialmente desigual
como a brasileira – passam por um giro de 360°, qualificando uma

93  
efetiva discussão sobre o papel social e político dos museus. Essas
novas veredas representam uma disputa, no campo simbólico, pelos
sentidos e significados da história, da arte e da cultura.
Por sua vez, a psicologia na América Latina desde as décadas
de 1960/70 vem se organizando e pautando uma reformulação
conceitual que orienta um compromisso ético da profissão para
com a realidade latino-americana, no sentido de contribuição para o
combate das desigualdades materiais e simbólicas, bem como uma
atuação orientada por normativas que estão atreladas às convenções
internacionais e nacionais sobre direitos humanos. Essas mudanças
conformaram a ampliação da atuação de psicólogos nas mais
variadas áreas, em vários tipos de instituições sociais e com um
variado tipo de atendidos. O trabalho na área da saúde, assistência
social, educação e cultura constitui, portanto, novos focos dessa
psicologia comprometida com a ideia de justiça social.
Nesse sentido, a atuação do psicólogo social em museus,
justamente num contexto de abertura para novas demandas,
incluindo o recebimento de um público historicamente excluído do
acesso a esses bens culturais, faz-se justificada. Essa contribuição
se dá naquilo que é das atribuições mais elementares do ofício “psi”:
a escuta, a análise e o manejo técnico.
A escuta ampliada, ferramenta indispensável do ofício “psi”,
elaborada no contexto da clínica individual é um dos pilares da recepção
da “queixa” por parte do outro. É neste momento que o profissional
recepciona a demanda, vinda das mais variadas formas, com os mais
distintos sentidos e significados, mas que, se bem “escutada” subsidiará
todo o projeto terapêutico singular, na esfera da psicologia clínica, mas
que se estende aos demais campos de atuação da psicologia social.
Na mesma linha, a “análise”, que é o campo de diagnóstico “psi”,
também é uma ferramenta no campo da atuação social, que qualifica

94  
as múltiplas determinações que estão colocadas nas esferas das
relações interpessoais. O manejo é a “práxis” do psicólogo, é a síntese
dos processos precedentes. É o caminho a ser seguido, orientado pelo
acolhimento da demanda, interpretação reflexiva e ação. Manejar, nesse
sentido, pressupõe mediações e objetos transicionais.
Ora, se pensarmos a estrutura de uma visita educativa em museus,
essas três atribuições são “ferramentas” que podem contribuir para
a qualidade do atendimento a grupos.
A tríade se faz pertinente no atendimento não só de grupos regulares,
mas também de grupos que outrora eram excluídos e que agora passam
a compor o público atendido por essas instituições, tais como pessoas
com deficiência, grupos em vulnerabilidade social, idosos, adolescentes
em conflito com a lei cumprindo medidas socioeducativas etc.
No meu dia a dia como educador, o saber “psi” e suas três bases
elementares de trabalho foram importantes para uma atuação que
possibilitou aos sujeitos envolvidos nesse processo trocas em que
a mediação do acervo permitiu reflexões sobre os mais variados
aspectos da vida, do cotidiano à estética. Cito o caso dos adolescentes
da Fundação Casa.
O adolescente que recebemos, em tese, está sob acompanhamento
e tem uma avaliação positiva da equipe da Fundação Casa, fator que
contribui para uma possível vinculação do adolescente com a visita a
uma instituição cultural. Acrescento aqui o entusiasmo e a ansiedade
que sair da instituição, muitas vezes depois de meses sem contato
com o “além-muros”, geralmente causa no adolescente.
Do ponto de vista negativo, algumas dimensões psicossociais
relacionadas aos históricos dos indivíduos e à dinâmica da Fundação
Casa também estão colocados, explícita e implicitamente, como
elementos que reverberam na visita e podem dificultar ou ser
empecilhos para a sua realização. O rigor, que certas vezes beira a

UM PSICÓLOGO SOCIAL TRABALHANDO EM MUSEUS Marcio Farias   95  


violação dos direitos humanos, é percebido quando da recepção deles
e pela maneira desconfiada e persecutória que esses jovens lidam
com as pessoas em geral, situação da qual os educadores não estão
isentos. É uma tendência dos adolescentes atendidos pela Fundação
Casa não confiarem, a priori, em ninguém, muito menos em alguém
desconhecido que os trata de maneira gentil e agradável. Acrescenta-
se ainda a dimensão de “barganha” que essas saídas para visitação
de espaços culturais representam entre adolescentes e técnicos da
Fundação Casa. São estes que fazem o “tal” do relatório para o juiz,
definindo quanto tempo eles ficarão em liberdade privada.
Ainda a respeito dos aspectos negativos, agora pela ótica da
instituição, os adolescentes sempre são trazidos por um veículo da
Fundação Casa, geralmente acompanhados por uma viatura da polícia.
São trazidos algemados e monitorados por agentes de segurança.
Considerando tudo isso, é fundamental compreender que:

1 A qualidade da visita está no acolhimento. Olhar no olho, ser singelo


no cumprimento (parece óbvio, eu sei...) faz toda a diferença. Pois é
nesse momento que os adolescentes tendem a confrontar o indivíduo
que os recebe. Não entrar na “provocação”, sentindo-se intimado, é
um passo fundamental para a afirmação de um vínculo positivo que
será imprescindível para a continuidade da visita;
2 A introdução pode ser mais longa, partindo de referenciais muito
mais ligados às expectativas da visita e experiências pessoais do
que um conteúdo programático do museu. Nesse momento, quando
da existência de um diálogo menos distante e formal, incluir alguns
conteúdos que o acervo contempla;
3 Existe um grande número de adolescentes que estão na Fundação Casa
com dificuldades de aprendizagem. No geral, tiveram uma educação
formal precária e desestimuladora. Em alguns casos, a questão está
relacionada a alguma dimensão cognitiva. Nesse sentido, as orientações

96  
de manejo são as mesmas do atendimento em acessibilidade (destaque
para as experiências sensoriais; maior atenção na articulação gestual
com o conteúdo da fala; falar mais brando etc.). No mais, a visita da
Fundação Casa (Adolescentes privados de liberdade) tem um caráter
muito mais exploratório da vivência e experiência no Museu do que uma
dimensão de conteúdo a ser explorado;
4 Por fim, pode ser uma visita marcada por um silêncio assustador.
Lidar com essa situação de maneira a não pessoalizar, tomando para
si essa questão, é fundamental.

O relato acima, acrescido de uma proposta de atendimento, é composto


por aquilo que entendo como as grandes contribuições do saber “psi”,
que têm possibilitado uma efetiva interface entre uma atuação de um
psicólogo social comprometido eticamente com a realidade social latino-
americana e a tentativa de superação das desigualdades materiais e
simbólico-históricas, de um lado, e, de outro, com os museus em novo
contexto, com novas abordagens comprometidas com uma pluralidade
de discursos e com uma diversidade de sujeitos a serem atendidos.

MARCIO FARIAS
Graduado em Psicologia pela Universidade Presbiteriana
Mackenzie (2011). Mestre em Psicologia Social na PUC-
SP (2015). Doutorando em Psicologia Social na PUC-SP.
Coordenador do Núcleo de Estudos Afro-Americanos
(NEPAFRO). Colaborador do Instituto Amma Psique e Negritude.
Compõe a equipe de Coordenação do Núcleo de Educação
do Museu Afro Brasil. Conselheiro do Instituto Luiz Gama.
Foi Parecerista de Projetos Culturais e Artísticos da Funarte.
Tem experiência de atendimento e formação com os temas:
Juventude, Cultura e Resistência; Psicologia da Educação, Arte
e Cultura. Em pesquisa, desenvolve estudos sobre Pensamento
social latino-americano e relações raciais; Negritude e lutas de
classes no Brasil; África, capitalismo e imigração.

uM PSICÓLOGO SOCIAL TRABALHANDO EM MuSEuS MARCIO FARIAS   97  


CULTURAS
Raphael Escobar

Para começar, é preciso explicar um pouco alguns fatores da


construção do território hoje conhecido como Cracolândia: fatores
históricos e construções políticas que lá existiram e como esses
processos influenciaram e ainda influenciam na imagem que foi
construída em cima daquele território e das pessoas que nele
residem.
A Cracolândia, surgida no final dos anos 80 e começo dos 90, é
considerada um dos maiores espaços abertos de uso de crack no
mundo. A discussão sobre o referido espaço aumentou muito a partir
de 2005/2006 e teve seu auge em 2012 com as ações do governo do
estado em tentativas de acabar com o consumo de crack na região.
Mas, como a região da Luz se tornou um ponto referencial para o
crack, devem também ser pensadas desde políticas públicas às
condições sociais, econômicas e arquitetônicas.

98  
Sua história precede o surgimento do crack no Brasil. Aquele
território, na Luz, é historicamente um espaço de boemia e
marginalidade. Antes conhecido como Boca do Lixo, nos anos 30
abrigava diversas produtoras de cinema, tendo sido referência
de produção de pornochanchadas. Desde então, aquele cenário
marginal foi construído com bares, cortiços, casas de prostituição e,
mais à frente, o tráfico (de maconha, principalmente).
Além dessa configuração, o surgimento da rodoviária da Luz em
1961 trouxe diversos migrantes para a cidade em busca de empregos.
Apesar da bela arquitetura modernista da rodoviária, o
planejamento não calculou o que ela acarretaria a todo o seu
entorno, como a dificuldade para um bom fluxo do transporte na
região, criando uma zona de muito trânsito na época.
A chegada do Terminal começa a povoar os arredores e, com
isto, muitos migrantes começam a ficar na região, por diversos
fatores sociais que envolviam o contexto1. Os assaltos aumentam
e as classes média e alta começam a se retirar da região da Luz.
Contudo, não se mudam para longe. Preferindo ainda ficar no
centro, mudam-se para Campos Elíseos, Higienópolis e outras
localidades nos arredores.
A Cracolândia já estava criada antes de existir o crack, que surge
em meados dos anos 80, e o tráfico de droga começa a existir nesta
região. Assim, aos poucos os usuários de crack começam já a ficarem
próximos e os que estão em outras regiões são levados para lá (ou são
expulsos de suas casas ou bairros ou são levados pela polícia2).
Aos poucos vai se formando um lugar de possibilidades para
esses que foram e são excluídos da sociedade (usuários ou não de
crack3). O exemplo é pensar que 70% de sua população é de ex-
presidiários4 que, com poucas possibilidades de reinserção na
sociedade, começam a morar ali.

Culturas Raphael Escobar  99  


Conforme os anos vão se passando, começam a surgir diversos
projetos para a revitalização da Luz, que contam com parcerias
público-privadas e com o surgimento de diversos espaços culturais
(com mais força a partir dos anos 2000). Deste modo, represálias
e ações da polícia (municipal e estadual) são comuns no território,
cada vez com mais intenção de apagar a existência destes que hoje
se encontram na região.
A estratégia do uso de equipamentos culturais opta por afirmar o
que é cultura ou que tipo de cultura é ou pode ser aceita na região:
uma cultura elitista que não aceita outras potencialidades.
Enquanto mediação, como podem se quebrar estas estratégias?
O trabalho em contexto de vulnerabilidade se caracteriza por
privilegiar a articulação com o público que troca: trata-se de fazer
“com” e não “para”. Tem como principal objetivo dar visibilidade para
as violências vividas, utilizando-se de meios artísticos que auxiliam
a comunicação e o protagonismo político. Deste modo, propõe-se o
“Nada” como forma de criação de vínculo, olhar e entendimento, ao
contrário de processos jesuíticos de ensino. Uma proposta que se
pretende entender antes mesmo de propor.
O Nada diz respeito a um recurso de trabalho que corresponde
a uma abertura para o território e seus agentes. Sustentar esse
Nada é absolutamente diferente de fazer nada: é estar presente com
constância, ativamente disponível para acolher o que surgir, mas
esperando surgir, de forma atenta e provocativa.5
Essas são as bases que potencializam a criação coletiva, a
interação e a articulação de territórios para que possamos fazer
proposições políticas que discutam violências e proponham lugares.
Assim, dentro do espaço público, é possível articular e ativar
proposições que, fora do contexto institucional, façam sentido
para este público: um bloco de carnaval que ocupe os espaços de

100  
gentrificação, um jornal escrito e desenhado pelo grupo que vira uma
ferramenta de comunicação, entre outros.
Agora, como lidar com uma estratégia de mediação dentro de
espaços culturais?
A arquitetura de um espaço cultural muitas vezes é opressora
e faz com que muitos não se sintam pertencentes àquele lugar ou
contexto. Quando o espaço cultural se propõe a “incluir” contextos
vulneráveis, junto disso vem uma imposição de conteúdo da
instituição, muitas vezes não aceitando os processos culturais em
volta da região. É importante cada dia mais que as instituições
se utilizem de objetos de mediação próximos aos contextos
vulneráveis, por exemplo, a cachaça, o cachimbo, o samba, a
pichação. Todos ainda exemplos de cultura muitas vezes deixados
à margem por diversas questões da discussão de classe e vão se
embrenhando em diversos outros contextos sociais e políticos da
formação de uma cultura e do que pode ser considerado cultura.
Grupos em vulnerabilidade têm sua própria construção social e,
portanto, cultural. Para que exista uma ligação entre os contextos
da rua e do espaço cultural, é preciso que o espaço cultural
aumente e aceite outras culturas.

NOTAS

1 De acordo com a autobiografia de Hiroito Joanides de Morais, intitulada


“Boca do Lixo”, muitos migrantes chegavam e São Paulo em busca
de oportunidades de emprego. Com certa dificuldade de conseguir, e
muitos sem dinheiro, ficavam na região da Luz em busca de chances
para voltarem para sua cidade de partida.

2 Há relatos de usuários de crack serem abordados pela polícia em outras


regiões da cidade e serem levados para a Cracolândia como forma de
centralizar estes usuários.

Culturas Raphael Escobar  101  


3 Ao contrário do que é dito, na Cracolândia nem todos os moradores são
usuários. De acordo com o Relatório de pesquisa e avaliação preliminar
do programa “De Braços Abertos”, 85% afirmam usar ou já terem usado
a substância. Mas é importante afirmar que a pesquisa é feita só com os
participantes do programa, que é focado em usuários de crack. Assim,
na Cracolândia existem muitos outros moradores de rua e conviventes
da região que não usam crack, só moram por lá.

4 Retirada de reportagem do jornal Estadão (http://sao-paulo.estadao.


com.br/blogs/sp-no-diva/cinco-descobertas-de-haddad-na-cracolandia/
acessado no dia 27 de junho de 2016)

5 O conceito de Nada foi retirado da sistematização do Projeto Oficinas


(Cedeca Interlagos).

RAPHAEL ESCOBAR
Artista graduado em Artes Visuais pelo Centro Universitário
Belas Artes de São Paulo, atua com educação não formal
dando oficinas para crianças e adolescentes em situação de
risco, como adolescentes e jovens privados de liberdade na
Fundação Casa (Antiga FEBEM).

102  
5.
DIVERSIDADE
INTELECTUAL

CAMINHOS
PARA AS
RELAÇÕES COM
O SABER
EMPREGO APOIADO
Márcia Pessoa

No decorrer da História das Pessoas com Deficiência Intelectual,


pautada por segregações, elas sempre viveram em ambientes nos
quais seus direitos básicos foram negados. Nunca tiveram voz ativa
e controle sobre suas próprias vidas, não participavam na definição
de seus próprios projetos de vida, pois sempre tiveram pessoas que
tomavam todas as decisões por elas. Desde a década de 1970 foram
ocorrendo mudanças devido ao aumento gradual na compreensão
de que Pessoas com Deficiência Intelectual devem ter assegurados
seus direitos humanos básicos.
Neste texto pretendo contribuir com a ampliação do olhar
para a importância do Emprego Apoiado, que é uma metodologia
individualizada, centrada na pessoa e com foco nas capacidades,
que visa a Inclusão de pessoas em situação de incapacidade mais
significativa no mercado de trabalho competitivo, respeitando as

104  
suas escolhas, interesses, habilidades e talentos, reconhecendo as
necessidades de apoio na obtenção do emprego, na sua manutenção
e no seu desenvolvimento (BETTI, 2011).
Conforme mencionado anteriormente, durante várias décadas as
Pessoas com Deficiência Intelectual foram atendidas em ambientes
protegidos, segregados, principalmente nas chamadas oficinas
de produção. Foi um modelo importante e, sem dúvida, teve seu
valor. No entanto, apresentava índices muito baixos de sucesso em
termos de inserção laboral, já que se baseava apenas no treino e
não ensinava as competências vocacionais, sociais e emocionais
relevantes para a integração no emprego competitivo.
Segundo Betti (2011), na década de 70 surgiram questões que
levantaram as primeiras hipóteses da importância do Emprego Apoiado,
inicialmente nos Estados Unidos, percebendo-se a ineficácia dos
programas das oficinas protegidas de trabalho. Notou-se que, quanto
maior fosse a permanência das Pessoas com Deficiências Intelectuais
em programas pré-profissionalizantes das oficinas protegidas, menores
eram as suas probabilidades de acesso ao emprego competitivo. Isto
porque estes locais aumentavam tanto a estigmatização como o seu
isolamento social. Portanto, pensou-se que o ideal seria que essas
pessoas convivessem naturalmente no mundo, ou seja, de modo que
não ficassem afastadas ou segregadas. Para inverter a “lógica do
corredor” das oficinas, o melhor seria tentar realizar o treinamento das
novas habilidades profissionais nos próprios locais de trabalho.
A partir dessa constatação, a década de 80, nos Estados Unidos, fez
evoluir um movimento a partir de projetos de várias Universidades,
como de Washington, de Wisconsin e de Oregon, dando origem
ao Emprego Apoiado, cuja proposta de orientação praticada nas
oficinas protegidas passou do tipo treino-colocação para o modelo
colocação-treino; ou seja, a pessoa primeiramente começaria a

EMPREGO APOIADO Márcia Pessoa  105  


trabalhar no emprego de sua escolha e perfil, recebendo no posto de
trabalho toda a formação necessária e apoio mediado, aumentando
as chances de bom desempenho e adaptação em sua função, tendo
à sua disposição os apoios necessários.
O modelo do Emprego Apoiado está fundamentado na crença de
que a inclusão profissional da Pessoa com Deficiência na sociedade
só é plena e possível quando a avaliação das suas competências é
baseada no Modelo Social da Deficiência, que, ao invés de “culpabilizá-
la” indicando suas incapacidades, irá identificar as falhas das
condições ambientais e sociais, de modo a alavancar as possibilidades
efetivas, potencializando as suas competências. Sendo assim, pode-
se dizer que o modelo do Emprego Apoiado parte do princípio de que
é a Sociedade quem deve modificar-se ou ajustar-se para incluir as
Pessoas com Deficiência, e não o contrário, pois todas as pessoas
possuem pontos fortes e habilidades que precisam ser valorizadas.
Além disso, o Emprego Apoiado trabalha com uma metodologia de
construção desta inclusão profissional articulada ao projeto de vida
da própria pessoa, considerando aspectos culturais, habitacionais,
educacionais, de lazer, sociais, entre outros. O indivíduo é visto como
um todo.
O projeto de vida precisa iniciar com o processo de Descoberta,
que é o ponto de partida para o desenvolvimento de um emprego.
Para essa descoberta precisamos fazer uma pergunta básica: quem
é essa pessoa? Nesse cenário entra o Planejamento Centrado
na Pessoa, que é uma estratégia que coloca o foco no indivíduo,
valorizando seus desejos, pois cada pessoa é um ser único, cheio
de talentos e de possibilidades, a abrir caminhos para a descoberta
das nossas experiências comuns e a trabalhar em conjunto para
construir uma vida em que os talentos possam ser partilhados com
os outros (BROOKE et al., 1997).

106   DIVERSIDADE INTELECTUAL – CAMINHOS PARA AS RELAÇÕES COM O SABER


Nesse sentido, é possível afirmar que o planejamento centrado na
pessoa envolve abandonar a perspectiva do planejamento centrado
no sistema, articular um processo que agrega a capacidade que o
profissional possui em ouvir a Pessoa com Deficiência e, dessa forma,
adequar as propostas e/ou o apoio no desenvolvimento da atividade.
Para tanto, os seguintes fatores devem demarcar o planejamento
centrado na pessoa: desvendar e otimizar as habilidades de cada
indivíduo; possibilitar que o indivíduo expresse suas habilidades;
instituir uma equipe que apoie e desenvolva estes ideais; instituir uma
teia comunitária de aceitação; e prover transformações nos serviços
para que estes permitam feedbacks aos interesses dos indivíduos.
Em síntese, o processo de desenvolvimento de emprego abarca o
conhecimento do indivíduo, uma vez que quanto mais o profissional
responsável por este o conhece, melhor estará preparado com vistas
à elaboração de um planejamento eficaz e, consequentemente,
negociará e comunicará de forma efetiva com o empregador a fim de
obter uma instalação adequada, contribuindo assim para a qualidade
de vida da pessoa com deficiência intelectual.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

PESSOA, Marcia Regina. EMPREGO APOIADO: do planejamento centrado na


pessoa à qualidade de vida. São Paulo – 2015 (Monografia apresentada como
requisito de Conclusão do Curso de Emprego Apoiado da Universidade Federal
de São Paulo - UNIFESP, para obtenção do título de especialista).

MÁRCIA PESSOA
Pedagoga com especialização em deficiência intelectual
pela Universidade Federal de São Paulo em Emprego
Apoiado, atua no Serviço de Qualificação e Inclusão
Profissional da APAE de São Paulo.

EMPREGO APOIADO Márcia Pessoa  107  


DIVERSIDADE INTELECTUAL
A EXPERIÊNCIA DO DEFICIENTE RESIDENTE NO MUSEU DO
FUTEBOL

Ialê Cardoso e Marcelo Continelli

ACESSIBILIDADE E O MUSEU DO FUTEBOL


O Museu do Futebol foi concebido para ser acessível em termos
estruturais (acesso físico e de fruição de conteúdo) e humanos (uma
equipe preparada para a inclusão), mas para formar uma equipe
culturalmente envolvida com a acessibilidade (de fato preparada para
a inclusão) é necessário um investimento contínuo. Pode-se dizer
que o projeto Deficiente Residente é fruto de um amadurecimento
da equipe e da instituição que revelou frutos inesperados no que
diz respeito às transformações comportamentais e à qualidade do
atendimento.

COMO SURGIU A IDEIA DO PROJETO DEFICIENTE RESIDENTE


O projeto Deficiente Residente, iniciado em 2010, nasceu de uma
necessidade, experimentada pela equipe do Núcleo Educativo do

108  
Museu do Futebol, de tornar familiares os universos distantes e
desconhecidos. Dúvidas básicas como, por exemplo, se podíamos dizer
a uma pessoa cega a expressão corriqueira “como você vê” a dúvidas
mais complexas como, por exemplo, se uma pessoa autista ou com
síndrome de Asperger consegue identificar as emoções por meio de
expressões faciais; ou seja, de que modo lidar com alteridades com as
quais temos pouco ou nenhum contato e desconstruir determinados
preconceitos. Esses anseios fizeram parte dos questionamentos que
acompanham o desafio de atender pessoas com deficiência com afeto
e levando em conta suas especificidades.

O PROJETO
O projeto Deficiente Residente partiu do princípio de que para
um museu ser acessível ao público com deficiência era necessário
fazer um projeto “com” e não “para” a pessoa com deficiência.
A palavra “com” aparecia como algo fundamental para colocar
todos os envolvidos no papel de protagonistas, pensando juntos
em melhorias na acessibilidade física do museu e no atendimento
humano ao público.

A RESIDÊNCIA
Em 2010, quando o projeto foi criado, tivemos a oportunidade de
planejá-lo para acontecer até 2015, perfazendo seis edições consecutivas.
Planejamos uma imersão, a cada ano, com uma deficiência específica,
escolhida juntamente com a equipe. Assim, em 2010 trabalhamos a
deficiência visual; em 2011, a deficiência intelectual; em 2012, a deficiência
auditiva; em 2013, a deficiência física; em 2014, a saúde mental; em 2015,
uma retomada com representantes das edições anteriores. A cada ano,
foram selecionados dois residentes para atuar com a equipe nas quebras
de barreiras atitudinais. Todos os residentes foram remunerados.

Diversidade Intelectual Ialê Cardoso e Marcelo Continelli  109  


A DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
Na segunda edição, trabalhamos com autismo e síndrome de
Asperger e, em conjunto com os residentes, identificamos duas grandes
dificuldades: distinguir, em objetos e fotos, o passado do presente;
e diferenciar sentimentos a partir de expressões faciais. Essas duas
descobertas fizeram com que a equipe, juntamente com os residentes,
fosse para o espaço expositivo com o objetivo de estudar as expressões
faciais nas fotografias do acervo (fisionomias de tristeza, alegria,
espanto, raiva, surpresa etc.) e também observar as vestimentas
utilizadas antigamente e hoje em dia por personagens do futebol como
jogadores, goleiros, árbitros e torcedores.

REFLEXÃO
Ao longo desse processo percebemos que a prioridade não é a
deficiência em si, mas os indivíduos e, a partir deles, a descoberta de
suas especificidades e potencialidades. A residência, que nada mais
é do que uma convivência plena e desejada, permite estabelecer
uma relação de reciprocidade que desperta em todos os envolvidos
segurança, serenidade, tolerância e afetividade. Um exercício de
respeito à  alteridade e de compreensão das diferentes e ricas formas
de ver e viver. A maior inovação do projeto foi o legado e o resultado
que ele deixa em todos os envolvidos, e o pensar “com” e não “para”
a pessoa com deficiência.

PREMIAÇÕES DO PROJETO DEFICIENTE RESIDENTE

• Prêmio Darcy Ribeiro em práticas e ações em educação museal


(2012)
• IV Prêmio Ibero-americano de Educação em Museus (2013)

110  
PARA SABER MAIS
Documentário do projeto
• https://www.youtube.com/watch?v=Lk9B-q3S-B4

Artigo Projeto Deficiente Residente: uma experiência de inclusão no


Museu do Futebol
• http://www.museudofutebol.org.br/wp-content/
uploads/2016/08/Artigo-Oi-Futuro-Formato-Digital.pdf

Artigo Deficiente Residente: uma experiência atitudinal


• http://www.museudofutebol.org.br/wp-content/
uploads/2016/06/Artigo-DR-2014-Blumenau.pdf

Diversidade Intelectual Ialê Cardoso e Marcelo Continelli  111  


IALÊ CARDOSO
Graduada em Artes Plásticas (bacharelado) pela Faculdade
Santa Marcelina (1997). Atua como coordenadora do Núcleo
de Ação Educativa do Museu do Futebol desde 2011, tendo
como foco principal a acessibilidade. É responsável pelo
Programa de Acessibilidade do Museu do Futebol (PAMF),
no qual coordena projetos, ações educativas e criação de
materiais para o público. Trabalhou como arte-educadora
com experiência em educação não-formal em instituições
culturais e museus (1999-2009). Foi coordenadora do Museu
da Casa Brasileira (2009) e professora de artes da escola
Núcleo Aprendizagem e Desenvolvimento, para alunos com
deficiência intelectual (2008-2012).

MARCELO CONTINELLI
Mestre em História Social pela Universidade de São Paulo,
graduação em História (bacharelado e licenciatura) pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2009).
Atualmente cursa Letras na Universidade de São Paulo
(USP). Atua como Assistente de Coordenação no Museu do
Futebol desde 2013, tendo sido educador do referido museu
no período de 2010 a 2013, durante o qual participou de
projetos educativos, da criação de jogos e materiais de apoio,
do desenvolvimento de roteiros temáticos e da elaboração do
sistema de avaliação institucional de visita educativa. Atuou
como professor de História para EJA (Educação de Jovens e
Adultos) no Programa de Educação Interdisciplinar (PEI) da
Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo (2007-2009).

112  
AO CICLO DE PALESTRAS DO
INSTITUTO TOMIE OHTAKE
Mario Paulo Bovino Greggio

Eu estou escrevendo o texto para dizer que foi uma pena que
não deu para ir no último encontro. Mas era dia do meu aniversário
e eu não estava com cabeça para roda de conversas. Eu estava
pensando em outras. Eu gostaria que tivesse mais no ano que
vem. A minha experiência como educador foi boa. Eu participei do
projeto Deficiente Residente no Museu do Futebol nas edições de
2011 e de 2015, quando voltaram todos os residentes das edições
anteriores. Na de 2011 eu aprendi muitas informações sobre o
futebol e já levei muita gente e expliquei as informações que eu
aprendi sobre o futebol para as pessoas que eu já levei no museu.
Eu soube fazer muito bem o papel de educador. Na de 2015 eu
aprendi outras coisas como espírito esportivo, ripa na chulipa e
pimba na gorduchinha. Essas são as minhas experiências. Eu
também gosto de levar as pessoas às exposições. O Museu do

113  
Futebol é acessível. E todos os museus deveriam ser acessíveis.
As exposições também.

MARIO PAULO BOVINO GREGGIO


Com atuação profissional na ONG Mais Diferenças, é
frequentador do Nossa Turma, grupo de adultos com
deficiência intelectual. Foi educador no Museu do Futebol e
participou das atividades do Programa Deficiente Residente,
onde contribuiu com as equipes do museu e compartilhou
suas experiências e características como pessoa com
Síndrome de Asperger.

114   DIVERSIDADE INTELECTUAL – CAMINHOS PARA AS RELAÇÕES COM O SABER


6.
PROMOÇÃO DA
IDENTIDADE E CULTURAS
SURDAS PARA A
REPRESENTATIVIDADE
NOS ESPAÇOS
CULTURAIS
EDUCADORES SURDOS NOS ESPAÇOS
DE EDUCAÇÃO E CULTURA
Edinho Santos

A mediação feita em instituições culturais é um espaço para a


educação não-formal e deve levar em consideração uma abordagem
adequada ao público surdo. Infelizmente tais abordagens são
escassas, dessa forma as pessoas surdas não frequentam esses
espaços.
Hoje há leis de acessibilidade que têm ampliado possibilidades
para o público surdo, de maneira a minimizar as barreiras que lhe
são impostas, aproximando essas pessoas da arte e da cultura.
As instituições culturais e museus são abertos a todos os públicos,
mas necessitam de um olhar especial para o público com deficiência,
para que de fato este possa ocupar espaço na cultura.
Além do olhar para o público, é necessário pensar em educadores
surdos ocupando esses espaços não formais de educação, para
atender não apenas o público surdo, mas também o ouvinte.

116
O educador surdo torna-se uma referência para o público, que
tem a possibilidade de mudar seu olhar a respeito da surdez e da
língua de sinais numa visita mediada em que a LIBRAS está em
primeiro plano enquanto o português ocupa um lugar secundário
na voz da intérprete. Dessa forma, é possível perceber as diferentes
possibilidades de atuação da pessoa surda.
As instituições culturais e museus precisam dar atenção ao
educador surdo para que a acessibilidade realmente aconteça nas
instituições. De fato, deve-se estabelecer uma parceria com esse
profissional, pois ele tem muito a contribuir com o desenvolvimento
da instituição em suas diferentes ações.
Quando a instituição presta atenção às demandas trazidas pelo
educador, em diferentes aspectos – como programação, divulgação,
adaptações de exposições –, a acessibilidade realmente acontece,
pois ele tem capacidade de avaliar quais ações são mais adequadas.
Em São Paulo temos instituições que são referência na
acessibilidade para surdos, mas infelizmente o mesmo não ocorre
em outras cidades do país, privando assim o público surdo do acesso
à arte e à cultura.

EDVALDO CARMO DOS SANTOS


Pedagogo graduado pela FMU, com experiência
profissional diversificada em educação e mediação de
artes em museus. Como educador surdo, fez parte das
equipes do Museu de Arte Moderna de São Paulo, Museu
do Futebol e Museu Afro Brasil. Atualmente, trabalha
como educador no Itaú Cultural e é também um dos
representantes do movimento Negro Surdo no Brasil.

EDUCADORES SURDOS Edinho Santos 117  


PRODUÇÕES CULTURAIS SURDAS
Hugo Eiji

Novas formas de olhar, pensar, sentir e expressar o mundo


têm ganhado espaço, pelas mãos de profissionais surdos, em
alguns dos principais aparelhos culturais da cidade de São Paulo.
As culturas surdas, ao redesenharem as possibilidades desses
aparelhos, começam a influir cotidianamente na dinâmica dos
circuitos culturais majoritários, trazendo à superfície uma série de
questões relativas ao Ser Surdo. Com isso, a máxima “nada sobre
nós sem nós”, bandeira maior de muitos grupos minoritários, vai
se firmando, ainda que a passos lentos, nas esferas de produção,
circulação e consumo de bens culturais, no que diz respeito aos
grupos surdos.
No entanto, para além da presença em si de profissionais surdos
nesses equipamentos culturais, urge dar corpo à experiência das
comunidades surdas (suas narrativas, suas línguas gestuais, suas

118
bandeiras e lutas etc.) também por meio das produções artísticas
que lhes dizem respeito: as Artes Surdas.
O termo Arte Surda (e, por extensão, produções surdas), mesmo
entre aqueles que participam das comunidades surdas, não raro
transita de forma imprecisa, incerta, amarrado a uma série de (in)
definições. Entre tantas produções culturais feitas por, para e sobre
pessoas surdas, então, o que se entende aqui como Arte Surda?
Arte Surda, aqui, é entendida como todas as produções artísticas
que trazem à tona – em diferentes suportes – questões relacionadas às
culturas surdas. Seja em pinturas, gravuras, esculturas, instalações,
performances, produções audiovisuais, espetáculos teatrais etc.,
a Arte Surda convida – e convoca – o espectador à imensidão do
mundo surdo, expressando de diferentes maneiras a história, as
lutas, as línguas, as experiências cotidianas, os protagonismos, os
marcadores culturais, as narrativas, as tensões, os desafios etc. que
permeiam esse mundo, refratando discursos ouvintistas que dia a
dia seguem a apequenar a potência da diferença Surda.
A designação Arte Surda (conhecida também como De’VIA –
DeafView/ImageArt, sobretudo no universo das artes plásticas, em
alguns países de língua inglesa), assim, vincula-se às produções
que têm em seu cerne a expressão de mundos e identidades
surdas, independentemente de tais obras serem produzidas por
pessoas surdas ou ouvintes. Em outras palavras, a definição é dada
a partir dos elementos que compõem a obra e não pela condição
física/sensorial de seu autor, o que em muito contribui para minar
o gesto paternalista que comumente ronda o fazer artístico de
pessoas com deficiência.
Ao ganharem os circuitos culturais majoritários, tais produções
começam a extrapolar as fronteiras dos eventos específicos
(realizados em associações, instituições, federações e escolas

PRODUÇÕES CULTURAIS SURDAS Hugo Eiji  119  


consagradas pelas comunidades surdas, por exemplo) e dos bastiões
tradicionais que até há pouco figuravam como únicos espaços
possíveis para a realização desse tipo de arte. Em decorrência
disso, mais e mais pessoas – seja de corpo presente em aparelhos
culturais ou imersas na profusão de conteúdos surdos que circulam
pela Internet – passam a ter contato com as artes e as culturas
surdas, ampliando as interfaces entre estas e o “mundo ouvinte”. O
imenso e belíssimo patrimônio dessas culturas, enredado na riqueza
do Deafhood (ou “surdidade”), vai assim se espraiando por diferentes
lugares, tornando os espaços e meios mais plurais e positivando a
experiência “daqueles com perda de audição”.
Com isso, também, desenvolvem-se novos campos de
experimentações estéticas a partir de uma língua de modalidade
visual-gestual, promovendo a fusão de diferentes linguagens e a
pesquisa sobre essas novas interseções.
Para que essa expansão seja acirrada, cabe a gestores,
programadores culturais, artistas, profissionais de diversas áreas
da cultura, entre outros, levarem a cabo a promoção das identidades
e das culturas surdas em toda a cadeia cultural, da produção
(garantindo políticas de fomento, recursos acessíveis, espaços de
formação etc.), à difusão/distribuição e ao consumo. Com isso,
ganham não apenas as comunidades surdas ao difundir produções
artísticas que delas emergem e que reafirmam os seus direitos e
as riquezas imanentes de ser surdo, mas ganhamos todos e todas
ao termos contato com novas sensibilidades e novas formas de se
fazer e de se pensar a arte.

p.s: para conhecer mais sobre várias produções culturais surdas (do
teatro, literatura, dança, artes plásticas cinema etc.) visite o Blog
Cultura Surda em http://culturasurda.net.

120  
PROMOÇÃO DA IDENTIDADE E CULTAS SURDAS PARA A REPRESENTATIVIDADE
HUGO EIJI
Formado em Comunicação Social pela Universidade de São
Paulo (ECA-USP) e em Pedagogia – Educação de Deficientes
da Áudio-comunicação – pela PUC-SP, tem Mestrado em
Ciências da Cultura pela Universidade de Lisboa e trabalha
com projetos de Educação de Surdos.

PRODUÇÕES CULTURAIS SURDAS Hugo Eiji  121  


7.
IDOSOS,
PARTILHA DE
LEMBRANÇAS E
EXPERIÊNCIAS
AÇÕES EDUCATIVAS COM O PÚBLICO DA
TERCEIRA IDADE NO MAE/USP
Judith Mader Elazari

O Museu de Arqueologia e Etnologia da USP tem desenvolvido


atividades educativas com diferentes públicos, sendo um deles o da
Terceira Idade, com o qual trabalha há mais de dez anos1. São projetos
de valorização de experiências e de vivências dos participantes. Essa
é uma das formas do museu reconhecer as identidades de povos e
indivíduos diversificados, valorizando-as. As atividades especiais
para esse público giraram em torno da inclusão dessas pessoas,
ações que agem em direção a um novo dimensionamento das
práticas museológicas.
Desde 2005 foram oferecidas oficinas semestrais com atividades
uma vez por semana, de cerca de duas horas e meia, dentro da
programação do projeto Universidade Aberta à Terceira Idade,
oferecido pela Pró-Reitoria de Cultura e Extensão da USP. Durante
este período, foram desenvolvidas ações que envolvem: Arqueologia,

123  
Patrimônio Cultural, Memória, Museologia e Objetos Biográficos e as
suas inter-relações.
Trabalhou-se com a contextualização teórica do processo de
trabalho a ser desenvolvido e com atividades práticas, sempre
intercaladas, a partir das seguintes principais etapas:

1 Palestras sobre Arqueologia, Cultura Material, Patrimônio Cultural,


Memória, Museologia e Objetos Biográficos, procurando-se inter-
relacionar cada um desses conceitos;
2 Manuseio e contextualização de objetos arqueológicos e etnográficos;
3 Simulação de escavação arqueológica;
4 “Escavação” da memória dos participantes em busca de objetos
pessoais ligados à história de vida de cada um;
5 Registro oral, escrito, figurativo, bordado e fotográfico dos objetos
escolhidos e contextualizados;
6 Visitas a outras instituições museológicas;
7 Planejamento e elaboração de Exposição com os objetos biográficos
e outras linguagens de apoio;
8 Montagem de exposição e visitação da mesma por diferentes
públicos;
9 Avaliação do processo educativo pelos participantes e por membros
do serviço educativo;
10 Possíveis desdobramentos das Oficinas2.

No decorrer de 12 oficinas, que foram realizadas de forma lúdica


e prazerosa, pôde-se constar conjuntamente a relevância social
desse grupo especial de pessoas, detentor de memória não oficial,
de memória coletiva. Desenvolveu-se a consciência dos participantes
e do público que visitou as exposições, do papel e da importância dos
idosos na sociedade atual.

124   IDOSOS, PARTILHA DE LEMBRANÇAS E EXPERIÊNCIAS


NOTAS:

1 Essas atividades educativas foram realizadas contínua e


sistematicamente desde 2005, mas a partir de 1994 já eram
desenvolvidas ações educativas com idosos, com grupos esporádicos e
com menor duração de tempo. Coordenei essas oficinas até 2015 e em
março de 2016 me aposentei.

2 Para o conhecimento mais aprofundado sobre as experiências


desenvolvidas no MAE/USP com públicos da Terceira Idade vide: Elazari,
J.M., Relato de uma experiência Educativa: Projeto Piloto Patrimônio
Cultura e Memória: A Terceira Idade e o MAE/USP. Revista do MAE, 7: 87-
97, 1997; Idem, Ação Educativa em museus: a Terceira Idade construindo
conhecimentos a partir de objetos no MAE/USP. Revista do MAE, 19:337-
354, 2009 e Idem, Encontros com Idosos: “escavando” a Memória a partir
de objetos, in Park, M.B. e Groppo, L.A (orgs.). Educação e Velhice, Ed.
Setembro, Holambra, 93-105, 2009.

JUDITH MADER ELAZARI


Bacharela e Licenciada em História e Mestra em História
Social pela USP, trabalhou como educadora no Museu de
Arqueologia e Etnologia da USP de 1987 a 2016, em ações
educativas, como na coordenação da oficina “Arqueologia e
Memória: a Terceira Idade no MAE/USP”.

AÇÕES EDUCATIVAS COM O PÚBLICO Judith Mader Elazari  125  


FRAGILIDADE
Cristiane Tenani Pomeranz

Sim! Somos todos frágeis e deveríamos ser criados, desde


sempre, cientes dessa nossa condição.
Mas o que se afirma e se aprende é justamente o contrário: a vida
é para os fortes e para fazer jus a tal afirmação vestimos máscaras
diversas, capazes, todas elas, de esconder nossas fraquezas. Desta
forma aprendemos a crescer. Adaptamos nossos disfarces à vida que
exige força.
Ao contrário do que supomos, no livro sobre Fragilidade, o
dramaturgo e roteirista Jean-Claude Carrière afirma que nossa
essência é feita de vidro. Está perpetuamente ameaçada, quebra-se
ao menor choque. Como reagir a essa informação assustadora?
Em um mundo repleto de injustiças e cobranças, nossas preces
ficaram sem respostas. A desilusão cresce e transforma-se em
amargura. E a angústia, em vulnerabilidade. Mas sempre disfarçadas.

126  
Muito se fala em envelhecimento. Nosso país envelhece sem
freios. A fragilidade humana fica sendo característica dos velhos. O
mais jovem não a quer para si, afinal, a vida precisa seguir seu rumo
num faz de conta insuportável.
Ao observar um idoso acamado sentimos nele nossa própria
fragilidade. Impossível desvirtuar o olhar da debilidade refletida.
A lágrima que escorre diante da delicadeza da nossa história
nos faz pensar no quanto inventamos a vida e criamos subterfúgios
para vivê-la. Mesmo que seja na mentira que elaboramos para
aparentar força e coragem. Somos fracos e essa é a verdade por
mais que tentemos escondê-la.
O que fazemos é aparentar certezas e posturas tão grandiosas
que chegamos a convencer a nós mesmos daquilo que é inexistente
e mesmo assim tão almejado.
Se pensarmos na História da Arte, cidades medievais mostravam
força e poder através das riquezas de suas catedrais.
Mais do que um lugar divino, criavam-se verdadeiros espaços
sagrados na crença de que era o poder econômico e político que
garantia a felicidade de um povo. Era preciso mostrá-lo.
Riquezas ostentadas enquanto a fragilidade do povo era disfarçada
em meio a folhas de ouro e ornamentos preciosos. Tudo era belo o
suficiente para encobrir os limites de sua gente.
Como exemplo podemos citar a Catedral de Chartres, patrimônio
mundial da UNESCO, que está localizada a 78 quilômetros de Paris.
Exemplar gótico mais conservado da França, apesar de seus 800
anos, a igreja é um centro de peregrinação cristã. Em uma de suas
capelas fica a relíquia conhecida como Santo Véu, que, segundo a
crença católica, trata-se do véu usado por Maria no momento da
anunciação.
A Idade Média não teve, em nenhum lugar, uma relíquia tão

Fragilidade Cristiane Tenani Pomeranz  127  


poética quanto esta, capaz de proporcionar à cidade inteira a certeza
de bênçãos pairadas sobre o povo.
O Manto de Maria foi doado por Carlos, o Calvo, e teria sido o
motivo da construção da catedral, que teve início em 1145 e que
depois de 1194 foi reestruturada e reconstruída após um incêndio
que teria destruído, entre muitas coisas, o manto de Maria.
O povo então se sentiu perdido pela destruição tendo sua maior
preciosidade queimada. Com as chamas, a fragilidade de toda uma
sociedade foi exposta e escancarada.
Curiosamente, como que em um milagre, o manto reaparece e a
população, que se sentia demolida, ganha novamente a certeza de
força e soberania.
Assim como nas catedrais medievais repletas de tesouros e vitrais
preciosos, escondemos nossa fragilidade na modernidade de uma
vida que encobre tristezas e angústias em frascos de comprimidos.
Os vitrais azuis da Catedral de Chartres refletem uma luz única
que nós, na modernidade, substituímos por telas de computadores,
tablets e celulares.
Os vidros da igreja refletem narrativas de histórias fabulosas em vidros
coloridos. Histórias que transmitem fé e fortalecem seus visitantes.
Já na luz dos monitores, as fraquezas são camufladas e o homem
mostra-se potente, feliz, com caras e bocas.
Ao envelhecer perdemos a capacidade de fingir e deturpar nossas
sensações. Ser frágil passa a ser percebido como uma verdade antes
não vista. O Velho é frágil. Não porque envelheceu, mas simplesmente
porque entendeu a real condição humana. O velho é sábio. Sabedoria
adquirida com a vida.
Ele entende os “mantos” sagrados mostrados pela vida como uma
simbologia e não como a verdade absoluta. Questiona-se o sentido
da veracidade.

128   IDOSOS, PARTILHA DE LEMBRANÇAS E EXPERIÊNCIAS


Como o manto de Nossa Senhora que reaparece sem levantar
questionamentos, a fragilidade da velhice como percepção
amadurecida dos velhos e escancarada aos jovens passa a ser um
fato real e comum a todos.
A Fragilidade é sim algo pertencente à velhice, mas não pertence
só aos velhos.
Se quiser aprender a ser forte, comece entendendo suas fraquezas.
É na certeza da fragilidade que conseguimos construir nossas
próprias catedrais.

FRAGILIDADE COMO REFRÃO


Passamos a vida a disfarçar nossa real natureza humana.
Somos frágeis e já nascemos nessa condição.
Por viver em uma sociedade onde a fraqueza é sinal de fracasso,
aprendemos a ostentar trajes que vão além da vestimenta.
Disfarces que nos trazem status comprado em lojas de grife e
que apontam poder para aqueles que desfilam sua potência em um
motor de carro de luxo.
Perde-se o sentido da força que vem do aprendizado que alimenta
a mente e o espírito, garantindo assim o verdadeiro crescimento.
Mas a fragilidade é como o refrão de uma música que não para
de tocar.
Somos frágeis. Quer queira, quer não. E isso perpetua em uma
certeza única que não nos deixa fingir em paz.
Precisamos ter aparente tranquilidade para demonstrar a força
que não possuímos. Serenidade em forma de frieza para convencer
quem quer que seja do nosso poder.
Ao atingir a vida adulta, o fardo ficará árduo e as estruturas serão
facilmente abaladas caso não tenhamos condições emocionais para
fingir. O tempo todo. As máscaras passam, então, a fazer parte do
que somos.

Fragilidade Cristiane Tenani Pomeranz  129  


E passamos a vida numa tentativa de enganar a nós e aos outros.
Somos fingidamente fortes e é esse o coro que ressoa como estribilho.
Com o envelhecimento, adquirimos um novo rótulo, tão peculiar à
idade avançada: frágil.
O Velho é fraco e ponto. Essa é uma imposição. Não se discute.
O idoso que vive uma velhice ativa precisa então lutar contra a
dualidade que se instala neste momento da vida. Finalmente, é
permitido apartar as máscaras que foram grudadas, formando
aquilo que um dia pensamos ser.
Ao assumir a fragilidade o velho se faz forte, pela primeira vez na
vida, e é essa força que interessa por sua verdade e fraqueza.
É intenso na sua potência e no seu saber que, nesta altura da vida,
entende que não precisa relacionar seu vigor a força alguma, e sim a
esta fragilidade assumida e percebida como parte do seu ser.
Bolhas de champanhe em copos de cristal! Não para ostentar,
mas sim para comemorar! Um brinde à fragilidade que enfim exala
em sua essência.

A FRAGILIDADE À FLOR DA PELE. ENRUGADA E SECA.


Envelhecer é um processo que nos acompanha desde que
nascemos, mas ao tornar-se velho, a presença do fim passa a ser
amiga constante.
Perguntas buscam explicação e o velho tenta encontrar algo
que justifique toda uma vida fantasiada em falsas impressões de
força.
Agora na velhice, é preciso ressignificar uma vida inteira para
poder entender e perdoar a falta de coragem de se mostrar frágil.
Para este momento da vida, a arteterapia pode ser uma aliada
para a compreensão do sujeito que já envelheceu e percebeu suas
máscaras de força esfarelarem-se ao vento. Através de atividades
significativas, o idoso entra em contato com questões pessoais

130   IDOSOS, PARTILHA DE LEMBRANÇAS E EXPERIÊNCIAS


vividas e percebidas, agora, como quem olha para a vida com a real
percepção da condição humana: somos frágeis. E somos todos.

ARTETERAPIA PARA IDOSOS EM SUA REAL CONDIÇÃO


A velhice é heterogênea. Velhos vivem as suas velhices de
maneiras múltiplas.
Alguns garantem a continuidade de uma vida interessante,
cercada de relações sociais e aprendizado. Outros vivem suas
velhices com a fragilidade e a televisão como únicas companhias.
Idosos em condições de vulnerabilidade social e física adoecem, sem
estímulo de vida. Viver passa a ser algo distante para muitos velhos
que mal se recordam do que venha a ser a energia vital.
Em comum, todos eles têm a presença constante da morte, que os
torna ainda mais frágeis em sua condição de velho. Viver fica pesado.
Para todos os velhos, a arteterapia tem a função de suavizar essa
fase da vida oferecendo o contato com a Arte, com a poesia, com
conhecimentos engrandecedores sobre a história da arte e seus artistas
etc. Através da oportunidade de olhar, com afeto, para esse sujeito
construído ao longo da vida, o idoso manifesta desejos ainda existentes,
mantém sua autonomia e vivacidade enquanto expressa e elabora
sentimentos atuais envelhecidos pelas dores e pesares da longevidade.

FRAGILIDADE HUMANA
Na famosa xilogravura A Grande Onda do artista japonês Katsushika
Hokusai, podemos pensar na fragilidade humana representada na
imagem, que faz parte da série Trinta e seis vistas do monte Fuji.
Produzida entre 1829 e 1833, a obra está no Museu Metropolitan de
Nova York e encanta os olhos de quem a observa, não pela fragilidade
de seus minúsculos barcos engolidos pela onda, mas sim pela força
com que ela é retratada, com garras no lugar da espuma.
Ao fundo, o Monte Fuji é mero espectador de toda essa situação.

Fragilidade Cristiane Tenani Pomeranz  131  


Com a velhice, há a compreensão de que viver nada mais é do que
um mar de turbulências. Aprendemos a remar nossos barcos, frágeis
e pequenos em condições adversas, mas sempre com o intuito de
mantermo-nos navegantes. Marinheiros deste mar de incertezas.

CRISTIANE TENANI POMERANZ


Bacharela em Comunicação Visual pela Universidade
Presbiteriana Mackenzie, especialista em arteterapia pelo
Instituto Sedes Sapientiae, mestranda em Gerontologia
Social pela PUC-SP e colaboradora do Portal do
Envelhecimento, idealizou e ministra desde 2009 o projeto
“Faça Memórias, Cultural”, curso de estímulo de memória
pela arte no MuBE.

132   IDOSOS, PARTILHA DE LEMBRANÇAS E EXPERIÊNCIAS


8.
DEFICIÊNCIAS
MÚLTIPLAS,
CAPACIDADES
SINGULARES
MEDIAÇÕES SINGULARES
Ana Amália Tavares Bastos Barbosa

“Deficiências múltiplas, capacidades singulares”. Fiquei “encafifada”


com esse título, ele é bastante amplo. Por outro lado: o que sei eu
sobre deficiências múltiplas? Eu conheço bem a minha e um pouco a
dos meus alunos, mas não sou especialista. Comecei a me perguntar
por que o Claudio Rubino tinha me chamado e então me lembrei de
que poderia falar das minhas experiências. Foram inúmeras visitas a
exposições que fiz com meus alunos e, portanto, muitas e variadas as
mediações que fiz e faço com eles.
Acredito ser muito importante levar meus alunos às exposições
porque é muito difícil para os pais os levarem sem o auxílio da escola
e é papel da escola propiciar o contato com o máximo de manifestações
culturais. Eles são seis cadeirantes, a maioria tetraplégicos e mudos,
com paralisia cerebral. Normalmente eles são excluídos da
sociedade, até mesmo pelos educativos dos museus, com raras

134  
exceções. Sendo assim, eu preparo a visita antes com um amigo
professor, quase sempre com José Minerini Neto ou Moacir Simplício,
e garanto que eles não serão tratados nem como deficientes mentais
nem como surdos porque eu sei (por experiência própria) o quanto
isso é irritante. Quero que eles estejam focados no conteúdo da
exposição e na experiência das formas. Eu raramente peço o
educativo, pois os educadores não estão preparados para mediar
com um grupo de pessoas que não respondem verbalmente ou só
respondem através de gestos.
Desde 2009 nós vamos a uma ou mais exposições por ano. Em 2009
eu pretendia levá-los ao Sindicato dos Arquitetos de São Paulo para ver
o móbile de Alexander Calder, mas, pasmem, o lugar era inacessível!
Então fomos à exposição de Tomie Ohtake no Instituto Tomie Ohtake.

MEDIAÇÕES SINGULARES Ana Amália Tavares Bastos Barbosa  135  


Ficamos animados com a alegria que as esculturas de Tomie Ohtake
provocaram e fomos ver a exposição de arte para crianças no SESC
Pompeia, onde havia uma releitura de Hélio Oiticica na qual nos
detivemos mais.

136   DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES


Em 2010 eu pensei em irmos de trem até a estação da Luz para
o Jardim das Esculturas no Parque da Luz. No primeiro semestre
fomos de carro mesmo e só no segundo semestre, depois de muita
briga com a CPTM, conseguimos fazer o passeio de trem da Barra
Funda até a estação da Luz.
Como ainda não tínhamos o serviço eventual de vans da prefeitura
para transportar cadeirantes, pedimos aos pais que levassem seus
filhos em um sábado à tarde à exposição de Ernesto Neto no Museu
de Arte Moderna no Parque Ibirapuera. Consequência: só uma aluna
compareceu.

138   DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES


Em 2011 estudamos a ilusão de ótica e fomos à exposição de
M.C. Escher no CCBB. Como não era permitido fotografar, temos
poucas fotos.

MEDIAÇÕES SINGULARES Ana Amália Tavares Bastos Barbosa  139  


Também em 2011 fomos à galeria do Instituto de Artes da UNESP
na Exposição como mediação, que era comemorativa dos 10 anos de
AEP (Arteducação Produções), empresa fundada por mim. Havia
obras minhas, do Moa e de outros amigos artistas, o que facilitou
bastante o acesso às obras.

140   DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES


Em 2012 a escola estava falando sobre diversidade cultural, então
achamos que deveriam conhecer mais manifestações artísticas
da América Latina e fomos ao pavilhão das artes do Memorial da
América Latina.

MEDIAÇÕES SINGULARES Ana Amália Tavares Bastos Barbosa  141  


Não sigo uma ordem cronológica linear em termos de História
da Arte, vou abordando os movimentos à medida em que aparecem
exposições compatíveis, como foi o caso do impressionismo.
Havia uma grande exposição sobre esse movimento no CCBB,
então estudamos o impressionismo e fomos à exposição. Novamente,
como não era permitido fotografar, temos poucas fotos.
Em 2013 soubemos que haveria uma exposição dos Mestres do
Renascimento no CCBB. Vimos ponto de fuga, entre outras coisas,
e fomos à exposição. Demos a maior sorte: pela primeira vez, a
educadora que nos recebeu estava preparada e meu amigo nem
precisou entrar em ação. Por isso temos fotos da visita.

DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES


Em 2014 estudamos o surrealismo de René Magritte e Salvador
Dalí e fomos à exposição de Salvador Dalí no Instituto Tomie Ohtake.

MEDIAÇÕES SINGULARES Ana Amália Tavares Bastos Barbosa  143  


Quando eles estavam estudando as diversas culturas que
formam a cultura brasileira fomos ao Museu Afro Brasil. Lembram
que eu disse que os educadores não estavam preparados? Pois é!
Teria sido trágico se não fosse cômico! O meu amigo não pôde ir e
fomos atendidos por um educador que insistia em nos tratar como
deficientes mentais. Quando ele se dirigiu a mim dessa forma, uma
das alunas deu uma sonora gargalhada!

144   DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES


2015 foi um ano atípico, pois tive que me afastar por motivo de
saúde durante quase seis meses. Começamos bem e no início do ano,
após estudar o hiper-realismo, fomos à disputadíssima exposição de
Ron Mueck na Pinacoteca. Contrapus com o abstracionismo, mas
infelizmente não consegui levá-los à exposição de Wassily Kandinsky
no CCBB/SP.

MEDIAÇÕES SINGULARES Ana Amália Tavares Bastos Barbosa  145  


Contudo (pra nossa sorte), em 2016 houve uma exposição de
Piet Mondrian no CCBB/SP. Com a ajuda dos meus amigos do AEP
(Arteducação Produções), e com foco no abstracionismo geométrico,
fomos à exposição.
Para encerrar o assunto abstracionismo, fomos
ver o acervo do MAC-USP.

MEDIAçõES SINGuLARES
Rever essas fotos me fez pensar. Eu acredito que essas visitas
mexem com muita coisa, não tenho como medir o que apreenderam.
Apenas sei que apreenderam e por isso parto desse princípio. Cada
visita é precedida por uma aula preparatória e depois seguida de
duas aulas, no mínimo, de um fazer artístico relacionado. Sei que é
difícil levar seus alunos às exposições, mas vale a pena!

Fotos: José Minerini Neto e


Moacir Simplício

ANA AMÁLIA TAVARES BASTOS BARBOSA


Artista plástica e arte educadora formada pela Fundação
Armando Álvares Penteado (FAAP/SP), estudou História da
Arte na Texas University at Austin, Design na School of Visual
Arts e Litografia na Columbia University em New York/USA.
Fundou a empresa Arteducação Produções, e é parte da equipe
desde 2001. É mestra pela Escola de Comunicações e Artes da
USP. Além disso, também atuou na área de ensino de línguas,
dando aulas de inglês e fazendo traduções simultâneas e
escritas. É doutora pela ECA/USP, defendida em maio de 2012.
Atualmente desenvolve sua pesquisa no pós-doutorado da
UNESP/SP sob orientação da Dra. Rosangella Leote. Em 2002,
teve um acidente vascular cerebral de tronco e como sequela
adquiriu a síndrome do locked in, ficando tetraplégica, muda
e disfágica, mas inteiramente consciente e com a cognição
plenamente preservada.

148   DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES


ESPAÇOS DE DIÁLOGO
Liliane Rebelo

Este texto é acima de tudo um exercício de profunda reflexão sobre


a pluralidade das nossas identidades e dos espaços de representação
que enfrentam nos dias de hoje uma crise sem precedentes. Foi no
contexto do ciclo de palestras Mediações Acessíveis, promovido pelo
Instituto Tomie Ohtake, que tive a honra de mediar uma mesa sobre
o tema LGBT e a Promoção da Diversidade na Cultura - Desmistificando
Lugares Comuns, com a presença da dramaturga escocesa Jo Clifford e
outros convidados. Alguns meses depois, participei do último debate do
ciclo que abordou o tema Deficiência Múltipla – Capacidades singulares,
onde pude compartilhar a experiência do programa Unlimited: Arte
sem Limites promovido pelo British Council no Brasil desde 2012 e que
celebra o trabalho produzido por artistas com deficiência.
Procurei neste exercício de escrita partilhar algumas reflexões
que nasceram da experiência dos últimos trabalhos na área de

149  
acessibilidade e que tento praticar todos os dias ao desconstruir
conceitos e padrões considerados “normais”.
O reconhecimento e a percepção da diversidade têm sido tema
central na pauta dos últimos tempos com a crescente onda de
violência, censura, intolerância e discriminação de todos os tipos.
Os inúmeros conflitos sociais assim como a emergência de grupos
subalternos que lutam para existir em seus direitos plenos são a
evidência da ausência de diálogos interculturais e seu efeito na
humanidade.
Quando há o entendimento de que entre eu e o outro há um campo
infinito de vivências e experiências distinto e complementar fica fácil
perceber a urgente necessidade de derrubar toda e qualquer “norma”
e “padrão” que parecem ditar as normas de convivência, ação e
aceitação. Faz-se necessário desobstruir os canais de percepção
do nosso inconsciente individual e coletivo para resgatar valores
morais e humanitários e alguns princípios básicos que acabamos
esquecendo como consequência da sobrecarga de informações e
influências que recebemos diariamente.
Faço analogia a uma máquina que precisamos reprogramar para
que a sociedade possa continuar em seu curso de evolução, no qual
a diversidade deva ser o estado natural do mundo, ou seja, o ponto
básico de operação. Nas últimas décadas, passamos a objetificar
e rotular tudo e todos, tendo nossas opiniões como único ponto de
partida e referência, e assim, assumindo um papel de promotor de
julgamentos para justificar nossas próprias limitações.
Quando nos permitimos ser acessados ou dar o acesso a alguém,
seja num diálogo ou em qualquer outra forma de expressão, alteramos
nossa codificação de pensamento à medida que absorvemos outro
ponto de vista; que não é certo, nem errado; que não é justo ou
injusto. É apenas diferente.

150   DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES


Tive a oportunidade de conhecer um pouco sobre o modelo social
da deficiência, por exemplo, cuja abordagem propõe retirar o indivíduo
e sua condição do foco da questão, e então apurar o olhar para as
barreiras que impedem o acesso. E é exatamente neste processo
de identificação das barreiras em que devemos atuar. No âmbito
cultural se faz muito importante a presença de ações regulares que
multipliquem e promovam o debate sobre acessibilidade, suscitando
mais espaços de diálogo e ação em equipamentos culturais.
Pensar o acesso a partir das capacidades e direitos é reverter a
ordem que impera o pensamento de discriminação. Ressignificar
o próprio conceito de deficiência é pensar as diversas condições e
potencialidades como terreno para o desenvolvimento criativo.
A integração é um processo que demanda participação coletiva e
a deficiência nada mais é do que uma construção social. A mudança
está acontecendo e vai levar o seu tempo. A representatividade
dos protagonistas deste movimento é crucial para alcançar o
próximo estágio de funcionamento dessa máquina, completamente
desgastada pela sociedade em que vivemos. Precisamos resgatar nos
indivíduos e no coletivo o espírito que abrace e celebre a diversidade,
combatendo assim todo e qualquer tipo de desigualdade.

ESPAÇOS DE DIÁLOGO Liliane Rebelo  151  


LILIANE REBELO
Gerente de Artes do British Council no Brasil, Liliane Rebelo
é formada em Jornalismo e tem especialização em Marketing
pela Chartered Institute of Marketing (UK/2012). Atualmente
cursa Gestão de Projetos Culturais no CELACC - Centro de
Estudos Latino-Americanos sobre Cultura e Comunicação
na USP-Universidade de São Paulo no programa de pós-
graduação. Há dez anos promove o intercâmbio cultural
entre o Reino Unido e o Brasil gerenciando projetos de
transformação social, diálogo, conexões, ações de formação
e ampliação do acesso. Vozes marginalizadas e oprimidas
como a de jovens em situação de vulnerabilidade, LGBTQ,
pessoas com deficiência e as mulheres têm sido o foco do
seu trabalho. De 2014 a 2015 trabalhou em Edimburgo, na
Escócia, gerenciando colaborações internacionais com o
Brasil, India e África do Sul. Sua experiência na Escócia
incluiu o cargo de Gerente Internacional de projetos na
Festivals Edinburgh, onde exerceu um papel de gestão
colaborativa para os doze grandes festivais de Edimburgo.
Em 2017 foi selecionada e convidada a integrar a equipe
de coordenação e comunicação do WOW Festival (Womens
of the world) realizado pelo Southbank Centre em parceria
com o British Council, em Kathmandu. Atualmente está
colaborando na realização do WOW-Festival Mulheres do
Mundo no Rio de Janeiro em novembro de 2018, em uma
parceria com a Redes da Maré.

152   DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES


DEFICIÊNCIA: APRENDIZAGEM E
SUPERAÇÃO
Roberta Galasso

Uma educação para a era relacional pressupõe o alcance de um


novo patamar na história da evolução da humanidade no sentido
de corrigir os inúmeros desequilíbrios existentes, as injustiças e
desigualdades sociais, com base na compreensão de que estamos
numa jornada individual e coletiva, o que requer o desenvolvimento
de uma consciência ecológica, relacional, pluralista, interdisciplinar,
sistêmica, que traga maior abertura, uma nova visão da realidade
a ser transformada, baseada na consciência da inter-relação e da
interdependência essenciais que existem entre todos os fenômenos
da natureza.
Desta forma, a educação desempenha papel primordial na vida
dos indivíduos, uma vez que o conhecimento é a ponte para sua
humanização e é por meio dele que se assegura a compreensão acerca
da realidade, o que permite a tomada de consciência, necessária para

153  
a intervenção no mundo, como salienta Paulo Freire (1999). Sem essa
compreensão, é impossível transformar as relações sociais.
Somos diferentes uns dos outros do ponto de vista biológico, social,
psicológico e cultural. Cada um se caracteriza como um sujeito
rico em possibilidades de crescimento na vida em sociedade. O ser
humano é uma combinação de condições e qualidades que vão sendo
atualizadas e concretizadas ao longo das histórias e existências, de
acordo com os relacionamentos, experiências e contextos de vida.
Para que possamos alcançar novas perspectivas e desafios nos
processos de aprendizagem que envolvem pessoas com deficiência,
temos que ter como premissa que a dimensão social não pode ser
diferenciada. A perspectiva apresentada traz princípios relevantes na
construção desses processos. Desta maneira, a reflexão sobre novas
práticas se faz necessária: considerar a compensação da deficiência
que ocorre por caminhos complexos de caráter social e psicológico.
Não se trata de substituir as funções ausentes, mas constituir
mecanismos psicológicos que permitam, por meio das vias preservadas,
compensar a falta das vias deficitárias, como, por exemplo, o cego que
enxerga por meio do tato. A característica principal de compensação do
cego é criar mecanismos de adaptação nos quais o tato passa a ter uma
função mais refinada. Neste processo, as experiências que o meio social
oferece serão alteradas mediante essa vivência, no todo social.
Vygotsky (1997) apresenta esta ideia por meio de dois aspectos –
o biológico e o social –, ou seja, a dimensão primária, que leva
em consideração as características orgânicas ou biológicas da
deficiência; e a dimensão secundária, que diz respeito às formas
qualitativas de interação do sujeito com seus pares.
Nesta perspectiva, considerar os aspectos biológicos e sociais da
deficiência nos apresenta um conceito extremamente relevante para
reflexões e possíveis reorientações das práticas sociais vigentes, seja

154   DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES


em espaços formais ou não formais, e, desta maneira, garantir ações
educativas inovadoras e infinitamente diversas, que considerem os
processos de aprendizagens das pessoas com deficiência.

El defecto originado por la deviación del tipo biológico estable


del hombre, al provocar la desaparición de algunas funciones, la
insuficiencia e el deterioro de los órganos y la desaparición de algunas
funciones, y la reorganización más o menos esencial de todo el
desarrollo en nuevas condiciones, según el nuevo tipo, como es natural,
altera de esta forma el transcurso normal del proceso de arraigo del
niño en la cultura. En verdad, la cultura está adaptada al hombre
típico, normal, a su constitución, y el desarrollo atípico condicionado
por el defecto no puede arraigarse en la cultura de un modo diferente e
indirecto como tiene lugar en el niño normal (VYGOTSKY, 1997, p. 17).

Essa afirmação nos leva a considerar que as práticas sociais


e pedagógicas são diferenciadas para os sujeitos deficientes e
não é possível comparar pessoas com deficiência e pessoas sem
deficiência com as mesmas “medidas”. Acreditamos no contrário: é
possível considerar mecanismos e práticas igualitárias. Entretanto,
vale ressaltar que a diferença consiste somente no modo de
desenvolvimento e em como o sujeito irá se apropriar do mundo.
Desta maneira, o sujeito se constrói no contato social que é originado
historicamente. O sujeito estabelece relações com a experiência de
outros sujeitos. É importante enfatizar que a experiência social extrapola
as interações sociais. Isto é, o sujeito se apropria da experiência dos
outros não somente em condições de interação imediata, mas por meio
da intersubjetividade, mediante o caráter dialético da mediação.
É importante sinalizar que Vygotsky (1998) ressaltou o papel ativo
do homem e da cultura. O homem constitui a cultura ao mesmo
tempo em que é por ela constituído. Entretanto, o desenvolvimento

Deficiência: Aprendizagem e Superação Roberta Galasso 155  


cultural humano encontra sustentação nos processos biológicos,
no crescimento e na maturação orgânica, formando um processo
complexo, em que o biológico e o cultural constituem-se mutuamente
no desenvolvimento humano.
Desta forma, o desenvolvimento biológico e cultural forma uma
unidade, na qual o processo de desenvolvimento psicológico é
determinado tanto pelo nível de desenvolvimento orgânico-biológico,
quanto pelo nível de utilização de signos. Neste sentido, o sentimento,
o pensamento e a vontade, que formam a tríade da natureza social da
consciência, são historicamente constituídos no contexto ideológico,
psicológico e cultural.
No processo de constituição do sujeito, as atividades humanas
são operacionalizadas ao longo do desenvolvimento humano pelos
signos, que são meios de comunicação e meios de conexões das
funções psicológicas superiores, presentes em todo o processo de
constituição do sujeito.
Desta forma, a deficiência provoca alterações nas interações sociais,
que se caracterizam como as condições essenciais para os processos
de comportamento. Sendo assim, as particularidades psicológicas do
deficiente têm como base o núcleo social e não o biológico.
Ao considerar esses princípios, teremos um grande trabalho
criador e dirigido à reorganização de novos princípios que permearão
as práticas educativas e sociais, pois podemos analisar a deficiência
como um conceito socialmente construído; é um signo que diferencia
a conduta do sujeito com deficiência e das demais pessoas.
Sendo assim, os processos educacionais em espaços formais e
não formais podem contribuir para vencer estigmas e preconceitos,
respeitando as especificidades como quaisquer outras necessidades.
Então, não nos entenderão se dissermos que o menino cego é
um menino com defeito e dirão que o cego é cego e que o surdo é

156   DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES


surdo, nada mais1 (VYGOTSKY, 1997, p. 62). Desta forma, uma grande
virtude a ser conquistada pelo ser humano é respeitar e conviver
com o diferente. Na história da humanidade esta luta tem sido
sofrida. “Olhar”, respeitar, aceitar e amar o diferente sem excluí-lo,
aceitando-o com suas dificuldades, possibilidades e competências, é
dever de todos. Para tanto, devemos despojar-nos de preconceitos,
questionar valores e transcender para um ser maior que se encontra
em cada um de nós (NARDI, 2001).

NOTAS

1 Tradução da autora do original em espanhol: [...] entonces no nos


entenderán si decimos que el niño ciego es un niño con defecto y dirán
que el ciego es ciego y que el sordo es sordo y nada más.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Saberes Necessários à Prática


Educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

MORAES, Maria Cândida. O paradigma educacional emergente. Papirus.


Campinas. SP, 1997.

NARDI, Roberta Galasso. Olhar. In: FAZENDA, I. Interdisciplinaridade:


dicionário em construção. São Paulo: Cortez, 2001.

VYGOTSKY, L. S. Pensamiento y Lenguaje. Cuba: Editorial Pueblo Y Educación,


1998.

________. Obras Completas- Tomo Cinco- Fundamentos de Defectología. Cuba:


Editorial Pueblo y Educación, 1997.

ROBERTA GALASSO NARDI


Com Doutorado e Mestrado em Educação e Currículo pela
PUC-SP e graduação em Pedagogia, membro do Grupo de
pesquisa Ecotransd-CNPq. Atuação profissional: Coordenadora
Pedagógica da AACD-Lar Escola e Coordenadora e Docente do
Curso de Pós-Graduação em Gestão Escolar - SENAC-SP.

Deficiência: Aprendizagem e Superação Roberta Galasso 157  


DESEQUILÍBRIO
Marcos Abranches

Des prefixo de negação (ou de ausência)


Equi igual
Libração ato de librar-se (movimento oscilante de um corpo até
que fique equilibrado)
Talvez seja realmente esta a minha missão. Quando Deus colocou
a dança em minha vida, não me perguntou se eu a queria ou não.
Simplesmente a colocou.
Deus não pergunta.
Mas de uma coisa estou certo. Ele me fez dançarino, para que, entre
tantos outros, obsecre ao mundo que reflita sobre a ausência do igual.
Meu corpo não oscila para o movimento físico. Oscilo meu corpo
na busca permanente da libração. Para aqueles que não sabem o
verdadeiro significado do igual e pensam que igual é corpo e mente
semelhante, não entendem que a equidade é a disposição para

158  
reconhecer imparcialmente o direito de cada um, e que a equidade
revela nas pessoas o amor, o senso de justiça, a imparcialidade, a
isenção e a ética. A minha dança oscila o meu corpo clamando por
lisura e reflexão sobre o modo de agir, pensar e opinar das pessoas.
Honestidade e integridade não são somente padrões que os outros
enxergam em nós. Oscilo meu corpo para que as pessoas possam
interiorizar os seus verdadeiros valores de equivalência.
Se estiverem vazios, por Deus, que a Arte os alimente.
Algumas pessoas podem pensar: se somos o sopro de Deus, quem
nasce com deformações físicas ou mentais é fruto de um sopro defeituoso?
A resposta para este tipo de desigualdade é que não há sofrimento
ao redor de nossos passos. O mal supostamente forjado não está
naqueles que o carregam, mas naqueles que padecem da aflição
de sua própria ansiedade, respeitável, mas inútil, projetando e
mentalizando ocorrências menos felizes para a vida dos portadores
de deficiência, que, em muitos casos, não são vistos como se supõe
e, por vezes, nem chegarão a vê-los assim.
Estes não oscilam seus corpos e nem suas mentes.
Acredito que entendemos melhor os normais. A recíproca não é
verdadeira. À medida que as limitações surgem, voltamo-nos para a
essência da vida e compreendemos mais a missão que temos aqui na
Terra. Para nós, a simples reflexão sobre a dor e o sofrimento basta
para evidenciar que há uma razão de ser muito profunda. A dor é um
alerta da natureza, que anuncia algum mal que está nos atingindo e
que precisamos enfrentar.
Para muitos, dor é lamúria.
Para muitos, dor é a desculpa para as fraquezas de suas almas.
Meus movimentos oscilantes não são alerta para a deficiência física,
mas para a deficiência do desamor. Procuro despertar nas pessoas as
mazelas provocadas pelo egoísmo e preconceitos que corroem a alma

Desequilíbrio Marcos Abranches  159  


e fomentam o ódio, o orgulho, a indiferença e a aflição do próximo,
asfixiando os mais nobres ideais da vida, alimentando o campo fértil da
ignorância com os ingredientes venenosos da revolta e da insensatez.
Oscilo meu corpo para o equilíbrio, para o despertar do vazio e
isolamento causado pela solidão. As desestéticas dos movimentos são
as desestéticas sentidas pelo abandono e pela rejeição, entendendo
que o bálsamo está na proteção do amor. Busco nos meus movimentos
um mundo sem angústia, sem dores, sem desespero. Busco a vida.
Busco na dança o equilíbrio do corpo e o belo da alma.

“ A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios:


Por isso cante, chore, dance, ria e viva intensamente antes que a
cortina se feche e a peça termine sem aplausos ”. (Charles Chaplin)

MARCOS ABRANCHES
Dançarino, coreógrafo e pessoa com deficiência física.
Em 2003 integrou-se à CIA FAR 15, atuou nos espetáculos
Senhor dos Anjos; Jardim de Tântalo e Metamorfose de
Franz Kafka, todos coreografados e dirigidos por Sandro
Borelli e Sônia Soares. Incentivado por Phillipe Gemet,
desenvolveu um trabalho coreográfico com mais duas
bailarinas e fundou o Grupo Vidança, apresentando a peça
Desequilíbrio, que posteriormente transformou-se em um
espetáculo solo, com mais de, até hoje, 100 espetáculos.
Participou do Kulturdifferenztans, em Colônia (Alemanha)
e Crossings Dance Festival em Düsseldorf (Alemanha),
apresentando Via sem Regra sob direção de Gerda König.
Atuou na peça Trem Fantasma, em uma adaptação, no
Brasil, da obra Navio Fantasma de Wagner, dirigido por
Christoph Schligensielf, o que lhe rendeu o convite para
atuar na temporada de 2008, reeditada para outubro de 2010,
da ópera teatralizada da Vida e Obra de Joana D’Arc, no
Deutsche Oper Berlin, dirigida por Christoph Schligensielf,
um dos mais respeitados diretores de toda Europa.

160   DEFICIÊNCIAS MÚLTIPLAS, CAPACIDADES SINGULARES


Desequilíbrio Marcos Abranches   161
INSTITUTO TOMIE OHTAKE NÚCLEO DE CULTURA E
PARTICIPAÇÃO
PRESIDENTE Felipe Arruda (diretor)
Ricardo Ohtake Ágata Rodriguez
Andrea Souza
NÚCLEO DE PESQUISA E
CURADORIA Bruno Ferrari
Paulo Miyada (coordenador) Claudio Rubino
Carolina de Angelis Divina Prado
Luise Malmaceda Elisabeth Barboza
Priscyla Gomes Emol
Theo Monteiro Fernanda Beraldi
Fernanda Castilhos
PRODUÇÃO Isadora Borges
Vitoria Arruda (diretora) Isadora Mellado
André Luiz Bella Jane Santos
Carla Ogawa Jordana Braz
Cecilia Bracale Julia Cavazzini
Karina Mignoni Lucia Abreu Machado
Lucas Fabrizzio Luis Soares
Mana Mendonça Maiara Paiva
Patricia Castilho Mauricio Yoneya
Rodolfo Borbel Melina Martinho
Nádia Bosquê
ADMINISTRAÇÃO E FINANÇAS
Pedro Costa
Roberto Souza Leão Veiga (diretor
executivo) Priscila Menegasso
Bruno Damaceno Victor Gabriel da Silva (estagiário)
Carlito Oliveira Junior Victor Santos
Fabiana Cristina de Almeida ASSESSORIA DE IMPRENSA
Joseilda Conceição Pool de Comunicação
Renê Rossignol Marcy Junqueira
Sergio Santos Souza Martim Pelisson
Willian dos Santos
Jodeval de Souza aprendiz junior INFORMÁTICA
André Biacca
NEGÓCIOS
Ivan Lourenço (diretor) DOCUMENTAÇÃO
Fernando Pinho Marcos Massayuki Sutani
Flavio Silva
SECRETARIA
Kelly Lima
Maria de Fátima da Silva Rocha
ASSUNTOS INSTITUCIONAIS Deolinda Correia de Almeida
Simone Alvim Moises Silva Mello
Eloise Martins
COORDENAÇÃO OPERACIONAL
Marcella Nigro
Alexandre Lopes Pereira
Wagner Antônio Barbosa (supervisor)
PROGRAMA DE ACESSIBILIDADE
INSTITUTO TOMIE OHTAKE

Luis Soares
coordenação geral

Victor Santos
assistência de coordenação

Claudio Rubino
coordenação Programa de
Acessibilidade

Matias Monteiro
coordenação de parcerias

Maiara Paiva
coordenação de produção

Fernanda Castilhos
produção

Bruna Kury, Kelen Nascimento,


Leonardo Bernardo e Misael Prado
aprendizes da cultura

Bruno Perê, Isadora Borges Brito e


Isadora Mellado
educadores

Diana Tubenchlak
concepção e educação No Colo,
atividades para bebês e famílias

Ricardo Miyada
fotografia

Julia Paccola e Luiza De Carli


design

Lívia Motta – Ver com Palavras


audiodescrição

Ponte Libras e Arte


intérpretes de língua brasileira de sinais,
LIBRAS e português

Gilberto Vieira
consultoria e avaliação de ações do
Território – Canindé

Liliana Tavares COM Acessibilidade


Comunicacional
produção Território – Recife
MEDIAÇÕES ACESSÍVEIS
CICLO DE ENCONTROS SOBRE ACESSIBILIDADE
EM ESPAÇOS DE EDUCAÇÃO E CULTURA

ORGANIZAÇÃO DESIGN
Felipe Arruda Julia Paccola
Luís Soares
Claudio Rubino REVISÃO
Divina Prado
TEXTOS Isabela Maia
Ana Amália Tavares Bastos Barbosa
Andi Rubinstein TRADUÇÃO
Camila Araújo Alves Isabela Maia
Cássio Rodrigo de Oliveira Silva
Claudio Rubino
Cristiane Tenani Pomeranz
Diana Tubenchlak
Edinho Santos
Felipe Arruda
Gabriela Aidar
Hugo Eiji
Ialê Cardoso
Jo Clifford
Judith Mader Elazari
Liliane Rebelo
Lívia Maria Villela de Mello Motta
Luís Soares
Maiara Paiva
Marcelo Continelli
Márcia Pessoa
Marcio Farias
Marcos Abranches
Mario Paulo Bovino Greggio
Paula Beatriz de Souza Cruz
Raphael Escobar
Renata Bittencourt
Roberta Galasso
Roberto da Silva
Victor Santos
PARA CONHECER UM POUCO MAIS DO
PROJETO MANHÃS DE HISTÓRIA /
PROGRAMA DE ACESSIBILIDADE INSTITUTO TOMIE OHTAKE
ACESSE:

Projeto Manhãs de História 2016:


https://www.youtube.com/watch?v=fV_LNlA5J9c&t=221s

Instituto Tomie Ohtake em LIBRAS:


https://www.youtube.com/watch?v=EVRGtRbdzBk

Divulgação Programa de Acessibilidade Instituto Tomie Ohtake 2017:


https://www.youtube.com/watch?v=iE_yJd3Yxw4

Programa de Acessibilidade Instituto Tomie Ohtake Recife 2017:


https://www.youtube.com/watch?v=TVj6D6VW_zw&t=55s

No Colo, atividades para bebês e famílias - Programa de Acessibilidade Instituto


Tomie Ohtake:
https://www.youtube.com/watch?v=f-RawFfEOao

Expresso Acesso - Instituto Tomie Ohtake:


https://www.youtube.com/watch?v=Ed6DezVvxmc

8a. Virada Inclusiva - Programa de Acessibilidade Instituto Tomie Ohtake:


https://www.youtube.com/watch?v=2a1grEqyTms&t=4s

Marcenaria para jovens e adultos - construção de mobiliário urbano:


https://www.youtube.com/watch?v=6bHrEZw_Jt8
Publicação composta em DIN, impressa pela Stilgraf em papel Offset.
PDF ACESSÍVEL COM AUDIODESCRIÇÃO

TÍTULO DO LIVRO: MEDIAÇÕES ACESSÍVEIS – CICLO DE ENCONTROS


SOBRE ACESSIBILIDADE EM ESPAÇOS DE EDUCAÇÃO E CULTURA.
INSTITUTO TOMIE OHTAKE.

Este é um arquivo PDF acessível, com audiodescrição, para que as pessoas com
deficiência visual possam ter acesso ao conteúdo e às informações contidas em cada
imagem. É possível fazer a leitura do texto e das imagens. Para isso, todas as fotos e
outros tipos de imagens foram audiodescritas e as descrições embutidas em código,
permitindo sua identificação pelos softwares leitores de tela usados por este público.
Inserimos a audiodescrição no final do livro para que os leitores interessados em
descrição de imagens possam conferir o trabalho, identificado pelas páginas.

Audiodescrição: VER COM PALAVRAS.


Descrição de imagens: Wagner Caruso e Lívia Motta.
Formatação PDF acessível: Wagner Caruso.
Consultoria em acessibilidade: Laercio Sant´Anna.

Audiodescrição da capa: a capa com fundo branco, escrita com letras azuis e
laranja, é ilustrada por duas linhas grossas, uma azul e outra laranja que sobem
paralelas do lado direito, se entrelaçam em uma curva fechada no meio e
sobem. No lado esquerdo, as linhas se sobrepõem na parte inferior e fazem um
semicírculo. O título da publicação: MEDIAÇÕES ACESSÍVEIS, escrito em
laranja na vertical em duas linhas, encontra-se no canto superior esquerdo. O
subtítulo: CICLO DE ENCONTROS SOBRE ACESSIBILIDADE EM ESPAÇOS DE
EDUCAÇÃO E CULTURA, escrito em azul em 7 linhas, encontra-se na parte
inferior central. No rodapé, a logomarca do Instituto Tomie Ohtake composta
por uma paleta, placa para por tintas, à esquerda, e o nome do Instituto à
direita, tudo em azul.

Logomarca do Instituto Tomie Ohtake. Audiodescrição: A logomarca do


Instituto Tomie Ohtake é composta por uma paleta, placa para misturar tintas,
à esquerda, e o nome do Instituto à direita, tudo em azul.

PÁGINA 1
Audiodescrição: No canto superior direito, a logomarca do Instituto Tomie
Ohtake composta por uma paleta, placa para por tintas, à esquerda, e o nome
do Instituto à direita, tudo em azul. O título da publicação: MEDIAÇÕES
ACESSÍVEIS, escrito em laranja na vertical em duas linhas, encontra-se logo
abaixo.

PÁGINA 2
Audiodescrição: Logomarca do Instituto Tomie Ohtake no canto
superior direito, é composta pela silhueta de uma paleta, placa de madeira
sobre a qual os pintores dispõem e combinam as tintas, à esquerda, e o nome
do Instituto à direita, tudo em azul.

1
PÁGINA 14
AudioAudiodescrição: Recorte de um trecho do mapa de ruas da cidade de
São Paulo, com marcadores circulares na cor laranja numerados de 1 a 10
plotados sobre alguns bairros que mostram os museus e instituições de cultura
da cidade mais visitados no ano de 2014, conforme segue: 1. Museu da
Imagem e do Som, 603.197 visitas, bairro: Jardins; 2. Catavento Cultural:
509.177 visitas, bairro: Centro; 3. Pinacoteca Luz: 425.575 visitas, bairro: Bom
Retiro; 4. Museu do Futebol: 419.363 visitas, bairro: Pacaembu; 5. Museu da
Língua Portuguesa: 386.798 visitas, bairro: Bom Retiro; 6. MASP: 288.883
visitas, bairro: Jardim Paulista; 7. Museu Afro Brasil: 209.097 visitas, bairro:
Ibirapuera; 8. Museu da Casa Brasileira: 150.472 visitas, bairro: Itaim Bibi; 9.
Casa das Rosas: 116.487 visitas, bairro: Paraíso; 10. Museu da Imigração:
94.781 visitas, bairro: Mooca.

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Figura 1. Audiodescrição: Trecho de uma página do site da MOBILIZE-
BRASIL com a seguinte informação em destaque: Em São Paulo, só 25% tem
ponto de transporte a até 1 km de casa.

Tabela 1. Audiodescrição: Transporte mais entrada, vezes, família de 4


pessoas (trazendo lanche de casa), igual custo para visitar um museu.

Tabela 2. Audiodescrição: média de salário em 25 distritos de São Paulo,


menos custo para visitar museus, igual acesso nulo ou precário à cultura
institucional.

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Audiodescrição: Página do site do Instituto Tomie Ohtake do Projeto:
EXPRESSO ACESSO, ilustrada com o desenho de um ônibus dentro de uma
circunferência azul, com informações de saídas, horários e pontos de parada de
uma linha de transporte gratuita que circulou em 2017, aos domingos, do
bairro do Canindé ao Instituto Tomie Ohtake.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de Claudio Rubino
agachado à frente de um menino cadeirante, mostrando uma réplica de uma
escultura da artista Tomie Ohtake.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de vários bebês de


fraldas participando do: "No Colo - Atividades para bebês e famílias", no
Instituto Tomie Ohtake. Alguns estão sentados, um está deitado de bruços e
outro está agachado segurando um pincel apoiado na parede, à esquerda,
forrada com folhas de papel manchadas de tinta.

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Foto 1. Audiodescrição: A fotografia em preto e branco mostra um grupo de
crianças, meninos e meninas, sentados no chão do hall do Instituto Tomie
Ohtake, assistindo a uma contação de história.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo com


aproximadamente 19 mulheres sentadas em cadeiras formando um grande
círculo, em um ateliê do Instituto Tomie Ohtake.

Foto 3. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo mulheres


com os olhos vendados, sentadas em carteiras escolares, participando de
uma oficina para professores no Instituto Tomie Ohtake.

Foto 4. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de várias pessoas,


homens e mulheres, todos usando aventais, alguns com mascaras,
trabalhando em grupos em bancadas retangulares de madeira dentro de
um galpão, no projeto intitulado: Marcenaria para Crianças e Jovens. Sobre
as bancadas, eles trabalham com placas de madeiras e ferramentas.

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Audiodescrição: A página é ilustrada no lado esquerdo por duas
linhas grossas na vertical, uma azul e outra laranja que viram para direita
fazendo uma leve curva.

PÁGINA 38
Audiodescrição: A página é ilustrada por linhas grossas, azuis e laranja, duas
no canto superior esquerdo na vertical, e duas fazendo uma curva no canto
superior direito.

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Audiodescrição: A página é ilustrada no canto superior esquerdo por duas
linhas grossas na vertical, uma azul e outra laranja e por uma linha
laranja fazendo uma curva no canto superior direito.

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Audiodescrição: A página é ilustrada no lado esquerdo por duas
linhas grossas na vertical, uma azul e outra laranja.

PÁGINA 47
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte de cima por duas
linhas grossas na horizontal, uma azul e outra laranja.

PÁGINA 54
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte de cima por duas
linhas grossas na horizontal, uma azul e outra laranja.

PÁGINA 63
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte de cima por duas
linhas grossas na horizontal, uma azul e outra laranja.
3
PÁGINA 70
Audiodescrição: A página é ilustrada no lado direito por duas linhas grossas
na vertical, uma azul e outra laranja que se sobrepõem na parte superior
fazendo uma curva fechada.

PÁGINA 71
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas na vertical, uma azul e outra laranja que se sobrepõem à direita
fazendo uma curva fechada.

PÁGINA 78
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas na vertical, uma azul e outra laranja que se sobrepõem à esquerda
fazendo uma curva fechada.

PÁGINA 88
Audiodescrição: A página é ilustrada no lado direito por duas linhas grossas
na vertical, uma azul e outra laranja que se sobrepõem no meio fazendo dois
elos.

PÁGINA 89
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas na horizontal, uma azul e outra laranja que se sobrepõem à direita
fazendo dois elos.

PÁGINA 93
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas na horizontal, uma azul e outra laranja que se sobrepõem à direita
fazendo dois elos.

PÁGINA 98
Audiodescrição: A página é ilustrada no na parte superior por duas linhas
grossas na horizontal, uma azul e outra laranja que se sobrepõem à direita
fazendo dois elos.

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Audiodescrição: A página é ilustrada no lado direito por duas linhas grossas
na vertical, uma azul e outra laranja que se sobrepõem na parte inferior
fazendo curvas em forma de 8.

PÁGINA 104
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas na horizontal, uma azul e outra laranja que se sobrepõem à direita
fazendo curvas em forma de 8.

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PÁGINA 108
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas na horizontal, uma azul e outra laranja que se sobrepõem à direita
fazendo curvas em forma de 8.

PÁGINA 113
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas na horizontal, uma azul e outra laranja que se sobrepõem à direita
fazendo curvas em forma de 8.

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Audiodescrição: A página é ilustrada no lado esquerdo por duas linhas
grossas na vertical, uma azul e outra laranja que se sobrepõem na parte
inferior fazendo curvas em forma de S.

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Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas, uma azul e outra laranja, na forma de U invertido, sobrepostas, e duas
linhas verticais e paralelas nas mesmas cores e espessura.
PÁGINA 118
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas, uma azul e outra laranja, na forma de U invertido, sobrepostas, e duas
linhas verticais e paralelas nas mesmas cores e espessura.

PÁGINA 122
Audiodescrição: A página é ilustrada no lado direito por duas linhas grossas
na vertical, uma azul e outra laranja que se sobrepõem na parte superior
fazendo curvas em forma de S.

PÁGINA 123
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas na horizontal, uma azul e outra laranja que se sobrepõem à direita
fazendo curvas em forma de S.

PÁGINA 123
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas na horizontal, uma azul e outra laranja que se sobrepõem à direita
fazendo curvas em forma de S.

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Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas, uma azul e outra laranja que se sobrepõem à esquerda, fazendo
curvas em forma de S.

PÁGINA 133
Audiodescrição: A página é ilustrada ao centro, por duas linhas grossas
paralelas na vertical, uma azul e outra laranja que se sobrepõem nas
extremidades superior e inferior fazendo uma curva fechada.

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Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas na horizontal, uma azul e outra laranja na parte superior fazendo um
ângulo reto à esquerda e uma pequena curva.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de quatro crianças
cadeirantes posando para foto. Atrás deles, cinco pessoas, um homem e quatro
mulheres, país e educadores.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um menino


cadeirante de perfil sendo conduzido por um homem no hall do Instituto Tomie
Ohtake, passando no meio das esculturas móveis da artista Tomie Ohtake,
feitas com estruturas tubulares onduladas brancas.

Foto 3. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco da artista Ana Amália


Barbosa sendo conduzida em sua cadeira de rodas por uma mulher, ambas
sorridentes, no hall do Instituto Tomie Ohtake, passando no meio de uma
escultura móvel da artista Tomie Ohtake, um grande aro tubular com formato
ondulado. À direita, o educador José Minerini Neto segura na borda do aro com
as duas mãos.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de cinco crianças com
a artista Ana Amália Barbosa, todas em cadeiras de rodas, olhando a réplica de
uma escultura do artista Hélio Oiticica nas mãos do educador José Minerini
Neto. Ele está agachado no chão, no galpão de exposições do Sesc Pompéia.
Atrás das crianças, seis mães e educadoras.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de uma menina negra,


sendo conduzida em sua cadeira de rodas por uma mulher, ambas sorridentes,
no galpão de exposições do Sesc Pompéia, passando por dentro de uma
escultura interativa, uma tenda retangular com estrutura de madeira pintada,
coberta por faixas largas de tecido estampado.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo de
crianças em cadeiras de rodas, algumas com múltiplas deficiências,
acompanhadas de pais e educadores, reunidas no Jardim das Esculturas no
Parque da Luz. Do lado esquerdo, em pé, o educador José Minerini Neto.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco, em primeiro plano, de


uma menina em cadeira de rodas, olhando para cima, no Jardim das Esculturas
no Parque da Luz. À esquerda, foco nas mãos de uma mulher segurando uma
bexiga cheia de ar em uma mão e uma vazia na outra mão.

Foto 3. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco do educador José


Minerini Neto e uma mulher, agachados no chão de terra no Jardim das

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Esculturas no Parque da Luz, amarrando várias bexigas cheias de ar em uma
escultura interativa intitulada: COLAR, formada por várias esferas de cerâmica
enfiadas em uma corda, presas nos troncos das árvores.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco da artista Ana Amália
Barbosa sentada em sua cadeira de rodas com uma instalação interativa do
artista Ernesto Neto no colo, no Museu de Arte Moderna. A instalação é
composta por uma rede de fios de tecido com tramas bem largas pendurada no
teto, cheia de bolinhas de plástico no formato de uma gota bem grande.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de duas meninas


deitadas sobre uma instalação interativa do artista Ernesto Neto no Museu de
Arte Moderna. A instalação é composta por uma rede de fios de tecido com
tramas bem largas cheia de bolinhas de plástico, esticada no chão.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco da artista Ana Amália
Barbosa no meio de quatro crianças, dois meninos e duas meninas, todos em
cadeiras de rodas, posando para foto na frente de uma obra do artista M.C.
Escher em uma exposição no CCBB – Centro Cultural Banco do Brasil, uma
pintura com vários quadrados concêntricos nas cores preto e branco,
intercalados, que cria uma ilusão de ótica parecendo ser um túnel.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de dois meninos em


cadeiras de rodas, acompanhados de seus pais e educadores, um no canto
esquerdo e outra no canto direito de uma pequena sala, uma obra interativa do
artista M.C. Escher em uma exposição no CCBB – Centro Cultural Banco do
Brasil. A sala com tetos e paredes brancas, tem duas janelas em arco, ao
fundo, com piso quadriculado preto e branco em desnível do lado esquerdo,
criando uma ilusão de ótica, dando a impressão que o menino e sua
acompanhante do lado direito têm o dobro do tamanho e que estão com as
cabeças quase próximas ao teto.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo de
crianças, meninos e meninas em cadeiras de rodas, acompanhadas de seus
pais, educadores e cuidadores, todos de perfil, apreciando alguns quadros
pendurados na parede, em uma exposição na galeria do Instituto de Artes da
UNESP.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco mostra uma menina


em cadeira de rodas, de perfil, dentro de uma escultura interativa, em uma
exposição na galeria do Instituto de Artes da UNESP. A obra é composta por
uma estrutura quadrada feita de tubos interligados, com vários fios de plástico
pendurados. Na frente dela, uma mulher segura um emaranhado de fios de
plástico transparentes em formato de um colar.

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Foto 3. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de duas crianças, um
menino e uma menina em cadeiras de rodas, olhando atentamente para uma
obra de arte nas mãos do educador Moacir Simplício. Ele está com os joelhos
flexionados, com o tronco inclinado à frente das crianças, na galeria do
Instituto de Artes da UNESP.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco da artista Ana Amália
Barbosa ao lado de algumas crianças, todas em cadeiras de rodas, juntamente
com seus acompanhantes, na portaria do pavilhão das artes do Memorial da
América Latina.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco, em primeiro plano (do


peito para cima), de uma menina em sua cadeira de rodas, de perfil,
apreciando uma escultura dentro de uma caixa de vidro transparente, no
pavilhão das artes do Memorial da América Latina.

Foto 3. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de uma orientadora do


Memorial da América Latina na frente de uma obra de arte, conversando com
várias crianças em cadeiras de rodas e seus acompanhantes, no pavilhão das
artes.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo de
pessoas, adultos e crianças em cadeiras de rodas, acompanhadas de seus pais,
cuidadores e educadores, posando para foto no hall do CCBB – Centro Cultural
Banco do Brasil em São Paulo. Do lado direito, a artista Ana Amália Barbosa.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo de


pessoas, adultos e crianças em cadeiras de rodas, e seus acompanhantes,
apreciando obras de arte dos Mestres do Renascimento. Na frente deles, à
direita, uma educadora do CCBB – Centro Cultural Banco do Brasil.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo de
pessoas, adultos e crianças cadeirantes, acompanhados de seus pais,
cuidadores e educadores, posando para foto no hall do Instituto Tomie Ohtake
no dia da visita à exposição de Salvador Dalí.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco do educador José


Minerini Neto ajoelhado no chão apontando para um quadro de Salvador Dali
intitulado: Idílio atômico e urânico melancólico. Do lado esquerdo, um grupo de
pessoas, jovens e crianças em cadeiras de rodas com seus acompanhantes
apreciando a obra.

Foto 3. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco da artista Ana Amália


Barbosa sentada em sua cadeira de rodas ao lado da sua acompanhante e dos
educadores José Minerini Neto e Moacir Simplício, atrás da reconstrução de

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uma obra interativa do artista Salvador Dali, intitulada: Rosto da Mae West. A
obra é composta por uma armação em forma de arco com os contornos no
formato de cabelos longos, loiros e cacheados, assim como eram os da atriz e
escritora norte-americana.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo de
meninos e meninas em cadeiras de rodas e seus acompanhantes, reunidos em
uma sala de exposições no Museu Afro Brasil no Parque do Ibirapuera. Na
frente deles, à direita, o educador, um homem negro com cabelos curtos. Ele
usa camisa xadrez de mangas compridas.

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Foto 1. Audiodescrição: A fotografia em preto e branco mostra, em primeiro
plano, a escultura hiper-realista do artista plástico Ron Mueck, intitulada: Casal
debaixo do guarda-sol, medindo 300x400x350 cm. A obra retrata um homem
com calção xadrez deitado no chão de barriga para cima, com o braço esquerdo
sobre a testa, com os joelhos flexionados, com a cabeça no colo de uma mulher
que olha fixamente para ele, embaixo de um guarda-sol. Ao fundo, várias
pessoas apreciam a obra, alguns em pé outros em cadeiras de rodas, na sala
de exposições da Pinacoteca.

Foto 2. Audiodescrição: A fotografia em preto e branco mostra em primeiro


plano e vista por trás, a escultura hiper-realista do artista plástico Ron Mueck,
intitulada: Jovem Casal, medindo 89x43x23 cm. A obra retrata dois jovens
adolescentes, um menino e uma menina em pé, lado a lado, sobre uma
plataforma retangular, ambos usando bermudas e camisetas. Ao fundo, várias
pessoas apreciam a obra, algumas em pé, outras em cadeiras de rodas.

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Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco da artista Ana Amália
Barbosa ao lado de uma jovem, ambas em cadeiras de rodas, apreciando obras
de arte do pintor neerlandês modernista Piet Mondrian no salão de exposições
do CCBB – Centro Cultural Banco do Brasil em São Paulo, sob orientação de um
educador local que está com o tronco inclinado para frente, ao lado delas.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um casal


interagindo com uma obra do artista Gerrit Rietveld, intitulada: Cadeira
Vermelha Azul, no salão de exposições do CCBB – Centro Cultural Banco do
Brasil em São Paulo. A obra, parte da exposição Mondrian e o movimento Stijl,
mostra uma cadeira gigante com estrutura de madeira vazada com encosto e
assentos feitos com placas de madeira retangulares. O homem está sentado
com a mão na testa, pensativo, com os pés totalmente esticados sobre o
assento e a mulher está em pé ao seu lado com o corpo inclinado à frente
segurando seu braço, sorridente.

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PÁGINA 147
Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo de
pessoas, homens e mulheres, em cadeiras de rodas, e seus acompanhantes,
alguns em pé, todos de perfil, apreciando uma escultura sobre uma plataforma
retangular, intitulada: Unidade Tripartida (1948/49), do artista Max Bill, na
galeria de exposições do MAC- MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEA-USP. Na
frente da obra duas educadoras do museu.

Foto 2. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo de


pessoas, homens e mulheres, em cadeiras de rodas, e seus acompanhantes,
alguns em pé, ao redor de uma grande escultura, sem título (1987), do artista
Ângelo Venosa, na galeria de exposições do MAC- MUSEU DE ARTE
CONTEMPORÂNEA-USP. Entre os visitantes, a artista Ana Amália Barbosa, à
direita, sentada em sua cadeira de rodas ao lado de sua acompanhante e o
educador José Minerini, ao centro, segurando uma folha de papel.

Foto 3. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo de


pessoas de costas, homens e mulheres, algumas em cadeiras de rodas, e seus
acompanhantes, apreciando ao fundo uma escultura em ferro cromado sem
título (1954), do artista Sofu Teshigahara, na galeria de exposições do MAC-
MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEA-USP. À frente do grupo, o educador José
Minerini.

PÁGINA 148
Foto 1. Audiodescrição: Fotografia em preto e branco de um grupo de
pessoas, homens e mulheres em cadeiras de rodas, acompanhadas de seus
cuidadores e educadores, posando para foto no terraço do MAC- MUSEU DE
ARTE CONTEMPORÂNEA-USP. Do lado direito do grupo, a artista Ana Amália
Barbosa e o educador José Minerini.

PÁGINA 149
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas, uma azul e outra laranja, na forma de U invertido, sobrepostas, que se
prolongam em linhas verticais e paralelas nas mesmas cores e espessura à
esquerda.

PÁGINA 153
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas, uma azul e outra laranja, na forma de U invertido, sobrepostas, que se
prolongam em linhas verticais e paralelas nas mesmas cores e espessura à
esquerda.

PÁGINA 158
Audiodescrição: A página é ilustrada na parte superior por duas linhas
grossas na horizontal, uma azul e outra laranja na parte superior fazendo um
ângulo reto à esquerda e uma pequena curva.

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PÁGINA 168
Foto 1. Audiodescrição: No rodapé da página, as logomarcas dos
patrocinadores: Lei de Incentivo à Cultura, Cateno, Cielo e dos realizadores:
Instituto Tomie Ohtake e Ministério da Cultura-Brasil Governo-Federal.

Contracapa
Audiodescrição: A contracapa, com fundo branco, é ilustrada por quatro
linhas grossas, duas azuis e duas cor de laranja que sobem paralelas do lado
esquerdo e no meio, se entrelaçam em curvas e elos. No lado inferior direito,
dois elos nas mesmas cores e espessuras sobrepostos.

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