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CLAUDINEI LUIZ CHITOLINA

JOSÉ APARECIDO PEREIRA


Rodrigo HAYASI PINTO

MENTE, CÉREBRO E CONSCIÊNCIA:


UM CONFRONTO ENTRE FILOSOFIA E CIÊNCIA
Conselho Editorial

Profa. Dra. Andrea Domingues


Prof. Dr. Antonio Cesar Galhardi
Profa. Dra. Benedita Cássia Sant’anna
Prof. Dr. Carlos Bauer
Profa. Dra. Cristianne Famer Rocha
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©2015 Claudinei Luiz Chitolina; José Aparecido Pereira;


Rodrigo Hayasi Pinto;
Direitos desta edição adquiridos pela Paco Editorial. Nenhuma parte desta obra
pode ser apropriada e estocada em sistema de banco de dados ou processo similar,
em qualquer forma ou meio, seja eletrônico, de fotocópia, gravação, etc., sem a
permissão da editora e/ou autor.

C5431 Chitolina, Claudinei Luiz; Pereira, José Aparecido; Pinto, Rodrigo


Hayasi
Mente, Cérebro e Consciência: um confronto entre filosofia e ciência/Clau-
dinei Luiz Chitolina; José Aparecido Pereira; Rodrigo Hayasi Pinto (orgs.).
Jundiaí, Paco Editorial: 2015.

320 p. Inclui bibliografia.

ISBN: 978-85-8148-696-3

1. Consciência 2. Filosofia 3. Tecnologia 4. Ciência . I. Chitolina, Claudinei


Luiz; Pereira, José Aparecido; Pinto, Rodrigo Hayasi
CDD: 100
Índices para catálogo sistemático:
Filosofia e Psicologia 100
Ciências 500
Tecnologia 600
IMPRESSO NO BRASIL
PRINTED IN BRAZIL
Foi feito Depósito Legal
SUMáRIO
Introdução.........................................................................................................5

Parte 1 – Mente e cérebro: subjetividade e consciência

Mente, pensamento e consciência em Descartes.........................................19


Dr. Claudinei Luiz Chitolina

Abordagem antirrepresentacionista da ciência cognitiva incorporada.....57


Dr. Kleber Bez Birolo Candiotto

Plasticidade neural: as bases neurobiológicas da aprendizagem................73


Dra. Débora de Mello Gonçales Sant´Ana

Parte 2 – Natureza humana, neurobiologia e filosofia da mente

O futuro da natureza humana:


entre o determinismo e o totalitarismo técnico...........................................85
Dr. Everaldo Cescon

Pascal e a artificialidade da natureza humana.............................................107


Dr. Rodrigo Hayasi Pinto

As promessas da biologia molecular


em um mundo de sobreveniência gradativa..............................................131
Dr. Gustavo Caponi

Parte 3 – Homem e técnica

Homo faber versus homo sapiens: trans-humanismo e


a revolução na neurociência cognitiva........................................................145
Dr. Osvaldo Pessoa Jr.
Heidegger e a natureza da técnica...............................................................159
Dr. Eladio Constantino Craia Pablo

Manipulação genética e controle do comportamento:


a crítica de Jonas à civilização tecnológica.................................................179
Dr. Jelson Roberto de Oliveira

Parte 4 – Filosofia da mente e racionalidade tecnológica

Por uma crítica à filosofia da mente cientificamente orientada...............199


Dr. José Aparecido Pereira

Do despertar tecnológico da consciência


– breve arqueologia da Internet como cérebro global..............................221
Dr. Erick Felinto

Mídia, racionalidade técnica e realidade virtual:


do crepúsculo do sujeito à morte do pensamento.....................................239
Dr. Luiz Hermenegildo Fabiano

Parte 5 – Psicologia, psicanálise e neurociência: confluências e conflitos

A psicanálise sob a ótica das neurociências:


interlocuções entre Eric Kandel e Freud....................................................255
Dra. Josiane Cristina Bocchi

Psicologia, comportamentalismo e subjetividade......................................279


Dr. José Antônio Damásio Abib

Psicopatologia e neurociência: confluências, divergências e excessos....297


Dra. Ana Maria T. Benevides Pereira

Considerações finais.......................................................................................313
Introdução

Compreender a intrincada e misteriosa relação que existe entre mente e


cérebro constitui um problema e um desafio para a filosofia e para a ciência
contemporâneas. É um problema filosófico, na medida em que toda abor-
dagem acerca da mente é sempre orientada por pressupostos (princípios,
conceitos ou ideias) que determinam uma concepção teórica e um método
de investigação. É um problema científico, uma vez que a explicação dos
mecanismos cerebrais pode nos auxiliar a compreender como a mente
funciona. Neste sentido, desvendar o funcionamento do cérebro pode ser
um passo decisivo na tentativa de se compreender a natureza da consciên-
cia. Representa um desafio, porque é uma questão emergente e incontor-
nável no debate filosófico e científico atual. Ou seja, a compreensão acerca
da origem e natureza do pensamento (e da consciência) implica uma profunda
e intensa interlocução entre filosofia e ciência. Tanto a filosofia quanto a
ciência estão não só empenhadas, mas implicadas no estudo da mente. As-
sim, se não é mais possível à filosofia especular e investigar a natureza da
mente ignorando as descobertas científicas acerca do funcionamento do
cérebro, de igual modo, não é possível à ciência desvendar os mecanismos
cerebrais e sua relação com as funções mentais sem lançar mão de pressu-
postos e conceitos filosóficos. Se, desde Descartes, a relação mente-corpo
é tida como racionalmente insolúvel (um problema incompreensível ou
um fato inexplicável), dado que a razão humana possui limites cognosci-
tivos, em nosso tempo, o problema mente-corpo foi reduzido ao problema
mente-cérebro, sobre o qual a ciência deposita grandes esperanças e promes-
sas de solução. Nessa investida, a neurociência cognitiva é vista como a
mais promissora dentre as ciências cognitivas, porque seu objeto de estudo
é o funcionamento cerebral.
Porém, se a filosofia não pode propor teorias da mente sem considerar
as conclusões da neurociência sobre o funcionamento dos mecanismos
neurais da atividade cerebral, disso não se segue que a natureza da mente
seja passível de investigação e de explicação científica. O que parece certo
é que existe uma correlação (correspondência) entre a atividade mental
e a atividade cerebral, mas não uma redução dos processos mentais aos
processos cerebrais. As regiões do cérebro que são ativadas ou desativadas
quando pensamos provam que o pensamento implica uma atividade neu-

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Claudinei Luiz Chitolina | José Aparecido Pereira | Rodrigo Hayasi Pinto (Orgs.)

ronal, mas não provam que o pensamento seja produzido pelos neurônios.
Ora, não é porque existe uma relação entre o dia e a noite, que a causa
do dia seja a noite ou vice-versa. De igual modo, pode-se dizer que não é
porque existe uma relação entre estados mentais e cerebrais que a mente
seja causada pelo cérebro. O que se sabe é que apesar dos avanços na ex-
plicação do funcionamento dos mecanismos cerebrais, os neurocientistas
não têm logrado êxito no desvendamento da experiência consciente. Nes-
se sentido, a pergunta: como é possível que estados ou processos cerebrais
produzam estados mentais permanece sem resposta ou explicação cien-
tífica. Assim, se para a neurociência, o problema da consciência consiste
em localizar (identificar e descrever) os correlatos neurais da consciência,
o problema difícil (hard problem) consiste em explicar como é possível que
um padrão de atividade neural se converta num conceito (significado). Por
isso, saber como determinadas atividades eletroquímicas dos neurônios
produzem ou dão origem à experiência consciente (subjetiva) é ainda um
problema sem solução para a neurociência. A explicação fisiológica da
dor explica como e porque sentimos dor, mas não explica a experiência
subjetiva ou o significado da dor. Ou seja, a ação dos mecanismos físico-
-químicos e nerofisiológicos do cérebro não é condição suficiente para
explicar a origem da consciência. Diante disso, resulta necessário indagar:
em que consiste a função do cérebro e sua relação com a mente? O ma-
peamento (imageamento) da atividade cerebral poderá revelar algo além
da existência de correlatos neurais da consciência? Ora, o que a neuroci-
ência atesta é que o cérebro é o órgão responsável pelas funções vitais de
nosso corpo, assim como de nossas funções mentais, porque comanda e
controla o funcionamento de todos os órgãos. Por exemplo, no córtex ce-
rebral encontra-se a função de controle de nossas funções cognitivas e no
hipotálamo encontramos a função de regulação das atividades fisiológicas.
Como veremos, a abordagem científica da mente enfrenta dificuldades
teóricas e metodológicas. Do ponto de vista teórico ou epistemológico,
o estudo científico da mente encerra problemas conceituais. Ao estudar
o funcionamento do cérebro, a neurociência depara-se com questões de
ordem conceitual, as quais transcendem o domínio empírico e experimen-
tal. Contudo, a crença de que é possível estabelecer um novo conceito de
mente (e de consciência) a partir da observação neurocientífica dirige o
atual estudo científico da mente. Mas será a mente apenas um conceito
que usamos para descrever e referir nossos pensamentos? Será a mente (e
todo vocabulário inerente à vida mental) um problema de linguagem (ape-

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Mente, Cérebro e Consciência

nas de ordem conceitual)? Como seria possível provar cientificamente que


a mente não é um fenômeno de natureza Imaterial? Os neurocientistas
pressupõem que a mente é redutível à atividade cerebral, mas são incapa-
zes de provar a verdade deste pressuposto.
De igual modo, do ponto de vista metodológico, a investigação acerca
da mente revela-se problemática, uma vez que segundo o método experi-
mental não é possível explicar o que não é passível de observação empírica.
O neurocientista observa direta ou indiretamente a atividade cerebral, mas
não pode concluir daí que estaria observando a mente, um fenômeno que
é empiricamente inobservável. Ou seja, se admitimos que a consciência
é um fenômeno subjetivo (impassível de observação em terceira pessoa)
e que a ciência é conhecimento objetivo, então é necessário concluir que
não é possível um conhecimento científico acerca da mente. Supor que o
cérebro é a sede (origem) do pensamento implica reduzir ou identificar os
processos mentais aos processos neurais. A explicação do funcionamento
do cérebro é a explicação do que ocorre em nosso cérebro quando pen-
samos, mas não é uma explicação de como e por que o pensamento ocorre. Ou
seja, o reducionismo materialista deixa sem explicação o mais intrincado
de todos os problemas: a consciência.
Cumpre notar, portanto, a persistência de uma lacuna explicativa (ex-
planatory gap) no discurso da neurociência, o que sugere a existência de uma
assimetria entre eventos físicos e mentais. Assim, o problema da consciên-
cia, porque é um fenômeno subjetivo, revela-se de difícil tratamento cien-
tífico. Se as lesões cerebrais, as doenças psicossomáticas e seus tratamen-
tos, assim como a utilização do efeito placebo de determinados remédios
provam que há uma relação de causalidade entre os processos cerebrais e
mentais, disto não se segue, porém, que a mente seja causada pelo cérebro.
Dizer que os estados mentais são causados por estados cerebrais não é o
mesmo que dizer que a origem do pensamento e da consciência estão no
cérebro. Os mecanismos neurais (cerebrais) sustentam e acompanham
nossa atividade mental, mas seria a mente resultado ou produto da ativida-
de cerebral? A mente é a mesma coisa que os estados mentais? Não seria a
relação entre mente e cérebro mais complexa que nossas hipóteses e teo-
rias? Se existem evidências científicas de que a mente depende do cérebro
para existir, por outro lado, existem evidências que nos levam a recusar a
hipótese de que a mente e o cérebro são idênticos ou redutíveis entre si.
Não é porque os fios do telefone transportam ou transmitem a mensagem
que comunicamos (o que falamos) que a fala seja causada pelos fios. De

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Claudinei Luiz Chitolina | José Aparecido Pereira | Rodrigo Hayasi Pinto (Orgs.)

modo análogo, poder-se-ia dizer que não é porque a atividade neuronal


serve de suporte da atividade mental que a mente é causada pelo cérebro.
Todavia, se não se pode bem compreender a natureza da mente sem
compreender o funcionamento do cérebro, também é verdade que não se
pode compreender o cérebro sem pressupor a mente. Ou seja, se a ativi-
dade mental depende da atividade cerebral, então deve existir uma relação
entre mente e cérebro. Portanto, é ilusório supor que o avanço científico
implica(rá) a superação ou a supressão da filosofia. Os pressupostos filo-
sóficos encontram-se no âmago da atividade científica, que inconfessada-
mente são assumidos pelos cientistas. Nesse sentido, a mente antes de ser
uma questão para a ciência é uma questão para a filosofia. Ou seja, toda
ciência repousa sobre fundamentos epistemológicos, os quais determinam
uma relação de dependência teórica para com a filosofia. Daí se segue que
as descobertas científicas acerca das relações entre mente e cérebro não
podem negligenciar ou ignorar o aparato conceitual da tradição filosófica.
O conhecimento científico pressupõe conceitos herdados ou hauridos do
pensamento filosófico. Assim, se o cientista pretende desvendar os meca-
nismos neuronais que poderiam explicar a origem do pensamento (e da
consciência), o filósofo quer saber o que é o pensamento, o que é a cons-
ciência. Se o cientista deseja explicar a realidade, o filósofo pergunta: o que
é explicar? O que é real? Se o cientista quer explicar os fenômenos mentais
a partir dos processos cerebrais, o filósofo indaga: o que é um fenômeno? O
que é uma relação de causa e efeito? Será o cérebro a causa da mente? Será o
cérebro a condição suficiente (aquilo pelo qual pensamos) ou a condição
necessária (aquilo com o qual pensamos)? É a mente um problema empí-
rico e/ou conceitual? É a mente uma atividade (função, evento ou proces-
so cerebral) ou uma entidade de natureza imaterial? Se o cientista afirma
que tudo o que existe é matéria, o filósofo insiste em perguntar, o que é a
matéria? Assim, se o cientista deseja estudar e explicar a mente, o filósofo,
entretanto, pergunta: o que é a mente?
Portanto, o olhar do cientista (assim como o do filósofo) nunca é neu-
tro ou desinteressado. É um erro supor que o cientista parte de fatos. Há
sempre uma teoria (perspectiva, interesse, conceito ou valor) que nos per-
mite pensar de um modo ou de outro. A pergunta filosófica precede logi-
camente a pergunta científica. Nesse sentido, a filosofia chega antes da ci-
ência, porque é sua tarefa investigar as condições de possibilidade de todo
conhecimento. Assim, se a investigação filosófica estiver desacompanhada
das descobertas científicas pode tornar-se excessivamente abstrata (teóri-

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Mente, Cérebro e Consciência

ca), por outro lado, a investigação científica ao ignorar seus pressupostos


pode supor que tudo o que existe deve ser passível de prova empírica ou
experimental, ou que o pensamento é subdeterminado pelos fatos. Em
outros termos, se o cientista está teoricamente desarmado para compre-
ender e explicitar os pressupostos de seu próprio pensamento, o filósofo
está ab initio desequipado para descrever e explicar o real em sua aparição
ou manifestação particular. Ao contrário do cientista que visa conhecer a
particularidade (um aspecto da realidade), o filósofo está destinado a pen-
sar e compreender questões de caráter universal (a totalidade do real), por
isso, suas hipóteses e teses não podem ser empiricamente testadas, confir-
madas ou refutadas. O filósofo só se interessa pelo particular à medida que
permite alcançar e compreender o universal. Porque são insuscetíveis de
prova empírica, os problemas filosóficos não podem ser abordados cien-
tificamente. Disso não se segue, entretanto, que os problemas filosóficos
são pseudoproblemas ou irrelevantes para a compreensão da realidade.
Os problemas filosóficos dizem respeito não a um subconjunto de coisas,
mas a todas as coisas. Enquanto o olhar científico visa explicar fenômenos
particulares (conhecer fatos), o olhar filosófico visa compreender ideias.
Ou seja, o pensamento filosófico procede segundo princípios e conceitos,
por isso, se apoia em razões (argumentos), enquanto que a ciência proce-
de segundo leis e causas explicativas. Assim, se os problemas científicos
são particulares (contingentes), os problemas filosóficos são universais;
não estão circunscritos aos fatos ou fenômenos, mas às ideias e princí-
pios. Portanto, a filosofia estabelece os princípios de compreensão ou de
inteligibilidade do real. O valor ou a validade de uma filosofia depende
tão somente da força lógica (de convencimento) de seus argumentos e de
seus procedimentos demonstrativos. Da ciência depende a explicação da
realidade. Por isso, as conclusões de uma filosofia são sempre definitivas,
uma vez que independem de experimentos (ou de evidências empíricas), ao
passo que as conclusões científicas são necessariamente parciais (incom-
pletos e falíveis), porque dependem de experimentos. Daí se segue que o
conhecimento científico é aproximativo (e não definitivo), dado que em
toda generalização pode existir uma lacuna lógica (um caso não verificado).
O conhecimento científico avança por acumulação, porque os novos cien-
tistas se servem das descobertas daqueles que os precederam. A proposição
de uma nova teoria científica implica a refutação (parcial) da teoria anterior.
Assim, se é possível o progresso no conhecimento científico, não parece,

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Claudinei Luiz Chitolina | José Aparecido Pereira | Rodrigo Hayasi Pinto (Orgs.)

entretanto, possível o progresso em filosofia, uma vez que toda filosofia é,


sob certo sentido, um sistema de pensamento independente dos anteriores.
Dito de outro modo, o grau de universalidade da ciência é menos
abrangente que o da filosofia. Diante disso, resta saber, portanto, se a mente
é um problema filosófico ou científico, se a relação entre mente-cérebro é um
problema teórico (conceitual) ou empírico, ou se é, ao mesmo tempo, um
problema conceitual e empírico. Ora, ao longo da história do pensamento
ocidental, a investigação acerca da origem e da natureza do pensamento
estava circunscrita à filosofia; em nosso tempo, porém, a ciência parece
ocupar (ou avançar sobre) um território que era domínio exclusivo da filo-
sofia. A ciência que na época moderna pretendia desvendar ou explicar os
fenômenos naturais, pretende agora desvendar o mais intrincado (comple-
xo) de todos os problemas: a relação entre mente e corpo. Como assinalamos,
a neurociência pretende explicar não só como o cérebro funciona, mas como
o pensamento é possível, isto é, sua origem e natureza. Entretanto, as pro-
fundas divergências entre a tradição filosófica e as descobertas científicas
nos levam a supor que o problema mente-cérebro está distante de uma solução
científica, ou mesmo de uma resposta filosófica consensual.
Todavia, se o avanço da ciência traz novos problemas para a filosofia,
a filosofia, entretanto, não pode ficar indiferente ou alheia ao que acon-
tece no campo científico, visto que nada do que é humano é estranho à
inquirição filosófica. É próprio da ciência pretender conhecer a realidade,
enquanto que é próprio da filosofia compreender o modo como pensa-
mos e conhecemos a realidade. Portanto, se o filósofo não pode pretender
dizer a última palavra, a ele cabe o direito (e o dever) de formular a última
e derradeira pergunta: o que é o pensamento? Por que pensamos? Ora, desde suas
origens gregas, a filosofia é mais um desejo de saber que propriamente
um saber. É na relação entre saber e não saber que se instaura a reflexão
filosófica. A indagação filosófica inaugura uma nova via de investigação,
mobiliza o pensamento na direção do desconhecido. Disso se segue que
onde o cientista encontra uma resposta ou uma solução para um proble-
ma, o filósofo encontra um novo problema. Entretanto, não é apenas o
desconhecido que se apresenta sob a forma de problema para a filosofia,
mas supor saber o que não se sabe. Há uma diferença entre compreender e
conhecer que constitui o cerne do problema da relação entre filosofia e ci-
ência. Conhecer, do ponto de vista científico, diz respeito à explicação dos
fenômenos. Porém, conhecer o modo como conhecemos, é compreender.
Por isso, compreender as relações entre mente e cérebro implica recolocar

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Mente, Cérebro e Consciência

em discussão a relação entre filosofia e ciência, demarcar o domínio e a com-


petência do filósofo e o domínio e a competência do cientista. Ressurge,
deste modo, o problema da demarcação entre ciência e não-ciência.
Contudo, a carência de formação filosófica dos cientistas, assim como
a ausência de formação científica dos filósofos, constitui um sério obs-
táculo que precisa ser superado, se quisermos tornar prolífico o diálogo
entre filosofia e ciência. Assim, a interlocução entre filosofia e ciência só
será possível se estivermos dispostos a romper a clausura intelectual que
substitui a crítica pela competência (teórica e técnica), expressão autêntica
da especialização do pensamento e do conhecimento. É tarefa da ciência
investigar e determinar as causas que explicam os fenômenos naturais,
mas é papel da filosofia compreender o que permanece impensado (não
interrogado) na ciência. Ao ignorar seus próprios pressupostos, a ciência
deixa transparecer sua relação de dependência teórica para com a filosofia.
De igual modo, o filósofo quando ignora (ou desconhece) as descober-
tas da ciência e suas implicações éticas e políticas, produz um discurso
descolado (desconectado) da realidade – cai no abstracionismo. O que
caracteriza o pensar filosófico é sua aderência à realidade. Por isso, uma
das tarefas fundamentais da filosofia no mundo contemporâneo consiste
em compreender a tarefa da ciência e da técnica e seus efeitos sobre a Na-
tureza e sobre o próprio homem.
Cumpre notar, entretanto, que o cientificismo – que é a ideologia cien-
tífica de nosso tempo proclama a ciência como a única forma válida de
conhecimento. Nesse sentido, as questões filosóficas seriam inúteis ou
irrelevantes, visto que foram superadas pela ciência. Para a perspectiva
cientificista, a filosofia não deve propor teses ou teorias, mas limitar-se a
analisar logicamente os resultados e as proposiçõs da ciência. Caudatária
da ciência, a filosofia transforma-se num instrumento ideológico. Ora, a
tarefa da filosofia não consiste apenas em analisar a validade do discurso
científico, muito menos em legitimá-lo ou sancioná-lo, mas de investigar e
buscar compreender seus pressupostos e fundamentos. A filosofia posta a
serviço da ciência – reduzida a uma condição servil é a negação da própria
filosofia, dado que é essencial ao pensamento filosófico o exercício da crí-
tica. Assim, uma filosofia da mente cientificamente orientada (ao invés de
uma filosofia cientificamente instruída ou informada) é a recusa da própria
filosofia, porque supõe uma visão científica da filosofia. Se o filósofo não
pode desconhecer as descobertas e os resultados da ciência, o cientista,
por sua vez, não pode ignorar ou desprezar a longa tradição filosófica, sob

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Claudinei Luiz Chitolina | José Aparecido Pereira | Rodrigo Hayasi Pinto (Orgs.)

pena de pretender reeditar velhos problemas filosóficos como se fossem


novos. Por outro lado, se a atividade filosófica é incompatível com a falta
de instrução ou de informação científica, a atividade científica, porém, não
é compatível com a ignorância filosófica. Assim como o médico corre o
risco de se converter num curandeiro (quando não segue os cânones de
seu ofício), o cientista corre o risco de se transformar num mago e o filó-
sofo num pretenso sábio – que é a antítese do verdadeiro filósofo.
Ora, se parece incontroversa a tese de que toda discussão (investi-
gação) pressupõe algum grau de conhecimento, então no diálogo entre
filosofia e ciência existe uma relação de pressuposição e de implicação.
Ou seja, a explicação científica pressupõe a compreensão filosófica, assim como
a compreensão filosófica implica a explicação científica. Assim, enquanto
a interrogação filosófica busca o sentido (a razão de ser) das coisas, a in-
dagação científica visa descobrir a função das coisas. Entretanto, explicar
sem compreender parece ser o destino da ciência de nosso tempo. O pen-
samento especializado (traço característico da ciência moderna e contempo-
rânea) representa a regressão (morte) do próprio pensamento, a tal ponto
de Heidegger afirmar em Que significa pensar? (1951 – 1952) que a ciência
não pensa, visto que é próprio da ciência calcular, controlar e manipular
a realidade. Segundo este filósofo, a ciência permanece na superfície da
realidade (na região ou no domínio ôntico sem poder penetrar no domínio
ontológico). Para este filósofo, quanto mais as ciências humanas avançam,
menos sabemos acerca do homem. Incapaz de transcender seus próprios
limites, a razão científica converte-se, segundo Horkheimer (O eclipse da ra-
zão – 1955) em razão instrumental (pensamento operacional). Portanto, é
equivocado dizer que o progresso nas ciências deve-se à especialização do
pensamento. Se conhecer mais significa compreender menos, cumpre en-
tão, indagar: o que é o progresso científico? Ora, se já não é mais possível a um
homem abarcar todo conhecimento, é possível, entretanto, compreender
o todo (a totalidade do real) – perceber as relações que existem entre as di-
ferentes partes ou aspectos do conhecimento. Este é o papel irrenunciável
da filosofia, testemunhado pela sua longa história.
A presente publicação está dividida em 5 capítulos. No Capítulo 1, bus-
ca-se, por um lado, discutir a origem e a natureza da consciência, a relação
entre mente e corpo, a ação causal entre estados mentais e cerebrais, a fim
de mostrar que a mente não é idêntica (nem redutível) ao cérebro. Nesse
sentido, apresenta-se a teoria cartesiana da mente que se apoia sobre uma
metafísica racionalista. A mente e o corpo são concebidos como duas subs-

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Mente, Cérebro e Consciência

tâncias distintas e opostas. A essência da mente é pensar, dado que tudo


pode ser apartado de mim, menos o meu pensamento. A essência do corpo
é ser extenso (espacial) e divisível. Portanto, assim como os corpos são os
modos de ser da extensão, as ideias são os modos de ser do pensamento.
Por outro lado, Chemero pretende demonstrar que mente e corpo não
são coisas ou substâncias distintas, mas aspectos ou partes de uma mesma
realidade. Ou seja, a mente não pode pensar nem existir sem o corpo, porque
toda cognição só é possível porque a mente encontra-se situada num corpo
(incorporada); as múltiplas possibilidades de ação (affordance) de um organis-
mo são determinadas por sua relação com o meio-ambiente. O corpo é a via
de acesso ao mundo. Por isso, não é a mente que pensa, mas a mente através
do corpo. O conhecimento não se dá por representação, mas mediante a
affordance. Nesse sentido, os seus defensores acreditam que a abordagem da
mente incorporada (ou situada) pode representar uma promissora tentativa
de superação dos impasses e das dificuldades geradas pelos dualistas e ma-
terialistas, na medida em que integram mente e corpo sob novo enfoque.
Da relação entre as capacidades do agente e as características do meio am-
biente surgem as diferentes possibilidades de ação. Dito de outro modo, a
cognição não é fruto de uma representação mental (o que implicaria a cisão
entre sujeito e objeto); ao contrário, efetiva-se como significação – produto
da relação entre os sistemas perceptivos do agente com o meio ambiente.
Por sua vez, a abordagem neurocientífica visa demonstrar mediante a
tese da plasticidade neural que o cérebro é um órgão em constante evo-
lução (sofre modificações estruturais e funcionais) e que suas funções de-
terminam nossas capacidades ou faculdades mentais. Ou seja, a cognição
depende da ação do organismo, porque não pode existir separação entre
sentir e pensar. A neuroplasticidade implica uma relação entre o orga-
nismo e o meio ambiente (físico e social). Assim, nossas habilidades de
pensamento dependem da capacidade funcional de nosso cérebro. Nesse
sentido, todas as faculdades mentais dependem operacionalmente dos me-
canismos de funcionamento do cérebro. Significa dizer que a capacidade
de pensar se desenvolve à medida que o cérebro se desenvolve e se mo-
difica (ou se reorganiza) pela ação de estímulos externos. Assim, novas
conexões sinápticas se formam para restabelecer ou reparar (compensar)
funções perdidas. Objetiva-se, portanto, contrapor uma perspectiva meta-
física com perspectivas pretensamente antimetafísicas, evidenciando suas
possibilidades e limites teóricos.

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Claudinei Luiz Chitolina | José Aparecido Pereira | Rodrigo Hayasi Pinto (Orgs.)

No Capítulo 2, discute-se as implicações e os limites dos avanços da bio-


logia molecular na compreensão da natureza humana, enquanto expressão
da capacidade técnica do homem de intervir sobre seu próprio ser e destino.
Considera-se, deste modo, não só os benefícios da manipulação genética,
mas seus riscos ou perigos, isto é, a instrumentalização do ser humano. Ad-
verte-se que a ciência posta a serviço da técnica pode transformar o homem
numa ameaça para si mesmo. Nesse sentido, somente a ética poderá devol-
ver ao homem o seu ser, isto é, a dignidade humana (a humanidade). Da su-
bordinação da técnica à ética depende a sobrevivência da espécie humana.
Neste sentido, Pascal concebe o homem como artífice de sua própria
natureza, uma vez que pode determinar seu modo de ser e de existir se-
gundo sua própria vontade. O caráter paradoxal da condição humana (a
sua grandeza e miséria) faz do homem um ser único no universo. Porque é
dotado de corpo e alma, o homem é um ser situado entre o infinitamente
grande e o infinitamente pequeno. Nossa dependência em relação ao ser
infinitamente grande deixa transparecer a impotência da razão humana.
Ou seja, a razão não é soberana; não pode determinar para o homem o
sentido de sua existência, porque é incapaz de conhecer a essência ou a
natureza humana. Assim, se a finitude do ser humano revela os limites da
razão, daí se segue que a filosofia e a ciência embora necessárias, revelam-
-se insuficientes para a autocompreensão do homem. A razão não pode
conhecer os primeiros princípios e aquelas verdades que são objetos de
intuição (sentimento) e não de compreensão ou de demonstração lógica.
Entretanto, o homem é o único ser que pode dispor de sua vida, porque
permanece livre para escolher entre o bem e o mal.
Por outro lado, os avanços da biologia molecular atestam a sobreve-
niência dos fenômenos mentais em relação aos fenômenos neurofisioló-
gicos, o que pode permitir ao homem compreender as bases biológicas
seu pensamento. Assim, enquanto a filosofia nutre uma profunda suspeita
(dúvida) sobre o papel da biologia molecular na compreensão da natureza
do ser humano, a biologia pretende revelar a partir da descoberta dos me-
canismos moleculares a verdadeira natureza humana.
No capítulo 3 aborda-se os problemas decorrentes das relações entre
o homem e a técnica. Se, por um lado, é possível através do poder tecno-
lógico modificar a natureza humana, intervir na programação genética,
por outro lado, impõe-se do ponto de vista filosófico a questão do sentido
do desenvolvimento tecnológico. A ideia de progresso que acompanha a
concepção moderna ou iluminista (e neopositivista) de razão conduziu o

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Mente, Cérebro e Consciência

homem à irracionalidade (à guerra e à barbárie). Para Heidegger, a essência


da técnica não é técnica. O esquecimento do ser pela metafísica ocidental
produziu a tecnificação do pensamento – a dominação do homem sobre a
Natureza e sobre si mesmo. A história da metafísica representa a tentativa
do homem em apreender e conhecer a essência das coisas (dos entes). Já
para Jonas, o problema da técnica não tem origem na natureza metafísico
do pensamento, mas em seu uso. É a separação entre ética e técnica que
faz do poder técnico-científico um instrumento de domínio e de destrui-
ção do homem pelo próprio homem e do homem sobre a natureza. As-
sim, se em Heidegger a técnica é concebida como destino inexorável da
metafísica ocidental – expressão da lógica calculadora (dominadora) do
pensamento racional, em Jonas, a técnica é concebida como uma questão
ética e antropológica. Nesse sentido, a manipulação genética representaria
um retrocesso, ao invés de um progresso para a humanidade.
O Capítulo 4 aborda a racionalidade tecnológica e suas repercussões
sobre o pensamento humano. O avanço técnico produz mudanças no nos-
so modo de viver e de pensar. Os artefatos técnicos da era da eletrônica
pretendem redefinir a lógica de funcionamento do pensamento, a fim de
dispensar o homem da tarefa de pensar. Se, por um lado, a tecnologia da
informática facilita e simplifica o trabalho do pensamento, por outro lado,
é o próprio pensamento que parece sucumbir sob o peso da revolução tec-
nológica. O homo sapiens está se convertendo em homo faber. O pensamento
cedeu lugar à operação técnica, à manipulação. Ora, quando somos impe-
didos de pensar somos também impossibilitados de compreender não só
a realidade, mas o pensamento. Transformado em operação mecânica, o
pensamento converte-se em procedimento formal. O significado é subs-
tituído pela função; o conteúdo desaparece em lugar da forma lógica. A
formalização do pensamento determina o funcionamento lógico (a vali-
dade), mas não a verdade do pensamento. Esvaziado de seu conteúdo, o
pensamento funcional desconhece a si mesmo. Incapaz de transcender os
seus limites operacionais, a criticidade (e a reflexividade) do pensamento
sucumbem em favor da operacionalidade. A eficiência operacional decreta
a morte do pensamento; nega-lhe a autonomia (que consiste em resistir
criticamente contra as determinações que são alheias ou externas ao pen-
samento) em nome da automatização. A máquina eletrônica não é apenas
um instrumento do pensamento, mas a condição e o limite do pensa-
mento. A mecanização do pensamento substitui o sujeito pela máquina, a
intelecção (inteligência) pela informação (memória); a compreensão pela

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