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FREGUESIA DE NOSSA SENHORA IMACULADA CONCEIÇÃO DO PORTO DAS

CAIXAS VISTA ATRAVÉS DOS PERIÓDICOS: O ASSASSINATO DO CORONEL


ANTÔNIO JANSEN DO PAÇO E O CASO DOS RECRUTAS ACORRENTADOS.
Mirian Cristina Siqueira de Cristo1

RESUMO:
Partindo da análise e da problematização dos periódicos da freguesia de Nossa Senhora
Imaculada Conceição do Porto das Caixas e de outros onde ela foi citada, percebe-se a
importância que alguns fatos adquiriram, na localidade e fora dela, traçando assim algumas
características sociais e econômicas da região. A localidade, que no ano de 1856 contava com
uma população de 3000 almas, possuía três periódicos diferentes, tendo assim um periódico
para cada grupo de 1000 habitantes. Dentre as notícias publicadas, duas tiveram grande
repercussão e destaque nacional: O assassinato do coronel Antônio Jansen do Paço e o caso dos
recrutas acorrentados.
Palavras-chaves: Freguesia de Nossa Senhora Imaculada Conceição do Porto das Caixas-
Periódicos-Século XIX.

ABSTRACT:
Starting from the analysis and problematization of the periodicals of the parish of Our Lady of
the Immaculate Conception of Porto das Caixas and others where it was mentioned, one can
see the importance that some facts have acquired, in the locality and outside, thus tracing some
social and economic characteristics of region. The locality, which in the year 1856 had a
population of 3000 souls, had three different periodicals, thus having a newspaper for each
group of 1000 inhabitants. Among the published news, two had great repercussion and national
prominence: The murder of Colonel Antônio Jansen do Paço and the case of the recruits in
chains.
Keywords: Parish of Our Lady of the Immaculate Conception of Porto das Caixas- Periodicals-
XIX century.

1
Aluna do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu, curso de Mestrado em História da Universidade Salgado
de Oliveira/Niterói, RJ. E-mail: mirian.de.cristo.1978@gmail.com
A freguesia de Nossa Senhora Imaculada Conceição do Porto das Caixas, hoje atual
2º distrito do município de Itaboraí, RJ, foi constantemente citada nos jornais da província do
Rio de Janeiro e em outras províncias brasileiras no século XIX, em parte pela sua importância
comercial e política, mas principalmente, pelos periódicos locais, que eram distribuídos para
inúmeras partes do Brasil e serviam de base de notícias para outras publicações. Em uma
consulta a Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional, somente entre os anos de 1850 e 1859,
a freguesia de Nossa Senhora Imaculada Conceição do Porto das Caixas aparece em 4.100
ocorrências2, demonstrando além da relevância local, o uso dos periódicos da região para o
repasse de informações. O jornal O Popular Jornal Commercial, compilador, noticioso e de
annuncios3 era o mais utilizado para esse fim, sendo encontrado citações dele nos periódicos
Estrella do Amazonas,4 Correio Sergipense,5 Pedro II6, Publicador Maranhense,7 A Imprensa,8
todos em outras províncias. Também foi utilizado nas publicações da província do Rio de
Janeiro como fonte de notícias do interior do recôncavo da Guanabara, entre elas o Correio
Mercantil, e Instructivo, Politico e Universal, o Diário do Rio de Janeiro, A Pátria, O Correio
da Tarde, O Jornal do Commercio, O Parahyba e o Tyranno.9 Apesar no alto número de
publicações do periódico O Popular em outros jornais, ele não era o único da localidade, que
contava com mais dois: O Patriota e o Semanário. Em 1862, O Popular foi então substituído
pelo Echo Popular folha comercial, litteraria e política do Porto das Caixas.
Vale ressaltar o início da imprensa no Brasil e a importância adquirida por ela na
Colônia e Império. Aqui surgiu de forma permanente, mas censurada, após a vinda da família
Real portuguesa em 1808. Depois do fim da censura prévia, em 28 de agosto de 1821, os jornais
começaram a fazer parte de forma mais expressiva da vida privada dos brasileiros, tornando-se
intimamente ligados ao cotidiano das pessoas, que passaram a acompanhar os acontecimentos

2
Disponível em
<http://memoria.bn.br/DocReader/docmulti.aspx?bib=%5Bcache%5D61790.4142572.DocLstX&pesq=porto%2
0das%20caixas>. Acesso em 15 de outubro de 2016.
3
O Popular Jornal Commercial, compilador, noticioso e de annuncios, impresso na Typographia de Almeida &
Paula Azevedo, rua da Conceição, nº 1, freguesia do Porto das Caixas. Publicado todas as quartas e sábados de
manhã, a assinatura por seis meses custava 3$Rs e o avulso saía por 100$Rs e teve suas publicações mantidas do
ano de 1854 até 1862.
4
Estrella do Amazonas. Manaus: Nº 263, 17º trimestre, 23 de janeiro de 1858, p. 3.
5
Correio Sergipense. Aracaju: Anno XIX, nº 30, 21 de maio de 1856, p. 3.
6
Pedro II. Ceará: Anno XVII, nº 1772, 06 de fevereiro de 1858, p. 2.
7
Publicador Maranhense. São Luiz: Anno XIX, nº 2417, 23 de outubro de 1860, p. 2.
8
A Imprensa. São Luiz: Anno II, 02 de outubro de 1858, n°?, p. 3.
9
Fonte: Hemeroteca digital. Disponível em
<http://memoria.bn.br/DocReader/docmulti.aspx?bib=%5Bcache%5D45590.2826502.DocLstX&pasta=ano%20
185&pesq=o%20popular%20do%20porto%20das%20caixas>. Acesso em 23 de julho de 2016.
políticos e culturais.10 Pode-se classificar um processo de “ibero-americanização” da imprensa
iluminista europeia em terras brasileiras, onde o novo mundo repetiu de certo modo, as
características do velho mundo. Em um esforço para integrar as novas terras à civilidade
europeia, homens e algumas mulheres de letras utilizaram os jornais para um processo
civilizatório, passando a imprensa a ser um meio eficiente e poderoso de influenciar costumes
e a moral pública. Os próprios títulos constantemente utilizados nos jornais brasileiros,
“Monitores”, “Despertadores”, “Lanternas”, “Faróis”, “Auroras”, demonstram as
características que essas publicações assumiram, de portadores “da luz”, veículos da cultura,
progresso e liberdade. A leitura em voz alto, pública e privada tornou-se um hábito valorizado,
visto como manifestações de sociabilidade e de atributos de pessoas cultas, favorecendo aqueles
que estavam à margem da escrita. 11
Raquel Discini Campos afirmou que o jornalismo teve no século XIX uma força ímpar
no processo de transformações políticas, econômicas e sociais e especialmente culturais,
tornando-se impossível dissociar o modo e vida urbano triunfante e o aumento do número dos
periódicos publicados. Pela imprensa ecoavam ideais republicanos, urbanismo, sanitarismo,
higienismo, cosmopolitismo, feminismo, moda, elegância, progresso, nacionalismo e muitos
outros valores. Para Discini, a força da opinião pública dos periódicos penetrava não somente
no interior dos lares, mas também em espaços públicos ou não tão públicos, de sociabilização
urbana, nas ruas, praças, bares, estações, salões de moças. Jornais circulavam de mão em mão,
tornando-se fonte principal de notícias e de repasses ideológicos. 12
Partindo então da análise e da problematização dos periódicos da freguesia de Nossa
Senhora Imaculada Conceição do Porto das Caixas e de outros onde ela foi citada, percebe-se
a importância que alguns fatos adquiriram, na localidade e fora dela, traçando assim algumas
características sociais e econômicas da região, a começar pelo alto número de periódicos para
o período (século XIX). A localidade, que no ano de 1856 contava com uma população de 3000
almas, possuía três periódicos diferentes, tendo assim um periódico para cada grupo de 1000
habitantes. Essa situação deve-se principalmente ao fato da freguesia ser ponto de passagem de
tropas e viajantes e de possuir uma população flutuante.

10
SALES, Germana Maria Araújo. Folhetins: uma prática de leitura no século XIX. Revista Entrelaces, p. 45,
agosto de 2007. Disponível em <http://www.entrelaces.ufc.br/germana.pdf>. Acesso em 12 de outubro de 2016.
11
PALLARES-BURKE, Maria Lúcia Garcia. A imprensa periódica como uma empresa educativa no século XIX.
Cadernos de Pesquisa, n. 104, p. 146-150, 2013. Disponível em <
http://www.fcc.org.br/pesquisa/publicacoes/cp/arquivos/168.pdf> . Acesso em 14 de novembro de 2016.
12
CAMPOS, Raquel Discini de. No rastro dos velhos jornais: considerações sobre a utilização da imprensa não
pedagógica como fonte de escrita para a História da Educação. Revista Brasileira de História da Educação,
Campinas, São Paulo: V. 12, n. 1, p. 50-51, jan. /abr. 2012. Disponível em <
http://www.rbhe.sbhe.org.br/index.php/rbhe/article/view/320>. Acesso em 14 de outubro de 2016.
Apesar de todos os esforços da elite local em romper as “barbáries do Sertão” e tornar-
se civilizada, dois fatos ocorridos na região demonstraram que a linha entre o bárbaro e o
civilizado ainda era muito tênue no segundo reinado e que ideias de liberdade, educação, cultura
e religiosidade ainda se confrontavam com ações que não combinavam com a suposta
civilidade. O assassinato do coronel Antônio Jansen do Paço e o caso dos recrutas acorrentados
do Porto das Caixas foram algumas dessas ações.
O assassinato do coronel Antônio Jansen do Paço causou uma grande comoção na
província do Rio de Janeiro e em várias províncias do Nordeste brasileiro, já que ele tinha sido
deputado da província do Maranhão. Inúmeros jornais acompanharam o desenrolar do processo
contra o espanhol Romão Netto, o descrevendo como “fera do Porto das Caixas”:

No dia 13 andante, à tarde, foi barbaramente assassinado no lugar-Porto das


Caixas-distante da corte sete legoas, pouco mais ou menos, por um creado
hespanhol, Romão Netto, de 23 annos, o coronel Antonio Jansen do Paço, ex-
deputado à assemblea geral legislativa pela província do Maranhão, e um dos
empresários da estrada de ferro do Cantagallo. Acommedito o falecido pelo
agressor, pôde apenas lançar d’um cabo de vassoura, o qual, depois de
pequena luta, lhe foi arrancado pelo malvado, que completamente o subjugou,
levando-o d’encontro à um dos muros do jardim de sua casa. Ahi prostando-
o, e pondo-lhe um joelho sobre o estômago, e um pé sobre o pescoço, o
apunhalou por diversas vezes. Esta fera foi imediatamente presa.13

O periódico A Imprensa, de São Luís do Maranhão também relatou o assassinato do


coronel, com uma descrição mais complexa do crime e de sua motivação. Segundo A Imprensa,
o criado Romão Netto estaria desobedecendo às ordens da família do coronel, que descontente
o demitiu. Planejando com antecedência o crime, Romão Netto teria mandado consertar sua
pistola, que não ficou pronta a tempo e por isso teria comprado um canivete para executar o
crime. Ao ser chamado no escritório do coronel Antônio Jansen do Paço para tratar de sua
demissão, Romão teria entrado em luta corporal e assassinado a vítima com dois golpes no
coração e outro no pulmão, só sendo contido pelo vizinho da família, um marceneiro que ao
ouvir os gritos, foi ao socorro do coronel. Romão Netto foi preso e levado para a cadeia da vila
de São João de Itaborahy. Para isso contou com uma escolta de 20 guardas nacionais. 14
Os jornais da província do Rio de Janeiro e de outras províncias continuaram a
acompanhar de perto o desenrolar do processo de Romão Netto. O periódico A Imprensa do dia
13 de fevereiro de 1858 e o Publicador Maranhense do dia 15 de fevereiro de 185815 relataram

13
Pedro II. Ceará: Anno XVII, nº 1772, 06 de fevereiro de 1858, p. 2.
14
A Imprensa. São Luís: Anno II, nº 12, 10 de fevereiro de1858, p. 1-2.
15
Publicador Maranhense. São Luís: Anno XVI, nº36, 15 de fevereiro de 1858, p.1-3.
a petição de queixa contra o réu. Nessa petição foi narrado que o réu Romão Netto morava com
a família da vítima há pelo menos um mês e que desde o início seu comportamento causou
desconforto na esposa do coronel Antônio Jasen do Paço e em suas filhas, sendo demitido por
essa causa poucos dias após a sua admissão. O acusado então procurou o coronel várias vezes
e pela insistência conseguiu seu emprego de volta, retornando então a ter uma conduta
“desrespeitosa e altaneira”. Assim, ficando impossível a convivência entre o criado e a família,
novamente o réu foi demitido. Na petição foram descritos os depoimentos das oito testemunhas,
todas acusando Netto de cometer o assassinato e do réu, que alegou inocência. Romão Netto
afirmou que seu patrão anterior Willians, o colocou para trabalhar como correeiro, função a
qual não se adaptou, permanecendo por algum tempo sem emprego. A irmã de Willians, então
esposa do coronel Paço, vendo-o sem emprego, o convidou para trabalhar na casa da família.
Netto relatou que nunca teve problemas antes de ser tirado do serviço de casa para ser correeiro,
mas que sempre foi muito maltratado por todos. Romão Netto descreveu os fatos do dia do
assassinato do coronel, dizendo que o esperava juntamente com o outro criado para receber os
dias trabalhados, além das roupas que a esposa da vítima negava em devolver, ameaçando de
mandar dois negros “meter-lhe o vergalho”. Segundo Netto, o coronel respondeu que estava
muito ocupado e irritado o espantou com um pau de vassoura. Romão Netto continuou a
narrativa, afirmando que não atingiu o coronel em nenhum momento com o canivete e que nem
viu cadáver algum, só ficando sabendo do assassinato após ser detido pelo sargento do Porto
das Caixas. 16
Romão Netto foi julgado e sentenciado a forca, sendo executado no Porto das Caixas
dois anos após a sentença. Nem mesmo a intervenção do ministro espanhol, que ameaçou acusar
as autoridades brasileiras de conduzir seu compatriota ao tribunal sem lhe dar o direito a um
defensor surgiu efeito.17 Netto não teve defesa porque, segundo o presidente do júri do Porto
das Caixas, todos os advogados da Corte se negaram a representá-lo.18 Foi o único
enforcamento que ocorreu na freguesia. 19 O acontecimento que mais marcou a população na
execução, foi o fato de Romão Netto não ter esperado pelo carrasco: pulou com tanta força do
patíbulo que a corda não aguentou e rompeu, fazendo com que caísse agonizante no chão. O
carrasco então o submeteu novamente a um outro enforcamento. Romão Netto foi enterrado no

16
A Imprensa. São Luís: Anno II, nº13, 13 de fevereiro de 1858, p.2-4.
17
A Imprensa. São Luís: Anno II, nº?, 02 de outubro de 1858, p.3.
18
O Tyranno. Rio de Janeiro: Anno II, nº11, 17 de abril de 1858.
19
MAGALHÃES, João de. Reminiscências do Porto das Caixas. Arquivo do Centro de Memória da Casa de
Cultura Heloísa Alberto Torres. Itaboraí, Rio de Janeiro: p. 18, março de 1944. Consulta no dia 23 de março de
2016.
cemitério da vila de Macacu, pois seu último pedido foi que não queria de forma alguma ter seu
corpo nas terras de S. João de Itaborahy ou da freguesia de Porto das Caixas. 20 A população
local tentou intervir a favor do espanhol, apelando para a Imperatriz Dona Tereza Maria
Cristina, mas a suspensão da execução, devido à distância e a falta de telégrafos, só chegou
após o enforcamento.21
A sentença foi criticada por muitos, que viram como algo bárbaro, desajustado com a
modernidade que o país estava adquirindo.22 O que se percebeu com a observação do desenrolar
do assassinato do coronel Antônio Jansen do Paço através dos periódicos da época foi, além da
grande comoção que o assassinato de um político influente causou na sociedade, a força da
opinião pública que transformou Romão Netto, através dos relatos do crime, em “fera do Porto
das Caixas”, fato que fez com que os advogados da província se negassem a defendê-lo.
Também pode ser analisado a abrangência nacional dos periódicos locais, principalmente do O
Popular Jornal Commercial, compilador, noticioso e de annuncios, que foi utilizado como
fonte de notícias sobre o crime, julgamento e sentença para os jornais das províncias do Norte
e Nordeste do Brasil. Ademais, percebeu-se o movimento de algumas publicações contra a pena
de morte ainda em vigor no país, ato que segundo esses periódicos nos distanciava da civilidade
e nos aproximava da barbárie.
Outro acontecimento relatado nos periódicos que causou críticas e comoção foi o “caso
dos recrutas acorrentados do Porto das Caixas”. Caio Prado Júnior, em seu livro Formação do
Brasil Contemporâneo descreveu o recrutamento para tropas durante a fase colonial e no
Império como “maior espantalho da população”, causador de grande temor. Não existia critério
algum para o recrutamento, organização regular e dependendo das necessidades fixadas nos
quadros, saíam os recrutadores a caça “das vítimas”, não existindo lugar nem hora apropriadas.
Entravam por dentro das casas, forçando janelas e portas e até mesmo as escolas eram invadidas
para arrancar delas estudantes. Quem era encontrado e julgado ter condições de tomar as armas
era levado à força para servir. 23 A corte não hesitava em sobrecarregar com violência os
recrutamentos.24 Assim ocorreu com os recrutas citados nos periódicos O Tynanno e o Diário
do Rio de Janeiro, todos os dois usando como fonte o jornal local O Popular:

20
Publicador Maranhense. São Luís: Anno XIX, nº 2417, p.2.
21
MAGALHÃES. João de. Reminiscências do Porto das Caixas...p.18.
22
Novo e Completo Índice Chronologico da História do Brasil, p.178, Jan.1857-dez.1864.
23
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil Contemporâneo: colônia. São Paulo: Ed. Brasiliense, p. 310-
311, 1994.
24
DIAS, Maria Odília Leite da Silva. A interiorização da Metrópole e outros estudos. São Paulo: Alameda, p.
35, 2005.
Lê-se no Popular do Porto das Caixas:
Na manhã de 30 de abril findo encontrámos, com dôr no nosso coração, a
cinco cidadãos acorrentados em uma só corrente pelo pescoço: maravilhados
com similhante sena, paramos e pedimos ao camarada que fechava similhante
préstito, nos dissesse si eram criminosos importantes; a resposta foi: São
recrutas vindo de Cantagallo! E lá seguiram o caminho esses infelizes
acorrentados, para servirem à pátria!25

Após a independência, a Constituição de 1824 determinou que a assembleia geral do


Império, além de ser responsável pelos recrutamentos, também possuía a função e estabelecer
anualmente, o tamanho das forças de terra e de mar, em situações ordinárias e extraordinárias.
Essas determinações reforçaram as decisões contidas em uma lei feita em 1823, onde estava
prescrito que os comandantes de armas eram totalmente sujeitos aos governadores provinciais,
exceto em relação à disciplina, a administração e o comando das unidades militares. A união
dessas determinações transferiu a atribuição de completar as fileiras do exército da esfera
militar, para a esfera civil, degenerando o recrutamento especialmente no âmbito das
províncias. Passou a ser utilizado como perseguição política e pessoal, resultando em cenas
vergonhosas,26 como as descritas no periódico O Popular e repassada para demais jornais. Era
o recrutamento “pau e corda”.
Para o alistamento no exército concorriam além dos voluntários, em um número
pequenos, os forçados a sentar praça,27 criminosos, vadios e outros elementos que as
autoridades queriam se livrar, utilizando para isso o serviço militar. Quando o número não era
suficiente, lançava-se então a mão do recrutamento.28 No relatório do ano de 1858, feito pelo
então ministro e secretário de Estado dos negócios da guerra, Jeronymo Francisco Coelho, foi
apresentado o decreto nº 2171 de 1º de maio de 1858, onde estava o regulamento de como
deveria ocorrer o recrutamento, admitindo o uso da força para se conseguir recrutas:

Art.4.º Nas mesmas circumstâncias, e dentro dos dous primeiros mezes da


época de cada anno fixada para o recrutamento, serão recebidos como
voluntários os indivíduos que se oferecerem para o serviço militar, e no fim
do dito prazo se procederá o recrutamento forçado, na forma das leis em vigor,
para completar-se em cada freguezia o número de recrutas que lhe tiver cabido
na distribuição, mas nem por isso deixarão de ser recebidos durante todo o

25
Diário do Rio de Janeiro: Anno ?, nº 150, 13 de maio de 1858, p. 1.
26
MARTINS, Francisco José Corrêa. Vida na caserna: as praças no Exército Brasileiro durante o século XIX. In:
RODRIGUES, Fernando da Silva; FERRAZ, Francisco; PINTO, Surama Conde Sá (Orgs.). História Militar:
Novos caminhos e novas abordagens. São Paulo: Paco Editorial, p.98-99, 2015.
27
Grifo nosso.
28
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil Contemporâneo: colônia...p. 310.
anno os que se apresentarem voluntariamente. Em cada anno, na época do
recrutamento, se publicará nas freguezias um edital conforme o modelo n.1. 29

Percebe-se que o recrutamento forçado foi utilizado para completar o número


destinado de recrutas para cada freguesia. Com o número pequeno de voluntários, esse sistema
de recrutamento foi recorrente. No mesmo decreto, foi demonstrado a força da esfera civil nos
recrutamentos, deixando transparecer que existiam representantes nas freguesias e vilas e que
era atribuição do presidente da província destinar um local para receber os recrutas:

Art.13.º Os encarregados do recrutamento nas freguezias remetterão os


recrutas, que fizerem, ao engarregado do recrutamento na villa do seu termo
ou na cabeça da comarca, o qual os enviará com segurança e commodidade
para a capital da província, ou para o lugar que lhe for indicado pelo respectivo
presidente, attendendo às distâncias e á maior facilidade das comunicações. 30

“Envio com segurança e comodidade” não combinavam bem com as descrições da


época sobre o processo de recrutamento e transporte. Era comum a ordem dada a todos os
soldados de um regimento, de deter quantas pessoas estivessem em seu alcance, com as únicas
limitações de serem brancas e não militares, existindo uma tolerância aos mulatos. Todos os
detidos eram levados as cadeias e aos corpos da guarda e somente lá se realizava a seleção de
quem estava apto ao serviço militar. 31 Para piorar o quadro do recrutamento forçado, ficou
estabelecido que os encarregados das freguesias receberiam por cada recruta que conseguissem,
apto para servir, a quantia de 10$Rs e por cada voluntário 20$Rs, sendo responsabilidade da
província pagar essas gratificações,32 fato que contribuiu para o aumento da “caça os recrutas”.
O periódico O Tyranno fez uma análise profunda sobre o recrutamento forçado a partir
do relato descrito no O Popular. O Tyranno se auto descrevia como “ter o fim principal de
pugnar pela humanidade,” aceitando “toda e qualquer publicação com inteiro segredo”,
condição que favoreceu o grande número de críticas ao governo imperial e que coloca em
questão a veracidade de algumas informações nele contidas. Ocupando quase uma página e de
autoria de Remigio de Sena Pereira (o autor não decidiu pelo anonimato), o caso dos recrutas

29
BRASIL. Relatório apresentado a assembléa geral legislativa na primeira sessão da decima legislatura pelo
ministro e secretario de Estado dos negócios da guerra, Jeronymo Francisco Coelho. Rio de Janeiro: Typoghaphia
Universal de Laemmert, p. 1, 1858.
30
BRASIL. Relatório apresentado a assembléa geral legislativa na primeira sessão da decima legislatura pelo
ministro e secretario de Estado dos negócios da guerra, Jeronymo Francisco Coelho. Rio de Janeiro: Typoghaphia
Universal de Laemmert, p. 2, 1858.
31
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil Contemporâneo: colônia...p.311.
32
BRASIL. Relatório apresentado a assembléa geral legislativa na primeira sessão da decima legislatura pelo
ministro e secretario de Estado dos negócios da guerra, Jeronymo Francisco Coelho. Art.20.º. Rio de Janeiro:
Typoghaphia Universal de Laemmert, p. 3, 1858.
acorrentados do Porto das Caixas foi classificado de “caçada humana”. Na publicação, foi
demonstrada a indignação com esse tipo de recrutamento, “que não poupava nem o ancião, nem
o pai de família, nem o filho único e muito menos o lavrador. Até o estrupiado não ficava
salvo”. Além disso, a coluna colocou em debate o prejuízo para a nação em se retirar o
camponês de seu serviço para colocá-lo nos quartéis, onde seu trabalho seria de menor valor
para o país do que o exercido na lavoura. Usando os recrutas acorrentados do Porto das Caixas
como exemplo, o recrutamento forçado foi severamente criticado pelo autor, afirmando que
essa prática era comum no Brasil, relatando como era feito o transporte dos recrutas: se viessem
por terra, mãos amarradas como “escravos fugidos”, acorrentados uns aos outros igualando-os
aos criminosos, movidos a chibatadas; se o caminho fosse pelo mar, eram lançados nos porões,
presos pelos pés com ferros. Concluiu o desabafo perguntando como poderia servir bem a uma
nação um recruta que começava nessas condições e que era preciso rever com urgência essa
prática para se conseguir soldados.33
A indignação causada por esse caso em particular, refletiu um descontentamento que
ocorria em todo o território nacional e em alguns outros países, que também se utilizavam do
recrutamento forçado. Com o número limitado de voluntários e o pouco contingente do exército
brasileiro, para as autoridades não restavam outras opções em se conseguir o número necessário
de praças que um país com a enorme extensão territorial necessitava. Os periódicos assumiram
bem a função de “expor a aversão contra os meios bárbaros de recrutamento” e de fazer uma
crítica ao governo imperial, demonstrando as opiniões sobre o tema de parte da população
brasileira.
Os periódicos observados, em especial O Popular Jornal Commercial, compilador,
noticioso e de annuncios permitiram realizar uma leitura social e econômica da freguesia de
Nossa Senhora Imaculada Conceição do Porto das Caixas. O alto número de periódicos
demonstraram a intenção de integrar a região “ à civilidade”. Esse número estava relacionado
com a vida urbana triunfante da freguesia, que contava com três publicações locais. O Popular
adquiriu grande significância na província do Rio de Janeiro e em outras, repassando as notícias,
os costumes e as ideias da região. A observação de algumas publicações revelou muito sobre a
localidade, que era em suma comercial, escravista, mas que queria estar longe da barbárie e
próxima da civilização.
A análise desses dois acontecimentos, o assassinato do coronel Antônio Jansen do
Paço e o caso dos recrutas acorrentados, através dos periódicos possibilitaram a percepção que

33
O Tyranno. Rio de Janeiro: Anno II, nº 24, 17 de julho de 1858, p.3.
a morte de um importante político poderia mover a opinião pública a ponto de todos os
advogados da corte se negarem a defender o réu, mas que parte da população também não
aceitava a pena de morte ainda em vigor; que a utilização da força e correntes para conseguir
praças não eram mais admitidos por alguns grupos, que aceitavam essa mesma forma de trato
com os escravos.
A indignação causada pelo caso em particular dos recrutas acorrentados, refletiu um
descontentamento que ocorria em todo o território nacional e em alguns outros países, que
também se utilizavam do recrutamento forçado. Com o número limitado de voluntários e o
pouco contingente do exército brasileiro, para as autoridades não restavam outras opções em se
conseguir o número necessário de praças que um país com a enorme extensão territorial
necessitava. Apesar do recrutamento do exército brasileiro imperial ser constantemente
lembrado nos estudos referentes a guerra do Paraguai, ele já existia de forma violenta anterior
a guerra, causando indignação da população por sua forma truculenta de se conseguir praças
para compor suas fileiras. O caso dos recrutas acorrentados do Porto das Caixas demonstra bem
essa indignação, aqui expressa em forma de notícias e colunas dos periódicos da época. Os
periódicos assumiram a função de “expor a aversão contra os meios bárbaros de recrutamento”
e de fazer uma crítica ao governo imperial, demonstrando as opiniões sobre o tema de parte da
população brasileira. Os progressos e as transformações dos periódicos não podem ser
observados de forma independente da História social e econômica que os encaixam. A posição
de instrumento cultural estava relacionada em cada caso às situações particulares do momento
e do espaço em que ocorreram.
Essas discordâncias ideológicas locais na verdade refletiam a agitação que o Império
vivia, com ideais republicanos, abolicionistas em choque com os defensores da escravidão e da
monarquia. O palco das divergências era os periódicos, que no século XIX adquiriram uma
força ímpar no processo de transformações políticas, econômicas e sociais e especialmente
culturais.
REFERÊNCIAS:
Fontes:

A Imprensa. São Luís: Anno II, nº 12, 10 de fevereiro de1858, p. 1-2.

A Imprensa. São Luís: Anno II, nº?, 02 de outubro de 1858, p.3.

A Imprensa. São Luís: Anno II, nº13, 13 de fevereiro de 1858, p.2-4.

A Imprensa. São Luiz: Anno II, 02 de outubro de 1858, n°?, p. 3.

BRASIL. Relatório apresentado a assembléa geral legislativa na primeira sessão da decima


legislatura pelo ministro e secretario de Estado dos negócios da guerra, Jeronymo Francisco
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