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Definição:

1- A justiça administrativa foi defendida pela sua finalidade,como o conjunto das garantias dos
particulares contra as atuações ilegítimas da administração que ofendessem os seus direitos
ou interesses.

Essa identificação correspondia à reacção contra a realidade oitocentista de uma


administração centralizada, e decorria de uma pré-compreensão liberal, que concebia a
administração ativa como o inimigo potencial das liberdades, considerando a protecção dos
direitos dos particulares como a finalidade exclusiva do princípio da igualdade administrativa.

2- A existência de litígios judiciais de que os particulares estão ausentes: litígios que surgem
nas relações entre os entes administrativos- cada vez mais prováveis em virtude da
complexidade organizativa, designadamente da pluralidade de administração resultante dos
processos de descentralização ou desconcentração personalizada, de delegação de funções, de
privatização formal e de reconhecimento de situações de independência-orgânica = a até
litígios inter-orgânicos, dentro da mesma pessoa coletiva, e inter-orgânicos, quando estão em
causa direitos dos membros de órgãos colegiais.

A instituição da justiça administrativa não se justifica integralmente em função da defesa dos


direitos dos cidadãos: a garantia jurisdicional da legalidade ( da juridicamente) da
administração também serve da prossecução do interesse público definido ao nível político-
legislativo que constitui a finalidade necessária e própria da atividade administrativa- essa
parece ser até a concepção mais conforme aos princípios fundamentais da administração
pública tal como estão consagrados no art. 266 da CRP.

Ao definir o âmbito da justiça administrativa, a constituição opta por uma fórmula substancial,
e não finalística, referindo-se ao "julgamento de todas as acções e recursos que tenham por
objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas" ( art.212 n3).

Apesar da constituição distinguir a prossecução do interesse público como finalidade principal


da administração pública, preocupa-se especialmente, no plano das garantias institucionais,
em assegurar o acesso dos administrados à justiça administrativa para tutela dos seus direitos
e interesses legalmente protegidos ( art. 268 n4 e 5).

Valerá porventura como base normativa para a afirmação de que a protecção efectiva dos
direitos dos administrados constitui o núcleo essencial ou, pelo menos, o domínio típico da
justiça administrativa.

3- as diferentes dimensões da instituição, que a determinam sob vários aspectos: substancial


ou material- quais são os litígios que lhe cabe, em princípio, resolver; funcional- como se
caracteriza a função exercida; orgânica- processual- por que os tribunais e segundo que
processo atua.

A justiça administrativa poderá apresentar-se como o conjunto institucional ordenado


normativamente à resoluçãode questões de direito administrativo, nascidas de relações
jurídico-administrativas, atribuídas por lei à ordem judicial administrativa, para serem julgadas
segundo um processo administrativo específico.
4- a designação " justiça administrativa", que preferimos aqui à designação tradicional de "
contencioso administrativo".

Por um lado, o processo contencioso já vinha sendo referido ao controlo jurisdicional da


legalidade administrativa; por outro lado, a expressão contencioso administrativo tem o seu
favor o peso da tradição e a circunstância de sublinhar o carácter especial ou especializado, em
alguns dos seus aspectos, da instituição que controla e garante a juricidade da atuação
administrativa.

5- problemas da justiça administrativa: são problemas da justiça administrativa os que


respeitam à função judicial de fiscalização da administração pública, envolvendo, além da
própria definição do contrato e dos contornos da instituição, a determinação e a harmonização
dinâmica dos princípios da juricidade e da separação de poderes: trata-se ainda de problemas
de "direito administrativo material "

Por outro lado, a justiça administrativa implica a existência de um " serviço público" de justiça,
sendo, por isso, objecto normativo de duas disciplinas: do " direito judiciário administrativo",
no que respeita à organização dos tribunais; do " direito processual administrativo ", no que
toca às relações processuais e ao regime geral do funcionamento da jurisdição.

modelos que têm sido adotados no espaço euro-continental ou latino-germânico: pressupõe


um sistema de administração executiva ou de ato administrativo, dotado de um direito
especial, diferente do direito comum , em que a lei regula primariamente termos substancias a
atividade administrativa e atribui à administração autoridade para, dispondo em regra de um
espaço próprio de avaliação, tomar decisões unilaterais obrigatórias para os particulares
,conformadoras da respetiva esfera jurídica , dotadas de força executiva e suscetíveis de, salvo
nulidade, adquirirem a estabilidade de caso resolvido se não forem impugnadas dentro de
certo prazo – isto é um sistema diferente do modelo inglês de “administração judiciária”.

1- A alternativa entre os modelos: objetivismo e subjetivismo: a comparação baseia-se em dois


critérios distintivos fundamentais: por um lado, a função do contencioso –visa-se, em 1ª linha,
a defesa da legalidade e do interesse público? ou a tutela de “direitos” (de posições jurídicas
substantivas individualizadas ) dos particulares? – e por outro lado, no que respeita à
impugnação de decisões administrativas, o objeto do processo- é um processo feito a atos, em
que está em causa verificar a legitimidade do exercício do poder administrativo? Ou julga-se a
alegada lesão das posições jurídicas subjetivas do administrador?

Na colocação e resolução atual do problema da opção entre modelos devem, assim,


considerar-se como dados ou pressupostos, que não estão em discussão, os seguintes: a) o
entendimento de uma clara divisão de poderes e de funções entre a administração e os
tribunais – o desenvolvimento de um controlo judicial da legalidade administrativa e a
superação dos modelos “administrativistas” de organização do contencioso; b) o tipo e o grau
de vinculação jurídica da atividade administrativa – a transformação do principio da legalidade
originário num principio de juridicidade da administração (incluindo o principio da precedência
da lei ou da reserva global da função legislativa e o respeito pelos princípios constitucionais); c)
o conceito de interesse público- a transformação de uma grandeza que começou por ser
entendida como reserva extrajurídica da Administração e agora é vista como a expressão
politico-legislativa do interesse comunitário, que constitui a finalidade que justiça e vincula a
função administrativa; d) as garantias dos administrados – a insuficiência das impugnações
administrativas, bem como do recurso contencioso de anulação dos atos administrativos, no
contexto de uma administração intervencionista , de prestação e de garantia, e tendo em
conta a consagração constitucional de um direito fundamental dos cidadãos de acesso pleno e
efetivo à justiça administrativa.

De facto, a opção atual por um modelo processual de justiça administrativa há-de referir-se ao
contexto resultante da evolução referida, visto que, todos hoje aceitam: a)que o processo
administrativo, é, na sua essência, um processo jurisdicional e, por isso, um litígio entre partes
– designadamente, ninguém, sustenta, que o processo seja a continuação do procedimento
administrativo que gerou o ato , ou que o particular recorrente tenha aí uma mera posição de
facto subordinada; b) que a administração tem o dever de executar as sentenças dos tribunais
– já que não aceita que a Administração tenha liberdade para cumprir ou não a sentença;
c)que os modelos organizativos administrativistas estão ultrapassados - ninguém defende que
o poder de decisão em matéria de contencioso administrativo deve caber em última instância
a órgãos políticos, ainda que supremos , ou a órgãos administrativos, ainda que
independentes, ou sequer a tribunais especiais, com menos garantias de independência face à
Administração. Por isso, a grande diferença que continua a existir entre os modelos é a do
ponto de partida para a construção do sistema, isto é, da função central da justiça
administrativa, conforme se vise, primacialmente, a defesa da legalidade ou juridicidade
administrativa, ou se pretenda, principalmente, assegurar a proteção dos direitos dos
particulares.

2. os modelos organizativos: na história do contencioso administrativo distinguiram-se três


modelos básicos de organização, se tomarmos como critério os sujeitos a quem foi sendo
atribuída a competência para decidir: órgãos da administração ativa, tribunais ou autoridades
“judiciárias”: A) modelo administrativista – chamado de “administrador-juiz”, de “autotutela”
ou de “jurisdição reservada” ou “conservada”- em que a decisão final dos litígios
administrativos compete aos órgãos superiores da administração ativa. Foi o modelo liberal,
típico dos primórdios do sistema de administração executiva, fortemente centralizado no
governo e em que, o “contencioso administrativo “ era visto como instrumento de realização
do interesse público, na época concebido como interesse do Estado, estranho aos interesses
individuais que compunham as relações sociais e regulado segundo normas especiais. O
modelo baseava-se em conceções de separação dos poderes que postulavam o caráter livre da
atividade executiva estadual, fosse por privilégio monárquico, fosse por vinculação do
Executivo ao Parlamento. B) Modelo judicialista, em que a decisão das questões jurídicas
administrativas cabe a tribunais integrados numa ordem judicial – de acordo com o principio
de que “julgar a administração é verdadeiramente julgar”- quer se trate de tribunais comuns
ou especializados em razão de matéria. É o modelo atual, que parte do principio que toda a
atividade administrativa, mesmo nos momentos discricionários, está subordinada ao Direito e
que atribui aos tribunais a competência para conhecer todos os litígios emergentes de relações
jurídicas administrativas interpessoais. C) Modelo judiciarista ou quase-judicialista- e, regra
chamado de “jurisdição delegada” ou “transferida”- em que a resolução dos litígios relativos à
administração, por não ser substancialmente estranha à função jurisdicional, cabe a
autoridades “judiciárias”, que são os órgãos administrativos independentes, alheios à orgânica
dos tribunais, apesar da sua designação como “tribunais administrativos”. É temporal e
culturalmente, um modelo intermédio na transição dos modelos administrativistas para os
modelos judicialistas.

A história do contencioso administrativo revela, porém, que há que ter em conta ainda dois
tipos de modelos mistos: D)o modelo administrativista mitigado, em que a decisão sobre as
questões contenciosas cabe a órgãos superiores da administração ativa, mas implica um
procedimento jurisdicionalizado com a intervenção consultiva obrigatória de um órgão
administrativo independente , cujo parecer era, ou não, homologado por aqueles órgãos; E) o
modelo judicialista mitigado, quando as sentenças dos tribunais (especializados ou mesmo
comuns), apesar da competência decisória destes, não tem força executiva fortemente
limitada perante a Administração.

Pode dizer-se contudo, que os modelos administrativos, puros ou mitigados, já não existem
atualmente e que a generalidade dos países adotou modelos organizativos judicialistas-
mesmo em França, onde em função do prestígio fundador do Conseil d´État, ainda subsiste
(embora só ao nível supremo) um modelo de justiça delegada, este aproxima-se fortemente na
prática do modelo judicialista de tribunais especializados. Desde a 2ª metade do século XX, em
face das transformações acima referenciadas, tornou-se inquestionável, a jurisdicionalização
plena do contencioso administrativo, embora, isso não signifique uma homogeneização dos
sistemas, já que as tradições nacionais continuam a marcar as soluções estabelecidas.

3- Os modelos processuais (ou operativos) mais marcantes da justiça administrativa: no


continente europeu, embora com variantes, predominou um modelo tradicional , conhecido
como” modelo francês”, que se desenvolveu em França a partir da revolução de 1789, e que
em termos simplificados ou estilizados, apresenta as seguintes caraterísticas típicas: A)exige-
se, com base numa ideia radical de separação dos poderes um contencioso especial para a
atuação de direito público da Administração, subtraído à lógica própria dos tribunais judiciais e
atribuídos a “tribunais administrativos”- que não são, em regra, verdadeiros tribunais, mas
órgãos administrativos independente ou “quase-tribunais”, embora atuando segundo um
processo jurisdicionalizado; B) no âmbito do contencioso administrativo prescreve-se a
existência de um domínio nuclear, de contencioso administrativo comum, constituído pelo
recurso de anulação de decisões administrativas , o recours pour excés de pouvoir- um recurso
que apesar da não judicialização, tende a ser de mera legalidade, sucessivo (pressupõe uma
decisão administrativa prévia, real ou em situações de omissão. Ficcionada como ato de “tácito
“ou silente) e limitado (por um lado porque não são plenos os poderes de cognição e de
decisão do juiz, que só pode anular o ato; por outro lado, porque há dificuldades em obter a
execução das sentenças contra a Administração). A este contencioso “natural” a lei pode
juntar, a título de complemento segundo um principio enumerativo , outros meios de ação em
tribunal, designadamente em matéria de contratos administrativos e de responsabilidade civil,
um contencioso dito de “plena jurisdição” mas onde, apesar disso, há certos limites, como a
sujeição ao principio da decisão administrativa prévia e a impossibilidade de injunções diretas
à Administração; C)fixa-se um regime processual de natureza fundamentalmente objetivista,
considerando-se o recurso de anulação como “um processo feito a um ato” ou como um
“conflito a propósito de um ato “, destinado em primeira linha a fiscalizar a legalidade do
exercício autoritário de poderes administrativos, em que os recorrentes particulares
desempenham a função de auxiliares da legalidade, porque interessados no resultado.

No entanto, em face de evolução do direito administrativo e em certo momento, por


influência das conceções anglo-saxónicas, emergem novas intenções, associadas à ideia de
uma” proteção judicial plena e efetiva” dos administrados, que propugnam por um modelo
predominantemente subjetivista- que se pode designar por “modelo alemão”. Procura-se
deste modo, a par de uma densificação substancial e procedimental da fiscalização judicial da
atividade administrativa, designadamente no que respeita à limitação dos poderes
discricionários: A)a jurisdicionalização total (material, processual ou orgânica) do contencioso
administrativo, isto é, a instituição de uma verdadeira “justiça administrativa” dentro da lógica
própria comum a todos os tribunais, embora em regra, com separação orgânica da jurisdição
comum; B)o desenvolvimento dos meios de ação de jurisdição plena (ações em que o juiz
dispõe de poderes de decisão diversificados e efetivos, anulatórios, declarativos,
condenatórios, cautelares), quando estejam em causa e na medida em que sejam lesados
direitos (posições jurídicas subjetivas) dos cidadãos, a fim de lhes garantir uma proteção
judicial efetiva em todas as situações, independentemente da prática de atos administrativos-
deixando de se reconhecer o principio da enumeração e o recurso contencioso de anulação
como o núcleo essencial do sistema; C)em geral, a acentuação dos aspetos subjetivistas no
processo administrativo, enquanto processo de partes, por exemplo, no que respeita à
legitimidade, aos poderes e deveres processuais das partes, ao uso dos meios cautelares, aos
efeitos de sentença, aos limites do caso julgado, ou à execução das decisões judiciais.

A evolução da generalidade dos sistemas aponta claramente no sentido de uma


subjectivização da justiça administrativa, tendo em conta, a comprovada insuficiência dos
modelos objetivistas clássicos para assegurar uma proteção judicial efetiva dos direitos e
interesses legalmente protegidos dos particulares, cuja importância se desenvolveu
exponencialmente, acompanhando o alargamento da intervenção administrativa a todas as
esferas da vida social. Não pode ignorar-se, porém, que cada um dos modelos tem as suas
vantagens e desvantagens, e que, se ninguém contesta que o modelo subjetivista fornece uma
proteção mais intensa aos administrados que sejam titulares de direitos perante a
Administração, tem de se reconhecer igualmente que o modelo objetivista oferece garantias
mais amplas de defesa da legalidade, especialmente, em extensão, na medida em que tende a
alargar a legitimidade para o acesso aos tribunais, seja contra atos individuais, seja contra
normas, tanto na ação particular como sobretudo, na ação coletiva, na ação pública e na ação
popular.

De facto, não podemos esquecer, por um lado, que a finalidade da justiça administrativa, há-
de ser assegurar a juridicidade da atividade administrativa e que esta não se reduz à proteção
jurídica dos direitos e interesses dos particulares que se dirigem aos tribunais, inclui também,
senão principalmente, a garantia da prossecução do interesse público e de diversos interesses
comunitários, bem como interesses individuais de outros particulares. Além de que, sendo a
atuação administrativa muitas vezes favorável aos particulares, há que acautelar o interesse
público contra a concessão de vantagens ilegais ou ilegítimas, designadamente quando
resultem de conluio entre os titulares dos órgãos e os interessados. Por outro lado, tem de
reconhecer-se que, mesmo do ponto de vista dos direitos e interesses dos privados, o modelo
objetivista também apresenta alguns aspetos vantajosos, até porque a consideração da
administração como poder não é apenas fonte de potenciais privilégios, significa igualmente a
existência de especiais deveres ou limitações que resultam em favor dos administrados, numa
perspetiva ferroviária da história, que o objetivismo pertence ao passado, e que o subjetivismo
representa o futuro: a necessidade de asseverar os direitos individuais contra a Administração
não pode fazer esquecer as realidades atuais da extensa difusão de utilidades e da intensa
intercomunicação de solidariedades, que geram situações de grande complexidade de
interesses, públicos e privados, e apontam para uma nova legalidade social exigindo, uma
reação efetiva contra normas lesivas do interesse público, bem como mecanismos
institucionais, coletivos e comunitários para a sua realização. Por isso mesmo, nos países do
modelo alemão, sempre existiu e se nota hoje, a vários propósitos alguma pressão no sentido
da acentuação das dimensões objetivistas do sistema.

O atual sistema de justiça administrativa- o quadro constitucional da justiça administrativa:

Apesar de a constituição pôr acento tónico na garantia dos direitos e interesses legalmente
protegidos dos administrados, limitando a própria garantia do recurso de anulação aos
titulares dessas posições jurídicas subjetivas, tal não deve ser interpretado como imposição
constitucional de um modelo estritamente subjetivista de justiça administrativa. A constituição
quis estabelecer as garantias dos administrados – com a intenção de assegurar uma proteção
plena perante a administração dos seus direitos e interesses legalmente protegidos- mas não
pretendeu impor um modelo processual determinado. A concretização desse modelo compete
ao legislador que, no uso da sua liberdade constitutiva, pode optar entre diversas fórmulas de
instituição da justiça administrativa, desde que respeite o quadro constitucionalmente
estabelecido- concretamente o modelo organizatório judicialista e a proteção efetiva dos
direitos dos administrados. O art268º da CRP, até pelo seu lugar sistemático, não pretende
estabelecer uma regulamentação global da justiça administrativa, mas apenas definir as
garantias dos administrados mas as suas relações com a administração - em especial, o
princípio da justiciabilidade dos atos de administração, assegurado por um direito fundamental
específico de acesso aos tribunais administrativos,num direito a um procedimento.

Não é concebível que o art268º contenha uma proibição ao legislador de alargar os meios da
justiça administrativa ao controlo da juridicidade das atuações da Administração, para defesa
da legalidade e do interesse público, mesmo que não estejam em causa, direitos dos
administrados: por um lado, a intenção é perfeitamente legítima, se não necessária, em face
do art266º, que erige o interesse público como finalidade primeira da Administração Pública;
por outro lado, um tal alargamento impõe-se sempre para as relações interadministrativas ,
tendo em conta que a Constituição atribui à ordem judicial administrativa a competência para
julgar a generalidade das questões de direito administrativo. Por fim, como é obvio que a
constituição não assume uma intenção densificadora e, ao consagrar o direito dos
administrados a uma proteção judicial efetiva , não pretende regular em pormenor o processo
administrativo, pois que deixa inequivocamente ao legislador um espaço importante para
conformação de aspetos fundamentais do regime do contencioso, como por exemplo, o objeto
e o prazo da ação de impugnação de atos, bem como, em geral, os poderes e deveres do juiz,
do M.P. , das partes e demais intervenientes no processo, os pressupostos e a estruturação
processual dos meios principais e cautelares, os efeitos e o processo de execução das
sentenças.

A reforma do modelo legal: depois de sucessivos anteprojetos de alteração de legislação,


sobretudo em função das revisões constitucionais de 1989 e de 1997, fora, sujeitos a discussão
pública, em janeiro de 2000, três anteprojetos de um “estatuto dos tribunais administrativos e
tributários” de um “código de processo dos tribunais administrativos “e de um diploma sobre
“comissões de conciliação administrativa”, elaborados, a partir de projetos anteriores e no
quadro de diretrizes governamentais, por uma comissão de magistrados dos tribunais
administrativos com aperfeiçoamentos muito relevantes. O Ministro da Justiça estabeleceu,
por despacho publicado do Diário da Republica, as orientações internas para a elaboração dos
respetivos projetos , tendo resultado na aprovação pelo Governo, em Junho de 2001, de duas
propostas de lei, uma de alteração do “Estatuto dos tribunais administrativos e fiscais” , outra
de aprovação de um “Código de processo nos tribunais administrativos”. Destas propostas
resultaram com algumas alterações, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF),
aprovado pela Lei nº13/2002, de 19 de Fevereiro, bem como o Código de processo nos
tribunais administrativos (CPTA), aprovado pela Lei nº15/2002, de 22 de Fevereiro que
entraram em vigor no dia 1 de janeiro de 2004.

Enunciamos a seguir alguns dos aspetos mais relevantes da Reforma, que como se verifica, é
significativamente alterado num sentido subjetivista, próximo do modelo alemão, embora com
a manutenção ou introdução de algumas notas claramente objetivistas: A)no âmbito da justiça
administrativa, atribui-se aos tribunais administrativos, nos termos constitucionais, a
competência para administrar a justiça “nos litígios emergentes das relações jurídicas
administrativas “e concretiza-se exemplificativamente esse âmbito em termos positivos e
negativos (art1º e 4º do ETAF). A tendência é para a ampliação do âmbito tradicional,
designadamente no que respeita aos contratos que envolvam a aplicação de direito público e
sobretudo à responsabilidade civil não apenas por atos praticados no exercício da função
administrativa mas também por atos das funções legislativas e jurisdicional. B) consagra-se o
Princípio da tutela jurisdicional efetiva, incluindo a, tutela cautelar, afirmando-se que
compreende “o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com
força de caso julgado, cada pretensão regularmente deduzida em juízo , bem como a
possibilidade de a fazer executar e de obter as providencias cautelares, antecipatórias ou
conservatórias, destinadas a assegurar o efeito útil da decisão (art2º . nº1 do CPTA). E
elencam-se mesmo, para que não haja dúvidas sobre a plena jurisdição, os diversos conteúdos
das pretensões possíveis junto dos tribunais e os correspondentes poderes do juiz, incluindo
pretensões e poderes declarativos, constitutivos, condenatórios, intimativos, preventivos e
executivos, em especial perante a Administração (art2º, nº2). Destas pretensões destacam-se
as que não eram anteriormente admitidas , designadamente, a condenação à pratica de ato
administrativo devido, a condenação à não emissão de atos administrativos, a intimação para
adoção ou abstenção de comportamentos administrativos, a condenação ao cumprimento de
deveres de prestação e ao restabelecimento de direitos ou interesses violados por atos
administrativos e a declaração da ilegalidade por omissão de regulamentos bem como a
resolução de litígios entre privados e entre órgãos da mesma pessoa coletiva pública; C)
altera-se radicalmente a definição dos meios processuais principais , criando duas formas
processuais, a ação administrativa comum e a especial: I) o recurso de anulação deixa de ser
considerado o meio normal do contencioso administrativo, perde mesmo o seu nome
simbólico de recurso, chama-se agora “impugnação de atos”, deixa de ser utilizado contra
omissões e em principio, contra indeferimentos ; juntamente com a condenação à prática de
ato devido e a declaração da ilegalidade de normas ou da respetiva omissão, passa a constituir
um dos pedidos a formular na ação administrativa especial (art46º do CPTA). II) A ação para o
reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos deixa de constituir um meio
autónomo e desdobrada em pedidos declarativos e condenatórios, integra, juntamente com as
ações tradicionais, a ação administrativa comum (art37º do CPTA). D) admite-se com grande
amplitude a cumulação de pedidos, em função da mesma relação jurídica ou da mesma
matéria de facto ou de direito (art4º do CPTA), por exemplo, dos pedidos de anulação de ato
administrativo ou de condenação à prática de atos com os de restabelecimento da situação
hipotética atual, do pedido de anulação de ato, com o do reconhecimento de uma situação
jurídica subjetiva ou com o de anulação de contrato subsequente, bem como de vários pedidos
com a condenação da Administração na reparação de danos (art4º, nº2, e 47º do CPTA); E) no
que respeita à tramitação das ações administrativas especiais, estabelecem-se regras
uniformes (art35º, nº2 e 78º e seguintes do CPTA), embora com particularidades relativas à
impugnação de atos (arts50º e ss), à condenação à prática de atos devidos (artigos 66º e
seguintes), e aos processos relativos a normas (artigos 72º e ss), para além de se
estabelecerem processos principais urgentes, em que se reúnem impugnações e intimações
urgentes (artigos 97º e ss). F) mantém-se um conceito muito vasto de legitimidade para a
impugnação de atos, incluindo o M.P. e os titulares de interesse direto na anulação do ato, e
até se alarga a pessoas coletivas e aos órgãos administrativos, bem como, no âmbito da ação
popular, a qualquer cidadão e a titulares de interesses difusos, incluindo as autarquias (artigos
55º e 9º, nº2 do CPTA). G) continua a reconhecer-se um papel processual relevante ao M.P.
para a fiscalização da legalidade, mas sobretudo no que respeita ao poder geral de iniciativa,
mas também, embora limitado à defesa de valores comunitários, o poder de dar parecer sobre
o mérito e o de invocação de novos vícios, apesar de se lhe terem retirado alguns dos seus
poderes processuais, limitando a intervenção na fase instrutória e suprimindo s vista final e a
participação na sessão de julgamento (art58º, 62º, 73º, 77º, 77º-A, 85º, 104º nº2º, 146º, 152º
e 155º do CPTA). H)consagra-se o principio da igualdade de armas entre o recorrente e a
Administração no sentido da consagração de um verdadeiro “processo de partes” incluindo o
pagamento de custas pela Administração (art189º nº1 do CPTA) e a possibilidade da sua
condenação por litigância de má fé (art6º), além de se eliminarem as restrições gerais à prova
testemunhal; I)alarga-se substancialmente, a proteção cautelar dos administrados, que
abrange quaisquer providências, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas
a assegurar a utilidade da sentença, e cuja adoção passa a ter em conta razões de justiça
material e a depender da ponderação dos interesses públicos e privados, em jogo (art112º e ss
do CPTA); J) a par do alargamento dos poderes do juiz, regula-se o processo executivo no
sentido do aperfeiçoamento das garantias dos particulares e da legalidade contra a inexecução
ilegítima de sentenças administrativas, reforçando a garantia da efetividade das decisões
judiciais, por exemplo, através da emissão de sentenças substitutivas e da previsão de sanções
pecuniárias compulsórias (art157º e ss do CPTA).

A apreciação global do modelo: a Reforma estabeleceu um modelo subjetivista, no entanto


visíveis os momentos objetivistas do regime, seja no que respeita à legitimidade ativa-
designadamente para a impugnação de atos administrativos , que continua a conferir-se a
interessados de facto na ação particular, se entende a associações e a todos os membros da
comunidade nas ações populares e no âmbito da ação pública, se alarga quanto ao M.P., em
matéria de condenação à pratica de ato devido e de contratos – seja quanto à previsão de
litígios inter-administrativos , inclusivamente entre órgãos da mesma pessoa coletiva, seja nos
significativos poderes que continuam a reconhecer-se ao M.P. como auxiliar de justiça, em
defesa da legalidade, sobretudo no que respeita à impugnação de normas, seja ainda em
outros aspetos específicos, como o conhecimento oficioso pelo juiz das ilegalidades do ato
administrativo impugnado. Por outro lado, tal como acontece no modelo alemão, o modelo
reformado, não altera, antes pressupõe e reafirma o sistema de administração executiva, ao
determinar o respeito, quer nas sentenças condenatórias das Administração, quer no respetivo
processo de execução, dos espaços de valoração própria concedidos pela lei aos órgãos
administrativos no exercício das suas funções, bem como ao aceitar a estabilidade de caso
decidido dos atos administrativos, mesmo que ilegais, desde que não sejam nulos, passado o
prazo da impugnação.

A revisão de 2015: a revisão do CPTA e do ETAF, aprovada pelo Decreto-Lei 2015, no uso da
autorização conferida pela Lei n100/2015 de 19 de Agosto, a partir de um anteprojeto posto à
discussão pública em 2014, não trouxe alterações ao modelo desenhado em 2002, tal como
descrito nos seus aspetos essenciais, a não ser como já fomos dizendo, quanto ao
desaparecimento da distinção entre ação administrativa comum e especial, passando todos os
processos principais não urgentes a tramitarem sob uma única forma de ação, que
corresponde no essencial ao da anterior ação administrativa especial. Houve modificações
significativas mas que visaram aperfeiçoar processualmente o modelo, das quais destacamos
algumas; alargamento da jurisdição administrativa ao julgamento de contraordenações em
matéria urbanística; acolhimento de novidades trazidas pelo novo Código de Processo Civil na
tramitação da nova ação administrativa , embora sem deixar de ter em conta as
especificidades próprias de alguns processos do contencioso administrativo; criação de um
novo processo urgente, visando dar uma resposta célere, pela concentração num único
processo, às pretensões dos participantes em “procedimentos de massa”, designadamente de
provas e concursos de pessoal; transposição, no domínio do contencioso pré-contratual , das
diretivas-recursos europeias, associando um efeito suspensivo automático à impugnação de
atos de adjudicação; clarificação dos requisitos gerais do regime da impugnabilidade dos atos
administrativos, designadamente quanto aos atos confirmativos e aos ineficazes e quanto aos
prazos de impugnação dos atos anuláveis; consagração do funcionamento dos tribunais
administrativos de circulo somente com juiz singular, exceto nas situações de julgamento
alargado legalmente previstas, entre muitas outras- alterações das quais se irá dando conta
nos locais próprios.

O critério substancial de delimitação: esta noção de “relação jurídica administrativa” para


efeitos de delimitação do âmbito material da jurisdição administrativa, deve abranger a
generalidade das relações jurídicas externas ou intersubjetivas de caráter administrativo, seja
as que se estabeleçam entre os particulares e os entes administrativos, seja as que ocorram
entre sujeitos administrativos. Pode ser entendido num sentido subjetivo, em termos de
incluir qualquer relação jurídica em que intervenha a Administração, designadamente uma
pessoa coletiva pública- a razão de ser da existência de uma jurisdição especial seria a
presença da Administração pública enquanto sujeito da relação, independentemente da veste
em que atuasse, pelo que tenderia a privilegiar-se igualmente um critério orgânico como
padrão substancial de delimitação. Pode entender-se em termos predominantemente
objetivos, como as relações jurídicas em que intervenham entes públicos, mas desde que
sejam reguladas pelo direito administrativo- nesse sentido, a razão de ser da jurisdição
administrativa seria, por contraposição com a jurisdição dita “comum”, a existência de um
estatuto especial do sujeito público, designadamente, a presença de elementos de autoridade
administrativa. Há ainda um outro entendimento que faz corresponder o caráter
“administrativo” da relação ao âmbito substancial da própria função administrativa. Resultaria
do contexto constitucional que o domínio considerado próprio dos tribunais administrativos
abrange as relações jurídicas que correspondam ao exercício da função administrativa,
entendida em sentido material. Ora, tal como assim se excluem da justiça administrativa os
litígios relativos às atividades materialmente políticas, jurisdicionais e legislativas, remetendo
para uma distinção substancial entre as funções do Estado, também se identificaria, para esse
efeito, uma função que pode ser desenvolvida por particulares e não tem de estar
estatutariamente sujeita ao direito administrativo.

Esta questão sobre o que se entende por “relação jurídica administrativa” devia ser resolvida
expressamente pelo legislador. Mas na falta de uma clarificação legislativa, parece-nos que
será porventura mais prudente partir-se do entendimento do conceito constitucional de
“relação jurídica administrativa” no sentido estrito tradicional de “relação jurídica de direito
administrativo” com exclusão, nomeadamente, das relações de direito privado em que
intervém a administração- sobretudo na medida em que se considere, como defendemos, que
esta definição substancial se refere apenas ao âmbito nuclear ou de principio da jurisdição
administrativa, não excluindo soluções justificadas de alargamento ou de compressão da
respetiva competência por parte do legislador. Têm de se considerar relações jurídicas públicas
(seguindo um critério estatutário, que combina sujeitos, fins e meios) aquelas em que um do
sujeitos, pelo menos, seja uma entidade pública ou uma entidade particular no exercício de
um poder público, atuando com vista à realização de um interesse público legalmente
definido.

A utilização de um critério material de delimitação, pressupõe, então, a existência de um


regime de administração executiva, em que se define um domínio de atividade, a função
administrativa e nesse contexto, um conjunto de relações onde a Administração é tipicamente
ou nuclearmente dotada de poderes de autoridade para cumprimento das suas principais
tarefas de realização do interesse público.

Excluem-se assim, em principio, do âmbito substancial da justiça administrativa as questões


administrativas de puro direito privado, isto é, as decorrentes da atividade de direito provado
da Administração- quer seja a que corresponde ao mero exercício da sua capacidade privada,
quer se trate da atividade funcionalmente administrativas, quando ou na medida em que se
desenvolvam através de instrumentos jurídicos privatísticos, ainda que toda a atividade
administrativa esteja sujeita aos princípios jurídicos fundamentais do direito administrativo.

Não se pode esquecer, porém, que o direito administrativo aparece frequentemente associado
à utilização de entidades e de meios de direito privado pela administração, dando lugar na
prática a uma aplicação miscigenada do direito público e do direito privado, de modo que
poderá considerar-se substancialmente incluído na justiça administrativa o conhecimento de
certos aspetos de direito público de uma atuação administrativa desenvolvida ao abrigo do
direito provado- como acontecerá, por exemplo, no contencioso relativo à formação de
contratos de direito privado, celebrados pela administração, quando ela siga um procedimento
“pré-contratual” de direito público. Por outro lado, é legítima a atração para os tribunais
administrativos da resolução global de litígios, alargada aos aspetos de direito privado, seja
para prevenir dúvidas, seja para evitar a duplicidade de processos, independentemente da
manutenção de uma diferença de regimes jurídicos aplicáveis.

Note-se que ao contrário do que acontecia na lei anterior, o novo ETAF, deixou de excluir
expressamente da jurisdição administrativa “as questões de direito privado, ainda que
qualquer das partes seja uma pessoa de direito público”. No entanto, apesar de conter uma
clausula de definição positiva do âmbito da justiça administrativa, também não optou por
incluir essas questões, o que significará que elas estarão excluídas por natureza, sem prejuízo
de haver uma atribuição expressa aos tribunais administrativos do julgamento de
determinados litígios de direito privado.

Outro aspeto de delimitação da fronteira da jurisdição administrativa em matérias de direito


privado é o das questões emergentes de atuações jurídicas privadas autorizadas ou licenciadas
pela administração. Se a questão disser respeito à ilicitude da atuação privada em aspetos que
por lei pertençam ao âmbito próprio da autorização ou do juízo autorizativo da administração,
havendo decisão administrativa que permitiu tal atuação, só o tribunal administrativo pode
conhecer da legalidade da decisão, no contexto do respetivo meio impugnatório.

Ficam igualmente fora do domínio próprio da justiça administrativa, as questões relativas à


validade de atos praticados no exercício de outras funções estaduais, estranhos à função
administrativa : assim acontece com a impugnação de atos que integrem o exercício da função
politica, bem como o exercício da função legislativa.

Remete-se assim, para uma distinção substancial entre as funções do Estado, remissão que
tende a ser absoluta no que respeita aos atos políticos, mas não e tao só relativa no que se
refere aos atos legislativos. Quanto aos atos políticos ou da função politica, o seu carater não-
administrativo resultará de serem atos de 1º grau, praticados por órgãos supremos, em
execução direta da constituição e destinados à prossecução direta de interesses fundamentais
da comunidade politica- por exemplo, atos auxiliares de direito constitucional, atos
diplomáticos, atos de defesa nacional, atos de graça.

Quanto aos atos da função legislativa, não havendo uma reserva material ou funcional de
regulamento, nada impede o legislador de estabelecer regimes jurídicos pormenorizados ,
tendo de considerar-se como atos legislativos- e portanto, subtraídos à jurisdição
administrativa- quaisquer disposições gerais e abstratas editadas sob forma de diploma
legislativo, ainda que tenham caráter regulamentar e portanto pertençam materialmente à
função administrativa. Já o mesmo não acontece com os atos administrativos, que podem ser
impugnados, perante os tribunais administrativos independentemente da sua forma, mesmo
que constem de um diploma legislativo. Contudo, dado que não estão proibidas as leis-
medida, o problema dos limites da jurisdição administrativa passa aqui pela distinção
substancial entre as funções estaduais- concretamente pela distinção entre “ato
administrativo” e “lei-medida”. Obviamente, que em função do critério material, também não
pertencem à justiça administrativa os litígios relativos à atividade desenvolvida no exercício da
função jurisdicional. Apesar de a delimitação ser aqui em regra mais fácil, dado que esta
função é constitucionalmente reservada em exclusivo aos juízes, encontramos zonas de
fronteira, seja no que respeita à atividade administrativa desenvolvida pelos tribunais, seja
quanto à prática, pela administração de atos quase judiciais- decisões de aplicação de coimas,
de resolução de litígios, ou de fixação de indemnizações, por exemplo. Note-se porém que,
como veremos melhor, o ETAF, ao contrário do que acontecia antes de 2002, atribui aos
tribunais administrativos a competência para conhecer litígios relativos à responsabilidade civil
extracontratual pelo danos causados no exercício da função politica, legislativa e jurisdicional-
o que deve ser interpretado como mais um alargamento da jurisdição administrativa a
matérias que substancialmente não são administrativas.

Como o conceito substancial de ato administrativo inclui logicamente uma nota orgânica, põe-
se a questão de saber se o domínio da justiça administrativa abrange, ou não, as questões
suscitadas no âmbito das relações substanciais de direito administrativo, quando nelas
intervenham órgãos ou entidades que não integram a Administração em sentido organizatório.
Deve entender-se a partir do art212º, n3 da CRP, que as questões relativas a qualquer
atividade pública em matéria administrativa, mesmo que proveniente de entidades não
administrativas, integram substancialmente a justiça administrativa, sem prejuízo de a lei as
poder atribuir a outra ordem judicial. A questão estará hoje mais esclarecida, tendo em conta
que o CPA adotou uma definição substancial de ato administrativo (art148º), que abrange
quaisquer decisões no exercício de poderes jurídico-administrativos. O conceito de
administração em sentido organizatório levanta problemas em zonas de fronteira, mas tende a
abranger todas as entidades, mesmo sob forma privada, que desempenham atividades
administrativas de interesse publico sob direção pública- note-se que a lei portuguesa
equipara expressamente as empresas públicas a entidades administrativas para efeitos de
sujeição à jurisdição administrativa dos litígios respeitantes ao exercício de poderes de
autoridade. Também para efeitos de responsabilidade civil, o regime aprovado pela Lei
nº67/2007 determina que as disposições que regulam a responsabilidade por danos
decorrentes do exercício da função administrativa são aplicáveis à responsabilidade civil de
pessoas coletivas de direito privado por ações ou omissões que adotem no exercício de
prerrogativas de poder público ou que sejam reguladas por disposições ou princípios de direito
administrativo (art1º, nº5). E na mesma linha, o próprio CPTA, ap definir atos impugnatórios
faz atualmente referência às decisões de autoridades não integradas na administração publica
e entidades privadas que atuem no exercício de poderes jurídico-administrativos (art51º, nº1).

Relações jurídicas administrativas: como vimos, a constituição define o âmbito da justiça


administrativa por referencia aos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas.
Torna-se conveniente e necessário, quanto mais não seja para este efeito, pensar o mundo
jurídico-administrativo em termos de relação jurídica, e não apenas a partir das categorias da
atividade da administração. Um relação jurídica, enquanto relação social disciplinada pelo
direito, pressupõe um relacionamento entre dois ou mais sujeitos, que seja regulado por
normas jurídicas, das quais decorrem as posições jurídicas ativas e passivas, que constituem o
respetivo conteúdo. No contexto da justiça administrativa, interessam-nos especificamente as
relações administrativas interpessoais ou intersubjetivas, dado que, como veremos, por razões
de delimitação funcional, os tribunais administrativos salvo em casos excecionais, previstos na
lei, só podem conhecer litígios entre partes ligadas por uma relação jurídica externa. Acresce
que também não pode pensar-se hoje nas relações internas como se representassem uma
área reservada à administração, em que esta poderia atuar livremente, sem sujeição a normas
jurídicas e sem interferência de poderes estranhos, designadamente dos tribunais. O caráter
interno ou externo de uma relação jurídica nem sempre é por essas duas razoes, fácil de
determinar e pressupõe no plano dos sujeitos respetivos, uma distinção clara entre os
conceitos de personalidade jurídica, de órgão e de titular ou membro de órgão. por um lado,
os problemas resultam, num plano organizativo, da multitude das administrações atuais, em
face dos fenómenos de descentralização e de desconcentração, bem como da complexidade
que decorre da organização ministerial do Estado-pessoa coletiva, ou ao nível da própria
administração estadual direta, as que conferem personalidade jurídica a direções gerais ou a
serviços autónomos integrados em ministérios. Por outro lado, há problemas que resultam da
juridificação das chamadas “relações especiais de poder”- antes consideradas como zonas
reservadas da administração, estranhas ao mundo do direito e por isso, subtraídas à lei e
imunes ao poder judicial- pelo interior das quais passa hoje a fronteira que separa as relações
especiais internas (“relações orgânicas”), reduzidas estas ao plano estritamente funcional. Por
fim, deve ter-se em conta que a diversificação funcional dentro de pessoas coletivas públicas
mais complexas leva a que decisões tomadas por alguns órgãos possa comprometer o
exercício da competência por outros órgãos, facto que justifica a impugnabilidade de atos de
um órgão por outro órgão da mesma pessoa coletiva, atualmente reconhecida expressamente
na lei (artigos 51º, nº2 alínea d))- em reconhecimento de uma dimensão externa destes atos.

Em síntese, são de considerar relações jurídicas administrativas internas ou intrapessoais: a)as


relações entre órgãos administrativos dentro da mesma pessoa coletiva, salvo quando o
contrário resulte da lei; b)as relações entre órgãos administrativos e os respetivos membros ou
titulares, salvo quando estejam em causa direitos próprios destes últimos, enquanto tais, bem
como; c)as relações (ditas “orgânicas”) entre os órgãos de uma instituição e os funcionários,
utentes ou sujeitos de relações especiais de direito administrativos ligados a essa instituição,
na medida restrita do respetivo vínculo funcional. Note-se porém, que uma vez mais, tal não
significa que, designadamente num contexto objetivista de defesa da legalidade, a lei não
possa, como vimos, atribuir aos tribunais administrativos a competência para conhecer litígios
entre órgãos da mesma pessoa coletiva ou entre um órgão e os respetivos membros, situações
que devem decorrer expressa ou inequivocamente da lei.

Em contraposição para efeitos de uma regra de inclusão no contencioso administrativo, devem


considerar-se relações jurídicas administrativas externas ou interpessoais: a) as relações
jurídicas entre a administração e os particulares incluindo: I) as relações entre as entidades
administrativas e os cidadãos, mas também II) as relações entre as organizações
administrativas e os membros, utentes ou pessoas funcionalmente ligadas a essas
organizações (as chamadas “relações fundamentais”) e III) as relações entre sujeitos privados
que atuem no exercício de poderes administrativos (sejam entidades públicas em forma
privada ou verdadeiros privados) e os particulares ; b)as relações jurídicas
interadministrativas, incluindo: I)as relações entre entes públicos administrativos mas também
II) as relações jurídicas entre entes administrativos e outros entes que atuem em substituição
de órgãos da administração no exercício da função administrativa, mesmo que não tenham
personalidade jurídica e ainda III) certas relações jurídicas entre órgãos de diferentes entes
públicos, quando a circunstância de se tratar de órgãos de pessoas coletivas distintas puder
ser considerada decisiva ou dominante para a caracterização da relação, por estarem em causa
interesses públicos diferentes (sejam divergentes, como acontece nas relações de controlo, ou
concorrentes, como por exemplo no caso da delegação de atribuições).

São diversos os tipos de relações jurídicas administrativas que podem ser objeto de várias
classificações doutrinais. Importa hoje sublinhar, que as relações jurídicas, as que ligam os
particulares à Administração, são cada vez menos frequentemente relações simples ou
bipolares, em que há apenas dois sujeitos ou dois polos de interesse (um ativo, outro passivo),
multiplicando-se as relações complexas ou multipolares, em que se confrontam mais de dois
sujeitos com interesses distintos e muitas vezes contrários- esta realidade, bem visível por
exemplo no âmbito da atividade concursal, prolifera atualmente em matéria urbanística e de
ordenamento do território ou de regulação económica, e nem sempre é totalmente captada
pela perspetiva da atividade, mesmo através da nova figura do “ato administrativo com efeitos
em relação a terceiros” ou “ato administrativo de duplo efeito”.

Posições jurídicas subjetivas dos particulares e da administração: a constituição define as


garantias dos cidadãos de acesso aos tribunais contra a administração a partir de posições
jurídicas subjetivas daqueles: é garantida a tutela jurisdicional efetiva de direitos ou interesses
legalmente protegidos, incluindo o reconhecimento desses direitos ou interesses, a
impugnação de quaisquer atos administrativos ou de normas administrativas com eficácia
externa que os lesem. Impõe-se assim analisar as posições jurídicas subjetivas dos particulares
em face a Administração, para determinar o significado destas categorias jurídicas- “direitos” e
de “interesses legalmente protegidos”- e por consequência, o alcance substancial da tutela
constitucionalmente prevista. Além disso, no processo administrativo também podem estar
em causa posições desfavoráveis de particulares, designadamente no âmbito das ações que
podem ser postas contra estes, bem como posições jurídicas substantivas da administração,
em especial nas relações interadministrativas.

As posições jurídicas subjetivas substantivam (públicas) dos particulares em face da


Administração: temos a considerar desde logo as posições de vantagens (ou favoráveis)- às
quais correspondem obrigações, deveres e sujeições da Administração e/ou limitações
(negativas) ou condicionamentos (positivos) da atividade administrativa. De um lado, as
posições jurídicas substantivas (“direitos e interesses legalmente protegidos” ou “direitos”,
num sentido amplo) e de outro lado, os interesses simples ou de facto.

i)as posições jurídicas substantivas implicam sempre uma intenção normativa de proteção
efetiva de um bem jurídico, próprio de determinado particular, seja em 1ª linha se já em 2ª
linha, em complemento de um interesse público primacial. A intencionalidade, o conteúdo
objetivo favorável e o grau de efetividade hão-de resultar da interpretação da norma de
direito substantivo que regula a relação jurídica, devendo presumir-se a intenção protetora
quando uma norma de direito objetivo seja necessária ou adequada ao favorecimento de
determinados interesses particulares. II) os interesses simples ou de facto representam
vantagens genéricas para os administrados ou então específicas de pessoas determinadas ,
mas que encaradas do ponto de vista da norma reguladora, são vantagens ocasionais ou
puramente reflexas relativamente ao interesse público- mesmo que se trate de interesses
diferenciados cujos titulares gozem, face à lei processual, de legitimidade impugnatória, por se
encontrarem numa situação que lhes confira interesse direto e pessoal na anulação de um ato
administrativo.

Por outro lado, dentro do conjunto das posições jurídicas substantivas, há uma certa variedade
típica e não-categorial em face da continuidade gradativa das figuras do “direito subjetivo” e
do “interesse legalmente protegido”. Assim temos: I) direitos subjetivos: a) direitos
transitivos ou de natureza obrigacional, sobretudo no contexto de uma administração social,
que é em grande medida uma “administração de prestações”- pense-se, por exemplo, nos
direitos sociais como os direitos às prestações da segurança social ou aos subsídios para o
exercício de atividades económicas ou de interesse social ou cultural, mas também nos direitos
a prestações decorrentes do dever estadual de proteção efetiva dos direitos, liberdades e
garantias dos particulares . b) direitos intransitivos ou absolutos: a que correspondem, do lado
da administração pública, deveres gerais de abstenção e de respeito: desde logo as liberdades
e determinados direitos fundamentais dos cidadãos, relativamente aos quais a constituição
impõe a abstenção pública, que ganham relevância ao nível administrativo através da
conceção das normas constitucionais que os consagram como direito imediatamente aplicável;
depois os direitos públicos reais, como por exemplo os direitos de uso normal do domínio
público estabelecidos por lei; c) direitos potestativos: que são poderes unilaterais, de provocar
inelutavelmente a constituição, modificação ou extinção de relações jurídicas aos quais
corresponde uma sujeição do lado passivo, como por exemplo o direito ao voto, o direito de
aceitar ou renunciar a mandato público, bem como os direitos de iniciativa de procedimento
ou de ação administrativa. II) direitos limitados : há graus de densidade normativa, que se
repercutem em graus de efetividade; a) existem de facto direitos condicionados que não
gozam de uma tutela plena: i)sejam os direitos condicionados em sentido estrito-
designadamente os direitos atribuídos por atos administrativos, mas sujeitos a condição
suspensiva ou a uma atuação procedimental integrativa da eficácia; ii) sejam os direitos
enfraquecidos que podem, por força da lei ou por força de ato administrativo com base na lei,
ser sacrificados através do exercício legítimo de poderes da autoridade administrativa- por
exemplo, o direito de propriedade face ao poder de expropriação ou ao poder de
planeamento, o próprio direito do funcionário ao vencimento face ao poder disciplinar de
suspensão, os direitos de utilização excecional do domínio público, perante os poderes de
gestão dominial, os direitos do concessionário face ao poder de resgate da concessão, o direito
do destinatário de ato favorável sujeito a reserva ou condição resolutiva. Iii) sejam os direitos
comprimidos, que são direitos limitados por lei em termos de necessitarem de uma
intervenção administrativa, unilateral ou contratual, que permita o seu exercício- por exemplo
direitos ou liberdades dos particulares que dependam de autorização administrativa, como a
liberdade de exercício da profissão que dependa da inscrição numa ordem profissional, ou a
liberdade de circulação automóvel dependente da obtenção da carta de condução ou para a
saída para o estrangeiro, da emissão de passaporte. Iv) sejam os direitos incompletos, que,
sendo mais que expetativas jurídicas, resultam da vinculação material de decisões
interlocutórias em procedimentos complexos, por exemplo os direitos ao licenciamento
resultantes da aprovação do projeto de arquitetura no procedimento de licenciamento de
obras particulares.

b)por sua vez há ainda “direitos prima facie”, isto é, posições subjetivas públicas em que estão
em causa diretamente e em primeira linha interesses próprios de particulares individualizados
, mas cujo conteúdo não esta perfeitamente determinado na lei, dependendo para se
tornarem definitivos e exercitáveis, de uma concretização ou densificação por parte da
autoridade administrativa. III)interesses legalmente protegidos: na fronteira entre interesse
legitimo por um lado e interesse simples ou de facto, por outro, operou-se uma evolução que
favoreceu a ampliação do conjunto das posições jurídicas substantivas: a)interesses
decorrentes da juridificação do poder discricionário- designadamente a necessidade de a
Administração atuar em conformidade com princípios gerais, como o da imparcialidade, de
igualdade, da justiça, da proporcionalidade, da racionalidade, da boa-fé e da proteção da
confiança legítima; b) interesses que se tornam relevantes no quadro das relações jurídicas
poligonais ou multilaterais- os particulares que não são destinatários diretos dos atos podem
ter um interesse no cumprimento, por parte da administração, das próprias normas legais que
indiretamente protegem os seus interesses- quer esses interesses sejam convergentes ou
divergentes relativamente aos interesses dos destinatários dos atos. C)interesses semi-
diferenciados, como por exemplo, os “interesses coletivos”- enquanto interesses de
associações na defesa de interesses gerais dos associados- e os “interesses locais gerais”
enquanto interesses da generalidade dos residentes numa determinada circunscrição
relativamente ao bens do domínio público (art68º nº1 e nº2, alínea b) e 186º, nº1, alínea b));
d) “interesses difusos” (constituição art60º, 66º, 78º; cpa artigos 68º, nº2 e 186º), embora
estes muitas vezes acabem por revelar como direitos individualizados ou de entidades
coletivas, quando não são vistos exclusivamente como direitos procedimentais; e) interesses
de “baixa normatividade”, decorrentes de certas formas de regulação administrativa (diretivas,
standards, recomendações, etc), que têm uma relevância jurídica limitada (soft law), em
grande medida em função do principio da proteção da confiança legitima, conferindo em regra
meros direitos a indemnização, bem como expetativas jurídicas e interesses de facto que
quando sejam afetados de forma especial e anormal pela atividade administrativa, podem dar
lugar a uma compensação “indemnização”) pelo sacrifício em função do principio da igualdade
perante os encargos públicos.

Posições de desvantagem (ou desfavoráveis): considerando agora as situações em que os


particulares aparecem numa situação desfavorável em face da Administração, há que
distinguir, na esteira da doutrina do direito privado, entre sujeições, deveres e obrigações e
ónus: A)as sujeições ou “estados de sujeição” constituem posições jurídicas passivas dos
particulares, que surgem nas relações jurídicas administrativas em correspondência com
direitos potestativos da Administração, mas que são sobretudo características enquanto
posições correspetivas de poderes jurídico-públicos gerais ou especiais, por exemplo, o poder
de expropriar, o poder policial, o poder tributário; B) os deveres em sentido amplo, incluem
obrigações dos particulares, decorrentes da lei, de regulamento, de ato (impositivo ou com
encargos modais) ou de contrato administrativo- a que correspondem em regra, direitos da
Administração de exigir a prestação- mas também os meros deveres, decorrentes das normas
jurídicas administrativas. A precisão legal de um dever pode ser direta, quando a lei
expressamente o estabeleça, ou indireta na medida em que o dever decorra do exercício de
poderes administrativos legalmente previstos, mas por força do principio da precedência da
lei, há-de existir sempre, mesmo no domínio (externo) das “relações especiais de direito
administrativo”. Quando a constituição do dever implique a concretização ou a restrição de
direitos, liberdades ou garantias fundamentais, tem de ser feita através de lei parlamentar ou
de decreto-lei autorizado. C) os ónus jurídicos, em sentido estrito, existem sempre que o
titular de um poder ou faculdade tem a necessidade prática de adotar um certo
comportamento caso pretenda assegurar a produção de um efeito jurídico favorável ou não
perder um certo efeito útil já produzido. Para alguns autores, o ónus não e uma posição
desfavorável, tratando-se antes, de uma figura “mista” ou “compósita”, visto que a obrigação
instrumental se associa a um poder ou uma faculdade.

O “status” ou situações jurídicas estatutárias: são posições jurídicas complexas, no contexto de


relações jurídicas dissimétricas ou polissimétricas, que formam um conjunto ordenado de
direitos e deveres, derivados, direta ou indiretamente de um único facto ou ato jurídico, como
por exemplo, os “status” de nacional, de munícipe, de funcionário ou de juiz (provocados pela
nomeação), de militar (resultamte da incorporação), de preso (efeito de sentença), de
estudante ou de internado(consequência da admissão administrativa num estabelecimento de
ensino público ou num estabelecimento hospitalar). São caracterizados por formarem um
conjunto de posições jurídicas ordenado, que resulta da sua definição genérica pela lei (por
norma jurídica) e da sua aplicação em bloco a todos os que se encontrem em determinadas
circunstâncias ou ingressem em determinado grupo ou categoria. Ao contrário dos direitos e
das obrigações “singulares”, as posições subjetivas integradas em “status”são susceptiveis de
ser modificadas por via normativa, sem que possam invocar-se regalias antigas, salvo as que
constituam direitos subjetivos individualmente adquiridos.

As posições jurídicas da Administração: a capacidade jurídica de direito público da


administração é desde logo uma capacidade delimitada pelo principio da especialidade, isto é,
pelas atribuições legais de cada um dos entes públicos que a compõem. Contudo, nos termos
do principio da legalidade, a capacidade jurídica de direito público, mesmo no domínio
contratual, ao incluir poderes de autoridade, identifica-se e é por isso, também, delimitada
pela competência que a lei atribui aos respetivos órgãos. A) a administração pública dispõe,
fundamental e carateristicamente de poderes públicos de índole geral, que são poderes-
deveres ou poderes funcionais, porque visam sempre a prossecução de interesses objetivos
(e/ou) de outrem- “interesses públicos “ ou o “interesse público”. São por isso, salvo
disposição da lei em contrário, poderes imprescritíveis e não estando na disponibilidade do
respetivo titular, inalienáveis e em principio irrenunciáveis. B)a administração é ainda titular,
perante os administrados de direitos e deveres concretos, muitas vezes decorrentes do
exercício dos seus poderes, no contexto de relações ou situações determinadas. Tratar-se-á na
maior parte dos casos, de direitos e deveres obrigacionais ou transitivos, mas podem ser
igualmente direitos absolutos e deveres gerais de abstenção (em face de liberdades
individuais), ou então, direitos potestativos e sujeições (designadamente no domínio
contratual). C) mas relações inter-administrativas, os entes públicos podem surgir em posição
de dominância-dependência mais ou menos intensa,( por exemplo, as relações de
superintendência do Estado sobre os institutos públicos ou dos municípios sobre a
administração indireta municipal, bem como as relações entre o Estado e os entes
autónomos), hipóteses em que essas relações se podem aproximar das que ligam a
administração aos particulares-assim, por exemplo, a atuação de um órgão de um instituto
pode depender da autorização ou aprovação ministerial, ou um ato de um órgão municipal
pode estar dependente de um parecer vinculativo ou de parecer vinculativo ou de uma
aprovação governamental. Mas podem relacionar-se em posição de paridade, que há-de ser
aferido em face da ambiência de direito público-seja nas relações intermunicipais ou
interinstitucionais, seja nas relações entre a administração central e as administrações locais;
D) os entes ou os órgãos públicos são também titulares de posições jurídicas procedimentais ,
não só de posições passivas, em correspondência com os direitos dos administrados, mas
também de posições ativas, como veremos melhor. São de destacar desde já, para alem dos
direitos dos entes administrativos em posições de subordinação ou dependência , o direito de
acesso aos tribunais administrativos para obter providências contra outras entidades
administrativas ou contra particulares.

A dimensão funcional da justiça administrativa : a justiça administrativa não abrange todo e


qualquer tipo de resolução de controvérsias emergentes das relações jurídicas administrativas,
referindo-se apenas àqueles processos que, visando exclusivamente a solução de uma
“questão de direito”, implicam o exercício da função jurisdicional, isto é, aos litígios que se
apresentem como questões jurídicas a solucionar, através de um processo jurisdicional, por
um tribunal. Parte-se de uma caracterização substancial da função jurisdicional, exigindo-se a
intenção direta de resolução de uma questão de direito e a decisão por órgãos independentes,
indiferentes e inoficiosos, segundo um processo justo e através de atos com autoridade de
caso julgado. Ao mesmo tempo, adota-se aqui uma noção ampla de “questão de direito” ou de
“questão jurídica”, englobando, numa dimensão subjetivista, os “conflitos de pretensões entre
duas ou mais pessoas”, mas também numa dimensão objetivista , “as controvérsias sobre a
verificação ou não verificação em concreto de uma ofensa ou violação da ordem jurídica”.
Esta perspetiva funcional, vai contribuir para a delimitação material do âmbito da justiça
administrativa relativamente a outros instrumentos ou formas de composição de litígios, seja
quanto ao respetivo objeto, seja quanto aos meios de solução. Tal como convoca a aplicação
do principio de divisão dos poderes, desde logo do ponto de vista orgânico, em face da reserva
constitucional para os tribunais da função jurisdicional, mas sobretudo do ponto de vista do
cintéudo e dos limites das decisões judiciais.

As delimitações materiais negativas decorrentes da perspetiva funcional da justiça


administrativa: deve começar-se por referir-se, como delimitação material negativa, a exclusão
da justiça administrativa das questões relativas a “atos internos” da administração ou a litígios
que relevam exclusivamente da organização ou das relações administrativas internas- por
exemplo, as questões relativas a ordens de serviço e a regulamentos de organização interna
dos serviços, as composições de conflitos orgânicos, as questões de disciplina interna dos
serviços e em geral, a resolução dos litígios no contexto das “relações especiais de direito
administrativo” na sua dimensão orgânica. É claro, que os conceitos de ato interno, de
regulamento interno ou de relação jurídica interna, tal como o conceito de “mérito”
administrativo são conceitos que sofreram uma grande depuração, de modo que aquilo que
hoje é considerado interno é já muito pouco, comparado com o entendimento antigo, que
tendia a abranger nessa esfera “administrativa” toda a organização administrativa , as relações
especiais de poder em todas as suas dimensões e a generalidade das relações inter-
administrativas, mesmo entre entes públicos autónomos. Ainda assim, subsiste, embora com
exceções que aqui confirmam a regra, uma limitação genérica da jurisdição administrativa
quanto ao conhecimento dos atos ou das relações meramente internas, dentro da própria
organização administrativa, sobretudo, dentro de cada pessoa coletiva pública. E note-se, esse
limite não é um mero resultado da circunstância de a jurisdição administrativa ser uma
jurisdição de legalidade ou de juridicidade, pois que essas relações internas também podem
ter relevo jurídico, embora não sejam jurídicas em termos externos, isto é, num plano
intersubjetivo.

Alem disso, a delimitação da justiça administrativa pelo carater jurisdicional da função


exercida, leva a que não possa hoje incluir a resolução de questões administrativas-quer se
apresentem como questões de mérito, quer mesmo como questões de legalidade ou de
juridicidade- quando este se realize através de meios administrativos de impugnação, seja no
âmbito do tradicional autocontrolo, por órgãos da administração ativa, com base em petição,
reclamação e recurso hierárquico ou tutelar, seja no âmbito de um heterocontrolo , levado a
cabo por autoridades administrativas independentes. Embora o recurso hierárquico, com um
procedimento mais ou menos jurisdicionalizado, primeiro (na época da “jurisdição reservada”)
e a intervenção de autoridades administrativas independentes, depois (na época da “jurisdição
delegada”), tenham constituído as formas típicas do contencioso administrativo tradicional,
hoje elas estão fora do âmbito próprio da justiça administrativa. A reclamação e os recursos
administrativos permitem o exercício do direito dos particulares de solicitarem a revisão ou de
reagirem contra a omissão ilegal de atos administrativos perante os respetivos autores- ou
perante órgãos com posição dominante no que respeita à competência exercida , em regra,
aos superiores hierárquicos- e podem ter como fundamento, salvo disposição em contrario
não so a ilegalidade mas também a inconveniência do ato impugnado. Estes meios
complementam a garantia dos particulares de acesso aos tribunais e quando a lei
expressamente o determine, a sua utilização pode mesmo constituir um pressuposto
processual da ação administrativa, mas apesar de a questão suscitada poder ser de legalidade
ou de juridicidade do ato administrativo, não pertencem ao âmbito da justiça administrativa,
porque a resolução da controvérsia não e jurisdicional e não cabe a um tribunal. Fica
igualmente fora da justiça administrativa a resolução de controvérsias relativas à atuação da
administração pública por meios políticos, na sequencia do uso de instrumentos petitórios dos
particulares dirigidos ao provedor de justiça ou ao parlamento.

Também não integrará a justiça administrativa a resolução de questões administrativas através


de mecanismos, mais ou menos informais, de Auto-composição de conflitos, através de
conciliação, de mediação ou de transação, nos casos em que sejam admitidas no âmbito de
aplicação do direito administrativo. A resolução de conflitos administrativos baseia-se na
vontade das partes, que são quem acaba por decidir a controvérsia, ainda que haja a
intervenção de um terceiro- característica que só por si os subtrai ao âmbito funcional da
justiça administrativa, que pressupõe uma hétero-resolução do conflito, isto é, uma decisão
obrigatória, tomada por um tribunal colocado acima das partes. Nem sempre é fácil distinguir
entre estas figuras por exemplo, entre conciliação e mediação, admitindo-se que há uma
diferença de método, parte da doutrina entende que na conciliação, o terceiro se limita a
aproximar as partes, enquanto que na mediação o mediador pode propor soluções, ao passo
que outra parte da doutrina afirma exatamente o inverso. Quanto à transação, entendendo-se
que implica um contrato pelo qual as partes poem termos a um conflito existente ou previnem
um litígio. Em regra, exige-se que se trate de um conflito ou de um litígio jurídico, que tenha
sido submetido ou possa vir a ser decidido por um tribunal, isto é, que constitua uma questão
de direito (administrativo) mas não pertence à justiça administrativa, por a decisão ser tomada
pelas partes e não pelo juiz ou tribunal. Os centros de arbitragem permanente , no art187º do
CPTA destinam-se também à composição de litígios em algumas matérias de direito
administrativo-além de contratos e da responsabilidade civil, relações jurídicas de emprego
público, sistemas públicos de proteção social e urbanismo. Todas estas atividades se integram
nos instrumentos e formas de composição não jurisdicional dos conflitos, cuja criação é
admitida pelo art202º, nº4 da CRP, exteriores, portanto, por razoes funcionais, ao edifício
institucional da justiça administrativa. A jurisdição arbitral, nas matérias em que é admitida
pelo CPTA ou nos casos previstos em lei especial, enquadra-se fundamentalmente no domínio
da arbitragem voluntária, decorrendo de convenções de arbitragem celebrada pelas partes, as
quais podem constituir compromissos arbitrais, que têm por objeto um litígio atual, ou
manifestar-se através de clausulas compromissórias relativamente a litígios eventuais,
emergentes de determinada relação jurídica, contratual ou extracontratual. O art182º do CPTA
confere, em geral, aos interessados, o direito de exigirem da administração a celebração de
compromissos arbitrais no âmbito dos litígios legalmente arbitráveis “nos casos e termos
previstos na lei”- perante a discussão doutrinal quanto ao sentido deste preceito, julgamos
agora que por maioria de razão, que, sobretudo, em face da opção legal pelo alargamento da
arbitragem à apreciação de atos administrativos, a norma não vai ao ponto de constituir um
direito potestativo do particular, dependendo o respetivo exercício de lei especial que
densifique os casos e defina os pressupostos, as condições e as regras processuais necessárias
ou adequadas para o efeito. A propósito da mediação e conciliação, o art187º do CPTA prevê
ainda e parece promover, quanto a nos avisadamente, a possibilidade de os ministérios ,
através de portaria, se vincularem à jurisdição dos centros de arbitragem permanentes para a
resolução de pequenos litígios, legalmente susceptíveis de arbitragem, estabelecendo o
respetivo “tipo” e “valor máximo”. Foi nesse quadro, que o ministério da justiça diligenciou no
sentido da constituição de uma associação privada sem fins lucrativos, que suporta um Centro
de Arbitragem Administrativa, no qual funcionam, sob a égide do Conselho Superior dos
Tribunais Administrativos e Fiscais, tribunais arbitrais para dirimir litígios emergentes de
relações jurídicas de emprego público e de contratos.

Seja qual for a sua génese, os tribunais arbitrais constituem nos termos do art209º, nº2 da
Constituição, categorias reconhecidas de tribunais , que exercem a função jurisdicional, ainda
que não sejam órgãos de soberania e os juízes-árbitros sejam cidadãos- configuram por isso,
uma situação constitucionalmente prevista de exercício de poderes públicos por privados. O
CPTA acrescenta, que quando decidam sobre questões de legalidade, os “árbitros decidem
estritamente sobre o direito constituído

, não podendo pronunciar-se sobre a conveniência ou oportunidade da atuação


administrativa, nem julgar segundo a equidade (art185º, nº2). Acresce ainda que os tribunais
arbitrais podem, salvo acordo das partes em contrário, decretar providências cautelares e
ordens preliminares. Esta jurisdição arbitral, que integra o exercício da função jurisdicional por
verdadeiros tribunais, não pode, no entanto, independentemente da nomenclatura legal, ser
confundida com a “arbitragem administrativa” de conflitos, desenvolvida por entidades
administrativas, mais ou menos independentes , que não constituam tribunais: seja a que
possa vir a ser atribuída por lei aos centros de arbitragem permanente acima referidos, à qual
se poderá vincular a própria administração, seja, aquela resolução de conflitos que caiba às
autoridades administrativas no âmbito das relações privadas sujeitas a regulação e fiscalização
administrativa. A mais da arbitragem voluntária, regulada pela LAV, há que considerar ainda a
previsão legal de arbitragem necessária em determinadas matérias administrativas,
designadamente quanto à fixação de indemnizações por expropriação, na falta de acordo,
quanto aos litígios emergentes da invocação de direitos de propriedade industrial, incluindo os
procedimentos cautelares.

os limites funcionais da justiça administrativa: essa atividade exercida pelos tribunais


administrativos sofre, em virtude da sua qualidade substantiva, limitações funcionais
específicas na medida em que se apresenta como uma atuação que envolve um juízo sobre
legitimidade do exercício de um outro poder público: o poder administrativo (executivo). De
facto, do principio da divisão dos poderes, na dimensão que “separa” o poder judicial dos
outros poderes públicos , há-de resultar alguma limitação para a justiça administrativa , como
resulta por exemplo para a justiça constitucional- visto que o juiz não pode pura e
simplesmente ignorar nem substituir-se à competência e à autoridade própria das decisões
jurídico-públicas da administração- do mesmo modo que o juiz constitucional tem de respeitar
a competência e a autoridade própria do legislador. Tradicionalmente afirmava-se que a
jurisdição administrativa, por natureza, era uma jurisdição limitada, tendo em conta a
consequente diminuição dos poderes de cognição e de decisão do juiz.

Os limites relativos ao conteúdo da fiscalização: de início como vimos, retirava-se da doutrina


da separação dos poderes a proibição genérica de os tribunais se substituírem ou sequer
controlarem a atividade de direito público da administração- entendido atualmente num
sentido não mecanicista, como um principio de equilíbrio, que não exclui, antes promove, a
colaboração e a interdependência entre os poderes- exprime-se nesta matéria , através das
limitações próprias de uma atuação judicial concebida tipicamente como atividade de
fiscalização ou garantia, em face de uma atividade administrativa de decisão. A) um primeiro
desses “limites à eficácia da proteção jurisdicional administrativa” resulta da própria distinção
funcional entre autoria e fiscalização. Entendida a fiscalização no sentido estrito do “controlo
de uma competência alheia”: o procedimento decisório difere do procedimento fiscalizador, é
metodicamente mais exigente e mais completo, determinando uma ineliminável margem de
responsabilidade de quem tem o poder-dever de decidir, tanto maior quanto mais a aplicação
da norma , pela sua indeterminação conceitual ou estrutural ou pela complexidade da situação
concreta, pressuponha ou suscite dúvidas ou incertezas. A função de decidir exige um
conhecimento completo de todas as circunstâncias relevantes da situação de facto e de
direito, uma ponderação real entre as alternativas e os respetivos efeitos e a escolha da
solução que melhor realize o interesse público que o agente enquanto 1º intérprete e autor
competente e responsável pela decisão tem a seu cargo. Diferentemente, para fiscalizar bem,
a entidade de controlo enquanto 2º intérprete, sobretudo quando seja, como é o tribunal, um
órgão inoficioso e imparcial, apenas precisa de elaborar o paradigma normativo, até onde este
seja determinável na situação concreta, submeter a decisão sujeita a controlo a testes de
juridicidade considerados fundamentais, para detetar o eventual incumprimento dos
princípios que regulam a atividade decisória. B)um outro limite, decorre da autocontenção do
juiz administrativo perante a reserva de discricionariedade da administração, no quadro de
uma divisão equilibrada dos poderes. Dantes , pretendia-se resolver a questão através da
distinção radical entre duas zonas de atividade: a zona do mérito, submetida a regras não
jurídicas de “boa administração” e reservada à administração, e a zona da legalidade,
submetida à lei e sujeita a fiscalização judicial. Sabemos que hoje não e assim e que toda a
atividade administrativa, mesmo a que represente o exercício de poderes discricionários, esta
subordinada ao direito- é jurídica , quer do ponto de vista funcional, quer do ponto de vista
substancial. No entanto, continua a valer a ideia de que no “respeito pelo principio da
separação e interdependência dos poderes, os tribunais administrativos julgam do
cumprimento pela administração das normas e princípios jurídicos que a vinculam e não da
conveniência ou oportunidade da sua atuação. Neste tipo de sistemas os tribunais
administrativos julgam, em principio, as questões de legalidade ou de juridicidade relativas à
atuação administrativa. Não lhes compete administrar, pelo que da sua jurisdição se excluem
os poderes de decisão que englobem questões de mérito, isto é, que impliquem a avaliação da
oportunidade e da conveniência da atividade administrativa segundo padrões ou regras de
“boa administração”. Por isso, hoje, importa sobretudo, saber, por interpretação da lei, a
quem cabe ou deve caber a responsabilidade própria pela decisão de aplicação da norma ao
caso concreto, se à Administração, se aos tribunais: serão relevantes, num ou noutro sentido,
a capacidade técnica e a legitimidade política ou social do órgão administrativo, a qualidade da
matéria e o tipo ou modo de decisão (juízos sobre aptidões pessoais, decisões de prognose,
decisões com consequências políticas), sendo certo que os tribunais, no contexto de um
Estado de Direito equilibrado- o “Estado Misto” atual- não devem efetuar um controlo total da
atividade administrativa sob pena de se cair num “desequilibrado” e indesejável “Estado dos
Juízes”. Note-se que este limite não vale apenas para os casos tradicionais de impugnação de
atos já praticados pela administração mas também para as ações que visem a condenação da
Administração ma adoção de comportamentos, na realização de prestações ou na pratica de
decisões de autoridade, bem como para os pedidos de modificação de contratos
administrativos que envolvam o exercício de poderes públicos. Também aí o respeito pela
atribuição legal do poder discricionário impede, que o tribunal possa ir além da condenação da
Administração ao cumprimento estrito das imposições normativas decorrentes da lei ou dos
princípios jurídicos na situação concreta.

A necessidade de decisão administrativa prévia: uma outra limitação funcional à justiça


administrativa residia no facto de o juiz administrativo, por ser um mero fiscal, só poder ser
chamado a intervir em segunda instância (“recurso”), em face do princípio da decisão
administrativa prévia ou da reserva administrativa da primeira decisão. O princípio porém,
nunca vigorou verdadeiramente no nosso ordenamento jurídico e perdeu grande parte do
sentido em face da afirmação constitucional do direito fundamental dos cidadãos de acesso
aos tribunais administrativos. Deixou de valer a ideia de que a justiça administrativa seria
excecional no que fosse além da impugnação de atos, que as ações só se incluiriam no
“contencioso administrativo por atribuição”. É certo, que por norma, a administração, pela
natureza das suas funções, tem e deve ter oportunidade para se pronunciar sobre as
pretensões dos particulares antes de estes suscitarem em tribunal os litígios – de modo que,
na generalidade dos casos, o tribunal, é chamado a julgar uma ação ou uma omissão
administrativa anterior. A exigência de prévio requerimento particular da intervenção
administrativa só pode ser condição substancial ou pressuposto processual de uma ação
quando essa intervenção administrativa seja, por força da lei, substantiva ou processual,
necessária no caso. De facto, a lei admite , em geral, o pedido de condenação à emissão ou
abstenção de “comportamentos” ou ao cumprimento de prestações devidas, que nem sempre
pressupõem um requerimento prévio do particular, e a lei admite mesmo, embora situações
excecionais, a possibilidade do pedido de condenação à não emissão de um ato administrativo
(art37º nº1 alínea c)), o que representa uma proteção preventiva, pouco usual nos modelos de
administração executiva.

Os limites à plena jurisdição do tribunal administrativo: antigamente, também se apresentava


como limite funcional da justiça administrativa a diminuição dos poderes de decisão do juiz
quando estivesse em causa a prática ou omissão de atos administrativos de autoridade – o juiz
só poderia anular o ato da Administração, não podendo exercer nesse domínio os poderes
típicos da plena jurisdição. De facto, já desde 1977 ou, pelo menos desde 1985, se entendia
que, ainda que o dispositivo da sentença se limitasse a anular o ato administrativo impugnado,
não se poderia esquecer que essa anulação representava uma eliminação retroativa do ato, de
modo que a decisão do juiz produzia “efeitos ultra-constitutivos”, ficando a Administração
obrigada a retirar todas as consequências jurídicas dessa eliminação, executando a sentença
com respeito pelo julgado. Por outro lado, ainda que se continuasse a reconhecer à
Administração um privilégio de execução prévia da sentença, dado que a própria efetivação de
muitas das consequências desta implicava a intermediação de uma atividade administrativa,
admitia-se que o juiz utilizasse diretamente poderes de plena jurisdição, na medida em que
acabava por “especificar” aquilo em que devia consistir a atividade administrativa de execução
do julgado. O entendimento atual da juridicidade e da justiciabilidade administrativas é
incompatível com uma proibição de condenação ou de injunção, nas relações entre o juiz e
administração, quer a prestação consista em uma ação material ou em uma atividade jurídica-
essa âmbito constitucional (no art268º) dos poderes judiciais de condenação à prática de atos
administrativos legalmente devidos ou de adoção de providências cautelares antecipatórias
necessárias à tutela judicial efetiva das posições jurídicas dos particulares. O CPTA, no
art2º,estão enumerados os pedidos que se podem dirigir aos tribunais administrativos,
incluindo expressamente os de condenação, intimação e injunção, dirigidos às autoridades
administrativas; tal como no art3º se refere aos poderes dos tribunais administrativos, como o
de fixar prazos para cumprimento dos deveres que imponham à Administração e de lhe aplicar
sanções pecuniárias compulsórias, e o de assegurar a execução das sentenças, inclusivamente
através de sentenças substitutivas de atos administrativos. O que o juiz não pode, é
determinar aquilo que a Administração há-de fazer num caso concreto, devendo limitar-se
então a uma condenação genérica ou diretiva. O juiz tem de respeitar por força de caso
decidido de um ato administrativo, quando este ainda que inválido, se tenha tornado
impugnável pela queda do prazo de impugnação, embora possa conhecer incidentalmente
essa eventual ilegalidade do ato, quando a lei o permita em regra, para efetivação da
responsabilidade civil da Administração. O principio implica tão só, o que é muito diferente,
uma proibição funcional de o juiz afetar a essência do sistema de administração executiva:
não pode ofender a autonomia do poder administrativo, isto é, o núcleo essencial da
discricionariedade, na medida em que a lei, confira aos órgãos da administração poderes
próprios de apreciação ou de decisão; tal como tem de respeitar em principio a autoridade e a
força estabilizadora características do ato administrativo, em especial, a sua força de caso
decidido.

O âmbito orgânico da justiça administrativa- a jurisdição administrativa:

Segundo um critério orgânico, a justiça administrativa compreende exclusivamente a


resolução das questões de direito administrativo que sejam atribuídas à ordem judicial dos
tribunais administrativos. Por outras palavras, tal dimensão só tem influência na determinação
do âmbito da justiça administrativa se à jurisdição administrativa não for atribuída a
competência para conhecer de todas as questões de direito administrativo e exclusivamente
dessas questões. Teremos de determinar o âmbito da jurisdição administrativa ao nível das
opções da legislação ordinária que regula a competência dos tribunais administrativos, desde
logo no ETAF, que contém as regras gerais dessa competência, mas também na legislação
especial que, a propósito de matérias especificas, acaba por conter normas que podem
significar uma atribuição ou uma subtração relativamente a essas competências comuns.
Referimo-nos a uma dimensão orgânica e não a uma dimensão orgânico-processual da justiça
administrativa , apesar de termos consciência de que a atribuição de uma questão aos
tribunais administrativos implica naturalmente a respetiva sujeição a um processo especial de
julgamento. Na verdade, o CPTA, embora se refira à jurisdição administrativa, parece ter a
pretensão de estender em geral, a aplicação dos seus preceitos, posto que com as necessárias
adaptações, “aos processos em matéria jurídico-administrativa “, cuja competência seja
atribuída a tribunais pertencentes a outra ordem jurisdicional. É pois, o âmbito da jurisdição
administrativa, enquanto organização dotada de competências, que tem relevo autónomo na
delimitação da justiça administrativa, visto que as regras processuais administrativas tendem a
acompanhar a dimensão material da instituição.

O alcance da reserva constitucional da jurisdição administrativa: a 1ª questão que se coloca é


pois, a da interpretação do atual art212º, nº3 da CRP- onde se diz, que “compete aos tribunais
administrativos (e fiscais) o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por
objeto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas (e fiscais)- para
saber se aí se consagra uma reserva material absoluta de jurisdição atribuída aos tribunais
administrativos, no duplo sentido de que por um lado, os tribunais só poderão julgar questões
de direito administrativo, e de que por outro lado, só eles poderão julgar tais questões.
Quanto ao 1º aspeto da questão, a jurisprudência do tribunal constitucional, formulada a
propósito dos tribunais militares parecia apontar para uma reserva negativa ou de exclusão
aplicável aos tribunais não judiciais- estes tribunais seriam tribunais especiais, no sentido de
que apenas poderiam julgar as questões que lhe fossem constitucionalmente atribuídas. As
tendências doutrinárias desenvolveram-se em sentido inverso, admitindo-se
generalizadamente a atribuição legal aos tribunais administrativos da resolução de litígios
referentes à atividade da Administração , ainda que respeitassem as relações ou incluíssem
aspetos de direito privado, considerou-se admissível a atribuição à jurisdição administrativa da
competência para julgar ações sobre contratos privados da Administração, ou para julgar
ações de responsabilidade civil extracontratual por atos de gestão privada da Administração.
Tal como se defendeu mesmo a atribuição de competência aos tribunais administrativos para
conhecer litígios decorrentes da atividade mo âmbito de outras funções estaduais- por
exemplo, ações sobre responsabilidade civil do Estado por atos da função politica, legislativa
ou jurisdicional. Como veremos a seguir, foi nesse sentido a Reforma da justiça administrativa
que optou por atribuir expressamente aos tribunais administrativos a resolução de litígios não
incluídos na cláusula geral do art212, nº3. Quanto ao segundo aspeto da questão, as opiniões
da doutrina dividiram-se mais claramente e propiciaram uma discussão alargada sobre o
alcance do preceito constitucional. Para alguns, resulta da Constituição uma reserva, perante a
qual o legislador não pode atribuir a outros tribunais, designadamente aos tribunais judiciais, o
julgamento de litígios materialmente administrativos, só sendo legítimas, nesta matéria, as
devoluções de competências em matéria administrativa para outros tribunais que forem
previstas ao nível constitucional, ou excecionalmente, em caso de estado de necessidade.
Outros autores propõem uma posição mitigada, admitindo a remissão do legislador para a
“jurisdição comum” de questões emergentes de relações jurídicas administrativas,
designadamente quando estejam em causa direitos fundamentais dos cidadãos, pretendendo
assim assegurar uma proteção processual mais intensa desses direitos. Num sentido de
alguma maneira próximo, o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República distinguia
entre o contencioso por natureza, que seria exclusivo dos tribunais administrativos e o
contencioso por atribuição ou acidental, que seria suscetível de ser conferido aos tribunais
comuns, porque, “tais matérias ainda se prendem com a problemática das garantias dos
particulares contra a Administração- uma posição que no entanto se baseia numa distinção
hoje ultrapassada. A posição mais razoável, pelo Tribunal de Conflitos e pelo Tribunal
Constitucional, parece ser, a que não lê o referido preceito constitucional como um imperativo
estrito, contendo uma proibição absoluta, mas , já que este não exclui essa interpretação-
como uma regra definidora de um modelo típico, suscetível de adaptações ou de desvios em
casos especiais. De facto, na sequencia da intenção de consagrar a ordem judicial
administrativa como uma jurisdição própria , ordinária e não como uma jurisdição especial ou
excecional em face dos tribunais judiciais, na linha da alteração do art211º (atual 209º), que
deixou de considerar os tribunais administrativos como tribunais facultativos. É normal que se
formule, um preceito que contenha a definição da área própria da “nova” ordem judicial
administrativa e fiscal no contexto da organização dos tribunais, adotando o sistema da
“cláusula geral”, sem com isso pretender-se necessariamente estabelecer uma reserva
material absoluta. Essa definição do âmbito-regra, que corresponde à justiça administrativa
em sentido material, deve ser entendida como uma garantia institucional, da qual deriva, para
o legislador ordinário, tao somente a obrigação de respeitar o núcleo essencial da organização
material das jurisdições. Mas só isso: fica proibida a descaracterização ou desfiguração da
jurisdição administrativa, enquanto jurisdição própria ou principal nesta matéria, mas não fica
proibida a atribuição pontual a outros tribunais do julgamento de questões substancialmente
administrativas, admitindo-se a razoabilidade dessas “remissões” orgânicas, muitas delas
tradicionais, que podem ter justificações diversas- devendo por isso, incluir-se na margem de
escolha política e portanto, de liberdade constitutiva própria do poder legislativo, aquele
preceito serve ainda para delimitar o sentido da parte final do nº1 do art211º, que atribui aos
tribunais judiciais uma competência jurisdicional residual, de modo que uma questão de
natureza administrativa passa a pertencer à ordem judicial administrativa quando não esteja
expressamente atribuída a nenhuma jurisdição. Por fim, uma interpretação tao rigorosa
implicaria a inconstitucionalidade ou suscitaria dúvidas e questões sobre a constitucionalidade
de leis importantes e de práticas de longa tradição, designadamente em matéria registral, de
polícia judiciária, de contraordenações e de expropriações por utilidade pública, bem como
uma alteração profunda da organização judiciária administrativa, para tornar o acesso
praticável e a proteção judicial dos cidadãos efetiva.

Em resumo, a interpretação mais razoável do preceito constitucional parece ser a de que visa
apenas consagrar os tribunais administrativos como os tribunais comuns em matéria
administrativa. Foi essa a interpretação que esteve na base da Reforma legislativa de 2002,
que redefiniu o âmbito da jurisdição administrativa em termos que não coincidem
inteiramente com a definição substancial da justiça administrativa determinada pela
Constituição.

São atribuídas pela CRP à jurisdição constitucional, por exemplo, determinadas competências
relativas a matéria administrativa, seja no que respeita a questões eleitorais, seja sobretudo
no que concerne à fiscalização abstrata da constitucionalidade das normas administrativas: i)
julgar certos processos em questões eleitorais comuns, incluindo as impugnações de atos
administrativos praticados pela Comissão Nacional de Eleições ou por órgãos da
administração eleitoral- art223º, nº2 alínea c), da constituição e o art8º da Lei do Tribunal
Constitucional (Lei nº28/82 de 15 de Novembro, alterado, entre outras, pela Lei orgânica
nº85/89, de 7 de setembro); ii) declarar com força obrigatória geral a inconstitucionalidade ou
a ilegalidade de normas administrativas com fundamento em violação direta da Constituição
ou de estatutos regionais –art281º, nº1 alíneas a),c) e d) da CRP e o art72º, nº2 do CPTA. B)
também não cabe na justiça administrativa a resolução de questões da legalidade financeira da
atuação administrativa, tal como decorre das contas dos entes públicos: o julgamento das
contas das entidades públicas cabe, por determinação constitucional, ao Tribunal de Contas,
ainda que nos termos da lei respetiva- art214 CRP. C) está também constitucionalmente
atribuído, ainda que de forma global e indireta, pelo art8ºm nº3, o conjunto de questões de
direito administrativo que pertencem à jurisdição de tribunais internacionais, em especial ao
tribunal de justiça e ao tribunal geral da união europeia, no âmbito da aplicação do direito da
união europeia- quer se trate de questões prejudiciais, relativas à interpretação das normas
comunitárias, quer se trate de questões julgadas a título principal, designadamente no âmbito
das relações diretas entre a administração comunitária e entidades ou empresas nacionais.
D)por fim, pode considerar-se que a previsão da existência de tribunais arbitrais também
constitui de algum modo uma compressão constitucional da reserva judicial dos tribunais
administrativos, cuja concretização é feita pelo legislador ordinário (desde logo, no CPTA) ao
definir as matérias administrativas suscetíveis de ser cometidas, em primeira instância, à
juridição arbitral.

A delimitação legal do âmbito da jurisdição administrativa

O âmbito da justiça administrativa não se determina, simplesmente no plano substancial e no


plano funcional, com base na constituição, dependendo ainda do recorte orgânico que seja
dado à jurisdição administrativa.

É essa definição realiza-se no plano legal, a par de normas que visam caracterizar o conteúdo
da cláusula geral estabelecida pela constituição, são de destacar, por outro lado, os preceitos
que implicam a diminuição, por subtracção, do âmbito da jurisdição administrativa, e, em
contrapartida, outros que produzem a sua aplicação, por atribuição aos tribunais
administrativos do julgamento de questão que, não lhes caberia substancialmente conhecer.

2.1- o âmbito da jurisdição administrava segundo ETAF

O ETAF começa por reafirmar, no art.1, a cláusula geral estabelecida na constituição p, que
define a competência dos tribunais administrativos de um ponto de vista substancial,
referindo-a aos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas.

Entendeu determinar a competência da jurisdição administrativa, através das enumerações,


no art.4, não só, como acontecia no diploma anterior, dos litígios excluídos, mas também dos
litígios nele incluídos.

Uma enumeração positiva é uma enumeração negativa, que referem os litígios cuja solução
compete ou não compete aos tribunais administrativos, circunstâncias que compete eliminar
algumas dúvidas e determinar com mais exactidão o âmbito da respectiva jurisdição.

Tal não significa, que não subsistam problemas quanto a esse âmbito, seja porque as
enumerações são exemplificativas, seja porque, sendo impossível, uma identificação de todos
os litígios ou até a sua classificação exaustiva, utilizam conceitos que carecem de precisão, seja
ainda porque não prejudicam a existência de legislação especial divergente.

E na linha de posição que assumimos na determinação do conceito substancial de justiça


administrativa, entendemos que a enumeração positiva é, meramente concretizadora da
cláusula geral que deriva da constituição, mas tem de ser considerada aditiva, quando seja
inequívoca que visa atribuir competências que não caberiam no âmbito definido por essa
cláusula.

A enumeração negativa é, meramente concretizadora da cláusula geral e, portanto,


delimitadora do âmbito substâncial da jurisdição, mas contém igualmente disposições que
restringem manifestamente tal âmbito, devendo reconhecer-se-lhes um carácter e um efeito
subtrativo.

2.1.1 - a generalidade das alíneas do n1 do art.4 - com excepção da parte das alíneas f) e g),
relativas a matéria de contrato e de responsabilidade civil- visa apenas a concretização positiva
do conceito de " Litígios emergentes das relações jurídicas administrativas", não levantando
problemas de maior.

O conteúdo as alíneas deve entender-se, por regra, delimitando em função da cláusula geral
do n1 : a partir de 2015 ficou expressamente afirmado, quanto à tutela de direitos
fundamentais referida na alínea a), que só cabe aos tribunais administrativos no âmbito das
relações jurídicas de direito administrativo, e quanto às relações jurídicas inter-administrativas
apontadas na alínea k), que abrangem tão só aquelas que se desenvolverem sob a égide do
direito administrativo. A preocupação legal de delimitação do âmbito da jurisdição através da
referência aos " poderes administrativos" e ao regime de "direito público" naquelas alíneas
que possam abranger atos jurídicos praticados por sujeitos privados, por exemplo, a alínea d),
sobre a fiscalização de legalidade de normas e atos jurídicos, e a alínea h), em matéria de
responsabilidade civil extracontratual.

A este conjunto de matérias, salienta-se ainda que as várias alíneas, ao concretizarem o


âmbito da jurisdição, cumprem um duplo propósito: o de enunciar as hipóteses mais
importantes de litígios decorrentes de relações jurídicas administrativas, e o de tornar clara a
competência dos tribunais administrativos relativamente a casos que, por determinações
legais anteriores, lhes tinha sido ou parecia terem sido subtraídos.

Com alínea a), relativa a tutela de direitos fundamentais que antigamente se considerava exigir
a intervenção da jurisdição comum, para ser de máximo alcance. E mesmo que se diga da
alínea k), relativamente às violações cometidas por entidades públicas valores e bens
constitucionalmente protegidos, por acção ou omissão.

2.1.2- os problemas em matéria de contratos e de responsabilidade, na medida em que tem de


se considerar um alargamento da jurisdição administrativa relativamente à cláusula geral de
definição substancial.

A) quanto aos contratos, esse alargamento é evidente na alínea e), em que se confere aos
tribunais administrativos competência para julgar litígios que tenham por objecto de validade
de atos pré-contratuais e a interpretação, validade e execução de contratos administrativos ou
de quaisquer outros contratos celebrados nos termos da legislação sobre a contratação
pública, por pessoas coletivas de direito público ou outras entidades adjudicantes.

Ao regular os procedimentos pré-contratuais, também abrange contratos de direito privado


celebrados pela administração, bem como alguns contratos celebrados por entidades privadas,
que sejam entendidos adjudicantes.
B) em matéria de responsabilidade civil extracontratual do estado, há a considerar duas áreas
de acrescimento da jurisdição administrativa

B1) a alínea f) atribui expressamente aos tribunais administrativos o julgamento das questões
relativas à responsabilidade civil extracontratual das pessoas coletivas de direito público,
incluindo pelos danos resultantes do exercício das funções políticas, legislativa e jurisdicional.
Não há quaisquer dúvidas sobre o carácter aditivo deste segmento do preceito, que avulta
ainda mais quando comparado do a lei anterior de 2002, que excluía expressamente o
respectivo julgamento da jurisdição administrativa, bem como com a exclusão, que se
mantém, do conhecimento da impugnaçãodos atos políticos e legislativos ( al.a) do n3).

Nota-se que a referencia à função jurisdicional só é, aditiva no que respeita à apreciação pelos
tribunais administrativos das acções de responsabilidade por erro judiciário cometido por
tribunais administrativos, pois que a responsabilidade pelos danos resultantes do
funcionamento ilícito da administração da justiça, sobretudo na medida em que esteja em
causa a ofensa ao direito a uma decisão em prazo razoável, envolve a resolução de questões
de direito administrativo, tal como acontece na alínea C), que inclui litígios relativos à validade
dos atos em matéria administrativa dos tribunais, mesmo dos judiciais.

Deve considerar-se incluída na competência dos tribunais administrativo, a título da mera


concretização, o conhecimento das acções de responsabilidade por atos causados pelos atos
de natureza administrativa relativos ao inquérito e à instrução criminal e ao exercício da acção
penal - isto apesar da impugnação desses atos de fazer perante os tribunais judiciais.

Levantam-se algumas questões de aplicação a alínea g) no que diz respeito a responsabilidade


dos titulares dos órgãos legislativos e dos magistrados - para além da irresponsabilidade dos
deputados ( art. 157 n1 da constituição), há a considerar a responsabilidade excepcional dos
juízes ( art.216 n2), que aponta para a necessidade de limitar ou excluir responsabilidade
externa dos magistrados, sem prejuízo de direito de regresso do estado em casos de dolo ou
de culpa, bem como a dúvida sobre a responsabilidade dos membros do governo, sobretudo
do conselho de ministros, relativa ao exercício da função política e legislativa.

B2) as alíneas f) e g) parecem indicar que compete à jurisdição administrativa a apreciação de


todos os litígios que tenham por objecto a responsabilidade das pessoas coletivas de direito
público, inclusivamente pelos danos decorrentes da sua atividade de "gestão privada" - o que
representa uma aplicação importante do âmbito respectivo.

E, não há qualquer razão para duvidar de que os tribunais administrativos passaram a ser
componentes para conhecer da responsabilidade das pessoas coletivas públicas por atos de
gestão privada, mesmo que o regime aplicável seja o estabelecido.

Em sentido contrário, poderia argumentar-se precisamente com a cláusula geral no art.1,


interpretada em termos estritos, que constituiria a regra delimitadora do âmbito da jurisdição
administrativa - na dúvida, valeria a regra geral de competência, carecendo as adições de
serem expressamente formuladas.

Esgrimir-se com o elemento histórico e com a comparação com a alínea h), que limita o
conhecimento pelos tribunais administrativos das acções de responsabilidade de sujeitos
privados - entre os quais parecem estar incluídos os " entes privados administrativos" e os
privados que exercem poderes públicos, designadamente os concessionários - em função de
aplicabilidade do regime substantivo específico da responsabilidade de direito público.

À jurisprudência determina em que medida há alargamento, na medida em que não


desapareceu a diferença de regimes substantivos de responsabilidade civil em função do
carácter público pu privado da atuação administrativa danosa.

E o entendimento jurisprudencial da norma tem ido claramente no sentido de alargamento:


por um lado, julga à jurisdição administrativa competente quanto à responsabilidade
extracontratual das pessoas coletivas públicas, seja por atos de gestão pública,seja por atos de
gestão privada, por outro lado, considera que os tribunais administrativos são competentes
desde que esteja em causa o exercício da função administrativa, mesmo que se trate de
atuações de entes privados fora do exercício de prerrogativas de poder público.

C) no que respeita especificamente a alínea g), também se pode perguntar se a jurisdição


administrativa abrange apenas as questões da responsabilidade dos titulares dos órgãos,
funcionário, agentes e demais servidores públicos por atos funcionais, isto é , praticados no
exercício das funções, ou também por atos funcionais. Apesar de a lei não distinguir, resultará
do critério geral de partição das competências que a jurisdição administrativa só conhece das
questões de responsabilidade civil por atos praticados pelos servidores públicos enquanto tais,
e, pelo menos aparente, com o exercício de funções administrativas.

Também serão da competência dos tribunais administrativos acções de responsabilidade


contra os titulares de órgãos e trabalhadores de pessoas coletivas privadas, quando atuam no
exercício de prerrogativas de poder público ou regulada suor disposições ou princípios de
direito administrativo p, interpretando-se o conceito " demais sujeitos" referido na alínea g) de
modo abrangê-los.

D) o ETAF traz uma aplicação da jurisdição administrativa em matéria de contratos e de


responsabilidade civil extracontratual da administração. Estas alterações legislativas têm um
mero alcance processual: não significam que as questões passem a ser inteiramente reguladas
pelo direito administrativo; levam é a que os tribunais administrativos passem a aplicar, a
título principal, normas de direito privado.

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