Sunteți pe pagina 1din 10

Artigos

UM JUDEU NO VATICANO II *
A jew in Vatican II

Antonio Carlos Coelho **

RESUMO: O desejado“aggiornamento” que João XXIII propôs para o Vaticano II seria incompleto
se não firmassem posições positivas diante de diversos ambientes sociais de então. Sentia-se
necessidade de que o concílio estabelecesse bases das novas exigências éticas e de coerência
teológica, no diálogo se impunha, inclusive com o judaísmo e os judeus. Por isso, foi confiada a
Johannes Oesterreicher, um judeu convertido e então cardeal, foi confiada, a tarefa de escrever
um texto com as verdades que deveriam reger a relação entre o povo de Israel e a Igreja – o
que veio a ser a base de “Nostra Aetate”. As seculares tensões entre cristãos e judeus, mesmo
durante o Concílio, incluindo Paulo VI, foram revividas muitas vezes, inclusive por lobbies árabes.
93
Todavia a Igreja deu passos significativos para uma aproximação aos irmãos mais velhos”, graças
à contribuição de grandes homens, como Oesterreicher.

PALAVRAS CHAVE: judeu, católico, relação, mudança, diálogo.

ABSTRACT: The so called and wanted “aggiornamento” that John XXIII proposed for the Vatican
II, would be incomplete if it would not establish positive positions before the several social
environments of its time. It was a quite felt need that the Concilium should establish the bases
for the new ethical and theological coherence demands, in the proposed dialogue including
the Judaism and the Jews. In this segment, it was entrusted to Johannes Oesterreicher, a former
Jew - converted, and a Cardinal - the task to compose a text on the fundamental truths which
should guide the relation between the people of Israel and the Church – that came to stand as
the basis of ‘’Nostra Aetate’’. The secular tensions between Christians and Jews, even during the
Concilium, as to also mention Paul VI, were revived many times, even by Arabic Lobbies.
Nevertheless, the Church walked at spaces of meaningful cores for an approaching of historic
meaning to the‘’older brothers’’, all of it, thanks to the contribution of great men, as Oesterreicher.

KEY WORDS: Jewish, catholic, relation, change, dialogue.

* Este artigo foi publicado nos Jornais Visão Judaica e Universidade (Instituto Ciência e Fé) no ano de 2012, em
Curitiba.

* * Antonio Carlos Coelho é professor de Ecumenismo e Judaísmo do Studium Theologicum e diretor do Instituto
Ciência e Fé. Estudou em Israel arqueologia bíblica e tradição judaica. Tem artigos publicados em diversos jornais
e revistas. Lançou “Encontros Marcados com Deus - Expressão da Unidade do Povo de Deus” pela Paulinas, em
abril de 1990.
Recebi do meu amigo Szyja Lorber, editor do Jornal Visão Judaica, um
artigo sobre a participação do cardeal Johannes Oesterreicher na elaboração
do principal documento da Igreja que estabelece as relações entre católicos e
judeus, o Nostra Aetate. Não haveria nenhuma novidade se o referido cardeal
não fosse um judeu convertido ao cristianismo e não tivesse o papel que teve
nas relações entre a Igreja e o Judaísmo.

Oesterreicher nasceu em 1904, no Stadt-Liebau, no norte da Moravia.


Filho de veterinário judeu chamado Nathan. Participou da juventude sionista
até que, influenciado pela leitura de Cardeal John Newman, Kierkegaard e
dos Evangelhos, converteu-se ao cristianismo. Em 1930 foi padre na diocese
de Viena. O conteúdo anti-judaico dos textos cristãos o assombrava. Reinava
entre os cristãos a ideia da necessidade da conversão dos judeus para a
realização das promessas bíblicas. Não eram poucos aqueles que trabalhavam
para a conversão dos judeus – assim como fazem hoje algumas denominações
cristãs.

No ano de 1937, o padre Oesterreicher, o filósofo Waldemar Gurian – de


94 origem judaica – e o teólogo Karl Thieme1 escreveram uma declaração sobre
os judeus, contra o racismo na Igreja e na sociedade e, salientando a santidade
do povo de Israel. Mas, quando os nazistas entraram na Áustria, em 1938, os
seus autores foram obrigados a fugir para Paris onde deram continuidade
ao trabalho através do rádio. Em sermões transmitidos em língua alemã
chamavam Hitler de “espírito imundo” além de denunciar os crimes praticados
pelos nazistas na Polônia contra judeus e poloneses. Após maio de 1940, com
a ocupação germânica da França, Oesterreicher escapou para Lisboa e, por
fim, chegou aos Estados Unidos, trabalhando na Universidade Seton Hall
University2 como especialista nas relações entre judeus e a Igreja Católica
na América. Foi um dos pioneiros no Diálogo Judaico-Católico nos Estados
Unidos.

Foi por essa razão que o Papa João XXIII o chamou para compor a
“Secretaria Unidade” durante a preparação do Concílio Vaticano II em 1962.
Encarregou-o de escrever um documento expondo as verdades básicas que
deveriam reger a relação entre o povo de Israel e a Igreja. Documento que
serviu de base para o futuro “Nostra Aetate”.

Quem lê o Documento publicado em outubro de 1965 pode julga-lo


insuficiente para estabelecer um diálogo profundo entre judeus e católicos. Mas,
1 Ao escrever este artigo foram consultados diferentes artigos sobre o Cardeal Oesterreicher.
Alguns citavam o teólogo Karl Thieme, no entanto nada encontrei sobre ele, senão um
homônimo que foi oficial do exército alemão durante a Segunda Guerra Mundial.
2 A Selton Hall University é uma universidade católica, localizada no Estado de New Jersey. Possui
o curso “Jewish-Christian Studies” entre seus programas de mestrado.
também, não pode negar de que foi um grande passo a favor da superação do
preconceito, provocando uma nova visão no interior da Igreja em relação aos
judeus.

Uma nova postura da Igreja em relação ao judaísmo era, na época, uma


exigência ética e de coerência teológica. O ocorrido durante a Segunda Guerra na
Europa, continente cristão, não era aceitável. Havia um forte sentimento de culpa
no meio cristão. Problema que deveria ser resolvido no seu ambiente. João XXIII
estava convencido de que a Igreja do pós-guerra e no mundo em transformações
deveria promover a aproximação entre católicos e judeus, bem como entre
católicos e cristãos de diferentes denominações. Para o Papa, a reforma desejada
não seria completa se não firmasse posições positivas entre os dois povos e entre
os cristãos não católicos.

Talvez para aqueles que pouco conhecem o mundo católico a Igreja


represente um grande rebanho obedientemente cego conduzido pela vontade
dos papas. Basta um olhar superficial sobre a história da Igreja para se perceber que
isso nunca foi uma realidade. O Concílio Vaticano II é uma prova disso. Diferentes
correntes – da ortodoxia à liberal, as experiências regionais se revelaram em 95
complexos debates e concertos no interior do Vaticano entre os anos de 1962
a 1965. Os documentos que resultaram do Concílio representam um avanço
imenso e colocou a Igreja em sintonia coma as transformações da sociedade no
século XX.

Nos anos 60 o resultado do Concílio provocou um terremoto dentro


da Igreja. Não faltaram insatisfeitos e muitos abandonaram a vida religiosa.
Grupos de resistência apareceram, chegando a gerar cisões e situações até hoje
não solucionadas. Todavia, deve-se considerar que as mudanças na sociedade
mundial, o progresso científico e tecnológico, a globalização, o fim da guerra fria
– fenômenos bastante recentes – promoveram um novo e intrincado cenário.
Assim, aquilo que foi renovador no ambiente católico nos anos 60, 70 e 80 hoje se
apresenta inadequado em muitos aspectos.

O cardeal Oesterreicher numa entrevista concedida a jornalistas alemães


nos anos 80 manifestou sua visão sobre “diálogo entre judeus e católicos”
apontando para novas necessidades e também, para um novo conceito do termo,
que para ele, se tornou um chavão e se apresenta limitado diante da atualidade.

Os caminhos para a aproximação da Igreja com os judeus não foi nada


fácil. Havia uma história triste a ser superada. Como, também, era necessário
converter mentalidades arcaicas e mesmo antijudaicas dentro da Igreja.

Papa João XXIII tratou de conduzir essa mudança de forma sábia com
gestos concretos de aproximação. Primeiramente chamou “um judeu” o Cardeal
Johannes Oesterreicher para redigir um documento expondo as verdades
básicas que deveriam reger a relação entre o povo de Israel e a Igreja. O Cardeal
Osterreicher era a pessoa certa. Vinha de família judaica, de uma região onde
o antijudaismo era fortemente sentido pelas comunidades. Como convertido
acreditou, por um tempo, que os seus irmãos israelitas deveriam passar pelo
mesmo processo. Depois percebeu a insanidade dessa ideia. Juntou-se a outros
judeus convertidos para lutar contra o antijudaísmo e o nazismo através de seu
programa de rádio. Portanto, experiência não lhe faltava e João XXIII percebeu a
força que possuía para dar início a uma transformação histórica.

Segundo Giuseppe Alberigo3, o anúncio do Concílio não despertou muito


interesse ao mundo judaico da época (1962), ou contrário do que ocorreu entre
os protestantes. Isto se deu em razão de não ter sido anunciado pela imprensa
o interesse da Igreja em estabelecer relações com os não-cristãos. Quanto ao
pouco interesse manifestado pelos judeus atribui-se, também, à complexidade
do mundo judaico – diversidade de representações e inserção do povo numa
pluralidade de culturas. Soma-se a isso a independência do Estado de Israel e os
96 efeitos da Shoá, onde quase 50% da população judaica da Europa foi exterminada.

Apesar desse conjunto de aspectos a serem observados pelos conciliares


em relação aos judeus e ao judaísmo pairava sobre os cristãos da Europa – no caso
sobre os católicos latinos4 – o peso da responsabilidade pela perda de milhões
de almas num ambiente que se vangloriava em ser espiritualmente cristão. Na
Alemanha, nos anos do Concílio não havia mais de 15 mil judeus. Na Polônia
restaram 20 mil dos três milhões que lá viviam antes do conflito, e 3 milhões de
judeus viviam em silêncio, cercados de suspeitas na URSS.

Papa João XXIII tinha vivido (1939-1945) na Turquia na condição de Núncio


Apostólico. Lá concedeu milhares de certificados de batismo a judeus, obteve
vistos turcos junto às autoridades, facilitando-lhes o trânsito e a emigração para
Palestina. Em setembro de 1940, sabendo do sofrimento imposto aos judeus na
Polônia, procurou estabelecer contatos visando contribuir para que chegassem
a Terra de Israel. Fez o mesmo, mas nem sempre com sucesso, aos judeus da
Hungria, Romênia, Moldávia, Eslováquia, Croácia, Grécia e Bulgária, intercedendo
diretamente junto ao Rei Bóris III da Bulgária. O Cardeal Roncalli (João XXIII),
naqueles tempos difíceis, cooperou com diversas pessoas de boa vontade, como
Chaim Barlas (Agência Judaica em Istambul), o Rabino Chefe Yitzhak HaLevi
Herzog e Ira Hirshman, representante do “War Refugee Board”, em Istambul. E,
3 Giuseppe Auberigo, coordenador da obra História do Vaticano II, traduzidos os volumes I e II por
José Oscar Beozo – Editora Vozes, Petrópolis. A obra é composta de seis volumes, no entanto, no
Brasil somente os dois primeiros volumes foram traduzidos do italiano.
4 Católicos latinos são que adotam o rito litúrgico latino, diferenciam-se daqueles que mantêm o
rito bizantino em sua liturgia. Os católicos latinos representam a maioria católica no Ocidente.
juntamente com o Cardeal Roncalli, colaboraram as Religiosas de Sion, o Arcebispo
Ângelo Rotta de Budapeste – este colaborador de Raoul Wallemberg5.

A experiência dos tempos de guerra marcou João XXIII. O Papa estava


decidido em estabelecer uma ponte entre a Igreja e o povo judeu. Apesar
do Vaticano não ter reconhecido oficialmente o Estado de Israel, o Papa fez
chegar a comunicação da sua eleição ao governo de Israel. Comunicação que
foi respondida com desejos de “sinceras bênçãos” pelo Rabino Chefe Yitzhak
Herzog, seu conhecido dos tempos da Turquia. Outro pequeno passo se deu
durante a Semana Santa de 1959. O Papa solicitou que fossem suspensas as
preces que soavam hostis aos judeus. Logo em seguida, o Papa determinou a
retirada dos livros litúrgicos todas as referências que pudessem soar ofensivas aos
judeus, muçulmanos, protestantes e pagãos. Esses gestos foram saudados pela
comunidade judaica.

No entanto, por ocasião da inauguração da nova Sinagoga de Colônia,


o que deveria representar um novo tempo nas relações entre cristãos e judeus,
retornaram as manifestações anti-judaicas. A sinagoga amanheceu, no dia da sua
inauguração,pixadacomsuásticas.NosEstadosUnidoseemalgunspaísesdaEuropa 97
surgiu uma nova onda antissemita. No dia 18 de janeiro de 1960, representantes
da B’nai B’rith solicitaram uma audiência com João XXIII. Agradeceram ajuda aos
judeus perseguidos no tempo em que esteve na Turquia, bem como a supressão
das palavras ofensivas aos judeus da liturgia católica. Em outubro do mesmo ano,
o Papa recebeu no Vaticano 130 representantes do United Jewish Appeal. Nesta
ocasião, ao encontrar com a comitiva, abriu os braços, num gesto acolhedor e
exclamou: “Sou eu, José, o vosso irmão” – a expressão remetia ao encontro de José
e seus irmãos no Egito. Dois anos após, em 17 de maio de 1962, cinco meses antes
de iniciar o Concílio aconteceu um episódio que ficou marcado na história dos
judeus romanos. O Papa, passando pela avenida ao longo do Tibre, encontrou-se
diante da Sinagoga de Roma. Fez parar o carro. Abriu a capota e abençoou um
grupo de judeus que saia do edifício. O Rabino Elio Toaff testemunhou o fato e
recordou que após um estranhamento compreensível daquelas pessoas, o grupo
cercou o automóvel do Papa aplaudindo-o entusiasticamente. Aquela tinha sido
a primeira vez na história que um Papa abençoava os judeus, e talvez fosse –
segundo Toaff – o primeiro gesto de reconciliação.

Em 1947, na Conferência de Seelisgsberg, promovida pelo Conselho de


Cristãos e Judeus, foram sugeridos dez pontos a serem revistos nas atitudes na
relação dos cristãos com os judeus. Entre eles estava a revisão da catequese e do
ensinamento cristão com respeito aos judeus e ao judaísmo.

5 Ver em: http://www.raoulwallenberg.net/news/irwf-postulates-apostolic/


Em junho de 1963, com o Concílio já em andamento, Jules Isaac6 entregou ao
Papa um memorando e um dossiê solicitando uma reformulação do ensinamento,
da pregação e da catequese cristã visando à eliminação das raízes do antissemitismo.
O dossiê entregue por Jules Isaac parece ter sido determinante. Tal documento foi
encaminhado ao Cardeal Bea e ao seu secretariado. Deu-se, assim, de forma mais
objetiva, a condução dos trabalhos sobre o tema das relações judaico-católicas. O
grupo de Bea criou uma rede de contatos com o mundo hebreu e suas principais
associações, em particular na França, Estados Unidos e Israel 7.

Apesar dos trabalhos se concentrarem no aspecto exclusivamente religioso


- não contemplando questões como o conceito nacional judaico e o Estado de Israel
- o decreto De Judaeis8 - elaborado pela comissão liderada pelo Cardeal Bea, ganhou
alcance político. Os bispos de origem árabe, principalmente dos países vizinhos a
Israel ficaram atentos aos possíveis problemas com suas comunidades. Os países
árabes não ficaram indiferentes, bem como as organizações judaicas e o Estado de
Israel mantiveram-se atentos às novidades e implicações políticas do decreto De
Judaeis.
98 Embora a orientação dada aos trabalhos sobre o decreto fosse de cunho
religioso, os árabes cristãos e muçulmanos temiam um estreitamento das relações
entre os estados do Vaticano e de Israel com a possível formalização das relações
diplomáticas. E outras palavras, os árabes receavam o reconhecimento do Estado de
Israel peloVaticano e a sua repercussão no mundo cristão.Tal preocupação deu início
ao lobby árabe junto às secretarias do Vaticano, bem como foram encaminhados
pedidos de intervenção a diferentes países. O objetivo era desencorajar os
conciliares a dar sequência ao trabalho de aproximação dos católicos aos judeus.

A movimentação contra a possibilidade de uma aproximação entre o


mundo hebraico e o Vaticano já era forte antes mesmo de iniciar o Concílio. Segundo
Giuseppe Alberigo, “as polêmicas se tornaram mais vívidas e públicas em seguida
à gafe cometida pelo World Jewish Congress, em 12 de junho de 1962, anunciou
o Dr. Chaim Wardi9 como observador não oficial no Concílio”. As reflexões sobre

6 Jules Isaac – 1877-1963 – historiador, foi inspetor geral da instrução pública na França, perseguido
pelo regime de Vichy por sua origem hebraica, perdeu sua mulher e filhos nas perseguições
nazistas.
7 Beozzo, José O., História do Concílio Vaticano II, vol. 1, p.390, Ed. Vozes, Petrópolis, 1995.
8 De Judaeis, decreto – é o nome dado a uma série de projetos de documentos do Concílio
Vaticano II de encaminharam a Igreja para o diálogo com o judaísmo. Serviram de base para
o documento final “Nostra Aetate”, que é uma pequena parte do que apresentou o decreto De
Judaeis.
9 Chaim Wardi, havia feito intervenções no Conselho Ecumênico das Igrejas em Nova Déhli, em
1961, participando da elaboração de uma declaração contra o antissemitismo. Dr. Wardi morava
em Israel e teve sua indicação tanto do Congresso Judaico Mundial como dos Ministérios do Ex-
terior e dos Assuntos Religiosos, o que deu uma conotação fortemente política na sua indicação
como representante judaico junto ao Concílio.
a relação Igreja-judeus estavam sendo tratadas com discrição, mas quando se
pensou em enviar representantes judeus ao Concílio, na condição de hóspedes
do Secretariado (órgão responsável pelo preparo da documentação sobre as
relações judaico-cristãs), houve resistência da parte da ortodoxia judaica. Portanto,
as pressões vinham de ambos os lados. Do judaísmo ortodoxo, que preferia ver
seus irmãos longe das questões da Igreja e, doutro lado, os árabes que temiam
a aproximação do Vaticano a Israel, prenunciando o reconhecimento do Estado.

O Vaticano passou a assistir os protestos dos países árabes e pedidos


de igual representação. Interessante é que, até então, nenhuma organização
muçulmana havia se manifestado quanto à possibilidade de diálogo religioso com
os católicos. Em janeiro de 1962 a revista Al-Sarqawi havia publicado um artigo
em resposta à Igreja, ocasião em que ela havia convocado os muçulmanos para
lutarem contra o ateísmo (comunismo). No artigo ficou claro que os muçulmanos
estiram dispostos a lutar ao lado dos cristãos contra o ateísmo na condição de que
a Igreja combatesse o sionismo.

Diante da oposição dos países árabes, considerando que muitas


comunidadescristãsvivem desdea antiguidade emterras do Islã e da interpretação
99
política que se desenvolveu, o Cardeal Bea, responsável pelas reflexões sobre o
diálogo com os judeus, resolveu suspender, ao menos publicamente, os trabalhos
do seu Secretariado.

O Papa João XXIII teve um pontificado curto. Morreu em 3 de junho de


1963. Todavia, ao contrário do esperado, revolucionou a Igreja Católica. Apesar da
sua simplicidade e do tipo bonachão não lhe faltaram coragem e força espiritual
para conduzir a Igreja ao mundo moderno.

João XXIII foi sucedido pelo Cardeal Giovanni Maria Montini, que escolheu
o nome Paulo VI para ocupar a Sé de Pedro. A ele coube dar continuidade do
Concílio Vaticano II. Apesar de ter mantido o mesmo espírito de aggiornamento10
iniciado pelo seu antecessor, não manifestou o mesmo carisma e simpatia às
relações da Igreja com o judaísmo.

Quando Concílio se encaminhava para sua conclusão, faltou-lhe


sensibilidade na sua pregação em relação aos judeus. Exatamente quando a Igreja
salientava em suas pregações e na liturgia a não aceitação, por parte dos judeus
a Jesus - Paulo VI, esqueceu o zelo de João XXIII. Na sua pregação do primeiro
domingo da Paixão – 4 de abril de 1965, disse:

10 Aggiornamento – termo usado por João XXIII para definir a adaptação e a nova apresentação
dos princípios católicos ao mundo atual e moderno, sendo o objetivo fundamental do Concílio
Vaticano II.
“Ora ló spirito e Il cuore di tutti sono chiamati a meditare alquanto, e in
raccoglimento, Il brano Del santo Vangelo teste letto”.

“È uma pagina grave e triste. Narra, infatti, lo scontro fra Gesù e Il popolo
ebraico. Quel popolo, predestinato a ricevere Il Messia, che Lo aspettava da
migliaia di anni ed era completamente assorto in questa speranza e in questa
certezza, al momento giusto, quando, cioè, Il Cristo viene, parla e si manifesta, non
solo non lo riconosce, ma ló combate, ló calunnia ed ingiuria; e, infine, lo ucciderà”
(Osservatore Romano de 7 de abril de 1965)

«Agora, o espírito e o coração de todos são chamados a meditar um pouco,


e em oração, do som do Santo Evangelho”.

«É uma página séria e triste. Narra, de fato, o confronto entre Jesus e os


judeus. Pessoas destinadas a receber o Messias, que o esperavam há milhares de
anos e que estavam completamente absorvidas por essa esperança e essa certeza,
e, no momento exato, isto é, quando Cristo estava presente, quando falou e se
manifestou, (elas) não só não o reconheceram, mas o combateram, o calúniaram,
100 o injuriaram e, finalmente, o mataram.” (tradução livre)

As palavras de Paulo VI foram uma bomba no ambiente hebraico.


O trabalho de João XXIII parecia ser coisa do passado. Era como se o antigo
sentimento antijudaico, aquele que atribuía aos judeus a responsabilidade pela
morte de Jesus (deicídio), retornasse com a mesma força dos séculos anteriores.
Jornais israelenses consideraram ser o Papa um antissemita. O gran-rabino de
Roma manifestou em telegrama enviado ao Secretário de Estado do Vaticano o
sentimento de “penosa surpresa” da comunidade hebraica diante das palavras de
Paulo VI.

Num comunicado lido em Nova York, em 28 de abril de 1965, o Cardeal


Bea afirma que se o Papa tivesse sido orientado por estudiosos não teria feito a
pregação que fez naquele domingo da quaresma de 196511.

Em 30 de abril, o Jerusalem Post publicou uma nota intitulada “O Papa


deplora a acusação feita aos judeus”. O texto da nota traz, também, um pedido de
desculpas do Papa ao povo judeu. Fato é que, o que Paulo VI disse já estava dito.
Refletia o sentimento secular da Igreja em relação aos judeus, como também,
traduzia a dificuldade que Paulo VI tinha em aceitar o caminho aberto pelo
Concílio e João XXIII para a aproximação com o povo de Israel.

Na visita que Paulo VI fez a Israel, apesar de ter sido recebido e acolhido
pelo governo, não fez nenhuma menção ao Estado de Israel. E, após seu retorno,

11 Il Concilio Vaticano II: quarto período, 1965, p. 287, Ed “La Civiltà Cattolica”, Roma, 1968.
agradeceu a acolhida, por telegrama, ao presidente de Israel, no entanto não usa
o termo “presidente” e sim, senhor Zalman Shazar.

Com espírito de boa vontade poderia dizer que Paulo VI agiu desta forma
motivado pela situação política entre árabes e israelenses e, que não queria dar
uma dimensão política nas relações entre a Igreja, o povo judeu e o Estado de
Israel. Todavia, a realidade era outra. Paulo VI, apesar de ter dado continuidade
ao Concílio e mantido o espírito do “aggiornamento”, não estava convencido da
necessidade de se fazer uma reabilitação das relações com Israel e o povo judeu.
A Paulo VI faltava a sensibilidade e a amizade que abundava em João XXIII, João
Paulo II e Bento XVI em relação aos judeus.

Não obstante aos tropeços diplomáticos e de sensibilidade de Paulo VI,


em outubro de 1965 o Concílio terminou, sendo publicado o mais importante
documento da Igreja em relação ao povo de Israel, o “Nostra Aetate”.

Não se tem dúvidas quanto ao valor do seu conteúdo. Representa um


esforço gigantesco de superação de uma mentalidade antissemita que perdurou
do nascimento do cristianismo aos horrores de Auschwitz. Seu conteúdo recupera 101
uma história perdida e contraditória à moral e a caridade expressa nos Evangelhos.

Reconhece a origem cristã no berço e no espírito judaico. Mais do que


um grande passo para a aproximação aos irmãos mais velhos – os judeus – foi
para a Igreja uma reconciliação com sua história e sua teologia. Não seria mais
suportável manter-se na sombra do pecado da segregação religiosa e étnica, da
inquisição, dos pogroms e da Shoá.

O Nostra Aetate talvez não contemple muito do que aqueles que


batalharam décadas para transformar a Igreja desejavam. Mas os nomes de
Cardeal Oesterreich, do Cardeal Agostinho Bea, do próprio Papa João XXIII,
da Congregação de Nossa Senhora de Sion e outras tantas pessoas devem ser
lembradas como grandes batalhadoras para essa transformação na Igreja Católica.
102

S-ar putea să vă placă și