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Evolução do pensamento ldeiniano:


revisão geral e visão pessoal'

I. Desenvolvimento do pensamento de Klcin

A importância fundamental do trabalho de Klcin reside crn ter


começado pelo estudo c tratamento de crianças. Klci n não foi a pri-
meira analista a tratar crianças, tendo sido precedida por Frcud e o
pai do Pequeno Ilans c por Hug-Ilcllmuth. Arma Frcud começou o
trabalho analítico com crianças maiores quase na mesma época que
Klein, mas numa linha U111 tanto diferente. .Iá Klcín inventou uma
forma analítica de usar a técnica do brincar que permitiu, mesmo a
crianças muito pequenas, abaixo dos três anos de idade, um meio
adequado de exprimir pensamentos e sentimentos, meio que podia
ser facilmente combinado com sua capacidade cvolu tiva de se
expressar por meio da linguagem. A invenção dessa nova técnica
pôs novos dados em evidência c deu a Klein, aos poucos, uma con-
vicção inabalável na veracidade dos fatos clínicos que ela descobria.
Acho o material clínico dos artigos iniciais sobre crianças absolu-
tamentc ínsttgante. Esses artigos estão entre os primeiros de psica-
nálise que li, e com certeza os primeiros que pareceram l-cais. Rira,
Trude, Pcter, Ruth, Fritz , Fclix, todos se tornaram pessoas de um
mundo novo, mas de certo modo familiar. Depois, fiquei desconcer-
tada, pois muitos colegas achavam Klcin muito difícil de ler e sua tco-

Este artigo foi originalmente puhlicndo no I'syc!J()on, :,ic l i, . .' 1 'J')..j, vol.
1..j,n" J, C01lCClIl/>01-al'y Kleinicl1I Psychoanulysis; pp. J2~-Jú-t
lOO Sobre a teoria psicullaUtica E-V0I11Ç1ÍOdo penswnento hleiniano 101

ria, às vezes, irracional. Seu estilo não é especialmente feliz, e tive Klcín foi uma inovadora, tanto nas idéias quanto na técnica de
dificuldade com os artigos mais "teóricos", mas todos os artigos clí- análise de crianças. Achei conveniente dividir seu trabalho e111duas
nicos iniciais pareciam uma boa monografia antropológica - antro- fases. Até 19.15, ela trabalhava basicamente den tI'O do quadro rcfc-
pologia social era minha profissão, na época, c meu primeiro amor rcncial de Fremi e de Abraham, embora tenha feito várias mudanças,
intelectual. Havia dados vívidos, teoria suficiente para a cornprccn- 1tlguIl1as inadvertidamente. Depois de 19.15, com os dois artigos
são dos dados, saltos repentinos de imaálnuçâo e de compreensão sobre posição deprcssíva (1935, 1940), o artigo sobre posição esqui-
zopararióidc (194ô), e Inveja e Gratidão (1957), desenvolveu uma
teórica que conduziam ao próximo artigo. Eu não achava difícil
nova teoria, própria. (Para lima introduçâo geral ao trabalho de
entender suas descrições clínicas, ou sua teoria; fantasia incons-
Klcin, ver Segal, 1974. Ver, também, Hinshelwood, 1989; Meltzcr,
ciente, objetos internos, superego sádico primitivo, ansiedade psicó-
19711; c Capcr, 1988. Pctot, 1990 e 1991, faz uma análise textual,
tica, um mundo de objetos muito bons ou muito maus, ataques ao
detalhada. da evolução do pensamento de Klcin. Grcenbcrg e Mit-
interior da mãe, desejos desesperados de reparar o dano - tudo
chell, 1911.1,discutem a posição dela como teórica de relações objc-
parecia familiar, em consonância profunda com um sentimento não
taís/cstrutura-pulsíonal. Kcrnberg, 196'), c Yorkc, 1971, apresentam
formulado dc coisas que eu podia ter sentido quando criança. Talvez revisões crítícas.)
tenha achado o seu trabalho tão convincente por conhecer tão pouco
de psicanálise c não ter ligação anterior com outras teorias. Na ver-
dade, foi ler Klein que me estimulou a ler Freud - tarefa ainda por
A. O primeiro período do trabalho de Klein, 1920-1935
terminar- e tive o mesmo sentimento de descoberta de algo já meio
sabido. Depois veio Bion e, gradativamente, muitos outros psicana-
listas, mas nenhum teve o impacto desses três primeiros.
o trabalho desse período é inovador, complexo, e fcito ponto por
ponto. Klcin descobria novos dados e elaborava novas concepções,
Toda a sua vida, apesar das controvérsias c do furor que ocorria à tão depressa, que suas formulações corriam o risco de ficar inconsis-
sua volta, Klcin achou que seu trabalho seguia os passos de Frcud, era tentos, especialmente por ela se apegar, ao mesmo tempo, à teoria
uma extensão do trabalho dele. E, na verdade, também segundo o das fases libidinais, de Frcud e de Abraham (Freud, 1905; Abraham,
meu modo de ver, existe uma fidelidade consistente, ao longo de todo 1924). Achei conveniente resumir o trabalho desse período em tópi-
o trabalho de Klein, ao que ela considerava o espírito essencial da cos conccituais, que, para combinar com a explosão de descobertas e
abordagem e da técnica de Frcud, Mas ela foi uma inovadora. Ela con- de idéias, ficam agora U111pouco desconcctados uns dos outros. Além
siderava o brincar da criança a contrapartida da associaçâo livre dos disso, alguns são descrições de suas descobertas e idéias, ao passo
adultos. Nessa brincadeira, Klein estava absolutamente preparada que outros são infcrôncias minhas a respeito da abordagem dela.
para desempenhar muitos papéis (nem todos) que a criança lhe suge- Algumas idéias desse período inicial se mantiveram ao longo de todo
ria, a fim de compreender as motivações c os sentimentos da criança. o seu trabalho, outras foram abandonadas ou rcforrnuladas. (Para
Em 1927, criticou Arma Frcud por introduzir elementos cducativos um relato cronolóüíuo desse período inicial, ver principalmente a
na análise de crianças, por incentivar a transferência positiva, c por nota do Editor em As Obru« de Melanie Klein, 197 S, e Pctot, 1990.)
não interpretar a transferência negativa (Klein, 1927a). As descri-
ções da técnica de Klein com adultos, anos depois, em 1943 (Kíng e l. Ptl[sões em Freiul e pu/sães em Klein. Durante esse período inicial,
Steincr, 1991, pp. 635-38) e em1952 (''As origens da transferência", Klein parece não ter visto diferença alguma entre a sua concepção de
1952a), são basicamente muito similares à técnica descrita em pulsão e a de Freud. Mas, sem perceber, estava fazendo uma impor-
1927, e, claramente, ela achava que arnbas se apoiavam em Frcud. tante mudança conccitual. Onde Freud pensa nas pulsõcs como tor-
(Arma Frcud, no entanto, pensou diferente. Ver King e Steincr, 1991, ças biológícas que se ligam a objetos quase que casualmente, através
pp. 629-34.) das experiências pós-natais, para Klcin as pulsões estão íncrente-
lO2 Soin:e (L teoria psicanalítica E,vo!lIçcio elo pensamento hle-iniano 103

mente ligadas a objetos. Durante esse período, ela ainda não tinha mais ferozes do que os pais reais pareciam ser. Aos poucos, desenvol-
rcjci tado total mcn te a idéia de naroisismo primário (o que faz veu a concepção de que o mundo e os objetos internos se constituem
depois, 1952a), mas se movia nessa direção. Mesmo nos anos inieiais, através dos mecanismos de íntrojeçâo e de projeção, que ela conside-
sua teoria é de relações objctais. Além disso, ela não concebe o cor- rou operantes desde o início da vida. Assim, o mundo interno não é
po do indivíduo como fonte de pulsões biológicas, mas como o uma réplica cio mundo externo: experiências cio mundo externo aju-
ag(;!!1te através do qual se exprimem as pulsões psicológicas de amor dam a moldar o mundo interno, e o mundo interno afeta a percepção
e de ódio - nesses anos iniciais. investigou principalmente o ódio individual do mundo exterior. Ao contrário de Freud, ela não rcs-
(Grccnbcrg c Mitchcll , 1983). Portanto, a abordagem de Klcin é, tringc a idéia de "objeto interno" ou de supercgo à simples interiori-
simultaneamente, uma teoria pulsional e uma teoria de relações zação das figuras parcntaís depois da passagem do complexo de
objctuis, ainda que suas "pulsões" se tornem cada vez mais psicológi- Itdipo. (Ver Hinshclwood, 1989, e Greenberg e Mitchell, 1983, para
cas, nâo tão bioló.~ieas, e o papel da ansiedade, afetando sua exprcs- uma descrição detalhada de objetos internos.)
sáo, fique cada vez mais importante à medida que o trabalho evolui.
4. () sU]Jel-e,4o primiti'l)() e o complexo de Êdipo. Kleín achava que as
2. Fantasia. Klein dífícllmcntc menciona fantasia de forma conceí- crianças tratadas por ela davam claros sinais de um supcrego primi-
tual, e não dá sinais de perceber que usava o conceito de maneira tivo e muito sádico (bem.como um senso moral mais desenvolvido).
diferente da de Frcud. Frcud usa o termo de diversas maneiras, mas, que niio correspondia aos pais reais, e que, segundo ela, baseiam-se
de acordo com () uso principal, o ser humano recorre à fantasia quan- em suas próprias fantasias sádicas. (Frcud reconheceu essa hi pótcsc
do há frustração do instinto (1911). Para Klein, a fantasia íncons- de Klcln. em lv/ai-Estar na Ci'l)iliz;açüo, 1930, p. 130.) Progressiva-
ciente acompanha tanto a gratificaçüo quanto a frustração, mas, mente, Klein coloca o surgtrncuto do complexo de Édipo -cada vez
além disso, é o conteúdo básico de todos os processos mentais; é li mais cedo, ligando-o finalmente ao desmame. Às vezes, liga o desen-
rcprcscntaçào mental dos instintos. No entanto, esse ponto de vista volvimento do supcrcgo ao complexo de Édipo, como Freud: outras
não foi mencionado de maneira concettual, formalmente, até o vezes, diz que o primeiro objeto íntrojetado pode exercer funções de
artigo de Susan Isaacs, "Anatureza e a função da fantasia", aprcscn- supercgo.
tado pela primeira vez em 1943, nas Discussões sobre as Controvér-
sías (King e Steiner, 19(1), e publicado depois (1952). Na visão de 5. Sadismo e ansiedade psicótica. 1~111 seus primeiros artigos, Klcín
Kleín, fantasiar é uma capacidade inata, e o conteúdo das fantasias, cnfatizou as pulsões Iibldinais e sua expressão na fantasia incons-
embora influenciado pelas experiências com objetos externos, nâo ciente l!111todas as atividades. (Ver especialmente a discussâo de
depende intci rarucutc delas. Para ela, o ódio é inato. Mais tarde res- Petot, 1990.) Aqui, Klcin rnenciona "libidinal" não no sentido geral
saltaria que o amor também é inato. de "amar" ou de "dar a vida", mas no sentido de sexualidade, envol-
Durante esse período inicial, está implícita a crença de Kiein de vendo uma busca algo cruel, em fantasia, de fins sexuais. Logo
que o bebê tambóm tem um conhecimento inconsciente, ainda que tlcPOis, começou a ínvcstigar, com entusiasmo característico, um
obscuro, dos objetos - seio, mãe, pênis, útero, coito, nascimento, novo terreno, o da agressão e da dcstrutívídade , que nesse período ~
bebês -, embora não o afirme índubitavclmente,
depois. (Mas ver 1927b, pp. 175-6.)
a não ser muito quase sempre chamou de sadismo. Até Além do Princípio elo Prazer,
de Frcud (1920), e mesmo depois, na psicanálise em geral, a agres-
t1
são não foi considerada um fenômeno nato, geralmente era citada I
3. ()l~iews e Inundo ·intentO. Nesse pcríodo inicial, Klcin desenvolve o C01110 um componente do instinto libidinal. Nesse período inicial e,
conceito de mundo "interno" de objetos internos. mais uma vez sem na verdade, ao longo de todo seu trabalho, Klcin pensa que o seio da
1
~
muita ênfase couccitual. No trabalho cl ínico com crianças, ficou bas-
tante perplexa pelo fato de as ímagos internas doi' pals serem muito
mãe, seu corpo e o coito dos pais são os alvos principais da projeção,
em fantasia, de impulsos destrutívos. Isso significa que o seio, a mãe !i
lO<! Sobre a teoria psicanalíti.ca E-voluç{io do pensamenco klcinumo 105

e o coito dos pais serão sentidos como perseguidores cruéis, e agres- a ser sentido como perigoso. A criança se sente permanentemente
sivarncntc atacados. Durante esse período inicial, Klein desenvolve [mpclidu, então. a encontrar objetos novos c menos perigosos, para
o conceito de "objeto combinado" - a fantasia da mãe hostil con- fazer novas equações, processo que constitui a base do simbolismo e
tendo um pênis hostil. Fantasias sádicas suscitam ansiedade in- do desenvolvimento do interesse por novos objetos. Klcin também
tensa, que, se.~lll1d() Klcin, pode ser a base da psicose na infância e esclarcce que essas equações é que dão vicia ao brincar da criança, e
da doença mental no adulto. De acordo com isso, ela desenvolve que os meSl110Sprocessos formam a base da transferência, Se a ansie-
uma nova concepção de neurose obsessiva como defesa contra a dade resultante do ataque ao corpo da mâe for excessiva, leva à inibi-
ansiedade psicótica primi tiva, em vez de considerá-Ia como regres- ção, à neurose, e, nos casos muitos gravcs, à psicose, eomo no caso de
são a um ponto de fixação na fase anal do desenvolvimento líbidínal. "Díck", discutido em "A importância da formação de símbolos no
(Ver especialmente 19:\2, pp. 149-75.) desenvolvimento do ego" (19:30).
A concentração de Klcin no sadismo foi com certeza afetada pela
mudança na teoria freudiana dos instintos, descrita cmALém do Prin- 7. () desellvoL'vimento elo menino e dllmenina. Aqui, Klein propõe
cípio do Prazer (1920), e pelo trabalho de Abraham sobre sadismo novas idéias sobre desenvolvimento, ressaltando a importância dos
oral canal (1924), mas acho que o principal motivo da sua ênfase ataques sádicos ao corpo da mãe descritos anteriormente, com o
veio do trabalho clínico com crianças, pois considerou que as crian- conseqüente medo de rctaliaçâo e a formação de um superego
ças analísadas por ela tinham fantasias sádicas muito oruéís acerca severo. Ela considera que meninos e meninas passam por uma "fase
das quais, de maneira característica, sentiam-se muito culpadas. feminina", e que, a partir da frustração pela mãe e por medo da reta-
Amplia retrospcotivamcntc suas idéias para construir uma teoria do líaçâo pelos ataques contra ela, afastam-se da mãe para buscar satis-
sadismo na primeira infância, e considera o sadismo como raiz fação junto ao pai e ao seu pênis; nessa fase, a relação fantasiada com
importante do instinto epistemofílico. Ao final dessa fase de traba- a mãe é de idcntificaçâo, em que a criança se "torna" a mãe a fim de
lho, começa a diferenciar descritivamente ansiedade de culpa. Mas tomar seu lugar ao lado do pai (1928), um precursor de pelo menos
usa pouco a idéia de amor, nesse período inicial. E, apesar da ênfase uma forma da idéia posterior de identificação projetiva (1946). Para
no sadismo, só em 19:\2, em i\ Psicanálise de Crianças, começa a as meninas, essa é a base da femínílldadc futura, para os meninos é
usar a idéia de Frcud do instinto de morte, c a mencionar o conflito normalmente superada na medida em que aumentem os desejos cdí-
entre instinto de vida e instinto de morte. Mesmo assim, não usa, de picos. Klcin considera que a menina tem um medo duradouro de ter
fato, a noção de conflito de forma coneeitual, a não ser numa fase o interior do seu corpo danificado, devido aos ataques sádicos reali-
posterior do seu trabalho. zados contra a mãe, e que isso é, para as meninas, a oontrapartída da
ansiedade de castração dos meninos. Em A Psicanúlise de Crianças,
6. () instinto episten1(~fílico e o simbolismo. Nos prímcíros artigos, Klein discute mais profundamente as complexidades do desenvolvi-
Klcín considera o instinto cpistemofílíco enraizado na libido e mcnto do menino e da menina, ressaltando, como outras analistas do
expresso em todas as atividades da criança. Aos poucos, começa a período, o conhecimento da vagina pela menina. Numa rase poste-
pensar no sadismo como elemento fundamental da ânsia de saber. rior de trabalho, Klcin reviu alguns pontos de vista iniciais sobre o
Acha que o bebê sente o corpo da mãe como fonte de todas as coisas desenvolvimento sexual (1945). Os pontos de vista de Klcin sobre de-
boas (c más), inclusive do pênis cio pai c, em fantasia, a criança ataca senvolvimento sexual interessaram a certos analistas c algumas
o corpo da mãe, tanto por frustração quanto para tomar posse de fcminístas, mas até agora nenhum colega inglês retomou o trabalho
suas riquezas. Esses ataques sádicos fantasiados despertam ansie- nessa área.
dade, que pode ser um estímulo para o desenvolvimento . .Iunta-
mente com as fantasias de projeção do sadismo para dentro da mãe, a 8. Fases. Nas formulações teóricas desse período, Klein se atcvc à
ansiedade derivada dos ataques ao corpo dela significa que este passa idéin das fases da libido descritas por Freud (1905) e às suas divisões,
10(, Sobre li teoria psicanalítica B-voluç{io do pensamento Ideinüt1lo 107

propostas por Abraham (1 924), 1118~ começa 8 ficar evidente sua portante o fato de o desenvolvimento do modelo estrutural frcu-
idéia de que as fantasias anais e fálicas ocorrem concomituntcrncntc diano, em lu.!~ardo modelo topográfico anterior, ter significado uma
com as orais. Dá a impressão de que ela não levou as fases em consi- mudança importante no modelo básico da mente. Suas idéias teóri-
deração, nas ohscrvaçócs clínicas, o qUI; cria certa díscordâncta cas começam a partir do modelo estrutural de () E,WJ e () ld, de Freud
entre os relatos teóricos e clínicos. (192.1), embora ela use os termos de maneira um pouco diferente e o
uso que ela faz do modelo estrutural divirja do de Freud, por ter
9. () efeito dos pais extenws. Apesar de desenvolver uma teoria de incorporado a idéia de relações de objeto como parte integrante.
relações objctais, em vez de uma teoria só biológica pulsíonal, Klcín O supcrcgo, como descrito antes, era anterior c mais complexo do
não realça conccítualmentc a personalidade e o comportamento dos que para Frcud. Sua idéia do "íd" não está tão arraigada na biologia.
pais reais corno parte do seu sistema teórico. Frcqücnterncntc, men- No caso do cgo, Klein nunca distingue realmente ego de sel], e ao
ciona a írnportáncia dos pais, e seu trabalho ciínico mostra que ela longo de todo () seu trabalho usa os termos de forma intcrcarnbiávcl,
relacionava o comportamento e as fantasias da criança ao comporta- o que Frcud, na verdade, também fazia freqüentementc. Klcin não
mento e ao caráter dos pais reais (ver principalmente a Parte 1 de parece ter percebido quão importante era, no pensamento de Freud,
/\ Psicanúlise de Cl'ÍallçaS [1932 J, e, mais tarde.A Narrutioa claAná- a mudança da concepção de ansiedade como libido represada para
Use de uma C1"Íança, [1 960b]), mas em sua teoria, prínclpalrncnte ansiedade como sinal. Já no período inicial do seu trabalho, ela pen-
no período inicial, tendia a ressaltar o papel dos pais corno fator cor- sava a ansiedade como resposta a forças dcstrutívas dentro da perso-
retivo e de mitiüaçâo na modífícação das ansiedades decorrentes das nalidade.
fantasias inerentemente sádicas da criança. No último período de
trabalho. ela explícita a importância do ambiente (1935, p. 2S5; 1952e,
p. 94, p. 9il; 1955, p. 141n3; 1957, p. 175, p. 185n2, pp. 229-30; B. A nova teoria de Klein: as posições esquizoparanóide e
1959, pp. 24il-9; 1963, p. 312). Mas fica evidente, mesmo no período deprcssiva, 1935· 1960
final, a idéia de Klcin de que, apesar de o caráter e do comporta-
mento dos pais serem muito importantes para moldar () desenvolvi- o trabalho realizado por Klcin até 1932, ponto por ponto e incom-
mento da criança, a constituição infantil também é fator extrema- pleto, foi seguido de um grande salto imaginativo, que trouxe o tra-
mente importante e a própria criança, um agente ativo. Esse ponto balho anterior para uma síntese nova e mais integrada. Isso não se
de vista tem levado a freqüen tos confusões, corno se significasse que deveu a um método novo, tal como a técnica do brincar foi para o tra-
os pais (o "ambiente") não são importantes, e por isso tem sido balho anterior, Consistiu na formação de novos pensamentos a
muito eritieado. respeito de fatos clínicos já conhecidos e de conceitos parcialmente
elaborados. lt uma realizaçâo notável de forrnulaçâo teórica, talvez
10. li ((b()rd{l.~em de Iílein das teorias de Freiul. Klcin não parece ter surpreendente e até mesmo misteriosa, já que Kleín nunca se preo-
ficado explicitamente interessada nos aspectos mais abstratos das cupou com a construção de teorias como um fim em si mesmo.
teorias de Frcud, especialmente nas teorias iniciais. i\ idéia do sis- A nova teoria consiste basicamente na delíncação dc dois con-
tema inconscicntc , com sua lógica especial de processo primário, juntos de ansiedades, defesas e relações de objeto que Kleín deno-
não parece ter chamado a sua atenção. Deixou para os colegas a mina de "posição esquí zoparanóide" e de "posíçâo dcpressíva".
tarefa de ressaltar que muitas qualidades do sistema inconscícntc Alguns analistas acharam difícil entender, e muitos, especialmente
foram processadas no seu conceito de fantasia mconscíentc. Ela não nos Estados Unidos, não acharam importante ou suficientemente
diferencia idéias c sentimentos descritivamente inconscientes dos plausível a ponto de valer a pc na o esforço. Na Inglaterra, em boa
dtnarnicameutc inconscientes. Talvez por seu trabalho inicial não parte da Europa c na Amértca do Sul, no entanto, a teoria teve grande
estar enraizado no modelo topográfico, não considera questão irn- influência, c a teoria desse último período tem sido a base da maior
108 Sobre a teoria psicanalítica E-vo/'uçiio cio pensamento hleinicnv, 109

parte dos desenvolvimentos elaborados pelos contemporâneos de p. 54), ela pensa que uma parte do instinto de morte fica fundido
Klein e colegas posteriores. com a libido, mas outra parte permanece dcfundída c continua sendo
A teoria é exposta em quatro artigos principais: "Uma contribui- uma fonte ativa de ansiedade de aniquilação, a partir de dentro.
ção à psicogênesc dos estados maníaco-depressívos'' (1935); "O luto Acompanhando a reforrnulaçáo do sadismo e da agrcssüo em ter-
e sua relação com os estados rnaníaco-depresslvos" (1940); "Notas mos da proveniência do instinto de morte, Kleín incrernenta o uso
sobre alguns mecanismos csquízóídcs" (l94ú); e "Inveja e Gratidão" das idéias de amor, de libido e da concepção do objeto bom como
(1957). Há uma dcscríção concisa da teoria em "Algumas conclusões núcleo do desenvolvimento normal do ego, Klcín observou o inter-
teóricas sobre a vida emocional do bebê" (1952b), mas sem incluir o jogo de amor e de ódio, no final dos anos de 1920 e começo dos anos
conceito de inveja. de 1930, mas nâo o usou conceitualrnente, na ocasião. No último
A nova teoria traz duas mudanças principais nas concepções período, esse interjogo se torna central na nova oonccpção das posi-
antes descritas como típicas do primeiro período de pensamento de ções csquizoparanóidc c deprcssíva.
Klein. Creio que essas mudanças são ambas necessárias para a forma- A segunda mudança importante é, depois de 1935, a redução da
ção da nova teoria, mas também, um pouco paradoxalmente, são sua adesão fi concepção de Frcud c de Abraharn de fases instintivas,
conseqüência dela. em favor de uma teoria do desenvolvimento baseada em trocas nas
Primeiro, rcformula as descrições anteriores de sadismo e de relações internas de objeto (e externas). Ela continua pensando que
agressão em termos de íntcraçâo dos instintos de vida e de morte, tal as expressões orais de amor e de ódio vêm primeiro, mas se sobre-
como se expressam no amor e no ódio. Em sua visâo do instinto de põem, em vez de serem segUidas pelos modos de expressão anal, me-
morte, Klcin acompanha Freud muito de perto, especialmente quan- tral. fálíco e gcnital. Mas, em vez de fases, sua nova teoria fala de
do faz definições teóricas formais a respeito. Em contextos clínicos, "posiçôcs", ou seja, de uma organização de ansiedades, mecanismos
fala com freqüência de "instintos dcstrutivos" ou de "instintos agres- de defesa e relações de objeto típicos. Ela acha que a posição csquízo-
sivos" e, às vezes, de "instintos autodestrutivos" sem explicar, a cada paranóide vem primeiro, na primeira infância, sendo seguida da posi-
momento, a maneira pela qual esses instintos derivam do instinto de ção dcpressíva, mas usa a palavra "posição", em vez de fase, para res-
morte. Para ficar em consonância com sua visão de que os instintos saltar que durante a infância, c também mais tarde, na vida, há uma
são inerentemente ligados a objetos, a formulação de instinto de flutuação entre as duas posições (1952b). Na sua concepção, as posi-
morte de Klein está dirigida mais clinicamente e menos biológica c ções não são fases que a pessoa atravessa e deixa para trás. Essa
filosoftcamcntc do que a de Frcud. Enquanto Freud pensa que não há mudança de concepção permitiu que alguns colegas, especialmente
idéia de morte ou de aniquilamento no inconsciente (1923, p. 57; Bion, afrouxassem ainda mais a vinculaçâo com o desenvolvimento
192ô, p. 129), Klcin pensa que " ... existe o medo de aniquilamento literal da primeira infância, a ponto de as posições serem concebidas
da vida" no inconsciente (1948, p. 29). Para Klcín, esse medo de aní- Como "estados mentais", independentemente da idade cronológica
quilaçào é a ansiedade primária, mais básica do que a ansiedade de em que são experimentadas. Essa ênfase ajudou muitos analistas a
nascimento, ansiedade de separação e ansiedade de castração. En- procurar mudanças momento-a-momento, na sessão, desde a inte-
quanto Frcud atribui a deflexão do instinto de morte ao "orga- gração e a ansiedade deprcssiva até a fragmentação c às vezes a per-
nismo", Kleín a atribui ao ego (1948, pp. 28-30; 1957, pp. 19()-1; scguiçáo, em vez de procurar grandes mudanças de caráter c de
1958, p. 237). Ela também considera que uma parte do instinto de orientação.
morte é projetada para dentro do objeto primário, o seio, que dessa
forma se torna um perseguidor, ao mesmo tempo que outra parte A posiçcio esquizopantnóide. A princípio, Klcín usou o termo "posi-
fíca re tida na personalidade; uma parte do instinto de morte inter- çâo puranóidc": depois acrescentou a palavra "csquizótde", em reco-
namente remanescente se volta contra o objeto persecutórlo, na for- nhecimento ao trabalho de Fairbairn (1941, 1944) sobre a cisão do
ma de agressão (1946, pp. 4-5; 1958, p. 238n). Como Freud (1923, ego e sua relação com os estados esquizóides.
'I

I'
110 Sobre a teoria pS'ÍCcl1lalitica E'L'oluçcio do pCIlSwnenw kleinumo 111 illl

Klcin acha que a posição csquízoparanóídc normal ocorre nos rídade dos objetos na sua totalidade e da pessoa corno um todo, do
!I:
três primeiros meses do primeiro ano de vida e se caracteriza por ponto de vista dela, vem mais tarde, na posição dcprcssíva, ,.di
ansiedade persccutória, ou seja, medo de aniquilação a partir de den- Klcin usa o termo "Idcnnficaçâo projctiva" para descrever um
tro, que, devido ao temor da malignidade, é projetado para fora, em eonjunto complexo de processos pelos quais parte do se.{t' é cxcindida
fantasia. Ela afirma que as sensações experimentadas pelo bebê são e projetada para dentro de um objeto, ao qual o indivíduo reage corno
sentidas corno se fossem "causadas" por objetos malévolos ou bené-
se o objeto fosse oscilou aparte doseilque foi projetada nele. O indi-
volos. Assim, a fome, do ponto de vista do bebê, provavelmente não é
víduo que assim projeta, íntrojetnrá, em fantasia, um objeto colorido
só uma experiência do tipo "não-há-comida-aqui", mas algo corno
pelo que foi projetado nele. lt por meio desse íntcrjogo constante que
"esse objeto está me matando de fome", ou "alguma coisa terrível
se constrói o mundo interno, do sell e dos objetos internos. Cisão,
está me atacando". () sentimento de conforto seria atribuído à moti-
projeção, e introjcçâo sâo os mecanismos mentais característicos da
vação benigna de um objeto bom. Claro que Klcín acha que os bebês
posição mental csquizoparanóíde. acompanhados de Idcallzaçâo,
desde o nascimento distinguem se/i de objeto, eu de não-eu, ainda
dcncgrímcnto e ncaação. Assim, a onipotência de pensamento é
que a distínçáo se baseie em percepções modeladas por fantasias c
por atribuiçôcs de motivação fantasiadas, sendo, portanto, suposta- característica da posição esquizoparnnóidc. Klcin observa que, quan-
mente muito diferentes das percepções de um observador adulto. do a projeção é excessiva, os objetos e o seif'fieHm fragmentados, mas
Certamente, colocar essas percepções em palavras pode levar a enga- ela não explica, no artigo de 1946, os motivos de a projeção ser exccs-
nos. Susan lsaacs afirma que esses eventos muito primitivos são síva em alguns indivíduos e menos pronunciada em outros.
experimentados primeiro como sensações, depois evoluem gradati- Klcin pensa que o fracasso na elaboração da ansiedade pcrsecu-
varncnte para imagens plásticas - visuais, auditivas, clnestésicas, tória e a tendência para a cisão, da posição csquizoparanóldc, são
tato, cheiro, gosto -antes de se ligarem a palavras (Isaacs, 1952). pró-condições básicas da paranóia c da esquizofrenia.
Nesse período, muito inicial, a preocupação é com o próprio sei!' Em artigos posteriores, Klein faz acréscimos importantes. Em
não com o objeto. Klcín afirma que se lida eom a ansiedade de aniqui- "Inveja e Gratidâo", afirma que um grau extremo de inveja primária,
lação a partir de dentro, por meio de cisão c de projeção. () bebê que ela considera como um fator constitucional, leva posição esqui-
à

cindc os sentimentos bons dos maus c, em fantasia, projeta ambos zoparanóldc patológíca. Como a inveja ataca o objeto bom, faz surgir
em objetos sentidos corno externos, "nâo-cu", de forma que ambos, o prematuramente uma vivêncía de ansiedade depressíva relativa ao
e.~o (seU) c o objeto, são cindidos. O bebi} vive num mundo em que ele dano produzido no objeto, e interfere na diferenciação primária de
e alguns objetos são muito maus, enquanto outros objetos e outros bom e mau, no objeto e tio sel], Dessa maneira, pode resultar em con-
aspectos seus são muito bons. As ernoções são lábeis; o que é bom fusão e, em casos muito graves, em estados confusionaís. (Ver tam-
vira mau rapidamente e vice-versa, e não há reconhecimento de que o
bém Rosenfcld, 1950.) Essa ruptura da cisão normal leva a dificulda-
objeto bom e o objeto mau são a mesma pessoa. O bebê vive num
des na elaboração da posição dcprcssiva e no prosseguimento para
mundo de objetos "parciais", no sentido de que o que seria um
uma experiência normal da posição depressiva.
objeto, para um observador externo, será, para o bebê, pelo menos
dois (bom e mau). Além do mais, Klcin afirma que o objeto primor- Num arti.~o posterior (1958), Klein sugere que os objetos maus
dial é um objeto parcial, o seio, mas do ponto de vista ele Klcin esse da posição esquizoparanóídc não são os mais aterrorizantes. As figu-
"seio" não é só um provedor de alimento, algo que satisfaz o instinto; ras mais utcrrorizantcs são cxcíndídas para dentro ele uma área pro-
é a própria fonte de amor, de vida. Ela afirma tacitamente que, na pri- funda do inconsciente, que permanece separada dos processos de
meira infância, osobjetos parciais unatômicos normalmente são per- desenvolvimento normal que fazem surgir o supe rcgo. Mas ela não
cebidos c tratados como se fossem objetos totais, e os objetos totais elabora plenamente essa idéia, nem a integra com o restante do seu
podem ser tratados corno parciais. O pleno reconhecimento da idcn- trabalho.
112 Sobre a teoria psicanalítica ]!;-voluçüo do penliClmcnto Ideiniww llJ

i\ posiçüo clep1·essi·v(!. Kloin acredita


que, dos três aos seis meses, as çâo. Seu fracasso constitui a base psíquica da doença maníaco-de-
relações de objeto do bebê mudam, de relações de objeto parcial para pressiva.
relações de objeto total. Embora não o diga explicitamente, Kleín No artigo de 1940, Klcin acrescenta também o luto normal aos
parece basear o estabelecimento dessas datas na observação bem fenômenos da posição dcprcssíva. () lu to, na vida posterior, rcativa a
conhecida de que em algum momento, entre os três e os seis meses, posição depressiva do primeiro ano do vida, e leva, de fato, por algum
tempo, ao sentimento de ter perdido toda a bondade interna. O luto
os bebês começam a parecer mais "humanos", e também a se com-
bem elaborado leva ao estabelecimento mais profundo c forte do
portar de maneira muito mais integrada. Klcin suplcrnenta esse tipo
objeto bom interno.
do observação casual com observações mais sistemáticas de Ribble
Na nova teoria, Klcin faz uma ligaçüo essencial c muito interes-
(1944). Klein fez suas próprias observações de bebês (1952c), mas sante entre o complexo de Édípo, o "complexo nuclear das neuroses"
esses exemplos se baseiam mais em formulações teóricas do que nos de Frcud, e a posição dcprcssiva. ElH observa que () início da posição
dados brutos dos quais deduziu suas formulações. dcprcssiva coincide com () início do complexo de Itdipo, c diz que a
Na maneira de Klein ver a posição dcpressíva, a mãe boa e a má tristeza acerca da perda temida do objeto bom é fonte de conflitos
são vistas como a mesma pessoa; o bebê começa a sentir que a mãe edipianos muito dolorosos, na posição dcprcssíva, pois os ataques ao
boa, que ele ama, foi estraga da pelos ataques que ele fez e continua a rival edípíuno são, ao mesmo tempo, ataques ao objeto amado (Klein,
fazer contra mãe má, pois a rnâe é uma só. Essa percepção muito 1940, p. 345; 1952b, p. 110; 1957, p. 1%; 1958, p. 239).
dolorosa faz surgir o quc Klcín chama de "ansiedade depressíva", Em artigos posteriores, Klcin faz acréscimos às primeiras des-
diferente da ansiedade persecutória da posição esquizoparanóide. cobertas. Entre outros, menciona que o temido objeto combinado
Consiste em um misto de preocupação com o objeto, medo de que do seu trabalho anterior é alterado, na posição dcprcssíva, pela con-
ele tenha se estragado de forma írreparávcl, culpa e senso de respon- cepçâo de pais internos c externos numa relação feliz, um com o
sabilidade pelo dano causado. O indivíduo tem medo de perder o outro (1952b). Faz uma revisão dos pontos de vista anteriores, em
objeto c tem um grande anseio de reparar o dano. O estado real do rclaçâo ao complexo de ltdipo (1945). Menciona também que expe-
objeto externo é muito importante. Se a mãe parecer cstragada, a riências transitórias de ansiedade dcprcssiva e de culpa podem
culpa e o desespero da criança aumentam. Se ela estiver aparente- ocorrer em relação a objetos parciais, na posição csquízoparanóídc
mente bem, ou, ao menos, capaz de ter ernpatia com os problemas da (1948,1%Oa).
criança a respeito do seu estado, diminui o medo da dcstrutividadc A dclincaçâo das posições csqulzoparanóidc c dcpressíva, junta-
da criança e aumenta a confiança nos desejos de reparação. A idéia mente com o papel da inveja primária de exacerbar as dificuldades da
de reparação, já introduzida em "Situações de ansiedade infantil posição csquízoparanóidc, compreendem as hipóteses teóricas fi-
refletidas numa obra ele arte e o impulso criativo" (1929b), torna-se nais de Klcin, integrando a maior parte das idéias iniciais numa nova
um conceito-chave. A dor da nova íntcgraçâo às vezes é tão grande constelação. Os conceitos de posições esquízoparanóldc c dcprcssiva
que leva a defesas características da posíçâo dcpressiva, tais como comprovaram-se extremamente ricos, tanto que suas expressões c
rcparaçâo maníaca e obsessiva, negação, triunfo e desprezo. Se essas implicaçôes ainda estão sendo ínvcstiáadas.
defesas falharem, o indivíduo pode retirar-se temporariamente ou
por períodos longos para defesas características da posição csquizo-
paranóide. 11. Evolução dos colegas de Kleín na Inglaterra
O resultado favorável da posiçâo depressiva é a ínterualíznçâo
segura do objeto bom, que, na visão de Kleín, se torna o "núcleo do Desde os anos de 1950, na Inglaterra, lima característica central foi
cgo", a base da segurança e do auto-respeito. A futura saúde mental o declínio do número de análises de criança realizadas por analistas
do indivíduo e a capacidade de amar dependem nessa internaliza- klcinlanos, embora a psícoterapta de crianças tenha se desenvolvido
114 SO/J)"ea teoria psicanalítica E-volllç(io do pe11SWltenlO kleinuma 115

1I
rapidamente como atividade profissional. Os analistas que conti- Como descrevi em outros escritos (1088, pp, /:l1-6, 1902), tem
nuam a trabalhar com crianças estão mais interessados em tentar havido muita discordância a respeito do uso do termo, que alguns
juntar os progressos da análise com evoluções técnicas da análise de acham que só deva ser usado para se referir a situaçócs em que o
adultos. receptor fique emocionalmente afetado pela projeção. Do meu
O interesse mudou, primeiro para a análise de pacientes psicóti- ponto de vista, essa rcstriçâo é um equívoco, pois limita mui to a uti-
cos, especialmente evidente nos artigos de Bion, Roscnfcld e Scgal lidade elo conceito, e, de qualquer maneira, seria totalmente con-
dos anos de 1950. O trabalho com esses pacientes continuou, trária à maneira como Klcin o usou. Penso que o termo se mantém
embora tenham sido cscritos menos artigos sobre pacientes pslcóti- melhor como conceito geral, suficientemente amplo para incluir
cos, desde os anos de 1950, e tenha aumentado muito o número de ambos os casos, os em que o receptor é emocionalmente afetado, e
artigos sobre pacientes Iírnítrofcs e narcisistas. Ocorreram muitas os em que nâo. No entanto, seria útil ter adjetivos que diferencias-
evoluções através do trabalho contínuo com esses e outros tipos de sem os vários subtipos de identificação projetíva. "Evocatlva" pode-
paciente: refinamento do conceito de ídcntífícaçâo projetíva; desen- ria ser usado para descrever o tipo de ídcntífícaçáo projctíva em que
volvimento de novas teorias sobre o pensamento; novas idéias acerca o receptor fica pressionado a se sentir de acordo com a fantasia do
das posições csqulzoparanóidc e dcpressíva, e evoluções na técnica. projetor.
(A discussão desses tópicos se baseia nas íntroduções que já escrevi A maior parte das questões que surgiram com o uso do conceito
para as diversas seções de Melanie Klein Hoie, 198/:l.) são mais bem respondidas da mesma forma, ou seja, usando o CC)l1-
ceito como um termo geral dentro do qual podem-se distinguir
1. Estudos das Psicoses. O trabalho com pacientes psicóticos deu vários subtipos. As diversas motivações da identificação projetiva -
aos analistas que o empreenderam uma profunda convicção de que o controlar o objeto, adquirir seus atributos, evacuar uma qualidade
pensamento dos pacientes psicótícos pode ser compreensível, que as má, proteger uma qualidade boa, evitar separação (Roscnfeld, 1971a)
idéias de Klein sobre as ansiedades c defesas da posição esquizopara- -, todas são mais úteis se mantidas sob a dcfiníção geral.
nóide são extremamente úteis na compreensão da maneira pela qual Talvez seja uma infelicidade Bion não ter desenvolvido um termo
relações de objeto infantis muito perturbadas habitam o mundo especial para o comportamento do indivíduo de induzir outra pessoa
\
interno do paciente psicótico, e' que essas relações podiam ser com- a se comportar de acordo com suas fantasias de ldcntífícação proje-
preendidas na medida em que fossem vividas na relação com o ana- tiva, Quando Bion analisava pacientes, principalmente pslcótlcos,
lista. Esse trabalho levou Scgal e Bion a desenvolver idéias sobre o falava com eles numa linguagem muito concreta, pois essa era a
forma de o paciente pensar; assim, ele diria, por exemplo: "Você está
processo de pensamento, e Rosenfeld a estudos profícuos de diversos
empurrando o seu medo de matar para dentro de mim" (Bion 1955).
temas, incluindo estados confusiouais, homossexualidade e sua rcla-
Isso, por um tempo, levou a uma moda, espcoíalmen te en tre analis-
çâo com a paranóia, narcisismo e estados Iimítrofes. (Ver Roscnfeld,
1965 e 1987.)
tas relativamente incxpcrtcntos, de falar conceicualmente a respeito r·
ele fantasias que estavam sendo postas, na verdade, concretamente
dentro da mente do analista. Esse uso foi duramente criticado por
2. ldeiuificação Projetitxc. Ainda que Kleín tenha definido o termo Sandler (1987), que usa os termos "atualízaçâo" c "anuência ao
"identificação projetiva" quase casualmente, c que pareça sempre papel" [role-responsioeness], muito úteis para descrever os proces-
ter tido dúvidas a respeito do seu valor, pelo fato de o seu uso poder sos em que os indivíduos se comportam de maneira a fazer com que o
ser inadequado (Scgal, 1982), o termo aos poucos se tornou o mais objeto sinta e se comporte de forma que satisfaça o desejo incons-
popular dos seus conceitos, o único a ser amplamente aceito e discu- ciente do projetor (1976a, 1976b, Sandler e Sandlcr, 1978). A prá-
tido por psicanalistas em geral, ainda que essa discussâo às vezes seja tiea corrente entre analistas klcinlanos ingleses, em parte devido às
incompatível com a concepção de Klcin. críticas de Sandler c outros, e principalmente devido ao trabalho de 11'
E-VO[lIÇÜO do pensw/l.enco kleiniaru,
116 Soin:e (l teoria )'isicanalíti.ca 117

Betty Joscph (1989), é distin.~uir conceítualmente a ídcntificação Nesse corpo de trabalhos. Bion sugere três modelos de compreensão
do processo de pensamento.
projctiva, como fantasia, do comportamento inconsciente do indiví-
duo de fazer o objeto se comportar de acordo com ela. O primeiro é similar à idéia de Segal, uma fantasia usada como
Outra mudança no modo de pensar a respeito da idcncifícaçâo hipótese no teste da realidade (Scgnl, 1964). Na formulação de Blon,
urna "prcconccpção" ele um seio, por exemplo, junta-se com a rcalí-
projetlva é que o termo quase só era usado para caracterizar uma
zuçâo, ou seja, um seio real, o que faz surgir uma concepção, que é
defesa muito patológica c primitiva. Continua sendo usado dessa
uma forma de pensamento. Ele considera a preconccpção como
maneira, quando o paciente descrito está funcionando prcdorrunan-
parte do equipamento mental inerente do indivíduo, uma idéia que
temente no nível da posição esquizoparanóídc, mas também é usado
tem afinidade com as fantasias herdadas de Freud (1916-17), com a
para descrever atribuiçôes de sei!' c de objetos internos c externos
noção klciniana dc que O bebê tem uma idéia inata da mãe e do seio
menos patológicas, atribuições que constituem a base da cmpatia c
(1952c e 1959), c COI11 o desenvolvimento da idéia de pró-dotação
que são caractcrfsticas da posiçâo depressíva. Essa distinçâo entre
dos psicólogo» (Stcrn, 19H5).
identificação projetiva "normal" e patológica ocorreu em grande
No segundo modelo, uma preconcepção encontra uma realiza-
medida por meio do trabalho de Bion (19ú2a, 1962h, 1963).
ção negativa, uma frustração, ou seja, não há seio disponível para
satisfação. () que acontece, em seguida, depende da hipotética
3. Trabulho sobre Simbolismo, Pensamento e Vivênda. Duas idéias de
capacidade do bebê de suportar frustrnção. Klein ressaltou que o
Klcin foram pontos de partida importantes para o trabalho posterior
objeto ausente, frustrador, é sentido, na expcriência primitiva, como
sobre o pensar. A primeira é a teoria sobre símbolos descrita ante-
um objeto mau. Bion levou essa idéia adiante. Se a capacidade do
riormente (pp. 110-11), e a segunda, a idéia de identificação projctiva.
bebê de agücntar frustração for grande, a percepção/experiência de
Num artigo original sobre formação de símbolos, desenvolvido a "não-seio" se transforma em pensamento, o que ajuda a suportar a
partir das idéias de Kleín, Hanna Scgal diferencia a formação de sím- frustração c torna possível usar o pensamento "não-seio" para pen-
bolos da posição esquizoparanóídc, que ela chama de cquaçâo sim- sar, ou seja, fazer conta to C0111,c suportar a perseguíçâo. Aos poucos,
bólica, e a formação dc símbolos da posição depressíva, que ela essa capacidade evolui para a capacidade de imaginar que o senti.
chama do slmbolízaçâo propriamente dita (Segal, 1957). Nas equa- monto mau, de ser frustrado, ocorre na verdade porque o objeto bom
ções simbólicas, o símbolo é confundido com o objeto, a ponto de ser está ausento, c pode, ou não, voltar. Se, no entanto, a capacidade de
o objeto; seu exemplo é de um psicótico que não conseguia tocar vio- Suportar frustração for baixa, a cxpcriêncía de "não-seío" não se
lino porque fazê-lo significava se masturbar em público. Nesse estado desenvolve como pensamento ele um "seio bom ausente", existe
mental, o cgo se confunde com o objeto, através da identíficaçâo pro- COmo um "seio mau presente", é sentido como um objeto mau con-
jetiva; como é o ego que cria o símbolo, o símbolo também se con- ereto elo qual é preciso se livrar por meio de evacuação, ou seja, de
funde com o objeto. Na posição depressíva, em que há maior cons- projcçiLo onipotcntc. Se esse processo se firmar, não é possível desen-
ciência da dífercncíuçâo e da separação de ego e objeto e em que há o volver símbolos vcrdadcíros, nem pensamento.
reconhecimcnto da ambivalência em relação ao objeto, o símbolo, O terceiro modelo veio a ser chamado de formulação do conti-
uma criação do ego, é reconhecido como separado do objeto, Ele nentc e do contido (Bion, 1962b; ver também O'Shaughnessy 19i1la).
representa o objeto, em vez de ser igualado a ele, podendo ser usado Nesse modelo, o bebê tem algum tipo de percepção sensorial, ncces-
para deslocar a agressão e a libido do objeto original para outros, Sidade ou sentimento que ele sente como maus e dos quais quer se
C01110Klcin descreveu no artigo sobre simbolismo (1930). livrar. Ele se comporta de maneira "mais ou menos calculada para
Bion usa a idéia de identificação projetiva para desenvolver uma fazcr surgir na mãe os sentimentos dos quaís quer se livrar" (Bíon
teoria do pensamento que teve profundo efeito no repertório conccí- 1962a). A identificação projetiva em si mesma é uma fantasia onipo-
tual c técnico de muitos analistas (1961a, 19f,2h, 19ú3, 1965). tentc, mas também leva ao tipo de comportamento que faz surgir o
11H Sobre a teoria psicanalítica E-volllçlio do pensamento ldeÚlill!W 119

mesmo sentimento na mãe. Se a mãe for razoavelmente bem equili- 195()-1955, 1952, 1956, 1960); e Rodrnan (ed.), 1987, pp. 89-93 e
brada e capaz de ter () que Bion chama "rêverie", ela pode aceitar e 144-6), antes da formulação do modelo continente-contido de pen-
transformar os sentimentos em algo tolerável, que o bebê possa rcin- samento, de Bion. A característica distintiva da construção de Bíon é
trojctar. Bion chama esse processo de transformação de "função o uso da idéia de projeção e de introjeção para formular lima concep-
alfa". Se tudo correr bem, o bebê reintrojeta não só a coisa má espe- çâo da dinâmica interna envolvida na interaçâo mútua de continente
cífica, transformada em algo mais tolerável, mas também, com o e contido. Ele ressalta principalmente a compreensão mental: do
tempo, a própria função alfa, c adquire dessa maneira os instrumen- ponto de vista de Bion, a compreensão mental, pelo outro, é o que
tos cmbrionárlos, dentro de sua mente, para tolerar frustração e permite ao indivíduo desenvolver a compreensão mental em si
para pensar. Podem desenvolver-se a sírnbolízaçâo, a "barreira de mesma e assim movimentar-se na direção de ter uma mente própria
contato" entre consciente e inconsciente, os pensamentos onírioos, e do reconhecimento da mente dos outros. Além do mais, ele concen-
os conceitos de espaço e de tempo. tra a atenção não só no efeito do continente no contido, mas também
Com certeza, o processo pode dar errado, tanto devido à incapa- do contido no continente. lt uma noção "interna", muito preocu-
cídadc de "rê'verie" da mãe quanto à inveja do bebê por não tolerar pada com a modificaçiio dos pensamentos e dos sentimentos pelo
que a mãe seja capaz de fazer o que ele não consegue. Se o objeto não pensar. O que ele descreve é mais um modelo do que uma descrição
consegue ou não contém as projeções - e aqui as qualidades reais do cmpírica; ele se aplica não apenas a uma mãe dando significado a um
objeto externo são muito importantes - o indivíduo recorre a idcnti- medo do bebê, ou a um bebê invejoso desenvolvendo um superego
ficaçôcs projctivas cada vez mais violentas. A rcintrojcçâo se efetua invejoso, ou aos exemplos específicos mãe-bebê descritos por ele,
com força similar. Por meio dessa rcintrojcçâo violenta, o indivíduo mas a muitas outras formas ele interução, incluindo, é claro, o pro-
desenvolve dentro de si um objeto interno que não aceitará projeção, cesso analítico.
que é sentido como despojando vorazmente o indivíduo de toda a Em "Uma teoria do pensar" (l9ô2a) e, na verdade, em seu traba-
bondade até então incorporada, que é onisciente, moralista, desinte- lho posterior, Bion nâo relacionou tanto esses três modelos de pensa-
ressado pela verdade c pelo teste da realidade. O indivíduo se identi- mento quanto podcria. Certamente, são as experiências repetidas de
fica com esse objeto obstinadamente não compreensivo, e está cria- altcrnâncí a de rcaltzações positivas e negativas que encorajam o
do o cenário da psicose, desenvolvimento dos pensamentos c elo pensar. g o retorno da mãe
De todas as idéias de Bion, as noções de continente e contido e dc ausente faz surgir uma situação especialmente importante, repetida
função alfa foram as mais amplamente aceitas e as menos compreen- muitas vezes na infância (e na análise), a mãe tomando para si e
didas. Sua adoção levou a uma atitude menos pejorativa com relação transformando, ou não conseguindo transformar, a experiência do
ao uso da idcntífícaçâo projetiva pelo paciente e a uma conceituação seio-mau-prcsente.
melhor da distlnçào entre identificação projctiva normal c identifi- Em trabalho subseqüente (1962b), Bion elabora mais profunda-
cação projctiva patológica. O modelo continente-contido de descri- mente o modelo de continente-contido e de pensar como uma expe-
volvírncnto do pensamento diminuiu a separação entre emoção e riênoía emocional de vir a se conhecer, ou a outra pessoa, que ele
cogruçâo. Além do mais, para Bíon, o objeto externo faz parte inte- denomina "K", distinguindo-a das preocupações analíticas mais
grante do sistema. Como descrito anteriormente, Klcín foi freqücn- habituais com amor (L) c ódio (lI). Ele também descreve a evasão do
temente acusada, erroneamente, penso, de não dar atenção ao arnbí- conhecimento e da verdade, que chama de "menos K". Ele diz que Ké
ente. (Ver anteriormente, p. 112.) Bion não só mostra que o am- tão essencial para a saúde psíquica quanto o alimento para o
biente é importante, o que Klcin também afirmou, mas também bem-estar físico. Em outras palavras, J( é sinônimo do instinto episte-
como ele é importante. A importância do ambiente foi ressaltada por mofílieo de Klcín, de forma mais elaborada.
muitos outros analistas ingleses (Rayncr, 1991), principalmente Bíon também desenvolve a idéia de tlutuação entre as posições
Fuírbaírn (1941, 1944); Bowlby (1944,1951); c Winnicott (1945, csquizoparanóidc e dcprcssiva, que representa pela expressão I'sBD,
I
!
I
Sobre (t teoria psú;xt1lalítica 1~·v()/HÇã()do pensamento hleill'iano 121
120

~
como um fator no desenvolvimento do pensamento (1963). Esse invejosos, levou a uma ênfase graclativa e crescente no reconheci-
movimento de ida c volta da posição esquízoparanóíde para a depres- mento da scparabrlídade e da independência do objeto como outra
siva foi originalmentc assinalado pela própria Kleín, mas Bion se con- marca inooutestávcl da posição deprcssíva, (Recentemente (1991),
centra na drmcnsâo de díspersâo-desintcgração (Ps) de um lado, c .Ioau-Michcl Quínodoz escreveu especificamente a respeito desse
íntcgração (D), do outro, ignorando no momento os outros elemen- tema e de sua relação com a solidão.)
tos das constelações csquízoparanóidc e depressiva descritos por Estudos sobre o pensamento e sobre desempenho artístico tam-
Klem. A formulação de Bíon chama a atenção para os aspectos positi- bém dcrnostraram a relação muito próxima, na verdade intrínseca,
vos do caos csqulzoparanóidc, para a necessidade de ser capaz de que existe entre a posição dcpressiva, o pensamento simbólico e a
enfrentar a possibilidade de um sentimento catastrófico de desintc- ortatívidade (Segal, 1952, 1957, 1974, 1991).
graçáo e de ausência de significado. Se a pessoa não consegue tolerar Um terceiro aspecto da posição depressiva que recebeu ênfase
a dispersão e a ameaçadora ausência de significado da posição esqui- ainda maior do que a que Kleín lhe deu é a conexão intrínseca entre o
zoparanóidc, certamente pode entrar em colapso, ou empurrar-se complexo de l~dipo e a posição dcpressíva (Britton, 1989, 1992a;
para uma intcgraçflo prematura, ou tentar aferrar-se a um estado O'Shauãhnessv, 1989). Como descrito anteriormente, a própria
específico de in tcgraçâo e de significado obsoleto (c.f. Eigen, 1985). Klcin chamou a atenção para essa relação. Acredito que a ênfase
() trabalho de BiO!1sobre o pensar é usado por muitos analistas e crescente na natureza intrínseca da ligaçüo entre o complexo de
ainda está sendo desenvolvido e investigado, principalmente na ltdipo c a posição dcprcssiva aconteceu devido ao foco no reconheci-
lnglaterru, por O'Shauáhncssy (19El1a, 1992) e Britton (1989, 1992b mento da scparabilídadc do objeto como aspecto essencial da posi-
e 1994). ção dcprcssíva. Quando se percebe a outra pessoa separada, sente-se
Descrevi brevemente, em outro lugar (1988, vol. 1, p. 158, e
1989, pp. 107-1(9), a tese de Esthcr Bick de que há uma fase de
que ela tem uma vida própria, que o sujeito não controla. A relação
com um terceiro objeto é a essência da "vida própria" do objeto pri-
I
J
mário da pessoa. 1
"nâo-Intcáração" c de "tdcntificação adesiva" no desenvolvimento
infantil, que precede o processo de projeção c íntrojeçâo tão essen- Investigações mais profundas de psicose, adicção, perversão ~
cial para a teoria de Klcín das posições esquizoparanóidc c depressiva sexual, estrutura perversa de caráter c principalmente estudos do í!
e para as teorias cio pensar de Bion (Bick 1968, 1986; ver também narctsisrno e de estados limítrofes levaram a refinamentos na com-
Anzicu, 1<)89). Embora muitos alunos de Bick tenham usado algu-
mas idéias suas no trabalho clínico, só Mcltzcr (1975; Meltzer et ai,
preensão da posição csquizoparanóíde
esquízoparanóidc
e da relação entre as posições
c deprcssiva. A própria Kleín fez uma distinção
I
f
1975), Tustin (1972,1<)81,1990) e Ogdcn (1990) tentaram incor- entre a posição esquizoparanótde normal (1946) c a evolução patoló-
porar as idéias dela ao seu sistema conccítual. gica que ocorre quando a inveja primária é muito forte (1957). Bion
aprofundou ainda mais, esboçando, principalmente no modelo con-
I
4. As Posiçôen e o Conceito de Or4ani.':wção Patológica. A posição tinente-contido de pensamento, os processos que podem levar à
dcprcssíva continuou a ser uma concepção central, ainda que tenham patologia na posição esquizoparanóide. Nesse modelo, ele menciona
ocorrido mudanças nas idéias a respeito dela, às vezes através de cui- dois fatores: deficiência na capacidade de "rêecríe" da mãe e inveja
dadosa análise clínica c coneeitual (.I. Stciner, 19<)2), outras sem que avassaladora do bebê. Ele deixa implícito que podem estar envolvidos
as pessoas percebessem que ocorria. Em suas próprias descrições, Outros fatores, no bebê hipotético, mas só discute a inveja. Aos pou-
Klcin ressalta a íntcgraçâo de objetos parciais - seio, face, mãos, cos, desenvolveu-se a idéia de uma "organização" de defesas, engre-
voz, cheiro - para formar o objeto total. Ressalta também a integra- nadas entre si para ordenar os fenômenos clínicos encontrados, prin-
ção da bondade e da maldade do objeto e do amor e do ódio do su- cipalmente os envolvidos em estados narcíslcos e limítrofes. Muitos
jeito. Essas características se mantiveram, mas o uso da idéia da posi- autores contribuíram para o desenvolvimento do conceito, e a pala-
ção deprcssiva , no estudo de pacientes limítrofes, pstcótícos e muito vra "organização" tem sido usada há algum tempo, primeiro como
YT..
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''''·'-O
122 Sobre a teoria psicarlalitica /E-r;o[tlÇÚO do pensmllento Ideínútno 123
\~:
·91

"organização defensiva" (Riviõre, 193ú; O'Shaughnessy, 1981b), listas que simpatizam com seu ponto de vista acham a técnica rígoro-
também corno "organizaçâo narcísica" (Roscnfcld, 1971a; Sohn, samcnte psicanalítica; os que não têm simpatia acham-na rígida c
1985) e, mais recentemente, como "organização patológrca", por pouco cmpátlca.
.lolm Stciner (1982, 1987, 1992). Além disso, muitos outros analis-
tas usaram a idéia sem usar o termo (Spillius, 1988, vol. 1, pp. 195- (a) canwtc.!Tístieus básicas da técnica kleinia71Ct.Como Segal (19ú 7)
2(2). Obviamente, influenciaram-se uns aos outros, mesmo sem per- menciona, as características básicas da técnica kleíniana derivaram
ceber, na ocasião, que tinham um tema comum. rigorosamente de Freud (1911-15): manutenção rigorosa do setting
llá duas correntes de pensamento principals a respeito da idéia psicanalítico, para manter a transferência tão pura c descontamínada
de organir.açiio patológica. A primeira é a domínância de um self quanto possível; preferência por cinco sessões por semana; ênfase na
mau sobre o resto da personalidade. Muitos autores ressaltam um transferência como foco central da ínteraçâo analista-paciente; cren-
elemento perverso, aditivo , nessa servidão, indieando que envolve ça de que a si tuação transfercnoíal se instaura desde o começo da aná- , I'
não só agressividade, mas também sadomasoquismo.
corrente é a idéia do desenvolvimento
A segunda
de um padrão estruturado de
lise; atitude de reocptivídade ativa, em ver. de passividade e de silêncio;
ínrerpretaçâo da ansiedade e da defesa em conjunto, em vez de separa-
r-
impulsos, ansiedades e defesas que fixam a personalidade em algum das; ênfase na interpretação, principalmente transfcrencial, como
pon to entre as posições csquizopuranóidc e dcprcssiva. Esse padrão agente de mudança terapêutica. Também há uma ênfase na totalidade
permite ao indivíduo a manutenção de um equilíbrio precário, mas da transferência. O conceito é mais amplo do que a expressão na ses-
mui to defendido, em que ele se protege do caos da posição esquizo- são, em relação ao analista, de atitudes relativas a pessoas específicas
paranóidc, ou seja, não se torna francamente psieótieo, mas não c/ou LI incidentes do passado histórico. Mais propriamente, usa-se o
progride a ponto de se defrontar com, c de tentar elaborar, os pro- termo para falar a respeito da cxtcriorizaçâo, na situaçâo analítica, de
blemas da posição dcpressíva, com a dor que lhos é intrínseca, bem forças e relações do mundo interno. O próprio mundo interno é consi-
como seu potencial de criatividade. Pode haver pequenas alterações derado como resultado de um processo constante de desenvolvi-
e às vezes até crescimento, mas uma organízação desse tipo é real- mento, produto da ínteração contínua de fantasias inconscientes,
mente muito resistente à mudança. As defesas operam e111conjunto defesas e experiências com a realidade externa, tanto no passado
com o intuito de construir U111sistema rígido que não desenvolve a quanto no presente. A ênfase de Klein e dos sucessores na ubíqüídadc l~~

flexibilidade característica das defesas da posição depressíva, c os da transferência deriva do uso do conceito de fantasia inconsciente.
esforços de reparação, tão característicos da posição dcpressiva, Ela considera que a fantasia inconsciente subjaz a todo c qualquer
são geralmente narcísicos demais para conduzir a uma resolução pensamento, racional ou irracional, em vez de ser uma categoria espe- 1~
duradoura. Há grande vuriaçâo na psícopatologtn das orgunizações cial de pensamento e de sentimento racional c adequada, e que, por-
patológicas, mas as análises desses pacientes costumam ficar para- tanto, não precisa ser analisada, c um segundo tipo de pensamento e
lisadas ou, por serem muito longas, só são bem-sucedidas em parte, de sentimento irracional c inadequado, e que, portanto, exprime a
ou, às vezes, intermináveis. Os autores se questionam se a destrutí- transferência e precisa ser analisado.
riril
vidudc, nessas organizações, é primária ou defensiva. Freqüente- Kleín e seus sucessores acreditam que, quando o paciente rc-
mente, arnbas, e de fato está implícito no trabalho de muitos auto- gride, o cuidado analítico deve continuar a tomar a forma de um ser-
res que essas o1".!~anizaçôes são formações de compromisso, ou seja, til1g analítico estável, contendo um processo interprctativo correto.
sâo ao mesmo tempo expressões de destrutívldade inerente e de sis- O analista não deve tentar recriar ou alterar experiências infantis, no
temas de defesa contra ela. consultório, por meio de atividades não-lnterpretativas. Klein se
atevo a esses princípios mesmo no desenvolvimento da técnica de
5. Sobre a Técnica. Intensos sentimentos a respeito da técnica, bem brincar com crianças, a não ser pelo fato de () brincar, bem como LI
como das idéias de Klcin c de seus colegas, silo experimentados. Ana- conversa, serem o meio de expressão. Similarmente, no trabalho
Sobre (L teoria psicwwlil'iea Eooluç/u) do pensamellw hleiniano 125
124

com pacientes psicóticos, algumas mudanças forçadas pelo paciente nutodestrutívídndc, que continuam a ser consideradas de central
foram adoradas, sem perda do método como um todo. Impor tância, tanto clínica quanto teoricamente, mas na forma pela
qual são analisadas, com menos confronto c mais apreensão das suti-
(b) evolllçôes na técnica. Nos últimos 30 anos, mais ou menos, houve lezas do conflito entre as diversas partes da personalidade. Essa
algumas mudanças de ênfase na técnica kleiniana. em parte por mudança foi Influenciada não só pelo trabalho de Bíon, mas também
estar dentro de uma sociedade psicanalítica crn que havia outros pela ênfase de Roscnfeld no aspecto comunicativo da ídentifícaçâo
pontos de vista, em parte devido ú ínvostigaçâo constante e à pres- projctiva, como também pela ênfase de .Ioseph na necessidade de o
teza de descartar procedimentos existentes aceitos. A evolução na analista tomar ciência das sutilezas do conflito interno do pacicn te a
técnica e nas idéias progrediram juntas, uma influenciando a outra. respeito da destrutivídadc c evitar juntar-se a ele numa atuação
1\ maior parte dessas mudanças se desenvolveu ponto por ponto e [actill~ 01lt) sadornasoquista.
sem que se tivesse muita consciência delas, na época; estavam "no Ainda que hoje o termo "instinto de morte" provavelmente seja
ar", sem serem propriamente produto de esforço consciente. menos usado do que há 30 anos, há concordância básica a respeito da
(i) a interpl-ewçüo da destnuiviâllde. Tanto Klein quanto seus sua importância. Existem dois aspectos, não mutuamente exclusi-
colegas têm sido freqüentemente acusados de cnfatizar demais o vos. Uma idéia é que os indivíduos com forte tendência para a destru-
negativo. Certamente Klein tinha muita consciência da destrutivi- tivídadc ou para a autodestrutívídade inerente tendem a atacar ou se
dado c da ansiedade que esta suscita, certamente foi uma das primei- afastar de relações potencialmente vivificantes, desejando não ter
ras áreas de pesquisa, mas ela também ressaltou, tanto na teoria nenhuma percepção de desejo que se imponha ao estado estático e
quanto na prática, a importância do amor, da preocupação do pa- aparentemente auto-suficiente. Outra idéia, intimamente relacio-
ciente com os objetos, da culpa e da reparação. Além disso, principal- nada, ressalta o que Roscnfeld, seguindo Freud, chama de "o crnpur-
mente no trabalho posterior, ela transmite ao paciente um intenso rão silencioso do instinto de morte", que promete um estado de Nir-
sentimento de apoio, quando estão sendo revelados os sentimentos vana, livre de desejo, de perturbação c de dependência (Roscnfcld,
negativos. Isso fica especialmente claro em Jnv(;!ja e Grutulão. Tenho a 1987). Tanto .Ioscph quanto Scgal também ressaltam o conflito
nnprcssâo de que seus pacientes não a sentiam como adversária, mas entre diferentes partes da personalidade a respeito do engodo volup-
como aliada na luta para aceitar os sentimentos que odiavam em si tuoso de se retrair para o desespero, o masoquismo c a perversão.
próprios, c que, portanto, tentavam negar e obliterar, Do meu ponto Existem diferenças na amplitude da crença dos analistas de que
de vista, essa atitude dava o sentimento de "equilíbrio" que Segal diz tendências marcadas de ataque às relações positivas c/ou de retirada
ter sido tão importante em sua experiência de ter tido Klein como para a auto-suficiência sejam inatas ou adquiridas, inerentes ou
analista (Scgal, 1982). Certamente esse tipo de equilíbrio é algo que defensivas. 1)0 meu ponto de vista, é uma falsa oposição. Tendo em
os analistas kleíuiunos atuais se esforçam intencionalmente para vista o tratamento de um paciente, é impossível dizer o que é inato, o
conseguir. 1\ esse respeito, alguns autores de artigos clínicos, do iní- que foi adquirido na Intcraçâo com outros e o que é produto cons-
cio dos anos de 1950 c 1960, muitos apresentados na Sociedade Bri- tante de interaçâo. O que se pode dizer é quão arraigadas estão as
túnica, mas não publicados, deram um passo atrás em relação ao tra- tendências negativas do paciente na situação analítica vigente, mas
balho da própria Klcín, especialmente do seu trabalho mais maduro. isso não nos diz se é inato ou adquirido. E, com certeza, faz parte do
Também foi um período em que a propalada "crença no instinto de trabalho do analista investigar em que medida seu comportamento
morte" foi tacitamente usada, na minha opinião, como uma espécie exacerba as tendências negativas do paciente. (~ igualmente impor-
de bandeira para diferenciar Ideinianos de outros grupos da Socie- tante que o analista evite qualquer atitude de culpar, seja o paciente,
dade Bri tânica. (Talvez outros gl"UpOStenham usado da mesma seja suas tendências inatas, ou seus objetos primários, pois a atitude
maneira sua oposição à idéia de instinto de mortc.) Desde aquele de culpar, qualquer que seja o alvo, perturba a curiosidade ativa, mas
tempo, tem havido mudança, não na ênfase na dcstrutividade ou na imparcial, do analista.
Sobre (l teoria psicanalítica Evolttç(Ío do penswne1lto hleillimw 127
126

(ii) a lil1;4tUlgem da 'Ínterpretaçào. Klcin desenvolveu uma lingua- 1989; Rícsenbcrg-Malcolm, 1981). Mas também há o risco de que, se
gem muito concreta e vívida de objetos parciais e de funções corpo- o analista se concentra exclusivamente no presente imediato, no
rais, no trabalho corri crianças pequenas, para quem essa linguagem aqui c agora, perca de vista os níveis infantis ele experiência e de fan-
era si.gnificativa e adequada. Extrapolando em relação ao passado, msía em que se baseia a expressão imediata do aqui c agora, de que o
ela afirmou que os bebês sentem c pensam da mesma maneira, e que,
além do mais, é esta a linguagem do pensamento e do sentimento
presente no inconsciente dc todas as pessoas. Da época de Klein até
hoje, o trabalho tem demonstrado amplamente que as fantasias vívi-
bebê, como se diz, seja jogado fora com a água do banho. Ambos os
níveis de expressão precisam ser ouvidos em conjunto, e ligados à
experiência. E, de fato, diversos colegas disseram que os COIlCeitos de
mundo interno e de fantasia inconsciente estão ficando tão atenua-
I
1'1
I
das baseadas em funções corporais freqüentemente se tornam cons- dos que muito da riqueza clínica da abordagem de Melanic Klcín 11

cientes na análise de adultos, mais especialmente no caso de psícóti- corre o risco de se perder.
cos e de límítrofcs. Ninguém que tenha lido os relatos de Klein sobre (iii) trunsferêncicc, coiurcuransferência e icleruificação projetnx».
seu trabalho com crianças, ou os relatos clínicos de seus alunos e Considera-se hoje que a transferêncla se baseia em ídentifícação pro-
colegas mais talcntosos, pode deixar de se imprcssionar com sua jctiva, usando-se o termo no seu sentido mais amplo, como sugeri
imaginação clínica c sua apreensão da fantasia inconsciente. Há anteriormente. De acordo com Segal, Klein freqücntcmente usou o
diversos exemplos na presente coletânea. Em mãos menos habilido- conceito de ídcntífícação projctiva em seu trabalho, mas a interpre-
sas, no entanto, essa abordagem perde o frescor e se torna rotineira. tava C0l110 expressão de desejos, percepções c defesas do paciente.
Alguns seguidores mais jovens e entusiastas interpretavam, e ainda Sua ênfase estava, em primeiro lugar, no material do paciente, não
às vezes interpretam, em termos de conteúdo verbal e comporta- nos sentimentos do analista, que, conforme ela pensava, só eram sus-
mental, de uma forma rigidamente simbólica que hoje parece preju- citados de maneira a interferir no trabalho analítico se o analista não
dicar a apreensão dos momentos vivos de contato emocional. Essas estivesse funcionando adequadamente. Seu ponto de vista é ilus-
interpretações não se baseiam na rcccptividadc ao paciente, mas no trado na hoje clássica história do jovem analista que lhe disse se scn-
desejo do analista de encontrar no material do paciente evidências tir confuso e que, portanto, interpretou que o paciente tinha proje-
de suas conccpçôcs pró-formadas. "Memória" c "desejo", nos termos tado confusão dentro dele, ao que ela respondeu: "Não, meu bem,
de Bion, substi tuern as hipóteses e a rcocptívídade (196 7b). Essa ati- você é confuso" (Scgal, 1982). Esse exemplo, no entanto, é o caso de
tude prcconccituosa pode ocorrer com qualquer conjunto de concei- uso errado ou inadequado da idéia de identificação projctiva; o ana-

11
tos analíticos. lista não enxergava o seu problema, e culpava o paciente por suas
deficiências. Bion usou, no entanto, exatamente o mesmo processo,
Alguns analistas, talvez cspeciahnente Donald Mcltzer, acham 1I
mas baseado na apreensão acurada da maneira pela qual seus pacicn-
adequado interpretar as fantasias inconscientes diretamente em lin-
guagem corporal de objetos parciais, mas a tendência geral, hoje em
tcs tentavam suscitar nele sentimentos que não conseguiam tolerar ~
em si, mas que inconscientemente desejavam exprimir, e que podiam f,
dia, é falar com o pncicnte, especialmente com o paciente não psicó-
ser compreendidos como comunicaçâo pelo analista. Bion, Roscn-
tico, muito menos em termos de estruturas anatôrnicas (seio, pênis)
feld e muitos outros, hoje, estão explicttamcntc propensos a usar
e muito mais em termos de funções psicológicas (observar, escutar,
seus sentimentos como fonte de informação a respeito do paciente.
pensar, evacuar ctc.). Juntamente com a ênfase crescente em fun-
ções, a concentração na experiência imediata da transferência fre- Kleln não se sentia à vontade, não só quanto à possibilidade de
qücntcmcntc leva à descoberta de camadas mais profundas de signi- uso inadequado do conceito ele identífícaçâo projetiva, mas também
ficado, alguns dos quais podem se basear em experiência corporal a respeito da questão Inttruamentc relacionada da ampliação do con-
infantil. Falar cedo demais de fantasia inconsciente em termos cor- ceito de contratransferênoia, como descrito por Ileimann (1950), ou
porais c de objetos parciais pode levar analista e paciente a falarem seja, do uso dos sentimentos do analista corno fonte de informação
sobre o paciente corno se este fosse uma terceira pessoa (Joseph, sobre o paciente. Klcin sabia da existência de uma tendência, entre
128 Sobre a teoria pS'icarlaliticCl Evolllçiio do pensamento kleiniruu, 129

os analistas, principalmente os menos experientes, de usar seus sen- A abordagem de Joseph se constrói na e amplia a visão psicanalí-
timentos construtivamente, mas o resultado acabava sendo a preo- tica geral de que o paclcn te rcvivc e repete na transferência as expe-
~
cupação excessiva com o monitornmcnto dos sentimentos como riências infantis, os padrões específicos de ansiedade e de defesa c os
pista principal dos acontecimentos da sessão, em detrimento do COI1- conflitos entre diferentes partes da personalidade. Seu método res-
salta, em especial, a 'rcpetiçâo de defesas infan tis, a tentativa de levar ~
tato direto com o material do paciente. No entanto, quase todos os
o analista a se comportar de forma a evitar experiências emocionais f-
analistas Ideinianos usam hoje o conceito de contratransfcrência no
sentido mais amplo, ou seja, como um estado mental induzido no dolorosas, na tentativa de manter ou de restaurar um sistema antigo
~,
~f
analista, ao menos em parte, como resultado da ação verbal c não- de equilíbrio psíquico. I

verbal por parte do paciente, cumprindo assim a fantasia de identifi- Seu método de trabalho suscitou interesse em muitos analistas.
cação projetiva do paciente. (Ver Spíllíus, 1988, vol, 2, pp, 11-13.) Todos concordam com a importância do contato emocional, mas
Como Money-Kyrle diz: "O analista vive o afeto como reação sua a muitos sentem que se podem fazer interpretações mais abrangcntes,
al.~o. ( ... ) Seu trabalho é diferenciar sua contribuiçâo da do pacien- holísticas, c ligações mais imediatas com a história do paciente, sem
perder o contato emocional na situação analítica imediata. Alguns

I
te." (1956, p. 342; ver também Sandler, 1976b, p. 46.)
acham o método muito limltantc c restritivo, mas ninguém duvida
Bion usa a palavra "contratransferência" no sentido restrito,
de que ela desenvolveu um aspecto novo e muito importante da téc-
querendo se referir aos sentimentos inconscientes patológicos do nica klciniana, .
analista, sua "transferência" em relação ao paciente, que revela a
(iv) reconstrução e o aqui e agora. Finalmente, tem havido recen-
necessidade de mais análise do analista. Com certeza isso traz con-
temente muita discussão entre analistas kleinianos sobre a maneira
fusão, já que Bion usa constantemente a idéia de contratransferên-
cia no sentido amplo. Só quando usa o termo é que está querendo
significar contratransferõncía no sentido mais restrito de patolo-
pela qual as experiências
principalmente
passadas surgem na situnçâo analítica,
a respeito de se c quando o relato do passado histó-
1
rico do paciente deve ser ligado de forma explícita, na sessão, a inter-
gia-do-analista. Na prática, no entanto, os dois tipos de contratrans-
pretações da situação transferencial-contratransfcreneiaL Há uma
~
ferência não sâo invariavelmente separáveis, já que suscitar a patolo- grande variedade de pontos de vista, que nâo se confinam a posições
gia-do-analista frequentemente é o instrumento por meio do qual o
paciente efetua sua ídcnnfícaçâo projctiva.
Fica cada vez mais evidente que há muito mais do que comunica-
nitidamente dcrnarcadns.
H.econstruir, recordar, c repetir sempre foram considerados im-
portantes, desde que Freud lhes deu atenção pela primeira vez, mas
I
l:
ção verbal envolvido na transferência e na contratransfcrêncía,
li
considero que o interesse renovado na questão do passado no pre-
existe uma permanente ínteração não-verbal, às vezes grosseira, às sente aconteceu ao menos em parte devido à ênfase de Joscph e de 1
vezes sutil, por meio da qual o paciente age sobre a mente do ana- seus colegas no acting-in, ou seja, na "repetição" como processo cen- !.
lista. Muitos analistas discutiram a importância do que o paciente tral a que os analistas devem se dirigir. A esperança é que por meio da
faz, em comparação com o conteúdo do que ele diz, mas Betty .10- análise eficaz da "rcpctição'' ocorra o "lembrar", não só a lembrança ~
scph enfatizou especialmente esse contraste como ponto de partida
da compreensão da maneira pela qual os pacientes desde cedo na
vida c na situação analítica se adaptam aos objetos e tentam centro-
lidos por meio de ídentifíoaçáo projetiva (Joseph, 1989). O paciente
de fatos históricos esquecidos, mas no sentido de tornar conscientes
ansiedades, defesas c relações de objetos internos rnantídas incons-
cientes no presente.
Segundo um dos pontos de vista, seria preciso apenas isso. Se
I
está, constante, mas inconscientemente, "cutucando" o analista forem feitas Iigaçôes cxplícítas com fatos reais do passado que, de
~
para que este se comporte de acordo com suas fantasias e expectati-
vas inconscientes, um termo mais coloquial para o que Sandler des-
creve como "atualizaçâo" (1976<1, 1976b; Sandler <.: Sandler, 1978).
qualquer forma, só podem ser conhecidos através do filtro das proje-
Ções do paciente, ele próprio fará essas ligaçôcs. Fazer, o analista, a
reconstrução na forma de ligações explící tas com o passado histó-
i
'I
DO Sobre CI teoria 1Jsic.:unalítica Euoluç/u) do pensamellto kleiniana !.lI

I,:
1'11

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rico é, ao mesmo tempo. desnecessário e ilusório, pois ao fazer essas dação de traumas passados possa levar à cisão entre um analista idea-
Iigaçôes ele corre o risco de desviar o paciente do impacto emocional lizado e um objeto primário denegrido, e a uma crença, por parte do
da sessão, c é na própria scssâo que os aspectos relevantes do passado analista, de ser capaz de saber como foi, de fato, a realidade externa
são experimentados de forma mais imediata. cio passado histórico.
Muitos analistas pensam, no entanto, que a ligação explícita com Assim, depois de muitos anos de pouca discussâo explícita de
o passado histórico é parte essencial do processo psicanalítico, que questões técnicas, parece provável hoje que essas e outras trocas
enriquece o que a experiência psicanalítica tem de mais significativo semelhantes levarão a declarações mais explícitas de uma grande
c dá ao paciente o senso de continuidade da experiência (Brcnrnan, variedade de pontos de vista.
1980). Existe certo desacordo a respeito de quando e como a Ii.~ação
explícita com o passado deva ser feita. Alguns analistas acham que.
ainda que o principal objetivo deva ser esclarecer c tornar consciente IH. Pensamentos pessoais sobre material elínieo e sobre
o passado no presente por meio da análise da "repetição" do pa- o bebê hipotétieo
ciente, seu actinM-in, pode-se ligar à visão atual do paciente com o
seu passado histórico (Joscph, 19R9; Rícsenberg Malcolrn, 1986). Nas conferências que fez na Inglaterra, em 1925, quc depois se torna-
Um ponto de vista comum a esses autores é que falar sobre o passado ram a Parte 1 de 11 Psicanálise de Crianças, Klcin relata material
é mais distante do que experimentar a imcdíatcz do aqui c agora da clínico detalhado, c a teoria, da maneira que ela a usa e desenvolve,
situação de transfcrência-eontratransferência, mas todos concor- restringe-se às idéias necessárias para dar sentido às suas observações
dam em que pode ser muito útil, contanto que não seja usado defen- clínicas. Na Parte 2 dcA Psicanálise de CJiança ..s, originalmente confe-
sivamente. rências realizadas em 1927, e em muitos outros artigos mais teóricos
Segal não concorda, no entanto, que interprctuçôes sobre o pas- iniciais, Klcin não escreve sobre material clínico real de crianças, mas
sado sejam necessariamente mais intelectuais e distantes do que a rcspcí to de um bebê hipotético. Ela extrapola em relação ao passado,
interpretações sobre a intcraçâo imediata analista-paciente. Roscn- afirmando que os bebês pensam da mesma maneira que as crianças
feld concorda com ela, pois pensa ser útil fazer Inrcrprctaçôes que analisou, assumindo também que há uma continuidade psíquica
rcconstrutívas e observações que tragam tudo o que lhe pareça rele- do primciro ano de vida até o começo da infância, e até a Iatêncía, até a
vante e que for sentido como componente essencial da análise da puberdade, adolescência e vida adulta. Quando discute bebês, não
transferência (Roscnfcld, 1987). traz evidências que a apóiem a partir da observação de bebês (mas, ver
Mas, em outro trabalho, Roscnfcld aprofunda a questão. Ele acha 1952c), e de fato é muito difícil saber como e por que ela chega ao seu
que, no caso de pacientes traurnatizados, Interpretações da si tuação sistema de estabelecimento de datas.
de transfcrência-contratransferência imediata podem ser prejudi- No desenvolvimento da teoria das posições esquizoparanólde e
ciais, de fato, pois o paciente as sente como se o analista estivesse depressiva, esse processo de tcorizaçâo cspcoulatíva sobre o desen-
repetindo o comportamento de um objeto primário egoísta e exi- volvimento do primeiro ano de vida é levado mais adiante. Mas, como
gente, que quer ser o centro da atenção c da preocupação do pa- descrito anteriormente, no entanto, as posições são hoje cada vez
ciente (Roscnfeld, 1986). Ele acha que o analista deveria concen- mais como estados mentais, eom destaque cada vez menor para a
trar-se, ao menos inicialmente, na clucidaçâo ernpática dos eventos seqüência delas nas conjeturas sobre o desenvolvimento infantil. As
traumáticos do passado, com todas as suas ramificaçôes. Críticos do posições não podem ser "provadas" pela observação de bebês ou por
ponto de vista de Roscnfeld pensam que o problema de repetir o com- experimentos, já que dizem respeito a modos de pensamento e de
portamento de um progenitor egoísta pode ser resolvido por meio da sentimento, c é mais difícil ainda ter acesso direto ao pensamento c
interpretação, e não por meio de comportamento diferente do do ao sentimento infantil do que ao pensamento e sentimento cons- :1
progenitor, e ficam ainda mais preocupados com que () foco na eluci- ciente c inconsciente de crianças maiores e de adultos.
i
lJ2 Sobre a teoria ps'icanalítica
E-voluç{io (10 pellSlIIllCl!to klciniano 1.1.1

Quando constrói o bebê hipotético, Klcin não está só. Freud,


Abraharn, Winnicott, Mahlcr, na verdade, virtualmente todos os ana- dos conceitos e0111dados clínicos reais, no entanto, não foi o foco
principal das Díscussõcs sobre as Controvérsias.
listas sentem-se muito livres para construir avaliações hipotéticas do
desenvolvimento mental de bebês, Creio que essas avaliações deri- Nâo sou contra hip6teses conjcturais -a psicanálise seria muito
vam principalmente do que acontece no trabalho clínico com pacicn- mais pobre se Frcud, Ahraham , Klcin c outros não tivessem tido cora-
tos, adultos e crianças, suplementadas por observações não muito gem e ima,~inação para fazê-Ias. Mas é quase surpreendente que as
sistematizadas de bebês e por raciocínio e idéias gerais a respeito do hipóteses devam ter tomado a forma de especulações sobre o pensa-
mento de bebês. O problema começa quando essas especulações são
que é plausível. Em outras palavras, as teorias se originaram de um
tratadas como fato. Nas Discussões sobre as Controvérsias, cada lado
conjunto de dados, mas foram expostas como se estivessem baseadas
tendia a agir como se o que Frcud disse fosse uma teoria "correta", c
num outro conjunto. lt como se o analista tivesse se perguntado:
então pulasse da consideração como teoria correta para considerá-Ia
"Que pensamentos e sentimentos de bebês são consistentes com o
que observo clinicamente, e com meus pensamentos a respeito?"
fato. Como Freud disse muí tas coisas, e cada lado caçasse afirmações !~
que apoiassem o seu ponto de vista, não surpreende que não tenham
Idéias sobre o que é plausível provavelmente são muito influenciadas
chcgndo a nenhum acordo, nem mesmo a uma melhor compreensão
pela teoria psicológica vigen te na época. (Em conexão com as teorias
UI11 do outro. Esse apego emocional a teorias conjeturuis nos coloca
que rivalizavam entre si nas Discussões sobre as Controvérsias, Rio-
em risco de nos uferrarrnos a unia teoria que acaba não sendo tão útil
cardo Stcincr (1991) apresenta um relato muito interessante sobre
quanto poderia ser, porque pensamos nela, literalmente, como "ver-
os diversos cientistas e autores que influenciaram os vienenses a dade".
acreditar que as crianças muito pequenas não podiam fantasiar nem
Freud descreve a atitude experimental adequada que se deveria
pensar e, em contrapartida, sobre os pensadores e cientistas que
adotar em relação às hipóteses, no primeiro parágrafo de "Os instin-
influenciaram Susan Isaacs na direção oposta.) tos e suas vicissitudes", em 1915. De fato, foi de grande vigor, tanto
Originária de outra disciplina, que já mudou da crença em fases de Frcud quanto de Klein, a prcdisposíção para abandonar um con-
hipotéticas para o ponto de vista de que as teorias deveriam prestar-se junto de hipóteses espcculativas em favor de outro que combinasse
à compreensão de fatos ctnográftcos específicos, achei surpreendente melhor com o material clínico ou que desse mais sentido para as
que psicanalistas de todas as escolas de pensamento construíssem a observações c teoria existentes. Esse tipo de evolução teve continui-
maior parte de suas teorias em termos de conjeturas hipotéticas sobre dade com os colegas de Klcin, embora em menor escala, e se deu
o desenvolvimento elebebês, quando parecia óbvio que essas asserções mais atençào ao trabalho clfnico e menos à construção de teorias em iÜl
e conjeturas não podiam ser diretamente ínvcstigadas com bebês. termos de reconstruções cspcculativas da primeira infância.
Essa preocupação com o pensamento infantil foi especialmente sur- Enquanto isso, recentemente. houve um grande aumento dos
preendente nas Discussões sobre as Controvérsias, em que a maior estudos sobre 11 primeira infância, tanto por meio da observação psi-
parte da controvérsia científica consistia em argumentos a respeito canalítica de bebês quanto por meio de observações c experimentos
de construções extremamente espcculatívas sobre a vivência infan- de psicólogos do desenvolvimento. Vale a pena observar que a pes-
til. Acho o artigo de Isaacs plausível, em parte porque ela apresentou quisa cxpcrnncnral com bebês muito pequenos consubstancíou mui-
várias evidências de observação e usou bem a idéia de continuidade tas conjeturas mais "cogníttvas" de Klein, especialmente a hipótese
genética, c em parte, com certeza, porque tenho muita familiaridade de que bebês muito pequenos conseguem fazer distinções muito
com seu ponto de vista. Mas a verdadeira utilidade do conceito de rudimentares de se(f' e objeto. Daniel Stcrn diz o seguinte:
fantasia, de Mclanic Klcin, não emerge dcs conjeturas sobre o papel "Os bebês começam a experimentar o surgimcnto de um senso
que desempenha no pensamento infantil, mas do significado e do de sei/a partir do nascimento. Já vêm pré-dotados para ter consciên-
enriquecimento que dá ao trabalho clínico com padentes. A relação cia de processos de auto-orguruzação. Nunca experimentam um
período de total índífcrcncínção seif:outro. Não há confusão entre
1.14 Sol/Te a teoria psicanalítica E-volllC;(/.O elo ]JenSWIl~nto hleüliwlO 1.15

sel] c outro, no início, ou em qualquer momento do primeiro ano de siva na primeira infância. Está implícito, na maioria dos artigos, que
vida. Também já estão pró-dotados para responder de forma seletiva () autor pensa nas posições como modelos mentais, se vistos da pers-
a eventos sociais externos e nunca experimentam uma fase de tipo pectiva do analista, ou estados mentais, se vistos do ponto de vista da
autista." (Stern, 1985, p. 10.) experiência do pacicn te.
Acho interessante que analistas kleinianos não dessem atenção A mudança de ênfase do aspecto de desenvolvimento elo bebê
específica a essa confirmação. Muito provavelmente porque seu inte- para o aspecto de estados mentais é muito mais pronunciada em
resse se distanciou das fases hipotéticas do primeiro ano de vida. alguns analistas do que em outros. Analistas com talento especial
para ver a expressão da experiência infantil na relação analítica têm
Do meu ponto de vista, os experimentos e as observações dos psi-
maior possibilidade dc pensar dentro do refcrencíal do desenvolvi-
cólogos do desenvolvimento são melhores para testar discrimina-
mento do bebê c de usar interpretações reconstrutívas, Analistas que
ções cognltlvas e seqüências de interaçâo cornportamental. Não são
ficam mais expiícítarncnte no aqui-e-agora provavelmente usarão as
tão boas, ou ainda não, para nos contar sobre o pensamento c o senti-
posições como estados mentais vigentes e flutuantes. Mas, acima de
mento dos bebês c de outros assuntos relevantes para a teoria psica-
tudo, comparados ao pensamento e à prática clínica de .10ou 40 anos
nalítica. A maior parte dos conceitos dos psicólogos do desenvolvi-
atrás, parece-me que a tendência geral, tanto para os analistas de
mento não está formulada de maneira que possa descobrir essas
tendência reconstrutiva quanto para os da tendência aqui-c-agora, é
questões, e talvez essa formulação não seja possível. Suponho que
o uso mais pronunciado das posições como modelos.
seja por esse motivo que muitos psicanalistas só se interessam de
forma perifóríca pelos experimentos dos psicólogos do desenvolvi-
mcnto. André Grcen, por exemplo, acha que as observações de bebê
e os experimentos não informam ao psicanalista o que ele precisa IV. Uma revisão
saber, e que, de qualquer maneira, o observador muito provavel-
mente só verá o que sua teoria a priori o encoraja a ver (Green, o trabalho inicial de Klein foi um grande período de descoberta clí-
1990). Meu ponto de vista pessoal é que a teoria psicanalítica ao nica cmpfrica, que incluiu descobertas discordantes das descobertas
menos deva ser consistente com as descobertas da psicologia do c dos pontos de vista de Freud. Depois, veio o período de construção
desenvolvimento, embora não possa ser reduzida a elas. E, de forma teórica, com o delineamento das posições esquizoparanóide e ele-
recíproca, penso que a pesquisa do desenvolvimento deveria enrique- pressíva, uma nova compreensão da ansiedade e novas idéias sobre a
cer-se com o uso de conceitos psicanalíticos sobre o desenvolvi- importància da inveja e da gratidão nas experiências primárias de
mento, mesmo que sejam só conjeturas. relações de objeto.

Parece-me que, recentemente, desenvolveram-se duas novas ten- Ftnalmentc, descrevi alguns desenvolvimentos centrais do pensa-
dências no pensamento psicanalítico. Arnbas partem das teorias mento klclníano, em anos recentes: estudos das psicoses, teorias de
extremamente conjeturaís do desenvolvimento e das fases infantis pensamento e experiência, ídcntiflcação projetiva e contratransferên-
vigentes na época das Discussões sobre as Controvérsias. Uma ten- cia,juntamcnte com evoluções ela técnica; e a evolução na concepção
dôncía se associa de perto (mas não se limita) à psicologia empíriea das posições esquizoparanóidc e depressíva e O uso dessas concepções
como modelos.
do desenvolvimento: um exemplo é o estudo obscrvacíonal e tcrapêu-
tíco do desenvolvimento da teoria da mente do indivíduo, de Georgc Observando o desenvolvimento klciniano corno um todo, duas
Moran e colegas, no Centro Anna Freud (Fonagy, 1991). Uma caractedsticas saltam aos meus olhos. Primeira, na orientação teó-
segunda tendência é o desenvolvimento da teoria de modelos men- rica, por ser uma teoria tanto de relações de objeto quanto de cstru-
tais, e é essa a tendência do pensamento kleiniano mais recente. tmoa pulsíonal. Segunda, na atitude clínica: é uma abordagem que
Seguindo a iniciativa de Bíon, deixou de ser uma preocupaçáo o inte- tem uma consideração especial pela realidade psíquica e pela neces-
'fi
resse de datar de forma exata as posiçôcs esquizoparanóide c depres- sidade de "conhecimento" do indivíduo no sentido de Bion e, às :
136 Solrn: a teoria psicanalítica

vezes, de evasão do "conhecimento". Hoje existe muita variedade de


interesses e de oricntuçâo no pensamento kleíníunu, mas todos eles
parecem ter em comum o interesse de investigar as raizes das rela.
ções de objeto vigentes no mundo interno e na experiência passada
recordada do indivíduo, e todos implicam o estudo da expressão das
relações de objeto arcaicas, de forma modificada, na relação entre 5
analista e paciente,
Muitas vezes me perguntei por que fiquei tão envolvida nessa dis-
ciplina tão exigente, com tanta ansiedade c tão pouca certeza, tanta
necessidade de abertura para coisas que não se entende, tanta tenta-
Melanie Klein revísítada: seus pensamentos não
ção de se aferrar ao que se conhece. Mas, de vez em quando, ressurge publicados sobre técnica
() senso de descoberta que senti há mais de 40 anos, quando li os pri-
meiros artigos clínicos de Klein. [Espero que os artigos deste volume
dêem ao leitor a percepção da maneira pela qual o senso de investiga-
ção e de descoberta continuam na nova geraçáo. J
Agradecimentos - Muitos colegas fizeram sugestões úteis sobre
este artigo, principalmente Ronald Britton, Míchael Fcldrnan, Peter
I<onagy, Betty Joseph , Ruth Riescnberg Malcolm, Edna O'Shau- Para todos os psicanalistas, a técnica é profundamente importante.
,ghncssy, Eric Rayner, Hclcn Schoenhals e John Stciner. Por meio dela é que obtemos nossos dados, e nossa teoria não teria
base sólida sem bons dados clínicos. Neste artigo, investigo o traba-
lho não publicado de Mclanie Kleln sobre técnica.
Klcin só publicou dois artigos técnicos: "As origens da transfc-
rência", em 1952, e "1\ técnica psicanalítica do brincar", um 1955,
mas deixou um conjunto de conferências sobre técnica, não publica-
das, com mais de l.500 páginas de anotações dedicadas específica-
mente a problemas técnicos, Pretendia escrever um livro sobre téc-
níoa, mas não () fez. Também ia escrever livros sobre mecanismos
esquizóídcs, solidão c desenvolvimento mental, talvez um número
excessivo de temas para poder se concentrar em qualquer um deles.
Talvez devamos ser gratos por ela ter escrito ao menos A Psicanálise
de Crianças, lrvoej« e Gmtidiío e a NWT(!ti'VC! da Análise ele uma
Criança, bem como seus diversos artigos.
!t Importante lembrar que, embora Klein tenha desenvolvido,
afinal, lima nova teoria, influente e controversa, sua base era a clí-

I
niua. Ficava fascinada com o material clínioo, a ponto de se perder
em seus detalhes. Sabemos, a partir do relato da supcrvisâo de .Iames

I
Clammill com Klcín, de 1957 a 1959, que ela tinha uma memória pro-
digiosa para material clínico, tanto seu quanto dele (Gammill,
19H9). Contaram-me que em discussões sobre teoria ela costumava

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