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35
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
Na
área
central1
da
cidade
de
Londrina-‐PR,
está
situada
a
maioria
das
principais
edifi-‐
cações
de
“caráter
histórico”
da
urbe,
devido
ao
fato
de
que
esta
parcela
do
espaço
urbano
se
formou
como
núcleo
inicial.
Dentre
esses
edifícios
está
a
atual
sede
do
Museu
Histórico
de
Londrina
Padre
Carlos
Weiss.
Localizado
atualmente
na
Rua
Benjamin
Constant,
número
900,
o
prédio
é
cercado
por
outros
elementos
urbanos
peculiares.
À
sua
frente,
se
encontra
a
Praça
Rocha
Pombo
e,
em
seguida,
a
antiga
Estação
Rodoviária,
atual
sede
do
Museu
de
Arte
de
Londrina.
À
sua
esquerda
existe
uma
viela
que
dá
acesso
ao
Planetário.
A
avenida
que
passa
atrás
de
seu
quarteirão
é
a
Avenida
Leste-‐Oeste,
uma
das
principais
vias
de
tráfe-‐
go
rápido
em
Londrina.
E
finalmente,
à
sua
direita,
o
frenético
movimento
produzido
pelo
Terminal
Central
de
ônibus
urbano.
Em
meio
a
estes
variados
elementos
urbanos,
em
sua
maioria,
caracterizados
por
uma
linguagem
arquitetônica
proveniente
da
Arquitetura
Mo-‐
dernista,
o
edifício
da
antiga
Estação
Ferroviária,
atual
Museu
Histórico,
se
estabelece
por-‐
tando
uma
linguagem
diferente,
única,
por
conta
de
suas
instâncias
urbanas,
históricas,
ar-‐
quitetônicas
e
artísticas,
fato
determinante
no
estabelecimento
desta
construção
como
ob-‐
jeto
privilegiado
da
presente
análise.
No
início
da
década
de
1940,
a
primeira
Estação
Ferroviária
da
cidade
de
Londrina,
inaugurada
em
28
de
julho
de
1935,
já
não
conseguia
comportar
adequadamente
a
deman-‐
da
de
serviços
de
uma
cidade
em
pleno
e
acelerado
processo
de
desenvolvimento
urbano.
Diante
desse
problema,
é
idealizada
a
construção
de
uma
nova
Estação
Ferroviária,
de
cará-‐
ter
monumental
para
a
época,
e
com
as
mais
modernas
instalações
desenvolvidas
pela
téc-‐
nica
daquele
momento,
trazidas
pela
interferência
e
ação
do
então
diretor-‐gerente
da
Rede
de
Viação
Paraná-‐Santa
Catarina
(RVPSC),
o
Coronel
Durival
de
Brito
e
Silva.
Assim,
no
ano
1
Não
será
utilizado
aqui
o
conceito
de
“Centro
Histórico”
para
referenciar
esta
parcela
da
cidade,
pois
pressu-‐
põe-‐se
que:
“O
conceito
de
‘centro
histórico’
é
instrumentalmente
útil
porque
permite
reduzir,
quando
não
bloquear,
a
invasão
de
zonas
antigas
por
parte
de
organismos
administrativos
ou
de
funções
residenciais
novas
que
fatalmente
conduziriam,
mais
cedo
ou
mais
tarde,
à
sua
destruição.
O
mesmo
conceito,
porém,
é
teorica-‐
mente
absurdo
porque,
se
se
quer
conservar
a
cidade
como
instituição,
não
se
pode
admitir
que
ela
conste
de
uma
parte
histórica
com
um
valor
qualitativo
e
de
uma
parte
não-‐histórica,
com
caráter
puramente
quantitati-‐
vo.
Fique
bem
claro
que
o
que
tem
e
deve
ter
não
apenas
organização,
mas
substancia
histórica
é
a
cidade
em
seu
conjunto,
antiga
e
moderna.
Pôr
em
discussão
sua
historicidade
global
equivale
a
pôr
em
discussão
o
valor
ou
a
legitimidade
histórica
da
sociedade
contemporânea,
o
que
talvez
alguns
queiram,
mas
que
o
historiador
não
pode
aceitar.”
(ARGAN,
1998,
p.79).
Contudo,
as
expressões
“edificação
histórica”
e
“caráter
histórico”
serão
utilizadas
para
se
referirem
ao
objeto
tratado,
aparecendo
entre
aspas.
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
36
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
de
1945
é
aberto
um
edital
de
licitação
para
a
obra,
que
é
concedida
à
construtora
Firma
Thá
e
Filhos
Ltda.,
proveniente
da
capital
Curitiba-‐PR.
A
construção
do
prédio
da
estação
e
de
todo
o
complexo
ferroviário
necessário
foi
iniciada
em
1946,
mas,
por
uma
série
de
ques-‐
tões,
só
foi
finalizada
em
1950,
sendo
sua
inauguração
aberta
ao
público
em
20
de
julho
do
mesmo
ano.
Apesar
de
satisfazer
muito
bem
suas
finalidades,
a
Estação
Ferroviária
localizava-‐se
bem
no
centro
da
cidade,
dividindo-‐a
literalmente
ao
meio
na
linha
norte-‐sul.
Ao
longo
dos
anos,
sua
localização
se
tornou
um
grande
entrave
para
o
crescimento
da
região
central,
tendo,
inclusive,
consequências
sociais
desastrosas,
em
especial
a
segregação.
Em
1966,
por
conta
desses
problemas
que
ocasionava,
foi
idealizado
pelas
autoridades
competentes
o
projeto
da
Variante
Ferroviária,
que
acarretaria
no
desligamento
das
atividades
da
Estação
Ferroviária
e
levaria
os
trilhos
para
a
parcela
norte
da
cidade,
a
fim
de
contemplar
as
indús-‐
trias
que
também
foram
direcionadas
para
aquela
região.
O
projeto
da
Variante
Ferroviária
só
foi
efetivamente
elaborado
na
década
de
1970
e
concluído,
em
todas
as
suas
etapas,
na
década
seguinte.
Assim,
o
trem
de
passageiros
deixa
de
trafegar
em
10
de
março
de
1981,
tendo
o
último
trem
de
carga
partido
da
Estação
Ferroviária
em
06
de
novembro
de
1982.
Nesse
mesmo
ano,
o
restante
dos
trilhos
foi
retirado
do
leito,
no
centro
da
cidade.
O
prédio
da
Estação
Ferroviária
acabou
relativamente
abandonado,
servindo
de
abrigo
para
pombos
e
marginais.
Figura
1
–
Museu
Histórico
de
Londrina
Padre
Carlos
Weiss
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
37
ANIMA
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III
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2013
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teoria
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cultura
A
instituição
do
Museu
Histórico
de
Londrina
Padre
Carlos
Weiss
teve
início
no
ano
de
1970.
Nessa
época,
o
Museu
Histórico
se
localizava
em
três
salas
do
porão
do
Colégio
Hugo
Simas,
em
meio
a
aperto,
falta
de
estrutura
e
muitas
goteiras.
O
prédio
da
antiga
Esta-‐
ção
Ferroviária
havia
sido
prometido
ao
Museu
Histórico
desde
1979,
pelo
então
Prefeito
Municipal,
Antônio
Casemiro
Belinati.
No
entanto,
a
transferência
da
instituição
para
a
nova
sede
dependia
do
andamento
das
obras
da
Variante
Ferroviária
e,
por
conta
disso,
só
em
1986
o
Museu
Histórico
ocupou
o
prédio.
Em
obra
iniciada
em
fevereiro
de
1986,
com
tér-‐
mino
em
dezembro
do
mesmo
ano,
a
antiga
Estação
Ferroviária
sofreu
um
trabalhoso
pro-‐
cedimento
de
refuncionalização,
expresso
no
projeto
dos
arquitetos
e
professores
do
curso
de
Arquitetura
da
Universidade
Estadual
de
Londrina
(UEL)
Antonio
Carlos
Zani
e
Jorge
Ma-‐
rão
Carnielo
Miguel,
a
fim
de
sediar
apropriadamente
o
Museu
Histórico.
Este
procedimento
foi
muito
criticado
na
época,
inclusive
por
museólogos,
que
afirmavam
que
as
técnicas
de
ambientação
adequadas
ao
novo
exercício
não
estavam
sendo
seguidas.
O
edifício
foi,
en-‐
tão,
cedido
ao
Museu
Histórico
em
regime
de
comodato
pela
Prefeitura
Municipal,
funciona-‐
lidade
que
exerce
desde
10
de
dezembro
de
1986,
data
de
sua
(re)inauguração
como
Museu
Histórico,
até
os
dias
de
hoje.
Buscamos
orientar
a
interpretação
de
nosso
objeto
de
pesquisa,
o
referido
prédio,
sob
duas
perspectivas
complementares
e
concomitantes:
elemento
urbano2
e
objeto
de
arte3
na
2
O
conceito
de
“elemento
urbano”
é
uma
adaptação
nossa
da
seguinte
conceituação
de
Kevin
Lynch:
“Esta
análise
limita-‐se
aos
efeitos
dos
elementos
físicos
perceptíveis.
Há
também
outros
fatores
influenciadores
da
imagem,
tais
como
o
significado
social
de
uma
área,
a
sua
função,
a
sua
história
ou,
até,
o
seu
nome.
Passare-‐
mos
por
cima
disto,
uma
vez
que
o
nosso
objetivo
é,
agora,
descobrir
a
importância
da
forma.
É
elementar
considerar
que
o
design
actual
se
deveria
usar
com
o
fim
de
reforçar
o
significado
e
não
de
o
negar.
Os
elemen-‐
tos
da
imagem
urbana
até
aqui
estudados,
que
podem
referir-‐se
a
formas
físicas,
são
passíveis
de
uma
classifi-‐
cação
conveniente
em
cinco
tipos
de
elementos:
vias,
limites,
bairros,
cruzamentos
e
elementos
marcantes.”
(LYNCH,
1999,
p.57).
A
fim
de
direcionar
nossa
interpretação
aos
elementos
propriamente
físicos
da
cidade,
os
conceituamos
de
“elemento
urbano”.
3
Utilizamos
o
conceito
de
“objeto
de
arte”,
pois,
“Da
distinção
de
um
espaço,
de
uma
forma
urbana
descende,
gera-‐se
a
arte,
que,
por
sua
vez,
permite
distinguir,
separar;
intimamente
relacionada,
portanto,
com
a
cidade,
da
qual
nada
mais
é
que
a
complexa
epifania,
a
fenomenização.
De
fato,
no
interior
da
cidade,
tudo
se
realiza
segundo
uma
techné
cujo
o
modelo
é
o
processo
que
realiza
a
obra
de
arte.
O
espaço
urbano
é
espaço
de
obje-‐
tos
(ou
seja,
de
coisas
produzidas);
e
entre
o
objeto
e
a
obra
de
arte
existe
uma
diferença
hierárquica
(ou
seja,
quantitativa,
de
valor)
mas,
ainda
assim,
sempre
no
interior
de
uma
mesma
categoria,
de
uma
mesma
série.”
(CONTARDI,
In:
ARGAN,
1998,
p.1).
Contudo,
temos
a
noção
de
que
esta
hierarquização
das
classificações
artís-‐
ticas
é
muito
tênue,
pois:
“A
própria
noção
de
objeto,
no
âmbito
dos
fatos
estéticos,
não
fornece
um
critério
geral.
Ainda
que,
com
base
na
experiência,
se
possa
dizer
que
todo
fato
artístico
determina
uma
relação
espe-‐
cial
entre
realidade
objetiva
e
realidade
subjetiva,
isso
não
significa
que
a
cada
ato
artístico
corresponde
a
produção
de
um
objeto
material.
Na
atual
condição
da
cultura
admite-‐se
até
(por
exemplo,
nas
poéticas
dada-‐
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
38
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
vertente
da
Arquitetura.
Primeiramente,
trataremos
da
existência
do
edifício
como
elemen-‐
to
urbano,
de
sua
classificação
e
propriedades
como
tal.
Para
tanto,
nos
utilizaremos
das
proposições
conceituais
do
urbanista
norte-‐americano
Kevin
A.
Lynch,
discutidas
na
obra
A
Imagem
da
Cidade
(1999).
Neste
trabalho,
o
autor
propõe
que
o
entendimento
do
design
urbano
seja
baseado
principalmente
em
sua
percepção
visual
e
apropriação
mental.
Em
ra-‐
zão
desta
hipótese,
o
autor
conceitua
qualidades
imprescindíveis
para
uma
cidade,
como
a
legibilidade
e
a
imaginabilidade.
A
inserção
da
experiência
individual
de
cada
habitante
nos
estudos
sobre
a
cidade
veio
a
contribuir
não
só
em
relação
aos
trabalhos
de
arquitetura
e
urbanismo,
mas
também
nos
estudos
de
História
Urbana
e
na
conceituação
histórica
de
ci-‐
dade,
pois
segundo
Giulio
Carlo
Argan
(1998):
Só
recentemente
a
experiência
da
cidade
foi
considerada
a
partir
da
experiência
individual
e
da
atribuição
pessoal
dos
dados
visuais.
O
livro
de
Kevin
Lynch
(The
Image
of
the
City)
destina-‐se
com
toda
probabilidade
a
mudar
radicalmente,
desde
os
alicerces,
a
metodologia
dos
estudos
urbanísticos
e,
enquanto
isso,
a
eliminar
em
definitivo
toda
uma
série
de
abstrações
de
conveniência
como
“a
sociedade”,
“a
comunidade”,
“a
função
urbana”.
Que
também
são
abstrações
interessadas,
porque
levam
a
considerar
a
cidade,
não
mais
como
um
lugar
onde
se
mora,
mas
como
uma
máquina
que
deve
realizar
uma
função,
que,
naturalmente,
é
sempre
uma
função
produtiva,
retrocedendo
todas
as
outras
atividades
a
atividades
com-‐
plementares
da
principal,
porque,
depois
do
trabalho
da
fábrica,
é
necessário
o
re-‐
creio,
depois
do
trabalho
e
do
recreio
é
preciso
uma
casa,
possivelmente
não
dis-‐
tante
da
fábrica,
onde
dormir.
São
justamente
estas
abstrações
que
corroem
em
profundidade
o
conceito
histórico
de
cidade,
porque
o
afastam
da
experiência
e,
portanto,
da
consciência
(ARGAN,
1998,
p.
230).
O
“diálogo”
entre
Lynch
e
Argan
aponta
para
a
ideia
de
corrosão
do
conceito
de
“cida-‐
de
histórica”.
Nessa
direção,
sinalizamos
para
o
contínuo
movimento
de
modificação
que
marcou
a
cidade
de
Londrina,
desde
a
sua
fundação
em
19294
até
a
atualidade,
constituin-‐
do-‐se
sob
o
título
de
metrópole5.
Esta
cidade
apresenta
a
mesma
composição
do
fenômeno
urbano
caracterizado
por
este
fazer-‐se
constante,
aos
quais
aludem
os
dois
autores:
ístas)
que
o
mesmo
objeto
possa
ser,
simultaneamente,
arte
e
não-‐arte,
bastando
para
qualifica-‐lo
ou
desquali-‐
fica-‐lo
como
arte
a
intencionalidade
ou
a
atitude
da
consciência
do
artista
ou,
até,
do
espectador.”
(ARGAN,
1998,
p.20).
Assim,
o
conceito
de
“objeto
de
arte”
em
nosso
trabalho
foi
utilizado
a
fim
de
direcionar
nossa
discussão
em
torno
do
objeto
e
não
em
sua
consolidação
(ou
não)
enquanto
obra
de
arte.
4
“Londrina,
ao
ser
fundada,
pertencia
à
Comarca
de
Tibagi,
mais
tarde,
veio
pertencer
à
Comarca
de
São
Jerô-‐
nimo
e,
em
1931,
já
um
“próspero
povoado”,
era
distrito
administrativo
do
município
de
Jataí.
Em
3
de
dezem-‐
bro
de
1934,
pelo
decreto
nº
2.519,
passa
a
município
de
Londrina,
Distrito
Judiciário
da
Comarca
de
Jataí.
Em
1939,
é
elevado
à
categoria
de
Comarca”
(ADUM,
1991,
p.54).
5
No
ano
de
2011,
a
cidade
de
Londrina
atingiu
a
densidade
demográfica
necessária
para
chegar
ao
patamar
de
metrópole
segundo
o
IBGE,
500
mil
habitantes.
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Discente
do
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de
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Social
Cultura
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39
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
A
cidade
não
é
apenas
um
objeto
percebido
(e
talvez
desfrutado)
por
milhões
de
pessoas
de
classes
sociais
e
características
extremamente
diversas,
mas
também
o
produto
de
muitos
construtores
que,
por
razões
próprias,
nunca
deixam
de
modifi-‐
car
sua
estrutura.
Se,
em
linhas
gerais,
ela
pode
ser
estável
por
algum
tempo,
por
outro
lado
está
sempre
se
modificando
nos
detalhes.
Só
um
controle
parcial
pode
ser
exercido
sobre
seu
crescimento
e
sua
forma.
Não
há
resultado
final,
mas
ape-‐
nas
uma
contínua
sucessão
de
fases
(LYNCH,
1999,
p.
2).
Os
elementos
urbanos,
portanto,
se
sobressaem
por
seu
desempenho
característico
dentro
do
espaço
urbano.
Kevin
Lynch
propõe
uma
classificação
para
os
diferentes
elemen-‐
tos
urbanos
com
base
em
sua
localização,
funcionalidade,
forma
e
utilização
no
cotidiano
dos
habitantes
locais.
Esta
maneira
de
entender
a
cidade
nos
possibilitou
atentar
para
a
per-‐
tinência
do
objeto,
o
edifício
da
antiga
Estação
Ferroviária,
para
a
cidade
de
Londrina.
Com
suas
diferentes
funcionalidades
durante
sua
existência,
sua
ação
como
elemento
urbano
também
sofreu
modificações.
Conforme
a
classificação
dos
elementos
urbanos
proposta
por
Lynch,
o
edifício
passou
do
papel
de
Ponto
Nodal6
e
Marco
Urbano7
para
apenas
Marco
Ur-‐
bano,
ao
qual
nos
deteremos.
Um
dos
aspectos
importantes
em
um
Marco
Urbano
é
o
que
o
autor
denomina
de
sin-‐
gularidade,
reforçada
em
nosso
objeto
ao
longo
dos
anos,
em
relação
à
sua
linguagem
arqui-‐
tetônica:
Uma
vez
que
o
uso
de
marcos
implica
a
escolha
de
um
elemento
dentre
um
con-‐
junto
de
possibilidades,
a
principal
característica
física
dessa
classe
é
a
singularida-‐
de,
algum
aspecto
que
seja
único
ou
memorável
no
contexto.
Os
marcos
se
tornam
mais
fáceis
de
identificar
e
mais
passíveis
de
ser
escolhidos
por
sua
importância
quando
possuem
uma
forma
clara,
isto
é,
se
contrastam
com
seu
plano
de
fundo
e
se
existe
alguma
proeminência
em
termos
de
sua
localização
espacial
(LYNCH,
1999,
p.
88).
Estes
elementos
de
identificação
de
um
Marco
Urbano,
apontado
por
Lynch,
o
qualifi-‐
cam
como
singular.
Esta
singularidade
está
presente
nele.
Contudo,
ela
vem
sendo
prejudi-‐
cada
paulatinamente
desde
o
início
dos
anos
de
1950,
com
o
verdadeiro
“boom”
de
constru-‐
ções
(em
sua
maioria,
exemplares
da
Arquitetura
Modernista),
que
marcaram
este
espaço
citadino.
Devido
ao
denso
movimento
de
verticalização
urbana,
o
prédio
veio
perdendo
sua
6
“Pontos
Nodais:
são
pontos,
lugares
de
concentração
estratégicos
de
uma
cidade.
Ponto
de
locomoção
para
ou
a
partir
dele.
Símbolos
de
influência,
núcleos,
conexão
ou
concentração”
(LYNCH,
1999,
p.
52).
7
“Marcos:
são
um
tipo
específico
de
referência
externa.
Objeto
físico
definido
de
maneira
simples.
Seu
uso
implica
a
escolha
de
um
elemento
a
partir
de
um
conjunto
de
possibilidades.
Pode
estar
dentro
ou
fora
da
cidade,
distante
ou
não.
São
geralmente
usados
como
indicadores
de
identidade,
ou
até
estrutura,
e
parecem
tornar-‐se
mais
confiáveis
á
medida
que
o
trajeto
vai
ficando
cada
vez
mais
conhecido”
(LYNCH,
1999,
p.53).
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
40
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
proeminência
visual
e
espacial
e
essa
perda
avançou
até
sua
refuncionalização
na
década
de
1980
e
ainda
mais
rapidamente
nos
últimos
anos.
Contudo,
um
dos
principais
fatores
de
identificação
deste
prédio
como
Marco
Urbano
é
sua
associação
histórica:
“As
associações
históricas
(ou
outros
significados)
são
reforços
poderosos
[...].
Quando
uma
história,
um
sinal
ou
um
significado
vem
ligar-‐se
a
um
objeto,
aumenta
o
seu
valor
enquanto
marco”
(LYNCH,
1999,
p.
90).
Esta
associação
histórica
é
um
dos
pontos
principais
de
sua
categorização
como
Marco
Urbano,
tanto
por
sua
trajetória
como
Estação
Ferroviária
quanto
em
sua
funcionalidade
atual
enquanto
sede
do
Museu
His-‐
tórico
da
cidade,
juntamente
com
a
plasticidade
eclética
do
edifício.
Giulio
Carlo
Argan
em
seu
escrito
História
da
Arte
como
História
da
Cidade
(1998)
em-‐
basa
nossa
pesquisa
na
perspectiva
da
História
da
Arte
e
da
Arquitetura,
ao
propor
uma
per-‐
cepção
artística
da
cidade,
na
qual
é
posta,
ela
mesma,
como
um
produto
de
arte,
resultante
de
um
múltiplo
e
complexo
processo,
em
constante
movimento
de
criação
e
recriação:
“Por-‐
tanto,
ela
não
é
apenas
[...]
um
invólucro
ou
uma
concentração
de
produtos
artísticos,
mas
um
produto
ela
mesma.”
(ARGAN,
1998,
p.73).
O
autor
percebe
a
cidade
como
um
produto
de
arte
porque
a
considera
um
só
todo
com
sua
própria
arquitetura,
sendo
esta,
fruto
dos
processos
e
das
técnicas
de
produção
artística.
A
arquitetura
também
é
posta
como
consti-‐
tutiva
e
expressiva
de
todo
o
sistema
em
que
se
insere,
além
de
o
autor
entender
a
Arte
co-‐
mo
uma
instituição
essencialmente
urbana.
Mas
é
necessário
apontar
que
Giulio
C.
Argan
considera
a
cidade
como
um
produto
de
arte,
mas
não
a
cristaliza
sob
o
conceito
de
“obra
de
arte”:
“Nosso
problema
é
justamente
o
do
valor
estético
da
cidade,
da
cidade
como
espa-‐
ço
visual.
Não
o
colocarei
em
termos
absolutos:
o
que
é
a
arte
e
se
uma
cidade
pode
ser
considerada
uma
obra
de
arte
ou
um
conjunto
de
obras
de
arte.”
(ARGAN,
1998,
p.228).
Assim,
nosso
trabalho
se
propôs
ao
entendimento
do
fenômeno
urbano
sob
esta
linha
de
investigação,
ao
colocar
como
problemática
a
interpretação
das
linguagens
arquitetônicas
e
consequentemente
artísticas
do
prédio
da
antiga
Estação
Ferroviária
de
Londrina.
Em
conjunto
com
as
interpretações
feitas
a
partir
do
escrito
do
urbanista
Kevin
Lynch,
buscamos
incorporar
a
nossa
proposta
à
perspectiva
artística
sobre
os
estudos
urbanos,
apresentada
por
Giulio
Carlo
Argan.
A
finalidade
é
a
de
apontar
um
liame
entre
os
estudos
históricos
de
arte
no
viés
arquitetônico,
mas
também
de
explicitar
o
entrelaçamento
entre
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
41
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
as
questões
urbanas,
arquitetônicas
e
humanas.
Uma
de
nossas
propostas
inclusive
é
apon-‐
tar
este
entrelaçamento
na
perpectiva
histórica
da
cidade
de
Londrina.
Assim,
as
expressões
artísticas
que
a
Estação
Ferroviária
apresenta
e
representa
em
sua
condição
de
elemento
urbano
que
constitui
a
imagem
da
cidade,
na
concepção
de
Kevin
Lynch,
serão
aqui
aborda-‐
das.
Esta
imagem
é
investida
em
concomitância
com
os
autores
citados,
possuidora
de
valor
simbólico,
estético,
funcional,
histórico.
E,
em
alguns
momentos,
são
estes
valores
que
pos-‐
sibilitam
apontar
outra
funcionalidade
para
um
dado
elemento
urbano.
É
sobre
esses
argu-‐
mentos
que
vimos
tentando
demonstrar
o
lugar
social
da
pesquisa
sobre
nosso
objeto:
o
edifício
da
Estação
Ferroviária
hoje
refuncionalizada
como
Museu
Histórico,
cabe
destacar
que
mesmo
depois
de
refuncionalizada
a
edificação
não
foi
despida
da
imagem
de
elemento
urbano
constituidor
da
paisagem
da
cidade
de
Londrina.
Mas,
porque
em
nosso
estudo
visamos
o
estudo
sobre
o
prédio,
principalmente
em
re-‐
lação
à
sua
forma,
e
não
em
conjunto
completo
com
sua
funcionalidade,
seja
como
Estação
Ferroviária
ou
como
Museu
Histórico?
Porque
segundo
Giulio
C.
Argan,
estas
são
duas
for-‐
mas
de
apreensão
diferentes,
mas
intercambiantes.
Decidimos
então,
trabalhar
com
“os
valores”
do
edifício
enfocando
as
expressões
artísticas,
aquelas
que,
de
acordo
com
Argan,
ficam
cravadas
na
retina
do
usuário,
mesmo
que
este
esteja
em
movimento,
pois
são
essas
expressões
que
despertam
os
sentidos,
as
sensibilidades,
mas
elas
não
estão
desvinculadas
do
uso,
mas,
o
uso
não
está
no
cenário
principal
desse
estudo.
A
qualidade
estética
de
um
elemento
urbano
é
sempre
relegada
a
segundo
plano,
em
razão
de
sua
funcionalidade,
por
este
motivo,
o
objetivo
em
destacar
tal
relevância
vem
exatamente
em
função
desse
“se-‐
gundo
plano”.
Nesse
sentido,
Argan
explica:
O
primeiro
ponto
a
ser
considerado
é
a
relação
entre
função
e
valor.
Os
dois
con-‐
ceitos
são
comunicantes;
aliás,
um
é
o
prolongamento
do
outro.
Mas
convém
dis-‐
tingui-‐los.
Sei
perfeitamente
que,
a
rigor,
não
há
função
sem
valor,
nem
valor
sem
função;
mas
a
atribuição
dos
dois
tipos
de
valor
(valor
da
função
e
função
do
valor)
ocorre
em
níveis
diferentes.
Tomemos
o
caso
de
uma
estação
ferroviária.
Se
estou
correndo
para
o
trem
que
parte,
apreciarei
a
racionalidade
do
percurso,
a
comodi-‐
dade
dos
serviços,
a
facilidade
de
acesso
aos
vagões
da
plataforma
em
nível;
mas
não
terei
tempo
de
avaliar
a
qualidade
estética
da
arquitetura.
Pode
acontecer
que
eu
pense
nisso
mais
tarde,
na
calma
da
cabine
do
trem.
Então,
talvez,
as
imagens
que
impressionaram
minha
retina
enquanto
eu
corria
para
o
vagão
e
que
a
memó-‐
ria,
sem
que
eu
quisesse,
reteve,
podem
voltar
a
minha
mente,
e
eu
terei
a
possibi-‐
lidade
de
olhá-‐las
e
avaliá-‐las,
ou
seja,
de
lembrar
que
a
estação
era
arquitetonica-‐
mente
excelente
e
que
foi
uma
pena
não
ter
podido
vê-‐la
melhor.
Não
tenho
ne-‐
nhuma
dificuldade
em
admitir
que
o
arquiteto
estudou
e
projetou
juntas
a
função
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
42
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
e
a
forma
da
estação;
mas
essa
estação,
eu
a
percebo,
ou
julgo,
ou
vivo
em
seu
di-‐
namismo
funcional,
ou
a
contemplo.
A
estação
continua
sendo
o
que
é;
minha
ati-‐
tude
é
que
muda,
e
a
atitude
contemplativa
faz
parte
da
existência
e
é
modo
de
experiência
tanto
quanto
a
atitude
ativa.
Isso
explica
por
que
uma
arquitetura
pode
conservar
o
valor
estético
inclusive
quando
cessa
sua
funcionalidade
objetiva
(AR-‐
GAN,
1998,
p.229).
A
proposta
de
abordamos
a
Arquitetura
sob
uma
perspectiva
artística,
visa
mostrar
como
a
edificação
é
também
um
espaço
produzido
a
partir
da
concepção
artística
e
não
só
de
uso,
e,
sobretudo,
que
essas
expressões
artísticas
fazem
parte
do
cotidiano
dos
seus
usu-‐
ários
como
bem
salientou
Argan,
mas
que
constitui
sua
imagem
simbólica,
de
localização,
de
referência
como
aponta
Kevin
Lynch.
As
fontes
históricas
que
são
exploradas
em
nossa
pesquisa
visam
apontar
para
a
tenta-‐
tiva
de
elucidação
da
problemática
abordada
a
partir
do
referencial
teórico
oferecido
por
Argan
e
Lynch,
qual
seja
a
constituição
da
cidade
como
produto
de
arte,
sobretudo
a
consti-‐
tuição
da
imagem
urbana
a
partir
de
um
elemento
urbano,
a
Estação
Ferroviária,
hoje
Mu-‐
seu
Histórico.
As
imagens
como
a
fotografia,
as
plantas
e
os
desenhos
arquitetônicos,
que
possibilitam
uma
construção
da
imagem
da
cidade
como
produto
de
arte,
se
constituem
em
um
tipo
de
documentação
imprescindível
aos
estudos
do
urbanismo
e
da
arquitetura.
Esta
é
a
fonte
imagética:
“Historiadores
urbanos
há
muito
tempo
se
dedicam
ao
que
eles
chamam
de
‘a
cidade
como
artefato’.
A
evidência
visual
é
particularmente
importante
para
esse
en-‐
foque
de
história
urbana”
(BURKE,
2004,
p.103).
E,
especificamente
as
fontes
fotográficas,
no
caso
em
foco,
desempenham
um
lugar
relevante.
Pois,
ao
considerar
a
importância
do
uso
de
imagens
para
os
estudos
a
respeito
do
urbano
e
do
arquitetônico,
nos
propomos
a
tratar
as
fotografias
como
“testemunhos
históricos”
pautados
na
indicação
de
Peter
Burke
(2004),
a
fotografia
como
aquela
fonte
que
apresenta
“registros”
da
arquitetura
da
Estação
Ferroviária/Museu
Histórico
de
Londrina.
Faz-‐se
importante
ressaltar
que,
segundo
a
metodologia
proposta
por
Burke,
o
foco
principal
do
trabalho
com
a
imagem
é
o
que
ela
retrata8.
Temos
em
vista
que,
em
torno
des-‐
te
tipo
de
instrumento
–
a
fotografia
–,
existe
um
crescente
debate
acerca
de
seus
usos
e
de
sua
conceituação
como
documento
passível
de
interpretação
e
diálogo
com
outros
tipos
de
8
Informamos
que
não
pormenorizamos
os
detalhes
referentes
a
este
tipo
de
fonte
como,
por
exemplo,
a
téc-‐
nica
fotográfica
utilizada,
a
composição
e
distribuição
estética
dos
elementos
na
imagem,
o
histórico
dos
fotó-‐
grafos
e
suas
poéticas,
entre
outros
pontos
essenciais
na
pesquisa
de
fontes
fotográficas
(KOSSOY,
2001).
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
43
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
44
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
cas,
mesmo
porque,
como
anteriormente
mencionado,
a
Estação
Ferroviária,
hoje
Museu
Histórico,
oferece
a
possibilidade
de
entendimento
dessa
subjetividade
na
arquitetura
que
apresenta
a
partir
da
percepção
que
o
usuário
tem
de
seu
uso
no
cotidiano,
como
alertou
Argan.
Além
da
representação
das
linguagens
artísticas9
expressas
na
plasticidade
do
edifício,
a
planta
arquitetônica
também
é
uma
fonte
muito
interessante
no
estudo
do
urbano
e
da
arquitetura.
Pois
possibilita
a
percepção
de
um
espaço
de
vivência,
imprescindível
na
com-‐
preensão
da
experiência
espacial
que
é
própria
da
arquitetura,
a
inserção
do
corpo
na
equa-‐
ção
arquitetônica,
ou
topologia:
“A
planta
arquitetônica
é
uma
explícita
descrição
geométri-‐
ca
que
carrega
uma
implícita
descrição
topológica10.”
(AGUIAR,
2009,
p.
2).
Nesta
perspecti-‐
va,
a
planta
arquitetônica
surge
como
descrição
central
do
comportamento
espacial
humano
dentro
da
arquitetura,
pois:
“A
planta
contém
o
movimento
dos
corpos
e
esse
movimento
ocorre
segundo
relações
topológicas”
(AGUIAR,
2009,
p.2-‐3).
Dessa
forma,
segundo
o
autor,
é
possível
ler
o
comportamento
sócio
espacial
das
pes-‐
soas
por
meio
da
planta,
de
maneira
sintética.
Tal
percepção
é
possível
de
ser
verificada
no
edifício
da
Estação
Ferroviária
a
partir
das
divisões
iniciais
destinadas
ao
seu
uso
e,
posteri-‐
ormente,
quando
transformado
em
Museu
Histórico,
pois
a
utilização
passou
a
ser
outra
e
as
subjetividades
implícitas
nesses
usos
precisaram
ser
captadas
pelos
arquitetos
de
cada
mo-‐
mento
distinto
e,
explicitadas
na
forma
e
na
distribuição
desses
espaços
de
circulação.
Pois,
com
afirma
Aguiar
(2009,
p.
4):
“Todo
e
qualquer
arranjo
espacial
produzido
pelo
homem
conterá
um
inerente
sistema
de
rotas
que
dará
suporte
à
imensa
variedade
de
progra-‐
mas/eventos
que
constituem
a
vida
humana”.
Em
nosso
trabalho
de
interpretação
das
linguagens
arquitetônicas
deste
edifício,
for-‐
mulamos
a
hipótese
de
que
o
edifício
que
sedia
atualmente
o
Museu
Histórico
de
Londrina
é
um
exemplar
da
Arquitetura
Eclética
ou
chamado
Ecletismo
Arquitetônico
(PAULA,
2010).
9
Segundo
Douglas
Vieira
de
Aguiar,
a
experiência
sócio
espacial
proporcionada
pela
arquitetura
é
o
que
lhe
confere
o
título
de
Arte
Social:
De
fato
no
fazer
arquitetônico,
quando
esse
é
exercitado
de
modo
positivo,
o
conceito/partido
adotado
é
capaz
de
agregar
à
experiência
espacial
algo
que
transcende
ao
uso
originalmente
programado.
É
justamente
sob
tais
condições
que
a
arquitetura
é
elevada
à
condição
de
arte
social
e
é
desde
essa
perspectiva
que
a
relação
entre
o
corpo
e
a
planta
deve
ser
enfrentada
(AGUIAR,
2009,
p.4-‐5).
10
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
45
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
O
verbete
eclético,
ecletismo
no
Dicionário
Oxford
de
Arte
se
refere
a
esta
nomenclatu-‐
ra
como
termo
aplicado
pela
crítica
de
arte
a
um
indivíduo
ou
estilo
que
relaciona
caracterís-‐
ticas
provenientes
de
diferentes
fontes.
Sendo
este
estilo
derivado
geralmente
da
ideia
(ex-‐
plícita
ou
não)
de
que
as
particularidades
de
vários
mestres
ou
estilos
podem
ser
seleciona-‐
das
e
combinadas
numa
só
obra
de
arte.
Neste
dicionário,
o
enfoque
conceitual
se
encontra
na
pintura,
mas
esta
designação
também
é
utilizada
na
arquitetura.
Nesta
vertente
artística,
o
Ecletismo
nomeia
uma
corrente
arquitetônica
(e
filosófica)
europeia
do
século
XIX,
na
qual
os
arquitetos
que
escolhiam
elementos
arquitetônicos
ditos
“históricos”
com
a
intencionali-‐
dade
de
criar
uma
nova
forma
de
arquitetura,
mas
de
uma
maneira
muito
peculiar
da
meto-‐
dologia
anterior,
a
historicista:
Em
arquitetura,
ecletismo
designa
a
atitude
dos
arquitetos
do
século
XIX
que
utili-‐
zaram
elementos
escolhidos
na
história
com
a
intenção
de
produzir
uma
nova
ar-‐
quitetura.
Eles
permitiram
todas
as
doutrinas
e
teorias,
pois
pretendiam
situar
a
arquitetura
no
seu
tempo:
a
opção
foi
de
não
romper
com
a
história.
Assim,
o
ecle-‐
tismo
dos
arquitetos
do
século
XIX
não
foi
uma
forma,
entre
outras,
de
historicis-‐
mo,
pois
enquanto
o
historicismo
buscou
reviver
o
passado
e
construiu
representa-‐
ções
da
história
inscrevendo
a
arquitetura
moderna
em
um
estilo
antigo,
o
ecletis-‐
mo
usou
elementos
e
sistemas
da
história
para
inventar
uma
arquitetura
adaptada
aos
novos
tempos
(PEDONE,
2002,
p.
8).
De
acordo
com
Jaqueline
Viel
Caberlon
Pedone
(2002),
isso
significou
uma
das
primei-‐
ras
etapas
do
“processo
de
modernização
da
arquitetura”
por
propor
uma
metodologia
de
construção
e
de
composição
totalmente
diferente11:
A
composição,
para
os
arquitetos
do
ecletismo,
se
referia
à
capacidade
de
concilia-‐
ção
e
de
invenção,
conseguindo
associar,
justapor
e
integrar
os
elementos
mais
he-‐
terogêneos
em
um
conjunto
capaz
de
funcionar
como
um
todo.
Os
condicionantes
contraditórios
dos
programas,
assim
como
os
próprios
desejos,
deveriam
ser
conci-‐
liados
na
elaboração
dos
projetos
de
arquitetura.
Em
busca
de
uma
síntese,
todas
as
exigências
deveriam
encontrar
uma
solução
harmoniosa
(PEDONE,
2002,
p.
163).
E
o
resultado
por
esta
busca
de
uma
síntese
harmoniosa
de
todas
as
exigências,
as
do
arquiteto,
as
do
proprietário
que
encomendava
a
obra
e
a
disponibilidade
de
técnicas
para
realizá-‐la,
foi
a
conciliação
entre
os
mais
diferentes
estilos
em
conjunto
com
a
inovação
da
técnica
construtiva:
O
ecletismo
então
propôs
a
conciliação
entre
os
estilos,
tornando-‐se
um
veículo
es-‐
tético
eficiente
para
a
assimilação
das
importantes
inovações
tecnológicas
do
perí-‐
odo.
Desse
modo,
em
projetos
realizados
com
as
novas
técnicas,
coexistiram
tipo-‐
11
Em
pintura,
esta
metodologia
já
era
utilizada
desde
o
Renascimento,
nos
quadros
de
Rafael
(CHILVERS,
1996.
p.
170).
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
46
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
logias
antigas
e
modernas,
de
tendências
oriundas
do
passado
e
outras
futuristas,
da
École
Polytechnique
e
da
École
des
Beaux-‐Arts,
de
engenheiros
e
de
arquitetos
(PEDONE,
2002,
p.
93).
O
Ecletismo
também
trouxe
inovações
no
urbanismo
das
cidades:
Como
de
costume,
a
historiografia
do
Ecletismo
concentrou
a
atenção
na
lingua-‐
gem
arquitetônica,
descuidando-‐se
das
referências
dessa
cultura
na
evolução
da
cidade,
nos
planos
diretores
e
no
projeto
urbano.
Ao
contrário,
o
historicismo
ar-‐
quitetônico
e
o
urbanismo
do
século
XIX
desenvolveram-‐se
na
mais
perfeita
simbi-‐
ose.
Tal
como
a
edificação,
também
a
cidade
teve
de
acertar
contas
com
quantida-‐
des
inéditas,
com
uma
nova
“escala”
dos
fenômenos
(as
ferrovias,
por
exemplo)
e
com
os
“grandes
números”
no
crescimento
dos
habitantes,
dos
veículos,
dos
servi-‐
ços.
Dois
foram
os
tratados
pelo
urbanismo:
a)
a
intervenção
na
cidade
preexisten-‐
te,
através
da
transformação
dos
antigos
muros
de
defesa
de
alamedas
arborizadas
para
passeio,
da
abertura
de
novas
artérias
de
cruzamento
(a
demolição
das
estru-‐
turas
medievais
e
do
Renascimento
por
exigência
do
trafego
e
da
higiene);
b)
a
de-‐
terminação
morfológica
da
expansão
urbana
e,
em
particular,
dos
novos
bairros
re-‐
sidenciais
burgueses,
dos
bairros
administrativos
e
comerciais
(FABRIS,
1987,
p.
23).
Tanto
que
o
termo
“Eclético”,
“Ecletismo”
toma
status
de
conceito
a
partir
deste
mo-‐
mento
do
século
XIX,
mas
não
com
a
conotação
de
certa
forma
negativa
com
o
qual
o
co-‐
nhecemos
hoje,
mas
com
uma
carga
simbólica
de
modernidade:
A
dialética
entre
arte
e
progresso,
ciência
e
história,
tradição
e
novidade
era
carac-‐
terística
de
modernidade,
uma
espécie
de
equilíbrio
entre
forças
antagonistas
em
uma
sociedade
que
rompeu
com
sua
história
ao
mesmo
tempo
em
que
nela
se
re-‐
fugiou.
[...]
Para
essa
situação
paradoxal,
que
buscava
a
conciliação
de
pontos
de
vista
divergentes
e
tinha
por
objetivo
resolver
suas
contradições,
o
conceito
de
ecletismo
forneceu
uma
resposta
(PEDONE,
2002,
p.
108).
E
a
plena
aceitação
da
estética
dos
mais
diversos
estilos
arquitetônicos
de
diferentes
momentos
da
História:
Afirmar,
de
fato,
que
a
história
da
arte
constitui
uma
“continuidade
de
renascimen-‐
tos,
produzidos
por
influências
internas
de
impulso
local
ou
externas
de
contágio
universal;
novações
sequentes
do
passado,
em
plena
transformação,
evoluindo,
ora
em
progresso,
ora
em
decadência”,
significa
esposar
a
ideia
de
história
inerente
ao
ecletismo.
Para
os
pensadores
ecléticos,
a
história
da
arte
apresenta-‐se
como
uma
sucessão
de
estilos
igualmente
válidos,
atitude
da
qual
não
escapa
nem
o
pró-‐
prio
Hegel
que,
após
ter
analisado
a
sequência
das
formas
a
partir
da
tríade
tese-‐
antítese-‐síntese,
considera
concluído
o
ciclo
na
experiência
estética
de
seu
tempo,
recomendando
o
ecletismo
a
seus
contemporâneos
(FABRIS,
1987,
p.
287).
O
Ecletismo
Arquitetônico
ficou
em
voga
na
Europa
até
o
início
da
primeira
metade
do
século
XX,
foi
um
estilo
quase
que
“globalizante”,
principalmente
por
ser
muito
exportado
para
as
colônias
europeias
durante
seu
auge
estilístico.
No
Brasil,
este
estilo
arquitetônico
é
trazido
durante
o
final
do
século
XIX,
permanecendo
em
voga
até
meados
da
primeira
meta-‐
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
47
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
de
do
século
XX.
Inicialmente,
dissemina-‐se
pelas
principais
capitais
a
exemplo,
Rio
de
Janei-‐
ro
e
São
Paulo
e,
consequentemente,
para
o
interior
do
país,
em
conjunto
com
as
ideologias
modernizadoras
do
início
do
século
passado,
pois
“[...]
em
todo
o
Brasil
o
Ecletismo
foi
sinô-‐
nimo
de
modernidade
e
de
modernização”
(FABRIS,
1987,
p.
7).
Em
todo
o
Brasil
e
talvez
principalmente
em
São
Paulo,
foi
duramente
criticado.
Ainda
de
acordo
com
Fabris
(1987),
personalidades
como
Monteiro
Lobato,
Alcântara
Machado
e
Mário
de
Andrade,
que
o
viam
até
mesmo
como
“hediondo”
e
“antiético”;
um
verdadeiro
entrave
para
a
afirmação
de
uma
cultura
arquitetônica
genuinamente
nacional.
Ramos
de
Azevedo
e
Ricardo
Severo,
na
mesma
época,
buscaram
estimular
uma
“renascença
naciona-‐
lista”,
com
o
revival
do
Estilo
Neocolonial,
a
mesma
bandeira
que
José
Mariano
Filho
em
ergueu
no
Rio
de
Janeiro.
Assim,
o
Ecletismo
Arquitetônico
foi
veementemente
destituído
de
seu
posto
pela
Arquitetura
Modernista
da
primeira
metade
do
século
XX.
A
refutação
da
importância
da
Arquitetura
Eclética
no
Brasil,
em
conformidade
com
Puppi
(1998),
foi
elevada
a
tal
dimensão
que,
mesmo
na
escassa
historiografia
da
Arquitetu-‐
ra
Brasileira,
este
estilo
arquitetônico
é
extensamente
criticado
e
contraposto
à
Arquitetura
Modernista,
desde
seus
primeiros
autores,
como
Lúcio
Costa,
até
meados
da
década
de
1980.
Já
por
volta
dos
anos
1990
até
o
presente,
a
historiografia
da
Arquitetura
no
geral
tem
se
voltado
lentamente
ao
Ecletismo
Arquitetônico
como
modo
de
repensar
seu
papel
na
arquitetura
mundial
e
também
na
brasileira.
A
razão
disto
é
a
extensa
perda
de
seus
exem-‐
plares
no
Brasil
e
na
Europa,
que,
por
serem
representantes
desta
linguagem
arquitetônica,
simplesmente
não
foram
preservados.
Por
conta
disso:
Reconstituir,
com
objetividade,
os
fatos
e
aprofundar
os
aspectos
problemáticos
do
Neoclassicismo
e
do
Ecletismo
foi
tarefa
dos
últimos
decênios;
primeiramente,
através
de
uma
reavaliação
crítica
geral
(quase
um
“reparo”
obrigatório),
depois
através
de
pesquisas
específicas
sobre
diferentes
regiões
e
países,
sobre
aspectos
determinados
e
arquitetos,
individualmente.
Dois
fatos
–
pelo
menos
na
Europa
–
estimularam
estes
estudos
e
interesses
renovados:
por
um
lado,
a
ampliação
do
problema
da
proteção
e
restauração
do
patrimônio
histórico-‐monumental
para
as
estruturas
urbanas
e
edifícios
do
século
XIX;
por
outro
a
crise
do
urbanismo
do
Mo-‐
vimento
Moderno
que
levou
a
uma
revisão
dos
princípios
desta
disciplina
e
a
uma
reflexão
crítica,
em
cujo
alicerce
se
encontram,
exatamente,
a
cultura
e
a
cidade
do
século
passado
(FABRIS,
1987,
p.
10).
Em
Londrina,
esse
estilo
irá
marcar
a
forma
de
algumas
construções,
geralmente
resi-‐
dências
da
elite
local,
sobretudo
em
meados
da
década
de
1940
e
1950,
que
se
constituíam
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
48
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
em
verdadeiros
palacetes
inspirados
nas
mansões
da
Avenida
Paulista,
em
São
Paulo.
Mas,
talvez
o
principal
representante
deste
estilo
arquitetônico
na
cidade
seja
o
prédio
que
abriga
hoje
o
Museu
Histórico
de
Londrina.
Em
meio
a
este
discurso
eclético
do
edifício
da
antiga
Estação
Ferroviária,
estão
soma-‐
das
as
mais
diferentes
linguagens
plásticas.
O
edifício
apresenta
elementos
provenientes
da
Arquitetura
Medieval,
nas
suas
vertentes
Gótica,
Românica
e
Normanda,
Germânica,
Mo-‐
dernista,
Arquitetura
de
ou
do
Ferro,
Clássica
Greco-‐Romana
e
entre
alguns
destes
elemen-‐
tos,
outros
poucos
que
ainda
resta
identificar
(SILVA,
2012).
A
reavaliação
da
arquitetura
eclética
nos
últimos
decênios
como
aponta
Fabris,
acon-‐
teceu
dentro
dos
espaços
acadêmicos.
A
presente
análise
insere-‐se
nesta
tendência,
procu-‐
rando
rever
a
condição
de
uma
arquitetura
considerada
menor,
ainda
rechaçada
em
muitas
regiões
do
país.
Todavia,
conforme
procuramos
demonstrar,
edifícios
como
o
Museu
Históri-‐
co
de
Londrina
Padre
Carlos
Weiss,
compõem
a
cidade,
tanto
como
elemento
urbano,
quan-‐
to
como
objeto
de
arte,
constituidor
da
condição
urbana
de
uma
metrópole.
Revista
Discente
do
Programa
de
Pós-‐Graduação
em
História
Social
Cultura
(PUC-‐Rio)
49
ANIMA
Ano
III
–
nº4
–
2013
história,
teoria
&
cultura
Referências
Bibliográficas
AGUIAR,
Douglas
V.
Planta
e
Corpo.
Elementos
PUPPI,
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Por
uma
História
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A
Trajetória
do
ADUM,
Sônia
Maria
Sperandio
Lopes.
Imagens
Edifício
1946-‐1986.
Trabalho
de
Conclusão
de
do
Progresso:
Civilização
e
Barbárie
em
Lon-‐ Curso
(Graduação
em
História)
–
Universidade
drina
–
1930/1960.
Dissertação
(Mestrado
em
Estadual
de
Londrina,
Londrina,
2012.
História
Social)
–
Faculdade
de
Ciências
e
Le-‐
tras,
Universidade
Estadual
Paulista,
Assis,
ZEVI,
Bruno.
Saber
Ver
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2°
edição:
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Paulo,
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PAULA,
Zueleide
Casagrande
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Os
Marcos
Urbanos
em
História
e
Memória:
o
Museu
Histórico
de
Londrina
“Pe.
Carlos
Weiss”
em
breve
nota.
Boletim
Museu
Histórico
de
Lon-‐
drina.
Londrina,
v1,
n°2,
2010.
PEDONE,
Jaqueline
Viel
Caberlon.
O
Espírito
Eclético.
Porto
Alegre,
2002.
250
p.
Disserta-‐
ção
(Mestrado
em
Arquitetura)
–
Programa
de
Pesquisa
e
Pós-‐Graduação
em
Arquitetura,
Universidade
Federal
do
Rio
Grande
do
Sul.
Revista Discente do Programa de Pós-‐Graduação em História Social Cultura (PUC-‐Rio) 50