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No capítulo 3 apresentamos mais detalhes sobre as nomenclaturas existentes para a disciplina.
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Tal diversidade é um tanto lógica, mas, em nossa opinião, estritamente
necessária de ser frisada, pois é possível constatar que boa parte desses
ingressantes não estudaram Percepção Musical anteriormente, ou melhor, não
tiveram experiências com esse modelo de estudo; o que faz surgir uma dificuldade
prática para o docente: mediar as orientações das ementas às condições de
conhecimento da classe, caminhando, entre o aperfeiçoar e o desenvolver bases,
respectivamente.
Uma possibilidade para essa ausência de estudo, talvez seja dos alunos
serem adeptos de um aprendizado teórico tradicional (sem muita relação com a
audição ou apreciação), ou mesmo do estudo autodidata que, muitas vezes, os
tornam até bons instrumentistas. Em nossa opinião, o que se faz imprescindível
para um curso ser realmente positivo nesses casos, é a metodologia utilizada pelo
professor que, no nosso entender, deve proporcionar a troca de experiências e
clareza no lidar com essa heterogeneidade.
Gerling (1995, p.23), então professora de Percepção da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, diz que muitos estudantes estão
despreparados, pois entram no 3º grau com ‘falhas e lacunas’ no seu aprendizado,
cujo cerne, para ela, está no ensino antecessor: “os alunos que entram no Curso
de Graduação em Música via de regra não têm uma leitura musical fluente e isto é
um forte indício de uma educação musical deficitária em vários aspectos
perceptivos e conceituais”.
Sem dúvida, esse tópico é muito pertinente, pois se a base não está
bem fundada não há como trabalhar sobre ela e obter um bom desempenho. Mas,
e quando não se tem base instituída? Sabemos da crescente conscientização
sobre a educação musical, das iniciativas particulares e do movimento para a volta
da música nas escolas, mas resultados visíveis e efetivos só poderão mesmo ser
discutidos após uma transformação real dessa falta de tradição em música.
Num outro olhar sobre as dificuldades trazidas pelos alunos, tendo como
norte nossa experiência como professora, verificamos que as mais extremas estão
no campo da melodia, principalmente com os famosos ditados (a uma ou mais
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vozes). Em contrapartida, o aspecto rítmico é o mais equilibrado e de mais fácil
desenvolvimento, também se comparado ao campo da harmonia. Dessa forma,
estudantes, em sua maioria, sabem traduzir a escrita musical para seu
instrumento, mas bem pouco praticam o processo inverso, da sonoridade para a
escrita – muitas vezes, salvo aqueles que vêm da música popular e conquistam
agilidade e reflexo entre ouvir, ler e escrever.
Poderíamos detectar várias alternativas ou hipóteses para o porquê
dessas dificuldades – aprendizado voltado estritamente ao instrumento, falta de
conexão entre teoria e prática, metodologias inadequadas, etc. – porém, é
essencial nos conscientizarmos do modelo de educação musical que recebemos
e, naturalmente, passamos adiante.
Quando a Percepção Musical propõe trabalhar aspectos suporte da
música, proporciona o fixar das bases, estando diretamente relacionada com o
educar (concordamos neste ponto com GERLING, 1995 e BERNARDES, 2000).
E, a partir do momento em que recebemos uma educação tradicional (que tem
como direção a boa leitura, a perfeita técnica e o virtuosismo), é também natural
que concebamos assim o modelo ideal de percepção. Assim, pairam no ar:
‘Poucos são os bons alunos!’, ‘Muitas são as dificuldades’, ‘Ouvido absoluto é
essencial’, etc. Idéias que costumamos pensar sobre a disciplina, e que traduzem
apenas uma postura, e não uma única e correta4 interpretação existente.
Acreditamos que há outras maneiras de se pensar e agir na disciplina (aliás, é
nosso dever questioná-las e buscá-las), e ainda muito se pode contribuir na área.
Outro tópico comum encontrado é a utilização do piano como principal
recurso em sala de aula. Convencionou-se, talvez por tradição, por amplas
possibilidades (instrumento rico para melodia, harmonia e mesmo ritmo) ou
simples comodidade, que a referência sonora padrão se daria através do som
desse instrumento, deixando de lado outros timbres também interessantes. É
evidente que exemplos de acordes, de mudanças de alturas e registros,
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Conceito relativo.
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acompanhamentos ao piano são facilmente abordados, mas o que nos chama
atenção é a aparente e quase restrição a demais fontes, que podem ser
trabalhadas também como conteúdo, não somente como ferramenta.
Certamente outros assuntos e problemáticas estão envolvidos no
ambiente de ensino da Percepção Musical, entretanto, nosso propósito agora é
centrarmo-nos nos aspectos que determinam sua enfática presença no estudo da
música.
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Dada a importância da audição, colher idéias sobre a relevância do
estudo da Percepção Musical, seja entre docentes, estudantes ou músicos
amadores, é tarefa relativamente fácil. Discursam questões referentes ao já
mencionado ouvir e escutar, mas também à formação básica e/ou profissional, à
execução prática, e à competência nas demais modalidades do campo musical,
como por exemplo, na composição e na regência.
Segundo Salgado e Varela (2006, p.3):
Uma das tarefas fundamentais de todo músico é escutar. Esta é uma habilidade
que convém desenvolver desde as etapas mais iniciais da formação
profissional, seja na que trata de um regente, de um compositor, um intérprete,
um etnomusicólogo ou um crítico musical, e num amplo sentido, todo público
informado deveria fazê-lo. Não é possível considerar-se competente em
qualquer destas áreas a menos que se tenha aperfeiçoado, na medida das
capacidades de cada um, a audição discriminada e crítica do produto da
atividade musical, qualquer que ele seja [tradução e grifos nossos].
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Frisamos aqui que as escolas de música as quais os autores se referem são aquelas vinculadas ao ensino
superior, já que o trabalho deles é pautado em sua experiência nesse nível e seus demais artigos e estudos
acompanham esse público.
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Sob outro enfoque, porém, continuando nessa perspectiva de
‘disciplina’, afirma Luz (apud BIAGIONI; LESSA, 2005, p.3):
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estudo, pois afirmam que o processo de musicalização do indivíduo está
subordinado aos aspectos perceptivos, necessários à significação musical.
Fonterrada (2005) comenta que no trabalho do belga Edgar Willems –
um dos mais expoentes educadores musicais do séc. XX – há forte presença do
fator auditivo em sua concepção de ensino. Segundo a autora, Willems acreditava
que ainda não se compreendia a natureza profunda da musicalidade, além de que
toda criança poderia ser preparada auditivamente. Conforme nossa argumentação
no item anterior.
Mais que educar e interagir música e a natureza humana, Willems
aspirava dar status científico ao seu trabalho, portanto, foi muito cuidadoso em
seus dois volume do L’oreille Musicale no qual estudou a audição sob três
aspectos: sensorial, afetivo e mental, no qual denomina sensorialidade auditiva,
sensibilidade afetiva auditiva e inteligência auditiva. O primeiro deles, ainda de
acordo com Fonterrada (2005), incentiva a escuta como entidade física,
apresentando exercícios para a distinção dos parâmetros do som (altura, duração,
intensidade, timbre); o segundo, se manifesta quando passamos do ato objetivo,
sensorial, de ‘ouir’ para o subjetivo écouter 6, que, grosso modo, seria uma escuta
sensível, afetiva, a qual oferece abertura para expressão emotiva. Exemplo disso
é sua forma de ensino para intervalos melódicos, cujo emprego de adjetivos como
paz, nervosismo e felicidade servem para explicitar o uníssono, a 2ª menor e o
intervalo de 3ª maior, respectivamente. Enfim, o terceiro e último aspecto,
comporta: comparação, julgamento, associação, análise, síntese, memória,
imaginação criativa e escuta interior, que, no nosso entender, voltam-se a
questões cognitivas e ao desenvolvimento da Percepção.
Porém, o que Fonterrada (2005) adverte, com razão, é que tais
instâncias da audição muitas vezes não são interpretadas corretamente, pois se
omite que Willems conceba esses fenômenos simultaneamente, e não de forma
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Fonterrada (2005, p.128-129) evidencia que os termos ‘ouir, écouter e entendre’, originais em francês, não
têm a mesma conotação em português, perdendo sua força quando traduzidos para ‘ouvir, escutar e
entender’.
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isolada. A autora explicita que esse caminho artificial é escolhido unicamente com
objetivo didático, para que cada uma das características mais importantes
pudesse ser analisada.
Outros educadores importantes como Kodály, Orff, dos contemporâneos
Schafer, Gainza, Swanwick, e ainda os princípios educacionais de Villa-Lobos7 –
pelo movimento do Canto Orfeônico8 no Brasil da década de 40 – dão ênfase para
o aspecto auditivo, como uma das bases de suas metodologias. Isso pode ser
visto pelas ferramentas com as quais difundiram suas idéias, seja pelo canto,
apreciação, composição, improvisação, entre outros (cuja conexão faz-se muito
estreita com a audição), mas também pelos programas de ensino e conteúdos a
serem trabalhados. Um fator de grande intensidade nessas propostas é a alta
valorização humana, com focos na cidadania, na sensibilização e afetividade – o
que indubitavelmente é muito louvável, mas que merecem todo cuidado, já que,
em excesso, podem adentrar fronteiras de outras áreas trazendo confusões
desnecessárias.
Assim, traçando um paralelo entre a educação musical básica e a
universitária, Bernardes (2000) considera que o processo de musicalização influi
diretamente na qualidade e seqüência do aprendizado posterior, mais
especificamente da Percepção Musical. Segundo ela, é essa disciplina que tem o
papel de continuidade e aprofundamento dos conteúdos vivenciados na primeira
fase do aprendizado musical, porém, questiona a roupagem formal que recebe ao
caracterizar-se no nível superior, perdendo criatividade e interatividade, muito
presentes na iniciação.
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Ver mais em GOLDEMBERG, Ricardo. Educação Musical: experiência do canto orfeônico no Brasil.
Disponível em: <http://www.samba-choro.com.br/debates/1033405862>. Acesso em fevereiro de 2007.
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Na introdução de Solfejos – originais e sobre temas de cantigas populares para ensino de canto orfeônico.
1º vol., é dito que no Curso Especializado de Música e Canto Orfeônico destinado à formação de professores,
“[...] a disciplina de ‘Solfejo e Ditado’ era a que mais se praticava no currículo do S.E.M.A pela absoluta
necessidade de apuração dos fenômenos de percepção do ritmo, altura do som e memória auditiva, fatores
indispensáveis a um professor de Canto Orfeônico”. Isso confirma a importância do estudo da Percepção
(auditiva e rítmica através da leitura e da escrita) no processo de ensino-aprendizagem musical do nosso país.
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Primeiramente é imprescindível considerar que os universos são
bastante diferentes e requerem posturas adequadas para cada faixa etária. O
caráter formal existe, mas talvez não seja determinante ou mesmo prejudicial.
Pensando no aspecto da perda de ‘criatividade e interatividade’ acreditamos que
há sim certa dificuldade em trazê-las com coerência para a educação profissional.
No entanto, sabemos que esse terreno é muito vasto, e desenvolvê-lo agora seria
falta de zelo já que o abordaríamos de forma rápida.
Então, o que realmente interessa observar é a presença de elementos
fundadores ou alicerces da Percepção Musical na etapa inicial, co-relacionando
seu desenvolvimento. Atividades de reconhecimento de timbres com brincadeiras
sonoras para crianças, criação de pequenas trilhas de histórias, além de outras
experiências, podem ajudar muito na acuidade auditiva para um futuro estudo
aprofundado. A grande problemática, como já dito, é que muitas vezes os alunos
não foram sequer musicalizados e essa base acaba por acontecer no próprio
curso de graduação, acarretando sérias conseqüências no seu desempenho e
andamento no programa acadêmico.
Essas e outras discussões colaboram na argumentação e possível
remodelação do perfil da disciplina, que tem como finalidade desenvolver o
sentido auditivo de maneira satisfatória para o cotidiano profissional do músico.
Notando que como bases das condutas na disciplina estão as correntes de
pensamentos que as concebem, acompanhamos a seguir os pontos mais
evidentes em Percepção.
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É importante frisar que essas duas maneiras de denominação foram retiradas dos próprios comentários de
professores da área, no qual, de um lado, o termo ‘treinamento’ é sempre evidenciado, e de outro, o uso
reiterado gira em torno de ‘compreensão’.
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Conceito relativo. Já nos detivemos ao uso desse adjetivo no início do presente texto.
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