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INTRODUÇÃO
Exprimir-se-á, nesta produção acadêmica, acerca das teorias das nulidades dos
atos processuais, dos tipos de vício dos atos processuais, bem como a possível
admissibilidade das provas ilícitas no processo e a convalidação destas. O paradigma da
inadmissibilidade das provas ilícitas é determinado por dispositivo constitucional e
ratificado pela cláusula do Devido Processo Legal - Due Process of Law -, na medida
em que o réu tem por direito impostergável o fato de não ser denunciado ou julgado
com base em elementos instrutórios obtidos em discordância com os limites legais.
Neste sentido, aponta José Frederico Marques citado por Roque Jerônimo de
Andrade na revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (1998):
Locke procura justifica diversa para a criação de um Estado. Para este filósofo, o
Estado não seria absoluto, como na tese de Hobbes, mas sim um Estado-juiz criado para
evitar que fossem usurpados do homem os direitos naturais à propriedade, liberdade e
vida. Portanto, far-se-ia um contrato devido à possível mácula destes direitos, logo, pela
impossibilidade de seguir vivendo em estado natural.
[...] aquela disposição moral que torna os homens aptos a fazer coisas
justas, que os faz agir justamente e desejar aquilo que é justo; e da
mesma forma, por injustiça, aquela disposição que faz os homens
agirem de modo injusto. Tomemos esta definição inicial como sendo
correta e geral [...]
Cada pessoa nasce já inserida em contexto social que a preparará para agir
conforme o contrato social que se organiza naquele contexto. A função social do
conjunto de normas e instituições que conformam o Direito na versão utópica “proteção
e defesa da pessoa”, é senão mais bem o evitar que a pessoa saia dos limites impostos
pelo projeto de Estado – Nação. Independentemente de sua concepção original, o
Direito funciona como uma ferramenta de inclusão e controle do Estado sobre os
cidadãos.
Este tipo de penalidade, entretanto, não possuía qualquer tipo de controle dentro
da própria comunidade, fato que ocasionava grandes prejuízos, até mesmo o
enfraquecimento do grupo, diante de tantas perdas. Tendo em vista tantas mortes,
mutilações e banimentos, a vingança privada passou a ser regulamentada por um poder
central que foi retirando do particular o poder de fazer justiça com as próprias mãos, até
que o Estado detivesse completamente o poder de punir.
Com a formação de uma estrutura estatal cada vez mais complexa, surgiu então,
classe profissional responsável por dirimir os conflitos. Na antiga Roma cabia à alta
classe e à classe média a proteção do Direito, atividade atualmente vinculada ao poder
judiciário. Assim nasce a jurisdição. A palavra jurisdição, do Latim, dicere ius, refere-se
à “atividade mediante a qual os juízes estatais examinam as pretensões e resolvem os
conflitos” fato que, para Pontes de Miranda determina a exigência de um pressuposto
conceitual de julgamento, ou seja, deve ser dito qual regra jurídica determinou a decisão
para dado conflito. No processo judicial, o magistrado age em substituição às partes que
não podem, por assim dizer, “fazer justiça com as próprias mãos” sob pena de
condenação pelo dito crime de “exercício arbitrário das próprias razões”, portanto,
caracteriza-se como heterocomposição de conflitos, isto é, a solução é determinada por
um terceiro alheio ao conflito.
A ingerência estatal nos atos da vida privada não se dá somente para a elisão de
conflitos, mas para a execução de atos de finalidade constitutiva, isto é, atos que buscam
a formação de situações jurídicas novas. A tais atos, cognomina-se jurisdição
voluntária. A inexistência da lide não afasta a possibilidade de existência de
controvérsia entre os interessados, daí então a necessidade de intervenção do poder
judiciário. Para alguns, devido a tal particularidade a jurisdição contenciosa não se
presta a atividades jurisdicionais, visto que não é substitutiva, muito menos declaratória,
pois o juiz se insere entre os participantes do negócio jurídico.
Aquele que não investido nos poderes jurisdicionais tentar desfrutar do direito de julgar
incorrerá no delito de “usurpação da função pública” previsto no Código Penal
Brasileiro. Os juízes, já aposentados também, não detêm do poder de decidir, conforme
disposto no art. 132 do Código de Processo Civil - CPC:
Art. 132. O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará
a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer
motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao
seu sucessor.
A correlação deve marcar o procedimento judicial. A decisão deve ser resultado direto e
imediato do pedido feito na petição inicial. Também chamado de princípio da
relatividade ou congruência da condenação, está presente na seara do Direito Processual
Penal para garantir a defesa do acusado, uma vez que o jurisdicionado só poderá ser
condenado pelos fatos que lhe forem imputados, e mesmo assim, deverá ter ciência dos
fatos para que possa proceder a defesa. É, portanto, princípio corolário dos princípios de
contraditório e da ampla defesa determinados constitucionalmente - art. 5º, LV -. Em
Mirabete: “[...] A acusação determina a amplitude e conteúdo da prestação jurisdicional,
pelo que o juiz criminal não pode decidir além e fora do pedido em que o órgão da
acusação deduz a pretensão punitiva. Os fatos descritos na denúncia ou queixa
delimitam o campo de atuação do poder jurisdicional”.
O da definitividade é princípio corolário da segurança jurídica, assegurada pelo
rol de direitos e garantias da Constituição da República Federativa do Brasil. Garante
que os direitos adquiridos não sejam violados e que a decisão judicial seja linear. A
decisão tem força de coisa julgada, ou seja, é imutável. Este princípio somente se presta
às decisões jurisdicionais, já que no Brasil vigora o sistema administrativo de jurisdição
única. Celso Antônio Bandeira de Melo ainda busca, efetivar analogia entre as decisões
administrativas e as decisões judiciais criando a chamada “coisa julgada administrativa”
ocorrente quando se esgotam as possibilidades de recurso ao processo administrativo
em comento. Determina a Constituição Federal:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]
Após a busca pelo poder judiciário para que os conflitos sociais fossem
dirimidos segue-se o nascimento de uma série de atos coordenados que culminam em
decisão que fulmina a tarefa da jurisdição. A esta série de atos dá-se o nome do
processo. Caracterizado pela autonomia, o processo, nas palavras de Calamandrei, tem
como objeto a relação jurídica material. Entretanto, nos dias atuais, não se discute que o
objeto processual é o pedido formulado pela parte em face da relação material
controvertida, ou seja, “a vontade concreta da lei, cuja afirmação e atuação se reclama.”
A forma dos atos processuais poderá ser solene ou não-solene. De forma solene
são aqueles aos quais a lei prevê determinada forma como condição de validade, ao
passo que os não-solenes têm forma livre, ou seja, podem ser praticados por quaisquer
dos meios de convencimento admitidos em direito. A forma está intimamente ligada à
segurança jurídica e à instrumentalidade processual, de modo que somente quando não
se atinge o fim visado pelo ato processual é que se deve reconhecer-lhe a invalidade.
A publicidade pode ser vista sob diversas óticas, a começar pela manutenção da
moralidade e, conseqüentemente a garantia da segurança jurídica. Assegura, ainda, a
possibilidade de contraditório e da ampla defesa, uma vez que garante ao réu conhecer
os atos e termos do processo bem como traslados e certidões a respeito deles. As
audiências devem ser realizadas a portas abertas e com acesso franqueado ao público.
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova
produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua
decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na
investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e
antecipadas.
As provas poderão, ainda, ser obtidas por meio documental que poderá ser
público ou particular, uma vez que tem apenas função probatória. Os documentos
poderão ser escrituras públicas, certidões, traslados ou mesmo telegramas, reproduções
fotográficas e livros. Os documentos probatórios, assim como o processo de modo
geral, devem estar em língua vernácula. Do contrário, deverá ser traduzido por
profissional juramentado.
É meio de prova, também, apesar de menos segura que a prova documental, por
ser carregado de subjetividade, o depoimento de testemunhas que podem ser
instrumentárias ou judiciárias. As testemunhas instrumentárias assinam o instrumento,
ao passo que as testemunhas judiciárias prestam depoimento em juízo. A prova oriunda
da presunção é extraída a partir de fato conhecido para alcançar fato desconhecido.
Podem ser ditas legais (juris) ou comuns (hominis), sendo as primeiras oriundas da lei, e
as segundas se baseiam no que ordinariamente acontece. Estas últimas são inaplicáveis
em casos em que não se admitem as provas testemunhais.
Há as provas periciais, que poderão ser feitas através de exame e vistoria. Exame
é a apreciação de alguma prova por peritos para auxiliar o juiz a formar a sua convicção.
Já a vistoria também é uma forma de perícia restrita, porém, à inspeção ocular. Destina-
se a perpetuar a memória de certos fatos transitórios, antes desaparecidos.
O princípio, citado supra, “livre convencimento” não tem por significado, entretanto,
que o magistrado deve sentenciar as causas secundum suam conscientiam - segundo a
própria consciência, mas determina que ele deve decidir secundum allegata et probata
partium - segundo alega e prova e parte. Sendo vedada aos magistrados a prática do non
liquet, o juiz deve insistir em resolvê-la seja adiando o problema, através de decisão
provisória; ou utilizando de meio mecânico de prova, necessariamente decisório como
duelo ou o juramento; e, ainda, empregando as regras de distribuição do ônus da prova.
Para o Código de Processo Penal o “onus probandi” caberá àquele que proceder
a alegação, entretanto, o juiz poderá mesmo de ofício - e neste ponto vê-se mitigação ao
princípio da inércia da jurisdição - determinar diligência para dirimir dúvida sobre ponto
relevante. Ora, se a pretensão punitiva do Estado - “jus puniendi” - tem fulcro em fato
delituoso atribuído a determinada pessoa, cabe a este a prova da existência do fato.
Sobre tal dispositivo legal escreve Frederico Marques:
Segundo estatui o texto legal por último citado, o réu será absolvido
quando não houver prova da existência do fato (artigo 386, n° II), ou
quando não existir prova de ter concorrido para a infração penal
(artigo 386, n° IV). Deduz-se de ambos os preceitos que à parte
acusadora incumbe fornecer os necessários meios de prova para a
demonstração da existência do corpus delicti e da autoria. Daí se
segue que todos os elementos constitutivos do tipo devem ter sua
existência provada, ficando o onus probandi, no caso, para a acusação.
Cabe a esta demonstrar, não só a chamada materialidade do crime (o
que é função do auto de corpo de delito), como ainda os elementos
subjetivos e normativos do tipo.
Ao réu não se veda a contraprova, a este, inclusive incumbe à prova de existência de
fato impeditivo, modificativo ou extintivo da pretensão punitiva do Estado, ou seja,
pode o réu alegar excludentes de ilicitude.
No que toca ao Direito Processual Penal há, ainda, o pressuposto de justa causa,
isto é, o recebimento da petição inicial presume, no mínimo, a existência de provas
indiciárias que demonstrem a inviabilidade. Tal exigência se dá, uma vez que o
processo penal envolve a possibilidade de limitação de direito fundamental do réu: a
liberdade. Segundo o magistério de Tourinho Filho: “não basta simples ‘denúncia’, ou
simples ‘queixa’, narrando o fato criminoso e dizendo quem foi o seu autor. É preciso
haja elementos de convicção, suporte probatório à acusação, a fim de que o pedido
cristalizado na peça acusatória possa ser digno de apreciação”. Ausente tal requisito,
que vinculem o imputado fato típico a denúncia ou queixa-crime será rejeitada, na
forma do art. 395 II do Código de Processo Penal: “Art. 395. A denúncia ou queixa
será rejeitada quando: [...] II - faltar pressuposto processual ou condição para o
exercício da ação penal.”
Passíveis de ser anulados são atos não-decisórios, como praticados com violação
da competência absoluta, os casos de nulidade expressa como aqueles em que é violada
a determinação da própria lei - como a falta de intervenção do Ministério Público,
conforme o art. 113, § 2º do CPC -. É dito ato nulo de pleno direito, segundo Humberto
Theodoro Júnior:
Quanto à nulidade os atos são classificados tais quais atos relativamente nulos e
absolutamente nulos. Não podem ser comparados aos atos inexistentes, uma vez que
estes últimos são mero fato e não dispõem da categoria de ato processual. Os atos
absolutamente nulos têm sua condição jurídica gravemente afetada por defeito
localizado em seus requisitos essenciais. Por comprometer a execução normal da função
jurisdicional, consiste em vício insanável e deve ser invalidado pelo juiz
independentemente de provocação da parte interessada. Até o momento da invalidação,
o ato tem eficácia. Caso a oportunidade para a prática eficaz do ato nulamente realizado,
deverá o juiz ordenar sua repetição - conforme art. 249, caput - do contrário, a parte
sofrerá as conseqüências da perda do direito de ação - a preclusão.
Relativamente nulos são os atos que, embora viciados em sua formação, são
capazes de produzir efeitos processuais e permanecer exercendo-os, a menos que a parte
requeira a invalidação. Estes tipos de atos, portanto, são ratificáveis expressa ou
tacitamente. O silêncio das partes é suficiente para convalidá-lo. O traço fulminante
para a distinção entre as nulidades absoluta e relativa é a possibilidade de o primeiro ser
decretado pelo juiz, sem que as partes assim requeiram, uma vez que simbolizam
violação às regras disciplinadoras dos pressupostos processuais e condições da ação. As
nulidades relativas, por seu turno, inspiram-se no direito privado e, por conseguinte,
depende da provocação da parte prejudicada.
É hipótese de nulidade, também, a sentença extra petita - mesmo que a lei assim não
expressamente declare - uma vez que a nenhum juiz é permitido prestar a tutela
jurisdicional fora do pedido da parte - conforme arts. 2º, 128 e 460 -. Neste sentido
decide a 4ª turma do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT - sob
relatoria do desembargador Ângelo Passareli:
Anulado o ato, uma vez que este não possui vida isolada, mas apenas dentro do
encadeamento de atos que compõem o procedimento, reputam-se sem efeito os atos
subseqüentes, na forma do art. 248 do CPC. Caso se trate de atos complexos, composto
por um feixe de atos simples pode ocorrer nulidade apenas na parte referente à
complexidade, portanto, a nulidade não ensejará a ineficácia dos atos restantes - art.
248, 2ª parte do CPC. Neste sentido, cita-se o cerceamento de defesa que, apesar de
provocar a anulação do julgamento, não invalida as provas coletadas na mesma
audiência - conforme art. 250 do CPC: “Art. 250. O erro de forma do processo acarreta
unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se
os que forem necessários, a fim de se observarem, quanto possível, as prescrições
legais.”
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova
produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua
decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na
investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e
antecipadas.
As provas inadmissíveis nos processos podem ser tratadas tais quais provas
ilegítimas ou, propriamente, ilícitas. As primeiras diferenciam-se no enfoque de ofensa
ao direito, verificada após a inserção das provas no processo tratando-se, pois, de
infringência a normas processuais, a exemplo dos interrogatórios em que não se adverte
o interessado do direito de permanecer em silêncio, sem que isto lhe acarrete
conseqüências prejudiciais. As segundas se caracterizam pela mácula ao direito
material, de modo que a irregularidade encontra-se no momento da colheita da prova.
São ditas provas ilícitas em sentido estrito, aquelas que violam o domicílio, as
comunicações, as obtidas mediante tortura ou maus-tratos, bem como as acolhidas com
infringência à intimidade e através da prática de outros ilícitos penais.
Neste sentido decidiu o Tribunal de Justiça, em idos dos anos 90, em processo
criminal de lesão corporal, no qual se admitiu como prova lícita uma fita que continha
gravação entre autor e réu do processo, feita pelo acusado, partindo da premissa de que
o direito à intimidade não tem caráter absoluto, devendo ceder em caso de conflito com
direitos fundamentais como a ampla defesa. Por meio do julgamento do Habeas Corpus
74.678-1/SP, de relatoria do ministro Moreira Alves, o Supremo Tribunal Federal - STF
- ratifica tal posicionamento:
"Habeas corpus". Utilização de gravação de conversa telefônica feita
por terceiro com a autorização de um dos interlocutores sem o
conhecimento do outro quando há, para essa utilização, excludente da
antijuridicidade
[...]
Criada e aplicada pela Corte norte-americana desde 1920, foi construída no caso
Silverhome Lumber VS. United States e, posteriormente, desenvolvida no caso
Nardone VS. United States em 1939, esta tese infere que é ilícita a prova derivada de
outra da mesma natureza. No mesmo sentido entende, ainda que de modo mais restrito,
a corte alemã e sempre entendeu, mesmo antes de 1988, o Supremo Tribunal Federal -
STF. A partir da absorção desta tese pelo direito processual pátrio o STF entendeu que a
escuta telefônica, por não ter à época lei regulamentadora, não poderia ser utilizada
como provas lícitas. Deste modo, as escutas, bem como as provas obtidas a partir dela
seriam impugnadas de ilicitude. Assim demonstra o julgamento do HC 75007-9/SP de
relatoria do min. Marco Aurélio
A tese dos frutos da árvore envenenada exerce clara influência sobre o art. 157,
§ 1º do Código de Processo Penal que propugna inválidas as provas derivadas das
provas ilícitas devendo estas serem desentranhadas imediatamente do processo. A
conseqüência imediata da inserção de uma prova ilícita no processo seria a sua
inexistência jurídica deste ou mesmo a nulidade absoluta, com fulcro no fato de que
todo ato processual que não detiver características de ato processual não poderá
produzir efeitos como tal sendo ineficaz desde a origem. Deste modo, a prova ilícita não
produziria nenhum efeito no processo.
[...]
Esta mitigação é clara no art. 157, § 1º, reformado pela lei 11.690/08 que conceituou a
citada expressão “fonte independente”. In verbis:
A ação penal nº. 307 - DF, que trata do impeachment de Collor traz a decisão,
segundo a qual, as escutas telefônicas realizadas por um dos interlocutores sem o
conhecimento do outro são inadmissíveis. Atreladas à tese supracitada, na época em que
se deu a deposição do presidente Collor, o ordenamento jurídico não dispunha da lei
9.296/96 que regulamenta as interceptações telefônicas, portanto, tratava-se de matéria
ilegal por incontinência de letra de lei. Segundo o doutrinador Luiz Flávio Gomes
(GOMES, 1997, p. 124): “a restrição de qualquer direito, particularmente um de
natureza fundamental, exige a intervenção do legislador, para se saber quais são os
limites dessa intervenção. A lei é o limite e dá segurança” (grifo nosso).
Tais provas não teriam o poder de incriminar, no entanto, seriam válidas para tutelar a
inocência do acusado:
A gravação clandestina, como se vê, não pode valer como prova, não
porque o comunicador não possa gravar sua comunicação, senão
porque não existe lei disciplinando como deve dar-se a gravação,
quando é cabível, quais crimes, quais pressupostos etc. É uma prova
colhida sem limites legais, sem base jurídica. Por isso mesmo,
jamais pode servir para incriminar.
No mesmo sentido leciona Ada Pellegrini Grinover:
Caso a prova ilícita esteja presente em processo cuja competência para julgar
esteja nas mãos do Tribunal do Júri, a decisão será irremediavelmente anulada, visto
que o veredicto dos jurados prescinde de motivação e, portanto, não há a possibilidade
de exercer a ponderação da influência da prova ilícita sobre a decisão. No magistério de
Grinover (2001, p. 144): “quando se fizer referência da prova ilícita em plenário, o juiz
deverá dissolver o Conselho de Sentença”. Por outro lado, se as provas ingressarem no
processo, mas não tenham servido de fundamento para a sentença de pronúncia, não
haverá a nulidade da sentença da pronúncia.
Como ressaltado outrora: a lei é o limite e a segurança. O réu tem por direito
garantido pelo princípio do “due process of Law” o fato de não ser condenado com base
em instrumentos obtidos com desrespeito aos limites impostos pelo ordenamento
jurídico. A nulidade de sentença condenatória assentada em prova ilícita é prova da
tutela estatal em relação aos direitos e garantias fundamentais. Neste sentido, admitiu o
Supremo Tribunal Federal - STF - a “teoria dos frutos da árvore envenenada”, e a
inadmissibilidade das provas ilícitas por derivação.
RECURSO PREJUDICADO.
É óbvio que a sentença tenha que ser clara, para evitar ambigüidades e
incertezas, e cumprir a sua função de instrumento pacificador na
composição de litígios. Dela não podem resultar incertezas.
Tão lógica é essa exigência que o novo Código nem sequer mencionou
diretamente. No entanto, os requisitos de clareza e precisão continuam
a ser básicos para a sentença, tanto que "cabem embargos de
declaração quando houver, na sentença ou no acórdão, obscuridade ou
contradição" (art. 535, nº I).
1. O ato praticado fora dos ditames legais deve ser considerado nulo,
inclusive de ofício, salvo quando tratar-se de nulidade não argüida
pela acusação, mas cujo reconhecimento poderá prejudicar a defesa,
por força do princípio da non reformatio in pejus; esse é, inclusive, o
teor da Súmula 160 do Pretório Excelso, segundo a qual é nula a
decisão do Tribunal que acolhe contra o réu nulidade não argüida no
recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício.
O relator, ministro Arnaldo Esteves Lima, proferiu decisão à guisa do art. 249
do Código de Processo Civil e da súmula nº. 7 daquele tribunal, isto é, observa que a
pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial e que o magistrado,
ao pronunciar a nulidade declarará os atos atingidos e ordenará as providências
necessárias. Para o ministro, o fato de a assistência técnica da BMW ter ciência das
diligências periciais confere lisura e transparência ao procedimento e permite que seja
produzido laudo pericial que retrate os fatos da forma mais fidedigna possível. A
nulidade dependerá da demonstração de prejuízos pela parte interessada:
CONCLUSÃO
Partindo das premissas engendradas pela jusfilosofia, segundo a qual o Estado
teria sido criado para a salvaguarda dos direitos inalienáveis do homem, como a
propriedade, a liberdade e a vida, pode-se concluir que a vedação às provas ilícitas no
processo, capitaneada pela Constituição da República e ratificada pelo princípio do
Devido Processo Legal - Due Process of Law - tem por escopo a garantia das
finalidades estatais, isto é, os limites da lei garantem que os cidadãos não sejam
julgados ou acusados com base em fatos que violem as normas legais.
O processo é passível de nulidade sob vários aspectos, podendo esta nulidade ser
considerada absoluta ou relativa. Os ditos atos nulos de pleno direito são aqueles que
contaminam o processo de nulidade e o inutiliza inteiramente, tais como a omissão do
autor no cumprimento das diligências necessárias ou a interferência do juiz de grau
inferior em matéria de instância superior.
O processo deve ser claro e atinente às regras determinadas em lei, para que o
magistrado - salvaguardado pelo princípio do livre convencimento - decida o conflito
em questão com base no princípio da verdade formal, isto é, reputam-se como
verdadeiros, determinados fatos, em face das provas carreadas nos autos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARENDT, Hannah. A condição Humana. 10ª Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
2007
BRASIL. Código de Processo Penal. Vade Mecum. Obra coletiva de autoria da Editora
Saraiva com a colaboração de Antônio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos
Santos Windt e Lívia Céspedes. 11ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
BRASIL. Código de Processo Civil. Vade Mecum. Obra coletiva de autoria da Editora
Saraiva com a colaboração de Antônio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos
Santos Windt e Lívia Céspedes. 11ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
BRASIL. Lei 9.9296/96, 24 de julho de 1996. Regulamenta o inciso XII, parte final, do
art. 5° da Constituição Federal.Presidência da República. Disponível em:
BRASIL. Tribunal Regional Federal (1ª região). Apelação Cível nº. 1469-MA
(1998.01.00.001469-4) Apelante: Conselho Regional de Enfermagem do Maranhão -
COREN/MA Apelado: HOSPITAL GERAL DE IMPERATRIZ. Relator: Juiz Carlos
Alberto Simões de Tomaz. Maranhão, 27 de fevereiro de 2003. Disponível: acesso:
20.06.12
BRASIL. Tribunal Regional Federal (1ª região). Apelação cível nº. 66063-MG
(1998.01.00.066063-4). Apelante: Uniãoo Instituto Nacional (INSS) e a Rede
Ferroviária Federal S/A. Apelado: Maria Silva Beirão, Maria Aparecida da Silva Beirão
e Rosélia da Silva Beirão. Relator: Juiz Federal Manoel José Ferreira Nunes. Minas
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COSTA, Yvete Flávio da; LASCALA, Maria Carolina Florentino. A litispendência nas
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GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Vol. 1 Parte Geral. 9ª Ed. São
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Prova ilícita é motivo para afastar súmula 691. Revista Consultor Jurídico, 14 de
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Prova obtida ilicitamente faz justiça absolver acusado de tráfico. Revista consultor
Jurídico, 27 de setembro de 2004 disponível em: acesso em: 03.06.12