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Estratégias discursivas das vitórias eleitorais de Fox (2000) e Lula (2002)


Ricardo Neves Streich1

1. Introdução

A presente comunicação é parte da pesquisa de doutorado provisoriamente


intitulada “Estratégias de desenvolvimento em questão: o papel do Estado no Brasil e
México (2000-2013)”. Esse trabalho de pesquisa é realizado no âmbito do Programa de
Pós-graduação em História Econômica da Universidade de São Paulo.
Um dos objetivos da pesquisa de doutoramento é tentar analisar as relações entre
as decisões no processo de condução política e econômica dos governos de Brasil e
México nos anos 2000. A escolha dos países se deu fundamentalmente por três razões, a
saber: 1) trata-se das duas maiores economias do continente; 2) a estrutura econômica dos
países é relativamente parecida, já que ambos possuem um parque industrial desenvolvido
(especialmente no tocante à indústria automotiva), grandes conglomerados de
comunicação, empresas petrolíferas importantes, além de serem exportadores de
commodities2; 3) o histórico e grave problema de pobreza e desigualdade econômica
existente nas duas nações.
Também orientou nossa escolha o fato de que os governantes de Brasil e México,
nesse período, possuírem perspectivas ideológicas bastante distintas. Vicente Fox do
Partido Acción Nacional (PAN) governou o México entre 2000 e 2006. Sua vitória
significou a primeira derrota do Partido Revolucionario Institucional (PRI) em 70 anos.
Grosso modo, o governo panista foi marcado por um discurso que preconizava a
eficiência estatal para combater a corrupção (tema central do debate eleitoral do ano 2000,
como veremos a seguir). É importante frisar que no México o mandato presidencial tem
duração de 6 anos e a reeleição não é permitida. Ainda assim, o Partido Acción Nacional
foi capaz de eleger – ainda que sob fortes suspeitas de fraude – o sucessor de Fox, Felipe
Calderón, em 2006.

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Doutorando em História Econômica pela Universidade de São Paulo e bolsista FAPESP (número do
processo 2017/17481-2) email: ricardostreich@gmail.com
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A fim de qualificar a comparação entre o grau de complexidade atingido por economias de distintos países
o pesquisador César A Hidalgo criou um índice denominado Índice de Complexidade Econômica (ICE). O
ICE busca dar conta “da multiplicidade de conhecimento útil embutida na economia” ao analisar o grau de
complexidade do leque de produtos que um país determinado é capaz de produzir (OEC, 2015). Nesse
sentido, foi estabelecido um ranking pelo Observatório da Complexidade Econômica (Observatory of
economic complexity - OEC em inglês) – ligado ao MIT -, no qual México e Brasil ocupam,
respectivamente, as duas primeiras posições do ranking latino-americano.
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Lula da Silva do Partido dos Trabalhadores (PT), por sua vez, governou o Brasil
por dois mandatos entre 2003 e 2010. Além disso, foi capaz de eleger sua sucessora Dilma
Roussef em 2010 e 2014. Os governos do Partido dos Trabalhadores, em que pesem as
particularidades de cada mandato, foram marcados por um discurso de tonalidade
desenvolvimentista, segundo o qual o Estado possui um papel fundamental na indução do
crescimento econômico e na redução da desigualdade social.
Contudo, é importante observar que a presente não versa sobre essa relação entre
economia e política. O esforço aqui repousa sobre a parte das “estratégias” – conceito que
nos é central, como indica desde já o título provisório da tese – dos governantes de Brasil
e México nos anos 2000. Sendo assim, é importante assinalar que a análise dessas
“estratégias discursivas” – parte integrante das “estratégias de desenvolvimento” - não se
pretende exaustiva. Nesse sentido, observar semelhanças e diferenças nas campanhas
eleitorais de políticos de orientações ideológicas tão distintas - especialmente no que diz
respeito ao papel do Estado no processo de desenvolvimento econômico - ajuda a colocar
novas luzes ao conturbado período vivido pelo continente latino-americano na transição
para o século XXI.
Na democracia liberal, ao menos em tese, as eleições são momentos primordiais,
durante os quais a sociedade debate distintos projetos e perspectivas para seu país. A
complexidade desse processo de disputa, ainda mais quando nossa análise abrange dois
países, impõe a necessidade de recortes. Por isso, para além de análise exaustiva da rotina
e dos materiais de campanha, optamos por elencar alguns materiais que sintetizam as
discussões presentes nas duas campanhas.
Por fim, com intuito de prosseguir à análise, apresentaremos de maneira breve os
principais dilemas político-econômicos da América Latina da virada do século XXI. Em
seguida, passaremos à análise das campanhas propriamente ditas.

2. A virada para o século XXI na América Latina

O mundo que emergiu após a queda do Muro de Berlim (1989) se tornou cada vez
mais conectado. O fenômeno vastamente descrito como “globalização” significou, em
linhas gerais, uma maior integração econômica dos países e, consequentemente, uma
maior mobilidade do capital financeiro e produtivo.
De modo geral, o discurso e as práticas econômicas dos anos 1990 foram
marcados pela necessidade de superação da crise econômica dos anos 1980
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(especialmente a inflação). Nesse sentido, formulou-se uma miríade de postulados que


preconizavam algumas respostas, tais como austeridade, privatizações,
desregulamentação e enxugamento do Estado. A retomada dos princípios liberalizantes
do ponto de vista econômico ficou conhecida como “neoliberalismo”.
O compromisso com os indicadores de bom desempenho financeiro –
especialmente a inflação – colocou duras limitações às economias latino-americanas que,
muitas vezes se viram em crises (provocadas pela necessidade de “ajustes recessivos”).
Evidentemente, as dinâmicas de aplicação do receituário neoliberal foram ocorrendo de
maneiras particulares nos mais diferentes países (especialmente por conta das
resistências). Daí, por exemplo, o fato de algumas das maiores empresas estatais do
continente - como a PETROBRAS, a PEMEX e a PDVSA -, não terem sido privatizadas,
muito embora tenham sofrido flexibilizações que facilitaram o vínculo com o capital
estrangeiro.
Vale traçar, então, um breve histórico das crises econômicas que assolaram a
América Latina nos anos 1990. Evidentemente, cada uma dessas crises tem suas razões
particulares, mas não deixa de ser interessante observar que muitas dessas crises sequer
tiveram origem na América Latina. Afinal, a integração econômica mundial
proporcionavam a amplificação das crises, justamente por conta dos processos de
desregulamentação financeira que fragilizou muitos países face a mobilidade de capitais
especulativos.
Em 1994, ocorreu a chamada “crise do peso mexicano”. A desvalorização da
moeda mexicana – em função da incapacidade do governo em manter o câmbio fixo –
acarretou uma grande fuga de capitais. As dificuldades de financiamento se fizerem sentir
no aumento de desemprego e diminuição do PIB. Em tempos de capitalismo cada vez
mais globalizado, a desconfiança alcançou outros países latino-americanos, no que ficou
conhecido como “Efeito Tequila”.
Algo muito parecido aconteceu na Ásia em 1997. O governo tailandês flexibilizou
o câmbio e a grande fuga de capitais desacelerou a economia. A crise logo se espalhou
pela região no que foi denominada “crise dos tigres asiáticos”. Posteriormente, em função
da importância econômica dos países do sudeste asiático essa crise se tornou a primeira
crise de escala global.
No ano seguinte foi a vez da Rússia. Após a desvalorização do rublo, o país
decretou moratória em 1998. O roteiro já conhecido incluiu o receio da crise se espalhar
pelo mundo. A solução, como em todos os casos anteriores, consistiu na intervenção do
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Fundo Monetário Internacional com vultosos empréstimos. É importante destacar que


para obter esses empréstimos os governantes dos países afetados pelas crises cambiais e
financeiras deveriam se comprometer com um austero programa econômico.
Em 1999, o mundo esperava por novas crises. O Brasil era visto potencialmente
como a próximo capítulo da série de crises que afetava o mundo globalizado. Logo após
a eleição, Fernando Henrique Cardoso (que havia sido reeleito em 1998) resolveu
desvalorizar o real, já que o custo de manter o regime de bandas cambiais 3 se mostrava
insustentável. O Brasil já possuía um acordo com FMI, por conta do receio provocado
pela crise russa. As medidas de austeridade tornaram os dois primeiros anos do segundo
mandato de Cardoso bastante inexpressivos em termos de crescimento econômico.
No último ano do século XX, um outro tipo de crise econômica apareceu. Se as
crises aconteceram em economias emergentes, a chamada “crise das pontocom” ou
“bolha da internet” ocorreu no coração do sistema capitalista internacional. Além disso,
não se tratava de crise derivada de questões cambiais. A euforia especulativa dos
chamados “capitais abutres” criaram uma bolha no ramo das empresas de tecnologia.
Desse modo, a bolsa NASDAq – onde se negociam ações de empresas do ramo
tecnológico – chegou a cair 10% no dia 14 de abril de 2000. O mercado financeiro nos
Estados Unidos sofreria ainda mais um duro golpe com os ataques de 11 de setembro de
2001. Após uma semana de bolsa fechada, o índice Dow Jones caiu 7,13% no dia de sua
reabertura.
Em dezembro de 2001, temos a última das grandes crises até a de 2008. “A crise
argentina” também ocorreu pelas dificuldades em manter a conversibilidade do dólar. Em
função da saída de capitais, o governo De la Rua impôs o “Corralito” - uma série de
restrições bancárias como limitação dos saques semanais. O pagamento da dívida
argentina também foi suspenso. As cenas dos protestos em que manifestantes batiam nas
panelas em frente à Casa Rosada circularam o mundo. Com o lema “¡Que se vayan
todos!” os argentinos derrubaram 5 presidentes em 12 dias.
Paralelamente a toda essa dinâmica de crises econômicas que atingiam o mundo
em geral e a América Latina em particular, houve a discussão da criação da Área de Livre
Comércio das Américas (ALCA). A proposta foi lançada por Bill Clinton na Cúpula das
Américas em 1994 e previa o estabelecimento de uma zona de livre comércio em todo o

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O regime de bandas cambiais consiste em uma mistura do câmbio fixo e do câmbio flutuante. Nesse
regime o Banco Central elege um piso e um teto para o valor do dólar e atua – comprando ou vendendo –
para manter a taxa de câmbio dentro do estabelecido.
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continente americano. Para além das dificuldades econômicas decorrentes das assimetrias
dos países do continente, a proposta enfrentou resistências de movimentos sociais de
diversos países até ser abandonada definitivamente na Cúpula das Américas de 2005.
Os debates sobre a ALCA ensejaram uma organização supranacional que
questionava a globalização. Com o mote “Um outro mundo é possível”, participaram 15
mil ativistas da primeira edição do Fórum Social Mundial em Porto Alegre no ano de
2001. Nesse espaço, manifestantes trocaram experiências, estratégias e estabeleceram
redes de contato. Além disso, se configurou em espaço privilegiado de diálogo entre
movimentos da sociedade civil e os partidos de esquerda que durante a primeira década
do século XXI foram vencendo as eleições na América Latina.
É importante citar que, especialmente no caso latino-americano, a resistência ao
neoliberalismo foi um fenômeno social que percorreu o continente durante toda a década
de 1990. Durante a década emergiram manifestações de diversos tipos. Desde revoltas
espontâneas como o Caracazo venezuelano em 1989, passando pela insurgência de
grupos autonomistas como o Ejercito Zapatista de Liberación Nacional (EZLN) no
México em 1994. Também ocorreram diversas deposições de presidentes que optavam
pela condução ortodoxa da economia como Carlos Andrés Perez na Venezuela em 1993
e também houve lutas contra privatizações como o caso da Guerra da Água na Bolívia
em 2000.
Poderíamos citar inúmeras revoltas e protestos populares que questionaram os
pressupostos do Consenso de Washington e seus aplicadores no continente. Contudo, por
conta de limitações de espaço, basta assinalar – como fizemos anteriormente - foi
justamente por conta dessa dinâmica de resistência que as medidas neoliberais foram
implementadas em ritmos e graus diferentes nos países latino-americanos.
Vemos, então, que o contexto da virada para o século XXI se encontrava bastante
conturbado. Havia um mal-estar nas democracias latino-americanas que suscitava
desejos de transformação política e social4. Evidentemente, esses anseios se fizeram
manifestar nas urnas. Foi por isso que México e Brasil, as duas maiores economias do
continente, elegeram governantes de oposição nas primeiras eleições dos anos 2000.

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A expressão “mal-estar na democracia” é de Eliel Machado (2004). Escrever isso em 2018, quando a
possibilidade de retrocessos autoritários estão em voga em diversos países do continente pode parecer
estranho e insensato. Contudo, é importante observar que àquela altura havia um mal-estar na democracia.
Hoje, com a emergência dos chamados populistas de direita, temos um mal-estar da democracia. Esse é um
tema que será abordado no desenrolar da pesquisa de doutoramento.
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Sigamos, então, às campanhas eleitorais que no entender do eleitorado dos respectivos


países foi capaz de melhor responder a essas turbulências sociais, políticas e econômicas.

3. As campanhas vitoriosas: o “Gobierno de Cambio” e “Um Brasil Para Todos”

Mencionamos anteriormente que Fox e Lula possuíam perspectivas bastante


distintas acerca do papel do Estado no que tange ao desenvolvimento econômico. Apesar
disso, é interessante notar que ambos à época das respectivas vitórias eleitorais eram os
maiores partidos de oposição em seus países. A vitória da oposição deve ser
compreendida nesse contexto justamente como a aspiração à mudança ou então como
resposta ao mal-estar que citamos anteriormente. Nesse seção, apresentaremos
brevemente os candidatos, um perfil geral de seus governos e a análise dos documentos
das respectivas campanhas.
O México do ano 2000 apresentava uma situação econômica peculiar. Após a
grave crise de meados dos 1990, a integração econômica com o gigante do norte parecia
dar resultados. Em 1999 e 2000, os índices de crescimento econômico foram bastante
satisfatórios (respectivamente, 3,7% e 7%) (FMI).
O clima de prosperidade econômica, contudo, não foi suficiente para que o PRI
ganhasse a eleição. No primeiro domingo de julho de 2000, dia 2, os mexicanos elegeram
Vicente Fox com 42,5% dos votos. A derrota eleitoral do PRI e a promessa de um
“Gobierno de Cambio” – lema da campanha de Fox - foram comemoradas nas ruas e,
assim, o presidente recém-eleito tomou posse em dezembro daquele ano contando com
alto entusiasmo dos mexicanos.
Vicente Fox foi presidente da Coca-Cola na América Latina. Com ascensão
meteórica na política, venceu a primeira eleição majoritária de que participou e se tornou
governador pelo estado de Guanajuato em 1995. Nesse sentido, podemos dizer que Fox
é o primeiro de uma linhagem que anda bastante em voga na América Latina do pós-crise
de 2008. Trata-se da figura do “gestor” que busca abordar a política a partir de parâmetros
de eficiência. Por isso, o “Cambio” prometido pelo presidente panista ocorreria em
função do aumento da eficiência do Estado e da eliminação da corrupção através do
combate ao patrimonialismo.
Contudo, em termos políticos o governo de Fox foi marcado por diversas
polêmicas e diversas suspeitas e acusações de corrupção. Como escapa aos limites desse
trabalho, basta citar que o termo “Foxilandia” é de uso relativamente comum na cultura
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política mexicana. Além de um documentário de mesmo título, há até mesmo um verbete


na Wikipédia que lista diversas polêmicas nas quais Fox estaria envolvido.
Em termos econômicos, a estreita vinculação à economia estadunidense, torna o
país muito suscetível às mudanças econômicas do vizinho do norte. Por isso, os reflexos
da bolha da internet e a crise de 2001 tornaram os três primeiros anos bastante difíceis (-
0,3%, em 2001; 1% em 2002 e 1,3% em 2003). A segunda metade do mandato de Fox
foi mais produtiva, até mesmo porque a economia americana mostrou sinais de
recuperação. Assim temos 4,1% de crescimento em 2004; 3% em 2005 e 4,8% em 20006
(FMI).
O regime de política econômica de Fox tinha como pressuposto manter o
equilíbrio fiscal e o superávit primário. Assim, em 2000 a Razão Dívida Pública
Bruta/PIB no México era de 41,85%, caindo para 37,75% em 2006 (FMI). As tendências
nos indicadores econômicos se fizeram sentir no campo social, o governo panista logrou
reduzir a pobreza em quase 10%, já que em 2000, a taxa de pobreza era de 41%, número
que diminuiu para 31,7%, em 2006 (CEPALSTATS).
Essas opções, de certa forma, já se faziam presentes no programa eleitoral.
Contudo, cremos que o documento que melhor traduz as intenções políticas de um
governante no México é o “Plan Nacional de Desarrollo”. Trata-se de documento que os
presidentes mexicanos necessitam apresentar ao Congresso no início de seu mandato, de
modo a tornar transparentes para os cidadãos mexicanos suas propostas.
Tomemos, pois, uma citação da apresentação do “Plan Nacional de Desarrollo
(2001-2006)”:

La democracia que estamos construyendo tiene como fundamento el


reconocimiento de la libertad y de la dignidad humana y, como consecuencia,
la aceptación del pluralismo y el respeto a las diferencias, dejar de lado la
intransigencia, los monólogos, los dogmas o las verdades absolutas, y
cualquier imposición que violente la conciencia individual. El Plan Nacional
de Desarrollo refleja el propósito indeclinable de dar forma a una democracia
moderna, en la que las decisiones se tomen con la participación colectiva de
todos y en la que expresiones diversas sean incluidas. En esta nueva etapa, el
ejercicio del poder público por parte del Estado deberá apegarse a la ley.
Construiremos juntos una gobernabilidad democrática que tenga como origen
y destino al ciudadano (PRESIDENCIA DE LA REPUBLICA DE MÉXICO,
2001).

É interessante observar a estratégia discursiva para o estabelecimento da


diferenciação em relação ao período priista. Pela negativa, nota-se que o governo do PRI
era a representação do atraso, afinal só agora a democracia “está sendo construída” de
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maneira “moderna”. O lugar do atraso também o lugar da corrupção, a qual deve ser
resolvida a partir de paradigmas “modernos” como a eficiência e a transparência:

Este proceso se acompaña de nuevas formas de estructurar el gobierno.


Estamos convencidos de la necesidad de replantear la estructura de la
administración pública para imprimirle eficacia, acabar con el burocratismo,
terminar con la corrupción y con el dispendio, y de establecer una nueva
relación entre el gobierno y la sociedad, una relación cimentada en el respeto,
la transparencia y la rendición de cuentas, con servidores públicos resueltos no
sólo a atender a los ciudadanos, sino a trabajar con ellos. (PRESIDENCIA DE
LA REPUBLICA DE MÉXICO, 2001).

Mais ao fim da apresentação do plano, uma passagem sutil e interessante


demonstra a relação entre meios e fins. A construção desse “novo” México, agora
transparente e moderno também significaria que:

Desde el primer día de mi gobierno convoqué a los mexicanos a construir un


nuevo México: un México competitivo y con visión global; con conciencia
ambiental y oportunidades para todos. Un México con libertad y democracia;
con educación y con valores. Para construir este nuevo México necesitamos
poner el país al día. Al día en materia económica, en materia de desarrollo
social y humano, en materia de orden y respeto, en materia de buen gobierno
y finanzas públicas sanas; pero sobre todo, necesitamos poner el país al día en
materia educativa. (PRESIDENCIA DE LA REPUBLICA DE MÉXICO,
2001).

Observe-se que o novo México é “competitivo” e tem visão “global”. Não é a toa
que é esse o primeiro item que aparece na enumeração e que parece subordinar todos os
outros. Vale lembrar que na virada do século XXI – na América Latina, em geral, e no
México, em particular, - o tema da integração econômica globalizada era central.
Ademais, o tema da desigualdade – o outro lado da moeda do “mal-estar” anteriormente
citado – não aparece de maneira explícita. Não é ao acaso que as questões “social” e
“humana” aparecem precedidas do substantivo “desenvolvimento”, o que indica uma
concepção bastante alinhada às tendências liberais.
Em suma, uma citação do discurso de posse de Vicente Fox é mais clara no que
diz respeito às suas concepções acerca das funções do Estado e da sua relação com a
Economia:

Sostengo enfáticamente que la justicia social es parte de una economía


eficiente, no su adversaria. Es hora de reconocer que ni todo puede ser resuelto
por el Estado ni todo puede ser solucionado por el mercado. Dicho de otro
modo: ni el Estado todo, ni el individuo solo. Es mi convicción que el voto por
la democracia es inseparable del voto por la equidad social (PRESIDENCIA
DE LA REPUBLICA DE MÉXICO, 2001).
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A citação deixa claro que ele se outorga – através de diversas mediações – como
representante da “igualdade social”. Outro ponto interessante a se observar que a justiça
social é parte de uma economia eficiente. Isso significa que o Estado deve auxiliar o
indivíduo nos problemas que o mercado não pode resolver. O recurso à força do Estado
– que fora de contexto poderia ser vista como uma posição de centro-esquerda – pode ser
compreendido como uma tentativa de dialogar com os anseios populares daquele período.
Nesse sentido, um discurso de tonalidade explicitamente liberal – tendo em conta o mal-
estar anteriormente citado – não seria capaz de ganhar as eleições. Contudo, como
citamos acima, Fox trabalha com o pressuposto da ideia de “capital humano” e é nesse
sentido que o Estado deve atuar para auxiliar os indivíduos, o que – apesar da roupagem
de protagonismo do Estado em seu discurso - também é sinal de uma perspectiva bastante
alinhada aos ditames da tradição liberal.
Em outubro de 2002, foi a vez dos brasileiros elegerem um novo presidente da
república. A possibilidade de vitória eleitoral de um governo de centro-esquerda, aflorou
os ânimos do mercado e, por isso, o risco-brasil e o dólar atingiram valores recordes.
Nesse contexto pré-eleitoral conturbado, Lula lançou o famoso documento A Carta aos
Brasileiros, no qual afirmava que seu governo não seria “de ruptura”. O documento
assinado por Lula era mais um passo na estratégia de se afastar da imagem de “radical”
que havia colaborado nas três derrotas eleitorais anteriores que ele sofreu.
A eleição ocorreu em dois turnos, haja visto que o vencedor não foi capaz de
angariar a maioria absoluta dos votos válidos no primeiro turno (46,4%). Assim, no dia
27 de outubro de 2002, Luís Inácio Lula da Silva derrotou José Serra com 61,27% dos
votos válidos. A posse presidencial, no Brasil, ocorreu em janeiro do ano subsequente à
eleição presidencial. Havia muita expectativa de como seria o “Um Brasil Para Todos” –
lema da campanha lulista em 2002.
O primeiro governo de Lula foi marcado pela tentativa de conciliar
responsabilidade fiscal e inclusão social, bem nos marcos preconizados pela Carta aos
brasileiros. É verdade que nesse momento prevaleceu a responsabilidade fiscal, ainda
mais se comparado aos governos petistas posteriores. Assim, o crescimento econômico
não ocorreu a taxas vigorosas. A média do primeiro mandato de Lula foi de 3,7%, com
pico de 4% em 2006 (FMI). A condução macroeconômica conservadora pode ser
observada na série de superávits primários e na redução da relação entre Dívida
Pública/PIB: 73,75%, em 2003, para 65,8% em 2006 (FMI). Por sua vez, o índice de
pobreza – preocupação bastante enunciada na campanha eleitoral de Lula – teve uma
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redução mais tímida do que a mexicana. No Brasil o número caiu de 37,8% em 2002 para
33,4% em 2006 (CEPALSTATS).
Tal qual o presidente mexicano, o governo petista também sofreu com os
escândalos de corrupção. Contudo, em função das estratégias do partido – especialmente
nos casos da Ação Penal 470 (conhecida popularmente como “mensalão”) – a
popularidade de Lula não foi abalada com os escândalos. A “blindagem” de Lula surtiu
efeito e, com a economia apresentando índices positivos, ele foi capaz de se reeleger em
2006.
Em termos de campanha política, o eixo da estratégia das eleições de 2002 foi
estabelecer a necessidade de um “novo pacto” social que pudesse substituir o vigente, que
seria responsável pela estagnação e dificuldade econômica experimentada pelos
brasileiros. Superar o modelo econômico neoliberal, então, só seria possível ao superar
as práticas políticas de condução estatal que o restringia a poucos:

A imensa tarefa de criar uma alternativa econômica para enfrentar e vencer o


desafio histórico da exclusão social exige a presença ativa e a ação reguladora
do Estado sobre o mercado, evitando o comportamento predatório de
monopólios e oligopólios. O controle social dará também mais transparência e
eficácia ao planejamento e à execução das políticas públicas nas áreas de
saúde, educação, previdência social, habitação e nos serviços públicos em
geral. A boa experiência do orçamento participativo nos âmbitos municipal e
estadual indica que, apesar da complexidade que apresenta sua aplicação no
plano da União, ela deverá ser estendida para essa esfera. Em outras palavras,
nosso governo vai estimular a ampliação do espaço público, lugar privilegiado
da constituição de novos direitos e deveres, o que dará à democracia um caráter
dinâmico (PARTIDO DOS TRABALHADORES, 2002).

Observe-se que, se comparado a Fox, a citação do programa de governo de Lula


possui algum tom de enfrentamento. A redução da desigualdade é tarefa prioritária que
tem como protagonista o Estado. Contudo, como dissemos anteriormente, a preocupação
de Lula também corria no sentido da estabilidade econômica (e por isso mesmo ele se
aliou a José de Alencar, um industrial, como vice). Nesse sentido, o próprio discurso de
posse já adiantava que a transição não seria repentina:

Vamos mudar, sim. Mudar com coragem e cuidado, humildade e ousadia,


mudar tendo consciência de que a mudança é um processo gradativo e
continuado, não um simples ato de vontade, não um arroubo voluntarista.
Mudança por meio do diálogo e da negociação, sem atropelos ou precipitações,
para que o resultado seja consistente e duradouro (SILVA, 2003).

O caráter negociado e pactuado da mudança indica que a estabilidade seria um


fator importante. Evidentemente, a economia seria “parte” disso – parafraseando a citação
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de Fox que elencamos há pouco – como indica o já citado documento Carta aos
brasileiros:

A questão de fundo é que, para nós, o equilíbrio fiscal não é um fim, mas um
meio. Queremos equilíbrio fiscal para crescer e não apenas para prestar contas
aos nossos credores. Vamos preservar o superávit primário o quanto for
necessário para impedir que a dívida interna aumente e destrua a confiança na
capacidade do governo de honrar os seus compromissos. Mas é preciso insistir:
só a volta do crescimento pode levar o país a contar com um equilíbrio fiscal
consistente e duradouro. A estabilidade, o controle das contas públicas e da
inflação são hoje um patrimônio de todos os brasileiros. Não são um bem
exclusivo do atual governo, pois foram obtidos com uma grande carga de
sacrifícios, especialmente dos mais necessitados (SILVA, 2002).

Por fim, vale assinalar, contudo, que diferentemente do presidente mexicano, o


sujeito presente na estratégia discursiva de Lula é plural, ou seja, são classes sociais. Isso
ocorre por que, ao menos na esfera da retórica, o presidente brasileira busca escapar dos
parâmetros liberais do debate acerca das funções do Estado. Contudo, é importante
observar que a utilização desse repertório da tradição política da esquerda não impediu o
primeiro governo de Lula de ser marcado por uma condução bastante ortodoxa da
economia. Afinal é justamente essa ambiguidade entre menções retóricas ao
enfrentamento e condução conservadora da economia (e consequentemente da política,
fenômeno conhecido como governabilidade) que caracteriza o que André Singer (2009)
denomina de "reformismo fraco”.

4. Considerações finais

Buscando abarcar as discussões ocorridas na mesa “Debates políticos


contemporâneos na América Latina e nos Eua” ocorrida no âmbito XIII Encontro
Internacional da Associação Nacional de Pesquisadores e Professores de História das
Américas (ANPHLAC), modificamos o conteúdo de nossa apresentação.
Buscamos aqui estabelecer o debate sobre o papel do Estado em sua relação com
a economia abarcando também as primeiras manifestações oficiais dos presidentes Fox e
Lula após suas respectivas vitórias eleitorais.
Em linhas bastante sintéticas, podemos dizer ambos presidentes tentaram conciliar
em seus discursos os elementos do mercado (e também estabilidade econômica) e do
Estado (no que diz respeito à sua capacidade de operar ações para reduzir a desigualdade
social). Evidentemente, cada um dos presidentes se localiza mais proximamente a um dos
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desses dois polos. Isso não significa, contudo, que a proximidade a um dos polos exclua
completamente as proposições do outro polo.
Fox, com sua origem empresarial, raciocina a partir de princípios e ditames
liberais. É notável o quanto a categoria “indivíduo” aparece em seu discurso. Lula, por
sua vez, de origem sindicalista articula seu discurso em função de coletividades. Não
apenas “classes”, mas também “brasileiros”, “cidadãos” e etc.
Outra relação interessante a se observar é a relação entre “justiça social” e
eficiência econômica. Nesse tópico, a distinção entre meios e fins que diferencia o
discurso dos presidentes fica bastante clara. Enquanto para Fox a “justiça social” é parte
de uma economia eficiente, para Lula a estabilidade econômica deve servir justamente
para que a pobreza seja diminuída.
Por fim, a força econômica dos mecanismos de financiamento internacional – e a
força ideológica do neoliberalismo – impuseram a necessidade de todos os problemas
serem abordados, mesmo pelos políticos de esquerda, em termos de “eficiência” e
“gestão”. Por outro lado, a força política das mobilizações sociais impôs – mesmo para
os políticos de direita - a pauta da desigualdade. É nesse cruzamento que as produções
discursivas e políticas da virada do século XXI precisam ser analisadas e compreendidas.

5. Referências bibliográficas

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