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1Laboratório de Ensaios em Durabilidade dos Materiais (LEDMa), Departamento de Ciência e Tecnologia dos
Materiais, Universidade Federal da Bahia, juliana.cavalheiro15@hotmail.com, 2Laboratório de Ensaios em
Durabilidade dos Materiais (LEDMa), Departamento de Ciência e Tecnologia dos Materiais, Universidade Federal
da Bahia, silas.andrade14@gmail.com, 3Laboratório de Ensaios em Durabilidade dos Materiais (LEDMa),
Departamento de Ciência e Tecnologia dos Materiais, Universidade Federal da Bahia, verasribeiro@hotmail.com
RESUMO
Em geral, as estruturas de concreto armado sofrem danos causados, geralmente, pela ação
combinada das intempéries e condições climáticas do ambiente em que estão inseridas.
Alguns desses danos resultam em grandes gastos de manutenção, principalmente quando
estas estruturas estão submetidas a ambientes extremamente agressivos como os que são
apresentados em áreas litorâneas que, por possuírem alta umidade e elevados teores de
íons cloreto, propiciam a aceleração do processo de corrosão das armaduras. Assim,
compreender as variáveis climáticas e os níveis de contaminação atmosféricas é
fundamental para garantir que a durabilidade e a vida útil das estruturas atendam aos
requisitos determinados pela NBR 6118:2014 - Projeto de estruturas de concreto -
Procedimento (ABNT 2014). O presente artigo apresenta um estudo de caso, realizado em
um empreendimento imobiliário situado na orla marítima da cidade de Salvador, Bahia,
Brasil, no qual foi utilizado o método da vela úmida, a fim de atestar a alta agressividade do
local em diferentes estações do ano e analisar a influência das variáveis climáticas e
geográficas (vento, chuva, altura, etc.) nos resultados, auxiliando na locação e seleção de
materiais e componentes a serem utilizados ao longo da obra, visando o aumento da
durabilidade. O método proposto se mostrou uma ferramenta eficaz de avaliação ambiental
do microclima, podendo servir, ainda, como referência para futuros projetos na região.
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1. INTRODUÇÃO
Durante o século XX, várias obras apresentaram patologias que geraram elevados custos
de recuperação (Helene 1993). Entre as mais graves, a corrosão que, segundo o estudo da
U.S. Federal Highway Administration, tem gerado aos Estados Unidos um custo anual de
US$ 276 bilhões (NACE 2016). No Brasil não há dados referentes aos custos da corrosão,
porém estima-se um gasto anual de US$ 22,12 bilhões (Gentil 2007).
Classificação geral do
Classe de agressividade Risco de deterioração
Agressividade tipo de ambiente para
ambiental da estrutura
efeito de projeto
Rural
I Fraca Insignificante
Submersa
II Moderada Urbana a, b Pequeno
Marinha a
III Forte Grande
Industrial a, b
Industrial a, c
IV Muito forte Elevado
Respingos de maré
a Pode-se admitir um microclima com uma classe de agressividade mais branda (uma classe acima) para
ambientes internos secos (salas, dormitórios, banheiros, cozinhas e áreas de serviço de apartamentos
residenciais e conjuntos comerciais ou ambientes com concreto revestido com argamassa e pintura).
bPode-se admitir uma classe de agressividade mais branda (uma classe acima) em obras em regiões de clima
seco, com umidade média relativa do ar menor ou igual a 65 %, partes da estrutura protegidas de chuva em
ambientes predominantemente secos ou regiões onde raramente chove.
cAmbientes quimicamente agressivos, tanques industriais, galvanoplastia, branqueamento em indústrias de
celulose e papel, armazéns de fertilizantes, indústrias químicas.
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Nesse contexto, a presente pesquisa propõe uma metodologia de avaliação da
agressividade ambiental de um microclima, através de um estudo de caso realizado em um
empreendimento situado na orla marítima de Salvador, Bahia, o qual se baseou na
aplicação do método da vela úmida.
2. METODOLOGIA
Para a fabricação das velas úmidas consultou-se a norma NBR 6211:2001, assim, cada vela
foi confeccionada utilizando-se um cilindro de teflon de 2,5 cm de diâmetro, sobre o qual foi
enrolada uma camada dupla de gaze cirúrgica, resultando numa área de 100 cm² exposta à
atmosfera, sendo esta área vinculada a solução de água glicerinada através das
extremidades da gaze que se estendiam até o fundo do frasco coletor (Fig. 2).
Fig. 2 – Vela úmida preparada pela equipe para a pesquisa, conforme NBR 6211
2.2. Instalação
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Para a instalação das velas úmidas, foram feitos suportes de madeira, que garantiram às
mesmas uma altura de um metro em relação ao solo, em posição mais alta que os
obstáculos situados num raio de três metros, conforme norma (NBR 6211)
Esperava-se alocar os suportes em posições que abrangessem todo o terreno sob os raios
de atuação das velas, entretanto, isso não foi possível. Assim, as velas, em um total de 12,
foram instaladas nos pontos indicados na Fig. 3, que são detalhados na Tabela 2.
Tabela 2 – Localização das velas úmidas utilizadas nos testes de avaliação do microclima
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2.3. Análise de dados
2 𝐴𝑔𝑁𝑂3 (𝑎𝑞) + 𝐾2 𝐶𝑟𝑂4 (𝑎𝑞) → 𝐴𝑔2 𝐶𝑟𝑂4 (𝑠) ↓ +2 𝐾𝑁𝑂3 (𝑎𝑞) (2)
Este método gera um excesso de AgNO3, logo, para obter o volume de nitrato utilizado
apenas para a formação do AgCl, foi titulada uma solução em branco. Após determinado o
volume de nitrato utilizado para titular as amostras e a solução em branco, foi possível
determinar a quantidade de cloretos, por meio da Eq. 3.
mg (Vn−Vb).N.M.Vt
Cloretos (m2 .dia) = Va.S.T
(3)
Em que:
Vn é o volume em mililitros de AgNO3 utilizado para titulação da vela de número n;
Vb é o volume de em mililitros de AgNO3 utilizado para titulação da vela branca;
N é a concentração da solução-padrão de nitrato de prata usada na titulação em mol/L;
M é a massa atômica do cloro expressa em mg/mol;
Vt é o volume total da solução da vela n após a lavagem do cilindro e gaze, em mililitros;
Va é o volume de alíquota utilizado no ensaio, em mililitros;
S é a área da gaze exposta, em metros quadrados;
T é o tempo de exposição, em dias.
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metálicas, em categorias baseadas em dados atmosféricos e/ou em medidas de taxas de
corrosão de metais-padrão. De acordo com esta norma, a categorização da agressividade
ambiental devido à contaminação por íons cloretos, segue a Tabela 3, sendo “B0” a
categoria que representa o menor índice de contaminação (insignificante do ponto de vista
de ataque de corrosão) e “B3” a categoria que representa o maior índice de contaminação.
Taxa de Cloretos
Categoria Nível de Agressividade
(mg/(m2.d))
B ≤ 13 B0 Insignificante
13 < B ≤ 60 B1 Mediano
60 < B ≤ 300 B2 Agressivo
300 < B ≤ 1500 B3 Muito Agressivo
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Tabela 4 – Dados Climatológicos de Salvador/BA para o ano de 2015, Estação 83229 Ondina
Velocidade Direção
Temperatura média Umidade relativa Precipitação
Mês/ano do Vento predominante
(°C) (%) (mm)
(m/s) do Vento
jan/15 26,5 0,76 ENE 78,8 51,3
fev/15 26,8 0,91 NE 81,6 89,6
mar/15 27,2 0,77 NE 79,7 31,3
abr/15 26,4 0,78 SE 85,5 394,2
mai/15 24,7 0,96 SE 91,4 639,0
jun/15 23,8 0,72 SE 90,9 352,4
jul/15 23,7 0,53 SE 88,8 184,0
ago/15 23,4 0,79 ESE 84,7 87,5
set/15 24,7 0,76 NE 81,9 27,6
out/15 25,7 0,73 NE 78,9 16,6
nov/15 26,9 0,98 NE 77,7 3,2
dez/15 27,2 0,82 NE 76,8 15,7
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Para a estação de inverno, no Brasil (21 junho a 22 de setembro), obtiveram-se os teores
apresentados na Tabela 5, os quais foram usados para gerar o mapa de agressividade do
terreno quanto às categorias de contaminação por cloretos. Para isso, foi necessário que se
estimasse a categoria de contaminação dos “pontos cegos”, áreas não contidas na zona de
influência das velas, adotando-se para os mesmos a categoria da vela mais próxima. Assim,
a Fig. 4 apresenta o mapa de agressividade para o trimestre de inverno.
Tabela 5 – Concentração de íons cloretos medidos através do método da vela úmida para o
período de Inverno e classificação conforme NBR 14643:2001.
Teor de cloretos
(mg/m2.d) Categoria
Nº da vela
(NBR 14643)
Jun/Jul Jul/Ago Ago/Set Média Inverno
1 583,78 740,32 362,10 562,07 B3
2 1136,39 1707,33 571,72 1138,48 B3
3 488,72 1087,19 481,79 685,90 B3
4 262,31 391,98 263,71 306,00 B3
5 1347,42 1817,16 641,03 1268,54 B3
6 962,44 1471,40 412,48 948,77 B3
7 641,22 768,06 295,83 568,37 B3
8 583,78 985,13 258,64 609,18 B3
9 468,99 1203,67 520,67 731,11 B3
10 426,00 278,82 355,00 353,27 B3
11 153,83 263,66 245,12 220,87 B2
12 165,67 305,08 230,58 233,78 B2
Fig. 4 – Mapa de agressividade da estação Inverno com base nos teores de íons cloreto
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O mesmo procedimento, foi utilizado para a estação primavera (23 de setembro a 21 de
dezembro), no Brasil. Assim, foram obtidos os resultados apresentados na Tabela 6, que
geraram o mapa apresentado na Fig. 5.
Tabela 6 – Concentração de cloretos, medidos através do método da vela úmida para a estação
Primavera e classificação conforme NBR 14643:2001
Teor de cloretos
(mg/m2.d) Categoria
Nº da vela
(NBR 14643)
Jun/Jul Jul/Ago Ago/Set Trimestre Inverno
1 255,60 285,69 267,29 269,53 B2
2 246,13 274,70 292,35 271,06 B2
3 298,20 260,33 380,06 312,86 B3
4 142,00 24,79 83,53 83,44 B2
5 562,32 297,52 292,35 384,07 B3
6 323,76 194,40 178,20 232,12 B2
7 145,79 155,52 243,63 181,65 B2
8 151,47 136,93 - 144,20 B2
9 233,83 194,40 - 214,12 B2
10 64,37 121,71 - 93,04 B2
11 102,24 97,20 - 99,72 B2
12 48,28 74,38 126,69 83,12 B2
Fig. 5 – Mapa de agressividade da estação Primavera com base nos teores de íons cloreto
Pode-se observar que, em geral, foram obtidos altos índices de cloretos nas duas estações
estudadas, o que era esperado, já que a orla marítima de Salvador é reconhecida como uma
das mais agressivas do mundo, fato este comprovado no trabalho de Vilasboas (2013).
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É notável que a Estação Inverno apresentou maior agressividade se comparada à Estação
Primavera, o que pode ser explicado com análise dos dados climatológicos apresentados na
Tabela 3. Assim, pode-se atribuir os resultados encontrados: i) A maior agitação do mar,
fonte do aerossol marinho, durante o Inverno, devido à intensidade das chuvas neste
período; ii) As cheias e ressacas que, também associadas as chuvas, diminuíram em muito
a distância entre a fonte emissora de cloretos e o terreno; iii) A umidade do ar mais alta, no
inverno, gerando um ambiente mais propício ao transporte dos sais marinhos e; iv) A
mudança de direção predominante do vento de SE (Inverno) para NE na Primavera, o que
provocou um aumento na distância ao mar, fazendo com que muitos cloretos se
depositassem em áreas externas ao terreno;
Segundo MORCILLO et al. (2000), quanto mais intenso e duradouro o período chuvoso,
maiores serão as chances de se obter concentrações de cloretos mais altas, pois a chuva
provoca agitação no mar que, por conseguinte, gerará mais cloretos em suspensão na
atmosfera. Assim, pode-se supor que, caso a avaliação fosse iniciada em janeiro de 2015,
obteríamos as maiores concentrações de cloretos na estação Outono (dia 20 de março a 20
de junho, no Brasil) já que neste período foi registrada a maior chuva de Salvador desde de
2006 quando choveu aproximadamente 590 mm durante o mês de abril (CLIMATEMPO,
2015). Já a estação Verão (21 de dezembro 2014 a 19 de março de 2015, no Brasil)
apresentaria valores baixos de agressividade, porém, superiores aos da estação Primavera,
já que sua precipitação e umidade relativa foram maiores que deste período.
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Tabela 7 – Tipo de tinta e recomendações de uso de acordo com a categoria de agressividade
ambiental (ISO 129445)
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Tabela 9 – Correspondência entre classe de agressividade e cobrimento nominal
4. CONCLUSÃO
A partir dos resultados obtidos, pode-se concluir que: i) O terreno analisado apresentou as
mais altas categorias de corrosividade por cloretos da NBR 14643, a B2 e B3, o que era de
se esperar, já que o clima úmido e a proximidade do mar incitam altas concentrações de
cloretos na atmosfera; ii) A avaliação da agressividade ambiental, na fase de projeto, em
empreendimentos no litoral brasileiro, pelo método da vela úmida, se torna fundamental para
o desenvolvimento de um projeto de durabilidade eficaz, com o objetivo de aumentar a vida
útil da estrutura e dos equipamentos do empreendimento e; iii) A metodologia proposta para
avaliação do microclima litorâneo mostrou-se eficaz, podendo contribuir de forma decisiva
para o aumento da durabilidade de novas edificações na região.
5. REFERÊNCIAS
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Chloride Deposition Rate by Wet Candle Method.
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NBR 6211: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. 2001. Corrosão atmosférica –
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Vilasboas, Jose. 2013. Estudo dos mecanismos de transporte de cloretos no concreto, suas inter-
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