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n • ~
a coerência intelectual do
evangelicalismo
Alister McGrath
é r
SHEDD
P U B L I C A Ç Õ E S
1
N o fim, é a própria hum anidade que é “D eus”, não algum a realidade objetiva
externa. N o desenvolvimento marxista do tem a de Feuerbach, as origens da
experiência religiosa interpretada com o “D eus” se acham na alienação socio-
econôm ica.53 E desta form a que M arx com enta sobre a abordagem feuerba-
chiana à alienação:
29
Deus não quer ser conhecido a não ser por intermédio de Cristo; nem
pode ele ser conhecido de qualquer outro modo. Cristo é o descendente
prometido a Abraão; nele, Deus cumpriu todas as suas promessas. Por
tanto, somente Cristo é o meio, a vida, e o espelho pelo qual vemos Deus
e conhecemos sua vontade. Por meio de Cristo, Deus declara seu favor e
misericórdia para conosco. Em Cristo, vemos que Deus não é um mestre
irado e um juiz, mas sim um pai gracioso e bondoso, que nos abençoa,
isto é, que nos salva da lei, do pecado, da morte, e de todo o mal, e nos
oferece a justiça e a vida eterna mediante Cristo. Este é um conhecimento
certo e verdadeiro de Deus; um a persuasão divina que não falha, mas
retrata (depingit) Deus mesmo num a forma específica, à parte da qual não
há nenhum Deus.70
mentárias, com este últim o envolvendo a plena consideração em que era tida a
:.m que alta estima de Jesus, já estabelecida e aceita dentro da devoção cristã.93 O fato
i rxolo- de o apóstolo Paulo citar hinos cristológicos pré-paulinos é sinal da aceitação
: : seus desses cânticos sacros dentro das com unidades a que ele escrevia (ou de onde
:>assem ele escrevia), e da formulação, ainda nos prim órdios da história cristã, da acen
:aa que tuada cristologia, semelhante à que seria endossada e exposta por Paulo. Já foi
sugerido que o uso de kyrios para referir a Cristo e sua divindade tem o objeti
vo de atribuir o term o ao influxo de grandes núm eros de gentios pagãos nos
: ;:a círculos cristãos.94 N o entanto, a evidência para isso é um tanto frágil; o uso
r>- do term o neste sentido exaltado parece ter suas origens com os cristãos judeus
-j^ originários da Palestina,95 e não pode ser atribuído a m al-entendidos ou a más
em representações pagãs.
20 O caráter fortem ente doxológico da estim a evangélica de Jesus C risto
provavelmente pode ser visto no seu grau mais m arcante nos grandes hinos
~ ;a desta tradição, particularm ente os que derivam de fontes pietistas.96 A adoração
-1 JU de Cristo com o o D eus que se hum ilhou para redim ir a hum anidade está ali
m isturada à reflexão sóbria sobre o custo daquela redenção e a m otivação que
ela oferece para a vida cristã autêntica e para a evangelização. A coerência do
entendim ento evangélico da im portância de Cristo am plia a m aneira com que
ele é cultuado e adorado, assim com o o m odo por que ele é entendido teologi
cam ente.
."■mo a Fica claro tam bém que a ênfase evangélica a respeito do senhorio de Cris
e Deus to tem implicações para o evangelismo. U m a vez mais, a coerência do entendi
rarcial m ento evangélico a respeito de Cristo torna-se clara; o reconhecim ento da
; um a identidade de Cristo leva diretam ente à proclamação de Cristo para o m undo
Deus; — ou melhor, para o seu m undo, do qual ele é o Criador, Redentor e Senhor.
Exploraremos este ponto na seção final desta análise.
refere
mente 5 . A importância querigmática de Jesus Cristo
eve ser
Jesus C risto é proclam ado ao m undo. Esta ênfase forte na proclamação
: Jesus
(do grego: kêrygma) de Cristo é integral para o entendim ento evangélico de
-osky-
sua pessoa e lugar. H á um a natureza fortem ente querigm ática no Novo Testa
urreto
m ento, onde Cristo é visto com o alguém para ser proclam ado e para quem
amosa
um a resposta é esperada. C om efeito, o caráter querigm ático do testem unho
nstãos
de Cristo encontrado no Novo Testam ento é tal, que M artin Káhler foi levado
a declaíar que “o C risto real é o Cristo pregado”.97 O conteúdo da proclamação
ara do
cristã é Jesus Cristo. Por exemplo, a proclamação do evangelho de Paulo enfo
s cris-
ca a pessoa de Cristo (G1 1.16), e, mais especificamente, o Cristo crucificado e
mente
ressurreto dos m ortos (IC o 1.23; 15.12). Nas cartas aos Coríntios, Paulo faz
jtesta-
42
: ntex-
~ o de A AUTORIDADE DA ESCRITURA
t com
: stura
fultou
no
r:a de
unda-
upada
r.do' a N a D ieta de W orm s (18 de abril de 1521), M artinho Lutero declarou de
Io de m aneira célebre: “M inha consciência é cativa da palavra de D eus.”110 D e ma-
um a neira bem semelhante, o evangelicalismo já se viu cativo dessa m esm a palavra
;pecí- de Deus. O princípio da suficiência da Escritura é de im portância central para
.ece e o evangelicalismo. A declaração da Confissão de W estm inster resume o con-
ir dos senso evangélico sobre essa questão im portante:
dade
?éo Todo o conselho de Deus, com respeito a todas as coisas necessárias para
Vm a sua glória, a salvação do homem, a fé e a vida, ou está expressamente
colocado na Escritura, ou, por ser um a boa e necessária conseqüência,
d er
pode ser deduzido da Escritura, à qual nada em tempo nenhum deverá ser
acrescentado, quer por novas revelações do Espírito, ou por tradições de
hom ens.111
ra ada
Talvez seja neste ponto que o evangelicalismo m ostra mais claram ente sua
final
continuidade teológica e espiritual com a Reforma, e sua preocupação de asseg
: riga-
urar que a vida e o pensam ento da com unidade cristã estão fundam entados em,
;ções
e continuam ente re-avaliados à luz da Escritura.112 C ontudo, isso não pode ser
'.o de
entendido como significando que o evangelicalismo é “um a religião de um livro”.
í :o,e
Antes, o evangelicalismo enfoca-se na pessoa e obra de Jesus Cristo, afirm ando
::>na-
a centralidade e soberania de Jesus Cristo em todas as matérias de fé e vida.
.ulta-
C ontudo, há um a ligação inextricável e íntim a entre a palavra de Deus en
fpelo
carnada e a palavra de Deus na Escritura, em que Jesus Cristo torna-se conhe
:= da
cido para nós po r m eio do testem unho da Escritura, que por sua vez está
centralizado em sua pessoa e obra. Esse ponto é tão im portante que podem os
examiná-lo em m aior detalhe.
46
A E scritu ra e Je s u s Cristo
A Escritura está literalm ente centrada em Cristo e Cristo está nela en
volvido. Só por m eio da Escritura ele pode ser conhecido. Q uando interpreta
da corretam ente, a E scritura conduz a C risto, que, só po r interm édio da
Escritura pode ser apropriadam ente conhecido. C om o Lutero declarou, Cris
to é “o ponto m atem ático da Escritura Sagrada”,113 assim com o a Escritura “é
as faixas em que Cristo foi envolvido e a m anjedoura em que foi colocado”.114
João Calvino destacou um ponto semelhante: “Isto é o que devemos buscar
[...] po r meio de toda a Escritura: conhecer Jesus Cristo verdadeiram ente, e as
infinitas riquezas nele incluídas e que são oferecidas a nós por Deus, o Pai.”115
C om o declarou o mais im portante teólogo da Igreja Reform ada Holandesa,
A braham Kuyper (1837-1920), o único objetivo da fé salvadora é “Cristo nas
vestes da Sagrada Escritura”.116
Apesar do alto conceito em que tem a Escritura, o evangelicalismo tem
resistido à tentação de identificar o próprio texto da Escritura com revelação.117
A Escritura é vista como um canal por intermédio do qual Deus se auto-revela
em Jesus Cristo. Em bora a Escritura seja portadora dessa auto-revelação em Cristo,
ela nao deve ser identificada diretam ente com essa auto-revelação. Ela não é
Jesus Cristo. C ontudo, como Kuyper manifestou com tanta propriedade, não
podemos encontrar Cristo, sob nenhum a forma, senão a que é encontrada na
Escritura. A fé aceita a Escritura como testem unho para Cristo, e submete Cris
to como aquele de quem a Escritura fala.118 Cristo é, portanto, conhecido so
m ente conform e é proclamado na Escritura; subseqüentemente, pela obediente
e responsável proclamação da igreja cristã. H á um a dimensão fortem ente trini-
tariana no entendim ento evangélico de revelação, especialmente evidente em
sua afirmação do papel distinto do Espírito Santo.119 C ontudo, a compreensão
evangélica de autoridade da Escritura enfoca-se particularm ente na pessoa e obra
de Jesus Cristo.
C om o vimos, no centro do evangelicalismo reside a convicção de que
D eus se fez conhecido em e por m eio de Jesus Cristo. Este não é um argum en
to especificamente evangélico: é a herança com um da igreja cristã. Karl Bar th
é apenas um dos seus grandes teólogos e faz a seguinte afirmação:
Quando a Escritura Sagrada fala de Deus, ela não dá margem a que nossa
atenção ou pensamentos divaguem aleatoriamente. [...] Quando a Escritu
ra Sagrada fala de Deus, leva-nos a concentrar nossa atenção e pensamen
tos em um único ponto e no que há para ser conhecido naquele ponto.
[...] Se procuramos saber mais com respeito a esse único ponto, sobre o
qual, de acordo com a Escritura, nossa atenção e pensamentos devem e
47
Para mim pessoalmente, certo dia no início de agosto daquele ano se destaca
como um dia negro, no qual noventa e três intelectuais alemães, entre os
quais fiquei horrorizado em descobrir quase todos os meus até aqui vene
rados mestres de teologia, publicaram uma profissão de apoio à política
de guerra de Kaiser W ilhelm II e seus conselheiros. Estupefato diante de
sua atitude, reconheci que eu não podia mais seguir a ética e a dogmática
deles, nem seu entendimento da Bíblia e da história, e que a teologia do
século XIX nao tinha mais nenhum futuro para m im .136
M inha argum entação é que não basta discutir a necessidade de arrancar a Es
critura dos que a aprisionam dentro das limitações severas de um a abordagem
fundam entalista. M uitas vezes, os libertadores da Escritura passam a encerrá-
la im ediatam ente dentro de sua visão de m undo. Isso não é libertação; isso é
m eram ente um a troca de ditadores, semelhante à que foi experim entada pelos
que tiveram a desventura de viver nas regiões orientais da A lem anha em 1945,
e que se viram libertados de H itler apenas para descobrir que tinham sido
salvos por Stalin.
A b o rd a g en s riva is à autoridade m elhor m oc : J
co,147 o lib e rai
Para alguns escritores, a noção de “a autoridade da Escritura” é inaceitável
ocidental tem :
por causa de um com prom etim ento anterior com a autoridade de alguma coisa
só terá de a rre
diferente. Em parte, o compromisso evangélico com a autoridade da Escritura
pode ser levaaa
representa um a avaliação cuidadosa e crítica de abordagens rivais à autoridade, e
ra ocidentá- sI :
um a afirmação de que a Escritura deve ser vista como detentora de m aior peso
Além c:í;
teológico e espiritual do que essas abordagens. N o que se segue, exploraremos
ser s u s te n ta i: i
quatro abordagens rivais, sujeitando-as à avaliação crítica. Cada um desses con
questionarem:;:
ceitos é complexo e digno de discussão por direito próprio; lamentavelmente,
há um só r : r.;
um a análise assim, da extensão de um livro, iria além do escopo do presente
com o o que a,
estudo. As quatro áreas a serem discutidas não podem ser tratadas com um a
cidade: “cuuur
am plitude que satisfaça àqueles que têm preocupação com certa metodologia.
sociedade num.
São estas as quatro áreas em questão:
crenças e vu_; r
1. C ultura verdadeiras
2. Experiência turalm ente r.: n
3. Razão m o tinha urr. :
14. Tradição tornou-se v :r:-
As duas prim eiras são características de abordagens “liberais” para a teolo da sociedace :■
gia; aflitas com a particularidade da fé cristã, elas tentam basear teologia em do século X • .
fundam entos ditos “universais”. Com eçam os considerando que autoridade se cultura; agara
pode atribuir à cultura. dos por uma :
pluralidade c :'
1. Cultura
liberdade m a a.
Alguns escritores liberais têm argum entado que a teologia deve buscar sua U m excue
legitimação e justificativa pública engajando-se com a cultura ocidental. U m m o cultura* : r
excelente exemplo dessa abordagem pode ser encontrado nas obras de G ordon pode ser e m ::
Kaufm an, que argum enta do seguinte m odo: volvimentc a ;
tava ter des:: :
As raízes da teologia não se restringem à vida da igreja ou a dogmas ou revelaram cue
documentos especiais venerados na igreja, nem podem elas ser encontra
tura ocidemu-
das em algo tão rudim entar como a “experiência crua”. Antes, serão en
da tentativa
contradas na(s) linguagem(ns) comum(ns) da cultura ocidental em geral.146
juízos ou m ru
valores e erm a
A inda assim esta afirmação levanta perguntas fundam entais de tal m agnitude,
tem sido ter aa.
que essa abordagem à teologia afunda antes de sair do porto. Por que cultura
tensões à u m e
ocidental? O que poderia concebivelm ente justificar essa etnocentralidade? Algo
espécie de ar r.
alarm antem ente parecido com um bruto imperialismo cultural se aninha den
samente a
tro dessa afirmação, que elim ina o resto da cultura global com o teologica
m ente insignificante. C om o os liberais britânicos do século XIX criam que o
57
m elhor m odo de aperfeiçoar o m undo era trazê-lo todo sob o governo britâni
co,147 o liberalismo teológico parece presum ir que só um a perspectiva liberal
aceitável
ocidental tem qualquer viabilidade global. O cristianismo asiático e africano
t u coisa
só terá de aprender com os seus superiores ocidentais. Essa abordagem não
tritura
pode ser levada a sério no m undo de hoje, onde as falhas e limitações da cultu
iade, e
ra ocidental sao evidentes, até para os que vivem dentro de seus limites.
:: r peso
Além disso, o apelo ingênuo à “cultura ocidental” no singular não pode
riremos
con- ser sustentado num a cultura pluralista m oderna. A abordagem liberal está in
questionavelm ente na sua m aior credibilidade dentro de um contexto em que
Lmente,
há um só ponto de vista característico da sociedade com o um todo — tal
•rríente
& com o o que parece ser presum ido pela expressão que desarm a pela sim pli
rr. uma
cidade: “cultura ocidental”. O sociólogo Peter L. Berger observa que “toda
íi-oçia.
sociedade hum ana tem seu corpus de sabedoria oficialmente reconhecido, as
crenças e valores que a m aioria das pessoas aceita como auto-evidentem ente
verdadeiras”. H ouve um ponto em que a sociedade ocidental foi tanto cul
turalm ente homogênea como declaradamente cristã. Nesse contexto, o liberalis
m o tinha um apelo considerável. Essa abordagem pura e meticulosa, porém ,
tornou-se virtualm ente impraticável pelo pluralismo crônico intelectual e moral
reoio- da sociedade ocidental m oderna. N o passado — por exemplo, na Inglaterra
em do século XVI — , pode ter existido um só conjunto de crenças e valores num a
me se cultura; agora, há m uitas crenças e valores com petitivos em oferta, incentiva
dos por um a constituição política que chega a ver a tolerância e cultivo de
pluralidade como um alvo nacional em si m esmo, consoante com a busca de
liberdade individual.148
c.~ >ua. U m excelente exemplo de um a obra relevante para ilustrar esse imperialis
- Um m o cultural ocidental, enquanto reivindicando estabelecer norm as universais,
>rion pode ser encontrado na análise de Lawrence Kohlberg a respeito do desen
volvim ento de estágios morais da infância à idade adulta.149 Kohlberg acredi
tava ter descoberto um m odelo de cultural universal; seus num erosos críticos
revelaram que seus “estágios m orais” só se referiam a hom ens brancos na cul
tura ocidental pós-Ilum inism o.150 A m esm a falácia fundam ental está por trás
da tentativa liberal de globalizar ou totalizar com base na cultura ocidental;
juízos ou verdades supostam ente “universais” são apresentados com base de
valores e crenças particulares altam ente etnocêntricas. O liberalismo ocidental
írura tem sido forçado a ceder sua particularidade cultural, e a abandonar suas pre
~_^0 tensões à universalidade. As implicações teológicas desta evolução para qualquer
espécie de apelo à “cultura” como recurso teológico fundam ental serão doloro
sam ente óbvias.
;e o
U m liberalismo teológico desse ripo, portanto, encontra o próprio cresci
m ento à deriva, perdendo o que foi outrora seu ancoradouro certo e seguro.
Q ue senso há na criação de um apelo universal à “cultura” quando não existe
um a cultura universal a que se apelar? Berger com enta sobre as enorm es di
ficuldades que a iniciativa liberalista teológica enfrenta, na m oderna cultura
pluralista ocidental:
A análise sociológica de Berger torna claro que alguns pontos de vista serão “a
sabedoria aceita em um m eio social e a com pleta tolice, em outro”. O u, dito
de outra forma, não é um m odo universal de pensar ou estipular valores; é
socialmente localizado, num a classe ou grupo social específico. Mais cedo no
tam os com o o “fundam entalism o” é m uitas vezes ligado com um endereço
sociológico que pareceria algo como “classe m édia baixa do extremo sul”. O
liberalismo tem tradicionalm ente ocupado um endereço sociológico um tanto
diferente: o da elite cultural. O s com entários perceptivos de Berger merecem
aqui ser estudados de perto:
É, pois, potencialm ente sem sentido falar ;sobre “tornar o cristianismo rele
vante para o m undo m oderno” ou para “a cultura ocidental”. Isso implica em
59
::esci- um a universalidade teórica para com “o m undo m oderno” e para com a “cul
rguro. tura ocidental” que está ausente na realidade. Toda tentativa de conform ar o
existe cristianismo às crenças de um grupo social dem onstra ser esse grupo irrele-
-^ vante para o outro. O paradoxo subjacente de toda iniciativa liberalista é que
:ui.rura para alguém que tenha o evangelho como “relevante”, há mais alguém para
quem ele é irrelevante.
U m problem a mais fundam ental, entretanto, está relacionado com a in
sistência liberalista tradicional que quer que a teologia cristã se relacione com
“m odos m odernos de pensar” ou “valores aceitáveis à nossa cultura”. N um a
cultura m onolítica, essa estratégia é bastante direta, quaisquer que sejam suas
deficiências teológicas. N o entanto, num a sociedade abertam ente com prom is
sada com o pluralismo, essas exigências degeneram em chavões vazios. Que racio
nalidade, ou que modos de pensar? Que valores? O filósofo Alasdair M aclntyre,
reagindo contra a retórica simples sobre “racionalidade” e “justiça”, provocati-
vam ente deu o título a seu célebre livro Whose Justice? Which Rationality? [Justiça
de quem? Que racionalidade?] debilitando severamente os fundam entos intelec
tuais do liberalismo. Além do mais, o passo célere de m udança cultural no
;:ío a O cidente resulta em acomodação cultural de um obsoletismo rápido; a sabe-
c ^ lto doria da m oda atual rapidam ente torna-se a m oda descartada de amanhã.
cres; e Para o historiador de teologia cristã nos últimos cinqüenta anos mais ou
c: no- menos, o m esm o m odelo pode ser visto emergir persistentem ente: o “espírito
cereço da época” acaba por mostrar-se bastante efêmero, conduzindo a um a janela
ò
■ O. igualmente breve de credibilidade para teologias que se baseiam em costumes e
: :m to ' práticas sociais contemporâneos. Foi essa observação que m otivou o comentário
em sábio de William Inge, ex-deão da Catedral de S. Paulo, em Londres: “Se você se
casa com o espírito de sua geração, você será um viúvo na próxim a.”153 Assim, as
posições radicais aparentem ente asseguradas da década de 1960 vieram a ser
derrubadas durante a década de 1980, justam ente com o o surgim ento do pós-
m odernism o reflete a credibilidade seriamente desgastada de um a racionalidade
universal que um dia foi vista com o central para o m étodo teológico “liberalis
ta”. O notável escritor liberal judeu Eugene B. Borowitz é um crítico que pôde
perceber essa tendência fatalm ente vulnerável da teologia liberal. Exam inando
as ruínas do pensam ento religioso liberal, tanto judaico com o cristão, Boro
witz destaca a vulnerabilidade — na verdade, a indefensibilidade — de suas
crenças centrais:
N o entanto, talvez a crítica mais fundam ental de todas as que foram aqui
expostas refira-se à cultura já “dada”. C om o vimos, a cultura alemã tornou-se
dom inada pelo socialismo nacional durante a década de 1930. O s que argu
m entaram que a teologia deveria receber suas sugestões ou buscar seus alicerces
na cultura logo se viram argum entando que a teologia cristã deveria responder
à situação totalm ente nova criada pelo surgim ento do socialismo nacional,
assum indo idéias e valores nazistas (ver p. 51-52). Em anuel H irsch argum en
to u que, visto que “o socialismo nacional, baseado no direito de m udança
histórica, tornou-se a form a auto-evidente e norm ativa de vida para todos os
alemães”, o cristianismo na Alemanha tinha a obrigação de incorporar essas nor
mas à sua vida e doutrina.155 M uito parecido é o ponto destacado em situações
subseqüentes, com exigências para que o cristianismo conforme-se à tendên
cia cultural mais nova, presum indo-se que qualquer direção que a cultura tom e
será, de algum m odo, o resultado de providência divina, e de im portância
obrigatória. C om o o surgim ento do nazism o e stalinism o já têm tornado
m uitíssim o claro, tendências culturais precisam ser criticadas. N ão se pode
perm itir que sejam normativas. E isso exige que o cristianismo baseie-se em
algo que transcenda particularidades culturais — especificamente, a auto-reve-
lação de Deus.
2 . Experiência
“Experiência” é um term o impreciso. As origens da palavra sao relativa
m ente bem entendidas; é derivada de experientia, palavra latina que pode ser
interpretada com o “o que resulta da viagem através da vida {ex-perientiaf.
Nesse senso lato, isso significa “um corpo de sabedoria acumulada, que surge
por meio de um encontro de primeira m ão com a vida”. Q uando se fala de “um
professor experiente” ou de “um médico experiente”, isso implica em que o
professor ou o médico tenha adquirido sua perícia por aplicá-la em primeira
mão. C ontudo, o term o desenvolveu um sentido adquirido, que nos diz respeito
particularm ente aqui. Veio a referir-se à vida interior dos indivíduos, na qual
aqueles indivíduos se tornam apercebidos de seus sentim entos e emoções subje
tivos.156 Relaciona-se ao m undo interno e subjetivo da experiência, com o opos
to ao m undo externo da vida cotidiana. U m a série de escritos, incluindo o
celebrado estudo de W illiam James, The Varieties ofReligious Experience [As va-
67
: rreci- riedades da experiência religiosa] (1902), que tem enfatizado a im portância dos
: ssíveis aspectos subjetivos da religião em geral, e do cristianismo em particular. O
:: men- cristianismo não é sim plesm ente sobre idéias; é tam bém sobre a interpretação
e transform ação da vida interior do indivíduo. Essa preocupação com experiên
cia hum ana é associada particularm ente com existencialismo, que tem procura
■: : m aqui
do restaurar um a percepção da im portância da vida interior de indivíduos
L ::rnou-se
tanto para a teologia com o para a filosofia.157
eue argu-
D uas abordagens principais podem ser observadas dentro da teologia cris
-s i-:cerces
tã quanto à questão do relacionam ento da experiência com a teologia:
,:í?Donder
1. A abordagem que se tornou especialmente associada com os escritores
1 -»icionaI,
liberais, que argum enta que a experiência provê um recurso fundam ental para
~ :ru m en -
a teologia cristã.
~ „ dança
2. A abordagem tradicional, associada ao evangelicalismo, que argum enta
.1 ::-dos os
que a teologia cristã oferece um a estrutura interpretativa pela qual a experiên
' ií5is nor-
cia hum ana pode ser interpretada.
: s::uações
Com eçaremos nossa análise dessas opções considerando a prim eira posição,
r :endên-
que vê a experiência h u m an a com o explicam, algo que possui im portância
r_ra tome
explanatória ou reveladora.
r : rrância
A idéia de que a experiência religiosa hum ana pode atuar com o um recur
l :jrn a d o
so fundam ental para a teologia cristã tem atrativos óbvios. Sugere que a teolo
: .; í pode
gia cristã trata da experiência hum ana — algo com um a toda a hum anidade,
c:c-se em
em vez de um bem preservado exclusivo de um pequeno grupo. Para os que se
i_:> rev e-
sentem embaraçados pelo “escândalo da particularidade” a abordagem tem
m uitos méritos. Sugere que todas as religiões do m undo são basicamente res
postas hum anas à m esm a experiência religiosa — a que m uitas vezes é possível
se referir com o “um a experiência de cerne do transcendente”. Teologia é, po r
rr.ativa-
tanto, a tentativa cristã de refletir sobre essa experiência hum ana com um , sa-
r : de ser
bendo-se que a mesm a experiência está por trás das outras religiões no m undo.
r:-:-::ia)”.
Voltaremos a esse ponto mais tarde, ao tratar da questão do relacionam ento do
i _r surge
cristianismo com as outras religiões.
i :e "um
Esta abordagem tem tam bém consideráveis atrações para a apologética
rr. que o
cristã, como os escritos de m uitos teólogos estado-unidenses recentes, espe
r nmeira
cialmente Paul Tillich e D avid Tracy, tornam claro. N aquilo que os hum anos
: respeito
com partilham um a experiência com um , quer optem ou não por vê-la como
n qual
“religiosa”, a teologia cristã pode se dirigir a essa experiência com um . O proble
es subje-
m a de concordar num ponto inicial com um é assim evitado; o ponto-inicial já
o pos
é fornecido, na experiência hum ana. A apologética pode dem onstrar que o
tando o
evangelho cristão pode fazer sentido da experiência hum ana com um . Provavel
f va
m ente, esta abordagem é vista em sua m elhor apresentação nos sermões de Paul
Tillich, The Courage To Be [A coragem para ser], que atraíram considerável atenção religiosa é forma'j
após sua publicação, em 1952. Para muitos, pareceu que TillicK obtivera êxito giosa” é conceirua
em correlacionar a proclamação cristã com a experiência hum ana com um .158 ficar suas caraeaei
N o entanto, há dificuldades aqui. A mais óbvia delas é a m uito pouca comunidade : : n
evidência em pírica para um a “experiência de cerne em com um ” através de que “as várias re_:í
toda a história e cultura hum ana. A idéia é facilm ente postulada, e virtual do Ú ltim o” e:
m ente impossível de ser verificada. Essa abordagem encontrou sua expressão mesmo um d c em
mais m adura e sofisticada na “Teoria de D outrina Experimental-Expressiva”, dificuldade em .<
para usar um term o empregado pelo distinguido teólogo de Yale, George L ind Com o Lindbe:.-:.
beck. E m sua obra The Nature ofD octrine [A natureza da doutrina] (1984), a possibilidace - :■
Lindbeck oferece um a análise im portante da natureza da doutrina cristã.159 mesma fé, em r
U m dos m uitos m éritos desse livro é o debate que tem iniciado com respeito a digna de créd::: s
esse aspecto injustam ente negligenciado da teologia cristã, que, recentem ente, linguagem e ; : ~
veio a assumir nova im portância por causa do im pacto do m ovim ento ecu articulações ce. :>
m ênico. Tentativas a;
Lindbeck sugere que as teorias de doutrina podem ser divididas em três cia inerente a ve;
tipos gerais. A teoria proposicional-cognitiva poe ênfase nos aspectos cogniti cia em pírica ;
vos da religião, enfatizando a m aneira em que as doutrinas funcionam como religiosos são :e>
reivindicações da verdade ou proposições informativas. A teoria experimental- que linguagem e
expressiva interpreta as doutrinas como símbolos não-cognitivos de sentim en pectativa de :a_ e
tos ou atitudes hum anas interiores. U m a terceira possibilidade, defendida pelo form a poderia ai
próprio Lindbeck, é a abordagem cultural-lingüística à religião. Lindbeck as empírico e o . : :
socia este m odelo a um a teoria de doutrina de “regra” ou “reguladora”. E a D a mesma :
crítica que Lindbeck faz à segunda dessas teorias que é de interesse particular colocada acima,
para nós a esta altura. observáveis. Ass;
A teoria “experimental-expressiva”, segundo Lindbeck, vê as religiões, in dessa abordaee-
cluindo o cristianismo, como manifestações públicas e culturalm ente condi “experiência
cionadas, e afirmações de formas pré-lingüísticas de consciência, atitudes e apreensões ex:>:;
sentim entos. Em outras palavras, há algum a “experiência religiosa” universal tende a “exper.e;
com um , que a teologia cristã (como acontece com outras religiões) procura nidade de te.
expressar em palavras. Experiência vem prim eiro; teologia surge mais tarde. m aneira comum
Conform e Lindbeck argum enta, a atração dessa abordagem à doutrina é fun Enquanm a
dam entada em um núm ero de características do pensam ento ocidental de fins constante atra e
do século XX. Assim, um a preocupação contem porânea com o diálogo inter- estiver articu.aa,
religioso em presta plausibilidade à visão de que as várias religiões são expressões ará a nao ccm e
diversas de um a experiência de cerne com um , tal com o um “cerne isolável de questionável: a;s:
encontro” ou um a “percepção não m ediada do transcendental”. de cultura, c.as e
A principal objeção a essa teoria, assim explicada, é sua óbvia incorreção tirar a c o n c m ú
fenomenológica gritante. Com o Lindbeck sugere, a possibilidade de experiência m ente — ela va:
63
'■'t. ãtençao religiosa é form atada por expectativa religiosa, de m odo que a “experiência reli
mera êxito giosa” é conceitualmente derivativa, se nao vazia. “E difícil ou impossível especi
r— ■- r ^158
ficar suas características distintas, e mesmo que isso seja feito, a afirmação da
m : pouca com unidade torna-se lógica e empiricamente inexpressiva”.160 A afirmação de
mmvés de que “as várias religiões são simbolizações diversas de um a só experiência de cerne
; - irtual- do U ltim o”161 é no final um axioma, um a hipótese não verificável — talvez até
-m ressão mesmo um dogma, no sentido pejorativo do term o — não menos por causa da
imessiva , dificuldade em localizar e descrever a “experiência de cerne” de que se trata.
íme Lind- Com o Lindbeck afirma corretamente, isso pareceria sugerir que há “pelo menos
r 1984), a possibilidade lógica de que um budista e um cristão podem ter basicamente a
m stã .159 mesma fé, em bora expressa m uito diferentemente”.162 A teoria só poderia ser
mmeito a digna de crédito se fosse possível isolar-se um a experiência “de cerne” com um da
m mente, linguagem e com portam ento religiosos, e dem onstrar que esses dois últimos são
mm: ecu- articulações de, ou respostas à primeira.
Tentativas de avaliar essa teoria são totalm ente frustradas por sua resistên
s em três cia inerente à verificação ou falsificação. Enquanto não há disponível evidên
i m-gniti- cia em pírica que nos perm ita avaliar a sugestão de que linguagem e ritos
tm como religiosos são resposta a um a experiência religiosa anterior, a possibilidade de
-.mental- que linguagem e ritos criem aquela experiência (por exemplo, suscitando ex
mmmen- pectativa de tal experiência, e indicando de que m aneira ela pode surgir, e que
pelo form a poderia assumir) é pelo m enos igualm ente provável, nos dois níveis, o
:ck as- empírico ,e o lógico.163
É a D a m esm a forma, a sugestão de que a experiência de indivíduos deve ser
licular colocada acima, ou antes, da religião com um em si parece inverter prioridades
observáveis. Assim, Schleiermacher, que poderia ser visto com o o arquétipo
:: es, m- dessa abordagem experim entalm ente fundam entada à teologia, não entende
e eondi- “experiência” com o designando as indiferenciadas emoções idiossincráticas ou
imdes e apreensões existenciais de cada crente individualm ente; ao contrário, ele en
immrsal tende a “experiência” baseada na m em ória, testem unho e celebração da com u
rm c u ra nidade de fé.164 A im portância teológica da experiência cristã é articulada de
mrde. m aneira com um , não individualm ente.
í . e fim- E nquanto a noção de um a experiência de cerne com um que perm anece
í m fins constante através da diversidade de culturas hum anas e do fluxo da história
c mter- estiver articulada e expressa num a variedade espantosa de maneiras, continu
messões ará a não convencer de m odo nenhum . Em piricam ente, a idéia é altamente
U-. eí de questionável: assim, Lonergan sabiamente admite que experiência religiosa varia
de cultura, classe e individuo,iL" enquanto aparentem ente sendo relutante para
c rreção tirar a conclusão que suas concessões sugerem, por mais que experim ental
mencia m ente — ela varia de um a religião para outra. Enquanto a tradição doutrinária
64
da igreja está publicam ente disponível para análise, perm itindo, no entanto,
que seu caráter alegadamente “im utável” seja acessado criticam ente, a experiên
cia religiosa perm anece um conceito subjetivo, vazio e nebuloso, cuja con
tinuidade e constância diacrônicas acham-se necessariamente além da verificação
ou — com o parece ser o resultado mais provável — da falsificação.166
As linhas principais da crítica de Lindbeck sobre teorias experimentais de
do utrina que trata de d o utrina com o que lidando com experiência ubíqua
pré-refietiva particular com um a todas as religiões são oportunas e persuasivas.
Três outras críticas de tais teorias podem ser acrescentadas, com o a seguir.
Em prim eiro lugar, devemos notar a insistência enfática dentro de pelo
m enos um a linha da tradição cristã: experiência e realidade são, pelo menos
potencialm ente, para ser opostas de m aneira radical. A doutrina não expressa
nem articula necessariamente a experiência, mas pode contradizê-la. Talvez a
mais notória instância dessa atitude seja encontrada na “teologia da cruz”, de
M artinho Lutero,167 em que é colocada ênfase sim ultaneam ente na im portância
da experiência religiosa na vida crista autêntica e na falta de sua confiabilidade
com o recurso teológico. O s escritos de um “teólogo da glória” e um “teólogo
da cruz” — para usar as expressões de Lutero — sobre a “expressão que busca
experiência” dão toda a aparência de ser m uito diferentes. C ontudo, ambos
requerem ser classificados sob o m esm o-m odelo “experimental-expressivista”.
Em segundo lugar, há um a aparente suposição de que a presente experiên
cia de um indivíduo, seja qual for ela, constitui-se no prim eiro dado da re
ligião. Essa ênfase parece sugerir que nenhum a distinção fundam ental pode
ser feita entre a experiência de um indivíduo que, deliberada e conscientemente,
determ inou rejeitar um a religião e alguém que da mesma forma, deliberada e
conscientem ente, determ inou abraçar outra. Por exemplo, um a ocorrência cada
vez mais com um dentro da situação religiosa global, mas que traz im portantes
raízes nos estágios formativos da tradição cristã é a conversão.168 E o caso de
um indivíduo, criado dentro de ambiente puram ente secular e disposto a um
ateísmo materialista, que subseqüentemente descobre o cristianismo e se torna
um “cristão nascido de novo”. Será que a experiência desse indivíduo nas duas
situações é a mesma? C ertam ente, é inconcebível que sejam idênticas, ou mes
m o similares, particularmente, se um a das mais experimentalmente orientadas
tradições cristãs está im plicada na experiência de conversão. Além disso, estu
dos psicológicos empíricos têm revelado que indivíduos religiosos “com prom is
sados” têm qualidades psicológicas e atitudes sociais m arcadam ente diferentes
dos que assumem um a posição m eram ente “consensual”.169 Em outras pala
vras, os que ativam ente escolherem assumir um com prom isso de fé são bastante
diferentes em seus pontos de vista dos que sim plesm ente estão de acordo em
65
r : entanto, atitudes e tendências sociais, das quais a religião é um a. Essas diferenças sao
: i experiên- expressas tanto no plano experimental como no cognitivo — por exemplo, a
>: cuja con- m aneira em que a oração é experim entada e interpretada.170 C ontudo, a abor
:r verificação dagem experimental-expressivista para a religião parece deixar de ter a estrutu
ra conceituai para distinguir essas situações, por causa do que Lindbeck cham a
r.tientais de de “tendências de homogeneização associadas ao expressivismo-experimental
r c r ubíqua liberal”.171 A “experiência” é assim tratada por liberalismo com o algo hom ogê
,r ersuasivas. neo, com um e imutável, não afetado por alterações em afiliaçÕes religiosas —
r é eguir. em suma, algum a coisa universal, sobre o que a teologia pode ser edificada na
i:r: de pelo arena pública.
menos ,A transição da descrença para a fé seria, portanto, considerada como que
:I: expressa envolvendo um grau de reorientação existencial, obrigando um a teoria experi-
-.c., _alvez a mental-expressivista de religião a explicar essa m udança. Por ser a conversão
:r cruz”, de um elem ento altam ente significativo na experiência religiosa hum ana, no pas
~ ? crtância sado e no presente, a necessidade de diferenciar entre a experiência de “crer” e
Trirrilidade a de “não crer” pareceria ser um aspecto suficientem ente im portante da re
reólogo ligião para requerer que teorias de religião e doutrina pudessem explicá-la.
: cxe busca Em terceiro lugar, um a questão séria exige atenção com respeito ao “con
i r :. ambos teúdo” ou “referente” de u m a experiência. C om o podem os saber que — como,
rressivista”. realmente, podem os até mesmo começar a perguntar se, e em que m aneira —
< experiên- a experiência que estamos tentando capturar em um m om ento ou símbolo
Lrrr da re- verbal realmente é um a experiência de Deusi172 Q ue bases temos para sugerir
■er.Tri pode que a experiência hum ana é de algum m odo relacionada a um a realidade,
cr. remente, tradicionalm ente designada “D eus”? Sobre que bases somos autorizados a iden
e.irerada e tificar um m om ento ou m om entos como carregados com a fragrância da d i
ré r. cia cada vindade, e nao sim plesm ente um a experiência hum ana e m undana? O grande
r. r : rtantes dilem a do jovem Karl Barth, preparando seu sermão do dom ingo em Safen-
. : caso de wil, torna-se o nosso dilema. Para Barth, a pergunta decisiva dizia respeito às
■: :tj a um palavras que ele pregaria: com o poderia ele descansar assegurado de que essas
e se torna palavras de algum m odo incorporavam ou transm itiam a palavra de Deus, e
c ras duas não m eram ente as suas palavras? Em que sentido ele podia alegar que estava
í :u mes- proclam ando a palavra de Deus, e não m eram ente em prestando um a legitim i
c r.entadas dade e autoridade imerecida às palavras de Karl Barth? Com o pode a “experiên
: í .; estu- cia buscando expressão” ser identificada com o experiência de Deus, e não com o
rr.rrom is- experiência de um m undo secular e ateísta, ou um solipsismo existencial e
c.rerentes excêntrico? E o que dizer de religiões não-teístas? Sem dúvida, um relato ex-
Liras pala- pressivo-experim ental do budism o de T heravada insistiria em que aquela
: rastante tradição dá acesso à experiência religiosa — mas será que pode ser vista como
c : rdo em um a experiência de Deus, quando aquela m esm a tradição explicitamente repu
dia essa sugestão? Experiência pode de fato buscar expressão — mas pede tam
bém um critério pelo qual pode ser julgada.
Além disso, este ponto pode ser desenvolvido particularm ente à luz da
tendência ao secularismo na sociedade ocidental. A abordagem “expressiva-
experim ental” à religião e doutrina afirma a prim azia da experiência atual como
o m eio da revelação de Deus. A pressuposição im plícita desta abordagem é
que há algum a experiência para expressar — por exemplo, a noção de Schleier-
m acher de piedade com o um senso de dependência absoluta, a categoria do
num inoso de- O tto , e a experiência de Tillich do incondicional. E se não há
nenhum a experiência para expressar? Se Deus é conhecido com o ausente do
seu m undo — que Bonhoeffer sugere ser o resultado inevitável em um “m u n
do já de m aioridade”173 — em que sentido podem os afirmar que ele está pre
sente*. Tom ando o evento da crucificação como paradigma, Lutero argum enta
que a experiência é corrigida pela doutrina; que a experiência é interpretada
apropriadam ente, até o ponto de ser contestada, por e dentro de um a estrutu
ra teológica. Experiência, em outras palavras, é o explicandum, em vez de a
explicans-, é o que exige ser interpretado, em vez de ser o agente interpretador
em si. D eus é conhecido (experim entado) com o ausente; a doutrina afirma
que D eus está presente de form a o culta.174 A teologia se engaja com a ex
periência hum ana; contudo, a experiência m uitas vezes precisa ser criticada e
radicalm ente reinterpretada. Este é um tem a m uito im portante na “teologia
da cruz”, de L utero.175 Para Lutero, a cruz'm onta um ataque poderoso sobre
outro recurso hum ano, sobre o qual demasiado peso espiritual é m uitas vezes
colocado, especialmente no pensam ento ocidental m oderno. A experiência do
indivíduo é destacada como tendo autoridade reveladora. “O que eu experi
m ento é que é o certo”. “Eu não o experim ento dessa form a.” Lutero sugere
que a experiência individual é com freqüência seriamente não confiável como
guia para questões de fé. A m aneira em que experim entam os as coisas não é
necessariamente a m aneira que as coisas realmente são.
E esta tensão potencial entre a teologia e a experiência que levanta tantas
dificuldades para escritores liberais, tais com o D avid Tracy e Schubert O gden.
C om o tem sido apontado m uitas vezes, o m odelo oferecido sistematicamente
por tais teólogos m inim iza tanto “a particularidade histórica da tradição [cris
tã] com o a força de seu conflito com a experiência”.176 Por essas razoes, a
segunda abordagem esboçada para o entendim ento da relação entre experiên
cia e teologia tornar a ser ouvida.
Segundo essa abordagem, a experiência é um explicandum, algo que em si
requer ser interpretado. A teologia cristã oferece um a estrutura pela qual as
am bigüidades da experiência podem ser interpretadas. A teologia visa a inter
67
■r rde tam - pretar a experiência. É como um a rede que podem os lançar sobre a experiên
cia, a fim de capturar seu sentido. A experiência é vista com o algo para ser
:r 7 iuz da interpretado, em vez de algo que em si é capaz de interpretar. A teologia cristã
em.mssiva- visa assim a dirigir-se a, interpretar e transformar a experiência hum ana. N o
com o que se segue, eu m e proponho a explorar esses temas com referência particular
: r "igem é aos escritos de M artinho Lutero e C. S. Lewis. A teologia européia, com sua
e mvnleier- longa tradição de lutar com a experiência dentro de um a estrutura cognitiva,
tr m r ia do tem um a contribuição im portante a fazer dentro desta discussão global, de
r j não há relevância especial num a era centrada-em -experiência.177 Três pontos podem
sente do ser aqui dispostos.
:m "m un- Prim eiro, a teologia se dirige à experiência. A teologia cristã não pode
e esri pre- perm anecer fiel ao seu conteúdo se ela se vê com o puram ente proposicional
. ju m e n ta ou cognitiva em sua natureza. O encontro cristão com D eus é transform ativo.
:e:rrerad a C om o Calvino afirmou, conhecer Deus é ser m udado por Deus; o verdadeiro
7 estrutu- conhecim ento de D eus leva à prestação de culto, à m edida que o crente é
rz de a arrebatado em um encontro transform ador e renovador com o D eus vivo.
rr :e :a d o r Conhecer Deus é ser m udado por D eus.178 C om o Soren Kierkegaard com en
77 iíirm a ta em seu Unscientific PostScript [Post-scriptum a Migalhas Filosóficas], conhecer
c 77. a ex- a verdade é ser conhecido pela verdade. “Verdade” é algo que afeta nosso ser
rm ead a e interior, à m edida que ficamos envolvidos em “um processo apropriado da
‘teologia mais apaixonada interiorização”.179
: s : sobre Isto não tem , em nenhum sentido, o objetivo de negar ou tirar a ênfase
ims vezes dos aspectos cognitivos da teologia cristã. Visa só a observar que a teologia é
ien d a do mais do que só informação intelectualizada. U m a teologia que toca a m ente,
_ rxperi- deixando de afetar o coração, não é a verdadeira teologia cristã — ponto enfa
■: sugere tizado tanto por Lutero com o por Calvino. Em bora Lutero seja crítico do
eom o papel da experiência em espiritualidade, não o descarta com o um a irrelevân
ó - não é cia. N a verdade, Lutero insiste em que, para ser um teólogo, há necessidade de
um a experiência básica. Ele descreve esse conceito em breves palavras num a de
■7 rantas suas mais difíceis e mais citadas afirmações: “E viver, morrer, e até ser conde
vdden. nado que faz um teólogo; não ler, especular e entender”.180 Ser um teólogo
7777.ente verdadeiro é não lutar com ninguém a não ser com o Deus vivo — não com
í: _cris- idéias sobre Deus, mas com o próprio Deus. E como pode um pecador sempre
semes, a esperar tratar adequadam ente com esse Deus?
tre riê n - Se você quer ser um teólogo de verdade — Lutero insiste — , precisa ter
experimentado um sentimento de condenação. Precisa ter passado por um m o
le em si m ento de clara compreensão, em que reconhece o quanto é realm ente peca
cual as dor, e o quanto merece a condenação de Deus. A m orte de Cristo sobre a cruz
a inter escreve, letra por letra, a extensão plena da ira de Deus contra o pecado, e nos
68
expõe com o quem é condenado. Só deste ponto podem os apreciar por com Es:,
pleto o tem a central do Novo Testam ento — com o D eus pôde livrar o peca na. Er.:
dor da sua destruição. Sem um a percepção com pleta de nosso pecado, e do vazam,
temível abismo aberto entre nós e Deus, nós não podem os apreciar a alegria e tar seir.r
m aravilha da proclamação do perdão que se alcança por meio de Jesus Cristo. que aieu
N u m a carta a seu colega Philip M elanchthon, datada de 13 de janeiro 1522, os — í
Lutero sugeriu que ele fizesse a seguinte pergunta sobre os assim chamados realizara
“profetas” que estavam na época confundindo os fiéis de W ittenberg: “Têm um a M r
eles experim entado aflição espiritual e o divino nascim ento, m orte e infer Allen .
no?”. U m a lista de sensações espirituais não é nenhum substituto pelo terror que O ;
acom panha um encontro real com o Deus vivo. Para esses profetas modernos, conta::
Lutero afirmou: “o sinal do Filho do hom em está faltando”. Quase qualquer essa pr:
um pode ler o Novo Testam ento, e ver nele algum sentido. Lutero insiste, por D r.
porém , em dizer que o verdadeiro teólogo é alguém que experim entou o senso intuiçã:
de condenação por causa do pecado — que lê o Novo Testam ento e reconhece satisfaz:
que a mensagem de perdão é a boa-nova. O evangelho é assim experimentado conter.:
com o algo libertador, que transform a a nossa situação, que é relevante para Deus. z
nós. E m uito fácil ler o Novo Testam ento com o se fosse nada mais do que um a pode ::
produção literária. Lutero nos lem bra que é só pelo reconhecim ento de nosso segue r
pecado, e todas as suas implicações, que podem os apreciar plenam ente a m a fim ale.
ravilhosa e encorajadora declaração de que D eus já perdoou nossos pecados eterniz
por m eio de Jesus Cristo. impe:
Em segundo lugar, a teologia interpreta a experiência. E um a conseqüên e sua ::
cia da doutrina cristã da criação: fomos feitos à imagem de Deus. H á aí a palavra
capacidade em butida — podem os até dizer a necessidade em butida — de nos coraçã.
relacionar com Deus. Deixar de relacionar-se com D eus é deixar de ser com saudac
pletam ente hum ano. Ser realizado é ser plenificado po r Deus. N ada transi distar.:
tório pode preencher essa necessidade. N ada que não seja o próprio Deus Er
pode esperar tom ar o lugar de Deus. Assim mesmo, por causa da decadência mo te:
da natureza hum ana, há hoje a tendência natural de se tentar fazer com que existèr.
outras coisas preencham essa necessidade. do na
O pecado nos afasta de Deus, e nos leva a pôr outras coisas em seu lugar. contir.
Essas vêm para substituir Deus. Elas, porém , não satisfazem. E, com o a cri marav
ança que experim enta e expressa insatisfação quando o pino quadrado nao se ravilha
encaixa no orifício redondo, passamos a experim entar um sentim ento de in gemic
satisfação. D e algum a forma, perm anece em nós a sensação de necessidade oferez
de algo indefmível, de que a natureza hum ana nada sabe; só sabe que não o reelarv
possui. sua irr
fazer c
Este fenôm eno tem sido reconhecido desde a aurora da civilização hum a
na. Em um de seus diálogos,181 Platão com para os seres hum anos a jarros que
vazam. D e algum a forma, nunca estamos totalm ente realizados. Podemos es
tar sempre despejando coisas nos “recipientes” de nossa vida, mas algo im pede
que alguns deles estejam inteiram ente abastecidos. Estamos sempre m eio vazi
os — e por esta razão, experim entam os um a profunda percepção de falta de
realização e felicidade. “O s que já suportaram o vazio sabem que encontraram
um a fom e diferente, ou um vazio; nada na terra pode satisfazê-la” (Diógenes
A llen).182
O sentim ento de insatisfação, já bem docum entado, é um dos pontos de
contato mais im portantes para a proclamação do evangelho. Em prim eiro lugar,
essa proclamação interpreta esse sentim ento vago e sem form a como um anseio
por Deus. D á substância e form a cognitivas ao que de outro m odo seria um a
intuição subjetiva am orfa e não identificada. Em segundo lugar, propõe-se a
satisfazê-la. H á um sentim ento de descontentam ento divino — não um des
contentam ento com Deus, mas com tudo o que não é Deus, que surge de
Deus, que em últim a análise conduz a Deus. Sartre está certo: o m undo não
pode trazer preenchim ento, satisfação. Aqui ele ecoa a visão cristã, que pros
segue para afirm ar que aqui, no m eio do m undo, alguma coisa que está por
fim além do m undo torna-se disponível para nós. N ão precisamos esperar pela
eternidade para experim entar Deus; esta experiência pode começar, por mais
im perfeitam ente que seja, agora. Talvez a m aior declaração deste sentim ento,
e sua interpretação teológica mais prim orosa, sejam encontradas nas famosas
palavras de A gostinho de H ipona: “Tu nos fizeste para ti m esm o, e nosso
coração está inquieto enquanto não descansa em ti”.183 H á um sentim ento de
saudade de algum lugar que nunca visitamos, a intim ação de um a terra m ui
distante, que nos atrai apesar de não a conhecermos.
Em todas as reflexões de Agostinho, especialmente nas Confissões, o mes
m o tem a recorre. Somos sentenciados a perm anecer incom pletos em nossa
existência atual. Nossas esperanças e mais profundos anseios continuarão sen
do nada além de esperanças e anseios. A solução desta tensão doce-amarga
continua real, m esm o para o cristão, que se torna cada vez mais apercebido da
m aravilha de Deus, e da imperfeição de nossa compreensão atual dessa m a
ravilha. H á um sentim ento de coisa adiada, de anseio, de desejo anelante, de
gemidos sob a tensão de ter de tolerar o presente, quando o futuro é que
oferece tan to .184 O s grandes temas da criação e redenção ali encontram um a
reelaboração que merece atenção cuidadosa. Por sermos criados por D eus à
sua imagem, nós o desejamos; por sermos pecadores, nós não podem os satis
fazer o nosso desejo — nem substituindo algo por Deus, nem tentando forçá-
70
-70' se vadiu; a miltoniana “enorme bem-aventurança” [...] chega perto. Foi, cla-
1— e ro, uma sensação de desejo; mas desejo de quê? Não, certamente, de uma
1 -go- tampa de lata de biscoitos de musgo, nem mesmo (embora isto tenha
r'~nn- vindo também) do meu passado [...] e antes de saber o que desejava, o
-om próprio desejo se desfizera, todo o vislumbre se dissipara, o m undo voltara
nuiha à normalidade, ou era agora só agitado pelo anseio do anseio que acabara
7 etria de sumir. Durara só um momento; e em certo sentido tudo o mais que
me acontecera até então era insignificante diante disso.187
mais
r# dos Lewis aqui descreve um breve m om ento de visão, um m om ento devastador de
trsis- sentir-se capturado por algo que vai m uito além das esferas de experiência de
-^o- cada dia. M as o que significava isso? Para que isso apontava, se é que apontava
.r.ho, Para alg ° ?
: .-am Lewis fez essa pergunta em um sermão notável intitulado “O peso da
rere glória”, pregado diante da Universidade de Oxford, em 8 de junho de 1941.
nu_ Lewis falou de “um desejo que nenhum a felicidade natural satisfará”, “um
jh a- desejo, ainda vagueando e incerto de seu propósito e ainda em grande parte
incapaz de ver esse objetivo na direção onde realm ente está”. H á algo autoder-
rotante no desejo hum ano, em que o que é desejado, quando alcançado, parece
_,_-j0 deixar o desejo insatisfeito. Lewis ilustra isso da busca antiga por beleza, usan
do imagens reconhecivelmente agostinianas:
algum a coisa que possa atender à busca do hom em pela satisfação dos desejos
do seu coração. Lewis argum enta que há. Fome — ele sugere — é um exce
lente exemplo de um a sensação hum ana que corresponde a um a necessidade
física real. Essa necessidade aponta para a existência de com ida que pode satis-
fazê-la. Sim one Weil faz ecoar este tem a, e destaca a im portância apologética
disso quando escreve: “O perigo não é se a alma deve duvidar se existe algum
pão, mas se por um a m entira ela vai ser persuadida a acreditar que não está
com fome. Ela só pode se convencer disso m entindo, pois a realidade de sua
fome não é um a crença, é um a certeza”.189
Os críticos menos perspicazes de Lewis — para tristeza geral, mais num ero
sos do que se poderia esperar — concluíram que seu argum ento se baseava
num a falácia elementar. Estar com fome não provava que havia pão à mão. A
percepção de fom e não correspondia necessariamente a um suprim ento de
alim ento. C ontudo, Lewis responde que essa objeção não vem ao caso.
A fome física de um homem não prova que ele conseguirá algum pão; ele
pode morrer de fome num a jangada no Oceano Atlântico. Mas certa
mente a fome de um homem prova que ele vem de uma raça que repara o
seu corpo comendo, e habita um m undo onde substâncias comestíveis
existem. D a mesma forma, embora eu não creia (até queria crer) que meu
desejo pelo Paraíso prova que eu desfrutarei dele, acho que é uma indi
cação relativamente boa de que ele existe e alguns homens desfrutarão
dele. Um hom em pode amar um a mulher e não tê-la para si; mas seria
m uito estranho se o fenômeno chamado “apaixonamento” ocorresse em
um m undo desprovido de sexualidade.190
Em tudo isso, Lewis faz ecoar um grande tem a do pensam ento cristão tradi
cional sobre a origem e o alvo da natureza hum ana. Fomos criados por Deus,
e experim entam os um profundo sentim ento de desejo por ele, que só pode ser
satisfeito pelo próprio Deus. Em bora as reflexões de Lewis sobre o desejo que
ele cham a de “alegria” reflitam sua experiência pessoal, é evidente que ele (como
incontáveis outros) considera que esse desejo seja um a característica m uito
espalhada da natureza e experiência hum anas. U m ponto im portante de con
tato para a proclamação do evangelho é assim estabelecido.
As descobertas de Lewis trazem tam bém nova profundidade a passagens
bíblicas familiares com respeito ao anseio que o hom em tem por Deus. “Com o
a corça anseia por águas correntes, a m inha alm a anseia por ti, ó Deus. A
m inha alma tem sede de Deus, do D eus vivo...” (SI 42.1-2). É bom notar que
o grande senso de anelo por D eus expresso neste texto — um desejo ardente
que assume ainda mais sentido se as reflexões de Lewis sobre “alegria” forem
levadas em conta. Deve ser dado destaque ao paralelo bíblico entre a sensação
de necessidade — no caso do texto, a sede anim al — e a necessidade e desejo
hum ano por Deus.
Em terceiro lugar, a teologia se propõe a transformar a experiência. A teolo
gia cristã não só fala à situação hum ana; ela se propõe a transformá-la. N ós não
apenas ouvimos que somos pecadores, necessitados do perdão de Deus e da
renovação divina, mas que esse perdão e essa renovação nos são oferecidos na
proclamação do evangelho. Se o aspecto negativo da proclamação cristã do Cris
to crucificado é que nós estamos longe de Deus, o lado positivo dessa procla
mação é que Deus se prontifica a trazer-nos para casa, para si mesmo, por meio
da m orte e ressurreição de seu Filho. Teologia não apenas interpreta nossa ex
periência em termos de alienação de Deus. Responde a essa experiência, inter
pretando-a como sinal de nossa alienação global de Deus em conseqüência do
pecado, e propõe-se a transformá-la por intermédio da graça divina.
U m dos m uitos méritos dos escritos de C. S. Lewis é que eles levam a sério
o m odo em que palavras podem gerar e transformar experiência. Para Lewis, as
palavras têm a capacidade de evocar um a experiência por que ainda não passa
mos, além de descrever um a experiência já vivenciada por nós. O que já co
nhecemos funciona como um sinalizador para o que ainda vamos conhecer, e
que está dentro do nosso alcance. E m seu ensaio The Language ofReligion [A
linguagem da religião], Lewis enfatiza este ponto capital do seguinte modo:
zunien- sistema que não pudessem ser provadas pela razão não poderiam ser contadas
-;;:ual, com o “racionais”. Teriam de ser descartadas. E, segundo, a razão era entendida
; mença como prioridade sobre o cristianismo. Razão vem prim eiro; cristianismo vem
rirnta- em segundo lugar. Razão é capaz de estabelecer o que é certo sem precisar
i ; uilo qualquer assistência da revelação; cristianism o tem de seguir, sendo aceito onde
■jr5so a endossa o que a razão tem a dizer, e sendo descartado onde segue o próprio
c r : ou cam inho. Então, por que ter preocupação com a idéia de revelação, quando a
razão poderia contar-nos tudo o que pudéssemos possivelmente desejar co-
...:: ’-on, nhecer sobre Deus, m undo, e sobre nós mesmos? Esta convicção absoluta-
= 'nade m en te resolvida na to tal com petência da razão h u m a n a form a a base à
e nu os depreciação racionalista da doutrina cristã da revelação em Jesus Cristo e por
:: á?uma meio da Escritura.
t
;uner- Esta abordagem ao cristianismo (ou, mais acertadam ente, esta form a de
• ■jbre deísmo tingido com cores palidam ente cristãs) trata de D eus com o um a idéia,
m uito um a construção da m ente hum ana. D eus é algo postulado, um a idéia que
:ue o geramos dentro de nossa mente, e depois escolhemos chamar de “Deus”. Cria-
cíndia mos essa idéia. E obra de nossa m ente. M as o cristianismo tradicional argu-
João m en tav a que D eus não p o d ia ser sim plesm ente p o stu la d o desse m odo
u íeriu cruam ente racionalista. Deus tem de ser experim entado, ele tem de ser encon-
►;us. o trado de frente. Ele é alguém que nos engaja; e, engajando-nos, força-nos a
:.:’.va- reavaliar a idéia que fazemos dele. M as o Deus da pura razão está preso dentro
" :■:> de dos limites de mentes hum anas. E mentes pequenas contribuem para um Deus
:: não pequeno.
i mos- 3. Finalm ente, esta posição racionalista foi em purrada até a sua conclusão
i :nira lógica. N a verdade, argumentava-se, o cristianismo inclui algumas crenças in
consistentes com a razão. E como a razão precisa ser vista tendo a autoridade
unha, final em matérias de fé, onde a Escritura está em desacordo com a razão, ela
ru-se, deve ser vista como errada ou enganosa. Tendo sido postulado por razão hu-
nizer m ana, Deus é, agora, “despostulado” [ou derrubado] por seu criador.205
c .i de C om o resultado da desconstrução sociológica da noção de “razão univer-
ve ser sal”, o apelo à “autoridade da razão” é feito hoje com bem m enos convicção.206
i nem U m a crença fundam ental na racionalidade da fé cristã perm anece intacta e
justificada; a tentativa do Ilum inismo de estabelecer razão hum ana não auxilia-
criros da com o o fundam ento norm ativo único para todo o discernim ento é visto
ar^u- agora com o seriamente falho. Em parte, esse reconhecim ento vem da com-
Deus preensão das limitações colocadas na razão; em parte, porém , vem tam bém da
tnnes. percepção pós-m oderna das conseqüências potencialm ente autoritárias de um
íí?em apelo à “totalização da razão ' (ver p. 151-159). “Ser razoável” não é reduzível
le seu a um único m étodo, e facilmente pode conduzir à “tirania da racionalidade”
80
por m eio da afirmação de que só este m odo de pensar, ou só este tipo de argu
m ento, tem algum a validade. E, com o escritores pós-m odernos têm enfatiza
do (ver p. 159-165), “ser razoável” vezes demais acaba tornando-se na exigência:
“aceitar o meu m odo de pensar”.
O reconhecim ento de que estruturas de racionalidade não são universais,
mas social e historicam ente localizadas, é de im portância considerável para a
teologia cristã, particularm ente em avaliar o valor do racionalismo iluminista.
Por exemplo, a crítica ilum inista da noção cristã tradicional da revelação de
D eus em Jesus Cristo, para Lessing, era inaceitável; negava acesso a essa “reve
lação” àqueles cuja localização histórica era, por exemplo, cronologicam ente
anterior ao nascim ento de Jesus de Nazaré. A força dessa objeção, presume-se,
é prim ariam ente moral, em que a acessibilidade da verdade não pesa diretamente
sobre sua exatidão. Para Lessing, este ponto serviu para realçar a superioridade
m oral da religião racional, que foi capaz de fazer um apelo às verdades univer
sais da razão.
C om o advento dos discernim entos da sociologia do conhecim ento, as
vantagens da posição de Lessing são seriamente desgastadas, provavelmente a
ponto de torná-las enganadoras. “Verdades universais da razão” podem mes
m o ser encontradas dentro dos confins um tanto restritos da lógica e da
m atem ática, m esm o se não resultam em nada mais além de tautologias —
reafirmações disfarçadas em explicações ou novos níveis de discernim entos.
Modelos de racionalidade em geral, porém , social e historicamente localizados e
condicionados. “Razão” precisa ser entendida com o referindo-se às estruturas
de racionalidade e noções preconcebidas de verdades auto-evidentes apropria
das a grupos sociais específicos em m om entos específicos da história, em vez
de algum a característica universal e perene do raciocínio hum ano. Precisa
m ente a m esm a crítica dirigida por Reimarus contra o cristianismo pode ser
colocada contra o apelo de Lessing à noção fictícia de razão universal: a localiza
ção social de um indivíduo determ ina as opções intelectuais que estão abertas
a ele. “Razão” e “revelação” são ambas sujeitas às limitações de historicidade.
4. Tradição
Para alguns escritores, a “tradição” tem bastante autoridade. Tradição seria
entendida aqui como o que designa um a doutrina ou crença tradicional, que
tem força de autoridade por causa de sua antigüidade. C ontudo, isso pode
facilm ente degenerar em sentim entalidade não crítica. A afirmativa “sempre
cremos assim” pode significar “sempre estivemos errados”. C om o o escritor do
terceiro século, Cipriano de Cartago, aludiu, “um a antiga tradição pode ser só
um antigo erro”. A tradição deve ser honrada onde pode ser dem onstrada
81
i± argu- como justificada, e rejeitada onde não o pode. Esta apreciação crítica de tradição
r.ratiza- foi um elem ento integral da Reform a,207 e baseava-se na crença fundam ental
uencia: de que a tradição era, em últim a análise, um a interpretação da Escritura que
tinha de ser justificada com referência à m esm a fonte com petente.
.'.'rrsais, C ontudo, a idéia de “tradição” é de im portância para o evangelicalismo
. rara a m oderno. O s evangélicos têm tido sempre a tendência de ler a Escritura como
''.a. se fossem os prim eiros a fazer isso. Precisamos lem brar que outros já estiveram
irão de lá antes de nós, e já a leram antes que nós o fizéssemos. Esse processo de
i reve- receber a revelação escriturai é “tradição” — não um a fonte de revelação soma
L~;nte da à Escritura, e sim um m odo particular de se entender a Bíblia que a igreja
LT.r-se, cristã tem reconhecido com o responsável e confiável. A Escritura e a tradição
»
L-r.ente não são, pois, para serem vistas como duas fontes alternativas de revelação; em
c.aade vez disso, são coinerentes. A Bíblia não pode ser lida com o se nunca tivesse sido
;r.:ver- lida antes. As hinódias e liturgias das igrejas constantem ente nos fazem lem
brar que a Escritura já foi lida, avaliada e interpretada no passado. James I.
: : j . as Packer, um dos mais influentes escritores evangélicos de anos recentes, enfati
;í:'-te a za esse ponto:
: mes-
i c da O Espírito tem estado ativo na igreja desde o início, fazendo o trabalho
para o que foi enviado — guiar o povo de Deus na compreensão da ver
cr. tos. dade revelada. A história do trabalho da igreja para entender a Bíblia
aaos e forma um comentário sobre a Bíblia que não podemos desprezar nem
urnras ignorar sem desonrar o Espírito Santo. Tratar o princípio de autoridade
crria- bíblica como uma proibição à leitura e aprendizado do livro de história da
rr. vez igreja não é um erro evangélico, mas um erro anabatista.208
tcLsa-
“Tradição” é assim entendida acertadam ente (por exemplo, pelos reformadores,
ser
como Lutero) na form a de um a história de discipulado — de leitura, interpre
^.iza-
tação e luta com a Escritura. Tradição é um a disposição de ler a Escritura,
>ertas
levando em conta as formas em que esta foi lida no passado. É um a percepção
Laie.
da dimensão geral da fé cristã, sobre um período extenso de tem po, que põe
em dúvida o individualism o superficial de m uitos evangélicos. H á mais na
5eria interpretação da Escritura do que qualquer crente pode individualm ente dis
cernir. E um a disposição para atribuir peso aos pontos de vista dos que nos
. que
precederam na fé, o que provê lembranças fortes da natureza corporativa da fé
p jde
r.rre cristã, o que inclui a interpretação da Escritura.
ir do A prim eira vista, essa ênfase na im portância da com unidade de fé pode
er só parecer estar em tensão com a convicção de que só a Escritura, apenas a Escritu
ra, é autorizada. N o entanto, escritores com o Lutero ou Calvino nunca ten-
rada
çionaram significar que a Escritura é lida individualmente. N ão se pretendeu
que o discernimento pessoal de um indivíduo seja elevado acima do discerni
m ento geral da igreja (embora tenha sido interpretado dessa maneira por certos
reformadores radicais, fora da corrente principal da Reforma). Em vez disso,
afirma que, em princípio, todo o m odo tradicional de se ler a Escritura deve
estar aberto ao desafio. Com o o estudo da história da igreja deixa claro, a igreja
pode por vezes entender a Escritura erradamente; os reformadores do século
XVI criam que a Escritura tinha sido m al-entendida num a série de pontos pela
igreja medieval, e incumbiram-se de reformar suas práticas e doutrinas naqueles
pontos. Esse, porém , é o caso de um a tradição ser criticada e renovada por den
tro, à luz dos fundam entos bíblicos sobre os quais, em últim a análise, ela repousa
e é reconhecida como em repouso. O s reformadores não se viam como quem
estava fundando um a nova tradição; sua preocupação era reformar um a tradição
já existente, mas que parecia ter sido desligada de suas bases escriturais.
O princípio da autoridade da Escritura até sobre seus mais prestigiosos
intérpretes é vigorosam ente sustentado pela Fórm ula Luterana de C oncord
(1577):
da reve tas em vez de pressuposições cristãs. M esmo estudiosos cujo trabalho em outros
rto sério respeitos tem sido bastante ilum inador têm achado difícil, po r vezes, chegar a
term os com milagres e profecia bíblica.213 O s evangélicos com razão rejeitam
:rilhado a crítica baseada em tanto preconceito como, em prim eiro lugar o não-cristão,
j crítico e em segundo lugar o baseado num a m etodologia falha, na qual um p o n to de
" neces- vista secular é im posto sobre o material bíblico.
peito à Os evangélicos têm argum entado tam bém que m uitas conclusões críticas
são realmente quase tentativas e incertas. Teorias que um dia foram vistas como
rnação, “resultados assegurados da crítica” — tais com o a teoria JE D P originária do
"poral, Pentateuco, a solução de duas fontes ao problem a sinótico, ou a crença con
os par- troladora de que as parábolas de Jesus só têm um ponto simples cada — são
■elação agora vistas sendo no seu m elhor questionáveis, e no pior, definitivam ente
r essas erradas.214 Críticos da Bíblia m uitas vezes parecem desconhecer a pura nature
ara esse za provisória da erudição.
rrios, e Ambas as tendências são observadas e criticadas pelo estudioso do Novo
netodo Testam ento, W alter W ink, que destaca a m aneira em que, no passado, os estu
;:udio- diosos eram notoriam ente dogmáticos sobre o que não poderia ter acontecido
.zagem no Novo Testamento:
e rodo
5o não Historiadores ainda podem exigir que garantias ou evidência sejam apre
5:órico sentadas para que se possa crer que algo fora do comum aconteceu [...]
srórica Eles podem providenciar controles de valor sobre superstição, lançando
"'rodu- um olhar crítico sobre reivindicações extraordinárias que tenham uma
5ão de inclinação tendenciosa. Ir além disso, porém, para afirmações dogmáticas
ente o de que curas pela fé, ou clarividência, ou ressurreição dos mortos é impos
crítica sível, é ir além da competência da pessoa como historiador para as asseve-
a_mos; rações de fé de uma pessoa presa aos estreitos confins de certa visão de
anto o m undo — ou o que Paul Ricoeur chamou de “o crível disponível”.213
-5 des-
M uito facilmente, a abordagem dos críticos à Escritura pode ficar presa à visão
de m undo rígida e estreita de um a ideologia, que recusou contem plar que
:zer a
qualquer coisa além de sua experiência de m undo pudesse ter acontecido, ou
ober-
que quaisquer idéias alheias a seu ponto de vista possam ser corretas. Em tais
erodo
pontos, a crítica pareceria ter extrapolado seus limites apropriados; a Escritura
:o de
está aí sendo julgada na base de um entendim ento transitório e provisório da
realidade, cujas limitações e temporalidade não parecem ter sido reconhecidas.
::icos
O evangélico não é mais livre de pressuposições do que o liberal, racionalista ou
:as, e
secularista. N ão obstante, evangélicos insistem em que estão preocupados em
rem
abordar a Escritura em seus termos, em vez de im por um a camisa de força
nalis
86
m odernizadora sobre ela, e que essa abordagem leva a um a leitura sim pática e
intelectualm ente satisfatória da Escritura.
C ontudo, os evangélicos, enquanto apontando as lim itações da crítica
bíblica, têm tam bém respondido positivam ente a alguns de seus achados. H á
um reconhecim ento m aior da necessidade de distinguir as questões da her
menêutica das questões de autoridade. Por exemplo, a autoridade da segunda
carta escrita pelo apóstolo Pedro, em últim a análise, depende da autoria Petri-
na? Tais questões recebem cada vez mais atenção dentro do evangelicalismo.
U m comprom isso total para com a autoridade bíblica não precisa — alguns
argum entariam — com prom eter um estudioso com um a abordagem específi
ca à interpretação bíblica. U m debate im portante e potencialm ente difícil está
em ergindo dentro do evangelicalismo que não sente mais a necessidade de
estar na defensiva sobre seu com prom isso nem para com a erudição bíblica
nem para com a autoridade bíblica.
alizada, a fim de que seu conteúdo possa ser mesclado com os pressupôs-
tos cognitivos e moldes sociais de nosso tem po.222
Escritura e narrativa
Term inam os esta análise do papel da Escritura no pensam ento evangélico
enfocando um a questão de im portância considerável na erudição bíblica re
cente: o reconhecim ento da posição prim ária do gênero narrativo dentro da
Escritura. D e que m aneira um a narração serve com o base da teologia?223 De
que m aneira pode-se falar de um a narrativa reter “autoridade”? À vista da im
portância desta questão em análise teológica contem porânea, passaremos dire
tam ente a um a consideração das implicações para o evangelicalismo do caráter
predom inantem ente narracional da Escritura.
Em seu estudo clássico de interpretação bíblica desde a Reforma, H ans
Frei m ostra como o surgim ento do racionalismo levou a um a gradativa rejeição
do caráter “narrativo” da Escritura.224 Para escritores “pré-críticos”, a interpre
tação da Escritura dizia respeito a “um a interpretação de histórias e seus signifi
cados, tecendo-os juntos em um a narrativa com um que se refere a um a história
única e seus modelos de sentido”.223 O Ilum inismo, porém , adotou um a rede de
abordagens à interpretação bíblica que reflete o racionalismo e o anti-super-
naturalism o do m ovim ento. C om o Brevard Childs dá a entender, a resultante
aplicação de “ferram entas críticas históricas com uns” deixou de fazer “justiça
. 0- plena à m atéria teológica ím par da Escritura com o auto-revelação de D eus”.226
Parte desse processo de interpretação, evidente do século X V III em diante, foi
um a rejeição do caráter “narrativo” da Escritura.
O evangelicalismo anterior estava plenam ente apercebido da im portância
da narrativa. M artinho Lutero é um excelente exemplo de um a abordagem
evangélica anterior a esse assunto. Ele nem (para antecipar o Ilum inism o) via a
narrativa como algo a ser eliminado a fim de se chegar aos “pontos” que se
apresentavam; nem (para antecipar o Romantismo) via a “história” como o veículo
único da verdade.227 A despeito de todas as suas críticas dos programas teológi
cos e exegéticos do Ilum inismo, porém , o evangelicalismo parece ter escolhido
segui-lo nesse respeito. O caráter narrativo da Escritura fora marginalizado sutil-
mente, a fim de facilitar sua análise puram ente como repositório de declarações
proposicionais, capazes de resistir aos critérios epistemológicos do Iluminismo.
Com o Frei aponta, o tem a da “narrativa” continuou presente dentro do evange
licalismo, mas foi transferido da Escritura para a jornada espiritual pessoal do
crente.228 Foi visto como apropriado aos evangélicos falarem de “sua historia”
(significando “o relato de como chegaram à fé, e estão progredindo na vida cristã
pessoal”). N o entanto, o fato de m uito da própria Escritura fazer um a narrativa
tem sido omitido. Por quê?
As razoes para isso são complexas, e não tão bem entendidas assim. Um
fator que parece ser de especial im portância nesse respeito é a m aneira em que
o evangelicalismo é responsivo diante de seu contexto intelectual. Através de
sua história, o evangelicalismo tem se m ostrado inclinado a cair num a form a
de racionalismo. H á am pla evidência de que isso ocorreu na H olanda durante
a parte final do século XVI, à m edida que os evangélicos se tornaram cada vez
mais influenciados pela prevalência da visão de m undo dos racionalistas.229
N os Estados Unidos, a tendência para aderir ao racionalismo dentro dos círcu
los evangélicos foi acelerada durante fins do século X V III e começo do século
XIX pela am pla adoção do que se to rnou conhecido com o o “realismo es
cocês” ou filosofia “do senso-com um ”230 — um a questão à qual voltaremos
mais adiante (ver p. 141-144). Em particular, o evangelicalismo tem respondi
do aos tipos de teologia de revelação associados com a neo-ortodoxia, especial
m ente a de Em il B runner, que trato u a revelação p u raniente com o um a
“presença pessoal”, ao enfatizar o conteúdo de informações da revelação. C on
tudo, pensando bem, isso tem sido um a reação exagerada; a resposta apropri
ada a B runner é afirmar o conteúdo inform acional da revelação, nao negar
seus aspectos pessoais. O resultado é que formas do evangelicalismo estado-
unidense que têm sido especialmente influenciados por racionalismo, como
aquela associada com Carl Henry, têm colocado ênfase demais na noção de
um a revelação bíblica puram ente proposicional.
N o entanto, isso não precisa ser feito. Efetivamente, à m edida que a pressão
para defender o evangelicalismo roubando os trajes do Ilum inism o dim inui,
os evangélicos são livres outra vez para redescobrir e recuperar as características
distintivas de um a abordagem mais bíblica à teologia, que põe ênfase em que
as ações de Deus na história, recontadas e interpretadas na Escritura, form am
um a narrativa.231 Q ualquer visão da revelação que vê a autom anifestação de
D eus como a m era transmissão de feitos concernentes a Deus é seriamente
deficiente, e arrisca fazer de Deus um análogo a um executivo corporativo que
espalha m em orandos a subalternos. Revelação é a auto manifestação de D eus e
auto-envolvim ento na história e, acima de tudo, suprem am ente, a decisão de
Deus de se tornar encarnado em Jesus Cristo, de m aneira que quem vê Jesus
Cristo vê o Pai. Revelação diz respeito aos oráculos de Deus, aos atos de Deus,
e à pessoa epresença de Deus.
Reduzir a revelação a princípios ou conceitos é suprim ir o elemento de
mistério, santidade e maravilha na automanifestação de Deus.232 O s “primeiros
princípios” podem tirar dúvidas e informar; não nos forçam a ajoelhar em reverên
cia e temor, como Moisés diante da sarça que se queimava, ou os discípulos na
presença do Cristo ressurreto. Por razões que podem ser compreendidas, o evan
gelicalismo tem no passado escolhido ser enfocado no elemento proposicional
ou cognitivo da complexa rede da revelação divina — um elemento que perm i
tia ao evangelicalismo m anter sua credibilidade e integridade durante um período
de assalto racionalista. O entendim ento decorrente de “revelação”, porém , esta
va em si perigosamente deficiente, beirando na aridez e esterilidade que eram as
marcas da m esm a racionalidade à qual o evangelicalismo estava buscando se
opor.
Reconhecer a qualidade narrativa da Escritura perm ite que seja recupera
da a plenitude da revelação bíblica. D e m odo nenhum essa estratégia envolve
abandono ou enfraquecim ento de um comprom isso evangélico com a verdade
cognitiva objetiva da revelação divina. E sim plesm ente reconhecer que a reve
lação envolve mais do que isso, e recom endar a sabedoria de se evitarem abor
dagens reducionistas à questão. Dois teólogos que estiveram preocupados em
recuperar a im portância da narrativa nesse respeito são Karl Barth e H . Ri-
chard N iebuhr. Para Barth, a Bíblia relatava um a narrativa que identificava o
“D eus de Jesus C risto”.233 Para N iebuhr, o testem unho bíblico, ele próprio
narrativo na forma, ilum ina nosso auto-entendim ento e nos capacita para fa
zer sentido de “a história de nossa vida”.234
O evangelicalismo sempre esteve preocupado em dem onstrar a ligação
próxim a entre Escritura e doutrina. Por razões que em últim o caso refletem a
dom inância das idéias do Ilum inism o em Princeton durante o século XIX, o
evangelicalismo era inclinado a m inim izar os elementos narrativos na Escritu
ra, a fim de assegurar o relacionamento íntim o entre Escritura e doutrina, m ui
tas vezes vendo a prim eira com o livro de fonte de d o utrinas. C o n tu d o ,
corretamente entendido, há um a ligação igualmente íntim a e interativa entre a
narrativa da Escritura e as afirmações doutrinárias. N o que se segue, eu me pro
ponho a explorar esse assunto, a fim de realçar claramente a ligação entre narra
tiva e doutrina.235
92
::.;:o ló g ica tificadora de Deus, como é ele percebido atuando no Novo Testamento. “Pai”,
~ : pediam “Filho” e “Espírito” são identificados como papéis relacionados dentro da nar
r. :al estru- rativa do Novo T estam ento.243 A d outrina da Trindade oferece um a chave
: r. cebíveis) herm enêutica para a interpretação correta das narrativas do Antigo e do Novo
: :;rru tu ra s Testam entos que, de outro m odo, poderiam ser entendidas com o dizendo
'a ;o m u m : respeito a três deidades diferentes. O discurso trinitariano é um a tentativa de
rrarrativas. identificar D eus no centro da narrativa escriturai. Isso, em com um com a
a :;.arraçao doutrina com o um todo, nem faz explicitamente, nem im pede explicitamente,
: cadente e afirmações metafísicas. É, a princípio, concernente à interpretação de um a
- criatura, narrativa.
£ :entrou- H á assim um relacionam ento dinâm ico entre a doutrina e a narrativa bíbli
&
cas. Essa narrativa possui um a subestrutura interpretativa, dando m ostra de
i c ru trin a afirmações doutrinárias. E evidente que há estruturas conceituais, ligadas a
" - com o estruturas narrativas, dentro da Escritura: essas funcionam com o pontos inici
c r: postas ais para o processo de geração de estruturas conceituais mais sofisticadas, no
- ai ten o r processo de form ulação doutrinária. C om base nessas sugestões escriturais,
c arau de marcadores e sinalizadores de caminhos bíblicos, afirmações doutrinárias po
i den- dem ser feitas, e ser então empregadas como um a estrutura conceituai para a
c ração. A interpretação da narrativa. A narrativa é re-lida e re-visionada à luz dessa estru
"etandi tura conceituai, no curso da qual modificações à estrutura são sugeridas. Há,
n ::s esta portanto, um processo de interação dinâm ica, de feedback, entre doutrina e
is ponto: Escritura, entre a estrutura interpretativa e a narrativa. Poder-se-ia descrever
:-r:cas são esse relacionam ento dialético em term os piagetanos, com o um de assimilação
caro.244 e acomodação: a narrativa é assimilada a conceitos, e os conceitos são aco
a ae dois m odados à narrativa. N o decurso deste espiral herm enêutico, novos níveis de
as im- interpretação são alcançados por um a oscilação interativa progressiva entre a
a; rcivin- narrativa generativa da Escritura e a estrutura interpretativa da doutrina.
T r tração Esse processo de interpretação envolve um a interação contínua entre nar
"• ... Jesus rativa bíblica e formulações doutrinárias, num a tentativa de encontrar um a
r . Dois estrutura interpretativa, ou um raio de ação de tais estruturas, já sugeridas
; rxigin- dentro do Novo Testam ento, na base das quais a narrativa de Jesus de Nazaré
: rc.acio- possa ser vista em níveis intensificados de sentido. Chegou-se à estrutura
drrariva, doutrinária que abarca o conceito de encarnação com algum a hesitação, por
ra. romo causa de suas evidentes implicações para o m onoteísm o judaico, e ela foi sujei
r. a a das ta à mais sustentada crítica no período do Ilum inism o e pós-Ilum inism o. N ão
■ac asse- obstante, perm aneceu nada mais que um a hipótese tentativa haver qualquer
espécie de descontinuidade radical entre a narrativa de Jesus de Nazaré e as
:a inter- estruturas interpretativas prim itivas contidas no Novo Testam ento, por um
a. -den- lado, e a doutrina da encarnação do outro.
Podemos sum ariar nossa análise da relação entre a narrativa bíblica e a
doutrina com o se segue. Narrativas precisam ser interpretadas corretam ente; a
doutrina cristã oferece a estrutura conceituai pela qual a narrativa da Escritura
é interpretada. Narrativas exigem interpretação. A narrativa da Escritura não é
nenhum a exceção. O Antigo Testam ento pode ser lido com o um a história da
busca por identidade entre um povo nôm ade do antigo oriente próxim o, as
sim com o os Evangelhos sinóticos podem ser lidos com o a história de um
revolucionário galileu mal orientado ou de um rabi judeu frustrado. A doutri
na articula a interpretação específica, ou a gama de interpretações, da narrativa
da Escritura apropriada ao auto-entendim ento da com unidade crista, levando
outros a questioná-la. Assim, a afirmação “Jesus é o C risto” é um a afirmação
doutrinária que perm ite que a narrativa de Jesus de Nazaré seja vista sob certa
luz. Esta afirmação não é, porém , arbitrária: é m antida para ser legítim a à luz
da própria narrativa. Rom anos 1.3-4 torna legítim a a idéia de que Paulo pre
tende afirm ar que Jesus é o Cristo, com referência à narrativa de Jesus de N a
zaré, justam ente como um a subestrutura narrativa pode ser detectada no caso
de outras afirmações teológicas ou éticas do apóstolo.246
A doutrina fornece a estrutura conceituai pela qual a narrativa bíblica é
interpretada. N ão é um a estrutura arbitrária, no entanto, mas é sugerida por
aquela narrativa, e dada a entender (por mais provisoriam ente que seja) pela
própria Escritura. Ela deve ser discernida dentro, em lugar de im posta sobre,
essa narrativa. A narrativa é prim ária; a estrutura interpretativa, secundária. O
Novo Testam ento inclui tanto a narrativa de Jesus de Nazaré com o a interpre
tação da relevância dessa narrativa para a existência das com unidades cristãs
primitivas; doutrina representa a extensão das sugestões quase-doutrinárias,
marcadores e sinalizadores a serem encontrados dentro do Novo Testamento.
A transição de um a narrativa para um a estrutura conceituai de pensam en
to teria efeitos potencialm ente destrutivos para a teologia cristã se a narrativa a
respeito de Jesus de Nazaré, tendo sido perm itida gerar um a estrutura especí
fica de conceitualismos, fosse esquecida. Tivesse um a abordagem conceituai
para o cristianismo (tal como aquele associado com o conceito de encarnação)
sido vista com o auto-suficiente e autônom a, a narrativa que originalm ente a
precipitou poderia ter desaparecido nas brum as da história. Tivesse isso ocor
rido, ansiedade séria necessariamente teria resultado com respeito à propriedade
e adequação dessa estrutura. Teria sido deixada suspensa sem visível susten
tação. N enhum critério, salvo os que foram impostos de fora por ideologias
rivais, poderia ser aduzido pelo qual ela pudesse ser avaliada. E ntretanto, a
narrativa fundam ental tem sido preservada pela com unidade de fé, e lhe foi
conferida status prim ário em reflexão doutrinai (particularm ente dentro das
rablica e a igrejas da Reforma, que perm anecem pontos de referência históricos para um a
aaamente; a autocom preensão evangélica).
a i escritura O princípio sola Scriptura é, em últim a análise, um a asserção da primazia
ra a ra nao é da narrativa fundam ental da Escritura sobre qualquer estrutura de conceitua-
. a a tó ria da lismos que ele possa gerar. A Reform a poderia razoavelmente ser interpretada
ra a m o , as- como um re-exame atrasado da estrutura medieval católica de conceitualismos
: r;a de um à luz de sua narração generativa; sim ilarm ente, o slogan da Reforma, ecclesia
: A doutri- reformata, ecclesia semper reformanda poderia ser interpretado como um a afir
:a aarrativa mação da necessidade de correlacionar continuam ente a narrativa generativa e
:I .evando os conceitos resultantes. N ós não temos acesso à história de Jesus em seu todo.
i -inrmação N ão possuím os a totalidade de tradições a respeito de Jesus. N ão obstante,
:a 5 0 b certa tem os acesso à parte daquela história e daquelas tradições que as primeiras
: à luz com unidades cristãs viam como fundam entais e doadoras de identidade, ju n
- i u I o pre- to com sugestões de possíveis estruturas interpretativas, perm itindo-nos ava
:f_5 de Na- liar quaisquer representações conceituais resultantes do evangelho — passados,
no caso presentes e futuros. Temos posse dos critérios pelos quais qualquer estrutura
proposta de conceitualismos pode ser gerada ou avaliada. N o fim, a doutrina
'i bíblica é cristã perm anece ou cai em relação à Bíblia, não a qualquer conjunto particu
la^rida por lar de conceitos.
: .; eia) pela A relação entre narrativa e metafísica pode ser explorada adicionalm ente
c s:a sobre, considerando-se a “teologia da cruz” de Lutero, talvez um dos mais teologica
-adiria. O m ente argutos relatos desse tem a.247 A teologia de Lutero é m uitas vezes incor
a :aterpre- retam ente descrita com o “anti-metafísica”, o que já levou a um grupo de juízos
ice; cristãs não-históricos com respeito à sua teologia. O ponto fundam ental de Lutero,
aaanárias, no entanto, é que a narrativa do Cristo crucificado deve ser interpretada com
^:am ento. base num a estrutura estabelecida por essa própria narrativa, em vez de com
>tasamen- base num a estrutura alienígena imposta. A hostilidade de Lutero para com a
r. arrativa a metafísica aristoteliana baseia-se na sua convicção de que esta im põe na narra
ira especí- tiva da Escritura um a estrutura interpretativa que leva a séria distorção dessa
c : aceitual narrativa.
icirnação) A preocupação exata de Lutero centra-se num grupo de atributos divinos,
e m e n te a tais com o a “glória de D eus”, o “poder de D eus” e a “justiça de D eus”. Se esses
1553 ocor- atributos são definidos na base de pressuposições metafísicas anteriores (inclu
c r riedade indo um uso não-crítico do princípio de analogia) o evangelho fica distorcido.
c- susten- C om o pode a revelação da “justiça de D eus” (iustitia Dei) (Rm 1.16-17) ser
icíologias boa-nova para a hum anidade pecadora, quando (com base em um a análise
rtranto, a aristoteliana de iustitia) essa revelação só pode ter im plícita a condenação? O
. r lhe foi rom pim ento teológico de Lutero (a ser datado em algum p onto de 1515)
carro das centrou-se em sua percepção de que é a narrativa de Jesus de Nazaré, enfocan
98
Conclusão
N este capítulo, argum entam os que o apelo evangélico à autoridade da
Bíblia é coerente e bem -inform ado. A atual retórica a respeito de um a “crise
em autoridade bíblica” é profundam ente enganosa, em que confunde questões
secundárias (o m odo em que a autoridade bíblica deve ser articulada e formaliza
da teologicamente) com a questão prim ária do papel fundam ental da Escritu
ra. C ada vez mais, os evangélicos estão expressando receios com respeito às
99
:ucde da
~ c 'crise
ruestões
?rrnaliza-
^'Critu-
íreito às
3
EVANGELICALISMO E PÓS-LIBERALISMO
do Ficará claro que esta crítica do papel fundam ental da experiência representa
r .: olano um passo decisivo de distanciamento da estratégia de um a geração anterior.
vozes As raízes filosóficas deste m ovim ento são complexas. D entro do m ovi
igrejas m ento, apreciação especial pode ser discernida pelo estilo de abordagem asso
' ;í:is vo- ciado com o filósofo Alasdair M aclntyre, que põe ênfase na relação entre
■: A vísta narrativa, com unidade e vida m oral.258 Nesse respeito, o pós-liberalismo rein-
r : í-libe- troduz um a forte ênfase na particularidade da vida cristã, em reação contra as
:.rresen- fortes tendências hom ogeneizadoras do liberalismo, em sua tentativa m alo
r -ícando grada de fazer coincidirem a teoria — de que todas as religiões estão dizendo a
mesma coisa — e a observação — de que as religiões são diferentes. Começamos
: í mais nosso envolvimento com o pós-liberalismo, considerando o próprio liberalis
=v : j teve mo.
. :Vc Di-
~ jlmer, D efinindo liberalism o
: : : corre-
Em certo sentido, “liberalismo” pode sim plesm ente ser definido como a
m ç a s de
posição teológica, até aqui característica de m uito da cultura ocidental, que
~e Yale
agora foi substituída pelo pós-liberalismo. N o entanto, há necessidade de ten
: : so .254
tar explorar, em maiores detalhes, os fundam entos do m ovim ento. 259 Talvez a
r í.ecidas
característica mais distinta do movim ento seja o seu acomodacionismo — isto é,
i o : que é
a sua insistência em que doutrinas cristãs tradicionais devem ser reafirmadas ou
pelo
reinterpretadas a fim de harmonizá-las com a tendência da época. Considerável
: resença
ênfase foi colocada na necessidade de se estar aberto para os novos insights
' 3 J pÓS-
apresentados pelo avanço filosófico, social e religioso, em vez de se estar am ar
: : .o pre-
rado a dogmas do passado. O liberalismo era especialmente hostil a qualquer
form a de particularismo, tal com o a noção de um a revelação divina especial.
d :m sua
Para o liberalismo, a religião precisa ser baseada em recursos hum anos univer
: rorma
sais, tais com o a cultura hum ana ou a experiência com um . A posição anti-
: liberal
particularista do liberalismo é especialmente evidente em sua antipatia para
l~ .1 toda
com a evangelização ou missão, que freqüentem ente são depreciados como
r_:i. falso,
“racismo teológico” ou “imperialismo cristão”.
5-5:5 pseu-
Para entender o liberalismo teológico, é necessário explorar as origens do
::idições,
liberalismo em geral. O term o “liberal” é term o francês em sua origem, datan
:.-iam C.
do da era napoleônica. O grande senso de libertação que acompanhara a Revo
::: ís fun-
lução Francesa de 1789 dera lugar a um sentim ento de desespero, à m edida
que a m áquina m ilitar de Napoleão esmagava tudo o que estava em seu cami
l: Bíblia;
nho. Tanto o regime jacobino quanto o bonapartista estenderam os poderes
■ nblicas
do Estado em nom e da “liberdade pessoal”, com base no pressuposto de que a
liberdade e a soberania do povo eram idênticas. As origens deste ponto de vista
provavelmente estavam na transferência que Jean-Jacques Rousseau propunha
das idéias clássicas romanas e gregas de virtude pública para a França moderna,
sem levar em conta a natureza fundam entalm ente diferente desses contextos.260
Reagindo contra essa evolução, m ovim entos surgiram que enfatizaram a
necessidade de salvaguardar a liberdade individual contra o controle estatal e
social, principalm ente lim itando-se o poder do Estado. O term o “liberal” foi
prim eiram ente usado nesse sentido político por escritores com o M adam e de
Stael e Chateaubriant, em 1807, ao se referirem especificamente aos que esta-
vam preparados para fazer oposição ao totalitarism o napoleônico.261 Em 1811,
a palavra aparece pela prim eira vez em espanhol, para se referir a elementos
reformadores preocupados em defender a liberdade da im prensa e liberdades
individuais. Sinais das origens estrangeiras da palavra na língua inglesa podem
ser vistos no diário de W alter Scott, que se referiu a um “partido de libéraux'.
A té a década de 1830, a palavra estava firm em ente estabelecida na língua in
glesa, sendo usada para se referir a um grupo de valores que abarcavam o ideal
de liberdade política, a inevitabilidade de progresso, a virtude da tolerância e o
poder da razão.262
Até a década de 1830, o term o “liberal” já estava em uso bastante regular,
referindo-se especialm ente a um a atitude política que celebrava o culto da
liberdade pessoal. E m seu dram a lírico Prometheus Unbound, [o poeta inglês]
Shelley escreveu sobre a natureza hum ana sendo “livre, incircunscrita, iguali
tária, sem classes, sem tribos e sem nações”. A natureza h um ana não era sujeita
a ninguém ; era totalm ente livre em suas escolhas. O forte senso de otim ism o
que permeava o m ovim ento, particularm ente no plano religioso, pode ser vis
to na famosa declaração de John M orley (1838-1923): “a natureza hum ana é
boa, o m undo tem condições de ser feito um lugar de habitação desejável, e o
mal do m undo é o fruto da m á educação e de instituições más”.263
Este sentim ento pode ser encontrado m uitas vezes no pensam ento inglês
liberal do início do século XX, e foi, em várias ocasiões, atribuído ao próprio
Jesus, com base no positivismo histórico um tanto ingênuo que caracterizava
o período. U m excelente exemplo é fornecido pelo teólogo liberal James Fran-
klin Bethune-Baker, que declarou que “a sociedade hum ana tem nela os ger
mes imortais do progresso em direção à sua perfeição, e as condições de sua
perfectibilidade foram descritas por dizeres com o os que são coletados no Ser
m ão do M o n te”.264 Isso ilustra tanto a sua visão perfeccionista da natureza
h u m an a com o a tendência liberal geral de projetar visões com pletam ente
m odernas em Jesus — um a tendência devastadoram ente caricaturada por
George Tyrrell, com particular referência a A d o lfv o n H arnack: “O Cristo que
H arnack vê, olhando para trás ao longo de dezenove séculos de escuridão católi
ca, é apenas o reflexo de um a face protestante liberal, vista no fundo de um
poço fundo”.265 Para m uitos, estas idéias sociais progressistas foram deixadas
em trapos nas conseqüências da Prim eira e Segunda Guerras M undiais, espe
cialmente quando os horrores dos campos de extermínio nazista se tornaram
am plam ente conhecidos.
D ado este compromisso liberal fundam ental com a liberdade, é provavel
m ente um a das maiores tragédias de nossos dias que em anos recentes o “libera
lismo” tenha, na visão de muitos observadores, degenerado de um compromisso
com abertura e tolerância para um a visão de m undo intolerante e dogmática,
que recusa reconhecer a validade de quaisquer óticas, salvo o próprio ponto de
vista. O liberalismo estava preparado para tolerar ou incentivar um a variedade
de pontos de vista, contanto que estes fossem relacionados com o m undo parti
cular dos indivíduos, e não tivessem im portância social ou pública. N a verdade,
o liberalismo representa um a tentativa de controlar — quer por marginalização
ou apaziguamento — as visões de m undo diferente dentro de limites estrita
m ente impostos, definidos e estruturados com base em sua percepção da nature
za da realidade. Efetivamente, o liberalismo adotou um a abordagem paternalista
para diferenças, tolerando-as enquanto não ameaçassem a sua hegemonia. É por
esta razão que a expressão “tirania liberal” está sendo cada vez mais aplicada ao
m ovim ento.266 Em bora possa inicialm ente parecer ser um oxim oro [palavras
reunidas, aparentem ente contraditórias], a expressão realm ente retrata com
acerto o desejo liberal de controlar diferenças segundo sua visão de m undo.
Isso é tanto verdade no cam po religioso com o o é na arena política. O teólogo
britânico John M acquarrie com entou:
O que se quer dizer com teologia “liberal”? Se significa apenas que o teólogo
a quem o adjetivo é aplicado tem abertura para outros pontos de vista, os
teólogos liberais são encontrados em todas as escolas de pensamento. Se
“liberal”, entretanto, torna-se o termo em si mesmo uma etiqueta de parti
do, ele geralmente acaba mostrando-se extremamente ilíberal.267
iizr.tal con- aristotelismo da Universidade de Paris do século XIII, ao escrever tanto a obra
l: : do que é Sum m a contra Gentiles como a Sum m a Theologiae. N em por isso já encontrei
_:r. escritor A quino descrito como um liberal. Realmente, essa abordagem é típica do cris
"basica- tianism o refletivo e intelectualm ente responsável no passar dos séculos. Essa
:.;om pro- visão é característica da reflexão cristã bem -pensada através dos dois mil anos
:: re.igiosas. de sua história, não a característica exclusiva ou descritiva do liberalismo.
certe- Um exemplo mais m oderno esclarecerá este ponto inequivocamente. Um a
í í ; visto de das mais significativas contribuições para a m oderna filosofia da religião vem de
: rssem um um grupo de escritores estado-unidenses, incluindo Alvin Plantinga e Nicholas
^rresentar- W olterstorff. Sua discussão do tem a “fé e racionalidade” tornou-se um ponto de
ü vez mais referência em debates recentes centrados neste tem a.274 C ontudo, o grupo não
: rrtoüente- tem inclinação nenhum a em direção ao liberalismo, representando em vez disso
i:r_cctual, a o que se poderia chamar de a “clássica abordagem reformada”, extraindo sua
r : : missada inspiração dos escritos de João Calvino. Em suma: não há nada distintivamente
r . : : 5 faz as liberal sobre ser academicamente sério e culturalmente informado.
raceis de A necessidade de ser sensível e responsivo a evoluções dentro da sociedade é
:.z:\ eu me incontestável. N ão obstante, para seus críticos, o liberalismo parece ter sido pos
Li rerda de suído de um a disposição para perm itir que seus planos e os recursos que ele leva
iz i questão a influir sobre eles sejam formatados por tendências transitórias, culturais, não
universais. O sociólogo francês Jacques Ellul (1912-94) identifica essa tendên
■: :í admiti- cia, que parece ter alcançado seu apogeu no fim da década de 1960 e primeiros
i - ' quais se anos da década de 1970, e aponta com seu dedo um dos aspectos mais aflitivos
r .: s atribu do liberalismo durante o decênio de 1960: sua tendência de dar feitio a teologias
i r : direta- a fim de justificar decisões que foram tomadas em outras bases.
r.r.céncia e -i'
f : “ emente O que me preocupa não é que as opiniões de cristãos m udam, nem que
;:í de uma suas opiniões são formatadas pelos problemas dos tempos; pelo contrário,
í_~:es como isso é bom. O que me preocupa é que os cristãos se conformam com a
■ reoresen- tendência do m omento sem introduzir nela nada de especificamente cris
v^rsal,2' 2 e tão. Suas convicções são determinadas pelo seu meio social, não pela fé
á s inade- * em revelação; falta-lhes a unicidade, a importância que deveria ser a ex
pressão dessa fé. É assim que as teologias tornam-se exercícios mecânicos
i ; :èm en- que justificam as posições adotadas, e justificam-nas em bases que abso
ir:ente in- lutamente não são cristãs.2 3
:: -im ento
■e-í= notar Teologias novas radicais — sendo “radical” um a palavra que então assegurava
rr. :■ se en- a credibilidade cultural das idéias a ela ligadas — eram elaboradas, geralmente
rr. mesmo com referência m ínim a ou altamente seletiva para a tradição cristã, o que providen
i i sério o ciava racionalizações post hoc de atitudes e idéias, cuja origem em últim a aná
lise se achava firm em ente no meio social. Para m uitos, parecia que a teologia
108
liberal era pouco mais do que um transitório aglomerado de idéias e valores, liberalisir.: :
derivados prim ariam ente do meio social em que os escritores liberais estavam — de m u n e :
geralmente universidades, separados das preocupações sociais e pastorais de cris princípio s r
tãos leigos comuns, e cada vez mais dom inados por um a visão secular que se do Ilumir.-S
esperava que a teologia compartilhasse, se fosse para m anter qualquer “credibi regiões. E q
lidade acadêmica”. O liberalismo escorregava facilm ente de rem etente para artigo re :tn
recipiente de um a cultura secular. dois eticis:i
O resultado dessa tendência é inevitável. E m sua obra American*Mainline enfatizair. i
Religion: Its Changing Shape a n d Future [Principal religião estado-unidense: sua da nova
mudança e futuro], os sociólogos W ade C lark R o o f e W illiam M cK inney digna de
fornecem um estudo im portante do declínio num érico regular em igrejas tradi ciar das "r n
cionais.276 A im portância da obra, no entanto, não se acha m eram ente em sua das do disn
docum entação de tendências, confirmadas em pesquisa após pesquisa, e ob teologia ru i
servadas em um capítulo prévio desse livro. R oof e M cK inney olham à frente Deus p ar: 3
para o futuro, e perguntam qual será o resultado dessas evoluções. A conclusão idéias e : : : ;
a que eles chegam: na década de 1990, o desafio ao cristianismo tradicional H á rr.-J
não virá dos “conservadores a quem desprezou, e sim dos secularistas a quem se dirija : :
777
gerou . " lares dos : : :
C ontudo, resta um a pergunta mais preocupante. Para onde está indo o coristas . t_;
liberalismo? O que ele tem a oferecer? Talvez a crítica mais devastadora do engajar c ~
liberalismo político deva-se a M ichael O akeshott, que o definiu como um a posta o fere:
associação civil sem objetivo estruturada por regras adverbiais.278 N ão tem fatalmer.r: :
realmente nenhum propósito. Sendo assim, Ronald D w orkin argum enta que valores cu :;
a virtude do liberalismo não está em sua prom oção ativa de nenhum conceito da cultur: s
de m oralidade ou do propósito da vida, e sim em sua recusa de prom over argum enr: ;
qualquer m odo de vida.279 E neutro. A m esm a agenda atravessou para o libe dentes a : : n
ralismo teológico, que já se tinha tornado decididam ente relutante para falar salmente
de evangelismo por causa de suas pretensões aos privilégios. A não ser que o se dirigir.
liberalismo recupere um com prom isso firme com o evangelho de Jesus Cristo, Há
é difícil ver o que pode ser feito para que ele continue a existir. Será ignorado noções sl: 2
pela igreja e pela sociedade, com o um todo. E esse m edo assom brado de ser são dadas ;_
condenado à irrelevância está por trás de um a das mais interessantes evoluções vida-rea_.- r. 3
dentro de um liberalismo cada vez mais cerceado — a busca por um a “teologia cristãos. ~rr>
pública”, para a qual podem os agora nos voltar. abstrações e
lições q u : 5
O liberalism o e a busca p o r um a “teologia p ú b lic a ” anos da : : :
U m tem a repetitivo da cena cultural contem porânea é o reconhecim ento Cynic [Ps;r:
de que o Ilum inism o chegou ao fim. O surgim ento do pós-m odernism o na
Se u ~ rr
cultura em geral, da Nova Era na esfera da espiritualidade pessoal,280 e do pós-
criar
liberalismo no cam po da teologia cristã, tudo conduz ao colapso da fé na visão
de m u n d o do Ilum inism o, especialm ente de seu racionalism o e busca por
princípios fundam entais universais. C ontudo, a notícia da m orte dem orada
do Ilum inism o parece ter sido m arcadam ente lenta para viajar para algumas
regiões. E quase com o se alguns pensadores não suportassem essa idéia. U m
artigo recentem ente publicado no Christian Century ilustra esse ponto. Nele,
dois eticistas cristãos liberais — M ax L. Stackhouse e D ennis P. M cC ann —
enfatizam a necessidade de um avivamento de “um a teologia pública”.281 A luz
da nova situação que se seguiu ao colapso do socialismo como visão m undial
digna de crédito — eles argum entam — existe um a necessidade de se distan
ciar das “particularidades confessionais, histórias exclusivas e esferas privilegia
das do discurso”. “Esta program ação para o pensam ento cristão requer um a
teologia pública, um m odo de falar sobre a realidade de D eus e a vontade de
Deus para o m undo que seja intelectualm ente válido na praça do m ercado de
idéias e m oralm ente eficaz no m ercado de bens e serviços.”
H á m uitas razões para apoiar esta proposta. Ela insiste em que a teologia
se dirija ao mais am plo dos públicos, exigindo ser ouvida até nos mais secu
lares dos contextos. A não ser que os cristãos devam m eram ente “pregar a seus
coristas”, eles precisam encontrar algum m odo “intelectualm ente válido” de
engajar o m undo secular lá fora. C ontudo, sob inspeção mais precisa, a pro
posta oferecida com tanta sinceridade por esses escritores acaba se m ostrando
fatalm ente falha. Ela se firm a no pressuposto de que, enquanto a linguagem e
valores da teologia cristã são form atados pela história, os valores e linguagem
da cultura secular não são condicionados por tais influências. N o cerne do
argum ento está um apelo aos “princípios de verdade, justiça e am or transcen
dentes a contextos”. Em outras palavras, essas três noções abstratas são univer
salm ente válidas, e determ inam a estrutura a que um evangelho público precisa
se dirigir.
H á três falhas principais nessa abordagem. Em prim eiro lugar, essas três
noções são abstrações improdutivas, que só podem vir a ser vivas quando lhes
são dadas substância. Precisam ser particularizadas, localizadas em situações da
vida-reaf. Esse ponto já foi apreciado pela m aioria dos pregadores e pastores
cristãos, preocupados em tratar das questões da vida real, em vez de tratar das
abstrações entorpecedoras de princípios gerais. Todos precisam aprender as
lições que R einhold N iebuhr aprendeu no centro da cidade de D etroit, em
anos da década de 1920. Em sua obra Leaves jrom the Notebook o f a Tamed
Cynic [Páginas das anotações de um cínico amansado], (1929), N iebuhr escreveu:
•" é reconheci- O argum ento básico é que a teologia liberal sente estar sob algum a espécie
c mme à opressão. de obrigação de se firm ar em algo na arena pública — tal com o conceitos
t ce escritores li- filosóficos ou “experiência com um hum ana”.28/ Lindbeck declara esta preocu
mmversais de for- pação liberal em term os de um “comprom isso com o em preendim ento funda
: r. ■rrutos fictícios, m ental de descobrir princípios ou estruturas universais”, quer estes acabem
Lz Pressuposições. sendo metafísicos, existenciais ou diferentes desses.288 O impulso fundam en
: "imperialista” talm ente apologético em intenção é encontrar um a base com um para a teolo
m m e justificável, gia cristã e o discurso público cristão, por um a análise anterior de conhecim ento,
e.; representa um cultura ou experiência hum ana. O m érito desta apreciação crítica está provavel
: u de “tribalis- m ente mais evidente no caso de Paul Tillich, cuja teologia apologética é am
e ~mor e raciona- plam ente vista como pronunciada por ditames extrabíblicos e não-cristãos, e
c.mmes de aceitar inadequadam ente baseada nas particularidades da tradição cristã.
universal” ou Esta tentativa de libertar a teologia cristã de pressupostos extrabíblicos será
í: c o m o — para m uito bem recebida por evangélicos.289 Isso certam ente indica que os evangéli
r.r.sen Crusoé. O cos podem se aliar, pelo menos até certo ponto, com a ênfase do pós-liberalismo
£-: se — é ampla- na Escritura bíblica como única fonte norm ativa da teologia e vida cristãs. Os
e -e acertou com evangélicos e pós-liberais parecem compartilhar o tipo de interesse freqüente
i cmatoriamente m ente expresso por Karl Barth com respeito à escravização ou corrupção em
. mcerce, um fun- potencial do pensam ento cristão por meio da intrusão de pressupostos estra
ic.e. O nascimen- nhos resultantes de um m étodo teológico deficiente, por interm édio do qual,
M-smo. que dá a há a permissão para que as idéias originadas fora da igreja assumam um a in
•o : severo novo fluência controladora dentro deja. Já exploramos a vulnerabilidade do libera
nr ocerto os olhos lismo nesse ponto (ver p. 60-61); na verdade, é necessário até adm itir que o
c c m ndo os críti- próprio evangelicalismo já tenha sido indevidam ente influenciado por pres
m mito de um a supostos do Ilum inism o, particularm ente no caso da antiga escola de Prince
ton (ver p. 140-146).
i :r:sce” das “Un N ão obstante, isso não exclui o procedim ento apologético de tentar iden
ir : nós-liberalis- tificar com unidades entre o evangelho e a experiência hum ana, a razão ou a
rmir um a criança cultura como possíveis “pontos de contato” para a evangelização.290 N em isso
irm ora, aconche- envolveria a rejeição do uso de term inologias e conceitos extrabíblicos no es
c :em enfatizado, forço de explicar ou deixar mais inteligível o caráter distinto do cristianismo
lt n rotundam ente para um auditório secular. O liberalismo acabou tornando o secularismo digno
m rm iindo clareza de crédito para o cristianismo em vez de ser ao contrário. O pós-liberalismo
ç i j in terio r dog- evita esse desastre apologético.
emção do caráter Enquanto a estratégia liberal mais antiga e agora desacreditada envolvia a
ã : contra a ilusão procura por princípios universais fundam entais, deste m odo — em efeito mais
.cr genuinam ente do que po r intenção — reduzindo o cristianism o a tais princípios, o pós-
L: seguinte; nossa liberalismo oferece um a posição m ediadora pela qual o cristianismo pode ser
>eral que sustenta explicado e recom endado, usando-se term inologias e conceitos m ediadores
sem perm itir que eles sejam sistem aticam ente anteriores ao evangelho, nem
que eles controlem nosso entendim ento do próprio evangelho.291 A apologética
é assim entendida como fundam entada em e controlada pela teologia sistemática,
com cada e toda a estratégia apologética sendo vista com o provisória e heurís
tica, respondendo à situação particular que está sendo tratada.292
-:. nem A pergunta crítica que surge desta abordagem, à qual voltarem os mais
-: gética tarde neste capítulo, é se teologia é sim plesm ente sobre a gram ática da fé —
r-T.ática, isso é dizer, regulagem de discurso cristão. A que esse discurso se relaciona? H á
rsurís- algum a realidade ou conjuntos de realidades fora do texto bíblico a que a
narrativa bíblica se relaciona? Será que as afirmações teológicas simplesmente
articulam gramática bíblica, ou elas se relacionam com alguma ordem objetiva,
sem considerar se reconhecemos ou não esse relacionamento? C om o veremos,
:eito um a ansiedade central evangélica que trata da abordagem pós-liberal é que ela
: visao parece representar um negocio puram ente intratextual, com pouca preocu
r estar pação pela sua possível relação com um a realidade objetiva externa.
Jesus A afirmação mais im portante dessa abordagem é encontrada nos escritos
Im do de George Lindbeck, especialmente na obra Nature ofD octrine [Natureza da
uralis- doutrina]. U m dos m uitos m éritos desse livro é o debate que ele iniciou sobre
:ão de este aspecto injustam ente negligenciado da teologia cristã, que tem recentem ente
udeus assumido nova im portância por causa do im pacto do m ovim ento ecum êni
? dife- co.296 E, pois, mais do que apropriado que essa tentativa de explorar a relação
. espe- entre evangelicalismo e pós-liberalismo comece por um delineam ento e —
i uma por provisoriam ente que seja — responda à análise de Lindbeck.
idição U m dos aspectos mais curiosos e tantalizantes da Nature o f Doctrine de
" ta da Lindbeck é que ele pretende claram ente que esse seja um texto pré-teológico,
em vez de um exercício em teologia sistemática. A obra esboça um program a de
:io nos pesquisa, em vez de articular seu resultado. Lindbeck vê o livro como sugestão
de um a estrutura para a exploração de perguntas e questões teológicas, em vez
;;n tra l de cuidar dessas questões diretam ente. Isso torna o texto um tanto difícil para
lin- um evangélico que tenha interesse especial no resultado da aplicação de um
rigmas m étodo, em que o evangelicalismo julga a confiabilidade de um m étodo teológi
- í cernir co, em parte em term os de suas conseqüências. E razoável revelar que Nature
ofDoctrine [Natureza da doutrina] foi publicado em 1984, o que perm itiu um
tem po mais do que suficiente para a aplicação subseqüente de sua abordagem;
no entanto, o próprio Lindbeck não produziu ainda um a obra substancial que
in d iq u e evidência de um a transição de investigação pré-teológica para a
declaração teológica.
N o que se segue, m inha análise é, portanto, necessariamente lim itada ao
próprio Nature ofDoctrine [Natureza da doutrina]\ ligando a análise de sua abor
dagem com um a tentativa de explorar no que as conseqüências de sua aplicação
poderiam se tornar. N o entanto, nessa parte do program a pré-teológico de Lind
beck que inclui a avaliação de abordagens existentes, é especialmente apropriado
sugerir e criticar sua avaliação de abordagens rivais. Por isso, voltamo-nos para
considerar a exposição de abordagens “proposicionais cognitivas” à doutrina.
A apreciação de Lin d b eck sobre o evangelicalism o
Com o resultado de sua análise da natureza de doutrina, Lindbeck identifica
três “teorias” ou entendimentos. Já temos endossado e expandido a análise de
Lindbeck sobre a abordagem à doutrina, a qual é característica do liberalismo
teológico, particularm ente na América do N orte, a que Lindbeck se refere como
a abordagem “experimental-expressiva” (ver p. 62-64). Em bora Lindbeck não
indique explicitamente que pretende tratar do evangelicalismo, um a das abor
dagens que ele comentará claramente seria associada com o movimento.
Este é o ponto de vista, designado por Lindbeck com o “proposicional” ou
“cognitivo”, que trata das doutrinas com o “proposições informativas ou reivin
dicações da verdade sobre realidades objetivas”.297 Este estilo de abordagem há
m uito tem po já é associado com o evangelicalismo, e tornou-se de especial
im portância no renascim ento evangélico da década de 1960, quando evangéli
cos como Carl H enry reagiram contra as abordagens à revelação associadas
com a neo-ortodoxia, por meio de ênfase forte no conteúdo inform ativo da
revelação divina, que era para ser articulada em form a de proposições. E n
quanto já argum entei que essa abordagem à doutrina cristã é inadequada, em
que deixa de fazer jus à plena complexidade das noções bíblicas de revelação,
continua sendo axiomático para os evangélicos o fato de tanto revelação como
doutrina terem aspectos cognitivos ou informacionais. A crítica explícita de
Lindbeck a tais abordagens im pacta claram ente sobre o evangelicalismo, mes
m o que o próprio Lindbeck não apresente explicitamente tais conexões.
Lindbeck argum enta que esta abordagem deve ser rejeitada como volun-
tarista, intelectualista e literalista, fazendo até a sugestão de que os que “perce
bem ou experim entam religião de m aneira cognitivista” são os que “com binam
insegurança descom unal com ingenuidade”.298 U m a prim eira hesitação sobre
esta crítica diz respeito à sua confiabilidade: parece ser baseada n u m entendi
m ento questionável da posição “cognitivo-proposicional”, aparentem ente basea
da no conceito de que os inclinados a esta posição m antêm a opinião de ser
possível declarar a verdade objetiva sobre Deus de m odo definitivo, exaustivo
e atem poral em form a proposicional.
Isso não pode ser considerado com o um a representação adequada dessa
posição, nem em sua form a clássica nem em sua form a pós-crítica. Deixa de
registrar a sofisticação histórica e lingüística de abordagens cognitivas à doutri
na.299 Por exemplo, a sugestão de Lindbeck de que a abordagem “cognitivo-proposi
cional” à doutrina trata de um a dada doutrina qualquer como “eternam ente
verdadeira”300 deixa de levar em conta a evidente capacidade de proponentes
desta abordagem de reformular, ampliar ou suplementar um a doutrina com cir
cunstâncias históricas em m udança.301 Lindbeck atribui um a imerecida inflexi
117
sentá-las em sua totalidade, e dadas as limitações inevitáveis que acom panham cogn::;' i
qualquer tentativa de expressar em palavras algo que em últim a análise está para . >
além delas, é a form a particular de palavras empregadas a mais confiável num experic"
m odo concebível? A controvérsia de Nicéia é um exemplo óbvio de um a luta naturi_n
para articular descobertas dessa maneira. Se um a experiência deve ser articulada cogn::/.-;
em palavras, a fim de comunicar ou tentar visionar em com um essa experiência, " D :;:
alguma forma de um a dimensão “cognitivo-proposicionaT é inevitável. C ontu que c r e:
do, isso não é reduzir a experiência a palavras, mas simplesmente tentar transmi- até o r. c r
ti-la por palavras.306 por exí.T
Este ponto com respeito à verbalização da experiência é válido, irrespecti- los c:m
vo se as palavras usadas são vistas ou não com o transmissoras de um a verdade mo t e : - 3
ontológica. Por exemplo, considere as linhas poéticas de Longfellow, de Saga unh _
o fK in g Olaf: deste r : i
a a b o rc i
O uvi um a voz que clamou, da d cu :r
Balder o belo tandc ur.
está m orto, está m orto. como e
Estas palavras não seriam consideradas ontologicam ente verdadeiras. Para usar to co'-: -
os term os de Lindbeck, elas são intrassistem icam ente verdadeiras, em que são h o m e~ 1
coerentes dentro do contexto do m ito nórdico de Valhalla.307 Esta afirmação
não deixa que seja implicado nada com respeito à verdade ou falsidade, a não nitiva> ]
ser que o m ito seja lido com o história. C ontudo, assim descreveu C. S. Lewis por e:ce~
a sua reação, ao ler os versos de Longfellow: “Eu nada sabia sobre Balder; mas o m eu ::
instantaneam ente fui elevado a regiões vastíssimas do céu setentrional, e dese Zuíntu: :
java com intensidade quase doentia algo que jamais poderá ser descrito (salvo tivas r:c§
que é frio, am plo, austero, pálido e distante); e então, [...] surpreendi-m e exa e discu:s
tam ente no m esm o m om ento, já perdendo o desejo e ansiando que ele vol mente
tasse.”308 m ente
Seria absurdo sugerir que palavras podem captar adequadam ente um a ex figuras e
periência; Ludwig W ittgenstein, que lam entou a incapacidade das palavras não-l:rt:à
para descrever ou transm itir o arom a do café, deixou-nos seguros de que esta em sue; j
mos perfeitamente apercebidos desse ponto. C ontudo, será que isso é um a coisa cia ote:rc
tão significativa? As palavras podem não ser capazes de prover um a descrição cia s e n ::;
totalm ente compreensiva do cheiro bom do café; assim m esmo, palavras são em
suficientem ente ajudadoras para deixar-me saber onde achar café, como asse por Licu.
gurar que o que achei é mesmo café, e depois experim entar seu aroma. Teorias teoriaí :i
cognitivas de doutrina reconhecem que palavras estão nas bordas da experiência, impacièr..
intim ando e colocando avisos da realidade que elas não podem captar. Aplicar de se e u r
epítetos pejorativos tais com o “intelectualista” ou “literalista” à abordagem
119
>: irúriva tem Por trás da profundidade da experiência hum ana e encontro jaz um a ten
:: _:rina, em são não resolvida — a tensão entre o desejo de expressar um a experiência em
r-ireriència é palavras, e a incapacidade das palavras para captar essa experiência em sua
' • paralelos plenitude. Tudo na experiência hum ana que é precioso e significativo é ameaça
i.::edca e na do de extinção, no que está em algum sentido além das palavras; contudo,
: ~ : análoga exige ser expresso em palavras para que se torne conhecim ento hum ano. E
txperiên- ameaçado com o espectro do solipsismo, no que, a não ser que um a experiên
■ torm u- cia possa ser com unicada a outrem , ela perm anece presa dentro do m undo
c.::;uldades particular experimental de um indivíduo. Palavras podem apontar para um a
ivcís para a experiência, podem começar a esboçar seus contornos — mas a descrição total
ao leque dessa experiência perm anece além das palavras. Palavras apontam adiante de
•ci :m pala- si, a algo m aior que foge ao seu alcance. Palavras hum anas, e as categorias que
. i . deve-se elas expressam, são esticadas até seus limites ao tentarem encapsular, com uni
::r~ d id o s e car, algo que atorm entadoram ente recusa ser reduzido a palavras. E a pura
i ; ■í 5 para a simulação da experiência hum ana, sua recusa obstinada de ser aprisionada den
tro de um a m atriz verbal, que aponta igualm ente para a necessidade de poesia,
~r.;:da con- simbolismo e doutrina. U m a impaciência exatamente com essa simulação parece
: m g e m as- estar por trás da rejeição de qualquer com ponente cognitivo a afirmações
c : renatural doutrinárias.
t : rosições. A intimação de algo mais que está além e é sinalizado pela experiência, é
■ _:~dbeck. característico da experiência hum ana. Vivemos nas terras marginais de algo
-'j. modelos mais — algo intim ado, algo por fim posicionado além dos horizontes de nossa
‘.if cogniti- com preensão, contudo, ocasionalm ente penetrando em nossa consciência.
ti -istinção Experiência e linguagem apontam para além de si mesmas, testificando que
.: ue Deus algo está além de suas divisas, contudo, como terreno em que, de m odo tanta-
líi : de que lizante, nós não conseguimos entrar. Linguagem do dia-a-dia se perde ao ten
£r.::ivo em tar captar além da soleira do empírico e observável, para captar o que sabe que
rz;:>am ser está adiante. C om o W ordsw orth sugere, os seres hum anos são “habitantes das
regiões fronteiriças”, firm em ente baseados no m undo real da experiência h u
cru definir m ana, contudo, estendendo-se em aspiração além de seus lim ites.312
Lr.a. como Esta sensação de estender-se atrás de algo inatingível, sugerido, mas não
i_:::na seja entregue pela experiência, tem nuanças fortem ente religiosas e conseqüências
>r ; surgi- religiosas im portantes. N ão está, porém , em nada confinada ao que podería
F.: mantis- mos razoavelmente cham ar de experiência “religiosa” ou situações “religiosas”.
:í::nho de A observação freqüente é que os hom ens n utrem ideais altos que, repetida
r~ a à vida m ente — e m uitas vezes tragicam ente — , deixam de alcançar. Existe a tensão
c uente in- no plano m oral entre os seres faltosos e finitos que somos, e o alto destino para
que nós nos sentimos chamados.
U m a tensão similar, captada por C. S. Lewis, existe no plano estético, na
busca por beleza.313 O m esm o senso de anseio doce-amargo, de Sehnsucht?lA
da incapacidade tanto da experiência de entregar o que prom ete, com o das
palavras hum anas para captar aquela experiência e as aspirações que ela en
gendra, perm eia os escritos de Evelyn W augh, talvez mais poderosam ente na
pungência fina de Brideshead Revisited, à m edida que lembranças do passado
invadem, ilum inam e transform am o presente.
Uma religião pode ser vista como uma espécie de estrutura ou meio cul
tural e/ou lingüístico que formata o todo da vida e pensamento [...] Não
é em primeiro plano um a coleção de crenças sobre a verdade e o bem
(embora possa envolvê-los), ou um simbolismo expressivo de atitude,
modos de sentir ou sentimentos básicos, (embora estes venham a ser gera
dos). Ao contrário, é semelhante a um idioma que torna possível a des
crição de realidades, a formulação de crenças, e a experiência de atitudes
interiores, modos de sentir e sentimentos. Como uma cultura ou língua,
é um fenômeno habitual que formata o subjetivismo de indivíduos em
vez de ser primariamente um a manifestação desse subjetivismo. C om
preende um vocabulário de símbolos discursivos e nao-discursivos junto
com uma lógica ou gramática distinta em termos da qual esse vocabulário
pode ser empregado significativamente.324
1. O que é verdade?
A que se referem as declarações teológicas? Em sua Grammar o f Faith
[Gramática da fé], Paul H olm er explana um a teoria reguladora de teologia que
claram ente tem tido algum a influência sobre a abordagem de Lindbeck. A
teologia é essencialmente interessada na descrição de regras intrabíblicas para
se falar em Deus, Cristo, e assim por diante. Essas regras não são estabelecidas
pela teologia; já são dadas no m aterial bíblico em si.328 Neste sentido, a teolo
gia nao introduz nada de novo ao m aterial bíblico, mas sim plesm ente expõe as
estruturas que já estão presentes, em m uito com o a gram ática coloca as regras
que governam o uso da linguagem .329 A gram ática é descritiva, não estabelece
regras; sim plesm ente rem ete informações sobre as regras que já são operacio
nais.
Lindbeck crê que a teologia trata da articulação e exploração dos aspectos
intra-sistêmicos da fé cristã. Aqui, Lindbeck segue a tradição associada com
Schleiermacher em adotar um conceito de doutrina essencialmente descritivo.
Para Schleiermacher, teologia dogmática é “o conhecimento de doutrina atual
m ente corrente na igreja”.330 Em essência, a teologia é um a investigação a res
127
r.r realidades peito da adequação de doutrinas para articular a fé que elas expressam. O teólo
cue se segue. go é obrigado a considerar o “valor eclesiástico” e o “valor científico” das doutri
nas — em outras palavras, sua adequação como expressões de sentimento religioso,
e sua coerência com o contexto do vocabulário teológico como um todo. A
:ur um a críti- doutrina é descritiva, prim ariam ente interessada em coesão intra-sistêmica.
u ?er prefa- Lindbeck parece sugerir que a abordagem lingüístico-cultural à doutrina
pode prescindir saber se o idiom a cristão tem qualquer referente externo. A
-'r estuda- língua funciona dentro de um m undo cultural e lingüístico; ela não se refere,
:: rrida para entretanto, a nada. A doutrina se preocupa com a regulação interna da lingua
ue fins do gem cristã, assegurando sua coerência. A questão de com o aquele idiom a se
relaciona com o m undo exterior é considerada im própria. Lindbeck oferece
'i- e valores como ilustração um a comparação entre um gram ático aristotélico e um não-
aristotélico. Am bos estariam de acordo com a opinião de que as sentenças
uentro da corretas têm certos componentes, como um sujeito e um objeto. O aristotélico,
então, argum entaria que a sentença “espelha”, de alguma forma, a realidade,
-..reralism o, enquanto o não-aristotélico m anteria a opinião de que essa afirmação gramati
f : oressair a cal não tem nenhum a implicação ontológica. D e form a semelhante — Lind
-f - - porém , beck argumenta — , o teólogo cristão pode permanecer “gramaticalmente ortodoxo”,
.: rerguntas sem denotar nenhum a pretensão metafísica, contentando-se em seguir as re
ruuuerwas e gras, em vez de aceitar suas implicações ontológicas.331
Para Lindbeck, doutrina é a linguagem da com unidade cristã, um idioleto
autoperpetuador. C om efeito, em alguns pontos ele parece sugerir que conce
ber teologia com o a gram ática da língua cristã exige o abandono de qualquer
o f Faith conversa sobre Deus como um a realidade independente e qualquer sugestão
cer.ogia que de ser possível fazer reivindicações sobre a verdade (num sentido ontológico,
-vrubeck. A em vez de intra-sistêmico) com respeito a ele.332 Lindbeck argum enta que a
'.ruças para teologia é um a “atividade de segunda ordem ” que não faz reivindicações da
^urrelecidas verdade, esta função sendo reservada para declarações de “prim eira-ordem ”.
u :. a teolo-
r.re expõe as Como a gramática por si não afirma nada, nem algo de verdadeiro nem
sca as regras algo de falso sobre o m undo em que a linguagem é usada, mas só sobre a
c estabelece linguagem, a teologia e a doutrina, até onde são atividades de segunda-
?: jperacio- ordem, nada afirmam de verdadeiro ou falso sobre Deus e sua relação com
as criaturas; falam apenas sobre tais asserções.333
í :; aspectos
“Verdade” é assim igualada com — virtualm ente ao ponto de ser reduzido a
:;;a d a com
— consistência, ou coerência interna. C ontudo, o próprio Lindbeck parece
: uescritivo.
nublar a distinção decisiva que ele introduz entre afirmações de “prim eira or
trriua atual-
dem ” e afirmações de “segunda-ordem ”. C om o Bruce M arshall, um antigo
earão a res
aluno de Lindbeck, tem com entado, há fortes paralelos entre as abordagens à
128
verdade associadas com Tomás de A quino e com Lindbeck.334 U m compromisso cristo i cri
implícito com pontos de vista sobre a verdade em relação aos quais os evangélicos d o u triru
pouco achariam para discordar está por trás da análise de Lindbeck, mesmo atribuiu]
que ele próprio não articule isso explicitamente. associuu.3
Portanto, com base na citação já feita, a conclusão seria que a teologia do co:'rr
regula a m aneira em que cristãos falam sobre Deus, mas não com enta sobre a ontolcui.
pretensão de que tais declarações sejam verdadeiras. “Religião” é, portanto, a
língua; teologia é só a gram ática que a regula. Faz pouco sentido perguntar se ca? Es:ur
a língua grega, a latina ou a inglesa é verdadeira; faz sentido, porém , descobrir m odem :
as regras que governam sua operação, a fim de que possam ser entendidas. m a. Nu
C ontudo, é um a simples m atéria de fato — que Lindbeck parece conceder o te rrr.:
im plicitam ente, ainda que não chame atenção para isso — que as religiões m a H.-.":
têm , sim, pretensões sobre a verdade, deixando a comparação direta de “re m ente; :>
ligião” e “linguagem ” deficiente em pelo m enos esse respeito. Se a linguagem é definiu r
para ser adotada como um m odelo para a religião, ela precisa ser reconhecida p e riè n : .=
com o tendo suas limitações, especialmente nesse respeito. C :n
Esta aparente evasão ou fuga de pretensões da verdade pode ser vista na pergu::::
discussão de Lindbeck sobre o homoousion. E nquanto ilustrando seu entendi relacic:::
m ento da função reguladora de doutrinas dentro da teologia, Lindbeck sugere com o : ?
que o credo Niceno “não faz reivindicações de verdade de prim eira ordem ”.335 N a za:e:
Em outras palavras, o homoousion não faz nenhum a referência ontológica, mas coisa? . :
m eram ente regula a linguagem tanto a respeito de Cristo com o de D eus.336 pencen:
Este estudo de caso é im portante, na m edida em que fornece um dos poucos Li ra
exemplos trabalhados, históricos, da tese de Lindbeck, perm itindo assim ser tifica : : :
julgado tanto sua com petência histórica com o teológica, por provisional que perene "
seja a m aneira. Lindbeck afirma que Atanásio entende o term o homoousios a p ro m
com o significando “tudo o que se diz do Pai é dito do Filho, exceto que o não r :1
Filho não é o Pai’”, assim, dem onstrando que Atanásio “pensou nisso, não pela u:'!
com o proposição de prim eira-ordem com referência ontológica, mas como p O S S i ;Ui
regra de pronunciam ento de segunda-ordem ”.337 Só no período medieval — danei: ..
Lindbeck sugere — , conceitos metafísicos entraram para ser lidos nesta abor que r : u
dagem essencialmente gramatical ao homoousion. N o período patrístico — ele ficaçl: 1
argum enta — , o term o era entendido com o um a regra de fala, bem indepen tação : :>
dente de qualquer referência à realidade extralingüística.
cristã r ]
C ontudo, Lindbeck parece negligenciar o fato de Atanásio basear a função
da e c r:
reguladora do homoousion em seu conteúdo substantivo. Em outras palavras,
dada a relação ontológica de Pai e Filho, a regulação gramatical de linguagem
c ia ln e r
a respeito deles segue como coisa natural. Para Atanásio, pareceria que “o ho
ao
moousion, reguladoramente construído, elimina inovação ontológica, não refe
de de;ui
rência ontológica”.338 Isto não é, que se enfatize, dizer que os debates patrísticos
129
rre a priori- original histórico, nem na situação atual. Enquanto a abordagem nos perm ite
eu: Ritschl, identificar um a abordagem cristã à identidade e im portância de Jesus Cristo,
de fé é deixa-nos com a questão severamente difícil de perguntar se essa abordagem é
:: i comu- ela m esm a justificada.
r. -rente do Assim, Frei declara que “a história do Novo Testam ento trata simples e
z ungelhos exclusivamente da história de Jesus de Nazaré, quer seja esta fictícia ou real”.358
7._;rão deve Enquanto im ediatam ente concedendo as dimensões positivas deste ponto, não
7 7? repre- m enos seu enfoque em Jesus, a dificuldade central torna-se clara de imediato.
pala- A “história” é mesmo fictícia ou real? C om o se poderia saber que não é simples
7 - 7 anzten m ente “um trecho de hiperficção requerendo ser um fato que se autogarante”?359
r 7:stórica,
Em bora esta questão possa ser descartada como ingênua po r alguns teólogos,
: :vío no
ela continua sendo de fundam ental im portância. A ansiedade central que even
.r.idade de
tualm ente levou à desagregação da abordagem bultm anniana à cristologia se
re o crente
enfocava no fundam ento cristológico m inim alista do querigm a — “das Dass”.
C:.e que é
E se o querigm a entendeu Jesus erradamente? As implicações cristológicas dis
so eram graves, e exigiam exploração, à m edida que tom ava impulso o desen
c : m todos
volvim ento da “new quest” (nova busca). C om o os escritos de E rnst Kásemann,
_ :?o com
Joachim Jeremias e G ünther Bornkam m dem onstram ,360 a relação entre fé e
rre?são de
história, descartada por Bultm ann como um a irrelevância, tornou-se um a questão
:: rã Deus,
central de estudos eruditos sobre o Novo Testamento e de reflexão cristológi
■rundador
ca.361 C ontudo, Frei parece nos levar de volta a um a rota bultm anniana desa
u: Ilumi-
creditada, sem a atenção devida para suas fraquezas percebidas e desenvolvimentos
:.;:o como
subseqüentes.
r. ria é pri-
A vista da im portância deste ponto, podem os explorar as diferenças entre
7 a comu-
B ultm ann e G erhard Ebeling a respeito dele.362 As diferenças entre B ultm ann
frrairam .
e Ebeling relacionam-se diretam ente com a sua avaliação do significado teológi
7 irudesse
co da figura histórica de Jesus de Nazaré. Para B ultm ann, tudo o que poderia
lerendên-
ser e tudo o que se poderia exigir que fosse conhecido sobre o Jesus histórico
uuressão é
era o fato de (das Dass) ele existir. Para Ebeling, a pessoa do Jesus histórico é a
u:?torica-
base fundam ental (das Grunddatum) da cristologia, e se pudesse ser m ostrado
. rrim azia
que a cristologia era um a interpretação errada da im portância do Jesus históri
i ;ristã.
co, essa seria levada a um fim. Nisso, Ebeling pode ser visto expressando as
: rnticada
preocupações que estão por trás da “nova busca do Jesus histórico”. Ebeling
7 unidade
aqui revela um a deficiência fundam ental na cristologia de Bultm ann: ela ter
t mais do
total falta de abertura à investigação (talvez “verificação” seja um term o m uito
s um páti-
forte) à luz da erudição histórica. N ão poderia a cristologia repousar sobre um
ue Hans
erro? C om o podem os saber que há um a transição justificável da pregação de
::m o “re-
Jesus para a pregação sobre Jesus? Ebeling desenvolve críticas paralelas às que
r.: entan-
foram feitas em outra parte por Ernst K ásem ann,363 mas com um enfoque
i "ntexto
136
(Eurc
a reliu
EVANGELICALISMO E PÓS-MODERNISMO
;-ram, na algumas bases para sugerir que tendências dentro do próprio protestantism o
- u^oroso foram responsáveis pelas origens do Ilum inism o.377 Q ualquer que seja a expli
emão Jo- cação, é ela m atéria de fato histórico que a visão de m undo do Ilum inism o, em
: mostrar várias formas locais, veio a ser dom inante naquelas áreas onde o evangelicalis
.rado por mo expandiu-se com o conseqüência dos reavivamentos e renovações do sécu
:am todo lo XVIII, e em que teve de se defender no século XIX.378 Assim, o Ilum inism o
teve pouco im pacto em países com o a Espanha, Grécia e Itália,379 nos quais o
m inismo evangelicalismo não tinha quase nenhum a presença, mas foi dom inante na
Alemanha, Inglaterra, Escócia e América do N o rte.380 C om o resultado, um
bom núm ero de pressupostos fundam entais do Ilum inism o parecem ter sido
10 absorvidos sem crítica no m ovim ento nesses estágios formativos.
::m u m a U m excelente exemplo é dado pela “filosofia do senso com um ”, um estilo
. reflexão de filosofia com linhagem reconhecidam ente reformada, mas fortem ente in
e um dia fluenciada por idéias do Ilum inism o, que emergiu nas universidades de Glas-
i. íua in- gow e Edinburgo, em fins do século XVIII, e foi associada com pensadores
rzm s u r como Francis H utcheson, Thom as Reid, A dam Sm ith, A dam Ferguson, H ugh
is iderada Blair e W illiam R obertson.381 Essa filosofia, particularm ente nas formas asso
í : -ógícas ciadas com Reid e H utcheson, foi introduzida na escola que se tornaria na
deixou Princeton University (naquele tem po, ainda conhecida com o a “College of
cam inho N ew Jersey”), por John W itherspoon, que m igrou da Escócia para ser presi
círorções dente da faculdade, em 1768.382 C ontudo, paradoxalm ente, ela deve ser vista
aa razão como um a “vanguarda liberal” em lugar de ser considerada com o “conserva
’l z ' neste dores levando razão a serviço de um a ortodoxia decadente”.383
::=nte. A O desenvolvimento do Ilum inismo na América do N orte assim testem u
C om o nhou um a aliança emergindo entre o que H enry F. M ay descreve como “Iluminis-
.cademia mo moderado” e formas de teologia reformada no auge do “Grande Despertamento”
i: m em - no cristianismo na América do N orte.384 O resultado abrangente dessa con
u>ar essa fluência foi que o fervor evangélico do “grande despertam ento” foi temperado
l : com o por formas do moralismo e racionalismo do Ilum inismo, especialmente em Prin
a? papel ceton, O s resultados logo ficaram óbvios. Harvard, que adotou a mesm a filoso
lação de fia, até 1810 já era unitariana. A visão teológica em Princeton era inicialmente
m rluen- dom inada por Archibald Alexander, conhecido pela feroz reputação de ser refor
tm o s as m ado com pontos de vista radicalmente ortodoxos. N o entanto, o fundam ento
filosófico sobre o qual essas óticas foram construídas e as bases em que foram
ir.adsmo desenvolvidas, são as do Ilum inism o escocês. C om o Ahlstrom comenta, se al
mostra- guém fosse ler Outline o f M oral Science [Um esboço da ciência moral], de Alexan
r.m ento der, e não conhecesse a identidade de seu autor, concluiria simplesmente que a
11 O Ilu- obra era de “algum inglês latitudinário m oderado interessado em difundir os
) menos pontos de vista de Butler, Reid e Price”.385 N a realidade, um a tensão desestabi-
lizadora existe entre a substância teológica da escola de Princeton e a filosofia evangélic;!
usada na sua justificação, defesa e exposição. E Princeton era para ser o cadi wick AIo _.i
nho no qual as grandes teorias evangélicas de inspiração e autoridade bíblica Carl H er.r
eram forjadas. O resultado? As teorias de escritores como Charles H odge (1797- um a ‘‘revr]
1858) são profundam ente influenciadas pelos preconceitos do Ilum inism o. um apeu
C om o George M arsden m encionou, a teologia de Princeton foi dom inada afirmaçã: i
pela suposição de que “qualquer pessoa sã e sem preconceitos de juízo poderia da própria
e precisava perceber as mesmas coisas” e que “verdades básicas são, em grande para H en n
escala, as mesmas para todas as pessoas em todos os tem pos e lugares”.386 é possíve.
O to m fortem ente racionalista dessa filosofia é particularm ente evidente O u;-j
nas obras de Benjam in B. W arfield,387 mas é claram ente evidente nas obras fundam e r. i
dos prim eiros tem pos de Charles H odge. Em sua análise perceptiva da teoria protestar:;
dedutivista de inspiração bíblica associada com Hodge, Kern R obert Trem- alta “cor.rj
bath dem onstra o quanto a sua teologia já dependia da “filosofia escocesa do que lógici
senso com um ”. Por exemplo, H odge tende a evitar a questão crítica da exten fornece : :
são até onde a razão hum ana pode ser falha ou mal dirigida como conseqüên O reri
cia de pecado, conduzindo a um a estimativa questionavelmente alta do papel da a “um 1:yt
razão hum ana na teologia. “Hodge deixou de notar até que ponto sua aceitação tornar a v;
sem críticas de filosofia de senso com um divergia dos conceitos tradicionais decaída. D
agostinianos e calvinistas da totalidade dos efeitos do pecado original”.388 que a revtl
Mais significativamente, talvez, a filosofia de linguagem associada com a nosa. Q uu
escola “do senso com um ” causou impacto dramático na compreensão de Hodge com pro r :;
a respeito da im portância da linguagem bíblica. Palavras podem ser conhecidas finitas c u:
direta e im ediatam ente pela m ente hum ana, sem a necessidade de quaisquer revelaçã: :
intermediários. Conhecer as palavras da Escritura é, portanto, saber im ediata aprisionou,
m ente com que realidades elas têm relação.389 Esta teoria da língua é de im tem dese :
portância fundamental, porque oferece alicerce à crença de Hodge de que, hoje, surgiu nu j
o leitor da Bíblia pode estar “seguro de encontrar m uitos pensamentos, palavras caram a .:i
e intenções do próprio Deus”.390 C ontudo, essa idéia metafísica foi emprestada, trabíblic u?
junto com outras de igualmente questionável paternidade teológica, do Ilumi- efeito 'en;:
nismo. A análise de H odge sobre a autoridade da Escritura é, em últim a instân ta por H ::
cia, baseada em um a teoria não reconhecida e implícita da natureza da linguagem, As
que se deriva do Ilum inismo, e reflete a ordem dessa corrente filosófica. há m u i:: k
T ão grande foi a influência da antiga escola de Princeton, que seu racio destacou o
nalismo passou para o evangelicalismo estado-unidense reform ado m oderno. doria hu.r:
Evangélicos, inconscientes da procedência complexa da abordagem de Prince graves c í >
ton, contentaram -se em absorver seus resultados, sem se preocupar em per divina e ::
guntar de onde eles vinham . D onald G. Bloesch já argum entou que um espírito palavras. j
fortem ente racionalista pode ser discernido m esm o dentro dos escritos desses mano. E ;r
143
>secu- um ponto lógico que pode ser form ulado proposicionalm ente e que é verda-
i rápi- deiro ou falso”.398 H enry adota um a abordagem que H ans Frei discerniu como
característica do racionalismo: a extração de declarações proposicionais lógicas
r.uitos de um trecho de escrita essencialmente narrativo.
Lir de Fica claro, então, que um grupo de escritores evangélicos im portantes tem,
ico de implícita ou explicitamente, tirado idéias de pressupostos associados com o Ilu-
e— e minismo, em vez de tirá-las da tradição crista. H á aqui um óbvio e im portante
L r.géli- paralelo com o desenvolvimento da teologia cristã durante o período patrístico,
ressão no qual um a igreja confiante e crescente desenvolveu-se de seu contexto original
u; , a palestino para entrar em um contexto mais intelectualmente sofisticado, dom i-
i:udo, nado pelas idéias da filosofia grega secular. Deve ser salientado que o desen-
r.ar-se volvim ento em que isso aconteceu e suas implicações precisas para a teologia
:a:do? crista perm anecem disputadas.399 N ão obstante, há um acordo amplo de que
ç:ca é a teologia cristã prim itiva furtou algumas das roupagens da filosofia grega a
fim de assegurar que fosse ouvida no m undo helenístico.400 E nquanto as preo-
noras cupaçÕes iniciais podem ter sido apologéticas — isto é, conseguir que o evan-
In s to gelho fosse ouvido por um auditório secular — parece que o “diálogo” acabou
está com o cristianismo sendo decisivamente influenciado pelas idéias e visões de
5-àção m undo daqueles a quem buscava se dirigir.
;caída E tentador argum entar que isso representa um a rendição por parte da
j-oca- teologia cristã à filosofia grega, provocando o célebre rom pante de Tertuliano:
quino “O que há em com um entre Atenas e Jerusalém? E ntre a academia e a igre
ja?”401 E ntretanto, um a leitura mais sensível das fontes sugere um a explicação
-:im o mais significativa — e potencialm ente mais preocupante — explanação de
ija r a desenvolvimentos. Os teólogos cristãos do período patrístico parecem ter as-
evan- sum ido que certas idéias e m étodos eram auto-evidentem ente corretos e não
' um a exigiam justificativas. Era inteiram ente natural e apropriado incorporar essas
£ que percepções “neutras” à teologia. Mais do que isso; com o eram com partilhadas
c e. o por todas as pessoas pensantes, podiam atuar, inicialmente, com o base de um a
!T-0 , e estratégia apologética e, subseqüentem ente, com o base de um a teologia cristã
;c:ias. coerente. C om base na percebida “neutralidade” e “universalidade” de idéias
filosóficas gregas, a teologia cristã assim se tornou cada vez mais entranhada
'ererir num a série de aventuras intelectuais que a levaram mais e mais longe do evan-
r.ente gelho do Novo Testamento.
rin- O evangelicalismo tem sido afetado de m odo m uito semelhante pelo Uumi-
>.:a. e nismo. Certas idéias centrais do Ilum inism o parecem ter sido trazidas a bordo,
' -Ogi- sem crítica, por alguns evangélicos, com o resultado que parte do m ovim ento
uutas que corre o risco de se tornar prisioneiro secreto de um a visão secular que já
5 tem está perdendo a vitalidade, está m orrendo a olhos vistos. Os evangélicos têm a
responsabilidade absoluta de assegurar que suas idéias centrais sejam baseadas
na Bíblia, nao no resultado da influência do Ilum inism o. Deixar de fazer isso
é perm itir que idéias e valores originários de fora da fé crista exerçam influên
cia controladora dentro dela — é inevitavelmente aum entar, assim, o grau em
que a teologia é culturalm ente condicionada.
D e que formas essa influência do Ilum inism o se mostra? Q uatro áreas
podem ser identificadas, com o se segue.
1. A natureza da Escritura
Existe um a tendência dentro do evangelicalismo de tratar a Bíblia sim
plesm ente com o um a fonte de doutrinas cristãs, e de negligenciar, suprim ir ou
negar seu cunho narrativo. Já discutim os o trabalho de H ans Frei (ver p. 89-
90), que argum enta que um a das mais distintas características da herm enêuti
ca bíblica durante o período do Ilum inism o foi negar seu caráter narrativo, ou
tratá-lo como um tanto embaraçoso, sendo m elhor tratá-la como um a fonte de
onde extrair a informação conceituai que se pudesse ter.402 Particularm ente, Frei
traça o desenvolvimento dessa tendência para reduzir o sentido da Escritura a
“um a afirmação proposicional gram atical e logicam ente sadia” à influência
continuada da filosofia de John Locke durante o século X V III.403 A tendência
geral de tratar a Bíblia puram ente com o um livro-fonte de verdades pura
m ente proposicionais pode ser argum entada de m aneira a encontrar base es
pecialm ente na antiga escola de P rinceton, em particular nos escritos de
Charles H odge e Benjam in B. W arfield, em que a influência das pressuposições
do Ilum inism o é especialmente fácil de ser notada.
Felizmente, o evangelicalismo está agora com eçando aos poucos a lim par
de si este dúbio vestígio do Ilum inism o,404 e movendo-se em direção a um a
posição que é bem mais sensível à natureza da própria Escritura. Por exemplo,
há m aior sensitividade ao papel de narrativas, particularm ente no Antigo Testa
m ento, em que as narrativas bíblicas podem ser vistas somadas umas às outras
para resultar num a narração cum ulativa da natureza e caráter de D eus.405 Em
vez de forçar a Escritura a um m olde ditado pelas preocupações do Ilum inis-
mo, o evangelicalismo pode dedicar-se a perm itir que a Escritura seja Escritu
ra.
2. Espiritualidade
Existe um a tendência de ver espiritualidade em termos de entendim ento do
texto bíblico — isto é, a leitura da Bíblia tirando sentido de suas palavras e
idéias, e entendendo seu fundo histórico e seu sentido para hoje. A ênfase con
tinua a ser sobre a razão, sobre o raciocínio. N o entanto, precisamos ir para trás
147
■- baseadas do Ilum inismo, e recuperar as mais antigas e mais autênticas abordagens à espiri
: nzer isso tualidade, como as que são encontradas em escritores como Jonathan Edwards,
r. ínfluên- ou John e Charles Wesley. O etos fortemente racionalista do Ilum inism o foi
c j a u em muitas vezes refletido no que se pode chamar de um embargo espiritual em
qualquer espécie de envolvimento emocional com a Escritura, ou qualquer uso
-i::o áreas da faculdade hum ana da imaginação — duas abordagens à leitura da Bíblia que
o evangelicalismo de tempos anteriores tinha em grande estima.
Ê am plam ente aceito o fato de o protestantism o, em todas as suas formas,
ter sido influenciado pelo racionalismo do Ilum inism o em grau m uito m aior
',r.ia sim- do que o Catolicism o R om ano ou a O rtodoxia Grega do Leste da Europa. Isso
r n m ir ou tem causado um im pacto devastador sobre a espiritualidade evangélica, e o
i-cr p. 89- colocou em séria desvantagem em relação à espiritualidade tanto do Catolicis
r~enêuti- m o rom ano com o da O rtodoxia Oriental. O Ilum inism o forçou o evangeli
ri.:ivo, ou calismo a adotar atitudes para chegar à espiritualidade que resultaram em
í :onte de abordagens um tanto frias, impessoais e racionais, com relação à Escritura. O
:cnie, Frei tradicional “tem po devocional” tem sido profundam ente influenciado por esse
.tritu ra a ponto de vista.406
r.rluência C ontudo, o Ilum inism o acabou. Precisamos expurgar, remover, o racio
[er.dência nalismo de dentro do evangelicalismo. E isso significa recuperar os aspectos
2 es pura-
relacionais, emocionais e imaginativos da espiritualidade bíblica, que o Ilum i-
r o ase es nism o declarou serem im próprios. C om o M artinho Lutero insistia constante
critos de m ente, o cristianismo está interessado no totus homo, a “inteira pessoa hum ana”,
-rosições não só a m ente hum ana. A firm ando isso, Lutero não estava fazendo nada mais
do que enfatizando a im portância de se m anter um entendim ento bíblico de
i. limpar natureza hum ana em todos os aspectos do viver cristão.
í : a um a O escritor australiano R obert Banks m enciona as implicações para a es
exemplo, piritualidade dessa visão bíblica da natureza hum ana quando observa que es
j Testa- piritualidade diz respeito “não só ao nosso espírito — tam bém à nossa m ente,
15 outras vontade, imaginação, sentim ento e corpo”. Esta percepção era familiar à tradição
Em evangélica, antes do Ilum inism o. Está passando da hora de a redescobrirmos.
Luminis- Para Banks, espiritualidade é sobre “o caráter e qualidade de nossa vida com
i Escritu- Deus, entre irmãos em Cristo e no m u n d o ”. Banks deliberadam ente evita duas
abordagens inadequadas à espiritualidade: a prim eira é puram ente intelectual
ou cerebral, ocupando a m ente e nada mais; a segunda é puram ente interioriza
da, não m antendo nenhum a relação com as realidades da vida de cada dia ou
r.ento do com as verdades da Escritura. Aqui, temos m uito terreno perdido para pôr em
t-ivras e dia. Isso, porém , pode ser feito. Podemos recuperar a nossa herança, buscando
r.». con- as abordagens evangélicas à espiritualidade que foram suprim idas pelo Ilum i-
r ira trás nism o, mas que são de im portância vital, hoje.
148
3 • Apologética
Em relação à apologética, o evangelicalismo já se m ostrou disposto a operar
dentro do paradigm a de um a racionalidade com o a que influenciou o texto
clássico de apologética racionalista de John Locke, The Reasonableness ofChris-
tianity [A racionalidade do cristianismo] (1695). C om base no pressuposto alta
m ente questionável de que “todo m undo concorda com o que é razoável”, as
credenciais racionais da fé cristã são apresentadas. Esta abordagem, porém ,
m ostrou-se profundam ente falha em dois respeitos. Prim eiro, tom a por certo
que o apelo do cristianismo é puram ente racional; segundo, baseia-se sobre
um a rede de pressupostos universais que deixam de se relacionar com os meios
fortem ente particularizantes em que o evangelho precisa ser proclam ado no
nível global. C om o o evangelicalismo já se expandiu m uito além de suas terras
tradicionais de fala inglesa, por exemplo, essas dificuldades se tornam especial
m ente evidentes. E m esm o em tradicionais terras próprias, o Ilum inism o tem
em grande parte dado cam inho a pontos de vista pós-m odernos.
Isso tem tido implicações significativas para a apologética evangélica no
contexto pós-m oderno (que não aceita mais o pressuposto fundam ental do
Ilum inism o, de um a racionalidade hum ana universal), e em contextos nao-
ocidentais (onde a razão “universal” em questão acaba se m ostrando inflexí
vel). C om o resultado, m uita apologética evangélica é incapaz de funcionar
efetivamente nestes dois contextos significativos. N o caso do pós-m odernis-
m o, o evangelicalismo descobre que seu pressuposto de categorias universais
de evidência e racionalidade é rejeitado já de início, com isso im possibilitando ir".
cor:
um a apresentação efetiva do evangelho nesse contexto. N o caso de contextos
não-ocidentais, o evangélico é obrigado a converter um auditório a maneiras
rzz.
ocidentais de pensar antes da credibilidade do evangelho poder ser articulada.
C ontudo, onde no Novo Testam ento é a credibilidade ou a comunicabilidctde
do evangelho feita dependente de crenças não-cristãs assim? O evangelicalis P: -'
CU:
m o precisa perm itir que sua abordagem ao evangelismo seja rem odelada e
fo i:
feita pelo Novo Testam ento, em vez de por pressupostos antiquados de um já
defunto Ilum inism o. H á um sério perigo de que o evangelicalismo possa sim
plesm ente prolongar a influência do Ilum inism o po r um endosso continuado
tra :
não-crítico de algumas de suas pressuposições e valores principais, dos quais
pelo m enos alguns são potencialm ente hostis ao etos evangélico.
pur
4. Evangelismo quz
a c
Finalm ente, em relação ao evangelismo, o evangelicalismo já se m ostrou
vulnerável a um a form a de racionalismo. C om base num a visão ilum inista de des:
A m orte d a m odernidade
A pós-m odernidade é um a noção vaga e mal-definida, que talvez pudesse
ser descrita, em determ inado plano, como a perspectiva intelectual geral que
surge após o colapso da m odernidade.413 Em bora existam os que m antêm o
conceito de que a m odernidade ainda está viva e ativa, essa posição está se tor
nando cada vez mais rara. A m odernidade acreditava num m undo que, em princí
pio, poderia ser entendido e dom inado. A pós-m odernidade não apenas tende a
ver, em últim a análise, que o m undo está além da compreensão ou do domínio;
ela vê que essa compreensão e esse dom ínio, em qualquer dos dois casos, são
imorais. E então, na frase reveladora de Alan W ilde — “um m undo precisando
ser rem endado é suplantado por um que não tem mais conserto”.414
O pós-m odernism o é caracterizado por sua desilusão fundam ental com os
grandes temas da m odernidade, que, im pressionantem ente, ele coloca dentro
de um a bateria cética de isolamento feito por pontos de aspas: “...”. M esm o no
nível de sua ortografia, escritos pós-m odernos sobre “verdade”, “razão”, “justiça”
ou “realidade” tornam claro que o que um dia era visto como universal é tratado
agora com o ultrapassado [fora de moda] e questionável. Com o o analista cul
tural O s Guinness observa:
... estar prestes a se afastar de algo que ele está contemplando fixamente.
Seus olhos estão com um olhar fixo, sua boca está aberta, suas asas estão
estendidas. E assim que se retrata o anjo da história. Seu rosto está voltado
para o passado. O nde nós percebemos uma cadeia de eventos, ele vê uma
só catástrofe que fica empilhando destroços e os lança à frente de seus pés.
O anjo desejaria ficar, acordar os mortos, e fazer inteiro o que foi destroça
do. Mas uma tempestade está soprando do Paraíso, e agarrou-se a suas
asas com tal violência, que o anjo não pode mais fechá-las. Essa tempesta
de o impulsiona irresistivelmente para o futuro para o qual suas costas
estão voltadas, enquanto o m onte de destroços à sua frente sobe em direção
ao céu. Essa tempestade é o que chamamos de progresso.425
Modernismo Pós-modernismo
Propósito Brincadeira
Projeto Acaso
H ierarquia A narquia
Centralização Dispersão
Seleção C om binação
Os term os reunidos sob a categoria do ‘“m odernism o” têm fortes nuanças
da capacidade de análise, ordenação, controle e dom inação do sujeito pen
sante. O s que são reunidos sob a categoria do “pós-m odernism o” possuem
igualm ente fortes nuanças da inabilidade do sujeito pensante no dom inar ou
controlar, com o resultado de as coisas precisarem ser deixadas com o são, em
toda a sua gloriosa e divertida diversidade. Isso se aplica igualm ente às religiões
e a tudo mais.
Ficará claro que há um comprom isso pré-existente com o relativismo ou
pluralism o dentro do pós-m odernism o, em relação às questões a respeito da
verdade. Para usar o jargão do m ovim ento, pode-se dizer que o pós-m odernis
mo representa um a situação em que o significativo substituiu o significado
com o enfoque de orientação e valores. Em term os da lingüística estruturalista
desenvolvida inicialm ente por Ferdinand de Saussure, e, subseqüentem ente,
por R om an Jakobson e outros, o reconhecim ento da arbitrariedade do sím bo
lo lingüístico e sua interdependência com outros símbolos lingüísticos m arca
o fim da possibilidade de sentidos fixos, absolutos. D e acordo com de Saus
sure, um “sím bolo” consiste de três coisas: o significativo (a imagem acústica
das palavras como ouvidas pelo receptor tencionado da mensagem), e o sig
nificado (o sentido que é evocado na m ente desse receptor por interm édio do
estímulo do significativo), e a unidade desses dois. Para de Saussure, a unidade
do significativo com o significado é um a convenção cultural. N ão há nenhum
fundam ento universal ou transcendente que relacione significativo e significa
do: é arbitrário, refletindo as contingências de condicionam ento cultural. 432
Desenvolvendo essas descobertas, escritores como Jacques Derrida, Michel
Foucault e Jean Baudrillard argum entaram que a língua era, em últim a análise,
excêntrica e cheia de caprichos, e não refletia nenhum a lei lingüística abrangente
absoluta. Era arbitrária, incapaz de pôr à m ostra o sentido. Portanto, Baudrillard
argum entou que a sociedade m oderna estava presa em um a armadilha num a
rede sem fim de sistemas artificiais de sinais ou símbolos, que nada significavam,
e m eram ente perpetuavam os sistemas de crenças dos que os criaram.433
U m aspecto de pós-modernismo que ilustra essa tendência particularm ente
bem, enquanto tam bém indicando sua obsessão com textos e língua, é a descons-
trução — o m étodo crítico que virtualm ente declara que a identidade e in
tenções do autor de um texto são um a irrelevância à interpretação do mesmo,
antes de insistir que, em qualquer caso, nenhum sentido fixo pode ser encon
trado nele. Esse m ovim ento surgiu prim ariam ente com o resultado da leitura
que Jacques D errida fez das obras de M artin Heidegger nos últim os anos da
década de 1960.434 Dois princípios gerais podem ser vistos como subjacentes
a esta abordagem à leitura de textos.
157
nuanças 1. Q ualquer coisa transm itirá sentidos que seu autor não pretendeu e não
:o pen- poderia ter pretendido.
:>ssuem 2. O autor não consegue expressar em palavras adequadam ente o que ele
-inar ou quer dizer de início.
fio, em Todas as interpretações são, portanto, igualm ente válidas, ou igualm ente
sem sentido (dependendo do seu ponto de vista) ,435 C om o Paul de M an, um
dos principais proponentes estado-unidenses desta abordagem , declarou, a
:=mo ou própria idéia de “significado” cheirava a fascismo. Esta abordagem, que flores
reito da ceu na Am érica do N orte do pós-Vietnã, ganhou respeitabilidade intelectual
erms- por acadêmicos como de M an, Geoffrey H artm an, H arold Bloom e J. Hillis
ficado Miller.436 “M etanarrativas” — isto é, narrativas generalizantes que pretenderam
: u ralis ta oferecer estruturas universais para o discernim ento do sentido — deveriam ser
emente, rejeitadas como autoritárias. Longe de discernir sentidos, essas narrativas im
>ímbo- punham os próprios sentidos de m aneira fascista.
J5 marca Desenvolvendo esta abordagem em um artigo publicado em princípios de
ic Saus- 1986, Lyotard argum entou que todas as narrativas universais, com o o marxis
aaústica m o, eram totalitárias em sua visão, e, portanto, potencialm ente capazes de
; o sig- gerar m entalidades propensas a “crimes contra a hum anidade”.437 Se as pes
*ídio do soas estão convencidas da retidão da posição que defendem, inevitavelmente
unidade haverá a tentação de controlar ou destruir os que discordam delas.438 U m a
"enhum abordagem similar foi adotada no ano seguinte pelo crítico literário Terry Ea-
t^nifica- gleton, que argum entou que noções como “verdade” ou “sentido” eram inten
iiral. 432 sam ente repressivas, e deviam ser rejeitadas como um a form a de terrorism o
. Michel acadêmico:
. análise,
■ingente O pós-modernismo assinala o fim de tais “metanarrativas”, cuja função
aurillard secretamente aterrorizante era basear e legitimar a ilusão de uma história
.a num a hum ana “universal”. Estamos agora no processo de acordar do pesadelo
r.sj.vam, da modernidade, com sua razão manipuladora e fetiche da totalidade,
para o descontraído pluralismo do pós-moderno, essa heterogênea gama
de estilos de vida e jogos de linguagem que já renunciou o impulso nostálgi
co de totalizar e legitimar-se [...] A ciência e filosofia precisam lançar fora
suas grandiosas pretensões metafísicas e verem a si mesmas mais modesta
mente como apenas outra coleção de narrativas.439
ogética,
A vu ln era bilidad e do pós-m o d ern ism o :
■as pre- Fou cault e L y o ta rd
nta que O pós-m odernismo tem aversão endêmica às questões sobre verdade, cren
rvadas a do que a noção de “verdade” é, na m elhor das hipóteses, ilusória e, na pior,
aade” se opressiva. N o entanto, a necessidade de ter a pergunta sobre a verdade no seu
erdade. planejam ento é relativamente fácil de ser entendida. O pós-m odernismo insiste
m ento é em que não é possível agir coerentemente com respeito ao m undo, pela razão
.ide”.441 fundam ental de o m undo ser um a coleção de fragmentos perpetuam ente mutáveis
;nhum a em vez de ser um todo unificado, estável e coerente. Pensar ou agir de maneira
. decidir coerente é, pois, ou repressivo (no que força a ordem sobre algo intrinsecamente
ntagens desordenado) ou ilusório (em que ignora como o m undo realmente é). Correção
:ra mais política sugere que a idéia de “verdade” pode chegar perto de fascismo intelec
itiva do tual, por causa de seus sobretons autoritários. Allan Bloom resume essa perspec
mo não tiva em The Closing ofthe American M in d [ 0 fechamento da mente estado-unidense]:
onal. As
oletas, e O perigo [...] não é o erro, mas a intolerância. O relativismo é necessário
Jogo de para a abertura; e esta é a virtude, a única virtude, à proclamação da qual,
por mais de cinqüenta anos. toda a educação primária se dedica. Abertura
— e o relativismo que a torna a única posição plausível em face de várias
pretensões à verdade e dos vários estilos de vida e tipos de seres humanos
— é a grande descoberta de nossos tempos. O verdadeiro crente é o peri
go real. O estudo da história e da cultura ensina que todo o m undo estava
louco no passado; os homens sempre julgavam estar certos, e isso os levou
a guerras, perseguições, escravidão, xenofobia, racismo e chauvinismo. O
importante não é corrigir os erros e realmente estar certo; é não pensar, de
maneira nenhuma, que você está sempre certo.443
>I j tão válidas errado — em vez de persegui-los na base dos próprios interesses fixados. A
:: .erància com crença básica do Ilum inism o na virtude louvável do conhecim ento é assim
■■errantas m ui- posta em dúvida. O conhecim ento pode tanto escravizar quanto libertar. A
— i m áquina tarefa da filosofia é, portanto, criticar, a fim de que possa resultar na em anci
c r certos pon- pação.
-. - haver al-
ex.:.uir certos Filosofia é precisamente o desafiar de todos os fenômenos de domínio em
' “isto como qualquer nível ou sob qualquer forma em que eles se apresentem — política,
--rica e moral econômica, sexual, institucional, e assim por diante. Esta função crítica
' . de 1930. da filosofia, até certo ponto emerge diretamente do imperativo socrático:
;_e o nazismo “Preocupe-se com você mesmo”, i.e., fundamente-se em liberdade, por
í : : que há ali,
meio do domínio de você mesmo.450
t ; :s de m inha
Por essas razões, Foucault crê que a própria idéia de verdade ou moralidade
i; outras po-
objetiva deve ser desafiada. Idéias — tais como “verdade” — que legitim am ou
:. agir im-
perpetuam repressão devem ser rejeitadas. Esta crença passou para a estrutura
c .r.em",
de m uito do pós-m odernism o. M as será isso certo? Será que a verdade sobre a
;: oernismo se
qual a crítica de Foucault realmente repousa não é um conjunto de crenças
:em os con-
bastante definidas sobre o que é certo e o que é errado? Para dar um a ilus
i ri"-François
tração: por meio dos escritos de Foucault, encontram os um a crença apaixona
:i-í do pensa-
da de que a repressão está errada. O próprio Foucault está assim com prom etido
com um valor m oral objetivo — que a liberdade é para ser preferida à re
::; ..'.ameinc
pressão. A crítica de Foucault da m oralidade realmente pressupõe certos va
:r.:eresses dos
lores morais. Atrás de sua crítica da ética convencional está um conjunto oculto
;: m a noção
de valores morais, e um compromisso, ainda não reconhecido, com eles. A críti
r r j conceito
ca de Foucault dos valores morais da sociedade parece deixá-lo sem nenhum
r:re verdade e
valor m oral de si m esm o — entretanto, sua crítica de valores sociais repousa
Lr.car padrões
sobre seus valores morais, intuitivam ente aceitos (em vez de explicitamente
o que é
reconhecidos e teoricam ente justificados), que ele claram ente espera que seus
r :. mas sim
leitores com partilhem .
.ize rem suas
C ontudo, por que a luta é preferível à submissão? Por que a liberdade é
e;se> fixados,
escolhida, em vez de a repressão? E quais as estruturas ou critérios morais
tru a n d o sua
propostos, pelos quais este posicionam ento implícito pode ser defendido? Es
u e.iminação
tas perguntas normativas exigem respostas, se a posição de Foucault pode ser
c radlm ente
justificada — contudo, Foucault rejeitou vigorosamente um apelo a princí
es.;ores argu-
pios norm ativos gerais com o parte integral de seu m étodo. N a verdade, ele faz
ir.extricavel-
um apelo ao sentim entalism o, em vez de apelar à razão; apela à compaixão, em
r_e estivesse
vez de apelar a princípios.431 O fato de m uitos terem com partilhado sua aversão
'nr oralidade”
intuitiva de repressão a s s e g u r o u q u e e l e f o s s e b e m r e c e b i d o — m a s a p e r g u n t a
i e do que é
fundam ental perm anece sem resposta. Por que a repressão é algo errado? E
aquela m esm a pergunta aguarda um a resposta convincente do pós-m odernis
m o, que seja vulnerável precisam ente onde Foucault é vulnerável. C om o Ben
Meyer tão devastadoram ente com entou:
Isso ilustra o ponto defendido por Schaeffer de que Sartre e outros niilis
tas “não conseguiram viver com as conclusões de seu sistema” — e assim revela
a necessidade de o apologista evangélico explorar o que poderiam ser essas
conclusões. “Q u an to mais lógico o hom em que m antém um a posição não-
cristã está dos próprios pressupostos, mais longe ele está do m undo real; e
quanto mais perto ele está do m undo real, mais longe ele está dos próprios
pressupostos’.454 As éticas anti-opressivas de Foucault pareceriam enquadrar-
se nesse caso, em que ilustram a necessidade de princípios fundam entais que
Foucault declarou adiantadam ente serem em si mesmos opressivos. N o entan
to, não é tão simples assim.
Foucault parece presum ir que o uso da força só é associado à injustiça.
Será, entretanto, que esse é o caso, realmente? N u m ensaio recente sobre a
natureza da crueldade, H élé Béji observa que “a única coisa que a justiça com
partilha com a injustiça é que ambas precisam ser exercidas com a autoridade
da força”.455 O ponto essencial em questão é que as pessoas precisam ser per
suadidas de que “justiça” é do próprio interesse antes que venham a servi-la.
Para o evangelicalismo, um aspecto central da doutrina do pecado original é que
a hum anidade é radicalm ente autocentrada, não tendo lugar para o altruísm o,
a nao ser que os próprios interesses específicos sejam servidos por meio dele.
U m dos m éritos centrais da filosofia política de Thom as H obbes e Jeremy
B entham é que ela reconhece explicitamente que os seres hum anos são “defi
cientes em altruísm o e, portanto, requerem a ameaça de coerção para incen
tivá-los a buscarem interesses majoritários em vez de os próprios interesses”.456
Foucault parece ou definir a justiça em term os puram ente de realização indi
vidual e auto-gratificaçao, ou perm anecer livre das realidades mais escabrosas
do com portam ento hum ano.
Conform e observado acima, Foucault é incapaz de oferecer qualquer padrão
norm ativo pelo qual a pessoa possa distinguir regimes sociais aceitáveis (como
o democrático-liberal) dos regimes inaceitáveis totalitários. Este ponto foi apre
ciado e desenvolvido no ensaio de M ichael Walzer, “T he Politics o f M ichel
Foucault”,457 que continua sendo um a das análises mais penetrantes do pensa
m ento m oral e social de Foucault a aparecer até agora. Walzer argum enta que,
no fim, Foucault precisa ser reconhecido com o um “anarquista m oral bem
com o um político m oral”. É possível, naturalm ente, argum entar que isso pode
acabar sendo um a representação incorreta de Foucault. N o entanto, esta ob
jeção levanta toda a questão de “intenção autonal”. A carreira de Foucault
poderia facilm ente ser vista com o representando um esforço sustentado de
destruir a idéia de que a leitura de um texto envolve questões de verdade ou
falsidade com respeito à sua interpretação. Para Foucault, o que o autor preten
deu dizer num dado texto não é de im portância nenhum a; textos — incluin
do os próprios textos de Foucault — podem ser lidos num a variedade de formas;
todos, porém , são igualm ente válidos.
N o entanto, o ponto de Walzer parece impossível de levantar dúvidas. A
ética é a livre criação de indivíduos, e não tem validade e força universal.458 E
criada por indivíduos, não precisa e não pode ser justificada ou criticada por um
apelo a qualquer conceito universal de justiça ou critério ético. Fazer assim é ou
um ato de ilusão ou opressão tentada. A ética de Foucault é um a autocriação
radical. C om o Richard Rortv. talvez o mais ilustre filósofo estado-unidense a
desenvolver a aversão de Foucault a princípios gerais e padrões normativos,
com enta, um a conseqüência dessa abordagem precisa ser o reconhecim ento
de que
Se, porém , esta abordagem é correta, que justificativa poderia ser dada para
fazer oposição ao nazismo? O u ao stalinismo? Rorty não pode dar um a justifi
cativa pela rejeição m oral ou política do totalitarianism o, com o ele mesmo
concede. Se ele está certo, Rorty admite, ele tem de reconhecer que
Conclusão
Neste capítulo, foi examinada a complexa rede de questões relacionadas
tanto ao surgim ento do m odernism o com o ao surgim ento do pós-m odernis
m o, e seu im pacto sobre o evangelicalismo. Ficará claro que m inha fundam en
tal convicção é que o evangelicalismo dem onstra um alto grau de poder de
elasticidade e coerência em face aos desafios m uito diferentes colocados por
m eio de cada um a dessas visões de m undo, um a das quais tenta justificar a
totalização, e a outra, a fragmentação.
N o passado, o evangelicalismo era confrontado com o desafio da m oder
nidade. Escolheu, por motivos que via com o convincentes, enfrentar esse de
safio usando os m étodos e pretensões de seu rival. O evangelicalismo, talvez
tendo ganhado, durante o século XIX, a impressão de que a m odernidade
estava aqui para ficar, perm itiu-se incorporar vários aspectos críticos da visão
de m undo m oderna em sua estratégia apologética, e dá pelo m enos alguma
indicação de ter perm itido que eles exercessem um a influência oculta sobre
seus m étodos teológicos. Chegou o tem po para o evangelicalismo elim inar de
si as influências fundam entais rem anescentes do Ilum inism o, não simples
m ente porque o Ilum inism o já acabou, mas por causa do perigo de perm itir
que idéias cujas origens e legitimação são de fora do evangelho cristão exerçam
um a influência decisiva sobre esse evangelho. O evangelicalismo tem ainda
que com pletar o ajustam ento apologético e teológico ao declínio da m oderni
dade; esta tarefa continua sendo um a prioridade para o m ovim ento.464
C ontudo, a lenta saída da m odernidade, ainda que inexorável, não sig
nifica que o evangelicalismo precise assumir a ordem pós-m oderna. C om efeito,
o evangelicalismo provê um ponto de observação fundam ental de onde criti
car aspectos da visão de m undo pós-m oderna, não m enos sua aparente reação
exagerada à ênfase do Ilum inism o na verdade. A verdade perm anece um as
sunto de im portância apaixonante para o evangelicalismo, m esm o que exista
um a pressão cultural bastante forte na sociedade ocidental para conform ar
com sua ótica prevalecente de “m eu ponto de vista é tão bom quanto o seu”.
Essa pressão talvez seja mais intensam ente enfocada e experim entada com
relação às questões levantadas pelo pluralism o religioso, para o qual nos voltare
mos em seguida.
EVANGELICALISMO E PLURALISMO RELIGIOSO
A natureza de p lu ralism o
O surgim ento de um a ideologia de pluralism o religioso — m elhor visto
com o um a subcategoria de pluralism o intelectual e cultural em seu direito, em
vez de com o um a entidade específica — é a conseqüência não tanto de algum a
percepção de um a fraqueza da parte do cristianism o, mas sim do colapso da
idéia do Ilum inism o de conhecim ento universal. E verdade que a atenção é às
vezes desviada do colapso da visão do Ilum inism o sugerindo-se que o pluralis
m o represente um desafio novo e irrespondível ao próprio cristianismo. O
teólogo de Princeton, Diogenes Allen, descarta corretam ente essa idéia como
um a pretensão falsa:
O que é religião ?
U m exemplo da dependência excessiva de categorias ocidentais pode ser
visto em relação ao próprio termo “religião”. A palavra “religião” precisa de m ais
exame. Em sua obra clássica, mas altamente problem ática — The Golden Bough
(1890) — , Sir James Frazer colocou o ponto fundamental: “é provável que nao
haja nenhum assunto no m undo sobre o qual opiniões difiram tanto como so
bre a natureza da religião, e form ular um a definição de religião que satisfaça a
todos obviamente tem de ser impossível”. C ontudo, tem havido recentemente
um esforço resoluto para se reduzir todas as religiões ao mesmo fenôm eno bási
co global.
Antes, observamos as tentativas que vários escritores liberais fizeram para
tratar “cultura” e “experiência” como universais, capazes de evitar o particularis-
m o que sentiam ser um a característica tão inaceitável do pensam ento cristão
tradicional. De m odo m uito semelhante, “religião” — ou, ocasionalmente, a
categoria híbrida de “experiência religiosa” — é introduzida como um terceiro
term o universal em potência, num a tentativa de evitar particularidade. Cada um
destes três, porém , é simplesmente um a noção pseudo-universal, derivando a
pouca credibilidade que possui da agenda totalizante de seus proponentes. Isso
fica agora especialmente claro no caso da categoria de “religião”, a qual é ampla
m ente concedida ser um a falsa categoria, incapaz de suportar a tensão teológica
das teologias pluralistas mais aventureiras e ambiciosas erigidas sobre sua base
espúria.
H á claramente um a questão de poder intelectual aqui, levantando a agenda
notada por M ichel Foucault. Q uem faz as regras que estabelecem o que é a
religião, e o que não é? As regras desse jogo determ inam o resultado: então,
quem decide sobre elas? A resposta a essa pergunta é bem simples: as regras
foram formadas e “policiadas” — para usar o term o de Foucault, com todos os
sobretons que com razão são implicados — por acadêmicos ocidentais liberais,
na base de um conjunto de pressupostos politicamente corretos que têm pouca
relação com as realidades empíricas das religiões.
175
erialismo C ontudo, muitos escritores liberais estão ansiosos sobre a violação da inte
isados. A gridade das diferentes religiões que essa abordagem hom ogeneizadora com
i termos, preende. David Tracy é exemplo de um teólogo liberal profundam ente cético,
lelectual- desconfiado, de tal abordagem, apontando que, como matéria de simples obser
r retirado vação, “não há nenhum a essência única, nenhum único conteúdo de ilum i
ir de um nação ou revelação, nenhum caminho único de emancipação ou libertação” a
ideologia ser descoberto dentro das religiões do m undo.475 Por trás de m uita discussão
estratégia ocidental recente sobre “as religiões” está o pressuposto de que “religião” é uni
ologia. versalmente um gênero, um a categoria concordada. O fato é que não é nada
disso. N um recente e im portante estudo, o teólogo de Cambridge, John Mil-
bank especifica que o “pressuposto sobre um gênero religioso” é central para
pode ser
a de mais ... a maneira mais atual de encontro como diálogo, mas seria um erro
imaginar que surgiu simultaneamente entre todos os participantes como
. que não o reconhecimento de uma verdade evidente. Pelo contrário, está claro que
como so- as outras religiões foram tomadas por pensadores cristãos como espécies do
satisfaça a gênero “religião”, porque esses pensadores sistematicamente classificaram
ntem ente fenômenos culturais divergentes sob categorias que incluem noções oci
leno bási- dentais do que constitui pensamento e prática religiosos. Essas falsas catego-
rizações têm sido aceitas freqüentemente por representantes educados-
eram para no-ocidente, eles mesmos de outras religiões, que são incapazes de resistir à
-rticularis- força retórica politicamente saturada do discurso ocidental.476
ro cristão
N inian Sm art tam bém observou que m uito da conversa livre sobre “religião
_mente, a
ii terceiro clássica” realm ente significa clássica ocidental, sendo, portanto, um reflexo da
cultura ocidental, em vez de um a categoria universal.477
Cada um
rivando a Dessa forma, precisamos estar intensamente preocupados com a validade
entes. Isso do ingênuo pressuposto, com um a estudantes de religião ocidentais (que, no
I é ampla- fim, refletem um a visão culturalmente condicionada), que “religião” é um a cate
teológica goria bem-definida, que pode ser nitidam ente, cirurgicamente distinguida de
e sua base “cultura” como um todo. O fato de a mitologia clássica grega, o confucionismo,
o taoísmo, as várias e diversas religiões da índia terem sido enganosamente re
o a agenda unidas sob o term o genérico “hinduísm o”, o cristianismo, o totemismo e o ani-
o que é a mismo, todos estes, poderem ser chamados de “religiões” denota que isso é um a
do: então, categoria alarmantem ente ampla e difusa, sem qualquer característica realmente
: as regras distinta. O utra vez, John B. C obb Jr., um pioneiro do diálogo cristão-budista,
I I todos os comenta:
lis liberais,
Eu não vejo razão a priori para presumir que religião tenha uma essência
rém pouca
ou que as grandes tradições religiosas sejam bem entendidas como re
ligiões, isto é, como tradições para as quais ser religioso é o alvo central.
Certamente, não vejo evidência empírica em favor dessa visão. Vejo so
mente hábito erudito e o poder da linguagem para iludir.478
Primeiro, religião não deve ser identificada com monoteísmo [...] A maioria
das religiões compreende várias deidades [...] Em certas religiões não há
nenhum deus. Segundo, religião não deve ser identificada com prescrições
morais controlando comportamento de pessoas que crêem [...] Terceiro, a
religião não está necessariamente preocupada com explicar como o m un
do veio a ser como é [...] Quarto, religião não pode ser identificada com o
sobrenatural, como intrinsecamente envolvendo crença em um universo
“além da esfera dos sentidos”.479
do? Lesslie New bigin faz um a observação vitalm ente im portante que precisa Sc':
irr;.
179
>;o' dos ser pesada cuidadosam ente, em relação a um a analogia m uito-citada para a
nrabular relação entre religiões.
eiosa ou
e.ectual- Na famosa história dos homens cegos e o elefante [...] o ponto verdadeiro
l mesma da história é constantemente negligenciado. A história é contada do ponto
c èjn um de vista do rei e seus cortesãos, que não são cegos mas podem ver que os
?ara nós, homens cegos são incapazes de captar a realidade total do elefante e só são
icmos de capazes de tocar uma parte dele. A história é constantemente contada a fim
ê alguns de neutralizar as afirmações das grandes religiões, para sugerir que seus adep
ntrário tos aprendem humildade e reconhecem que nenhum deles pode ter mais de
v iu que um aspecto da verdade. Naturalmente, porém, o ponto real da história é
icendo a exatamente o contrário. Se o rei também fosse cego, não haveria nenhuma
::es, e as história. A história é contada pelo rei, e é a afirmação imensamente arro
e: assim gante de alguém que vê a verdade completa, que todas as religiões do m un
ma parte do estão só estendendo a mão para apalpar e pegar. Ela corporifica a pretensão
de já conhecer a realidade completa que relativiza todas as pretensões das
parece religiões.486
r resume
a mesma New bigin expõe a arrogância em potencial de qualquer pretensão de se dizer
. o diálo- capaz de ver todas as religiões do ponto de vista de alguém que vê a verdade
•i5 sejam plena. Alguém afirmar que vê o quadro grande, enquanto cristãos e outros
^rende às vêem só um a parte dele, eqüivale ao imperialismo, a não ser que esteja univer
sair mais salm ente disponível um conhecim ento público aberto a um exame e avaliação
r. é m ui- crítica geral.
rmo com A reivindicação a acesso privilegiado para um conhecim ento total e com
cs dados preensivo da realidade é geralmente tratada com intenso ceticismo, não menos
: embora por causa de sua evidente falta de fundam entos empíricos, e sua resistência à
r narmo- verificação ou falsificação. Existe um acordo geral de não perm itir nenhum a
ir. Com o posição privilegiada da qual o “quadro grande” pode ser visto. Escritores como
ernocên- John H ick têm insistido em que as diferenças óbvias entre as “religiões” do
arropria- m undo devem-se a suas percepções diferentes de “o Real”. N enhum a evidên
trièncias cia empírica de substância, porém , tem sido oferecida para essa afirmação. Faz
, aiferen- igual sentido dizer que as religiões são diferentes, e devem ser respeitadas por
cendente isso — ou, no que diz respeito ao assunto, dizer que algumas estão simples
idequada m ente erradas. N inian Smart, que se dedica a docum entar os fenôm enos ob
serváveis da religião em vez de forçá-los em moldes preconcebidos, enfatiza
►sa analo- que o “juízo quanto a saber se há um cerne com um básico de experiência
co m un- religiosa deve ser baseado nos fatos, e não determ inados apriori pela teologia”.
le precisa Sobre adotar esta abordagem fenomenológica, ele argum enta que é bastante
irrazoável pensar que “há suficiente semelhança conceituai entre Deus e nirva
na (como concebido no budismo theravadin) para asseverar que o theravadin e
o cristão estão cultuando o mesmo Deus — o theravadin, porém, não está basi
camente cultuando”. 487 D e m aneira semelhante, os próprios escritores budistas
são intensamente resistentes à sugestão de que o taoísmo, confucionismo e bu
dism o são só estradas diferentes que sobem à m esm a m ontanha.488
Lesslie N ew bigin, com entando sobre as visões relacionadas de W ilfrid
Cantwell Sm ith, bate m uito na m esm a tecla:
A não ser que a “plena realidade que torna relativas todas as reivindicações das
religiões” seja tornada publicamente disponível e sujeita a intensa análise empíri
ca — e até que isso aconteça — , a reivindicação de que, de alguma forma, todas
as religiões providenciam instâncias de seus vários aspectos é pouco mais do que
um a alegação não verificada, sem nenhum a base legítima. Efetivamente, repre
senta um a reivindicação tanto não verificável como nao falsificável, um a in
trusão no m undo de especulação em vez de um a pesquisa empírica sólida. Com o
John H ick sabe que as religiões são apenas “diferentes experiências fenomenais
do único noumenon divino; ou, em outra linguagem, diferentes transformações
experimentais do mesmo transcendente input inform acional”? C om o poderia
ele dem onstrar isso a um auditório imparcial?
Discussões sobre o pluralism o religioso foram seriamente obstruídas por
um a m entalidade bem -intencionada, mas, no fim, espúria, que está travada na
visão m undial de “nós todos estamos dizendo a m esm a coisa realm ente”, que
suprim e ou evade as diferenças entre diferentes crenças a fim de construir al
gum a teoria artificial que explique atributos com uns. A supressão deliberada
ou a evasão de diferenças é academ icam ente inaceitável, e não pode ser tolera
do por quaisquer pessoas preocupadas em fazer justiça às religiões do m undo
com o são vistas por seus adeptos, em vez de em versões artificialm ente re-
181
.cnvadin e construídas dessas crenças religiosas que emergem das tendências hom ogenei-
: está basi- zantes de estudiosos de religião.
- budistas Em im portante e recente estudo, a teóloga de Yale, Kathryn Tanner, argu
:?mo e bu- m enta que a teologia pluralista liberal já sucum biu ao “discurso colonialista”,490
tentando reduzir as religiões a manifestações dos mesmos impulsos transcen
W ilfrid dentais, ou m inim izar suas diferenças por am or à ordem teórica:
prudência rom ana não podia ser infligido em criminosos que fossem cidadãos
a aisputa.
rom anos, mas só em escravos e rebeldes políticos: a cruz.
i nistória
N egar que o cristianismo e o islã estão em discordância sobre um a questão
: o Novo
tão fundam ental pareceria trocar argum entação raciocinada por rogos especi
a janto a
ais e afirmações petulantes.499 Divergência honesta não é pecado. Além disso,
_?aar afir-
a disposição de reconhecer diferenças remove a crítica mais básica dirigida
: simples
contra o diálogo intra-fé: que não está preparado para reconhecer diferenças
: aspectos
genuínas. Só alguém de integridade intelectual altam ente questionável pode
r . : rreu na
ria discutir que é verdade tanto que “Jesus m orreu, sim, na cruz” e que “Jesus
c-:ionada.
não m orreu na cruz”. Diferenças precisam ser reconhecidas e suas implicações,
t: comen-
exploradas.
aenhum a
Vamos considerar o diálogo entre judeus e cristãos, com o qual eu tenho
~.a ressur-
estado envolvido pessoalmente. N u m im portante estudo recente, o ilustre escri
:a :eologia
tor judeu, Jacob Neusner, argum entou que, realmente, não tem havido nenhum
-rralmente
diálogo judeu-cristão, em que a crença central de cada fé — a doutrina da
í : se Jesus
encarnação, no caso do cristianismo, e a divina vocação de Israel, no caso do
judaísm o — tem sido evitada pelos que se têm envolvido nessas discussões.300
— um as-
Será que isso pode ser diálogo real — ele pergunta — , se não há confrontação
Küng,
de diferenças tão claras e abertas? Por que essas discussões interconfessionais
escritores
buscam estabelecer pontos de acordo, e ignoram diferenças tão grandes?
_ rre-com -
Em parte, a resposta a essas perguntas é simples: o objetivo desse diálogo
::erente de
geralmente é estabelecer pontos em comum , a fim de m elhorar entendim ento e
a cruz de
respeito m útuo num m undo m oderno altamente polarizado, em que diferenças
religiosas são de substancial im portância política — um ponto enfatizado por
- ara deter-
Gilles Kepel, do Instituto de Estudos Políticos em Paris.501 C ontudo, este alvo
cr.culdades
inteiram ente digno de apreço tem seu lado mais negativo. Pode m uito facil
lüiões, mas
m ente levar à supressão deliberada de diferenças, nos interesses de harm onia.
aacterística
E inteiram ente apropriado que as religiões do m undo sejam reconhecidas como
: veredicto
discordastes entre si no que se refere às suas crenças. O cristianismo vê a auto-
: :sa repre-
revelação final de D eus com o tendo acontecido em Jesus Cristo; o islã o vê
as mortes
com o tendo ocorrido por meio de M aom é. Em bora de acordo com a idéia de
: ises, Buda
um a revelação final de Deus, ocorre que as duas religiões diferem fundam ental
^ande êxito
e irreconciliavelmente, tanto no m odo específico dessa revelação com o em seu
eas de Isra-
conteúdo. O s cristãos insistem em que Jesus foi crucificado; os m uçulm anos
*a agradável
insistem em que ele não o foi. Se o crente convicto realmente crê alguma coisa,
rr. após um
a divergência é inevitável — e apropriada. C om o o distinto filósofo estado-
z só alguns
unidense Richard Rorty disse, ninguém , “a não ser o ocasional calouro coope-
iao e zom-
rador” realmente crê que “duas opiniões incompatíveis a respeito de um assunto
5 r.umanos
im portante são igualm ente boas”.1112
: :r. a juris
184
u m cr.;;i
de Deus; contudo, por causa do nosso pecado, essa presença é apenas um
rs
sonho. O que deveria estar pleno do conhecim ento, glória e presença de Deus,
acha-se vazio.
E scrirura
Assim, dentro de nós há um relacionam ento com Deus — relacionam en
re lig i:- !
to fraturado — e um a receptividade para com D eus — receptividade insatis
p e rié r.j.a
feita. A criação estabelece um a potencialidade, que o pecado frustra — contudo,
d a e5:r_r
a m ágoa e a dor daquela frustração continuam vivas em nossa experiência. E
m ais c : :
esse m esm o senso de vazio que, em si, está por trás da idéia de um ponto de
básica 7*í
contato. Estamos apercebidos de que algo está faltando. Podemos não ser ca
várias : : í
pazes de dar-lhe o nome. Podemos ser incapazes de fazer alguma coisa a respeito.
m e n c s a^
O evangelho cristão, porém , é capaz de interpretar nosso desejo ardente, o
liz aç ã:. E
sentim ento de não nos sentir realizados, com o um a percepção da falta de Deus
ser /j
— e assim prepara o cam inho para a realização. U m a vez que reconhecemos
que estamos incom pletos, que nos falta algo, começamos a pensar se esse vazio Q-=~
n ism c a í
espiritual poderia ser preenchido. E este im pulso que está por trás da busca
é c o n te i
hum ana por realização religiosa — um a busca que o evangelho vira de ponta
plexa e i.
cabeça com sua declaração de que fomos buscados pela graça de Deus.
T estar.: tr.
E precisamente esta a idéia que está por trás das famosas palavras de Agos
dos c a re.
tinho: “Tu nos fizeste para ti m esmo, e nossos corações estão inquietos até que
ética. L ::
descansem em ti”.507 As doutrinas da criação e redenção com binam -se para
d e salvari
interpretar esse senso de descontentam ento e falta de realização como um a
da, ela r ‘
perda — perda de com unhão com Deus — que pode ser restaurada. O quadro
N.
de um a natureza hum ana partida, que ainda possui a capacidade de estar ciente
p rim i : r :■
de sua perda, e de esperar que possa ser restaurada é dado. H á um ponto
referir-
natural de contato para o evangelho, fundam entado na frustração da natureza
do c o r m
hum ana de satisfazer-se por seus projetos. Agostinho captou essa idéia perfeita
os e s c r i:::
m ente quando falou da “m em ória amorosa”508 de Deus. E a memória de Deus,
N a bas t a
baseada nas doutrinas da criação e redenção, que afirm am que, por m eio do
clusão r^ :
pecado, nós tem os parcialm ente perdido algum a coisa — e somos de algum a
Jesus r : r :
form a tornados conscientes daquela perda por meio da graça. E um a lem
Is>; r
brança amorosa, experim entada como um senso de nostalgia divina, de anseio
c o m o .'.'r.-’
espiritual. H á um a sede para se ter mais daquilo do que só temos em parte.
dele. N a :
O ponto de contato é, então, um a percepção ou consciência da presença
dos c o ra :
passada de D eus e o presente em pobrecim ento dessa presença, suficiente para
d a em :z:
m over-nos ao desejo de recuperá-la totalm ente por m eio da graça de Deus. É
q u a lq u a : :
um gatilho, um estímulo, um ante-gosto do que ainda virá, e um a revelação
O N:
da insuficiência e pobreza do que agora temos. Para usar o vocabulário de
Jesus Cr;>i
Agostinho, o ponto de contato é um a m em ória latente de Deus, reforçada por
re a firn :: _
187
um encontro com sua criação, que tem o potencial de nos dirigir para a fonte
renas um
m ediante a qual seu senso de anseio doce-amargo pode ser satisfeito.
r ue Deus,
Aqui está um a estrutura interpretativa definida, firmemente alicerçada na
Escritura e na tradição cristã, que visa a fazer sentido de m uito da experiência
jnam en-
religiosa hum ana. U m impulso fundam ental que parece existir por atrás da ex
ue insatis-
periência religiosa — a busca pelo transcendente — pode ser explicado dentro
— contudo,
da estrutura da teologia cristã. Não é m inha intenção desenvolver esse ponto
rriencia. E
mais do que isso, simplesmente porque o espaço não o permite. M eu argum ento
uonto de
básico, porém, é que o próprio evangelho nos capacita para entender por que as
- Io ser ca-
várias tradições religiosas da hum anidade existem, e por que pode haver pelo
- i :espeito.
m enos algum grau de convergência entre elas em relação a um a busca por rea
irdente, o
lização. Esse grau de convergência pode ser teologicamente justificado, e precisa
de D eus
ser apologeticamente explorado.
: nhecemos
Q ue abordagem pode ser, então, adotada para o lugar salvífico do cristia
e esse vazio
nism o dentro da situação religiosa do m undo? O ponto inicial que mais ajuda
í ; da busca
é considerar a própria noção de “salvação”. A noção cristã de “salvação” é com
- i de ponta
plexa e altam ente cheia de nuanças. As imagens controladoras usadas no Novo
eus.
Testam ento para articular seus vários aspectos incluem term os e conceitos tira
de Agos-
dos de relacionamentos pessoais, cura física, transações legais e transform ação
e:os até que
ética. C ontudo, no meio dessa rica diversidade de entendim entos da natureza
im -se para
de salvação, um fator perm anece constante: seja como a salvação for entendi
eomo um a
da, ela é fundam entada na vida, m orte e ressurreição de Jesus C risto.509
O quadro
Salvação é um a possibilidade só po r causa de Jesus Cristo. O s cristãos
estar ciente
prim itivos não hesitavam em usar o term o “salvador” (no grego: sôtêr) para
um ponto
referir-se a Jesus Cristo, apesar de esse term o já ser am plam ente usado dentro
ua natureza
do contexto complexo e diverso no qual o evangelho prim eiro apareceu. Para
e:i perfeita-
os escritores do Novo Testam ento, Jesus foi o único salvador da hum anidade.
■:.i de Deus,
N a base da evidência disponível aos escritores do Novo Testam ento, esta con
: r meio do
clusão pareceu inteiram ente apropriada e necessária. A evidência a respeito de
í de algum a
Jesus precisava ser interpretada nessa direção, e foi assim interpretada.
£ um a lem -
Isso não significa, porém , que os prim eiros cristãos pensavam que Jesus
de anseio
com o sôter oferece a mesm a sôtêria que outros que portaram esse título antes
em parte,
dele. N a religião clássica grega, Poseidon e os D ioskouroi eram todos aclama
da presença
dos com o sôtêres;510 contudo, a “salvação” em questão parece ter sido concebi
-ciente para
da em term os de livramento tem poral de um a ameaça presente, em vez de
de Deus. É
qualquer noção de salvação eterna.
-ua revelação
O Novo Testamento afirma a particularidade do ato redentivo de Deus em
cabulário de
Jesus Cristo.511 A tradição cristã primitiva, baseando-se no Novo Testamento,
eforçada por
reafirmou essa particularidade. Enquanto concedendo a revelação de Deus ia
bem além de Jesus Cristo (em que Deus tornou-se conhecido em várias exten
sões por esses meios como a ordem natural da criação, e a consciência hum ana e
civilização), o conhecimento geral de Deus não era entendido como compreen
dendo salvação universal. João Calvino declarou os vários estilos de conheci
m ento de Deus disponíveis à hum anidade quando ele fez sua celebrada distinção
entre um “conhecimento de Deus, o Criador”, e um “conhecimento de Deus, o
redentor”.512 O prim eiro era disponível universalmente, m ediado por meio da
natureza e (de m aneira mais plena e mais coerente) da Escritura; o último, que
só constituía um conhecimento de Deus distintivamente cristão, tornou-se co
nhecido por intermédio de Jesus Cristo, conforme é revelado na Bíblia. Assim,
Calvino não teria problem a algum em permitir, por exemplo, tanto a judeus
quanto a m uçulmanos terem acesso a um conhecimento de Deus, como Cria
dor; o conhecimento particular e distintivamente cristão de Deus está ligado a
conhecê-lo como redentor, em vez de conhecê-lo apenas como Criador.
Calvino aqui expressa um consenso estabelecido há longo tem po dentro da
teologia cristã: o conhecimento de Deus pode ser alcançado fora da tradição
cristã. D entro da tradição reformada, a posição geral de Calvino tem sido m an
tida, a despeito do desafio vigoroso de Karl Barth, que insistiu em que nenhum
conhecimento de Deus era disponível ou possível fora de Cristo, m udando as
sim de um a posição cristocêntrica para um a posição cristomonista. A forte tradição
da teologia natural dentro da tradição reformada aponta para a crença, baseada
na Bíblia, de que Deus não se deixou sem testemunhas no m undo, quer na
própria natureza, na filosofia clássica, ou em outras religiões.513 Por exemplo,
Romanos 1.18-32 deixa claramente implícito que revelação divina ocorreu na
história, na cultura e na experiência hum ana antes da vinda de Jesus Cristo, e
indica que isso pode ser visto como um a preparação para o próprio evangelho
(praeparatio evangelica).
O m esm o princípio geral é m antido na dogm ática luterana, e é mais
freqüentem ente expresso em term os da distinção entre Deus Absconditus e Deus
revelatus. C om o Carl E. Braaten m enciona, a tradição luterana reconhece um a
estrutura dual dentro da revelação de Deus: o Deus oculto da criação e da lei
(Deus absconditus) e o D eus revelado do pacto e do próprio evangelho (Deus
revelatus),514 U m a abordagem semelhante é tam bém associada com o Segun
do Conselho Vaticano.’15 Ao adm itir o conhecim ento de D eus fora da com u
nidade especificamente cristã, eu não estou dizendo nada novo, notável nem
particularm ente controverso; estou m eram ente reiterando um consenso de
longa data dentro da teologia cristã.
Apesar disso, algumas correções precisam ser acrescentadas im ediatam ente:
1. A tradição cristã é testem unha de um entendim ento particular de “D eus”,
e não pode ser amalgam ada nos vários conceitos de divindade encontrados em
outras religiões. A dm itir que algo de Deus seja conhecido em religiões não-
cristas não é aceitar com o verdadeira a opinião de que todos os aspectos dos
entendim entos de D eus dessas religiões não-cristãs sejam coerentes com o cris
tianism o, nem que todos os aspectos da compreensão cristã a respeito de Deus
sejam encontrados em outras religiões. Estamos falando sobre “pontos de con
tato” e convergências ocasionais, não de identidade nem m esm o de acordo
consistente fundam ental.
2. N a compreensão cristã, o conhecim ento factual ou cognitivo de Deus
não é visto como salvífico em si. C om o Soren Kierkegaard observou em sua
obra Unscientific PostScript, é perfeitam ente possível com preender o entendi
m ento cristão de D eus sem ser um cristão.516 C onhecim ento de Deus é um a
coisa; salvação é outra. Perm itir que algo seja conhecido de D eus em religiões
não-cristãs não im plica em dizer que a “salvação”, no entendim ento cristão do
term o, seja possível entre elas.
3. Além disso, a idéia de “salvação” varia consideravelmente de um a re
ligião para outra. Nas religiões nativas do oeste da África especialmente, por
exemplo, m uitas vezes não há nenhum elem ento transcendente discernível
associado às noções que no meio delas se desenvolvem a respeito de salvação.
A falta de atenção dispensada às traduções de escritos religiosos de outras crenças
para o inglês, especialmente os trazidos da ín d ia e China, perm itiu o surgi
m ento da pressuposição de que todas as religiões com partilham idéias com u
nas sobre “salvação”. O fato é que, no inglês, o term o “salvação” é m uitas vezes
usado para traduzir referências ao sânscrito ou chinês, com conotações e asso
ciações bem diferentes do conceito cristão. Essas divergências são disfarçadas
pelo processo de tradução, que m uitas vezes sugere um grau de convergência
ausente na realidade. Tão im portantes são esses pontos que serão explorados
em m aior detalhe.
ral), que optou por tornar-se conhecido de um a form a altam ente particular
em Jesus Cristo e por m eio dele. U m a parte essencial da agenda do pluralismo
prescritivo é a eliminação de qualquer distintividade em relação ao entendi
m ento cristão da natureza, propósitos e pessoa de Deus.
C ontudo, a história religiosa hum ana m ostra que idéias hum anas naturais
sobre o núm ero, natureza e caráter dos deuses é notoriam ente vaga e m istura
da. A ênfase cristã é sobre a necessidade de adorar, cultuar, não os deuses em
geral (as censuras de Israel contra a religião cananita sendo especialmente im
portantes aqui), mas o culto a um Deus que optou por tornar-se conhecido.
C om o R obert Jenson argum entou persuasivamente, a doutrina da Trindade é
um a tentativa de explicar em detalhes a identidade desse Deus, e evitar con
fusão com rivais requerentes a esse título.524 A doutrina da Trindade define e
defende a particularidade e distinção e, por fim, a importância do “D eus dos
cristãos”. O Novo Testam ento dá um a nova guinada nessa evolução usando
para isso a sua linguagem sobre “o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus C risto”,
encontrando nas ações e paixões de Jesus Cristo a identidade de Deus. Em
resumo: para os cristãos, D eus é revelado cristologicamente.
Este ponto é de im portância considerável. A m aioria dos pluralistas reli
giosos ocidentais parecem trabalhar com um conceito de Deus form atado pela
tradição cristã, quer isto seja reconhecido abertam ente ou não. Por exemplo,
um apelo é feito por pluralistas m uitas vezes à noção de um gracioso e am o
roso Pai. N o entanto, esta é um a noção de Deus, distintivam ente cristã, que
em últim a análise é baseada e substanciada em Jesus Cristo. N ão há nada como
a “noção de Deus independente de tradição”. N em a idéia de D eus expressa
por K ant, que alegava ser puram ente racional em caráter e, portanto, indepen
dente de cultura, é na realidade etnocêntrica. Foi profundam ente m oldada
por suposições cristãs implícitas que estavam arraigadas na m atriz social de
Kant. C om o Gavin D ’Costa observou, o conceito de Deus m anifestado por
John Hick, que desem penha papel significativo em sua visão de m undo plu
ralista, foi decisivamente m oldada — quer se reconheça ou esteja preparado
para adm itir isto — por considerações cristológicas. “Até que p onto”, ele per
gunta, “pode H ick expor um a doutrina da vontade universal salvífica de Deus
se ele não baseia essa verdade crucial na revelação de D eus em Cristo, trazendo
assim a cristologia de volta ao centro do palco?’525
Pluralistas têm colocado um a cunha entre D eus e Jesus Cristo, com o se os
cristãos fossem obrigados a escolher entre um e outro. A m edida que o pên d u
lo balança em direção a um a abordagem teocêntrica (presum indo que o “deus”
em questão é com um a todas as tradições religiosas), a cristologia dos pluralis
tas religiosos fica reduzida a proporções insignificantes. Só a mais baixa cristo-
193
urucular logia possível dentro da tradição cristã é declarada digna de aceitação no período
i_:ilismo m oderno (passando por cima do fato desajeitado de que esta cristologia tinha
er.tendi- sido rejeitada com o herética pela igreja prim itiva). Se os pluralistas têm algu
m a fonte infalível de conhecim ento sobre a natureza e propósitos de Deus à
parte de Cristo, qual é o objetivo do evangelho? E que tipo de D eus é este que
pode ser conhecido separadam ente de Cristo? Estamos falando sobre “o Deus
e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo” (lP e 1.3), m esm o, ou sobre algum a deidade
diferente? U m a idéia de Deus só pode ser considerada “cristã” se estiver sujeita
ao padrão da auto-revelação de Deus por meio de Jesus Cristo, conform e tor-
na-se conhecida por nós pela Escritura.
Q ual é a relevância deste ponto para o nosso tema? Salvação, no entendi
m ento cristão desta noção, envolve um relacionam ento alterado com Deus,
quer isto seja entendido pessoalmente, substancialm ente, m oralm ente ou le
galmente. Sobre que Deus, porém , estamos faltando? Os escritores do Antigo
Testam ento estavam bem certos de que “salvação”, como eles a entendiam , era
sobre um novo relacionam ento, não com nenhum dos deuses de Canaã, Filis-
tia ou Assíria, mas com o uno e único Deus pactuai de Israel, a quem eles
L-:as reli- conheciam pelo título pessoal que o distinguia: “o Senhor”. Para o cristianis
Liido pela m o, a noção da salvação inclui explicitamente e se centra sobre um relaciona
exemplo, m ento, inaugurado no tem po e a ser consum ado além do tem po, com ninguém
- e amo- mais do que o “Deus e Pai de nosso Senhor Jesus C risto”. Estamos assim tratan
risuâ, que do com um a noção de salvação altam ente particularizada, como ficará claro
ü a como mais adiante nesta seção.
5 expressa
O lugar de Jesus Cristo na salvação
:ndepen-
rr.oldada Já tratam os da im portância de Jesus Cristo em relação ao entendim ento
5? ciai de cristão de Deus, e a tendência pluralista que acaba, como diz o teólogo da
<:rdo por Harvard, Harvey Cox, “abrandando a figura do próprio Jesus”. Para Cox —
rr.io plu- que já foi um dia considerado um dos mais radicais teólogos da década de
p reparado 1960 — , a m aneira mais apropriada para os cristãos se em penharem em diálo
. ele per- go significativo entre as diferentes crenças é começar reconhecendo que “Jesus
^ ue Deus é, em algumas formas, o elem ento mais particularístico do cristianism o”.526
. crazendo Cox aqui cham a a atenção para o ponto de haver um a necessidade de começar
de algo concreto e histórico, em vez de iniciar de algum símbolo abstrato. E
:: mo se os para os cristãos, este elem ento particularista é Jesus Cristo. A teologia cristã,
: : pêndu- espiritualidade cristã e acima de tudo o culto cristão são fortem ente enfocados
te o "deus” em Cristo.
55 pluralis- O Novo Testam ento, que endossa e legitim a este cristocentrism o, não vê
lixa cristo m eram ente Jesus Cristo como expressão de um a salvação divina, que pode se
tornar disponível em outras formas. Ele é claramente entendido como o consti
tutivo dessa salvação. N a tradição cristã, Jesus é visto com o mais do que Rasul
(“o enviado”, para usar a definição fundam ental m uçulm ana da seqüência de
profetas que culm inou com M aom é). Ele é visto com o o que estabelece tanto
quanto como o que é enviado — um profeta e um salvador. A essa altura, os
pluralistas têm várias opções para declarar que o Novo Testam ento está sim
plesm ente errado sobre esse ponto (o que im pede um a séria pretensão de ser
cristão), até sugerir que as afirmações do Novo Testam ento podem ser verdade
para os cristãos, mas não têm força para obrigar nesse respeito extra muros
ecclesiae (fora dos limites da igreja).527 C ontudo, pelo m enos potencialm ente,
o Novo Testam ento vê de m aneira clara Jesus Cristo com o o salvador do m u n
do, não apenas de cristãos, referindo-se, assim, ao caráter fortem ente universal
de sua obra savífica.
A natureza da salvação
Em um im portante estudo, John H ick argum enta que há um a estrutura
de cerne com um a todas as religiões que “são fundam entalm ente iguais em
exibir um a estrutura soteriológica. Isto é, todas elas estão interessadas em sal
vação/ libertação/ ilum inação/ realização”.328 N o entanto, pode ser observado,
razoavelmente, que esses conceitos de salvação são concebidos de maneiras tão
radicalm ente diferentes, e entendidos para ser estabelecidos ou alcançados de
tantas maneiras diferentes, que só alguém que estivesse obstinadam ente deter
m inado, com o um a questão de princípio, para tratá-los com o aspectos do
mesmo todo m aior teria suficiente flexibilidade intelectual para fazer isso. Será
que o cristianismo e o satanismo realmente entendem da m esm a form a a sal
vação? M eus conhecidos sobre o satanismo certam ente não me levam a crer
assim. C om efeito, os satanistas aceitam que há um Deus; mas optam por
adorar a antítese desse Deus. Esse dualism o dificilm ente deixa entrever a pro
priedade num a teoria pluralista das religiões.
U m observador m enos envolvido na questão, aliviado por não ter de de
fender a idéia de que todas as religiões do m undo são basicamente a mesma,
poderia sugerir razoavelmente que elas não só oferecem diferentes meios de
alcançar e conceituar a salvação; elas oferecem “salvações” com pletam ente dife
rentes. A visão rastafariana de um paraíso no qual os negros são servidos pelos
criados brancos; a idéia hom érica de tártaros; o velho conceito nórdico do
valhallá; a visão budista de nirvana; a esperança cristã da ressurreição para a
vida eterna — todos são obviamente diferentes. Com o todos os caminhos para
a salvação podem ser igualmente “válidos” quando os alvos a serem alcançados
em tão diferentes m odos são tão obviam ente nada relacionados?
r . : o consti- C om o foi notado acima, há enorm e variedade dentro das religiões com
c eue Rasul relação à natureza da salvação. Conceitos cristãos de salvação estão enfocados
rjúència de no estabelecimento de um relacionam ento entre Deus (no sentido cristão do
tanto termo) e seu povo, e utilizam um a variedade de imagens para articular seus
si iltura, os vários aspectos. Por trás dessas convergentes imagens de salvação está o tem a
c: está sim- com um a todas: “salvação em e por meio de Cristo” — isto é o m esm o que
:r.íio de ser dizer que salvação é um a possibilidade som ente por causa da vida, m orte e
íer verdade ressurreição de Jesus Cristo, e essa salvação é m oldada em sua imagem. Q u a n
:\r>'a muros do os cristãos tentam explicar o que está incluído na palavra “salvação”, Joseph
r.eialmente, A. D i Noia, OP, tece o seguinte comentário:
: do m un-
... nós nos achamos falando sobre o Deus triúno; a encarnação, paixão,
i:e universal
morte e ressurreição de Jesus Cristo; graça, pecado e justificação; transfi
guração e divinização; fé, esperança e caridade; os mandamentos e as vir
tudes morais; e muitas outras coisas caracteristicamente cristãs. Não
devemos ficar surpresos se, em tentar responder a uma pergunta cognata,
r.i estrutura
um membro de outra tradição religiosa, digamos, um budista, mostrar-se
:e iguais em
bem específico sobre nirvana e tudo que diz respeito a alcançá-lo. Não
a iis em sal-
nos devemos surpreender, também, se a descrição de salvação e nirvana
r :òservado,
nao coincidirem [...] salvação tem um conteúdo específico para os cris
r.ineiras tao
tãos. Compreende uma comunhão interpessoal, tornada possível por Cris
cir.çados de
to, entre pessoas humanas e o Pai, Filho e Espírito Santo. Pelo menos à
re n te deter-
primeira vista, isso parece ser algo muito diferente do que se pode supor
isnectos do
que budistas buscam quando eles seguem o Excelente Cam inho Octuplo
it: isso. Será
que os dirige no caminho de realizar iluminação e a extinção do eu em
:: :m a a sal-
nirvana. Pelo menos na face das coisas, o que os budistas querem dizer
íe-. im a crer
com “nirvana” e o que os cristãos querem dizer com “salvação” não pare
; -.'iam por
cem coincidir.529
trever a pro-
Diferenças entre noções de salvação são refletidas tam bém no culto de
L; :er de de- com unidades religiosas. O s que são atraídos à noção budista de salvação, (ou,
,:e a mesma, mais acertadam ente, um a das m uitas opções dessa natureza disponíveis dentro
te 5 meios de das várias tradições budistas) dificilm ente desejarão tornar-se cristãos; isso
irr.ente dife- porque, na teologia, culto e oração cristãos são entrelaçados bem de perto com
;r. idos pelos um a série definida de crenças tanto sobre a pessoa como sobre a obra de Jesus
■nordico do Cristo. O culto cristão reflete crenças específicas a respeito tanto da natureza
reieão para a da salvação com o da natureza do salvador. Geoffrey W ainw right e outros têm
irninhos para enfatizado o m odo em que a teologia e a doxologia são bem interligadas,530
n alcançados tornando impossível enxertar, por exemplo, um a idéia budista de salvação num a
com unidade de culto cristão. N um contexto relacionado, m uçulm anos con
tinuam a estar, no m áximo, altam ente céticos, e, mais em geral, intensam ente
críticos, diante da prática caracteristicam ente crista de adorar Jesus Cristo.
(Esta prática é geralmente vista com o um caso de heresia de ittakhadha, pela
qual Jesus é reconhecido como Filho físico de Deus.)
Escritores pluralistas ocasionalm ente referem-se à idéia de “salvação de
gatinho” dentro do hinduísm o, com o indicação de que a noção de graça não é
distintam ente cristã. A distinção entre “salvação de gatinho” e “salvação de
m acaco”, dentro da tradição bhakti marga do hinduísm o, repousa sobre o fato
de que um a tigresa carrega seus filhotes, enquanto que bebês macacos têm de
se dependurar em suas mães. M uitas vezes, apela-se para essa idéia de “salvação
de gatinho” específica a esta form a de hinduísm o, como um a indicação da
“convergência” das religiões sobre a graça de Deus.
A situação, porém , não é tão simples quanto esta análise poderia sugerir.
O conceito não é achado em nenhum dos docum entos de fundação do hin
duísm o, que datam do período védico — 2000-600 a.C. — , no qual um a
síntese entre a religião sacrificial politeísta dos arianos e o m onism o panteísta
do upanishades ocorreu, nem durante o período purânico — 300-1200 A.D .
— , durante o qual formas sírias do cristianismo se tornaram estabelecidas nas
regiões do sul da índia, e é especialmente associada ao escritor medieval Sri
Ram anuja (c. 1050-1137).531 A suposição de que “salvação de gatinho” dem ons
tra, um a inerente similaridade entre hinduísm o e cristianismo é perigosamente
simplista; poderia igualm ente ilustrar a conhecida tendência de alguns escri
tores hindus de “em prestar” idéias do cristianism o.532 Semelhanças podem
refletir o tipo de em préstimos que tomavam, associados às tendências forte
m ente sincretistas de algumas formas do hinduísm o; não é preciso entendê-las
com o refletindo convergência fundam ental.
C om esses pontos em m ente, vamos discutir a pergunta: “A salvação é
possível fora do cristianismo?”. C om o resultado dos escritos de Ludwig W itt-
genstein, teólogos se têm tornado acentuadam ente sensíveis à necessidade de
estabelecer o contexto em que as palavras são usadas.533 Para W ittgenstein, o
lebensform (“form a de viver”), dentro do qual um a palavra era usada, era de
im portância decisiva em estabelecer o sentido daquela palavra. O lebensform
cristão é, portanto, de im portância controladora para entender o que o con
ceito cristão de salvação sugere, pressupõe e expressa.
C om o o próprio W ittgenstein observou, a m esm a palavra pode ser usada
n u m grande núm ero de sentidos. U m m odo de tratar com isso poderia ser de
inventar um vocabulário totalm ente novo, no qual o sentido de cada palavra
seria com precisão e inequivocam ente definido. M as essa não é um a opção
real. Línguas, como religiões, são entidades vivas, e não podem ser forçadas a
r -rm ente ter com portam ento tão artificial. U m a abordagem perfeitam ente aceitável,
_s Cristo, segundo W ittgenstein, é dar-se ao trabalho de definir o sentido particular no
pela qual um a palavra deve ser entendida, a fim de evitar confusão com seus m uitos
outros sentidos. Isso envolve um estudo cuidadoso de suas associações e seu
uução de uso na “form a de viver” em que ela se relaciona.534 Esse ponto parece ser apre
ru a nao é ciado por Paul Knitter, que, ao observar que “todo conhecim ento é carregado
u ução de de teoria”, conclui que “cada religião está falando dentro de seu jogo-de-lin-
b :e o fato guagem”.535 Esse uso de um conceito W ittgensteiniano claram ente indica um a
; s :èm de percepção da necessidade de identificar o uso de palavras em “jogos-de-lin-
salvação guagem” para verificar seu sentido específico dentro da tradição em que são
;;rção da empregadas. “Salvação” é claram ente um exemplo disso. Seu uso e associações
dentro da tradição cristã, especialmente no culto, dem onstra um a com preen
Li sugerir, são específica de que a fé cristã é entendida com o conferindo aos crentes, sua
c do hin- base final, e o m odo em que isso acontece.’36
cual um a Se o term o “salvação” é entendido como significando “algum benefício
r anteísta conferido a m em bros de um a com unidade, e alcançados por eles, quer indi
: j O A.D. vidual ou corporativam ente”, todas as religiões oferecem “salvação”. Todas —
r ridas nas e isso definitivamente não só religiões — oferecem alguma coisa. C ontudo, essa
cieval Sri é um a afirmação tão geral que ficou vazia de valor teológico significativo.Todas
uemons- as religiões, junto com teorias com o a do marxismo e escolas psicoterapêuticas
samente com o a terapia rogeriana podem legitim am ente ser intituladas de “salvíficas”.537
ur.s escri- A declaração “todas as religiões oferecem salvação” é assim potencialm ente
Dodem pouco mais do que um a tautologia. Só pelo uso do mais violento dos meios
:irs forte- pode-se dizer que todas as religiões oferecem a m esm a “salvação”. Respeito
::endê-las pela integridade das religiões do m undo exige que “salvação” seja particularizada
— isto é, que a m orfologia distinta da compreensão de salvação de um a re
íj_vação é ligião (incluindo a sua base, seu m odo de transmissão e apropriação, e sua
w i g W itt- natureza inerente) deve ser respeitada, e não hom ogeneizada forçadam ente
ííidade de para ajustar-se às necessidades de algum grupo de pressão em particular dentro
eustein, o da academia.
zi. era de O caráter distintivo de cada religião pode e precisa ser afirmado: o budis
Uoensform m o oferece um estilo de “salvação”, assim com o o cristianismo oferece outro.
ue o con- N ão é nenhum a crítica do budism o sugerir que este não oferece um a salvação
especificamente cristã, assim com o nao é nada imperativo dizer que a visão
;er usada cristã da salvação não é a m esm a que a visão budista a respeito dela. Essas
eria ser de diferenças refletem o simples fato de que o cristianismo não é o budism o. E
i i palavra essencial respeitar e honrar diferenças, e resistir à tentação sempre presente de
ma opção forçar todos a um m esm o molde.
terçadas a
198
Já::;
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acadêna:;
ou d e fe a .
Já não há dúvida nenhum a de que o evangelicalismo é de im portância m uito
grande para o futuro do cristianismo global.544 Para pessoas de fora, seu dina
mismo e ativismo espiritual, junto com o intenso compromisso tão característi
co de crentes, individualm ente, e de igrejas evangélicas, são fortes indícios do
crescimento significativo de longo prazo no movimento. Os evangélicos — eles
mesmos — , porém, apontariam o seu compromisso total com o evangelho como
razão fundam ental para o sucesso atual e potencial futuro. Eles argum entam
que perm aneceram fiéis ao evangelho durante o período na cultura ocidental
em que outros se entregaram a pressões sociais para acom odar o cristianismo
às idéias e valores de um a visão de m undo secular. Sua paixão pela verdade do
evangelho pode ser vista agora como justificada. Eles já colhem as recom pen
sas de sua fidelidade.
Talvez essa resposta seja um tanto simplista. Parte do argum ento deste
livro foi que os evangélicos perm itiram , realmente, que o seu contexto secular
afetasse seu pensam ento; o que pode ser visto claram ente na m aneira em que
Charles Elodge e Benjam in B. W arfield perm itiram que a teoria de linguagem
associada com o “realismo escocês” influenciasse sua compreensão da autori
dade bíblica (ver p. 141-144). O utros exemplos poderiam ser dados, sem dúvida.
Apesar disso, a convicção evangélica fundam ental não deixa de ser que é im
perativo perm anecer fiel ao evangelho de Jesus Cristo, e não perm itir que
idéias ou valores externos ao cristianismo exerçam um papel norm ativo dentro
de seu pensam ento ou vida.
A presente obra explorou a questão da coerência intelectual e credibilidade
acadêmica do evangelicalismo. Se “acadêmico” é entendido como ter referência
a normas e valores culturais que chegaram a prevalecer em muitas instituições
acadêmicas ocidentais, o evangelicalismo não terá interesse nenhum em adotar
ou defender im portância “acadêmica”. O evangelicalismo tem estado ocupado
demais levando adiante seu m inistério evangelístico e pastoral para ter m uito
tem po para esse tipo de preocupação “acadêmica”. C ontudo, em m uitas partes,
o term o “acadêmico” continua a fazer referência à coerência e plausibilidade
intelectual, ligado a um forte comprom isso com a erudição. Foi preocupação
desta obra m ostrar que, nesse sentido mais antigo do term o, o evangelicalismo
tem toda razão de pensar em si, e de ser julgado, com o “acadêmico”.
Para alguns evangélicos, isso será um a irrelevância. Q uem se im porta com
o fato de o evangelicalismo ter ou não qualquer peso intelectual? C ertam ente
a coisa im portante é ganhar pessoas para o Senhor e cuidar de sua alma. H á
sabedoria enorm e neste parecer, e ele deve ser respeitado e honrado. Isso nos
faz lem brar que ao evangelicalismo nunca pode ser perm itido perder de vista
os grandes desafios e alegrias do m inistério do evangelho, ou da im portância
de se m inistrar a, e cuidar de pessoas com uns que am am o Senhor, mas não
têm interesse em intelectualidade. C om esta visão, não é inconsistente, porém ,
que o evangelicalismo tem tam bém um alto grau de coerência intelectual,
especialmente em face de seus rivais no m undo acadêmico contem porâneo.
Mas por que im porta apontar isso? Q ue valor isso pode ter?
Apreciar os m éritos e a sofisticação potencial do evangelicalismo nesse
respeito é bastante im portante por várias razões. U m ponto simples diz respeito
ao papel de universidades e outros educandários na cultura ocidental. O s es
tereótipos oferecidos nesses estabelecimentos de ensino a respeito do evangeli
calismo, retratam -no como anti-intelectual e sem im portância para pessoas
que pensam . O sucesso popular e influência do m ovim ento são assim mal
interpretados em alguns círculos acadêmicos influentes com o um a indicação
direta de sua falta de m érito e sofisticação intelectual. C om o resultado, a elite
social do am anhã m uitas vezes tem sido saturada durante sua fase form ativa
com estereótipos anti-evangélicos. E nquanto o protesto de evangélicos contra
tais estereótipos deve continuar, isso deve ser suplem entado com afirmação
cada vez mais vigorosa e dem onstração da sofisticação intelectual do m ovi
m ento.
A voz evangélica precisa, pois, ser ouvida em nível acadêmico, com cursos
sobre “teologia evangélica” e “espiritualidade evangélica”, sendo perm itido a
estes achar seu lugar legítimo no ensino de seminários e educandários respeita
dos. Os evangélicos precisam apreciar esta sofisticação para si mesmos antes de
poderem persuadir outros. A presente obra procurou encorajar este processo
de edificação de confiança dentro do m ovim ento, para que futuros líderes e
pensadores evangélicos de potencial não precisem se sentir sob pressão legíti
m a para abandonar sua fé evangélica por causa de sua alegada irracionalidade.
205
•a rer m uito Talvez o m aior desafio para o evangelicalismo na próxim a geração seja
u:ras partes, desenvolver um compromisso intelectual cada vez m aior sem perder suas raízes
a_>ibilidade na vida e fé dos crentes com uns. As associações fortem ente negativas da pala
■reocupação vra “acadêmico” são um constante aviso dos perigos de se form ular um a teolo
•ae.icalismo gia ou visão de m undo sofisticada sem se engajar firm em ente com a agenda e
interesses da igreja. Aspirar à erudição intelectual é a coisa mais fácil do m u n
r.ro rta com do; já desenvolver isto enquanto se perm anece firm em ente em contato com as
Certam ente realidades da vida cristã com um é tarefa um tanto mais intim idante.
.2 rima. H á C ontudo, isso permanece um a tarefa que precisa ser assumida. O evange
í :, Isso nos licalismo, especialmente na América, tem raízes profundam ente populistas.
cer de vista E nquanto a fundam entação segura na cultura popular evita que o evangelica
rr.nortância lismo se gratifique no negócio de erudição acadêmica visando a esse aspecto,
:r. mas não isso m esm o pode significar que o m ovim ento corra um risco sério de se tornar
rrre. porém , tão intelectual e espiritualm ente efêmero e pouco profundo quanto a cultura
:r.:electual, geral. Teologia, entendida com o um engajam ento positivo e sustentado com
ín porâneo. as riquezas e recursos da fé cristã, oferece ao evangelicalismo a oportunidade
de suplem entar seu populism o dinâm ico e ativista colocando raízes profun
íii.no nesse das, capazes de nutrir e sustentar o m ovim ento no coração e na m ente.
ciz respeito O “escândalo da m ente evangélica”, na expressão de M ark Noll, está no
r.ral. Os es- fato de, n u m passado recente, evangélicos terem deixado de perm itir que sua fé
:: cvangeli- formatasse sua compreensão de m u ndo.545 Em parte, a presente obra visou a
tara pessoas corrigir esta deficiência, tranqüilizando os evangélicos da coerência e viabilidade
' aí sim mal de suas crenças. Para construir um prédio, é preciso primeiro que se esteja asse
■a indicação gurado da confiabilidade de seus alicerces. Este livro visou a buscar a aceitação
cado, a elite pública da adequação intelectual e suficiência do evangelicalismo, tanto em
c rormativa term os dos próprios critérios internos com o das alternativas no m undo oci
Li: os contra dental m oderno.
: afirmação Os evangélicos não precisam mais se sentir desm edidam ente vulneráveis,
l ao movi- na defensiva, ou pedindo desculpas sobre as crenças que os distinguem dos
seguidores de outras doutrinas religiosas. Podem começar a aplicá-las, con
: : m cursos solidá-las, e estender os grandes avanços feitos durante a últim a geração. A
?ermitido a paixão evangélica pela verdade precisa tornar-se um a paixão pela m ente evangélica.
i: s respeita- O evangelicalismo já fez grandes contribuições para a formatação e renovação da
i : í antes de vida da igreja que Cristo fundou; a tarefa de form atar e renovar a vida da
;re processo m ente crista é o que o aguarda agora.
c 5 líderes e
e_;;ão legíti-
::: nalidade.