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Resumo
O presente artigo tem como objetivo apresentar uma breve trajetória do Serviço
Social no Brasil e sua relação com a Educação Popular, buscando identificar, a partir
1
Assistente Social. Doutora em Serviço Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professora do Curso
de Serviço Social do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), Ceará, Brasil.
2 Assistente Social. Residente em Saúde da Familia e Comunidade pela Escola de Saúde Pública do Ceará,
Brasil.
Introdução
Para Abreu (2010, p. 155), a Educação Popular pode ser definida como uma
“tendência pedagógica identificada com a luta de classes, portanto, utilizada como
instrumento de organização popular”. Em Freire (1993, p.19), a Educação Popular
assume uma função teórico-prática de busca pela superação da condição de
oprimido através da práxis social: uma educação não para as classes populares
(oprimidas), mas com estas. Articulando essa concepção de Educação Popular com
o Serviço Social, Silva e Silva (2011, p. 228) concebe a Educação Popular (EP)
como um dos eixos estratégicos para operacionalizar o Projeto Profissional de
Ruptura com o conservadorismo. Para a autora, o objetivo da EP é “[...] viabilizar
um processo reflexivo acerca do cotidiano dos setores populares, de modo a
contribuir para a construção de um saber popular que venha a possibilitar uma forma
de resistência ao processo hegemônico das classes dominantes”.
Porém, é preciso atentar para a apropriação da EP pela perspectiva descrita
por Netto (2011) como Reatualização do Conservadorismo, momento em que havia
a exigência de uma maturação teórica que pudesse subsidiar a prática profissional.
Existia também uma recusa às matrizes positivistas através da adesão da
fenomenologia na busca por uma “compreensão” das práticas sociais. Nesse
contexto, a utilização das categorias “diálogo”, “consciência” e “transformação
social”, sistematizadas na EP de Freire, passam a se articular com propostas
existencialistas e subjetivistas de práticas interventivas. O “diálogo, pessoa e
transformação social” da chamada “nova proposta”, sistematizada por Almeida
(1978), resgatou “a herança psicossocial, a tendência à centralização nas dinâmicas
individuais e o viés psicologizante”. (NETTO, 2011, p. 245).
Assim, percebemos que o exercício profissional do Serviço Social, em seus
diversos períodos históricos, vem intermediando várias práticas educativas,
destinadas especialmente as classes populares. A modernização conservadora que
pôs no imaginário do país a possibilidade de um desenvolvimento nacional para
todos, de fato, foi benéfica, econômico e socialmente, para o empresariado e
demais setores da burguesia associada, especialmente no período da ditadura civil-
militar consolidada por um golpe de Estado em 1964, atendendo as necessidades
de acumulação do capital nacional/internacional.
Por outro lado, é notável, no período destacado, o surgimento de
experiências contra-hegemônicas, como foi o caso das Ligas Camponesas, do
Movimento de Cultura Popular, do Centro Popular de Cultura, do Programa Nacional
de Alfabetização, do Movimento de Educação de Base e das Comunidades
Eclesiais de Base (SILVA, 2007), que se forjaram em meio a uma onda repressiva
na América Latina. Foi dentro dessa nova e conflituosa dinâmica social que,
contraditoriamente, o Serviço Social dá maior fôlego ao seu “Projeto de Ruptura
Profissional” com o conservadorismo e adoção da perspectiva emancipatória que
possibilitou uma maior proximidade com as experiências concretas de Educação
Popular. Esta, não como mecanismo de reprodução da ideologia dominante, mas
como instrumento de contestação, educação política e trabalho de base.
Essa relação entre o Serviço Social e EP deu-se também por intermédio do
Movimento Estudantil que protagonizou experiências de resistência no período
ditatorial, tendo como referência a União Nacional dos Estudantes (UNE), que
fomentou ações, sobretudo, através dos Centros de Cultura Popular, onde atuavam
junto às organizações populares utilizando o método de Paulo Freire. Essa
organização pautava junto ao Movimento Estudantil de Serviço Social (MESS),
dentre outros, a necessidade do enfrentamento e rompimento com o regime
ditatorial. Através de severa repressão, a UNE entra em um processo de ilegalidade,
parte da “cultura da ditadura”.
Vale salientar que nesses espaços houve esforços de assistentes sociais e
outros profissionais, estudantes e educadores populares nas experiências de EP. O
Serviço Social no Movimento de Cultura Popular (MCP), por exemplo, exercia a
administração dos Centros de Cultura Popular no exercício de mobilizar lideranças
para assumir a direção dos referidos centros. Podemos verificar o surgimento de
um projeto societário coletivo que já reconhecia na liberdade como valor central.
No âmbito latino-americano, o Movimento de Reconceituação do Serviço
Social toma fôlego, com a influência de um conjunto de contestações sociais as
ditaduras que ganharam relevo no continente. Novas formulações práticas e
teóricas, tensionadas pela intensificação da “dependência político-econômica em
relação ao imperialismo norte-americano” (SILVA E SILVA, 2011, p. 99), forjaram
novas bases políticas para a profissão. O Serviço Social estabelece um
envolvimento orgânico nas contestações populares, em especial nos espaços
acadêmicos, nos Congressos e Seminários, Nacionais e Internacionais, da
categoria. Esse processo teve a aproximação com a tradição marxista e a EP como
elementos centrais. Sobre isto, vale lembrar que, “segundo Netto (2002), Abreu
(2002) e Faleiros (2005), a aproximação do Serviço Social com as ideias de Paulo
Freire na América Latina se dá no decorrer do Movimento de Reconceituação da
profissão”. (MACHADO, 2013, p. 124).
A Intenção de Ruptura com o conservadorismo, perspectiva que ganha força
no declínio do regime ditatorial, especialmente a partir de meados dos anos de
1970, ascende a partir das experiências da Pontifícia Católica de Minas Gerais, com
destaque ao denominado Método BH. Este método se desenvolveu por intermédio
da mudança no currículo da Escola de Serviço Social mineira e através de
experiências de pesquisa e extensão universitária. As principais referências dessa
perspectiva propunham a adesão na matriz curricular dos eixos centrais do método
de Freire e uma interlocução mais central com a tradição marxista. Porém, segundo
Netto (2011), ocorreram alguns equívocos na forma com que se deu tal interlocução,
a exemplo da incorporação enviesada e fragmentada do marxismo e do
pensamento freiriano, reforçando uma prática psicologizante, por um lado, e, por
outro, uma concepção restrita, estruturalista, das instituições e do próprio Estado,
obscurecendo a análise sobre as contradições que são inelimináveis ao exercício
do Serviço Social. Todavia, ocorreram mudanças substantivas na dimensão política
da profissão, sobretudo no âmbito da formação. Para o autor:
Considerações Finais
Referencias bibliográficas
FREIRE, Paulo. Ação cultural para liberdade e outros escritos. 5. Ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1981.
_______. Pedagogia do oprimido. 11. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
_______. Ditadura e Serviço Social. Uma análise do serviço social no Brasil pós-
64. 16. Ed. São Paulo: Cortez, 2011.