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A VOZ DE DAVID ZÉ NA LUTA PELA INDEPENDÊNCIA DE ANGOLA.

1966-1977

(Isaías Menezes Pereira – Aluno regular do Mestrado Profissional de História da


África, da Diáspora e dos Povos Indígenas. UFRB – Cachoeira.)

Introdução

David Zé (1944-1977), nome artístico de David Gabriel José Ferreira, é uma peça
fundamental para a compreensão de um tema ainda pouco abordado pela
historiografia brasileira e angolana: as reações artísticas dos angolanos frente ao
golpe-contragolpe fraccionista de 27 de maio de 1977. Neste episódio, temos mais
quatro personagens de suma importância: Nito Alves (1945-1977), ex-dirigente do
Movimento Popular pela Libertação de Angola (MPLA), revoltado com a postura
ideológica do seu superior, o primeiro presidente republicano, Agostinho Neto (1922-
1979), um dos principais responsáveis pelo processo de descolonização. Dessa
revolta, resultaria uma oposição entre outros dois movimentos ditos nacionalistas, a
Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), liderada pelo falecido General
Mobuto Sese Seko. De uma nova fragmentação será criada a União Nacional para a
Independência Total de Angola (UNITA), por Jonas Malheiro Savimbi.

Nossa proposta gira em torno dos movimentos culturais desse período, num
contexto em que política e cultura estão intrinsecamente ligadas, principalmente
quando se percebe uma lacuna historiográfica no que diz respeito às manifestações
artísticas frente ao golpe fraccionista angolano. Antes, porém, é preciso fazer a
contextualização, do ponto de vista de uma leitura, vista de cima, dita tradicional,
para depois problematizar a relação entre a política e a cultura angolana no
processo de independência e no pós-independência.

A denominação golpe-contragolpe fraccionista, está relacionada à tentativa – por


parte de Nito Alves − de fracionar o MPLA e a um atentado contra a vida do então
presidente, Agostinho Neto. Ambas as tentativas de golpe fracassaram e os
“Nitistas” (seguidores de Nito Alves) foram perseguidos, presos, torturados e mortos
no contragolpe. Não se sabe a data exata em que Nito Alves foi preso, mas,
segundo rumores, foi fuzilado e se fez desaparecer o seu corpo, afundando-o no
mar amarrado a pedras. Sobre a intransigente intolerância ao fraccionismo, é o
próprio Agostinho Neto quem afirma:

Portanto, quando nós dizemos fraccionismo, significa que alguém


dentro da Organização, dentro do país, quis formar grupos que fossem
diferentes do MPLA. Ora neste país, o único Movimento que existe é o
MPLA e quem defender outro Movimento qualquer, não pode ser
tolerado.
(António Agostinho Neto. Textos políticos escolhidos. [S.l.]: Edições
DIP, 1985. 253 p.)

Inspirado no modelo político do leste europeu, quando assumiu a presidência,


Agostinho Neto instaurou o regime mono-partidário e esta era uma das maiores
indignações dos seus inimigos. Falecendo em 1979, deixou como sucessor José
Eduardo dos Santos, presidente de Angola até a atualidade.

David Zé, foco da nossa atenção nesse trabalho, no meio dessa turbulenta ditadura,
expõe sua arte. “Suas letras trazem mensagens implícitas sobre o sentimento da
revolução angolana. Com poesias dotadas de um conteúdo de caráter muito
politizado, David Zé defendia nas suas canções as ideias nacionalistas do MPLA de
Agostinho Neto. Independentemente desse conteúdo, musicalmente, David Zé foi
um dos grandes da história angolana. Morreu durante os tristes episódios do golpe-
contragolpe de 27 de maio de 1977.”i Esta é uma das raríssimas informações sobre
David Zé, disponíveis na internet, onde só foi encontrado um site com uma sucinta
biografia sua. Por outro lado, o artista é saudado pelos angolanos entrevistados
como “O guerreiro revolucionário! O Maior compositor de todos os tempos”.
Perguntado sobre o que representa David Zé para ele e para a Angola, Raul Jorge
de Resende Rosário1 responde:

“David Zé foi o Bob Marley de Angola... poeta, intérprete e músico à frente da


sua época... cantava sobre igualdade social e opinava sobre política
internacional... ele mais um trio de músicos eram os mais da época... Urbano
de Castro, David Zé, Artur Nunes e Sofia Rosa... a revolução apanhou-os com
tanta popularidade em Luanda e a Angola ... que acabaram mortos em 77
misteriosamente na chacina do 27 de maio...

1
Ator e Músico. Combateu a UNITA ao lado do MPLA durante a guerra civil de Angola em 1992.
Até hoje as causas são estranhas... pois estes cantavam também e acima de
tudo ao amor à igualdade... e com uma sonoridade e música acima da
média...
Ouvi falar de David Zé pela primeira vez quando tinha 5 anos. Em 1977
estavam em Luanda os três movimentos de libertação: FNLA, ao norte,
apoiadas pelo ex-Zaire e mercenários franceses; MPLA, no centro, apoiada
pelos comunistas e com os intelectuais mulatos e brancos e a UNITA, ao sul,
apoiada pelos racistas sul-africanos. Ganhou o MPLA e declarou a
independência. A FNLA enfraqueceu e a UNITA combateu o governo com
armas até 2004. Estive nos confrontos em Luanda somente em 1992 quando
a UNITA não aceitou as primeiras eleições gerias. (Raul Jorge de Resende
Rosário, depoimento concedido em 18/09/2014)

Perguntado sobre o que levou David Zé – um músico tão popular, que acompanhou
o presidente Agostinho Neto em diversas viagens e apresentações – a ser posto na
linha de frente da guerra civil, Raul Jorge sugeriu a sua hipótese:

“Eu era pequeno, mas hoje sei que houve ciúmes dos militares e políticos em
relação à popularidade dos artistas e intelectuais que já na altura tinham mais
fama e também tinham os seus ideais. Isso abalou a cultura popular angolana
até hoje.” (Raul Jorge de Resendo Rosário, depoimento concedido em
18/09/2004)

Quanto à vida de David Zé, sabe-se apenas sobre sua filiação à moral baseada na
Igreja Metodista, o casamento, o serviço Militar pela FAPLA, a profissão de professor
e fundidor. Iniciou sua carreira artística em 1966 e gravou 14 singles até 1975.
Tratam-se de informações muito vagas e incompletas.

O campo de problemas desta pesquisa começa por perguntar sobre as dificuldades


vividas pelos artistas angolanos naquele contexto histórico. Quais foram as suas
influências e invenções? O que estava por trás da história de David Zé – um poeta
que acompanhou várias vezes o presidente Augustinho Neto −, para ter sido enviado
às trincheiras como soldado e, por fim, assassinado no episódio de maio de 1977?
Para Finalmente indagar sobre como trabalhar este tema na sala de aula do ensino
médio e como pensar sobre materiais didáticos para dinamizar a compreensão
desses temas, ou seja, dos conflitos políticos e da música de uma África
contemporânea, a partir do exemplo do que ocorreu em Angola. São as primeiras
perguntas que a minha proposta de pesquisa objetiva responder para demonstrar
como a história de David Zé pode ser uma excelente ferramenta educacional, para
discutirmos não só o ensino de história da África, mas também o papel da música e
outras manifestações artísticas na política e na cultura, levando-as para a sala de
aula.

Justificativa

Este projeto tem um potencial interdisciplinar capaz de envolver algumas, se não


todas as disciplinas da área de humanas. Além dos dois conteúdos obrigatórios por
lei, mas nem sempre efetivados na prática na maioria das escolas – quais sejam, o
Ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira e a Música como Conteúdo
Obrigatório, mas não exclusivo, do componente curricular −, aspectos geográficos
do continente africano ou restritamente angolano, as correntes e ideias filosóficas
que influenciaram tanto os músicos, quanto os políticos que perderam a vida ou
foram responsáveis pela morte de milhares de angolanos, são assuntos e temas que
também poderão se beneficiar dos resultados e produtos desse projeto de pesquisa,
que a principio, pretende produzir um documentário com depoimentos de Angolanos
em Luanda e/ou Angolanos que moram no Brasil para abordar o tema da
independência pelo viés musical, cultural.

Tive a oportunidade de participar como músico, do II Festival Internacional de Teatro


em Luanda em maio de 2013. Neste intercâmbio cultural, descobri que nas salas de
aula de Luanda, o ensino de história está restrito apenas à história geral, ou apenas
à história de Portugal, o conteúdo sobre a história de Angola não está presente nas
salas de aula de Angola, nem, efetivamente, do Brasil.

O artigo denominado A formação de professores de história e a problemática da


diversidade cultural em Angola, publicado por Ana Luzia Pires Lobo Jacinto, do
Instituto Superior de Ciências da Educação, discute as contradições da Lei de Base
do Sistema de Educação (L.B.S.E.), lei nº 13/01 de 31 de Dezembro de 2001,
argumentando que esta

constitui a base legal da última Reforma Educativa em Angola; nela


constam as orientações e bases legais para todo o sistema educativo.
O primeiro artigo define que o “sistema de educação é o conjunto de
estruturas e modalidades através dos quais se realiza a educação
tendente a formação harmoniosa e integral do indivíduo com vista à
construção de uma sociedade livre, democrática, de paz e progresso”
(ANGOLA, 2001, p. 76). Quanto aos objetivos gerais da educação
foram definidos os seguintes: a) Desenvolver harmoniosamente as
capacidades físicas, intelectuais, morais, cívicas, estéticas e laborais
da jovem geração, de maneira contínua e sistemática, e elevar o seu
nível científico, técnico e tecnológico, a fim de contribuir para o
desenvolvimento socioeconômico do país; b) Formar um indivíduo
capaz de compreender os problemas nacionais, participação ativa na
vida social, à luz dos princípios democráticos. (JACINTO, 2011, p. 1-2)

A autora questiona se os professores angolanos estão preparados para lidarem com


as várias aspirações relacionadas à diversidade cultural angolana. Vê-se que os
programas de História, direcionados para a formação de professores de estudos
sobre o continente africano, só são abordados em função da presença europeia em
algumas regiões do continente.

O programa da 10ª classe está constituído pelos seguintes eixos


temáticos: introdução à História; origem e evolução do homem;
civilizações fluviais e as primeiras sociedades de classe; civilizações
mediterrâneas; Europa feudal; África antes do século XV; Ásia antes
do século XV.
Por seu turno, o programa de História da 11ª classe abarca
essencialmente aspectos ligados à História Universal, dentre os quais
temas relacionados com a expansão européia, a formação da
mentalidade moderna, as revoluções liberais, a cultura e a ideologia do
século XX, a Europa no século XX. Encontra-se também um tema
relacionado com os continentes africano e asiático que é o nº 3, assim
discriminados: Sobre o continente africano consta o seguinte tema: “a
era do tráfico de escravos,” constituído pelos seguintes subtemas: os
factores do surgimento do tráfico, as condições dos escravos durante
a travessia atlântica, o desenvolvimento do tráfico de escravos e a
resistência africana, as sociedades africanas não afectadas pelo
tráfico e pela presença europeia, as consequências (em África: caso
de Angola; na América e na Europa). Esses temas constam
igualmente nos programas da 4ª e 8ª classe, pretende-se deste modo,
que se faça um aprofundamento dos mesmos na 11ª classe. .
(JACINTO, 2011, p. 3-4)

Como se percebe, nos programas de ensino não consta o estudo da dimensão


multicultural angolana, constata-se a existência obrigatória de conteúdos mais
relacionados com a história universal, enquanto que, em nossa opinião, o estudo
das sociedades africanas, e angolana em particular, permitiria que os estudantes
tivessem uma visão real do modus vivendi dessas sociedades, o que possibilitaria o
desenvolvimento de valores socioculturais (JACINTO, 2011, p. 4-5). Portanto,
dedicar uma pesquisa sobre as reações políticas e culturais, a partir da trajetória e
produção artística de David Zé, é reafirmar a Lei 10.639/03, incluindo o estudo da
História da África e dos Africanos nas escolas Brasileiras e a possibilidade de
ensinar uma história interdisciplinar, mais lúdica, livre dos dogmas tradicionais sem
perder os limites clássicos. Para esta última justificativa, podemos ainda ressaltar a
inoperância da Lei nº 11.769/08, que prevê a obrigatoriedade do ensino da música
na educação básica e onde – no Art. 3o –, lê-se: Os sistemas de ensino terão 3
(três) anos letivos para se adaptarem às exigências estabelecidas nos arts. 1 o e
2o desta Lei. A mesma já completa cinco anos e pouco ou nada se fez.

Angola foi escolhida como lugar da nossa proposta como uma forma de
agradecimento à excelente receptividade que foi concedida a um grupo de artistas
valencianos, no qual também me encontrava. A troca de experiências no meio do
teatro, da música e outras artes foram as causas que me fizeram escolher o recorte
temporal e nosso personagem principal: David Zé e golpe e contra-golpe fraccionista
de maio de 1977, pelo estranho fato do “maior compositor de todos os tempos, o
guerrilheiro, o revolucionário,” cantor e professor só ter disponível na internet apenas
um site (Wikpédia), contendo a sua biografia com apenas cinco pequenos
parágrafos.

Considerações Teórico-Metodológicas

A música sempre esteve presente nas escolhas que fiz. Quando graduando
em Licenciatura Plena em História pelo Campus V da UNEB, decidi pesquisar a vida
e a obra de Raul Seixas diante das mazelas da Ditadura Militar no Brasil, suas
técnicas de drible à censura, influências filosóficas e musicais. Esse projeto de
pesquisa me permitiu um apoio da FAPESB para a Iniciação Científica durante dois
anos. Neste período, publiquei alguns artigos e finalizei meu Trabalho de Conclusão
de Curso com o artigo denominado “Eu não sou besta pra tirar onda de herói: Uma
micro-história da juventude brasileira nos anos de chumbo. 1964-1985”.
Durante os estágios ( de Observação, Oficina e Regência) , levava o violão
pra a sala de aula e aprendi como utilizar a música de diversas formas, seja
reproduzindo-as sozinho, ensaiando corais ou auxiliando os alunos na composição
de paródias relacionadas aos temas propostos para as séries em que realizei os
referidos estágios.
Em 2012, nosso grupo teatral de Valença foi contemplado no edital
Calendário das Artes do Governo do Estado da Bahia para apresentar a peça A Órfã
do Rei, escrita pelo dramaturgo angolano José Mena Abrantes. O drama conta a
história das órfãs portuguesas enviadas para Angola e submetidas ao casamento
forçado, entre outras estratégias de dominação colonialista, com a finalidade de
“higienizar” a população da colônia. Compus a trilha sonora deste espetáculo e o
apresentamos em Valença e em duas comunidades quilombolas do Baixo Sul:
Laranjeiras e Boitaraca.
Em 2013, fui contemplado novamente pelo Calendário das Artes no projeto
Musicalizar nas escolas. Com este novo projeto, promovemos um bate papo nas
quatro escolas estaduais da zona urbana de Valença. Acompanhado pela minha
banda, Os Aimorés, cantávamos 12 músicas do período da Ditadura Militar e
dividíamos em quatro blocos de discussão com os professores de filosofia,
português e história de cada escola.
Atualmente, trabalho na Escola Estadual Gentil Paraíso Martins, em Valença,
e – desde o maio de 2014 − venho promovendo o projeto Música na Ditadura.
Neste, realizo uma apresentação, seguida de debate, aula-show, lembrando os 50
anos do Golpe Militar de 1964. Através de canções, que canto acompanhado do
violão, letras, imagens, trechos de filmes, vídeos e clipes musicais, demonstrando as
estratégias de sobrevivência que os artistas e jovens brasileiros encontraram para
fugir dos porões da Ditadura. Este projeto foi apresentado pela primeira vez na
Escola Estadual da Cachoeira, através da ONG Casa de Barro. Em seguida, percorri
as oito escolas estaduais de Valençaii. Cinco na zona rural e três na cidadeiii. O
projeto Música na Ditadura também já foi apresentado na cidade de Gandu, pela
Secretaria de Cultura, na cidade de Cruz das Almas, no Colégio Montessori e, até o
final de 2014, percorrerá várias cidades do estado da Bahia, como parte do
calendário pedagógico da rede estadual pelo programa “Direito à Memória”.
Este pequeno curriculum é uma forma de demonstrar que sempre tive a
intenção de procurar me aprimorar nos meus estudos para continuar pondo a teoria
em prática. Penso que a música é uma excelente ferramenta para a sala de aula.
Ressalto que não é preciso ser músico para trabalhar com ela, mas é preciso estar
atento às reflexões que uma canção possibilita. Sobre a produção historiográfica
contemporânea, Maria Izilda Santos de Matos ressalta, em seu artigo História e
música: reflexões, pesquisa e ensino:

A produção musical se apresenta como um corpo documental


particularmente instigante, já que por muito tempo constituiu um dos
poucos documentos sobre certos setores relegados ao silêncio,
centrando-se na expressão de sentimentos e abordando temáticas tão
raras em outros documentos. Trata-se de uma documentação muito
rica e pouco explorada pela análise histórica, como grande potencial
para a revelação do cotidiano, das sensibilidades e das paixões, como
algo que todos os dias penetra pelos ouvidos e está na boca de todos.
(MATOS,2003, p58)

Como estamos tratando de um estudo histórico das experiências de um


músico, professor e guerrilheiro angolano (David Zé), entraremos em contato com
uma cultura diferente, etnias, idiomas e ritmos que interessam ao ramo da História
Cultural proposta por Peter Burke. O autor provoca os historiadores no artigo
Abertura: A Nova História, seu passado e seu futuro:
Quer gostem, quer não, os historiadores estão tendo de se preocupar
com questões que por muito tempo interessaram a sociólogos e a
outros cientistas sociais. (BURKE, 1992, p. 31)

Ainda nesse recorte, podemos analisar a história política de Angola e a guerra


pela independência, a violência que causou a morte de David Zé, de outros artistas
populares e de milhares de cidadãos angolanos. No seio de todo este tormento, a
história cultural ainda nos permitirá analisar as emoções que este artista
proporcionou e proporciona até hoje nos cidadãos e cidadãs angolanos, bem como,
poderá proporcionar aos alunos e alunas na sala de aula aqui no Brasil, na Bahia.

David Zé é lembrado pelos angolanos pelas suas letras de conteúdo politizado e


libertador, de caráter nacionalista, como podemos analisar na canção Mwangolé (O
guerrilheiro):
Eu guerrilheiro
Que passa o tempo lá na mata (2x)
Lá na Mata do Maiome
Lá nas zonas do leste
Aonde chove todos os dias
Aonde os mosquitos não se contam
Os muruins já não se contam
A gente as vezes passa fome
Pra libertar o nosso povo
Esse é o preço da revolução.
Ê Mwangolá, Ê Mwangolé, Ê Mwangolá

O imperialista diz que Cabinda não é Angola


O americano diz que Cabinda não é Angola
Eles só tentam separar-nos
Espalhando boatos e mentiras
Mas eles nunca dizem nunca [...]
Eles só tentam dividir-nos

Angola hoje deu um passo bem em frente


A união dos movimentos
Se fosse feita na prática
A reação não passaria
Ê Mwangolá, Ê Mwangolé, Ê Mwangolá

Este foi o guerrilheiro


Que passou as estações na mata
Foi o guerrilheiro
Que passou o natal na mata
O ano novo lá na mata
O carnaval foi lá na mata
Pra libertar o seu povo
Esse é o preço da revolução.
(David Gabriel José Ferreira, 1972)

As palavras de David Zé listam as dificuldades diárias enfrentadas por aqueles que


vivem nos campos de batalha: O tédio, a fome, o isolamento, o mal-estar. Esses
guerrilheiros não foram célebres guerreiros treinados para tal, mas homens comuns
que por ideologia ou a força, abdicaram do conforto do lar e da família.

A música Guerrilheiro é composta em um tom que evoca o sobrenatural. Poucas e


repetidas notas, lembra o som hipnótico, talvez fazendo alusão à sensação de
cansaço e mal-estar impostos aos guerrilheiros nos campos de batalha. David Zé
canta quase suplicando e no refrão outras vozes o acompanham em um coro
sombrio.

Essas canções nos fazem refletir, como o fez Aby Warburg, que “Deus está no
particular”, nos detalhes, nos sinais, nas pistas, por consequência nas descobertas e
finalmente nas transformações que estas descobertas proporcionarão à sociedade e
aos seus indivíduos como agentes sociais, cientes da sua história.
Através deste documentário, pretendemos refletir sobre a contribuição de David Zé
para a cultura, a política e a educação de Angola de 1966 a 1977; Ampliar a
biografia de David Zé bem como a produção historiográfica sobre a época em que
Produzir materiais didáticos que reflitam a atuação de David Zé na luta pela
independência de Angola e promover o debate sobre as possibilidades de execução
das Leis 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que torna obrigatório o ensino sobre
História e Cultura Afro-Brasileira nos níveis médio e fundamental e da lei 11.769 de
18 de agosto de 2008 que torna obrigatório mas não exclusivo, o ensino de música
no componente curricular.

O fato mais intrigante desta pesquisa é a ausência de informações do nosso objeto


na internet. As únicas informações encontradas foram: uma biografia, no site onde
as informações têm sempre um caráter duvidoso, o Wikpédia; um site de rádio,
Lastfmiv, onde encontramos dois pequenos parágrafos sobre David Zé; e um blog,v
onde o texto se encontra em inglês com algumas informações mais ricas. Além
destes, encontrei 23 músicas com o nome de David Zé no youtubevi. Alguns desses
vídeos trazem as letras das canções, mas a grande maioria não está nem nos
vídeos do youtube, nem em lugar algum. A canção o guerrilheiro, citada acima, por
exemplo, foi redigida enquanto eu ouvia a canção. Apesar de ser um português
aparentemente compreensível, em algumas canções David Zé canta trechos,
quando não toda a música, em diferentes idiomas das etnias africanas. Uma delas
se chama 1º de agostovii. É cantada em kimbundu, uma língua africana falada ao
noroeste de Angola. A letra neste idioma não se encontra disponível na internet. No
site citado, existe uma tradução que diz:

O 1º de Agosto é um dia das forças armadas angolanas, vamos erguer as


raízes. Pretos e mulatos e até brancos, vão cultivar café, cortar a cana de
açúcar, para fazermos a revolução da Namíbia do Zimbábue em África,
quebrar o inimigos da África, rapazes rapazes, ergamos as raízes.

A canção é um semba, bastante percussivo, com solos de guitarra que lembram a


salsa. No final da música David Zé explica, em português, o motivo da nome
escolhido para a música: “1º de agosto. Dia das Forças Armadas Populares de
Libertação de Angola. 1º de agosto é um dia de luta. 1º de agosto é o dia da
solidariedade com todos os povos oprimidos do mundo”. (David Gabriel José
Ferreira, 1972)

Esta canção será uma das fontes que pretendo analisar no documentário. Com ela,
podemos proporcionar aos discentes um contato com uma das línguas africanas,
além de contextualizá-la diante da luta pela descolonização angolana. As Forças
Armadas Populares de Libertação de Angola (FAPLA) era o exército do MPLA, o
mesmo em que David Zé prestou serviço militar e foi diretor musical do agrupamento
Aliança FAPLA-POVO. Através desta ligação, David Zé acompanhou o presidente
Agostinho Neto aos festejos de independência de Moçambique, São Tomé e
Príncipe e Guiné-Bissau, onde cantou a canção Quem Matou Amílcar Cabralviii,
político de Guiné-Bissau, assassinado por dois membros do seu próprio partido, o
Partido Africano para a Independência de Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
Coincidência ou não, os angolanos afirmam que quem matou David Zé foi o MPLA,
seu próprio partido.

A maior parte das minhas fontes serão as canções de David Zé. Pretendo ainda
entrevistar pessoas que conviveram com David Zé em Angola e as comunidades
angolanas no Brasil. Para isso, utilizarei os contatos que fiz na minha experiência
cultural em Luanda, onde pude conversar com pessoas que participaram
efetivamente da guerra civil. São pessoas que estiveram tanto no campo político e
cultural quando no campo de guerra.

Entrelaçando as particularidades destas fontes orais, textuais e sonoras, pretendo


remontar o episódio de maio de 1977 em Angola, propondo estratégias, dinâmicas e
metodologias pedagógicas que permitam levar este capítulo da história para as
salas de aula do ensino médio.

Bibliografia:

ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. História. A arte de inventar o passado.


Ensaios de teoria da história – Bauru, SP: Edusc, 2007.
BURKE, Peter. A Escrita da História: Novas perspectivas. São Paulo: UNESP, 1992.
p. 07-37.

BURKE, Peter. O que é História Cultura? Tradução de Sérgio Goes de Paula. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 2005.

FIÚZA, Alexandre Felipe. “Deixa cantar de novo o trocador”: Considerações acerca


do trabalho com a canção na sala de aula. UNICAMP.

GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes, o cotidiano e as idéias de moleiro


perseguido pela inquisição. São Paulo: Compainha das Letras, 1987.
GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história SP: Companhia das
Letras. 1989.

GINZBURG, Carlo. O nome e o como. In: A micro-história e outros ensaios. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 1989, p.173-174.

HUNT, Lynn. A nova história cultural. Tradução Jefferson Luiz Camargo 2ªed. SP: Martins
Fontes, 2001.LEVI, Giovanni. Sobre a Micro-História. In: BURKE, Peter. A Escrita da
História: novas perspectivas .São Paulo: UNESP, 1992.

MATOS, Maria Izilda Santos de. História e música: reflexões, pesquisa e ensino. PUC-SP

MATTOS, Hebe; ABREU, Martha; DANTAS, Carolina Viana; MORAES. Personagens negros
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da cultura brasileira. UFF. p. 299-319

MELLO, Adilson da Silva; JUNIOR, Otávio Candido da Silva. Uma leitura da “circularidade”
entre culturas em Carlo Ginzburg. Janus, lorena, ano 3, nº 4, 2º semestre de 2006.
PARANHOS, Adalberto. Sons de sins e nãos: a linguagem musical e a produção de
sentidos. Projeto História, São Paulo: EDUC/FAPESP/FINEP, n. 20, p. 221-226, 2000.

VAINFAS, Ronaldo. Domínios da História: Ensaios da teoria e metodologia. RJ: Campus,


1997.

REFERÊNCIAS DA INTERNET

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ii
http://www.direc5.com/2014/05/projeto-musica-na-ditadura-tem-novo.html
iii
http://www.direc5.com/2014/06/alunos-do-jequirica-conhecem-classicos_5.html
iv
http://www.lastfm.com.br/music/David+Z%C3%A9
v
http://exoticinvasive.blogspot.com.br/2011/07/david-ze-guerrilheiro.html
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https://www.youtube.com/results?search_query=David+Z%C3%A9
vii
https://www.youtube.com/watch?v=yJMY0URjRCQ
viii
https://www.youtube.com/watch?v=X3AoF3UpNPE
 http://pt.wikipedia.org/wiki/David_Z%C3%A9
 http://www.lastfm.com.br/music/David+Z%C3%A9
 http://exoticinvasive.blogspot.com.br/2011/07/david-ze-guerrilheiro.html
 https://www.youtube.com/results?search_query=David+Z%C3%A9

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