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ou questões de ordem ética e legal.
Resumo
Em 2004, a Unidade de Arqueologia da Universidade do Minho e o Município de Valença implementaram
na cidade de Valença um projeto de arqueologia urbana, vinculado a um ampla intervenção de requalificação
urbana, que ainda decorre.
No âmbito desse projeto têm-se realizado levantamentos, sondagens, escavações e acompanhamentos arqueo
lógicos, com o duplo objetivo de minimizar os impactes resultantes da execução de obras e de investigar a
evolução urbana de Valença, das suas origens até à atualidade.
Pelas metodologias implementadas, pelo conceito de intervenção integrada e pelos resultados obtidos,
considera-se que o projeto de estudo arqueológico de Valença realiza plenamente o conceito de Arqueologia
Urbana entendida como atuação de investigação aplicada.
Abstract
The Archaeology Unit of the University of Minho and the Municipality of Valença implemented in 2004
a project of urban archaeology, linked to a large-scale intervention of urban renewal, which is still on-going.
Under this project have been conducted surveys and archaeological excavations, with the double objective to
minimize the impacts resulting from the implementation of works and investigate the urban evolution of the
city of Valença, from its origins to the present.
Both by the methodologies implemented and by the concept of integrated intervention and the results
obtained, the archaeological study of Valença fully realizes the concept of Urban Archaeology understood as
applied research activity.
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de informar atempadamente os projetos de inter- da Cabeça (chamados ‘imperfeitos’ porque nunca
venção urbana, o projeto de estudo arqueológico de se concluíram, ficando apenas com os taludes em
Valença não se esgota na execução das intervenções terra). A obra de fortificação, perfeitamente adap-
preventivas nem na escavação arqueológica. tada à configuração do relevo, completou-se com a
A par destas, o projeto orienta-se para a investiga- construção dos meios baluartes de São José e Santo
ção do urbanismo, das arquiteturas e das técnicas António, que desenharam a retaguarda do recinto de
construtivas, das economias e das sociedades, con- modo a esta se abrir para a Magistral ou Vila Velha,
templando o estudo das diversas estruturas e espó- com a qual se ligava pela chamada Porta do Meio.
lios correlacionados. Com uma função exclusivamente militar, destinada
Orienta-se ainda para o reforço da identidade de a proporcionar a defesa avançada da vila de Valença,
Valença como valor patrimonial, afirmando-o como a Coroada manteve-se livre de habitações até mea-
monumento qualificado que pode ser fruído na du- dos do século XVIII, momento em que, já fortificada
pla vertente lúdica e de conhecimento, seja através também a Magistral ou Vila Velha, se desenharam os
da integração de ruínas arqueológicas nos espaços quarteirões entre a Capela do Bom Jesus e a Porta do
urbanos requalificados, como nas portas medie- Meio, com várias ruas e vielas a configurar um novo
vais da Gabiarra e do Açougue, seja ainda através arrabalde da vila de Valença, que nos finais de oito-
do desenvolvimento de projetos complementares centos se estendia já até às proximidades do Paiol.
de criação de núcleos museológicos distribuídos A par destas construções civis, o amplo terreiro
por diferentes espaços da fortaleza, com conteú- do Campo de Marte foi sendo ocupado, no de-
dos expositivos alusivos à arqueologia e história de curso do século XVIII, com instalações militares,
Valença e seu território. como o paiol, quartéis e um poço, este último co-
É também por esta perspetiva de intervenção inte- locado a descoberto aquando do desaterro da zona
grada e de investigação aplicada que se considera que circundante do Paiol do Campo de Marte. O seu
o estudo arqueológico em curso em Valença realiza desmonte e posterior aterro da zona foi acompa-
plenamente o conceito de Arqueologia Urbana. nhado pela equipa de arqueologia, tendo todos os
elementos pétreos que compunham o poço sido
3. Principais resultados numerados e transportados para instalações muni-
cipais, pois o novo arranjo urbano não contemplou
Para efeitos de registo arqueológico, a fortaleza de a sua conservação in situ. A face nordeste de um dos
Valença foi dividida em duas zonas, A e B, corres- elementos do bocal apresenta a seguinte epígrafe,
pondentes respetivamente aos recintos fortificados inscrita em cartela retangular de cantos recortados:
da Coroada e da Magistral (ou Vila Velha). Assim, a “MANDADO ABRIR PELO SR TT CEL IZIDORO
descrição dos resultados organiza-se de acordo com M. M. [DA] COSTA / [18?] 15”.
essa divisão, seguindo-se um subcapítulo com a
síntese interpretativa. 3.2. Recinto da Magistral (ou Vila Velha)
A principal novidade proporcionada pela interven-
3.1. Recinto da Coroada ção arqueológica realizada na zona da Vila Velha,
Pode afirmar-se que a colina/outeiro onde se im- foi a identificação de uma ocupação datável dos pri-
planta o recinto da Coroada não conheceu qualquer meiros séculos da nossa Era, correspondente a um
ocupação estruturada antes da construção da forti- povoado fortificado tipo ‘castro’, com uma linha de
ficação em finais de Seiscentos, não se confirmando muralha subcircular que deveria coroar o outeiro
a hipótese de aí ter existido um arrabalde medieval, sobranceiro ao rio Minho.
como sugeria a vista se sul desenhada cerca de 1509 Trata-se de vestígios encontrados na zona da desig-
por Duarte de Armas (1997). nada Porta de D. Afonso ou Porta do Açougue, que
Os dados arqueológicos permitem estabelecer a corresponde a um dos troços melhor conservados
sequência do processo construtivo, que se iniciou da fortificação medieval de Valença e que foi objeto
pelo lado sul com a construção dos baluartes de São de escavações arqueológicas alargadas, pois tratava-
Jerónimo, Santa Bárbara e Santa Ana, com o reve- -se de uma zona arqueologicamente sensível.
lim da Coroada a defender a porta do mesmo nome De facto, para além de ter sido possível esclarecer
e o revelim e fossos ‘imperfeitos’ virados à Senhora que o baluarte de São João, construído no séc. XVIII,
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pondia a um antigo povoado fortificado romaniza- dos programas de requalificação, que de acordo com
do, estrategicamente implantado num outeiro que as perspetivas da época buscavam o ‘desafogo da
dominava a passagem do rio Minho, servida então fortificação’.
pela via romana que ligava Bracara Augusta (Braga)
a Asturica Augusta (Astorga), por Tude (Tui). 3.4. Conclusões
A vila medieval recebeu carta de foral de D. Afonso Os resultados proporcionados pelo conjunto de
II em 1217, que em 1262 o rei Afonso III confirmou, trabalhos arqueológicos de escavação, sondagens e
mudando-lhe o nome para Valença, como atual- acompanhamento das obras até esta data realizados
mente se chama. Inscrevia-se no vasto conjunto em Valença, permitem tirar dois tipos de conclu-
de ‘vilas novas’ fortificadas que defendiam a fron- sões. Uma de caráter metodológico e outra de cará-
teira do rio Minho, desde Melgaço até Caminha, no ter científico.
âmbito de um vasto programa da coroa portuguesa Em relação à metodologia utilizada, a primeira con-
para fixar os limites territoriais de Portugal. clusão é a de que esta se revelou plenamente adequa-
No decurso dos séculos XIV e XV documentam-se da para responder às condicionantes estabelecidas,
intervenções de manutenção e restauro, sempre de pois tanto possibilitou efetuar um diagnóstico pré-
iniciativa régia. Da fortaleza medieval conservam- vio à execução das obras, com base no qual se mini-
-se ainda algumas partes importantes, como as mizaram ou anularam os poucos impactes negativos
Portas da Gabiarra e o lanço da Porta do Açougue, identificados, como assegurou o registo gráfico e
esta última ostentando ainda as armas afonsinas. fotográfico de todos e quaisquer vestígios com inte-
Devido ao seu posicionamento estratégico na fron- resse arqueológico, documentando-se simultanea-
teira, frente à cidade espanhola de Tui, a vila for- mente toda a pré-existência e alterações que sofreu
tificada de Valença veio a ser objeto de um novo e com as obras. Consequentemente possibilitou o
ambicioso projeto de fortificação, para responder às desenvolvimento futuro dos estudos arqueológicos
exigências modernas da arte da guerra, levantando- sobre Valença, suportando o desenvolvimento de
-se entre finais do século XVII e os inícios do século um verdadeiro programa de arqueologia urbana.
XVIII um complexo fortificado com quase 1000 m Em relação aos resultados científicos, os dados ar-
de comprimento e 400 m de largura. queológicos obtidos permitiram estabelecer a se-
Composta por dois núcleos principais interligados, quência completa da evolução da ocupação do local
a Coroada e a Magistral (ou Vila Velha), a fortaleza e caraterizar detalhadamente as soluções constru-
moderna de Valença, cujo projeto original nunca tivas correlacionadas. Sendo certo que ainda há
foi executado na totalidade, possui 12 baluartes e 4 muito que estudar, a partir dos registos das esca-
revelins, formando um conjunto cuja dimensão e vações realizadas, torna-se evidente que o avanço
características arquitetónicas são bem a expressão de conhecimento conseguido só foi possível pelo
da importância da fortaleza de Valença, que era a enquadramento científico da intervenção, que pro
cabeça da defesa moderna do Norte de Portugal, move o estudo de todos os períodos históricos re
ordenando todo o sistema defensivo fronteiriço da presentados no registo arqueológico.
linha do rio Minho.
Desativada como estrutura militar em 1910 e clas-
sificada como Monumento Nacional em 1928, a
praça-forte de Valença veio a ser objeto, nas décadas
seguintes do século XX, de continuadas interven-
ções da Direção Geral dos Edifícios e Monumentos
Nacionais, que realizaram inúmeras obras de con-
servação, restauro e requalificação (http://www.
monumentos.pt/Site/APP_PagesUser/SI PA .
aspx?id=3527).
Na Magistral (ou Vila Velha) como na Coroada, a
expressão arqueológica destas intervenções tradu-
ziu-se no registo dos vestígios arqueológicos cor-
respondentes às edificações demolidas no contexto
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Figura 1 – Ortofotomapa de Valença com localização das in-
tervenções arqueológicas (assinaladas a cor vermelha).
Figura 2 – Da esquerda para a direita: Pormenor de ruínas modernas e contemporâneas no Baluarte de Santo António;
Pormenor do poço do Campo de Marte; Pormenor da solução construtiva da cortina setentrional da Coroada.
Figura 3 – Da esquerda para a direita: Pormenor de escadaria do povoado fortificado romanizado, sob a muralha medie-
val na Porta do Açougue; Perspetiva de ruínas modernas e contemporâneas no Largo do Governo Militar; Pormenor de
cunhal tardomedieval na Travessa do Eirado.
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