Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
Introdução
Para a discussão da presente temática parece sumamente relevante, se
não imprescindível, uma breve incursão pelo estudo do histórico e conceito de
coisa julgada no processo civil e pelo princípio constitucional da
inafastabilidade da jurisdição, visto que tal procedimento norteará o
entendimento do assunto tratado pelo presente trabalho, bem como sustentará as
bases para uma perfeita compreensão e conclusão.
Feito isto, necessário se faz um estudo do fenômeno da coisa julgada à
luz do processo administrativo donde iremos averiguar a possibilidade de
rediscussão da decisão proferida nesta via.
2. Coisa Julgada
2.1. Histórico e conceito
O direito português tem por sua base o direito inúmeros institutos jurídicos
romanisticos, dentre eles a coisa julgada, e durante o período de colonização portuguesa
no Brasil os ordenamentos utilizados eram os da colônia, com isso a característica
definitiva da sentença permanecia, assim também como sua irrecorribilidade.
No Brasil a coisa julgada passou a ser considerada pelo código de processo civil
de 1939 “a decisão judicial que não cabe mais recurso”, já o código de processo civil de
1973 da uma nova visão sobre essa questão interpretando a coisa julgada como lei entre
as partes.
No Brasil o direito como um todo passou a ter uma visão constitucional a partir
da constituição de 1988 e com isso direito processual e consequentemente a coisa
julgada também. Ficando claro no Art. 5, inciso XXXVI, da CF de 1988 – “ a lei não
prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”
A coisa julgada é tipificada como formal e material: A coisa julgada formal será
aquela que possui imutabilidade uma vez que se exauriu todas as possibilidades de
recursos, não podendo ser alterada nessa mesma relação jurídica; A coisa julgada
material é aquela em que já houve a coisa julgada formal (não possuindo mais recursos)
no entanto esse poder de imutabilidade daquela relação se torna “lei entre as partes”
impedindo que o mesmo caso passe a ser discutido em outros processos.
1
(TEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Direito Processual
Civil e Processo de Conhecimento. 51ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010, p. 523)
Algumas vezes, com a expressão, muito criticada, “coisa julgada
administrativa” pretende-se referir a situação sucessiva a algum ato
administrativo em decorrência do qual a Administração fica impedida
não só de retratar-se dele na esfera administrativa, mas também de
questioná-lo judicialmente.
4. Processo Administrativo.
No que tange ao processo administrativo, Camillo Soubhia Netto (2007) 2 afirma
que a coisa julgada tem aí o significado de tornar a decisão “irretratável pela própria
2
SOUBHIA NETTO, Camillo. Da coisa julgada administrativa. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, X, n.
43, jul. 2007. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.
php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=4215>. Acesso em out 2015.
Administração”, já que, sendo a Administração parte da lide, o Judiciário sempre
poderia apreciar a causa, a fim de evitar lesão ou ameaça a direito. Alexandre dos
3
Santos Lemos (2012, p. 41) reforça que, enquanto no processo civil existe uma
“intervenção imparcial para dirimir a controvérsia”, o processo administrativo é
conduzido, em regra, pela Administração, que “também tem interesse no seu
resultado.”.
(...) não pode a Administração proferir decisões com força de coisa julgada,
pois ninguém pode ser juiz e parte ao mesmo tempo ou ninguém pode ser juiz
em causa própria. Aliás, é essa precisamente a distinção fundamental entre a
função administrativa e a função jurisdicional.
Di Pietro ainda ressalta que os recursos podem seguir até a autoridade máxima
na estrutura hierárquica administrativa. A Lei 9784/99, que regula o processo
administrativo na esfera federal, porém, estipulou que “O recurso administrativo
tramitará no máximo por três instâncias administrativas, salvo disposição legal
diversa.”. (Art. 57).
3
LEMOS, Alexandre dos Santos. Coisa Julgada administrativa. Limites e controvérsias. Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012. Disponível em:
<https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/67444/000872295.pdf?sequence=1>, acesso em
Outubro de 2015.
4
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 23ª edição. Editora Atlas, São Paulo, 2010.
A autora lembra (2010, p. 634) que o direito de recorrer é constitucional, citando
o inciso LV do artigo 5º da Constituição de 88, verbis “Aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”. (Grifo nosso).
A Emenda 45, de 2004, trouxe também um novo parágrafo (3º) ao artigo 103-A
da Constituição, que traz outra possibilidade de reforma de ato administrativo, uma vez
que, por essa redação, quando o mesmo “contrariar súmula aplicável” ou
“indevidamente a aplicar”, será cabível reclamação ao STF, cuja procedência anula o
ato.
5
Gislene Frota Lima (2004) contribui com a discussão quando lembra ter o
Brasil adotado o sistema de jurisdição única e que, assim, “todos os litígios são
resolvidos de forma definitiva pelo Poder Judiciário.”. Para a autora, dessa forma, “não
se nega à Administração Pública o poder de decidir, mas tão-somente o de fazê-lo de
forma definitiva e coercitiva.”. No seu entender, portanto, ocorre o que denomina
“preclusão administrativa”, que impede que a decisão seja modificada no âmbito
administrativo, mas não impede que as partes, se não satisfeitas, recorram à esfera
judicial.
5
LIMA, Gislene Frota. Da possibilidade de revisão judicial das decisões administrativas
desfavoráveis à própria Administração Pública Tributária. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n.
364, 6 jul. 2004. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/5399>. Acesso em: 26 out. 2015.
6
STJ - RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA RMS 44510 GO 2013/0406338-3
(STJ). Disponível em: < http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/178410476/recurso-ordinario-em-
mandado-de-seguranca-rms-44510-go-2013-0406338-3> , acesso em Outubro de 2015.
EXECUÇÃO DE OBRA. APLICAÇÃO DE MULTA.
ALEGAÇÃO DE COISA JULGADA ADMINISTRATIVA.
NÃO COMPROVAÇÃO. (...) 2 - O instituto da coisa julgada
administrativa só restara configurado quando não couber mais
nenhum recurso na via administrativa. (...).
de Contas.
7
MANSOLDO, Felipe Fayer. Revisão judicial de atos administrativos: considerações sobre o
interminável caso Nestlé-Garoto . Revista da Associação Mineira de Direito e Economia, V. 03, 2010,
p. 02.
Art. 73. O Tribunal de Contas da União, integrado por nove Ministros,
tem sede no Distrito Federal, quadro próprio de pessoal e jurisdição
em todo o território nacional, exercendo, no que couber, as
atribuições previstas no art. 96.
Pelo exposto conclui-se que, não se trata aqui de função jurisdicional exclusiva
do Judiciário posto que, o julgamento das contas compete ao Tribunal de Contas
podendo ser posteriormente apreciado pelo Poder Judiciário. Mesmo assim, as decisões
dos Tribunais de Contas estão sob o a rigorosa observação do controle de
constitucionalidade e das garantias processuais. Nas palavras de Soubhia Netto:
REFERÊNCIAS:
FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. Ed. Lumen
Juris. 14ª Edição, 2005.