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Post-truth' declared word of the year by Oxford Dictionaries. British Broadcast Corporation News,
16/11/2016. [On-line] Disponível em: < https://www.bbc.com/news/uk-37995600>, acessado em
12/05/2018.
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Word of the Year 2016 is... Oxford Dictionaries. [on-line] Disponível em <
https://en.oxforddictionaries.com/word-of-the-year/word-of-the-year-2016>, acessado em 12/05/2018.
(alt-right), definida como substantivo que nomeava agrupamentos ideológicos que
usavam a internet para divulgar pontos de vista controversos ligados a tendências
reacionárias e/ou conservadoras; “Brexiteer”, substantivo que nomeava aqueles
indivíduos que defendiam a saída da Inglaterra da União Européia; “Latinx”, substantivo
de gênero neutro ou não-binário que definia pessoas de descendência ou origem latino-
americana; e entre outras que falavam de tendências culturais da geração dos “millenials”,
estava o adjetivo “woke”, que qualificava as denúncias individuais e informais online de
injustiças sociais, especialmente o racismo – a palavra e uma hashtag a transformava em
um comando operativo (#staywoke) se tornaram populares com esse mesmo sentido
depois do assassinato do jovem Michael Brown por um policial em Ferguson, no
Missouri, e foi propulsionada com as manifestações subsequentes do movimento Vidas
Negras Importam (Black Lives Matter)3.
Para Davies, esse novo tempo da política não era simplesmente o filho do
casamento de movimentos de extrema-direita (chamados de “populistas”) com as redes
sociais. Para entender este fenômeno, como ele sugeria, era preciso voltar aos primórdios
do humanismo secular, avançar pelo racionalismo iluminista, passar pela consolidação de
um processo de afirmação dos fatos na vida pública pelo jornalismo de meados do século
XX e chegar ao mundo hiper-acelerado das tecnologias de informação e comunicação do
século XXI. A política da pós-verdade era a política deste mundo presente, cuja a marca
seria a substituição dos fatos pelos dados. Ela é baseada em cálculos que medem o que
sentem e o que fazem os usuários dos social-media e oferece respostas eficazmente
localizadas. Ela é a realização radical da utopia mcluhaniana de que o “meio é a
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WOKE. Merriam-Webster Dictionary. [On-line] Disponível em: < https://www.merriam-
webster.com/words-at-play/woke-meaning-origin>
mensagem”: a política da pós-verdade é a política do algoritmo. O argumento e o diálogo
pelo consenso no espaço público estavam suspensos. As crenças e “teorias da
conspiração” distribuídas e consumidas on-line eram, agora, o fundamento desse novo
tempo da política estranho aos princípios das democracias liberais.
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Essas duas teses poderiam ser encontradas articuladas em um artigo dos economistas Hunt Allcott e
Matthew Gentzkow. Este trabalho é baseado em uma análise microeconômica (oferta e consumo) em um
mercado de informações durante as eleições presidenciais de 20116 nos EUA. Ele foi publicado no
influente Journal of Economic Perspectives, no segundo semestre de 2017 e, em menos de um ano, já foi
citado mais de 800 vezes. C.f: ALCOTT, H.; GENTZKOW, M. Social Media and Fake News in the 2016
Election. Journal of Economic Perspectives, v. 31, n. 2, primavera de 2017, pp. 211-236.
expressão havia atingido um pico de 100 % e chegado a 75% em julho. Nesse meio tempo,
a palestra de uma historiadora “virou viral”.
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em 2005, Lipstadt publicou e vendeu bem um livro de memórias em que relatava seus combates
judiciais com o negacionista David Irving e o processo que teriam levado “a história ao julamento”, no
final de 2016 este mesmo texto serviu de inspiração para o filme “Denial”, originalmente produzido para
internet e circulado em formato digital
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A série de palestras era organizada pelo departamento de “empreendedorismo social” da Escola de
Negócios da Universidade de Oxford. Ela funcionava como uma franquia que levava a marca registrada
dos TED Talks: palestras curtas, comoventes e engajadoras sobre tecnologia, entretenimento e design
que apresentavam on-line “ideias que valem a pena ser disseminadas”. O problema a ser explorado pelo
evento era o “de como desenvolver o pensamento crítico sem abrir mão da empatia” neste mundo da
“pos-verdade”, das “fake-news”, dos “fatos alternativos” e das redes sociais? Os organizadores do
evento garantiam que respostas as essas questões seriam dadas durante a programação que seria
dedicada a fazer “pensar cuidadosamente sobre o conceito de verdade e sobre os seus cambiantes
papeis políticos, sociais e econômicos”. Especialistas que lidam com a verdade e escritores de ficção
iriam demonstrar que “nem sempre é fácil de achar, definir e compreender o conceito de verdade”, mas
que estes eram “um desafio e um elemento unificador exclusivamente humano.”
processos judiciais e risadas”. Os risos de Lipstadt são reações denunciativas de situações
ou de objetos de absurdos. Talvez por esse caráter, eles marcavam os três movimentos de
sua história. Ela riu quando soube do absurdo da negação do “mais bem documentado
genocídio” já perpetrado; riu quando dois proeminentes historiadores do Holocausto
sugeriram que ela pesquisasse sobre o negacionismo e, consequentemente, o levasse a
sério; e, finalmente, mais uma vez diante do absurdo, riu quando recebeu a notificação de
que um negacionista havia a processado judicialmente por danos morais.
Já não estou mais às voltas com a pesquisa – pelo menos por enquanto. Os
seus resultados estão aqui e, depois dessa longa e aparentemente inútil digressão, logo há
de saber do que ela se trata. Mais antes, dois ou três parágrafos.