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sumário

Sumário
Ano 13 - Dezembro de 2016

3 Diálogo
Entrevista com Gustavo Caetano, fundador da empresa Samba Tech, que fala sobre sua trajetória com a maior plataforma de vídeos on-line da
América Latina, o ecossistema de startups de Belo Horizonte e o empreendedorismo.

13 Dossiê
As startups e seus ecossistemas. Esse tipo de empreendimento está se tornando um agente fundamental do desenvolvimento econômico e
tecnológico mundial; e a parceria entre governo, academia e mercado é fundamental para garantir um ambiente propício para o seu crescimento.
Atores envolvidos nesse cenário falam sobre suas iniciativas e mostram a importância das startups para a nova realidade.

43 O papel do setor público na construção de ecossistemas de startups


Felipe Matos, sócio-fundador da Startup Farm, diretor-executivo do Dínamo, COO do programa Start-up Brasil e cofundador do Instituto Inova-
ção, da Inventta e da Inseed Investimentos.

45 Em tempos de crise, startups são tiro certo


Yuri Gitahy, investidor-anjo e fundador da Aceleradora

47 As startups e as organizações
Sérgio Rocha Motta, administrador, MBA Executivo em Governança de TI e pós-graduado em Engenharia de Telecomunicações. Especialista na
Gerência de Mudanças da Prodemge.

50 Quer ter sucesso? Aprenda a errar!


Marina Trindade, coach, consultora com foco em educação, desenvolvimento pessoal e execução de projetos e fundadora da Aporé, aceleradora
de pessoas.

52 Existe um “lado B” do empreendedorismo digital


Evandro Oliveira, administrador, pós-graduado em Administração Pública e Tecnologias da Informação, com ênfase em Segurança de Redes do
Setor Público.

55 Ensino de programação para crianças: um investimento na educação que fomenta o mercado


Gabriela Gasparin, jornalista e escritora, escreve sobre a importância do ensino de programação para crianças e adolescentes na MadCode.

57 Empreender para o público B2C ou B2B


Talita Lombardi, COO da Mobocity e fundadora da plataforma de conteúdo Menina Executiva Content.

54 Pensar TI
Artigos inéditos descrevem experiências, pesquisas e reflexões envolvendo startups e seus ecossistemas.

61 Ecossistemas de startups: o caso do CESAR com Tecnologia da Informação


Luiz Pinheiro, doutorando na Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP) na linha de Tecnologia da Informação (AATI). Professor no MBA da
Universidade Mackenzie e no MBA da PUC-PR (Campus Londrina). Revisor nos periódicos Gestão & Tecnologia (RG&T) e Revista
Eletrônica de Administração (REAd) e nas conferências internacionais IFIP e-business, ALTEC e AMCIS.

67 Direito e empreendedorismo: aspectos legais importantes aplicáveis às startups


Nomaston Rodrigues Mota, bacharel e mestre em Administração pela UFMG, graduando em Direito pela UFMG. Trabalha na Pro-
demge desde 2005, atualmente na área de educação a distância.

81 Ecossistemas de startups e as TICs, a expansão das ações governamentais do G2C e G2B para a consolidação
de smart cities
Grazielle Costa Santos, mestranda em Sistemas de Informação e Gestão do Conhecimento (Fumec), MBA em Gestão de Projetos,
especialista em Desenvolvimento Web e bacharel em Administração e Análise de Sistemas. Analista da Prodemge, atua como gestora
dos projetos Siged Corporativo e Sigcon Saída.

90 Uma visão do ecossistema de startups de software em Belém, PA


Cleidson de Souza, graduado em Ciência da Computação pela Universidade Federal do Pará, mestre em Ciência da Computação pela
Universidade Estadual de Campinas e doutor em Information and Computer Science pela University of California, Irvine. Pesquisador
do Instituto Tecnológico Vale e professor da Universidade Federal do Pará.
Nágila Natália de Jesus Torres, bacharel em Sistemas de Informação pela Universidade Federal do Pará, mestranda do curso de Ciên-
cia da Computação na área de Engenharia de Software e professora substituta na UFPA do curso de Bacharelado em Sistemas de
Informação e Engenharia da Computação.
editorial
Uma publicação da:

Ano 13 - n.º 16 - Dezembro de 2016


Editorial
Q uais os requisitos necessários para que as comunidades de startups
Governador do Estado de Minas Gerais
Fernando Damata Pimentel
Secretário de Estado de Planejamento e Gestão se desenvolvam e se consolidem? Qual o papel dos agentes públi-
Helvécio Miranda Magalhães Júnior
Diretor-Presidente cos e privados nesse segmento? Como ignorar a atual efervescência em
Paulo de Moura Ramos
Diretor de Desenvolvimento de Sistemas torno das startups e seu impacto no desenvolvimento socioeconômico e
Marconi Eugênio
Diretora de Gestão Empresarial
das tecnologias da informação e comunicação?
Fátima Vieira Lima
Diretor de Negócios Entre os diversos assuntos inicialmente em pauta, os desafios ligados a
Gustavo Daniel Prado
Diretor de Infraestrutura e Produção esse cenário impuseram-se como o eixo temático da edição que agora
Pedro Ernesto Diniz
chega ao crivo de nossos leitores. Afinal, tratava-se de aproveitar a
oportunidade de contribuir, no calor dos acontecimentos, para a re-
EDIÇÃO EXECUTIVA
Superintendência de Marketing flexão e a elucidação de tópicos relevantes sobre o tema, destacando
Gustavo Grossi de Lacerda
Gerência de Comunicação
iniciativas de fomento a essas comunidades de empreendedores.
Lívia Mafra
Edição, Reportagem e Redação
Cabe lembrar que startups são empreendimentos que assumem o risco
Júlia de Magalhães Carvalho – MG 10249 JP
de gerar valor com base em ideias e projetos inovadores, com um nível
Artigos Pensar TI
Nomaston Rodrigues Mota de especificidade considerável, e fora dos padrões usuais de negócios
Wérica Maria de Souza Diniz
Coordenação de Produção Gráfica e Capa e gestão. Sobrevém aí o desafio de criar uma ambiência adequada ao
Guydo Rossi
Revisão
surgimento de modelos de negócios viáveis, escaláveis e repetíveis, de
Academia de Revisão
modo incremental ou disruptivo, sob condições de grande incerteza.
Diagramação
Guydo Rossi
É nesse sentido que se justifica o recorte específico de nossa aborda-
Colaboração
Livia Mafra gem, expresso a partir da analogia com o conceito de ecossistema. Do
Wenderson Sobreira
Impressão arcabouço legal aos programas de incentivo e aceleração, tal noção en-
Prodemge
Tiragem
fatiza os necessários atributos de interação, interdependência e coope-
3.000 exemplares
ração que distinguem os ambientes propícios ao florescimento de co-
Periodicidade
Anual munidades de startups.

A propósito, esta edição só se tornou realidade por contar com a colabo-


ração de profissionais qualificados, os quais se dispuseram a partilhar co-
nhecimentos e experiências relevantes, em âmbito local e internacional.
A revista Fonte visa à abertura de espaço para
a divulgação técnica, a reflexão e a promoção Ao agradecer-lhes a generosa contribuição, esperamos oferecer ao leitor
do debate plural no âmbito da tecnologia da
informação e comunicação. O conteúdo dos
artigos publicados nesta edição é de res-
uma visão analítica e plural sobre as startups e seus ecossistemas, com
ponsabilidade exclusiva de seus autores.
insumos para responder às questões formuladas no início deste texto e,

Prodemge - Rodovia Papa João Paulo II,


quem sabe, suscitar outras indagações, ideias e iniciativas nesse segmento.
n.º 4.001 - Serra Verde - CEP 31630-901
Belo Horizonte - MG - Brasil
www.prodemge.gov.br
atendimento@prodemge.gov.br
Boa leitura a todos!
Diretoria da Prodemge
Diálogo
Diálogo
Lições e visões de um empreendedor
mineiro de sucesso
Gustavo Caetano fala sobre sua história como CEO da Samba Tech
e traz suas impressões sobre o ecossistema de startups no Brasil

Ele foi apontado pelo site Business Insider radoras de telefonia. A ideia foi, em poucos meses,
como o Mark Zuckerberg brasileiro, por ser jovem abraçada por um investidor-anjo, que investiu 200
e rico, e ter uma empresa de sucesso. Não é para mil dólares na empresa. Nascia, assim, a Samba
menos. Aos 34 anos, Gustavo Caetano con- Mobile.
seguiu transformar sua empresa Samba Com pouco menos de dois anos,
Tech na maior plataforma para vídeos a empresa já era referência no mercado
on-line da América Latina, que distribui latino-americano e chegou a receber o
mais de 500 milhões de vídeos por mês. reconhecimento do Ministério de Ci-
O negócio começou, na verdade, ência e Tecnologia com o Prêmio Finep
como uma empresa revendedora de de Inovação pela sua contribui-
jogos eletrônicos para celular. ção para o desenvolvimento
Em 2004, após tentar sem su- tecnológico do Brasil.
cesso baixar um joguinho Em paralelo, a Samba
para seu aparelho então Mobile criou o Com-
top de linha, Gustavo bogames, um canal
montou um plano de de venda de games
negócios e tornou- para computador,
se revendedor da e firmou parce-
Brainstorm, uma rias com desen-
produtora de volvedores de
games inglesa. jogos e portais
Seus clientes de internet
eram as ope- brasileiros.

Dezembro de 2016 5
A empresa cresceu até o momento em que se percebeu que o negócio seria finan-
ceiramente arriscado. Foi quando Gustavo Caetano decidiu mudar o foco, tentando
prever, segundo suas palavras, “quais seriam as próximas montanhas”. Os celulares
e os vídeos on-line apareceram como tendência da comunicação digital e surgiu,
então, a ideia da plataforma de vídeo on-line, utilizando a tecnologia que já existia
na empresa. Era o nascimento da Samba Tech, que cuidava de todo o processo
relacionado ao vídeo, desde o momento em que ele sai da câmera até ser disponi-
bilizado no site do cliente.
Desde então a empresa vem crescendo e hoje tornou-se o Samba Group, for-
mado pelas empresas Samba Tech, Adstream Samba e Samba Ads. Ao longo dos
anos, recebeu diversos prêmios e reconhecimentos como uma das empresas mais
inovadoras do mundo. Gustavo Caetano também vem colhendo prêmios por sua
atuação como CEO.
Nesta entrevista para a Fonte, Gustavo Caetano, mineiro de Araguari, conta
sobre sua história como empreendedor, os desafios e as oportunidades vivenciados
pela Samba Tech e o ecossistema de startups de Belo Horizonte. Ele também dá
dicas para quem quer começar a empreender.

...... .
Fonte: Como começou sua história como los para as operadoras, para que elas então vendes-
empreendedor? sem para os seus clientes.
Gustavo Caetano: Minha história começou Foi assim que começou minha trajetória de
quando eu ainda estava na faculdade. Era 2004 e empreendedor, a partir de uma oportunidade, de
resolvi comprar um celular colorido. Nessa época uma visão: se não tem ninguém fazendo, aí está uma
não havia muitos celulares coloridos e eles também boa oportunidade de negócio.
não eram um produto de massa, como hoje. Eu que-
ria baixar joguinhos para o aparelho, mas não havia Fonte: Naquela época, você tinha noção de
nenhum disponível, pois as operadoras não vendiam que o que estava fazendo era empreender?
esse tipo de serviço por aqui. Gustavo Caetano: Não. Eu nunca tinha em-
Eu resolvi então correr atrás de empresas preendido e na minha família não havia casos de
que faziam isso fora do país. Descobri uma fabri- empreendedores. Quer dizer, havia o meu avô. Mas
cante na Inglaterra, entrei em contato com eles e não era algo que estava na minha cabeça. Na época
consegui trazê-los para o Brasil como revendedor. da faculdade, eu imaginava seguir carreira em uma
Eu tinha 19 anos e fechei contrato com eles. Nas- grande empresa. Esse era o meu sonho e estava me
ceu então a Samba Mobile, primeiro conceito da preparando para isso.
empresa, antes de ela ser Samba Tech. A ideia era De repente, surgiu essa oportunidade e eu
trazer os joguinhos de fora para o Brasil e vendê- fui fazendo, vendo no que isso ia dar. Na hora em

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que eu vi, as coisas estavam acontecendo e eu aca- vendendo para quase todas as grandes operadoras.
bei montando uma empresa. Mas nunca imaginei: Até que um dia fomos chamados por uma
“Nossa, vou virar um empreendedor!”. Mesmo por- grande operadora brasileira para renegociar o con-
que, na época, empreender não era tão glamoroso trato. Nosso modelo era de divisão de receita: isso
assim como é hoje: “Nossa, você tem uma startup, significa que, de tudo o que a operadora vendia,
que legal!”. Não, não era assim. nós ficávamos com 50% e ela com os outros 50%.
O que aconteceu foi que eu criei um negócio A operadora então impôs que o modelo seria 70%
para resolver um problema. para ela e 30% para a Samba Mobile. Isso nos as-
sustou. Inicialmente, nós tínhamos um valor para as
Fonte: Você teve algum incentivo da faculda- operadoras, o que fazia com que elas ficassem de-
de para empreender e inovar? pendentes da gente. Mas essa situação mudou e dois,
Gustavo Caetano: Eu estudei na Escola Su- três anos depois percebemos que era difícil negociar
perior de Propaganda e Marketing (ESPM), que com grandes empresas. Ainda mais num mercado
possui unidades em São Paulo e no como esse – no Brasil, por exemplo,
Rio de Janeiro – eu estudei no Rio. são somente quatro operadoras. Nós
Na ESPM, existe uma empresa jú- vimos que seríamos esmagados se
nior e eu comecei a trabalhar lá. “Mas nunca imaginei: continuássemos tentando negociar
Acabei virando presidente dela. ‘Nossa, vou virar um com as operadoras, porque a nossa
Na empresa júnior, você aca- empreendedor!’. Mes- margem ia cair cada vez mais.
ba empreendendo, mesmo sem sa- mo porque, na época, Começamos então a buscar
ber que está fazendo isso. É preciso empreender não era tão uma alternativa para sair da depen-
contratar pessoas, gerir um time, glamoroso assim como dência das operadoras. Foi aí que
motivá-lo, vender, gerenciar o cai- é hoje ” surgiu a ideia de criar uma plata-
xa... Você acaba tomando conta de forma para distribuir vídeo – tam-
um negócio! bém numa época em que ninguém
Eu acho que esse foi um grande estímulo para fazia isso. Estávamos em 2007.
mim, porque, quando comecei a fazer diversas coi- Nós criamos uma plataforma parecida com o
sas na Samba Tech, eu percebi que eu já tinha feito YouTube, mas a ideia era vender para quem não qui-
essas mesmas coisas na empresa júnior. sesse usá-lo. Nosso mercado inicial eram as grandes
empresas de televisão, que produziam conteúdo,
Fonte: Como a Samba Mobile virou a Samba mas não queriam usar o YouTube como principal
Tech? canal de distribuição de conteúdo.
Gustavo Caetano: Nós começamos a vender
os joguinhos para as operadoras e o negócio esta- Fonte: Como surgiu a ideia da plataforma
va caminhando bem. Abrimos um escritório em de vídeo?
Santiago, no Chile, depois outro em Buenos Aires, Gustavo Caetano: Nós estávamos reunidos,
na Argentina. Do México pra baixo, estávamos pensando em quais seriam as próximas montanhas,

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as próximas ondas. A gente imaginou que as pesso- sonho então. Nós tínhamos que convencer a pessoa
as, à medida que tivessem mais banda, iam assistir de que na Samba Tech ela não seria só mais uma,
a mais vídeos na internet. E, nessa situação, as em- que aqui ela poderia ajudar a construir algo maior.
presas precisariam de uma plataforma profissional O terceiro desafio foi crescer. Já tínhamos va-
de distribuição que não fosse gratuita, como o You- lidado o mercado e trazido gente para ajudar a cons-
Tube. Desenvolvemos então um YouTube para em- truir essa solução para resolver o problema que acha-
presas e foi muito assertivo, deu super certo. mos. Mas a gente precisava crescer e crescer é muito
difícil. Então fomos atrás de investimento, de capital
Fonte: Quais foram os desafios que a Samba de risco, de fundo, para nos ajudar nessa parte.
Tech enfrentou para crescer e se desenvolver?
Gustavo Caetano: O primeiro desafio foi Fonte: Como vocês conseguiram esse inves-
validar o mercado, saber se nossa ideia teria al- timento?
guma aderência no mercado. Nós não tínhamos Gustavo Caetano: Nós procuramos um fun-
know-how. A maioria das startups do de Belo Horizonte chamado FIR
é fundada por pessoas novas, saí- Capital. Ele é um fundo supertradi-
das da faculdade, que não têm co-
“Nós mostramos que cional, que já investiu em diversas
nhecimento da indústria. Essa foi a tínhamos uma ideia, a empresas. Nós apresentamos nossa
grande dificuldade: saber se nossa transformamos em um ideia, eles gostaram e nos ajudaram
ideia teria sentido para o mercado. protótipo e já tínhamos a montar um plano de negócios para
É difícil vender algo para alguém clientes utilizando essa captação. Acabamos captando, num
que você não sabe como trabalha, solução, mas precisá- primeiro momento, cinco milhões de
o que faz. Nós utilizamos muita ex- vamos de dinheiro para reais com a FIR para nos ajudar no
perimentação para chegar no mode- crescer mais rápido.” nosso crescimento.
lo perfeito e ideal. A gente buscou O que facilitou nossa aborda-
experimentar, porque tínhamos o gem com o fundo foi que a gente já
grande desafio de entender se esse nosso produto te- tinha clientes pagando pela nossa solução. Nós mos-
ria ou não valor para o mercado no qual estávamos tramos que tínhamos uma ideia, a transformamos
apostando. em um protótipo e já tínhamos clientes utilizando
Uma vez que achamos esse mercado, o pró- essa solução, mas precisávamos de dinheiro para
ximo desafio foi contratar pessoas para que pudés- crescer mais rápido. Esse foi o grande argumento.
semos crescer. Precisávamos achar as pessoas cer-
tas, com o perfil certo da empresa, que trouxessem Fonte: A Samba Tech é um caso de startup de
um pouco do nosso DNA e da nossa cultura. Isso sucesso. Quais foram os diferenciais dela?
foi desafiante, ainda mais porque não tínhamos um Gustavo Caetano: O que eu acho interessan-
RH gigante ou formal, ou mesmo budget para pagar te é que temos um perfil diferente. Por não ser for-
para a pessoa um salário maior do que ela ganhava mado na área de tecnologia, assim como a maioria
no seu outro emprego. Tornamo-nos vendedores de da diretoria não é (somos da área de negócios), nós

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sempre tivemos a preocupação de pensar primeiro Reputação é o que as outras pessoas falam de você
no problema que estamos resolvendo, para depois no mercado. O que as outras empresas e a mídia
pensar na solução. falam de sua startup?
O que eu vejo é que muitas startups focam A Samba Tech conseguiu resolver esse pro-
primeiro na solução. A pessoa cria algo e depois ten- blema. Porque desde o início a gente sabia que ia
ta empurrar isso para resolver algum problema que enfrentar esse ceticismo do mercado: mas o que es-
ele inventa. A gente sempre teve essa preocupação ses jovens de Belo Horizonte estão fazendo aqui?
inversa. Isso é realmente um problema? Vamos ex- Nosso foco, então, ao entrar em um mercado novo,
plorar isso, conversar com as pessoas para entender sempre foi tentar conquistar o líder desse mercado.
se é ou não um problema, para depois tentar chegar Isso é difícil. Mas, se a gente ganha esse tipo de em-
em uma solução mais palpável. presa, é muito mais fácil vender para as outras. Essa
A gente gasta muito tempo pensando no pro- foi nossa aposta desde o começo e deu supercerto.
blema. Isso está no nosso DNA e faz com que a
gente consiga se diferenciar. Desde Fonte: Como a Samba Tech
o começo essa foi a nossa mentali- virou o Samba Group?
dade: primeiro entender a fundo se a Gustavo Caetano: Dentro
gente está resolvendo um problema da Samba Tech a gente criou alguns
grande para as empresas, para de- produtos que tiveram que virar em-
pois criar uma solução. “Essa foi nossa aposta presas, porque eles começaram a
desde o começo e deu ir tão bem que, se eles ficassem lá
Fonte: O fato de a Samba supercerto.” dentro, acabariam mortos. Todos
Tech ser uma empresa pequena, de os dias temos que fazer escolhas,
Belo Horizonte, formada por pes- decidir no que vamos focar, o que
soas jovens, em algum momento foi vamos desenvolver. E nós perce-
empecilho para o seu crescimento? bemos que não ia dar para fazê-los
Gustavo Caetano: Em um primeiro momen- dentro da Samba Tech.
to, sim, porque as pessoas não têm confiança em Então resolvemos fazer um spin-off, ou seja,
gente jovem. Elas dizem: “Mas são vocês que vão transformar esse produto em uma empresa na qual
tomar conta? Vocês já trabalham com quem?”. a Samba Tech é acionista, mas que seja uma em-
Para as startups desse porte, que estão come- presa independente, com CEO e operação à parte.
çando a crescer, eu sempre dou esse conselho – que Nós fizemos isso com duas empresas e aí criamos o
foi uma coisa que a gente utilizou na Samba Tech: Samba Group, que é mais uma nomenclatura para
vocês precisam ter endosso e reputação. mostrar que a Samba é um grupo de empresas, e
Endosso é realmente ter clientes de peso. No não mais uma.
nosso caso, por exemplo, tínhamos a Globo, a Loca-
liza e a Kroton como clientes. Esse tipo de empresa Fonte: Vocês não são mais uma startup, no
dá endosso, algo como “A Globo confia na gente!”. conceito mais aceito para essa palavra. Mas você e

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a Samba Tech são referência no ambiente de start- Esse é muito o espírito do San Pedro Valley
up. Por que isso acontece e como você enxerga seu – a colaboração. Os CEOs das empresas têm um
papel nesse ambiente? grupo de WhatsApp e estamos sempre juntos. Por
Gustavo Caetano: A primeira coisa que eu exemplo, uma equipe da Samba Tech está reven-
acho importante é que a gente gasta (eu, pessoal- do nosso processo de vendas. Eu entrei em contato
mente, e a Samba Tech) muito tempo passando com o Diego, da Rock Content, uma startup refe-
conhecimento e experiências para as pessoas que rência em vendas no San Pedro Valley, e pedi para
estão começando. Eu escrevo artigos no LinkedIn ele conversar com essa equipe. Eles foram lá e o
e sou influência nessa rede. Hoje mesmo eu publi- Diego gastou uma parte do seu tempo ensinando
quei um artigo lá intitulado “Por que agora é o me- sobre metodologia de vendas e tudo mais.
lhor momento para empreender”. São coisas que eu É essa troca que tornou o nosso ambiente de
não ganho nada para fazer, mas são um jeito de (e inovação (o San Pedro Valley) referência no país
é meu papel fazer isso) devolver para a sociedade o inteiro. Aqui, as pessoas – seja o dono da empresa
que eu recebi. ou alguém dentro dela – sempre vão
Eu também fundei a Asso- achar um tempo para ajudar outras
ciação Brasileira de Startups, que startups e sem ganhar nada por isso.
hoje é a maior organização latino- A gente faz isso, porque queremos
“É essa troca que tornou
americana de startups, com quatro que as outras empresas cresçam e
o nosso ambiente de
mil afiliadas. Também fiz isso sem
inovação (o San Pedro fiquem grandes juntas.
receber nada. Também dou muitas Valley) referência no
palestras voluntariamente, inclusi- país inteiro.” Fonte: Como você acha que
ve em escolas – outro dia mesmo seria o ambiente de startups em
eu fui ao Colégio Loyola falar para Belo Horizonte se o San Pedro Val-
as crianças de lá. Porque eu acho ley não existisse?
que, às vezes, uma fala minha pode Gustavo Caetano: Seria
mudar a vida de um menino e ele pode pensar: “Eu muito mais difícil. Na época que eu fundei a Samba
posso fazer isso também”. Eu também falo muito Tech, não havia startups na cidade. Belo Horizonte
nas universidades do interior (porque eu sou do in- era um ambiente de mineração e o estado era reco-
terior) e eu vejo que as pessoas me enxergam como nhecido por suas indústrias pesadas.
alguém em quem elas se inspiram: “Eu posso ser Nós criamos a Samba Tech em um conceito
igual a ele; eu posso fazer mais do que ele!”. aberto. Não há paredes, salas ou divisórias entre as
Nosso papel é importante. A Samba acredita pessoas. Todos os números são abertos na parede
muito nisso. Hoje mesmo, dentro do nosso escri- para que os funcionários possam conhecer e saber o
tório, nós recebemos um grupo de 40 pessoas de que está acontecendo. Temos essa política de trans-
outras empresas para bater um papo sobre inovação parência e agilidade e isso começou a influenciar
e o futuro. Nós estamos sempre abertos a colaborar. outras pessoas. Mas na época a gente não tinha nem

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com quem discutir esse assunto, não podíamos con- Este é todo o diferencial: o ambiente da cida-
versar sobre as melhores práticas, trocar ideias so- de com as universidades formando gente de ponta.
bre o que estávamos fazendo. Florianópolis, por exemplo, é outro polo com mais
Hoje isso acontece demais e é um facilitador. ou menos essas características: tem gente super-
Sem o San Pedro Valley seria muito mais difícil. qualificada em um lugar gostoso de se morar, com
Hoje se veem na cidade várias empresas crescendo qualidade de vida.
rapidamente, como Rock Content, Sympla, Méliuz,
Hotmart... Elas estão crescendo acima da média de Fonte: O que caracteriza o San Pedro
mercado nacional, porque temos aqui um ambiente Valley?
extremamente colaborativo e aberto. Isso acaba nos Gustavo Caetano: Ele é a comunidade de
dando atalhos. startups de Belo Horizonte. Não é uma localidade,
um bairro, uma associação, uma região. A Samba
Fonte: Quais outras características de Belo Tech, por exemplo, estava na Pampulha, antes de
Horizonte tornam a cidade um am- se mudar para a Raja, e está no San
biente tão propício para as startups? Pedro Valley.
Gustavo Caetano: A cidade “Hoje se veem na ci-
é muito boa – é uma cidade grande, dade várias empresas Fonte: E como a comunida-
mas com cara de cidade pequena. crescendo rapidamente de se move para dar continuidade a
Seu povo também. Essa cultura do (...) acima da média sua atuação?
mineiro de ser acolhedor e rece-
de mercado nacional, Gustavo Caetano: Esse é
ber bem as pessoas. Isso influencia
porque temos aqui um um processo natural. O San Pedro
muito e nós estamos dispostos a
ambiente extremamente Valley não tem presidente, não tem
colaborativo e aberto.”
isso: recebemos bem as pessoas de nada formal. Existem alguns even-
fora, gastamos tempo e nos dedica- tos que acontecem naturalmente,
mos a isso. A índole do povo é outro sem uma formalidade de uma asso-
ponto, ele é conhecido por ser do bem. Isso faz toda ciação. Outro dia, por exemplo, o Tomás, da Track-
a diferença. sale, mandou um e-mail informando sobre um jan-
Um lado crucial é o das universidades. Nós tar sobre vendas que eles estavam promovendo e
temos universidades de ponta formando talentos. E dizendo como seria legal se nosso diretor de vendas
muitas vezes esses talentos querem ficar em Belo pudesse participar. Então foi uma iniciativa bacana,
Horizonte, não querem ir a São Paulo ou ao Rio. E com a presença de vários diretores de vendas daqui
hoje existe oportunidade para essas pessoas se desen- de Belo Horizonte. É algo supernatural.
volverem, crescerem e fazerem uma carreira legal na
cidade. Se elas quiserem trabalhar em uma empresa Fonte: Como o San Pedro Valley se relacio-
mais descontraída, agora elas podem. O San Pedro na com outros agentes do ecossistema de startups?
Valley tem mais de duzentas empresas, por exemplo. Gustavo Caetano: Existe uma relação

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mútua de querer desenvolver o ecossistema como de crédito. O Bank Fácil é outra startup que permite
um todo. O governo, por exemplo, recriou o Seed. que qualquer pessoa tenha acesso a crédito, com
Nesse momento, o secretário Miguel Corrêa cha- taxa reduzida. A Dr. Consulta realiza consultas com
mou os empreendedores do San Pedro Valley para preços populares. Para esse tipo de inovação, de
remontar o programa e ajudar a reconstruí-lo. Isso impacto social, há muitas oportunidades no Brasil.
é interessante e impacta o ecossistema. O empreendedor devia focar em áreas como essas
Essa nossa abertura em colaborar pode ser que eu falei, que têm grandes mercados e com gran-
usada por todo mundo. A gente colabora com a des problemas para resolver.
Fumsoft, o MGTI, a prefeitura, o estado. Esse tipo A gente vive um momento único: temos mer-
de participação e abertura é porque a gente está cado e os empreendedores estão mais preparados.
envolvido no ecossistema como um todo. E é apar- Não são mais pessoas que perderam o emprego,
tidário. Voltando ao exemplo do Seed, queremos não tinham o que fazer e foram empreender. Esta
que ele seja recriado, se desenvolva e seja o seu geração agora empreende por opção e é superqua-
melhor. Então, todo mundo ajudou lificada. Essas pessoas dizem “vou
a fazer o programa renascer de sair da faculdade e montar uma em-
uma maneira positiva. “Essa nossa abertura em presa”. Ou então: “Vou fazer um
colaborar pode ser usa- MBA, depois eu volto e empreen-
Fonte: Como você avalia o da por todo mundo. (...) do”. Tem vários empreendedores
ecossistema de startups no Brasil? Esse tipo de participa- que estão fazendo a diferença e têm
Nós estamos no caminho certo para ção e abertura é porque uma formação acima da média, isso
fomentar inovação e empreendedo- a gente está envolvido porque eles estão enxergando que o
rismo no país?
no ecossistema como Brasil, apesar de suas dificuldades,
Gustavo Caetano: Sim. Eu
um todo.” tem oportunidades gigantescas.
acho que estamos em um momen- São coisas que os estrangei-
to positivo, porque o Brasil é um ros não enxergam. Nosso país tem
mercado consumidor muito grande, que permite uma realidade muito própria e temos condição de
que várias oportunidades aconteçam. ter inovação nascendo aqui.
Mas mais interessante que isso é que os pro-
blemas que existem hoje no país, em áreas como Fonte: Quais são as dificuldades para se
educação, saúde, segurança, acabam sendo oportu- empreender no Brasil?
nidades para as startups. Existem diversas startups Gustavo Caetano: Acho que a maior dificul-
que estão resolvendo de maneira inovadora (ou dade é a burocracia de governo. É a dificuldade de
utilizando a tecnologia) os problemas do dia a dia abrir ou fechar uma empresa. Hoje, levam-se anos
das pessoas. para conseguir fechar uma empresa e, além disso,
A Bank Blue Financeira, por exemplo, per- você leva o passivo. Esse tipo de situação dificulta
mite que qualquer pessoa tenha acesso a um cartão o empreendedorismo, pois ele se torna uma ativida-

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de de risco. Nos EUA, tem gente que montou cinco te com uma aceleradora. E o mais interessante é
empresas, sendo que três faliram e duas deram cer- que existem aceleradoras focadas em determinado
to. Aqui, se você falir duas empresas, está enrolado mercado. A Porto Seguro, por exemplo, criou uma
para o resto da vida. aceleradora nesse assunto deles, chamada Oxigê-
Outra dificuldade é entender as taxas e os im- nio. A Wayra é uma aceleradora da Telefônica.
postos. São vários impostos e é tudo muito confu- Existem várias grandes empresas criando
so. Por exemplo, se você recebe investimento, não projetos para se aproximar das startups. Elas fazem
pode fazer parte do Simples. Então, se uma empre- isso, primeiro, porque precisam das startups para
sa recebeu 50 mil reais de investimento, ela já pas- crescer, porque as startups têm agilidade, conse-
sa a ter que seguir regras como as de uma empresa guem inovar e criar coisas que dentro das grandes
muito maior que ela. empresas dificilmente acontecem. Por outro lado,
Por último, existe a dificuldade legal, traba- esse tipo de desenvolvimento precisa da escala de
lhista. Essa parte para startups é um terror, porque uma grande empresa. A Accenture, por exemplo,
muitas startups têm horário flexí- criou um programa para se apro-
vel. A pessoa pode chegar a hora ximar das startups e de suas ino-
que quiser, ir embora a hora que vações e ao mesmo tempo ela leva
“A quem me procura essas startups para seus clientes,
quiser, jogar videogame ou fazer
dizendo que tem uma
coisas que não existiam na época aos quais muitas vezes as startups
ideia, mas que não
em que essas leis foram feitas. Isso não teriam condições de chegar. É
sabe como colocar em
acaba muitas vezes por gerar um prática, eu sugiro entrar uma situação na qual os dois lados
passivo grande, pelo empresário em contato rapidamente ganham.
fazer coisas que o juiz do trabalho com uma aceleradora. ” As empresas hoje no Brasil
não vai entender. São várias regras estão muito bem servidas de boas
criadas para um outro momento e aceleradoras e isso é um exemplo
que, quando trazidas para o nosso para o mundo todo. Só não dá para
dia a dia, impactam muito a vida do empreendedor comparar com o Vale do Silício.
e dificultam, por exemplo, a retenção de talentos
na empresa. Fonte: Por que o Vale do Silício deu tão certo?
Gustavo Caetano: Basicamente é um am-
Fonte: Fale sobre exemplos positivos, no Brasil e biente de inovação e colaboração com histórias de
no mundo, para o fomento à inovação e ao empre- sucesso. Lá existem a Stanford e outras boas facul-
endedorismo. dades, fazendo um bom ambiente de inovação. Além
Gustavo Caetano: As aceleradoras no Brasil disso, as pessoas trabalham em uma empresa como a
são de altíssimo nível. A quem me procura dizendo HP, saem de lá e montam outra empresa de sucesso.
que tem uma ideia, mas que não sabe como colocar É uma empresa de sucesso gerando outra empresa
em prática, eu sugiro entrar em contato rapidamen- de sucesso.

Dezembro de 2016 13
O que a gente mais tem que desejar para o cisam. Dar desafios para que as empresas possam
nosso ambiente é isso: uma empresa de sucesso mostrar soluções para ajudar a resolvê-los. E, se o
gerando outra empresa de sucesso. Quanto mais governo se interessar, ele conversa e contrata.
empresas de sucesso temos na nossa região, mais Além disso, facilitar esse ambiente de taxa-
talentos e dinheiro elas atraem para todo mundo. ção e legislação, para que as startups tenham mais
facilidade de competir – porque não estamos com-
Fonte: E qual o papel dos governos no fo- petindo com empresas locais, mas, sim, com em-
mento às startups e à inovação? presas do mundo todo.
Gustavo Caetano: Eu não gosto do gover-
no colocando dinheiro nas startups, porque acho Fonte: Uma última pergunta: qual o seu
que ele não tem know-how para isso e não con- conselho para quem quer começar a empreender?
segue adicionar valor para a startup mais do que Gustavo Caetano: A primeira coisa é tirar
uma empresa de capital de risco faria. O caminho as ideias da cabeça ou do papel. Uma ideia por si
não é esse. só não tem valor nenhum. Então o primeiro passo
O governo tem uma possibilidade que é inse- para o empreendedor é começar a fazer. Só assim
rir as startups nos governos como fornecedoras. O é possível ver as dificuldades ou perceber que nin-
que elas mais precisam é de trabalho e muitas vezes guém quer comprar aquilo que se acreditou que to-
conseguem fazer o serviço muito mais rápido, mais dos comprariam ou que é difícil fazer algo que se
barato e com mais tecnologia do que uma grande achou que seria fácil. O empreendedor idealizador,
empresa. Acho que o papel mais importante do go- em vez de um realizador, não tem mais espaço.
verno é esse: se ele tem um problema de mobilida- Tirem as ideias da cabeça o quanto antes, co-
de urbana, deveria trazer as startups que trabalham loquem em prática o mais rápido possível, nem que
esse assunto para ajudá-lo a pensar em soluções. seja para falhar. Só assim para aprender com a falha
Esse é o tipo de fomento de que as empresas pre- e fazer algo melhor.

14 Dezembro de 2016
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Startups:
dinamismo, inovação e
flexibilidade

O que são e por que essas empresas estão se


tornando agentes fundamentais do desenvolvimento
econômico e tecnológico mundial

E
m janeiro de 2016, ao anunciar seus resultados página com perfil e fotos, e enviassem mensagens aos
do trimestre anterior, com lucro de 1,6 bilhão de amigos por meio do mural. No seu primeiro ano de vida,
dólares, o valor de mercado do Facebook passou ainda restrita aos alunos de universidades, ela já tinha um
dos 300 bilhões de dólares. A empresa fechou 2015 com milhão de usuários e, dois anos depois, quando se abriu
1,59 bilhão de usuários, o que, junto com a publicidade para quaisquer pessoas, eles tornaram-se 12 milhões.
móvel, foi responsável pelos números que impressiona- Mesmo sendo considerado um gigante da internet,
ram a bolsa e os investidores. com presença nos quatro cantos do planeta, o Facebook
Outros dados também são exemplares para mostrar é ainda considerado por muitos como uma startup. O que
o tamanho do Facebook: mais de 14 mil funcionários; significa isso? Significa que ele ainda está procurando por
além da sede na Califórnia, escritórios em 14 cidades um modo de aumentar a receita e ser lucrativo; que seu
norte-americanas e 35 cidades espalhadas pelo mundo; produto é repetível, já que o Facebook só precisou desen-
seis centrais de processamento de dados; média diária de volver o código uma vez e todos os seus usuários o utili-
1,13 bilhão de pessoas ativas, sendo que 84,2% delas es- zam; e escalável, pois foi distribuído para o mundo todo.
tão fora dos Estados Unidos e do Canadá. De acordo com o professor de empreendedoris-
O Facebook começou como uma iniciativa de estu- mo Steve Blank, essas são as principais características
dantes da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. de uma startup: uma empresa que está em busca de um
A partir de um programa criado por Mark Zuckerberg modelo de negócios viável, que seja repetível (capaz
para que os colegas pudessem escolher os amigos mais de vender o mesmo produto para todos os clientes) e
atraentes, surgiu o thefacebook.com. É uma rede social escalável (capaz de crescer para atender grandes quanti-
que, no seu início, permitia que os usuários criassem uma dades de clientes).

Dezembro de 2016 15
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Steve Blank
Referência quando se estuda sobre startups, Ste-
ve Blank é um professor e empreendedor do Vale
do Silício. Ele leciona em universidades como Stan-
ford, Berkeley e Columbia e fundou oito startups,
sendo que quatro chegaram a abrir capital na bolsa
de valores. Reconhecido pelo desenvolvimento da
metodologia conhecida como Desenvolvimento do
Cliente, Blank escreveu, entre outros, os livros The
Startup Owner’s Manual (Startup - Manual do Em-
preendedor - o Guia Passo A Passo Para Construir
Uma Grande Empresa, em sua edição brasileira) e
The Four Steps to the Epiphany (Do Sonho à Reali-
zação em 4 Passos – Estratégias Para a Criação de
Empresas de Sucesso, em sua edição brasileira).

Quando se fala sobre startups, essa é a definição negócios inovadores, mesmo que eles copiassem modelos
mais aceita entre as pessoas envolvidas com o tema. Ou- de negócio estrangeiros, explica Yuri. Segundo ele, foi em
tras características intrinsecamente ligadas a esse tipo de 2010 que o sucesso do Peixe Urbano, um dos primeiros
empresa são inovação, risco e incerteza, pois elas estão sites de compras coletivas do país, mudou esse cenário.
buscando descobrir se há clientes para seu produto ou se “Ele foi a primeira startup brasileira que adaptou bem um
seu modelo de negócio é executável e lucrativo. O concei- modelo de negócio já estabelecido lá fora, cresceu muito e
to principal por trás de uma startup, explica o investidor dominou rapidamente o mercado nacional”, conta.
Yuri Gitahy, é o de um negócio com um forte aspecto de Desde então, esse segmento cresce a cada ano
inovação, gerenciado para crescer muito rápido, ter uma e cada vez mais o mercado e os governos percebem a
margem interessante e dominar um mercado inteiro em importância desse tipo de empresa para alavancar o de-
poucos anos. senvolvimento econômico e social do país. Um sintoma
desse aquecimento no Brasil é que a cidade de São Paulo
História recente aparece entre os 20 maiores ecossistemas de startups no
mundo, segundo o Startup Ecosystem Ranking 2015 –
Há alguns anos, a palavra startup não era um termo estudo realizado pela Compass, uma desenvolvedora de
muito conhecido no Brasil. Foi a partir de 2006 que empre- software para empresas de tecnologia. É a única cidade
sas como Via6 e boo-box começaram a servir de inspira- da América Latina presente na lista, no 12º lugar. Segun-
ção para empreendedores digitais brasileiros tentarem criar do o relatório, estima-se que entre 1.500 e 2.700 startups

16 Dezembro de 2016
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

ativas estejam em São Paulo, com destaque para os seto-


Dados sobre os empreendedores do ecossistema
res de e-commerce e Software as a Service (SaaS), e seu de startups de São Paulo
ecossistema apresenta um índice de crescimento de 3.5, o
83% homens
terceiro mais rápido entre os presentes no top 20.
Minas Gerais também é destaque no Brasil como polo 62% jovens entre 18 e 34 anos
de inovação e empreendedorismo, espaço propício para o 73% dedicam todo o seu tempo à startup
surgimento e o crescimento de startups. Segundo o secre-
48% deixaram emprego, com carteira assinada
tário de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia
e Inovação, Miguel Corrêa, o estado é o segundo maior 43% vêm da área de tecnologia
ecossistema de startups do país, com cerca de 400 empre- 28% já estiveram em outra startup
sas. Além disso, abriga o San Pedro Valley, comunidade de
Fonte: Pesquisa Lado/A, Lado/B Startups 2015
empreendedorismo que é referência para negócios de base
tecnológica no país e no mundo, os clusters de Santa Rita no estado, desenvolvendo suas competências e ideias em
do Sapucaí, seis parques tecnológicos e seis institutos tec- projetos que possam ser implementados aqui. Nosso pa-
nológicos públicos, mais de 23 incubadoras distribuídas em pel é abrir espaço para que essas pessoas tenham oportu-
16 cidades, e é o maior estado em número de universidades nidade de crescer, gerar negócios e ter participação ativa
públicas do Brasil, que promovem boa formação e inves- no desenvolvimento do estado”.
timento em pesquisa e desenvolvimento. “Isso tudo faz de Para ilustrar a força do ecossistema mineiro, pode-se
Minas um ambiente favorável para a inovação”, afirma. citar o ranking nacional 100 Open Startups. Em sua oitava
O secretário conta ainda que o estado está inves- edição, lançada em maio de 2016 pelo movimento de mes-
tindo em ações estratégicas para fomentar a cultura em- mo nome, 11 empresas de Minas Gerais apareceram entre
preendedora em Minas: “Queremos incentivar e inspirar as cem mais bem avaliadas do Brasil, sendo nove de Belo
estudantes, pesquisadores e profissionais a empreender Horizonte, uma de Janaúba e uma de Lavras.

O movimento 100 Open Startups conecta pro- 1,5 mil startups brasileiras das seguintes áreas de atu-
postas de startups com a estratégia de inovação das ação: cidades inovadoras, sociedade da informação,
grandes empresas em busca de soluções e oportunida- saúde e bem-estar, educação do futuro, indústria do
des para os desafios da sociedade e do mercado. O mo- futuro, energia, energia elétrica, fármacos e cosméti-
vimento é conduzido por empreendedores, empresas e cos, wearables, agronegócio, gestão pública, pequenas
investidores e visa a identificar as cem startups mais empresas, varejo, serviços financeiros, construção,
atraentes do país para fazer parte do evento Open In- alimentos, turismo e eventos, esporte, moda e beleza,
novation Week. Na edição de 2015, foram analisadas plataformas científicas e tecnológicas.

Dezembro de 2016 17
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

STARTUPS MINEIRAS NO RANKING

• Leva Eu: plataforma de gestão de demanda de viagens que otimiza a infraestrutura de transportes.
• PickMeApp: soluções de carona gratuita e transporte para eventos.
• Solides: tecnologias para mapeamento do comportamento humano.
• Sun Block: sensores vestíveis para monitorar a exposição excessiva de crianças ao sol.
• LogPyx: otimização de fluxos logísticos internos com uma plataforma de Internet das Coisas (IoT).
• POP Recarga: moeda eletrônica para pagamentos em dinheiro na internet.
• NetBEE: dispositivo inovador para rastrear carros roubados.
• TI.Mob: sistema inteligente para gestão de estacionamentos públicos.
• Bluelux: conecta o smartphone a todo o sistema de iluminação de uma casa.
• CellSEQ: metodologias alternativas e inovadoras que resultam em informações mais completas e asser-
tivas, gerando valor na cadeia produtiva de pequenas e grandes indústrias.
• Construct APP: aplicativo de gestão de obras que conecta o trabalho de campo ao escritório da empresa.

Olimpíadas de Startups Das 50 empresas participantes, 22 foram ou são


aceleradas em Minas Gerais, e as três primeiras coloca-
Outro destaque recente das startups mineiras acon- das foram startups mineiras: BeerOrCoffee, Virturian e
teceu nos Startup Games, realizados no Rio de Janeiro Lett Insights. Para Roberta Vasconcellos, cofundadora
durante os Jogos Olímpicos Rio 2016. Nos dois dias da da BeerOrCoffee, que ficou em primeiro lugar, os Star-
competição, 50 startups de todo o mundo foram selecio- tup Games foram um jogo na vida real. “Nós precisá-
nadas para participar de uma simulação virtual de uma vamos convencer grandes investidores e empreendedo-
bolsa de valores, por meio de um aplicativo desenvolvido res a investir no nosso negócio. Tivemos que aprimorar
especialmente para os jogos. Cada empresa recebeu cem nosso pitch e recebemos grandes insights. Também foi
ações e dez milhões de libras virtuais para investir nas uma oportunidade de abrir portas, já que as startups se-
outras startups durante as atividades. Ao final, o grupo lecionadas para participar foram aquelas com potencial
que teve mais ações, ou seja, recebeu mais investimento de globalização”, conta.
dos outros participantes, foi o grande vencedor. Rafael Costa, CEO da Virturian, ficou impressio-
nado com a qualidade da reprodução de eventos típicos
do dia a dia de uma startup que busca investimentos e
deseja operar globalmente. “Convencer alguém a com-
prar uma participação virtual de sua startup implicava
aprendizado constante e exercício contínuo de persua-
são e melhoria dos argumentos de venda”, analisa. O
resultado final, na opinião de Rodrigo Carvalho, foi po-
sitivo: “Saímos de lá com várias ideias novas e uma rede
de contatos valiosíssima”.
Essa foi a segunda edição dos Startup Games – a
primeira foi realizada durante os Jogos Olímpicos de
Segunda edição do evento premiou três empresas mineiras Londres em 2012. Além da competição oficial, o evento

18 Dezembro de 2016
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

promoveu workshops, mentoria e palestras, tudo dentro de possibilitar grande visibilidade internacional para os
da Casa Britânica, residência oficial do Reino Unido du- participantes.
rante a Rio 2016. O objetivo foi promover o networking A revista Fonte conversou com representantes das
entre os atores do mercado empreendedor do Brasil e três startups vencedoras sobre as suas histórias e as ex-
do Reino Unido e estreitar o contato de negócios, além periências nos Startup Games. Confira!

Entrevista com

Roberta Vasconcellos,
cofundadora da BeerOrCoffee, empresa que criou um aplicativo para facilitar o networking

Como surgiu a ideia da startup BeerOrCoffee? quando a gente percebeu que o mais importante são as pes-
O BeerOrCoffee é um aplicativo para conectar pes- soas que a gente encontra no caminho – é a partir delas que
soas por meio de localização, de interesse e de um cafezi- as coisas acontecem nas nossas vidas, que a gente consegue
nho ou cerveja, para que elas, a partir disso, possam trocar alcançar nossos objetivos, que as oportunidades surgem.
ideias, discutir parcerias de negócio, fazer amizades. Isso Como empreendedores, nós também tomamos di-
surgiu a partir da experiência anterior dos três fundadores versos cafés e cervejas com pessoas que foram essenciais
com o aplicativo Tysdo (Things You Should Do), platafor- para transformar nosso negócio e nos passar algum tipo
ma para ajudar seus usuários a realizarem seus objetivos, de conhecimento. Nós acreditamos no poder da conexão,

Dezembro de 2016 19
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

do relacionamento e do networking. Além disso, perce- cisávamos convencer grandes investidores e empreende-
bemos que isso acontece frequentemente – uma pessoa dores a investir no nosso negócio. Tivemos que aprimorar
precisa de algo e ao seu lado está alguém que pode ajudá- nosso pitch e recebemos grandes insights. Também foi
la, mas ela não sabe. Foi a partir dessas experiências que uma oportunidade de abrir portas, já que as startups se-
a gente pensou que a tecnologia pode ser uma aliada para lecionadas para participar foram aquelas com potencial
facilitar o processo desse encontro entre as pessoas. de globalização. O Reino Unido tem muitos incentivos
Depois de uma validação no Chile e em Belo Ho- para se abrir um negócio lá e todo esse conhecimento foi
rizonte, a BeerOrCoffee começou oficialmente em no- passado para nós. Pudemos fazer contatos com pessoas
vembro de 2015, em São Paulo, em parceria com o Cubo que realmente poderão abrir portas para a expansão do
Coworking Itaú, e hoje estamos em mais de cem comu- BeerOrCoffee em outros países.
nidades empreendedoras e de profissionais, como Google
Campus SP, Seed e outros. Ter ganhado as Olimpíadas de Startups já apresentou
algum resultado para a BeerOrCoffee?
Quais os principais desafios enfrentados pela empresa Sim. Assim que estivermos preparados para ir para
até o momento? Londres, os organizadores do evento já ofereceram opor-
Primeiro, nós aprendemos muito com o Tysdo, nos- tunidades e comunidades que poderão usar o BeerOrCo-
so aplicativo anterior, e evitamos cometer os mesmos er- ffee, além de coworking que poderemos usar gratuita-
ros que tivemos com ele. mente no início.
O desenvolvimento mobile é um grande desafio.
Uma questão importante que envolve aplicativos é a aqui- Qual a avaliação que você faz do ecossistema de star-
sição de usuários. O tempo que as pessoas gastam com tups de Belo Horizonte?
seu celular é muito concorrido e é importante que o apli- Eu sou suspeita, pois faço parte desse ecossistema
cativo gere muito valor para elas. Então, estamos sempre há sete anos, quando comecei a trabalhar na Samba Tech.
preocupados em desenvolver nosso produto, para que ele Foi lá que eu aprendi tudo sobre startups e onde pude ver
realmente resolva os problemas do usuário e gere valor como nosso ecossistema é especial.
para ele. Isso é uma constante evolução. Belo Horizonte tem um ambiente muito propício
Mas nada disso adiantaria se não tivéssemos uma para desenvolvimento de startups. A cidade tem muitos
rede que se ajudasse de fato. Então, decidimos por come- bons desenvolvedores, formados nas nossas universida-
çar com uma comunidade privada, que crescesse somente des, como a UFMG; os custos, se comparados com os de
por meio de convites – para entrar era preciso conhecer São Paulo, também são melhores; e tem a comunidade
alguém dentro da rede ou de uma comunidade do ecossis- que se ajuda muito – os empreendedores mais antigos re-
tema brasileiro de startups. tribuem muito para o ecossistema com a troca de conhe-
Outro desafio é a relação entre os mercados off-line cimento entre os membros da comunidade.
e on-line, já que temos parcerias com bares e cafés para O apoio do governo, por meio do Seed, que já está
promover os encontros entre as pessoas. Quando um usu- em sua terceira edição, também é essencial para alavan-
ário convida alguém por meio do aplicativo, nós suge- car e dar oportunidades para as startups, desenvolvendo
rimos um local para eles se encontrarem; e, além disso, cada vez mais o ecossistema empreendedor de Minas. É
quem convida oferece o primeiro café ou cerveja, o que é muito importante conseguir aliar o apoio do governo com
um gesto de gentileza. as iniciativas empreendedoras.
Eu tenho muito orgulho de pertencer ao San Pedro
Como foi a participação nas Olimpíadas de Startups e Valley, porque a gente se ajuda muito. Nós acreditamos
o que vocês aprenderam com essa experiência? no colaborativismo e é assim que se constrói um ecos-
O Startup Games foi um jogo na vida real. Nós pre- sistema de sucesso.

20 Dezembro de 2016
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Entrevista com

Rafael Dias Costa,


CEO e cofundador da Virturian, empresa de soluções proativas em manutenção industrial

Como surgiu a ideia da startup Virturian? se imagina. E para uma startup pode ser ainda mais difícil,
A Virturian é a transformação de uma pequena em- pois devemos delimitar adequadamente o problema para
presa de engenharia e desenvolvimento de softwares fo- que possamos desenvolver uma solução “matadora”, que
cada em projetos customizados e soluções avançadas. Em entregue o que se propõe ao cliente e ainda seja possível re-
meio à crise de 2014, observei que tínhamos que repensar plicar e escalar. Trabalhamos intensamente numa pesquisa
o modelo de negócio da empresa e colocar em prática um com diversas indústrias de vários setores, buscando validar
sonho grande. Havia dentro de mim uma enorme convic- hipóteses que havíamos construído para problemas indus-
ção de que poderíamos desenvolver uma solução a ser triais. De início, o trabalho foi bastante árduo, porque era
adotada por muitas indústrias no mundo. Foi então que bastante complicado falar com as pessoas na indústria, mas
comecei a desenvolver com o Gabriel, um engenheiro que resolvemos isso utilizando ao máximo nossa rede de con-
trabalhava comigo, o conceito de um software que permi- tatos. A outra dificuldade foi convencer o pessoal da indús-
tisse escalar uma solução na indústria. Ao final daquele tria a expor francamente os problemas sem que isso vio-
ano, convidei o Gabriel e o Carlos, um desenvolvedor lasse alguma questão estratégica da corporação. Ao final,
também da antiga empresa, para fundar a startup Virtu- concluímos que deveríamos tratar o problema das paradas
rian e participar de um programa de aceleração, o Startup inesperadas de produção por falhas em motores elétricos.
Farm. Foi assim que tudo começou. O segundo desafio foi o desenvolvimento da so-
lução, mas, para nossa felicidade, encontramos muito
Quais os principais desafios enfrentados pela empre- rápido um parceiro que nos abriu as portas para testar
sa até o momento? e validar o produto em uma de suas unidades indus-
Nosso primeiro desafio foi definir o problema a ser triais, a Gerdau. A partir daí, foi aproximadamente um
solucionado. Pode parecer óbvio para alguns, mas encon- ano de desenvolvimento com intensas aprendizagens.
trar um problema que as pessoas queiram tratar e que pa- Nesse período, a parte mais difícil foi manter a equipe
guem para solucionar pode ser muito mais difícil do que unida e motivada com poucos resultados e sem recursos

Dezembro de 2016 21
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

para fazer viagens à fábrica, pagar a estrutura básica de O Startup Games foi um evento que simulou um
trabalho e manter as pessoas. Chegamos a seis pessoas mercado de compra e venda de ações das startups. Me im-
e perdemos uma nessa trajetória. A solução desenvolvi- pressionou a qualidade da reprodução de eventos típicos do
da é hoje o nosso sistema que chamamos de Virturian dia a dia de uma startup que busca investimentos e dese-
SenseMaker. Ele captura os dados de funcionamento ja operar globalmente. Convencer alguém a comprar uma
dos motores elétricos nos sistemas de informação ou participação virtual de sua startup implicava aprendizado
automação das fábricas, como a velocidade e a corrente constante e exercício contínuo de persuasão e melhoria
elétrica do equipamento que variam no tempo. Numa in- dos argumentos de venda. Quanto mais falava com pes-
fraestrutura de nuvem, conectada pela internet e fora da soas, melhores ficavam os argumentos e mais fluido ficava
fábrica, são extraídas informações dos dados com técni- o processo de convencimento. Mas a melhor parte era se
cas de Big Data. Por fim, o sistema avisa para as pesso- deparar com as surpresas do mercado... falar com investi-
as dentro da indústria, antes que ocorra uma parada de dores profissionais que apareciam com uma capacidade de
produção, quais motores elétricos têm algum problema, investimento cada vez maior. Então começou uma compe-
que problema é esse e quando aquilo será crítico a ponto tição entre as startups para o crescimento no mercado, que
de causar uma parada catastrófica. Isso coloca as indús- eu posso comparar com o possível trabalho de lidar com
trias em outro nível de manutenção, pois permite a elas competidores no mercado real.
reduzir até 70% o número de paradas não programadas,
aumentar a produção, reduzir o custo de manutenção e Qual a avaliação que você faz do ecossistema de start-
tornar o processo de produção muito mais previsível, o ups de Belo Horizonte?
que acarreta redução de multas por atrasos, redução de Em Belo Horizonte está acontecendo uma coisa ex-
estoques e, inclusive, aumento da qualidade. cepcional. Organicamente surgiu uma comunidade empre-
Hoje, nossos desafios se concentram em tracionar endedora em negócios de alto risco e baseados em tecno-
o negócio, isto é, aumentar o volume de vendas e de logia. Isso é fruto de muitas coisas plantadas por gerações
máquinas monitoradas sem perder o controle da opera- de empreendedores, e investimentos privados e públicos. É
ção; selecionar e acolher adequadamente novas pessoas impressionante a qualidade dos empreendedores e do cor-
na equipe e captar um investimento para acelerar ainda po de colaboradores das startups. Quase sempre com boa
mais a empresa em 2016. formação, passagens pelas melhores universidades, pós-
graduados e com passagens por empresas multinacionais.
Como foi a participação nas Olimpíadas de Startups e o Até mesmo uma nova geração tem surgido... aqueles que
que vocês aprenderam com essa experiência? já nasceram vindos de outras startups.

Entrevista com

Rodrigo Carvalho,
diretor e cofundador da Lett Insights, empresa de auditoria e monitoramento de e-commerce

Como surgiu a ideia da startup Lett Insights? para os supermercados. Entre eles, grandes players como
A ideia da Lett Insights surgiu em 2014, quando a por exemplo a Nestlé, uma das nossas primeiras clientes.
nossa equipe estava desenvolvendo o projeto de um com- O contato com essas grandes marcas nos fez iden-
parador de preços para compras de supermercado on-line. tificar uma nova oportunidade de negócios que é o core
A princípio, pode parecer que esse projeto não tem business da Lett hoje: a automação do trade marketing
nenhuma conexão com o que fazemos hoje, mas ele foi para o canal de vendas e-commerce. Hoje, a Lett conse-
fundamental. Com ele, desenvolvemos toda a base tecno- gue conectar a indústria e o varejo que opera em e-com-
lógica de aquisição de dados que a Lett usa até hoje e tive- merce e ajudar ambos a venderem mais on-line, usando a
mos contato direto com diversos fornecedores de produtos inteligência da nossa solução.

22 Dezembro de 2016
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Quais os principais desafios enfrentados pela empresa


até o momento? várias ideias novas e uma rede de contatos valiosíssima.
O início de qualquer startup que deseja vender seu Inclusive, está nos planos da Lett internacionalizar seu
produto para grandes empresas é muito difícil. O proces- produto em breve e o evento nos abriu várias portas para
so de vendas é diferente do ambiente startup ao qual se o mercado do Reino Unido.
está acostumado. Você precisa gastar horas no telefone até
conseguir falar com a pessoa certa dentro de cada empresa Qual a avaliação que vocês fazem do ecossistema de
e, por fim, não consegue escapar de várias reuniões pre- startups de Belo Horizonte?
senciais até o tomador de decisões resolver te contratar. O ecossistema de startups de Belo Horizonte pos-
Todo esse processo costuma demorar mais de 6 sui algo muito diferenciado no seu DNA, que é a co-
meses e, após esse tempo, pode ser que demore mais 90 operação. É incrível como empreendedores de sucesso,
dias para o seu primeiro boleto ser faturado na conta da com agendas cheias de compromissos em suas startups,
empresa! Isso exige muito fôlego da empresa, que precisa conseguem sempre um espaço para ajudar quem está
ter um capital inicial para não comprometer o seu fluxo começando. Muitas vezes, um pequeno conselho de al-
de caixa. Só conseguimos passar por essas etapas graças a guém com mais experiência pode fazer total diferença
programas do governo de incentivo à inovação, como por para quem está começando.
exemplo o Sinapse da Inovação, em Santa Catarina, e o Além desse movimento promovido pelos próprios
Seed, em Minas Gerais; além de programas de incubação empreendedores, também vejo uma movimentação bas-
como o Celta e a Nascente. tante interessante do governo do estado para incentivar
o ambiente de startups. O retorno do programa Seed e
Como foi a participação nas Olimpíadas de Startups e outras iniciativas como, por exemplo, criar espaços de
o que vocês aprenderam com essa experiência? coworking comunitários podem ser um grande diferen-
A participação no Startup Games foi incrível. Mais cial para Minas Gerais atrair talentos de outros estados. É
do que uma competição, o evento conseguiu reunir au- claro que esse tipo de projeto traz retorno apenas a longo
toridades internacionais no campo da inovação para nos prazo, então agora é torcer para que essas ações conti-
dar uma aula de empreendedorismo. Saímos de lá com nuem ao longo das próximas trocas de mandatos.

Dezembro de 2016 23
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Ecossistema
de uma startup
O
dicionário Aurélio define ecossistema como o programas de fomento entram na estrutura para disponibi-
conjunto das condições físicas, químicas e bio- lizar capital. E o poder público é o responsável por estabe-
lógicas de que depende a vida de uma espécie lecer um ambiente regulatório adequado, com legislação e
vegetal ou animal, ou que depende da sua vida. O conceito incentivos que permitam o desenvolvimento das startups
é adequado para as startups: elas precisam de um ambiente e seu relacionamento com os outros entes do ecossistema.
estruturado que as ajude a nascer, crescer e se estabelecer. O desenvolvimento de um bom ecossistema de star-
“Poucos discordam da importância e potencial de startups tups passa também por outros fatores. Para o grupo Dína-
para o desenvolvimento econômico de regiões que as abri- mo, fundado por Felipe, esse ecossistema deve ser com-
gam. Contudo, para que elas surjam e cresçam, é preciso posto por seis pilares: capital, talentos, cultura, densidade,
que haja todo um ecossistema de inovação e empreende- regulação e diversidade. Pensando neles, o grupo – forma-
dorismo para apoiá-las”, afirma Felipe Matos, sócio-fun- do por profissionais de empresas de tecnologia como Goo-
dador da Startup Farm, maior aceleradora de startups na gle, Microsoft, Plug e Performa Investimentos, e membros
América Latina, e COO do programa Start­Up Brasil. de organizações como Anjos do Brasil, Startup Farm, As-

Belo Horizonte tem o segundo maior ecossistema de startups do Brasil em termos de número de empreendimentos

Esse ecossistema é formado por universidades, ace- sociação Brasileira de Startups, Up Brasil, Associação Bra-
leradoras, incubadoras, investidores, governo e diversos sileira de Venture Capital e Ação da Cidadania – foi criado
outros agentes que atuam para estimular o empreendedo- com o objetivo de dialogar com governos pela criação de
rismo e a inovação em uma determinada região. Cada um políticas públicas mais eficientes para o empreendedoris-
deles tem um papel diferente: a academia e os centros de mo de startups no país.
pesquisa, por exemplo, são importantes formadores de ta- Essa visão do papel dos governos é compartilhada
lentos, essenciais para a formação de equipes qualificadas pelo CEO da Samba Tech, Gustavo Caetano: “[O papel do
nas startups. Investidores-anjo, fundos de venture capital e governo é] facilitar esse ambiente de taxação e legislação,

24 Dezembro de 2016
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Pilares de um ecossistema de inovação e empreendedorismo tecnológico

Cultura Capital
Disseminar a cultura de inovação e empreendedo- Ter capital é essencial para o surgimento de start-
rismo é essencial para que empreendedores tirem suas ups. O capital de risco precisa de um ambiente regulató-
ideias do papel e criem soluções inovadoras e disrup- rio que compreenda os riscos existentes nesse modelo de
tivas. Ecossistemas de sucesso conseguiram criar essa investimento, incentivando-o à tomada de riscos.
cultura entre os atores do meio.
Densidade
Talentos Aproximar talentos e empreendedores ajuda a ge-
Formar talentos preparados para pensar e atuar rar novas ideias e inovações. Daí a importância de se
em inovação é parte fundamental de um ecossiste- criarem hubs e clusters de inovação para aumentar as
ma de sucesso. O ambiente deve preparar os jovens possibilidades de surgimento de novos negócios.
para um mercado de trabalho inovador, tecnológico,
disruptivo e diverso. Sociedade
Lutar por um ambiente mais diversificado e in-
Regulação clusivo, com políticas que incentivem a entrada de
Construir um processo mais ágil e flexível nas mulheres e pessoas de menor renda no ecossistema
questões tributária, trabalhista e legal para o ambien- propiciará o surgimento de inovação focada no aten-
te de startups, tornando o ambiente de negócios mais dimento às demandas e necessidades da grande maio-
preparado para as empresas inovadoras no país. ria da população.

para que as startups tenham mais facilidade de competir do o estudo Cidades Empreendedoras 2015 da Endea-
– porque não estamos competindo com empresas locais, vor. O mesmo levantamento apontou que Uberlândia é
mas, sim, com empresas do mundo todo”. A burocracia onde empreendedores encontram mais facilidade para
brasileira dificulta, por exemplo, a abertura e o fechamento abrir suas empresas: conseguem fazer isso em 24 dias.
de empresas. “Esse tipo de situação dificulta o empreende- Entre as capitais pesquisadas, o índice é de 44 dias
dorismo, pois ele se torna uma atividade de risco”, analisa. em Belo Horizonte, o dobro do tempo em São Paulo,
Em um artigo para o jornal Estado de S. Paulo, Re- 103 dias no Rio de Janeiro e chega a 177 dias em
nato Steinberg, sócio-fundador da rede social de moda Florianópolis.
Fashion.me, relembrou as experiências em abrir sua em-
presa no Brasil e nos Estados Unidos: “Abrir a nossa em- Contibuições legislativas
presa aqui no Brasil levou cerca de três meses e exigiu a Em Minas Gerais, uma iniciativa da Assembleia Le-
contratação de advogado e contador. Era uma empresa gislativa (ALMG) está buscando o apoio da sociedade civil
‘limitada’, mas pouco tempo depois tivemos que mudar o para construir uma política estadual de estímulo, incenti-
nosso objeto social: mais alguns meses e mais dinheiro, vo e promoção ao desenvolvimento de startups. O Fórum
aprovações na junta comercial e em outros órgãos”. Situa- Técnico “Startups em Minas – A construção de uma nova
ção bem diferente do que aconteceu nas terras do Tio Sam. política pública” está promovendo encontros na capital e
Sem sair do seu escritório em São Paulo, Renato conseguiu no interior do estado para colher sugestões e propostas dos
abrir a empresa e uma conta em banco em cerca de quatro cidadãos que vão subsidiar a elaboração de um marco re-
dias. “E gastando bem menos dinheiro”, relembrou. gulatório do ecossistema de startups em Minas, aprimoran-
Renato enfrentou essas dificuldades há alguns anos, do o projeto de lei 3.578/16.
mas a situação não mudou muito. Apesar de o tempo A ação teve início em julho de 2016 com a realização
para se abrir uma empresa ser diferente em cada cidade, de reuniões preparatórias, que tiveram a participação de
existem localidades em que se gastam até 304 dias para diversos agentes do ecossistema mineiro de startup, como
passar por essa etapa. É o caso de Caxias do Sul, segun- secretarias e entidades do governo, empreendedores de

Dezembro de 2016 25
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê
Foto: Clarissa Barçante/ALMG

Assembleia Legislativa promoveu debates públicos para discutir o marco regulatório das startups em Minas Gerais

Política estadual de estímulo, incentivo e promoção ao desenvolvimento local de startups


Projeto de lei 3.578/16
I – convergir um ecossistema de inovação em rede de governo, empreendedores,
investidores, aceleradoras e incubadoras, universidades, empresas, associações de classe
e prestadores de serviço, de modo a evitar ações isoladas;
II – desburocratizar a entrada das startups no mercado;
III – criar processos simples e ágeis para abertura e fechamento de startups;
IV – propiciar segurança e apoio para as empresas em processo de formação;
V – criar um canal permanente de aproximação entre governo e startups;
VI – buscar instituir modelos de incentivo para investidores em startups;
VII – promover o desenvolvimento econômico das startups do Estado;
VIII – diminuir limitações regulatórias e burocráticas;
IX – contribuir para a captação de recursos financeiros e fomentar as ações e atividades
voltadas para o setor de inovação tecnológica.

26 Dezembro de 2016
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê
Foto: Guilherme Bergamini/ALMG

Primeiro fórum técnico sobre startups no interior do estado aconteceu em Santa Rita do Sapucaí
startups, representantes da academia, da iniciativa privada devem se inscrever para participar das discussões em um
e de organizações da sociedade civil. Nas reuniões, foram desses três grupos. O documento de cada grupo contém
definidas todas as etapas do processo, incluindo uma con- perguntas para estimular o debate e cinco propostas que
sulta pública pela internet, encontros regionais em Montes devem ser votadas pelos integrantes – elas poderão ser
Claros, Santa Rita do Sapucaí, Uberlândia e Viçosa, e um aprovadas, rejeitadas ou complementadas. As regras pre-
debate público. veem ainda a possibilidade de apresentação de cinco novas
Para embasar os trabalhos, os organizadores do Fó- propostas em cada município.
rum produziram um documento contendo assuntos a serem Tudo que for produzido na consulta pública e nos
debatidos nos encontros regionais e que também embasa- encontros será discutido no evento final, programado para
rão a consulta pública. Eles foram divididos em dez temáti- acontecer entre os dias 23 e 25 de novembro de 2016, em
cas: conceito de startups; papel dos atores no ecossistema; Belo Horizonte, quando serão discutidas e aprovadas as
cultura, educação e empreendedorismo; política tributária propostas a serem entregues ao presidente da ALMG. O
específica; desburocratização; acesso a mercados tradicio- processo é longo, mas já foi possível levantar, pelas reu-
nais; articulação com os municípios; políticas estaduais de niões preparatórias, algumas sugestões para estimular as
fomento e de investimento; atração de investidores; e ca- startups no estado, como a implementação de um progra-
nais de informação e divulgação. ma de estímulo a essas empresas; a criação de incentivos
Todos esses temas foram agrupados em três partes, públicos ou privados para startups criadas e desenvolvidas
para facilitar as discussões e a coleta de sugestões duran- dentro das universidades e escolas; e a criação de um sis-
te os encontros regionais: empreendedorismo e inovação; tema de gestão integrada e informatizada do processo de
políticas e desburocratização; investimentos e incentivos. formalização desse tipo de empreendimento, o que redu-
Dessa forma, os interessados em participar do encontro ziria custos e diminuiria o tempo de abertura de empresas.

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Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

ENTREVISTA
Miguel
Corrêa

Secretário de Estado de Desen-


volvimento Econômico, Ciência,
Tecnologia e Ensino Superior de
Minas Gerais

O
belo-horizontino Miguel Corrêa da econômico, a geração de empregos e a democra-
Silva Júnior está à frente da Secre- tização de oportunidades. Esses três pilares estão
taria de Estado de Desenvolvimen- diretamente ligados aos negócios da tecnologia da
to Econômico, Ciência, Tecnologia informação e à comunicação na era digital”.
e Ensino Superior de Minas Gerais desde janeiro
de 2015. Com formação em História pelo UNI- Nesse contexto, o governo do estado vem desde
BH, o secretário estava em seu terceiro mandato então trabalhando para desenvolver o ecossistema
como deputado federal quando foi convidado para mineiro de startups. As cerca de 400 empresas,
assumir a pasta. o San Pedro Valley, os clusters de Santa Rita do
Em uma de suas primeiras entrevistas no novo car- Sapucaí, os parques e institutos tecnológicos, as
go, para a Sucesu-Minas, Miguel Corrêa explicou incubadoras e as universidades públicas presentes
que fomentar a inovação é prioridade para o go- em Minas são destacados pelo secretário como
verno. Para isso, ele investe em ciência, educação características do segundo maior ecossistema
e tecnologia: “Temos que entender que essas áreas do Brasil.
trabalham em um sistema. Investir em uma forta-
lece a outra”, afirmou à época. E acrescentou: “A “Seus números significativos não são ao acaso.
ciência, a tecnologia e a inovação são instrumentos São resultado de um intenso trabalho do governo
essenciais para o crescimento, o desenvolvimento estadual para articular os atores do ecossistema e

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ENTREVISTA
transformar Minas no melhor lugar para se inovar”. Projetos do governo do estado, por meio da Secreta-
Nesta entrevista para a Fonte, o secretário Miguel ria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecno-
Corrêa fala sobre as ações e os programas do go- logia e Ensino Superior (Sedectes), têm fomentado
verno estadual nesse ambiente, que está se tornan- o já propício ambiente de empreendedorismo e ino-
do uma referência no país inteiro. vação de Minas Gerais, incentivando jovens a se en-
volverem com pesquisa e tecnologia, aproximando
Fonte: Minas Gerais é destaque no Brasil como grandes empresas e startups, trazendo eventos con-
polo de empreendedorismo e uma potência em ceituados para o público mineiro, impulsionando a
ciência e tecnologia. O que torna o estado um criação de novas soluções para o mercado e criando
ambiente favorável à inovação, à ciência e à uma cultura de inovação efetiva no estado.
tecnologia? Qual o papel do governo e da Se-
dectes no fomento à inovação e à tecnologia Fonte: Quais os critérios adotados pelo governo
no estado? para definir suas políticas públicas de apoio à
inovação e ao empreendedorismo no estado?
Miguel Corrêa: O estado é o segundo maior ecos-
sistema de startups do Brasil, com cerca de 400 Miguel Corrêa: O objetivo dos projetos estaduais
empresas; abriga o San Pedro Valley, comunidade
é apoiar iniciativas que possam desenvolver Minas
de empreendedorismo que é referência para negó-
Gerais, apostando na economia criativa como motor
cios de base tecnológica no país e no mundo, os
de seu crescimento. O investimento do governo do
clusters de Santa Rita do Sapucaí, seis parques tec-
estado nas estratégias de incentivo ao empreendedo-
nológicos e seis institutos tecnológicos públicos;
rismo e inovação já tem gerado frutos para o ecos-
conta com mais de 23 incubadoras distribuídas em
sistema mineiro, que se destaca no cenário nacional
16 cidades; e é o maior estado em número de uni-
com a qualidade da sua mão de obra, universidades
versidades públicas do Brasil (onze federais e duas
e centros tecnológicos, bem como o potencial das
estaduais).
empresas nascentes. Projetos de estudantes estão
ganhando visibilidade nacional e internacional; star-
Isso tudo faz de Minas um ambiente favorável para
a inovação e seus números significativos não são tups estão encontrando ambiente favorável e recur-
ao acaso. São resultado de um intenso trabalho do sos financeiros para seu desenvolvimento; empreen-
governo estadual para articular os atores do ecos- dedores estão em contato direto com investidores;
sistema e transformar Minas no melhor lugar para e jovens, se capacitando para o desafiante mercado
se inovar. Investindo em economia criativa, esta- tecnológico. E essas são as diretrizes e os propósitos
mos alcançando relevância nos mercados de em- das políticas públicas do governo estadual.
preendedorismo e tecnologia e criando uma cultu-
ra de inovação no ambiente mineiro, o que torna Fonte: Como é a rede de relacionamento que
propício o florescimento de novas ideias e soluções o governo está estruturando para promover a
revolucionárias. ciência, a tecnologia e a inovação no estado?

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ENTREVISTA
Miguel Corrêa: O governo de Minas conta com por meio da implantação de uma rede de polos de
uma rede integrada de apoio à ciência e à inovação, educação a distância, ampliando, democratizando e
que inclui grandes instituições como a Fundação interiorizando o acesso a conteúdos pedagógicos que
de Apoio à Pesquisa do Estado de Minas Gerais sirvam para capacitação e requalificação da mão de
(Fapemig), o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro obra e para a formação profissional); entre outros.
e Pequenas Empresas (Sebrae), as universidades
federais e estaduais, os clusters de tecnologia de Fonte: Pensando no objetivo de fomentar a ino-
diversas cidades mineiras, além de empreendedo- vação e o empreendedorismo em Minas, como a
res, mentores e gestores. Sedectes trabalha as diferenças entre a veloci-
dade da administração pública, com suas ques-
Fonte: Quais ações estratégicas o governo mineiro tões burocráticas e legais, e o ritmo das startups,
promove ou de quais participa para apoiar o cres- mais dinâmico e ágil?
cimento do ecossistema de startups em Minas?
Miguel Corrêa: O contato com esse ritmo vem
Miguel Corrêa: As estratégias estão organizadas sendo benéfico para a Secretaria exatamente para
dentro do Programa Minas Digital, que é uma ini- aprendermos e aprimorarmos técnicas mais ágeis
ciativa do governo estadual por meio da Sedectes. O de administração, simplificando processos quando
programa busca atuar efetivamente em todo o terri- possível e alcançando resultados com menos recur-
tório mineiro, espalhado por 17 locais estratégicos de sos e mais rapidez. A Sedectes tem respeitado os
desenvolvimento, abarcando todas as ações governa- termos e tempos legais, mas tem aprendido com a
mentais de incentivo e apoio à ciência, tecnologia e filosofia das startups, reduzido a burocracia e tor-
inovação. O projeto inclui diversos programas, como nado mais dinâmicos os procedimentos.
o Seed (programa de aceleração de startups); os hubs
de inovação (espaços de inovação e excelência cor- Fonte: O programa Minas Digital foi elaborado
porativa, contendo cursos de empreendedorismo para gerar o desenvolvimento econômico e social
e cursos voltados para tecnologia via Uaitec, além do estado e do país a partir da inovação, da econo-
de espaço de coworking, estações de trabalho, mo- mia digital e da economia criativa. Quais os prin-
nitoria e mentoria, locais de convivência e salas de cipais resultados já alcançados pelo programa?
teleconferência); o calendário de eventos anual (pro-
gramação positiva durante o ano, com eventos volta- Miguel Corrêa: Um dos principais resultados é
dos para tecnologia, empreendedorismo e geração de o Seed, que é um programa que faz parte do pro-
negócios, fomentando o mercado mineiro e colocan- jeto Minas Digital e está em sua terceira rodada
do o estado no mapa da inovação. Entre os eventos, de aceleração (teve início em junho e termina em
Imagine Cup, FOMs, Pint of Science e Finit); a Rede dezembro). O programa tem duração de seis meses
Uaitec (Universidade Aberta Integrada, que visa a e acolhe cerca de 40 startups por rodada. Durante
oferecer, de forma gratuita, qualificação profissional o processo de seleção, foram seis meses de prepa-

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ENTREVISTA
ração, 1.453 empresas inscritas, mais de quatro mil nit), englobando em sua programação o Cam-
empreendedores de 23 estados brasileiros e mais pus Party, o 100 Open Startups e a DemoLatam.
de 40 países para chegar nas startups selecionadas. Como foi a articulação para trazer esses eventos
internacionais para Minas Gerais?
Nas duas primeiras edições, o Seed já acelerou 73
startups, sendo 53 brasileiras e 20 estrangeiras. Jun- Miguel Corrêa: Já viemos negociando com esses
tas, essas empresas levantaram mais de R$ 10 mi- atores (Campus Party, 100 Open Startups e Demo-
lhões em investimentos após seu período de acele- Latam) há quase um ano. Tivemos a oportunidade
ração pelo programa. Para esta terceira rodada, são de conhecer e vivenciar esses eventos em edições
80 mil reais de capital semente e mais de 500 mil anteriores e percebemos que a experiência se en-
dólares em prestação de serviço por startup, ou seja, caixaria em Minas Gerais. Apresentamos nosso
consultorias, mentorias, workshops, palestras, aces- ecossistema, que é extremamente atrativo, e con-
so a softwares de parceiros como Microsoft, Ama- solidamos a parceria para trazermos o que há de
zon e IBM, entre outros benefícios. No Espaço Cen- melhor no mercado mundial para nosso estado.
toeQuatro, as startups vivenciam um ambiente único
e renovado. São quase 40 ideias recebendo mentoria Fonte: Qual a importância desses eventos e
personalizada, formação empreendedora, escritório quais os objetivos e metas que a Sedectes espera
compartilhado e conexão com o ecossistema global. alcançar com sua realização em Minas Gerais?

A qualidade dos projetos alavancados dentro do Miguel Corrêa: Ao trazer grandes e conceituados
programa também foi destaque na competição inter- eventos nacionais e internacionais para o estado, o
nacional Startup Games, no Rio de Janeiro. Quatro governo visa a impulsionar a formação de negócios
startups participantes da atual rodada de aceleração e parcerias entre os diversos atores do mercado e a
do Seed foram as vencedoras da competição, que in- fortalecer o desenvolvimento do ambiente empreen-
cluiu 50 empresas nacionais e internacionais entre dedor mineiro; assim, transformando Minas Gerais
8 e 9 de agosto na British House, residência oficial em polo tecnológico e de inovação da América La-
do Reino Unido, durante a Rio 2016. BeerOrCoffee, tina. O calendário de eventos está articulado com as
Virturian e Lett ocuparam os três primeiros lugares, ações prioritárias do estado e faz parte do programa
respectivamente, seguidos da Pris, em quarta colo- Minas Digital, que visa a gerar crescimento econô-
cação. As equipes mineiras venceram mais de 40 mico através da tecnologia, da inovação e da econo-
empresas na disputa, que contou com startups de vá- mia digital e criativa. Criando uma agenda positiva
rios estados brasileiros e países como Chile, Estados durante todo o ano, a Sedectes pretende gerar siner-
Unidos, Venezuela e Inglaterra. gia entre os participantes, segmentar corretamente
os públicos estratégicos, facilitar e diversificar a
Fonte: Em novembro, acontece a Feira Interna- captação de recursos para empreendimentos em Mi-
cional de Negócios, Inovação e Tecnologia (Fi- nas, e estimular o turismo de negócios.

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ENTREVISTA
Fonte: Como o Seed (Startups and Entrepre- do parceiros, vencendo competições, evoluindo em
neurship Ecosystem Development), programa seus objetivos e colocando Minas Gerais no mapa
de aceleração de startups do governo mineiro, se do empreendedorismo e da inovação. A terceira ro-
insere no ecossistema de startups de Minas? Por dada nem acabou e já é um enorme sucesso.
que incluir a participação de startups estrangei-
ras nesse processo? Fonte: Quais são as outras ações e projetos que
compõem o programa Minas Digital?
Miguel Corrêa: O Seed promove ambiente para
o desenvolvimento das startups mineiras, conec- Miguel Corrêa: Como destaquei, uma das princi-
ta os diversos atores do ecossistema, como em- pais ações do Minas Digital para fomentar o empre-
preendedores, mentores, investidores e gestores, endedorismo de impacto no estado está representa-
articulando um estado integrado e coeso. da pela terceira rodada do Seed, maior programa de
As startups estrangeiras vêm para somar, trazen- aceleração do estado.
do novos conhecimentos e experiências, atrain-
do investimento de diferentes partes e mostrando Além disso, como premissa, o Minas Digital visa a
Minas Gerais para o mundo. Além disso, tais em- mostrar ao universitário que ele deve empreender e
presas podem implementar sedes ou filiais no es- investir em tecnologia, não importando sua área de
tado após o programa, resultado que tem sintonia atuação. Para isso, estamos criando hubs de inovação,
com o objetivo do governo de reter seus talentos e que serão espaços de inovação e excelência corporati-
atrair novos. va, coordenados pelo estado, contendo cursos de em-
preendedorismo, cursos voltados para tecnologia via
Fonte: As 40 startups selecionadas pelo Seed em Uaitec, espaço de coworking, treinamento e mentoria.
março de 2016 estão concluindo seu processo de O primeiro deles será implantado no antigo prédio da
aceleração. Como a Sedectes avalia essa terceira Fapemig, na região da Savassi, em Belo Horizonte.
etapa do programa?
As ações nos hubs terão aproximação com as unida-
Miguel Corrêa: A mais recente etapa do Seed já des do Uaitec, fundamental para o objetivo da Sedec-
começou de maneira positiva. A terceira rodada tes: somar esforços e unir entidades distintas para a
bateu todos os recordes em número de inscrições, garantia da eficácia dos hubs de inovação.
regiões e países. Além disso, foi a primeira vez
que o Seed recebeu inscrição de todas as regiões Investindo no Minas Digital e nas Uaitecs, estamos
do Brasil. criando oportunidades e levando educação e capaci-
tação para todos os cantos do estado. No último re-
Podemos perceber nos resultados já alcançados, latório da Uaitec, tivemos 26 mil inscritos no total,
como disse anteriormente, que as startups acelera- sendo 38% entre 15 e 18 anos; 40% de pessoas que
das estão desenvolvendo seus projetos, encontran- procuraram emprego recentemente e não encontra-

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ENTREVISTA

Finit 2016 – Feira Internacional de Negócios, Inovação e Tecnologia

ram; 58% que não têm renda e 71% que recebem o Além disso, estamos trazendo os maiores eventos
benefício do Bolsa Família. A Uaitec já oferece mais de tecnologia e inovação para Minas. Já tivemos,
de 34 mil vagas para cursos profissionalizantes e de somente neste ano, a Imagine Cup (competição de
idiomas a essas pessoas, atingindo mais de 300 mil tecnologia da Microsoft, em que uma equipe minei-
interessados. Dessa forma, democratizamos o acesso ra foi campeã brasileira e vai representar Minas e o
à educação e queremos criar a cultura de empreende- país na final nos EUA); o Pint of Science (evento
dorismo nos mineiros para continuarmos evoluindo. internacional que reúne pesquisadores em bares da
O programa Minas Digital prevê a formação de cem capital); o FOMs (fórum de mídias sociais que trou-
mil jovens por ano no setor de tecnologia e empreen- xe grandes nomes do marketing digital e da tecnolo-
dedorismo. Apesar de ser uma criação da Sedectes, nos gia e bateu recorde de inscrições com 42 mil pedidos
hubs de inovação todos os atores do setor se farão pre- para 900 vagas, que acabaram em dois minutos); e
sentes, tais como Fiemg, Sebrae, Senai, Fecomércio, a Finit – feira internacional de negócios, inovação e
MGTI, instituições de ensino, Cefet de Belo Horizon- tecnologia realizada em novembro, que contou, en-
te, municípios e, claramente, o próprio estado como tre outros eventos, com a Campus Party, principal
verdadeiro articulador, fomentador e executor das po- evento tecnológico do país que chegou pela primeira
líticas públicas de inovação e empreendedorismo. vez a Belo Horizonte.

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Governo de SP se une a startups para


solucionar desafios da gestão pública

O governo do estado de São Paulo criou em 2015 para realizar os testes e conduzir internamente as solu-
o programa Pitch Gov SP, uma iniciativa para encontrar ções”, explica.
soluções inovadoras para desafios de relevância pública Depois de um mês de inscrições, as comissões de
em diferentes áreas. Foi a partir de dois problemas iden- avaliação estabelecidas analisaram as soluções de 304
tificados no ecossistema paulista de startups e também no startups, com base nos critérios de maturidade, mode-
governo que se montou o programa: primeiro, a baixa ve- lo de negócios, equipe e aderência aos desafios. Foram
locidade da administração pública para inovar e, segundo, então selecionadas 15 empresas, que apresentaram seus
a necessidade das startups de testar suas soluções no am- produtos em um evento em novembro do mesmo ano no
biente do governo. Palácio dos Bandeirantes, com a presença de empreende-
“O governo é lento para inovar. Ele não consegue dores, representantes do governo paulista e investidores.
identificar novas soluções e também não consegue con- Dessas, 12 startups foram convocadas para implementar
tratá-las para o governo. Além disso, as startups criam so- suas soluções, por meio de teste, junto ao governo.
luções a todo momento e gostariam de testar em ambien- Na avaliação da Secretaria de Governo, a primeira
tes reais e de governo, que são completamente diferentes edição do Pitch Gov foi muito boa, pois, além de conhe-
do ambiente da iniciativa privada”, ressalta Eduardo Aze- cer as soluções, o governo pôde se aproximar das startups.
vedo, membro da equipe do Pitch Gov SP. O programa Por meio dos testes, os gestores também puderam ver que
foi então elaborado para aproximar o governo de soluções essas soluções conseguem facilitar e resolver problemas
tecnológicas criadas por startups. que eles não conseguiam de outra forma. “Nós vemos va-
Regulamentada por meio do decreto 61.492/2015, lor nessa aproximação governo e startups, tanto na troca
a primeira edição do Pitch Gov lançou em setembro de de conhecimento, quanto na questão de as soluções serem
2015 um edital de chamamento para apresentação, sele- realmente úteis”, elogia Eduardo. Segundo ele, as empre-
ção e teste das soluções. Foram definidas três áreas de sas deram um retorno positivo, pois o contato com o setor
atuação: educação, saúde e facilidades ao cidadão, com público permitiu a elas conhecer burocracias, processos
um total de 35 desafios lançados às startups. “As duas pri- e metodologias de trabalho com os quais as startups não
meiras foram escolhidas por uma demanda das próprias tinham contato, e possibilitou também atingir escala e im-
startups, que tinham um maior número de soluções dessas pacto social.
áreas que poderiam contribuir para o setor público. Na
outra ponta, as secretarias de Educação e Saúde já tinham Startups finalistas
contato com essas novas tecnologias e, por isso, conse- Na área de educação, foram selecionadas as star-
guimos casar essas duas realidades. tups Árvore (plataforma de biblioteca digital personali-
A terceira área foi escolhida por ser uma área de zada), ClassApp (aplicativo que substitui a agenda esco-
tecnologia e por estar mais próxima da Secretaria de lar e conecta escolas, professores, pais e alunos), DEV
Governo, que coordenou o Pitch Gov, o que facilitaria Tecnologia (soluções para Internet das Coisas) e Leva

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Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Eu (solução de gestão de demanda de viagens). Na saú- testes acontecem em três meses, e outros que irão durar
de, Aime (previsão de locais com maiores focos de den- o triplo do tempo.
gue por meio de data analysis e inteligência artificial), Outra característica dessa fase é que não haverá
Memed (plataforma para médicos que facilita consulta transferência de recursos do governo para as empresas.
sobre medicamentos), Saúde Controle (armazenamento Para cada convênio também foi feito um plano de traba-
de histórico médico digital do usuário) e Aquarela (solu- lho, em um trabalho conjunto das startups e do governo.
ção de negócio em gestão, tecnologia e inovação). E, na O documento explicita a solução a ser testada, as metas e
área de facilidades ao cidadão, Get Ninjas (plataforma os resultados esperados, os métodos de trabalho, a data de
de contratação de serviços de profissionais e mão de obra implementação e as ações das partes envolvidas. Eduardo
especializada), Hand Talk (solução para tradução auto- explica ainda que, para os casos em que é necessário, há
mática em línguas de sinais), IaiNet (identificação de acordo de confidencialidade de informações.
usuários por meio de PDVs com antenas wi-fi) e Nama
(atendimento via inteligência artificial). Resultados
Dessas, nove empresas já assinaram convênios in- Eduardo Azevedo cita o exemplo da solução da
dividuais com o governo. “Entendemos que cada solu- GetNinjas como um ótimo exemplo que atende bem aos
ção é diferente e, por isso, a duração de cada convênio interesses do governo e do cidadão. Pelo convênio, os
foi definida em comum acordo com a startup e a secre- alunos dos cursos do Programa Escola de Qualificação
taria que testará a solução, levando em consideração o Profissional do Fundo Social de Solidariedade do Estado
melhor prazo para realizar os testes e identificar se a de São Paulo (Fussesp) poderão divulgar seus serviços
solução realmente apresenta resultados”, detalha Edu- gratuitamente por um período de seis meses na platafor-
ardo. Ele diz que o governo percebeu não existir a ne- ma virtual de oportunidades da startup. “Desse modo, o
cessidade de delimitar desde o início o prazo para os governo proporciona mais uma ferramenta para ajudar
testes, por isso existem convênios que preveem que os tanto os cidadãos que foram formados pelo serviço do

Quinze soluções foram finalistas da primeira edição do Pitch Gov SP. Startups as apresentaram em evento no Palácio dos Bandeirantes

Dezembro de 2016 35
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

governo como também aqueles que estão procurando um cipação do governo, das escolas e dos pais; e isso é muito
fornecedor, mas não sabem onde achar”, esclarece. importante, pois ajuda os alunos a se desenvolverem e
Outro convênio que está apresentando bons resul- apresentarem melhores resultados educacionais”.
tados é o feito com a startup Memed, que está possibili-
tando aos usuários do Instituto de Assistência Médica ao Segunda edição
Servidor Público Estadual (Iamspe) de São Paulo o recei- Depois do sucesso da primeira edição do Pitch Gov
tuário médico padronizado. “A solução está ajudando o SP, Eduardo Azevedo afirma que o governo de São Pau-
farmacêutico, na ponta do atendimento, evitando erros de lo está planejando uma segunda, a ser lançada ainda este
prescrição de medicamentos, e também os médicos, que ano. O trabalho inclui definir as áreas que participarão
ficam sabendo quais remédios estão disponíveis na rede da iniciativa, visto que vários gestores públicos paulistas
de farmácias do governo”, conta Eduardo. Segundo ele, demonstraram interesse em estar mais próximos da ino-
essa integração não existia em toda a rede estadual e, por vação, conhecendo e testando soluções.
meio dos testes, está sendo implementada gradualmente, Outras definições também estão sendo discutidas,
apresentando bons resultados. como o modelo de chamamento das startups e os desafios
Na área de educação, Eduardo cita o exemplo do a serem apresentados. “Essa é uma parte interessante do
convênio com o ClassApp, que prevê um projeto piloto programa, pois é o momento que o governo mostra às
nas escolas técnicas estaduais do Centro Paula Souza para startups quais são os problemas enfrentados no seu dia
utilização do aplicativo de comunicação escolar cujo ob- a dia. Estamos analisando a possibilidade de se permitir
jetivo é conectar escolas, professores, pais e alunos. Ele que as empresas se juntem para, entendendo a cadeia do
conta que o retorno das pessoas que estão utilizando o problema, que muitas vezes é complexo, possam apre-
aplicativo é positivo: “Elas citam a facilidade de comuni- sentar uma solução mais completa, perene e efetiva para
cação, a sensação de proximidade e de uma maior parti- vencê-lo”, conta Eduardo.

Fapemig: contribuindo para


transformar conhecimento em benefícios
para a sociedade
Para além das iniciativas governamentais, os agentes vídeos curtos (pitches) enviados por pesquisadores de
do ecossistema mineiro de startups mostram que suas ações instituições de ensino e pesquisa do estado. Para a sele-
e iniciativas são importantes para fomentar o ambiente de ção, os organizadores da Inova Minas utilizaram critérios
inovação e empreendedorismo no estado. Um exemplo foi como a relevância dos resultados da pesquisa, a tangibili-
a Mostra de Ciência, Inovação e Tecnologia Inova Minas dade desses resultados e a capacidade do pesquisador de
Fapemig, que aconteceu em agosto de 2016 em Belo Hori- explicar o projeto para o público leigo.
zonte. Com um público de mais de 15 mil pessoas, o obje- A mostra incluiu, entre outros, o projeto de uma
tivo foi “disseminar junto à sociedade o esforço realizado cadeira virtual controlada por músculos da face (da Uni-
pelas universidades, centros de pesquisa e empresas para o versidade Federal de Uberlândia), uma plataforma di-
desenvolvimento da ciência, tecnologia e inovação”. gital para criação de dicionários terminológicos para a
Para isso, 40 projetos financiados pela Fundação de Língua Brasileira de Sinais (do Cefet-MG) e o projeto
Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) de validação de novos biomarcadores com potencial uso
foram expostos nos diversos espaços do Circuito Cultural em diagnóstico e prognóstico da tuberculose em huma-
da Praça da Liberdade. Eles foram selecionados entre 220 nos (da Universidade Federal de Minas Gerais).

36 Dezembro de 2016
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Todos esses trabalhos são frutos do conhecimento


gerado pela academia e têm potencial para se transfor-
mar em benefícios práticos para a sociedade. Esse “pulo
do gato” é o que falta para o país avançar ainda mais
na geração de riqueza a partir da sua produção cientí-
fica. “Temos muitos casos de sucesso de transferência
de tecnologia para a geração de empregos e renda, o
que demonstra que sabemos ligar ciência e economia
em benefício da sociedade, mas faltam, ainda, mecanis-
mos efetivos que possam fazer desta prática uma mania
nacional, a exemplo do que ocorre em outros países”,
afirma o presidente da Fapemig, Evaldo Ferreira Vilela.
Nesse cenário, a Fundação tem financiado, em
conjunto com a Secretaria de Estado de Desenvolvimen- Inova Minas preparou eventos para públicos de todas as idades
to Econômico, Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de
Minas Gerais (Sedectes), ambientes de startups de base são um importante caminho para que o conhecimento e
tecnológica, e fomentado parques tecnológicos, incuba- a pesquisa gerados pela academia cheguem ao mercado.
doras, aceleradoras de empresas e núcleos de inovação “Elas estão viabilizando o uso e a aplicação das paten-
tecnológica. Segundo Evaldo, essa é a contribuição da tes. E têm criado um rico ambiente de formação de ta-
instituição que dirige para o fortalecimento do ecossis- lentos e empreendedores, com novos valores portadores
tema de inovação em Minas Gerais. As startups, afirma, de futuro”, conclui.

Entrevista com Evaldo Ferreira Vilela,


presidente da Fundação de Amparo à
Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig)

Como você avalia o cenário atual da produção científica


brasileira e a geração de riqueza a partir dela?
O Brasil ampliou significativamente sua produção
científica nas últimas décadas. Alcançou países como
a Holanda, ocupando posição de destaque como o 13o
lugar no ranking mundial de quem mais publica. Esse
fortalecimento veio com a expansão e a excelência con-
quistadas na pós-graduação stricto sensu, principalmen-
te, nas ciências da saúde, agricultura e ciências básicas.
Apesar de ainda insuficiente, o financiamento da pesqui-
sa cresceu e foi chave para o avanço da produção cientí-
fica. Já o transbordamento desta produção científica dos

Dezembro de 2016 37
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

laboratórios de pesquisa para as empresas e o mercado, Graças ao empreendedorismo jovem em Minas


com consequente geração de riquezas, continua ainda Gerais, temos participado ativamente desse ecossistema.
um desafio a ser vencido em nosso país. Temos muitos Fica em Minas o San Pedro Valley, localizado no bairro
casos de sucesso de transferência de tecnologia para a São Pedro, em BH, que tem esse nome como referência
geração de empregos e renda, o que demonstra que sa- para empresas de base tecnológica de Belo Horizonte.
bemos ligar ciência e economia em benefício da socie- A comunidade surgiu em 2011, durante encontros infor-
dade, mas faltam, ainda, mecanismos efetivos que pos- mais dos empreendedores das startups Beved, Deskme-
sam fazer desta prática uma mania nacional, a exemplo trics, Everwrite e Hotmart. Hoje são mais de 200 empre-
do que ocorre em outros países. sas de diversos setores, além de espaços de coworking,
aceleradoras, investidores e interessados. O objetivo é
Quais os desafios que se enfrentam hoje no país para reunir as startups de Belo Horizonte para juntos identi-
transformar o conhecimento científico produzido pela ficar oportunidades, necessidades e incentivos para esse
academia em inovação e oportunidades de atuação no mercado, além de divulgar vagas e notícias. Segundo o
mercado? site startupbase.net, Minas Gerais é o segundo estado do
Os desafios ainda são muitos e partem da ausência de país em número de startups, atrás apenas de São Pau-
mecanismos facilitadores da transferência dos resultados lo. Além disso, há uma grande movimentação, em nível
da pesquisa para a indústria, para as empresas, que é onde nacional, para promoção das startups e do próprio ecos-
acontecem as inovações. Os mecanismos não existem ou sistema. Em julho, aconteceu o InovAtiva Brasil, que
não funcionam por conta de uma legislação arcaica, retró- selecionou a lista das 125 startups selecionadas para a
gada, que não permite agilidade na prática da ciência e nem segunda etapa do ciclo de aceleração 2016. Das 125, 11
na proteção do conhecimento gerado. A legislação atrapa- carregam no DNA as riquezas das Minas Gerais. A par-
lha ainda a relação universidade-empresa, inviabilizando, tir de agora, as equipes selecionadas receberão mais sete
muitas vezes, a inovação que deve acontecer nas empresas semanas de mentoria e capacitação on-line.
com os conhecimentos gerados na pesquisa pública, como
acontece nos países desenvolvidos. Faltam, ao final, políti- Quais as ações e os projetos da Fapemig voltados para
cas públicas e políticos sensíveis às causas do desenvolvi- startups? Fale sobre eles.
mento econômico e social com base na nova economia, ou A Fapemig é parceira do Programa Minas Digital,
seja, a economia do conhecimento. por meio do Seed (Startups and Entrepreneurship Ecosys-
tem Development), organizado e dirigido pela Sedectes,
Qual o papel da Fapemig em um ecossistema de empre- um dos melhores programas de startups do Brasil. Apoia-
endedorismo e inovação? mos também diversos outros programas como o Lemo-
Na sequência, preenchendo lacunas, a Fapemig tem nade. Participamos, ainda, de fundos de investimento em
financiado, conjuntamente com a Secretaria de Estado de startups com o mesmo propósito de contribuir para que a
Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Ensi- pesquisa que ela financia possa chegar à sociedade, possa
no Superior de Minas Gerais (Sedectes), ambientes de star- beneficiar a qualidade de vida das pessoas.
tups de base tecnológica, com foco no empreendedorismo
inovador. Igualmente, tem fomentado parques tecnológi- As startups e o incentivo ao empreendedorismo cresce-
cos, incubadoras e aceleradoras de empresas, bem como os ram nos últimos anos em Minas Gerais. Quais os bene-
núcleos de inovação tecnológica (NITs), que são locus de fícios que esse crescimento trouxe para o estado?
novos negócios em nossos ambientes de pesquisa. Assim, As startups têm se mostrado um novo e importante
a Fapemig está contribuindo, substancialmente, para o for- meio para transpor os muros dos laboratórios de pesquisa
talecimento do ecossistema de inovação em Minas Gerais, e chegar com o conhecimento e a tecnologia ao mercado.
o que é muito importante para o nosso futuro. Elas estão viabilizando o uso e a aplicação das patentes.
E têm criado um rico ambiente de formação de talentos e
Como acontece a articulação entre a Fapemig e os ou- empreendedores, com novos valores portadores de futu-
tros agentes do ecossistema de startups para fomentar a ro. O movimento das startups vem carregado de esperan-
inovação e o crescimento desse mercado? ça para nossa juventude e nosso país.

38 Dezembro de 2016
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Laboratório móvel é oportunidade de


levar inovação ao interior do estado
Um dos destaques da mostra Inova Minas foi o A participação na Inova Minas foi uma oportunida-
LabTruck, um laboratório aberto móvel que percorre o de para o Senai-MG apresentá-lo ao público e verificar a
estado de Minas Gerais oferecendo a cultura maker aos reação das pessoas a ele. O resultado? “Um sucesso. Para
cidadãos. A iniciativa do Serviço Nacional de Aprendiza- nossa surpresa, tivemos uma grande visitação e todas
gem Industrial de Minas Gerais (Senai-MG), pioneira no as atividades propostas no período da mostra estiveram
país segundo o gerente de Serviços Tecnológicos da en- sempre lotadas”, conta Ricardo.
tidade, Ricardo Aloysio Nunes, oferece prototipagem de A iniciativa do LabTruck, conta Ricardo, surgiu da
produtos e processos e promove negócios. “Isso fortalece ideia e da necessidade de criar alguma forma de levar o
a cultura de inovação e criatividade no estado”, afirma. conceito e a filosofia do Laboratório Aberto do Senai-MG
Nas cidades em que estaciona, é a própria comuni- para o interior do estado. O Laboratório é um espaço co-
dade que opera o LabTruck, orientada pelos técnicos da laborativo voltado a qualquer pessoa que tenha interesse
unidade de Belo Horizonte do Senai. As pessoas interes- em experimentar e tirar suas ideias do papel. “Ele é aber-
sadas em participar aprendem a utilizar as máquinas e os to a toda a comunidade, principalmente às startups, que
equipamentos e podem interagir de forma colaborativa podem utilizar de toda a infraestrutura e apoio técnico do
com os projetos existentes. Já os empreendedores podem Senai no processo de criação, através da prototipação de
desenvolver suas tecnologias e experimentá-las, aprimo- novos produtos, processos e negócios”, explica.
rando seus protótipos em busca de inserção no mercado. Segundo Ricardo, os principais usuários do Labo-
Ricardo destaca outro benefício do projeto: “Pela dispo- ratório são mensalistas makers, alunos de universidades
nibilização de recursos localmente, empodera-se a popu- e escolas, empresários, inventores, startups e indústrias.
lação para criar soluções e mudar sua realidade”. “Dessa maneira, criamos conexões nos diversos setores

Em 2016, o LabTruck atendeu o público do Laboratório Aberto e participou da Inova Minas, do Sebrae eXchange e do Fórum do Amanhã

Dezembro de 2016 39
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

da indústria mineira, para desenvolvimento e validação


de suas ideias e projetos, fortalecendo o ecossistema de P7 Criativo: um polo
inovação”, diz.
Na avaliação do Senai-MG, a implementação do
de inovação e
Laboratório Aberto superou as expectativas mais oti- empreendedorismo nas
mistas da instituição, tanto em relação ao público-alvo
do projeto, quanto aos resultados apresentados. “Prin- áreas de Tecnologia da
cipalmente se analisarmos o pouco tempo em que tudo
isso aconteceu. Isso confirma que foi uma decisão e um
Informação e da
planejamento acertados e que agora também culminam
na decisão de levar essa iniciativa por todo o estado por
Comunicação (TIC) e
meio do projeto LabTruck”, analisa Ricardo. de Economia Criativa
Ricardo Aloysio e Silva, gerente de
Serviços Tecnológicos do Senai-MG

Como o Senai-MG enxerga o ecossistema de


empreendedorismo e startups em Minas e no
Brasil?
Estamos no momento propício para ino-
vação de locais não convencionais. A tecno-
logia está ficando mais fácil, mais barata, os
custos estão caindo, os equipamentos estão se
tornando mais disponíveis. Hoje, Minas Gerais
conta com um rico ecossistema empreendedor
com iniciativas integradas, que estão em ascen-
são e estão transformando Minas Gerais em um
dos lugares cruciais para o futuro da inovação.
Um projeto que une governo estadual e iniciativa
privada promete ser o maior polo vertical da economia
Qual a importância do Laboratório Aberto e
criativa no Brasil. O empreendimento P7 Criativo fun-
do LabTruck para o mercado mineiro e o seu
cionará no prédio arquitetado por Oscar Niemeyer em
ecossistema de startups?
1953 na Praça 7, no centro de Belo Horizonte, e abrigará
Essas iniciativas permitirão que pessoas
diversos atores da cadeia de inovação no estado, como
comuns tenham acesso a equipamentos, tecno-
empreendedores, investidores, especialistas, marcas,
logias e financiamentos que antes não vislum-
empresas e outros atores ligados a atividades, produtos
bravam, que eram reservados a grandes em-
ou serviços desenvolvidos a partir do conhecimento, da
presas e universidades. Reunir esses usuários
criatividade ou do capital intelectual.
em um espaço compartilhado, alinhado a uma
Os objetivos são: proporcionar um ambiente com-
iniciativa móvel do LabTruck, de baixo custo,
pleto de inovação, colaboração e empreendedorismo
com infraestrutura e apoio técnico, favorece a
para a comunidade criativa e inovadora; atrair investi-
liberdade da criação e experimentação neste
mentos de impacto para o estado; promover Belo Ho-
ecossistema de startups. O mercado mineiro se
rizonte como cidade da Indústria Criativa; consolidar
beneficia, uma vez que impulsionamos ideias a
densidade para o ecossistema de startups; fomentar a
serem transformadas em negócios, aumentando
criação de startups e promover interação com grandes
assim a competitividade da indústria mineira.
empresas e fundos; e proporcionar visibilidade global ao
polo de economia criativa de Minas Gerais.

40 Dezembro de 2016
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Para revitalizar e estruturar o espaço destinado ao uma educação focada no movimento de startups.
empreendimento, serão investidos até 60 milhões de reais. Estão trabalhando em parceria no projeto do P7
As obras devem começar no segundo semestre de 2016 Criativo a Federação das Indústrias do Estado de Minas
e serão concluídas antes de 2018. Segundo o governo do Gerais (Fiemg), o Serviço de Apoio às Micro e Peque-
estado, depois de reformado, o prédio de 25 andares con- nas Empresas de Minas Gerais (Sebrae Minas), a Com-
tará com espaço de coworking, laboratórios, auditórios, panhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Ge-
centro de pós-produção audiovisual, biblioteca, centro de rais (Codemig) e a Fundação João Pinheiro (FJP). Além
desenvolvimento de software, ambientes de locação para disso, o projeto conta com o apoio do San Pedro Valley,
pequenas e médias empresas, restaurante e café, além de e de empresários do segmento de tecnologia.

ECONOMIA CRIATIVA

Termo criado para nomear modelos de negó- no conhecimento e produzem bens tangíveis
cio ou gestão que se originam em atividades, e intangíveis, intelectuais e artísticos, com con-
produtos ou serviços desenvolvidos a par- teúdo criativo e valor econômico.
tir do conhecimento, da criatividade
Grande parte dessas atividades vem dos
ou do capital intelectual de indi-
setores de cultura, moda, design, música e
víduos com vistas à geração de
trabalho e renda. artesanato. Outra parte é oriunda do setor
de tecnologia e inovação, como o desen-
Diferentemente da econo-
volvimento de softwares, jogos eletrôni-
mia tradicional, de manufatura,
agricultura e comércio, a economia cos e aparelhos de celular. Também estão
criativa, essencialmente, foca o po- incluídas as atividades de televisão, rádio, cine-
tencial individual ou coletivo para produzir bens e ma e fotografia, além da expansão dos diferentes usos
serviços criativos. De acordo com a Organização das da internet (desde as novas formas de comunicação até
Nações Unidas, as atividades do setor estão baseadas seu uso mercadológico), por exemplo.

Parque tecnológico: um ambiente de


inovação e empreendedorismo
Em setembro de 2016, uma iniciativa realizada pela pré-aceleração e as quatro melhores foram escolhi-
no parque tecnológico de Belo Horizonte (BH-TEC) das para receber investimentos de 250 mil reais.
mostrou a importância do trabalho em rede dos agen- “O parque é um ambiente de inovação, que se propõe
tes do ecossistema de startups. Foi mais uma edição do a reunir os atores do sistema de inovação para facilitar a
Lemonade, um programa de pré-aceleração de startups troca entre eles”, explica a gestora executiva do BH-TEC,
promovido pela Fundepar (gestora de programas de in- Mariana de Oliveira Santos. Segundo ela, por aglutinar di-
vestimentos criada pela Fundação de Pesquisa e Desen- versas iniciativas e estar em contato com outros agentes do
volvimento – Fundep) e correalizado pela Secretaria de ecossistema, o parque não consegue existir dissociado do
Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Ensino Superior tecido de agentes do setor tecnológico da cidade.
de Minas Gerais, pela Techmall (aceleradora de startups) Os parques tecnológicos conceitualmente lidam
e pelo Sebrae Minas. Na ocasião, 40 startups passaram com empresas em vários estágios de desenvolvimento,

Dezembro de 2016 41
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Terreno onde funciona o BH-TEC é da Universidade Federal de Minas Gerais. Licitação para construção do segundo prédio está aberta

desde empresas nascentes até aquelas que já validaram Biotecnologia e Ciências da Vida. “Esse prédio está rela-
seu modelo de negócio e estão no mercado tentando tivamente cheio”, conta Mariana. E, sem novos espaços,
crescer ou criar novos negócios. “Elas podem ter um oportunidades são perdidas. Por isso, o BH-TEC está se
nível de maturidade maior, não sendo necessariamente preparando para um edital em busca de um parceiro para
startups”, conta Mariana. O diferencial é que as empre- construir e operar o próximo prédio. “Os prédios dos par-
sas abrigadas pelo parque são inovadoras e estão sempre ques têm a tendência de serem mais flexíveis e adaptáveis
desenvolvendo e aprimorando seus serviços e produtos. às necessidades das empresas. Mas como não é de nosso
“As startups têm muita flexibilidade para se adap- interesse fazer a gestão do espaço físico, buscamos um
tar e adequar seu produto à necessidade do cliente. Essa desenvolvedor privado que se associe ao parque e possa
lógica de uma empresa flexível, que consegue se adaptar construir e operar o segundo prédio”, afirma Mariana.
e fazer novos negócios e se reinventar ao longo de sua A expansão é necessária para o BH-TEC crescer
trajetória também é presente nas empresas de tecnologia e fazer com que ele dê ainda mais retorno para a so-
que atuam em mercados nacionais, mas que nascem com ciedade e a região onde está inserido. Mariana cita al-
uma mentalidade global. Entre as empresas do parque, guns números que mostram a importância do parque e
existem aquelas que exportam ou têm interação com o os resultados que ele já alcançou: “Nos últimos quatro
exterior. Mesmo aquelas que atuam exclusivamente no anos, as empresas do parque, juntas, faturaram mais de
mercado nacional têm que ser competitivas. Isso é uma 230 milhões de reais. E 10% desse dinheiro é investido
regra aqui das empresas do BH-TEC”, analisa. em pesquisa e desenvolvimento, um valor extremamen-
Atualmente, o primeiro prédio institucional do te alto mesmo para empresas de tecnologia. O total de
parque abriga 19 empresas de tecnologia, três centros imposto pago por elas também já retorna todo o investi-
de tecnologia e a Associação Nacional de Empresas de mento realizado pelo poder público no parque”.

42 Dezembro de 2016
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Conheça mais sobre o BH-TEC


O Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BH- Seus cinco sócios-fundadores fazem parte da estrutu-
TEC) é uma associação civil de direito privado sem ra de governança do parque. Eles se reúnem periodi-
fins lucrativos, de caráter científico, tecnológico, camente no Conselho de Administração para definir a
educacional e cultural, que funciona como um política de desenvolvimento, o planejamento e as es-
condomínio que abriga empresas que se dedicam tratégias do parque. Compõem ainda essa estrutura a
a investigar e produzir novas tecnologias e centros Assembleia Geral, o Conselho Fiscal e o Conselho Téc-
públicos e privados de pesquisa e desenvolvimento. nico Científico, além da Diretoria Executiva, que atua
na gestão e operação do parque.
Ele foi criado em 2005 pela parceria entre a
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Sempre que há espaço disponível e não há interesse
o governo do estado de Minas Gerais, a prefeitura das empresas residentes em se expandir, o BH-TEC
de Belo Horizonte, o Serviço Brasileiro de Apoio publica editais chamando os interessados em entrar
às Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais no parque. A empresa interessada submete um resu-
(Sebrae-MG) e a Federação das Indústrias de Minas mo do seu plano de negócio e sua motivação para es-
Gerais (Fiemg), que representam a tríplice hélice da tar dentro do parque. A seleção é feita primeiramente
inovação. Ele conta ainda com o apoio da Fundação pela Diretoria Executiva e pelo Conselho Técnico,
de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig) e que analisam as propostas, e depois há a deliberação
da Agência Brasileira da Inovação (Finep). no Conselho de Administração.

Entrevista com Mariana de Oliveira


Santos, gestora executiva do BH-TEC

Qual o papel de um parque tecnológico em um am-


biente de empreendedorismo e inovação?
O parque funciona como indutor do desenvolvimen-
to regional, na medida em que ele reúne empresas de tec-
nologia, centros de pesquisa públicos e privados e serviços
de apoio à atividade de tecnologia. Ele é um ambiente de
inovação, que se propõe a reunir os atores do sistema de
inovação para facilitar a troca entre eles. Os parques, em
geral, estão sempre próximos ou relacionados a universi-
dades, de modo que os pesquisadores e o conhecimento
gerado se transformem em novos negócios.
O principal desafio dos parques é criar uma iden-
tidade territorial e institucional para a inovação em de-
terminada região e facilitar a troca entre empresas, go-
Divulgação

verno e universidade, no sentido do desenvolvimento de


produtos de alto valor agregado.

Dezembro de 2016 43
Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê

Como é a articulação entre o parque tecnológico e com sucesso, o país terá um novo modelo de interação
os outros agentes do ecossistema? entre o setor privado e os parques e ambientes de inovação
Os ambientes de inovação precisam trabalhar em para otimizar essa fase de construção.
rede. Então, o BH-TEC está sempre em contato com as in- Do ponto de vista financeiro, os parques normal-
cubadoras de Belo Horizonte, da Região Metropolitana de mente nascem deficitários devido ao seu modelo de
Belo Horizonte, de Minas Gerais e do resto do país, assim negócio. A partir do momento que ele ganha escala,
como com outros parques tecnológicos de outras localida- e isso acontece no mundo inteiro, ele aufere um pou-
des e do exterior, e aceleradoras. O parque é um ambien- co mais de receita, não precisando tanto se preocupar
te que consegue aglutinar diversas iniciativas e que está com a sustentação da sua operação. Por isso a impor-
em contato com outros agentes. Ele não consegue existir tância de crescer fisicamente.
dissociado do tecido de agentes do setor tecnológico da
cidade. Não é possível atuar sem ser em conjunto. Nós Quais os benefícios para uma empresa de tecnolo-
atuamos vislumbrando todos esses parceiros e empresas gia ser residente no parque?
que estão surgindo nos diversos ambientes, mesmo porque Primeiro é a convivência com outras empresas de
todas elas poderiam, em última instância, vir ao parque ou tecnologia – isso é intangível e muito significativo. Elas
estar associadas de alguma maneira. dividem espaço com outras empresas que estão vivendo
desafios similares aos seus, trocam boas práticas, se tor-
Quais os desafios que o parque enfrenta para fo- nam amigas. Esse aprendizado mútuo é muito importante
mentar a inovação? e rico. Algumas, inclusive, passam a fazer projetos con-
Primeiro é a questão cultural. Essa cultura de intera- juntos. Aprendem coisas nas quais não são especialistas.
ção, colaboração e troca não é muito internalizada na nos- A convivência e a sinergia do contato diário e permanente
sa rotina ou na nossa forma de trabalhar. Mas ela é essen- é muito importante.
cial para ajudar a fomentar um ambiente de inovação. Por Acesso facilitado ao crédito. As empresas do BH-
isso, precisamos trabalhar para construí-la. Isso é difícil TEC, por exemplo, têm enquadramento automático, so-
de fomentar, principalmente porque as pessoas envolvidas mente pelo mérito de estarem no parque, a algumas linhas
nesse processo querem ver um retorno imediato. A cultura de financiamento do BDMG e do BNDES. O parque tam-
do give first (de abrir as portas e ouvir, de perceber que as bém promove articulações com fundos de capital, como
oportunidades podem vir de qualquer lugar) é uma ques- por exemplo o Primatec.
tão não muito comum no Brasil. Divulgação e relacionamento, porque a gente ajuda
Isso tudo se reflete nos mecanismos de interação, a dar voz a demandas das empresas de tecnologia, o que é
por exemplo, das universidades com empresas. Buscamos muito importante para empresas que são pequenas. O par-
construir mecanismos institucionais para promover inova- que ajuda a formar essa representatividade da empresa e
ção e novas formas de facilitar a interação entre eles. O também sua visibilidade, além da divulgação na imprensa.
parque tem uma proximidade com a UFMG forte. Mas é Apoio à internacionalização. O parque mantém con-
importante frisar que o BH-TEC pretende ser um parque vênios com ambientes de inovação no mundo todo, que as
da cidade, então outras universidades e faculdades podem empresas têm oportunidade de visitar, e onde podem fazer
manter convênio com ele. A relação com a UFMG é um pi- um soft landing ou buscar parceiros comerciais. Nós tam-
loto importante, por ser a principal universidade do estado. bém recebemos oportunidades de outros parques tecnológi-
Ainda do ponto de vista cultural, as pessoas desco- cos e divulgamos aqui, assim como disseminamos oportu-
nhecem os ambientes de inovação e o BH-TEC. Temos o nidades de empresas que estão em busca de parceiros. Essa
desafio de engajar no desenvolvimento do parque a popu- é uma tendência mundial forte: grandes empresas procuram
lação de Belo Horizonte e as pessoas que direta ou indire- os ambientes de inovação para prospectar novos parceiros e
tamente podem se apropriar mais dele. negócios com empresas de tecnologia e startups.
Outro desafio é o de construir o segundo prédio do Incentivos fiscais da prefeitura. O terreno do BH-
parque, trazendo a iniciativa privada para colaborar. A TEC é da UFMG e, por isso, isento de IPTU. Dessa ma-
proposta é ter um desenvolvedor privado que se associe ao neira, as empresas residentes no parque não pagam IPTU.
parque e possa construir e operar o segundo prédio, por- Em relação ao ISS, a prefeitura tem um programa pelo
que não nos interessa fazer a gestão do espaço físico. Esse qual empresas de tecnologia têm redução no pagamento, e
é um modelo novo para o Brasil, mas que a gente acredita as empresas de tecnologia do parque têm ainda um enqua-
ter muito potencial. Se conseguirmos superar esse desafio dramento facilitado nesse programa.

44 Dezembro de 2016
O papel do setor público
na construção de ecossis-
temas de startups

Divulgação
P
Felipe Matos*
oucos discordam da importância e do poten- falamos de um ambiente legal e burocrático que dê
cial de startups, empresas de base tecnológi- agilidade e flexibilidade para o surgimento, desen-
ca com alto potencial de crescimento, para volvimento e crescimento das startups, incluindo
o desenvolvimento econômico de regiões que as questões como captação de investimentos, atração
abrigam. Contudo, para que elas surjam e cresçam, de recursos humanos qualificados, gestão da proprie-
é preciso que haja todo um ecossistema de inovação dade intelectual, geração de negócios e exportações.
e empreendedorismo para apoiá-las. A segunda forma de atuação dos governos é
Um bom ecossistema é composto por dife- transversal. Embora não seja o governo a única en-
rentes recursos, organizados por tidade responsável por alguns dos
agentes e instituições que proveem “AQUI, FALAMOS DE demais pilares de formação de ecos-
um ambiente propício de estímu- um ambiente legal e sistema, como cultura, densidade,
lo a essas novas empresas. Itens burocrático que dê agili- talentos, diversidade ou capital, ele
como talentos qualificados (papel pode atuar de forma preponderante,
de universidades e centros de pes-
dade e flexibilidade para com iniciativas que os fortaleçam,
quisa), capital disponível (papel de o surgimento, desenvol- estimulem e incentivem – como
investidores-anjo, fundos de ventu- vimento e crescimento melhoria na educação; incentivo à
re capital e programas de fomento) das startups, incluindo cultura empreendedora, a espaços
e um ambiente regulatório adequa- questões como captação de coworking e ao investimento;
do (papel do poder público) são al- de investimentos...” programas de fomento financeiro a
guns deles. novos negócios; entre outros.
O Dínamo, grupo de policy Enquanto o ecossistema
advocacy sem fins lucrativos que busca dialogar avançou muito nos últimos 12 anos, em quase todos
com governos pela criação de políticas públicas mais os seus aspectos, muito pouco se evoluiu em relação
eficientes para o empreendedorismo de startups, do à regulação. Apesar de estarmos entre as dez maiores
qual eu sou orgulhosamente um dos fundadores, economias do planeta, estamos na posição 116 en-
mostra seis pilares que compõem um ecossistema de tre 189 países no ranking Doing Business, do Banco
inovação e empreendedorismo tecnológicos: capital, Mundial, que mede a facilidade de se fazer negócios
talentos, cultura, densidade, regulação e diversidade. em cada país. Em itens como abertura de empresas e
Quando pensamos no papel do setor públi- pagamento de impostos, estamos no 174º e no 178º
co no ecossistema, podemos imaginar duas formas lugares, respectivamente.
de atuação. A primeira delas, direta, passa pela re- Se considerarmos então as startups, de base
gulação (esta de sua competência exclusiva). Aqui, tecnológica e inovadora, questões como registro de

Dezembro de 2016 45
propriedade intelectual e facilidade para a atração Nesse cenário, predominam por parte dos
de investimentos passam a ser importantes e apre- governos as ações transversais, que são mais fá-
sentam um cenário desalentador no país. O prazo ceis de executar, embora tenham um impacto mais
de concessão de uma patente no Instituto Nacional restrito. Bons exemplos são o Start-up Brasil, do
da Propriedade Industrial (Inpi), por exemplo, pode qual tive a honra de ser diretor de operações entre
passar de dez anos. Em se tratando de investimen- 2013 e 2015, e o Seed, do governo de Minas. De-
to, a regulamentação de fundos é feita para inves- fendo a execução dessas ações sempre em forma-
timentos em grandes empresas e não em startups. tos de parcerias público-privadas, como ocorreu no
Ao receber um investimento de um fundo, uma star- próprio Start-up Brasil, que colheu resultados de
tup deve obrigatoriamente tornar-se uma sociedade muito êxito, por alavancar investimentos privados
anônima*, perdendo o regime tributário Simples e e potencializar o ecossistema ao fortalecer acelera-
tornando mais morosa sua gestão. doras de empresas privadas, tendo recebido reco-
Do lado dos investidores, a legislação traba- nhecimento nacional e internacional.
lhista é cruel com investidores pessoa física que, ao Vale destacar também como ponto positivo
se tornarem sócios, podem vir a responder pesso- a criação do Dínamo, já citado, formado por repre-
almente por passivos trabalhistas futuros da startup sentantes de diversas entidades da sociedade civil
(vale lembrar que a taxa de sucesso de startups é representando o ecossistema (startups, aceleradoras,
baixa, dado seu alto risco em função do alto grau investidores, empresas de tecnologia, espaços de co-
inovador). Para os investidores pessoa jurídica, os working etc.), que tem sido atuante junto a governos
impostos de renda sobre ganho de capital passam de para promover diálogos que resultem na melhoria
34%. Não há no país nenhum incentivo fiscal espe- nas políticas públicas pró-empreendedorismo.
cífico para o investimento em empresas inovadoras. É preciso simplificar nosso ambiente regulatório e
Enquanto quem deixa o dinheiro rendendo em títu- ampliar os incentivos e estímulos em todos os ní-
los do governo ou na poupança, que não geram ga- veis para que tenhamos um ambiente de real apoio
nhos para a economia real, têm descontos progres- às startups e ao empreendedorismo.
sivos no IR, o investidor de startups paga o valor Felipe Matos
cheio. Em muitas modalidades de investimento de Referência em empreendedorismo digital e de-
risco, também não se consideram os prejuízos com senvolvimento de startups. Fundador de empre-
investimentos malsucedidos, o que onera ainda mais sas, acelerador, investidor-anjo, gestor de fundo
o investidor. Enquanto isso, economias vizinhas, de investimentos, educador e gestor de políticas
como o Chile e diversos países mais desenvolvidos, públicas. Sócio-fundador da Startup Farm, maior
oferecem diversos incentivos, tanto para a empresa ace-leradora de startups na América Latina, e dire-
como para os investidores. Tudo isso contribui para tor-executivo do Dínamo, pelo qual são propostas
uma diminuição do capital disponível ou para a eva- políticas públicas de apoio a empreendedorismo.
são das empresas inovadoras, que acabam levando COO do programa Start­-up Brasil e co­fundador
do Instituto Inovação, da Inventta e da Inseed In-
suas sedes para o exterior, onde todo esse processo
vestimentos, gestora do Fundo Criatec. Membro
é muito facilitado.
do conselho da ABStartups, de conselhos empre-
Trata-se de uma questão ardilosa, que para ser sariais e voluntário em grupos de apoio ao em-
mudada exige muita vontade política e alinhamento, preendedorismo no Brasil. Premiado pelos leitores
tanto entre Executivo e Legislativo, como entre es- do portal Startupi entre os que mais contribuíram
feras municipais, estaduais e federal, por exemplo, para o ecossistema de startups brasileiro em 2013
para os temas tributários ou trabalhistas. Em tempos e 2014; considerado pela revista PEGN como um
de crise fiscal, há ainda menos espaço para a criação dos “7 chefões do empreendedorismo” no Brasil; e
de incentivos que afetam a receita pública. reconhecido pelo The Summit como um dos nove
superconectores da cena tech de São Paulo.
* A CVM publicou recentemente, em setembro de 2016, uma nova regulamentação para fundos menores, que simplifica sua gestão e permite o investi-
mento direto em sociedades limitadas. É um grande avanço no setor de investimentos, mas que, por enquanto, precisa de readequação dos fundos em
vigência para vigorar.

46 Dezembro de 2016
Em tempos de
crise, startups
são tiro certo

Divulgação
A
Yuri Gitahy*
té pouco tempo, falar sobre startups era res- Em 2010, uma startup criou uma nova refe-
trito a poucos e pequenos círculos. Recen- rência para os empreendedores brasileiros. O Pei-
temente, com a adoção cada vez maior da xe Urbano, criado por Júlio Vasconcellos (recém-
tecnologia no nosso dia a dia, startups são assunto na chegado do Vale do Silício) foi a primeira startup
mesa de almoço de qualquer profissional brasileiro. brasileira que adaptou bem um modelo de negócio
Isso é decorrência de um movimento recente, com já estabelecido lá fora, cresceu muito e dominou
conceitos ainda não compreendidos por grande parte rapidamente o mercado nacional. Esse é o concei-
das pessoas. to principal por trás de uma startup: um negócio
Até 2006, não existia muita com um forte aspecto de inovação,
referência nacional sobre o que seria “ DIVERSOS FUNDOS gerenciado para crescer muito rá-
uma startup. Isso aconteceu devido à INTERNACIONAIS pido, ter uma margem interessante
crise na economia digital no final do INICIARAM sua e dominar um mercado inteiro em
século XX, quando milhares de star- poucos anos.
atividade de
tups que proliferavam na América A boa fase econômica bra-
desapareceram no estouro da bolha
investimento em sileira daquela época, com a ban-
(como foi descrito o derretimen- startups brasileiras, deira de sucesso do Peixe Urbano,
to das ações na bolsa de valores da como Accel, Tiger e começou a atrair mais capital es-
Nasdaq). No Brasil, exemplos como Rocket Internet.” trangeiro. Diversos fundos inter-
Buscapé, UOL e Submarino são al- nacionais iniciaram sua atividade
guns dos poucos que resistiram a de investimento em startups bra-
essa crise e mantiveram seu crescimento. sileiras, como Accel, Tiger e Rocket Internet. Até
De 2006 em diante, empresas como Via6 e celebridades como Luciano Huck e Angélica se
boo-box (que receberam capital de risco da Confra- tornaram sócios de startups, e essa popularização
par e da Monashees, respectivamente) aos poucos do conceito concretizou a fase de maior avanço
foram servindo de inspiração para mais empreen- do cenário brasileiro de startups. Esse período de
dedores digitais tentarem criar negócios inovado- crescimento marcou o recente boom amplamente
res. O número de startups foi gradualmente cres- retratado pela imprensa, fazendo com que a palavra
cendo até 2009, mas normalmente eram tentativas “startup” ficasse tão popular.
de adaptar modelos de negócios estrangeiros ao Todo esse impulso chegou ao ponto de movi-
Brasil (em muitos casos, tratava-se de uma cópia mentar também o governo federal. Em 2012, o Mi-
tupiniquim sem melhorias concretas). nistério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI)

Dezembro de 2016 47
começou a planejar e implementar o edital Start- entre outros, esse movimento mostrou que a inova-
Up Brasil, que gerou uma multiplicação de acelera- ção aberta direcionada às startups em um momento
doras. Isso aconteceu porque o edital permitia que de crise seria uma ótima alternativa para diversifi-
empreendedores de todo o Brasil tivessem acesso cação de produtos e mercados. A contrapartida foi
a bolsas de pesquisa do CNPq, desde que apoia- ótima para empreendedores que realmente sabiam
dos por aceleradoras homologadas pelo MCTI. Os gerir uma startup: experimentação, custos baixos,
governos estaduais também se movimentaram para feedback constante do cliente e não dependência
apoiar startups, com programas públicos (entre eles de capital para começar a vender (mas sim para
o pioneiro e internacionalmente reconhecido Seed- crescer) tornavam a parceria com grandes empre-
MG, lançado na gestão anterior mas reformulado e sas uma excelente alternativa. Quando bem geren-
mantido pelo atual governo do estado). ciado, esse relacionamento tem gerado cada vez
Os dois anos seguintes foram marcados por mais frutos.
programas de incentivo estaduais e municipais em Ainda assim, hierarquia pode conflitar com
todo o Brasil. Infelizmente, o agravamento gradual autonomia, previsibilidade de receita conflita com
da crise econômica fez com que orçamentos fos- risco alto... por isso, a chamada “mentalidade star-
sem reduzidos, o movimento foi tup” é distante do meio corporati-
diminuindo e forçou até mesmo vo, e inovação não é uma coisa que
as aceleradoras a buscarem outras “ A CONTRAPARTIDA combina tanto assim com a cultura
fontes de receita – como cursos, FOI ÓTIMA para arraigada nas grandes empresas.
consultoria e gerenciamento da empreendedores que A conclusão importante é que, en-
aceleração custeados por grandes realmente sabiam gerir quanto grande parte das empresas
empresas. uma startup: a sofre com a crise, startups estão
Para piorar, a dificuldade experimentação, custos crescendo e contratando mais do
econômica fez diversos empreen- que nunca. Startups boas não se
baixos, feedback
dedores repensarem se deveriam retraem – crescem no mínimo 15%
mesmo deixar seus empregos para
constante do cliente e ao mês, e têm problemas constan-
impulsionar sua startup. Os juros não depender de capital tes para suprir seu crescimento
altos também reduziram a oferta para começar a vender ” com pessoal qualificado.
de capital de investidores-anjo, Fato é que muitas novas star-
porque a remuneração de fundos tups nascem para aproveitar justa-
DI se tornou bem mais segura que aportar capi- mente as oportunidades que a crise trouxe. A visão
tal em startups. Portanto, mesmo com o aumento de novos empreendedores (e cada vez mais jovens)
rotineiro de empreendedores iniciantes pensando pode ser a chave para a criação de um novo merca-
em novas startups, foi reduzido o percentual da- do, ou a conquista de um existente. Portanto, se você
queles que realmente estavam realizando um bom é um grande empresário chefiando uma empresa pú-
trabalho. Era cada vez mais difícil encontrar pro- blica ou privada, vale se aproximar e explorar novas
jetos viáveis. Basta perguntar aos fundos de inves- estratégias de mercado junto a startups que têm si-
timento em capital de risco, que possuem centenas nergia com seu negócio. E pense rápido, porque sua
de milhões de reais disponíveis mas não encon- concorrência provavelmente já está tentando. Um
tram projetos viáveis para investir na proporção ótimo começo é participar do CASE, evento anual
que esperam. que reúne todo o ecossistema brasileiro de startups
Também no período a partir de 2012, uma em um único lugar. Para saber mais, acesse http://
outra onda paralela se iniciava: grandes empresas case.abstartups.com.br.
começaram a falar sério sobre startups e iniciaram
a criação de programas corporativos de apoio a Yuri Gitahy
elas. Inaugurado pela Telefônica e pelo Bradesco, Investidor-anjo e fundador da Aceleradora.

48 Dezembro de 2016
Asstartups e as
organizações

Divulgação
Sérgio Rocha V. Motta*

O
lhamos para tudo à nossa volta e nos sur- tardio, com resultados insatisfatórios que, no pior
preendemos com as novidades, as tecnolo- caso, não garantem a sobrevivência da organização
gias, as novas formas de gestão, as novas no mercado, e, no melhor caso, não geram o valor
organizações etc. Essas surpresas, sob a ótica das diferencial que teriam se fossem feitas antes, de
organizações tradicionais, podem propiciar admira- forma pioneira.
ção, rejeição ou desprezo. No entanto, essas orga- Quando falamos de startups, parece aconte-
nizações não podem ignorá-las, não podem achar cer o mesmo. Startups são novas organizações que
que elas irão acontecer sem impactar seus negócios se estruturam sem hierarquias, de forma ágil, assu-
e sua existência de alguma forma. mem alto riscos, inovam de forma
Às vezes, as organizações “ MAS ESPERA AÍ: disruptiva, crescem rapidamente,
colocam o foco no exterior e se SE VOCÊ É promovem a colaboração criativa,
esquecem de olhar para o interior. da nova geração utilizam-se de home office ou co-
Ao deixar de ter uma visão holís- talvez não se working, entre outras coisas que
tica, na qual exterior e interior fa- surpreenda chamam a atenção. Se você é da
zem parte de um todo, não fomen- com estas coisas, nova geração, talvez não se surpre-
tam nem incentivam internamente para você elas talvez enda com essas coisas, que talvez
o empreendedorismo, a inovação sejam normais.” lhe sejam normais. Na verdade,
e as mudanças necessárias prove- quem se surpreende são aqueles
nientes dessas ações. Entretanto, é que vivenciaram ou vivenciam as
preciso que isso aconteça antes que o mercado ou a organizações tradicionais – e talvez até admirem a
concorrência tenham a iniciativa de inovar, afetan- certa distância as startups: “É tudo muito ‘bacana’,
do direta ou indiretamente seus negócios. Quando muito ‘legal’, mas eu acredito mesmo é no tradi-
isso acontece, a organização é impactada e muitas cional ‘aqui não, Juvenal’.
vezes, quando consegue entender o motivo, atua A questão é que as startups vieram para ficar,
reativamente às mudanças impostas pelo mercado, para resolver problemas e criar o novo, para mudar
buscando inovar ou copiar o novo modelo de negó- aquilo que todos achavam que seria eterno, para
cios, serviços ou produtos. impor uma nova velocidade a tudo e a todos – uma
Isso gera mudanças internas na organiza- aceleração inusitada. Tudo isso vai mudar a rea-
ção que, no entanto, virão talvez em um momento lidade de quem as executa e de quem as observa.

Dezembro de 2016 49
As empresas tradicionais que se colocarem apenas É preciso lembrar que, quando estamos fa-
na posição de admiradoras ou observadoras dessas lando de intrastartups, estamos falando de startups
startups correrão um grande risco em relação a sua que deverão nascer e crescer dentro das empresas,
existência, a seu negócio, a seus talentos, entre ou- corporações e organizações que, por natureza, es-
tros aspectos. tão enraizadas no sabor de regras, normas, hie-
Não seria então importante que essas or- rarquia, trabalho presencial, ambiente de trabalho
ganizações fossem proativas diante deste novo com divisórias e baias, punição, premiação e todos
cenário, deixando de olhar apenas para fora, es- esses hábitos comuns na grande maioria das orga-
perando e admirando o surgimento do novo que nizações tradicionais. Isso garante a estabilidade
vem de fora, e começassem a olhar e desenvolver delas, no entanto, não garante a sua sustentabilida-
internamente startups – o que alguns autores cha- de e longevidade.
mam de intrastartups – nos mesmos moldes das As novas e renovadas organizações já evo-
que veem externamente? luíram em sua maturidade total ou parcialmente:
As startups internas estão ligadas aos concei- flexibilizando sua forma de trabalho, abolindo toda
tos e às iniciativas do empreende- hierarquia ou parte dela; alterando
dorismo – neste caso o empreen- seu ambiente de trabalho para um
“ ...ESSAS TECNOLO-
dedorismo interno. Elas precisam modelo colaborativo, sem divisó-
então olhar para necessidades e
GIAS QUE JÁ chegaram rias, lugares marcados nem gave-
problemas dos clientes interno e
e outras que ainda vão tas, onde as pessoas olham para
externo das organizações, se colo- chegar necessitam ago- pessoas e não cantos; instituindo
car no lugar deles e pensar em solu- ra de percepção e con- o trabalho a distância, entre outras
ções inovadoras de negócios, sem cepção criativa que as mudanças.
se esquecer que poderão ser su- insiram em novos mo- Dentro desse contexto, ou-
portadas por tecnologias também delos de negócios, ser- tro aspecto importante é alocar o
inovadoras, tais como aprendiza- viços e produtos, e que perfil profissional adequado para
do de máquina, robôs inteligentes, (...) tenham como antí- liderar e atuar com inovação nessas
impressoras 3D e 4D, internet das doto a dose necessária startups internas. Geralmente, nas
coisas, computação em nuvem, de sagacidade, força e organizações tradicionais existem
blockchain, entre outras. atratividade...” certas preferências por um deter-
Essas tecnologias que já minado perfil padrão de profissio-
chegaram e outras que ainda vão nal que é requerido ou recomenda-
chegar necessitam agora de percepção e concep- do nas contratações ou promoções para atuar como
ção criativa que as insiram em novos modelos de executivo ou em cargos gerenciais na hierarquia.
negócios, serviços e produtos, e que, mesmo tendo Esses profissionais geralmente têm o perfil adequa-
riscos significativos, tenham como antídoto a dose do para garantir a situação atual e a estabilidade
necessária de sagacidade, força e atratividade para da empresa no formato tradicional, e lidam muito
superá-los, não podendo faltar ações ágeis e con- bem com inovações incrementais (a famosa melho-
tundentes que consigam superar as dificuldades e ria contínua). No entanto, não são adequados para
conquistar o mercado, gerando então resultados lidar com inovações disruptivas, que é o que deve
significativos. Quando esse conjunto de coisas faz ser feito no novo cenário das startups internas que
sentido, impulsiona as organizações a novos ru- as organizações necessitam fomentar e vivenciar
mos, aumentando sua sustentabilidade e rentabili- agora.
dade ao tornar seus negócios mais atraentes, dife- É preciso entender que o perfil dos colabora-
renciados, escaláveis e lucrativos. dores e líderes que irão atuar nesse novo cenário é

50 Dezembro de 2016
diferente. Existem novas habilidades que precisam O que importa é ter ideias e fazer o possível
ser levadas em consideração: uma empresa vale para torná-las uma realidade que mude a realida-
não pelo seu patrimônio ou pelo seu faturamento de atual; não desistir diante dos erros e fracassos;
atual, mas sim pela sua capacidade de geração de ser tolerante, resiliente e flexível para se adequar a
resultado positivo de valor presente líquido a partir novas ideias e aceitar alterações que acrescentem
de seu fluxo de caixa futuro. melhorias à ideia inicial. Afinal, conforme Tho-
O perfil para garantir o futuro da empresa mas Edison, “talento é 1% de inspiração e 99%
é aquele que possui caráter empreendedor, senso de transpiração”.
crítico, inteligência emocional, criatividade, empa- Se a questão era como as organizações tra-
tia e que não teme errar quando está incumbido de dicionais poderiam instituir um espirito ágil, cria-
inovar, visto que o erro faz parte do aprendizado tivo, colaborativo, flexível e inusitado visando à
(errar rápido para aprender rápido), nem fazer as inovação, o conceito de startups internas aparece
mudanças necessárias para atingir o objetivo pro- como uma boa resposta. Deve-se levar em consi-
posto ou novos objetivos que poderão surgir duran- deração que o processo de inovação nessas orga-
te o processo para gerar mais valor e um resultado nizações nem sempre tem a mesma dinâmica e ve-
mais satisfatório para o negócio. locidade que as startups impõem.
Em vez de profissionais “É COMUM É comum encontrar estruturas en-
generalistas ou especialistas, as ENCONTRAR gessadas que cerceiam a liberdade,
habilidades necessárias deverão dificultam as mudanças culturais e
ESTRUTURAS
compreender sua fusão: o chama- corroem a autonomia, dificultando
engessadas que
do perfil do profissional Modelo T os movimentos e as ações ágeis de
cerceiam a liberdade,
ou T-Shaped referenciado desde a curto prazo.
década de 90. No eixo horizontal,
dificultam as Existem algumas empresas
este deverá ter a capacidade de mudanças culturais e que já entenderam o recado e estão
compreender várias disciplinas e, corroem a autonomia, investindo em inovação utilizando-
no eixo vertical, deverá possuir dificultando os se de startups externas. As startups
conhecimentos sólidos em uma movimentos e ações internas, trabalhadas num ecossis-
determinada disciplina. ágeis de curto prazo.” tema separado da estrutura normal,
As startups internas, assim podem também alavancar rapida-
como as startups externas, deverão mente novos produtos, serviços e
ter liberdade para errar. Fundamental entender que modelos de negócio. No entanto, existem empresas
esses erros ocorrem em ambientes segregados, que em que essas iniciativas ainda não começaram a
permitem a verificação e a validação das ideias. A acontecer. Caberá ao futuro nos informar sobre o
empresa deverá ter a tolerância para conviver com destino delas.
erros que, se punidos, poderão levar a um bloqueio
de criatividade). Testar diante do novo e do desco-
nhecido poderá provocar falhas, acertos e adequa- Sérgio Rocha V. Motta
ções que vão, no final, conduzir ao sucesso. Administrador (UNA), MBA Executivo em
“De fato, não fracassei ao tentar, cerca de Governança de TI (UFLA) e pós-graduado em
Engenharia de Telecomunicações (Ietec), Adminis-
dez mil vezes, desenvolver um acumulador. Sim-
tração de Sistemas de Informação (UNA) e
plesmente encontrei dez mil maneiras que não fun- Gerência de Projetos (Ietec). Certificado Itil V2, Itil
cionam”, disse Thomas Edison. Nessa linha, Scott V3, Itil Expert, Itil Service Manager (Master v2) e
Adams disse: “Criatividade é permitir a si mesmo Cobit Foundation 4.1. Especialista III na Gerência
cometer erros. Arte é saber quais erros manter.” de Mudanças da Prodemge.

Dezembro de 2016 51
Quer ter sucesso?
Aprenda a errar!

Divulgação
P
Marina Trindade*

assei anos refletindo e estudando sobre pessoas para quebrar o modelo mental do “eu não posso er-
e suas relações com o trabalho. Gosto de ob- rar/fracassar” em estudantes e adultos.
servar atitudes e entender o que acontece por
trás delas. Nesse processo percebi que muitas pessoas Fracassamos ou desistimos?
vivem no “modo automático”: trabalham por traba- Tive a oportunidade de trabalhar em mais de
lhar, aproveitam o que dá no tempo livre e sentem-se 70 projetos nos últimos dez anos. Decidi analisá-los e
obrigadas a ter a vida que levam de segunda a sexta. cheguei à conclusão de que mais de 54% desses pro-
O que mais me incomodou ao observar a rela- jetos não deram certo. Será que eles foram um fracas-
ção das pessoas com o trabalho em várias indústrias so mesmo ou as pessoas/empresas desistiram deles?
de países e classes sociais diferentes Relembrei cada projeto em
foi o MEDO DE ERRAR. Não ser que trabalhei (desde projetos em
bem-visto pelos chefes e colegas de “TRANSFORMAR O multinacionais até projetos pesso-
trabalho, perder o emprego, ser cri- MAU RESULTADO EM ais) para entender por que alguns
ticado/questionado pelos outros são não deram certo e a minha conclu-
ruína ou aprendizado é
os maiores medos das pessoas. são foi: os projetos não deram certo
Mas, afinal, o que é errar? O uma escolha sua e você porque não tiveram continuidade,
que é fracassar? É realmente algo é o único responsável faltou conexão das pessoas com o
ruim? Eu atuava como consultora por ela” propósito deles e ninguém se dedi-
de inovação (e estava acostumada cou 100% para tirá-los do papel e
a errar muito!) quando conectei os realmente fazê-los acontecer.
pontos: somos educados desde pe- “Até que ele tentou, mas não
quenos a ver o erro como algo negativo e crescemos deu certo”; “E se não der certo? O que faço?”; “Não
com esse mindset. A não ser que você passe por um quero ser um fracassado”. Quantas vezes você escuta
processo de transformação profunda do seu modelo frases como essas no seu dia a dia? Comece a pres-
mental (o que aconteceu comigo ao trabalhar com tar atenção, pois elas são mais comuns do que você
inovação), você seguirá com o mesmo mindset para imagina.
o resto da vida. Não dar certo é quase sempre visto como fra-
Fiquei tão incomodada com o medo de errar casso, por isso temos tanto medo de tentar algo novo
das pessoas que perdi algumas noites de sono refle- e não dar certo; ninguém quer fracassar. Mas... você
tindo sobre o assunto há três anos. Desde então, tra- sabe o que a palavra fracasso significa? De acordo
balho como designer educacional, coach e mentora com o dicionário on-line Dicio, fracasso significa:

52 Dezembro de 2016
capazes de conquistar. O seu sucesso é diferente do
“1. Ausência de sucesso. meu, que é diferente do sucesso para seu colega de
2. Ação de fracassar, de não obter o que se trabalho, subordinado, chefe, vizinho, irmão, ami-
pretendia em qualquer âmbito da vida. go, namorado etc. Somos sete bilhões de pessoas
3. Derrota, insucesso. no mundo e somos COMPLETAMENTE DIFE-
4. Barulho causado pela queda de alguma RENTES uns dos outros, com sonhos diferentes.
coisa; barulho, estrondo.” Mudar a forma como você enxerga o erro é
(Disponível em: <https://dicio.com.br>. Acesso em 24 out. 2016) mudar a forma como você pensa e age, ou seja, o seu
modelo mental. Isso é complexo e difícil, não é uma
Fracassar é não obter o que se pretendia. Se o tarefa fácil! O primeiro passo para mudar é aceitar
que você tentou fazer não teve continuidade ou você que você não tem controle de nada e que tudo em que
não se dedicou 100% ao projeto, não pode afirmar você acredita foi construído a partir de experiências
que fracassou. As chances de você ter desistido do vividas ao longo da sua vida. Quando aceitamos isso,
seu projeto em vez de ter fracassado são bem maio- nos abrimos para o novo e começamos, aos poucos, a
res. Ele poderia ter dado certo, e muito certo! quebrar paradigmas, os quais transformarão profun-
Mas, se você não se sentiu conectado com o damente nosso modelo mental ao longo do tempo.
propósito do projeto, quer dizer que ele não fazia A forma como você fará a transformação do
sentido para você naquele momento da sua vida. seu modelo mental não importa. Você pode mudar
Nesse caso, você desistiu de forma consciente: havia de emprego, de país, conviver com pessoas diferen-
outros projetos que lhe trariam mais benefícios do tes, meditar, tirar um ano sabático, arriscar mais no
que aquele projeto em particular. emprego, abrir um negócio, fazer terapia/coaching/
Portanto, tire o peso do fracasso das suas cos- mentoria, ser voluntário, trabalhar por conta própria
tas! Muitas vezes você nem chegou a fracassar e, etc. Não há um único caminho, não existe fórmula
mesmo quando tiver certeza de que fracassou, apren- mágica. Acredito que todas as respostas estão den-
da com os erros que cometeu e siga em frente. Trans- tro de cada um de nós – só precisamos tirá-las do
formar o mau resultado em ruína ou aprendizado é inconsciente, trazê-las para o consciente, aceitar que
uma escolha sua e você é o único responsável por ela. temos limitações e identificar formas de trabalhar
Eu poderia trazer inúmeros casos de pessoas essas limitações para ter disciplina e foco e, assim,
famosas para exemplificar o que acabei de falar, mas alcançar nossos objetivos.
você pode encontrar facilmente esses exemplos ao Se o texto fez sentido para você, comece a agir
“dar uma googleada” rápida na internet (pesquise já! Não deixe para amanhã. O seu sucesso depende
por “pessoas que fracassaram e deram a volta por única e exclusivamente de você, mas para alcançá-
cima”). Poderia falar de mim também, pois já errei e lo você precisará errar e aprender muito. Você está
fracassei algumas vezes, zerei minha conta bancária, disposto a isso?
mas consegui dar a volta por cima financeiramente e
Marina Trindade
me sinto muito realizada e feliz com a vida que tenho Coach e consultora com foco em educação,
hoje. Porém, quero falar de algo mais relevante nes- desenvolvimento pessoal e execução de projetos.
tas últimas linhas que tenho. Fundadora da Aporé, aceleradora de pessoas que
Continuar um projeto até o final, se dedicar oferece programas de mentoria profissional para
100% a ele (seja pessoal ou de uma empresa), exige jovens. Tem experiência em inovação nas áreas de
que você não tenha medo de errar e fracassar. Não é design thinking, desenvolvimento de novos
negócios, open innovation e planejamento estraté-
à toa que desistimos tanto e temos o sentimento tão
gico. Economista (FEA-RP/USP) com especializa-
forte de fracasso. ção em Project Management (PMI) e em Psicolo-
Enquanto o medo do erro predominar em gia Social (Wesleyan University). Possui colunas
nossos pensamentos e atitudes, não será possível sobre inovação, educação e mentoria publicadas
alcançar o sucesso que tanto almejamos e somos em revistas e blogs na América Latina.

Dezembro de 2016 53
Existe um “ ” lado B
do empreendedorismo
digital

Divulgação
E
Evandro Oliveira*
m algumas situações, temos que ser radi- remos que os termos são equivalentes a outros usados
cais. Com alguns temas, não dá para co- há muito tempo. Vejo muita fumaça e pouco fogo,
meçar nenhum debate sem que os interve- ou, como dizíamos alguns anos atrás quando grandes
nientes tenham mais do que uma simples noção dos players de TI anunciavam um produto novo sem que
seus termos e situações específicas. Ser crítico a ele existisse, puro vaporware. Reconheço que gran-
um tema “da moda”, comparar algo que tem uma des startups existem: Facebook, Google, Orkut, Twit-
faceta de novidade (agora chamada de inovação), ter. Inovaram e viraram sucesso. Podemos alimentar
mas que não passa de “mais do mesmo”, é arrisca- a possibilidade de que o sucessor de Facebook esteja
do e complicado. próximo de nós ou estamos apenas vivendo numa bo-
Uma das dificuldades ao se tratar de temas lha, sem perceber2?
inovadores, que são atribuídos a empreendedores di-
gitais, está relacionada a “cutucar a onça com vara Pouca inovação
curta”, mostrar que termos modernos podem conter Tomando-se o maior exemplo atual de empre-
ideias bem conservadoras e antigas, além de ter que endedorismo digital, o Uber (serviço de locação de
entender em qual mundo vivemos e o que é inova- transporte com motorista, em nível mundial), numa
ção de verdade. Deve-se ter a perfeita dimensão de análise do empreendimento em si não existe diferen-
termos1 como aceleradora, angel investors, bootstrap- ça no serviço (desculpa, mas motorista cortês, balinha
ping, business angel, due diligence, early stage finan- e água não são diferenciais de inovação!). Considera-
ce, equity, incubadora, mentor, minimum viable pro- se que o serviço é uma evolução do táxi tradicional,
duct (MVP), private equity, spin-off, startup, venture e um avanço pelo uso de tecnologias mais avançadas
capital, entre muitos outros estrangeirismos. Caso do que o rádio PX e as centrais de rádio que abriga-
você queira debater o tema, e não domine os termos, vam os taxistas. O Uber, se é um case de sucesso do
será atropelado por alguém que pode saber menos do ponto de vista da inovação, é um retumbante fracasso
que você sobre o conteúdo, mas domina a verborragia do ponto de vista do negócio. Um prejuízo de US$
típica de inovações e modismos. 1,6 bilhão no primeiro semestre de 2016, processos
Entendo que todas essas condições demons- cíveis no mundo inteiro, países bloqueando o serviço,
tram, claramente, que a única inovação é o canal em ameaças à integridade física de parceiros. Perguntem
que as ideias, os serviços e até os produtos são dispo- aos “anjos” e investidores: onde está o sucesso?
nibilizados. Muito termo moderno e pouca novidade A inovação é, única e exclusivamente, relacio-
relacionada ao empreendedorismo tradicional. Se to- nada às novas tecnologias disponibilizadas e ao custo
marmos o significado desses termos, dessas expres- diminuído em relação a custos tradicionais. Sendo as-
sões, das atividades e da pirotecnia reinante, constata- sim, analogamente ao Uber, inúmeros outros serviços

54 Dezembro de 2016
estão sendo disponibilizados. Podemos citar: reboque Desde 2010, estudos vêm sendo realizados so-
de autos, caminhões com combustível, prestadores de bre o tema sucesso X insucesso desse tipo de empre-
serviços residenciais – todos, sem exceções, utilizam endimento, e os resultados gerais são assustadores.
os mesmos conceitos de empreendedorismo e até mar- As causas de mortalidade são várias. Existem núme-
keting tradicional. ros que indicam uma progressão na tendência de mor-
Cézar Taurion (2016), consultor sênior para talidade à medida que aumenta o número de sócios.
transformações digitais, em um dos seus artigos so- Mas sem dinheiro de investidores e sócios não é pos-
bre tecnologia e inovação3, fala com grande proprie- sível levar uma startup por muito tempo. A “mágica”
dade sobre a velocidade das mudanças e as surpresas talvez seja: “venda a ideia”, pule fora do negócio e
com as quais os setores tradicionais têm que lidar com deixe-o com profissionais.
grandes avanços tecnológicos e inovação nos canais Um estudo da Fundação Dom Cabral (FDC)
de oferecimento de produtos e informação. sobre as causas da mortalidade das startups brasilei-
O exemplo mais pujante que pode ser citado é ras revelou que ao menos 25% das startups morrem,
o caso Airbnb. Os executivos do setor hoteleiro nem definitivamente, antes do primeiro ano de vida7, e
imaginavam que um serviço similar ao negócio deles mais da metade desses empreendimentos digitais não
pudesse ser criado por meio de uma startup. Alguém completa quatro anos de existência. Em outro estudo,
conseguiu imaginar uma alternativa, arrumou um realizado pela Startup Farm, os números indicam que
“anjo” (designação moderna para mecenas) e a rea- os estudos da FDC são factuais, mas tímidos. Nele,
lizou. Agora o setor hoteleiro preocupa-se em como identificou-se que 74% das iniciativas encerram as
recuperar-se da pancada. Ainda que a tecnologia este- atividades em até cinco anos, e as causas estão mais
ja totalmente disponível aos hotéis, a recuperação vai relacionadas aos conflitos entre sócios e ao desalinha-
custar caro. Preocuparam-se com a concorrência que mento entre a proposta original e o interesse merca-
tinha visibilidade e não imaginaram uma concorrên- dológico do que a uma hipotética falta de aporte de
cia que não existia. capital ou investimento.

Fracasso Dinheiro fácil


O glamour sobre as startups tem perdido sua A rigor, não existe dinheiro fácil para empre-
força . Pelo menos alguns setores começam a mensu-
4
endimentos digitais. Existem milhões de ideias, mui-
rar suas taxas de sucesso e o que temos visto é alar- tas delas semelhantes ou até iguais em tudo, existem
mante. Algumas frases lidas em publicações voltadas investidores sem projetos consistentes à disposição e
para inovação e TI chegam a assustar: existe uma gama imensa de intermediários que bus-
▪ “A cada 4 startups, 3 vão falhar” (Wall Stre- cam um Uber para chamar de seu.
et Journal, 2012)4 Não sou afeito a analogias, mas aqui há uma
▪ “90% dos novos empreendimentos digitais que se encaixa perfeitamente no mundo das startups.
não terão a sorte dos outros 10%” (Forbes, 2015)5 A analogia é com o jogador de futebol. Existem mi-
▪ “Estimativas apontam 90% de insucessos lhões de agentes e empresários, alguns até gastam pe-
nas startups” (The Guardian, 2014)6 quenas fortunas e fazem investimentos de vulto para
Considerando que essas manifestações são da remunerar pai e mãe de um garoto de 12 anos que
mídia do exterior, imagina-se que esse catastrofismo possui vídeos fantásticos no YouTube. Esse garoto
ainda não tenha chegado ao Brasil. Mas não é bem o pode estourar após uns 5 ou 6 anos de investimen-
caso. Os exemplos no Brasil podem ser mais dramá- to. Daí em diante, é só alegria. Mas quantos garotos,
ticos. Especula-se que, de milhões de apps (resultados pais, mães, empresários, agentes, cartolas, técnicos
mais visíveis das chamadas startups de sucesso, ou existem e acham que sabem quem é o diamante? Mi-
daquelas que tiveram aporte) que foram finalizados lhares ou milhões. Quantos chegarão a ser um Ney-
e colocados em alguma store, nem 10% têm número mar? Nesta década? Um; dois. Quem sabe?
de downloads satisfatórios – sendo que raros são os A partir dessa analogia afirmo, com eleva-
casos que chegam a dar retorno e ser monetizados. do grau de certeza, que o mercado ou as iniciativas

Dezembro de 2016 55
direcionadas a obter startups de sucesso diante da Aquele pensamento de Glauber Rocha de
crítica e do público são como jogadores de futebol “uma ideia na cabeça e uma câmera na mão...” como
de 12 anos de idade. As incertezas são muito maio- suficiente para fazer e acontecer não pode continuar
res e mais prováveis do que as certezas no “maravi- prosperando, sob o risco de vermos boas ideias e ino-
lhoso” mundo dos empreendedores digitais em que vações de verdade, fundamentadas em pesquisa e de-
as aparências, a pompa e as circunstâncias iludem senvolvimento sérios, serem relegadas a um segundo
muita gente. plano, e de o país continuar patinando em inovação.
Resumidamente, temos que melhorar muito
Considerações finais os recursos existentes, principalmente para pesqui-
Diante dessas pequenas e até superficiais afir- sa e desenvolvimento, para que contribuam para a
mações, dizer que “todo cuidado é pouco” ou que sociedade como um todo. Temos que consolidar o
“cuidado com o andor que o santo é de barro” pode conhecimento no negócio e ter menos preocupação
parecer coisa ultrapassada, mas não é. Os valores in- com as tecnologias disponíveis. Devemos nos preo-
vestidos são elevadíssimos, os retornos financeiros e cupar menos com monetização e retorno de investi-
operacionais têm sido pífios. A bolha das startups e mentos (ficar rico rápido é complicado) e mais com
aceleradoras está aí. desejos e necessidades da população incluída digi-
Receio que a Geração Y, aquela que está na talmente. As aceleradoras e congêneres devem rever
“crista da onda”, que se julga autossuficiente para seus critérios e objetivos. Menos pirotecnia e mais
empreender individualmente, que bate no peito e não startups voltadas para saúde, educação, sustentabi-
aceita regras, hierarquia, modelos organizacionais lidade. Pensar um mundo novo com investimentos
testados durante décadas, pode ser (e está sendo) des- mais pesados em poucas iniciativas que tenham ino-
mascarada e desafiada. Existem evidências que po- vação de verdade. Muitos problemas de infraestru-
dem ser verificadas a partir dos projetos de startup tura merecem mais atenção do que projetos voltados
fracassados e que podem ter sua causa na falta de pre- para nichos e segmentos sem a perspectiva de retor-
paro da maioria dos candidatos a empreendedores di- no financeiro e operacional.
gitais. Quem falha é o empreendedor e não a startup8. Evandro Oliveira
De se lamentar, principalmente, é o fato de que Graduado em Administração. Pós-graduado (MsC) em
aceleradoras, anjos e assemelhados ainda não estejam Administração Pública e Tecnologias da Informação,
colocando a real para os aspirantes a empreendedores com ênfase em Segurança de Redes do Setor Público.
digitais. Ainda se vê muita ideia limitada ou repetida Professor nos cursos de Administração, Computação e
sendo apresentada como inovação. Ciência da Informação. Consultor, palestrante e
conferencista.

1- CURCIO, Renata. Glossário de empreendedorismo digital. Empreendedorismo digital, 02 ago. 2016. Disponível em: https://empreende-
dorismodigital1.wordpress.com/2016/08/02/glossario-termos-que-todo-empreendedor-precisa-sabe/. Acessado em: 21 out. 2016.
2- PERRIN, Fernanda. Moda das startups é desafiada por fracassos e falta de preparo dos jovens. Folha de S. Paulo, 21 jun. 2015.
Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/06/1645335-apos-serie-de-fracassos-onda-de-abertura-de-start-ups-enfrenta-
ressaca.shtml. Acessado em: 21 out. 2016.
3- TAURION, Cezar. Você escolhe quem faz a disrupção. Você mesmo ou os outros fazem por você! Linkedin, 15 set. 2016. Dispo-
nível em: https://www.linkedin.com/pulse/voc%C3%AA-escolhe-quem-faz-disrup%C3%A7%C3%A3o-mesmo-ou-os-outros-fazem-
taurion?trk=eml-b2_content_ecosystem_digest-network_publishes-132-null&midToken=AQH2x740rUjB5A&fromEmail=fromEmail&ut=1Bbf
p4uU8v6Ts1. Acessado em: 21 out. 2016.
4- CAGE, Deborah. The venture capital secret: 3 out of 4 start-ups fall. The Wall Street Journal. 20 set. 2012. Disponível em: http://www.
wsj.com/articles/SB10000872396390443720204578004980476429190. Acessado em: 21 out. 2016.
5- PATEL, Neil. 10 pontos para fracassar uma startup. Traduzido e adaptado por Ivan Bonillo. Techmall blog. 27 ago. 2015. Disponível em:
http://techmallsa.com.br/90-das-startups-fracassam-o-que-voce-precisa-saber-sobre-os-10/. Acessado em: 21 out. 2016.
6- CAROLL, Rory. Silicon Valley’s culture of failure... and ‘the walking dead’ it leaves behind. The Guardian. 18 jun. 2014. Disponível em:
https://www.theguardian.com/technology/2014/jun/28/silicon-valley-sartup-failure-culture-success-myth. Acessado em: 21 out. 2016.
7- CLICO. Por que 1 em cada 4 startups morre no primeiro ano de vida? Guia do empreendedor. Disponível em: http://www.guiaempreen-
dedor.com/1-em-cada-4-startups-morre-no-primeiro-ano-de-vida/. Acessado em: 24 out. 2016.
8- HASHIMOTO, Marcos. O que fracassa não é o negócio, é o empreendedor. Pequenas Empresas & Grandes Negócios. Disponível em:
http://revistapegn.globo.com/Revista/Common/0,,EMI334120-17141,00-O+QUE+FRACASSA+NAO+E+O+NEGOCIO+E+O+EMPREEND
EDOR.html. Acessado em: 24 out. 2016.

Nota do autor – Muito possivelmente, leitores que nunca viram um disco de vinil não entenderão a utilização do termo “lado B”. Faz parte das mudanças
culturais que estamos vivenciando.

56 Dezembro de 2016
Ensino de
programação
para crianças:
um investimento na educação
que fomenta o mercado

Divulgação
V
Gabriela Gasparin *
ivemos em um mundo cada vez mais digital. Daniel Cleffi, um dos sócios-fundadores da
O smartphone tornou-se nossa “extensão”: MadCode, avalia que a programação é a “língua
usamos o WhatsApp para nos comunicar, franca” do mundo moderno, que é eminentemente
o Waze para escolher trajetos, aplicativos de bancos tecnológico. Para ele, os que tiverem esse conheci-
para pagar contas. Serviços como o Uber revolucio- mento se destacarão dos demais. “Um médico que
nam profissões. Softwares transformam empresas. tiver esse conhecimento saberá melhor como usar
Tal avanço tecnológico é fruto de um mercado movi- a tecnologia a favor da cura, da democratização da
do por ideias inovadoras, a maioria vinda de startups. informação ou do bem-estar do paciente”, exempli-
Porém, ser protagonista nesta era fica. Cleffi sugere que saber pro-
digital exige preparo. Educadores e “ A PROGRAMAÇÃO É gramar hoje é um diferencial assim
especialistas recomendam o apren- como ser fluente em inglês foi no
O NOVO IDIOMA
dizado da linguagem dos computa- passado.
dores, vista como “o novo idioma do mundo moderno, O pensamento vai ao en-
global”, desde a infância. Nesse ce- que é eminentemente contro de ações tomadas por re-
nário, a MadCode acredita que, ao tecnológico. Saber presentantes de grandes potências
aprender a programar hoje, crianças
programar é ser fluente mundiais, como Estados Unidos e
e adolescentes terão um diferencial Inglaterra. Ninguém quer ficar para
competitivo no futuro. em tecnologia” trás na “corrida tecnológica”. Em
O ensino de programação 2013, o presidente dos EUA, Ba-
para jovens vem sendo defendido rack Obama, divulgou um vídeo à
globalmente. Um dos motivos é que as empresas nação pedindo que os jovens americanos aprenden-
precisam de pessoas capacitadas para o desenvolvi- dam a programar para que o país mantenha-se na
mento de novas tecnologias. Mas não é só isso. Na vanguarda tecnológica.
era digital, entender ao menos o básico da “língua Com o mesmo argumento, o Reino Uni-
dos computadores” é de utilidade para todos. do incluiu oficialmente, em 2014, aulas de pro-
Saber o chamado “pensamento computacio- gramação regulares na grade escolar básica. Em
nal” desde a infância é útil não só para futuros enge- 2013, ao anunciar o novo currículo das escolas,
nheiros de softwares. O conhecimento desenvolve o então ministro da Educação britânico, Michael
habilidades úteis a qualquer área, como raciocínio Gove, disse: “Isso elevará os padrões pelo globo
lógico, criatividade, trabalho em equipe e capacida- e fará com que nossas crianças possam competir
de de resolver e lidar com problemas. na corrida global.”

Dezembro de 2016 57
Mercado de startups Especialistas avaliam, sobretudo, que o caso
É claro que grande parte dessas medidas visa de sucesso israelense é mais relacionado ao forte trei-
a atender à crescente demanda da sociedade pelo namento militar existente no país (ao qual são subme-
desenvolvimento tecnológico. Tanto empresas con- tidos todos os jovens) e à determinação da população
solidadas como as chamadas startups precisam de do que a um sistema educacional estruturado.
profissionais qualificados para executar milhares Segundo reportagem publicada em julho de
de ideias e suprir com a tecnologia as necessidades 2016 no jornal O Estado de S. Paulo, muitos dos
humanas. empreendedores israelenses passaram por rígido
Ter contato com a linguagem computacional treinamento em unidade de inteligência e ciberse-
desde a infância permite que as habilidades para dar gurança do Exército. De qualquer forma, foi ne-
ordens à máquina sejam desenvolvidas e aprimora- cessário um contato inicial com a linguagem tec-
das ao longo dos anos. Em entrevista à rede de TV nológica para que esses jovens conseguissem criar
americana CNN em 2013, Bill Gates afirmou que negócios inovadores.
“entender como o computador funciona nos permite
saber o que é possível fazer e o que não é”. Desenvolvimento pessoal
Essa percepção proporciona segurança para Além de atender a demandas do mercado,
criar e desenvolver demandas de um mundo cada aprender programação desde cedo traz inúmeros be-
vez mais digital. Segundo Cleffi, o aprendizado de nefícios às crianças. Trata-se de inseri-las na nova
programação transforma meros consumidores de realidade tecnológica da vida humana.
tecnologia em criadores, transforma sonhadores em Dan Crow, entusiasta do ensino da progra-
inovadores. “Nossos alunos criam jogos, aplicativos mação para crianças, avaliou em artigo publicado
e sistemas reais que os motivam muito a estudar, a no jornal The Guardian em 7 de fevereiro de 2014
querer e aprender mais.” que essa forma de “raciocinar” como o computador
Não é por acaso que uma ONG alemã resol- combina matemática, lógica e algoritmos proporcio-
veu ensinar programação a refugiados naquele país na uma “nova forma de pensar sobre o mundo”.
em busca de capacitá-los para a demanda do merca- Nesse sentido, é disseminada a frase de Steve
do. De acordo com reportagem publicada em 2015 Jobs (dita em 1995 para o jornalista Robert Cringe-
no The Huffington Post, empreendedores da área de ley): “Todos deveriam saber programar, porque isso
tecnologia dos arredores de Berlim procuraram a or- nos ensina a pensar.” Na prática, programar exige
ganização interessados em recrutar refugiados. pensar nos processos em partes, de forma estrutura-
da, começando da parte mais simples para as mais
Nação das startups difíceis.
Um exemplo mundial de empreendedorismo Outro benefício é aprender desde a infância
tecnológico é Israel, conhecida como a “nação das a lidar com frustrações, uma vez que a escrita de
startups”. De acordo com o centro de pesquisas isra- códigos funciona por meio de tentativa e erro. “O
elense IVC, em 2015 eram mais de 5,4 mil empre- aprendizado mostra a eles que grandes feitos de-
sas do setor no país, que tem uma população de 8 mandam muita dedicação e foco, e os ensina formas
milhões de habitantes (como comparativo, no Brasil estruturadas e organizadas de identificar e solucio-
eram 4,1 mil startups em operação no final de 2015, nar problemas. Esse aprendizado vale para a vida”,
mas somos 200 milhões de habitantes). completa Cleffi.
Há vários exemplos de softwares de suces-
Gabriela Gasparin
so desenvolvidos em Israel. Entre eles estão o Jornalista e escritora. Tem experiência de mais de dez
aplicativo de navegação em mapas Waze, o clás- anos como repórter em veículos como o Portal G1, o
sico ICQ (de troca de mensagens instantâneas) e Agora São Paulo e o extinto Jornal da Tarde. Na Mad-
o Viber (de mensagens). Code, escreve sobre a importância do ensino de pro-
gramação para crianças e adolescentes.

58 Dezembro de 2016
Empreender
para o público
B2C ou B2B

Divulgação
E
Talita Lombardi *
m quatro anos como blogueira de tecnologia Públicas) se especializaram em divulgar startups na
e pessoa de negócios, tenho me deparado mídia, pois os usuários brasileiros ainda adoram con-
com diversas situações em que os empreen- sumir coisas que estão “em alta”. O desafio é con-
dedores têm ideias incríveis, focadas no público B2C seguir uma capa de revista quando sua empresa só
(business to customer), mas que no final das contas tem as linhas de código. Jornalistas querem números,
não conseguem usuários suficientes para validar seus conversões, entregas. É um mercado muito competi-
negócios. Para não fechar as empresas, esses empre- tivo e os empreendedores ainda estão aprendendo a
endedores pivotam os negócios para atender ao pú- lidar com ele.
blico B2B (business to business). A Diante desses aspectos, será
questão então é: por que é tão difícil que o mercado B2B é mais fácil? A
um negócio B2C? resposta é não, porém existem for-
Para responder a essa per- “ COMO EU VOU SER mas de o empreendedor conseguir
gunta, temos alguns conceitos que percebido nesse manter sua empresa até que consi-
podemos abordar, como: mundo de empreende- ga um maior investimento para es-
- Early adopters: são pessoas que calá-la e expandi-la. Desde que eu
dores querendo fazer
estão aptas ao uso de novas tecno- comecei a trabalhar com negócios,
logias. Elas testam e, se gostam do a mesma coisa?” há 16 anos, as formas de vender
produto ou serviço, compartilham- para clientes B2B mudaram muito,
no com os amigos ou o implemen- mas eu entendo que a essência é a
tam nas empresas em que traba- mesma. Hoje, temos e-mail, redes
lham. Porém, nem sempre é legal ter um perfil de sociais voltadas a negócios e muitos outros recursos.
usuário que adora novas tecnologias, pois, no Brasil, Isso, no meu ponto de vista, faz com que tenhamos
consumimos muitas startups de fora, “depreciando” mais acesso às pessoas que vamos precisar abordar,
o mercado nacional. porém todo mundo está fazendo isso e a grande per-
- User aquisition (aquisição de usuários): esse real- gunta é: como eu vou ser percebido nesse mundo de
mente é um custo que ninguém espera. Muitas pes- empreendedores querendo fazer a mesma coisa?
soas desenvolvem toda a empresa (os códigos) para A primeira dica é: as empresas precisam ino-
validar o mercado e se deparam com algo que nin- var e não sabem disso ou, se sabem, precisam apren-
guém gosta. O produto dele não é viral e é preciso der por onde começar. As startups podem ser o pon-
colocar mais investimento para que as pes-soas con- tapé inicial nesse processo e alguns grandes players
sigam enxergar sua ideia. Empresas de RP (Relações no Brasil já começaram a aproximação nesse merca-

Dezembro de 2016 59
do desenvolvendo programas internos para atração quando esse capital vem dos bancos, política instável
de startups e empreendedores, por meio das Hacka- e a inflação.
thons, que acontecem todas as semanas em diferen- Ainda assim, as oportunidades são infinitas
tes pontos do Brasil; há também editais do governo; quando você foca primeiro na construção de uma
e patrocínio a diversos eventos de fomento ao empre- base sólida e depois se aventura em mercados mais
endedorismo tecnológico. difíceis, com investimento próprio ou com inves-
Mas, se a ideia é ter uma startup B2B, a forma timento de terceiros. Lembre-se de que no Brasil
mais prática é conversar diretamente com essas em- temos que criar as oportunidades mostrando valor
presas e tentar se transformar em fornecedor delas, ao mercado. A maioria das startups não se espalha
pois, uma vez que você conquistou esse lugar, será como um viral de sucesso, mas é sensacional quando
muito difícil trocarem sua solução por outra. Dife- dá certo. Quem sabe teremos uma empresa unicórnio
rentemente dos usuários finais, empresas buscam es- em breve por aqui?
tabilidade com seus fornecedores, não cada dia uma Empreender é algo que está na moda, mas é
melhor oferta ou condição. de uma responsabilidade muito grande. Seja curioso,
Ainda sobre o mercado B2B, posso elencar al- coloque as mãos na massa, converse com pes-soas
gumas dicas para se sair bem nele, tais como: valide sobre a sua ideia e, quando tudo estiver fluindo, volte
seu negócio; mapeie o mercado; atue com geração ao mercado e ajude as outras empresas. Empreende-
de leads; venda sua ideia. Esse último ponto pode dor de verdade reinveste no ecossistema em que está
ser feito por meio de televendas, reunião presencial, inserido.
calls, e-mails ou outros formatos. Talita Lombardi
COO da Mobocity, startup brasileira que desenvolve
Para finalizar, podemos considerar diversos aplicativos para o dia a dia, e fundadora da Menina
outros fatores que não citei no artigo. Aqui no Bra- ExecutivaContent, plataforma de conteúdo premium
sil, qualquer empreendedor, B2C, B2B, P2P ou que sobre o mercado de empreendedorismo. Entre suas
atue sob outro modelo, vai encontrar dificuldades conquistas, destacam-se também o site StartupsStars,
com notícias exclusivas sobre o universo das startups,
burocráticas para abrir ou mesmo fechar a empresa,
seu e-book Sales Thinking, com foco no mercado
difícil acesso ao capital de risco, altas taxas de juros B2B, e o livro infanto-juvenil Jessica Rainbow.

60 Dezembro de 2016
Pensar TI

As startups
e seus ecossistemas
Dezembro de 2016 61
Pensar TI

As startups e seus ecossistemas, sob diferentes óticas, em artigos inéditos: o caso do Cen-
tro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife como um ecossistema de startups para
a área de Tecnologia da Informação e Comunicação; um mapeamento do ecossistema
de startups de softwares de Belém, PA; a discussão sobre aspectos jurídicos do direitos
societário, tributário, de propriedade intelectual, do consumidor e do trabalho envolvendo
o empreendedorismo; e uma análise sobre como o ecossistema de startups e as ações
62 governamentais podem contribuir para a consolidação das cidades inteligentes. Dezembro de 2016
Ecossistemas de startups:
O caso do Cesar com tecnologia da
informação

Luiz Pinheiro

Doutorando na Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP) na linha de pesquisa de Tec-


nologia da Informação (AATI). Professor no MBA da Universidade Mackenzie e no
MBA da PUCPR (campus Londrina). Revisor nos periódicos Gestão & Tecnologia
(RG&T) e Revista Eletrônica de Administração (REAd) e nas conferências interna-

Divulgação
cionais IFIP e-business, ALTEC e AMCIS. Página: http://www.luizpinheirojunior.com

RESUMO
A tecnologia da informação (TI) tem adentrado os processos de negócios de organizações públicas e privadas. Dado
esse contexto, iniciativas têm emergido para o desenvolvimento de empreendedores no segmento. O presente artigo
tem como objetivo explorar como o Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (Cesar) atua como um ecos-
sistema de startups (ES) para a área de TI. Ao analisar dados secundários, conclui-se que o Cesar atua como um ES
nos blocos de empreendedorismo, inovação e formação. Também se verifica que o desenvolvimento de um ES pode
beneficiar universidades e empresas e fortalecer o desenvolvimento local com reflexos nacionais e internacionais.

Palavras-chave: Ecossistema de startups. Tecnologia da informação. Empreendedorismo.

1. Introdução necessidades de consumidores tec- endedores do Google (Larry Page e


nológicos fomentam ideias empre- Sergey Brin) e do Facebook (Mark
Com o advento da internet e a endedoras para a abertura de novas Zuckerberg). Esses empreendedores
revolução tecnológica atual, novas empresas. têm uma visão distinta da constitui-
empresas têm entrado no mercado, Empresas tradicionais como ção empresarial, denominando seus
competindo em escala global. A fun- a General Motors (GM) e General empreendimentos como “startups”,
dação de novas empresas por jovens Electric (GE), centenárias de funda- que são pequenas empresas consi-
líderes com visão de longo alcance ção, têm mercados específicos e aten- deradas, na literatura, com funda-
tem modificado mercados, abrindo, dem consumidores em todo o mundo, ções e estratégias inovadoras, desde
inclusive, novas participações em com líderes e conselhos administrati- a origem.
bolsas de valores. vos em vários países, e traçam estra- O mercado de startups é com-
A partir de 1990, a área de tégias em larga escala. posto de pequenas empresas que es-
tecnologia da informação (TI) tem Diferentemente desse formato, tão em estágio inicial e visam a um
crescido em grande escala devido à há uma grande massa de empreen- modelo de negócio em grande es-
adoção global de devices por parte dedores que não possuem um capital cala com um possível crescimento
de organizações públicas e privadas, financeiro inicial estável, mas detêm em curtíssimo prazo (Sebrae, 2016).
influenciando a sociedade de forma ideias que podem revolucionar o Esse mercado tem movimentado um
geral. Dado esse contexto, novas mercado, como os casos dos empre- grande volume de negociações de

Dezembro de 2016 63
produtos e serviços: em 2014, foram no mercado. Estima-se que possuem de uma corporação já estabelecida no
aproximadamente 2 bilhões de reais menos de um ano de fundação e são mercado. Atua com estrutura pronta,
(G1, 2014). formadas por poucas pessoas. Essas direcionando apenas uma determina-
A atuação em conjunto de star- pequenas empresas estão em fase de da equipe de trabalho para um novo
tups que almejam objetivos em co- experimentação dos seus produtos ou projeto que visa à fundação de uma
mum tem fortalecido o setor, desde serviços desenvolvidos em seu plano empresa “filha”. Com outro formato,
a procura por recursos financeiros e de negócios (Sahlman, 1990). a iniciativa independente (II) é funda-
espaço físico até por apoio estratégi- O sucesso de uma empresa co- da inicialmente na projeção de um ou
co. Com isso, percebe-se que startups meça a aparecer após um período em mais empreendedores com ideias em
têm se organizado em arranjos locais atuação, por meio de variáveis mer- comum para iniciar as atividades de
com universidades, governos, insti- cadológicas, econômicas, de gestão, negócios. No entanto, uma empresa
tuições, associações e empresas, na planejamento, fornecedores e parcei- II tem maiores dificuldades iniciais
busca pelo desenvolvimento de no- ros. Os resultados definem a estabili- na sua constituição, por falta de estru-
vos negócios, o que torna possível a dade do empreendimento, fazendo-o tura, fontes de financiamento e amplo
formação de um ecossistema de start- migrar para uma nova estrutura or- planejamento estratégico. Ambos os
ups (ES). ganizacional, deixando de ser startup modelos visam à criação de empresas
Desenvolver o empreendedo- para tornar-se uma empresa de pe- que proporcionem produtos e servi-
rismo é um desafio para as univer- queno porte (Lussier, 1995). ços, e só se diferenciam em seu for-
sidades, e operacionalizá-lo para O desempenho dessas novas mato de constituição inicial (Shrader;
solucionar problemas locais leva ao empresas é estudado, pois muitas Simon, 1997).
surgimento de novos negócios prove- delas não conseguem sobreviver e Se a situação de fundação da
nientes de ideias surgidas em salas de se estabilizar no mercado. Entre o empresa for a partir de outra corpo-
aula e transferidas ao contexto local. primeiro e o terceiro ano, elas estão ração, grupo de pesquisa ou univer-
A universidade forma a mão de obra em fase de desenvolvimento dos pro- sidade, será caracterizada no modelo
e um ES pode prover a infraestru- dutos e podem sofrer dificuldades na spin-off, ou seja, gerada a partir de
tura para que conceitos de negócios distribuição por falta de confiabilida- uma ideia individual ou de um gru-
sejam aplicados na prática e para de e conhecimento da marca. Entre- po que propõe soluções. A formação
que novas empresas que buscam de- tanto, esse estágio está relacionado acadêmica é de suma importância
safios para mercados locais ou glo- amplamente ao conhecimento e a ca- nesse aspecto, pois faz uma integra-
bais sejam desenvolvidas. racterísticas do empresário: o empre- ção entre o conhecimento prático e
Com esse enfoque, o presente endedor, nesse caso, atua como cére- teórico, estruturando o pensamento
artigo tem como objetivo explorar bro da organização e é responsável de seus empreendedores. Uma em-
como o Centro de Estudos e Siste- por tomadas de decisões que podem presa spin-off recebe o apoio de rela-
mas Avançados do Recife (Cesar) influenciar a possível sobrevivência cionamentos institucionais que forta-
atua como um ES para a área de TI. futura dela. O nível educacional e a lecem a marca e se desenvolvem com
O artigo está estruturado em um bre- formação são características de casos toda a cadeia de parceiros de negócio,
ve referencial teórico conceituando de sucesso na gestão desses novos desde fornecedores até clientes (Le-
startups e o ES e, em seguida, um es- empreendimentos (Hudson; Schroe- mos, 2008).
tudo de caso com o Cesar e posterior der; Van de Ven, 1984). A limitação de recursos para
análise dos dados obtidos. Além de startups, novas empre- utilização, as múltiplas influências
sas do mesmo porte são apresentadas de competidores, a imaturidade, os
2. Startup: conceito na literatura como new ventures, que mercados e tecnologias dinâmicas
podem ser constituídas de duas for- são características de uma startup, o
O conceito de startup é utili- mas: a iniciativa de corporação (IC), que torna necessária a implantação de
zado globalmente para as empresas que é fundada a partir de outra empre- processos e rotinas nessas empresas.
que estão em período de iniciação sa, com apoio e fomento estruturado Pelo fato de a inovação tecnológica

64 Dezembro de 2016
ser um elemento importante, empre- modelo de empresas que surgem das • orientação empreendedora.
sas de tecnologia acabam destacan- necessidades de produtos com ênfase Espaços como coworkings têm
do-se, constituindo diversas startups em TI. Portanto, a globalização des- sido locais de grande inspiração em-
ou new ventures (Sutton, 2000). sas tecnologias fortalece a criação de preendedora nos quais pessoas com-
O desempenho superior e a hardwares e softwares que suprem as partilham escritórios e oferecem pro-
sustentabilidade de novos empreen- necessidades dos vários segmentos dutos e serviços, sendo considerados
dimentos estão relacionados aos re- da indústria, do comércio e da presta- espaços de trabalho colaborativo. A
cursos da empresa, destacando como ção de serviços (Bridigi, 2009). busca por investidores para suas em-
item importante, nesse aspecto, o co- O setor de TI representa um presas também proporciona contato
nhecimento (knowledge) e seus mé- grande percentual das startups cria- com aceleradoras, que são organiza-
todos de aplicação. O gestor (CEO) das no Brasil. Isso se verifica desde ções financiadoras desses projetos,
da startup é o detentor inicial desse a elaboração de trabalhos no perío- que poderão se tornar grandes empre-
recurso, portanto deve disseminar do acadêmico, que proporcionam a sas no futuro (Sebrae, 2016).
suas habilidades aos demais integran- criação de prováveis soluções que Um ES brasileiro é caracteriza-
tes de sua equipe, propagando uma se tornam softwares que poderão ser do pela união de organizações com
fusão de ideias alinhadas aos objeti- empreendidos futuramente. Univer- objetivos em comum, e nessa lista
vos em comum do negócio. As redes sidades especializadas em cursos de constam aceleradoras, governos e
de relacionamento com outras em- tecnologia tornaram-se polos geográ- entidades, investidores-anjo, incuba-
presas do mesmo ramo também favo- ficos de desenvolvimentos, e empre- doras, fundos de venture capital e até
recem esta fase inicial, pois integram sas do ramo mantêm-se próximas iniciativas de crowdfunding (Startu-
a startup com grandes corporações a esses locais para recrutamento de pi, 2016). O modelo de ES estadu-
que fornecem informações relevan- mão de obra qualificada, formação de nidense é muito difundido em várias
tes e suprem dúvidas ou dificuldades grandes equipes e apoio do conheci- partes do mundo, e o Vale do Silício,
de mercado (Noel; West, 2009). mento acadêmico-científico (Ribeiro; desde a sua formação, é visto como
No setor de tecnologia, aplica- Pimentel, 2009). um local que “respira empreende-
se inovação constantemente. Entre- dorismo e inovação”, o que tem sido
tanto, há um desenvolvimento de 2.1. Ecossistema de startups replicado em espaços empreendedo-
incertezas promovido pela tecnologia (ES) res no território brasileiro.
autodestrutiva. Para continuar nes-
se modelo competitivo, as empresas Juntos somos mais fortes! Pe- 3. Procedimentos metodológicos
desenvolvem produtos e soluções quenos empreendedores unem-se al-
atendendo a uma acelerada demanda mejando o cooperativismo empreen- A pesquisa utilizou uma
de mercado, obtendo alguns benefí- dedor. Alcançar resultados de sucesso perspectiva objetivista, por meio de
cios como aprendizagem frequente e em comum, aliados às necessidades um estudo de caso (Yin, 2013) com
novos projetos de desenvolvimento. de recursos estruturais, financeiros e a utilização de coleta de dados secun-
As empresas do formato startup são de mão de obra, leva grande parte dos dários. O período de coleta foi entre
promotoras desses eventos, dada a CEOs de startups a trabalharem em julho e setembro de 2016 por meio
criação contínua de tecnologias em conjunto e com parcerias (Román; do portal do Cesar, verificando pos-
fase de experimentação que podem Congregado; Millán, 2013). tagens institucionais em redes sociais
ser aceitas dependendo da avaliação Segundo o Sebrae (2016), a como Facebook e LinkedIn.
pelo público usuário (Kotha; Wa- formação de um ES é caracterizada Além disso, foi realizada uma
dhwa, 2006). pela busca em comum de: varredura nos gerenciadores de busca
O surgimento da informática • espaço físico; como o Google e um levantamento
junto à revolução das redes de com- • fornecedores; de notícias nos principais veículos
putadores, em parceria com a cone- • investimentos/investidores; de informação nacional (G1, UOL).
xão via internet, favoreceu esse novo • mercado consumidor; A pesquisa contou também com uma

Dezembro de 2016 65
coleta de vídeos e palestras do Cen- em áreas interdisciplinares voltadas Após a conclusão dessa etapa,
tro, postados no YouTube. para inovação, como engenharias, os docentes começaram a apoiar os
Após a coleta dos dados, cita- sistemas, tecnologia, design e ad- seus alunos não apenas em ques-
se que essa estratégia também pode ministração, com faturamento apro- tões teóricas, mas também em como
ser denominada como uma extensão ximado de 120 milhões de reais em operacionalizar conceitos da área de
da Netnografia (Kozinets, 2007). Os 2015. engenharia de computação por meio
dados foram tabulados no software O instituto está sediado no Por- do desenvolvimento de novas tec-
Atlas TI para verificar possíveis blo- to Digital de Recife (PE), que possui nologias. Atualmente, o Centro de
cos que se relacionam com o obje- aproximadamente 270 organizações Informática da UFPE tem a maior
tivo do artigo, evidenciando-se três ao seu redor, nas áreas de tecnolo- graduação na área de informática
categorias: empreendedorismo, ino- gia, inovação e empreendedorismo, do país e também o maior programa
vação e formação. sendo o Cesar apenas uma delas. de pós-graduação em informática da
Os dados não são confidenciais Atualmente, o Cesar possui filiais América Latina, com aproximada-
à organização, fato que a isenta de distribuídas pelo país nas cidades de mente 1.500 estudantes e cem pro-
qualquer situação de desconforto ou Curitiba (PR), Manaus (AM), Soro- fessores doutores.
de problemas que venham a prejudi- caba e São Paulo (SP) com a matriz Mesmo com essas iniciativas,
cá-la, e foram coletados em locais de sediada em Recife. muitos dos alunos que obtinham uma
acesso público. A triangulação dos   formação avançada deixavam o es-
dados ocorreu entre fontes secundá- 4. Análise dos dados tado de Pernambuco ou até mesmo
rias, mantendo a validade e confiabi- o país para trabalhar em outras or-
lidade da pesquisa. A análise dos dados está dividi- ganizações, pois faltavam empresas
da em três blocos, iniciando pela for- tecnológicas de ponta para abarcar a
3.1. O caso do Cesar mação de alunos que se tornam em- mão de obra qualificada. Essa situa-
preendedores, passando para a oferta ção foi solucionada com o adendo do
O Centro de Estudos e Siste- de suporte para a inovação e depois Cesar captando essa mão de obra e
mas Avançados do Recife (Cesar) para a comercialização de produtos e apoiando-a em projetos inovadores.
foi fundado em 1996 por um grupo serviços sustentados pelo empreen- Além disso, atualmente o Ce-
de sete professores do Centro de In- dedorismo. sar conta com a Faculdade Cesar,
formática da Universidade Federal residências em software e engenha-
de Pernambuco (UFPE), como uma 4.1. Formação (Cesar.edu) rias, especializações em segurança
instituição que desenvolve produtos da informação, design de interação,
e serviços gerados com inovação. Verifica-se que na fundação gestão ágil de projetos, Internet das
O Cesar visa a lucros como receita do Cesar foi realizada uma reforma Coisas (IoT) e mestrados profis-
no seu faturamento, que, no entanto, estrutural do currículo da graduação sionais em engenharia de software
não são divididos entre os acionistas, em TI na UFPE, observando disci- e design, sendo todos reconhecidos
sendo totalmente transferidos como plinas ministradas nas universidades pelo Ministério da Educação (MEC)
investimentos na própria organiza- de Stanford, Berkeley, Edimburgo, e pela Coordenação de Aperfeiçoa-
ção ou utilizados como capital de ris- Glasgow e no Massachutts Institute mento de Pessoal de Nível Superior
co nas empresas incubadas no insti- of Technology (MIT). Tal reforma (Capes).
tuto, caracterizando-se, dessa forma, demandou tempo para ser efetivada,  
como instituição sem fins lucrativos. pois vários professores tiveram que 4.2. Inovação
O Cesar não recebe nenhum cursar doutorado fora do país (PhD)
recurso financeiro governamental, o para obter formação de ponta, além O Cesar está envolvido em to-
que o leva a ser um instituto de ino- do tempo envolvido no alinhamento das as etapas de inovação por meio
vação autossustentado, agregando docente e aplicado das universidades de estratégias de inovação, redesign
aproximadamente 500 colaboradores estrangeiras. de negócios, construção de padrões

66 Dezembro de 2016
e modelos de novos negócios. Esse ou serviços e entrega para clientes. vendas de mais de 100 mil unidades.
fator colabora com o desenvolvimen- Proporciona incubação aos novos O LEV foi totalmente criado pelo
to de novos negócios, bem como fo- empreendedores de startups, for- instituto, o qual cobra royalties sobre
menta a abertura de startups. necendo estrutura, investimentos e sua comercialização.
Na área de inovação, o apoio na estruturação do modelo de
Cesar trabalha com design de no- negócios. 5. Considerações finais
vos produtos, processos e serviços, É possível evidenciar que,
trazendo a experiência do usuário nos últimos 20 anos, o Cesar contri- O presente artigo teve como
como uma competência para inovar. buiu para o desenvolvimento de apro- objetivo explorar como o Centro de
Realizam-se projetos de interação, ximadamente 30 novos negócios, Estudos e Sistemas Avançados do
cocriação e redesign com soluções empresas que resultaram de projetos Recife (Cesar) atua como um ecos-
centradas no cliente. O objetivo final de excelência na busca por soluções sistema de startups (ES) para a área
é criar experiências que melhorem a para os problemas do cotidiano. de TI. É possível evidenciar, por meio
vida das pessoas. Atualmente um dos projetos da análise dos dados, que a organiza-
No entanto, nessa área foi de novo empreendimento em que o ção do ES do Cesar conta com alguns
verificado que, além da etapa de en- Cesar vem atuando é o monitor de atores que são relevantes para esse
genharia, seja ela de produto ou de irrigação (MI), que visa a aprimorar processo, sendo eles a universidade e
processo, o ato de inovação requer a performance na agricultura acom- as empresas intermediadas pelo insti-
um profissional de outra área. Por panhando pivôs de irrigação. Mesmo tuto, conforme a Figura 01.
isso, junto com os engenheiros apre- limitado à infraestrutura de conexão É relevante ressaltar que
sentam-se os designers (no Cesar são brasileira, o instituto desenvolve so- não necessariamente o governo pre-
aproximadamente 60 designers), que luções que servirão para as conecti- cisa intervir de forma direta para a
desenvolvem, alteram e modificam a vidades de todas as regiões do Brasil, efetivação desse processo, sendo o
interface do produto ou serviço, sen- sendo gerenciado por dispositivos seu efeito indireto restrito à criação
do um diferencial nos processos de voltados para a Internet das Coisas de marcos regulatórios e a aspectos
inovação. (IoT). legais, o que torna o ecossistema au-
O instituto atribui ao proces- É relevante também citar tossustentado pelos próprios atores.
so de inovação o elenco de pessoas que o Cesar desenvolveu o LEV (Lei- Na pesquisa, também foi pos-
+ negócios + tecnologias como um tor Digital de Livros), em parceria sível identificar três blocos que são
conjunto de cooperação para o suces- com a Saraiva, com um ranking de relevantes para o sucesso de um
so. O Processo de Inovação
no Cesar (PIC), utilizado em
aproximadamente 200 pro-
jetos, é composto de quatro
etapas: 1. Estudos e pesqui-
sas, 2. Ideação, 3. Prototipa-
ção e 4. Avaliação.

4.3 Empreendedoris-
mo (Cesar.labs)

O Cesar.labs fo-
menta a criação de novos
empreendimentos, desde a Fonte: Elaboração própria a partir
criação do negócio até o de- de dados da pesquisa (2016)

senvolvimento de produtos Figura 1 — Modelo conceitual de ecossistema de startups – Cesar

Dezembro de 2016 67
ecossistema de startups: formação, da de efetivação de uma ideia para relevante para lançar a ideia no merca-
inovação e empreendedorismo. lançar no mercado. Inovar requer do e aguardar o modelo de negócio ser
A formação reconhece a neces- habilidades técnicas, mas também sustentável em longo prazo.
sidade de qualificação tanto por par- de design, o que torna esse processo A pesquisa propõe um modelo
te dos docentes, como por parte dos multidisciplinar conforme verificado conceitual de organização do ES na
alunos, identificando modelos inter- durante a pesquisa. área de TI (Figura 01), no qual atores
nacionais de sucesso e importando- Por fim, ao contar com líderes são relevantes e blocos conceituais de
os para o contexto brasileiro. Vale e colaboradores de formação sólida, formação, inovação e empreendedo-
ressaltar que os professores visam à tanto técnica como conceitual, no de- rismo auxiliam a alcançar os resulta-
aplicabilidade dos conceitos na práti- senvolvimento de novos produtos e de dos, como visto pelo Cesar ao longo
ca, o que leva ao desenvolvimento de serviços inovadores que venham para dos últimos 20 anos (desde 1996). O
novos produtos ou serviços. resolver problemas antes sem solu- presente estudo possui limitações pelo
O desenvolvimento de novos ção, é necessário empreender a ideia fato de ser qualitativo e analisar um
produtos e serviços é mediado pela e, nessa etapa, o empreendedorismo caso em específico, sugerindo estu-
inovação, item já ressaltado na for- apoiado por um centro de estudos, seja dos futuros sobre outros casos das de-
mação de futuros empreendedores por meio de incubação, seja por inves- mais regiões brasileiras ou verificando
que possuem uma base consolida- timentos ou apoio estratégico, torna-se ecossistemas de outros setores.

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68 Dezembro de 2016
Direito e empreendedorismo:
aspectos legais importantes aplicáveis
às startups

Nomaston Rodrigues Mota


Bacharel e mestre em Administração pela UFMG e graduando em Direito pela

Divulgação
UFMG. Trabalha na Prodemge desde 2005, atualmente na área de Educação a
Distância.

RESUMO
Startup é uma expressão para identificar novas empresas com ideias inovadoras, cujo negócio está ligado ao desenvol-
vimento de novos produtos e serviços. Por serem empresas inovadoras e buscarem um crescimento rápido, burocracias
que permeiam o negócio são vistas como contraproducentes. Entretanto, não se preocupar com esses aspectos, espe-
cialmente com as questões jurídicas, pode determinar o insucesso de uma empresa promissora. Este artigo apresenta
aspectos jurídicos relativos aos direitos Societário, Tributário, de Propriedade Intelectual, do Consumidor e do Tra-
balho que estão no dia a dia de um empreendedor. Não se pretende esgotar o conteúdo dessas áreas, mas introduzir o
empreendedor nesse mundo, a partir de uma linguagem compreensível para quem não é jurista.

Palavras-chave: Direito. Empreendedorismo. Startup. Principais aspectos.

1. Introdução se refere à forma como a startup gera dor de ter uma fonte de renda. Em-
valor para os seus stakeholders. Ele é presas, geralmente, atuam em nichos
A expressão inglesa startup sig- repetível quando permitir à empresa tradicionais de mercado, o que reduz
nifica começar algo. Contudo, ela tem entregar o mesmo produto ou serviço sensivelmente a incerteza quanto à
sido usada para identificar novas em- em escala potencialmente ilimitada, aceitação do mercado consumidor do
presas, criadas a partir de ideias ino- sem a necessidade de customização produto ou serviço comercializado, e
vadoras, cujo negócio esteja ligado para cada cliente; e escalável quan- têm como objetivo se manterem ren-
à pesquisa e ao desenvolvimento de do possibilitar um crescimento para táveis no longo prazo (Duton, 2012;
novos produtos ou serviços (Barroca, a empresa sem que isso implique Júnior, 2015).
2012). Vale, porém, destacar que nem aumento dos custos de operação. A Por se tratarem de empresas
toda nova empresa é, necessariamen- extrema incerteza, por fim, refere-se que têm na inovação o segredo do seu
te, uma startup. à dúvida quanto à sustentabilidade do negócio e como um de seus objeti-
Em uma concepção mais atual, negócio, ou seja, se ele irá ou não dar vos um crescimento rápido, aspectos
uma startup seria uma nova empresa certo (Gitahy, 2011). burocráticos inerentes ao mundo dos
que atua com um “modelo de negócios Diferentemente disso, um novo negócios são vistos geralmente como
repetível e escalável, trabalhando em pequeno empreendimento não nasce contraproducentes. Entretanto, a fal-
condições de extrema incerteza” (Gi- de um produto ou serviço inovador, ta de preocupação com esses aspec-
tahy, 2011). O modelo de negócios mas da necessidade do empreende- tos, especialmente aqueles ligados a

Dezembro de 2016 69
questões jurídicas, pode ser determi- sozinho ou acompanhado depende Participação respondem pelas dívi-
nante para o insucesso de uma nova desde questões pessoais até de ele- das sociais com seus bens pessoais,
empresa com um produto ou serviço mentos essenciais para um novo de maneira solidária e ilimitada. Isso
promissor. O conjunto normativo negócio, como recursos financeiros significa que, falindo o negócio, os
que regulamenta o mundo empre- e competências técnicas dos inves- sócios terão que usar seus bens pes-
sarial será um “companheiro” cons- tidores. soais para saldar eventuais dívidas da
tante de qualquer empreendedor. Por Uma das primeiras análises a se empresa (Aquino, 2010).
isso, desconsiderar o universo que fazer é considerar se a execução do A legislação civil apresenta
regulamenta um negócio é um erro objeto social ou a gestão do negócio nove tipos societários. Aqui, abor-
que pode ser determinante para uma depende de competências pessoais daremos somente cinco tipos: o Mi-
startup, ocasionando problemas que dos potenciais sócios. Empreender croempreendedor Individual; a Em-
podem inviabilizar o novo negócio, sozinho é viável quando é possível presa Individual de Responsabilidade
ou mesmo fazendo com que a em- terceirizar algumas atividades sem Limitada; a Sociedade Simples; a
presa perca ou diminua seu valor de prejuízo para o negócio. Caso contrá- Sociedade Limitada; e a Sociedade
mercado. rio, o caminho mais adequado será a Anônima. Os tipos societários Socie-
Nesse sentido, este artigo tem sociedade. Como exemplo, pode-se dade em Nome Coletivo, Sociedade
como objetivo apresentar os princi- citar uma clínica médica que realiza em Comandita Simples e Sociedade
pais aspectos jurídicos relativos ao um exame inovador criado por dois em Comandita por Ações não serão
empreendedorismo em cinco áreas médicos, que necessita dos dois co- tratados aqui por serem formatos
do Direito: Direito Societário; Direito nhecimentos para a realização dos pouquíssimo utilizados atualmente
Tributário; Propriedade Intelectual; procedimentos e a análise do exame. (Ashikaga, 2003) e desinteressantes
Direito do Consumidor; e Direito do Nessa situação, a execução do objeto para novos empreendedores por não
Trabalho. De antemão, é importante social depende pessoalmente de am- protegerem o patrimônio dos sócios
destacar que as questões jurídicas a bos. Sendo assim, o caminho mais em relação às obrigações da socie-
serem discutidas nas próximas pági- razoável será a sociedade. dade (artigos 1.039, 1.045, 1.091 do
nas não são as únicas que envolvem Outra decisão importante se Código Civil/2002). Por último, a
todo o universo legal das startups, refere ao tipo societário a ser ado- Sociedade Cooperativa não será tra-
mas são áreas que, se negligenciadas, tado ao registrar a empresa. Antes, tada por se configurar em um forma-
podem trazer grande prejuízo para o porém, de apresentar os tipos socie- to distinto não aplicável ao contexto
empreendedor. Além disso, não se tários, deve-se comentar que, mesmo das startups.
tem a pretensão de se esgotar o con- na situação de um empreendimento O primeiro tipo é o Microem-
teúdo das áreas jurídicas supramen- não registrado junto ao órgão compe- preendedor Individual (MEI), forma-
cionadas, mas de introduzir o empre- tente, ele será, ainda assim, regulado to regulado pela lei complementar
endedor nesse mundo a partir de uma por lei (artigos 986 a 996 do Código 123/06. Diferentemente das demais,
linguagem compreensível para quem Civil/2002). São os casos da Socie- o MEI não é uma pessoa jurídica
não é jurista. dade em Comum, também chamada (PJ), mas uma pessoa física que tra-
de sociedade de fato ou irregular, e da balha por conta própria e se legaliza
2. Direito Societário Sociedade em Conta de Participação como pequeno empresário. Em razão
(Aquino, 2010). Em ambos os casos, disso, o MEI não goza de algumas
Diante da oportunidade de um as empresas não possuem personali- proteções legais direcionadas às pes-
negócio promissor, umas das primei- dade jurídica: a primeira por não pos- soas jurídicas. Para adotar esse for-
ras decisões de um empreendedor é: suir contrato social e a segunda pela mato, é necessário que o faturamento
empreender sozinho ou com sócios? falta de interesse dos sócios no regis- anual do MEI seja, no máximo, de
Assim como para outras decisões tro. Como consequência, os sócios R$ 60 mil, além de ele não poder
empresariais, não existe uma respos- da Sociedade em Comum e os sócios possuir mais de um estabelecimen-
ta certa. A decisão entre empreender ostensivos da Sociedade em Conta de to ou participação em outra empresa

70 Dezembro de 2016
como sócio ou titular (Brasil, 2006). na junta comercial e se inscrever na da empresa proporcionalmente à sua
Apesar de não ser pessoa ju- Receita Federal, na Secretaria de Fa- participação social. Consequente-
rídica, o MEI pode possuir CNPJ, o zenda do Estado e na prefeitura. Não mente, a remuneração também será
que possibilita a abertura de conta existe limite para o faturamento de proporcional ao investimento feito
bancária e obtenção de empréstimos uma Eireli. Entretanto, caso o em- por cada um.
em nome da pessoa jurídica, além presário deseje obter as vantagens do Uma característica importante
de viabilizar a emissão de notas fis- Simples Nacional, ele deverá adotar a sobre a Sociedade Limitada se refere
cais. Ele poderá, também, optar pelo configuração de microempresa (ME), ao quórum para deliberação de ma-
Simples Nacional, contribuindo com cujo faturamento anual deve ser, no térias relevantes para a empresa. Em
valor fixo mensal de, no máximo, R$ máximo, de R$ 360 mil; ou Empresa algumas decisões, exige-se a aprova-
50,001, dependendo do setor de atu- de Pequeno Porte (EPP), cujo fatura- ção de, no mínimo, 3/4 do capital3,
ação, e obter a isenção de tributos mento anual tem que estar entre os li- como por exemplo a fusão da socie-
federais. A formalização do MEI é mites de R$ 360 mil e R$ 3,6 milhões dade com outra. No caso específico
gratuita e é feita por meio do Portal (Junta Comercial do Paraná, [201-?]; da designação do administrador, exi-
do Empreendedor, na internet (Portal Brasil, 2006). ge-se a aprovação de 2/3 do capital
do Empreendedor, [20-]). O terceiro tipo societário é a social. Em outros, como a aprovação
O segundo tipo societário é a Sociedade Limitada, empresa cons- das contas do administrador, exige-se
Empresa Individual de Responsabi- tituída por duas ou mais pessoas por aprovação de mais de 50% do capital
lidade Limitada (Eireli). Trata-se de meio de um contrato social, que deve social (Brasil, 2002).
pessoa jurídica constituída por ape- ser registrado na junta comercial. É A Sociedade Anônima (S/A),
nas uma pessoa: o próprio empresá- necessário também que a empresa por sua vez, é uma forma jurídica na
rio. Teve como propósito extinguir a se inscreva na Receita Federal (para qual o capital não está atribuído a um
prática do chamado “sócio laranja”, obter CNPJ), na Secretaria da Fa- sócio específico, mas está dividido
estratégia usada para burlar a lei, que zenda (para obter inscrição estadu- em ações que podem ser negociadas
só permitia a constituição de socie- al) e na prefeitura (para obter alvará livremente na bolsa de valores, sem
dade limitada com, no mínimo, dois de funcionamento). a necessidade de escritura pública.
sócios (Sebrae, 2016). O nome da empresa deve ser Pode ser composta por dois ou mais
Comparativamente ao MEI, a formado pela denominação (nome acionistas e ser classificada como
Eireli possui vantagens por possuir que designa o objeto da empresa, aberta ou fechada, se suas ações são
personalidade jurídica. Uma delas é podendo incluir também o nome ou não negociadas na bolsa de valo-
a segurança jurídica em razão da se- dos sócios) ou pela firma (nome de res (Brasil, 1976).
paração dos patrimônios do sócio e um ou mais sócios, por extenso ou A lei que regula as S/As é bem
da empresa, o que significa que, em abreviado, de modo indicativo da re- detalhista, tratando desde a definição
regra, as dívidas da Eireli deverão ser lação social), seguidos ao final pela do objeto social e a denominação até
saldadas exclusivamente pelos bens e palavra “limitada” ou sua abreviatu- de aspectos contábeis, como escri-
direitos da pessoa jurídica, não afe- ra. É o tipo societário mais utiliza- turação e critérios de avaliação de
tando o patrimônio pessoal do sócio do no Brasil, seja pela simplicidade ativos. Apesar do preciosismo nor-
em caso de falência.2 de operação, seja pela proteção mativo, a S/A é um formato bastante
Para criar uma Eireli, o empre- dada ao patrimônio dos sócios (Pi- utilizado e testado na realidade brasi-
sário deve investir capital mínimo de nheiro, 2009). leira, o que oferece ao acionista segu-
cem vezes o valor do maior salário- O capital da sociedade é di- rança quanto ao retorno sobre o seu
mínimo vigente no país, sendo ne- vidido em quotas, sendo que cada investimento. Como exemplo, vê-se
cessário registrar o contrato social sócio será responsável pelas dívidas que a responsabilidade do acionista
1 Os valores de contribuição são atualizados anualmente, de acordo com o salário mínimo.
2 A exceção a essa regra se refere à desconsideração da personalidade, hipótese adotada quando ocorre abuso da personalidade jurídica, causado por desvio
de finalidade da empresa ou confusão patrimonial entre bens e direitos do sócio e da empresa.
3 Os votos também são proporcionais à participação de cada sócio no capital social da empresa.

Dezembro de 2016 71
quanto às dívidas da empresa se res- gistro do contrato social da Socie- de uma maneira de resguardar o valor
tringe às ações de fato subscritas no dade Simples é feito no cartório de patrimonial de uma empresa que tra-
capital social da empresa. registro civil de pessoas jurídicas em balha com produtos e serviços inova-
Quanto ao nome, ela poderá as- vez de na junta comercial. Além dis- dores, uma vez que ele está mais nos
sumir qualquer denominação, desde so, as sociedades simples não estão ativos intangíveis do que no valor no-
que não seja idêntica a de outra em- sujeitas à falência e não podem solici- minal do patrimônio físico.
presa já existente, e deverá ter as ex- tar recuperação judicial, uma vez que A PI é o ramo do direito que
pressões “Companhia” ou “Socieda- esses institutos jurídicos se aplicam “garante a inventores ou respon-
de Anônima” no final (Brasil, 1976). somente ao empresário e à sociedade sáveis por qualquer produção do
O registro do seu estatuto, bem como empresária (MPSP, 2003). intelecto o direito de obter, por um
dos seus demais atos, deve ser feito Outra diferença é que a socie- determinado período de tempo, re-
na junta comercial do estado. dade simples poderá ser limitada ou compensa pela própria criação”
Por possuir uma legislação exi- ilimitada, dependendo do que estiver (ASPI4, [201-?]). Trata-se das normas
gente, é necessário avaliar se esse é previsto no contrato social. A lei deixa jurídicas que conferem ao detentor
o tipo adequado para o seu negócio. a cargo dos sócios a decisão quanto à dos direitos de PI proteção quanto ao
Deve-se ponderar se o custo/bene- corresponsabilidade pelas obrigações uso indevido de invenções, marcas,
fício de se estar sob uma regulação da empresa. Havendo previsão no desenho industrial, trabalhos literá-
detalhista e em um tipo societário contrato social, a responsabilidade rios e artísticos, programas de com-
maduro supera a adoção de um tipo será limitada. Caso contrário, eles te- putador, entre outros.
societário mais simples, mas com ris- rão responsabilidade ilimitada. As normas relativas à PI regu-
cos maiores quanto ao investimento Quanto à adoção do tipo so- lam uma série de situações. Entre-
feito (Jucemg, 2015). cietário, não existe uma fórmula que tanto, neste trabalho serão tratados
Por fim, o último tipo societá- indique ao empreendedor qual é a somente alguns pontos relativos à
rio é a Sociedade Simples. Diferen- melhor opção. O importante nessa marca, aos direitos autorais, a paten-
temente das demais, a lei não reco- escolha é analisar as singularidades tes, ao desenho industrial e ao segre-
nhece a Sociedade Simples como de cada empreendimento e a vontade do de negócio.
sociedade empresária, uma vez que dos sócios para se definir o formato A marca se refere aos sinais dis-
suas atividades são de natureza inte- mais adequado. Vale ressaltar que, tintivos visualmente perceptíveis, não
lectual, científica, literária ou artís- nesse momento, é importante consul- compreendidos nas proibições legais.
tica (Brasil, 2002). A principal dife- tar um advogado para receber orien- São elementos possíveis de serem
rença entre uma sociedade simples e tação especializada, uma vez que ele apreendidos pela visão e que permi-
uma sociedade empresária é que, na terá outros conhecimentos além dos tem distinguir um fornecedor ou um
primeira, as atividades da empresa expostos aqui. produto de outro. Como se percebe
são realizadas pelos próprios sócios pela definição legal, o Direito bra-
e estão vinculadas à profissão deles. 3. Propriedade Intelectual sileiro não admite outros estímulos
“A sociedade empresária, por sua além dos visuais como formadores
vez, pode exercer qualquer ativi- Para uma startup, a proteção de uma marca, como, por exemplo, o
dade econômica organizada para a à Propriedade Intelectual (PI) é um ronco de um motor ou um cheiro es-
produção e/ou circulação de bens ou tema essencial. A maioria dessas pecífico. Inclusive, traz uma lista de
de serviços”, independentemente da empresas tem, na inovação, o seu di- sinais que não são registráveis como
profissão dos sócios (Caetano Advo- ferencial competitivo. Por isso, pro- marca no Brasil (Brasil, 1996).
gados, 2012). teger o chamado ativo intangível da A proteção jurídica da marca
As diferenças com os demais sociedade pode significar dar ao ne- assegura ao titular do direito o uso
tipos empresariais não se resumem gócio os meios necessários à sua so- exclusivo dela em todo o território
apenas a aspectos conceituais. O re- brevivência no longo prazo. Trata-se nacional. Associar uma marca a um
4 Associação Paulista de Propriedade Intelectual

72 Dezembro de 2016
produto ou serviço desejado pelo trataremos serão os direitos autorais. torgados pelo Estado aos inventores
consumidor não é algo fácil e sim- Trata-se de um conjunto de normas ou autores ou outras pessoas físicas
ples e nem se consegue isso em pou- jurídicas que conferem “prerrogati- ou jurídicas detentoras de direitos
co tempo. Com o registro da marca, vas [...] à pessoa física [...] criado- sobre a criação” (CIT, [20--?]). É um
o titular pode explorá-la comercial- ra da obra intelectual, para que ela documento que possibilita ao inves-
mente, obtendo o retorno feito para possa gozar dos benefícios morais e tidor obter uma vantagem competiti-
se ganhar a confiança do consumi- patrimoniais resultantes da explora- va em relação aos seus concorrentes
dor. Vale destacar que no Brasil o ção de suas criações” (Ecad, [20-- em razão do investimento financeiro
órgão responsável pelo registro de ?]; Brasil, 1998). O objetivo dessas feito em pesquisa e desenvolvimento.
marcas (Inpi – Instituto Nacional da normas é garantir a autores e divul- Entretanto, para se registrar uma pa-
Propriedade Industrial) considera, gadores instrumentos que permitam tente, é necessário que o produto pos-
ao analisá-la, o segmento de atuação explorar comercialmente obras inte- sua os requisitos de patenteabilidade
do empreendedor. Assim, é possível lectuais, recuperar o capital investi- previstos em lei, que são: a) novida-
a existência de marcas similares de do nelas, além de assegurar o respei- de: o objeto novo ou ainda não reve-
empresas que atuam em segmentos to à autoria. lado; b) atividade inventiva: o objeto
diferentes. O requisito para isso é que Os direitos do autor são divi- não é resultante de mera combinação
as duas marcas não confundam o con- didos em morais e patrimoniais. Os de fatores já pertencentes ao estado
sumidor, como, por exemplo, no caso morais são direitos da personalida- da técnica; e c) aplicação industrial:
da marca Fox, que no Brasil se refere de, sendo, portanto, pessoais (vincu- o objeto com aplicação seriada in-
a um veículo da Volkswagen e tam- lados àquele que criou), inalienáveis dustrial em qualquer meio produtivo
bém a um canal de TV por assinatura. (não são passíveis de disposição (Fiocruz, 201-?).
Por atuarem em segmentos distintos gratuita ou onerosa), irrenunciá- Com a patente, o Estado reco-
e não confundirem o consumidor, as veis (o autor não pode abdicar do nhece ao titular o monopólio de de-
duas marcas coexistem no mercado, seu direito), perpétuos (podem ser terminada tecnologia por um certo
mesmo sendo iguais. reivindicados a qualquer tempo) e período de tempo, tendo como con-
O registro da marca tem valida- imprescritíveis (não se extinguem trapartida a inclusão do invento em
de de dez anos, podendo ser prorro- com o decurso do tempo) (Amaran- banco de dados público aberto para
gado por períodos iguais e sucessivos te, 2014). Sendo assim, só podem ser pesquisa e experimentação. É uma
indefinidamente (Brasil, 1996). O exercidos pelo autor. forma de fomento à inovação, dado
registro protege a marca no território Já os direitos patrimoniais são que a exploração comercial exclusiva
nacional, não produzindo efeitos em aqueles que asseguram a explora- garante retorno significativo ao titular
outros países. Caso o empreendedor ção econômica exclusiva da criação. da patente.
queira registrar a marca em outros pa- São direitos que pertencem ao au- No Brasil, são patenteáveis
íses, ele deverá fazer um pedido em tor; entretanto, ele pode transferi-los as tecnologias que se enquadram
cada um. a terceiros para que estes possam em duas categorias: a) invenção:
Antes de efetuar o registro da explorá-los comercialmente em seu ideia nova que permite solucionar
marca, uma prática aconselhável é lugar. Essa exploração, porém, não é um problema prático; e b) modelo
realizar uma busca de anterioridade, perpétua, durando até 70 anos conta- de utilidade: proteção dada a obje-
processo por meio do qual se verifica dos a partir de 1º de janeiro do ano tos de uso prático que apresentam
se a marca já existe ou não no país. subsequente ao falecimento do autor, melhoria funcional no seu uso ou na
Essa busca é importante porque o uso período a partir do qual a obra será de sua fabricação.
de marcas que possuem impedimento domínio público. Para depositar uma patente jun-
pode gerar problemas, desde indeni- A patente é outro instrumento to ao Inpi, o titular deve descrever
zação para o dono da marca, até cus- protegido por lei. Ela é um “título de detalhadamente a invenção, desde
tos com processo judicial. propriedade temporária sobre uma os materiais até os métodos utiliza-
O segundo instrumento de que invenção ou modelo de utilidade, ou- dos e os resultados alcançados. Essa

Dezembro de 2016 73
descrição deve ser minuciosa a ponto A lei nº 9.279/96, em seu artigo 195, dor, mas sim aqueles que o adquirem
de permitir que um terceiro consiga tipifica as práticas consideradas como como destinatário final. Logo, uma
reproduzir o invento. concorrência desleal, sendo, portan- empresa ao adquirir insumos para re-
Antes, porém, de depositar uma to, rol taxativo por se tratar de penas alizar seu objeto social não atua como
patente, é importante que o titular restritivas de direitos e pecuniárias consumidora. Porém, se ela adquire
efetue uma busca de patentes para (Brasil, 1996). produtos de limpeza para manuten-
confirmar que a tecnologia é uma no- Apesar da regulação legal ção do seu estabelecimento, ela será
vidade. A busca pode ser feita gratui- quanto ao segredo de negócio, as consumidora.
tamente através da internet, por meio orientações mais adequadas para o Esse conceito é importante para
da base de patentes do Inpi ou em ba- empreendedor se referem a cuidados empreendedores na medida em que
ses de dados internacionais. que ele deve ter no dia a dia, como: ele condicionará as obrigações da
É importante observar que, utilização de senhas de acesso, ou nova empresa para com os seus clien-
mesmo depois de patenteado, um até de biometria, nos computadores tes. Porém, mesmo que a nova em-
produto pode ser questionado admi- ou ambientes onde os segredos estão presa atue em um setor de B2B (bu-
nistrativamente junto ao Inpi, caso se guardados; utilização de termo de siness to business, de empresa para
comprove que não foram observados confidencialidade ao se contratar no- empresa), é importante destacar que
os requisitos de patenteabilidade, ou vos empregados; marcação de todos o CDC determina a responsabilidade
mesmo judicialmente, em caso de da- os documentos que contêm essas in- solidária de todos os fornecedores de
nos a terceiros. formações como confidenciais, entre uma cadeia produtiva. Isso significa
Os dois últimos instrumentos outros. Tais medidas, apesar de não que é possível que um consumidor
de que trataremos aqui são o desenho darem plena garantia de que terceiro que adquiriu um produto que utilizou
industrial e o segredo de negócios. de má-fé não violará a confidenciali- alguma peça produzida ou um servi-
O desenho industrial é a “for- dade das informações corporativas, ço prestado pela sua empresa possa
ma plástica ornamental de um objeto comprovarão judicialmente que se acioná-la judicialmente por algum
ou o conjunto ornamental de linhas trata de segredo de negócio, possibi- defeito no produto.
e cores que possa ser aplicado a um litando ao empreendedor obter a de- Dentro da relação, o consumi-
produto, proporcionando resultado vida indenização pela violação. dor é considerado a parte vulnerável,
visual novo e original na sua configu- seja sob a ótica econômica seja sob a
ração externa e que possa servir de 4. Direito do Consumidor ótica técnica, motivo pelo qual é alvo
tipo de fabricação industrial” (Bra- de proteção legal. Aqui serão discuti-
sil, 1996). Nesse caso, a lei protege Este tópico tem como base so- dos cinco direitos do consumidor que
a configuração externa do objeto, não mente o Código de Defesa do Con- impactam as atividades de qualquer
abarcando aspectos funcionais dele. sumidor (CDC). Entretanto, é impor- fornecedor. Conhecê-los e observá-
Ao registrar um desenho industrial, o tante destacar que existem outras leis los são ações importantes para se
Inpi não efetua exame prévio de no- que regulam as relações de consumo. evitar não só o passivo consumerista,
vidade ou originalidade. Entretanto, Inicialmente, deve-se compre- mas também consequências penais
o registro poderá se tornar nulo caso ender quem são consumidor e forne- previstas no CDC.
o Inpi comprove a existência anterior cedor, uma vez que desses conceitos Incialmente, trataremos sobre o
do objeto. decorrerão uma série de direitos e direito à informação e a transparência
Por fim, o segredo de negócio obrigações. O CDC define consumi- nas relações de consumo. É direito
se refere à informação proprietária dor como “toda pessoa física ou ju- básico do consumidor ter acesso à in-
que possui grande valor para uma rídica que adquire ou utiliza produto formação adequada e clara sobre os
empresa na medida em que ela per- ou serviço como destinatário final” diferentes produtos e serviços, com
manece em segredo. Trata-se de ins- (Brasil, 1990). Nesse sentido, vê- especificação correta de quantidade,
tituto jurídico regido pelas normas se que nem toda pessoa que adquire características, composição, qualida-
que regulam a concorrência desleal. um produto ou serviço é consumi- de, tributos incidentes e preço, bem

74 Dezembro de 2016
como sobre os riscos que apresentem. o consumidor a uma desvantagem observa ao menos um dos requisitos
Nesse sentido, o fornecedor deve exagerada e desproporcional. exigidos pelo dispositivo legal para
oferecer ao cliente informação cla- O CDC não define o que seja tal: verossimilhança das alegações e
ra, precisa e em língua portuguesa, uma cláusula abusiva. Em vez disso, hipossuficiência do consumidor.
sendo vedada a propaganda engano- ele apresenta uma lista de práticas A verossimilhança das alega-
sa ou abusiva que leve o consumidor que são definidas como abusivas. Al- ções significa que os argumentos
ao erro (Aguiar Júnior, 1994). A in- guns exemplos de cláusulas abusivas apresentados pelo consumidor devem
formação deve ser legível, contendo citadas pelo CDC são: a) cláusulas possuir aparência da verdade. Já a hi-
características essenciais do produto, que possibilitem ao fornecedor alte- possuficiência se verifica pela análise
riscos à segurança do consumidor e rar preços unilateralmente; b) trans- da capacidade técnica e informativa
condições integrais da oferta. ferência de responsabilidade para do consumidor. Sendo assim, ao se
A inobservância dessa obrigação terceiros; c) impossibilidade ao con- identificar ao menos um dos requisi-
é considerada como crime, podendo o sumidor do reembolso de quantias já tos mencionados, o juiz deve aplicar
fornecedor ser multado ou condenado pagas; entre outras. a inversão e comunicar as partes sua
a anos de detenção por essa prática. Como remédio para tais situa- decisão. (Theodoro, 2013). Com isso,
Como se observa, as penas para um ções, o CDC prevê a possiblidade de o fornecedor é quem terá que provar,
mau fornecedor vão além daquelas modificação de cláusulas contratuais portanto, que as alegações do consu-
meramente mercadológicas. pela via judicial quando for necessá- midor não são verdadeiras.
Outro direito do consumidor é rio reestabelecer o equilíbrio contra-
o de arrependimento, direito que se tual entre consumidor e fornecedor. 5. Direito Tributário
refere à faculdade que o consumidor O quarto direito se refere à pro-
possui de desistir da compra den- teção do consumidor nas situações de É comum ouvir que o Brasil
tro do prazo de sete dias, contados fornecimento de produto ou serviço possui umas das maiores cargas tri-
a partir da assinatura do contrato ou com concessão de crédito, como nas butárias do mundo. Apesar desse
do recebimento do produto ou servi- vendas a prazo com pagamento via fato, um empreendedor deve enten-
ço. Esse direito, porém, só pode ser boleto. Nesse caso, a lei determina der que esse é um dos desafios a se-
exercido se a compra tiver sido feita que as multas geradas pelo não paga- rem enfrentados ao se decidir abrir o
fora do estabelecimento comercial, mento da dívida não podem exceder próprio negócio. É importante que o
como compras por telefone ou pela 2% do valor da prestação. Uma ob- empreendedor tenha consciência de
internet. O exercício desse direito servação a ser feita é que essa multa que realizar uma má gestão tributária,
não depende de justificativa ou da se refere somente à penalização do permanecer na informalidade ou agir
vontade do fornecedor. O consumi- consumidor por atraso no pagamento, de maneira ilícita pode gerar reper-
dor poderá devolver o produto sem não abrangendo as multas compensa- cussões negativas, como dificuldades
obrigatoriamente apresentar qualquer tórias geradas em razão de prejuízo para obtenção de crédito, formação
tipo de motivo, sendo que os custos devido à quebra de contrato pelo con- equivocada de preços, multas pesadas
de transporte relativos à devolução sumidor (Benatti, 2011; CNJ, 2015). em razão de não recolhimento de im-
do produto serão de responsabilidade O último direito a ser tratado é postos, possibilidade de o patrimônio
do fornecedor (Brasil, 1990). o de inversão do ônus da prova. Tra- dos sócios e administradores serem
O terceiro direito trata da pro- ta-se de um direito aplicável às situa- atingidos para cobertura de passivo
teção contra cláusulas abusivas. Nos ções em que os litígios são resolvidos tributário, repercussões criminais,
contratos celebrados, o fornecedor pela via judicial, nas quais o fornece- dificuldades de se fecharem contratos
não pode estabelecer cláusulas abu- dor deve provar que a alegação feita em razão de impossibilidade de emis-
sivas, consideradas pela lei nulas de pelo consumidor não é verdadeira. A são de documento de regularidade
pleno direito, ou seja, elas não pos- inversão do ônus da prova, porém, fiscal, entre outros.
suem valor legal (Brasil, 1990). Tais não ocorre em todas as situações, O planejamento tributário deve
cláusulas são ilegais por submeterem mas somente naquelas em que o juiz ser um tema estratégico em uma

Dezembro de 2016 75
nova empresa. Apesar de isso exigir nico para a realização do cálculo do derá pesquisar e se certificar de todas
conhecimento e o acompanhamento valor mensal devido e pode efetuar as obrigações a serem cumpridas pelo
um profissional especializado, é im- a apresentação de declaração única e optante do regime, além de acessar
portante que o empreendedor saiba simplificada de informações socioe- informações que explicam todo o sis-
informações básicas, pois isso o aju- conômicas e fiscais. tema do Simples Nacional.
dará na escolha do profissional e nas Pelo Simples Nacional, a tribu-
discussões sobre o plano mais ade- tação é realizada com base na recei- 5.2. Lucro Presumido
quado para o perfil da sua empresa. ta bruta da empresa, que é calculada É um regime de tributação de
Neste tópico, serão listados os com base no chamado regime de cai- complexidade intermediária, sen-
principais tributos que incidem sobre xa (momento em que o dinheiro entra do um pouco mais complexo que o
a atividade empresária, bem como os efetivamente no caixa da empresa) ou Simples Nacional e menos complexo
regimes tributários previstos no Di- pelo regime de competência (momen- que o Lucro Real. Trata-se de uma
reito brasileiro, mostrando como são to em que a empresa adquire o direito modalidade de tributação na qual a
tratados os tributos listados em cada ao recebimento do dinheiro), sendo base de cálculo do IRPJ e da CSLL é
um dos regimes. facultado ao empreendedor a esco- determinada de maneira simplifica-
Os principais tributos que in- lha do regime a ser utilizado. Sobre a da, mais precisamente de uma forma
cidem sobre a atividade empresária base de cálculo, incidirá uma alíquota presumida.
são: a) Imposto de Renda de Pessoa que varia entre 4% e 17%. O que vai O cálculo é feito a partir da re-
Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social determinar o valor da alíquota será ceita bruta da sociedade, sobre o qual
sobre o Lucro Líquido (CSLL), que o montante da receita bruta (quanto se aplica uma alíquota que varia de
incidem sobre lucro; b) PIS e Cofins, maior a receita, maior a alíquota) e a 1,6% a 32%, considerando a ativida-
que incidem sobre receita; c) INSS, atividade que o empreendedor efeti- de da empresa. Quando não há regra
que incide sobre a folha de pagamen- vamente exerce. específica, a alíquota aplicada é de
to; d) IPI, ICMS e ISS, que incidem Entretanto, não é qualquer em- 32%. Esse regime de tributação se
sobre fabricação e comercialização preendedor que pode optar pelo Sim- torna interessante quando o lucro da
de produtos e serviços. ples Nacional. A Lei Complementar empresa é percentualmente superior
Já os regimes de tributação são: 123 enumera uma série de vedações à alíquota aplicada, visto que o valor
a) Simples Nacional; b) Lucro Presu- para a adoção do Simples nacional. do lucro superior ao índice da alíquo-
mido e c) Lucro Real. Entre elas se destacam: a) a empresa ta não será tributado e poderá ser ab-
deve possuir somente pessoas físicas sorvido pela empresa.
5.1. Simples Nacional como sócios; b) os sócios só podem É importante, porém, destacar
É um “regime compartilhado de possuir quotas de uma única empre- que a alíquota mencionada será apli-
arrecadação, cobrança e fiscalização sa que se enquadra dentro dos limi- cada somente à receita bruta opera-
de tributos” (Receita Federal, [200- tes de receita para ME e EPP; c) não cional, não se aplicando a receitas
?]). É um regime tributário simplifi- são admitidos sócios domiciliados no financeiras, que são incluídas inte-
cado, aplicável às pessoas jurídicas exterior; d) a empresa não pode par- gralmente para fins de cálculo do im-
registradas como microempresa (ME) ticipar como sócia em outras pessoas posto devido.
ou empresa de pequeno porte (EPP). jurídicas; e) empresas não podem atu- Assim como no Simples Na-
Trata-se de um regime de tri- ar como consultoria, locadora de imó- cional, no Lucro Presumido pode-se
butação criado com o objetivo de veis, agência de publicidade, escritório adotar tanto o regime de caixa como
simplificar a vida do micro e peque- de advocacia, entre outras atividades. o regime de competência. O uso do
no empresário, uma vez que o reco- A Receita Federal lançou em regime de caixa nessa hipótese pode
lhimento dos tributos mencionados é seu site uma página dedicada ao Sim- ser interessante para a empresa, na
feito em uma única guia. Além disso, ples Nacional (http://www8.receita. medida em que não existirá um des-
o optante pelo Simples Nacional tem fazenda.gov.br/SimplesNacional/), compasso entre a entrada efetiva de
à sua disposição um sistema eletrô- por meio da qual o empreendedor po- dinheiro e o pagamento dos tributos.

76 Dezembro de 2016
O tratamento dos demais tribu- cada item de receita e de despesa. reforçar a necessidade de planeja-
tos nesse regime ocorre da seguin- É um regime que pode ser ado- mento para uma gestão eficiente de
te maneira: no caso do PIS/Cofins, tado por qualquer empresa. Contudo, tributos. Antes de tomar uma deci-
a empresa deverá adotar o regime é normalmente adotado por empresas são quanto ao regime tributário a ser
cumulativo, cuja alíquota combina- de maior porte, seja por causa dos adotado em um ano, o empreendedor
da é de 3,65%, sendo a base de cál- controles exigidos, seja por determi- deve realizar projeções para que se
culo a receita bruta da sociedade; já nação legal. Muitas empresas não o escolha o mais adequado, seja com
o ICMS ou ISS, bem como o INSS, consideram interessante em razão do base em estimativas estatísticas, seja
têm tratamento igual nos regimes do esforço necessário para se cumprirem com base em dados da empresa dos
lucro presumido e do lucro real. Vale as obrigações legais, como por exem- anos anteriores.
mencionar que o pagamento desses plo a necessidade de comprovação A opção feita pelo empreende-
tributos é feito separadamente, cada documental de cada item de receita e dor deve recair sobre a modalidade
um em uma guia respectiva. de despesa para se fazer a declaração na qual o pagamento de tributos se dê
Quando somados nominalmen- tributária. de forma mais econômica, o que re-
te os valores de todos os tributos pa- Com a adoção desse regime, a dundará, consequentemente, em mais
gos sob esse regime, chegar-se-á a empresa tem mais vantagens quando dinheiro para a empresa. O planeja-
uma alíquota de 14,53% sobre a re- sua margem de lucro real for peque- mento permitirá uma decisão mais
ceita bruta. na, geralmente quando ela for menor acertada e mais economia de dinheiro
Assim como no Simples Nacio- do que a margem do lucro presumido no final do ano.
nal, existem requisitos legais para que (até 32%). Se a margem de lucro real
uma empresa possa optar pelo Lucro for grande, a empresa pagará um va- 6. Direito Trabalhista
Presumido. Nesse caso, só pode op- lor maior de IRPJ e de CSLL.
tar pelo regime a empresa com recei- A vantagem do Lucro Real em Neste tópico, serão tratados
ta bruta total igual ou inferior a R$ relação ao Lucro Presumido é que, quatro assuntos básicos: vínculo
78 milhões por ano. Além disso, não neste, mesmo quando a empresa tem empregatício e fraude trabalhista;
podem optar pelo Lucro Presumido prejuízo ela deverá pagar imposto, contrato de trabalho; direitos do em-
aquelas empresas obrigadas por lei a uma vez que o lucro é presumido. pregado; e término do contrato de
adotarem o regime do Lucro Real. No Lucro Real, isso não acontece. trabalho.
É válido mencionar que a opção Em caso de prejuízo, além de não
pelos regimes do Simples Nacional e pagar IRPJ e CSLL, a empresa po- 6.1. Vínculo empregatício
do Lucro Presumido deve ser feita derá acumular prejuízo fiscal, que O primeiro passo para a com-
anualmente, não podendo ser alterada pode ser compensado com lucro real preensão das normas que regulam
durante o ano. de anos seguintes. as relações trabalhistas é entender a
No regime do Lucro Real, os quem elas se aplicam. Logo, é neces-
5.3. Lucro Real valores nominais do IRPJ e da CSLL sário saber quem a lei define como
É aquele que considera como somados correspondem a uma alíquo- empregado e como empregador.
regra geral o lucro líquido ajustado, ta de 34%, usando como base de cál- Um trabalhador é aquela pessoa
apurado na escrituração contábil após culo o lucro líquido ajustado. No caso que utiliza sua força de trabalho para
as adições, exclusões e compensa- do PIS/Cofins, a alíquota incidente é obter uma contraprestação em dinhei-
ções permitidas em lei, para deter- de 9,25% sobre a receita bruta. As alí- ro. Entretanto, nem todos os trabalha-
minação do Imposto de Renda e da quotas de ICMS e ISS variam confor- dores são abrangidos pela CLT, sendo
Contribuição Social sobre o Lucro me a localidade da empresa. Por fim, que os direitos previstos na lei são ga-
Líquido da empresa (Labor Jurídico, a contribuição previdenciária perma- rantidos somente para aqueles que se
2012). Trata-se de uma sistemática de nece com alíquota de 20% sobre o encontram com o status de empregado.
tributação que considera o resultado valor da folha de pagamento. Empregado é toda “pessoa físi-
efetivo da empresa, gerado a partir de Para concluir este tópico, vale ca que prestar serviços de natureza

Dezembro de 2016 77
não eventual a empregador, sob a de- pessoal de serviço. A CLT equipara a exceção, que é o prazo prescricional
pendência deste e mediante salário” empregador, para os efeitos exclusi- quanto ao FGTS, que é de 30 anos.
(Brasil, 1943). Para se enquadrar nes- vos da relação de emprego, os pro- O prazo prescricional, porém, é reco-
se conceito, é necessário que a rela- fissionais liberais, as instituições de nhecido jurisprudencialmente a partir
ção empregado-empregador possua beneficência, as associações recreati- do fim do vínculo efetivo da relação
as seguintes características: a) pesso- vas ou outras instituições sem fins lu- empregatícia mais o período de aviso
alidade: o serviço deve ser realizado crativos que admitirem trabalhadores prévio, e não da rescisão do contrato
pela própria pessoa, não podendo ser como empregados (Brasil, 1943). de trabalho.
substituída por terceiro; b) habitua-
lidade: é a prestação de serviço não 6.2. Fraude trabalhista 6.3. Contrato Individual de
eventual, que se mantem contínua Ter um empregado significa Trabalho
no decorrer do tempo; c) onerosi- também ter encargos trabalhistas. Vi- É definido como “o acordo táci-
dade: o serviço é prestado mediante sando a fugir desses custos, algumas to ou expresso, correspondente à re-
contraprestação pecuniária ou outro empresas tentam burlar a legislação, lação de emprego”, tratando-se de um
bem que se expresse em dinheiro; incorrendo em contratação fraudu- tipo de contrato específico, destinado
d) subordinação: o empregado se lenta. Ou seja, contratam um empre- à formalização da relação de emprego
sujeita às ordens e determinações do gado, mas formalizam outro tipo de (Brasil, 1943). Não há necessidade de
empregador, podendo ser fiscalizado relação. Um exemplo é a chamada que o contrato individual de trabalho
ou disciplinado por ele. Essas são as “pejotização”. O empregador exige a seja escrito, podendo ser verbal ou tá-
principais características que são tra- criação de uma pessoa jurídica para cito. O simples fato de uma pessoa se
ços distintivos da relação de emprego contratar o trabalhador, porém, man- caracterizar como empregado faz nas-
no Brasil (TRT4, [20--?]). tém com ele vínculo que se caracte- cer automaticamente um contrato de
Existem outros tipos de traba- riza como relação de emprego. Isso trabalho. Consequentemente, nasce
lhadores que são reconhecidos pela gera economia para o empregador, para o empregador o dever de cumprir
legislação brasileira. Entretanto, a lei porque os encargos fiscais de contra- as obrigações trabalhistas.
define que eles não estão sob uma re- tação de um fornecedor são meno- Os contratos de trabalho podem
lação de emprego, o que significa que res do que os encargos trabalhistas. ter prazo determinado ou prazo inde-
eles não usufruem da proteção dada Entretanto, isso pode gerar passivo terminado. O contrato por prazo inde-
pela CLT. Alguns exemplos são: a) trabalhista, pois o trabalhador pode terminado é a regra geral, sendo que
autônomos: prestam serviços de ca- processar judicialmente a empresa os por prazo determinado só são au-
ráter eventual e não se encontram em solicitando o reconhecimento do vín- torizados por lei em três situações es-
relação de subordinação com aqueles culo de trabalho. Ele ganhando, a Jus- pecíficas: a) contrato de experiência
que contratam seus serviços; b) vo- tiça do Trabalho obrigará o empre- (máximo de três meses); b) contrato
luntários: atividade não remunerada gador condenado a cumprir todas as para realizar atividades de caráter
que, por lei, a atividade não configura obrigações trabalhistas que deveriam transitório (máximo de dois anos); e
vínculo empregatício; c) estagiários: ter sido cumpridas durante o período c) contrato para empresas com prazo
estudantes que usam a empresa como de vigência do vínculo empregatício determinado de extinção (máximo de
meio de complementação da forma- (TST, 2015). dois anos). Em todas as hipóteses, se
ção; não são considerados emprega- Esse processo possui prazo o contrato de trabalho superar o pra-
dos por determinação legal e possuem prescricional de dois anos após a zo máximo permitido por lei, ele se
lei específica que regulamenta a rela- extinção do vínculo trabalhista. In- converte, automaticamente, em con-
ção com a empresa (Minuci, 2014). gressando com ação dentro do prazo trato por prazo indeterminado (Bra-
O empregador, por sua vez, é de dois anos, o empregado poderá sil, 1943).
toda pessoa jurídica que, assumindo pleitear direitos relativos aos últimos Apesar de se tratar de um con-
os riscos da atividade econômica, cinco anos de vínculo com o em- trato com regulação detalhada pela
admite, assalaria e dirige a prestação pregador (Brasil, 1943). Existe uma CLT, é possível incluir cláusulas es-

78 Dezembro de 2016
peciais não previstas na lei. Exem- possa se servir (alimentação, vestu- aquelas que são obrigatórias, como,
plos de cláusulas especiais são: a) de ário, habitação, entre outros). Con- por exemplo, recolhimento do FGTS,
confidencialidade: manutenção de si- tudo, o valor das utilidades não pode 13º salário e adicionais (noturno, de
gilo das informações da empresa du- ser superior a 70% do valor do salário periculosidade, de insalubridade).
rante a vigência do contrato de traba- mínimo fixado para a região onde o
lho. A empresa pode incluir também trabalhador se encontra. 6.4.2. Jornada de trabalho
um período pós-contrato no qual se Outro tema importante sobre No Brasil, a jornada de traba-
deve manter sigilo; b) de não concor- esse assunto é a equiparação salarial. lho é de oito horas diárias e 44 horas
rência: veda a atuação do empregado Se duas pessoas executam a mesma semanais, sendo oito horas de segun-
em atividades concorrentes durante atividade e estão lotadas no mesmo da a sexta e quatro horas no sábado.
e após o contrato de trabalho. Nas cargo, elas terão o direito de receber Existem, porém, profissões que ex-
vedações pós-contrato, o empregado o mesmo salário, sem distinção de cluem o sábado como dia útil, seja
fará jus à indenização pelo dano à sua sexo, nacionalidade ou idade. Trata- por lei, seja por convenção coletiva.
liberdade; c) de permanência no em- se de um princípio adotado pela le- Caso o empregado extrapole o
prego: ocorre quando há investimen- gislação trabalhista. Para aplicação limite das horas diárias de trabalho,
to na formação do empregado (cur- dessa regra, porém, a diferença entre configura-se hora extra. Tais horas
sos de especialização, por exemplo) o tempo de exercício da atividade ou são remuneradas de maneira dife-
para que ele possa oferecer retorno à tempo na função não pode ser de mais rente. Se trabalhadas em dias úteis,
empresa em termos de desempenho. de dois anos, os dois empregados têm acrescenta-se 50%; se em dias de
Nesse caso, estipula-se reembolso de que trabalhar no mesmo local e estar descanso, acrescenta-se 100% ao
despesas e até multas em caso de des- vinculados à mesma empresa. valor da hora. Esses valores podem
ligamento antes de prazo estipulado Para manter a diferença sala- alcançar percentuais maiores quando
(Jardim, 2015). rial estando presentes as condições negociados em convenções coletivas.
mencionadas, a empresa deverá com- Porém, o limite de horas extras por
6.4. Principais direitos do em- provar que existe diferença entre os dia é de duas horas. Caso a empresa
pregado (Brasil, 1943) empregados que justifique a desigual- exija do empregado horas extraor-
dade salarial. Ela poderá comprovar dinárias superiores a duas horas por
6.4.1. Salário essa diferença mostrando que um em- dia, ela poderá ser autuada pelo Mi-
É um dos principais direitos do pregado tem maior produtividade que nistério do Trabalho.
empregado. Quanto à periodicidade, o outro ou que um tem mais perfeição Existem duas maneiras de se
é possível negociar com o emprega- técnica que o outro. aproveitarem essas duas horas diárias
do o prazo de pagamento. Entretanto, A remuneração, por sua vez, se sem, necessariamente, remunerá-las
esse prazo, por determinação legal, diferencia do salário por incluir a to- como horas extras: compensação de
não pode ser estipulado por período talidades dos ganhos do empregado. jornada, que é um acordo individual
superior a um mês. É possível, por Além do salário, somam-se também para compensação proporcional das
exemplo, negociar o pagamento de parcelas remuneratórias facultativas, horas a mais trabalhadas em outro
15 em 15 dias, mas nunca o paga- como gorjetas, gratificações ajusta- dia; e negociação com o sindicato
mento em prazo superior a 30 dias. das, prêmios, ajudas de custo, diárias para implementação de banco de ho-
Além disso, quando o pagamento for para viagem. Quando o pagamento ras, com compensação realizada em
definido como mensal, ele deverá ser dessa parcela remuneratória é feito até um ano.
feito, no máximo, até o 5º dia útil do de maneira contínua, essa pode ser Existem duas modalidades de
mês subsequente ao trabalhado. incorporada ao salário em razão da empregados na legislação brasileira
O salário não precisa ser pago expectativa que se gera no emprega- que não estão abarcadas na regulação
integralmente em dinheiro, podendo do de recebimento do valor devido à sobre hora extra, prevista na CLT. São
ser pago também em utilidades, ou sua periodicidade. Além das parcelas elas: a) empregados que trabalham ex-
seja, bens dos quais o empregado remuneratórias facultativas, existem ternamente: aqueles que não precisam

Dezembro de 2016 79
comparecer diariamente à empresa e o período aquisitivo de 12 meses de apenas uma das partes ou por moti-
que regulam seu próprio horário de trabalho. O período concessivo se re- vos alheios à vontade das partes.
trabalho; e b) empregados que exer- fere ao subsequente trabalhado. Caso Esse último caso, conhecido
cem cargos de confiança: geralmente, o empregador não conceda as férias como extinção do contrato de traba-
ocupam cargos altos na empresa e, para o empregado dentro do período lho, ocorre nas situações de contrato
por vezes, personificam a empresa no concessivo, ele deverá indenizá-lo, por prazo determinado, com a che-
trato com demais empregados. pagando em dobro o valor das férias gada do seu termo, quando uma das
Quanto ao controle da jornada não concedidas. partes falece ou, ainda, por motivo
de trabalho, trata-se de uma obrigação Ao empregador, é facultada a de força maior, como aconteceu com
patronal, que deverá fixar os horários escolha da data para concessão das os bingos no brasil, que foram extin-
de início e término da duração do tra- férias. Entretanto, ele terá a responsa- tos em razão de uma determinação
balho. Em empresas com mais de dez bilidade de pagar antecipadamente o de autoridade pública.
empregados, é obrigatório o registro valor referente às férias do emprega- Esses casos são exceções.
desse controle, por meio de mecanis- do mais 1/3 como adicional de férias Como regra, a rescisão do contrato
mo manual, mecânico ou eletrônico. até dois dias antes do início das férias ocorre por meio da vontade de, pelo
Dentro da jornada de trabalho o do empregado. menos, uma das partes, situação na
empregado terá direito a períodos de O período de férias correspon- qual a rescisão passará pelas análi-
descanso (intrajornada). No caso de de a 30 dias corridos. Entretanto, esse ses seguintes: se a iniciativa foi do
intrajornada de quatro horas diárias, número poderá ser menor, caso o em- empregado ou do empregador, se a
o empregado não fará jus a intervalo pregado tenha faltado injustificada- demissão foi com ou sem justa causa
de descanso. Para as jornadas que va- mente ao longo do período aquisitivo. e se o contrato era por prazo deter-
riam entre quatro e seis horas diárias, O artigo 130 da CLT relaciona o nú- minado ou indeterminado. A análise
o intervalo será de 15 minutos. Para mero de ausências injustificadas com desses pontos determinará o valor
os que trabalham mais de seis horas a quantidade de dias correspondentes das verbas rescisórias a serem pagas
diárias, o intervalo deverá ser de, no aos quais o empregado terá direito a pelo empregador.
mínimo, uma hora e, no máximo, férias, que irá de 30 até 12 dias. Vale No término sem justa causa dos
duas horas. O intervalo entre duas mencionar que as férias podem ser contratos por prazo indeterminado, a
jornadas subsequentes (interjorna- concedidas em um único período ou parte que quer por fim ao contrato
da), por sua vez, deve ser no mínimo fracionadas, sendo que o período de deverá efetuar o aviso prévio, que é
de 11 horas. férias nunca poderá ser inferior a dez a comunicação à outra parte com an-
Além disso, o empregado tem dias. tecedência sobre o fim do contrato.
direito também a um dia de repouso Dentro do tema, uma das facul- Para aqueles que têm até um ano de
remunerado por semana, que deverá dades do empregado é a possiblidade serviço na mesma empresa, o aviso
ser, preferencialmente, aos domin- de conversão de 10 dias das férias em prévio será de 30 dias. Para aque-
gos. Caso o empregado tenha faltado dinheiro, o chamado abono de férias. les com mais de um ano de serviço,
injustificadamente em um dia na se- O empregado deverá notificar a em- devem ser acrescidos 3 dias por ano
mana, o empregador poderá descon- presa antecipadamente do interesse de serviço, até o máximo de 60 dias,
tar o valor do descanso semanal re- em receber o abono. perfazendo um total de até 90 dias.
munerado do salário do empregado. Com o aviso prévio, surge para
6.4.4. Rescisão do contrato de o empregador a faculdade de man-
6.4.3. Férias trabalho ter ou não o empregado trabalhando
Outro período de descanso im- A rescisão do contrato de tra- durante o período. Na hipótese nega-
portante para o empregado são as fé- balho é o término do vínculo em- tiva, o empregador deverá indenizar
rias. Trata-se de um período anual ao pregatício, gerando a cessação das a outra parte. Se, porém, ele decide
qual o empregado faz jus sem prejuí- obrigações para as partes. Ela pode manter o trabalhador durante o aviso
zo de sua remuneração, após cumprir ocorrer pela vontade de ambos, de prévio, este terá o direito de faltar

80 Dezembro de 2016
sete dias seguidos durante esse pe- mento de salário ou recolhimento 7. Conclusão
ríodo ou ter sua jornada de trabalho do FGTS ou, ainda, quando expõe
reduzida em duas horas. A justifica- o empregado a situações constran- O panorama legal aqui apresen-
tiva para esse direito é a concessão gedoras de assédio moral. A conse- tado teve como objetivo introduzir o
para o empregado de tempo para que quência da rescisão indireta é que empreendedor no mundo jurídico de
ele busque uma recolocação imedia- o empregador deverá arcar com as alguns ramos do Direito relacionados
ta no mercado de trabalho. verbas rescisórias como se tives- às atividades de empreendedorismo.
Outra hipótese de término é se demitido o empregado sem justa É uma ciência com linguagem
aquela ocorrida com a demissão do causa (multa de aviso prévio, multa própria e com uma dinâmica de difí-
empregado por justa causa. As situ- rescisória de 40% do FGTS, 13º e fé- cil apreensão para quem não é um es-
ações nas quais essa hipótese pode rias proporcionais). pecialista. Apesar disso, é um mundo
ocorrer estão previstas no artigo 482 Rescindido o contrato, é ne- com influência direta no dia a dia em-
da CLT, sendo esse um rol taxativo, cessário ainda levá-lo para homo- presarial, o que impõe ao empreende-
não podendo essa demissão ser reali- logação do sindicato de classe ou dor uma certa “obrigação” de domi-
zada por motivos alheios aos previs- da Superintendência Regional do nar um mínimo de conteúdo para não
tos em lei. Nesse caso, o empregador Trabalho. Essa homologação é im- se envolver em situações que podem
pagará ao demitido somente o valor portante, tanto para o empregado lhe acarretar prejuízo.
do saldo de salário devido, não ar- (uma vez que sem ela, na hipótese Além de conhecer um míni-
cando com os valores referentes às de demissão sem justa causa ou jus- mo de conteúdo jurídico, é impor-
verbas rescisórias. ta causa pelo empregador, ele não tante que o empreendedor contrate
A justa causa, contudo, não conseguirá sacar o valor do FGTS) um advogado de sua confiança, para
é aplicável somente do emprega- como para o empregador (que poderá orientá-lo detalhadamente quanto
dor para o empregado, mas também sofrer penalidade quando da fiscali- aos aspectos jurídicos de maior re-
pode acontecer no sentido inverso. zação pelo Ministério do Trabalho). levância para sua empresa. O domí-
É a chamada rescisão indireta. Esse Além da homologação, é necessário nio do conteúdo, inclusive, ajudará
tipo de rescisão tem sido muito co- também que o empregado realize o o empresário na hora de discutir
mum quando a empresa descumpre exame médico demissional para ava- as melhores opções com o seu
obrigações trabalhistas como paga- liar o seu estado de saúde. advogado.

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82 Dezembro de 2016
Ecossistemas de startup e as TICs, a expan-
são das ações governamentais do G2C e G2B
para a consolidação de cidades inteligentes
Grazielle Costa Santos
Mestranda em Sistemas de Informação e Gestão do Conhecimento (Fumec), MBA
em Gestão de Projetos, especialista em Desenvolvimento Web e bacharel em
Administração e Análise de Sistemas. Analista da Prodemge, atua como gestora do
projeto Siged Corporativo (gestão eletrônica de documentos) e do Sigcon Saída (gestão
de convênios de saída), sistemas que visam a fortalecer as ações governamentais
no âmbito das Secretarias de Estado e estruturas do Poder Executivo, bem como a
realizar o acompanhamento da saída de recursos do orçamento fiscal por meio de

Divulgação
convênios e resoluções. Tem atuação acadêmica em cursos de graduação (Promove
e FCSL) e pós-graduação (UNA e UNI BH).

RESUMO
Salientam-se neste artigo aspectos relevantes da estrutura de ecossistemas de startups, o papel governamental e suas
ações de forma a contribuir para a consolidação das cidades inteligentes. Este trabalho vem ressaltar iniciativas mul-
tidisciplinares que proporcionaram ganhos significativos à qualidade dos serviços prestados pelo governo ao cidadão
(G2C) a partir de relações entre governo e empresas (G2B). Concluiu-se que os esforços para a consolidação dos
ecossistemas de startups devem ser vistos como uma via de mão dupla, com a finalidade de fomentar o crescimento e
a inovação das relações G2B para o atendimento à necessidade crescente de ações do governo ao cidadão, como um
passo importante para as cidades inteligentes.

Palavras-chave: Startup. Smart cities. Governo eletrônico. G2B. G2C.

1. Introdução lise, estão aspectos de governança, um novo conceito de empreendedo-


O conceito de cidade inteligen- inovação, sustentabilidade, inclusão rismo que preza pelo feedback con-
te significa, essencialmente, a efici- e conectividade, sendo este último tínuo (Ries, 2012). Diferentemente
ência, mas a eficiência com base na aspecto considerado fator crítico de da atuação de empresa tradicional
gestão inteligente e nas tecnologias sucesso no âmbito das cidades inte- para a qual se recomenda fazer um
da informação e comunicação (TICs) ligentes. plano detalhado do negócio/projeto
integradas com a participação ativa As primeiras iniciativas empre- para posterior ingresso no mercado,
do cidadão. Isso implica um novo endedoras que cunharam o perfil de nas startups recomenda-se validar
tipo de governança, com a participa- startup e colocaram o Vale do Silício, a ideia para que se constatem a sua
ção efetiva dos cidadãos nas políticas na Califórnia, como ponto de che- aceitação, a viabilidade de mercado,
públicas. (Pinto; Valente, 2014). ck-in dos sonhos de todos os novos bem como a existência de pessoas
O Intelligent Community Fo- empreendedores de tecnologia teve que consumam o produto (Carva-
rum (2006), Fórum Comunidade In- seu início no final da década de 30, lho; Alberone; Kicorve, 2012). É um
teligente, desenvolveu uma lista de quando inciativas apoiadas pela Uni- feedback constante tanto quantita-
indicadores que fornecem uma es- versidade de Stanford incentivaram a tivo como qualitativo e esse ciclo
trutura para a compreensão de como inovação e contribuíram para o surgi- pode ser resumido em construir, me-
as comunidades e regiões podem mento de grandes empresas como a dir e aprender (Ries, 2012).
ganhar uma vantagem competitiva Hewlett-Packard (HP). Segundo o portal StartUp Bra-
na economia de banda larga de hoje. No Brasil, onde o conceito ain- sil (2016), as startups cumprem com
Entre suas cinco dimensões de aná- da ganha forma, startup é visto como a função de continuamente revitali-

Dezembro de 2016 83
zar o mercado, mas precisam de um A pesquisa proposta neste tra- Define-se como uma sociedade de
ambiente propício para que se desen- balho busca evidenciar aspectos so- empreendedores, ideias, habilidades,
volvam e tenham sucesso. O Sebrae- bre os ecossistemas de startups com startups, incubadoras, mentores, ca-
PR (2015) consolida a definição de ênfase na importância das soluções pital, entre outros atores.
startups em cinco tópicos relevantes: de TIC para a ampliação do conceito Um ecossistema de startup, as-
proposta inovadora, modelo de negó- de cidades inteligentes, conceito este sim como um ecossistema biológico,
cio escalável, base tecnológica, baixo que hoje tem papel essencial para o pressupõe que seus elementos intera-
custo para iniciar suas atividades, sucesso das iniciativas do governo jam de forma harmônica, buscando
ideia com potencial de se transformar para o cidadão (G2C) e justifica-se sempre a adaptação quando ocorre
em negócio. Essa relação de tópicos pela necessidade de apresentar ao lei- a extinção de algum componente.
varia em grau de importância, de tor aspectos que permeiam o cenário A inexistência de um elemento cau-
acordo com a visão de cada ator in- de crescimento das startups no Brasil sa um desequilíbrio e quase sempre
tegrante dos ecossistemas de startups. e suas relações entre governo e em- afeta outro(s) elemento(s) do ecos-
O ecossistema de uma startup presas (G2B). sistema, sendo a gestão estratégica
pode ser definido como o ambiente pautada na avaliação desse ponto de
que afeta as startups, com destaque 2. Cidades inteligentes e os ecossis- equilíbrio do ecossistema.
aqui para instituições que incenti- temas de startups e inovação Para o cenário Brasil, onde os
vam o desenvolvimento de inovação As cidades inteligentes (smart conceitos de startup começaram a ser
e empreendedorismo, incluindo uni- cities) foram definidas como terri- ventilados entre 1996 e 2001, durante
versidades, incubadoras, acelerado- tórios que trazem inovação através o período conhecido como “bolha da
ras, governo etc. Assim, para que os das tecnologias de informação e co- internet”, as definições e os conceitos
ecossistemas possam ser mais bem municação dentro da mesma locali- ainda dividem opiniões entre os dois
apoiados, é interessante identificar os dade, e não poderiam existir sem en- grandes grupos de atores, que são
diversos elementos que o compõem, globar os conceitos e premissas das os empreendedores de startups e os
bem como compreender como as cidades digitais (inclusão digital nos apoiadores/investidores.
startups operam, os desafios enfrenta- municípios com foco na melhoria da Segundo o Sebrae-PR (2015),
dos por estas e também como superá- qualidade dos serviços e da gestão ecossistemas referência em startup no
los ou minimizá-los (Torres, De Sou- pública, por meio da instalação de Brasil e no mundo, como StartupBa-
za, 2016). redes, pontos públicos de acesso à se, San Pedro Valley, Genome Project
As cidades inteligentes ampliam internet, sistemas de gestão na área e Mapped in Israel apontam para uma
o foco no crescimento do conceito de pública e capacitação). composição conforme a Figura 1.
economia colaborativa, que é fruto da O conceito de cidade inteligen- Os ecossistemas de inovação
união de três pontos de sucesso que o te relaciona o investimento na quali- também têm sido objeto de discus-
tornam cada vez mais atrativo a par- dade da infraestrutura de TICs como são de longa data no cenário mun-
tir da evolução ampla da sociedade: meio para enfatizar o papel do capital dial: vários estudos atuais reúnem os
social, com destaque para o aumento humano, da educação, da aprendiza- conceitos de Moore (1997) com os
da densidade populacional, o avanço gem e do desenvolvimento urbano de Freeman e Ludval (1988), desen-
para a sustentabilidade, o desejo de mais rápido, motivado pelo empreen- volvendo a conotação de que esses
uma comunidade e uma abordagem dedorismo, pela inovação da indús- ecossistemas incluem a integração,
mais altruísta; econômico, focado em tria e pela criação de novos produtos, em uma dada área geográfica, eco-
monetização do estoque em excesso devido à força de trabalho educada e nômica, industrial ou empresarial
ou ocioso, aumento da flexibilidade capacitada com o uso de soluções e entre os agentes, fatores, entidades
financeira, preferência por acesso em serviços de TICs (Santos, 2016). e atividades tangíveis e intangíveis
vez de aquisição, e abundância de ca- Para Torres e De Souza (2016), que interagem entre si e com o am-
pital de risco; e tecnológico, benefi- um ecossistema de startups pode ser biente socioeconômico em que se
ciado por redes sociais, dispositivos denominado também como ecossiste- localizam e se aglomeram espacial-
e plataformas móveis, além de siste- ma empreendedor, sendo visto como mente. Da mesma forma que em um
mas de pagamento (Krupinsk, 2014). o ambiente que afeta as startups. ecossistema da natureza ou biológi-

84 Dezembro de 2016
co, cada elemento, também chamado qual a tecnologia da informação e da ca das cidades inteligentes.
de indivíduo, tem seu próprio nicho comunicação é usada de forma inten- No mundo empreendedor, onde
e um papel a ser desempenhado no siva para melhorar a gestão pública os ecossistemas e os conceitos de
conjunto do ecossistema de inova- e o atendimento ao cidadão. Assim, cidades inteligentes se integram na
ção (Kon, 2016). o seu objetivo é colocar o primeiro construção de um melhor conceito de
Com base no que foi apresenta- setor ao alcance de todos, amplian- sociedade, em diversos momentos a
do, é possível compreender por que os do a transparências das suas ações e relação entre governos e startups de
conceitos de ecossistemas de startups incrementando a participação cidadã todos os nichos, principalmente as li-
e de inovação se inter-relacionam e (Berlini, 2014). gadas às TICs, tem variado entre uma
se integram às ações voltadas para A Figura 2 mostra os pilares de relação de apoio do governo, a partir
as cidade inteligentes, pois, segundo desenvolvimento avaliados sob a óti- de processos de aceleração e incuba-
Larios et al. (2014), elas necessitam
ser vistas como um ambiente urbano
sustentável, sendo um desafio para as
TICs lidar com aspectos de infraes-
trutura integrados às diferentes cama-
das de tecnologia a fim de fazer com
que componentes físicos, normas e
produtos desenvolvidos sejam inte-
grados e utilizados por todos os seto-
res da sociedade de forma relevante.
O papel das tecnologias de in-
formação e comunicação é o de su-
porte à gestão do conhecimento. O
desafio é identificar e/ou desenvolver
e implantar tecnologias e sistemas de
informação que deem apoio à comu-
nicação, como forma de colabora-
ção, possibilitando a troca de ideias
Fonte: Sebrae-PR (2015). Figura 1 — Atores dos ecossistemas de startup
e experiências e criando as estruturas
de organização de repositórios, onde
haja a possibilidade de recuperação
de informações para a gestão do co-
nhecimento (Santos, 2016).
Seguindo nesse desafio da con-
solidação de cidades inteligentes pre-
ocupadas também com a criação de
um arcabouço de informações para
a gestão do conhecimento no âmbi-
to do governo eletrônico, com ênfase
nas ações do governo para o cidadão
(G2C), o governo, como um de seus
atores, tem procurado integrar-se aos
ecossistemas aqui apresentados, pau-
tados no conceito de que o governo
eletrônico é uma infraestrutura única
de comunicação compartilhada por Fonte: Adaptado de Iotbusiness, 2016 Figura 2 — Pilares da construção das
diferentes órgãos públicos a partir da cidades inteligentes

Dezembro de 2016 85
Fonte: Endeavor Brasil (2015). Figura 3 — Framework de avaliação do ecossistema empreendedor

ção, e uma relação cliente-fornece- mework utilizado na pesquisa para A Figura 4 mostra o mapa das
dor, com a realização dos pitches e de avaliação do ambiente empreende- startups de tecnologia espalhadas
outras formas de contratação dentro dor, pautado em seus sete pilares: pelo território nacional no ano de
dos conceitos do relacionamento go- ambiente regulatório, infraestrutu- 2010, onde é possível observar maior
verno e empresa (G2B), isso devido ra, mercado, acesso a capital, ino- número de empresas concentradas
à crescente demanda por melhoria e vação, capital humano e cultura nas regiões Sul e Sudeste do Brasil.
ampliação dos serviços do governo empreendedora. Hoje, quase seis anos depois, a
para o cidadão (G2C) e às potenciali- Com a análise dessas deter- Região Sudeste ainda desponta como
dades que podem ser exploradas des- minantes, é possível observar que a a melhor região para os ecossistemas
sa parceria com base nos pilares das participação governamental é pre- de startups, empreendedorismo e
cidades inteligentes. missa na construção do ecossiste- inovação. São Paulo é o estado com
É importante ressaltar que toda ma empreendedor. o maior número de startups, Minas
essa interação apenas é possível de-
vido à característica predominante
das startups: “Uma empresa de base
tecnológica, com um modelo de ne-
gócios repetível e escalável, que pos-
sui elementos de inovação e trabalha
em condições de extrema incerteza”
(Abstartups, 2016).

3. Aspectos relevantes dos ecossis-


temas de startups e as relações G2B
(governo e empresas)
No final de 2014, a Endeavor
Brasil lançou a primeira edição do Ín-
dice de Cidades Empreendedoras com
um objetivo claro: ajudar ecossiste-
mas locais a serem cada vez mais fér-
teis para o crescimento das empresas.
A Figura 3 apresenta o fra- Fonte: Startup PI (2016) Figura 4 — Mapa das startups de tecnologia no Brasil em 2010

86 Dezembro de 2016
Gerais aparece em seguida e o Rio de
Janeiro ocupa o terceiro lugar. Parceria entre startups e governo: medidas recomendadas
São Paulo, segundo o estudo
Estabelecimento e divulgação de direção estratégica clara
global Startup Ecosystem Ranking 1 quanto aos ecossistemas.
2015, é a 12ª cidade mais favorável
no mundo para novas empresas de Uso de canais digitais para acelerar o engajamento
2 com a população.
tecnologia, o que mostra um avan-
ço em relação ao estudo anterior, de Disponibilização de dados como matéria-prima para novos
3 negócios (trânsito, violência, educação, saúde etc.).
2012. A cidade é a única no Brasil e
na América Latina a aparecer no estu-
do, que mapeia os 20 melhores ecos- 4 Ampliação da conexão física e digital de seus moradores.
sistemas de startups do mundo.
Belo Horizonte conquistou 5 Oferta de áreas e incentivos a empresas emergentes.
uma posição privilegiada nesse mer-
cado no âmbito nacional devido ao Investimento na qualificação de pessoas e na oferta
6 de serviços necessários à inovação.
grande número de startups na região
do bairro São Pedro, onde foi cria-
da a comunidade San Pedro Valley, 7 Regulamentação rápida de novos modelos de negócio.
nome inspirado no maior polo mun-
Promoção de ecossistemas e da cena local e apresentação de
dial de tecnologia, o Vale do Silício, 8 si mesmo como um centro de inovação.
na Califórnia, Estados Unidos, sede
de grandes empresas como Google, Atuação do governo como consumidor, buscando novas soluções
9 e se mostrando acessível à oferta de novas empresas.
Apple, Samsung, Intel, entre outras.
Hoje, a comunidade está espalhada Fonte: Adaptado de Época Negócios (2015). Tabela 1 — Medidas recomendas
em toda a cidade e uma de suas prin-
cipais características é a abertura, a Os estados do Sudeste e Sul do De acordo com o portal Startup
troca de informações entre as empre- Brasil já avançam em alguns desses PI (2016), a Associação Brasileira de
sas que compõem o grupo (TecHoje, aspectos e têm se destacado pela re- Private Equity e Venture Capital, a
2016). ceptividade dos governos aos serviços Associação Brasileira de Startups, o
O que torna cidades no Brasil de pequenas e médias empresas, mas, BNDES, a Endeavor Brasil, a Finep,
e no mundo ecossistemas propícios à assim como no restante do país, ainda o Sebrae e o Start-Up Brasil são lis-
vida das startups é a segurança que os esbarram em aspectos como regula- tados como referência de apoio aos
empreendedores passam a ter quanto mentação de novos serviços e elabora- ecossistemas em aspectos de investi-
à capacidade de trabalharem em con- ção de um plano estratégico claro para mento, aceleração e incubação, mais
junto com diversas áreas do governo, o crescimento dos ecossistemas. um exemplo da parceria entre gover-
trabalhando na desburocratização de no e iniciativa privada para o fortale-
O Ministério da Ciência, Tec-
processos, firmando parcerias, promo- cimento das ações do segmento.
nologia e Inovação (MCTI) lançou,
vendo a quebra de paradigmas cultu-
em 20 de agosto de 2012, o Programa
rais. Segundo o estudo da Citie.Org, 4. Aspectos relevantes dos ecos-
Estratégico de Software e Serviços
de 2015, publicado em matéria da re- sistemas de startups e as relações
de TI, o TI Maior, com a finalidade
vista Época Negócios no mesmo ano, G2C (governo e cidadão)
de fomentar a indústria de software
é possível ressaltar nove iniciativas Para Almeida e Aragão (2008),
e serviços na área de tecnologia da
originadas do alinhamento entre em- as startups são vistas como empre-
informação (TI), sendo acompanha-
preendedores e governo, criadas pelos endimentos que usam tecnologias
principais ecossistemas de startups do do por estados e municípios em ter- inovadoras e atuam em mercados
mundo que influenciaram positiva- ritório nacional que também adota- segmentados e especializados, rece-
mente nas conquistas desses resultados ram iniciativas semelhantes a fim de bendo incentivos de governos e uni-
no ranking (As 5 melhores..., 2015). apoiar os ecossistemas. versidades para inovação, fazendo

Dezembro de 2016 87
investimentos em pesquisa & desen-
Startup Contexto da solução desenvolvida
volvimento, e empregando profissio-
nais técnico-científicos da área de Permitirá que os alunos dos cursos do Programa Escola de
tecnologia e engenharia. Qualificação Profissional, do Fundo Social de Solidariedade do
GetNinjas
Estado de São Paulo (Fussesp), divulguem seus serviços na
O fortalecimento das relações plataforma virtual de oportunidades da startup.
entre o governo e empresas e a ado-
ção de medidas sustentáveis para a Oferece uma ferramenta para tradução automática de conteúdo
manutenção dos ecossistemas envol- em linguagem de sinais. A solução promove a acessibilidade de
deficientes auditivos, tendo em vista que a maior parte dessa
vidos trouxeram impactos positivos população prefere acessar conteúdos em Libras, e que apenas
Hand Talk
também para o cidadão, pois, de for- cerca de 30% desse segmento é alfabetizado em Língua
Portuguesa. A parceria com a empresa se dará em duas frentes:
ma direta, repercutiram no fortaleci-
no site da Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência
mento das ações do governo para o (SEDPcD) e em postos de atendimento do Poupatempo.
cidadão (G2C) a partir do momento
que os governos se tornaram clientes Desenvolvimento de uma plataforma que interage virtualmente
com os usuários, facilitando a comunicação entre prestadores
dos produtos gerados pelas startups Nama
de serviços e clientes. A solução possibilitará que o governo e o
e não somente apoiadores da conso- cidadão se comuniquem de forma automática e personalizada.
lidação do segmento, resultando em
melhor gestão e prestação de serviços Gestão de wi-fi em ambientes públicos e privados que possibilita
o acompanhamento e a gestão de conteúdos para públicos
ao cidadão com o uso das TICs. IaiNet direcionados. A parceria entre a iaiNet e o governo do estado
Nas cidades inteligentes, a ino- de São Paulo ocorrerá no AcessaSP, em quatro postos de
vação e a criatividade são pilares atendimento do programa.
de soluções que visam a melhorar
Plataforma que organiza as informações médicas dos pacientes.
a qualidade de vida da população e O teste com a solução será feito primeiro no Hospital do Servidor
Saúde
integram todas as dimensões da inte- Público do Estado de São Paulo (Iamspe) e deverá, em uma
Controle segunda etapa, ser expandido para toda a rede da Secretaria de
ligência: humana, através da inova-
Estado da Saúde.
ção e da criatividade; coletiva, pela
cooperação de todos na criação; e, Alunos do ITA criaram um site que publica vídeos didáticos
claro, artificial, que inclui todas as Qmágico gratuitos e desenvolveram um software que avalia o aprendizado
dos alunos com medidores de desempenho.
ferramentas tecnológicas públicas
disponíveis e as infraestruturas de Plataforma organizadora de desafios baseada no Facebook, na
comunicação. “É uma cidade das qual os usuários sugerem soluções inovadoras para problemas
pessoas e para as pessoas” explica Progolden que vão desde a esfera urbana à empresarial. Atualmente, o 8º
Soluções Batalhão da Polícia Militar de Minas Gerais utiliza a plataforma
Miguel de Castro Neto (2015). para levantar quais são as melhorias necessárias para a área de
Tecnológicas
Nesse novo modelo de cidade, segurança pública, e o cidadão pode acompanhar as sugestões
a capacidade de usar a tecnologia e via internet.
criar informação a partir dos dados
Estudantes da Fundação João Pinheiro, em Minas Gerais,
produzidos seja pelos municípios, criaram a plataforma digital para promover interação entre
seja por todos os cidadãos, poderá startups e órgãos públicos estaduais. O produto surgiu
contribuir para o seu crescimento, Junto pensando em integrar esses dois atores, por meio de parcerias
e compras governamentais, para resolver questões pertinentes
garantindo uma cultura participativa. nas áreas de saúde, educação, desenvolvimento econômico e
A seguir, são listados alguns tantas outras temáticas de que o Estado trata.
dos diversos produtos bem-sucedidos
nascidos de startups brasileiras que, A solução mineira oferece cursos virtuais de capacitação para
o mercado de trabalho a pessoas com deficiência visual e
tendo o governo como cliente, passa- auditiva. Com uma plataforma adaptada e cursos produzidos
Signa
ram a beneficiar milhões de cidadãos didaticamente em Libras e com legendas, a Signa também atua
junto a empresas para o recrutamento e a integração dessas
no âmbito das relações G2C e con-
pessoas no ambiente de trabalho.
tribuíram para o fortalecimento das
ações para as cidades inteligentes. Fonte: Adaptado de Startup PI (2016). Tabela 2 — Startups e suas soluções para o G2C

88 Dezembro de 2016
5. Discussão Dentre esses pilares, a dimensão deve enfatizar o papel do capital hu-
Estima-se que, até 2050, o per- da complexidade do sistema jurídico e mano na construção das cidades inte-
centual de pessoas vivendo nos gran- tributário das cidades merece atenção ligentes, sendo sempre um agente fa-
des centros urbanos chegará 70% da especial, pois em todos os ecossiste- cilitador à educação, à aprendizagem
população mundial. No Brasil, de mas esse foi apontado como um fator e ao desenvolvimento urbano mais
acordo com o IBGE, o percentual já que impacta negativamente a consoli- rápido, motivando o empreendedoris-
atingia 84,4% da população do país dação do segmento, mesmo naqueles mo, a inovação da indústria e a cria-
em 2010. Com isso, os desafios em onde o governo é atuante, muitas ve- ção de novos produtos devido à força
prol do crescimento inteligente das zes forçando mudança de startups com de trabalho educada e capacitada com
cidades tornam-se maiores a cada dia grande potencial do mercado para re- o uso de soluções e serviços de TICs,
e a evolução necessita acontecer cada giões mais acessíveis nesses aspectos. e não somente um cenário de evolu-
vez mais rápido (Santos, 2016). Uma pesquisa realizada pelo ção a ser projetado para o futuro da
Faz-se necessário que sejam Sebrae em 2014, que ajudou a compor sociedade.
projetadas, de forma coordenada, so- o projeto Global Entrepreneurship Os conceitos apresentados nes-
luções para atender aos aspectos de Monitor (GEM, 2014), relacionada ta pesquisa têm sido cunhados não
governança, inovação, sustentabili- a aspectos de empreendedorismo no somente no Brasil, mas em diversos
dade e inclusão, pautados nas medi- Brasil, registrou que os três tópicos países do mundo. O conhecimen-
das de fortalecimento geradas a partir mais citados como favoráveis foram: to necessita ser disseminado para a
da integração dos ecossistemas apre- capacidade empreendedora, políticas quebra de paradigmas e o avanço dos
sentados neste artigo. governamentais, e educação e capaci- resultados, não somente de forma sa-
A Figura 5 apresenta os pilares tação. Em relação aos fatores limitan- zonal ou regionalizada, mas em todo
considerados por profissionais dos tes, os três tópicos mais citados foram o território nacional, sendo uma fer-
ecossistemas de startups como neces- políticas governamentais, educação e ramenta para o crescimento globali-
sidades essenciais. Cabe aos atores capacitação, e apoio financeiro. zado que projete o país como um todo
envolvidos estabelecer diretrizes para Muitas iniciativas para mudar no cenário mundial.
que eles sejam atendidos na medida e essa realidade têm sido fomentadas O estímulo das instituições de
no tempo certos de cada necessidade, pelos ecossistemas em todo o terri- ensino à criatividade e a conscienti-
pois, apesar de os ecossistemas apre- tório nacional, buscando diminuir ao zação sobre a importância do empre-
sentados neste artigo estarem corre- máximo os fatores limitadores, mas endedorismo para a economia do país
lacionados, todos apresentam suas mantendo o seu equilíbrio. A Figura em escolas, cursos técnicos e univer-
particularidades, que devem ser res- 6 mostra o relacionamento entre as sidades brasileiras, além de todas as
peitadas para a geração de soluções ações para a manutenção desse equi- ações que já estão sendo implemen-
de impacto para a sociedade como líbrio. tadas atualmente da chamada “edu-
um todo. A correlação dos ecossistemas cação empreendedora”, são de suma
importância para que novas startups
e mais cidadãos tenham condição de
compor de forma consciente o gru-
po de atores identificados para esses
ecossistemas.
O fator “políticas governamen-
tais” deve compreender esforços não
somente dos três níveis de governo,
nos âmbitos federal, estadual e mu-
nicipal, de forma coordenada e ex-
tensiva, mas também dos atores dos
ecossistemas e do cidadão que se
Fonte: Adaptado de Startup PI (2016) Figura 5 — Pilares para os ecossistemas de startups beneficia de seus produtos, principal-
mente no que tange ao G2C, para que

Dezembro de 2016 89
novas soluções que aproximam o go- O apoio a projetos de inovação à sociedade como um todo, e não
verno do cidadão sejam criadas com e pesquisa científica e tecnológica, ser um paradigma bem-sucedido e
cada dia mais efetividade. por meio do aporte de recursos para aplicável apenas às regiões Sudeste
O mercado de TI emprega 1,3 o desenvolvimento de soluções de e Sul do país.
milhão de profissionais de acordo com TIC, aproximando a sociedade dos Cabe a todos os setores da so-
a Associação Brasileira das Empresas órgãos públicos bem como do incen- ciedade trabalhar em prol da constru-
de Tecnologia da Informação e Comu- tivo a profissionais da administração ção dos pilares dos ecossistemas de
nicação (Brasscom), com um fatura- pública a apresentar projetos de pes- startup e inovação, avaliando, con-
mento em torno de R$ 123 bilhões em quisa e desenvolvimento de solu- tribuindo e solidificando suas ações,
2015, o que correspondeu a 4,5% do ções em TIC para o G2C e o G2B, tornando suas características itens
PIB nacional, e a maioria das startups faz-se necessário para a integração inclusivos a todas as fatias da popu-
no Brasil e no mundo é voltada para as dos ecossistemas e deve estender- lação e extensivos realmente a todo
TICs: por isso, é importantíssima a va- se principalmente às regiões menos o território nacional, pois inovação
lorização do profissional no mercado cotadas para a criação de startups, com pilares sólidos, para o concei-
e a capacitação e o estímulo para que com o objetivo de desenvolver tal to de startups, é sinônimo de cres-
ele possa empreender e contribuir para cultura empreendedora na região e, cimento para todo seu ecossistema
a elevação desses resultados. por consequência, promover ganhos e sociedade.

Fonte: Índice de cidades empreendedoras (2016).


Figura 5 — Ecossistema empreendedor brasileiro de startups

90 Dezembro de 2016
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Dezembro de 2016 91
Uma visão do ecossistema de startups
de software de Belém (PA)
Cleidson R. B. de Souza
Possui graduação em Ciência da Computação pela Universidade Federal do Pará,
mestrado em Ciência da Computação pela Universidade Estadual de Campinas
e doutorado em Information and Computer Science pela University of California,
Irvine. Realizou estágio pós-doutoral no Massachusetts Institute of Technology.
Pesquisador do Instituto Tecnológico Vale e professor da Universidade Federal do

Divulgação
Pará. Membro Afiliado da Academia Brasileira de Ciências.

Nágila Natália de Jesus Torres


Bacharela em Sistemas de Informação pela Universidade Federal do Pará.
Atualmente é mestranda do curso de Ciência da Computação na área
de Engenharia de Software e professora substituta na UFPA do curso de
Bacharelado em Sistemas de Informação e Engenharia da Computação. Atua
principalmente nos seguintes temas: Engenharia de Software, modelagem de
processos, desenvolvimento web (PHP) e ecossistemas de startups de software
Divulgação

(empreendedorismo, inovação e modelos de negócios inovadores para startups).

RESUMO
Existe um interesse em diversas regiões do mundo em incentivar startups visando a estimular o seu desenvolvimento
e, principalmente, o crescimento econômico das regiões onde estão localizadas. Essas startups não são entidades
isoladas e vivem em um ambiente que inclui outros elementos, ou seja, as startups existem em um ecossistema. O
entendimento desse ecossistema permite a identificação de seus aspectos positivos e negativos, permitindo, assim,
a tomada de decisões sobre como melhor fomentá-lo. Este trabalho apresenta um mapeamento do ecossistema de
startups de software de Belém (PA). Esse mapeamento foi feito a partir de uma pesquisa qualitativa realizada por
meio de entrevistas com os principais atores desse ecossistema.

Palavras-chave: Ecossistema. Startup. Software. Inovação. Belém.

1. Introdução e contextualização berg, 2013). Neste artigo, uma star- ressaltado como importante para a
Recentemente, as chamadas tup é definida como uma organização geração de renda e a atração de fun-
startups têm despertado a atenção em temporária que tem em sua essência a dos de investimentos, bem como para
várias áreas do conhecimento devido inovação e a incerteza; não está limi- o desenvolvimento social e tecnoló-
ao espaço e à visibilidade que elas têm tada a uma área específica, mas busca gico das regiões onde estão instaladas
adquirido e, principalmente, devido à um modelo de negócio escalável, lu- (Kallberg, 2013; Santos, 2016). Esse
geração de riqueza por meio de sua crativo e que possa ser repetido (Ries, crescente interesse pelo empreende-
participação no crescimento econô- 2012; Blank; Dorf, 2012). dorismo, principalmente na área de
mico e tecnológico nas regiões onde O empreendedorismo, materia- tecnologia da informação (TI), na
estão localizadas (Ziviane, 2012; Kall- lizado nas startups, é cada vez mais qual a tecnologia é canalizada para

92 Dezembro de 2016
gerar negócios nas mais diversas pendência natural, um ecossistema 2. Metodologia
áreas do conhecimento, tem criado de startups também exige que seus Este trabalho adotou a pesqui-
uma cultura de apoio ao ecossiste- componentes interajam de forma har- sa qualitativa, por essa metodologia
ma de startups por meio de diversos mônica, buscando a adaptação quan- permitir ao pesquisador ir a campo e
esforços. Governos, universidades e, do algum elemento deixa de existir. buscar informações com pessoas en-
em menor escala, a iniciativa privada Logo, para propor estratégias adequa- volvidas no contexto do objeto que se
têm ajudado a fomentar esse cenário das e programas eficazes de apoio, é quer estudar. Godoy (1995) ressalta
de empreendedorismo (Calmanovici, importante, antes de tudo, conhecer que a pesquisa qualitativa pode ser a
2011; TI Maior, 2015). Exemplos de o ecossistema onde as startups se de- mais indicada para o entendimento de
estratégias de incentivo à criação de senvolvem. um fenômeno como um todo, princi-
startups, visando ao surgimento de Atualmente, existem vários palmente quando a compreensão en-
um ecossistema propício à inovação esforços que visam a entender ecos- volver relações sociais e culturais, o
no Brasil, incluem: sistemas por meio de mapeamentos que é justamente o caso do mapea-
1. O Startup Brasil1 e o Brasil- realizados nas mais diversas cidades mento de um ecossistema de startups,
MaisTI2, que fazem parte do e países. Como exemplo disso, é pos- que envolve diversos atores em dife-
Programa Estratégico de Sof- sível destacar: no contexto internacio- rentes instituições.
tware e Serviços de Tecnologia nal, a Startup Genome4, uma comuni-
da Informação do TI Maior3, dade digital que visa a mapear startups 3. Coleta de dados
do Ministério da Ciência, Tec- do mundo inteiro. No âmbito nacional, Entrevistas semiestruturadas
nologia e Inovação (MCTI); e pode-se citar o trabalho de Kon et al. foram adotadas neste trabalho, pois
2. O Serviço Brasileiro de apoio (2014) sobre Israel. Finalmente, um permitem o controle e, ao mesmo
às Micro e Pequenas Empresas exemplo de um mapeamento de ecos- tempo, a flexibilidade em sua con-
(Sebrae), através de programas sistema no contexto regional é o traba- dução, ou seja, nessa abordagem as
como a Feira do Empreende- lho de Santos (2016) sobre a cidade de perguntas são uma combinação de
dor, que objetiva fomentar a São Paulo. perguntas fechadas (controle) e aber-
criação de um ambiente favo- Porém, na cidade de Belém tas (flexibilidade) (Dewalt; Dewalt,
rável para a geração de opor- (PA), não existe nenhum mapeamen- 2002). Assim, esse tipo de entrevista
tunidades de negócios inova- to do ecossistema de startups. Apesar permite a indagação de outras ques-
dores. da existência de várias entidades que tões que não foram previamente ela-
A sustentação das startups, en- procuram incentivar o empreendedo- boradas, mas que emergem conforme
tretanto, exige um conjunto de fato- rismo e as startups de software na re- as respostas dos informantes e a flui-
res que devem trabalhar juntos em gião, não existe uma análise minucio- dez da própria conversa.
prol de um ecossistema saudável. sa desse ecossistema que inclua seus O método “bola de neve”,
Um ecossistema de startups é vis- problemas, seus principais atores e as também conhecido como cadeia de
to como um ambiente composto de relações entre esses atores. O objetivo referências (Dewes, 2013), foi utili-
programas de incentivo ao empreen- deste trabalho é justamente atender a zado para a identificação de outros
dedorismo, universidades, incubado- essa falta de estudos sobre o ecossis- informantes relevantes para a pesqui-
ras, empreendedores e capital, entre tema de startups de software na cidade sa. Ou seja, o pesquisador seleciona
outros fatores que influenciam direta de Belém. Espera-se que, com a pes- uma amostra do público-alvo e cada
ou indiretamente as startups (Aleisa, quisa descrita neste trabalho, o apoio entrevistado indica outros possíveis
2013). Assim como um ecossistema oferecido por essas entidades possa entrevistados sucessivamente. Esse
biológico, em que os seres convivem ser mais bem direcionado, visando a método utiliza a rede de amizades e
mutuamente em uma espécie de de- suprir as lacunas hoje existentes. contatos dos membros que fazem par-
1 BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. Startup Brasil. Disponível em: <http://startupbrasil.org.br/>. Acessado em:
01 nov. 2016.
2 BRASILMAISTI. Disponível em: <http://www.brasilmaisti.com.br/>. Acessado em: 01 nov. 2016.
3 BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. TI Maior. Disponível em: <http://timaior.mcti.gov.br/>. Acessado em: 01 nov. 2016.
4 STARTUP GENOME. Disponível em: <https://startupgenome.co/>. Acessado em: 01 nov. 2016.

Dezembro de 2016 93
te da amostra até alcançar um tamanho
amostral desejável. Por exemplo, po-
demos presumir que uma startup nor-
malmente tem contato com outra(s)
startup(s), formando, então, uma teia
de relações no ecossistema. A quan-
tidade de entrevistas e os elementos
que compõem todo o escopo amostral
estão dispostos a seguir na seção de
“Contexto da Pesquisa”.
A seleção da amostra foi feita
com base em um modelo conceitual
sobre ecossistemas de startups que
foi desenvolvido em nosso trabalho
anterior (Torres; Souza, 2016). Esse
modelo conceitual, resultado de uma Tabela 1 — Total de entrevistados, por categoria
revisão da literatura com 20 trabalhos, ber: aberta, axial e seletiva. Na codifi- recomendado pela Teoria Funda-
foi norteado pelos seguintes temas: cação aberta, os dados são analisados mentada em Dados (Strauss; Corbin,
estudos de ecossistemas de startups, minuciosamente (linha por linha) para 2008). Na etapa 1, o máximo pos-
análise do funcionamento de startups serem classificados dentro de um (ou sível de elementos do ecossistema
de tecnologia, dificuldades de empre- mais) conceito(s) que representa(m) identificado anteriormente foi englo-
ender em ecossistemas de startups, e esses dados de forma abstrata. Na co- bado. A etapa 2 teve o objetivo de
relatos e mapeamento sobre ecossiste- dificação axial, emprega-se o método ratificar, ou não, os dados anteriores
mas de startups. Esse modelo permitiu de comparação constante entre as ca- e ainda abranger um número maior
identificar elementos importantes em tegorias para desenvolver novas cate- de startups de software e outros ele-
um ecossistema de startups e garantir gorias. O surgimento dessas categorias mentos do modelo conceitual que
que membros de todos os elementos justifica e esclarece as primeiras, em ainda não tinham sido entrevistados.
do ecossistema fossem entrevistados. que vão ser identificados fenômenos
relacionados, contextos, estratégias 6. Resultados
4. Análise dos dados interacionais e as consequências das O estudo indicou uma teia de
Métodos de codificação da te- ações (Banks et al., 2000). Finalmen- relações entre os elementos presentes
oria fundamentada em dados foram te, na codificação seletiva é eleita ou no ecossistema de startups de software
utilizados, pois essa é uma aborda- criada uma categoria principal que irá de Belém (Figura 1). As relações con-
gem interpretativa, pela qual é possí- compor o conjunto no final da teoria tínuas se mostraram fortes, ou seja,
vel compreender os dados de modo a criada sobre o contexto pesquisado. são relações bastante cultivadas. As
relacioná-los para transformá-los em Este trabalho utilizou as codificações relações pontilhadas denotam relações
conhecimento. Bartelmebs (2009) in- aberta e a axial, pois seu objetivo não fracas, ou seja, nas quais existem pou-
dica que é preciso transcrever e des- é formar uma teoria, mas compreender cas interações entre os elementos ou
tacar trechos dos dados considerados um fenômeno de interesse, neste caso ainda pouca influência de um elemen-
importantes e tentar resumi-los em pa- o ecossistema de startups de Belém. to sobre o outro. As setas unidirecio-
lavras que representem ou façam sen- nais indicam que o elemento de onde a
tido para o texto, que irão constituir as 5. Contexto da pesquisa seta sai influencia/implica o elemento
categorias ou os códigos de análise. As entrevistas semiestrutura- ao qual leva a seta. Por outro lado, as
A teoria fundamentada em dados das foram divididas em duas etapas setas bidirecionais indicam relações
(Strauss; Corbin, 2008) é constituída (Tabela 1), de maneira intercalada de reciprocidade.
de três estágios de codificação, a sa- com a análise de dados, conforme A seguir, pode-se notar que, du-

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minação do conhecimen-
to e discussão do cenário
empreendedor atual, e de
estratégias para fomentar
o ecossistema. Por exem-
plo:
“O governo, [...] sempre
tá na parceria com a gen-
te, tá sempre ali caso pre-
cise de um palestrante ou
alguém pra fazer mento-
ria ou alguém que possa
dar uma consultoria...”
(P. de apoio C, informa-
ção verbal)
As universidades
têm relação com todos
os elementos citados
anteriormente, porém
algumas relações são
mais fortes que outras,
Figura 1 — Ecossistema de startups de software de Belém
conforme a Figura 1. Por exemplo, a
rante e/ou após a descrição dos ele- “Olha as startups que eu tenho incubadora, por estar dentro da pró-
mentos da Figura 1, existem trechos contato são fora daqui, aqui na pria universidade, apresenta diversos
de códigos retirados das entrevistas. região, por incrível que pareça, projetos e programas para o incentivo
Esses trechos estão expressos entre eu tenho pouco contato com a às startups. A aceleradora, diferente-
aspas, justamente por serem represen- comunidade... não é falta de mente disso, ainda não tem nenhum
tações fiéis da fala dos entrevistados. interesse, mas as startups pelo projeto em desenvolvimento com as
A razão para incluir trechos dos có- menos as que se mostram lá no startups, pois ainda está nascendo e
digos segundo, Banks et al. (2000), é grupo, nos próprios meetups, estabelecendo parcerias com as uni-
evidenciar a autenticidade da narrativa têm ideias, mas não estão desen- versidades. Pode-se observar, então,
transmitida pelos autores. volvendo o produto...” (Startup o crescimento do ecossistema de star-
No contexto de Belém, os rela- H, informação verbal) tups de Belém com a entrada recente
cionamentos entre as startups entrevis- “É mais tipo como se fosse men- de novos elementos. Por outro lado,
tadas são pouco cultivados. Pode-se tores, pessoas com mais expe- outros componentes têm atuado de
observar, por outro lado, que há uma riência, aí quando a gente tem forma contínua em Belém, como é o
maior relação entre startups de Belém uma dúvida, falamos com eles, caso das próprias universidades que,
com startups de outros estados. Isso para ver o que eles acham, pra por meio de diversos tipos de incen-
ocorre porque, como Belém agrega gente errar menos e tentar acer- tivos, têm ajudado no estabelecimento
um número maior de startups inician- tar o máximo...” (Startup I, in- do ecossistema. A universidade tem
tes, ou seja, que ainda estão em fases formação verbal) se destacado por ser um elemento
de construção e validação do produ- O relacionamento entre univer- que vem estimulando cada vez mais
to, elas preferem manter contato com sidade e os elementos incubadora, par- os alunos a aprimorarem a sua capa-
startups mais experientes, que acabam que tecnológico, comunidades/órgãos cidade criativa para criar startups de
atuando como mentoras. Esse contato, de fomento e aceleradora, ainda que software a partir do capital intelectual,
na maioria das vezes, é remoto, princi- informal, se estabelece por meio de o que é importante para o desenvol-
palmente por causa da distância física parcerias, apoio na divulgação e rea- vimento da educação formal. Esses
entre elas. lização de eventos, patrocínios, disse- estímulos variam desde o ensino de

Dezembro de 2016 95
programação, pelo qual se propõe ao outros encontros que discutiam a prá- se tem quase nenhum tipo de apoio
aluno que resolva problemas reais a tica do empreendedorismo na compu- direto ou algum programa específico
partir de soluções inovadoras, até a re- tação. para as startups, ou seja, que realize
alização de eventos, gincanas, hacka- “Assim o que me motivou ser investimento, seja financeiro, inte-
thons entre outros. Inicialmente, a pre- empreendedor foi com o [...] lectual ou institucional. Um relato
tensão não era a de que os estudantes meu orientador. [...] ele já tem pontual afirma que o motivo para a
criassem empresas a partir dessa di- esse espirito de empreendedor, a ausência de um apoio direcionado
dática, mas isso acabou gerando inte- gente sempre conversava sobre está no fato de a startup não ser exa-
resse nos alunos conforme se observa fazer um negócio, construir um tamente uma empresa com CNPJ,
a seguir: produto, e tornar esse produto não possuir renda média, ser com-
“Dentro de sala de aula eu sem- melhor...” (Startup E, informa- posta de poucos funcionários e ter
pre estimulo nos trabalhos de ção verbal) um grau de risco elevado.
classe que eles pensem em ideias Enquanto a educação formal, “Falando como indústria a gen-
que elas possam ser úteis e uma oriunda do ensino acadêmico, é im- te ainda vê um entrave com re-
vez sendo úteis, ou seja, resol- portante para a formação empreen- lação às startups, algumas não
vendo problemas que existem de dedora, a educação informal também têm CNPJ, não estão formaliza-
fato, pode se tornar um negócio, é responsável pelo desenvolvimento das... só têm um funcionário tra-
então essa é uma primeira ini- desse perfil. A educação informal é balhando e não têm uma renda
ciativa que não é explícita. O adquirida com experiências. O pro- média pra caminhar como uma
objetivo quando eu estimulo eles blema é que os empreendedores de empresa... então a gente verifica
a resolverem problemas não foi Belém têm pouca educação informal, que é um pouco de grau de risco
que eles criassem negócios...” o que, entretanto, é aceitável em um para nós da indústria, em inves-
(Universidade B, informação ecossistema inicial que ainda não tir na startup...” (P. de apoio C,
verbal) está em um ciclo virtuoso. Espera-se, informação verbal)
“Ultimamente o que eu tenho mais tarde, que, por meio de peque- Os eventos promovidos pela in-
feito é ministrar disciplina prá- nos esforços, o ecossistema se desen- cubadora, pelo parque tecnológico e
tica e essa prática envolvendo volva de forma natural. por órgãos de apoio destinados à for-
o desenvolvimento prático de “A gente quer começar a fo- mação de uma cultura empreendedora
software com clientes fora da mentar esse tipo de público e de- foram importantes para as startups no
universidade... então eu acredi- pois com o tempo a gente acre- início do negócio, ou seja, quando o
to, que embora o foco não seja dita que vai ser uma coisa mais ecossistema era desconhecido para
tanto a questão do empreende- orgânica, a partir do momento elas. De acordo com as entrevistas, os
dorismo, o foco seja que o aluno que a gente vai ter sucesso com eventos são interessantes para estimu-
tenha uma vivência mais prática os projetos, os investidores or- lar o networking, conhecer pessoas e
da engenharia de software, mas ganicamente já vêm buscar os identificar parceiros. Todavia, após a
acho que a partir daí que eu nossos projetos, saber sobre etapa inicial, a prioridade não é mais
tenho observado que os alunos eles...” (Aceleradora A, infor- participar de eventos, mas sim desen-
acabam se interessando como é mação verbal) volver e lançar o produto. Logo, esses
a realidade do mercado”. (Uni- As comunidades/os órgãos de eventos têm a característica de estimu-
versidade C, informação verbal) apoio, em sua maioria, ajudam as star- lar, de “ensinar” como começar um
Além disso, apesar de não ser tups de forma indireta. Há, por exem- negócio, de aproximar pessoas com
possível dizer exatamente quando o plo, um programa que dá treinamento ideias em comum e, sobretudo, de ins-
interesse pelo empreendedorismo sur- para um grupo de uma aceleradora que tigar pessoas a empreender. As men-
giu, o estímulo ao empreendedorismo, por sua vez dá suporte intelectual para torias, por exemplo, nasceram após os
na maioria dos casos, foi intensificado startups. Outro exemplo são institui- encontros e eventos, nos quais pessoas
durante a graduação com os próprios ções que promovem palestras sobre com projetos ou ideias individuais en-
professores e também por meio da propriedade intelectual e sobre como contram outras que, de alguma forma,
participação em eventos, congressos e preparar um plano de negócio. Não têm experiência anterior em um negó-

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cio ou são empreendedores ou profes- problema e como eu vou resol- a startup a recusar o investimento nes-
sores, e acabam virando mentores. ver aquilo’, então por isso me se estágio é não querer ceder parte da
“Algumas [reuniões] são pós- envolvo muito na cultura ameri- empresa ou parte dos lucros para o in-
eventos, onde a gente acaba cana porque eles estão em outro vestidor.
mantendo um contato e achando nível...” (Startup A, informação “A gente quer ter poder de bar-
interessante o projeto e tenta de verbal) ganha, a gente quer utilizar o
alguma forma motivar o pes- “Não gosto de eventos que se bootstrapping, a gente vai se
soal, a gente vai ajudando, vai colocam as ideias para compe- sustentar o quanto a gente pu-
oferecendo, se tiver qualquer tir, não é sadio, não é assim que der, pois quanto menos a gente
dúvida me procura...” (Mentor o mercado funciona, acho que der da empresa para o investi-
A, informação verbal) não estimula o empreendedoris- dor, melhor pra gente...” (Start-
“A gente participou de eventos mo, mas a competição...” (Start- up A, informação verbal)
no início da criação da empre- up C, informação verbal) Para alguns entrevistados, é
sa, mas hoje a prioridade [...] Houve contatos de startups com preciso tomar cuidado com os inves-
[é] outra (lançar o produto). investidores (sendo esses investido- tidores e com suas propostas. Uma
Os encontros são importantes res não locais). Os investidores pare- startup, em particular, não aconse-
para observar o que não funcio- ceram ser uma opção bastante atrati- lha nenhuma iniciante a aceitar fi-
nou...” (Startup C, informação va, porém eles preferem investir em nanciamento de investidor porque
verbal) startups que estão em estágios avan- ele só visa ao retorno financeiro,
Esses eventos voltados para em- çados do desenvolvimento do negó- menosprezando o negócio e a pró-
preendedorismo e startups receberam cio, pois consideram que o risco asso- pria equipe.
diversas críticas. Entre elas, citam-se: ciado delas seja menor. Logo, o início “Eu não aconselho nenhuma
(i) a competição realizada por muitos tende a ser mais difícil, e é quando as empresa que está nascendo ter
eventos não é uma prática saudável startups precisam, com maior ênfase, ilusões de ter uma pessoa en-
para fim de estímulo ao empreende- de dinheiro. trando no negócio pra investir
dorismo porque incita a concorrência “[Os investidores] querem in- somente o dinheiro... tem que
e não a criatividade; (ii) alguns pales- vestir em algo que já está ge- pensar mil vezes antes de acei-
trantes que incentivam o aparecimento rando dinheiro. Se houvesse um tar qualquer financiamento,
de empresas não são empreendedores, protótipo funcional na época porque aqui se tem uma cultu-
o que desestimula os ouvintes; (iii) provavelmente teríamos saído ra de que o dinheiro é o mais
os eventos são muito motivacionais com um investidor...” (Startup importante e menosprezar sua
em detrimento de ajudar no desen- B, informação verbal) capacidade por conta de entrar
volvimento do produto. Nesse caso, “Conversamos com alguns in- com o dinheiro...” (Startup C,
as startups que já têm pelo menos um vestidores, até porque estávamos informação verbal)
produto funcional praticamente não em uma das maiores e melhores Falta também a sociedade acre-
participam desses eventos, porque aceleradoras, aí eles disseram ditar na atuação, principalmente, da
querem algo mais voltado para a exe- que quando a gente colocasse o incubadora e do parque tecnológico.
cução do negócio: produto no mercado a gente vol- Segundo as entrevistas, essa socie-
“Aqui tem muita coisa motiva- tava a conversar, eu fiquei muito dade ainda vê esses elementos com
cional, eu quero ver é mais coisa interessado, só que eu preciso certa desconfiança.
técnica, mais coisa pesada, nor- ter isso no mercado...” (Startup “A sociedade em si ainda não
malmente o americano fala mais H, informação verbal) vê o parque [...] como Instituto
sobre coisas técnicas, negócios, Nesse sentido, as startups rela- de Inovação...” (P. de Apoio D,
faturamento, o brasileiro ainda tam que, quando se está em estágio informação verbal)
tá muito mais no ‘Vamos lá pes- avançado, dificilmente ainda se quer “Apesar do parque já ser conso-
soal que vamos mudar o Brasil’. investimento, pois a parte mais difí- lidado no mundo, no país o con-
No início, confesso que estive cil do processo, que é a fase inicial, ceito de parque ainda é novo, a
nisso, eu gosto de ‘eu tenho um já foi superada. Outro fator que leva dificuldade maior é fazer com

Dezembro de 2016 97
que essa proposta de parque encontrar uma forma de geração de importante apenas no início do negó-
passe a ser abraçada pela socie- renda em situações em que não exis- cio. Para startups que já tinham um
dade, que as pessoas acreditem tem outras alternativas. O medo do produto ou que estavam em estágios
mais nos resultados...” (Parque fracasso reforça o perfil de “empre- mais avançados, os eventos não im-
A, informação verbal) endedor por necessidade” em vez do portavam na mesma intensidade, isso
“empreendedor por oportunidade”. porque eles têm como característi-
7. Discusão Porém, isso contrasta com as ca apenas motivar o surgimento de
Os resultados apresentados na entrevistas realizadas com as startups, ideias, sem apoiar startups que estão
seção anterior sugerem que as startups pois, apesar de enfrentarem muitos de- em estágios maduros do desenvol-
em Belém são motivadas por expe- safios, elas se mostraram confiantes e vimento do produto. Além disso, a
riências alheias, por experiências de empolgadas, principalmente porque a falta de divulgação do objetivo das
trabalho, por conversas informais com maior motivação delas é poder mudar comunidades empreendedoras e a
pessoas inseridas no ecossistema e por a realidade na qual se encontram. Nes- participação de grandes empresas em
participações em eventos. No traba- se caso, o dinheiro não é o mais impor- eventos dedicados a startups foram
lho de Santos (2016), esses estímulos tante, mas sim a felicidade que a ativi- motivos de críticas.
compõem a educação informal, res- dade empreendedora proporciona para De acordo com os informantes,
ponsável pela formação empreende- essas pessoas. Isso parece ser, então, um elemento muito importante duran-
dora das pessoas. Segundo Isenberg uma característica de empreendedores te o início da jornada empreendedora,
(2011), o capital humano é atualizado brasileiros, para os quais o prazer de em Belém, é a universidade. Identifi-
através da formação, da experiência e mudar algo e criar coisas é mais im- cou-se que as faculdades de compu-
de histórias de sucesso que inspiram portante que o retorno financeiro que tação estão trazendo uma abordagem
novas gerações e tornam a sociedade essa atividade pode proporcionar, pois de ensino que estimula a relação entre
mais tolerante ao risco e ao fracasso e essa característica, além de ter sido alunos e o meio externo à academia.
à criação de riqueza. identificada em Belém, foi encontra- Em Belém, essa abordagem surgiu há
A literatura (Lemos, 2011; Kall- da em empreendedores de São Paulo mais ou menos quatro ou cinco anos
berg, 2013; Oliveira et al., 2013; Silva, (SANTOS, 2016). Os dados deste es- e o seu objetivo inicial não foi apoiar
2011) afirma que duas das característi- tudo parecem reforçar a característica os alunos a criar empresas, mas a de-
cas marcantes de empreendedores de otimista desses empreendedores, pois senvolver projetos de software para
ecossistemas de startups, em países em nenhum momento foi citado nas pessoas reais, resolvendo problemas
cujo ecossistema ainda é iniciante, são entrevistas o medo de falhar. Pelo con- reais. Além da sala de aula, a univer-
a aversão ao risco e o medo de falhar. trário: as startups entrevistadas tinham sidade tem criado diversos estímulos
Na Alemanha, isso é uma característi- persistência de tentar. Por exemplo, para esses alunos, como maratonas de
ca visível, mas já existem iniciativas uma das startups entrevistadas estava programação, fábricas de software,
de ensino de empreendedorismo na perseverando com uma segunda equi- projetos com startups e eventos que
educação para melhorar esse panora- pe na mesma startup; outra startup, promovem o empreendedorismo na
ma (Von; Muller, 2009). Assim como em um segundo negócio; outros em- computação. Em Belém, essa cultu-
o povo alemão, o povo brasileiro, em preendedores deixaram seus empre- ra tem gerado uma atuação cada vez
geral, também apresenta essa carac- gos, um deles abandonou o mestrado, maior de alunos e profissionais da
terística, o que reforça uma cultura e partiram para a criação de startups computação na criação de startups a
defasada para o empreendedorismo, que, como se sabe, têm um alto risco. partir de projetos e pesquisas ligados
mas um ponto positivo é o otimismo Outros profissionais de startups mais às atividades universitárias. Apesar
do brasileiro em relação à absorção de conservadores pretendem, assim que dessa atuação incipiente da universi-
novos mercados e tecnologias justifi- o retorno financeiro for mais palpável, dade no ecossistema de startups, pode-
cado pelo aumento do poder de com- abandonar seus empregos atuais para se dizer que foi a partir disso que as
pra da classe C e pelo crescente acesso atuar de forma exclusiva na startup. pessoas começaram a enxergar o em-
à internet (Oliveira et al., 2013). Para Conforme já mencionado, a preendedorismo como oportunidade
Silva (2013), essa iniciativa do brasi- relação entre startups e eventos que de mudar de vida, dando início a um
leiro é motivada pela necessidade de estimulam o empreendedorismo foi ciclo virtuoso. Dessa forma, as uni-

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versidades em Belém e o empreende- mentos motivadores. A relação entre o de maior risco (Oliveira et al., 2013).
dorismo ganharam “nova roupagem” parque tecnológico e as startups não se Além disso, as startups ressaltam que
ao querer transformar ideias criativas mostrou muito forte, afinal as empre- o investimento oriundo de investido-
e conhecimento científico em inova- sas ainda não sabem efetivamente qual res não é saudável, pois eles estão in-
ções tecnológicas e negócios lucrati- a proposta do parque e como ele pode teressados apenas no retorno financei-
vos. Em contrapartida, em São Paulo, ajudá-las. A aceleradora ainda está in- ro. Em São Paulo, foram observadas
os mecanismos institucionais que se cipiente e sua atuação atualmente está situações nas quais o investidor cobra
mostraram mais relevantes foram as concentrada na definição de parcerias excessivamente a startup por resulta-
incubadoras e aceleradoras, enquanto com as universidades para poder ini- dos (Santos, 2016).
as universidades, apesar de estarem ciar sua atuação em Belém.
trabalhando para reverter esse quadro, As incubadoras se mostraram 8. Considerações finais
ainda não têm um papel significativo em estreita relação somente com as Este estudo mapeou o ecossiste-
no ecossistema (Santos, 2016). startups que estão incubadas, apesar ma de startups de software da cidade
A prática de estimular o empre- de as entrevistas terem apontado de- de Belém, através de uma pesquisa de
endedorismo nos alunos, porém, não é ficiências na sua infraestrutura. Na cunho qualitativo guiada por entrevis-
nenhuma novidade em universidades verdade, a relação é forte porque o tas semiestruturadas (Dewalt; Dewalt,
nos Estados Unidos. Ziviani (2012) local de instalação dessas startups é a 2002) e pelo método “bola de neve”
ilustra que as universidades de ponta incubadora, porém, a “interação” en- (Dewes, 2013). Utilizou-se o conceito
estadunidenses incentivam o apareci- tre as startups incubadas está limitada de codificação da teoria fundamenta-
mento de empresas de alta tecnologia às dependências do prédio, ou seja, da em dados (Strauss; Corbin, 2008)
na área de TI, levando ao surgimento há pouco ou nenhum contato entre como procedimento de análise de da-
de várias empresas de sucesso, tais elas. Fora da incubadora, as startups dos. Entre os resultados, destaca-se
como Google e Facebook, criações de têm um relativo contato com outras, que foi possível identificar que star-
alunos de ciência da computação de principalmente com startups de fora tups de Belém não interagem ou inte-
Stanford e Harvard, respectivamen- do estado. Isso acontece porque essas ragem pouco. Essa distância entre os
te, e evidenciam que isso é uma for- startups estão em estágios mais avan- elementos do ecossistema é um ponto
ma importante de geração de riqueza. çados, o que as torna mais atrativas que merece atenção. Embora a pre-
Cruz (2012) afirma que é essencial que para as startups de Belém que, como sença de comunidades de fomento ao
as universidades brasileiras comecem iniciantes, podem aprender com os empreendedorismo tenha sido impor-
a disseminar entre seus alunos a ideia erros e com a experiência das startups tante para atrair ainda mais empreen-
de criar uma empresa e que isso pre- mais maduras. dedores, o networking em eventos tem
cisa ser valorizado, pois a maior parte O elemento investidor não teve sido importante apenas no início do
das startups é criada por estudantes. uma relação forte com as startups. negócio e criticado por diversas vezes
Entretanto, apenas recentemente essa Verificou-se que houve um contato por startups em estágios mais avança-
perspectiva de empreendedorismo inicial de possíveis investidores com dos. De acordo com os entrevistados,
está sendo absorvida por universida- pelo menos quatro startups entrevista- os programas de apoio também não
des em Belém, devido à necessidade das, mas essa relação não foi efetiva- causam grandes impactos em startups.
de estimular a capacidade criativa e da, principalmente pelo nível inicial e Por outro lado, a forma tradicio-
inovadora dos jovens. de alto risco em que se encontravam nal de ensino nas universidades está
Os programas de apoio, em sua essas empresas. Nesse sentido, há lentamente sendo substituída por ma-
maioria, não detinham nenhum tipo relatos na literatura de que existe ca- neiras inovadoras de incentivar os alu-
de incentivo institucional, intelectu- pital de investimento suficiente, mas nos a aplicar o conhecimento prático
al ou financeiro para as startups. Em poucos têm acesso a ele; assim, es- no mercado, utilizando-se da inovação
contrapartida, motivavam as pessoas, ses investidores preferem investir em e da capacidade intelectual deles. Isso
divulgavam o empreendedorismo e grandes empresas, nas quais os riscos tem despertado a curiosidade e a cria-
disseminavam o conhecimento atra- são menos elevados, argumentando tividade dos estudantes, que durante a
vés de eventos, feiras e competições, que falta estrutura legal que os incen- graduação e depois dela têm se inte-
por isso foram vistos apenas como ele- tive a investir em empreendimentos ressado e se esforçado para criar start-

Dezembro de 2016 99
ups baseadas nos conhecimentos ad- de ecossistemas de startups de sof- se isso afetou a maturidade do ecos-
quiridos na universidade. Em Belém, tware. Além disso, a transcrição in- sistema e, consequentemente, aumen-
existem dificuldades em explorar com tegral dos áudios foi uma atividade taram as histórias de sucesso, e se sur-
eficiência alguns elementos do ecos- que consumiu bastante tempo para giram investidores e a confiança deles
sistema, como os investidores. Entre- ser concluída. Esta pesquisa também em investir em startups foi encorajada.
tanto, isso faz parte de um ecossistema está limitada à cidade de Belém, De um modo geral, espera-se
que está se iniciando, no qual ainda uma vez que não era o objetivo ma- que se tenha contribuído com a forma-
não há uma cultura empreendedora pear outras cidades regionais. ção principalmente do ecossistema e
enraizada. É preciso estimular cada Trabalhos futuros incluem a que as startups de software de Belém
vez mais a participação de entidades realização deste trabalho em outras enxerguem neste trabalho a oportuni-
para então criar um ciclo virtuoso. cidades e capitais do Brasil, a fim de dade de crescerem, considerando as
Algumas dificuldades foram confrontar os dados com o objetivo de oportunidades e os desafios existentes.
encontradas no decorrer da pesqui- estimular cada vez mais a reflexão de Que os outros elementos do ecossiste-
sa como a pouca disponibilidade órgãos de fomento. Interessante tam- ma também se esforcem para auxiliar
de informantes e de materiais na bém identificar, anos mais tarde, o que na criação de uma cultura empreende-
literatura referentes a mapeamentos mudou após experiências adquiridas: dora em Belém.

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100 Dezembro de 2016


Memória Viva

caiu a ficha?
Segundo os registros de direitos auto- vida social de forma ampla, alcançando as artes,
rais da Biblioteca Nacional, a partitura do manhas e falas das pessoas ao longo do tempo.
“samba carnavalesco” Pelo Thelephone é a
certidão de nascimento de um gênero mu- Nessa dinâmica, um termo ou expressão li-
sical agora centenário. Havia, claro, outros gado a alguma inovação tecnológica pode, pelos
sambas em circulação na época do registro usos e costumes, ganhar as ruas e permanecer
da música, em 1916. O que obteve a prima- no vocabulário geral para além da obsolescência
zia da história soa mais como um maxixe, do produto ou serviço a que se referia de início. Na
misto de lundu africano com polca europeia. área da telefonia, por exemplo, muitos ainda hoje
Mas vale o escrito, e a constatação que vem dizem que vão discar um número, embora ma-
ao caso aqui: já em sua estreia oficial, uma nuseiem aparelhos dotados de teclados, analógi-
manifestação emblemática de nossa cul- cos ou digitais. Saber o porquê de existir o verbo
tura popular abordava um novo dispositivo discar tornou-se, com o correr dos anos, um co-
tecnológico e evidenciava sua influência na nhecimento quase exclusivo do pessoal que uti-
comunicação e na sociabilidade cotidianas. lizou os antigos modelos de telefone com disco.

Nenhuma novidade nesse tipo de apro- Também é usual que esse processo agregue
priação, em especial no que diz respeito à sentidos renovados a palavras e expressões que,
nossa música, tão pródiga na crítica política em contextos diversos, assumem outras conota-
e na crônica de costumes quanto na assi- ções. Dizemos que “a ficha caiu” quando alguém fi-
milação e disseminação de novidades. A nalmente se dá conta de algo que antes não perce-
verdade é que o impacto transformador das bia. Porém, em plena era da mobilidade, associar a
novas tecnologias e mídias se espraia na expressão à situação que por analogia a originou,

Dezembro de 2016 101


convenhamos, denota certa idade. Em geral, municar e se relacionar, haja vista a ex-
isso é apanágio de quem, no século pas- pansão das redes sociais e a miríade de
sado, inseria fichas metálicas em telefones aplicativos que seguimos baixando em
públicos, no afã de completar suas ligações. nossos smartphones. Subjacente a esse
Uma experiência que pode soar insólita, ou cenário, está a inquietação do espírito
Memória Viva

mesmo bizarra, a um hiperconectado nativo humano, a centelha da inovação aliada


digital pertencente à “Geração Millennials”. a um permanente senso de curiosidade.

Para quem nasceu nos estertores do Retomando o fio da história, quarenta


mundo analógico, pode até valer o barato anos antes do registro de Pelo Thelepho-
de ouvir um vinil cult num toca-discos vinta- ne, D. Pedro II integrava o júri responsá-
ge. Mas a cabeça desse pessoal está mes- vel por avaliar as invenções em exibição
mo é na nuvem, com seus apps e serviços numa espécie de Campus Party da Expo-
on demand. São jovens já totalmente imer- sição Centenária, que celebrava, na Fila-
sos na fluidez, horizontalidade e intercone- délfia (EUA), os avanços da era industrial.
xão ubíqua dos ambientes digitais em rede.
Eles têm uma pressa danada, unem prazer Um dos expositores era Alexander
e trabalho, querem tudo ao mesmo tempo Graham Bell. Conforme seus relatos, a atu-
agora. São avessos a hierarquias, possuem ação do imperador do Brasil, um entusiasta
fome de reconhecimento e empreendem, das inovações em ciência e tecnologia, foi
sem medo de errar, nos ramos da econo- decisiva para acelerar o reconhecimento
mia criativa e nos ecossistemas de startups. de sua nova invenção. Sem a insistência
de D. Pedro II para que os jurados avalias-
Todo esse movimento causa um bo- sem o invento com atenção e antecedên-
cado de ansiedade, fricções e conflitos cia, a ficha com relação à relevância do
geracionais nas famílias e organizações. telefone iria demorar a cair – e sabe-se lá
Provoca também reflexos profundos em se Pelo Thelephone viria a ser considera-
nossa maneira de trabalhar, consumir, co- do, tempos depois, como o primeiro samba.

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