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Contestado

A terra e a guerra, conhecer para pertencer

Célia Regina De Bortoli


Nascida e residente em Salto Veloso (SC)
Psicóloga
Diretora de Cultura do Departamento Municipal de Cultura de Salto Veloso (SC)

O Vale do Contestado é um limite geográfico, cultural e turístico, que


compreende 62 municípios de Santa Catarina onde ocorreu a Guerra do
Contestado. Em 2012 comemora-se o centenário do conflito armado que definiu
os limites territoriais entre os estados de Santa Catarina e o Paraná. Os limites
estão definidos, mas os conflitos ainda não cessaram como sugere o título deste
livro. Há uma batalha em todo o território e fora dele que pretende resgatar,
desvendar a história desta guerra e deste povo. O historiador Nilson Thomé,
afirma que a Região do Contestado ainda não tem sua História construída, tem
passado e tem histórias.
Indivíduos constroem sua identidade e moldam sua personalidade através
do significado que dão as histórias de suas origens e desta forma passam a
pertencer a uma família por laços sanguíneos e/ou afetivos, segundo Basbaum
(citado por Thomé) um povo constrói sua identidade e constitui uma sociedade
humana se tem uma história para poder perpetuar a sua identidade, preservar
seus traços culturais e cultivar suas tradições.
Apesar da atual e qualificada bibliografia sobre o conflito, a maioria dos
catarinenses pouco sabem sobre o evento, livros literalmente mofam nas
prateleiras das bibliotecas. Por que esse conflito não faz parte da “história
oficial” do Brasil? Ou se faz, é apenas timidamente, nunca levando em conta
que foi em números a maior guerra civil do país?
Em 2012 não há o que comemorar e sim constatar, desvendar, deslindar.
Há muitas pessoas interessadas no tema e na data, pois será um momento de
visibilidade no qual nossos historiadores, pesquisadores, poetas, compositores,
dramaturgos, artistas, artesões e tantos outros preocupados com o resgate
histórico e cultural da região contestada poderão divulgar seus trabalhos. O
Estado de Santa Catarina, através da Secretaria de Turismo e Cultura assumiu o
compromisso de que o evento não pertence apenas ao Vale e sim ao estado,
afinal a batalha travada definiu os limites geográficos do estado de Santa
Catarina, mas, não define, ainda, a identidade do catarinense.
Afinal o que significa ser catarinense? Em seu trabalho Identidade
Catarinense e a Formação do Litoral Açoriano, Moraes afirma que na trajetória
histórica das discussões em torno da identidade catarinense, os discursos sempre
foram de legitimação dos luso-brasileiros ou dos teuto-brasileiros, prevalecendo
durante a história do Estado os interesses das elites governamentais e/ou
intelectuais. Dar visibilidade à região e torna-la território catarinense é uma
batalha política, é questão de cidadania e cabe ao Estado através de suas ações
garantir que todos desejem e possam ser um cidadão em todas as suas
dimensões, inclusive a cultural, que é imprescindível no processo de construção
de sua identidade. Estudar a História do Contestado é de fundamental
importância para o entendimento da identidade cultural do catarinense, significa
resgatar memórias e preservar a cultura.

Não basta aproveitar a data e partir dela criar um mote turístico,


explorando-a como um produto atraente e lucrativo, é necessário perceber que a
guerra ainda se faz presente em regiões socialmente subdesenvolvidas e
culturalmente esquecidas. O que temos aqui é uma “cicatriz na história aberta”,
frase da música Epílogo, do espetáculo O Exército Encantado de São Sebastião,
de autoria de Bárbara Biscaro. O velosense, Gilberto Tomazi, em seu artigo
Heranças e Direitos dos Jovens do
Contestado afirma que o Contestado
pode ser entendido não somente a
partir de suas causas econômicas,
limítrofes, políticas e sociais. A dívida
social a ser creditada às novas
gerações da atualidade não se reduz
apenas a questões de ordem material.
Há, também, um viés cultural a ser
considerado e resgatado.

Imagem 1
Bandeira do Contestado, adereço da peça
teatral O Exército
Encantado de São Sebastião. Foto de
Gerusa Ansiliero

É a partir do meu não saber que


escrevo. Pouco sei destas histórias
que são relatadas sobre a Guerra do
contestado. Sou natural de Salto Veloso, município localizado no Meio Oeste de
Santa Catarina que pertence à região contestada. O surgimento da vila, que deu
origem e nomeou o município ocorreu no final do século XIX, quando o caboclo
Antônio José Veloso construiu sua casa junto ao rio, próximo de quedas d’água,
em meio à mata. Seu rancho tornou-se parada de descanso aos os tropeiros que
conduziam o gado dos Campos de Palmas para à antiga Perdizes, hoje Videira.
Nos anos 20 se inicia o processo de colonização da região e aqui chegaram
famílias italianas, vindas do Rio Grande do Sul, com seus títulos de posse de
terras, nas quais muitas famílias caboclas moravam, então se repete a expulsão e
exclusão desse “povo contestado”.

Queda d’água no Rio Veloso em Salto Veloso SC. Foto Gerusa Ansiliero.

Ser velosense e carregar neste gentílico a história de um caboclo não é


garantia de que a história deste povo foi preservada. Monges, fontes milagrosas,
conflitos, caboclos invasores, virgens, eram termos conhecidos, porém
desconexos, não se encaixavam na história de minha cidade, na minha história.
Começo a ligar os pontos diante de uma peça teatral que assisti em Salto Veloso
em 2008. Saí do teatro com uma sensação estranha, me sentia confusa e
ignorante: Como assim? Esse conflito foi aqui? Teve tal dimensão? Por que
nunca ninguém me falou? Eu já havia sentido assim, quando em 1989, durante a
leitura de livro sobre a Ditadura Militar no Brasil (1964, o ano que não acabou,
de Zuenir Ventura), chocada e indignada pensava: como nunca ninguém me
contou sobre a ditadura? Isso aconteceu há tão pouco tempo e eu não percebi?
Essa indignação muda minha postura diante da vida e dos fatos, passo a ler mais
e a me dar conta do quanto havia de resquícios da ditadura militar ali no espaço
que eu ocupava, me engajo no movimento estudantil e percebo a importância de
exercer minha cidadania. A vida segue e diante de escolhas, após 14 anos
morando em Curitiba PR, retorno à Salto Veloso e numa busca pessoal de
identidade, atenta a tudo que possa servir de referência para aqui me arraigar e
sentir segura passo a querer ter consciência sobre minha cidade. Interessa-me
saber da vida dos que aqui chegaram, me impressiono pela grandiosidade de
alguns personagens, ouço histórias, faço perguntas relembro de causos, mas,
continuo atenta apenas à visão do italiano que aqui chegou com o título de suas
propriedades e teve que disputar o espaço com os caboclos, construindo suas
casas sobre o cemitério caboclo, ateando fogo em suas taperas para então iniciar
o cultivo.
Voltemos ao teatro, uma peça simples encenada por atores adolescentes,
amadores, mas, com um conteúdo articulado que conseguiu me inserir no
contexto e fez com que eu passasse a perceber que havia muito conteúdo a
respeito, muitas pessoas interessadas em revelar, em dar visibilidade ao conflito.
À medida que me envolvo com a cidade, consigo me sentir velosense e percebo
que, mesmo não havendo aqui nenhum fragmento físico do conflito, há em Salto
Veloso e na região, várias pessoas preocupadas em resgatar, revelar e recontar
nossa história, agora sim inserida num contexto mais amplo e contemplando a
trajetória dos que aqui já viviam e a tragédia ocorrida na região.

Há na região inúmeras
manifestações culturais que abordam o
conflito, peças teatrais, músicas,
poesias, pinturas, fotografias, livros,
filmes. Em Salto Veloso, no ano de
2006 o Secretário de Educação,
Amarildo Pedro Biscaro, idealizou um
espetáculo que teria uma dupla função,
seria uma ferramenta pedagógica para
os professores que ensinariam o
conteúdo nas escolas e também
despertaria a reflexão acerca das raízes
e da história da região do meio-oeste
catarinense, território onde ocorreu a
Guerra do Contestado. Em 2009, com o
patrocínio do governo do Estado de
Santa Catarina o Projeto O Contestado em Canto e Dança foi executado, a atriz
e diretora Bárbara Biscaro e o cenógrafo Roberto Gorgati foram convidados
para orientar e dirigir o processo de criação do espetáculo e a formação de
atores. Segundo Bárbara Biscaro, no espetáculo “O Exército Encantado de São
Sebastião” a escolha do tema e da linguagem de teatro de rua, utilizando como
uma das referências às danças dramáticas do Brasil demonstra o interesse de
preservar a memória da região, e partiu da constatação de uma lacuna existente
na manutenção e discussão da História local através da linguagem teatral. A
intensa presença dos imigrantes italianos, alemães e austríacos na região, entre
outros, acabou por deixar mais forte enquanto manifestação cultural a
preservação de hábitos e formas artísticas trazidas pelos colonizadores,
diminuindo número de artistas que se dedicam a elaborar esteticamente os
elementos da cultura e da História atual da região.
Salto Veloso SC. Foto de Gerusa Ansiliero

A peça, O Exército Encantado de São Sebastião, segundo a descrição da


dramaturga Bárbara Biscaro, apresenta alguns dos principais protagonistas do
conflito: O Trem-boi que representa o trem a vapor e evocando a construção da
estrada de ferro São Paulo – Rio Grande do Sul, O americano, que representa o
empresário Percival Farquhar, dono da empresa construtora da ferrovia e de um
complexo de serrarias, O coronel, evoca o sistema coronelismo dos grandes
latifundiários, O caboclo, representa a população da região, resultado da mistura
das populações de índios, espanhóis, portugueses e negros que povoavam o
interior do Brasil, O Monge ou Zé Maria, representa os 3 monges que viveram
na região, o João Maria D’Agostini, o João Maria e o Zé Maria que desencadeou
o conflito em 1912, O soldado, representa os tenentes, coronéis e soldados que
combateram na Guerra. A virgem ou Maria Rosa simboliza a figura das
“virgens” que cercavam o Monge Zé Maria e Maria Rosa que foi uma líder
espiritual e política nos redutos. Adeodato: guerreiro caboclo que comandava as
táticas de combate nos redutos em 1914. O cavaleiro representa os Doze Pares
de França, guerreiros nomeados por Zé Maria para proteger os redutos dos
fanáticos.
Ensaio do Grupo de teatro Trem boi.
Fotos de Gerusa Ansiliero

O projeto extrapolou seus objetivos iniciais, pois, além de ser um material


didático eficiente e despertar a reflexão acerca do conflito, ele valorizou a
produção artística e cultural da cidade utilizando atores, músicos e outros
profissionais e incentivou a estruturação de um grupo teatral. O espetáculo O
Exército Encantado de São Sebastião – O Contestado em Canto e Dança,
tornou-se um produto cultural que tem levado o grupo a outras cidades, e com
ele a história do conflito e dos velosenses, e tem atraído à Salto Veloso turistas,
como a visita de um grupo de doutorandos da UFPR, guiado pelo professor
Nilson Fraga.

O teatro apresentado em círculo com a linguagem de teatro promove a


interação com o público tornando cada apresentação única. Risos e lágrimas
surgem e a história desperta o interesse nos que não conheciam o Contestado,
reflexão aos que buscam mais informação. É a arte proporcionando vivenciar a
diversidade cultural, possibilitando (re)conhecimento.

Garantir e incentivar a continuidade destas manifestações artísticas


culturais e o surgimento de outras é papel do Estado, em todas as suas esferas,
pois, o exercício da cidadania passa necessariamente pelo viés da cultura. Do
ponto de vista cultural, a participação popular é a garantia de diversidade, é a
possibilidade de identificação e pertencimento. A “comemoração” do
Centenário da Guerra do Contestado é uma oportunidade que temos de
efetivamente ampliar o mapa cultural e turístico de Santa Catarina, conhecer
nossa diversidade cultural, garantir suas manifestações gerando inclusão social e
desenvolvimento. Esse novo ambiente social é propicio ao desenvolvimento da
criatividade, que, segundo Fayga Ostrower, é um potencial inerente ao homem,
e a realização deste potencial uma de suas necessidades. Através do ato criativo
o individuo se expressa, se reconhece, se identifica, e, este processo gera
autoestima, que é fundamental para transformar o ambiente segundo suas
necessidades.

BISCARO, Bárbara. Projeto: o Exército Encantado de são Sebastião. Salto


Veloso, SC. 2009
OSTROWER, Fayga. Criatividade e Processo de Criação. 6ª edição. Petrópolis:
Vozes, 1987.

MORAES, Marcos J. IDENTIDADE CATARINENSE E A FORMAÇÃO DO


LITORAL AÇORIANO.II Seminário de Ciências Sociais Aplicadas, América
do Norte, 0, nov. 2010. Disponível
em: http://periodicos.unesc.net/index.php/CSA/article/view/395. Acesso em: 26
Jan. 2012.

THOMÉ, Nilson. A Construção da História Cultural do Contestado. Caçador,


SC. 2004 Disponível em:
http://www.achegas.net/numero/vinte/nilson_thome_20.htm. Acesso em: 13 de
jan. de 2012.

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