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2 JANK, Marcos Sawaya. Agronegócio versus agricultura familiar? O Estado De S. Paulo - Terça-Feira,
5 de julho de 2005 - Pág. A-2 (Espaço Aberto).
Distinção convencional: questão agrária (a dimensão social) e questão agrícola (a
dimensão técnica), para constatar que no Brasil o agrícola sempre foi priorizado, em
detrimento do social.
A questão agrária sempre esteve relacionada com os conflitos por terra. Estando a
reflexão da “Questão Agrária” fortemente ligada ao debate da Reforma Agrária, de
territorialização, desterritorialização e reterritorialização do capital e do campesinato, e
da discussão da estrutura altamente desigual de posse e uso da terra.
3 DELGADO, Guilherme Costa. A questão agrária no Brasil, 1950-2003. Brasília: Ipea,. 2005.
4 FERNANDES, Bernardo Mançano. Questão Agrária: conflitualidade e desenvolvimento territorial. In:
Luta pela Terra, Reforma Agrária e Gestão de Conflitos no Brasil. Antônio Márcio Buainain (Editor).
Editora da Unicamp, 2008.
Pode ser divertido, além de instrutivo, consultar o novo Atlas Nacional do Brasil.
Comece pelo mapa “Grau de Urbanização”. Verá que a mais gritante mancha de
urbanização corresponde ao Pantanal Mato-Grossense, imediatamente seguida pela
Campanha Gaúcha. Nem o Estado de São Paulo, ou o do Rio de Janeiro, mostram tão
fortes borrões urbanos. Dá para entender? A resposta é afirmativa para quem já percebeu
o quanto é absurda concepção adotada pelo Brasil para delimitar seus espaços urbanos e
rurais. Se quiser formar uma idéia mais razoável da distribuição espacial do
povoamento, procure nas páginas anteriores o mapa “Densidade Demográfica”. Este
sim destaca as cerca de 50 aglomerações urbanas, das quais uma dúzia de
verdadeiros bunkers metropolitanos. Fora dessas 50 aglomerações só se vê imensas
regiões rurais que sempre contam em suas proximidades com uma ou duas cidades, seus
verdadeiros centros urbanos.
Há uma forte crença no Brasil de que sua intensa urbanização transformará a população
rural em mera relíquia de um ultrapassado subdesenvolvimento. Por isso, nenhuma
discussão séria sobre o assunto pode começar se não for desfeita a dupla confusão –
estatística e histórica – que sustenta esse traiçoeiro fatalismo. A vigente definição de
“cidade” é obra do Estado Novo. Foi o Decreto-Lei 311, de 1938, que transformou em
cidades todas as sedes municipais existentes, independentemente de suas características
estruturais e funcionais.5 É verdade que a partir de 1991 o IBGE definiu três categorias
5 Até 1938 o Brasil não teve dispositivo legal que estabelecesse diferença entre cidade e vila. Era
costume elevar à condição de vila, ou mesmo diretamente à condição de cidade, rústicas sedes de
freguesia, a mais antiga unidade territorial brasileira. E vilas e cidades surgiam até sem a prévia existência
de freguesias. Tanto cidades, quanto vilas, podiam ser sedes de municípios. E os limites geográficos de
sua jurisdição eram demarcados pelos limites das freguesias, desde que se tratasse de espaço com
ocupação consolidada. Até havia regras para que as cidades e vilas pudessem exercer suas diferentes
funções, mas a decisão de criar ou elevar uma localidade à categoria de vila, ou de cidade, não respeitava
qualquer norma.
de áreas urbanas (urbanizadas, não-urbanizadas, e urbanas-isoladas) e quatro tipos de
aglomerados rurais (extensão urbana, povoado, núcleo e outros). Todavia, em vez de
abolida ou amenizada, acabou sendo fortalecida pela nova nomenclatura essa rígida e
vetusta convenção de que toda sede de município é necessariamente espaço urbano.
Enfim, o mínimo que se pode dizer a respeito da metodologia oficial de cálculo da “taxa
de urbanização” do Brasil é que ela é anacrônica e obsoleta. E a evolução das
abordagens de delimitação urbana no resto do mundo só confirma que o uso desse
indicador deveria exigir extrema cautela. Para que a configuração territorial brasileira
não permaneça tão obscura, é imprescindível construir tipologias alternativas, capazes
de captar a imensa diversidade dos municípios. Um desafio que começou a ser
enfrentado com muito sucesso no estudo Caracterização e Tendências da Rede Urbana
do Brasil(Ipea/Ibge/Nesur-IE/Unicamp, 1999). Atualizando-se os resultados desse
trabalho, percebe-se que só está efetivamente na rede urbana menos de 60% da
população brasileira (ver tabela 2.1). E não mais de 80%, como impõe a
linha estadonovista que baliza a metodologia oficial.
6 VEIGA, José Eli da. O Brasil rural precisa de uma estratégia de desenvolvimento. Brasília,
MDA/CNDRS/NEAD, 2001.
de consenso sobre suas implicações. E o principal foco do debate refere-se à
importância relativa que ainda tem, e ainda terá, a própria agropecuária no processo de
desenvolvimento, e particularmente para a solução das questões de emprego e de
pobreza rural. Mas não é difícil identificar as duas teses que polarizarão esse debate.
Graziano da Silva (1999:29-30) está convencido de que “a única estratégia capaz de
reter a população rural pobre nos seus atuais locais de moradia e, ao mesmo tempo,
elevar sua renda” é “a criação de empregos não-agrícolas nas zonas rurais”. Já para
Romeiro (2001), “mais do que nunca, é necessário ampliar o apoio fundiário e
agrícola, aos produtores familiares de modo que suas famílias não sejam obrigadas a
buscar formas alternativas precárias de sobrevivência.
O que interessa é saber se atividades rurais dos setores secundário e terciário que
certamente geram maiores rendas per capita que as do setor primário têm mais chance
de brotar no entorno de grandes fazendas especializadas em pecuária de corte, grãos ou
cana-de-açúcar, ou no entorno de concentrações de sítios familiares poli produtivos.
Em síntese, o estudo de Veiga mostrou o que não só o Brasil Rural é muito maior do que
se calcula, como boa parte desse significativo espaço vinha apresentando indícios de
dinamismo demográfico que nada deixam a desejar às áreas urbanas mais prósperas.
Por ser a terra um meio de produção relativamente não reprodutível (ou pelo menos,
mais complicado de ser multiplicado) que a forma de sua apropriação histórica ganha
uma importância fundamental. Em alguns países, como no caso do Brasil, o proprietário
de terra tem até mesmo o direito de não utilizá-la produtivamente, isto é, deixá-la
abandonada, e de impedir que outro a utilize. Por isso é que a estrutura agrária - ou seja,
a forma como a terra está distribuída - torna-se assim o ''pano de fundo" sobre o qual se
desenrola o processo produtivo na agricultura e é um aspecto fundamental para se
compreenderem os padrões civilizatórios de um povo.
A Herança Histórica
f) Os anos 1970
Nos anos 1970, três grandes modificações ocorreram:
- o fechamento das fronteiras agrárias, envolvendo as questões de colonização da
Amazônia e da participação da grande empresa pecuária, deslocando a pequena
produção agrícola;
- o Progresso acelerado de modernização da agricultura no Centro-Sul do país;
- a crescente presença do capitalismo monopolista no campo ou seja, de grandes
empresas industriais que passaram a atuar tanto diretamente na produção agropecuária
propriamente dita, como fortaleceram sua presença no setor de comercialização e de
fornecimento de insumos para a agricultura.