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Rio de Janeiro
2011
DANIELLA TARSITANO DA ROCHA
Rio de Janeiro
2011
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INTRODUÇÃO
reveste de efeitos erga omnes, caso editada resolução do Senado Federal, que suspende a
visando a esclarecer suas causas e efeitos no mundo jurídico, por meio da abordagem dos
texto constitucional.
Por fim, será possível concluir sobre a importância da alteração, em tese, conferida
NO ORDENAMENTO BRASILEIRO
Constituição, que permite ser ela o parâmetro de controle devido à posição vertical que
em uma maior dificuldade na alteração da norma constitucional, que ocorrerá por meio de
influenciado pelo direito norte-americano, através do judicial review, outorgou aos órgãos
da hermenêutica jurídica1.
Apesar de ter sido delimitada pelo texto constitucional uma competência ao Poder
Legislativo de zelar pela guarda da Constituição, não foi conferida de forma exclusiva, já
Federal de julgar recursos cujo objeto era a validade ou aplicação de leis ou atos dos
criação da forma de controle abstrato. A partir de sua vigência, surgiu, pela primeira vez
no ordenamento, a norma do atual art. 52, X, à época o artigo 91, IV CF/342, que
concentrado somente foi instituído em 1965, por meio da Emenda Constitucional nº. 16 à
1
STRECK, Lênio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do direito. Rio de
Janeiro: Forense, 2004.
2
BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil: “Artigo 91 - Compete ao Senado
Federal: (...)IV - suspender a execução, no todo ou em parte, de qualquer lei ou ato, deliberação ou
regulamento, quando hajam sido declarados inconstitucionais pelo Poder Judiciário.” Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao34.htm>. Acesso em: 12 out. 2010.
6
Procurador Geral da República. Neste ínterim, ainda era predominante o controle difuso.
para democratizar o seu acesso. A principal modificação foi a ampliação do restrito rol dos
de historicamente ser o controle difuso dominante, existe a tendência para tornar abstrato o
sistema.
ou por via de exceção, possui como característica fundamental o exercício por qualquer
inconstitucionalidade para afastar a sua incidência da lei ou ato normativo naquele caso
específico.
como meio de defesa, razão a justificar sua nomenclatura. Poderá ocorrer em qualquer
3
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo de Processo Civil. 6. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1993, p. 30-31.
7
Tribunal Federal. A matéria será suscitada pelas partes, Ministério Público ou mesmo pelo
Magistrado ex officio.
unicamente em relação às partes naquele caso concreto em que foi suscitada como questão
incidente, razão pela qual a sua eficácia é reconhecida como inter partes, mesmo após o
acórdão remetido ao Senado Federal, que, no âmbito de sua atuação discricionária, poderá
4
SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 208-209.
5
MORAES. Alexandre. Direito Constitucional.19. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 650-651.
6
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 19 fev. 2011.
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editar uma resolução para suspender a aplicação da lei ou ato normativo declarado
inconstitucional no caso concreto. Esse ato tem caráter político e confere à decisão da
Corte Suprema o efeito erga omnes, capaz de vincular todos os juízos e Tribunais ao
instrumento de garantia dos direitos dos cidadãos, já que pode ser exercido por qualquer
fundamental que atua como distinção entre as duas formas de controle é a competência.
sendo ameaçada ou lesada por meio da existência de uma lei ou ato normativo que
abstrato.
de alcançar toda a coletividade. Essa eficácia erga omnes conferida às ações diretas está
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prevista no artigo 102, §2º da Constituição Federal e no artigo 28, parágrafo único da Lei
n. 9.868/99.
equivale à declaração de nulidade da lei que será retirada do ordenamento jurídico com
Uma das principais diferenças entre o controle difuso e o concentrado reside nos
efeitos de suas decisões. Enquanto no controle difuso as decisões possuem eficácia inter
controle concentrado, a decisão alça seus efeitos aos demais órgãos do poder judiciário e a
difuso, por meio da atuação política do Senado Federal, essa diferença deixa de existir.
7
MORAES, op. cit., p. 651.
10
vedação de progressão de regime aos condenados pela prática dos crimes daquela espécie.
Supremo Tribunal Federal no HC nº 82.959, o que não foi concedido, uma vez que o juiz
competente da Vara de Execuções Penais entendeu não ter a decisão efeitos erga omnes
procedente o seu mérito, para que fosse afastada a vedação legal de progressão e deixou a
cargo do juiz de primeiro grau avaliar no caso concreto a presença dos requisitos para a
concessão do benefício.
A questão ainda não foi analisada pela totalidade dos Ministros que compõem o
artigo científico.
11
Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal8. O voto do Ministro Gilmar Mendes, relator
do feito, julgou procedente a Reclamação, sendo acompanhado pelo Ministro Eros Grau.
concedeu habeas corpus de ofício para que o juiz examine os demais requisitos para
SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO
O art. 52, inc. X da CRFB prevê a suspensão de execução, que tem natureza de um
ato político praticado pelo Senado Federal. Por meio deste instituto, a Alta Casa do
Congresso tem o condão de editar uma resolução com o fim de conferir efeitos erga omnes
a uma decisão definitiva exarada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de recurso
extraordinário. A resolução do Senado passa a ser uma condição para o alcance de eficácia
de que evita que uma demanda necessite passar por todo o trâmite processual nas
instâncias do Poder Judiciário para que seja reconhecida a sua inconstitucionalidade. Uma
8
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação n. 4335. Relator: Min. Gilmar Mendes. Publicado no
DOU de 27.04.2007. Disponível em:
http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2381551>. Acesso em: 20 mar.
2011.
9
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo de jurisprudência n. 463. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo463.htm>. Acesso em: 11 out. 2010.
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Suprema, ela teria sua execução suspensa, evitando novas demandas sobre o mesmo tema.
ato normativo federal, estadual ou municipal, comunica a decisão à Casa Legislativa para
O Regimento Interno do Senado Federal prevê em seu artigo 386 que a resolução
deve ser editada após receber a comunicação da decisão definitiva da Corte Suprema, pelo
em seu artigo 178 que, após o trânsito em julgado de decisão que declare determinado
artigo incidenter tantum inconstitucional, deverá ser comunicado o Senado Federal para
10
BRASIL. Resolução n. 93 de 1970 do Senado Federal. Art. 386: “O Senado conhecerá da declaração,
proferida em decisão definitiva pelo Supremo Tribunal Federal, de inconstitucionalidade total ou parcial de
lei mediante:
I – comunicação do Presidente do Tribunal;
II – representação do Procurador-Geral da República;
III – projeto de resolução de iniciativa da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.”
Disponível em: <http://www.planejamento.gov.br/hotsites/acervo_normativo/RESSF-1970-93.pdf>. Acesso
em: 19 jun. 2011.
11
BRASIL. Resolução n. 93 de 1970 do Senado Federal. Art. 388: “Lida em plenário, a comunicação ou
representação será encaminhada à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que formulará projeto de
resolução suspendendo a execução da lei, no todo ou em parte.” Disponível em:
<http://www.planejamento.gov.br/hotsites/acervo_normativo/RESSF-1970-93.pdf>. Acesso em: 19 jun.
2011.
12
Art. 178 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal: “Declarada, incidentalmente, a
inconstitucionalidade, na forma prevista nos artigos 176 e 177, far-se-á a comunicação, logo após a decisão,
à autoridade ou órgão interessado, bem como, depois do trânsito em julgado, ao Senado Federal, para os
efeitos do art. 42, VII, da Constituição.” Disponível em:
13
inconstitucional.
específico, é possível ampliar o alcance da decisão sem que os limites subjetivos da coisa
julgada sejam violados, pois o ato político do Senado não interfere na imutabilidade
separação de poderes, a função do instituto era permitir que o próprio órgão responsável
exercer o seu papel, tal qual determina o comando constitucional. A Casa Legislativa
tradicionalmente não exerce sua atribuição e deixa de editar a resolução para suspender a
influi diretamente na sua fraca atuação, mantendo os efeitos das decisões do STF somente
<http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/legislacaoRegimentoInterno/anexo/RISTF_Dezembro_2010.pdf>.
Acesso em: 13 mar. 2011.
13
MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Teoria das Constituições Rígidas. 2 ed. São Paulo: José
Bushatsky, 1980, p. 212.
14
Alfredo Buzaid entendem que o Senado somente estaria vinculado à suspensão de eficácia
Mendes e Clèmerson Merlin Clève14, sustentam que o Senado não estaria obrigado a se
manifestar, pois sua atuação é facultativa, por ser “revestido de conformação legislativa”.
da Casa Legislativa sejam influentes na sua aplicação. Esse argumento, aliado ao fato de
ser uma resolução de cunho político, justifica a inércia do Senado em editar o ato e aplicar
o instituto.
Segundo o ilustre ministro e doutrinador, a Corte Suprema possui outros meios de conferir
Federal entendem que o órgão legislativo não pode se resumir a publicar decisões do
Supremo Tribunal Federal. Nessa esteira de racioncínio, podemos citar Lenio Luiz Streck,
in verbis:
De fato, a norma constitucional teve por finalidade conferir ao Legislativo, por ato
eficácia de suas próprias leis, sem se submeter aos comandos do Poder Judiciário,
exercer o poder que lhe foi conferido pelo constituinte, o que esvazia o comando
A inércia do Senado impede que seja cumprida a destinação para a qual foi criada a
jurídico.
artigo como solução para retirar o condicionamento da eficácia erga omnes da decisão do
sua participação para tanto. Essa tese confere maior amplitude aos efeitos da
16
STRECK, Lenio Luiz: A nova perspectiva do Supremo Tribunal Federal sobre o controle difuso: Mutação
Constitucional e Limites da Legitimidade da Jurisdição Constitucional. Disponível em:
<http://leniostreck.com.br/index.php?option=com_docman&Itemid=40>. Acesso em: 24 mar. 2011.
17
[Seguindo esse posicionamento, pode ser citado o Min. Gilmar Ferreira Mendes em seu livro] MENDES,
Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 1.245.
16
CORTE SUPREMA
transformação informal do texto constitucional, atribuindo-lhe novo sentido, sem que para
torna-se necessário que o texto seja reinterpretado para acompanhar a evolução social e
18
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação n. 4335. Relator: Min. Gilmar Mendes. Publicado no
DOU de 09.02.2007. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28Rcl%24%2ESCLA%2E+E+43
35%2ENUME%2E%29&base=baseMonocraticas>. Acesso em: 10 abr. 2011.
17
Constituição. Sua função é interpretar e aplicar o texto constitucional elaborado pelo Poder
Constituição e interpretar seu texto para que fique sempre atual, para acompanhar a
evolução da sociedade.
Sem imiscuir-se nas doutrinas que estudam esses institutos, o que fugiria ao objeto de
estudo deste artigo, seria equivalente a atuar sem legislar a partir da interpretação de uma
norma, mas também sem limitar demasiadamente a intensidade da análise de uma lei ou
ato normativo.
52, X da CRFB na relatoria da Reclamação 4335 do STF gera muita polêmica entre
juristas e doutrinadores.
4335, defensores da mutação, têm por base o mesmo pensamento jurídico que respalda a
19
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação 4335. Relatoria: Min. Gilmar Mendes. Publicado no
DOU de 25.08.2006. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28Rcl%24%2ESCLA%2E+E+43
35%2ENUME%2E%29&base=baseMonocraticas>. Acesso em: 10 abr. 2011.
18
norma universal, que deve ser aplicada a toda situação semelhante àquela examinada, em
mutação constitucional que se pretende realizar no artigo 52, X, da CRFB. Segundo a tese
de uma norma universal a ser aplicada em todos os casos que a ele se assemelham.
examinado. Seria criada uma espécie de regra aplicável a todos, sendo necessário,
norma tida como universal pelos aplicadores do direito é correta, pois ela pode até ser
correta, mas não ser aplicável ao caso20. Inúmeros questionamentos são realizados no
sentido de identificar qual o papel da justiça constitucional a ser exercida pelo Supremo
Tribunal Federal.
20
STRECK, op. cit, p. 27.
19
desempenhe cada vez mais suas funções atípicas, não se concentrando em suas funções
divisão dos Poderes representava a autonomia entre eles, no exercício de suas funções
típicas.
Tribunal Federal suspender de forma imediata a eficácia do ato questionado, por meio da
difuso. O controle de constitucionalidade foi e é até hoje mantido como misto, mas o foco
21
BRASIL. Lei nº 9.868/99 de 10 de novembro de 1999. Art. 10: “Salvo no período de recesso, a medida
cautelar na ação direta será concedida por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal, observado
o disposto no art. 22, após a audiência dos órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo
impugnado, que deverão pronunciar-se no prazo de cinco dias”. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9868.htm>. Acesso em: 13 jun. 2011.
20
§1º-A, do Código de Processo Civil, por meio do qual foi novamente ampliado o poder
extraordinários não apenas neguem seguimento, como também possam lhes dar
similares, cujo mérito tenha solução pacificada na jurisprudência da Corte Suprema, para
análise do STF.
efeitos da decisão não só em relação ao seu dispositivo, mas estendendo o efeito erga
dispositivo prevê a criação das súmulas vinculantes, que vinculam os demais órgãos do
Administradores Públicos, ao retirar sua liberdade, obrigando-os acatar e seguir o seu teor
civis públicas pode ser elencado como mais um exemplo de amplitude dos efeitos
subjetivos das decisões do Supremo Tribunal Federal. Os efeitos de uma decisão em sede
Tribunal uma competência antes somente exercida pelo Senado Federal. A partir daí,
melhor significado para a norma atualmente seria permitir que o Senado apenas tivesse o
controle difuso23.
eficácia geral são comuns ao ordenamento, o que não era à época de criação da suspensão
23
MENDES, op. cit, p. 1.252.
22
Diante de todos esses motivos, há de se concluir que a norma contida no artigo 52,
razões, mas sim devido ao meio pelo qual se busca alcançar tal alteração.
firmes, mas sua retirada do ordenamento não pode ser realizada por meio de interpretação
A crítica que se faz não é ao fundamento da tese, mas à forma como ela pretende
ser aplicada. Faz sentido retirar essa vinculação ao Senado, mas não por meio de mutação
princípio impõe uma atuação maior dos poderes no desempenho de suas funções atípicas.
Todavia, isso não pode significar a permissão para um Poder desempenhar uma
contrapesos.
Seria imprudente que o próprio STF invocasse a mudança, pois pareceria que um
O ideal seria permitir que tal alteração fosse realizada formalmente por meio de
de sua função jurisdicional, mas não pode substituir a vontade do legislador constituinte
direito a ser aplicado ao caso, evitando exorbitar sua função e atuar como legislador
fato de que a suspensão de eficácia pode ser mantida como um instrumento a mais para
concessão de eficácia erga omnes às decisões do controle difuso. Seria um acréscimo, não
eficácia prevista no artigo 52, X, da CRFB. Entretanto, a sua alteração por meio de
É preciso mudar, mas não a qualquer custo e de qualquer modo. Ratificar a tese da
CONCLUSÃO
verificada por meio das espécies difusa e concentrada de controle. Cada espécie sempre
Dentre as diferenças mais marcantes está a eficácia das decisões que produzirão
modalidades de controle.
jurisdicional.
tese, que tem como seu principal defensor o Ministro Gilmar Ferreira Mendes, retiraria do
Senado Federal a faculdade de suspender a eficácia de uma lei ou ato normativo declarado
alterar informalmente o conteúdo da constituição sem a alteração de seu texto, por meio de
atividade interpretativa.
25
instituto da suspensão de eficácia pode ser entendido como ultrapassado, pelos inúmeros
alteração de seu texto, o que não pode ser realizado da forma como os defensores da
mutação pretendem.
separação de poderes são alguns dos vários fundamentos existentes para embasar a
norma constitucional prevista no artigo 52, X, da CRFB. Porém, não é possível admitir
que a retirada da regra do ordenamento pátrio seja realizada por meio da mutação
Magna Carta.
REFERÊNCIAS
MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Teoria das constituições rígidas. 2. ed. São
Paulo: José Bushatsky, 1980.
MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva,
2010.
MORAES. Alexandre. Direito Constitucional. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006.
MORAES, Guilherme Pena de. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2008.
SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.