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A hermenêutica serve como uma ferramenta eficaz para compreender o ser humano e
a relação entre as pessoas expressa pela cultura. Assim, é empregada na interpretação
de qualquer texto, mas sendo crucial para o direito, teologia e literatura.
Sem aprofundar na história da hermenêutica como disciplina, os modelos
contemporâneos de Círculo Hermenêutico foram desenvolvidos por Heiddger, Ricoeur
e Gadamer nos meados do século XX sob influências da fenomenologia. E sem abordar
seus principais críticos — a desconstrução e outros pós-modernistas — e sua alternativa
concorrente — o modelo de Espiral Hermenêutico —, o modelo de Círculo
Hermenêutico passou de um processo de intelecção para um método de análise textual,
principalmente pelos trabalhos de Ricoeur e Gadamer.
Círculo Hermenêutico
Parece simples, e é. Mas para quem estiver interessado em leituras aprofundadas além
dos fins de entretenimento ou mera informação, o uso do círculo hermenêutico requer
mais elaboração. Esse passo a passo mostra o emprego do círculo hermenêutico para
leituras críticas de textos literários, jurídicos, históricos, etnográficos e sacros. Para fins
didáticos, a leitura crítica com o círculo hermenêutico foi separada em duas fases, a
leitura e a análise.
A leitura
Nessa fase de leitura, inicia-se com a leitura inicial ou cursiva para adquirir uma
compreensão geral, sem despender muita atenção aos detalhes. A leitura do texto como
um todo providenciará um significado orientador. Se o leitor conseguir sintetizar o texto
em somente uma sentença é porque conseguiu uma compreensão inicial do que se é
dito no texto.
Depois dessa “leitura ingênua, ” o texto é divido em unidades menores para uma leitura
minuciosa. Essa unidade menor pode ser a parte de uma frase, de uma oração, de várias
orações, de um parágrafo. Ou seja, pode ser um pedaço de qualquer tamanho do qual
se visa extrair apenas um sentido válido.
Uma vez feitos os fichamentos, o leitor revisa suas notas, relê o texto anotado, as partes
isoladas e por fim, o texto por inteiro. Nessa segunda leitura totalizante, o leitor
compara seu conhecimento preconcebido com o que aprendeu com o texto. Nesse
passo, o leitor deverá ler e reler exaustivamente, até reduzir drasticamente suas dúvidas
de compreensão ao tempo que emergirão as questões de interpretação. (Relembrando,
compreensão é “o que diz o texto” e interpretação é “o que o texto quer dizer”).
Somente depois de uma leitura crítica de um texto, o leitor pode discordar ou concordar
com o autor. E as maneiras gentis e academicamente honestas de discordar seriam
(conforme Mortimer Adler, 1972, p.106):
“Você foi mal informado”: as informações usadas pelo autor são contrárias aos fatos.
“Você é ilógico; seu raciocínio não é convincente”: o argumento não possui sentido
lógico, geralmente apresentando conclusões sem ligações com as premissas ou
generalizações sem fundamentos.
“Sua análise está incompleta”: o autor possui e usa com maestria as informações válidas,
seu raciocínio é congruente, porém deixa de abordar questões que ele próprio levantou
e tinha meios de resolvê-las, mas não fez.
É o momento de o leitor tomar uma atitude quanto ao texto. Começa por lançar mão de
sua bagagem cultural e conversar com outros interlocutores. Como duas pessoas não
vivenciam as mesmas experiências, seria oportuno discutir suas perspectivas com quem
esteja familiarizado com o texto –- desde colegas a outros autores que já utilizaram o
mesmo texto ou discutiram questões semelhantes.
Análise
São várias as teorias ou paradigmas que orientam a leitura analítica. Tomando como
ponto de partida a hermenêutica fenomenológica, o objetivo é encontrar significados
sem esperar achar uma única verdade fundamental. Isso é devido à consciência de
possíveis significados em um processo contínuo entre os limites do dogmatismo e da
zetética. Deve-se duvidar tanto do que se interpretou quanto confiar nas interpretações
possível. De acordo com Palmer (1969), na hermenêutica fenomenológica deve-se
“deixar as coisas se manifestarem como elas são, sem forçá-las com as nossas próprias
categorias. Isso implica em uma reversão da direção usual. Não somos nós que
apontamos para o que as coisas são; ao contrário, as coisas se mostram para nós”. A
hermenêutica exige a intersubjetividade do investigador. E, para isso, ele deve alcançar
a distância interpessoal a partir do objeto de estudo.
Uma vez estabelecida a teoria de leitura, procede-se à análise hermenêutica.
São vários níveis sobrepostos de leituras críticas com seus métodos, terminologias e
focos. Entre eles estão a crítica textual, a análise gramatical, a análise linguística, a
crítica literária, a crítica histórica e a análise do discurso. A cada uma dessas leituras
críticas, o leitor deverá anotar suas observações e impressões para depois relê-las para
formular uma conclusão.
A crítica textual, ou baixa crítica, tenta reconstruir o texto caso não haja uma versão
definitiva. São glosadas as variantes para decidir quais possuam maior legitimidade. Em
tempos de plágio digital, é a hora de jogar o texto no Google ou algum programa de
análise textual. Outra parte da crítica textual é a alta crítica ou crítica de redação. Nela
se busca determinar a autoria, autenticidade, local e tempo da composição. A
determinação de autoria pode ser auxiliada por usos de colocações, vícios de linguagem,
comparação com outros textos de mesma procedência e notar outras idiossincrasias.
Questiona-se: existem motivos para duvidar da honestidade do texto ou do autor?
Conhecer o autor é fazer uma introspecção em seus motivos, seus vieses, seu estilo e
suas ideias.
Uma vez estabelecido o texto e a autoria, segue-se uma análise gramatical. É voltar a
fazer análises básicas de morfossintaxe, semântica (aqui campos semânticos serão
valiosos) e pragmática para ver como o texto produz sentido gramatical. Uma vez mais,
desvios recorrentes da norma padrão de gramática serão elementos de análise.
Relembrando que leitura e análise foram aqui separadas didaticamente, o leitor após a
análise volta a ler suas notas e o texto como um todo. Nesse processo contínuo,
produzir-se-á interpretações válidas e sólidas
SAIBA MAIS
ADLER, Mortimer; VAN DOREN, Charles. How to Read a Book. New York, Simon and
Schuster, 1972.
HEIDEGGER, Martin. Being and Time. New York: Harper & Row, 1972.
GADAMER, Hans George. Truth and Method. New York: Continuum, 2000.