Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
MUSEU NACIONAL
Inteligência Extraterrestre
e
Evolução
As especulações sobre a possibilidade de vida
em outros planetas no meio científico moderno
Rio de Janeiro
1990
JAYME MORAES ARANHA FILHO
Inteligência Extraterrestre
e
Evolução
As especulações sobre a possibilidade de vida
em outros planetas no meio científico moderno
Rio de Janeiro
1990
agradecimentos
introdução 1
fontes
, .
8
sumano 14
anexos:
anexo 1. 116 fotografias da Voyager 220
anexo 2. mensagem do presidente dos EUA na Voyager 224
anexo 3. petição internacional SETI (1982) 225
anexo 4. propaganda de filiação à Planetary Society 226
Abreviaturas et extraterrestre
eti extraterrestrial intelligence
NASA National Aeronautics and Space Administration
ONU Organização das Nações Unidas
OVNI objeto voador não-identificado
SETI Search for Extraterrestrial Intelligence
UFO unidentified flying object
(gm) «Grifos meus» (após transcrição de citação, para indicar
itálicos não presentes no original)
introdução
havia um disco de cobre elaborado por cientistas, contendo fotos, falas, sons e
estabelecer cantata.
ao fim da leitura desta dissertação, o leitor concorde que o ser inteligente que se
gera chuva, sabe que ela causará de saída espanto ao ocidental, que a julgará
volta para aspectos de sua própria cultura, o sentido do movimento sofre como
estranhar o cotidiano, buscar despojar-se do senso comum para poder nele flagrar
Introdução - 3
certo que nenhuma cultura pode de fato ser um bloco monolítico, absolutamente
nativo, tão identificado ao seu informante. Navegando pela diversidade dos níveis,
dos campos da própria cultura, muito há a estranhar logo após dobrar a esquina,
relativo face aos recortes que estuda, fazendo da sua reflexão o resultado de
respeitadas. Meu desconcerto só aumentou diante dos nomes dos seus autores.
que operava em determinado conto de f.c., mas não havia nada de espantoso em
ler um conto sobre uma civilização alienígena no século XXV. Era a coisa mais
natural, com que me acostumara muito antes de ouvir da antropologia, nos tempos
Mas a Ciência acadêmica era outra história. A NASA dos anos 70/80 nada
à Lua dos anos 60. Como podia ela envolver-se em semelhante especulação
maravilhosa, apostar na existência palpável das civilizações alienígenas inventadas,
científico em si, mas pelo cruzamento de ambos, Era o fato dos porta-vozes da
que me pareceu inconcebível. Era a mistura destes dois terrenos, inicialmente tão
como uma profanação. Mais que uma ousadia do pensamento, parecia que os
se, não para a desnaturalização da descrição nativa, mas para demonstrar sua
que nem sabia se tinham utilidade, mas que seria um desperdício não anotar. A
Sagan não estivesse em cada esquina. Por necessidade intelectual fui obrigado a
estrangeiro em vários níveis: outra cultura e história, outra biologia, outro planeta.
Não ocidental, não humano, não terrestre, em todos os sentidos ele é o que vem
linguagem articulada que talvez se pudesse fazer traduzir, enfim, um ser com o
zona ambígua em que uma identidade profunda convive com o estranho absoluto,
nessa franja limítrofe, mas crucial para toda cultura, onde se busca definir as
2. «Depuis la fin du XIXe siecle, le monde foisonnant des créatures fabuleuses en Occident a subi
une structuration sous-jacente autour de deux pôles, de deux figures mythiques, qui vont
prendre sens l'une par rapport à l'autre dans des relations analogiques et antithétiques:
l'Homme sauvage et l'Extraterrestre. Ces figures de l'étrangeté sont significatives parce qu'elles
se situent au plus pres de l'image humaine, dont elles représentent la premiere altération, au
sens étymologique de "faire autre". Elles marquent chacune les limites exactes entre l'humain
et le non-humain» (RENARD:1984:71).
Introdução - 7
mais acabada de fazer toda diferença cultural encontrar seu lugar na linha do
a ser uma forma do mesmo, apenas deslocado na linha da história. Pois a eti
natureza/cultura. Não era apenas o olho viciado do antropólogo que inventa a sua
tribo: era uma formulação explícita no discurso nativo. Havia toda a temática da
universal, único suporte capaz de garantir que a comunicação com a eti pudessem
se realizar. Lévi-Strauss foi-se tornando uma referência cada vez mais presente na
reflexão. Por outro lado, a visão mais global de Sagan sobre o momento atual da
científica".
(1934- ). Uma recapitulação de sua carreira profissional é útil para avaliar o grau
planeta (Cf SAGAN:1973, caps. 13 e 22). Fez cálculos para uma semeadura análoga
3. Os dados biográficos de Sagan foram coletados em MouRÃo (1987), verbete «Sagan»; SAGAN
et ai (1984), ficha dos autores; SAGAN & SHKLOVSKY (s/d), nota introdutória; SAGAN (1983a),
contracapa.
Introdução - 9
Planetários da Une Cornell (NY). Em 1969 tornou-se editor da revista /carus, junto
com Frank Drake (outro pioneiro da procura por eti). Passa então a conselheiro
incluir uma mensagem para etis nas sondas Pioneers, elaborando uma placa
gravada, junto com sua esposa Linda e Frank Drake. Em 1973 empreendeu, junto
Campbell Award pelo melhor livro científico do ano; Joseph Priestley Prize por
(1973, 1985a), três livros se destacam: Dragons of Eden (1983b), uma sofisticada
do cérebro humano; Cosmos (1983b), inicialmente uma série de dez capítulos para
programa radioastronômico SETI. Dois dos livros que organizou marcam dois
comunicação com eti realizado na URSS (1973), uma coletânea reunindo diversas
opiniões de cientistas sobre o caráter dos UFOs (com PAGE:1974). Participou ainda
traduzido no Brasil em 1984. Ele foi inteiramente escrito pelas pessoas que
das tentativas de mandar mensagens para eti, suas técnicas, seus princípios,
(escritora) e TIMOTHY FERRIS (escritor). SAGAN fecha o livro com dois breves
Introdução - 11
Encerra com um epílogo otimista quanto ao contato com etis e ao futuro da nossa
civilização.
de vida, e vida inteligente, em outros planetas. Seus autores estão em geral ligados
McGowAN & ORDWAY (1966) são exemplos. Ou então são escritores especializados
Alguns dos principais livros destas duas categorias possuem tradução editada
sobre a história da ufologia BRIAZACK & MENNICK (1979) e DURRANT (s/d; 1980).
polêmica sobre os canais marcianos. JAKI (1978) realizou uma minuciosa história
estatuto das hipóteses ainda hoje em construção. Além destes, LoVETOY (1964),
KOYRÉ (1986), um artigo de TIPLER (1981) e um de BECK (em REGIS JR, ed, 1985)
fornecem subsídios a uma reconstituição histórica dos debates sobre a questão eti.
,
sumario
. A estrutura da tese acompanha de perto a exposição etnográfica.
Capítulos
Introdução - 15
Por fim, apresento a idéia de travar comunicação com etis, e o contexto geral em
que se forjaram as iniciativas de enviar mensagens para etis, que serão o objeto
etis que precederam à da Voyager, realizadas por alguns dos mesmos cientistas que
depois a criaram. Aparecem como esboços do que será o disco, em que algumas
mensagem (cap. 4), descrevo uma a uma as quatro partes em que a mensagem
situa-se entre a faixa das saudações e a dos sons. Mereceu um capítulo separado
precedentes.
CAPíTULO 1
2. «We have seen that the debate in fact arose in antiquity, continued in almost every subsequent
century, and had by 1916 produced over one hundred forty books on this topic. The great
majority of these, moreover, as well as most of the thousands of pre-1917 essays, papers, and
reviews in the debate, advocated extraterrestrial life. Although some authors of these
publications possessed only modest learning, a large number were persons of indisputable
prominence. About three-fourths of the most prolific astronomers and nearly half of the most
prominent intellectuals of the eighteenth and nineteenth centuries contributed to the debate.»
(CROWE:1988:547).
3. Interessado em refutar a possibilidade de haver etis, Tipler detém-se particularmente nos
curiosos argumentos de Alfred R. Wallace, codescobridor com Darwin da teoria da evolução
das espécies, contra a crença na existência de seres extraterrestres. A respeito das concepções
«hiperseleccionistas» de Wallace ver CANGUILHEM (1989) e GOULD (s/d), sobre seus argumentos,
quase teológicos, a respeito da posição única do ser humano no universo, ver GOULD (1985).
4. «The Plutarchean argurnent becarne a part of the natural theology of Christianity after the
Copernican revolution; the Lucretian argurnent carne into its own after the Darwinian»
(BECK:1987:5).
1. Panorama eti - 19
s. «It is during this time [1959, publicação na Nature do artigo de CoCCONI & MORRISON,
considerado reiniciador do debate nos moldes contemporâneos] that the question of other
intelligent beings in the cosmos ceases to be called "the plurality of worlds question tt , as it was
referred to for hundreds of years, and becomes the ttETI question tt » (TIPLER:1981:142).
1. Panorama eti - 21
6. Para esta breve cronologia ufológica, consultei principalmente BRIAZACK & MENNICK (1979) e
DURRANT (s/d).
1. Panorama eti - 22
testemunha da chegada dos seres «from outer space». Como cantava Caetano na
solidão do exílio londrino, «while my eyes ...»
7. FERREIRA NETO (1984) realizou um estudo etnográfico da crença ufológica entre nós, explorando
a ambigüidade do caráter religioso/científico de grupos de «ufologia avançada» de Brasília. Eu
mesmo investiguei alguns grupos de «ufologia científica» no Rio, durante um ano, em 1986/7.
1. Panorama eti - 24
8. TARTER (1987), astrónoma da NASA e da Une da Califórnia, fornece uma listagem dos
principais programas de escuta radioastronómica SETI entre 1959 e 1984. O artigo é uma
ótima "etnografia nativa" do empreendimento SETI, feita por uma das suas maiores entusiastas.
1. Panorama eti - 25
exaustivo programa existente 9 • Por outro lado, desde 1981 a NASA prepara um
amplo programa SETI, que deverá iniciar a fase de escuta em 1992. A sua
inauguração deverá fazer parte das comemorações dos quinhentos anos de
descoberta do Novo Mundo por Colombo lO.
Por fim, especula-se sobre as possíveis mensagens eti que se possa receber: se
seria ela decifrável, a exigência do uso de uma linguagem universal, e o que
provavelmente conteria tal mensagem.
12. Nenhum planeta jamais pôde ser observado em outras estrelas, pois o poder de resolução dos
telescópios situados em solo não é suficiente para detetá-los mesmo que lá estejam. (O
telescópio espacial Hubble, colocado em órbita em abril de 1990, poderia trazer novos dados
a respeito deste enigma; devido ao defeito em suas lentes, no entanto, a astronomia terá de
esperar por outra oportunidade). Kant e posteriormente Laplace propuseram um modelo de
formação do sistema planetário solar que ficou conhecido como «teoria da nebulosa»: uma
nuvem original de gás em rotação iria progressivamente se esfriando e contraindo, submetida
à mecânica das forças gravitacionais e do movimento de rotação, formando um núcleo central
de condensação (a estrela) e outros secundários mais periféricos (os planetas). Na virada do
século, medidas da quantidade de movimento angular do sol mostraram-se incompatíveis com
as previstas pelos cálculos da nebulosa em rotação e contração. Em seu lugar, passou-se a
preferir teorias catastróficas: a matéria que formou os planetas teria sido "arrancada" do sol
por alguma estrela que passou raspando há bilhões de anos. Novos dados espectográficos
mostraram que a "anomalia" do sol - momento angular mínimo para a sua massa - é
compartilhada por toda uma classe de estrelas a ele aparentadas. Uma nova teoria da
nebulosa, que incorporou a idéia da transferência de momento angular da estrela para os
planetas através de forças magnéticas, voltou a conquistar a hegemonia no meio científico. O
que para nós importa nisso tudo é notar que as explicações catastróficas da origem do sistema
solar sugeriam que planetas só surgiriam em circunstâncias excepcionais, fruto do acidente de
corpos astronômicos em rota de colisão, ao passo que a teoria da nebulosa sugere que a
formação de sistemas planetários é um fenômeno normal e esperado para toda uma classe de
estrelas. (Sobre a evolução dessas teorias ver: JAKI:1978; SAGAN & SHKLOVSKI:1966).
13. A idéia de que a Terra primitiva deveria ter uma atmosfera redutora que, exposta às fontes
de energia naturais (luz solar, relâmpagos, calor vulcânico), produziria espontaneamente
moléculas orgânicas como as proteínas, primeiro passo para uma biogênese estritamente
química, já fora sugerida pelo biólogo marxista Oparin na década de 20. Mas serão os
1. Panorama eti - 28
experimentos pioneiros de Miller (MILLER:1955; MILLER & UREY:1959) que tirarão a discussão
do terreno da especulação e lhe atribuirão o estatuto de simulação experimental. Para a
história da discussão a respeito da origem da vida, ver FARLEY (1979), Caries (1984). ORGEL
(1973) apresenta a sua visão de conjunto. O número de setembro de 1977 da Scientific
American, inteiramente dedicado ao tema «Evolution», faz uma excelente revisão das várias
etapas da origem da vida, que mantém-se ainda relativamente atualizada (embora 15 anos
neste terreno faça as hipóteses minarem em lacunas ou simplificações apressadas).
14. Por outro lado, um ponto crucial na cadeia de "geração" de civilizações é saber se a evolução
biológica de espécies inteligentes é um fenômeno recorrente, típico da evolução de toda
"biosfera". Alguns dos maiores biólogos darwinistas pronunciaram-se sobre a conjectura eti.
George SIMPSON (1964), T. DOBZHANSKY (1972; 1978), Ernst MAYR (1978; 1987) recusam a
possibilidade de haver outras espécies antropomorficamente inteligentes. Outros preferem
considerar a questão não concludente e apoiam a iniciativa SETI (GouLD:1985). Para uma
análise detalhada das opiniões de Simpson, Dobzhansky, Mayr e Sagan a respeito da
possibilidade de evolução de outras espécies inteligentes, ver ARANHA F. (1990).
15. D.W. Atchley, Melvin Calvin (premiado com o Nobel de Química durante a conferência), G.
Cocconi, Frank Drake, Su-Shu Huang, John C. Li1ly, Philip M. Morrison, Bernard M. Oliver,
J.P.T. Pearman, Carl Sagan e Otto Struve (SAGAN & SHKLOVSKI:1966:485; DRAKE: 1984:47).
1. Panorama eti - 29
16. Apresento uma versão da equação levemente alterada por Sagan (1983b:298ss), e semelhante
à apresentada por CAMERON (1980). Para a versão original, de F. Drake, ver SAGAN &
SHKLOVSKY (1966: cap. 29).
1. Panorama eti - 30
17. «N pode ser tomado como o produto ou multiplicação de um número de fatores, cada qual
um tipo de filtro [... ]» (SAGAN:1983b:298).
18. Para uma análise estritamente formal da estrutura da equação, ver ARANHA F.:1989.
1. Panorama eti - 31
19. «Uma das grandes virtudes dessa equação [...] é que envolve aspectos que vão da astronomia
planetária e estelar à química orgânica, biologia evolucionária, história, política e psicologia.
Muito do Cosmos está contido na equação de Drake» (SAGAN:1983b:299).
20. Esses mesmos ícones são utilizados por Sagan na publicação das contribuições do Congresso
sobre Comunicação com etis, de 1971 (SAGAN, ed.:1973). Encontrei a fórmula de Green Bank
ilustrada por uma cópia "pirata" dos mesmos ícones numa revista brasileira sobre ufologia (REIS
& MANFREDI: s/d).
1. Panorama eti - 31A
fj~~
.~1'"
~.~_~40..
x Doe X x x X fL = N
(SAGAN: 1983b:300-1)
fc
fi
fI
fp.ne
N*
fp.ne
N*
tecno
inteli logia
gência
planeta
geomorfo
auto-
destruição
em que ela não surge (Marte?); à linhagem que gera uma espécie inteligente
(f; = homem), contrapõe-se um primo não inteligente (chimpanzé?); à espécie
inteligente que desenvolve tecnologia (fc = homem moderno), contrapõe-se outra
igualmente inteligente porém não tecnológica (baleia?).
As estimativas dos outros ítens da fórmula foram feitas com base quer em
dados de observação empírica (nO de estrelas), quer na «suposição de
mediocridade», i.e., na analogia antropocêntrica. Mas o último Ítem é uma
incógnita absoluta. «Para o cálculo de fL não há sequer - felizmente para nós,
mas infelizmente para a discussão - um exemplo terrestre conhecido» (SAGAN &
SHKLOVSKI:1966:489). A auto-destruição de uma civilização constitui uma classe de
fenômeno ainda não observada, mas considerada possível e decisiva. «Dificilmente
exclui-se a possibilidade de nos destruirmos amanhã» (SAGAN:1983b:301). Referida
ao (nosso) futuro, ela condensa as expectativas com a continuidade da evolução,
e traz os signos incômodos do tempo de vida, prazo de morte.
1. Panorama eti - 34
a perder-se além das fronteiras gravitacionais do sol. Numa única ocasião também
emitiu-se uma mensagem de rádio: na reinauguração do maior radiotelescópio do
mundo, o de Arecibo (Porto Rico), dirigido pela Une Cornell, em 1974.
1 reciprocidade
arecibo 1974
do mundo, que a mensagem de Arecibo deve ser entendida. Frank Drake, diretor
esperava ser recebida, não supunha uma eti de prontidão que a flagrasse. A
freqüência eleita, a curta duração da única emissão (169 segundos), a distância das
estrelas alvo (24 mil anos-luz), denotam que o sentido da mensagem não era
efetivamente iniciar diálogo radioastronômico com uma eti vizinha. «Rather it was
da cerimônia, indica o seu caráter ritual, a sua intenção antes de tudo simbólica.
«[The message was transmitted] only as a kind of symbol of the capabilities of our
distâncias interestelares:
«[Era] o sinal mais forte oriundo da Terra. O sinal seria tão forte que talvez
fosse um milhão de vezes mais brilhante que o sol em um comprimento de onda
comparável, sinal este facilmente detectável por radiotelescópios não mais sensíveis
do que os nossos em distâncias interestelares de vários milhares de anos-luz»
(DRAKE: 1984:59).
1. Ver tb: SAGAN:1985:288; SAGAN:1984:6. E ainda DRAKE (1984:59): «[...] pareceu-nos que a melhor
dedicatória para o "novo" telescópio seria transmitir uma mensagem interestelar utilizando-o».
2. Arecibo - 40.
testar uma hipótese, como o SETI, não espera sequer alcançar qualquer eti
interestelar» alcançado.
«Cerca de seis meses após o encontro de Green Bank, ocorreu-me que uma
poderosa maneira de enviar mensagens interestelares não ambíguas seria
transmitindo quadros semelhantes aos de uma televisão comum, procedimento
utilizado com as crianças para que aprendam a falar. Mostramos objetos às
2. Arecibo - 41.
quadro, onde cortar a linha e reiniciar logo abaixo. A solução também exemplifica
bits, divisível apenas por dois primos, de modo que apenas dois tipos de
retângulos poderiam ser compostos (um de 23x73, outro de 73x23). Entre as duas
2. Retorna aqui a fascinação com a série dos primos, já presente nas especulações SETI a
respeito das mensagens de etis. Os números primos não podem ser deduzidos em sua
totalidade por qualquer lei geral, e neste sentido são arbitrários, mas são determinados por
imperativos inteiramente lógicos, e neste sentido são universais e necessários.
o o o o o o
o o o o o NUMBERS 1 TO 10
.. o .... o o o
0000000 NUMBER LABELS
~~~~~RS.
........ 0 0 0
.. 0 0 FOR
.. 0 0 HYOROGEN,
CARBON,
.... 0 0 .... ] NITROGEN.
I I I I I I OXYGENANO
c PHOSPHORUS
000.......... 0 0 0 ........ 0 0 ........
0000.... 0 ........ 0 0 00000
000........ 0 0 ......... 0
I 1I I I I I I I I I I
FORMULAS FOR
SUGARS ANO
BAses lN
00.......... 0 0 0 ........ NUCLEOTIDES
00000 00 00 OF DNA .
0 ............ 0 0 00
I I I I I I I I I I I
II
.... 0
.... 0 NUMBEROF
- - - - - - - - - NUCLEOTIDES
.. o INONA
o ....
OOUBLE HELlX
.... 0
IOFDNA
O
HUMAN BEING
1
-I 1101100
1 1 1 1 1 1
1 1 1
111111
\
o
1 1
1 101 1 1
1 1
110
I
J,
HEIGHTOF
HUMAN B.EING
HUMAN
POPULATION
ARECIBO
TElESCOPE
~ TRANSMITTING
MESSAGE
ARECIBO MESSAGE lN PICTURES aDd accompauyiDl traD81a. for alI the number8 shown to be read.) The ehemical formulae are
tlOD ehowe lhe biDary venion of the me8sale decoded. Eaeh num· tbose for lhe componente of the DNA moleeule: lhe phoephate
. ber thal is u8ed is marked with a label that indie.tes its slart. When Iroup, the deoxyriboee sUlar and the orlaDie basel thymlne, Ad·
.U lhe dilits of a number eannot be fitted mto one Une, lhe dipte enme, paniDe and cytoline. Both the hei,ht 01 the h1lDWl beinl
for which there i. no room are written 1lDder· the leut lipifi. and lhe cUameter o, lhe tele.eope are pven ln unitl o, lhe
eaut dipL (The mee"le muet he oriented ln three dilerent waJI wavelenlth lhat ie ueed to transmit lhe mellale: 12.6 eeDtimeten.
:::::::::.:.:":::. ~:':::::::::: '::::' :'::::::::::::::::::.:::::::: ~':: :::':::::':::':' ::::; ~:::::::::::;::::::::: :::::::::::::::::::::::::::::::::: ;:: :: .. ,:,::',:.:.:.:.: ... :;'::;,:.::: -::::: .:::.::::::: .. ::: ::::::::;:::::::::;:' :::::.:::::; :::::::: :::::::::.;;:::::;:::::.:.::::::: ;:::::;::::: :::: ::;: ~:::::.;:::::: -:::::::,:;::::::":,'. ~ -:;:::
.
c
·.•: .
. • •.
1ç
. '. ..'. .•. .••0.• .'•. •. a•.q·•.•"•.':O.• •.> n.•·.•. C·•. U..••.•.··.•:..•.am
1
• .•:·.•:....
••.•..•...•:.•. •. :.:.:..•. .••.•.•.•.•.•:.•.••2 . :.••.•.•. .•:.•...•:••:.:::.•.•. •·.·.·.·.<b·.·.· .:·.•.:• e
·.,I.•.·.·• U
.••..•.·:.•.•.••.
· ' . I.••..••
.·. :.•.•.•.•.•.•.
>m · ·:•. · 1~
. •. :•. : :·t·.:.:é·
.•.•• ~.·r
.•. •·. .r•. •. i.•.:.C.•·. •·.: •r·a.•·.•. •.•:• ..t•.• .•:· • ·:.e. •:.• :. :.•.. :•. . . : :. :::>f6tmtnâ$>ti()$·::~:çom:pºn$:Q~~§}ªp···:PNA::;:
:::.:.e
.•·.•. S
•..· •• :
:.·:
•..• r. •:.·•. .~ªh~~~~rnd~tJfu~d~i>
.. .
4
• .• • .•. •.•. •.•.• •:.• .•5
:.• .• • . •. •:•'.•·.•·.•·:·.SI·
.•·.•.O
.• . C•. •.•••a.••.• ·ta.·
•••.·.U·.· ·••.t•.
.•·. •.I
.• •.i·• •.Z..•.S·. •.•·.•.•.
."
·.·• a.•:. ç.••.• a.·V~ I••. ·.• a.·• •.
•.
C
·.I· . •.• .• •:.·•. Z:.·
P •.• .•·.•
.••. ••I .·.1.·
·•.• t .·: ·O·
••.•·. •
r IO'.'
i~iª'Qrijmª'· •~~• • ~i§~~mª'~91ª'tU • • • • •
.• . •.':J•.•·. :••••.•:•:.·•.•·•.•·:•.• ••. .• .• .• .• •. •. •. •. .• • . •. •. • • %••••••••••••••••••.•••••.. .
·\·:::;::·.·.).t~:ÇfJp~~:~~*R·9:pip.:·:~m~$:~qtH·~:/.~9.~jm~gitJ:~f:: .
Mensagem de Arecibo
«The message begins with a «lesson» describing the number system to be used.
This system is the binary system, believed to be one of the simplest number
3. Drake inspira-se aqui parcialmente na idéia de uma mensagem que, partindo de uma notação
mínima auto-evidente, apresente progressivamente a própria linguagem em que está cifrada,
numa pirâmide de crescente complexidade e abstração, tal como proposta pelo matemático
holandês Hans Freudenthal em um livro de 1960, intitulado LINCOS: design of a language for
cosmic intercourse (FREUDENTHAL:1987, para um extrato do livro). Lincos é a contração de língua
cósmica em latim.
2. Arecibo - 43.
retângulo introdutório, que não faz parte ainda da fórmula do ADN mas
(«STAFP»:1975:464).
message describes some characteristics af life on Earth wich [...] would be of most
nas formas vivas terrestres seja a única possível. Um ser vivo extraterrestre, fruto
avaliar o patamar evolutivo alcançado pelos emissores, sob dois pontos de vista:
alcançado pela espécie talvez possa ser inferido de sua complexidade genética.
ADN [...] expressa algo que não poderia ser de outra maneira descrito em um
trabalho de arte tão simples - o nível da nossa evolução e uma medida do nível
taken with the strength of our signal, a great deal about the leveI of our
technology» (<<STAFF»:1975:465).
o motivo pelo qual os autores supõe que o telescópio seria reconhecido por
telescópio, por ser determinada por exigências da matemática e da física das ondas
showing a device which directs rays to a point. The mathematical curve which
a cabeça de uma figura humana, «stablishing the connection between the DNA,
the complexity of the helix, and the intelligent creature» (<<STAFF»:1975:465). À sua
planetário com um planeta habitado. Estes temas são os mesmos levantados nas
a equação de Green Bank - que aliás foi originalmente formulada pelo mesmo
seguinte).
.
[ij.
":~~'
~. " ';-
':'.' . ..;.·2··
t:i .,o-
. "..... '- o··;'"
fp x De x x x x
Equação de Green Bank (Sagan:1983:300-1)
fz - vida
fi - inteligência
fp • De
planeta
fc - tecnologia
Mensagem de Arecibo
interestelar valer a pena? O que selecionar para mandar-lhes? E como, por que
meios, cifrado de que forma, de modo a poder ser decifrado por quem quer de
civilizações estranhas. E para ela, o que uma eti deseja receber de nós é o nosso
retrato.
lógica do SEnso Ela é como uma antecipação da mensagem' de uma eti que um
dia seria captada por uma antena SETI. Permutados os lugares, a mensagem
s. O próprio observatório será utilizado para um programa SETI, em 1975-6, por Drake e Sagan
(Cf TARTER:1985:193).
CAPíTULO 3
pioneer 1972/3
satélite geológico (LAGEOS), posto em órbita em 1974 e que não cairá antes de
oito milhões de anos: Sagan lá também colocou uma mensagem, com mapas-
1. Deixaram mais: «To commemorate the first moon landing, a small plaque had been attached
to it. The plaque read: "Here men from the planet Earth first set foot upon the moon July
1969, AD. We carne in peace for alI mankind". Also left on the moon were a shoulder patch
from the Apollo 1 mission to commemorate "Gus" Grissom, Edward White and Roger Chaffee,
two medals to honor the Soviet cosmonauts, Yuri Gagarin and Vladimir Komarov, who had
given their lives in their nation's space effort, a silicon disk wich had been etched with the
gaodwill messages from leaders af 73 cauntries and a galden olive branch which symbolized
peace.» (DEwAARD:1987:67). Note-se o disco com os votos de representantes nacionais - um
prenúncio da solução adotada para a mensagem da Voyager, 8 anos depois.
3. Pioneer - 49
lançadas que se dirigiram para o exterior do nosso sistema planetário. Foram «de
das Pioneer. Sagan, sua esposa e Frank Drake "escreveram" a mensagem. O evento
mensagem não evidente, mas supostamente decifrável por uma eti. Os autores
oferecia ao tato.
Placa da Pioneer
\.;
'~\'I; ~
o I-l-
o o
I-D:
.:~"fr õ'" o
ll-D:-
mam-
o
estilo jornalístico: «Nudes and Map teII about Earth to Other Worlds»
(SAGAN:1973).
mesmo próton ao centro, o sinal que representa o elétron no entanto sofre uma
alteração - mudou seu spin. Esta é uma propriedade fundamental da física dos
elementos )3.
seus dois estados energéticos mais baixos está, para a mensagem, como o metro-
3. É esta propriedade que fundamenta toda a tecnologia da espectrografia astronõmica, pela qual
se pode, entre outras coisas, determinar quais os elementos componentes de uma estrela. As
freqüências características dos elementos formam raias de absorção ou emissão que mancham
o contínuo do espectro da luz estelar, segundo configurações características.
4. Para um comentário sobre o sentido da convenção das medidas-padrão, consolidadas na
convenção de 1875, ver MERLEAU-PONTY & MORANDO (1971:92).
3. Pioneer - 53
transition of the most abundant atom in the Galaxy should be readily recognizable
É na crença de que a ciência seja comum, às etis como aos terrestres, que
message itself intends to communicate the locale, epoch, and something of the
é «a linguagem científica».
«There is, of course, the possibility that the message on Pioneer 10 - invented
by human beings but directed at creatures of a very different kind - may prove
ultimately mysterious to them. We think note We think we have written the
message - except for the man and woman - in a universal language. The
extraterrestrials cannot possibly understand English or Russian or Chinese or
Esperanto, but they must share with us common mathematics and physics and
astronomy. I believe that they will understand, with no very great effort, this
message written in the galactic language: ttScientifictt » (SAGAN:1973:30). 5
5. Ver também SAGAN (1984:7-8): «[na placa] está gravado um desenho de alguma coisa da época
e do local de nossa civilizacão, representada em uma linguagem científica que esperamos ser
compreensível a uma sociedade cientificamente instruída sem qualquer conhecimento prévio de
nosso planeta ou de seus habitantes» (gm).
3. Pioneer - 54
O pulsar é fonte
,/
,..':.t
estelar intermitente de I
...1
)
extremamente regular e
forma precisa de
freqüência. É a única estrela (concedendo que seja estrela) a possuir uma espécie
pulsar não permanece constante para sempre. Decai lentamente à medida em que
galáxia. Seu eixo é o único que não possui nenhum número inscrito, nem qualquer
habitante da galáxia.
freqüências dos pulsares, para amarrar uma configuração única, possível de ser
ajuste fino na localização: nenhuma estrela vizinha deve possuir uma série tão
pública da mensagem mostrou que mesmo para os terrestres esta era a parte mais
justificada pelos dez dedos superiores (SAGAN:1973:28). Mas a mão não aparece
apenas como o índice da tecnologia inscrito no nosso corpo, ela surge também
and woman on the plaque are, to a significant degree, representative of the sexes
figuras panraciais: «we made a conscious attempt to have the man and woman
3. Pioneer - 58
panracial» (idem, p. 26). No entanto a distribuição dos papéis entre os dois sexos
posições do homem e da mulher, foi mo!tivo das mais insistentes críticas nos mídia
apenas que quem levanta a mão em aceno é a mulher. (Ver figura na página
ordem técnica, que contrastam com censuras morais feitas à mensagem - a nudez
das figuras humanas, a representação das etnias, o papel desigual atribuído aos
sexos. Mas justo por suas críticas e restrições, tanto as censuras morais quanto as
da Voyager.
Consideradas, não pelo motivo da sua recusa, mas por constituírem soluções
Da placa da Pioneer
Da foto 52 da Voyager
nos sensores da sonda. (Este recurso foi utilizado pelas Voyager, às quais não
e magnitude.
neural connections» (SAGAN, SAGAN & DRAKE: 883, gm). Uma medida da
assim fornecer elementos para estimar o nível de inteligência da espécie, tal como
voyager1977
nomes iniciais eram Mariner 11 e 12. As trajetórias traçadas para cada uma foram
resultante final, ambas as naves seriam arremessadas para fora do sistema solar,
O fato de ser um
artefato humano
enviado ao espaço
interestelar, tal
como as Pioneer
de 1972, confere-
lhe uma
peculiaridade que
Sonda Voyager
não passou
em solo marciano. Ele conta que foi procurado pelo diretor do projeto Voyager
para que elaborasse uma mensagem, no estilo da placa das Pioneer, para ir a
exterior do sistema solar, mas aproveitando um veículo que será lançado com este
destino, acrescentam-lhe uma compacta mensagem que não o atrapalhe. Elas vão
«de carona». «Está de carona, assim como todas as outras mensagens colocadas
4. Voyager - 62
sempre no último minuto) com outro objetivo» (SAGAN:1984:9). A missão não foi
sem destino, ela ainda servirá a uma "missão" secundária e incerta, a um pequeno
«Existe algo mais a bordo das duas naves espaciais Voyager. Muito depois de seus
Cita Philip Morrison (físico do MIT, um dos que lançou a idéia da SETI), Frank
Harvard), Leslie Orgel (biólogo do Salk Institute for Biological Research), Bernard
Procurou ainda Isaac Asimov, Arthur C. Clarke e Robert Heinlein, três monstros
enviar música como parte da mensagem. Além disso era exeqüível a curto prazo
indústria fonográfica 2•
e mais longa (hora e meia; 3/4 do tempo de gravação), reúne uma seleção de
2. Foi a CBS que "garantiu todas as liberações [de direitos autorais], fez a mixagem das músicas,
saudações e sons, e cortou os moldes de cera a partir dos quais as matrizes metálicas são
feitas" (SAGAN,22).
3. Na verdade, a mensagem escrita de Carter e a lista dos congressistas foram enviadas como
fotos. A rigor, foram 118 imagens, mas apenas as 116 primeiras compõem a primeira parte
da mensagem.
4. Voyager - 64
locutor de TV: «[...] por favor NASA, por favor,IInclua em seu LP intergalático/O
som da nossa música. [...]/Não incluir música [...]1 Seria dar-lhes as nossas mentes;
de entrada a todo o resto. O disco foi protegido por uma capa metálica com
o disco das hostilidades da viagem, ela cumpre uma função chave na veiculação
e gravadas no metal (tal como a placa das Pioneers), algumas figuras deveriam
deformações anamorfóticas 4 •
há uma reprodução do
localização do sistema
E numa área de 2 cm de
•.• ".#'
. , ,. ' ?,:.: .
diâmetro foi fixada uma M ... :~~~·:·::·:::.:-~.:._ ~. '~"~ • • •
..-
_
amostra ultrapura de
::':::',:·:'·':;,.. ,::.,:·,'Y·:-'::.·'::::,·.;·,<.::::':': :U·:'C::'::::/:»)::/'/::::::U)),Y:?:/:, ' , , ',. : ::::,.' ': . ,:.:,;., ; :.;,:-: :,,:-:;.;:.:.: :;:; ,':',:;';: : :.:. : .:.:.;: :.: .:,': : :': : ;:': : "':":':.:.,: ';: : ';.: • :-:-:',.,: .-:":..:.',., .' . '.':':. ',' :,','.'
...,::Jj::ê)·:Ou:strª:QPªS:::··:::;::-·/?:··;::::::.'.• •'., .,:,'" '.'. ",., ','.'.' ','",' ','.',', '.' ,., •.',•. ::,:::::',-::'.:-'.':':'::::::':";::".>;:':<,::::://::::.:-,./:··/(>,:::[,:-.: . ··.}í'MAGE·NS.·"
.
. ········\··MU$iPâ•• )•• • ·.·)···>··················· . < .•.•. ••.••••..• <•••••••••.••..•••··················<>HHHi/··..MPS1dÂS> • ·.· · ·<· · · .
"'.-,' '.,' .:::''-:-:-::'' ::'::::.::: :::-:,' . ::.-:-:« :.,:::'::,/'/::":':.. (,/;,.':-::.. >:/;::::::,.::/:\)\/////>:<.::::::::':::-'::'::-''.' '.
Disco da Voyager
retratos da Terra
superfície metálica. «Minha primeira idéia foi fazer uma modesta extensão da
de sua biologia, a base bioquímica de seus corpos. Uma espécie de Pioneer que
para extraterrestres» a umas poucas imagens: «A idéia original era de seis fotos.
nos com duas exigências contraditórias: elas deveriam conter tanta informação
Não trazem assim nenhuma informação nova, não ajudam na interpretação das
preceder certas fotografias por uma sua reprodução simplificada, onde os objetos
5. Fotos - 69
É uma maneira de dizer: 'Isto é o que queremos que você veja na foto'»
(LOMBERG:1984:77). 3) Por fim, a simples repetição de temas, objetos e imagens
confirmar imagens.
como um todo, conferindo-lhe uma identidade global. Tal como nas figuras
um bricolage dos traços das várias raças humanas, a civilização terrestre deve
aparecer consolidada num corpo social único e abrangente, ainda que composto
nem toda informação tem o mesmo peso. Sagan tencionava mandar o máximo de
princípios dos quais o mais importante era o seguinte: enviar a qualquer possível
provavelmente não teriam acesso por outros meios» (SAGAN:1984:32, gm). Com esta
eti. Não era necessário perder tempo (e disco) para repassar o óbvio, para repetir
mais. A sonda muda já dizia de nossa tecnologia; ao disco, cabia dizer algo mais.
A intenção era «fornecer [às eti] imagens de toda a Terra e dos seus
habitantes» (LoMBERG:1984:76). Permitir-lhes visualizar as nossas especificidades,
dizem respeito a classes de fenômenos mais raros, mais inacessíveis ao estudo, cuja
entenderem mas também tanto mais valiosa a informação, uma vez compreendida»
(SAGAN:1984:32, gm).
humana, aquilo que se supõe deva ser distinto da eti, sem deixar de ser
elas não interessaria obter informações óbvias sobre o universo, que já possuem
a informação rica e interessante para uma eti está nas peculiaridades da vida e
da inteligência terrestres. «Queremos dizer a esses outros seres alguma coisa que
comentadas uma a uma por LOMBERG (cap.3), responsável pela sua seleção. Listo-
as a seguir, de forma sintética. Os títulos e números das fotos são os dados por
que são reproduzidas junto ao texto deste trabalho. (O Anexo 1 traz a totalidade
da fotos).
5. Fotos -73
II
III
Lomberg, que comenta, antes de apresentar a foto 63: «Todas as outras fotos são
informação científica [...] para nos apresentar. Deste ponto em diante [...], embora
o critério principal da seleção ainda seja a informação contida, esta muitas vezes
rv
podem tocar» (LoMBERG:1984:77).
mensagem.
sua cadeia de reprodução sexuada. Embora compareça bem no início da série das
Elas são tomadas antes de tudo como representantes da espécie biológica, como
da espécie humana. Não obstante, fotos como a 35 (pai com filho), 36 (crianças
(LOMBERG: 1984:95).
próximos, esse outro representante dos primatas poderia ser confundido com a
espécie inteligente terrestre, seus traços distintivos não notados, sua diferença
fornece uma pista de que estes últimos não fazem parte da raça que enviou a
como uma imagem especular do próprio fotógrafo da cena. Essa disposição dos
atores em cena e do ângulo de visão da fotografia, contrasta curiosamente com
e o fundo, uma mistura entre o alvo da mira humana e a estepe. Foi para evitar
essa indefinição e ensinar «a ver a foto como nós a vemos» (1984:103) que se
a distinção sutil entre essas duas espécies de «parentes próximos» (p. 103).
Lomberg chega a aventar a possibilidade de a foto ser interpretada erroneamente
porém essencial.
um indígena quase-nu, caçando com uma lança artesanal. O mais próximo da série
natural, mas dela já inequivocamente distinto. O bosquímano funciona aqui como
humana o mais próximo da "selva" possível, mas já dela destacado. Lomberg não
vê aqui lugar para qualquer dúvida sobre qual a espécie inteligente. Nenhuma
confusão possível, nenhum barramento da fronteira humano/não-humano. Os
cervo e estepe, entre dois "objetos" naturais, para os quais os humanos se dirigem.
si: a foto retrata «uma relação tipicamente humano/animal: o ser humano prestes
5. Fotos - 81
pai»), todos signos do salto evolutivo humano, face ao resto do reino vivo.
ataque do homem primitivo - compõe os dois pólos de uma distinção sutil mas
"culturais", entre «uma visão do nosso planeta» e uma da nossa civilização. Entre
da foto de Júpiter à evolução dos vertebrados. Não é guiado tampouco por esse
química ou biologia.
Alguns temas são alvo de uma atenção recorrente dos autores, que os
do alimento de cru para cozido: «De um lado os peixes estão crus e frios
5. Fotos - 82
da ONU «observando um globo que é o seu planeta natal»; 111, uma página do
System of the World, de Isaac Newton, como representante da escrita e dos livros,
que «têm sido o meio através do qual os seres humanos guardam e pesquisam
homem. Uma das consultoras procuradas por Sagan, Steven Toulmin, professora
entendem pela noção de social pode ser apreendido da solução adotada: algumas
parede, auxiliado por outro que lhe traz tijolos; na foto seguinte, um grupo de
professor auxiliando
um deles a escrever:
ainda educamos
nossas crianças em
tutores particulares
ou através de
máquinas de ensinar Foto 97: Interior de fábrica
- pelo menos até agora» (p. 107). Em todas estas cenas, a atividade retratada
erguendo o filho ao ombro. O diagrama dos vertebrados (foto 52) inclui um casal
das Pioneers, com uma diferença: para calar os protestos das feministas, que
1. A foto original, apresentando um casal em nu frontal, um louro e uma morena grávida, foi
censurada pela NASA, para evitar críticas moralistas. Enviaram apenas a silhueta. A foto é
reproduzida em LoMBERG (1984:74).
5. Fotos - 85
em que aparecem
figuras humanas
procuram, de cada
vez, registrar uma
raça, um povo, uma
nacionalidade
diferente. Há fotos
uma raça lado a lado numa mesma atividade. Os corredores nas Olimpíadas (foto
5. Fotos - 86
72) foram incluídos para «mostrar representantes de várias raças de seres humanos
mostram «um grupo de seres humanos de várias raças e culturas fazendo alguma
Terra vista do espaço (flZ) (em ambas, a mesma face (África, Oriente Médio,
Índia) é apresentada), mais uma informação poderia ser apreendida: a divisão em
nações. Ao examinar o globo «notarão que a Terra está dividida por um padrão
fronteiras territoriais ou políticas, fronteiras que são conceitos e não marcas reais
no planeta» (pl07). A comparação dos dois globos faz a ponte entre um objeto
diversidade
morfológica
representada culmina
humanos. «Além de
incluir vários tipos
raCIaIS e
nacionalidades, a foto
Foto 36: Grupo de crianças
5. Fotos - 87
de pessoas»
f36); «Novamente as
crianças aparecem em
círculo, seus olhos
uma mesa lembra os círculos das fotos 36 e 74» (p. 109, f81). «Arranjo
privilégio, sem
diferenciar suas
posições. Equidistantes
de um centro para o
um espaço "interior" e
igualmente
compartilhado que é a
que liga
Foto 38: Retrato de família
perifericamente os seus
morfológica dos indivíduos humanos (etnias, sexos), sem que essas diferenças
5. Fotos - 88
silhueta (f37) que assinala pesos e idades típicos para quatro dos componentes.
astrônomos de qualquer civilização (p. 118) - fazem referência aos projetos SETI,
às expectativas de contactar etis por rádio. «Esta foto [do radiotelescópio de
Arecibo] revela que a Terra está pronta para entrar na conversa» (p. 119).
qualitativo, reproduzindo uma página do seu System of the World (f111), «onde,
evolutivo. O astronauta
com a do caçador
saudações da Voyager
que são pronunciadas. O primeiro gênero inclui o texto enviado pelo então
em nenhum dos dois gêneros acima considerados: uma gravação subaquática dos
sons emitidos por uma baleia corcunda. Por ocupar uma posição peculiar em
verbais no disco, mesmo sabel1do que não poderiam ser compreendidas, e como aos
língua. Conjecturou-se que talvez pudessem ser compreendidas (no seu sentido
(L. SAGAN:1984:132). Porém a mensagem em si, mesmo não decifrada, já era uma
seu texto, a «linguagem falada pode, todavia, ser de algum interesse; se o disco
(SAGAN:1984:22). Mas este "alô" deveria ser evocado não por um indivíduo, um
comunidade, ainda que esta fosse complexa e consistisse de muitas partes» (L.
Sua primeira idéia (<<Talvez por ingenuidade minha [...]», SAGAN:1984:23) foi
mais diversos entraves burocráticos. Por fim, um tanto fora de seu controle, a
das línguas mais faladas na Terra» (idem:24). Elas eram excessivamente longas e
solução adotada foi editá-las, compilando frases soltas na fala de cada orador e
compondo uma mensagem de fragmentos poliglotas (os fragmentos selecionados
são dados no Apêndice B do livro). Afinal, justifica Sagan, queriam apenas que
incompreensível às etis.
geral da ONU, tomou a iniciativa de preparar uma gravação com a sua saudação
Uma vez com a mensagem do secretário geral da ONU, Sagan achou conveniente
da NASA. «De forma que, se o leitor quiser saber por que motivos o nome do
Senador John Stennis do Mississippi consta a bordo da Voyager, direi que isto
parece decidir-se da pior forma e perder seu encanto e motivação primeira: «Esta
parte da mensagem da Voyager é, sem dúvida alguma, um sinal aqui para baixo
realizada, esta parte da mensagem não corresponde ao plano inicial para o disco.
Fora justamente para evitar este gênero de "interferência" que se procurara não
Sagan é cauteloso o suficiente para não fazer uma queixa direta quanto ao
excluir esse "corpo estranho" incrustado no miolo do disco. Mas é evidente a sua
insatisfação com os resultados. Não era o tipo de "Alôs" que ele pretendia incluir
no disco. Acima de tudo, não eram representativos das línguas humanas. Não havia
1. EBERHART (1980), num artigo de 1977 em que sumaria a mensagem da Voyager, citado
elogiosamente por SAGAN como «um pormenorizado e preciso relato do conteúdo do disco»
(1984:38), simplesmente omite todo este bloco das "autoridades políticas". Das saudações apenas
lista as 54 línguas; e inclui a gravação das baleias no bloco seguinte da mensagem, como o
primeiro dos «Sons».
6. Saudações - 99
planeta Terra que tivemos que tomar medidas de emergência» (29). As "medidas"
esposa de Carl).
conseguiram uma listagem das mais faladas, relacionando as línguas por ordem
as vinte e cinco línguas mais faladas». Pôde-se depois incluir mais que o dobro.
hitita, o latim, selecionadas por «terem estas línguas uma importância histórica» (L.
SAGAN:1984:125, gm).
Linda Sagan, que não pronunciou nenhuma das saudações, aproveita para sugerir
em casa?"» (idem:124). Ou: «Ei, vocês aí, nós não mordemos, como é que são as
coisas do seu lado? Sinceramente, Terra» (idem:125). Algumas das saudações que
Linda destaca das 54 enviadas: em latim, «Saudações a vocês, não importa quem
«Espero que todos estejam bem. Estamos pensando em vocês. Por favor venham
deste sentido cronológico sugerido por Carl (da língua mais antiga ao inglês de
percentual da população mundial. Por fim, inclui um balanço das línguas e países
hierarquizante exemplar2•
onde as posições relativas das instituições, dos cargos e das nações eram os
engloba as diversas nações numa instituição maior, mas apenas administra parte
uma agência diplomática. Por outro lado, o projeto Voyager, embora com
científicas, por seu aspecto ideológico - levar uma mensagem em nome dos "povos
2. Igualmente na resenha da mensagem do disco feita por EBERHART (1980), citada na nota
anterior, a lista das línguas em que se enviou saudações não obedece sequer à ordenação
aleatória original da mensagem, mas à não-hierarquizante e neutra ordem alfabética.
6. Saudações - 102
(SAGAN: 1984:27).
participado por todos os indivíduos humanos. Por isso, quanto mais variações se
apresenta, menos elas são capazes de diferenciar, mais elas redundam e delineam
civilização.
Talvez mais sério que o papel das nacionalidades seja o dos indivíduos. O
qual se apreendesse apenas os traços gerais da sua etnia - de modo algum a sua
públicos, que prontamente elevam a figura do indivíduo que ocupa o cargo - por
sua capacidade, por sua responsabilidade, pelo poder investido - acima dos
demais. O indivíduo que se quer mostrar deve servir apenas como uma atualização
acadêmicas e universitárias.
locutores (embora seus nomes constem por cortesia na relação de saudações que
o livro apresenta) são anônimos. «Os locutores foram escolhidos pela sua fluência
o canto da baleia
bloco dos «Sons da Terra», há uma gravação subaquática dos sons emitidos por
Voyager. Ela não foi apenas fotografada e passivamente incluída como um objeto
da paisagem terrestre. O seu canto é investido do estatuto de uma mensagem
dirigida a etis: «[...] uma mensagem dos companheiros habitantes da Terra, que
candidatos à inteligência.
sol). Em princípio ela é apresentada como mais uma saudação às etis, reunida
aos "alôs" humanos. Localiza-se ao final do bloco das «Saudações», logo após os
canto das baleias corcunda, lançado no fundo dos oceanos para ser ouvido a
«Sons». Era apenas mais um som a ser coletado da sua lista, encontrado em um
circuito outro que não o da seleção das músicas ou das saudações, entre um
baleias como o primeiro ítern da série dos «Sons», logo antes da «música das
esferas».
Entre a música, a fala e o mero som, a saudação da baleia não tem uma
posição definitiva na fronteira entre natureza e cultura. Justo porque ela tematiza
tal fronteira: o lugar que cabe à baleia na classificação dos seres naturais coloca
outro ser vivo conhecido que não o humano. Pelo menos a respeito de três
mais de 100 palavras para comunicar-se com seus treinadores, chegando a adquirir
que fez do golfinho o que «Lassie» havia feito do cão doméstico. Um dos
principais responsáveis pelo furor em torno ao assunto era o biólogo John Lilly,
«There was a feeling that this effort to communicate with dolphins - the dolphin
is probably another intelligent species on our own planet - was in some sense
comparable to the task that will face us in communicating with an intelligent
species on another planet, should interstellar radio communication be established»
(SAGAN:1973:167).
Uma década depois, SAGAN (1973) queixa-se dos resultados a que chegaram
os estudos iniciados por Lilly4. Apesar de terem produzido «an important atlas on
(p.175).
pública com a ascensão dos movimentos ecológicos nos Estados Unidos e Europa.
É o momento em que todo jovem ou artista tem uma t-shirt com o slogan «Save
the Whales!», ou um botton «Let them live!».
corcunda,
desenvolvendo técnicas
microfones submersos e
colecionando um
gravações anuais de
recorreu para obter a gravação de uma baleia. «Payne acredita que estas canções
encontram a distâncias tão grandes que uma não pode ver ou sentir o cheiro da
7. Baleia - 111
situação das baleias e a do contato com uma eti que faz delas um personagem
mais complexos, que não podem ser assim explicados: parecem desempenhar
funções sociais no grupo. «Alguns sons das baleias são chamados canções, mas
complexa seqüência de tons, que dura uns quinze minutos (até uma hora), ao fim
compasso por compasso, cadência por cadência, nota por nota» (idem). Além de
poder ser repetida pelo indivíduo, ela costuma ser entoada em conjunto pelo
(idem).
gregários fazendo gravações periódicas dos seus sons, evidenciou que as canções
de uso coletivo mantêm-se relativamente estáveis, mas aos poucos, mês a mês, elas
melodias. Payne atesta: «As músicas gravadas em 1964 e 1969 são tão diferentes
Devido à grande variação tonal nas canções, Sagan se pergunta se elas não
seriam portadoras de informação, «or, put another way, that whale language is
dolphins like human Homers before the invention of writing, telling of great deeds
done in years gone by in the depth and far reaches of the sea?» (idem).
se especula sobre o alcance dos sons emitidos por baleias: apesar de desprovidas
canal:
Num oceano ainda não explorado por humanos, a "cultura cetácea" vive o
seu esplendor, sua época de ouro. Mas a aldeia global não-tecnológica das baleias,
tentando estabelecer contato por rádio com outros possíveis seres semelhantes,
extinção das espécies. Pior que sofrer a poluição ambiental por resíduo ou efeito
é pescada pela sua carne, seus ossos, e seu óleo ainda fabrica cosméticos e
até algum tempo atrás, não eram classificadas como animal tabu, cuja matança ou
ingestão ferisse algum preceito. Sua carne não causava repulsa, seu sacrifício
cultural particular, alguns animais são foco de atitudes rituais, ao passo que outros
não. [...] Não é totalmente claro por que deva ser assim, mas um fato que é
seu status classificatório na cultura ocidental: há uma tensão entre dois códigos
morais, o da economia do pescador, que diz que toda baleia é boa para consumo
as baleias entre os seres que merecem direitos análogos aos humanos. Mesmo no
argumentar pela suspensão temporária da pesca, não condena a pesca em si, não
extinção, mas por motivos morais. A sua matança teria conotação semelhante à
"selvagens" sub-humanos.
Sagan. «There is a monstmous and barbaric traffic in the carcasses and vital fluids
of whales. [...] But why, until recently, has there been so little outcry against this
slaughter, so little compassion for the whale?» (SAGAN:1973:178, gm). Sagan chega
"espécie amiga" e tabu, vêm numa progressão desde pelo menos os anos 60. Países
como os EUA recentemente extinguiram sua indústria baleeira, aprovando leis que
Observe-se que são justo algumas das potências "menos ocidentais" as que mais
7. Aparentemente para alguns japoneses, sequer os golfinhos estão excluídos da dieta. Uma notícia
no jornal Estado de São Paulo (07/11/90), por exemplo, informa da matança de uns seiscentos
golfinhos por pescadores japoneses «para serem usados como alimento». Os pescadores ainda
justificam a sua caça por o golfinho concorrer com sua atividade econõmica, comendo muitos
dos já escassos peixes.
7. Baleia - 117
impedir o massacre.
deve ser assistido junto com a versão hollywoodiana de John Huston da baleia
8. Boa parte do documentário é dedicado às baleias corcundas e seu canto, a respeito das quais
entrevistam Roger Payne.
9. «Dada a sua situação, pois, consideraria eu essa enorme giba como o órgão representativo da
firmeza e indomabilidade do cachalote; e em breve tereis ocasião de verificar que o grande
monstro é na verdade indomável» (MELVILLE:1982:372).
10. «[...] e em todas as estações do ano e em todos os oceanos declararam uma guerra sem
tréguas à massa animada mais poderosa que sobreviveu ao Dilúvio, a mais monstruosa, a mais
montanhosa, esse mastodonte do mar, grande como o Himalaia, dotado de tão prodigiosa força
inconsciente que mesmo os seus pânicos devem ser mais temíveis do que os seus ataques mais
ousados e maliciosos» (MELVILLE:1982:98).
7. Baleia - 118
marinheiros que passam mais de ano numa única excursão de pesca, retornando
encarna como nenhuma outra esta potência inesgotável da natureza ll• Se há algum
força "elemental" da baleia, recolher-se ao seu lugar de mero humano l2. Desonra-
11. «Uma da mais estranhas sugestões que acabou por associar-se definitivamente com a baleia
branca, nos espíritos inclinados à superstição, era a idéia sobrenatural de que Moby Dick tinha
o dom da ubiqüidade, e que fora realmente encontrado em latitudes opostas, simultaneamente.
[...] que alguns baleeiros se extremassem nas suas superstições e declarassem que Moby Dick
era não somente ubíquo como também imortal (porque a imortalidade não é mais do que a
ubiqüidade no tempo) [...]» (MELVILLE:1982:211-2).
12. «lY de qué es culpable el capitán Achab, de Melville? De haber elegido a Moby-Dick, de
haber elegido la ballena blanca en lugar de obedecer a la ley de grupo de los pescadores que
dice que cualquier ballena es buena para ser cazada. Ese es el elemento dem6nico de Achab,
su traici6n, su relación con Laviatán, esa elección de objeto que 10 compromete en un devenir-
ballena» (DELEUZE & PARNET:1980:51).
13. «- Vingar-se de um pobre bruto! - gritou Starbuck - Deixar-se dominar pelo mais cego
instinto! Lol!cura! Enfurecer-se com um animal, Capitão Ahab, parece-me blasfêmia.
«- [...] As vezes penso que apenas ele existe. Porém é bastante: atarefa-me, avassala-me.
Vejo a sua força atroz unida com a imperscrutável malícia que o reforça. Essa coisa
imperscrutável é o que odeio principalmente e quer seja o cachalote branco o agente, quer
atue por sua própria conta, o certo é que descarrego sobre ele o meu ódio. Não me fale de
blasfêmia, homem. Eu desafiaria até o sol, se ele me insultasse. Porque se o sol pudesse fazer
isso, eu podia cumprir o que disse, desde que há em tudo isso uma espécie de justiça, a
inveja presidindo a toda criação.» (MELVILLE:1982:193).
7. Baleia -119
são dotadas de razão e sensatez, mais até que alguns homens, seus carrascos -
o líder do Green Peace conta como, quando uma baleia foi atingida, o macho do
bando passou por ele, olhou, e compreendeu que não era ele o seu inimigo;
dirigiu-se ao baleeiro, e findou também arpoado. Por outro lado, a hybris dos
dos baleeiros sequer atinge os operários do navio-usina (eles acenam para o Green
a baleia branca impune, apenas com mais alguns arpões indiferentes encravados,
o perigo atual é da extinção primeiro das baleias. Já os defensores das baleias são
I
devir humano.
no cinema e séries de TV, ela ensaiou várias soluções possíveis para a questão
Num espírito muito próximo ao dos cenários da ficção científica, mas com
denso como Júpiter. Baseados em uma analogia com a vida marinha terrestre
(p.747), imaginaram três espécies básicas: ~<Ecological niches for sinkers, floaters,
and hunters appear to exist in the Jovian atmosphere» (p.737)14. A sua intenção
era demonstrar que não se podia descartar de saída a presença de formas de vida
14. SAGAN (1983b:42-3) fornece ilustrações dessas espécies fantásticas nas paisagens jupterianas.
7. Baleia - 121
«When looking at present-day science fiction books, one is struck by the sarne
phenomenon: the abominable animaIs that hunt the poor astronaut lost on a
distant planet are products of recombinations between the organisms living on the
earth. The creatures coming from outer space to explore the earth are depicted
in the likeness of mano You can watch them emerging from their unidentified
flying objects (UFO's); they are vertebrates, mammals without any doubt, walking
erect. The only variations concern body size and the number of eyes. Generally
these creatures have larger skulls than humans, to suggest bigger brains, and
sometimes one or two radioantennae on the head, to suggest very sophisticated
sense organs. The surprising point here again is what is considered possible. It
is the idea, more than a hundred years after Darwin, that, if life occurs anywhere,
it is bound to produce animaIs not too different from the terrestrial ones; and
above all to evolve something like man». (JAcOB:1977:1161)
15. «A explicação comum desta unidade molecular é que somos todos - árvores e pessoas, o
peixe diabo-marinho, o limo vegetal e os paramécios - descendentes de um único e comum
instante da origem da vida no início da história em nosso planeta» (SAGAN:1983b:38).
7. Baleia - 122
cérebro 16• Por não ter sido herdada, por ser como que uma "mutação" sui-generis,
todos os organismos da Terra, desde os bolores aos homens, são parentes muito
próximos.» (SAGAN & SHKLDvsKI:1966:420)
certeza que se pode ter a respeito da biologia et é que ela é diferente - uma
certeza negativa, de que não pode ser como nada de já conhecido l '.
«Não posso lhes dizer como se parece um ser extraterreno. Sou terrivelmente
limitado pelo fato de conhecer somente um tipo de vida, a da Terra. Algumas
pessoas, artistas, escritores de ficção científica, por exemplo, têm especulado como
serão estes seres. Sou cético quanto à maioria destas visões extraterrestres.
Parecem-me apoiar-se bastante em formas de vida já conhecidas. [...] Não acredito
que a vida em qualquer outro local se pareça com um réptil, inseto ou ser
humano, e muito menos com adaptações cosméticas como pele verde, olhos
pontudos e antenas.» (SAGAN:1983b:40)
lugar, seja qual for a morfologia corpórea eti, ela deverá possuir um dispositivo
«Eu certamente não espero que seus cérebros sejam anatomicamente ou talvez
mesmo quimicamente semelhantes aos nossos. Seus cérebros terão tido diferentes
histórias evolutivas em ambientes diferentes. Só temos de olhar para os animais
terrestres com sistemas orgânicos substancialmente diferentes para ver quanta
variação na fisiologia cerebral é possível.» (SAGAN:1983a:176).
17. Alguns autores não concordam com estas conclusões, e crêem que uma espécie inteligente
extraterre~treseria necessariamente, ao menos em sua anatomia geral, parecida com um
humano. E a posição defendida por BIERI (1964), em artigo dirigido contra os argumentos de
SIMPSON (1964). O astrónomo brasileiro MOURÃO (1980:100ss), ele próprio um adepto da
necessidade do antropomorfismo eti, cita o professor de antropologia de Harvard, Willian
Howells, que se dedicou à questão e concluiu que «a forma humana é inevitável» (sic).
7. Baleia -124
cerebral, a
tecnologia também
possui o seu
correspondente
anatômico: o
«apêndice
manipulativo»,
órgão capaz de
apropriar-se de
objetos do meio
ambiente como
Possíveis morfologias etis, segundo MACGOWAN & ORDWAV:1972:329.
mediador da ação,
associada aos dois membros livres para manipulação. O elefante é o centauro com
e ação eficaz. O fato da linguagem eleita pelos Gardner ter sido a de sinais com
18. O apelo à figura dos cefalopodos na discussão sobre inteligência extraterrestre é recorrente:
a estrutura do órgão da visão dos polvos constitui o exemplo mais contundente de convergência
evolutiva, pela sua espantosa semelhança com a dos olhos dos mamíferos. Como já anotamos
acima, Bateson estudou o comportamento de polvos antes de interessar-se por golfinhos. Vale
lembrar que Júlio Verne fez de um polvo gigante o seu leviatã em As vinte mil léguas
submarinas de 1870. MELVILLE (1982) também faz um calamar gigante vir à tona diante dos
botes baleeiros como sinal de mal presságio (§59, p. 305).
7. Baleia - 126
darwinismo 19• O trabalho dos Gardner, citado acima, apenas reflete o grande
órgãos para manipular, não fazem construções de engenharia, mas são criaturas
«The brain size of whales is much larger than that of humans. Their cerebral
cortexes are as convoluted. They are at least as social as humans. Anthropologists
believe that the development of human intelligence has been critically dependent
upon these three factors: brain volume, brain convolutions, and social interactions
among individuaIs. Here we find a class of animaIs where the three conditions
leading to human intelligence may be exceeded, and in some cases greatly
exceeded» (SAGAN:1973:177)
19. Sobre a história da mitologia do «homem selvagem», e sua relação com a descoberta do
orangotando e outros macacos, ver TINLAND (1968).
7. Baleia -127
Todas estas peculiaridades levam Sagan a crer que os cantos das baleias
baleias são uma espécie no mesmo nível evolutivo da humana, tão inteligentes ou
parecerem com homenzinhos verdes, mas dependem dos verdes entre os homens
para sobreviver.
a espécie humana à cadeia dos seres vivos. Já a baleia se liga ao homem não
tanto pela raiz biológica, mas pela capacidade cultural, e não evoca hierarquia
levam à inteligência.
star trek «Space, the final frontier. These are the voyages of the Starship
new life and new civilizations, to boldly go where no man has gane before». Com
clássico da ficção científica. Uma filmagem de 1986 feita para o cinema (Star Trek
IV) revive muito do imaginário evocado pela equipe do disco da Voyager em torno
7. Baleia -129
ao canto das baleias. Seria útil para a análise da saudação das baleias na Voyager
consulta arquivos e reconhece o padrão sonoro como o mesmo emitido por uma
espécie de baleias extinta no século XXI. «The probes transmissions are the songs
do filme foram fornecidos pelo mesmo Roger Payne procurado pela equipe da
Voyager. Spock sugere que uma civilização et estabeleceu contato com baleias
retornara agora após sua extinção «to determine why they lost contact». Incapazes
humana. Num tour de force que só a ficção permite (ainda), empreendem uma
espaçonave Enterprise nos céus de São Francisco do século XX são tomadas por
uma eti extremamente avançada, que passou a utilizá-la para comunicar-se com
artificialmente os cantos da baleia. Spock é definitivo: «The sounds... but not the
Não há como conversar numa língua da qual só se conhece a fonética, mas não
recurso de comunicação, já familiar aos seus fãs. Aplicando sua mão ao crânio de
20. Cf Webster de HOUAISS. Talvez pudéssemos traduzÍ-Io por barbarismo, seguindo ironicamente
a etimologia lembrada por LÉVI-STRAUSS (1976e:333): «[...] é provável que a palavra bárbaro
se refira etimologicamente à confusão e à inarticulação do canto dos pássaros, opostas ao valor
significante da linguagem humana». Mais adiante, na discussão a respeito da música, veremos
que o próprio Lévi-Strauss não considera o canto dos pássaros assim tão inarticulado.
7. Baleia - 131
chamam os vulcanianos. Na São Francisco dos anos 80, mergulha num aquário
que a sonda alienígena se afaste da Terra. Se não podemos imitar o canto das
baleias para sossegar um estranho que só fala sua língua, é preciso seduzir uma
sua língua, e não se conforma com a falta de resposta. As baleias, extintas pelos
sonda alienígena nem as baleias, mas que entende-se muito bem com o
vulcaniano. Por fim, o doutor Spock, curinga da partida, que tampouco é capaz
de comunicar-se com a sonda ou entender o canto das baleias, mas que fala a
7. Baleia -132
ocupava, por usurpação, o lugar lógico das baleias. Os humanos nunca haviam
aliados das baleias vieram tomar satisfações. Incapazes de uma performance similar
responder aos seus enigmáticos sinais. Por outro lado, a sonda ignorava os apelos
sonda não reconhecia os sinais enviados pela civilização terrestre como mensagens
"pontudas". (Ao retornar ao século XX, para poder passar por humano comum e
caminhar nas ruas, prende uma tiara à cabeça, ocultando suas extremidades
sua cega (e surda) matança "etnocida". Baleias e sonda voltam a conversar. Mas
--------------1 comunicação
linguagem linguagem
de baleia humana
morfologias antropomorfismo
estranhas
barreira de
incomunicabilidade
linguagem simbólica. Veremos mais adiante que é algo desta ordem de questões
21. Esta condição limite para a comunicação entre civilizações planetárias é tema recorrente na
ficção científica. Uma recente incursão neste domínio é o conto de TAVARES (1989,
«Stuntmind») concebe voluntários que se expõe ao extraterrestre e retornam despersonalizados,
porém cheios de informações científicas que não compreendem.
CAPíTULO 8
os sons da Terra
como alegoria do silencioso movimento dos corpos celestes (som 1), e uma frase
falada em meio aos estalos de uma fogueira (som 10), mas comparecem cercados
150). Complemento metonímico das imagens, quase emanando das figuras tornadas
barulhentas, os sons da Voyager são onomatopéias terrestres.
A escassez de tempo para realizar o disco (dois meses) não permitiu maior
Embora independente, o bloco dos sons possui uma estrutura em muito similar
microfones do gravador.
[...]» (LOMBERG:1984:72).
Sons da Terra
interligadas e acionadas por uma mesma força mecânica, num universo regido
pela regularidade de leis matemáticas. «Kepler era apaixonado por uma "música
das esferas" literal e creio que teria adorado ver aqui a sua obsedante
composta pelos homens, que, por uma homologia fundamental com a natureza,
uma seqüência de outras reações químicas que, por fim, conduziram à origem da
chuvas e ondas (sons 4) lembram «os oceanos, como cenário da nossa origem».
1. Uma breve apresentação didática das idéias de Kepler encontra-se em SAGAN (1983, cap. 3, esp.
pp. 62ss).
8. Sons -140
uivo canino indicam os últimos momentos de uma natureza que ainda desconhece
a espécie humana.
Assim como na série das fotografias, a transição do primeiro grupo de sons para
o segundo é enfatizada pelo contraste exemplar entre o último dos sons "naturais"
bosquímano.
não articulada daquele que aqui representa o último dos pré-hominídeos. «A voz
sua presunção e intimidá-lo, «um uivo solitário que reverbera com os perigos e
incertezas dos primórdios de nossa existência» (som 8). O ganido da fera o faz
é apresentado na foto 62, justo no flagrante da caça com o dardo. Mas a fala
aqui gravada não é sua, não pertence à cena fotografada, não traduz suas
língua é sua, a fala é uma saudação (ainda mais uma) pronunciada de encomenda
confundem. «Os humanos começaram a usar o fogo para alterar seu ambiente e,
2. A cena não deixa nada a dever à seqüência da descoberta da ferramenta por hominídeos em
2001: Uma Odisséia no Espaço, de Kubrick e Clarke (1968), em que aprendem a combater
o leopardo e outros adversários com a clave e o fogo. Apenas que em 2001, o encontro com
a tecnologia não é um produto da evolução natural da espécie humana, mas o resultado de
uma engenharia obscura operada por uma inteligência extraterrestre, presente sob a forma do
enigmático monólito negro.
3. Cachorros domésticos também são ilustrados nas fotos 44 e 69 - «esperamos que os receptores
entendam que os cães são nossos amigos» (LoMBERG:1984:106).
8. Sons - 142
(som 13); os sons titânicos do "trabalho da natureza" (sons 2,3,4) contrastam com
eco na série correspondente de fotografias (fotos 101 a 108). Como nas fotos, há
estágio de um foguete saturno 5 (o mesmo das ApoIos que alcançaram a Lua nos
aplausos da assistência.
pela mãe (sI7), lembram a "ilha antropológica" na primeira metade das fotografias
Os dois últimos sons da mensagem, sinais vitais e pulsares, não são a rigor
gravados "como se" representassem vibrações acústicas. Tal como a «música das
4. Segundo GUNN (1988:510), a contagem regressiva, fórmula que sintetiza precisão técnica e
expectativa, foi uma invenção de Fritz Lang, para introduzir suspense em seu filme Woman
in the Moon (1929).
8. Sons -144
alguns dos sinais vitais de Ann Druyan. Durante uma hora computou-se o seu
qual um som. «Embora houvesse uma chance mínima de que minha mente viesse
a ser lida por esse método [...]» (DRUYAN:1984:160). A intenção era a de que estes
5. Às vezes, mesmo depois de anos domesticando intelectualmente esses mitos com que trabalho,
o espanto inicial ainda assalta-me. Essas conjecturas parecem-se demais com a imaginação
descompromissada da ficção científica.
8. Sons -145
1983b:287).
6. É a partir de uma suposição muito semelhante que se constrói o roteiro do cult de ficção
científica Brainstorm, de DOUGLAS TRUMBULL (1983). Nele, cientistas desenvolvem uma
aparelhagem capaz de gravar em fita magnética a atividade cerebral de um indivíduo
monitorado por um capacete de eletrodos à la EEG. O extraordinário é que além de gravar,
ela permite reproduzir: apertando-se o play ao invés do rec, a leitura da fita, estando um
indivíduo conectado aos terminais do engenho, induz no sujeito as mesmas sensações e
pensamentos experimentados pela cobaia inicial, sem qualquer perda da intensidade original.
Militares com intenções panópticas financiavam o projeto, na expectativa de desenvolver uma
espécie de scanner telepata, capaz de substituir com infinita eficácia os arcaicos detetor-de-
mentiras e soro-da-verdade usados em interrogatórios. O clímax da projeção ocorre quando a
diretora do projeto pressente a fatalidade de um infarto e pass.a seus últimos minutos
conectada à máquina. O protagonista faz de tudo para obter a fita e (re-)experimentar sua
morte. De uma cabine de telefone público, usando um modem, ele obtém acesso ao
computador central do laboratório, e o faz repassar a fita, transmitir-lhe o registro fatal.
Sobrevive ao indizível - àquilo que só pode ser vivenciado em sua forma bruta e irredutível.
8. Sons -146
também se espera que a sinfonia dos sinais vitais induza no ouvinte os afetos
irreprimíveis de minha própria vida, consegui ater-me bastante bem nesta linha de
tons puros e harmônicos, a vibração do pulsar foi gravada em "estado bruto". Tal
o perfil das ondas de rádio captadas, tal o sinal sonoro sulcado no disco. O efeito,
8. Sons - 147
outra estrela. Faz parte do folclore de «alarmes falsos» das pesquisas SETI, como
peculiaridade do seu sinal coincidir à primeira vista com o que teóricos da SETI
haviam previsto seria uma emissão eti. DRUYAN faz menção explícita ao episódio:
vitais soa um pouco como a estática de rádio gravada, vinda das profundezas
a música da Voyager
Antes de tudo porque ela reúne dois aspectos extremos e dificilmente conciliáveis
filosofias» (idem, gm). Isto faz dela o suporte intelectivo de qualquer mensagem
matemática, talvez a primeira consiga herdar algo do estatuto da última. «Em vista
é possível que muito mais que nossas emoções sejam transmitidas pelas músicas
artigo [...] propondo que a física sonora permitiria apenas um número muito
alguns dos princípios estéticos das formas, de arte humana, especialmente a música,
1. Uma epígrafe colhida por Sagan, para o capítulo sobre comunicação com civilizações
extraterrestres do seu livro Cosmos (SAGAN:1983b:292), é de Joseph Fourier:
«Não pode haver uma linguagem mais universal e mais simples, mais livre de erros e
obscuridades ... mais digna de expressar as relações invariáveis das coisas naturais [do
que a matemática]. Interpreta [todos os fenômenos] pela mesma linguagem, como para
atestar a unidade e simplicidade do plano do universo, e tornar ainda mais evidente esta
ordem mutável que preside sobre todas as coisas naturais».
2. É pela matemática e a música que Sagan lembra a ficção do encontro de humanos com
extraterrestres vindos em discos voadores no filme Contatos imediatos de terceiro grau (1977)
de Spielberg. Após criticar a adoção no roteiro das histórias ufológicas de cantato, ressalva:
«o filme teve pelo menos uma virtude: as mensagens iniciais eram singelas, porém matemáticas
[...] e musicais» (SAGAN:1984:14).
9. Música - 151
las».
«Nesta foto [115], cada pessoa toca um instrumento, e estes são idênticos na
forma, embora de tamanhos diferentes. São instrumentos de corda e as pessoas
estão pressionando-as ou friccionando-as. A vibração de uma corda é uma das
características (a produção de tonalidade e harmonia) que devem ser iguais em
todo lugar, e os extraterrestres devem conhecer ou ser capazes de imaginar que
uma corda vibrando produz um certo tipo de som. [...] Esperamos que os
receptores compreendam, através da análise do som, que este foi produzido pela
vibração das cordas. Depois será fácil associar os instrumentos e as pessoas
tocando com os sons vibrantes das cordas na música [...] saberão que a música
é composta e escrita, e que estamos mostrando isto.» (LoMBERG:1984:121Y
seja obrigada por natureza a seguir uma mesma pauta, mas a suposição da
«Mythologiques» galáctico.
É a ela que se referem as fotos 115-6, são dela os compassos então executados,
por fim, é ela que encerra o disco, a última música do último sulco. E ela é
triste. «[...] Beethoven desperta profundas emoções [...] porém a questão é: que
emoções? Sem dúvida, a Cavatina é triste. [...] Porém tristeza apenas não basta
para definir a Cavatina. Por ela também correm regatos de esperança e algo da
lamento e uma queixa pela solidão cósmica. «Em determinado ponto reunimos as
cinco ou seis músicas que nos pareciam as mais obsedantes e expressivas de uma
espécie de solidão cósmica [...] para nós elas exprimem uma aspiração de contato
«Há uma hora e meia de música delicada de diversas culturas, algumas delas
rural da galáxia.
(SAGAN:1984:13).
nova camada (sistema límbico, mamífero), a qual finalmente foi revestida pelo
espécie.
inteligência: «[...] a marca registrada de uma civilização bem sucedida pode ser a
(SAGAN:1983a:176).
4. Em outro contexto, JACOB (1977:1166) cita o modelo de evolução cerebral de McLean como
uma ilustração exemplar do modo bricoleur de operar da evolução, e também conclui que
muitos dos problemas das civilizações humanas derivam da precária articulação entre os níveis
do córtex cerebral: «This evolutionary procedure - the formation of a dominating neocortex
coupled with the persistence of a nervous and hormonal system partially, but not totally under
the rule of the neocortex - strongly resembles the tinkerer's procedure. It is somewhat like
adding a jet engine to an old horse carl. It is not surprising, in either case, that accidents,
difficulties, and conflicts can occur».
9. Música -156
os musicais.
seja, que se pode talvez considerar outros animais como seres dotados de cultura.
coup», p.30) pode-se encontrar as leis naturais (proporções matemáticas, física das
Mas o que dizer do canto de certos pássaros? Não trabalham eles tons
5. «Kantisme sans sujet transcendantal» foi como Paul Ricoeur denominou criticamente a démarche
de Lévi-Strauss, o que não deixou de agradar o último (LÉVI-STRAuss:1964:19).
9. Música - 157
Ela é um signo tão inequívoco da cultura que quase nos permite afirmar que
apenas os homens).
«L'homme n'est sans doute pas le seul producteur de sons musicaux s'il partage
ce privilege avec les oiseaux, mais cette constatation n'affecte pas notre these,
puisqu'à la différence de la couleur, qui est un mode de la matiere, la tonalité
musicale - que ce soit chez les oiseaux ou chez les hommes - est, elle, un mode
de la société. Le prétendu «chant» des oiseaux se situe à la limite du langage;
iI sert à l'expression et à la communication. II demeure donc vrai que les sons
musicaux sont du côté de la culture. C'est la ligne de démarcation entre la culture
et la nature qui ne suit plus, aussi exactement qu'on le croyait naguere, le tracé
d'aucune de celles qui servent à distinguer l'humanité de l'animalité.» (LÉVI-
STRAuss:1964:27, gm)
seres que fabricam utensílios; não teríanlos só por esse fato a segurança de que
pertencem à ordent da huntanidade. Na verdade, encontramo-los em nosso globo,
dado que alguns animais são capazes de, até certo ponto, fabricar utensílios ou
esboços destes. Apesar disso, não cremos que tenham concluído a passagem da
natureza à cultura. Mas imagine que encontrássemos seres vivos que tivessem uma
língua tão diferente da nossa quanto se queira, mas que seria passível de tradução
em nossa linguagem, portanto, seres com os quais poderíamos nos comunicar [...]
Qualquer linguagem que você pudesse conceber, pois o que é próprio da
linguagem, é que possa ser traduzida, senão não seria uma linguagem, pois não
seria um sistema de signos, necessariamente equivalente a um outro sistema de
signos através de uma transformação. As formigas podem construir palácios
subterrâneos extraordinariamente complicados, dedicar-se a culturas tão
especializadas quanto a dos cogumelos, que somente em um estádio de seu
desenvolvimento - que a natureza não realiza espontaneamente - são apropriados
para lhe servir de alimento, mas nem por isso pertencem menos à animalidade.
Mas se fôssemos capazes de trocar mensagens e discutir sobre elas, a situação
seria de outra ordem, estaríamos na ordem da cultura e não mais na da
natureza.» (LÉVI-STRAuss:1989:137-8, gm)
pode ser compreendida pelo receptor. No entanto, ela é uma linguagem sui-
generis, de outro nível que o da linguagem articulada verbal, pois que apesar de
ser inteligfvel (friso o termo que alude à inteligência), ela paradoxalmente não
«Mais que la musique soit un langage, [...] et qu'entre tous les langages, celui-
là seul réunisse les caracteres contradictoires d'être tout à la fois intelligible et
intraduisible, fait du créateur de musique un être pareil aux dieux, et de la
musique elle-même le suprême mystere des sciences de l'homme, celui contre
lequel elles butent, et qui garde la clé de leur progres.» (LÉVI-STRAuss:1964:26,
gm)
"eu" numa frase musical não designa o músico executor ou compositor: a música
7. Aproximando-a da poesia: «Poder-se-ia definir o mito como esta modalidade do discurso onde
o valor da fórmula traduttore, traditore tende praticamente a zero. Desta perspectiva, o lugar
do mito, na escala dos modos de expressão lingüística, é oposto ao da poesia, não importando
o que se tenha dito para aproximá-los.» (LÉVI-STRAuss:1975:242).
9. Música - 160
Tal como os mitos, mas de uma forma inusitada, a música aciona estruturas
8. As músicas (como os mitos) constituem-se como «des machines à supprimer le temps» (p.24).
9. Também para Lévi-Strauss, emoção e música caminham juntas: «[...] nous avons vu qu'en droit,
sinon toujours en fait, fonction émotive et langage musical sont coextensifs.» (p.38).
9. Música - 161
«Du fait que les structures et les formes [musicales] imaginées par les théoriciens
se sont le plus souvent révélées artificielles et parfois erronées, iI ne s'ensuit pas
qu'aucune structure générale n'existe, qu'une meilleure analyse de la musique,
prenant en considération toutes ses manifestations dans le temps et l'espace,
parviendrait un jour à dégager.» (LÉVI-STRAuss:1964:32)
a música sugere o lugar peculiar que ela ocupa na rede de sistemas simbólicos da
antropologia.
10. Vale consultar o comentário de Otávio PAZ (1984:96-9) sobre o modelo da analogia universal
de Baudelaire, em que cita este mesmo trecho sobre a música de Wagner, a título de exemplo
da concepção baudelairiana de «universo como uma linguagem».
9. Música - 162
ordená-las por ordem de "classificação" - "the winner is... "ll. A seleção apenas
hierarquia, deve-se estar alerta contra qualquer preconceito etnocêntrico para não
qualidade compatível com o valor desse legado e com variedade suficiente para
dar uma idéia da diversidade dos povos da Terra» (idem, p162). Novamente, é a
mesmo tempo que se reúne todas as manifestações diversas sob o rótulo de uma
11. Apesar de Ann Druyan, em uma matéria jornalística para o New York Times, referir-se à
seleção musical da Voyager como «Earth's Greatest Hits» (Cf SAGAN:1984:21).
9. Música - 163
Músicas da Voyager
9. Música - 164
algumas sequer tem título, nunca executor, mas sempre o nome do etnólogo que
as recolheu. O caso mais radical é a dos Índios Navajo (20), que sequer pela
nação são identificados: apenas povo cercado e registrado pelos etnólogos, não
formam país.
12. Pretendeu-se mandar o «Here comes the sun», dos Beatles, mas esbarraram em impedimentos
de direitos autorais. Perderam a vaga para Chuck Berry.
13. A Sagração da Primavera, incluída por representar uma incursão moderna ao que se imagina
como a música primitiva (FERRIS:1984:188-9), foi utilizada por Walt Disney, em seu
longametragem Fantasia (1940), para encenar uma história do cosmos bem nos moldes da
cosmogonia exercitada pela Voyager: música das esferas, cataclismas de formação do planeta,
surgimento da vida, evolução biológica, etc.
9. Música - 165
se impôs sem tensões. Para alguns, bastava mandar Bach, Bach o disco inteiro (ef
melhor era mandar várias composições curtas e de mesmo estilo, fugas bachianas
Bach continua ainda hoje, não apenas na arte, mas em outros campos, incluindo
a tecnologia que possibilitou a Voyager. [...] ele é quase um compositor universal,
14. Observo a coerência dessas seleções com a tipologia sugerida por LÉVI-STRAUSS (ainda em
1964, pp.37-8) para os gêneros de mensagens musicais clássicas. Para cada uma das três
funções cognitivas da linguagem isoladas por Jackobson - metalinguística, referencial e poética
-, Lévi-Strauss encontra um gênero de estilo musical, de mensagem, de compositor. Bach (e
Stravinsky) «explicitent et commentent dans leurs messages les régles d'un discours musical»,
são «músicos do CÓdigo». Beethoven (e Ravel) são «músicos da mensagem» e da «narrativa».
Já Wagner e Debussy pressupõem a existência cultural da narrativa a partir da qual a sua
mensagem se desenvolve: são músicos «do mito». O privilégio pelos dois BB parece sublinhar
a necessidade de explicitar o código (Bach), e apresentar o emissor (Beethoven). Wagner talvez
fosse exageradamente difícil de ser compreendido por uma cultura estranha, por pressupor um
imaginário comum.
9. Música - 166
gravados.
curiosas pistas sobre o sentido da mensagem musical da Voyager. Lomax deu mais
que uma simples sugestão: ele propôs um critério de seleção para todas as
BERKOWITZ: 1972).
Por outro lado, Lomax sustenta que o melhor modo para produzir uma
o seu sistema de subsistência l '. Trabalhando com uma coleção inusitada de dados,
a tentativa de Lomax visa compilar base empírica para uma postura teórica nada
nova: uma teoria evolucionista da sociedade humana em geral, como também uma
15. Entre eles, Robert E. Brown, do Centro de Música Mundial de Berkeley, cuja lista de
sugestões (parcialmente adotadas) foi incluída como um apêndice (C) de SAGAN et ai: 1984.
16. Lomberg (1984) faz referência a LoMAX et al:1968 e LoMAX:1977. Consultei LoMAX &
BERKOWITz:1972 e LoMAX & ARENSBERG:1977.
17. «Qur aim is to locate all cultures in areally bounded subsistence systems, arranged along a
scale of increasing productivity»; «[...] subsistence is a far more dependable classifier of culture
regions and areas than is language.»; «[...] the evidence that subsistence leveI is the key to all
other aspects of cultural evolution, including communication.» (LoMAX & ARENSBERG:1977:660-2).
9. Música - 167
subsistência».
música que Lomax tentou convencer Sagan. Lomax «acredita que estágios
que passamos, atestar o estágio que atingimos. «Se são corretas as idéias de
como veículo os temas musicais» (idem). A mensagem musical deveria então ter
18. A esse respeito, LoMAX & ARENSBERG (1977:660) reivindicam a influência do trabalho de
SAHLINS, SERVICE, HARDING & KAPLAN (1973): «Their justification of descriptions of living
cultures as illustrative of stages in human productive development (Sahlins et aI. 1973:59)
supports our experiment. [...] Thus, they say (p.33), "a contemporaneous primitive culture with
a given technology is equivalent, for general purposes, to certain extinct ones known only by
the remains of a similar technology"».
9. Música -168
aceito. «O tempo e outras pressões, contudo, impediram que déssemos crédito total
que o outro, uma música é signo de mais civilização que outra, fere o princípio
igualitário -, a recusa do modelo de Lomax atesta que este bloco foi inteiramente
mensagem. Elas podem até ser justapostas, mas não combinadas numa única
apresentação.
que são a própria alma da mensagem. Lévi-Strauss quis mostrar que a mitologia
Nenhuma marca visível no disco, nenhuma sinal peculiar nas gravações indica ao
leitura do disco, as únicas indicações estão gravadas na sua capa: orientam para
muito menos dos ouvidos com que deveria ouvir. Como inferir que um trecho
possui linguagem falada, outro, inteiramente diferente, também; porém mais além,
sulco.
10. Evolução & diversidade -170
"saudações", que no entanto são ainda fotos e não falas; também o canto da
Por outro lado, o conjunto dos quatro permite novas figuras de sentido.
um bloco, mas da relação que se forma entre os quatro blocos, como um jogo
lado a lado como os grandes blocos que compõem. As 116 fotos, as tantas
critério que guia a seleção dos componentes e permite reuní-Ios como unidades
da diversidade.
a saga dos seres inteligentes terrestres, desde suas origens cosmogônicas até sua
Por outro lado, os blocos das saudações e das músicas obedecem a outros
passa nessas séries, das línguas, das músicas, é que o valor predominante é
entre os elementos. Como não poderia deixar de ser, um tal valor também
prescritiva.
poderiam ser aqui aplicados. O sistema simbólico opera segundo dois eixos
sintagma. Formam uma malha virtual e sincrânica, dada toda de uma vez,
sintagma lingüístico ela obriga à seriação. Por isso, o único recurso que resta para
evolução diversidade
hierarquia igualdade
sucessivo simultâneo
ordenação fixa aleatório
diacronia sincronia
sintagma paradigma
10. Evolução & diversidade -174
evolutivo e o igualitário. Qual a relação entre os dois pólos, o que justifica esta
que permite articular os dois pólos na tensão significativa que inicialmente nos
terrestres e sua origem. Funcionam como representações de outras coisas que não
dos fenômenos naturais. É certo que o homem e os fatos da civilização nela estão
presentes, mas são como que englobados pela natureza - apresentados como fatos
humana.
por leis naturais universais. É assim que, para identificar o tipo de estrela que é
o sol, os autores incluíram uma foto do espectro solar, da luz solar visível
decomposta nas diversas freqüências de onda que a formam (foto 8). «A solução
comum aos astrônomos de toda a galáxia. [...] Achamos que as linhas de absorção
na foto do espectro solar [...] gritariam 'estrela G2! estrela G2!' alto e claramente»
Essa classificação é tanto natural quanto universal: a luz das estrelas desmanchada
por um prisma obedece aos mesmos padrões, vista de qualquer lugar da galáxia.
A informação sobre a classe de estrela do nosso sol está cifrada numa «linguagem
obriga qualquer ciência e tecnologia convergirem para uma solução ótima comum,
Cada uma tem o seu passo próprio. Obedecem no entanto a uma mesma
universal.
diversas línguas que servem apenas aos humanos; 3) afetos codificados numa
duas partes que possuem eficácia comunicativa com uma eti, uma parte
estético reside a babel verbal em toda a sua idiossincrasia étnica. Em cada língua,
10. Evolução & diversidade - 178
com uma frase e uma voz distintos, entoa-se o mesmo refrão: "olá! há alguém aí?
uma eti. No entanto, o que este trecho da mensagem parece esconder, é apenas
como que são regidas por um universo de regras comum, derivado da finitude dos
é assim antes de tudo uma extensão do bloco de saudações. Apenas que se este
desolado. A epígrafe do capítulo que trata das saudações cita versos de Don
Blanding que expressam tal ambivalência afetiva: «É mais alegre do que uma
o convite à conversação nos blocos das saudações e das músicas. Mas as duas
talvez seja tão eloqüente quanto o conteúdo. Procurando oferecer uma amostragem
«If there exists a gaIactic community of civilizations that truIy embraces much of
the Milky Way [...] I think it a great conceit, the idea of the present Earth
establishing radio contact and becoming a member of a gaIactic federation -
something like a bIuejay or an armandillo appIying to the United Nations for
member-nation status» (SAGAN:1973:241-2)
conselhos da ONU, um tanto ingenuamente idealizada como órgão que reúne «as
evolução diversidade
natureza cultura
retrato convite
informações intenções
ciência diplomacia
10. Evolução & diversidade -181
ângulos.
aparece nas saudações, músicas e em alguns trechos de fotos, visa indicar o grau
nossa genealogia natural. Mas não chegam a compor o retrato completo. O último
natureza, não pode ser representado por um único ícone na cadeia linear da
composta por dois pólos mutuamente excludentes, ganha novo contorno. A relação
engloba.
portanto, como que num cubismo ainda tímido, de dois ângulos distintos, não
emblema de toda iniciativa de contactar etis? Por que a ausência de contato com
determinante da mensagem, que não havia até aqui comentado. Ele é mencionado
imperativo negativo, uma prescrição do que nela não poderia entrar. Um interdito
espírito da mensagem?
adolescência
(SAGAN:1984:38-40). Não foi apenas aos autores que ocorreu indagarem-se sobre
humanidade e nos censuraram por não termos incluído cenas de fome, devastação,
realista ou idealizado da civilização. «Isto nos levou a uma discussão sobre quão
nossa violência [...] Mostrando-nos como somos realmente, uma espécie mergulhada
em lutas, não haveria, pelo menos, uma garantia sobre o valor da gravação como
toda esta face do retrato. O retrato que constitui a mensagem da Voyager, apesar
se ao fim um retrato idealizado. «Decidimos que o pior que havia em nós não
deveria ser enviado para a galáxia» (idem). Não o retrato conciso mas total que
se poderia fazer, e sim um elegante mas elíptico, que expõe os melhores ângulos,
que captura os traços de maior valor, que oferece a face mais própria à
algo que sobreviveria a nós e ao nosso tempo, algo que seria o único stmbolo da
11. Adolescência - 187
Terra que o universo teria» (idem, gm). Mais, não menos, que um retrato, era um
oferecer o nosso melhor lado ao cosmos? Tentamos enviar nossa melhor música.
Por que não mostrar uma visão otimista, em vez de desesperadora, da humanidade
critério da escolha das músicas, além do representativo, foi estético; o das fotos,
crivo de uma censura. A descrição da violência, pela carga de repulsa moral que
indicar de forma inequívoca qual o sinal do valor que lhe atribuimos. Assim, a
ou hostil aos receptores ('Veja como nós somos valentes'), sendo este o motivo
civilização. A bomba nuclear é o ícone por excelência para a física do século XX.
os cenários de mundos ainda além do alcance dos olhos humanos, quanto mais
robô espião teleguiado e descartável. Depois dele, outros sem dúvida seguirão. Os
mesmos seres que o enviaram não cessam de elaborar planos mais arrojados de
(LOMBERG: 1984:87).
pôde pegar «carona» na sua carcaça, é porque ela deu uma paradinha para que
informação, ele doa; em vez de invadir e espionar para um senhor oculto, ele
relações entre culturas estranhas, tem de ser contornado. Que a sonda seja apenas
militar. A função ritual do disco é de buscar abolir essa ambigüidade inerente aos
oferecidos são bem mais informações raras que especiarias caras. E trata-se de
uma oferta de generosidade absoluta, visto que não espera efetivamente nenhuma
resposta, nenhuma recíproca: «[...] qualquer criatura que se depare [com o disco
da Voyager] pode perceber que ele foi remetido sem qualquer esperança de
espaço por uma nave alienígena, o disco é executado, e em seguida, uma cápsula
explode ao chão, mas o seu tripulante escapa condensado sob uma forma
mãe que o enviou, temperada pelo seu improvável romance com a surpreendida
o que a Voyager parecia prometer. É recebido pelo que não está descrito na
combinam numa estrutura geral humanóide apêndices derivados de outros seres e animais
terrestres, recorrendo a todo o estoque do bizarro e do repugnante, desde os répteis, passando
pelos insetos, até os microorganismos.
O starman não é necessariamente humanóide. Em nenhum momento aparece a figura da
sua anatomia "original", sequer se são uma espécie biológica composta por indivíduos, aos
moldes terrestres. O acidente destrói todos os traços particulares da eti. Vê-se reduzido apenas
ao traço mais essencial: a inteligência, e as artes de sua tecnologia (carrega esferas com as
quais opera alguns "milagres", como contactar sua nave-mãe ou ressuscitar animais). É o
conhecimento que possui da biologia terrestre (fornecido na mensagem da Voyager) que
possibilita a solução de emergência: clonar um corpo humano, a partir da informação
estratégica estocada num álbum de recordações familiares - um análogo doméstico da
mensagem da Voyager. Utiliza-se do corpo humanóide como quem veste uma roupa,
reproduzida a partir de um modelo pré-existente, dos materiais terrestres disponíveis. Assimila
a forma humanóide a partir do que possuem em comum, a inteligência, que perdura para lá
das suas necessárias diferenças: a história evolucionária particular, as idiossincrasias biológicas.
11. Adolescência - 192
preparada para entrar em contato com culturas eti, pois sequer ainda resolveu
pelo próprio povo que representam. Não falsificam as informações que enviam.
Trata-se de uma aposta, uma aposta otimista no futuro próximo. Para Sagan,
no other time as risky, but no other time as promising for the future of life on
vez mais amplas, até englobar a totalidade da espécie. Do indivíduo isolado pré-
«ln our earliest history, so far as we can teU, individuaIs held an aUegiance
toward their immediate tribal group [...] related by consanguinity. As time went
on, the need for cooperative behavior - in the hunting of large animaIs or large
herds, in agriculture, and in the development of cities - forced human beings into
larger and larger groups. The group that was identified with, the tribal unity,
enlarged at each stage of this evolution. Today [...] most human beings owe their
primary allegiance to the nation-state (although some of the most dangerous
politicaI problems still arise from tribal conflicts involving smaller population units).
«Many visionary leaders have imagined a time when the allegiance of an human
being is not to his particular nation-state, religion, race, or economic group, but
to mankind as a whole; when the benefit to a human being of another sex, race,
religion, or politicaI persuasion ten thousand miles away is as precious to us as
to our neighbor or our brother. The trend is in this direction, but it is
agonizingly slow. There is a serious question whether such a global self-
identification of nzankind can be achieved before we destroy ourselves with the
technological forces our intelligence has unleashed». (SAGAN:1973:6, gm)3
Para uma sociedade que acredita na escala evolutiva como único sentido
momento atual, esta tensão entre evoluir ou morrer coloca-se de forma mais
perpetua.
«Sem remontar até as concepções antigas [de evolucionismo social], retomadas por
Pascal, assimilando a humanidade a um ser vivo que passa por estágios sucessivos
da infância, adolescência e maturidade, é no século XVIII que se vêem florescer
os esquemas fundamentais que serão, logo em seguida, objeto de tantas
manipulações: as "espirais" de Vico, suas "três idades", anunciando os "três estados"
de Comte, a "escada" de Condorcet.» (LÉVI-STRAUSs:1976e:337)
«[...] It would be a great mistake to ignore where we have come from in our
attempt to determine where we are going.
«There is no doubt that our instinctual apparatus has changed little from the
hunter-gatherer days of several hundred thousand years ago. Qur society has
changed enormously from those times, and the greatest problems of survival in
the contemporary world can be understood in terms of this conflict - between
what we feel we must do because of our primeval instincts and what we know
we must do because of our extragenetic learning» (SAGAN:1973:7).
humana com outros animais através de uma curva da proporção entre memória
Inspirado numa sugestão de Kardashev quanto aos tipos de sinal de rádio que a
SETI poderia captar (KARDASHEv:1980), Sagan cria uma classificação geral das
civilizações, mensuradas pelo que crê ser as duas principais características de uma
determinismos biológicos.
11. Adolescência - 196
tecnológico e dos impasses políticos e morais da civilização. Não é por outra que
foi por ele eleita para ícone do último fator da fórmula de Green Bank. Apesar
4. Para um breve relato das injunções que levaram ao projeto Manhattan e à bomba americana,
sob o ponto de vista da relação dos cientistas com a política e as agências governamentais,
ver BELL (1977:424ss).
11. Adolescência - 197
«Se sobrevivermos, nossa época ficará famosa por duas razões: o momento
perigoso de adolescência tecnológica que dirigimos para evitar a autodestruição e
por ser a época em que iniciamos nossa viagem às estrelas.
«A escolha é rígida e irónica. As mesmas torres de lançamento de foguetes
utilizados para lançar as sondas aos planetas são suspensas para enviar ogivas
nucleares às nações. As fontes de poder radioativo na Viking e na Voyager
derivam da mesma tecnologia que compõe as armas nucleares. As técnicas de
rádio e de radar empregadas para orientar e guiar os mísseis balísticos e defender
contra os ataques são também utilizadas para monitorizar e comandar a
espaçonave nos planetas e para captar os sinais das civilizações próximas a outras
estrelas. Se utilizarmos essas tecnologias para nos destruirmos, certamente não nos
aventuraremos aos planetas e estrelas. O inverso também é verdadeiro. Se
continuarmos rumo aos planetas e estrelas, nossos chauvinismos serão abalados
ainda mais. Ganharemos uma perspectiva cósmica. Reconheceremos que nossas
explorações poderão continuar somente a favor de todas as pessoas do planeta
Terra. Inverteremos nossas energias a um empreendimento devotado não à morte,
mas à vida: a vida em outros locais. A exploração espacial - não-tripulada e
tripulada - utiliza muitos dos mesmos conhecimentos tecnológicos e
organizacionais, exigindo a mesma dedicação à valorização e à coragem dos
empregados na guerra.» (SAGAN:1983b:339-342)
o símbolo por excelência da globalização: o único ato total que uma nação
civilização passa a poder suicídio! A morte, a sua própria, agora lhe pertences.
5. As histórias de ficção científica que lidam com o tema do apocalipse nuclear, gostam de fazer
qe um único indivíduo o responsável pelo desencadeamento da destruição de toda a civilização.
E o folclore do único botão, da caixa preta no interior da casa branca. Quem não se lembra
do Dr. Strangelove [«Dr. Fantástico», entre nós] de Kubrick (1964)?
11. Adolescência - 198
exata.
dupla negativa «We are not alone» (título de um dos livros de divulgação dos
projetos SETI de maior repercussão, escrito pelo editor de ciência do New York
isolado, impedido de comunicar-se com outros de sua espécie, permite falar que
sentido condensa essa robinsonada cósmica6? Como pode toda uma cultura temer
a sua solidão?
é porque sem dúvida somos um, e apenas um. Nós, a civilização terrestre, o
engloba toda a espécie biológica, e que a posição estrutural do "eles", dos "de
6. LINDA SAGAN (1984:133) ainda compara a Voyager ao expediente da garrafa atirada às correntes
do mar, para a eventualidade de alguém encontrá-la: «A Voyager foi comparada a uma garrafa
com uma mensagem dentro atirada ao acaso da amurada de um navio. A diferença é que a
garrafa custou caro e a nota foi escrita por um computador e não por um lápis. Estamos
lançando nossa garrafa no vazio do céu». A cinematografia de ficção científica já nos havia
oferecido uma versão mais literal do personagem de Defoe na era da exploração espacial, sob
a figura de um astronauta "naufragado" em Marte: Robinson Crusoe on Mars (1964).
7. Nos EUA, o principal defensor deste neo-malthusianismo pós-moderno é o biólogo da Une
de Stanford (Califórnia), Paul Ehrlich, que reduz todos problemas econâmicos e ecológicos da
atualidade a uma única causa primordial: a superpopulação. Seu livro de maior repercussão,
The population bomb (1968), faz da superpopulação um problema tão explosivo e de efeitos
catastróficos comparáveis aos de uma guerra termonuclear (EHRLICH:1971).
11. Adolescência - 200
encontrar.
esgotado todos os recursos simbólicos disponíveis. Tal como fez com os demais
da aldeia global. «This is the moment af the homogenization of the world, when
There are no exotic pIaces left on Earth to dream about» (SAGAN:1973:227, gm).
«It is remarkable that the nations and epochs marked by the greatest flowering
of exploration are also marked by the greatest cultural exuberance. ln part, this
must be because of the contact with new things, new ways of life, and new modes
of thought unknown to a closed culture, with its vast energies turned inward»
(SAGAN:1973:67) 9
8. O motivo central do premiado filtne de ficção científica e horror, Soylent Green (1973), é a
descoberta pelo protagonista de que as rações sintéticas de alimentos populares, numa Nova
York de 2022 superpoluída e povoada, são produzidas a partir do reprocessamento da carne
de cadáveres humanos. Já em O Adnlirável Mundo Novo de HUXLEY (1977 [1932]), e sem
nenhum horror ou segredo, os cadáveres eram reaproveitados para extrair fósforo e outros sais
minerais.
9. Esta formulação é notavelmente próxima à que LÉVI-STRAUSS (1976e) apresentou em «Raça e
História» (ver especialmente capítulo 9, sobre a «coalizão» das culturas).
11. Adolescência - 201
o tempo: uma civilização para a qual nada resta a civilizar é uma civilização sem
futuro 10•
10. BENVENISTE (1976, cap. 28: «Civilização: contribuição à história de uma palavra», original de
1954) traça o surgimento do termo civilização, seu duplo sentido de "ato" e de "estado", e seu
compromisso com a idéia de evolução e progresso contínuo: «[...] devemos considerar, para
explicar o aparecimento tardio de civilisation, a própria novidade da noção e as mudanças que
ela implicava na concepção tradicional do homem e da sociedade. Da barbárie original à
condição atual do homem na sociedade, descobria-se uma gradação universal, um lento processo
de educação e de refinanlento; para resumir, um progresso constante na ordem daquilo que
a civilité, termo estático, já não era suficiente para exprimir, e a que era realmente preciso
chamar civilisation, para lhe definir em conjunto o sentido e a continuidade. Não era somente
uma visão histórica da sociedade; era também uma interpretação otimista e decididamente não
teológica da sua evolução que se afirmava [...]» (p. 376).
11. Veja-se o diagnóstico de Otávio PAZ (1984:191) sobre o fim do modernismo: «Sua quebra
revela uma fratura no próprio centro da consciência contemporânea: a modernidade começa
a perder a fé em si mesma. [...] «A crença na his,tória como uma marcha contínua, ainda que
com tropeções e quedas, adotou muitas formas. As vezes, foi uma aplicação do 'darwinismo'
no plano da história e da sociedade; outras vezes, uma visão do processo histórico como
realização progressiva da liberdade, da justiça, da razão ou qualquer outro valor semelhante.
Em outros casos a história se identificou com o desenvolvimento da ciência e da técnica ou
com o domínio do homem sobre a natureza ou com a univ~rsalização da cultura. Todas estas
idéias têm algo em comum: o destino do homem é a colonização do futuro. Nos últimos anos
houve uma mudança: os homens começam a ver o futuro com terror, e o que parecia ontem
as maravilhas do progresso são hoje seus fracassos. O futuro já não é o depositário da
perfeição, mas sim do horror. Demógrafos, ecologistas, sociólogos, físicos e geneticistas
denunciam a marcha para o futuro como uma marcha à perdição. Uns prevêem o esgotamento
dos recursos naturais, outros a contaminação do globo terrestre, outros ainda uma devastação
atômica. As obras do progresso se chamam fome, envenenamento, volatização. Não importa
saber se estas profesias são ou não exageradas: ressalto que são expressões da dúvida geral
sobre o progresso. E significativo que um país como os Estados Unidos, onde a palavra
mudança desfrutou de uma veneração supersticiosa, hoje surja outra que é a sua refutação:
conservação. Os valores que mudança irradiava agora transferiram-se para conservação. O
presente faz a crítica do futuro e começa a desalojá-lo.» (PAz:1984:191)
11. Adolescência - 202
«This is also the moment in our history when, for the first time, the whole of
our planet has been explored, when tribalism is dissipating, when great
transnational groupings of states are being organizaed, when stunning technological
advances in communications and transportation are eroding the cultural differences
among the various segments of mankind. But cultural diversity is the forge for the
survival of our civilization, just as biological diversity is the forge for the survival
of life.» (SAGAN:1973:155-6) 12
cósmicos.
órbita terrestre, o «herói dos povos» russo Iuri Gagárin, em 1961, ao olhar pela
vôo orbital, John Gleen em 1962, também se encanta com o azulado do horizonte
12. LÉVI-STRAUSS (1983:35) formula-o de uma forma semelhante: «En ce sens, on peut dire que
la recombinaison génétique joue, dans l'histoire des populations, un rôle comparable à celui
que la recombinaison culturelle joue dans l'évolution des formes de vie, des techniques, des
connaissances et des croyances par le partage desquelles se distinguent les sociétés».
13. Posteriormente, descreverá suas impressões em livro: «En regardant l'horizon, je distinguais
nettement sa courbure, ce qui produit un effet bien curiex. La Terre était ceinte d'une auréole
bleuâtre, devenant progressivement plus foncée vers l'extérieur, jusqu'à prendre successivement
une teinte bleu turquoise, puis francehment bleue, violette et, finalement, noire comme de
rencre. Je scrutais avec une émotion fébrile ce monde nouveau, inaccoutumé pour moi,
cherchant à tout observer avec soin et à me le rappeler» (GAGARINE & LÉBÉDEV:1969:9).
11. Adolescência - 203
curvando-se: «The horizon is brilliant, brilliant blue. There, I have the mainland
terrestre inteiro, tal qual as fotos obtidas em Terra, por meio de telescópio, de
outros planetas do sistema solar. O globo completo, total, mônada viva levitando
8 em dezembro de 1968, enquanto pela primeira vez uma nave tripulada entrava
«The Earth is now passing my window. It's about as big as the end of my
thumb. Waters are all sort of a royal blue; clouds, of course, are bright white.
The reflection of the Earth is much greater than the moon. The land areas are
generally sort of dark brownish to light brown. What I keep imagining is, if I
were a traveller from another planet, what would I think about the Earth at this
altitude? Whether I think it would be inhabited». (DEWAARD:1987:59)
original surge após a cópia, o testemunho do objeto real só se torna possível após
14. Enquanto as potências vencedoras da guerra levavam as suas disputas para o campo
extraterrestre, no Brasil, o governo militar ditava atos pouco institucionais e entupia calabouços
de gente. Mas o apelo simbólico da escapada extraterrestre alcançava mesmo os que ainda
não sabiam se voltariam a ver sol. Caetano canta: «quando eu me encontrava preso / na cela
de uma cadeia / foi que eu vi pela primeira vez / as tais fotografias / em que apareces
inteira / porém lá não estavas nua / e sim coberta de nuvens» (Terra). E segue brincando
com a analogia da nave e a etimologia de planeta.
15. AsCOT (1988:229) observa que a primeira ocorrência da expressão «Vaisseau spatial TERRE» de
seu conhecimento foi em 1968, numa «Conférence intergouvernementale d'experts sur les bases
scientifiques de l'utilisation rationelle et de la conservation des ressources de la biosphere»,
organizada em Paris pela Unesco. O economista "verde" Kenneth Boulding, da Une Colorado,
um dos criadores do termo com o seu ensaio «A economia da futura nave espacial Terra»,
recorda-se de Adlay Stevenson utilizando-a, numa conferência de 1965 na ONU (Cf
CHISHOLM:1981:40). Ele acredita que uma das causas da atual crise ecológica provém da
conscientização dos limites terrestres, evidenciados nas iniciativas astronáuticas: «E temos ainda
a exploração espacial que nos permitiu ver realmente a Terra pela primeira vez, uma coisa
de uma beleza fantástica. Essa experiência também contribuiu para o sentimento de clausura.
Um dos paradoxos dessa estória do espaço é que ela resultou numa espécie de claustrofobia.
Chegamos à conclusão de que, mesmo se formos mui..to longe no espaço, não teremos muito
mais aonde ir. Afinal, só temos mesmo a Terra. E por isso que essa tarefa espacial é
totalmente diferente da de Colombo. Ele estava desc~brindo um novo mundo, ao passo que
os astronautas descobriram um deserto muito velho. E por isso que tenlOS essa sensação de
solidão. Temos de contar só conosco» (CHISHOLM:1981:44-5, gm).
16. O introdutor da popular «hipótese Gaia», LoVELOCK (1987, ed. orig. 1979), um biólogo que
chegou a participar dos preparativos da missão Viking da NASA em busca de vida em Marte,
relaciona o surgimento da sua concepção de um macro-organismo planetário (<<the Earth's living
matter, air, oceans, and land surface form a complex system which can be seen as a single
organism and which has the capacity to keep our planet a fit place for life», p. x) com a
visão da Terra plena nas janelas das naves espaciais: «Ancient belief and modern knowledge
have fused emotionally in the awe with which astronauts with their own eyes and we by
indirect vision have seen the Earth revealed in alI its shining beauty against the deep darkness
of space» (p. ix).
11. Adolescência - 205
Netuno, seu último alvo no fim de 1989, voltou suas câmeras para trás em
formam um único quadro que reúne toda «a família solar». «Para Sagan, o retrato
o duplo do tempo
sociedades locais até então com identidades e histórias próprias; ela esgota os
instável justa medida: «d'une part, une égalité relative, de l'autre, une distance
reconstitue-t-elle pas à ses dépens une situation comparable avec celle que certains
océaniennes?» (LÉVI-STRAuss:1983:44).
simples das populações nativas, o aniquilamento físico das culturas das fronteiras
ou menos bem sucedidas da "sociedade humana", cujo modelo mais bem acabado
era o ocidente.
desigualdades sociais que hoje se quer ver abolidas - e são efetivamente abolidas
vergonha do seu passado, do seu berço, selvagem. Tal com Freud falou de uma
origem pelo mais baixo. O ocidente capitalista triunfante não dorme tranqüilo com
ocidente efetivamente incorporou aos seus quadros as herdeiras das várias culturas
iniciativa da guerra final, não recai mais sobre as grandes potências. A guerra fria
mundo 2•
1. Para LÉVI-STRAUSS, a própria etnologia é fruto desse estigma moral do ocidente: «Poderia
também, do mesmo modo, pretender-se o contrário; se o Ocidente produziu etnógrafos, é
porque um remorso muito poderoso deveria atormentá-lo, obrigando-o a confrontar a sua
imagem com a de sociedades diferentes, na esperança de que elas refletirão as mesmas taras
ou ajudarão a explicar como é que as suas se desenvolveram no seu seio. Mas, mesmo que
seja verdade que a comparação da nossa sociedade com todas as outras, contemporâneas ou
desaparecidas, provoca o desmoronar das suas bases, outras sofrerão o mesmo destino. Esta
média geral que eu evocava há pouco, faz ressaltar alguns bárbaros: verifica-se que fazemos
parte do número destes; não por acaso, pois que, se não o tivéssemos sido e se não
tivéssemos, neste triste concurso, nlerecido o prinleiro lugar, a etnografia não teria aparecido
entre nós - não teríamos tido necessidade dela. O etnógrafo pode tanto menos desinteressar-
se pela sua civilização e deixar de ser solidário com seus erros, quanto a sua própria
existência é incompreensível - a não ser como uma tentativa de redenção: ele é o símbolo da
expiação. Mas outras sociedades participaram no mesmo pecado original [...]» (s/d:488, gm).
2. O último episódio, ainda não encerrado, deste drama pós-colonial foi a invasão e anexação do
Kwait pelo Iraque, seguido de embargo pelas Nações Unidas e iminência de guerra. Tal como
com Khomeini anos antes, repete-se a caracterização dos árabes como fanáticos seguidores de
um perverso e imprevisível tirano, explodindo um caldeirão de ressentimento anti-imperialista.
Mas o elemento complicador do conflito é a quantidade e o nível de sofisticação tecnológica
dos armamentos iraquianos, comprados do próprio ocidente em anos de exportação petrolífera
e política anti-Irã. Toda a questão roda em torno à possibilidade de já existir uma «arma
final» nas mãos das ditaduras terceiro mundistas: as especulações sobre a «bomba árabe», ou,
12. Duplo do tempo - 210
porque a eti não é exatamente o duplo do outro, dos povos destruídos. Ela é
antes o duplo do próprio ocidente. Mas a escala do tempo é deslocada: elas estão
(como Lomax pretendia quanto à música da Voyager) como a sua imagem mais
atrasada, agora esse efeito de retroação no tempo incide contra si. A eti se coloca
obrigada a reviver sua história, mas agora do outro lado da cena, encarnando o
declarou que a idéia original para a história de Guerra dos Mundos, a invasão e
posição de civilização mais primitiva sendo invadida por outra mais avançada do
Halo weel1 5, pela irradiação de Orson Welles de uma versão "jornalística" do conto
pânico público. O que mais espanta neste episódio não é o efeito inédito de
transmitida diretamente pela TV, o que mais chama a atenção neste episódio é
o fato de que uma tal invasão extraterrestre era já considerada dentro do campo
4. A respeito do filme de 1953, adaptação da história de Wells, GUNN (1988:495) observa: «Just
as Well's novel may be read as the nightmarish unleashing of guilt upon an imperialist society,
the film may be undertood on one leveI as articulating the more contemporary fear of being
invaded by cold-blooded Communists».
5. Welles confessou que a farsa «was intended to be the Mercury Theatre's own radio version of
dressing up in a sheet and jumping out of a bush and saying boo» (GuNN:1988:380).
12. Duplo do tempo - 212
«Se uma civilização avançada estiver para chegar em nosso sistema solar, não
haverá nada que possamos fazer a respeito. Sua ciência e tecnologia estarão muito
além de nós. É perda de tempo preocupar-nos com as possíveis intenções
malévolas de uma civilização avançada com a qual deveremos estabelecer contato.
É mais provável que, se sobreviveram ao tempo, isto signifique que tenham
aprendido a viver com eles mesmos e com os outros. Talvez nossos receios sobre
um contato extraterrestre sejam meramente unta projeção de nosso próprio passado,
unIa expressão da nossa consciência culpada pela nossa história anterior, a destruição
de civilizações só unI pouco nIais atrasadas do que a nossa. Lembramos de
Colombo e os Arawaks, Cortés e os Astecas, mesmo o destino dos Tlingits nas
gerações pós-La Pérouse. Lembramo-nos e preocupamo-nos.» (SAGAN:1983b:310-
1, gm)
Foi sob O espectro da segunda grande guerra mundial que a figura dos
décadas seguintes, com a guerra (de nervos) fria. À paranóia com a incessante
inaugurado pelo filme de Robert Wise, O dia em que a Terra parou (1951):
nos céus nativos de duas maneiras: em primeiro lugar, sempre houve UFOs no
guerra finaIs.
Apenas alguns exemplos cinematográficos recentes: Alien (1979), The Thing (1982
socorro, etc. Ainda alguns exemplos: This Island Earth (1955), The man who fell
on Eartll (1976).
Talvez apenas por este fundamento comum pode-se sustentar que a noção de ser
de uns por contraste com outros. Há no meio SETI uma espécie de rejeição a
responder à questão "por que eles não estão aqui?", ou, nos termos atribuídos a
Fermi, "where are they?", embora plausíveis, não chegam a justificar inteiramente
extraterrestre» para os UFOS 11• Acham a idéia não exatamente absurda mas
11. Uma ou outra exceção naturalmente existe: o astrofísico americano J. Hynek, o astrónomo
francês Jacques Vallée; não obstante, mais confirmam a regra do que a invalidam.
12. É significativo que a Voyager tenha despertado uma reação nociva no meio ufológico. Sagan
transcreve da carta que recebeu de um deles: «Colman S. von Keviczky, diretor de algo que
ele denomina de Rede Internacional de Pesquisa e Análise de OVNIs e Espaçonaves Galáticas,
está convencido de que já temos indícios evidentes de visita extraterrestre e preocupa-se, pois
nossos visitantes podem ficar confusos com o envio de saudações ao espaço interestelar. Em
uma carta ao Secretário Geral da ONU, cuja cópia von Keviczky teve a gentileza de me
remeter, ele diz: "O poderio do mundo classifi~ou a pesquisa estratégica dos OVNIs como
espionagem, arriscando a segurança nacional! A luz de atitude militar tão insofismável, a
tentativa da NASA de buscar comunicação com 'possível' inteligência extraterrestre não é
apenas uma descarada incoerência mas parece ser pura hipocrisia"» (SAGAN:1984:38). O envio
de mensagens é um ritual que, entre outros efeitos, desacredita a crença ufológica. Torna fato
consumado a opinião de que eles não se encontram ainda na Terra.
12. Duplo do tempo - 217
«o outro protesto, muito sério, foi feito por Sir Martin Ryle, laureado com o
Prêmio Nobel e Astrónomo Real da Inglaterra. Escreveu com grande ansiedade,
pois achava perigoso revelar a nossa existência e localização na galáxia. Pelo que
sabíamos, as criaturas fora daqui eram malévolas ou famintas, e, sabedoras da
nossa existência, viriam nos atacar ou comer. Recomendou veementemente que
mensagens desse tipo não deveriam ser novamente enviadas e até solicitou a
aprovação do Comitê Executivo da União Astronómica Internacional quanto a uma
resolução condenado esse tipo de mensagem. Outras personalidades menos
conhecidas pensavam da mesma forma.» (DRAKE:1984:65)
primeiro lugar, o fato de que as eti lIão estão aqui, de que não fomos invadidos,
«The most likely contact with extraterrestrial intelligence is with a society far more
advanced than we. But we will not at any time in the foreseeable future be in
the position of the American Indians or the Vietnamese - colonial barbarity
practiced on us by a technologically more advanced civilization - because of the
great spaces between the stars and what I believe is the neutrality or benignness
of any civilization that has survived long enough for us to make contact with it.
(SAGAN:1973:179-180)
irmãs das que produzem armas de destruição em massa, ao atingir esse limiar
12. Duplo do tempo - 218
«We need not speculate on the nature of future societies or extrapolate into the
indefinite future in arder to see why such societies might be self-limiting. We need
only look around USe [•••] If every civilization that invents weapons of mass
destruction must deal with comparable problems, then we have an additionaI
principie of universal applicability. Weapons of mass destruction force upon every
emerging society a behavioral discontinuity: if they were not aggressive they
probably would not have developed such weapons; if they do not quickIy learn
how to controI that aggression they rapidly self-destruct. Those civilizations devoted
to territoriality and aggression and violent settIement of disputes do not Iong
survive after the development of apocalyptic weapons. Long before they are abIe
to make any significant colonization of the Milky Way they are gone from the
galactic stage. Civilizations that do not self-destruct are pre-adapted to live with other
groups in nlutual respect. This adaptation must apply not only to the average state
or individual, but, with very high precision, to every state and every individual
within the civilization. [...] Perhaps - although we consider this unlikely - very
few societies succeed in such a programme. ln any case, the only societies long-
Iived enough to perform significant colonization of the Galaxy are precisely those
least likely to engage in aggressive galactic imperialism.» (SAGAN &
NEwMAN:1987:158-160, gm)
evoluem paralelamente nos vários níveis que caracterizam uma civilização: não
utópica.
ao vazio são perguntas a que ciência alguma pode dar resposta. São questões
ocidente viva da crença no progresso, convive com a ansiedade pelo futuro: nunca
Chamo mais uma vez Lévi-Strauss para situar o momento civilizatário que
1~~li.~:~.
anexo 2
mensagem do Presidente dos EUA na Voyager
Fonte: SAGAN et aI (1984:28)
Jimmy Carter
Presidente dos Estados Unidos da América
CASA BRANCA
16 de junho de 1977
anexo 3 petição internacional Seti
publicada na Science:1982:426 (<<Letters»). [Ref: SAGAN at ai (1982)]
·Carl Sagan. ComeU University~ David Baltimore. Massachusetts In~titute of Technology: Richard Berend-
zen.. A~erican University: John Billingham. NASA A~es R.escarch Center: Melvin Calvin. University of
Cahfomla. Berkeley~ A. G. W. Cameron. Harvard Unaversaty: M. S. Chadha. Bhabha Atomic Research
Centre. Bombay. lndia~ S. Chandrasekhar. University of Chicago~ Francis Crick. Salk Institute: Robert S.
Dixon. Ohio ~tate Uni~ersit.y: T. ~. Donahue. University or Michigan: Frank D. Drake. ComeU University:
Lee A. DuBndge. Cahfornaa Instttute of Technology: Freeman J. Dyson. Institute for Advanced Study:
Manfred Eigen. Max Planck Institute. Gõttingen. Federal Republic of Germany: Thomas Eisner. Cornell
University; James Elliott. Massachusetts Institute of Technology: George B. Field. Harvard Vniversity:
Vitaly L. Ginzburg. Lebedev Physical Institute. Mosco\\': Thomas Gold. Cornell University: Leo Goldberg.
Kitt Peak National Observatory: Peter Goldreich. California Institute of Technology: J. Richard Gott III.
Princeton University: Stephen Jay Gould. Harvard Univer~ity: Tor Hagfors. National Astronomy and
lonosphere Center: Stephen W. Hawking. Cambridge University. Cambridge. Unitcd Kingdom: David S.
Heeschen. National Radio Astronomy Observatory: Jean Heidmann. University of Paris: Gerhard Herzberg.
National Research Council of Canada; Theodore Hesburgh. University of Notre Dame: Paul Horowitz.
Harvard University~ Fred Hoyle. Cambridge University. Cambridge. United Kingdom: Eric M. Jones. Los
Ajamos Scientific Laboratory: Jun Jugaku. University of Tokyo: N. S. Kardashev. Institute for Cosmic
Research. Soviet Academy of Scíences. Mo~cow: Kenneth I. Kellerman. National Radiu Astronomy
Observatory; Michael J. Klein. Jet Propulsion Laboratory: Richard B. Lee. University ofToronto: Per-Olor
Lindblad. Stockholm Observatory: Paul D. MacLean. National Institute of Mental Health: Matthew
Meselson. Harvard University~ Marvin L. Minsky. Massachusetts Institute of Technology: Masaki Mori-
moto. Nobeyama Radio Observatory. Tokyo: Philip Morrison. Ma~sachusetts Institute ofTechnology: Bruce
Murray. California Institute of Technology: William I. Newman. University of California. Los Angeles:
Bernard~. Oliver. Hewlett-Packard Corporation: J. H. Oort. Leiden University. Leiden. The Netherlands:
Ernst J. Opik. Armagh Observatory. Northem Ireland: Leslie Orgel. Salk (nstitute: Franco Pacini. Arcetri
Obs~rvatory. F~orence. Italy: ~.ichael D. Papagiannis. Boston Univerf\ity: Línus Pauling. Linus Pauling
Instltute for SClence and Medlcme: Rudolf Pesek. Czechoslovak Academy of Sciences. Prague: W. H.
Pickering. Califomi~ Ins~itute0r. Technology: C.yril ~onnaml?eruma. University of Maryland~ Edward M.
Purcell. Harvard Umverslty: DaVid M. Raup. Untverslty ofChlcago: GroteReber. Tasmania~ Martin J. Rees.
lnstitute of Astronomy. Cambridge University. Cambridge. United Kingdom: Dale A. Ru~sell. National
Museums of Canada. Ottawa. Canada: Roald Z. Sagdeev. Institute for Cosmic Research. Soviet Academv of
Sciences. Moscow; I. S. Shklovskii. (nstitute for Cosmic Research. Soviel Academy of Science~. MU'CllW:
JH.' C. Taner. Unive~sity ~f California. Berkeley: Lewis Tho~as. Memorial Sloan-Kettering Cancer Center:
Klp S. Thome. Cahforma (nstltute of Technology; Sebastlan von "oerner. National Radio Astronomy
Observatory; Edward o. Wilson. Harvard University~ Benjamin Zuckerman. University of Maryland.
Dear Friend,
As someone lured by the immense complexity and beauty of the universe we share, you may now realize that
humankind is about to enter a new generation of space exploration that could change forever how we look at ourselves
as a species and at the universe around USo
The triumphs of the last 30 years ... MERCURY ... MARS ... VENUS ... JUPITER SATURN ... URANUS ... AND
NOW NEPTUNE! Ali have been visited by the first generation of space explorers of robotic emissaries. Even Halley's
Comet was encountered by an international flotilla of spacecraft. And 20 years ago the Moon was visited by humans.
Now with Neptune the reconnaissance phase of planetary exploration is over. A new age of exploration is beginning.
VOU CAN HAVE A FRONT ROW SEAT FOR THIS DRAMATIC NEW AGE OF PLANETARV EXPLORATION.
No, I can't reserve for you (or myself) a spot on a planetary mission ... yet. Sut I can reserve your membership in
THE PLANETARY SOCIETY, the largest space interest group in the world, with more than 125,000 members in
over 100 nations.
As an international member of THE PLANETARY SOCIETY, you will receive the most up-to-date, scientifically accu-
rate results of each and every one of these new missions through the pages of the "member's only" publication,
THE PLANETARV REPORT. Vou will see breathtaking photographs of distant worlds, and read about their scientific
significance in understandable terms.
But before I tell you ali your benefits as a member of THE PLANETARY SOCIETY, let me explain how your membership
will benefit the cause of space exploration and the quest for extraterrestriallife and intelligence.
INTERPLANETARV EXPLORATION
Vou see, we do more than watch planetary exploration happen. THE PLANETARV SOCIETY helps make it happen.
For example:
A few years ago there were no announced plans by any nation to send humans to Mars. ln 1987, The Planetary Society
sponsored a Spacebridge conference for American and Soviet scientists and policy makers; the theme was, "Together
to Mars". ln 1988, President Mikhail Gorbachev called on the U.S. to join in a cooperative program to explore Mars with
the U.S.S.R. The U.S. has not yet formally responded, but on July 20, 1989 President George Bush endorsed the Mars
goal and directed U.S. government officials to present a plan for achieving this goal. The Planetary Society is working
to make the U.S. plan one which will be truly international in execution.
It is as citizens of the planet Earth that we explore the solar system-not just citizens of the U.S., the U.S.S.R., or any
individual country. Planetary exploration presents a unique opportunity for mutual understanding and cooperation,
which are vital to the survival of our planeI.
More than any other organization, THE PLANETARV SOCIETY has exercised international leadership in bringing the
various spacefaring nations together in significant cooperative ventures. We are, in fact, a major link between space
scientists from around the world. And we serve as a major information source for global efforts in planetary exploration.
126431
We led the caU for the U.S. and the U.S.S.R. to renew the agreement to cooperate in space, and to begin coordination
on their Mars orbiter missions of the next decade. That particular agreement is now signed and being implemented, as
are many other international agreements with other nations.
The search by radio telescope for extraterrestrial intelligence is another major PLANETARY SOCIETY projecto We now
operate the most powerful radio receiver in the world for that purpose-META (for Megachannel Extraterrestrial Assay)
at our site at Harvard, Massachusetts. META has the capability of scanning 8.4 million radio channels simultaneously,
looking for signals trom other civilizations.
It wasn't always so easy. ln 1981, declaring the Search for Extraterrestrial Intelligence (SETI) too fantasy-like to justify
government support, the U.S. Congress eliminated NASJ\:s funds to search for other intelligent civilizations in space.
Sut THE PLANETARY SOCIETY, with funds contributed by our members, refurbished Harvard University's 84-foot
radio telescope and began our own search of the northern skies for extraterrestrial radio signals. We are pleased
to announce that our SETI search will expand to the Southern Hemisphere in 1990 through an agreement with
Argentinas Institute of Radio Astronomy near. Buenos Aires.
We are now working to encourage other nations to participate in the search programo The governments of
Australia, Canada, France, the U.S.S.R., the U.S. and others have made initial eftorts which we must encourage.
So much has happened. There is much more yet to come. And with many more spacecraft scheduled to be launched
or to send results in the next few years, who can tell what the heavens will yield?
But one thing is clear. THE PLANETARY SOCIETY WILL BE THERE, LEADING THE WA~
And by joining THE PLANETARY SOCIETY today, you will be encouraging new exploration by helping THE PLANETARY
SOCIETY get our message heard everywhere ... through expert testimony for increased interplanetary exploration, and
for SETI, and through our leadership for international cooperation in future space ventures.
As a member, you will be invited to a variety 01 Society-sponsored activities ... conferences, seminars, slide shows
and films, workshops and other events that ofter direct informal contact with scientists and other society members.
And your official PLANETARY SOCIETY membership card will identify you as a member in good standing, admitting
you to Society-sponsored events and activities.
The price of a membership is just US $35. That is little to pay for the enormous impact you will have as a member 01
this highly influential group, as wett as ali membership benefits and privileges.
So take your front row seat for this exciting new generation of space exploration by joining THE PLANETARY
SOCIETY today. Ali you have to do is return the Membership Acceptance Form aI the top of this letter, with your dues
payment, or if you prefer, use your VISA, American Express, or MasterCard.
Sincerely,
Louis Friedman
Executive Director
PS. For a limited time, we are offering two-year memberships for just US $65.
Bibliografia
FREUOENTHAL (HAN~
KANT (IMANUEL)
1987 «Excerpts from LINCOS:
1984 Histoire générale de la
design of a language for
nature et théorie du ciel,
cosmic intercourse», in REGIS
Paris, Vrin, 315 pp. [1755]
JA (ed):1987:215-228. [1960]
SAGAN (CARL)
1970 «Life», Encyclopaedia SAGAN (CARL) & SHKLOVSKI (I. S.)
Britannica, pp.1 083-1 088. 1966 A Vida Inteligente no
1973 Cosmic Connection - an Universo, Portugal, Europa-
extraterrestrial perspective, NY, América, s/d, 577pp. [Intelligent
Doubleday, 274 pp. [trad. bras.: Life in the Universe, Holden-Day,
A civilização cósmica, Rio, Artenova, San Francisco,1966] [Deli, New
1976] York, 1967]
1983a Os Dragões do Éden -
especulações sobre a evolução da
inteligência humana, RJ, F.Alves,
SAGAN (CARL), SAGAN (LINDA), DRAKE
195pp. [1977] (FRANK)
1983b Cosmos, Rio, Francisco Alves, 1972 «A Message from Earth»,
1983 (4a.) (1a.:1981), [NY, Science: 1972:175:881-4.
1980]
1984 «Para Seres e Tempos do SAGAN (CARL) et ai
Futuro», «A missão da Voyager 1982 «An International Petition»,
no sistema solar exterior» e Science, 1982:218:426.
«Epílogo», in SAGAN et ai: 1984,
pp.1-42, 211-230, 231-246. SAGAN (CARL) et ai
1985a O romance da ciência, RJ, F. 1984 Murmúrios da Terra - o disco
interestelar da Voyager. RJ,
Alves. [Broca's brain: reflections on
the romance of science, 1979] F.Alves, 274pp. [Murmurs of
1985b «A atmosfera e as Earth, NY, Literary Agence,
conseqüências climáticas da 1978].
guerra nuclear», in EHRLlCH et
ai: 1985, pp. 35-72. SAGAN (LINDA)
1986 Contato, Rio, Guanabara, 512 1984 «Saudações da Voyager», in
pp. [1985] [romance de ficção SAGAN et ai, 1984, pp. 123-
científica] 147.
TINLAND (FRANK)
1968 L'homme sauvage - homo ferus
et homo sylvestris, de I'animal à
I'homme, Paris, Payot, 287 pp.
filmes
Alien (1979), dir. Ridley Scott; rol. Dan Soylent Green (1973), dir. Richard
O'Bannon. 117 mino Fleischer, adaptação da novela «Make
Roam! Make Roam!» de Harry
Brainstorm (1983), dir./rot. Douglas Harrison, 97 mino
Trumbull. 106 mino
Star Trek I: the motion picture (1979),
Close Encounters of the Third Kind dir. Robert Wise. 145 mino
(1977), dir./rot. Steven Spielberg. 135
mino Star Trek IV: the voyage home (1986),
dir./rot. Leornard Nimoy. 118 mino
The day the Earth stood still (1951),
dir. Robert Wise, rol. E. H. North; Starman (1984), dir. John Carpenter, rol.
adaptação do conto «Farewell to the Bruce A. Evans e Raynold Gideon.
Master» de Harry Bates, 92 mino 115 mino
Dr. Strangelove, or how I learned to The Thing (1951), dir Christian Nyby,
stop worrying and love the bomb rol. Charles Lederer, adaptação de
(1964), dir. Stanley Kubrick, rol. «Who Goes There?» de John W.
Kubrick, Terry Southern e Peter Campbell, Jr. 86 mino
George, adaptação de «Red Alert» de
George. 102 mino The Thing (1982), dir. John Carpenter,
rol. Bill Lancaster, refilmagem do
E.T.: the extra-terrestrial (1982), dir. mesmo conto de Campbell (acima).
Steven Spielberg, rol. Melissa 109 mino
Mathison. 115 mino
This Island Earth (1955), dir. Joseph M.
Fantasy (1940), Walt Disney. 81 mino Newman, rol. Franklin Coen e Edward
G. Q'Callaghan, adaptação do conto
The Great Whales (1977), National de Raymond F. Jones. 86 mino
Geographic Society, dir'/prod'/rot.
Nicolas Noxon. 2001: A Space Odissey (1968), dir.
Stanley Kubrick, rol. Kubrik e Arthur
Lifeforce (1985), dir. Tobe Hooper, rol. C. Clark. 141 mino
Dan O'Bannon & Don Jakoby,
adaptação de «Space Vampires» de Vive la Vie (1984), dir. Claude Lelouche.
Colin Wilson. 101 mino
War Games (1983), dir. John Badham,
The Man Who Fell on Earth (1976), dir. 113 mino
Nicholas Roeg, rol. Paul Mayersberg,
adaptação do conto de Walter Tevis. War of the Worlds (1953), dir. Byron
138 mino Haskin, adaptação da novela de H. G.
Wells, 85 mino
Moby Dick (1956), dir. John Huston, rol.
de Houston e Ray Bradbury. Woman in the Moon (1929,mudo), dir.
Fritz Lang, rol. Barre Lyndon,
Radio Days (1987), dir./rot. Woody Allen. adpatação da novela de Thea von
Harbou, 97 mino [Die Frau im mond]
Robinson Crusoe on Mars (1964), dir.
Byron Haskin, adaptação livre de
Daniel Detoe, 109 mino
Jornal do Brasil
06/08/89 «Naves desvendam mistérios do cosmos»,
assinado por JORGE LUIZ CALlFE.
26/08/89 «Voyager 2 conclui com sucesso a missão de
12 anos no espaco»
28/12/89 «Engenheiros comparam viagem à Lua à
construção de pirâmides
28/01/90 «Astrônomos da NASA procuram
extraterrestres», p.15, artigo assinado por J. L.
CALlFE.
03/07/90 «Baleias».
08/06/90 «Voyager fotografa o Sistema Solar - Terra é
apenas um ponto azul na Via Láctea».
27/10/90 «EUA alteram base orbital e buscam ETs», p.
7.
Superinteressante
Março/1989, ano 3, nO 3 - «À procura dos
extraterrestres», pp. 18-25.
Janeiro/1988, ano 2, n° 1 - «E a nave vem (discos
voadores)>>, pp. 14-19.
PROJETO DE TESE DE MESTRADO
j\ eX.obj oloçj él, COlno <:1 c l1arnanl alguns, o estudo sobre a possj bj-
lj (lad~~ ele vj (la. extra-terrestre, de vj da I)Ossj velmentc or'j f;j rla-
d~l j n:Je enderlterae!'1te de" terrestre. I'Jeste r1Jvel, 111Uj tos de seus
t. CLHJ.S St..10
- CO::1Url~3 ('lOS do astrôrlOlno 11orte-arner5 car1C CLLrl
é deles - j n\lestj [3ação de caInpo (2). Constj tuj tal carnpo ern,
havendo not5cia de um deterrnjnado caso de cantata jmedjato
(?) C07n urn Objeto Voador r~ão-Identj fj cada (OVl-JI), o pesquj-
[.3ador di ri !~e-se pessoalrnente a.o local da ocorrêncj a para ai)ll-
guns. (6).
I~esumindo, os l:5ruPOS ufológicos que se propõem urna
tratJalho la15 ti co e teóri co, clue te:\lclern éi ser prornovi dos j 11-
djvjdualmente, o que se pode notar pelas publjcações dos re-
sultados sempre assjnadas por um autor, e não pelo seu grupo,
por contraste com as anterjores a vjg11ja ufológjca é uma atj-
vjdade:grupa~ -lonsiste numa espécie de expedição, quando um
grupo de ufólogos se desloca para uma região previamente es-
colhida por suas boas condições de observação ufológica (alta
incidência, céu amplo e sem luminosidade devido a grandes ci-
dades próximas), lá encontra um local afastado de qualquer
habitação e que permita acamparemÇ7)A duração varia de uma noi-
te a uma semana ou até duas. Há diversas atividades de gru~c,
to. Não por Deus, bem entendjdo, mas pelos seres extra-terrestres.
Por eles escolhjdo para ser um medjador entre eles e a humanjda-
de, para ser um embajxador. É comum (mas não predomjnante) °
ufólogo que jnjcjou a sua carrejra devjdo a um contato marcante,
a partjr do qual converteu-se à ufologja, dedjcando-lhe sua vjda.
f/1III# ~f/1III# ,
r1o.
PLANO DE TRABALHO
:lnlel'j C:)J1(), por C1tltlS (1.3C:lcl<:lf.> corlsul tor (1:1 F'or<]Cl. l\.ére~ dOB !J/\~
sobre UFO~') (Prc)jcto Lj vro Azul), e qUê ,(.1,<:111110\.1 rnundj éll IlotOI'j c-
dade como consultor cjentffjco do fjllne de Spje1berg Cantatas
Tme(lj atas ele 3 Q GI'(lU. Ilyr1elc dj stj rlf:~uj II dllas I~r'arlcles C{l.tc[~orj D.S:
18
(CEV), contata estrj tarnerlte 1)81 quj co, telepátj CO, corn unI ser
(5). A 11j pótese CltlaSe unj versalrnente acej ta é f)Or toàos co-
111~ecj (1;].: (lue ~3U() er1ger1110s, nélves ele trarlSI)Orte j rltercstelar',
19
(r/). A ref~j no cscolhj dn., I)ela sua "alta j ncj dêncj a ufoló[';j ca"
mesma, é com &eqUêncj a a regjão onde o grupo jâ desen-
vaI ve tlrna })esquj sa ele campo com habj tantes locaj s, e na qual
já se habjtuaram a jnstalar-se.
( 12) •
(14). "We don't have UFOs, only UFa reports. The patterns and
contents of these reports constjtute the UFO phenomenon"
(Hynek, cjtado em UNI nº 2, majo-junho/85, p.21).
(17). l~specj ':.llrnellte o ele 3 º e ·42 [~ra.us, os Clt1e Illélj s perto Cl'lG-
trate-se ULl cnDO (le ~:~~rande repercussão nacj anal -- I). C~{.
,.",
crtSO ,J
~l
BIBLIOGRAFIA UTILIZADA
Rjo, s/de
()'J1II ])OCLlrnc11to (revj stél) - Coleção cornpleta. I-furTlus Ecl., HJ o
( I10 s. 1 a 8; 1 9 7 8 - 8 O) •
SAGAN, C.- ~osmos. Francjsco Alves, Rjo,1983.
~-)A(}AN, (~., e outros - l·Illrrnúrjos da Terra, o djsco jr1tercstelar
da Voyager. Francjsco Alves, Rjo, 1984.
UFOLOGIA ~'~P. CIOIJ!\.I.J E I1JTF~RI~ACIOrJAL (revj sta) - Coleção cOlnple-
Capítulo: 21 ─ a procura
Rio,16mar90
APRESENTAÇÃO
1. A denominação foi proposta por HUXLEY, cuja obra de maior repercussão intitulava-se Modern
Sintesis (1953).
1
2. As referências bibliográficas deste segmento que apontarem apenas a página, remetem a este artigo.
3. Numa reunião de recentes artigos de cientistas e filósofos sobre inteligência extraterrestre (REGIS JR: 1987), o
texto de Simpson é citado por seis dos onze autores do livro.
2
Simpson reconhece a grande aceitação que o tema há muito possui, inclusive no meio
científico, no entanto acusa que os biólogos *raramente foram consultados+. Mesmo quando o
assunto invade o terreno das ciências da vida ─ sob o título de *space bioscience+ e
*exobiologia+ ─, a abordagem é feita sobretudo do ponto de vista da bioquímica ou biofísica.
Mas toda a questão depende fundamentalmente de um parecer sobre a evolução das espécies
biológicas, uma vez que não se procura apenas vida extraterrestre, mas uma espécie
inteligente, e mais, capaz de estabelecer comunicação com a espécie humana. Ora, cabe à
biologia, *strictly speaking+ (769), à biologia evolucionária e sistemática, analisar os
mecanismos pelos quais a espécie humana, com todas as suas idiossincrasias, pôde aparecer
na Terra. A partir desta análise do surgimento biológico da peculiaridade humana, cabe
novamente à biologia julgar se ele pode "repetir-se", ressurgir muito semelhante em outra
cadeia evolutiva. *As a evolutionary biologist and systematist, I believe that we should make
ourselves heard in this field+ (769).
Em seu juízo final quanto à existência de eti, Simpson oscila entre afirmar a sua
extrema improbabilidade ou a sua total impossibilidade. A improbabilidade deriva da análise
das circunstâncias que permitiram o surgimento da espécie humana, e a estimativa de o
quanto elas podem ter se repetido em outros sítios, o quanto são cosmicamente freqüentes. A
impossibilidade deriva da relação da noção de inteligência e de espécie humana. Mas o
resultado é o mesmo: não adianta imaginar ou procurar eti. No fim, ambas encontram-se nas
vizinhanças do zero: *Improbability piled on improbability approaches impossibility+ (774).
Não é o primeiro dos fatores que Simpson pretende discutir. Mesmo quanto ao
segundo, só em parte lhe interessa. Estão referidos, não ainda à biologia, mas a outros campos
científicos. Simpson contenta-se em enunciar a opinião hegemônica dos especialistas
apropriados. A primeira cabe a astrônomos, que parecem unânimes em concordar que
planetas semelhantes à Terra são comuns na galáxia. A segunda cabe basicamente aos
bioquímicos, que igualmente acreditam que formas de vida quase inevitavelmente surgirão
em planetas suficientemente similares à Terra.
4. Quando escreveu o artigo, vários componentes julgados essenciais ainda não haviam sido obtidos *under
realistically primitive conditions+. Mas Simpson acreditava que eles acabariam sendo sintetizados em simulações de
laboratório. De fato, várias das lacunas foram e continuam a ser preenchidas até hoje. Sobre toda a cadeia de reações
de síntese das macromoléculas primordiais ver DICKERSON:1978, sobre a formação da estrutura celular, ver
SCHOPF:1978. As pesquisas continuam: o prêmio Nobel de química do ano passado foi concedido a dois
pesquisadores que descobriram atividade catalítica (até então uma função típica de proteínas) em ARN. O achado veio
a reforçar a hipótese de que o ARN tenha sido a primeira molécula a estocar e replicar informação genética.
5
expectations and extrapolations of the chemist and can obtain further enlightenment only
from the biologist as such+ (772).
5. Sobre à elaboração da noção de organismo vivo, l'être vivant, como germinal na constituição da biologia moderna
ver CANGUILHEM:1975, FOUCAULT:1966 (caps 5,7,8) e JACOB:1983.
6. Novamente as intuições de Simpson coincidem com os achados e opiniões atuais. Ver referências à nota 3, e mais
EIGEN et al:1981.
6
rara, improvável. *It would seem that evolution must frequently or usually have ended at that
preorganismal stage+ (772).
Os entusiastas por etis (em sua maioria não biólogos strictu sensu) costumam assumir
que, uma vez surgida vida em um planeta, ela evoluirá de forma semelhante à que se passou
na Terra. Para Simpson, a única base para tal presunção é a opinião de que *the course
followed by evolution on earth is its only possible course, that life cannot evolve in any other
way+ (772). A duas fontes de conhecimento científico deve-se indagar da justeza dessa
opinião: à paleontologia e à teoria evolucionista (773). O estudo do registro fóssil, a fim de
notar se o curso da evolução da vida terrestre seguiu como que direcionado para um
determinado resultado, tendendo gradativamente à elaboração de um modelo último de
espécie. A teoria evolucionista para, a partir da análise dos mecanismos pelos quais as
espécies se originam, descobrir se eles podem de alguma forma privilegiar a constituição de
humanóides.
7. Neste segmento, toda referência bibliográfica que contenha exclusivamente a página da obra, refere-se a
DOBZHANSKY:1978.
11
irreproduzíveis. *L'espèce humain est presque certainement unique au sein de l'univers, et
notre planète est également unique+ (87).
Aqui, o termo único tem um sentido valorativo, que se soma ao sentido "lógico". O
tema da unicidade ─ da história e das espécies biológicas ─ parece participar de uma
anfibologia. Não apenas único porque sem igual, irrepetível, mas também porque
excepcional, privilegiado. O valor da unicidade ressurge na sutil recusa de um caráter
acidental para a evolução. Dobzhansky prefere crer *que l'évolution universelle représente
une vaste entreprise, à laquelle tout et tout le monde participe+ (99).
12
A impossibilidade de prever o curso da evolução para Dobzhansky ─ no que se
distingue de Simpson ou de Mayr ─ não se deve ao indeterminismo fundamental das ciências
biológicas. Ao contrário, deve-se ao determinismo radical, à extrema complexidade dos
determinantes envolvidos, e à limitação laplaciana do conhecimento humano. *Les
phénomènes biologiques e psychologiques sont moins prévisibles [que les célestes], mais
seulement parce qu'ils sont plus complexes et que les lois qui les gouvernent n'ont pas encore
été découvertes+ (89).
A noção de evolução não é exclusiva da biologia. *Je ne prétends pas que Darwin ait
fait de l'évolution un principe universel. [...] Pourtant, la théorie darwinienne de l'évolution
biologique est la pierre angulaire de la conception évolutionniste du monde, débutant par
l'évolution cosmique et culminant dans l'évolution humaine+ (92). Dobzhansky reconhece ao
menos três tipos de evolução: a inorgânica, a orgânica e a humana. *Ces différentes sortes
de'évolution ne sont pas indépendentes l'une de l'autre; elles représentent plutôt trois étapes
de l'évolution générale du cosmos+ (94). Os processos evolutivos são inteiramente diferentes
em cada nível, e os conceitos da evolução biológica (hereditariedade, mutação, seleção
natural) não se aplicam aos astros ou à cultura. Mas em todos os níveis, não se encontra um
mundo estático, ou cíclico, mas em processo. Chega a referir-se a Teilhard de Chardin, um
*evolucionista audaz+, e à sua visão no limite entre o científico e o místico8.
Não se pode saber ao certo se o curso da evolução é ditado pelo acaso ou se persegue
um fim último. É a ignorância também que impede lançar um juízo sobre o caráter global da
evolução: se ela é fortuita e acidental, ou se possui uma direção. Ao homem, único ser
consciente da própria evolução, cabe perguntar-se sobre o rumo da evolução. Dobzhansky
parece ter esperanças de que a ciência chegue a apreender este fim, detetar este rumo. *Où va
l'évolution? [...] Quatre siècles de progrès scientifique, depuis Copernic, n'ont pas dévoilé ce
mystère; le dernier siècle, depuis Darwin, rend la question plus pressante que jamais+ (99)
8. Uma referência simpática à *filosofia otimista+ de Chardin também se encontra no encerramento do seu livro O
Homem em Evolução (1968). Após apresentar o *ponto Ωmega+ para o qual a evolução se encaminha, a última frase
do livro é também uma citação de Chardin: *o Homem não é o centro do Universo como ingenuamente se acreditava
no passado, mas algo muito mais belo ─ Homem, a seta ascendente da grande síntese biológica. Homem, a última a
nascer, a mais fina, a mais complexa, a mais sutil das sucessivas camadas da vida+.
13
A natureza surge como atora, como que dotada de intenção, quase como num
animismo evolucionista. Ela é uma artesã paciente que tenta, *par essai et erreurs+, alcançar
um modelo mais perfeito. *Chaque espèce biologique représente un essai de la nature, qui
expérimente un nouveau mode de vie+ (96). Dentre as experiências, o homem ocupa um lugar
especial. *L'humanité représente en effet, en tant qu'espèce biologique, une extraordinaire
réussite. [...] Ceci résulte d'un complexe de caractères adaptatifs nouveau, transmis
indépendamment des gènes, qui s'appelle la culture+ (97). E até onde se sabe, este lugar
privilegiado se situa em relação a todo o universo. *La vie joue un rôle important dans cette
évolution, et particulièrement une forme de vie appelée l'homme, qui n'existe, par autant
qu'on sache, que sur une seule et remarquable planète+ (96).
ERNST MAYR
9. Em MAYR:1978 faz um extremamente breve comentário, condensando o seu argumento principal (p.44). Todas as
referências bibliográficas deste segmento que se restrinjam à página, referem-se a MAYR:1987.
14
one multiplies these with each other, one comes out so close to zero, that it is zero for all
practical purposes+ (29).
Mayr ri-se de ter ganho uma aposta com um físico, quando a sonda automática Viking
pousava em Marte. Apostara que nenhuma vida seria detectada. No entanto, referindo-se aos
trabalhos de Eigen *and his school+10 sobre a formação de macromoléculas e inclusive
estocagem de informação e replicação em "condições primitivas", aceita que a biogênese seja
um processo repetível. *The probability of the repeated origin of macromolecular systems
with an ability for information storage and replication can no longer be doubted+ (24). Caso
planetas semelhantes à Terra sejam comuns, expectativa que os astrônomos compartilham
mas para a qual não possuem evidências diretas, concorda que possa existir vida
extraterrestre. Mas nada se pode afirmar. Exceto que não há vida ─ após as Mariner, as
Pioneer, as Viking ─ nos demais planetas do sistema solar.
10. Ver p.ex. EIGEN et al:1981. A referência citada por Mayr é KÜPPERS:1983.
11. A respeito das divergências epistemológicas entre os ramos da ciência na visão de Mayr, ver MAYR:1985.
15
Apresentando um calendário simplificado do surgimento e história da vida terrestre,
Mayr traça um panorama da complexidade da evolução biológica. Seguindo a linhagem que
deu origem ao Homo sapiens, parte dos supostos primeiros organismos (há 3,8 bilhões de
anos, 700 milhões após a formação do planeta12), passa pelo surgimento dos unicelulares com
núcleo (há apenas 800 milhões de anos), dos cordados (550), vertebrados (500), mamíferos
(250), primatas (70), antropóides (24), hominídeos (7) e homem moderno (há 30 mil anos).
Nota como a vida primitiva custou a produzir um exemplar eucariote (3 bilhões de anos), e a
explosão de diversificação do período cambriano.
Um dos argumentos dos que crêem ser provável a eti é a analogia com a evolução
convergente de órgãos em linhagens diferentes. O caso mais contundente é o do
desenvolvimento independente do olho nos vertebrados e nos cefalopodos, chegando a um
resultado estruturalmente bastante semelhante13. Mayr não recusa tal convergência, e até a
exagera: cita um estudo seu (em parceria) no qual mostra que o órgão ocular surgiu
independentemente no mínimo 40 vezes em grupos distintos. Acredita que ele sempre
desenvolva-se quando representar "vantagem seletiva". Mas Mayr abandona a discussão em
termos de mecanismos evolutivos, e toma os dados sobre recorrência como pura constatação
empírica de probabilidade. A múltipla origem e convergência dos olhos apenas demonstra o
quanto este caráter é provável, enquanto a raridade histórica da inteligência prova sua
improbabilidade. A surpreendente semelhança estrutural dos olhos do polvo e dos vertebrados
também é deixada para trás, diluída nas 40 aparições de órgãos fotorreceptores, com
12. Sobre a precocidade relativa do surgimento da vida na Terra, recuada até praticamente os primeiros registros
geológicos disponíveis, ver GOULD:s/d. Tal precocidade é comumente considerada um signo da alta probabilidade de
surgimento da vida nas condições da Terra primitiva.
13. Para um biólogo que toma o caso da convergência adaptativa dos olhos dos vertebrados e dos polvos como
central na discussão sobre a possibilidade de eti, ver ORNSTEIN:1982.
16
estruturas as mais diversas. Além disso, Mayr nunca menciona o sistema nervoso central, ou
o desenvolvimento do órgão cerebral, como substrato orgânico da inteligência. Não reduzindo
a irrupção da inteligência à evolução de um órgão de grande valor adaptativo, escapa ao
essencial da analogia entre o surgimento dos olhos e a possibilidade do surgimento de uma
eti14.
CARL SAGAN
14. Considere-se ainda o papel chave que se costuma atribuir ao aparecimento dos olhos no desenvolvimento do
sistema nervoso central, por exigir processamento das imagens num bulbo ocular.
15. Utilizo seis textos em que Sagan aborda a problemática biológica da inteligência humana e extraterrestre. Para
facilitar o sistema de citações, utilizo as seguintes siglas, nas referências a estas seis obras:
S1 = SAGAN:1970 S4 = SAGAN:1983a
S2 = SAGAN & CHKLOVSKII:1966 S5 = SAGAN & DRAKE:1975
S3 = SAGAN:1983b S6 = SAGAN:1984
17
adaptativo para estranhar que não haja outros concorrentes a descobrir um caminho evolutivo
semelhante, a encontrar a mesma mina de adaptabilidade.
Para Sagan, a diferença de opinião quanto à probabilidade de eti não se deve a uma
má compreensão da noção biológica de evolução, ou a um uso equívoco por parte de
cientistas de formação física, mal avisados a respeito dos limites dos conceitos de cada
disciplina. *O grande princípio da biologia ─ aquele que, até onde sabemos, distingue as
ciências biológicas das ciências físicas ─ é a evolução através da seleção natural+ (S4:pXIX).
Sagan, que também graduou-se em biologia, resume os princípios do evolucionismo antes de
discutir suas implicações na especulação sobre eti.
Para Sagan, não é nem a ignorância dos princípios da biologia, nem uma discordância
de fundo epistemológico quanto a estes princípios, que funda um julgamento favorável à
existência de eti. Por outro lado, é ou a ignorância ou um bias epistemológico que justifica a
16. Esta incapacidade de prever, e portanto de submeter-se à prova, inerente ao darwinismo, levou POPPER a
considerá-lo tautológico e um "programa metafísico de pesquisa" (1986:p176ss). Para uma refutação, ver RUSE:1981.
19
opinião de que não deve haver outros seres vivos inteligentes no universo. 1) Ignorância
quanto à variedade de formas de vida possível, sua recorrência ou raridade, a que os biólogos
se vêem constrangidos, por só obterem informação sobre um tipo de vida, o terrestre, e
mesmo assim precária, como exemplifica o queijo suíço dos registros paleontológicos. *O
estudo de um único instante de vida extraterrestre, não importa quão modesto,
desprovincializará a biologia+ (S3:p41). 2) Bias epistemológico por tratar-se de uma disputa
do tipo ptlomaica/copernicana, em que o lugar que se pretende reservar para o ser humano na
natureza decide a posição dos contendores. Para Sagan, considerar o homem a única espécie
inteligente no cosmo é ainda superestimar seu valor, atribuir-lhe superioridade face a qualquer
outro ser existente, fazer de todo o universo apenas o cenário para nosso surgimento,
recolocar a Terra no centro. Por outro lado, considerar a inteligência um fenômeno comum,
freqüente, representa o descentramento copernicano, ferir o preconceituoso orgulho
antropocêntrico, destituir (ao menos diluir) o homem do topo hierárquico da criação.
Devolver à natureza a posse da inteligência que julgara ter capturado com exclusividade.
Para Sagan, a inteligência não representa a peculiaridade de uma espécie, mas como
que um novo patamar de organização biológico, a descoberta de um novo nível de
estruturação sobre o qual se desdobrar, tal como foi a formação do núcleo celular, ou a
20
multicelularidade, e a explosão de diversificação decorrente. A inteligência é herdeira da
formação do cordão espinhal nos cordados, a descendente mais radical deste "achado" da
explosão cambriana.
17. Ainda definindo o atributo humano: *A curiosidade e a premência de resolver problemas representam as marcas
registradas emocionais de nossa espécie; e as atividades mais caracteristicamente humanas são a matemática, a
ciência, a tecnologia, a música e as artes [...]+ (S4:p54).
21
entanto numa proporção muito maior que a genética. *As duas curvas se cruzam+ em algum
réptil primitivo que, *pela primeira vez na história do mundo, possuía mais informação em
seu cérebro do que em seus genes+. Nesta comparação, Sagan encontra uma tendência
evolutiva nítida e persistente na direção da encefalização. *Grande parte da história da vida,
desde o Período Carbonífero, pode ser descrita como o domínio gradual (e certamente
incompleto) dos cérebros sobre os genes+ (S4:p28).
Embora uma tendência, isto não significa que os mecanismos clássicos da evolução
são aqui subvertidos, e que a inteligência desenvolve-se "lamarckianamente" ou devido a um
programa já embutido nas formas primitivas e que apenas se "desenrola" na história
evolutiva. Sagan não abandona o darwinismo, mas segue um caminho que se poderia intitular
hiper-adaptacionista. *Não há mistério quanto a isto: os organismos inteligentes, de um modo
geral, sobrevivem melhor e deixam maior prole do que os estúpidos+ (S4:p173; tb S1:1087).
Uma vez que representa uma formidável vantagem adaptativa, o desenvolvimento da
inteligência é obtido através de uma longa série de "seleções do mais inteligente". *A seleção
natural serviu como uma espécie de peneira intelectual, produzindo cérebros e inteligência
cada vez mais competentes para manipular as leis da natureza+ (S4:p175).
O que Sagan reivindica universal não é a anatomia do órgão nervoso, mas sua função.
A inteligência só pode ser uma: a reflexão de uma mesma realidade universal. *Muito embora
o desenvolvimento de humanos ─ ou os seus aproximados equivalentes anatômicos
extraterrestres, os humanóides19 ─ seja improvável, não poderia ser o desenvolvimento dos
seus equivalentes intelectuais um acontecimento evolutivo universal?+ (S2:P430).
Sagan supõe que haja muitos caminhos, várias vias evolutivas possíveis, todas
tendendo a desenvolver a mesma faculdade, alcançar o mesmo resultado. *Naturalmente que a
rota evolutiva seria diferente daquela que observamos na Terra. A seqüência exata de
acontecimentos que ocorreu aqui [...] provavelmente não aconteceu da mesma forma em
qualquer outro ponto do universo. Entretanto, deve haver muitas vias funcionalmente
equivalentes para um resultado final semelhante+ (S4:173). Chega a suspeitar da existência de
uma lei biológica, ainda não formulada pelos biólogos, que justifique esta "poligenia" do
caráter intelectual: *There might be a kind of biological law decreeing that there are many
paths to intelligence and high technology, and that every inhabited planet, if it is given
enough time and it does not destroy itself, will arrive at a similar result+ (S5:p103). De várias
origens separadas, partindo de estados diferentes, os sulcos da evolução tenderiam a
convergir, a encontrar-se na produção de espécies intelectualmente similares. *Por maiores
que sejam as diferenças no ponto inicial, é inevitável uma convergência gradual no conteúdo
intelectual [...]+ (S6:p6).
18. Expressão de François JACOB (1977), inspirado no uso que dela faz LÉVI-STRAUSS (1976), para descrever o estilo
de "trabalho" da evolução biológica.
19. Sagan demonstra conhecer melhor o sentido que a ficção científica atribui ao termo humanóide que Simpson:
antropomórficos tanto anatômica quanto intelectualmente.
24
BIBLIOGRAFIA CITADA
CANGUILHEM, GEORGES
1975 *Le vivant et son milieu+ in La connaissance de la vie
Paris, J.Vrin, 20 ed., pp. 129-154. (1965).
DICKERSON, RICHARD E.
1978 *Chemical Evolution and the Origin of Life+
Scientific American, vol.239, n.3, pp.62-78.
DOBZHANSKY, THEODOSIUS
1968 O Homem em Evolução. SP, Polígono-EDUSP, 420pp.
1978 Le droit à l'intelligence ─ génétique et égalité. Paris, Ed.Complexe-PUF, 103pp.
[Genetic Diversity and Human Equality, 1973]
EIGEN, M. et al
1981 *The origin of genetic information+
Scientific American, vol.244(4), pp.88-118.
FOUCAULT, MICHEL
1966 As Palavras e as Coisas. Lisboa, Portugália, 502pp. (ed. port. s/d)
HUXLEY, JULIAN S.
1953 Evolution: the modern synthesis. NewYork,London; Harper.
JACOB, FRANÇOIS
1983 A Lógica da Vida ─ uma história da hereditariedade. RJ, Graal, 328pp. (1970)
1977 *Evolution and Tinkering+. Science, vol.196, n.4295, pp.1161-6.
KÜPPERS, B.-O.
1983 Molecular Theory of Evolution
Berlin,Heidelberg,NewYork : Springer.
LÉVI-STRAUSS, CLAUDE
1976 O Pensamento Selvagem. SP, Cia. Ed. Nac., 331pp. (1962)
MAYR, ERNST
1978 *Evolution+. Scientific American, vol.239, n.3, pp.38-47.
1985 *How Biology Differs from the Physical Sciences+. in DEPEW & WEBER:1985.
1987 *The probability of extraterrestrial intelligent life+.
in REGISJR:1987, pp.23-30.
MILLER, STANLEY L.
25
1955 *Production of some organic compounds under possible primitive Earth conditions+.
J. Am. Chem. Soc., vol.77, p2351s.
ORNSTEIN, LEONARD
1982 *A biologist looks at the numbers+. Physics Today, vol.35(3), pp.27-31.
POPPER, KARL
1986 *O darwinismo como programa metafísico de pesquisa+
in Autobiografia Intelectual. SP, Cultrix, pp.176-190. (1974)
RAUP, DAVID M.
1987 *ETI without intelligence+. in REGISJR:1987, pp.31-42
RUSE, MICHAEL
1981 *Darwin's theory: an exercise in science+. New Scientist, n.90, pp.828-830.
SAGAN, CARL
1970 *Life+. Encyclopaedia Britannica, pp.1083-1088.
1983a Os Dragões do Éden ─ especulações sobre a evolução da inteligência humana
RJ, F.Alves, 195pp. (1977)
1983b Cosmos. RJ, F.Alves, 364pp. (1980)
1984 *Para Seres e Tempos do Futuro+. in SAGAN et al:1984, pp.1-42.
SAGAN, CARL et al
1984 Murmúrios da Terra - o disco interestelar da Voyager.
RJ, F.Alves, 274pp. (1978)
SCHOPF, J. WILLIAM
1978 *The Evolution of the Earliest Cells+
Scientific American, vol.239, n.3, pp.84-102.