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Trabalho de Projecto apresentado para cumprimento dos requisitos necessários à

obtenção do grau de Mestre em Tradução de Alemão, realizado sob a orientação


científica de Ana Maria Bernardo

1
AGRADECIMENTOS

A redacção desta memória e a realização do projecto respectivo beneficiou do


apoio inestimável de algumas pessoas e instituições.

Em primeiro lugar, gostaríamos de exprimir aqui o nosso mais profundo


agradecimento à nossa orientadora, na pessoa da Doutora Ana Maria Bernardo, sem a
qual não teríamos levado a bom porto este trabalho. Constituiu uma honra, um orgulho,
uma satisfação e simultaneamente uma leveza poder contar com o rigor, a credibilidade,
a humanidade e o pragmatismo inigualáveis da Doutora Ana Maria Bernardo,
personalidade cimeira nos estudos tradutológicos e, desde há alguns anos, nossa grande
influência.

Em segundo lugar, estamos extremamente agradecidos ao Professor Carsten


Sinner, por nos ter acolhido em Leipzig, por demonstrar uma afabilidade e uma atenção
raras e por nos ter permitido debruçarmo-nos sobre a sua valiosíssima obra. Contituiu,
de facto, um enorme privilégio termos travado conhecimento com uma figura da
craveira intelectual do Professor Carsten Sinner.

Em terceiro lugar, endereçamos os nossos agradecimentos por um lado à


Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, que sempre
acorreu às nossas solicitações em tempo útil e de forma atenciosa e, por outro, ao
Institut für Angewandte Linguistik und Translatologie da Universidade de Leipzig, que
revelou uma disponibilidade invulgar na disponibilização de recursos.

Por último, um agradecimento a todos os nossos familiares e amigos que, de


variadíssimas formas, demonstraram o seu apoio e compreensão. Dentre estes, um
muito especial a Jessica Klosa, uma companheira de vida que sempre nos deu força para
continuarmos perante todas as adversidades.

2
TRABALHO DE PROJECTO

Linguística das Variedades e Tradutologia - uma relação a explorar a partir


do manual "Varietätenlinguistik"

PEDRO AUGUSTO FERREIRA

RESUMO

O presente trabalho de projecto pretende explorar a relevância teórica e prática


da variação linguística para a Tradutologia e para a prática da tradução. Pretende
também contribuir para a divulgação na comunidade académica lusófona da
problematização conceptual em torno da variação linguística levada a cabo no meio
germanófono, bem como discutir as suas possibilidades de transposição tradutória para
a língua portuguesa, variedade europeia.

Nele se descreve o processo tradutório da publicação em língua alemã


“Varietätenlinguistik”, em particular a análise do texto de partida relevante para tradução
segundo a proposta de Christiane Nord (1988). A análise factorial leva a prever-se a
obtenção de uma tradução instrumental de cariz equifuncional com o propósito de
cumprir as funções do TP no RC. Problematizando igualmente as traduções como
variedade da língua, este trabalho sugere para o TC uma crescente estandardização,
conservadorismo e menor criatividade que o TP e outros textos originais comparáveis na
LC, colocando o TC a obter, enquanto variedade, num contínuo variacional hipotético
entre o tradutorês e a invisibilidade do tradutor.

PALAVRAS-CHAVE: análise textual relevante para tradução; abordagem


textual; abordagem funcionalista; tradução como variedade; Linguística das Variedades.

3
PROJECT

Variety linguistics and translation studies – the handbook


"Varietätenlinguistik" and their possible connections

PEDRO AUGUSTO FERREIRA

ABSTRACT

This project aims at exploring the theoretical and practical relevance of linguistic
variation for translation studies and translation practice. It also aims at raising
awareness of its conceptualization within German-speaking academia and also at
discussing its translation possibilities into Portuguese, European variety.

It describes the translation process of the German handbook


“Varietätenlinguistik”, notably the translation-relevant source-text analysis according to
Christiane Nord's (1988) approach. The factor analysis allows for predicting a target text
that is an equifunctional, instrumental translation and that intends to transpose source-text
functions to the target recipient. It also approaches translations as language varieties and
suggests that the target text will exhibit growing standardization, conservatism and
reduced creativity when compared to the source text and other comparable original texts
within the target language. This places the prospective target text, as a variety, on a
hypothetical variational continuum between translationese and the translator's invisibility.

KEYWORDS: translation-relevant text analysis; text-based approach;


functionalist approach; translation as a variety; variety linguistics.

4
ÍNDICE

Introdução........................................................................................................ 1

I: Descrição do projecto “Varietätenlinguistik”................................................ 2

I. 1. Objectivos e contexto de aplicação ................................................. 3

I. 2. Meios e metodologia adoptados.......................................................4

II: A abordagem textual em Tradutologia......................................................... 9

II. 1. Enquadramento teórico e a contribuição de Nord........................... 9

III: Análise do texto de partida relevante para tradução................................. 17

III. 1. Considerações iniciais................................................................. 17

III. 2. Factores extratextuais.................................................................. 19

III. 3. Factores intratextuais.................................................................. 36

III. 4. A questão do efeito...................................................................... 58

IV: As traduções enquanto variedades........................................................... 61

Conclusões.................................................................................................... 69

Bibliografia ................................................................................................... 73

Anexos .......................................................................................................... 76

Anexo A: Glossário de siglas utilizadas ........................................................ 78

Anexo B: Glossário terminológico bilingue .................................................. 78

Anexo C: Apresentação bilingue da tradução................................................ 84

5
INTRODUÇÃO

A presente memória de projecto pretende dar conta de parte do processo


tradutório da publicação em língua alemã “Varietätenlinguistik” para português europeu,
particularmente da análise de texto relevante para tradução, aplicada ao TP, segundo a
proposta de Christiane Nord (1988). Esta, sendo de base funcionalista mas incluindo um
olhar renovado sobre esse mesmo TP e somando-lhe o princípio ético da lealdade,
pressupõe a análise da situação comunicativa do TP (interrelação entre factores
situacionais ou extratextuais e factores intratextuais), a qual é depois contrastada com o
skopos pretendido para a tradução.

Este trabalho escrito desenrola-se em quatro capítulos. O primeiro contém uma


descrição do projecto “Varietätenlinguistik”, seus objectivos e contexto de aplicação, bem
como os meios e metodologia adoptados. O segundo procura enquadrar teoricamente a
abordagem textual em Tradutologia, ressaltando a contribuição de Nord naquele campo.
O terceiro constitui o cerne deste trabalho, apresentando uma análise do texto de partida
relevante para tradução, com destaque para a função do texto e para a discussão da
questão do efeito. O quarto e último apresenta-se como segmento quiçá mais inovador, ao
discutir, com base em informações suscitadas pelo TP, o carácter das traduções como
variedades da língua e a problemática da variação em tradução, bem como as
consequências disso para o nosso próprio TC.

Em anexo, incluimos uma listagem com as siglas utilizadas; incluimos o glossário


inicial por nós elaborado com base essencialmente no capítulo 10 de “Einführung in die
portugiesische Sprachwissenschaft” (2.ª ed., 2008, da mesma editora e colecção que o
nosso TP) e a respectiva tradução em língua portuguesa “Introdução básica à Linguística
portuguesa” (Colibri, 2016); incluimos ainda os trechos da nossa tradução, em
apresentação bilingue, que julgamos relevantes.

1
I - Descrição do projecto “Varietätenlinguistik”

I.1. Contexto de aplicação e objectivos

A memória de projecto que ora se apresenta refere-se a uma empresa que se


encontra ainda em fase intermédia de concretização. Isto porque engloba não apenas a
“aplicação original dos conhecimentos e competências adquiridas”, como a “satisfação
de fins sociais, culturais e/ou económicos identificados”1. A primeira citação diz
respeito à tradução propriamente dita e em sentido restrito, ou, usando a distinção entre
diferentes estádio de elaboração que Koller (1979) leva a cabo, a uma tradução de
trabalho, uma posição intermédia entre o borrão de tradução e a versão final, em que
sobressai uma utilização mais intensiva dos meios auxiliares do tradutor e a não
infracção das normas gramaticais e lexicais da LC2, sendo estilisticamente aceitável
(Bernardo 2009: 188). A segunda corresponde ao conceito kolleriano de versão final, a
da tradução de longa vida, com um círculo de receptores ilimitado, utilização de todos
os meios auxiliares (eventualmente perguntas ao autor ou recurso a peritos, cotejo da
versão definitiva com o original, requisitos de qualidade) e adequação da forma
linguística à finalidade da tradução (Bernardo 2009: idem).

Quer isto dizer que esta memória se debruça sobre a análise de texto de partida
relevante para tradução da obra de 2014, em língua alemã, “Varietaetenlinguistik”, da
autoria de Carsten Sinner, director do IALT, Institut für Angewandte Linguistik und
Translatologie da Universidade de Leipzig. Essa análise foi o ponto de partida
metodológico para a elaboração de uma espécie de tradução de trabalho (cujos trechos
julgados relevantes serão apresentados em anexo). A Universidade de Leipzig é
reconhecidamente uma das mais antigas e prolíficas instituições no campo da
1

Segundo o Regulamento interno da componente não-lectiva, Trabalho de Projecto, in


https://intranet.fcsh.unl.pt/alunos-informacao-academica/mestrados/normas-
regulamentares/regulamento-interno-componente-nao-lectiva-trabalho-de-projecto, consultado a
15/06/2017.

2 LC – Língua de Chegada. Usaremos ao longo desta memória siglas comuns na disciplina, a indicar em
glossário final próprio.
2
Tradutologia, com uma contribuição inegável para a autonomia científica dos estudos
tradutológicos. Com efeito, foi naquela instituição lipsiana que o conceito de translação
foi avançado para melhor descrever o fenómeno tradutório, pois que lhe somaria à
função comunicativa e social um carácter teleológico que permitiria ao tradutor produzir
um texto com valor comunicativo equivalente. Os princípios fundamentais da escola
funcionalista, que se baseou em muitos dos pressupostos da Escola Tradutológica de
Leipzig e na qual se baseia a metodologia de análise textual que escolhemos para o
nosso projecto, remetem para essas três características fulcrais: acto comunicativo,
função social e objectivo da tradução (cf. Bernardo 2010: 52).

Convém acrescentar desde já que este projecto se concretizará plenamente


apenas com a edição, em língua portuguesa, variedade europeia, de uma tradução final
do mesmo texto, socorrendo-se obrigatoriamente da necessária adequação, em
consonância com as directrizes de uma editora interessada, e de um especialista em
Linguística, e, mais concretamente, em Variação Linguística, que possa efectuar a
revisão científica da obra. Enviamos já e-mails a diversas casas editoriais que
julgássemos potencialmente interessadas nessa mesma edição, ainda sem respostas
concludentes.

O projecto reveste-se, portanto, de uma intervenção num domínio pertinente


para a área de especialidade do nosso mestrado, visando ainda o “desenvolvimento de
conteúdos intensivos em conhecimento”3 sob a forma de um manual em Linguística das
Variedades. Além do objectivo editorial principal, foram elencados os seguintes
objectivos parcelares:

1 - explorar a relevância teórica e prática da variação linguística para a


Tradutologia e para a prática da tradução;

2 - dar a conhecer à comunidade académica e profissional lusófona aspectos


relacionados com a problematização conceptual em torno da variação linguística levada
a cabo no campo germanófono, bem como discutir a sua relação com o correspondente
sistema conceptual português e possibilidades de transposição, por via tradutória, para a
língua portuguesa;
3 Segundo o Regulamento interno da componente não-lectiva, Trabalho de Projecto, referido
anteriormente.
3
3 - aprofundamento dos conhecimentos e práticas de tradução de textos
científicos na área da Tradutologia e Linguística (textos LSP), graças também à
possibilidade de retorno, in loco, proporcionado pelo autor do manual a ser traduzido.

Em termos dos potenciais beneficiários ou públicos visados por este projecto de


tradução, julgamos que a função do texto, revelada pela análise textual inicial, a de
divulgação científica, se pode manter no TC. Assim, visará tanto os estudantes (dos três
ciclos de estudos) de universidades do espaço lusófono, matriculados em disciplinas
mais concretamente ligadas à Linguística das Variedades e cursando não só
especificamente Linguística, como também Tradução ou Ensino de Língua Estrangeira,
como também um público mais geral interessado por estas temáticas.

I.2. Meios e metodologia adoptados

A competência tradutória pode ser definida como “um feixe de várias


competências parcelares distintas: competência linguística, competência textual,
competência cultural, competência técnica, competência de investigação e competência
de transfer.” (Bernardo 2001:559). A propósito da competência textual, destacamos a
competência analítica, a capacidade de identificar os factores internos e externos do
texto que condicionarão as escolhas do tradutor ao longo do processo tradutório.

A actividade central neste projecto contemplou a análise relevante para tradução


do TP “Varietätenlinguistik”, focando-se em aspectos que pudessem ser fonte de
problemas de tradução com o intuito de preparar a tradução propriamente dita, após
análise de características sintácticas, semânticas e estilísticas, bem como da situação
comunicativa (cf. Williams 2002: 6). Intentou-se seguir as directrizes elaboradas por
Christiane Nord (1988) apreendidas no âmbito do presente curso de mestrado, e
beneficiando do saber transmitido pela orientadora deste projecto na FCSH, que,
julgamos, continuam a ser sólidas linhas orientadoras de qualquer prática tradutória,
além do mais provenientes do mesmo campo académico germânico.

Tendo em conta a natureza do TP, o trabalho exploratório inicial aflorou


igualmente o domínio da terminologia e da distinção entre língua comum e língua de
4
especialidade, com vista ao traçar de possíveis relações entre os dois sistemas
linguístico-conceptuais em diálogo. Esse trabalho levou à leitura de textos paralelos em
língua portuguesa, que são listados na bibliografia, muitos dos quais recomendados pelo
autor e citados pelo próprio no TP. Destacamos a “Introdução Básica à Linguística do
Português”, tradução de António C. Franco, edição Colibri de 2015 com base num TP
de 2008 editado precisamente pela Narr, a editora alemã do nosso TP 4. Foi com base
nestoutro manual, mais especificamente no referido capítulo e no seguinte, sobre
“Evolução do português fora de Portugal” que elaborámos um glossário exploratório
(ver Anexo 2). Este manual da Colibri acabou por constituir uma referência em termos
de normas e escolhas de tradução a seguir, não só em termos lexicais e conceptuais (a
começar pelo título que propomos para o nosso TC), como também de estruturação do
texto, de que é exemplo a opção pela não tradução dos exercícios apresentados no TP. A
leitura de um relatório de estágio decorrido na editora Colibri e que se detém
precisamente sobre esta obra garantiu-nos a credibilidade final do processo de edição da
mesma, mormente atentando na análise textual que é feita quanto aos marcadores de
intenção comunicativa, marcas enunciativas, marcas composicionais e marcas
organizacionais e marcas temáticas (Pereira 2015: 71-72).

Outro domínio que tocamos com o nosso trabalho tem que ver naturalmente com
a formação de tradutores, área sobre a qual o modelo de Christiane Nord também se
debruçou. A propósito da aplicação do seu modelo a este domínio, Nord diferencia
dificuldade de problema, avançando que as dificuldades não são qualidades inerentes a
um texto, mas sim subjectivas e dependentes da formação do tradutor e respectivas
condições de trabalho. Já no caso de um problema, tratar-se-á de uma tarefa de transfer
objectiva que qualquer tradutor terá de resolver, independentemente daquelas condições
referentes às dificuldades, durante um processo de tradução particular (cf. Nord 1987: 5-
8).

No âmbito da formação de tradutores, para a especificação do grau de


dificuldade de uma tarefa tradutória, Nord (1991) defende que se devem ter em conta os
seguintes parâmetros, correspondentes a diferentes fases do processo tradutório:

4 Esta publicação inclui um capítulo intitulado “Língua e Sociedade”, em que sobressai o sub-capítulo
“Linguística das Variedades”.
5
1 - o grau absoluto de dificuldade do TP, na fase da sua análise;

2 - o nível de conhecimento e competência do tradutor, incluindo conhecimento


factual, competência na LP, competência de transfer, competência na LC, em todas as
três fases;

3 - as instruções de tradução e os problemas pragmáticos, culturais e linguísticos


que envolvem;

4 – as condições técnicas e de trabalho, nas fases de análise do TP e de produção


do TC. E

Estes parâmetros originariam quatro categorias de dificuldades de tradução, as


quais se confirmaram igualmente para o nosso caso, tendo sido igualmente evidenciadas
pela análise ao TP:

a) dificuldades específicas ao texto – o grau de compreensibilidade do TP,


dependente de factores intratextuais e analisável através do cariz do conteúdo,
pressuposições, estruturas sintácticas, clareza da estruturação do texto, traços supra-
segmentais e elementos não-verbais;

b) dificuldades dependentes do tradutor – nível de conhecimento e competência


do tradutor, tendo em conta que mesmo o tradutor mais experiente encontra dificuldades
relacionadas com a inexistência de uma competência total, havendo sempre uma
décalage entre o domínio da LP e o da LC, a nativa;

c) dificuldades pragmáticas – relacionadas com a natureza da tarefa e a


orientação do TP para uma situação que não corresponde à de efectivação do TC,
podendo, contudo, ser reduzidas com as instruções de tradução (as quais, porém, no
nosso caso, foram sendo definidas ao longo do processo);

d) dificuldades técnicas – relacionadas com a diferença de conhecimentos entre a


temática e conteúdo do TP e o nível de conhecimento e competência do tradutor,
podendo ser minoradas com a consulta de textos paralelos, textos modelo, textos
comparativos e textos de referência, ou ainda materiais de apoios como glossários e
6
dicionários (foi o que tentámos fazer com a elaboração do glossário inicial e a consulta
à literatura de apoio).

Nord distingue ainda quatro categorias de problemas:

i. pragmáticos, decorrentes do contraste entre a situação de uso do TP e


aquela para a qual é produzido o TC;

ii. derivados de convenções, que surgem das diferenças de convenções


comportamentais entre CP e CC (convenções de tipo de texto, convenções de tradução,
etc.);

iii. linguísticos, relacionados com as diferenças estruturais entre LP e LC;

iv. próprios do texto, ligados às características do TP (cf. Nord 1991: 167).

Neste cômputo, refira-se, por um lado, que o trabalho teve assistência do


programa de pesquisa assistida da Bibliotheca Albertina da Universidade de Leipzig,
que serve a Faculdade de Filologia onde está albergado o instituto de onde emanou o
TP. Por outro, e fruto igualmente, mas não só, dos contactos tidos com o autor, a
selecção de excertos a traduzir procurou respeitar critérios como a relevância das
temáticas versadas, mormente no campo dos estudos tradutológicos, para as
comunidades de língua portuguesa, beneficiando do contributo e produção académica
particularmente notável do espaço de língua alemã.

De relevar será a ausência de manuais específicos equivalente ao TP na


bibliografia portuguesa, com excepção do sub-capítulo na publicação da editora Colibri
que mencionámos atrás, conforme nos confirmou uma pesquisa em várias bibliotecas
universitárias e sítios de editoras. Assim, para a consideração de textos paralelos,
baseámo-nos em artigos em língua portuguesa (tanto na variedade europeia, como
brasileira) sobre variação linguística, em que predomina a perspectiva dialectológica 5 e
se verifica já consciência para os campos de estudo da variação (diacronia, diatopia,
diastratia e diafasia), ainda que a visão meramente diacrónica e diatópica da variação
5 Obra fundamental é Introdução à Linguística Geral e Portuguesa (1996), da Caminho, mas entre
outros, consultámos mais demoradamente o Manual de Linguística Portuguesa (2016) da editora De
Gruyter.
7
seja o tom geral ou uma apresentação predominantemente descritiva da distribuição
sociolinguística de segmentos fonológicos (Rodrigues 2016: 98). Pelo autor do TP foi-
nos sugerido o volume VI, sobre o Português, no Lexikon der Romanistichen Linguistik
(1994), que, efectivamente, contém uma análise aprofundada de temáticas como a
sociolinguística, a variação dialectal, os tecnolectos, as gírias e, inclusive, uma
“linguística variacional”, como correspondente para “Varietätenlinguistik”. O facto de
se nos apresentar como uma obra por vezes causadora de demasiado estranhamento do
ponto de vista sintáctico, o que foi confirmado por Carsten Sinner como indício de
tradução, levou-nos a descurar esta obra como fonte principal de escolhas tradutórias.
Contudo, contém observações valiosíssimas, como o facto de a disciplina da Linguística
das Variedades ainda estar nos seus inícios em Portugal (Holtus 1994: 623), bem como
uma análise à distribuição de marcas diassistemáticas na célebre gramática de
Cunha/Sintra (1985).

8
II: A abordagem textual em Tradutologia

II.1. Enquadramento teórico e a contribuição de Christiane Nord

A valorização do texto traduzido como unidade linguística pode ser isolada


como abordagem própria, dada a especificidade que as suas contribuições indiciam em
termos de visão da tradução, sofrendo influência de disciplinas como a teoria da acção e
cognitiva, além de que, como avança Bernardo (2009), comporta uma forte presença de
tradutólogos de expressão alemã, com perspectivas sólidas e inovadoras. Destaque para
o papel fundador de Hartmann (1964) na descrição da pluralidade de tipos de texto e de
Schmidt (1976) na teoria de texto sob a influência da teoria dos actos de fala e teoria
sistémica. As noções textuais linguísticas mais produtivas para a Tradutologia incluem a
de espécies de texto, cuja análise fornece pistas importantes para o tradutor, as noções
de pragmática textual como a intenção do autor, força ilocucionária do texto e seus
pressupostos, o domínio da temática textual (e a sequência proposicional do tema e
conteúdo que o tradutor deve buscar, bem como coerência interna), e as de semântica e
sintaxe textual. Segundo Bernardo, os estudos de tradução de expressão inglesa (Snell-
Hornby, Pym), apesar de reiterarem a importância de uma visão global do texto, não
auxiliarão o tradutor a lidar com a textualidade com a mesma profundidade que as
abordagens germânicas (Bernardo 2009: 638).

Livro fundacional que enfatiza a vertente pragmática, comunicativa e accional


do texto é Einführung in die Textlinguistik, de Beaugrande e Dressler (1981), que faz
parte de um conjunto de obras que perspectivam o texto como unidade sígnica
empregue numa situação comunicativa, com uma determinada função, espelhando uma
intenção e visando um efeito, visão funcional do texto que virá a ser adoptada pela
perspectiva funcionalista (Bernardo 2009: 640). Nord refere que os autores designam o
texto como ocorrência comunicativa (Nord 1991: 13), um conceito de textualidade de
cariz accional, pois as noções de textualidade centradas no texto, tais como coerência,
coesão e os procedimentos a elas relacionados (recorrência, paralelismo, paráfrase, pro-
formas, anáfora, catáfora), e que se referem a características estruturais, apenas ganham

9
relevância por contraste com situação e função (Nord 1991: 12). Beaugrande e Dressler
tomaram em consideração o facto de haver situações em que mesmo não-textos têm de
ser aceites como textos, tendo adicionado às noções centrais atrás referidas outras
noções centradas no utilizador, como a intencionalidade e a aceitabilidade (atitudes do
falante e do ouvinte) e os factores sociais de situacionalidade e intertextualidade (Nord
1991: 13).

O estabelecimento de tipologias textuais relevantes para tradução remontarão a


Fedorov (1953), destacando-se igualmente Jumpelt (1961) e sua distinção de seis tipos
de texto, também designados por géneros de tradução. Neubert (1968) procede a uma
divisão consoante critérios pragmáticos de contextos de recepção e de potencial
relevância dos textos para os receptores: TP e TC com finalidades idênticas, dirigindo-
se aos leitores de ambas as culturas (texto científico); TP voltado para o contexto de
partida (imprensa, jurídico); texto oriundo de um determinado contexto mas dirigido a
todos os públicos (literário); textos produzidos para serem traduzidos com vista a um
contexto de chegada (Bernardo 2009: 640).

Bernardo considera, contudo, esta tipologia demasiado genérica, mais próxima


de um modelo ideal do que de traduções concretas, apesar de assentar em parâmetros
que o tradutor deve ponderar (distância entre contextos comunicativos e conhecimentos
prévios) (Bernardo 2009: 641). Também Nord, partindo, tal como Neubert, de critérios
pragmáticos da recepção do texto, parece querer ultrapassar este problema de equivaler
um tipo de tradução com um tipo de texto, pois defende que a recepção depende das
expectativas individuais determinadas pela situação e pelos factores sociais,
pressupostos e necessidades comunicativas do receptor, pelo que um texto (que
permanecerá provisório até ser recebido, até ver a situação comunicativa completada e a
sua função definida) pode ter tantas funções quanto receptores. Por isto, Nord sugere
que a solução passa por, primeiro, controlar a recepção do TP por meio de um modelo
de análise exaustivo cobrindo todas as características textuais relevantes e, segundo,
controlar a produção do TC por meio de rigorosas instruções de tradução que governem
a função (prospectiva) do TC (Nord 2009: 17).

Nord critica igualmente as tipologias que reclamam serem “relevantes para a


tradução” por as considerar demasiado genéricas. Entre elas, a de Reiß, que já em 1971
10
publicaria a primeira tipologia textual, depois modificada em 1976, e com base no
“organon” de Bühler sobre as funções da linguagem (Nord 1991: 20). Esta tipologia
engloba não só teorias dos tipos de textos, como também das espécies de texto,
distinguindo classe de texto (formas de textualização em sistemas semióticos diversos),
tipo de texto (resultante da função da linguagem predominante) e género de texto
(representando um conjunto de textos com estruturação fixa, assentes em convenções
históricas e socioculturais de uma comunidade linguística) (Bernardo 2009: 643). Reiß
propôs inicialmente um divisão triádica (informativo, estético, apelativo ou operativo),
acrescentando depois o audio-medial (ou subsidiário), categoria que abandonou em
obras posteriores.

O tipo de texto constituiria um dos fundamentos para, em articulação com a


função da tradução, determinar o método de tradução, como o indica em 1983 na obra
Texttyp und Übersetzungsmethode (Bernardo 2009: 643). Este critério, contudo, é
criticado como insuficiente, mesmo que a autora tenha admitido que uma função não
remeta obrigatoriamente para um tipo de texto e que muitas vezes estamos perante
formas mistas e híbridas. Apesar da inovação da focalização accional sobre a tradução,
que exige do leitor uma acção subsequente ao efeito que o texto tenha nele (Bernardo
2009: 647), e daí ter Reiß adoptado a designação de operativo mais tarde, Bernardo
considera tal pouco pertinente e os métodos de tradução respectivos pouco aplicáveis na
prática (Bernardo 2009: 651), avaliando a abordagem como afastada da materialidade
linguística do texto, da sua “textura física” (Bernardo 2009: 655). Acrescente-se que, ao
identificar o TP com um destes tipos de texto, o tradutor pode decidir sobre a hierarquia
de equivalência na produção do TC, implicando que esta tipologia só fará sentido se o
skopos da tradução requerer equivalência (Nord 1991: 20).

A tipologia avançada por Koller (1979) também se baseia na equivalência e no


critério da relevância tradutória, distinguindo o autor dois tipos de textos, ficcionais e
técnicos, incluindo neste último tipo ainda três categorias: textos de carácter geral no
âmbito da comunicação corrente; textos de carácter geral e técnico no âmbito da
comunicação técnica mas também entre não-peritos; textos técnicos com carácter
técnico, destinados à comunicação entre especialistas, que subdivide ainda mais
(Bernardo 2009: 656). Comportam os dois principais tipos diferenças qualitativas e em
termos das expectativas do leitor, sendo essas diferenças estabelecidas com base em
11
quatro critérios: sanções/consequências práticas (um pouco à semelhança dos riscos
referidos por Pym e a que faremos alusão no capítulo 4 desta memória), ficcionalidade,
esteticidade e significados intralinguísticos, socioculturais e intertextuais (Bernardo
2009: 657). Segundo Nord, o facto de classificar todos os textos de acordo com cinco
categorias, cada uma com o seu critério, impossibilita o estabelecimento de regras de
tradução sistemáticas (Nord 1991: 21).

Nord refere ainda a proposta de Matt et al. (1978), em que se classifica os textos
de acordo com o número de funções textuais relevantes, no que são seguidos por Thiel
(1980). Nela avança-se uma hierarquia de categorias: primeira, o nível do tipo de texto
com as funções relevantes; segunda, uma subcategoria especificada de acordo com a
relação social típica entre emissor e receptor; terceira, o tipo de texto. Nord, sublinha
aqui a polifuncionalidade dos textos e propõe a possibilidade, por meio de um modelo
global de análise textual que tem em conta factores intratextuais e extratextuais, de o
tradutor estabelecer a função cultural de um TP, podendo depois compará-lo com a
função cultural (prospectiva) do TC requerido pelo iniciador, identificando ou isolando
os elementos do TP que devem ser preservados ou adaptados na tradução (Nord 1991:
21).

Na visão de Bernardo, mesmo esta contribuição não permite uma visão textual
holística, sendo essa lacuna preenchida por Neubert/Shreve (1992), perspectiva que
tentou fornecer uma visão unificadora dentro da Tradutologia de expressão alemã e
maior interdisciplinaridade (Bernardo 2009: 662). Centrados na noção central de
textualidade, os autores vêem a tradução como operação entre textos, o TP, o TC e um
terceiro texto, uma “tradução virtual”. Englobando elementos da ciência da
comunicação e da cognição, analisam os diversos tipos de conhecimento envolvido no
processamento de texto por parte do tradutor, destacando o conhecimento comunicativo
(não foi coincidência terem-se socorrido da teoria dos actos de fala e dos princípios de
cooperação de Grice e máximas associadas) e o textual, que possibilita ao tradutor
conhecer o mundo textual da CC (Bernardo 2009: 664).

O texto neste modelo é visto como detendo uma superstrutura, que é preenchida
com o conceito de protótipo para se encontrar regularidades no processo de tradução.
Neubert/Shreve obliteram a vertente semântica em favor de uma mais cognitiva e
12
interaccional ao somar àquele conceito os de frames, scenarios, schemas, plans e
scripts, numa definição mais flexível. Os protótipos serão estruturas cognitivas que os
falantes usam na produção e recepção textuais, dando forma a textos em contextos
concretos e, na opinião dos autores, seriam vantajosos para a tradução pois integrariam
conteúdo informativo, configuração textual e função social do texto (Bernardo 2009:
666). Ao contrário dos autores de expressão inglesa, como Pym e Snell-Hornby, que
também salientam a importância da textualidade e do transfer mas continuam a preferir
a equivalência face ao protótipo, Neubert/Shreve agem empiricamente e especificam as
facetas da textualidade a partir da perspectiva do tradutor, que passaria por cinco fases:
planeamento, ideação, desenvolvimento, expressão e parsing. Já a textualidade neste
modelo seria enformada por sete parâmetros: intencionalidade, aceitabilidade,
situacionalidade, informatividade, coerência, coesão e intertextualidade (Bernardo 2009:
668).

Julgamos que o método de análise textual relevante para tradução proposto por
Nord, ainda que a abordagem de Neubert/Shreve se nos afigure mais actual e global,
será mais exequível num projecto como o que aqui descrevemos. À altura do início do
mesmo, baseámo-nos na nossa experiência lectiva, nomeadamente nas sessões da
disciplina de Tradução de Texto Científico do corrente Mestrado, em que pudemos
tomar contacto com a abordagem nordiana. Só mais tarde, com o projecto em estado
avançado, nos foi dado a conhecer a proposta de Neubert/Shreve. Num futuro próximo
afigurar-se-nos-ia pertinente poder submeter tal contribuição a uma nova experiência
tradutória.

Debruçando-se sobre o papel e a função da análise textual do TP, Nord (1991)


critica a ambiguidade do conceito de equivalência, afirmando que a discussão sobre a
fidelidade e liberdade na tradução não conduzem senão a impasses, pois equivalência
implica que vários requisitos têm de ser cumpridos em todos os níveis de texto: dizer-se
que TP e TC deverão ter a mesma função e dirigir-se ao mesmo receptor ilustra o
problema pragmático do conceito; dizer-se que o TC deve imitar o TP no seu estilo
remete para as características intratextuais; interpretar-se equivalência com identidade
de sentido remete para a interdependência entre factores intra e extratextuais (cf. Nord
1991: 22). Afirma a autora ainda que, segundo a noção de equivalência funcional, a
exigência de que a análise de textual do TP deva fornecer a única fundação legítima
13
para a determinação de equivalência é algo que tal análise textual do TP não pode
cumprir, já que a equivalência funcional entre TP e TC não é o skopos normal de uma
tradução e sim um caso excepcional em que o factor “alteração de funções” recebe o
valor zero (Nord 1991: 23).

Segundo o seu conceito de texto, cada texto ocupa o seu lugar numa
configuração de elementos particulares e interdependentes (factores), cuja constelação
determina a sua função, pelo que basta um elemento mudar para que a constelação dos
outros elementos na configuração mude também. E existe sempre pelo menos um
elemento que muda: o receptor, com as suas idiossincrasias textuais e culturais. A
adaptação do TP às normas da CC faz parte do quotidiano do tradutor, não havendo um
equivalente normal na LC para uma unidade linguística da CP (Nord 1991: 25).

Nord critica a posição funcionalista de que a tradução se baseie no conceito


dominante da relação entre situação e texto, estando o tradutor unilateralmente
vinculado à situação de destino. Defende, por seu lado, que não pode haver processo de
tradução sem TP e que traduzir é produzir um TC funcional mantendo uma relação com
um dado TP que é especificado de acordo com a função pretendida para o TC (skopos);
a tradução permite dar lugar a um acto comunicativo que não aconteceria sem ela
devido às barreiras linguísticas e culturais (Nord 1991: 28).

No seu livro Translating as a Purposeful Activity (1997), Nord aborda a atitude


crítica que rodeia a teoria funcionalista em geral e a Skopostheorie em concreto em dez
questões controversas, propondo depois a sua noção de função mais lealdade (cf. Nord
1997: 109-122):

 nem todas as acções têm uma intenção – que Vermeer contrapõe com a sua
definição de acção como contendo intencionalidade, donde, qualquer
comportamento sem intencionalidade não pode ser visto como acção. Dito
de outra forma, as acções não têm intenção própria, mas são vistas como
intencionais pelos participantes;

 nem todas as traduções têm uma finalidade – em todo o caso, dado que cada
decisão tradutória deve ser orientada por um objectivo e por uma intenção

14
desde que haja mais do que uma possibilidade à escolha, o tradutor nunca
traduz aleatoriamente, e sim consciente ou inconscientemente com base num
receptor, mesmo que o produtor do TP o ignore;

 as abordagens funcionalistas extravazam os limites da tradução em sentido


restrito – à crítica de Koller responde Nord com exemplos em que não se
espera da tradução equivalência, privilegiando as relações entre textos,
independentemente de status e estrutura textual, daí que um princípio central
na Skopostheorie seja a liberdade de escolha de skopos;

 a Skopostheorie não é uma teoria original – apesar de admitir que é óbvio


que cada acção tenha um propósito, Nord cita Vermeer e distingue a
estaticidade do skopos, que reside na CC, do dinamismo do propósito, que se
radica na CP;

 o funcionalismo não se baseia em dados empíricos – terá nascido em


instituições formadoras de tradutores, devendo-se o seu foco nas diferenças
entre TP e TC à sua forte orientação para a prática profissional;

 o funcionalismo produz peritos escravos do skopos – deve distinguir-se


skopos (definido pelo iniciador) e estratégia de tradução (como perito, o
tradutor tem aqui liberdade de decisão), além de que a Skopostheorie dá mais
liberdade do que a mera reprodução de características superficiais das teorias
tradicionais;

 o funcionalismo não respeita o original – o texto deve ser visto como


conceito sociológico, o produto de diferentes factores situacionais, pelo que
não existe nem TP nem TC sem a recepção correspondente que o complete;

 o funcionalismo é uma teoria da adaptação – Nord preconiza a tradução


documental e a instrumental, pelo que esta crítica não tem fundamento;

 o funcionalismo não “funciona” em tradução literária – pode ser um skopos


possível que a tradução mantenha a originalidade do original, mas não

15
bastará reproduzir o que está no texto porque cada cultura tem noções
diferentes de originalidade literária;

 o funcionalismo está impregnado de relativismo cultural – crítica de Pym


(1992), que Nord aceita, mas que refere ser uma reacção às tendências
universalistas anteriores e com implicações pedagógicas, ao mostrar aos
tradutores que os seus padrões de comportamento têm uma marca cultural
específica, devendo antes falar-se de anti-universalismo cultural.

Assim, a funcionalidade será o mais importante critério tradutório, mas não o


único e o tradutor estará comprometido bilateralmente com o TP e com a situação do
TC, sendo responsável tanto perante o emissor do TP com face ao receptor do TC,
responsabilidade que Nord designa por lealdade (Nord 1991: 29). Será um princípio
moral indispensável nas relações humanas comunicativas, por oposição a fidelidade,
uma relação técnica entre dois textos (Nord 1991: idem).

16
III: Análise do texto de partida relevante para tradução

III.1. Considerações iniciais

Segundo Christiane Nord (cf. 1989: 96), o processo tradutório é começado por
um iniciador que se dirige a um tradutor pois necessita de um texto numa LC, ou seja,
um TC, para um receptor da CC. O iniciador contrata o tradutor para produzir tal TC
com base num TP pré-existente na LP e usado por um determinado emissor para um
receptor específico na CP. Assim, um mesmo indivíduo pode assumir vários papéis
neste processo. Contrariamente à visão de inúmeros tradutólogos, que dividem o
processo tradutório em duas ou três etapas, geralmente designadas por fase de análise,
(possível) fase de transfer e fase de síntese, Nord preconiza um modelo circular.
Decorre daí que seja primordial a análise, no TP, dos factores relevantes para o
cumprimento de um dado skopos, e que ocorra antes do segundo passo, a análise do TC.
O principal enfoque é feito sobre os elementos textuais de particular relevância para a
formulação do TC e que estejam de acordo com esse skopos. Segue-se a fase de
transfer, em que características relevantes do TP são tratadas e colocados à disposição e
seleccionados os meios a usar no TC. A concepção, ou síntese, final termina o processo
(cf. Nord 1991:37). Nord refere que este processo se desenvolve circularmente, dado
que cada progresso se relaciona com a feitura de uma constante retrospectiva. Através
de cada novo dado assimilado no decorrer do processo de análise e de interpretação, os
conhecimentos anteriormente acumulados vão sendo confirmados ou corrigidos (cf.
Nord 1989:105). Um TC pode, na acepção nordiana, estabelecer dois tipos de relações
funcionais com um TP:

a) ser um documento de um acto comunicativo passado e próprio da CP – o TC


apresenta uma função metatextual; a tradução pode assumir a forma de interlinear
(propósito de reprodução do sistema da LP, processo focado nas estruturas lexicais e
sintácticas da LP), literal (reprodução da forma da LP, focada nas unidades lexicais do
TP), filológica (reproduz a forma e conteúdo do TP, foco nas unidades sintácticas do

17
TP) ou exoticizante (reproduz a forma, conteúdo e situação do TP e foca-se nas
unidades textuais do TP).

b) ser um instrumento num novo acto comunicativo da CC, para o qual o TP


representa uma espécie de modelo relativamente a determinadas características (Nord
1989: 102). Aqui, o TC pode apresentar a funções referencial, expressiva, apelativa,
fática e/ou subfunções. As formas de tradução possíveis são a equifuncional (com o
propósito de cumprir funções do TP nos RCs e foco nas unidades funcionais do TP), a
heterofuncional (busca funções similares às do TP e foca-se na transferência de funções
do TP) e homóloga (com o propósito de atingir efeito homólogo ao do TP e focada no
grau de originalidade do TP).

Tal significa que o TC pode informar o seu leitor sobre a forma como o emissor
do TP comunicou com o seu leitor ou pode dirigir-se directamente ao leitor de chegada
por meio de um novo acto comunicativo. Assim, uma tradução instrumental só é
possível, em princípio, quando a intenção comunicativa do autor/emissor do TP não vise
exclusivamente os RPs mas também possa incluir receptores da CC, de tal maneira que
a proposta de informação do TP se mantenha (cf. Nord 1991: 83).

A seguinte lista de perguntas baseia-se na Fórmula de Lasswell (1948), mais


tarde desenvolvida por Mentrup (1982) para “pragmatischen W-Kette” (cadeia
pragmática universal) e seguidamente interpretada de forma mais restrita e também
reinterpretada por Christiane Nord para a tradução (cf. Nord 1991:40). A cada pergunta
equivale o respectivo factor, entre parêntesis, a ter em conta na análise textual:

QUEM (emissor) transmite


A QUEM (Receptor)
PARA QUÊ (Intenção)
através de QUE MEIO (meio ou canal)
ONDE (local)
QUANDO (tempo)
POR QUE MOTIVO (pretexto)
um texto com QUE FUNÇÃO?

18
SOBRE QUÊ (tema)
o emissor diz O QUÊ (conteúdo)
(O QUE NÃO DIZ) (pressuposições)
por QUE ORDEM (estruturação)
com recurso a que ELEMENTOS NÃO-VERBAIS
por QUE PALAVRAS (léxico)
por QUE TIPO DE FRASES (sintaxe)
com QUE TOM (elementos supra-segmentais)
com QUE EFEITO? (Nord 1989:106)

II.2. Os factores extratextuais

A primeira linha de questões direcciona-se à situação comunicativa, aos


chamados factores extratextuais. Designam estes os factores da situação concreta em
que o texto se efectiva como instrumento de comunicação. O segundo grupo, por seu
lado, engloba os factores intratextuais, cujas questões se relacionam com o próprio texto
e suas características formais e de conteúdo. O último parâmetro de análise, contudo,
relativa aos efeitos sobre os receptores, representa um factor global, pois o efeito de um
texto advém da interacção entre factores extratextuais e intratextuais (Nord 1989: 107).
Realce para o facto de haver uma estreita relação entre os vários factores, sendo
possível, em larga medida, inferir ou formular expectativas sobre uns a partir dos outros.
Outra nota para o facto de esta análise poder aplicar-se tanto ao TP como ao TC, como
Nord o exemplifica (1991) com base em três exemplos de textos.

Poder-se-ia afirmar que quanto mais se apurar sobre a situação do texto menores
se revelarão as dificuldades de compreensão intratextuais (Nord 1991:175). Por
princípio, os factores extratextuais pragmáticos são abordados primeiramente porque
influem primordialmente sobre as expectativas do receptor, permitindo-lhe mais

19
facilmente tolerar ou até ignorar eventuais desvios intratextuais a determinadas normas
linguísticas (Nord 1991:197).

Assim, iremos debruçar-nos inicialmente sobre aqueles factores situacionais e só


depois sobre os intratextuais em detalhe. As categorias fundamentais são as de espaço e
tempo, sendo que a categoria de tempo pertence igualmente à identidade histórica de um
certo mundo. A primeira questão de base envolve, por conseguinte, essas dimensões
espácio-temporais da situação. Uma vez que essa situação se encontra obrigatoriamente
marcada culturalmente, a segunda questão de base visa as características culturais
específicas. Por fim, a terceira questão de base relaciona-se com a interacção entre
situação e função comunicativa do texto (Nord 1991:47). A análise factorial constitui
um processo recursivo, no qual a formulação, confirmação e correcção de expectativas
são uma constante.

Emissor

O emissor é, no geral, a pessoa ou instituição que se dirige a alguém por meio do


texto ou que deseja despertar um efeito no receptor6. Emissor e redactor do texto não
têm obrigatoriamente que coincidir, depreendendo-se isso muitas vezes do ambiente
textual. No caso de o emissor ou alguém próximo de si não poderem ser interpelados, o
tal ambiente textual (referências ou notas, por exemplo), bem como os factores meio,
local, tempo, pretexto e função textual costumam ser fonte de dados e pistas importantes
(Nord 1991:49 e 53).

Se seguirmos, na análise do nosso TP, a checklist de questões sugerida por Nord


para este factor, começaremos por indagar quem é o emissor. Verificando a publicação,
o Professor Carsten Sinner é claramente indicado desde logo como autor na capa e
página seguinte, ainda que não haja referência ao mesmo na contra-capa nem presença

6 “Iniciador, comitente ou cliente – pessoa, grupo ou instituição que inicia o processo de tradução,
decide sobre o seu desenvolvimento e identifica os fins do encargo tradutório. O iniciador deverá ter
conhecimento do conteúdo, fins e utilização do TP e do TC, bem como o poder de influenciar a
própria produção do TC, exigindo um dado formato de texto ou uma terminologia específica. O papel
de iniciador pode ser assumido por um dos agentes na interação translacional: autor do TP, recetor
imediato do TC ou comitente do encargo tradutório” (Viseu 2015: 5).
20
de sinopse. A mera leitura do prefácio, confirmando os primeiros indícios, permite-nos
inferir que emissor e produtor textual coincidem, pelo uso da primeira pessoa e da
profusão de agradecimentos a entidades e personalidades que assistiram o autor na
feitura da obra. Em termos de informação sobre este emissor, a consulta ao sítio pessoal
do mesmo revela-nos um académico relativamente jovem, nascido em 1971 no Hesse,
com escolaridade feita em Marburg e Berlim, estudos completados na Alemanha e
outros países latinos nos domínios da interpretação e tradução de espanhol e português,
do catalão, em ciências sociais e no alemão como língua estrangeira. É igualmente
docente em institutos de Romanística de várias universidades germânicas desde 1997 e,
desde há uns anos, director do célebre Instituto de Linguística Aplicada e Translatologia
da Universidade de Leipzig. Intratextualmente, a página 2 da publicação destaca este
facto. Caso estas evidências não fossem suficientes para a geração de expectativas sobre
a sua relação com o tema, a consulta à extensa lista de publicações (a obra em análise é
a mais recente do autor), artigos, apresentações e teses orientadas pelo autor elucidariam
desde logo a íntima relação do autor com a temática, onde predominam obras sobre
Linguística Românica, leitorados em vários países latinófonos e o destaque cimeiro
dado à Linguística das Variedades entre os interesses de investigação.

Estes elementos enformarão alguma informação que se possa pressupor e que


faça parte do conhecimento prévio dos receptores, ou seja, sendo o autor e sua
personalidade conhecidos do meio académico alemão, os seus leitores, que em parte
deste também farão parte (especialistas, alunos), esperarão dele um rigor aliado a
clareza explicativa.

O tom informal com que o autor se descreve no mesmo sítio Web, coadjuvado
por um artigo crítico relativamente ao último acordo ortográfico da língua alemã,
confirmam as expectactivas de um texto académico mas aqui e acolá pontuado por
comentários de boa disposição, indiciados pela postura afável que o prefácio da obra
evidencia.

A possibilidade de contacto directo com o autor e de solicitação de mais detalhes


confirmou estas expectativas. Ainda que não tenhamos eventualmente colocado todas as
questões mais pertinentes de compreensão deste e de outros factores, como o pretexto

21
da obra7, os diálogos tidos com o Professor Sinner revelaram uma pessoa que, apesar de
extremamente ocupada, se mostrava extremamente disponível na hora de atendimento e
procurava limar arestas de compreensão e contribuir para uma atmosfera afável.

As pistas a inferir sobre o emissor a partir de outros factores situacionais como o


tempo (2014), o local (Tübingen), o meio (edição Narr Verlag “Studienbücher” -
manuais de estudo - em papel e electrónica), a função do texto (introdução ao tema,
manual universitário, divulgalção científica) e pretexto (não é claro no prefácio,
depreendendo-se que resultou de muitas conversas com inúmeros especialistas e de
artigos anteriores do autor, conforme consulta ao acervo da biblioteca da universidade; a
capa e 2.ª página incluem o subtítulo “Eine Einführung” - uma introdução - e a contra-
capa adiciona o adjectivo “umfassende” - abrangente, completa -) apenas confirmam as
suspeitas levantadas pela análise inicial.

Estes dados permitem-nos (e permitiram no início da tradução) apontar para uma


circunscrição dos receptores ao meio académico: professores universitários de
disciplinas da Linguística, especialistas em Linguística das Variedades, alunos de
disciplinas abordando a questão das variedades linguísticas, nomeadamente de cursos de
Linguística Aplicada ou Tradução, leitores interessados no tema do público em geral.
Permitem-nos também esperar um intratexto típico dos conteúdos LSP altamente
formatados, estruturas tema-rema em consonância, sintaxe identificável com os textos
técnico-científicos académicos germânicos ainda que simultaneamente aligeirado com
exemplos da cultura popular (como o próprio autor dá a entender no prefácio).

Intenção do emissor

O factor da intenção do emissor questiona sobre que reacção pretende o emissor


causar no receptor com o texto em análise. Os diferentes níveis de intenção
correspondem às funções da comunicação que enformam o modelo de Nord. Incluem
informar sobre uma temática (intenção referencial), partilhar as suas ideias e atitudes
sobre as coisas (intenção expressiva), persuadir o receptor a adoptar uma opinião ou

7 O motivo pormenorizado de edição na Narr Verlag, dados sobre tiragens ou até o processo de
compilação dos capítulos (que aguardam resposta por email).
22
acção (intenção operativa) e manter o contacto (intenção fáctica). O nível zero de
intenção corresponderia ao caso em que emissor e receptor se identificassem.

Pressupõe-se que o emissor não é imbuído de apenas uma intenção mas que se
deve admitir a emergência de várias funções combinadas e de diferentes pesos, mesmo
comparando as intenções do TP e as do TC (Nord 1991:55 e seg.).

A intenção reveste-se de particular importância tendo em conta também o


princípio da lealdade8. o tradutor, segundo Nord, mesmo em caso de alteração da função
do texto, não deve agir contrariamente à intenção do emissor (cf. Nord 1991:55)

No que toca à checklist de Nord para este factor, primeiro há que determinar se
existem afirmações extratextuais e intratextuais do emissor que apontem para as suas
intenções com o texto. No prefácio, Carsten Sinner agradece aos numerosos agentes que
o ajudaram a perceber as temáticas de outros ângulos, que o assistiram na discussão
sobre variedades e tradução e as leituras críticas que recebeu antes da publicação da
obra. Pensamos que estes três vectores denunciam uma intenção simultaneamente
pluridisciplinar, ainda que partindo do meio da Tradutologia e Linguística Aplicada,
intenção essa também crítica de apresentação da temática, centrando-se essa intenção no
apelo ao receptor. Estas mesmas preocupações revelou o autor nos encontros
preparatórios que com ele tivemos, em que sublinhou, para o TC, a necessidade de se
destrinçar os vários termos-charneira da obra para uma tradução leal, assim como a
resolução de questões de tradução como a aplicabilidade dos exemplos ao leitor
português, o que evidencia um cuidado com o leitor tanto do TC, como do TP. Os
fenómenos paralinguísticos intratextuais somam-se a este “caldo” intencional, com
dezenas de pontos de exclamação (expressando tanto entusiasmo como espanto e
indignação) e momentos humorísticos (revelando-se contador de pequenas histórias).

As intenções associadas convencionalmente ao tipo de texto a que mais


aproximadamente se pode atribuir o nosso TC incluem a informativa e a apelativa, mas
a própria Christiane Nord afirma que, com Thiel, se abandonou a ideia de textos ligados
inequivocamente a um tipo textual (Nord 1991: 21), cabendo mais ao tradutor perceber
como funciona culturalmente um TP e um TC. Tal parece confirmar-se aqui com o
8 O tradutor, segundo Nord, mesmo em caso de alteração da função do texto, não deve agir
contrariamente à intenção do emissor (cf. Nord 1991:55)
23
avanço da intenção expressiva e mesmo fática (demonstrada pela pista que nos dá a
inserção de numerosas interpelações ao leitor e à conexão sintáctica sistemática entre o
final de um capítulo e o início do seguinte) em termos de “carga” intencional9.

Entre as pistas sobre a intenção a inferir de outros factores situacionais, importa


fazer referência ao papel comunicativo do emissor, professor prestigiado que quererá
decerto transmistir com eficácia o seu conhecimento, que se dirige a receptores
estudantes ou colegas de profissão, aspecto em que o valor prestígio não deverá ser
descartado. Referência também para o meio, ou a inserção numa colecção académica de
manuais por parte de uma editora com provas dadas no mercado e que será sinónimo de
credibilidade para o leitor, e o pretexto, a que Sinner alude no final do prefácio (convite
de Juergen Freudl e financiamento de Kathrin Heyng e Karin Burger), que reforça as
intenções não só informativas, como também operativas (recurso a agentes de créditos
firmados).

Receptor

O texto de chegada orienta-se essencialmente para receptores diferentes dos do


texto de partida, os quais se diferenciam primeiramente pela pertença a culturas e
comunidades linguísticas distintas. Nessa linha, têm de ser convertidos precisamente
aqueles elementos que são determinados pelas especificidades do TP referentes ao
destinatário e aqueles que o tradutor consegue isolar na sua análise textual (Nord
1991:59). O tradutor elicita os elementos textuais que acha determinantes segundo a sua
orientação pelo receptor do TC, que se encontra numa situação comunicativa divergente
da do RP. Os conhecimentos prévios, ou background comunicativo, do receptor são de
crucial importância para o tradutor, ou seja, o que este consegue pressupor no receptor
não depende apenas das suas características (idade, sexo, habilitações, origem
geográfica, etc) mas também da actualidade do tema. Tal como os dados do emissor, os
dados do receptor podem ser inferidos tanto das características intratextuais, como do

9 São exemplos disto, na introdução, enunciados como “wie dies manche LeserInnen vielleicht erwartet
hätten” (pág. 7) ou “Die LeserInnen sollen vielmehr in die Lage versetzt werden, sich ein eigenes
Urteil zu bilden” (pág. 7).
24
corpo textual, como ainda das informações sobre o emissor e factores externos como a
intenção, o meio, o local, o tempo, o pretexto e a função (Nord 1991:60pp).

Relativamente à informação sobre o receptor que se pode obter do corpo textual


da nossa obra, se atentarmos na menção a “Einführung” desde a primeira página, a
“Lehrbuch” (manual escolar) no prefácio, à indicação de que existe uma página Web
onde as soluções dos exercícios se encontram, bem como a referência directa a
“Studierende” no mesmo prefácio, chegamos à conclusão, agora mais afunilada, de que
esta obra se dirige essencialmente a estudantes do ensino superior alemão actuais,
portanto destinatários jovens (ao que não será estranho o tom por vezes informal) mas
com alto grau de literacia. A recomendação, no final do prefácio, de que não será
necessário completar os exercícios para a preparação dos capítulos desvenda claramente
a quem se dirige em primeiro lugar o Professor Sinner, ainda que, como refere Nord,
pode sempre haver segundos receptores e receptores ocasionais (Nord 1991: 52).

Em termos do que se pode saber sobre o receptor com base na informação sobre
emissor e sua intenção, a posição de Sinner como decano na Universidade de Leipzig e
director do IALT, e respectiva intenção de “fazer escola”, transmitir conhecimentos
sólidos inseridos no contexto de uma instituição com um percurso científico autónomo e
criadora de linhas de investigação próprias, mas também persuadir alunos de outras
instituições das suas posições sobre a Linguística de Variedades, permitirá inferir
receptores tanto pertencentes à mesma escola como provenientes de outras
universidades noutras regiões da Alemanha.

No que toca às pistas passíveis de obter sobre as expectativas do destinatário do


TP e com base noutros factores situacionais, o meio de publicação do texto seleccionado
(editora Narr, série Studienbücher) corrobora o público-alvo como sendo estudantes
universitários especializados na temática, já que esta editora representa a fina nata em
termos de oferta didáctica de especialidade, actualidade, credibilidade e presença nas
bibliotecas e faculdades alemãs. A edição de 2014 e o local Tübingen (meio
universitário) confirmam essa actualidade, suscitando expectativas da presença da
abordagem de temáticas em voga na sociedade alemã e na comunidade científica como
as questões de género, bem como do uso de uma linguagem fluida e moderna.

25
Não dispomos de informação suficiente sobre as reacções do receptor do TP que
possam influenciar as estratégias de tradução, a qual exigiria investigação mais
demorada eventualmente em fóruns alemães online e porque existe apenas uma
recensão crítica da obra (por Sebastian Greußlich, 2016). Contudo, apraz-nos registar
aqui um pequeno facto: nos vários meses de estadia em Leipzig, apenas por uma vez
conseguimos requisitar um exemplar da obra numa das várias bibliotecas da
universidade, sendo que cada uma dispõe de vários exemplares para requisição, o que
atesta, pelo menos para a segunda cidade da Saxónia, o sucesso do livro em termos de
recepção pela comunidade estudantil. Se considerarmos o tradutor como receptor do TP,
e socorrendo-nos igualmente das conversas com o autor, denota-se uma preocupação
forte de adequação funcional e pragmática dos tópicos ao leitor, patente na sugestão
feita pelo mesmo de questões a reflectir antes de se iniciar a tradução, as quais se
centravam principalmente na compreensibilidade de um possível leitor português.

Mais conclusões se podem aventar destas pistas obtidas para o receptor em


termos de características intratextuais a esperar: o visar-se um público universitário trará
decerto uma estruturação do texto em capítulos temáticos claros, com estruturação
interna coerente, e elementos textuais não verbais relacionados com o didactismo que o
receptor exige, mormente inclusão de gráficos, figuras, exemplos e exercícios. O nível
académico do público-alvo provocará uma sintaxe complexa e léxico rigoroso. A origem
geográfica dos leitores alemães constituirá pressuposto pragmático para exemplos e
referências a dialectos regionais do espaço germanófono.

Meio/canal

Nord entende meio10 como o suporte material através do qual o texto chega ao
receptor, o qual determina as expectativas do receptor sobre a função do texto (Bernardo
2009: 659). Para o tradutor, no que toca ao meio, é relevante a perceptibilidade, as
possibilidades de armazenamento de informação e os pressupostos comunicativos que
aquele encerra.

10 Canal é mais usado em teoria da comunicação para designar ondas sonoras ou impressão em papel
(Nord 1991: 56).
26
Uma distinção primordial será entre meio oral e meio escrito, bem como
correspondente distinção no que toca à forma de apresentação da informação (nível de
explicitude, argumentação, tipos de frases, coesão, elementos não-verbais). Além disso,
o tipo de meio fornece pistas sobre a intenção do emissor e o pretexto da comunicação,
bem como sobre o tempo e local da produção textual, dado que a produção de um meio
está sujeita à evolução histórica e é marcada culturalmente. (Nord 1991:64pp). Dado
que a escolha do meio é assaz determinada por convenções (para determinadas funções
textuais existem para cada cultura suportes preferidos), é importante para o tradutor
elicitar características típicas do meio (conteúdo/forma) e classificá-las como
específicas ou universais (Nord 1991:68).

A obra de Carsten Sinner em análise surge em edição de papel e edição


electrónica, o que lhe permite grande difusão, apesar de não termos encontrado dados
sobre tiragens, nem termos detectado segundas edições. Surge igualmente inserida na
colecção Studienbücher da editora NARR Verlag, sendo coadjuvada não só pelo sítio da
editora na sua distribuição, como do já referido sítio para consulta das soluções dos
exercícios propostos. Na mesma colecção são assuntos principais os estudos anglísticos,
germanísticos e romanísticos, assim como a didáctica do ensino de alemão como língua
estrangeira.

Como tal, o design da publicação segue as orientações da colecção, apresentando


na contra-capa um resumo relativamente neutro dos conteúdos, ainda que contendo
alguns adjectivos enaltecedores (“zahlreiche Daten” - inúmeros dados – e “vielfältige
Arbeitsaufgaben” - exercícios diversificados) com função operativa.

Em termos de outros factores situacionais que possam fornecer pistas sobre o


meio/canal, o emissor e sua intenção apontam para uma clareza e credibilidades só
possíveis com um meio como este manual, editado por uma casa da especialidade. O
pretexto é referido no prefácio, desencadeado por Jürgen Freudl, funcionário da NARR
Verlag11. Na mesma linha, Kathrin Heyng e Karin Burger são consultoras da mesma
editora, sedeadas em Leipzig, cidade de reconhecida actividade livreira, onde se realiza

11 Segundo pesquisa nossa, é referido abundantemente e de forma elogiosa em inúmeros prefácios e


dedicatórias de livros da especialidade, tanto em língua alemã, como noutras línguas (uma consulta
em google.de com os termos “Jürgen Freudl” e “NARR” forneceu 448 mil resultados, sendo as
primeiras páginas de resultados exclusivamente edições do tipo referido.
27
a segunda maior feira do sector no país e reforçando a ideia de que haveria
mercado/público-alvo para um manual desta craveira, no caso específico, e pensando na
função do texto, quiça “o” manual universitário na área.

Estes dados e pistas obtidos sobre o meio permitem-nos inferir um desejo de


rigor e clareza de apresentação da informação junto dos receptores. Permite-nos também
inferir, intratextualmente, um nível de explicitude elevado, argumentação coerentemente
desenvolvida, ainda que num nível intermédio entre a discussão teórica e a mera
descrição conceptual, tipos de frases tendencialmente longas, coesão evidenciada por
elementos como índice remissivo e referências, ao longo do texto, para outros locais no
corpo do texto, e, finalmente, e novamente, presença de elementos não-verbais como
gráficos, tabelas, figuras e exercícios.

Local

Nord refere que esta dimensão é abordada apenas nas publicações centradas na
fórmula da nova retórica, ainda que em tradução a questão da cultura ancorada
geograficamente e sua influência nos TPs seja sempre uma preocupação, e que, ao
contrário de outros autores, prefere abordar este factor separadamente (Nord 1991: 60),
em consonância com o seu quadro de análise e categorias básicas.

Referir-se-á esta dimensão não só ao local de emissão e produção, como também


ao de recepção do texto. A determinação da pragmática do local é de crucial importância
principalmente nos conteúdos redigidos numa língua de partida que apresenta
variedades geográficas (ou diatópicas), sendo que o local de produção pode indiciar a
variedade usada no TP e, assim, determinar a variedade utilizada pelo tradutor.

Na dimensão espacial, são de relevância não apenas os elementos linguísticos,


como também as condições culturais e políticas (exemplo de textos redigidos sob
censura e elementos subliminares presentes), indiciando igualmente a filiação cultural
de emissor e receptores. As informações sobre o emissor e os receptores permitem fazer
inferências sobre a pragmática espacial e o meio, bem como elicitar dados sobre o
pretexto (Nord 1991:71).
28
Ao analisarmos o local de produção e transmissão do texto em apreço,
verificamos que a resposta não é inequívoca. A informação sobre a dimensão espacial
no ambiente textual aponta-nos para Leipzig, local onde Carsten Sinner lecciona,
segundo a já referida nota na segunda página, e Tuebingen, local de edição. Também se
pode adicionar aqui o espaço mais alargado de inserção cultural a que a menção
obrigatória à Biblioteca Nacional Alemã faz referência (assim como os regulamentos
editorais respeitantes aos direitos de autor, provenientes da jurisprudência germânica),
assim como, se mais quisermos especular, o espaço de pertença cultural europeu
indiciado pela referência “printed in the EU”, evidenciando a filiação numa comunidade
de conhecimento transnacional.

Mais complexa se torna a noção de espaço se atentarmos no prefácio e seus


agradecimentos, em que o autor revela terem os textos também resultado de estadias
académicas suas em locais tão diversos como Telavive (Israel), Concepción (Chile) e
Brasília. Era até agora claro que esta dimensão englobaria o espaço universitário,
tornando-se agora ainda mais claro, porém, que se estende a mais universidades que não
apenas as alemãs (estadias em outras universidades são referidas no mesmo prefácio:
Berlim, Leipzig).

Os locais de produção deste texto pressupõem uma recepção pretendida que


extravasa as fronteiras do espaço germanófono, mesmo que esse espaço seja
directamente referido na primeira linha da introdução, convocando conhecimentos
prévios relacionados com as fronteiras administrativas dos países que o compõem. E
mesmo que, por exemplo, o autor se socorra na mesma introdução de idiomas como
“alter Wein in neuen Schlaeuchen” (vinho novo em odres velhos). Com efeito, as pistas
sobre a dimensão espaço inferidas de outros factores situacionais parecem confirmar
este “piscar de olhos” a públicos externos e um espaço, digamos, dual, ora germânico,
ora internacional. O emissor possui um percurso no estrangeiro, relacionado com a
didáctica de segunda língua, e os receptores universitários, mesmo se considerarmos
aqueles matriculados em universidades alemãs, serão marcados pelo multiculturalismo
próprio encorajado pela sociedade alemã, bem como pelas altas percentagens de
estudantes estrangeiros nos cursos aí ministrados. O factor meio (Tübingen + Leipzig)
representa igualmente um salto nas antigas fronteiras político-culturais alemãs, não
sendo de menosprezar o carácter online (logo, global) da edição.
29
As características intratextuais, se se atender às conclusões extraídas para o
factor espaço, apontarão para a adopção da variedade do Hochdeutsch (alemão norma
padrão), ainda que pululada decerto por exemplos noutras variedades dentro das
fronteiras germanófonas. Além disso, o próprio autor refere explicitamente na
introdução que inclui exemplos consultáveis por todos os utilizadores das línguas
românicas.

Tempo

Segundo Nord, a dimensão temporal da produção de um texto deve ser analisada


também separadamente e não inserida nas pressuposições situacionais ou situação
interna de um texto, como outros autores optaram por fazer (Nord 1991: 63), sendo um
pré-sinal do estado de desenvolvimento histórico da língua adoptada, dado que cada
idioma, no seu uso e nas suas normas, se encontra sujeito a mudança socio-cultural
constante. O tempo afecta também os tipos de texto, permitindo igualmente perceber o
background comunicativo de emissor e receptor. Em tradução, esta dimensão refere-se
não apenas à produção e recepção do TP, como também às do TC, a ambas as situações
comunicativas (cf. Nord 1991:72pp), que vivem dos respectivos “contextos” temporais.
A temporalidade interfere, assim, nas dimensões emissor, pressuposições situacionais,
intenção, receptor, pretexto (topicalidade) e nas características intratextuais (variedades
linguísticas históricas, elementos da deixis temporal) (idem).

A data de publicação (2014) é uma pista da altura de elaboração da obra de


Carsten Sinner, até porque, segundo Nord, tais datas oferecem um terminus ante quem
(Nord 1991: 66). A transmissão será, portanto, posterior, eventualmente através de
numerosas aulas em universidades, cada qual com o seu próprio tempo de exposição. Já
o tempo da escrita nos parece ter sido bastante alargado, podendo remontar mesmo aos
primeiros artigos do autor sobre a temática. O segundo capítulo da obra socorre-se, por
exemplo, de conteúdos presentes já em 1999 na produção articular de Sinner sobre
termos técnicos no português do século XVIII. O prefácio indicia isso mesmo, ao referir
as conversas longas e estadias profícuas que levaram à compilação de materiais. A
bibliografia em nome próprio elencada no final do volume remonta a 2001.

30
Não obstante, tal distância não será suficiente para gerar problemas de
desfasamento temporal. O ambiente textual fornece numerosos exemplos de tipos de
linguagem actuais (calão, gírias, variedades regionais, linguagem internet, etc) e
inclusive de artigos tão recentes quanto pelo menos 2013. Se pensarmos em termos das
informações que se pressuponha que façam parte dos conhecimentos prévios do
receptor, destacamos precisamente a actualidade e credibilidade dos dados apresentados,
a variedade histórica actual do alemão norma padrão e também, cremos nós, uma certa
maturidade e mestria na conjugação de efeitos argumentativo-estilísticos por parte de
um autor experiente no tema e com um percurso académico longo, ou seja, um tempo de
maturação, por assim, dizer, elevado.

Relacionam-se igualmente estas afirmações com as pistas sobre a dimensão


tempo que outros factores situacionais permitem inferir. Assim, além do emissor
anteriormente referido, o meio (colecção Studienbücher da Narr, física e electrónica)
será marcado pela actualidade da casa editorial e da vivacidade da colecção em que se
insere a obra, com uma produção praticamente mensal de novos títulos. O pretexto,
convite da editora, indiciará a actualidade do tema na academia alemã e uma vontade de
partilhar essa discussão com outras comunidades linguísticas, daí a escolha de um autor
como Sinner. A função informativa e simultaneamente operativa de fazer prevalecer
uma visão sobre a matéria das variedades, em que novas questões são admitidas, como
as questões de género ou a Linguística de Migrações, confirmam a dimensão de tempo
imbuída de actualidade forte.

Como referimos atrás, não parece haver problemas fundamentais de


desfasamento temporal entre a situação do TP e a possível situação do TC, por haver
pouco tempo transcorrido entre a data de publicação e a da nossa tradução (bem como
previsível publicação em Portugal), ainda que o estado de maturidade científica em
Portugal sobre a temática seja menos avançado. A possível publicação da nossa
tradução, em virtude da maior maturação da academia alemã face ao tema das
variedades, poderá, quiçá, contribuir para uma sincronia situacional entre TP e TC.

Pretexto da comunicação

31
Este factor não foi abordado directamente pelos autores tidos em conta por Nord,
apesar de Reiß referir a “situação histórica”, se bem que as questões analíticas das
abordagens de análise textual com orientação comunicacional incluam a indagação
“porquê”, que Nord entende como o motivo para uma comunicação (Nord 1991: 67). A
dimensão do pretexto aplicar-se-á não apenas à razão/motivo para a produção textual
(relativa ao emissor) como também à ocasião para a recepção do texto (relativa aos
receptores).

Certos pretextos ou tipos de pretextos estão ligados convencionalmente a


determinados tipos de textos e meios preferidos. Daí que o conhecimento do motivo
possa fazer desvendar pormenores de outros factores situacionais como o emissor e a
intenção12, o receptor, o tempo13 e o local, e ainda a função do texto, assim como
características intratextuais (geralmente conteúdo, vocabulário e estrutura sintáctica,
traços supra-segmentais e elementos não-verbais, todos guiando as expectativas do
receptor) (cf. Nord 1991: 68).

Ao tradutor cabe a tarefa crucial de contrastar o motivo do TP com o do TC e


perceber o impacto disto nas decisões de transfer. Posteriormente, o motivo do TC pode
ser inferido do que se sabe sobre essa situação de transfer14.

Por que motivo elaborou Carsten Sinner esta obra? Pensamos que terá sido para
fixar produção académica sua num volume e adicionar-lhe elementos novos,
considerando a vertente de motivação do emissor. Em termos de ocasião, o pretexto
prender-se-á com o convite da editora Narr, na pessoa de Freudl e com consultoria
prestada. O mercado existente e o preenchimento de um vazio na colecção dos
Studienbücher completará o quadro de motivação (se se pesquisar por “Varietät” no sítio
da mesma, o único manual que surge exclusivamente dedicado à temática é
precisamente o de Sinner).

12 Já no sentido contrário (inferir destes sobre o motivo) apenas se pode retirar conclusões indirectas.

13 Que não se deve confundir com o pretexto, pois o primeiro insere-se na situação comunicativa e o
pretexto relaciona a mesma situação comunicativa e os participantes com um evento exterior/anterior
à situação.

14 Iniciador mais contrato de tradução (cf. Nord 1991:76pp).


32
A informação sobre o pretexto discernível no texto é ainda mais reveladora. No
prefácio, Sinner refere que Freudl procurava alguém para editar o livro e que se lembrou
do Professor de Leipzig. Temos aqui o pretexto ocasional. No prefácio, o autor
desenvolve a relevância da abordagem desta temática num volume: a questão das
variedades estará “en vogue” na academia alemã, tem tido uma importância crescente e,
como se percebe quando o director do IALT se socorre de uma pergunta surgida num
congresso sobre Linguística Espanhola decorrido na mesma cidade, pode ser vista como
intrínseca e obrigatória a qualquer investigação linguística.

Além do próprio texto, a vasta produção articular do emissor dar-nos-ia já pistas


sobre esse pretexto relacionado com a importância da temática das variedades. O
receptor estaria, assim, já familiarizado parcialmente com esse pretexto (na sua
dimensão de motivo por parte do emissor), o que terá guiado as suas expectativas sobre
o texto e sua função simultaneamente informativa e operativa15.

Os dados e pistas sobre o pretexto permitem-nos esperar reflexos nas


características intratextuais que passem por um conteúdo marcado pela descrição
dialogante das várias abordagens nesta área, assim como um elencar das principais
divisões subtemáticas. Espera-se um vocabulário conceptual e terminológico rigoroso,
bem como frases definitórias, com estrutura argumentativa complexa e também frases
exemplificativas. Como elementos não-verbais esperados, além dos já mencionados
para outros factores, eventualmente a presença de mapas dialectais.

De entre os problemas que possam surgir das diferenças entre o pretexto do TP e


o do TC, no nosso caso concreto refira-se que a situação de transfer é de difícil
definição, pois não existe um contrato de tradução entregue ao tradutor, que é
simultaneamente o iniciador, em conjunto com o próprio autor, que aceitou orientar a
mesma. As directrizes de tradução foram sendo definidas numa base dialogante entre as
preocupações do autor sobre a aplicabilidade dos conteúdos próprios da academia
germânica à situação portuguesa, por exemplo as nossas reflexões enquanto tradutor,
enquanto simultaneamente receptor do TP e membro da CC, e a análise textual relevante
que empreendemos e aqui descrevemos. O pretexto do TC é, em certa medida, simétrico

15 Na introdução, Sinner evidencia pretender dar espaço à convivência de posições divergentes, mas
adiante é possível descortinar algumas críticas a certos autores especializados.
33
ao do TP, pois, ao invés de sermos convidados para editar, pretendemos convencer uma
editora a editar a nossa tradução. Isso poderá ter condicionado a tradução e provocar
uma certa mimese, uma certa subserviência às convenções e prestígio da CP, antevendo-
se uma tradução instrumental de cariz equifuncional, cujo propósito seja o
cumprimento das funções do TP no RC e um foco nas unidades funcionais.

Função do texto

O conceito de função textual subentende a função comunicativa ou a


combinação de funções comunicativas de um texto numa situação concreta de produção
e recepção, obtida a partir da combinação de factores extratextuais. Certas combinações
são de tal maneira frequentes que as estruturas dos textos nelas utilizados se tornam
convencionalizadas e designam tipos textuais (Nord 1991:79).

Nord (2001), na esteira de Bühler e da escola funcionalista, menciona quatro


funções textuais principais, cada qual com subfunções associadas:

 representação de factos do mundo (subfunções informativa, instutiva e


didáctica);

 expressão de sensibilidades e sentimentos (subfunções emotiva, narrativa);

 apelo a um receptor para causar determinada reacção (subfunções


persuasiva, ilustrativa, pedagógica);

 estabelecimento, manutenção e interrupção de contacto com o receptor


(subfunções de estabelecimento, interrupção e small talk) (Nord 2001: 8).

O normal, segundo Nord, é a função do TC alterar-se na tradução, levantando-se


a questão da relevância da análise da função, isto devido à lealdade à intenção do
emissor do TP, bem como ao facto de somente depois de se saber a função do TP se
poderá perceber a sua compatibilidade com a função escolhida para o TC. Assumindo-
se que uma tradução é uma proposta de informação relacionada com a proposta de
34
informação do TP, Nord refere que essa relação só pode ser de dois tipos fundamentais,
como já referimos atrás: documental, em que o TC é um documento da relação entre
autor e receptor do TP ou instrumental, em que o TC é um instrumentos comunicativo
por direito próprio entre o EP e o RC. A tradução instrumental poderá assumir três
formas: uma em que a função é preservada; outra em que, como não é possível cumprir
as funções do TP pelo tradutor, é feita uma adaptação que não viole a intenção de
partida; uma terceira, designada por Nord como “tradução correspondente”, em que se
visa um efeito homólogo ao reproduzir-se no contexto da CC a função do TP no
contexto da CP16.

O corpo textual fornece informação sobre a função textual do TP mediante


designações de tipos de texto, as quais convocam experiências de leitura no receptor. A
obra de Sinner inclui desde logo na capa a designação “Einführung”, que convoca as
experiências associadas com a leitura de manuais universitários de divulgação de um
tema específico. A pertença à colecção “Studienbücher” confirma esta identificação com
o contexto universitário e implica cumprimento da função informativa (com suas
subfunções instrutiva e didáctica), mas simultaneamente operativa (subfunções
ilustrativa e pedagógica), por convidar à aprendizagem aprofundada e efectiva dos
conteúdos, que serão avaliados.

Ao longo dos últimos pontos, a configuração dos factores extratextuais, como


intenção do emissor (fixação e transmissão de produção científica), meio (editora
universitária), receptor (estudantes universitários alemães, ou estrangeiros em
universidades alemãs ou especialistas universitários de outros países), pretexto (convite
de editora especializada para suprir lacuna; crescimento da importância da temática, que
está em voga), assim como tempo e local (Alemanha actual), parece confirmar a função
descrita acima. As expectativas relativamente às características intratextuais foram
também sendo elencadas gradualmente para o somatório das conclusões que foram
sendo retiradas da análise dos factores extratextuais. E parece-nos não haver indicações
de que o receptor vá utilizar o texto numa função que não a pretendida pelo emissor. A
ausência de contrato de tradução claro apontava já para este tipo de relação, e veremos
mais adiante se a análise dos factores intratextuais confirmam as nossas suspeitas.

16 Forma mais frequente em tradução literária (cf. Nord 1991: 72-73).


35
III.3. Factores intratextuais

No seu modelo, e ao contrário da Nova Retórica e da típica distinção básica


entre conteúdo e forma, Christiane Nord afirma que já é longa a evidência, em
Linguística, de que estas duas dimensões dificilmente se podem separar num signo
linguístico. Além disso, ter-se-á provado complicada a aplicabilidade na análise textual
das duas como categorias (cf. Nord 1991: 79). Parte-se aqui mais da hipótese de que a
inversão de um modelo de síntese da produção de um texto conduz a um modelo de
análise textual, em que o propósito comunicativo do emissor faz parte da dimensão
semântica e determina a selecção de itens de informação. Na dimensão da estruturação
do texto, são seleccionados os mais importantes elementos internos na transmissão da
mensagem, elementos esses que não são apenas informativos, mas também exibem uma
função estilística (cf. Nord 1991: 81).

Nord define estilo como a forma através da qual a informação é apresentada ao


receptor, uma definição puramente descritiva, referente à intenção do emissor (este
envia pré-sinais ao receptor sobre como efectuar a recepção com base na sua
competência textual de decifração dos padrões estilísticos de certos tipos de texto) bem
como às normas e convenções sociais.

Tal como no caso dos factores extratextuais, do ponto de vista metodológico


verifica-se a recursividade da análise dos intratextuais e a sua interdependência. Para
alguns textos a análise focar-se-á em certos elementos internos, ao passo que noutros a
sua distribuição será mais convencionalizada. Ao tradutor caberá dominar activamente
os padrões de expressão estilística para decidir que elementos achará necessários para
cumprir a função desejada para o TC (cf. Nord 1991: 84).

36
Tema

Em geral, todas as abordagens de análise textual dão relevância a este factor,


ainda que com diferentes visões: Reiß (1984) centra-a na questão “o quê” e Wilss
(1977) refere que é de cariz pragmático mas, na visão de Nord, sem o justificar. Por isso
a autora de “Textanalyse” aponta seis razões que relevam esta dimensão: a) existe
coerência se um tema domina o texto, sendo preciso ter em atenção uma possível
hierarquia temática em caso de combinação de textos e na presença de elementos não
verbais a marcarem-na; b) a inserção cultural do tema, o que condiciona as
pressuposições e a sua relevância para a tradução, o que não impica que, no caso em que
o contexto do TP não é universal, o TC tenha de se condicionar à cultura da LP; c) a
determinação do tema delimita as realidades extralinguísticas, permitindo ao tradutor
perceber se possui saber-fazer (também terminológico) e que pesquisa terá de
empreender; d) permite efectivar o controlo de compatibilidade, a viabilidade da tarefa;
e) permite, uma vez feita a análise do tema, abordar a função do título e ambiente
textual, dado que na nossa cultura as convenções sintácticas apontam para a tematização
desde o título; f) pelo tema se pode inferir elementos extratextuais ainda não obtidos
com a análise inicial e confirmar/infirmar as expectativas geradas por essa análise (cf.
Nord 1991: 86-87).

A competência linguística desempenha aqui papel central, pois explicar a


coerência textual (relações entre elementos textuais) não basta para completar a
compreensão textual. Esta emana da coordenação da informação verbalizada com uma
realidade particular, um conhecimento do mundo. Nord (Nord 1991: 88) cita Scherner
(1984) na sua factorialização do modo de compreensão textual pelo leitor: o horizonte
de emissor e receptor, os conhecimentos que têm armazenados; a competência
linguística adquirida; a situação comunicativa que ambos percebem; o co-texto, o
ambiente linguístico dos elementos em questão. A relevância destes factores para o
tradutor reside no facto de este tentar perceber que os horizontes não se devem apenas
às idiossincrasias individuais, mas também às influências culturais, pelo que o tradutor

37
nunca poderá ser um observador desinteressado: entende o texto por contraste com o
seu horizonte e tenta encontrar justificação intelectual para esse entendimento (Nord
1991: 88).

No caso do TP em apreço, trata-se de um texto a nosso ver integral, único e


tematicamente coerente. Os vários capítulos circunscrevem-se à temática da Linguística
das Variedades, a evolução histórica da disciplina e as várias dimensões em que opera,
não se detectando pistas em contrário. Ou seja, não parecem existir indícios de que se
trata de uma combinação de textos, ainda que o autor se socorra de inúmeros exemplos
provenientes de outros tipos textuais para ilustrar as sub-problemáticas que vai
analisando.

O tema central da Linguística das Variedades marca presença explícita na


designação e no início de praticamente todos os capítulos (sob as mais variadas formas,
desde a designação do tema, passando pelo recuso a collocations do género “variação”,
“cadeia de variação”, “variedades” e “contacto entre variedades”), sendo provavelmente
a publicação no mercado alemão que mais demoradamente se detém sobre o mesmo.
Não existe, portanto, hierarquia de assuntos compatíveis, típica de combinação de
textos, antes uma ordenação de sub-temas derivados do tema principal: questões
centrais, perspectivas, conceptualização, acepções, variação diatópica, variação
diastrática e diafásica, diamesia e diacronia, contacto linguístico e Linguística das
Variedades, e variação diassistemática e tradução.

O tema obtido pela análise interna corresponde às expectativas geradas pela


análise externa, pois nesta o emissor e a sua intenção, ligação ao tema e especialização
apontavam para isso mesmo. O mesmo se pode afirmar dos receptores (especialistas na
área ou alunos de disciplinas relacionadas), do tempo e local (academia alemã actual na
área das ciências da linguagem), do meio (colecção específica) e do pretexto (Sinner
refere explicitamente na introdução que o tema estaria en vogue).

A verbalização do tema, além das frases tópicas que referimos acima para cada
capítulo, é profusa no que toca ao corpo do texto. Desde logo no título, mas igualmente,
se nos é permitido detalhar, na introdução, onde se regista 27 palavras compostas
formadas com “Varietaet” por prefixação ou sufixação, isto em apenas 4 páginas. Este

38
exercício produziu nada mais nada menos do que uma média de 4 resultados por página
em média para todo o volume. Se multiplicarmos por 280 páginas, percebe-se a
omnipresença do vocábulo. Se considerarmos o termo central “Varietätenlinguistik”,
este ocorre 99 vezes ao longo do manual, confirmando a ligação umbilical do conteúdo
textual à temática. Adicionais análises de coerência e coesão, com produção de cadeias
semânticas reforçariam estes dados, não temos dúvidas.

Este tema está ligado a um contexto cultural específico, o do meio académico-


científico germanófono especializado nas questões de variação linguística, que difere
quantitativa e qualitativamente do meio académico-científico da CC pelo facto de se
encontrar a produção científica e, particularmente, de terminologia, neste último ainda
num estado mais incipiente (Holtus 1994: 623). Este facto, entre outras questões,
levou-nos a questionar, por exemplo, a inclusão do ponto 4.1 no TC, uma vez que
aborda a diversidade de abordagens germânicas sobre a diatopia e culmina num quadro
elaborado por Radtke (1973) e citado pelo autor (Sinner 2014: 91), em que se evidencia
a abundância de termos variados em alternativa a outros três relativamente centrais:
Hochsprache, Umgangsprache e Dialekt. Esta diversidade levou-nos a recorrer a
alguma explicitação dos mesmos no TC, ainda que esta estratégia tenha sido mais uma
excepção e menos uma regra, pois se trata de um tipo de texto convencionado e em que,
no cômputo terminológico geral, as convenções da CC não obrigam a verbalização extra
no TC.

Conteúdo

A bibliografia não terá, até Nord, lidado de forma satisfatória com esta questão,
permanecendo vagos conceitos como significado e conteúdo e havendo poucas pistas
para a sua determinação. Em Thiel (1978) e Reiß (1984) limita-se ao léxico e em Bühler
(1984) a um sumário/paráfrase. Quando o tradutor possui um bom domínio da LP e
respectivas normas e convenções de produção textual, à partida haverá poucos
problemas na aferição do conteúdo, sendo necessário, ainda assim, meios para verificar
esse conhecimento intuitivo (cf. Nord 1991: 90).

39
A paráfrase é defendida como instrumento de análise de conteúdo, em que este
conceito é definido como a referência de um texto a objectos e fenómenos da realidade
extralinguística (do mundo ficcional ou real). Aquela referência é expressa por
estruturas lexico-gramaticais (palavras, orações, padrões frásicos, tempo, tom, etc.) que
se complementam, reduzindo a ambiguidade e formando um texto coerente. O ponto de
partida da análise de conteúdo deve ser a informação veiculada por elementos textuais
ligados, na superfície do texto, por meios linguístico-textuais como conexões lógicas,
relações tema-rema, perspectiva frásica funcional, etc. (idem: 91).

Os meios de coesão (anáfora, catáfora, substituições, recorrência, paráfrase, pro-


formas, etc.) usados na análise de conteúdo variam de língua para língua, constituindo a
paráfrase uma dificuldade do TP (procedimento de tradução intratextual), além de que
em certas culturas estas são típicas de certas formas de texto.

As conotações (significados secundários) são informações expressadas por um


elemento linguístico em virtude da sua associação a um certo código linguístico - níveis
estilísticos, registos, estilo funcional, dialectos, etc.). Algumas fazem parte do
conhecimento comunicativo de todos os falantes, quando ligadas de perto a um item
lexical e presentes num dicionário, enquanto que outras pertencem apenas aos
horizontes de emissor e receptor. A função do texto permite gerar expectativas sobre
estes elementos (Nord 1991: 93).

A análise da situação interna é igualmente relevante para perceber se equivale à


externa. A informação no texto pode ser factual, baseada nos factos vistos
convencionalmente como realidade por emissor e receptor, ou ficcional, sendo
ficcionalidade uma propriedade pragmática atribuída a um texto pelos participantes na
interacção comunicativa. A sua definição depende da noção de realidade e das normas
de textualidade prevalecentes na sociedade em questão (cf. Nord 1988, in Nord 1991:
94).

Como foi sendo aventado na análise da situação externa, os factores


extratextuais são principalmente verbalizados logo nas primeiras páginas da obra e de
forma relativamente visível. O emissor é-o na capa e páginas seguintes, bem como o uso
da primeira pessoa o denuncia nos agradecimentos e introdução, onde fica também

40
visível, ainda que mais indirectamente, a sua intenção. O receptor é referido
directamente como “Studierende” na introdução, a propósito da forma de preparação do
estudo dos capítulos e indirectamente na inclusão de exercícios, que usam da função
operativa. O meio é aludido pela designação da colecção e logo nos agradecimentos, ao
referir que este “Lehrbuch” seria impossível sem os agentes mencionados. O tempo
consta da data de edição, tal como o local, sendo que este factor recebe várias menções
na introdução17. O pretexto é mencionado no prefácio com os agradecimentos ao editor
da Narr, bem como na afirmação, na introdução, de que as questões em Linguística das
Variedades estão en vogue. Finalmente, a capa exibe a função do texto (“Einführung”),
que é profusamente repetida ao longo do mesmo.

Em virtude da dimensão da obra, recorremos à recensão crítica do TP, elaborada


por Sebastian Greußlich (2016), com fonte de uma paráfrase resumida que possa
indiciar as unidades de informação mais gerais desta publicação. Assim, a introdução
gira em torno da questão sobre se ainda é possível hoje em dia abordar um qualquer
tema em Linguística que não desemboque, mais cedo ou mais tarde, na problemática
das variedades. Neste capítulo faz-se uma diferenciação entre a Sociolinguística e a
Linguística das Variedades, uma descrição da delimitação e posicionamento
diassistemático da disciplina, bem como dos conceitos-chave de “Variation, Varietät,
Variable, Varianz”, que pertence aos problemas centrais da Didáctica. O capítulo 2
aborda as concepções pré-científicas de variedades segundo três autores modernos
(Fernão de Oliveira, Claude Fabre de Vaugelas e Sperone Speroni), e que visa um
público estudantil ao conferir uma dimensão histórica ao conhecimento científico
listado.

A parte central do volume inclui os capítulos 3 a 5: no primeiro, é reconstruída a


emergência dos modelos teóricos sobre Linguística das Variedades no contexto do
debate linguístico com a problemática da variação; segue-se uma discussão crítica de
perspectivas sistemáticas fundamentais inerentes à Linguística das Variedades, como a
variação no espaço, no capítulo 4, e as variedades diastráticas e diafáscias, no quinto.
Neste âmbito, são apresentados, de forma instrutiva, inúmeros casos exemplificativos,

17 Na pág. 9 “im deutschpragigen Umfeld oder im fremdsprachigen Umfeld” - aqui revelando a


geografia textual, o posicionamento do emissor face a um ambiente estrangeiro; pág. 10 “im
deutschpragigen Raum”; ponto 4.1, pág. 92 “im Hinblick auf die Traditionen im deutschsprachigen
Raum”.
41
como a questão do pluricentrismo, no caso da diatopia, ou parâmetros como pertença de
género ou geracional no caso da diastratia e diafasia, ou ainda a discussão de tipos
consolidados de variedades como as línguas de especialidade e linguagens técnicas, em
que se menciona a problemática da sua classificação sob determinadas dimensões de
variedades. A discussão crítica destes pontos e desenvolvida nos últimos anos na
academia germânica é referida nos seus pontos principais e de forma clara ao longo
destes capítulos.

O capítulo 6 insere-se igualmente nesta linha de discussão crítica, no caso da


diamesia e diacronia, fazendo uso do modelo de Koch/Oesterreicher (1985) como
ampliação das dimensões de variedades por Coseriu e fundação sistemático-
antropológica que opera num contínuo de “proximidade-distância” (Sinner 2014: 209).

Os dois últimos capítulos ocupam-se do contacto linguístico e da tradução,


respectivamente, ou seja, a temas com os quais a Linguística das Variedades possui
pontos de intersecção. No primeiro são descritos os fundamentos terminológicos e
conceptuais do contacto linguístico, são apresentadas variedades induzidas por contacto,
variedade de aprendizagem e, por fim, mencionadas as traduções como variedades
próprias (ver capítulo IV desta memória). O último capítulo ocupa-se da variação
diassistemática como problema tradutório, tal como é visto de um ponto de vista
tradutológico, bem como as suas manifestações em textos não ficcionais e textos
ficcionais.

Não existe desfasamento entre a situação comunicativa interna e a obtida pela


análise externa, como se depreende da descrição das unidades informativas. Lapsos de
coesão e coerência parecem igualmente não existir, a julgar pela estruturação temática e
constante referenciação anafórica e catafórica sempre que existe a verbalização de
argumentos ou conceitos anteriormente avançados ou se esclarece que um conteúdo será
abordado em maior detalhe mais à frente no corpo do texto.

A partir da análise de conteúdo, é possível prever conclusões relativamente a


outros factores intratextuais. Nestes se incluem a estruturação bem como o estilo.
Pensando na já referida definição de Nord (forma de apresentação da informação ao
receptor), esperar-se-á neste domínio um estilo neutro mas em associação com a função

42
didáctica que vise um reconhecimento racional e que se dirija primeiramente às
capacidades intelectuais do destinatário, onde preponderarão figuras como o paralelismo
e o cumprimento das convenções estilísticas dos textos académicos na área da
Linguística.

Pressupostos

Nord (1991) refere que não existe uma noção única de pressuposto, mas que
adopta a pragmático-situacional avançada por Schmidt (1976), em que aquele é
assumido por emissor e receptor, sendo a comunicação eficaz quando um e outro
partilham pressupostos em quantidade suficiente. No dia-a-dia, estes factores não são
referidos e reportam-se a objetos e fenómenos (realia) da CP. Os pressupostos incluem a
informação que o emissor espera fazer parte dos conhecimentos do receptor, numa
perspectiva centrada no primeiro, incluindo um aspecto dinâmico (que se adequa à
noção de produção textual que serve de base à sua análise intratextual), bem como um
orientado pelo resultado. Segundo convenções sociais de comunicação, não devem ser
enunciadas trivialidades nem factos incompreensíveis, devendo o emissor avaliar a
situação, os conhecimentos prévios do receptor e a relevância da informação do texto. O
tradutor terá de perceber que informação trivial para o receptor do TP pode ser
desconhecida para o do TC (cf. Nord 1991: 96).

Estes pedaços de informação não verbalizada tornam difícil ao tradutor a sua


identificação, pois este está familiarizado com a CP, pelo que tem de determinar a que
mundo pertence o texto. Se factual, então são feitas proposições sobre a realidade, sendo
que um texto factual só o é em função da sua classificação, pelo receptor, de acordo
com um conceito de realidade dependente de convenções filosófico-sociológicas. Nord
(1991) recorre ao conceito de ambiente cultural do texto de Koller (1979), um ponto de
ancoragem, para explicar que a informação do mundo da CP que é pressuposta exige
que o tradutor ajuste o seu grau de explicitação na CC, o que implica estratégias de
expansão e redução que variam segundo tipos de texto e funções textuais (Nord 1991:
98).

43
As redundâncias, informação verbalizada repetidamente num texto (explicações,
repetições, paráfrases, sumários, tautologias, etc. - neste modelo, as situacionais) são
indicadores de pressupostos e, de acordo com a teoria da informação, visam combater o
ruído, são formas de assistir à compreensão de um texto face a passagens obscuras,
irrelevantes ou trechos de pensamento complexo. O nível de redundância depende da
quantidade de conhecimentos prévios que o emissor espera do receptor, mas também
pode depender de convenções culturais relacionadas com a legibilidade (Nord 1991:
99).

A probabilidade da presença de pressupostos pode ser calculada com base na


distância de receptor de TP e receptor de TC face ao ambiente cultural do tema e níveis
de explicitação e redundância. Certos elementos de cristalização no texto (construções
participiais com o particípio presente, passivas, infinitivos, verbos modais, valências de
verbos, etc.) e outros sinais intratextuais (tema, conteúdo, estruturação, traços supra-
segmentais), bem como de factores extratextuais (emissor, receptor, tempo, local,
pretexto) contribuem para a detecção de pressupostos. Ao tradutor, agente com
competência na CC, cabe verificar a compreensibilidade da informação verbalizada
segundo o ponto de vista do receptor da CC, localizar e, eventualmente, compensar essa
informação (Nord 1991: 100).

O modelo de realidade a que se refere a informação intratextual da obra de


Sinner é claramente factual, emitindo do início ao fim proposições sobre a realidade que
descreve, as questões relacionadas com a discussão teórica da Linguística de
Variedades, numa perspectiva histórico-crítica, mas também actual e didáctica. Seria
impossível darmos conta aqui de todas as ocorrências de referências verbalizadas
explicitamente no texto a essa realidade, ficando-nos por algumas suscitadas pela
introdução, em que, como vimos, a frase tópica faz ressaltar tais “varietätenlinguistische
Fragestellungen”. Outros exemplos poderão ser a referência a “Veröffentlichungen”,
“Stellenauschreibungen an Fachhochschulen und Universitäten”, ou
“sprachwissenschaftlichen Module vieler Bachelor- oder Masterstudiengänge”, e ainda
“Boom von Arbeiten”, realia intimamente relacionados com o mundo universitário e
discussão académica a que se reporta o texto. A presença de inúmeras construções
passivas (“ist auch kontrovers diskutiert worden” ou “ist hier im Rahmen des (vom
Umfang her) Möglichen versucht worden”) desde o início indicam que se pressupõe que
44
o emissor emite juízos verdadeiros do alto do seu papel social de professor na matéria
numa faculdade com tradição nessa área no seio da cultura germânica, e que, portanto,
esses juízos e referências à recente produção científica exponencial na área da
Linguística das Variedades serão recebidos como credíveis.

Na mesma introdução, o autor usa de alusões explícitas ao modelo de realidade


referente a essa cultura académica e a uma atitude crítica que lhe subjaz, ao apelidar
ironicamente a visão que se tem de certas orientações como “novas”, as quais recebem a
“etiqueta” da disciplina. Faz pressupor com tal que é necessária uma visão mais crítica,
o que confirma no parágrafo seguinte, ao defender uma visão mais transdisciplinar e
crítica, o que se propõe fazer com o volume em questão. Este modelo de realidade é
transferível para o TC não só pensando na convencionalização comum e intercultural
decorrente do tipo de texto, como também na intenção do emissor de possibilitar a
leitura a receptores estrangeiros familiarizados com as línguas românicas. O emissor
pressupõe igualmente que os seus leitores são versados na língua franca académica que
é o inglês, daí optar por utilizar citações e termos em língua inglesa sem qualquer
tradução, pressuposto esse que pode ser transportado para a CC.

Ainda assim, o texto apresenta alguma informação que obriga a explicitação no


TC. Um exemplo é o conceito de “Ausbau” (elaboração), avançado por Kloss (1967),
referido na introdução e depois desenvolvido no capítulo 3, bem como mencionado em
capítulos posteriores, não esquecendo os compostos a ele associados, e “Abbau”
(redução ou decomposição), que Munske (1983) propôs para complementar o anterior.
Estes dois termos exigem uma explicitação, pois são deixados como estrangeirismos na
academia lusófona, o que obstará à compreensão de certos leitores do TC. Em sentido
inverso, certos quadros repletos de conceitos próprios do tema e que resumem as
divergentes escolhas conceptuais de autores alemães para conceitos centrais poderão
candidatar-se a uma redução, como no capítulo 3, quando o autor fala da estruturação da
língua segundo Moser, ou no início do capítulo 4.

Estruturação do texto

45
Nord (1991) refere que Thiel (1974) analisa em detalhe este aspecto, sugerindo
que o texto tem uma macroestrutura informacional consistindo em microestruturas,
sendo os segmentos textuais macro marcados ou delimitados pela (des)continuidade de
tempo. As razões pelas quais ambos os aspectos, macro e micro, são importantes para a
análise textual relevante para tradução incluem: se um texto for composto por diferentes
segmentos e condições situacionais, isso requererá diferentes estratégias de acordo com
as suas funções; início e fim de um texto desempenham papel especial na sua
compreensão, devendo ser analisados em separado para se perceber como guiam a
recepção; certos tipos de textos incluem convenções culturais específicas, fornecendo a
análise da estruturação informação valiosa sobre tipo e função; em textos complexos, as
microestruturas informacionais fornecerão o tema do texto (cf. Nord 1991: 101).

No caso de combinações de textos, em que certos textos estão inseridos noutros


de nível mais alargado, como pode acontecer numa antologia sobre Linguística, por
exemplo, essa inclusão costuma ser assinalada por título e contexto do título, espécie de
enunciado metacomunicativo, sendo esta hiperfrase substituída por informação sobre a
situação comunicativa no caso do texto de nível mais elevado em que se insere o de
menor (Nord 1991: 102).

A nível macroestrutural, frases metacomunicativas como “A diz (a B)” podem


ser sinais de início de um texto encaixado, realçando a importância da análise de
subtextos e de “in-textos” no TP, segundo Schmidt (1971)18. As inclusões (“como se
referiu”) comentando o próprio texto são também enunciados metacomunicativos e dão
sinais ao receptor, representando a orientação (extratextual) pela recepção através de
meios intratextuais. Ainda ao nível macroestrutural, as delimitações hierárquicas das
secções do texto (capítulo, trecho, parágrafo, frase complexa, frase não complexa, etc.),
de um ponto de vista semântico, permitem obter uma orientação apenas superficial,
sendo, portanto, crucial a interpretação de todo o texto, em que, como já se referiu, os
inícios e fins de textos são valiosos e devem ser analisados independentemente (são
marcados por traços verbais e não-verbais por vezes convencionais, consoante o tipo de
texto).

18 Aqui, podem referir-se notas de rodapé, exemplos, citações – que podem ter as mesmas quatro
funções básicas da linguagem e frequentemente apresentam uma função textual própria, como Nord
afirma, ainda que em textos científicos a primordial seja a informativa e com forma convencional
ligada à referenciação bibliográfica.
46
Se se distinguir estrutura formal de semântica (funcional), e se o nível mais
elevado for o metacomunicativo e o segundo constituído por unidades macro, o terceiro
nível será o de frases complexas e simples (formalmente). Semanticamente, podem
distinguir-se unidades de informação, enunciados, relações lógicas (causalidade,
finalidade, especificação, etc.). Um quarto nível, o microestrutural, será o de partes de
frase e suas relações, como a estrutura tema-rema. A divisão em frases pode facilitar
uma primeira aproximação à microestrutura do texto, sendo uma segunda etapa possível
a divisão semântica em unidades de informação. À partida, uma estruturação que
represente uma analogia com objectos e situações do mundo real, que não seja
específica de uma língua e em que a distância entre CP e TP não seja grande não
apresentará problemas insolúveis para o tradutor (Nord 1991: 105).

Em línguas como o português, com um sistema verbal complexo, incluindo as


categorias de tempo, modo, voz e aspecto, os textos podem ser estruturados por meios
da “mise en relief”, marcação dos tempos perfectivos (pretérito perfeito simples, por
exemplo) por oposição ao imperfectivo, iterativo ou durativo, descritos pelos tempos
imperfeitos (pretérito imperfeito). Já no alemão, esse “relief” é conseguido pela
distribuição da informação por orações subordinadas e principais. Assim, certas
informações recebem maior destaque do que outras, condicionando a estrutura textual
(Nord 1991: 106).

A divisão microestrutural semântica de frases e unidades de informação em tema


e rema (TRS - informação presente numa oração que pode ser inferida do contexto,
pertencendo a um grupo de pressupostos vs. parte informacional nova, não inferível) é
independente das estruturas sintácticas. A ligação entre unidades revela um tipo de
progressão temática que caracteriza a estrutura argumentativa do texto. A dinâmica
comunicacional de um texto com progressão linear, em que o rema de uma frase
constitui o tema da frase seguinte, difere significativamente da de um texto com um
tema contínuo e vários remas. O TRS é visto como universal semântico realizado de
maneiras diferentes consoante a língua (Nord 1991: 107)

A macroestrutura é assinalada por meios formais que marcam as fronteiras de


segmentos. Estes marcadores não-verbais são combinados com marcadores lexicais (por
exemplo, complementos circunstanciais iniciais - “em primeiro lugar”, “finalmente”) e
47
foco (“por um lado”, “por outro lado”). Nos tipos de texto com “ordo naturalis”
convencional, a estruturação é marcada de acordo com o tema e conteúdo. A
microestrutura é marcada por estruturas sintácticas (orações principais/subordinadas,
tempos, inclusões, etc.) ou meios lexicais (como a catáfora) e traços supra-segmentais
(estruturas de foco, pontuação, etc.) (Nord 1991: 107).

O texto de Carsten Sinner constitui uma unidade independente, autónoma, ainda


que integre textos hierarquicamente menores, tais como exemplos, extensas e frequentes
citações, numerosas notas de rodapé, as quais, contudo, se fundem bem na estruturação
geral do texto principal e lhe reforçam a função.

A macroestrutura é assinalada por sinais ópticos que sublinham a organização


temática, entre os quais a divisão em capítulos e subcapítulos, os diferentes tamanhos e
tipos de letra, a translineação e o avanço da primeira linha nos novos parágrafos. Outros
sinais poderão ser certos marcadores como as inclusões (“Somit” em início de frase com
8 resultados e no interior da frase com 73 resultados) e marcadores de foco (35
resultados na pesquisa do termo “einerseits” e sensivelmente o mesmo para
“andererseits”) .

Elementos não verbais

Os signos provenientes de outros códigos não linguísticos recebem a designação


funcional de elementos não verbais, sublinhando Nord que desempenham papel
complementar na comunicação verbal, englobando, nos textos escritos, fotos,
ilustrações, símbolos, tipos especiais de impressão, etc. Mesmo que sejam elementos
norteados pelo receptor, poucos autores em análise textual relevante para tradução os
terão considerado, com excepção de Thiel (1978), pressupondo concepções restritas de
texto (Nord 1991: 108).

Podem distinguir-se os elementos não verbais que acompanham o texto (ex.:


design do texto) dos que complementam o texto (ex.: tabelas) ou ainda os que
48
constituem partes textuais independentes (ex.: tira de baixa desenhada) ou que
substituem certos elementos textuais (ex.: o * que substitui uma palavra tabu). Em
comunicação escrita, não podem ser usados expressões gestuais, mas a reduzida
contextualidade pragmática dos textos escritos tem de ser compensada. Isso é feito
parcialmente por traços supra-segmentais, mas também por meios não verbais como
imagens (foto, banda desenhada, desenho), o que até pode transmitir uma mensagem
mais relevante que o texto verbal (Nord 1991: 109).

Certos tipos de textos comportam elementos não verbais convencionalizados.


Cabe ao tradutor identificar esses elementos caso o “skopos” da tradução requeira
“equivalência de efeito”, pensando também que podem ser específicos da CP, pelo que
há que decidir quais serão mantidos/adaptados/omitidos em relação às convenções da
CC. Além disso, a análise dos mesmos fornece informação sobre aspectos da
estruturação textual (parágrafos, marcadores), de pressupostos (marcas de omissão),
léxico (expressões faciais que sugerem significado irónico) e traços supra-segmentais
(linhas mais curtas num poema). Em termos extratextuais, a intenção do emissor e a
função do texto são os factores mais caracterizáveis por estes elementos. A sua detecção
aparenta ser de menor dificuldade e mais previsível em certos tipos de textos (Nord
1991: 110-111).

No caso de “Varietätenlinguistik”, pudemos identificar os seguintes elementos:


desde logo, a ausência de cor, excepto na capa e contra-capa (em que o amarelo que se
coaduna com o preto permitem identificar o volume com a colecção – coadjuvado com
a presença do logótipo da editora nessas mesmas páginas e na segunda página e a
diferenciação entre tipo de letra do tipo calibri nestas páginas e do tipo times new
roman no corpo to texto); o destaque (negrito e tamanho de letra maior) dado às
designações de capítulos (no índice) e a estas e às dos sub-capítulos (no corpo do texto,
com capítulos a usarem de letra maior); o uso extensivo de itálico para destaque de
conceitos-chave à área temática (inclusive com distinção entre itálico e normal na
mesma palavra composta) e que são identificáveis, mesmo sendo apresentados escritos
noutras línguas; a presença de setas nas referências anafóricas e catafóricas sempre que
num determinado capítulo são referidos conceitos centrais tratados noutros capítulos
(bem como nos enunciados explicativos especificamente do domínio da descrição
linguística, onde, além de setas, se pode verificar o uso de sinais + e *, ou ainda de
49
aspas); utilização do símbolo de um livro e caixa envolvendo a bibliografia adicional a
consultar no final de cada capítulo; um número relativamente extenso de tabelas (16) e
de figuras (28).

As funções desempenhadas por estes elementos relativamente às partes de texto


verbal são diversas. Tipos de letra e tabelas/figuras contribuem para
complementar/estruturar o texto, símbolos acompanham o texto (elementos da descrição
linguística) mas também se relacionam com partes de texto separadas (bibliografia
recomendada). Verifica-se o uso, principalmente na introdução, de aspas com função de
expressão de ironia e neologismo/composição menos vulgar de palavra. Uma função
didáctica e, até, de aligeiramento da densidade e ritmo textuais, pode ser inferida da
presença de inúmeras figuras com tiras de banda desenhada.

Alguns destes elementos, mormente os que contribuem para a estruturação e


complementaridade textuais, estarão relacionados convencionalmente com o tipo de
texto informativo-científico (divisão em capítulos e tabelas, caracteres próprios da área
temática). Contudo, parece-nos que os restantes não dependem do tipo de texto e mais
do tipo de meio, das escolhas de layout da casa editorial, em que o autor terá tido
alguma influência. Estas escolhas editoriais evidenciam uma conexão entre esses
elementos não verbais e a CP (referências bibliográficas e exemplos destinados aos
estudantes germanófonos), sendo questão a ter em conta pelo tradutor em termos da sua
relevância nos termos das normas e convenções da CC.

Léxico

Nord refere que todas as abordagens de análise textual orientadas para a


tradução dão relevância às características do léxico, sublinhando a importâncias de
aspectos semânticos, estilísticos e formais. As escolhas lexicais são determinadas tanto
pelos factores extratextuais, como intratextuais, sendo que as características semânticas
e estilísticas do léxico (conotações, campos semânticos, registo) podem apontar para as
dimensões de conteúdo, tema e pressupostos, ao passo que as formais e gramaticais
50
(partes de discurso, função lexical, morfologia) direccionam a análise para estruturas
sintácticas e traços supra-segmentais previsíveis (cf. Nord 1991: 112).

A selecção dos itens lexicais é determinada em larga medida pelo tema e


conteúdo, que influenciam os campos semânticos e cadeias isotópicas. Assim, aspectos
morfológicos (sufixos, prefixos, compostos, acrónimos, etc.), colocações, expressões
idiomáticas, uso figurativo (metonímia, metáfora), entre outros, deverão ser analisados à
luz da semântica textual, sendo também útil a análise componencial no caso de
neologismos (cf. Nord 1991: 112).

A dimensão lexical ilustra particularmente bem a interdependência entre factores


extra e intratextuais, já que reflecte a situação em que o texto é usado e seus
participantes. Assim, como estes factores estabelecem um quadro de referência para a
selecção de palavras, deve analisar-se se as expectativas geradas pela análise sobre os
factores extratextuais são confirmadas pelo texto relativamente a:

 emissor – características gerais (origem, estatuto, posição, papel comunicativo);


menção do mesmo intratextualmente como emissor – uso de primeira pessoa e
de expressões pessoais (“na minha opinião”);

 intenção do emissor – o aspecto pragmático do interesse concreto que subjaz à


produção textual, intencionalidade evidenciada pelo léxico situacional e além
das normas e convenções, visível quando o tradutor tem de elicitar a intenção de
um autor em usar determinada expressão ou figura por meio da observação do
grau de originalidade (metáforas, palavras de outras áreas e registos, uso
metonímico), contrastando a escolha de palavras com o que se espera para o
padrão do tipo de texto e verificando se se trata de uma característica típica de
todo um texto – a intencionalidade semântica é igualmente relevante, a selecção
de unidades de informação, bem como as pistas explícitas sobre a intenção do
emissor;

 a orientação para o receptor reflecte o léxico na utilização de registos, lectos e


estilos não determinados por este ou inserções explicativas – o receptor pode

51
também ser referido explicitamente e as formas de tratamento são condicionadas
culturalmente;

 o meio influencia o nível de estilo (coloquial, formal) dos elementos lexicais, a


formação de palavras (em especial palavras “económicas”, como as usadas em
imprensa) e expressões deícticas;

 o espaço influencia igualmente a deixis e referências à situação interna, mas


também a escolha de itens lexicais referentes ao contexto cultural (nomes
próprios, instituições e termos culturais);

 o tempo reflecte-se, mais uma vez, em elementos deíctivos, referências


temporais internas e em marcações temporais de certos itens – influenciando a
opção por tradução sincrónica ou actualizante;

 o pretexto da comunicação condicionará a tradução ao exigir um nível de estilo


ou certas formas/clichés, sendo de analisar a ocasião de surgimento do TC face à
do TP;

 a função do texto (em correlação com o tipo de texto) reflecte-se na escolha de


léxico (a LSP é um campo com funções específicas em termos de uso lexical),
apontando as convenções do tipo de texto para a subordinação, pretendida pelo
autor, da forma ao conteúdo, estabelecendo as guias para um determinado efeito
(Nord 1991: pp 114-117).

Uma análise completa dos elementos lexicais a uma obra da envergadura de


“Varietätenlinguistik” jamais caberia no âmbito da memória que aqui apresentamos,
pelo que indicamos apenas alguns exemplos que reflectem factores extratextuais, atitude
do emissor e dimensão estilística.

Refira-se que a própria natureza do tipo de texto dá pouco azo a que se utilizem
dialectos (ou variedades diatópicas...), tendo confirmado a análise extratextual a
presença do alemão padrão actual, num registo formal, mas com léxico especializado
típico não só do meio (manual universitário de Linguística, colecção didáctica), como

52
da função de transmissão de conhecimento científico especializado. Relativamente a
estes pontos, exemplifiquemos com termos presentes na primeira frase do primeiro
parágrafo da Introdução que constituirão um primeiro campo semântico dependente do
tema e conteúdo (que surgem no texto pela ordem que os referimos):
Varietätenlinguistische, Fragestellungen, Forschung, Lehre, Philologien, Theorie,
Fremdsprachenunterricht, Veröffentlichungen, Schwerpunkte, sprachwissenschaftlichen,
Module, Bachelor- oder Masterstudiengänge, Kompetenzen, Fachhochschulen,
Universitäten, Professuren, Ansätze, Forschungsansätzen oder -paradigmen, Arbeiten,
Interkulturalität, Ausrichtungen, Transferwissenschaft, Lebenswissenschaften,
Arbeitsbereiche. Devido ao carácter temático do primeiro parágrafo, cremos que os
restantes capítulos comportarão especialização lexical ainda maior.

Em termos das características do léxico que reflectem a atitude do emissor e


interesse estilístico, referência para expressões de certeza como “vereinfacht gesagt”
(pág. 12, com duas ocorrências, pág. 96, por vezes reforçada com advérbio “eher”, pág.
202) ou “In der Literatur herrscht keine eindeutige Meinung” (pág. 192). A já referida
metáfora “alter Wein in neuen Schläuchen” insere-se nesta linha. A dimensão
terminológica encontra-se amplamente representada por elementos não verbais (sinais
deícticos, como setas que remetem para o glossário final) e faz igualmente parte, em
termos de estruturação, dos títulos dos capítulos e sub-capítulos.

O texto pode, então, ser atribuído a um nível de estilo formal e convencionado


pelo tipo de texto académico:

 marcado pela presença de palavras com raiz grega e latina e de expressões


utilizadas noutras línguas associadas à cultura universitária e a um registo formal
como o francês e o latim, de maior densidade de utilização de nominalização e
de itens nominais de menor frequência de uso/eruditos ou associados ao discurso
académico alemão, como “dezidiert”, advérbio em crescente disseminação na
Alemanha nas situações comunicativas marcadas por registo mais oficial;

 construções impessoais como “ist Ähnliches zu beobachten”;

 frases complexas com grande número de orações subordinadas;

53
 ausência de contracções lexicais; uso de termos e expressões abstractas - “einer
ständig wachsenden Zahl”;

 uso de linguagem cuidada - “Angesichts der Flut an Veröffentlichungen und


immer weiter reichenden Spezialisierungen in den letzten Jahren musste eine
Auswahl getroffen werden”;

 referência a fontes credíveis como evidência de suporte – uma constante na


discussão argumentativa, que coloca em diálogo as várias perspectivas
debruçando-se sobre a sub-temática abordada em cada ponto.

Sintaxe

Os aspectos formais, funcionais e estilísticos da estrutura sintáctica constituem


preocupação em praticamennte todas as abordagens de análise textual orientada para a
tradução, mas Nord refere não serem tidos em conta de forma sistemática. Apesar do
repertório transcultural das figuras estilísticas sintácticas (paralelismos, quiasmos,
perguntas retóricas, etc.), o seu efeito varia consoante a estutura da língua. As frases
hipotácticas complexas costumam ser utilizadas na descrição de factos complexos.
Contudo, em alemão estas frases mais frequentemente têm uma aparência complexa e
intrincada, em parte porque o verbo tem de ser colocado em posição final nas orações
subordinadas, por comparação com línguas românicas como o português, em que a
sintaxe apresenta um carácter geral linear e em que as construções não finitas (gerúndio,
particípios, infinitivos) são preferidas em detrimento de subordinadas (cf. Nord 1991:
118).

A análise da estrutura sintáctica fornece informação sobre o tema (simples vs


complexo), a estruturação do texto (ordem de detalhes de informação) e traços supra-
segmentais (foco, velocidade, tensão), podendo algumas figuras apontar para
pressupostos. Extratextualmente, revela essencialmente dados sobre intenção, meio e
função do texto.
54
O tradutor obtém uma primeira impressão da estrutura sintáctica ao analisar o
comprimento médio e tipo de frases (declaração, perguntas, exclamações, elipses, etc.) e
outras construções que substituem frases (gerúndios, infinitivos, particípios) e inclusões,
no texto (estruturas paratácticas e hipotácticas) e na conexão de frases mediante
conectores (conjunções, advérbios de tempo, substituições). Com base nisto, percebe
como a informação fornecida no texto está estruturada, devendo esta análise servir uma
interpretação funcional. Abaixo do nível frásico e oracional, a ordem de constituintes e
de palavras leva a novos dados sobre a estrutura. Os meios de foco de certas partes de
frase variam de língua para língua (Nord 1991: 119).

No texto que decidimos analisar para tradução, a grande maioria das frases são
longas. A título de exemplo, na primeira página e nas primeiras duas frases, o
comprimento médio é de 7 linhas, apresentando uma combinação de mecanismo de
parataxe por meio de coordenação e de hipotaxe com a inclusão de orações
subordinadas. Os conectores (adversativos como “dabei” ou consecutivas como “So”) e
construções demonstrativas (“Von der wachsenden Popularität”) no início de frases
relacionando-se a constituintes da frase anterior são frequentes. As frases mais
abundantes serão as declarativas, com pouca frequência de interrogativas e
exclamativas. Referência para a relativa abundância de construções participiais (“ist
auch kontrovers diskutiert worden”).

Na primeira página, Sinner insere a já referida questão surgida num congresso


ocorrido em Leipzig, na qual se aborda a omnipresença da questão das variedades na
problematização linguística. Trata-se sem dúvida de uma questão retórica, pois o autor,
como o próprio refere, dela se socorre como “Denkanstoss” para a diversidade de
trabalhos sobre variedades, diferindo grandemente dos restantes tipos de perguntas
surgidas no texto, geralmente relacionadas com dúvidas evidenciadas pelo autor
relativamente à menor clareza conceptual em abordagens analisadas ou com questões
presentes em citações de trechos de outros emissores ou exemplos linguísticos inseridos
no texto principal.

55
Características supra-segmentais

Incluem estas os elementos de organização textual que vão além da componente


lexical e sintáctica, formando o tom específico do texto, que depende primeiramente do
meio e dos meios ópticos como itálico, tipos de letra e espaçamentos, aspas, entre
outros. Nord defende que os textos escritos possuem “Gestalt” fonológica que indica ao
leitor a intenção, dependendo, entre outros factores, do estilo e de convenções do tipo de
texto (cf. Nord 1991: 121).

O conceito de tom refere-se à totalidade de qualidades prosódicas em enunciados


e incluem características gerais como tonicidade, ritmo, velocidade, altura, tensão e
pausas, sendo o tom uma forma de organização do texto, pois serve para marcar a
estrutura informacional e dividir o discurso em unidades tonais, bem como marcar o
núcleo semântico da frase (o tom ajuda a desambiguar entre sentidos possíveis,
sinalizando a atitude do emissor, assim como a sua personalidade e autoridade) (Nord
1991: 122).

As pausas são destacadas por Nord como traço supra-segmental, mesmo que
ocorram em sequência com o lado verbal do enunciado e não em simultâneo, pois
funcionalmente a sua posição, comprimento e variação no texto não podem ser
separados do tom, já que influenciam melodia e velocidade (e mesmo distinguindo
pausas fonológicas de paralinguísticas).

Nord defende também que os aspectos de prosódia e entoação visíveis nos textos
orais e em literatura devem ser tidos em conta na análise textual de qualquer tipo de
texto, pois muitas vezes alteramos o sentido lido numa frase se usarmos de tom e
acentuação diferentes, já que o texto apela ao ouvido e visão internos do leitor, que
forma uma espécie de imagem acústica sugerinod uma fonologia particular (Nord 1991:
124).

A organização fonológica de um texto é representada pela selecção de


deteminadas palavras, ordens de palavras, onomatopeias, corpos tipográficos e
pontuação, que podem ser específicos de uma língua. As regras formais de pontuação
56
sintáctica em alemão (principalmente as vírgulas) são bastante rígidas, havendo menor
possibilidade de usar as vírgulas como instrumento estilístico como é o caso do
português, em que estas são usadas como instrumentos semânticos, prosódicos e
rítmicos, dividindo trechos discursivos mais do que assinalar o final de uma unidade
sintáctica (Nord 1991: idem).

A expressividade é indicada pela escolha lexical (expressões afirmativas como


“na verdade” e avaliações enfáticas como “óptimo” atraem acentuação; partículas como
“doch” e “ja” produzem contornos entoacionais particulares em alemão), pela sintaxe
(construções com clivagens, inclusões proferidas com diferente entoação face à frase
principal, elipses, enumeração assindética), pelo contexto (produz a acentuação
contrastiva – se aquele não for claro, então esta é produzida por elementos gráficos,
como aspas para destacar neologismos e não só ironia, no português) e por estruturas
tema-rema. Para o tradutor é importante perceber a dimensão fonológica pois a
imaginação acústica do leitor é específica da língua, pois lê o texto por comparação com
o seu conhecimento prévio de entoação, devendo-se adaptar a entoação do TP aos
padrões LC (Nord 1991: 126).

Parece-nos que o autor evita o tom científico neutro, seco e distanciado que
costuma caracterizar este tipo de textos, uma vez que este apresenta algumas marcas de
cordialidade, inclusive de empatia, para com o público alvo, encurtando a distância
comunicativa.

57
III.4. A questão do efeito

A última questão que recobre o TP visa o seu efeito, categoria que deve ser
considerada por relação com o receptor: este tem determinadas expectativas
relativamente ao texto, engendradas na decorrência tanto da análise da situação
comunicativa, como dos conhecimentos prévios. Esta categoria não é exclusivamente
extratextual nem intratextual, mas vive da sobreposição e interdependência de ambas os
tipos de factores, que se interafectam reciprocamente. As informações relativas a um
factor devolvem geralmente outros dados ou pistas sobre outro(s), ainda para mais tendo
em conta de que estamos na presença de um processo recursivo (cf. Nord 1991:145).

Nord salienta, ainda assim, três pares de factores que julga serem determinantes
para o seu estabelecimento. A intenção do emissor e a sua relação com o texto detém um
papel particularmente relevante no controlo do efeito, ainda que não se deva confundir
com este, pois trata-se mais de uma antecipação do efeito no receptor empreendida pelo
emissor. Cada receptor apresenta expectativas de cariz cultural específico (por exemplo,
face a convenções de tipos de textos ou princípios estéticos) e o efeito obtém-se da
relação sempre variável entre os meios estilísticos empregues e as convenções culturais
(cf. Nord 1991: 131). O tradutor tem de antecipar o efeito possível do texto, o que lhe
exige competência cultural e imaginação prática relativa às consequências das suas
acções linguísticas de forma a levar a bom termo o processo social em que se envolveu,
colocando-se no lugar do receptor (Nord 1991: 132).

Já a relação entre receptor e o mundo do texto implica a comparação, por parte


do receptor, do mundo extralinguístico verbalizado no texto com a sua expectativa,
determinada pelos seus conhecimentos, os seus horizontes e a sua predisposição
(Bernardo 2009: 661). Assim, a selecção do tema e do conteúdo do texto pode ser feita
de modo a causar um certo efeito (um tema inusitado pode requerer concentração ou
provocar desagrado, ou somente desinteresse), sendo de particular importância para o
tradutor, que terá de recorrer a mecanismos de ligação para manter o interesse em
temáticas desconhecidas (Nord 1991: 133). O mesmo se aplica ao conteúdo e selecção
de detalhes informativos para ilustrar a temática, tal como às pressuposições, devendo o

58
tradutor decidir se deseja verbalizar informação que não pode ser pressuposta pelos
conhecimentos prévios do receptor do TC (Nord 1991: 133).

Por último, a autora germânica destaca a relação entre receptor e estilo, que
exige da parte do tradutor um conhecimento bastante aprofundado do efeito das figuras
de retórica dentro de cada cultura (Bernardo 2009: 661). Isto inclui igualmente registos
e formatos estilísticos que caracterizam todo o texto, como solenidade, carácter popular,
coloquial, etc. O tradutor deverá, preferencialmente, analisar as qualidades retóricas do
TP, confiando não apenas no seu instinto, e identificar o efeito dominante pretendido
pelo emissor, como o de docere (transmitir informação), delectare (produzir prazer
estético) ou movere (causar uma reacção específica no leitor). A convencionalização de
funções textuais em certos tipos de textos implica a convencionalização do efeito com
frequência, pelo que a escolha de características convencionalizadas é feita pelos
produtores textuais pensando já na sua identificação por partes dos receptores (Nord
1991: 134).

Mesmo admitindo que há diferentes tipos de efeitos, a autora não os insere numa
tipologia, preferindo falar de pólos entre os quais oscilam as variantes possíveis
(Bernardo 2009: 661). Assim, distingue os seguintes tipos:

- efeito adequado à intenção vs. efeito não-adequado – o efeito pode (i)


corresponder à expectativa gerada pelos factores extratextuais e suplementada pelo
intratexto no receptor ou à intenção do emissor ou (ii) produzir um efeito distinto da
intenção do emissor. Isto é tanto mais relevante em comunicação intercultural porquanto
o emissor do TP visa o receptor do TP e não o do TT.

- distância cultural vs. distância zero – o mundo textual pode a) corresponder à


CP (o receptor pode identificá-lo com o seu próprio mundo, havendo distância zero); b)
não corresponder nem à CP nem à CC, ou seja, ambas apresentam distância cultural,
devendo o emissor descrever explicitamente as características do mundo textual, que
servirá para o receptor do TC; ou c) efectivamente corresponder de facto à CP, mas o
emissor “desculturalizou-o” por meio de dados temporais e espaciais específicos,
causando assim um possível efeito de distância zero para CP e CC devido à utilização
de um certo grau de generalização (Nord 1991: 137).

59
- convencionalidade vs. originalidade – o efeito será tanto mais convencional
quanto mais previsíveis forem os elementos intratextuais, com base na função textual, e
quanto mais dominantes estes forem. Em sentido oposto, um texto terá um efeito
“original” se contiver bastantes elementos textuais determinados pela pessoa do emissor
ou a sua intenção particular. Os efeitos de textos com características estilísticas
convencionais dependem principalmente da sua mensagem (Nord 1991: 137)

Nord ilustra a interrelação de factores externos e internos ao texto por meio de


uma grelha extensa que apresenta para cada correlação factorial um exemplo de acção
ou acto comunicativo (Nord 1991:138). Confessamos que julgamos enigmáticos os
critérios de inclusão na mesma grelha, o que nos faz pensar na crítica de Bernardo à
mesma grelha e que tem que ver com a falta de eficácia da mesma por se não reportar a
um mesmo texto (Bernardo 2009: 661).

Relativamente ao nosso TP, podemos afirmar que estamos na presença de um


efeito bastante próximo do pólo da intencionalidade, tendo em conta a relação próxima
do emissor e sua intenção com a temática, como evidenciámos em análise prévia. Em
termos do parâmetro da distância cultural, o mundo textual corresponde
maioritariamente à CP (como a interrelação de factores extratextuais o mostra),
prevendo nós necessitarmos de efectuar operações de omissão ou explicitação para
aproximar da CC aqueles momentos textuais referidos a propósito das pressuposições.
No que toca à convencionalidade, será desse pólo que mais se aproximará, porque
dependentes de uma previsibilidade argumentativa e estilística deste tipo de texto de
divulgação científica, como o evidencia a função do texto descrita. Contudo, certas
características próprias do emissor, descritas no início da análise, contribuirão para um
efeito ligeiro de maior originalidade, também pensando nas características supra-
segmentais.

60
IV. As traduções enquanto variedades

No âmbito do nosso projecto de tradução, é para nós relevante para tradução


prosseguir com uma breve descrição da dimensão variacional do texto traduzido,
aspecto que nos foi salientado pela leitura e análise do manual do Professor Sinner, que
a ele lhe dedica um subcapítulo inserido em capítulo próprio sobre contacto linguístico,
desenvolvendo depois no capítulo oitavo a problemática das variação como dificuldade
de tradução. Pensamos poder afirmar que o esquema “pós-funcionalista” de Nord e a
adequação ao receptor de alguma forma reforçam o estatuto da tradução como criação e
recriação de variedade.

De acordo com Sinner, a tradução representa um caso especial de contacto


linguístico relacionado com a competência bilingue do tradutor e a (possível) adopção
de estruturas da LP na LC (cf. Sinner 2014: 255). Do ponto de vista tradutológico, a
questão premente é a de perceber se os textos traduzidos constituem uma variedade
própria da LC, ou seja, um tipo específico de variedade induzida por contacto. Ainda
que possa partilhar traços com os fenómenos de variedades linguísticas sincrónicas
induzidas por contacto ou as variedades típicas de aprendentes de língua estrangeira ou
de migrantes (cf. Sinner 2014: 244), não se deve aqui confundir com o conceito de
línguas mistas, tais como os chamados portunhol, spanglish ou mesmo portalemão19,
conceito que, aliás, não recebe consenso de credibilidade nos estudos linguísticos, para
cuja difusão errónea de motivação conceptual Sinner alerta, num contexto de “caos
terminológico”, do qual os linguistas, defende, se devem distanciar (cf. Döring 2007:
32). Importa igualmente não confundir variedade na tradução com tradutorês, indício de
uma tradução menos conseguida e que a denuncia como tal, a que faremos referência
mais à frente.

19 Termo avançado por Dias (1989), por referência aos “falares emigreses” que descreve, em particular à
variante do português falada por emigrantes e seus descendentes em solo alemão, cuja forma de língua
nativa influenciada por línguas de contacto, devido à sua relevância numérica e por meio das visitas a
Portugal e reemigração, terá já influenciado as variedades do português em Portugal (Sinner 2005: 1-
20).
61
Conforme Haßler (2001), a tradução diferencia-se das mais habitualmente
reconhecidas formas de contacto linguístico, nomeadamente dos seus fenómenos e
produtos, mediante uma série de características que incluem:

1. a consciência do estabelecimento do contacto, já que as soluções tradutórias não


surgem por si próprias na sequência de regularidades e preferências induzidas
por contacto e a tradução só de forma restrita será comunicação espontânea, pois
o tradutor reflecte nas estruturas da LP à disposição e tanto pode evitar
interferências, como utilizar empréstimos;

2. o facto de as grandezas de partida da tradução serem enunciados cuja devolução


de sentido na LP tem de encontrar verbalização numa LC por recurso a outros
meios linguísticos. O grau de classificação do processo tradutório como contacto
imediato depende da finalidade da tradução, que, por sua vez, dependerá
fortemente, e sincronicamente, do tipo de texto (cf. Haßler 2001: 154).

A tradução, sabe-se, não é apenas uma mera transposição, antes a transposição


para um novo mundo textual, processo que se torna tanto mais problemático quanto se
considerar as diferentes arquitecturas das variedades das línguas envolvidas. A já
clássica distinção, por Catford (1965), dos três tipos de tradução (palavra a palavra,
literal e livre) corresponderá ao nível da transcodificação, sendo igualmente legítima
como oferta de verbalização. Contudo, por contraste com o processo de
transcodificação, metalinguístico e direccionado à transparência das estruturas da LP e à
equivalência entre elementos individuais, a tradução, por seu lado, não se limita à
referenciação de um termo isolado e sim antes busca a verbalização numa outra língua
do Äußerungssinn (significado da enunciação). Tais Äußerungen vivem de relações
dentro dos próprios enunciados e de outras que residem no sistema linguístico. A esta
dimensão estruturalista somar-se-á, na esteira do conceito de norma de Coseriu, o
vínculo textual dos elementos linguísticos, implicando a realização relativamente
estável de meios linguísticos cujo efeito ultrapassa o do texto em que ocorrem. Os
textos utilizados transculturalmente exibem propriedades próprias e a tradução circulará
num contínuo entre textos de cariz conceptual e textos referenciais (cf. Haßler 2001:
161).

62
Cada elemento linguístico num texto opõe-se a uma simples transcodificação
devido a uma série de factores: pertencer a um sistema gramatical e estar condicionado
por relações gramaticais específicas; os lexemas possuirem, além do seu significado
referencial, uma qualidade semântica condicionada pragmaticamente, como Jakobson
apontara já (1966); determinados elementos – inclusive sintagmas – estarem vinculados
a textos de referência concretos, transportando a tal mundividência textual que deverá
ser explicitada na tradução. Certas propostas de verbalização são usadas pelo tradutor
quando as soluções na LC não são satisfatórias, podendo incluir empréstimos,
decalques, etc., contudo, o sucesso de tais resultados pode levar a que actuem além do
texto e sejam integrados no sistema da LC (ex.: variantes morfémicas, anglicismos
sintácticos, etc.) (cf. Haßler 2001: 165).

As variedades possíveis para esta actividade além da transcodificação poderão


restringir-se a duas, se se considerar a tradução por parte de nativos da LC ou a de não-
nativos da LC, ou ainda a três, mais incomum, que compreenderia a tradução de não-
nativos de LP e LC. Certo será que existe um consenso sobre o facto de os textos
traduzidos exibirem aspectos particulares face aos textos originais na mesma língua, tais
como frequências divergentes de utilização de meios linguísticos (cf. Sinner 2014: 256).

A literatura consultada parece desvalorizar o conceito de erro como relevante


para a aferição da tradução como variedade, reduzindo-o a “tradução incompetente”,
como refere Tirkkonen-Condit (2002) e designando-o por “translationese”, termo usado
pejorativamente e que remete para conceitos da Linguística das Variedades como o
jargão e a gíria, significando uma avaliação negativa da qualidade de uma tradução, por
oposição às caracterísitcas linguísticas ou textuais que não podem ser evitadas nos
textos traduzidos, os chamados universais de tradução (cf. Tirkkonen-Condit 2002:
208).

Em nossa opinião, porém, e pensando no conceito de competência defendido por


Bernardo e apontado em I.2, o conceito de erro não deve ser totalmente relegado da
consideração de traduções como variedades, isto se se tiver em conta uma classificação
de texto traduzido mais kolleriana e se se pensar que estamos perante uma tradução de
trabalho e não uma tradução finalizada. Além disso, consideramos mais adequada a
noção de erro avançada por Nord (1991), que difere do mero desvio de uma norma,
63
convenção ou sistema de regras, da quebra de uma norma numa situação de contacto
linguístico, resultado de deficiente competência linguística e factual. Nord disseca esta
noção dizendo que se refere a dois tipos de erro: a falta de compreensão será um erro
em parte linguístico e em parte pragmático, ligado à recepção; a violação de uma norma
pode ocorrer tanto na fase de transfer como de produção do TC. Assim, avança a autora
alemã uma noção funcionalista de erro, segundo a qual um enunciado não contém em si
a qualidade da incorrecção mas esta é-lhe atribuída pelo receptor à luz de uma
determinada norma, surgindo os erros de tradução, por conseguinte, em função do
skopos. Um erro de tradução será, assim, a falha no cumprimento de uma instrução de
tradução, de uma expectativa de modelo de acção, uma frustração das expectativas
(Nord 1991: 187), mas sempre do lado do receptor. Apesar de esta visão estar integrada
numa perspectiva pedagógica e de gestão das dificuldades das tarefas tradutórias,
julgamos ser útil porque igualmente recoloca o foco no texto traduzido como produto
linguístico resultante de contacto e interferência linguísticas, sendo sujeito a fenómenos
típicos da comunicação intercultural e da dinâmica de interafectação entre as variedades
de uma ou de várias línguas. Com efeito, em Linguística das Variedades, conceitos
como gramaticalidade e aceitabilidade não são pacíficos (Sinner 2014: 81) e a
catalogação de certas realizações como agramaticais ou inadequadas pode reflectir não
apenas mau juízo sobre a variedade em presença, como igualmente uma noção
autoritária de política linguística.

Curiosamente, porém, a literatura específica desta área (Delaere 2012: 220)


aponta para uma maior estandardização, ou aproximação à norma vigente, nos textos
traduzidos, em especial certos tipos de textos (nos quais se insere a nossa tradução de
um texto não-ficcional). No caso do estudo de Delaere, ainda assim, tais achados são
contrapostos com questões como a real originalidade dos textos originais na LC (o que
obrigaria a estudos sobre a influência de L2 nos mesmos), o papel de tradutores
literários versus tradutores técnicos na aplicação de tal estandardização, as políticas
editoriais e o papel das casas editoriais nos dados encontrados, entre outros (Delaere
2012: 221).

Regressando de novo a um local de consenso, já Baker (1993) havia referido a


existência de uma série de fenómenos típicos em tradução relacionados não com os
sistemas linguísticos envolvidos mas com o processo tradutório. Os textos traduzidos
64
serão mais explícitos e menos ambíguos, mais conservadores e mais simplificados,
havendo também a tendência para a utilização de estruturas tidas como standard, o
evitar repetições e a preferência por construções características da LC (cf. Sinner 2014:
256).

Enquanto que Baker designou tais características de universais de tradução,


outros autores usaram termos diferentes, como Toury (1995), que menciona duas leis,
precisamente a referida crescente estandardização e a da interferênica do TP. A ideia de
normalização assemelha-se ao conceito de convencionalidade de Chesterman (1997),
que reformulou a lei de Toury, dado que os tradutores tendem a substituir itens
específicos do texto por itens institucionalizados: as traduções tendem a ser menos
idiossincráticas e mais convencionalizadas do que os seus originais (Delaere 2012: 206).
Stewart (2000), numa referência à visão de Chesterman sobre itens institucionalizados,
afirma que essa convencionalização implica que boa parte do uso linguístico é rotineiro,
relacionando a hipótese da convencionalidade com o facto de que geralmente se
presume que os tradutores produzam uma linguagem menos criativa que os produtores
originais. Acrescenta que os tradutores que traduzem para uma língua não-nativa
produzem ainda mais texto convencional do que os que o fazem para a sua língua;
acrescenta também a ideia de que os corpora podem apresentar uma tendência
normalizante nos textos traduzidos e que, quando utilizados no estudo da tradução, na
verdade contribuem para a tendência normalizadora ao reduzir o aspecto criativo nas
traduções (cf. Delaere 2012: 206).

A explicitude em Baker significa que existirão menos itens potencialmente


ambíguos, tais como referências a nomes próprios sem um atributo genérico, ou
referências intertextuais por explicar, tais como alusões ou citações. A simplificação
lexical implica uma maior raridade de vocabulário menos frequente, prevendo a
hipótese da normalização que as traduções tendem a exagerar características frequentes
da LC, que metáforas e expressões idiomáticas serão mais convencionais e que as
expressões dialectais e coloquiais surgirão menos frequentemente (cf. Tirkkonen-Condit
2002: 208).

Katharina Reiß (1971) sugerira já que as traduções não explorariam todos os


recursos linguísticos da LC. Ao discutir os mecanismos de avaliação de qualidade da
65
tradução sem recurso ao TP, propõe esta autora o teste de se recolher as palavras mais
frequentes na LC que não existam na LP e verificar até que ponto surgem na tradução.
Estas palavras em falta revelariam se o tradutor domina a LC o suficiente para obter
uma boa qualidade na sua tradução. Segundo Reiß, esta regra geral aplicar-se-á não
apenas àquelas palavras em falta mas também a todos os conceitos e expressões que são
enunciados na outra língua com diferentes meios linguísticos (cf. Tirkkonen-Condit
2002: 209).

A este propósito, Tirkkonen-Condit (2002) avança uma hipótese potencialmente


universal que designa de hipótese dos itens únicos. Refere-se ao facto de os textos
traduzidos poderem manifestar menores frequências de elementos linguísticos que não
dispõem de equivalentes linguísticos na LP, de tal forma que poderiam igualmente ser
usados como equivalentes de tradução. Os elementos únicos não serão intraduzíveis,
podendo ser fenómenos frequentes, típicos e completamente normais na língua. Serão
únicos apenas no que toca ao seu potencial de tradução, dado que não se manifestam de
forma semelhante noutras línguas, ou pelo menos nas LP das traduções (cf. Tirkkonen-
Condit 2002: 209).

Uma série de estudos com base em corpora e que comparam textos originais e
traduções numa mesma língua mostraram que a existência de universais de tradução tem
vindo a ser considerada uma consequência do processo de tradução e de edição,
permitindo concluir-se que as traduções podem constituir variedades próprias no seio de
uma língua (cf. Sinner 2014: 256). Anthony Pym (2008) parece reforçar essa
preponderância do processo de produção, propondo que a tendência para estandardizar e
para canalizar a interferência da LP são ambas estratégias adversas ao risco e que o seu
estatuto enquanto leis possíveis depende da relativa ausência de recompensas para os
tradutores que assumem riscos, sendo que será na dinâmica da gestão de risco que se
poderão encontrar possíveis leis futuras. Numa tentativa de unificar as contradições que
assinala entre as leis de Toury e os universais de Baker, nomeadamente o facto de Baker
apenas ter em conta a primeira das leis tourinianas e não considerar suficientemente a
interferência, Pym argumenta que os tradutores tendem a estandardizar e a veicular
interferência porque são estas as duas formas principais de reduzir ou transferir o risco
comunicativo. Se o TP e a CP são autoritários ou prestigiosos, faz sentido permitir que
tal prestígio absorva o risco, produzindo assim interferência. Da mesma foram, se a
66
sintaxe da LP é particularmente difícil de interpretar, faz sentido investir em reduzir-lhe
a incompreensibilidade, produzindo assim estandardização (cf. Pym 2008: 19).
Revemo-nos nestas últimas observações no que toca à tradução que empreendemos.

Não se deve confundir esta questão de se considerar a tradução como variedade


própria no seio de uma língua com o desafio que representa a variação diassistemática
para a tradução. Podemos aventar, contudo, que um TC é variedade no seu, digamos,
diassistema de chegada (DC) também porque qualquer TP se insere num diassistema
próprio, de partida (DP). Apoiamo-nos aqui, novamente, na noção de lealdade de Nord
para com a intenção do emissor e na observação de que os factores de análise textual
propostos remetem na sua totalidade para categorias e dimensões elas próprias
integrantes do posicionamento do TP como variedade da língua, ou como locus
variacional.

Encontra-se isto em linha com a já extensa literatura tradutológica que avança


tipologias de variedades relevantes para a tradução. Sinner (2014) refere a de Catford
(1965), bem como a de Mayoral (1990), uma sintetização da catfordiana, que inclui
variedades mediais, estilísticas, origem geográfica, individuais (etnolecto), de género,
etárias, temporais (estados de língua, segundo Catford), socio-económicas,
profissionais, temáticas (registo) e segundo o tipo de texto (cf. Sinner 2014: 259). No
contexto da equivalência conotativa em tradução, Koller (1992) menciona as dimensões
diassistemáticas sob a forma de conotações: relativas ao nível de língua, sociais
(específicas de grupos), atinentes à origem geográfica, próprias do meio, específicas do
efeito estilístico, típicas da frequência, especiais do domínio de aplicação (linguagem
técnica) e particulares em termos de avaliação (cf. Sinner 2014: 261).

Tradicionalmente, os trabalhos sobre tradução de variedades diassistemáticas


têm-se debruçado mais preferencialmente sobre o nível diatópico, menos sobre o
diastrático, e mais sobre os textos literários ou ficcionais (cf. Sinner 2014: 262) 20.
Interessam-nos mais, pela natureza do nosso projecto, os textos não-ficcionais, nos
quais parece reinar o consenso de que o problema da variação em tais textos se reduz à
20 Um exemplo clássico desta problemática em Tradutologia é a peça Pygmalion, de Bernard Shaw.
Destacamos a sua abordagem por Ramos Pinto (2008), que analisa, do ponto de vista dos estudos
descritivos e com base em corpora, as estratégias tradutórias de recriação ou não recriação da variação
linguística de partida por relação com a manutenção da relação de equivalência formal entre coerência
interna de ambos os textos e suas consequências para a função prospectiva do TC.
67
detecção de pistas que a denunciem e à sua dissolução em língua comum/norma-padrão
pela tradução (Sinner 2014: 270). Em termos do exercício da profissão, a presença de
variedades diassistemáticas em textos não-ficcionais desempenhará papel relevante
apenas no sentido em que o tradutor deverá saber reconhecer certas estruturas como
marcas dialectais ou construções passivas próprias de uma variedade diatópica ou
diastrática e diafásica (linguagem médica em alemão e em português, por exemplo),
bem como reconhecer que tais estruturas não são transponíveis (Sinner 2014: 270).
Contudo, esta redução de marcas dialectais à norma-padrão no TC não se coaduna com
a necessidade de se identificar com precisão as relações intralinguais entre termos
aparentemente idênticos mas provenientes de variedades (tecnolectos, por exemplo)
específicas de tais línguas e com realizações também específicas nas variedades da
LC21. A designação “variacionista”, por exemplo, parece ser mais frequente na literatura
sobre Linguística das Variedades (ou variacional) preponderante no português do Brasil,
devido a uma maior influência da sociolinguística laboviana.

Seria necessária uma análise mais detalhada à tradução de trabalho que


incluimos neste projecto para se avaliar de que maneira as observações atrás expostas se
conformam aos resultados da análise ao TP por nós obtidos. As nossas expectativas vão
no sentido, contudo, de que o nosso TC apresentará crescente estandardização,
conservadorismo e menor criatividade que o TP e outros textos originais comparáveis
na LC.

21 Especialmente no caso das línguas pluricêntricas como o português e tendo em conta a forte
ancoragem cultural de muitos textos não-ficionais - textos jurídicos, por exemplo.
68
CONCLUSÕES

Christiane Nord (1991) refere que o processso tradutório circular pode ser visto
por analogia com um conceito hermenêutico moderno em que o círculo de compreensão
constitui uma metáfora para a interdependência de movimentos de tradição e do
movimento do intérprete (cf Nord 1991: 35, citando Gadamer 1972). Levý (1967) havia
já chamado a atenção para o jogo com informação completa, em que cada jogada é
influenciada pelos conhecimentos adquiridos na anterior e pela situação daí resultante
(in Nord 1991: 35). Paepcke (1986) sustenta que a base da tradução é a interpretação e
que, também devido ao papel de actor social por parte do tradutor, o processo de
tradução, como pergunta aberta que é, permanece sempre inacabado.

Concordamos com esta visão e o nosso projecto reflecte isso mesmo. A análise
que empreendemos poderia conter níveis sucessivos de profundidade e rigor que iriam
influenciar a utilização das peças do jogo comunicativo. Por este motivo, e também
devido às limitações de tempo e escopo que se nos apresentam, esta memória não inclui
ainda uma análise crítica ao TC, dando apenas a entender que traços são expectáveis na
mesma (e que podem ser contrastados com os trechos anexados) com base na análise
textual do TP.

A essa incompletude do processo não serão alheias as dificuldades e problemas


que sentimos, recorrendo à tipologia enunciada por Nord (1991).

 Quanto às primeiras, pensamos ter sentido com maior veemência as


dificuldades dependentes do tradutor, um nível de conhecimento e
competência por vezes insuficientes, tendo em conta que mesmo o tradutor
mais experiente encontra dificuldades relacionadas com a inexistência de
uma competência total, havendo sempre uma décalage entre o domínio da
LP e o da LC, a nativa;

 dificuldades pragmáticas relacionadas com a não formulação clara de


instruções de tradução, dado que, no nosso caso, foram sendo definidas ao
longo do processo;

69
 dificuldades técnicas, resultantes da diferença de conhecimentos entre a
temática e conteúdo do TP e o nível de conhecimento do tradutor, o que se
tentou minorar com a consulta de textos paralelos e de textos de referência,
bem como de materiais de apoio (como o Dicionário de Termos Linguísticos,
organizado por Maria Francisca Xavier e Maria Helena Mateus, e a
composição de um glossário).

No que toca aos problemas, pensamos que:

 a nível pragmático, a situação de uso do TP apresenta diferenças substanciais


face à situação prospectiva do TC (espaço, pressupostos, meio), mas não
obstam estes (em virtude da preponderância temática) a uma
equifuncionalidade pragmática;

 ao nível das convenções, não parece haver diferenças abissais, inclusive


havendo indícios de assimilação, por parte da CC, das convenções da CP por
apresentar menor estatuto;

 em termos de problemas linguísticos, certas diferenças estruturais entre LP e


LC ao nível lexical e sintáctico permanecem por resolver na nossa análise,
nomeadamente uma análise terminológica sistemática e o aprofundamento
da análise tema-rema e dos tipos de frases, manifestamente por falta de uma
prática que o possa efectivar em tempo útil, tal é a dimensão da obra em
análise;

 por fim, em termos dos problemas próprios do texto, ligados às


características do TP, referência para alguma insuficiência ao nível da análise
dos traços supra-segmentais e na identificação de figuras de estilo.

Não obstante, e se nos quisermos circunscrever, a posteriori, à formulação de


instruções de tradução com vista à obtenção de um skopos, e partindo das mesmas
questões operacionalizadas por Nord (1991) para o caso do TP, chegaríamos à seguinte
lista possível:

70
QUEM (Carsten Sinner) transmite
A QUEM (Leitores lusófonos)
PARA QUÊ (Divulgação científica de ponta sobre Linguística das Variedades)
através de QUE MEIO (Editora portuguesa – edição física e electrónica)
ONDE (Portugal)
QUANDO (2017)
POR QUE MOTIVO (Intenção do tradutor em dar a conhecer temática)
um texto com QUE FUNÇÃO? (informativa, didáctica)

SOBRE QUÊ (Linguística das Variedades)


o emissor diz O QUÊ (consultar paráfrase)
(O QUE NÃO DIZ) (pressuposições podem abundar em referências do TP à CC)
por QUE ORDEM (idêntica a TP, menos eventualmente exemplos e exercícios)
com recurso a que ELEMENTOS NÃO-VERBAIS (decisões de edição)

por QUE PALAVRAS (o existente já em PT + contraste com glossário)


por QUE TIPO DE FRASES (sintaxe inicialmente mimética, depois alvo de
edição e ajustamento de constituintes)
com QUE TOM (eventualmente dotado de menor originalidade que o do TP)
com QUE EFEITO? (convencionalidade, proximidade cultural, intencional)

Na acepção de Nord (1991), o TC esperado pode com segurança ser designado


como tradução instrumental, possível quando a intenção comunicativa do autor/emissor
do TP não vise exclusivamente os RPs mas também possa incluir receptores da CC, de
tal maneira que a proposta de informação do TP se mantenha, como foi referido.
Antevê-se uma tradução instrumental de cariz equifuncional, cujo propósito seja o
cumprimento das funções do TP no RC e um foco nas unidades funcionais. Assim, o TC
pretenderá ser um instrumento comunicativo por direito próprio entre o EP e o RC.

O problema da variação enquanto tradução assumiu-se como relevante no nosso


processo, principalmente em termos da identificação do tipo de texto e do registo
utilizado pelo autor, assim como da necessidade de explicitação (metalinguística) de
determinados exemplos em que eram empregues variedades diatópicas. Como

71
referimos, as expectativas para o nosso TC vão no sentido de apresentar crescente
estandardização, conservadorismo e menor criatividade que o TP e outros textos
originais comparáveis na LC, possivelmente colocando o nosso TC, enquanto
variedade, num contínuo variacional hipotético entre o tradutorês e a invisibilidade do
tradutor.

Esta dimensão da tradução enquanto variedade contribuiu de forma relevante


para o cumprimento de dois dos nossos objectivos para este projecto, o de explorar a
relevância teórica e prática da variação linguística para a Tradutologia e prática da
tradução e o de aprofundar os conhecimentos e práticas de tradução de textos científicos
na área da Tradutologia e da Linguística. O restante objectivo, o de dar a conhecer à
comunidade académica e profissional lusófona aspectos relacionados com a
problematização conceptual em torno da variação linguística levada a cabo no campo
germanófono, poderá concretizar-se com a edição de um TC que, esperamos, seja do
agrado de uma casa editorial, ou seja, possa cumprir a função pretendida, de forma leal.

72
BIBLIOGRAFIA

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75
ANEXOS

76
Anexo A: Glossário de siglas utilizadas (conformes à prática na disciplina)

CP – cultura de partida

CC – cultura de chegada

EP – emissor de partida

EC – emissor de chegada

LP – língua de partida

LC – língua de chegada

LSP – Language for Special Purposes (língua de especialidade)

RP – receptor de partida

RC – receptor de chegada

TP – texto de partida

TC – texto de chegada

77
Anexo B: Glossário terminológico bilingue (com base no capítulo 10, “Sprache und
Gesellschaft” - “Língua e sociedade” de Endruschat, Annette / Jürgen Schmidt-Radefeldt
(2006): Einführung in die portugiesische Sprachwissenschaft, e respectiva tradução para
português - Endruschat, Annette / Jürgen Schmidt-Radefeldt (2016), Introdução Básica à
Linguística do Português, trad. de A. Franco)

DE-DE PT-PT

Sprache und Gesellschaft Língua e sociedade

complexo de normas não marcado e


abstraktes, unmarkiertes Norm-Gebilde abstracto

Analyseparameter parâmetro analítico

Anredeform forma de tratamento

Architektur der Sprache arquitectura da língua

Ausdrucksweise modo de expressão

außersprachlich determiniert determinado extralinguisticamente

Aussprache pronúncia

Bantusprache língua bantu

bilinguale Gesellschaft sociedade bilingue

Bilinguismus Bilinguismo

Bündelung sprachlicher Varianten feixe de variantes da língua

Datenerhebung levantamento de dados

deutschsprachig de expressão alemã

Diachronie diacronia

diafrequente diafrequente

diaphasisch diafásico

78
diastratisch diastrático

Diasystem diassistema

Diasystematische Markierung marca diassistemática

diasystematisches Unterscheidungsmerkmal traço distintivo diassistemático

diatopisch diatópico

didaktisches Problem der Varianz problema didáctico da variação

differenzierter Beschreibungskatalog lista descritiva diferenciada

Differenzierungslinie linha de diferenciação

Diglossie diglossia

einsprachig monolingue

einzelne Sprechergruppe grupo concreto de falantes

endliches Inventar inventário finito

exoglossisch exoglóssico

freien Variante variante livre

funktioneller Parameter parâmetro funcionai

funktionelle Sprache linguagem funcional

gebildete Elite elite culta

Gebrauch einer Sprache política linguística

Gebrauchsnorm norma de uso

Gebrauchsnormen normas de uso

Gefüge von Systemen trama de sistemas

Gemeinsprache língua padrão

Generative Transformationsgrammatik gramática gerativa transformacional

Gesellschaft estrutura social

79
gesellschaftliche Funktion der Kommunikation função social de comunicação

grammatische Abweichung desvio gramatical

grammatischen Kompetenz competência gramatical

Grenzgebiet zona de fronteira

H-Varietät variedade H

historische Einzelsprache língua histórica

Hochdeutsch alemão padrão

individuelle Mehrsprachigkeit multilinguismo individual

institutionelle Mehrsprachigkeit multilinguismo institucional

Intersektionalität interseccionalidade

Koexistenz zweier Sprachen coexistência de duas línguas

kolloquial-vulgär coloquiais-vulgares

Kommunikationssituation situação comunicativa

kommunikative Absicht intenção comunicativa

kommunikativen Verhalten comportamento comunicativo

kompetente Sprachbenutzer sujeito falante competente

Kompetenz competência

konnotative Variante variante conotativa

Kreolisch crioulo

L-Varietät variedade L

liguistische Beschreibungsebene nível de descrição linguística

Mehrsprachigkeit multilinguismo

metasprachlich metalinguístico

80
mögliche Sprachverwendung uso possível da língua

Mundart dialecto

mundartlicher und stilistischer Unterschied diferença dialectal e estilística

nicht verwandte Sprachen línguas não aparentadas

Paraphrasebeziehung relação de paráfrase

Performanz performance

Phonem fonema

Phonematik Fonologia

Polyglossie poliglossia

portugiesische Nationalsprache língua nacional portuguesa

pragmatische Äquivalenz equivalência pragmática

probabilistische Grammatik gramática probabilística

Rederecht direito de falar

Redesituation situação de fala

Redestil estilo discursivo

Regionalvariante variante regional

regulierend eingreifen intervenção reguladora

relative Abgegrenztheit delimitação relativa

Repertoire von sprachlichen Mitteln repertório de meios linguísticos

Rollensystem sistema de papéis

Schweizerdeutsch alemão da Suíça

soziale Schicht estrato social

soziales Phänomen fenómeno social

81
Sprach(en)politik política de línguas

sprachbewusst consciência da língua

Sprachform forma de língua

Sprachgebrauch uso da língua

Sprachgemeinschaft comunidade linguística

Sprachkontakt contacto das línguas

sprachliche Realität realidade linguística

sprachliche Relativitätstheorie teoria da relatividade linguística

sprachliche Ausdrücke expressões linguísticas

sprachlicher Konflikt conflito linguístico

Sprachstufe nível de língua

Sprachsystem sistema linguístico

Sprachverwendung uso da língua

standardisierte Normgrammatik gramática normativa estandardizada

Stil- bzw. Sprachgebrauchsweisen estilos ou modos de uso da língua

Stilebene Nível de estilo

Subvarietät subvariedade

Synchronie sincronia

System von Systemen sistema de sistemas

systematische Gesamtschau visão sistemática de conjunto

Teildisziplin subdisciplina

Überblick visão de conjunto

Untersuchung investigação

82
Urteilsfähigkeit capacidade de formar juízos

Variablenregel regra variável

Variante variante

variationslinguistisch linguística variacional

Varietät variedade

Varietätengrammatik gramática das variedades

Varietätenlinguistik Linguística das variedades

Varietätenraum espaço de variedades

Verhältnis zueinander relação umas com as outras

Verschiedenheit der Sprachtechnik diversidade da técnica linguística

Verwendungssphäre esfera de uso

Wertorientierung orientação por valores

estrutura da palavra e da frase


Wort- und Satzbau (Morphosyntax) (Morfossintaxe)

Wortschatz (Lexikologie, Idiomatik) Léxico (lexicologia, fraseologia)

Zungenspitzen- und das Zäpfchen-r realizações apical e uvular

Zusammenleben von zwei oder mehreren


convívio de duas ou várias línguas
Sprachen

Zweisprachigkeit falar ou dominar duas línguas

83
Anexo C: Apresentação bilingue de trechos do TC - DE-PT

1. Einleitung 1. Introdução
Eine Sprache As línguas não
ist kein são monólitos.
Monolith. (Seidl/Wirth
(Seidl/Wirth 2008)
2008)

1.1. Ziele und Probleme 1.1. Objectivos e problemas


Nos últimos anos, as questões da linguística das variedades
Varietätenlinguistische Fragestellungen haben im ganharam uma importância crescente no espaço germanófono
deutschsprachigen Raum in den letzten Jahren in Forschung em termos de investigação e ensino, no que toca às filologias
und Lehre in den muttersprachlichen und fremd-sprachlichen de língua materna e língua estrangeira. A sua relevância para a
Philologien zunehmend an Bedeutung gewonnen, und ihre teoria e a prática, por exemplo no ensino de língua estrangeira
Bedeu-tung für die Theorie und die Praxis, etwa für den (cf. também Hensel 2000, Baßler/Spiekermann 2001a e
Fremdsprachenunterricht (vgl. bereits Hensel 2000, 2001b), foi também alvo de controvérsia. Testemunho desta
Baßler/Spiekermann 2001a und 2001b) ist auch kontrovers crescente popularidade, juntamente com o número crescente
diskutiert worden. Von der wachsenden Popularität zeugen de publicações em cujo título estão explicitamente referidos
neben einer ständig wachsenden Zahl von termos como variedades ou linguística das variedades , bem
Veröffentlichungen, in deren Titel explizit Termini wie como a inserção de questões centrais à linguística das
Varietäten oder Varietätenlinguistik genannt werden, auch die variedadess nos módulos de línguas em muitos cursos de
Aufnahme varietä-tenlinguistischer Schwerpunkte in die bacharelato ou de mestrado, é a referência a uma orientação ou
sprachwissenschaftlichen Module vieler Bachelor- oder competências em variação linguística nos concursos ao ensino
Masterstudiengänge, die Erwähnung varietätenlinguistischer superior e, não menos importante, a abertura de cadeiras
Aus-richtung oder Kompetenzen in Stellenausschreibungen professurais no campo da linguística das variedades.
an Fachhochschulen und Universitäten und nicht zuletzt die Aparentemente, as abordagens da linguística das variedades
Einrichtung von Professuren für Varietäten-linguistik. estão na moda. Convém aqui referir que também aqui se
Varietätenlinguistische Ansätze sind offensichtlich en vogue. verifica algo semelhante, tal como antes se constatou para
Dabei ist Ähnliches zu beobachten wie zuvor bei anderen outras abordagens ou paradigmas de investigação, como no
Forschungsansätzen oder -para-digmen, etwa dem Boom von caso do "boom" de trabalhos no âmbito da interculturalidade e
Arbeiten unter dem Blickwinkel der Interkulturali-tät und ultimamente também no contexto de "novas" orientações
zuletzt auch im Zusammenhang mit „neuen“ Ausrichtungen como a ciência de "transfer" ou ciências da vida, nas quais
wie der Transferwissenschaft oder Lebenswissenschaften, bei frequentemente se trata de um resumo dos domínios já
denen es sich häufig um die Zusammenfassung bereits existentes,. Esta tendência leva igualmente a que "se ofereça
existierender Arbeitsbereiche handelt. Dieser Trend führt vinho novo em odres velhos". Assim, existem estudos e
auch dazu, dass manchmal alter Wein in neuen Schläuchen publicações com a etiqueta linguística das variedades apesar
angeboten wird. So werden dann auch Studien oder de, após uma análise crítica, só de forma limitada a mereçam.
Publikationen mit dem Etikett Varietätenlin-guistik versehen, Será digna de registo a amplitude de temas que são hoje
die dieses bei kritischer Betrachtung nur bedingt verdienen. atribuídos à linguística das variedades, assim como a
Bemerkenswert ist die Breite an Themen, die heute der associação - variável – da mesma linguística a diversos
Varietätenlinguistik zuge-ordnet werden, sowie auch die – campos de trabalho, mesmo dentro da Linguística. Servirá
variierende – Zuordnung der Varietätenlinguis-tik zu como motivo de reflexão para esta problemática uma questão
unterschiedlichen Arbeitsbereichen in der Sprachwissenschaft intencionalmente provocatória colocada aquando do Sétimo
selbst. Als Denkanstoß hierzu soll eine sicherlich mit Absicht Congresso Internacional de Linguística Hispânica de Leipzig,
provokant formulierte Frage dienen, die in einer Debatte auf em 2009: É possível ainda hoje em dia algures na Linguística
dem 7. Internationalen Kongress zur hispanisti-schen ter uma perspectiva, que não apenas um olhar puramente
Linguistik in Leipzig im Jahr 2009 gestellt wurde: Kann man teórico e absolutamente formal, que mais tarde ou mais cedo
außer bei einem rein theoretischen, absolut formalen Blick não se consiga obter por meio da questão sobre as
auf die Dinge eigentlich irgendwo in der Sprachwissenschaft variedades?
heute noch etwas machen, bei dem man es nicht früher oder
später mit der Varietätenfrage zu tun bekommt?

84
Eine Einführung in die Varietätenlinguistik kann sich Uma introdução à linguística das variedades não se
nicht nur mit denjenigen Bereichen auseinandersetzen, die pode debater apenas com aquelas áreas que, numa análise
bei einer kritischen Analyse aus Sicht des Ver-fassers in crítica do ponto de vista do autor, pertencem ao seu
ihren Aufgabenbereich gehören, und nicht nur eindeutig domínio de competência, e inequivocamente não apenas
varietätenlin-guistische Modelle betrachten, sondern muss com modelos provenientes da linguística das variedades.
auch diejenigen Bereiche berück-sichtigen, die nur Pelo contrário, deve igualmente ter em conta aquelas áreas
manchmal als Teil der Varietätenlinguistik dargestellt que só por vezes são representadas como parte dessa
werden, und sollte auch Modelle vorstellen, die nur in linguística das variedades, e deveria também introduzir
manchen Philologien oder nur aus manchen Perspektiven modelos que são entendidos como abordagens da mesma
als varietätenlinguistische Ansätze verstanden werden. apenas em certas filologias ou certas perspectivas. É o que
Dies ist hier im Rahmen des (vom Umfang her) se procura aqui no âmbito (do) possível.
Möglichen versucht worden. Considerando a torrente de publicações e cada vez
Angesichts der Flut an Veröffentlichungen und immer mais variadas especializações surgidas nos últimos anos,
weiter reichenden Spe-zialisierungen in den letzten Jahren impôs-se uma selecção. Com isso, incorre-se sempre no
musste eine Auswahl getroffen werden. Da-mit geht perigo de não se abordar um tema tão aprofundadamente
immer die Gefahr einher, ein Thema nicht so eingehend como certos leitores e leitoras possivelmente esperariam,
behandelt zu haben, wie dies manche LeserInnen vielleicht ou até de se descurar completamente certos aspectos. A
erwartet hätten, oder manche Aspekte gar ganz zu selecção dos materiais aqui apresentados foi acompanhada
vernachlässigen. Bei der Auswahl des präsentierten de uma preocupação em abranger todos os modelos,
Materi-als wurde zwar Sorge getragen, jene Modelle, definições e publicações com especial relevância, interesse
Definitionen und Erscheinungen zu berücksichtigen, die ou que fossem alvo de debate. Procurou-se em especial
als besonders relevant, bemerkenswert oder diskutabel er- incluir as abordagens que promoveram a discussão num
schienen. Es wurde insbesondere versucht, diejenigen determinado sentido ou que representam determinadas
Ansätze einzubringen, welche die Diskussion in einer opiniões de forma mais marcada, que as clarificam ou que
bestimmten Richtung weitergebracht haben oder die podem ser vistas como pertencendo a um grupo de
bestimmte Positionen in prägnanter Weise repräsentieren, abordagens semelhantes. Esta selecção não pode
auf den Punkt bringen oder als Vertreter einer Gruppe von naturalmente deixar de ser subjectiva e não deve ser
ähnlichen Ansätzen angesehen wer-den können. Diese interpretada como fechada. Tentou-se em particular evitar
Auswahl kann aber natürlich nur subjektiv sein und ist representar qualquer modelo ou abordagem como melhor
auch nicht als geschlossen zu interpretieren. Insbesondere ou pior: esta introdução procura apresentar as abordagens
wurde vermieden, ein Mo-dell oder einen Ansatz als de forma compreensível, afastando, contudo, uma posição
besser oder schlechter darzustellen: Diese Einführung prescritiva. Assim, deve ter-se em conta que, na análise das
versucht, die Ansätze nachvollziehbar darzustellen, dabei diferentes abordagens, para certas problemáticas não existe
aber keine präskriptive Position einzunehmen. Es ist dafür uma resposta última e definitiva que seja a mais "correcta".
bei der Bearbeitung einzelner Ansätze zu be-achten, dass Os leitores e leitoras devem antes colocar-se na posição de
es für manche Fragestellungen keine endgültige, formularem um juízo autónomo e compreender como se
ultimative Antwort darauf geben wird, was nun „richtig“ desenvolvem as diferentes posições relativamente à análise
sei. Die LeserInnen sollen vielmehr in die Lage versetzt das variedades linguísticas. Por conseguinte, como
werden, sich ein eigenes Urteil zu bilden und die corolário do esforço de análise histórica da linguística das
Entwicklungen unterschiedlicher Positionen der variedades, serão igualmente apresentados modelos
Auseinandersetzung mit den Varietäten der Sprache ultrapassados e interpretações datadas que, olhando para as
nachzuvollziehen. Daher werden aus dem Bemühen um circunstâncias em que surgiram, devem ser entendidos
eine historio-graphische Aufarbeitung der como produtos do seu próprio tempo.
Varietätenlinguistik heraus auch inzwischen über-holte
Modelle und widerlegte Auslegungen erfasst, die aus ihren
Entstehungszu-sammenhängen heraus als Produkte ihrer
Zeit verstanden werden müssen.

85
Bei der Arbeit mit dieser Einführung sollte Na utilização deste manual de iniciação, deve
darum berücksichtigt werden, dass die ter-se em conta que as eventuais contradições que
Widersprüche, die sich zwischen den possam surgir entre as abordagens ou perspectivas
Herangehensweisen oder Perspektiven dos diferentes autores ou modelos não ocorrem em
unterschiedlicher Autoren oder Modelle ergeben benefício de uma determinada posição, mesmo que
können, nicht zugunsten einer bestimmten Haltung tal seja prática costumeira em algumas das
aufgelöst werden, auch wenn dies in manch einer introduções à venda no mercado ou em sub-
der auf dem Markt befindlichen Einführungen in domínios da Linguística. Isso é igualmente válido
die Sprachwissenschaft oder in Teilbe-reiche der para as contradições ou diferentes tendências e
Sprachwissenschaft durchaus übliche Praxis ist. preferências em termos de uso de terminologia da
Dasselbe gilt auch für Widersprüche oder parte de diferentes filologias, línguas ou países.
unterschiedliche Tendenzen oder Präferenzen beim Bastaria, assim, uma análise entre as abordagens
Gebrauch der Terminologie in verschiedenen fortemente divergentes do que se entende por
Philologien, verschiedenen Sprachen oder Ländern. registo, ou a questão sobre o uso do termo, para
So könnte etwa allein eine Aufarbeitung der sehr encher vários volumes.
stark divergierenden Auffassungen zu dem, was Por isso, nos exercícios propostos ao longo dos
unter Register zu verstehen ist, oder der Frage, wie
vários capítulos é possível vislumbrar
der Terminus gebraucht wird, mehrere Bände
recorrentemente problemáticas que visam possibilitar
füllen.
o reconhecimento das posições divergentes e uma
In den Aufgaben zu den einzelnen Kapiteln discussão crítica de posições divergentes ou
finden sich darum immer wieder auch contraditórias. Isso levará a que se tenha em conta a
Fragestellungen, die ein Erkennen der experiência, para muitos estudantes por vezes
kontrastierenden Positionen und eine kritische desencorajadora (e, com justificação, frustrante), na
Auseinandersetzung mit divergierenden oder sich preparação das aulas ou dos exames, de que outras
widersprechenden Aussagen ermöglichen sollen. informações, evidentemente outros "conhecimentos",
Damit wird der für viele Studierende mitunter sejam veiculados ou adoptados nas leituras ao longo
verunsichernden (und zu Recht frustrierenden) do curso de acordo com o uso do respectivo manual
Erfahrung Rechnung getragen, dass je nach de iniciação. Simultaneamente, tentar-se-á fornecer
Verwendung der einen oder der anderen Einführung uma análise histórico-disciplinar da linguística das
in der studien-begleitenden Lektüre, in der variedades, bem como da consideração dos seus
selbstständigen Unterrichtsnachbereitung oder bei aspectos linguístico-variacionais no contexto da
der Prüfungsvorbereitung, andere Informationen, Linguística.
augenscheinlich anderes „Wis-sen“ vermittelt bzw.
aufgenommen werden. Zugleich wird dabei auch ein
diszi-plinhistorischer Blick auf die
Varietätenlinguistik bzw. die Berücksichtigung va-
rietätenlinguistischer Aspekte in der
Sprachwissenschaft versucht. Lösungsvorschläge zu
einigen der Aufgaben finden sich unter
www.narr.de/narr-
studienbuecher/varietaetenlinguistik.

86
4. Variation im Raum: 4. Variação no espaço:
diatopische variedades diatópicas
Varietäten
4.1. Hochsprache, Umgangssprache, 4.1. Língua culta, linguagem corrente,
Dialekt …: Terminologie dialecto…: terminologia

Die Auseinandersetzung mit der Diatopie A abordagem da diatopia deve começar por
soll mit einer Betrachtung terminologi- uma consideração das problemáticas
scher Fragestellungen beginnen, die im terminológicas que se revelem adequadas
Hinblick auf die Traditionen im deutsch- tendo em conta as tradições no espaço
sprachigen Raum angebracht erscheint. Im germanófono. No contexto da variação
Zusammenhang mit geographischer geográfica, ou variedades diatópicas,
Variation bzw. diatopischen Varietäten ist muitas vezes fala-se de variedades locais,
vielfach von lokalen Varietäten, von de Mundart (falar), Dialekt (dialecto),
Mundart, Dialekt, Regiolekt, Regiolekt (regiolecto), überregionaler
überregionaler Umgangssprache u. Ä. die Umgangssprache (linguagem corrente
Rede. Die Un-terschiede und genaue nacional), e outras expressões que tais . As
Abgrenzung zwischen manchen dieser diferenças e a delimitação exacta entre
Ausdrücke sind allerdings selbst algumas destas expressões nem sempre é
Muttersprachlern des Deutschen häufig clara, mesmo para falantes nativos do
nicht klar, was bei der Frage nach den alemão, o que desde logo faz levantar a
Kriterien für die Klassifizierung von questão sobre os critérios para a
Varietäten als Sprache oder Dialekt bzw. classificação de variedades como língua ou
nach einer begrifflichen Klärung schnell dialecto, bem como sobre uma elucidação
deutlich wird. conceptual.

Tab. 4.1. Ausdrücke für Hochsprache,


Umgangssprache, Dialekt (nach Radtke 1973: 82)
Tab. 4.1. Expressões para Hochsprache, (língua
culta) Umgangssprache (linguagem corrente),
Dialekt (dialecto) (segundo Radtke 1973: 82)

87
7.3. Übersetzungen als 7.3. As traduções enquanto variedades
sprachkontaktbedingte condicionadas pelo contacto
Varietäten entre línguas
Übersetzung stellt – wie Dolmetschen – einen A tradução constitui - tal como o interpretariado -
besonderen Fall von Sprachkontakt dar, der an das um caso especial de contacto linguístico, o qual
übersetzende Individuum und seine Kompetenzen in depende do indivíduo que traduz e da sua
zwei Spra-chen und die mögliche Übernahme von competência nas duas línguas, bem como da
Strukturen der Ausgangs- in die Ziel-sprache geknüpft possível adopção na língua de destino de estruturas
ist (vgl. Haßler 2001). Aus da língua de partida (cf. Haßler 2001). Do ponto de
übersetzungswissenschaftlicher Per-spektive ist zu vista da Tradutologia, a questão a colocar será se os
fragen, ob übersetzte Texte eine eigene Varietät einer textos traduzidos constituem uma variedade própria
Sprache darstellen. Damit wären sie ein eigener Typ de uma língua. Dessa forma, corresponderiam a um
von kontaktbedingten Varietäten. Streng genommen tipo próprio de variedades condicionadas/induzidas
wäre zwischen mindestens zwei Arten solcher pelo contacto. Em rigor, dever-se-ia distinguir pelo
Übersetzungs-varietäten zu unterscheiden, den von menos dois tipos de variedades de tradução, a dos
Muttersprachlern der Zielsprache in ihre Sprache textos de falantes nativos da língua de destino que
übersetzten und den von Muttersprachlern der traduzem para a sua língua e a dos textos de falantes
Ausgangssprache in die Zielsprache übersetzten
nativos da língua de partida que traduzem para a
Texten (eher ausnahmsweise kämen von Nichtmutter-
sprachlern beider Sprachen angefertigte
língua de destino (a título mais excepcional poder-
Übersetzungen als dritter Typ der Über- se-ia incluir as traduções feitas por falantes não
setzungsvarietät dazu). Es besteht inzwischen nativos face a ambas as línguas como terceiro tipo
weitgehend Einigkeit darüber, dass übersetzte Texte – de variedade tradutória). Entretanto, existe um
abgesehen von sprachlichen Fehlern, um die es in consenso geral sobre o facto de os textos traduzidos
dieser Ana-lyse nicht geht – Aspekte aufweisen, die in - independentemente dos erros linguísticos, dos
Originaltexten nicht in dieser Form vorliegen, etwa quais não versa a nossa análise - exibirem aspectos
abweichende Frequenz sprachlicher Mittel. Delaere et que não existem nos textos originais sob a mesma
al. (2012) sind mit Messungen auf Grundlage eines forma, como frequência divergente de meios
Korpus von Originaltexten in belgi-schem linguísticos. Delaere et al. (2012), recorrendo a
Niederländisch und von ins belgische Niederländisch medições baseadas num corpus de textos originais
übersetzten Texten der Frage nachgegangen, ob em neerlandês belga e de textos traduzidos para a
übersetzte Sprache standardnäher ist als nichtüber- mesma variedade, abordaram a questão sobre a
setzte Sprache: língua traduzida é mais próxima do standard do que
The results of our analysis show that (i) in general, a não traduzida:
there is indeed a standardizing trend among
translations and (ii) text types with a lot of editorial The results of our analysis show that (i) in
control (fiction, non-fiction and journalistic texts) general, there is indeed a standardizing trend
contain more standard language than the less edited among translations and (ii) text types with a lot of
text types (administrative texts and external editorial control (fiction, non-fiction and
communication) which adds support for the idea journalistic texts) contain more standard
that the differences between translated and non- language than the less edited text types
translated texts are text type dependent. (Delaere et (administrative texts and external
al. 2012: 203) communication) which adds support for the idea
that the differences between translated (…)

88
8. Diasystematische Variation 8. Variação diassistemática e
und Translation tradução
8.1. Diasystematische Variation in der 8.1. Variação diassistemática na
Translationswissenschaft Tradutologia

Diasystematische Variation stellt eine besondere


Herausforderung für die Trans-lation – A variação diassistemática representa um
(schriftliches) Übersetzen und (mündliches) desafio particular para a tradução (escrita) e
Dolmetschen –1 dar.2 In ei-nem der Klassiker interpretação (tradução oral)1.2 Numa obra
der Auseinandersetzung mit den Problemen des clássica abordagem dos problemas da tradução
Übersetzens in deutscher Sprache, „Über die para língua alemã, "Sobre os diferentes métodos
verschiedenen Methoden des Uebersezens“, de traduzir", explica Friedrich
erklärte Friedrich Schleichermacher bereits Schleichermacher já em 1813 (1813/1838: 207–
1813 (1813/1838: 207–208): 208):

(...) (a inserir tradução para PT de José Miranda


Justo, Porto Editora, 2001)
Schleiermacher gebraucht hier noch nicht, wie in
der modernen deutschen Trans-
lationswissenschaft üblich, Dolmetschen für das Schleiermacher não utiliza aqui ainda o
mündliche und Übersetzen für das schriftliche interpretar, frequente na moderna Tradutologia,
Übertragen. Er erwähnt die Unterschiede para a transmissão oral, e traduzir para a escrita.
zwischen verschiedenen diatopischen und Menciona as diferenças entre diferentes
diastratischen Varietäten einer Sprache, geht auf variedades diatópicas e diastráticas de uma
diaphasische und idiolektale Unterschiede ein língua, aborda as diferenças diafásicas e
und berücksichtigt im Hinblick sowohl auf die idiolectais e tem em conta a perspectiva
Sprache als System als auch auf die Sprache des diacrónica, tanto em termos da língua como
Einzelnen die diachrone Perspek-tive. Damit sistema, como da língua do indivíduo. Com isso
zeigt er, wie ein Blick auf die in der mostra, como um olhar sobre os temas tratados
Translationswissenschaft behan-delten Themen pela Tradutologia evidencia, um entendimento
beweist, ein außerordentlich modernes excepcionalmente moderno da estruturação
Verständnis für die diasy-stematische Gliederung diassistemática da língua.
der Sprache.

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