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Vejamos uma reflexão sobre o racismo e uma das vertentes desse pensamento racista
pelas lentes de Clóvis Moura.
Por Clovis Moura
Um pensamento comum entre os historiadores precursores do racismoe
é a visão de que os negros. índios e mestiços em geral são elementos
bárbaros, pagãos, gentios sem capacidade civilizadora e os brancos,
detentores das estruturas de poder, aqueles elementos que
impulsionaram a nossa sociedade em direção à civilização.
Não queremos dizer que haja um racismo racionalizado e sistematizado,
pelo menos nos primeiros produtores dessa literatura, até o século XIX.
mas um racismo larvar, indefinido, que era justificado pela situação de
barbárie dessas populações, fato que explicaria a sua escravização,
subalternização e discriminação. Os pretextos religiosos ou de outra
ordem justificavam a aventura colonialista. A ideologia religiosa,
especialmente a 'cristã, foi, no particular, um anteparo que justifica a
escravização dos Filhos de Cam. Todos os historiadores cujo pensamento
analisamos são acordes num particular: os negros não tinham condições
de dirigir a sociedade; eram por determinação divina ou de outra ordem
condenados a serem massa dominada pelos brancos, detentores do
poder e do privilégio divino ou racial de dominar o mundo.
A partir de determinada época, mais especificamente a partir do século
XIX, surge uma corrente historiográfica científica, a qual procurava,
através de categorias evolucionistas vulgares, demonstrar que o negro
fora escravizado e dominado na Africa por razões de ordem biológica,
isto é. por se encontrarem na última escala da evolução racial e, por
isto, o seu cérebro e equipamento de psicológico e moral não tinham
condições acompanhar o pro cesso civilizatório.
A partir daí, época que coincide com a expansão do capitalismo na
Europa e o seu sistema de dominação planetária dos povos coloniais,
toda uma antropologia colonialista adquire o status de ciência e passa a
dar respaldo à aventura de dominação das metrópoles dominadoras. O
capitalismo monta toda uma arquitetura teórica para justificar
cientificamente o que antes era justificado através de razões bíblicas,
morais ou de competições locais. Com isto, o racismo como é hoje
conhecido racionaliza-se, isto é. deixa de considerar essas diferenças
raciais como simples opiniões teológicas ou empíricas, para afirmar que
cientificamente as raças não-brancas e o negro em particular
encontram-se oprimidos e discriminados por incapacidade biológica de
acompanharem o processo civilizatório, aqui confundido e identificado
com a expansão capitalista.
Um dos teóricos desse racismo antropológico, V. de Lapouge, escrevia
em 1880: "Estou convencido de que no próximo século milhões de
homens se matarão por um ou dois graus a mais do índice cefálico." Esta
afirmativa inteiramente destituída de conteúdo científico, mas cheia de
realismo político (realpolitik) foi dramaticamente concretizada na
ideologia nazista a qual, apoiada no mito da superioridade racial dos
nórdicos arianos, levou o mundo a uma tragédia sem precedentes. O
racismo, o mito de superioridade racial de um povo sobre outro,
encobre, presentemente, os interesses expansionistas ou messiânicos de
povos que se julgam eleitos e desejam, através dessa cortina de
fumaça, conseguir a hegemonia econômica, social e cultural sobre povos
mais fracos. Esta racionalização do preconceito através do racismo, por
isto mesmo, não morreu e ainda exerce papel e função de importância
em diversos blocos de poder de nações que disputam a hegemonia no
mundo capitalista.
Há, portanto, no presente momento, uma reformulação do racismo que
se corporifica em uma série de ideologias, muitas delas reivindicadoras
de pseudo-direitos milenares que nos levariam novamente a ter de ouvir
o discurso de um povo eleito o qual, através de um mandato bíblico,
estaria destinado a dominar o mundo. No entanto, a função dessas
ideologias é sempre a mesma: dar respaldo a projetos de exploração de
um povo militarmente mais forte sobre outro mais fraco. Com isto
queremos dizer que a função do moderno racismo é racionalizar a
permanência do capitalismo e da sua expansão sobre outros povos.
Definindo este novo racismo, Immanuel WalIerstein escreve:
O que entendemos por racismo tem pouca relação com a xenofobia
existente em vários sistemas históricos anteriores. A xenofobia era
literalmente horror ao "estrangeiro". O racismo do capitalismo
histórico não tinha nada a ver com os "estrangeiros". Muito pelo
contrário. O racismo era a forma como vários setores da força de
trabalho na mesma estrutura econômica eram obrigados a se
relacionar entre si. O racismo era a justificação ideológica para a
hierarquização da força de trabalho e suas distribuições
enormemente desiguais do rendimento. O que entendemos por
racismo é aquele conjunto de asserções ideológicas combinado com
aquele conjunto de práticas contínuas, que resultaram na
manutenção ao longo do tempo, de uma ulta correlação entre
etnicidade e alocação da força de trabalho. As asserções ideológicas
davam-se sob a forma de alegações que supunhum traços "culturais"
genéticos e/ou de longa permanência de vários grupos, e eram de
fato a causa principal da locação direrencial das posições nas
estruturas econômicas. Entretanto, as crenças de que certos grupos
são "superiores" a outros, em certas características relevantes para o
desempenho na área econômica, sempre surgiu de fato depois, e não
antes da locação desses grupos na força de trabalho. O racismo
sempre foi post hoc. Considerava-se que os que eram econômica e
politicamente oprimidos eram "inferiores" (lmmanuel WaJlerstein. O
capilalismo hislórico)
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