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1 INTRODUÇÃO
O livro “Introdução Crítica ao Direito das Mulheres” é o quinto volume da série “O
Direito Achado na Rua”. Essa série surgiu após a elaboração de um projeto de um curso de
extensão universitária a distância, por pesquisadores do Núcleo de Estudos para a Paz e os
Direitos Humanos (NEP), com a contribuição do Centro de Educação a Distância da
Universidade Federal de Brasília. E tinha como um de seus maiores propósitos ser um produto
de saber e reflexão da sociedade, a partir de articulações da mesma na luta por direitos e
justiça, transformada em uma experiência legítima ao nascer do meio social.
Essa ideia está inserida tanto em “Introdução Crítica ao Direito das Mulheres” como
em outros volumes da série, que reúnem textos com abordagens que possibilitam a construção
de um debate, de um diálogo, que pode ser entendido pelo popular, não necessitando de uma
formação acadêmica, pois se transforma em uma troca de conhecimento. O quinto volume que
visa debater os direitos das mulheres nasceu da necessidade dessa reunião de escritos que
pudessem servir de base para a formação das Promotoras Legais Populares (PLPs), a partir do
projeto de extensão “Direitos Humanos e Gênero: Promotoras Legais Populares”.
2.3 O Núcleo de Prática Jurídica como instrumento de promoção dos direitos humanos
As faculdades de Direito possuem um papel de extrema relevância na formação dos
operadores. Elas ficam responsáveis por incutir na formação dos alunos uma visão crítica do
Direito, e não somente uma perspectiva positivista do fenômeno jurídico, onde se enaltece
pura e friamente a letra da lei. As salas de aulas como lugares propícios aos debates acerca
dos direitos, demonstra que a universidade precisa estar interligada com a sociedade, a fim de
contribuir para a construção de um Direito produzido por diversos sujeitos sociais e
condizente com a realidade.
Neste contexto, inserem-se os núcleos de assistência e assessoria jurídica das
faculdades como exemplo desse diálogo plural entre a academia e a coletividade, pois atuam
também como um meio de corrigir injustiças praticadas contra categorias mais excluídas da
sociedade, ao reafirmarem os direitos destes e ampliarem o acesso à justiça. Isto é, não serve
apenas para que os estudantes desenvolvam na prática suas habilidades, mas também para a
promoção de direitos humanos, agindo em defesa da comunidade.
Como exemplo, pode-se citar o Núcleo de Prática Jurídica e Escritório de Direitos
Humanos e Cidadania (NPJ) da UnB como a sede original no Distrito Federal do curso das
Promotoras Legais Populares. A proposta de formação do curso juntamente com o NJP como
instrumento da participação popular resultou em uma experiência valiosa para as mulheres do
Distrito Federal, pois deu visibilidade aos problemas enfrentados por elas, principalmente em
relação à violência doméstica, e provocou mobilização. O diálogo plural, a partir de uma
troca, acaba produzindo novas formas de expressão legítimas para combater injustiças antigas
e ascender os direitos já consolidados.
3.7 A luta das mulheres contra a desigualdade é uma luta contra o capitalismo
Assim como o patriarcado, o capitalismo é um dos sistemas de dominação e
exploração estruturantes da sociedade. Ser mulher em uma sociedade patriarcal e capitalista
significa sofrer a naturalização da dominação masculina por meio da cultura e a exploração da
lógica do capital. Nesse modelo econômico, a acumulação e a obtenção de lucro são feitas por
uma pequena parcela do grupo social a partir da exploração da grande maioria. Sendo assim, o
capitalismo se beneficia do patriarcado instituindo a divisão sexual do trabalho.
Essa sociedade, baseada em valores desiguais dispostos hierarquicamente, explora
distintamente os homens e as mulheres. A divisão sexual do trabalho significa dizer que
mulheres ocupam as tarefas de reprodução, o trabalho ligado ao mundo privado; enquanto os
homens, a produção, sendo assalariados. Isto é, usa-se o pressuposto de que o trabalho
feminino é um dom, inerente ao seu sexo, cabendo a ela exercer esse talento das atividades
domésticas, da educação e do cuidado. As mulheres que decidem desbravar o mundo
produtivo do trabalho, acabam ganhando uma renda menor do que os homens, mesmo
ocupando igual função, cargo ou sendo mais qualificadas.
A diferença salarial é um problema social presente atualmente e que tem raízes na
cultura machista. Apesar de muitas mulheres ocuparem cargos da vida pública, elas acabam
ocupam profissões que possuem características de cuidado, porque estão próximas das
habilidades que elas adquiriram durante a sua socialização. Assistentes sociais, empregadas
domésticas, babás e professoras são alguns dos exemplos de profissões desvalorizadas e mal
remuneradas por serem exercidas por figuras femininas.
É importante pontuar também a tripla jornada que a mulher enfrenta, tendo em vista
que mesmo com a inserção da mesma no mercado de trabalho, as funções de cuidadora do lar
e ainda dos filhos não foram apartadas dela, resultando em uma sobrecarga.
Então, tudo isso ilustra bem a divisão sexual do trabalho imposta pelo capitalismo, que
jogou somente sobre os ombros das mulheres as principais atividades de sustentabilidade da
vida, ausentando os homens e o Estado de qualquer responsabilidade ligada a essa situação.
Sendo, portanto, de extrema importância compreender que a luta pela desigualdade de gênero
é também uma luta contra o capital.
6.5 Família não é lugar de violência: Mulheres construindo um novo direito de família
fundado no afeto
A ideia tradicional e triangular de família composta pelo pai, pela mãe e pelo filho,
vem sendo desmantelada como a única forma de organização possível e “correta”. As novas
configurações familiares, mais baseadas no respeito e afeto, estão sendo incluídas no
imaginário social, após longos anos de muito sofrimento, tendo em vista que o grupo familiar
era, e ainda é, um lugar de controle. O modelo triangular surgiu de uma junção de duas
ideologias diferentes, mas que tem como objetivo o poder através da exploração: o
patriarcado e o capitalismo.
Quando se fala em relações familiares patriarcais e capitalistas, pressupõe-se que as
mulheres são incapazes de participarem da vida pública, cabendo ao pai e ao marido assisti-
las na gerencia dos bens para sobreviverem. Logo, o homem e a mulher se completam, e
devem seguir a moral cristã que prega o casamento com a geração de filhos, para que estes
venham a se apropriar e gerar a acumulação de bens deixados pelo pai. Sendo assim, as
mulheres têm o dever de serem recatadas e gerarem filhos de sangue aos seus maridos;
enquanto estes, têm o dever de manter a honra da família, controlando sua esposa e gerando
patrimônios.
Pode-se ver então como o grupo familiar serve como uma instituição hierárquica de
controle de cada indivíduo e de satisfação de interesses, de acordo com a lógica do capital,
onde pequena parcela da sociedade possui riquezas através da exploração da maioria. A
influencia desse modelo construiu uma legislação que oprimia as mulheres, permitindo, por
exemplo, que os maridos pudessem cometer violências contra suas esposas, a fim de corrigi-
las, e estupra-las, pois, o sexo era uma obrigação da esposa. As mulheres, conforme o tempo,
foram resistindo e sendo o motor de transformação da família, tendo em vista que sua
organização e luta foram de total importância para que muitas mudanças acontecessem.
Apesar das alterações na lei, os dados de mulheres vítimas de violência dentro da própria
família é um dos mais altos ainda hoje.
6.13 As mulheres atingidas por barragens e a violação dos direitos humanos no atual
modelo energético
O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e outras entidades da sociedade
civil denunciam o modelo de implementação, desenvolvimento e planejamento das barragens,
questionando quais os reais interesses das instalações. Dados coletados por tais instituições
demonstram a dinâmica de violação de direitos humanos na construção de barragens, ao
expulsar milhares de pessoas de suas casas e terras, agravando ainda mais a situação de
desigualdade social vivenciada pelas mesmas. Tal situação se agrava ainda mais no caso das
mulheres, tendo em vista a discriminação de gênero.
Devido a divisão sexual do trabalho, as mulheres são um grande número nas
atividades informais e autônomas. Sendo assim, com a chegada das barragens, elas perdem
sua ocupação que gerava renda, sendo difícil retornar, tendo em vista que dependiam muito da
área onde já tinham vínculos. Além do mais, não são reconhecidas como atingidas pelas
barragens, pois comumente não possuem as terras em seus nomes, pois dependem dos
maridos, aumentando ainda mais sua invisibilidade. Torna-se necessário a organização das
mulheres a fim de transformar a realidade social, a partir da pressão do poder público na
inclusão de políticas públicas que auxiliem a população e impeçam a busca cega por lucro das
transnacionais.