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R$ 9,90
DEPRESSÃO
NA SOCIEDADE DO VAZIO
ENTREVISTA COM MARIA RITA KEHL
BRIZOLA NETO
HERANÇA FORTE NA
LUTA NACIONALISTA
INJUSTIÇA ESCANCARADA
O QUE FAZER PARA PUNIR JOSÉ PADILHA
RICOS E PODEROSOS “GARAPA” MOSTRA
A DUREZA DA FOME
GUTO LACAZ MARILENE FELINTO GLAUCO MATTOSO ANA MIRANDA JOSÉ ARBEX JR. GILBERTO VASCONCELLOS MARCOS
BAGNO FERRÉZ JOÃO PEDRO STEDILE RENATO POMPEU TATIANA MERLINO EDUARDO SUPLICY GEORGES BOURDOUKAN
HAMILTON OCTAVIO DE SOUZA CESAR CARDOSO FREI BETTO GERSHON KNISPEL FIDEL CASTRO EMIR SADER MARCELO SALLES
PLÍNIO TEODORO CAROLINA ROSSETTI FELIPE LARSEN MC LEONARDO ULISSES TAVARES GUILHERME SCALZILLI CLAUDIUS
www.carosamigos.com.br
Com as obras de infraestrutura do PAC,
a roda da economia gira, o Brasil se
desenvolve e fica melhor para todos.
• O Governo Federal, estados, municípios e a iniciativa privada estão se movimentando
para fazer um Brasil melhor para todos. Com o PAC, serão investidos mais de
R$ 646 bilhões até 2010.
Complexo do
Alemão - RJ
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BR 101 - NE
Confiança no Brasil.
É assim que a gente segue em frente.
CAROS AMIGOS ANO XIII 146 MAIO 2009
Injustiça escancarada
04 Guto Lacaz.
EDITORes: hamilton octavio de souza, igor fuser e jose arbex jr EDITORa adjunta: Tatiana Merlino EDITOR ESPECIAl: Renato Pompeu EDITORiA DE ARTE: Henrique Koblitz Essinger e Ricardo Reis (Coordenador) editor de FOTOGRAFIA: Walter Firmo REPÓRTERes: Camila
Martins, Felipe Larsen, Fernando Lavieri, Luana Schabib e Marcos Zibordi ESTAGIÁRIOS: Bruna Buzzo e Carolina Rossetti CORRESPONDENTES: Bosco Martins (Mato Grosso do Sul), Marcelo Salles (La Paz), Maurício Macedo (Rio Grande do Sul) e Anelise Sanchez (Roma) SECRETÁRIA
Da REDAÇÃO: Simone Alves DIRETOR DE MARKETING: André Herrmann PUBLICIDADE: Melissa Rigo CIRCULAÇÃO: Pedro Nabuco de Araújo Relações Institucionais: Cecília Figueira de Mello (Coordenadora) ADMINISTRATIVO E FINANCEIRO: Ingrid Hentschel, Elisângela Santana
CONTROLE E PROCESSOS: Wanderley Alves, Elys Regina LIVROS CASA AMARELA: Clarice Alvon Sítio: Paula Paschoalick (Editora), Ecomm (Desenvolvimento) APOIO: Alessandra Martins, Douglas Jerônimo e Neidivaldo dos Anjos ATENDIMENTO AO LEITOR: Lília Martins Alves, Zélia
Coelho e Maura Carvalho ASSESSORIA JURÍDICA: Marco Túlio Bottino, Aton Fon Filho, Juvelino Strozake, Luis F. X. Soares de Mello, Eduardo Gutierrez e Susana Paim Figueiredo REPRESENTANTE DE PUBLICIDADE: BRASÍLIA: Joaquim Barroncas (61) 9972-0741.
JORNALISTA RESPONSÁVEL: hamilton octavio de souza (MTB 11.242)
diretor geral: wagner nabuco de araújo
CAROS AMIGOS, ano XIIi, nº 146, é uma publicação mensal da Editora Casa Amarela Ltda. Registro nº 7372, no 8º Cartório de Registro de Títulos e Documentos da Comarca de São Paulo, de acordo com a Lei de Imprensa.
Distribuída com exclusividade no Brasil pela DINAP S/A - Distribuidora Nacional de Publicações, São Paulo. Impressão: Bangraf
Ditabranda categoria”, como a sra. diz. Todos ficaram sa- gurar a paz e a ordem social, protegendo e
Numa época em que o ex-presidente do bendo da avaliação com meses de antecedên- restaurando direitos.
Estados Unidos autoriza técnicas de tortura cia. Tem como defender um “professor” que Desembargador Pedro Ranzi
no interrogatório de acusados de terroris- acertou uma, duas, cinco ou dez questões? Presidente
mo, o jornal Folha de S. Paulo tenta atenuar Humberto Silva, São Paulo - SP
Dossiês
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a estupidez e a crueldade do período de dita-
dura militar no Brasil, que torturou, exilou Caros Amigos Em reparo a inverdades contidas na repor-
e assassinou presos políticos. Um discurso Sou assinante da Caros Amigos há muito tagem assinada por Palmério Dória e publicada
mentiroso e hipócrita justificou o golpe de tempo e percebo que a minha impressão é na edição nº 143, esclareço aos leitores da Caros
estado no Brasil. Mentira e hipocrisia legiti- que a revista não acompanha mais os novos Amigos, em primeiro lugar, que estive à fren-
maram a invasão do Iraque. Cuidado, a His- tempos. Parece que vocês não deixaram ain- te da Gerência Geral de Segurança e Investiga-
tória é cíclica... TORTURA NUNCA MAIS!!! da as camisas e bandeiras juvenis. Parecem ções da Anvisa e não do “Serviço de Inteligência
André Brandão, abrandao68@yahoo.com.br velhos que não amadureceram com o tempo do Ministério da Saúde na gestão José Serra”.
e ainda brigam por coisas boas, mas de ma- Em segundo lugar, o repórter ressuscitou ve-
Jackson Lago e Roseana Sarney neira puramente juvenil. Resultado? Recebo lhas mentiras, todas devidamente rebatidas à
O império faraônico dos Sarney vai aca- a revista em casa e nem olho mais. época, quando comprovei serem descabidas as
bar como o império faraônico dos Maga- Ismael Santos Teixeira informações que atribuíam a mim a elaboração
lhães: ACM Neto perdeu recentemente para de dossiês contra políticos. Na verdade, o meu
prefeito em Salvador, Paulo Souto tomou um Adoro a revista, mas não gostei do papel trabalho na Anvisa se restringiu ao desmantela-
banho de Wagner nas urnas das eleições de que está sendo usado agora: é muito brilhan- mento das quadrilhas de fraudadores de remé-
2006 para governador da Bahia. Tá acaban- te e reflete a luz. dios. Em relação à CPI dos Grampos, por mim
do com aquela conversa de “meu curral”. Dirceu Mezzette da Costa presidida na Câmara Federal com total indepen-
Esdras Souza, Itabuna/BA dência, esclareço que investigamos fatos, e não
Protógenes Queiroz pessoas. Contudo, por terem mentido à CPI, de-
Marilene Felinto Poder Judiciário do Estado do Acre fendo o indiciamento por falso testemunho do
Marilene Felinto, li sua coluna na Caros NOTA DE REPÚDIO delegado Protógenes Queiroz, do ex-diretor da
Amigos de abril e gostaria muito de repro- Rio Branco, 27 de março de 2009 Abin, Paulo Lacerda, e do ex-diretor-adjunto da
duzi-la na Editoria de Educação do Fazendo O Poder Judiciário do Estado do Acre, na Abin, Milton Campana. Proponho, ainda, o indi-
Media. Aproveito para manifestar meu apre- pessoa de seu Presidente, Desembargador ciamento do banqueiro Daniel Dantas pelo cri-
ço e admiração pelos seus textos sempre bri- Pedro Ranzi, diante das declarações feitas me de interceptação ilegal.
lhantes. Geralmente é pela sua coluna que pelo delegado da Polícia Federal Protógenes Deputado federal Marcelo Itagiba (PMDB-RJ),
eu inicio a leitura da Caros. Queiroz, em entrevista para a revista Caros presidente da CPI dos Grampos
Denilson Botelho, Professor e Historiador Amigos, e agora repercutidas na imprensa
Editor de Educação do Fazendo Media local, vem expressar publicamente o seu re- Palmério Dória responde:
www.fazendomedia.com púdio às informações divulgadas, considera- A ordem dos fatores não halterofilista,
Espaço interativo virtual: Na Bruzundanga das infundadas, irresponsáveis e caluniosas como dizia o saudoso Stanislaw Ponte Preta.
http://nabruzundanga.blogspot.com contra esta Instituição. Marcelo Itagiba está habilitado a prestar ser-
Devido à gravidade das declarações, cau- viços a José Serra, Fernando Henrique Car-
Dona Marilene Felinto, caso houvesse o sadoras de danos à imagem do Judiciário doso, Gilmar Mendes e Nelson Jobim seja lá
concurso que a sra. defende, pelo aproveita- Acreano, serão adotadas as medidas judi- onde for. Pena para o doublê de delegado e
mento na referida prova , seriam esses profes- ciais cabíveis, de forma a trazer a público a parlamentar é que, daquela vez, na operação
sores mais antigos, os excluídos. Seus “direi- verdade dos fatos. na Lunus de Jorge Murad e Roseana Sarney,
tos” teriam ficado de fora. Por outro lado, os A Justiça do Estado do Acre não permi- a ideia era ranquear Serra, mas deu Lula.
que se saíram melhor na avaliação, boa parte tirá atos levianos de desmoralização e con- Além disso, se ele acredita em grampo sem
vem dessas “faculdades particulares de quinta tinuará cumprindo a sua missão de asse- áudio, posso acreditar no que quiser.
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Thais?
Presente!
Quando este texto sair – porque a revis- A de Thais foi dessas mortes inesperadas O título deste meu texto “Thais? Presen-
ilustração gil brito
ta é de publicação mensal –, Thais já terá (um carro, uma estrada, um choque brutal), te!” tem a ver também com que ela foi: trata-
morrido haverá dois meses. E esses tempos que não deixam de provocar um sentimen- se da saudação, palavra de ordem (conforme
de verbo (“terá morrido”, “haverá” – futuro to de inconformismo, de revolta, como se o uma amiga em comum lembrou na home-
do presente composto e futuro do presente lógico fosse sempre a vida e não a morte – nagem íntima que oferecemos a ela), que o
simples), parecem não naturais (soam des- especialmente de quem ainda não dobrara o MST usa para invocar seus heróis, anôni-
conexos na leitura) e deveriam ter o nome cabo das tormentas dos 50 anos (que com- mos ou não, em reuniões.
de “futuro absurdo”, não fosse toda a idéia pletaria este ano). E Thais Sauaya Pereira Entre tantos erros nossos humanos (lem-
de futuro ser em si absurda. Como se conce- (1959-2009) foi uma espécie de “José Cláu- brou outra amiga nossa), Thais parece ter fei-
be um “futuro do presente”, um “futuro do dio”. Quem foi José Cláudio? Também não to tudo certo antes de ir embora: como quem,
pretérito”? O tempo presente, diz a gramá- sei exatamente (fui eu, foi você): um conhe- no poema, toma antes uma consoada (leve re-
tica, é indivisível; mas o pretérito e o futuro cido (ou amigo ou parente) do poeta pernam- feição noturna, sem carne, que se toma em
subdividem-se, explica: pode haver pretéri- bucano Manuel Bandeira, que transformou dia de jejum); como quem vê na morte uma
to perfeito, imperfeito e mais-que-perfeito; o nome de José Cláudio em poesia e escre- presença “caroável” (que procura ser amável
futuro do presente e futuro do pretérito. Po- veu sobre ele versos magníficos: “O espanto através de palavras ou gestos; afável, gentil,
de-se dizer, portanto, que o tempo presen- que nos deixaste!/Como fizeste crescer em afetuoso); como quem, caralho!, lavrou antes
te (o indivisível) é, no estrito senso, a única nós o mistério augusto da morte! (...)”. o campo, limpou a casa, pôs a mesa, deixou
forma de realidade (Schopenhauer). É isto. Não se darão para Thais nomes de ruas nem cada coisa em seu lugar. Como se o poema ti-
Tiro aqui uma licença poética para escre- se construirão para ela espetaculares pontes vesse sido escrito mesmo para ela.
ver sobre Thais e não sobre os outros temas de homenagem (como se constroem para os
quaisquer que costumo escolher. Deveria co- grupelhos de direita no poder e seus amigos). Consoada
meçar corrigindo o parágrafo introdutório, Nem Thais, eu acho, desejaria ter seu nome Manuel Bandeira
mudar para o tempo do leitor (o tempo verbal estampado numa ponte. Era insurgente, re-
do momento em que se dá o fato: o presen- volucionária natural, uma força das forças Quando a Indesejada das gentes chegar
te da leitura, o passado da morte de Thais). sociais, triunfo da revolução sobre o reacio- (Não sei se dura ou caroável)
E começaria o texto assim: Thais morreu faz narismo, uma dessas que ajudou a construir, Talvez eu tenha medo.
dois meses (no dia 23 de março de 2009). A nos bastidores, um país menos pior chama- Talvez sorria, ou diga:
escolha inicial, pelo tempo “futuro absurdo”, do Brasil, um lugar de menos desilusão para – Alô, iniludível!
é resultado do impacto que a morte súbita amigos seus, filhos seus, seus parentes, seu O meu dia foi bom, pode a noite descer.
desta pessoa amiga ainda tem sobre mim. marido. Militante de esquerda desde o Movi- (A noite com os seus sortilégios.)
Tiro licença, como se eu pudesse ser um mento Estudantil na década de 70, contribuiu Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,
Manuel Bandeira (1886-1968), que escreveu para desenhar isto que hoje se chama Parti- A mesa posta,
dúzias de elegias, poemas ternos e lindos, do dos Trabalhadores (PT) – tudo sem car- Com cada coisa em seu lugar.
para os amigos mortos (e para os vivos): “A go, tudo no anonimato. Colaborou até mesmo
Mário de Andrade Ausente”, “Ovalle”, “Olegá- para uma convicção quase impossível: de al- (OPUS 10)
rio Mariano”, “...Augusto Frederico Schmidt”, guma “resistência ética e grandeza no jorna-
“José Cláudio” etc. etc. Não tenho tantos ami- lismo”, título do perfil biográfico que escre- Marilene Felinto é escritora.
gos, e tenho menos ainda a verve poética. veu sobre o jornalista Aloysio Biondi. marilenefelinto@carosamigos.com.br
A “ditabranda”
mostra as suas garras
Golpe. Puro e simples golpe. Golpe vaga- exceção, peço desculpas antecipadas): “ditabranda” estão em pleno mo-
bundo, de republiqueta de banana. Golpe de todos permaneceram caladitos, obedientes e vimento em nosso país.
jagunço, de gente baixa e mesquinha, de pig- obsequiosos diante do grande marimbondo de As elites (se é que se pode utilizar tal
meu moral, de candidato a ditador. O idioma fogo José Sarney. conceito no caso brasileiro), com a parti-
falta para caracterizar o que foi feito no Mara- E os outros partidos de esquerda? Protesta- cipação decisiva, vergonhosa e capitulado-
Para entender qual é a do Obama em relação a nós, latino-ame- A Coréia do Sul tem uma população 7 vezes menor que a dos Esta-
ricanos, precisamos conhecer o que o maior antropólogo do sécu- dos Unidos. No entanto, a cada ano, ela forma o mesmo número de en-
lo XX, Darcy Ribeiro, pensou sobre os Estados Unidos na história genheiros que os EUA. Num programa internacional de avaliação, os
da humanidade. sul-coreanos ficaram com o 1o lugar em solução de problemas, 1o em
Toda a obra de Darcy Ribeiro traz alguma importante reflexão a res- leitura, 3o em matemática e 7o em ciência. Em 1945, a taxa de alfabeti-
peito dos EUA, país que se converteu na vanguarda do imperialismo e zação no país era de 22%, hoje é de 99%. É o que acontece quando uma
que ajudou a derrubar João Goulart em 1964 e exilar Leonel Brizola. nação mobiliza todos os seus recursos em favor da educação. Corta.
Em toda sua vida deve ter ido apenas uma única vez (quando já Em 2007, divulgou-se o INAF (Indicador de Analfabetismo Funcio-
estava com câncer) aos EUA, embora sua amiga e tradutora para o nal): 75% dos brasileiros entre 15 e 64 anos são incapazes de ler e in-
inglês de O Processo Civilizatório, Betty Meggers, tivesse insistido terpretar adequadamente um texto simples. Se somos hoje quase 200
várias vezes para que ele fosse conhecer o país do Tio Sam. Sua mu- milhões, significa que 150 milhões são analfabetos funcionais, isto é,
lher, a etnóloga Berta Ribeiro, de origem romena, poliglota, falan- pessoas que tiveram acesso à escolarização mas não desenvolveram
do perfeitamente o inglês, tinha uma irmã que morava nos EUA. plenamente as habilidades de leitura (e de cálculo também), o equiva-
Depois de regressar do exílio, Darcy recusou bolsa oferecida lente às populações somadas da França e da Alemanha.
pela Ford Foundation porque os EUA haviam ajudado a derrubar Esses dados não seriam suficientes para escandalizar nossas clas-
João Goulart. A vantagem de sua tão alardeada personalidade nar- ses dirigentes? Não. A história da nossa formação social mostra que,
císica é que ele deixou registrados todos os episódios e momentos há meio milênio, as classes dirigentes brasileiras não só não se escan-
de sua biografia, conforme se lê em Confissões (1997). dalizam como tiram o máximo proveito desse abismo social que sepa-
Montevidéu, primeiras semanas de exílio, estavam lá seus amigos an- ra o pequeno círculo dominante da monumental maioria de classes
tropólogos Clifford Evan e Betty Meggers oferecendo-lhe bolsa de estu- subalternas. Os dados do analfabetismo funcional “coincidem” com
do, 2.500 dólares, para ir aos EUA consultar a biblioteca do Senado. os da distribuição (distribuição?) de renda em nosso país, a mais in-
Recusou. Nunca aprendeu a falar inglês; ler, lia, como se vê pe- justa do planeta.
los livros de sua biblioteca, mas não falava, como também não falava O desenvolvimento econômico do Brasil nos últimos anos e sua
fluentemente o espanhol. Seu ex-aluno Pi Hugarte (entrevistado por crescente importância no panorama internacional – comprovada pela
Haydée Ribeiro, La Memoria de Las Memorias) assinalou que Darcy sigla BRIC, iniciais dos “países emergentes” – em nada se fazem acom-
gostava de usar neologismos a fim de elaborar novos conceitos, ex- panhar de um desenvolvimento social que mereça o mesmo destaque.
traídos da língua inglesa. Somos uma nação onde o elemento africano tem um profundo impac-
Não se pode dizer que tivesse birra com os EUA e os norte-ame- to na nossa história musical, religiosa, culinária, afetiva, linguística
ricanos, foi amigo do sociólogo Donald Pierson, mas é que a histó- etc., mas continuamos profundamente racistas. Somos o país em que
ria colocou o imperialismo na cola dele, padeceu com a CIA, telefo- as desigualdades de salários entre homens e mulheres é das maiores
ne grampeado, desavenças com o embaixador Lincoln Gordon. do mundo. Temos um genocídio diariamente praticado contra os ado-
Em Américas e a Civilização, considerado por Berta Ribeiro o me- lescentes pobres, negros em sua maioria, eliminados por traficantes e
lhor livro de Darcy Ribeiro, traz como subtítulo “processo de forma- pela polícia. Um sistema carcerário que arrancou lágrimas do obser-
ção e causas do desenvolvimento desigual dos povos americanos”. vador da Anistia Internacional, que o qualificou de “inferno”. E, é cla-
Nele são retratadas as etapas históricas dos EUA, país que experi- ro, uma forte liderança entre os países mais corruptos.
mentou penúria em seu passado na fase de ocupação do deserto com Mais sinistro é comprovar, como as pesquisas vêm mostrando, que
colonos, pioneiros e emigrantes pauperizados pela revolução mer- a maioria do nosso professorado também se inclui naquele apavoran-
cantil e pela revolução industrial na Europa, ou seja, europeus bran- te índice de analfabetismo funcional. Procurados hoje em dia pelos es-
cos que emigraram com suas mulheres para reconstruírem na nova tudantes de origem mais humilde e de baixíssimo letramento, os cur-
terra as matrizes de seus paises de origem, ingleses, holandeses, ir- sos de licenciatura continuam desconhecendo a realidade social de
landeses, suecos. Trata-se de uma colônia de povoamento, com um seu alunado, e vão diplomando milhares de pessoas sem habilitações
projeto de “autocolonização”, tendo por objetivo transplantar as for- mínimas para exercer a profissão docente. Já coletei centenas de tex-
mas de vida européia em regiões de clima temperado. Como um con- tos escritos por professores da rede pública do Distrito Federal (maior
tingente cosmopolita anglicanizado, porque os ingleses eram em renda per capita do país) e me surpreendi com sua quase absoluta in-
maior número, gente pobre, perfil caucasóide, engajados em pro- capacidade de escrever vinte linhas sobre o próprio ofício.
priedade granjeira familiar, que foram alfabetizados para ler a Bíblia Enquanto nossas elites governantes ficam se divertindo com BRIC
em igrejas modestas e sem a desqualificação do trabalho manual. pra lá e G-20 pra cá, incomodadas apenas com as altas e baixas das
Obama, em seus discursos, abusa da palavra missão e dos pio- bolsas, 75% dos brasileiros se veem desde sempre excluídos de qual-
neiros. Darcy mostrou que a missão estava indo para o brejo. Hoje quer progresso real no plano da cidadania. É triste viver num país
os pioneiros se converteram em gângsteres multinacionais. emergente com uma educação submersa...
Gilberto Felisberto Vasconcellos é sociólogo, jornalista e escritor Marcos Bagno é linguista e escritor. www.marcosbagno.com.br
Relógios
As garras do sol entravam pelos vãos ria vida, o silêncio definiu o argumento certo. gurar uma ponta dos cabos, Matheus gritou.
das telhas. Os moradores da rua de cima voltaram - Pega aí molecada, pode pegar, leva e ven-
O calor então se espalhava e era hora para suas casas particulares, mas quando de, é tudo nosso dinheiro mesmo.
de levantar. faltava luz, faltava lá também, quando tinha O técnico continuava com a ponta do cabo
A pesada coberta, que ganhara no casa- tiro, lá escutava também, quando havia chei- na mão e falava baixinho.
mento há alguns anos, não combinava com ro de maconha era de lá que vinha também, - Pô, aí já é bagunça, para por favor, vai
nenhum lençol nem forro de travesseiro, mas mas quando a polícia invadia os barracos, lá complicar a gente depois.
sua esposa também não deixava de dormir na rua de cima ninguém mexia. Os meninos saíram dos barracos, como se
por isso. Começaram a chegar os homens, seus ma- fossem convocados para um grande carnaval
Era um dia especial, iriam instalar os reló- cacões, seus empregos invejados, suas botas e cada um pegou seu pedaço de cabo.
gios para controle de luz. isolantes, seus equipamentos, tal qual pendu- No outro dia, após o dono do ferro-velho
Antigamente também havia assassínios de ho 1. A sociedade brasileira continua anestesiada em relação ao ver
mossexuais a troco de nada, em crimes de ódio dadeiro problema da crise.
e preconceito, ou para simples roubo. Mas, A imprensa burguesa tem passado a idéia de que:
quando comecei a trabalhar em jornal, em a) A crise é cíclica, normal no capitalismo, portanto, logo saire
1960, os jornais não mencionavam que a mos dela.
vítima era homossexual – dizia-se algo b) A crise é um fato natural, e portanto atinge a todos, devemos
assim como “segundo seus vizinhos, a nos conformar.
vítima tinha hábitos reservados”. O lei c) A crise não tem culpados. Ela aconteceu e pronto!
tor tinha de ser tão sutil quanto o reda d) O governo está certo quando ajuda as empresas para elas da
tor tinha sido para entender o que eram rem empregos.
“hábitos reservados”. e) O Brasil é um país protegido por Deus e pelo presidente do Ban
Havia os “conflitos generalizados” quan co Central, Sr. Meirelles, e, portanto, a crise aqui terá pouco efeito.
do ocorriam brigas de bar, em bailes ou festas; Tudo isso não passa de falácias.
uma briga de rua entre duas pessoas era chama
da “desinteligência”. Tanto os “conflitos generaliza 2.O governo brasileiro tem atendido a todas as demandas dos ca
dos” como as “desinteligências”, na maioria dos casos, pitalistas. Os banqueiros puderam reduzir a transferência ao Banco
ocorriam “após farta ingestão de bebida alcoólica”. Os assassinos, por ve Central dos depósitos à vista, ou seja, um reforço de caixa de 180 bi
ilustração: hke... www.subis.blogspot.com
zes, agiam com “requintes de crueldade” (como se crueldade pudesse ser lhões de reais com os quais compraram títulos do governo, receben
alguma coisa requintada), sem que se explicasse o que o criminoso tinha do 11% de juros.
feito com a vítima, ou com seu cadáver. Os setores industriais terão um reforço de 100 bilhões de reais na
Os estupradores e os autores de atentados violentos ao pudor, caixa do BNDES, retirados do orçamento da União. As vinte maio
hoje apontados como “maníacos”, eram abertamente chamados de res agroindústrias, a Sadia, Perdigão, alguns frigoríficos estrangei
“tarados”. Um que ficou célebre foi o “tarado do Ibirapuera”, antes ros, receberam 12 bilhões reais para capital de giro. Os capitalistas
das construções que marcaram esse parque no quarto centenário do agronegócio, os mesmos que diziam sustentar o Brasil e retira
da cidade de São Paulo, em 1954. vam dos bancos 70 bilhões de reais como crédito rural, exigiram 150
Ninguém morria de “câncer”, e sim falecia “de insidiosa moléstia”. bilhões, e já botaram na rua 280 mil assalariados rurais. O governo
Não se podia falar “isso fez com que aquilo acontecesse”; tinha de se di tem acenado com “apenas” mais 98 bilhões. A segunda preocupação
zer “isso fez que aquilo acontecesse”. Não se podia falar do “entrosamen do governo é não contaminar a disputa eleitoral e a terceira é evitar
to” de um time de futebol, pois essa palavra não constava do dicionário que o clima de crise gere um sentimento de desânimo, com conse
– mandavam a gente falar da “entrosagem” de um time, o que recusá quências incontroláveis.
vamos e simplesmente a organização dinâmica da equipe ficava sem ser Por tudo isso, está evitando o debate sobre a crise na sociedade.
mencionada. Após muita discussão, no decorrer do tempo, admitiu-se
que “entrosagem” era de relógio e “entrosamento” era de time de fute 3.Os partidos políticos já estão em plena campanha eleitoral. Nem
bol. Hoje é “entrosagem” que não consta do vocabulário dos programas querem ouvir falar em crise.
de processamento de texto.
Num sepultamento, não se dizia que, do velório tal, o cortejo seguiria 4.Diante desse quadro é urgente que as centrais sindicais, os movi
para o cemitério tal, mas sim que “o féretro sairá do velório tal para o mentos sociais e as pastorais sociais, comecemos imediatamente um
cemitério tal”. Por sinal que era um crime repetir palavra e, na segunda verdadeiro mutirão na sociedade, para debater a crise.
vez que se ia usar “cemitério” num texto, tinha-se de dizer “necrópole”, Essa crise não é cíclica, é estrutural do capitalismo e será prolon
ou mesmo “campo santo”, e quando se ia escrever pela segunda vez a gada e profunda. E coloca em xeque os padrões atuais de consumo e
palavra “hospital”, tinha de se usar “nosocômio”, ou “casa de saúde”. os recursos naturais, o equilíbrio do meio ambiente. Nas crises ante
Nas inaugurações, o texto-legenda (notícia em que o texto era cons riores cerca de 80% da humanidade viviam no meio rural, e tinham
tituído apenas de uma legenda maior do que a maioria das legendas, ou melhores condições de resistir à crise do capitalismo industrial. Ago
seja, uma foto-notícia), tinha de se terminar com “Compareceram auto ra 80% da humanidade vivem nas cidades. Daí a necessidade de deba
ridades civis, militares e eclesiásticas. Na foto, aspecto da solenidade”. ter políticas publicas que garantam a manutenção das mínimas con
Isso era invariável. dições de vida do povo das cidades.
Renato Pompeu é jornalista e escritor. João Pedro Stedile é membro da coordenação nacional do MST e da Via
rrpompeu@uol.com.br Campesina Brasil.
A mesma instituição que concede habeas corpus a figuras como a proprietária da butique de luxo Daslu, que
deve aos cofres públicos R$ 1 bilhão, deixa ladras de xampu e desodorante longos meses mofando na cadeia
Maria Aparecida (foto) evita olhar para transferida para o “seguro”, onde ficam as A situação indigna Gisleine. “É um des-
sua imagem refletida no espelho. Faz quatro presas ameaçadas de morte. Maria Apareci- caso muito grande. Já era para esse julga-
foto:s igor ojeda
anos que a jovem paulistana saiu da cadeia, da passou a apanhar dia e noite. “Eu chora- mento ter acontecido. Minha irmã pagou
mas, nem que quisesse, conseguiria esque- va muito de dor no olho, e elas começaram muito caro por esse xampu que não chegou
cer o que sofreu durante um ano de deten- a me bater com cabo de vassoura”, relem- a utilizar”, critica. “Tem gente que não pre-
ção. Seu reflexo remonta ao ocorrido no Ca- bra, emocionada. Somente quando compa- cisa estar na cadeia. Existem penas alterna-
deião de Pinheiros, onde esteve presa após receu à audiência do seu caso, sete meses tivas e o caso dela não seria de prisão, mas
tentar furtar um xampu e um condicionador depois de ter sido detida, sua transferência sim de internação, já que desde os 14 anos
que, juntos, valiam 24 reais. Lá, Maria Apa- para a Casa de Custódia de Franco da Ro- ela toma medicação controlada”, afirma.
recida de Matos pagou por seu “crime”: fi- cha, na Grande São Paulo, foi autorizada.
cou cega do olho direito. Lá, diagnosticaram que havia perdido a vi- Justiça seletiva
Portadora de “retardo mental moderado”, são do olho direito. O mesmo recurso jurídico – o habeas cor-
a ex-empregada doméstica foi detida em fla- Foi nessa época que sua irmã Gisleine pro- pus – pedido pela advogada Sonia Drigo para
grante em abril de 2004, quando tinha 23 curou a Pastoral Carcerária, que a encami- que Maria Aparecida respondesse ao processo
anos. Na delegacia, não deixaram que telefo- nhou para a advogada Sonia Regina Arrojo em liberdade foi solicitado e concedido, em 24
nasse para a família. Foi mandada diretamen- e Drigo, vice-presidente do Instituto Terra, horas, a outra mulher. Mas um “pouco” mais
te para a prisão, onde passou a dividir uma Trabalho e Cidadania (ITTC). Sonia entrou rica: a empresária Eliana Tranchesi, proprie-
cela com outras 25 mulheres. Em surto, a jo- com um pedido de habeas corpus no Tribu- tária da butique de luxo Daslu, em São Pau-
vem não dormia durante a noite, comia o que nal de Justiça de São Paulo, que foi negado. lo, condenada em primeira instância a uma
encontrava pelo chão, urinava na roupa. Apelou, então, ao Superior Tribunal de Justi- pena de 94,5 anos de prisão. Três pelo cri-
Passado algum tempo, para tentar encer- ça (STJ), que, em maio de 2005, concedeu li- me de formação de quadrilha, 42 por descami-
rar um tumulto, a carceragem lançou uma berdade provisória à jovem, 13 meses depois nho consumado (importação fraudulenta de
bomba de gás lacrimogêneo na área das de- de ter sido presa por causa de 24 reais. um produto lícito), 13,5 anos por descaminho
tentas. Uma delas resolveu jogar água no ros- A advogada também entrou com um pe- tentado e mais 36 por falsidade ideológica.
to de Maria Aparecida, e a mistura do gás com dido de extinção da ação, baseando-se no Somando impostos, multas e juros, a Jus-
o líquido fez com que seu olho fosse sendo “princípio da insignificância”, aplicado tiça diz que a Daslu deve aos cofres públi-
queimado pouco a pouco. “Parecia que tinha quando o valor do patrimônio furtado é tão cos 1 bilhão de reais. Os representantes da
um bicho me comendo lá dentro”, conta. baixo que não vale a pena a justiça dar con- empresa contestam esse valor, mas afirmam
A pedido das colegas de pavilhão, que tinuidade ao caso. No entanto, até hoje, o que já começaram a pagar as dívidas. A sen-
não aguentavam mais os gritos de dor e processo não foi julgado, e Maria Aparecida tença inclui ainda o irmão de Eliana, Anto-
os barulhos provocados pela moça, ela foi continua em liberdade provisória. nio Carlos Piva de Albuquerque, diretor fi-
sua saúde em risco ou em condições semelhantes à fazendo lembrar o índio na construção cuidadosa e
de trabalho escravo, obviamente ela venderá sua fluente do objeto, e quanto mais o antro-
força de trabalho por qualquer preço. Entretanto, pólogo se distancia do mundo índio no
no caso de existir uma Renda Básica de Cidada- rumo da visão filosófica, mais ele revela
nia, a qual garanta a todos, não importando o elemento da alma índia e mais amal-
sua origem, raça, sexo, idade, condição gama um em outro. Um trabalho lindo.
civil ou mesmo socioeconômica, o su- E vai ele mesmo construindo sua está-
ficiente para atender suas necessida- tua de mármore, de murta, e ainda mais
des vitais, então as pessoas podem vaga, mais inconstante estátua perene de
não aceitar o trabalho. Podem dizer palavras.
que aguardarão por uma oportuni- Numa das leituras subliminares, é fei-
dade melhor, mais de acordo com ta uma construção da própria alma brasileira,
suas vocações. Podem até buscar criada nesse embate de diferentes almas, crenças
um curso profissional que lhes pos- e experiências humanas. Nosso lado inconstante.
sibilite encontrar algo mais próximo Muitas vezes, ao ler o ensaio, eu parecia estar desco-
de suas aptidões ou aspirações. brindo algumas razões de comportamentos meus, e de
É por aumentar a liberdade de todos pessoas do meu mundo. Nos interlúdios, a inconstân-
os seres humanos na sociedade que o filóso- cia de nossa própria história brasileira. E afinal, a re-
fo Philippe Van Parijs argumenta em suas velação da perenidade índia, sua constância quanto à
obras que a RBC significará o grande avan- própria experiência, crença, modo de viver, e de ser.
ço da humanidade no Século XXI. Todo ser vivo é eternamente aquele que nasceu.
COMO GARANTIMOS
O FUTURO DOS NOSSOS
FILHOS
suposta perseguição aos jorna- do Estado, que exploram o sensa- e armas. Se essas são as coisas que mais mo-
lis-tas na investigação dos crimes do cionalismo sem o menor pudor e senso vem dinheiro no planeta, como deixar nossos
Banco Opportunity. O jornalista Mino Carta, ético, vão acatar? filhos queridos fora disso?
da Carta Capital, que conhece de cor e salte- E foi através da educação das crianças
ado as sujeiras do banqueiro Daniel Dantas PIRAÇÃO PARANÓICA que descobrimos nossa nova ética. Quais
colocou as coisas nos seus devidos lugares. O jornal O Globo está a cada dia babando os valores pelos quais todo mundo briga?
mais. Difícil mesmo é destacar uma única bes- Igualdade? Que o quê! Todo mundo é desi-
IMPRENSA NEGRA teira no mar de besteirol direitoso. Uma delas: gual desde que nasce. Se você tem dúvida,
Aprovada na Faculdade de Educação da deu recentemente uma chamada na capa com vá visitar as maternidades do plano de saú-
USP a dissertação de mestrado do sociólo- denúncia contra o ex-governador do Rio de Ja- de e as públicas. E tem mais: o importante
go Ariovaldo Lima Junior, sobre o “Jornal neiro, Leonel Brizola, falecido em 2004, com não é saber o valor das coisas, é ter mais di-
Irohin”, uma publicação da imprensa negra base em informações do extinto SNI e, no final nheiro do que seu vizinho para comprá-las.
de combate ao preconcei-to e ao racismo. da mesma chamada, dizia que nada daquilo ha- Porque no nosso mundo quem compra é que
Normalmente os oligopólios da mídia igno- via sido comprovado. É o antijornalismo! manda. Foi o que ensinamos para Ruffles e
ram as violências do Estado contra a popu- Nokia. Não precisamos de cidadania, de tí-
lação negra. FARRA DE SERRA tulo de eleitor, de identidade. Nossa identi-
No afã de contemplar os aliados com ver- dade é o tênis que a gente usa e o carro que
DESSERVIÇO NACIONAL ba publicitária, o governo José Serra, do PS- a gente compra. E viver é gastar no cartão.
Várias entidades, entre elas a Federação dos DB-SP, está colocando anúncio da Sabesp até E foi assim que vivemos. Hoje, eu e meu
Jornalistas, Abraço (Associação Brasileira de em jornal do sertão nordestino. Surrealista marido estamos mortos e felizes, vendo nos-
Rádios Comunitárias), FNDC (Fórum Nacional mesmo é o anúncio veiculado nas TVs sobre sos filhos vivos e bem-sucedidos enquanto
pela Democratização da Comunicação) e Conse- os serviços noturnos de limpeza dos trens do curtimos nossa vida eterna aqui no céu. Ou
lho Federal de Psicologia, divulgaram nota de metrô. Não serve para nada, é puro desperdí- melhor, num paraíso fiscal.
protesto contra a Anatel (Agência Nacional de cio do dinheiro público.
Telecomunica-ções), que em abril destruiu oito Cesar Cardoso é escritor de letras do
toneladas de equipamentos apreendidos em rá- Hamilton Octavio de Souza é jornalista. tesouro nacional e cobrou uma nota para
dios comunitárias. É puro vandalismo! hamilton@uol.com.br psicografar essa mensagem.
Exploração de nióbio
r e g u l a m e n ta ç ã o
Deputado Federal do PDT, neto de Leonel Brizola, fala da
defesa dos recursos naturais, da sua trajetória política e
da luta contra a exploração das multinacionais
Gilberto Felisberto Vasconcellos: Que questões po Rockefeller, exporta 90% do nióbio extraído. processo de privatizações da Companhia Vale
envolvem o nióbio no Brasil? Isso é mais um exemplo deplorável da simbio- do Rio Doce, o ex-presidente Fernando Henri-
Toda indústria de alta tecnologia é altamen- se da burguesia nativa com os interesses das que, o ministro das Minas e Energias na épo-
te dependente do nióbio, não tem turbina de grandes corporações multinacionais que en- ca do governo Fernando Henrique, o senhor
avião, não tem turbina de termoelétricas, não gordam o imperialismo. Com o deputado mi- Roger Agnelli, que comprou a Vale, para expli-
tem oleoduto se não tiver nióbio, porque ele é neiro José Fernando Aparecido, a gente tem lu- car por que a venderam pelo preço de seis me-
anticorrosivo. E o dado importante, é que jus- tado na Câmara por um novo marco regulatório ses do seu faturamento. E mais, o mais grave,
tamente 95% das reservas de nióbio do mundo na questão mineral no Brasil. Dá mais de um a Constituição Federal diz que quem detém o
concentram-se só nas minas amazônicas, onde trilhão de dólares o nióbio que você tem hoje na solo não detém o subsolo, que o subsolo é pa-
está demarcada a Reserva Raposa do Sol, sem Amazônia. Isso com preço estipulado lá na Bol- trimônio da União, e junto com a venda da Vale
serem exploradas. Há uma mina em ativida- sa de Londres, abaixo do custo, sem levar em do Rio Doce entregaram as maiores minas bra-
de em Araxá, Minas Gerais, uma associação do conta a importância que tem o nióbio hoje na sileiras, as de Carajás, exploradas pelo senhor
grupo Moreira Sales com o grupo Rockefeller, a indústria, principalmente na indústria de pon- Roger Agnelli.
Cia. Brasileira de Mineração de Metais-CBMM. ta. É mais um caso da história de 500 anos de
que vendem internacionalmente o nióbio a um espoliação internacional do Brasil. Renato Pompeu: A CBMM tem interesse em que
preço abaixo do custo. Fato grave é que mesmo não sejam exploradas as reservas de nióbio
sendo o único exportador no mundo deste mi- Renato Pompeu: A sua intervenção no Congresso de Roraima, que estão nas terras indígenas.
nério estratégico, o nosso país não é sequer ca- teve repercussão na mídia? Mas a direita militar divulga na Internet que a
paz de determinar o preço do nióbio no merca- Olha, na grande mídia a gente pode dizer demarcação contínua das terras indígenas foi
do externo. Nos momentos de baixa dos valores que essa repercussão ela realmente não acon- feita para possibilitar a exploração do nióbio
das commodities como ocorre na crise atual, o tece, e ai a gente entende inclusive as pressões de Roraima por empresas estrangeiras.
preço da extração e do refino fica superior ao que deve haver dos grandes grupos multinacio- Acho que uma questão não inviabiliza a ou-
valor em que é cotado na bolsa de Londres, em nais nesse sentido, talvez os grandes anuncian- tra. Nesse primeiro momento há essa pressão
média U$ 90 o kilograma. Na jazida atualmen- tes e sustentadores da grande mídia. Só para clara da CBMM para não desvalorizar a explo-
te mais explorada, em Araxá, Minas Gerais, a dar um exemplo, nós fizemos uma convocação ração do nióbio na mina que ela tem em Araxá,
Companhia Brasileira de Metalurgia e Minera- na Comissão de Minas e Energia, requerimen- porque é uma exploração muito mais difícil do
ção (CBMM) pertencente ao grupo Moreira Sal- to meu e do deputado José Fernando Apareci- que a exploração que é possível hoje na Amazô-
les associado a multinacional Molycorp, do gru- do, convocando, para que se explicasse esse nia. Mas eu concordo plenamente que essa de-
Reflexões
ESQUECERAM DE MIM sobre minha
ou O FRACASSO DO G-20 última viagem a Israel - 2
Meu nome é miséria. Comprometo, hoje, a vida de cerca de 1,5 Monumentos como marcos de contradições
bilhão de pessoas, sobretudo crianças desnutridas, vulneráveis à
morte precoce.
Tinha esperança de que na reunião em Londres, no início de abril, o
G-20, que reúne as 20 maiores economias do planeta, se lembrasse de
mim. Hoje, devido à indiferença dos que governam o mundo, ameaço a
maioria da população da África, cuja situação é agravada por cerca de
tando, entre outros países, Burkina Fasso, Mali, Tanzânia, Madagascar, Namíbia e Marrocos. Atualmente coor-
dena o programa “Casa das Áfricas” (www.casadasafricas.org.br), centro de informações, estudos e pesquisas.
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5 6 7
1 – Niamey, capital do Níger, 1995./ 2 - Mulher e crianças do grupo Zemba. Opuwo, Namíbia, 2006./ 3 – Estudantes em Windhoek, capital da Namíbia, 2006./
4 - Menino em passeata contra o abuso sexual de crianças. Maputo, Moçambique, 2002./ 5 – Mulher e criança Himba – uma sociedade pastoril do grupo Herero,
do sul de Angola e norte da Namíbia. Kunene, Namíbia, 2006./ 6- Alunas da escola de Aït Benhaddou vestidas para evento festivo, Marrocos, 2007./ 7 – Meninas
durante o festival de cinema africano (FESPACO), Uagadugu, capital de Burkina Fasso, 1995./ 8 - Passeata em subúrbio da Cidade do Cabo, lembrando os 30
“A depressão cresce
a nível epidêmico”
Em entrevista exclusiva para Caros Amigos, a psicanalista fala de seu novo livro, analisa as consequências
do ritmo frenético da vida contemporânea e aponta a depressão como sintoma social de uma
sociedade que cria o “sujeito esvaziado" Maria Rita Kehl conta a sua experiência como jornalista,
nos anos 70 e 80 e, mais recentemente, como psicanalista de homens e mulheres que integram o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, na Escola Nacional Florestan Fernandes.
Tatiana Merlino: Qual sua origem, e como você o que é jornalismo, escreve trabalho de esco- Hamilton Octavio de Souza: O Jornal do Bairro?
entrou para a psicanálise? la”. E eles falavam: “Vai assistir tal filme”. Aí Não. Ele foi uma iniciação para eu aprender
Nasci na cidade de Campinas aqui do lado, me ensinaram o que é um abre de uma maté- a escrever, não era jornal de esquerda. Mas era
apesar de me considerar paulistana. Todos os ria, enfim, que não pode ter cara de trabalho muito legal, porque era um jornal muito engra-
filhos são de Campinas, mas fomos criados escolar. E eu virei jornalista free lancer, em se- çado. Ele era a capa, com artigos de política, e
aqui, passei a vida inteira no bairro de Pinhei- guida veio a lei que exigia registro. Foi muito a contracapa, com artigos de cultura, e o resto
ros. Estudei em uns colégios de freiras. Mi- formadora para mim a época dos jornais alter- eram anúncios. E todos os artigos eram escri-
nha mãe era religiosa, e depois fiz psicologia nativos, dos tablóides, foi o único lugar em que tos em 40 linhas. Em 40 linhas você aprende a
na USP em 71 a 75, no período mais fecha- eu pude ser contratada numa redação, porque pegar o fundamental, você não precisa entender
do da Universidade, com muita gente cassada. eles já estavam totalmente irregulares mesmo, do assunto, você junta umas idéias, faz um tex-
Então, muito insatisfeita com o curso, lá pelo então eles contratavam gente que era de mo- to razoável, agradável, põe uma abertura cha-
terceiro ano eu queria trabalhar, sair de casa. vimentos. Foram três anos, de 75 a 78 no má- mativa, um final retumbante e ponto. Quarenta
E bati na porta do Jornal do Bairro, cujo dire- ximo, mas foi muito marcante, muito forma- linhas é o meu forte, digamos assim.
tor era o Raduan Nassar, que ainda não era o dor, porque foi o período que eu pude alargar
grande escritor, e falei: “Eu quero escrever”. esse horizonte de uma faculdade de psicologia, Hamilton Octavio de Souza: Você colaborou com
Eu queria trabalhar em alguma coisa que não numa formação um pouco medíocre numa épo- aqueles jornais feministas da época?
fosse psicologia, que me parecia na época uma ca em que estava todo mundo com medo, mes- No Mulherio. Recebi a notícia que esse jor-
coisa muito xarope. E aí o editor, José Carlos mo porque eu nunca entrei para a luta arma- nal ia começar e eu era levemente atraída pela
Abbate, e o Raduan foram muito generosos, do da nem nada. Mas as coisas que me acontecem esquerda. Eu não tinha formação política: no
tipo: “Bom, você sabe escrever, mas não sabe hoje eu devo muito a esse período. começo, nas reuniões de pauta tinha que dis-
anúncio
Nossos doentes não têm acesso a numerosos e sua vontade de mudar a política e a imagem
equipamentos de diagnóstico e medicamentos dos Estados Unidos. Compreende que travou
vitais, embora provenham da Europa, do Japão, uma batalha muito difícil para conseguir ser
ou de outro país, se possuem alguns componen- eleito, apesar de preconceitos centenários.
tes ou programas dos Estados Unidos. Partindo disso, o presidente do Conselho de
Em virtude da extraterritorialidade, as Estado de Cuba expressou sua disposição para
restrições relacionadas com Cuba devem ser dialogar com Obama e, com base no mais estri-
aplicadas pelas empresas dos Estados Uni- to respeito à soberania, normalizar as relações
O governo dos Estados Unidos, através dos que produzem bens ou prestam serviços com os Estados Unidos.
da CNN, anunciou que serão aliviadas algu- em qualquer parte do mundo. Um influen- Cuba não aplaude as mal chamadas Cú-
mas odiosas restrições impostas por Bush aos te senador republicano, Richard Lugar, al- pulas das Américas, onde nossos países não
cubanos residentes nos Estados Unidos para guns mais de seu partido com igual título discutem em pé de igualdade. Se servissem
visitar suas famílias em Cuba. Quando se in- no Congresso, e mais outro número de im- para alguma coisa, seria para fazer análises
ilustração hke... www.subis.blogspot.com
dagou se tais prerrogativas reconheciam ou- portantes senadores democratas são a favor críticas de políticas que dividem nossos po-
tros cidadãos norte-americanos, a resposta do fim do bloqueio. Foram criadas as condi- vos, saqueiam nossos recursos e obstaculi-
foi que não estavam autorizados. ções para que Obama empregue seu talento zam nosso desenvolvimento.
Do bloqueio, que é a mais cruel das me- numa política construtiva que acabe com o Agora falta apenas Obama persuadir to-
didas, não se disse uma só palavra. Dessa que fracassou durante quase meio século. dos os presidentes latino-americanos de que
maneira piedosa é chamado o que constitui Por outro lado, nosso país, que resistiu e o bloqueio é inofensivo.
uma medida genocida. O prejuízo não é me- está disposto a resistir a tudo o que for neces- Cuba resistiu e resistirá. Não estenderá
dido só por seus efeitos econômicos. Custa sário, não culpa Obama das atrocidades come- jamais suas mãos para pedir esmolas.
constantemente vidas humanas e ocasiona tidas por outros governos dos Estados Uni-
sofrimentos dolorosos a nossos cidadãos. dos. Também não questiona sua sinceridade Fidel Castro Ruz
No inicio do mês de abril, o jogador Adria- Você dorme comigo, mas pode acordar com Parte da crônica esportiva decidiu que
no da Inter de Milão não voltou à Itália no prazo uma pensão de ex-marido. os campeonatos estaduais de futebol che-
previsto, dando um susto em seus empresários Pode desejar outro homem desde que ele garam a um nível irremediável de indigên-
e servindo de manchete para os jornais mais seja eu. cia e previsibilidade, devendo ser extintos
vendidos do mundo. O príncipe encantado era um sapo. Ago- e substituídos por disputas mais amplas.
Acabado o mistério, descobriu-se que ele ha- ra lava os pratos e vem dormir, comedor de Não surpreende que a medida seja defen-
via passado as últimas 48 horas em uma favela mosca. dida majoritariamente pela imprensa das
da zona norte do Rio, onde nasceu e foi criado. Sua boceta não é novidade. capitais: apenas os clubes poderosos co-
A mídia então se preocupou com outra coisa: Meu pau não é novidade. nheceriam benefícios, enquanto os interio-
o que ele teria ido fazer neste lugar? Você é aquele pacote morno que dorme à mi- ranos cairiam no ostracismo das divisões
A desconfiança de que ele tenha ido buscar nha direita. inferiores.
drogas é tão ridícula quanto a de que ele tenha O lado esquerdo é meu e pronto. É universalmente sabido que isso leva-
ido falar com traficantes, pois com o dinheiro Concordo em discutir a relação, mas você ria, em pouco tempo, à extinção de dezenas
que ele tem se consegue droga em qualquer can- chama isto de relação? de times sem recursos. As cidades menores
to deste planeta. E se foi falar com o responsá- Absolutamente não é possível discutirmos a sofreriam consequências negativas para o
vel pela venda do varejo da droga naquela loca- relação na disputa final do campeonato. comércio e o emprego, perdendo ainda mais
lidade, não levaria 48 horas. Os filhos de seu casamento anterior foram sua tão menosprezada identidade regional.
Sinceramente, qual é problema de uma pes- falta de planejamento familiar. Agora, se vira. Ao mesmo tempo, os clubes ricos ganhariam
soa visitar o lugar onde morou e onde mora a Meus filhos são ótimos, quem não presta é fortunas absorvendo diretamente os talen-
maioria dos seus verdadeiros amigos? minha ex-mulher. Pior que errei de novo, arru- tos originados nos rincões. Para dimensio-
Mas entre tanta besteira que foi falada na mí- mando você. nar os valores envolvidos, basta fazer um le-
dia sobre esse caso, separei um que me chamou É entediante esse seu hábito de ir sempre vantamento dos jogadores mais badalados
mais atenção. ao banheiro, de defecar e tomar banho para dar do país que foram revelados por times de
O apresentador Brito Jr., da TV Record, fa- uma simples rapidinha. menor expressão.
lou o seguinte: Vejo você de calcinha e nem penso em tirar. Mas apenas o aspecto financeiro não ex-
“Muitos artistas que nascem nessas localida- Essa plástica ficou ótima, mas só quando plica o apego à proposta malévola. A indisfar-
des, que na verdade são caldeirões de pobreza e você está vestida. Pelada, a cicatriz salta aos çável decadência técnica do futebol nacional
violência, não conseguem conviver com o cho- olhos. nivelou os times negativamente, ameaçando
que cultural que têm fora dela, saem do caldei- Não é que eu não goste de sexo oral, mas a primazia dos chamados “grandes”. Se um
rão, mas o caldeirão não sai de dentro deles”. com esse corrimento e minha afta na língua rebaixamento no campeonato brasileiro soa-
Esse “caldeirão” citado pelo apresentador é, está difícil. lhes constrangedor, semelhante fracasso em
na verdade, a favela. E os artistas que nascem Xeretou meu perfil no orkut de novo? nível estadual pareceria desmoralizante, aba-
na favela são favelados, não vão deixar de ser Daqui a pouco vai querer me instalar um lando certas ilusões de “grandeza” que a im-
por terem ficados ricos e famosos. gps, né? prensa alimenta para valorizar-se a reboque
Pobreza não tem só na favela, violência tam- Estava me masturbando no banheiro, sim, de seus preferidos.
bém não, mas posso garantir pra esse apresen- mas pensando em você. É essa mitologia da superioridade ima-
tador que na favela tem muito mais diversidade Bom dia por quê? nente que disfarça a cadeia de artimanhas vi-
cultural do que em qualquer outro lugar. Boa noite pra quem? ciadas dos gabinetes futebolísticos. O poder
Tem-se muito mais contato físico, muito mais Nunca tinha reparado que você comia de dos clubes privilegiados advém de uma po-
informação e vivência do problema do próximo, boca aberta. pularidade construída com títulos que foram
que gera outro tipo de convivência humana que Antes, meu bem pra cá, meu bem pra lá. Ago- possíveis graças à generosidade dos contra-
pessoas da outra classe social desconhecem. ra, meus bens pra cá, meus bens pra lá. tos publicitários e de transmissão televisiva,
A definição dada à favela pelo apresentador Por que não ficou com ele? além dos infames sistemas de repasses desi-
só faz aumentar a visão preconceituosa sobre a Por que não fiquei com ela? guais de verbas por parte da CBF. Para com-
favela e aumentar a distância entre as classes Vou explicar nada. Você não entenderia. pletar o cartel, resta apenas eliminar a inde-
no Brasil. Tenho sonhos, mas troco por sono que ama- sejável concorrência.
nhã é dia de batente.
MC Leonardo é compositor, autor, com seu ir- Também te amo, querida. Guilherme Scalzilli, historiador e escritor.
mão MC Junior, de funks de protes-to, como o Autor do romance “Crisálida” (editora Casa
Rap das Armas. mcleonardo@carosamigos.com. Ulisses Tavares acha que casamento é uma coi- Amarela).
br - http://mcjunioreleonardo.wordpress.com sa, amor é outro troço. Coisas de poeta. www.guilhermescalzilli.blogspot.com
CHOQUE
DE CAPITALISMO
NAS RUAS
DO RIO LEMBRA
A DITADURA
A nova administração municipal
aumentou a repressão sobre
Foto: marcelo Salles
os desempregados,
subempregados,
camelôs e trabalhadores
pobres em geral.
Se você está desempregado no Rio de Ja- cio logo na primeira semana de janeiro. E É contra o uso de armas convencionais pe-
neiro, cuidado. Se você não tem onde mo- não tem data para terminar. “Apesar de mui- los guardas e acredita que o Rio de Janei-
rar, redobre a atenção. Você está na mira tos terem uma dimensão de que choque é ro deve se espelhar em cidades como Nova
do Choque de Ordem. Apesar de a Prefeitu- algo passageiro, acho que choque não é algo York, Chicago, Bogotá e Medellín. “A hora
ra negar, durante a apuração desta repor- passageiro, choque é algo intenso. A prefei- que você combate o pequeno delito você dei-
tagem ficou claro que a repressão empreen- tura vai permanecer com essa intensidade, xa absolutamente caracterizado que o poder
dida pela nova administração está voltada vai fazer valer as posturas e a lei municipal, público vai estar presente permanentemen-
essencialmente contra as parcelas mais po- porque não há outro caminho para a cidade te combatendo essas transgressões”.
bres do povo. Não foram poucos os relatos do Rio de Janeiro”, explica Rodrigo Bethlen, O secretário mais badalado pelas corpora-
que ouvi de agressões contra camelôs e pes- o chefe da Secretaria de Ordem Pública, es- ções da mídia fluminense afirmou que o Cho-
soas em situação de rua, sendo que o mais pecialmente criada para comandar as ações. que de Ordem não é seletivo. Ele citou três
chocante foi narrado pelo defensor público De acordo com os números oficiais, até mar- episódios em que as ações foram direcionadas
Alexandre Mendes. Quando pergunto sobre ço foram abordadas 5.076 pessoas, mais de contra gente rica: a demolição de um restau-
denúncias de agressão física, ele diz: duzentos mil automóveis foram multados ou rante na Gávea, de uma casa na Barra e do
“Isso eu posso falar porque presenciei, pois rebocados e cerca de 180 mil produtos diver- prédio conhecido como Minhocão, na favela da
acompanhei e assinei o boletim de ocorrência. sos foram recolhidos. Cerca de oitenta cons- Rocinha. “Pra mim lei vale pra todo mundo,
Houve uma agressão estúpida da Guarda Mu- truções populares foram destruídas. tanto pra mim quanto para o prefeito Eduardo
nicipal. Uma senhora de 60 anos, de muleta, foi Bethlen, ex-vereador pelo PFL e homem Paes. Se a lei não for respeitada por todo mun-
derrubada no chão e usaram sua própria mu- de confiança do prefeito Eduardo Paes, me do, nosso choque não tem validade”.
leta para agredi-la. Por pedir que não fizessem recebeu na sexta-feira, dia 17 de abril, no
isso, um menino negro tomou uma banda e vá- sétimo andar do gigantesco prédio da Pre- Em nome do lucro
rias cacetadas e também outras duas pessoas feitura, que fica no centro da cidade. Fui “Mas quantos camelôs eles prenderam?
acabaram apanhando. Foi uma ação de extre- prontamente atendido e todas as perguntas Quantos foram feridos? Só pessoas em situ-
ma violência”, lembra Alexandre, do Núcleo de foram respondidas com desembaraço; trata- ação de rua foram recolhidas 2 mil”. Quem
Terras da Defensoria Pública do Estado do Rio se, sem dúvida, de um grande quadro da di- questiona é Antônio Futuro, mestre em
de Janeiro. Ele explica que o Núcleo de Direi- reita fluminense. O secretário de Ordem Pú- Educação pela UERJ e professor da mes-
tos Humanos está acompanhando denúncias de blica tem a pele branca, cabelo preto liso, ma Universidade. “Eles se especializaram
agressão e o de Fazenda Pública está acompa- barba bem feita e gesticula muito enquanto em não mudar a estrutura. Só que agora
nhando denúncias de roubo de mercadoria. fala. Ele defende, para a Guarda Municipal, estão agindo como se estivessem mudando,
O Choque de Ordem, conjunto de ações o uso de armas não letais (ou menos letais, apesar de não ter havido nenhuma mudan-
coordenadas pela Prefeitura, mas com apoio segundo fabricantes) como os tasers – apa- ça nas relações de classe. Sem dúvida são
das polícias e da iniciativa privada, teve iní- relhos que disparam projéteis eletrificados. ações de criminalização da pobreza. Eu que-
São Paulo, 25 de março de 2009. No escri- E neste momento, nada melhor que um afago vanguardista na defesa dos interesses da Ca-
LEI ROUANET
PROFIC
Insatisfação e polêmica
entre o privado e o público
Luis Carlos moreira,
"Tem que ter nesse política de Estado regras claras
que vão regulamentar a ação do governo".
“Hoje, no Dia Mundial do Teatro, nós, tra- lho neoliberal da América Latina. Dinhei-
balhadores de grupos teatrais de São Paulo ro público que irriga o marketing
organizados no Movimento 27 de Março, so- cultural de grandes empresas.
mos obrigados a ocupar as dependências da Collor “matou vários coelhos
Funarte na cidade”. E 350 atores ocuparam com uma porrada só: agradou
Vadaru
a Fundação Nacional das Artes, para tornar as estrelas, que até hoje se mobi-
público o seu descontentamento contra a po- lizam para manter intactos seus
nn
Foto: Ya
lítica privatizante da cultura. Em carta aber- privilégios; agradou a rede Globo,
ta ao Ministério da Cultura, pediam o fim do empresa que o levou à presidência da Re-
“falso diálogo” e cobravam “o diálogo hones- pública, além das empresas gigantes e seus
to e democrático que nos tem sido negado”. diretores de marketing, que têm mais poder Iná é autora do livro A luta dos grupos tea-
Até hoje agora vigora o Pronac, Programa na formulação de políticas de fomentos às ar- trais de São Paulo por Políticas Públicas para a
Nacional de Cultura, a lei Rouanet, criado em tes do que o próprio presidente da República; Cultura, em que avalia cinco anos da lei do Fo-
1991, no governo Collor. No dia 23 de março o fomentou grandes fundações, como Roberto mento em São Paulo, um exemplo de política
MinC colocou o Profic – Programa Nacional de Marinho e Itaú (ver quadro), as maiores cap- pública para o teatro que tem gerado bons re-
Fomento e Incentivo à Cultura – em consulta tadoras. Goebbels vira no túmulo de inveja”, sultados. Em entrevista, ela disse: “Quem quer
pública no seu sítio até 6 de maio, quando será falou o diretor do grupo Folias d’Arte Marco ser artista é, na verdade, candidato a integrar
encaminhado ao legislativo. Antonio Rodrigues, para o jornal Brasil de a força de trabalho. Se ele começar a se pen-
O que tem sido o foco das discussões na im- Fato, na primeira semana de abril. sar como trabalhador que não tem um lugar no
prensa é a restrição da política de isenção fiscal, A lei Rouanet não é pautada somente pelo in- mercado ele vai dar um salto político. Não nos
e o consequente aumento da presença estatal centivo fiscal. Há ainda o FNC, Fundo Nacional colocamos mais na perspectiva de artistas que
na gestão dos recursos. A isenção fiscal permi- de Cultura. Foi essa a política cultural manti- como tais exigem privilégios”.
te às grandes empresas abater seu “investimen- da desde então e pelo atual governo Lula, mas, Os trabalhadores da cultura, então, ao en-
to” cultural nos impostos. Leia-se dinheiro pú- antes de chegar ao poder, “no programa do PT carar a escassez da oportunidade de emprego
blico cedido aos interesses do capital. para o primeiro mandato a parte cultural está se colocam no mesmo contexto dos demais tra-
A lei Rouanet é “inconveniente no atendi- muito bem contemplada – foi o Antonio Candi- balhadores que olham com preocupação para a
mento de todas as dimensões da cultura bra- do que segurou as pontas nisso tudo -, só que crise financeira. “Trata-se da percepção de um
sileira, em todo território, em todas suas ma- não foi cumprida”, diz Cesar Vieira, diretor do horizonte em que não tem dinheiro nem para
nifestações”, disse o ministro Juca Ferreira, Teatro União e Olho Vivo. resgate de banco, quem dirá para renúncia fis-
ao jornal Folha de S. Paulo. Ele revelou que cal, ou dinheiro no cofre público para o Estado
3% dos proponentes levam 50% dos recur- O barulho veio do teatro gerenciar. Acho que essa percepção já bateu”.
sos. Um universo enorme de artistas e pro- Como resultado da ocupação, foi marcada João Sayad, secretário de cultura do estado
dutores culturais está excluído. uma reunião com representantes do MinC e da de São Paulo, demonstra o mesmo temor com a
A mudança deixou alguns produtores Funarte para discutir políticas públicas para crise. Mas é favorável à manutenção do incenti-
culturais nervosos, outros um pouco mais a cultura. O Movimento 27 de Março riscou vo fiscal: “Até o FMI está propondo mais gastos
aliviados. Mas, de fato, ninguém está intei- no chão: “incentivo fiscal a gente não discu- junto com o Banco Mundial, e nesse momento
ramente satisfeito. te”. Dias depois, na sede da Cia. Antropofágica a comunidade cultural se vê com uma proposta
de Teatro, no bairro paulistano de Perdizes, os que redistribui os seus gastos em vez de pedir
Histórico da lei manifestantes se reencontravam e a filósofa Iná um aumento, me parece inoportuno.”
Com as drásticas mudanças políticas do Camargo Costa discursou: “A ocupação, como Convicta, Iná Camargo critica a lei de incen-
começo da década de 90, a lei Rouanet se gesto político, significa que o Movimento 27 de tivo: “Para nós, é uma política muito perversa.
tornou instrumento para uma política cul- Março deu um passo à frente. Somos trabalha- Eu quero sua pura e simples revogação”. Com o
tural casada perfeitamente com o mergu- dores artísticos e não mais artistas”. incentivo grandes empresas financiam expres-
Proponentes e incentivadores
É fácil descobrir para onde vai para o di-
nheiro da área de cultura. O site do MinC
disponibiliza dados sobre os maiores propo-
nentes (pessoa física ou jurídica que solicita
recursos para financiar projetos) e incentiva-
dores (pessoas ou empresas que financiam os
projetos e abatem no imposto de renda).
O sistema Salicnet do MinC também informa
os maiores projetos financiados pelo mecenato.
Dos dez maiores, oito são do estado de São Pau-
lo e dois do Rio de Janeiro. Sete são projetos do
Banco Itaú, através do seu braço cultural.
Um dos maiores projetos é da BrasilCon-
nects Cultura, presidida por Edemar Cid Fer-
Ocupação da Funarte no dia 27 de março, promovida pelo movimento de mesmo nome. reira, ex-dono do Banco Santos, que está sendo
Barulho da classe artística contra o imobilismo do governo.
acusado pelo Ministério da Cultura de irregula-
pos para esquentar o financiamento à cultura, ma, mas não aloca recursos, me desculpe. É o ridades na prestação de contas da verba usada
vem à mente a pergunta: se o empresário pode gestor do capital que tem que raspar o tacho”. no projeto Retrospectiva Picasso. A restituição
pegar dinheiro público para por em seu próprio Há uma proposta de emenda constitucional pedida pelo MinC é de R$9,9 milhões.
marketing, o que fará com que ele, num deter- do deputado Paulo Rocha, do PT, a PEC-150,
minado momento, se sinta incentivado a inves- de 2003, para tornar obrigatório o aumento Os maiores proponentes de 2008
tir, por conta própria, em cultura? da vinculação de recursos orçamentários para 1. Instituto Itaú Cultural
A Fundação Itaú Cultural sai tradicional- a Cultura, nos níveis federal, estadual e mu- .................................... R$ 29.500.000,00
mente com o maior montante. 2007 e 2008 fo- nicipal. Já aprovado pela Comissão de Cons- 2. Dançar Marketing Comunicações Ltda
ram bons anos para essa fundação, com cifras tituição de Justiça, o texto prevê a aplicação (empresa de consultoria cultural que
de 27 e 29,5 milhões, respectivamente. Tudo orçamentária da União de 2%, dos estados tem como clientes a Coca-Cola, IBM, Am-
indica que 2009 seguirá igualmente atraen- 1,5%, e dos municípios 1%. E o governo fede- Bev, HSBC, Bradesco, Nestlé, Telefônica
te par a Fundação Cultural Itaú que continua ral terá que destinar 25% de sua cota para os e Gessy Lever)
como a primeira do ranking, nos dados libe- estados e 25% para os municípios. O aumen- .................................... R$ 17.106.322,48
rados pelo Ministério da Cultura, no sistema to de verbas do MinC seria significativo. Mo- 3. Fundação Orquestra Sinfônica Brasileira
SalicNet, disponível na web. reira não acredita que isso represente uma .................................... R$ 14.757.435,00
Moreira integrou comissão do Movimento real mudança: “Interessa a todos, ao banco,
27 de Março que debateu com o MinC, no iní- todo mundo mama nisso. O Congresso Nacio- Maiores projetos do mecenato
cio de abril. A primeira pergunta: Qual o or- nal provavelmente vai topar. É migalha, mas 1. Plano Anual de Atividades 2008, da Fun-
çamento que o governo destina à cultura? 0,6 no fundo é um salto absurdo”. dação Itaú Cultural, São Paulo, 2007,
por cento. “Somos, para esse governo, zero à Cesar Vieira, acredita no PT e aposta que, .......................................... R$29.5000,00
esquerda, literalmente. Sempre foi assim. Por apesar das grandes pressões econômicas, o atu- 2. Projeto de restauração do Conjunto Ar-
quê? Porque nossa mão de obra não interes- al governo ainda possibilita diálogo, ao contrá- quitetônico do Arquivo Nacional, Rio de
sa para o capital, é simples assim! O Ministé- rio dos anteriores, declaradamente direitistas. Janeiro, 2000,
rio da Cultura se julga inteligente porque está “Tem o Sérgio Mamberti, o próprio ministro ..................................... R$28.351.000,00
tentando moralizar a ação das raposas den- (Juca Ferreira) que veio aqui”. 3. Plano Anual de Atividades 2007, da
tro do galinheiro e ao mesmo tempo fala ‘es- Mais do que possível, Vieira acha neces- Fundação Itaú Cultural, São Paulo,
tamos falando a mesma coisa, vamos fortale- sário estabelecer um diálogo entre o gover- ..................................... R$27.000.000,00
cer o Fundo Nacional de Cultural”. no federal e artistas de cinema, teatro, artes 4. Estação da Língua Portuguesa, Fun-
O atual orçamento do Fundo Nacional de plásticas, circo, considerando também as ca- dação Roberto Marinho, Rio de Janeiro,
Cultura, um dos braços da lei Rouanet, tem 280 racterísticas culturais de cada região, para 2001, Rio de Janeiro, 2001,
milhões, para dar conta de tudo na cultura. A evitar aberrações, como por exemplo o fato ..................................... R$25.527.760,84
verba da Fundação Nacional de Arte, Funarte, de que 80 por cento dos recursos do MinC 5. Brasil 500 anos Artes Visuais: Exposi-
está na faixa dos 30 milhões de reais, isso para vão para o Sul e Sudeste. Vieira, que fora do ção e Itinerância, BrasilConnects Cultura,
todas as artes. Ok. Números muito modestos, ramo teatral é advogado, define a proposta São Paulo, 1999,
mas a perplexidade não vem daí. O incentivo do MinC: “uma colcha de retalhos”. Contra ..................................... R$23.211.946,35
fiscal conta com orçamento de 1.400.000.000 isso, quer que o meio cultural faça barulho,
reais (sim, um bilhão e quatrocentos milhões). sem receio de reações contrárias. “Eu acho Os maiores incentivadores de 2008
que o que funciona é o Estado e não entregar 1. Petróleo Brasileiro S.A – Petrobras
Futuro incerto para a Cultura de novo para as grandes firmas. Não tem que ................................... R$142.299.096,44
Moreira exige uma atitude mais concreta do ter receio que o estado não tenha competên- 2. Companhia Vale do Rio Doce
governo. “Tem que ter nessa política de estado cia pra nada, senão nunca mais vai poder ge- ..................................... R$28.242.894,46
regras claras que vão regulamentar a ação do rir um correio, o ensino, etc.”. 3. Banco do Brasil S.A
executivo. Ele não vai fazer o que quer. O que a ..................................... R$25.522.855,40
gente diz para o governo é o seguinte: quando Carolina Rossetti e Felipe Larsen são Fonte:
você (governo) diz que está criando um progra- repórteres. http://sistemas.cultura.gov.br/salicnet/Salicnet/Salicnet.php
Relato da fome
por quem passa fome
Depois de fazer o “Ônibus 174” e “Tropa de Elite”, ambos
sobre a violência urbana, o cineasta José Padilha lança o
documentário “Garapa”, que trata da fome “do ponto de
vista de quem está com fome”.
Bruna Buzzo: Por que você quis filmar o Camila Martins: E o que é o Bolsa Família para pa”, ficamos amigos da Estamira. Eu e o Mar-
“ Garapa” ? aquelas pessoas? cos mandamos dinheiro para as famílias que
Com o “Ônibus 174” eu conheci o pessoal Eu acho o Bolsa Família um programa sen- filmamos no “Garapa” desde 2005, fizemos
do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e sacional. Eu sou um defensor do assistencialis- uma casa para a Estamira.
Econômicas (Ibase), que trabalha com a ques- mo. O capitalismo tem sérios problemas, e ele
tão da segurança alimentar. Então pensei em não resolve o problema dessas pessoas. O que Bruna Buzzo: V ocê acha que o espectador
fazer um filme sobre a fome. Ao invés de olhar nós gostaríamos é que elas fossem absorvidas médio de cinema que assistir “ Garapa”
para a fome estatisticamente, vou fazer um pela sociedade. Para que isso aconteça é preci- vai fazer algo para mudar essa situação da
filme do ponto de vista de quem passa fome. so primeiro ter assistencialismo e depois edu- miséria?
Porque eu já tinha percebido, com “Ônibus cação, porque o cara tem que comer para po- Eu tento não julgar o público. No “Tropa
174” e “Tropa de Elite”, que embora os meni- der estudar. Criticam o Bolsa Família dizendo de Elite” a crítica do público apontou que os
nos de rua e a violência da polícia sejam ver- que é um programa de transferência de renda brasileiros gostam do capitão Nascimento, são
dades óbvias, o óbvio não é tão óbvio assim. com caráter eleitoral. Qualquer programa polí- violentos. Mas eu não sei dizer o que o públi-
Então vamos olhar a fome do ponto de vista tico tem um efeito eleitoral. Não dá para esque- co vai fazer. Eu acho que um filme dificilmen-
de quem está com fome, porque isso dá mais cer a história do Brasil. Quando tinha a taxa de te resolve um problema social.
significado que a estatística. Uma coisa é falar inflação, o Brasil transferiu dinheiro dos pobres
que 910 milhões de pessoas passam fome no para os ricos, de forma muito mais eficiente que Bruna Buzzo: E a opção de fazer o filme em
mundo, outra é você ver aquilo. Eu quis con- o Bolsa Família. E esse programa era de estelio- preto e branco?
tar a história da fome do ponto de vista das nato eleitoral? Claro que era. Então porque não O diretor tem que fazer opções estéticas,
pessoas que passam fome, isso é o “Garapa”. se falou em estelionato eleitoral antes? não tem jeito. No “Garapa”, foi muito mais que
a cor. Eu tirei tudo do filme. Fiz um filme no
Bruna Buzzo: Uma das críticas ao “ Garapa” Camila Martins: V ocê filmou “ Garapa” antes de qual faltassem coisas. Eu quero que falte no fil-
acusou o documentário de expor as famílias. “ Tropa de Elite” , por que só saiu depois? me o que o espectador está acostumado a ver,
Como você vê estas críticas? Foi uma questão de dinheiro, estávamos cap- porque acho que é uma maneira boa de expri-
Eu acho engraçado uma crítica a um do- tando recursos e começando a montar o “Gara- mir a fome. A pergunta que eu faço é a seguin-
cumentário que mostra a fome dizer que não pa”. Quando entrou o dinheiro do “Tropa” não te, quando você vê o “Garapa”, você sai de lá
deveria ter exposto tanto. Porque a fome não tinha dinheiro para terminar o “Garapa”. entendendo mais, sentindo na pele o que é pas-
é a moeda que você deixou cair, não é um sar fome? Se você entendeu o que significa,
negócio pequenininho, a fome atinge uma Bruna Buzzo: Depoisque você encontrou as três funcionou o filme.
em cada 7 pessoas no mundo, é um negócio famílias que estão no filme, você as ajudou?
enorme. Então, a idéia de que não se pode As pessoas, em geral, ajudam pessoas que Bruna Buzzo: Qual foi sua trajetória até chegar
mostrar o óbvio é uma ideia estranha, só al- conhecem, não desconhecidos, isso é um fato. no cinema?
guém que acha que não existe acha que não Eu convivo com as pessoas que filmo, fico ami- Eu nasci no Rio, em 1967, e vivi no Rio,
deve mostrar. go delas. Fiquei amigo das famílias do “Gara- com breves intervalos fora. Venho de família
Emir Sader
A CRISE e o outro mundo possivel
A crise confirma as análises e previsões do entre outras – nesse momento, onde estão as O FSM não passou da fase das denúncias
Fórum Social Mundial. A volatilidade do capital propostas alternativas, aquelas que podem à das propostas, das alternativas, da cons-
financeiro foi fator essencial para desatar a cri- conduzir ao outro mundo possível? trução do outro mundo possível. Não mu-
se, as teses do Estado mínimo e da centralida- É a hora de propor formas concretas de re- dou a predominância das ONGs na direção,
de do mercado são consensualmente apontadas gulação da circulação do capital financeiro, nos quanto os grandes protagonistas da luta
como responsáveis pela generalização da crise. termos que a Attac propôs, com um imposto antineoliberal são os movimentos sociais; a
As políticas de livre comércio concentraram para um fundo para realizar os direitos básicos limitação dos participantes à chamada “so-
mais do que nunca renda e poder dentro de de cidadania. Propô-lo aos governos que par- ciedade civil”, quando são governos latino-
cada país e entre os países do norte e do sul do ticipam dos processos de integração regional. americanos que estão construindo o outro
mundo. A transformação de tudo em mercado- Propô-lo aos governos do Sul do mundo. mundo possível; manter o FSM como espa-
ria expropriou direitos elementares da grande Fala-se abertamente de nacionalização dos ço de intercâmbio, quando a crise mundial
maioria da humanidade – da educação e da saú- bancos. Para o outro mundo possível, se trata pede propostas, alternativas.
de públicas ao contrato de trabalho. A desre- de desmercantilizar o sistema bancário, mas
gulação produziu uma brutal transferência de não apenas de colocar os bancos provisoria-
capitais do setor produtivo ao especulativo. mente sob o controle de Estados, para reca- sugestões de leitura
Nesse momento, ao invés de retomar es- pitalizá-los, a fim de devolvê-los em seguida TRABALHO, AUTOGESTÃO E DESENVOLVIMENTO
sas criticas, aprofundá-las à luz das suas ao mercado, nem de deixá-los sob controle de José Ricardo Tauille
Editora da UFRJ
comprovações concretas, traduzi-las em po- uma tecnocracia estatal.
O TEMPO E O CÃO
líticas concretas e disputar hegemonia, no No momento em que as teses do FSM são Maria Rita Kehl
momento em que se reconhecem teses como confirmadas na prática, o FSM tem o perfil www.boitempoeditorial.com.br
a necessidade de estatizar o sistema bancá- mais baixo do que ele nunca teve. A que se MODERNISMO
rio, do Estado atuar como indutor do cresci- deve isso? A que o FSM envelheceu, não se Peter Gay
Cia. das Letras
mento econômico e regulador do mercado, de adaptou à velocidade com que as coisas se
subordinar o equilíbrio monetário e o ajuste deram no mundo, com que se desatou a cri-
fiscal à necessidade de combater a recessão, se e se debate abertamente as alternativas. Emir Sader é cientista político.
Nem só os profissionais de saúde, mas todas as razão pela qual os Estados Unidos invadiram e ocu-
pessoas interessadas em problemas humanos, po- param o Iraque, aqui está a resposta”. E a ganhado-
dem consultar com proveito o Dicionário da Edu- ra do Prêmio Nobel da Paz em 1997, Jody Williams,
cação Profissional em Saúde, lançado em segunda afirmou: “Juhasz apresenta o problema do petróleo
edição revista e ampliada pela Escola Politécnica com detalhes, oferecendo soluções reais e os pas-
de Saúde Joaquim Venâncio, Fundação Oswaldo sos concretos para conquistá-las. Em um mundo
Cruz-Fiocruz e Ministério da Saúde, e organiza- que glorifica a guerra e a violência, Juhasz nos
do por Isabel Brasil Pereira e Julio César França oferece reflexão e atitude”. A conclusão de Anto-
Lima. Pois na sua elaboração colaboraram não nia Juhasz: “Devemos pensar de modo radical,
apenas profissionais de saúde, como médicos em aceitar seguir novos rumos e acreditar em nossa
geral, sanitaristas, psicólogos, enfermeiras, mas capacidade de por fim às guerras, proteger nosso
também pedagogos, historiadores, comunicólo- clima, nossas comunidades e nossos trabalhadores
gos, especialistas em geral em ciências humanas, arquitetos, etc. e construir um futuro mais seguro, sustentável e pacífico”.
Há, por exemplo, verbetes como “atenção à saúde”, “avaliação em Igualmente da Ediouro é a autobiografia Inocência roubada – a histó-
saúde”, mas também “capital cultural”, “capital humano”, “capital in- ria da mulher que chocou os EUA revelando sua vida em uma seita po-
telectual”, “capital social”, “divisão social do trabalho”, “globaliza- ligâmica, da americana Elissa Wall, em colaboração com Lisa Pulitzer.
ção”, “humanização”, “neoliberalismo e saúde”, “participação social” Diz Wall: “Desde o dia em que nasci, pertenci à Igreja de Jesus Cristo
“precarização do trabalho em saúde” e muitos outros com temáticas dos Santos dos Últimos Dias. Aquele modo de vida era o único que eu
assim amplas. Fica claro portanto que a obra, além de seu rigor téc- conhecia; não me era possível imaginar outro diferente. Pelo que me ha-
nico em questões específicas de saúde, abrange uma ampla gama de viam ensinado, cabia ao profeta (Warren Jeffs) decidir o que era melhor
assuntos, a mostrar que os problemas humanos em geral, desde a para nós, e as palavras que ele dizia vinham direto de Deus”. Aos pou-
empregabilidade e o bem-estar, estão interligados com as questões cos, querendo ser enfermeira ou professora, além de mãe – pelos precei-
de saúde. Parafraseando a antiga sentença latina, poderíamos dizer tos de sua Igreja teria de esforçar-se para ter filhos a partir dos 14 anos
que esse dicionário tem como lema “Mente sã num corpo são, numa – ela foi se dando conta de que a vida com que lhe acenavam não era ple-
sociedade sã”. No fundo, o que está em jogo em todos os verbetes é a namente humana. Seu caso foi parar na Justiça e terminou com o julga-
felicidade humana. mento de “um dos mais notórios criminosos dos Estados Unidos”. Essa
Também de educação, mas num outro registro, tratam várias das obra poderia inspirar alguém no Brasil a pesquisar vidas semelhantes
contundentes crônicas de Marcus Cortez no livro Golpe na alma, pu- tolhidas por fundamentalismos caboclos.
blicado pela Pé-de-Chinelo Editorial, que têm o educador Paulo Frei- Para encerrar, temos, da Best-Seller, o livro também autobiográfico
re e seus métodos como temas evocativos e comoventes. Mas também de Rodger Klingler, Memórias do submundo – um alemão desce ao in-
há crônicas sobre o jornal Folha de S. Paulo, “A tortura que a impren- ferno no Rio de Janeiro. Hoje ele está radicado em seu país, depois de ter
sa censurou”, e sobre a Rede Globo, “A escória humana brasileira”. É morado no Brasil, atraído pela beleza de suas mulheres e pelo preço ba-
uma obra sobre um sonho de Brasil feliz acalentado no início dos anos ratíssimo da cocaína, em comparação com o mercado europeu. Acabou
1960 e que se transformou em pesadelo num Brasil infeliz a partir de cumprindo pena por tráfico de drogas no Rio, sofrendo tratamento desu-
1964 e, particularmente, a partir de 1968. mano dos policiais. Trecho: “Embora eu mantives-
Já a Ediouro costuma ter seus lançamentos bada- se os dentes firmemente trincados, deixei escapar
lados por setores da grande mídia, mas esse A tira- um leve gemido. – Olha só, o alemãozinho está gos-
nia do petróleo – a mais poderosa indústria do mun- tando – disse odiosamente um dos policiais”. Em
do e o que pode ser feito para detê-la, da jornalista e suma, um brado contra nosso sistema prisional.
escritora americana Antonia Juhasz, teve pouca re-
percussão nos grandes meios de comunicação, tal- Renato Pompeu é jornalista e escritor, autor
vez por afetar os interesses de grandes empresas do romance-ensaio O Mundo como Obra de Arte
que são grandes anunciantes. A coronela Ann Wri- Criada pelo Brasil, Editora Casa Amarela, e edi-
ght, da Reserva do Exército dos Estados Unidos, tor-especial de Caros Amigos. Envio de livros
comentou sobre o livro de Juhasz: “Se nossas tro- para a revista, rua Paris, 856, cep 01257-040,
pas e o povo norte-americano quiserem saber a São Paulo-SP.
EXPOSIÇÃO
Peter Paul Rubens e seu Ateliê de Gravura
De 24 de abril a 24 de maio de 2009
Terça a domingo, das 9h às 21h
Classificação: livre
Entrada franca
Galeria Vitrine
CURITIBA
Rua Conselheiro Laurindo, 280 – Centro – (41) 2118-5409
EXPOSIÇÃO
Babinski
De 12 de maio a 7 de junho de 2009
Terça a sábado, das 10h às 21h
Domingo, das 10h às 19h
Classificação: livre
Entrada franca
Galeria da CAIXA
RIO DE JANEIRO
Av. Almirante Barroso, 25 – Centro – (21) 2544-4080
EXPOSIÇÃO
Ser Jovem na França
De 23 de abril a 17 de maio de 2009
Terça a sábado, das 10h às 22h
Domingo, das 10h às 21h
Classificação: livre
Entrada franca
Galeria 3
SALVADOR
Rua Carlos Gomes, 57 – Centro – (71) 3322-0228/0219
EXPOSIÇÃO
Victor Brecheret
De 12 de maio a 28 de junho de 2009
Terça a domingo, das 9h às 18h
Classificação: livre
Entrada franca
Galeria do Pátio e Galeria Arcos
Carbono Neutro – Árvores do cerrado estão sendo plantadas para compensar o CO2 emitido com a realização desta edição do Prêmio.
çõ es vão se esp
olu alhar
S
por todo o Br
asil
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