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.( \, t92 Na casa ile meu pai

da que concordássemos em que todas as nossas velhas


crengas eram superstisóes,
precisarlamos de princfpios para ¡lorte¡¡r nossas escolhas
de novas a.angor.Aléfn
disso, há provas de que os sucessos práticos acham-se
basicamen," uur"n* au
cultura tradicior¡al. A quest5o de dever¡nos ou náo adot¡r esses 7
métodos náo é
purament€ técnica. Náo podemos evitar o problem¡ de saberse O pós-colonial e o pós-modeftrc
é possível adotar
estilos cognitivos antagonísticos e individualistas e, como
talvez quiséssemos fa-
z.Et, conseft¡ar uma ao¡al camonitLria conciliató¡ia.
As cultu¡as e os povos tem "Vocé se chamaw Bimbirakak
sido f¡eq{¡enlemente capazes de manter esses critérios duplos (" cstovo tu¡lo l¡c¡tt lssim
i^prego o I:-
termo em caráter neo pejorativo, pois talvez precisemos de critérios To¡ n o u - se V icto¡- E¡¡ il e- Louis- Henr i- I o s eph
diieÁtes
para fins diferentes). Assim, se pretendemos tentar, temos O que
de enfrentar essas difi_
culdades,_O método cientifio pocJa lcwr ao pny,rct;st) cm nrrs\a Ao que eu ñe leftbre
comprccn\¡o
do mundu, m¿o ¡tZo é prcci* *r ade¡ttt de'lht,reau Vara ir*Jagzr ,cLk kor,u Ntto ftlck seu lroÍcntctco cotñ
I
apenas ao progresso na busca de todos os nossos objetivos Rockelellcr..."
humanos. Nessa área,
podemos aprender junlamenle com outras culrurai- inclusive, Yambo OuoloSu.m
po..""-plo, u
cultura japonesa, que aparenremente Iogrou uma cena segregagao
ent're as
esfera-s moral-polftica e cognitiva. Nesse aspecto, parece-me
evidente que o
filósofo ganés KwasiWiredu tem razao. Só resolveremos nossos p.oUt"-u.'s.
o, f-f m I987, o Centro de Arte Africana em Nova York organ izou uma expo-
sisáo chamada P.rlpectives: Angles on A[rr'.dr, árl IPer.spectivas: Angu-
encararmos como problemas humanos, decor¡entes de uma situasáo
especi¡I. tr
Náo os solucionaremos se os virmos como problemas af¡icano., j"rado.
pelo
lJ los da arte africanal.r A curadora, Susan Vogel, havia ¡rabalhado com
fato de se¡mos meio dife¡entes dos out¡os. diversos "co-cu¡adores'i que relaciono por sua ordem de aparecimento no fn-
dice: Ekpo Eyo, ex-diretor do Departlmento de Antiguidades do Museu Nacio-
nal da Nigéria; Willian¡ ltubin, dirctor de Pinturr e Escultura do Museu de Arte
Moderna de Nova York e organizador de sua controvertida exposisáo Prirr¡-
fiyrlrro; Romare Bearden, pintor afro-americano; lvan Karp, curador de Etno-
logia Africana do unstitutol Smithsonian; Nancy Graves, pintora, escultora e
cineasta euro-americana; James Baldwin, que certamente dispensi¡ comentários
adjetivatórios; David Rockefeller, colecio¡ador dc arte e amigo dos poderosos;
Lela Kouakou, artistr e adivinho b¡úle da Costa do Marñm (essa é umaiustapo-
sigio deliciosa: o mais rico e o mais pobre,lado a lado); Iba N'Diaye, escultor
senegalés; e Robert Farris Thompson, professor dc Yale e histori¡dor de arte
africana e afro-americana. Vogel descreve o processo de selegio em seu ensaio
introdutóri<¡. Fornnr oferecidas a cada um, i única mulher e ¡os nove homens,
cerca dc cenr fotografi¡s de "artc ¡fricana dc tipo e origem tiio v¡riados e quali-
dadc tño superior quanto pudenros reunir", sendo-lhes solicitado que escolhes-
scm tlcz para a exposiglio.'Ou lalvczcu rlcvcssc dizcr, nrais cxala¡rúrtc, qLtc isso
é o que foi oferecido a oito dos honre¡rs. Pois Vogel acrescenta qt¡e " In]o caso do
artista baúle, trm honrenr familiarizado apenas com a arte de seu próprio povo,
son¡entc obict)s l)¡riles fornm i¡cluí(k)s n(r conjunto dc fotogr;rfias'l Nesse pon-
to, somos renrctidos a uma nota de rociapé do ensaio, que diz:

Mostrnr'lhe o nrcsrr)o conjunlo de [ok)s vislo pelos outros tcri¡ sitlo intc-
I
rcssante, nras perlurbador cnr tcnnos tl¡s re¡sóes quc estávamos huscan(k).
I
I

¡r-r.,qiE_. I
194 Na casa rlc nrcu Pai Opós-colofiialeopósrnod¿r o l9i

Estudos estéticos de campo, meus e d€ outros, mostraram que os informan- decoragáo. Nessas respostas, temos um microcosmo da localizagáo do africano
tes africanos criticam as esculturas de outros Srupos étnicos em termos de nos Estados Unidos contemporaneo o que equivale a dizer, certamente, pós-
seus próprios critérios tradicionais, nruitasvezes presumindo que essas obras moderno.
-
s¡o apenas entalhes grosseiros de sua própria tradisio eslética. Fiz toda essa citagáo de David Rockefeller, náo para enfatizar o conhecido
Voltarei num momcnto a essa nota iraesistível. Mas, deixem-me fazer uma fato de que as questóes do que chamamos de valor "estét ico" estáo crucialmente
pausa para citar um pouco mais, desta vez excertos das palavras de David vinculadas ao valor de mercado, nem tampouco para chamar atensáo para o
Rockefeller, que decerto.jamais "Icriticaria] esculturas de outros grupos étni- fato de que isso é sabido pelos que atuam no mercado de arte. Antes, quero
cos em termos de seus próprios critérios tradicionais'l ao discutir o que o catá-
manter claramente visível diante de nós o fato de que David Rockefeller está
logo chama de "figura feminina fanti":' autorizado a dizer 4a alquer coisa sobrc a arte da Africa por ser urn coñpradot e
por estar no c¿rfro, ao passo que l¿la Kouakou, que meramente Produz arte e
(...) possuo coisas semelhantes a essa e sempre as aprec¡ei. Essa é uma versao vive na periferia, é um africano pobre cujas palavras só vém ao caso coino pa¡te
bem mais soñsticad¿ do que as que tenho visto, e achei-a ¡ruito bonita (...) da mercadologizagáo8 tanto para aqueles dentre nós que compóem o públi-
a composisño total tem um ar nruito contemporioeo, muito ocidental. É o -
co do museu quanto para os colecionadores, como Rockefeller da arte baú-
tipo de coisa que combina muit<¡ bem com as coisas ocidentais contempora- -
le.e Quero lembrar-lhes, em sunla, como é importante que ¡ arte ¡fric¡¡na sej¡
ne¡s. Ficaria bcm num aP¡rtamento ou numa crsa modernos.
wa mercndorin,
Mas o co-cur¡dor cuja escolha nos pori ¡ c¡nrinho é lames Baldwin
Podemos supor que David Rockefeller tenha ficado radiante ao dcscobrir
o único a escolher uma pesa que náo estava nos moldes da Africa do "primiti-
-
que seu julgamento final era compatível com as intensóes dos criadores da es-
cultura. Pois uma nota de rodapé do"fndice catalográfico" anterior revela que o vismo", uma escultura que será minha pedra angular, uma pega rotulada Pelo
Museu de Arte de Baltimore deseja "trazer a público que a autenticidade da fi- museu como "lorubano com bicicleta': Eis um pouco do que Baldwin disse
gura fanti desta colegeo foicontestada'l Na verdade, o trabalho de Doran Ross sobre ela:
sugere que esse obieto, quase com certeza, é uma pega moderna, produzida em
Isso é incrível. Tem que ser contemporineo. Ele está re¡lmente indo ) citl¡de.
minha cidade natal de Koumassi pela oficina de um certo Francis Akwasi, que conv iDce te. 'l¡lvcz sua missio se revele inrpos-
É algo muilo elegrnte, muito
"se especializa em entalhes para o mercado internacional, no estilo da escultura Ele está desafi¡ndo algo ou algo o desafiou. Está plantrdo na teali-
sível.
tradicional. Muitas de suas obras encontram-se agora em museus de todo o -
dade imediata através da bicicleta. (...) Aparentemente, é um homenr muito
Ocidente e foram divulgadas como auténticas por Cole e Ross"t (sim, o mesmo orgulhoso e calado.Veste-se de um modo meio poliglota. Nada parece assen-
Doran Ross) em seu clássico catálogo The Atts of Ghona lArtes de Gana l. tar-lhe muito bcnr.
Mas, a6nal, é dilicil ter cettem do glue agradaria a um homem que indica
como razño para sua escolha de ot¡tra pega (dessn vez, unra nráscara senufo): A interpretaslo dessa pesa por llaldwin, evidente e i¡evitavelmente, é feita
"Devo dizer que escolhi essa pesa porque ela me pertence. Foi-me oferecida "em termos de seus próprios critérios", numa reasáo contextual¡z¡da apenas
pelo presidente Houphouet Boign¡ da Costa do Marfim'I'otr qt¡e comenta pelo conhecimento de que ¡s biciclctas seo novas na Africa e de que essa obra,
dc quak¡ucr ruodo, nio se parecc trcn¡ u¡n pouco com as pegas quc ele lembra
no que concerne ao mercado de ¡rte af¡icana (...) as melhores peqas tém saí- ter visto em sua infincia no museu Schonrburg, no Harlem. E sua resposta (or_
do por pregos altíssimos. Em geral, as pegas menos boas enr termos de quali- pedeia a argumentaqáo de Vogel, de que se deveria recusar ao único africano
d¡de nio tém subido de preco, E essa é uma boa razio para escolher as boas, "autenticamente tr¡dicion¡I" o tinico cujas resPostas, no dizer deh, pode-
e náo as ruins. Elas sabem se tornar nrais valiosas. -
riam ter sido encontradas um século atrás a possibilidade de escolher entre
Gosto d¡ ¡rte ¡fric¡n¡ como objekrs quc acho q!c scrilm atr¡cntcs p¡ra
da África, porque,
-
diferentenrente dos demais co-cura-
¡s culturas artlsticas
usi¡r num¡ cas¡ ou num escritório (... ). Nlo acho que ell combine com tudo,
dores, que si¡o norte-anrericanos e ¡fricanos educ¡dos na Europa, ele usaria
necessariamente enbora a dc melhor qualid¡de talvez o faga. Mrs acho
-
que combin;r bcnr com a arquitctura contemporinc¡.7
"seus próprios critórios". Esse adivinho baúle, esse aldeáo autenticañente afri-
cano essa é a mensagem neo sabe o que nó5, pós-modernistas Senuínos,
tlá qualquer cois¡ rle deslumbrantemente despretensioso n¡ movimentaqño - -
sabenros agor¡: qL¡e o pior de lodos os erros co¡rsiste cnr iulB¡r o Oulro segundo
desenvolta do sr. Ilockefeller entre ns considerafóes financeir¡s, estóticrs c de nossos próprios termos. I: assinr, em nome desse discernimento relatiirista, im-
t96 Nt cosa de trcu pai O pós-coloniol e o póslrtodefio 197

pomos nosso iulgamento: o de que Lela Kouakou nío pode julgar esculturas permissáo de proliferar nesses mares, come§arei Por uma história a resPeito
vindas de fora da zona cultural baúle, porque como todos os outros "infor- rle minlra falecida amign Margaret Masterm¡n. Certa ocasiáo, em meados dos
- ele as interpretará como se
mantes" africanos que encontramos em campo anos 60, Margaret foiconvidada a participar de um simPósio Presidido porKarl
-
elas tivessem a pretensáo de atender aos padróes baúles. Popper, no qual Tom Kuhn deveria ler um artiSo; dePois, ela, ). M. w. Watkins'
Pior do que isso, é um absurdo explicar as respostas dc Lrla Kouakou conro Stephen Toulmin, L. Pearce Williams, Imre Lakatos e Paul Feyerabend trava-
decorrentes de um desconhecimento de outras tradiqóes se ele de fato for riam um debate sobre o trabalho de Kuhn. Infelizmente Para Margaret¡ela con-
-
parecido com a maioria dos artistas "tradicionais" de hoje, se for parecido, por traiu uma hepatite infecciosa no periodo imediatamente anterior ao simpósio
excmplo,com Francis^kwasi, dc Koumassi, como sern dúvida se supóe que seja. e, por isso, neo póde plcparar um texto. Felizmente Para todos nós, Porém, ela
Kouakou pode julgar out¡os artistas por seus próprios padróes (e que outra p¿dcs¿ntar-sc em scu lcito de hospital no Bloco I do hosPit¡l dc Norwlch' ¡
coisa, a6nal, poderia ele ou qualquer pessoa fazer, exceto náo fazer nenhum jul-
-
cuja equipe foi dedicado o artigo que acabou escrevcndo e criar um fndicc
gamento?), mas, supor que ele desconhega que existem outros padróes dentro -
remissivo para A esttutura dos revolugóes científicas. No Proce§so de fazer o
da Africa (e, mais ainda, fora dela) é ignorar um conhecimento cultural ¡bsolu- fichamento do livro, Mar8aret identificou "nada ñenos de 2l sentidos, Possi-
tamente básico, que é comum i maioria das culturas pré-coloniais e i maioria velmente mais, náo menos", em que Kuhn utiliza a palavra "paradigma'l Depois
das culturas coloniais e pós-coloniais do continente: o conhecimento cultural de catalogar esses 2l usos, ela comenta laconicamente que "nem todos e§ses
que explica por que existem, de fato, as pessoas que ho.ie chamamos de "baúles'l sentidos de 'paradigma' sáo incoerentes entre si", e prossegue:
Serbaúle,por exemplo, é, para um baúle, neo ser branco, naro ser senufo, náo ser
francés.r0 Os grupos étnicos a "tribo" baúle de Lela Kouakou, por exemplo Náo obstante, d¡da ¡ divcrsidade, é obviamcnte razoável Pergunt¡r: exi§te
-
--, em cujo interior toda a vida estética africana parece transcorrer, sáo (como alguma coisa em comum entre todos csses sentidos? Haverá, filosollcamente
argumentarei no próximo capitulo) produto de articulasóes coloniais e pós-co- falando, algo de definido ou ger¡l na no§ño de paradigma que Kuhn está ten-
loniais. E alguém qr.re sabe o suficiente para se preparar como baúle para o sécu- tando esclarecer? Ou será que ele é aPena§ um poeta_historiado¡ descreven_
do diferentes acontecimentos ocorridos na história da ciéncia e se referindo a
lo XX certamente sabe que existem outros tipos de arte.
todos eles através do uso da mesma Palavra, "paradigma"?r'?
Mas o "lorubano com bicicleta" de Baldwin faz nrais do que desmentir a
estranha nota de rodapé de Vogel; cle nos dá uma imagem de um obieto que A pertin¿ncia dessa historieta mal chega a requerer explicagáo: e a tarefa de per-
pode servir de porta de entrada en¡ meu terna: uma obra da arte africana con' seguir a palavra 'pós-moderni§mo" nas Páginas de LyotarC, Iameson e Haber-
temporánea que nos permitirá explorar a articulasáo entre o pós-colonial e o mas, dentro e fora da Viltage Voice e d,o TLSlTimes Literury Supplemeñtl,e até da
pós-moderno. O "lorul¡a¡o com l¡icicleta" é assim descrito no catálogo: resenha de livros do New Yo¡k Times, faz com que a tarefa de fixar o sentido do
Plgina 124 "para<iigma" de Kuhn se assemelhc a um trabalho de um minuto antes do café
I¡ou)cn) coor l)iciclct:r rlu nl¡rnh¡|.
Ioruba, Nigéria, século xx Náo obstante, etrJt¿, penso eu, uma história a contal sobre todas essas histó-
M¡rdcirir c pinlur¡, rlt.l5 l/4 p¡'1. ri¡s or¡ ctr rlcvcri¡ dizcr, é chro, qtrc há muitas, m¡5 est¡, por enqüanto, ó a
Muscu de Ncw¡rk. - c, it nrctlida quc cu a li)r conlando, o ciclist{ dc Iorut¡a irc bará rc§sur-
nrinh¡
-
gindo no horizonte.
A influéncia do mundo ocidental revela-se nás roup¡s e na bicicleta dessa
escultura iorubana neotradicional, quc provavclmcnte rcprescnta um merca- Deixem-me comcgar pelo aspecto mais óbvio e, com certeza, um dos mais
dor a caminho do mercado." cornen(ados da explicagáo da pós-modernidade por Jean-Franqois Lyotard: o
f¡to de ela ser uma metanarrativa do fim das metanarrativas.lr É claro que
E é essa palavra, "neotradicional" uma palavra quase corrcta , que fornece, teorizar alguns asPectos centrais da cultura contemporenea como Pó5-qualquer
a meu ver, a pista fund¡mental.
-
coisa é, inevitavelmente, invocar un)a narr¡tiva. E, do Iluminismo em diante, na
Europa e nas culturas dela derivadas, esse "Pós" também §ignificou "acima e
Mas, náo sei como explicar essa pista sem dizer, primeiro, con¡o mantenho além'l de modo que dar um passo adiante (no temPo) represe¡tou' ipso facto,
minha orientas¡o nis águas infestadas de tubaróes no redor da ilha semántica progre<lir.la Brian McHale anunc¡a, em seu rccenle Post¡nodetnist Fiction lA'fic'
do pós-moderno. lá que as narrativas, diversame[te das metan¡rrativas, t¿m qlo pós-modernistal:
198 Na cata ¡le r eu gai O pós- co lonial e o p ós- m o.le rn o

Q!anlo ao prefixo PÓs, quero ¡qui enfatizar o elemento de cori¿lii¿r¡.ir¡ ló- A tese de )ameson nesse ensaio é que devemos caracterizar tal distineSo, neo
Bica e L¡slór¡cn, cnl vcz tltt si»rplcs ¡osa,ri.r¡iiiirl.'lcrnl'ornl.
() ¡ús-nrotlcr- cnr lcrnros for¡¡ais cnr tcrnros, diglnros, dc umt "cstética da tcxtuolialodd',
nismo p/ov¿m do modernismo, em ccrto sentido, mais do que sacede ao mo- -
ou do "eclipse, finalmente, de toda a profundeza, especialmente da própria
dernismo. (..,) O pós-modernisrno ó a posteridade do modernismo, isso é historicidade", ou da "'morte' do sujeito", ou da" cultu¡a do simulac¡o", ou da
tautológico (...)r5 "socied¡dc do espetáculo"r'-, mas cm tcrmos da "funcionalidade social da
O que prete¡rdo frisar, portanto, n¡o é a masante questeo ló8ica de que a
própria cultura'l
visáo de Lyotard na qual, na falta de"grandes narrativas de legitimaseo", res- IO] alto modernismo, seja qual for seu conteúdo politico declarado, foi opo-
-
tam-nos apenas legitimasóes locais, imanentes a nossas práticas pareceria sicionista e marginal numa cultura de classe média vitoriana, ou prosaica, ou
-
pressupor sua própria "grande narrativa de legitimagáo", na qual a justiga mos- dos anos dourados. Embora o pós-modernismo seja igualmentc ofensivo cm
tra¡ia residir, de maneira nada excitante, na institucionalizatáo do pluralismo: todos os aspectos enumerados (pensem no ro*plrtou na pornografia), ele
trata-se, antes, de que a análise dele parece ter necessidade de encarar a situasio já neo é, nesse sentido, nada "oposicionista"; a rigor, constitui a própria esté-
contemporanea como oposta a um conjunto imediatamente anterior de práti- tica domin0nte ou hegemónica da sociedade de consumo e, significctivc-
cas, e como indo além destas. O pós-modernismo de Lyotard
mente, serve ¡ produgáo de mercadorias desta última, praticamente como

da vida contemporinea como pós-modern a


- sua teorizagáo
é posteriot ao odcrnismo por-
um laboratório de novas formas e modismos.A tese favorável a uma concep-
-
que rejeila aspectos do modernismo. li, nesse rcpúdio dos predecessores inre- §¡o do pós-modernisnro como calegoril period iza n tc basein- sc, portuto, no
pressuposfu de que, mesnro que lodos os aspcctos fornrais enu n¡erltlos lci¡¡¡
diatos (ou, mais espccialmcntc, de suas teorias sobre eles mesmos), esse pós- jf estej¡m presentes no antigo alto nroclernismo, a própria inrportlncil des-
modernismo recapitula o gcsto crucirrl da ovant-ganle histórica; na verdade, scs aspcctos se modifici¡ qu¡ndo elcs se tr¡¡nsfornr¡m nunra ¡lorri,r¡rr{, cül-
recapitula o gesto cruci¡l do "artista" nloderno, no sentido de modernidade ca- tr¡r¡l com unra funcionalidade socioeconómicn precisa,D
racteristico do uso sociológico, em que ela denota "uma era introduzida através
do Renascimento, da filosofia racionalista e do Iluminismo, de um lado, e da )ameson considera que a chave para compreender a situag¡o pós-moderna é
transiqáo do Estado absolutista para a democracia burguesa, de outro";ró no o "declínio" da "oposisáo dialética" entre o alto modernismo e a cultura de mas-
sentido de "artista" encontrado na exposigio de Trilling sobre "O cigano erudi- sa, isto é, a mcrcadologizagáo e, se posso cunhar um barbarísmo, o des-oposi-

to" de Arnold, cuia "existéncia tenciona pertt¡rbar-nos e nos deixar i¡rsatisfeitos cionismo das formas culturais antes constitutivas do alto modernismo.
com nossa vidfl hab¡tual na culnrra (...)"r7 Sem dúvida, há muito quc dizer em f¡vor dir lcorizaglo jamcsoniana do pós-
Essa busca insistcnte de um conlraste uma modernidade ou um mo- moderno. Mas, náo creio que compreendamos o que é comum a todos os vários
dernismo contra o qual colocar-se
-
é extremamente notável, dada a falta pós-modernismos se nos ativermos ¡r viseo oniabrangente de lameson. A mer-
-
de qualquer explicagáo plausível e nitidamente formal sobre o que distingue cadologizagio de uma ficgáo, de uma postura de oposicionismo, que é vendável
o moderno e o pós-moderno. Nt¡m ens¡io recente, Fredric fameson admite, iustamente porque sua mercadologizasáo Sarante ao consumidor que ela náo é
a certa altura, depois de resenhar as recentes teorizasóes francesas (Deleuze, uma ameasa substa¡cial, foi central, de fato, para o papel cultural do "rock punk"
Baudrillard, Debord), que é difícil distinguir formalmente o pós-moderno do ña Europa e na América. Entretanto, mais do que uma palavra e uma.conversa,
alto !Dodernismo: que ¿ que faz de Lyotard e Jameson teóricos rivais do zesrro pós-moderno?
Náo tenho o que náo há de ser surpresa uma deñnigáo do pód-moder-
(...) realmente, uma das dificuldades de especificar o pós-modernismo reside - -
no para colocar no lugar da de rameson ou da de Lyotard: mas há agora um
em sua relasáo simbiótica ou parasitária com [o alto modernismol. Com consenso aproximado sobre a estrutur¡ da dicotomia moderno/pós-nroderno,
efeito, com a canonizagáo de um alto modernismo até aqui escandaloso, feio,
nos muitos campos da arquitetura i poesia, i filosofia, ao ro¿t e ao cinema
dissonante, amoral, anti-soci¡l e boómio, ofensivo para a clásse média, com -
em que ela tem sido invocada. Em cada um desses campos, há uma prática
sua promosáo á própria imagem da cultura superior em geral e, o que talvez -antecedente que reivindicou uma certa exclusividade de discernimento e, em
seja o mais importante, com sua cultuacáo na instituisáo acadómica, o pós-
modernisnro emerge como r¡m nrodo de cbrir um espaso criativo para os cada um deles, o pós-modernismo é um dos nomes da rejeigío dessa reivindi-
I
artistas hoje oprimidos pelas categorias doravante hegemónicas da ironia, cagio de exclusividade, uma rejeisáo que é quase sempre maisio¿osa embora
conrplexidade, ambigiiidade, tenrporalidadc densa e, em parlicular, monu- náo necessariamente menos séria do que a prática que ela almeja substituir.
-
mcntalisnro estético e utópico.r3
-
Que isso niio scrve comc; defnigoo dLt pós-rnodernismo decorre do fato de que,
200 Na .asa .le ñeu Pai O pós - co lonial e o pó t- mo¡l.tn o t0l

em cada campo, essa rejeisáo da exclusividade assume uma certa forma esPe- náo era um fundacionista). A modernidade a que se faz oposigio aqui, portan-
cífica, que reflete as especificidades de seu contexto. to, pode ser cartesiana (na Fransa), kantiana (na Alemanha) e positivista lógica
Entende! dessa maneira os vários pós-modernismos é deixar em aberto a (nos Estados Unidos),
questáo de como suas teorias da vida social, cultural e económica contemPore- Na arquitetura, o pós-modernismo é a rejeigáo de um exclusivismo funcio-
nea se relacionam com as práticas efetivas que constituem essa vida; é deixar nal (bem como a acolhida de um certo gosto pelo pastiche). A modernidade a
em aberto, portanto, as relasóes entre o Pd s-modenismo e a pós-modernidode. que se faz oposiqio aqui sáo o "monumentalismo", o "elitismo" e o "autori-
Quando a prática é teoria literária ou filosófica o pós-modernismo co-
- -,
mo teotia da pós-modernidade só pode ser suficiente se reflete em alguma
tarismo" do Estilo Internacional de Le C,orbusier, ou de Mies.:r
Na "literatura"/ o pós-modernismo reage contra a seriedade exagerada do
medida as realidades dessa prática, pois a prática em si é plenamente teórica. alto modernismo, que mobilizava a "dificuldade" como modo de privilegiar sua
Mas,quando um pós-modernismo aborda, digamos, a propaganda ou a poesia, própria sensibilidade rstética, e celebrava uma complexidade e uma ironia so-
ele pode ser suficiente como explicagáo delas, ainda que entre em conflito com
mente apreciáveis por uma elite cultural. A modernidade aqui sáo, digamos
suas narrativas, com as teorias que elas tém sobre si mesmas. É que, diver- (sem nenhuma or<lem particular), Proust, Eliot, Pound e Woolf.
samente da filosofia e da teoria literária, a propaganda e a poesia náo se colr- .- Na teoria politica, por fim, o pós-modernismo é a rejeigáo do monismo do
pdcm predominantemcnte de suas teorias articuladas a seu próprio respeito.
Marxista com M maiúsculo (embora nio do marxista mais recente, com M mi-
Uma per8unta importante é po¡ qr¿esse distanciamento em relagio aos an- núsculo) e das concepsóes liberais de justiga, bem como su¡ derrubada por
cestrais tornou'sc um aspecto tio central de nossas vidas culturais. E a resposta, uma concepgáo da política como sendo irredutivelmente plural, cada pcrspecti-
com certeza, tem a ver com o sentido em que ¡
arte é cada vez mais merca- va sendo essencialmente contestável po¡ outras perspcctivas. A modcrnidade,
dologizada._Vender a si mesmo e a seus produtos como arte no mercado é im- aqui, §áo as grandes r¡arrativas políticas oitocentistas de Marx e Mill, mas inclui,
portante, acima de tudo, para abrir um espago em que o sujeito se distinga de por exemplo, obras mais recentes, como a reconstruqáo de Tfie I iberal Theory of
outros produtorcs e produtos *
e isso se faz pela construqdo e acentuasño d¡s
htstice lA teoria libual lajrrsriqa*1, de fohn Rawls.
diferengas. Esses exemplos esquemáticos pretendem sugerir como poderíamos com-
E isso qtre responde por uma ccrtir intens¡fica9io do vclho individualismo d¡
preendcr a semelhanqa dc f¡míli¡ cntre os vários pós-modernismos como sen-
pro(hrs¡]o ¡rlísticir pós-¡'cn scc¡tistx: nx r¡'ir rlir Ic¡r'orlrr5rio rrrcclrric¡, o inrlivi-
tlo rcgith por unr princípio /iorrxo. lllcs taubénr sugcrcrrt ¡ror quc os grandcs
dualismo estético a caracterizagáo da obra de arte como perten cen¡e I oeuvre
de um indivíduo
- e a absorgáo da vida do artista na concepsáo da obra po- teóricos do pós-modernismo
-digamos, Lyotard, fameson e Habermas¡2
-
-
dem ser considerados, precisamente, como modos de ide¡¡tificar os objetos para
parecem competir por um mesmo território: o privilegiamento lyotardiano de
um certo antifuñdacionismo filosólico decerto pode¡ia ser visto como subscre-
o mercado. O escultor da bicicleta, em contraste, nio será conhecido pelos que
vendo embora, penso eu, náo plausivelmente causando cada um desses
con¡prrrc¡r cssc obieto; st¡a vid¡ intliviclu¡l nfur f¡rí ncnhunr¡ rlifcrcns¡ pnr¡ a - -
nlovi¡¡lcik)s; a caúctcr¡zas¡o jamcsoniana rkr pós-modernismo como a Iógica
história futura da obra. (Na verd¡de, ele certamente s¡be disso, no sentido de do capitalismo avangado tendo a mercadologizagáo das "culturas" como as-
que se sabe de qualquer coisa cura negagáo nunc¡ se tenha sequer considerado.)
pecto central
-
bem poderia explicar, igualmente, muitos aspectos de cada
Náo obstante, existe alguña cois, no objeto que serve para prepará-lo para o -
uma dessas transisóes; e o projeto habermasiano certamente tenciona (ainda
mercado: a disponibilidade da cr.¡ltura iorubana e de histórias sobre a cultura que em nome de uma metanarrativa sumamente n5o-lyolardianal'fornecer um
iorubana que ccrquem o objeto e o distingam da"arte popular" de outros locais. fiod$ operandi núñ mundo em que o pluralismo, por assim dizer, é uma ¡eali-
Voltarei a esse ponto. dade ) espera de instituisóes.
Pcrmit¡nr-¡ne confirmar essa proposigáo através de exempkrs. A cultura pós-moderna é a cultura em que operam todos os pós-modernis-
Na filosofia, o pós-modernismo é a rejeigáo do consenso dominante, desde mo§, ora em sinergia, ora em competi§áo; uma vez que a cultura contemPorá-
Descartes até o positivismo lógico, passando por Kant, sobre o fund¡cionismo nea, em certos sentidos a que voltarei, é transnacional, a cultura pós-moderna é
(existe uma via para o conhecimento, que é apan:igio da epistenrologia) e sobre
global- embora isso náo signifique, de maneira alguma, que ela seja a cultura
o rcalismo metafísico (existe unra verdade, que é apanágio da ontologia), cadr de todas as pessoas do mundo.
qual comprometido com uma nogáo unitária da razáo; assim, essa reieifño cele-
bra figuras como Nietzsche (que nio era um realista nletafísico) e Dewey (que
' Edi(Iobr¿sileir!rSioP¡ulo,MirtinsFont.s.(N.da'1.)
O p ós- co lorial t o pós- t¡to ¿.n o l0J
202 Na cnso .le ñe Pai
história, ou, dito em termos simples, por que a caracterizagño modernista da
Se o oós-modernismo é o projero de trallscender algumas espécies rlc lnodernis- modernidade deve ser questionada. Compreender ¡osso mundo é rejeitar a
relativa¡re¡tc constrangido
;"":;,;;; Projeto de autoprivilegia¡nento
que nosso esculttrr n':olm-
afirma9áo weberiana da racionalidade do que Weber chamou dc racionalizagáo,
a" r-u .oá"rniau¿e privilegiada presl¡me-se
com bicicleta" dev¡ ser
-'
entendido' em conlraste' como Pre-
bem como sua projegAo da inevitabilidade dela; é ter, portanto, uma concepsáo
riirior¡¿l do "Hcntem radicalmente pós-weberiana da modernidade.
(Estou supondo' portanto' que ser neotr¡dicion¡l
l.to ¿,,rudicional.
^oáa.no, dcseml)cnh¡do fclo neo
constitua unla maneira dc scr tradicirtn¡l; o lrabrlho lbdcntos conrcgrr por unr pxr tlc clric¡lurirs conhccirl¡s c ritcis: l'hom s
narr¡liv¡s socioló-
i lrl r".t,- o* *,omarei sucintamcntc mais acliantc ) As contr¡ a dcsumlnidade c 0 §ecul¡rizasio da socied¡de
Stearns Eliot coloci¡-se
vcio ser
da tradigáo pelas quais esse cscultor-ou escultora
a
gi.". ]r"opoflgtas moderna, a extensáo do ¡acionalismo iluminista ao mundo inteiro. Ele parti-
.--A.u.".i"tUaromaneira sáo dominadas, é claro' porWeber
"
t'eorizado(a)'dessa lha da explicagáo weberiana da modernidade e, em termos mais diretos, a de-
weberiana da autoridade tradicional (e carismática)'
em
plora. Le Corbusier é a favor da racionalizaseo uma casa é uma "máquina
,prr;ga, i"r,"tia"aa racio¡al, é compatlvel com sua caracterizagáo geral da -
em que viver"-, mas também ele partilha da visáo de modernidade de Weber.
Weber insistiu na impor-
áodernidade como a racionalizagio do mundo; e
E, é claro, os grandes racionalistas os que créem numa razáo trans-histórica
i;;;;;.t." processo c¡racteristicamente ocidental para o reslo da humani-
triunfando no mundo
-
a partir de Kant, sio a fonte da viseo kantiana de
dade. A introdugáo de A étic| Protestante' comega
assim: -,
Weber. O modernismo na literatura, na arquitetura e na filosofia a explica-
um filho da moderna qio da modernidade que, segundo meu modelo, o pós-modernismo procura -
No estudo de qualquer problema da história universal'
indaga6áo de qual a conrbinagáo subverter pode ser favorável ou contrário tr razáoi mas, em cada campo, a
ciritizagao europei" seÁPre estará sujeito A

d. futo.", qu".. poa. atribuir o fato de na Civiliza§áo Ocidental'e sonrente -


racionalizasáo o caráter difundido da razá.o é vista como a dinámica
"
na Civilizcalo Ocidental' haverem aprrecido fenómenos
cultur¡is,dotados -
singularizadora da história contemporánea.
-
v'llor c st8_
lcomo q,rertnlos crer) de um desenvolvintenlo urriv€rsnlcm scu Enlret¡nto, o comeso do saber pós-moderno consiste em pergunlar se a
nificado.rr racionalizatio weberiana foi de fato o que aconteceu. Para Weber, a autori-
uma importáncia dade caris¡nática a autoridadc de Stalin, Hitler, Mao, Guevara; Nkrumah
Nao há dúvida de que a modernid¡de ocidental tem hoie - -
ó ciclista iorubano como Sting e seus chefes ame- é anti-racional; no entanto, a modernidade foi dominada justamente por esse
oeosráfica universal. -
nor"u" ,roPical añazónica, ou Paul Simon e os músicos mbaqanga carisn¡¡. A secularizasáo mal parece estar avangando; as religióes clescem em
iináio', d"
-iérnutnn¿
¿ um testemunho disso Mas' se posso tomar
emprestado o toda parte do mundo; mais de 90olo dos norte-americanos ainda reconhecem
-
de outra pessoa, a verdade é que o Império dos Sinais Cont¡a- algum tipo de teísmoi o que chamamos "fu¡damentalismo" está táo vivo no
"-rr¿rti.oo ".onro qr"remos crer" de weber reflete suas dtlvidas sobre se o irn- Ocidente quanto na Africa, no Oriente Médio e no Extremo Oriente; Iirnmy
"ioi",l'
,rr;r- no
oala"ntul ¿ táo claranlente
-undo de valor universal qrt¡nto decerto Swagg¡rt c Rilly Graham t¿m ne8óc¡os na Louisiana e na Califórnia, assim
ur;versal; e o pós-modernismo com certeza endossa Plena- como na Costa Rica e em Gana.
i-d" i-pornnrio
mente sua resisténcia a essa afirmagáo A bicicleta entra em nossos museus O que podemos ver em todos esses casos, penso eu, neo é a vitória da Razáo
diz ¿on¡o ela dcvc scr valoriza- iluminista com ll maiúsculo que teria acarretado exat¡mente o fim do ca-
,oru ,". u"lo.ir",l" por nós (e David ltockefeller -
ául; rnur, .orno a p¡es¿,fa do objeto nos telembra esse fato 'sev conteúdo
*ri. risma e a universalizagáo do secular
-,
nem tampouco a penetrasáo de uma
razeo instrumfntal mais restriln em todas ss esferas da vida, mas sim o que
nos lembra que o comércio é de meo dupla
nossa modc¡nidadc nossa Weber confundiu com isso, o sabcr: a incorpor¡¡slto dc tpdos 0s ¡lrcas do mundo,
Quero argumentar que, para comprcender -.
piiteiro temos que entender por que a racionali- e de todas as áreas até mesmo da antiga vida"privada", rra economia monetária.
modernidadJ humana
-, do Ocidente ou da A modernidadc transformou cad¡ t¡m dos elementos do real num letreiro, e o
,rii. á" ,rr"¿.;, nlo pode ser vista conro a tendéncia
letreiro tliz "vende-se"; e isso sc aplica até a campos como a feligiÁo, onde a
razáo instrumental reconheceria qtle o mercado tem, quando muito, um lugar
' D(l¡sio br¡sileirx: Slo l¡t'k, Pioneira (N dr'r') ambíguo.
..()rurür\rr(.(lr/úrtr,tñJt¡l,hr,1¡r¡r¡iJ:.rr)tr'rf¡'¡¡"1¡hrt'nl'Intr'*"liv¡'r'l'lt"l'u'' Sc hojc sc ¡ocic vcr t¡t¡c o cliscurso wcbcriano sobre a vitóri¡ da r¡zio instru-
tranh* ,,rbrr,^ ir¡onots. ( r o nr¡f¡r'' "'¡'It¡ '¡rori¡ llln)c ¡1Ü iic(¡r (i("rilkx tlc u'or8e
mental constitui um erro, lquilo enr quc Weber pensou como sendo o desen-
Lücas.(N. da l.)
204 Na cosd de meu pai
O pós - colonial e o pó s+t odetn o t05

canto do mundo, ou seia, a difusáo de uma visáo científica das


coisas, descre- tes e simpáticos de Weber, comenta, a certa altura de sua discussio de uma
ve, se tanto, o mundo minúsculo _
e, nos Estados Unidos, bastante marginal
das distingóes tcóricas desse autor (a distinsáo, aliás, entre patrimonialismo e
dos cfrculos académicos superiores e de algumas ilhas sob sua influé"ncir-
-O.mundo do intelectual l, penso
feudalismo), que "Ie]ssa distingáo só fica clara enquanto é formulada em ter-
eu, basicamente desencantado (até os acadé-
r¡ricos teístas, em sua maior¡a, n¡o acreditam em fantasmas
mos abstratos",lt Ao ler Weber, essa é uma sensasáo que se tem feiteradamente.
e espiritos dos an-
cestrais); e um número menor de pessoas (embora ainda O problema é exemplificado na discussáo weberiana do "carisma" na Teoria da
muito numerosas¡ organizagao sociol e econünica:
supóe--que o mundo seja povoado pelas multidóes
de esplritos das religióes an-
tigas. Mesmo assim, o que temos visto recentemente nos O termo "carisma" será aplicado a uma certa qualidade de uma personalida-
Estados Unidos náo é a
secularizagáo o fim das religióes mas sua mercadologizagáo; de individual, em virtude da qual ele se distingue dos homens comuns e é
- -, e, com essa
mercadologizagáo, as religióes tém ido mais longe e
crescidá _',"r, tratado como dotado de poderes ou qualidades sobrenaturais, sobre-huma-
se expaodiram em vez de morrer. ^..lulo" nos ou, no mfniño, especificamente excepcionais. Estes sáo (...) co4sidera-
-
O pós-modernismo pode ser visto, portanto, como um novo dos como tendo origem divina ou exemplar, c, com base neles, o indivfduo
modo de com_
preender a multiplicaqio de distingóes decorrente da em qüesteo é trátado como um lfder.26
necessidade <ie ab¡ir um
espago para si
- a Onecessidade
de¡nidade cultural.
que impulsiona a dinámica subjacente da mo- Note-se como o carisma é disiuntivamente definido aqui como implicando
modernismo assistiu i
economizagao do murrdo.orno u ora capacidades mágicas ("sobrenaturais, sobre-humanas", "de origem divi-
vitória da razáo; o pós-modernismo rejeila essa afirmageo,
Drto da teoria, a mesma multiplicidade de distinqóes
perm¡tir¿o, no ir_ na"), de um lado, ora qualidades meramente "excepcionais" ou "cxemplares",
que vemos nas cr¡lturas de outro. A primeira disjungño de cada alternativa abrange satisfatoriamente
que ele procur¡ entender. os ¡nuitos c¡sos de lideranqa sacerdotal e profética que Weber discutc, por
exemplo, em seu estudo do ludalsmo anrigo. M¡s é a segunda, presumivel-
Preveio ¡l objesño de que o Weber a quem me venho mente, que devemos empregar ao proturar entender o papel polftico de Hitler,
opondo é unra espécic de
caricatur¡. E neo fica¡ia insatisfeito em arlmitir que hl certa
r".o.i¿oj" ni,ro. Stalin ou Mussolini, que, embor¡ tenham sido "excepcionais" e "exemplares",
Weber previu, por exemplo, que a racionolizagao do niro for¡m considerados como tendo poderes "sob renatu rais", "de origem divi-
mundo continr¡ari¡ a e¡_
contrar resisténcia, e sua visáo de que cada caso de carisnra na'l O fato é t¡ue grande parte do que Webe¡ tem a dizer em sua discussáo geral
precisava ser.,ro-
tinizado" náo pretendeu excluir o aparecimento de
novos Iia.r". -rlrn,it¡.u. do carisma, na Teoria da otganizagño social e econóñica e na explicagáo da"do-
em nossa época, como nas anteriores: nossa política do minaqáo" em Economio e sociedadat exige que levemos a sério seu aspecto
carisma talvez náo o
tivesse surpreendido.l¡ Certamente, além disso, sua
concepgio d" .".r. i_pfi mágico. Quando, entretanto, efetivamente o levamos a sério, descobrimos que
cava muito mais do que o cálculo instrumental. a teoria weberiana náo consegue aplicar-se aos exemplos de ca¡isma que se
Já que muito do qu. u..inll.l
aquileria sido previsto por ele, talvez mais valh¡ encarar isto
c.rná r-",.;"i- incluem na segunda disjungáo de sua definigáo. Em suma, a explicasáo que
9áo de uma leitura equivocada e esrreita (se bem que conhecidal ¿e WeU"lá" Weber dá ao carisma assemelha dois fenómenos estreitamente relaciooados
que como uma argumentasio coñtrária ao que há
de melhor nas visóes com_ como a liderarisa de Stalin, numa ponta do €spectro, e a do rei Davi ou do
-
plexas e cambiantes do próprio Weber.
imperador Carlos Magno, n¡ outra em que as idCias mágico-religiosas pa-
Mas, creio que também poderiamos interpretar essa leitura
equivocada _ -
recern, pára dizé-lo em termos brandos, desempenhar papéis singularmente
que encontramos, talvez, em Talcott parsons _ como sendo conseqiiéncia, em diferentes. Se acompanharmos a lógica dessa conclusáo, redefinindo o carisma
parte, de um problema da própria obra de Weber parte weberiano de maneira a insistir em seu componente mágico, dal decoÍcrá, por
da ¿i¡*i¿"J" ¿"*"
obra está em que, apesar da profusáo de detalhes históricos
em ,;;;;;;;, deñnigáo, que o desencanto do mundo *
o declfnio da magia leva ao fim
sobre a religiáo, o direito e a economia, é freqüente -
cos de um nível muito elevado de abstragáo.
ele mobilizar ,".;.;;;;- do carisma; nesse caso, porém, teremos de nos perguntar queo correto é afir-
Como resultado, n"- .".p.a n.a mar, com Weber, que as concepsóes mágicas desaparecem cada vez mais com a
cla¡o se há realmente tragos comuns significativo,
o, f.rá.;;;: modernidade. E, se ele tiver razáo nisso, também lererios quc abandonar a
sociais que ele assemelha sob co¡ceitos genéricos "n,r. "ário,
como ..racionul;ro9ao; afirmas¡o de que a sociologia da polftica de Weber no qual o carisma de-
o, -
"carisma'i (Esse é um dos problemas gerais levantados pela
Weber nos "lipos ideais'i) Reinhard Bendix, um dos
famosa .onnun., l"
inrirpretes mol. irnport"n_ I
' Edifao brasileira: Ik.rllin, &lilom da UnB, v. l, 1991.(N.d¡T.)
I

I
206 Na cosa le meu Pai O pós-colo ial eo pótrtrc¿err1o 107

sempenha um papel conceitual central esclarece os avi¡rrsos politicos carac- independéncia nigeriana em 1960. Mas ela pertence a um généro que certame¡-
terlsticos da modernidade.
- I te foi produzido desde entio: o 8énero que o catálogo chama de ,eotodicional.
Há um coniunto similar de dificuldades na explicagao weberiana da racio- Dito em tcrmos simples, o que há de caracterísl¡co nesse g¿nero é clc scr produ-
Íalí¿as¡,o. Dm A ético protestante e o espl¡ito do capitalitfito,tT Weber escreveu: zido para o Ocidente.
"Se este ensaio der alguma contribui§ao, que seia a de dest¡c¡r a conrplexidade Devo fazer algumas ressalvas. Evidentemente, muitos dos primeiros com-
do conceito, apenas superficialmente simples, de racional." Mas, talvcz tir.¡ue- pradores rcsidcnr nr Afr¡c¡ c nlu¡k)§ dclcs siio, juridicnnrcntc, cithtl¡ios tle Est¡-
mos tentados a indagar se nossa compreensáo das verdadeiras complexidades dos africanos. Mas, os consumidores burgueses africanos da arte neotr¡dicional
dos fenómenos históricos dos últimos séculos de história social, religiosa, eco- sáo educados em estilo ocidental e, quando querem arte africana,é comum pre-
nómica e política da Europa Ocidental se torna realnrente mais profunda pela ferirem pegas "genuinamente" tradicionais, com o que me refiro a pegas que
utilizasáo de um conceito de racionalizagio que reúne um suposto aurñento do eles acreditem ter sido produzidas pré-colonialmente, ou, pelo menos¡ num es-
cálculo meios-fins (racionalidade instrumental); um declfnio do apelo a"forgas tilo e por métodos iá estabelecidos nos tempos pré-coloniais. Tais compradores
misteriosas e incalculáveis" e um aumento correlato da con6anga no cálculo seo minoria. A maior parte dessa arte, que é tradicionalpor lusat técnicas efetiva
(desencanto ou intelectualizagáo);?¡ e o crescimento do "valor racionalidade", ou supostamente pré-coloniais, mas que é ,¿o essa, pela serventia que possa
que significa algo como uma concentrasáo crescente em maximizar uma gamá ter, é a explicasáo que frometi antes
-
por ter elementos reconhecidamente
estreita de metás últimas.2e Procurando ñ¡ncionar nesse nível elevado de gene-
-
provenientes do colonial ou do pós-colonial como ¡eferéncia, tem sido feita
ralidade, assimilando num conceito tántos processos, a meu ver distintos e in- para turistas ocidentais e outros colecionadores.
dependentemente inteligíveis, a apreciagáo weberiana detalhada e sutilda diná- A incorporaqáo dessas obras no mundo ocidental da cultura museológica e
mica de muitos processos sociais é obscurecida aqui por seu aparato teórico; de seu merc¡do artistico quase nada tem a ver, é claro, con o pós-modernismo.
mal chega a surpreender, penso eu, que aqueles que foram guiados por seus Basicamente, a ideologia medi¡nte a qual elas sáo in@rporadas é modernistai
escritos teóricos tenham ¡tribuido a Weber uma imagem mais crua do que a trata-se da ideologir que levou algo chámado "Rali" a Artáud, algo chamado
exibida em sua obr¡ histórica. "AÍiica" a Picasso, e algo chanrado "Japao" a Barthes. (Essa incorporastro, como
um Outro oficial, foiobviamenle criticada desde seusprimórdios: Oscar Wilde
Venho explorando como se afigura a nrodernidade do ponto de vista do intelec- certa vez comentou que "o Japáo inteiro é pura inveDgAo. Náo existe esse país,
tual euro-americano. Mas, como se afigura ela, vista dos espagos pós-coloniais náo existe esse povo."]o) O que lpós-modernista éa confi¡sa convicsáo de Vogel
habitados pelo "Homem com bicicleta"? Falarei sobre a Africa, confiando t¿¡¡ro de que a arte africana náo deve serjulgada "em termos dos critérios tradicionais
em quc parte do que tenho a dizer se aplicará a outros locais do chamado Ter- Ide outreml'l Para o modernismo, a ¡rte primitiva deveria ser julgada por crité-
ceiro Mundo,.J¡¡or¡ro em que, em certos locais, certamente náo o fará. Falarei, rios estéticos pretensamenl universair, etpor esses padróes, nnalmente se vcri-
primeiro, dos produtores desses chamados trabalhos artísticos neotradicionais ficou que era possível valoriáJa. Os escultores e pintores que julgaram isso
e, depois, do caso do romance africano. Creio que nos concentrarmos exclusiva- possível estavam predominantemente buscando um ponto arquimediano fora
mente no romance (como se inclin¡ram ¡ fazer os teóricos das culturas ¡fric¡- de suas próprias culturas, para fazcr uma crític¡ de r¡ma modernidade webe-
nas contemporáneas) equivale a distorcer a situagáo cultural e a importlncia, riana. Para os pds-modernismos, em contraste, essas obras, como quer que de-
dentro dela, do pós-colonialismo. vam ser entendidas, n¡o podem ser vistas como legitimadas por padróes que
Náo sei quando o "Homem com bicicleta" foi feito, nem por quem; a arte transcendJm a cultura e a hislória,
africana, até recentemente, foi colecionada como propriedade de grupos "étni- O que há de útil no objeto rcotndiciotal como modelo a despeito de sua
cos", e náo de indivfduos e estúdios¡ de modo que nio é incomum que nenhum¡ marginalidade na maioria d¡s vid¡s afric¡n¡s
-
é que sua i¡¡corporafio no
das pegas da exposi§1o Perspectiros tenha sido identificada na "Lista catalo-
-
mundo dos museus (enquanto muitos objetos feitos pelas mesmas máos, como
Bráfica" pelo nome de um artista individual, embora muitas delas sejam do sé- os bancos, por exemplo, residenr pacificamente cm laies ¡ráo burgueses) faz
culo XX (e nin8uóm há de ter-se surpreendido, em cortraste, com o fato dc a lembrar que na Africa, ao contrlrio, a distingño entre cultura e cultura de mas-
maioria delas sergentilmente rotulada com o nome dos proprietários d¡s cole- algum sentido, corresponde predominantemente ¿ distingáo en-
sa, se é que faz

§óes, basicamente particulares, em que elas hoje se encontram), Como resulta- tre os que tém e os que náo t¿m umr educagáo formal de estilo ocidental como
do, nio seidizer se a obra é literalnlentc pós-colonial, ou scjr, produzida após a consumirlores culturais.

I
208 Na casa ¿e meu pai
O p ós- colori al ¿ o pós1n oderno 209

O fato de a disting¡o ter que ser feira dessa maneira _ n¡ maior parte
._ da re.jeitada através dessas obras de arte. O que aqui se chama."sincretismo" é pos-
Africa ao sul do Saara, exclufda a República da Africa do
SLrl _ significa que a sibilitado pelo comércio internacional de mercadorias, mas náo é conseqüéncia
oposigáo entre a cultura refinada e a culturu a. rnurru.O
.rir,. #'.a.riiJ'.- do gesto de abrir espago.
que há um corpo significativo de instrugáo ocidental
formal: e isso exciui (na Os intelectuais pós-coloniais da Africa, em contraste, sao quase totalmente
maioria dos lugares) as artes plásticas e a música. Há distingóes
de género e de dependentes de duas instituiqóes para obter apoio: a universidade africana
público nos tipos de música africana e, para vários
,,tradicional,,,
fins culturais, eiiste algo a -
uma instituisáo cu.ia vida intelectual é macisamente constituida como ociden-
que chamamos música que ainda praticamos e valo.ir"_o., iru", tal e os editores e leitores euro-americanos. (Mesmo quando esses escritores
tanto os habitantes das aldeias quanto os moradores urbanos,
bu.gu"r.. fnro -
procuram escapar do Ocidente, como fez Ngugi wa Thiong'o ao tentar cons-
burguese-s, escutam em discos e, o quc é mais
importante, n. .íc1i",; r;", truir t¡m drama camponés kikuyu, suas teorias de sua situasáo sáo irredu-
Michael Jackson e King Sonny Adé.
Isso quer dizer que, basicamente, o campo em que tivelmer¡te pautadas em sua formagáo euro-americana. A concepsáo de Ngugi
essa distingio faz mais
sentido é o único enr que eh é poderosa e difirnclicl¡, n s¡l,er: sobre o potencial do escritor ¡a politica é essencialmente a da vanguarda, a do
¡ litc.:r,r.;;;;" nrodernisnro dc esquerda.)
na escrita em Iínguas ocidentais. porta¡rto, é ¡f que encontr¡mos, penso eu¡ um
lugar para a considerasdo da questáo do pó¡-cálonialismo Ora, essa dupla dependéncia da univcrsidade e do editor euro-¡mericano sig-
da cri rr" ni6ca que a primeira geraqáo de romances africanos modernos a geragáo de
contemporanea. "i¡.",," -
Things Fall Apatt l{s coisas se desintegram), de Achebe, e tEnfort noir [O me-
nino ¡egrol, de Laye foi redigida no conteno das nosóes de política e cultura
O pós-colonialismo é a condigio do que poderiamos
chamar, <1e maneira oou_ -
dominantes nos mundos universitário e editorial francés e inglés das décadas de
co generosa, uma intelectualidade comprisrn:
a de um grupo de esaritoraa oan_
sadores ¡elarivamenre pequeno, de esiilo ocidental 1950 e l960.lsso nao quer dizer que eles tenham sido como os romances escritos
"
..i;;;;"1,';r.
"-fo.n,"giu
intermedeia, na periferia, o comércio de bens culrurais na Europa Ocidental nessa ocasiáo, pois parte do que era considerado óbvio por
No Ocjdente, eles sáo conhecidos pela Áfricu qu"
do capiralis_" n,r.¿]r. esses escrilores e pela cultura superior da Europa da época era que as novas lite-
of"..."n,, ..r, ;;;;";;;;;", raturas das novas nasóes deviam ser anticolonialistas e nacionalistas. Esses pri-
os conhecem pelo Ocidente que eles apresentam
i Africa e po¡ !,-" Ai;;;;;" meiros romances parecem pertencer ao mundo do nacionalismo literário dos
eles inventaram para o mundo, uns para os
ourros e para a ifricJ. séculos Xvlll e XIX; sáo teorizados como a recriasáo ficcional de um passado
Todos os aspectos da vida cultu¡al africana contemporánea
inclusive a _ cultural comum, artisticamente trabalhado numa tradisáo comum peloescritor;
música e algumas esculturas e pinturas, e até alguns
textos com o, qr"i, . ó.i encontram-se na tradigáo de Scott, cujas Minsffelsy of the Scottith Border lCan-
dente quase náo tem nenhuma fanriliaridade I
fora^ ¡rfl*r.i" j;;;;riú;"
poderosamente, pela transigño das sociedades §óes da fronteira escocesa] pretenderam, como ele disse no prefácio, "contribuir
africanas pelo colo"¡"1fr".l", rn*
nem todos sáo, no sentido pertinente, pdJ_coloniais. um pouco para a história de minha terra natal, cujos tragos peculiarcs, maneiras
E iue p¿, ¿. ,¿.-..l"_
nial, como o ¡dide pós-nroderno, é o " ecarátervém-se derreterido edissolvendo nos de su¡ irmá ealiada'i Os romanccs
¡ás do gesro de abrir espaio
/ct Jltcs; c nluttils lrcxs rlir vitlit ctrltr¡r¡l aliicirnir crrrrlcrrrprrrilrrt¡r
q;;:;;;rl dessa primeira fase, portanto, sáo leg¡lim¡sóes realistas do nacionalismo: autori-
_ tl.rouik¡ 7.i¡nl tlt¡r "rclor¡ro ¡s I r¡(lisócs'l ¡r( ) n¡csn¡o tcn¡po que rcconheccnr as cxigéncias
que veio a ser teorizado como cultura popular,
em cspccial n¡o.r,eo I ol"'l*- de uma modernitlade wcberian¡ racionalizada.
padás em transcender dessa maneira o colonialismo (em
ir além dele). Na ver_
dade,.poder-se-ia dizer que um marco da cultura popular
é que,;; ;;p;;t Do fim dos anos 60 em diante, €sses romances celebratórios da primeira fase
mos de formas culturais internacionais seo notavelmenre
indifer"rrt". ¡ qr.ria. comesaram a rarear: Achebe, por exemplo, passou da criagáo de um passado
do neocolonialismo ou "imperialismo cultr¡ral, _ nio ¿ p-pr¡r^"^,1 utilizável enr Things Fall Apott para uma denúncia cínica da política na esfera
descartem, mrs que seo cegos para ela. Isso nao significa "r" "
modernismo sejam irrelevaDtes p¡ra essas formu,ie.ukrrr,
que a's t.;;;";;;';;,- moderna, em A Mr¡, ol tlrc Peoplc lUn homcrn do povo]. Maq eu gostaria de
poi, ;;;;;i; focalizar um romance francófono do fim dos anos 60, que tematiza de maneira
nalizagio do.mercado e a mcrcadologizagio das "
obras de arie lhcs
centrais. Realmente significa, porém, que essas obras
ri; r;;, extremamcnte vi8orosa muilas das quesióes que venho formulando sol¡re a ¡rle
de arte náo sao entendiáas
por seus produtores ou coosumidores em termos e a mode¡nidade refiro-me, é claro, a l¿ Devoir de violexce lO dever de violén-
de um pdj_r, od"rriroro, ni" cial de Yambo Ouologuem. Esse romance, como muitos dessa segunda fase, re-
há nenhuma prltica anterior cuj¡ reivindicagio de
exclrjM¿"¿" á. rlri"."Jf. presenta u¡n questionamento dos dl primeira: ele identifica o romance re¡lista
I I

?10 Na cito rle ñeu paí O l'ós-colo itl¿ o pttsl,n¡tnto llr

como parte da tática de legitimasáo naciooalista e, portanto, é se posso ini- (obra que dificilmente seria desconhecida dos leitores francófonos; se estes últi-
ciar um catálogo de suas maneiras-de-ser-pds-isto-e-pói-aquilo
-
pós-tealista. mos constituem um frrrto, trata-se do furto aventureiro do cleptomanfaco, que
- I
Ora, é claro que o pós-nrodernismo também é pós-realista. Mas o pós-realis- se atr€ve a nos deixar flagrá-lo no ato).
mo de Ouologuem certamente é motivado de um modo bem diferente do de E a primeira frase do livro estabelece habilidosafnente o estilo oral-¡quela
autores pós-modernos como, digamos, Pynchon. O realismo naturaliza: o "ro- altura, uma convensáo inevitável da narragáo africana com palavras que
mance africano" originário de Chinua Achebe Things Fall Apart e de
-,
Ngaté descreve acertadamente como tendo a "concisdo e a beleza e poder im-
Camaft Laye L'Enla¡, ¡oi¡
-
é "realista". Assim, Ouologuem é contra ele;
- pressionantes de um provérbio"...,r: c nesse mome[to zomba de nós, pois a fr¡-
rejeita
-
a rigor, ataca
-
as convensóes do realismo. Procura deslegitimar as se ecoa o comeso do romance de holocausto decididamente anti-africano de
- -
formas do romance aíiicano realista, em parte, com certeza, porque o que esta- André Schwartz-Bart, escrito em 1959, Le Demier des jr§r¿J fO liltimo dos.ius-
va procurando naturalizar era um nacionalismo que, em 1968, havia claramen- tosl; um eco que empréstimos posteriores mais substanciais vém confirmar.¡a
te fracassado. A burguesia nacional que pegou o bastao da racionalizaqio, da
Nor /¿r¡ boivent l'éclat du soleil, et, vaincus, s'étonnent de plcurer. Mas-
industrializagáo e da burocratizat¡o, em nome do nacionalismo, revelou-se
challah! oua bismillah! (...) Un récit de I'aventure sangl.nte de lá négraille
uma cleptocracia. Seu entusiasr¡¡o pelo nativismo era uma racionalizagáo de
honfe aux hommes de rie¡l tíendroit aisément dans la ptemié¡e moi-,'
sua ánsia de manter as burguesias nacionais de outras nagóes e particular- - -
¡ié de ce sílcle; ñ.tit la v¿itable histoire des N¿gres romrr¿r.¿ beaucor¡p
mente as poderosas nagóes industrializadas fora do caminho. Como obser-
-
plus tór, avec les Sáifs, en I'an 1202 de notre ére, daos l'Empire africain de
-
vou Jonathan Ngaté, " (.,.) Le Devoir de violerce (...) versa sobre um mundo em Nakem, (...).)5
gte a eficácia do apelo aos A¡cestrais, assim como os próprios Ancestrais, é
seriamente questionada".]r O fato de o romance ser pós-realista dessa maneira Nor yea.t regoivent la lumidre d'étoiles mortes. Une biographie de mon ami
permite a seu autor tomar emprestadas, quando precisa delas, as técnicas do E¡nie tiendrait aiséner, y'ans le deuxi¿me quart du XX' siécle; mais h té-
¡itable histoi¡e d'Er¡ie Lévy con nencetr¿s tAr, dans la vielle cité anglicane de
modernismo, que, como aprendemos com Fredric ,ameson, muiras vezes sáo
York. Plus précisément: le I I mars I 185.16
também as técnicas do pós-modernismo. (É úlil leñbrar, ¡este ponto, como
Yombo Orrologuenr é descrito na contrtcapa da primeira edigao das Editions Para essr comparrs¡o, fiz minhas próprias tradusóes, que sáo táo lilerais
du Seuil: "Nl ¿¡ 1940 ar Mali. Adntissible i I'kole Non¡nl¿ Supéricurc, l,icencié quanto possível:
¿t Lettres. Licencié en Philosophie. Diplóñe d'étudet supérieutes d'Anglois. Pré-
pare e th¿se de doctorat de Sociologie.'a Retirár empréstimos do modernismo Nossos oll¡o¡ bebem o brilho do sol e, vencidos, surpreendem-se por chorar,
I
M¡schallah! oua bismillahl (...) Uma narrativa da aventura sangrenta da
europeu náo chega a ser dificil para alguém tio qualifrcado a rigor, ser al-
guém da Ecole Normale é, na eDcantadora formulagio de Christopher Miller, - negrada
-
vergonha aos homens ordináriosl
-
cabcria focilmente na pti-
meira metade deste Jlculo; mas o veriladeira hisfdria dos negros conre¡a mui-
"mais ou menos equivalente a ser batizado por Bossuet".3: ') to nr¡feJ, conr os saífes, no ano 1202 de nossa era, no império africano dc
A discussáo de Christopher Miller sobre le Devoir de violence em Blank Nakem, (...).
Darkness IEscuridáo vazial enfoca proveitosamente algumas questóes teóri-
-
-
cas da intertextualidade, levantadas pela persistente massagem que o romance
biografia rJc meu amigo
Nossos oll¡o.r recel¡em a luz de cstrelas nrortas. Uma
Ernie caberia lacilmente no segundo quarto do século xxi ,nas a tetdoileila
faz com um texto após outro na superffcie de seu próprio corpo. O livro con-
hbtória de Etf.ie Lévy conreqa bem antc5 na velha cidade anglicana de York.
tém, por exemplo, a tradugío de um trecho do romance de Graham Greene lri Mais precisamentc em I I de mdrso de I185.
a Bottlefield lCampo de batalhaj, de 1934 (traduzido e aprimorado, segundo
alguns leitoresl), e empréstimos de Borrle de rrrf []ola de sebol, de Maupassant O leitor adequadamente preparado há de esperar por u¡n holocausto afri-
cano; c esses ecos certamente pretendem ironizar a posigio dos governanles
I
de Nakem como descendentes de Abraham El Héir, "lc luif oir" [o judeu
' "Nasc¡¿o €m 1940 no Mali. Ad'niti¡lo na Escol¡ Normal Superior. Licencicdo em l"erras. Li- I
negrol. ''
c€nciado.m [ilosofia. Diploma deestudos superiores ein ¡ngl¿s. EsrI preparando unu tese de
.i.)lror¡Jo tm So. iolosi¡l' (^-. daT.) O livro conrega, portanto, com uma piad¡ doentia contra o n¡tivismo, i cus-
I
ta do leitor desavisado: e o ataque ao realismo é eis aqui meu segundo marco
- t¡.q'6Bcoi8n. Bosuei (1627,170,1), escriror francés célebre por suls pr¿dicas em Paris e por I -
t r$ t.ft$6.s«itosi foihnrb¿fl tlrelido (ebispo). (N. da T.) pós-nativista; esse livro é um antídoto homicida contra a saudade das Raízes
I

i
-

tu
2.t2 Na casa de meu pai O pós-colonial e o pós-noierno 2tj
I
IRoots]. Como disse Wole Soyinka, numa interpretasáo iustificadamente rcs- modernizadores, vem a racionalidade; essa é a possibilidade que o romance ex-
peitada, "a Bfblia, o Coráo e a solenidade histórica dos Sriofi sáo reduzidos ¡ I clui. O romance de Ouologuem é típico desse segundo estágio, no sentido de
histrionice de meninos levianos, disfargados de seres humanos." E tentador náo ser escrito por alguém que se sinta i vontade e seia aceito pela nova elite, a
interpretar o ataque I história, aqui, como um repúdio, náo das raizes, m¡s do I burguesia nacional. Longe de ser uma celebrasáo da nasáo, portanto, os roman-
islamisrno, cómo faz Soyinka ao prosseguir: ces da segunda fase a fase pós-colonial sáo romances de deslegitimasáo,
- -
re.jeitando o iñperiún ocident^|, é verdade, mas também rejeitando o projeto
Uma cultura que reivindicou uma antiguidade autóctone nas partcs da Afri- nacionalista da burguesia nacional pós-colonial. E, ao que me parece, a base
ca quc se subnreteranr r seus ineglvcis atrntivos ¿ confi¡rr(c¡rcntc provir(lir
desse projcto de dcslegitimasio realmente nio é a pós-moderniita; antes, ela se
imperialista; pior ainda, demonstra-se que ela é essencialmente hostil ¡ cul-
fundamenta num apelo a um universal ético; na verdade, baseia-se, como se
tura loc¡l (...) Ouologtrem declara que n incrrrsáo mugrrlrnana na Africa nc-
gra é corrupta, violc»t¡, dcc¡dcntc, clitist¡ c inscnsivcl. No rrrluirro, cssa obra
lrlscilrr prcrlrrnrinarrtcr¡¡cnlc ¡ls rcsl)ostis ¡ntclcctnais i\ oprcssio na Africa,
funciona como um enorme esfregáo na operagao de limpeza do convés para num apelo a um certo respeito simples pelo sofrimento humano, numa revolta
o comeco da rest¡urasio raci¡l.re fundamental contra o sofrirnento inrerminável dos últimos trinta anos. Ouolo-
gucn¡ dilicilDreotc tetrderia a unir firrgas conr um relativismo que pudesse per-
A mim me parece muito mais claro interpretar o r€púdio como um repúdio mitir que a horripilantemente nova-velha Africa da exploragáo fosse entendida
da históriá nacional, ver o texto como pós-colonialmente pós-nacionalista, e legitimada em seus próprios termos locais.
também como anti- (e portanto, é claro, pós-) nativista. (Na verdade, a inter-
- -
Os romancistas pós-coloniais da Africa romancistas ansiosos por escapar
pretagáo de Soyinka nesse ponto par€ce ser guiada por sua própria tendéncia, do neocolonialismo
-
já nao estáo comprometidos com a nasáo; e, nesse as-
igualmente representativa que discuti no qurrto capitulo de interpret¡r ¡
-
pecto, h6o de parecer, como sugeri, enganosamente pós-modernos. Mas, o que
-
Africa como raga e lugar em tudo.) Raymond Spartacus Kassoumi
-, que é, se escolheram em lugar da nagAo neo é um tradicionalismo mais ¡ntigo, porém a
existe algurn, o herói desse romance
-
é, afinal, um filho da terra, mas seus Africa- o continente e seu povo. lsso fica bastante claro, creio, cm Le Devoí¡ ¡le
-
projetos políticos no fim da narrativ¡ nio chegam a ser aninradores. Mais do violerrre; no fim do romance, Ouologuem escreve:
que isso, o romance tematiza explicitamente, no antropólogo Shrot¡enius
um eco evidente do nome do africanista alemáo Frobenius, cu.ja obra é citada
- Muitas vezes, é verdadc, a alma quer sonhar com o eco sem passado da felici-
dade, Mas, jogados no mundo, náo podemos deixar de lembrar que SaIf,
por Senghor o mecanismo pelo qual a nova elite veio a inventar suas tradi-
-, pranteado tr¿s milhóes de vezes, renasce incessanten¡ente n¿ tlistóri¡, sob as
§óes, através da "ciéncia" da etnografia: cinzas quentes de mais de (riota repúblicas africanas..)
I

S¡if fabulava e o intérprete traduzia; Madoubo repetia em francés, requin- Se havemos de nos identificar com alguém, i¡ f¡¿, será com "la négtaille"
tando as sutilezas para deleite de Shrobenius, lagostim humano atacado pcla a negrada, qu€ náo tem nacionalidade. Para esse fim, uma república é táo boa -
tateante ñania de querer ressuscitar, a pretexto dc uma autonomia culturil,
o que equivale a dizer táo ruim quar¡to qualquer outra. Se essa postulasáo
um universo africano que náo correspondia a mais nada de vivo; (..,) queria -
de si mesmo como africano
-
e nem desta ou daquela etnicidade supostamen-
descob¡ir um sentido metafisico em tudo (...) Considerava que a vida africa- I
-
te pré-colonial nem dos novos Estados nacionais
na era pura arte (...).o I
l de violence, esse recurso pós-colonial i - está implfcita em Le Devoir
Africa é encontradq, nos importantes
No comeqo, fóramos informados de que "existem poucos relatos escritos, e
- E¡tr¿ les cnrr IEntre as águas], le Bel Immonde
I
romances de V. Y. Mudimbe
as vcrsóes dos anciáos divergem das dos griotg que diferem cl¡s dos cro¡ris-
I
[O Relo lnrundo] (rccém-publicado cnr inglés como llcÍorc thc Bitth oÍ thc
tas".¡rAgora, somos alertados contra o discurso supostamente científico dos Mool [Antes do n¡scinrc¡¡to da lurl) c l,'Étrrt lO desviol perto d¡
etnógrafos.'1 i supcrficic, e vez ¡|ós outr¡.{r
-, n¡¡is
t
Por ser esse um romance que procura deslegitimar náo apenas a forma do I
realismo, mas também o conteúdo do nacionalismo, ele nos parecerá, nessa Em I Ecor¡ por exemplo, há um momento enr que o protagonista, de quem o
medida, enganosamente pós-moderno. Erga nosafien¡e, pois o qve temos aqui livro constilui o diário,lembra uma conversa com a namorada francesa de seus
I
é pós-tñodernismo, e sim pós-fiodernizoeío; náo uma estética, mas uma po- tempos de estudante a moga sobre quem ele reflete constantemente, ao se
^eo
litica, no sentido mais literal do termo. Depois do colonialismo, diziam os l -
envolver com uma mulher africana:
i

I
i
2la Na caso de neu Pai O pós-colonial e o pós-modttno 215
I
I
I
Vocé nio lem como saber, Isabelle' como a Africa é exigente' também africano, e estar assim comprometido, querendo ou neo, com um
-Ela {a Africal é importante Para voc¿, neo é? I engajamento no sofrimento africano. Essa demanda feita pela Africa nada tem a
-Para dizer a verdade, náo sei... Realmcnte nio sei"' Eü me
pergunto se I
ver conr urna simpatia pelas culturase tradigóes africanas; refletindo, um pouco
-
n¡o co5tumo fiaar aPenas brincando com isso' depois, sobre a resposta alienante do padre l-loward, Landu deixa isso claro:
Nari.., eu náo compreendo. P¡ro minr, o inrportante é ser eu nresma'
I
-
Ser européia náo é uma bandeira
i
I O padre Iloward também é padre, como eu. É esse o lago que nos une, Será
nuoca foi ferida como... l que éo único? Náo. Existem nossos goslos conruls.
-Vocé
Vocé está dramatizando, Nala, Carrega sua africanidade como um A música clássica. Vivaldi. Mozart. Bach. (..,)
-
mártir... Isso dá o que pensar... Eu o desprezaria se entrasse no seu
jogo' E há também nossas leituras. Os livros, nós os passávamos um pa¡a o
A diferenfa, isabelle, a diferen§a é que a EuroPa é antes de tudo uma outro. Nossas lembransas comuns de Roma. Nossas discussóes apaixonadas
-
idéia, uma inst itu i(¿o iu rídica... ao passo quea Africa " sohrc o papeldo padre, esobre a literatura e os romances policiais que ambos
O qué?... devorávamos, Sou mais próximo do padre Howard que de meus compa-
- A ifrica talvez seja sobretudo um corpo, uma exi§t¿ncia múltiPl¡ Es- lriot¡s, mesmo os padres.
-
tou me expressando ¡na1..." Só unrá coisa nos sep¡ra: a cor da p(lc.¡¡

diálogo me parece captar a ambiSüidade essencial da reh§'o do intelec-


Esse I Em nome dessa "couleur de lo peou", que é precisamente o ,inal da solida-
tual africano pós-colonial com a Africa. Mas, deixem-me acomPanhar a Africa' riedade com a Africa, Landu parte do catolicismo romano para o marxismo,
que
finalmente, no primeiro romance de Mudimbe, Entre les eoux, romance I
procurando iuntar a energia revolucionária popular deste ú{timo ¡ visao ética
tematiza essa questeo de maneira sumamente explícita. e religiosa do primeiro, proieto qu€ ele examina numa passagem postc-
Em Eúre les cottÍ lutn narrativ¡ na primeira pessoa nosso Prota- I -rior, ao lembrar - uma conversa mantida muito tempo ante§, em Roma, com
- um
-, en théologie
"doctoñt et
gonista é um jesuíta afiicano, Pierre f¡ndu' qu€ tem I
monsenhor Sanguinetti. "tÉ,glise et I'Afriq¡¡¿", diz-lhe o monsenho¡ "comptent
en ¡lroit carron",6' adqrriridos quando esttldante en) Roma Landu srrr vorrs."r" l.ondu pergrnt¡, no prescntei
inncltircncc i
é ap¡nhado cntre sll¡ dcvo§áo ¡ lSrei¡ e, como se diria nu¡rra linguagcnr nruis I

pr;testanle, a Cristo; e este último o leva a rePudiar a hierarquia católico-roma- A Igrcje alnda podcria contor comigo? É o qu..u dcrci¡rl. G d.¡.ro. O G¡¡.n.
cmPe- cial, no entanio, é queCristo conta comigo. Maq ca Africa? Dc quc Africa mc
na oficial de sua pátria e a se Iigar a unr grupo de guerrilheiros marxistas, I
falou Sanguinetti? A de meus confrades negros que conrinuaram no bom ca-
nhados em eliminar o Estado corrupto pós-independéncia Quando fala
pela
o padre I miñho, ou a de meus pais, a quem iá tral? Ou será qu¿ele estava falando da
primeira vez de suas inten§óes a seu suPerior imediato na hierarquia'
que Africa que defendemos neste c¡¡n¡po?so
Howard, que é branco, este lhe responde, imediatamente e sem remorso' I

isso será uma traisáoi Toda vez que Landu enfrenta uma decisáo crucial,.ela lhe é formulada como
disscra- me meu suPerior quan-
I uma pergunta sobre o significado da Africa.
estará comet€ndo uma trai(áo
-Voc¿ - Após ser acusado de outra traisáo desta vez, pelos rebeldes, que intercep-
do lhc participei meu Projeto. I
-
taram uma carta enderegada a seu bispo (urDa carta em que Landu apela para
Contra quem?
- i que ele se solidarize com os negros rebeldes, que os recupere para Crisro)
-Cristo.
Padre, nAo será antes o Ocidente que estou traindo? Isso ¿ uma trai§áo i
Landu é condenado morte. Enquanto aguarda ¡ execus¡o, ele se lembra de
-,
-
mesmo nssim? N¡o tenho o direito de mc dissociar desse cristianismo que , algo que um tio lhe dissera, dez anos i¡ntes, sobre "os ancestrais":
traiu o Evangelho?
Voc¿ é padre, Pierre. "Farás falta aos teus...'; dissera-me meu tio há mais de dez anos. Et¡ me recu-
- DesculPe, padre, sou r¡m P¡dre negro.{7 sara a ser iniciado. Que queria di?er? Eles é que me estáo fazendo faha, Seria
- esta sua maldisáo? A fórmula me ¡nv¡diu, a princlpio discreta, depois eston-
' importante, creio, náo ver a negritude ¡qui como uma questao de raga EIa
E tcante, impedindo-me de pensar: "lspera que nossos ancestrais dessam.l'ua
é, antes, r¡m sinal de africanidade Ser um padre negro é ser um
padre quc ó
cabega queimará, tua garganta explodirá, tcu ventre se abrirá e teus pés se
quebrarño. Iispcra que os anceslrais dcsqam..." Illes haviam descido. E eu ti-
' "L)ouh)rJ¿o cnt r.ologia e licenci.¡¡urJ ú rdrr.ilo(¡n¿n'i'o:(N d! l') nha apcrras a sccura de uma Fé rilcion¡lizadr para me defendcr d¡ África.'5'
216 No caso de ,nc poi O pós-colonial c o pós-modefio 217

A visáo de modernidadc dessa passagem náo é, a meu ver, weberiana. Sendo impulso que transcende as obrigagóes para coñ igrcias e nagóes, é o que propo-
pós-colonial, Picrre Lrndu é coDl¡il o itrlp¡¡so rxcion¡liz¡lllc d¡ rrrodcr¡idadc nlro n¡rrcncicrnros corn o l;rndrr de Mudinrbc.
ocidental (que essa modernidade seja representada pelo carolicismo, aqui, nesse Mas, lambém há algo a reieitar na adesáo pós-colonial i Africa de Na¡a, o
coñtexto africano, confirn¡a quio pouco a modernidadc tcnr it vcr, enl í¡ltima p¡otagonista anterior de I'Ecarr, de Mudimbe: o tipo de maniqueísmo quc faz
instáncia,.conr a secularizaqio). E, nresnro r¡essc nronre¡lto! qu¡ndo ele acredita da Africa"unr corpo" (¡ naturez¡), €m oposisáo ¡ realidade iurldica da Europa
estar diante da morte, a pergunta "Que signiñca ser africano?"está ño centro de (a cultura), e depois deixa de reconhecer muito embora o añrmc a plena
sua ¡nente.
-
significasáo do fato de a Africa ser também "uma existéicio tiúhipla".- Entre os
Um ataque das forgas do governo ao campo salva Pierre Landu da execugáo; dguas fornece uma vigorosa crítica pós-colonial desse bin¡rismo: podemos lé-
a intervengio de um bispo e de um irmio com ligagóes poderosas dentro do lo como argumentando que, para quem postula uma escolha ou-ou entre a
Estado moderno salva-o do destino de um rebelde capturado: e ele se ¡fasta do Africa e o Ocidente, nAo há lugar no mundo real da polltica, e seu lar deve ser o
mundo para adotar uma vida monástica, sob um novo nome neo mais mundo extraterreno, o retiro monástico.
Pedro-sobre-quem-construirei-minha-lgrejt, m¡s Mi¡tcus-M¡ria -d¡ Encarna-
§io numa ordem diferente e mais co¡ltenrplativa. euando o deixamos, suas Se hl r,rnra ligio no formato amplo dessa circulagáo de culturas, certámente ela
-,
palavras finais, as últimas do romance, sáo: "(.,.) a humildade de minha degra- é que todos iá estamos contaminados uns pelos outros, que iá náo existe uma
daglo, que glória para o homeml"t2 Nem Marx nem S¡o Tomás, sugere o ro- cultura africana pura, plenanrente autóctone, i espera de resgatc por nossos ar-
mance ¡enhuma das duas grandes energias pollticas do Ocidente na Africa tistas (assim como náo existe, é claro, cultura [orte-americana sem ralzes afri-
-
oferecem um caminho a seguir Mas esse retraimento para o que é do outro canas), E há um sentido claro, em alguns textos pós-coloniais, de que a pos-
-,
nrundo náo pode ser uma solusáo polftica. O pós,colonialisnro tambénr se tor- tulagáo de uma Africa unitária, em contraste com um Ocidente monolÍtico
nou! penso eu, uma condigáo do pessimismo. o binarismo do Er¡ e do Outro *, é a última das pedr.as de toque dos moder-
-
Literatura pós-realista, políticá pós-nativista, solidariedade t¡ansfiacional, nizadores, da qual devemos aprender a prescindir.
em vez de nacionol. E pessimismo: uma espécie de pds-otimismo para com- lá em Le Detoit de violence, na devastadora crltica da "shrobéniusologie"
pensar o entusiasmo ar¡terior por The Suns of Independence IOs sóis da inde- Ishrobcniusologia] feita por Ouologuem, vimos os primórdios dessa crítica
pendéncial. O pós-colonialismo é posterior a tudo isso: e seu pds, como o do pós-colonialdo que poderíamos chamar de"alterismo": a construgáo e celebra-
pós-modernismo, é também um pds que contesta as narrativas legitimadoras 9áo de si mesmo como o Outro. "(...) eis a arte ne8ra l¡atizada de'estética'e
anteriores. E as contesta em nome das vítimas sofredoras de,,m¡is de trinta comercializada salve! no universo imaSinário das'trocas vivificantes'!",tt
repúblicas'l Mas contesta-as em nome do universal ético, em nome do huma-
- -
escreve Ouologuem; e entao, depois de descrever a elaboragtro fant¡smática de
nismo, "la gloire pour l'homme".E,baseado nisso, ele náo é um aliado do pós- uma nristificasáo "inventada por S¡if i ele anuncia que "(,,,) r arte oegra forjou
modernismo ocidental, mas um adversário: com o que acredito que o pós-mo- seus titulos de nobreza no folclore da espiritualidade merc¡rntilista, salve, salve,
dernismo possa ter algo a aprender. salve..."5t Shrobenius, o antropólogo, como ¡pologista de"scu" ¡'rovo; um públi-
co europeu que absorve sofregamente es§e outro que se tornou exótico; os co-
Pois o que estou chamando de humanismo pode ser provisório, historic¡mente rncrciantcs e produtores dc rrte rfric¡n¡, que comprcen«lcnr i¡ necessidide de
contingente, anti-essencialista (em outras palavras, pós-modcrno) e, ainda ¿s- nranter os "nristérios" que cstltrclccenr sct¡ pft)duto cor¡lo "cxótico"; as cl¡te§
sim, ser exigente. Decerto podemos manter um compromisso vigoroso com a tradicio¡ais c contcmporáneas que requerem um possrdo sentimentalizado
Preocupagáo de evitar a crueldade e a dor e, ao mesmo tfmpo, neo obstante, para .rr¡torizar seu po,ler atual, tudo isso é e*po,to iuor cunrplicidades com'
"rn
reconhecer a contingéncia dessa preocupageo.tr Talvez, portanto, possamos re- plexas e múltiplcs:
cuperar, dentro do pós-modernismo, o humanismo dos escritores pós-colo-
"(...) comprovcr o csplendor de sua arlc* a grandeza dos irrpérios da ldade
niais a preocupasáo com o sofrimento humano, com ¡s vítimas do Btado
-
pós-colonial (uma preocupasáo que encontramos por toda parte: em Mudim-
Médi¡ constituiu ¡ verdadeira face da Africa, sábia, bela, rica, ordeira, nao
violenta e ¡roderosr, ao mesnro tempo que hunranista o próprio berqo dr
be,como vimos; em,{ Play ol Giants llogo d,e gigantesl, de Soyinka; em Achebe, civilizagio egipcia."
-
Frrrah, Gordime¡ hbou Tansi,lista dificil de complerar) ao mesmo tempo B¡b¡ndo ¡ssim, Shrobcnius, de volta ao lar, tirou disso unra du¡la vanta-
-,
rejeitando as narrativas mestras do modernismo. Esse impulso humano, um I
¡icrn: clc unr lado, nlistificou o povo de seu próprio p¡ís, quc, cncantado,
218 Na coto rle ,fieu pai O pós-coloñiile o pós-ñorlerno 2t9

alsou-o a uma cátcdra sorbonical, e de outro, explorou o scntimentalisn¡o máquinas de alteridade. E o que corre o risco de se transformar €m nosso papel
crioulo feliz demais por ouvir um branco dizer r.¡uc "a Africa cra o vcntre principal. Nossa única distingáo, no nrundo dos textos em que somos retarda-
-
do nruldo c o ber(o da civilizirqiro". tários, é que podemos mediá-lo para nossos companheiros. Isso se aplic¡ es-
A negrada ofereceu is toneladas, conseqüentemente e de grasa, ¡ráscar¡s
pecialmente quando o pós-colonial encontra-se com o pós-moderno, pois
e tesouros artíslicos aos acólit<rs da "shrobeniusologia'l$
o que o leitor pós-moderno parece exigir de sua Africa é sumamente próximo
Mais adiante, Ouologuem articula com mais exatidáo as interligagóes das misti- do que o modernismo como documentado na exposigáo Primitivismo de
ficaqóes africanistas com o turismo, bem como a produgáo, embalagem e co- William Rubin, em 1985
- exigiu dela. O papel que a Africa como o resto do
mercializagáo das obras de arte africarias: Terceiro Mundo
- -
desempenha para o pós-modernismo euro-americano (tal
-
como sua importáncia mais bem comprovada para a arte modernista) deve ser
Uma escola africanista, assim agarrada ás brumas do simbolismo mfgico-
religioso, cosmológico e mítico, havia oascido: tanto assim que, durante tr¿s distinguido do papel que o pós-modernismo poderia desempenhar no Terceiro
I

anos, homens e que homensl at¡avessadores, aventureiros, aprendizes de Mundo; qual seria este, a meu vcr, ainda é cedo demais para dizer. E o quc
i
-
banql¡airo, políticos, caixeiros-vinjant€s, conspiradores "cientistas", dizia- acontecer.acontecerá, náo por nos pronunciarmos §obre o a§§unto na teoria,
I -,
se, mas na verdade scntinelas servis, rnontando guarda diante do monumcn- mas pdas prlticrs cotidianas mutávcir ds vida cultural afrlcan¡,
to "sh roben iusológico" do pseudo-simbolismo negro, acorreram a Nakem. É quc, durante todo esse tempo, nas culturas da Afrlca, cxistem aquclca quc
I
Já a aquisisáo das máscaras antigas se tornara problemática, desde que se lecusam a ver-se como o Outro. Apcsar da realidade esmagadora do declfnio
I Shrol¡cnius e os missionlrios tinham tido a felicidade de comprá-hs em pro-
I
económico, apcsar da pobreza inimaginável, apesar das gucrras, da d€snutri§ro,
fusáo. Assinr, Saif e essa é ¿inda ho.ie uma prát¡ca correnle nrandou da doenga e da instabilidade política, a produtividade cuhural africana cresce a
I
- -
enterr¡r montóes de máscaras, feitas ás pressas i semelhanga dos originais, olhos vistos: as literaturas populares, a narrativa oral e a poesia, a dansa, o
enr cha¡cos, brejos, lagoas, pa¡lanos, lagos e lodagais, nem que fosse para
teatro, a música e as art¿s visuais, todos vicejam. A produgáo cultural contem-
exunrá-l¡s algum tempo depois, vendendo-as a curiosos e a leigos a peso de
poránea de muitas sociedades afiicanas e as muitas tradigóes cujos testemu-
ouro. Essas máscaras de tr¿s anos de idade estavam, segundo se dizia, carre-
nhos persistem de modo muito vigoroso
- sáo um antldoto contra a visáo
gadas conr o peso de quatro séculos de civilizagio.'7
sombria do romancista pós-colonial.
-
Ouologuem expóe aí, de maneira vigorosa, as ligagóes que vimos antes em Sou grato a )ames Baldwin por sua introdugáo ao "Homem com bicicleta":
algumas das opinióes de David Rockefeller sobre o sistema internacional do uma figura que, como viu Baldwin com tanto acerto, é poliglota falando
comércio artístico, o mundo internacional da arte: vé-se de que modo uma ioruba e inglés, provavelmente um pouco de haussá e unr pouquinho de fr¡ncés
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ideologia do valor estético desinteressado o "botismo" da "arte negra" coño para suas viagens a Cotonou ou Ca¡narócs, e alguém cujas "roup¡s nio lhe as-
"estética"
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mistura-se com a mercadologizagio internacional da cultuñ ex- sentam muito bem". Ele e outros homens e mulhercs, entre os,qúais vive quase
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pressiv¡ africana, uma mercadologizageo que exige, pela lógica do gesto de todo o tempo, sugerem-me que o lugar onde buscar a esperanga náo é apenas o
abrir espago, a fabricagao da alteridade. (Um bdnus significativo é que ela tam- romance pós-colonial- que lutou por alcangar o discernimentó de um Ouo-
bém se harmoniza com a decoraqio dos apartamentos modernos.) Shrobenius, loguem ou um Mudimbe mas a viseo exaustivá dessa criatividade menos
" Ic]e morchond-confectíonfieur d'idéologie" esse negoci¡nte-manufator de
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angustiada. Pouco importa para quen ela foi feita; aquilo com que devemos
ideologias o etnógrafo aliado a Sa'if
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imagem da casta dominante africana aprender é a imaginasao que a produziu. O "Homém com Lricicleta" foi produ-
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"tradicional" -
inventou uma África que é um corpo contrário ¡ Europa, a zido por alguém que nio se importa com o fato de a bicicleta ter sido um¡ in-
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instituiqáo jurídica; e Ouologuenr incitc-nos vigoros.rmente ¡ nos recu5¡rmos vensáo de Homem Branco ela náo está ali para ser o Outro db Eu iorubano;
e *er essc Orrtro.'3 -
está ali porque alguéñ se importou com sua solidez; está ali porque nos levará
mais longe do que nossos pés; está ali porque as máquinas s6o agora táo africa-
Sara Suleri escreveu ¡ece¡rtemcnte, em Mcnfless l)ays lDias sc'nr carnel, sobre scr n¡s qu¡nlo os ronl¡ncist¡s... c ll'i() ¡nvcDtrdas quarrkr o rcinl) clc N¡kcnr.dl
Irrlil(lir (orlro unr¡ "nriquirrrr <lc ultcr'itllrlc" c sol¡rc cstar rlccitlitl¡¡rrcrrtc l:rlt:¡
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disso." Se ¡rio há saída para o intelectual pós-colonial dos romances de Mu-
dinrbc, ó porque, desconfio, aorx) intelectuxis !lnr¡ cirtcgori¡ ¡nslitt¡í(lit nr
Aliicl rcgr'a pckr colorrialislrtr cstirnros scr¡¡prc c¡r pcrig() (lc ¡¡(!s tonl¡rr,tros
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