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VIDA PSÍQUICA
E ORGANIZAÇÃO
De Fernando C. Prestes Motta e Maria Ester de Freitas (Orgs.)
Rio de Janeiro : Editora FGV, 2000. 152 p.
Por Ana Paula Paes de Paula, Mestre em Administração Pública e Governo pela FGV-
EAESP, Doutoranda em Ciências Sociais no IFCH-Unicamp e Pesquisadora da Fapesp.
E-mail: appaula@uol.com.br
São
RAE Paulo,
• v. 41
v. 41
• n.
• 4n. •4 Out./Dez.
• p. 103-110
2001 RAE - Revista de Administração de Empresas • Out./Dez. 2001 103
Resenhas
uma importante ressalva: essa abordagem pode ser bas- volvimento de um ambiente de trabalho mais criativo e
tante reducionista se não for integrada a outras discipli- adequado às inquietações humanas.
nas do campo das Ciências Sociais. Dessa forma, defen- Dessa forma, mapeiam o território das dimensões sub-
de um resgate dos textos sociológicos de Freud, pois es- jetivas da gestão, argumentando que os gerentes devem
tes poderiam esclarecer a origem dos pressupostos fun- cultivar características específicas, entre elas: a sensibili-
damentais da cultura humana, revelando muito sobre os dade à variedade de conhecimentos (técnico, cultural,
processos inconscientes que consolidam determinados emocional, etc.), a capacidade de expressão dos fenôme-
valores, crenças e formas de controle nas organizações. nos afetivos, a habilidade para arbitrar com justiça na
Segundo o autor, a análise desses pressupostos aumenta- ausência de regras, a habilidade para tolerar as ambigüi-
ria nossa compreensão da cultura organizacional e evi- dades e incertezas e a capacidade de desenvolver a auto-
denciaria os motivos que tornaram universais certas idéi- reflexão e o pensamento crítico.
as empresariais como a eficácia, o desempenho e o su- Assim, os gerentes necessitam desenvolver, no míni-
cesso. mo, cinco repertórios de sensibilidades para lidar com
Gilles Amado também questiona se a cultura organi- pessoas e suas relações:
zacional não estaria preenchendo o vazio individual e • sensibilidade com as transgressões como fontes de
social de nossa época, na qual a organização vem-se tor- inovação, tal como demonstra Norbert Alter no pri-
nando um todo unificado e “aconflitual” que assume o meiro artigo da coletânea;
lugar do ego ideal. Assim, uma vez que há grande ade- • sensibilidade com os processos de cognição, comuni-
rência da subjetividade à vida organizacional, qualquer cação e poder, abordados por Antônio Virgílio de Bas-
tentativa de gerenciar a cultura da empresa implica domi- tos, Phillipe Zarifian e Barbara Townley em seus tra-
nação. Na sua visão, para contornar essa armadilha, o in- balhos;
divíduo precisar ter coragem suficiente para mobilizar suas • sensibilidade com a interioridade, prazer, emoção e
energias criativas na busca da autonomia, cultivando uma relações amorosas e familiares, temas tratados respec-
dimensão imaginária capaz de gerar um novo projeto de tivamente por Eugène Enriquez, Gibson Burrell, Lin-
sociedade. da Rouleau e Maria José Tonelli;
Na mesma trilha de Amado, Tiago Matheus avalia • sensibilidade com a cultura brasileira e estrangeira,
as dificuldades de elaborarem-se projetos coletivos em como abordam Fernando Prestes Motta, Rafael
uma era de individualismo: divididos entre a vontade de Alcapadini e Ricardo Bresler e Maria Ester de Freitas
pertencer a um grupo – que atribua significado a suas nos últimos textos do livro.
experiências – e a necessidade de tolerar as frustrações A leitura desses artigos é uma boa seqüência para o
– que são comuns à vida em sociedade –, a saída dos leitor que busca ampliar seus conhecimentos sobre a
indivíduos costuma ser o “cada um por si”. Para o autor, questão da subjetividade nas organizações, pois revela
este é um claro sinal de que ainda não alcançaram um suas inúmeras nuanças e alguns textos resgatam de um
autoconhecimento de suas exigências e limitações pesso- outro ângulo problemas discutidos em Vida psíquica e
ais, pois mostram-se impermeáveis às relações sociais que organização.
auxiliam no processo de constituição do ego. No entanto, cabe um alerta aos leitores que preten-
Encerrando essa coletânea, Miguel Caldas e Maria José dem utilizá-lo como uma referência para as práticas em-
Tonelli discutem a capacidade adaptativa dos indivíduos presariais: desenvolver habilidades e sensibilidades em
do nosso tempo, caracterizando um tipo peculiar: o “ho- relação às questões subjetivas não significa administrá-
mem-camaleão”. Para os autores, este é movido mais pela las, pois não é possível captá-las por meio de técnicas e
reação do que pela reflexão, de modo que imita o com- fórmulas de gerenciamento, mas somente pela percepção
portamento mais valorizado no meio circundante, trans- individual, o que não é algo que possa ser ensinado, mas
formando-se em um ser cuja aparência sobrepuja a es- que se conquista pela própria experiência subjetiva.
sência. Como é motivado pelo medo e pelo instinto de Qualquer tentativa de relacionar instrumentalmente a
sobrevivência, o “homem-camaleão” costuma ser uma subjetividade traz o risco de transformá-la em um modis-
presa fácil das técnicas e estilos administrativos em voga mo gerencial, além de promover um resgate dos proces-
nos domínios organizacionais. sos de dominação presentes na “gestão da paixão”, anali-
Em Gestão com pessoas e subjetividade, Eduardo sados por Enriquez e outros autores em ambos os livros.
Davel e Sylvia Constant Vergara advogam que a compre- Isso poderia significar uma ameaça ao avanço de nosso
ensão da subjetividade pelos gestores poderia aperfeiço- conhecimento sobre a subjetividade nas organizações, um
ar sua atuação profissional, auxiliando no alcance de maior campo delicado e no qual ainda estamos dando os pri-
produtividade e qualidade, além de possibilitar o desen- meiros passos.
104 RAEde•Empresas/FGV-EAESP,
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São Paulo, 2001
Brasil.