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INTRODUÇÃO À PSICOPEDAGOGIA
Conselho Editorial EAD
Dóris Cristina Gedrat (coordenadora)
Mara Lúcia Machado
José Édil de Lima Alves
Astomiro Romais
Andrea Eick
Obra organizada pela Universidade Luterana do
Brasil. Informamos que é de inteira responsabilidade
dos autores a emissão de conceitos.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido
na Lei nº .610/98 e punido pelo Artigo 184 do Código
Penal.
ISBN: 978‐85‐7838‐195‐0
Edição Revisada
APRESENTAÇÃO
Inicialmente, cabe referir que a forte menção aos educadores Paulo
Freire, Maria Celina Melchior, Nadia Aparecida Bossa, Fernando Bec‐
ker e Celso Antunes deve‐se ao fato de que, na nossa opinião, eles
apresentam informações mais amplas a respeito dos assuntos tratados
na presente obra.
No segundo capítulo, abordamos o surgimento da ciência da psicope‐
dagogia e a multidimensionalidade do objeto de estudo psicopedagó‐
gico. Salientamos o importante papel dessa área de estudo enquanto
espaço de reflexão para a ação pedagógica, momento no qual o profes‐
sor pode se conscientizar do trabalho que vem desenvolvendo, possibi‐
litando definir novos rumos para a sua práxis, a fim de colaborar com
a construção de uma sociedade mais justa, harmônica e igualitária.
6
O terceiro capítulo aborda o campo de atuação da psicopedagogia e
busca, a partir da caracterização da práxis psicopedagógica, a reflexão
sobre os diferentes enfoques (clínico, preventivo e da pesquisa cientifi‐
ca) adotados na ação psicopedagógica.
O quarto capítulo trata sobre a práxis psicopedagógica no âmbito insti‐
tucional e busca a compreensão da ação do profissional, tendo como
enfoque especial a prática psicopedagógica na escola e no hospital.
O sexto capítulo aborda o sistema familiar contemporâneo e o papel do
diagnóstico familiar sob o enfoque da psicopedagogia, a fim de verifi‐
carmos as possíveis repercussões da dinâmica familiar na educação e
na aprendizagem escolar dos seus integrantes.
O oitavo capítulo aborda a teoria das inteligências múltiplas, desafian‐
do o leitor a pensar sobre a própria concepção de inteligência humana.
A partir dessa reflexão, propõe a ressignificação do conceito de inteli‐
gência, de acordo com a teoria estudada e, por último, apresenta a
intersecção entre a teoria das inteligências múltiplas e a prática peda‐
gógica.
Por fim, o nono capítulo trata da avaliação sob o ponto de vista do
conhecimento de competências, por meio da qual o professor busca
aprimorar o processo de ensino‐aprendizagem, em vez de fazer uma
mera classificação dos conhecimentos do aluno mediante atribuição de
uma nota.
SOBRE O AUTOR
SUMÁRIO
Atividades .................................................................................................... 22
Atividades .................................................................................................... 32
Atividades .................................................................................................... 42
Atividades .................................................................................................... 52
5.3 Refletindo sobre a formação docente e seu reflexo na prática educativa .... 58
Atividades .................................................................................................... 60
Atividades .................................................................................................... 71
Atividades .................................................................................................... 80
11
8 A APRENDIZAGEM FRENTE ÀS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS............................... 81
Atividades .................................................................................................... 89
Atividades .................................................................................................... 98
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Katia Cilene da Silva
RETROSPECTIVA HISTÓRICA DA
PSICOPEDAGOGIA
Primeiro capítulo tem como proposta apresentar a história da trajetória
da psicopedagogia no Brasil. Para tanto, faremos uma breve contextua‐
lização do processo que desencadeou o surgimento dessa ciência em
diferentes momentos históricos.
Iniciaremos nossa caminhada pela Europa do século XIX e, a seguir,
abordaremos respectivamente a história da psicopedagogia na Argen‐
tina e no Brasil.
Bossa observa que, com o avanço do capitalismo industrial, foi pelos
avanços científicos e pelas formulações teóricas que se buscou explicar
as desigualdades inerentes à sociedade emergente. Paralelamente a
esse contexto, em que os ideais burgueses de igualdade e de fraterni‐
dade do século XVIII e do início do século XIX vão sendo deixados de
lado, surge como ciência independente a psicologia.
A partir desse pensamento, constatamos que o enfoque orgânico foi o
primeiro a orientar médicos, educadores e terapeutas na definição dos
14
problemas de aprendizagem no início do século XX. Acrescentamos
que, segundo Bossa3, esse foi um momento de grande desenvolvimen‐
to das ciências médicas e biológicas.
No que se refere ao surgimento da psicopedagogia, observamos que a
psicopedagoga francesa Janine Mery, citada por Bossa4, faz algumas
considerações sobre o termo psicopedagogia e sobre a origem dessas
ideias na Europa. Mery utilizava o termo psicopedagogia curativa para
caracterizar uma ação terapêutica, que levava em consideração tanto
os aspectos pedagógicos quanto os psicológicos no tratamento de cri‐
anças que apresentavam fracasso escolar.
Segundo Bossa, ainda com base nos estudos de Mery, os primeiros
centros psicopedagógicos foram fundados na Europa, em 1946, por
Juliette Favez‐Boutonier e George Mauco. Esses centros tinham direção
médica e pedagógica e buscavam unir conhecimentos da área da psico‐
logia, da psicanálise e da pedagogia no tratamento de comportamentos
socialmente inadequados de crianças, tanto na escola quanto no lar,
objetivando a sua readaptação. Em outras palavras, esses centros cons‐
tituíram as primeiras tentativas de articulação entre medicina, psicolo‐
gia, psicanálise e pedagogia na solução dos problemas de comporta‐
mento e de aprendizagem.
Seguindo a descrição da história da psicopedagogia na Europa, a partir
de 1948, segundo o psicólogo francês Maurisse Debesse, citado por
Bossa5, o termo pedagogia curativa passou a ser definido como sendo a
terapêutica para atender a crianças e adolescentes desadaptados que,
embora inteligentes, tinham maus resultados escolares. Esse autor
explica que a pedagogia curativa, introduzida no centro de psicopeda‐
gogia de Estrasburgo, França, era conduzida individualmente ou em
grupos e era conhecida como o método que favorecia a readaptação
pedagógica do aluno, uma vez que buscava ajudar o sujeito a adquirir
conhecimentos, bem como desenvolver a sua personalidade. Segundo
a autora, para Debesse, a pedagogia curativa situava‐se no interior
daquilo que, hoje, chamamos de psicopedagogia.
Bossa6 ressalta que o sentido conferido à psicopedagogia por Debesse,
em 1948, apresenta algumas variações em relação ao que lhe é conferi‐
do hoje pelos diversos profissionais da área.
Ainda segundo Bossa7, o professor Lino de Macedo afirma que, como
já é sugerido no termo psicopedagogia, essa é uma nova área de atuação
profissional, que busca uma identidade e requer uma formação de
nível interdisciplinar.
15
Finalizamos a nossa retomada histórica na Europa, enfatizando a forte
influência que a literatura francesa exerceu sobre o movimento psico‐
pedagógico na Argentina.
Segundo Bossa11, no que se refere à inserção da psicopedagogia no
âmbito pedagógico, as psicopedagogas Fernández e Montti concordam
em afirmar que foi a dinâmica histórico‐social que determinou a neces‐
sidade de um profissional que respondesse aos graves problemas en‐
frentados pela pedagogia diante da expansão demográfica do pós‐
guerra, gerando uma crise na escola devido à utilização de métodos
inadequados, aumento de matrículas, entre outras dificuldades. Diante
dessa situação, as referidas autoras salientam que surgiu a necessidade
de um profissional para orientar o processo educativo, construindo um
16
conhecimento mais profundo dos processos de desenvolvimento, de
maturidade e de aprendizagem humana.
Ainda de acordo com essas psicopedagogas, durante os 30 anos que se
passaram desde o estabelecimento da psicopedagogia na Argentina,
essa ciência vem ocupando um espaço significativo no âmbito da edu‐
cação e da saúde. Elas enfatizam que o processo evolutivo da psicope‐
dagogia é marcado pela mudança de abordagem, da reeducativa para
a clínica, e que tal transição ocorreu na década de 1970, com a criação
de centros de saúde mental em Buenos Aires, onde equipes de psicólo‐
gos atuavam fazendo diagnóstico e tratamento.
Ao reavaliarem os sujeitos depois de um ano de tratamento, os psicó‐
logos constataram que o problema de aprendizagem havia sido resol‐
vido, mas que, no lugar desse problema, os sujeitos tinham passado a
apresentar graves transtornos de personalidade, como fobias, traços
psicóticos, etc. Ao perceberem que estavam sufocando a única maneira
que essas pessoas tinham para se expressar e, consequentemente, pro‐
duzindo um deslocamento de sintoma, os reeducadores começaram a
mudar de postura, incluindo no seu trabalho o olhar e a escuta clínica
da psicanálise, resultando no atual perfil do psicopedagogo argentino.
Segundo Bossa12, no que se refere à atuação psicopedagógica propria‐
mente dita, Fernández e Montti observam que ela está ligada, funda‐
mentalmente, às áreas da educação e da saúde. As referidas psicope‐
dagogas observam que a função desse profissional na área educativa é
cooperar para diminuir o fracasso escolar, esteja esse relacionado à
instituição, ao sujeito ou, o que é mais frequente, a ambos. Acrescen‐
tam que esse objetivo é perseguido por meio de assessoramento a pais,
professores e diretores, para que possam decidir e opinar na elabora‐
ção de planos de recreação, cujo objetivo é o desenvolvimento da cria‐
tividade, do juízo crítico e da cooperação entre os alunos. Ainda, na
área educativa, o psicopedagogo argentino, segundo Fernández e
Montti, citadas por Bossa13, atua no serviço de orientação vocacional,
na passagem do ensino fundamental para o ensino médio e deste para
o ensino superior, bem como em outras atividades que surgem em
função de necessidades concretas da instituição.
Quanto à área da saúde, Fernández e Montti, citadas por Bossa14, refe‐
rem que o psicopedagogo trabalha em consultórios particulares e/ou
em instituições de saúde, hospitais públicos e particulares. Sua função
é reconhecer e atuar sobre as alterações da aprendizagem sistemática
e/ou assistemática por meio do reconhecimento das alterações da
aprendizagem sistemática, pela realização de diagnóstico, na busca da
identificação dos múltiplos fatores geradores do problema de aprendi‐
17
zagem, buscando, fundamentalmente, descobrir como o sujeito apren‐
de.
Salientamos o fato de que as práticas psicopedagógicas na Argentina e
no Brasil assemelham‐se em muitos pontos, uma vez que o referencial
teórico adotado pelos brasileiros é fortemente marcado por influências
argentinas.
Ainda nos dias atuais, a primeira atitude dos educadores e dos familia‐
res de crianças com problemas de aprendizagem é recorrer ao médico.
Logo, essa figura continua tendo uma grande importância nas decisões
das famílias.
É a partir do final da década de 1970 e início dos anos 1980 que, se‐
gundo Bossa17, começa a se configurar uma nova teoria sobre o enten‐
dimento do fracasso escolar. O enfoque passou, então, a ser a visão
18
sociopolítica, na qual o problema de aprendizagem passa a ser enten‐
dido enquanto problema de ensinagem.
Segundo Bossa18, não obstante o avanço teórico no final da década de
1970, Cecilia Azevedo Collares observava que os educadores continu‐
avam a delegar causas extraescolares ao fracasso escolar e defende a
ideia de que esse é um problema social e politicamente produzido.
Segundo a autora, faz‐se necessário desmistificar a ideia de que o fra‐
casso escolar é causado por fatos externos e passar a entender a articu‐
lação entre estes e as dificuldades existentes no próprio âmbito escolar
que determinam o fracasso escolar.
Para Bossa19, na visão de Collares, essa postura de relacionar causas
extraclasses ao fracasso escolar conduz, por vezes, à relativização e, até
mesmo, à inversão de muitas das formas de se compreender esse fra‐
casso, citando como exemplo a atual caracterização do fracasso escolar
como “problemas de aprendizagem” e que deveria, nesta perspectiva,
se configurar principalmente como “problemas de ensinagem”, que
não são produzidos unicamente dentro da sala de aula.
Neste sentido, Patto, citada por Collares20, afirma que “o processo
social de produção do fracasso escolar se realiza no cotidiano da escola
[...] é nas tramas do fazer e do viver o pedagógico quotidianamente nas
escolas, que se pode perceber as reais razões do fracasso escolar das
crianças advindas de meios socioculturais mais pobres”.
Foram os trabalhos de Maria Helena Souza Patto, Cecília Azevedo
Collares e Zaia Brandão que, segundo Bossa21, protestaram contra o
descaso dos nossos governantes para com a educação em nosso país. A
referida autora enfatiza que é fundamental a abordagem do fracasso
escolar do ponto de vista dos fatores sociopolíticos, visto que essa
problemática costuma ser relacionada à manutenção das más condi‐
ções de vida e de subsistência de grande parte da população escolar
brasileira. E acrescenta que o discurso científico não se pode prestar a
perpetuar tal situação.
19
1970 e, posteriormente, difundiu seus estudos em conferências pelo
Brasil.
Ao tratar sobre a formação do psicopedagogo no Brasil, Bossa refere
que, no final da década de 1970, surgiram, no âmbito institucional, os
primeiros cursos com enfoque psicopedagógico, antecedendo a criação
dos cursos formais de especialização e aperfeiçoamento. Segundo
Bossa23:
Esses cursos tratavam de temas como “a criança‐problema em classe comum”,
“dificuldades escolares”, “pedagogia terapêutica”, “problemas de aprendizagem
escolar”. Eram oferecidos a psicólogos, pedagogos e profissionais de áreas afins, em
busca de subsídios para atuar junto às crianças que não respondiam às solicitações
das escolas.
Ainda não podemos deixar de citar, segundo Bossa24, ao falarmos
sobre o histórico da psicopedagogia no Brasil, o trabalho da professora
Genny Golubi de Moraes, coordenadora dos cursos da Pontifícia Uni‐
versidade Católica de São Paulo (PUCSP) e responsável pela formação
de um grande número de profissionais. Ela priorizou o trabalho pre‐
ventivo, demonstrando a preocupação de que cada vez menos crianças
chegassem à clínica por problemas escolares.
Acrescentamos que foi, em 1979, por iniciativa da pedagoga e psico‐
dramaticista Maria Alice Assimon e Madre Sodré Dória, que foi criado
o primeiro curso regular de psicopedagogia no Instituto Sedes Sapien‐
tiae, na cidade de São Paulo. Bossa observa que o curso oferecido pela
Sedes Sapientiae passou por momentos diferentes. Primeiramente
abordou o enfoque da reeducação em psicopedagogia, embora hou‐
vesse preocupação com as questões preventivas. Segundo Eloisa Qua‐
dros Fagali e Vera Maria Rosseti Ferretti25, a reeducação
era vista como um processo de reintegração, em que estavam presentes os fatores
afetivos, os de raciocínio e os conceitos, de maneira geral. A compreensão do
raciocínio, apoiava‐se na epistemologia genética de Piaget, e os aspectos afetivos
fundamentavam‐se na relação vincular, no aqui‐e‐agora, segundo abordagem
gestáltico‐fenomenológica [...].
Essas autoras observam que, posteriormente, o curso assume um cará‐
ter mais terapêutico, no qual os aspectos afetivos da aprendizagem
ganham destaque no âmbito clínico. Essas mudanças continuam e
abrem espaço para se refletir e se praticar a psicopedagogia na institui‐
ção escolar. Ainda segundo Fagali e Ferretti26, o curso Sedes enfatiza a
valorização das diferenciações do papel do psicopedagogo, buscando
uma análise mais rigorosa da identidade desse profissional na distin‐
ção entre o perfil clínico e institucional.
20
A partir dos fatos anteriormente mencionados, Bossa27 salienta que a
nova abordagem daquele curso pioneiro reflete a mudança na forma
de conceber a problemática do fracasso escolar. Pois é indicativa da
busca do profissional brasileiro pela sua identidade, que nasceu reedu‐
cador. Ao longo do tempo, ampliou o seu compromisso, assumindo a
responsabilidade em relação à diminuição dos problemas de aprendi‐
zagem nas escolas e, consequentemente, à redução dos altos índices de
fracasso escolar.
Outro estado que merece destaque no que diz respeito ao pioneirismo
na formação institucional do psicopedagogo, ainda na perspectiva de
Bossa28, é o Rio Grande do Sul. Em Porto Alegre, a autora observa que
os primeiros centros de estudos voltados para a formação e à atualiza‐
ção em psicopedagogia foram organizados nos mesmos modelos dos
cursos do Centro Médico de Pesquisas de Buenos Aires. Logo, essa
formação tem suas raízes num modelo médico de atuação.
Acrescentamos que, segundo Sonia Moogen Kiguel, citada por Bossa29,
o primeiro registro de um curso de orientação psicopedagógica data de
1954 e foi patrocinado pelo Centro de Pesquisas e Orientação Educaci‐
onal (CPOE) da Secretaria de Educação e Cultura e coordenado por
Aracy Tabajara e Dorothy Fossati. Nesse mesmo período, foi criado o
Departamento de Educação Especial, orientado para o atendimento de
crianças especiais. Em 1967, foi desenvolvido pelo CPOE um curso de
dois anos de duração para professores, especializado no atendimento
psicopedagógico das clínicas de leitura, sob a supervisão do Dr. Qui‐
rós.
Salientamos que, segundo Kiguel, citada por Bossa30, ao falarmos da
história da psicopedagogia, no Rio Grande do Sul, não podemos dei‐
xar de mencionar o Dr. Quirós, pelos inúmeros livros publicados dedi‐
cados à preocupação com a linguagem e a aprendizagem. Assim como
pelas constantes vindas a Porto Alegre, pelas oportunidades de estágio
e curso oferecidos a diversos especialistas gaúchos em sua clínica, que
se constituíram no marco inicial de estudos sobre linguagem e apren‐
dizagem.
Bossa31 ainda observa que, além das iniciativas de formação de grupos
informais no Rio Grande do Sul, a Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul (PUCRS) passa a desenvolver, a partir de 1972,
cursos de especialização e mestrado no programa de educação, com
área de concentração em aconselhamento psicopedagógico. Também
na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), vem sendo
desenvolvido, desde 1984, um curso de especialização em aconselha‐
mento psicopedagógico no programa de pós‐graduação da Faculdade
21
de Educação (Faced). A partir do início da década de 1990, os cursos de
especialização em psicopedagogia, lato sensu, multiplicaram‐ se. A
demanda é grande, vários cursos estão surgindo, tanto nas instituições
estatais quanto nas particulares, em diferentes estados brasileiros (RJ,
SP, RS, PA, SC, MG, ES, MS, GO, BA, PE, CE e Distrito Federal).
Depois dessa breve retomada da trajetória da psicopedagogia no Bra‐
sil, na qual abordamos os movimentos de grupos que antecederam os
cursos formais, cujo objetivo era o aprofundamento dos estudos sobre
os problemas de aprendizagem, os cursos e as suas respectivas dinâ‐
micas, é importante citarmos a existência da Associação Brasileira de
Psicopedagogia (ABPp).
Segundo Bossa32, é a ABPp, enquanto elemento de organização formal,
de uma categoria profissional não reconhecida legalmente, que dá os
contornos à prática psicopedagógica em nosso país. É responsável pela
organização de eventos de dimensão nacional, bem como por publica‐
ções cujos temas retratam as preocupações e tendências na área. Os
temas dos encontros e dos congressos promovidos por essa entidade,
ao longo dos anos, refletem a trajetória da atuação psicopedagógica
dos seus primórdios aos nossos dias.
A psicopedagogia no Brasil, hoje, conforme Scoz, citada por Bossa33, “é
a área que estuda e lida com o processo de aprendizagem e suas difi‐
culdades e, numa ação profissional, deve englobar vários campos do
conhecimento, integrando‐os e sintetizando‐os”. Ou seja, na concepção
da referida autora, a psicopedagogia trata‐se de uma ação interdisci‐
plinar.
No que se refere à questão da formação do psicopedagogo no nosso
país, Scoz, segundo Bossa34, considera que existem vantagens e des‐
vantagens. Como vantagem, menciona o fato de a nossa formação em
psicopedagogia envolver profissionais de diferentes áreas. Acentua,
diferentemente do que acontece na Argentina, o caráter interdiscipli‐
nar dessa área de estudo. Por outro lado, essa diversidade de profissi‐
onais dificulta a formação de uma identidade própria do psicopedago‐
go.
Destacamos que, como educadores, devemos nos envolver nessa bus‐
ca, no sentido de colaborarmos com o processo de construção perma‐
nente dessa área de conhecimento, buscando a atualização permanente
no que se refere à compreensão do processo de aprendizagem. Além
disso, na identificação dos fatores facilitadores e comprometedores
desse processo, com vista a uma melhor intervenção, acreditamos que
22
essa é uma atitude que deve ser comum a todos àqueles que têm inves‐
tido e acreditado na educação.
Ponto Final
A nossa excursão pela retrospectiva histórica da psicopedagogia, no
Brasil e no mundo, revelou‐nos que a área de conhecimento da psico‐
pedagogia é recente, enquanto área de estudos, e está em busca da sua
própria identidade. Salientamos que tal tarefa consiste num trabalho
árduo, ao levarmos em consideração as dificuldades impostas pela
complexidade do objeto de estudo dessa área do conhecimento, as suas
origens teóricas e a questão da formação do psicopedagogo no Brasil.
Atividades
1) Segundo Bossa (2007), a preocupação com os problemas de
aprendizagem, que originou a psicopedagogia, surgiu em que lo‐
calidade e em qual período?
2) Quem são os fundadores dos primeiros centros psicopedagógicos
fundados na Europa, em 1946? Quando foram criados e quais os
objetivos do atendimento por eles realizados?
3) Explique o termo psicopedagogia curativa, com base na concepção
da Psicopedagoga Mery, segundo Bossa (2007).
4) Segundo Bossa (2007), para Debesse, a partir de 1948, como passa
a ser definido o termo pedagogia curativa? Descreva a terapêutica
realizada com bases na pedagogia curativa.
5) Segundo Bossa (2007), nos relatos da psicopedagoga Fernández,
em breve retrospectiva histórica sobre a trajetória da psicopeda‐
gogia na Argentina, qual o tempo aproximado do surgimento do
curso de graduação em psicopedagogia e qual a primeira cidade a
oferecer uma faculdade de psicopedagogia?
6) Analise as afirmativas a seguir e assinale (V) para as verdadeiras e
(F) para as falsas.
( ) Nas primeiras décadas deste século, os psicólogos argentinos
não tinham autorização para clinicar. Dessa forma, a educação
surgiu para eles como uma área efetiva de trabalho, levando‐
os a produzirem toda uma metodologia sobre a chamada difi‐
culdade de aprendizagem, originando a atual psicopedagogia.
23
( ) Citadas por Bossa (2007), Fernández mostra que a atividade
psicopedagógica, enquanto práxis, iniciou a partir da criação
do curso de graduação em psicopedagogia.
( ) Os profissionais que atuavam na psicopedagogia, no âmbito
da reeducação, tinham como objetivo medir os déficits e ela‐
borar planos de tratamento, que visavam trabalhar as funções
egóicas como: memória, percepção, atenção, motricidade e
pensamento, a fim de superar as faltas constatadas.
( ) A psicopedagogia surge no âmbito da educação, com o objeti‐
vo de resolver o fracasso escolar.
( ) Segundo Bossa (2007), para Fernández, o fato de a atividade
psicopedagógica ter surgido antes da criação do curso de gra‐
duação em psicopedagogia deve‐se à necessidade manifesta‐
da por profissionais que possuíam formação em outra área,
como, por exemplo, filosofia, de ocupar um espaço que não
podia ser preenchido nem pelo psicólogo, nem pelo pedago‐
go.
7) Segundo Bossa (2007), a concepção orgânica acerca dos problemas
de aprendizagem foi amplamente difundida aqui no Brasil, na dé‐
cada de 1970. Qual a ideia difundida como causa dos problemas
de aprendizagem nesse período e como foi designada?
8) Em que ano foi criado, no Brasil, o primeiro curso regular de psi‐
copedagogia, em que localidade, e o responsável pelo fato?
9) A psicopedagogia é uma categoria profissional que não é reconhe‐
cida legalmente. Quem é responsável pela organização formal
desses profissionais aqui no Brasil?
O CAMPO EPISTEMOLÓGICO E A
2
MULTIDIMENSIONALIDADE DO
OBJETO DE ESTUDO
PSICOPEDAGÓGICO
Este capítulo tem como objetivo contextualizar o leitor acerca do sur‐
gimento da ciência da psicopedagogia. Inicialmente, apresentaremos a
contextualização do campo epistemológico da psicopedagogia. Na
sequência, abordaremos as diferentes definições sobre o objeto de
estudo da psicopedagogia, a partir das concepções dos teóricos argen‐
tinos e brasileiros, colocando ênfase num ponto em comum entre elas.
Por fim, faremos a caracterização da multidimensionalidade do objeto
de estudo psicopedagógico.
25
ao fato de que, na época, a ideia amplamente aceita no Brasil (e em
outros países) era de que os problemas de aprendizagem estavam
relacionados a fatores neurológicos. Nessa época, o rótulo de DCM era
amplamente difundido, de modo quase rotineiro, como diagnóstico de
crianças que apresentavam como sintoma dificuldade na aprendiza‐
gem. Tal concepção a respeito do entendimento do fracasso escolar
indica o peso da concepção organicista no entendimento de uma pro‐
blemática que, como vimos, se afirmava ser preocupação da psicologia
e da pedagogia. Ainda no entender de Bossa3, essa segunda afirmação
possibilita a seguinte correlação: “Quanto maior a preocupação com o
aspecto orgânico no entendimento das dificuldades de aprendizagem,
menor será a atenção para o aspecto psicológico”. Contudo, observa
que, ao levarmos em consideração as implicações de tal possibilidade
na prática, constatamos que ela não pode ser pensada como uma sim‐
ples aplicação da psicologia experimental à pedagogia.
Ainda segundo Bossa4, Macedo ratifica o pensamento anterior ao afir‐
mar que o termo psicopedagogia, ao ter sido inventado, passa a assina‐
lar, de forma simples e direta, uma das mais profundas e importantes
razões da produção de um conhecimento científico: o de ser meio, o de
ser instrumento para outro, seja numa perspectiva teórica ou aplicada.
Nessa perspectiva, enquanto produção de conhecimento científico, a
psicopedagogia, que nasceu da necessidade de uma melhor compreen‐
são do processo de aprendizagem, não pode ser explicada como apli‐
cação da psicopedagogia à pedagogia.
Outro autor que contesta a ideia de que a psicopedagogia é uma apli‐
cação da psicologia à pedagogia é Roland Barthes5 ao enfatizar o cará‐
ter interdisciplinar da psicopedagogia:
O interdisciplinar, de que tanto se fala, não está em confrontar disciplinas já
constituídas, das quais, na realidade, nenhuma consente em abandonar‐se. Para
que se faça interdisciplinaridade, não basta tomar um “assunto” (um tema) e
convocar em torno, duas ou três ciências. A interdisciplinaridade consiste em criar
um objeto novo que não pertença a ninguém [...].
Para Bossa6, reconhecermos o caráter interdisciplinar da psicopedago‐
gia significa admitirmos sua especificidade enquanto área de estudos,
uma vez que, ao buscar conhecimentos em outros campos, ela cria o
seu próprio objeto, condição essencial da interdisciplinaridade. Nas
palavras da autora:
[...] a psicopedagogia como área de aplicação, antecede o status de área de estudos,
a qual tem procurado sistematizar um corpo teórico próprio, definir o seu objeto de
estudo, delimitar o seu campo de atuação; para isso, recorre à psicologia,
psicanálise, lingüística, fonoaudiologia, medicina e pedagogia.
26
A referida autora observa que, ao admitirmos essa intersecção, não
temos alternativa se não abandonarmos a ideia de tratar a psicopeda‐
gogia apenas como aplicação da psicologia à pedagogia. Pois, mesmo
se recorrêssemos apenas a essas duas disciplinas, na busca da solução
dos problemas de aprendizagem, não estaríamos fazendo uma mera
aplicação de uma à outra. Mas, sim, constituindo uma nova área que,
ao recorrer aos conhecimentos dessas duas, pensa o seu objeto de es‐
tudo a partir de um corpo teórico próprio, ou melhor, que se busca
construir.
Para Bossa8, na concepção de Fernández, ainda não existe uma teoria
sobre a prática específica da psicopedagogia em relação aos problemas
de aprendizagem. Assim sendo, a autora observa que a psicopedago‐
gia busca a compreensão dos problemas de aprendizagem na teoria da
inteligência de Piaget e na psicanálise. Lembremos que a teoria da
inteligência de Piaget propõe um modelo acerca do desenvolvimento
da inteligência, mas não uma teoria referente às rupturas no aprender
acerca do sujeito que não aprende. A psicanálise permite, entre tantas
outras coisas, realizar uma leitura do inconsciente e possibilita um
marco psicopatológico ao qual recorremos para melhor compreender a
estrutura da personalidade dos pacientes. Fernández enfatiza que a
psicopedagogia precisa e está tentando construir uma teoria própria,
um espaço específico, em que possa diferenciar a técnica e o lugar,
enquanto especialista em problemas de aprendizagem.
27
Para Müller10, ao refletirmos sobre o objeto de estudo específico da
psicopedagogia, devemos levar em consideração o lugar em que esse
campo de atividade está situado. Segundo a autora, citada por Bossa11,
cabe à psicologia pensar sobre
como se incrementam os conhecimentos, ou entram em contradição e são
substituídos; que leis regem esses processos; que influências afetivas e
representações inconscientes os acompanham; que dificuldades interferem ou
impedem; de que maneira se pode favorecer as aprendizagens ou tratar suas
alterações.
[...]
o sujeito que aprende é motivo de perguntas para os psicopedagogos e destinatário
de sua atividade profissional.
Bossa12 complementa o pensamento anterior ao afirmar que é papel da
pedagogia refletir sobre os sistemas e métodos educativos (O que é
educar? O que é ensinar? O que é aprender?), quais são os problemas
estruturais que estão envolvidos no surgimento dos transtornos da
aprendizagem e no fracasso escolar, assim como pensar sobre propos‐
tas de mudanças.
Entre os teóricos brasileiros, com base em Bossa14, citamos o trabalho
de Kiguel e destacamos que, na perspectiva dessa estudiosa, o objeto
central de estudo da psicopedagogia estruturou‐se em torno do pro‐
cesso de aprendizagem humana, envolvendo os padrões evolutivos
28
normais e patológicos. Levando em consideração a influência do meio
(família, escola, sociedade) no desenvolvimento.
[...] a psicopedagogia estuda o ato de aprender e ensinar, levando sempre em conta
as realidades interna e externa da aprendizagem, tomadas em conjunto. E, mais,
procurando estudar a construção do conhecimento em toda a sua complexidade,
procurando colocar em pé de igualdade os aspectos cognitivos, afetivos e sociais
que lhe estão implícitos.
Em outras palavras, a referida autora indica a necessidade de o psico‐
pedagogo ter um olhar globalizado ao analisar as variáveis que podem
estar interferindo no processo de aprendizagem, em vez de se deter
apenas no aspecto cognitivo.
Do ponto de vista de Scoz16, a psicopedagogia preocupa‐se com o pro‐
cesso de aprendizagem com as suas dificuldades e, em uma ação pro‐
fissional, deve sintetizar conhecimentos de diferentes áreas do conhe‐
cimento de forma integrada. Para tanto, a autora enfatiza a importân‐
cia de o profissional da educação ter acesso às informações de diferen‐
tes ciências (pedagogia, psicologia, sociologia, psicolinguística) de
forma a aprofundar os conhecimentos, vinculando‐os à realidade edu‐
cacional, de forma a ter uma visão global do aluno. E o maior desafio
das escolas, na concepção da psicopedagoga, é buscar caminhos que
possibilitem ao educador rever a própria prática e descobrir alternati‐
vas possíveis para melhorar sua ação.
a partir do momento em que o foco de atenção passa a ser a compreensão do
processo de aprendizagem e a relação que o aprendiz estabelece com a mesma, o
objeto da psicopedagogia passa a ser mais abrangente: a metodologia é apenas um
aspecto no processo terapêutico, e o principal objetivo é a investigação de etiologia
da dificuldade de aprendizagem, bem como a compreensão do processamento da
aprendizagem considerando todas as variáveis que intervêm neste processo.
O pensamento de Rubinstein indica a necessidade de o psicopedagogo
não se preocupar unicamente em inibir o sintoma apresentado por
meio da utilização de técnicas e/ou metodologias, mas olhar de forma
29
global para o sujeito com dificuldade de aprendizagem, a fim de com‐
preender como ele constrói novas aprendizagens. Levando sempre em
consideração todos os diferentes aspectos envolvidos nessa situação.
Ao abordar a temática do objeto de estudo da psicopedagogia, Clarissa
S. Golbert18 diz que este deve ser entendido a partir de dois enfoques:
preventivo e terapêutico. No enfoque preventivo, o objeto de estudo
da psicopedagogia é o sujeito a ser educado, o seu processo de desen‐
volvimento e as alterações envolvidas nesse percurso. A característica
preventiva propõe que as possibilidades do aprender sejam analisadas
de forma ampla, que não fiquem restritas à escola, mas que sejam
levadas em consideração as aprendizagens construídas na família e na
comunidade. Tal iniciativa, no entendimento de Golbert, pode esclare‐
cer, de forma mais ou menos sistemática, professores, pais e adminis‐
tradores sobre as diferentes etapas do desenvolvimento, os avanços
nos processos de aprendizagem, as condições psicodinâmicas da
aprendizagem e as condições determinantes das dificuldades de
aprendizagem. No que tange ao enfoque terapêutico, a autora conside‐
ra como objeto de estudo da psicopedagogia a identificação, a análise e
a elaboração de uma metodologia de diagnóstico e tratamento volta‐
dos para as dificuldades de aprendizagem constatadas.
Segundo Bossa19, na visão de Maria Lucia Lemme Weiss, a psicopeda‐
gogia estuda o aprimoramento das relações com a aprendizagem, bem
como busca uma melhor qualidade na construção da própria aprendi‐
zagem de alunos e educadores.
Sobre o objeto de estudo da psicopedagogia, Bossa21 afirma ter havido
um tempo em que o trabalho psicopedagógico priorizava a reeduca‐
ção, ou seja, o processo de aprendizagem era avaliado em função das
defasagens apresentadas. O objetivo do trabalho consistia na supera‐
ção de tais déficits. Em outras palavras, o objeto de estudo era o sujeito
que não podia aprender, e a não‐aprendizagem era entendida pelo
enfoque que salientava a falta. Nesse contexto, o psicopedagogo bus‐
cava a homogeneização dos grupos, as regularidades, o esperado para
determinada idade, visando a minimizar as diferenças e acentuar a
uniformidade.
Atualmente, ainda na visão de Bossa22, a psicopedagogia trabalha com
uma concepção de aprendizagem, cujo processo está diretamente rela‐
cionado a um equipamento biológico sujeito às disposições afetivas e
intelectuais, que interferem na forma com que o sujeito se relaciona
com o meio. Tais disposições afetivas e intelectuais influenciam e são
influenciadas pelas condições socioculturais do sujeito e do seu meio.
Nesse contexto, o objeto de estudo da psicopedagogia passa a ser,
inicialmente, o processo de aprendizagem, ou seja, cabe à psicopeda‐
gogia estudar as características da aprendizagem humana, como se
aprende, como a aprendizagem varia evolutivamente, quais os fatores
que a influenciam, como reconhecer, tratar e prevenir as alterações na
aprendizagem, entre outras características.
31
2.5 A multidimensionalidade do objeto de estudo
psicopedagógico
A multidimensionalidade do objeto de estudo da psicopedagogia, na
concepção de Bossa23, é decorrente da sua própria natureza. Uma vez
que essa ciência estuda e trabalha com o processo de aprendizagem, a
partir da reflexão sobre os fatores que o influenciam de modo a facilitá‐
lo, bem como sobre aqueles que dificultam sua evolução, criando as
dificuldades de aprendizagem, ou seja, intervém nas dimensões consti‐
tutivas do processo de aprendizagem. Também atua diretamente com
o agente de transmissão e com o sujeito do conhecimento.
Enfatizamos que o sujeito‐objeto da psicopedagogia, ainda na perspec‐
tiva da autora, é o ser humano contextualizado em situação de apren‐
dizagem. Seu campo de atuação pode ser entendido como sendo resul‐
tante entre a convergência conceitual da aprendizagem, do sujeito
contextualizado em situação de aprendizagem e dos processos psico‐
educativos enquanto objetos da intervenção e da reflexão psicopeda‐
gógica. São essas características que, segundo Müller24, conferem ao
campo de ação da psicopedagogia sua característica multidimensional,
pois envolvem uma complexa série de fatores, tais como as questões
pré‐subjetivas (o social, a linguagem, a conformação neurobiológica) e
a questões subjetivas, como, por exemplo, os processos de construção
do conhecimento e da constituição da subjetividade e a dinâmica afeti‐
va. Tanto as questões pré‐subjetivas como as subjetivas são contextua‐
lizadas a partir das relações intersubjetivas e pela convergência com os
aspectos intrasubjetivos e situacionais. Logo, a contextualização da
aprendizagem envolve restrições, limitações e possibilidades cogniti‐
vas e subjetivas, educacionais, econômicas, culturais e socioambientais.
Para Castorina25
a psicopedagogia deve partir da originalidade de seu campo de trabalho, da
índole de seus problemas, para selecionar os aspectos significativos das teo‐
rias de referência, recriar suas hipóteses e reformular seus instrumentos
para adequá‐los às questões estritamente psicopedagógicas e, inclusive, dis‐
cutir questões que representem autênticos desafios para o desenvolvimento
daquelas teorias, procurando uma relação bidirecional entre as teorias de
referências e as práticas psicopedagógicas.
Acrescentamos ainda, que, segundo Bossa26, ao considerarmos a natu‐
reza do objeto da intervenção psicopedagógica, em sua complexidade
real, estamos diante de uma demanda que exige a realização de uma
série de ações, exigindo do profissional de psicopedagogia conheci‐
mento de diferentes disciplinas no que se refere à formação teórica,
32
necessária para a tomada de decisão sobre a estratégia ou a ação a ser
realizada. Especialmente porque a pluralidade dos processos psico‐
educativos escolares e extraescolares excedem em vários sentidos os
aportes de uma única disciplina, hegemônica, da qual derivam marcos
conceituais interpretativos e técnicas adequadas para a intervenção
psicopedagógica.
Ponto Final
Esse capítulo abordou o surgimento da ciência da psicopedagogia e
possibilitou o leitor a refletir sobre a multidimensionalidade do objeto
de estudo psicopedagógico. Levando em consideração as concepções
dos teóricos argentinos e brasileiros no que se refere à definição do
objeto de estudo da psicopedagogia, assim como as transformações
que esta definição sofreu com o passar do tempo.
Atividades
1) Segundo Bossa (2007), para Kiguel, o surgimento da psicopedago‐
gia pode ser entendido a partir de duas perspectivas. Descreva‐as.
2) Segundo Bossa (2007), os teóricos argentinos consideram como
objeto de estudo, ou o .................. da psicopedagogia, a ..................,
com seus ..............................
3) Segundo Bossa (2007), para o psicopedagogo argentino Visca,
como pode ser entendida inicialmente a psicopedagogia?
4) Na perspectiva de Kiguel, segundo Bossa (2007), entre os teóricos
brasileiros, qual o objeto central de estudo da psicopedagogia?
5) Qual o enfoque da psicopedagoga Golbert (1985), ao abordar a
temática do objeto de estudo da psicopedagogia?
6) Segundo a psicopedagoga Golbert (1985), no enfoque preventivo,
o objeto de estudo da psicopedagogia é:
a) o sujeito a ser educado;
b) o processo de desenvolvimento do sujeito;
c) as alterações envolvidas no decorrer do desenvolvimento do
sujeito;
d) as possibilidades do aprender numa visão global, que não fi‐
quem restritas à escola, mas que sejam levadas em considera‐
ção as aprendizagens construídas na família e na comunida‐
de;
33
e) todas as alternativas estão corretas.
7) Qual o objeto de estudo da psicopedagogia, no que tange ao enfo‐
que terapêutico, segundo a psicopedagoga Golbert (1985)?
8) Explique a afirmação: “A definição do objeto de estudo, assim
como os demais aspectos da área de estudo da psicopedagogia,
passaram por fases distintas.”
9) Qual é o ponto comum, no que diz respeito ao entendimento do
objeto de estudo da psicopedagogia, na concepção dos teóricos ar‐
gentinos e brasileiros?
10) Na visão da psicopedagoga Weiss (1992), o que estuda a
psicopedagogia?
3
Katia Cilene da Silva
CAMPO DE ATUAÇÃO DA
PSICOPEDAGOGIA
No que se refere às modificações da práxis psicopedagógica através do
tempo, Bossa1 refere que “houve um tempo em que o trabalho psico‐
pedagógico priorizava a reeducação, o processo de aprendizagem era
avaliado em função de seus défictis, e o trabalho procurava vencer tais
defasagens.” Salientamos que, no contexto anteriormente citado, o
objeto de estudo da psicopedagogia, segundo a referida autora, era
entendido como sendo um sujeito que não podia aprender. A “não
aprendizagem” era compreendida por um enfoque que salientava a
falta e buscava estabelecer as semelhanças entre grandes grupos de
sujeitos, as regularidades e o esperado para determinada faixa etária,
com o objetivo de minimizar as diferenças e salientar a uniformidade.
Depois de algum tempo, a psicopedagogia, segundo Bossa2, foi marca‐
da por uma modificação na noção de “não‐aprendizagem” que passou
a ser entendida como sendo carregada de significados, e não como
35
oposição ao aprender. Ela acrescenta que essa fase da psicopedagogia,
foi fundamentada, em especial, na psicanálise e na psicologia genética:
“Essa nova abordagem leva em consideração a singularidade do indi‐
víduo ou grupo, buscando o sentido particular de suas características e
suas alterações, assim como as situações da própria história e do seu
mundo sociocultural”. A nova maneira de encarar o sujeito, na concep‐
ção de Fernández, segundo Bossa3, reflete na forma como o objeto de
estudo é entendido e, nesse contexto, ele passa a ser “sempre o sujeito
aprendendo”. Lembramos que a concepção de sujeito varia em função
da visão de homem adotada em cada momento histórico e da sua cor‐
respondente concepção de aprendizagem.
Em outras palavras, o caráter clínico da psicopedagogia reside no fato
de que, no trabalho de ensinar a aprender, o psicopedagogo utiliza
critérios diagnósticos, na busca de compreender a falha na aprendiza‐
gem, ainda que o seu objetivo seja a prevenção dos problemas de
aprendizagem. Essa ênfase no caráter clínico deve‐se ao fato de a práti‐
ca psicopedagógica envolver sempre um processo diagnóstico ou de
investigação, que precede a construção do plano de trabalho. Nesse
sentido, Fernández, citada por Bossa6, ressalta que “o diagnóstico não
completa o olhar interpretativo nem diagnóstico: todo processo tera‐
pêutico é também diagnóstico”.
Para a autora, de modo geral, a psicopedagogia clínica busca compre‐
ender de forma global e integrada os processos cognitivos, emocionais,
sociais, culturais, orgânicos e pedagógicos que interferem na aprendi‐
zagem, a fim de criar situações que possibilitem o resgate do prazer de
36
aprender, em sua totalidade. Envolvendo, nesse processo os pais, pro‐
fessores, orientadores educacionais e demais profissionais que transi‐
tem no universo educacional do aluno.
No que se refere à investigação diagnóstica, a presente autora observa
que se trata de um processo complexo, no qual se encontra presente
uma série de manifestações conscientes e inconscientes, envolvendo os
aspectos pessoais, a dinâmica familiar atual e passada, o sociocultural,
o educacional, a aprendizagem sistemática. Bossa8 acrescenta que “o
decifrar do sentido da dificuldade de aprendizagem repercute sobre o
problema que interpretamos: a nossa linguagem sobre a linguagem da
enfermidade nos leva a um compromisso, ou seja, ao diagnóstico,
promotor de decisões acerca do tratamento”.
A autora ainda salienta que a leitura do diagnóstico pode variar se‐
gundo cada profissional, em função da sua formação, dos marcos
referenciais que sustentam a sua prática e da abordagem teórica com a
qual ele se identifica. Assim sendo, para que o psicopedagogo entenda
o sujeito que aprende como um sujeito epistêmico‐epistemofílicoa,
segundo Bossa9, é preciso que seus procedimentos diagnósticos e tera‐
pêuticos estejam de acordo com tal concepção. Nessa perspectiva, o
psicopedagogo vai procurar conhecer, por meio do processo diagnósti‐
co, o que o sujeito pode aprender e de que forma, assim como buscar
conhecer o interjogo, entre o desejo de conhecer e o de ignorar. Esse
conhecimento só é possível pela leitura clínica, pela escuta psicopeda‐
gógica, momento no qual o psicopedagogo vai decifrar os processos
que dão sentido aos fatos observados e norteiam a intervenção.
meio de um processo de descentração que lhe possibilita uma melhor compreensão do mundo e de si
mesmo.
37
conhecimentos estruturados, de forma a constituir uma matriz teórica
interpretativa. Esse aspecto também é salientado por Fernández, como
nos mostra Bossa10, quando afirma que o psicopedagogo deve incorpo‐
rar conhecimento sobre o organismo, o corpo, a inteligência e o desejo.
Logo, as teorias que se ocupam da inteligência, do inconsciente, do
organismo e do corpo não conseguem dar conta dessa questão, quando
utilizadas isoladamente. Ou seja, a prática psicopedagógica necessita
de uma teoria, fundamentada em conhecimentos de diferentes corpos
teóricos para sustentá‐la.
Na relação com o aluno, ainda de acordo com Bossa11, o psicopedago‐
go deve estabelecer uma investigação cuidadosa, que lhe permita pen‐
sar numa série de hipóteses indicadoras de estratégias, capazes de
planejar uma situação terapêutica que facilite uma vinculação satisfa‐
tória com a aprendizagem. A autora observa que, ao lado desse aspec‐
to mais técnico, o psicopedagogo também trabalha a relação do aluno
com a aprendizagem, no que diz respeito a sua postura, disponibilida‐
de, buscando a autovalorização, a fim de que o aluno torne‐se agente
de seu processo e aproprie‐se do seu saber, tornando‐se capaz de cons‐
truir novos conhecimentos.
No que diz respeito ao papel do psicopedagogo, Bossa12 indica a ne‐
cessidade de esse profissional saber como o sujeito se constitui, quais
as transformações por que passa nas diferentes etapas da vida, de que
recursos de conhecimento dispõem e de que forma produz conheci‐
mento e apropria‐se de novas aprendizagens.
Esse saber exige conhecimento científico e, nesse sentido, Bossa13 expli‐
ca que o psicopedagogo deve recorrer a teorias que lhe possibilitem
reconhecer de que modo se dá a aprendizagem e as leis que regem tal
processo, levando em consideração as influências afetivas e as repre‐
sentações inconscientes que o acompanham. Também deve ser capaz
de identificar o que pode estar comprometendo e o que pode estar
facilitando o processo de aprendizagem.
É preciso ainda que o psicopedagogo tenha conhecimento sobre como
os sistemas e métodos educativos interferem no processo de ensino e
aprendizagem. Bem como conheça os problemas estruturais que estão
intervindo no surgimento dos transtornos de aprendizagem e no pro‐
cesso escolar.
Destacamos que, nessa abordagem, é imprescindível que o psicopeda‐
gogo aprenda como os outros aprendem e, também, como ele próprio
aprende. E essa construção só pode ser feita, segundo Fernández, cita‐
da por Bossa14, com uma formação sustentada sobre três pilares. São
38
eles: a prática clínica, a construção teórica e o tratamento psicopedagó‐
gico‐didático.
No que se refere à prática clínica, a autora observa que pode ser reali‐
zada em instituições educativas, de saúde ou em consultório, numa
perspectiva individual, grupal e familiar.
Segundo Bossa15, sobre a construção teórica, Fernández destaca o fato
de esta estar permeada pela prática, a partir da qual a teoria psicope‐
dagógica passa a ser construída.
No que diz respeito ao trabalho preventivo, a autora diz que a psico‐
pedagogia pode atuar em três diferentes níveis.
O primeiro nível de prevenção considera que a ação do psicopedagogo
deve estar voltada para os processos educativos, com o objetivo de
diminuir a “frequência dos problemas de aprendizagem”18. Nesse
enfoque, o trabalho está direcionado para as questões didático‐
metodológicas, bem como para a formação e orientação de professores,
além de fazer aconselhamento aos pais. Como exemplo da atuação do
psicopedagogo nesse nível, a autora cita o processo de alfabetização,
ressaltando que, ao se deparar com novas teorias sobre a alfabetização,
cabe ao psicopedagogo, juntamente com outros profissionais da escola,
39
elaborar métodos de ensino compatíveis com as novas concepções
acerca desse processo. Esse momento é marcado pelo trabalho do psi‐
copedagogo junto aos professores, auxiliando‐os a se apropriarem de
novos conhecimentos e dos procedimentos metodológicos deles decor‐
rentes.
O segundo nível de prevenção tem por objetivo minimizar e tratar os
problemas de aprendizagem já instalados19. Logo, cabe ao psicopeda‐
gogo criar um plano diagnóstico da realidade institucional e elaborar
planos de intervenção baseados nesse diagnóstico, a partir do qual
buscará avaliar os currículos com os professores, para que tais trans‐
tornos não se repitam. Nesse nível, a autora ainda utiliza a alfabetiza‐
ção como exemplo da ação do psicopedagogo. A situação descrita
apresenta a possibilidade de que, num determinado grupo, classe ou
instituição, apareça transtorno na aprendizagem da leitura e escrita.
Nessa situação, Bossa20 observa que é função do psicopedagogo fazer o
diagnóstico do grupo e intervir nos procedimentos didático‐
metodológicos utilizados, ou seja, além de determinar as causas do
transtorno, o psicopedagogo tem de encontrar os meios para eliminá‐
lo.
No terceiro nível de prevenção descrito por Bossa, a finalidade do
trabalho psicopedagógico é eliminar os transtornos, já instalados, por
meio dos procedimentos clínicos e de todas as suas implicações. A
autora enfatiza que, nesse nível, o caráter preventivo continua presen‐
te, uma vez que, ao eliminarmos um transtorno, estamos prevenindo o
aparecimento de outros. Como exemplo, utiliza mais uma vez o pro‐
cesso de alfabetização como ponto de referência, citando casos em que
os problemas específicos de leitura e de escrita já se encontram instala‐
dos. Nessa situação, indica que o profissional deve agir diretamente no
problema diagnosticado, a fim de tratá‐lo e evitar outros tipos de
transtornos.
A partir das características do enfoque preventivo da psicopedagogia,
observamos que o papel do psicopedagogo, na visão de Bossa, segun‐
do Teresinha de Jesus Paula Costa21
Ainda em nível internacional, no estudo das relações entre inteligência
e afetividade, Bossa destaca os trabalhos de Alicia Fernández, César
Coll Salvador, Constance Kamii, Jeanine Marie Nardin, Jean Marie
Dolle, Jorge Visca, Mabel Condemarin e Sara Paín.
No tocante ao acervo psicopedagógico no Brasil, Bossa24 refere que,
atualmente, além das dissertações de mestrado e das teses de doutora‐
do, trabalhos científicos publicados em revistas, livros e boletins já
constituem um corpo de conhecimentos consistente, em que se tem
embasada a atuação psicopedagógica e a construção de novas produ‐
ções científicas.
41
Fagali, Leandro de Lajonquière, Leda M. Codeço Barone, Lino de Ma‐
cedo, Mareia Zampieri Torres, Marta Rabioglio, Monica Cintrão, Nadia
Bossa, Neide de Aquino Noffs, Sônia Madi, Sônia Maria Colli de Souza
e Suely Grimaldi Moreira (São Paulo). Seus trabalhos foram produzi‐
dos nas universidades estaduais e federais desses estudos e na Pontifí‐
cia Universidade Católica. Podemos citar ainda investigações desen‐
volvidas por grupos de pesquisa na Unicamp, Universidade São Paulo
(USP), Universidade do Estado do Rio de janeiro (UERJ), na Universi‐
dade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS), nas Pontifícias Universidades Católicas de
São Paulo (PUCSP), do Rio de Janeiro (PUCRJ), do Rio Grande do Sul
(PUCRS), de Campinas (PUC‐Campinas) e Instituto Sedes Sapientiae.
Ponto Final
O terceiro capítulo abordou o campo de atuação da psicopedagogia a
partir da caracterização da práxis psicopedagógica e da reflexão sobre
a ação psicopedagógica, sob os enfoques clínico, preventivo e da pes‐
quisa cientifica. A partir do referencial teórico utilizado, ratificamos a
ideia inicial de que a construção da ação psicopedagógica deve ser
realizada por meio da articulação entre as diferentes modalidades de
atuação psicopedagógica, a fim de que possamos olhar o educando de
forma globalizada.
42
Atividades
1) Ao pensarmos sobre as características da práxis psicopedagógica,
o que devemos levar em consideração?
a) A ação psicopedagógica tem estreita ligação com a visão de
objeto‐sujeito de estudo de um determinado período.
b) A práxis psicopedagógica apresentará características diferen‐
tes, dependendo do tipo da abordagem utilizada, clínica ou
preventiva.
c) No que se refere às modificações da práxis psicopedagógica
através do tempo, Bossa (2007) comenta que “houve um tem‐
po em que o trabalho psicopedagógico priorizava a reeduca‐
ção, o processo de aprendizagem era avaliado em função de
seus défictis, e o trabalho procurava vencer tais defasagens.”
d) Depois de algum tempo, a psicopedagogia, segundo Bossa
(2007), foi marcada por uma modificação na noção de “não‐
aprendizagem” que passou a ser entendida como sendo car‐
regada de significados e não como oposição ao aprender.
e) Todas as alternativas estão corretas.
2) Como podemos entender a psicopedagogia sob o enfoque clínico,
segundo Bossa (2007)?
3) Na concepção de Bossa (2007), qual é o espaço de interação da
psicopedagogia no enfoque clínico?
4) Segundo Bossa (2007), qual é o papel do psicopedagogo no enfo‐
que clínico?
5) Segundo Bossa (2007), onde o psicopedagogo pode realizar a prá‐
tica clínica?
6) No que diz respeito ao trabalho preventivo, Bossa (2007) diz que a
psicopedagogia pode atuar em três diferentes níveis, a saber:
I. O segundo nível de prevenção considera que a ação do psico‐
pedagogo deve estar voltada para os processos educativos,
com o objetivo de diminuir a frequência dos problemas de
aprendizagem.
II. O primeiro nível de prevenção tem por objetivo minimizar e
tratar os problemas de aprendizagem já instalados.
III. O terceiro nível de prevenção refere que a finalidade do traba‐
lho psicopedagógico é eliminar os transtornos, já instalados,
por meio dos procedimentos clínicos e todas as suas implica‐
ções.
43
a) As afirmativas I e II estão incorretas.
b) Todas as afirmativas estão incorretas.
c) Somente a afirmativa I está incorreta.
d) Todas as afirmativas estão corretas.
e) Somente a afirmativas II está correta.
7) Qual a importância da pesquisa científica para a formação do
psicopedagogo?
4
Katia Cilene da Silva
A PRÁXIS PSICOPEDAGÓGICA EM
ÂMBITO INSTITUCIONAL
Neste capítulo, temos como objetivo refletir sobre a práxis psicopeda‐
gógica no âmbito institucional. A fim de buscarmos compreender
como se dá a ação do psicopedagogo, nesse contexto, partiremos da
caracterização da práxis psicopedagógica institucional. E, depois,
abordaremos a prática psicopedagógica na escola, enfocando aborda‐
gens curativas e preventivas e a intervenção psicopedagógica no hospi‐
tal. Descreveremos esse ambiente e analisaremos a ação do psicopeda‐
gogo no espaço da brinquedoteca e na classe hospitalar.
45
A atuação do psicopedagogo institucional, ainda na concepção de
Bossa, irá se caracterizar pela natureza e pela intencionalidade do
trabalho da empresa, na qual o profissional está interagindo. Nesse
contexto, a autora2 observa que o psicopedagogo atua “na construção
do conhecimento do sujeito que, nesse momento, é a instituição, com
sua filosofia, valores e ideologia”. Acrescenta que a demanda de cada
instituição está relacionada à forma de existir do sujeito institucional,
seja ele a família, a escola, uma empresa industrial, um hospital, uma
creche ou uma organização assistencial.
Sabemos que há diferentes concepções em relação ao que se entende
por psicopedagogia na escola. O presente trabalho insere‐se, ainda na
concepção de Bossa5, de que “pensar a escola, à luz da psicopedagogia,
significa analisar um processo, que inclui questões metodológicas,
relacionais e socioculturais, englobando o ponto de vista de quem
ensina e de quem aprende”, levando em consideração a participação
da família e da sociedade. Em outras palavras, assim como refere
Weiss, citada por Bossa6, a psicopedagogia tem a importante tarefa de
garantir ao aluno e ao professor um espaço em que possam desenvol‐
ver um nível de autonomia, na busca do conhecimento, por meio de
46
uma postura crítica em relação à estrutura da escola e da sociedade
que ela representa.
Gradativamente, a reflexão psicopedagógica ampliou suas abordagens
e atuações sobre diagnóstico e, no que se refere às interferências na
aprendizagem, à luz do desenvolvimento da criança, contando princi‐
palmente com as contribuições oferecidas pela EPISTEMOLOGIA
GENÉTICAa e PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO AFETIVOb.
A psicopedagogia curativa, segundo Fagali e Vale9, visa à reintegração
do indivíduo com problemas de aprendizagem no processo de cons‐
trução do conhecimento. E, embora venha sendo desenvolvida em
consultórios, onde o trabalho assume uma conotação clínica, geralmen‐
te, individual, essa prática tem sido reformulada para o trabalho em
grupo no contexto institucional, como escolas, creches, centros de
reabilitação e hospitais. Observamos, segundo as autoras, que “a abor‐
dagem curativa está voltada para grupos de alunos que apresentam
dificuldades na aprendizagem e tem como objetivo reintegrar e rea‐
daptar o aluno à situação de sala de aula, respeitando as suas necessi‐
dades e ritmos.”
A psicopedagogia preventiva
a epistemologia genética é a teoria desenvolvida por Jean Piaget, a fim de mostrar como acontece o
a
desenvolvimento cognitivo, ou seja, como se dá o desenvolvimento do pensamento da criança.
b a psicologia do desenvolvimento afetivo considera que o afeto, entendido como sentimentos, emoções,
desejos, vontades e os valores são de fundamental importância na construção da inteligência.
47
assessoria junto a pedagogos, orientadores e professores. Com o obje‐
tivo de redefinir os procedimentos pedagógicos, buscando a integração
dos aspectos afetivo e cognitivo, por meio da aprendizagem dos con‐
ceitos, construídas a partir de diferentes áreas do conhecimento, assim
como trabalhar as questões pertinentes às relações vinculares profes‐
sor‐aluno.
Ainda no que se refere à psicopedagogia preventiva, segundo Bossa11,
ao dedicar‐se a áreas relacionadas ao planejamento educacional, ao
assessoramento pedagógico e ao colaborar na elaboração dos planos
educacionais e sanitários no âmbito das organizações, o trabalho psi‐
copedagógico e a ação psicopedagógica assumem caráter clínico, uma
vez que, é a partir da realização do diagnóstico institucional, o psico‐
pedagogo vai planejar as propostas de prevenção, pertinentes a cada
situação.
Como articulador e facilitador do processo de ensino‐aprendizagem, o
psicopedagogo institucional escolar, após a observação do explícito e
constatação do implícito, através do diagnóstico psicopedagógico,
deve planejar a intervenção psicopedagógica. Embora leve em conside‐
ração o indivíduo, não deverá ficar centrada nele, mas nos demais
elementos do grupo com os quais esse indivíduo interage. Além disso,
apesar de ter seu foco naquilo que não funciona, deverá ressaltar os
pontos positivos existentes para trabalhar a partir deles.
Lembramos que a escola, além de uma instituição de ensino, é também
um local de trabalho, com necessidades diferenciadas. Dessa forma,
para que o psicopedagogo faça uma intervenção que venha ao encon‐
tro da demanda de cada instituição, é preciso que faça uma profunda
observação na dinâmica e na organização da escola (objetivos, espaço
físico, planejamento e desenvolvimento de atividades, plano didático,
recursos materiais disponíveis, relacionamento entre funcionários etc.),
levando em consideração sua realidade e o momento em que está sen‐
do vivido.
No que diz respeito ao aperfeiçoamento das construções pedagógicas,
Fagali e Vale13 destacam a existência de diferentes maneiras de inter‐
venção psicopedagógica. A primeira refere‐se à necessidade de propor
48
a releitura e a reelaboração na programação curricular, dando ênfase
para a articulação dos aspectos afetivo‐cognitivos, levando em consi‐
deração o desenvolvimento global do indivíduo. A segunda maneira
consiste em fazer uma análise mais detalhada dos conceitos, a partir de
atividades que possibilitem trabalhar de diferentes formas o conteúdo
programático. Através da integração dos interesses, do raciocínio e das
informações, de forma que o aluno participe ativamente nos diferentes
níveis de escolaridade. A terceira e última sugestão das referidas auto‐
ras sobre os modos de intervenções está relacionada à criação de mate‐
riais, de textos e de livros para o uso do próprio aluno, a fim de desen‐
volver o raciocínio, construindo criativamente o conhecimento, sem
esquecer de integrar o afeto e a cognição, no diálogo, com as informa‐
ções.
Segundo Fernández14, ao desenvolver seu trabalho na instituição esco‐
lar, o psicopedagogo deve ficar atento às relações que se estabelecem
entre o sujeito ensinante e sujeito aprendente que há em cada aluno e
em cada professor. Pois a modalidade de ensino do professor é conse‐
quência de sua própria modalidade de aprendizagem. Assim como a
relação particular do professor com seus alunos e seu grupo está dire‐
tamente relacionada ao grupo real ou imaginário a que pertence o
professor e, por fim, ao sistema educativo como um todo.
Finalizando, observamos que boa parte da nossa aprendizagem acon‐
tece dentro da instituição escolar, na relação com o professor, com o
conteúdo e com o grupo social escolar como um todo. Dessa forma,
destacamos a importância da formação continuada no que se refere à
capacitação de pedagogos e ou psicopedagogos. Pois é através da
construção de um referencial teórico sólido, que lhe possibilite desen‐
volver a percepção de como se processou a evolução dos diferentes
conhecimentos, na história da humanidade, que o educador poderá
melhor compreender o processo de construção de conhecimentos dos
alunos e ser capaz de identificar as diferentes etapas do desenvolvi‐
mento evolutivo destes. Compreendendo a sua relação com a aprendi‐
zagem e prevenindo, dessa forma, possíveis dificuldades de aprendi‐
zagem.
49
de diagnosticar os prováveis fatores que estão interferindo negativa‐
mente nas interações desenvolvidas no interior dessa instituição. A
partir de então, planejar estratégias facilitadoras no que tange à dinâ‐
mica e à organização do hospital, buscando uma maior integração da
equipe médica, enfermeiros e demais funcionários, com vistas ao bem‐
estar do indivíduo hospitalizado.
Salientamos que a promoção da saúde não se restringe à ordem curati‐
va e também não se reduz ao tempo de permanência no hospital. Mas
trata da necessidade de se tentar auxiliar a criança a atravessar a situa‐
ção de hospitalização com maiores benefícios, ultrapassando o sentido
convencional do tratamento médico. E, proporcionando‐lhe um con‐
texto rico e repleto de significados, certamente auxiliará e contribuirá
para a recuperação do seu bem‐estar físico, psíquico e social por uma
prática que interliga educação e saúde.
Para abordarmos a presente questão da ação psicopedagógica na classe
hospitalar, precisamos refletir sobre o papel do psicopedagogo nesse
contexto. Para tanto, baseamo‐nos na concepção de Fonseca17, ao des‐
crever o papel do professor na escola hospitalar, e estendemos ao psi‐
copedagogo as características mencionadas pelo referido autor. Enten‐
demos que, como educadores, ambos os profissionais devem estar
capacitados para criarem estratégias que favoreçam o processo ensino‐
aprendizagem de forma contextualizada ao desenvolvimento e as
experiências daqueles que o vivenciam. Respeitando e levando em
consideração as referências subjetivas das crianças, a partir de um
planejamento flexível, constantemente reorientado pela situação espe‐
cial e individual de cada criança.
Fazendo uma breve apresentação desse novo espaço no ambiente hos‐
pitalar, a experiência nos leva a ratificar a concepção de Macedo19;
quando diz que a brinquedoteca hospitalar pode ser caracterizada
como sendo um espaço livre onde o indivíduo pode expressar, por
51
meio das brincadeiras e jogos, seus desejos, fantasias, medos, imagina‐
ção, ansiedades, enfim, toda insegurança gerada pela doença e interna‐
ção.
A brinquedoteca hospitalar, ao possibilitar o ato espontâneo e criativo
da criança ou do adolescente, assim como dos seus acompanhantes,
funciona como um espaço transacional, que contribui para o fortaleci‐
mento do vínculo médico‐criança‐acompanhante, amenizando possí‐
veis traumas psicológicos, decorrentes do sofrimento e da ansiedade
do paciente20.
Salientamos que não temos como objetivo dar receitas acerca da ação
do psicopedagogo na brinquedoteca hospitalar. Porém, a partir da
nossa experiência e das pesquisas realizadas, observamos que, entre
tantas intervenções possíveis, cabe ao psicopedagogo fazer atendimen‐
to no leito, quando o indivíduo estiver impedido de se deslocar até a
brinquedoteca. Assim como interagir através de diferentes abordagens
lúdico‐pedagógicas sugeridas por Maria Júlia Kovács21. Entre elas, a
leitura de histórias, de livros com temas gerais ou mais específicos, se a
criança assim o desejar, a realização de conversas, atividades expressi‐
vas (desenho, pintura, argila, massinha etc.), atividades de relaxamen‐
to que possam trazer bem‐estar e potencializar o tratamento.
Para Kóvacs22, a brinquedoteca é um local de comunicação, de expres‐
são de necessidades e de emoções da criança e/ou adolescente, assim
como de seus familiares que necessitam ser assistidos de forma inte‐
gral. Assim, o sofrimento pode ser acolhido e os desejos e as necessi‐
dades são atendidos na medida do possível.
Ilustra essa situação o depoimento de duas mães a respeito do trabalho
que desenvolvemos em um hospital, no ano de 2006. A primeira tra‐
duziu a nossa interação da seguinte maneira: “Ótimo, a criança inter‐
nada fica muito sensível. Quando tem as atividades, elas espairecem,
brincam e chegam até a esquecer um pouco que estão doentes, e nesse
tempo (horário) que a ludoteca está funcionando, até mesmo os acom‐
panhantes descansam e espairecem” (R.T.R.S.C., mãe de L.R.S. C., 4
anos). Esse depoimento revela a importância do atendimento psicope‐
dagógico no que se refere à atenção integral da criança internada e
seus familiares. A segunda mãe diz: “Na minha opinião, é um espaço
‘louvável’, porque, embora se esteja passando por um momento deli‐
cado, faz a gente pensar no tempo que se tem e não se faz para os fi‐
lhos. Há importância desses momentos de diversão junto com os fi‐
lhos, juntamente com alguém que pode nos auxiliar, na dedicação e
brincadeiras. Meu filho se sentiu em casa e encerro minha opinião com
a frase de uma criança de seis anos, que chegou aqui com muita dor...
52
— Oh, mãe! Nem parece que a gente está em um hospital. Eu gostei
daqui, quantos dias nós vamos ficar? Eu gostei daquelas tias que brin‐
cam com a gente. Parabéns pelo trabalho”. (S.W.N., mãe de G.W.N., 06
anos).
Ponto Final
O presente capítulo abordou a práxis psicopedagógica no âmbito insti‐
tucional, e revelou que a área de conhecimento da psicopedagogia
pode e deve estar presente nas diferentes áreas de atuação humana,
como por exemplo, nas empresas, escolas e hospitais. Também abor‐
dou a atuação psicopedagógica na escola, enfatizando o papel do psi‐
copedagogo enquanto assessor. Por fim, tratou sobre a atuação psico‐
pedagógica no ambiente hospitalar, no qual constamos que a ação do
psicopedagogo, nesse ambiente, interliga educação e saúde.
Atividades
1) Na concepção de Bossa (2007), como pode ser caracterizada a
complexidade da atuação do psicopedagogo institucional?
2) Descreva a trajetória da psicopedagogia na instituição escolar, de
acordo com Fagali e Vale (1993).
3) Atualmente, segundo Fagali e Vale (1993), como a práxis pedagó‐
gica na escola se divide?
53
4) Na concepção de Bossa (2007), qual o papel do psicopedagogo na
escola, enquanto assessor?
5) Na concepção de Fonseca (2003), qual o papel do psicopedagogo,
no contexto hospitalar?
6) Descreva, a partir da concepção de Macedo (2007), a importância
da brinquedoteca, no ambiente hospitalar.
5
Katia Cilene da Silva
VÍNCULOS AFETIVOS ENTRE
EDUCADOR E EDUCANDO
O presente capítulo tem por objetivo refletir sobre as relações vincula‐
res entre indivíduos que vivenciam juntos o processo de construção do
conhecimento, enfrentando situações semelhantes, com pontos de
convergência e divergência no dia a dia das relações interpessoais, a
fim de melhor compreender as patologias emergentes dessa relação.
Para tanto, propomos, inicialmente, uma reflexão sobre a comunicação,
o vínculo e o conhecimento sob o enfoque do campo de estudo da
psicopedagogia. Depois, trataremos do papel do pedagogo frente a não
aprendizagem. Por último, abordaremos a formação docente e seu
reflexo na prática educativa, a partir do pensamento do educador
Paulo Freire.
55
Leila Chamat3: “O nível e o tipo de vinculação que a criança estabelece
com as pessoas que a cercam vão determinar o nível e o tipo de vincu‐
lação que são estabelecidos com o conhecimento, repercutindo, assim,
na sua aprendizagem escolar”.
A observação sobre as possibilidades de comunicação da criança pode
ser feita, segundo Chamat4, por meio da abordagem da “psicanálise
como método de investigação profunda das relações envolvidas no
não‐aprender, porém, dentro de um enfoque social onde se configu‐
ram as estruturas psíquicas dessa não possibilidade”.
Somos da opinião de que, independentemente da abordagem adotada
na busca dos fatores envolvidos na não aprendizagem, o importante é
conhecermos como se estabelecem as relações vinculares externas ao
indivíduo, no que se refere à interação entre a comunicação, o vínculo
e o conhecimento, a partir da compreensão das interações do indiví‐
duo na família, na instituição escolar e/ou na sociedade como um todo.
Ao pararmos para refletir sobre a nossa própria trajetória de aprendi‐
zagem, facilmente identificaremos a “influência” das pessoas que con‐
viveram conosco no nosso jeito de realizar determinadas tarefas. Até
mesmo no que se refere à nossa preferência por leitura, passeios, sem
falar daquelas disciplinas escolares em que encontramos maior ou
menor grau de dificuldade durante a trajetória escolar.
falar sobre as dificuldades escolares das crianças seria uma forma encobridora de se
referir à patogenia do grupo social no qual a criança se encontra inserida, exceto
talvez as dificuldades oriundas de uma problemática orgânica, como um
comprometimento neurológico, endocrinológico e outros, ou mesmo, um
rebaixamento intelectivo [...].
Ainda segundo a autora, qualquer interferência negativa nesse proces‐
so poderá atrapalhar o processo de aprendizagem, fazendo com que a
criança mobilize suas defesas, a fim de se defender de seus medos e de
suas ansiedades, criando um obstáculo na vinculação com o conheci‐
mento e, consequentemente, aprisionando a sua inteligência.
Pelo exposto, e com base em nossa experiência clínica, apresentaremos
um caso clínico que visa a ilustrar tal problemática.
A. F. (seis anos e oito meses, cursando a pré‐escola), em tratamento
psicopedagógico com a queixa de que não interagia na sala de aula,
ficava imóvel o tempo todo. Não interagia com a professora nem com
os colegas. Não falava devido à existência de um atraso na fala. Os
colegas faziam as atividades por ela. Segundo a mãe, tais dificuldades
estavam ligadas ao déficit cognitivo da filha, devido ao fato de a meni‐
na ser portadora da síndrome de West.a
Quando questionada sobre o comportamento da filha, em casa, a mãe
afirmou que ela brincava com seus brinquedos e andava de bicicleta na
rua, acompanhada do irmão. Também relatou que, embora utilizando
um vocabulário próprio, tentava se comunicar através da fala.
a A síndrome de West é uma síndrome de origem neurológica que é caracterizada pela presença de
“quadros convulsivos” de difícil controle. A maioria das crianças afetadas seria portadora de sequelas
neurológicas e mentais. Tem sido assinalado, no entanto, casos em que o desenvolvimento é normal
(Machado; Ghinato, 2008).
57
Nos primeiros encontros, deparamo‐nos com uma criança desconfiada,
por assim dizer, introspectiva e sem iniciativa para realizar qualquer
tipo de atividade. Não é demais lembrar: para que nossa A. F. come‐
çasse a interagir com a presente terapeuta, foi preciso que construís‐
sem gradativamente um vínculo. E, embora, à medida que o tempo
transcorria, estivesse superando gradativamente a “barreira do silên‐
cio” e da falta de motivação para as novas aprendizagens, o mesmo
não era observado no que dizia respeito ao comportamento de A. F.
em sala de aula. Ela continuava manifestando um comportamento de
evitação das situações que lhe pudessem trazer novos conhecimentos.
Algumas vezes, durante o atendimento psicopedagógico, retornava ao
sintoma inicial de inibição total.
Mediante aos avanços e aos retrocessos observados no comportamento
de A. F., realizamos uma observação na sua sala de aula.
Essa visita foi fundamental para a condução do presente caso. Depa‐
ramo‐nos com uma professora desmotivada e despreparada para o
atendimento de crianças com necessidades especiais. A professora,
talvez sem perceber, acabava criando um clima de hostilidade entre ela
e a menina. Pois, a todo o momento, reclamava em alta voz que A. F.
não fazia nada e solicitava que os colegas “ajudassem A. F. a fazer as
tarefas”.
A. F. foi transferida de escola e deu continuidade ao atendimento psi‐
copedagógico com a terapeuta por um período de aproximadamente
dois anos.
Quanto à evolução de A. F., tivemos muitos ganhos: a menina não só
adquiriu os fonemas que estavam ausentes em seu inventário fonético,
quando iniciou o atendimento, como passou a utilizar a linguagem
oral para comunicar‐se nos diferentes momentos do dia a dia.
Lembramos do dia em que a mãe de A. F. chegou ao atendimento e
comentou que a filha tinha colocado‐a numa confusão. Ela relatou que
“a mãe da amiguinha da A. F. xingou ela [sic] porque a filha teria se
queixado de que A. F. tinha dito que a boneca dela [sic] era mais boni‐
ta”. Acrescentou que saiu em defesa da filha, dizendo que tal fato não
podia ter acontecido, pois a menina não falava.
Foi assim que a mãe de A. F. começou a se convencer de que a filha
estava caminhando rumo a uma maior autonomia.
Buscando, então, responder ao questionamento: “Será a dificuldade de
aprendizagem, ou a não aprendizagem, um problema apenas do alu‐
58
no?” Levando em consideração o aporte teórico abordado até o presen‐
te momento, e com base no relato clínico apresentado, salientamos o
papel de protagonista do professor frente ao processo de aprendiza‐
gem. Parafraseando o educador Paulo Freire8, para quem “não há
docência sem discência”, nesse sentido, também é verdadeiro afir‐
marmos que “não existe docência sem discentes” e tampouco “profes‐
sor sem aluno”.
Acrescentamos que questões externas, relativas ao dia a dia, influenci‐
am e atingem tanto o professor como os alunos, refletindo diretamente
na forma com que interagem entre si.
Desde o começo da formação do docente, segundo Freire10, o educador
deve se assumir como sujeito da produção do saber, convencendo‐se
definitivamente de que ensinar “não é transferir conhecimento, mas
criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção”. É
preciso que fique claro para o professor, desde o começo de sua forma‐
ção, que, “embora diferentes entre si, quem forma, se forma e re‐forma
ao formar e quem é formado, forma‐se e forma ao ser formado”. O
autor ainda acrescenta que “não existe docência sem discência, as duas
se explicam, e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não
se reduzem à condição de objeto um do outro. Quem ensina aprende
ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”.
Aprofundando a reflexão sobre a afirmação de Freire11, de que inexiste
docência sem discência, observamos que o educador salienta que “en‐
sinar exige rigorosidade metódica”, mas, também, exige que o educa‐
dor, na sua prática docente, reforce a capacidade crítica do educando,
sua curiosidade. É preciso que, mais do que se preocupar em esgotar
os conteúdos, os educadores preocupem‐se em criar condições para
que a aprendizagem seja possível. Para tanto, concordamos com Frei‐
re12: “Necessitamos de educadores e de educandos criadores, instiga‐
dores, inquietos, rigorosamente curiosos, humildes e persistentes”.
59
A partir do mencionado, destacamos a importância do papel do edu‐
cador, ao assumir uma postura crítica de modo que não se preocupe
apenas em ensinar os conteúdos de forma mecanizada, mas conduza o
educando a pensar certo.
Na perspectiva de Freire13, não existe ensino sem pesquisa e vice‐versa.
Tais afazeres encontram‐se intrinsecamente interligados. Em outras
palavras, o professor que realmente ensina é aquele que busca, questi‐
ona e indaga a si próprio.
Ainda na concepção do referido autor, é papel do professor pesquisar
para constatar e constatar para intervir, pois é intervindo que esse
profissional educa e é educado, num movimento dialógico. Para tanto,
é indispensável que o professor leve em consideração, respeite o co‐
nhecimento ou os saberes dos educandos, pois, para Freire14, “trans‐
formar a experiência educativa em simples treinamento técnico é
amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício
educativo: o seu caráter formador”. Respeitar a natureza do conheci‐
mento dos educandos implica o entendimento de que o ensino dos
conteúdos não pode dar‐se alheio à formação moral do educando.
Trata‐se de acreditar que “pensar certo implica numa prática docente
crítica, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o
pensar sobre o fazer”.
A propósito, concordamos com Freire17 quando ele diz que “ensinar é
uma especificidade humana”, porque, antes de ser educador, o profes‐
sor é gente e, independentemente da sua formação, não deve se esque‐
cer do sentido humano, ou seja, precisa sempre ter em mente que o
60
aluno – sujeito aprendente – deve ser tratado com tolerância, respeito,
carinho e doação.
Finalizando, enfatizamos que não é possível desvincular as habilidades
cognitivas e a social da emoção, pois o indivíduo é um ser indivisível.
Logo, como educadores, somos da opinião de que não existe processo
de ensino aprendizagem que aconteça sem que a emoção seja traba‐
lhada paralelamente ao conhecimento que nos propomos a disseminar.
Lembramos que trabalhar levando em consideração o afeto e a emoção
requer paciência. Pois, trata‐se de um processo continuado que difere
da metodologia de simples memorização, em que o educando é obri‐
gado a estudar determinado assunto para a prova, decorando e livran‐
do‐se do problema. Ao estudarmos a aprendizagem do ponto de vista
da vinculação afetiva, ratificamos a ideia de que o afeto é condição sine
qua non na relação entre aquele que ensina e o que aprende, para o
rompimento das amarras que aprisionam a inteligência e impedem a
sua real expressão.
Ponto Final
O presente capítulo abordou os vínculos afetivos entre educador e
educando, no processo de ensino aprendizagem, a partir da reflexão
sobre o enfoque da psicopedagogia no conjunto comunicação, vínculo
e conhecimento. Aspectos, esses, interligados e interdependentes.
Também provocou a reflexão sobre a formação docente e seu reflexo
na prática educativa sob a concepção do educador Paulo Freire.
Atividades
1) Explique o significado do vínculo na concepção de Pichon‐Rivière
(1998).
2) Qual a influência das relações vinculares das crianças com as
pessoas que as cercam na aquisição de novas aprendizagens?
(Responda com base no pensamento da psicanalista Melanie
Klein).
3) Na concepção de Klein, segundo Chamat (1997), no tocante à
compreensão do processo de construção do conhecimento do in‐
divíduo, onde o psicopedagogo deve buscar elementos que lhe
possibilitem entender os fatores responsáveis pela não aprendiza‐
gem da criança?
61
4) Segundo Chamat (1997), onde são originadas todas as patogenias
que levam à não‐aprendizagem e que não são consideradas como
exceções?
5) Segundo o educador Freire (1999), três pontos são fundamentais
para o processo de ensino aprendizagem. Cite‐os.
6) Explique a afirmação de Freire (1999): “Ensinar não é transmitir
conhecimento”.
7) Explique “não há docência sem discência”, utilizada por Freire
(1999).
8) Explique a afirmação “ensinar é uma especificidade humana”, a
partir do pensamento de Freire (1999).
6
Katia Cilene da Silva
RELAÇÕES FAMILIARES E
PROCESSO DE APRENDIZAGEM
O capítulo seis tem como proposta refletir sobre o papel da família na
compreensão dos problemas de aprendizagem. Para tanto, inicialmen‐
te contextualizaremos o leitor acerca das características do funciona‐
mento do sistema familiar contemporâneo e de suas possíveis reper‐
cussões na educação e na aprendizagem escolar dos diferentes sujeitos.
Trataremos também da família do sujeito com problema de aprendiza‐
gem. Em seguida, abordaremos a questão do diagnóstico familiar sob o
ponto de vista psicopedagógico. No último item, apresentaremos um
estudo de caso, no qual analisamos o processo de aprendizagem frente
às relações familiares a fim de relacionarmos a prática com o aporte
teórico estudado.
A família contemporânea tem criado formas próprias de organização,
não mais se limitando à família nuclear (pai, mãe e filhos dos mesmos
pais). Tal fato é consequência dos tempos modernos: os casais sepa‐
ram‐se por diversas vezes, passando a conviver ou não com os filhos,
frutos das uniões anteriores e da nova relação conjugal.
Acrescentamos ainda que qualquer mudança, na constituição, na con‐
figuração e no funcionamento familiar, irá refletir na subjetividade das
pessoas, uma vez que a subjetividade se constrói na relação com o
outro, no campo do humano, dos afetos, das paixões.
63
Contudo, é importante considerarmos que, segundo Nathan W. Ac‐
kerman1, por maiores que sejam as transformações na configuração
familiar, essa instituição “permanece como unidade básica de cresci‐
mento e experiência, desempenho ou falha”, contribuindo assim tanto
para o desenvolvimento saudável quanto patológico de seus compo‐
nentes.
Segundo Fernández3, ao levarmos em consideração que é por meio da
interação dos quatro níveis de desenvolvimento humano (orgânico,
corporal, intelectual e desejante) que o sujeito constrói novas aprendi‐
zagens, também devemos considerar que a construção e a dinâmica de
cada um deles sofrem a influência direta da família.
De modo geral, ainda na concepção de Fernández4, a família do sujeito
com problema de aprendizagem pode ser caracterizada “como um
bloco indiferenciado, em que cada um pode viver, se tiver um outro de
quem ser ou a quem converter em parasita”. O choque entre esse sujei‐
to e essa estrutura pode acontecer quando ele toma iniciativa para
romper com esse bloco, buscando sua individualidade. Essa situação
de conflito pode fazer com que o sujeito apresente dificuldades na
aprendizagem.
A partir da contextualização anterior, é preciso que a dinâmica psico‐
pedagógica se volte para a compreensão dos papéis vivenciados pelos
integrantes da família para auxiliá‐los a vivenciarem situações de dife‐
64
renciação, discriminação, separação e exclusão, como objetivo central
do tratamento psicopedagógico.
Ainda na concepção de Fernández5, para as famílias cujo sistema se
baseia na indiferenciação de seus elementos,
torna‐se difícil aceitar que pensar diferente não quer dizer rechaçar o outro; [...]
que é possível e necessário que os membros de uma família ou de um casal
vivenciem uma mesma cena e, não obstante, a relatem diferentemente, conforme a
tenham sentido, sem que isso implique que um relato seja verdadeiro e o outro
mentiroso.
É fundamental que se rompam as amarras da indiferenciação uma vez
que a aprendizagem é uma possibilidade tanto para a criança como
para o adulto de conquistar a autonomia, sendo que esse processo
pode sofrer a interferência de desejos de ordem inconsciente pela pre‐
sença de sistemas familiares estruturados e estruturantes de indiferen‐
ciação, os quais são considerados terrenos próprios para o aparecimen‐
to de sintomas na aprendizagem.
Reconhecer a influência da família na formação global do sujeito exige
que a psicopedagogia utilize um modelo diagnóstico, baseado na dife‐
renciação de cada um dos integrantes do grupo familiar.
Sabemos que não existe uma receita, teoria ou técnica específica, que
nos permita abordar a família como objeto diagnóstico. Contudo, nossa
prática indica que o envolvimento familiar é de grande utilidade para
esclarecer em menor tempo e com maior profundidade a etiologia do
sintoma e as características de suas pautas de manutenção.
65
aprendizagem, isso não quer dizer que estejamos, de acordo com Fer‐
nández7, diante de uma “família com problema de aprendizagem”.
Para a autora, o sujeito trazido à consulta não deve ser recebido so‐
mente porque a família, a escola ou o médico o designaram como paci‐
ente. Na clínica particular, muitas vezes, o fracasso circunstancial na
aprendizagem de um dos membros de uma família é utilizado como
uma estratégia para solicitar ajuda para outra criança, que apresenta
um sintoma neurótico ou uma estrutura psicótica não declarada pelos
pais. Fernández8 também observa que, no hospital, às vezes, a consulta
para um dos filhos menores que apresenta um problema de aprendi‐
zagem reativo permite observar a existência de oligotimias ou psicose
em outros irmãos. Possibilitando, assim, não só um diagnóstico dife‐
rencial mais rápido entre problema de aprendizagem reativo e sinto‐
ma, mas também um trabalho preventivo para que o fracasso escolar
não se constitua em um sintoma e, sim, em uma indicação terapêutica
focalizada naquele que levava a carga maior de patologia.
Para olharmos através da família, ainda na perspectiva de Fernández9,
é preciso levar em consideração, concomitantemente, os níveis indivi‐
dual, vincular e dinâmico, os quais se entrecruzam, por sua vez, com
dois olhares: “O que considera principalmente as imagens, sensações e
ideias de cada um dos membros do grupo familiar, e o que a equipe
terapêutica percebe”.
No nível individual, Fernández10 indica que o atendimento psicopeda‐
gógico está centrado no paciente‐designado, na sua particular inter‐
relação organismo‐corpo‐inteligência‐desejo. No entender da autora, o
sujeito é perpassado por uma rede particular de vínculos e significa‐
ções em relação ao aprender, conforme seu grupo familiar. Nesse nível,
a fim de conhecermos a dinâmica do sujeito no grupo familiar, a autora
indica a necessidade de observarmos o paciente em três momentos:
com todo o grupo, com os irmãos e somente com o terapeuta, com o
objetivo de verificar em que medida essas três situações modificam.
Essas observações devem contemplar a atitude da criança ante o exte‐
rior (observando seus deslocamentos, seu olhar, o tipo de escuta etc.),
o modo como ela transmite ou expressa seus sentimentos e ideias, a
sua disponibilidade corporal, o seu grau de curiosidade e a forma de
expressão verbal, entre outros aspectos.
O nível dinâmico, ainda na perspectiva de Fernández12, “é destinado a
esclarecer o sistema de papéis necessários para o funcionamento e
manutenção da estrutura familiar e os modelos de interação possí‐
veis”. Nesse nível, a autora indica a necessidade de o psicopedagogo
verificar o grau de contato do sujeito com a realidade circundante (se o
sistema lhe permite, o castiga, o proíbe ou o estimula), se admite, san‐
ciona ou estimula a autonomia de seus membros, se respeita a privaci‐
dade ou o direito de guardar informação pessoal sem ser considerado
por ele um segredo. Essa descrição, realizada por um dos membros da
família, sobre alguns aspectos, como, por exemplo, quem impõe a
autoridade no grupo ou a quem se recorre quando há algum problema,
serve para começarmos a separar os diferentes papéis representados
pelos sujeitos no grupo familiar.
A ação diagnóstica tem como objetivo revelar o segredo da família e,
nesse sentido, Fernández13 observa que “não há segredo de um só. O
segredo age tanto na mente de quem o comunica como de quem o
recebe”. O segredo, segundo Isidoro Berenstein, citado por Fer‐
nández14, funciona como elemento estruturante em algumas famílias.
Para o autor, o segredo familiar pode ser caracterizado como sendo as
informações vinculadas com a história do grupo familiar ou estar rela‐
cionado a particularidades de um dos seus integrantes que, em geral,
são ocultadas, parcialmente, com a certeza de que não são desconheci‐
das por outros elementos do grupo.
67
Na concepção de Fernández15, “o segredo que cobra valor patogênico é
aquele em que uma pessoa não decide guardar ou que se vê obrigado a
esconder”. A autora acrescenta que o segredo pode agir de diferentes
maneiras e cita alguns exemplos de situações familiares nas quais ele
se faz presente.
não podemos dizer que o aprender está atrapado em sua totalidade, mas nesta
dialética que a aprendizagem normal implica entre o mostrar e o guardar, se
somente se entender o guardar, sem sentir‐se, com direito a mostrar, pode
culpabilizar‐se extensivamente todo guardar, como se fosse um esconder e, então,
ir se perdendo paulatinamente também a possibilidade de guardar.
A terceira situação utilizada por Fernández,19 para exemplificar a ques‐
tão do segredo na família, pode ser descrita da seguinte maneira: “B
não deu a A uma informação certa (importante para sua identidade
(dela) e, em seu lugar, lhe dá uma informação falsa”.
68
O problema de aprendizagem, no caso anteriormente descrito, segun‐
do Fernández20, apresenta‐se como uma muralha de defesa, ante a
desorganização psicótica. A autora traz como exemplo de tal situação
“o caso da criança adotada, a quem não se dá a conhecer sua origem,
obrigando‐a a renegar seu saber inconsciente, aceitando uma falsa
informação”. Também traz como exemplo, uma situação na qual o pai
morre em um acidente automobilístico, enquanto a criança está de
férias e, quando ela retorna, é informada de que o pai está viajando. Ao
comentar esse caso, a autora salienta que, na situação anteriormente
mencionada, como nas demais situações de segredo, não podemos
considerar esse como um trauma real, como o necessário causador de
um processo patológico.
A quarta situação utilizada por Fernández,21 para exemplificar a ques‐
tão do segredo na família pode ser descrita da seguinte maneira: “A vê
e B lhe diz que não viu o que viu”. Como exemplo de tal situação, a
autora menciona os casos em que um sujeito pode ter observado ou
presenciado algo que estava proibido ou perto de uma situação de
segredo, e a família passa a lhe dizer que o sujeito imaginou que não
viu aquilo que realmente viu. O exemplo anterior ilustra uma situação
relacionada ao desmentir, mecanismo estudado por Freud como espe‐
cífico da psicose. A autora salienta que desmentir significa dizer a
alguém que mente ou dissimular esse fato, para que não se saiba. As‐
sim, segundo Berenstein, citado por Fernández22, constitui‐se uma
ruptura do eu, em que uma parte reconhece e aceita a realidade, en‐
quanto a outra parte a desmente. Ambos os níveis de organização
persistem, criando o ponto disposicional para os posteriores processos
psicóticos, associados com a perda de significação da realidade e com a
reconstrução de uma segunda realidade, para cobrir a perda de signifi‐
cação original.
69
refere ao entendimento das dificuldades de aprendizagem e na condu‐
ção do processo terapêutico. Nesse sentido, a família pode ser conside‐
rada a base de todas as experiências futuras da criança, uma vez que
exerce uma forte influência sobre seus componentes, podendo facilitar
ou entravar o seu desenvolvimento.
A autora ainda observa que, ao considerarmos o sintoma como resul‐
tante da articulação construtiva do organismo, do corpo, da inteligên‐
cia e da estrutura do desejo do sujeito, incluído num meio familiar e
num sistema educacional, no qual seu sintoma tem sentido e funciona‐
lidade, não podemos diagnosticar o sintoma sem levar em considera‐
ção o grupo familiar e a instituição educativa. Ela enfatiza, ainda, que
também não podemos ignorar a originalidade e a autonomia do sujei‐
to, possibilitando‐lhe espaço para que se expresse, a fim de podermos
observar o possível atrape da inteligência.
Segundo Chamat25, outra autora que enfatiza a necessidade de o edu‐
cador direcionar o olhar para a família do sujeito com dificuldade de
aprendizagem é Paín. Em sua concepção, o diagnóstico das dificulda‐
des de aprendizagem só faz sentido quando leva em consideração a
leitura do significado do sintoma apresentado pela criança, na família e
para esta.
Em outras palavras, a autora propõe a compreensão do real significado
do não‐aprender, mediante a leitura dos papéis assumidos pelos pais e
pelo filho com dificuldade de aprendizagem. Para tanto, indica a ne‐
cessidade de se conhecer o papel real do sujeito que se encontra impe‐
dido de construir novas aprendizagens e os reais ganhos da família,
por meio dos diferentes papéis assumidos diante do problema de
aprendizagem do filho.
Durante nossa conversa, o pai ainda associou a dificuldade do filho de
adequar a sua fala ao medo de perder a sua posição na família. Levan‐
tou a possibilidade de ele estar com medo de que “coloquem outro
bebê dentro de casa”, caso ele cresça, como aconteceu anteriormente
com os irmãos.
Durante essa conversa com o pai, foi possível fazermos algumas com‐
binações. Entre elas, a importância de F. S. G. passar a ser tratado como
um menino da sua faixa etária, em vez de ser infantilizado pela famí‐
lia. Na semana seguinte, já foi possível observar um novo comporta‐
mento em F. S. G.: ele chegou ao atendimento com a fala mais inteligí‐
vel e produzindo os fonemas que haviam sido trabalhados.
escritora, que tem formação nas duas áreas.
71
vivenciar tal papel. Observamos, ainda, que as pessoas envolvidas
nesse processo não têm consciência dessa situação e tratam o sujeito
como se estivesse hipnotizado, sinalizando‐o sobre como ele é. Essa
característica garante a eficácia do mandato, fazendo com que ele não
se sinta autorizado a se apropriar de novas aprendizagens.
Ponto Final
Neste capítulo, tivemos como objetivo principal provocar a reflexão
sobre o papel da família na compreensão dos problemas de aprendiza‐
gem. Inicialmente abordamos a caracterização da família contemporâ‐
nea. Na sequência, a família do sujeito com problema de aprendiza‐
gem, na qual constatamos que, embora não haja parâmetros específicos
para caracterizar as famílias de sujeitos com dificuldade de aprendiza‐
gem, através do diagnóstico psicopedagógicos, buscamos o conheci‐
mento necessário para planejar nossa ação psicopedagógica.
Atividades
1) Como está formada a família contemporânea?
2) A partir da leitura realizada, questionamos: modificações na estru‐
tura da família exercem alguma influência sobre os seus elemen‐
tos? Explique sua resposta.
3) Na concepção de Fernández (1991), a aprendizagem se dá a partir
da interação de quais níveis do desenvolvimento?
4) Como pode ser caracterizada a família do sujeito com problema de
aprendizagem, segundo Fernández (1991)?
5) Quando o paciente designado é uma criança ou um adolescente, o
que é importante ser considerado para o modo de diagnosticar,
segundo Fernández (1991)?
6) O que é de grande utilidade para abordagem da família como
objeto diagnóstico, na concepção de Fernández (1991)?
7) Segundo Fernández (1991), qual a o papel do diagnóstico familiar
na prática psicopedagógica?
7
RELAÇÃO ENTRE PRÁXIS
DOCENTE E MODELOS
PEDAGÓGICOS
Para tanto, perguntamos para você, leitor: o que você aprendeu com o que lhe
ensinaram?
73
Analisaremos essa questão à luz dos estudos dessas autoras, os quais
revelam que, em situação de aula, de supervisão, de assessoria e de
consultoria, os educadores, ao trazerem seus temas ou suas dificulda‐
des, freqüentemente acreditam que essas situações estão atreladas a
um momento único, a um lugar específico ou a um grupo de pessoas
em especial. Eles parecem não perceber que têm uma história anterior.
As autoras ainda observam que costuma estar presente no discurso
desses profissionais, na queixa ou mesmo na comunicação não verbal,
a dicotomia entre o fazer profissional e o que eles viveram ao longo da
trajetória pessoal de cada um. Salientam, ainda, que os referidos pro‐
fissionais acreditam que as experiências que vivenciaram no papel de
aprendentes não influenciam nas suas escolhas e formas de pensar a
prática profissional no momento atual. É como se isolassem as experi‐
ências anteriores da atividade profissional, como se fossem mundos
diferentes, coisas isoladas.
durante um trabalho de consultoria a um grupo, cujo tema era a dificuldade em
manter a disciplina com os alunos, os professores, em sua maioria, falavam do
assunto, rindo, com um corporal queixoso, subentendendo falta de segurança e, no
discurso oral, faziam a colocação de que os alunos não reconheciam a autoridade do
professor e não os levavam a sério.
A fim de sensibilizarem os profissionais, essas psicopedagogas propu‐
seram uma vivência na qual os professores foram convidados a enfati‐
zar suas linguagens corporais. Após serem submetidos a essa dinâmi‐
ca, os educadores concluíram que, se eles estivessem no lugar de seus
alunos, também não se levariam a sério. As autoras ainda enfatizam
que, por incrível que possa parecer, o grupo de professores se divertiu
muito ao retratar aquelas situações.
Durante a avaliação dessa vivência, os professores perceberam que as
dificuldades de que estavam enfrentando ao imporem limites aos
alunos, tinham relação com a rejeição de que eles próprios sentiam em
relação aos seus professores por terem sido autoritários e insensíveis à
especificidade de cada um, refletindo na dificuldade que hoje eles
enfrentam ao exercerem o seu papel de professores.
As autoras5 lançam um questionamento:
“Que diferença essa consciência pode fazer no processo de aprendizagem ou nos
processos de ensino de um profissional? Qual é a grande vantagem desse
conhecimento?”.
Por meio da teoria abordada, vemos que o pedagogo, assim como
qualquer outro ensinante – educador, psicopedagogo –, preocupado
com a sua tarefa social de provocar aprendizagens, necessita reconhe‐
cer a trajetória das próprias aprendizagens, enquanto aprendente, a
fim de identificar‐se nesse reconhecimento e se autorizar a efetivamen‐
te ensinar. Acreditamos que é a partir dessa tomada de consciência e
do conhecimento das diferentes teorias pedagógicas que poderemos
estruturar nosso trabalho, para potencializarmos a construção de no‐
vas aprendizagens, estimulando, dessa forma, o aluno a adquirir um
novo conhecimento.
Na nossa opinião, ter consciência da nossa própria trajetória como
aprendizes possibilita‐nos, enquanto educadores, uma maior coerência
entre o pensamento e a ação. Contudo, a ação pedagógica é complexa e
exige um olhar ampliado.
Acrescentamos ainda que a representação da sala de aula, em especial
a relação ensino‐aprendizagem, pode ser representada, na concepção
de Fernando Becker7, de três formas distintas, através de diferentes
modelos pedagógicos. Utilizaremos a denominação pedagogia diretiva,
pedagogia não diretiva e pedagogia relacional, usada pelo referido autor ao
se referir aos modelos pedagógicos, e mostraremos como tais modelos
são sustentados um a um, por determinada epistemologia.
75
A pedagogia diretiva e seu pressuposto epistemológico
Como é a aula, propriamente dita, nesse contexto? Segundo Becker9, “o
professor fala e o aluno escuta. O professor dita e o aluno copia. O
professor decide o que fazer e o aluno executa. O professor ensina e o
aluno aprende”. Essa concepção pedagógica era bastante comum na
década de 1950 ou de 1960 ou, quem sabe, até dois séculos atrás. Se
alguém fosse questionado a respeito do motivo que leva o professor a
agir de tal maneira, a maioria das pessoas responderia que é porque o
professor aprendeu que é assim que se ensina. Nesse sentido, o autor
observa que essa resposta, embora correta, não é suficiente para escla‐
recer a questão. Ele é da opinião de que o professor que age assim
acredita que o conhecimento pode ser transmitido para o aluno. Esse
professor acredita no mito da transmissão do conhecimento. Do co‐
nhecimento como forma ou estrutura, não só como conteúdo. Em ou‐
tras palavras, o professor acredita numa determinada epistemologia,
baseada na crença da gênese e do desenvolvimento do conhecimento.
Becker questiona: como se configura tal epistemologia?
A fim de responder à questão anterior, Becker10 recorre à definição do
sujeito e objeto, utilizada na linguagem epistemológica: “O sujeito é o
elemento conhecedor, o centro do conhecimento. O objeto é tudo o que
o sujeito não é. Em outras palavras, o objeto consiste no mundo no
qual o sujeito está mergulhado: isto é, o meio físico ou social.” Ainda
na concepção do autor, a epistemologia que está por trás da prática
desse professor considera que o indivíduo, ao nascer, é tábula rasa,
nada tem em termos de conhecimento. Ou seja, o sujeito, na visão
epistemológica desse professor, é uma folha de papel em branco. De
acordo com esse paradigma, o conhecimento (conteúdo) e a capacida‐
de de conhecer (estrutura) do sujeito vem do meio físico ou social. E,
empirismo é o nome dessa explicação da gênese e do desenvolvimento
do conhecimento.
Como podemos ver, a ação do professor do exemplo, citado por Bec‐
ker11 , não é gratuita. Ela está legitimada por uma epistemologia, se‐
76
gundo a qual o sujeito é totalmente determinado pelo mundo do objeto
ou pelos meios físico e social. Quem representa esse mundo, na sala de
aula, é, por excelência, o professor que acredita no seu imaginário, que
somente ele pode produzir algum novo conhecimento no aluno. Este
aprende se, e somente se, o professor ensina. Para tanto, o aluno deve
fazer silêncio, prestar atenção, ficar quieto e repetir tantas vezes quan‐
tas forem necessárias as atividades propostas, até que o conteúdo que
o professor deu entre e fique aderido na sua mente. Podemos represen‐
tar epistemologicamente essa relação da seguinte maneira:
S <= O
A partir desse esquema utilizado por Becker12 para representar a rela‐
ção professor e alunos, podemos perceber que a concepção pedagógica
em questão está fundamentada na epistemologia empirista, a qual
entende que o mundo físico e social (O) vai ser determinante para a
formação do sujeito (S), que é considerado como uma folha de papel
em branco. Na sala de aula, a disciplina escolar é exercida com todo
rigor, o aluno aprendeu a silenciar, mesmo quando discorda do profes‐
sor.
Ainda na concepção de Becker13,
o produto pedagógico acabado dessa escola é alguém que renunciou ao direito de
pensar e que, portanto, desistiu de sua cidadania e do seu direito ao exercício da
política no seu mais pleno significado: qualquer projeto que vise a alguma
transformação social, escapa a seu horizonte, pois ele deixou de acreditar que sua
ação seria capaz de qualquer mudança.
Traduzindo o modelo epistemológico em modelo pedagógico, temos a
seguinte relação:
A <= P
77
A pedagogia não diretiva e seu pressuposto epistemológico
A dinâmica da sala de aula, de acordo com este modelo, é descrita por
Becker15 da seguinte maneira: o professor não diretivo deve interferir o
mínimo possível na dinâmica da sala de aula, ele é um auxiliar do
aluno. Toda e qualquer iniciativa do aluno é, a priori, considerada boa,
instrutiva. Nesse contexto, o professor acredita que o aluno traz consi‐
go um saber e que precisa fazê‐lo emergir da consciência. Em outras
palavras, o professor acredita que o aluno aprende por si mesmo. O
professor pode, no máximo, despertar o conhecimento que existe no
estudante.
Você deve estar se perguntando: sobre qual epistemologia se sustenta
esse modelo pedagógico?
S => O
O autor explica que o termo apriorismo vem de a priori, isto é, aquilo
que é posto antes, como condição do que vem depois. Ele se refere à
bagagem hereditária. Esse modelo epistemológico acredita que o sujei‐
to (S) nasce com o conhecimento já programado na sua herança genéti‐
ca, logo, a interferência do meio físico ou social (O) deve ser reduzida
ao mínimo.
Voltando a falar do papel do professor, Becker17 enfatiza que o educa‐
dor, na perspectiva apriorista, inconsciente, na maioria das vezes,
renuncia àquilo que seria a característica fundamental da ação docente:
a intervenção no processo de aprendizagem do aluno.
A relação de poder, na pedagogia diretiva, agora está disfarçada. De
acordo com Becker18, “essa mesma epistemologia, que considera o ser
humano dotado de um saber de nascença, conceberá também, depen‐
dendo das conveniências, um ser humano desprovido da mesma capa‐
cidade”. Surge, assim, a teoria da carência sociocultural para garantir
que marginalização socioeconômica e déficit cognitivo são sinônimos.
Tal crença surge da ideia de que a maior incidência de dificuldades ou
de retardos de aprendizagem surge entre os malnutridos, os pobres, os
marginalizados, ou seja, trata‐se de déficit herdado, epistemologica‐
mente legitimado.
78
O modelo epistemológico apriorista pode ser traduzido para a relação
pedagógica da seguinte maneira:
A => P
79
(acomodação) provocadas pela assimilação do material ou que o aluno
se aproprie, num segundo momento, não mais do material, mas dos
mecanismos íntimos de suas ações sobre esse material. Tal processo
far‐se‐á por reflexionamento e reflexão, a partir das questões levanta‐
das pelos próprios alunos, das perguntas levantadas pelo professor e
de todos os desdobramentos daí decorrentes.
S <=> O
Esse processo constitutivo, segundo Becker24, entende que o sujeito (S)
constrói novas aprendizagens a partir da interação com o mundo físico
e social (O). Essa interação realizada por uma via de mão dupla não
tem fim nem começo absoluto. Nessa perspectiva, o professor (P) acre‐
dita que seu aluno (A) é capaz de aprender sempre. No entanto, o
autor observa que essa capacidade precisa ser analisada sob duas di‐
mensões complementares entre si, que são a estrutura ou condição
prévia de todo aprender, que indica a capacidade lógica do aluno e o
conteúdo. Sendo assim, o processo de aprendizagem exige uma dupla
atenção do professor que, além de ensinar, precisa aprender o que seu
aluno construiu até o momento, condição prévia para as aprendiza‐
gens futuras. Em contrapartida, o aluno precisa aprender o que o pro‐
fessor tem a ensinar (conteúdos) e isso o desafiará a novas aprendiza‐
gens, exigindo dele respostas nas dimensões de conteúdo e estrutura.
Esse modelo epistemológico pode ser traduzido da seguinte forma:
A <=> P
A tendência da sala de aula relacional, na perspectiva de Becker25, é a
superação da figura autoritária do professor e do dogmatismo do con‐
teúdo, por meio da construção de uma disciplina intelectual e de re‐
gras de convivência, a fim de tornar o ambiente propício para a apren‐
80
dizagem, utilizando como ferramenta pedagógica o diálogo e o questi‐
onamento e provocando no aprendiz a curiosidade necessária para
impulsioná‐lo a construir novos conhecimentos.
Ponto Final
O presente capítulo abordou a reflexão sobre a relação entre a práxis
docente e os modelos pedagógicos. Para tanto, partimos da reflexão
sobre a influência da trajetória do educador enquanto aprendiz na sua
ação pedagógica. Na sequência, analisamos as diferentes teorias (pe‐
dagogia diretiva, pedagogia não diretiva e pedagogia relacional) e os
respectivos pressupostos epistemológicos que dão sustentação à práxis
pedagógica.
Atividades
1) A partir da leitura realizada, explique por que é importante que o
educador tenha conhecimento da sua trajetória enquanto apren‐
diz.
2) A partir do referencial teórico abordado, questionamos: o que
podemos conhecer ao analisarmos as ações de qualquer professor?
3) Na concepção de Becker (2001), de quantas formas distintas a sala
de aula, em especial a relação ensino‐aprendizagem, pode ser re‐
presentada?
4) Qual é o pressuposto epistemológico que sustenta a pedagogia
diretiva? E qual a visão do professor sobre o aluno nesse modelo
pedagógico?
5) Qual a dinâmica da sala de aula no modelo pedagógico não dire‐
tivo, na concepção de Becker (2001)? Explique a crítica feita pelo
autor a respeito desse tipo de intervenção pedagógica.
6) Qual é a concepção de aprendizagem presente na abordagem da
pedagogia relacional, na perspectiva de Becker (2001)?
7) Com qual dos três modelos pedagógicos (pedagogia diretiva,
pedagogia não‐diretiva e pedagogia relacional) você se identifica?
Justifique a resposta teoricamente.
81
8
Katia Cilene da Silva
A APRENDIZAGEM FRENTE ÀS
INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS
Segundo Antunes4, a escola brasileira, com raras exceções, ainda traba‐
lha com o conceito de inteligência, utilizado há bem mais de cem anos.
A pessoa considerada inteligente é aquela que sabe se expressar com
clareza e apresenta competência para dominar desafios da matemática.
Mas, afinal, o que é INTELIGÊNCIA?
83
provocações que a vida apresenta”. Não está, pois, relacionada com
pontuação de QI ou a formação acadêmica.
Segundo Antunes7,
é a inteligência que nos possibilita dar sentido às coisas que vemos e à vida que
temos e que nos leva a conversa interior, possibilitando‐nos resgatar o
conhecimento de arquivos da memória, assim como a capacidade de raciocínio,
criar novos objetivos e inventar saída quando não nos parece haver indícios de sua.
O autor acrescenta que a inteligência é a característica que faz de cada
sujeito um ser único.
A inteligência cinestésico-corporal
Uma observação extremamente importante, segundo Antunes8, é o fato
de Gardner não ter denominada essa inteligência de corporal, mas de
cinestésico‐corporal. O autor salienta que essa é uma diferença significa‐
tiva, uma vez que a origem da palavra cinestésica/o refere‐se aos movi‐
mentos finos do corpo, às sensibilidades mais sutis, como aquelas
obtidas por meio de tato, paladar, audição e olfato. Logo, a inteligência
cinestésico‐corporal abrange não apenas os músculos, mas o movimen‐
to, a agilidade e a destreza das ações corporais amplas.
A partir da definição anterior, Antunes9 aponta para a necessidade de
nos preocuparmos com a estimulação integral dessa inteligência, bus‐
cando o equilíbrio entre a realização de atividades motoras amplas e
aquelas que valorizam os movimentos finos e sutis. Embora essa inte‐
ligência esteja presente desde o nascimento, é a partir dos dois ou três
anos, com a realização de exercícios sistemáticos, que se poderá obser‐
var como essa inteligência se manifesta.
Acrescentamos ainda que a inteligência cinestésico‐corporal difere das
demais num único aspecto: é a única inteligência cujo aprimoramento
implica uma melhor qualidade de vida, pois a prática de exercícios
regularmente não é apenas um fundamento que nos torna corporal‐
mente mais inteligentes, mas melhora nossa capacidade cardiovascu‐
lar, podendo evitar ou adiar uma diversidade de doenças.
Você percebe que seu aluno (filho ou outra criança) apresenta um alto
nível de inteligência ecológica quando se mostra extremamente inte‐
ressado em conhecer tudo sobre os animais da atualidade ou do pas‐
sado, tem interesse em programas que envolvam visitas a zoológicos,
passeios no campo ou atividades ao ar livre, como cavalgar, passear
com um cachorro, fazer de um animal doméstico “seu amigo”.12
A inteligência espacial
A inteligência espacial, muitas vezes chamada de visuoespacial, segun‐
do Antunes13, é observada na capacidade de o sujeito relacionar o
próprio espaço com o espaço que o envolve, percebendo e adminis‐
trando distâncias, pontos de referência e localizando‐se geografica‐
mente, bem como revelando a capacidade em perceber diferentes obje‐
tos, transformando‐os ou combinando‐os em novas posições. Essas
características geralmente estão nitidamente presentes em grandes
arquitetos, escultores, matemáticos, motoristas de táxi, marinheiros e,
sobretudo, pintores.
Seu aluno (filho ou outra criança) provavelmente apresenta um alto
nível de inteligência espacial, segundo Antunes14, quando:
percebe com facilidade mudanças de lugar nos móveis e/ou obje‐
tos em casa ou na escola; monta quebra‐cabeça com maior facili‐
dade que as crianças da sua faixa etária;
parece pensar, não com palavras, mas com imagens visuais, de‐
monstrando interesse por atividades artísticas ou de construções;
tem especial fascínio por máquinas e pode desenhar inventos, pro‐
jetar brinquedos ou desenvolver mudanças significativas em brin‐
quedos já existentes.
O autor observa que, em situações rotineiras, o sujeito pode mostrar‐se
extremamente sonhador, distraindo‐se com facilidade.
85
Inteligências pessoais (intrapessoal e interpessoal) e inteligência
existencial
De acordo com Antunes15, “embora exista uma relativa independência
entre as inteligências interpessoal, intrapessoal e existencial, elas são as
únicas que se referem plenamente à ‘pessoa’, razão pela qual Gardner
chamou as duas primeiras de inteligências pessoais”. O autor observa
que, diferentemente dos demais tipos de inteligências — por exemplo:
lingüística, espacial, naturalista ou qualquer outra — as inteligências
pessoais e existenciais são suscetíveis aos sentimentos e às emoções e
suas manifestações conduzem sempre ao auto e ao heteroconhecimen‐
to.
Ao abordar a inteligência interpessoal, Antunes17 destaca que a pessoa
que possui essa característica em evidência apresenta facilidade para
compreender o outro em seus aspectos emocionais e inclui‐se com
facilidade em diferentes grupos sociais.
A música é uma linguagem tão ou mais rica e expressiva que a lingua‐
gem verbal, pois, mesmo quem não sabe compor, deixa‐se emocionar
pelo acordar das lembranças, diante do ritmo de uma música ou diante
da sonoridade do canto de um pássaro.
86
Segundo Antunes20, sabemos que nosso aluno (filho ou outra criança)
provavelmente apresenta um alto nível de inteligência, sonora ou
musical, quando lembra com extrema facilidade de músicas e melodi‐
as, mostra‐se sensível ao som em seus ambientes, apresenta motivação
para tocar instrumentos musicais ou deixa‐se encantar pela visão de
um músico ou orquestra, tem interesse em colecionar CDs, cantarolar e
cantar, assumindo o seu conteúdo como verdadeiro intérprete. Esse
tipo de inteligência se manifesta também quando a criança afirma se
concentrar ou aprender melhor com o rádio ligado. Nesse caso, cabe ao
professor respeitar essa característica.
A inteligência lógico-matemática
De acordo com Antunes22:
envolvam o reconhecimento de objetos diferentes, que permitam a
associação, comparação;
explorem conceitos de quantidade, tempo, causa e efeito; utilizem
símbolos abstratos para representar objetos concretos; possam su‐
gerir o uso de habilidades na resolução de programas lógicos;
87
levantem e testem hipóteses; usem habilidades matemáticas di‐
versas, como estimativas, interpretações de estatísticas, represen‐
tações gráficas e muitas outras;
A inteligência linguística
A inteligência lingüística, de acordo com Armstrong24, é aquela ligada
ao dom das palavras. É a inteligência do jornalista, do narrador de
histórias, do poeta, do advogado. Os sujeitos que são hábeis nessa
inteligência podem discutir, persuadir, entreter ou instruir com eficá‐
cia, através da palavra falada, através de trocadilhos, jogos de palavras
e frases difíceis. Eles também podem ser verdadeiros bancos de dados
de curiosidades, devido à capacidade de reter fatos em suas mentes.
Ou, então, são especialistas em literatura, leem vorazmente, sabem
escrever com clareza e podem gerar outros tipos de expressões através
da mídia impressa.
Inicialmente, observamos que Antunes desmistifica a crença de que, ao
considerarmos a existência de diferentes tipos de inteligência, estamos
fragmentando ou classificando aspectos particularizados de um todo.
Para tanto, o referido autor cita a existência da localização cerebral de
áreas específicas para operar saberes específicos, como a área de Broca
e de Wernicke para a linguagem. Com esse exemplo, Antunes25 “mos‐
tra que não existe uma inteligência global que se busca dividir, mas
núcleos cerebrais distintos que operam recursos específicos, ainda que
o cérebro humano funcione mais ou menos como uma orquestra e
áreas diferentes se envolvam para a apresentação de um resultado
específico”. Ou seja, “o fato de ouvirmos com destaque o piano em
uma melodia, não significa que reconhecê‐lo implica em ‘fragmentar’ a
orquestra”26.
88
No paradigma das inteligências múltiplas, a aprendizagem faz parte
de um processo interativo de construção e reconstrução interior, no
qual as inteligências (potencial biopsicológico) são utilizadas como
recurso essencial para ajudar o sujeito a resolver problemas, a adaptar‐
se a novas situações, a criar e a aprender. Sendo a possibilidade de
avanços decorrente da ideia de que os diferentes tipos de inteligências
são educáveis e evoluem progressivamente, desde que devidamente
estimulados. Difere, pois, da visão empirista de aprendizagem, a qual
o professor transfere o conhecimento para aluno.27
Ainda de acordo com Antunes28, “o valor que a sociedade empresta a
esta ou àquela inteligência subordina‐se à cultura inerente, tempo e
local em que se vive”. Por exemplo, enquanto em alguns locais a capa‐
cidade musical se sobrepõe à lingüística, em outros se atribui valor
maior à capacidade matemática que à administração de situações emo‐
cionais, entre outras possibilidades.
Em relação ao potencial de aprendizagem humano, no que tange aos
diferentes tipos de inteligências, Antunes29 observa que esse potencial é
diversificado e está diretamente relacionado à conjunção de fatores
genéticos e dos estímulos ambientais que o sujeito recebe dentro e fora
da escola. Salienta ainda que uma pessoa sem distúrbios severos ou
disfunções cerebrais possui todas as inteligências, ainda que com po‐
tenciais diversificados.
De acordo com o autor, apesar de em qualquer faixa etária o sujeito se
mostrar sensível ao estímulo das inteligências, a maior parte das inteli‐
gências encontra‐se sensível ao desenvolvimento dos dois aos seis anos
de idade. É o cérebro humano o órgão que se compromete pelo desuso
das inteligências. Portanto, as diferentes inteligências necessitam de
estímulos diversificados, desde a vida pré‐natal até idades bastante
avançadas.
No que compete à ação pedagógica propriamente dita, com base em
Antunes30, observamos que:
todo professor precisa levar em consideração, ao planejar sua ação
pedagógica, o fato de que não existe no cérebro humano um nú‐
cleo, um ponto ou uma área específica para uma única inteligên‐
cia. Dessa maneira, quando se colocam em ação os atributos de
uma ou de outra inteligência, utilizam‐se áreas presentes pratica‐
mente em todo o cérebro. Em contrapartida, “a ocorrência de aci‐
dentes, disfunções cerebrais, adquiridas ou não, pode afetar uma
ou mais inteligências, sem que isso necessariamente implique em
um comprometimento integral”31. Por isso, é possível que um alu‐
89
no apresente uma dificuldade de aprendizagem que afete uma ou
mais inteligências, sem ficar, contudo, impossibilitado de desen‐
volver o potencial das demais;
para fins didáticos, as inteligências podem ser consideradas subin‐
teligência, sendo que cada uma das inteligências pode ser identifi‐
cada por diferentes manifestações. Por exemplo, a inteligência lin‐
guística pode se manifestar através da escrita, da oralidade ou da
sensibilidade de emoções, despertadas pela intensidade com que o
sujeito apropriou‐se das mensagens orais ou escritas;
não existe uma única abordagem pedagógica para o trabalho com
as inteligências múltiplas em sala de aula e, portanto, não existem
receitas definitivas sobre como estimulá‐las;
Ponto Final
Este capítulo possibilitou a reflexão sobre o tema da aprendizagem
frente às inteligências múltiplas. Para atingir tal objetivo, levamos o
leitor a pensar sobre o que é inteligência. Apresentamos as inteligên‐
cias múltiplas, descrevendo‐as uma a uma. E, no último ponto aborda‐
do, estabelecemos uma relação entre a ação pedagógica e a concepção
da existência de inteligências múltiplas.
Atividades
1) Segundo Antunes (2006a), quem é o mentor da teoria das inteli‐
gências múltiplas e em que ano essa teoria surgiu?
90
2) Que mudanças a teoria das inteligências múltiplas provocou, no
que se refere à compreensão do termo inteligência, na visão de
Antunes (2006a)?
3) Qual a definição de inteligência, na concepção de Armstrong
(2004)?
4) Segundo Antunes (2006b), como Howard Gardner definiu a inte‐
ligência cinestésico‐corporal?
5) Segundo a concepção de Antunes (2006c), defina o que vem a ser
inteligência ecológica.
6) Defina, segundo Antunes (2006d), a inteligência espacial.
7) As manifestações de quais inteligências conduzem ao auto e ao
heteroconhecimento, na perspectiva de Antunes (2006g)?
8) Segundo Antunes (2006e), a inteligência lógico‐matemática pode e
deve ser estimulada, tornando‐se mais .................. nos que já a pos‐
suem em ................. grau e mais nos que a possuem em um padrão
.........................
9) Os sujeitos que são hábeis nessa inteligência podem discutir, per‐
suadir, entreter ou instruir com eficácia, por meio da palavra fala‐
da, de trocadilhos, de jogos de palavras e de frases difíceis. De
qual inteligência estamos falando?
10) Segundo Antunes (2006a), a nova concepção de inteligência utili‐
zada na teoria das inteligências múltiplas trouxe alguma influên‐
cia para a escola? Explique sua resposta.
91
9
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM A
SERVIÇO DE UMA EDUCAÇÃO
TRANSFORMADORA
O presente capítulo tem por objetivo refletir sobre a avaliação, a partir
da concepção de Maria Celina Melchior1 , de “que ensinar é propiciar
condições para que o sujeito desenvolva suas potencialidades através
da assimilação e transformação desses conhecimentos, no contexto de
sua prática social”. Ou seja, estudaremos a avaliação sob o ponto de
vista do conhecimento de competências. Para tanto, descreveremos as
diferentes modalidades e finalidades de avaliação presentes nessa
nova concepção de avaliação.
a aprendizagem escolar acontece num processo interacional, no qual as atitudes e o
comportamento da pessoa, são influenciados pelos membros do grupo ao qual
pertence. A relação do aluno com uma pessoa de autoridade — o professor ou a
professora — estabelece um sistema de papéis e de status diante dos quais os
alunos reagirão de maneiras diferentes [...].
A avaliação diagnóstica
No que se refere aos instrumentos utilizados na prática da avaliação
diagnóstica, a autora observa que são muitas as possibilidades, mas é
preciso que os professores tenham sensibilidade e criatividade na hora
de propor a atividade a ser realizada. Melchior6 também observa que,
para trabalhar com a modalidade de avaliação diagnóstica, o professor
precisa saber “observar, analisar e pesquisar, com embasamento teóri‐
co, as dificuldades dos alunos”, a fim de planejar ações que lhe possibi‐
litem potencializar a reconstrução de conceitos, fatos, habilidades e
atitudes que necessitem de intervenção pedagógica, dando aos alunos
condições para construírem novas aprendizagens.
Ainda na concepção de Melchior7, quando os resultados da avaliação
servem de diagnóstico da situação do aprendiz, ajudam a individuali‐
zar a ação docente, combatendo a desigualdade e a discriminação, uma
vez que o diagnóstico permite que o professor ajuste o programa a ser
desenvolvido às condições do aprendiz. Valorizando os conhecimentos
93
prévios e buscando estratégias pedagógicas para estimular o desen‐
volvimento dos pontos considerados fracos.
Conforme afirmamos anteriormente, a avaliação diagnóstica faz parte
do processo ensino‐aprendizagem, logo perpassa por todo o processo
educativo. Quando realizada no início do processo, serve para orientar
a ação do educador na organização do planejamento escolar. No entan‐
to, quando realizada durante o processo de ensino‐aprendizagem, os
diferentes momentos de situação avaliativa fornecem informações
importantes sobre as diferentes etapas do processo pedagógico, ser‐
vindo de diagnóstico para a etapa seguinte e possibilitando ao profes‐
sor repensar sua ação pedagógica.
Na concepção de Gerard Scallon, segundo Jacques Grégoire8, “a avali‐
ação diagnóstica exerce duas funções. A primeira é de natureza pre‐
ventiva e refere‐se à integração dos alunos numa nova sequência de
aprendizagem”. O autor explica que essa avaliação está voltada para a
atividade mental do discente, coloca ênfase na identificação dos es‐
quemas existentes para partir da situação do aluno ou relacionar os
novos conhecimentos com os já existentes para construir novos sabe‐
res. Essa avaliação é feita para ajudar a aprender e não para dizer o
que o aluno sabe. A segunda função da avaliação diagnóstica proposta
por Scallon, citado por Grégoire9, é o fato de ela “determinar as causas
das dificuldades persistentes em certos alunos”. Essa característica, no
entender do autor, aproxima a avaliação diagnóstica da função forma‐
tiva da avaliação. Contudo, faz uma ressalva: “A avaliação diagnóstica
inteirar‐se‐ia pelas causas exógenas à situação da aprendizagem, en‐
quanto a avaliação formativa levaria em consideração apenas as causas
endógenas a essa mesma situação”.
A avaliação formativa
A avaliação formativa, segundo Melchior10, é aquela que está inserida
em um projeto educativo específico para favorecer o desenvolvimento
daquele que aprende.
A avaliação formativa, para Melchior, está situada no centro da ação
de formação. Por meio dela o professor busca informações úteis à regu‐
lação dos processos de ensino e de aprendizagem. Essa autora12 ressal‐
ta “que apenas o lugar em relação à ação não basta, pois toda avalia‐
94
ção, mesmo no centro da ação, tem uma dimensão cumulativa e toda
avaliação tem um contexto pedagógico, uma dimensão prognóstica, no
sentido que a conduz a um melhor ajuste do processo”. A autora enfa‐
tiza que o que se faz ou não com o resultado da avaliação é que garan‐
te o caráter formativo ou não, uma vez que a avaliação só pode ser
entendida como formativa quando os dados coletados forem colocados
a serviço de uma relação de ajuda.
Ainda de acordo com Melchior13, a avaliação formativa apresenta duas
características básicas e específicas. São elas: a função corretiva e o
caráter informativo.
O caráter formativo ou avaliação informativa é a essencial nessa avali‐
ação. Neste sentido, Melchior14 acrescenta que a avaliação formativa
informa tanto o aluno como professor sobre o que deve ser feito no
decorrer do processo de aprendizagem. É a partir da constatação das
dificuldades que o professor elabora novas atividades para superá‐las
e toma conhecimento dos resultados efetivos do seu trabalho, podendo
rever sua ação. Nesse contexto, com o auxílio do professor, o aluno
toma conhecimento de suas dificuldades e, juntos, têm a possibilidade
de optar por outro caminho para a aprendizagem, estabelecendo‐se
assim uma relação transparente entre docente e discente.
Salientamos que a prática da avaliação formativa, ainda na concepção
de Melchior15, exige do professor flexibilidade e vontade de adaptação,
de ajuste. A autora observa que o aumento da variabilidade didática é
sem dúvida um dos únicos indicativos capazes de fazer com que essa
avaliação seja reconhecida de fora. O pensamento de Melchior é ratifi‐
cado por Charles Hadji16, que afirma: “Uma avaliação que não é segui‐
da por uma modificação das práticas do professor tem poucas chances
de ser formativa!” A partir disso, Melchior17 destaca que a principal
característica da função formativa é, exatamente, o trabalho de reto‐
mada após os resultados e que esse aspecto fica evidente na tríade:
coleta de informação – diagnóstico individualizado – ajuste de ação. A
autora ainda enfatiza que para uma avaliação ter caráter formativo
precisa ter, necessariamente, as três etapas.
95
va, mas o uso que o avaliador faz, com as informações que obtém, a
partir das observações realizadas e dos instrumentos aplicados.
Após todas as considerações feitas sobre a prática da avaliação forma‐
tiva, perguntamos: “Quais as possíveis dificuldades que devem ser
superadas pelo professor para que utilize na prática a avaliação forma‐
tiva”? Existem vários fatores que podem interferir negativamente no
fazer pedagógico do educador, entre eles Melchior19 menciona a con‐
cepção da prática avaliativa como medida, a falta de conhecimento
teórico dos professores e, consequentemente, a falta de variabilidade
didática.
No que se refere à questão do uso da prática avaliativa como medida,
Melchior observa que essa ideia vai contra a proposta da avaliação
formativa, uma vez que a avaliação como medida é objetiva no sentido
de que, uma vez definida a unidade, deve‐se ter sempre a mesma
medida do mesmo fenômeno. Em contrapartida, no domínio das ano‐
tações, mesmo quando assistida por computador, a avaliação e a inter‐
venção são, em última instância, operações e ações realizadas por seres
humanos. Melchior20 ainda ressalta que “os instrumentos utilizados
para medir, por mais precisos que possam parecer, carregam a subjeti‐
vidade do avaliador e, na medida em que se ‘pretende exata’, jamais é
objetiva, pois, o que se está avaliando não são coisas, e sim pessoas”.
Acrescenta, ainda, que enquanto houver uma preocupação maior com
o resultado da avaliação, é difícil pensar em uma avaliação formativa.
Ao abordar a questão da pobreza dos saberes necessários ou a falta de
conhecimento teórico dos professores, como sendo um fator que pode
impedir a prática da avaliação formativa, Melchior21 observe que: “A
avaliação formativa implica, necessariamente, em um trabalho de
interpretação das informações coletadas”. Nesse sentido, a autora
complementa que os progressos da avaliação formativa estão atrelados
aos progressos da pesquisa didática e psicológica: “Um duplo domínio
está envolvido, pois se trata não somente de adquirir uma melhor
compreensão do aluno, mas também do objeto a ensinar”. Para ela, o
professor que não dispõe de modelos operacionais nos dois domínios
anteriormente citados utiliza conceitos parcialmente adequados, o que
interfere negativamente na atividade de interpretação, comprometen‐
do o aspecto formativo da avaliação.
Em relação à falta de variabilidade didática, Melchior22 enfatiza que “a
avaliação formativa se caracteriza pelo fato de adaptar as atividades de
ensino e de aprendizagem em função da interpretação feita a partir das
informações coletadas”. Em outras palavras, o diagnóstico orienta a
96
busca de solução, mas depende da capacidade de o professor planejar
e colocar em prática estratégias de recuperação.
Retornando à pergunta que nos provocou a pensar sobre a questão dos
possíveis obstáculos presentes na prática da avaliação formativa, con‐
cordamos com Melchior23 quando afirma que existem vários outros
fatores que, de uma forma ou outra, interferem negativamente no
processo de avaliação. Mas todos eles estão diretamente ligados ao
fazer pedagógico do avaliador. Logo, o sucesso ou o fracasso da avali‐
ação pode ser creditado à habilidade com que o avaliador a conduz.
A avaliação cumulativa
Essa avaliação, ainda na concepção de Melchior, pode ser considerada
um ponto de parada na trajetória educativa para um balanço e diag‐
nóstico para o reinício da caminhada. Esse é um momento de reflexão,
no qual o professor faz a análise de todos os dados do aluno, recolhi‐
dos no decorrer de um determinado período. A autora cita como
exemplo o fato de que, ao avaliar uma língua, na perspectiva cumula‐
tiva, o professor não deve considerar apenas as questões referentes à
gramática, mas deve considerar também o uso que o avaliando faz
dela na sua comunicação escrita ou oral.
Enfatizamos que a principal característica da avaliação cumulativa é o
fato de ser construída a partir da realização de sínteses das avaliações
realizadas nos diferentes momentos dos processos de ensino‐
aprendizagem. Ela não pode ser reduzida a uma mera aplicação de um
teste, contendo todo o conteúdo acumulado desde o início das ativida‐
des. Ela deve representar o momento atual, com base nos resultados
97
obtidos durante o desenvolvimento, relacionados ao diagnóstico inici‐
al, feito no início do processo. Nesse sentido, Melchior26 observa que
“este conhecimento é significativo e relevante para o aluno? Para que
serve? Ele conseguirá transferir o aprendido para novas situações na
sua vida?” Embora a partir de uma análise superficial possa parecer
simples a tarefa do professor em atribuir um resultado cumulativo,
essa é uma função complexa que exige muita reflexão e ajustes no
decorrer do processo avaliativo.
De modo geral, podemos dizer que a avaliação cumulativa tem a fun‐
ção de verificar se as aquisições visadas pela formação foram realiza‐
das. Através dela o professor faz o balanço das aquisições do discente,
no final da formação, com vistas a expedir, ou não, o “certificado” de
formação. Tal característica aproxima essa avaliação da função admi‐
nistrativa, pois o resultado, que é enviado para a secretaria da institui‐
ção, serve para compor o currículo do avaliando. Lembramos, nova‐
mente, que o produto dessa avaliação é resultante da análise dos de‐
sempenhos e condições evidenciadas pelo avaliando desde o diagnós‐
tico inicial, passando pela avaliação processual, ocorrida durante todo
o processo de ensino e de aprendizagem.
Concordamos com Melchior27: negarmos a necessidade de um momen‐
to terminal da avaliação é o mesmo que ignorarmos a importância da
verificação da produtividade do trabalho. Contudo, salientamos que
não basta constatarmos as dificuldades ou deficiências do discente
durante o processo de ensino‐aprendizagem, é preciso encaminharmos
a solução delas. E, nesse contexto, os registros ganham destaque, pois
são fundamentais para o encaminhamento e o planejamento da etapa
seguinte.
Destacamos como um espaço de intersecção entre as três modalidades
de avaliação abordadas no presente capítulo, de acordo com a concep‐
ção de Melchior28, o fato de todas elas apresentarem os mesmos pres‐
supostos, pois todas consideram que a avaliação serve para melhorar o
processo de ensino‐aprendizagem e deve ser realizada de forma diver‐
sificada, com a utilização de diferentes ferramentas.
No que tange aos pontos de divergência entre as três modalidades
avaliativas, Melchior destaca: o momento em que a avaliação é feita, a
finalidade e o uso que o avaliador faz com seus resultados. Segundo a
autora29:
98
quando se pretende um diagnóstico, a avaliação é feita no início
de uma etapa do processo de ensino‐aprendizagem e necessaria‐
mente seus resultados servem de subsídio para o planejamento da
etapa seguinte;
ao chegar ao final de uma etapa, o professor deve comunicar ad‐
ministrativamente um resultado. Para tanto, necessita ver o aluno
como um todo desde o diagnóstico inicial, passando pelos diferen‐
tes momentos avaliativos, realizados durante o processo e levando
em consideração o momento atual do aluno. Esse resultado deixa
de ser provisório e vai fazer parte do seu currículo escolar.
Embora as três modalidades de avaliação sejam distintas umas das
outras, encontram‐se inter‐relacionadas e se complementam de forma
cumulativa.
Ponto Final
Este capítulo abordou a avaliação sob o ponto de vista do conhecimen‐
to de competências. Inicialmente, foram apresentados os pressupostos
teóricos que sustentam essa nova tendência de avaliação. E, com a
finalidade de aprofundar os estudos sobre o referido tema, discutiu‐se
sobre as diferentes modalidades e finalidades de avaliação presentes
na nova concepção. Ressaltamos que a avaliação, assim, como toda
ação docente é organizada e executada de acordo com a concepção
educacional do professor.
Atividades
1) Como a avaliação é entendida por Melchior (2003)?
2) Quais são as três modalidades de avaliação possíveis, na concep‐
ção de Melchior (2003), e como podem ser diferenciadas?
3) De acordo com Melchior (2003), em qual paradigma a avaliação
diagnóstica busca sustentação?
4) Qual a finalidade da avaliação formativa, segundo Melchior
(2003)?
99
5) Defina a principal característica da avaliação cumulativa, segundo
Melchior (2003).
6) De acordo com a concepção de Melchior (2003), qual o ponto de
intersecção entre as avaliações diagnóstica, formativa e cumulati‐
va? Por quê?
7) Segundo Melchior (2003), quais os pontos de divergência entre as
avaliações diagnóstica, formativa e somativa?
REFERÊNCIAS NUMERADAS
CAPÍTULO 1 28 BOSSA, 2007, p. 57.
29 BOSSA, 2007, p. 54.
1 BOSSA, 2007, p. 38. 30 BOSSA, 2007, p. 54.
2 BOSSA, 2007, p. 39. 31 BOSSA, 2007, p. 57.
3 BOSSA, 2007, p. 39. 32 BOSSA, 2007, p. 58.
4 BOSSA, 2007, p. 39. 33 BOSSA, 2007, p. 58.
5 BOSSA, 2007, p. 41. 34 BOSSA, 2007, p. 58.
6 BOSSA, 2007, p. 42.
7 BOSSA, 2007, p. 42. CAPÍTULO 2
8 BOSSA, 2007, p. 42.
9 BOSSA, 2007, p. 42. 1 BOSSA, 2007, p. 20.
10 BOSSA, 2007, p. 42. 2 BOSSA, 2007, p. 21.
11 BOSSA, 2007, p. 43. 3 BOSSA, 2007, p. 21.
12 BOSSA, 2007, p. 43. 4 BOSSA, 2003, p. 19.
13 BOSSA, 2007, p. 44. 5 BARTHES, 1988, p. 99.
14 BOSSA, 2007, p. 44. 6 BOSSA, 2007, p. 19.
15 BOSSA, 2007, p. 50. 7 BOSSA, 2007, p. 23.
16 BOSSA, 2007. p. 51. 8 BOSSA, 2007, p. 23.
17 BOSSA, 2007, p. 51. 9 BOSSA, 2007, p. 23.
18 BOSSA, 2007, p. 52. 10 MÜLLER, 1984.
19 BOSSA, 2007, p. 52. 11 BOSSA, 2007, p. 23.
20 COLLARES, 1992, p. 25. 12 BOSSA, 2007, p. 23.
21 BOSSA, 2007, p. 52. 13 BOSSA, 2007, p. 23.
22 SCOZ; MENDEZ, 1987, p. 16. 14 BOSSA, 2007, p. 21.
23 BOSSA, 2007, p. 55. 15 BOSSA, 2007.
24 BOSSA, 2007, p. 55. 16 SCOZ, 1991.
25 FAGALI; FERRETTI, 1982, p. 2. 17 RUBINSTEIN, 1992, p. 103.
26 FAGALI; FERRETTI, 1982, p. 3. 18 GOLBERT, 1985, p. 13.
27 BOSSA, 2007, p. 56. 19 BOSSA, 2007, p. 22.
101
20 BOSSA, 2007, p. 24. 2 BOSSA, 2007, p. 87.
21 BOSSA, 2007, p. 24. 3 BOSSA, 2007, p. 87.
22 BOSSA, 2007, p. 25. 4 BOSSA, 2007, p. 88.
23 BOSSA, 2007, p. 123. 5 BOSSA, 2007, p. 89.
24 MÜLLER, 1984. 6 BOSSA, 2007, p. 89.
25 CASTORINA, 1989, p. 15. 7 FAGALI; VALE, 1993, p. 3.
26 BOSSA, 2007, p. 123. 8 FAGALI; VALE, 1993, p. 9.
9 FAGALI; VALE, 1993, p. 9.
CAPÍTULO 3 10 FAGALI; VALE, 1993, p.10.
11 BOSSA, 2007, p. 89.
1 BOSSA, 2007, p. 24. 12 BOSSA, 2007, p. 67.
2 BOSSA, 2007, p. 24. 13 FAGALI; VALE, 1993, p. 10.
3 BOSSA, 2007, p. 24. 14 FERNÁNDEZ, 2001.
4 BOSSA, 2007, p. 25. 15 FONSECA, 2003, p. 20.
5 BOSSA, 2007, p. 66. 16 FONSECA, 2003, p. 20.
6 BOSSA, 2007, p. 44. 17 FONSECA, 2003, p. 25.
7 BOSSA, 2007, p. 67. 18 FONSECA, 2003, p. 25.
8 BOSSA, 2007, p. 32. 19 MACEDO, 2007, p. 63.
9 BOSSA, 2007, p. 27. 20 MACEDO, 2007, p. 65.
10 BOSSA, 2007, p. 27. 21 KOVÁCS, 2007, p. 24.
11 BOSSA, 2007, p. 25. 22 KOVÁCS, 2007, p. 24.
12 BOSSA, 2007, p. 6.
13 BOSSA, 2007, p. 26. CAPÍTULO 5
14 BOSSA, 2007, p. 26.
15 BOSSA, 2007, p. 26. 1 PICHON‐RIVIÈRE, 1998, p. 24.
16 MENDES, 2007. 2 PICHON‐RIVIÈRE, 1998, p. 37.
17 BOSSA, 2007, p. 24. 3 CHAMAT, 1997, p. 17.
18 BOSSA, 2007, p. 25. 4 CHAMAT, 1997, p. 20.
19 BOSSA, 2007, p. 25. 5 CHAMAT, 1997, p. 17.
20 BOSSA, 2007, p. 25. 6 CHAMAT, 1997, p. 18.
21 COSTA, 2000. 7 CHAMAT, 1997, p. 58.
22 BOSSA, 2007, p. 68. 8 FREIRE, 1999, p. 23.
23 BOSSA, 2007, p. 68. 9 FREIRE, 1999, p. 23.
24 BOSSA, 2007, p. 68. 10 FREIRE, 1999, p. 25.
11 FREIRE, 1999, p. 28.
CAPÍTULO 4 12 FREIRE, 1999, p. 29.
13 FREIRE, 1999, p. 32.
1 BOSSA, 2007, p. 87. 14 FREIRE, 1999, p. 37.
102
15 FREIRE, 1999, p. 43. 3 PORTILHO; PAROLIN, 2007, p. 128.
16 FREIRE, 1999, p. 38. 4 PORTILHO; PAROLIN, 2007, p. 128.
17 FREIRE, 1999, p. 102. 5 PORTILHO; PAROLIN, 2007, p. 128.
6 WEISZ, 2003, p. 55.
CAPÍTULO 6 7 BECKER, 2001, p. 15.
8 BECKER, 2001, p. 15.
1 ACKERMAN, 1986, p. 29. 9 BECKER, 2001, p. 15.
2 FERNÁNDEZ, 1991, p. 97. 10 BECKER, 2001, p. 16.
3 FERNÁNDEZ, 1991, p. 97. 11 BECKER, 2001, p. 17.
4 FERNÁNDEZ, 1991, p. 97. 12 BECKER, 2001, p. 18.
5 FERNÁNDEZ, 1991, p. 97. 13 BECKER, 2001, p. 18.
6 FERNÁNDEZ, 1991, p. 91. 14 BECKER, 2001, p. 19.
7 FERNÁNDEZ, 1991, p. 91. 15 BECKER, 2001, p. 19.
8 FERNÁNDEZ, 1991, p. 92. 16 BECKER, 2001, p. 20.
9 FERNÁNDEZ, 1991, p. 92‐94. 17 BECKER, 2001, p. 21.
10 FERNÁNDEZ, 1991, p. 92. 18 BECKER, 2001, p. 22.
11 FERNÁNDEZ, 1991, p. 94. 19 BECKER, 2001, p. 22.
12 FERNÁNDEZ, 1991, p. 95. 20 BECKER, 2001, p. 23.
13 FERNÁNDEZ, 1991, p. 101. 21 BECKER, 2001, p. 23.
14 FERNÁNDEZ, 1991, p. 101. 22 PIAGET, 1977, p. 303.
15 FERNÁNDEZ, 1991, p. 101. 23 BECKER, 2001, p. 24.
16 FERNÁNDEZ, 1991, p. 101. 24 BECKER, 2001, p. 26.
17 FERNÁNDEZ, 1991, p. 101. 25 BECKER, 2001, p. 27.
18 FERNÁNDEZ, 1991, p. 101.
19 FERNÁNDEZ, 1991, p. 101‐102. CAPÍTULO 8
20 FERNÁNDEZ, 1991, p. 102.
21 FERNÁNDEZ, 1991, p. 101‐102. 1 ANTUNES, 2006a, p. 21.
22 FERNÁNDEZ, 1991, p. 102. 2 ANTUNES, 2006a, p. 22.
23 FERNÁNDEZ, 1991, p. 102. 3 ANTUNES, 2006a, p. 22.
24 FERNÁNDEZ, 1991, p. 49. 4 ANTUNES, 2006a, p. 14.
25 CHAMAT, 1997, p. 75. 5 ARMSTRONG, 2004, p. 11.
26 CHAMAT, 1998, p. 75. 6 ARMSTRONG, 2004, p. 18.
27 FERNÁNDEZ, 1991, p. 100. 7 ANTUNES, 2006a, p. 19.
8 ANTUNES, 2006b, p. 25.
CAPÍTULO 7 9 ANTUNES, 2006b, p. 26.
10 ANTUNES, 2006b, p. 23.
PORTILHO; P 1 AROLIN, 2007, p. 127. 11 ANTUNES, 2006c, p. 19.
2 PORTILHO; PAROLIN, 2007, p. 127. 12 ANTUNES, 2006c, p. 21.
103
13 ANTUNES, 2006d, p. 17. 5 MELCHIOR, 2003, p. 44.
14 ANTUNES, 2006d, p. 20. 6 MELCHIOR, 2003, p. 44.
15 ANTUNES, 2006g, p. 17. 7 MELCHIOR, 2003, p. 44.
16 ANTUNES, 2006g, p. 18 8 GRÉGOIRE, 2000, p. 24.
17 ANTUNES, 2006g, p. 19. 9 GRÉGOIRE, 2000, p. 24.
18 ANTUNES, 2006g, p. 19. 10 MELCHIOR, 2003, p. 47.
19 ANTUNES, 2006h, p. 19. 11 PERRENOUD, 1999, p. 50.
20 ANTUNES, 2006h, p. 21. 12 MELCHIOR, 2003, p. 48.
21 ANTUNES, 2006f, p. 19. 13 MELCHIOR, 2003, p. 48.
22 ANTUNES, 2006f, p. 22. 14 MELCHIOR, 2003, p. 48.
23 ANTUNES, 2006f, p. 22. 15 MELCHIOR, 2003, p. 49.
24 ARMSTRONG, 2004, p. 19. 16 HADJI, 2001, p. 21.
25 ANTUNES, 2006a, p. 30. 17 MELCHIOR, 2003, p. 48.
26 ANTUNES, 2006a, p. 30. 18 MELCHIOR, 2003, p. 50.
27 ANTUNES, 2006a, p. 26. 19 MELCHIOR, 2003. p. 51.
28 ANTUNES, 2006a, p. 28. 20 MELCHIOR, 2003, p. 51.
29 ANTUNES, 2006h, p. 20. 21 MELCHIOR, 2003, p. 51.
30 ANTUNES, 2006a. 22 MELCHIOR, 2003, p. 52.
31 ANTUNES, 2006h, p. 27. 23 MELCHIOR, 2003, p. 52.
24 FREIRE; HORTON, 2003, p. 161.
CAPÍTULO 9 25 MELCHIOR, 2003, p. 53.
26 MELCHIOR, 2003, p. 53.
1 MELCHIOR, 2001, p. 21. 27 MELCHIOR, 2003, p. 55.
2 COLL et al., 1998, p. 141. 28 MELCHIOR, 2003, p. 55.
3 MELCHIOR, 2001, p. 23. 29 MELCHIOR, 2003, p. 55.
4 MELCHIOR, 2003, p. 43.
REFERÊNCIAS
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_____. Inteligências múltiplas e seus jogos: inteligência cinestésico‐corporal. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006b. v. 2.
_____. Inteligências múltiplas e seus jogos: inteligência ecológica. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006c. v. 3.
_____. Inteligências múltiplas e seus jogos: inteligência espacial. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006d. v. 4.
_____. Inteligências múltiplas e seus jogos: inteligência lógico‐matemática. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006e. v. 5.
_____. Inteligências múltiplas e seus jogos: inteligências pessoais e inteligência existencial. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2006f. v. 6.
_____. Inteligências múltiplas e seus jogos: inteligências pessoais e inteligência existencial. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2006g. v. 7.
_____. Inteligências múltiplas e seus jogos: inteligência sonora. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006h. v. 8.
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GABARITO
CAPÍTULO 1
1. Segundo Bossa, a preocupação com os problemas de aprendizagem teve sua origem na Europa,
ainda no século XIX, devido ao avanço do capitalismo industrial e aos avanços científicos e de
formulações teóricas, a fim de buscar explicações para as desigualdades inerentes à sociedade
emergente.
2. 2.Os primeiros centros psicopedagógicos foram fundados na Europa, em 1946, pelos médicos
Juliette Favez‐Boutonier e George Mauco. Esses centros tinham direção médica e pedagógica e
buscavam unir conhecimentos da área da psicologia, da psicanálise e da pedagogia, no tratamento
de comportamentos socialmente inadequados de crianças, tanto na escola como no lar, objetivando
a sua readaptação. Esses centros constituíram as primeiras tentativas de articulação entre medicina,
psicologia, psicanálise e pedagogia, na solução dos problemas de comportamento e de
aprendizagem.
3. Mery utilizava o termo psicopedagogia curativa para caracterizar uma ação terapêutica que levava
em consideração tanto os aspectos pedagógicos quanto os psicológicos, no tratamento de crianças
que apresentavam fracasso escolar.
4. Segundo Maurisse Debesse, a pedagogia curativa introduzida no centro de psicopedagogia de
Estrasburgo, França, era conduzida individualmente ou em grupos e era conhecida como o método
que favorecia a readaptação pedagógica do aluno, uma vez que buscava ajudar o sujeito a adquirir
conhecimentos, assim como desenvolver a sua personalidade. Ainda na concepção do autor, a
pedagogia curativa situa‐se no interior daquilo que, hoje, chamamos de psicopedagogia.
5. Segundo Fernández, faz mais de 30 anos que o curso de graduação em psicopedagogia surgiu na
Argentina, tendo sido Buenos Aires a primeira cidade a oferecer uma faculdade de psicopedagogia.
6. a. V
b. F
c. V
d. F
e. V
7. Na década de 1970 foi amplamente difundida, aqui no Brasil, a ideia de que os problemas de
aprendizagem teriam como causa uma disfunção neurológica, não detectável em exame clínico, a
chamada disfunção cerebral mínima (DCM). A autora acrescenta que, além do rótulo DCM, termos
como dislexia, disritmia e outros também foram utilizados pela psicologia individual, para
camuflar os problemas sóciopedagógicos, como, por exemplo, situações de desigualdade de
oportunidades educacionais da época.
8. Segundo Bossa, o primeiro curso regular de psicopedagogia no Brasil foi criado no ano de l979, no
Instituto Sedes Sapientiae, na cidade de São Paulo, por iniciativa da pedagoga e da
psicodramaticista Maria Alice Assimon e Madre Sodré Dória.
107
9. Segundo Bossa, a Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp)é o elemento de organização
formal que dá os contornos à prática psicopedagógica em nosso país, tendo sido responsável pela
organização de eventos de dimensão nacional, bem como por publicações, cujos temas retratam as
preocupações e tendências na área.
CAPÍTULO 2
1. A primeira possibilidade levantada por Kiguel indica que a psicopedagogia surgiu na fronteira
entre a psicologia e a pedagogia, pela necessidade de atendimento para as crianças consideradas
inaptas, dentro do sistema educacional, por apresentarem distúrbios de aprendizagem. Como
segunda possibilidade, ela refere que a psicopedagogia pode ter surgido como uma tentativa de
explicação para o fracasso escolar, por outras vias que não a pedagógica e a psicológica.
2. Pilar‐base; aprendizagem e problemas.
3. A psicopedagogia, segundo Visca, pode ser entendida como uma ação secundária à medicina e à
psicologia, que se desenvolveu como uma área de conhecimento independente e complementar,
tendo como objeto de estudo o processo de aprendizagem e recursos diagnósticos, corretores e
preventivos próprios.
4. Na perspectiva de Kiguel, o objeto central da psicopedagogia, entre os teóricos brasileiros,
estruturou‐se em torno do processo de aprendizagem humana, envolvendo os padrões evolutivos
normais e patológicos e levando em consideração a influência do meio (família, escola, sociedade),
no desenvolvimento.
5. Para Golbert o objeto do estudo da psicopedagogia deve ser entendido a partir dos enfoques
preventivo e terapêutico.
6. e.
7. O objeto de estudo da psicopedagogia, no enfoque terapêutico, segundo Golbert, consiste na
identificação, na análise e na elaboração de uma metodologia de diagnóstico e tratamento voltadas
para as dificuldades de aprendizagem constatadas.
8. O objeto de estudo da psicopedagogia, assim como das demais áreas de estudo da psicopedagogia,
sofreram a influência dos diferentes momentos históricos nas suas produções cientificas, em função
da visão de homem adotada em cada um desses momentos e da sua correspondente concepção de
aprendizagem.
9. Destacamos como ponto comum entre os profissionais brasileiros e argentinos, no que tange ao
entendimento do objeto de estudo da psicopedagogia, o fato de ambos os profissionais,
inicialmente, preocuparem‐se e ocuparem‐se do tema da aprendizagem, tendo como causa e razão
da psicopedagogia os problemas advindos do processo de aprendizagem. Esse foi o eixo condutor
inicial que, segundo Nadia Bossa, trouxe a discussão dos problemas de aprendizagem, de um
território pouco explorado, situado além dos limites da psicologia e da própria pedagogia, para um
campo de estudo que evoluiu, constituindo‐se em uma prática.
10. Na visão de Weiss, a psicopedagogia estuda o aprimoramento das relações com a aprendizagem,
bem como busca uma melhor qualidade na construção da própria aprendizagem de alunos e
educadores.
CAPÍTULO 3
1. e.
3. Segundo Bossa, o trabalho clínico acontece na relação entre um sujeito com sua história pessoal e
sua modalidade de aprendizagem, buscando compreender a mensagem de outro sujeito, implícita
no não‐aprender.
108
4. Segundo Bossa, o psicopedagogo tem que saber como o sujeito se constitui, quais as transformações
por que passa nas diferentes etapas da vida, de que recursos de conhecimento dispõe e de que
forma produz conhecimento e apropria‐se de novas aprendizagens. É preciso ainda que tenha
conhecimento sobre como os sistemas e métodos educativos interferem no processo de ensino‐
aprendizagem, bem como conheça os problemas estruturais que estão intervindo no surgimento
dos transtornos de aprendizagem e no processo escolar. Também é imprescindível que o
psicopedagogo aprenda como os outros aprendem e como ele próprio aprende.
5. No que se refere à prática clínica, Bossa observa que pode ser realizada em instituições educativas,
de saúde ou em consultório, numa perspectiva individual, de grupo ou familiar.
6. a.
CAPÍTULO 4
1. Como psicopedagogos institucionais, de modo geral, segundo Bossa, dialogamos com um
“complexo que se manifesta como um sistema particular”. Nesse contexto, nosso sujeito é a
instituição, com sua complexa rede de relações. A complexidade desse trabalho consiste no fato de
que as diferentes instituições são formadas por várias cabeças, diferentes corações, fazendo parte de
um mesmo organismo, que, para funcionar saudavelmente, exige que todos os órgãos estejam em
sintonia.
2. Na concepção de Fagali e Vale, inicialmente, a psicopedagogia surgiu na instituição escolar a partir
da necessidade de melhor compreender as dificuldades de aprendizagem, voltando o olhar para as
questões relacionadas ao desenvolvimento cognitivo, psicomotor e afetivo, implícitas no processo
de aprendizagem. Gradativamente, a reflexão psicopedagógica foi ampliando suas abordagens e
atuações sobre diagnóstico e, no que se refere às interferências na aprendizagem, à luz do
desenvolvimento da criança, passou a contar, principalmente, com as contribuições oferecidas pela
epistemologia genética e psicologia do desenvolvimento afetivo.
3. Segundo Fagali e Vale, ao romper com o velho paradigma da preocupação exclusiva acerca dos
problemas de aprendizagem, a práxis psicopedagógica na escola divide‐se em duas vertentes: a
psicopedagogia curativa ou terapêutica e a psicopedagogia preventiva.
4. O psicopedagogo, enquanto assessor, na concepção de Bossa, deve orientar a escola sobre o seu
papel, seja no que concerne à reestruturação da atuação da própria instituição junto a alunos e
professores, assim como no que se refere ao redimensionamento do processo de aquisição e
incorporação do conhecimento dentro do espaço escolar, ou encaminhando alunos para outros
profissionais.
5. Na concepção de Fonseca, no contexto hospitalar, o psicopedagogo, enquanto educador, deve estar
capacitado para criar estratégias que favoreçam o processo ensino‐aprendizagem, de forma
contextualizada ao desenvolvimento e experiências daqueles que o vivenciam, a partir de um
planejamento flexível, constantemente reorientado pela situação especial de cada criança.
6. Fazendo uma breve apresentação deste novo espaço no ambiente hospitalar, a experiência nos leva
a ratificar a concepção de Macedo de que a brinquedoteca hospitalar pode ser caracterizada como
sendo um espaço livre onde o indivíduo pode expressar, por meio das brincadeiras e jogos, seus
desejos, fantasias, medos, imaginação, ansiedades, enfim, toda insegurança gerada pela doença e
internação. A brinquedoteca hospitalar, ao possibilitar o ato espontâneo e criativo da criança ou do
adolescente, assim como dos seus acompanhantes, funciona como um espaço transacional, que
contribui para o fortalecimento do vínculo médico – criança – acompanhante e vice‐versa,
amenizando possíveis traumas psicológicos, decorrentes do sofrimento e da ansiedade do paciente.
109
CAPÍTULO 5
1. Na concepção de Pichon‐Rivière, o vínculo é entendido como sendo a maneira particular pela qual
cada indivíduo se relaciona com outro ou outros, criando uma estrutura particular a cada caso e a
cada momento. Essa estrutura é dinâmica, está em contínuo movimento e funciona acionada ou
movida por fatores instintivos, por motivações psicológicas.
2. Segundo a psicanalista Klein, o nível e o tipo de vinculação que a criança estabelece com as pessoas
que a cercam vão determinar o nível e o tipo de vinculação que são estabelecidos com o
conhecimento, repercutindo, assim, na sua aprendizagem escolar.
3. Segundo Klein, a compreensão do processo de construção do conhecimento do indivíduo dá‐se
através de uma investigação detalhada a respeito da natureza das comunicações estabelecidas pela
criança, nas diferentes interações realizadas nos diversos contextos sociais dos quais participa. É ali
que o psicopedagogo vai buscar elementos que lhe possibilitem entender os fatores responsáveis
pela não aprendizagem.
4. Segundo Chamat, todas as patogenias que levam a não aprendizagem e que não são consideradas
como exceções, são originadas no convívio familiar ou escolar e/ou num contexto social mais
amplo.
5. a. Ensinar não é transmitir conhecimento.
b. Não há docência sem discência.
c. Ensinar é uma especificidade humana.
6. Na concepção de Freire, ensinar não é transmitir conhecimento, mas criar as possibilidades para a
sua produção ou a sua construção, pois, embora diferentes entre si, quem forma se forma e re‐forma
ao formar e, quem é formado, forma‐se e forma ao ser formado.
8. O professor Paulo Freire quer, com essa afirmação, demonstrar o caráter humano da prática
educativa, pois antes de ser educador, o professor é gente e, independentemente de sua formação,
não deve esquecer o sentido humano, ou seja, precisa ter sempre em mente o sentido humano, ou
seja, que o aluno, sujeito aprendente, deve ser tratado com tolerância, respeito, carinho e doação.
CAPÍTULO 6
1. A família contemporânea tem criado formas próprias de organização, não mais se limitando à
família nuclear (pai, mãe e filhos dos mesmos pais). Tal fato é consequência dos tempos modernos,
quando os casais separam‐se por diversas vezes, passando a conviver ou não, com os filhos, frutos
das uniões anteriores e da nova relação conjugal.
2. Qualquer mudança na constituição, configuração e funcionamento familiar irá refletir na
subjetividade das pessoas, uma vez que a subjetividade se constrói na relação com o outro, no
campo do humano, dos afetos, das paixões. Contudo, é importante considerarmos que, segundo
Ackerman, por maiores que sejam as transformações na configuração familiar, essa instituição
permanece como unidade básica de crescimento e experiência, desempenho ou falha, contribuindo
assim para o desenvolvimento tanto saudável quanto patológico de seus componentes.
3. Segundo Fernández, a construção de novas aprendizagens se dá através da interação dos quatro
níveis do desenvolvimento humano (orgânico, corporal, intelectual e desejante), salientando que a
construção e a dinâmica de cada um deles sofre a influência direta da família.
4. Na concepção de Fernández, a família do sujeito com problema de aprendizagem pode ser
caracterizada como um bloco indiferenciado, em que cada um pode viver, se tiver um outro de
quem ser ou a quem converter em parasita.
5. Quando o paciente designado é uma criança ou adolescente, segundo Fernández, é importante que
o modo de diagnosticar leve em consideração o olhar‐conhecer a criança através da família.
110
6. Não existe uma receita, teoria ou técnica específica que permita abordar a família como objeto
diagnóstico. Contudo, o envolvimento familiar é de grande utilidade para esclarecer, em menor
tempo e com maior profundidade, a etiologia do sintoma e as características de suas pautas de
manutenção.
7. A ação diagnóstica tem como objetivo revelar o segredo da família e, neste sentido, Fernández
observa que “não há segredo de um só. O segredo age tanto na mente de quem o comunica como de
quem recebe”.
CAPÍTULO 7
1. Segundo Portilho e Parolin, é através do desafio ao educador de rever a própria trajetória histórica,
construída enquanto aprendente, assim como as situações que lhe foram propostas pelas pessoas
que o mobilizaram durante esse fenômeno, que ele poderá repensar estratégias que lhe possibilitem
a retomada de um novo caminho, tanto no aspecto pessoal como na sua práxis enquanto educador.
2. Ao analisarmos as ações de qualquer professor, somos capazes de conhecer as ideias, as concepções
e as teorias que estão por trás delas, mesmo que ele não tenha consciência delas. Para tanto,
devemos observar as concepções que o professor tem sobre conteúdo, processo de aprendizagem e
como deve ser o ensino, características estas implícitas nos atos do educador.
3. A sala de aula, em especial, a relação ensino‐aprendizagem, pode ser representada, na concepção de
Becker, de três formas distintas, por meio de diferentes modelos pedagógicos, a saber: a pedagogia
diretiva, pedagogia não diretiva e pedagogia relacional.
4. A psicopedagogia diretiva está alicerçada na concepção epistemológica do empirismo. Nesse
contexto, o professor considera o aluno como uma folha de papel em branco e acredita que somente
ele pode produzir algum novo conhecimento no aluno. Este aprende se, e somente se, ele ensinar.
Para tanto, o aluno deve fazer silêncio, prestar atenção, ficar quieto e repetir tantas vezes quantas
forem necessárias as atividades propostas, até que o conteúdo que o professor deu entre e fique
aderido na sua mente.
5. Becker descreve a dinâmica da sala de aula, de acordo com esse modelo, da seguinte maneira: o
professor não diretivo deve interferir o mínimo possível na dinâmica da sala de aula, ele é um
auxiliar do aluno. Toda e qualquer iniciativa do aluno é, a priori, considerada boa, instrutiva. Nesse
contexto, o professor acredita que o aluno traz consigo um saber e que precisa fazê‐lo emergir da
consciência. Em outras palavras, o professor acredita que o aluno aprende por si mesmo. Ele pode,
no máximo, despertar o conhecimento que existe no discente. Sobre o papel do professor, Becker
enfatiza que neste modelo pedagógico o educador, ao assumir uma perspectiva apriorista,
inconscientemente, na maioria das vezes, renuncia àquilo que seria a característica fundamental da
ação docente: a intervenção no processo de aprendizagem do aluno.
6. O professor, na abordagem relacional, segundo Becker, acredita que tudo o que o aluno construiu
ou constrói em sua vida serve de degrau para que continue a construir novos conhecimentos. Nessa
perspectiva, a aprendizagem é considerada construção, ação e tomada de consciência da
coordenação das ações e professor e aluno determinam‐se mutuamente. Esse processo constitutivo
não tem fim nem começo absoluto. Nessa perspectiva, o professor acredita que seu aluno é capaz de
aprender sempre.
7. A resposta desta questão é pessoal, mas deve ser embasada no referencial teórico estudado no
presente capítulo.
CAPÍTULO 8
1. A teoria das inteligências múltiplas, segundo Antunes, surgiu no ano de l983, a partir dos estudos
sobre as estruturas da mente, de autoria do psicólogo norte‐americano Howard Gardner, da
Universidade de Harvard.
111
ou de criar produtos que sejam valorizados dentro de um ou mais cenários culturais, tendo como
base científica evidências biológicas e antropológicas.
3. Para Armstrong, inteligência é a capacidade de uma pessoa aprender com suas experiências
passadas, a partir do contexto, das tarefas e das provocações que a vida apresenta, não estando
relacionada com pontuação de QI ou formação acadêmica.
4. Antunes salienta o fato de Gardner não ter denominado esta inteligência de corporal e sim de
cinestésico‐corporal. Para o autor essa é uma diferença significativa, uma vez que a origem da
palavra cinestésica/o refere‐se aos movimentos finos do corpo, às sensibilidades mais sutis, como
aquelas obtidas por meio do tato, paladar, audição e olfato. Logo, a inteligência cinestésico‐corporal
abrange não apenas os músculos, mas o movimento, a agilidade e destreza das ações corporais
amplas.
5. A inteligência ecológica, também conhecida como inteligência biológica ou naturalista, segundo
Antunes, está ligada à competência do sujeito em perceber a natureza, de forma integral e com sua
capacidade de envolver‐se, com profunda empatia nos mundos animal e vegetal, demonstrando
interesse em conhecer hábitos, semelhanças e diferenças, formas, classificação nos diferentes
ecossistemas.
6. A inteligência espacial, segundo Antunes, é observada na capacidade de o sujeito relacionar o
próprio espaço com o espaço que o envolve, percebendo e administrando distâncias, pontos de
referência e localizando‐se geograficamente, bem como revelando a capacidade em perceber
diferentes objetos, transformando‐os ou combinando‐os em novas posições.
7. Segundo Antunes, diferentemente dos demais tipos de inteligências, as inteligências pessoais e
existencial são suscetíveis aos sentimentos e às emoções e suas manifestações conduzem sempre ao
auto e ao heteroconhecimento.
8. Aguçada; alto; elevada e moderado.
9. Inteligência linguística.
10. Na concepção de Antunes, esse novo paradigma em relação à concepção de inteligência, proposto
por Gardner, muda de forma significativa o conceito de escola e de aula. Nesse novo contexto, a
aprendizagem faz parte de um processo interativo de construção e reconstrução interior, no qual as
inteligências (potencial biopsicológico) são utilizadas como recurso essencial para ajudar o sujeito a
resolver problemas, adaptar‐se a novas situações, criar e aprender, sendo a possibilidade de
avanços decorrente da ideia de que os diferentes tipos de inteligências são educáveis e evoluem
progressivamente, desde que devidamente estimuladas. Difere da visão empirista de
aprendizagem, que considera que o professor transfere o conhecimento para o aluno.
CAPÍTULO 9
1. Na concepção de Melchior, a avaliação é entendida como parte do processo de ensino‐
aprendizagem, na qual o professor busca conhecer as competências dos alunos, em vez de
preocupar‐se somente com a aprendizagem dos conteúdos.
2. Melchior diz que existem três modalidades de avaliação e destaca que o critério que as diferencia
uma da outra consiste basicamente no lugar que a avaliação ocupa na ação docente, ou seja,
dependendo da finalidade, do momento e do uso que o professor faz do resultado da avaliação
escolar, na relação ensinar e aprender, ela pode ser diagnóstica, formativa e cumulativa.
4. A avaliação formativa, segundo Melchior, é aquela que está inserida em um projeto educativo
específico para favorecer o desenvolvimento daquele que aprende. Está situada no centro da ação
de formação; por meio dela, o professor busca informações úteis à regulação dos processos de
ensino e de aprendizagem. Segundo a autora, o que se faz ou não com o resultado da avaliação é
que garante o caráter formativo ou não, uma vez que a avaliação só pode ser entendida como
formativa quando os dados coletados forem colocados a serviço de uma relação de ajuda.
112
5. A principal característica da avaliação cumulativa, segundo Melchior, é o fato de ser construída a
partir da realização de sínteses das avaliações realizadas nos diferentes momentos dos processos de
ensino‐aprendizagem. Ela não pode ser reduzida a uma mera aplicação de um teste, contendo todo
o conteúdo acumulado desde o início das atividades. Deve representar o momento atual, com base
nos resultados obtidos durante o desenvolvimento, relacionados ao diagnóstico inicial, feito no
início do processo.
7. No que tange aos pontos de divergência entre as três modalidades avaliativas, Melchior destaca o
momento em que a avaliação é feita, a finalidade e o uso que o avaliador faz de seus resultados.