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Flávio Desgranges
Arte enquanto relevante atividade educacional (em que medida a experiência artística
pode ser compreendida como ação educativa?).
Pesquisa (1992): Há uma relação entre crianças e jovens que se sentem fracassadas
pessoal e socialmente e uma incapacidade de pensar a própria história (dificuldade de se
referir ao passado; articular a linguagem para falar da própria vida; incompreensão
quanto ao sentido da própria existência; dificuldade de se situar no presente e de
projetar-se no futuro; não se sentem autores e sujeitos da própria história).
Crianças que vão ao teatro tem maior facilidade de conceber um discurso narrativo, de
criar histórias (quem sabe ouvir uma história sabe contar histórias), sentindo-se
motivado, quem sabe, a fazer história.
Isto pode contribuir a que ele lance um olhar interpretativo para a vida, exercitando sua
leitura de mundo.
Uma obra de arte pode estimular o espectador a lançar um olhar renovado, estetizado
para o mundo, fruindo a existência como uma experiência artística.
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Mikhail Bakhtin: O sujeito da contemplação ocupa lugar único, seu ponto de vista é
singular e intransferível.
Cada contemplador participa do diálogo com o autor da obra, logo, o sentido desta é
inesgotável.
Diante da cena teatral há uma tensão constante entre espectador e obra, pois num
primeiro momento ele se aproxima da obra, vivenciando-a e, num segundo momento,
afasta-se dela para refletir e compreender (mergulho no universo ficcional e retorno à
própria consciência, formulando um juízo de valor particular acerca dela).
“O todo estético não é algo para ser vivido, mas para ser criado”.
Para regressar à sua consciência, o espectador precisa imprimir uma atitude rítmica que
quebre e descompasse o ritmo da cena (imprimir um ritmo próprio interrompendo o
ritmo da obra e da vida), desvencilhando-se da obra - ato criador é um ato extra-rítmico.
A escritura cênica passa a ser entendida como elemento autônomo do texto, criando
signos visuais e sonoros que desafiam e estimulam a imaginação e a atitude produtiva
do espectador.
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O teatro moderno pesquisa o diálogo da arte com a sociedade, imbuído muitas vezes de
uma vontade democratizadora, convidando o espectador para uma participação efetiva,
entendido como interlocutor vital no ato teatral.
Agora o espectador não está na platéia somente para entender algo que o artista tem
para dizer, mas para elaborar uma interpretação da obra de arte, uma atuação que
solicita sua participação criativa.
A capacidade de analisar uma peça teatral não é somente um talento natural mas uma
conquista cultural, daí a necessidade de formação desses espectador. Tal como os
criadores da cena, os espectadores também precisam aprender e aprimorar o seu fazer
artístico.
Encenador, dramaturgo, teórico do teatro. Inicia suas pesquisas acerca do teatro épico
nos anos 1920.
Brecht realiza uma analogia entre palco e vida social, concebendo um teatro que
revelava suas próprias estruturas (palco como reflexo da própria sociedade que o
engendrava, revelação dos mecanismos constituintes da sociedade burguesa).
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O teatro épico de Brecht estruturava-se como uma pedagogia do espectador. Este,
familiarizado com os elementos da linguagem cênica seria capaz de realizar uma leitura
própria e apurada do discurso teatral.
Relação entre a revelação dos meandros da arte teatral (finalidade didática de sua
exposição) e o desnudamento e crítica aos mecanismos político-sociais da sociedade
capitalista.
Espectador como leitor apurado dos signos teatrais e do discurso cênico, ampliando sua
experiência crítica e criativa (democratização dos meios de produção teatral).
O teatro épico não é criação de Brecht (características épicas já eram apresentadas por
outros encenadores e pelo teatro político da época), mas suas formulações práticas e
teóricas do épico eram bastante particulares. Brecht denominou seu teatro como épico e,
mais tarde, como teatro dialético.
Tensiona o teatro burguês com o teatro proletário, chegando a uma terceira forma que
contém e nega as duas formas, indicando uma nova relação entre teatro e sociedade.
Principais características:
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- História contada por um narrador, em sua descrição dos acontecimentos, quanto pelos
personagens, nos diálogos (caráter fortemente narrativo, com certa distancia entre o
narrador e o mundo narrado).
- Esta distância se estende ao espectador para que este mantenha uma atitude reflexiva
acerca do assunto narrado. O espectador não deve viver o que vivem os personagens,
mas questioná-los.
- autonomia entre as partes da peça (caráter fragmetário): cada cena tem valos em si,
tendo unidade e sendo ligada às outras pela idéia que contém. Não há vinculação de
causa e conseqüência entre as cenas (evolução linear da trama é quebrada, rompendo a
progressão dramática em direção ao desfecho, após o clímax) , daí decorre:
- a fábula é elemento central do teatro de Brecht, pois revela as vicissitudes sociais que
enredam os personagens, contudo, não apenas o texto, mas a encenação como um todo
assume papel narrativo, contando e maneira crítica a história.
- o homem não está entregue à história, mas pode construí-la (o espectador pode
analisar o comportamento do outro em cena, pensando em modificações de conduta ao
personagem, refletindo sobre o condicionamento cotidiano de suas próprias atitudes.
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4. Desconstrução do espectador: teatro dos anos 1960
Final dos anos 1950 até início da década de 1970 – efervescência social e forte
movimento artístico-teatral (lutas pela libertação nacional em países latino-americanos;
busca dos direitos civis das minorias...)
Teatro ligado à atuação política e interessado em rever sua atuação nesta esfera.
A nova sensibilidade sociopolítica caminhava junto com uma nova percepção estética,
com a produção teatral engajada na luta política, voltando seus trabalhos para a
denúncia dos mais diversos tipos de abuso e à reflexão das necessidades da luta.
A experiência artística podia despertar o sujeito para lançar um novo olhar para si e para
o entorno, numa revolução que começaria primeiro no âmbito individual, sem a qual
não seria possível uma mudança autentica na sociedade e no mundo.
O teatro passou a ser feito em espaços não convencionais: ruas, praças, fábricas, igrejas,
escolas, empresas e hospitais (experimentos realizados na esteira da contracultura,
sobretudo nos EUA, com repercussão pelo resto do mundo).
O próprio termo espectador (aquele que assiste) começa a ser questionado, levando ao
extremo as propostas modernistas dos encenadores do início do século XX.
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participantes utilizando-se do acaso, imprevisto, aleatório, sem foco narrativo ou de
significados fechados, usando várias formas de arte).
O teatro se afastava da visão de evento sob total controle dos artistas, abrindo-se para
processos inesperados, somente se definindo com a presença e efetiva atuação dos
espectadores.
A arte teatral viu suas operações formais, suas estruturas fortemente questionadas. Estas
inovações teatrais, com intenso furor na década de 1960, radicalizam a experiência
moderna.
Diminuía-se assim a distancia entre teatro e vida, e alguns grupos mais radicais
buscavam não fazer teatro mas viver teatro, uma arte que substitui a vida e a transforma,
em vez de comentá-la. A arte deveria continuar na vida e não terminar após a sessão.
5. Living Theatre
Um dos grupos mais radicais e contundentes dos EUA. Criadores: Julian Beck e Judith
Malina.
O nome “teatro vivo” vem da oposição ao cenário cultural da época que lhes parecia
momentâneo ou moribundo.
Junção entre arte e vida, vivendo a arte para além das práticas artísticas, invadindo a
própria existência dos participantes.
No plano artístico Malina e Beck ocupavam lugar central no grupo, o que contrariava a
proposta inicial de autonomia e divisão coletiva de tarefas.
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Considerado como “fábrica de ação”, não se propunha refletir sobre a sociedade, mas
substituí-la pela arte, participando ativamente da vida (não a comentando). Todas as
atitudes eram vistas como teatrais, seja na sala de teatro ou fora dela.
Buscavam uma arte imediata, que tirasse o espectador de seu estado de estupor,
provocando um envolvimento visceral do espectador. Engajar o espectador intelectaul,
imaginativamente, mas sobretudo, fisicamente, provocando-o sensorialmente, buscando
uma comunhão plena entre palco e platéia.
O teatro não está acima, nem é uma imitação da realidade. Utilizavam a ambigüidade
entre realidade e ficção para criar uma insegurança, tensionando as barreiras que
separavam um universo do outro.
Em 1970 o grupo vem ao Brasil, em plena ditadura militar, sofrendo com a repressão e a
prisão de seus integrantes.
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6. Teatro do Oprimido
Nesta prática teatral, cada espectador é considerado um ator em potencial, o que não é
natural, mas precisa ser desenvolvido, cuidadosamente preparada, visando um
participante em estado de alerta, pronto pra agir.
Depois dos exercícios dramáticos, o participante realiza propostas em que pode intervir
diretamente nas cenas apresentadas, com o objetivo de que, transformando-se em
protagonista da ação dramática, possa utilizar na vida as ações que ensaiou na cena.
A história individual ou fato relatado repercutirá nos demais quando os participantes são
do mesmo agrupamento social: “a opressão de um é a opressão de todos”.
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Teatro-jornal: uma notícia é dissecada e apresentada sob a forma teatral.
Questões críticas:
É fundamental saber a que público se dirige o evento, para que a cena encontre
ressonância na platéia, com temas que engajem o espect-ator, percebendo que sua vida
está de fato em jogo. O envolvimento do grupo com a questão tratada é fundamental.
Quando o público mantém certa distancia ao tema, a falta de desafios concretos
transforma a experiência em exercício de estilo e a proposta não vai muito longe.
Os grupos, pela imediatez na relação com so participantes, acabam por engendrar cenas
pouco elaboradas artisticamente, o que acarreta perda do caráter poético das
formulações teatrais, enfraquecimento da potencialidade estética.
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Nos anos 1970 o próprio Brecht afirmou que as peças didáticas e não as épicas
propunham uma nova compreensão de seu teatro, centrado na participação efetiva do
espectador, um evento em que os integrantes seriam ao mesmo tempo observadores e
atuantes.
Assim a peça didática não podia mais ser estudada como um teatro de espetáculo e seu
caráter pedagógico estaria fundamentado na proposição participativa dos integrantes do
evento. Os aprendizes são aqueles que estão jogando e participando, não o público.
A peça didática ensina quando nela se atua, não quando se é espectador (não há
necessidade de espectadores a priori, embora sua presença não seja proibida). Não se
tratava de um teatro voltado para espectadores mas para atuantes, estes atuam para si
mesmos, visando seu próprio aprendizado.
Inicialmente as peças didáticas foram pensadas para serem trabalhadas por crianças e
jovens nas escolas ou por grupos de operários, encontrando outros espaços e outro
público possível ao teatro, visando a sua democratização, com amadores, rompendo
coma organização artística tradicional e buscando novos meios de produção teatral.
Estas peças deveriam ir ao encontro de novas relações, para quem o teatro fosse de fato
necessário, constituindo-se em importante espaço de reflexão e atuação diante das
questões de seu tempo.
Segundo Brecht as crianças apreendem tão bem como os adultos tudo o que merece ser
compreendido.
Reiner Steinweg defende a revisão das peças didáticas pois estas sempre foram
desprezadas pelos especialistas devido à crueza e à rigidez da ação dramática, sobretudo
quando comparadas com o refinamento estético do teatro épico.
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O dramaturgo alemão concebeu a peça didática como um modelo de ação (moldura que
deve ser preenchida de diversas maneiras pelos atuantes), não como uma obra acabada,
sendo a participação dos atuantes fundamental no seu processo de construção.
Apresentações públicas da peça didática não constituem seu objetivo último, o que não
impede que haja apresentações para a platéia. Neste caso também poderiam ser
pensadas formas e estratégias de participação dos espectadores.
Não é casual a revisão da peça didática e sua importância nos anos de 1970, quando
estavam em curso investigações teatrais que buscassem relações diferenciadas com os
espectadores, propondo experiências artísticas radicais.
A peça didática pode contribuir, portanto, para os estudos teatrais no âmbito das
propostas participativas que colocam o espectador como atuante, bem como ampliando
a relação entre teatro e pedagogia.
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Na investigação proposta por estes jogos, o prazer de jogar se aproxima do prazer de
aprender a fazer e a ver teatro, estimulando os participantes a organizar um discurso
cênico apurado, explorando a utilização dos diferentes elementos que constituem a
linguagem teatral.
Nas avaliações das cenas também podem ser enfocadas questões relativas à vida social
que tenham surgido nas improvisações, bem como quanto às resoluções artísticas,
aprimorando a capacidade do grupo em articular um discurso cênico.
Estes jogos implicam um processo coletivo de tomada de decisões, seja em relação aos
rumos do jogo, seja para avaliar os jogos realizados.
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9. Jogo Dramático e a construção do discurso
Para Peter Slade: Não é entendido como uma atividade propriamente artística, mas um
comportamento natural do ser humano, referindo-se às brincadeiras infantis onde está
presente a dramaticidade, experimentando e apreendendo diversos aspectos da vida
social.
2 espécies de jogo infantil: jogo projetado (a criança brinca com os objetos e os fazem
criar vida) e jogo pessoal (a própria criança se torna as pessoas imaginadas, animais ou
coisas).
O jogo dramático infantil pode ser organizado e proposto pelos adultos com objetivos
educacionais dirigidos, mas é importante respeitar e estimular esses jogos, deixando as
crianças criarem seu próprio jeito de realizá-los.
O coordenador deve estar atento para que haja um caráter estético na prática
desenvolvida, sem, contudo, reproduzir os padrões estéticos da comunicação de massa.
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O teatro como análise de gestos e atitudes, não como reprodutor irrefletido de
comportamentos usuais.
O Jogo Dramático não está subordinado ao texto, o qual é substituído pela palavra
improvisada. O jogo está calcado numa linguagem global que utiliza diferentes signos
visuais e sonoros (sendo a palavra mais um elemento). Cabe destacar aos participantes
que a linguagem teatral não é só verbal, sendo constituída de inúmeros elementos de
significação.
A cena teatral possibilita que o participante tome consciência dos diversos signos que
nos são bombardeados diariamente nos meios de comunicação contemporâneos,
despertando um olhar crítico sobre eles e permitindo uma leitura própria e seletiva dos
mesmos. Essa apreensão crítica pode ser re-utilizada nas elaborações cênicas das
oficinas.
Nas sessões de Jogo Dramático deve vigorar a liberdade de criação, às idéias dos
participantes, valorizando variedades de temas e de formas de resolução dos jogos
propostos. O coordenador deve prezar por um espaço aberto aos diferentes pontos de
vista e tratamentos cênicos, havendo uma tensão necessária entre a liberdade de criação
e a interferência crítica do coordenador do processo.
Não há expectativa de voltar o trabalho para um resultado final, uma montagem. Esta
pode ocorrer, mas torna-se fundamental que as resoluções cênicas apresentadas no
evento expressem a investigação do grupo, não as do coordenador. Este pode e deve
participar das resoluções artísticas do grupo, mas sem sufocar as iniciativas e criações
dos participantes.
O coordenador deve, na análise das cenas, apoiar-se nos três principais elementos que
compõem a cena: espaço, situação e personagem, estimulando o grupo a pensar e se
apropriar desses aspectos fundamentais. Ele deve convidar o grupo a descobrir os
detalhes do ambiente que está concebendo na improvisação (exploração do espaço
cênico), definir melhor alguns momentos da história (como se apresentar teatralmente
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uma situação), discutir a função de cada um dos personagens envolvidos (construção de
personagens).
Por não ser um sistema fechado, cabe ao coordenador elaborar uma sistematização para
o processo de aprendizagem, para que o professor não se perca na proposição de
exercícios aleatórios.
O coordenador deve guiar também os debates e análises, sobretudo nas fases iniciais,
para que o grupo perceba com clareza o que importa na avaliação dos jogos, evitando,
assim, que a avaliação se restrinja a apenas um determinado foco de investigação ou que
o debate seja confuso, disperso e pouco produtivo.
Contudo o coordenador deve guiar sem impor sua avaliação, pois estará impedindo que
o grupo tenha na experiência a apropriação da análise das cenas, efetivando a produção
coletiva de conhecimentos.
Jogo Teatrais : Viola Spolin, EUA, a partir de 1940. Forte influência do estudo de
Stanislávski sobre as ações físicas enquanto procedimento de formação de atores.
Spolin toma como base os jogos de regras, criando um sistema de exercícios para o
treinamento do teatro, liberando a atuação de crianças e amadores de comportamentos
rígidos e mecânicos em cena. Os jogos de improvisação estimulam o participante a
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construir um conhecimento próprio acerca da linguagem teatral, onde o indivíduo, junto
com o grupo, aprende a partir da experimentação cênica e da análise crítica do que foi
realizado.
Este sistema descarta afigura autoritária de um professor que detém o saber, propondo
uma dinâmica educacional em que o professor trabalha em conjunto com o grupo,
participando e coordenando o processo de aprendizado que deve ser prazeroso.
Cada jogador escolhe a autodisciplina através das regras do jogo, sem alguém para
agradar ou dar concessões, podendo concentrar toda sua energia no jogo.
Este método trabalha os participantes nos âmbitos intelectual, físico e intuitivo, dando
importância também à capacidade intuitiva, capaz de proporcionar conquistas de
resoluções cênicas inesperadas e surpreendentes. Assim, é importante a instauração no
grupo de um ambiente favorável à livre experimentação.
O foco de um jogo não é seu objetivo, mas o ponto de concentração dos jogadores a ser
apreendido em relação ao aspecto da linguagem a ser investigado.
São possíveis várias respostas diferentes e não há certo ou errado. Várias possibilidades
devem ser experimentadas, envolvendo o grupo na busca por resoluções cabíveis, nunca
definitivas. Os jogadores não partem em busca de uma verdade cênica previamente
construída, mas partem em busca da produção de conhecimento sobre o teatro e seus
elementos.
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O jogador deve corporificar, não sentir; ver e não imaginar; comunicar e não interpretar;
mostrar e não contar. Ou seja, tornar real e não fazer de conta, buscando respostas
orgânicas para o problema e não gestos pensados que queiram explicar a situação.
Conceitos como bom e mau, certo ou errado não participam deste esquema de
avaliação, o qual se dá de maneira objetiva, com o coordenador lançando questões para
o grupo baseadas no foco de investigação. Eliminando as críticas pessoais e julgamento
de valores, dissolve-se a necessidade de uma liderança dominante e autoritária.
Um crítica a este sistema é a pouca atenção dada aos aspectos político-sociais presentes
nos acontecimentos criados pelos participantes, uma vez que a avaliação das cenas deve
ser guiada pelo foco de investigação definido no exercício.
A educação do participante passa também por sua formação crítica, ampliando sua
percepção do mundo e de sua possibilidade de atuação efetiva na vida social, olhando
para a realidade de novas maneiras, havendo em Spolin, portanto, a preocupação com a
transformação total do indivíduo, pensando o mundo de forma distinta.
O coordenador deve atentar para que os comentários acerca das cenas não fiquem
muito vagos, ou excessivamente pessoais, o que tornaria a avaliação pouco produtiva.
Aqui centrar a proposta de análise no foco ajuda não a restringir, mas a centrar os
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comentários do grupo, tornando claro o processo gradual e cumulativo de
aprendizagem.
O sistema de Spolin pretende regular e abranger a atividade teatral mas existe também
para ser superado e negado enquanto conjunto de regras.
Na década de 1990, Beatriz Cabral traz o Drama para o Brasil como relevante método
de ensino, utilizando-se de forma particular de jogos de improvisação teatral.
Pré-texto: fase inicial fundamental que tem como objetivo inserir o grupo na situação
dramática, além de definir o contexto da narrativa que será explorada no decorrer do
processo.
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apresentar os antecedentes da ação e propor o engajamento do grupo nas tarefas e papéis
da narrativa. Delimita, assim, todo o processo e impede que o coordenador se afaste do
foco de investigação ou se perca em exercícios que não acrescentem a narrativa.
Episódios: fragmentos e eventos que compõem a estrutura narrativa, através dos quais
se desenvolve a narrativa. Convidam e desafiam o grupo a se relacionar com as novas
situações propostas, mantendo o interesse e o envolvimento dos participantes, além de
dar continuidade à construção da história e possibilitar a exploração teatrl dos elementos
da trama. São realizados em seqüência com relação estreita entre uma atividade e outra,
num desenvolvimento investigativo.
Destacam-se as atividades:
O Drama não é uma prática rígida, sendo a ação do coordenador central, o que levanta o
questionamento até que certo ponto os participantes podem se apropriar da linguagem
teatral, efetivando a construção de um discurso cênico apurado.
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Envolvendo-se na evolução dramática e nas peripécias dos personagens, questiona-se a
pouca atenção dada às resoluções cênicas e no aprimoramento dos elementos de
significação teatral. O grupo não seria estimulado a refletir acerca dos aspectos próprios
do discurso cênico.
A falência das reformas coletivas fazem com que o indivíduo volte-se para si mesmo,
para as descobertas de experiências e transformações pessoais, numa busca narcisista de
identidade.
A arte moderna promovia a pluralidade interpretativa por parte do espectador, uma obra
de arte aberta, com a necessária participação do espectador numa recepção
personalizada. A arte contemporânea radicaliza esta proposição de autoria do
espectador, uma vez que não somente a significação fica ao seu encargo, mas também a
própria escritura artística.
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facilmente apreendida, logo não há uma obra, mas possíveis obras a serem concebidas
pelo receptor.
O que antes era compreendido por unicidade, agora o é por diferenciação, onde o
espectador relaciona as partes não com o todo, mas os fragmentos entre si, suas relações
possíveis, sem compor necessariamente uma totalidade. É proposto ao espectador que
transite entre os vários fragmentos de uma não-obra, pedaços decompostos, onde cada
narrativa suscita a renarrativização das anteriores. Cada pedaço redimensiona,
recontextualiza o outro.
A encenação assume-se como prática específica, como escritura cênica que não precisa
ser comandada pela lógica dramática, inaugurando novas relações entre texto e cena. O
fio condutor não é mais uma historia a ser apresentada, mas está focada a relação com o
espectador no multifacetado jogo de linguagem estabelecido pelos elementos que
compõem a cena. Há um processo inconcluso, onde a participação do espectador é
fundamental para elaborar aspectos constitutivos da obra, em processo, inacabada.
Os pedaços e fragmentos não se ligam por relações causais, mas por livre associação,
ou por relações de necessidades, desejos, vontades, tensões, contralances inesperados.
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A produção teatral contemporânea é marcada pela multiplicidade e pela
heterogeneidade, pela explosão das narrativas. A obra tem um caráter dialógico,
requisitando a efetiva participação do receptor enquanto co-criador do evento, havendo,
portanto, um viés educacional da experiência artística participativa.
O artista está menos preocupado com o entendimento que a obra suscita no espectador
do que com a provocação que lhe faz. A superdosagem de informações conduz a uma
apatia bem informada.
O caráter pedagógico do teatro deixa de ter um valor formador para ter um valor
performático, ligado à do espectador de formular elaborações estéticas próprias,
inesperadas, num processo de provocação dialógica, reagindo aos lances propostos,
fazendo jogadas inventivas, novos jogos de linguagem articulados à imaginação da
platéia. O estímulo à reflexividade provoca a capacidade inventiva dos espectadores.
A atitude do receptor em relação à obra teatral possui 3 fases: no primeiro momento, ele
reconhece o signo; no segundo, decodifica o signo; no terceiro, interpreta o signo,
relacionando-o aos demais signos visuais e sonoros presentes na encenação.
Muitas vezes o público pergunta ao artista o que quer dizer este ou aquele signo, qual a
“mensagem” que o artista quis passar, como se não coubesse aos próprios espectadores
criar respostas pessoais às provocações semióticas, efetivando o papel que lhes cabe no
evento, padecendo de falta de autonomia.
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A instituição escolar muitas vezes não estimula o indivíduo a empreender leituras
críticas e produtivas acerca dos eventos artísticos e das situações da vida. É difícil que
alguém desacostumado a produzir uma interpretação pessoal de seu cotidiano
espetacularizado empreenda atos autorais e produtivos quando confrontado com a
prática teatral.
Para isso podem ser usadas estratégias como debates, curós de formação aos professores
e alunos, encontros para reflexão antes e depois do espetáculo, dinamizando a recepção
da obra.
A relação com os professores pode lhes atentar que o teatro pode ser um espaço
prazeroso de produção efetiva dos conhecimentos, podendo mediar o encontro de seus
alunos com esta arte.
O espectador deve ser estimulado a fazer uma leitura transversal dos espetáculos,
percebendo que não apenas o texto tem algo a comunicar numa encenação (leitura
horizontal), valendo-se de diversos signos que, justapostos, formam uma composição no
espaço, conjunto complexo de signos que se renova a cada instante. Neste jogo de
linguagem, o espectador é desafiado a decodificar e interpretar cada elemento.
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