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O MOVIMENTO ZEITGEIST
UMA NOVA FORMA DE PENSAR

(PARTE 1)
2

Sumário

Prefácio...................................................................................................................3

1 Visão geral..........................................................................................................6
2 A Visão cientifica do mundo.............................................................................16
3 Buscando soluções...........................................................................................24
4 Lógica vs psicologia...........................................................................................29
5 A questão da unidade humana.........................................................................37
6 O argumento final: a natureza humana...........................................................44
7 Definindo saúde pública...................................................................................52
8 História da economia........................................................................................68
9 Eficiência de mercado vs eficiência técnica....................................................104

Os capítulos restantes ainda estão sendo traduzido pelo pessoal do movimento


Zeitgeist Brasil. Assim que estiver tudo pronto, disponibilizo na net. Espero que
todos enviem cópias a seus amigos.

Samuel Lima ( Barbalha – CE)

16/12/2014
3

Prefácio

"O resultado de qualquer pesquisa séria só pode ser o de fazer surgir duas perguntas
onde antes só havia uma."

- Thorstein Veblen -

Origem do nome:

"O Movimento Zeitgeist" (MZ) é o atual identificador do movimento social descrito


nos ensaios a seguir. O nome não tem nenhuma relação histórica significativa com
qualquer especificidade cultural e não deve ser confundido/associado com qualquer
outra coisa previamente conhecida com um título similar. Na verdade, o título é
explicitamente baseado no significado semântico dos termos em si. O termo
"Zeitgeist" é definido como o "clima intelectual, moral e cultural geral de uma
época." O termo "Movimento" implica simplesmente em um "movimento" ou
mudança. Por isso, o Movimento Zeitgeist (MZ) é uma organização que luta por
mudanças no clima intelectual, moral e cultural dominante da época.

Estrutura do Documento:

O texto a seguir foi preparado para ser o mais conciso e abrangente possível. Trata-
se de uma série de ensaios ordenados por assunto de maneira a embasar um
contexto mais amplo. Enquanto cada ensaio foi concebido para ser avaliado em seu
próprio mérito, o verdadeiro contexto consiste na forma como cada questão
trabalha para sustentar uma linha de pensamento mais ampla, no que diz respeito à
organização mais eficiente da sociedade humana. Aqueles que lerem estes ensaios
de forma linear notarão que existe uma boa quantidade de sobreposição de certas
ideias. Isso é proposital, pois tal repetição e ênfase é considerada útil, já que alguns
dos conceitos soarão muito estranhos para aqueles sem qualquer exposição prévia
aos mesmos.

Além disso, uma vez que só será possível manter a compreensão de cada assunto e
suas inter-relações através de uma grande exposição de detalhes, um grande
esforço foi feito para referenciar pesquisas de terceiros ao longo de cada ensaio,
através de notas de rodapé e anexos, permitindo ao leitor um acompanhamento
para um estudo mais aprofundado, conforme surgir o interesse.

O Organismo do Conhecimento:

Como acontece com qualquer pesquisa que é apresentada, estamos lidando com
compostos de dados gerados em série. A observação, sua avaliação, documentação
e integração com outros conhecimentos, existentes ou pendentes, é a maneira pela
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qual todas as ideias notáveis surgem. É importante compreender esta continuidade


no que diz respeito à maneira como pensamos sobre o que acreditamos e o porquê
dessa crença, pois o mérito da informação está sempre separado da pessoa ou
instituição que a comunica ou representa. A informação só pode ser avaliada
corretamente quanto à sua prova ou falta dela por meio de um processo sistemático
de comparação com outra evidência física verificável.

Da mesma forma, essa continuidade também implica que não pode haver uma
"Origem" empírica das ideias. Do ponto de vista epistemológico, o conhecimento é
gerado, processado e expandido principalmente através da comunicação entre
nossa espécie. O indivíduo, com suas propensões e experiências de vida
inerentemente diferentes, atua como um filtro personalizado de processamento
pelo qual uma determinada ideia pode ser transformada. Coletivamente, nós,
indivíduos, estamos abrangidos naquilo que poderia ser chamado de uma "Mente
de Grupo", que é o processador social de ordem maior pelo qual os esforços
individuais idealmente se unem. O método tradicional de transferência de dados
através da literatura, da partilha de livros de geração para geração, tem sido um
caminho notável desta interação da Mente de Grupo, por exemplo [1].

Issac Newton talvez tenha declarado melhor essa realidade com sua frase: "Se vi
mais longe do que os outros, foi por estar de pé sobre os ombros de gigantes". [2]
Essa noção é trazida aqui a fim de focar o leitor na consideração crítica dos dados - e
não em uma suposta "fonte" - já que, na verdade, empiricamente falando, não
existe tal coisa. O reconhecimento de uma fonte só se faz relevante diante dos
padrões culturais, temporais e tradicionais, como nos créditos literários de um livro-
texto para referenciar uma futura pesquisa. Não há declaração mais errada do que
esta: "Esta é a minha ideia." Tais noções são subprodutos de uma cultura material
que tem sido reforçada através da busca de recompensas materiais, usualmente
através do dinheiro, em troca da ilusão de “propriedade” das suas criações. Muitas
vezes, uma associação com o ego se sobressai quando um indivíduo reivindica
prestígio sobre seu “crédito” por uma ideia ou invenção.

No entanto, isso não significa excluir a gratidão e o respeito por aquelas pessoas ou
instituições que demonstraram dedicação e perseverança em relação à expansão do
conhecimento em si, nem mesmo significa diminuir a importância necessária
daqueles que alcançaram um "status" de especialista, de “expert” em um campo
particular. As contribuições de pesquisadores, pensadores e engenheiros brilhantes,
como R. Buckminster Fuller, Jacque Fresco, Jeremy Rifkin, Ray Kurzweil, Robert
Sapolsky, Thorstein Veblen, Richard Wilkinson, James Gilligan, Carl Sagan, Nicola
Tesla, Stephen Hawking e muitos, muitos outros pesquisadores, do passado e do
presente, serão referenciadas e terão suas fontes indicadas neste texto, servindo
como parte de um mosaico maior que você está prestes ler. Expressamos uma
5

enorme gratidão em relação a todas as mentes dedicadas que estão trabalhando


para contribuir com um mundo em aperfeiçoamento. No entanto, mais uma vez,
quando se trata do nível de compreensão, a informação em si não tem origem,
lealdade, preço, ego e nem viés. Ela simplesmente se manifesta, auto-corrige e
desenvolve, como um organismo em si mesmo, através da nossa "Mente de Grupo"
coletiva, para a qual todos nós somos, invariavelmente, um veículo componente.

Entendido isso, "O Movimento Zeitgeist" não reivindica a criação de qualquer ideia
que promove e é melhor classificado como uma instituição de ativismo/ensino que
trabalha para amplificar um contexto onde as descobertas científicas
existentes/emergentes possam adequar-se como um imperativo social.

Notas de rodapé para "Prefácio"


[1] Em sua obra "Cosmos", Carl Sagan, referindo-se à destruição da Biblioteca de Alexandria, célebre como
a maior e mais significativa biblioteca do mundo antigo, afirma: “Foi como se a civilização inteira tivesse se
submetido a uma cirurgia cerebral auto aplicada, e a maioria de suas memórias, descobertas e paixões
foram extinguidas irreversivelmente.” Cosmos, Carl Sagan, Ballantine Books, New York, 1980, Chapter XIII,
p279.

[2] The Correspondence of Isaac Newton, Volume 1, editado por HW Turnbull, 1959, P416
6

1. Visão Geral

"Nem as grandes estruturas políticas e financeiras de poder do mundo, nem os


profissionais cegados pela especialização, nem a população em geral percebem que
... agora é altamente viável cuidar de todos na Terra em um "padrão de vida maior
que qualquer outro já conhecido". Isso já não deve ser mais você ou eu. O egoísmo é
desnecessário e, doravante, não mais se justifica através da sobrevivência. A guerra
está obsoleta."[3]

- R. Buckminster Fuller -

Sobre

Fundado em 2008, o Movimento Zeitgeist (MZ) é um grupo de defesa de


Sustentabilidade, que opera através de uma rede de Capítulos Regionais, Equipes de
Projeto, eventos públicos, comunicações pela imprensa e operações de caridade.

O ativismo do MZ é explicitamente baseado em métodos não-violentos de


comunicação com o foco principal em educar o público sobre as verdadeiras fontes
de muitos problemas pessoais, sociais e ecológicos comuns hoje em dia, aliado ao
vasto potencial de resolução de problemas e melhoria da humanidade que a ciência
e a tecnologia têm alcançado - mas que ainda não é aplicado devido a barreiras
inerentes ao sistema social atual.

Embora o termo "ativismo" seja correto pelo significado exato do termo, o trabalho
de sensibilização do MZ não deve ser interpretado como o tradicional "protesto de
ativistas", tais como vemos historicamente. Em vez disso, o MZ se expressa através
de projetos educacionais e racionais direcionados, os quais não trabalham para
impor, ditar ou convencer cegamente - mas para pôr em ação uma linha de
pensamento que é, logicamente, auto-concretizável quando as considerações
causais da "sustentabilidade" [4] e "saúde pública"[5] são referenciadas a partir de
uma perspectiva científica.

No entanto, a busca do MZ é ainda muito semelhante a dos Movimentos dos


Direitos Civis do passado, onde notamos a opressão realmente desnecessária,
inerente à nossa ordem social atual, que estrutural e sociologicamente restringe o
potencial e bem-estar humanos da grande maioria da população mundial, sem
mencionar que sufoca outras melhorias em detrimento de seus próprios métodos já
consagrados.

Por exemplo, o modelo social atual, ao mesmo tempo que perpetua enormes níveis
de ineficiência econômica generalizada corrosiva, como será visto em ensaios
posteriores, também intrinsecamente beneficia um grupo econômico ou "classe" de
7

pessoas em detrimento de outro, perpetuando privações relativas e desigualdades


tecnicamente desnecessárias. Isso poderia ser chamado de "fanatismo econômico",
dadas as suas consequências, e não é menos insidioso do que a discriminação
baseada em gênero, etnia, religião ou credo.

No entanto, este "fanatismo" inerente é realmente apenas uma parte de um quadro


maior, que poderia ser chamado de "violência estrutural" [6], iluminando um amplo
espectro de sofrimento, desumanidade e privação "incorporados" que são
simplesmente aceitos hoje como "normalidade" pela maioria mal informada. Este
contexto de "violência" se estende muito além e mais profundamente do que
muitos consideram. O escopo de como nosso sistema socioeconômico
desnecessariamente deprecia a nossa saúde pública e inibe nosso progresso hoje só
pode ser reconhecido claramente quando tomamos uma perspectiva "técnica" ou
"científica" imparcial dos assuntos sociais, superando as nossas afinidades
tradicionais, muitas vezes limitantes.

A natureza relativa da nossa consciência cai frequentemente como vítima dos


pressupostos de "normalidade" onde, digamos, a privação e a pobreza crescentes de
mais de 3 bilhões de pessoas [7] são vistas como um estado social "natural"
inalterável por aqueles que não estão cientes da quantidade de comida de fato
produzida no mundo, qual sua destinação e o seu desperdício ou quais são as
possibilidades técnicas, eficientes e abundantes, de produção alimentícia dos dias
atuais.

Esta "violência" invisível se estende aos Memes culturais [8], onde as tradições
sociais e sua psicologia podem, sem intenção maliciosa direta, resultar em
consequências prejudiciais a um ser humano. Por exemplo, há culturas religiosas no
mundo que optam por evitar qualquer forma de tratamento médico convencional.
[9] Enquanto muitos poderão argumentar os parâmetros morais ou éticos do que
significaria para tal cultura a morte de uma criança em decorrência de uma doença
comum, que poderia ter sido tratada se as ferramentas científicas modernas fossem
autorizadas, nós, por nossa vez, pelo menos concordaríamos que a morte dessa
criança, na verdade, foi causada não pela doença em si mesma, mas pela condição
social que não permitiu o correto emprego da solução.

Como um exemplo mais abrangente, uma grande quantidade de estudos sociais já


foi feita sobre o tema "Desigualdade Social" e seus efeitos sobre a saúde pública.
Como será discutido mais em ensaios posteriores, existe uma vasta gama de
problemas de saúde física e mental que parecem ter nascido dessa condição,
incluindo tendências para violência física, doenças cardíacas, depressão, deficiência
educacional e muitas, muitas outras manifestações - com consequências
verdadeiramente sociais, que afetam a todos nós. [10]
8

O ponto essencial aqui é que quando damos um passo para trás e consideramos
entendimentos recentes de causalidade, que claramente têm produzido efeitos
prejudiciais sobre a condição humana, mas seguem intocáveis desnecessariamente
devido a tradições pré-existentes estabelecidas pela cultura, nós fatalmente somos
levados ao contexto de "direitos civis" e, portanto, sustentabilidade social.

Este novo Movimento de Direitos Civis trata da partilha do conhecimento humano e


da nossa capacidade técnica não só para a resolução dos problemas, mas também
para facilitar um sistema social estruturado cientificamente, que, na verdade,
otimizaria o nosso potencial e bem-estar. Qualquer subtração criaria um
desequilíbrio e uma instabilidade social, já que negligenciar tais questões seria
simplesmente uma forma oculta de opressão.

Então, voltando ao contexto geral, o MZ trabalha não só para a conscientização de


tais problemas e suas verdadeiras raízes sistêmicas - daí uma lógica de resolução -,
mas também para expressar o nosso potencial, além das soluções diretas dos
problemas, em melhorar muito a condição humana em geral, resolvendo problemas
que, de fato, ainda não foram sequer cogitados. [11]

O ponto de partida é dado pela integração da própria natureza do raciocínio


científico, onde o estabelecimento de uma linha de pensamento empírico tem
precedência sobre todo o resto. Uma linha de pensamento pela qual a organização
social como um todo pode encontrar um contexto mais preciso de sustentabilidade,
em uma escala nunca antes vista, através de um reconhecimento (e aplicação) do
Método Científico.

Foco

As amplas ações do MZ poderiam ser resumidas como Diagnosticar, Educar e Criar.

Diagnosticar

Diagnóstico é "a identificação da natureza e da causa de alguma coisa". Para


diagnosticar corretamente a condição causal dos vastos problemas sociais e
ambientais que temos hoje não basta queixar-se deles ou criticar as ações de
pessoas ou instituições particulares. Um verdadeiro Diagnóstico deve buscar a causa
raiz de um problema e trabalhar neste nível para buscar a sua resolução.

O problema central hoje é que muitas vezes há o que poderia ser chamado de um
"quadro de referência truncado", onde a falta de visão e o erro diagnóstico de uma
determinada consequência persistem. Por exemplo, a solução tradicional atual para
a reforma do comportamento humano pela prática de muitos dos chamados
"crimes" é frequentemente o encarceramento punitivo. No entanto, em princípio,
9

isso não diz nada sobre a motivação mais profunda do "criminoso" e porque sua
psicologia o levou a tais atos.

Nesse nível, a resolução torna-se mais complexa, pois o crime é consequência de


uma somatória de fatores físicos e culturais que se intensificam ao longo do tempo.
[12] Isto não é diferente de quando uma pessoa morre de câncer, uma vez que não
é realmente o câncer que a mata em sentido literal, visto que o próprio câncer é o
produto de outras forças.

Educar

Como um movimento educacional que opera sob a suposição de que o


conhecimento é a ferramenta/arma mais poderosa que temos para criar uma
mudança social duradoura e relevante na comunidade global, não há nada mais
importante do que a qualidade da formação pessoal de cada um, e a sua capacidade
de comunicar tais ideias de forma eficaz e construtiva para as outras pessoas.

O MZ não trata de seguir um texto rígido de ideias estáticas. Tais associações


restritas e limitadas são típicas de cultos religiosos e políticos, e não do
reconhecimento da emergência que ressalta a natureza "anti-establishment" [13] do
MZ. O MZ não impõe nada neste sentido. Pelo contrário, o MZ trabalha para criar
uma linha de pensamento aberta sem fim, que deve ser entendida e percebida por
cada indivíduo, na esperança de inspirar sua capacidade independente de entender
a sua relevância em seus próprios termos, em seu próprio ritmo.

Além disso, a educação não é apenas um imperativo para aqueles não familiarizados
com a Linha de Pensamento e Conjunto de Aplicações [14] relacionada ao MZ, mas
também para aqueles que já o apoiam. Assim como não existe uma "utopia", não há
um estado final de compreensão.

Criar

Embora certamente relacionado à necessidade de ajustar os valores humanos


através da educação, para que as pessoas do mundo entendam e vejam a
necessidade de tais mudanças sociais, o MZ também trabalha para considerar
detalhadamente como um novo sistema social, com base na Eficiência Econômica
Ótima [15], iria aparecer e operar, dada a nossa situação atual de capacidade
técnica.

Exemplos desse trabalho são programas como o Global Institute Redesign [16], um
grupo digital de estudo e resolução de problemas (um "think tank"), que tenta
demonstrar como o cerne da infra-estrutura social poderia se desdobrar, baseado
em nosso estado tecnológico atual, combinando essa capacidade técnica com a
10

linha de pensamento científico, a fim de calcular a infra-estrutura técnica o mais


eficiente possível para qualquer região do mundo.

Vale a pena ressaltar que o MZ defende uma abordagem de "governança" que tem
pouca semelhança com a forma de governança atual ou com as anteriores, a qual se
origina de uma interligação multi-disciplinar de vários métodos comprovados de
otimização máxima, unificados por uma abordagem contra-balanceada de
"Sistemas" que é projetada para ser tão "adaptável" quanto possível às melhorias
emergentes ao longo do tempo. [17]

Como será discutido mais tarde, a única referência possível que poderia ser
considerada "mais completa" num dado momento é a que leva em conta a maior
observação interativa (Sistema) tangivelmente relevante. Essa é a natureza da
sinergia de causa e efeito que ressalta a base técnica de uma economia
verdadeiramente sustentável.

Lei Natural / Economia Baseada em Recursos

Hoje, existem vários termos, em diferentes círculos, que expressam a base lógica
geral de um Sistema Social mais cientificamente orientado, incluindo os títulos
"Economia Baseada em Recursos" ou "Economia da Lei Natural." Enquanto esses
títulos trazem referenciais históricos e um tanto arbitrários, o título "Economia
Baseada em Recursos / Lei Natural" (EBRLN) será utilizado aqui como o definidor do
conceito, uma vez que possui uma base semântica mais concreta. [18]

A Economia Baseada em Recursos / Lei Natural deve ser definida como: "Um
sistema sócio-econômico adaptável derivado ativamente das referências físicas
diretas relacionadas às leis científicas que regem a natureza".

No geral, estabelece-se que através do uso de pesquisas socialmente direcionadas e


conhecimentos testados em Ciência e Tecnologia, somos capazes de desenvolver
abordagens sociais que poderiam ser profundamente mais eficazes no atendimento
às necessidades da população humana. Estamos agora em condições de aumentar
drasticamente a saúde pública, melhor preservar o habitat, além de
estrategicamente reduzir ou eliminar muitos problemas sociais comuns hoje, que
são, infelizmente, considerados inalteráveis por muitos devido à sua persistência
cultural.

Desde o surgimento do reconhecimento científico, este raciocínio genérico não


encerra nenhuma novidade e vários indivíduos e organizações notáveis do passado
e do presente têm feito alusão a tal re-orientação científica da sociedade de uma
forma ou outra. Alguns exemplos notáveis são a Tecnocracia Inc., R. Buckminster
11

Fuller, Thorstein Veblen, Jacque Fresco, Carl Sagan, HG Wells, Instituto Singularity e
muitos outros.

Linha de Pensamento

Da mesma forma, muitas dessas figuras ou grupos também têm trabalhado para
criar aplicações tecnológicas temporalmente avançadas, trabalhando para aplicar as
possibilidades atuais nessa linha de pensamento, a fim de permitir ganhos de
eficiências e de resolução de problemas, tais como "Sistemas de Cidade" de Jacque
Fresco [19] ou a Casa Dymaxion de R. Buckminster Fuller. [20]

No entanto, apesar da importância desta engenharia aplicada ser óbvia, é


fundamental lembrar que todas as aplicações tecnológicas específicas somente
provocarão uma transição quando a evolução dos conhecimentos científicos e suas
aplicações tecnológicas emergentes forem levados em consideração. Isso faz que,
com o tempo, todas as aplicações atuais de tecnologia tornem-se obsoletas.

Assim, o que nos resta é apenas a linha de pensamento em relação aos princípios
científicos de causa e efeito. O MZ é fiel a esta linha de pensamento, e não a figuras,
instituições ou avanços tecnológicos contemporâneos. Ao invés de seguir uma
pessoa ou projeto, o MZ segue o conceito científico de compreensão e, portanto,
atua de maneira descentralizada, holográfica e tendo essa linha de pensamento
como base ou influência para a ação.

Da Superstição à Ciência

Um fato interessante a ser mencionado é o quanto a evolução do entendimento


humano sobre si mesmo e seu habitat, afasta as ideias e perspectivas mais antigas
que deixam de ser aceitas devido à introdução constante de novas descobertas e
informações.

Uma palavra chave digna de definição é superstição, que, em muitas circunstâncias,


pode ser definida como uma categoria de crenças que em algum momento foi
sustentada por experiências e percepções, mas não pode mais ser aceita como
verdade devido às novas e conflitantes descobertas.

Por exemplo, mesmo que hoje o pensamento religioso tradicional possa parecer
cada vez mais inadmissível a um número de pessoas maior do que nunca no
Ocidente, fato atribuído ao rápido crescimento da informação e acesso à mesma,
[21] as raízes do pensamento religioso podem ser atribuídas a períodos em que os
seres humanos conseguiam justificar a validade e precisão de tais crenças, dada a
limitada compreensão que tinham do seu ambiente nesses tempos primórdios.
12

Este padrão é evidente em todas as áreas do conhecimento, inclusive no meio


"acadêmico" moderno. Mesmo as conclusões classificadas como "científicas" que,
com a introdução de novas informações e novos testes, muitas vezes, não podem
mais ser consideradas válidas, [22] ainda são comumente defendidas meramente
devido à sua inclusão em tradições culturais.

Tais "instituições estabelecidas", como podem ser chamadas, muitas vezes desejam
se preservar por razões de ego, poder, renda ou meramente pelo conforto
psicológico. Este problema é, em muitos aspectos, o núcleo da nossa paralisia social.
[23] Dessa forma, é importante reconhecer este padrão de transição e perceber o
quão crítica é a vulnerabilidade quando se trata de sistemas de crenças. Sem falar
no fenômeno das "instituições estabelecidas", que são culturalmente programadas
para buscar a auto-preservação em vez de evoluir e mudar, o que pode ser muito
perigoso.

Da Tradição à Emergência

O confronto das nossas tradições culturais com a crescente base de dados de


conhecimento emergente é o que define o "zeitgeist" da forma que conhecemos.
Sendo que, uma análise da história mostra uma lenta dissolução das tradições
culturais supersticiosas e antigos conceitos sobre a realidade, à medida que as novas
referências científicas de causa e efeito são consideradas.

Isto é o que o Movimento Zeitgeist representa em seu mais amplo contexto


filosófico: Um movimento do próprio zeitgeist cultural em novos, verificáveis e
otimizados conceitos e suas aplicações.

Apesar de observarmos amplas mudanças e evolução em diferentes áreas do


conhecimento e da prática humana, como por exemplo nossa vasta tecnologia
material, nosso sistema social ainda é consideravelmente atrasado. Persuasão
política, Economia de Mercado, Trabalho Assalariado, Desigualdade, Estados-Nação,
Legislações e muitas outras bases de nossa sociedade continuam sendo amplamente
aceitas na cultura atual, por sua simples persistência ao longo do tempo como
sendo a evidência de seu valor e permanência empírica.

É neste contexto que a atuação do MZ se faz mais importante: Mudar o sistema


social. Atualmente já existem muitas possibilidades de resolução de problemas
técnicos para o desenvolvimento pessoal e social que continuam a passar
despercebidas ou mal interpretadas. [24] O fim da guerra, da pobreza, a criação de
uma abundância material para suprir as necessidades humanas nunca vista na
história , a extinção da criminalidade da forma como a conhecemos, o
empoderamento da verdadeira liberdade pessoal através da remoção de trabalho
inútil, monótono, e a resolução de muitas ameaças ambientais, incluindo as
13

doenças, são algumas das possibilidades quando levamos em consideração a nossa


realidade técnica.

No entanto, essas possibilidades além de não serem reconhecidas, acabam sendo


literalmente restringidas pela ordem social vigente, impedindo a execução de tais
soluções. Dessa forma, eficiência e prosperidade ficam em oposição direta aos
próprios mecanismos de nosso sistema social [25].

Portanto, enquanto o sistema social tradicional e seus valores não forem desafiados
e atualizados de acordo com o conhecimento atual, enquanto a maioria da
população humana não compreender a linha de pensamento tecnicamente
necessária para apoiar a sustentabilidade e saúde pública, como consequência do
rigor da investigação científica e sua validação, até que grande parte da bagagem de
falsas premissas, superstição, lealdades divididas e outros obstáculos culturais
socialmente insustentáveis e geradores de conflitos sejam superados - todas as
possibilidades que temos em mãos para melhoria de vida e soluções de problemas
permanecerão adormecidas.

A verdadeira revolução é a revolução de valores. Muitos valores humanos bem


como a forma de operação da sociedade ainda correspondem a valores que datam
de séculos atrás. Se queremos progredir e resolver os problemas enfrentados de
forma efetiva, bem como reverter o que pode ser chamado de um declínio
acelerado da nossa civilização, é preciso mudar a forma de pensar sobre nós
mesmos e sobre o mundo em que vivemos.

A tarefa central do Movimento Zeitgeist é trabalhar para trazer essa mudança de


valores à tona, bem como promover a unificação da família humana, uma vez que
todos nós compartilhamos o mesmo planeta e todos nós estamos conectados pelas
mesmas leis de ordem natural, conforme já provado através de métodos científicos.

Este entendimento comum se estende muito além do que muitos têm entendido no
passado. A simbiose da espécie humana e a relação sinérgica com o nosso lugar no
mundo confirma que não somos entidades isoladas, sob qualquer aspecto, e que o
novo despertar social deve apresentar um modelo social de trabalho derivado desta
lógica inerente, se esperamos sobreviver e prosperar em longo prazo. Podemos nos
alinhar ou podemos sofrer. Só depende de nós.

Notas de rodapé para "Visão Geral"


[3] Critical Path, R. Buckminster Fuller, St. Martin Press, 1981, Introdução, xxv
14

[4] O termo "Sustentabilidade", geralmente definido "como a capacidade de ser sustentado, suportado,
mantido, ou confirmado" (http://dictionary.reference.com/browse/sustainability) é muitas vezes hoje
comumente referenciado/ entendido dentro de um contexto de Ciências Ambientais. O contexto do MZ
estende mais longe, no entanto, incluindo a noção de Sustentabilidade Cultural ou Comportamental que
considera o mérito de sistemas de crenças em geral e suas consequências causais menos óbvias.

[5] O termo "saúde pública", geralmente definido como "a ciência e a prática de proteger e melhorar a
saúde de uma comunidade, através de medicina preventiva, educação em saúde, controle de doenças
transmissíveis, aplicação de medidas sanitárias e monitoramento de perigos
ambientais"(http://dictionary.reference.com/browse/public+health?s=t) é usado neste texto como base de
medida para considerar o bem-estar físico, psicológico e sociológico das pessoas das sociedades ao longo
do tempo. Isto é para ser considerado o barômetro final do sucesso ou falha de um sistema social aplicado.

[6] O termo "violência estrutural" é comumente atribuído a Johan Galtung, introduzido no artigo
"Violência, Paz e Investigação para a Paz" (Violence, Peace, and Peace Research; Journal of Peace Research,
vol. 6, No. 3, 1969, pp 167 -191). Trata-se de uma forma de violência onde alguma estrutura social ou
instituição social prejudica as pessoas, impedindo-as de satisfazer as suas necessidades básicas. O termo foi
expandido por outros pesquisadores, como o psiquiatra criminal Dr. James Gilligan, que faz a seguinte
distinção entre violência "comportamental" e "estrutural": "Os efeitos letais da violência estrutural operam
continuamente, ao invés de esporadicamente, enquanto os homicídios, suicídios... guerras e outras formas
de violência comportamental ocorrem um de cada vez. " (James Gilligan, Violence, GP Putnam, 1996, p192)

[7] http://www.globalissues.org/article/26/poverty-facts-and-stats (Origem: Indicadores de


Desenvolvimento do Banco Mundial, 2008)

[8] Meme: an idea, behavior, style, or usage that spreads from person to person within a culture
(http://www.merriam-webster.com/dictionary/meme)

[9] http://uk.lifestyle.yahoo.com/religious-parents-causing-suffering-sick-kids-says-report-115021612.html

[10] Leitura recomendada: The Spirit Level de Richard Wilkinson e Kate Pickett, Pinguim, março de 2009

[11] Mais informações sobre este assunto serão apresentadas em uma sequência denominada "Buscando
Soluções".

[12] A relação entre o comportamento humano (neste contexto, comportamento de uma natureza
socialmente ofensiva, conforme determinado pelas leis da sociedade) e a influência do ambiente na
vida/educação de uma pessoa está agora fora de debate. Um termo relacionado a tomar nota é a natureza
"Bio-Psico-Social" do organismo humano.

[13] O termo "Anti-Estabelecimento" (anti-establishment) é geralmente usado num contexto implicando


oposição a um grupo existente, estabelecido. Utilizado aqui, o contexto é mais literal naquele que o próprio
MZ trabalha para não "institucionalizar" a si mesmo como uma entidade rígida, mas sim ser entendida
como mais um gesto, um símbolo de uma nova forma de pensamento ou visão do mundo que
simplesmente não tem limites.

[14] Os termos "Linha de Pensamento" e "Conjunto de Aplicação" serão usados frequentemente neste
texto uma vez que estão interligados. Por favor consulte a Lista de Vocabulário, Apêndice A, para
esclarecimentos.

[15] Por favor consulte a Lista de Vocabulário - Apêndice A para esclarecimento do termo. Mais será
discutido na Parte III.
15

[16] http://www.globalredesigninstitute.org

[17] Ver Parte III para saber mais sobre o assunto "Governo".

[18] O termo "Economia Baseada em Recursos" pode ser interpretado literalmente como "uma economia
baseada em recursos". Isso, historicamente, tem acarretado em uma confusão na qual as pessoas podem
argumentar que todas as "economias", por definição, são "baseadas" em "recursos". O termo também tem
uma forte associação com a organização denominada Projeto Vênus, que afirma ter originado o termo e a
ideia, buscando ao mesmo tempo registrar o termo como marca (http://tdr.uspto.gov/search.action?sn =
77829193). O Termo "Lei Natural / Economia Baseada em Recursos" é considerado mais completo aqui,
não só para evitar tal confusão associativa possível, mas também por causa da precisão mais semântica do
termo em si, LNEBR (NLRBE), uma vez que este faz referência mais claramente aos Sistema e Processos de
Leis Físicas Naturais, em vez de apenas aos recursos planetários.

[19] Jacque Fresco, "The Best That Money Can't Buy" (O Melhor que o Dinheiro Não Pode Comprar), Global
Cybervisions de 2002, Capítulo 15

[20] http://en.wikipedia.org/wiki/Dymaxion_house

[21] A relação inversa de acúmulo de alfabetização/conhecimento para crença supersticiosa é clara. De


acordo com a "United Nations’ Arab Human Development Reports", menos de 2% dos árabes têm acesso à
Internet. Os árabes representam 5% da população do mundo e ainda assim produzem apenas 1% dos livros
do mundo, a maioria deles religiosos. Segundo o pesquisador Sam Harris: "Espanha traduz mais livros para
o espanhol a cada ano do que todo o mundo árabe traduziu para o árabe desde o século IX." É evidente
supor que o crescimento da religião islâmica em Nações árabes é garantido por uma relativa falta de
informações para essas sociedades.

[22] Um Prêmio Nobel para o que é conhecido como "Lobotomia" foi atribuído ao neurologista Português
Egas Moniz em 1949. Hoje, a lobotomia é considerada um procedimento bárbaro e ineficaz.
(Http://www.npr.org/templates/story/story.php?storyId=4794007)

[23] O apoio financeiro indispensável à perpetuação de um determinado negócio, "lucrativo" ou mesmo os


chamados "sem fins lucrativos", estabelece uma dissonância entre o produto ou serviço vendido de uma
empresa e a real necessidade ou viabilidade que o produto ou serviço tem ao longo do tempo. Na verdade,
a obsolescência de um determinado produto/serviço, que implica muitas vezes na obsolescência do
empresa produtora ou corporação, parece inevitável à medida que novos avanços técnicos surgem. A
consequência é uma perpétua asfixia de novas ideias/invenções que poderiam perturbar ou substituir as
"Instituições Estabelecidas" ou pré-existentes, resultando em uma perda de receita. Um breve olhar sobre
a situação das possibilidades tecnológicas de hoje, considerando-se, ao mesmo tempo, a questão do
porquê dessas melhorias não serem imediatamente aplicadas, traz luz à natureza paralisante das
instituições que demandam renda.

[24] "ZeitNews", um site de ciência e tecnologia relacionado ao MZ, é recomendado. www.zeitnews.org

[25] Ver Parte II, para mais informações sobre este assunto.
16

2. A Visão Científica do Mundo

"Quase todos os grandes erros sistemáticos que iludiram os homens por milhares de
anos se basearam na experiência prática. Horóscopos, encantamentos, oráculos,
magia, feitiçaria, curandeirismo e médicos empíricos antes da medicina moderna,
todos foram fortemente estabelecidos aos olhos do público através dos séculos
devido a seus supostos êxitos práticos. O método científico foi concebido
precisamente com o fim de elucidar a natureza das coisas sob condições
cuidadosamente controladas e por critérios mais rigorosos do que aqueles presentes
nas situações criadas por problemas práticos."[26]

- Michael Polanyi -

De um modo geral, a evolução do conhecimento humano pode ser vista como um


movimento a partir de observações superficiais, processadas pelos nossos limitados
cinco sentidos físicos, "intuitivamente" filtradas pelo enquadramento educativo e
valores daquele tempo - para um método de medição objetiva e métodos de análise
auto-promotores que trabalham para chegar a (ou calcular) conclusões através de
teste e reteste das provas, buscando validação por meio do valor de referência da
causalidade científica - uma causalidade que aparece para compor as características
físicas da chamada "Natureza" em si.

As "Leis Naturais" do nosso mundo existem quer nós escolhamos reconhecê-las ou


não. Estas regras inerentes ao nosso universo estavam presentes antes que os seres
humanos desenvolvessem uma compreensão para reconhecê-las, e por mais que
possamos debater a respeito da exata precisão da nossa interpretação dessas leis,
no atual estágio de nossa evolução intelectual, há evidência suficientemente
consolidada para mostrar que estamos, de fato, conectados por forças estáticas que
têm uma lógica inerente, mensurável e determinante.

Os vastos desenvolvimentos e a integridade preditiva encontrados na matemática,


física, biologia e outras disciplinas científicas provam que nós, como espécie,
estamos lentamente compreendendo os processos da natureza e o aumento da
nossa capacidade inventiva em simular, acentuar ou reprimir tais processos
naturais, confirmam o nosso progresso na compreensão da natureza. O mundo ao
nosso redor hoje, abundante em material tecnológico e invenções que alteram a
vida, é um testemunho da integridade do Processo Científico e do que este é capaz.

Ao contrário de tradições históricas, onde existe uma certa estagnação em relação


ao que as pessoas acreditam, como ainda é comum em dogmas religiosos, esse
reconhecimento da "Lei Natural" inclui características que desafiam profundamente
a assumida estabilidade de crenças que muitos consideram sagradas. Como será
expandido mais tarde neste ensaio no contexto de "Emergência", o fato é que,
17

simplesmente, não pode existir uma conclusão intelectual única ou estática sobre a
nossa percepção e conhecimento, exceto, paradoxalmente, quanto ao padrão
subjacente de incerteza dessas mudanças e adaptações em si mesmas.

Isso é parte do que poderia ser chamado de uma visão científica do mundo. Uma
coisa é isolar técnicas de avaliação científica para interesses específicos, como a
lógica que usamos para avaliar e testar a integridade estrutural de um projeto de
construção de uma casa, e outra, é quando a integridade universal desse tipo de
raciocínio está enraizada permitindo que relações de causa e efeito e métodos de
validação sejam aplicados a todos os aspectos de nossas vidas.

Albert Einstein disse uma vez: "Quanto mais a evolução espiritual da humanidade
avança, mais certo me parece que o caminho para a religiosidade genuína não passa
pelo medo da vida, pelo medo da morte e por uma fé cega, mas sim por uma luta
em busca de conhecimento racional". [27]

Enquanto cínicos da Ciência muitas vezes trabalham para reduzir a sua integridade
para outra forma de "fé religiosa", rebaixando sua precisão como "fria" ou "sem
espiritualidade", ou mesmo destacando as consequências da tecnologia aplicada ao
mal, como a criação da Bomba Atômica (que, na realidade, é uma indicação da
distorção dos valores humanos, ao invés dos da engenharia), não se pode ignorar o
poder incrível que essa abordagem (científica) proporcionou à raça humana com a
compreensão e aproveitamento da realidade. Nenhuma outra "ideologia" chega
perto de combinar os benefícios preditivos e utilitários que este método de
raciocínio tem proporcionado.

No entanto, isso não quer dizer que a negação cultural ativa desta relevância não
está ainda difundida no mundo de hoje. Por exemplo, quando se trata de Crença
Teísta, muitas vezes há uma tendência de divisão que deseja elevar o ser humano
acima de tais "meras mecânicas" da realidade física. A suposição implícita aqui é
que, geralmente, os seres humanos são mais "especiais" por alguma razão e, talvez,
existam forças, como uma intervenção de "Deus", que podem substituir as Leis
Naturais à vontade, tornando-as menos importantes do que, por exemplo, a
obediência contínua à vontade de Deus, etc.

Infelizmente, ainda existe uma grande vaidade humana na cultura que assume, sem
evidência comprovada, que os seres humanos estão separados de todos os outros
fenômenos e que nos considerarmos conectados ou até mesmo um produto de
forças naturais e científicas seria o mesmo que rebaixar a vida humana.

Ao mesmo tempo, há também uma tendência para o que alguns chamam de


pensamento "Metamágico" [28], que poderia ser considerado um tipo de transtorno
de personalidade esquizofrênica, onde a fantasia e a ilusão leve ajudam a reforçar
18

falsas suposições de causalidade no mundo, nunca aproveitando o rigor do Método


Científico [29]. A Ciência requer testes e repetidas replicações de um resultado para
que este seja validado, e muitas crenças de pessoas aparentemente "normais"
atualmente situam-se fora deste requisito. Além das religiões tradicionais, o
conceito de "Nova Era" [30] também é comumente associado a este tipo de
pensamento supersticioso. Embora seja extremamente importante que nós, como
sociedade, estejamos conscientes da incerteza de nossas conclusões em geral, e
que, portanto, devemos manter uma mente aberta, criativa, para todas as
postulações, a validação dessas postulações só pode vir através de uma consistência
mensurável, não de pensamento positivo ou fascinação esotérica.

Tais ideias e pressupostos invalidados representam um quadro de referência que


muitas vezes é assegurado por "Fé" [31], não Razão, e é difícil discutir o mérito da Fé
com qualquer um, uma vez que as regras de Fé, por sua natureza, recusam
argumentos. Isto é parte do dilema em que a sociedade humana vive hoje: Nós
simplesmente acreditamos que estamos sendo tradicionalmente ensinados pela
nossa cultura ou nós questionamos e testamos essas crenças frente a realidade
física ao nosso redor para ver se elas são verdadeiras?

A Ciência está claramente preocupada com o amanhã e não possui nada de sagrado,
sempre pronta para corrigir falsas conclusões já estabelecidas quando uma nova
informação surge. Aceitar uma incerteza tão inerentemente - ainda que seja uma
abordagem extremamente viável e produtiva para a visão de mundo do dia-a-dia -
requer uma sensibilidade muito diferente - uma que incorpora a vulnerabilidade,
não a certeza.

Nas palavras do professor Frank L. H. Wolfs (Departamento de Física e Astronomia


da Universidade de Rochester, NY), cuja "Introdução ao Método Científico" é
reproduzida no Apêndice B deste texto para a referência: "Costuma-se dizer que na
ciência as teorias nunca podem ser provadas, apenas refutadas. Há sempre a
possibilidade de que uma nova observação ou uma nova experiência entre em
conflito com uma teoria de longa data". [32]

Emergência

O coração do método científico é o ceticismo e a vulnerabilidade. A ciência está


interessada na maior aproximação da verdade que se pode encontrar, e se há algo
que a ciência reconhece explicitamente, é que praticamente tudo o que sabemos
será revisto posteriormente assim que uma nova informação surgir.

Do mesmo modo, o que poderia parecer absurdo, impossível ou mesmo


"supersticioso" em um primeiro momento, pode se provar ser um útil e viável
entendimento para o futuro, uma vez validada a sua integridade. Isso implica em
19

uma Emergência de Pensamento - uma Emergência da "Verdade", se você preferir.


Uma análise rápida da História demonstra constante mudança de comportamentos
e práticas baseada em conhecimento constantemente atualizado, e este humilde
reconhecimento é essencial para o progresso humano.

Simbiose

Um segundo ponto extremamente característico da Visão Científica do Mundo, que


vale a pena ser citado, diz respeito à natureza Simbiótica das coisas que
conhecemos. Descartado em grande parte por muitos, hoje, como "senso comum",
essa compreensão detém profundas revelações sobre a maneira como pensamos
sobre nós mesmos, nossas crenças e nossa conduta.

O termo "Simbiótico" é normalmente utilizado no contexto de relações


interdependentes entre espécies biológicas. [33] No entanto, o nosso contexto do
vocábulo é mais amplo, referente à relação de interdependência de tudo. Enquanto
antigamente, visões intuitivas dos fenômenos naturais poderiam ter considerado,
por exemplo, a manifestação de uma árvore como uma entidade independente,
aparentemente auto-suficiente em sua ilusão de separação, a verdade é que a vida
da Árvore é totalmente dependente de um "fluxo" de forças aparentemente
"externas" para que ocorra sua própria manifestação e existência. [34]

A água, luz solar, nutrientes e outros atributos interativos "externos" necessários


para permitir o desenvolvimento de uma "Árvore" são exemplos de uma relação
simbiótica. Entretanto, o âmbito dessa simbiose tornou-se muito mais revelador do
que já conhecíamos no passado e parece que quanto mais aprendemos sobre a
dinâmica do nosso universo, mais imutável sua interdependência.

O conceito que melhor incorpora essa noção é o de um "Sistema". [35] O termo


"Árvore" é realmente uma referência a um Sistema conhecido. A "Raiz", "Tronco",
"Ramos", "Folhas" e outros atributos dessa Árvore poderiam ser chamados de
"Subsistemas". Contudo, a "Árvore" em si também é um subsistema, pode-se dizer,
talvez, da "Floresta", que, por sua vez, é um subsistema de outro mais abrangente,
encerrando fenômenos maiores, como os de um "Ecossistema". Tal distinção pode
parecer trivial para muitos, mas o fato é que a grande falha da cultura humana tem
sido a de não respeitar plenamente o âmbito do "Sistema Terra" e como cada sub-
sistema desempenha um papel relevante.

O termo "Sistemas Categóricos" [36] poderia ser usado aqui para descrever todos os
sistemas, aparentemente pequenos ou grandes, pois tais distinções linguísticas são
arbitrárias. Esses sistemas conhecidos e as palavras usadas para referenciá-los são
simplesmente conveniências humanas para a comunicação. O fato é que parece
haver um único sistema possível, organizado pela Lei da Natureza, o qual pode ser
20

legitimamente referenciado uma vez que todos os sistemas que hoje percebemos e
classificamos só podem ser subsistemas. Não podemos simplesmente encontrar um
sistema verdadeiramente fechado em qualquer lugar. Mesmo o "Sistema Terra",
que intuitivamente parece autônomo, com a Terra flutuando no vazio do espaço, é
totalmente dependente do Sol, da Lua e provavelmente de muitos e muitos outros
fatores simbióticos que nós sequer podemos, até agora, entender ou definir.

Em outras palavras, quando consideramos as interações que conectam esses


"Sistemas Categóricos", encontramos uma conexão que é geral e, em um nível
social, compreendida esta interação entre os sistemas, provavelmente chegamos à
base da perspectiva mais viável para a verdadeira sustentabilidade humana [37]. O
ser humano, como a árvore ou a Terra, parece ser, mais uma vez, intuitivamente
auto-suficiente. No entanto, por exemplo, sem oxigênio para respirar, não
sobreviveremos. Isto significa que o sistema humano requer interação com um
sistema atmosférico e, consequentemente, com um sistema de produção de
oxigênio. E uma vez que o processo de fotossíntese fornece a maior parte do
oxigênio atmosférico que respiramos, é de nosso interesse estar ciente sobre o que
afeta esse sistema particular, trabalhando para harmonizar nossas práticas sociais
com ele.

Quando testemunhamos, por exemplo, a poluição dos oceanos ou o rápido


desmatamento da Terra, muitas vezes esquecemos o quão importante tais
fenômenos realmente são para a integridade do sistema humano. Na verdade, há
tantos exemplos de perturbações ambientais perpetuadas hoje pela nossa espécie,
devido a uma consciência fragmentária da cadeia simbiótica de causa e efeito que
une todos os sistemas categóricos conhecidos, que uma enorme coleção de dados
poderiam ser dedicados a esta crise. A falha em reconhecer essa "Simbiose" é um
problema fundamental e uma vez que este Princípio de Sistemas Interativos [38] for
totalmente compreendido, muitas de nossas mais singelas práticas, atualmente,
provavelmente parecerão ignorantes e perigosas no futuro.

Crenças Sustentáveis

Isto nos leva para o nível de Pensamento e Compreensão propriamente ditos. Como
observado antes, o sistema de linguagem que usamos isola e organiza os elementos
do nosso mundo para uma compreensão geral. A própria linguagem é um sistema
baseado em distinções por categorias que associamos à nossa realidade percebida.
No entanto, por mais necessário tal modo de identificação e organização seja para a
mente humana, ele também implica uma falsa divisão.

Dado esse fundamento, é fácil especular sobre como temos crescido tão
acostumados a pensar e agir de maneira intrinsecamente divisiva e por que a
história da sociedade humana tem sido uma história de desequilíbrio e conflito. [39]
21

É nesse nível que tais Sistemas Físicos que discutimos ganham relevância frente aos
Sistemas de Crença/Pensamento. [40]

Enquanto a ideia de "sustentabilidade" pode ser tipicamente associada com os


processos técnicos, eco-teorias e engenharia moderna, muitas vezes esquecemos
que nossos valores e crenças precedem todas essas ideias e aplicações. Portanto, a
verdadeira sustentabilidade significa que precisamos de crenças e valores
sustentáveis e essa conscientização só pode vir de um reconhecimento válido das
leis da natureza, às quais estamos ligados.

Podemos medir a integridade de um Sistema de Crença? Sim. Podemos medi-la pela


forma como os seus princípios se alinham com a Causalidade Científica, com base no
feedback resultante. Se fôssemos comparar os resultados dos diferentes sistemas de
crenças que buscam um fim comum,[41] poderíamos medir o quão bem essas
perspectivas alcançam seu fim e, dessa forma, qualificar e classificar esses sistemas
uns em relação aos outros.

Como será explorado em detalhes mais adiante, a comparação central de sistemas


de crenças neste ensaio é entre a "Economia de Mercado Monetário" e a já
mencionada "Lei Natural/Economia Baseada em Recursos". No centro desses
sistemas está essencialmente uma crença conflitante sobre causalidade e
possibilidade, e o leitor é aqui desafiado a fazer julgamentos objetivos sobre a forma
como cada perspectiva realmente cumpre metas humanas de fim comum.

Tendo isso em consideração e no contexto deste trabalho, especificamente nos


pontos sobre Emergência & Simbiose, poderia generalizar-se que qualquer Sistema
de Crença que (a) não tem incorporada em si a concessão para que o próprio
sistema de crença possa ser inteiramente alterado, ou até mesmo tornado
completamente obsoleto pela assimilação de novas informações, é um sistema de
crença insustentável; e (b) qualquer sistema de crença que permite isolamento e
divisão, apoiando a integridade de um segmento ou grupo em detrimento de outro,
é um sistema de crença insustentável.

Sociologicamente, ter uma Visão Científica do Mundo significa estar disposto e


capaz de se adaptar, tanto como um indivíduo como uma civilização, quando novas
percepções e abordagens surgirem que melhor resolvam os problemas e promovam
prosperidade. Essa visão de mundo provavelmente marca a maior mudança da
história na compreensão humana. Cada conveniência moderna de que desfrutamos
é resultado desse método, quer seja reconhecido ou não como a lógica inerente,
auto-geradora e mecanicista, que é estabelecida para ser universalmente aplicável a
todos os fenômenos conhecidos.
22

Enquanto muitas pessoas no mundo ainda atribuem a causalidade aos deuses,


demônios, espíritos e outras visões não mensuráveis baseadas na "fé", uma nova
era de razão parece estar no horizonte, onde o conhecimento científico emergente
sobre nós mesmos e nosso habitat está desafiando o tradicional e estabelecido
enquadramento que herdamos dos nossos ancestrais menos informados.

Já não é a orientação "técnica"[42] da ciência rebaixada a meros dispositivos e


ferramentas - a verdadeira mensagem dessa Visão do Mundo é a filosofia pela qual
devemos orientar as nossas vidas, valores e instituições sociais.

Como será discutido em outros ensaios relacionados com este texto, o Sistema
Social, sua Premissa Econômica ao longo de sua estrutura Legal & Política, tornou-se
em grande parte uma condição de "fé" na forma que está agora perpetuada. O
Sistema Monetário da economia, por exemplo, argumenta-se ser baseado em pouco
mais do que um conjunto de premissas agora ultrapassadas e cada vez mais
ineficientes, não diferente de como os primeiros seres humanos falsamente
assumiram que o mundo era plano, demônios causavam doenças, ou que as
constelações no céu eram construções fixadas, estáticas, bidimensionais,
semelhantes a tapeçarias. Há enormes paralelos que podem ser estabelecidos entre
a fé religiosa tradicional e as instituições culturais estabelecidas que assumimos
serem válidas e "normais" atualmente.

Assim como a Igreja na Idade Média detinha o poder absoluto na Europa,


promovendo lealdades e rituais que hoje a maioria consideraria absurdos ou até
mesmo insanos, as gerações vindouras provavelmente olharão para trás, para as
práticas estabelecidas em nosso tempo atual, e pensarão exatamente da mesma
forma.

* Consulte o Apêndice B, que explica o Método Científico.

Notas de rodapé para "A Visão Científica do Mundo"


[26] http://www.todayinsci.com/QuotationsCategories/SCat/ScientificMethod-Quotations.htm

[27] Citado em: "All the Questions You Ever Wanted to Ask American Atheists", por Madalyn Murray O'Hair,
Amer Atheist Press, 1986

[28] Stanford University Behavioral Biology Professor, Dr. Robert Sapolsky é provavelmente mais notável
com seu uso do termo "MetaMagical". Seu trabalho é recomendado: http://benatlas.com/2009/12/robert-
sapolsky-on-metamagical-schizotypal-thinking/

[29] Ver o Apêndice B para uma introdução ao Método Científico

[30] O termo Nova Era é geralmente definido como "um amplo movimento caracterizado por abordagens
alternativas para a cultura ocidental tradicional, com um interesse na espiritualidade, misticismo ..."
23

[31] Carl Sagan era famoso principalmente por corroborar com a definição de Fé como "Crença sem
Evidência".

[32] http://teacher.nsrl.rochester.edu:8080/phylabs/AppendixE/AppendixE.html

[33] http://dictionary.reference.com/browse/symbiotic

[34] O Termo "Externo" neste contexto é enquadrado como relação a um objeto percebido. O ponto de
maior abrangência aqui é que não existe tal coisa como "externo" ou "interno" no contexto de sistemas de
ordem maior.

[35] O "Sistema" é definido como: "um conjunto de coisas que trabalham juntas como partes de um
mecanismo ou de uma rede de interconexão." É interessante notar-se que, frente a importância deste
conceito como a relevância do "Sistema" ou "Teoria dos Sistemas", será um tema repetitivo com respeito
ao quadro de referência que realmente suporta verdadeira sustentabilidade humana em nosso habitat.

[36] Este Termo é uma variação sobre a noção mais comum de "Pensamento Categórico", que está fazendo
uma reflexão através da atribuição de pessoas ou coisas para as categorias e, em seguida, utilizando as
categorias como se representassem algo no mundo real.

[37] Para ser expandida em maiores detalhes na Parte 3 deste texto.

[38] Ver Anexo A, Lista de Vocabulário

[39] A Revolução Neolítica é um marcador notável para uma mudança dramática nas funções sociais e
relações humanas, à medida que a civilização passou de forrageamento e caça - vivendo em subserviência a
processos naturais - a uma profunda capacidade de controlar a agricultura para alimentação e de criar
ferramentas/máquinas para facilitar o trabalho humano. Poderia ser argumentado que a sociedade
humana não foi madura o suficiente para lidar com essa habilidade, e a perpetuação do medo e da escassez
levou à acumulação, privatização, agrupamentos em nações e outras tendências de divisão para a auto-
preservação de grupo em vários níveis.

[40] Para maior clareza filosófica, poderia ser argumentado que todos os resultados das percepções
humanas são projetados - até mesmo as próprias leis da natureza. No entanto, isto não altera a eficácia que
foi observada com respeito ao imenso controle e compreensão que temos através do método da ciência.

[41] A noção de "fim comum" ou "terreno comum" será repetida neste texto e é uma crítica consciente a
média das necessidades, intenções e consequências do ser humano. A premissa central da defesa do MZ é
que os seres humanos são mais parecidos do que diferentes conforme compartilhamos as mesmas
necessidades básicas quantificáveis e reações. Em muitos aspectos este é o atributo unificador que poderia
compreender o que é chamado de "Natureza Humana" e, como será mais descrito em ensaios posteriores,
os seres humanos, de fato, têm partilhado reações previsíveis e comuns às influências positivas e negativas,
tanto psicológicas quanto fisiológicas. Portanto, a inteligente organização humana de uma sociedade é
obrigada a levar isso em conta diretamente para o bem da saúde pública - algo que o atual sistema do
mercado monetário não faz.

[42] Como será prolífico neste texto, o termo "Técnico", enquanto praticamente sinônimo de "Científico", é
empregado para melhor expressar a natureza causal de todos os fenômenos existentes - incluindo até
mesmo o comportamento humano e a própria psicologia/sociologia. A premissa central de defesa do MZ é
que a resolução de problemas e a manifestação do potencial é uma avaliação "técnica" e esta abordagem, a
ser aplicada a todos os atributos sociais, está no centro do novo modelo social defendido.
24

3. Buscando Soluções

"Um novo tipo de pensamento é essencial para que a humanidade possa sobreviver
e se mover em direção à níveis mais elevados."[43]

- Albert Einstein -

Uma consideração central inerente à perspectiva do MZ sobre a mudança social


para melhor diz respeito ao conceito de "Progresso" em. Parece haver dois ângulos
básicos a serem considerados quando se trata de progresso pessoal ou social:
Manifestação Potencial e Resolução de Problemas.

Potencial e Resolução

Manifestação Potencial é simplesmente a melhoria de uma condição que não foi


considerada antes de estar num estado problemático. Um exemplo seria a
capacidade de aperfeiçoar o desempenho atlético humano em um campo particular
através de fortalecimento, dieta e refino de técnicas específicas e outros meios que
simplesmente não eram conhecidos antes.

Resolução de Problemas, por outro lado, é a superação de uma questão que tem
atualmente consequências prejudiciais reconhecidas e/ou limitações para um
determinado assunto. Um exemplo genérico seria a descoberta da cura para uma
doença debilitante existente, de modo que essa doença não cause mais danos.

No entanto, em uma visão ampla, há uma sobreposição clara entre essas duas
noções quando a natureza do desenvolvimento do conhecimento é levada em
conta. Por exemplo, um "aperfeiçoamento" de uma determinada condição, uma
prática que então torna-se normal e comum em uma cultura, pode também,
potencialmente, ser parte de um "problema" no mesmo contexto, o qual requer
resolução caso novas informações a respeito de sua ineficiência sejam encontradas
ou novos avanços a tornem obsoleta por comparação.

Por exemplo, o transporte aéreo, que é relativamente novo na sociedade, expandiu


enormemente a eficiência do transporte a partir de sua aplicação. No entanto, até
que ponto o transporte aéreo moderno será visto mais como um "problema",
devido à sua ineficiência inerente, em comparação com outro método [44].
Portanto, a eficiência é relativa neste sentido, já que apenas quando há uma
expansão do conhecimento a abordagem que era considerada "melhor" se torna
"inferior".

Este ponto aparentemente abstrato é criado para comunicar o simples fato de que
cada prática que consideramos normal hoje em dia tem incorporada em si uma
25

ineficiência inevitável, a qual, mediante novos desenvolvimentos em ciência e


tecnologia, provavelmente vai produzir um "problema" em algum momento no
futuro quando for comparada a potenciais emergentes mais novos. Essa é a
natureza da mudança, e se os padrões científicos da história refletem alguma coisa,
é que o conhecimento e suas aplicações continuam a evoluir e melhorar, de um
modo geral.

Então, de volta para as questões aparentemente distintas da Manifestação Potencial


e Resolução de Problemas, pode-se deduzir daí que todas as resoluções de
problemas também são atos de manifestação potencial e vice-versa.

Isto também significa que as ferramentas reais utilizadas pela sociedade para uma
determinada finalidade são sempre transitórias. Não importa se é o meio de
transporte, as práticas médicas, produção de energia, o sistema social, etc [45].
Todas essas práticas são manifestações/resoluções em relação à necessidade e à
eficiência humanas, com base no estado transitório de entendimento que nós temos
/ tínhamos no momento da sua criação/evolução.

Proposta Raiz e Causa Raiz

Portanto, quando se trata de pensar em qualquer ato de invenção ou de resolução


de problemas, temos de chegar o mais perto da Proposta Raiz (Manifesto) ou a
Causa Raiz (Problema) possível, respectivamente, para fazer uma avaliação mais
precisa para a ação. Assim como as ferramentas e técnicas de uso potencial são tão
viáveis como a compreensão do seu propósito fundamental, ações para a resolução
de problemas são apenas tão boas quanto o entendimento da causa raiz do mesmo.
Isso pode parecer óbvio, mas esse conceito não está presente em muitas áreas do
pensamento no mundo de hoje, especialmente quando se trata de sociedade. Ao
invés de perseguir esse foco, a maioria das decisões sociais são baseadas em torno
de costumes tradicionais que têm limitações inerentes.

Um exemplo simples disso é o método atual de encarceramento humano para o que


se denomina "comportamento criminoso". Para muitos, a solução para as formas
"ofensivas" do comportamento humano é simplesmente remover os indivíduos da
sociedade e "puni-los". Isto é baseado em uma série de premissas que datam de
milênios atrás. [46]

No entanto, a ciência do entendimento do comportamento humano mudou muito


ao longo do tempo no que se diz respeito à causalidade. Hoje é de conhecimento
comum nas ciências sociais que a maioria dos atos "criminosos" provavelmente não
ocorreriam se certas condições ambientais básicas, de apoio, fossem definidas para
o ser humano [47]. Colocar as pessoas em prisões não está efetivamente resolvendo
nada relacionado à causa do problema. Na verdade, é apenas um paliativo, se assim
26

podemos dizer, que reprime temporariamente alguns efeitos do problema maior.


[48]

Outro exemplo, embora aparentemente diferente do anterior, mas igualmente


"técnico", é a maneira pela qual a maioria pensa sobre soluções para problemas
domésticos comuns, como acidentes de trânsito. Qual é a solução para uma
situação em que um motorista comete um erro e casualmente muda de pista,
apenas para atingir o veículo próximo a ele, causando um acidente? Deveria haver
um enorme muro entre eles? Deveria haver um melhor treinamento? Deveria a
pessoa simplesmente ter sua carteira de motorista revogada, de modo que não
possa dirigir de novo? É aqui, mais uma vez, onde a noção de "causa raiz" é muitas
vezes perdida nas molduras estreitas de referências comumente entendidas pela
cultura como soluções.

A causa raiz do acidente pode ser apenas parcialmente a questão da integridade do


condutor, a questão mais importante é a falta de integridade da tecnologia / infra-
estrutura que está sendo utilizada. Por quê? - Porque a falibilidade humana é
historicamente reconhecida e imutável [49]. Então, assim como os primeiros
veículos não tinham "Airbags" para passageiros e motoristas, algo que é comum
hoje e reduz grande quantidade de lesões que existiram no passado [50], a mesma
lógica deveria ser aplicada ao sistema de interação própria do veículo, tendo em
conta as novas possibilidades técnicas para o aumento da segurança, para
compensar o erro humano inevitável.

Assim como o Airbag foi desenvolvido anos atrás à medida que a evolução do
conhecimento se desenrolava, hoje existe tecnologia que permite que veículos
automatizados, sem motoristas, possam detectar não apenas cada elemento da rua
necessário para operar com precisão, como podem detectar uns aos outros,
tornando as colisões quase impossíveis. [51] Este é o estado atual de uma "solução"
como quando consideramos a causa raiz e a finalidade raiz, em geral.

No entanto, por mais avançada que a solução possa parecer, especialmente tendo
em conta os cerca de 1,2 milhões de pessoas que morrem desnecessariamente em
acidentes de automóvel a cada ano, [52] este exercício de pensamento ainda pode
ser incompleto se continuarmos a alargar o contexto em relação aos objetivos.

Possivelmente há outras ineficiências que se relacionam com a infra-estrutura de


transporte e, além disso necessitam serem levadas em conta e superadas. Talvez,
por exemplo, o uso de veículos individuais, independentemente da sua segurança,
tem outros problemas inerentes que só podem ser logicamente resolvidos pela
remoção do próprio automóvel. Talvez em uma cidade com uma população móvel
em expansão tal veículo de transporte independente se torna desnecessariamente
complicado, lento e geralmente ineficiente. [53]
27

A solução mais viável nesta circunstância pode ser a necessidade de um sistema de


transporte unificado e integrado em massa, que possa aumentar a velocidade,
reduzir o consumo de energia, a utilização de recursos, a poluição e muitas outras
questões relacionadas com o efeito que o uso de automóveis em tal condição,
então, passa a fazer parte do "problema" emergente .

Se o objetivo de uma sociedade é fazer a coisa "correta" e, portanto, sustentável,


reduzindo as ameaças para os seres humanos e os habitats, e sempre aumentando a
eficiência - uma lógica dinâmica auto-geradora se desenvolve com relação a nossas
possibilidades técnicas e abordagens de design.

A Nossa Realidade Técnica

Claro que a aplicação deste tipo de solução de problemas está longe de ser limitada
a esses exemplos físicos. É a "política" a resposta para nossos infortúnios sociais?
Será que ela direciona para causas raízes pelo seu próprio "design"? Seria o dinheiro
e o sistema de mercado o método mais otimizado para o progresso sustentável, a
resolução de problemas e a manifestação do potencial econômico? O que o nosso
estado moderno da ciência e da tecnologia têm para contribuir no campo da
compreensão de causa e efeito no nível da sociedade?

Como outros ensaios indicarão mais tarde em grande detalhe, esses entendimentos
criam uma linha de pensamento natural e clara com relação a quão melhor o nosso
mundo poderia ser se nós simplesmente seguíssemos a lógica criada através do
Método Científico de pensamento para cumprir o nosso objetivo comum de
sustentabilidade humana. Os 1 bilhão de pessoas que passam fome no planeta não
estão fazendo isso por causa de alguma imutável consequência natural da nossa
realidade física. Há abundância de comida para todos. [54] É o sistema social, que
tem a sua própria lógica desatualizada e artificial, que perpetua essa atrocidade
social, juntamente com inúmeras outras.

É importante salientar que o MZ não está preocupado com a promoção de


"remendos" como seu objetivo final, que, é triste dizer, é o que a grande maioria das
instituições de ativistas do planeta estão fazendo atualmente. [55] Queremos
promover a maior ordem, maior eficiência do conjunto de soluções disponíveis em
um determinado momento, alinhados com os processos naturais, para melhorar a
vida de todos, ao mesmo tempo garantindo a integridade do nosso habitat.
Queremos que todos compreendam essa "linha de pensamento" de forma clara e
desenvolvam uma identificação de valor com a mesma.

Não há uma solução única - somente o raciocínio empírico da Lei Natural é que
alcança as soluções e finalidades.
28

Notas de rodapé para "Buscando Soluções"

[43] Em "Atomic Education Urged by Einstein", New York Times, 25 de maio de 1946

[44] Um exemplo moderno notável é a nova tecnologia de transporte, tal como transporte "Maglev", que
usa menos energia e move-se substancialmente mais rápido do que as companhias aéreas comerciais
http://www.et3.com/

[45] Novamente, esta realidade está incorporada pelo termo "conjunto de aplicativos" ao longo deste
texto.

[46] Sugestão de leitura: "Violence: Our Deadly Epidemic and Its Causes" (Violência: Nossa Epidemia Mortal
e suas Causas), Dr. James Gilligan, 1996

[47] O estudo 'Merva-Fowles ", realizado na Universidade de Utah na década de 1990, descobriu conexões
poderosas entre desemprego e crime. Eles basearam sua pesquisa em 30 grandes áreas metropolitanas,
com uma população total de mais de 80 milhões. Eles descobriram que um aumento de 1% na taxa de
desemprego resultou em: aumento de 6,7% no número de homicídios, um aumento de 3,4% nos crimes
violentos, um aumento de 2,4% em crimes contra a propriedade. Durante o período de 1990 a 1992, isso se
traduziu em: 1.459 homicídios adicionais; 62.607 crimes violentos adicionais; 223.500 crimes contra a
propriedade adicionais. [Merva & Fowles, Effects of Diminished Economic Opportunities on Social Stress,
Economic Policy Institute, 1992]

[48] Ver Anexo G, palestra de Ben McLeish : "Out of the Box: Prisons" (Fora da Caixa: Prisões)

[49] http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/pmc1117770/

[50] Um estudo de 1996 da NHTSA encontrou o benefício de redução de mortalidade para todos os
motoristas numa estimativa de 11% quando eram utilizados "air bags".
http://www.nhtsa.gov/cars/rules/regrev/evaluate/808470.html

[51] [52] http://www.car-accidents.com/pages/stats.html

[53] Uma lenta mudança geral, mesmo na sociedade comercial moderna, de "propriedade" para "acesso"
está começando a ganhar apoio. http://gigaom.com/2011/11/10/airbnb-roadmap-2011/

[54] As principais organizações internacionais afirmaram estatisticamente que há comida suficiente para
todos e que a fome não é causada por falta de recursos. [http://www.wfp.org/hunger/causes]. Em
combinação com melhorias de eficiência que serão abordadas mais na Parte 3, a absoluta abundância
global de alimentos da mais alta qualidade de nutrientes também é possível hoje.

[55] Esse comentário não é para humilhar qualquer instituição social bem-intencionada a trabalhar para
ajudar dentro dos limites do método sócio-econômico atual. No entanto, como será descrito mais na Parte
2, o modelo social atual inerentemente restringe a uma vasta quantidade de possível prosperidade /
resolução de problemas, devido à sua própria concepção e instituições, portanto, ativistas e instituições
sociais que evitem essa realidade só podem estar trabalhando para ajudar a "remendar" problemas, não
corrigi-los, já que eles se originam do próprio sistema social. Um exemplo comum é o de organizações de
caridade que desejam fornecer alimento aos pobres. Essas organizações não estão geralmente abordando
por que essas pessoas são pobres para começar e, portanto, não estão realmente trabalhando para
resolver a raiz do(s) problema(s).
29

4. Lógica vs Psicologia

"Nós não agimos corretamente porque temos virtude ou excelência, mas


provavelmente temos estas porque agimos corretamente".[56]

- Aristóteles -

Uma consequência poderosa, mas muitas vezes despercebida, da nossa


vulnerabilidade ambiental em adaptar-se à cultura existente, é que a nossa própria
identidade e personalidade está, muitas vezes, ligada às instituições, práticas,
tendências e, portanto, aos valores sob os quais nascemos e existimos. Esta
adaptação psicológica e a inevitável familiaridade criam uma zona de conforto que,
ao longo do tempo, pode ser dolorosa de interromper, independentemente de quão
bem fundamentados sejam os dados que afirmam o contrário do que acreditamos.

Na verdade, a maior parte das objeções ao Movimento Zeitgeist encontradas


atualmente, em específico os pontos que dizem respeito às soluções e, portanto, às
mudanças, parecem guiadas por estreitas molduras de referência e de um viés
emocional, mais do que por uma avaliação intelectual. Reações comuns deste tipo
são muitas vezes proposições únicas, as quais, ao invés de abordarem criticamente
as verdadeiras premissas articuladas em um argumento, servem para rejeitá-lo
completamente através de associações aleatórias.

A mais comum classificação desses argumentos são "projeções" [57], e torna-se


claro muitas vezes que esses adversários estão na verdade mais preocupados em
defender sua identidade psicológica do que em considerar objetivamente uma nova
perspectiva. [58]

Bloqueio Mental (Mind Lock)

Em uma obra clássica dos autores Cohen e Nagel, intitulada "An Introduction to
Logic and the Scientific Method" [Uma introdução à Lógica e ao Método Científico],
este ponto é abordado de forma pertinente no que diz respeito ao processo de
avaliação lógica e sua independência da psicologia humana.

"O peso da evidência não é por si só um evento temporal, mas uma relação de
implicação entre determinadas classes ou tipos de proposições... Claro, o
pensamento é necessário para apreender tais implicações... no entanto, ele não faz
da Física um ramo da Psicologia. A percepção de que a lógica não pode ser restrita a
fenômenos psicológicos nos ajudará a distinguir entre a nossa ciência e a nossa
retórica - concebendo esta última como a arte da persuasão ou de discutir de modo
a produzir a sensação de certeza. Nossas disposições emocionais dificultam a nossa
aceitação de certas proposições, não importa o quão forte seja a evidência em seu
30

favor. E uma vez que todas as provas dependem da aceitação de certas proposições
como verdadeiras, nenhuma proposição pode ser comprovada como verdadeira a
quem está suficientemente determinado a não acreditar." [59]

O termo "Bloqueio Mental" (Mind Lock) foi cunhado por alguns filósofos [60] no que
diz respeito a este fenômeno, definindo-o como "a condição em que a perspectiva
de alguém torna-se auto-referente, formando um circuito fechado de raciocínio".
Pressupostos aparentemente empíricos moldam e protegem a visão de mundo de
um indivíduo e qualquer coisa contrária vinda de fora pode ser "bloqueada", muitas
vezes mesmo inconscientemente. Esta reação pode ser comparada ao reflexo físico
comum de proteger-se de um objeto estranho em movimento em direção a si - só
que nessa circunstância o "reflexo" é defender suas crenças, e não seu corpo.

Embora frases como "pensar fora da caixa" possam ser uma retórica comum hoje
em dia na comunidade ativista, raramente os fundamentos da nossa maneira de
pensar e da integridade de nossas instituições mais estabelecidas são desafiados.
Eles são, na maioria das vezes, considerados "fatos óbvios" e assumidos como
inalteráveis.

Por exemplo, nas assim chamadas democracias do mundo, um "Presidente", ou


equivalente, é um ponto de foco comum em relação à qualidade do governo de um
país. Uma grande quantidade de atenção é gasta em tal figura, suas perspectivas e
ações. No entanto, raramente alguém se pergunta: "Para começar, por que temos
um Presidente?" "Como se justifica o seu poder enquanto figura institucional como
uma forma otimizada de governança social?" "Não é uma contradição alegar que
uma sociedade é democrática quando o público não pode realmente opinar e
interferir nas ações do presidente, uma vez que ele ou ela é eleito?"

Tais questões são raramente consideradas já que as pessoas tendem, mais uma vez,
a se adaptar à sua cultura, sem objeção, assumindo que é "do jeito que é". Tais
orientações estáticas são quase universalmente resultado da tradição cultural e,
como Cohen e Nagel apontam, é muito difícil comunicar uma ideia nova e
desafiadora para aqueles que estão "suficientemente determinados a não acreditar
nela."

Tais pressupostos tradicionais, tidos como empíricos, são provavelmente uma fonte
enraizada de retardo pessoal e social no mundo de hoje. Esse fenômeno,
juntamente com um sistema educacional que reforça constantemente tais noções
estabelecidas por meio de suas instituições de "academia", sela ainda mais esta
inibição cultural e agrava o obstáculo a uma mudança relevante. [61]

Embora o alcance dessa tendência seja amplo no que diz respeito ao debate, há aqui
duas falácias argumentativas comuns, dignas de nota, pois surgem constantemente
31

quando da relação com as Aplicações e Linha de Raciocínio promovidas pelo MZ. Em


termos técnicos, essas táticas compreendem o que poderia ser chamado de "Guerra
de Valores" [62], que é conduzida, conscientemente ou não, por aqueles que têm
interesses emocionais/materiais próprios em manter as coisas do modo como estão,
opondo-se à mudança.

A falácia "Prima Facie"

A primeira é a associação "Prima Facie". Esta significa simplesmente "sob primeira


impressão", "antes de investigação" [63]. E é de longe o tipo mais comum de
objeção.

Um clássico estudo de caso é a acusação comum de que as observações e soluções


apresentadas pelo MZ são simplesmente um "Comunismo Marxista" requentado.

Exploremos isso brevemente como um exemplo. Referenciando "O Manifesto


Comunista" [64], Marx e Engels apresentam várias observações com relação à
evolução da sociedade, especificamente a "luta de classes", as relações estruturais
inerentes ao "capital", juntamente com uma lógica geral de como a ordem social
transitará através de "revolução" para um sistema, em parte, sem estado, sem
classes, enquanto, ao mesmo tempo, observando uma série de mudanças sociais
diretas, como a "Centralização dos meios de comunicação e transporte nas mãos do
Estado", a "Responsabilidade igualitária de todos para o trabalho" e outras
particularidades. Marx cria papéis no esquema que ele sugere como uma batalha
em curso entre a "Burguesia e Proletários", expressando desprezo pela exploração
inerente, que ele diz ser essencialmente enraizada na ideia de "propriedade
privada". No entanto, a meta acumulada em geral é a busca de uma "sociedade sem
Estado e sem classes".

Superficialmente, reformas propostas por soluções promovidas pelo MZ podem


parecer espelhar atributos do "Marxismo", se se ignorasse completamente o
raciocínio subjacente. A ideia de uma "sociedade sem classes", "sem propriedade
universal" e a redefinição completa do que seja o "Estado" pode, superficialmente,
mostrar confluência entre os simples gestos em si, especialmente uma vez que a
Academia Ocidental comumente promove uma "dualidade" entre "Comunismo" e
"Capitalismo", usando dos pontos característicos já mencionados como as
diferenças fundamentais. No entanto, a Linha de Raciocínio para apoiar essas
conclusões aparentemente semelhantes é bastante diferente.

As referências defendidas pelo MZ para a tomada de decisão não são uma Filosofia
Moral [65] que, quando examinadas em sua raiz, são essencialmente o que foi a
manifestação filosófica Marxista.
32

O MZ não está interessado nas noções poéticas, subjetivas e arbitrárias de "uma


sociedade justa", de "liberdade garantida", "paz mundial", ou em "fazer um mundo
melhor", simplesmente por parecer "certo", "humano" ou "bom". Sem uma
Estrutura Técnica que tenha um referente físico direto a tais termos, tal relativismo
moral tem pouco ou nenhum propósito a longo prazo.

Em vez disso, o MZ está interessado em aplicação científica, orientada à


sustentabilidade social, física e cultural. [66]

Como será expresso em maior detalhe em capítulos posteriores, o Método da


Ciência não se restringe a sua aplicação no "mundo físico" [67] e, portanto, o
sistema social, a infra-estrutura, a relevância educacional e até mesmo o
entendimento do comportamento humano, todos existem dentro dos limites da
causalidade científica. Por sua vez, há um sistema de retroalimentação (feedback)
natural integrado à realidade física, que se expressa de forma muito clara em
termos do que "funciona" e do que "não funciona" ao longo do tempo [68], guiando
nossa adaptação consciente.

O marxismo não é baseado nessa visão de mundo "calculada", mesmo que possam
haver algumas características inerentes de base científica. Por exemplo, a noção
marxista de uma "sociedade sem classes" servia para superar a "desumanidade",
originada do capitalismo, que era imposta sobre a classe trabalhadora ou
"proletariado".

A linha de pensamento do MZ, por outro lado, tem por fontes avanços em estudos
humanos. Acredita-se, por exemplo, que a estratificação social, que é inerente ao
modelo capitalista de mercado, é realmente uma forma de violência indireta contra
a grande maioria, tida como resultante de uma psicologia evolutiva que nós, seres
humanos, naturalmente possuímos [69]. Isso gera uma forma desnecessária de
sofrimento humano, em muitos níveis, o que é desestabilizador e, por
consequência, tecnicamente insustentável.

Outro exemplo é o interesse do MZ na remoção de Propriedade Universal [70] e a


criação de um sistema de "acesso compartilhado". Isso é muitas vezes rapidamente
condenado à ideia marxista da "abolição da propriedade privada". No entanto, de
modo geral, a lógica marxista relaciona a existência da propriedade privada para a
perpetuação do "burguês" e sua exploração contínua do "proletariado". Ele afirma,
no Manifesto, "A característica distintiva do comunismo não é a abolição da
propriedade em geral, mas a abolição da propriedade burguesa."

A lógica defendida pelo MZ, por outro lado, refere-se ao fato de que a prática da
posse universal e individual de mercadorias é ambientalmente ineficiente, um
desperdício e, por fim, insustentável como prática universal. Isso apoia um sistema
33

de comportamento restritivo e uma grande quantidade de privação desnecessária e,


por consequência, o crime torna-se comum em sociedades com uma distribuição
desigual de recursos.

De qualquer forma, tais alegações "prima facie" são muito comuns e muito mais
poderia ser comentado. No entanto, não é o escopo desta seção discutir todas as
supostas conexões entre marxismo e a linha de pensamento defendida pelo MZ.
[71]

A Falácia do "Espantalho"

A segunda falácia argumentativa tem a ver com a deturpação de uma posição,


deliberada ou projetada, comumente referida como a falácia do "Espantalho" [72].
Quando se trata do MZ, isso geralmente tem a ver com interpretações forçadas, as
quais não possuem evidência significativa para serem consideradas relevantes ao
ponto em questão.

Por exemplo, ao discutir a organização de um novo sistema social, as pessoas


costumam projetar os seus valores e as preocupações atuais para o novo modelo,
sem considerar ainda a grande mudança de contexto que provavelmente anularia
essas preocupações imediatamente.

Uma dessas projeções do espantalho seria a de que em uma sociedade onde as


produções de materiais fossem baseadas em aplicação tecnológica direta, e não
num sistema de troca que exige trabalho humano remunerado, as pessoas não
teriam nenhum incentivo monetário para fazer qualquer coisa e, portanto, o modelo
seria um fracasso, já que nada seria levado a diante.

Esse tipo de argumento é sem validade testável com relação às ciências humanas e é
realmente uma suposição intuitiva proveniente do clima cultural atual, onde o
sistema econômico coage todos os seres humanos a papéis de trabalho de
sobrevivência (receita/lucro), muitas vezes independentemente de interesse pessoal
ou utilidade social, gerando uma distorção psicológica com relação ao que cria
motivação.

Nas palavras de Margaret Mead: "Se você olhar atentamente, verá que quase tudo o
que realmente importa para nós, tudo o que encarna o nosso mais profundo
compromisso com a maneira como a vida humana deve ser vivida e cuidada,
depende de alguma forma de voluntariado." [73]

Em uma pesquisa da opinião pública de 1992, mais de 50% dos adultos norte-
americanos (94 milhões de norte-americanos) se voluntariaram para causas sociais,
34

a uma média de 4,2 horas por semana, num total de 20,5 bilhões de horas por ano.
[74]

Também foi descoberto em estudos que empregos mundanos e repetitivos se


prestam mais a recompensas tradicionais, como dinheiro, ao passo que o dinheiro
não parece motivar a inovação e criatividade. [75] Em capítulos posteriores, a ideia
de Mecanização aplicada ao trabalho mundano para libertar o ser humano será
discutida, indicando como o sistema de trabalho por renda é desatualizado e
restritivo, não só para o potencial industrial e a eficiência, mas também para o
potencial humano em geral.

Outro exemplo comum da falácia do espantalho é a afirmação de que, se a transição


para um novo sistema social for posta em prática, a propriedade dos outros deve ser
vigorosamente confiscada por um "poder de decisão" e a violência seria o resultado.
Isto, mais uma vez, é uma projeção/medo sem validação, imposta sobre a lógica
defendida pelo MZ.

O MZ enxerga a materialização de um novo modelo sócio-econômico acontecendo


com o consenso necessário da população. O seu próprio entendimento, juntamente
com as "pressões biossociais" que ocorrem enquanto o sistema atual piora, são a
base de influência. A lógica não suporta a disposição "ditatorial", porque essa
abordagem, além de ser desumana, não iria funcionar. Para que esse sistema
funcione, ele precisa ser aceito sem coerção estatal ativa. Portanto, é uma questão
de investigação, educação e ampla aceitação pessoal pela comunidade. Na verdade,
as próprias particularidades da interação social e estilo de vida realmente exigem
uma grande aceitação dos mecanismos e valores do sistema.

Da mesma forma, e último exemplo aqui do "Espantalho", é a confusão sobre como


a transição para um novo sistema poderia acontecer. Na verdade, muitos tendem a
ignorar as propostas do MZ apenas por essa questão, simplesmente porque não
entendem como isso pode acontecer. Este argumento, em princípio, é o mesmo
raciocínio do exemplo de um homem doente que está buscando tratamento para a
sua doença, mas que não sabe onde pode obter tal tratamento, quando esse estaria
disponível, ou qual é o tratamento. Será que sua falta de saber como e quando
conseguir o tratamento de fato interrompe a sua necessidade de busca pelo
mesmo? Não - não se ele quiser ser saudável. Dado o péssimo estado das coisas
neste planeta, a humanidade também deve continuar buscando, e um caminho
inevitavelmente aparecerá. [76]

Os argumentos "Prima facie" e do "Espantalho" são a base da grande maioria das


objeções encontradas com respeito ao MZ e no Apêndice D - "Objeções Comuns" -
mais exemplos podem ser encontrados para referência.
35

Finalmente, vale a pena reiterar que a batalha entre Lógica e Psicologia é realmente
um conflito central na arena da mudança social. Não existe nenhum contexto mais
pessoal e sensível do que a forma como organizamos a nossa vida em sociedade, e
um importante objetivo do MZ, em muitos aspectos, é encontrar técnicas que
possam educar o público quanto ao mérito desta linha de pensamento lógica e
mecanicista, superando a bagagem de confortos psicológicos desatualizados que
não possuem nenhum valor progressista viável no mundo moderno.

Notas de rodapé para "Lógica vs Psicologia"

[56] Will Durant, A História da Filosofia: A Vida e Opiniões dos maiores filósofos do Mundo, 1926

[57] Sigmund Freud foi o primeiro a tornar famosa a ideia de Projeção Psicológica, definida como "um
mecanismo de defesa psicológico em que a pessoa inconscientemente nega seus próprios atributos,
pensamentos e emoções, que são atribuídos ao mundo exterior, geralmente para outras pessoas." No
entanto, o uso do termo é mais geral, nesse contexto, refletindo a simples noção de assumir a
compreensão de uma ideia baseada em uma relação falsa ou superficial de entendimentos anteriores -
geralmente em uma postura defensiva que rejeite sua validade.

[58] O termo "Patologia Cognitiva" é um conceito sugerido deste fenômeno. Uma característica comum é o
"raciocínio circular", onde a crença é justificada meramente ao se re-referenciar a própria crença. Por
exemplo, ao questionar um teísta porque ele acredita em Deus, uma resposta comum pode ser "Fé".
Perguntar por que ele tem "fé" muitas vezes resulta em uma resposta como "porque Deus recompensa
aqueles que têm fé". A orientação de causalidade é incompleta e auto-referente.

[59] Logic and The Scientific Method, Cohen e Nagel, Harcourt, 1934, p. 19

[60] Sugestão de leitura: The Cancer Stage of Capitalism, John McMurtry, Pluto Press, 1999, capítulo 1

[61] A crítica sobre "Academia" não deve ser confundida com a sua definição padrão, ou seja, uma
"comunidade de estudantes e docentes envolvidos no ensino superior e de pesquisa." O contexto aqui é a
natureza de inibição das "escolas" de pensamento que muitas vezes evoluem para criar um ego em si
mesmo, onde dados conflitantes são ignorados ou mesmo desmentidos. Além disso, há um risco comum a
este modo de pensamento onde a "teoria" e "tradição" sobrepõem, com muita frequência, a "experiência"
e "experimento", perpetuando conclusões falsas.

[62] Sugestão de leitura: Value Wars: The Global Market Versus the Life Economy: Moral Philosophy and
Humanity, John McMurtry, Pluto Press, 2002

[63] http://dictionary.reference.com/browse/prima+facie

[64] Escrito por Karl Marx e Friedrich Engels em 1848, este texto é amplamente considerado como a
expressão ideológica definitiva do comunismo marxista. O "comunismo" é considerado a aplicação prática
do "marxismo". Texto online: http://www.marxists.org/archive/marx/works/1848/communist-
manifesto/index.htm

[65] Definido como "o ramo da filosofia que trata do argumento sobre o conteúdo da moralidade e da
discussão meta-ética sobre a natureza do julgamento moral, linguagem, raciocínio e valor."
[http://www.thefreedictionary.com/moral+philosophy]
36

[66] O argumento de que a ciência não é uma filosofia é certamente aberto à semântica e interpretação,
mas o ponto que está sendo feito aqui é que as noções de "certo e errado" e outras distinções "éticas"
comuns na filosofia assumem uma ótica diferente no contexto científico, pois têm mais a ver com a
utilidade e equilíbrio do que meros conceitos de "moralidade", como é classicamente definido. Do ponto de
vista da ciência, o comportamento humano é mais alinhado com a causalidade inerente descoberta no
mundo natural, validada por meio de testes, construção de inferência lógica e associações para justificar as
ações humanas como "apropriadas" para uma determinada finalidade. Novamente, isso é sempre ambíguo
em certo nível e, provavelmente, o contexto mais preciso da filosofia em relação à ciência é o de um
precursor da validação durante a investigação e experimentação.

[67] O termo "mundo físico" é muitas vezes usado para diferenciar entre os processos "mentais" da mente
humana ou fenômenos do tipo sociológicos, e o ambiente físico que existe fora dos processos cognitivos da
percepção humana. Na realidade não há nada fora do "mundo físico", como o conhecemos, já que não se
encontra nenhum exemplo concreto onde as relações causais são simplesmente anuladas.

[68] Retroalimentação (Feedback) do Meio Ambiente poderia ser entendida como o "mecanismo de
correção" da natureza no que se refere a decisões humanas. Um exemplo simples seria a produção
industrial de produtos químicos que produzem retroações negativas quando liberados no meio ambiente,
mostrando a incompatibilidade com as necessidades ambientais de suporte à vida - como foi o caso dos
CFC's e seu efeito sobre a Redução da Camada de Ozônio.

[69] Sugestão de leitura: The Spirit Level, Kate Pickett & Richard Wilkinson, Bloomsbury Press, 2011

[70] Este conceito será explorado mais na Parte 3, mas vale a pena notar que o tipo de "acesso" habilitado
pelo sistema social sugerido (LNEBR) não exclui relações jurídicas para garantir o uso dos bens. A ideia de
reduzir o atual sistema de propriedade para um de "acesso protegido", onde, por exemplo, uma câmera
obtida a partir de um centro de distribuição garante o aspecto lícito do seu aluguel para essa pessoa, não
deve ser confundido com a noção capitalista de propriedade, que é uma distinção universal e uma grande
fonte de ineficiência industrial e desequilíbrio.

[71] Veja o Apêndice D, Objeções Comuns

[72] Provavelmente a melhor descrição disso é imaginar uma luta em que um dos adversários constrói um
homem feito de palha, ataca-o, em seguida, proclama vitória. Ao mesmo tempo, o verdadeiro oponente
continua intocado.

[73] "Have you noticed...", Vital Speeches of the Day, Robert Krikorian, 1985, p. 301

[74] Giving and Volunteering in the United States: Findings from a National Survey, Hodgkinson &
Weitzman, 1992, p. 2

[75] Sugestões de leitura: Drive: The Surprising Truth About What Motivates Us, Daniel Pink, Riverhead,
2011

[76] Mais informações sobre o tema da Transição na Parte IV


37

5. A Questão da Unidade Humana

O meu país é o mundo, e a minha religião é fazer o bem."[77]

- Thomas Paine -

Uma conclusão fundamental que ressoa da lógica defendida pelo MZ é que a


sociedade humana precisa unificar suas operações econômicas e trabalhar para se
alinhar com a dinâmica natural do mundo físico, como uma única espécie
compartilhando um único habitat, se quisermos resolver os problemas, aumentar a
segurança, aumentar a eficiência e prosperar. As divisões econômicas mundiais que
vemos hoje não são apenas uma fonte clara de conflito, desestabilização e
exploração, a própria forma de conduta e interação em si também é extremamente
ineficiente em um sentido econômico puro, limitando gravemente o nosso potencial
social. [78]

Enquanto Estado-nação, a estrutura baseada em competição é de fácil justificativa


como uma consequência natural da nossa evolução cultural, dada a escassez
inerente de recursos historicamente e a longa história da guerra em geral. Também
é natural considerar que a sociedade humana pode muito bem encontrar um
propósito em afastar-se desses modos de operação se percebermos que é de fato
vantajoso para todos nós como um grupo.

Como será discutido aqui, os malefícios e as ineficiências do modelo atual - quando


comparado com os possíveis benefícios e soluções - são simplesmente inaceitáveis,
e as possibilidades de eficiência e abundância, extrapoladas dentro do novo sistema
sócio-econômico defendido pelo MZ, repousam, em parte, em um esforço coletivo
da população humana em prol do trabalho em conjunto e compartilhamento de
recursos de forma inteligente, e não na restrição e luta como se espera do design
social atual.

Além disso, as hoje emergentes pressões sociais e riscos ao redor da guerra


tecnológica, poluição, desestabilização ambiental e outros problemas não mostram
apenas uma gravitação lógica em direção a uma verdadeira organização global - eles
mostram uma necessidade racional - e a mentalidade xenófoba e mafiosa natural do
Estado-nação atual, muitas vezes sob o rótulo de "patriotismo", é uma fonte de
desestabilização grave e de desumanidade generalizada, sem mencionar, mais uma
vez, a perda substancial de eficiência técnica.

Falsas Divisões

Como observado nos capítulos anteriores, a base central da nossa sobrevivência e


qualidade de vida, como indivíduos e como espécie, no planeta Terra, gira em torno
38

da nossa compreensão da Lei Natural e de como ela se relaciona com o nosso


método de economia. Esta premissa é uma compreensão referencial simples, onde
as leis físicas da natureza são consideradas no contexto da eficiência econômica,
tanto nos níveis humanos e de habitat.

É lógico que qualquer espécie dependente do habitat em que vive deve alinhar suas
condutas com a ordem natural inerente ao mesmo, da melhor forma que a atual
compreensão permita. Qualquer outra inclinação é irracional e, por definição, só
poderá trazer problemas.

Entendendo que o planeta Terra é um "Sistema" simbiótico/sinérgico com recursos


disponíveis sem nenhum viés nacionalista, associado a uma inerente ordem causal
científica subjacente, que em muitos aspectos serve como um "guia" lógico para a
espécie humana se alinhar, permitindo uma maior eficácia social, descobrimos que
nosso contexto mais amplo, como uma sociedade global, transcende praticamente
todas as noções de divisão tradicional/cultural, o que inclui não prestar nenhuma
lealdade a um país, empresa ou até mesmo tradição "política".

Se por "economia" entendemos o aumento da eficiência no atendimento às


necessidades da população humana, que, ao mesmo tempo, trabalha por uma
maior sustentabilidade e prosperidade, então nossas operações econômicas devem
levar isso em conta e se alinhar com o mais amplo e relevante "sistema" natural que
pudermos entender. A partir desta perspectiva, as entidades do Estado-nação são
claramente falsas. São divisões arbitrárias, perpetuadas pela tradição cultural, que
não são lógicas nem possuem eficiência técnica.

Valores

A organização geral da sociedade de hoje é baseada em uma competição humana


em muitos níveis: os estados-nação competem entre si por recursos
físicos/econômicos; as entidades do mercado corporativo competem por
lucro/participação de mercado, e os trabalhadores comuns competem por
ocupações que proporcionem salários e, portanto, sobrevivência pessoal.

Sob a superfície desta ética social competitiva está um desrespeito psicológico


básico ao bem-estar alheio e ao habitat. A própria natureza da competição
pressupõe levar vantagem sobre os outros por um ganho pessoal e, logo, a divisão e
exploração (de seres humanos e meio ambiente) são atributos fundamentais da
ordem social vigente. Praticamente todas as ditas "corrupções", definidas como
"crime" no mundo contemporâneo, são baseadas na mesma mentalidade que
orienta o "progresso" do mundo através do valor competitivo.
39

Não é à toa, de fato, dado este quadro e sua crescente miopia, que várias outras
divisões sociais, superficiais e nocivas, ainda são perpetradas - tais como raça,
religião, credo, classe ou preconceito xenófobo. Essa antiga bagagem de divisão
trazida dos estágios de medo da nossa evolução cultural, simplesmente, não tem
sentido dentro da realidade física. E agora serve apenas para impedir o progresso, a
segurança e a sustentabilidade.

Hoje, como será descrito em capítulos posteriores, os possíveis métodos produtores


de abundância e eficiência - que poderiam remover a maior parte das privações
humanas, aumentar muito o padrão médio de vida, aperfeiçoar a saúde pública e
melhorar a sustentabilidade ecológica - são deixados de lado devido às tradições
sociais antigas que hoje vigoram, incluindo o conceito de Estado-nação. O fato é que
existe tecnicamente apenas uma raça - a Raça Humana [79]; há apenas um único
habitat básico - a Terra; e existe apenas uma maneira funcional de pensamento
operacional - Científica.

Origens e Influência

Vamos considerar rapidamente as origens do modelo divisório/competitivo. Sem


entrar em muitos detalhes, está claro que a evolução da sociedade humana incluiu
uma história de conflitos, escassez e desequilíbrio. Embora existam debates sobre a
natureza da sociedade durante o período de tempo que antecede a Revolução
Neolítica [80], a terra desde essa altura tem sido um campo de batalha onde foram
tomadas inúmeras vidas por causa da concorrência, seja material ou ideológica. [
81]

Este reconhecido padrão é, de fato, tão difundido que muitos, hoje, atribuem a
propensão para o conflito e dominação a uma característica implacável de nossa
natureza humana, concluindo que o ser humano é simplesmente incapaz de operar
em um sistema social que não seja baseado neste quadro competitivo, e que
qualquer esforço nesse sentido criará uma vulnerabilidade a ser explorada por um
poder após o outro, expressando esse aparente traço dominante/competitivo. [82]

Enquanto o assunto "natureza humana" em si não é o foco direto deste capítulo


[83], que seja contextualmente especificado que a suposição de "abuso de poder
prático" tem sido uma grande parte da defesa do modelo divisório/competitivo,
usando uma visão geral da história como base para sua validade. No entanto, as
condições detalhadas desses períodos históricos e a conhecida flexibilidade do ser
humano são muitas vezes desconsideradas nessas avaliações. [84]

Os padrões históricos de conflitos ao longo da história não podem ser levados em


conta isoladamente. Uma referência detalhada a essas condições e circunstâncias se
faz necessária. Na verdade, é possível dizer que a propensão à dominação e conflito,
40

que é, visivelmente, uma possível reação de quase todos os seres humanos, haja
vista nossa necessidade de preservação e sobrevivência [85], seja provocada pela
influência social mais do que seja ela a fonte de tal reação. Quando nos
perguntamos como o exército nazista foi capaz de justificar moralmente suas ações
na Segunda Guerra Mundial, muitas vezes esquecemos a enorme campanha de
propaganda promovida por aquele regime, que trabalhou para explorar essa
vulnerabilidade essencialmente biológica. [86]

O Verdadeiro "Interesse pessoal"

A noção de "interesse pessoal" é claramente inerente ao desejo comum do ser


humano de sobreviver. Isso é bastante óbvio e é fácil ver como, historicamente, a
necessidade bruta de sobrevivência pessoal, que muitas vezes se estende à família
e, em seguida, à "tribo" (comunidade local), configuraram o cenário para o
complexo e divisório paradigma que existe hoje. Do ponto de vista histórico, deveria
ser esperado que grandes teorias econômicas seriam baseadas na noção de
competição e desigualdade, como na obra de Adam Smith. Considerado o pai do
livre mercado, ele tornou popular a suposição de que se todos tivessem a ética de
cuidar apenas de si, o mundo progrediria como uma comunidade [87].

Esta noção de "Mão Invisível" de progresso humano decorrente do estreito auto-


interesse pessoal pode ter sido uma filosofia viável há muitos anos atrás, quando a
simplicidade da própria sociedade era baseada na ideia de todos como sendo
produtores [88]. No entanto, a natureza da sociedade mudou muito ao longo do
tempo com o aumento da população, estruturas com propósitos inteiramente
diferentes, e a tecnologia avançando exponencialmente. Os riscos associados a este
tipo de pensamento estão agora a revelar-se mais perigosos do que benéficos, e a
definição de "interesse pessoal" está tomando um contexto maior do que nunca.

Não é do seu interesse pessoal proteger e cultivar o habitat que o sustenta? Não é
do seu interesse pessoal cuidar da sociedade como um todo, provendo a seus
membros, para que as consequências da privação, tais como o "crime", sejam
reduzidas tanto quanto possível para garantir a sua segurança? Será que não é
interesse pessoal considerar as consequências das guerras imperialistas que podem
produzir ódio xenofóbico/nacionalista feroz de um lado do planeta, apenas para,
digamos, uma mala-bomba explodir atrás de você em um restaurante como um ato
desesperado de "retribuição" e vingança?

Não é interesse pessoal garantir a todas as crianças das sociedades - não apenas as
suas - que tenham a melhor criação e educação para que o seu futuro e o futuro de
seus filhos possam existir em um mundo responsável, educado, e cada vez mais
produtivo? Não é do seu interesse pessoal certificar-se de que a indústria esteja tão
organizada, otimizada e cientificamente acurada quanto possível, de modo que não
41

produzamos tecnologia barata, inferior, que possa talvez causar um problema social,
no futuro, se falhar?

O ponto fundamental é que as coisas mudaram no mundo de hoje e seu "interesse


pessoal" agora é apenas tão bom quanto o seu "interesse social". Ser competitivo e
viver pra si mesmo, passar por cima dos outros, só tem uma consequência negativa
no longo prazo, pois isso é não reconhecer o extenso sistema no qual estamos todos
integrados. Uma usina de energia nuclear barata feita no Japão pode não significar
muito para as pessoas nos Estados Unidos. No entanto, se essa planta tiver uma
falha técnica em grande escala, a precipitação e a poluição podem chegar até os
lares americanos, provando que você nunca está seguro no longo prazo, a menos
que tenha uma consciência global.

Finalmente, apenas uma visão consciente da terra-humanidade pode garantir um


verdadeiro "interesse pessoal" a alguém no mundo moderno de hoje e, portanto,
garantir, em muitos aspectos, o nosso valor adaptativo social [89]. A própria ideia de
querer apoiar "seu país" e ignorar, ou até mesmo apreciar, o fracasso dos outros, é
um estado de desestabilização das coisas.

Guerras

Os dias de guerra prática há muito acabaram. Novas tecnologias no horizonte têm a


capacidade de criar armas que farão a bomba atômica parecer uma catapulta
romana, em seu poder destrutivo. [90] Séculos atrás, os danos da guerra poderiam
pelo menos se restringir às partes beligerantes envolvidas. Hoje, o mundo inteiro
está ameaçado. Existem hoje mais de 23 mil armas nucleares, que poderiam acabar
com a população humana muitas vezes. [91]

De muitas maneiras, a nossa própria maturidade social está sendo questionada


neste momento. Paus e pedras como armas podiam suportar uma grande
quantidade de distorção humana e más intenções. No entanto, em um mundo de
armas nano-tecnológicas que poderiam ser construídas em um pequeno laboratório
e com enorme poder destrutivo, o nosso "interesse pessoal" humano precisa
assumir o controle, e a instituição da guerra precisa ser sistematicamente
interrompida. A fim de fazer isso, as nações devem unificar-se tecnicamente e
partilhar os seus recursos e ideias, e não acumulá-los para o auto-aperfeiçoamento
competitivo, que é a norma hoje.

Instituições como as Nações Unidas tornaram-se fracassos completos a este


respeito, porque, naturalmente, tornam-se ferramentas de construção imperiais,
devido à natureza subjacente das divisões em países e à dominância sócio-
econômica do sistema baseado em propriedade / dinheiro / competição. Reunir
"líderes" globais em uma mesa para discutir os seus problemas simplesmente não é
42

suficiente - a própria estrutura precisa mudar para dar suporte a um tipo diferente
de interação entre esses "grupos" regionais, de forma que a perpétua "ameaça"
inerente entre os estados-nação seja removida.

Para finalizar, não há, empiricamente, propriedade de recursos ou ideias. Assim


como todas as ideias são desenvolvidas em série pela cultura através da "mente de
grupo", os recursos do planeta são igualmente transientes em suas funções e
definidos cientificamente de acordo com seus possíveis propósitos. A Terra é um
sistema único, juntamente com as leis da natureza que a governam. Ou a sociedade
humana reconhece e começa a agir sobre essa lógica inerente, ou sofreremos no
longo prazo.

Notas de rodapé para "A Questão da Unidade Humana"


[77] Rights of Man, Thomas Paine, 1791, p. 162

[78] Um exemplo disso seria o viés econômico patriótico que muitas vezes influencia as ações da indústria
regional. Na realidade física, tecnicamente existe apenas uma economia quando se trabalha com os
recursos do planeta Terra e as Leis Naturais. A ideia de "Produzido nos EUA", por exemplo, gera uma
ineficiência técnica imediata, pois a produção adequada de mercadorias é um assunto mundial em todos os
níveis, inclusive o usufruto do conhecimento do mundo. Restringir intencionalmente o trabalho e a
utilização/aquisição de materiais somente apenas dentro dos limites das fronteiras de um determinado
país é economicamente contraproducente no verdadeiro sentido da palavra "economia".

[79] No campo da genética humana, "Eva mitocondrial" refere-se ao ancestral matrilinear comum mais
recente (MRCA - do inglês, Most Recent Common Ancestor) dos humanos modernos. Em outras palavras,
ela era a mulher mais recente de que todos os seres humanos vivos hoje descendem, do lado materno.
Somos uma família." Além disso, descobriu-se que todas as características de diferença de raça
(características faciais, cor da pele) estão ligadas às condições ambientais em que esses sub-grupos de
seres humanos viveram e evoluíram. Portanto, isto é uma falsa distinção como um meio para discriminação
superficial.

[80] Às vezes também chamada de Revolução Agrícola, que foi a primeira revolução historicamente
verificável do mundo na agricultura. Foi a transição em larga escala de muitas culturas humanas de um
estilo de vida de caça e coleta para um de agricultura e colonização que suportou uma população cada vez
maior e é a base para os padrões da sociedade moderna de hoje.

[81] Somente no século 20, estatísticos afirmam que o número de mortes humanas da guerra varia entre
180 e 220 milhões, com alguns contrariando esses números, alegando evidências que colocam esses
números 3 vezes maiores em muitos casos regionais:
[http://www.sciencedaily.com/releases/2008/06/080619194142.htm ]

[82] Um texto clássico que empregava esse medo básico era de Hayek, "O Caminho da Servidão". Neste
trabalho de Hayek o conceito de "Natureza Humana" tinha uma implicação muito clara, justificada
fundamentalmente pelas tendências históricas do totalitarismo, o qual ele sugeria estar relacionado às
economias colaborativas e planejadas.

[83] Ver o capítulo: O Argumento Final: A Natureza Humana.


43

[84] Foi comprovado que o Debate Natureza/Criação é uma falsa dualidade nos campos de estudo da
psicologia comportamental biológica-evolucionária. A realidade é a de uma interação contínua, com o peso
da relevância variando de caso a caso. No entanto, o que é relevante aqui é o estudo do "gradiente de
comportamento" do ser humano e exatamente quão adaptáveis e flexíveis somos. Sugestões de leitura:
Why Zebras Don't Get Ulcers, Robert Sapolsky, W. H. Freeman, 1998.

[85] Comumente denominada: "A resposta de luta ou fuga" (ou a resposta ao estresse agudo) e foi descrita
pela primeira vez pelo fisiologista americano Walter Bradford Cannon.

[86] "Porque, naturalmente, as pessoas não querem guerra. Por que um pobre coitado em uma fazenda vai
querer arriscar a sua vida em uma guerra quando o seu maior ganho é conseguir voltar inteiro para sua
fazenda? Naturalmente, as pessoas comuns não querem guerra, nem na Rússia, nem na Inglaterra, nem
mesmo na Alemanha. Isso é compreensível. Mas, afinal de contas, são os líderes do país que determinam a
política e é sempre uma simples questão de arrastar o povo, seja isso uma democracia, ditadura fascista,
parlamento ou ditadura comunista. Com voz ou sem voz, o povo sempre pode ficar à disposição dos líderes.
Isso é fácil. Tudo que você tem a fazer é dizer-lhes que estão sendo atacados e denunciar os pacifistas por
falta de patriotismo e expor o país ao perigo. Isso funciona da mesma forma em qualquer país ", Hermann
Göring [um dos principais membros do Partido Nazista; Em uma entrevista com Gilbert na cela prisional de
Göring durante o Tribunal de Crimes de Guerra de Nuremberg (18 de abril de 1946)].

[87] "Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro e do padeiro que esperamos o nosso jantar, mas
da consideração que eles têm pelos próprios interesses. Apelamos não à humanidade, mas ao amor-
próprio, e nunca falamos de nossas necessidades, mas das vantagens que eles podem obter.
"- Adam Smith, A Riqueza das Nações, Uma Investigação Sobre a Natureza, Vol. 1

[88] Em 1917, o sociólogo Thorstein Veblen escreveu esta observação perspicaz com relação às mudanças
na sociedade e como elas refletem a premissa original da economia de mercado."As teorias padrão da
ciência econômica assumiram os direitos de propriedade e contrato como premissas axiomáticas e termos
finais de análise; e suas teorias são geralmente desenhadas de tal forma a se encaixarem às circunstâncias
da indústria artesanal e do pequeno comércio... Essas teorias... parecem convincentes, em geral, quando
aplicadas à situação econômica daquela época... É quando essas teorias padrões são aplicadas à situação
atual, que superou as condições de produção artesanal, que elas parecem inoperantes e aberrantes." [Uma
Investigação Sobre A Natureza Da Paz E Os Termos Da Sua Perpetuação] Ele também antecipou a ascensão
da "classe de investimento", na forma das atuais instituições financeiras não-produtoras, tais como bancos
e mercado de ações, que se tornaram mais lucrativas do que a própria produção de bens de verdade.

[89] Valor adaptativo é um termo biológico geralmente definido como "A probabilidade de que a
descendência de um indivíduo que possui uma característica específica não vai perecer." Neste contexto,
estamos ligando as ações humanas, socialmente, com a ideia de sobrevivência da espécie.

[90] Ref: http://crnano.typepad.com/crnblog/2005/05/applicationsfo.html

[91] Ref: http://www.wagingpeace.org/articles/dbarticle.php?article_id=253


44

6. O Argumento Final: A Natureza Humana

"O homem adquire, ao nascer, através da hereditariedade, uma constituição


biológica, que devemos considerar fixa e inalterável, incluindo os impulsos naturais
característicos da espécie humana. Além disso, durante a vida, ele recebe uma
constituição cultural fornecida pela sociedade através da comunicação e de muitos
outros tipos de influências. É esta constituição cultural que, com o passar do tempo,
é sujeita à mudança e determina em larga escala a relação entre o indivíduo e a
sociedade."[92]

- A. Einstein -

A "Linha de Pensamento" e o "Conjunto de Aplicações" [93], apresentados em


materiais do MZ, são técnicos por natureza, expressando o interesse na aplicação do
método e do mérito da Causalidade Científica em prol do sistema social como um
todo.

Os benefícios desta abordagem não devem apenas ser levados em conta por seu
próprio mérito, mas também devem ser considerados em contraste com os
métodos tradicionais em voga e suas consequências. Assim será possível perceber
por comparação que os atuais métodos da sociedade não estão somente
grosseiramente ultrapassados e ineficientes - estão cada vez mais perigosos e
desumanos -, tornando ainda mais importante a necessidade de mudanças sociais
em larga escala. Não se trata de "Utopia" - mas sim de melhorias verdadeiramente
práticas.

A base geral do conceito de Mercado Monetário (capitalista, de livre mercado) tem


fundamentalmente a ver com os pressupostos relativos ao comportamento
humano, aos valores tradicionais e a uma visão intuitiva da história - e não a um
raciocínio emergente, a medidas reais de saúde pública, à capacidade técnica ou à
responsabilidade ecológica. É uma abordagem não-técnica e filosófica que
simplesmente assume que as decisões humanas feitas por meio de sua lógica
interna e de seu sistema de incentivos irão produzir um resultado responsável,
sustentável e humano, impulsionadas pela noção ilusória de "liberdade de escolha"
que, em uma perspectiva de funcionalidade social, parece equivalente a uma
anarquia organizacional. [94]

É por isso que o modelo de uma economia monetária de mercado é muitas vezes
considerado naturalmente religioso nos materiais do MZ, pois seu mecanismo
causal é baseado em suposições praticamente supersticiosas sobre a condição
humana, havendo pouca correlação com os entendimentos científicos emergentes
sobre nós mesmos e sobre a rígida relação simbiótica/sinérgica entre o nosso
habitat e as leis naturais que o regem.
45

Ao apresentar a Linha de Pensamento orientada a soluções do MZ aos que não o


conhecem, é quase sempre apenas uma questão de tempo até que ao menos a
premissa científica básica possa ser compreendida e aceita nos seus conceitos. Por
exemplo, o fato isolado sobre a nossa realidade técnica de termos os recursos e
métodos industriais necessários para facilmente alimentar todos no planeta Terra
de forma que ninguém passe fome, [95] raramente encontra objeção. Se hoje você
perguntar a qualquer pessoa se ela gostaria de ver o fim da fome de mais de 1
bilhão de pessoas no planeta, [96] ela provavelmente concordaria pela óptica
daquilo que é "moralmente correto".

No entanto, no momento em que a lógica retrata as reformas sociais e econômicas


em grande escala que são necessárias para fornecer um suporte real a esse 1 bilhão
de pessoas, muitos mostram desprezo e rejeição ao assunto. Além dessas
temporariamente inflexíveis associações "de valores" - quando as pessoas
essencialmente se recusam a mudar qualquer coisa a que se acostumaram em suas
vidas, mesmo que a mudança resulte claramente em um melhor resultado a longo
prazo - há um argumento tão comum que merece uma discussão preliminar.

É o argumento da "Natureza Humana". Este argumento pode também ser


considerado como a única objeção restante, se desconsiderarmos os quase
arbitrários estilos de vida e práticas culturais que as pessoas temem abandonar
devido às suas identidades e comodidades.

Seriam os seres humanos compatíveis com um sistema socioeconômico científico e


verdadeiramente sustentável ou estaríamos condenados ao mundo que temos hoje
por conta de nossa genética?

Tudo é Técnico

A razão de um novo sistema social baseado diretamente em uma visão científica,


que compreenda e maximize tecnicamente a sustentabilidade e a prosperidade, não
pode ser superada por uma outra abordagem, por mais corajosa que tal afirmação
possa parecer. Por quê? Porque simplesmente não há outra abordagem quando a
lógica natural e unificada do Método Científico é aceita como o mecanismo
fundamental de causalidade física e inter-relações.

Por exemplo, uma grande variação de superfície (ornamental) pode constar no


projeto de um avião, mas a mecânica que permite o voo está vinculada às leis da
física e, logo, o design físico geral do avião também estará, a fim de alinhá-lo a essas
mesmas leis e funções.

Construir uma máquina para realizar algum trabalho com o objetivo de otimizar o
desempenho, segurança e eficiência não é uma questão de opinião, assim como não
46

importa quantos enfeites coloquemos em nossas casas, a estrutura física da


construção deve estar de acordo com as rígidas leis da física e as dinâmicas naturais
do habitat, de modo a conferir segurança e resistência e, portanto, haverá uma
mínima variação no sentido técnico.

A organização da sociedade humana não pode ser diferente se o objetivo é a


integridade e otimização. Portanto, pensar na natureza funcional de uma sociedade
é pensar em um esquema mecanicista. Assim como projetaríamos um avião para
funcionar da melhor maneira tecnicamente possível, também deveríamos projetar o
sistema social, que é igualmente técnico em seu funcionamento.

Infelizmente, nunca na história foi dada uma verdadeira chance a essa perspectiva e
hoje o nosso mundo ainda caminha de forma incongruente, tendo como principal
incentivo o lucro pessoal e a vantagem imediata, no lugar de métodos industriais
estratégicos, alinhamento ecológico, estabilidade social, preocupação com a saúde
pública e sustentabilidade geracional.

Tudo isso está sendo dito novamente pois o argumento da Natureza Humana
mantido contra essa abordagem é realmente o único argumento aparentemente
técnico que pode defender o antiquado sistema que temos hoje; é realmente o
único argumento que resta quando as pessoas interessadas em manter esse sistema
percebem que não há nada mais que elas possam argumentar logicamente e que
seja viável, dada a irracionalidade inerente a qualquer outra objeção ao sistema
social baseado na lei natural.

Irracionalmente Limitado?

Resumindo, este desafio pode ser posto em uma pergunta: "Seria a espécie humana
capaz de se adaptar e prosperar em um sistema tecnicamente planejado e
organizado, onde nossos valores e práticas sejam alinhados com as leis conhecidas
da natureza, ou estaríamos limitados por nossos genes, biologia e psicologia
evolucionista, podendo apenas operar da forma como conhecemos hoje?"

Enquanto atualmente muitos argumentam sobre as especificidades do Debate


Natureza vs Criação - do Behaviorismo de "tábula rasa" [97] ao determinismo
genético [98] - tornou-se claro, no mínimo, que a nossa biologia, nossa psicologia e
nossa condição sociológica estão inexoravelmente ligadas ao ambiente em que
vivemos, tanto do ponto de vista da adaptação evolutiva geracional (Evolução
Biológica), como dos preconceitos e valores de curto prazo que absorvemos do
nosso meio ambiente (Evolução Cultural).

Então, antes de entrar em detalhes sobre este assunto, vale a pena notar que a
nossa própria definição de ser humano, na visão de longo e curto prazo, é baseada
47

em um processo de adaptação às condições existentes, incluindo os próprios genes.


[99] Isso não quer dizer que é preciso ignorar a relevância genética, mas que é
preciso destacar o processo do qual fazemos parte, uma vez que a relação gene-
ambiente só pode ser considerada como uma interação contínua, com as
consequências em grande parte resultando das condições ambientais a curto e
longo prazo. Se este não fosse o caso, não haveria dúvidas em admitir que a espécie
humana provavelmente teria desaparecido há muito tempo devido a uma falha em
se adaptar.

Além disso, embora esteja claro que nós, seres humanos, ainda mantemos reações
"inatas" e previsíveis de sobrevivência pessoal, [100] também temos a capacidade
de evoluir os nossos comportamentos através do pensamento, consciência e
educação, [101] o que nos permite, de fato, controlar e superar essas reações e
impulsos primitivos, se as condições necessárias forem mantidas e reforçadas. Esta é
uma distinção muito importante e é, de muitas maneiras, o que separa a variedade
dos seres humanos dos outros primatas. [102]

Uma observação rápida sobre a diversidade histórica da conduta humana ao longo


do tempo, em contraposição ao ritmo relativamente lento de maiores mudanças
estruturais em nossos cérebros e DNA [103] nos últimos dois mil anos, mostra que a
nossa capacidade de adaptação (via pensamento / educação) é enorme ao nível
cultural.

Parece que somos capazes de nos comportarmos de muitas maneiras possíveis, e


que uma "natureza humana" fixa, ou um conjunto universal e inalterável de traços
comportamentais e de reações comuns a todos os seres humanos, sem exceção, não
pode ser considerada válida. Em vez disso, parece haver um espectro de possíveis
comportamentos e reações previsíveis, todos mais ou menos dependentes do tipo
de desenvolvimento, educação, estímulos e condições que tivemos.

A esse respeito, não há como enfatizar suficientemente o imperativo social, pois a


influência do meio ambiente é um fator enorme a condicionar não só nossas
preferências de tomada de decisão em curto e em longo prazo, como também a
interação ambiental global com a nossa biologia, a qual também tem efeitos
poderosos sobre o bem-estar pessoal e, consequentemente, em muitos aspectos da
saúde pública.

Verificou-se que as condições ambientais, incluindo fatores como dieta nutricional,


[104] segurança emocional, [105] associação social [106] e todas as formas de
estresse podem influenciar o ser humano de muito mais maneiras do que antes se
pensava. Esse processo começa no útero, nos períodos de adaptação pós-natal e no
"aprendizado planejado" da infância, [107] e continua ao longo da vida em todos os
aspectos fisiológicos e psicológicos.
48

Por exemplo, embora haja evidências de que a depressão, um distúrbio psicológico,


possa contar com uma predisposição genética, é o ambiente que realmente a
provoca ou não [108]. Novamente, não se procura aqui minimizar a influência da
biologia sobre nossas personalidades, mas de mostrar a importância crítica em
compreender essas realidades e adaptar o nosso sistema social e as macro
influências, permitindo o resultado mais positivo possível.

Mudando As Condições

A ideia de mudar influências/pressões da sociedade para fazer aflorar o melhor da


condição humana ao invés do pior, é o cerne do imperativo social do MZ, e essa
ideia é infelizmente ignorada em considerações sociais da cultura de hoje. Existem
evidências enormes que indicam que a influência do meio ambiente é o que
essencialmente cria nossos valores e preconceitos e, embora as influências
genéticas/fisiológicas possam determinar tendências e acentuações para certos
comportamentos, a influência mais ativa em relação à nossa variabilidade é a
experiência de vida e a condição do ser humano, sendo portanto a forma de
interação entre o "interno" (fisiológico) e "externo" (ambiental).

Em última instância, a questão mais relevante é o estresse. Nossos genes, biologia e


psicologia evolutiva podem ter alguns problemas, mas não são nada em comparação
com a desordem ambiental que criamos em nossa cultura. A enormidade de um
estresse atualmente desnecessário no mundo de hoje - dívida, incerteza de
trabalho, aumento de riscos de saúde, tanto em nível mental como fisiológico - e
muitas outras questões criaram um clima de mal-estar que tem tornado as pessoas
cada vez mais doentes e perturbadas.

No entanto, o escopo dessa visão não é apenas tratar das várias pressões temporais
que podem desencadear esta ou aquela propensão específica - é sobre tratar de
todos os valores educacionais, religiosos/filosóficos, políticos, sociais e ideais
perpetuados e reforçados por essas pressões. Se fôssemos confrontados com uma
opção de adaptar a nossa sociedade de uma forma que possa comprovadamente
melhorar a saúde pública, nós simplesmente não o faríamos? Pensar que os seres
humanos em uma sociedade são simplesmente incompatíveis com métodos que
possam aumentar seu padrão de vida e de saúde é extremamente improvável.

Concluindo esta seção, afirmemos que a "Natureza Humana" é um dos temas mais
complexos se levarmos em conta suas minúcias. No entanto, a ampla consciência
sobre uma provável melhoria da saúde pública básica por meio de redução do
estresse, aumento da qualidade nutricional e estabilização da sociedade,
trabalhando em direção à abundância e simplicidade ao invés de conflitos e
complexidade, não é suscetível a muitos debates.
49

Sabemos atualmente de algumas verdades sobre a condição humana que nos


fornecem evidências suficientes de que não só geramos respostas e hábitos pobres
a partir da influência da atual ordem socioeconômica, como também
desrespeitamos muito o nosso habitat, o que gera não só uma ausência de
sustentabilidade no sentido ecológico, mas também no sentido cultural. Pensar que
os seres humanos simplesmente são incompatíveis com essas resoluções, mesmo
que signifique mudar muito o nosso mundo, põe em cheque a longa história de
adaptação que provamos ser capazes de traçar.

Notas de rodapé para "O Argumento Final: Natureza Humana"

[92] "Por que socialismo?" http://monthlyreview.org/2009/05/01/why-socialism

[93] Estes termos estão detalhados na Lista de Vocabulário - Apêndice A. A "Linha de Pensamento" tem a
ver com o raciocínio subjacente que leva às conclusões defendidas pelo MZ - enquanto o "Conjunto de
Aplicações" é simplesmente o estado atual da tecnologia. A diferença entre os dois é que o primeiro é
quase empírico, enquanto o segundo é transitório já que as ferramentas tecnológicas estão sempre em
mutação.

[94] Muito pode ser dito sobre o assunto de organização econômica e mecanismos de produção industrial,
e muito mais será descrito na Parte 3. No entanto, é necessário afirmar aqui que o "mecanismo de preços",
que é o catalisador fundamental do desdobramento do desenvolvimento econômico, é inerentemente
anárquico devido à falta de relações sistêmicas eficientes nas práticas macro-industriais. Produção,
distribuição e alocação de recursos não são de forma alguma "estratégicos" no sentido físico e técnico - a
única estratégia utilizada, definida como "eficiência" na economia de mercado, tem a ver com o lucro e
perda / custo do trabalho / despesa. Apenas parâmetros monetários que não possuem nenhuma
vinculação com a eficiência física.

[95] Isto foi confirmado pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação e pelo
Programa Alimentar Mundial. Este site é recomendado para referência:
http://overpopulationisamyth.com/food-theres-lots-it#header-1

[96] http://www.news-medical.net/news/20090623/102-billion-starving-people-worldwide-UN-says.aspx

[97] A noção de "tábula rasa" tornou-se popular por Thomas Hobbes, mas pode ser encontrada nos escritos
de Aristóteles. Esta é a ideia de que, em suma, os indivíduos nascem sem orientação mental inata e que
tudo é aprendido. Atualmente, esse conceito tem sido bastante refutado devida à comprovada
"aprendizagem programada" e "psicologia evolutiva" inerentes aos seres humanos; entretanto, essa ideia
ainda tem persistido.

[98] A visão de que os seres humanos são substancialmente mais afetados pelos genes e pela Biologia do
que pelo condicionamento ambiental, no que diz respeito ao comportamento humano, ainda é um debate
acalorado, sem mencionar a frequente reação intuitiva de muitos em relação a certos padrões humanos. A
frase "É apenas a natureza humana" é muitas vezes expressa pelo leigo. Autores como Steven Pinker são
notáveis por promoverem o domínio da psicologia evolutiva sobre o condicionamento ambiental.

[99] Uma "adaptação", em biologia, é um traço com um papel funcional atual na história de vida de um
organismo, que é mantido e desenvolvido por meio da 'seleção natural'. Em suma, isso ocorre devido a
pressões sobre o organismo em um meio ambiente. Da mesma forma, "Epigenética" é um novo campo e
estuda as mudanças hereditárias na expressão gênica ou no fenótipo celular causadas por mecanismos
50

outros além das alterações na sequência de DNA. Em suma, é uma adaptação de curto prazo a nível de
"expressão" gênica, que também é influenciada pelo meio ambiente. E no que se refere a cultura, isso é
mais fácil de entender. Por exemplo, o idioma que você fala é uma adaptação ao grupo cultural existente,
assim como a religião que você pode ter aprendido e, portanto, muitos dos valores que você possui são um
resultado direto das condições culturais das quais você faz parte.

[100] O conceito de uma "Reação Instintiva" pode ser aqui aplicado. No entanto, a diferenciação do que é
ou não instintivo tornou-se cada vez mais ambígua no estudo do comportamento humano. Ainda assim,
está fundamentalmente claro que existem padrões muito específicos em comum na espécie humana,
especialmente no contexto de sobrevivência e influência do estresse. Diante do perigo, reações biológicas e
endócrinas muito comuns ocorrem quase que universalmente, e muitas vezes geram tendências
comportamentais também previsíveis em todas as outras espécies.

[101] O termo "plasticidade comportamental" pode ser aqui aplicado como uma extensão de
"neuroplasticidade", que se refere a mudanças ativas nas vias neurais e nas sinapses. Assim como o cérebro
era considerado um órgão estático, o comportamento humano - expressão da atividade cerebral -
claramente também sofre mudanças. Por mais complexos que assuntos como o "livre-arbítrio" e os
processos de decisão sejam para as ciências psicológicas, a natureza da mente humana demonstra,
claramente, adaptabilidade e vulnerabilidade às condições externas. Ao contrário de nossos ancestrais
primatas, nosso neocórtex avançado* parece ser um centro de pensamento consciente e, nas palavras do
Dr. Robert Sapolsky, neurocientista da Universidade de Stanford: "Em um certo nível, a natureza de nossa
natureza não será particularmente limitada por nossa natureza "[no filme Zeitgeist: Moving Forward, de
2011].

[102] * Mais informações sobre o neocórtex, uma área avançada do cérebro humano atribuída à
consciência podem ser encontradas aqui: http://www.nature.com/nrn/journal/v10/n10/abs/nrn2719.html

[103] Taxas de mutações no DNA variam de espécie para espécie e têm sido historicamente muito difíceis
de se estimar. Hoje, com Sequenciamento Direto, é possível isolar as mudanças exatas. Em um estudo
realizado em 2009, os DNAs de dois parentes masculinos distantes - separados por treze gerações - cujo
ancestral comum viveu há 200 anos atrás, foram sequenciados, encontrando apenas 12 diferenças entre
todas as "letras" de DNA analisadas. "Os dois cromossomos Y ainda eram idênticos em 10.149.073 das
10.149.085 letras examinadas. Das 12 diferenças... apenas quatro eram verdadeiras mutações ocorridas
naturalmente através das gerações. "[http://www.sciencedaily.com/releases/2009/08/090827123210.htm]
Em relação ao genoma humano, estima-se que pode passar por apenas algumas centenas de mudanças ao
longo de dezenas de milhares de anos.

[104] Um exemplo clássico é a "Fome do Inverno Holandês". Um estudo de rastreamento de pessoas que
sofreram desnutrição grave enquanto fetos durante a Segunda Guerra Mundial, constatou que em sua vida
adulta sofriam de várias síndromes metabólicas e problemas de metabolismo devido à "programação" que
ocorreu durante esse período no útero. Ref: Famine and Human development: The Dutch hunger winter of
1944-1945. New York, NY, EUA: Oxford University Press.

[105] Dr. Gabor Maté em sua obra "In the Realm of Hungry Ghosts" (North Atlantic Books, 2012) apresenta
uma enorme quantidade de pesquisas a respeito de como a "perda emocional" que ocorre em idades
jovens afeta o comportamento na vida adulta, mais especificamente a propensão para os vícios.

[106] A relevância da natureza da interação social é mais profunda do que se pensava. A correlação entre
os diversos fatores macro-sociais e problemas de saúde pública, tais como expectativa de vida, transtorno
mental, obesidade, doenças cardíacas, violência e muitas outras questões sociológicas, foram bem
resumidas no livro The Spirit Level, escrito por Richard Wilkinson e Kate Pickett, Penguin, março 2009.
51

[107] Um estudo singular de prematuros em incubadoras descobriu que, quando os estimulavam durante
esse tempo (ou mostrava-se "afeto" através do simples toque) a sua saúde fisiológica, em longo prazo, era
bastante melhorada em comparação com os que não eram tocados. Ref: Tactile/kinesthetic stimulation
effects on preterm neonates, Pediatrics. 1986

[108] Ref: The Structure of Genetic and Environmental Risk Factors for Common Psychiatric and Substance
Use Disorders in Men and Women, Arch Gen Psychiatry. 2003; 60
52

7. Definindo Saúde Pública

"Somos todos responsáveis por todos."[109]

- Dostoyevsky -

Visão Geral

Qual é a verdadeira medida de sucesso para uma sociedade? O que é que nos faz
felizes, saudáveis, estáveis e equilibrados com o mundo ao nosso redor? Não seria o
nosso sucesso simplesmente a nossa habilidade de entendermos e nos adaptarmos
às realidades do nosso mundo para conseguirmos os melhores resultados possíveis
em qualquer circunstância? E se descobríssemos que a própria natureza do nosso
sistema social estaria, na verdade, reduzindo a nossa qualidade de vida em longo
prazo?

Como será discutido neste ensaio, as estruturas, valores e práticas sociais


contemporâneas se desviaram, ou são em grande parte alheias ao verdadeiro
significado de saúde de uma sociedade. Ao que nossas instituições sociais dão
prioridade ou desconsideram, aliado às metas e motivações associadas ao “sucesso”
pessoal, as quais são, muitas vezes, claramente “dissociadas” do que avanço e
suporte à vida realmente significam [110], é um assunto pouco considerado no
mundo de hoje. Na verdade, a maioria das medidas de “prosperidade” e
“integridade” da condição humana são hoje equiparadas a meros padrões
econômicos básicos, como o PIB, IPP ou índices de emprego. Infelizmente, essas
medidas não dizem praticamente nada sobre o verdadeiro bem estar e
prosperidade do ser humano.[111]

O termo Saúde Pública é uma classificação médica, essencialmente definido como:


“A abordagem à medicina que se preocupa com a saúde da comunidade como um
todo.”[112] Embora muitas vezes utilizada especificamente em referência a doenças
transmissíveis e suas condições sociais mais amplas, o contexto aqui vai se estender
para todos os aspectos de nossas vidas, incluindo não só a saúde fisiológica, mas
também a saúde mental. Se o valor de um sistema social é medido pela saúde de
seus cidadãos ao longo do tempo, avaliar e comparar as condições e consequências
através de análises simples de tendências e levantamentos deve dar dicas sobre o
que pode ser mudado ou melhorado em nível social.

O contexto central aqui é como a própria condição social - o sistema


socioeconômico - está afetando a saúde humana como um todo. Nas palavras do
médico Rudolph Virchow: "A medicina é uma ciência social e a política nada mais é
do que medicina em grande escala." [113] Virchow reconheceu que qualquer
problema de saúde pública está invariavelmente relacionado à sociedade como um
53

todo. Suas estruturas, características e valores predominantes têm uma profunda


influência sobre a saúde e o comportamento de uma sociedade, e argumentos
acerca do mérito de novas ideias sociais inevitavelmente devem ser conduzidos a
partir de uma avaliação racional da qualidade das mesmas mediante comparações.

Uma vez que cada componente da Saúde Pública tem suas próprias características e
causalidade, é possível considerar abordagens alternativas para a resolução ou
melhoria de um determinado problema, que podem não estar sendo praticadas
atualmente, mas que claramente deveriam estar. A base da Linha de Pensamento
aqui expressa passa por uma análise dos atuais componentes de Saúde Pública para
entender o que está acontecendo ao longo do tempo e nas diferentes
circunstâncias, juntamente com uma avaliação caso a caso dos problemas e uma
consideração inferencial do que se poderia "consertar" ou "melhorar" na maior
escala possível.

É convicção no MZ que o modelo social existente é uma causa de "patologia social",


e que ele perpetua um desequilíbrio que está, desnecessariamente, gerando
distúrbios fisiológicos e psicológicos em toda a população, sem mencionar a
limitação sistêmica do potencial humano e de resolução de problemas. Claro que
esse contexto, naturalmente, também se estende à saúde ambiental, ou seja, ao
estado atual do planeta, já que os problemas / pressões / alívios ecológicos sempre
têm um efeito sobre a nossa saúde pública em longo prazo. No entanto, esse não é
o foco deste ensaio.

Esta análise irá separar a questão da Saúde Pública em duas categorias gerais -
fisiológicas e psicológicas [114] - com cada categoria dividida em temas que
representam problemas dominantes em um percentual relevante da população em
geral.

Que fique bem entendido que efeitos fisiológicos e psicológicos raramente, ou


nunca, têm causas singulares. Há uma relação "bio-psico-social"[115] entre
praticamente todos os fenômenos humanos, ilustrando, mais uma vez, a simbiose
multi-nível característica do ser humano. Em outras palavras, enquanto o problema
sob análise pode ser considerado em geral "fisiológico", a sua causa oculta pode
muito bem ser em parte "psicológica" ou "sociológica", e vice-versa.

O Fator Econômico

Como se observa, a principal tese deste ensaio é mostrar quão profundamente o


nosso sistema socioeconômico mundial afeta a saúde pública, com foco mais
específico no poder da pobreza, estresse e desigualdade. Se você olhar rapidamente
para as principais causas de morte em nível mundial, como elencadas pela
Organização Mundial da Saúde [116], diferenças claras baseadas no nível econômico
54

de uma região, como o fato de que o câncer é mais comum em sociedades de alta
renda, enquanto doenças diarreicas são mais comuns em sociedades de baixa
renda, dão uma visão de como o amplo contexto da posição socioeconômica pode
afetar a saúde pública.

Mahatma Gandhi uma vez disse: “A pobreza é a pior forma de violência”.[117] Seu
contexto se relacionava com as mortes desnecessárias causadas pela pobreza, no
sentido das limitações mais amplas que as severas restrições financeiras têm sobre a
saúde. Esta ideia foi mais tarde englobada em um termo chamado Violência
Estrutural [118], definida pelo Dr. James Gilligan como "... as taxas aumentadas de
morte e invalidez sofridas por aqueles que ocupam os degraus inferiores da
sociedade." Ele diferencia Violência Estrutural de Violência Comportamental, sendo
que na primeira o causador "opera continuamente, em vez de esporadicamente".
[119]

Favor notar que o termo "Violência" neste contexto não se limita à classificação
usual de danos físicos, tais como combate pessoal ou abuso físico. O contexto se
estende para incluir a opressão social, muitas vezes invisível, que, através das
características da cadeia de motivações inerentes ao nosso sistema social, leva ao
dano desnecessário de pessoas, tanto físico, psicológico ou ambos. Exemplos disso
podem variar do óbvio ao complexo na corrente de causa e efeito.

Um simples exemplo "macro" seria o predomínio de doenças diarreicas nas


sociedades atingidas pela pobreza. Sozinhas, essas doenças matam cerca de 1,5
milhão de crianças a cada ano. [120] Essas doenças são completamente evitáveis e
tratáveis, e enquanto a própria infecção é transmitida através de ingestão de água
ou alimentos contaminados, ou de pessoa para pessoa como resultado da falta de
higiene, sua própria prevenção e raridade em países de primeiro mundo, em
comparação, mostra que a causa real já não é a doença em si, mas a condição de
pobreza que lhe permite se espalhe sem restrições. No entanto, as causas não
cessam aí, de modo que precisamos nos perguntar "o que está causando a
pobreza?"

Um exemplo "micro" mais abstrato seriam os problemas de desenvolvimento


humano quando de pressões adversas nas estruturas familiares ou comunitárias.
Imagine uma mãe solteira que, devido à necessidade financeira para criar seu filho,
deve trabalhar para conseguir uma grande renda a fim de fazer face às despesas, o
que limita a sua presença com a criança. As pressões não apenas reduzem o apoio e
orientação necessários para o desenvolvimento da criança, mas também
desenvolvem tendências para a depressão e ansiedade, devido ao estresse contínuo
de dívidas, contas e afins; e os abusos nascidos da frustração começam a surgir na
família. Isso, então, cria grave dano emocional [121] na criança e o desenvolvimento
de estados mentais neuróticos e insalubres surgem, como a propensão para a
55

dependência de drogas. [122] Anos mais tarde, ainda sofrendo com a dor sentida
naqueles períodos iniciais, a criança, agora adulta, morre em uma overdose de
heroína. Pergunta: o que causou a overdose? A heroína? A influência da mãe? Ou a
circunstância econômica que a mãe se encontrava que não permitiu o equilíbrio e o
devido cuidado de seu filho? [123]

Claramente, não há utopia para a condição humana, e achar que podemos ajustar o
sistema socioeconômico para acabar com todos esses e outros macro e micro
problemas estruturais, 100% do tempo, é um absurdo. [124] No entanto, o que é
possível é uma melhoria drástica de tais questões de saúde pública, mudando a
natureza da condição socioeconômica da forma mais estratégica possível. Ao
prosseguirmos com a análise caso a caso dos principais transtornos mentais e físicos
do mundo, notamos que a verdadeira necessidade para a melhoria da saúde pública
repousa, quase que inteiramente, nesta premissa socioeconômica de causalidade
[125].

Segundo Gernot Kohler e Norman Alcock em seu trabalho de 1976, 'An Empirical
Table of Structural Violence', dramáticas 18 milhões de mortes estavam previstas
para ocorrer a cada ano devido à violência estrutural [126], e esse estudo foi
realizado há mais de 30 anos. Desde então, a diferença global entre ricos e pobres
mais do que duplicou, o que sugere que o número de mortes hoje seja muito maior.
De fato, a violência estrutural é o assassino mais mortal do planeta. O gráfico a
seguir mostra as taxas de morte de um grupo demográfico específico, revelando a
mais ampla correlação entre baixa renda e aumento da mortalidade.

[Ver o Diagrama no PDF]

GD Smith, JD Neaton, D. Wentworth, R. e J. Stamler Stamler, "Diferenciais


socioeconômicos em risco de mortalidade entre os homens selecionados para o
Teste de Risco de Múltiplo Fator de Intervenção: I. Homens Brancos ', American
Journal of Public Health (1996) 86 (4): 486-96.

Saúde Fisiológica

Hoje, os principais problemas fisiológicos da população humana incluem grandes


epidemias causadoras de mortalidade, tais como o câncer, doenças cardíacas,
derrame, etc. Problemas relativamente menores, que não só reduzem a qualidade
de vida, mas também frequentemente precedem essas doenças mais graves,
incluem pressão alta, obesidade e outras questões que, embora menos críticas em
comparação, ainda são uma parte do processo que pode levar a doenças graves e à
morte ao longo do tempo [127]. Novamente, é importante lembrar que a causa
dessas doenças "físicas" não são estritamente "físicas" no sentido estrito da palavra,
56

pois estudos modernos demonstram que o estresse psicossocial [128] possui


relações profundas com problemas fisiológicos aparentemente desconexos.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, as causas de morte mais comuns em


países com renda baixa, média e alta são doenças cardíacas, infecções no trato
respiratório inferior, derrame e câncer.[129] Embora cada uma dessas doenças (e
muitas outras) possa estar relacionada às causas que serão apresentadas, para
simplificar, focaremos nas doenças cardíacas.

Estudo de Caso: Doença Cardíaca

Embora o tratamento das doenças cardíacas tenha levado, recentemente, a um leve


declínio global no número de ataques cardíacos e óbitos,[130] o diagnóstico de
doenças cardíacas não diminuiu, e alguns estudos regionais mostram que ele está
em ascensão, [131] ou em um ritmo de aumento substancial [132]. A Doença
Coronária Cardíaca ainda é considerada, globalmente, pela OMS como "a principal
causa de morte" [133] e verificou-se que, embora existam fatores genéticos em
jogo, 90% das pessoas que morrem "têm fatores de risco influenciados pelo estilo
de vida" e, em geral, a doença é considerada amplamente evitável se ajustes no
estilo de vida são feitos.

Resumindo, relações já estabelecidas com dietas ricas em gordura, tabagismo,


álcool, obesidade, colesterol alto, diabetes e outros fatores de risco nos permitem
estender a causa da doença cardíaca, e quando rastreamos as influências, a
influência mais profunda e ampla encontrada não tem a ver só com a renda
absoluta, mas com o status socioeconômico relativo.

A OMS deixou claro em escala global que, geralmente, níveis socioeconômicos mais
baixos geram mais doenças do coração e, naturalmente, mais fatores de risco que
conduzem a elas. [135] Isto, por um lado, traça uma relação direta entre a situação
econômica e a ocorrência de doenças. Não há nenhuma evidência mostrando que as
diferenças genéticas entre grupos regionais possam ser responsáveis por essas
variações, e é óbvio que o baixo poder de compra leva as pessoas a estilos de vida
que incluem muitos desses fatores de risco.

Um estudo de 2009 no American Journal of Epidemiology chamado "Life-Course


Socioeconomic Position and Incidence of Coronary Heart Disease" descobriu que
quanto mais tempo uma pessoa permanece em situação de pobreza, maior a sua
probabilidade de desenvolver doenças cardíacas [136]. Pessoas que estiveram em
desvantagem econômica ao longo da vida demonstraram mais propensidade ao
fumo, obesidade, má alimentação e assim por diante. Em um estudo anterior,
realizado pelo epidemiologista Dr. Ralph R. Frerichs, com enfoque específico na
divisão socioeconômica da cidade de Los Angeles, Califórnia, descobriu-se que a taxa
57

de morte por doença cardíaca foi 40% maior para os homens pobres do que para os
mais ricos. [137]

Dado que a nossa tese original considera um elo entre o próprio sistema social e a
prevalência de doenças e seus fatores de risco associados, é preciso considerar a
relação direta entre estresse e poder de compra.

Começando com o último, que é mais simples, é óbvio que hábitos de saúde ruins
ocorrem em ambientes de baixa renda devido à falta de recursos financeiros para
uma melhor nutrição, [138] atenção médica [139] e educação. [140] Muitos dos
alimentos com alto teor de gordura e alto fator de risco de sódio, por exemplo, que
levam a doenças cardíacas, também são os alimentos mais baratos encontrados nas
lojas.

Vale notar que o nosso modelo socioeconômico produz bens com base na
capacidade de compra da demografia alvo. A decisão de produzir bens alimentícios
de baixa qualidade é tomada com base no lucro, e, como a grande maioria do
planeta é relativamente pobre, não é nenhuma surpresa que, a fim de atender a
esse mercado, a qualidade deva ser reduzida para permitir vendas competitivas. Em
outras palavras, há um mercado para cada classe social, e, naturalmente, quanto
mais baixa a classe, menor a qualidade. Essa realidade é um exemplo de uma ligação
direta entre o sistema social e a causa de doenças. Enquanto educar as pessoas
pobres sobre a diferença de qualidade nos produtos alimentares poderia ajudá-las a
tomar melhores decisões em relação à alimentação, as restrições financeiras
inerentes à sua condição poderiam facilmente tornar essa decisão difícil, se não
impossível, pois, mais uma vez, esses produtos são em média mais caros.

Numa época em que a produção de alimentos e a nutrição humana são um


fenômeno científico bem entendido quanto ao que funciona ou não - o que é
saudável, geralmente, e o que não é - temos que questionar por que a abundância
de alimentos deliberadamente insalubres e de métodos industriais prejudiciais ainda
existem. O motivo é que a saúde humana não é o objetivo da produção industrial de
alimentos e nunca foi, devido ao interesse exclusivo na geração de lucros. Mais
informações sobre o transtorno de incentivo inerente à economia de mercado
monetário serão fornecidas em ensaios posteriores.

O Fator Estresse

Agora vamos analisar o papel do estresse. O estresse tem mais efeitos sobre a
doença cardíaca do que se pensava, e isso não tem a ver somente com o fato
estatístico de que as pessoas de baixa renda tem uma tendência a lidar melhor com
seus problemas por meio de hábitos como o fumo e a bebida, manifestando pressão
arterial elevada e, consequentemente, ignorando a sua saúde e bem-estar por causa
58

da luta constante por renda e sobrevivência. Embora esses fatores sejam evidentes,
e, novamente, encontram-se amarrados a uma estratificação inevitável encontrada
na Economia de Mercado Monetário, [141] a forma mais prejudicial de estresse vem
sob a forma de estresse psicossocial, ou seja, o estresse relativo à interação
psicológica com o ambiente social.

O professor Michael Marmot, do Departamento de Epidemiologia e Saúde Pública


da Universidade de Londres, dirigiu dois estudos importantes relacionando status
social à saúde [142]. Usando o sistema de Serviço Civil Britânico como grupo
experimental, eles descobriram que o gradiente de qualidade de saúde nas
sociedades industrializadas não é simplesmente uma questão de falta de saúde para
os desavantajados e boa saúde para todos os outros. Eles descobriram que havia
também uma distribuição social da doença. Na medida que se passava do topo da
escala socioeconômica para a parte inferior, os tipos de doenças que as pessoas
teriam, em média, mudaria.

Por exemplo, aqueles mais baixos na escala hierárquica tiveram um aumento da


mortalidade baseada em doenças cardíacas quatro vezes maior em comparação
com aqueles em níveis mais privilegiados. Mesmo em um país com planos de saúde
universalizados, quanto pior a situação financeira e a posição hierárquica de uma
pessoa, pior será, em média, a sua saúde. A razão é essencialmente psicológica, pois
verificou-se que quanto mais estratificada é a sociedade, pior é a saúde pública, em
geral, especificamente para as classes mais baixas. [143]

Esse padrão tem sido confirmado por muitos estudos ao longo dos anos, incluindo
uma profunda compilação de pesquisas organizada por Richard Wilkinson e Kate
Pickett. Em seu trabalho, "The Spirit Level - Why Equality is Better for Everyone",
eles usam como fonte centenas de estudos epidemiológicos sobre o assunto,
descrevendo como sociedades mais desiguais perpetuam uma vasta gama de
problemas de saúde pública, tanto fisiológicos quanto psicológicos.

Deixando de lado as doenças cardíacas, sabemos agora que alguns tipos de câncer,
doenças pulmonares crônicas, doenças gastrointestinais, dores nas costas,
obesidade, pressão alta, baixa expectativa de vida e muitos outros problemas
também estão ligados ao nível socioeconômico de modo geral, não tendo ele como
apenas um fator de risco singular. [144] Há um "gradiente social", que pode ser
assim chamado, dos níveis de saúde ao longo da sociedade, e a posição onde nos
encontramos em relação a outras pessoas tem um poderoso efeito psicossocial -
aqueles acima de nós têm, em média, uma saúde melhor, enquanto os abaixo de
nós têm níveis piores de saúde [145].
59

Uma comparação estatística entre a saúde pública de países com altos níveis de
desigualdade de renda (como os Estados Unidos) e os com níveis mais baixos do
mesmo índice (como o Japão) revela essas verdades de forma muito óbvia.[146]

No entanto, tais doenças geralmente consideradas “físicas” são apenas uma parte
da crise na saúde pública gerada pela desigualdade que, por sua vez, é apenas mais
uma consequência da estratificação direta e imutável, inerente ao nosso sistema
social global.

Saúde Psicológica

Talvez a implicação mais profunda em saúde pública seja o resultado da


desigualdade social na nossa saúde mental ou psicológica. Isso se estende às
reações e tendências comportamentais, tais como atos de violência ou abuso,
juntamente com problemas emocionais como depressão, ansiedade e distúrbios de
personalidade em geral.

Uma avaliação geral da tendência de depressão e ansiedade nos países


desenvolvidos, países que muitos, intuitivamente, pensariam possuir mais alegria e
conforto devido à riqueza material disponível, revela uma realidade muito diferente.
[147, 148] Um estudo britânico que examina a depressão entre pessoas na faixa dos
20 anos descobriu que ela era duas vezes mais comum em 1970 do que em 1958.
[149] Um estudo americano com cerca de 63.700 estudantes universitários
descobriu que o número de jovens adultos que apresentam níveis mais elevados de
ansiedade é cinco vezes maior do que no final de 1930. [150] Um estudo de 2011
apresentado na Associação Americana de Psicologia mostrou que a doença mental é
mais comum entre os estudantes universitários do que era há uma década. [151]

O psicólogo Jean Twenge, da Universidade de San Diego, localizou 269 estudos


relacionados que mediram a ansiedade nos Estados Unidos entre 1952 e 1993, e a
avaliação conjunta mostra uma tendência dramaticamente clara do aumento na
ansiedade ao longo deste período, concluindo, por exemplo, que ao final de 1980, a
criança mediana americana estava mais ansiosa do que os pacientes psiquiátricos
infantis da década de 1950. [152]

Um relatório do NCHS (Centro Nacional de Estudos Estatísticos em Saúde dos EUA)


de 2011 revela que a taxa de uso de antidepressivos nos EUA, entre os adolescentes
e adultos (pessoas com idades entre 12 e mais velhos), aumentou quase 400% entre
1988-1994 e 2005-2008. Os antidepressivos foram o terceiro medicamento mais
prescrito pelos norteamericanos de 2005 a 2008. [153]
60

Enquanto um componente genético da depressão pode ser considerado relevante, a


taxa das tendências aponta claramente uma causa ambiental como força motriz.
Nas palavras de Richard Wilkinson:

"Embora as pessoas com doença mental tenham, por vezes, alterações nos níveis de
certas substâncias químicas do cérebro, ninguém tem demonstrado que essas
alterações são a causa da depressão, no lugar de serem causadas pela
depressão...embora certa vulnerabilidade genética possa estar na base de algumas
doenças mentais, isso, por si só, não explica os enormes aumentos de doenças nas
últimas décadas - nossos genes não podem mudar tão rápido." [154]

Parece que o nosso status social relativo tem um efeito profundo em nosso bem-
estar mental e essa tendência também pode ser encontrada no que poderia ser
declarado como a psicologia evolutiva dos primatas semelhantes. Um estudo de
2002 realizado com macacos do gênero Macaca descobriu que aqueles que eram
subordinados, ou inferiores, em uma determinada hierarquia social, tinham menos
atividade de dopamina que os que eram dominantes, e que essa relação mudava
quando os grupos se arranjavam diferentemente. Em outras palavras, a biologia
tinha pouco a ver - somente o arranjo social foi responsável por reduzir ou elevar os
níveis de dopamina. Também foi descoberto que o macaco hierarquicamente
inferior usaria mais cocaína para compensar. Isso é revelador, pois os baixos níveis
de dopamina em primatas (incluindo os seres humanos) possuem uma correlação
direta com a depressão. [155]

Esse padrão tornou-se muito claro e, enquanto fatores diretos de estresse como a
segurança no emprego, dívidas e outros fatores econômicos, em grande parte
inerentes ao sistema social, desempenham um papel importante,[156] a relevância
do status socioeconômico propriamente dito ainda se faz preponderante.

O gráfico a seguir é uma comparação global da Saúde Mental e do Uso de Drogas


por país [157]. Ele inclui nove países que abastecem os dados das pesquisas da OMS,
incluindo transtornos de ansiedade, transtornos do humor, transtornos impulsivos,
vícios e outros. Pode-se ver claramente que os Estados Unidos, que também tem o
mais alto nível de desigualdade, tem um enorme nível de distúrbios na saúde mental
e com as drogas, em comparação com os países menos estratificados, tendo a Itália
como o que apresenta os menores índices dos referidos distúrbios.

Mesmo o status social ditado pelas relações de castas, em países como a Índia, pode
ter um efeito profundo sobre a confiança e o comportamento. "Um estudo realizado
em 2004 comparou a capacidade de resolução de problemas de 321 meninos
indianos de alta casta contra 321 de baixa casta. Os resultados demonstraram que,
quando a casta não era anunciada publicamente antes de começar a resolução de
problemas, ambos grupos atingiam resultados semelhantes. Na segunda rodada,
61

depois de anunciadas as castas de cada grupo, o grupo da casta inferior obtinha um


resultado muito pior, e o da superior, um muito melhor, produzindo dados bem
divergentes em relação à primeira rodada.[158] As pessoas são muito influenciadas
pela percepção do seu status pela sociedade e, muitas vezes, quando acreditamos
ser vistos como inferiores, agimos como tal.

Em conclusão a esta subseção sobre o fenômeno psicossocial da desigualdade, que


mostra uma relação clara com o bem-estar psicológico, é importante rapidamente
destacarmos a vasta gama de problemas relacionados. Embora estudos mais
aprofundados de tais questões possam ser encontrados no Reading List (Anexo C)
deste texto, as obras de Sapolsky, Gilligan, Maté e Wilkinson são altamente
recomendadas - que seja constatado aqui que, geralmente, quando se trata de
Educação, Capital Social (confiança), Obesidade, Expectativa de Vida, Gravidez
Precoce, Prisão e Castigo, Mobilidade Social, Oportunidade, e mesmo Inovação -
países com menos desigualdade de renda estão mais bem colocados do que aqueles
com maior desigualdade. Dito de outra forma, são sociedades mais saudáveis.

Estudo de Caso: Violência Comportamental

Associada às questões sobre a desigualdade social relacionadas acima, há uma que


merece um olhar mais profundo - Violência Comportamental. O psicológo criminal
Dr. James Gilligan, ex-chefe do Centro de Estudos da Violência da Escola de
Medicina de Harvard, escreveu um tratado definitivo sobre o assunto em sua obra
“Violence: Our Deadly Epidemic and its Causes” (Violência: Nossa epidemia mortal e
suas causas - tradução livre). Dr. Gilligan deixa muito claro que as formas extremas
de violência não são induzidas de forma aleatória ou geneticamente, mas são
reações bastante complexas que se originam de experiências estressantes, tanto em
curto quanto em longo prazo.

Por exemplo, o abuso infantil, tanto físico quanto emocional, aliado a níveis cada vez
mais intensos de estresse individual, tem uma correlação direta com atos
premeditados e impulsivos de violência. E enquanto os homens possuem uma
propensão estatisticamente maior para a violência, devido, em grande parte, às
características endocrinológicas que, embora não causem reações de violência,
podem aumentá-las sob a influência do estresse, [159] o ponto em comum, aqui, é a
influência do meio ambiente e da cultura.

Não se pode negar a relação dos hormônios ou até mesmo de possíveis propensões
genéticas [160], mas mostrar que a origem desse comportamento claramente não é
a nossa biologia, mas a condição sob a qual um ser humano vive e as experiências
que enfrenta. Outras hipóteses populares de causas, como o “instinto”, também são
muito abstratas e vagas para sustentar qualquer validade operacional. [161]
62

"Eu estou sugerindo que a única maneira de explicar as causas da violência, para
que possamos aprender a evitá-la, é aproximar a violência de um problema de
saúde pública e medicina preventiva, e de pensar na violência como um sintoma de
uma patologia que ameaça a vida, e que, como todas as formas de doenças, tem
uma etiologia ou causa, um patógeno." -Dr. James Gilligan [162]

No diagnóstico do Dr. Gilligan, ele deixa muito claro que a maior causa de
comportamento violento é a desigualdade social, destacando as consequências da
vergonha e humilhação, características emocionais daqueles que se envolvem em
violência. [163] Thomas Scheff, professor emérito de sociologia na Califórnia
afirmou que “a vergonha era a emoção social”.[164] Vergonha e humilhação podem
ser equiparados com os sentimentos de estupidez, inadequação, vergonha, loucura,
sentir-se exposto, insegurança, etc. - na sua origem, tudo é, em grande parte, social
ou comparativo.

Não é necessário dizer que, em uma sociedade global, não só com crescente
disparidade de renda, mas, inevitavelmente, disparidade de "auto-estima" - uma vez
que o status é apresentado como diretamente relacionado ao "sucesso" em nossos
empregos, tamanho de contas bancárias e assim por diante - não é nenhum mistério
que os sentimentos de inferioridade, vergonha e humilhação sejam parte
importante da cultura dos dias atuais. A consequência desses sentimentos tem
implicações muito graves para a saúde pública, como observado anteriormente,
incluindo a epidemia de violência comportamental que vemos hoje nas suas formas
variadas e complexas. Terrorismo, tiroteios em escolas e igrejas, e outros atos
extremos que simplesmente não existiam antes, revelam uma evolução na própria
violência. Dr. Gilligan conclui: "Se quisermos evitar a violência, então, a nossa
agenda deve ser a reforma política e econômica". [165]

O diagrama a seguir mostra as taxas de homicídio entre as nações ricas, com


diferentes níveis de desigualdade social. Os Estados Unidos, provavelmente o maior
defensor "anti-socialista" com as menores proteções estruturais (como a falta de
assistência médica universalizada), que ao mesmo tempo insiste na ética psicológica
de que a "independência" e "competição" são os valores mais importantes -
apresenta um nível enorme de violência. Enquanto que os debates, na paisagem
política americana, sobre a epidemia (de violência) ainda giram em torno do
controle de armas, o que obviamente nada tem a ver com a causalidade.

[Ver o Diagrama no PDF]

Em Conclusão

Este ensaio tentou passar uma visão concisa das relações causais fundamentais em
saúde humana, nos níveis psicológico e fisiológico. Seu cerne é a forma como a
63

condição socioeconômica, em geral, melhora ou piora a saúde pública como um


todo, aludindo às condições ideais que possam melhorar a felicidade, reduzir as
doenças e aliviar problemas epidêmicos de comportamento, como a violência.

Embora seja muito claro como as relações econômicas diretas reduzem a saúde e o
bem-estar humano na forma de privação absoluta, como a incapacidade para obter
alimentos de qualidade, restrições de tempo em função do trabalho, as quais, por
sua vez, reduzem o apoio emocional e de desenvolvimento às crianças, e a perda na
qualidade da educação devido a problemas de financiamento regionais, aliado a
distúrbios específicos como o fato de que a maioria dos casamentos termina devido
a problemas financeiros,[166] a questão da privação relativa tem sido um foco
maior por ser também causa das mais absolutas privações.

Colocada no contexto estrutural e socioeconômico, essa realidade desafia


firmemente o ethos (sistema de crenças) de que concorrência, classes e outras
noções "capitalistas" de incentivo e progresso são motores do progresso social e da
saúde. Quanto mais aprendemos sobre esse fenômeno, mais forte se torna o
argumento de que a natureza do nosso sistema socioeconômico está aquém do seu
foco e intenção. O progresso e o sucesso humano não são claramente definidos pelo
fluxo constante de bens de mercado, dispositivos e criação de materiais para
compra. Saúde Pública e bem-estar são baseados em como nos relacionamos uns
com os outros e com o meio ambiente como um todo.

O resultado é uma forma oculta de violência contra a população e, portanto, a crise


de saúde pública que vemos é realmente uma questão de direitos civis e humanos.
Quando claramente vemos genocídios no mundo, nos opomos fortemente em bases
puramente morais. Mas e se existisse um genocídio constante, invisível, mas muito
real - perpetuado não por uma pessoa ou grupo específico, mas por um distúrbio
psicológico nascido do estresse gerado pelo método tradicional de interação
humana e de ordenamento econômico, um que foi inventado e codificado?

Como será discutido nos ensaios seguintes, meros ajustes no atual sistema
socioeconômico não são suficientes, em longo prazo, para resolver esses problemas
de forma substancial. Os princípios mais fundamentais do nosso modelo atual estão
vinculados às orientações hierárquicas econômicas e competitivas, e trabalhar
verdadeiramente para remover esses atributos e suas consequências exige
transformar completamente todo o sistema social.

Notas de rodapé para "Definição de Saúde Pública"

[109] Parafraseado, de Irmãos Karamazov, Fyodor Dostoyevsky, 1880, p. 316

[110] A questão aqui diz respeito à forma como a sociedade moderna recompensa e reforça certos
comportamentos em detrimento de outros. Por exemplo, no mundo ocidental, mais recompensas
64

financeiras chegam a instituições financeiras não produtoras do que a verdadeiramente produtoras de bens
e serviços. Isso tem gerado um problema de incentivo que também inclui o desrespeito ambiental e o
desprezo à saúde pública em geral. Como será aludido mais adiante neste texto, a psicologia da economia
de mercado, na verdade, se opõe à sustentação da vida.

[111] Nos últimos anos, outras tentativas foram feitas para quantificar "felicidade" e o bem-estar, como a
Felicidade Interna Bruta (FIB) Indicador que faz mensuras através de pesquisas periódicas
http://www.grossnationalhappiness.com/

[112] Definição de Saúde Pública: http://www.medterms.com/script/main/art.asp?articlekey=5120

[113] "A Evolução da Medicina Social" (The Evolution of Social Medicine), Rudolph Virchow: Rosen G., do
Manual de Sociologia Médica, Prentice-Hall, 1972

[114] Fenômenos sociológicos serão agrupados aqui na categoria Psicológica por uma questão de
simplicidade, pois o resultado de uma condição sociológica são os estados psicológicos dos indivíduos
agregados.

[115] Bio-psico-social significa a interação de uma influência biológica, psicológica e sociológica sobre uma
determinada consequência. Por exemplo, a obesidade, superficialmente, refere-se a comer. Se uma pessoa
come demais, ela ganha peso. No entanto, há boas evidências (como será apresentado mais adiante neste
ensaio), atualmente, que mostram como a psicologia de uma pessoa pode ser levada a almejar o conforto
de consumir devido a fatores externos - como uma história emocional de privação ou má adaptação
corporal onde maus hábitos são formados e esperados. Essas últimas noções que influenciam a própria
psicologia são um resultado da condição sociológica.

[116] Fonte: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs310/en/index.html

[117] Citado em "Uma paz justa através de Transformação: Fundações culturais, econômicas e políticas
para a mudança" (tradução livre), a Associação Internacional da Paz, 1988 (A Just Peace through
Transformation: Cultural, Economic, and Political Foundations for Change, International Peace Association,
1988).

[118] Referência sugerida: An Empirical Table of Structural Violence, Gernot Kohler e Norman Alcock, 1976
http://jpr.sagepub.com/content/13/4/343.extract

[119] Violence, James Gilligan, Grosset / Putnam, New York, 1992, p. 192

[120] Fonte: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs330/en/index.html

[121] O termo perda emocional relaciona-se com um trauma emocional grave vivido, principalmente na
infância, com efeitos persistentes. Nas palavras do Dr. Gabor Maté "O maior dano causado pela
negligência, trauma ou perda emocional não é a dor imediata que infligem, mas as distorções de longo
prazo que eles induzem na forma como a criança em desenvolvimento continuará a interpretar o mundo e
sua própria situação." "In the Realm of Hungry Ghosts", North Atlantic Books, 2012, p. 512

[122] Como observado antes, o trabalho de Gabor Maté sobre o tema da dependência resultante da perda
emocional na infância e sentimentos de inseugrança é altamente recomendado. "In the Realm of Hungry
Ghosts", North Atlantic Books, 2012

[123] Recomenda-se o trabalho "Mental Illness and the Economy" (Doença Mental e a Economia, tradução
livre), por MH Brenner. Resumo: "Ao correlacionar extensos dados econômicos e institucionais do Estado
de Nova York no período 1841-1967, Harvey Brenner conclui que as instabilidades da economia nacional
65

são a fonte mais importante de flutuações nas admissões hospitalares por doença mental ou nas taxas de
admissão destas."

[124] Ver "Fator Humanidade" na Lista de Vocabulário, Apêndice A

[125] Um estudo de referência no mesmo contexto básico é O Efeito de Fatores de Risco Conhecidos Sobre
o Excesso de Mortalidade entre Adultos Negros nos Estados Unidos, Journal of the American Medical
Association, 263 (6) :845-850, 1990. Esse estudo epidemiológico constatou que dois terços das mortes
afroamericanas, no contexto do estudo, só poderiam ser explicadas devido ao baixo status socioeconomico
e suas consequências diretas / indiretas.

[126] "An Empirical Table of Structural Violence" ("Uma tabela empírica da Violência Estrutural", tradução
livre), Gernot Kohler e Norman Alcock, 1976

[127] Referência: http://thetimes-tribune.com/lifestyles-people/as-obesity-rates-rise-chief-heart-surgeon-


sees-more-high-risk-patients-in-operating-room-1.1379223

[128] Definição de Psicossocial: Envolve aspectos de comportamento social e psicológico;


Interrelacionamento http://medical-dictionary.thefreedictionary.com/psychosocial

[129] As dez principais causas de morte, OMS


http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs310/en/index.html

[130] Tendências dos EUA para doenças cardíacas, câncer e derrame, PRB
http://www.prb.org/Articles/2002/USTrendsinHeartDiseaseCancerandStroke.aspx

[131] A doença cardíaca irá subir 25% até 2020


http://www.belfasttelegraph.co.uk/news/local-national/northern-ireland/heart-disease-to-rise-25-by-
2020-16177410.html

[132] Novas estatísticas europeias sobre doença cardíaca e AVC


[http://www.sciencedaily.com/releases/2012/09/120929140236.htm]

[133] O Atlas de Doenças do Coração e Derrame, OMS e CDC, Parte 3, Carga Global de Doença Coronária
(The Atlas of Heart Disease and Stroke, WHO & CDC, Part 3, Global Burden of Coronary Heart Disease)
[134] Ibid.

[135] Ibid., Capítulo 11, status socioeconômico

[136] "Curso de vida, posição socieconômica e incidência de doença cardíaca coronariana", tradução livre
(Life-Course Socioeconomic Position and Incidence of Coronary Heart Disease), American Journal of
Epidemiology, 1 de abril de 2009. http://aje.oxfordjournals.org/content/early/2009/01/29/aje.kwn403

[137] Doença Cardíaca ligada à Pobreza (Heart Disease Tied to Poverty), New York Times, 1985
http://www.nytimes.com/1985/02/24/us/heart-disease-tied-to-poverty.html

[138] Citação do estudo "Americanos de baixa renda podem pagar uma dieta saudável?", tradução livre
("Can Low-Income Americans Afford a Healthy Diet?") "Muitos profissionais de nutrição acreditam que
todos os americanos, independentemente da renda, tenham acesso a uma alimentação nutritiva de grãos
integrais, carnes magras, legumes e frutas frescas. Na realidade, os preços dos alimentos representam uma
barreira significativa para muitos consumidores que estão tentando equilibrar uma boa alimentação com
preços acessíveis." http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2847733/
66

[139] Referência: Os custos médicos empurram milhões de pessoas para a pobreza em todo o mundo, OMS
(Medical costs push millions of people into poverty across the globe, WHO)
http://www.who.int/mediacentre/news/releases/2005/pr65/en/index.html

[140] Referência: "Estudos afirmam que discrepâncias na educação entre ricos e pobres aumenta"
(Education Gap Grows Between Rich and Poor, Studies Say), New York Times 2012
[ http://www.nytimes.com/2012/02/10/education/education-gap-grows-between-rich-and-poor-studies-
show.html?pagewanted=all ]

[141] Estratificação de classes é uma parte imutável do modelo socioeconômico atual, devido tanto ao
sistema de incentivos que distribui renda desproporcionalmente, quanto ao favorecimento estratégico das
camadas superiores da hierarquia - como em 2007, os executivos chefes das maiores 365 empresas norte-
americanas receberam bem mais de 500 vezes o salário do trabalhador médio. Isso pode ser combinado
com práticas de política monetária macroeconômica que estruturalmente recompensam os ricos e punem
os pobres através do sistema de juros. (Os ricos recebem renda através de juros sem aplicarem
investimentos, enquanto os pobres, com falta de capital de investimento, tomam empréstimos para a
maior parte das suas grandes compras, pagando juros. Abstraindo, os pobres são obrigados a dar seu
dinheiro aos ricos por meio desse mecanismo.)

[142] Whitehall Study I & II, http://www.ucl.ac.uk/whitehallII/ Veja também: Epidemiologia da situação
socioeconômica e saúde (Epidemiology of socioeconomic status and health), M. Marmot
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/10681885

[143] Ibid.

[144] Um qualificador aqui é que esse fenômeno se relaciona mais ainda às sociedades relativamente ricas,
de modo geral, do que a sociedades mais atingidas pela pobreza.

[145] Referência: "Determinantes Sociais da Saúde: Os fatos sólidos", tradução livre (Social Determinants of
Health: The Solid Facts), RG Wilkinson & M. Marmot, Organização Mundial da Saúde, 2006

[146] Um PDF com um resumo dos gráficos de linha de regressão extraídos da obra de R. Wilkinson e
Pickett K. pode ser encontrado aqui para referência:
http://www.tantor.com/Extras/B0505SpiritLevel/B0505SpiritLevelPDF1.pdf

[147] Referência: "O aumento dramático de ansiedade e depressão em crianças e adolescentes", tradução
livre (The Dramatic Rise of Anxiety and Depression in Children and Adolescents), Peter Gray, 2012

[148] Transtornos de Ansiedade estão em ascensão (Anxiety Disorders Are Sharply on the Rise), Timi
Gustafson RD [http://timigustafson.com/2011/anxiety-disorders-are-sharply-on-the-rise/]

[149] Tendências temporais em saúde mental infantil e adolescente (Time Trends in child and adolescent
mental health), Maughan, Collishaw, Goodman & Pickles, Journal of Child Psychology e Psiquiatria, 2004

[150] Buscando a fonte dos Transtornos de Ansiedade ( Sourcing the Anxiety Disorders Association of
America), Association of America, este artigo é um somatório de recomendar:
http://www.msnbc.msn.com/id/39335628/ns/health-mental_health/t/why-are-anxiety-disorders-among-
women-rise/#.UI9PRoUpzZg

[151] A depressão em ascensão nos estudantes universitários (Depression On The Rise In College Students),
NPR, 2011 [http://www.npr.org/2011/01/17/132934543/depression-on-the-rise-in-college-students]
67

[152] A idade da ansiedade? A era da ansiedade? Mudanças nas estatísticas de nascimento em relação à
ansiedade e neuroses (The age of anxiety? Birth cohort change in anxiety and neuroticism), JM Twenge,
Journal of Personality and Social Psychology, 2007

[153] Uso de antidepressivos em pessoas acima de 12 anos (Antidepressant Use in Persons Aged 12 and
Over) : Estados Unidos, 2005-2008, Laura A. Pratt, NCHS Out 2011
[http://www.cdc.gov/nchs/data/databriefs/db76.htm]

[154] The Spirit Level por Richard Wilkinson e Kate Pickett, Penguin, março de 2009, p. 65

[155] "Dominância social em macacos: os receptores D2 da dopamina e auto-administração de cocaína",


tradução livre (Social dominance in monkeys: dopamine D2 receptors and cocaine self-administration),
Morgan & Grant, Nature Neuroscience, 2002 5 (2): 169-74

[156] As taxas de suicídio explodem na esteira da recessão econômica (Suicide rates rocket in wake of
economic downturn recession), Nina Lakhani, The Independent, 15 de agosto de 2012

[157] Gráfico de The Spirit Level por Richard Wilkinson e Kate Pickett, Penguin, março de 2009, p. 67

[158] Sistemas de crenças e desigualdades duráveis (Belief Systems and Durable Inequalities), Policy
Research Working Paper, Waskington DC: Banco Mundial, 2004 | Gráfico de The Spirit Level por Richard
Wilkinson e Kate Pickett, Penguin, março de 2009, p. 113-114

[159] O hormônio testosterona tem sido comumente "culpado" pela agressão masculina. No entanto,
verificou-se que as diferenças inter-individuais dos níveis de testosterona não resultam em diferenças de
proporções entre os níveis de comportamento agressivo, quando foram realizados ensaios com a
população em geral. Verificou-se que, ao invés da testosterona causar níveis crescentes de agressão, ocorre
essencialmente o contrário. Veja "O problema com a testosterona", tradução livre (The Trouble with
testosterone), Robert M. Sapolsky, Simon & Schuster, 1997 p. 147-159

[160] Ver: "Violência - Um coquetel nocivo de genes e o ambiente", tradução livre (Violence—A noxious
cocktail of genes and the environment), Mariya Moosajee, JR Soc Med. 2003 Maio, 96 (5): 211-214 | Notas
de um estudo realizado na Nova Zelândia, onde uma aparente ligação genética encontrada para o
comportamento violento só se manifestaria se ocorresse uma grande quantidade de abuso na infância para
desencadear a expressão da propensão genética. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC539471/

[161] "Violência", tradução livre (Violence), James Gilligan, Grosset/Putnam, New York, 1992, p. 210-213

[162] Ibid, p. 92

[163] Ibid, capítulo 5

[164] "Vergonha e conformidade: o sistema de defesa emocional", tradução livre (Shame and conformity:
the defense-emotion system), TJ Scheff, American Sociological Review, 1988, 53:395-406

[165] "Violência", tradução livre (Violence), James Gilligan, Grosset/Putnam, New York, 1992, p. 236

[166] "Brigas por dinheiro predizem taxas de divórcio" (Money Fights Predict Divorce Rates), Catherine
Rampell http://economix.blogs.nytimes.com/2009/12/07/money-fights-predict-divorce-rates/
68

8. História da Economia

"É um sistoma da nossa condição que nenhuma escola, disciplina ou teoria de


análise social tenha se baseado em requisitos da vida...Ao invés disso, certas
construções sociais são invariavelmente adotadas como o corpo de referência
definitivo - conjuntos de ideias, o estado, o mercado, uma classe, desenvolvimento
tecnológico, ou algum outro fator que não as próprias bases da vida."[167]

- John McMurtry -

Visão global

A Economia é provavelmente a característica social mais crítica, relevante e


influente que existe. Praticamente todos os aspectos de nossas vidas, geralmente
sem reconhecimento consciente, têm uma relação com o desenvolvimento histórico
e atual disposição do pensamento econômico, em um nível ou outro, moldando
nossas instituições sociais, crenças e valores fundamentais mais básicos. Na
verdade, a própria essência de como nós, como sociedade, pensamos sobre a nossa
relação um com o outro e com o habitat que nos sustenta é, em grande parte,
resultado direto das teorias e práticas econômicas que nós perpetuamos.

Uma análise profunda das filosofias históricas, religiosas e morais, do


desenvolvimento governamental, dos partidos políticos, dos estatutos legais e
outros contratos sociais e crenças que compõem determinado sistema social e sua
respectiva cultura revela o profundo impacto que pressupostos econômicos têm e
continuam a ter na formação do "Zeitgeist" de uma época.

Encontrar-se-ão raízes da origem ou da perpetuação de muitas filosofias


econômicas, geralmente aceitas em um nível ou outro, em situações de divisão e
exploração, como escravatura, divisão de classes, xenofobia, racismo, sexismo,
subjugação, ainda comuns à história cultural humana. A história é bastante clara no
que diz respeito à forma como a condição social é preparada pelas premissas
econômicas prevalecentes de um determinado período, e essa ampla consideração
sociológica, infelizmente, não recebe muita importância no mundo de hoje quando
se pensa sobre por que o mundo está do jeito que está e por que pensamos da
forma que pensamos.

A título preliminar, um ponto que irá ressurgir mais adiante neste ensaio, tem
havido uma dualidade normalmente observada na maior parte do pensamento
econômico moderno, onde o "Livre-Mercado Capitalista", ou seja, as ações "livres"
de produtores independentes, trabalhadores e comerciantes, que trabalham em
conjunto para comprar, vender e empregar, [168] devem ser contrastadas com o
"Estado", ou seja, um sistema unificado de poderes delegados que tem a capacidade
69

de definir a política legal e mandatos econômicos que podem inibir as ações do


"Livre-Mercado" por meio de intervenções. A maioria dos debates econômicos hoje
gira em torno dessa dualidade, em um nível ou outro, com os interesses "laissez-
faire" - os que desejam ter uma economia de mercado completamente não
regulamentada - constantemente em guerra com a "política" - os que pensam que
algum tipo de controle governamental centralizado e decisões baseadas no
planejamento econômico e político sejam melhores.

O Movimento Zeitgeist não toma nenhum desses lados, mesmo que muitos ouvintes
das propostas do MZ tenham uma reação instintiva de assumir a última associação
(estatismo) [169]. Tal como acontece com muitos sistemas de crença tradicionais,
defesas e perspectivas polarizadas são comuns, e pensar que não há outro quadro
possível de referência no que diz respeito à forma como um sistema econômico
pode ser desenvolvido e administrado, é fechar-se dogmaticamente a muitas
considerações relevantes e emergentes.

A breve abordagem a seguir é sobre o desenvolvimento "Histórico" da economia.


Será traçada a história geral do pensamento econômico a partir do século XVII em
diante, com destaque para as influências fundamentais que deram origem ao
moderno sistema "Capitalista de Livre-Mercado". No entanto, como será mais
expandido na Parte III, uma perspectiva diferente também será aludida. Vamos
chamá-la de visão "Mecanicista". A perspectiva mecanicista dos fatores econômicos
tem um olhar diferente sobre as causas, as realidades científicas da existência
humana e o nosso habitat, e constrói um modelo de teoria econômica a partir do
ponto de vista da razão estratégica - e não da tradição histórica.

O ponto principal é que o pensamento econômico moderno não é realmente


moderno, e que a grande maioria das suposições ainda consideradas como
"definidas", tais como "propriedade", "dinheiro", "classismo", as teorias de "valor",
"capital" e outros conceitos que perpassam praticamente todos os argumentos
históricos contextualmente relevantes, estão realmente desatualizados em suas
premissas subjacentes. O rápido desenvolvimento das ciências industriais,
informacionais e humanas, que passaram praticamente ignoradas pela tradição
econômica estabelecida, estão inserindo reconsiderações críticas e novas relações
que simplesmente não existem nos modelos tradicionais. [170]

A respeito das sempre mutantes "escolas" de pensamento que trouxeram o debate


econômico para onde está hoje, a tradicional evolução acadêmica, muitas vezes
estereotipada, da teoria (e prática) econômica estabelecida parece ter desenvolvido
um quadro de auto-referência. [171] Em outras palavras, as considerações
econômicas mais comuns, discutidas e aceitas hoje, as que são mais propagadas nas
prestigiadas escolas acadêmicas e conferências governamentais, derivam sua
importância do simples fato de terem sido consideradas importantes por muito
70

tempo. Metaforicamente falando, é algo semelhante a visualizar o motor de um


automóvel e assumir que a estrutura dos componentes do motor é imutável, e que
apenas a variação entre os componentes existentes é possível, em oposição à ideia
radical de redesenhar toda a estrutura do motor a partir do zero, talvez com base
em novas tecnologias e informações que atendam às mesmas finalidades de forma
mais eficiente e com mais êxito.

O pensamento e a prática econômicos "modernos" são um motor antigo com


gerações de "especialistas" eminentes tentando administrar antigas peças
constituintes, recusando-se a aceitar a possibilidade de que todo o motor esteja
desatualizado e, talvez, cada vez mais prejudicial. Eles continuam a publicar
argumentos, teorias e equações que reforçam a falsa importância do motor antigo
(antigo "sistema de referência"), ignorando novos adventos da ciência e da
tecnologia que contradizem seu tradicionalismo. Não é diferente da longa história
de outras ideias "estabelecidas", tão abjetas quanto a escravidão humana, em que a
sociedade em geral realmente não questionava suas práticas, e considerava tais
estruturas estabelecidas, impostas e codificadas, como "naturais" à condição
humana. [172]

Temas subjacentes

Tomada como perspectiva histórica, a Europa da Idade Média [173] é, em geral, um


ponto de partida ideológico aceitável, uma vez que as ideias mais centrais
características do capitalismo moderno, que mais tarde se espalharam pelo mundo,
parecem ter se estabelecido durante este período. [174] É a partir do século 17 que
encontramos a maior parte dos filósofos influentes, altamente conceituados nos
atuais livros de história tradicionais de economia. Enquanto os historiadores
descobriram que os gestos básicos da "propriedade" e o ato de "troca por lucro"
remetem ao segundo milênio a.C. [175], a fundação do seu núcleo de
desenvolvimento e institucionalização parece repousar em torno do fim do período
feudal e início do período mercantilista.

Ao invés de discutir as várias diferenças entre os sistemas socioeconômicos que


precederam o Capitalismo moderno, é mais interessante notar as semelhanças
gerais. Nesse contexto mais amplo, o sistema Capitalista parece ser uma evolução
evidente das suposições históricas mais profundamente enraizadas acerca da
natureza humana e suas relações sociais. [176]

Primeiramente, é observado ao longo dessa evolução que a divisão de classes tem


sido reconhecida e utilizada em diferentes graus. As pessoas têm sido geralmente
divididas em dois grupos. [177] Aquelas que produzem por uma recompensa mínima
e aquelas que ganham a partir dessa produção. Da antiga escravidão egípcia, [178]
ao agricultor camponês labutando pela subsistência para o seu senhor no
71

feudalismo medieval, [179] até a opressão codificada dos mercadores através dos
monopólios estatais no Mercantilismo, [180] o tema da desigualdade tem sido
muito claro e consistente.

Uma segunda característica comum a essas filosofias socioeconômicas ocidentais


dominantes é o desrespeito básico (ou talvez ignorância) às relações críticas entre a
espécie humana e seu habitat. Por mais que possamos encontrar algumas exceções
nas tribos indígenas, como as sociedades nativoamericanas pré-coloniais, [181] o
pensamento econômico ocidental passa longe de tais considerações, exceção feita
aos mais recentes e crescentes problemas ecológicos que têm forçado respostas
governamentais e alavancado um interesse geral em uma "reforma". [182]

A terceira e última ampla característica a ser observada é a ausência generalizada de


reconhecimento social pelo bem-estar das pessoas ao nível das necessidades
humanas e, consequentemente, pela saúde pública. Os avanços nas ciências
humanas, que ocorreram em grande parte após as doutrinas fundamentais do
pensamento econômico serem tradicionalmente codificadas, descobriram que os
desejos humanos e as necessidades humanas [183] não se equivalem e que a
privação desse último pode criar muitas consequências negativas não só para o
indivíduo, mas para a sociedade. Comportamento antissocial, "criminoso" e
violento, por exemplo, encontra-se baseado nas várias formas de privação social
enraizadas na tradição socioeconômica. [184] De forma mais geral, o sistema ignora
tais consequências sociais inerentes, relegando esses resultados a meras
"externalidades", na maioria dos casos.

Essa realidade foi ainda mais agravada no século 18, onde a premissa "Socialmente
Darwinista" [185] de "trabalho-por-recompensa" reduziu cada vez mais o ser
humano a um objeto a ser definido e qualificado pela sua contribuição ao sistema
de trabalho. Se a pessoa média é incapaz de obter trabalho ou de se envolver com
sucesso na economia de mercado, não há nenhuma garantia real à sua própria
sobrevivência ou bem-estar, com exceção da "interferência" do "Estado" na forma
de auxílio. Nos dias de hoje, essa realidade se tornou bem controversa, pois o rótulo
de "socialismo" tem sido uma reação instintiva sempre que a política governamental
tenta fornecer ajuda direta para os cidadãos sem o uso do mecanismo de vendas
e/ou do mercado de trabalho.

A Aurora do Capitalismo de Livre Mercado

O feudalismo medieval (vigente do século IX ao XVI) foi o sistema socioeconômico


dominante que, essencialmente, precedeu o "capitalismo de livre mercado" na
Europa Ocidental, tendo o que mais tarde viria a ser chamado de "mercantilismo",
como fase de transição.
72

O feudalismo se baseava em um sistema de obrigações e serviços mútuos,


ascendentes e descendentes na hierarquia social, com todo o sistema social
dependente essencialmente da agricultura. A sociedade medieval era
majoritariamente agrária e a hierarquia social se baseava, principalmente, nos laços
das pessoas com a terra. As instituições econômicas básicas eram as "Guildas", e se
alguém quisesse produzir ou vender um produto ou serviço, geralmente se juntaria
a uma guilda. Muito pode ser detalhado sobre esse extenso período da história e,
como a maior parte da história, está sujeito a várias interpretações e debates. No
entanto, como foco deste ensaio, apenas apresentaremos uma visão geral da
transição econômica para o capitalismo de "livre mercado". [186]

Com a melhora da tecnologia agrícola e dos transportes, ocorreu uma expansão do


comércio e, por volta do século XIII, com, por exemplo, o advento da carroça de
quatro rodas, aumentou rapidamente o alcance das interações entre os mercados.
Da mesma forma, houve um aumento na especialização do trabalho, das
concentrações urbanas e também um crescimento populacional. [187] Essas
mudanças, juntamente com o resultante aumento do poder dos "mercadores-
capitalistas", como poderiam ser chamados, lentamente enfraqueceu os laços
tradicionais e habituais que mantinham a estrutura social feudal coesa.

Com o tempo, cidades mais complexas começaram a surgir, as quais foram bem
sucedidas na obtenção de independência dos senhores feudais, e sistemas cada vez
mais complexos de troca, crédito e lei foram surgindo, muitos dos quais espelhavam
aspectos básicos do capitalismo moderno. No sistema Feudal comum, o produtor
manual, geralmente, também era o vendedor para o comprador final. No entanto,
com a contínua evolução do mercado em torno desses novos centros urbanos, o
artesão começou a vender, com um desconto em grandes quantidades de produtos,
para comerciantes não-produtores que revenderiam em mercados distantes por
"lucro" - outra característica que se tornaria comum no Capitalismo de Mercado.

Por volta do século XVI, a indústria artesanal comum ao Feudalismo se transformou


em um reflexo bruto do que conhecemos hoje, com a terceirização de mão de obra,
a propriedade singular sobre a produção, e com muitos se encontrando cada vez
mais na posição de "empregados" ("classe trabalhadora") em vez de produtores.
Eventualmente, a lógica em torno do lucro monetário começou a ser,
sistematicamente, o núcleo decisivo das ações e as verdadeiras sementes do
capitalismo de mercado criaram raízes. [188]

O mercantilismo, que essencialmente dominou a política econômica da Europa


Ocidental entre o século XVI e o fim do século XVIII, [189] foi caracterizado por
monopólios comerciais, conduzidos pelo Estado de modo a garantir uma "balança
comercial" positiva, [190] juntamente com muitos outros extensivos regulamentos
sobre a produção, salários e comércio emergendo ao longo do tempo, aumentando
73

ainda mais o poder do Estado. O conluio entre essas indústrias emergentes e o


Estado era comum e muitas guerras ocorreram devido a essas práticas, uma vez que
se baseava em restrições ao comércio entre as nações, que muitas vezes tinha o
efeito de uma guerra econômica. [191]

Adam Smith, que será discutido mais adiante neste ensaio, escreveu uma extensa
crítica ao mercantilismo em seu clássico texto de 1776, Uma Investigação sobre a
Natureza e Causas da Riqueza das Nações. [192] A partir dessa obra é que nasce,
teoricamente, a ideologia do capitalismo de "livre mercado", rejeitando aquilo que é
frequentemente chamado de capitalismo "Estatal", em termos modernos, em que o
Estado "interfere" na "liberdade" do mercado - uma característica central do
Mercantilismo. [193]

Hoje, o "Capitalismo", em seu conceito específico, é definido culturalmente sob o


contexto teórico de "Livre Mercado" e não capitalismo "Estatal", embora muito seja
discutido a respeito de qual dos dois tipos de sistema realmente temos hoje, entre
outras variações do termo. Na realidade, não existem sistemas baseados puramente
no "Livre Mercado" ou no "Estado", mas uma fusão complexa entre os dois. Mais
uma vez, como foi observado no início deste ensaio, a grande maioria dos debates e
a responsabilização pelos desdobramentos econômicos, frequentemente, giram em
torno dessas ideias polarizadas. [194]

Definindo Capitalismo

O capitalismo [195] como conhecido atualmente, não só em sua teoria econômica,


mas com seus poderosos efeitos políticos e sociais, surgiu na sua forma, como já
observado, muito lentamente ao longo de um período de vários séculos. Deve ser
dito de antemão que não há acordo completo entre os historiadores/teóricos da
economia a respeito de quais realmente são as características essenciais do
capitalismo. No entanto, reduziremos, aqui, a sua caracterização histórica (que
alguns provavelmente acharão discutível) a quatro fatores básicos.

1) Produção e Distribuição Baseadas no Mercado: A produção de mercadorias é


baseada em inter-relações e dependências bastante complexas que não envolvem
diretamente interações pessoais entre produtores e consumidores. Oferta e
demanda são mediadas pelo sistema de "Mercado".

2) Propriedade Privada dos Meios de Produção: Isto significa que a sociedade


garante a particulares o direito de ditar como as matérias-primas, ferramentas,
máquinas e edifícios necessários à produção podem ser usados.

3) Dissociação da Propriedade e do Trabalho: Em suma, uma divisão de classes


constante é inerente, onde no nível superior, "capitalistas", [196] por definição
74

histórica, possuem os meios de produção, mesmo que não tenham a obrigação de


contribuir para a própria produção. Tudo produzido pelos trabalhadores, que só
possuem seu próprio trabalho, é de propriedade do capitalista, de acordo com a lei.

4) Incentivo da Auto-Maximização assumido: interesses individualistas, competitivos


e aquisitivos são necessários para o bom funcionamento do capitalismo já que uma
pressão constante em consumir e expandir é necessária para evitar recessões,
depressões e outros efeitos negativos. De muitas maneiras, essa é a visão
comportamental "racional" instituída, em que se todos os seres humanos agirem de
uma certa forma, o sistema funcionaria sem inibição. [197]

Locke: Evolução da “Propriedade”

Uma profunda corrente filosófica do sistema capitalista é a noção de "propriedade".


O filósofo inglês John Locke (1632-1704) é uma figura essencial. Baseando-se
também na obra mais influente de Adam Smith, Riqueza das Nações, Locke não
apenas define sua ideia geral, como também apresenta uma contradição sutil,
porém, poderosa.

No capítulo V, intitulado "Propriedade", na obra Segundo Tratado Sobre o Governo,


de Locke, publicada em 1689, é apresentado um argumento sobre a natureza da
propriedade e sua apropriação.

Ele afirma: "Podemos dizer que o trabalho de seu corpo e a obra produzida por suas
mãos são propriedade sua. Sempre que ele tira um objeto do estado em que foi
fornecido pela natureza, mistura nisso o seu trabalho e a isso acrescenta algo que
lhe pertence; dessa forma o torna sua propriedade." [198] Essa declaração
(sinalizando apoio ao que viria mais tarde ser associado com a "Teoria de Valor-
Trabalho"), propõe a lógica de que desde que o trabalho é "propriedade" do
trabalhador (uma vez que ele é dono de si mesmo), toda a energia expendida pelo
seu trabalho transfere para o produto obtido o valor de propriedade.

Sua postura filosófica é derivada essencialmente de uma perspectiva cristã, em que


afirma: "Deus deu o mundo a todos os homens; mas já que o deu em benefício deles
e para servi-los em suas conveniências da vida, Ele não pode ter tido em mente que
o mundo permaneceria sempre comum e não cultivado." [199]

Diante dessa declaração da natureza "comum" da terra e dos seus frutos a toda a
humanidade, antes do seu "cultivo" e apropriação, ele também deriva que os
proprietários são obrigados a não deteriorar nada ("Deus não criou nada para que
os homens desperdiçassem ou destruíssem." [200]) e devem deixar o suficiente para
os outros ("Essa apropriação de um pedaço de terra não era feita em detrimento de
75

nenhum outro homem, pois havia suficiente [e em boa qualidade] para todos...
"[201]).

Esses valores, de forma simplista, parecem ser, em geral, socialmente justificáveis.


Ele deixa claro, até este ponto, que o contexto de propriedade é relevante apenas
na medida das necessidades do proprietário e dentro de sua capacidade de cultivar
ou produzir. [202]

No entanto, na Seção 36, é revelada uma realidade singular, cujas implicações Locke
provavelmente não previu e que, de muitas maneiras, anularia todos os argumentos
anteriores em defesa da propriedade privada. Ele afirma: "A 'coisa' que bloqueia
isso é a invenção do dinheiro, e o acordo tácito entre os homens de o atribuir valor;
isso tornou possível, com o consenso dos homens, acumular mais posses e ter
direito sobre elas." [203]

Consequentemente, a sua premissa original, aqui resumida, de que: "Qualquer um


pode, através do seu trabalho, vir a possuir o quanto puder usar em seu benefício
sem deteriorá-lo; qualquer quantia além disso é mais do que lhe compete e
pertence aos outros"[204] se torna de difícil entendimento, pois o dinheiro não
apenas permite "[os homens] a ter mais posses", implicitamente esvaziando a ideia
de que "qualquer quantia além disso é mais do que lhe compete e pertence aos
outros", mas também implica que o dinheiro pode comprar trabalho, o que invalida
a ideia de que "[nesse caso, o comprador] mistura nisso o seu trabalho e a isso
acrescenta algo que lhe pertence; dessa forma o torna sua propriedade." [ 205]

Finalmente, a condição "Deus não criou nada para que os homens desperdiçassem
ou destruíssem" [206] é anulada por uma nova associação de que o dinheiro, sendo
ouro ou prata, na época, simplesmente não se deteriora. "Assim foi estabelecido o
uso do dinheiro - alguma coisa duradoura que o homem podia guardar sem que se
deteriorasse e que, por consentimento mútuo, os homens utilizariam na troca por
coisas necessárias à vida, realmente úteis, mas perecíveis." [207]

É aqui onde se encontra, pelo menos no discurso literário, a verdadeira semente da


justificação da propriedade capitalista, onde o uso do dinheiro, tratado em si como
uma mercadoria abstrata (na verdade, uma assumida personificação do "trabalho"),
permitiu o nascimento de uma evolução no pensamento e na prática, que cada vez
mais alterou o foco da produção relevante (o "cultivo" de Locke) para uma simples
mecânica de propriedade e de busca por lucro. [208]

Adam Smith

Adam Smith (1723-1790) é frequentemente citado como um dos filósofos


econômicos mais influentes da história moderna. Sua obra, mesmo que
76

naturalmente baseada em escritos filosóficos de outros antes dele, é muitas vezes


considerada um ponto de partida para o pensamento econômico no contexto do
capitalismo moderno. Atingindo a maturidade no início da Revolução Industrial,
[209] Smith viveu em uma época em que as características inerentes ao "modo de
produção" capitalista estavam se tornando cada vez mais evidentes, haja vista a
introdução de fábricas e mercados concentrados e centralizados.

Como se sabe, em 1776, Smith publicou sua obra hoje mundialmente famosa Uma
Investigação sobre a Natureza e Causas da Riqueza das Nações. Entre outras
observações relevantes, ele parece ser o primeiro a reconhecer as três principais
categorias de renda da época - (a) lucros, (b) arrendamentos e (c) salários - e como
eles se relacionam com as principais classes sociais do período - (a) capitalistas, (b)
donos de terras e (c) trabalhadores. É interessante notar que o papel dos donos de
terras/arrendamentos, raramente discutido hoje nos tratados econômicos
modernos, foi um ponto de foco comum na época, pois os sistemas pré-industriais,
ainda em grande parte agrários, destacavam os donos de terras (que mais tarde, nas
atuais teorias de mercado, seriam dissolvidos em sua classificação como simples
proprietários).

A contribuição mais notável de Smith para a filosofia capitalista foi a sua noção de
que, apesar de os indivíduos poderem agir de forma mesquinha, egoísta, em seu
próprio benefício ou do grupo, ou classe, a que pertencem, e mesmo que o conflito,
tanto individual ou de classe, pareça ser o resultado dessas ações, há o que ele
convencionou chamar de uma "mão invisível", que garantiria um resultado social
positivo a partir dessas intenções individuais, egoístas e não-sociais. Esse conceito
foi apresentado em suas obras A Teoria dos Sentimentos Morais [210] e A Riqueza
das Nações.

Nessa última, ele afirma: "Portanto, já que cada indivíduo procura, na medida do
possível, empregar seu capital em fomentar a atividade nacional e dirigir de tal
maneira essa atividade para que seu produto tenha o máximo valor possível, cada
indivíduo necessariamente se esforça por aumentar ao máximo possível a renda
anual da sociedade. Na realidade, geralmente, ele não tenciona promover o
interesse público, nem sabe até que ponto o está promovendo. Ao preferir
fomentar a atividade do país e não de outros países, ele tem em vista apenas sua
própria segurança; e orientando sua atividade de tal maneira que sua produção
possa ser de valor maior, visa apenas seu próprio ganho e, nesse, como em muitos
outros casos, é levado como que por uma mão invisível a promover um objetivo que
não fazia parte de suas intenções. Aliás, nem sempre é pior para a sociedade que
esse objetivo não faça parte das intenções do indivíduo. Ao perseguir seu próprio
interesse, o indivíduo muitas vezes promove o interesse da sociedade muito mais
eficazmente do que quando tenciona realmente promovê-lo." [211]
77

Esse ideal quase religioso teve um efeito poderoso na era pós-Smith, dando uma
justificativa muito social para o comportamento, por natureza, anti-social e auto-
maximizante, comum à psicologia Capitalista. Essa filosofia básica estava para se
desenvolver, em parte, como a fundação da economia "Neoclássica" [212], ao final
do século XIX.

Smith, sabendo muito bem dos conflitos de classe inerentes ao capitalismo, passa a
discutir a natureza de como alguns homens ganham "... superioridade sobre a maior
parte de seus irmãos", [213] reforçando o que passou a ser considerado por outros
teóricos como uma "lei da natureza" sobre o poder humano e a subjugação. Sua
visão de propriedade estava em harmonia com John Locke, elaborando sobre a
forma como a própria sociedade se manifesta em torno dela. Ele afirmou: "O
governo civil, na medida em que é instituído para garantir a propriedade, de fato o é
para a defesa dos ricos contra os pobres, ou daqueles que têm alguma propriedade
contra os que não têm propriedade alguma." [214 ]

Propriedade, como instituição, também requer um meio que justifique seu


respectivo valor. Com esse fim, várias “Teorias de Valor” foram e continuam sendo
postuladas. Frequentemente baseada na Política de Aristóteles, a contribuição de
Smith ainda é amplamente citada como uma influência fundamental. Na realidade,
Smith se baseia na premissa de produção/propriedade de Locke, chamada de
"mistura de trabalho", e, a partir daí, estende-a, criando a "Teoria do Valor-
Trabalho".

Ele afirma: "O trabalho foi o primeiro preço a ser pago por todas as coisas, a moeda
de troca original. Não foi por ouro ou por prata, mas pelo trabalho, que toda a
riqueza do mundo foi originalmente comprada, e seu valor, para aqueles que o
possuem, e que querem trocá-lo por algumas novas produções, é precisamente
igual à quantidade de trabalho que pode capacitá-los a comprar ou comandar".
[215] Muitos capítulos do Livro I de A Riqueza das Nações trabalham para explicar a
natureza de preços/valores de acordo com suas categorias de renda/classe de
"salários", "arrendamentos" e "lucros". No entanto, nota-se que sua lógica é
bastante circular, especialmente quando se percebe que as atribuições de preços se
originam simplesmente de outras atribuições, em uma cadeia sem um ponto de
partida real, a não ser a fraca distinção de trabalho empregado, que não tem, é
claro, nenhuma qualificação monetária estática ou intrínseca. Esse problema de
ambiguidade em ambas as teorias de valor dominantes, a de "trabalho" e a de
"utilidade", comuns à teoria de mercado Capitalista, será abordado em detalhes
mais adiante neste ensaio.

Em geral, a teoria econômica de Smith apoiou o Capitalismo "Laissez-faire" (de livre


mercado) como o mais alto modo de operação socioeconômico, afirmando que: era
um "sistema de liberdade natural" e "Todo homem, contanto que ele não viole as
78

leis da justiça, é deixado perfeitamente livre para perseguir seus próprios interesses,
seu próprio caminho, e trazer tanto a sua indústria quanto seu capital para a
concorrência com os de qualquer outro homem, ou grupo de homens".[216] Esse
conceito, como será discutido mais tarde no ensaio "Distúrbio do Sistema de Valor",
é uma suposição bastante ingênua sobre o comportamento humano e, de fato, uma
contradição.

Malthus e Ricardo

Thomas Malthus (1766-1834) e David Ricardo (1772-1823) foram dois conhecidos


teóricos, pioneiros na economia política do início do século XIX. Eles eram "rivais
amigáveis" em algumas perspectivas, mas, a partir de uma visão histórica ampla,
compartilhavam praticamente o mesmo ponto de vista, intimamente ligado ao de
Adam Smith.

O final da Revolução Industrial na Europa e América foi um período de extenso


conflito entre trabalhadores e proprietários capitalistas. Inúmeras revoltas e greves,
em resposta às condições de trabalho aberrantes e abusivas, não só para os
homens, mas também para mulheres e crianças, eram habituais. Isso rapidamente
deu origem ao que, atualmente, chamamos de Sindicatos, e uma batalha
generalizada entre "trabalhadores e proprietários" tem continuado desde então.
Para enfatizar a extensão dessa guerra de classe, na Inglaterra, o "Combination Act",
de 1799, impôs, basicamente, a proibição de qualquer associação de trabalhadores
de existir, impedindo que exercessem influência ou inibissem os interesses de seus
empregadores. [217]

O historiador Paul Mantoux, escrevendo sobre este período, comentou acerca de "o
poder absoluto e sem controle do capitalista. Durante esse período, a idade heroica
de grandes empreendimentos, isso era reconhecido, admitido e até mesmo
proclamado com franqueza brutal. Era assunto do próprio empregador, ele fazia
como escolhera e não considerava necessária qualquer outra justificativa de sua
conduta. Ele devia salários a seus empregados e, uma vez pagos, os homens não
teriam mais nenhuma reivindicação para com ele". [218] Foi no meio disso tudo que
Malthus e Ricardo contextualizaram seus pontos de vista econômicos e sociais.

Começando com Malthus, sua obra clássica Um Ensaio sobre o Princípio de


População orienta-se essencialmente em torno de dois pressupostos. O primeiro é
que a estrutura de classes de proprietários abastados e trabalhadores pobres
inevitavelmente iria reemergir, não importando quais reformas fossem
tentadas.[219] Ele considerou isso uma lei da natureza. A segunda ideia, em parte
corolária da primeira, era simplesmente que a pobreza e o sofrimento e, portanto,
as divisões econômicas, eram consequências inevitáveis da lei natural. [220]
79

Sua tese sobre a população repousa na simples premissa de que a "População,


quando não controlada, aumenta em uma progressão geométrica. A subsistência
aumenta apenas em uma progressão aritmética". [221] Portanto, se o padrão de
vida de todos na sociedade for aumentado, a grande maioria iria responder
aumentando a quantidade de filhos. Logo, a população seria muito em breve
empurrada de volta para a pobreza através da "população" ultrapassando a
"subsistência". Era somente por meio da "restrição moral" [222], uma qualidade
social que ele alega pertencer aos membros da classe alta, que esse problema seria
contornado pelo comportamento. Evidentemente, a diferença entre os ricos e os
pobres era o grande caráter moral dos primeiros e a mesquinhez dos últimos. [223]

Mais uma vez, como observado antes neste ensaio, a condição cultural teve muita
influência nas premissas do pensamento que orientaram as operações econômicas
até os dias atuais. Enquanto muitos podem, atualmente, descartar Malthus e essas
ideias claramente ultrapassadas, suas sementes criaram raízes profundas nas
doutrinas econômicas, valores e relações de classe ocorridas durante e depois de
seu tempo. Na verdade, variações de sua teoria populacional ainda são comumente
citadas, por aqueles com uma mentalidade mais "conservadora", em relação a
países economicamente menos desenvolvidos.

Malthus, juntamente com Locke e Smith, também manifestou convicções


profundamente cristãs em suas referências, tanto as diretamente extraídas das
escrituras, quanto as baseadas em sua interpretação pessoal. Malthus molda sua
"restrição moral" com a implicação de que um verdadeiro cristão denunciaria, de
forma justa, tais vícios de base e que, também, aceitaria a miséria, inevitável e
necessária, de modo a manter os limites populacionais dentro dos limites de
subsistência.

Da mesma forma, assim como há, atualmente, um grande debate legislativo a


respeito da noção e uso do "bem-estar" ou programas de "auxílio estatal" em
benefício dos pobres, [224] Malthus, naturalmente, era um grande defensor da
abolição do que foi chamado de "Leis Pobres", assim como foi David Ricardo.

Passando para Ricardo, ele aceitou essencialmente as teorias e conclusões de


Malthus sobre a natureza e as causas da pobreza da população, mas não concordou
com certas teorias econômicas, tais como alguns elementos das Teorias de Valor e
de Subconsumo de Malthus, e certos pressupostos de classe. Como a maioria dos
detalhes desses desacordos são supérfluos para essa discussão mais ampla (e
também indiscutivelmente ultrapassados), as contribuições mais notáveis de
Ricardo para o pensamento econômico serão nosso ponto de foco.

Em 1821, Ricardo terminou a 3ª edição da sua influente obra Princípios da Economia


Política e Tributação. No prefácio, ele expõe seu interesse: "O produto da
80

terra...tudo o que é derivado de sua superfície pela aplicação conjunta de trabalho,


maquinário e capital é dividido entre três classes da comunidade, ou seja, o
proprietário do terreno, o proprietário do estoque de capital, e os trabalhadores da
indústria que cultivam a terra. Determinar as leis que regulam essa distribuição é o
principal problema em Economia Política". [225]

Por mais que permanecesse crítico de certos aspectos da "Teoria do Valor-Trabalho"


de Adam Smith, ele ainda apoiou a distinção fundamental, afirmando: "Possuindo
utilidade, as mercadorias derivam seu valor de troca a partir de duas fontes: de sua
escassez e da quantidade de trabalho necessária para obtê-las." [226] Em comum
com Smith, ele explica: "Se a quantidade de trabalho empregado nas mercadorias
regula seu valor de troca, cada aumento da quantidade de trabalho deve aumentar
o valor da respectiva mercadoria, assim como toda diminuição deve baixá-lo." [ 227]

Consequentemente, a visão de Ricardo sobre a sociedade e as divisões de classe do


seu tempo a partir da perspectiva laboral foi, logicamente, a de que se opunham os
interesses dos trabalhadores e dos capitalistas. "Se os salários devem aumentar",
ele frequentemente afirmou, "então... os lucros vão necessariamente cair". [228] No
entanto, embora essa desarmonia aluda a um interesse subjacente de cada classe
em trabalhar para obter vantagem uma sobre a outra, muitas vezes resultando em
desequilíbrio sistêmico, em grande parte devido ao poder dos proprietários
capitalistas de controlar o trabalho (e definir políticas), aliado ao advento da
mecanização (aplicação das máquinas), que reduziu sistematicamente a necessidade
de trabalho humano em setores aplicados, ele alude à convicção de que a teoria do
"Capitalismo", se aplicada corretamente, deve sempre criar o pleno emprego em
longo prazo.

Sobre a questão específica da aplicação das máquinas substituindo o trabalho


humano em benefício do fabricante, afirma: "O fabricante ... que ... possa recorrer a
uma máquina que deve ... [reduzir os custos] de produção de sua mercadoria,
desfrutaria de vantagens peculiares se pudesse continuar a cobrar o mesmo preço
em seus bens; mas... seria obrigado a baixar o preço de suas mercadorias, ou o
capital fluiria para o seu comércio até que seus lucros retornassem ao nível geral.
Assim, então, o público é beneficiado pelas máquinas." [229]

Entretanto, assim como em outros aspectos de seus escritos, é notória a


contradição. Ainda que mantendo a ideia básica de que o público em geral se
beneficiaria pela introdução de máquinas em substituição ao trabalho, sob o
pressuposto de que os preços de mercado cairiam ordenadamente, e de que os
demitidos seriam sempre realocados naturalmente, na terceira edição de sua obra
Princípios, Ricardo inicia o capítulo 31 afirmando: "Desde que tornei minha atenção
para questões de economia política, tenho sido da opinião de que ... a aplicação de
máquinas em qualquer ramo de produção, por ter o efeito de economizar trabalho,
81

seria boa no geral ... [mas] a substituição de trabalho humano por maquinário é
frequentemente muito prejudicial para os interesses da classe de trabalhadores".
[230]

Ele mais tarde requalificaria o argumento, afirmando "Espero que as declarações


que fiz não levem à conclusão de que as máquinas não devem ser incentivadas. Para
elucidar o princípio, estive supondo que, de repente, máquinas melhores são
descobertas e logo amplamente utilizadas; mas a verdade é que essas descobertas
são graduais, e antes operam em determinar a aplicação do capital guardado e
acumulado, que desviando o capital de qualquer aplicação". [231]

Sua refutação à questão de os seres humanos serem substituídos por máquinas,


mais tarde chamada "desemprego tecnológico", também encontraria concordância
em muitos outros economistas que o seguiram, incluindo John Maynard Keynes
(1883-1946), que, alinhado com a suposição geral de "ajuste" de Ricardo, chegou a
afirmar:

"Estamos sendo afligidos por uma nova doença que alguns leitores podem ainda não
ter ouvido o nome, mas ouvirão muito nos próximos anos - o desemprego
tecnológico. Quer dizer desemprego devido à descoberta de meios de economia da
aplicação do trabalho, superando a nossa capacidade de encontrar novas aplicações
para o mesmo. Mas isso é apenas uma fase temporária de desajuste. Em longo
prazo, tudo isso significa que a humanidade está solucionando seu problema
econômico". [232]

O assunto é trazido aqui como um destaque, porque ele será revisto na Parte III
deste texto, junto a um contexto de aplicação tecnológica aparentemente não
compreendido ou ignorado pelos principais teóricos da economia da história
moderna, que, mais uma vez, estão muitas vezes presos em uma estreita margem
de referência.

Como uma consideração final sobre Ricardo, também o creditam por sua
contribuição ao "livre-comércio" internacional, especificamente em sua Teoria da
Vantagem Comparativa e a perpetuação do etos básico sobre a "mão invisível" de
Adam Smith. Ricardo afirma: "Sob um sistema de comércio perfeitamente livre, cada
país naturalmente dedica seu capital e trabalho à aplicação mais benéfica para cada
um. Essa busca de vantagem individual é admiravelmente ligada ao bem universal
do todo. Ao estimular a indústria, recompensar a engenhosidade e utilizar mais
eficazmente as capacidades conferidas pela natureza, o trabalho é distribuído da
forma mais efetiva e econômica: ao passo que, através do aumento da produção em
massa, o benefício geral é difundido, e une-se, por um laço recíproco de interesses e
relações, a sociedade universal das nações do mundo civilizado". [233]
82

Teorias de Valor e Comportamento

Até este ponto, as grandes contribuições de quatro grandes figuras históricas e as


características centrais, inevitavelmente inerentes à filosofia capitalista, foram
brevemente discutidas. Perceber-se-á que, por baixo dessas visões, repousam
hipóteses sobre o comportamento humano e relacionamentos sociais (de classe) e
uma lógica de mercado "metafísica", onde tudo dará certo se determinados valores
e uma postura "egoísta" forem assumidos pelos participantes do jogo de mercado,
concomitante a pouca "restrição" ao próprio mercado.

Como uma nota singela, em nenhum lugar nos escritos desses pensadores ou na
grande maioria das obras produzidas pelos teóricos posteriores em favor do
Capitalismo de "livre mercado", a real estrutura e processos de produção e de
distribuição são discutidos. Há uma desvinculação explícita entre "Indústria" e
"Negócios", o primeiro relacionando-se ao processo técnico/científico do verdadeiro
desdobramento econômico, e o último apenas referindo-se às dinâmicas codificadas
do mercado e à busca de lucro. Como será discutido mais adiante, um problema
central, inerente ao modo de produção capitalista, é como os avanços na
"abordagem industrial", que podem permitir um aumento da resolução de
problemas e promoção de prosperidade, foram bloqueados pelos dogmas
aparentemente imutáveis da "abordagem de negócios" tradicional. Esta última tem
regido as ações da primeira, em detrimento do seu potencial.

Esse tipo de desvinculação ou corte no sistema de referência é também encontrado


em outras áreas de atuação, tais como nas teorias laborais, de valor e de
comportamento humano, dominantes que, inevitavelmente, atuam como
justificantes da instituição do Capitalismo. Como observado antes, a "Teoria do
Valor-Trabalho", que se tornou popular por suas implicações a partir de Locke,
Smith e Ricardo, é uma proposta generalizada afirmando que o valor de uma
mercadoria está relacionado com o trabalho necessário para produzir ou obter essa
mercadoria. Tão aceitável quanto essa ideia seja, a partir de um ponto de vista
intuitivo, existem vários níveis de ambiguidade em sua quantificação. Muitas
objeções históricas têm resistido, por exemplo, como os diferentes tipos de
trabalho, contando com diferentes habilidades e salários, não poderiam ser
apropriadamente combinados, ou como equacionar os recursos naturais e o próprio
capital de investimento.

O crescimento dos "Bens de Capital" [234], no século XX, como a automação das
máquinas de trabalho, também apresenta desafios para o conceito bastante
simplificado de trabalho derivado das Teorias Laborais, já que, depois de um certo
ponto, o valor do trabalho inerente às máquinas de produção, que hoje já
funcionam para a produção de mais máquinas, com menor aplicação do esforço
83

humano ao longo do tempo, apresenta, nesse contexto, uma transferência cada vez
mais diluída de valor. Tem sido proposto por alguns economistas contemporâneos,
com base nos rápidos avanços nos campos da informação e ciências tecnológicas,
que o uso da automação industrial, aliado à "inteligência artificial", poderia muito
bem remover quase inteiramente os seres humanos da "força de trabalho"
tradicional. De repente, Capital se tornaria Trabalho, por assim dizer. [235]

Essa ambiguidade se estende também para as teorias de valor concorrentes


postuladas pelos economistas, incluindo principalmente a chamada Teoria do Valor-
Utilidade. Enquanto a Teoria do Valor-Trabalho assume, basicamente, a perspectiva
do trabalho ou produção, a Teoria do Valor-Utilidade toma o que poderíamos
chamar de "perspectiva de mercado": o valor não é derivado do trabalho, mas do
propósito (ou utilidade) de seu uso (valor de uso) pelo consumidor, conforme por
ele percebido.

O economista francês Jean-Baptiste Say (1737-1832) destaca-se em relação à Teoria


do Valor-Utilidade. Como um discípulo auto-proclamado de Adam Smith, ele
discordava de Smith sobre a questão do valor, afirmando: "Depois de ter mostrado
... a melhoria que a ciência da economia política deve ao Dr. Smith, não será inútil
indicar, talvez... alguns dos pontos em que ele errou... Somente ao trabalho do
homem ele atribui o poder de produzir valores. Esse é um erro." [236]

Passa, então, a explicar como o "valor de troca" (preço) de qualquer bem ou serviço
depende inteiramente do seu "valor de uso" (utilidade). Ele afirma: "O valor que a
humanidade atribui aos objetos origina-se do uso que pode fazer deles...[À] aptidão
inerente ou capacidade de certas coisas em satisfazer as diversas necessidades da
humanidade, darei o nome utilidade... A utilidade das coisas é o trabalho-base do
seu valor, e seu valor constitui riqueza... Embora o preço seja a medida de valor das
coisas, e o seu valor a medida de sua utilidade, seria absurdo concluir que, ao elevar
o preço à força, a utilidade poderia ser aumentada. Valor de troca, ou preço, é um
índice da utilidade reconhecida de certa coisa. [237]

A Teoria do Valor-Utilidade é diferente da Teoria do Valor-Trabalho, não só pela


forma como deriva o valor, mas também na implicação de um tipo de racionalização
subjetiva nas decisões humanas no mercado. O Utilitarismo [238], que se tornou
profundamente característico dos pressupostos microeconômicos apresentados
pelos economistas Neoclássicos contemporâneos, é muitas vezes modelado em
fórmulas matemáticas complexas, em um esforço para explicar como os seres
humanos "maximizam sua utilidade" no mercado, especificamente pela ideia de
aumentar a felicidade e reduzir o sofrimento.

Por baixo dessas ideias sobre o comportamento humano, como acontece com a
maioria das teorias econômicas, estão, mais uma vez, valores e suposições
84

tradicionalizadas. O economista Nassau Senior (1790-1864) apoiou um tópico


popular e hoje recorrente de que os desejos humanos são infinitos: "O que nós
queremos afirmar é que nenhuma pessoa sente que todas suas vontades estão
adequadamente supridas: que cada pessoa tem alguns desejos insatisfeitos das
quais ele acredita que uma riqueza adicional iria gratificar." [239] Tais declarações
sobre a natureza humana são constantes nestes tratados, com noções de ganância,
medo e outros mecanismos de reflexos hedonistas que assumem, entre outras
coisas, que a aquisição material, de riqueza e ganho são inerentes à felicidade.

Hoje, a perspectiva microeconômica dominante e amplamente aceita é a de que


todo o comportamento humano é redutível a tentativas estratégicas racionais para
maximizar os lucros ou ganhos e evitar a dor ou perda. Argumentos utilitaristas
sempre expansivos dessa natureza continuam a ser utilizados para justificar
moralmente o competitivo Capitalismo de "Livre Mercado". Um exemplo disso é a
noção de "voluntarismo" e a sugestão de que todos os atos no mercado nunca são
coagidos e, portanto, todos são livres para tomar suas próprias decisões para o seu
ganho ou perda. Essa ideia é extremamente comum hoje em dia, como se tais
"trocas livres" existissem num vazio, sem outras pressões sinergéticas; como se as
pressões pela sobrevivência, em um sistema com claras tendências para uma luta de
classes e escassez estratégica, não gerasse uma coerção inerente, forçando os
trabalhadores a se submeterem à exploração capitalista. [240]

No geral, o modelo Utilitarista (hedonista e competitivo, e "eternamente


insatisfeito") da natureza humana é provavelmente a defesa mais popular
atualmente do sistema capitalista. Trata-se, em muitos aspectos, tanto de uma
teoria psicológica de como as pessoas se comportam, quanto de uma teoria ética
sobre como elas devem se comportar, apoiando indiscutivelmente uma lógica
retroativa que, muitas vezes, coloca a teoria de mercado à frente da realidade do
comportamento humano, sujeitando a última à primeira.

Na realidade, quando a perspectiva utilitarista é totalmente considerada, dois


graves problemas surgem. Primeiro, é praticamente impossível encontrar
previsibilidade em tais fronteiras do "prazer e dor" após um certo grau no nível
social. Não há meios empíricos de comparar a intensidade do sentido de prazer de
um indivíduo com o de outra pessoa, além da suposição básica de querer mais
"ganhos" do que "perdas". Enquanto a Teoria do Valor-Utilidade pode ser lógica de
um ponto de vista generalizado, puramente abstrato, sem quantificação, o
funcionamento de tais dinâmicas emocionais é, na realidade, suscetível à severa
variação.

Toda a experiência de vida de uma pessoa, em relação a outra, pode encontrar


alguns pontos muito básicos em comum, no que diz respeito ao condicionamento
pessoal de resposta ao prazer e dor, mas raramente uma concordância paralela será
85

encontrada nos detalhes. Desde que os prazeres individuais são considerados o


último critério "moral" no utilitarismo, não há nenhuma maneira de fazer tais
julgamentos entre os prazeres de dois indivíduos. O economista Jeremy Bentham,
muitas vezes considerado o pai do utilitarismo, na verdade reconheceu isso de
passagem, escrevendo: "Preconceito à parte, o jogo de push-pin é de igual valor
com as artes e as ciências da música e da poesia. Se o jogo de push-pin fornecer
mais prazer, é mais valioso do que qualquer um". [241]

O segundo problema é a natureza míope da suposta reação emocional. Os seres


humanos têm expressado historicamente o interesse racional de sofrer no presente,
a fim de ganhar (ou esperar ganhar) no futuro. Altruísmo, que passou por amplo
debate filosófico, poderia muito bem estar enraizado em formas de "prazer" obtido
pelo ato (doloroso) altruísta em benefício de outros. Como será discutido mais
tarde, a premissa de dor e prazer apresentada por tais argumentos, reforçada por
uma reação impulsiva por ganho, tornou-se um padrão socialmente recompensado.
Isso tem gerado uma mentalidade onde ganho a curto prazo é procurado e,
frequentemente, às custas de sofrimento a longo prazo, na verdade.

No entanto, abstratamente, o utilitarismo também oferece um tipo bizarro de


equalizador, uma vez que isso pode ser identificado sob a perspectiva de "troca
mútua" e, portanto, uma maneira de sempre se ver o capitalismo como um sistema
de harmonia social, e não, de guerra. Voltando à Teoria do Valor-Trabalho versus a
Teoria do Valor-Utilidade, a primeira mostra claramente o conflito em como a Teoria
do Trabalho leva em conta a relação custo-benefício procurado pelo capitalista às
custas de salários para os trabalhadores. A Teoria da Utilidade, por outro lado,
remove completamente essas ideias e afirma que todos estão buscando a mesma
coisa e, portanto, deixando a estrutura de lado, todo mundo é igual. Em outras
palavras, todas as trocas se tornam mutuamente benéficas para todos em uma
lógica estreita e absurdamente abstrata e generalizada. Todas as ações humanas são
reduzidas a esse sistema de "trocas" e, portanto, todas as diferenças políticas ou
sociais teoricamente desaparecem.

A Insurreição "Socialista"

O Socialismo, como o Capitalismo, não tem uma definição aceita universalmente no


discurso público em geral, mas é frequentemente definido, em termos técnicos,
como "um sistema econômico caracterizado pela propriedade social dos meios de
produção e pela gestão cooperativa da economia". [242] A raiz do pensamento
socialista parece remontar ao século XVIII na Europa, em uma história complexa de
"reformadores" desafiando o sistema Capitalista emergente. Graco Babeuf (1760-
1797) é um teórico notável dessa área com a sua "Conspiração dos Iguais", que
tentou derrubar o governo francês. Ele afirmou: "A sociedade deve ser feita para
86

operar de tal maneira que elimine de uma vez por todas o desejo de um homem em
se tornar mais rico, ou mais sábio, ou mais poderoso que os outros."[243] O anarco-
socialista francês Pierre Joseph Proudhon (1809-1865) é famoso por declarar que
"Propriedade é Furto" na sua obra O que é a Propriedade? Uma Investigação sobre
o Princípio do Direito e do Governo.

Até o início do século XIX, as ideias socialistas foram se expandindo rapidamente,


geralmente como resposta aos notados problemas morais e éticos inerentes ao
capitalismo, como a desigualdade de classes e a exploração. A lista de pensadores
influentes é vasta e complexa, portanto, apenas três indivíduos serão discutidos
aqui, observando as suas contribuições mais relevantes: William Thompson, Karl
Marx e Thorstein Veblen.

William Thompson (1775-1833) teve uma influência poderosa sobre o pensamento


socialista. Ele era a favor da ideia de "Cooperativas", que ficou famosa com Robert
Owen, como um tipo de alternativa ao modelo de negócio capitalista e,
filosoficamente, tomou uma perspectiva utilitarista ao lidar com o comportamento
humano. Ele foi muito influenciado por Bentham, mas seu uso/interpretação do
utilitarismo era bastante diferente. Por exemplo, ele acreditava que se todos os
membros da sociedade fossem tratados da mesma forma, ao invés de entrarem
numa luta de classes e exploração, eles teriam capacidades iguais para experimentar
a felicidade. [244]

Ele argumentou extensivamente em favor de uma espécie de socialismo de


"Mercado", onde o igualitarismo e a equidade prevalecesse, em seu famoso An
Inquiry into the Principles of the Distribution of Wealth Most Conducive to Human
Happiness. Ele deixou claro que o capitalismo era um sistema de exploração e
insegurança, afirmando: "A tendência no arranjo existente das coisas em relação à
riqueza é para que uns poucos enriqueçam em detrimento da massa dos
produtores, para fazer com que a miséria dos pobres seja mais desesperadora".
[245] No entanto, ele passou a reconhecer que mesmo que tal híbrido do
capitalismo e socialismo surgisse, a premissa oculta da competição ainda seria um
problema sério. Ele escreveu longamente sobre os problemas inerentes à natureza
da concorrência do mercado, destacando cinco questões que têm sido a retórica
comum do pensamento Socialista desde então:

O primeiro problema foi que cada "trabalhador, artesão e comerciante [viu] um


concorrente, um rival em todos os outros ... [e cada um viu] "uma segunda
competição, uma segunda rivalidade entre ... [sua profissão] e o público." [246] Ele
passou a afirmar que seria "do interesse de todos os médicos que as doenças
deveriam existissem e prevalecessem, ou seu comércio seria reduzido em dez ou
cem vezes". [247]
87

O segundo problema foi a inerente opressão às mulheres e a distorção da família,


observando que a divisão do trabalho e a ética do egoísmo competitivo garantiram
ainda mais o penoso trabalho das mulheres no lar e a desigualdade de gênero. [248]

O terceiro problema associado com a competição era a inerente instabilidade


gerada na própria economia, afirmando: "O terceiro mal aqui imputado ao próprio
princípio da competição individual é que isso deve, ocasionalmente, levar a meios
não rentáveis ou imprudentes de esforço pessoal... cada indivíduo deve julgar por si
mesmo a probabilidade de sucesso na ocupação que ele assume. E quais são os seus
meios de julgar? Cada um, fazendo bem em sua vocação, está interessado em
esconder o seu ganho com medo de que a concorrência o reduza. Qual indivíduo
pode julgar se o mercado, frequentemente a uma grande distância, às vezes em
outro hemisfério do globo, está abastecido ou próximo de o ser, com o item do qual
está propenso a fabricar?...E caso um erro de julgamento... o leve a uma produção
desnecessária, e, portanto, inútil, qual é a consequência? Um simples erro de
julgamento...pode acabar em grave dificuldade, se não em ruína. Casos desse tipo
parecem ser inevitáveis sob o regime de competição individual em sua melhor
performance". [249]

O quarto problema observado é como a natureza egoísta do mercado competitivo


não garante segurança em torno de condições essenciais de suporte à vida, tais
como segurança na velhice, em caso de doenças e de acidentes. [250]

O quinto problema indicado por Thompson em relação à concorrência de mercado


foi que ela retardou o avanço do conhecimento. "A ocultação aos concorrentes,
portanto, daquilo que é novo ou excelente, deve acompanhar a competição
individual ... porque o interesse próprio, mais forte, está em oposição ao princípio
da benevolência". [251]

Karl Marx (1818-1883), ao lado de muitos outros, foi influenciado pelo trabalho de
Thompson e é provavelmente um dos mais conhecidos filósofos econômicos hoje.
Com seu nome frequentemente associado de forma depreciativa aos perigos das
atitudes do Comunismo Soviético, ou "totalitarismo", Marx também é
provavelmente o mais incompreendido de todos os economistas popularizados.
Embora mais famoso na mente do público geral por apresentar tratados sobre ideias
Socialistas-Comunistas, Marx, na verdade, passou a maior parte de seu tempo com o
assunto Capitalismo e suas operações. Sua contribuição para o compreensão do
capitalismo é mais ampla do que muitos imaginam, pois, hoje, muitos termos e
jargões econômicos comumente usados em conversas sobre o capitalismo, na
verdade, encontram raiz nos tratados literários de Marx. Sua perspectiva era, em
grande parte, histórica, e contava com conhecimentos bem detalhados sobre a
evolução do pensamento econômico. Devido ao tamanho imenso de seu trabalho,
apenas algumas questões influentes serão abordadas aqui.
88

Uma questão a ser destacada é a sua consciência de como a "troca", uma


característica capitalista, tornou-se a base primordial das relações sociais. Ele
declarou em sua obra Grundrisse: "De fato, na medida em que a mercadoria ou o
trabalho é concebido apenas como valor de troca, e a relação em que os vários
produtos são postos em contato um com o outro é concebida como a troca desses
valores de troca ... então as pessoas... são simples e exclusivamente concebidas
como trocadores. Enquanto o aspecto formal é levado em conta, não há
absolutamente nenhuma distinção entre eles ...Como sujeitos de troca, sua relação
é, portanto, a de igualdade ". [252]

"Embora um indivíduo 'A' sinta necessidade do produto de um indivíduo 'B', ele não
se apropria disto pela força ou vice versa, pelo contrário, reconhecem-se
reciprocamente como proprietários...Um não se apropria do que é do outro à força.
Cada um se despoja de sua propriedade de forma voluntária."[253]

Mais uma vez, como antes observado em relação ao tema recorrente das relações
humanas e os pressupostos de classe (ou negações), Marx enfatizou o que poderia
ser chamado de três ilusões principais: a ilusão de liberdade, de igualdade e de
harmonia social, reduzidas a uma associação extremamente limitada em torno da
ideia de "troca mutuamente benéfica", que seria o único relacionamento econômico
real pelo qual toda a sociedade deve ser avaliada.

"É no caráter da relação monetária - na medida em que é desenvolvida em sua


pureza até este ponto, e sem considerar as relações de produção mais bem
desenvolvidas - que todas as contradições inerentes à sociedade burguesa parecem
dissolver-se nessa mesma relação concebida de forma simples; e a democracia
burguesa, mais ainda do que os economistas burgueses, se refugia nesse aspecto ...
a fim de construir desculpas para as relações econômicas existentes.[254]

Em seu trabalho Capital: Crítica da Economia Política, Marx analisa extensivamente


muitos fatores do sistema capitalista, ou seja, a natureza dos commodities, a
dinâmica entre Valor, Valor de Uso, Valor de Troca, Teoria do Trabalho e Utilidade,
juntamente com uma investigação profunda sobre o que "Capital" significa, como o
sistema evoluiu e, finalmente, a natureza das funções dentro do modelo. Um tema
importante a notar é o seu ponto de vista sobre "Valor Excedente", que, em
demonstração da "Teoria do Valor-Trabalho" de Ricardo, é o valor apropriado pelo
Capitalista sob a forma de lucro, que é o excesso de valor (custo) inerente ao
próprio trabalho/produção.

Ele afirmou em relação a dispensar a origem desse "Excedente" na troca:


"Distorçamos como queira, o fato permanece inalterado. Se equivalentes são
trocados, não há valor excedente, e se não-equivalentes são trocados, ainda assim
89

não há valor excedente. A circulação, ou troca de mercadorias (commodities), não


gera valor algum". [255]

Em seguida, ele argumenta sucintamente sobre a diferença entre "trabalho" e


"força de trabalho", essa última consistindo tanto em "medida de valor" como em
"instrumento de troca", em que um trabalhador só é recompensado para atender
suas necessidades de subsistência, representadas em seu salário, enquanto que
tudo o que ultrapassar esse valor é um "excedente", teoricamente, traduzido por
"lucro", feito pelo capitalista, que, em sendo somados, apresentam-se no mercado
de troca através da "etiqueta de preço". [256] Esse ponto, que se estende ao
contexto e dinâmica inerentes à circulação e aplicação de diferentes formas de
capital (capital ainda definido como um meio de produção, mas, nesse caso,
principalmente na sua forma monetária), remete à conclusão de que a exploração
dos trabalhadores era inerente à criação de "excedente" ou "lucro". Em outras
palavras, como implicação, essa foi uma forma de desigualdade básica incorporada
ao sistema Capitalista, e enquanto um pequeno grupo de "donos" controlarem o
valor excedente criado pela classe trabalhadora, sempre haverá ricos e pobres,
riqueza e pobreza.

Marx amplia ainda mais essa ideia fazendo uma reavaliação da "propriedade", que
era, nessa circunstância, essencialmente a base legal do próprio "capital",
permitindo a explícita expropriação coerciva do "trabalho excedente" (a parte do
trabalho que gera excedente), quando declara: "No início, os direitos de
propriedade nos pareceram ser baseados no próprio trabalho do homem. Pelo
menos, tal suposição era necessária uma vez que apenas proprietários de
commodities com direitos iguais poderiam se equiparar, e o único meio pelo qual
um homem poderia tornar-se proprietário de mercadorias alheias era através
alienação (desvinculação) de suas próprias commodities; e estas poderiam ser
substituídas apenas pelo trabalho. Agora, no entanto, a propriedade passou a ser o
direito, por parte do capitalista, de se apropriar do trabalho não remunerado
(trabalho excedente) de outras pessoas ou do seu produto, e a ser a impossibilidade,
por parte do trabalhador, de se apropriar do seu próprio produto. A separação feita
entre propriedade e trabalho tornou-se a consequência necessária de uma lei que
aparentemente teve origem com a identidade de ambos."[257]

Marx desenvolve esses tipos de argumentos extensivamente em seus escritos,


incluindo a ideia de que o trabalho da classe trabalhadora não pode ser "voluntário"
nesse sistema - apenas coercivo - uma vez que a decisão final de aplicar o trabalho
em troca de salário estava nas mãos do capitalista. Ele afirmou: "O trabalhador,
portanto, apenas se sente separado de seu trabalho, e em seu trabalho, separado
de si mesmo. Ele está em casa quando não está trabalhando, e quando está
trabalhando, não está em casa. Portanto, seu trabalho não é voluntário, mas
90

coercivo; é trabalho forçado. Portanto, não é a satisfação de uma necessidade; é


apenas um meio de satisfazer necessidades externas às verdadeiras
necessidades."[258]

Por fim, foi essa exploração e desumanização complexa, degradante e multifacetada


do trabalhador médio que o incomodava tanto e que o levou à reforma. Ele até
inventou uma frase - "A Lei da Miséria Crescente" - para descrever como a felicidade
da população trabalhadora em geral era inversa à acumulação de riqueza da classe
capitalista. No fim das contas, Marx estava convencido de que as pressões inerentes
ao sistema levariam a classe trabalhadora a se revoltar contra a classe capitalista,
permitindo um novo modo "Socialista" de produção, onde, em parte, a classe
trabalhadora operaria em seu próprio benefício.

Thorstein Veblen (1857-1929) será o último auto-proclamado "Socialista" cujas


ideias influentes sobre o desenvolvimento e falhas do capitalismo serão exploradas
aqui. Como Marx, ele tem a vantagem do tempo no que diz respeito à digestão da
história econômica. Veblen ensinou economia em várias universidades durante sua
vida, produzindo literatura prolificamente sobre várias questões sociais.

Veblen era muito crítico das presunções econômicas neoclássicas, especificamente a


respeito das ideias utilitaristas aplicadas à "Natureza Humana", observando a ideia
de que todo o comportamento econômico humano seria reduzido a uma interação
hedonista de auto-preservação e maximização absurdamente simplista.[259] Ele
assumiu o que poderíamos chamar de uma visão "evolutiva" da história humana, em
que a mudança é definida pelas instituições sociais que assumiram o controle ou
que foram superadas. Afirmou, no que diz respeito ao atual estado do tempo (o qual
ele considerou "materialista"):

"Como qualquer cultura humana esta civilização materialista é um arranjo de


instituições - tecido institucional e desenvolvimento institucional...O
desenvolvimento da cultura é uma sequência cumulativa de adaptação, e as formas
e meios desse desenvolvimento se dão nas respostas habituais da natureza humana
às exigências que variam rapidamente, cumulativamente, mas com certa
consistência nessas variações cumulativas sucessivas que se seguem - incontinenti,
porque toda nova mudança cria uma nova situação que induz uma nova variação na
resposta habitual; cumulativamente, porque cada nova situação é uma variação do
que aconteceu antes dela e incorpora como fatores causais tudo o que foi realizado
antes; consistentemente, porque os traços subjacentes da natureza humana
(propensões, aptidões, e outros) por força dos quais as respostas ocorrem, e no
terreno sobre o qual a adaptação tem efeito, permanecerão inalterados."[260]

Veblen desafiou o fundamento básico do modo de produção capitalista,


questionando muitos dos fatores que haviam sido essencialmente "dados" ou
91

tornados empíricos pelos séculos de debate econômico. As instituições agora


enraizadas de "Salários", "Rendas", "Propriedade", "Juros", "Trabalho" foram
perturbadas em sua suposta simplicidade por uma visão de que nenhuma delas
poderia ser tida como intelectualmente viável, fora da associação puramente
categórica com limites extremos de aplicação. Ele brincou sobre como "um bando
de ilhéus Aleútes revirando destroços e surfando com ancinhos e encantamentos
mágicos para capturar mariscos são considerados, do ponto da realidade
taxonômica, envolvidos em uma façanha de equilíbrio hedonista em renda, salários
e juros. E não é nada mais do que isso". [261]

Ele viu a produção e a própria indústria como um processo social em que as linhas
estavam acentuadamente turvas, pois envolvia invariavelmente a partilha de
conhecimentos (usufruto) e habilidades. De muitas maneiras, via essas
características categóricas do Capitalismo serem inerentes ao Capitalismo em si, e
não, representativas da realidade física, mas apenas um grande artifício. Descobriu
que a teoria Neoclássica dominante existiu, em parte, para ocultar a luta de classes
e a hostilidade, inerentes e fundamentais, para proteger ainda mais os interesses
dos que ele chamou de "Interesses Excusos" ou "Proprietários Ausentes"
(Capitalistas) [262].

Rejeitou a ideia de que a "propriedade privada" era um "direito natural", como foi
assumido por Locke, Smith e outros, muitas vezes fazendo piadas sobre o absurdo
do pensamento que leva os "Proprietários Ausentes" a reivindicar a "posse" de
mercadorias produzidas, na realidade, pelo trabalho do "trabalhador comum",
destacando o absurdo do princípio antigo de que a partir do trabalho advém a
propriedade.[263] Foi mais longe para expressar o inerente caráter social da
produção e como a verdadeira natureza da habilidade e da acumulação de
conhecimento anulavam completamente a suposição de direitos de propriedade em
si mesma, quando afirmou:

"Esta teoria dos direitos naturais de propriedade torna o esforço criativo de um


indivíduo isolado, auto-suficiente, a base da propriedade que lhe cabe. Ao fazer isso
ignora o fato de que não existe um indivíduo isolado, auto-suficiente... A produção
tem lugar apenas na sociedade - somente através da cooperação de uma
comunidade industrial. Essa comunidade industrial pode ser grande ou pequena ...
mas sempre conta com um grupo grande o suficiente para conter e transmitir as
tradições, as ferramentas, o conhecimento técnico e as aplicações sem os quais não
se pode haver organização industrial ou qualquer relação econômica dos indivíduos
uns com os outros ou com seu ambiente... Não há produção sem conhecimento
técnico, logo, não há nenhuma acumulação ou riqueza a serem possuídas,
isoladamente ou de outra maneira. E não há nenhum conhecimento técnico fora de
uma comunidade industrial. Como não há produção individual nem produtividade
92

individual, a preconcepção dos direitos naturais ... reduz-se ao absurdo, mesmo sob
a lógica de suas próprias premissas." [264]

Tal como aconteceu com Marx, ele não viu outra maneira de distinguir as duas
principais classes da sociedade do que as separando entre aquelas que trabalham e
aquelas que exploram esse trabalho [265], tendo a parte lucrativa do capitalismo (o
"Negócio") completamente separada da produção em si ( "Indústria"). Ele faz uma
distinção clara entre Empresas e Indústria e refere-se à primeira como funcionando
como um veículo de "sabotagem" para a indústria. Ele viu uma completa
contradição entre a intenção ética da comunidade em geral em produzir
eficientemente e com bons serviços, e as leis de propriedade privada, que tinham o
poder de dirigir a indústria para a causa apenas do lucro, reduzindo sua eficiência e
intenção. O termo "sabotagem", nesse contexto, foi definido por Veblen como a
"retirada consciente de eficiência". [266]

Ele afirma: "A planta industrial está cada vez mais operando de forma ociosa ou
parcialmente ociosa, operando com sua capacidade produtiva de maneira cada vez
mais reduzida. Trabalhadores estão sendo demitidos... E enquanto essas pessoas
estão em grande necessidade de todos os tipos de bens e serviços que essas plantas
ociosas e operários ociosos estão aptos a produzir. Mas, por razões de conveniência
empresarial é impossível deixar essas plantas ociosas e operários ociosos
trabalharem - ou seja, por não haver lucro suficiente para os homens de negócios,
ou em outras palavras, por não haver renda suficiente para os interesses escusos".
[267]

Além disso, Veblen, ao contrário da grande maioria das pessoas nos dias atuais que
condenam os atos de "corrupção" por razões éticas, não viu nenhum dos problemas
de abuso e exploração como uma questão de "moralidade" ou "ética". Viu os
problemas como inerentes - construídos sobre a natureza do próprio Capitalismo.
Ele afirma: "Não é que esses capitães dos Grandes Negócios cujo dever é
administrar esta sabotagem mínima salutar na produção sejam maus. Não é que
eles pretendam encurtar a vida humana ou aumentar o desconforto humano,
maquinando um aumento de privação entre seus semelhantes... A questão não é
saber se esse tráfego com privações é humano, mas se é uma boa gestão
empresarial". [268]

No que diz respeito à natureza do governo, a visão de Veblen foi muito clara: o
governo, pela sua própria construção política, existia para proteger as estruturas de
ordem social e de classes existentes, reforçando as leis de propriedade privada e,
por extensão, reforçando a desproporcional classe dominante (no poder). "A
legislação, vigilância policial, a administração da justiça, os militares e o serviço
diplomático, todos estão principalmente preocupados com as relações de negócios,
93

interesses pecuniários, e eles têm uma preocupação pouco mais que casual com
outros interesses humanos", [269], afirmou.

A ideia de democracia também estava profundamente violada pelo poder


Capitalista, em sua opinião, quando afirmou que "o governo constitucional é um
governo de negócios". [270] Veblen, enquanto consciente do fenômeno do
"lobbying" e da "compra" de políticos, comumente visto hoje como uma forma de
"corrupção", não via isso como a verdadeira natureza do problema. Em vez disso, o
controle do governo por negócios não era uma anomalia - era simplesmente o que o
governo tinha manifestado ser desde seu design. [271] Por sua própria natureza,
como um meio institucionalizado de controle social, o Governo sempre protegeria
os "ricos" contra os "pobres". Uma vez que os "pobres" sempre ultrapassam
enormemente em quantidade os "ricos", uma estrutura legal rígida favorecendo os
ricos (interesses dos proprietários) teve que existir para manter a separação de
classes e intactos os benefício dos interesses capitalistas. [272]

Da mesma forma, também reconheceu como o governo do Estado Capitalista


necessitava fortemente manter os valores sociais alinhados com os seus interesses -
o que Veblen chamou de "Cultura Pecuniária". Portanto, os hábitos predatórios,
egoístas e competitivos típicos do "sucesso" na guerra social subjacente inerente ao
sistema Capitalista, naturalmente reforçam aqueles valores. Ser generoso e
vulnerável é de pouca utilidade para o "sucesso" nesse contexto, pois o cruel e
estrategicamente competitivo são ícones da recompensa social. [273]

Em uma avaliação ampla, Veblen buscou analisar criticamente a estrutura central e


os valores do modelo capitalista de livre mercado, trazendo algo que pode ser
indicado como conclusões profundamente avançadas sociologicamente, no que diz
respeito às contradições internas, ineficiência técnica e distúrbios de valor desse
modelo. Seu trabalho é muito indicado para revisão por todos aqueles interessados
na história do pensamento econômico, especificamente para os céticos em relação
à premissa do capitalismo de livre mercado.

Em Conclusão: O capitalismo como "Patologia Social"

A história do pensamento econômico é, em muitos aspectos, a história das relações


sociais humanas, com um modelo em que certas suposições ganham destaque a
ponto de serem consideradas sagradas e imutáveis após um tempo. Esse elemento
tradicionalista, originado a partir de sistemas de valores e crenças de períodos
anteriores, tem sido um tema principal nesta breve revisão da história econômica. O
ponto central sendo que os atributos tidos como "óbvios" para as teorias
dominantes da economia de hoje não são, de fato, baseados em uma base física
direta, como seria necessário para encontrar validação através do método científico,
mas sim, baseados na mera perpetuação de um quadro ideológico estabelecido,
94

cuja evolução para uma auto-referência intrincada à sua lógica interna justifica sua
própria existência e suas próprias normas.

Hoje em dia, não é o que dá corpo à ideologia capitalista em seus detalhes o mais
problemático, mas sim, o que ela omite, por extensão. Assim como religiões
primitivas viram o mundo como sendo plano e tiveram que ajustar sua retórica, uma
vez que foi comprovado ser redondo, pela ciência, a tradição da economia de
mercado é confrontada com desafios similares. Considerando a simplicidade das
abordagens agrárias e, por fim, primitivas para a produção industrial, houve pouca
conscientização ou uma necessária preocupação com as possíveis consequências
negativas ao longo do tempo, não só em nível do habitat (ecológico), mas também
em nível humano (saúde pública).

Da mesma forma, o sistema de mercado, com suas suposições muito antigas acerca
das possibilidades, também ignora (ou até mesmo confronta) os avanços poderosos
na ciência e tecnologia, que expressam capacidade para resolver problemas e criar
uma elevada prosperidade. De fato, como será explorado no ensaio "Eficiência de
Mercado vs. Eficiência Técnica", tais ações progressistas e de um reconhecimento da
harmonia em relação ao habitat e ao bem-estar humano revelam que Capitalismo
de "Livre Mercado", literalmente, não faculta essas soluções, já que em sua própria
mecânica padrão dispensa ou funciona contra tais possibilidades.

De um modo geral, a resolução de problemas e, consequentemente, o aumento da


eficiência é, em muitos aspectos, um anátema para a operação do mercado. A
solução dos problemas em geral significa o fim da capacidade de obter renda a
partir da "manutenção" desses problemas. Melhor eficiência quase sempre significa
uma redução na necessidade de trabalho e de energia e, ao mesmo tempo em que
isso possa parecer positivo em relação à verdadeira eficiência do planeta, também,
muitas vezes, significa uma perda em postos de trabalho e redução da circulação
monetária devido a sua aplicação. [274]

É aqui onde o modelo capitalista começa a tomar o papel de um agente social


patogênico, e não apenas no que diz respeito ao que ignora, inviabiliza ou evita
devido a sua própria estrutura, mas também em relação ao que reforça e perpetua.
Se voltarmos à declaração de Locke sobre como a natureza do dinheiro, com o
consentimento tácito da comunidade, era essencialmente a de servir a comunidade
em si mesma, é fácil notar como esse simples "meio de troca" evoluiu até sua forma
sociológica atual, em que toda a base do mercado funciona, na verdade, não com a
intenção de criar e ajudar a sobrevivência, saúde e prosperidade humanas, mas,
agora, apenas para facilitar o ato de lucrar e o lucro, somente. Adam Smith nunca
teria previsto que, nos dias de hoje, os campos mais lucrativos e compensatórios
não seriam a produção de bens para a melhoria ou suporte da vida, mas sim, o ato
de movimentar o dinheiro - daí o "trabalho" das instituições financeiras como os
95

bancos, "Wall Street" e as empresas de investimento - empresas que literalmente


criam nada, no entanto, possuem imensa riqueza e influência.

Hoje, a única real Teoria de Valor vigente é a que poderia ser chamada de
"Sequência Monetária de Valor". [275] O dinheiro tem assumido vida própria no que
diz respeito à reforçada psicologia de sua circulação. Não possui nenhum propósito
definido diretamente, apenas o de gerar mais dinheiro a partir de menos dinheiro
(investimento). Esse fenômeno de "dinheiro gerando dinheiro" não só criou um
distúrbio no sistema de valor, em que esse interesse em ganho monetário supera
tudo o mais, tornando secundárias e "externas" ao foco da economia as questões
ambientais e de saúde pública verdadeiramente relevantes, mas sua propensão
constante em "multiplicar" e "expandir" possui, realmente, um aspecto canceroso -
essa ideia de "crescimento" necessário, ao invés de um estado de equilíbrio
estacionário - e continua o seu efeito patológico em diferentes níveis.

Muito poderia ser dito sobre o sistema de dívida[276] e sobre como praticamente
todos os países do planeta Terra estão agora em dívida com eles mesmos, na
medida em que nós, a "espécie humana", na verdade não temos dinheiro suficiente
em circulação para nos pagar de volta o que tomamos emprestado do nada. A
necessidade de mais e mais "crédito" para abastecer o "mercado" é constante hoje
devido a esse desequilíbrio, o que significa que, como no câncer, estamos lidando
com a intenção de expansão e consumo infinitos. Isso simplesmente não funciona
em um planeta finito.

Além disso, o etos competitivo, orientado pela escassez inerente ao nosso modelo,
continua a perpetuar a luta de classes sectarista que mantém em guerra consigo
mesmo não só o mundo, através do imperialismo e do protecionismo, mas também
a população geral. Hoje, muitos andam por aí com medo uns dos outros, já que a
exploração e o abuso é o etos dominante recompensado. Todos os seres humanos
se adaptaram a essa cultura em que vemos uns aos outros, desnecessariamente,
como ameaças a nossa própria sobrevivência, em contextos "econômicos" cada vez
mais abstratos. Por exemplo, quando duas pessoas chegam a uma entrevista de
emprego em busca de sustento, não estão interessadas no bem-estar uma da outra,
já que apenas uma sairá empregada. Na verdade, a capacidade empática é uma
pressão negativa nesse sistema de vantagem, e é completamente não
recompensada pelo mecanismo financeiro.

Da mesma forma, o pressuposto de que poderia existir "justiça" em um ambiente


tão competitivo, especialmente quando a natureza do "ganhar" e do "perder"
significa uma perda no suporte à vida ou à sobrevivência, é uma ideia
profundamente ingênua. Os estatutos legais existentes que servem para impedir as
leis de monopólio e "corrupção" financeira existem porque não há, literalmente,
qualquer garantia possível contra a chamada "corrupção" nesse modelo. Como
96

sugerido neste ensaio por Smith e Veblen, o "Estado" é, na realidade, uma


manifestação da premissa econômica, e não o contrário. O uso do poder do Estado
para legislar, para garantir a segurança e a prosperidade de uma classe sobre outra,
não é uma distorção do sistema capitalista, é uma característica fundamental da
ética competitiva do livre-mercado.

Muitos dos libertários, Laissez-faire, da Escola Austríaca, de Chicago e outras


ramificações neoclássicas, constantemente tendem a falar sobre como "a
Interferência do Estado" é o problema hoje, como ter políticas de importação /
exportação protecionistas ou o favorecimento de certas indústrias pelo Estado.
Supõe-se que de alguma forma o mercado pode ser "livre" para operar sem a
manifestação de monopólio ou das "corrupções" inerentes ao que hoje
consideramos "capitalismo de compadrio", apesar de toda a base da estratégia ser
competitiva ou, em termos mais diretos, "em guerra". Mais uma vez, assumir que o
Estado não seria usado como uma ferramenta para a vantagem diferencial - uma
ferramenta para o negócio - é um absurdo.[277]

Afinal, esses valores aberta e desnecessariamente egoístas têm estado na raiz do


conflito humano desde a sua origem e, como observado, a noção histórica de
conflito humano, no nível de classe, é vista pela maioria como "óbvia", "natural" ou
"imutável". No modelo social existente, extraído de uma referência orientada
inerentemente pela escassez, xenofobia e racismo, não há tal coisa como a paz ou
equilíbrio. Simplesmente não é possível no modelo Capitalista. Da mesma forma, a
ilusão de igualdade entre as pessoas, nas sociedades ditas "democráticas", também
persiste, assumindo que de alguma forma a igualdade política pode se manifestar
fora da explícita desigualdade econômica inerente a este modo de produção e de
relações humanas.

No início deste ensaio, a distinção entre a visão "Histórica" e a "Mecanicista" da


lógica econômica foi mencionada de passagem. A importância da perspectiva
"Mecanicista" (científica), que será explorada em ensaios posteriores, é crítica no
que tange a compreensão de quão profundamente desatualizada e falha a
economia de mercado realmente é. Quando tomamos as leis da natureza
conhecidas, tanto nos níveis humanos e de habitat, e começamos a calcular quais as
nossas opções e possibilidades, tecnicamente, sem a bagagem de tais pressupostos
históricos, uma linha de pensamento muito diferente emerge. Na opinião do MZ,
esta é a nova visão de mundo pela qual a humanidade precisa se alinhar a fim de
resolver seus atuais e crescentes problemas sociológicos e ecológicos, além de abrir
a porta para enormes possibilidades para a prosperidade futura.

Notas de rodapé para "História da Economia"

[167] The Cancer Stage of Capitalism, John McMurtry, Pluto Press, 1999, p.viii
97

[168] Uma definição menos generalizada do "Livre-Mercado" é a seguinte: "Um sistema econômico em que
os preços e salários são determinados pela livre concorrência entre as empresas, sem regulamentação do
governo ou medo de monopólios" [http://dictionary.reference.com/browse/free+market]

[169] Como será descrito em ensaios posteriores, muitas vezes a falsa categorização do MZ de ser
"Estatista" está enraizada na sua oposição geral aos Princípios de Mercado, o que este acredita ser
insustentável e, muitas vezes contraproducente. Estatismo, que pode assumir várias formas, tais como
Comunista, Fascista ou Socialista, defende uma "autoridade central" para decidir como o processo
econômico/político deve se desdobrar, com pouca ou nenhuma influência relevante ocorrendo através da
população em geral. O MZ apoia um processo de tomada de decisão aberta, sob a imposição de leis básicas
de sustentabilidade e eficiência, comprovadas cientificamente .

[170] A noção de "Externalidade", qual será observada mais adiante neste ensaio, é um exemplo disto. A
maioria dos custos ambientais e sociais, sistêmicos para a abordagem de Mercado, juntamente com
discutível perda de eficiência e, consequentemente, prosperidade, são dispensados da equação teórica do
Mercado, entre muitas outras questões relevantes.

[171] O filósofo econômico John McMurtry afirmou de forma geral sobre esta questão: "Esta tendência
prevalece dos Racionalistas Continentais em diante. Leibniz, Spinoza, Descartes, Berkeley, Kant e Hegel, por
exemplo, mais ou menos inteiramente pressupunham o regime social da sua época e suas formas
constituintes como, de alguma forma, a expressão da Mente divina, que eles vêem apenas como seu dever
racional de aceitar ou de justificar. " The Cancer Stage of Capitalism, Pluto Press, 1999, p.7

[172] Aristóteles (384 aC-322 aC), enquanto creditado com vasta contribuição científica, lógica e filosófica,
também era a favor da escravidão, justificando a realidade com o que poderia ser alegado como viés, não
razão. Ele declarou: "Mas será que existe alguém assim destinado pela natureza para ser um escravo, e
para quem tal condição é conveniente e correta, ou melhor, não é toda a escravidão uma violação da
natureza? Não há dificuldade em responder a esta questão, no terreno da razão e da verdade. Por que
alguns devem governar e outros serem governados é algo, não só necessário, mas apropriado, a partir da
hora de seu nascimento, alguns estão marcados para a sujeição, outros para governar". Política, Livro I,
Capítulos III a VII

[173] O termo "Idade Média" geralmente refere-se ao período da história européia que durou do século V
ao século XV.

[174] Para um estudo detalhado do sistema econômico e da sociedade medieval, o trabalho seguinte é
sugerido: The Agrarian Life of the Middle Ages, JH Chapman e Eileen E. Powers, eds., 2d ed, The Cambridge
Economic History of Europe, vol. 1 London, Cambridge University Press, 1966

[175] Macroeconomics from the beginning: The General Theory, Ancient Markets, and the Rate of Interest,
David Warburton Paris, Recherches et Publications, 2003 p.49

[176] A "Emergente" consideração do desenvolvimento econômico parece ser um conceito relativamente


novo, introduzido mais popularmente por Thorstein Veblen no início do século 20. Sugestão de leitura
sobre o assunto de evolução econômica: The Evolution of Institutional Economics: Agency, Structure and
Darwinism in American Institutionalism, Geoffrey M. Hodgson, Londres, Routledge, 2004

[177] A distinção de "classes" em categorias específicas é sem significado exato, historicamente. O ponto
aqui é a presença permanente de uma classe claramente dominante, seja a nobreza antiga, por exemplo,
ou a oligarquia financeira moderna.

[178] Sugestão de leitura, The Historical Encyclopedia of World Slavery, Junius P. Rodriguez, Vol I, Seção E
98

[179] Sugestões de leitura: Mediaeval Feudalism, Carl Stephenson, Cornell University Press, 1956

[180] A History of Economic Theory and Method, Robert B. Ekelund, Robert F. Hebert, New York: McGraw-
Hill, 1975

[181] Sugestões de leitura: Defending Mother Earth: Native American Perspectives on Environmental
Justice, Jace Weaver, Orbis Books, 1996

[182] Para listar os problemas ecológicos agora enfrentados pela a humanidade, da desestabilização
climática, à poluição, ao esgotamento de recursos, a perda de biodiversidade e outras invariáveis ameaças
à saúde pública, seria muito extenso para detalhes aqui. Na visão do MZ, estas questões são em grande
parte resultado da premissa Capitalista e suas abordagens e valores aceitos.

[183] Os padrões de consumo da sociedade moderna têm mostrado uma natureza arbitrária com relação
ao "Querer Humano", assim como a poderosa mudança de valores que ocorreu no início do século 20 com
a aplicação de publicidade ocidental moderna. "Necessidades Humanas", no entanto, são necessidades
básicas, em grande parte compartilhadas por todos os seres humanos, que mantêm a saúde física e
psicológica.

[184] Ver o ensaio prévio "Definindo Saúde Pública".

[185] "Darwinismo Social" é uma ideologia muito geral que procura aplicar conceitos biológicos do
darwinismo ou de "sobrevivência do mais apto" para sociologia e política. O termo foi popularizado nos
Estados Unidos em 1944 pelo historiador Richard Hofstadter. A intuição deste conceito, no entanto,
aparece muito tempo antes da época de Darwin no pensamento filosófico.

[186] Sugestões de leitura: Mediaeval Feudalism, Carl Stephenson, Cornell University Press, 1956

[187] Sugestões de leitura: The Economy of Early Renaissance Europe, Harry A. Miskimin, Englewood Cliffs,
NJ: Prentice-Hall, 1969, p.20

[188] Sugestões de leitura: A Evolução do Capitalismo, Maurice H. Dobb, Guanabara, 1987, capítulo 4

[189] Enciclopédia de Economia, David R. Henderson e João C. das Neves, Principia, 2001 "mercantilismo"

[190] Um balanço positivo do comércio também é conhecido como um "superávit comercial" e consiste em
exportar mais do que é importado em valor monetário. Este ato por parte do Estado hoje é muitas vezes
chamado de "protecionismo".

[191] The Growth of Economic Thought, Henry William Spiegel, Duke University Press, 3 Ed, 1991, pp.93-
118.

[192] A Riqueza das Nações, Adam Smith, 1776, Livro IV: Dos Sistemas de Economia Política

[193] Murray Rothbard, economista de destaque da moderna "Escola Austríaca", resumiu a perspectiva e
crítica "Estatista": "O mercantilismo, que atingiu seu auge na Europa dos séculos XVII e XVIII, foi um sistema
de estatismo que empregava falácia econômica para construir uma estrutura de poder imperial do Estado,
bem como subsídio especial e privilégio monopolista para indivíduos ou grupos favorecidos pelo Estado.
Assim, o mercantilismo assegurava que as exportações deveriam ser incentivadas pelo governo e as
importações desencorajadas". [Mercantilism: A Lesson for Our Times?, Murray Rothbard, Freeman, 1963]

[194] Como será discutido no ensaio "Desordem do Sistema de Valores", esta é uma falsa dualidade e é
discutível em relação aos problemas subjacentes comumente atribuídos ao debate polarizado.
99

[195] A partir de agora, neste ensaio, usaremos o termo "Capitalismo" em sua forma cultural mais comum,
implicando o contexto teórico do "Livre-Mercado".

[196] Enquanto um "Capitalista" pode ser considerado uma pessoa a favor desta abordagem para a
economia, uma definição mais precisa denota "uma pessoa que tem capital, especialmente capital extenso,
investido em negócios de empresas." [Http://dictionary. reference.com/browse/capitalist]. Em outras
palavras, esta é uma pessoa que possui ou investe capital para um retorno ou lucro, mas mesmo assim não
tem a obrigação de contribuir para a produção efetiva ou trabalho de qualquer natureza.

[197] Um corolário disso são as várias "Escolhas Racionais" e "Teorias da Utilidade", comuns à teoria
microeconômica do Livre-Mercado, que tenta quantificar as ações humanas em torno de vários modelos
comportamentais. Mais sobre isso nos próximos ensaios.

[198] Segundo Tratado sobre o Governo Civil, John Locke, Capítulo V, Seção 27, 1689

[199] Ibid., Capítulo V, Seção 34

[200] Ibid., Capítulo V, Seção 31, 1689

[201] Ibid., Capítulo V, Seção 33, 1689

[202] Locke declara: "A natureza fez bem ao estabelecer limites à propriedade privada através de limites
para o quanto os homens podem trabalhar e limites para o quanto eles precisam. O trabalho de nenhum
homem poderia domar ou apropriar-se de toda a terra; o prazer de nenhum homem poderia consumir mais
do que uma pequena parte, de modo que era impossível para qualquer homem, desta forma, infringir o
direito do outro, ou adquirir uma propriedade em detrimento de seu vizinho ... " [Segundo Tratado sobre o
Governo Civil, John Locke, Capítulo V, Seção 36, 1689]

[203] Ibid., Capítulo V, Seção 36, 1689

[204] Ibid., Capítulo V, Seção 31, 1689

[205] Ibid., Capítulo V, Seção 27, 1689

[206] Ibid., Capítulo V, Seção 31, 1689

[207] Ibid., Capítulo V, Seção 47, 1689

[208] A Bolsa de Valores e o poder crescente dos investimentos e poderes financeiros ao redor do mundo
no século 21 refletem bem esta consequência. Parece que o simples ato de posse e comércio via dinheiro
por si só, sem a necessidade do cultivo de produtos e serviços humanos, tornou-se o setor mais lucrativo no
mundo de hoje.

[209] A Revolução Industrial ocorreu, de acordo com vários historiadores, a partir de cerca de 1760 a algo
entre 1820 e 1840, inicialmente na Europa. Foi essencialmente a transição/aplicação de processos de
fabricação novos, de base tecnológica.

[210] "Os ricos só selecionam do ¨bolo¨ o que é mais precioso e agradável. Eles consomem pouco mais que
os pobres, e apesar de seu egoísmo natural e rapacidade, embora busquem apenas sua própria
conveniência, embora o único fim que se propõe a partir do trabalho de todos os milhares que eles
empregam seja a satisfação de seu próprio desejos vãos e insaciáveis, eles dividem com os pobres o
produto de todas suas melhorias. Eles são movidos por uma mão invisível a fazer quase a mesma
distribuição das necessidades de vida, o que teria sido feito, fosse terra dividida em partes iguais entre
100

todos os seus habitantes, e, assim, sem querer, sem saber, avançar o interesse da sociedade e dispor meios
para a multiplicação da espécie". [A Teoria dos Sentimentos Morais, par. IV.I.10, 1790]

[211] A Riqueza das Nações, Adam Smith, 1776, par. IV.2.9.

[212] Não existe uma definição estática de "Economia Neoclássica". No entanto, um resumo geral,
culturalmente comum, inclui o amplo interesse nos mercados não regulamentados, "livres", focando na
determinação dos preços, produtos e distribuição de renda em mercados através de oferta e demanda,
muitas vezes mediada através de uma hipotética maximização de utilidade por indivíduos com restrição
orçamentária e dos lucros das empresas com restrições de custo.

[213] Ibid., par. V.1.2

[214] Ibid.

[215] Ibid.

[216] Ibid., par. IV.9.51

[217] Este poder dos interesses Capitalistas de se envolver e, em muitos aspectos, tornar-se o governo,
para servir a sua própria vantagem competitiva também será discutido no ensaio posterior: "Desordem do
Sistema de Valores"

[218] A Revolução Industrial, no Século XVIII, Paul Mantoux, trad. Sonia Rangel, São Paulo, Hucitec/Unesp.

[219] Ele afirma: "Nenhum possível sacrifício dos ricos, particularmente em dinheiro, poderia, por qualquer
tempo, prevenir a recorrência de angústia entre os membros inferiores da sociedade, quem quer que
fossem eles" [Ensaio sobre o Princípio da População, Thomas Malthus, 1798, Capítulo 5]

[220] Ele afirma: "Aparentou-se, que a partir das leis inevitáveis da nossa natureza alguns seres humanos
devam sofrer pela miséria. Estas são as pessoas infelizes que, na grande loteria da vida, têm tirado um
bilhete em branco ". [Ensaio sobre o Princípio da População, Thomas Malthus, 1798, capítulo 10]

[221] Um Ensaio sobre o Princípio da População, Thomas Malthus, 1798, Capítulo 1

[222] De sua 2ª edição do Ensaio sobre o Princípio da População, 1836, Principles of Political Economy, vol.
1, p.14. Nova York, Augustus M. Kelley, 1964.

[223] É de nenhuma valia que a Teoria Populacional Malthusiana é, na realidade, bastante imprecisa em
relação aos fatores relacionados ao crescimento populacional, baseado no conhecimento estatístico atual.
Além do efeito que a tecnologia tem desempenhado na expansão da capacidade de produção e eficiência,
de forma exponencial, particularmente no que diz respeito à produção de alimentos, a generalização de
que os padrões de vida mais elevados aumentam a população proporcionalmente não é suportado por
comparação regional. Países pobres, estatisticamente, hoje têm uma taxa de reprodução maior do que os
países ricos. A questão parece ser um fenômeno cultural, religioso e educacional, não uma "lei da natureza"
rígida como Malthus concluiu.

[224] Ref.: Abolição da Previdência: Uma Ideia se Torna uma Causa (Abolishment of Welfare: An Idea
Becomes a Cause) [http://www.nytimes.com/1994/04/22/us/abolishment-of-welfare-an-idea-becomes-a-
cause.html ]

[225] Os Princípios de Economia Política e Tributação, David Ricardo, 1821.


101

[226] Ibid., p.5

[227] Ibid., p.7

[228] Ibid., p.64

[229] Ibid., p.53

[230] Ibid., p.263-264

[231] Ibid., p.267

[232] A partir do ensaio: Possibilidades econômicas para os nossos netos, John Maynard Keynes, 193

[233] Os Princípios de Economia Política e Tributação, David Ricardo, 1821, Dent Edition, 1962, p.81

[234] "Bens de Capital" são geralmente definidas como: Quaisquer ativos tangíveis que uma organização
utiliza para produzir bens ou serviços, tais como edifícios de escritórios, equipamentos e máquinas. Os bens
de consumo são o resultado final deste processo de produção.
[http://www.investopedia.com/terms/c/capitalgoods.asp#axzz2Gxg1RmR6]

[235] Sugestões de leitura: O Fim dos Empregos: O Contínuo Crescimento do Desemprego em Todo Mundo,
Jeremy Rifkin, M Books, 1996.

[236] Tratado de Economia Política, Jean-Baptiste Say, 1821.

[237] Ibid., p.62

[238] Jeremy Bentham, um defensor notável do "Utilitarismo Clássico", declarou: "A natureza colocou a
humanidade sob o governo de dois mestres soberanos, dor e prazer. São só eles que devem apontar o que
devemos fazer ... Pelo princípio da utilidade entende-se, o princípio que aprova ou desaprova qualquer
ação, de acordo com a tendência que esta pareça ter para aumentar ou diminuir a felicidade da parte cujo
interesse está em questão: ou, o que é a mesma coisa em outras palavras, promover ou se opor a essa
felicidade. Eu digo que de toda ação que seja, e, portanto, não só de cada ação de um indivíduo em
particular, mas de todas as medidas do governo. " [Uma Introdução aos Princípios da Moral e Legislação,
Jeremy Bentham, 1789, Abril Cultural, 1979]

[239] An Outline of the Science of Political Economy, Nassau Senior, 1836, Londres, Allen and U., 1938, p.27

[240] Mais informações sobre esta questão serão discutidas no ensaio "Classicismo Estrutural".

[241] Rationale of Reward, Jeremy Bentham Livro 3, Capítulo 1

[242] http://www.britannica.com/EBchecked/topic/551569/socialism

[243] The Defense of Gracchus Babeuf before the High Court of Vendôme, University of Massachusetts
Press, 1967, p.57

[244] An Inquiry into the Principles of the Distribution of Wealth Most Conducive to Human Happiness,
William Thompson, London, William S. Orr, 1850, p.17

[245] Ibid., p.xxix


102

[246] Ibid., p.259

[247] Ibid.

[248] Ibid., pp.260-261

[249] Ibid., pp.261-263

[250] Ibid., p.263

[251] Ibid., p.267

[252] Grundrisse, de Karl Marx, tr. Martin Nicolaus, Separata Vintage Books, New York, 1973 p.241

[253] Ibid., p.243

[254] Ibid., p.240-241

[255] Capital, Karl Marx, Foreign Languages reprint, Moscou, 1961, vol. 3, p.163

[256] Ibid., p.176

[257] Ibid., vol. 1, pp. 583-84

[258] Manuscritos econômico-filosóficos de 1844, Karl Marx, Moscou, Progress, 1959, p. 69

[259] “Why Economics Is Not an Evolutionary Science,” Place of Science in Modern Civilization and Other
Essays, Thorstein Veblen, pp.73-74.

[260] “The Limitations of Marginal Utility,” The Place of Science in Modern Civilization and Other Essays,
Thorstein Veblen, New York, Russell and Russell, 1961, p.241-242

[261] “Professor Clark’s Economics”, Place of Science in Modern Civilization, Thorstein Veblen, p.193

[262] Absentee Ownership and Business Enterprise in Recent Times, Thorstein Veblen, Augustus M. Kelley,
New York, 1964, p.407

[263] “The Beginnings of Ownership”, Essays in Our Changing Order, Thorstein Veblen, p.32.

[264] “The Beginnings of Ownership”, Essays in Our Changing Order, Thorstein Veblen, pp.33-34

[265] “The Instinct of Workmanship and the Irksomeness of Labor”, Essays in Our Changing Order,
Thorstein Veblen, pp. 188-190

[266] The Engineers and the Price System, Thorstein Veblen, New York, Augustus M. Kelley, 1965, p.1

[267] Ibid., p.12

[268] Absentee Ownership and Business Enterprise in Recent Times, Thorstein Veblen, New York, Augustus
M. Kelley, 1964, pp.220-221

[269] The Theory of Business Enterprise, Thorstein Veblen, New York, Augustus M. Kelley, 1965, p.269
103

[270] Ibid., p.285

[271] Ibid., p.286-287

[272] Ibid., p.404-405

[273] A Teoria da Classe Ociosa, Thorstein Veblen, New York, Augustus M. Kelley, 1965, pp.229-230

[274] Um exemplo simples disso é a quantidade de financiamento e emprego que foi gerada a partir do
tratamento contra o câncer. Se a cura para o câncer realmente surgisse, resultar-se-ia na redução destas
enormes instituições médicas. Isto significa que a resolução de problemas podem resultar na perda de
subsistência para muitos dos que trabalharam para atender esses problemas. Isto é criar um reforço
perverso para manter as coisas do mesmo jeito - evitar mudanças de forma geral.

[275] Esta frase foi apresentada por John McMurtry em sua obra The Cancer Stage of Capitalism, Pluto
Press, 1999

[276] A criação de dinheiro pela dívida, juntamente com a sua multiplicação através do sistema de
empréstimos de Reserva Fracionada, uma prática quase universal dos bancos centrais do mundo, continua
a buscar o crescimento infinito por seus próprios mecanismos.

[277] É importante ressaltar que "Disciplina de Mercado", ou a natureza corretiva do mercado, pela qual
todos negócios devem ser suscetíveis, hoje só se aplica às classes mais baixas. Como observado
historicamente pela retórica "Grande Demais Para Quebrar" e recentes (~ 2008) salvamentos bancários no
valor de mais de 20 trilhões de dólares, os setores ricos são protegidos pelo gesto do tão chamado
"Socialismo", e não Capitalismo.
104

9. Eficiência de Mercado vs Eficiência Técnica

"O aspecto sinergético da indústria, realizando cada vez mais trabalho com cada vez
menos investimento de tempo e de energia por cada unidade de desempenho...
nunca foi formalmente contabilizado como um ganho capital da sociedade
sedentária. A eficácia sinérgica de um processo industrial mundialmente integrado é
inerentemente muito maior do que o confinado efeito sinérgico de sistemas
soberanos operando separadamente. Logo, só uma renúncia mundial das soberanias
pode permitir a fundação de um alicerce de alto padrão para toda
humanidade.[276]"

- R. Buckminster Fuller -

Visão geral

O desenvolvimento científico, mesmo evoluindo paralelamente ao desenvolvimento


econômico tradicional ao longo dos últimos 400 anos ou mais, tem ainda sido
largamente ignorado e visto como uma "externalidade" pela teoria econômica. O
resultado tem sido uma "separação" entre a estrutura socioeconômica e a estrutura
de suporte à vida a qual estamos todos ligados, e da qual todos nós dependemos.
Hoje, na maioria dos casos, além de certos pressupostos técnicos com relação a
como um sistema não baseado na dinâmica do mercado e no "mecanismo de
preços" [277] poderia funcionar, o argumento mais comum de apoio ao capitalismo
de mercado é que ele é um sistema de "independência" ou "liberdade".

A extensão dessa veracidade depende muito da interpretação, mesmo que tais


termos genéricos sejam onipresentes na retórica dos defensores do modelo. [278]
Parece que tais noções são, em verdade, reações às tentativas anteriores de
sistemas sociais alternativos que geraram problemas de poder como o
"totalitarismo". [279] Assim, desde então, com base nesse medo, qualquer modelo
concebido fora da estrutura capitalista é muitas vezes impulsivamente relegado à
suposta tendência histórica rumo à "tirania" - e, em seguida, descartado.

Seja como for, este gesto subjacente de "liberdade", seja qual for sua implicação
subjetiva, gerou uma neurose ou confusão sobre o que significa para uma espécie
como a nossa sobreviver e prosperar no habitat - um habitat claramente regido por
leis naturais. O que descobrimos é que, no âmbito do nosso relacionamento com o
habitat, simplesmente não somos livres, e ter uma orientação predominante de
valores de uma suposta liberdade, a qual é então aplicada no modo como
deveríamos operar nossa economia global, tornou-se cada vez mais perigoso para a
sustentabilidade humana no planeta terra. [280]
105

Deixando a dificuldade das relações sociais de lado, os seres humanos,


independentemente de seus costumes sociais tradicionais, estão estritamente
vinculados pelas leis naturais que regem a terra, e desviar-se desse alinhamento é o
que, invariavelmente, inibe a nossa sustentabilidade, prosperidade e saúde pública.
Deveria ser lembrado que os pressupostos fundamentais de nosso sistema
socioeconômico atual desenvolveram-se durante períodos de consciência científica
substancialmente menores tanto sobre nosso habitat quanto nós mesmos. [281]
Muitas das consequências negativas, hoje comuns nas sociedades modernas,
simplesmente não existiam no passado, e é esse presente choque de sistemas que
está desestabilizando ainda mais e de muitas maneiras o nosso mundo.

Será aqui argumentado que a integridade de qualquer modelo econômico é, na


verdade, melhor mensurada pelo quão bem alinhado ele está com as conhecidas leis
que regem a natureza. Este conceito de lei natural não é apresentado aqui como
algo esotérico ou metafísico, mas como fundamentalmente observável. Embora seja
verdade que as leis da natureza são, ao longo do tempo, constantemente refinadas
e alteradas em nosso entendimento, certas realidades causais mantiveram-se, e
mantêm-se, definitivamente verdadeiras.

Não há dúvida de que o organismo humano tem necessidades específicas de


sobrevivência, como a de nutrição, água e ar. Não há dúvida em relação a quais
processos ecológicos fundamentais asseguram a estabilidade ambiental do nosso
habitat e que devem permanecer sem perturbação em suas relações simbióticas-
sinérgicas. [282] Também não há discussão de que a psique humana, por mais
complexa que seja, apresenta, em média, reações básicas previsíveis a estressores
ambientais, e, logo, como reações de violência, depressão, abuso e outras questões
comportamentais negativas possam daí resultar. [283]

Essa perspectiva científica, causal ou técnica das relações econômicas reduz todos
os fatores relevantes a um quadro de referência e a uma linha de pensamento
relacionados à nossa compreensão atual do mundo físico e suas dinâmicas tangíveis
naturais. Essa lógica considera a ciência do estudo humano, logo, mais uma vez, a
natureza em comum das necessidades humanas e da saúde pública, e combina estas
com as regras comprovadas do nosso habitat, com o qual estamos, sinérgica e
simbioticamente, conectados. Conjuntamente, um modelo racional de operação
econômica partindo "do zero" pode ser generalizado com pouquíssima necessidade
dos séculos de estabelecimento da teoria econômica tradicional. [284]

Isso não quer dizer que esses argumentos históricos não possuem valor no que diz
respeito à compreensão da evolução cultural, mas sim que, se uma visão de mundo
verdadeiramente científica é assumida em relação ao que "funciona" ou "não
funciona" na estratégia de eficiência que é exigida pelo jogo de xadrez da
sobrevivência humana, há pouca necessidade de uma abstração sobre a referência
106

histórica. Essa visão se situa no cerne da lógica reformista do MZ e será revista, mais
uma vez, na parte III deste texto.

O ponto em questão é que esses aspectos praticamente imutáveis da consciência


científica quase não são reconhecidos pelo atual modelo econômico dominante. Na
verdade, será argumentado que esses dois sistemas não estão apenas dissociados,
mas são diametralmente opostos em muitos aspectos; fazendo alusão a realidade
de que a economia competitiva de mercado não é realmente "consertável" em seu
todo, e, portanto, um novo sistema baseado diretamente nestas realidades da "lei
natural" precisa ser construído a partir do zero.

Este ensaio vai examinar e contrastar uma série de considerações "econômicas",


tanto do ponto de vista do sistema de mercado (lógica de mercado), quanto da
lógica mecanicista ou "técnica". Será expresso como a "eficiência" tem dois
significados muito diferentes em cada ponto de vista, argumentando-se que "a
eficiência de mercado" [285] é apenas eficiente no que diz respeito a si mesma, em
que são usados conjuntos de regras criados pelo homem associados,
principalmente, à dinâmica econômica clássica, que facilita o lucro e o crescimento,
enquanto a "Eficiência Técnica", que referencia as conhecidas leis da natureza,
busca a maneira mais otimizada possível de desenvolvimento industrial, de forma a
preservar o habitat, reduzir o desperdício e, finalmente, garantir a saúde pública,
baseando-se em entendimentos científicos emergentes. [286]

Consumo Cíclico e Crescimento Econômico

O capitalismo de mercado, em sua operação básica, pode ser generalizado como


uma interação entre proprietários, trabalhadores e consumidores. A demanda dos
consumidores gera a necessidade de produção pelos proprietários (capitalistas),
que, em seguida, empregam trabalhadores para a realização desse ato. Esse ciclo
tem origem essencialmente na "demanda" e, portanto, o verdadeiro motor do
mercado é o interesse, a capacidade e o ato de todos comprarem no mercado.
Todas as recessões e depressões [287] são resultado, em um nível ou outro, de uma
diminuição nas vendas. Por isso, a necessidade mais crítica em manter as pessoas
empregadas e, portanto, manter a economia em um estado de "estabilidade" ou
"crescimento", é o consumo constante e cíclico.

O crescimento econômico, que é geralmente definido como "um aumento da


capacidade de uma economia em produzir bens e serviços, em comparação com
outro período de tempo" [288], é um interesse constante de qualquer economia
nacional de hoje e, consequentemente, da economia global. Muitas táticas
macroeconômicas são utilizadas, frequentemente, em épocas de recessão para
facilitar empréstimos, produção e consumo, a fim de manter uma economia
funcionando em seu nível atual ou, preferencialmente, além dele. [289] O ciclo de
107

negócios, um período de expansão e contração oscilante, tem sido reconhecido


como uma característica da economia de mercado, devido à natureza de "disciplina
do mercado", ou de correção, o que, segundo os teóricos, é em parte um aumento e
diminuição naturais dos sucessos e fracassos nos negócios. [290]

Em suma, a taxa (aumento ou redução) de consumo é o que gera os períodos de


crescimento ou contração do ciclo de negócios, tendo, geralmente, a regulação
monetária macroeconômica como o que aumenta ou diminui a facilidade de liquidez
(normalmente por meio de taxas de juros), com o fim de "gerenciar" as expansões e
contrações. Embora a política macroeconômica monetária moderna não seja o tema
deste ensaio, é importante ressaltar aqui, como um parêntese, que o respeito
recíproco para com ambos os períodos, de expansão e de contração, do ciclo de
negócios não existiram, historicamente. Os períodos de expansão monetária
(frequentemente via crédito mais barato), que normalmente se correlacionam com
períodos de expansão econômica (já que mais moeda é colocada em uso), são
saudados pelos cidadãos como sucessos nacionais para a sociedade, enquanto que
todas as contrações são vistas como fracassos políticos.

Portanto, sempre houve um interesse dos estabelecimentos políticos (que querem


parecer bons) e das principais e influentes instituições do mercado (protegendo os
lucros empresariais), em preservar os períodos de expansão pelo maior tempo
possível e lutar contra todas as formas de contração. Essa perspectiva é natural do
sistema de valores inerente ao capitalismo, pois o "sofrimento" deve ser evitado em
todos os momentos, muitas vezes de maneira míope. Nenhuma empresa quer
reduzir seu tamanho voluntariamente, nem qualquer partido político quer parecer
"mau", mesmo que a teoria econômica tradicional nos diga que esses períodos de
contração são "naturais" e deveriam ser permitidos.

O resultado tem sido, em suma, um aumento constante da oferta de dinheiro (ou


seja, do poder de compra e do capital) em épocas de recessão, resultando em uma
dívida global maciça, tanto pública quanto privada. [291] A verdade é que todo o
dinheiro passa a existir a partir de empréstimos, e cada um desses empréstimos é
feito com juros, pois o empréstimo e a taxa de juros acumulada (lucro do banco)
devem ser pagos; significando que a própria natureza da criação monetária, por
padrão, implica automaticamente um saldo negativo. Existe sempre mais dívida do
que dinheiro em circulação. [292]

Então, voltando ao ponto principal que diz respeito à necessidade de demanda e


consumo para manter o funcionamento da economia, esse processo de troca com
foco geral no crescimento está no coração do contexto de "eficiência" do mercado.
Não importa o que esteja sendo produzido ou o seu efeito sobre o estado das
relações humanas ou terrenas. Essas são todas, novamente, "externalidades". Como
um exemplo concentrado dessa lógica, o mercado de ações, que em si não é nada
108

mais do que o comércio de dinheiro e de seus agora numerosos "derivativos", gera


um enorme PIB e um "crescimento" através dos lucros e vendas resultantes. [293]

No entanto, sem dúvida, esse mercado não produz nada de valor tangível ou de
suporte à vida. O mercado de ações e as instituições financeiras agora maciçamente
poderosas são completamente auxiliares à economia produtiva real. Enquanto
muitos argumentam que essas instituições de investimento facilitam os negócios e
os empregos pela aplicação de capitais, esse ato, mais uma vez, só é sistemicamente
relevante no sistema atual (eficiência de mercado) e totalmente irrelevante em
termos de produção real (eficiência técnica).

Em suma, quando se trata de lógica de mercado, quanto mais volume de negócios


ou de vendas melhor - e assim é - independentemente se o item vendido é o
crédito, rochas, "esperança" ou panquecas. Qualquer poluição, desperdício ou
outros malefícios do tipo, são, mais uma vez, "externos". Não há nenhuma
consideração pelo papel técnico dos processos reais de produção, das estratégias de
distribuição eficientes, da aplicação de projetos ou similares. Assume-se que tais
fatores culminem, metafisicamente, no melhor para as pessoas e para o habitat
simplesmente porque é isso o que a "mão invisível" [294] do mercado implica.

No entanto, a crescente revolução "mais com menos" [295] das ciências industriais
criou uma nova realidade, onde o avanço da tecnologia industrial reverteu o padrão
de "esforço material cumulativo" no que diz respeito à eficiência. A lógica de que
"mais trabalho, mais energia e mais recursos" produzirão resultados
proporcionalmente mais eficazes tem sido contestada. Em cada vez mais
circunstâncias a redução de energia, mão de obra e materiais para realizar
determinadas tarefas tem obtido êxito, dadas as nossas aplicações científicas e
técnicas modernas. [296]

Por exemplo, a comunicação por satélite hoje, por mais intelectualmente


sofisticada, em que incorpora uma grande quantidade de conhecimento elaborado,
é, na realidade física, bastante simples e eficiente em seus recursos em comparação
com as alternativas anteriores de comunicação, que em suas aplicações globais
envolveram uma enorme quantidade de materiais pesados, tais como fios de cobre
pesados, juntamente com a difícil tarefa, muitas vezes arriscada, de assentar esses
materiais por meio da força de trabalho humana. O que é feito hoje, em geral, com
um conjunto de pequenos satélites globais em órbita é realmente incrível,
comparativamente. Essa revolução de design, que vai ao coração do que a
verdadeira eficiência (técnica) econômica significa, está em oposição direta ao
consumo cíclico do modelo econômico baseado em crescimento.

Mais uma vez, a intenção do sistema de mercado é manter ou elevar o volume de


negócios, já que isto é o que mantém as pessoas empregadas, que aumenta a taxa
109

de emprego e o chamado crescimento. Assim, em sua essência, toda a premissa de


eficiência do mercado é baseada em torno de táticas para alcançar esse objetivo e,
portanto, qualquer força que trabalhe para reduzir a necessidade de trabalho ou
volume de negócios é considerada "ineficiente" do ponto de vista do mercado,
ainda que possa ser muito eficiente nos termos da verdadeira definição da própria
economia, que significa conservar, reduzir o desperdício e fazer mais com menos.

Se, hipoteticamente, reduzirmos a nossa sociedade global a uma pequena ilha com
uma população, respectivamente, pequena e com tecnologia muito limitada em
comparação a dos dias de hoje, e descobrirmos que apenas um número x de itens
de sobrevivência e comida seriam possíveis pela regeneração natural da terra, seria
uma boa ideia empregar um sistema econômico que procura aumentar a utilização
de recursos e o volume de negócios na ilha o mais rápido possível pelo bem do
"crescimento"? Naturalmente, a ética do uso estratégico e da preservação se
desenvolveria como um ethos em tal condição. A ideia seria reduzir o desperdício ao
invés de acelerá-lo, o que, novamente, é a verdadeira definição de "economia" -
economizar.

Obsolescência Desnecessária: Competitiva e Planejada

Quando pensamos em obsolescência, muitas vezes consideramos as rápidas


mudanças tecnológicas ocorrendo no mundo de hoje. De tempos em tempos parece
que nossos dispositivos de comunicação e de processamento, ou seja, nossa
tecnologia computacional, passam por um rápido desenvolvimento. A "Lei de
Moore", por exemplo, que demonstra, essencialmente, como o poder de
processamento dobra a cada 18-24 meses, foi estendida a outras aplicações
tecnológicas semelhantes, trazendo luz à forte tendência geral de avanço científico.
[297]

No entanto, quando se trata da produção de bens, duas formas de obsolescência


(eventual) ocorrem hoje que não são baseadas na evolução natural da capacidade
tecnológica, mas, sim, resultado de (a) a estrutura artificial e competitiva das regras
do sistema de mercado, juntamente com (b) o impulso orientador da "eficiência" de
mercado em busca de volume de negócios e lucros recorrentes.

A primeira (a) poderia ser chamada de "obsolescência competitiva (ou intrínseca)".


Esta é a obsolescência resultante da natureza competitiva da economia, já que cada
entidade produtora se comporta de forma a manter uma vantagem diferencial em
relação a outra, reduzindo as despesas de produção, a fim de manter o preço
"competitivamente" baixo para o consumidor. Esse mecanismo é chamado,
tradicionalmente, de "custo-benefício", e tem como resultado produtos
relativamente inferiores no momento mesmo em que são produzidos. Essa
necessidade competitiva permeia cada etapa da produção, consequentemente, há
110

uma redução da eficiência técnica ao longo do tempo pelo uso de materiais, meios e
projetos mais baratos.

Imagine, hipoteticamente, levarmos em conta todos os requisitos materiais para,


por exemplo, criarmos um carro buscando maximizar a sua eficiência, durabilidade e
qualidade da forma mais otimizada estrategicamente, com base nos próprios
materiais - e não no custo deles. [298] O ciclo de vida do carro, então, seria
determinado apenas pelo seu desgaste natural, tendo como foco deliberado um
design de atualização dos atributos do carro quando estes se tornassem obsoletos
ou danificados por circunstâncias decorrentes do uso natural.

O resultado seria um produto projetado para durar, reduzindo assim o desperdício


e, invariavelmente, aumentando a eficácia de sua utilidade. É fato que muitos no
mundo hoje acreditam que é isso o que, de fato, acontece no desenho e produção
dos bens, porém, isso simplesmente não é a realidade. É matematicamente
impossível que qualquer empresa competitiva produza, estratégica e tecnicamente,
o melhor bem numa economia de mercado, já que o mecanismo de "custo-
benefício" garante uma produção abaixo da ideal.

A segunda forma (b) de obsolescência é conhecida como "planejada", e esta técnica


de produção que estimula o consumo cíclico ganhou destaque no início do século
XX, quando o desenvolvimento industrial avançava em eficiência a um ritmo
acelerado, produzindo produtos melhores mais rapidamente. Na verdade, não havia
só uma necessidade de incentivar que o público em geral comprasse mais [299], o
problema resultante de um aumento da longevidade e da eficiência geral dos bens
também estava desacelerando o consumo. Mais uma vez, o fenômeno "mais com
menos" estava despontando rapidamente.

Ao invés de permitir que a vida útil de um bem fosse determinada pela sua
capacidade natural, com a intenção lógica de uma lei natural de que ele existisse por
tanto tempo quanto possível, dados os recursos limitados de um planeta finito e um
interesse natural em economia de energia, materiais e recursos humanos, as
corporações decidiram que seria melhor criar sua própria "vida útil" para os bens,
inibindo, deliberadamente, eficiência. [300]

Na década de 1930, alguns até mesmo quiseram tornar obrigatório que todas as
indústrias, de forma legal, decidissem os ciclos de vida útil não pelo estado natural
da capacidade tecnológica, mas pela simples necessidade contínua de trabalho e
aumento do consumo. Na verdade, o exemplo histórico mais notável deste período
foi o cartel da lâmpada Phoebus, na década de 1930, onde, em um tempo em que as
lâmpadas eram capazes de durar até cerca de 25.000 horas, o cartel forçou todas as
empresas a restringir a vida útil das lâmpadas para menos de 1000 horas para
garantir compras repetidas. [301] Hoje, todos os principais fabricantes têm a
111

estratégia de limitar os ciclos de vida dos bens com base em modelos de marketing
de consumo cíclico, e o resultado não só gera um desperdício repreensível de
recursos finitos, mas também um desperdício constante de trabalho humano e de
energia. Fora da dinâmica da economia de mercado, é extremamente difícil
argumentar contra a necessidade de um desenho otimizado das mercadorias.
Infelizmente, a natureza da eficiência de mercado não permite por padrão tal
eficiência técnica.

Propriedade versus Acesso

A tradição de propriedade pessoal tornou-se um marco da cultura moderna,


existindo pouco incentivo financeiro, em longo prazo, para que se utilize um sistema
de compartilhamento ou de acesso. Por mais que existam, nos dias de hoje, alguns
exemplos de compartilhamento comunitário de mercadorias [302], a ética geral de
"propriedade" e as características de valor e investimento inerentes à propriedade
tornam tais abordagens de partilha mais custosas, em longo prazo, para quem as
utiliza, em comparação com a compra direta.

Do ponto de vista da eficiência de mercado, essa é uma coisa boa; quanto mais
compras diretas de bens, melhor. Em geral, se 100 pessoas desejam dirigir um carro,
ter 100 pessoas comprando esses carros é mais "eficiente" para o mercado do que
se 100 pessoas compartilharem 20 carros em um sistema estrategicamente
projetado de acesso, permitindo uma utilização com base no tempo de uso real.

Se analisarmos os padrões, em média, de uso real de um determinado bem,


descobriremos que muitos tipos de produtos podem ser usados de forma
intermitente. Veículos, artigos de lazer, equipamentos para projetos e vários outros
gêneros de bens, são comumente acessados em intervalos de tempo relativamente
distantes, tornando a propriedade uma tarefa não apenas um pouco inconveniente,
dada a necessidade de armazenar esses itens, mas, também, claramente ineficiente
sob a ótica da verdadeira integridade econômica, que busca a redução do
desperdício em todos os momentos.

Todos os anos, inúmeros livros são emprestados e retornam praticamente de graça


para bibliotecas em todo o mundo, não só poupando uma enorme quantidade de
recursos materiais ao longo do tempo, mas também facilitando o acesso ao
conhecimento por aqueles que de outra forma poderiam não ter meios para obtê-
lo. Ainda assim, essa prática é uma rara exceção no mundo movido à eficiência de
mercado de hoje, tão clara é a desvantagem para o mercado ter qualquer coisa
disponível sem compra direta por cada pessoa. [303]

Todavia, vamos, hipoteticamente, expandir essa ideia do compartilhamento de


conhecimento para o compartilhamento (acesso liberado) de bens materiais. Do
112

ponto de vista da eficiência de mercado, essa seria uma extrema inibição. Enquanto
ainda seria gerado lucro no modelo capitalista através do empréstimo de itens para
as pessoas com base em suas necessidades, esse seria enormemente
desproporcional quando comparado com o lucro / consumo em uma sociedade
baseada na propriedade pessoal e separada de cada bem.

Por outro lado, a eficiência técnica seria intensa. Não apenas menos recursos seriam
utilizados (e menos força de trabalho), uma vez que uma menor quantidade de cada
bem precisaria ser criada para satisfazer o tempo de uso dos cidadãos, mas também
a disponibilidade de tais bens poderia muito bem se estender a muitas pessoas que
de outra forma não teriam como pagar por eles, mas poderiam pagar uma taxa de
"aluguel" (aqui ainda supondo um sistema de mercado). A este respeito, a eficiência
técnica tem dois níveis - ambiental e social. Do ponto de vista ambiental, uma
redução drástica no uso de recursos; do ponto de vista social (todo o resto
permanecendo igual), um aumento na disponibilidade de acesso a certos bens
também ocorreria.

Então, do ponto de vista da eficiência técnica, em intenso detrimento da eficiência


de mercado, uma sociedade orientada pelo acesso compartilhado ao invés da
propriedade universal, seria excepcionalmente mais sustentável e benéfica. É claro
que tal prática naturalmente desafiaria valores profundamente identificados com a
cultura "proprietária" de hoje. [304]

Competição vs. Colaboração

O problema da sociedade buscar uma cultura competitiva ou colaborativa tem


gerado um contínuo debate durante séculos, trazendo suposições sobre a natureza
humana como uma comum defesa da competição. [305] Hoje, economistas
discutem, sobretudo, a concorrência como um incentivo necessário para a contínua
inovação [306], juntamente com a suposição, geralmente implícita, de que
simplesmente não há o suficiente nesse planeta para todos e, portanto, não temos
escolha a não ser lutarmos uns com os outros em algum nível, restando inevitáveis
perdedores. [307] Apontadas tais premissas, o contexto aqui destacado de eficiência
de mercado versus eficiência técnica será explorado no que diz respeito aos
benefícios e/ou consequências da competição.

Há dois ângulos principais a serem considerados: o primeiro é (a) como a


concorrência afeta a própria produção industrial, o segundo é (b) como ela de fato
afeta a inovação ou o desenvolvimento criativo.

(a) Se examinarmos o formato da produção industrial atual, vemos um sistema de


interação global complexo; de recursos, materiais e bens movendo-se
constantemente de um local para outro para fins diversos de produção ou
113

distribuição. Os negócios, em sua busca por lucro e custo-benefício, procuram, a


todo momento, invariavelmente, trabalho, equipamentos e instalações baratas para
se manter competitivos no mercado. O que pode assumir a forma de trabalho local
imigrante pago com um salário mínimo, um "trabalho escravizante" no exterior,
fábricas de processamento relativamente barato por todo o país, etc.

A questão fundamental é que a partir do ponto de vista da eficiência de mercado, a


taxa de lucro sobre o custo é tudo o que importa, mesmo se a produção global
estiver desperdiçando quantidades desproporcionais de combustível, transporte,
força de trabalho, etc. [308] A noção de "eficiência proximal", neste caso a eficiência
derivada da distância entre os pontos de produção industrial e de distribuição, não é
levada em conta, e a globalização hoje, na prática, empenha-se em uma
movimentação dispendiosa de recursos ao redor do mundo, baseando-se quase
inteiramente em um interesse por economia de dinheiro, e não por eficiência
técnica otimizada.

Esse desprezo pela importância da "eficiência proximal" por parte das indústrias,
sejam nacionais ou internacionais, é fonte de muito desperdício. Hoje em dia, a
produção industrial é quase inteiramente internacional, especialmente na era
tecnológica. O grau em que isso se faz necessário, do ponto de vista técnico, é
mínimo, na pior das hipóteses. Enquanto, historicamente, a produção agrícola tem
sido regional, dada a propensão de certas regiões para a produção de certos tipos
de bens, ou, talvez, pelo ambiente mais propício para outros cultivos, essa é uma
pequena produção em relação à grande maioria de bens industriais produzidos, sem
contar as diversas possibilidades tecnológicas atuais que permitem superar tais
necessidades regionais. [309]

"Localização", significando a redução deliberada da distância entre e ao redor de


todas as facetas da produção e distribuição, é a maneira tecnicamente mais
eficiente para uma comunidade operar, tendo em conta as exceções óbvias, por
exemplo, a extração mineral que obviamente precisa ser feita em sua fonte de
origem na terra, etc. É simples notar que, especialmente no que diz respeito às
aplicações técnicas modernas que atualmente não são empregadas, a grande
maioria dos bens que sustentam a vida podem ser produzidos nas proximidades de
onde devam ser utilizados.

Como será descrito com mais detalhes na parte III deste texto, há uma linha de
raciocínio tecnicamente eficiente em relação à proximidade quando se trata da
extração, produção, distribuição e eliminação ou reciclagem de resíduos. O
resultado ao final seria a preservação de enormes quantidades de recursos e energia
humana - preservação de uma capacidade que, de fato, poderia ser realocada no
caso de necessidade de desenvolver mais projetos, ao invés de descartada como
mero desperdício através do modelo de mercado atual. [310]
114

Como uma nota final sobre esse assunto de como a competição limita a eficiência
técnica da produção industrial, aumentando o desperdício - a realidade da
"multiplicidade" de bens é outro problema. Toda a produção de empresas
concorrentes entre si é normalmente orientada em torno de estatísticas históricas
sobre qual é sua "cota de mercado" e quantos bens elas podem, em média, vender
por região; paralelamente, o próprio fato de várias empresas, que trabalham no
mesmo gênero de produção de bens, produzirem produtos quase idênticos, com
apenas pequenas diferenças, só contribui para as fontes desnecessárias de
desperdício.

Como também será descrito na próxima subseção, a ideia de, por exemplo, várias
empresas de telefonia celular competirem por participação de mercado com simples
variações de projetos, consequentemente gerando ineficiências relativas nos
mesmos como estratégia para obter melhor custo-benefício, aliado à ausência geral
de compatibilidade entre os componentes em vista do benefício financeiro de
estabelecer padrões de marcas e compatibilidades de sistemas, cria uma outra
complexa rede de ineficiência. [311]

Obviamente, a partir da perspectiva da eficiência técnica, uma única e coletiva


empresa de telefonia celular, que produzisse o estrategicamente melhor, com o
design universalmente mais adaptável e compatível, não só seria mais respeitosa
com o meio ambiente, mas também criaria um uso tremendamente mais fácil e
eficiente, já que os problemas de reparo de peças e de incompatibilidades seriam
drasticamente reduzidos.

Costuma-se argumentar, no entanto, que a busca competitiva e as resultantes


variações de produtos oriundas da busca, entre empresas concorrentes, por cotas
de mercado seria uma forma de apresentar novas ideias ao público. No entanto,
também se poderia alcançar esse método por meio de sistemas de feedback direto
em massa que esclareceriam as necessidades do público, juntamente com uma
campanha emergente de conscientização sobre o que é possível, no momento,
realizar, dada a evolução empírica do avanço tecnológico.

(b) A segunda questão aqui, como já dito, tem a ver com a forma como a
concorrência afeta a própria inovação ou desenvolvimento criativo. Conquanto
ainda exista hoje a suposição de que recompensas distintas pela contribuição de
alguém motiva outras pessoas a buscarem a mesma recompensa, o que também é
uma comum justificativa sobre a existência de "classes", estudos sociológicos
modernos apontam visões conflitantes. [312] A ideia de que os seres humanos são
motivados por uma necessidade inerente de "vencer" os outros, ganhando, por
exemplo, mais recompensas materiais e financeiras que os outros, não tem
justificativa confiável fora a visão intuitiva extraída da condição do mercado, por
115

design altamente competitivo e voltado para a escassez, em que a humanidade


encontra-se hoje.

No entanto, mais uma vez, o debate sociológico pode ser posto de lado, enquanto o
contexto é como a competição se relaciona diretamente com o mercado e a
eficiência técnica. Resumindo, o sistema competitivo procura sigilo quando se trata
de ideias de negócio, em geral universalmente, contra o fluxo de livre
conhecimento. O uso de patentes e direitos autorais ou "segredos comerciais" não
perpetua o avanço da inovação, como muitos defensores do mercado competitivo
assumem - mas o retarda.

É muito interessante pensar sobre o que o conhecimento significa, como é gerado e


como é estranho alguém reivindicar racionalmente "propriedade" sobre uma ideia
ou invenção. Em nenhum momento da história humana qualquer indivíduo por si
mesmo chegou a uma ideia que não tivesse sido gerada em série por muitos antes
dele. A culminação histórica do conhecimento é um processo social e, portanto,
qualquer reivindicação de propriedade de uma ideia por pessoa ou corporação é
intrinsecamente defeituosa. O termo semieconômico usual usado hoje é "usufruto",
que significa "o direito legal de usar e aproveitar os frutos ou benfeitorias de algo
que pertence a outrem". [313] Na realidade, porém, todos os atributos de cada ideia
em existência hoje, no passado, e para sempre no futuro, têm, sem exceção, um
ponto de origem distintamente social e não pessoal.

Torna-se óbvio que a noção de propriedade intelectual, ou seja, a posse de meros


pensamentos e ideias, manifestou-se a partir do período da história humana em que
a criatividade de uma pessoa se tornou atada a sua sobrevivência pessoal. Em um
sistema econômico onde as ideias das pessoas têm a capacidade de gerar renda
para elas, a noção desse tipo de propriedade torna-se relevante. Afinal, se você
"inventar" algo no sistema moderno que possa gerar vendas e, consequentemente,
ajudar na sua sobrevivência econômica, seria extremamente ineficiente, do ponto
de vista do mercado, permitir que a ideia seja "open-source", uma vez que os
outros, buscando a própria sobrevivência, provavelmente se aproveitariam
rapidamente da invenção de modo a explorá-la financeiramente.

Também é fácil notar como o fenômeno do "ego" se manifesta na ideia de


propriedade intelectual, uma vez que a base de recompensa em tal sistema tem,
invariavelmente, um laço psicológico com o senso de autoestima pessoal. Se uma
pessoa "inventa" algo, transforma-o numa propriedade intelectual, explora-o por
lucro e, em seguida, compra uma casa grande e uma extensa propriedade, o seu
"status" como ser humano é tradicionalmente elevado na medida das normas
estabelecidas pela cultura - essa pessoa é considerada um "sucesso". No entanto, se
116

pararmos para pensar sobre isso de um modo geral, o compartilhamento de


conhecimento não tem um resultado negativo fora da premissa econômica de
propriedade para fins de exploração por lucro. Não há nada a perder e, sem dúvida,
muito a ganhar socialmente através da partilha de informação. Voltando ao anterior
exemplo deste ensaio, de empresas concorrentes de telefonia celular,
perceberemos que dentro dos limites das reuniões de diretoria, onde
frequentemente marqueteiros, designers e engenheiros consideram como em geral
melhorar seu produto, o compartilhamento de suas ideias é fundamental.

No entanto, imagine se essa reunião fosse estendida de uma vez a todas as


empresas de telefonia celular, onde elas não só poderiam remover suas artificiais e
pouco úteis perspectivas de mercado, concebidas para tomar a fatia de mercado de
outras concorrentes (como através de truques estéticos), elas poderiam trabalhar
para produzir cumulativamente a "melhor" combinação. Estendendo ainda mais, e
se todos os projetos fossem de "domínio público", no sentido de que qualquer
pessoa no mundo que tivesse interesse em ajudar a melhorar uma ideia fosse capaz
disso?

Os esquemas de design de um telefone celular poderiam ser expostos publicamente


com um sistema de interação técnica, onde pessoas de todo o mundo poderiam
ajudar, se possuíssem a habilidade, na eficiência técnica e utilidade do design.
Embora este seja um exemplo hipotético abstrato, é claro que o resultado de uma
abordagem aberta à troca de informações facilitaria uma explosão de criatividade e
produtividade nunca antes vista. Como será discutido na Parte III, a remoção do
sistema de mercado monetário é crítica para a facilitação dessa capacidade.

Trabalho por Remuneração

O núcleo do sistema de mercado é a venda do trabalho de um indivíduo como uma


mercadoria. Em muitos aspectos, a capacidade do mercado de empregar a
população tornou-se uma medida de sua integridade. No entanto, o advento da
"mecanização", ou automação do trabalho humano, tornou-se, no decorrer do
tempo, um ponto cada vez maior de interferência. [314] Historicamente, a aplicação
tecnológica de máquinas no trabalho tem sido vista como uma questão não só de
progresso social, mas também de progresso "econômico" no sentido do mercado,
principalmente devido ao aumento da produtividade.

O pressuposto básico é que a mecanização (ou ampla inovação tecnológica) facilita a


expansão industrial e, portanto, uma realocação inevitável do trabalho deslocado
pelas máquinas para novos setores emergentes. Esse é um modo usual de defender
a mecanização. [315] Historicamente falando, parece que isso contém alguma
verdade, pois o problema da redução da força de trabalho humano em um setor -
como foi o caso com a automação da agricultura no Ocidente - foi superado em
117

certa medida pelo avanço de outros setores de atividade, como o moderno setor de
serviços. No entanto, essa suposição de que a inovação tecnológica gerará novas
formas de emprego em harmonia com os deslocados por ela, estabelecendo um
equilíbrio, é realmente pouco defensável se levarmos em conta a taxa de mudança
na inovação, juntamente com os interesses de redução de custos das empresas.
[316]

Quanto a este último, o "papel" da mecanização do ponto de vista da eficiência de


mercado é quase que exclusivamente o de assistir a relação "custo-benefício". A
robótica, nos dias de hoje, supera em muito a capacidade física do ser humano
médio, contando que há um rápido avanço nos processos de cálculo que continuam
a exceder largamente o raciocínio humano. O resultado é a capacidade da indústria
em empregar máquinas, o que, invariavelmente, tem mais capacidade produtiva do
que o trabalho humano, juntamente com o incentivo financeiro extremamente
notável de reduzir a dependência dos proprietários de negócios de muitas formas.
Conquanto as máquinas requeiram manutenção, elas não precisam de seguro de
saúde, seguro-desemprego, férias, proteção sindical e muitos outros atributos
característicos do trabalho humano dos dias de hoje. Portanto, na estreita lógica
inerente à busca pelo lucro, é natural que as empresas sempre busquem a
mecanização, dadas as suas vantagens de custo em longo prazo e, portanto, de
eficiência de mercado.

Quanto à sugestão de que o equilíbrio será sempre finalmente encontrado entre os


novos papéis de trabalho e a mão de obra deslocada devido à inovação tecnológica,
o problema é que a taxa de mudança do desenvolvimento tecnológico excede em
muito a taxa de novas criações de trabalho. [317] Este problema é único, pois
também se assume que a sociedade humana sempre necessitará novas formas de
emprego. É nesse ponto que os valores culturais subjetivos devem ser considerados.
Tendo em conta que a nossa condição sociológica atual exige o emprego humano
como a espinha dorsal da sustentabilidade do mercado, portanto, da eficiência de
mercado, a ética do "trabalho" e suas associações de identidade, culturalmente, têm
perpetuado um conceito em que a real função do trabalho - a sua verdadeira
utilidade - torna-se menos importante do que o simples ato de trabalhar. [318]

Assim como a eficiência de mercado não considera o que, em geral, realmente está
sendo comprado e vendido, desde que se mantenha o consumo cíclico a um ritmo
aceitável, os papéis de trabalho assumidos hoje na produção são igualmente
arbitrários do ponto de vista do mercado. Em tese, poderíamos imaginar um mundo
onde as pessoas estão sendo pagas para fazer o que poderia ser considerado
ocupações "inúteis", do ponto de vista de utilidade, gerando altos níveis de PIB
praticamente sem uma verdadeira contribuição social. De fato, mesmo hoje nós
poderíamos voltar atrás e perguntar a nós mesmos qual é o papel social de muitas
118

instituições, e talvez chegar à conclusão de que elas servem somente para manter o
dinheiro em movimento, não para criar ou realmente contribuir com qualquer coisa
tangível em benefício da sociedade.

Essas são questões filosóficas complexas, pois elas desafiam a ética tradicional
dominante e a própria natureza do que o "progresso", sob vários aspectos,
realmente significa. Por exemplo, vale a pena considerar o seguinte exercício de
pensamento. Imagine se revertêssemos nosso sistema social para o século 16, onde
muitas realidades tecnológicas modernas (século 21) eram inéditas.

A população daquela época teria, naturalmente, expectativas bem aquém do que


seria tecnicamente possível obter em relação ao que é geralmente aceito como
possível hoje. Se esta sociedade fosse capaz de implementar da noite para o dia a
capacidade tecnológica massiva da era moderna, há pouca dúvida de que
praticamente todo o núcleo de sobrevivência da população poderia ser
automatizado. Então a questão passa a ser o que eles fariam com essa liberdade
recém descoberta? Qual seria o foco cultural de suas vidas se o trabalho penoso
fundamental à sobrevivência fosse removido? Será que eles inventariam novos
trabalhos simplesmente porque podem? Será que eles evoluiriam, preservando e
incorporando essa nova liberdade através de uma alteração do próprio sistema
social, com a remoção do anteriormente necessário "trabalho por remuneração"?
Essas perguntas chegam à raiz do que são realmente o progresso, objetivos
pessoais, sociais e o sucesso.

No entanto, um valor cultural dominante nos dias de hoje é o de "ganhar a vida"


trabalhando, e a aplicação da mecanização, no sentido da eficiência do mercado, é
na verdade uma faca de dois gumes. Enquanto que o custo-benefício é inerente à
mecanização e, consequentemente, o aumento geral do lucro reduzindo os custos
para os empresários, a dispensa de trabalhadores humanos, conhecida hoje como
"desemprego tecnológico", realmente funciona contra a eficiência de mercado na
medida em que os trabalhadores desempregados ficam incapazes de contribuir para
o consumo cíclico necessário que alimenta a economia, uma vez que perderam seu
poder de compra como "consumidores".

Esta contradição dentro do modelo capitalista é singular. Do ponto de vista da


eficiência do mercado, a mecanização, portanto, representa tanto um resultado
positivo quanto negativo nesse sentido, e quando percebemos que a taxa de
mudança tecnológica irá, com toda a probabilidade, dispensar as pessoas cada vez
mais rapidamente do que novos setores de emprego poderão ser criados, a
mecanização se torna cada vez mais aparente como um fator inibidor para o
capitalismo. Nessa circunstância, há, como resultante, uma diminuição da eficiência
de mercado.
119

Entretanto, por outro lado, do ponto de vista da eficiência técnica, novamente


vemos grande melhora e imensas possibilidades em muitos níveis. A capacidade de
produção permitida através dessa implantação mostra claramente um aumento
poderoso, em termos de eficiência, em relação não apenas ao efeito da produção
industrial, mas também um aumento da eficiência geral dos próprios bens, pela
capacidade de precisão e integridade inerente a essa produção. Além disso, uma
implicação desse novo nível de eficiência de produção é que a satisfação das
necessidades da população mundial nunca foi tão possível. É fácil ver que sem a
interferência da lógica de mercado sobre esta nova capacidade técnica, que,
invariavelmente, inibe o seu potencial, o que poderia ser considerado,
relativamente, uma "abundância" da maioria dos bens de manutenção da vida
poderia ser proporcionado para a população global. [319]

Escassez vs. Abundância

"A oferta e a procura" é uma relação usual de mercado que expressa, em parte,
como o valor de um recurso ou bem é proporcional ao quanto dele existe ou está
disponível. Por exemplo, os diamantes são considerados quantitativamente mais
raros e, por conseguinte, de valor mais elevado do que a água, que pode ser
encontrada em abundância no planeta. Da mesma forma, certas criações humanas,
se criadas em pequenas quantidades, também estão sujeitas a essa dinâmica,
mesmo que a noção de raridade seja culturalmente subjetiva, como o fato de uma
única tela de um artista renomado chegar a valer em uma venda muitas e muitas
vezes o valor dos recursos reais empregados. [320]

Do ponto de vista da eficiência de mercado, a escassez, em geral, é uma coisa boa.


Enquanto extrema escassez é, de fato, desestabilizante tanto para a indústria
quanto para a economia como um todo ("crises"), a forma mais otimizada dentro da
qual o sistema de mercado pode existir é uma espécie de pressão equilibrada de
escassez, daí a garantia da demanda em produzir venda. Mais uma vez, as exigências
vitais das pessoas não são reconhecidas nessa equação.

Satisfazer as necessidades humanas na forma de alimentação, habitação,


circunstâncias de baixo estresse para a saúde mental, etc, é algo totalmente
"externo" aqui e não tem relação direta com a eficiência de mercado. Satisfazer as
necessidades humanas diretamente seria, mais uma vez, ineficiente para a lógica do
mercado, uma vez que eliminaria a pressão da escassez, que incentiva o consumo
cíclico. Dito de outra forma, há uma necessidade de desequilíbrio a fim de abastecer
essa pressão de demanda, e esse desequilíbrio pode vir de várias formas.

Dívida, por exemplo, é uma forma de escassez imposta que coloca uma pessoa em
uma posição na qual deve submeter-se frequentemente a um trabalho que pode ser
de uma natureza mais "exploradora" - isto é, a recompensa (normalmente o salário)
120

é grosseiramente desproporcional ao que é necessário para que o indivíduo


mantenha um padrão saudável de vida. Nesse caso, o sistema de dívida facilita uma
forma distinta de eficiência de mercado beneficiando o empregador, já que a
facilidade de baixar os salários (custo-benefício) aumenta naturalmente com o
aumento dos níveis de dívida privada.

Quanto mais em dívida as pessoas estiverem, mais provável é que elas se submetam
a trabalhos com baixos salários, dessa forma gerando mais lucro para os
empresários. Na verdade, a mesma lógica pode ser aplicada ao uso de
"sweatshops"[N.T.: "fábricas de transpiração/suadouro"] no terceiro mundo, não
regulados legalmente, que são frequentemente "explorados" por empresas
ocidentais. Excessivas horas de trabalho, juntamente com salários muito baixos são
comuns - ainda assim essas pessoas literalmente não têm escolha a não ser aceitar,
já que não existem outras opções de sobrevivência na sua região, muitas vezes
devido à dívida resultante de medidas de austeridade. [321]

Na verdade, o controle no fornecimento total de dinheiro é baseado na escassez


generalizada, visto que, como dito anteriormente, todo o dinheiro de hoje é feito
através de dívidas e este dinheiro de dívida é vendido no mercado como uma
mercadoria por meio de "empréstimos", com o acréscimo de juros associados de
forma a gerar lucro para os bancos. No entanto, este lucro dos "juros", que nada
mais é do que dinheiro, não é criado na fonte de dinheiro. Por exemplo, se um
indivíduo toma um empréstimo de 100 dólares e paga 5% de juros sobre o
empréstimo, o indivíduo é obrigado a pagar 105 dólares. Mas, em uma economia
onde todo o dinheiro passa a existir através de empréstimos, essa a realidade, só
existe mesmo o "principal" ($ 100) na fonte de dinheiro, a "receita financeira"
(US$5) é inexistente.

Portanto, existe sempre mais dívida do que o dinheiro necessário para pagá-la. Além
disso, uma vez que os pobres são os maiores responsáveis pelos empréstimos,
geralmente feitos para casas, carros, etc, e os ricos mantêm um superávit financeiro,
esta pressão geral de endividamento tende a cair sobre as classes mais baixas,
agravando o problema inerentemente insuperável de estar endividado e, portanto,
com opções limitadas. Neste modelo, a falência, por exemplo, não é um resultado
de algumas más decisões financeiras - mas é uma consequência inevitável - como o
jogo da “dança das cadeiras”. [322]

Então, voltando ao ponto central, a realidade da escassez no sistema econômico


atual é uma fonte de grande eficiência para o mercado, porque se as pessoas
tivessem suas necessidades básicas atendidas, ou se elas fossem capazes de atender
a essas necessidades sem a pressão externa da dívida insolúvel que mantém os
desequilíbrios, o consumo cíclico, os lucros e o crescimento sofreriam. Apesar de
parecer perverso a nossa intuição e humanidade o fato de manter as pessoas com
121

privações ser uma condição positiva para o funcionamento do mercado, essa é a


realidade.

Desnecessário dizer que, do ponto de vista da eficiência técnica, em que o ser


humano é visto como uma máquina bioquímica com uma necessidade universal por
nutrição básica, estabilidade e outros requisitos psicossociais, que se não alcançados
podem resultar em doenças, tanto físicas como psicológicas, pode-se reconhecer o
estado dissociado do bem-estar humano e social da "lógica de mercado". [323]

Como último ponto sobre a questão, o mercado procura sempre a manutenção de


problemas. Na verdade, pode-se afirmar, genericamente, que a ineficiência técnica
é a condutora da eficiência de mercado. A resolução de problemas não é uma busca
do mercado, uma vez que criaria uma diminuição no faturamento e, portanto, uma
perda no ganho e de movimentação monetária. O resultado disso, em parte, é um
reforço perverso que incentiva a busca ou mesmo o agravamento geral dos
problemas. Um século atrás a ideia de vender água engarrafada teria soado
estranha, dada a sua abundância geral e fato de não ser poluída. Nos dias de hoje,
essa é uma indústria anualmente multimilionária derivada principalmente da
poluição da água que ocorreu devido a práticas industriais irresponsáveis. [324] O
lucro e os empregos agora associados a essa realidade tecnicamente ineficiente de
poluição e destruição de recursos, têm aumentado, uma vez mais, a eficiência do
mercado econômico necessária para manter a continuação do consumo cíclico.

Conclusão

A eficiência de mercado, genericamente falando, nos leva a uma “macro” e “micro”


realidade. Na escala macro tudo o que pode aumentar as vendas, crescimento ou
consumo, independentemente da pressão de demanda originária, ou o que está
realmente a ser comprado e vendido, é considerado eficiente nesse contexto. Na
escala micro, essa eficiência toma a forma de condições que podem permitir o
aumento do lucro e a redução dos custos ("custo-benefício") dos negócios.

Essa "eficiência" inerente ao capitalismo opera sem qualquer respeito pelos custos
sociais ou ambientais de seu processo, apenas para manter o consumo cíclico e o
lucro, e o mundo que você vê ao seu redor, cheio de desordem ecológica, privação
humana e instabilidade geral, social e ambiental, tem sido o resultado disso. Por
outro lado, a eficiência técnica, que se poderia caracterizar como um obstáculo para
a eficiência do mercado, procura manter o meio ambiente, a saúde humana e,
essencialmente, o equilíbrio do mundo natural. A redução de resíduos, a resolução
de problemas, e a manutenção do alinhamento com a lei natural; é a lógica do senso
comum encarnada.
122

É lamentável perceber que hoje temos dois sistemas opostos de economia


funcionando ao mesmo tempo - e que trabalham um contra o outro, na verdade. O
sistema de mercado, que incorpora a sua tradicional lógica arcaica, é totalmente
fora de sincronia com a economia (técnica) natural na forma como existe. O
resultado é uma grande dissonância e desequilíbrio, sempre com novos problemas e
consequências para a espécie humana. Está claro qual sistema vai "ganhar" essa
batalha. A natureza vai persistir com as suas regras naturais, independentemente de
quanto teorizemos sobre esta ou aquela validação da forma como tradicionalmente
nos organizamos neste planeta.

A natureza não se preocupa com nossas grandes ideias monetárias e econômicas,


suas teorias de "valor", nem com os modelos financeiros sofisticados ou equações
detalhadas a respeito de como pensamos que o comportamento humano se
manifesta e por quê. A realidade técnica é simples: aprender, adaptar e alinhar com
as leis que regem a natureza, ou sofrer as consequências. É absurdo pensar que a
espécie humana, tendo em vista a sua evolução dentro das mesmas leis naturais às
quais nossa prática econômica (e valores) devem se alinhar, seja incompatível com
tais leis. Trata-se apenas de uma questão de maturidade e consciência.

Finalizando com uma nota à parte, há uma tendência emergente no século XXI, na
esteira de todos os crescentes e persistentes problemas ecológicos, que pretende
seguir a chamada "economia verde". Alguns têm até mesmo dividido esse ponto de
vista econômico em setores, incluindo aplicações para a energia renovável,
ecoedifícios, transporte limpo e outras categorias de foco [325]. Notar-se-á que
todas essas percepções e aplicações potenciais estão, em geral, alinhadas com a
perspectiva técnica ou científica discutida neste ensaio.

Infelizmente, por mais positiva que seja a intenção dessas novas organizações e
planejadores de negócios, a ineficiência inerente ao modelo econômico capitalista -
com toda a sua necessidade de certas formas de "eficiência" artificial para se manter
- imediatamente polui e limita profundamente todas essas tentativas, o que explica
porque tais abordagens técnicas eficientes ainda não foram realmente aplicadas. A
triste realidade é que, apesar de ser possível implementar algumas melhorias,
qualquer progresso será inerentemente limitado em um grau cada vez maior, já
que, conforme descrito, a base estrutural na qual o capitalismo de mercado
funciona é ativamente contrária às eficiências inerentes à visão das leis naturais. A
única solução lógica é repensar toda a estrutura existente, caso almejemos, em
longo prazo, uma verdadeira eficiência, prosperidade elevada e soluções de
problemas.

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