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O estudo da sexualidade na psicologia social:


uma perspectiva brasileira

Chapter · January 2013

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6 authors, including:

Valeschka Martins Guerra Clarisse Lourenço Cintra


Universidade Federal do Espírito Santo Universidade Federal do Espírito Santo
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O Estudo da Sexualidade na Psicologia Social: Uma Perspectiva Brasileira

Valeschka M. Guerra
Eduardo C. Ceotto
Clarisse L. Cintra
Arielle S. Scarpati
Camila N. Bonfim
Lucas Có B. Duarte
Universidade Federal do Espírito Santo

Psicologia Social: campo de estudo e o que o sexo tem a ver com isso

A Psicologia Social pode ser definida como a ciência que estuda as relações entre o meio social e o comportamento do
indivíduo e suas influências. Aqui, comportamento deve ser compreendido não apenas como uma ação externa exercida
a partir do meio e/ou sobre esse, mas a interação entre comportamento, cognição e afeto. Por essa perspectiva, o
pensamento e a emoção também são compreendidos como comportamentos construídos e influenciados pelo meio
social. A sociedade na qual vivemos é percebida por esta disciplina tomando por base uma perspectiva histórica, que vai
desde a organização de seus membros em grupos até a estruturação de seus valores, costumes e instituições necessárias
à sua continuidade (LANE, 1981).

Para Smith e Mackie (1995), a própria definição de psicologia social dá um lugar central à influência que processos
sociais e cognitivos exercem sobre a percepção e interação dos indivíduos com os outros. Assim, a psicologia social tem
como objeto de estudo tudo aquilo que diz respeito à interação e influência recíproca entre indivíduos e destes com a
sociedade. Os psicólogos sociais investigam construtos como atitudes, crenças, normas, processos grupais, gênero,
cognição social, representações sociais, preconceito, estereótipo, entre outros, observando-se, dessa forma, a ampla
dimensão de seu campo.

Neste sentido, percebe-se que a psicologia social está intrinsecamente envolvida com as mais diversas áreas da
psicologia, tais como: a) nos processos de socialização vivenciados em todas as etapas da vida humana e estudados pela
psicologia do desenvolvimento; b) nos processos de construção e direcionamento do pensamento, memória, atenção,
entre outros estudados pela psicologia cognitiva; c) na inserção do indivíduo nos mais diversos grupos sociais e o efeito
desta inserção em sua saúde mental; d) nos fatores psicossociais relacionados ao crime e à vitimização, estudados pela
psicologia jurídica; e) no desenvolvimento e aplicação de instrumentos e testes psicológicos apropriados para os mais
diversos grupos sociais, além de outras aplicações e diálogos que podem ser estabelecidos por esta disciplina.

Assim, percebe-se que o conhecimento construído pela psicologia social enquanto disciplina tem muito a oferecer para
a compreensão da sexualidade como objeto de estudo e pesquisa. Apesar da criação do termo ‘sexualidade’ ter
localizado o sexo como área do comportamento humano passível de estudo científico no contexto da biologia e da
saúde, o simples surgimento desse termo no final do século XIX causou uma mudança na forma de se discutir e
compreender o sexo, transformando de forma decisiva os significados sociais desse tipo de comportamento (Mottier,
2008).

Sexualidade: definição e estudo científico

O termo ‘sexualidade’, de acordo com o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (HOUAISS, 2001), é definido como
uma qualidade do ser sexual. Tal qualidade é “compreendida como o conjunto de desejos, práticas, relacionamentos e
identidade erótica, ou ainda como aspectos bastante abrangentes da vida pessoal e social que têm algum tipo de
significado erótico para a pessoa” (GUERRA, GOUVEIA, 2011, p. 228).

Para Strey (1999), as diferenças entre homens e mulheres não podem ser reduzidas aos fatores biológicos associados ao
termo ‘sexo’, mas são mais bem compreendidas em termos do conceito de ‘gênero’, que leva em consideração os
significados atribuídos ao masculino e ao feminino por diferentes grupos sociais. Tais significados envolvem as
características típicas de cada indivíduo, além de “comportamentos, interesses, estilos de vida, papéis sociais definidos e
a consciência de si” (GUERRA, GOUVEIA, 2007, p. 44).

Giddens (1993) sugere que o surgimento do que ele chama de ‘sexualidade plástica’ é decorrente de uma série de
mudanças culturais e sociais, tais como o lançamento da pílula anticoncepcional, na década de 1960. Esta percepção da
sexualidade de homens e mulheres contemporâneos retira a importância da reprodução do ato sexual e atribui um
caráter central à vivência individual do prazer. Este autor sugere que a sexualidade seria um aspecto do indivíduo que
age de forma a estabelecer a interação entre o corpo, a identidade e as normas sociais (GIDDENS, 1993). A importância
da sexualidade enquanto processo simbólico de constituição e expressão da identidade também é enfatizada por
Kahhale (2001), que sugere que a intimidade é vivenciada tanto na dimensão particular como na pública, estando
intrinsecamente associada às normas e valores sociais.

Neste sentido, segundo Mottier (2008), a sexualidade também pode ser considerada um objeto cultural e não apenas
uma experiência biológica. “A sexualidade é moldada por forças sociais e políticas e conecta-se a relações de poder que
envolvem classe, raça e, principalmente, gênero” (MOTTIER, 2008, p. 02). Para esta autora, a compreensão da
sexualidade passa necessariamente pelo estudo da forma como esta se estrutura de acordo com as ideias normativas
acerca do masculino e feminino, ou seja, acerca das formas de comportamento consideradas socialmente ‘apropriadas’
para homens e mulheres.

A partir dessa perspectiva, a sexualidade é concebida enquanto um processo em permanente construção, pois tal
expressão da identidade e intimidade humanas, muda de acordo com a personalidade, a satisfação de necessidades
básicas, o contato interpessoal, a vivência de prazer e amor, e com o momento histórico e contexto sociocultural
(GUERRA, GOUVEIA, 2011; WAS, 2008).

De acordo com a World Health Organization - WHO (2006), a sexualidade pode ser definida como um aspecto central
que faz parte do ser humano durante toda a vida e
compreende o sexo biológico, identidades e papéis de gênero, orientação sexual, erotismo, prazer,
intimidade e reprodução. A sexualidade é vivenciada e expressa em pensamentos, fantasias, desejos,
crenças, atitudes, valores, comportamentos, papéis e relacionamentos. (...) A sexualidade é
influenciada pela interação de fatores biológicos, psicológicos, sociais, econômicos, políticos,
culturais, éticos, legais, históricos, religiosos e espirituais (WHO, 2006, p. 05).

Para Mottier (2008), três modelos principais têm sido utilizados na busca de se compreender a sexualidade em termos
culturais:
a) o modelo religioso / moral: que enfatiza comportamentos sexuais considerados ‘naturais’ e a influência
negativa que o desvio da norma sexual pode causar no desenvolvimento individual e na conduta social;
b) o modelo biológico: que enfatiza aspectos físicos e de saúde dos organismos sexuados; e
c) o modelo social: que busca a origem e significado dos comportamentos sexuais na interação do indivíduo
com as estruturas sociais.

Segundo esta autora, estes três modelos continuam sendo importantes e têm uma grande influência na construção dos
significados e conceitos atribuídos aos diferentes comportamentos e identidades sexuais.

A maioria dos estudos iniciais acerca da sexualidade investigava o comportamento sexual considerado ‘anormal’, como
a homoafetividade (ver revisão em MOTTIER, 2008). No entanto, outros pesquisadores – como Havelock Ellis, no final
do século XIX; Alfred Kinsey, entre 1948 e 1950; e Shere Hite, a partir da década de 1970 –, enfatizaram o estudo do
comportamento sexual ‘normal’. Suas pesquisas não apenas descreveram o comportamento de milhares de participantes
ao redor do mundo, mas ressaltaram as diferenças sociais observadas naquele tipo de comportamento considerado
‘natural’, abrindo caminho para o desenvolvimento da literatura científica acerca da sexualidade a partir de uma
concepção social.

Porter e Teich (1998) afirmam que os tópicos centrais de estudo da sexologia foram aspectos biológicos do ato sexual,
tais como ereção, orgasmo e ejaculação. Ainda na década de 1990, estes autores já sugeriam a necessidade da realização
de estudos sobre preconceitos e atitudes acerca da sexualidade, enfatizando a importância de investigar o caráter social
da sexualidade humana. Já se percebia a dissolução da noção de sexualidade enquanto comportamento humano estável e
ligado exclusivamente à biologia. “O sexo parece ter hoje menos a ver com sexo biológico e manobras genitais; muitos
o relacionam antes com a autodefinição e auto-satisfação” (PORTER, TEICH, 1998, p. 23).

Nos últimos dez anos, pesquisadores internacionais têm investigado a forma como os seres humanos abordam e
compreendem sua própria sexualidade e a sexualidade do outro, e como essa percepção influencia suas interações
sexuais (SNELL, FISHER, WALTERS, 2001). Os mais variados objetos de estudo têm sido investigados na psicologia
social durante este período. Para tanto, diversos instrumentos foram desenvolvidos, de forma a proporcionar uma maior
variedade de escalas válidas para pesquisa na área, tais como a Sexuality Scale (SNELL, 2001), que busca mensurar
auto-estima depressão e preocupação sexual. A auto-estima sexual, por exemplo, associa-se positivamente com o uso
apropriado de métodos contraceptivos (SMITH, SNELL, 2001). Uma outra escala desenvolvida busca avaliar duas
formas diferentes de relacionamento sexual: aquele que enfatiza o cuidado e a preocupação com as necessidades sexuais
do(a) parceiro(a) e aquele que adota uma perspectiva de troca na relação (HUGHES, SNELL, 2001).

Diferentes estudos têm enfatizado temas como ansiedade sexual, culpa sexual, mitos acerca da sexualidade masculina e
feminina, atitudes sexuais, mitos de aceitação do estupro, confidências sexuais, locus de controle sexual interno e
externo, ansiedade, motivação, receio e satisfação sexuais (ver revisão em SNELL et al., 2001).
Essa variedade de temas no âmbito internacional deve-se ao desenvolvimento de um interesse acerca das práticas e
significados sexuais a nível científico e social. No que diz respeito às pesquisas desenvolvidas no Brasil, Parker e
Barbosa (1996) afirmam que a sexualidade, enquanto tema de pesquisa das ciências sociais, foi ignorada durante a
maior parte do século XX, sendo foco apenas das ciências médicas. Apesar do direcionamento dado às pesquisas, que
enfatizavam o lado biológico do sexo e a saúde da população, desde o início da década de 1990, Richard Parker já
discutia a importância do erotismo e dos significados das práticas sexuais para compreender a sexualidade brasileira
(PORTELLA et al., 2004). Foi apenas a partir de 1970 que surgiram pesquisas sociais sobre sexualidade, iniciadas após
movimentos sociais feministas e homossexuais ocorridos na sociedade brasileira.

Segundo Parker (1991), as práticas sexuais foram construídas e significadas com base em uma sociedade brasileira
patriarcal, cujos conceitos de masculino e feminino ainda são definidores das relações sociais estabelecidas. Sendo
assim, toda experiência sexual é “produto de um complexo conjunto de processos sociais, culturais e históricos” (p. 13).

Devido ao atraso do desenvolvimento de um interesse da psicologia na sexualidade enquanto objeto de estudo, esta
pesquisa tem como objetivo realizar um mapeamento da produção científica brasileira sobre sexualidade e que utiliza
conceitos derivados da Psicologia Social, identificando o campo representacional construído por esse conjunto de
produções a partir dos objetivos gerais dos artigos publicados no país nos últimos dez anos.

Método

Objeto de estudo

Este estudo tem por objeto artigos teóricos ou empíricos publicados em periódicos brasileiros indexados pela biblioteca
eletrônica SciELO (Scientific Electronic Library Online). Tais artigos precisavam conter, em seu título, resumo ou
palavras-chave, o termo "sexualidade".

Procedimentos de coleta

Alguns critérios de inclusão / exclusão dos artigos foram definidos, de forma a tornar o banco de dados coerente com os
objetivos da pesquisa. São eles:

a) Objetivo da publicação: foram incluídos apenas artigos que abordavam o tema ‘sexualidade’ de forma direta;
b) Área de conhecimento: foram incluídos apenas artigos que apresentassem alguma intercessão com a área da
Psicologia Social, no sentido de utilizar teorias ou construtos comumente estudados na Psicologia Social, tais
como atitudes, identidade, gênero, representações sociais, entre outros;
c) Ano de publicação: foram incluídos artigos publicados no período entre Julho de 2001 e Junho de 2011,
perpassando os últimos dez anos de produção científica sobre o tema;
d) Idioma: foram incluídos artigos publicados em língua portuguesa, considerados acessíveis para a totalidade dos
profissionais da área no país;
e) Tipo de publicação: foram incluídos artigos de relatos de pesquisa, relatos de intervenção, pesquisa
bibliográfica, pesquisa documental e ensaios teóricos;

Assim, foram excluídos artigos que tratavam de algum aspecto da sexualidade humana apenas de forma indireta ou que
tratavam do tema a partir de diferentes perspectivas (tais como a psicanalítica, clínica, médica, enfermagem, história,
entre outras), quando estas não introduziam ou utilizavam algum conceito ou teoria da Psicologia Social; artigos
publicados fora do período pré-definido ou em algum idioma estrangeiro, assim como resenhas de livros. A busca geral
pelo termo "sexualidade" restringiu-se à base de dados do SciELO, tendo encontrado 606 artigos. Após a aplicação de
tais critérios, 433 artigos foram excluídos, sendo 173 selecionados para análise.

Organização e tratamento dos dados

Primeiramente, foi realizado um mapeamento inicial dos artigos selecionados. Uma planilha eletrônica foi construída,
de forma a catalogar os dados de acordo com: a) ano de publicação; b) área e subárea de conhecimento; c) tipo de
artigo; d) objetivos; e) população alvo; f) tamanho da amostra estudada; g) métodos de coleta de dados; h) métodos de
análise de dados; e i) teoria e/ou construto teórico utilizados na análise.

Com base nos dados levantados, optou-se por disponibilizá-los em tabelas e gráficos, apresentando-os de forma mais
compreensível, seguindo-se as discussões sobre cada temática.

Resultados e Discussão

Inicialmente, tem-se, no Quadro 1, a distribuição dos trabalhos publicados envolvendo o tema da sexualidade na última
década no Brasil. Pode-se observar que entre os anos de 2001 e 2011 há um salto nas publicações relativas ao tema no
período que vai de 2001 a 2003, seguido por um declínio das mesmas. O ápice de publicações está no período de 2006-
2007, que concentra 31,2% da produção.

Apesar de uma certa instabilidade percebida na quantidade de publicações acerca da sexualidade ao longo dos últimos
dez anos no Brasil, também é perceptível o aumento de interesse pelo tema. A partir de 2008, tem sido mantida uma
média de 20 publicações sobre o tema a cada ano, o que ainda pode se repetir no ano de 2011.

Quadro 1. Distribuição da quantidade de publicações por ano

Tais publicações são desenvolvidas por pesquisadores das mais variadas áreas, como pode se observar na Tabela 1, a
seguir, onde se apresenta a área de conhecimento dos dois principais autores dos trabalhos selecionados para análise.
Ressalta-se, sobre isso, que o CNPq classifica as áreas do conhecimento dos autores a partir de 09 categorias, a saber:
Ciências Exatas e da Terra, Engenharias, Ciências da Saúde, Ciências Biológicas, Ciências Humanas, Lingüística,
Letras e Artes, Ciências Agrárias, Ciências Sociais Aplicadas, e Outros. Entretanto, para efeito desta apresentação dos
resultados, foram utilizadas as áreas apresentadas na filiação institucional dos autores.

Tabela 1. Divisão das publicações por área de conhecimento dos autores

Área de conhecimento F %
Ciências Humanas 41 23,7
Psicologia 40 23,2
Psicologia Social 11 6,4
Ciências da Saúde
Bioética, Ciências da Saúde, Ciências Médicas, Enfermagem, Medicina, Medicina 74 42,8
Social, Saúde Coletiva e Saúde Pública
Ciências Sociais
Antropologia, Ciências Domésticas, Ciências Políticas, Ciências Sociais, Direito, 46 26,6
Estudos Sociais, História, Linguística, Serviço Social e Sociologia
Educação 12 6,9
TOTAL 173 100,0
Nota. Apenas as áreas em negrito foram utilizadas para o cálculo da porcentagem total, portanto, excluindo as frequências específicas
da Psicologia, apresentadas apenas para detalhamento.

A área de conhecimento que concentrou o maior número de artigos publicados foi a de Ciências da Saúde, com 74
trabalhos publicados (42,8%). Estes se dividem entre as diversas disciplinas que fazem parte da área, sendo
Enfermagem a disciplina ou subárea das Ciências da Saúde com maior número de publicações dedicadas ao tema, com
25 artigos (14,5%), seguida pela Saúde Coletiva, com 15 trabalhos publicados (8,7%).

A Psicologia é a grande responsável pelas publicações na área das Ciências Humanas, sendo responsável por 23,2% do
total de publicações. No entanto, estudos em Psicologia Social somam apenas 6,4% do total de artigos publicados no
país.

Em termos de áreas de estudo, a produção é bem diversificada, possuindo artigos que abordam aspectos históricos,
morais, sociais, antropológicos, culturais e psicossociais. Pode-se observar que a utilização do modelo biológico ainda é
uma forte tendência na compreensão da sexualidade (MOTTIER, 2008), principalmente se for considerado que existe
uma participação majoritária de pesquisadores da área de saúde neste campo (PARKER, BARBOSA, 1996). Assim, os
estudos em sexualidade se dão muito mais pelo viés da saúde que pelo viés psicossocial.

No que diz respeito às pesquisas desenvolvidas e apresentadas nestas publicações, a Tabela 2 mostra a distribuição dos
artigos em relação à população estudada.

Tabela 2. Distribuição das publicações de acordo com a população estudada

População estudada F %
Crianças 02 1,16
Adolescentes e jovens 55 31,79
Adultos 38 21,97
Idosos 02 1,16
Estudantes 13 7,51
Homens 14 8,09
Mulheres 32 18,50
Negros e moradores de periferia 10 5,78
Homossexuais / travestis / transexuais 06 3,47
Outros 13 7,51
TOTAL 185 106,94
Nota. Foram considerados 123 artigos, com um total de 185 diferentes populações. Na coluna percentual, considerou-se o total de
artigos (N = 173). Foram utilizados somente os artigos de Relato de Pesquisa, Estudo de Caso e Relato de Intervenção.

No que se refere à população estudada, contamos com 123 artigos que definiam a origem dos participantes dos estudos.
Em alguns casos, para objetivar a análise, os participantes foram divididos e colocados em mais de uma categoria.
Como por exemplo: Adolescentes do sexo feminino. A contagem, neste caso, foi para adolescentes e também para
mulheres. Desta forma, tornou-se possível chegar a um total de 185 tipos de participantes em 123 artigos.

Com relação à etapa do desenvolvimento, há uma predominância de estudos com Adolescentes e Jovens (55 artigos)
seguidos pelos Adultos (38). É importante ressaltar neste aspecto que mesmo com o aumento da expectativa de vida, a
população idosa não tem sido privilegiada nos estudos em sexualidade. A população de estudantes, principalmente pela
facilidade de acesso, também aparece representada. Chama a atenção, ainda, o fato de que populações menos assistidas,
também não têm sido objeto de estudo com relação à sexualidade, o mesmo ocorre com os Homossexuais/ Travestis e
Transexuais. Agrupados na categoria ‘outros’ estão os professores e profissionais de saúde, pais de alunos, membros de
igrejas, usuários de drogas e deficientes visuais. Estes trabalhos são, em sua maioria, de origem qualitativa, com
amostras de no máximo 20 sujeitos, como se pode verificar na Tabela 3.

Tabela 3. Distribuição das publicações de acordo com o número de participantes

Tamanho da amostra (participantes) F %


1 a 20 47 41,2
21 a 50 17 15,0
51 a 100 8 7,0
101 a 1000 29 25,4
1001 a 5040 13 11,4
TOTAL 114 100,00
Nota. A diferença da quantidade de publicações utilizadas para esta análise (N = 114) para o total de artigos selecionados (N = 173)
deve-se à inexistência de informações acerca do tamanho da amostra de algumas publicações.

Em seguida, na Tabela 4, são apresentados os tipos de estudos realizados, a partir da classificação dada pelos próprios
autores. Destaca-se a pequena quantidade de estudos documentais (0,6%), estudos de caso (1,8%) e relatos de
experiência (1,8%). Por outro lado, há um destaque considerável para os Relatos de Pesquisa, modalidade de trabalho
presente em 125 dos 173 trabalhos analisados.

Tabela 4. Distribuição das publicações de acordo com o tipo de estudo

Tipo de estudo F %
Documental 01 0,6
Estudo de caso 03 1,8
Ensaio teórico 21 12,9
Relato de experiência 03 1,8
Relato de intervenção 05 3,1
Revisão de literatura 05 3,1
Relato de pesquisa 125 76,7
TOTAL 163 100,00
Nota. A diferença da quantidade de publicações utilizadas para esta análise (N = 163) para o total de artigos selecionados (N = 173)
deve-se à inexistência de informações acerca do tipo de estudo desenvolvido em algumas publicações.

Ensaios teóricos acerca do tema também podem ser destacados, em comparação aos outros tipos de estudos
desenvolvidos, somando 12,9% do total de publicações. Tais artigos que apresentam, principalmente, relatos de
pesquisa, utilizam em suas abordagens teórico-conceituais, temas, conceitos e teorias derivados da Psicologia Social.
Para a identificação destes conceitos e teorias utilizados, foi realizado um levantamento dos mesmos em cada um dos
artigos, sendo os resultados apresentados na Tabela 5, a seguir.

Tabela 5. Conceitos e teorias da Psicologia Social presentes nos artigos sobre sexualidade

Conceitos e teorias F % Conceitos e teorias F %


Gênero 134 41,2 Normas sociais 03 0,9
Representações Sociais 32 9,8 Poder 03 0,9
Identidade Social 25 7,7 Cultura sexual 02 0,6
Preconceito 19 5,8 Mídia 02 0,6
Atitudes 18 5,5 Apego 01 0,3
Vulnerabilidade social 18 5,5 Avaliação Psicológica 01 0,3
Valores 15 4,6 Comunicação não-verbal 01 0,3
Crenças 08 2,5 Conjugalidade 01 0,3
Percepção 08 2,5 Construcionismo social 01 0,3
Orientação sexual 07 2,2 Homoafetividade 01 0,3
Cultura 05 1,5 Infra-humanização 01 0,3
Homofobia 04 1,2 Persuasão 01 0,3
Relacionamento interpessoal 04 1,2 Raça 01 0,3
Violência 04 1,2 Religiosidade 01 0,3
Redes de apoio 03 0,9 Transcultural 01 0,3
(cont.) TOTAL 325 100,0
Nota. A diferença da quantidade de conceitos e teorias utilizadas para esta análise (N = 325) para o total de artigos selecionados (N =
173) deve-se à utilização de mais de um conceito ou teoria por artigo.

Partindo do campo de estudo da psicologia social, buscou-se identificar quais conceitos e teorias comumente utilizados
pelo campo são também identificados nos estudos sobre sexualidade (Tabela 5). A concepção de gênero representa a
grande maioria dos estudos desenvolvidos acerca da sexualidade (41,2%). Note que no conceito de gênero, tal qual
proposto por Scott (1995) estão presentes os temas ou termos feminilidade, masculinidade, identidade e relações de
gênero. No que diz respeito às teorias utilizadas pelos pesquisadores, foram identificadas quatro teorias clássicas em
Psicologia Social. Dentre elas, a mais referenciada é a Teoria das Representações Sociais, desenvolvida por Serge
Moscovici, que aparece citada em 32 artigos (9,8%). A segunda teoria mais citada é a Teoria da Identidade Social,
desenvolvida por Henri Tajfel, que surge em 25 publicações (7,7%). O Construcionismo Social, de Kenneth Gergen e a
Teoria do Apego de John Bowlby completam o quadro dos campos teóricos utilizados.

No entanto, uma leitura mais aprofunda destes artigos demonstra que, em grande parte, os conceitos e teorias, ao serem
apropriados por outras disciplinas, sofrem alterações no significado proposto pelos autores das mesmas. Temas como
atitudes, crenças, identidade, percepção, persuasão, valores, e até mesmo representações sociais, são utilizados sem a
explicitação das conceituações próprias das teorias estudadas.
Não se pretende aqui defender que tais termos, conceitos e teorias sejam de uso exclusivo da Psicologia Social. A
apropriação dos mesmos por disciplinas de outras áreas demonstra a princípio, a abrangência que estes alcançaram, e a
importância dos estudos desenvolvidos pela Psicologia Social e pode, portanto, ser considerada uma consequência
benéfica da construção do conhecimento. No entanto, é necessário enfatizar certo cuidado quando da utilização de tais
referências. Sem o aporte teórico no qual estes termos são definidos e significados, não é possível estabelecer relações
entre construtos ou interpretar relações observadas empiricamente.

Para melhor compreender os artigos e a forma como a produção brasileira aborda a sexualidade, recorreu-se a um
estudo mais aprofundado dos objetivos dos mesmos, possibilitando o acesso aos sentidos atribuídos pela comunidade
acadêmica ao tema. Pretende-se, assim, compreender também como estes conceitos são compartilhados e transmitidos,
ou seja, de que forma é construído o discurso científico e como este é absorvido pela população em geral. Para tanto, foi
utilizado o conceito de Campo Representacional, tal qual exposto por Serge Moscovici ao descrever as Representações
Sociais (RS).

As RS, concebidas como uma “forma de conhecimento, socialmente compartilhada e elaborada” (JODELET, 2001, p.
22), têm “em seu bojo a ideia de um conhecimento construído por um sujeito ativo em íntima interação com um objeto
culturalmente construído, que revela as marcas tanto do sujeito como do objeto, ambos inscritos social e
historicamente” (TRINDADE, SANTOS E ALMEIDA, 2011, p. 102).

Dessa forma, é importante ressaltar uma das funções das representações sociais que, de acordo com Moscovici (2003),
consiste em tornar familiar o não familiar; o que nos leva à compreensão de que os autores, ao definirem os objetivos de
suas pesquisas, o fazem no sentido de também definir o seu objeto de estudo, ou seja, representá-lo.

Neste sentido, o conceito de campo ou sistema representacional é utilizado para ajudar na compreensão sobre o
movimento de construção das representações sociais dos próprios autores ao desenvolver seus estudos sobre
sexualidade. Segundo Camargo e Wachelke (2010), quando várias RS relacionam-se mutuamente, elas formam uma
unidade organizada; a expressão sistema ou campo representacional refere-se, pois, a um conjunto integrado de
representações sociais em que duas ou mais representações estão relacionadas umas com as outras. Monchietti,
Lombardo, Sánchez e Krzimien (2010) afirmam que o campo representacional seria heterogêneo e diverso, abrangendo
as visões contraditórias que coexistem no contexto representacional, o qual é compartilhado entre as pessoas. Assim
sendo,
a constituição deste campo representacional resulta em grande parte de sua impregnação pelo
conhecimento técnico e científico de forma mais ou menos direta ou através da reelaboração operada
pelos meios de comunicação de massa. De certa forma tanto a heterogeneidade quanto a clara
contradição entre determinados componentes do campo são revelados pela presença simultânea de
elementos correspondentes a distintos momentos históricos da constituição do conhecimento
científico. (p.108)

Camargo e Wachelke (2010) citam o trabalho desenvolvido por Rouquette para explicar a construção dos sistemas
representacionais, afirmando que os objetos de representação trazem em si uma herança baseada em eventos passados.
Isto pode ser compreendido pelo fato de que, ainda segundo os autores, os objetos de representação não são concebidos
de forma independente e possuem limites estabelecidos através de decisões metodológicas impostas ao/pelo
pesquisador.

Optou-se por estudar os objetivos dos artigos selecionados tendo por base a ideia de campo representacional. A primeira
etapa consistiu em organizar todos os objetivos em uma planilha, possibilitando assim uma melhor visualização. Em
seguida foi feita uma análise dos objetivos, excluindo os verbos, preposições, artigos e demais elementos de ligação,
permanecendo, assim, as palavras mais significativas. Por exemplo:

Tabela 6. Exemplo da utilização dos objetivos gerais para análise

Objetivos Palavras utilizadas


Traduzir e adaptar a ASKAS para a cultura brasileira, por ser uma cultura_brasileira
escala que não pergunta diretamente sobre a sexualidade do sexualidade
respondente idoso e/ou seus hábitos e atividades sexuais pessoais. idoso
atividades_sexuais
Nota. O objetivo descrito foi retirado de Viana, Guirardello e Madruga (2010)

Inicialmente, realizou-se uma categorização destas palavras mais significativas dos objetivos. Um total de 324 palavras
foi levantado, estas podendo ser organizadas em 12 categorias, a saber:

a) Afetividade: termos associados à emoção, sentimentos, bem-estar;


b) Áreas / práticas profissionais: termos associados a disciplinas ou áreas específicas, tais como enfermagem,
medicina, psicologia, etc.;
c) Cognição: termos acerca de pensamentos, memória, crenças, opiniões, etc;
d) Comportamento: expressões acerca do comportamento sexual, práticas e atividades sexuais;
e) Conceitos utilizados: temas e teorias derivados da Psicologia Social, tais como atitudes, representações
sociais, valores, etc.;
f) Contextos: referências ao contexto social, comunidade de inserção dos participantes;
g) Instituições: escolas, centros de saúde, Centros de Referência de Assistência Social – CRAS, etc.;
h) População: referências a um grupo específico de participantes, tais como adolescentes, homossexuais,
deficientes;
i) Relações interpessoais: termos associados a relacionamentos, relação conjugal, parentalidade, redes de apoio,
entre outros;
j) Saúde: termos que enfocam aspectos relacionados à saúde, como DST-Aids, prevenção ou tratamento de
doenças;
k) Sexualidade: expressões que enfatizam o aspecto global da sexualidade, como construção da sexualidade,
orientação sexual, entre outros;
l) Violência: termos associados à vivência de violência, como violência conjugal, estupro, abuso sexual, etc.

Após o levantamento de todas as palavras significativas dos objetivos e sua categorização para melhor compreensão dos
dados, conforme descrito acima, utilizou-se o método TISCON1 como forma de análise. As palavras foram organizadas
em um arquivo .txt e submetidas à análise pelo software SPAD-t, o que possibilitou a realização de uma análise léxica
do conteúdo, buscando assim uma melhor homogeneização de todo o banco. Esta análise realiza uma aproximação das
palavras que possuem o mesmo significado semântico. Após esta etapa, os dados foram transferidos para o software
SPSS e submetidos à Análise de Correspondência (ANACOR). Os resultados desta análise estão apresentados no
Quadro 2.

Quadro 2. Organização dos elementos de representações sociais

1
Method of detecting Translation Invariant Structures in different Contexts. (WAGNER, VALENCIA,
ELEJABARRIETA, 1996).
O campo representacional, estudado a partir da abordagem estrutural e conforme a orientação metodológica adotada, é
apresentado em um gráfico de dispersão (scatterplot) em que são expostos os cruzamentos dos perfis das palavras2, ou
seja, o gráfico representa o espaço semântico do campo representacional. A partir da análise léxica, foram selecionados
os 10 temas mais frequentes para o estudo da Análise de Correspondência. Ao utilizar-se o procedimento ANACOR
cruzando, no caso, os 10 temas entre si, obtém-se sempre 9 palavras na matriz simétrica, uma vez que a última palavra é
sempre eliminada (HAIR et al., 1995; ZONTA, 1997; CEOTTO, 1999).

O procedimento ANACOR produz o gráfico baseado nos escores: os elementos que são similares permanecem
próximos (graficamente) e os que são diferentes são representados afastados no gráfico, demonstrando assim as
proximidades ou distanciamentos entre os elementos de representação pesquisados.

Os elementos identificados foram: Sexualidade (n=61); Adolescentes-Jovens (n=60); Gênero (n=50); DST-AIDS
(n=29); Saúde (n= 26); Mulheres (n=24); Percepção (n=24); Violência (n=24); Homens (n=17) e Discurso (n=15). Cabe
ressaltar que o elemento Gênero está organizado em função das palavras masculino e feminino e suas derivações –
homossexual, transexual e LGBT3 –, além, é claro, da expressão Gênero, que era a mais frequente, tendo sido por isso
escolhida como elemento-chave. Os elementos Homens e Mulheres não foram associados a este tema, pois de acordo
com os teóricos da área, trata-se de elementos biológicos, não devendo, portanto, ser aproximado com Gênero.

A partir da análise do campo representacional, observa-se que os elementos DST-AIDS, Adolescentes-Jovens e Gênero
encontram-se agrupados próximos, indicando uma alta associabilidade entre eles. Estes elementos podem ser
considerados os mais organizativos da representação, ou seja, eles possuem características que podem apontá-los como
elementos com tendências à centralidade. De acordo com Abric (2001), o núcleo central é o “elemento fundamental da
representação, pois é ele que determina ao mesmo tempo sua significação e sua organização” (pp. 162-163). O
posicionamento destes elementos ajuda a pensar no fortalecimento da consistência, sentido e significado da produção
acadêmica sobre a sexualidade humana em cima dos trabalhos com foco em DST-AIDS, Gênero e Adolescentes-
Jovens.

O artigo de Torres, Beserra e Barroso (2007), identificado nesta revisão, é um exemplo que ajuda a compreender o
campo representacional; este estudo teve por objetivo analisar a influência das relações de gênero no contexto dos
adolescentes e as diferentes percepções de gênero quanto à vulnerabilidade a doenças sexualmente transmissíveis.

Os demais elementos colaboram, conforme descrito na TRS, para a composição dos elementos periféricos e
desempenham essencialmente dois papéis: codificação e proteção. Assim, “suas funções consistem (...) na adaptação à
realidade concreta e na diferenciação do conteúdo da representação e, em termos históricos, na proteção do sistema
central” (SÁ, 1996, p. 22).

Os elementos Percepções, Sexualidade e Saúde aparecem um pouco mais afastados do centro do gráfico (ponto 0;0),
compondo a periferia do campo representacional, ajudando na organização e manutenção dos elementos centrais. Os
artigos de Rodrigues, Brino e Williams (2006) e de Pocahy e Nardi (2007) exemplificam este conjunto periférico. O
primeiro estudou as concepções de adolescentes sobre violência sexual e depressão, e o outro buscou compreender as
experiências sobre a sexualidade por parte de jovens que aderiram a ações de saúde em DST-AIDS.

Verifica-se, também, que os elementos Homens e Mulheres localizam-se ainda mais afastados. Alguns dos artigos
relacionados a estes elementos apresentam comumente temas associados a planejamento familiar, adultério, turismo
sexual, utilização de métodos contraceptivos. Finalizando o estudo de campo representacional, temos o elemento
Violência. A presença desse elemento no estudo do campo representacional de sexualidade demonstra a existência de
uma ligação entre sexualidade e práticas violentas, principalmente nos estudos de gênero, como pode ser verificado, por
exemplo, em Brasil, Alves, Amparo e Frajorge (2006), que identificam a violência como um dos fatores de risco para o
desenvolvimento da adolescência.

Considerações finais

Este estudo teve como objetivo principal mapear a produção científica brasileira acerca da sexualidade nos últimos dez
anos, identificando o campo representacional sobre o tema construído pelos pesquisadores das mais diversas áreas.
Espera-se que estes objetivos tenham sido alcançados.

No entanto, cabe aqui assinalar algumas limitações potenciais do estudo. Primeiramente, é preciso relembrar que apenas
a base de dados do SciELO foi consultada e somente artigos contendo o termo ‘sexualidade’ foram selecionados para
estas análises. Estas escolhas podem ter reduzido a quantidade de publicações incluídas, sugerindo que as

2
Os termos apresentados passarão a ser chamadas de elementos de representação visando, assim, facilitar o
entendimento.
3
Conforme grafia utilizada nos artigos.
representações identificadas e conclusões discutidas aqui, possivelmente, não abrangem a totalidade do conhecimento
publicado sobre o tema neste período. Uma segunda limitação diz respeito à ausência de algumas informações nos
artigos selecionados, tais como definição do tipo de estudo, quantidade de participantes ou área de conhecimento dos
autores. Entretanto, não foi objetivo deste trabalho generalizar resultados ou analisar a totalidade da produção científica
brasileira sobre o tema, apenas mapeá-la sistematicamente, de forma a permitir uma discussão teórico-metodológica a
respeito da mesma. Neste sentido, acredita-se que a amostra de publicações utilizada não apresenta discrepância da
realidade do país, fazendo com que estas discussões ainda sejam consideradas válidas.

A diversidade dos objetos de estudo incluídos no estudo da sexualidade, identificados nesta pesquisa enquanto campo
representacional demonstra a multiplicidade da sexualidade enquanto campo de estudo. Cada um dos elementos aqui
apresentados (DST-Aids, Saúde, Gênero, Percepção, Adolescentes-Jovens, Sexualidade, Homens, Mulheres e
Violência), se estudados separadamente, poderá apresentar representações específicas, construindo uma complexa rede
de associações que constituem o conhecimento compartilhado sobre o tema. Estudar tal complexidade possibilita
compreender o modelo de ciência utilizado e desenvolvido pelos pesquisadores no decorrer de suas trajetórias
acadêmicas.

O que influencia a escolha dos temas estudados? Considerando as características apresentadas por Moscovici (2003)
com relação a uma das funções das representações sociais, qual seja, de tornar familiar o não familiar, os pesquisadores
partem de seus sistemas de crenças e valores – considerando aqui também as características próprias de suas áreas de
formação e de sua cultura de inserção – apreendidos e socialmente compartilhados.

Assim, é possível compreender a presença dos elementos DST-AIDS, Adolescentes-Jovens, Gênero e Saúde, enquanto
elementos que fortalecem e dão consistência à análise realizada. A ênfase biologicista dos estudos abre espaço para a
compreensão dos elementos culturais presentes no sistema de crenças e valores dos autores. Utilizar, portanto, teorias e
conceitos derivados da Psicologia Social não significa, neste contexto, adotar uma abordagem psicossocial para a
compreensão dos fenômenos estudados.

Uma vez que a produção acadêmica tem como um de seus objetivos a normatização de práticas profissionais e de
intervenção, a prevalência de relatos de pesquisa demonstra, antes de tudo, a necessidade de conhecer os objetos de
estudo. No entanto, uma preferência por tipos específicos de pesquisa (qualitativa, em geral, com amostras pequenas) e
por grupos amostrais também específicos (adolescentes, jovens, estudantes) demonstra certa elitização dos estudos,
derivada não apenas da área de conhecimento dos autores, mas também da conveniência do acesso a essas populações.
Neste sentido, lacunas podem ser observadas, tais como:
a reduzida quantidade de pesquisas em comunidades de baixa renda ou grupos marginalizados que, quando
ocorrem, enfocam apenas comportamentos de risco, prevenção e tratamento de doenças e gravidez na
adolescência;
a quase que completa ausência de estudos desenvolvidos com idosos, refletindo uma crença geral de que a
sexualidade se encerra com a vida adulta;
uma maior ênfase em informações acerca de aspectos positivos associados à vivência da sexualidade, como a
estima e assertividade sexual, compreensão da importância de uma boa imagem corporal, do conhecimento e
cuidado com o próprio corpo, entre outros.

Os resultados apresentados aqui sugerem que a sexualidade é percebida por muitos pesquisadores como um problema
que precisa ser contido, “e não como parte essencial da experiência humana, fonte de alegria e prazer, assim como de
sofrimento e dor” (CORNWALL, JOLLY, 2008, p. 30). A percepção do brasileiro enquanto povo com um forte apelo à
sexualidade (PARKER, 1991) não extingue a crença-tabu acerca do falar abertamente e estudar sexualidade, presente
nas famílias e escolas brasileiras.

Neste sentido, a construção de conhecimentos sobre a sexualidade não pode se restringir a informações e dados factuais
acerca da iniciação sexual de adolescentes, seus comportamentos de risco e prevenção de doenças (CORNWALL,
JOLLY, 2008). Para a Organização Mundial de Saúde (WHO, 2006), o conceito de saúde sexual abrange uma vivência
positiva e respeitosa da sexualidade, tendo como base a construção de relacionamentos sexuais saudáveis, livres de
coerção, discriminação, doença e violência. Ou seja, a saúde sexual individual só pode ser alcançada a partir do
momento em que um relacionamento sexual é construído com o respeito integral aos direitos sexuais do outro e não
apenas com restrições comportamentais e cuidados na atividade sexual (WHO, 2006).

A Millenium Declaration é um documento técnico desenvolvido pela World Association for Sexual Health (WAS,
2008) que tem como objetivo estabelecer metas direcionadas à instituições governamentais, acadêmicas, de setor
privado e à sociedade em geral. São elas:
1) Reconhecer e proteger os direitos sexuais de todos;
2) Avançar na direção da igualdade e equidade de gênero;
3) Condenar, combater e reduzir todas as formas de violência relacionada à sexualidade;
4) Fornecer acesso universal à informação e educação sexual compreensiva;
5) Garantir que programas de saúde reprodutiva reconheçam a centralidade da saúde sexual;
6) Reverter a expansão do HIV-AIDS e outras doenças sexualmente transmissíveis;
7) Identificar, abordar e tratar preocupações e disfunções sexuais;
8) Reconhecer que o prazer sexual é um componente do bem-estar geral.

Uma visão tão abrangente da sexualidade humana, associada a metas a serem alcançadas, pode contribuir de forma
decisiva para a elaboração de novas pesquisas nas mais diversas disciplinas e, especificamente, na psicologia social. A
elaboração de pesquisas que estudem o tema a partir de diferentes perspectivas e a publicação destas em periódicos
científicos de circulação nacional só tem a contribuir para a construção do conhecimento na área.

Como afirma Costa (1999), o sexo


faz rir, chorar ou gozar, mas não qualifica ninguém. Todos têm sexo, gostam ou não
de sexo, fazem sexo e são sexualmente diferentes nas preferências e inclinações, mas
ninguém é definido por ele. Não por silêncio ou recalque puritanos, mas
simplesmente porque o sexo nada mais é do que aquilo que podemos dizer dele
enquanto seres sexuais (p. 152).

E a psicologia social pode contribuir de forma decisiva para a compreensão dos aspectos sociais envolvidos no processo
de construção e vivência da sexualidade.

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