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Prólogo

Era uma vez, em um tempo em que as estrelas no céu brilhavam muito menos que agora…

Os deuses da luz, da ordem e do destino competiam com os deuses da escuridão, do caos e do


acaso para ver quem controlaria o mundo. Essa competição ocorreu, não em batalha, mas em um
jogar de dados.

Ou melhor, muitas, muitas jogadas. Uma e outra e outra vez eles jogavam os dados.

E houve vitórias, e houve derrotas, mas nenhuma resolução.

Por fim, os deuses se cansaram dos dados. Imediatamente eles criaram muitas criaturas para serem
suas peças de jogo, e um mundo no qual jogar. Humanos, elfos, anões, homens-lagarto, goblins,
ogros, trolls e demônios.

Às vezes eles se aventuravam, em alguns casos conseguindo vitórias, em outras sofrendo derrotas.
Eles encontravam tesouros, ficavam felizes, e no fim, morriam.

Nesse mundo, apareceu um aventureiro em particular.

Ele não vai salvar o mundo.

Ele não vai sequer mudar nada.

Afinal, ele é apenas mais um peão, como você poderia encontrar em qualquer lugar…
A luta brutal terminou, ele pisou com sua bota no cadáver do goblin morto.

Ele estava manchado com o sangue carmesim do monstro, do seu elmo de aço sujo e armadura de
couro, até a malha feita de anéis metálicos encadeados que cobriam todo o seu corpo.

Um pequeno escudo surrado estava fixado em seu braço esquerdo, e em sua mão, ele segurava uma
tocha ardente.

Com seu calcanhar contra o cadáver da criatura, ele abaixou sua mão livre e retirou casualmente a
espada de seu crânio. Era uma lâmina de aparência barata, com um comprimento mal concebido, e
agora estava encharcada de cérebro de goblin.

Deitada no chão com uma flecha no ombro, o corpo magro de uma menina tremia de medo. Seu
clássico rosto adorável e doce, emoldurado pelos longos e quase translúcidos cabelos cor de ouro,
estava franzido com uma junção de lagrimas e suor.

Seus braços magros, seus pés; todo seu corpo deslumbrante estava com as vestimentas de uma
sacerdotisa. O som do cajado de monge que ela agarrou ressoou, com seus anéis pendurados
batendo uns contra os outros com suas mãos trêmulas.

Quem era esse homem diante dela?

Tão estranha era sua aparência, a aura que o ocultava, que ela imaginava que ele pudesse ser
mesmo um goblin; ou talvez algo muito pior, algo que ela ainda não tinha conhecimento.

— Que-quem é você…? — perguntou ela, suprimindo seu terror e dor.

Após uma pausa, o homem respondeu: — Matador de Goblins.

Um assassino. Não de dragões ou de vampiros, mas o mais simples dos monstros: goblins.

Normalmente, o nome poderia parecer comicamente simples. Mas para Sacerdotisa, naquele
momento, era tudo, menos engraçado.

Você já ouviu esta história antes.

O dia em que um órfão criado no templo faz quinze anos, ele se torna um adulto e deve escolher o
seu caminho: ele permanecerá no templo como um servo da deusa, ou partirá e tentará ganhar a
vida mundo afora?
Sacerdotisa escolhera o último, e uma visita à Guilda dos Aventureiros era o que escolheu fazer.

A Guilda dos Aventureiros — criada para apoiar aquelas corajosas almas desbravadoras — foi
inicialmente formada, assim dizendo, por um punhado de pessoas que se conheceram em um bar.
Ao contrário de outras associações de trabalhadores, a Guilda dos Aventureiros era mais uma
agência de empregos do que um sindicato. Na guerra atual entre monstros e “aqueles que possuem
língua”, os aventureiros eram como mercenários. Ninguém toleraria a existência de pessoas
armadas se não fossem administradas cuidadosamente.

Sacerdotisa parou seu trajeto quando a vasta sucursal que estava diretamente dentro dos portões da
cidade tirou seu folego. Quando ela entrou na recepção, ficou surpresa ao encontrá-la agitada de
aventureiros, embora ainda fosse de manhã.

Esses edifícios ostentavam grandes pousadas e tavernas — geralmente juntas — bem como um
escritório, tudo em um. Realmente, esse tipo de clamor era o resultado natural por possuir esses
três serviços no mesmo lugar.

Para cada humano comum com armadura de placas, havia um mago elfo com manto e cajado. Aqui
havia um anão barbudo empunhando um machado; e ali, havia um dos pequenos indivíduos
moradores dos prados, conhecidos como rheas. Sacerdotisa abriu caminho através da multidão,
passando por homens e mulheres de todas as raças e idades que se poderia imaginar e carregando
todos os tipos de armas, indo em direção a Garota da Guilda. A fila serpenteava sem parar, cheia de
pessoas que vieram pegar, registrar uma missão ou apresentar um relatório.

Um aventureiro empunhando uma lança estava conversando com alguém coberto por uma
armadura pesada.

— Então? Como foi com o manticora no desfiladeiro?

— Não era grande coisa. Se quiser um grandão, acho que seria melhor tentar as ruínas ou algo
desse tipo.

— É justo, mas você nunca vai colocar comida na mesa desse jeito.

— Ei, ouvi dizer que tem um espírito maligno causando problemas perto da capital. Quem quer que
for para lá pode conseguir uma boa recompensa, hein?

— Talvez eu conseguisse lidar com ele, se for só um demônio de nível baixo…

Sacerdotisa se surpreendeu não menos que três vezes ouvindo a conversa casual, e cada vez, ela
trouxe seu cajado de monge mais perto para fortalecer sua determinação.

— …Em breve também irei…!

Ela não possuía a ilusão de que a vida de um aventureiro era simples. Sacerdotisa vira em primeira
mão os feridos que retornaram da masmorra, vindos ao templo, implorando por um milagre de
cura. E curar tais pessoas era precisamente o credo da Mãe Terra.
Como ela poderia se afastar então, de se pôr em perigo para fazer o que lhe fora ensinada? Ela era
uma órfã, e o templo a salvou. E agora era sua vez de reembolsar essa dívida…

— Pois não, o que te traz aqui hoje?

A fila havia avançado progressivamente quando Sacerdotisa permaneceu perdida em pensamentos,


e agora era sua vez.

Usando uma expressão doce, Garota da Guilda atendendo-a ainda era jovem, embora mais velha
que Sacerdotisa. Sua roupa imaculada estava impecavelmente bem cuidada, com seu cabelo
castanho-claro entrelaçado em tranças. Um rápido olhar à volta do local não deixava dúvidas que a
recepção da guilda seria um local de trabalho exigente. Essa recepcionista não mostrava nenhuma
atitude tensa, muito comum entre as jovens profissionais, sendo, talvez, um sinal do quão bem ela
conhecia o seu trabalho.

Sacerdotisa sentiu um pouco do seu nervosismo diminuir. Ela engoliu em seco e falou:

— Hum, eu… eu quero ser uma… uma aventureira.

— Tem… certeza? — questionou Garota da Guilda, sua expressão doce desapareceu


momentaneamente quando ela hesitou brevemente, aparentemente sem palavras. Sacerdotisa sentiu
os olhos da recepcionista se moverem do seu rosto para seu corpo, e estranhamente envergonhada,
assentiu.

A sensação desapareceu quando Garota da Guilda retomou um sorriso e disse: — Entendo. Você
sabe ler e escrever?

— Uhm, sim, um pouco. Eu aprendi no templo…

— Então preencha isso, por favor. Se tiver alguma coisa que não entender, é só perguntar.

Era uma ficha de aventura. Letras douradas se destacavam através do velino marrom claro.

Nome, sexo, idade, classe, cor dos cabelos, cor dos olhos, tipo de corpo, habilidades, magias,
milagres… Informações tão simples. Tão simples que quase não parecia certo.

— Ah — interrompeu Garota da Guilda — pode deixar os espaços “capacidades” e “história do


aventureiro” em branco. A guilda vai preencher eles mais tarde.

— S-sim, senhora. — Sacerdotisa assentiu, e então, com a mão trêmula, pegou uma pena,
mergulhou ela em um tinteiro e começou a escrever com letras precisas.

Ela entregou a folha terminada para Garota da Guilda, que olhou para o papel com um aceno,
depois pegou um estilete prateado e esculpiu uma série de letras cursivas em uma insígnia branca
de porcelana. Ela entregou a insígnia para Sacerdotisa, que percebeu que possuía as mesmas
informações que a sua ficha de aventura, mas agora com letras bem distribuídas.
— Isso vai servir como sua identificação. Nós chamamos isso de “status”. Embora — acrescentou
ela, provocadoramente — ele não diga nada que não conseguimos descobrir olhando para você. —
Então ela disse calmamente para Sacerdotisa que pestanejava: — Ele será usado para confirmar a
sua identidade se alguma coisa acontecer com você, por isso tente não perder.

Se algo acontecer?

Por um segundo, Sacerdotisa foi pega de surpresa pelo tom sério de Garota da Guilda, mas não
demorou muito para ela ligar os pontos. A única vez que precisariam “confirmar sua identidade”,
era quando alguém fora assassinado tão horrendamente, que ninguém poderia dizer quem era.

— Sim, senhora — disse Sacerdotisa, enquanto desejava que sua voz parasse de tremular. — Mas é
realmente assim tão fácil se tornar uma aventureira…?

— Se tornar uma, sim.

A expressão de Garota da Guilda estava ilegível. Ela estava preocupada ou resignada? Sacerdotisa
não podia dizer.

— É mais difícil progredir nos ranques. Os quais são baseados em assassinatos, quanto bem você
tem feito e os testes de personalidade.

— Testes de personalidade?

— Às vezes você encontra os tipos eu-sou-forte-o-suficiente-para-fazer-tudo-sozinho.

Então, ela acrescentou baixinho: — Mas existem muitos tipos de excêntricos por aí. — E quando
ela disse isso, por um instante seu comportamento mudou. Se suavizando com um sorriso saudoso
e caloroso.

Oh, pensou Sacerdotisa, não sabia que ela podia sorrir assim.

Garota da Guilda notou que Sacerdotisa a observava e rapidamente limpou a garganta. — As


missões são fixadas lá. — Ela indicou um quadro de cortiça que cobria quase uma parede inteira.
— Escolha aquelas que são adequadas ao seu nível, é claro.

As opções eram pequenas, já que a multidão enorme de aventureiros passava pelo quadro toda
manhã. Mas a guilda não possuiria um quadro daquele tamanho se não precisasse.

— Pessoalmente — disse a recepcionista — eu recomendo a você ficar com os pés molhados por
limpar os esgotos. Sem brincadeira.

— Limpar os esgotos? Mas aventureiros não lutam contra monstros…?

— Existe honra em caçar ratos gigantes também. E você vai fazer um bem verdadeiro ao mundo.
— Ela acrescentou em voz baixa: — Recém-chegados com um pouco de experiência podem
avançar para os goblins, eu acho — e outra vez havia aquele olhar sem expressão.
— Bem, isso é tudo por aqui no registro. Boa caçada!

— Ah, o-obrigada. — Sacerdotisa baixou a cabeça em gratidão e deixou a recepção. Ela pendurou
a insígnia de porcelana no pescoço e soltou um suspiro que esteve segurando. Ela era uma
aventureira registrada. Foi simples assim.

Mas, o que devo fazer agora?

Sacerdotisa levava apenas seu cajado (o símbolo do seu ofício), um saco com uma muda de roupas
e algumas moedas.

Ela ouvira que o segundo andar do edifício da guilda era destinado aos aventureiros de níveis
baixos. Talvez ela devesse começar reservando um quarto, depois ver que tipos de missões estavam
disponíveis…

— Ei, quer ir se aventurar com a gente?


— Hãããã?

O convite inesperado veio de um jovem com uma espada no quadril e um peitoral de aço brilhante
amarrado no peito. Da mesma forma que a Sacerdotisa, ele possuía uma insígnia nova de porcelana
em volta do pescoço.

As insígnias vinham em dez variedades, indicando o ranque do portador, da platina no topo até a
porcelana dos aventureiros noviços na parte inferior.

— Você é uma sacerdotisa, certo?

— Hum, sim. Sim… sou.

— Perfeito! Exatamente o que meu grupo precisa.

Logo atrás do jovem espadachim, ela podia ver agora outras duas garotas. Uma usava um uniforme
de artista marcial, com o cabelo amarrado em onda e um olhar muito confiante no rosto, enquanto a
outra possuía óculos e um cajado, com um olhar frio.

Uma lutadora e uma maga, ela presumiu.

Guerreiro seguiu o olhar de Sacerdotisa e reiterou “Meu grupo”, com um aceno. — Estamos em
uma missão urgente, mas eu gostaria de pelo menos mais uma pessoa. O que me diz?

— O que você quer dizer com “urgente”…?

— Temos que nos livrar de alguns goblins!

Goblins. Os goblins viviam nas cavernas perto da cidade desde tempos imemoriais, ou assim
diziam. Eles eram os monstros mais fracos, e a superioridade numérica era a única coisa agindo a
seu favor.

Eles eram quase tão altos quanto uma criança, com força e inteligência equivalentes. Tudo o que os
distinguia de um pequeno ser humano era a sua capacidade de enxergar no escuro. Eles faziam
todas as coisas monstruosas usuais; ameaçavam pessoas, aterrorizavam aldeias e raptavam
donzelas.

Eles eram fracos, sim, mas era melhor deixar os goblins deitados dormindo.
Os aldeões haviam ignorado os goblins a princípio… mas depois as coisas mudaram. Primeiro, as
colheitas que eles armazenaram para o inverno desapareceram, até à última semente. Os habitantes
da cidade, enfurecidos, repararam suas cercas e depois colocaram patrulhas rondando a área com
tochas na mão.

Os goblins passaram facilmente por eles.

Eles roubaram a ovelha, junto com a filha do pastor e algumas mulheres que saíram para ver o que
era todo aquele alvoroço.

Os aldeões ficaram rapidamente sem opções. Eles reuniram seus recursos escassos e foram à
guilda: a Guilda dos Aventureiros, onde os aventureiros se reuniam. Certamente, publicar uma
missão traria alguém para ajudá-los.

Hum, e…

Sacerdotisa estava de pé com o dedo nos lábios, perdida em pensamentos enquanto Guerreiro dava
sua explicação.

Uma boa e velha caça aos goblins como sua primeira aventura. Muitas pessoas fizeram isso. E ela
nem precisava encontrar a aventura, a aventura a encontrara. Tinha que ser o destino.

Ela nunca imaginara que poderia fazer tudo sozinha, de qualquer forma. Aventurar-se sozinha
como uma clériga era suicídio. Ela precisaria de um grupo eventualmente. Ela estava muito
preocupada em se juntar com completos estranhos; mas alguém que fez um convite a ela não era
um completo estranho, não é? Sim, nenhum garoto alguma vez a convidou para qualquer coisa
antes, mas havia mais duas garotas ali.

Então tudo ficaria bem… certo?

— Tudo bem então. Se você me aceitar.

Ela respondeu com um aceno firme com a cabeça, e Guerreiro deu um grito.

— Sério?! Demais! Então, quem está pronto para ir em uma aventura?!

— O quê, só vocês quatro? — interrompeu Garota da Guilda. — Eu tenho certeza de que se vocês
esperarem um tempo, outros aventureiros irão aparecer…

Guerreiro não pareceu se incomodar com o fato de a própria Garota da Guilda ter sentido a
necessidade de comentar isso. — São só alguns goblins. Tenho certeza de que quatro pessoas são
suficientes. — Ele se virou para seus companheiros. — Certo? — Ele parecia tão seguro, e com um
sorriso alegre no rosto. Então ele se virou para Garota da Guilda. — As donzelas capturadas estão
esperando serem resgatadas. Não temos tempo a perder!

Vendo isso, o rosto da jovem trabalhadora retornou de novo naquela expressão ilegível, enquanto
um profundo e estranho desconforto se formava no fundo do coração de Sacerdotisa.
A tocha cintilava fracamente na brisa pútrida.

O sol do meio-dia fora encoberto pela escuridão que preenchia a caverna. Na entrada era difícil de
enxergar, e mais para dentro era quase preto.

As sombras projetadas das rochas brutas dançavam enquanto a chama balançava, deslizando pelas
paredes como monstros em um afresco.

Três garotas e um garoto, cobertos com quaisquer peças de armadura ruins que poderiam encontrar.
Em uma formação irregular, eles avançavam nervosamente através da escuridão densa. Guerreiro
ia na frente, segurando a tocha. Lutadora estava atrás dele. Maga mantinha a retaguarda. E
prensada entre a artista marcial e a maga, a terceira na fila, estava a garota com vestes de
sacerdotisa, segurando seu cajado de monge ansiosamente enquanto caminhava.

Foi Maga que sugeriu que se deslocassem em uma fila. Desde que não existisse caminhos
ramificados, eles não teriam que se preocupar com um ataque vindo de trás. E se os aventureiros na
frente se mantivessem firmes, os detrás ficariam seguros, capazes de prestar apoio da parte de trás
da fileira. Esse era o plano, de qualquer forma.

— É-é realmente uma boa ideia? Ir direto até eles? — O murmúrio de Sacerdotisa não soava
confiante. No mínimo, ela parecia consideravelmente mais preocupada do que estava antes de
terem entrado na caverna. — Quero dizer, nós não sabemos nada sobre esses goblins.

— Céus, quanta preocupação. Acho que é exatamente o que se poderia esperar de uma sacerdotisa.
— A voz de Guerreiro, um bocado ousado, ecoou no vazio da caverna até desaparecer. — Até
crianças não têm medo de goblins. Raios, eu ajudei a expulsar alguns de minha aldeia uma vez.

— Oh, pare — disse Lutadora. — Matar alguns goblins não tem nada de especial. Você está se
envergonhando. Além do mais — acrescentou ela, com uma voz desagradável, porém baixa —
você nem os matou.

— Eu não disse isso — respondeu Guerreiro, fazendo um beicinho.

Lutadora deu um suspiro, irritada, mas de alguma forma afetuoso. — Os goblins podem picar esse
perdedor como carne para o almoço, mas eu chutarei o traseiro deles. Então não se preocupe.

— Perdedor? Isso magoa! — A luz da tocha brilhava no rosto abatido de Guerreiro, mas pouco
depois, ele estava erguendo alegremente sua espada. — Ei, nós quatro poderíamos lidar com um
dragão se tivesse um aqui!

— Gente, não estamos ansiosos demais? — murmurou Maga, fazendo Lutadora rir. As vozes do
grupo ecoaram, se misturando na caverna.

Sacerdotisa se manteve em silêncio, com medo, como se falar pudesse atrair algo da escuridão.
— Mas espero caçar um dragão algum dia — disse Maga. — Vocês não? — O sorriso mudo de
Sacerdotisa parecia concordar com Maga e com Guerreiro assentindo. Mas a escuridão escondia
uma expressão tão ambígua quanto a de Garota da Guilda.

Será mesmo?, perguntou ela a si mesma, mas não se atreveu a exprimir as suas dúvidas, mesmo
que o desconforto formasse uma tempestade dentro dela.

“Nós quatro poderíamos…” dissera ele, mas como Guerreiro poderia confiar plenamente em
pessoas que conhecia não faz nem dois dias? Sacerdotisa sabia que eles não eram pessoas más,
mas…

— Vocês têm certeza de que não devíamos ter nos preparados um pouco mais? — pressionou ela.
— Nós nem sequer temos p-p… poções.

— Também não temos dinheiro. Ou tempo para comprar isso — respondeu Guerreiro, com
bravata, sem prestar atenção ao tremor na voz de Sacerdotisa. — Estou preocupado com aquelas
garotas sequestradas… E de qualquer maneira, se um de nós for ferido você pode simplesmente
curar, não é?

— É verdade que tenho os milagres de cura e de luz… mas…

— Então vamos ficar bem!

Ninguém pôde ouvir Sacerdotisa dizer com uma voz ininteligível: — Mas eu só posso usar três
vezes…

— É ótimo que você esteja tão confiante e tudo mais — disse Lutadora — mas você tem certeza de
que não vamos nos perder?

— É um túnel longo. Como poderíamos nos perder?

— Não sei quanto a isso. Você se entusiasma tanto. Eu não posso tirar meus olhos de você nem por
dois segundos!

— Olha quem fala…

Lutadora e Guerreiro, que pertenciam à mesma cidade natal, entraram em uma das discussões que
eles partilhavam desde o início da viagem.

Sacerdotisa, seguindo atrás deles, se agarrou ao cajado com as duas mãos e repetiu o nome da Mãe
Terra em um murmuro.

— Por favor, nos guie em segurança através disso…

Ela rezou tão baixinho que suas palavras nem mesmo ecoaram, só adentraram na escuridão e
desapareceram.Talvez a Mãe Terra tenha ouvido sua oração, ou talvez Sacerdotisa só tenha sido
cuidadosa quando disse tais palavras.
— Vamos lá, se apresse. Mantenha a fila — repreendeu-a Maga.

— Ah, certo, desculpe…


Sacerdotisa foi a primeira a reparar.

Ela estava passando na frente de Maga, que a ultrapassou enquanto rezava, quando ouviu. Um som
de algo se deslocando, como uma pedra rolando.

Sacerdotisa deu um arranque.

— De novo? O que foi dessa vez? — perguntou Maga com aborrecimento quando alcançou mais
uma vez Sacerdotisa, que estava parada no lugar, tremendo.

Maga havia se formado entre os melhores de sua turma da academia na capital, onde ela aprendera
suas magias, e ela não gostava muito de sacerdotisas. A garotinha espantadiça no grupo deles fez
uma primeira impressão terrível, e desde que entraram na caverna, a opinião de Maga por ela só
piorou.

— A-agorinha, parecia que eu ouvi algo d-deslizando…

— Onde? Na nossa frente?

— N-não, atrás de nós…

Ah, por favor.

Isso não era cautela; era covardia. Essa sacerdotisa não possuía coragem de tomar as rédeas de sua
vida como um aventureiro precisava. Guerreiro e Lutadora foram ficando mais distantes à frente,
enquanto ela ficou lá. Ocupados com suas brincadeiras, os dois nem olharam para trás.

Uma luz cada vez mais distante atrás deles e apenas a escuridão se aprofundando adiante, Maga
soltou um suspiro.

— Olhe. Temos andado direto como uma flecha desde que entramos na caverna, certo? O que
poderia possivelmente estar atrá… — E então, seu tom frio e exasperado…

— Goblins!!

…se tornou um grito.

Não foi um desmoronamento que Sacerdotisa ouvira, mas de escavação.

Criaturas medonhas saltaram de um túnel e correram em direção a Maga, que teve o azar de ser a
última da fila.
Cada mão segurava uma arma rústica, e cada rosto tinha um olhar repulsivo. Esses eram os
habitantes de cavernas do tamanho de crianças.

Goblins.
— G-g-gggg…

De repente, ela foi incapaz de encontrar sua voz, Maga levantou seu cajado com ponta de granada
que recebeu na formatura.

Era um milagre que sua língua contorcida conseguisse formar as palavras da magia.

— Sagitta… inflammarae… radius! — Flecha de fogo, emerja!

Conforme ela puxou cada parte da magia de onde fora gravada nas profundezas de sua memória, as
palavras começaram a surgir; palavras com o poder de moldar a própria realidade.

Um raio de fogo brilhante em forma de flecha voou da granada do tamanho de um punho do seu
cajado, e atingiu um goblin no rosto. Houve um chiado nauseante e cheiro de carne queimada.

Esse já era!

A vitória trouxe uma onda de alegria que deixou um sorriso extravagante em seu rosto. Maga se
encheu de confiança de que se isso funcionou uma vez, funcionaria novamente.

— Sagitta… inflammarae… radiaaaaiii!!

Mas havia muitos goblins e apenas quatro membros no grupo. Antes que ela terminasse a magia,
um dos inimigozinhos agarrou seu braço. Ela nem teve tempo de reagir antes que o goblin a
socasse no chão irregular de pedra.

— Ouch! Ah…!

Seus óculos foram atirados de seu rosto e destruído, deixando sua visão embaçada. Um goblin
arrancou rapidamente seu cajado da mão.

— E-ei! Me devolva isso! Isso não é para tipos como v-você!

Um condutor mágico tal como um cajado ou anel era um salva-vidas do conjurador, mas mais do
que isso, era o seu orgulho.

Como se respondendo ao grito meio insano de Maga, o goblin segurou o cajado na frente de seus
olhos e o quebrou com um crac.

O rosto de Maga se retorceu em fúria, sua máscara de indiferença desapareceu.


— Por que, seu…!

Ela se contorceu no chão, lutando contra o seu captor com seus braços fracos e com seus peitos
grandes balançando. Isso não foi uma escolha sábia. O goblin irritado sacou sua adaga e a levou
com muita força no estômago dela.

— Ouuuchh?! — Ela deu um grito agoniada quando a lâmina perfurou suas entranhas.

É claro, os companheiros de Maga não estavam parados, nem mesmo Sacerdotisa.

— E-ei, todos vocês! Se afastem dela! Parem…! — Ela balançou seu cajado com seus braços
delicados, tentando expulsar os goblins para longe.

Existem alguns clérigos que são qualificados em artes marciais. Outros, tendo se aventurado
durante muito tempo, poderiam até se gabar de uma boa dose de força física.

Sacerdotisa não era um deles.

A forma como ela estava balançando loucamente seu cajado não estava atingindo nada, de
qualquer forma.

Cada vez que seu cajado de monge atingia a parede ou o chão, ele fazia um ruído de chocalho. E
para o bem ou para o mau, os goblins deram um passo atrás.

Talvez a tivessem considerado uma sacerdotisa guerreira, ou talvez eles apenas tenham tido medo
de ela atingir eles por pura sorte.

Seja qual for a razão, Sacerdotisa se aproveitou da abertura momentânea para afastar Maga deles.

— Seja forte! — gritou Sacerdotisa, praticamente sacudindo Maga. — Aguente firme…!

Mas não houve resposta. A mão de Sacerdotisa se afastou ensopada de sangue.

A lâmina enferrujada ainda estava enfiada no abdômen de Maga, com o rasgo brutal revelando suas
entranhas devastadas.

Sacerdotisa sentiu sua garganta fechar por causa da visão horrível, a respiração de Maga saiu como
um chiado tenso.

— Ah… Agh…

Mas ela estava viva. Se contraindo e convulsionando, mas viva.

Ainda havia tempo. Tinha de haver. Sacerdotisa mordeu forte os lábios.


Apertando seu cajado perto do peito, Sacerdotisa colocou a mão sobre as vísceras se espalhando de
Maga, como se fosse empurrá-las de volta no lugar e recitou as palavras do milagre:

— Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, coloque tua venerada mão sobre esta criança…

As magias podem afetar o funcionamento racional do mundo, mas Cura Menor é a genuína
intervenção divina.

Conforme a oração fazia efeito, a palma de Sacerdotisa começou a brilhar com uma luz suave que
pairou sobre Maga. Enquanto a luz começava a expandir, o estômago arruinado de Maga
gradualmente se recompunha à normalidade.

É claro que os goblins não eram do tipo que esperariam e deixariam isso acontecer.

— Malditos! Seus goblins imundos! Como se atrevem a fazer isso com elas!!

Guerreiro finalmente reparou o que se passava atrás dele e veio voando para cobrir suas
companheiras, cortando seus possíveis atacantes.

Ele havia jogado fora a tocha e agora segurava a espada firmemente com as duas mãos. Ele deu um
impulso, perfurando a garganta de um goblin.

— GUIA?!

— Quem é o próximo?

Ele arrancou a espada de sua primeira vítima, apanhando o segundo enquanto se virava. Ele cortou
completamente o goblin do ombro à cintura.

Com um jorro de sangue do goblin, Guerreiro deu um grande grito, embriagado pela sede de
sangue.

— Então, qual o problema?! Venham e me peguem!

Guerreiro era o segundo filho de um fazendeiro, e desde sua juventude, ele sonhava em se tornar
um cavaleiro. Como alguém poderia se tornar um cavaleiro, ele não sabia, mas ele tinha certeza de
que força era um dos pré-requisitos. Os cavaleiros nas histórias de ninar que ele ouvira sempre
derrotavam monstros, frustrando o mal e salvando o mundo. Aqui nessa caverna — batendo nesses
goblins, salvando donzelas indefesas e protegendo seus amigos — ele se viu finalmente um
cavaleiro.

Esse pensamento trouxe um sorriso ao seu rosto.

O poder percorria através das suas mãos, seu sangue bombeava em suas orelhas, tudo reduziu até
que ele conseguisse ver apenas o inimigo diante dele.
— Espera! Você não pode lidar com eles sozinho!

Ele ainda não era um verdadeiro cavaleiro.

Quando a voz de Lutadora alcançou seus ouvidos, Guerreiro viu uma das espadas gastas enfiada
em sua coxa.

— Ugh! Ora, seu…!

Foi o goblin que ele cortou através do peito. A lâmina sangrenta de Guerreiro não fora suficiente
para dar um golpe mortal.

Retirado da sua postura de combate, Guerreiro deu um segundo golpe no goblin, e dessa vez ele
morreu sem nem sequer gemer.

Mas, momentos depois, outro monstro estava chegando atrás dele…

— Tome isso! — Ele contra-atacou com a espada, mas ela atingiu a parede da caverna com uma
pancada estridente.

Era o último movimento que ele faria.

A tocha que ele largara no chão crepitou e apagou, e na escuridão que envolveu à sua volta, ele
ficou espantado com quão alto seu grito ecoou.

Sem uma família de renome e sem dinheiro, Guerreiro foi incapaz de investir em um escudo ou um
elmo; ele só possuía o peitoral de placas frágil para o proteger. Ele não tinha meios de se salvar dos
golpes viciosos dos goblins.

— Não… não pode ser!

Lutadora não conseguiu chegar ao inimigo a tempo. Enquanto observava o jovem por quem tinha
tanto apreço morrer, ela ficou pálida e imóvel.

Tudo o que ela podia fazer era formar suas duas mãos trêmulas em punhos e tomar uma posição de
combate.

— Vocês duas, corram.

— M-mas…! — protestou debilmente Sacerdotisa, mas ela sabia que seria inútil. Apesar dos
cuidados de Cura Menor, Maga em seus braços mal estava responsiva, sua respiração era curta e
superficial.

A horda de goblins estava se aproximando, fixada em suas presas restantes. Eles ainda estavam
cautelosos com Lutadora, mas eles avançariam sobre ela em pouco tempo.
Sacerdotisa olhou para Maga e Lutadora, e depois olhou horrorizada para os goblins ainda
maltratando o corpo caído de Guerreiro.

Vendo que suas companheiras ainda não se moveram, Lutadora estalou a língua. Então ela deu um
grito ressoante, avançando contra a multidão de monstros.

— Hi-yaaaaah!

Seus punhos e pés eram flexíveis e rápidos. Seu próprio pai a treinara antes de morrer, e agora ela
demonstrava a própria essência de sua arte.

Ela não morreria aqui. A arte de seu pai não podia perder para tais inimigos patéticos.

Enquanto eu viver, nunca perdoarei vocês por matar aquele garoto!

Seu coração e mente corroboraram seu treinamento quando ela levou seu punho direto no plexo
solar de um goblin.

Ela empurrou seu inimigo para o lado quando ele caiu no chão vomitando, depois acertou ele com
um único golpe faca de mão em seu pescoço quando ela girou.

Golpe crítico.

O golpe terrível no pescoço deixou a cabeça do goblin inclinada em um ângulo impossível quando
ele desabou.

No mesmo momento, ela foi para o espaço deixado pelo seu corpo e usou o impulso para dar um
chute em arco no ar à frente dela. Seu chute giratório rigorosamente controlado acertou mais dois
goblins, os matando antes que alcançassem o chão…

— O qu…?!

Mas, um terceiro goblin pegou facilmente sua perna e prendeu o seu tornozelo.

O rosto de Lutadora empalideceu, e ele começou a apertar.

Os goblins deveriam ter o tamanho de crianças… não era?

— HUURRRRGH!

A criatura, cujo hálito rançoso passou por ela enquanto se contorcia, era gigante.

Ela não era uma garota pequena, e mesmo assim teve que levantar a cabeça para olhar esse inimigo
nos olhos. A dor em seu pé aumentava cada vez mais até que arrancou um grito de seus lábios.

— Ahh… a-arrrrgh… me… deixe… ir-aaah!!


Com a perna de Lutadora presa, o goblin a bateu casualmente contra à parede. Houve um som
distante e ríspido de alguma coisa partindo.

Lutadora desmaiou sem sequer gemer, então ela estava inconsciente quando o goblin a balançou e
bateu contra a parede oposta.

— Hrr, guhhh…?!

Ela fez um som que quase não era humano, vomitando com sangue quando foi jogada no chão.
Então o resto da horda se jogou sobre ela.

— Ugh! Urrgh! Ya… yaaah! Ugh!

Os goblins acertaram Lutadora com suas clavas, surdos aos seus gritos, até que arrancaram suas
roupas e as jogaram para longe.

Os goblins mostraram a mesma misericórdia para os aventureiros invasores, tal como o grupo tinha
a intenção de lhes mostrar.

Atormentada pela sua horrível provação, Lutadora deu um grande grito agudo, mas dentro dele,
Sacerdotisa tinha a certeza de que conseguiu entender as palavras.

— Fujam! Depressa!

— Eu… eu sinto muito…!

Tampando os ouvidos para os ecos na caverna dos goblins violando sua companheira, Sacerdotisa
pegou Maga e partiu em retirada, tropeçando.

Correr. Correr. Correr. Tropeçar, então se recompor e correr ainda mais.

Através da escuridão ela ia, escorregando em cada pedra, mas nunca parando.

— Me desculpe…! Me… desculpe! Por favor me… me perdoe…! — As palavras saíram dela em
suspiros irregulares.

Não havia mais luz. Ela sabia que estavam sendo perseguidas cada vez mais e mais fundo na
caverna, mas o que ela podia fazer?

— Ahh… ah…
Os passos dos goblins, se aproximando cada vez mais a cada eco, era o que mais aterrorizava ela.

Parar agora seria tolice e ela não podia voltar pelo caminho que veio. Mesmo que pudesse, ela não
iria ver nada mais do que tristeza.

Agora ela compreendia a expressão ambígua da recepcionista da guilda.

Sim, os goblins eram fracos. Seu grupo de aventureiros ansiosos — seu Guerreiro, sua Maga, sua
Lutadora — sabiam disso. Goblins eram tão altos, inteligentes e fortes quanto uma criança humana.
Tal como eles ouviram.

Mas o que acontecia quando crianças pegavam armas, planejavam o mal, procuravam matar e
viajavam em grupos fortes de dez?

Eles nem sequer consideraram isso.

O grupo deles era fraco, inexperiente, não familiarizado com o combate, não possuíam dinheiro ou
sorte, e o mais importante, eles estavam esmagadoramente em menor número.

Era um erro comum, do tipo que se ouvia o tempo todo.

— Ah!

As mangas compridas de Sacerdotisa finalmente se enroscaram em suas pernas e ela caiu


indelicadamente no chão. Seu rosto e suas mãos ganharam arranhões generosos, mas muito pior,
ela não conseguiu manter Maga em seus braços.

Sacerdotisa se apressou para puxá-la de volta, uma garota que nem sequer conhecia alguns dias
atrás.

— E-eu sinto muito! Você está bem?!

— Ur, hrrg…

Em vez de uma resposta, saliva salpicada com sangue emergiu da boca de Maga.

Sacerdotisa esteve tão concentrada em correr, que não reparou que Maga começara a tremer
violentamente. Parecia que o corpo inteiro dela estava em chamas, e suor encharcava sua capa
grossa.
— Por-por quê…?

Sacerdotisa destinou a pergunta diretamente para si. Sua oração não alcançou à deusa?

Afligida por essa preocupação, Sacerdotisa usou um tempo precioso para tirar as roupas externas
de Maga e verificar a ferida.

Mas o milagre funcionou como previsto. O abdômen de Maga estava encharcado de sangue, mas
estável. A ferida desaparecera.

— A-ahn, n-nessas… nessas horas, o que devo…?

Sua mente estava em branco.

Ela sabia um pouco de primeiros socorros. E ainda podia usar seus milagres.

Mas outro milagre de cura iria realmente ajudar? Havia mais alguma coisa que deveria tentar?
Aliás, em seu estado miserável, ela conseguiria se concentrar o suficiente para fazer uma petição
efetiva à deusa?

— Ahh? Aaahh!

O momento que ela desperdiçou fora o que contava. Sacerdotisa quase desmaiou quando uma dor
súbita a afligiu.

Ela ouviu um assobio — alguma coisa em alta velocidade? — e depois seu ombro esquerdo se
preencheu com uma dor ardente. Ela olhou para ele e viu uma flecha enfiada no fundo de sua
carne. Sangue escorria e manchava suas vestes.

Sacerdotisa não estava usando nenhuma armadura. A flecha rasgara selvagemente suas roupas e
adentrou sob seu ombro adorável. Os preceitos proibiam excesso de armadura, e ela não possuía
dinheiro de qualquer modo. Agora, cada pequeno movimento parecia amplificado cem vezes, e
provocavam um ardor e dor como se ela fora perfurada com ferro ardente.

— Aaaaghh…!

Tudo o que ela podia fazer era cerrar os dentes, manter as lágrimas em seus olhos e olhar
atentamente para os goblins.

Dois monstros armados se aproximavam. Sorrisos perversos dividiam seus rostos; fios de baba se
penduravam nos cantos de seus lábios.

Seria melhor se pudesse morder sua própria língua e morrer. Mas sua deusa não permitia o
suicídio, e ela parecia destinada a ter a mesma sorte que seus amigos.

Será que eles a rasgariam? Ou a violariam? Ou os dois?


— Ohh… não…

Ela tremia; seus dentes começaram a ranger, impotentes.

Sacerdotisa puxou Maga para perto, usando seu próprio corpo para proteger sua companheira, mas,
de repente, ela sentiu algo quente e molhado em suas pernas. Os goblins pareciam ter sentido o
cheiro, e seus rostos se contorceram de nojo.

Sacerdotisa repetiu desesperadamente o nome da Mãe Terra, tentando evitar ver o que estava
diante dela.

Não havia esperança.

Mas então…

— O qu…?

Nas profundezas da escuridão, surgiu uma luz.

Parecia como uma estrela da noite brilhando orgulhosamente contra o crepúsculo invasor.

Um único ponto de luz, sempre-tão-pequeno, mas vividamente brilhante, e ele se aproximava


progressivamente.

A luz era acompanhada pelos passos calmos e determinados de alguém que não tinha quaisquer
dúvidas sobre onde estava indo.

Os goblins olharam para trás, confusos. Seus amigos haviam deixado uma presa escapar?

E então, logo atrás dos goblins, ela o viu.

Ele não era muito impressionante.

Ele usava uma armadura de couro suja e um elmo de aço imundo. No seu braço esquerdo, um
escudo estava preso e na sua mão estava uma tocha. Sua mão direita segurava uma espada que
parecia ter um comprimento estranho. Sacerdotisa não pôde deixar de pensar que seu próprio grupo
terrivelmente despreparado parecia mais bem preparado do que ele.

Não, ela queria gritar, se afaste! Mas o terror paralisou sua língua, e ela não conseguiu gritar. Ela
estava profundamente humilhada por lhe faltar a coragem de Lutadora.

Os dois goblins se viraram para o recém-chegado, não demonstrando nenhuma relutância em


mostrar suas costas para Sacerdotisa impotente. Eles lidariam com ela mais tarde. Um deles
colocou uma flecha na corda do arco, puxou e disparou.

Era uma flecha rústica com a ponta de pedra. E o goblin era francamente um arqueiro terrível.
Mas, a escuridão é a aliada dos goblins.

Ninguém poderia esquivar de uma flecha que voava repentinamente da escuridão…

— Hmph.

Mesmo enquanto dava um bufo escarnecedor, o homem cortou o projétil no ar com um golpe
rápido de sua espada.

Incapaz de compreender a implicação do que aconteceu, o segundo goblin avançou na direção do


homem. A criatura empunhava a única arma que carregava, outra das adagas enferrujadas dos
monstros. Sua lâmina encontrou uma fenda no ombro do homem e enfiou nela.

— Nããão!

Sacerdotisa deu um grito, mas não houve outro som. O golpe do goblin fez apenas um som baixo
de metal raspando metal.

A lâmina foi parada pela malha sob a armadura de couro do homem.

O goblin desnorteado forçou ainda mais sua lâmina. O recém-chegado aproveitou a oportunidade.

— GAYOU?! — O goblin gritou quando o escudo do homem bateu nele com um som seco e o
prensou contra a pedra.

— Você primeiro… — disse friamente o homem.

Seu significado ficou claro quando ele pegou sua tocha e a levou calmamente para o rosto do
goblin.

Houve um grito insuportável e abafado. O cheiro de carne queimada preencheu a caverna.

O goblin lutou, meio enlouquecido com a dor, mas preso pelo escudo, ele nem sequer conseguia
agarrar seu próprio rosto.

Finalmente, ele parou de se mover, seus membros caíram inanimadamente no chão. O homem se
certificou de que o monstro estava imóvel, então puxou lentamente seu escudo.

Houve um grande humph quando o goblin tombou ao chão, com o rosto queimado.

O homem deu ao monstro um pontapé casual, rolando seu corpo, e então entrou mais fundo na
caverna.

— Próximo.

Foi um espetáculo bizarro. Sacerdotisa já não era mais a única que estava aterrorizada.
O goblin com o arco deu um passo inconscientemente para trás, parecendo — compreensivelmente
— disposto a abandonar seu companheiro e fugir. Coragem, afinal, é a última palavra que alguém
associaria a um goblin.

Mas agora Sacerdotisa estava atrás dele.

Ela exalou abruptamente. E dessa vez, ela conseguiu se mover. Ela poderia ter uma flecha no
ombro, um goblin na frente dela, suas pernas esgotadas e sua companheira inconsciente a
pressionando para baixo, mas ela se moveu.

Com seu braço livre, Sacerdotisa levou o seu cajado de monge ao goblin.

Foi um gesto sem sentido. Ela não teve realmente a intenção de o fazer, agiu por instinto.

Mas foi mais que suficiente para fazer o goblin parar por um instante.

Naquele instante, a criatura pensou mais freneticamente sobre o que fazer do que alguma vez o fez
em toda sua vida. Mas antes que ele pudesse tomar uma decisão, sua reação incompleta se chocou
contra a parede de pedra, impulsionado pela espada que o guerreiro armadurado lançou através
dele.

Metade da cabeça do goblin permaneceu na parede. A outra metade com o resto dele, desabou no
chão.

— Já são dois.

A luta brutal terminou, ele pisou com sua bota no cadáver do goblin morto.

Ele estava manchado com o sangue carmesim do monstro, do seu elmo de aço sujo e armadura de
couro, até a malha feita de anéis metálicos encadeados que cobriam todo o seu corpo.

Um pequeno escudo surrado estava fixado em seu braço esquerdo, e em sua mão, ele segurava uma
tocha ardente.

Com seu calcanhar contra o cadáver da criatura, ele abaixou sua mão livre e retirou casualmente a
espada de seu crânio. Era uma lâmina de aparência barata, com um comprimento mal concebido, e
agora estava encharcada de cérebro de goblin.

Deitada no chão com uma flecha no ombro, o corpo magro de uma menina tremia de medo. Seu
clássico rosto adorável e doce, emoldurado pelos longos e quase translúcidos cabelos cor de ouro,
estava franzido com uma junção de lagrimas e suor.

Seus braços magros, seus pés; todo seu corpo deslumbrante estava com as vestimentas de uma
sacerdotisa. O som do cajado de monge que ela agarrou ressoou, com seus anéis pendurados
batendo uns contra os outros com suas mãos trêmulas.

Quem era esse homem diante dela?


Tão estranha era sua aparência, a aura que o ocultava, que ela imaginava que ele pudesse ser
mesmo um goblin; ou talvez algo muito pior, algo que ela ainda não tinha conhecimento.

— Que-quem é você…? — perguntou ela, suprimindo seu terror e dor.

Após uma pausa, o homem respondeu: — Matador de Goblins.

Um assassino. Não de dragões ou de vampiros, mas o mais simples dos monstros: goblins.

Normalmente, o nome poderia parecer comicamente simples. Mas para Sacerdotisa, naquele
momento, era tudo, menos engraçado.
Como ela deveria olhar para o homem — Matador de Goblins — enquanto se sentava atônita,
esquecendo até a dor em seu ombro? Ele se aproximou até que pairasse sobre ela, assustando
Sacerdotisa e a fazendo tremer.

Mesmo agora, tão próximo e com a tocha o iluminando, sua viseira escondia seu rosto e ela não
podia ver os olhos dele. Era como se a armadura estivesse cheia com a mesma escuridão da
caverna.

— Você acabou de se registrar? — perguntou calmamente Matador de Goblins, notando a insígnia


pendurada em seu pescoço. Ele também possuía uma. Ele balançou suavemente a luz da tocha, que
ele colocara no chão. A cor refletida vagamente naquela pequena reminiscência de luz, era uma
incontestável prata.

Sacerdotisa soltou um pequeno “Oh…”. Ela sabia o que essa cor significava. Era a terceira maior
posição no ranque do sistema de dez níveis da guilda.

Apenas algumas pessoas na história alcançaram o ranque platina, e os de ranque ouro normalmente
trabalhavam para o governo nacional, mas depois deles vinham os pratas, indicando alguns dos
mais hábeis aventureiros não afiliados que exerciam seus ofícios independente.

— Você é… ranque prata. — Ele era um veterano experiente que dificilmente poderia estar mais
distante de Sacerdotisa ranque porcelana.

“Eu tenho certeza de que se vocês esperarem um tempo, outros aventureiros irão aparecer…”

Poderia ter sido esse o aventureiro sobre quem Garota da Guilda havia falado?

— Então você consegue falar.

— Hã?

— Você tem sorte.

As mãos de Matador de Goblins se moveram tão facilmente, que ela não teve tempo de reagir.

— O qu…? Ahh!

A ponta da flecha rasgou a carne dela quando ele a puxou, a onda súbita de dor deixou Sacerdotisa
sem fôlego. Sangue fluiu da ferida enquanto os olhos dela se enchiam de lágrimas.
Com o mesmo jeito casual, Matador de Goblins alcançou uma bolsa em seu cinto e pegou um
frasco pequeno.

— Beba isso.

Através do vidro claro, ela viu um líquido verde que emitia uma fosforescência suave: uma poção
de cura.

Justo o que Sacerdotisa e seu grupo precisavam, mas não possuíam dinheiro nem tempo de
comprar.

Ela poderia ter simplesmente pegado ele, mas, em vez disso, olhou para frente e para trás, entre o
frasco e Maga ferida.

— S-senhor! — Para sua surpresa, quando ela conseguiu fazer sua voz funcionar mais uma vez, as
palavras brotaram dela. — N-não podemos dar a ela? Meu milagre não conseguiu…

— Onde ela está ferida? O que aconteceu?

— F-foi uma adaga… em seu estômago…

— Uma adaga…

Matador de Goblins sentia que o abdômen de Maga, de certo, estava bem. Quando cutucou ele com
um dedo, ela tossiu mais sangue. Ao longo do seu exame rápido, ele nem sequer olhou para
Sacerdotisa, que abraçava de forma protetora Maga. Então ele disse sem rodeios: — Desista.

Chocada, Sacerdotisa ficou pálida e engoliu em seco. Ela abraçou mais forte Maga.

— Olhe. — Matador de Goblins tirou a adaga ainda alojada na malha sob seu ombro. Um líquido
viscoso e escuro que ela não conseguia identificar estava cobrindo toda a lâmina.

— Veneno.

— V-veneno…?

— Eles o fazem a partir de uma mistura de suas próprias salivas e excrementos, juntamente com
ervas que eles encontram na natureza.

“Você tem sorte.”

Sacerdotisa engoliu em seco outra vez quando o significado completo das palavras de Matador de
Goblins vieram à tona.

Foi sorte a ponta da flecha não ter sido mergulhada em veneno, senão ela não estaria aqui. Foi sorte
o goblin com a adaga não ter a atacado primeiro…
— Quando esse veneno entra no organismo, primeiro a pessoa terá problemas respiratório. Sua
língua começará a espasmar, depois todo seu corpo. Logo, se desenvolverá uma febre, perderá a
consciência e então morrerá.

Ele limpou a lâmina lascada com a tanga do goblin e a escondeu no cinto, então murmurou por
dentro do capacete: — Eles são criaturas muito traiçoeiras.

— S-se ela foi envenenada, só precisamos a curar, certo…?

— Se você quer dizer um antídoto, então eu tenho um, mas o veneno está nela há muito tempo. É
tarde demais.

— Oh…!

Nesse momento, os olhos ondulados de Maga se focalizaram muito brevemente. Ela gorgolejou
com o sangue em sua garganta, e com os lábios tremendo, formou palavras sem som, sem voz. —
… e… ate…

— Entendido.

Não muito tempo depois que disse isso, Matador de Goblins cortou a garganta de Maga.

Maga espasmou, deu um gemido baixo, então tossiu um bocado de sangue espumento e morreu.

Inspecionando a lâmina, Matador de Goblins estalou a língua quando viu que foi embotada pela
gordura.

— Não fique triste — disse ele.

— Como pode dizer isso?! — exclamou Sacerdotisa. — Talvez… talvez nós ainda pudéssemos
ter… ajudado ela… — Ela apertou o corpo de Maga, que estava flácido e sem vida.

Mas…

Ela não conseguia achar o resto das palavras. Maga realmente esteve além da salvação? E se assim
fosse, a matar seria uma gentileza? Sacerdotisa não sabia.

Ela só sabia que ainda não conseguira o milagre de cura, o qual neutralizava venenos. Havia um
antídoto aqui, mas pertencia ao homem à frente dela. Não era dela para fazer o que quisesse.
Sacerdotisa se sentou tremendo no chão, incapaz de beber a poção ou mesmo de se levantar.

— Ouça — disse bruscamente Matador de Goblins. — Esses monstros não são brilhantes, mas
também não são tolos. Eles foram ao menos, inteligentes o suficiente para eliminar primeiro seu
conjurador. — Ele fez uma pausa, depois apontou. — Olhe ali.
Pendurado na parede, estava um rato morto e uma pena de corvo. — Isso são totens dos goblins.
Há um xamã aqui.

— Um xamã…?

— Você não sabe nada sobre xamãs?

Sacerdotisa balançou a cabeça com dificuldade.

— Eles são conjuradores. Melhores do que sua amiga aqui.

Goblins conjuradores? Sacerdotisa nunca ouviu falar em tal coisa. Se tivesse, talvez seu grupo
ainda estivesse vivo…

Não.

Ela se resignou ao pensamento em seu coração. Mesmo que soubessem, eles não teriam
considerado esses xamãs algo para se temer. Goblins eram presas fracas, uma forma de os
aventureiros novos adquirirem experiência.

Ou assim ela acreditava até mais cedo naquele dia.

— Você viu algum grandão? — Matador de Goblins analisou seu rosto novamente, enquanto se
ajoelhava no chão.

Dessa vez — mesmo que mal — ela pôde ver seus olhos. Uma luz fria, quase mecânica, brilhava
dentro desse capacete sujo.

Sacerdotisa se agitou e se tensionou, perturbada pelo olhar implacável que a olhava de dentro do
elmo. Ela de repente se lembrou da umidade quente em suas pernas.

Ela fora atacada por goblins, assistiu seus amigos morrerem em instantes, viu sua equipe
praticamente aniquilada e ela sobrevivera sozinha.

Parecia irreal.

A dor latejante em seu ombro e a humilhação de se molhar, por outro lado, era inegável.

— S-sim, havia um… eu acho… Ficar só fugindo, me tomou toda concentração que tinha… — Ela
balançou fracamente a cabeça, tentando trazer a memória ofuscada.

— Esse era um hobgoblin. Talvez eles tenham pegado um viajante como guarda.

— Um hob… Você quer dizer uma fada do lar?

— Parente distante.
Matador de Goblins verificou suas armas e armadura, depois se levantou. — Eu seguirei o túnel
deles. Tenho que lidar com eles aqui.

Sacerdotisa levantou os olhos para ele. Ele já estava olhando para longe dela, encarando a
escuridão à frente.

— Você consegue voltar sozinha ou vai esperar aqui?

Ela se agarrou a seu cajado de monge com as mãos exaustas, forçando suas pernas trêmulas se
levantar, com lágrimas nos olhos.

— Eu… vou… com você!

Era a sua única opção. Ela não suportaria voltar sozinha e nem ser deixada ali sozinha.

Matador de Goblins assentiu. — Então beba a poção.

Quando Sacerdotisa tomou o medicamento amargo, o calor em seu ombro começou a desaparecer.
A poção continha pelo menos dez ervas diferentes e não faria nada espetacular, mas ia parar a sua
dor.

Sacerdotisa deu um suspiro aliviada. Foi a primeira vez que ela bebeu uma poção.

Matador de Goblins a observou uma última vez. — Muito bem — disse ele, então partiu para a
escuridão. Não havia qualquer hesitação em seus passos; ele nunca parou para olhar para ela. Ela
correu para conseguir o acompanhar, com medo de ficar para trás.

Enquanto avançavam, ela lançou um olhar para trás. De volta a imóvel e silenciosa Maga.

Não havia nada que Sacerdotisa pudesse dizer. Mordendo os lábios, ela curvou bem a cabeça e
jurou voltar pela sua amiga.
De alguma forma eles não encontraram nenhum goblin na curta caminhada ao túnel. Eles haviam,
no entanto, encontrado pedaços horríveis de carne espalhados ao redor. Talvez tenham sido outrora
de humanos. Não havia como saber. Havia sangue suficiente na pequena caverna para se engasgar,
e o seu cheiro se misturava com o odor espesso das vísceras espalhadas.

— Err, eurrggh…

Sacerdotisa avistou o corpo de Guerreiro, caindo reflexivamente de joelhos e vomitando.

Parecia que sua última refeição de pão e vinho havia acontecido há anos. Aliás, parecia ter passado
uma eternidade desde que Guerreiro a convidou para essa aventura.

— Nove… — acenou Matador de Goblins. Ele estava contando os corpos dos goblins,
imperturbado com a cena à volta deles.

— A julgar pela dimensão do ninho, deve haver menos da metade sobrando.

Ele pegou a espada e a adaga do corpo de Guerreiro e as pendurou em seu próprio cinto. Ele
verificou as outras vítimas dos goblins também, mas aparentemente não encontrou nada que o
satisfizesse.

Sacerdotisa, limpando a boca, lhe deu um olhar reprovador, mas ele não parou.

— Quantos de vocês havia?

— O quê?

— Garota da Guilda só disse que alguns novatos tinham ido caçar goblins.

— Havia quatro de… Oh! — gritou ela acidentalmente, limpando furiosamente a boca com as duas
mãos. — M-minha outra membro do grupo…! — Como ela pôde ter esquecido?

Ela não viu o corpo de Lutadora. Ela, que havia se sacrificado, sofrendo coisas indescritíveis para
salvar os outros, não estava em lugar algum.

— Uma garota?

— Sim…
Matador de Goblins segurou a tocha mais perto e vasculhou cuidadosamente o chão da caverna.
Havia pegadas frescas, sangue, um líquido sujo e uma trilha, como se algo tivesse sido arrastado
pelo chão.

— Parece que a levaram mais para dentro. Não posso dizer se ela está viva ou não — disse ele,
tocando vários fios longos de cabelo aos quais restos de peles continuavam agarrados.

Sacerdotisa se levantou debilmente. — Então temos de salvá-la…

Mas, Matador de Goblins não respondeu. Ele acendeu uma tocha nova, depois jogou a velha em
um túnel lateral. — Goblins tem excelente visão noturna. Mantenha ela acesa. A escuridão é nossa
inimiga… Ouça.

Ela obedeceu, esforçando seus ouvidos para qualquer som.

Da escuridão além da chama da tocha, havia passos, pá-pá-pá.

Um goblin! Vindo provavelmente para investigar a luz da tocha.

Matador de Goblins pegou uma das adagas do cinto e a lançou na escuridão.

Houve um som ríspido como algo sendo perfurado. O corpo de um goblin se lançou na luz fraca da
tocha. Quando o viu, Matador de Goblins avançou e levou sua espada através do coração da
criatura. O goblin morreu sem fazer um barulho, pois a adaga atravessara sua garganta. A coisa
toda aconteceu quase que rápido demais para acompanhar.

— Dez.

Quando Matador de Goblins o adicionou a sua contagem, Sacerdotisa olhou para o túnel e
perguntou timidamente: — Você também consegue ver no escuro?

— Quase nada.

Matador de Goblins não se importou em recuperar a lâmina empapada de gordura do cadáver. Em


vez disso, ele pegou a espada que Guerreiro trouxera, estalando sua língua quando viu que era
longa demais para os tuneis estreitos.

Depois ele pegou a lança do goblin que acabou de matar. Era feita grosseiramente de ossos de
animais, mas uma lança para um goblin era apenas um pouco mais longa que uma faca para um
homem adulto.

— É apenas prática. Eu sei exatamente onde os seus pescoços estão.

— Prática? Quanta prática…?

— Muita.
— Muita?

— Você está perguntando demais, não acha?

Sacerdotisa ficou calada. Ela abaixou a cabeça envergonhada.

— O que você consegue usar?

— Como? — Ela levantou apressadamente a cabeça novamente, não entendendo o que ele queria
dizer.

Matador de Goblins nunca deixou sua atenção vacilar do túnel enquanto falava. — Quais milagres?

— Eu tenho Cura Menor e Luz Sagrada, senhor.

— Quantos usos?

— Três no total. Eu… eu tenho dois sobrando. — Não era nada extraordinário, mas Sacerdotisa era
uma das iniciantes mais talentosas. Já era uma conquista o simples fato de conseguir rezar para a
deusa, fazer um pedido e ser concedido um milagre. E depois, poucas pessoas conseguiam suportar
unir sua alma com a deusa repetidamente. Isso exigia experiência.

— Isso é consideravelmente mais do que eu esperava — disse ele. Isso era um elogio, ela supôs,
mas ela teve dificuldades em aceitar. Seu tom era ordeiro e frio, mal revelando qualquer emoção.

— Luz Sagrada, então. Cura Menor não nos ajudará nada aqui. Não desperdice seus milagres com
ela.

— S-sim, senhor…

— Esse que matamos era um batedor. Estamos no túnel certo.

Com a ponta da lança, ele apontou mais a fundo para o buraco do qual o goblin viera. — Mas, seu
batedor não vai voltar. Nem os que mataram seu grupo. Eu acabei com eles.

Sacerdotisa ficou calada.

— O que você faria?

— O quê?

— Se você fosse um goblin. O que faria?

Com a pergunta inesperada, Sacerdotisa tocou seu dedo esguio contra o queixo, pensando a pleno
vapor. O que ela faria se fosse um goblin?
Sua mão, que uma vez ajudara com os serviços no templo, parecia muito branca para ser a de uma
aventureira.

— …Armar uma emboscada?

— Exatamente — disse Matador de Goblins, com sua voz calma. — E vamos cair nela. Se prepare.

Sacerdotisa empalideceu, mas assentiu.

Matador de Goblins tirou um rolo de corda e algumas estacas de madeira e as colocou a seus pés.

— Eu tenho um mantra para você — disse ele, sem tirar os olhos do seu trabalho. — Se lembre. As
palavras são entrada do túnel. Se as esquecer, você morre.

— S-sim, senhor! — Sacerdotisa agarrou seu cajado de monge com ambas as mãos.

Entrada do túnel, entrada do túnel, repetiu ela desesperadamente para si mesma.

A única coisa em que ela podia confiar era nesse homem misterioso que se chamava de Matador de
Goblins. Se ele a abandonasse, então ela, Lutadora e as meninas raptadas da aldeia estariam
perdidas.

Um momento depois, Matador de Goblins terminou seus preparativos. — Vamos.

Sacerdotisa o seguiu o mais rápido que pôde, passando pela corda e entrando no túnel.

O túnel era notadamente firme, não algo que parecia ter sido construído apenas para montar um
ataque surpresa. A cada passo, terra caía das raízes das árvores que haviam transpassado pelo teto,
mas não parecia haver nenhum risco de colapsar. Contudo, o declive gradual deixava Sacerdotisa
desconfortável. Humanos não pertenciam a esse ambiente.

Ela devia ter percebido desde o início, e agora que se deu conta, era tarde demais: os goblins
passam a vida inteira no subsolo. Verdade, eles não eram nada como os anões, mas, porque ela e
os outros subestimaram os goblins tão mal só porque não eram fisicamente fortes?

Bem, é tarde demais para arrependimentos…

Sacerdotisa pisava cuidadosamente sob a luz tênue da tocha. Ela olhou para as costas de Matador
de Goblins. Seus movimentos não mostravam nenhuma hesitação ou medo. Será que ele sabia o
que estava adiante?

— Estamos quase lá. — Ele parou de repente, e Sacerdotisa quase se chocou nele. Ela se endireitou
mais rápido do que ele conseguiria se virar com seus movimentos mecânicos.

— Agora, Luz Sagrada.


— S-sim, senhor. Estou pronta… quando você estiver.

Ela respirou fundo e expirou. Então ela segurou seu cajado, firmemente no lugar. Matador de
Goblins também ajustou suas mãos na tocha e na lança.

— Faça.

— Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, conceda tua luz sagrada para nós que estamos
perdidos na escuridão…

Matador de Goblins avançou enquanto Sacerdotisa levantava seu cajado em direção a escuridão. A
ponta começou a resplandecer com uma luz que se tornou tão brilhante quanto o sol. Um milagre
da Mãe Terra.

Com a luz em suas costas, Matador de Goblins entrou rapidamente no cômodo dos monstros.

Talvez eles só tivessem se apropriado da maior caverna nesse complexo de cavernas. Os goblins
esperando na sala mal construída apareceram na vista.

— GAUI?

— GORRR?

Havia seis goblins lá, bem como um dos grandões e um sentado em uma cadeira, usando uma
caveira na cabeça. Os monstros estreitaram os olhos contra a súbita luz pura, uivando em confusão.

Também lá, deitadas e imóveis, estavam várias moças.

Alguma coisa sombria, sem dúvida, estava acontecendo naquele lugar.

— Seis goblins, um hob e um xamã, oito no total. — Matador de Goblins contou seus oponentes
sem mostrar qualquer tremor em sua voz.

É claro, nem todos os goblins estavam fechando os olhos e lamentando.


— OGAGO, GAROA… — O xamã sentado no trono agitou seu cajado e recitou uma magia
ininteligível.

— GUAI? — Ele foi interrompido pela lança de Matador de Goblins o perfurando no peito. Ele
estrebuchou e tombou para trás de sua cadeira.

Os goblins ficaram paralisados com essa tragédia, e Matador de Goblins aproveitou o momento. A
espada de Guerreiro ressoou quando Matador de Goblins a liberou da bainha.

— Muito bem, vamos sair daqui.

— O quê?! S-sim, senhor!

Mesmo enquanto falava, Matador de Goblins já estava se virando e correndo. Chocada com sua
velocidade e sem saber o que fazer, Sacerdotisa o seguiu. Os goblins recuperaram seus juízos
quando a luz recuou e logo começaram a persegui-los.

No espaço de uma respiração, Matador de Goblins já estava muito à frente de Sacerdotisa enquanto
ela corria para o declive. Ele estava acostumado a tomar o papel de vanguarda e de retaguarda, ou
isso era o resultado de um enorme treinamento e experiência? Seja como for, era incrível para ela
que ele pudesse ser tão ágil enquanto vestido com uma armadura de couro e malha, com sua visão
limitada pelo capacete.

Foi quando o viu saltar ligeiramente na entrada do túnel que as palavras de seu mantra voltaram
preenchendo sua mente. — Oh não…! — Ela esquivou por pouco do fio armadilhado no chão.
Matador de Goblins já estava encostado na parede, e Sacerdotisa se apressou para fazer o mesmo
no lado oposto.

— GUIII!!

— GYAA!!

Eles conseguiam ouvir as vozes enfurecidas e os passos pesados dos goblins subindo o declive.
Sacerdotisa deu uma espreitadela furtiva e viu um corpo brutamonte à frente do grupo: o
hobgoblin.

— Agora! Faça de novo! — Matador de Goblins lançou essas palavras para ela.

Sacerdotisa deu um aceno e esticou seu cajado com os símbolos de seu sacerdócio para o túnel. Ela
falou as palavras da oração sem gaguejar.
— Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, conceda tua luz sagrada para nós que estamos
perdidos na escuridão…

Misericordiosa era a luz da Mãe Terra para eles, mas não para os olhos dos goblins, que
queimaram com seu esplendor.

— GAAU?!

O hobgoblin cegado tropeçou no fio armadilhado e tomou um tombo desajeitado.

— Onze. — Matador de Goblins saltou nele e golpeou implacavelmente sua espada no cérebro da
criatura. Ela gorgolejou uma vez, duas vezes, depois espasmou e morreu.

— A-aí vem os outros! — chamou Sacerdotisa. Ela estava sem milagres, e a repetição do ritual
consome-alma a deixou enfraquecida, com o rosto pálido pelo esforço.

— Eu sei. — Matador de Goblins puxou uma garrafa de sua bolsa e jogou contra o corpo do
hobgoblin. Ela quebrou, liberando uma substância preta e espessa de dentro. O cheiro enjoativo fez
Sacerdotisa pensar que talvez fosse algum veneno desconhecido.

— Vejo vocês no inferno.

Matador de Goblins chutou o corpo encharcado para o túnel. Os goblins se aproximando,


apanhados de surpresa pelo pedaço de carne rolando na direção deles, acertaram suas espadas nele.

Foi uma reação instintiva. Quando perceberam que era o seu próprio guardião que haviam
apunhalado, eles entraram em pânico. Os goblins lutaram para extrair suas armas, enfiadas no
fundo da carne do hobgoblin e agora cobertas pela substância preta…

— Doze, treze.

Era tarde demais para eles.

Sem uma pitada de remorso, Matador de Goblins lançou a tocha no túnel com eles. Houve
um ssssss quando o cadáver do hobgoblin pegou fogo, apanhando dois dos seus perseguidores com
isso.

— GYUIAAAAAA!! — Os goblins gritaram esbracejados no chão, queimando enquanto rolavam


de volta para o fundo do declive. Sacerdotisa se engasgou com o cheiro de carne assada que flutuou
até ela.

— O-o que era aquilo?

— Alguns chamam de óleo de Medeia. Outros, petróleo. É gasolina. — Ele havia conseguido isso
com um alquimista, ele disse indiferentemente, acrescentando: — Terrivelmente caro para um
efeito tão simples.
— M-mas lá… dentro, as garotas raptadas…

— O fogo não se espalhará para longe só com alguns corpos para se alimentar. Se essas garotas
ainda estiverem vivas, isso não vai matá-las. — Ele murmurou: — E ainda não estamos livres dos
goblins — fazendo Sacerdotisa morder os lábios novamente.

— Então, v-você vai voltar?

— Não. Quando eles não conseguirem mais respirar, eles sairão sozinhos.

A espada de Matador de Goblins agora estava perdida, presa no cadáver ardente do hobgoblin no
fundo do túnel. Ele provavelmente não estava ansioso para lutar com uma lâmina encharcada de
cérebro, de qualquer maneira.

Ele pegou a arma que o hobgoblin deixara cair, um machado de pedra. Era apenas uma rocha
amarrada em um galho, rústico em todos os sentidos da palavra. Mas também, isso o tornava fácil
usar.

Matador de Goblins brandiu o machado rapidamente pelo ar, o testando e descobriu que poderia
empunhá-lo facilmente com uma mão.

Satisfeito, ele alcançou sua bolsa e tirou outra tocha.

— Toma — disse Sacerdotisa, oferecendo uma pederneira, mas Matador de Goblins não olhou para
ela.

— Essas bestas nunca pensam que alguém poderia criar uma emboscada para eles — disse ele.

Ela ficou em silêncio.

— Não se preocupe. — Ele brandiu o machado com golpes cuidadosamente coordenados,


acertando cada golpe na pederneira. — Terminará em breve.

Ele estava certo.

Ele lidou com cada um dos goblins quando emergiram das chamas e da fumaça. Um tropeçou na
corda e encontrou sua cabeça partida. O segundo saltou sobre a corda, mas foi derrubado pelo
machado que o aguardava. O terceiro foi o mesmo. O machado não saía da maçã do rosto da quarta
criatura, então Matador de Goblins tomou a clava do monstro no lugar.

— Esse é dezessete. Vamos entrar.

— S-sim, senhor! — Sacerdotisa se apressou para acompanhar Matador de Goblins enquanto ele
mergulhava na fumaça turva.
O lugar tinha uma aparência terrível. O hobgoblin foi queimado para lá do reconhecimento, e seus
companheiros estavam pouco melhores. O xamã estava caído com a lança ainda atravessada em
seu corpo. E as garotas estavam deitadas na imundice do chão.

Como Matador de Goblins previu, a fumaça flutuava acima delas.

Mas, sobreviver nem sempre é uma benção; algo que Sacerdotisa percebeu quando reconheceu o
corpo de Lutadora entre elas.

— Uggh… euhrrrgh…

Nada sobrava no estômago de Sacerdotisa. Ela vomitou apenas a bílis amarga queimando em sua
garganta, e sentiu as lágrimas em seus olhos marejando outra vez.

— Bem assim.

Enquanto Sacerdotisa vomitava, Matador de Goblins erradicou as chamas que percorriam ao longo
da gasolina no chão.

Ele caminhou até o xamã perfurado. O goblin parecia surpreso com sua própria morte. Ele
permanecia completamente imóvel. A imagem de Matador de Goblins de pé sobre ele se refletiu
em seus olhos vidrados.

— Como eu imaginei — disse Matador de Goblins, levantando imediatamente sua clava.

— GUI?! — Quando o xamã assustado tentou se levantar, a clava desceu e então ele estava morto
de vez.

Sacudindo a clava salpicada com miolos do xamã, Matador de Goblins murmurou: — Dezoito. Os
de níveis alto são durões.

Matador de Goblins começou a chutar violentamente o trono, agora vazio em todos os sentidos.
Sacerdotisa se nauseou novamente quando viu que ele era feito de ossos humanos.

— Truque típico dos goblins. Olhe.

— O… o quê? — Sacerdotisa limpou os olhos e a boca enquanto levantava a cabeça. Atrás do


trono pendia uma das tábuas podres de madeira que os goblins usavam em vez de portas.

Um armazém escondido, ou era mais que isso? Sacerdotisa agarrou seu cajado quando um som
estridente veio de dentro.

— Você teve sorte.

Quando Matador de Goblins puxou a tábua para o lado, houve vários gritos agudos. Junto com um
estoque de pilhagem, havia quatro crianças goblins aterrorizadas agachadas dentro.
— Essas criaturas se multiplicam rapidamente. Se seu grupo tivesse chegado mais tarde, haveria
cinquenta deles e eles teriam atacado em massa.

Só de pensar nisso — sobre o que teria lhe acontecido e a todos — Sacerdotisa tremeu. Ela
imaginou dezenas de goblins a levando, produzindo crianças meio-goblins…

Olhando para as formas encolhidas, Matador de Goblins ajustou sua clava.

— Você vai… matar as crianças, também? — perguntou ela, mas já sabia a resposta. Ela tremeu
quando ouviu o tom uniforme de sua própria voz. Havia seu coração, suas emoções, sido
anestesiados pela investida da realidade? Ela queria que fosse verdade. Só dessa vez.

— Claro que sim — disse ele, com um aceno calmo.

Ele devia ter visto isso muitas, muitas vezes.

Ela sabia que ele se chamava “Matador de Goblins” por uma razão.

— Nós destruímos seu ninho. Eles nunca vão esquecer isso, muito menos perdoar. E os
sobreviventes de um ninho aprendem, se tornam mais inteligentes. — Enquanto falava, ele
levantou casualmente a clava, ainda coberta com cérebro do xamã. — Não há razão para os deixar
viver.

— Mesmo que houvesse… um goblin bom?

— Um goblin bom? — Ele exalou de uma forma que sugeria estar realmente perplexo com a ideia.

— Pode haver… se procurássemos, mas…

Ele não disse nada por um longo momento. Então ele falou:

— Os únicos goblins bons são os que nunca saem de seus buracos.

Ele deu um passo.

— Isso tornará vinte e dois.

É uma história comum, uma que ouvimos o tempo todo.

Uma aldeia é atacada por goblins. Algumas donzelas são raptadas.

Alguns recrutas decidem que irão se livrar dos goblins como sua primeira missão.

Mas os goblins são muitos, e o grupo todo é abatido.

Ou talvez só um se safe e salve as garotas também.


Durante seu cativeiro, as garotas foram forçadas a servirem de brinquedos aos goblins.

Desesperadas, elas se abrigam no templo.

O sobrevivente solitário foge lentamente do mundo e nunca deixa sua casa novamente.

Nesse mundo, esses tipos de coisas são uma ocorrência diária, tão comum quanto o nascer do sol.

Era mesmo? Sacerdotisa não tinha certeza. Esses eventos avassaladores da vida realmente
aconteciam o tempo todo?

E se sim, poderia ela, sabendo disso em primeira mão, continuar a acreditar na Mãe Terra?

No fim, havia apenas duas coisas de que Sacerdotisa tinha certeza.

Que ela iria continuar como uma aventureira.

E que esse Matador de Goblins exterminou cada goblin naquele ninho.

Mas então, isso, também, não é mais do que outra dessas histórias contadas muitas vezes.
Em algum lugar que não era aqui. Em um lugar extremamente longe, mas incrivelmente perto.

Chacoalha, chacoalha, uma certa divindade está jogando dados.

Ela parece uma doce menina e seu nome é Ilusão.

Uma e outra vez ela joga. Ela teve um dia muito bom, e um sorriso paira em seus lábios.

Mas os dados não atendem a vontade dos deuses.

Com um suspiro curto e bonito, Ilusão esconde seu rosto.

Oh! Que jogada terrível. Ela nem sequer olha.

Mas, por mais bonita e doce que ela pode ser, nem sequer Ilusão pode alterar os números do dado.

Nenhum equipamento ou estratégia ajudará.

Chame de acaso ou destino, essas coisas acontecerão.

Ilusão fica desapontada, e outro deus aponta e ri dela.

Seu nome é Verdade. Eu te disse, diz ele, tão levado pela alegria que bate palmas.

Verdade, afinal, não tem restrições. Cruel.

Ele diz que ela foi uma tola por apostar em uma missão tão cheia de riscos.

Ilusão resmunga para si mesma, mas não há nada que ela pudesse fazer.

Ela mesma não se segura quando pega alguns aventureiros guiados pelo destino.

Então, como ela poderia se queixar quando seus próprios aventureiros acaso morriam?

É simples como as coisas funcionam.

Ouvindo isso, alguns poderiam se opor ao que parece ser deuses usando seres humanos como
brinquedos.
No entanto, qual caminho não é influenciado pelo acaso ou pelo destino?

Quando todos os seus aventureiros estão mortos, no entanto, já não há nada a se fazer.

É lamentável, mas essa aventura terminou.

Prepare alguns aventureiros novos e tente novamente.

Vai ficar tudo bem dessa vez. Certamente, esses novos irão…

Naquele momento, as duas divindades notam que um novo aventureiro apareceu sobre o tabuleiro.

Verdade dá um grunhido de desgosto.

Ilusão dá um início delicado.

Ele chegou.
Ela teve um sonho familiar.

Ela sonhou com um dia de verão quando ainda era muito pequena. Oito anos talvez. Ela viera
sozinha para a fazenda do seu tio para ajudar a dar à luz a um bezerro. Em sua tenra idade, ela não
percebeu que era só uma desculpa para lhe deixar brincar.

Ela estava indo ajudar com um parto. Esse era um trabalho importante.

E melhor ainda, ela estava saindo da aldeia e indo para a cidade; tudo por conta própria!

Claro que, ela se gabou disso com ele. Ela se lembrou do olhar mal-humorado que surgiu em seu
rosto. Ele era dois anos mais velho que ela, mas ele não sabia nada sobre a vida fora da aldeia. Ele
mal conseguia imaginar uma cidade, muito menos a capital.

É verdade, ela era como ele nesse aspecto, mas ainda assim…

Ela já não conseguia lembrar o que começou.

Ele ficou zangado, eles brigaram e ambos acabaram em lágrimas. Olhando para trás, ela pensou
que talvez tivesse ido longe demais, acreditando que podia dizer o que quisesse porque ele era um
garoto.

Falando demais, o magoando suficiente para que ficasse realmente zangado. Ela não considerou
que isso pudesse acontecer. Ela era jovem, afinal de contas.

Eventualmente, a irmã mais velha dele veio o buscar e levou para casa, o conduzindo pela mão.

A verdade era que queria o convidar para ir com ela.

Na carruagem para a próxima cidade, ela olhou de volta para sua aldeia pela cortina da janela.

Sua mãe e seu pai vieram se despedir dela. Ele não foi visto enquanto ela acenava se despedindo de
seus pais.

Enquanto ela saía na carruagem retumbante, ela sentiu uma pontada de arrependimento. Ela não
teve a oportunidade de pedir desculpa.

Quando voltasse, ela teria que se reconciliar com ele…

O dia de Vaqueira começou cedo.


Isso porque ele acordou cedo, mesmo antes do galo cantar ao amanhecer.

A primeira coisa que ele fez ao acordar foi dar uma volta na fazenda. Ele nunca negligenciava isso.

Quando ela lhe perguntou sobre isso uma vez, ele disse que estava procurando por pegadas. “Os
goblins se movem a noite” dissera ele. “Eles voltam aos seus ninhos ao amanhecer, mas eles
sempre fazem reconhecimento antes de um ataque”. Então, disse a ela que estava procurando por
pegadas, para garantir que não perderia nenhum sinal dos goblins.

Quando ele terminou sua primeira inspeção, ele fez outra. Dessa vez, ele estava procurando por
qualquer estrago na cerca. E se encontrasse algum, ele iria se encarregar de buscar algumas estacas
e tábuas, e então consertar.

Vaqueira acordou com o som dos seus passos passando pela sua janela. O galo finalmente começou
seu cacarejo matinal.

Ouvindo aquela caminhada casual autoconfiante, ela deslizou seu corpo nu para fora da cama de
palha, deu uma boa espreguiçada e um bocejo. Depois colocou algumas roupas íntimas sobre sua
forma voluptuosa antes de abrir a janela.

O vento fresco e revigorante da manhã soprava.

— Bom dia! Estou vendo que acordou cedo como sempre! — Vaqueira repousou seus seios vastos
sobre a armação da janela e se inclinou para fora, falando com ele, que estava de costas enquanto
olhava para a cerca.

— Sim — disse ele, se virando.

Ele usava uma armadura suja, placas de couro e um capacete de aço; um escudo estava preso em
seu braço esquerdo e uma espada pendurada na cintura.

Assim como ele sempre estava. Apertando os olhos em direção ao sol, Vaqueira disse: — O tempo
está bom hoje. O Sr. Sol está tão brilhante!

— Ele está.

— Tio já acordou?

— Não faço ideia.

— Hmm. Bem, tenho certeza de que vai acordar em breve.

— Acha mesmo?

— Você deve estar com fome. Vamos tomar o café da manhã. Vou preparar ele em um instante.
— Está bem.

Ele assentiu lentamente.

Ele ainda é um homem de poucas palavras, pensou Vaqueira com um sorriso.

Ele não era assim quando eram pequenos. Pelo menos, não devia ter sido.

Apenas os detalhes do tempo mudavam, eles tinham a mesma conversa toda as manhãs.

Mas, ele era um aventureiro, e ir em aventuras era um negócio arriscado. Se ela estava falando com
ele de manhã, isso significava que ele sobreviveu mais um dia, então ela não se oporia, não
importando quão poucas palavras partilhassem.

Ainda sorrindo, Vaqueira se espremeu na sua roupa de trabalho e foi tranquilamente para a
cozinha.

Eles deveriam revezar na preparação das refeições, mas era Vaqueira quem fazia efetivamente a
refeição. Em todos os anos em que viveram juntos, ele raramente cozinhara.

Duas vezes, três vezes talvez? Quando tive aquele resfriado, tenho certeza…

Ela não dissera a ele que a sopa que ele fez era rala e aquosa, com medo que ficasse chateado.

Ela pensava que às vezes, já que ele se levantava cedo de qualquer forma, talvez pudesse fazer o
café da manhã de vez em quando. Mas, aventureiros levam vidas imprevisíveis. Não existia nada
que ele pudesse fazer, então ela não o importunava sobre isso.

— Bom dia, Tio! O café da manhã sairá em breve, está bom?

— Sim, bom dia. O cheiro está bom hoje. Meu estômago está roncando. — Seu tio, o dono da
fazenda, acordou assim que ele veio da sua inspeção.

— Bom dia, senhor.

— Mm-hm… bom dia. — Seu tio respondeu com uma palavra curta e um aceno brusco
ao seu cumprimento atencioso.
Na mesa havia queijo, pão e uma sopa cremosa, todos produzido ali mesmo na fazenda.

Ele levou a comida a abertura de sua viseira. Vaqueira o observava encantada.

— Aqui está por esse mês — disse ele, como se recordando repentinamente de algo. Ele pegou um
saco de couro de sua bolsa no quadril e colocou na mesa. O saco fez um som intenso quando caiu,
e através da abertura, peças de ouro brilhavam.

—…

O tio dela olhou para ele em silêncio, como se relutante em aceitar.

Ninguém poderia o culpar. O homem armadurado não precisava alugar espaço nos estábulos de
alguma fazenda fora-de-mão. Ele poderia ter ficado em uma suíte real em algum lugar.

Por fim, seu tio deu um pequeno suspiro de rendição e puxou o saco para si.

— É terrivelmente lucrativo ser um aventureiro.

— Os negócios têm sido bons ultimamente.

— É mesmo? Diga, você… você está…? — Seu tio era normalmente tão bom em lidar com as
pessoas, mas em torno desse homem, sempre ficava com a língua presa. Vaqueira simplesmente
não conseguia entender…

Com uma mistura de medo e resignação, seu tio finalmente continuou:

— …Você está indo hoje de novo?

— Sim, senhor — respondeu calmamente ele. Sempre com o mesmo aceno lento com a cabeça. —
Eu irei à guilda. Muito trabalho para se fazer.

— Entendi. — Seu tio fez uma pausa. — Sendo assim, não exagere.

— Não, senhor.

O tio dela parecia perplexo com a voz uniforme do homem, enquanto ele tomava um gole de leite
quente de seu copo.

Suas conversas matinais sempre terminavam assim. Vaqueira tentou aliviar o clima dizendo, com
uma alegria forçada: — Bem, tenho que fazer algumas entregas, então podemos ir juntos!

— Está bem. — Ele assentiu, mas com isso, a expressão do tio dela se tornou ainda mais tensa.
— …Quero dizer, nesse caso, posso levar a carroça — mudou rapidamente o aventureiro.

— Ah, Tio é apenas uma mãe-coruja — disse Vaqueira. — Eu vou ficar bem. Eu sou muito mais
forte do que pareço, você sabe! — Ela enrolou a manga e flexionou o bíceps para mostrá-lo.

É verdade, seus braços eram maiores que as das garotas de mesma idade da cidade, mas não era o
que você poderia chamar de musculosa.

— Tudo bem. — Isso foi tudo o que ele disse quando terminou o café da manhã. Ele deixou a mesa
sem nem agradecer a refeição.

— E-ei, espere um minuto, mais devagar! — disse ela. — Tenho que me preparar também! Espere!

Mas isso, também, era como as coisas sempre foram. Vaqueira comeu o resto do seu café da manhã
de uma forma muito imprópria.

Ela acompanhou a imensa refeição — que ela precisava devido todo o trabalho que fazia — com
leite, e depois levou todos os pratos para a pia.

— Muito bem, Tio, estamos indo!

— Volte logo. E em segurança. Por favor.

— Vai ficar tudo bem, Tio. Estaremos juntos.

Ainda sentado à mesa, seu tio possuía um olhar desanimado, como se estivesse dizendo: É isso que
me preocupa. O tio de Vaqueira era um fazendeiro amável e de bom coração, como ela mesma
sabia bem. Ele só não parecia se dar bem com o aventureiro. Ou melhor… seu tio parecia ter medo
dele. Apesar de não haver nada para ter medo…

…Ela estava bastante certa.

Quando ela foi para fora, ele já estava andando na estrada além da cerca. Ela foi para onde a
carroça estava guardada atrás da casa, apressadamente, mas não correndo.

Ela havia preenchido a carroça com os produtos no dia anterior, então ela só tinha que pegar o
guidão e empurrar. A medida em que as rodas rangiam, o produto e o vinho sacudia em cima da
carroça.

Ele caminhava ao longo da estrada arborizada para a cidade, com Vaqueira seguindo atrás puxando
a carroça. Cada vez que a carga sacudia passando sobre o cascalho, seu peito saltava junto.

Esse trabalho estava longe de ser difícil o suficiente para ser cansativo, mas à medida que
avançavam, ela começou a suar um pouco e a respirar um pouco mais forte.

— ……
De repente, sem qualquer palavra, ele diminuiu o ritmo. Ele não parou, obviamente, mas
desacelerou. Ao mesmo tempo, Vaqueira, com uma explosão de energia, acelerou até que estivesse
andando ao seu lado.

— Obrigada.

— …Disponha. — Ele balançou a cabeça enquanto poupava suas poucas palavras. Talvez fosse o
seu capacete que fez o gesto parecer bastante estranho.

— Trocar?

— Nem, estou bem.

— Entendi.

A Guilda dos Aventureiros também abrigava uma pousada e uma taverna, e era lá que Vaqueira
entregaria o produto; esse era o seu trabalho. Era o lugar onde ele conseguiria a missão do dia; esse
era o trabalho dele.

Vaqueira não podia ajudá-lo com seu trabalho, e por isso se sentia mal de alguma forma por ter a
ajuda dele com o seu.

— Como tem ido as coisas? — perguntou ela, junto ao ruído da carroça, olhando de lado para ele.

Não que tivesse muito para ver. Ele usava seu capacete desde que se levantava todos os dias.
Independentemente da expressão que ele usasse, ela não conseguiria ver.

— Mais goblins ultimamente.

Suas respostas eram sempre curtas. Curtas, e de alguma forma, suficientes. Vaqueira assentiu
radiante.

— Sério?

— Mais do que o habitual.

— Então você está ocupado?

— Estou.

— É, você está fora o tempo todo esses dias.

— Estou.

— É um grande prazer ter muito trabalho, hein?


— Não — disse ele, balançando a cabeça calmamente. — Não é.

— Por que não? — perguntou ela, e ele respondeu:

— Eu preferiria que não houvesse goblins.

— Sim… — disse ela, assentindo.

As coisas seriam melhores sem nenhum goblin


A estrada melhorava gradualmente, e eles podiam distinguir os edifícios no horizonte enquanto a
agitação da cidade flutuava aos seus ouvidos. Aqui, como na maioria das cidades, a guilda estava
logo após o portão. Ela também era o maior edifício da cidade, imponente sobre o seu arredor,
ainda maior que o Templo da Mãe Terra com sua enfermaria anexada. Aparentemente, isso era
porque muitas pessoas de fora da cidade vinham à guilda e necessitariam a encontrar facilmente.

Vaqueira, por exemplo, estava contente por ser fácil de encontrar.

A guilda também alegava que queria ser capaz de apreender rapidamente qualquer patife que
estivesse andando por aí se chamando de aventureiro.

Ainda assim, era difícil distinguir a maioria dos aventureiros dos bandidos comuns à primeira vista.

Ela observava todas as variedades de armaduras escandalosas usadas pelas pessoas caminhando
pelas ruas, e ele com seu elmo de aço, embora estivessem no meio da cidade, e deu um sorriso
sarcástico.

— Espere aí, está bem? Só vou deixar a entrega.

— Claro.

Vaqueira deixou rapidamente o produto na entrada de serviço na parte de trás do edifício, depois
exalou enquanto limpava o suor da sua testa. Ela tocou a campainha para chamar o cozinheiro, lhe
mostrou uma folha de balanço para confirmar que trouxe tudo tal como solicitado, e pegou sua
assinatura. Agora, tudo o que ela precisava era da assinatura de Garota da Guilda, e sua entrega
estaria terminada.

— Desculpa por te fazer esperar.

— De maneira alguma.

Ele ainda estava lá quando ela saiu na frente de novo, como sabia que seria.

Quando eles passaram juntos pela porta vai-e-vem da guilda, o alívio momentâneo do sol foi
levado pelo calor corporal coletivo de todas as pessoas preenchendo o edifício. A guilda estava
animada como sempre.

— Eu vou pegar essa assinatura.

— Claro.
Lá fora ele esperara por ela, mas aqui dentro eles iriam se separar.

Ele caminhou para uma fileira de assentos junto à parede e se instalou em um com autoridade,
como se fosse reservado para ele. Vaqueira acenou levemente para ele, depois foi em direção a
recepção, onde uma fila de visitantes aguardava. Ali havia aventureiros, pessoas apresentando
missões e puxa-sacos de todas as espécies. Comerciantes de ferrarias a penhoristas, de mercadores
a vendedores ambulantes de medicina. Veio-lhe à ideia de que se aventurar possuía mais despesas
do que parecia.

— Então, olha. Esse troll veio para cima de mim, certo? Mas eu fui como: Hoje não!, e esquivei
dele por muito pouco!

— Oh, meu, isso parece muito cansativo. Talvez devesse experimentar uma poção de estâmina.

Vaqueira viu um aventureiro segurando uma lança relatando ansiosamente suas façanhas para a
garota da recepção. Seu corpo impressionantemente esbelto, que parecia composto de músculos
praticamente sólidos, expressava sua força. A insígnia em torno do seu pescoço mostrava que ele
era um aventureiro de ranque prata.

Vaqueira sabia que esse era o terceiro maior ranque na hierarquia da guilda. Ela sabia por que
também era o seu ranque.

— Poção de estâmina? Quem precisa disso? Querida, eu simplesmente enfrentei um troll com nada
além da minha lança nas mãos. O que acha disso?

— Ah, eu ouvi quão assustadores são os trolls… — Quando ela começou a se sentir incomodada,
buscando palavras, os olhos de Garota da Guilda pairaram sobre ele sentado perto da parede.

— Oh! — Seu rosto se iluminou instantaneamente.

— Ugh. Matador de Goblins. — Lanceiro resmungou enquanto seguia o olhar de Garota da Guilda.

Talvez ele tivesse falado um pouco alto demais. O rebuliço na guilda aumentou quando o primeiro
visitante, depois outro, olhou na direção dele.

— Eu não consigo acreditar que ele é ranque prata também. — Uma cavaleira elegante balançava a
cabeça com desgosto. As marcas em sua armadura de platina evidenciavam muitas batalhas e a
tornava ainda mais impressionante. — Sabe-se lá se ele é mesmo capaz de lutar contra qualquer
coisa maior que um goblin? Um “especialista”? Heh! Eles estão dando um ranque prata para
qualquer um hoje dia!

— Deixe-o em paz. Ele nunca teve nada a ver conosco mesmo. Quem se importa com o que ele
faz?

Um grande guerreiro tanque fez à cavaleira um gesto depreciativo com a mão. Era a tolice ou
coragem que o deixava parecer tão à vontade em sua armadura vilânica? Tanto ele quanto a
cavaleira usava insígnias de prata, então eles também não eram aventureiros novatos.
Dois garotos, entretanto, estavam de pé falando, com suas placas finas de couro. Cada um possuía
uma adaga, um cajado e uma veste.

— Olhe para ele! — disse um. — Eu nunca vi uma armadura tão suja!

— Pois é, até nós dois temos coisas melhores que ele…

Seus equipamentos eram todos tão baratos quanto os dele, mas “melhores” no sentido em que não
havia nenhum arranhão neles.

— Parem com isso — disse reprovadoramente uma paladina com idade próxima a dos garotos. —
E se ele ouvir vocês? Tenho certeza de que ele é um novato assim como nós. — O escárnio em
suas vozes estava tingido com alívio por encontrar outra pessoa tão patética quanto eles. Eles não
mostraram sinais de notarem a insígnia de prata ao redor de seu pescoço.

— Heh-heh-heh… — Uma conjuradora com um chapéu pontudo e uma veste escandalosa parecia
apreciar a conversa. Ela era chamada de bruxa e era uma usuária de magia ranque prata. Ela
abraçou seu cajado sedutoramente e se encostou de volta perto da parede, indiferente ao que se
passava.

Os sussurros se espalharam pelo lugar. Aqueles que o conheciam e aqueles que não, todos
murmurando juntos.

E no meio de tudo isso, ele estava sentado tranquilamente em seu assento como se alheio àquilo.

Ele não liga. Ele não está fingindo, ele realmente não se importa. Então, acho que não vale a pena
ficar com raiva por ele…

Vaqueira segurou a língua, mas ela não estava nada feliz.

Naquele momento, ainda com uma cara amarrada, ela encontrou os olhos de Garota da Guilda. Por
detrás do seu sorriso inflexível, ela possuía o mesmo olhar de Vaqueira.

Resignação. Raiva. Nojo. E… o reconhecimento de que não existia nada que pudesse fazer.

Eu sei como você se sente.

Garota da Guilda fechou os olhos por um segundo e suspirou.

— Com licença, por favor. Eu já volto.

— Sim, é, uhum, por favor… eu irei esperar. Ainda não terminei de te contar sobre minhas
façanhas corajosas… digo, de fazer o meu relatório!

— Sim, eu entendo. — Garota da Guilda desapareceu em uma sala dos fundos.


Pouco depois, ela apareceu no corredor. Ela segurava uma pilha pesada de papéis com os dois
braços. Com muito esforço, ela os trouxe até o quadro de cortiça na parede.

— Certo, pessoal! É hora de postar as missões da manhã! — A voz de Garota da Guilda atravessou
o saguão, silenciando os murmúrios do local. Suas tranças saltavam alegremente enquanto ela
acenava para chamar a atenção da multidão.

— Finalmente! — Com olhos cintilando, os aventureiros se aglomeraram perto de Garota da


Guilda, derrubando cadeiras com a pressa. Afinal de contas, se eles não pegassem uma missão, eles
não comeriam hoje. Tal era a vida de um aventureiro. A natureza, bem como a recompensa
oferecida pela missão, influenciaria a reputação dos aventureiros. E quão bem eles contribuíram ao
mundo — um valor que as pessoas comuns se referiam simplesmente como “pontos de
experiência” — determinaria seu ranque. E todos queriam subir de posição.

A classificação de um aventureiro lhe conferia renome, afinal. Ninguém confiaria uma missão
importante para um aventureiro porcelana ou obsidiana, não importa quão habilidosos eles fossem.

Com Garota da Guilda olhando, os aventureiros reunidos disputavam enquanto puxavam missões
do quadro.

— As de ranque porcelana são tão… miseráveis. Não quero passar a vida inteira atrás de ratos no
esgoto.

— Bem, não podemos fazer muita coisa. Ei, que tal essa?

— Extermínio de goblins? Legal. De fato, parece um trabalho para alguns iniciantes.

— Oooh, essa é boa. Eu quero matar alguns goblins…

— Não! Você ouviu Garota da Guilda… precisamos começar com os esgotos!

— Que tal dragões? Algum dragão? Algo marcial!

— Ah, desista, você não tem o equipamento para isso. Pegue o de acabar com bandidos. O
pagamento não é ruim.

— Ei, eu estava olhando essa missão!

— Bem, eu a peguei primeiro. Acho que você vai precisar encontrar outra.

Lanceiro de há pouco estava atrasado para a disputa, e acabou sendo empurrado pela multidão até
cair com o traseiro no chão. Ele se levantou e voltou rapidamente para o tumulto com um rugido.

— Certo, pessoal, não há necessidade de brigarem — disse apaziguante Garota da Guilda, com o
sorriso ainda colado no rosto.
— Hmph. — Por fim, Vaqueira se afastou de Garota da Guilda. Ela não queria ser pega nisso, e
não parecia que iria conseguir essa assinatura tão cedo.

Entediada, Vaqueira deixou seu olhar se dirigir para a parede. Ele ainda estava sentado lá.

Ela havia dito uma vez: “É melhor nos apressarmos ou todo o trabalho vai desaparecer”, mas ele
respondera: “Extermínio de goblins não é popular”. Os fazendeiros postavam os trabalhos, então as
recompensas eram baixas, e como eram vistas como missões de nível baixo, os aventureiros mais
experientes não as pegariam.

Então ele esperaria pela área da recepção se esvaziar. Não tinha pressa.

E… ele nunca disse isso, mas Vaqueira pensava que ele esperava para que os novos aventureiros
pudessem escolher suas missões primeiro. Não que ela tivesse sugerido isso a ele. Ele só iria dizer
“É mesmo?” como sempre fazia.

— Hmm… — Se ela iria ficar presa ali de qualquer forma, talvez devesse esperar com ele?

Ela não deveria ter hesitado.

— Ah… — Outra pessoa se aproximou dele antes que pudesse.

Uma aventureira jovem. Ela usava vestimentas de sacerdotisa sobre seu corpo delicado, com o
símbolo da Mãe Terra pendurado no seu cajado de monge.
— …Oi — disse brevemente Sacerdotisa, em pé na frente dele. Ela parecia desconfortável
enquanto fazia uma pequena reverência.

— Sim. — Isso foi tudo o que ele disse. O que quer que ele poderia estar pensando, estava
escondido dentro desse capacete. Ele não pareceu notar que Sacerdotisa estava ainda mais nervosa
por sua incapacidade de obter uma resposta adequada dele.

— Eu comprei alguns equipamentos. Assim como você me disse. — Ela enrolou as mangas de suas
vestimentas. Um conjunto novo em folha de malha envolvia seu corpo esbelto, os elos acorrentados
cintilavam levemente.

— Nada mal.

Alguém que não sabia de nada poderia levar a cena para o lado errado, mas suas palavras não
continham qualquer insinuação.

Ele finalmente se virou para Sacerdotisa, olhou para ela de cima a baixo e assentiu.

— Os anéis são um pouco largos, mas será o suficiente para parar as lâminas deles.

— Madre Superiora ficou muito descontente comigo. Ela queria saber por que uma serva da Mãe
Terra usaria uma armadura.

— Ela provavelmente não sabe muito sobre os goblins.

— Não é isso. Isso é uma violação dos preceitos…

— Se isso vai interferir com seus milagres, talvez você devesse mudar de crenças.

— Minhas orações alcançarão à Mãe Terra!

— Então não há problema.

Sacerdotisa inflou suas bochechas de raiva. Ambos ficaram em silêncio por um momento.

— Não vai se sentar?

— Oh, e-eu irei! Eu me sentarei!


Corando, ela se abaixou rapidamente na cadeira ao lado dele. Seu pequeno traseiro fez um
bonito bump quando se sentou.

Sacerdotisa colocou seu cajado sobre o colo e juntou as mãos, como se tentasse se encolher no
assento. Aparentemente, ela estava bastante nervosa.

— Hmph. — Vaqueira soltou um grunhido inconsciente, mas não era como se ele nunca tivesse
mencionado essa garota. Ela era uma aventureira com quem ele havia feito dupla há cerca de um
mês. Ele não chegou a dizer que a encontrou na primeira aventura dela e a colocou sob sua asa,
mas Vaqueira concluiu isso juntando os fragmentos de informação que conseguiu dele.

Por um lado, ela sempre esteve preocupada com ele lá fora sozinho, então ela estava feliz que havia
alguém com ele agora. Por outro lado… ela tinha que ser tão jovem?

Vaqueira vinha com ele à Guilda dos Aventureiros todos os dias, mas essa foi a primeira vez que
via Sacerdotisa pessoalmente. Ela era tão magra que parecia que um abraço forte poderia a partir
no meio. Vaqueira olhou para seu próprio corpo avantajado e soltou um pequeno suspiro.

Sacerdotisa não notou que Vaqueira a observava. Em vez disso, ainda corando furiosamente, mas
parecendo ter despertado sua coragem, ela abriu a boca.

— S-sobre o outro dia…

O tom elevado e ritmo rápido de suas palavras deveriam ser consequência de seu nervosismo,
certamente.

— E-eu acho que destruir toda a caverna com a mistura inflamável foi… foi exagerado!

— Por que motivo? — Ele continuou parecendo como se nada disso o surpreendesse. — Não
podíamos deixar os goblins para lá.

— S-sim, mas e… e quanto as consequências? E se toda a m-montanha viesse abaixo?

— Estou mais preocupado com os goblins.

— Eu sei! E-estou tentando te dizer que essa falta de preocupação é o problema!

— …Entendi.

— E-e outra coisa! Acho que a maneira com que você se livrou do… do cheiro deveria ser um
pouco… um pouco mais…! — Ela começou a se inclinar para fora do assento enquanto falava.

O tom dele sugeria que estava ficando irritado. — Então, você aprendeu os horários para atacar? —
Sacerdotisa engoliu em seco, pega desprevenida pela mudança repentina de assunto.

Vaqueira, bisbilhotando inocentemente, riu consigo mesma.


Ele não mudou nem um pouco desde que éramos jovens.

— É… no início da manhã ou no fim da tarde — respondeu Sacerdotisa, enquanto tentava mostrar


com o rosto que não o deixaria se safar facilmente.

— Por quê?

— P-porque esses são respectivamente o entardecer e o amanhecer para os goblins.

— Correto. O meio-dia é a meia-noite para eles. A guarda deles é mais rigorosa. Próxima pergunta:
Como você ataca um ninho?

— Bem… se possível, você faz fogo para a fumaça os expulsar para fora. Porque é… é perigoso…
dentro do ninho.

— Correto. Só entre quando não tiver tempo ou nenhuma outra escolha. Ou quando você quiser ter
a certeza de que matou cada um deles.

Ele a interrogou enquanto ela se esforçava para encontrar respostas. — Itens?

— P-principalmente poções e tochas.

— Só isso?

— E-e uma corda. Há sempre um uso para corda… eu acho.

— Não se esqueça. Magias e milagres.

— S-seus itens podem substituir muitas vezes magias e milagres, portanto, você deve guardar sua
magia para quando precisar.

— Armas.

— Hum, você deveria ter…

— Não, não deveria. Tire elas do inimigo. Eles têm espadas, lanças, machados, clavas, arcos. Não
preciso de ferramentas especiais. Sou um guerreiro.

— …Sim, senhor. — Ela concordou como uma criança que fora repreendida pelo seu professor.

— Mude suas armas, mude suas táticas. Fazer a mesma coisa várias vezes é uma boa maneira de se
matar.

— Hum, eu posso… anotar isso?


— Não. Se eles tirarem as notas de você, eles aprenderiam com elas. Você tem que saber tudo de
cor. — Ele disse calmamente enquanto Sacerdotisa se esforçava para gravar suas palavras na
memória. Isso realmente parecia ser a conversa entre professor e aluno.

Ele já falou tanto assim alguma vez? Vaqueira ficou inquieta quando a questão surgiu em sua
mente.

Ela não conseguia entender por que isso a deixou tão inquieta. Ela queria obter a assinatura assim
que pudesse e ir para a casa.

— Muito bem — disse ele, se levantando de repente. Olhando em volta, ela percebeu que a
multidão de aventureiros estava se espalhando para cuidar de seus negócios. Havia muito a se
fazer: preparar equipamento, estocar comida e suprimentos, reunir informações.

Sacerdotisa se apressou para o acompanhar enquanto ele caminhava em direção a Garota da Guilda
sem sequer olhar para os aventureiros que partiam.

— Ah… — Vaqueira havia perdido sua chance novamente. Sua voz, como sua mão estendida,
pairara no ar.

— Oh, Sr. Matador de Goblins! Bom dia! Que bom te ver hoje de novo! — A voz e o rosto de
Garota da Guilda carregavam todo o brilho que Vaqueira não possuía.

— Algum goblin?

— Claro, sim! Não há muitos hoje, eu temo, mas há três missões envolvendo goblins. — Enquanto
ele permanecia lá calmamente, Garota da Guilda escolheu alguns papéis com mãos hábeis. Ela
parecia os ter preparado antecipadamente.

— A aldeia nas montanhas do oeste tem um ninho de tamanho médio. A vila no rio do norte tem
um ninho pequeno. E há um ninho pequeno nos bosques do sul.

— Aldeias de novo?

— Sim. São todos fazendeiros, como de costume. Eu me pergunto se os goblins estão as visando.

— Talvez. — Ele tomou suas palavras de brincadeira com seriedade. — Mais alguém pegou
alguma dessas missões?

— Sim. Um grupo de novatos estão nos bosques do sul. Aquele é um pedido de uma aldeia perto
da floresta.

— Novatos — murmurou ele. — Quem estava no grupo deles?

— Vejamos… — disse Garota da Guilda. Ela lambeu o dedo e começou a folhear um maço de
papéis.
— Um guerreiro, um mago e um paladino. Todos ranques porcelana.

— Hmm. Isso é bastante equilibrado.

— Eles estavam aqui mais cedo… Só três pessoas? Eles nunca sobreviverão! — O ranger de dentes
em pânico de Sacerdotisa contrastou fortemente com a avaliação comedida por ele. — Digo, nós
tínhamos quatro, e…

Ela ficou pálida e tremeu ligeiramente. Ela agarrou seu cajado de monge firmemente.

Vaqueira desviou o olhar, com a sensação inquietante aumentando mais nitidamente dentro dela.

Por que ela não percebera antes?

Ele conhece uma aventureira em sua primeira missão… uma aventureira…

Ela devia ter compreendido o que isso significava.

— Eu tentei explicar a eles… eu realmente tentei. Mas eles insistiram que ficariam bem — disse
Garota da Guilda desconfortavelmente. Ela obviamente sabia da história de Sacerdotisa.

Mas, no fim das contas, os aventureiros eram responsáveis por si mesmos.

Sacerdotisa olhou implorando para ele.

— Nós não podemos deixá-los! Se não os ajudarmos…

Sua resposta foi imediata. — Vá se quiser.

— Quê…?

— Vou pegar a do ninho na montanha. No mínimo, um hob ou um xamã deve estar lá. —
Sacerdotisa olhou vagamente para ele. Não havia como adivinhar a expressão escondida atrás do
seu elmo. — Com o tempo, esse ninho crescerá, e então as coisas ficarão piores. Eu tenho que
cortar o mal pela raiz.

— Então… então você vai simplesmente os abandonar?!

— Eu não sei o que você acha que faço — respondeu ele, balançando firmemente a cabeça — mas
esse ninho deve ser tratado. Como já disse, você pode ir à floresta se quiser.

— M-mas então você vai enfrentar o ninho da montanha sozinho, não é?!

— Eu já fiz isso antes.

— Ahhhh! — disse Sacerdotisa, mordendo seus lábios com força.


Mesmo de onde estava, Vaqueira podia ver Sacerdotisa tremendo. Mas seu rosto não sugeria medo.

— Você é impossível!

— Você vem?

— É claro que vou!

— Você a ouviu.

— Ah, muito obrigada vocês dois! — disse Garota da Guilda, curvando a cabeça para eles em
gratidão. — Nenhum outro aventureiro experiente pega missões de goblins…

— Experiente uma ova — resmungou taciturnamente Sacerdotisa, olhando para a insígnia de


porcelana. Ela parecia uma criança amuada.

— Ha-ha-ha… bem, você que sabe… Então, vocês dois estão indo?

— Sim — disse Sacerdotisa, com um aceno relutante. — Sobre minhas objeções!

Ele sempre estava preparado, então com o trabalho administrativo feito, eles estavam prontos para
partir imediatamente.

Eles passariam por Vaqueira no caminho para a porta. Não existia outra saída do edifício. O que
ela deveria — ou não deveria — dizer? Perturbada, ela abriu a boca várias vezes como se para
dizer algo.

Mas, no final, ela não disse nada.

— Já estou indo. — Ele era o único que, como sempre, parava bem na frente dela.

— O quê? Ah… Sim. — Ela assentiu. Houve uma longa pausa antes que conseguisse espremer
para fora mais duas palavras: — Tenha cuidado.

— Você também, no caminho de casa.

Sacerdotisa acenou enquanto passava, e Vaqueira respondeu com um sorriso ambíguo.

Ele nunca olhou para trás.

Vaqueira voltou sozinha para a fazenda, puxando a carroça vazia e depois cuidou dos animais sem
dizer uma única palavra.

A medida em que o sol se erguia pouco a pouco no céu, ela almoçou um sanduíche no pasto. E
quando o sol descera em direção ao horizonte, ela jantou à mesa com seu tio. Ela não conseguiu
saborear bem a comida.
Depois do jantar, ela foi para fora. Um vento fresco nascido da noite acariciava suas bochechas.
Quando ela olhou para cima, ela pôde ver todo o céu vasto com suas muitas estrelas e duas luas.

Ela não sabia muito sobre aventureiros ou goblins. Ela não estava na sua aldeia quando os goblins
atacaram dez anos atrás.

Ela estava na fazenda de seu tio, ajudando com o nascimento de um bezerro. Em sua tenra idade,
ela não percebeu que era só uma desculpa para lhe deixar brincar.

Foi pura sorte que ela tivesse evitado a catástrofe. Apenas sorte.

Ela não sabia o que aconteceu com seus pais. Ela se lembrava de enterrar dois caixões vazios. Ela
se lembrava de o padre dizer alguma coisa, mas tudo o que sabia era que seus pais se foram.

Ela se lembrava de estar sozinha no início, mas já não sentia isso.

E sempre houve o se. Se ela não tivesse brigado com ele naquele dia. Se ela tivesse lhe pedido para
vir com ela…

Talvez as coisas tivessem sido diferentes. Talvez.

— Fique acordada até muito tarde e você terá dificuldade amanhã de manhã — disse uma voz
grossa, junto do som de passos no mato.

Ela se virou e viu seu tio, com a mesma expressão preocupada que possuía naquela manhã. — Eu
sei. Eu vou para a cama daqui a pouco — prometeu ela, mas seu tio balançou a cabeça franzindo a
testa.

— Ele tem que cuidar de si mesmo, mas você também. Eu o deixo ficar aqui porque ele me paga,
mas seria melhor se você se mantivesse longe dele.

Ela ficou em silêncio.

— Eu sei que vocês são velhos amigos, mas às vezes, o passado é apenas o passado — disse ele. —
Ele não é mais o mesmo. Ele está fora de controle.

Você deveria saber disso.

Vaqueira apenas sorriu com a sua repreensão. — Talvez. Mesmo assim… — Ela olhou para as
estrelas. Para as duas luas e para a estrada que se estendia abaixo deles. Ainda não havia sinal dele.

— Eu vou esperar um pouco mais.

Ele não voltou naquela noite.

Era meio-dia no dia seguinte quando ele retornou. Então ele dormiu até o amanhecer.
No dia seguinte, não mostrando sinal de fadiga, ele se juntou com Sacerdotisa para se aventurar nos
bosques do sul. Vaqueira ouviu dizer mais tarde que os novatos nunca voltaram da floresta.

Naquela noite, ela teve aquele sonho familiar de novo.

Ela nunca havia se desculpado.


— Nos ajude! Você precisa nos ajudar! Os gubrins acabaram de chegar na nossa aldeia!

— Está apresentando uma missão? Por favor, preencha esse formulário, senhor.

O fazendeiro agarrou o papel com tanta força que o amassou, e Garota da Guilda pegou uma folha
nova. Isso não era nada incomum na Guilda dos Aventureiros. Ela lidou com meia dúzia de pessoas
assim antes do café da manhã.

Os aventureiros estavam ocupados durante o dia, então eles visitariam a guilda pela manhã na
maioria das vezes ou à noite. Essas missões apresentadas, entretanto, não eram tão previsíveis.

As batalhas entre os deuses haviam durado tanto tempo que os monstros agora eram uma parte
familiar do mundo. Quando uma aldeia era atacada, um ninho de criaturas terríveis seria
encontrado inevitavelmente em algumas ruínas próximas ou algo do gênero. O homem diante dela
naquela tarde era só mais um em um desfile de pessoas que apareciam desesperadas.

— Se isso continuar, apenas os deuses sabem o que vai acontecer com as pobres vacas! E os nossos
malditos campos? Os gubrins vão queimá tudo…

A mão do fazendeiro tremia enquanto escrevia. Cada vez que ele cometia um erro, Garota da
Guilda estava pronta com uma nova folha de missão.

Sim, cada vez; cada vez que apareciam monstros, cada vez que eles atacavam uma vila, os
aventureiros viriam. Sejam dragões, demônios, olhos gigantes com seus nomes profanos, ou às
vezes, até mesmo uma equipe de foras da lei sem coração.

Todos os que se situavam entre os velhos inimigos daqueles que possuem palavras: os Que-Não-
Rezam.

Claro, esse era um termo duvidoso, uma vez que incluía sacerdotes servindo aos deuses das trevas.
E os mais numerosos entre os Que-Não-Rezam eram — você adivinhou — os goblins.

— Nós nem sequer temos moças para eles levarem!

Garota da Guilda entrecerrou seus olhos, tentando entender as letras que rastejavam como vermes
pela página. Elas não eram muito legíveis. Esse era o escriba mais talentoso que a aldeia pôde
reunir?

De alguma forma, eram sempre essas pequenas cidades rurais fronteiriças que os goblins iam atrás.
Os goblins realmente estavam visando as aldeias de propósito? Era só por que existia tantas
aldeias, ou tantos goblins? No que diz respeito a Garota da Guilda, tais questões estavam acima de
sua remuneração.

— Parece que a papelada está em ordem. Você tem a recompensa com você?

— Com certeza. Diga, é verdade que os gubrins às vezes pegam uma garota para conhecer ela,
então a devoram todinha?

— Há casos em que isso aconteceu, senhor.

O fazendeiro ficou visivelmente mais pálido enquanto pegava um saco. Garota da Guilda aceitou
sem hesitar com seu sorriso perfeito. Era terrivelmente pesado…

O saco estava cheio principalmente com peças de cobre, algumas pratas brilhavam entre elas. Não
havia uma única peça de ouro no saco.

Garota da Guilda pegou uma balança debaixo do balcão. O valor das moedas seria avaliado em
relação a um peso estabelecido.

— Tudo certo, confirmei o montante — disse ela depois de um momento. — Está tudo certo.

Ela duvidou que a recompensa chegaria a dez peças de ouro no total. Apenas o suficiente para
contratar alguns aventureiros de ranque porcelana com as taxas da guilda. Leve em conta as taxas
de processamento que a guilda cobrava por agir como intermediária, e os agricultores poderiam
ficar realmente no vermelho.

Mas aquele monte de moedas — algumas cobertas de sujeira, algumas com ferrugem, peças novas
e velhas jogadas juntas — tinham um significado.

Alguém que não entendia esse significado nunca poderia se tornar uma recepcionista da guilda.

— Não se preocupe, senhor. Alguns aventureiros estarão prontos dentro de alguns dias para matar
seus goblins. — Não importava como ela se sentia por dentro, seu sorriso nunca vacilava. O
fazendeiro assentiu de alívio.

Ele provavelmente imaginava um caçador de monstros com uma armadura resplandecente, lutando
galantemente contra os goblins. Garota da Guilda sabia bem. Ela sabia que não eram esses que
apareceriam. Os aventureiros que encontrariam o caminho para aquela aldeia seriam ranques
porcelana. Completos novatos.

A maioria deles seriam feridos na batalha. Se as coisas ficassem ruins, eles morreriam. Havia até
mesmo uma chance de — na pior das hipóteses — que a aldeia fosse destruída.

Então, embora pudesse simplesmente ser para fazer com que todos se sentissem melhor, todas as
recompensas eram pagas no fim da missão.
Não havia fim para os goblins. Um provérbio afirmava que “cada vez que uma pessoa falha, um
goblin nasce”. Eles só possuíam seus números como vantagem. Eles eram os mais fracos de todos
os monstros que poderiam atacar uma aldeia. Mesmo os trolls não eram comparação.

Goblins tinham apenas a inteligência, a força e o tamanho de uma criança pequena. Então,
novamente, essa era outra maneira de dizer que os goblins eram tão inteligentes, fortes e
perspicazes quanto uma criança.

O extermínio de goblins pagava uma ninharia. Aventureiros experientes evitavam eles como
pragas.

Os recém-chegados eram absolutamente os únicos que podiam ir.

Eles podiam ser feridos, eles podiam morrer, mas eles matariam os goblins. Mesmo que o primeiro
grupo a ir fosse aniquilado, o segundo ou o terceiro conseguiria.

Sim, os goblins seriam expulsos. Então o Estado não teria que se envolver. O Estado possuía coisas
maiores para se preocupar: demônios, caos em geral.

— Bem, senhorita, eu certamente irei esperar. Espero que você possa nos ajudar.

Os procedimentos burocráticos terminaram, o fazendeiro deixou o edifício da guilda, curvando a


cabeça repetidamente em agradecimento. Garota da Guilda o observou ir com um sorriso, contendo
um suspiro.

— Esse é o terceiro hoje…

Enviar três grupos de aventureiros inexperientes para a morte, ou deixar três aldeias serem
destruídas? Só de pensar nisso dava um nó em seu estômago. Esse nó pairava nela como uma
nuvem.

Claro, Garota da Guilda tentava explicar as coisas para todos os novatos. Ela contava a eles sobre o
perigo, até mesmo recomendava outras missões que poderiam pegar.

Mas ninguém jamais queria que sua “aventura” fosse matar ratos nos esgotos.

Os aventureiros experientes, por sua vez, eram bastante felizes caçando as criaturas que viviam nas
montanhas, longe de qualquer habitação humana.

Muito poucos aventureiros que assumiam uma missão de goblincídio voltavam ilesos.

A maioria que fazia essas tarefas eram aventureiros idealistas que estavam começado agora. O
resto possuía apenas um pouco de experiência. A guilda sempre esteve incomodada por sua
incapacidade de produzir um núcleo sólido de caçadores de goblins. E ali, simplesmente não existia
aventureiros de renome que enfrentariam voluntariamente os goblins imensamente perigosos.
— Bem — disse ela a si mesma, se esticando no balcão — isso não é bem verdade. — O balcão
bonito e polido contra a sua testa e bochechas ruborizadas dava uma sensação agradável. Ela sabia
que esse comportamento não era condizente à sua educação como filha de uma família decente ou
de sua posição como recepcionista da guilda, mas mesmo ela tinha que relaxar de vez em quando.
E não havia visitantes para vê-la naquele momento, a propósito.

Como eu queria que ele se apressasse e chegasse aqui…

E bem naquele momento, a campainha da porta da guilda soou quando se abriu. Garota da Guilda
se apressou para a postura correta.

— Minha querida Garota da Guilda, eu derrotei alguns bandidos!

Um aventureiro com uma lança veio pela entrada. A expressão distorcida no seu rosto parecia
pouco feliz. Atrás dele, uma bruxa entrou com passos elegantes, com os quadris balançando
enquanto caminhava. Ela encontrou os olhos de Garota da Guilda.

A bruxa piscou apologeticamente para ela. Garota da Guilda pôs aquele sorriso sem fim no rosto.

— Oh, meu, isso parece muito cansativo. Você poderia fazer o seu relatório, por favor?

— Bem, deixa eu te falar, não foi fácil! Eles estavam acampados bem na estrada principal!

— Oh, meu, isso parece muito cansativo. Por favor, nos conte tudo sobre isso no seu relatório por
escrito.

— Devia ter pelo menos uns vinte, vinte e um bandidos escondidos lá, e eu peguei cada um!

— Oh, meu, isso parece muito cansativo. Talvez devesse experimentar uma poção de estâmina.

— …Sim, por favor.

— Aqui está. Obrigada por comprar conosco!

Os itens que a guilda vendia em nome dos comerciantes que frequentavam o lugar,
compreensivelmente, não eram de qualidade excepcionalmente elevada. A poção de estâmina, por
exemplo, não era uma boa poção mágica, mas uma mistura de algumas ervas diferentes.

Mas funcionava. Não havia nada de mal em manter uma na mão ou mesmo realmente a beber. E o
lucro que a guilda fazia com tais itens poderia ser alocado em todos os tipos de propósitos úteis.

Eu nunca colocarei meu rosto naquele lugar de novo, contudo, prometeu a si mesma Garota da
Guilda, com um sorriso apaziguador, enquanto observava Lanceiro se inclinar sobre o balcão bem
onde ela estava deitada pouco tempo atrás.

Foi quando o sino tocou pela segunda vez.


— Oh!

— Ugh…

A figura que apareceu na entrada fez o rosto de Garota da Guilda se iluminar e Lanceiro dar um
estalo indisfarçável com a língua.

Seu passo era ousado e despreocupado, de alguma forma ameaçador.

Ele usava uma armadura de couro suja e um elmo de aço. Seu equipamento era inferior, patético
mesmo.

Ninguém na guilda tinha que olhar para a insígnia de prata em volta de seu pescoço para saber
quem ele era.

Matador de Goblins.

— Bem-vindo de volta! Está tudo bem? Algum ferimento grave?

— Não que eu saiba.

Seu sorriso estampado se abriu em uma risada como uma flor a dançar. Enquanto Lanceiro ficava
parado com uma expressão sufocante, Matador de Goblins assentiu e disse:

— Era um ninho pequeno, mas havia um hob lá. Problemático.

— Eu adoraria ouvir tudo sobre isso. Por favor se sente, descanse… Ah! Eu vou fazer um pouco de
chá também! — Garota da Guilda correu como uma cachorrinha animada para a sala dos fundos,
com sua trança saltando.

Matador de Goblins se sentou comodamente em uma cadeira próxima, e passou a olhar para
Lanceiro. Pela primeira vez, ele pareceu perceber que Lanceiro olhava fixamente para ele com um
olhar frio, e com um pequeno “hmph”, Matador de Goblins disse: — Peço desculpas se interrompi
alguma coisa.

Houve uma longa pausa. Então, Lanceiro respondeu: — Não, não interrompeu. Eu já havia
terminado de fazer meu relatório.

— Entendi.

O aventureiro da lança chutou uma cadeira com um grunhido venenoso. No banco de frente para
ele, Bruxa, que assistia a tudo, estava esperando com um sorriso debochado.

— Bandidos, você disse? …Se não tivéssemos tomado aquela estrada, não teríamos feito nenhuma
peça de cobre hoje.
— Oh, bem, me desculpe! E daí se eu quisesse me gabar um pouco?

— Mesmo que você diga isso… — disse Garota da Guilda, que acabara de voltar para a recepção,
com seus lábios vermelhos se dobrando.

— Daí nada. Eu acho que me lembro de minhas magias ajudarem um pouco, não é…?

— …Eu sei que elas ajudaram.

— Aww, o mais forte da fronteira não pode ficar amuado…

Lanceiro cruzou os braços, mal-humorado. Bruxa, olhando para ele carinhosamente, deu um riso
agradável.

Garota da Guilda bufou enquanto ouvia e mentalmente mostrou a língua para eles.

Ela sabia, é claro, que manter as gangues de bandidos sob controle era um trabalho perfeitamente
digno. E ela sabia que Lanceiro, um aventureiro ranque prata, era conhecido pelo nome de “o Mais
Forte da Fronteira”.

Então ela não pegou leve, e ela certamente não queria o ignorar. Ela realmente não queria. Era só
isso; bem, há aventureiros cuja força é a sua única reivindicação de fama, e então existia aqueles
que saiam da trilha para assumir os trabalhos que ninguém mais queria.

Como não posso os tratar um pouco diferente?

Não era só preferência pessoal. Com certeza. Provavelmente.


Ela abaixou a linda caneca de argila com um tap. Vapor subia do chá marrom-claro de dentro.

Quando ele bebeu, Matador de Goblins parecia estar só derramando o líquido em seu capacete. Ele
não prestou atenção na fragrância ou sabor. Ou o fato de que as folhas eram de seu estoque pessoal,
que ela havia conseguido da capital e foram misturadas com um pouco de poção de estâmina, para
criar uma bebida única…

— Hum, de qualquer forma, bem-vindo de volta! — disse Garota da Guilda tão docemente quanto
conseguiu. Era assim que ele sempre foi, então ela tentou não se incomodar com isso. — Eu sei
que você esteve formando uma equipe com alguém ultimamente. Seu primeiro solo depois de um
bom tempo deve ter sido difícil.

— Sempre trabalhei sozinho antes. Eu posso me virar. — Ele abaixou o copo, acenando com a
cabeça. Ela ficou contente pelo menos, ao ver que não havia nenhuma gota sobrando.

Pelo menos, ele nunca disse não ao meu chá.

— Entendo — comentou ela, ansiosamente.

Bem… não era que não houvesse nada a reclamar.

Ela estava genuinamente feliz por ele estar orientando essa Sacerdotisa, a quem Garota da Guilda
considerara como sem esperança. E ela se sentiu melhor só de saber que ele possuía uma
companheira de armas agora.

Mas só ele e uma garota, sozinhos em uma masmorra…? Eu não sei…

A única coisa que lhe dava esperança era saber que ele sempre esteve se empenhando mais sobre o
trabalho do que com as mulheres, e sua amiga era uma clériga devota.

Supondo que eu não os tenha julgado mal.

Bem, já era um pouco tarde para se preocupar, de qualquer forma. Há quanto tempo ele estava
vivendo naquela fazenda?

Na verdade, Sacerdotisa estivera fora no templo por três dias, alegando algo sobre deveres
religiosos. Supostamente, ela voltaria para se juntar a Matador de Goblins hoje ou no dia
seguinte…

Garota da Guilda sorriu para si mesma. Era bem a cara dele continuar pegando missões por si
mesmo enquanto isso.
— Algo errado?

— Ah, não. Só… não se meta em problemas, está bem?

— Se ao me meter em problemas eu puder matar alguns goblins, eu faria isso e não o consideraria
um prejuízo.

Ele estava calmo e, como sempre, absolutamente focado no extermínio de goblins.

Enquanto preenchia alguns registros, Garota da Guilda roubou um olhar no seu capacete sob o
pretexto de olhar sua papelada. É claro, ela não podia ver a sua expressão. E, no entanto…

Quanto tempo havia passado desde que ela o conheceu? Quase cinco anos? Ela havia acabado de
terminar seu treinamento na capital e foi designada oficialmente para esse edifício.

Ele aparecera na guilda de repente, um novato até então. Ela estava bastante certa de que, naquela
época, ela não pensou em nada disso.

Mas, sempre que ela não conseguia designar todas as missões de goblincídio, lá estaria ele.

Ele sempre voltava dessas missões. E ele sempre terminava o trabalho. Todas as vezes.

Ele nunca mostrou a sua força ou se vangloriou dos seus feitos. Ele fez simplesmente o que devia
ser feito, de novo e de novo, até que finalmente alcançou o ranque prata.

Ele não tomava riscos desnecessários; ele sempre era gentil, se tranquilo. Valia a pena a longa e
ansiosa espera pelo seu retorno.

Ele não trocou de equipamento desde que nos conhecemos. Mas essa é só uma outra maneira de
dizer que ele é familiar.

Garota da Guilda percebeu que as boas lembranças fizeram sua boca esboçar um sorriso, mas ela
não tentou esconder.

— Ah, você realmente é sempre de grande ajuda.

— Sou?

— Ah, sim!

Houve uma pausa. — Entendi.

Garota da Guilda lambeu o polegar e folheou seus papéis, olhando, como de costume, para todas as
missões relacionadas aos goblins.
Ontem ele matou goblins. Hoje ele matou goblins. Existia muitas equipes iniciantes fazendo um
bom trabalho também. E ainda assim, as missões de goblincídio nunca acabavam. Eles tinham pelo
menos uma todos os dias. Talvez, à medida em que os aventureiros se multiplicavam, os ninhos de
goblins também. Ou talvez mais ninhos de goblins significassem mais aventureiros.

— Por que os goblins estão atacando constantemente nossas aldeias? — perguntou Garota da
Guilda, à toa. Seria mais fácil se fossem os homens-lagarto, entende? Então, pelo menos a única
diferença seria a cultura. — Talvez os goblins simplesmente desfrutam atacar as pessoas. — Ela
pensava que estava apenas puxando assunto. Goblins era algo que eles tinham em comum. Na
verdade, ela estava meio que brincando.

— O motivo? — disse ele. É simples. Após uma pausa, ele continuou: — Imagine que um dia, a
sua casa é atacada repentinamente por monstros.

Garota da Guilda se endireitou e colocou as mãos nos joelhos. Ela se concentrou em seus ouvidos.
Ela estava preparada para escutar. Afinal, não era sempre que ele decidia iniciar a conversa.

— Imagine que um dia sua casa é atacada repentinamente por monstros.

— Eles se pavoneiam em sua aldeia como se pertencessem a eles. Eles matam seus amigos, eles
matam sua família, eles saqueiam sua casa.

— Imagine que eles atacam sua irmã. Eles a torturam, eles a violam, eles a matam. Eles profanam
os corpos de sua família, fazem o que querem, gargalhando o tempo todo.

— E você vê tudo de onde se escondia, tentando não respirar.

— Como você poderia deixar isso para lá?

— Então você pega uma arma, você treina a si mesmo, você aprende, você cresce. Tudo o que faz
é para ajudar a se vingar.

— Você os procura, os caça, você luta, você ataca, e você os mata, e os mata, e os mata e os mata.

— Às vezes as coisas dão certo, e às vezes não. Mas cada vez que se pergunta: como vou os matar
da próxima vez? Qual é a melhor maneira de os matar? Dia após dia, mês após mês, isso é tudo o
que você pensa.

— Quando você tem uma chance, é claro que você testa cada ideia que tem.

— E quando você tem feito tudo isso a um tempo suficiente…


— …Você começa a gostar.

Garota da Guilda engoliu em seco.

— Hum, isso…? Você está…?

Ele ainda estava falando sobre os goblins? Ela não tinha certeza.

Talvez — o pensamento passou raspando a beira de sua mente — ele estava falando de si mesmo.

Mas, antes que ela pudesse expressar essa especulação, ele continuou: — Alguns tolos acham que
estão sendo magnânimos dizendo que deveríamos poupar os jovens. — Eles não percebem que os
goblins roubam animais para manter suas crianças alimentadas?

Tremendo ligeiramente, Garota da Guilda assentiu. Ela entendia muito bem o que ele dizia.

Os ranques porcelana e os jovens que esperavam ser aventureiros vinham o tempo todo, cheios de
confiança. “Eu lutei contra alguns goblins quando eles vieram à minha aldeia uma vez. Eles são
insignificantes. Vou ficar bem”.

Esses que os caras durões “lutaram”, não eram mais que alguns goblins, se afugentavam facilmente
e batiam em retirada. Faça isso uma ou duas vezes, e deixe as pessoas pensarem que deveriam se
tornar aventureiras.

Os goblins que sobreviviam a esses encontros, por outro lado, aprendiam e cresciam. Eles eram
conhecidos como andarilhos. Muitos deles se estabeleciam eventualmente em ninhos novos, muitas
vezes como chefes ou guardas.

Depois disso, as lutas com eles eram determinadas mais pela sorte do que pela força.

— É assim que as coisas costumam ocorrer, enfim — disse ele brevemente. — Em outras palavras,
eu sou para os goblins o que os goblins são para nós.

Garota da Guilda prendeu a respiração, sem palavras. O que ela poderia fazer com essa torrente de
emoção? Não, primeiro… primeiro, ele estava ali.

Deuses. Ela soltou a respiração. — Bem, me desculpe, mas…

— Sim?

Antes de pena, antes de tristeza, antes de simpatia: — Somos nós que damos as missões a você.
Então por sua lógica, o que isso faz de nós?

— Hmm.

Por que me sinto tão zangada?


Ela trouxe seu sorriso habitual ao rosto e bateu no balcão com o dedo.

— Você está nos comparando aos deuses das trevas? Isso é terrível. Sou tão assustadora assim?

— …Não foi isso que eu quis dizer.

— Foi o que pareceu.

Quando ela bateu no balcão de novo, ele deu um gemido, intimidado.

— Como a guilda pode manter a sua reputação por falar assim por aí?

Outro gemido.

— Eu gostaria de evitar isso. Talvez seja melhor se eu não lhe oferecesse missões no futuro.

Uma longa pausa. — Isso seria um problema para mim.

— Seria, não seria?

De alguma forma seu problema de uso sincero de palavras parecia muito infantil.

O seu sorriso fixo parecia que estava prestes a se romper.

— Alguém tem que fazer essas missões, e você está fazendo elas. Você devia estar orgulhoso
disso.

Ela balançou o dedo como se dissesse: Se você não for, isso refletirá na guilda… e em mim.
No fim das contas, era verdade. Ela era responsável por ele como um aventureiro. E o que era
mais…

— Você é um aventureiro ranque prata.

Dessa vez, foi a vez de Matador de Goblins ficar em silêncio.

Verdade, ela não podia ver a sua expressão por detrás de seu elmo. Mas depois de cinco anos, não
significava que ela não conseguisse adivinhar como ele se sentia.

Finalmente, ele disse: — E… onde estão os goblins de hoje? Quão grande são os ninhos?

— Muito bem, muito bem.

Acho que vou deixar passar… dessa vez. Enquanto ela ria consigo mesma, os dedos de Garota da
Guilda voavam pelas pilhas de papéis de missões. Ela pegou três folhas, depois escolheu uma.
Esteve lá por alguns dias; uma missão de goblincídio, é claro.

— Esse está nas montanhas do norte. Perto da aldeia há um… bem, um castelo, mais ou menos.
Uma fortaleza na montanha.

— Eles fizeram o seu ninho lá?

— Sim. Nós já temos vítimas também. A irmã de quem registrou foi sequestrada, e… — Ela
suspirou quando virou o papel, embora soubesse que era falta de educação. — Alguns aventureiros
bem-intencionados que passavam por lá foram a resgatar, mas ainda não voltaram.

— …É tarde demais — disse Matador de Goblins, calmamente e friamente. — Considerando o


tempo que a viagem vai levar, eles estarão perdidos antes de eu chegar lá.

Não obstante, ele estava de pé. Como sempre, não havia sinais de hesitação.

— Não podemos deixar assim. Se destruirmos o ninho agora, talvez não haja mais vítimas.

— …Certo.

Certo, era por isso. Era por isso que ele era a pessoa mais valiosa na fronteira.

Existia aqueles que poderiam lutar contra um monstro poderoso.

Mas, quantos poderiam continuar voltando para a luta?

Muitos foram salvos graças a ele. Ele estava fazendo um serviço de verdade ao mundo.

Pelo menos, ele me salvou.


Então, ela faria o que fosse preciso. O que pudesse.

— Tudo certo. Boa sorte, meu Matador de Goblins!

Ela o ajudaria a andar com a cabeça erguida.


Depois de uma festa que durou três dias e três noites, os goblins ficaram muito satisfeitos.

Os restos de suas presas cobriam o chão do que uma vez fora um salão opulento, agora
conspurcado com excremento, fedor e cadáveres.

Antes, eles fizeram apenas uma captura magrinha, mas agora possuíam quatro presas frescas.
Quatro mulheres, nada menos. Humanas, é claro, mas também uma elfa e uma rhea. Os goblins
ficaram naturalmente exaltados com isso, e a sua celebração foi completamente sem restrições;
como se os goblins alguma vez mostrassem restrição.

As garotas foram extremamente superadas em números pelos goblins, rodeadas, e então


completamente cercadas por eles… O que aconteceu depois dificilmente se repetiria.

Mas, essas não eram garotas rurais normais.

Seus corpos expostos, com as roupas brutalmente arrancadas, eram diferentes, mas todos
mostravam os efeitos de um longo treinamento. Suas peles estavam bronzeadas, com cicatrizes que
falavam de velhas feridas, e cada vez que eram tocadas, os músculos endurecidos eram visíveis
através de uma camada flexível de gordura.

E no canto da sala, jogados de lado com tanto lixo, estava uma pilha de armaduras, capacetes,
espadas e escudos roubados.

Essas mulheres eram aventureiras do oitavo ranque, aço; ou melhor, foram.

Agora, nenhuma delas estava respirando.

Como isso aconteceu?

Esse foi o último pensamento a passar pela mente da filha nobre que fora a líder do grupo.

Elas estiveram tão erradas em assumir essa aventura, tomadas pela indignação justa ao ouvir sobre
uma aldeã sequestrada e querendo a libertar?

Não foi precisamente o orgulho que as conduziu à sua destruição. Elas haviam se esgueirado ao
meio-dia, na esperança de pegar os goblins enquanto dormiam.

A fortaleza da montanha fora construída de árvores antigas pelos elfos, e era um lugar
desconhecido para as aventureiras, um labirinto no qual não possuíam um guia. Então elas nunca
abaixaram a guarda.
Elas se prepararam o melhor que puderam na pequena aldeia, sabendo muito bem que muitos
goblins as aguardavam. Elas só sabiam que tinham que resgatar a garota.

Essas não eram iniciantes de rostos delicados; elas estiveram em uma série de aventuras e tinham
uma boa dose de experiência e habilidade. Na frente, sua líder armadurada empunhava sua arma
em prontidão, e uma patrulheira rhea observava a área como um falcão. Guardando a retaguarda,
uma maga elfa estava preparada com suas magias, e uma monja humana rezava por milagres.

Elas se mantiveram em formação, ficaram alerta e verificaram cada centímetro de chão. Elas não
haviam cometido nenhum erro.

A verdade nua e crua, era que elas simplesmente tiveram azar.

Primeiro, a fortaleza — tal como era comum nessas estruturas — estava cheia de armadilhas. As
armadilhas que os elfos uma vez estabeleceram para afastar os goblins, agora, ironicamente,
serviam para manter os goblins seguros.

A exaustão de sua Patrulheira em procurar as armadilhas elaboradas, sensíveis e mortais,


desempenhou um papel importante no que aconteceu. Elas haviam chegado no santuário interior da
fortaleza, e no final, Patrulheira não percebeu um dispositivo de alerta.

— Todo mundo, formação!

Enquanto um alarme soava loucamente, o grupo correu para suas posições ao comando de sua
líder. Maga ficou no centro, com sua líder Cavaleira, Patrulheira e Monja em três pontos ao redor
dela. Não era um substituto de uma parede boa e sólida entre elas e o inimigo, mas era uma
formação forte.

Mas, os goblins que as rodeavam eram muitos, realmente muitos.

O chame, se quiser, de tirania da maioria.

A habilidade de arquearia de Patrulheira era um dom divino, mas mesmo ela não poderia resistir
quando existia mais inimigos que possuía de flechas.

Maga usou quatro de suas artes, cinco — um grande número — mas, eventualmente, sua força
acabou.

Monja manteve suas orações por milagres e proteção até que não pudesse mais rezar, e ela não
tinha mais nada.

A líder delas combatia, com sua lâmina coberta de sangue, mas quando se cansou, os goblins a
dominaram, e depois a caçada acabou.

Elas possuíam todos aqueles corpos, e ainda assim a luta não duraram uma hora inteira.
E lá entre os montes de corpos perfurados por flechas, mutilados por espadas, queimados por
magias, uma celebração começou.

— Hr… hrrr… — A voz da elfa estava tensa de medo.

— Se-se afastem… Se afastem…! — O rosto da rhea estava desesperado. Monja orava


silenciosamente, e sua líder estava mordendo os lábios com força suficiente para arrancar sangue.

Os goblins lambiam os lábios enquanto olhavam para suas presas, que se aninhavam e se
abraçavam.

A terceira e última parte do azar do grupo era que seus inimigos eram goblins.

Normalmente, as cativas dos goblins eram comidas ou forçadas a se tornarem recipientes de


reprodução, e algumas eram ocasionalmente deixadas sozinhas, guardadas para um dia chuvoso.

Mas dessa vez foi diferente.

Essas aventureiras mataram muitos de seus irmãos, e ninguém estava com vontade de lhes dar um
fim simples.

Os goblins viviam pela lei da sobrevivência, dispostos a sacrificar quantos deles fossem precisos
para vencer. Então eles não lamentavam as mortes de seus camaradas. Mas, a raiva e o ódio por
essas mortes eram profundos.

— GARUUURU.

— GAUA.

Os goblins ficaram encantados por encontrar vinho entre as provisões que tomaram das mulheres.
Suas mentes embriagadas, pequenas e insignificantes inventaram jogos horríveis um atrás do outro
para jogar com suas prisioneiras. E a aldeia estava bem abaixo da montanha, um lugar fácil para
obter mais brinquedos se eles terminassem com os que tinham aqui.

A pobre aldeã capturada mal serviu dez goblins antes de não aguentar mais. Já a tinham usado por
um bom tempo.

Não havia esperança.

Cavaleira, com suas roupas rasgadas, com um goblin a segurando, deu um grito agudo.

— Seus bastardos! Vocês querem humilhar alguém? Comecem comigo!

Ela era filha de uma casa nobre. Ela havia se tornado uma cavaleira errante a serviço do Deus
Supremo, responsável pela administração da lei e da justiça. Ela contemplara todos os destinos
malignos que poderiam acontecer com ela e estava pronta para eles.
Mas, ela não estava preparada para sacrificar suas amigas.

Primeiro, Patrulheira foi usada para tiro ao alvo frente aos seus olhos. A líder implorou aos goblins
pela vida da sua companheira. Pelo fato de Monja ter tentado morder sua própria língua enquanto
os goblins a matavam dolorosamente, eles empurraram entranhas de sua camarada para dentro de
sua boca. Quando Maga foi queimada viva, o coração de Cavaleira se partiu em mil pedaços e a
sua alma falhou.

Foi só depois de três dias e três noites que os goblins finalmente concederam o desejo da líder.

O que lhe aconteceu durante esses três dias até que seu corpo, tão mutilado que mal parecia
humano, foi jogado no rio, não estava apto para ser escrito.

O corpo da aventureira que foi levado até eles, e o riso estridente que ecoou pelo vale, deixou os
aldeões do sopé da montanha atormentados de medo.

Mas, há exceções para todas as regras.

Por exemplo, um goblin de sentinela que segurava uma lança rudimentar e patrulhava a muralha no
ar da noite.

Ele, e só ele, não estava rindo.

Obviamente, não é que ele sentia qualquer tipo de simpatia para com as mulheres degradadas. Ele
só estava chateado por ele ter sido deixado de fora da celebração.

Ele esteve de guarda, vigiando a aldeia, quando as aventureiras atacaram, então ele não havia
participado da caçada. E (ele foi informado) que aquele que não caça, não tem direito de partilhar
os espólios.

Ele não teve nenhuma resposta a esse argumento, e então ele se retirara silenciosamente de volta
para a muralha.

O guarda tremia no seu posto, congelando no vento que soprava da montanha abaixo. Era possível
ele ter um pouco de sorte?

Eles lhe haviam poupado um dedo queimado. Ele teria gostado de ao menos um pedaço da rhea.
Ele mastigou saudosamente o dedo, desejando por algo mais, e quando o fez, ele começou a
respirar cada vez mais avidamente.

Não lhe ocorreu que se ele estivesse na luta contra as aventureiras em vez da guarda, ele poderia ter
morrido. Todos os goblins acreditam que todos os outros goblins estariam na frente, enquanto ele
mesmo luta de uma posição confortável na parte de trás.

Ainda assim, as mortes de seus irmãos os irritavam, e isso os tornavam difíceis de lidar…
— GUI…

Vigiar a aldeia não interessava. Ter um guarda contra invasores inimigos era mesmo necessário?
Essa fortaleza fora construída há muito tempo pelos elfos (não que os goblins se importassem).
Quando partiram, ela ficou esquecida e deserta até que os goblins se mudaram. Tudo o que os
goblins querem de um ninho é que ele seja robusto, seguro e ofereça uma boa caçada. Então eles
tomaram a fortaleza, com todas as armadilhas, estratagemas e muros que seus construtores
abandonaram.

Com tudo isso, essa fortaleza não precisaria de um guarda. O goblin preso no dever de guarda
estava profundamente descontente.

Então, quando ele notou, ele ficou realmente eufórico.

— GRRRRR?

Aventureiros. Dois deles.

Um deles era um guerreiro com uma armadura suja de couro e um capacete de aço, não tentando se
esconder enquanto caminhava calmamente entre as árvores. Um escudo pequeno estava preso em
seu braço. No seu ombro havia uma aljava, em sua mão um arco e no quadril uma espada.

Ele parecia um fracote. Por que eles deveriam se preocupar com ele? O goblin de guarda estava
concentrado na pessoa caminhando ao lado do guerreiro. Era uma linda garota com vestimentas de
sacerdotisa que estava sem jeito, segurando seu cajado e parecendo nitidamente pouco à vontade.

O guarda lambeu os lábios. Nenhum deles era muito carnudo, mas pelo menos aquela presa podia
servir para algo.

Ele fez o rosto mais desagradável e, com saliva pendurada em sua boca, voltou para dentro para
alertar os outros. Isso era conforme a ordem, mas ele nunca deveria ter tirado os olhos dos
aventureiros.

O guerreiro ajustou uma flecha no arco e puxou a corda tanto quanto pôde. Um pano embebido
com óleo de Medeia estava enrolado na ponta da flecha. A sacerdotisa friccionou uma pederneira
nela.

— GAAU!

— GOURR!
Os goblins que o guarda convocou foram se ralando até os muros e começaram a clamar e apontar
para os aventureiros. Mas era tarde demais.

— Uma plateia e tanto — murmurou Matador de Goblins de seu capacete, enquanto soltava a
flecha.

A flecha se alojou nas paredes de madeira, e as chamas avançaram em direção aos goblins, que
começaram a gritar.

Uma segunda flecha ardente veio voando. Em um piscar de olhos, havia fogo por todo o lado.

— GAUAUAAAA?!

Uma criatura em pânico tentando escapar perdeu o equilíbrio e escorregou, levando junto dois de
seus companheiros a cair da muralha até o chão muito abaixo. O guarda estava entre eles, mas
Matador de Goblins não sabia e nem se importava.

— Três.

Ele contou calmamente e atirou outra flecha.

Fogo, é claro, era o grande inimigo dos elfos. Se o povo da floresta ainda estivesse naquela
fortaleza, nunca teria sido tão fácil atacar com um simples pano flamejante.

Mas os elfos, que teriam oferecido súplicas aos espíritos para extinguir todas as chamas, já não
estavam mais lá. Qualquer proteção que eles pudessem ter erguido contra a conflagração, se foi há
muito tempo.

A fortaleza na frente dos aventureiros era grande e sólida, mesmo assim, era apenas de madeira.

— Já chega de flechas de fogo. Se prepare.

— Ah, c-certo!

Enquanto Matador de Goblins puxava o arco mais uma vez, Sacerdotisa ficou com o cajado de
monge a postos, preparada para iniciar a oração consome-alma à deusa.

A cobrindo, Matador de Goblins acertou uma flecha entre os olhos de um goblin tentando fugir
pelo desfiladeiro. O monstro tombou para trás na fortaleza queimando da qual ele estava tão
desesperado para escapar.

— Idiota. Esse é o quarto.

No instante seguinte, houve um tum enfadonho quando uma pedra ricocheteou no seu capacete.

— Ah, não! Você está bem?! — exclamou Sacerdotisa.


— Não entre em pânico — respondeu ele balançando a cabeça, irritado por ela ter quebrado sua
concentração ao gritar.

Ele estalou a língua, então viu um goblin no desfiladeiro segurando uma corda.

Uma funda poderia ser uma arma poderosa. Podia ser apenas um pedaço de corda que lançava a
pedra, mas o projétil poderia viajar com uma velocidade e força mortal. E era quase impossível
ficar sem munição, uma característica que Matador de Goblins gostava muito.

Mas, de qualquer forma, mesmo que os goblins tivessem conseguido o contato com uma funda…

— Poderia importar se fosse em uma caverna. Mas não à essa distância.

Fora dos combates corpo a corpo em lugares confinados, a força física dos goblins se tornavam
irrelevantes. Faltavam-lhes coordenação para ataques à distância. A pedra que ricocheteou em seu
capacete há pouco, foi provavelmente um golpe de sorte.

Ainda assim, as coisas podiam ter sido diferentes se os dois fossem iniciantes presunçosos. Mas
Matador de Goblins não era nada senão minucioso.

Ele disparou uma flecha na direção do atirador, perfurando sua garganta. Contra as chamas
brilhantes, a falta de visão noturna não fazia diferença.

— Cinco… Eles virão em breve.

Tal como ele previra, uma multidão de goblins apareceu na entrada, tentando correr da fortaleza
em chamas. Eles carregavam seu vinho, suas presas, seus espólios e eles se empurravam nos seus
esforços para sair pela porta.

Enquanto corriam pelas suas vidas através da fortaleza, na qual eles gostavam bastante de viver,
parecia que seus terrores se transformaram em raiva. Suas faces horríveis cintilavam com a
intenção de matar Matador de Goblins e Sacerdotisa. Muitos planos malignos percorriam suas
cabeças. Quando saíssem do edifício, eles matariam os dois aventureiros? Os violariam?

Cada goblin possuía uma arma em mãos, e todos estavam visando Sacerdotisa parada bem nos
arredores da entrada…

— Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, pelo poder da terra, conceda segurança para nós
que somos fracos.

E de repente, os goblins se viram batendo suas cabeças contra uma parede invisível e cambaleando
para trás de volta à fortaleza. Uma parede de poder sagrado bloqueou a entrada e evitou os goblins
de escapar. A Mãe Terra, abundante em misericórdia, protegeu sua devota seguidora com o milagre
de proteção.

— GORRR?!
— GARRR?!

Os goblins ficaram cada vez mais em pânico quando perceberam que ficaram presos. Eles gritavam
e choravam enquanto batiam suas clavas e seus punhos contra a barreira invisível e perceberam que
nada poderia a quebrar. Fumaça e chamas lentamente obscureceram os goblins, até que
desapareceram da visão.

— Eu ouvi dizer que você havia recebido um milagre novo — disse Matador de Goblins,
disparando casualmente uma flecha em um goblin tentando escapar da área. — Seis. Isso tornou
nosso trabalho muito mais fácil.

— Mas… para usar Proteção assim… — disse Sacerdotisa. Sua voz estava rouca, e não era por
respirar a fumaça que surgia dos goblins que outrora viveram.

Ela esteve no templo nesses últimos dias para aprender novos milagres. Proteção era um dos dois
que lhe foram concedidos.

Dependendo de sua força e status, os clérigos que saíram para o mundo poderiam receber novos
milagres, bem como oráculos. Parecia que sua fé era mais forte do que ela mesma percebera. Isso a
incomodava cada vez que a Madre Superiora elogiava os frutos de sua aventura…

…Mas se isso significasse ganhar um novo milagre, ela suportaria o treinamento com a convicção
de que isso iria a ajudar apoiar Matador de Goblins.

E isso foi o que havia acontecido.

Por que a Mãe Terra me concedeu esse milagre…?

Ela soltou um suspiro longo e infeliz.

— Pode existir uma porta traseira ou um túnel de fuga. Fique alerta.

— Como você pensa nessas coisas?

— A imaginação também é uma arma. — Com essas palavras, Matador de Goblins preparou outra
flecha. — Aqueles sem ela são os primeiros a morrer.

— …Você quer dizer, como as primeiras pessoas que vieram aqui antes?

— Isso mesmo.

A fortaleza da montanha ardeu.

Com isso, a aldeia abaixo foi salva da ameaça dos goblins. As almas de cada uma daquelas
aventureiras falecidas poderiam ir para os braços de qualquer deus em que acreditassem.
Os corpos dos goblins queimavam. Os corpos das aventureiras queimavam. E o corpo da garota
raptada queimava enquanto a fumaça flutuava em direção ao céu.

— Nós precisaremos controlar o incêndio. Quando estiver esgotado, precisaremos procurar por
sobreviventes e lidar com eles — disse Matador de Goblins, olhando para a fumaça, sem um traço
de emoção em sua voz. Houve uma pausa. — …Agir como meu ranque pode ser… difícil.

Sacerdotisa o observava como se estivesse vendo algo desolador. Não havia como saber sua
expressão debaixo daquele capacete. Ou não deveria ter havido.

Quase inconscientemente, ela juntou as mãos, se ajoelhou e rezou.

O calor e a fumaça cobriram o céu com nuvens escuras, e por fim, uma chuva negra começou a
cair. Ela rezou enquanto os pingos de chuva caiam sobre ela, enquanto suas vestimentas ficavam
marcadas de cinza.

A única coisa que ela queria era salvação.

Salvação para quem e pelo que ela não sabia.

— O rei goblin perdeu a cabeça para um golpe crítico dos mais terríveis!

O bardo deu um dedilhar melodioso em seu alaúde.

— Um azul escaldante, o aço de Matador de Goblins cintila no fogo.

As notas ecoavam pela rua a noite. As pessoas paravam para ouvir, atraídas pela melodia poderosa
e melancólica.

— Assim, o plano repugnante do rei chegava ao seu fim apropriado, e a adorável princesa alcançou
seu salvador, seu amigo.

Jovens e velhos, homens e mulheres, ricos e pobres, pessoas de todas as posições sociais assistiam
o bardo. Sua epopeia peculiar dependeria inteiramente de sua própria habilidade para o seu
sucesso.

— Mas ele é Matador de Goblins! Em nenhum lugar ele permanece, mas jurou vagar, não deve ter
outro ao seu lado.

Uma jovem na primeira fila deu um suspiro caloroso e triste. O bardo reteve o sorriso que trouxe
aos seus lábios e continuou serenamente:

— Fora apenas o ar ao seu alcance que a grata donzela encontrou… o herói partira, sim, sem olhar
para trás.

Blam, blam, blam.


— Obrigado! Essa noite é até onde eu levarei a história da queima da fortaleza da montanha do
conto do Matador de Goblins, herói da fronteira.

A audiência que havia se reunido na rua da capital se dispersou em um murmúrio. O bardo deu
uma reverência elegante de agradecimento enquanto as moedas retiniam em seu chapéu.

Um aventureiro ranque prata que nunca sofreu uma derrota enquanto expulsava todos os goblins ao
longo da fronteira indomável. Para os aldeões assolados por esses monstros, ele poderia muito bem
ser considerado ranque platina: um herói que apareceu como o vento e desaparece da mesma
forma. A epopeia que o bardo moldou sobre essa figura de boatos que ele teve chance de ouvir
parecia ser bem-aceito. Isso era o que contava.

— Senhor…?

Surpreendido pela voz repentina e clara, o bardo olhou para cima no meio do caminho para pegar
algumas moedas do chão. O resto da plateia já havia ido embora, mas uma pessoa ficou ali, com o
rosto escondido por um manto.

— Aquele aventureiro sobre o qual você cantava… ele realmente existe?

— Claro que sim. Absolutamente. — O bardo estufou o peito.

As pessoas acreditavam nos feitos relatados pelos poetas e menestréis. Ele dificilmente admitiria
que havia inventado a canção com base em pedaços de bisbilhotagem ao acaso.

E de qualquer forma, esse assassino misterioso de goblins deu a ele uma boa quantidade de
dinheiro. O mínimo que ele poderia fazer era cuidar da reputação do homem.

— Ele está em uma cidade há dois ou três dias de viagem na direção da fronteira oeste.

— É mesmo? — suspirou a figura, e com um aceno, o capuz do manto caiu para trás.

Seu corpo flexível estava vestido com um traje de caçador. Um arco enorme estava pendurado em
suas costas. Ela era esbelta e linda.

O bardo não pôde deixar de a encarar, e não só pela sua beleza.

Ele ficou impressionado com suas orelhas longas em formas de folha.

— Orcbolg… — disse ela, com um som melodioso, mas estranho. Uma aventureira elfa.
Sim, olá. Bem-vindo à Guilda dos Aventureiros! Está apresentando uma missão? Então, por
favor…

O-o quê? Uma entrevista? Hum… isso é oficial? Tem certeza de que está tudo bem? Ufa.

Uhum.

A Guilda dos Aventureiros; hee-hee, eu sei o que você está pensando. É estranho ter uma agência
de emprego para um bando de rufiões.

Na realidade, bem no início, a guilda não era uma guilda, era só uma taverna onde aventureiros se
encontravam. O Rei do Tempo estabeleceu isso para apoiar esses heróis, as pessoas que mais tarde
seriam aventureiros ranque platina. Mas hoje em dia é um escritório real! Eu passei em um exame
oficial e tudo mais para se tornar uma recepcionista, sabia?

Mulheres profissionais… hee-hee, minhas colegas também são todas mulheres talentosas, é claro,
então eu não quero me gabar. Mas tive muita sorte em conseguir esse emprego.

Os aventureiros trabalham arduamente para ganhar a confiança do público, porque a confiança se


traduz em um trabalho melhor. Os nossos estimados recrutadores de missões julgam suas
habilidades por sua posição, e você nunca terá falta de pagamento.

E então, sabe, há… Você já ouviu falar sobre isso, certo?

Tem também aqueles valentões itinerantes que entram dizendo: “Me concederam uma arma
lendária!” ou “Os próprios deuses me protegem!”. Eles são realmente muito complicados. Eles não
têm registros, e não podemos recomendar aos nossos clientes confiarem em pessoas que vão por aí
fazendo o que bem entendem. Não é como se pudéssemos apenas olhar para uma folha com
números convenientes e saber o quão fortes esses vadios são.

É por isso que a guilda estabeleceu três alicerces para avaliar seus membros. Nomeadamente,
quanto bem eles têm feito ao mundo, o valor agregado das recompensas que ganharam e as
avaliações de personalidade realizadas mediante a entrevistas frente-a-frente. Alguns se referem ao
resultado coletivo como “pontos de experiência”.

Isso é o que nossa estrutura de ranque parece, com o um sendo o maior e o dez sendo o mais baixo.

1. Platina. Esse é extremamente raro. Apenas algumas pessoas na história alcançaram esse
ranque. Melhor nem pensar nisso.
2. Ouro
3. Prata
4. Cobre. Essa posição constitui nossos membros mais talentosos, com base nas suas habilidades
e o grau de confiança que eles ganharam. Eles são realmente especiais!
5. Rubi
6. Esmeralda
7. Safira. Esses são as fileiras do meio. Nem todos as alcançam hoje em dia.
8. Aço
9. Obsidiana
10. Porcelana. Esses são os nossos novatos. É quando se sentem confortáveis que estão em grande
perigo.

Você pode ver que existe diferentes níveis baixos, médios e superiores. O chame de régua.

O quê? Existem casos em que uma missão é, em última análise, nunca aceita? Bem, não posso…
dizer que não há…A maior parte das vezes acontece com missões de goblincídio. Há tantas delas, e
os recrutadores das missões são muitas vezes de aldeias agrícolas, então… Bem, elas não são
populares. Elas podem ser complicadas, e as recompensas são pequenas. Existem muitos goblins,
sabia?

Acho que se pode dizer que elas são boas missões para principiantes, mas… Bem…

Ah, com licença, alguém acabou de entrar. Podemos falar disso depois?

Hum-hum!

Sim, olá! Como posso ajudar?

— Me dê goblins.
— Orcbolg — disse a elfa sem preâmbulo. Sua voz soou clara, como se estivesse entoando uma
magia.

Era antes do meio-dia, quando os aventureiros que acordaram tarde vinham ver quais missões
ainda estavam disponíveis. Era consideravelmente mais calmo do que bem de manhãzinha, mas a
guilda ainda estava cheia de burburinhos, e todos os olhos estavam fixos na elfa.

— Oh, meu… Olha só para ela! — Um garoto guerreiro novato assobiou apreciativamente.

— Ei! — cortou seu membro de grupo, uma aprendiza de clériga.

— Desculpe — disse o garoto com um sorriso apaziguador, mas seus olhos continuaram voltados à
elfa.

Era difícil o culpar. Os elfos eram naturalmente possuidores de uma beleza de outro mundo, mas
mesmo entre seus números, essa jovem era impressionante.

A idade possuía pouco significado para os elfos, mas pela aparência, ela parecia ter dezessete ou
dezoito anos. Ela era esbelta e alta, vestida com um traje de caçadora ajustado, e se movia tão
graciosamente quanto uma corça.

O arco grande pendurado em suas costas revelava que ela era uma patrulheira ou talvez uma
arqueira. A insígnia em volta de seu pescoço era feita de prata.

— Ela é uma alta-elfa… Eles são os descendentes de sangue das fadas…

— Suas orelhas são realmente mais longas do que as de outros elfos…

Uma druidesa e uma rhea sussurraram para um guerreiro meio-elfo de armadura leve, enquanto seu
outro membro do grupo, um guerreiro de armadura pesada, a olhava. Um batedor jovem que
escutava nas proximidades disse conscientemente: — Claro que são.

Garota da Guilda já lidara com alto-elfos antes e não estava nervosa ao se deparar com essa, mas
ela ficou confusa com as palavras que saíram da boca da garota.

— Sinto muito, minha senhora. Você quer dizer ork, como a orca?

Ela estava acostumada com as pessoas se aproximando do balcão e simplesmente dizendo o nome
de um monstro, mas essa era uma palavra que nunca escutou antes. Por outro lado, há cinquenta
mil tipos de monstros (sem exagero!), então era possível que esse fosse alguma variedade que ela
não estava familiarizada.
Ou talvez fosse o nome de algum elfo? A língua élfica possuía o ritmo de uma magia ou uma
canção.

— Não. Orc. Orcbolg. — Enquanto ela repetia as palavras, Alta-Elfa Arqueira inclinou a cabeça
como se dissesse Entendeu? Baixinho, ela acrescentou: — Estranho…

— Eu ouvi dizer que ele estava aqui.

— Hum, entendo. Então está procurando por um aventureiro, sim? — Garota da Guilda possuía
muitos talentos, mas até ela não conhecia o nome completo de todos os aventureiros de cor. Ela se
virou para pegar uma pasta grossa da prateleira atrás de si, mas depois ouviu:

— Idiota. É por isso que você, Orelhuda, precisa descer do pedestal em que você as colocou.

As palavras vieram de um anão robusto e corpulento, parado ao lado da elfa. A única coisa visível
por cima do balcão era a sua testa brilhante e sem cabelos. Ele acariciou sua barba branca longa
refletidamente.

Sua roupa era de um estilo oriental incomum, e em sua cintura, ele carregava o que parecia um
monte de tralha. Garota da Guilda podia dizer que era um conjurador; um anão xamã. Ele, também,
usava uma insígnia de prata ao redor do pescoço.

— Esse lugar pertence às pessoas altas — disse ele. — Te engana se acha que suas palavras de
orelhuda vão te dar qualquer benefício.

— Meu, quão inútil você é. Então como, em sua sabedoria, eu deveria chamar ele? — disse a alta-
elfa com um bufo e uma expressão bastante não-elfo.

Em resposta, Anão Xamã enrolou seu bigode orgulhosamente e disse: — “Corta-barba”, é claro!

— Hum, lamento, senhor, mas também não há ninguém aqui com esse nome — disse Garota da
Guilda apologeticamente.

— O que, ninguém?! — disse o anão.

— Não, senhor. Sinto muito.

A alta-elfa balançou a cabeça em sinal exagerado de desgosto, dando de ombros com um suspiro.

— Tamanha é a sabedoria que os anões possuem. Teimosos tanto quanto as rochas que trabalham,
e sempre convencidos de que estão certos.

— Desça aqui e repita isso! — exclamou Anão Xamã. Ele poderia ter começado uma briga naquele
momento se a elfa não tivesse o dobro da sua altura. Ele mal conseguia a alcançar se ele tentasse
saltar uns trinta centímetros do chão. A elfa ficou cada vez mais presunçosa.
O anão cerrou os dentes. Então, de repente, ele pareceu pensar em algo, e um sorriso inesperado
veio ao seu rosto.

— …Heh. Vocês elfas… Corações tão rígidos quanto uma tábua e igualmente planos. Isso explica
tudo.

— O quê?! — Dessa vez foi a elfa que ficou vermelha-viva. Ela olhou para o anão e cobriu
inconscientemente seu peito.

— Is-isso não tem nada a ver com nada! E-engraçado ouvir isso de você, quando todas as filhas de
anões são cilíndricas!

— Nós as chamamos de rechonchudas, Orelhuda, e é melhor que ser uma tábua!

Suas vozes ficavam cada vez mais altas.

A inimizade entre os elfos e anões era tão antiga quanto os deuses. Ninguém sabia, no entanto,
exatamente como isso começara; até mesmo os elfos eternos não tinham bem a certeza. Talvez
fosse simplesmente essa grande antipatia antiga: os elfos reverenciavam as árvores e odiavam o
fogo, enquanto os anões derrubavam árvores para fazer fogo.

Qualquer que seja a fonte desse ódio, esses dois não seriam aqueles que iriam o superar, enquanto
eles discutiam na frente de Garota da Guilda, que mantinha um sorriso cada vez mais desesperado
em seu rosto.

— Hum, vamos… vamos deixar isso para lá, tudo bem…?

— Com licença, vocês dois, mas se vocês querem discutir, por favor, façam isso em outro lugar e
poupem o resto de nós. — Uma grande sombra pairou sobre eles, interrompendo a discussão.

Um homem-lagarto se ergueu sobre eles, com o corpo coberto de escamas, sibilando ligeiramente
seu hálito. Até mesmo Garota da Guilda quase soltou um “caramba…” ao vê-lo.

Ela nunca havia visto o traje tradicional que ele usava. Em volta de seu pescoço estava uma
insígnia de prata, bem como um amuleto curioso.

Lagarto Sacerdote juntou as mãos em um gesto incomum e curvou a cabeça para Garota da Guilda.
— Minhas humildes desculpas. Parece que meus companheiros estão causando problemas a você.

— Ah, n-nem um pouco! Todos os nossos aventureiros são pessoas tão impulsivas. E-estou
acostumada com esse tipo de coisa!

Mesmo assim, o grupo diante dela era uma visão incomum. Não era só porque eles eram de raças
diferentes.

Os alto-elfos eram raros, mas não era sem precedentes as pessoas jovens da floresta se tornarem
aventureiras para saciar sua curiosidade acerca do mundo. Os anões eram muito semelhantes aos
seres humanos em seu amor pelos tesouros e pela bravura, e assim, frequentemente se tornavam
aventureiros. E embora os homens-lagarto fossem por vezes, considerados mais semelhantes aos
monstros, algumas de suas tribos eram amigáveis, e de vez em quando, um homem-lagarto se
tornava um aventureiro.

Mas os três de uma vez, e todos ranque prata. Para três aventureiros de origens tão diferentes
formar um grupo juntos, era algo que Garota da Guilda nunca viu antes.

— Hum… — Garota da Guilda olhou para a elfa e o anão, cuja discussão ainda não havia
diminuído, depois para o homem-lagarto. Exteriormente, ele parecia que poderia expor as suas
presas e saltar sobre eles a qualquer momento…

— Então… quem vocês estão procurando, senhor? — Ainda assim, ele parecia ser o mais fácil dos
três para se conversar.

— Hmm. Lamentavelmente, eu mesmo não possuo facilidade com a língua dos homens…

Garota da Guilda assentiu junto.

— Orcbolg e Corta-barba são o que vocês chamariam de apelidos. Na sua língua, vocês diriam…

— Ele assentiu firmemente e, como ela tinha de alguma forma esperado, disse:

— …Matador de Goblins.

— Oh! — O rosto dela brilhou, e ela bateu as mãos antes que soubesse o que estava fazendo. Ela
suprimiu o desejo de dar um grito de entusiasmo.

Outros aventureiros vieram aqui só para o encontrar. Sua reputação estava se espalhando.

Não posso deixar essa oportunidade escapar, por ele!

— Eu o conheço, senhor! Muito bem!

— Oh, conhece?! — Os olhos do homem-lagarto se ampliaram e sua língua saiu de sua boca, no
que parecia ser o equivalente a um sorriso dos homens-lagarto. Garota da Guilda nem pestanejou
frente a expressão bastante feroz.

— Ah, você gostaria de um chá, talvez?

— Eu não poderia a incomodar assim. — Ele chamou seus companheiros: — Vocês dois, parece
que quem buscamos está realmente aqui.

— Viu? Eu te disse.

— Ahh, mas você não pôde dizer a eles, pôde, moça?


— Olha quem fala.

— O que foi?!

Lagarto Sacerdote soltou um chiado. A elfa e o anão olharam silenciosamente um para o outro.

— Bem, então, minha senhora Garota da Guilda. Onde está meu senhor Matador de Goblins?

— Hum… Ele foi caçar alguns goblins há cerca de três dias.

— Oh-ho. Entendo. Mas é claro.

— Suponho que ele voltará logo, senhor. — Garota da Guilda olhou esperançosa para a porta da
guilda. Ela estava preocupada com ele, claro, mas confiante de que voltaria.

Ele nunca seria derrotado por meros goblins, afinal.

— Lá! — gritou Garota da Guilda quando o sino sobre a porta soou, e dois aventureiros entraram.

O homem-lagarto, a elfa e o anão se viraram para a porta… e ficaram sem palavras.

Uma linda garota com vestimentas sagradas estava lá, segurando um cajado de monge nas mãos.
Uma sacerdotisa. Excelente.

O problema era o homem que caminhava audaciosamente adiante dela. Ele usava uma armadura de
couro suja, um elmo de aço e carregava uma espada que parecia muito longa para se empunhar,
junto com um pequeno escudo redondo. Ele parecia patético. Qualquer novato em sua primeira
missão estaria melhor preparado.

Ele caminhou sem parar até o balcão. Sacerdotisa teve que correr para o acompanhar, mas à
medida que seu ritmo diminuía, ela finalmente conseguiu chegar ao seu lado.

— Bem-vindo de volta, meu querido Matador de Goblins! Vocês dois parecem estar em boa forma.
— Garota da Guilda lhes deu um bom aceno, sua trança saltou na hora.

— Nós terminamos o trabalho com segurança.

— Sim, de certa forma.

O adendo de Sacerdotisa traiu um pouco de cansaço face ao relatório calmo de Matador de


Goblins. Ela estava sorrindo corajosamente, mas… Garota da Guilda assentiu. Ela podia entender.
Matador de Goblins pegava missões dia após dia, noite após noite, com quase nenhum descanso. O
acompanhar deveria ser difícil.

— Tudo certo. Me dê os detalhes mais tarde. Não precisa ser agora.


— Hum?

— Sim. Há alguns visitantes aqui para o ver, Sr. Matador de Goblins.

Ele se virou para o grupo ao lado dele como se estivesse os notando pela primeira vez: uma alta-
elfa arqueira, um anão conjurador e um lagarto sacerdote.

Sacerdotisa soltou um pequeno ruído em choque e então fechou a boca rapidamente.

— São goblins?

— Nada disso! — Alta-Elfa Arqueira lhe deu um olhar suspeito como se ela não pudesse acreditar
no que estava ouvindo, mas ele simplesmente respondeu: — Entendi.

— Então, você é Orcbolg? Você não se parece…

— Porque eu não sou. Nunca fui chamado por esse nome.

A elfa ficou com uma expressão emburrada, enquanto o anão, afagando a barba, reprimiu uma
risada. Lagarto Sacerdote, embora parecesse um pouco incomodado, parecia acostumado com isso.
Ele juntou as mãos em um gesto estranho, e então inclinou a cabeça suavemente para Matador de
Goblins.

— Nós, humildes visitantes, temos negócios com meu senhor Matador de Goblins. Poderíamos
solicitar um pouco de seu tempo?

— Como quiser.

— Se vocês quiserem ter uma reunião, temos quartos no andar de cima… — O homem-lagarto fez
um gesto de gratidão para Garota da Guilda por sua sugestão.

— Vamos, então.

Sacerdotisa ficara em silêncio durante todo o intercambio, mas agora disse, com um pouco de
pânico no olhar ao ver Matador de Goblins enquanto ele saía: — H-hum, e-eu deveria…? Eu
deveria me j-juntar a vocês?

Ele olhou o corpo delgado dela de cima em baixo, e então balançou a cabeça.

— Descanse.

Ele não parecia esperar um argumento. Sacerdotisa deu um pequeno aceno.

E sem um segundo olhar, Matador de Goblins subiu as escadas calmamente.


— Não se preocupe. Você o terá inteiro de volta. — Alta-Elfa Arqueira deu a Sacerdotisa uma leve
reverência quando passou. O anão e o homem-lagarto a seguiram.

Sacerdotisa ficou ali, sozinha.


— Ai-ai…

Sozinha. Ela se sentava perto da parede, em uma cadeira no canto que parecia ser guardada para
ele. Suas mãos envolviam uma xícara de chá que Garota da Guilda trouxera.

Ele provavelmente só queria o que era melhor para ela. Ela ergueu o copo até os lábios.

— Ahh… — suspirou ela quando um calor se espalhou pelo seu corpo. Sacerdotisa reconheceu
essa sensação como o efeito de uma poção de estâmina.

Era uma especialidade de Garota da Guilda adicionar isso ao chá. Era maravilhoso para o corpo
cansado de Sacerdotisa.

Eu estou o atrapalhando?

Ele era ranque prata, ela apenas porcelana. Mesmo apesar dessa diferença, ela não pensava que
fosse um fardo para ele, mesmo assim…

Sacerdotisa esfregou os olhos. Suas pálpebras estavam pesadas.

Ela podia ouvir o balbuciar dos aventureiros de toda a guilda. Estava lotada como todos os dias.
Algo atraiu sua audição, palavras que ela não conseguia entender bem. Ela bocejou.

— Ei! E aí!

— O quu…? — Quando ela ouviu a voz uma segunda vez, Sacerdotisa despertou abruptamente, se
endireitando às pressas.

De pé na frente dela havia um jovem que parecia de alguma forma nervoso, também ranque
porcelana.

Ele era um guerreiro novato que ela viu antes. Ao lado dele estava uma garota, uma aprendiz de
clériga. Em seu pescoço estava pendurado a balança e a espada, os símbolos do Deus Supremo, que
supervisionava a lei e a justiça.

— Você… digo, você é a garota que trabalha com ele, certo?

— Com… quem?
— Você sabe, aquele cara. Ele está sempre com aquele capacete? — disse a clériga com uma voz
aguda.

— Ah — disse Sacerdotisa, com sua perplexidade evaporando. — Está falando do Sr. Matador de
Goblins?

— Sim, ele mesmo! Ei… — Guerreiro abaixou repentinamente a voz e olhou em volta
pavorosamente. — Você também é ranque porcelana. Que tal vir conosco?

Sacerdotisa prendeu o fôlego, calada. Uma torrente de emoções assolou dentro dela, ameaçando
dividir seu coração em dois.

Ela apertou os punhos e fez recuar a investida violenta. Foi apenas um segundo antes dela balançar
lentamente a cabeça.

— Não. Obrigada, mas não.

— Mas ele é um esquisitão! Que tipo de ranque prata não caça nada além de goblins? — perguntou
Guerreiro Novato, franzindo a testa. Qualquer ranque prata normal iria atrás de coisas maiores.

— É — disse Sacerdotisa Aprendiz, examinando o salão com preocupação. — E arrastar uma


novata também. Sabia que algumas pessoas pensam que você é prisioneira dele? — Está tudo bem
com você?

— Até ouvi que o motivo pelo qual ele sai para caçar goblins por si mesmo é algo… estranho.
Entende o que quero dizer?

— Olha, isso não é…! — A voz de Sacerdotisa aumentou reflexivamente.

— Então, pessoal. Nada de intimidação. — Suas emoções coletivas foram acalmadas por uma voz
suave e doce que surgiu subitamente. Quando ela havia chegado? Há quanto tempo ela esteve lá?
Bruxa, com seu corpo sensual e uma insígnia de prata no pescoço, estava parada bem ao lado deles.

— M-mas não estávamos…

— Isso, será o suficiente. Vão, para lá, tudo bem?

Guerreiro Novato parecia estar pronto para continuar discutindo um pouco mais, mas Sacerdotisa
Aprendiz o pegou pela manga e o levou embora.

Bruxa deu a Sacerdotisa um olhar simpático e disse com um sorriso: — Me deixe, lidar com eles,
sim?

Isso foi o suficiente. A clériga e o guerreiro disseram “Vamos sair daqui!”, aparentemente ao
mesmo tempo, e com um olhar ansioso em Sacerdotisa, eles saíram.
Sacerdotisa se sentou na cadeira, com a xícara de chá nas mãos. Bruxa se sentou lentamente na
cadeira ao lado dela, quase se debruçando no assento.

— Então. Você é, a garota que anda junto, com ele, certo?

— Ah, sim, senhora, tenho a honra de o acompanhar. — Sacerdotisa assentiu firmemente,


colocando as mãos juntas com a xícara de chá nos joelhos.

— O acompanha, hein? — disse Bruxa significativamente. Sacerdotisa lhe deu um olhar intrigado.
Bruxa ignorou. — Deve ser, bastante, difícil. Ele não nota muito, não é…?

Sacerdotisa lhe deu um olhar intrigado novamente. — Hum, eu… Ele…

— Por outro lado, parece, que você não é muito melhor.

Sacerdotisa fez um gesto apologético de vergonha, mas Bruxa a olhou carinhosamente. Ela pegou
um cachimbo longo de metal e colocou elegantemente algumas folhas nele.

— Posso? …Inflammarae. — Sem esperar por uma resposta, Bruxa tocou o cachimbo com o dedo.
Uma fumaça aromática e rosada logo saiu.

— Eu sei. Um desperdício estúpido de uma palavra de poder, não é? — Bruxa deu uma risada
espontânea com Sacerdotisa perplexa. — E você… Quantos milagres, você pode usar…?

— Hum, eu tinha dois até recentemente; agora tenho quatro. No entanto, só posso rezar cerca de
três vezes…

— Uma ranque porcelana, com quatro milagres. Meu, você é muito brilhante.

— Oh, obri-obrigada… — Sacerdotisa curvou a cabeça, fazendo seu corpo pequeno parecer ainda
menor. O sorriso de Bruxa não vacilou.

— Sabe, ele uma vez, fez um pedido muito estranho, para mim, também.

— Quê…? — Sacerdotisa olhou de repente para o rosto de Bruxa.

Bruxa inclinou a cabeça tentadoramente. — Eu sei, o que está pensando — disse ela,
provocantemente.

— N-não, não estou…!

— Ele queria uma ajudinha, com um pergaminho. Então eu sei quão, difícil é,
para… o acompanhar.

— Não, eu… Ele… Bem, um pouco. Ele é ranque prata, depois de tudo. — Ela fez uma careta
levemente cansada. Quando assentiu, ela viu a xícara de chá ainda em suas mãos. Olhando para o
fundo do copo através do líquido marrom translúcido, as palavras pareciam cair de seus lábios
como água:

— E-eu mal consigo acompanhar ele… E e-eu não sou nada além de problemas para ele…

— E ele é tão, bom no que faz, não é? — Bruxa respirou forte e soltou um anel de fumaça. Ele
flutuou preguiçosamente até Sacerdotisa e se dissolveu em sua bochecha. Ela tossiu violentamente.
Bruxa se desculpou com uma risada.

— Esse é o resultado, que vem com anos, e mais anos, caçando goblins, sem descanso. — Ele está
léguas à frente de uma garota ranque porcelana. Bruxa girou seu cachimbo refletidamente. —
Matar goblins certamente, faz mais bem para o mundo, do que alguém que caça uma presa maior…
mas não são nada bons nisso. — Seu cachimbo apontava para os aventureiros circulando na guilda.

Em algum lugar no saguão, as orelhas de Lanceiro arderam. Bruxa estreitou os olhos e olhou para a
multidão.

— Isso não quer dizer, que uma fixação, por goblins seja… absolutamente, saudável.

Sacerdotisa estava em silêncio.

— Na capital, por exemplo, não há fim para os demônios. Há monstros, por todo lado, nesse
mundo.

Bem, obviamente. Se não houvesse, os aventureiros não seriam tão ubíquos, não importa quantas
ruínas abandonadas pudesse haver. Mas, com ameaças de todos os tipos pipocando em todos os
lugares, só os militares não poderiam manter as coisas sob controle. Seu papel deveria ser lidar
com os países vizinhos, deuses das trevas ou necromantes. Goblins eram claramente uma ameaça.
Mas eles não eram os únicos.

— Se você quiser… ajudar outra pessoa. Você pode fazer isso, mesmo com, aquelas duas crianças
de antes, por exemplo.

— É que… Eu poderia, mas… — Sacerdotisa estava ficando nervosa outra vez. Ela se inclinou
para a frente na cadeira, mas não conseguiu falar mais nada. Ela se perdeu com um murmúrio
incoerente.

— Hee-hee. Existem, tantos, caminhos, não? E nenhuma, certeza. É difícil de fato… — Ela deu um
tapinha na cabeça de Sacerdotisa que se recompunha. — Desculpa. — Sacerdotisa achou a fumaça
perfumada estranhamente calmante.

— Pelo menos… se você quiser, o acompanhar, deixe, que seja sua própria decisão.

Se me permite dizer isso.

Com isso, Bruxa se levantou com o mesmo movimento furtivo de quando se sentou.
— Ah…

— Até, logo. Eu acredito que você tem, um encontro… me perdoe, uma aventura… com ele. — E
com um ligeiro aceno com a mão, ela se afastou com os quadris balançando, desaparecendo na
multidão.

— Minha própria decisão…?

Sozinha outra vez, Sacerdotisa moveu suavemente a xícara de chá em suas mãos.

O calor que ela sentia momentos antes havia desaparecido.


Quando eles entraram na sala de reuniões, a elfa retirou o arco de seu ombro e perguntou: —
Então, você é mesmo ranque prata?

As cadeiras na sala estavam cobertas com um pano de cor bronze e rodeavam uma mesa que fora
limpa até brilhar. As prateleiras estavam forradas com crânios e presas de monstros, os troféus de
aventureiros passados.

— Segundo a guilda. — A armadura e o capacete imundo de Matador de Goblins não pareciam


evidenciar seu ranque. Ele se sentou com força em uma cadeira.

— Francamente, eu não consigo acreditar nisso — disse a elfa. Ela se sentou à frente dele com não
mais que um passo e balançou a cabeça. — Quero dizer, olhe para você. Eu já vi insetos que
pareciam mais intimidantes.

— Não seja estúpida, Orelhuda! — O anão, sentado alegremente de pernas cruzadas no chão, deu
uma risada zombeteira. Embora os seres humanos tentassem ser atenciosos com as outras raças,
suas cadeiras eram grandes demais para os anões e rheas. — Antes de serem polidos, todas as joias
e metais preciosos parecem pedras. Nenhum anão julgaria uma coisa só pela sua aparência.

— Ah, sério?

— Sim, é sério! A armadura de couro garante facilidade de movimento. A malha deixaria uma
adaga às escuras — pontificava Anão Xamã, avaliando Matador de Goblins com um olhar
abrangente. Ainda que a maioria dos seus deveres fossem pastorais, quando se tratava de armas e
equipamentos, até uma criança anão sabia mais do que muitos comerciantes de longa data. —
…Seu elmo, o mesmo. Espada e escudos são pequenos, fáceis de usar em um espaço apertado.

Matador de Goblins não disse nada.

A elfa olhou suspeitosamente para ele.

— Ele podia ao menos procurar um equipamento mais agradável.

— Itens limpos cheiram a metal — disse Matador de Goblins, com um tom de aborrecimento em
sua voz. Goblins têm um excelente olfato.

— Deuses. Vocês habitantes da floresta são tão apaixonados por seus arcos, que não saberiam se
uma espada estivesse apunhalando vocês no pescoço.

— Tsc… — rangeu os dentes a elfa com a farpa do anão. Ele estava irritante, mas não errado. A
caça era tão natural como a respiração para os elfos. Essa arqueira, por sua vez, sabia alguma coisa
sobre supressão de odores. Mas ela era jovem entre os alto-elfos e havia deixado sua casa na
floresta ainda recentemente. Os vários anos que ela gastou até agora no resto do mundo eram um
piscar de olhos para um elfo. Ela ainda carecia de muita experiência.

O anão acariciou a barba com um olhar de autossatisfação. — Minha vida tem sido mais longa que
suas orelhas, garota. Por que não aprende algo do seu venerável ancião?

— Hmph. — Mas, então a elfa estreitou os olhos como um gato brincando com um rato. — Tenho
dois mil anos — disse ela. — Quantos anos você tem mesmo?

O anão não disse nada por um longo tempo. Então, relutantemente: — Cento e sete.

— Ah, meu, nossa. — A elfa riu dissimuladamente, e o anão acariciou sua barba abatidamente.

Eles pareciam prontos para continuar assim para sempre. Assim que Matador de Goblins estava
começando a achar que era hora de ele ir para baixo, Lagarto Sacerdote balançou a mão.

— Vocês dois, já chega de falar de suas idades. Vocês envergonham aqueles de nós que não
medem nossas vidas em séculos ou milênios. — Ele estava encostado na parede. Os homens-
lagarto não se sentavam em cadeiras humanas, principalmente, parecia, que suas caudas
atrapalhavam.

— Então, o que vocês querem comigo? Uma missão? — Matador de Goblins foi direto ao ponto
como sempre.

— Sim, é isso — disse a elfa. Ela parecia séria. — O número de demônios ao redor da capital vem
aumentando, como tenho certeza de que você sabe…

— Não, não sei.

— Isso pode ser traçado de volta ao renascimento de espíritos malignos. Eles querem usar um
exército para destruir o mundo!

— Entendi.

— …E nós estávamos contando, com sua ajuda…

— Encontre outra pessoa — disse ele sem rodeios. — Se não for goblins, então não me importo.

A elfa se enrijeceu. — Você entende o que estou dizendo? — perguntou ela, com os dentes
cerrados e uma onda de raiva em sua voz. Suas orelhas características em formas de folha tremiam.
— Um exército de demônios está vindo. Estamos falando sobre o destino do mundo aqui!

— Sim, eu ouvi.

— Então por que…?


— Antes de o mundo acabar, os goblins acabarão com muitas mais aldeias — disse Matador de
Goblins com sua voz uniforme, quase mecânica. Como se dissesse: Isso é tudo para mim, minha
verdade. — Não podemos ignorar os goblins porque o mundo está em perigo.

— Como pode…?! — A elfa chutou sua cadeira, seu rosto pálido ficou vermelho. Ela se inclinou
sobre a mesa para agarrar Matador de Goblins. Foi o anão que a impediu.

— Bem, espera lá, Orelhuda, pense no que está fazendo.

— Como assim, anão?

— Nós não podemos simplesmente entrar aqui e ordenar que ele faça algo. Um platina poderia se
safar assim, mas nós não.

— Si… Bem, sim, mas…

— Nada de “mas”, então. Sossegue. Nos deixe ter uma boa conversa civilizada. — Ele repreendeu
a elfa com um aceno de sua mão pequena e áspera.

— …Está bem — bufou ela de má vontade e se sentou de volta na cadeira. Vendo isso, e vendo
que Matador de Goblins não pareceu nem um pouco chateado com o incidente, o anão deu uma
risada satisfeita.

— Ele pode ser jovem, mas ele é “Corta-barba” de fato! Ele é tão rígido quanto uma pedra!

— Então — disse Lagarto Sacerdote — você não vai se opor caso eu continue a lhe oferecer essa
missão?

— Por mim tudo bem — disse o anão, passando sua mão em sua barba. — Melhor isso que um
covarde.

— Meu senhor Matador de Goblins, por favor, não confunda nossa intenção. Viemos, de fato, para
lhe pedir que nos ajude a matar os diabinhos.

— Entendi. Então estamos falando de goblins — disse Matador de Goblins. — Nesse caso, eu
aceito.

Houve um silêncio.

— Onde eles estão? Quantos são?

Alta-Elfa Arqueira parecia um pouco horrorizada; os olhos de Lagarto Sacerdote se arregalaram. O


anão riu vigorosamente.

— Ora, qual é a pressa, garoto? Não quer ouvir o resto da história de Escamoso?
— Claro — disse Matador de Goblins com um aceno firme. — Informação é crucial. Preciso saber
o tamanho do ninho, se há um xamã. E quanto aos hobs?

— Eu esperava que você fosse perguntar primeiro sobre a remuneração — disse Lagarto Sacerdote,
com sua língua balançando para fora e tocando o nariz. Poderia ser considerado como cobrir o
rosto para esconder seu constrangimento. — …Para começar, como minha humilde companheira
disse antes, há um exército de demônios se preparando para invadir.

Silêncio.

— Um dos senhores demônios, até então selado, despertou e agora procura nos exterminar…

— Não estou interessado — disse Matador de Goblins. — A mesma coisa aconteceu há dez anos.

— Hmm. Eu também pensava que isso não era de meu interesse. — O homem-lagarto revirou os
olhos com uma careta.

Uma variedade de expressões passou pelo rosto da elfa quando ele falou, transmitindo
principalmente Eu não posso acreditar nesse cara. Ela olhou carrancuda para Matador de Goblins,
mas seu rosto, e qualquer expressão, estava escondido atrás do seu elmo.

— Mas, subsequentemente, os chefes de nossas tribos, todos os reis dos homens e os líderes dos
elfos e dos anões realizaram uma grande conferência.

— Os rheas não são muita coisa em combate, então nos falta um… mas por outro lado, somos os
representantes que eles enviaram — disse o anão, batendo na barriga. — Somos aventureiros,
afinal. Faremos o mundo e nossas fileiras algo de bom como parte da barganha!

— Parece que estamos indo para uma batalha enorme. — Não que você se importe. A elfa parecia
ter desistido.

O anão continuou alisando a barba. — O problema, veja, é que esses insetinhos desagradáveis
começaram a ficar mais ativos nas terras dos elfos.

— Surgiram campeões ou senhores? — perguntou Matador de Goblins com um murmúrio.

O anão respondeu: — Talvez.

A elfa levantou suas longas orelhas com as palavras desconhecidas. — Campeões? Senhores? O
que são esses?

— Heróis goblins. Reis dos goblins. Pense neles como goblins de ranque platina, em nossos
termos. — Matador de Goblins cruzou os braços com um longo “hmmm”. Ele parecia muito sério.
A elfa pensou que ele parecia estar calculando algo. Depois de uma longa pausa, ele disse:

— Não importa. Ainda não existem informações suficientes. Continue.


— Após nossa investigação, descobrimos um ninho único e excepcionalmente grande. Mas… bem,
política, sabe.

— Os militares não se moverão contra goblins. Como sempre. — Acompanhando o pensamento do


homem-lagarto, Matador de Goblins parecia perguntar e afirmar ao mesmo tempo.

— Os reis humanos nos veem como aliados, mas não como iguais — disse a elfa, com os ombros
rígidos. — Se tentássemos trazer nossos soldados nisso, eles pensariam que estaríamos tramando
alguma coisa.

— Por isso, um grupo de aventureiros… Mas, só nós não poderíamos nos apresentar diante dos
humanos.

— Então, Orcbolg… De muitos, nós escolhemos você.

— Orelhuda tem um jeito verdadeiro com as palavras, não é? — disse o anão com uma risada seca.
A elfa olhou para ele, mas o olhar passou rapidamente.

— Vocês têm um mapa? — perguntou calmamente Matador de Goblins.

— Aqui. — O homem-lagarto pegou um pergaminho de sua manga e o entregou a Matador de


Goblins. Matador de Goblins o desenrolou de forma bruta. O mapa foi desenhado com tinta de
cascas de árvore. O estilo abstrato, porém, preciso, era típico da cartografia élfica.

Representava um campo árido com um edifício de aparência antiga. Matador de Goblins apontou
para a estrutura.

— Ruínas?

— Provavelmente.

— Número?

— Só sabemos que o ninho é muito grande.

— Eu vou partir imediatamente. Me paguem o quanto quiser. — Matador de Goblins assentiu,


enrolou o mapa com um movimento casual e ficou de pé vigorosamente. Guardando o mapa, ele
deu uma verificação rápida em seu equipamento e então começou a caminhar em direção à porta.

A elfa ficou nervosa. — E-espere um segundo! — Suas orelhas tremiam, e como antes, ela chutou
a cadeira e estendeu a mão. — Você fala como se estivesse indo para lá sozinho.

— Estou.

A carranca da elfa dizia: Você só pode estar brincando.


O homem-lagarto fez um barulho intrigado. — Essa é só a minha humilde observação, mas aquela
estimada acólita da Mãe Terra é membro de seu grupo, não é, meu senhor Matador de Goblins?

— Você está indo lidar com eles sozinho? — disse a elfa. — Você está louco?

Matador de Goblins parou e expirou lentamente. — Sim.

E sem mais uma palavra, ele saiu da sala de reuniões.

Qual pergunta ele teve a intenção de responder, eles não conseguiam dizer.

Não tinha como saberem.


Inspira, expira. Ele parou por apenas um segundo. Então Matador de Goblins desceu rapidamente
as escadas e foi diretamente à recepção. A palavra que pronunciou foi a mesma que sempre estava
em seus lábios:

— Goblins.

— Então eles vieram para lhe oferecer uma missão! — Garota da Guilda olhou intensamente por
cima do trabalho dela.

Lanceiro estalou a língua nas proximidades. Ele esteve apenas tentando falar com Garota da
Guilda.

— Que tipo de missão é? Vou fazer um registro.

— Aquele homem-lagarto lhe dará os detalhes. Estou saindo. Mas preciso de dinheiro. Me dê a
recompensa da última missão.

— Hmm… Mas você não fez seu relatório ainda… Bem, acho que para você podemos fazer uma
exceção, Sr. Matador de Goblins. — Ela acrescentou: — Só entre nós. — Ela assinou um pedaço
de papel e pegou uma bolsa de couro de um cofre. Uma recompensa que pode não ser suficiente
para compensar até mesmo um grupo de ranque porcelana, mas seria uma soma bastante justa se
você assumisse toda a aventura sozinho. Matador de Goblins poderia se apoiar nos pagamentos das
missões de goblins justamente porque trabalhava sozinho.

Ele pegou o monte de moedas sujas — recolhidas meticulosamente pelos habitantes de alguma
aldeia empobrecida — e despejou metade em sua bolsa.

— Dê o resto a ela.

— Claro. E-espere, você está sozinho? Ela não…?

— Eu vou deixá-la descansar.

Isso foi tudo que ele disse a Garota da Guilda mistificada antes de se afastar.

Lanceiro lançou a Matador de Goblins um olhar sujo enquanto passava.

— Quem ele pensa que é, afinal?

Mas Matador de Goblins não ouviu o sussurro irônico. Não importava. Ele tinha muito a pensar.
Enquanto andava, ele estava calculando mentalmente seus suprimentos restantes. Ele teria que
comprar cordas, cunhas, óleo, antídotos, poções e vários outros consumíveis. Uma vez que ele
saísse da guilda, ele teria que ir a algum lugar para abastecer as provisões também. Ele precisava
de energia. O equipamento de campismo não era problema. Contanto que fosse sozinho, o menor
dos confortos seria suficiente. Assumindo que o pergaminho estivesse correto…

— Sr. Matador de Goblins!

Quando estava prestes a sair pela porta, ele ouviu passos leves correndo atrás dele. Ele bufou.

— Hum, isso… isso era uma missão, certo?

Era Sacerdotisa.

Sua cadeira não estava muito longe da porta, mas a corrida parecia ter a cansado. Ela estava
arfando e seu rosto vermelho.

— Sim — disse ele. — Extermínio de goblins.

— Isso foi… o que pensei. — Sacerdotisa deu um sorriso resignado. Ela mal conseguia
acompanhar o imprevisível ir e vir. Não obstante, ela segurou seu cajado de monge entusiasmada.
— Então me deixe…

— Não. — Matador de Goblins a cortou friamente. — Irei sozinho.

— O quê?! — Sacerdotisa ergueu a voz com as palavras calmas de Matador de Goblins.

Todos os olhares ainda no salão se voltaram na direção deles com o quase grito dela. Alguns
murmuraram: “Ah, é Matador de Goblins” e desviaram o olhar novamente.

Mas Sacerdotisa olhou diretamente para ele, lançando suas palavras. Ele não iria sozinho. Ela não
se importava se ele sempre voltasse. Ele não iria.

— Pelo menos… pelo menos você poderia falar comigo antes de se decidir…

Matador de Goblins inclinou a cabeça com uma expressão de completa perplexidade.

— Não estou?

Sacerdotisa piscou.

— Eu… eu acho que estamos conversando, sim…

— Acredito que estamos.

— Ahh… — Quem poderia a culpar pelo suspiro que escapou nesse momento?
— Mas isso não significa muita coisa se eu não tiver nenhuma escolha no assunto, afinal.

— Não tem?

Ele realmente não tem jeito.

— Eu vou com você. — Ela declarou corajosamente, sem hesitar.

Do outro lado de sua viseira, Matador de Goblins olhou para ela. Seu capacete sujo e maltratado se
refletiu no seu olhar.

— Eu não posso o deixar — disse ela.

Seus olhos se encontraram. Ambos ficaram em silêncio por um longo momento.

— …Faça o que quiser. — Por fim, Matador de Goblins deu um suspiro. Ele pareceu um pouco
irritado.

Mas Sacerdotisa segurou seu cajado com as duas mãos. Seu sorriso era como uma flor
desabrochando.

— Obrigada, eu vou.

— Então vá pegar sua recompensa primeiro.

— Certo! Espere aqui um instante… Ei, e o nosso relatório?

— Podemos o fazer mais tarde.

— Tudo bem!

Matador de Goblins ficou perto da porta e esperou enquanto Sacerdotisa saía correndo. Desde o
desembarque, rostos incomuns a observavam. Alta-Elfa Arqueira, Anão Xamã e Lagarto Sacerdote
olharam uns para os outros. Alguém soltou um pequeno suspiro.

— Mesmo nós podemos ver o que está acontecendo aqui. Essa garota tem potencial. — O anão foi
o primeiro a descer as escadas, acariciando sua barba.

— Longe de mim propor uma missão e se recusar a prosseguir com ela. — O homem-lagarto veio
depois com um aceno firme, juntando as mãos para a elfa. Ele desceu as escadas com um passo de
cada vez, com a cauda balançando de um lado ao outro.

A arqueira estava em silêncio, sem palavras.

Orcbolg, o aventureiro goblincida, estava aqui diante de seus olhos, mas ele não era nada como
tinha imaginado. Ela não conseguia compreender seu estilo de vida. Ele era estranho para ela.
O que, você vai deixar um pequeno choque te parar agora?

A elfa riu. Ela não deixara a floresta procurando exatamente isso?

Ela verificou o arco e depois o segurou em seu ombro.

— Sinceramente, não acha que deveria respeitar os mais velhos?

Dizendo isso, ela desceu as escadas com passos leves.

Veja, grupos são muitas vezes formados de maneiras bem inesperadas.


Hmm? Uma entrevista…? Extermínio de goblins? Que coisa estranha para se perguntar.

Alguns goblins atacam uma aldeia. Os aldeões vêm até nós. Por favor se livrem do ninho. Nos
ajudem! Nós imploramos, Ó heróis! Então pegamos nossas armas, vamos lá, matamos alguns
goblins e pegamos nosso dinheiro. Que há para falar? O típico golpear e cortar.

É um trabalho rápido. Não nego que também tivemos sorte, mas… Bem. Você consegue alguma
experiência em rastrear e lutar, e a guilda lhe dá uma quantidade surpreendente de crédito por
ajudar. Quero dizer, eu entendo. Minha cidade natal foi atacada por goblins há pouco tempo. E é
verdade, alguns aventureiros vieram ajudar.

É só… Como posso dizer isso? Existem três tipos de pessoas que caçam goblins: Pessoas que os
abateram facilmente. Pessoas que tomam suas porradas e aprendem com elas. E as pessoas que
subestimam os goblins e são eliminadas.

Qual delas somos? Somos os que acabam com eles facilmente! Bem… de qualquer forma, agora
somos. Nós levamos alguns golpes antes. Nós trouxemos um lampião conosco, mas nosso batedor
caiu e ele quebrou. Então tudo ficou escuro como breu. Descobrimos mais tarde que os goblins
colocaram um fio armadilhado. Uma armadilha. Os goblins montaram uma armadilha!

A luz e o barulho revelaram nossa posição, e uma vez que as coisas ficaram escuras, havia goblins
por todo lado.

O garoto — nosso usuário de magia — ficou um pouco preocupado e tentou lançar uma
magia. “Não faça isso” digo. “Guarde ela para algo importante. Você só tem uma. Não a
desperdice em um monstro pequenininho”. Depois disso, o inferno começou.

Os goblins à nossa volta. Estávamos lutando o melhor que podíamos, corta, corta, corta. Morte.
Gritos. Você não sabe se está acertando pedras ou cortando carne. Você também acaba sendo
cortado. Você só está usando armaduras baratas. Quando me vi tentando brandir uma espada larga
em um túnel, foi quando pensei que fosse morrer.

Ei, do que está rindo, caramba? Os maiores guerreiros começaram arriscando suas vidas contra
goblins. Você quer ser uma paladina, não ria.

Sinto muito por isso. Essa senhora — essa cavaleira — está no meu grupo. Eu sou o líder, no
entanto, tudo bem?

Onde eu estava? Havia um dos grandes os liderando. Minha espada ficou presa em alguma coisa.
Ele possuía um machado, e estava o brandindo para todos os lugares. Achei mesmo que fosse
morrer. Então zás, uma Seta de Fogo o fritou.
Nossa cavaleira possuía alguns milagres; tínhamos dinheiro, pegamos equipamentos, antídotos e
tudo mais. Praticamente custou mais se preparar do que conseguiríamos com a missão… mas isso
me salvou. Isso salvou a todos nós.

É por isso que sempre digo, enquanto estiver preparado, goblins não são nada.

Mas, digamos que você soubesse que poderia ganhar noventa e nove vezes de cem. Quem garante
que essa não é a centésima vez? Não existe garantias. Você só está jogando com as probabilidades.

Se vai morrer por causa de um lance ruim, mas vale o fazer lutando com um dragão.

E somos ranque prata agora. O trabalho chato como goblins não manterá nosso grupo equipado.

De todo jeito, os goblins são os monstros mais fracos, certo? Então por que não deixar os
principiantes lidar com eles? Claro, nem todos conseguem, mas… eles possuem chances melhores
do que contra um dragão, não é?

Ainda sim… é só uma chance.


Três dias se passaram em um piscar de olhos.

Sob as estrelas e as duas luas, em um campo que parecia não ter fim, cinco aventureiros estavam
sentados em um círculo. Uma longa e fina trilha de fumaça flutuava para o ar de sua fogueira. Bem
atrás deles, a floresta onde os elfos viviam se insurgia na escuridão.

— Parando para pensar, por que todos vocês se tornaram aventureiros?

— Por causa de uma bela refeição, obviamente! E quanto a você, Orelhuda?

— Claro que você queria comida. Eu… eu queria conhecer o mundo exterior.

— Quanto a mim, eu busco aumentar meu status erradicando heresia, para que possa me tornar um
naga.

— O que disse?

— Eu busco aumentar meu status erradicando heresia, para que possa me tornar um naga.

— Uh… Claro. Consigo entender isso, eu acho. Eu também sou religiosa.

— Eu queria matar…

— É, de alguma forma acho que consigo adivinhar, obrigada.

— Não interrompa o homem, Orelhuda! — resmungou o anão, enquanto tecia folhas de grama seca
em conjunto.

O fogo não queimava muito alto. Os elfos odiavam fogo e estabeleciam vigias para manter os
incêndios afastado. Mesmo tão longe da floresta como estavam, os efeitos ainda eram perceptíveis.

Sacerdotisa e o homem-lagarto haviam preparado isso, o último jantar que comeriam antes de
chegarem no ninho.

— Hmm, é delicioso! O que é isso? — A carne com boa textura fora preparada com especiarias
assim que começou a assar. O anão, encantado com o resultado cheiroso e crocante, tomou dois ou
três petiscos.

— Estou contente por você achar satisfatório. — O homem-lagarto respondeu aos louvores do anão
com um sorriso gratificante, o que para ele significava arreganhar seus dentes longos. — É a carne
seca de uma criatura do pântano. As especiarias incluem ingredientes que não são encontrados
nesse lugar, por isso o motivo de seu paladar achar incrível.

— É por isso que ninguém gosta de anões. Eles são gulosos e carnívoros para começar — zombou
a elfa.

— Bah! Como poderia uma aspirante a coelha como você apreciar as virtudes de uma refeição
como essa? Me dê outro!

— Eca…

O anão lambeu a gordura dos dedos e deu outra boa bocada na carne como se para ressaltar seu
ponto. A elfa grunhiu de nojo ao vê-lo comer tão vigorosamente algo que ela nem conseguia
contemplar em comer.

— Hum, talvez você gostaria de um pouco de sopa? Não é grande coisa, com só uma fogueira para
cozinhar, mas…

— Sim, por favor!

Sacerdotisa fez uma sopa de feijões secos com habilidade. A elfa não havia pegado nenhuma carne,
então a sugestão de algo que ela pudesse comer foi o suficiente para fazer suas orelhas balançarem
de alegria.

A tigela quase transbordando de sopa que Sacerdotisa passou para ela tinha um sabor bastante
suave que era inegavelmente deliciosa.

— Hmm. Tenho que lhe dar algo por isso… — A elfa pegou de sua mochila pequenas e finas
pastilhas de pão envoltas em folhas e as quebrou em pedaços. O cheiro dela era ligeiramente doce,
mas não possuía fruta ou açúcar nela.

— Isso… não é pão seco, é? E não é um biscoito…

— É uma conserva que os elfos fazem. Na verdade, quase nunca partilhamos com mais ninguém.
Mas hoje é uma exceção.

— Isso é delicioso! — Mal havia dado uma mordida e o sabor impressionante trouxe palavras de
apreciação aos lábios de Sacerdotisa.

Uma surpresinha estava escondida na comida. O exterior crocante dava lugar a um interior suave e
úmido.

— Ah? Isso é bom. — A elfa parecia desinteressada, mas a maneira como fechou os olhos
ligeiramente a fez soar muito satisfeita.

— Grh! Bem, agora que a elfa está se exibindo, não posso deixar os anões ficarem sem ser
representados, posso? — Assim, Anão Xamã pegou um jarro de argila grande e bem fechado.
Houve um som de líquido se agitando dentro. Quando ele sacou a rolha e derramou um pouco em
um copo, o odor pungente de álcool fluiu pelo acampamento.

— Heh-heh. Diga olá para a nossa especialidade, feita no fundo de nossas adegas… vinho de fogo!

— Vinho… de fogo? — A elfa olhou com interesse para o copo que o anão segurava.

— Nada mais, nada menos! Não me diga que essa é sua primeira bebida, Orelhuda.

— C-claro que não, homem das cavernas! — dizendo isso, ela pegou o copo da mão dele.

Ela lançou um olhar duvidoso no copo aparentemente normal. — Está claro. Vinho não é feito de
uvas? Já vi antes, sabe. Não sou tão jovem. — Ela jogou a cabeça para trás e bebeu o copo inteiro.

Seguiu-se um ataque de tosse incontrolável, causado pela ardência seca da bebida.

— V-você está bem? A-aqui, beba um pouco de á-água! — Sacerdotisa ofereceu apressadamente
um cantil para a elfa ofegante, cujos olhos estavam esbugalhados.

— Ha-ha-ha-ha-ha! Talvez seja um pouco demais para uma moça delicada como você!

— Por favor, seja moderada. Uma patrulheira bêbada não servirá muito.

— Eu sei disso, Escamoso! Não vou a deixar ter muito.

O anão riu alegremente para a mulher enquanto o homem-lagarto sibilou de modo repreensivo.

— Você aí, Corta-barba! Gostaria de um gole?

Matador de Goblins não disse nada a não ser pegar o copo oferecido e beber com entusiasmo.

Ele não dissera uma única palavra durante todo o jantar, ele meramente levava a comida até a sua
viseira. Logo depois, ele ficou absorvido em seu próprio afazer. Ele poliu a espada, o escudo e a
adaga; verificou o fio das lâminas; e as devolveu às suas bainhas. Ele lubrificou sua armadura de
couro e de malha.

— Grh… — A elfa fez um ruído insatisfeito ao ver Matador de Goblins em suas tarefas. Seu rosto
estava tão vermelho quanto um tomate cozido.

— …O quê?

— …Você sequer tira esse capacete quando está comendo. O que há com você?

— Se eu fosse ser atingido na cabeça por um ataque surpresa, eu poderia perder a consciência.

— …E vo’ apen- comu, comu, come. Por que você nõn cozinha algu para nós agura?
A elfa disse a ele essa incongruência com uma língua complexa, enrolando suas palavras. Ela
apontou acusadoramente para a rocha grande ao lado de Matador de Goblins.

Ele não respondeu, mesmo quando a elfa bêbada o encarou e emitiu outro “Grrhh?”.

— Aah — sussurrou o anão. — Seus olhos estão vidrados…

Observando a cena, Sacerdotisa sugou ligeiramente suas bochechas.

Ele está pensando. Ela ainda não conseguia ver o rosto dele, mas sabia bem isso.

Depois de um tempo, Matador de Goblins vasculhou sua mochila com uma pitada de exasperação.
Ele rolou uma rodela dura e seca de queijo.

— Isso serve?

Oh-ho. Lagarto Sacerdote lambeu a ponta do nariz com sua língua. Ele esticou o pescoço na
direção do queijo como se nunca tivesse visto isso antes.

— Que tipo de coisa é essa?

— Isso é queijo. É feito agitando o leite de uma vaca ou uma ovelha.

— Você deve estar brincando, Escamoso — disse o anão. — Nunca viu queijo antes?

— Estou sendo muito sincero. Isso é bastante novo para mim.

— Os homens-lagarto não criam animais? — perguntou Sacerdotisa. Ele assentiu.

— Na nossa sociedade, os animais são para caça. Não para se cuidar.

— Dá içu qui. Vou cortar. — A elfa surrupiou o queijo de Matador de Goblins e, quase mais rápido
do que os olhos pudessem ver, ela cortou em cinco pedaços com uma faca que afiou em uma rocha.

— Aposto que assar um pouco faria maravilhas aqui. Então, onde há um bom graveto?

Na sugestão do anão, Sacerdotisa disse: — Tenho espetos se quiser. — Ela tirou várias hastes
longas de metal da sua bolsa.

— Oh, moça, você sabe como se preparar para uma viagem! Ao contrário de algumas pessoas que
conheço.

— Se você tem alguém em mente, vai logo e fale. — A raiva parecia colocar clareza de volta na
voz da elfa.
— Por que não pergunta ao seu coração? — riu o anão, afagando a barba. — Seu coração
em forma de tábua. — Então ele disse: — De qualquer forma, me deixe cuidar disso. Fogo é a
alçada do meu povo! — e ele enfiou o queijo nos espetos e os colocou sobre o fogo. Ele os assou
com movimentos rápidos e seguros como um mago lançando uma magia. Um cheiro doce
misturado com fumaça surgiu.

Antes que percebessem, o queijo começou a derreter e escorrer. O anão passou os espetos para seus
companheiros aventureiros, e cada um os levou até a boca.

— É doce, como néctar!

Lagarto Sacerdote deu um grito extasiado e bateu a cauda no chão. — Como néctar, isso!

— Fico feliz que o primeiro queijo da sua vida não o desapontou — disse o anão, dando uma
grande mordida na sua própria fatia e a acompanhando com um gole de vinho de fogo. — Ahh,
vinho de fogo e queijo, é uma boa dupla!

Ele limpou o vinho que escorreu em sua barba e deu um suspiro satisfeito. A elfa franziu a testa.
Parecendo voltar bem ao seu eu normal e altivo, ela deu mordidas delicadas em seu queijo.

— Hmm. É meio azedo, mas… doce — disse ela. — Como uma espécie de banana. — Suas
orelhas longas fizeram um grande movimento para cima e para baixo. Então seus olhos se
estreitaram como um gato tossindo uma bola de pelo.

— Isso é daquela fazenda? — perguntou Sacerdotisa com um sorriso brilhante, a meio caminho do
seu próprio pedaço de queijo.

— É.

— É delicioso!

— É?

Matador de Goblins assentiu silenciosamente e colocou calmamente um pedaço de queijo na boca.


Ele mastigou, engoliu, tomou um bocado de vinho de fogo, e depois puxou sua bolsa para mais
perto. No dia seguinte, eles entrariam no ninho de goblins. Ele tinha que checar novamente seu
equipamento.

A mochila estava lotada com uma variedade de frascos, cordas, correntes e itens não identificáveis.
A elfa, cuja letargia foi varrida pelo queijo picante e doce, olhou para a coleção com interesse.
Matador de Goblins examinava um pergaminho que estava amarrado de maneira peculiar. A elfa
estendeu a mão assim como, aparentemente satisfeito com os nós, Matador de Goblins colocava o
pergaminho de volta à sua bolsa.

— Não toque nisso — disse ele categoricamente. A elfa retirou a mão apressadamente. — É
perigoso.

— E-eu não ia mexer. Só estava olhando.

— Não olhe. É perigoso.

A elfa bufou ligeiramente para ele. Matador de Goblins não se perturbou.

Disposta a não aceitar um não como resposta, a elfa olhou para o pergaminho de soslaio. — Não é
um pergaminho mágico? — perguntou ela. — Nunca vi um antes.
Com suas palavras, não apenas Sacerdotisa, mas o anão e o homem-lagarto se inclinaram para
olhar.

Um pergaminho mágico. Um item por vezes encontrado em ruínas antigas, embora muito
raramente. O desenrole, e até mesmo uma criança poderia lançar a magia escrita nele. O
conhecimento de como os fazer foi há muito perdido, mesmo o mais velho dos alto-elfos não sabia.
Os itens mágicos eram bastante raros, mas tais pergaminhos estavam entre os mais raros de todos.

Não obstante, eles eram itens surpreendentemente inconvenientes para aventureiros. Qualquer uma
de uma variedade infinita de magias poderia ser escrita neles, da mais útil a mais mundana, e eles
poderiam ser utilizados apenas uma vez, a propósito. Muitos aventureiros simplesmente os
vendiam — por uma boa quantia — para pesquisadores ou colecionadores de raridades. Um mago
no grupo era mágico o bastante para eles. Eles precisavam mais de dinheiro do que pergaminhos.

Matador de Goblins era um dos poucos que mantinha seu pergaminho. Mesmo Sacerdotisa não
sabia que ele o possuía.

— Tudo bem, tudo bem. Eu não tocarei, nem mesmo olharei, mas você pelo menos poderia nos
dizer qual magia está escrito nele?

— Não. — Ele nem sequer olhou para ela. — Se você fosse capturada e dissesse aos goblins, e
depois? Você saberá o que é quando eu o usar.

— …Você não gosta de mim, não é?

— Não tenho nada em particular.

— Não é apenas uma maneira de dizer que não se importa?

— Não quero dizer mais do que já disse.

A elfa cerrou os dentes e suas orelhas se agitaram de raiva.

— Desista, Orelhuda. Ele é mais teimoso que eu. — O anão riu alegremente. — Ele é Corta-barba,
afinal.

— Você quer dizer Orcbolg.

— Eu sou Matador de Goblins — murmurou ele.


A elfa franziu a testa com isso, e o anão acariciou sua barba, se divertindo.

— Hum, perdão — interrompeu Sacerdotisa — mas o que Orcbolg quer dizer, exatamente?

— É o nome de uma espada que aparece em nossas lendas — disse a elfa. Ela ergueu
orgulhosamente o dedo como uma professora instruindo seus alunos. — Era uma lâmina goblincida
que brilharia em azul quando um orc… um goblin, estivesse perto.

— Seja dito, no entanto, que foram nós anões quem forjaram ela — interveio Anão Xamã.

A elfa bufou. — E a chamou de “Corta-barba”. Que nome horrível. Os anões podem ter boas
cabeças para criação de itens, mas não para mais nada.

— Então, Orelhuda, você admite que seu povo não é artesão tão habilidoso quanto o meu é! — Ele
deu uma enorme gargalhada. A elfa estufou suas bochechas.

O homem-lagarto revirou bem os olhos, como se não pudesse acreditar no que via, e trocou um
olhar com Sacerdotisa. Ela estava começando a entender que essa era sua maneira de fazer uma
piada.

Ela também passou a apreciar os argumentos amigáveis. Assim era os elfos e os anões. Sacerdotisa,
que estava pela primeira vez com pessoas de outras raças, sabia que nunca poderia confiar nos
membros de seu grupo se não os conhecesse. Então ela tentou conversar com eles, e em pouco
tempo, se tornaram bons amigos.

A fé ancestral do homem-lagarto não se chocava com os ensinamentos da toda-compassiva Mãe


Terra. E existia outra garota no grupo de mesma idade que Sacerdotisa, ou pelo menos parecia. Isso
a deixou muito à vontade.

Matador de Goblins, por sua vez, não parecia especialmente acolher ou rejeitar qualquer um deles.
Mas isso parecia de certo modo ao gosto do anão. O que quer que Matador de Goblins fez que
irritou a elfa, ele pareceu gostar de imitar isso.

Esse pequeno grupo estranho havia se encontrado inesperadamente, e ainda assim, existia uma
sensação de que se pertenciam.

Sacerdotisa sentiu um calor incomum se espalhando por ela.

“Ei, quer ir se aventurar com a gente?”

O que não significava que não houvesse nada que cutucasse seu coração…

— Ah sim, há uma coisa que estive pensando — disse o homem-lagarto, com sua cauda soando e
abrindo o maxilar. O fogo dançava. Antes de fazer sua pergunta, ele fez o estranho gesto das
palmas juntas. Ele alegou que era uma expressão de gratidão pela refeição.

— De onde os goblins brotam? Meu avô me disse uma vez de um reino sob à terra…
— Eu — o anão arrotou — ouvi dizer que eles eram rheas ou elfos caídos.

— Que preconceito! — Alta-Elfa Arqueira olhou feio para Anão Xamã. — Me foi ensinada que os
goblins são o que se torna os anões que ficam obcecados por ouro.

— Preconceito, de fato! — O anão olhou triunfantemente para a elfa, que balançou ligeiramente a
cabeça.

— Ora, ora, nosso sacerdote não disse que eles vieram de debaixo da terra? E não é de onde os
anões vem?

— Grrr…! — O anão só pôde ranger os dentes sobre isso. A elfa deu uma risadinha satisfeita. O
homem-lagarto, é claro, lambeu o nariz com a língua.

— Eu disse sob à terra, mas não de elfos ou anões. Que histórias os humanos dizem, Sacerdotisa?

—Ah, hum… — Sacerdotisa estava no meio do caminho de reunir a louça de todos e limpar. Ela
deixou o trabalho de lado e se endireitou, colocando as mãos sobre os joelhos. — Temos um ditado
que diz que quando alguém falha em algo, um goblin aparece.

— O quê?! — riu a elfa.

Sacerdotisa assentiu com um sorriso. — É apenas uma forma de ensinar boas maneiras. Se você
não fizer isso ou aquilo, um goblin virá atrás de você!

— Isso parece de fato uma notícia sombria, garota! — disse o anão. — Porque só a orelhuda
responderia por um exército de goblins!

— Ei! — As orelhas da elfa se apontaram para trás. — Que rude. Aguarde só até amanhã. Você
verá se alguma de minhas flechas falharão em acertar o alvo.

— Ah, elas vão acertar em alguma coisa, com certeza… temo que elas me acertem, bem na parte
de trás!

— Está bem. Anõezinhos são bem-vindos para se esconderem atrás de mim.

— Com certeza irei! Você é uma patrulheira, não é? Um pouco de exploração ajudaria todos nós
— disse o anão, afagando a barba com um sorriso malicioso.

A elfa levantou o braço e parecia prestes a responder, quando uma única palavra murmurada
passou entre eles. — Eu…

Naturalmente, a atenção do grupo se voltou para a origem.

— Eu ouvi dizer que eles vêm da lua — disse Matador de Goblins.


— Da “lua”, você se refere a uma das duas do nosso céu? — perguntou o homem-lagarto.

— Sim. — Matador de Goblins assentiu. — A verde. Rochas verdes, monstros verdes.

— Bem, nunca pensei que eles poderiam ter vindo sobre minha cabeça — disse o anão com um
longo e pensativo suspiro.

Com grande interesse, a elfa perguntou: — Então, as estrelas cadentes são goblins vindo até aqui?

— Não sei. Mas não há grama, árvores ou água na lua. Só rochas. É um lugar solitário — disse ele,
serenamente. — Eles não gostam de lá. Eles querem um lugar melhor. Eles têm inveja de nós, com
ciúmes, eles descem aqui.

— Aqui?

— Sim. — Ele assentiu. — Então quando você fica com inveja, você se torna um goblin.

— Entendi — disse a elfa com um suspiro decepcionado. — Outra historinha para ensinar as
crianças boas maneiras.

— Hum, quem te contou essa história? — perguntou Sacerdotisa, se inclinando um pouco para a
frente. Ele sempre foi tão realista e racional. Esse tipo de história parecia o contrário dele.

— Minha irmã mais velha.

— Oh, você tem uma irmã mais velha?

Ele assentiu. — Tive.

Sacerdotisa sorriu suavemente. O pensamento desse aventureiro durão sendo repreendido por sua
irmã era de alguma forma animador.

— Então — pressionou a elfa — você realmente acredita que os goblins vêm da lua?

Matador de Goblins assentiu ligeiramente.

— Tudo o que sei — disse ele, encarando os dois globos no céu — é que minha irmã nunca esteve
errada. Sobre qualquer coisa.

Com isso, ele ficou em silêncio. A fogueira crepitou. Com suas orelhas compridas, a elfa detectou
uma pitada de suspiro.

Ela aproximou silenciosamente o seu rosto do capacete de Matador de Goblins. Ela ainda não
conseguia ver sua expressão. Um sorriso travesso se espalhou pelo seu rosto. — Pfft. Ele
adormeceu!
— Oh-ho, o vinho de fogo finalmente o apanhou, não é? — O anão estava só agitando a última
gota da garrafa.

— Pensando nisso, ele teve a sua quota-parte dessa coisa, não é?

Sacerdotisa pegou um cobertor de seu equipamento e colocou cuidadosamente sobre ele. Bem
gentilmente, ela tocou a armadura de couro no peito dele. Ela também estava cansada, mas ele
precisava descansar.

— Vamos também, precisamos do nosso repouso — disse o homem-lagarto solenemente. — E


vamos determinar a vigia. Uma boa noite de sono por si só é uma arma em nosso arsenal.

Sacerdotisa, a elfa e o anão se ofereceram para o turno.

Quando ela se aconchegou debaixo de seu cobertor, a elfa roubou um olhar em Matador de
Goblins. — Hmm — murmurou ela para si mesma. — Dizem que um animal selvagem nunca
dorme na frente daqueles em que não confia…

Para seu próprio desconforto, ela achou que isso a inspirou um ligeiro lampejo de felicidade.
O ninho estava bem no meio de um campo enorme.

Talvez ninho nem era sequer a palavra certa para isso. Ele possuía uma entrada quadrada de pedra
branca que se sobressaia do chão, meio enterrada na terra. Isso não era uma caverna. Era
claramente feito pelo homem: ruínas antigas.

A pedra pálida apanhava a luz do sol a se pôr, cintilando um vermelho como sangue.

Dois goblins estavam de guarda. Eles estavam posicionados em ambos os lados da entrada, com
lanças em suas mãos e placas de couro precárias cobrindo seus corpos. Com eles estava um cão;
não, um lobo.

— GURUU…

— GAU!

Um dos goblins, olhando ao redor, foi se sentar e foi repreendido pelo outro. O primeiro monstro se
forçou a ficar de pé, deu um bom bocejo e olhou para o sol com um ódio indisfarçável. O lobo
estava deitado no chão ao lado deles. Suas orelhas se contraíam. Os animais selvagens não
baixavam a guarda mesmo quando descansavam.

A elfa via tudo isso dos arbustos não muito longe.

— Goblins com um cão de guarda? Só pode ser brincadeira.

— Isso prova que essa horda tem tempo e recursos sobrando. — Ao lado dela, Matador de Goblins
estava deitado no chão. Ele estava amarrando um pedaço de corda em uma pedra pequena, com seu
olhar nunca se desviando dos goblins. — Fiquem alerta. Deve haver muitos deles lá dentro.

— Só por curiosidade, e se a horda não tivesse recursos extra?

— Então eles não ficariam com o cão. Eles o comeriam.

A elfa sacudiu a cabeça. Ela não devia ter perguntado. Lagarto Sacerdote riu silenciosamente.

— Isso é seguro? — perguntou a elfa. — Vai ficar de noite em breve. Não deveríamos esperar, e
agir amanhã durante o dia?

— Ainda estamos no início da manhã para eles agora. É a hora certa.


— …Tudo bem, então. Aqui vai.

A elfa puxou uma flecha enquanto respirava.

Os elfos não usavam ferro. As hastes das suas flechas eram feitas de galhos que, naturalmente,
possuíam o tamanho e a forma adequada; as pontas eram de dentes de animais, e para as penas, eles
usavam folhas.

O arco de Alta-Elfa Arqueira, feito do galho de uma grande faia e amarrado com seda de aranha,
era maior que ela. Mas ela lidava com ele facilmente, se agachando nos arbustos e colocando uma
flecha na corda.

A seda de aranha fez um som sibilante quando ela a puxou firmemente.

— Me diga que essas coisas funcionam melhor do que parecem — disse o anão desesperadamente.
Ele achou que não poderia confiar em um pedaço de madeira e folhas. — Por favor, não erre! Você
tem uma aljava cheia de flechas, mas temos poucas magias.

— Silêncio — ordenou rigorosamente a elfa. O anão fechou a boca obedientemente. Depois disso,
ninguém disse nada.

O arco dobrou com o mero som de madeira tensionando. O vento assobiou. A elfa moveu suas
longas orelhas bem ligeiramente.

O goblin à direita bocejou. A elfa soltou a flecha.

Ela deixou o arco silenciosamente. Mas ela parecia cair a vários passos à direita dos goblins.

Anão Xamã deu um estalo franco com a língua. A elfa, no entanto, estava sorrindo. Ela já tinha
uma segunda flecha na mão.

Em um instante, a flecha desviada desenhou um grande arco pelo ar, passando pelo goblin da
direita e levando parte da sua coluna com isso. Ela continuou indo para a bochecha do goblin da
esquerda; encontrado a cavidade ocular dele e a atravessou direto.

O lobo se levantou, sem saber o que aconteceu, mas abriu sua boca para uivar um alerta…

— Tarde demais!

A elfa soltou a segunda flecha quase que rápida demais para se ver. O lobo voou para trás. Foi só
então que os dois goblins colapsaram ao chão como sacos de batatas, mortos.

Foi uma exibição espetacular de habilidade, muito além da capacidade humana.

— Isso foi incrível! — Sacerdotisa olhou encantadoramente para a elfa.


— De fato — disse Lagarto Sacerdote, com seus olhos grandes ficando ainda maiores. — Mas o
que você fez? É algum tipo de feitiçaria?

A elfa deu uma risada orgulhosa e balançou a cabeça. — Qualquer tecnologia suficientemente
avançada é indistinguível da magia. — Suas orelhas sacudiram deliberadamente.

— Essa é uma afirmação ousada comigo aqui em pé — disse Anão Xamã, quem era bastante
versado em tecnologia e magia.

— Dois… Estranho. — Matador de Goblins se levantou dos arbustos. Se a flecha da elfa errasse,
ele planejava lançar sua pedra no inimigo em lugar.

— O quê? Tem algum problema? — disse a elfa, pensando que ele estava se referindo ao seu tiro
com arco.

Ele balançou a cabeça com uma pitada de exasperação. — Eles estavam com medo. Já encontrou
algum goblin diligente?

— Não acha que eles estejam preocupados porque estão ao lado de uma floresta de elfos?

— Nós poderíamos esperar — disse ele, e com essa resposta indiferente, ele caminhou até os
goblins e se ajoelhou para inspecionar seus cadáveres.

— Ah, hum… — Sacerdotisa parecia adivinhar o que ele estava fazendo. — Você pre-precisa de a-
ajuda…? — perguntou ela com uma voz baixa e um sorriso tenso no rosto.

— Não preciso — disse Matador de Goblins sem rodeios. Sacerdotisa soltou um suspiro de alívio.
Seu rosto ficara um pouco pálido.

— O que você está fazendo? — A elfa, cuja curiosidade foi naturalmente atiçada por esse
intercambio, foi até Matador de Goblins e olhou para baixo.

Uma faca havia aparecido em sua mão. Ele a cravou no cadáver do goblin e cortou casualmente as
tripas da criatura.

A elfa se enrijeceu e puxou o braço dele. — C-como pode fazer isso com eles? Eu sei que você
odeia goblins, mas não precisa…

— Eles têm um excelente olfato.

— …Hã?

Matador de Goblins estava calmo enquanto dava essa resposta que não era uma resposta. Ele
cobriu suas manoplas com sangue, e depois tirou o fígado de um dos corpos.

— Especialmente para com o odor de mulheres, crianças e elfos.


— Es… espere um segundo. Orcbolg. Você não está dizendo para…

Em resposta, Matador de Goblins enrolou o fígado em um pano e o espremeu.

Alta-Elfa Arqueira, finalmente entendendo onde ele conseguiu as manchas em sua armadura, ficou
mais branca que as pedras que se erguiam sobre eles.

Momentos depois, os guardas mortos foram escondidos com segurança nos arbustos, e o grupo
avançou em direção às ruínas. As paredes de calcário cercavam o caminho estreito que parecia se
inclinar suavemente para baixo.

Matador de Goblins estava na liderança. Com sua espada, ele bateu no chão e nas paredes. Depois
ele jogou sua pedra de estimação para frente, viu que caiu com segurança, e a trouxe de volta.

— Sem armadilhas.

— Hmm. Eu especulo, mas esse lugar parece ser um templo.

— Parece que esse campo foi o local de uma batalha durante a Era dos Deuses — disse
Sacerdotisa. Ela passou a mão sobre uma escultura na parede. — Talvez seja uma fortaleza ou algo
assim da época… Embora a construção certamente me pareça ser humana…

— Primeiro um lar para soldados, agora para goblins. O que é mais cruel? — ponderou
sombriamente Lagarto Sacerdote, juntando suas mãos.

— Falando em crueldade — continuou o anão — você vai ficar bem, Orelhuda?

— Errgh… acho que vou ficar doente — choramingou Alta-Elfa Arqueira. Seu equipamento
tradicional de caça estava coberto de sangue. O líquido que brotou do fígado do goblin revestia seu
cabelo e escorria pelo seu corpo. Mesmo o anão não tinha coragem de provocá-la nesse estado.

— Se acostume com isso — disse Matador de Goblins ao lado da elfa. À sua esquerda, seu escudo
estava fixado em seu braço, e em sua mão havia uma tocha. Em sua mão direita, sua espada
cintilava. A elfa lançou um olhar feroz em sua direção enquanto trocava seu arco por um menor,
mas as lágrimas reprimidas nos cantos dos seus olhos e suas orelhas caídas lamentavelmente a fez
menos que intimidante.

— Quando voltarmos, espero que você se lembre disso!

— Vou me lembrar — disse ele brevemente.

A tocha crepitava. As alas dos elfos pareciam se estender até aqui. Ou talvez, muitas, muitas luas
atrás, os elfos viviam nessas terras.

Para Matador de Goblins, o verdadeiro problema era que isso limitava sua capacidade de atacar
com fogo.
— Vocês humanos são absolutamente inconvenientes — disse o anão, acariciando seu bigode. Dos
membros do grupo, apenas Matador de Goblins carregava uma tocha. O anão, a elfa e o homem-
lagarto possuíam diferentes graus de visão noturna.

— Eu sei. É por isso que temos nossos truques.

— Bem, eu gostaria que você tivesse pensado em algum melhor — disse Alta-Elfa Arqueira
abatida.

Sacerdotisa, sentindo muita pena dela, falou em uma tentativa de oferecer algum conforto. — Hum,
isso sairá quando lavar… geralmente.

— Você entende a minha dor.

— Estou acostumada com isso — disse ela com um sorriso fraco. Suas vestimentas estavam, uma
vez mais, cobertas por fluidos de goblin. Sacerdotisa estava no meio da formação, agarrando
levemente seu cajado de monge. O caminho era suficientemente largo para que dois pudessem
andar lado a lado, então Alta-Elfa Arqueira e Matador de Goblins iam lado a lado na frente de
Sacerdotisa, enquanto Anão Xamã e Lagarto Sacerdote vinham por trás. Ela era ranque porcelana,
afinal. Ela era o membro mais fraco e frágil de seu grupo. Eles tinham que a proteger.

Apesar disso, e despeito de Sacerdotisa sofrer um pouco de complexo de inferioridade, nenhum dos
outros a via como um fardo. Todos conjuradores poderiam usar só algumas magias, e algumas
vezes. Nenhum deles era aventureiro ranque platina que poderia usar magias ou milagres dezenas
de vezes por dia. Ter um curandeiro no grupo poderia significar que alguém teria uma magia
guardada para quando fosse mais preciso.

Ou melhor, alguém que poderia conservar suas magias era aquele que poderia sobreviver…

Sacerdotisa observava seus companheiros em silêncio atento. Ela segurava seu cajado vagamente.

É quase como qualquer outra aventura…

E de repente, ela estava andando na frente de Maga de novo.

Assim como da primeira vez…

Com os lábios trêmulos, Sacerdotisa recitou o nome da Mãe Terra várias vezes. Ela esperava que
nada acontecesse nessa missão. Mas, ela sabia que era um desejo fútil.
Os passos dos aventureiros ecoavam estranhamente pelo caminho pavimentado. Não havia sinais
de goblins. Ainda.

— O subterrâneo e eu somos velhos amigos, mas não gosto daqui — disse o anão, limpando o suor
da testa. Eles estiveram prosseguindo por um declive ligeiramente diagonal desde que entraram nas
ruínas. O caminho parecia reto a olho nu, mas na verdade se curvava um pouquinho, formando um
saca-rolhas. A curvatura e o declive causavam estragos no sentido de equilíbrio dos aventureiros.

— Parece quase como se estivéssemos em uma torre — disse Sacerdotisa, exalando.

— Algumas das antigas fortalezas foram de fato construídas em tal forma — disse o homem-
lagarto. Na retaguarda do grupo, sua cauda balançava para lá e para cá.

— Eu queria que tivéssemos vindo aqui quando não estava infestado de goblins — sussurrou a
elfa. — Eu teria gostado de dar uma olhada um pouco.

Algum tempo depois, o declive acabou e o caminho se bifurcou em esquerda e direita. Ambas as
rotas pareciam idênticas.

— Esperem — disse a elfa bruscamente.

— O que foi?

— Não se mexa — disse ela a Matador de Goblins.

Ela se arrastou pelo chão. Seus dedos alcançaram o espaço entre as pedras de calçada bem à frente
deles, procurando algo.

— Um alarme? — perguntou ele.

— Provavelmente. Eu o notei por ser novinho em folha, mas teria sido fácil não o notar. Todo
mundo, tenha cuidado.

O lugar que a elfa indicou estava realmente um pouco levantado. Pise nele, e um barulho soaria em
algum lugar, alertando os goblins sobre intrusos.

Sacerdotisa engoliu em seco. O longo e tortuoso declive jogara fora sua concentração e seus
sentidos. Ela podia ver a armadilha agora que foi apontado para ela, mas sem o aviso da elfa, ela
certamente nem perceberia.
— Goblins. Bestas insolentes — cuspiu o anão, afagando a barba.

Calado, Matador de Goblins iluminou o chão com a tocha, depois cada um dos corredores da
esquerda e da direita, olhando atentamente para as paredes. Não havia nada nelas, exceto a fuligem
da iluminação uma vez utilizada pelos residentes há muito desaparecidos da fortaleza.

— O que foi? — perguntou Sacerdotisa.

— Nenhum totem.

— Oh, tem razão… — Só Sacerdotisa entendeu a observação de Matador de Goblins. Os outros


membros do grupo ouviram com perplexidade. Mas Matador de Goblins não disse mais nada.

Ele está pensando. Sacerdotisa olhou para o grupo e percebeu que restava a ela dar a explicação.

— Hum, em outras palavras, isso significa que não há, hum, goblins xamãs aqui.

— Nenhum conjurador? — disse a elfa aplaudindo de felicidade. — Sorte a nossa.

— Não.

O homem-lagarto soltou um suspiro sibilante. — Você está, então… perturbado com a ausência de
conjuradores, meu senhor Matador de Goblins?

— Sim. — Ele assentiu, daí ele indicou o alarme com a ponta de sua espada. — Os goblins comuns
jamais elaborariam algo assim.

— Orelhuda disse que era novinho em folha. Isso significa que ele não faz parte das defesas
originais do forte.

— Pensei em pisar nisso para os atrair para fora — murmurou Matador de Goblins. — Mas acho
que é melhor não.

— Meu senhor Matador de Goblins, você falou antes de sua experiência com tais ninhos extensos
— disse o homem-lagarto, enquanto tomava cuidado para que sua cauda não passasse pelo alarme.
— Como você lidou com eles?

— Eu trago os habitantes para fora e os aniquilo um de cada vez. Às vezes eu uso fogo. Às vezes
eu direciono um rio para o ninho. Existem várias formas. — Perto dele, a elfa parecia horrorizada.
— Mas não podemos as usar aqui. — Ele se virou para Alta-Elfa Arqueira. — Você consegue ver
alguma pegada?

— Lamento. Em uma caverna, talvez, mas em pedras como essas…

— Deixe o anão dar uma olhada — disse Anão Xamã, se aproximando.


— Tudo bem, mas cuidado com o alarme.

— Eu sou corpulento, não estúpido. Terei cuidado.

A elfa abriu caminho educadamente. Ele se abaixou em frente ao grupo. Ele andou para frente e
para trás por meio da interseção em forma de T. Ele chutou o chão de pedra, olhando para ele
atentamente. Um momento depois, ele deu a sua barba um golpe confiante. — Entendi. Sua
pequena toca fica à esquerda.

Sacerdotisa ficou confusa. — Como sabe?

— Pelo desgaste no chão. Eles vêm da esquerda e voltam pela direita, ou vêm da esquerda e se
viram para sair.

— Tem certeza? — disse Matador de Goblins.

— Claro que tenho. Eu sou um anão — respondeu Anão Xamã, batendo na barriga.

— Entendo — murmurou Matador de Goblins, ficando em silêncio.

— Alguma coisa errada, meu senhor Matador de Goblins? — disse o homem-lagarto.

— Iremos por aqui — disse Matador de Goblins, e com sua espada, ele apontou… para a direita.

— Atarracado há pouco não disse que os goblins estão à esquerda? — a elfa disse.

— Sim. Mas se formos por esse caminho, chegaremos tarde demais.

— Tarde demais para quê?

— Você vai ver — disse ele acenando calmamente.

Pouco depois de iniciarem o caminho da direita, eles foram pegos por um fedor sufocante. O ar era
carregado e enjoativo. Um gosto acre ficava em suas bocas com cada respiração.

— Tsc… — O anão apertou o nariz.

— Argh… — Os olhos do homem-lagarto reviraram bastante em seu rosto.

A elfa, também, tirou inconscientemente a mão de seu arco e cobriu a boca.

— O qu… o que é isso? É seguro respirar? — se queixou ela.

Os dentes de Sacerdotisa estavam batendo. Ela conhecia esse odor.


— Não resista. Respire pelo nariz. Você se acostumará com isso logo. — Matador de Goblins não
olhou para trás, e apenas andou resolutamente mais adiante pela passagem.

O grupo se apressou em continuar. Mesmo Sacerdotisa de alguma forma conseguiu continuar.

A fonte do fedor estava próxima. Eles se depararam com uma porta de madeira apodrecida que
parecia colocada para separar parte das ruínas.

— Hmph. — Matador de Goblins lhe deu um chute firme. Com um rangido agonizante, a porta
abandonou seu dever e colapsou. O líquido sujo que cobria o chão espirrou quando a porta caiu
nele.

Era aqui que os goblins colocavam todos os tipos de resíduos. Restos de comida, incluindo ossos
com pedaços de carne agarrado a eles. Excremento. Cadáveres. Tudo. As paredes anteriormente
brancas se tornaram de um carmesim encardido com as pilhas de lixo.

No meio de tudo, eles podiam distinguir uma mecha de cabelos cor de linho e uma perna presa a
uma corrente. Quatro membros devastados cheios de cicatrizes horríveis. Os tendões foram
cortados.

Era uma elfa.

Definhada, enterrada na imundice, e a metade esquerda de seu corpo, no entanto, ainda mostrava a
beleza pela qual o seu povo era conhecido.

A metade direita era uma história diferente.

Sacerdotisa pensou que a elfa parecia como se estivesse coberta por cachos de uvas. Sua pele
delicada e pálida estava invisível sob o inchaço azulado. Seu olho e seu peito estavam destruídos.

O objetivo era inconfundível: tortura por mera tortura.

Ah, de novo não… O pensamento floresceu na mente de Sacerdotisa e se apegou nela.

— Huegh… Eurghhh…

Bem próxima de Sacerdotisa — aparentemente tão longe — Alta-Elfa Arqueira adicionava o


conteúdo de seu estômago aos resíduos que cobriam o chão.

— O que é isso? — O anão afagou sua barba, mas não conseguiu esconder o horror em seu rosto.

— Meu senhor Matador de Goblins? — Mesmo Lagarto Sacerdote normalmente inescrutável,


estava com uma expressão evidente de nojo.

— Nunca viram isso antes?


Com sua pergunta calma, Alta-Elfa Arqueira assentiu, sem se incomodar em limpar a boca.
Lágrimas pingavam em suas bochechas, e suas orelhas ficaram quase que completamente caídas
em sua cabeça.

— Entendi. — Ele assentiu.

— … aaate…… ma… maaaate… — Sacerdotisa olhou subitamente para o gemido melancólico. A


elfa aprisionada. Ela ainda estava viva! Sacerdotisa correu até ela e a segurou, ignorando a sujeira
que imediatamente cobriu suas mãos.

— Me dê uma poção!

— Não, ela está muito debilitada. Só ficará em sua garganta. — O homem-lagarto seguiu
Sacerdotisa até a prisioneira e estava inspecionando suas feridas com suas garras escamadas. —
Ela não está ferida mortalmente, mas corre o risco de morrer de exaustão. Ela precisa de um
milagre.

— Certo! — Sacerdotisa trouxe seu cajado para perto de seu peito com uma das mãos e colocou a
outra no peito da elfa ferida. — Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, coloque tua venerada
mão sobre as feridas da tua filha.

Observando sua curandeira conceder o milagre da deusa pelo canto do olho, Matador de Goblins se
aproximou de Alta-Elfa Arqueira.

— Você a conhece?

Ainda agachada e tremendo impotentemente, a elfa balançou a cabeça. — Muito… muito


provavelmente ela era como eu… uma elfa “desenraizada” que… se tornou uma aventureira.

— Entendi. — Matador de Goblins assentiu e então com seu passo ousado, andou em direção a
prisioneira. Sua espada estava na mão. O homem-lagarto lhe deu um olhar desconfiado.

— Ah…!

Estamos sem tempo.

Sacerdotisa empalideceu e se levantou. — E-espere aí! — Ela ficou com os braços abertos na
frente da elfa prostrada. Matador de Goblins não parou.

— Se mexa.

— Não! Eu… eu não vou!

— Eu não sei que ilusão você está abrigando agora — disse exasperado Matador de Goblins. Seu
tom não mudou. Era implacável e calmo. — Mas eu vim aqui com um único propósito: para matar
goblins.
Sua espada desceu.

Houve um jato de sangue e um grito.

— Três.

O baque de um corpo. Era um goblin, com a espada atravessada em seu cérebro. Ele largou a adaga
envenenada que esteve segurando quando morreu. Ninguém notou ele se escondendo na pilha de
lixos atrás da elfa aprisionada.

Não, pensou Sacerdotisa, balançando a cabeça. Isso não era verdade. Ele havia notado. E a
prisioneira também.

— Ma… mate todos… eles… — A elfa aventureira trouxe para a boca um bocado de sangue
juntamente com suas palavras.

Matador de Goblins colocou o pé contra o cadáver e tirou sua espada. Ele usou a túnica do goblin
para limpar a gordura reluzente da lâmina.

— Essa é a minha intenção — respondeu ele calmamente. Ninguém mais disse nada.

O que esse homem vira em sua vida? O que ele era? As pessoas que estavam nesse lugar repleto de
sujeira finalmente tiveram um lampejo de compreensão.

Sacerdotisa se lembrou da avaliação de Bruxa sobre Matador de Goblins. Em suas palavras:


“Deixe, que seja sua própria decisão”.

Agora ela entendia claramente o que isso significava. Todo aventureiro, mesmo aqueles que não
sobrevivem à sua primeira missão, experimentam matança e morte. Encontrariam coisas horríveis e
terríveis. Aldeias e cidades devastadas por monstros não seriam uma visão incomum para eles.

Mas havia uma lógica por trás de tudo. De bandidos e vândalos, à elfos negros e dragões, mesmo
os limos; todos possuíam um motivo para a forma como agiam.

Goblins por si só eram diferentes. Eles não tinham motivo. Apenas maldade. A maldade para com
os humanos, para com todos os outros seres vivos. Para caçar goblins, você seria confrontado com
esse mal várias vezes.

Isso não era uma aventura. E alguém que escolhia seguir esse caminho, não era um aventureiro.
Eram como ele.

Um homem com uma armadura de couro suja e um capacete sujo, carregando uma espada que
parecia quase que grande demais para se empunhar.

— Matador de Goblins…
Em meio a escuridão e o mau cheiro, alguém sussurrou seu nome.
A responsabilidade de proporcionar uma escolta para a prisioneira elfa voltar para a floresta caiu
sobre Lagarto Sacerdote.

Ele pegou várias presas pequenas de sua bolsa e as espalhou no chão.

— Ó chifres e garras do nosso pai, Iguanodon — entoou ele — seus quatro membros se tornam
duas pernas para andar sobre a terra.

Quando ele falou, as presas no chão chacoalharam e começaram a aumentar de tamanho. Um


momento depois, elas formaram o esqueleto de um homem-lagarto, que curvou a cabeça para
Lagarto Sacerdote e se ajoelhou.

— Esse é o guerreiro dragãodente, um milagre que recebi de meu pai — explicou ele.

— Quão bem ele luta? — perguntou Matador de Goblins.

— Tão bem quanto eu mesmo, ele pode lidar com um ou dois goblins se a necessidade surgir.

O homem-lagarto escreveu uma carta explicando a situação e entregou ao guerreiro dragãodente,


após o qual a criatura ergueu a elfa sobre seu ombro e partiu.

Entre isso e Cura Menor, o grupo agora havia usado dois dos seus milagres. Ninguém contestou.

— Mas que raio…? O que está acontecendo aqui? — se queixou Alta-Elfa Arqueira, agachada na
sujeira. Sacerdotisa deu uns tapinhas em suas costas.

Estranhamente, embora eles ainda estivessem no local cheio de sujeira, já não notavam o cheiro.

Acho que devemos ter se acostumado.

Sacerdotisa deu um sorriso pesaroso. Seus braços e pernas tremiam um pouco.

Anão Xamã estava puxando firmemente sua barba e fazendo cara feia. Alegando que se sentia
indisposto, ele fora ficar na porta do local. O guerreiro dragãodente, carregando a elfa, passou por
ele.

Matador de Goblins tinha suas costas viradas para tudo isso. Ele vasculhou a bagunça, empurrando
as coisas ao redor, as jogando de lado, até que finalmente pegou algo do lixo.
Era uma mochila de lona, destinada claramente a um aventureiro. Os goblins haviam metido suas
garras no interior, embora tivessem a jogado fora. Talvez tivessem se cansado dela. Estava muito
suja. Matador de Goblins, também, começou a vasculhar dentro.

— Ah, sabia que tinha que estar aqui. — Ele pegou um pedaço enrolado de papel, já amarelado
pela idade.

— O que é isso? — perguntou baixinho Sacerdotisa, enquanto dava palmadinhas nas costas da elfa.

— Deve ter pertencido a essa prisioneira — disse Matador de Goblins, desenrolando calmamente o
papel; não, era uma folha seca. Com o dedo, ele traçou as linhas fluidas que estavam desenhados
nela, e depois assentiu como se tivesse encontrado o que queria.

— É um mapa dessas ruínas.

— Essa elfa deve ter o usado para se orientar… — Havia uma boa chance de que, infelizmente, ela
não soubesse que as ruínas se tornaram um ninho de goblins. Levando em conta que entrar em
algumas ruínas abandonadas era uma aventura, o destino que ela sofreu foi certamente um
resultado possível.

O fato deles terem chegado a tempo de salvar ela foi pura sorte. Por mais que Sacerdotisa odiasse
admitir.

— O caminho da esquerda conduz a uma galeria — disse Matador de Goblins, estudando o mapa
atentamente — que está ao lado de um átrio. Quase que posso assegurar que a maior parte da horda
está lá. É o único lugar grande o suficiente para que todos eles durmam. — Ele dobrou o mapa e
colocou em sua própria bolsa. — Parece que a esquerda era a escolha correta.

— Hmph. — O anão deu um resmungo ofendido.

Matador de Goblins também pegou alguns frascos de pomada e outros itens pequenos da mochila.

E então, sem preâmbulo, ele jogou a bolsa para Alta-Elfa Arqueira.

Ela ficou confusa.

— Você leva.

Quando Alta-Elfa Arqueira pôs a mochila, ela olhou para cima. Os cantos dos olhos dela estavam
vermelhos e inchados de tanto esfregar; ela parecia muito desconfortável.

— Vamos.

— Espera aí, você não pode falar assim com…

— Está tudo bem. — A elfa cortou o discurso indignado de Sacerdotisa.


— Nós… nós temos que nos apressar.

— Isso mesmo — disse Matador de Goblins calmamente. — Temos que matar esses goblins. —
Ele andou com seus passos ousados, de certa forma violentos. Sobre a porta desabada ele foi,
deixando o lugar cheio de lixo para trás.

Ele não olhou para trás.

— E-ei, espere…!

A elfa gritou e correu para segui-lo enquanto Sacerdotisa foi junto em silêncio.

Os dois aventureiros restantes olharam um para o outro.

— …Deuses do céu — suspirou o anão, torcendo sua barba. — Ele é uma figura, isso sim. Me
pergunto se ele é mesmo humano.

— Ouvi dizer que Eotyrannus, o Tirano da Alvorada, era assim também. Parece que as histórias
não são completamente falsas. — O homem-lagarto revirou bem os olhos.

— Talvez você tenha que ser um pouco louco para ser bom nesse trabalho.

— Seja como for, devemos ir. Eu, pessoalmente, não posso perdoar essas criaturas.

— Nem eu, Escamoso. Os goblins são antigos inimigos dos anões, se pensar nisso.

Anão Xamã e Lagarto Sacerdote olharam um para o outro, então foram atrás de Matador de
Goblins.

O caminho da esquerda se torcia como um labirinto. Isso era natural para uma fortaleza. Se não
conhece o terreno, você nunca saberia para onde ir.

Mas eles tinham o mapa deixado pela elfa e duas pessoas procuravam atentamente por armadilhas.
Eles encontraram várias patrulhas de goblins em seu caminho pela fortaleza, mas não foi nada
inesperado. Alta-Elfa Arqueira disparou suas flechas neles com seu arco curto, e se ela falhasse em
os deter, Matador de Goblins entraria na luta e acabaria com eles.

No fim, nem um único goblin sobreviveu ao seu encontro com o grupo.

Sacerdotisa olhou discretamente para o rosto da elfa, tenso como uma corda esticada.

Ela viu os disparos quase milagrosos da elfa na entrada das ruínas. A ideia de que suas flechas
pudessem falhar em parar seus alvos parecia quase insondável…

Matador de Goblins, porém, não parecia se importar. Ele avançava com os mesmos passos calmos
de sempre.
Finalmente, eles chegaram ao último lugar para dar um descanso antes da galeria.

— Quantas magias ainda temos? — perguntou Matador de Goblins silenciosamente. Ele ficou
perto da parede, trocando sua arma.

Alta-Elfa Arqueira estava agachada no canto, e Sacerdotisa se moveu para ficar perto dela, lhe
oferecendo um tapinha no ombro. — Hum, eu usei Cura Menor uma vez, então… tenho dois
milagres sobrando — disse ela.

— Eu invoquei um guerreiro dragãodente só uma vez — disse o homem-lagarto. — Eu, também,


posso usar até três milagres, mas… — Com sua cauda sacudindo de um lado para o outro, ele
enfiou a mão em sua bolsa e tirou um punhado de dentes. — O milagre do guerreiro dragãodente
exige uma matéria-prima. Eu só posso o realizar talvez mais uma vez.

— Eu entendo. — Matador de Goblins assentiu. Seu olhar caiu sobre o anão. — E quanto a você?

— Bem, vejamos… — O anão começou a contar com seus dedos pequenos, murmurando “um,
dois…” em voz baixa. — Depende da magia — concluiu ele — mas digamos quatro vezes, talvez
cinco. Bem, quatro com certeza. Não se preocupe.

— Entendi.

O número de vezes que um conjurador poderia usar suas magias aumentava com seu ranque, mas
não drasticamente. O poder real dos conjuradores estava na variedade e dificuldade das magias que
poderiam lançar. Se eles não fossem um aventureiro ranque platina — e ainda assim, um com um
dom notável — o número de vezes que eles poderiam conjurar por dia era limitado.

Isso significava que todas as magias eram preciosas. As desperdice e morra.

— Hum, quer beber alguma coisa? Consegue beber?

— Obrigada. — Alta-Elfa Arqueira pegou o cantil que Sacerdotisa lhe ofereceu e o colocou em
seus lábios.

Ela fizera tudo, mas em silêncio até esse momento. A elfa sempre recebeu as preocupações de
Sacerdotisa com um sorriso fraquinho e balançando a cabeça.

Quem poderia a culpar?, pensou Sacerdotisa. Depois de ver o que aconteceu com a outra elfa
assim…

Sacerdotisa mesma às vezes sonhava com o que aconteceu com seus antigos companheiros.

Naquela época, ela e Matador de Goblins pegaram uma missão atrás da outra quase sem parar.
Olhando para trás, ela estava feliz que não tivesse tempo para parar e pensar.

— Não coloque muito em seu estômago. Isso reduzirá seu fluxo sanguíneo — disse Matador de
Goblins calmamente. — Você não reagirá tão rapidamente.
Ele não dizia isso para benefício da elfa. Era apenas uma prática. Ele estava se certificando de que
todos estivessem cientes.

Sacerdotisa parou, como se cobrindo inconscientemente a elfa. — Matador de Goblins, senhor! —


disse ela. — Você não poderia ser… um pouco mais…?

— Não quero enganar ninguém — disse ele balançando a cabeça lentamente. — Se estiver apta a
me acompanhar, então se junte a mim. Se não estiver, então volte. É muito simples.

— …Não seja ridículo — disse a elfa, limpando as gotas de água em sua boca. — Eu sou uma
patrulheira. Orcbolg… você, até você, não poderia explorar, procurar por armadilhas e lutar
sozinho.

— Aqueles que podem devem fazer o que são capazes.

— Estou dizendo que nós não temos a força. Somos apenas cinco.

— Números não são o problema. Seria muito pior deixar esse lugar assim.

— Ah, pelo amor dos deuses! — A elfa agarrou seus cabelos. Suas orelhas apontaram para trás. —
O que está acontecendo aqui? Nem sequer sei mais…

— …Vai voltar, então?

— Como eu poderia?! Depois de ver o que fizeram a essa prisioneira?! E a minha casa… Minha
casa não está tão longe daqui…

“Entendo” foi sua única resposta para a arqueira agitada. — Nesse caso, vamos. — Com isso, ele
ficou de pé, anunciando o fim de sua breve pausa.

Matador de Goblins foi em frente sem outras palavras. A elfa olhou com ódio para as costas dele,
rangendo os dentes.

— Se acalme, Orelhuda. O território inimigo não é o lugar para começar uma briga.

Houve uma pausa. — Você está certo — disse a elfa.

O anão deu uns tapinhas gentilmente em suas costas. As orelhas longas da elfa caíram.

— Sinto muito. Eu odeio concordar com um anão. Mesmo quando está certo.

— Ah, essa é a orelhuda que eu conheço!

Com o arco curto na mão, a elfa partiu. Sacerdotisa se curvou um pouco para o anão enquanto
passava. O anão seguiu, revirando sua mochila. E o homem-lagarto mais uma vez compôs a cauda
das suas linhas.
— Todo cuidado é pouco — disse o anão.

— De fato. Devo fazer preparativos para rezar. — O homem-lagarto fez seu gesto estranho das
palmas juntas.
Seguindo o mapa, o grupo logo encontrou a galeria.

A elfa foi na frente, nas pontas de seus pés como um gato espreitando. Ela gesticulou para os
outros sobre como proceder.

Por isso ela foi a primeira a ver o vasto salão.

Tal como o mapa mostrava, a galeria ficava ao lado de um átrio enorme. O teto tinha que ser tão
alto quanto o nível do solo. Os elfos viviam por milhares de anos, e ali dificilmente poderia ter tido
um morador da floresta tão antigo quanto esse lugar.

Apesar de sua idade, as paredes de pedra branca ainda exibiam ilustrações impressionantes das
batalhas da Era dos Deuses. Os deuses belos lutando com os abomináveis, espadas cintilando, raios
voando, até finalmente chegar aos dados.

Era uma representação da criação do mundo. Se esse lugar fora outrora uma fortaleza, o que os
soldados daqui sentiam ao ver isso? Se as circunstâncias fossem diferentes, Alta-Elfa Arqueira teria
deixado escapar um suspiro fascinado.

Mas as circunstâncias não eram diferentes, e ela manteve a boca fechada.

Ela se inclinou sobre a balaustrada da galeria e espiou o átrio. Por um muro que se erguia absoluto
como um penhasco, ela pôde ver goblins.

E não um ou dois. Nem mesmo dez ou vinte.

Um vasto exército. Cinco aventureiros não podiam contar o número com seus dedos em conjunto.

A elfa engoliu em seco. A fúria abrasadora em seu peito ficou fria de repente.

Aquela prisioneira pôde ter sido feita de brinquedo por cada goblin nesse lugar. A elfa gravou de
repente o que poderia acontecer com ela no menor dos deslizes.

Ela não possuía a coragem para enfrentar isso sozinha. Ela mordeu os lábios para parar seus dentes
de rangerem.

— Como está?

A elfa quase saltou de surpresa. As suas orelhas voaram para trás.


Como Matador de Goblins aparecera ao lado dela sem notar?

Em parte, a elfa esteve focada em outras coisas. Mas Matador de Goblins se moveu agora com uma
sutileza que ela nunca poderia ter imaginado a partir de seu passo violento habitual. Ele não fez
nenhum barulho.

Ele não estava segurando uma tocha, talvez por preocupação de ser visto.

— N-não me assuste assim…

— Foi sem querer.

A elfa olhou furiosamente para o capacete de aço. Ela limpou o suor que surgiu em sua testa.

— De qualquer forma, veja por si mesmo. Eles são muitos.

— Não será um problema — disse Matador de Goblins calmamente.

Ele gesticulou para os outros membros do grupo para se juntarem a eles, depois explicou seu plano.

Ninguém argumentou.

O primeiro a notar algo incomum foi um goblin que saiu da cama. Era quase a hora de mudar a
guarda, mas a última patrulha ainda não voltara.

Bem, talvez ele tivesse ido atormentar aquela elfa um pouco mais. Verdade, não era tão divertido
agora que seus gritos estavam ficando mais fracos. Com sorte, eles apanhariam outra em breve.

Sem ele saber, uma oportunidade para fazer exatamente isso estava a caminho.

O goblin fez um bom alongamento, afrouxando seu corpo fino e deixando sua barriga saliente se
pender. Assim que seu alongamento se tornou um bocejo, ele viu algo estranho empoleirado sobre
a galeria.

Um anão.

Um anão emborcando o conteúdo de uma jarra vermelha.

— GUI…?

Naquele momento, o anão olhou para o goblin desnorteado e cuspiu nele. O cuspe veio abaixo
como uma névoa.

O goblin espirrou. Isso era licor! Aquele anão lhe cuspiu álcool!
— Beba fundo, cante alto, deixe os espíritos te guiar! Cante alto, pise rápido, e quando você
dorme eles te vejam, que uma jarra de vinho de fogo esteja em seus sonhos para te
cumprimentar! — E então, mais uma vez, o anão deixou algumas gotas de sua bebida escorrer no
monstro confuso.

O goblin estava totalmente perplexo com tudo isso, mas ele estava ciente o suficiente para alertar
seus companheiros. Ele abriu a boca e…

…não fez nenhum som.

Sua língua se moveu e ele respirou, mas sua voz não saiu.

Então, por que acha que isso aconteceu?

Olhando atentamente, o goblin pôde ver uma linda garota humana ao lado do anão, agitando um
cajado de monge.

— Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, nos conceda paz para aceitar todas as coisas…

O goblin não pareceu entender as palavras que a voz baixa dizia. As engrenagens enferrujadas em
sua pequena cabeça se tornaram tão rápidas quanto podiam, mas de alguma forma ele se sentia
tonto e um pouco… agradável.

A última patrulha ainda não voltou. Por que não tirar mais outro cochilo até eles voltarem?

Ele deu um bom bocejo e voltou para a cama.

E depois morreu.

Ele nunca soube que fora vítima de Silêncio e Estupor. Matador de Goblins cortou a sua garganta
com uma adaga antes de ele ter tido a chance de descobrir. O goblin abriu os olhos, o sangue surgiu
da ferida, mas Matador de Goblins pressionou mais a adaga e o matou.

Alta-Elfa Arqueira e Lagarto Sacerdote desceram da galeria sem fazer barulho e colocaram suas
armas para trabalhar por todo o grande salão. Eles tinham que se mover rapidamente a fim de
terminar o serviço enquanto as magias lançadas por Sacerdotisa e o anão ainda estivessem ativas.

Eles tinham que ser calmos, implacáveis. Cortar a garganta de um goblin dormindo, o esmagar até
ele parar de se mover e então partir para o próximo. Não era uma batalha. Era só um trabalho.

Mas não era um trabalho fácil. A elfa fez um som baixo de cansaço. Ao cortar a terceira ou quarta
garganta goblin, ela não podia mais esconder o esforço que aquilo estava exigindo dela.

O suor formava gotas em sua testa. A lâmina de sua faca de pedra estava empapada de gordura que
não sairia não importa o quão bem ela limpasse.
Ela olhou em volta, tentando ver o que seus companheiros estavam fazendo. O homem-lagarto
carregava uma espada feita de dente polido de algum animal. A lâmina branca já ficara vermelha,
mas o fio de corte não parecia ter ficado cego. Ela realmente devia ter sido forjada por algum poder
milagroso.

Matador de Goblins, é claro, se movia facilmente de uma garganta para outra.

E ele nem sequer tem uma arma especial. Alta-Elfa Arqueira observou as mãos dele com a
perspicuidade da visão que apenas um caçador élfico possuía. Quando ele matou outro goblin, ele
cortou alguns dedos para liberar a adaga de sua mão, e trocou sua lâmina cega por essa nova.

Entendi. A elfa deslizou sua própria lâmina de volta a bainha e o imitou.

Ela começou a matar mais dos monstros adormecidos. Cada um morreu sem saber que não foi o
primeiro e não seria o último.

E no meio do massacre, a elfa viu sua raiva diminuindo.

Não era que tivesse esquecido a visão terrível da outra elfa. Isso era impossível. E mesmo assim…

— ………

Em seu coração, havia uma frieza mecânica, estranha e nova.

Ela engoliu em seco inconscientemente. Os olhos dela começaram a divagar… na direção do


homem, com sua armadura barata de couro e elmo de aço, que ainda cortava indiferentemente as
gargantas dos goblins. Enquanto ele fazia seu trabalho, ele tomava um tempo extra para apunhalar
cada corpo duas vezes, para assegurar que estava morto.

Como ele pode pensar em fazer isso sozinho? …Bem, acho que ele sempre trabalhou sozinho
antes.

O que ela estava pensando desse homem? A elfa não sabia, mas mesmo enquanto fazia essa
pergunta, suas mãos estavam arrancando a faca dos dedos de um goblin.

Eles acabaram de matar cada goblin no salão grande em pouco menos de trinta minutos.

A bela pedra branca, os desenhos cativantes nas paredes; tudo estava encharcado de sangue de
goblin.

Quando chamam o campo de batalha de um mar de sangue, eles não estão brincando, pensou a
elfa.

Por fim, o anão e Sacerdotisa vieram sem fôlego da galeria. Matador de Goblins olhou para os
aventureiros reunidos, depois apontou para mais profundamente adentro com a espada. Ele estava
coberto de sangue da cabeça aos pés, mas… para a elfa, isso fazia pouca diferença. O mapa
deixava claro que existia outro cômodo mais para dentro. Eles procurariam por sobreviventes e os
matariam.

Seus olhos encontraram os dele; pelo menos, ela pensou que sim, embora não conseguisse ver
através do capacete dele. Com um aceno, Matador de Goblins partiu com seus passos ousados.
Como sempre, ele não olhou para trás.

Todo mundo estava em silêncio. O que ele faria se ninguém o notasse saindo?

Deuses.

O grupo se entreolhou e sorriu silenciosamente.

Foi Sacerdotisa que seguiu atrás dele primeiro. A elfa foi depois, com seu arco curto tão pesado
quanto chumbo em suas mãos. E, finalmente, o homem-lagarto e o anão se juntaram a eles, o grupo
todo preparado para sair do salão… e foi quando aconteceu.

Houve um baque de ar. No silêncio, foi quase o suficiente para os abalar.

Todos ficaram imóveis, olhando na direção que pretendiam se aventurar.

Matador de Goblins ergueu rapidamente seu escudo e desembainhou a espada — uma das lâminas
que ele tirou de um goblin — com sua atenção jamais vacilando.

Houve outro barulho, mais perto do que o primeiro. Algo estava chegando.

Então, da escuridão, ele emergiu.


Ele possuía um grande corpo azul-escuro. Chifres cresceram em sua testa, e um odor pútrido os
assaltava com cada respiração da criatura. Em suas mãos havia um martelo de guerra enorme.

Os olhos da elfa se arregalaram de choque, e sua voz saiu em um sussurro tenso. — Ogro…!

A primeira coisa que eles ouviram quando o som foi restabelecido no local, foi o eco dessa palavra.
— Eu achei que os goblins estavam quietos demais. É tão difícil encontrar uma boa ajuda hoje em
dia… — A boca do ogro era como um rasgo em seu rosto; sua respiração se agitava para fora. Sua
voz era um uivo. — Vocês não são como aquela habitante da floresta de antes. Vocês vieram aqui
sabendo que essa era a nossa fortaleza, procurando nos fazer violência. — A sede de sangue do
ogro era nítida, hipnotizando os aventureiros. Olhos dourados cintilavam em seu rosto.

Cada membro do grupo sacou suas armas, tomando posturas baixas e se preparando para lutar. De
suas fileiras, Matador de Goblins disse calmamente: — O quê? Você não é um goblin?

— Eu sou um ogro! Não me diga que não sabia?! — berrou ele. Alta-Elfa Arqueira se aproveitou
dessa conversação para colocar uma flecha em seu arco curto.

Um ogro. Um canibal.

Se os goblins eram movidos por um ódio para com aqueles que possuem palavras, ogros eram
movidos apenas pela sua sede em caçar presas. Essas criaturas infiéis Que-Não-Rezam,
provocavam medo nos corações dos aventureiros em todos os lugares. Qualquer um que conheceu
um ogro e sobreviveu para contar a história falava de sua força e presença assustadora.

Diziam que uma cavaleira com um escudo resistente morreu quando tentou bloquear o ataque do
ogro, só para acabar com seu próprio escudo enfiado na cabeça.

Diziam que um grande guerreiro desafiara um ogro para uma batalha de cem dias, mas que o
monstro nunca sofreu um arranhão, e depois de meses de combate, o guerreiro caiu exausto.

Diziam que uma maga que conhecia muitas magias tentou comparar inteligência com um ogro,
porém, foi queimada até a morte quando descobriu que o ogro conhecia mais magias do que ela.

Basta dizer que, ogros eram adversários difíceis mesmo para aqueles de ranque prata. Os ranques
porcelanas poderiam ser simplesmente esmagados como insetos.

Medo estava escrito no rosto de todos os membros do grupo. Os braços trêmulos de Sacerdotisa
fizeram o seu cajado de monge chacoalhar em suas mãos.

Mas, Matador de Goblins disse com enorme exasperação: — Não. Eu não sabia.

Houve um tremendo som de algo fendendo; o ogro estava rangendo os dentes. Ele olhou para o
guerreiro diante dele, com uma armadura de couro barata e um capacete de aço, como se não
pudesse acreditar no que via.
— Seu patife! Você se atreve a zombar de mim?! Me foi concedido um exército pelos generais
demônios…

— Hmm… eu sabia que tinha que existir alguém no comando — disse Matador de Goblins,
balançando a cabeça. — Mas eu não sei nada sobre ogros, generais demônios ou que seja.

Em um excesso de fúria, o ogro deu uma série de uivos ininteligíveis. Com cada rugido, ele bateu
seu martelo de guerra contra as paredes, sacudindo as ruínas e fazendo a pedra branca quebrar.

— Então me deixe te ensinar sobre nós, ignorante! — O monstro estendeu a sua grande e pálida
mão esquerda e começou a recitar: — Carbunculus… Crescunt… — Uma luz fraca apareceu em
sua palma e girou até que se tornasse uma chama. A chama queimou em vermelho, depois
gradualmente branca, e finalmente azul…

— Ele está invocando uma Bola de Fogo!

— …Iacta!

Anão Xamã gritou seu aviso assim que o ogro terminou sua magia. Uma esfera de fogo letalmente
quente veio voando, trilhando uma cauda como um cometa.

— Se espalhem! — berrou Alta-Elfa Arqueira. A coisa óbvia a se fazer face uma magia de efeito
em área como essa, era se separar para que o grupo todo não fosse exterminado com apenas um
golpe. Enquanto os membros do grupo correram para todas as direções, um entre seus números foi
diretamente à frente.

— Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, pelo poder da terra conceda segurança para nós que
somos fracos…

Sacerdotisa ficou lá, minúscula contra a grande bola de chamas, com seu cajado estendido e sua
voz erguida.

E a Mãe Terra, na sua misericórdia, ouviu sua súplica sincera. Ela concedeu o milagre de proteção.

A bola de fogo se deparou com uma parede invisível e pairou no ar, rugindo enquanto queimava.

— Ouch…!! — A pressão e o calor assediaram Sacerdotisa, chamuscando sua pele e as mãos,


calcinando sua carne. Seu cajado chacoalhou. O suor formava gotas em sua testa.

— Ó… Ó Mãe… Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, pelo poder da terra conceda


segurança para nós que somos fracos! — Com seus lábios secos, seus pulmões ardendo,
Sacerdotisa repetiu a oração. Mas o calor tremendo foi gradualmente derretendo a barreira
invisível…

— Ahhh! — Proteção foi finalmente superada por Bola de Fogo. O calor diminuíra um pouco pela
longa batalha da magia contra o milagre de Sacerdotisa, mas ainda assim, um vento quente e
poderoso atravessou o átrio, assaltando os aventureiros. A umidade evaporou do ar em um instante,
e o sangue de todos os cadáveres dos goblins ferveram.

Mas, não foi o suficiente para causar danos.

— Haa… ahh… — Sacerdotisa estava de joelhos, com a língua de fora enquanto puxava o ar.

Ela estava com o estado Sobrecarga, ela executara mais orações do que poderia lidar. O ritual a
conectou diretamente ao céu, mas enfraqueceu sua própria alma, agora seu rosto estava pálido e ela
estava incrivelmente fria.

— E-e-eu sin-sinto mui-muito…!

— Não — disse Matador de Goblins, dando um passo à frente e preparando seu escudo. — Você
nos salvou.

Sacerdotisa, toda torta, assentiu vigorosamente e se agarrou ao seu cajado. — Bom trabalho —
disse Alta-Elfa Arqueira, enquanto a sustentava. — Você ficará bem. Agora deixe o resto conosco.

— Garotinha detestável! — disse o ogro. — Não pense que deixarei você ter um fim tão agradável
quanto aquela elfa!

— Acha que consegue lidar com a gente? Então venha a pegar! — Alta-Elfa Arqueira foi para a
frente de Sacerdotisa e soltou a flecha do seu arco já retesado.

O ogro balançou seu martelo e deu um grito de guerra retumbante.

— Convoque um guerreiro dragãodente — disse Matador de Goblins, com sua atenção jamais se
deslizando enquanto segurava o seu escudo erguido para proteção. — Precisamos de mais aliados.
— O elmo de aço não desviou do ogro, e a espada, com um aspecto inconvenientemente curto que
ele tomou de um goblin, estava apontada para o inimigo.

— Bem colocado, meu senhor Matador de Goblins. — Lagarto Sacerdote fez seu gesto estranho
com as mãos juntas, depois espalhou algumas presas pequenas no chão.

— Ó chifres e garras do nosso pai, Iguanodon, seus quatro membros se tornam duas pernas para
andar sobre a terra! — Em um instante, os dentes se ergueram para formar um guerreiro
esquelético.

Lagarto Sacerdote imediatamente seguiu isso com a oração da garraespada: — Ó asas falciformes
de Velociraptor, rasgue e dilacere, voe e cace! — A presa que ele segurava nas mãos unidas
cresceu e se moldou diante de seus olhos, até que estivesse do tamanho de uma cimitarra. O
homem-lagarto jogou a arma recém-criada para o guerreiro convocado e puxou sua própria espada
curta da bainha.

— O guerreiro dragãodente e eu iremos à frente com o meu senhor Matador de Goblins! Nos
apoiem por detrás!
— Tão certo quanto céu aberto! — A resposta do anão foi tão firme quanto um martelo golpeando
uma casa. Ele pegou um punhado de pó de argila do bolso e jogou no ar.

— Saiam, seus gnomos, é hora de trabalhar, não se atrevam a fugir de seu dever; um pouco de pó
pode não causar choque, mas mil fazem uma bela rocha!

— Acha que vou deixar você se safar com isso, seu encrenqueiro minúsculo? — O ogro correu em
frente, brandindo o martelo. Talvez ele quisesse romper a linha de frente para alcançar os
defensores na retaguarda. Ele possuía o poder para isso.

Mas ele foi impedido pela arqueira, que disparou flecha ponta-broto após flecha nele. — Os anões
podem aprender magias, mas não como mover suas pernas atarracadas, hein?

— Urraaaghh! — Cada flecha encontrou seu alvo, e um desses alvos foi o olho direito do ogro. Ele
parou confuso e recuou com a mão no rosto.

— Me perdoe, sua majestade pernuda! Todos temos que lutar com o que os deuses nos deram!

Naquele momento, o pó que esteve flutuando no ar se transformou em uma massa de pedras


pequenas que voaram para o corpo enorme do ogro. Essa era a magia Impacto Pétreo.

— Hrrgh! Você acha que um truque como esse iria me parar? — O ogro cambaleou um pouco sob
os impactos repetidos. Mas não mais que isso. O canibal mandou as pedras longe com a mão e
retomou seu avanço aos aventureiros.

Matador de Goblins se opôs a ele sozinho.

Enquanto se movia, com o escudo em seu braço, ele deu um golpe rápido nas pernas do monstro
com sua espada.

Seus movimentos foram curtos, rápidos, precisos e tão implacáveis como sempre…

— Hum…!

…e ela ricocheteou no ogro com um barulho metálico. A pele do monstro, mesmo em suas pernas,
era tão dura quanto pedra.

— Tal impertinência!

— Hah…?!

O martelo de guerra se moveu para cima e atingiu o guerreiro que cambaleava. Sua armadura
amassou, e Matador de Goblins voou, caindo em uma pilha no chão.

— Orcbolg!!
— Matador de Goblins, senhor! — Tanto Sacerdotisa quanto a elfa gritaram, com seus rostos
igualmente pálidos.

— Não sou um mero goblin! — berrou o ogro, retirando a flecha do olho e a jogando fora. O olho
deveria ter sido arruinado, mas em vez disso, borbulhou e se curou, e logo cintilou com malícia
mais uma vez.

Então os ogros não eram apenas imensamente fortes, mas também capazes de se curar. Os dentes
da elfa começaram a ranger.

— Vocês pararam minha magia. Vocês destruíram meu olho. Eu vou cobrar caro por essas
humilhações! — Ele ergueu o martelo de novo, visando Matador de Goblins. — Primeiro, irei
arrancar seus membros. Depois irei me divertir com sua elfa e sua pequena Sacerdotisa enquanto
assiste!

— Como se fosse assim tão fácil, canibal! — A salvação de Matador de Goblins veio na forma do
guerreiro dragãodente que o homem-lagarto invocou. O servo esquelético arrastou Matador de
Goblins para longe do golpe na hora H.

— Matador de Goblins, senhor…!! — Com passos cambaleantes, Sacerdotisa foi para onde o
guerreiro fora evacuado.

— Tome conta dele, minha senhora Sacerdotisa! — O homem-lagarto e os outros se moveram para
interceptar o ogro que avançava.

— Saia da frente, seu morador rastejante do brejo! — O monstro trouxe seu martelo para baixo,
mas o homem-lagarto o desviou habilmente para o lado com sua cauda.

— Mestre anão, minha senhora patrulheira… vossas ajudas, por favor!

— Lance uma magia, anão!

— Deixa comigo!

Correndo pelo chão destruído, a elfa disparava suas flechas como um dilúvio. Galho e depois outro
galho voavam, perfurando a carne pálida do ogro.

— Você é tão irritante quanto uma mosca, garota!

— O qu…? Hã?!

Mas, isso foi tudo o que eles fizeram. O ogro não mostrou quaisquer sinais de lesões, e bateu seu
martelo de guerra na parede. A elfa perdeu o equilíbrio no chão que tremeu e foi lançada para o ar.

Uma criatura sem asas é imóvel no ar, e esse ogro não era alguém que perderia tal chance. Ele deu
um passo, avançando com um brandir de sua arma.
— O quêêê?!

Mas, tampouco a elfa era uma que perderia a oportunidade. Ela curvou seu corpo como uma
acrobata e passou pelo martelo que se aproximava.

O movimento do ogro, no entanto, não era só para eliminar a elfa. Como se fosse para cumprir o
voto de vingança do monstro, escombros caíram do teto com o impacto.

— Hrgh!

— Ooo!

O homem-lagarto se arrastou para fora do caminho, e o anão rolou para evitar os destroços. Mas o
guerreiro dragãodente descarnado não conseguiu se mover rápido o suficiente para escapar. As
pedras caíram sobre ele, seguidas de perto pelo martelo de guerra. O guerreiro dragãodente se
despedaçou, em nada mais que o que ele fora antes, uma pilha de ossos.

Ele certamente serviu ao seu propósito como um alvo extra, e ainda assim…

— Isso não vai servir! — gritou o homem-lagarto.

— Vocês pensaram em me parar com ossos, galhos e pedras?! — uivou o ogro, quebrando as
flechas que crivavam seu corpo com um bom movimento do martelo. A elfa se afastou da pilha de
destroços que o golpe anterior fizera, ansiosa para evitar repetir a experiência.

— Nesse ritmo, estaremos acabados! — gritou ela, mesmo enquanto pulava no ar, preparando e
depois lançando outra flecha. Ela não tinha outra opção, embora os acertos parecessem não fazer
nenhum dano, e ela possuía poucas flechas.

— Essa é a última das minhas magias também! — disse o anão, lançando outro Impacto Pétreo. A
saraivada de pedras fez com que o ogro vacilasse, mas, por outro lado, o deixou ileso.

— Isso é o melhor que conseguem fazer, fadas?!

— Hrmph, eu sabia que deveria ter aprendido Seta de Fogo em vez disso! — O anão sacudiu sua
mão vazia com uma carranca e um resmungo. — Ou talvez eu deveria ter seguido com Estupor.

— Não é hora para se preocupar com o que já passou — disse o homem-lagarto


despreocupadamente, com seus olhos revirando. — Devemos fugir?

— Nem pense nisso — disse alegremente o anão. — Meu avô arrancaria minha barba!

— Concordo. Um naga não foge.

Enquanto eles brincavam, o infatigável Lagarto Sacerdote preparava sua espada curta, e o anão
pegou uma funda.
— Ha-ha-ha-ha-haaa! Ficaram sem truques, aventureiros? — O salão tremeu com mais um golpe
do martelo do monstro. O golpe esmagou vários cadáveres de goblins, enviando pedaços voando
pelo ar. Um pedaço de goblin caiu perto de Matador de Goblins, o respingando. Ele gemeu e se
mexeu.

— Matador de Goblins, senhor…! — chamou-o Sacerdotisa, com lágrimas nos olhos e apoiando a
cabeça dele com as mãos. Com a ajuda dela, ele finalmente levantou a cabeça.

— Eu não consigo… ver muito bem… O que está aconte… cendo…?

— Todos ainda estão lutando…!

— Entendi… Me dê uma poção de cura. Uma poção de estâmina também — disse Matador de
Goblins calmamente, inspecionando seus suprimentos de relance. Ele se sentou rigidamente.

Parte de seu escudo e armadura de couro sobre seu peito estavam esmagados. Sua cabeça parecia
esquisita de alguma forma, e quando ele estendeu a mão para tocá-la, ele percebeu que havia um
amassado no seu capacete. Seu corpo inteiro doía; toda vez que respirava, a dor o atravessava…

Mas a dor era um sinal de que ele ainda estava vivo. Ótimo.

Ele certamente sofreu lesões não despicientes. Mas essa armadura miserável salvou sua vida.

— Certo!

— Obrigado.

Sacerdotisa encontrou os frascos em suas bolsas, estourou as rolhas e entregou para ele. Matador
de Goblins os pegou estoicamente e bebeu um, depois o outro. Ele jogou os frascos de lado; eles
deixaram novos resíduos no chão de pedra enegrecidos quando se quebraram.

Ao contrário de um milagre dos deuses, poções como essas possuíam efeitos relativamente
menores. A dor de Matador de Goblins aliviou um pouco, mas seu corpo ainda parecia como se
fosse feito de chumbo. Mas ele podia se mexer. Ótimo.
— Aqui vamos nós. — Matador de Goblins se apoiou com a espada quebrada enquanto se
levantava. — Onde… está minha bolsa?

— Hum, aqui está…

Seus membros exaustos tremiam tanto quanto as mãos. Mas ela não deixou transparecer ou se
queixou. Ela apenas puxou o equipamento para perto.

— …Muito bem.

Matador de Goblins remexeu o conteúdo de sua bolsa, finalmente encontrando o pergaminho.

Sacerdotisa empalideceu. Ela olhou para Matador de Goblins; aos seus olhos, ele estava turvo pelas
lágrimas. — Você não pode…

— Se trará a vitória nessa batalha, eu certamente posso. — Ele balançou a cabeça suavemente. —
E se isso funcionar… as coisas não serão tão ruins, pelo menos. — Ele forçou suas mãos e ficou de
pé, depois pisou em frente.

Ele ouvia o sangue pingando de alguma de suas feridas, manchando o chão de vermelho debaixo
de seus pés. Contanto que não o fizesse escorregar, ele não se importava.

— Orcbolg! — gritou Alta-Elfa Arqueira quando o viu.

— Eu tenho um plano. Aqui vai.

— Claro! Faça! — Alta-Elfa Arqueira não perguntou qual era o plano, apenas disparou outra flecha
de seu arco.

— Certo, Corta-barba! Eu tenho fé em você!

— Lamentavelmente, estamos muito pressionados aqui.

Anão Xamã e Lagarto Sacerdote assentiram um para o outro, depois saltaram para fora da luta sob
a cobertura das flechas da elfa.

Mas…

— Oh…! — Alta-Elfa Arqueira mordeu os lábios.


Matador de Goblins entrou na frente deles, levantou seu escudo quebrado e tomou uma postura
firme. Suas feridas eram obviamente severas. Mais um golpe poderia dividir sua carne e ossos, o
matando.

Não, espere… Alta-Elfa Arqueira balançou a cabeça. Ele está procurando por sua chance… Ele
faria alguma coisa. Se houvesse algo que pudesse ser feito, ele encontraria. Então me deixe fazer
minha parte também…

O anão agarrou alguns escombros do chão e lançou com a funda. O homem-lagarto correu em
direção ao ogro, o cortando com as garras. E claro, as flechas da elfa caíram como chuva.

— Seus insetos! Seus insetinhos irritantes!

O ogro, com flechas alojadas por todo o seu corpo, ficou enfurecido. Seu martelo de guerra se
movia para lá e para cá com um som parecido com uma tempestade. Cada golpe derrubava mais
escombros e fazia os cadáveres no chão se remexerem.

Apesar de tudo, Matador de Goblins manteve sua distância, sem vacilar.

O ogro olhou com desgosto para o guerreiro meio morto, e então, distorcendo o rosto
horrivelmente, ele riu.

— Pensando nisso, se bem me lembro, sua amiga pequenina estava sem milagres… sem força… —
Ele esticou sua palma gigante. — Carbunculus… Crescunt… — A bola de fogo branca familiar
começou a se formar na palma de sua mão enquanto ele entoava as palavras.

Alguém engoliu em seco.

— Ah… Oh! — Sacerdotisa tentou ficar de pé, mas tombou de volta ao chão. Seu cajado de monge
caiu de suas mãos trêmulas.

— Não se preocupe. Se por acaso ela sobreviver a isso, eu prometo não a matar… imediatamente.

O fogo na mão do ogro brilhou em branco, depois finalmente azul, ameaçando queimar os
aventureiros. Não havia como detê-lo.

— Eu tenho comida, depois de tudo. O que eu preciso é de alguém para me ajudar a reconstruir as
fileiras dos meus goblins.

Naquele momento, Matador de Goblins saltou como uma verdadeira flecha em direção a bola de
fogo em expansão.

O ogro bufou. O que esse guerreiro poderia fazer com ele? Esse aventureiro moribundo?

— Me deixe conceder teu desejo, garoto! Eu vou te queimar até que nem mesmo cinzas
permanecerão! — A última das palavras de poder, as palavras que poderiam alterar o próprio
funcionamento do mundo, foi expelida por ele e foi para a chama turbulenta.
— Iacta!

A bola de fogo voou da palma do ogro. Ela parecia colocar o próprio ar em chamas.

A morte correu em direção a eles.

Sacerdotisa — ou foi Alta-Elfa Arqueira? — gritou.

Lagarto Sacerdote e Anão Xamã se moveram para proteger as mulheres.

E depois:

— Tolo.

A palavra calma e solitária de um homem encontrando seu inimigo.

Um rugido.

Um clarão.

E finalmente, silêncio.

— Hmm… Hrr? — O ogro não conseguia entender o que havia acontecido.

Ele se sentiu flutuando. E depois seu corpo enorme bateu em uma pilha de escombros.

Talvez ele tenha feito a bola de fogo poderosa demais e fora um pouco atordoado pelo recuo. Ou
isso foi um estratagema de seus pequenos oponentes?

Na verdade, não era nenhum dos dois.

— Hrgh…?! — O ogro perdeu o fôlego com o impacto. Ele conseguia ver suas próprias pernas.

Mas, elas não estavam mais ligadas a ele.

Matador de Goblins caminhava em direção ao ogro, com fumaça subindo dele. Finalmente o ogro
se deu conta que foi cortado ao meio.

— Grr… Hrrrghh! — Quando abriu a boca para falar, ele começou imediatamente a vomitar
sangue. No mesmo momento, seu nariz se preencheu com o odor de ferro e outro cheiro estranho.

Sal.

A câmara estava inundada com água do mar.


A água estava vermelha de sangue: do ogro e de Matador de Goblins.

Por quê?! O que aconteceu?! O que… o que você fez comigo?!

Quando o ogro se contorceu de dor, suas entranhas se esparramaram para fora, uma voz calma o
respondeu:

— O pergaminho continha a magia Portal.

Matador de Goblins desfez o nó e revelou o pergaminho mágico sendo queimado por uma chama
sobrenatural. O fogo continuou a consumir a folha mesmo enquanto encharcada com água, até que
finalmente o pergaminho desapareceu sem deixar vestígios.

— Ele abriu para o fundo do mar. — Quando Matador de Goblins falou, a elfa (com efeito, todos)
ficaram sem palavras.

Pergaminhos eram procurados por um bom preço, mas mesmo muito raramente, existia um
aventureiro que não desejava se separar de um.

Um artefato antigo, esse pergaminho continha a magia perdida Portal. Escreva o destino nele com
as palavras de poder, e poderia abrir uma porta para aquele lugar. Para um aventureiro, poderia ser
uma arma poderosa ou uma rota de fuga salva-vidas. Mas, as chances de tal item aparecer em um
mercado eram quase nulas. Se você quisesse um, você tinha que procurar em masmorras profundas
e ruínas antigas por si mesmo…

…e ainda assim, você precisaria de uma insígnia platina ou muita sorte para encontrar um. Matador
de Goblins usou seu pergaminho sem hesitação, e nem sequer para escapar, mas para atacar. Isso
depois de ele ter pagado Bruxa da Guilda dos Aventureiros um bom dinheiro para conectar o
pergaminho ao fundo do mar.

A água do mar retida viera voando com tanta força que extinguiu instantaneamente a bola de fogo
e cortou o ogro em dois.

— Hrg! Yarr! Graaaa!!

O ogro observou mudamente suas pernas caídas no chão. Ele se debateu na piscina de água,
cuspindo e tossindo sangue. Ele não mostrava nenhum sinal de curar a si mesmo. Os ogros
possuíam grandes capacidades de regeneração, mas mesmo eles não podiam voltar das garras da
morte.

Eu vou… morrer? Eu? Morrer?!

— Grrrrawwwwooooohhhh!!

Talvez fosse a falta de sangue no cérebro, mas o ogro foi apanhado por um terror inarticulado. Ele
deu uma grande e patética lamúria.
Ele não conseguia entender.

— Agora mesmo… o que você disse que era? — O homem caminhou até o ogro e ficou acima
dele.

Que não era um goblin, não é?

As palavras deram voltas na cabeça do ogro, como um eco.

Isso significava… Isso significava…

Que ele havia preparado essa magia… apenas para matar alguns goblins!

— Esqueça. Não importa.

O ogro se moveu para falar; se era para implorar por sua vida ou para lhes provocar uma última
vez, ele mesmo não sabia. Mas, suas últimas palavras não chegaram a sair de sua boca. Matador de
Goblins esmagou a garganta do ogro com seu calcanhar. O ogro deu um suspiro final mudo,
olhando vagamente para o capacete de aço impiedoso.

— Você está muito longe de ser tão assustador…

O homem levantou a espada. Era isso. O fim. O ogro viu os olhos frios brilhando na escuridão
dentro desse elmo.

— …quanto os goblins que já enfrentei.

A consciência do ogro foi consumida pela dor e a humilhação, medo e desespero; depois ela foi
submersa em escuridão; então foi extinguida.

Quando eles saíram das ruínas, eles encontraram uma carruagem élfica à espera deles. O guerreiro
dragãodente escoltara com sucesso a prisioneira ao seu lar, e a sua gente enviou apressadamente
um grupo às ruínas. Os guerreiros que acompanhavam a carruagem portavam, para um elfo, um
equipamento impecável. Todo ele era feito apenas da generosidade da terra: madeira, couro e
pedra.

— Bom trabalho! O que reside nessas ruínas? São os goblins…?

Mas os aventureiros subiram diretamente na carruagem. Mesmo o anão, que normalmente teria
algumas boas palavras para os elfos, não disse nada.

Todos eles estavam completamente esgotados.

— …Em todo caso, nós procuraremos lá dentro — disse um dos guerreiros, grosseiramente. — Por
favor, tenham uma boa viagem até a cidade. — E com isso, eles desapareceram nas ruínas.
O cocheiro deu um grito aos cavalos, e a carruagem começou a se movimentar com o barulho de
cascos.

O sol se pôs sem que o grupo percebesse, e as luas seguiram o seu curso. Logo o sol estava
nascendo de novo. A luz do amanhecer brilhava no céu pálido do outro lado do horizonte.
Deveriam ter levado a noite toda até chegarem à cidade.

Os companheiros de viagem deixaram suas armas envoltas em embrulhos. Cada um deles estava à
vontade; ninguém se movia. Bem, quase ninguém.

Alta-Elfa Arqueira se moveu até que sua boca estivesse perto da orelha de Sacerdotisa.

— Ei… — disse ela.

— Sim…? — Sacerdotisa ergueu seus olhos preguiçosamente. Ela estava morta de cansaço,
estafada de suas orações consome-alma, e, no entanto, estava com um sorriso valente.

— Ele é sempre assim? Digo, ele sempre faz esse tipo de proeza? — A elfa não parecia melhor que
Sacerdotisa, preta e vermelha de sangue e mal conseguia manter os olhos abertos. Ela apontou para
Matador de Goblins, caído contra uma caixa de madeira.

Ele ainda usava sua armadura amassada e segurava sua espada quebrada… mas ele estava
finalmente dormindo. Todos os traços de suas feridas foram removidos pela magia Revigorar de
Lagarto Sacerdote. Não era uma surpresa que fosse muito mais poderosa que Cura Menor de
Sacerdotisa. Essa era simplesmente a diferença entre um ranque porcelana e um prata.

O problema…, meditou ele, balançando a cauda, o problema é a fadiga acumulada.

Depois de acabarem com o ogro, Matador de Goblins queria fazer uma busca por quaisquer goblins
sobreviventes. Embora estivesse claro que ele era o membro mais esgotado do grupo. E ele tentava
de tudo para não demonstrar isso…

— Sim… — disse Sacerdotisa com uma expressão tensa. — Ele é sempre assim.

— Hmm…

— Mas você ficaria… surpreendida com o quanto ele se preocupa com os que estão ao seu redor.
— Ela tocou na armadura dele com seu dedo fino. Ele não se mexeu. Ela acariciou suavemente o
couro sujo. — Ele não tem que nos ajudar. Ou nos ensinar. Mas ele o faz.

— Hmm — murmurou outra vez a elfa.

Ela estava zangada.

Ela não conseguia se conciliar com o que aconteceu. Isso não foi uma aventura. Como alguém
poderia chamar aquilo disso?
— Não posso evitar. Eu não consigo suportar Orcbolg.

E isso foi tudo.

Eu pensava que as aventuras deveriam ser divertidas.

Isso não foi uma aventura.

Não teve a emoção ou a satisfação de descobrir coisas novas, o prazer de experimentar o


desconhecido.

Ela foi deixada com apenas um cansaço vazio.

Então, existia pessoas por aí que não faziam nada além de caçar goblins, nunca encontrando um
único prazer em suas “aventuras”.

Para ela, isso era imperdoável.

Ela era uma aventureira. Ela deixara a floresta porque amava aventuras.

A elfa assentiu com convicção. Sim. Algum dia ela o mostraria. Talvez não agora, possivelmente,
mas um dia.

— Eu vou lhe mostrar o que uma verdadeira aventura é.

Pois, se ela não mostrasse, ele — e todos eles — poderiam estar perdidos…
Opa! Eu matei alguns goblins! Vim fazer meu relatório.

Hã? Por que você está tão surpreso? Eu sei que estou sozinho. Uma pessoa não pode lidar
normalmente com alguns goblins?

Hmm…? Quem é aquele? Ele parece muito importante.

Um feiticeiro da capital? Mas ele é tão pequeno!

Ei, desculpe, desculpe! Não fique com raiva. Eu só achei que fosse legal.

Meu relatório? Ah, é. Hum… Vejamos. Acho que vou começar do início.

Eu fui criado no templo, mas fiz quinze anos, então tive que sair. Decidi me tornar um
aventureiro…

E havia essa missão para matar alguns goblins em uma caverna velha perto dessa aldeia. Quero
dizer, todos começam com goblins, certo?

Enfim, era mais ruínas antigas do que uma caverna. Elas se pareciam com as de todas as histórias.
Dentro, ela parecia… meio que parecia o templo da cidade.

Hã? Goblins? Ah, sim, havia alguns. Muitos, na verdade. Eles continuaram vindo até mim, então
eu continuei os derrubando. Eu tinha sangue por todo meu corpo, e eles fediam. Foi um verdadeiro
inferno.

Veneno? É isso o que os antídotos são, certo? Um capacete? Essas coisas ficam quentes. Além
disso, meu cabelo é muito longo para eles.

E então, hum… Onde eu estava? Ah, certo. Eu dizia como isso parecia o interior do templo. Até
onde você pudesse ir, lá estava um pedestal, e quando eu fui até ele, eu encontrei um chefe grande
e velho. Ele estava todo: “Eu sou um dos dezesseis generais do inferno!” ou algo assim. Ele estava
realmente cheio de si. Embora ele fosse apenas um goblin. Ele era um goblin, não era?

Acho que existem alguns goblins fortes, no entanto. Ele realmente usava magias em mim! Mas
também tenho algumas magias. Eu usei Seta de Fogo. Talvez… cinco ou seis vezes? Eu não estava
contando. Isso me deixou muito cansado, então eu disse: “Hora de acabar com isso!”, mas quando
tentei o apunhalar, minha espada quebrou!
Então ele veio até mim! “Eu vou comer seu fígado!” disse ele. Odeio admitir, mas… bem, digamos
que eu estava usando roupas íntimas limpas quando entrei lá.

E-enfim, eu estava muito preocupado porque eu não tinha mais uma espada, mas eu alcancei
precisamente o pedestal. Por quê? Bem, porque havia uma espada enterrada nele. Como aquela no
símbolo do Deus Supremo. Não me importava se fosse velha; eu só precisava de uma arma. A
espada saiu, e adivinha o que mais? Ainda era brilhante, como se fosse novinha!

Não demorou muito depois disso. O chefe deu um grito desagradável quando eu o cortei ao meio.
“Você pode me matar” disse ele, “mas os outros quinze caçarão você! Você não terá descanso, até
aos confins da terra eles irão te perseguir!”. Bem, que seja, certo? Quinze goblins, cinquenta
goblins, quem se importa?

O que quer dizer, que eu planejo lutar contra eles?

…Hã? Os antigos espíritos do mal voltaram? O cara que eu matei era um dos seus generais? E essa
é a espada da luz?

Pfft. Até parece. Eu não posso ser o herói lendário, posso?

Digo, eu sou uma garota!


Até hoje, ele se lembrava de uma vez em que sua irmã mais velha o repreendeu firmemente.

Foi quando ele fez aquela garota, sua velha amiga, chorar.

Por quê? Bem… Porque ela estava fazendo uma viagem para a cidade. Ela estava indo ficar em
uma fazenda.

Ela estava contando a ele tudo sobre isso. Ele havia ficado com inveja. Ele não conseguiu se
controlar.

Ele não sabia nada sobre a vida fora de sua aldeia. Ele não sabia o nome das montanhas ao longe
ou qualquer coisa que jazia além delas.

Ele sabia que se seguisse a estrada o bastante, se chegaria a uma cidade, mas o que isso significava,
que tipo de cidade era, ele não sabia.

Quando era novo, ele pensava que se tornaria um aventureiro. Ele deixaria a aldeia, talvez matasse
um ou dois dragões, e depois voltaria para a casa como um herói; um aventureiro ranque platina.

Claro, depois que ele viu mais alguns de seus aniversários indo e vindo, ele se deu conta que isso
era impossível.

Não, não impossível.

Mas ele teria que deixar sua irmã. A irmã que o criou depois que sua mãe e seu pai morreram.

Ele poderia ter se tornado um aventureiro. Mas ele decidiu não escolher esse caminho.

Foi por esse motivo que ele estava com raiva de sua amiga.

Enquanto sua irmã o levava para a casa pela mão, ela o repreendeu.

“Quando você se irrita com alguém, você se torna um goblin!” e “Você deveria proteger as
garotas!”.

A sua irmã era sábia.

Não que ela possuísse muito conhecimento, mas sua mente era afiada. Talvez a mais perspicaz da
aldeia. De fato, ela ganhava sua comida ensinando as crianças locais a ler e escrever. As crianças
eram necessárias para trabalharem nas fazendas de suas famílias, mas a alfabetização também era
importante.

Em tudo, ela tentava transmitir a seu irmãozinho a importância de usar a cabeça. Se você continuar
a pensar, disse-lhe ela, você eventualmente encontrará algo.

Sua irmã deveria ter sonhado em ir à cidade para estudar. Mas ela ficou na aldeia por ele. Então ele
também ficaria. Por ela.

Para ele, isso era a coisa mais óbvia.

Quando eles chegaram em casa, sua irmã fez para ele um guisado de carne de frango ao leite. Ele
amava o guisado de sua irmã. Ele pediria outra tigela, e depois outra, mas agora, ele não conseguia
se lembrar de como era o sabor.

Certamente, porque essa foi a última vez que ele experimentou antes d’eles chegarem…

Ele abriu os olhos lentamente.

Ele se levantou do tapete de junco e olhou para o teto familiar.

Seu corpo ainda doía. Ele esticou gradualmente seu corpo, depois pegou calmamente suas roupas
com a mão. Uma camisa de cânhamo sem adornos. Ela estava desbotada pelas várias lavagens e
cheirava vagamente a sabão. A camisa o impedia de se queimar no sol. E cobria as cicatrizes que
estavam por todo o seu corpo.

Ele colocou a camisa simples de cânhamo, depois um jaquetão de algodão.

Ele ia colocar seu capacete de aço e a armadura, depois se lembrou que os entregou a uma loja para
repará-los.

Ele também não possuía um escudo. Ele havia tomado um golpe crítico daquele ogro.

— …Hmph.

Não havia nada a se fazer sobre isso. Ele pôs a espada no quadril para ter o mínimo de segurança.
Seu campo de visão parecia excepcionalmente amplo e brilhante, sua cabeça também estava leve e
isso o perturbava.

— Bom dia! Você certamente dormiu bem! — A voz veio a ele como um ataque surpresa.

Era aquela garota, sua velha amiga, inclinada ao seu quarto, com seu peito repousando no peitoril
da janela aberta.
Uma brisa soprava entrando no quarto. Ele não sentia o ar do início do verão em sua pele como
agora há muito tempo.

Sua amiga estava com suas roupas de trabalho. Um pouco de suor estava em sua testa. Da luz que
se espalhava, ele adivinhou que o sol já estava alto no céu.

— Desculpe — disse ele, oferecendo a palavra lacônica em desculpas por dormir demais. Parecia
que ela já havia começado a cuidar dos animais. Ele perdera completamente a chance de ajudar.

Ela sacudiu a mão, sem nenhum sinal de aborrecimento em seu tom. — Ah, não, está bem. Você
precisa descansar mais que tudo. Eu sei disso, porque caso contrário, você nunca perderia sua
inspeção matinal. Você dormiu bem?

— Sim.

— Parece que vai ser um dia quente hoje. Tem certeza de que não ficará quente demais nessas
roupas?

— …Talvez tenha razão — disse ele assentindo lentamente. Ela estava certa. E realmente, o
algodão volumoso o atrapalharia quando estivesse trabalhando. Então ele arrancou a armadura
interior que colocou momentos antes e jogou sobre a cama.

— Nossa, não precisa ser tão bruto com ela. Você vai rasgá-la.

— Não me importo.

— É claro que não… — Ela deu de ombros e entrecerrou os olhos como se estivesse tomando
conta de uma criança. — Bem, por mim tudo bem. Estou com fome. Tio deve ter acordado. Vamos
nos apressar e tomar o café da manhã.

— Está bem — respondeu ele calmamente e saiu de seu quarto. Ele caminhou pelo corredor.

O mestre da casa, que já estava sentado à mesa na sala de jantar, ficou com os olhos arregalados
quando viu a figura na entrada.

— Bom dia, senhor.

— Si… sim. Bom dia.

Ele não prestou atenção na reação de Tio, então apenas deu um aceno cortês e se sentou à frente
dele. Tio se ajustou desconfortavelmente.

— Você já, uhh, você acordou um pouco tarde hoje…

— Sim. — Ele assentiu firmemente. — Eu dormi demais. Farei a minha inspeção mais tarde.
— Entendi… — A confirmação saiu quase como um gemido. Tio abriu a boca, depois a fechou
outra vez, então franziu as sobrancelhas. — Você deveria… descansar um pouco. Não pode
trabalhar se não tiver força, não é?

Ele ficou em silêncio por um momento, depois assentiu. — Verdade.

Isso foi o mais próximo de uma conversa que eles tiveram.

Ele sabia que o dono da fazenda era uma boa pessoa. Ele tratava a garota, sua sobrinha, como sua
própria filha. Mas ele também sabia que o dono não gostava dele, ou pelo menos, o achava
desconfortável.

Era uma escolha de cada pessoa quem gostar ou não gostar. Ele certamente não precisava tentar
convencer Tio de uma forma ou de outra.

— Ufa! Desculpem pela demora! Vou trazer a comida em um segundo, então comam! — Sua
velha amiga veio correndo momentos depois e começou a colocar os pratos na mesa. Queijo, pão e
uma sopa cremosa. Tudo feito fresco na fazenda. Ele comeu avidamente, como sempre. Quando
terminou, ele empilhou os pratos vazios, empurrou a cadeira para trás ruidosamente e ficou de pé.

— Estou indo.

— O quê? Ah, droga, já é hora de fazer as entregas? — Com suas palavras, ela começou a se
apressar. Ela enfiou um pedaço de pão na boca de forma bastante imprópria. Observando-a, o dono
da fazenda contorceu a boca relutantemente.

— A carroça de novo?

— Ah, Tio, você é muito preocupado. Já te disse, eu sou muito mais forte do que pareço…

— Eu os levarei — disse ele brevemente. A garota e o seu tio trocaram um olhar. Ele não tinha
sido suficientemente claro?

— Eu vou levá-los — repetiu ele. Ela parecia confusa, sem olhar bem para ele, então balançou a
cabeça.

— Não, você… você não precisa fazer isso. Você precisa descansar.

— Meu corpo vai amolecer — disse ele calmamente. — Além disso, eu tenho negócios na guilda.
— Ele sabia que não falava muito. Ele não se lembrava se sempre foi assim. Mas ele sabia que por
mais breve que pudesse ser, ela sempre procuraria meios de cuidar dele.

Mais uma razão para ele dizer claramente o que tinha que dizer.

— Está tudo bem — disse ele, e deixou a sala de jantar.


Ele podia ouvir os passos rápidos dela enquanto se apressava atrás dele.

A carroça estava parada lá fora. As entregas para a Guilda dos Aventureiros foram transferidas na
noite anterior. Ele puxou as cordas para ver se estava tudo seguro, então pegou a trave e começou a
empurrar.

As rodas rangiam como se vivas, retumbando ao longo do caminho de cascalho. Ele podia sentir o
peso em seus braços.

— Tem certeza de que está realmente bem? — Assim que ele chegou no portão, ela veio correndo,
ofegante. Ela espreitou o rosto dele.

— Sim. — Ele assentiu brevemente, então deu outro empurrão.

A estrada arborizada se estendia até a cidade. Ele foi lentamente, um passo após o outro, sentindo a
terra debaixo de seus pés.

Assim como ela disse, o dia parecia provavelmente esquentar. Ainda não era meio-dia e os raios do
sol já estavam fortes. Ele estava suando dentro de pouco tempo. Ele deveria ter trazido uma toalha
de rosto.

Ele estava pensando justamente que se não entrasse em seus olhos não haveria problema, quando
algo macio roçou sua testa.

— O que aconteceu com descansar um pouco? — As bochechas dela estufaram de aborrecimento


enquanto limpava a testa dele com o lenço. — Você desmaiou assim que voltou e dormiu por dias.
Tem ideia de como fiquei preocupada? — Ele fingiu pensar por um momento, então balançou a
cabeça. Certamente não era tão importante.

— Isso já foi há três dias.

— Foi apenas há três dias! É por isso que eu disse para não exagerar — disse ela enquanto estendia
a mão e limpava seu rosto. — Você mal podia ficar de pé! Você precisa descansar.

Ainda puxando a carroça, ele suspirou. — Você…

— Hum?

— …é muito parecida com seu tio.

Parecia que ela não podia decidir bem se isso a deixava feliz ou zangada. De qualquer forma, ela
não parecia disposta a ceder.

— É só um pouco de trabalho excessivo. Você não tem que se preocupar comigo — explicou ele
com uma pitada de aborrecimento.
Não. Não era aborrecimento. Ele simplesmente odiava ser lembrado que mal podia cuidar de sua
própria saúde.

Mas preciso ser lembrado. Para que não cometa o mesmo erro duas vezes.

— Foi isso que a sua amiga Sacerdotisa lhe disse? — A sua voz parecia nervosa. Ele olhou para ela
pelo canto dos olhos e viu que suas bochechas ainda estavam um pouco estufadas, emburrada.

— Não.

Ele olhou para frente novamente e deu um outro empurrão na carroça.

— Outro membro do grupo que disse.

— Hmm — disse ela, acalmada. — Você está se aventurando com muitas pessoas novas hoje em
dia.

— Só estivemos em uma missão.

— Parece que está planejando continuar em mais, hein?

Ele não pôde responder. Ele não sabia o que dizer.

Seria mentira dizer que ele não tinha tal intenção. Existia coisas piores. Mas, ele se daria o trabalho
de os convidar para sua próxima missão…?

Naquele momento, o vento surgiu. Ele fechou os olhos, ouvindo o farfalhar dos galhos e relaxando
com a luz que se infiltrava pelas folhas.

Eles se calaram.
A brisa. Seus passos. Suas respirações. O barulho das rodas girando.

Um pássaro cantava em algum lugar. Uma criança gritava ao brincar. O tumulto da cidade ainda
estava longe.

— Isso é bom. — O murmúrio veio de repente de seus lábios.

— O quê…?

— Isso é melhor do que caçar goblins.

— Nossa, você realmente sabe como encantar uma garota.

— Entendi…

Aparentemente, ele ainda não se comunicava claramente.

Se você não soubesse o que dizer, era melhor não dizer nada. Pelo canto do olho, ele viu a
expressão confusa dela. Ele continuou empurrando a carroça em silêncio.

— Heh-heh! — riu ela de repente. Como se ela mesma não esperasse.

— O quê?

— Nada!

— Sério?

— Sério.

Ela caminhou, cantarolando uma melodia que ele não reconhecia. Mesmo assim, ele não precisava
reconhecer. Ela estava feliz. Isso era o suficiente.

Eles estacionaram a carroça na entrada dos fundos e entraram na recepção da guilda. Tudo estava
calmo. Era quase meio-dia, então é claro que a maioria dos aventureiros já havia partido. Ou talvez
todos eles estivessem na capital, que estava tendo bastante problemas ultimamente. Ele não sabia.
Na guilda, havia alguns recrutadores de missão preenchendo uma papelada e alguns aventureiros
que ele sabia estar descansando, e mais nada. Muito poucas pessoas pareciam estar sentadas
esperando alguém, e a fila para ver Garota da Guilda era pequena.
— Perfeito — disse sua velha amiga batendo as mãos, contente. — Não terei que esperar para
sempre para conseguir a assinatura que preciso. Vou tratar disso e já volto, mas… você disse que
tinha algo para fazer também, não foi?

— Sim.

— Está bem. Bom, quando terminar, podemos nos encontrar aqui e ir para casa juntos!

— Tudo bem.

Ele observou ela ir sorrindo, depois ele deu uma olhada ao redor do saguão.

Ele não viu quem estava procurando. Talvez ele estivesse um pouco adiantado.

Nesse caso, ele esperaria no seu assento habitual perto da parede. Ele se dirigiu a ele com seu passo
ousado característico…

— Hum…?

…e quase esbarrou em uma pessoa sentada na cadeira. Essa pessoa olhou para ele suspeitosamente.
Era o aventureiro da lança.

Lanceiro se inclinou na cadeira, com as pernas abertas, olhando claramente para ele.

— Nunca vi alguém tão em forma, mas tão pálido. Não reconheço seu rosto. É novo por aqui?

— Não. — Ele balançou a cabeça uma vez enquanto falava. É claro, o homem o reconhecia. E
claro, ele não era novo.

Mas, parecia que Lanceiro se recusou a acreditar que era mesmo ele sem a sua armadura habitual.
Lanceiro se dirigiu a ele com um tom ao qual alguém poderia usar com um colega desconhecido.

— Acredito que não seria. Os aventureiros que querem ganhar dinheiro hoje em dia vão para a
capital, não é? — disse ele. — Você deve estar aqui para um descanso ou algo assim.

O recém-chegado assentiu com o “algo assim” e Lanceiro riu.

— A capital é um lugar perigoso. Posso entender por que você gostaria de tirar uma folga. — Com
um movimento ágil, ele se endireitou e ajustou sua mão na lança. — Ouvi dizer que lá todos estão
preocupados com espíritos malignos ou algo parecido. Uma batalha para salvar o mundo? Soa
como uma bela maneira de fazer um nome para si.

— Você não vai ir para lá?

— Eu? Não seja ridículo. A única coisa pela qual eu luto é por mim. Não pelo dinheiro nem pelo
destino do mundo.
— Bem — alterou Lanceiro — por mim e… — Ele deu um olhar significativo para Garota da
Guilda.

Quando o recém-chegado deixou seu olhar se desviar para a recepção também, ele viu Garota da
Guilda correndo por detrás dele como uma cachorrinha animada. Aparentemente, uma multidão de
aventureiros não era a única coisa que mantinha a guilda ocupada.

— …por razões pessoais — finalizou Lanceiro. — Eu não preciso de um lema, um grito de guerra.

— Não?

— Não. — Dizendo isso, Lanceiro se acomodou na cadeira.

Ambos viram Bruxa sensual vindo rebolando até eles.

— Bem, nos vemos — disse Lanceiro. — Tenho um encontro com… ou devo dizer em… algumas
ruínas. Me deseje sorte!

— Eu irei. — Ele assentiu calmamente.

— Você é mesmo uma pessoa do povo — disse Lanceiro, com uma risada, e: — Isso não é muito
ruim.

Enquanto os dois saiam do local, Bruxa olhou para essa “pessoa do povo” atrás e lhe deu uma boa
e significativa piscadela, com uma risada.

— Tenha, cuidado — disse ela.

— Eu irei.

E então, ele se sentou na cadeira recém-vazia.

Ele olhou distraidamente para o teto elevado da guilda. Foi só agora que ele percebeu que Lanceiro
e Bruxa estavam juntos em um grupo. E ele pensava que conhecia bem os dois.

— Hum, Matador de Goblins, senhor! Matador de Goblins, você está aqui, senhor?!

Dessa vez, uma voz hesitante. Ele deslocou seu olhar em direção ao som, mas não moveu a cabeça,
um hábito em usar o capacete por tanto tempo.

Ele viu o garoto aprendiz da oficina, parado ali, com um avental de couro manchado de graxa.

— Sou eu.

— Oh, graças aos céus. Eu não sabia quem era você. O chefe está perguntando por você. Ele disse
que o trabalho está pronto.
— Está bem. Já vou para lá.

A Guilda dos Aventureiros não era só para distribuir missões; ela hospedava todos os tipos de
atividades empresarial. Além dos escritórios, existia uma pousada, uma taverna, uma loja de itens e
uma loja de equipamentos. É claro, não era absolutamente necessário ter estabelecimentos como
esses fazendo parte do edifício da guilda, não mesmo. Mas no que dizia respeito ao Estado, era
conveniente manter os rufiões em um só lugar tanto quanto possível em vez de os ter
perambulando pela cidade.

Quando ele se levantou e saiu, ele foi para uma das oficinas da guilda. Através do prédio, em outra
divisão mais para dentro. Na frente de uma forja brilhante estava um velho movendo
implacavelmente um martelo, trabalhando em uma espada que acabara de sair do molde, em uma
verdadeira espada temperada.

Claro, era um item de produção em massa que não tomava muito tempo para se forjar; nada
comparado com as espadas de lendas. Entretanto, também, a capacidade de forjar essencialmente a
mesma espada, várias vezes, com quase nenhuma variação, era um talento impressionante.

— …Você está aqui. — O velho olhou para ele. Os pelos faciais do ferreiro eram tão abundantes
que ele poderia ser confundido com um anão. Deve ter sido pelas longas horas na forja que o levou
ter um olho semicerrado e o outro arregalado anormalmente. Não era uma aparência atraente.

— Você faz pedidos após pedidos, mas só das mercadorias mais baratas. Me diga, como eu poderia
preencher meu cofre assim?

— Desculpe.

— Não se desculpe. Apenas tenha mais cuidado com meus produtos.

— Vou tentar.

— Hrmph — resmungou o velho — não reconheceria uma piada se ela o mordesse… Hmph. Para
cá. — Ele acenou. Quando Matador de Goblins se aproximou, o ferreiro estendeu a armadura e o
capacete para ele.

— Devem estar bons, mas os experimente para ter certeza. Vou ajustá-los se necessário. De graça.

— Obrigado.

Sua armadura suja, amassada e quebrada havia ficado tão boa quanto… Bem, não tão boa quanto
uma nova, mas tão boa quanto antes do seu encontro com o ogro. Ao menos, ele poderia confiar
nela com sua vida mais uma vez.

— E um pergaminho? Conseguiu arranjar um?

— Você me deu o ouro, então te arranjo as mercadorias. Mas pergaminhos são raros. E caros. — O
velho deu um resmungo zangado e voltou para a forja. Ele puxou a espada simples de ferro que
criou, inspecionou, depois a devolveu para o fogo com um estalo de língua. — Quando algum
aventureiro encontrar um e vier vender, eu vou pegar ele para você, mas isso é o máximo que posso
fazer.

— Eu sei. É o suficiente. — Ele passou um saco de peças de ouro para o aprendiz, depois foi para
um canto da oficina onde ele ficaria fora do caminho.

O ferreiro havia anexado um novo jaquetão acolchoado com algodão para usar de proteção sob sua
armadura. Que gentil da parte dele.

Luvas, cota de malha, armadura, guarda-peito e depois o capacete. Ele colocou o equipamento
mecanicamente, em sua ordem habituada. Ao fazê-lo, ele ouviu a voz intrigada do aprendiz.

— Ei, chefe. Esse cara é um aventureiro ranque prata, certo?

— Ouvi dizer.

— Por que ele usa essa armadura? Se ele quisesse se mover silenciosamente, teríamos a malha de
mithril ou…

— Você não sabe, garoto?

— Não, senhor. Por que não uma boa espada mágica em vez de um pergaminho ou…

— Porque só um bebezinho seria burro o suficiente para pegar uma lâmina encantada para lidar
com os goblins! — O ferreiro atingiu o ferro com toda a força, um som nítido soou quando o
martelo encontrou a espada.

— Esse é um homem que conhece seu trabalho.

Não estou popular hoje?, pensou ele. Quando voltou da oficina para o saguão, ele viu alguém
correndo na sua direção. Os passos tap-tap-tap eram acompanhados pelo salto de um peito
maravilhoso e um rosto envolvido em um sorriso.

— Matador de Goblins, senhor! — Sacerdotisa acenou enquanto corria até ele.

— Sim, o quê?

— Aqui, veja isso!

Ela alcançou a sua manga ansiosamente e puxou sua insígnia. Já não era mais branco porcelana,
mas sim uma obsidiana reluzente.

Ah. É disso que se trata?

Ele assentiu para sua companheira radiante. — Você subiu do décimo ranque para o nono.
— Sim, senhor! Fui promovida! — O sistema de ranque que os aventureiros viviam era baseado na
quantidade de bem que um aventureiro fizera ao mundo; alguns se referiam a isso como “pontos de
experiência” ou algo assim, mas era, em essência, baseado nas recompensas que eles ganharam
pelas caças. Aqueles que haviam ganhado uma certa quantidade poderiam ser promovidos no
ranque, na pendência de uma breve avaliação pessoal. Dificilmente poderia existir algum problema
para com a personalidade de Sacerdotisa, então essa promoção foi efetivamente um
reconhecimento de sua força crescente. — Não tinha certeza de que eles iriam me dar, mas acho
que a batalha com o ogro contou um bocado… — Ela coçou sua bochecha ruborizada com o dedo.

— Entendi.

Novamente, o que é um ogro?

Ah, certo; era aquela criatura que eles encontraram sob as ruínas, não era? Ele assentiu. Então a
pequena expedição deles foi bastante importante, no fim das contas. Depois de um momento de
pensamento, ele acrescentou brevemente:

— Bom para você.

— Devo tudo a você, senhor! — Seu olhar, seus lindos olhos, estavam fixados nele. Ele respirou
fundo. O que ele deveria dizer? Houve uma longa pausa.

— De modo algum — soltou ele, finalmente. — Eu não fiz nada.

— Você fez muita coisa! — respondeu ela com um sorriso. — Você me salvou quando nos
conhecemos.

— Mas não pude salvar seus companheiros.

— É verdade, mas… — Seu rosto se tensionou por um momento. Ela não conseguiu terminar bem
sua frase, compreensivelmente.

Até ele ainda se lembrava de toda cena terrível muito claramente. De Guerreiro, de Maga, de
Lutadora, que haviam perdido tudo. O grupo dela fora esmagado a pó.

Sacerdotisa engoliu em seco, mas continuou resolutamente. — Mas você me salvou. Quero pelo
menos te agradecer por isso. — Então ela sorriu. Em seu rosto, o sorriso era como uma doce flor.
— Então, obrigada! — disse ela fazendo uma grande reverência. Matador de Goblins,
previsivelmente, ficou sem palavras.

Sacerdotisa disse que iria ao templo e deixaria a Madre Superiora saber sobre sua promoção. Ele
ficou parado, a observando partir com seus passos delicados e suas mãos envoltas firmemente ao
redor do seu cajado de monge.

Ele ficou em silêncio.

Ele olhou para a recepção, onde sua velha amiga ainda parecia ocupada com a papelada.
— Vou descarregar a carroça — disse ele, e ela acenou como resposta.

Ele deixou o átrio e foi para a entrada da guilda. Ele pegava os vegetais e produtos da carroça, um a
um, e os colocava perto da entrada da cozinha. Trabalhando sob o sol quente, suor começou a
acumular em sua testa debaixo do capacete em pouco tempo.

Mas, era importante proteger a cabeça. Ele não podia baixar a guarda. Era o que ele estava
pensando quando:

— Ei… Você tem um minuto? — chamou-o uma voz calma, repentinamente por trás dele.

Ele largou a carga e se virou lentamente.

— Orcbolg? O que está fazendo…? — Era Alta-Elfa Arqueira. Suas orelhas longas estavam de pé
em linha reta.

— O que, Corta-barba está aqui? Então é ele! Você já deveria estar de pé?

— Ouvi dizer que você dormiu por três dias… mas você parece perfeitamente sadio agora.

— Seus passos o entregaram, não é? — respondeu a elfa, ao anão e ao homem-lagarto que estavam
alinhados a ela. Parecia que os três haviam se assentado na cidade após a sua viagem de
goblincídio.

Tradicionalmente, aventureiros sempre foram andarilhos, mudando suas bases de operações sempre
que fosse conveniente ou necessário.
— Esse é um lugar agradável — disse a elfa — muito confortável. Mas, o que você está fazendo?
— Ela se inclinou com grande interesse.

— Estou descarregando essa carroça.

— Hmm… Espere, não me diga… Você está precisando de dinheiro, então pegou um emprego de
entregador.

— Não — disse ele irritado. — Você quer alguma coisa?

— Ah, sim. Esse cara, uh… — A voz da elfa morreu significativamente, assinalando com o dedo
Lagarto Sacerdote. A língua do homem-lagarto sacudia para cima e para baixo de seu nariz. Suas
mãos estavam incessantemente inquietas.

— Meu senhor Matador de Goblins, eu… Hum…

— O quê?

— Eu solicito humildemente, alguns… haa…

— O que foi? — perguntou Matador de Goblins.

Anão Xamã intercedeu com um sorriso. — Escamoso aqui quer um pouco de queijo.

— Ele deveria ter simplesmente dito logo — sugeriu Alta-Elfa Arqueira, estreitando os olhos como
um gato. O homem-lagarto silvou para eles, mas os dois não pareceram ligar. Talvez tenham ficado
satisfeitos por ter visto esse lado do imperturbável companheiro. Era o homem-lagarto que
normalmente era o mediador do grupo.

Matador de Goblins podia ver que ele não ia sair dessa. Eles estiveram juntos por apenas uma
missão até agora. Havia muitas coisas que ele não sabia.

— Isso servirá?

Ele abriu um dos pacotes na carroça, tirou uma rodela de queijo e jogou para eles.

— Oh-ho! — O homem-lagarto pegou e seus olhos se reviraram bastante em seu rosto.

— Pode pagar a guilda por ele.


— Sim, sim, entendido, meu senhor Matador de Goblins! Oh, doce néctar! Vales tanto quanto
ouro! — Ele estava praticamente dançando. Ele abriu a boca e deu uma grande mordida no queijo.

A elfa deu um sorriso impotente. — Eu acho que mesmo o mais sério dos caras tem que se soltar
de vez em quando — disse ela.

— Entendo. — Matador de Goblins assentiu. Ele não se sentia mal por isso. Ele foi para o próximo
item na carroça.

Ele agarrou a caixa de madeira, pegou e a abaixou. Então, a próxima e a próxima. Era um trabalho
simples, mas ele não odiava isso. Contudo, quando ele olhou para cima, algumas caixas mais tarde,
havia a elfa, ainda parada.

Ela se movia inquieta enquanto observava ele com seu trabalho repetitivo.

— O-o quê? Não deveria estar aqui?

— Não. — Ele balançou a cabeça ligeiramente. — Mas vai ficar quente hoje.

— Ou… ouça! — Sua voz estava um pouco alta demais. Suas orelhas se moviam para cima e para
baixo, para cima e para baixo.

— O que foi agora? — perguntou ele com um suspiro.

— Hum, estamos… estamos vendo algumas ruínas atualmente…

— Ruínas.

— É, como a que nós fomos em nossa última missão. Tentando descobrir o que os espíritos
malignos estão planejando e tudo mais…

— Entendi.

— Mas o nosso grupo não tem um guarda de frente bom, certo? — Quero dizer, eu sou uma
patrulheira; ele é um sacerdote. Baixinho é um conjurador. Ela brincava com o cabelo enquanto
falava e sem olhar bem para ele.

— Certo — concordou ele. Tudo o que ela disse era verdade.

— Então, quer dizer… — Ela parou de falar e olhou para o chão. Ele esperou que ela continuasse.
— Eu pensei que talvez… talvez deveríamos falar com você…

Ele estava em silêncio. Era isso? Ele levantou outra caixa sem uma palavra.

As orelhas da elfa caíram, e ele colocou a caixa de volta para baixo.


— Vou pensar nisso.

Ele podia ouvir praticamente suas orelhas florescerem. — Certo! Claro! Faça isso! — Com um
pequeno aceno, ela partiu para a frente da guilda. O anão a seguiu, acariciando a barba com uma
das mãos e puxando o homem-lagarto — ainda fascinado com seu prêmio delicioso — com a
outra.
— Que tal isso, Corta-barba? A vida é tão difícil para Orelhuda. Ela deveria ter simplesmente
perguntado logo para vir junto!

— Calado, anão. Eu ainda não estou sem flechas.

— Estou tremendo na base, moça. — Parecia que a elfa não estava fora do alcance da voz. Matador
de Goblins observou os dois se afastarem, discutindo alto.

Antes que percebesse, ele estava quase terminando de descarregar a carroça. Ele soltou uma
tragada de ar e balançou o capacete. O sol estava alto no céu. Era quase verão.

Então…

— Yaaah!

— Heeeeyah!

De repente, gritos ressoaram, acompanhados pelos sons claros de metal se chocando.

O som de uma luta de espadas. E não era repentino. Ele só não havia prestado atenção.

Ele ergueu seu pescoço para encontrar a fonte do distúrbio. Estava vindo da praça atrás do edifício
da guilda, bem na frente dele.

— Ha-ha-ha, você chama isso de golpe? Você não poderia nem matar um goblin dessa forma!

— Droga! Ele é muito grande; ele está entrando na minha guarda! Dê a volta pela direita!

— Tudo bem, aqui vamos nós!

Um guerreiro fortemente armadurado empunhava uma espada larga tão facilmente quanto um
palito de fósforo, e se defendia da pressão dos dois garotos. Um dos meninos era o batedor do
grupo do guerreiro fortemente armadurado, e o outro… ele era o guerreiro novato que fora aos
esgotos. Seus movimentos possuíam as características gerais de um ranque porcelana inexperiente,
mas ele estava indo bem nisso de tentar encontrar o fluxo de combate.

— Não é um plano ruim — respondeu o guerreiro bem armadurado — mas isso não funciona se
gritar para o seu adversário!

— Yrrrahhh?!

— Waaagh!

O abismo de experiência e força era simplesmente grande demais. Guerreiro de Armadura Pesada
lidava com eles facilmente.
Parecia que Matador de Goblins ficou um pouco conspícuo demais enquanto ficava observando
eles treinarem.

— Bem, se não é Matador de Goblins — disse uma voz baixa com mais do que uma pitada de
suspeita. Era a mulher com amadura de cavaleiro. Como ele se lembrava, ela também fazia parte
do grupo do guerreiro armadurado.

— Não vi você por alguns dias — falou ela. — Eu estava começando a pensar que o ogro deu um
fim em você. Mas aqui está você, vivo e bem.

— Sim.

— …É assim que você fala com todos que conhece?

— Sim.

— …Estou vendo… — Cavaleira franziu a testa como se tivesse uma dor de cabeça e balançou a
cabeça na medida.

Ele não achava que era tão estranho assim, mas ele mantinha isso para si mesmo. Ele disse, no
entanto: — Não pensei que o guerreiro novato fosse um membro de seu grupo.

— Ah. Ele não é. Estávamos fazendo um pouco de treino com o garoto aqui… — Aparentemente,
eles notaram o outro guerreiro jovem praticando sua espada nas proximidades e o convidou para
participar.

A maioria dos possíveis guerreiros que surgiam no país com uma espada e um sonho, eram
autodidatas no uso das armas. Mesmo essa chance de treinar com um aventureiro real poderia
salvar a vida do garoto um dia.

— Agora só tenho que ensinar essas garotas a agirem como senhoritas…

Em frente ao lugar onde o batedor e o espadachim jovem estavam corajosamente encarando o


guerreiro com sua armadura pesada, uma clériga e uma druidesa estavam encostadas em uma
parede baixa, observando o confronto com um entusiasmo indisfarçado.

— E esse cabeça de atum está provavelmente ficando cansado agora. Talvez eu devesse entrar —
disse Cavaleira, com um sorriso um pouco distorcido. Ela ergueu seu escudo enorme e sua espada
(seu orgulho e alegria) e saltou sobre o muro para o confronto. — Muito bem, agora vocês estão
em apuros! Pensei ter ouvido que havia guerreiros poderosos aqui, mas tudo o que vejo são um par
de fracotes!

— O quêê? Como você pode mesmo ser uma paladina falando desse jeito?!

— Aqui está a minha resposta!


— Um pouco de treinamento! — chiou Guerreiro de Armadura Pesada, que sempre atacou da
frente; era por isso que as pessoas gostavam dele. Sua espada larga girou como um furacão, com
seu escudo enorme impedindo um golpe atrás do outro. Ele bailou para longe de cada retaliação
perspicaz e encontrou uma abertura de brinde. A clériga e a druidesa estavam bem indo à auxílio
dos rapazes muito pressionados quando…

— Essa cavaleira não consegue cuidar da própria vida, não é? — Uma risada tão clara quanto um
sino seguiu. Quando alguém apareceu ao lado dele?

— Perdoe a intromissão, meu querido Matador de Goblins, mas que tal você beber isso? Está muito
quente aqui fora… — Ela havia saído pela porta da cozinha. Agora lhe oferecendo um copo.

— Obrigado — disse ele, o pegando. Ele tomou em um grande gole com seu capacete. Era frio e
doce.

— Tem um pouco de limão e mel nele — disse Garota da Guilda. — Dizem que é bom para a
fadiga. — Ele concordou. Isso poderia dar uma boa adição ao seu setor de suprimentos. Ele teria
que lembrar disso.

— Há uma conversa ultimamente sobre um edifício novo que seria dedicado a esse tipo de treino
— disse ela, acenando para o grupo treinando.

— Oh? — Ele limpou as gotas do líquido em seus lábios.

— Poderíamos contratar alguns aventureiros aposentados para ensinar. Há muitos iniciantes que
simplesmente não sabem nada de nada. — Se pudéssemos ensinar a eles mesmo um pouco, talvez
mais deles voltariam para casa. Ela olhou para longe e sorriu. Garota da Guilda vira muitos
aventureiros virem… e irem. Só a papelada que ela tinha que lidar não suavizava o golpe. Não era
difícil de entender por que ela queria ajudar os recém-chegados.

— E… — acrescentou ela. — Mesmo depois de se aposentar, você ainda tem que viver. Todo
mundo precisa de algo para ocupar o tempo.

— É mesmo? — Ele deu o copo vazio para ela.

— Sim, é — insistiu ela, com seu habitual aceno serelepe, suas tranças saltavam. — Então é
melhor se cuidar também, está bem?

Ele ficou calado por um momento. — Parece ser o conselho de todo mundo para mim ultimamente.

— Eu vou esperar até que você esteja curado antes de lhe dar mais missões. Talvez um mês.

— Tsc… — gemeu ele.

— E da próxima vez que você trabalhar até colapsar, será seis meses.

— Isso seria… um problema.


— Seria, não seria? Então, por favor, aprenda a lição dessa vez. — Ela riu. Então, ela disse que
havia terminado a papelada das entregas. Ela se virou para voltar à guilda, os gritos e tinidos dos
aventureiros jovens voando para seu mentor ainda soavam atrás dele.

A garota, sua velha amiga, estava esperando impacientemente ao lado da carroça. Quando ela viu
Matador de Goblins, seu rosto se iluminou. Ele a chamou em voz baixa:

— Vamos para casa?

— Sim, vamos!

A carroça estava muito mais leve do que estivera pela manhã.

Quando ele chegou de volta na fazenda, ele buscou algumas pedras queimadas pelo sol e começou
a construir um muro de pedra. As bases do muro já existiam, mas com os goblins, você nunca
poderia ser cuidadoso demais. Até Tio reconheceu relutantemente o valor do muro, com a lógica de
que isso ajudaria a manter longe os animais selvagens.

Matador de Goblins trabalhou silenciosamente até que, após o sol ter passado de seu zênite, sua
velha amiga veio com uma cesta no braço. Eles se sentaram juntos na grama, comendo sanduíches
e bebendo vinho de uva frio como almoço. O tempo passou a um ritmo prazeroso.

Com o muro quase terminado e as entregas do dia seguinte já transportadas na carroça, o sol
começou a se pôr no horizonte. Sua amiga disse que iria preparar a comida e partiu, o deixando
vagar sem rumo pelas pastagens. A grama farfalhava suavemente na brisa do início de verão.

Acima dele brilhava duas luas e um céu cheio de estrelas. As estrelas já deveriam estar em suas
novas posições para a nova estação, mas ele não conseguia dizer. Para ele, as estrelas eram apenas
uma forma de orientação. Quando era mais novo, com seu coração ainda ardendo com os contos
dos velhos heróis, ele queria aprender as histórias das constelações. Mas agora…

— O que foi? — Ele ouviu os passos leves na grama atrás dele. Ele não se virou.

— Hummm? O jantar está pronto. Mas não tenha pressa. No que está pensando? — Quando ele
olhou para as estrelas, ela se sentou próximo a ele tão tranquilamente quanto o vento. Ele pensou
por um momento e então se sentou também. Sua malha tilintou um pouco.

— Sobre o futuro.

— O futuro?

— Sim.

— Hum…

A conversa morreu, e eles ficaram em silêncio, olhando para o céu. Não era um silêncio
desagradável. Era um silêncio que eles acolheram; era tranquilo. Os únicos sons eram a quietude
do vento, o balbuciar da cidade de longe, os insetos e suas próprias respirações. Cada um deles
parecia entender o que o outro queria dizer.

Ele era humano, afinal. Ele envelheceria, se machucaria. Quando ele estivesse muito cansado, ele
colapsaria. Um dia ele chegaria no seu limite. Se ele não morresse primeiro, o dia em que ele não
conseguiria continuar matando goblins inevitavelmente chegaria.

E o que ele faria então? Ele não sabia.

Ele é mais fraco do que pensava, pensou ela, o olhando de soslaio.

— Desculpa.

As palavras saíram de repente, espontaneamente, dos seus lábios.

— Pelo quê? — Ele balançou a cabeça, atipicamente. Talvez devido ao seu capacete, o gesto
pareceu estranhamente amplo e infantil.

— Não… nada. Não é nada.

— Você é estranha — murmurou ele enquanto ela ria.

Ele está fazendo birra? Era um pequeno detalhe, mas não havia mudado desde que ele era jovem.
Com esse pensamento em mente, ela puxou o braço dele.

— Hrg… — Ele viu sua visão se mover, e então a parte de trás de sua cabeça foi apoiada contra
algo suave. Quando ele olhou para cima, ele viu as estrelas, duas luas; e os olhos dela.

— Você ficará com óleo.

— Não me importo. Essas roupas podem ser lavadas, e eu posso me banhar.

— É mesmo?

— É. — Ela apoiou sua cabeça em seus joelhos. Ela acariciou o capacete dele enquanto se
aproximava e sussurrou: — Vamos pensar sobre as coisas. Podemos ter o nosso tempo.

— Nosso tempo, hum…?

— Correto. Temos todo o tempo do mundo.

Ele se sentia estranhamente à vontade, como uma corda bem tensionada que tinha finalmente se
afrouxado. Quando ele fechou os olhos, ele ainda sabia como ela estava mesmo que não pudesse a
ver. Assim como ela sabia como ele estava, mesmo com seu rosto ocultado.

O jantar naquela noite foi guisado.


Um dia de remanso como esse se seguiu por quase um mês.

Em algum lugar, a batalha entre os aventureiros e os espíritos malignos ficava mais acalorada
enquanto isso…

Então, de repente, acabou.

Foi dito que um simples novato seguiu a orientação de uma espada lendária, e no final de sua
aventura havia matado o rei demônio. Esse principiante — uma garota, como ocorreu — assim, se
tornou o décimo sexto aventureiro ranque platina da história.

Uma grande celebração foi proclamada na capital, e até mesmo Matador de Goblins afastado da
cidade, observou alguns festejos.

Isso não queria dizer que tinha alguma coisa a ver com ele.

Ele estava interessado apenas no clima, nos animais, nos campos e nas pessoas ao seu redor. O
tempo passou a um ritmo prazeroso. Os dias possuíam a qualidade de uma sesta da tarde.

Mas, todas as coisas acabam, muitas vezes cedo.

O fim de seu idílio apareceu sob a forma de manchas negras repulsivas em suas pastagens
encharcadas de orvalho matinal. Traços de lama e excrementos pelos campos, eles eram
inconfundíveis: pegadas pequenas.
— Eu deveria fugir? O quê? — A garota que estava na cozinha fazendo o café da manhã
(Vaqueira) ficou surpresa com as palavras. — Por quê?

— Eu encontrei pegadas. — Ela entendeu, mesmo que vagamente, o que isso significava. Alguém
que não sabia de nada, poderia presumir que eram pegadas de crianças ou alguma brincadeira das
fadas.

Elas eram pegadas pequenas, feitas por pés descalços que estavam cobertos de lama e excrementos.
Os pés de alguém que não ligava em pisar na grama do pasto.

Ela sabia. Ela confiava nele para saber o que eram. Ambos sabiam que o tempo finalmente havia
chegado, por mais fervorosos que desejassem que não fosse.

— Goblins. — Ele (Matador de Goblins) sempre falava de goblins. Ele estava junto à mesa do café
da manhã com sua armadura e elmo. Era bizarro, sim, mas também era o que ele fazia todos os
dias.

O que ele não fazia todos os dias, era abandonar a inspeção da fazenda para vir dizer que ela
deveria fugir.

Ela parou de cozinhar e olhou para suas mãos. O que poderia dizer? Ela encontrou ou as palavras
certas.

— Mas… você pode detê-los, não pode? — Ela queria que ele dissesse algo normal em resposta.
“Sim” ou “Eu posso” ou “É a minha intenção”. Ela precisava ouvir esse tom calmo.

— Não — disse ele — não posso. — Sua voz parecia muito tênue. As palavras pareciam ser
espremidas para fora.

O quê? Uma expressão de confusão e surpresa escaparam de seus lábios. Ela se virou de repente e
viu ele se movendo ligeiramente, como se estivesse tremendo.

— Em uma caverna, eu poderia enfrentar uma centena de goblins e ganhar. De alguma forma.

Ele estava com medo?

Ele?

Os olhos de Vaqueira se arregalaram de surpresa.


Sua fazenda estava cercada por uma cerca, por um muro de pedra e barreiras que ele mesmo
reforçou. Havia algumas armadilhas também, colocadas para apanhar animais intrometidos.

Estava longe de ser perfeito. Mas ela sabia que ele fizera tudo o que podia para protegê-los.

Quando ela olhou para ele, ele olhou para baixo uma vez, como se hesitando, mas fora isso, ele
encontrou diretamente os olhos dela. Ou pelo menos, ele estava tentando.

— Nosso inimigo é um senhor — disse ele brevemente.

Existia dez tipos diferentes de pegadas. Uma horda que poderia decidir atacar um assentamento
bem defendido — e então enviar dez goblins para explorar o lugar — deveria ter um líder. Um hob
ou um xamã talvez, mas não. Nessa escala, tinha que ser…

Um senhor goblin.

Alguém que não conhecesse bem poderia zombar da ideia. Mas ele sabia bem. Ele sabia
exatamente o que isso significava. Provavelmente, a horda teria mais de uma centena de goblins
fortes. Se os batedores haviam passado, o ataque poderia vir hoje, amanhã no máximo. Não havia
tempo para implorar por ajuda dos governantes ou do Estado. Mesmo que tivesse, os nobres nunca
se incomodariam com meros goblins.

Matador de Goblins sabia de tudo isso. Vaqueira também sabia.

Porque foi o mesmo dez anos antes.

— Uma horda de goblins…? — Uma centena ou mais de criaturas viciosas e malignas, vindo
diretamente a eles?

— Eu não sou um ranque platina… não sou um herói.

Eles não possuíam o número.

Eles não possuíam a força.

Isso significava…

— Eu não posso.

Era isso.

— Você deve fugir.

— Agora, enquanto ainda há tempo.


Vaqueira se moveu para ficar bem na frente dele. Ela encarou o seu capacete. Quando ela teve
certeza de que ele não tinha mais nada a dizer, ela murmurou: — Tudo bem.

— Você está decidida?

— Sim. — Ela respirou fundo e soltou. Existia três coisas em seu coração, três coisas que ela
precisava de coragem para dizer.

— …Me desculpe.

Agora que ela havia dito a primeira delas, o resto seria mais fácil.

— Não vou embora. — Ela forçou seu maxilar rígido formar um sorriso. Ela não o deixou
perguntar por quê. Ele sabia porquê. — Porque você pretende ficar, não é?

Ele não disse nada.

— Viu? Eu sabia. Você fica quieto quando é apanhado. Sempre fica.

— Eles não vão apenas te matar.

— Sim. Eu sei — disse ela, calmamente.

Sua voz soou fria. Ele estava tentando ainda mais do que ela em manter a calma. — Eu estava
vendo.

— …Eu sei. — Ela sabia exatamente o que ele queria dizer. Porque ele lutou, porque ele
continuava a lutar. Ela sabia de tudo isso.

— A horda pode ser expulsa um dia — disse ele, como se estivesse falando com uma criança. —
Mas não pense que você será salva. Mesmo se você viver esse tempo todo, seu espírito será
quebrado.

A intenção de suas palavras — sua tentativa de assustá-la com a implicação eu não vou poder te
salvar — era tão flagrante que ela quase riu.

Não, é claro, que ele estivesse errado. Ele não estava errado, e mesmo assim…

— Então fuja.

— Eu disse, não. — Apesar das circunstâncias, ela achou que estava feliz em saber que ele estava
preocupado com ela. E ela estava preocupada com ele. Ela tinha que fazê-lo entender isso. — Eu
não quero que aconteça de novo. — As palavras saíram dela por vontade própria. — Não haverá
nenhum lugar para você voltar como casa… — E em seu coração ela acrescentou: Ou eu
Não existia outro lugar que ele pudesse chamar de casa. Passaram-se dez anos, e ela nem tinha
certeza se poderia chamar esse lugar de casa.

Ele olhou distante para ela, sem dizer nada. De algum lugar nas profundezas da escuridão de seu
capacete, ele a observava. Sob seu olhar, ela sentiu um embaraço súbito se intensificando. Ela
desviou o olhar e ficou vermelha; ela olhou para o chão. Mesmo quando ela se repreendeu por ser
tão tola, as palavras continuaram, procurando algum tipo de desculpa.

— Q-quero dizer, pense nisso. Mesmo que escapássemos, os animais… as vacas, as ovelhas. Todos
desapareceriam.

Ele estava em silêncio.

— Com isso, me refiro…

Silêncio.

— Eu entendi. — Duas palavras sussurradas. — É — murmurou ela de volta.

— Eu… realmente sinto muito. Sei que estou sendo teimosa.

— …Não faça essa cara. Relaxe.

Ela sorriu. Era um sorriso fraco, lágrimas se formaram nos cantos de seus olhos. Ela deve ter se
sentido mal por ele fazer algo assim.

— Farei o que puder — disse ele. E então ele (Matador de Goblins) se afastou dela.

Ele fechou a porta, caminhou pelo corredor e saiu. Ele olhou rapidamente pela fazenda, gravando o
terreno em sua memória, e então pisou sob a estrada para a cidade.

Isso era tolice.

Ela poderia escapar para a cidade.

Ou ele poderia ter a deixado inconsciente, a amarrado e colocado ela em um lugar seguro.

Por que ele não fez isso? Por que ele não a fez sair?

Só havia uma razão. Ele não queria.

Ele não queria fazê-la chorar de novo.

— Eu deveria proteger as garotas…

— …Você.
Matador de Goblins falava consigo mesmo, e, no entanto, houve uma resposta. Ao lado dele, de
braços cruzados, estava o dono da fazenda. Ele esteve ouvindo, ou talvez ele só tivesse ouvido.

— Você deveria ao menos se despedir quando sair — cuspiu ele, olhando para Matador de
Goblins, que de fato concordou bastante com ele. Tio havia tomado tudo para si, poupando eles o
máximo que podia.

— Sinto muito. Eu…

O dono da fazenda interrompeu bruscamente Matador de Goblins enquanto se desculpava. — Ela é


uma boa garota. — As palavras saíram espremidas de sua boca apertada, com um rosto aflito. —
Ela cresceu tão bem.

— …Sim.

— Então não faça ela chorar.

Matador de Goblins ficou em silêncio, sem saber como responder. Se fosse apenas uma questão de
dizer algo, qualquer coisa, ele poderia facilmente fazer sua língua se mover e seus lábios falarem.

Mas, depois de uma longa deliberação, ele decidiu dizer apenas a verdade.

— Eu vou… tentar.

Às vezes, ele odiava o fato de que não conseguia mentir. Com aquelas palavras murmuradas
pesando sobre ele, ele começou a andar.
A Guilda dos Aventureiros estava agitada mais uma vez. Cheio de barulho da multidão, dos
equipamentos sendo preparados, dos risos.

Aqueles que estiveram longe, lutando contra as forças do caos, haviam voltado. Nem todos, claro,
poderiam voltar. Mas ninguém falava nisso.

Alguns que não foram vistos de novo caíram para monstros nas cavernas, nas ruínas, nas planícies
ou nas montanhas. Outros se mudaram para terras novas, ou ficaram ricos e deixaram de se
aventurar, ou, de outra forma, se aposentaram. Ninguém procuraria averiguar seus destinos.
Aqueles que não voltaram, desapareceriam lentamente da memória coletiva até serem
verdadeiramente esquecidos. Esse era o fim de um aventureiro.

Assim, quase ninguém olhou para cima quando o sino balançou e ele entrou, com sua armadura de
couro ordinária e seu capacete, com seu escudo pequeno atado em seu braço e sua espada ridícula
no quadril.

— Oh, Matador de Goblins — disse acidamente Lanceiro. — Imaginei que estivesse vivo.

Mais alguns reagiram da mesma maneira. Eles pensavam que ele estivera fora em uma missão
longa ou talvez estivesse tendo uma pausa prolongada. O homem que aparecia todos os dias
perguntando por goblins, havia se tornado parte do ambiente da guilda.

Matador de Goblins entrou com seu passo ousado habitual, mas ele não se dirigiu ao seu assento
perto da parede. Ele nem sequer foi a recepção, só caminhou diretamente para o centro do saguão.
Os aventureiros sentados nas proximidades lhe deram olhares estranhos. Eles não conseguiam ver
sua expressão atrás do capacete.

— Com licença. Por favor, me escutem. — Sua voz era baixa e suave, mas atravessou
extremamente bem o tumulto na guilda. Pela primeira vez, a maioria das pessoas no salão estavam
olhando para ele.

— Eu tenho um pedido.

Uma comoção eclodiu.

— Matador de Goblins tem um pedido?

— Nunca o ouvi falar antes.

— Não é ele quem está sempre sozinho?


— Nem, ele tem uma garota com ele ultimamente.

— Ah é, aquela coisinha esbelta… Na verdade, ele não tem um monte de membros de grupo
atualmente?

— Um homem-lagarto e um anão, ou algo assim. E eu achava que ele só se importasse com


goblins.

— Essa amiga elfa dele é quase tão fofa quanto aquela sacerdotisa!

— Nossa, talvez eu devesse começar a caçar goblins!

Matador de Goblins olhou para os aventureiros tagarelando um após o outro. Alguns ele conhecia
pelo nome. Outros, não. Mas ele reconhecia todos e qualquer rosto.

— Uma horda de goblins está vindo. Eles estão visando uma fazenda fora da cidade.
Provavelmente essa noite. Eu não sei quantos são. — Ele falou calmamente para eles, essas pessoas
que ele conhecia. O furor entre os aventureiros ficou mais alto. — Mas pelo número de batedores,
eu acredito que há um senhor entre eles. Em outras palavras, pelo menos uma centena de goblins.

Uma centena de goblins? Sendo liderados por um senhor?

Isso não era uma piada. A maioria dos aventureiros pegavam extermínio de goblins como sua
primeira missão. Alguns falharam e pagaram seu fracasso com a vida. Outros, porém — seja
através da sorte, força ou quem sabe o que — sobreviveram. Muitos deles estavam parados lá
naquele momento. Eles sabiam em seus ossos o terror — ou melhor, francamente, a dificuldade —
dos goblins. Quem lutaria voluntariamente contra uma série dessas criaturas? E com um senhor
como brinde; um goblin que se destacava não em força ou magia, mas em liderança.

Essa não era uma horda comum. Era um exército.

Mesmo um principiante ignorante se recusaria a ajudar. Só Matador de Goblins poderia confrontar


alegremente algo assim. E mesmo Matador de Goblins, claramente, não estava disposto a ir
sozinho agora…

— Não há tempo. Cavernas são uma coisa, mas em uma batalha campal, não posso fazer isso
sozinho. — Matador de Goblins se virou, tendo a vista de todos na sala. — Preciso da ajuda de
vocês. Por favor. — Então ele abaixou a cabeça.

Em um instante, vozes sussurrantes preencheram o salão.

— O que vai fazer?

— O que você acha?

— Goblins, hein…?
— Ele devia lidar com isso sozinho.

— Não conte comigo!

— Nem comigo. Essas coisas são imundas.

Ninguém disse nada diretamente a Matador de Goblins. Ele ficou com a cabeça baixa, imóvel.

— …Ei. — Quando outra voz baixa cortou a multidão, os aventureiros pararam o tumulto de novo.
— Como sabemos que você está certo? — Era o aventureiro da lança. Ele fixou Matador de
Goblins com um olhar intenso.

Matador de Goblins ergueu a cabeça silenciosamente.

— Essa é a Guilda dos Aventureiros — disse Lanceiro — e nós somos aventureiros.

Matador de Goblins não disse nada.

— Não precisamos ouvir você. Quer ajuda, registre uma missão. Ofereça uma recompensa, entende
o que estou dizendo? — Lanceiro olhou para seus colegas aventureiros por apoio.

— Ele está certo! — falou alguém.

— É, somos aventureiros!

— Você quer que arrisquemos a vida de graça? — continuaram as zombarias.

Matador de Goblins ficou onde estava e olhou em volta. Não procurando apoio, exatamente.

Em uma mesa no fundo da sala, Alta-Elfa Arqueira ficou de pé, com seu rosto furiosamente
vermelho, mas Anão Xamã e Lagarto Sacerdote a pararam. Para Bruxa sentada em um banco, com
um sorriso inconsistente pairando em seu rosto. Ele olhou para a recepção para ver Garota da
Guilda desaparecendo em pânico em uma sala dos fundos. Ocorreu-lhe que estava procurando por
Sacerdotisa. Dentro do capacete, ele fechou os olhos.

— É, esse cara está certo!

— Que tal você nos dizer o que vai nos pagar por lutar com uma centena de goblins?

Não existia hesitação agora. Ele havia renunciado isso há dez anos. Matador de Goblins respondeu,
calmamente e claramente:

— Tudo.

A guilda ficou silenciosa.


Todos sabiam o que ele queria dizer com essa palavra.

— Tudo o que tenho — disse ele calmamente.

Se qualquer aventureiro lutar comigo contra uma centena de goblins, ele ou ela pode pedir
qualquer coisa ou tudo.

Lanceiro nivelou os ombros e acertou as costas. — Então, e se eu lhe dissesse para se afastar de
Garota da Guilda e me deixar ficar com ela? — perguntou ele bufando.

— Ela não é minha — respondeu Matador de Goblins, com seriedade absoluta. Ele ignorou o
sussurro que corria no meio da multidão, falando dele ser incapaz de ter senso de humor. — Tudo o
que tenho — disse ele — que lhe posso dar. Meu equipamento, meus bens, meu conhecimento,
meu tempo. E…

— Sua vida?

Matador de Goblins assentiu afirmativamente. — Até minha vida.

— Então se eu disser morra, o que vai fazer? — perguntou Lanceiro. Ele parecia exasperado, como
se não pudesse acreditar no que estava acontecendo.

Eles achavam que sabiam como ele responderia. Mas, depois de uma pausa longa, ele disse: —
Não. Eu não posso fazer isso.

Não, claro que não. A tensão no ar diminuiu bem ligeiramente. Esse cara talvez não estivesse bem
da cabeça, mas mesmo ele tinha medo de morrer.

— Se eu morresse, há alguém que lamentaria minha morte. E eu prometi não fazer essa pessoa
chorar.

Os aventureiros que ouviram contendo a respiração se entreolharam.

— Então, a minha vida também não é minha para dar.

Lanceiro engoliu em seco. Ele olhou para Matador de Goblins. Para o capacete de metal que estava
entre ele e a expressão por trás dele. Ele encontrou os olhos de Matador de Goblins apesar da
máscara.

— Não sei o que diabos está pensando.

Matador de Goblins não disse nada.

— Percebo que está falando sério.

— Sim. — Ele assentiu calmamente. — Estou.


— Mas que diabos! — disse Lanceiro, puxando os cabelos. Ele começou a andar para a frente e
para trás na frente de Matador de Goblins, batendo no chão com a traseira de sua lança. O
momento agonizante se estendeu mais e mais. Por fim, Lanceiro deu um grande suspiro e disse
com uma voz cheia de resignação: — O que eu faria com sua vida mesmo assim? …Mas você me
deve uma boa bebida.

Ele bateu seu punho contra o peitoral de placas de couro de Matador de Goblins.

Matador de Goblins cambaleou. O capacete de aço olhou vagamente para Lanceiro.

Lanceiro olhou de volta para ele. Tem algum problema? — Um aventureiro ranque prata acabou de
pegar sua missão de goblincídio. À taxa de mercado, nada menos. Deveria estar grato.

— …Estou. — Matador de Goblins assentiu firmemente. — Me perdoe. Obrigado.

— Guarde para depois de termos matado alguns goblins. — Os olhos de Lanceiro se ampliaram um
pouco, e ele coçou a bochecha desconfortavelmente. Ele nunca pensou que chegaria o dia em que
ele ouviria “obrigado” desse homem.

— E-eu também estou com você! — Uma voz clara soou pela guilda. Todos se viraram para olhar
para uma elfa arqueira que derrubara sua cadeira e se levantou. Ela se encolheu sob os olhares, com
suas orelhas compridas tremendo. — Eu… eu matarei esses goblins com você. — Sua coragem
pareceu ter aumentado depois, e ela caminhou em linha reta através do salão até Matador de
Goblins e pôs o dedo em seu peito. — Então… então, da próxima vez, você tem de vir comigo em
uma aventura! Eu encontrei algumas… algumas ruínas.

— Está bem. — Matador de Goblins assentiu imediatamente. As orelhas da elfa ficaram em pé. —
Se eu sobreviver, eu me junto a você.

— Caramba, não precisava dizer isso — bufou a elfa, encarando o capacete. Ela se virou. — Vocês
vêm também, certo?

O anão respondeu primeiro, suspirando enquanto acariciava a barba com um pouco de


aborrecimento. — Acho que não tenho escolha. Mas, não vou ser subornado com uma bebida,
Corta-barba. É melhor me trazer um barril inteiro!

— Você terá — disse Matador de Goblins.

— Certo, então! — exclamou felizmente o anão. — E… suponho que eu me juntaria a você em sua
aventura, Orelhuda?

— É claro! Somos membros de um grupo, não somos? — riu a elfa, e depois de um segundo, o
anão se juntou.

— Que nunca se diga que eu abandonaria meus companheiros. — O homem-lagarto se levantou


lentamente. Ele tocou a ponta de seu nariz com a língua. — Nem que eu recusaria um amigo
necessitado. Mas falando em recompensas…
— Queijo?

— Exatamente. Ah, até sinto o sabor!

— Não é meu. Mas ele é feito na fazenda que está sendo visada.

— Mesmo? Mais um motivo para destruirmos aquelas bestas comedoras de estrume! — Os olhos
do homem-lagarto se reviraram, e ele juntou suas palmas para Matador de Goblins. O último
entendeu que essa era uma forma de humor do homem-lagarto.

Então, quatro aventureiros se reuniram em torno de Matador de Goblins.

Ele não via Sacerdotisa em lugar algum.

— Então, nós temos cinco…

— Não. Seis. — Bruxa se levantou com um ruído farfalhante. Ela caminhou e ficou ao lado de
Lanceiro, com seus quadris balançando o caminho todo. — Poderia ser muito bem sete… embora,
não posso, ter certeza — disse ela significativamente; depois ela tirou um cachimbo longo de seu
peito. — Inflammarae. — Ela girou o cachimbo, encheu ele com um pouco de tabaco, depois o
acendeu com um toque de seu dedo e respirou fundo. A fumaça perfumada flutuou pela guilda.

Os aventureiros restantes tagarelaram animadamente. Não era que eles queriam abandonar a
fazenda para a destruição. Muitos deles só não estavam prontos para arriscarem suas vidas por uma
ninharia. E quem os pode culpar? Todos valorizavam suas próprias vidas.

Eles só precisavam de mais um empurrão…

— A guilda está… A guilda está oferecendo uma missão também!

Esse empurrão veio de uma voz enérgica. Garota da Guilda veio saltitante da sala dos fundos,
agarrando um maço de papéis. Ela estava ofegante, com o rosto vermelho, e suas tranças
balançavam loucamente para cima e para baixo.

Ela começou a empilhar os papéis na recepção. — Há uma recompensa de uma peça de ouro para
cada goblin que matar. Agora é sua chance, aventureiros!

Toda a multidão se agitou. Era claro que a guilda quem proporcionaria o dinheiro para a
recompensa. A capacidade de trabalho em grande escala era uma das vantagens de tal organização.

Não tinha como saber o quanto Garota da Guilda se esforçara para convencer seus superiores de
que isso era uma boa ideia.

— Tsc. Acho que estou dentro então. — Um aventureiro (o guerreiro fortemente armadurado) deu
a sua cadeira um empurrãozinho enquanto se levantava e pegava uma das folhas de papel.
Cavaleira, sentada ao lado dele, olhou para ele surpreendida.
— Você vai?

— Não sou fã de Matador de Goblins, mas ei… dinheiro é dinheiro.

Cavaleira deu um sorriso diabólico com seu rosto delicado. — Não posso tolerar mentirosos. Você
deveria apenas admitir que é por causa de ele ser o único que expulsou os goblins de sua cidade
natal.

— Ei, guarde isso para si, mulher! De qualquer forma, ainda vou conseguir uma peça de ouro por
goblin.

Eu também. É, conte comigo. Eu devo a esse cara. Um a um, os murmúrios começaram; as pessoas
se levantavam.

— E quanto a você? Pensei que você odiava sua coragem.

— Eu aspiro me tornar uma paladina. Quando alguém pede ajuda, sou obrigada a oferecê-la —
disse Cavaleira com um sorriso malicioso, ao qual Guerreiro de Armadura Pesada respondeu dando
de ombros e um riso.

— Aw, bem. Se vocês dois irão, acho que estamos indo junto.

— Estamos?

— Ora, ora, é claro que temos de ajudar!

Apesar de uma pequena discussão, o resto do grupo do guerreiro armadurado se levantou.

— Ei…

— O quê?

Observando-os, o guerreiro novato com quem treinaram há vários dias, chamou a jovem clériga.

— Eu ainda nunca fui em um extermínio de goblins.

— …Acho que não. Dizem que é perigoso.

— Mas… tenho que tentar um dia desses, certo?

— …Você não tem jeito — disse ela. Mas… se você insiste. E o garoto estendeu a mão para ela.

Alguém os observando deu um pequeno suspiro. — Eu me tornei um aventureiro no mesmo dia


que ele. Acho que isso é o que se pode chamar de destino.

— Se eu não ouvisse essa voz perguntando por goblins todos os dias, não me sentiria bem.
— Concordo. Ele é tipo uma… parte daqui… uma fundação, entende?

— Eu odeio o ter por perto. Mas… eu detestaria não o ter mais por perto.

— Eu só estava procurando uma forma de arranjar algum dinheiro. Um goblin, um ouro, hein?
Nada mal.

— Em toda a minha vida, nunca vi um recrutador de missão tão estranho — murmurou alguém.
Outra pessoa concordou. Um após o outro, aventureiros se levantaram.

Sim, eles eram aventureiros.

Eles tinham sonhos em seus corações. Eles tinham princípios. Eles possuíam ambições. Eles
queriam lutar pelas pessoas.

Talvez eles não tenham tido a coragem de dar um passo à frente. Mas eles receberam esse pequeno
empurrão. Não existia mais motivos para hesitarem.

Extermínio de goblins? Certo. Esse era o trabalho deles. Se houvesse uma missão, eles a tomariam.

Alguém levantou sua espada no ar e gritou: — Não somos membros de um grupo, e não somos
amigos… mas somos aventureiros! — Outros aderiram ao grito. Aqueles que não carregavam
espadas levantaram seus báculos, lanças, machados, arcos, punhos.

Havia principiantes. Veteranos. Guerreiros, magos, clérigos e ladinos. Havia humanos, elfos,
anões, homens-lagarto e rheas. Os aventureiros reunidos na guilda preenchiam o ar com suas
vozes, batendo no chão com os pés.

Matador de Goblins, envolto por seus gritos, examinou a sala. Seus olhos se encontraram com os
de Garota da Guilda. Ela estava suando um pouco, mas ela lhe deu uma piscadela travessa.
Matador de Goblins curvou a cabeça para ela. Ele achava que era o mínimo que poderia fazer.

— Isso funcionou bem. — Houve uma pequena risada.

Ele se virou e viu, parada próxima como uma sombra, Sacerdotisa.

Claro que ela estava lá. Como ela não estaria?

— …Sim. Deu. — Matador de Goblins assentiu.

Nesse dia, talvez pela primeira vez, não faltaram aventureiros prontos para pegar uma missão de
goblins.
Era o início de uma longa noite.

— GRARARARARARA! GRARARARA!!

Vendo a lua no topo do céu — “meio-dia” para o seu povo — o senhor goblin deu suas ordens.

Suas palavras foram transmitidas em um instante, com um clamor de vozes rosnantes, e o exército
de goblins começou a avançar. Escondidos em um campo de gramas tão altas quanto a si mesmos,
eles levantaram seus escudos quando ficaram em pé. Os goblins os chamavam de “escudos de
carne”: tábuas nas quais mulheres e crianças capturadas foram amarradas. Em suma, dez
prisioneiros nus estavam presos diante do exército. Eles gemiam periodicamente, espasmavam ou
se contorciam incompreensivelmente.

Os goblins, por sua vez, já tiveram muita diversão com esses prisioneiros. Se o escudo de carne
vivia ou morria, não importava nada para eles. O que importava era que isso causaria resistência
dos aventureiros ao lançarem uma flecha ou uma magia. Em contrapartida, se um aventureiro
capturasse um goblin e o usasse da mesma forma, nenhum outro goblin hesitaria em disparar
diretamente por ele. É verdade, ele poderia ficar zangado por ter que matar seu companheiro
goblin, mas só seria mais uma motivação para rasgar seus inimigos em pedaços.

O senhor goblin gargalhou só de pensar o quão tolos os aventureiros eram.

No limite de suas vistas, eles podiam identificar as luzes da fazenda. A cidade só poderia ser vista
mais além.

Havia aventureiros na cidade. Aventureiros! Uma palavra nojenta para criaturas nojentas.

O senhor goblin chegou a uma decisão repentina. Ele pegaria cada aventureiro e os socariam de
estacas até morrerem. Talvez antes do fim, eles se arrependeriam por tudo o que haviam feito à sua
espécie.

Assim como os aventureiros que atacaram seu ninho — sua casa — e o abandonaram no deserto
porque era muito jovem.

Eles começariam com a fazenda. Roubar o gado e a ovelha para encher suas barrigas. Pegar a
garota para si mesmo e aumentar seus números.

A fazenda daria uma cabeça de ponte conveniente para atacar a cidade, massacrar os aventureiros e
reforçar ainda mais suas fileiras. Então, finalmente, eles se voltariam para a capital humana, a
arrasariam, e ergueriam um reino goblin no seu lugar!
Esse dia ainda era um sonho, mas o plano na mente do senhor goblin era bastante real.

Os recrutas abaixo dele não conseguiam entender isso. Mas, eles tinham sua raiva, seu ódio e sua
luxuria se agitando dentro deles. O reconhecimento da fazenda revelara a presença não só de carne
fresca, mas de uma jovem.

Eles se moviam ardentemente pela grama, que farfalhava enquanto avançavam. Finalmente, as
luzes da fazenda estavam próximas. Em momentos, o ataque começaria.

Então aconteceu.

— GRUUU?

Uma névoa perfumada flutuou sobre o campo. Um dos portadores do escudo na frente do exército
foi tragado, e um momento depois, ele reapareceu, se virando bem para outra direção e caindo no
chão. Os outros portadores do escudo começaram a cair um por um. No tempo que o senhor goblin
levou para piscar, formas escuras avançaram das sombras ao redor do muro da fazenda.

Aventureiros! Isso é magia!

— GAAAUU!! — O senhor deu um grito.

— GAUGARRR!! — Um goblin xamã gritou algo e agitou seu cajado. Um raio foi disparado e
atingiu um aventureiro no peito. Mas, enquanto o aventureiro caía, os outros diminuíram
rapidamente a distância com os goblins e agarraram os escudos de carne. Eles ignoraram
completamente o inimigo, recuando em vez disso tão rápido quanto chegaram. O xamã balançou
seu cajado de novo e entoou, na esperança de atingir um dos aventureiros em fuga.

— GAAA?!

Uma flecha feita de galho perfurou seu peito. Sua boca se abriu e fechou por um momento, e então
ele caiu de costas na grama, morto.

Graças a sua excelente visão noturna, os goblins logo localizaram a fonte do disparo.

Em cima de uma das árvores na fazenda: um elfo. Um elfo estava disparando neles!

Os arqueiros goblins se apressaram em devolver o fogo com seus arcos curtos, mas o elfo apenas
bufou e saltou nos arbustos.

Os aventureiros que carregavam os escudos de carne passaram pelo muro, e em troca, um grupo
dos seus companheiros armados apareceram. Eles continuaram abaixados enquanto corriam em
direção aos goblins, acompanhados do barulho de suas armaduras.

— GORRRRR!!
O senhor goblin gritou apressadamente para suas tropas contra-atacarem, mas eles não estavam
conscientes o bastante para lhe obedecerem. A magia Estupor agia magicamente sobre eles, e um
atrás do outro, eles foram derrubados por flechas com suas mentes ainda esvoaçadas.

— Então esses são os seus “escudos”. Criaturas macabras — disse a elfa, com nojo estampado em
seu rosto. Ela atravessava velozmente o campo, disparando flechas como o vento. Ela podia
disparar tão facilmente quanto podia respirar. Ela conseguia acertar seus alvos com os olhos
fechados. Suas flechas ceifavam goblins como uma foice através do trigo.

Ela não matara realmente muitos dos inimigos. Mas, ela não conseguiria continuar para sempre.

— Eu peguei o conjurador deles!

— Muito bem, seus arruaceiros! Hora de ganharem seu dinheiro!

— Ha-haaa! Olhem nosso ouro marchando bem na nossa direção!

Os aventureiros fizeram contato com o inimigo antes que o exército confuso de goblins pudesse se
reformar.

Agora, nenhum dos lados poderia usar magias, pois poderia apanhar seus próprios aliados no
efeito; os aventureiros naturalmente, mas até mesmo os goblins possuíam algum senso de risco e
vantagem. Eles não possuíam escrúpulos em usar seus companheiros como escudos, mas eles
tinham que ter cuidado para que o número de escudos disponíveis não ficasse muito baixo. E de
qualquer forma, mesmo quando se tratava de usar magias, goblins ainda eram goblins. Eles eram
covardes e cruéis.

Assim, a batalha começou.

O tinir das espadas ressoavam. O cheiro de sangue estava em toda parte sobre a planície envolta
pela noite. Berros, gemidos, gritos de guerra. Em meio ao clamor, silhuetas — aventureiros,
goblins — podiam ser vistos desaparecendo um a um enquanto os combatentes caíam.

— Deuses, há goblins suficientes aqui para te libertar dessa vida! — rugiu de rir Lanceiro enquanto
derrubava inimigo após inimigo.

À medida que cada monstro tombava no chão, Lagarto Sacerdote saltava neles e os atingia com um
golpe final. — De fato, até mesmo o meu senhor Matador de Goblins estava desesperado… — Ele
fez o gesto das palmas juntas e sacou a espada-presa. Ainda existia muitos goblins para matar.

— Não que, me importe, mas para teu próprio bem… fique dentro, de minha magia Deflexão de
Projéteis, está bem? — Bruxa estava próxima, com o cajado na mão e lançando magia atrás de
magia, seus seios fartos arquejavam enquanto ela respirava profundamente.

Por perto, Anão Xamã havia usado Estupor quantas vezes fora capaz e havia recorrido a sua funda.
— Me enterrem, Corta-barba estava certo de que ninguém poderia lidar com esse monte sozinho!
— Ele disparou uma pedra que traçou uma linha perfeita de sua funda até a cabeça de um goblin.
— Céus — disse ele — aqui você quase nem precisaria mir… O qu…?!

Anão Xamã semicerrou os olhos. Alta-Elfa Arqueira reparou imediatamente e gritou: — O que é
isso, anão?

— Montadores, Orelhuda! Goblins montados a caminho!

Uivos ecoaram por todo o campo iluminado pelas luas. Goblins montando lobos cinzentos enormes
e brandindo espadas vinham correndo através da escuridão.

— Vou atirar neles daqui! Segure eles!

— Certo! Parede de lança, não os deixem passar! — Com as ordens de Lanceiro, os aventureiros
próximos ficaram ombro a ombro e posicionaram suas armas para frente. Os lobos vieram como se
alheios a chuva de flechas caindo sobre eles. Os aventureiros impulsionaram suas lâminas com
prazer na barriga das feras.

Houve um uivo e um grito estridente.

— Errraggghh!

Um aventureiro fora atingido por um montador investindo e encontrou um lobo em sua garganta.
Muito dos animais, no entanto, sucumbiram aos ataques dos aventureiros, lançando os goblins de
suas costas.

— Atacaaaaaar! — O homem-lagarto liderou com um grande berro e voou para finalizar os


cavaleiros derrubados. Como o guerreiro sacerdote que era, de vez em quando, ele gritava
estridentemente no que parecia ser uma oração dos homens-lagarto.

Apesar de tudo, os aventureiros estavam ganhando bem comodamente.

Em geral, em uma disputa direta entre um aventureiro e um goblin, o aventureiro normalmente se


sairia melhor, desde que a má sorte não intervisse. E o que era mais…

Matador de Goblins disse: — Estabeleçam emboscadas. Eles são especialistas em ataques


surpresas, mas nunca esperam ser emboscados.

Ele disse: — Tomem uma postura baixa. Apontem para as pernas. Eles são pequenos, mas não
podem voar.

Ele disse: — Eles certamente terão escudos de carne. Lancem magias de sono, então usem esse
momento para salvar os reféns.

Ele disse: — Mesmo que vocês pensem que podem matá-los enquanto resgatam os escudos, não o
façam. Se eles acordarem, só será um problema.
Ele disse: — Não usem magias de ataque. Guardem suas magias para outras coisas.

Ele disse: — Espadas, lanças, flechas, machados, qualquer tipo de arma pode ser usado para matá-
los. O que vocês não podem fazer com uma arma, façam com magia.

Ele disse: — Eliminem primeiro os seus conjuradores.

Ele disse: — Não os deixem chegar atrás de vocês. Sempre continuem se movimentando. Façam
movimentos pequenos com suas armas. Conservem suas forças.

Ele disse…

Os outros aventureiros ficaram francamente atônitos com a quantia de conhecimento que Matador
de Goblins lhes transmitiu.

Aventureiros não eram soldados, mas eles não eram estranhos quanto a estratégias. Ainda assim,
eles não estavam acostumados a tomar tanto cuidado contra os goblins. Aventureiros experientes e
inexperientes viam os goblins como inimigos insignificantes.

— Cara! Não só eu farei um bom dinheiro; eu começarei a impressionar a minha garota! — Com
essas táticas em mãos, os goblins eram fáceis de se lidar, contanto que pudessem ser forçados a
combates um contra um. Lanceiro e os outros guerreiros impulsionavam suas armas para a
esquerda e para a direita, por todo o lado encontrando um goblin para matar.
Nas profundezas das fileiras inimigas, todavia, eles podiam ver uma forma enorme erguida,
formando uma silhueta contra a lua.

— Ali está! Um hob… Espera, é isso?

— GURAURAURAURAURAUUUU!!

O grande rugido atravessou o campo de batalha sangrento.

A criatura era tão grande que poderia ser confundida com um ogro. Ela segurava uma clava
manchada de sangue e cérebro. Um campeão goblin.

Um goblin, sim, mas um tão poderoso que poderia com suas próprias mãos, virar a maré da
batalha.

Todavia, estava longe de qualquer aventureiro recuar de um desafio só porque possuía o dobro do
tamanho deles e carregava um porrete grande.

— Ahhh, aí está o grandalhão! Eu estava ficando cansado desses frangotes! — Guerreiro de


Armadura Pesada foi o primeiro a mergulhar no campeão, com sua arma no ombro e um sorriso
selvagem nos lábios. Revirando os olhos, Cavaleira o seguiu, com seu escudo erguido.

— Justo quando estava ocupada contando quantas cabeças de goblins eu havia recolhido — disse
ela.

— Os conte depois! Lute agora!

— Vocês guerreiros têm mentes tão obcecadas. — Com essa brincadeira, eles avançaram
alegremente para a batalha contra o novo inimigo.

Por todo o campo, armas tocavam umas às outras, e sangue jorrava pelo ar.

— E onde está o nosso líder destemido nisso tudo? — perguntou Lanceiro, enquanto parava para
limpar a ponta de sua lança no pelo de um lobo. Sua respiração estava ficando irregular.

Atravessando o campo, uma nova massa escura apareceu.

Reforços dos goblins. Não havia tempo para descansar. Ele segurou perto sua lança e se preparou.

— Ah, eu acho, que você sabe, a resposta, para isso — sussurrou Bruxa, com uma voz melosa,
enquanto dava uma longa tragada em seu cachimbo e soltava lentamente a respiração. Um vapor
rosa perfumado flutuou ao vento, e todos os goblins que o respiraram, encontraram seus sentidos
entorpecerem. Ao longe, os reforços começaram a se mover mais lentamente também.

— Obviamente — disse Alta-Elfa Arqueira, com uma risada, disparando contra os inimigos
estupefatos. — Ele foi matar goblins.
Como é que isso aconteceu?!

O senhor goblin corria tão rápido que estava quase tropeçando. Assim que ele percebeu que não
existia chance de vitória, ele fugiu do campo de batalha. Atrás de si, ele podia ouvir armas
tilintando, gritos e os sons de magias reverberando.

Alguns desses gritos pareciam ser de aventureiros. Mas a maioria era de goblins.

Isso deveria ser um ataque surpresa para estabelecer uma posição na área. E, no entanto…

Nós é que tomamos! Então, como é que isso aconteceu?!

Sua horda estava perdida. Com suas forças em cheque, não valia a pena rondar por perto.

Contanto que ele sobrevivesse, isso era tudo o que importava.

Ele voltaria para o ninho, usaria as mulheres capturadas lá para construir suas tropas.

Tal como antes.

O senhor goblin era um andarilho, o sobrevivente solitário de um ninho destruído por aventureiros.
Agora, ele vivia só para matar aventureiros.

Não é tão difícil.

Sua primeira vítima tinha sido a mulher que o poupara “porque ele era apenas uma criança”. Ela se
tornou comida para ele assim que virou as costas.

Ele aprendeu então que, se você atingisse um aventureiro com força suficiente na cabeça com uma
pedra, eles se tornariam bastante flexíveis. Quando ele descobriu que uma clava era ainda mais
eficaz, ele a usou. Então, ele aprendeu a usar armas e vestir armadura. Da forma como os
aventureiros formavam seus grupos, ele apercebia as melhores formas de liderar uma horda.

Seus longos dias vagueando, haviam treinado seu corpo e mente até que ele fosse um desafio até
mesmo para um guerreiro humano.

Isso seria o mesmo.

Sob as duas luas, o senhor se afastava da batalha e corria por sua vida.
Através da grama, levantando a terra, em direção a floresta. Dentro da floresta. Havia uma caverna.
Seu ninho.

Ele havia falhado. Mas, enquanto vivesse, haveria outra chance.

Ele aprenderia e reabasteceria suas tropas, e da próxima vez seria melhor. Da próxima vez…

— Eu sabia que você viria aqui.

Uma voz calma, fria e quase mecânica o pegou. Irrefletidamente, o senhor goblin parou onde
estava. Ele preparou o machado de guerra que segurava na mão.

Seus olhos podiam distinguir a figura parada diante dele no escuro. Era um aventureiro com
armadura de couro barata e um capacete de aço. Um escudo pequeno estava preso em seu braço
esquerdo, e na mão direita, uma espada quase longa demais para se empunhar. Ele estava salpicado
com sangue de matança, de pé em uma poça nauseante.

— Tolo. Vejo que ambos usamos nossos exércitos como iscas.

O senhor podia falar a língua comum, apesar d’ele a desprezar. Ele não sabia quem era esse
aventureiro. Mas estava muito claro o que tinha acontecido.

— Sua casa não existe mais.

— ORGRRRRRR!!

O senhor deu um grito ensurdecedor e avançou em Matador de Goblins. O senhor levou o seu
machado para baixo em um arco, o que significava dividir o crânio do aventureiro, mas Matador de
Goblins bloqueou o golpe com seu escudo. Houve um barulho de metal se partindo.

Matador de Goblins balançou bem o escudo e empurrou de lado o machado, então deu um impulso
perspicaz com a espada.

— Hrm! — murmurou ele.

A ponta da sua espada atingiu o senhor no peito, mas só fez um som seco. O goblin estava usando
um peitoral de placas.

Matador de Goblins era imperturbável, mas se congelou por um segundo, e naquele momento, o
machado veio a ele de lado.

Uma decisão instantânea. Ele se atirou para o lado, rolando para evitar o golpe. Ele se ergueu de
joelho, ofegante.
—…

Matador de Goblins se levantou e girou sua espada lentamente na mão, segurando o escudo diante
de si.

— GRRRR…

O senhor fez um som de desgosto e agarrou seu machado de guerra com as duas mãos.

O abismo entre a força e armamento deles era imenso.

Suas feridas de antes. O mês se recuperando. Ele precisou desse tempo para se curar, e mesmo
assim…

Matador de Goblins estava perfeitamente ciente de que suas habilidades haviam diminuído. No
entanto, não seria um problema. Ele não deixaria ser um problema. Havia um goblin na frente dele.
Era tudo o que ele precisava.

— …!

Matador de Goblins se lançou como uma flecha sobre o adversário.

Ele se moveu em uma postura baixa; com a mão esquerda, ele agarrou um punhado de grama, a
cortou e jogou no senhor goblin.

No segundo que o senhor tomou para dispersar com a mão a nuvem de grama, Matador de Goblins
impulsionou sua espada.

Sangue voou, e um grito.

— GARUARAARARAA?! — O senhor brandiu seu machado de guerra em frenesi, sangrando


pela testa. Antes que um observador pudesse ter estalado a língua, um ataque conectou em Matador
de Goblins.

Ele se sentiu flutuando no ar, e depois aterrissou dolorosamente no chão.

— Oof! Ugh… — As suas costas se encontraram com o chão duro, forçando o ar de seus pulmões.
Ele viu que seu escudo quase fora dividido ao meio.

Suas habilidades podem ter enferrujado, mas seus músculos ainda se lembravam de seu papel. O
escudo que ele levantou instintivamente salvou sua vida de novo.

— Eles não são bons em ataques frontais… — murmurou ele, se levantando, se apoiado em sua
espada.
— GAROOOO!!

O senhor goblin não perderia sua chance. Ele veio investindo pela grama.

Matador de Goblins deu um pequeno aceno com a cabeça. Ele segurou sua espada no alto, levantou
seu escudo surrado e encarou o senhor de cabeça erguida.

Um instante depois, ele correu contra o inimigo.

O machado de guerra do senhor goblin veio assobiando pelo ar. Matador de Goblins manteve seu
escudo para encontrá-lo e impulsionou sua espada.

Impacto.

O machado dividiu o escudo em dois e cortou fundo no braço de Matador de Goblins. O


aventureiro saiu voando mais uma vez.

Mas, no mesmo momento, sua espada cortou a barriga do goblin, que agora jorrava sangue no
campo escuro.

— GAU…

Mas a ferida não era fatal. O senhor franziu a testa furiosamente.

— Ugh, tsc…?! — Matador de Goblins começou a se levantar do chão. Mas ele não aguentava. Ele
tentou usar sua espada para se erguer, mas estava quebrada.

— GURRR… — O goblin até parecia aborrecido. Pelo menos, ele teria sua vingança pelas suas
tropas caídas. Ele cortaria as mãos e os pés desse homem, o amarraria em uma estaca e o torturaria
até a morte. Quando imaginou esse futuro sombrio, o senhor goblin começou a gargalhar, então ele
seguiu lentamente até a sua presa.

Ele deu um chute perverso no capacete de Matador de Goblins imóvel.

Silêncio.

O senhor não ficou satisfeito. As presas deveriam se acovardar no momento da morte.

Mas, que seja.

Morte acabaria com isso. Para sempre. Talvez essa noite ele teria de se contentar com isso.

O senhor goblin ergueu o machado de guerra lentamente.

Crac.
No segundo seguinte, o machado foi jogado para trás.

— GAU…?

Ele havia atingido uma raiz de árvore ou algo assim? O senhor olhou para trás com frustração, mas
não existia nada lá. As árvores mais próximas estavam um pouco longe.

— GA, RRR…?!

Desta vez, como tentativa de abaixar sua arma, o senhor descobriu que o machado não se movia
nada. Não, era seu próprio corpo que não respondia aos seus comandos. Seus ossos rangiam como
se algo estivesse pressionado contra ele. Como se estivesse preso entre duas paredes invisíveis.

— GA, GAO…?!

Os olhos do senhor viraram para frente e para trás; ele nem sequer conseguia se mexer.

O que estava…? O que estava acontecendo…?!

— Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, pelo poder da terra conceda segurança para nós que
somos fracos…

A resposta à sua pergunta veio na forma de uma voz miraculosamente clara entoando uma oração.

Uma jovem bela saiu do bosque nas proximidades. Suor pairava em sua testa, e em suas mãos
trêmulas estava um cajado de monge.

Uma sacerdotisa jovem rezando fervorosamente para a Mãe Terra.

Isso é culpa dela!

— GAAAAUUAUAUAUAUAAA!!

O senhor goblin uivou todas as ameaças vis que conhecia. Ele arrancaria seus membros e a faria
comê-los! Não, ele a perfuraria com uma estaca tão fundo pelo rabo que sairia pela boca! Ele
quebraria seus dedos em pedacinhos pequenos um a um, queimaria o seu rosto até que ninguém a
reconhecesse…

Ela parecia tão frágil. Certamente, um pouco de intimidação era tudo o que seria necessário para
assustá-la…

— …!

Mas ele estava errado.

Rosto pálido, mordendo os lábios, Sacerdotisa ainda segurava seu cajado trêmulo.
O senhor começou a se preocupar.

— GA… RO…?

Talvez essa garota não fosse bem o que parecia.

Mudança de tática então. O senhor pôs sua expressão mais lamentável e implorou por perdão. Ele
jamais faria tal coisa novamente. Ele esteve errado, muito errado. Ele viveria discretamente na
floresta, nunca mais veria uma aldeia humana de novo. “Por favor, perdoe. Por favor”.

Ele balbuciava com sua versão patética da língua comum. Se fosse possível, ele teria se jogado a
seus pés.

Não seria a primeira vez que ele teria convencido um aventureiro a poupar sua vida por meio de
uma demonstração de arrependimento.

A primeira vez foi a muito antes dele ter se tornado um senhor; de fato, ele ainda era uma criança.
Se pensarmos bem, esse aventureiro também fora uma mulher. “Tudo bem” dissera ela, “mas
nunca deve fazer esse tipo de coisa de novo”. Ele concordou avidamente. E depois, claro, a matou
assim que ela se virou.

Ele tomou o deleite sombrio da memória daquela mulher implorando por ajuda enquanto ele a
esfaqueava até a morte. Ela havia pensado que era forte.

Se ele pudesse viver agora, ainda haveria tempo para tramar sua vingança.

E antes de tudo, eu levarei essa garota!

— Como se eu o deixasse. — Uma voz fria ecoou, o apanhando.

— GA, RR…?!

A voz emitiu frio pelas suas veias como um vento das entranhas da terra.

Matador de Goblins ficou de pé lentamente.

Seu braço esquerdo pingava sangue. Na mão esquerda, ele segurava o escudo fendido. Na direita,
sua espada quebrada.

Ele andou ousadamente em direção ao senhor goblin. Ele empurrou a espada no lado do pescoço
do goblin paralisado.

— GA… GO…?!

A arma quebrada não podia cortar ou perfurar.


Mas ela poderia esmagar. A criatura algaraviava sem sentido enquanto a lâmina pressionava a sua
traqueia.

— Um senhor? Ridículo. — O senhor tentou desesperadamente se esforçar.

— Você é um goblin.

O goblin abriu a boca, lutando por ar.

— Apenas um goblin…

Mas ele não podia fazer nada.

— …imundo e inútil.

O rosto do senhor mudou de cor, e sua língua se estendeu para fora. Saliva espumava para a beira
da boca; seus olhos rolaram para cima.

— E eu…

Quando o senhor sentiu sua consciência indo embora, uma questão surgiu em sua mente sumindo.

O quê? O que é você?

— …sou Matador de Goblins!

Os olhos da criatura permaneceram rolados para trás da cabeça. O goblin que seria rei espasmou
uma, duas vezes e morreu. Houve um longo silêncio.

— Essa é uma… cabeça de goblin…

A espada de Matador de Goblins caiu de sua mão bem enquanto suas palavras saíam de seus lábios.
Depois ele caiu para frente como se suas cordas tivessem sido cortadas.

Sacerdotisa jogou seu cajado de lado, correu em frente e o pegou. — Matador de Goblins, senhor!
— Ele era bastante pesado para seus braços finos, coberto de couro, metal, lama e sangue.

Um momento depois, o milagre Proteção desvaneceu, e o corpo do senhor goblin se colapsou


próximo a Matador de Goblins. Sacerdotisa não olhou para ele, mas sim para as feridas de Matador
de Goblins. Havia um corte profundo no seu braço esquerdo. Na pior das hipóteses, poderia chegar
até o osso.

— Por favor… não faça essas tolices…

— …Argh…
Ela soltou um gemido de sua mente enquanto pressionava suas mãos na ferida, ignorando o sangue
que manchava suas mãos.

— Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, coloque tua venerada mão sobre as feridas do teu
filho…

A oração era discreta, obstinada e sincera.

O que aconteceu naquela primeira aventura…? Eu quero que nunca aconteça de novo…

A Mãe Terra ouviu graciosamente sua súplica e tocou o braço de Matador de Goblins com seu
dedo iluminado. Foi assim que Sacerdotisa usou seu milagre remanescente.

Ele lhe dissera que distrairia o senhor goblin enquanto ela usava Proteção.

Ela já não estava perturbada com a ideia de usar dois milagres Proteção em conjunto, não para
proteger seu alvo, mas para prendê-lo. Mas ela não havia adicionado o terceiro milagre Proteção
como ele instruiu.

Talvez tenha sido uma revelação que a impediu de esgotar seus milagres. Pois se ela tivesse, a vida
desse homem — esse homem estranho, teimoso e sério — teria acabado aqui.

— …Deuses. Eu já te disse…

— Matador de Goblins, senhor!

Com a voz bruta que a alcançou, ela respondeu com lágrimas nos olhos.

— …Tolice não é o que ganha batalhas.

Matador de Goblins se sentou penosamente. Sacerdotisa o ajudou o melhor que pôde, o apoiando
sob seus braços. Ele era quase pesado demais para apoiar. Agora, ela tentou ajudá-lo a se pôr de pé.
Esforçando-se para o agarrar com seus braços esbeltos e bonitos, Sacerdotisa o apoiou no ombro e
se levantou.

— Você pode… dizer isso…

—…

— …Mas acho que… precisa ter mais cuidado…!

— É?

Ela ficou em silêncio.

— …Me desculpe.
Fungando e soluçando, Sacerdotisa balançou a cabeça veementemente.

Passo por passo lacrimosos, ela começou a andar para a frente devagar e seguramente.

Tomando o cuidado para tirar o máximo de peso sobre ela quanto pudesse, Matador de Goblins
disse calmamente: — Foi porque eu confio em você.

Sacerdotisa sorriu através das lágrimas que escorriam pelas suas bochechas. — …Você realmente
não tem jeito, não é?

Ela pensou em seus companheiros que haviam morrido em sua primeira aventura juntos. Ela
pensou nos aventureiros que estavam sangrando e morrendo nesse momento. Ela pensou nos
goblins que foram mortos. Ela pensou no senhor goblin que morreu na sua frente.

Enquanto todas essas coisas rodavam em sua mente, ela tomou consciência do peso do homem
apoiado nela. Era tudo o que ela podia fazer para mantê-lo com seu corpo exausto.

Ela avançava com um passo penoso de cada vez, mal se movendo. Os sons da batalha estavam
longe, e as luzes da cidade ainda mais.

Mas, a cada passo, seu coração se alegrava.


— Pela nossa vitória, pela fazenda, pela nossa cidade, pelos nossos aventureiros…

Alta-Elfa Arqueira olhou em volta, para todos os seus aliados que se reuniam na guilda, cada um
com seus diversos ferimentos.

— …e pelo esquisito que está sempre falando de goblins! Viva!

Um grande grito surgiu da multidão, e todos esvaziaram seus copos. Esse era o quinto ou sexto
brinde, mas ninguém se importava. Eles vieram para a guilda praticamente antes de o sangue da
batalha secasse, e eles estavam bobos com a vitória.

E que vitória foi.

Uma centena de goblins destruídos. Os goblins possuíam xamãs, campeões e tudo mais ao seu
lado, e ainda não foram páreos para os aventureiros.

É claro, os aventureiros não haviam escapado ilesos. Houve mortos e feridos. Há sempre aqueles
apanhados pela má sorte. Assim, a agitação aqui não era apenas em comemoração à vitória, mas
também em memória dos amigos caídos. Todos que se aventuram sabiam que amanhã poderia ser
eles.

Quando a batalha acabou, Vaqueira e seu tio também foram pegos pelas festividades, e a festança
aumentou rapidamente e se propagou.

Ele — como sempre — estava sentado em um banco no canto perto da parede.

Seu braço esquerdo estava enfaixado contra o peito, mas a dor parecia ter desaparecido. Ele
observava a festa no reflexo sobre a superfície brilhante de uma peça de ouro.

Anão Xamã havia preparado seu estoque pessoal de vinho de fogo, e estava o compartilhando em
volta. Mais de um novato acabou embriagado antes de ter virado um copo inteiro.

Próximo ao anão, um guerreiro dragãodente, sob o controle de Lagarto Sacerdote, realizava uma
dança bizarra aclamada.

Garota da Guilda corria como uma cachorrinha animada. Quando Lanceiro chegou até ela, Bruxa
lhe deu um golpe forte com seu cachimbo.

— Taverneiro! Sou uma mulher rica essa noite! Continue assim!


— Carne! Traga carne! No ponto!

— Você não disse que sairia comigo? Hã? Que tal ir conhecer meus pais na volta de casa…?!

— Uau! Quantos copo já bebeu?

— Muuuuito bem! Se juntem a mim para uma bebida… precisamente hoje!

— Oh, que tal um antídoto para se proteger da ressaca?

— …Um, por favor.

Ele semicerrou um pouco os olhos.

Ele limpou todo o ninho de goblins, mas do exército mesmo, ele matara só o senhor.

Daí a sua recompensa: uma peça de ouro.

Ele pressionou a peça na palma de Sacerdotisa, que se sentava ao seu lado. Mais cedo, ela esteve
sorrindo intensamente, mas conforme a festa avançou, ela descansou a cabeça no ombro dele, e
agora estava respirando levemente durante o sono.

— Ela deve ter lutado muito.

Do outro lado da jovem, ela (Vaqueira) acariciava o cabelo de Sacerdotisa. Ela limpou um pouco
de sujeira da bochecha de Sacerdotisa, em um gesto que lembrava a de uma irmã mais velha
cuidando de sua irmã mais nova. — Ela é só uma menina. Não a faça se sobrecarregar, está bem?

— Sim. — Ele assentiu calmamente. Vaqueira franziu os lábios.

— Você não está de bom humor. — Ela pausou. — Aconteceu alguma coisa?

— Não é nada — disse ele, balançando ligeiramente a cabeça.

— Como sempre.

— …Sério?

Os dois ficaram calados, observando os aventureiros. Os vencedores reunidos bebiam, comiam,


riam e celebravam. Tanto os feridos quanto os ilesos. Aqueles que se distinguiram especialmente e
aqueles que não. Todos os sobreviventes aproveitavam o que ganharam com essa aventura.

— …Obrigada — sussurrou ela para ele.

— Pelo quê?
— Por nos salvar.

— …Eu não fiz nada — disse ele bruscamente.

O silêncio retornou entre eles. Não era desconfortável. Cada um deles sabia o que o outro estava
pensando.

— Ainda não…

— Hmm? — Ela inclinou sua cabeça com seu sussurro reprimido.

— Ainda não acabou…

— Talvez. Mas isso é alguma coisa.

Ela esperou ele responder.

Ele pensou e pensou, e então disse lentamente, com hesitação: — Eu suponho… eu acho que
quero… me tornar um aventureiro.

— É?

Para ela, ele parecia ter dez anos de idade outra vez. Mas, ao contrário de quando tinha oito anos,
dessa vez, ela podia responder com um sorriso e um aceno incentivador. — Tenho certeza de que
consegue.

— Acha?

— Sim, acho.

Pode não ser até o longínquo dia em que não houvesse mais goblins, mas…

— Mm… ha… aah? — Naquele momento, Sacerdotisa se mexeu. Suas pálpebras se abriram. —
Hum, o qu…?! E-eu adormeci…? — perguntou ela, com o rosto vermelho-vivo. Ao vê-la, ela
(Vaqueira) riu.

— Ha-ha-ha. Todo mundo lutou tanto hoje. Não podemos te culpar por querer tirar uma
sonequinha.

— Oh, ahh, hum… Me d-desculpe…

— Não me importo.

— Muito bem. Tenho que ir agradecer algumas pessoas. — Com mais uma afagada carinhosa no
cabelo de Sacerdotisa, Vaqueira se levantou. O “vá com calma hoje” que ela soltou quando partiu,
suscitou um aceno dele, e um rubor e uma olhadela para o chão de Sacerdotisa.
— …Você está bem? Não vai se juntar aos outros?

Sacerdotisa balançou a cabeça. — Estou bem. — Ela pausou. — Estou… aproveitando sozinha.

Não, não está bem… Não sei por que, mas isso não pode continuar…

De repente, Sacerdotisa bateu as mãos. Essa era outra coisa que aprendeu com Matador de Goblins:
muito melhor agir no momento, do que encontrar uma estratégia perfeita depois do ocorrido.

— So-sobre você, Matador de Goblins, senhor? Está tudo bem?

— Com o quê?

— Com o… dinheiro ou… qualquer coisa?

— Nenhum problema. — Foi uma mudança brusca de assunto, e independentemente de Matador


de Goblins reconhecer ou não, ele assentiu. — Compensei todos como combinamos.

Ela lhe deu um olhar interrogativo.

— Eu paguei uma rodada de bebidas.

— Ah. — Sacerdotisa colocou inconscientemente a mão na boca. Seu olhar acabara assim de cair
sobre Lanceiro, que estava retirando a rolha de outra garrafa de vinho fino. Ao lado dele, Bruxa
estava saboreando seu primeiro copo de vinho de alta classe.

Ele deve saber, certo? Certamente. Provavelmente.

— …Você é inteligente, não é?

— O mercado decidiu que o extermínio de goblins não vale muito.

— E isso está certo?

— Acho que sim.

— De qualquer forma — murmurou ele — a guilda está pagando a recompensa de agora. — Não
lhe custou nada.

Ela olhou para ele com os olhos entreabertos. Ele realmente não parecia incomodado. Claro,
Sacerdotisa não estava falando realmente sério, tampouco. Era só um gracejo. Ela se sentiu
flutuando. Seu coração acelerou. O sangue se apressou pelo corpo.

— Matador de Goblins, senhor…

— Sim?
— Por que você não…? Digo, por que não publicou uma missão normal?

Era aquelas teatralidades na guilda realmente necessárias? Não teria sido suficiente publicar uma
missão normalmente? Essas eram as perguntas em sua mente.

Matador de Goblins ficou em silêncio.

— Se não quer responder, está… está bem… — acrescentou apressadamente ela.

O silêncio se esticou por mais um momento.

— Não havia razão importante — disse ele balançando a cabeça. — Só… quando aconteceu
comigo, ninguém veio.

Ele olhou para a multidão de aventureiros bem bêbados. Aqueles que se apressaram a se juntar a
ele, aqueles que arriscaram suas vidas para matar os goblins.

E aqueles que não haviam voltado, que morreram.

— Era possível que ninguém viesse dessa vez também. Não há promessas. Só sorte.

Essa foi a sua única razão. Ele murmurou: — E porque, ouço, que sou “esquisito”.

Então, o capacete de aço ficou silencioso mais uma vez. Sacerdotisa suspirou.

Esse cara realmente não tinha jeito.

Então ela lhe disse: — Você está errado. Se pedir minha ajuda, vou te ajudar.

— Não seja estúpida.

— Não só eu, também. Todos os aventureiros nessa cidade… todos eles.

No fundo de seu coração, ela suspirou. Ele realmente não tinha absolutamente jeito.

— Da próxima vez também. E depois dessa. Sempre que precisar de ajuda, eu vou estar aqui.
Estaremos aqui.

No fundo de seu coração foi onde ela também encontrou suas próximas palavras.

— Então… então sorte não tem nada a ver com isso. — Então ela sorriu, um sorriso tímido que
surgiu como uma flor desabrochando.

— É mesmo? — murmurou ele, e ela disse “Sim, é”, inflando um pouco seu peito.
Agora… agora ela poderia dizer isso, não poderia?

Seu coração batia forte em seu peito. Ela apertou seus punhos e soltou o fôlego.

— Diga, Matador de Goblins, senhor…

Ela deveria estar bêbada. A bebida a fez fazer isso. Sim, isso serviria como desculpa.

— Eu sei que é um pouco tarde, mas… eu poderia pedir por uma recompensa também?

— Que recompensa?

Por favor, oh, por favor, Mãe Terra, me dê coragem…

A coragem de dizer as palavras que lhe diria o que ela queria.

Ela inspirou, expirou. Ela olhou diretamente para ele.

— Por favor, me deixe ver seu rosto. Seu verdadeiro rosto.

Ele não disse nada por um longo momento.

Com isso, ele suspirou quase em resignação, e pôs as mãos em seu capacete.

Ele soltou as travas e removeu o elmo, e depois de uma longa batalha, lá estava ele, sob as luzes do
salão.

Sacerdotisa riu baixinho e assentiu, sem fazer nenhum esforço para esconder suas bochechas
vermelhas.

— Eu acho que você parece… ainda mais corajoso assim.

— Acha?

Foi naquele momento, enquanto ela concordava, que um grito atravessou o ar.

— Ahhhh!! Orcbolg, você tirou seu capacete?! Não é justo! Eu nunca tive a chance de ver o seu
rosto! — O rosto de Alta-Elfa Arqueira estava vermelho-vivo. Ela estava apontando o dedo para
ele, e suas orelhas tremiam loucamente.

— O quê?!

— O que você disse?!


Nenhum dos outros aventureiros perderam o que havia acontecido. Afinal, seus poderes agudos de
percepção eram a chave para sua sobrevivência.

Naturalmente, os foliões se pressionaram para vê-lo, ainda segurando suas bebidas, sua comida.

— O-o qu-quuu…? Incrível! Que oportunidade!

— Você acha? Parece que sim. Ele provavelmente só tira esse capacete quando está dormindo ou
quando quebra…

— Oh-ho! Bem, é assim que um guerreiro deve parecer!

— Eu não tinha esperado menos de você, Corta-barba. Você tem uma boa aparência.

— Hã…? Sinto que o conheço de algum lugar… Pfft! Deuses. Não suporto esse rosto.

— Hee-hee. Eu sabia, que deveria ser… bastante bonito, debaixo dessa armadura.

— Espera, esse é o rosto de Matador de Goblins?!

— Ei, me traga os livros que mantivemos essas apostas!

— …Isso quer dizer que os espíritos malignos voltarão amanhã?

— Droga, e eu que apostaria tudo que era uma mulher naquela armadura!

— Eu pensei que ele deveria ser um goblin…

— Eiii, alguém adivinhou corretamente? Venha aqui e receba!


Ele foi empurrado por sua família adotiva, amigos e camaradas de armas — pessoas que ele
conhecia e pessoas que ele nunca conheceu — todos tentando dar uma olhada melhor nele. Ao lado
dele, Sacerdotisa, que foi apanhada com ele no empurra-empurra, estava perturbada. Ela olhou para
ele por ajuda.

Estava barulhento, animado e descontrolado.

Amanhã, as coisas provavelmente voltariam ao normal.

Nada mudaria. Nada mesmo.

Exceto…

“Da próxima vez também. E depois dessa. Sempre que precisar de ajuda, eu vou estar aqui.
Estaremos aqui.”

— É mesmo…?

“Então… então sorte não tem nada a ver com isso.”

— Espero… que seja verdade.

E com essas palavras, mesmo bem ligeiramente, ele sorriu.

Era uma vez, em um tempo em que as estrelas no céu brilhavam muito menos que agora…

Os deuses da luz, da ordem e do destino competiam com os deuses da escuridão, do caos e do


acaso para ver quem controlaria o mundo. Essa competição ocorreu não em batalha, mas em um
jogar de dados.

Ou melhor, muitas, muitas jogadas. Uma e outra e outra vez eles jogavam os dados.

E houve vitórias e houve derrotas, mas nenhuma resolução.

Por fim, os deuses se cansaram dos dados. Imediatamente, eles criaram muitas criaturas para serem
suas peças de jogo, e um mundo no qual jogar. Humanos, elfos, anões, homens-lagarto, goblins,
ogros, trolls e demônios.

Por vezes eles se aventuravam, eles obtinham vitórias, sofriam derrotas, encontravam tesouro ou
felicidade, e finalmente morriam.

Os deuses, os observando, por sua vez ficavam felizes e tristes; eles riam e choravam.
Com o tempo, os deuses mais inesperadamente vieram a desfrutar dos feitos de suas peças de jogo,
para amar verdadeiramente o mundo que criaram. Foram as suas devoções a esse mundo que
inicialmente mostraram aos deuses que eles possuíam corações.

É verdade, os dados às vezes vão mal, e falhas vêm, mas é assim que as coisas são.

Nesse mundo, apareceu um aventureiro em particular.

Ele não era um rapaz excepcional. Sua inteligência não o distinguia, nem seus talentos, nem sua
origem, nem seu equipamento, nem nada.

Ele era apenas um guerreiro humano, como você poderia encontrar em qualquer lugar.

Todos os deuses gostavam dele, mas isso não pressagiava grandes coisas.

Ele não salvaria o mundo.

Ele talvez sequer mudaria nada.

Afinal, ele era apenas mais um peão, como você poderia encontrar em qualquer lugar…

Mas esse aventureiro era um pouco diferente dos outros.

Ele era extremamente cuidadoso, sempre pensando em planos, deliberando, treinando, sem deixar
passar nenhuma oportunidade.

Ele não deixava os deuses jogarem os dados.

Ele não precisava de uma origem, talento ou trapaças.

Tais coisas eram como porcaria para ele.

Até os deuses eram irrelevantes em seus olhos.

Mas um dia, os deuses perceberam uma coisa.

Ele não salvaria o mundo.

Ele talvez sequer mudaria nada.

Afinal, ele era apenas mais um peão, como você poderia encontrar em qualquer lugar.

Mas ele não deixaria os deuses jogarem os dados.

Assim, até mesmo os deuses não sabiam qual seria o destino desse aventureiro.
Sua luta contínua em algum lugar até agora.
Posfácio

Olá, pessoal. Kumo Kagyu aqui.

Esse livro não é perfeito, mas coloquei tudo o que possuía nele. Se você desfrutou de ler, ficarei
muito feliz.

Quero começar com algo muito importante:

O aventureiro representado nesse livro teve uma grande quantidade de treinamento. Por favor, não
tentem isso em casa (sem a autorização de seu mestre de jogo).

O “esquisito” conhecido como Matador de Goblins surgiu de uma pergunta simples: como seria um
mundo de fantasia que fosse o lar de um aventureiro que só caçasse goblins? A partir dessa
pergunta veio uma semente, e continuei escrevendo a partir dessa semente até que tivesse um
trabalho inteiro nas mãos, e agora esse trabalho se transformou em um romance…

Ao longo dos dois anos em que levou para esse livro ver sua publicação, minha vida esteve cheia
de pessoas que só poderiam estar aqui pelo destino ou talvez por uma sorte extremamente boa:

A todos aqueles que estiveram interessados nas sementes plantadas por essa primeira questão.

A todos aqueles que me encorajaram a transformar essas ideias em um romance.

A todos aqueles que revisaram o romance.

Sem cada um de vocês, eu não estaria onde estou agora. Obrigado. Do fundo do meu coração,
obrigado.

Eu nunca poderia ter sonhado que esse livro seria levado para uma versão em quadrinhos, antes
mesmo de ser publicado. Se a vida é como uma caixa de chocolate, eu certamente nunca saberia
que conseguiria isso.

Por falar em coisas incríveis:

Existe um tipo de jogo denominado como jogo de interpretação de papéis (RPG) ou “RPG de papel
e caneta”, porque você os joga com uma caneta, papel e dados. Eu já joguei RPG de mesa há mais
de dez anos e continuarei a jogá-los em um futuro próximo; e aqui consegui escrever um romance
sobre eles. Meu primeiro romance, nada menos. Se eu fosse voltar no tempo e dizer ao meu eu
mais novo que as coisas seriam desse jeito, ele nunca acreditaria em mim.

Aos muitos personagens dos jogadores que viveram e morreram, aventurados e aposentados: eu
não poderia ter feito isso sem tudo o que eu aprendi com vocês. Vocês têm minha profunda
gratidão.

Eu não tive a oportunidade de escrever agradecimentos até agora, e existe mais pessoas a quem
quero agradecer do que consigo contar…
Primeiro, a todos os leitores da versão online desse livro. Vocês estiveram lá para mim quando
tudo começou.

A todos os amigos envolvidos na criação desse livro, obrigado por seu encorajamento e suas
críticas. Seus esforços ajudaram a fazer desse livro o que ele é.

A todos os que jogaram comigo na última década, obrigado. Vamos matar zumbis de novo algum
dia.

A Noboru Kannatuki, meu maravilhosamente talentoso ilustrador: todos os personagens são


adoráveis. Iupi!

A Kousuke Kurose, que é responsável pela versão em quadrinhos do livro: muito obrigado por
assumir esse projeto.

Ao editor que me deu tanta orientação e a toda equipe editorial da GA Bunko.

A todos que eu nem sequer conheci, que trabalharam para publicar e promover esse livro:
obrigado.

A Steve Jackson, Ian Livingstone, Gary Gygax, Dave Arneson, Ukyou Kodachi e Kiyomune
Miwa. Sorcery!, Dungeons & Dragons e Chaos Flare mudaram minha vida.

E, finalmente, a todos os que leram esse livro: muito obrigado. Espero conhecê-lo um dia, mal
posso esperar.

Até a próxima vez! Kumo Kagyu

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