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Os Precedentes Judiciais nos

Estados Unidos: Apontamentos


para uma Comparação
José Jesus Cazetta Júnior'

1. Em todos os países do common law, tal como ocorre entre nós, a função dos
órgãos jurisdicionais de primeira instância é aplicar normas e resolver controvér-
sias. 2 Mas nos Estados Unidos e na Inglaterra a teoria jurídica admite que os Tri-
bunais dotados de competência recursal cumpram, ordinariamente, duas funções
distintas: (a) julguem e, se isso for necessário, (b) criem normas gerais e dotadas de
abstração, i.e., passíveis de sucessivas aplicações a todos, sempre que se repitam
hipóteses similares às dos fatos principais da causa. 3
Essa missão normativa foi focalizada por John W. Salmond em uma passagem
clássica:

uÉ bem verdade que, em geral, o dever das cortes é jus dicere e não jus
dare; entretanto, de fato e de direito, elas realmente possuem estas duas
funções. Os precedentes criativos são o resultado do exercício intencional,

I Promotor de Justiça em São Paulo. Doutor em Direito Processual Civil pela USP.
2 Geralmente se diz que esta função é a única. Cf.. p. ex .• Ana Laura Magaloni Kerpel. EI precedente
constitucional en el sistema judicial norteamericano. Madrid: McGraw-Hill. 2001. p. 40-41; Paul D. Car-
rington. Daniel J. Meador e Maurice Rosenberg. ]ustice on Appeal. St. Paul: West. 1976. p. 3. Para uma
análise um pouco distinta. que identifica já na primeira instância a função de produzir antecipadamen-
te normas. com o exercício moderado de alguma predição. em auxílio à função normativa das Cortes
superiores e desde que isso não implique a desconsideração de precedentes vinculantes. cf. Evan H.
Caminker. Precedent and Prediction: the Forward-Looking Aspects of Inferior Court Decisionmaking.
Texas Law Review. v. 73. nº 1. novo 1974. p. 1-82.
l Para Mauro Cappelletti. a produção judicial de normas é um aspecto inevitável de qualquer tipo de
julgamento. que atinge seu grau máximo no controle jurisdicional das leis. Cf. I..:attività e i poteri dei
giudice costituzionale in rapporte con iI loro fine generico: natura tendenzialmente discrezionale
dei prowedimento di attuazione della norma costituzionale. Scritti giuridici in memoria di Piero Calaman-
drei. V. m. Padova: Cedam. 1958. p. 83-164.
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pelas cortes, do seu privilégio de desenvolver o direito ao mesmo tempo


em que o aplicam."4
Para a efetividade dessas duas funções, a estabilidade é um valor relevante. 5
Quando tem por objeto a própria decisão - que se torna, em princípio, imutável-,
fala-se em res judicata. 6 Quando concerne aos seus motivos essenciais e ao impacto
normativo que terá para a comunidade (especialmente em futuros julgamentos,
entre outros contendores), o fenômeno é designado como stare decisis.7
Cabem, entretanto, duas observações quanto a essa terminologia:
a) originalmente, a expressão res iudicata (ou res judicata) também abrangia
o significado atual de stare decisis;8
b) a frase stare decisis só é empregada para designar o vínculo que o julga-
mento produz para os próprios juízes e Tribunais: não os que derivam
para outras autoridades. 9
1.1 O stare decisis - ou seja, a força vinculante dos precedentes para os juízes -
tem o seu centro de gravidade no princípio da universalização,lo segundo o qual
casos similares devem ser tratados de modo análogo. II A esse princípio ético se as-

4 No original: "While it is quite true that the duty of the couns is in general jus dicere and not jus
dare, nevenheless they do in fact and in law possess both these functions. Creative precedents are the
outcome of the intentional exerci se by the couns of their privilege of developing the law at the same
time that they administer it" (The Theory of Judicial Precedents. The Law Quarterly Review, v. 16, nO
LXIY, oct. 1900, p. 379); cf., no mesmo sentido, Edward Allan Famsworth, An introduction to the legal
system of the United States, 3. ed. New York: Oceana, 1996, p. 50-51; Gian Antonio Micheli, Contributo
alio studio della formazione giudiziale dei Diritto: "Case Law" e "Stare Decisis" (1938). Opere Minori
di Diritto Processuale Civile, v. 1, Milano: Giuffrê, 1982, p. 3-79.
s Cf. Oliver P. Field, The effect of an unconstitutional statute (1935), Washington, BeardBooks, 1999,
p. 150 e ss. Contudo, a estabilidade não é um fim em si e deve ser objeto de uma ponderação com
outros valores, entre os quais a necessid:ide de manter o sistema flexível para as mudanças sociais e
econômicas. Cf. Roscoe Pound, What of stare decisis? Fordham Law Review, v. X, nº I, 1941. p. 1-13.
6 Cf. Roben von Moschzisker, ResJudicata, Yale Law journal, v. 38,1928-1929, p. 299-334; Edward W.
Cleary, ResJudicata Reexarnined, Yale Law jouma!, v. 57, 1948, p. 339-350; Allan D. Vestal, PredusionIRes
Judicata Variables: Parties, In: Iowa Law Review, v. 50, 1964-1965, p. 27-76; e idem, PreclusionIResJudica-
ta Variables: Nature ofthe Controversy, Washington University Law Quarterly, April1965, nO 2, p. 158-192.
7 Michael Zander observa que a expressão mais exata é "stare rationibus decidendis". Cf. The Law-
Making Process, 4. ed., London, Butterwonhs, 1994, p. 190. A locução resumida "stare decisis" é deri-
vada da máxima latina "stare decisis et non quieta movere", que - segundo Edward D. Re - significa
"mantenha-se a decisão e não se disturbe o que foi decidido" (Cf. Stare Decisis, Trad. de Ellen Gracie
Northfleet, Revista de Informação Legislativa, ano 31, nO 122, maio/jul. 1994, p. 282). O sentido, de
acordo com a famosa definição de Henry Campbell Black, é este: "to adhere to precedents, and not to
unsettle things which are established" (em tradução livre: aderir aos precedentes e não alterar o que se
tomou assente). Cf. Black's Law Dictionary, 6. ed. St. Paul, Minn., West Publishing, 1990, p. 1406.
8 Cf., sobre esse uso arcaico, G. R. Dolezalek, "Stare Decisis": Persuasive Force of Precedent and Old Au-
thority (12" - 20" Century), Cape Town, University of Cape Town, 1989, p. 20, nO l.
9 Cf. James Hardisty, Reflections On Stare Decisis. Indiana Law journal, v. 55, nº I, p. 4l.
lO Para uma discussão aprofundada desse fundamento, cf. David Lyons, Formal Justice and Judicial
Precedent. In: Vanderbilt Law Review, v. 38, nO 3, April1985, p. 495-512; Theodore M. Benditt, The Rule
ofPrecedent. Laurence Goldstein (Org.). Precedent in Law, Oxford, Clarendon Press, 1987, p. 89-106; Neil
MacCormick, Why Cases Have Rationes and What These Are. In: Laurence Goldstein, ob. cit., p. 155-182.
II Cf. Jed I. Bergman, Putting Precedent in its Place: Stare Decisis and Federal Predictions of State
Law. Columbia Law Review, v. 96, 1996, p. 982.
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sociam outros fins políticos: (1) tornar os julgamentos racionais e previsíveis; (2)
proteger a confiança que as decisões anteriores tenham gerado, inclusive quanto
à imparcialidade do sistema judiciário; (3) permitir que os Tribunais focalizem,
gradualmente, questões novas. 12
A doutrina opera em duas dimensões: (a) a horizontal e (b) a vertical.B A
primeira significa a obrigatoriedade de um precedente para a corte que o criou. A
segunda exprime a força obrigatória para os Tribunais de menor hierarquia. 14

1.2 A vinculação horizontal é um aspecto diretamente ligado ao adequado


exercício da função de criar normas de aplicação geral e de proteger sua vigência
(nomofilaxia) .
Convém fazer, aqui, algumas distinções:

a) embora demonstre, na prática, uma forte tendência a mantê-los, 15 a Su-


prema Corte dos Estados Unidos sempre se atribuiu muita liberdade
para a desconsideração dos seus precedentes,16 especialmente em ques-
tões constitucionais;17

12 Cf., inclusive para indicação de outros fins, Lief H. Carter e Thomas F. Burke, Reason in Law, 6. ed.
New York, Longman, 2002, p. 29-30; Henry Campbell Black, The principie of stare decisis, The Ameri-
ean Law Register, v. 34, 1886, p. 745-757; Henry Campbell Black, The doctrine of stare decisis. The Bar,
v. 23, 1916, p. 312-317; Henry M. Hart Jr. e Albert M. Sacks, The legal process: basie problems in the making
and applieation of law, ed. revista por William N. Eskridge Jr. e Philip P. Frickey, Westbury, Foundation,
1994, p. 568-70; Lewis E Powell Jr., Stare decisis and judicial sei f restraint, Washington and Lew Law
Review, v. 47, nº 2,1990, p. 281-290; Henry Paul Monaghan, Stare decisis and constitutional adjudica-
tion, Columbia Law Review, v. 88, 1988, p. 723-773.
13 Enrique Alonso Garcia nega essa dimensão vertical, dizendo que o princípio do stare decisis implica
apenas que um Tribunal deve seguir o seu próprio precedente em um caso análogo: a vinculação dos
tribunais inferiores seria mera derivação da hierarquia judicial (cf. La interpretación de la Constitución,
Madrid, Centro de Estudios Constitucionales, 1984, p. 165-166). Essa restrição também é feita por
outros escritores (cf., p. ex., Oliver P. Field, The effeet of an uneonstitutional statute, cit., p. 163), mas
quase todos não a acolhem. Cf., p. ex., Aulis Aamio, On the Predictability of Judicial Decisions. In:
Matti Hyvarinen e Kauko Pietilã (Org.). The Institutes We Live By, Research Institute for Social Sciences,
University ofTampere, 1997, p. 208; James Hardisty, Reflections On Stare Decisis, Indiana Law Joumal,
v. 55, nº 1, p. 46-47; LiefH. Carter e Thomas F. Burke, ob. cit., p. 29; Lewis A. Kornhauser, Adjudica-
tion by a resource-constrained team: hierarchy and precedent in a judicial system, Southem Califomia
Law Review, v. 68, 1994-1995, p. 1608-1624.
14 Cf., para uma comparação entre a concepção inglesa e a norte-americana, Arthur L. Goodhart, Case
Law in England and America, ComeU Law Quarterly, v. Xv. nº 2, Feb. 1930, p. 173-193.
15 Cf. Blaustein e Field, Overruling Opinions in the Supreme Court, Miehigan Law Review, v. 57, 1958,
p. 151.
16 Cf., para uma proposta de maior rigidez em todos os precedentes que não versem sobre a Consti-
tuição, Lawrence C. Marshall, "Let Congress do it": the case for an absolute rule of statutory stare
decisis, Miehigan Law Review, v. 88, 1989-1990, p. 177-238. Essa idéia foi combatida por William Es-
kridge, The case of the amorous defendant: criticizing absolute stare decisis for statutory cases, Miehi-
gan Law Review, v. 88, 1989-1990, p. 2450-2466, e houve réplica: Lawrence Marshall, Contempt of
Congress: a reply to the critics of an absolute rule of statutory stare decisis, Miehigan Law Review, v. 88,
1989-1990, p. 2467-2479.
17 Cf., para uma análise histórica dessa distinção e para o seu aprofundamento, Thomas R. Lee, Stare
decisis in historical perspective: from the founding era to the Rehnquist Court, Vanderbilt Law Review,
Os Precedentes Judiciais nos Estados Unidos 189

b) as Cortes de Apelação consideram-se vinculadas, em princípio, aos pró-


prios precedentes (ainda que atuem de um modo bastante pragmático e
não tão formalista quanto as Cortes inglesas);lS
c) em todos os Tribunais que estão no nível mais baixo da hierarquia judi-
ciária, justamente porque não lhes compete criar normas gerais, não há
essa dimensão horizontal do stare decisis. 19

A maior liberdade da Suprema Corte para se afastar, justificadamente, dos


precedentes relativos à aplicação da Constituição também é preconizada por mui-
tos escritores. 20 Essa posição tem, entretanto, os seus opositores e foi objeto, p.
ex., de uma crítica severa por Herbert C. Kaufrnan, para quem decisões em maté-
ria constitucional deveriam ter força vinculante similar à de qualquer precedente.
Segundo esse autor, as mudanças na interpretação da Constituição geram incer-
teza e os mesmos inconvenientes que a doutrina do stare decisis pretende evitarY
Mas o argumento é rebatido, com vantagem, por Edward H. Levi:

"A liberdade que a Corte tem para abandonar sua prévia leitura da
Constituição é um reconhecimento da primazia do documento. Concedido
à Corte o direito e o dever de interpretá-lo, não lhe foi dado o dever ou a
oportunidade para reescrever suas palavras. Pode decidir casos com base
em sua interpretação das palavras, mas se a análise do raciocínio por exem-
plos tem algum significado, é o de que uma corte posterior pode aceitar o
resultado naqueles casos, mas justificá-los com uma diferente teoria. E o
valor da atividade de uma corte, em contraste com a atuação de uma As-
sembléia Constituinte ou de uma legislatura, é que os assuntos são consi-
derados passo a passo. "22

v. 52, 1999, p. 703 e ss; Caleb Nelson, Stare decisis and demonstrably erroneous precedents, Virginia
Law Review, v. 87,2001, p. 1-84.
18 Cf. P. S. Atiyah e Robert S. Summers, Fonn and substance in Anglo-American law: a comparative study of
legal reasoning, legal theory, and legal institutions, Oxford-New York, Oxford-Clarendon, 1987, p. 118-133;
Karl Nickerson L1ewellyn, The bramble bush: on our law and its study, 2. ed. New York, Oceana, 1991, p.
156-159; Raimo Siltala, A theory of precedent: from analytical positivism to a post-analytical philosophy of Iaw,
Oxford - Portland, Hart, 2000, p. 123-126.
19 Cf. Jed I. Bergman, ob. cit., p. 983, nota 74; Lewis A. Kornhauser, ob. cit., p. 1609 e 1628; Ugo
Mattei, Precedente Giudiziario eStare Decisis, Digesto del/e Discipline Privatistiche, Sezione Civile, XIV,
Torino, UTET, 1996, nº 3, p. 149; Ana Laura Magaloni KerpeI. ob. cit., Madrid: McGraw HiII, 2001,
p.41-42.
20 Cf., a propósito, o voto dissidente do Justice Brandeis em Burnet v. Coronado Oil & Gás Co.,
285 U.S. 393, 406-8 (19832); também: E. A1lan Farnsworth, ob. cit., p. 57; Edward Corwin, Judicial
Review in Action, University of Ptnnsylvania Law Review, v. 74, 1925-1926, p. 650; Edward H. Levi, An
Introduction to Legal Reasoning, The University ofChicago Law Review, v. 15, nº 3, Spring 1948, p. 541-
543; William Douglas, Stare Decisis, Columbia Law Review, v. 49, 1949, p. 735-758; Note, Constitu-
tional Stare Decisis, Harvard Law Review, v. 103, 1989-1990, p. 1344-1362.
li Cf. A defense of stare decisis, The Hastings Law Journal, v. lO, 1958-1959, p. 283-289.
22 No original: "The freedom which the Court has to abandon its prior reading of the Constitution
is a recognition of primacy of the documento Granted the right and the duty of the Court to interpret
190 Revista de Direito Administrativo

1.3 A vinculação vertical apresenta algumas nuanças. Na Inglaterra, a força


obrigatória do precedente do órgão de vértice (a Câmara dos Lordes) é absoluta
para as cortes inferiores. 23 Essa também é a opinião que atualmente prevalece
nos Estados Unidos a propósito da vinculação aos precedentes da Suprema Corte
FederaJ.24
Há vários contraditores, para os quais é admissível que um tribunal inferior
se negue a seguir um precedente, notadamente quando outras decisões lhe per-
mitam prever, com razoável segurança, que a regra será alterada ou abolida2s e,
sobretudo, quando o preço a pagar por uma rígida adesão ao precedente seria, nas
circunstâncias do caso concreto, alto demais, a ponto de se converter em fonte de
grave injustiça e de perda irreparável de um direito individual de especial impor-
tância. 26 Mas essa tese foi repelida pela Suprema Corte no precedente Rodriguez de
Quijas v. Shearson/American Express, Inc., no qual decidiu - sem fundamentação -,
que "se um precedente desta Corte tem direta aplicação em um caso, mas parece
se apoiar em razões rejeitadas em uma série de decisões, a Corte de Apelação deve
seguir o precedente especificamente aplicável, deixando para esta Corte a prerro-
gativa de revogar suas próprias decisões" Y

the document, it has not been given the duty or the opportunity to rewrite the words. It can decide
cases on the basis of its interpretation of the words, but if the analysis or reasoning by example means
anything, it means that a later court can accept the results in those cases but justificy them on a
different theory. And the value of the court action as opposed to action by a constitutional convention
or a legislature is that the matter can be taken one step at a time." Cf. The Nature ofJudicial Reason-
ing, The University of Chicago Law Review, v. 32, nº 3, Spring 1965, p. 404.
23Cf. Michael Zander, ob. cit., p. 199-204; John Chipman Gray, Judicial precedents: a short study in
ComparativeJurisprudence, Harvard Law Review, v. 9,1895-1896, p. 35-41.
24 Cf. Jed L Bergman, ob. cit., p. 983; Evan H. Caminker, Why Must Inferior Courts Obey Superior
Court Precedents? Stanford Law Review, v. 46, 1993-1994, p. 820, nº 9; Evan H. Caminker, Precedent
and Prediction: the Forward-Looking Aspects of Inferior Court Decisionmaking, Texas Law Review, v.
73, nº I, novo 1974, p. 71-72; Stanford Levinson, On Positivism and Potted Plants: "Inferior" Judges
aild the Task of Cor.stitutional Interpretation. Conn. L. Rev., v. 25, 1993, p. 845.
25 Cf. Note, Stare decisis in lower Courts: predicting the demise of Supreme Court precedent,
Washington Law Review, V. 60, 1984, p. 97; Ugo Mattei, Stare decisis: il valore dei precedente giudiziario negli
Stati Uniti d'America, Milano, Giuffre, 1988, p. 295-309.
26 Para o aprofundamento dessa discussão, cf. Note, Stare decisis and the lower courts: two recent
cases. Columbia Law Review, v. 59, 1959, p. 504-516; Note, Lower court disavowal of Supreme Court
precedent. Vírginia Law Review, V. 60,1974, p. 494-539; Note, The Attitude oflower courts to changing
precedents. Yale Law Journal, V. 50, 1940-1941, p. 1448-1459; David C. Bratz, Stare decisis in lower
courts: predicting the demise of Supreme Court precedent, Washington Law Review, V. 60, 1984-1985,
p.87-100.
27 No original: "If a precedent of this Court has direct application in a case, yet appears to rest on
reasons rejected in some other lines of decisions, the Court of Appeals should follow the case which
directly controls, leaving to this Court the prerogative of overruling its own decisions." Cf. Evan H.
Caminker, Precedent and Prediction: the Forward-Looking Aspects of Inferior Court Decisionmaking,
Texas Law Review, v. 73, nº 1, Nov. 1974, p. 20.
1!r ______________________________ Os Precedentes judic'als nos Estados Unidos 191
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2. Quando seja abstraído dos fatos que foram julgados e enunciado em termos
gerais, o fundamento de uma sentença é utilizável em casos futuros. 28 Na técnica
em apreço (que é bastante complexa),29 ele é convertido em uma norma e sua força
obrigatória depende (a) da efetiva necessidade de empregá-lo para o julgamento,30
(b) da corte em que se originou o precedente e (c) de sua pertinência e relevância
para a nova causa.
Para a construção de sua moderna teoria dos precedentes, os ingleses levaram
ao paroxismo a máxima Res judicata pro veritate accipitur, isto é, aquela antiga pre-
missa segundo a qual as decisões judiciais são corretas e proferidas com uma vo-
cação para a permanência. A fórmula clássica - que sintetiza a eliminação judicial
dos conflitos - nascera como um expediente técnico de proteção à autoridade de
uma sentença e para impedir que a alegação de erros pudesse provocar um novo
julgamento. Limitada às partes, ao pedido e à causa de pedir, confere estabilidade,
apenas, à parte dispositiva de uma sentença. Estendida aos respectivos fundamen-
tos, faz com que uma questão jurídica tenha, no caso presente em que é suscitada,
a mesma resposta que já recebeu em um caso anterior.
Desse modo:

a) a própria sentença cumpre uma função normativa, formulando um cri-


tério de julgamento, destinado ao caso concreto e a futuras aplicações
e que não é concebido para alcançar, simplesmente, as partes,31 mas
(potencialmente) todos os que estejam em situação semelhante;

28 Uma questão do caso concreto somente interessa à formação de precedentes se for suscetível de
um tratamento in abstracto, pois só assim poderá dar origem a uma regra passível de futuras aplicações.
Por exemplo, se o réu praticou ou não a conduta que lhe foi atribuída, é mera questão do caso concre-
to; a qualificação juridica que sua conduta receba é uma questão que comporta abstração e, como tal,
idônea para originar um precedente. Por outro lado, toda interpretação de um enunciado normativo é
necessariamente tão geral quanto este e, por isso, sempre gera precedentes. Cf. John W. Salmond, ob.
cit., p. 387-388.
29 Segundo Ana Laura Magaloni Kerpel, "formular uma regra geral, aplicável a um litígio similar,
implica dotar de certa generalidade os fatos que deram origem à disputa" (cf. ob. cit., p. 83). Essa
operação consiste, pois, em selecionar os fatos relevantes e convertê-los em uma hipótese abstrata e
geral. Cf. autora e ob. cit., p. 84; Frederick F. Schaeur, Playing by the rules: a philosophical examinarion of
rule-based decision-making in law and in life, Oxford-New York, Clarendon, p. 183; A. Simpson, The ratio
decidendi of a case and the doctrine ofbinding precedent, p. 156-159.
30 O fundamento dessa teoria, segundo John P. Dawson, é este: "O discernimento e a autoridade dos
juízes derivam de sua necessidade de se concentrar nos casos particulares que são apresentados para
sua decisão." No original: "The insight and authority of judges derive from their need to concentrate
on the particular cases that are presented for their decision." Cf. The Oracles of the Law. Ann Arbor: The
University of Michigan Law School, 1968, p. 504.
31 Isso foi bem destacado por Emilio Betti: quem participou do processo pôde influir nas premissas
lógicas da decisão; para terceiros - que não tiveram essa oportunidade - elas são juridicamente irrele-
vantes, mesmo porque a missão do juiz, quando deva decidir acerca da procedência do pedido, "não é
a de aplicar a lei substancial como norma geral e abstrata, nem de aplicá-Ia, por meio de precedentes
interpretativos, como norma regulamentar comum a todas as relações similares à litigiosa, que por-
ventura existam na realidade, ou com eficácia vinculante também quanto a outras relações que sejam
de algum modo contíguas à relação litigiosa". Mas, em nota de rodapé, o autor fazia essa ressalva: "Isso
192 Revista de Direito Administrativo

b) O poder normativo da corte se esgota, não apenas nos limites do caso


julgado, mas também para fixar os princípios e as regras de julgamento
em situações idênticas ou comparáveis.

Em teoria, isso significa que, em cada nível da hierarquia judiciária, a função


de criar normas só pode ser exercida uma única vez: em nome da coerência do
sistema, o arbitrium judieis é excluído, gradualmente, para o futuro. Ou, como está
em clássica lição de Salmond: "O desenvolvimento do direito judiciário envolve
a gradual eliminação daquela liberdade judicial à qual deve sua origem. Em qual-
quer sistema no qual precedentes têm autoridade as cortes estão ocupadas em
forjar grilhões para os próprios pés."32
Durante várias décadas (mais exatamente, entre 1898 33 e 1966),34 a segunda
conseqüência também era produzida pelos julgamentos da Câmara dos Lordes,
pois sua função normativa se consumava com a aplicação, ao caso concreto, do
princípio destinado a regê-lo. Atualmente, ela está imune a esse efeito, que só
opera nos níveis inferiores da organização judiciária inglesa. A função normativa
da Câmara dos Lordes tornou-se, assim, inexaurível, pois, embora tenha ressalva-
do que, em princípio, dará prevalência à estabilidade de suas decisões pretéritas
(inclusive na parte relativa à criação de normas), ela reconheceu a si mesma a
prerrogativa de corrigir, para o futuro, os erros de apreciação cometidos em seus
julgamentos ou, mais exatamente, de mudar de opinião, introduzindo no fun-
cionamento do Poder Judiciário um elemento de dinamismo que é similar, nesse
aspecto, à tradição do Parlamento inglês.

poderia acontecer em uma jurisdição de mero direito objetivo, como nos parece que a Magistratura
do trabalho exerce nas controvérsias concernentes à aplicação do regulamento coletivo do trabalho,
fazendo deste uma interpretação autêntica. Assim aconteceria praticamente também em um sistema de
direito costumeiro que transferisse ao juiz a criação do direito por meio de uma rede de precedentes
judiciais rigidamente observados, como na 'judge made law'." Cf. Diritto Processuale Civile Italiano, 2. ed.
Roma: Foro Italiano, 1936, p. 606.
32 No original: "The growth of case law involves the gradual elimination of that judicial Iiberty to
which it owes its origino In any system in which precedents are authorative the courts are engaged in
forging fetters for their own feet." Cf. John W. Salmond, ob. cit., p. 386.
33 A vinculação da Câmara dos Lordes aos próprios precedentes era uma forte tendência - expressa,
p. ex., em Beamish V. Beamish (1861) -, mas essa questão só foi decidida no caso London Tramways V.
London County Council (1898). Cf. Henry M. Hart Jr. e Albert M. Sacks, ob. cit., Westbury, Foundation,
1994, p. 572-576. Sobre essa autodeclaração de infalibilidade da Câmara dos Lordes, cf. John P. Daw-
son, ob. cit., p. 90-94.
34 Em 26 de julho de 1966, o então Lord Chancellor (Lord Gardiner) anunciou, no famoso Practice
Statement, que doravante a Câmara dos Lordes passaria a desconsiderar seus precedentes quando lhe
parecesse correto fazê-lo. Ressalvou, entretanto, que, normalmente, continuariam a ser tratados como
obrigatórios e que teria em conta, especialmente, os riscos da eliminação retroativa de precedentes em
determinadas matérias, nas quais a proteção da confiança e a necessidade de certeza se destacam. Trans-
postas para nossas categorias jurídicas, tais matérias dizem respeito às obrigações, aos direitos reais, ao
direito tributário e ao direito penal. C( Michael Zander, ob. cit., p. 191-193; Rupert Cross and J. W. Har-
ris, Precedent in English Law, 4. ed. Oxford: Clarendon, 1991, p. 104-108. Sobre a importância histórica
dessa declaração, pronunciada fora de qualquer julgamento, cf. John P. Dawson, ob. cit., p. 94.
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2.1 Reduzida à sua expressão mais simples, a teoria é esta: (a) todo caso
foi decidido segundo uma razão jurídica (ratio deddendi), (b) pertinente aos fatos
essenciais da causa e (c) que poderá adquirir força vinculante em situações simila-
res, (d) conforme a posição ocupada na hierarquia judicial tanto pelo tribunal em
que houve o julgamento como pela corte onde é invocado.
Por isso, um aspecto fundamental na atividade dos práticos consiste em ve-
rificar se uma proposição jurídica abstrata,35 presente em uma decisão, realmente
integra sua ratio deddendi. 36 Esta nunca é a decisão do caso concreto, mas uma
"regra geral sem a qual [... ] teria sido decidido diferentemente" .37 Logo, qualquer
raciocínio judicial que seja estranho àquele núcleo do julgamento é, por definição,
um mero dictum ou obiter dictum,38 apto eventualmente a persuadir39 e na prática
dotado de enorme influência, mas incapaz, por si, de obrigar quem quer que seja. 40
Existem muitas definições de ratio deddendi ou do seu termo sinônimo - hol-
ding (que é empregado nos Estados Unidos)Y Segundo uma fórmula muito difun-
dida, "a doutrina de um caso é uma proposição jurídica geral da qual, em conexão
com as circunstâncias do caso, a decisão logicamente resulta, e sobre a qual a
Corte baseou sua decisão, quer o tenha declarado, quer não" Y
Essa definição dá o devido destaque a alguns aspectos fundamentais:

a) uma coisa é a decisão concreta, que, ao se tornar estável, quase sempre


é imutável apenas para as partes; outra, a norma subjacente a ela, com
eficácia perante todos 43 e cuja modificação caberá ao Parlamento ou a

3S Ou uma série de proposições jurídicas com essas características. Cf. H C Black, Law ofJudicial Pre-
cedent, St. Paul, 1912, p. 40. Quando a decisão se funda em mais de uma, todas vinculam. Cf. Michael
Zander, ob. cit., p. 263.
36 Cf. John P. Dawson, ob. cit., p. 95.
37 Cf. Eugene Wambaugh, The Study of Cases: a Course of Instruction in Reading, Stating Reported Cases,
Composing Head-Notes and Briefs, Criticizing and Comparing Authorities, and Compiling Digests, Boston:
Litde, Brown and Company, 1894, p. 43.
38 A rigor, trata-se de duas espécies: dieta ou judicial dieta são os raciocínios judiciais desenvolvidos
em tomo de uma questão do caso, embora desnecessários para resolvê-los; obiter dieta, os que não te-
nham peninência com o caso. Atualmente, a segunda expressão abrange os dois sentidos. Cf. Michael
Zander, ob. cit., p. 262.
39 Uma eficácia do mesmo tipo - embora de menor grau - pode resultar das obras doutrinárias. Cf. John
W Salmond, The Theory ofJudicial Precedents, Law Quarterly Review, v. 16, 1900, nota I, p. 380.
40 Michael Zander enfatiza: "The most carefully considered and deliberate statement of law by ali five
Law Lords which is dictum cannot bind even the lowliest judge in the land. Technically he is free to
go his own way. In practive, of course, weighty obiter pronouncements from higher couns are likely
to be followed and will cenainly be given the greatest attention, but in strictest theory they are not
binding" (cf. ob. cit., p. 262-263).
41 Cf. Edward Allan Famswonh, ob. cit., p. 54, nota 15; Ugo Mattei, Precedente Giudiziario eStare De-
cisis, ob. cit., nº 8, p. 155; Ana Laura Magaloni Kerpel, ob. cit., p. 8I.
42 Cf. Eugene Wambaugh, ob. cit., p. 29.
43 É muito expressiva esta passagem de Salmond: "A decisão concreta é vinculante entre as panes,
somente a sua abstrata ratio decidendi é que tem força obrigatória para todo mundo." No original: "The
concrete decision is binding between the panies to it, but it is the abstract ratio decidendi which alone
has the force oflaw as regards the world at large." Cf. ob. cit., p. 387.
194 Revista de Direito Administrativo

uma corte superior à julgadora - normalmente, a suprema (que, por não


ter ninguém acima de si, sempre pode rever seus próprios critérios);
b) a eficácia vinculante de uma norma, extraída de um precedente, não
depende do modo, mais ou menos exato, como a decisão a exprimiu e
surge até mesmo sem uma declaração contemporânea e expressa quan-
to ao seu alcance;44
c) justamente porque uma norma cuja criação tenha sido judicial só é legí-
tima quando, para realizar o julgamento, sua produção era indispensável,
somente vinculam os princípios necessários para a decisão do caso con-
creto45 e, conseqüentemente, não têm força obrigatória as afirmações
cuja amplitude também abarca outras hipóteses, que não se concretiza-
ram no caso em julgamento e que, conseqüentemente, foram ditas de
passagem e não para o cumprimento da função de julgar. 46

2.2 A força obrigatória de um precedente se vincula à norma geral na qual


se funda o julgamento e que foi aplicada aos fatos. É aí que está a ratio decidendi.
Convém observar, no entanto, que ela é extraída por quem aplica o precedente:
o modo como é expressa, na própria decisão, não a modifica, não a limita, nem a
amplia. Por isso, o que gera o precedente não é, propriamente, a motivação, mas o
motivo da decisão (ainda que não tenham sido expostos de modo correto ou que
tenham ficado simplesmente tácitos).
Esta é uma distinção fundamental na doutrina do precedente: a que contra-
põe a (1) decision à (2) opinion. A primeira é o resultado do julgamento. A segunda
é constituída pelas palavras que cada juiz utiliza para justificar sua conclusão.
Não há como confundi-las: as razões expostas por quem decidiu nem sempre são
congruentes com a própria decisãoY

2.3 Para que a decisão de um caso constitua precedente no julgamento de


outro não é necessário que os fatos em apreciação sejam idênticos: basta que
sejam substancialmente análogos. A pertinência e a aplicabilidade são afastadas
quando haja diferenças relevantes entre eles - como a presença, tão-somente no
primeiro ou exclusivamente no segundo, de circunstâncias importantes, aptas a
influir na decisão.

44 Cf. Arthur L. Goodhart, Determining the Ratio Decidendi of a Case, Ya/e Law]ouma/, v. XL, nº 2,
Dec. 1930, p. 164-168.
4S Em tom enfático, Salmond advertiu: "A prerrogativa dos juízes não é criar o direito formulando-o e
declarando-o - isto pertence à legislatura -, mas criar o direito aplicando-o. A declaração judicial, de-
sacompanhada de uma aplicação judicial, não tem autoridade." No original: "The prerogative ofjudges
is not to make law by formulating and declaring it - this pertains to the legislature - but to make law
by applying it. Judicial declaration, unaccompanied by judicial application, is of no authority." Cf. ob.
cit., p. 388-389.
46 Cf. Edward H. Levi, The Nature of Judicial Reasoning, The University Df Chicago Law Review, v. 32,
nº 3, Spring 1965, p. 399.
47 Arthur L. Goodhart dá alguns exemplos que se tornaram célebres no direito inglês. Cf. Determi-
ning the Ratio Decidendi of a Case, Ya/e Law]ouma/, v. XL, n· 2, Dec. 1930, p. 162-163.
~--------------------------------- Os Precedentes Judiciais nos Estados Unidos 195

A doutrina do stare decisis exige que a corte encarregada do novo julgamento


confronte os fatos principais dos dois casos e, expondo os seus motivos, faça as
distinções que ela mesma considere razoáveis e idôneas para a conservação de
ambos. 48 Pouco importa que, no exercício dessa função, não adote a norma ju-
rídica com o teor e o alcance enunciado no julgamento anterior: de certo modo, a
regra pertinente muda no momento em que é aplicada. 49 Na verdade, quem deve aplicá-
la sempre pode lhe dar uma abrangência maior, menor ou diversa, precisamente
porque a declaração do critério, contida em uma decisão, nunca integra sua ratio
decidendi: é um mero dictum.
Por isso, o que interessa em um precedente não é propriamente este ou aque-
le aspecto que uma corte, ao decidir um caso, declarou importante, mas unica-
mente o que é visto, em uma nova decisão e por quem a profere, como a melhor
explicação do julgamento anterior. Em nada importando o lugar que ocupe na
organização judiciária, a vinculação de uma corte a precedentes não lhe subtrai o
dever de adotar suas próprias decisões. 50

2.4 Assim compreendido, o stare decisis não contraria o caráter dinâmico do


Direito e não impede sua consciente adaptação a novos contextos. Em primeiro
lugar, porque o método jurídico que o emprega nunca exclui o poder de fazer dis-
tinções (na verdade, pressupõe o seu exercício). Em segundo lugar, porque a corte
que os criou pode eliminá-los. Ali se trata do distinguishing;51 aqui, do overruling.
As duas técnicas convergem para manter o delicado equilíbrio entre a estabilidade
das normas jurídicas e sua permanente possibilidade de modificação. A primeira
é utilizável, indistintamente, por qualquer corteY A segunda revoga o produto de
um poder normativo e, por conseguinte, só pode ter por objeto um precedente da
própria corte ou de outra, sobre a qual ela tenha supremacia.
Há, aqui, uma gradação: a eliminação de um precedente (overruling) é excep-
cional e a ela se recorre unicamente se não couber qualquer distinção razoável
entre eles. 53

48 Cf. Edward H. Levi, The Nature of Judicial Reasoning, The University of Chicago Law Review, v. 32,
nO 3, Spring 1965, p. 400.
49 Cf. Edward H. Levi, An Introduction to Legal Reasoning, The University of Chicago Law Review, v.
15, nO 3, Spring 1948, p. 503.
5(l Cf. Carleton Kemp Allen, Precedent and Logic, The Law Quarterly Review, v. 41, 1925, p. 334;
Edward H. Levi, An lntroduction to Legal Reasoning, The University of Chicago Law Review, v. 15, nO 3,
Spring 1948, p. 502.
SI Há muitas maneiras de realizá-lo e essa técnica - que antecipa a eliminação do precedente - tende
a ser prontamente empregada quando ele tem contra si a communis opinio doctorum. Cf. Carleton Kemp
Allen, Precedent and Logic, The Law Quarterly Review, v. 41, 1925, p. 334.
52 "A descoberta da semelhança ou diferença" - como observou Edward H. Levi - "é o passo principal
[ ... ] e a função de cada juiz." O comentário está nesta passagem: "The finding of similarity or differ-
ence is the key step in the legal processo The determination of similarity or difference is the function
of each judge." Cf. An lntroduction to Legal Reasoning, The University of Chicago Law Review, v. 15, nO
3, Spring 1948, p. 502.
S3 OU, quando - em comparação com o atual - o caso anterior pareça um "case in ali four" ou "case
in paint".
196 RevISta de Direito Administrativo

3. O Common Law reconhece ao offieium judieis amplos poderes eqüitativos,


e o sistema de direito norte-americano, construído a partir dessa tradição, de-
senvolveu instituições e escolas de pensamento próprias, como a jurisprudência
sociológica e o realismo jurídico, que ainda hoje têm a adesão dos práticos 54 e cujo
traço comum é a rejeição do formalism0 55 e de sua trama sistemática de conceitos
e definições. 56
Compreende-se, pois, que o tema das fontes do direito não receba nos Estados
Unidos a atenção especial que lhe é dedicada na tradição jurídica à qual nos fi-
liamos. Não existe uma rigorosa sistematização teórica dessa matéria e, embora
esteja claro que devem aplicar os preceitos legislativos válidos, os juízes - que
gozam de um imenso prestígio - sempre se reservaram amplos poderes de inter-
pretação, que são fortalecidos pela preocupação de decidir os casos similares com
os mesmos critérios (e, por conseguinte, com a vinculação aos precedentes que te-
nham pertinência). O método de trabalho dos juízes, fortemente influenciado pela
consciência de que participam de uma obra coletiva, não é o de examinar cada caso
como se fosse inédito, mas o de procurar decidi-lo, sempre que possível, aplicando
a experiência adquirida com os julgamentos que o antecederam.
O stare deeisis não é, propriamente, uma regra jurídica, mas um princípio de
policy, que deriva de razões de justiça e conveniência, relacionadas à eficiência da
jurisdição e à estabilidade e à previsibilidade do direito. Justamente por isso é es-
sencialmente flexível: quando haja razões substanciais para uma solução diversa,
o precedente teoricamente aplicável pode ser objeto de distinções ou modificações
e, se necessário, é admissível a sua eliminação (overruling) por quem tenha auto-
ridade para isso.
Uma preocupação fundamental dessa doutrina é a de impedir alterações de
critérios caprichosas, fundadas unicamente na vontade ou na ideologia que se tor-
nou dominante: considera-se impróprio abandonar um precedente quando a única
razão para isso é a possibilidade aberta pela mudança na composição do Tribunal,
porque isso afetaria sua credibilidade e o tornaria vulnerável a pressões políticas
e sociaisY Mas, nesta altura da exposição, o importante é reter que essas técnicas

54 Ou seja. todos os que interpretam e aplicam profissionalmente o Direito. Cf. John Henry Merry-
man, Common Law: paesi di - IH) Diritto degli Stati Uniti d'America, Enciclopedia Giuridica, v. 7, Roma,
Istituto della Enciclopedia Italiana, 1988, p. 1-8.
ss Cf. Richard A. Posner, The Meaning ofJudicial Self-Restraint. Indiana Law joumal, v. 59, nº I, 1983.
p.I-6.
S6 Cf. Lawrence Meir Friedman, A History of American Law, New York: Simon and Schuster. 1973;
John Henry Merryman, Common Law: paesi di - I1I) Diritto degli Stati Uni ti d'America, ob. cit.; Julius
Stone, The Province and Function of Law, Sydney: Associated General Pub., 1946, p. 391 ss; Giovanni
Tarello, li realismo giuridico americano, Milano: Giuffre, 1962.
57 Esta questão foi amplamente debatida no caso Planned Parenthood of $outheastem Pennsylvania v.
Casey (1992), no qual a Suprema Corte - com uma nova maioria, bem mais conservadora - teve a
oportunidade de eliminar um critério muito polêmico, relativo ao direito ao aborto (o célebre Roe v.
Wade. decidido 19 anos antes). Três juízes - Sandra Day O'Connor, Anthony M. Kennedye David H.
~--------------------------------
BtIB5
Os Precedentes Judiciais nos Estados Unidos 197

exprimem um fato que caracteriza a experiência norte-americana: a responsabi-


lidade primária pelo desenvolvimento orgânico do seu direito é uma função dos
juízes - e não da doutrina 58 -, e aqueles agem coletivamente, como uma equipe,
sob a liderança (mas não a chefia) de quem esteja atuando nos níveis superiores
da organização judiciária.

3.1 Assim como ocorre no nível federal, cada Estado tem sua própria Consti-
tuição e seus próprios sistemas judiciários. Os dois sistemas - o federal e os esta-
duais - coexistem, cada qual operando no âmbito das respectivas competências. A
estrutura judiciária se articula do mesmo modo em ambos: há um primeiro grau
de jurisdição, constituído pelas cortes de primeira instância (trial courts, normal-
mente com uma composição monocrática); um segundo grau, constituído pelas
courts of appeai e um órgão de vértice (ou supreme court).
Não há uma estrutura separada de órgãos jurisdicionais especialmente com-
petentes para todas as questões de natureza administrativa e constitucional. As
cortes de primeiro grau, no exercício de sua jurisdição ordinária, julgam essas
matérias, salvo quando tenham sido atribuídas a jurisdições especiais. 59 Também
as decisões destas se sujeitam aos mesmos meios de impugnação, perante os mes-
mos juízes de segundo grau.
Contra as decisões das appellate courts somente são interponíveis recursos
sobre questões de direito 60 e há uma crescente tendência, por parte das cortes
supremas estaduais, a admiti-los somente quando os casos tenham suficiente im-
portância pública ou jurídica a ponto de merecer novas considerações. As partes
insatisfeitas com as decisões proferidas pelas cortes estaduais podem apresentar
um recurso (petition) à Suprema Corte Federal para a concessão de um writ of
certiorari, tendente ao reexame do julgamento. Dos inúmeros recursos interpos-
tos, a Suprema Corte só acolhe uma parte mínima e é esse writ of certiorari que
constitui o principal meio para que ela controle a constitucionalidade dos atos
normativos estatais.
Nos Estados Unidos todos os juízes - estaduais e federais, em qualquer grau
de jurisdição - têm o dever de examinar e decidir todas as questões pertinentes
à Constituição Federal, que as partes suscitem no curso de um processo. Uma
conseqüência dessa atividade é a "constitucionalização" do direito norte-ameri-

Souter - disseram que, se a questão tivesse surgido pela primeira vez, não teriam reconhecido o direito
em apreço, mas que, considerados os valores envolvidos e o interesse na estabilidade social, não se
justificava a eliminação da regra. Cf., sobre este caso, Adele Anzon, 11 vaiare dei precedente nel giudizio
sul/e leggi, Milano: Giuffrê, 1995, p. 47-53.
58 Cf. John Henry Merryman, Common Law: paesi di - I1I) Diritto degli Stati Uniti d'America, ob.
cit., nº 4, p. 2.
59 Cf. Henry J. Abraham, The judicial process, 7. ed., New York e Oxford, Oxford University, 1998,
p.164-168.
60 Cf. Henry J. Abraham, ob. cit., p. 157.
198 Revista de Direito Administrativo

cano. O direito processual penal, p. ex., tornou-se em larga medida uma matéria
especial do direito constitucional, pois é integrado por um conjunto de regras
jurisprudenciais extraídas da interpretação da garantia constitucional de um pro-
cesso justo (due process of law), 61 do privilégio contra a auto-incriminação (privilege
against selfincrimination), 62 da proteção contra buscas e apreensões arbitrárias,63
do direito a um julgamento célere e público,64 da presença do júri,65 do direito à
confrontação com as testemunhas,66 da proibição de infligir penas cruéis ou ex-
traordinárias etc. 67
Regras jurisprudenciais também produziram uma sensível mudança na di-
visão territorial do poder. A estrutura federal dos Estados Unidos reflete uma
origem genuinamente plural. Ao constitUÍ-lo, os vários Estados da União, sen-
do soberanos nos respectivos territórios, delegaram ao governo federal alguns de
seus poderes (principalmente, o de impor tributos, de emitir moeda, de declarar a
guerra, de celebrar tratados internacionais, de disciplinar o comércio entre eles e
com o exterior, de legislar sobre marcas e patentes, falências, direitos autorais),
reservando para si todas as outras funções de governo. Entretanto, a partir dos
anos 30 e 40 do século 20, com o apoio da Suprema Corte (que a princípio resisti-
ra),68 houve uma enorme expansão dos poderes federais, por interpretação amplia-
tiva dos spending power e commerce power (art. lº, seção 8, nº 3, da Constituição).69
Neste caso, destinaram-se à criação de um "mercado comum" e à definição das
condições para uma concorrência efetiva, isto é, foram concebidas para eliminar
todas as barreiras à livre circulação das mercadorias e ao exercício do comércio em

61 Cf. Edward S. Corwin, The doctrine of Due Process of Law before the Civil War, Harvard Law
Review, v. 24, 1910, p. 366-385 (primeira parte) e 460-479 (segunda parte); Leonard G. Ratner, The
Function of the Due Process Clause, University of Pennsylvania Law Review, v. 116, 1968, p. 1048-1116.
62 Cf. Akhil Reed Amar e Renée B. Lethow, Fifth Amendment First Principies: the Self-Incrimination
Clause, Michigan Law Review, v. 93,1994-1995, p. 857-928; os principais precedentes são indicados por
Jethro K. Lieberman, A practical companion to the Constitution, Berkeley-Los Angeles-London: University
of California, 1999, verbete self-incrimination, p. 453-455.
63 Cf. Akhil Reed Amar, The Bill of Rights as a Constitution, Yale Law Joumal, v. 100, 1991, p. 1175-
1181; os precedentes são indicados por Jethro K. Lieberman, ob. cit., verbete search and seizure e diver-
sas especificações que o seguem, p. 442-449.
64 Cf. Jethro K. Lieberman, ob. cit., verbetes prejudicial publicity; trial, faimess; trial, speedy e trial, public,
p. 364-365 e 515-518, com extensa indicação dos principais precedentes.
65 Cf. Akhil Reed Amar, The Bill of Rights ... , ob. cit., p. 1182-1199; uma clássica exposição das ori-
gens dessa instituição: James B. Thayer, The Jury and its Development, Harvard Law Review, v. 5, nO 6,
Jan. 1892, p. 249-273 (primeira parte), nO 7, Feb. 1892, p. 295-319 (segunda parte) e nO 7, Mar. 1892,
p. 357-388 (terceira parte); quanto aos precedentes, Jethro K. Lieberman, ob. cit., verbetes jury and
jurors, impartiality of e trial by jury, p. 270-271 e 518-519.
66 Cf., para os precedentes, Jethro K. Lieberman, ob. cit., verbete confrontation with witnesses, p. 113-114.
67 Cf., para uma indicação dos precedentes, Jethro K. Lieberman, ob. cit., verbetes death penalty;
punishment, criminal and civil e punishment, cruel and unusual, p. 137-138 e 401-403.
68 Cf. United States v. Butler, 297 U. S. 1 (1936).
69 Cf. Stevard Machine Co. v. Davis, 301 U.S. 548 (1937); United States v. Darby, 312 U. S. 100 (1941);
Katzenbach v. McClung, 379 U.S. 294 (1964).
~--------------------------------- Os Precedentes Judiciais nos Estados Unidos 199

todo O território nacional, bem como para garantir a livre competição, inclusive
com o combate aos monopólios.

3.2 O modelo processual norte-americano - caracterizado pela concentração,


pela oralidade e pela imediação - deve muitas de suas características ao direito
individual, garantido pela Constituição, ao julgamento pelo júri, tanto em matéria
civil quanto em matéria penal. Em princípio, o júri julga tão-somente as questões
de fat0 70 e suas decisões não são motivadas: daí a ausência, no direito processual
norte-americano, de um meio de impugnação destinado ao reexame dos fatos de
uma demanda. No jury trial, o juiz limita-se a presidir o julgamento e a decidir as
questões de direito: são essas decisões que podem ser objeto das impugnações pe-
rante as appellate courts. Como os jurados são particulares, temporariamente reti-
rados de suas ocupações profissionais, há a necessidade de concentrar a decisão da
causa em uma ou várias audiências sucessivas, nas quais as provas são exibidas, as
questões processuais resolvidas e os fatos, determinados.
Não existe uma carreira judicial nos Estados Unidos: cada Estado tem seu
próprio sistema para a seleção dos juízes; os juízes federais são nomeados pelo
Presidente, com a aprovação do Senado e em caráter vitalício. Geralmente a no-
meação consagra, em idade madura, uma brilhante carreira profissional e a posi-
ção de juiz confere prestígio e respeito. 71
A tutela jurisdicional é reforçada pela prerrogativa de impor coações pessoais
e de punir, própria do offieium judieis, que se reflete no campo administrativo, no
qual os juízes dispõem do poder de ordenar a um funcionário público que cumpra
os próprios deveres (mandamus) ou de proibir-lhe que pratique atos ilícitos (prohi-
bition ou quo warranto).

3.3 O sistema judiciário federal é composto por quatro tipos de tribunais:

a) um pequeno número de cortes especializadas, que lidam com matérias


específicas (p. ex., patentes);
b) 94 cortes distritais (federal district courts),72 que são os órgãos de primei-
ra instância (trial courts), competentes para causas cíveis e criminais em

70 A distinção entre questões de fato e questões de direito, tradicionalmente útil para a demarcação
da competência do júri, sempre foi cercada de sutilezas e sua aplicação nesse campo nunca foi abso-
luta. Cf. James B. Thayer, Law and Fact in Jury Trials, Harvard Law Review, v. 4, nº 4, Nov. 1890, p.
147-150.
71 Cf., sobre a organização judiciária none-americana, Henry J. Abraham, The Judicial Process, ob. cit.,
especialmente p. 42-51 e 54 ss.
72 90 delas estão distribuídas pelos 50 Estados; as demais estão no distrito de Colúmbia, em Pono
Rico e nos territórios federais: Guam, Ilhas Virgens Americanas (Virgin Islands) e Ilhas Marianas do
None (Nonhern Marianas Islands). Ao todo, são integradas por cerca de 600 juízes. Esses dados fo-
ram extraídos de Tyll Van Geel, Understanding Supreme Court Opinions, 2. ed., N.Y., Longman, 1997, p. 7,
e Henry J. Abraham, ob. cit., p. 172-178.
200 Revista de Direito Administrativo

que haja interesse federal (nelas, a maior parte das ações é proposta, a
prova, produzida, e o primeiro julgamento, realizado);
c) 13 cortes de apelação (U.S. eourts of appeal), i. e., os órgãos de segunda
instância, cuja competência, limitada territorialmente, também é cumu-
lativa (i. e., para causas cíveis e criminais);73
d) a Suprema Corte dos Estados Unidos (United States Supreme Court), com-
posta por nove Ministros (um dos quais, seu Presidente) e doravante
designada simplesmente como Suprema Corte.

Em matéria penal, há uma infinidade de pontos suscetíveis de se converter


em questões constitucionais. Fora dessa esfera - isto é, no que designamos resi-
dualmente como matéria cível -, os temas de direito constitucional geralmente
constituem o fundamento da demanda e envolvem a alegação, pelo autor, de que
uma lei, uma política ou uma conduta administrativa é inconstitucional. 74
Contra a decisão dessas questões de direito, proferida em primeira instância,
é interponível a apelação, que deve se fundar em erro quanto à interpretação da
Constituição Federal, das leis federais ou de precedentes. O seu julgamento sem-
pre é colegial: normalmente, cabe a três juízes; excepcionalmente, à composição
plenária (en bane) da respectiva corte, até o limite de nove integrantes. Essas cor-
tes - que também julgam apelações contra decisões das agências federais - não
têm poderes instrutórios (isto é, não determinam a produção de novas provas e,
para o exercício de sua jurisdição, se baseiam na reprodução escrita das que foram
apresentadas em primeira instância).
A Suprema Corte tem competência originária para determinados casos (basi-
camente, aqueles em que um Estado ou um diplomata é parte). São muito raros:
desde a sua criação, cerca de 200. Além disso, compete-lhe rever as questões de
direito constitucional federal decididas pelas cortes de apelação.

3.4 A Suprema Corte não dá conselhos ou opiniões: decide casos e contro-


vérsias, i. e., processos nos quais haja interesses contrapostos inter partes. 75 Ao

73 A competência é vinculada a determinado território. Para esse fim, foram criados 12 circuitos,
cada qual com uma Corte de Apelação. O 13 2 circuito (Federal Circuit) é constituído por 3 cortes
federais especializadas. Esses tribunais reúnem, ao todo, cerca de 160 juízes.
74 Questões de direito federal ou direito constitucional federal também podem ser suscitadas no
sistema judiciário de cada Estado. A solução que se der a elas é passível de reexame pela Suprema
Corte dos Estados Unidos. Cf. Walter F. Murphy, James E. Fleming e Sotirios A. Barber, American
ConstitutionalInterpretation, 2. ed., New York, Foundation Press, 1995, Appendice A, When May a Liti-
gant lnvoke "the Constitution"?, p. 1403-1412.
7S Cf., sobre o conceito de advisory opinions, a negação dessa competência à Suprema Corte pelos cons-
tituintes, os precedentes em que a matéria foi examinada e hipóteses em que tal função foi atribuída ao
Judiciário, Quincy Wright, Advisory Opinions. Encyclopaedia of the Social Sciences, v. 1, New York: Mac-
Millan, 1935, p. 475-480. Para um minucioso estudo sobre a experiência de cinco Estados na aplicação
desse instituto (Colorado, Maine, Massachusetts, New Hampshire e South Dakota), cf. Oliver P. Field,
The Advisory Opinion - An Analysis, Indiana Law Journal, v. 24, 1949, p. 203-231.
~------------------------------------ Os Precedentes Judiciais nos Estados Unidos 20 I

julgar, freqüentemente interpreta a Constituiçã076 e, desenvolvendo-a, enuncia


uma regra para ocaso, 77 que geralmente aplica, desde logo, como fundamento de
sua decisão. Essa norma se destina a reger os casos análogos e:

a) vincula todas as outras cortes,78 o que - permitindo a antecipação men-


tal dos resultados prováveis de futuras demandas - facilita o exercício
das profissões jurídicas, conferindo aos advogados um relativo poder de
predição;
b) serve de diretriz para os outros Poderes, aos quais esclarece os fins que
podem ou devem alcançar, os métodos admissíveis para atingi-los e os
limites de sua atuação em situações típicas, suscetíveis de repetição.

Além disso, ao justificar o critério com o qual decidiu, o Tribunal age como
um educador, paulatinamente transmitindo à sociedade o sentido dos valores con-
sagrados na Constituição e ilustrando o significado prático que assumem em de-
terminados contextos, especialmente nas situações de conflito.
Portanto, esse alto Tribunal (a) julga, fixando critérios uniformes para todo o
Poder Judiciário; (b) modera o exercício dos poderes políticos; e (c) realiza uma
função pedagógica, em permanente diálogo com a opinião pública. Em outros
termos, atua como (1) um Tribunal supremo; (2) um árbitro de conflitos no âm-
bito da Federação e um supervisor de políticas públicas (policy maker); e (3) um
professor. 79
Mas, segundo a interpretação da Suprema Corte, a Constituição Federal foi
estruturada unicamente como um limite para a atuação do Estado e nela não há
uma garantia de padrões mínimos de segurança e bem-estar para os indivíduos
(Cf. DeShaney v. Winnebago County Department of Social Services [1989] e National
Collegiate Athletic Association v. Tarkanian [1988]). Por isso, não regula simples re-
lações entre particulares e, conseqüentemente, toda controvérsia constitucional
sempre diz respeito ao que o Governo (ou, mais exatamente, quem age por ele ou
sob sua influência) fez ou exige que um particular faça. Em suma: para que surja
uma verdadeira controvérsia constitucional, passível de reexame pela Suprema
Corte, é indispensável que o conflito diga respeito a um comportamento do pró-
prio Estado ou que, tendo sido praticado por particulares, seja atribuível de algum

76 Sobre a supremacia judicial na interpretação da Constituição, Cf. Walter F. Murphy, James E. Fle-
ming e Sotirios A. Barber, ob. cit., Parte I1I, Who May Authoritative/y Interpret the Constitution, p. 262 ss
e 345 ss.
77 Bem observam Walter F. Murphy, ]ames E. Fleming e Sotirios A. Barber: "Como em teologia, músi-
ca e literatura, a interpretação constitucional freqüentemente requer criatividade." Cf., inclusive para
as referências à vastíssima literatura, ob. cit., p. 5.
78 Cf. Maria A. Ahumada Ruiz: Boerne v. City Flores: citação do precedente ...
79 Cf. Ralph Lerner, The Supreme Coun as Republican Schoolmaster. In: Kennit L. Hall (Org.). The Su-
preme Court in American Society: Equa/justice Under Law (a Reader), New York, Garland, 2001, p. 235 ss.
202 Revista de Direito Administrativo

modo àquele, em razão do seu estímulo, da sua proteção ou da sua tolerância


(esta é a doutrina da state action).80

3.5 Nos Estados Unidos, a vinculação aos precedentes não é imposta por
lei 81 e a Constituição não faz qualquer referência textual a esse fenômeno. Con-
tudo, alguns autores argumentam que o art. m, ao estruturar o Poder Judiciário,
pressupôs sua produção. Seria, pois, um postulado inerente à Constituiçã082 e
insuscetível de ser afastado por lei. 83
Antes de ser promulgada a Constituição dos Estados Unidos, alguns Tribu-
nais (como os da Virgínia e da Carolina do Norte) já haviam negado aplicação a
leis, considerando-as contrárias às respectivas Constituições. 84 Essa possibilidade
era admitida por boa parte dos constituintes 85 e alguns deles viam com entusias-
mo o reconhecimento, aos juízes,86 dessa competência que, no século XX, passaria
a ser conhecida como judicial reviewY
Foi nesse clima que Marshall pôde dizer, em nome da Suprema Corte, que há
muito tempo era pacífico (long and well established) que um Tribunal tinha o poder

80 No contexto norte-americano, essa expressão abrange os três Poderes. Também podem ser inse-
ridas na categoria da state action as condutas dos eleitores e do particular que exerça um poder estatal
ou em cuja atividade haja vínculos significativos com o Estado, a ponto de sua conduta ser imputável
a este. A doutrina em apreço, contudo, é bastante complexa, está repleta de algumas incoerências e
não será possível nem é necessário examiná-Ia profundamente aqui. Um excelente resumo, com indi-
cação dos precedentes, foi feito por Jethro K. Lieberman. Cf. State Action, A practical companion to the
Constitution: how the Supreme Court has ruled on issues from abortion to zoning, Berkeley-London, Univer-
sity of California, 1999, p. 477-479. Ver, também, Mary Cornelia Aldis Porter, State Action, In: Kermit
L. Hall (Org.). The Oxford companion to the Supreme Court of the United States, New York, Oxford, 1992,
p.822-823.
81 Para Evan H. Caminker, nada impede que uma lei federal imponha essa obrigação a tribunais
federais. Cf. Why must inferior courts obey superior courts precedents? Stanford Law Review, v. 46,
1994, p. 838.
82Cf., p. ex., Michael C. Dorf, Dicta and Artic1e I1I, U. Pa. L. Rev., v. 142, 1994, p. 1997; Henry P.
Monaghan, Stare Decisis and Constitutional Adjudication, Columbia Law Review, v. 88, 1988, p. 754.
83 Opinião contrária, contudo, é sustentada por alguns autores, para os quais o Congresso tem am-
pla competência, em relação aos tribunais federais, para disciplinar a matéria por lei (cf. John Harri-
son, The power of the Congress over the rules of precedent, Duke Law joumal, v. 50, 2000-2001, p.
503-543), podendo até mesmo proibir a aplicação de precedentes constitucionais (cf., p. ex., Michael
Stokes Paulsen, Abrogating stare decisis by statute: may Congress remove the precedential effects of
Roe and Casey?, Yale Law joumal, v. 109,2000, p. 1535).
84 Cf. David E. Engdahl, John Marshall's 'Jeffersonian' Concept of Judicial Review, Duke Law joumal,
v.42, 1992-1993, p. 282-289.
85 Cf. William W. Van Alstyne, A Criticai Guide to Marbury v. Madison, Duke Law journal, v. 1, 1969,
p.38-45.
86 Cf. Raoul Berger, Congress v. the Supreme Court, Cambridge, Mass., Harvard University, 1969, p. 143.
87 Aparentemente, essa expressão foi empregada pela primeira vez por Edward S. Corwin: cf. The
Establishment of Judicial Review, Michigan Law Review, v. 9, nº 3, 1910-1911, p. 102-125 (primeira
parte) e idem, v. 9, nº 4, p. 283-326 (segunda parte). Nesse sentido, Cf. Robert Lowry Clinton, Marbury
v. Madison andjudicial review, Lawrence, Kan., University Press ofKansas, 1989, p. 7.
~--------------------------------- Os Precedentes Judiciais nos Estados Unidos 203

de recusar aplicação a leis inconstitucionais. Mas essa prerrogativa não implica,


necessariamente, que a interpretação judicial seja vinculante para os outros poderes.
Em sua famosa argumentação, Marshall enfatiza que a prerrogativa de afastar
a lei para a prevalência da Constituição é Ínsita ao dever de solucionar um caso
concreto. 88 Ao expor os seus fundamentos, deixa claro que está falando dessa
possibilidade como um subproduto, sempre, da apreciação de um caso singular.
Em suas palavras, "a particular case", "that case", "the case", "a case".89 Por isso,
e com base em minuciosa interpretação dos antecedentes políticos, David E. Eng-
dahl argumenta que, segundo a doutrina ali exposta, incontestável é simplesmen-
te a decisão do caso concreto e não o raciocínio desenvolvido para o julgamento,
que não privaria terceiros (Le., os particulares e os demais poderes) do direito à
sua interpretação da Constituição.
Esse autor sustenta, em suma, que - diferentemente do que se decidiu em
Cooper v. Aaron (1958)90 - Marshall concebia as decisões da Suprema Corte como
obrigatórias, tão-somente, para as partes e nos limites do que fora decidido especifica-
mente para o caso, não lhes emprestando autoridade em geral e para todos. 91 No
entanto, Engdahl reconhece que sua tese tem contra si a opinião majoritária92 e o
senso comum,93 favorecido pelo hábito de identificar a supremacia como inerente

88 Cf. ob. cit., p. 279-339.


89 Cf. 5 V.S. (1 Cranch) 177-179.
90 Esse precedente, no qual foi interpretado o significado e o alcance do controle de constitucio-
nalidade, estendeu a supremacia da Constituição às decisões em que ela seja aplicada pela Suprema
Corte, argumentando com a sua função no sistema e com a opinião que se generalizara desde Marbury
v. Madison (1803). O caso Cooper v. Aaron, decidido em uma sessão especial no verão de 1958, versou
sobre a resistência oposta por autoridades do Estado do Arkansas, entre as quais o Governador Orval
E. Faubus, ao cumprimento de ordens da Justiça Federal, expedidas para a integração racial em esco-
las, de acordo com os critérios contidos no precedente Brown v. Board ofEducation (1954). Cf. Henry
J. Abraham, ob. cit., p. 206, 226 e 368; Arthur S. Miller, Constitutional Decisions as De Facto Class
Actions: a Comment on the Implications of Cooper v. Aaron, University of Detroit journal of Urban Law,
v. 58, nO 4, 1981, p. 573-586.
91 Cf. ob. cit., p. 279-339.
92 Não se trata, porém, de opinião isolada. Akhil Reed Amar, p. ex., também considera que a supre-
macia da interpretação não está contida, necessariamente, no caso Marbury v. Madison. Cf., deste autor,
Marbury, Section 13, and the Original Jurisdiction of the Supreme Court, The University of Chicago Law
Review, v. 56, 1989, p. 445-446.
93 Em texto anterior, David E. Engdahl já sustentara uma interpretação interessante, contrária ao
pensametno da maior parte dos autores: para ele, a organização hierárquica do sistema judiciário não
é exigida pelo texto da Constituição nem foi pressuposta, pois não existia na época. Além disso, tanto
na Inglaterra q'Janto nos Estados americanos, o adjetivo "supremo" qualificava um tribunal com uma
ampla competência territorial ou funcional e, entre os que tinham essa qualificação, raros eram os
que julgavam recursos, nada impedindo a coexistência de várias cortes "supremas", alternativa, aliás,
sugerida no projeto da Virginia. Cf. What's in a name? The Constitutionality of Multiple 'Supreme'
Courts, Indiana Law journal, v. 66, 1991, p. 457-510. Nesse ponto, com a discordãncia de Akhil Reed
Amar, para quem essa hierarquia está implícita no art. III da Constituição Federal. Cf., deste autor, On
Lawson on Precedent, Harvardjournal ofLaw & Pub/ic Po/icy, v. 17, 1994, nO 1, p. 41.
204 Revista de Direito Administrativo

à posição da Suprema Corte na organização judiciária. Além disso, o entendimen-


to dominante teria sido estimulado pelos grupos que têm a esperança de imple-
mentar políticas públicas sem a participação do eleitorado e sem a intermediação
parlamentar.
O fato é que, no caso Cooper v. Aaron (1958), decidiu-se que a supremacia da
Constituição também se estende às decisões em que ela seja aplicada pela Supre-
ma Corte. O argumento da decisão foi extraído, essencialmente:

1. do lugar que o Tribunal ocupa e da função que lhe cabe no sistema


constitucional; e
2. da pacífica aceitação pela sociedade, desde Marbury v. Madison (1803),
da supremacia de sua interpretação constitucional.

Esse julgamento unânime foi realizado em uma sessão especial no verão de


1958 e versou sobre a resistência oposta por autoridades do Arkansas, entre as
quais o Governador Orval E. Faubus, ao cumprimento de ordens da Justiça Fede-
ral, expedidas para a integração racial de estudantes nas escolas daquele Estado
e como conseqüência da necessidade de dar fiel aplicação ao célebre precedente
Brown v. Board of Education (1954).94

3.6 A supremacia judicial na solução das questões constitucionais - ou, mais


exatamente, o poder normativo reconhecido neste campo à Suprema Corte - re-
sulta, na verdade, de uma longa convenção social, que nunca ficou imune a um
fecundo debate. Esse poder peculiar não é o reflexo de um princípio hierárquico:
exprime, simplesmente, o pleno exercício da função constitucional que a Supre-
ma Corte assumiu. É bem conhecida a ponderação feita por um dos seus juízes
- Robert H. Jackson -, em voto proferido no caso Brown v. Allen (1953): "Nós não
somos os últimos porque somos infalíveis: somos infalíveis apenas porque somos
os últimos."9S
Nesse tema, os autores norte-americanos geralmente recordam uma frase
muito feliz de um certo bispo Hoadly, extraída de um sermão que pregou perante
o Rei da Inglaterra em 31 de março de 1717: "Quem tenha uma autoridade abso-
luta para interpretar qualquer preceito jurídico escrito ou oral, é quem é verdadei-
ramente o legislador, para todos os fins e propósitos, e não a pessoa que primeiro
os escreveu."96

.. Cf. Henry J. Abraham, ob. cit., p. 206, 226 e 368; Arthur S. Miller, Constitutional Decisions as De
Facto Class Actions: a Comment on the Implications of Cooper v. Aaron, University of Detroit Joumal of
Urban Law, v. 58, nº 4, 1981, p. 573-586. Esse princípio foi reiterado diversas vezes: p. ex., Baker v. Carr,
369 U.S. 186 (1962); Powell v. McCormack, 395 U.s. 486 (1969) e Nixon, U.S. V., 418 U.S. 683 (1974).
95 No original: "We are not final because we are infallible, but we are infallible only because we are
final." Cf. Brown v. AlIen, 344 U.S. 443 (1953).
96 No original: "Whoever hath an absolute authority to interpret any written or spoken law, it is he
who is truly the lawgiver to ali intents and purposes, and not the person who first wrote them." Apud
~--------------------------------- Os Precedentes Judiciais nos Estados Unidos 20S

Em harmonia com esse pensamento, há uma célebre frase de Charles Evan


Hughes, proferida em um discurso, antes de se tornar juiz da Suprema Corte:
"Estamos sob uma Constituição, mas a Constituição é o que os juízes dizem
que é."97 Antes dele, mas expressando essa idéia com maior sutileza, tornou-se
clássica a postulação da supremacia judicial feita por Joseph Story: "Raciocinando
com os termos da Constituição, e com os princípios aceitos da nossa teoria do
direito, a conclusão apropriada é que o Poder Judiciário dos Estados Unidos é,
em última instância, o intérprete final da Constituição em todas as questões de
natureza judicial. "98
Focalizando esta função normativa, Jethro K. Lieberman anota que ela não se
limita, simplesmente, ao poder de dar a última palavra em um caso particular, mas
contém - além disso - a pretensão de que os outros poderes e todas as autoridades
(inclusive dos Estados) sigam o espírito da decisão (e, conseqüentemente, o seu
critério) também nos casos não submetidos à Suprema Corte. 99
Contudo, nesse tema é mais convincente a interpretação defendida por
Edward S. Corwin, a quem se deve uma das mais claras exposições do pensa-
mento que ainda hoje é o dominante nos Estados Unidos. 1oo Sustenta esse autor
que a outorga da supremacia hermenêutica que transcenda os casos efetivamente
julgados sempre envolve algum risco, mas, considerados os prós e os contras, é
preferível dar à Suprema Corte o privilégio de interpretar a Constituição de modo
definitivo lOI e a seus juízes a condição de intérpretes oficiais do documento,I02limi-
tando-se essa obrigatoriedade, entretanto, às autoridades administrativas e aos
Tribunais. Ou seja, sem negar à Corte a faculdade de mudar de opinião e sem
subtrair de cada parlamentar e da sociedade o direito à sua própria interpretação.
Desse modo, promove-se a estabilidade política, mantendo-se, porém, um per-
manente intercâmbio de opiniões com o povo e com os seus representantes. Esse
diálogo pode levar a Suprema Corte, quando lhe pareça oportuno, a uma mudança

James B. Thayer, The origin and scope of the american doctrine of Constitutional Law, Harvard Law
Review, v. 7, 1893-1894, p. 152. Edward S. Corwin, judicial Review in Action, ob. cit., p. 656.
97 Cf. ]ethro K. Ueberman, A practical companion to the Constitution, Berkeley-Los Angeles-London:
University of Califomia, 1999, verbete judicial supremacy, p. 266.
98 No original: "Reasoning from the terms of the constitution, and the known principies of our
jurisprudence, the appropriate conc1usion is, that the judicial department of the United States is, in
the last resort, the final expositor of the constitution, as to ali questions of a judicial nature ... " Cf.
Commentaries on the Constitution ofthe United States, v. 1, Cambridge [Mass.], Brown, Shattuck, and co.,
1833, p. 360.
99 Cf. ob. cit., p. 266.
100 Cf. judicial Review in Action, ob. cit., p. 651-654; Idem, The DoctrÍne of judicial Review, Princeton,
Princeton University, 1914, p. 20-26 e 66-68.
101 Nas palavras desse autor, "the exc/usive power of interpreting the Constitution with finality". Cf.
judicial Review in Action, ob. cit., p. 654.
102 Cf. judicial Review in Action, ob. cit., p. 661.
206 Revista de Direito Administrativo

de posição, e serve, no mínimo, para que ela escolha, reafirme e exponha, racio-
nalmente, suas premissas.

3.7 Esse debate se renovou quando Ronald Reagan se tornou Presidente


(1981-1989). No curso de um esforço para mudar a tendência política majoritá-
ria nos Tribunais, ele nomeara juízes conservadores para todas as vagas disponí-
veis (inclusive na Suprema Cone) e colocara juristas afinados com sua ideologia
nos principais cargos de sua Administração - entre os quais Edwin Meese I1I.103
Esse grupo, formado por adeptos de um método conhecido como originalismo,
esforçou-se para ressuscitar uma tese minoritária, que tivera defensores ilustres
no século XIX (entre os quais Abraham Lincoln).I04 Segundo essa corrente, uma
decisão em que a Suprema Cone interprete ou aplique a Constituição não trans-
cende, necessariamente, o caso específico em que foi proferida e, sobretudo, não
subtrai do Poder Executivo a liberdade política para agir segundo o seu próprio
entendimento da Constituição.
Não é possível resumir, aqui, todos os termos do debate. Para a finalidade
da exposição, basta salientar que, sob intensa crítica da comunidade jurídica, o
Governo viu-se forçado a um recuo, no qual mitigou o peso de suas afirmações
e reconheceu a autoridade especial da Suprema Cone como intérprete da Cons-
tituição.
Um dos principais críticos da posição assumida pelo Governo Reagan foi
Burt Neuborne, ativista dos direitos civis e fiel adepto da opinião majoritária
entre os juristas norte-americanos. A conclusão do seu pensamento pode ser
resumida assim: 1os

a) a interpretação que a Suprema Cone tenha feito da Constituição é vin-


culante para os outros poderes e para todas as autoridades dos Estados,
que podem, entretanto, criticá-la e lutar para que a altere (ou para que
se modifique o contexto em que ela foi realizada);

103 Nomeado como Attorney General.


104 Em essência, é a mesma interpretação que David E. Engdahl, já citado, atribui a John Marshall.
Cf. Harold M. Hyman, Lincoln, Abraham, In: Kermit L. Hall (Org.), The Oxford Companion to the Su-
preme Court ofthe United States, New York-Oxford: Oxford University, 1992, p. 504; Gary L. McDowell,
verbetes Original Intent e Reagan, Ronald. In: Kermit L. Hall (Org.), ob. cit., p. 613 e 709-710; Craig R.
Callen, Stare Decisis and the Case for Executive Restraint. In: Mississipi College Law Review, v. 9, nº 1,
FalI 1988, p. 79-100.
lOS Cf. The Role of the Legislative and Executive Branches in Interpreting the Constitution, Comell Law
Review, v. 73,1988, p. 375-379, e idem, The Binding Quality ofSupreme Coun Precedent (Perspectives
on the Authoritativeness of Supreme Coun Decisions). In: Tu/ane Law Review, v. 61, 1987, p. 991-1002.
Houve um seminário a respeito dessa polêmica e uma imponante revista jurídica publicou um número
especial, com ensaios de diversos autores, inclusive Edwin Meese. Cf. Perspectives on the authoritative-
ness of Suprem e Coun decisions. Tulane Law Review, v. 61, nO 5, April 1987, p. 977-1095.
~--------------------------------
atlas
Os Precedentes Judiciais nos Estados Unidos 207

b) O caráter obrigatório - que é produzido pelo holding (não pelo dictum)


- (I) in depende da existência de uma sanção e (11) só limita o exercício
da autoridade pública, não alcançando, portanto, os particulares;
c) no caso dos legisladores, o grau de vinculação é menor: é que a liberdade
política dos eleitores repercute na atuação dos seus representantes;
d) essa supremacia - que confere maior autoridade à Constituição - orien-
ta o comportamento das pessoas (inclusive das detentoras do poder),
previne conflitos e estende a todos (sobretudo aos mais pobres) os be-
neficios que obteriam caso tivessem acesso à Suprema Corte.

Esta posição está em perfeita sintonia com a orientação que tem prevalecido
na Suprema Corte, presente, por exemplo, em voto proferido em 1947 por Felix
Frankfurter: '~té esta corte tem a última palavra apenas por algum tempo. Sen-
do composta por homens falíveis, pode errar. Mas a revisão dos seus erros deve
ocorrer por um método jurídico regular. A corte pode ser provocada a reconsiderar
suas decisões e, ao longo de sua história, isto tem sido feito com sucesso e fre-
qüentemente. Ou, o que esta corte considerou seu dever decidir pode ser modifi-
cado pela legislação, como freqüentemente foi, e, sendo o caso, por uma emenda
constitucional. "106

'06 No original: "Even this courr has the last say only for a time. Being composed of fallible men, it
may erro But revision of its errors must be by orderly process of law. The courr may be asked to recon-
sider its decisions, and this has been done successfully again and again throughout our history. Or,
what this courr has deemed its duty to decide may be changed by legislation; as it often has been, and,
on occasion, by constitutional amendment." Cf. United States v. United Mine Workers, 330 U.S. 258,
e Henry ]. Abraham, ob. cit., p. 368.

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