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Resumo
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Licenciado em Psicologia Escolar pela Universidade Pedagógica, de momento é docente de Psicologia da
Aprendizagem e responsável pela Secção de Cultura do Departamento de Serviços Sociais, na Universidade
Pedagógica delegação de Maxixe. Correio electrónico: euclidescossa@gmail.com ou
euclidescossa@hotmail.com.
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Introdução
Devo antes de mais, endereçar o meu especial agradecimento ao Professor Jaime Alípio pela
paciência ao se dispor a entrevista e o esclarecimento de alguns aspectos relativos ao percurso
histórico da Universidade Pedagógica e dos cursos ministrados. E não só, aos colegas que de
uma ou de outra forma ajudaram-me a perceber algumas incongruências quando da
elaboração do presente artigo, bem como a rectificação em aspectos técnicos e linguísticos.
O contexto que levou esta transformação foi a necessidade de formar psicólogos que podiam
actuar na área da educação. O objectivo, como afirma o Professor Jaime Alípio com quem
desenvolvemos uma interessante entrevista, era que este profissional deveria actuar na escola,
observando os processos ligados à aprendizagem e os comportamentos subsequentes e ajudar
os pais no relacionamento com os seus filhos e, não só, facilitar a aprendizagem e ajudar o
professor a lidar com o insucesso escolar. Neste processo cria-se igualmente o curso de
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Como que uma evolução, de Psicologia Escolar passa a designar-se Psicologia Educacional,
mantendo-se as intensões e uma boa parte do currículo, com a diferença que, o curso de
Psicologia Educacional apresenta dois minor’s, um em Educação de Infância e outro em
Educação e Assistência Social. Portanto volta-se aqui ao regime de formação bivalente, com
uma nova abordagem curricular porém, implicitamente, com o mesmo alcance: formar um
profissional com dupla funcionalidade para a leccionação de Psicologia.
Levanta-se aqui um paradoxo epistemológico: o que distingue, sob ponto de vista de alcance,
a Psicologia Escolar e a Psicologia Educacional? Ou seja, qual é o seu estatuto
epistemológico? Pretendemos, em primeira linha, analisar o processo de transição e
construção do currículo de Psicologia Educacional então ministrado na Universidade
Pedagógica e reflectir sobre o seu modelo de formação principalmente no que se refere à
pertinência das Práticas Pedagógicas (Estágio Técnico Profissional) nele desenvolvido. Com
objectivo maior de abrir as possibilidades de reflexão em torno das Práticas Pedagógicas e
com ela as Práticas Profissionalizantes na sua relação com o perfil do psicólogo educacional
que se pretende formar. Por outro lado pretendemos analisar até que ponto está-se a ter em
conta a necessidade de uma prática clínica, um subsídio extremamente fundamental para o
psicólogo, uma vez que grande parte dos problemas decorrentes do processo de aprendizagem
descai em abordagens clínicas de intervenção. Tal é o exemplo do papel do psicólogo escolar
e/ou educacional no processo de ensino inclusivo. Será que o modelo de formação da UP
habilita uma plena intervenção destes psicólogos neste grande debate que é o ensino
inclusivo? E até que ponto as Práticas (Estágio Técnico Profissional) são efectivas?
Pretendemos portanto demonstrar a necessidade de uma prática clínica na formação dos
Psicólogos Educacionais como pressuposto básico para uma plena intervenção em contexto
educacional e não só, o resgate e a pertinência da existência do curso de Psicologia Escolar no
panorama da intervenção em saúde escolar.
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Informação obtida em entrevista com o Prof. Doutor Jaime Alípio.
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Desde já alertar que não pretendemos fazer um estudo exaustivo quanto ao processo de
“transformação” da acção da Universidade Pedagógica no contexto da Educação em
Moçambique mas sim debruçar-nos apenas nas motivações da transformação curricular e suas
consequências no que tange ao curso de Psicologia ministrado nesta instituição. Propondo,
portanto, um estudo comparado em relação ao contexto a que estes pretendiam dar respostas,
os objectivos curriculares e o seu alcance.
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Dentre os objectivos do curso de Psicologia e Pedagogia constavam a aquisição de habilidades de planificação
curricular, para além da leccionação de cadeiras psicopedagógicas. Portanto verifica-se aqui uma orientação mais
direccionada para o ensino do que para a intervenção psicológica. (cf. Plano Curricular de Bacharelato e
Licenciatura em Psicologia Escolar)
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Cf. Plano Curricular de Bacharelato e Licenciatura em Psicologia Escolar, 2008
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Psicológicas era bastante limitado uma vez que dever-se-ia considerar a Pedagogia,
Psicologia, Planificação e Administração da Educação e disciplinas gerais.
É por isso que o alcance deste curso prendia-se na formação de professores de Psicologia e
Técnicos de Educação. No entanto, entre outras, o perfil do psicólogo escolar centrava-se na
capacidade deste realizar pesquisas em Psicologia Escolar, sendo algumas das suas tarefas
ocupacionais: leccionar as disciplinas de Psicologia Escolar em instituições de ensino
vocacional e de formação de professores; diagnosticar perturbações de aprendizagem e de
comportamento; orientar jovens e adultos nas escolhas académicas e profissionais nas classes
terminais do ensino primário, secundário ou equivalente. Em relação ao anterior curso de
Psicologia e Pedagogia, o curso de Psicologia Escolar comporta um grande número de
disciplinas científicas técnicas e específicas: Introdução a Psicologia, Psicologia do
Desenvolvimento, Psicologia Social e das Organizações, Psicologia da Aprendizagem,
Psicologia da Personalidade, Psicopatologia Infanto-Juvenil, Psicologia Cognitiva, Orientação
Escolar e Profissional, Métodos de Observação e Avaliação Psicológica, Psicologia
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A Universidade Pedagógica é criada pelo Diploma Ministerial n°73/85 de 4 de Dezembro de 1985 como uma
Instituição de Ensino Superior, de utilidade pública, estatuariamente responsável pela formação de professores
para todos os níveis do Sistema Nacional de Educação em Moçambique e outros quadros da Educação.
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PLANO CURRICULAR DE BACHARELATO E LICENCIATURA EM PSICOLOGIA ESCOLAR, 2008: 8
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Este curso decorria sem actividades práticas ligadas a intervenção clínica, supervisionada, o
que tornava o curso mais teórico que prático. Os estudantes eram levados a exercer as
chamadas Práticas Pedagógicas (nas escolas) o que apenas os propiciava forte componente
pedagógica, que se pretendia reduzir, do que psicológica, que se pretendia potenciar.
Acreditamos que a falha deste currículo começa aqui. Ao não oferecer uma vivência clínica,
como o psicólogo escolar pode efectivamente cuidar das perturbações (distúrbios ou
transtornos) que possam decorrer do processo de aprendizagem? Como diagnosticar ou
desenhar um programa efectivo de orientação escolar e profissional sem bases
epistemológicas coerentes? Como questionar os métodos de intervenção em psicologia
escolar, sem vivenciar a prática do psicólogo escolar na escola, sem vivenciar os efeitos de
um processo terapêutico sobre o paciente e a sua evolução em contexto clínico-hospitalar?
Em 2009 (cf. Vale et all, 20098), no âmbito da segunda reforma curricular da Universidade
Pedagógica, os cursos voltam a ser ministrados em regime Bivalente, tendo-se utilizado a
estratégia de “major” (corpo geral do curso e que corresponde aos dois primeiros anos) e
“minor” (especialização e que corresponde aos dois últimos anos). Cria-se assim o curso de
Bacharelato e Licenciatura em Psicologia Educacional com Habilitação (minor) em Educação
de Infância e Educação e Assistência Social. As Reformas Curriculares, iniciadas em 2007
assentaram-se na exigência de actualização do raio de acção desta Instituição face a um
contexto global de melhoria da qualidade de ensino, da aprendizagem, da gestão pedagógica
administrativa da Instituição, motivados pelo compromisso em relação a Agenda 2025, o
Plano de Acção para a Redução da Pobreza Absoluta (PARPA), o Programa Quinquenal do
Governo de Moçambique, o Plano Estratégico da Educação e Cultura (PEEC), as
Transformações Curriculares do Ensino Básico e Ensino Secundário Geral, a Proposta do
Quadro Nacional de Qualificações do Ensino Superior (QNQ-ES), e a Proposta de Sistema
Nacional de Acumulação e Transferência de Créditos Académicos (SNATCA) 9. A opção pelo
curso de Psicologia Educacional parece ter-se centrado na seguinte ideia:
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Plano Curricular de Bacharelato e Licenciatura em Psicologia Escolar, 2008: 8
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Plano Curricular de Bacharelato e Licenciatura em Psicologia Educacional com Habilitação em Educação de
Infância e Educação e Assistência Social, 2009
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Neste ponto há que congratular a Universidade Pedagógica, na medida em que um sistema de transferência e
acumulação de créditos académicos permite maior mobilidade horizontal, vertical e diagonal dos estudantes,
para além da competitividade no acesso ao mercado de trabalho aos diplomados, bem como a necessidade de
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Entre outros objectivos, o curso de Psicologia Educacional foi desenhado para que o
formando adquira uma visão científica do desenvolvimento humano, adquira e domine
conteúdos na área de Psicologia Educacional, adequando-os às actividades profissionais que
vai desenvolver particularmente na Educação de Infância e Assistência Social (é por isso que
se colocam como sectores de trabalho alvo as instituições de infância e grupos comunitários, e
o Ministério da Mulher e de Coordenação da Acção Social). Ao fazer-se esta proposta a
Universidade Pedagógica pretende extrapolar as barreiras da Escola, para abarcar um leque
ainda maior de campos de actuação, típico da construção epistemológica da Psicologia
Educacional.
Por um lado, o currículo do Ensino Secundário Geral e Técnico Profissional não previam a
integração das disciplinas de Psicologia e Pedagogia na formação dos seus graduados, bem
como a integração de um psicólogo escolar na intervenção e assistência de crianças no Ensino
Primário pois o seu campo de actuação ainda não tinha sido claramente definido e/ou
actividades de Orientação Escolar e Profissional; o facto do curso de Psicologia Escolar ser
monovalente; e por este apresentar no seu currículo, pouca clareza em relação às disciplinas
de Psicopatologia e Necessidades Educativas Especiais, sendo que os seus conteúdos eram
tratados de forma comungada, ditaram a retirada deste no quadro dos cursos da Universidade
Pedagógica e a consequente substituição pelo curso de Psicologia Educacional.
promoção da mobilidade de estudantes dentro da região da SADC, pela adequação e harmonização dos cursos da
UP aos outros sistemas de ensino da região.
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Ao ser desenhado desta forma pretende-se que o psicólogo educacional seja capaz de
diagnosticar e elaborar estratégias de intervenção em crianças com problemas de
aprendizagem e desadaptação sócio escolar. Se partirmos do actual plano das Práticas
Pedagógicas (cf. Dias et. al., 2010); estes formandos apenas no último ano são levados a
realizar o Estágio Técnico Profissional nas instituições de infância e grupos comunitários
(creches, jardins de infância), e o Ministério da Mulher e de Coordenação da Acção Social10.
Um Estágio Técnico Profissional não deve ser apenas o fim de um processo mas sim a
continuidade de um processo do qual exigir-se-á um relatório exaustivo de todo o percurso,
não de um semestre mas de vários semestres (que compõem os anos lectivos) arrolando os
vários momentos possíveis de se vivenciar, por exemplo: ao nível das necessidades educativas
especiais, ao nível da intervenção e assistência social, ao nível da orientação escolar e
profissional, ao nível do aconselhamento psicológico e psicoterapia, abarcando o
relacionamento com a equipe multidisciplinar, entre outras (voltaremos a este assinto mais
adiante).
Afinal o que são Práticas Pedagógicas? Antes de nos atermos a qualquer comentário acerca do
modelo de Práticas Pedagógicas proposto pela Universidade Pedagógica há que
questionarmos á sua epistemologia, se possível desconstruirmo-la para no fim determinarmos
quais as leis que orientam as práticas gerais e até que ponto é possível falarmos de uma
prática específica. Não pretendemos aqui dar respostas mas levantar questionamentos que nos
levem a reflexões!
Para tal analisamos o Manual de Práticas e Estágio Pedagógico (2010). Na primeira edição o
presente manual designava-se apenas Manual de Práticas Pedagógicas (2008), já na segunda
edição incluiu-se o Estágio Pedagógico, como parte das práticas, sendo que estas têm carácter
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E neste ponto, ainda podemos questionar os mecanismos em que este Estágio acontece. Como são
credenciados os formandos a realizar tais práticas, qual é o nível de supervisão, e quais o instrumento de recolha
de informação, enfim, o debate é interminável.
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O que nos oferece comentar é que deste modo quer num ou noutro caso a vivência clínico-
hospitalar não se encontra efectiva, mas apenas superficialmente estes formandos se
aproximam da profissão. Na medida em que, pelo menos nos planos curriculares as práticas
resumem-se a visitas de estudos para posteriores debates em seminários. Com a diferença que
no Estágio o formando participa activamente em algumas actividades das quais fará um
relatório das aprendizagens de apenas quatro meses que compõem o semestre lectivo! Como
então o estudante irá perceber os processos de desistência dos pacientes, as suas resistências,
conflitos e a necessidade de um diagnóstico diferencial cada vez mais exaustivo? Como
efectivamente estas práticas são supervisionadas? Será que o estágio técnico profissional
(neste caso Estágio em Psicologia Educacional) espelha todas as actividades desenvolvidas
desde os primeiros anos das práticas (2º e 3º anos)?
A Psicologia Escolar e a Psicologia Educacional parecem dizer a mesma coisa, mas não são.
Logo à prior e, analisando a formação de cada um dos conceitos, a Psicologia Escolar
constitui a Psicologia institucionalizada (à Escola), enquanto instituição, donde procura, por
inerência do objecto de estudo da Psicologia (o estudo do comportamento, das cognições e
das emoções) estudar os factores que determinam a plena saúde mental escolar, e/ou dos
indivíduos que compõem a escola e intervir sobre eles.
Por outro lado, e pelo mesmo processo, a Psicologia Educacional corresponderia à aplicação
da Psicologia na Educação, donde, igualmente, seu foco estaria no estudo dos factores
psicológicos inerentes ao processo de ensino e aprendizagem (educação formal e não formal),
bem como ao processo de transmissão de valores culturais, éticos, cívicos das gerações
adultas (educadores) às gerações mais novas (educandos). Uma espécie de “Teoria
psicológica da educação”. Portanto abarca um leque ainda maior de aplicabilidade, atingindo
a escola, a família, a comunidade, todos os sectores onde a educação ocorre. Em primeira
análise.
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Ora vejamos, a Psicologia Educacional (ou Psicologia da Educação) como nos afirma
Sprinthal e Sprinthal (1993), tem-se debatido desde à sua existência com problemas de
identidade, por inerência da posição que ocupa quanto à sua epistemologia, ou seja ela é uma
ponte em construção entre dois mundos, entre duas tradições diferentes, não sendo
suficientemente científica para a Psicologia, nem suficientemente prática para o ensino. No
entanto, e quem nos garante é Salvador et al (1999), ainda na obra de Pessanha (2010), a
Psicologia Educacional pode também ser assumida como uma disciplina com objectivos e
conteúdos próprios, sendo assumida como um dos ingredientes imprescindíveis para
fundamentar cientificamente a educação e o ensino.
Como afirma Coll (2000; apud Pessanha, op. Cit.) a Psicologia Educacional centra os seus
estudos sobre os processos de mudanças comportamentais, provocados ou induzidos nas
pessoas como resultado das suas participações em actividades educativas. Este estudo
acontece com três finalidades: (1) contribuir para a elaboração de uma teoria explicativa
destes processos; (2) elaborar modelos e programas de intervenção dirigindo à sua acção
sobre eles com uma finalidade determinada; (3) dar lugar a uma prática educativa coerente
com as propostas teóricas formuladas.
Segundo Antunes (2008), a Psicologia Educacional pode ser considerada como uma subárea
da psicologia, o que pressupõe esta última como área de conhecimento. Ou seja, o corpus
sistemático e organizado de saberes produzidos de acordo com procedimentos definidos,
referentes a determinados fenómenos ou conjunto de fenómenos constituintes da realidade,
fundamentado em concepções ontológicas, epistemológicas, metodológicas e éticas
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Antunes (op. Cit.) sublinha que a psicologia educacional e psicologia escolar são
intrinsecamente relacionadas, mas não são idênticas, nem podem reduzir-se uma à outra,
guardando cada uma sua autonomia relativa. A primeira constitui uma área de conhecimento
(ou subárea) e, grosso modo, tem por finalidade produzir saberes sobre o fenómeno
psicológico no processo educativo. A outra constitui-se como campo de actuação profissional,
realizando intervenções no espaço escolar ou a ele relacionado, tendo como foco o fenómeno
psicológico, fundamentada em saberes produzidos não só, mas principalmente, pela subárea
da psicologia, a psicologia da educação.
Considerações finais
mesmo porque grande parte deles são privados. O alcance da Psicologia Educacional parece
então perder-se de vista.
Bibliografia