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Passagens da Fotografia

Antonio Fatorelli

1 INTRODUÇÃO

De modo a precisar os contornos das preocupações que motivam este texto e que se
esboçam, de modo sumário, na indagação: que questões envolvem o fazer fotográfico hoje?
–, foi utilizado o recurso de colocar em perspectiva os balizadores que informam a prática
fotográfica e a reflexão que se faz sobre ela.

Esta opção implica privilegiar as motivações pessoais dos fotógrafos, ao mesmo tempo
referindo-as ao contexto cultural de época: um tipo de determinação dinâmica na qual as
fotografias criam realidade ao tempo em que se instituem em referência a redes de relações
culturais, sociais e institucionais mais complexas.

A história dos meios e de seus suportes, fotografia/cinema/tv/vídeo e imagem digital, não é


uma história linear e sucessiva de superação dos primeiros pelos últimos, mas uma história
de assimilações e deslocamentos recíprocos. Nesta linha evolutiva, cumpre perceber o
modo diferencial pelo qual a fotografia inscreveu um sujeito e um modelo de subjetivação
singular, irredutível ao modelo renascentista e ao modelo clássico, e como, prospectivamente,
redefiniu-se a partir da presença de novos suportes.

Perguntamo-nos então de que modo a fotografia, enquanto meio de expressão e de


comunicação, se reconfigurou em vista das questões emergentes da atualidade. A atual
reconfiguração do campo fotográfico, por exemplo, é uma decorrência das mutações
de uma prática que passa a incorporar procedimentos e etapas mais complexas,
incompatíveis com sua definição tradicional. O trânsito entre os suportes, as hibridações
e miscigenações são uma outra face deste movimento de remoldagem dos meios em face
dos novos desafios da atualidade.

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MODALIDADES ���
DE AGENCIAMENTO
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Com o intuito de identificar os componentes que singularizam a prática fotográfica


contemporânea, fortemente dominada pela lógica virtual, cabe distinguir outros
momentos que precedem o atual, delineado a partir da década de 1980: um momento
que corresponde à segunda metade do século XIX, em que estava em conta a constituição
de imagens em conformidade com o modo de funcionamento do olho humano; um
segundo momento, que se desdobra significativamente entre os anos 1920 e 1950, em
que as questões que faziam diferença passaram a se referir ao conceito de inconsciente
trazido pela difusão da psicanálise.

Estes três momentos são marcados pela presença de três tipos de sujeitos, ou três processos
de subjetivação que, pelas distâncias que apresentam entre si, merecem ser singularizados:
um sujeito psicofisiológico, um sujeito da consciência e do inconsciente, e um sujeito
maquínico ou simulado – predominância sucessiva do olho, do aparelho psíquico e das
redes neurais ou, ainda, considerando-se os materiais de proeminência econômica em cada
época, do carvão, do carbono e do silício.


Deleuze, acompanhando a periodização da história da arte proposta por Alois Riegl, distingue três funções da imagem
cinematográfica, a saber: embelezar a natureza; espiritualizar a natureza e rivalizar com a natureza. Nossa periodização
inspira-se mas não se confunde com a de Deleuze. Entre as duas, além dos pontos em comum, existem hiatos quanto às
datas de abrangência de cada período e também na definição dos conceitos.
A princípio, condicionado em grande parte pelas pesquisas desenvolvidas no campo da

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fisiologia, o aparelho fotográfico foi utilizado na última metade do século XIX sobretudo como
instrumento de prótese da visão – um modo de utilização do equipamento como extensão
imediata dos órgãos da visão, que supõe uma relação de exterioridade entre olho e máquina.

É possível identificar, por volta de 1920, um segundo momento em que passa a contar a
criação de imagens de natureza formal abstrata e fortemente ancoradas na subjetividade do
artista, que encontram seu correlato nas várias grades modernistas e no modelo de inconsciente
proposto pelas correntes psicanalíticas centradas nas contribuições de Sigmund Freud.

Atualmente, os projetos de simulação desenvolvidos em diversas áreas, em especial a


pesquisa em direção à criação de uma inteligência artificial, como também os recentes
desenvolvimentos no campo da engenharia genética, da neurobiologia e da cibernética,
todos fortemente ancorados nos modelos informáticos, mas sobretudo os novos regimes de
experiência e de sensibilidade virtuais, indicam uma outra modalidade de interação entre
o humano e a técnica, marcada pela dissolução da distância entre corpo e máquina. Nesta
passagem do visível ao visual, a máquina vai deixando de ocupar uma função instrumental
que simplesmente estende, de modo quantitativo, as faculdades do olho, para desempenhar
um papel constitutivo na criação de imagens.

A fixação destes três momentos aqui destacados indica que os modos de imbricação entre
homem e cultura e entre técnica e natureza correspondem a modos diferenciados de
experienciar o espaço e o tempo.

Estes três pontos de articulação apontam para a presença de diferentes tendências na fotografia,
em particular para a existência de duas direções prioritárias que atravessam a história do meio
e que podemos definir como tendência purista – Peter Henry Emerson, Alfred Stieglitz, Joel
Meyerowitz – e tendência pluralista – Henry Peach Robinson, Man Ray, Alain Fleischer. Os
puristas defendem e praticam a fotografia como forma de arte autônoma, exclusivamente
referida aos procedimentos próprios ao meio, enquanto os pluralistas preconizam uma prática
aberta às influências da pintura e de outras formas de expressão.

Três lances, três atos, marcam, de modo emblemático, essas diferenciações.

2.1 Primeira imagem

Ao longo do último quarto do século XIX, os fotógrafos e cientistas Henry Peach Robinson
e Peter Henry Emerson estabeleceram um debate sobre o estatuto da fotografia que
mobilizou, de forma inédita, os salões e os fotoclubes, onde geralmente eram trazidas a
público as novas descobertas e debatidas as últimas tendências estéticas. Sede de importantes
concursos e exposições fotográficas, os fotoclubes tornaram-se centros de divulgação e
também de legitimação do pensamento científico e artístico.

O debate entre Robinson e Emerson polarizou-se em torno da definição do lugar da


fotografia no contexto das artes plásticas e da sua relação com os saberes científicos da
época. De modo inaugural, esses fotógrafos deram corpo a um debate acerca da natureza
da fotografia que, repetidamente, haveria de voltar à cena em outras conjunturas.

O debate entre Robinson e Emerson gravitou em torno de alguns temas centrais, que
são, por si, reveladores desse lugar epistemológico da fotografia, entre os quais contam:
a particularidade da fotografia enquanto meio de expressão, relativamente aos materiais
e técnicas que mobiliza; a relação entre fotografia e artes plásticas e, por contigüidade,
entre a avaliação estética da imagem fotográfica e os cânones da história da arte; a

qualificação da imagem fotográfica relativamente ao seu vínculo com o referente externo;

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a relação entre imagem fotográfica e as proposições científicas da época, principalmente
em relação à fisiologia da percepção.

Pela primeira vez as indagações sobre o meio são formalizadas de modo sistemático,
incorporando às suas premissas hipóteses teóricas originadas em outras áreas – como a
física e a química –, e estéticas, convergindo várias proposições originalmente pertencentes
ao ideário pictórico e literário. Certamente, o ponto de partida que ensejou as especulações
de Robinson e Emerson é o da relação disjuntiva, da concepção desse hiato que separa
os fenômenos naturais e os objetos culturais tanto da imagem percebida quanto da
imagem representada. Parte-se, portanto, da problematização de uma questão muitas vezes
negligenciada pelas correntes realistas, prioritariamente voltadas para a celebração das
qualidades icônicas da imagem fotográfica.

Por meio da promoção de uma prática fotográfica direta, realizada espontaneamente, como
defendeu Emerson, ou do uso da montagem e das estratégias de cenarização e de direção das
personagens desenvolvidas por Robinson, ambos estavam mobilizados para obter imagens
coincidentes com a imagem percebida, um programa que implicou o reconhecimento do
modo de atualização dos sentidos e, por decorrência, a participação ativa do corpo na
operação perceptiva. Não por acaso as divergências entre Emerson e Robinson no campo da
fotografia referem-se diretamente às proposições científicas elaboradas pelos fisiologistas da
percepção, à teoria do foco diferencial elaborada pelo físico e fisiologista alemão Hermann
von Helmholtz, no caso de Emerson, e às proposições sobre a constituição do espaço –
efetivo e diegético –, e sobre a memória, no de Robinson.

Muito embora mobilizando procedimentos técnicos distintos, esses dois fotógrafos


perseguiram o ideal de obtenção de uma imagem coincidente com a imagem perceptiva.
Mesmo Robinson, defensor de procedimentos francamente artificiais, como as encenações
realizadas em estúdio e as montagens obtidas no laboratório fotográfico, estava voltado
para a superação das deficiências do processo fotográfico que resultavam na criação de
imagens de natureza distinta das imagens percebidas. Esta referência comum ao modelo
da percepção é que os caracteriza como promotores de um sujeito fisiológico – imagens
formadas na retina (Emerson) – e das imagens mentais, mais abstratas, porém igualmente
sensíveis (Robinson). Pelas suas posições diferenciais, é possível identificar, na estética de
Emerson, a promoção de um tipo de sujeito-tela, de certo modo passivo, sobre o qual
viriam inscrever-se os traços do mundo externo, ao passo que Robinson cria uma imagem
de origem mental, mais projetiva e produtiva, que incorpora outras determinações espaciais
e temporais ao aqui e agora do instantâneo.

2.1.1 Emerson

Após descartar a hipótese realista, por considerá-la falsa em relação à natureza, o fotográfo
e médico Peter Henry Emerson identificou sua posição estética com a dos pintores
impressionistas, preferindo, contudo, nomeá-la sob o rótulo de naturalismo:

Para nós Impressionismo significa a mesma coisa que Naturalismo, mas o fato de tal
palavra permitir ao artista uma interpretação tão ampla, até absurdamente ampla,
nos faz preferir o termo Naturalismo, porque ele permite que a obra sempre possa ser
comparada a uma Natureza padrão. (EMERSON, 1890, p. 22)


Tal como defendida pelos pintores pré-rafaelitas ingleses: “O realista não faz nenhuma análise. Ele satisfaz-se com as
pequenas coisas e omite os raios de sol. O mais que puder, ele pinta todas as veias de uma folha exatamente como são,
em vez de pintar a folha como ela se apresenta na sua totalidade” (EMERSON, 1890, p. 24).

Do mesmo modo que William Turner e os pintores impressionistas, entre eles James Whistler,

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que o influenciaram diretamente, Emerson está envolvido com as impressões obtidas direta

e instantaneamente da natureza. Tal perspectiva implica a consideração do modo como a


natureza é percebida e, portanto, a valorização do corpo e dos órgãos dos sentidos – em
especial do olho e da retina. Esta passagem do real – do objeto em si – para o naturalmente
percebido – o objeto tal como aparece – estabelece uma distância, ou um nível inicial de
abstração, entre a imagem percebida e a coisa em si e, na seqüência, entre a imagem percebida
e sua representação visual. A partir deste momento, olhar uma imagem significa indagar-se
sobre o modo como foi percebida e sobre os procedimentos de representação visual.

Nas suas formulações, Emerson esforça-se por manter a precedência da natureza sobre essas
duas operações, criando um tipo de lastro primordial sobre o qual viriam inscrever-se as
percepções e os signos. Pode-se dizer, neste sentido, que a sua modernidade está no modo
como articulou as concepções naturalistas à especificidade do processo criativo.

É isto, então, que entendemos por Naturalismo: que todas as sugestões devem vir da
natureza e todas as técnicas devem ser utilizadas para possibilitar a mais verdadeira
impressão da natureza. (EMERSON, 1890, p. 24)

Trata-se, neste caso, de uma concepção naturalista que atribui à percepção o lugar de
verdade, para o qual devem voltar-se o trabalho de arte e as representações em geral.
Esta prioridade concedida à experiência sensível insere-se no contexto mais amplo da
mutação radical dos balizadores que informam a prática fotográfica, o que significou o
abandono dos procedimentos atualizados pela câmera escura e do que eles secretavam,
em especial o estabelecimento de uma separação entre espaço exterior e interior e a
configuração de um sujeito vazio.

Após enunciar seu pressuposto – “nossa proposição é a de que a imagem deve ser a
transposição de uma cena como vista por um olho humano normal” (EMERSON, 1890,
p. 97) e estabelecer seu objetivo – “o que objetivamos na arte é, portanto, a aparência do
fenômeno” (EMERSON, 1890, p. 97) –, a atenção de Emerson dirige-se à compreensão
dos fenômenos visuais, em especial dos gaps que separam a percepção efetiva de uma
percepção analítica ou ideal. Nesse seu esforço de compreensão do ato de visão, Emerson
sustentou-se nas mais recentes e influentes pesquisas desenvolvidas pelos fisiologistas dele
contemporâneos, tais como: os fenômenos da aberração esférica e do ponto cego propostos
por Helmholtz (EMERSON, 1890, p. 109); as escalas de sensibilidade do olho, elaboradas
por Gustav Theodor Fechner; o fenômeno da visão binocular, estudado por Le Conte, e
as teses de Hering sobre a sensibilidade do olho às cores, todas explicitadas e discutidas
no capítulo central deste seu livro, sintomaticamente intitulado Phenomena of Sight, and
Art Principles deduced therefrom que, na sua primeira parte, recebeu o seguinte subtítulo:
Physical characters of the eye as an optical instrument.

No enfrentamento da questão fisiológica, Emerson valeu-se, principalmente, das teses sobre


a natureza da percepção visual desenvolvidas por Helmholtz, em especial da sua teoria do
foco diferencial, segundo a qual o ato de ver implica a eleição de uma área central da cena,
percebida de modo nítido, e o ligeiro desfocamento das áreas periféricas. Após sustentar
que o ponto central é o mais importante fator no estudo da visão e da arte, Emerson cita
textualmente o fisiologista: “todas as demais partes da imagem retiniana, exceto aquela formada
na área central, são vistas de modo imperfeito”, ao que acrescenta, “portanto, a imagem que
recebemos através do olho é como um quadro minuciosa e laboriosamente finalizado no
centro, porém apenas esboçado nas suas margens”. (EMERSON, 1890, p. 102)


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Na sua versão fotográfica, a suposição de Helmholtz transformou-se em procedimento
estético. Empenhado em obter uma aproximação máxima entre a imagem ocular e a
imagem fotográfica, Emerson propõe que também as fotografias devessem apresentar foco
apenas na região central e margens ligeiramente desfocadas.

A esses critérios formais, Emerson acrescentou uma série de outros argumentos com o
objetivo de salvaguardar a especificidade e a autonomia da fotografia frente às iconografias
tradicionais. No contexto da sua concepção de fotografia direta, a câmera fotográfica
será tomada como uma espécie de caixa preta inviolável, do mesmo modo que a chapa
impressionada, à qual nada deve ser acrescentado ou removido. Dessa maneira, a garantia
de especificidade e originalidade do meio está no respeito à lógica operativa do aparelho,
sempre concebido no seu formato convencional.

Emerson enumera os seguintes critérios, todos compatíveis com os critérios da prática


fotográfica posteriormente nomeada de direta e pura e coincidentes com os princípios da
imagem verídica: 1. A fotografia é um meio independente, com suas próprias características
inerentes e é, potencialmente, uma grande forma artística; 2. Os controles que ela oferece
são adequados para expressar a visão; 3. O efeito emocional e psicológico da fotografia se
encontra na imagem sem retoques produzida pela lente, tal como registrada pelo material
sensível; 4. Esse efeito não deve nunca ser estragado pelo retoque ou pela cópia combinada;
5. A composição não tem nada a ver com regras ou fórmulas (NEWHALL, 1989, p. 56).

Igualmente distante do realismo e do idealismo, a posição estética defendida por Emerson,
diretamente derivada do modo de funcionamento da visão, entra em colapso, corroída
exatamente onde parecia mais sólida, nos seus pressupostos científico-fisiológicos. Após
difundir ampla e entusiasticamente suas teses, tendo conquistado, nesse itinerário, um
enorme contingente de adeptos, Emerson fez uma retratação peremptória das suas posições,
mantendo-se por vários meses afastado da cena social e cultural. Em um panfleto tornado
público em 1891, intitulado The death of naturalistic photography, desilude-se com as
possibilidade científicas da fotografia, vista como um meio que conta com recursos por demais
limitados e que não oferece as possibilidades de controle e de plasticidade que desejava.

Estavam delineados, contudo, os parâmetros estéticos da fotografia direta e pura, que


viriam a exercer uma forte influência sobre o movimento pictorialista em sua versão menos
intervencionista e, posteriormente, sobre as posições modernistas defendidas por Paul
Strand e Alfred Stieglitz no pós-guerra.

2.1.2 Robinson

As impressões compostas realizadas pelo pintor e fotógrafo Henry Peach Robinson são
o resultado de uma criteriosa montagem, no laboratório, de vários negativos tomados
individualmente. Obedecendo a um estudo preliminar, esses negativos, gerados em
diferentes momentos e lugares, são ampliados um a um, de modo a compor, ao final,
uma cena aparentemente prosaica.

Essas montagens, que obtiveram enorme repercussão nos salões europeus de fotografia
entre as décadas de 1860 e 1880, representavam cenas alegóricas e personagens literárias,
freqüentemente apresentadas de modo moralista. Na mesma direção do sueco Oscar Rejlander,
seu predecessor e inspirador, as imagens de Robinson trazem a marca da estética difundida
nas academias de arte, o que lhes valeu as designações de classicistas e de fotógrafos-artistas.


Historicamente empregadas com o intuito de minorar os efeitos ocasionados pela baixa

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sensibilidade e pelo reduzido contraste do material fotográfico, que inviabilizavam, por
exemplo, o registro numa única chapa das altas e baixas luzes de uma cena, o emprego
da montagem estendeu-se, com Robinson, a situações mais complexas, como a síntese de
vários instantes e a obtenção de perspectivas impróprias ao aparelho fotográfico.

De natureza conceitual e técnica, as operações que envolviam a realização das impressões


compostas “perfaziam as mesmas operações da mente” (CRAWFORD, 1979, p. 55) –
, como observou o historiador Willian Crawford a respeito das impressões compostas
realizadas por Rejlander –, na seleção e na disposição dos elementos percebidos, além
de possibilitarem o controle tonal dos elementos individualmente retratados. O uso
dessas impressões facultava igualmente a Robinson corrigir as distorções perspécticas
ocasionadas pelo aparelho fotográfico, conferindo às imagens fotográficas as mesmas
propriedades visuais das cenas e, o que é original, constituindo-as de modo a que também
elas operassem por saltos, associando imagens originadas em diferentes momentos e
lugares, à semelhança das imagens mentais.

A edição de imagens tomadas em diferentes momentos e lugares permitiu a Robinson


interferir diretamente na natureza do código e na instantaneidade da tomada, criando a
possibilidade de modulação sobre os vetores espaciais e temporais da representação.

Robinson não se furtou a alterar os procedimentos fotográficos habituais com vistas a


intensificar o realismo das suas imagens, segundo uma concepção realista de viés experimental,
referida à aparência final da imagem. Em seu livro Pictorial Effect in Photography, publicado
em 1869, Robinson diz:

O fotógrafo jamais deve permitir que sua criatividade o leve a representar, através de
truques, qualquer cena que não se encontre na natureza. Se ele o fizer, está violentando
sua arte, porque sabe-se que o resultado final representa um objeto ou coisa que existiu
por um período de tempo diante da sua câmera. Não obstante, todas as formas de
artifício, truque ou prestidigitacão estão à disposição do fotógrafo, de modo que eles
pertencem à sua arte e não falseiam a natureza. (apud CRAWFORD, 1979, p. 56-57)

Tal versão do realismo, que parte das aparências e convoca as potências do falso, possibilitou-
lhe investigar as possibilidades técnicas e expressivas do meio sem preconceitos, elaborando
novas sintaxes visuais e relacionando a fotografia a outras práticas artísticas. Esse projeto, que
teve por fim investir as fotografias de Robinson das mesmas qualidades formais e também
das mesmas propriedades da cena real, combina elementos singulares do realismo e do
idealismo, traduzidos na sua intenção de manter-se fiel aos fatos, e uma igual preocupação
com o modo de funcionamento da mente. Existe em comum nessas formulações uma
prioridade conferida ao elemento intelectual, manifesta na ênfase conferida ao elemento
subjetivo na apreensão do entorno, prioridade que se traduz esteticamente na mobilização
de procedimentos abertamente intervencionistas e artificiais.

Ao acontecimento, Robinson interpõe a análise desse acontecimento, sua contextualização


relativamente a outros acontecimentos, contíguos ou afastados, e a sua interpretação
subjetiva, referida não mais aos estímulos visuais, mas ao trabalho da mente, também
corpóreo. Essas proposições encontram sua formulação estética nas determinações múltiplas
e diacrônicas das impressões compostas. Não por acaso, dentre as contribuições científicas
da época, proporcionadas principalmente pelos fisiologistas, Robinson identificou-se


Por meio da combinação de negativos tomados separadamente, Robinson tinha em vista obter os efeitos atualmente
tor-nados disponíveis pelas objetivas ditas corretivas, usadas sobretudo nas fotografias de arquitetura. Trata-se, nos dois
casos, de corrigir a tendência de convergência das linhas em direção ao ponto de fuga. Além do controle espacial, a mon-
tagem possibilitava um controle localizado da intensidade de luz e do tamanho de cada elemento da cena. 
especialmente com as concepções correntes sobre a natureza do espaço extensivo e sobre

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o aspecto associativo do real.

Robinson foi, em verdade, um artista conceitual que concebeu previamente suas imagens
e realizou-as em concordância com princípios intelectuais. De modo bem diverso do
pretendido por Emerson, para quem Robinson era um “pretensioso e seu livro a quintessência
de falácias literárias e anacronismos na arte” (NEWHALL, 1989, p. 55), seus tableaux-
vivants precederam e de certo modo anteciparam as encenações teatrais e as instalações
realizadas atualmente por influentes artistas, do mesmo modo que sua concepção do
trabalho artístico como produção de artifício que pode e deve associar procedimentos da
poesia, do teatro e da fabulação mítica antecipa, do ponto de vista da lógica da produção
imagética não-verídica, o hibridismo e a crescente virtualização recorrentes no campo das
práticas artísticas contemporâneas.

Ainda que de modo tímido, essas proposições começam a anunciar um tipo de flexibilização
do ato de olhar, cada vez menos referido às condições empíricas e à presença de um
referente preexistente. A visão, mais do que o olhar, constitui o território de experiência
desse sujeito. Encarnada, irremediavelmente atada ao corpo, essa visão que se descola da
retina tem um papel fundamental no processo de conformação do sujeito moderno. A
abstração do ato de olhar implica um distanciamento da imagem retiniana e, no contexto
da história da arte, o abandono dos projetos estéticos fundados primordialmente nos
estímulos sensoriais, como o de Emerson e o dos impressionistas. Uma tal passagem pode
ser comparada à que foi realizada no século XX pelos movimentos artísticos de vanguarda,
como o cubismo e o surrealismo, e também pela arte como idéia de Marcel Duchamp e
pela arte conceitual da década de 1960.

No decorrer da segunda metade do século XIX, os fotógrafos-cientistas Edward Muybridge,


Etienne-Jules Marey e Albert Londe, tomando partido das recentes tecnologias dos filmes,
puderam decompor o movimento em vários instantes, revelando momentos da trajetória
dos móveis que são vedados à percepção direta. De modo semelhante, em muitos aspectos,
aos trabalhos realizados por Robinson e por Rejlander, esses fotógrafos-cientistas criaram
uma estética fotográfica em que contava uma crescente abstração da visão. Ao revelarem
cenas e intervalos temporais imperceptíveis ao olho, suas imagens situam-se na fronteira do
até então invisível. Dessa vez, de uma invisibilidade imanente.

2.2 Segunda imagem

O segundo momento caracteriza-se pelas iniciativas com vistas a compatibilizar um tipo


de linguagem abstrata a um projeto voltado para a expressão da visão pessoal do fotógrafo,
no caso de Alfred Stieglitz, dentro dos limites da estética purista e, para Man Ray, abrindo
o campo às influências de outros meios. Os projetos desses dois fotógrafos estão referidos
a um centramento na experiência do sujeito como lugar de uma dimensão oculta passível
de ser revelada ou intuída através da arte. Ao apontar para uma engenharia da interioridade
do sujeito e para uma lógica subjacente das imagens, o conceito freudiano de inconsciente
está no cerne da produção desses dois fotógrafos.

Em torno da década de 1920, Stieglitz introduz a agenda modernista no campo da
fotografia, enfatizando sobretudo as questões da autonomia da obra de arte e da
especificidade do meio. Nesse momento estava em conta uma modalidade muito especial
de abstração voltada ao desvelamento de elementos imateriais, de certas substâncias
essenciais que informam o visível.

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Nesse ideário, compartilhado pelos mais renomados fotógrafos da primeira metade do
século XX, como Paul Strand, Edward Weston e Ansel Adams, manifesta-se a crença na
existência de uma dimensão imaterial que preside a constituição do visível. Nesta divisão
entre o visível e o invisível cabe à fotografia revelar, através do inventário das aparências, a
forma da essência. Persiste nesse inventário algo oculto, um olho do espírito, uma dimensão
invisível, de natureza distinta daquela sugerida pelo que escapa ao olhar.

Em outra direção, francamente conceitual, que guarda afinidades com os trabalhos realizados
pelos dadaístas (Raoul Hausmann e Hannah Höch, entre outros) e construtivistas (Alexander
Rodtchenko e László Moholy-Nagy), mas também tendente a um tipo de abstração centrada
no sujeito, Man Ray praticou uma fotografia infiltrada de estrangeirismos e de línguas que
ele fez falar. Pintor de formação, foi também escultor, designer e fotógrafo polivalente,
com passagens marcantes no campo da publicidade, principalmente da fotografia de moda.
Com o mesmo propósito compartilhado por outros artistas do grupo surrealista, Raoul
Ubac e Maurice Tabard entre eles, Man Ray reinventou o fotograma, que chamou de
rayograma, fez uso de processos especiais, como a solarização e a montagem de negativos,
sempre empregados como vias de acesso ao inconsciente, e sobretudo criou – através dos
movimentos de enquadramento e corte, do tratamento da luz e da utilização do close-up
– um tipo de estranhamento frente à experiência do real que tem como contrapartida o
acesso à escrita automática do mundo (KRAUSS, 1985, p. 60 et seq.).

O pano de fundo dessa conjuntura é formado pelas iniciativas de compatibilizar um tipo de


linguagem abstrata a um projeto voltado para a expressão da visão pessoal do fotógrafo, no
caso de Stieglitz, dentro dos limites da estética purista e, para Man Ray, abrindo o campo às
influências de outros meios: diferenças que se exerceram sobre o fundo comum do modelo
expressionista, fortemente marcado por um centramento na experiência do sujeito. Em
acréscimo, ao apontarem para uma engenharia da interioridade do sujeito e para uma
lógica subjacente das imagens, a produção desses dois fotógrafos encontra-se intimamente
associada aos conceitos de inconsciente e de símbolo.

A fotografia híbrida de Man Ray e a fotografia pura e direta de Stieglitz estão, nessa
perspectiva, em oposição relativa. Antes de se excluírem, tais projetos se complementam, e,
no limite, estendem seus domínios específicos. No interior da batalha travada pelas acusações
recíprocas, que parecem apontar para o inevitável extermínio de uma ou outra corrente, os
contendores se fortalecem, sempre aprofundando e expandindo seus respectivos projetos.


Em outra oportunidade, sobre suas fotos de pimentões, Weston pontuou, “é clássico, satisfaz completamente – um
pimentão – contudo é mais do que um pimentão: é abstrato, porque o tema está totalmente ausente, não tem atributos
psicológicos e nenhum sentimento humano é despertado. Este novo pimentão nos transporta para além do mundo que
conhecemos conscientemente. Com certeza, muito da minha obra tem esta qualidade, muitos dos meus pimentões do
ano passado, exceto este, e na verdade todos os novos, conduzem-nos para uma realidade interior – o absoluto – onde há
um claro discernimento, uma revelação mística.” (CRAVENS apud NEWHALL, 1989, p. 82)

De acordo com a definição proposta por Jacques Aumont, “a palavra abstração designa um afastamento da realidade,
o que faz com que a arte abstrata só tenha definição negativa (diz-se não-figurativa), a arte da perda da representação”
(AUMONT, 1993, p. 260). Na crítica fotográfica, tornou-se habitual identificar como abstrata a imagem que apresenta seu
referente de modo não-convencional, não-documental ou não-literal, como, por exemplo, os close-ups de Edward Weston.
 Segundo Aumont, “a imagem expressiva é a que exprime seu autor através de uma forma enérgica (…) O expression-
ismo opôs-se então às escolas imediatamente anteriores, o impressionismo e o naturalismo, como a arte da necessidade
interior oposta à arte da realidade exterior, como a arte da projeção do Eu oposta à imitação da natureza” (AUMONT,
1993, p. 292). 
2.2.1 Alfred Stieglitz

Passagens da Fotografia
Relativamente às tendências históricas, a participação de Stieglitz no contexto do movimento
pictorialista situa-se na tradição da estética naturalista defendida por Emerson, cabendo-lhe
o lugar de promotor, nos Estados Unidos, das teses sobre o foco diferencial, a participação

discreta e imparcial do fotógrafo e o respeito pelo referente. Não foi casual, neste sentido,
sua recusa em aceitar as retratações finais de Emerson formalizadas no seu último artigo
“The Death of Naturalistic Photography”. De modo bem diverso do seu predecessor, sua
própria trajetória pauta-se na defesa e na depuração desses ideais, conduta que terminou
por levá-lo a abandonar, ao final da década de 1910, a estética pictorialista para fixar os
rumos da fotografia moderna norte-americana.

Após fundar, na virada do século, a galeria Photo-Secession e tornar-se editor da revista
Camera Work, ambas as iniciativas dedicadas à divulgação dos trabalhos dos fotógrafos
pictorialistas – entre eles Edward Steichen, Robert Demachy, Alvin Langdon Coburn,
Gertrude Käsebier, Clarence White e Gustave Le Gray –, Stieglitz exerceu uma influência
seminal na divulgação do movimento modernista europeu nos Estados Unidos, promovendo
exposições de artistas como Pablo Picasso, Georges Braque e Marcel Duchamp. Também
com referência à produção artística norte-americana, Stieglitz promoveu diversas exposições
de importantes artistas norte-americanos, como Arthur Dove, Georgia O’Keeffe e John
Marin, perfazendo uma trajetória que mereceu, por parte do crítico norte-americano Andy
Grundberg, o seguinte comentário:

Para compreendermos o que o modernismo significou para a fotografia, temos


inevitavelmente que levar em consideração a imensa influência de Stieglitz, presente até
os dias de hoje. Ao longo da sua complexa carreira, ele exerceu as atividades de crítico,
editor, dono de galeria de arte, produtor, entusiasta e inspirador. Todavia, iniciou-se como
fotógrafo e como tal permaneceu durante toda a sua vida. (GRUNDBERG, 1990, p. 19)

A primeira série de fotografias do período modernista de Stieglitz são imagens tomadas


por um viajante, por alguém que está transitando por diferentes lugares, deslocando-se
incessantemente de um ponto a outro, maravilhado com os veículos de transporte, com
as novas máquinas da aceleração que interligam cidades e países de modo nunca visto.
Nessas imagens, as máquinas que simbolizam o progresso – aviões, aeroplanos, dirigíveis e
locomotivas – dividem o espaço urbano com as carruagens tracionadas pela força animal.
Nesse cenário de deslocamentos incessantes, o fotógrafo é um entre outros viajantes, aquele
que se desloca continuamente entre o cais do porto, a estação ferroviária e as vias públicas.

Na grande cidade moderna, onde tudo está em movimento, o fotógrafo, com sua
máquina armada sobre tripés, surpreende os deslocamentos a partir de um ponto de
vista fixo, mas excepcionalmente versátil. A imobilidade circunstancial do equipamento
possibilita a representação dos fluxos urbanos, de todas as entradas, saídas e percursos
viários. O meio fotográfico encontra, nesta versão, uma das suas definições como
um meio de transporte que favorece a circulação de imagens, ocasionando uma
simultaneidade de olhares e de novos fluxos.

O gesto de fotografar e as próprias imagens fotográficas integram esses grandes fluxos urbanos,
funcionando como suas metáforas, a um só tempo potência de fluxo e sua apreensão.


Sobre este ponto, Stieglitz (apud NEWHALL, 1989, p. 98) vaticinou: “Fiquei furioso com Emerson quando ‘The
Death of Naturalistic Photography’ foi publicado: uma retratação, motivada por ignorância, da sua estética pura”. 
As imagens que constituem esta primeira série de fotografias – que pode ser chamada de

Passagens da Fotografia
horizontal – funcionam como metáforas do processo fotográfico enquanto procedimento
de transporte, contemporâneo às máquinas da velocidade e do tempo comprimido.
Constituídas como sistemas fechados, dependentes de uma entrada e de uma saída (input/
output), a máquina industrial e a máquina fotográfica funcionam de modo análogo – a
primeira transformando matéria-prima em produtos seriais, e a máquina fotográfica criando
um tipo especial de cartografia ou de mapa da cidade moderna.

As fotografias verticais integram a segunda série de Stieglitz. São imagens da verticalidade


urbana, dos arranha-céus de Nova York, tomadas não mais das ruas, por alguém que
está passando, mas a partir de outros prédios: imagens de edifícios surpreendidos desde
outros edifícios. O eixo de tomada aqui é sempre vertical, acompanhando o movimento
ascendente da arquitetura urbana.

As grandes obras arquitetônicas, esses outros produtos da engenharia e da técnica moderna,
encontram-se, nessa série, monumentalizadas pela fotografia. Tais imagens não são, porém,
meros documentos dessa arquitetura. Nelas, a direção da luz e os jogos cromáticos entre as
sombras e as altas luzes acrescentam-se como suplementos ao mapa da cidade, reescrevendo-
a como uma superfície modulável, a exemplo do que se passa com a imagem do negativo
fotográfico no momento da sua exposição. Seccionada por essas variações cromáticas, tornada
superfície de inscrição, a cidade converte-se em metáfora ideal do processo fotográfico.

Quando vistas lado a lado, as imagens urbanas de Stieglitz compõem uma seqüência
minimalista quase cinemática. A luz, que é o elemento de modulação da composição
das imagens individuais, anima-as com relação umas às outras, tornando-as mutuamente
referidas. Esta mesma intensidade-luz que as sustenta individualmente parece também
perpassá-las no conjunto, criando um efeito de continuidade cinética entre os planos. Trata-
se, neste caso, de um tipo de montagem-luz que anima o movimento, utilizando como
recurso de edição as propriedades cromáticas. Metáfora da gênese química dos suportes
fotossensíveis, a impressão cromática da cidade transfigura a topografia urbana em um
protótipo do processo fotográfico.

Essas duas séries de Stieglitz – a série horizontal e a série vertical – integram um projeto
fotográfico em que prevalece a concepção de uma autenticidade da imagem e de uma
originalidade do fotógrafo. É um projeto ancorado na experiência espiritual e pessoal do
fotógrafo no contexto do cenário urbano, em um certo “sentimento pelas ruas”, na expressão
de Henry Miller (1987: 140), e em um tipo de subjetividade expressionista.

Do mesmo modo que Eugene Atget e Brassaï percorrendo as ruas de Paris, essas séries
remetem a uma experiência sensório-motora, quando o projeto fotográfico se pauta no
registro de uma presença na cidade que se apresenta como um espaço público extensivo,
possível de ser percorrido ou atravessado e que privilegia simultaneamente um sujeito
e um lugar da experiência.

Dotados de um olhar inaugural, esses fotógrafos de rua são capazes de revelar a singularidade
do lugar-comum, de propor novas experiências perceptivas e outras vistas da cidade.
Conforme Miller observou sobre Brassaï,

Tudo a que seu olho se apega adquire valor e significado, um valor e um significado, eu
diria, até agora evitado ou desprezado. O fragmento, o defeito, o lugar-comum – ele
descobre nessas coisas o que existe de novidade ou perfeição. Explora com igual interesse
a rachadura na parede ou o panorama de uma cidade. (MILLER, 1987, p. 136)

10
Tais fotografias de rua confirmam a existência de uma realidade preexistente e se afiguram como

Passagens da Fotografia
seus legítimos documentos, fundando simultaneamente um real e a sua representação.

O ensaio realizado por Stieglitz a partir dos anos 1920 e 1930, formado por uma série
de fotografias de nuvens, algumas delas denominadas Equivalentes, compõe a terceira
série. O cinetismo dos meios de transporte e da arquitetura urbana encontram-se diluídos
nessas grandes massas cinzentas, com a horizontalidade viária e a verticalidade compacta
dos arranha-céus tornadas apenas céu. Para realizar essas tomadas oblíquas não é preciso
caminhar pelas ruas ou ascender aos pavimentos superiores dos prédios. Nessas fotos o
movimento sucede em outro plano, superior – cartografia invertida da urbe –, que implica
a total abstração do ponto de vista do fotógrafo e o abandono de toda referência social.

Nessas imagens de nuvens tudo parece diluir-se, à exceção de um pequeno arbusto ou de uma
casa campestre comprimida em uma margem do quadro, únicas referências materiais nessas
fotos. Mas o singular aqui é a potência analógica dessas imagens, expressa na semelhança
constitutiva entre a natureza do referente e a base química do negativo. Como assinala
Philippe Dubois (1994, p. 202), “a nuvem com suas miríades de pontos de vapor de água
suspensos, a fotografia, com suas miríades de cristais de haleto, capta e reflete em sua própria
matéria, na descontinuidade de seus grãos, as variações luminosas que a cercam”.

Nesse ensaio de maturidade não há sentido, para o fotógrafo, em apontar a câmera para
objetos e acontecimentos imediatos. Trata-se antes de remeter a imagem fotográfica
diretamente ao seu equivalente, ali onde se inscreve sua essência estética e química. Sobre
esse ensaio, Stieglitz declarou:

quis fotografar as nuvens para descobrir o que me haviam ensinado quarenta anos de
fotografia. Através das nuvens, deitar no papel minha filosofia de vida – mostrar que as
minhas fotografias não se deviam ao conteúdo e aos temas – a árvores singulares, a rostos,
a interiores, nem a dons particulares – as nuvens estão ali para todos – não se cobra taxas
sobre elas até o presente – são livres. (STIEGLITZ, apud DUBOIS, 1994, p. 201)

A remissão que Stieglitz faz às suas outras fotos, a partir do ponto de vista dos Equivalentes,
estabelece uma hierarquia, centrada no índice de abstração metafórico, em que as imagens
precedentes ocupam lugares inferiores ou intermediários, como se a sua trajetória
apresentasse uma linha ascendente em direção a estágios mais avançados de emancipação
dos conteúdos e temas particulares.

Fica explicitada, também, na declaração precedente de Stieglitz, a distância entre o seu


projeto e a prática documental convencional. Empenhado em reivindicar para a fotografia
o mesmo prestígio obtido pelas obras de artes plásticas, o que, na sua agenda, significava,
de modo muito pragmático, obter para a fotografia o mesmo reconhecimento institucional
em galerias e museus alcançado pelas artes plásticas e, igualmente, um valor elevado de
mercado, Stieglitz acrescenta, em seu projeto, algo ao formato documental. A principal
dessas diferenças decorre da presença de uma intenção metafórica que, como ele próprio
anunciou, envolve uma abstração do aqui e agora. No aspecto técnico, todavia, esses ensaios
permanecem sobrevalorizando os aspectos descritivos da imagem – os mesmos consagrados
pela prática documental convencional.

A fotografia de arte promovida por Stieglitz diferencia-se, ao mesmo tempo em que coincide,
com o projeto documental. Considerada do ponto de vista da emancipação do sujeito e do


Nessa linha evolutiva, os retratos realizados por Stieglitz, em especial seus close-ups de Georgia O’Keefe, que não
abordaremos diretamente neste ensaio, antecedem e preparam suas imagens de nuvens. No plano estético, esses retratos
manifestam a preocupação recorrente de Stieglitz com as linhas abstratas e as formas geométricas, empregadas, nesse
caso, com o objetivo de dissolver as relações orgânicas naturais. 11
objeto que mobiliza o ideário moderno, a fotografia direta ou pura permanece a meio caminho,

Passagens da Fotografia
promovendo, através do emprego de uma linguagem abstrata, a pretendida liberdade do
autor, mas conservando a aderência imediata e supostamente objetiva ao referente.

É verdade que, em uma escala de valor, Stieglitz priorizava a vocação abstrata e autoral da
criação, opção que faz com que o suplemento dessas fotografias esteja sempre associado à
qualidade e à intensidade da experiência do fotógrafo. Mas é imprescindível considerar as
decorrências da fixação de Stieglitz no modelo descritivo-figurativo. Afinal, a ambigüidade
e as inconsistências da trajetória modernista na fotografia oscilam nesse pêndulo.

No caso do modernismo na pintura e nos demais meios artesanais, as vanguardas
históricas conquistaram, por meio do tratamento plástico da matéria pictórica, a auto-
referencialidade da obra. No caso da fotografia, porém, a atenção aos procedimentos
singulares ao meio implicou, ao contrário, a manutenção de relações ainda mais diretas
e imediatas com o referente.

O formato do projeto moderno vanguardeado por Stieglitz define-se por meio da
demarcação de uma fronteira externa, que secciona o fotográfico e o não-fotográfico,
e o estabelecimento de linhas divisórias internas ao campo, que distinguem a prática
artística especializada das práticas documental e amadora. Em confronto com as fronteiras
externas, a fotografia moderna pretende-se pura e auto-referida, ao passo que na relação
com as fronteiras internas ao meio ela se define como prática especial, nem estritamente
documental, nem meramente amadora – um lugar de contato, simultaneamente restritivo
e expansivo, figurativo e abstrato, direto e alusivo.

As opções técnicas sancionadas pelo modernismo estendem-se a diferentes etapas do processo
de criação. A seguir apontam-se algumas dessas opções – todas, note-se, relacionadas a
questões sobre a instantaneidade, a bidimensionalidade do plano e a figuração: a apologia
da imagem única em oposição às montagens e seqüências fotográficas; a fixação do ideal
de obtenção de instantâneos de alta definição e grande poder descritivo em substituição às
imagens flou; a preferência por tomadas externas em oposição à artificialidade dos estúdios;
o privilégio dos flagrantes sobre as poses; a utilização de papéis fotossensíveis industrializados
em substituição ao emulsionamento manual; a obtenção de cópias que respeitam o formato
original do negativo, todos critérios que visam assegurar a transparência da imagem.

Conceitualmente, a observância desses critérios ocasionou a apologia da direção tópica
– que encerra a qualidade lenticular de reprodução de linhas e pontos da imagem – e
da direção crônica, de proporcionar um registro instantâneo. Por meio desses critérios
técnicos, o projeto moderno legitima essas duas orientações, supostamente inerentes ao
meio, em oposição frontal às técnicas artesanais ou intervencionistas. Não por acaso,
sua consagração ocasionou a virtual exclusão da estética pictorialista e, em linha direta,
de todas as estratégias associacionistas que contassem com a colaboração de outros
saberes e práticas, visuais ou literárias, como se verifica no caso dos fotógrafos-artistas, do
surrealismo, do futurismo e do concretismo.

O aspecto reducionista dessa viagem afigura-se na demarcação do seu próprio território e
na desqualificação de certos procedimentos, em tese, não menos fotográficos. São


Em artigo publicado em 1940, o crítico de arte norte-americano Clement Greenberg defendeu a auto-referenciali-
dade como o critério estético por excelência da arte moderna, que, na sua visão, norteia-se, “quer conscientemente
quer inconscientemente, por uma noção de pureza derivada do exemplo da música; as artes de vanguarda nos últimos
cinqüenta anos alcançaram uma pureza e uma delimitação radical de seus campos de atividade sem exemplo anterior na
história da cultura. As artes encontram-se agora em segurança, cada uma dentro de suas legítimas fronteiras…” e, mais
adiante, “as artes, portanto, foram tangidas de volta a seus meios, e neles foram isoladas, concentradas e definidas. É em
virtude de seu meio que cada arte é única e estritamente ela mesma” (GREENBERG, 1997, p. 53-54). 12
operações que privilegiam o elemento neutro e o lugar identitário, interditado às

Passagens da Fotografia
passagens, às misturas ou aos compostos.

Por outro lado, a potência do modernismo está em criar uma imagem do invisível a partir
dos dados empíricos de superfície, mantendo o alinhamento fenomenológico fotógrafo-
equipamento-referente. Resultado que é obtido através de um tipo de abstração metafórica,
uma figura de estilo que possibilitou ao movimento afirmar-se como artístico, em
confrontação com a prática documental e amadora. Em acréscimo, essa preocupação com o
lenticular, o descritivo e o direto proporcionou o progressivo domínio técnico e químico

sobre o elemento mínimo da imagem, uma tendência que vai persistir na produção de Paul
Strand, Edward Weston, Ansel Adams e Minor White.

Vista retrospectivamente, se a viagem moderna tivesse problematizado a questão do
referente através do uso ou da mera aceitação de procedimentos não-figurativos ou de
práticas compostas, talvez pudesse ter alcançado a radicalidade que propôs. Pode ser então
que, pela natureza quase imaterial do referente, as fotografias de nuvens realizadas por
Stieglitz representem uma aposta na auto-referencialidade da imagem. É possível pensar que,
além de escapar da racionalização da perspectiva, como observou Hubert Damish (apud
BELLOUR, 1983, p. 215), os Equivalentes escapem também da projeção referencial.

O trabalho de identificação e de celebração das singularidades do meio levado a termo
por fotógrafos e críticos modernos culminou com o estabelecimento dos conceitos de
fotografia direta e de purismo. No contexto do ideário moderno, esses dois conceitos
ocuparam o lugar de centros de referência destinados a selecionar as opções estéticas
responsáveis pela valorização das propriedades internas, aquelas que, como se viu,
garantem as operações de purificação.

O modernismo fotográfico estabeleceu-se, portanto, como movimento restritivo,


sistematizando as tendências históricas da fotografia, com referência a uma clivagem
estabelecida em confrontação com os demais meios de expressão visual. No interior
dês,as oposições, a ênfase conferida ao específico fotográfico afirmou-se por meio da
desqualificação do que havia de comum entre a fotografia e a pintura, o desenho, a
gravura, o cinema e a literatura, de modo a demarcar uma fronteira entre o que se
identificava com o irredutivelmente fotográfico e o excluído, território das passagens,
dos intermediários e dos híbridos.

No caso da pintura, a assimilação do conceito de auto-absorção significara o virtual
abandono das linhas e dos contornos figurativos em direção a uma linguagem crescentemente
abstrata, em que a prevalência do referente se esbatia na importância conferida ao corpo e
à visão do artista. Entretanto, como se viu, a assimilação desse mesmo conceito, no caso da
fotografia, redundou na ênfase unilateral dos aspectos descritivos e lenticulares da imagem
que terminaram por inibir seus desdobramentos formais e conceituais.

2.2.2 Man Ray

Seu ponto de partida e sua ambiência não foram o meio fotográfico, escultórico ou pictórico
nos seus particularismos processuais e técnicos. Utilizou-os todos com referência a uma
potência visual, fazendo-os funcionar à sua maneira, recriando-os, forçando-os a falar ali
onde eram silêncio. Não apenas os meios. Man Ray fez o mundo falar o indizível, não um
mundo que preexistia, objetivo e passivo, mas aquele que ele animou a partir da sua prática
artística, sempre referida ao interior – aos processos e à dimensão irracional.

13
Para fazer a fotografia falar, Man Ray dedicou-se intensivamente ao trabalho de laboratório,

Passagens da Fotografia
investigando a natureza física e química do processo fotográfico, sem qualquer tipo de
idéia preconcebida, postura que lhe valeu a acusação de estar afinado com a estética e a
ética pictorialistas. Tais acusações partiram, decerto, dos modernistas que, ao elegerem o
elemento técnico e a prática meramente descritiva como os elementos-sujeito da história
do meio, desqualificaram seguidamente as práticas híbridas, artesanais e projetivas. Man
Ray rebatia cada investida dessa mentalidade tecnicista: “As pessoas me perguntam: ‘Que
tipo de câmera você usa‘? Respondo: A um pintor, não lhe perguntam que tipo de tinta e
de pincéis utiliza.” (MAN RAY, 1979, p. 20). A resposta de Man Ray não tem intenção de
estabelecer nenhuma hierarquia entre fotografia e pintura, mas simplesmente de embaralhar
os termos e comutar os valores habitualmente associados ao meio fotográfico.

Tal postura verifica-se também no debate acerca da natureza artística da fotografia, travado
com Stieglitz na posição de defensor do estatuto artístico da fotografia, em que Man Ray
dissera que, como artista, não estava interessado na fotografia, para depois acrescentar:
‘Eu mesmo não sei o que é arte. Acho que os velhos mestres não eram artistas; eram
apenas bons fotógrafos antes que a câmera fosse inventada’ (MAN RAY apud HILL;
COOPER, 1979, p. 21).

Para os modernos que o consideravam pictorialista, Man Ray teria sido, nesse sentido
do termo, um pós-moderno, dotado de uma inquietação criativa que o tornou precursor
em larga medida das revoluções por que passou a imagem após a década de 1970. Sua
familiaridade com vários meios – do air-brush à pintura, da fotografia ao cinema – reflete
uma prática plural, exercida na fronteira entre os diferentes campos de arte, muitas vezes
expandindo seus limites convencionais, como foi o caso dos fotogramas e das solarizações
no âmbito da fotografia. Em verdade, Man Ray manteve-se avesso a todo pensamento ou
prática que se exerce pela discriminação de opostos, atitude que o levou a lutar também pela
diluição das fronteiras entre a vida e a morte, o local e o universal, o real e o imaginário.

Man Ray foi um revolucionário10 que nunca se deixou seduzir pelo óbvio, pelas fórmulas
dos manuais fotográficos que exaltavam a boa fotografia, nem pelo sentido de dicionário da
linguagem. Sobrepôs, à boa foto e à linguagem formal, os exercícios de um pensamento vivo
que se reinventa todo o tempo. Suas passagens pelo dadaísmo e pelo surrealismo estão longe
de lhe conferir o título de membro desses grupos. Na verdade, tomou esses movimentos
mais pelos seus potenciais subversivos do que propriamente pelos seus programas, usando-
os à sua maneira no que apresentavam de contestadores.

Man Ray foi o mais influente e, por longo tempo, o único fotógrafo ligado ao grupo surrealista.
Suas fotos integraram vários números da revista La Révolution Surréaliste, surgida em 1924,
a publicação oficial do movimento, e também da revista que a substituiu a partir de 1930,
Le Surréalisme au Service de la Révolution. A contar de 1933, publicou vários trabalhos na
revista Minotaure, que trazia no seu corpo editorial os mais destacados nomes do movimento,
como André Breton, Paul Éluard e Marcel Duchamp. A contribuição de Man Ray é notável
também em livros e apresentações públicas do grupo: além de ilustrar o livro de poemas
1921, de Benjamin Péret e Louis Aragon, contribuiu com várias ilustrações para os livros de
Breton, entre eles Nadja, L’amour fou e Anthologie de l’ humour noir. É igualmente notável
sua galeria de retratos dos mais destacados artistas e pensadores da sua época: Tristan Tzara,
André Breton, Marcel Duchamp, Henri Matisse, Constantin Brancusi Georges Braque11.
10
Sobre Stieglitz, que conhecera nas suas idas às galerias Photo-Secession e 291, Man Ray certa vez comentou: “ele era
um separatista, e a idéia de separar-se ou rebelar-se sempre me atraiu. Eu era um revolucionário” (HILL; COOPER, 1979,
p. 19). Nesta passagem evidencia-se o reconhecimento da importância de Stieglitz na cena cultural norte-americana e a
imediata percepção da contradição do projeto modernista, onde ele deixa de ser expansivo para se tornar restritivo. Man
Ray marca desse modo sua distância frente ao projeto esteticista e abstracionista defendido pelos puristas.
11
Para informações mais detalhadas sobre imagens publicadas e datas de referência, cf. Arturo Schwarz, (1977, p. 238 et seq.). 14
Mas, no que se refere ao seu relacionamento com o grupo surrealista, marcado por essa

Passagens da Fotografia
intensa colaboração que se prolongou por mais de vinte anos, Man Ray manteve-se
distante das disputas em torno das questões doutrinárias e também das atividades internas
do grupo. Talvez seu alinhamento com o ideário anarquista, manifesto na sua juventude,
seja mais esclarecedor da sua atitude como criador do que sua posterior afinidade com os
movimentos dadaísta e surrealista.

É provável que o papel dúbio que a fotografia desempenhou no interior do movimento
surrealista – desprezada ao ponto de não ter merecido a atenção de Breton nos seus
manifestos12 e, ao mesmo tempo, exaltada como a prática solidária por excelência com
os procedimentos surrealistas do automatismo e da instantaneidade – tenha favorecido
esta sua posição a um só tempo marginal e de grande importância em praticamente
todas as realizações do grupo.

Sua obra não se endereça ao olho, lugar da percepção, como também não parte dos objetos
como lugar de sentido. Se nas suas imagens há referências ao olho, como em The Object
to Be Destroyed, trata-se de um olho construído por meio de certos procedimentos que o
destituem dos seus atributos anatômicos habituais — um olho inconsciente, constituído na
medida dos produtos da imaginação, que se acrescenta às coisas e à sua percepção imediata.

Em artigo significativamente intitulado Deceiving Appearances, Man Ray destaca a
importância desse olho inconsciente: “Ademais, a fotografia não se limita ao papel de copiadora.
Ela explora aqueles aspectos que nossa retina jamais registra…” (MAN RAY, 1989, p. 12)

Essa prioridade concedida às idéias e às imagens mentais aproxima a obra de Man Ray ao
projeto estético de Duchamp, em especial da defesa que este fez de uma arte conceitual.
Tanto os ready-made de Duchamp quanto os objetos de Man Ray funcionam de modo
essencialmente perverso. Do ponto de vista de um ideário que busca otimizar o desempenho
das máquinas, acrescentando-lhes maior eficiência e confiabilidade, suas obras, inúteis
do ponto de vista utilitário, apresentam um funcionamento negativo. Criados para
estabelecerem uma sucessão de paradas e um tipo de circulação ambígua das energias,
esses dispositivos questionam a lógica do pensamento positivista que promoveu os avanços
técnicos e a expansão da produção industrial em larga escala.

Parte vital da produção artística de Man Ray, suas fotografias tornam visível o que as
imagens produzidas em conformidade com as normas convencionais não podem deixar
ver. Constituídas como artefatos técnico-mecânicos, elas acrescentam ao repertório dos
procedimentos técnicos e formais uma modulação que subverte as expectativas habitualmente
associadas ao meio. Algumas dessas fotos, como Explosante- fixe, resultam do emprego de
procedimentos que forçam a máquina a desempenhar tarefas imprevistas, enquanto outras,
como os rayogramas, simplesmente dispensam a intermediação do aparelho fotográfico.
Em meio à polêmica sobre o lugar do fotógrafo, ao ser indagado se ele mesmo tirava suas
fotos, Man Ray desfechava: “Sempre. Ainda que outra pessoa aperte o botão, sou eu que
tiro a fotografia” (MAN RAY apud HILL; COOPER, 1979, p. 21).

Man Ray tem uma participação muito precisa na controvérsia sobre a natureza artística da
fotografia, que envolveu os mais importantes críticos e fotógrafos das décadas de 1920 e 193013.

12
No primeiro Manifesto, Breton atém-se prioritariamente aos recursos poéticos, essencialmente literários, tornados dis-
poníveis pelos procedimentos surrealistas. Refere-se aos pintores apenas em uma nota, na qual cita textualmente Georges
Seurat, Pablo Picasso, Giorgio de Chirico, Francis Picabia, Paul Klee e Man Ray, dentre outros artistas, sem qualquer
referência a fotógrafos. A inclusão de Man Ray nesta lista deve-se exclusivamente à sua contribuição pictórica.
13
Este debate contou, a partir de 1928, com uma coluna permanente, assinada por Jean Gallotti, na importante revista
L’ Art Vivant, da qual participaram destacadas personalidades da época, como Alfred Stieglitz e Man Ray. 15
Enquanto os românticos envolveram-se com a questão essencialmente moral de se a imagem

Passagens da Fotografia
fotomecânica poderia contar com o mesmo tipo de subjetividade que os artistas-artesãos
projetam em suas obras, e os puristas, por sua vez, empenharam-se no reconhecimento do
valor artístico da fotografia através da valorização dos elementos formais próprios ao meio,
Man Ray envolveu-se com um modo de funcionamento da máquina que já não era o da
sua negação moral ou o da exaltação dos seus potenciais estéticos, mas o da sua assimilação
a uma poética do inconsciente. A máquina fotográfica – e antes dela a técnica do air-brush,
que Man Ray utilizara largamente no período dadaísta –, criava um tipo de imagem de
natureza muito próxima à das imagens inconscientes, funcionando, da mesma maneira que
a escrita automática serviu aos poetas do grupo, como procedimento automatista de acesso
ao inconsciente, com a singularidade de realizá-lo instantânea e mecanicamente.

Os trabalhos fotográficos de Man Ray, incluídos aqueles nos quais a fotografia está associada a
outras técnicas, como na montagem Trans Atlantique, situam-se na tensão entre a descrição
fotográfica – a condição de a fotografia ser ordinariamente a imagem instantânea de uma
experiência imediata – e esse recuo imposto pelas operações mentais que a abrem aos jogos
do inconsciente. Tal tendência de associar elementos aparentemente opostos encontra
paralelo na própria origem do termo surrealista. Acolhendo o método de análise defendido
por Freud, em especial o lugar de prioridade que este concedeu à realidade psíquica e
ao sonho como expressão do inconsciente, Breton defende, no seu primeiro manifesto, a
superação das antinomias que segregam a realidade cotidiana do universo onírico. Sobre
este último, acrescenta:

Do momento em que seja submetido a um exame metódico, quando, por meios a


serem determinados, se chegar a nos dar conta do sonho em sua integridade (isto
supõe uma disciplina da memória que atinge gerações: mesmo assim comecemos
a registrar os fatos salientes), quando sua curva se desenvolve com regularidade e
amplidão sem iguais, então se pode esperar que os seus mistérios, não mais o sendo,
dêem lugar ao grande Mistério. Acredito na resolução futura destes dois estados, tão
contraditórios na aparência, o sonho e a realidade, numa espécie de realidade absoluta,
de surrealidade, se assim se pode dizer. (BRETON, 1985, p. 44-45)

Do ponto de vista da produção dos trabalhos fotográficos, a mediação entre esses dois
termos se faz pela intervenção do artista, que agencia certos objetos e elege determinados
recursos visuais de modo a conferir à imagem um valor simultaneamente atual e virtual.
As técnicas de solarização e de cópia negativa, os rayogramas, os recursos de inversão do
eixo de tomada e de enquadramento, são empregados, nesse curso, como procedimentos
complexos que objetivam a criação de um suplemento. Mobilizados com o intuito de
provocar uma idéia através da aproximação de duas realidades distantes ou de apresentar
uma visão incomum, esses recursos impõem sempre um distanciamento que ocasiona uma
espécie de gap. Os elementos da crítica, da ironia e do desejo, que são as substâncias por
excelência do suplemento, irrompem nesse espaço intermediário, marcado pela distância.

Man Ray, que certa vez declarara detestar as pessoas que admiravam a destreza técnica do
seu trabalho, manteve-se avesso às questões estéticas, entendidas como soluções meramente
formais. Tal postura decorre da prioridade concedida ao aspecto conceitual da obra que,
uma vez definida, dispõe os elementos visuais de modo a que eles funcionem à sua maneira.
A finalidade do seu processo criativo inscreve-se, desse modo, nos conceitos mentais que os
jogos de linguagem despertam, muito mais do que nos efeitos que as disposições formais
dos elementos visuais possam ocasionar.

Com Man Ray, a fotografia prestou-se a finalidades que ultrapassaram a do registro sumário
obtido segundo critérios da verossimilhança. Havia, na sua acepção, “melhores coisas a fazer na
16
vida do que copiar” (MAN RAY, 1989b, p. 11), sentimento, aliás, amplamente compartilhado

Passagens da Fotografia
pelos surrealistas, que Breton expressara nos termos de uma aversão aos detalhes e às intenções
descritivas que haviam pontuado até então boa parte da produção literária.

O trabalho fotográfico de Man Ray pode ser compreendido em três fases, nitidamente
separadas, mas que trazem em comum a mesma tensão presente nas operações de
deslocamento. São elas: os fotogramas realizados na década de 1920; as solarizações da
década de 1930 e os desenquadramentos, considerados neste último item certos recursos
como a inversão do ângulo de tomada e o flou, largamente utilizados na fotografia direta. Os
fotogramas de Man Ray, batizados pelo próprio artista de rayogramas, constituem um tipo
muito especial de fotografia: uma imagem obtida sem a utilização de câmeras e objetivas,
tomada diretamente da sombra dos objetos dispostos sobre um suporte fotossensível.
Formada de modo instantâneo e contando em larga medida com o acaso, esse tipo de
imagem apresenta-se como uma via privilegiada de acesso ao inconsciente.

No universo da produção surrealista, os rayogramas14 significaram a tradução para o
registro visual das técnicas automatistas inicialmente utilizadas pelos mais destacados
poetas e escritores do grupo, como Paul Éluard, Philippe Soupault, Louis Aragon e o
próprio André Breton. Já do ponto de vista da história do meio, significaram a remissão
da fotografia à pré-história da pintura e a correlata disjunção entre fotografia e indústria
da figuração, que implicam rearranjos dos campos fotográficos e a revisão das definições
ontológicas e essencialistas do meio.

Resultado de certas operações manuais realizadas pelo fotógrafo, os fotogramas alinham-
se, pelo menos no âmbito processual, com as imagens artesanais – como a pintura e a
gravura – numa época em que os fotógrafos mais afinados com as transformações em curso
buscavam marcar suas diferenças com a tradição pictorialista.

A dependência exclusiva dos procedimentos químicos, desse modo supervalorizados pela
ausência de câmeras e objetivas, confere ao fotograma um lugar de todo singular na história
da fotografia. No fotograma Kiki drinking, por exemplo, o critério da verossimilhança
não funciona de modo pleno. Também não encontramos aqui o contraste ou os tons
intermediários, nem mesmo a definição dos detalhes normalmente buscados em fotografias.
Estas são qualidades decorrentes do uso de objetivas com alto poder de resolução e da eleição
de uma série de equipamentos de precisão permanentemente aperfeiçoados pela indústria
da figuração. Ao invés desses efeitos ópticos, Kiki drinking resulta da contigüidade entre
imagem e objeto, um tipo de disposição que só se verifica no ambiente controlado do
laboratório, na ausência de qualquer paisagem e da luz natural.

A primeira etapa do processo de realização dos fotogramas é a eleição dos objetos. Tal
controle por parte do artista indica que nessas imagens nenhuma presença é aleatória e
nenhum acontecimento antecede a situação fotográfica. Apenas o resultado final da
imagem – a densidade das sombras e o registro das formas – depende do acaso. Curiosa e
surpreendente é essa inversão entre controle e acaso, em que a previsibilidade da técnica
dá lugar ao aleatório e o imotivado da paisagem é substituído pelo rigor do conceito que
encontra a sua expressão nos objetos eleitos pelo artista.

Tais qualidades indicam que essas imagens são efeito de uma viagem na imobilidade. Ao
invés da vertigem proporcionada pelas grandes extensões e dos imprevistos de percursos,
recorrentes nas viagens no espaço, presenciamos nesse caso o efeito de um deslocamento

14
Em verdade Man Ray não foi o primeiro a realizar fotogramas: Chistian Schad já havia obtido fotogramas antes, e
Laszló Moholy-Nagy realizou-os extensivamente a partir dos anos 1920. A originalidade da contribuição de Man Ray
está na subordinação deste recurso ao inventário surrealista. 17
interno, efetuado nos limites do quarto escuro, livre dos ruídos, da poeira e da luz natural.

Passagens da Fotografia
Uma vez transformado em local gerador de imagens, o laboratório torna-se o lugar por
excelência do artifício, o meio físico no qual se realiza a viagem.

A incidência do acaso em algumas dessas imagens é intensificada pela ação do fotógrafo durante
o momento de exposição dos objetos à luz. Deslocando seus materiais sobre a superfície
sensível no decorrer dessa fração de segundo, o fotógrafo cria uma impressão flou, por vezes
um efeito puramente atmosférico, que resulta em uma imagem ainda mais rarefeita.

Um outro recurso, igualmente rarificador, foi sistematicamente trabalhado por Man Ray.
Trata-se do emprego de anteparos reflexivos – como espelhos, vidros, prismas e cristais –,
rebatidos sobre uma superfície opaca, que criam uma imagem quase cinética, como na
rayografia Untitled, de 1922.

Após os fotogramas, predominantes na sua iconografia da década de 1920, Man Ray
produziu uma série de fotografias utilizando os recursos da cópia negativa e da solarização.
Este último procedimento, em si muito simples – consistia em acender e imediatamente
desligar a luz do laboratório durante a revelação do negativo ou da cópia fotográfica –,
ganhou, em suas mãos, estatuto conceitual de procedimento automatista. Seus resultados
nesse campo são surpreendentes: cenas triviais, uma vez destacadas da sua ambiência
original, adquirem uma aura de mistério.

A interferência, em grande medida aleatória, da luz artificial no decorrer do processamento
provoca a substituição da linha figurativa dos objetos por um halo luminoso que se estende
por todo o plano da imagem. Também a separação tonal entre os matizes brancos e negros,
que encontramos nas fotos convencionais, cede lugar a uma variação de tons cinzas que, desse
modo, passam a dominar toda a cena. Essas duas variáveis – o apagamento dos contornos e
a inversão tonal – introduzem, em um primeiro momento, um “senso de descorporeidade da
imagem” (PHILLIPS, 1988, p. 205-208) e, a seguir, a suspensão da referência pontual entre
imagem e objeto, como na solarização Primat de la matière sur la pensée .

A manutenção dessas distâncias visuais e conceituais parece conspirar no sentido do
estabelecimento das condições ideais de emergência do inconsciente e do irracional. O
laboratório fotográfico, transformado aqui em câmera escura – lugar gerador de imagens –,
ocupa nesse projeto a função de dispositivo regulador da distância entre os fatos subjetivos,
conscientes e inconscientes, e o mundo exterior. Se, tradicionalmente, o sistema de projeção
da perspectiva central proporcionou a representação do que, por definição, está fora – da
reprodução da natureza por ela mesma, como defenderam alguns de seus praticantes mais
eufóricos –, no caso desses fotogramas, quando o laboratório ocupa o lugar de câmera escura,
o foco está nos produtos do inconsciente, daquilo que, a princípio, não se deixa divisar.

Asseguradas as condições de emergência do inconsciente ou, dito de outro modo, estabelecida
a distância relativamente aos determinantes externos, o acaso passa a desempenhar o papel
de elemento surpresa em torno do qual organizam-se as tarefas técnicas. Lee Miller, sua
assistente por longa data e que viria a realizar várias solarizações, descreveu as circunstâncias,
de todo acidentais, nas quais Man Ray descobriu o processo: acidentes são de tal modo
recorrentes na sua trajetória que terminam por tornar-se um método de trabalho.

Algo passou entre os meus pés na escuridão do laboratório, eu soltei um grito e acendi
a luz. Nunca descobri o que era, talvez fosse um camundongo. Então rapidamente
percebi que o filme fora totalmente exposto à luz. Havia nos tanques de revelação,
prontos para serem retirados, uma dúzia de negativos quase completamente revelados,
imagens de um nu contra um fundo preto. Man Ray pegou-os, colocou-os no hipo
e olhou para eles. As partes não expostas dos negativos, que constituíam o fundo 18
negro, foram expostas à forte luz do laboratório, desse modo reveladas ao ponto de

Passagens da Fotografia
confundirem-se com o branco dos corpos…Não foi nada mal ter feito esta descoberta
única e acidental, mas Man acabou por empenhar-se em controlar o fenômeno e
torná-lo cada vez mais previsível. (MILLER apud SCHWARZ, 1977, p. 282)

Uma terceira via, também associada aos procedimentos automatistas, constitui-se de


fotografias diretas em que as operações de deslocamento se processam no momento da
tomada pela variação do ponto de vista ou da rotação do eixo da câmera. Nessa série de
imagens, os procedimentos de deslocamento encontram-se sistematicamente associados à
intenção de criar um estranhamento. Uma vez que essas imagens são tomadas diretamente,
mantendo o alinhamento clássico entre fotógrafo, câmera e objeto, espaçar tem a intenção
de proporcionar uma interpretação inédita da cena, de produzir o “informe” – associando o
dorso à forma animal, como em Minotaure, ou fazendo coincidir certas angulações faciais
com a anatomia do falo, como em Anatomies –, seja através do deslocamento do ângulo de
tomada ou mesmo da associação imprevista entre figuras e formas visuais.

Nesse momento não está em conta a criação de imagens em um ambiente controlado


ou mesmo a intervenção na sua materialidade, mas propriamente um trabalho que se
aproxima, em vários aspectos, do trabalho do editor, daquele que direciona a atenção por
meio da seleção dos elementos e das relações visuais presentes na imagem, operação que, no
caso do fotógrafo, está diretamente associada às opções de enquadramento. O ato de tornar
estranho ou de desfamiliarizar consiste então em despertar os aspectos insólitos ou em fazer
emergir relações latentes habitualmente não percebidas pelo olhar convencional.

2.3 Terceira Imagem

Em um contexto em que a realidade se apresenta de modo cada vez mais difuso através dos
meios de comunicação em tempo real, o espaço real é progressivamente substituído por
espaços virtuais, o sujeito psicológico perde sua densidade, a natureza é substituída pelo
artifício e as imagens são convertidas em clichês, que projeto fotográfico pode intensificar
os sentidos e fazer pensar?

Após o extenso mapeamento imagético promovido pela fotografia de inspiração documental
e o vasto repertório de imagens legado pela produção fotográfica de inspiração subjetiva e
metafórica e, a partir da década de 1960, a vulgarização da imagem promovida pela Pop
Art, a fotografia desconstrutiva e as estratégias de apropriação e reciclagem de imagens
largamente promovida por diversos fotógrafos contemporâneos, as variáveis que envolvem
a realização de imagens tornam-se progressivamente mais complexas.

Comparadas com a viagem na extensão realizada por Eugene Atget e Brassaï e, também,
com a tradição da grande fotografia documental, em especial com o que tais projetos
significaram em termos da presença do fotógrafo em vários pontos da cidade, do país ou
do planeta, a produção fotográfica das décadas de 1980 e 1990 – ao menos no que ela traz
de singular frente às gerações precedentes – significou uma ruptura com os padrões de
percepção que pressupunham a existência de um espaço extensivo.

Contemporaneamente, a experiência estabelece-se a partir de redes complexas de
comunicação, de circuitos imateriais que engendram outras modalidades de percepção e
criação de imagens. Como observa Fredric Jameson, as novas tecnologias imagéticas de
transmissão e transporte impõem uma desarticulação entre o corpo e o meio ambiente
construído, ao mesmo tempo em que constituem um espaço que não se percorre. Nessa
nova ambiência, a fenomenologia do ato fotográfico ganha outros contornos.

19
O gesto mais trivial de empunhar a câmera e percorrer as ruas da cidade, que constituía

Passagens da Fotografia
procedimento comum para qualquer fotógrafo, não mais se apresenta como uma etapa
fundamental do trabalho. Também os suportes de inscrição da imagem, tomados pelos
artistas modernos como o ponto distintivo de cada campo artístico, associam-se em novos
amálgamas, ocasionando o aparecimento de imagens híbridas.

Entretanto, as transformações ocorridas no âmbito da prática fotográfica contemporânea
referem-se a regimes de sensibilidade que incluem, sem a elas se circunscreverem, questões
de forma e de estilo. Além das etapas e dos materiais que integram o trabalho criativo,
transformaram-se também a motivação do fotógrafo e o conceito da obra.

Três aspectos da imagem – descentramento, desconexão com o aqui e o agora e trânsito
entre os suportes – perfazem as operações através das quais as imagens se virtualizam na
contemporaneidade. Tal tendência à virtualização refere-se, nesse caso, não apenas às
imagens de síntese, já virtuais por natureza, mas à produção fotográfica analógica que as
torna especialmente aptas a viajar.

A idéia e a sensação de descentramento mostram-se de tal modo recorrentes na experiência
contemporânea que, não fosse a natureza em aberto desta, poderiam ser tomadas como um
novo centro. A tendência à dissolução da modalidade de arquitetura sustentada a partir
de um núcleo central observa-se nos mais diversos domínios: o plano pictórico revela-se
descentrado, em oposição à especificação pontual da linha de fuga; a noção de identidade
passa a comportar fissuras; a fixação do significado da imagem pulveriza-se na proporção
do declínio da aura, daquele tipo de ambiência que comportava a presença singular de um
original, enfim, uma relação interminável que inclui a arquitetura acentrada da Internet
e os conceitos de acaso, de caos e de indeterminação que constituem os paradigmas
científicos contemporâneos15.

Certas estratégias fotográficas apresentam-se especialmente próximas às novas práticas de
comunicação definidoras da viagem contemporânea. Trabalhando com imagens recicladas
a partir de cenários criteriosamente construídos ou de dispositivos de instalação, fotógrafos
como Cindy Sherman, Sherrie Levine, Laurie Simmons e Alain Fleischer impõem um
afastamento da noção de natureza como realidade a partir da qual se constituiria a imagem
reflexo. Por sua vez, as estratégias de cenarização e de apropriação de imagens arquetípicas
da mídia são operações que acentuam o caráter construído e convencional da imagem.

No caso das séries de Sherrie Levine e Richard Prince – em que o original é uma imagem,
uma outra imagem retirada do universo da mídia – ou do universo de Laurie Simmons – em
que a imagem representa um cenário construído com finalidades estritamente fotográficas
–, produz-se uma ruptura na mecânica de remissão da imagem a uma situação originária.
Nesse caso, o sentido da imagem passa a depender exclusivamente da participação do
observador, da intencionalidade do criador e do seu próprio poder projetivo. Apresentando-
se como jogos de percepção, essas imagens autoquestionam-se enquanto imagens verídicas,
e, no limite, autodestroem-se enquanto tais.

No âmbito da crítica da imagem, a categoria fotografia foi redefinida de modo a incorporar
as mutações em curso. Fixado pelo ideário modernista em função da separação entre os
diferentes meios de expressão, o conceito de fotografia foi estendido com vistas a abrigar
formas limítrofes e híbridas. De modo sintomático, a crítica Rosalind Krauss (1985, p. 93)

15
Portanto, algo bem distinto do que ocorrera com a postura purista que orientou a prática fotográfica descritiva, a qual
sabemos, afirmara-se como critério de demarcação das fronteiras que separam o fotográfico do não-fotográfico e também
por meio da definição dos elementos mínimos da imagem – quadro único, ponto de fuga, figuração, autor. O aspecto
reducionista dessa agenda deixa-se visualizar nas figuras que anuncia: singular, linear, unicidade, centro, fronteira. 20
definiu o espaço escultórico e, em conseqüência, o espaço estético pós-moderno em termos

Passagens da Fotografia
de espaços lógicos. Segundo sua análise,

no pós-modernismo, a práxis não é definida em relação a um determinado meio


de expressão – escultura –, mas sim em relação a operações lógicas dentro de um
conjunto de termos culturais para o qual vários meios – fotografia, livros, linhas em

paredes, espelhos ou escultura propriamente dita – possam ser usados


e, em complemento, que
a lógica da práxis pós-modernista já não é organizada em torno da definição de um
determinado meio de expressão, tomando-se por base o material ou a percepção
desse material, mas sim através do universo de termos sentidos como estando em
oposição no âmbito cultural.

Essa substituição da ênfase na pureza do meio por uma rede de operações lógicas desloca a
questão estética do eixo subjetivo e processual para o de posições relacionais ocupadas pelo
artista e pela obra no interior do campo cultural.

De modo geral, a crítica redefine seus parâmetros a partir da emergência dessas novas
modalidades de hibridizações entre os meios. Trabalhos como O fotográfico, da própria
Rosalind Krauss; O ato fotográfico, de Philippe Dubois; La imagen precária del dispositivo
fotográfico, de Jean-Marie Schaeffer, e mesmo os escritos de Barthes sobre fotografia — todos
da década de 1980, que buscaram dar conta de uma especificidade da imagem fotográfica,
serão, pouco mais de uma década após serem lançados, vistos como historicamente datados
e, na visão de alguns dos seus próprios autores, superados.

Dubois, por exemplo, reconsidera radicalmente a ênfase genérica nas qualidades indiciais
da imagem fotográfica que orientara sua abordagem em O ato fotográfico e outros ensaios.
Em entrevista que concedeu em 1995, Dubois (1995, p. 3) assinala que,

Não interessa mais a questão de definir o que é a fotografia, pois já se falou sobre isso
nos anos 80 e porque esta não é mais uma questão que se coloque em área nenhuma,
nem no cinema, nem na fotografia. Por outro lado, hoje não se acredita mais no poder
da teoria enquanto modelo puro. Então, não existe mais o interesse pela fotografia
como modo autônomo. Ao contrário, percebe-se que a fotografia não pode ser pensada
por ela mesma, que é preciso pensá-la em relação à pintura, às novas tecnologias da
informática, das imagens magnéticas. Não é mais uma questão de especificidade, mas
uma questão de integração das artes, integração das imagens.

As fotografias realizadas em Cape Code, por Joel Meyerowitz, e as foto-instalações de


Alain Fleischer inserem-se nessa conjuntura em que o conceito de virtual adquire sua
dimensão plena e as noções de campo ampliado e de pós-fotografia tentam dar conta dos
novos desafios da imagem. Meyerowitz, a partir da perspectiva purista, e Fleischer, com a
concepção de uma imagem não-verídica, propõem abordagens limites, do ponto de vista
dos seus respectivos modelos, nessa conjuntura em que os únicos pontos de partida possíveis
do trabalho fotográfico parecem ser o artifício e a simulação.

2.3.1 Joel Meyerowitz

Fotógrafo egresso do fotojornalismo, integrante da tendência New Color Photography,


Meyerowitz desenvolve há vários anos um projeto fotográfico em Cape Code, região
litorânea próxima a Nova York. Sua câmera está apontada para a praia e os banhistas, quase
sempre familiares ou pessoas do seu convívio íntimo; para o mar, os barcos e o horizonte; ou 21
ainda, em outros momentos, para a casa de veraneio e arredores. Seu tema é a experiência

Passagens da Fotografia
na sua densidade, retratada com maravilhamento e espontaneidade. Há uma qualidade
de presença e uma temporalidade nessas imagens que as aproximam da experiência do
sublime. Uma presença real ao longo de uma temporada veranista, com sol, praia, mar e
lugares batidos, mas tudo a um passo de modelar-se em outras vistas. Essa realidade em
vias de transmutar-se engendra uma efemeridade que aspira à plenitude, que deixa escapar
da sua fragilidade o absoluto, anunciando que, no mundo da descartabilidade, o sublime
constitui uma das possibilidades de afirmação da singularidade da imagem.

Tecnicamente muito bem acabadas, realizadas através do processo day-transfer — que
possibilita amplo controle dos tons da imagem e longa permanência das cópias —, as fotos
de Meyerowitz alinham-se à tradição da fotografia clássica, realizada com equipamento de
grande formato, filmes de última geração e controle meticuloso do processamento, além
de respeitarem os imperativos do meio, como a tomada direta e a estrita utilização de
materiais fotográficos convencionais. Porém, essas imagens acrescentam algo ao universo
da fotografia direta ao insinuarem que a possibilidade de uma presença real está à distância
de alguns quilômetros da metrópole, em alguma vila de pescadores recortada pelo mar, em
um lugar que ainda guarda o vestígio do convívio entre pessoas simples, que retiram seu
sustento de uma relação direta com a natureza. São esses lugares recuados no tempo que
invocam o imaginário pictórico de outras épocas, como as marinhas de William Turner, as
paisagens de Emerson e as nuvens de Stieglitz.

Esse ensaio sintetiza a trajetória da fotografia direta assimilando, ao tempo em que as
transforma em novas promessas, as intenções espiritualizantes da fotografia de Stieglitz e as
apostas de Emerson em uma representação espontânea. Por sua vez, a força de transfiguração
dessas imagens advém da sua aproximação com os elementos do sublime, numa indicação
de que, hoje, essas apostas parecem só poder realizar-se em circunstâncias extremas.

Entretanto, o que levou um fotógrafo de rua, familiarizado com a linguagem fotojornalística,
ágil e ávido diante dos fatos, empunhando um equipamento portátil de grande versatilidade, a
abandonar todos os índices de liberdade proporcionados pela grande cidade para permanecer
horas diante da cena, por vezes a mesma cena, portando um equipamento de grande formato,
que, pelo seu peso e volume, inibem todo deslocamento e investida impulsiva? Pode ser que
a condição da viagem contemporânea, realizada sobretudo na imobilidade, tenha marcado
também essa experiência ao ar livre. Por outro lado, excessivamente controladas do ponto de
vista técnico, essas imagens parecem resultar de um domínio sobre a paisagem, do mesmo
tipo daquele obtido sobre os objetos cenográficos pelos fotógrafos de estúdio.

Se tais paisagens parecem coincidir com as forças naturais e, nesse aspecto, despertar o
sentimento do sublime, apresentam-se por demais cenarizadas, ao ponto de parecerem
ter sido construídas para serem fotografadas. A associação do sublime com o artifício
pode não ser, afinal, acidental, e esse ensaio de Meyerowitz sobre o verão revela o modo
contemporâneo, construído e estilizado de representação da natureza.

2.3.2 Alain Fleischer

O fotógrafo e cineasta francês Alain Fleischer trabalha no limite entre o instantâneo


fotográfico e a instalação. Realizadas através dos mais variados dispositivos de projeção,
suas imagens transitam na fronteira entre a imagem única da fotografia convencional e
as imagens sobrepostas ou seqüenciais projetadas em superfícies as mais diversas, como
paredes de prédios, espelhos e objetos tridimensionais.
22
Nessas projeções, vários tipos de imagens refletidas ou de outras fotografias acrescentam-

Passagens da Fotografia
se à superfície urbana, ou a objetos de uso diário, como outros objetos, como ocasiões de
experiências originais, com a diferença de que delas estão ausentes a espessura e o peso
dos objetos tridimensionais. Nessas instalações, a imaterialidade das ondas luminosas das
imagens soma-se à materialidade do espaço efetivo, criando, como anotou Domingues a
respeito das instalações com dispositivos multimídia, uma “mistura do real e do virtual
tecnológico” (DOMINGUES, 1998, p. 180). Nas instalações de Fleischer, como na
série Exhibitions — na qual fotos eróticas são projetadas, à noite, em cenários urbanos
—, não concorrem dispositivos multimídia, mas projeções de slides convencionais,
verificando-se, contudo, aquela mesma mestiçagem do real e do virtual que resulta na
virtualização da obra como um todo.

Uma vez que nessas imagem sobrepõem-se tempos e espaços de naturezas distintas — alguns
preexistentes à tomada fotográfica, outros inerentes a ela —, não há como condicionar o
processo de criação à representação de um real preexistente. A imagem fotográfica final
resulta, nesses casos, da projeção óptica de um real preexistente, mas esse real é ele mesmo
uma foto moldada a alguma superfície ou um efeito anamórfico gerado pelo aparelho
fotográfico, como em Franz 2, e, portanto, uma projeção em segundo grau que duplica e
redimensiona a relação de correspondência pontual entre imagem e referente.

O uso recorrente de espelhos, de rebatimentos e de ressonâncias visuais nessas imagens tem o
sentido de abolir o termo singular — o que se apresenta imediatamente ou o que é facilmente
apreensível —, mediante o qual dispõem-se as imagens da verdade, os clichês e os estereótipos.
Como anota Fleischer, o emprego de procedimentos múltiplos e complexos não é casual.

As coisas não são tão simples. No meu caso, tanto como no caso de muitos outros
artistas que utilizam a fotografia, cada imagem é resultado de um processo lento e
complicado, cada obra representa vários dias de trabalho: reunir as imagens que serão
reutilizadas por projeção, instalar o dispositivo, os objetos, regular as luzes, fazer as
experiências, fazer a tomada e depois realizar as provas no laboratório é um processo
análogo ao de uma encenação teatral. (FLEISCHER apud SAYAG, 1995)

Uma tal modalidade de representação não se adapta ao papel passivo habitualmente associado
ao processo de inscrição das imagens analógicas. Resultantes de um movimento simultâneo
de projeção e de inscrição, essas imagens acrescentam-se ao real como outras realidades,
mais enigmáticas e provocantes, sempre de modo a instaurar um conflito entre o privado
e público, o estático e o dinâmico, a castração e o desejo ou, então, para simplesmente
apresentar o trivial transfigurado em objeto fantasmático, como em L’âme du couteau.
Instáveis como as imagens dos antigos daguerreótipos, que só se deixavam ver em certas
angulações, precárias — um átimo parece poder transfigurá-las — e complexas — lugar
de convergência de vários estratos temporais e espaciais —, essas imagens de Fleischer
são dotadas da mesma virtualidade das redes eletrônicas, dos circuitos magnéticos e dos
parâmetros modulares da ciência contemporânea Em acréscimo, sua condição de estar em
permanente trânsito — entre um suporte fotográfico e um suporte-objeto, entre a imagem
única e a série, entre o instantâneo e o tremido, entre a ficção e a realidade — aproxima-as
dos existenciais que informam a viagem atual.

23
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