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De 07 a 10 de outubro de 2013
1. Introdução
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Geógrafo, Doutor em Geografia e Professor do departamento e do Programa de Pós-graduação em
Geografia da Universidade Federal Fluminense- UFF. Email:valterdocarmocruz@hotmail.com
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que deixa então de ser teórico, é que ela não vale nada ou que o momento
ainda não chegou. Não se refaz uma teoria, fazem−se outras; há outras a
serem feitas. E curioso que seja um autor que é considerado um puro
intelectual, Proust, que o tenha dito tão claramente: tratem meus livros como
óculos dirigidos para fora e se eles não lhes servem, consigam outros,
encontrem vocês mesmos seu instrumento, que é forçosamente um
instrumento de combate. (Gilles Deleuze, 1972 p. 71).
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Roubar aqui nada tem a ver com o plágio, a cópia, desonestidade intelectual, segundo Gallo (2008,
p 75-6) para Deleuze, o ato de criar em filosofia é uma espécie de roubo, na medida em que cada
filósofo entra em contato com o pensamento dos outros, mergulha em seus campos problemáticos e
apropria-se de seus conceitos. Mas, uma tal apropriação, que é o próprio aprendizado, significa uma
re-criação, uma vez que os conceitos são deslocados de seu campo problemático para um outro
campo, o daquele que faz a experiência do pensamento próprio. Neste sentido, o roubo é o contrário
do plágio; plagiar é repetir, é fazer como, é imitar, é copiar. Roubar é repetir fazendo a diferença, é
fazer como inventando um novo jeito de se fazer, é inventar de novo.
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"reais" uma completamente distinta e externas umas das outras. Mas há também posições
que afirmam que os conceitos são construções intelectuais, instrumentos analíticos que
distinguem uns dos outros no plano epistemológico e nada tem haver diferenças "reais" no
nível ontológico. Essa ambiguidade requer uma maior clareza de qual é a natureza do
conceito, pois grande parte dessa ambiguidade é fruto da falta de clareza e passa pela
própria forma como a natureza do conceito foi pensando historicamente pelas diferentes
correntes do pensamento filosófico.
Segundo Haesbaert (2009) ao longo do percurso histórico, encontramos
posições que se estende no interior de um amplo continuum que vai desde a posição
estritamente realista até aquelas completamente idealistas.
O conceito, ao longo da história, se estende no interior de um amplo
continuum que vai desde a posição estritamente realista de alguns que o
consideram como um retrato fiel da "realidade" e que, ao ser enunciado,
parece carregar consigo o próprio "real", até, no outro extremo, a posição
idealista em que o conceito não passa de um instrumento, uma técnica, um
"operacionalizador" que não tem outro compromisso senão o de servir ao
pesquisador enquanto instrumento de análise (HAESBAERT, 2009: 96).
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Neste sentido, segundo Haesbaert (2009) o conceito nunca pode ser confundido
com o "real" ou com o "empírico", pois eles nunca serão a mesma coisa -- por isso, mais
queuma "re-apresentação" diferenciadora do "real", o conceito é um instrumento, uma"medi-
ação" (no sentido concomitante de "meio-ação") a que recorremos para sua compreensão,
mas que nunca se restringe, de modo algum, a este caráter "mediador" ou de"meio", já que
o conceito também, sempre, acaba por acionar, "fundar" realidades.(HAESBAERT,
2009:97).
Assim, o conceito não deve ser procurado, pois não está ai para ser
encontrado. O conceito não é uma "entidade metafísica", ou um "operador
lógico", ou uma "representação mental". O conceito é um dispositivo, uma
ferramenta, algo que é inventado, criado, produzido, a partir de condições
dadas e opera no âmbito mesmo destas condições. O conceito é dispositivo
que faz pensar, que permite, de novo, pensar. O que significa dizer que o
conceito não indica, não aponta uma suposto verdade, o que paralisaria o
pensamento; ao contrário, o conceito é justamente aquilo que nos põe a
pensar. Se o conceito é produto, ele é também produtor: produtor de novos
pensamentos, produtor de novos conceitos; e, sobretudo, produtor de
acontecimentos, na medida em que é o conceito que recorta o
acontecimento, que o torna possível (GALLO, 2008: 43).
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também interdita e que exclui determinados modos de falar, narrar sobre determinados
aspectos e determinadas problemáticas a realidade. Assim, cada conceito inaugura novas
capacidades perceptivas, novas sensibilidades frutos das novas linhas de visibilidade e
enunciação que cada conceito inaugura quando é criado, inventado ou usado .
Assim, por exemplo, quando falamos que o conceito de território tem como foco
fundamental a questão do poder e da política e que o conceito de lugar nos permite fazer
uma leitura que tem como foco a dimensão da experiência vivida, do cotidiano, a dimensão
mais poética, sensível e subjetiva da dimensão espacial, o que estamos indicando são os
diferentes regimes de luz e de enunciação que cada conceito inaugura sobre a realidade
sócio-espacial, estamos falando das linhas de luz e de enunciação de cada conceito, aquilo
que permite vermos e falarmos de certos aspectos da realidade num primeiro plano e
secundarizarmos outro. No conceito de território o poder e a política estão o foco das linhas
de luz e de enunciação, em contrapartida a experiência sensível e poética está nas sombras
e penumbras do conceito, já no conceito de lugar aquilo que apreendido com alto grau de
resolução é muito mais uma poética do espaço do que a política do espaço, as questões
que envolvem o poder e conflito estão nas sombras e penumbras das linhas de luz do
conceito de lugar.
As linhas de visibilidade e de enunciação é que criam e instaram a
especificidade contrastante entre os conceitos, pois, nas zonas de penumbra os conceitos e
seus problemas se aproximam e se ordenam com semelhanças, assim, por exemplo,
quando olhamos a linhas de luz e enunciação entre as principais conceituações de território
e lugar há uma clara diferença entre o foco desses conceitos, mas quando olhamos para o
aspecto periférico de cada conceito, nas suas zonas de sombra vemos elementos que se
assemelham como, por exemplo, da questão do pertencimento e da identidade que tanto um
quanto outro conceito recobre parcialmente.
2.2.Linhas de força
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2.3.Linhas de objetivação
Assim as linhas de luz e de força criam as linhas de objetivação que são uma
espécie de lente de objetivação, lente para ver o mundo, instaurando uma forma especifica
de compreensão e intervenção no mundo, ou melhor, dizendo uma forma de compreensão-
intervenção no mundo. Essas linhas de visibilidade/enunciação/força/objetivação remetem
diretamente a questão dos problemas ou campo de problematizações de onde um conceito
emerge e também ao solo epistemológico/teórico/metodológico que o sustenta.
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O que leva um autor a formular, produzir, criar um conceito? Ou ainda o que nós
faz escolhermos trabalhar, usar um conceito e não outro na realização de nossas
pesquisas? Essas questões implicam em perguntar sobre a razão da existência dos
conceitos. Deleuze e Guattari (1992) nos apontam um caminho fundamental, para
respondermos a essas questões, para esses autores todo conceito só pode ser
compreendido a partir do problema ou do campo de problematizações no qual foi criado e
formulado, pois, todo conceito é criado e formulado a luz de problemas específicos,
problemas estes que podem ser reformulados e recolocados de maneiras diferentes ao
longo da história. Gondar (2005:13) inspirada em Deleuze afirma que "um conceito não
surge do nada, e tampouco é um ápice de uma história linear, cujo progresso ou o
aperfeiçoamento exige a sua definição, como se ele existisse em larva desde o inicio dos
tempos". Para a autora o conceito é uma tentativa de responder a um feixe de problemas
que se constrói, de maneira contingente, em um determinado momento, em outros termos,
"um conceito não surge do aprimoramento das idéias, mas da emergência de um campo
problemático que exige novas categorias do pensamento que lhe façam face". Assim, o ato
da criação dos conceitos está diretamente ligado a questões e problemas aos quais se
supõe que eles respondam.
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Nossas reflexões estão diretamente inspiradas nas formulações de Deleuze e Guattari(1991) e nos
comentários de Gallo (2007) sobre a obra desses filósofos. Contudo, trata-se de um diálogo livre, de
uma apropriação “bárbara” das ideias, uma leitura assinada, pois os autores localizam suas reflexões
sobre o conceito, exclusivamente, no campo da filosofia, único domínio, segundo os autores, em que,
de fato, criam-se e inventam-se conceitos.
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Não podemos tomar os conceitos como elementos isolados, pois eles estão
envolvidos em uma atmosfera mais ampla, os conceitos são criados partir de um solo
epistemológico/teórico/metodológico específico, todo conceito traz as marcas desse plano.
Cada conceito é uma tentativa de dar conta de questões especificas construídas num
determinado momento histórico, a partir de um solo epistemológico e de um campo teórico-
metodológico próprio, pois todo conceito está localizado, ele brota de um solo
epistemológico específico a partir do qual é formulado o problema que ele supõe responder,
isso implica que todo conceito opera a partir de um campo teórico-metodológico específico e
é a partir dessas referências que os conceitos nos permitem fazer uma leitura-intervenção
singular no mundo.
Quando nos itens anteriores falávamos que os conceitos de território e lugar
tinham linhas de luz, linhas de força e linhas de objetivação distintas e portando implicavam
em diferentes leituras da espacialidade /geograficidade do social, estávamos falando que
tais conceitos respondiam a questões e problemas distintos, estes problemas também foram
formulados a partir de solos epistemológicos e campos teórico-metodológicos distintos, são
planos de imanência que rasgam o caos do real de maneira diferentes inaugurando
horizontes e possibilidade singulares de compreensão-intervenção no mundo.
Assim, por exemplo, faz diferença se um conceito como o de lugar é construído
a partir do solo epistemológico da fenomenologia (Geografia humanista) ou do materialismo
histórico (geografia marxista) ou ainda a partir do pós-estruturalismo (Geografia pós-
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moderna). Do mesmo modo, também podemos dizer que fazer uma leitura do conceito de
Território a partir de uma perspectiva semiótica (Geografia cultural) é bem diferente do que
fazer uma leitura do território a partir de uma abordagem do materialismo histórico
(Geografia marxista) ou de uma abordagem pós-estrututalista do território.
Segundo Deleuze e Guattari (1992: p.27) não há conceito simples, todo conceito
é complexo, pois "todo conceito tem componentes, e se define por eles. Tem, portanto uma
cifra. Todo conceito tem um contorno irregular, definido pela cifra de seus componentes".
Assim, não há conceito construído a partir de único elemento, todo conceito é uma
multiplicidade "formado por componentes e define-se por eles; claro que totaliza seus
componentes ao constituir-se, mas é sempre um todo fragmentado, como um caleidoscópio,
em que a multiplicidade gera novas totalidades provisórias a cada golpe de mão"
(Gallo,2008).
Neste sentido, podemos entender que o conceito é uma questão de articulação,
corte e superposição, o conceito é um momento, um ponto de coincidência, de articulação e
condensação de vários elementos lógicos e históricos, criando uma configuração
singular.Entende-se, portanto, que um conceito nunca é criado do nada, mas, sim, de uma
multiplicidade de situações; é resultante de uma heterogênese de cruzamentos de
problemas, outros conceitos e acontecimentos.Neste sentido, todo conceito só ganha
sentido a partir do conjunto de outros conceitos, a partir de conjunto de relações e inter-
relações entre elementos e conceitos, construindo redes, teias, constelações e planos
conceituais. Sobre essa ordenação, conexão e inter-relação entre os conceitos no mesmo
plano de Deleuze e Guattari (1992) afirmam:
(...) os conceitos se acomodam uns aos outros, superpõem-se uns aos
outros, coordenam seus contornos, compõem seus respectivos problemas,
pertencem à mesma filosofia, mesmo se têm histórias diferentes. Com
efeito, todo conceito, tendo um número finito de componentes, bifurcará
sobre outros conceitos, compostos de outra maneira, mas que constituem
outras regiões do mesmo plano, que respondem a problemas conectáveis,
participam de uma co-criação. Um conceito não exige somente um
problema sob o qual remaneja ou substitui conceitos precedentes, mas uma
encruzilhada de problemas em que se alia a outros conceitos coexistentes
(Deleuze e Guattari 1992: p.30)
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4-Referências Bibliográficas
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