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OURO PRETO – MG
2018
THAÍSSA JUCÁ JARDIM OLIVEIRA
OURO PRETO – MG
2018
O482f Oliveira, Thaíssa Jucá Jardim.
Fossa Séptica Biodigestora [manuscrito]: limitações e potencialidade de sua
aplicação para o tratamento de águas fecais em comunidades rurais / Thaíssa
Jucá Jardim Oliveira. - 2018.
106f.: il.: color; grafs; tabs.
CDU: 502:004
Catalogação: www.sisbin.ufop.br
DEDICATÓRIA
Rubem Alves
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, agradeço a meus pais, meus avós, meu tio Jr. e meu irmão por terem incentivado
desde a minha infância meu gosto pela ciência e pela leitura. Obrigada pelo carinho, pelo apoio
e por entenderem minha ausência em momentos tão delicados quanto os que nós passamos nos
últimos anos.
Ao meu orientador, Aníbal Santiago, por ter confiado no meu trabalho e por ter enfrentado junto
comigo as dificuldades que tivemos na execução desta pesquisa. Todos os seus
questionamentos, indicações e reflexões contribuíram demais, não só para a minha formação
profissional, quanto para a pessoal.
À minha co-orientadora, Prof. Maria Célia, por ter me introduzido no universo da microbiologia
e por ter me ensinado, ainda que sem perceber, sobre o amor à pesquisa e ao ensino.
À Thalita e Natália, pela dedicação e pelas inúmeras horas que passamos no LSA apanhando
dos equipamentos e aprendendo juntas as metodologias de análise. Sem vocês, essa pesquisa
certamente não teria sido possível.
À D. Graça, Sr. Geraldo e Ricardo por disponibilizarem sua residência para a realização desta
pesquisa, pelas conversas maravilhosas e por todo o apoio logístico ao meu trabalho.
À equipe do LIGA (Ludmila, Everton, Thiago, Sara e Lilian) por me acolherem enquanto
“sóciopessoa”e pela valorosa troca de experiências. Um agradecimento especial à Ludmila por
ser o anjo da guarda de praticamente toda a turma de mestrado de 2016.
Ao Ricardo e ao Paulo Bernardo, pelo companheirismo e pelos bons momentos que tivemos
juntos durante o mestrado. Foi um privilégio ter construído essa amizade com vocês.
À Andreíza, Andressa, Laís, Grazielle e Ricardo (novamente), pelo apoio prático na reta final
da escrita. A contribuição de vocês foi muito importante para a qualidade deste trabalho.
A todos os meus colegas do ProAmb, pela parceria nos estudos e nos bares da Bauxita. Pois
nem só de trabalho vivem os pós-graduandos!
Ao Vinícius, pela companhia leve em praticamente todas as madrugadas e finais de semana que
eu passei na UFOP. Agradeço por sempre incentivar o meu trabalho, por me dar colo quando
eu precisava descansar e por compreender minhas limitações durante este período. Ter você
perto de mim tornou tudo mais fácil.
Aos companheiros do OcupaUFOP por estarem ao meu lado na pelo direito à uma educação
pública e de qualidade para todos.
Ao Sr. José Carlos e ao Márcio pelo cuidado que tiveram comigo no nosso dia-a-dia de trabalho.
À equipe de motoristas da UFOP por ter possibilitado a realização dos nossos campos.
À Prof. Silvana de Queiroz e ao Prof. Marcos Von Sperling pelas valorosas contribuições e pelo
incentivo que me deram na banca de defesa desta dissertação.
Feitos todos os agradecimentos, aproveito este espaço para negar a meritocracia e lembrar a
todas as leitoras que fazer pós-graduação no Brasil ainda é um privilégio da classe média/alta e
da população branca, que ocupa a maior parte das vagas, notadamente nos cursos de engenharia.
Nesse sentido, ainda temos um longo caminho a percorrer em busca de um ambiente acadêmico
menos elitizado e mais próximo das causas populares.
A Fossa Séptica Biodigestora – FSB é uma tecnologia social desenvolvida em 2001 pela
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, com a finalidade de promover o tratamento
anaeróbio de águas fecais no meio rural, produzindo um efluente adequado para o uso agrícola.
Com o objetivo de avaliar o desempenho da Fossa Séptica Biodigestora no tratamento de águas
fecais, o presente trabalho buscou sistematizar e analisar os principais dados produzidos sobre
o desempenho da FSB no período de 2001 a 2018 e complementá-los com um estudo pioneiro
do ciclo de funcionamento do sistema, a partir de uma unidade da FSB instalada em Cachoeira
do Campo, Ouro Preto – MG. Além dos parâmetros físicos e químicos convencionais, foram
avaliados os seguintes indicadores biológicos: E. coli, Enterococcus spp., Salmonella sp. e
adenovírus humanos (HAdV). Na revisão de literatura, constatou-se que existe uma
concentração da produção científica sobre a FSB no eixo Sul-Sudeste e que apenas 16% das
publicações apresentam dados primários sobre o desempenho deste sistema no tratamento de
águas fecais. Dentre as publicações referentes ao desempenho da FSB, foram selecionados 14
estudos, que tiveram suas informações sistematizadas e comparadas com unidade instalada em
Cachoeira do Campo (FBCC) em busca de um padrão de funcionamento do sistema. A FBCC
apresentou resultados próximos daqueles identificados na literatura e seu efluente atingiu
qualidade satisfatória para uso nos seguintes casos: a) fertirrigação no caso de culturas que se
desenvolvem distantes do nível do solo; b) cultivos de alto nível tecnológico e produção
mecanizada; c) por meio de técnicas de irrigação com elevado potencial de minimização de
exposição. O sistema apresentou uma capacidade de remoção de 6,63 unidades logarítmicas
para E.coli; 1,2 unidades para Samonella sp.; 3,06 para Enterococcus spp.; e 2,5 para HAdV.
Ademais, a análise em diferentes dias do ciclo apontou que a inserção do esterco na FBCC
resultou em um salto da eficiência de remoção interna de DBO de 16% para 90%, indicando
que o período no qual é realizado a coleta influencia diretamente nos dados apresentados pelas
pesquisas. Também foram verificadas alterações devido ao inóculo em toda a série de sólidos,
nos parâmetros microbiológicos, no oxigênio dissolvido e na temperatura interna dos três
reatores.
The Biodigester Septic Tank (FSB) is a social technology developed in 2001 by the Brazilian
Agricultural Research Corporation (Embrapa), with the purpose of promoting the anaerobic
blackwater treatment in the rural environment, producing an effluent suitable for agriculture. In
order to evaluate the performance of the Embrapa FSB in blackwater treatment, this research
intended to systematize and analyze the main data produced about the performance of the FSB
in 2001 to 2018 period, complementing them with a pioneer evaluation of the system's operating
cycle using a FSB installed in Cachoeira do Campo, Ouro Preto - MG. In addition to the
conventional physical and chemical wastewater parameters, were analyzed four biological
indicators: Echerichia coli, Enterococcus spp., Salmonella sp. and human adenovírus (HAdV).
In the literature review, it was verified that there is a concentration of scientific production
about the FSB in the Brazil South/ Southeast and that only 16% of the publications present
primary data on the performance of this system in blackwater treatment.Of these, 14 studies
were selected and had their information compared with the unit installed in Cachoeira do
Campo (FBCC) in search of a system operation standard. FBCC presented results close to the
literature, and its effluent reached a satisfactory quality for use in the following cases: a)
fertirrigation in the case of crops that develop far from the soil; b) high technology crops and
mechanized production; c) through irrigation techniques with high potential for minimization
of exposure. The system had a removal capacity of 6.63 log units for E. coli; 1.2 log units for
Samonella sp.; 3.06 for Enterococcus spp.; and 2.5 for HadV. In addition, the analysis on
different days of the cycle indicated an increase in the BOD removal of 16% to 90% in the days
after inoculum insertion, which indicate that the collection’ period has direct influence in the
data presented by the surveys about FSB. Changes due to the inoculum were also observed in
the solids set, microbiological parameters, dissolved oxygen and in the internal temperature of
the three reactors.
Tabela 1 - pH médio nos reatores da FSB: amostras da FBCC e valores de referência (da literatura) ..54
Tabela 2 - Concentração de DBO e DQO na FSB: valores de referência e FBCC (amostras coletadas
em p= 30 cm). ...................................................................................................................................63
Tabela 3 - Concentração de DBO e DQO na FSB: FBCC ( p=120 cm) ..............................................64
Tabela 4 – Concentração de Nitrogênio na FSB: valores de referência e da FBCC (p=30cm) .............65
Tabela 5 - Concentração de Fósforo na FSB: valores de referência e FBCC (p=30cm) .......................68
Tabela 6 - Concentração de fósforo no lodo da FBCC .......................................................................69
Tabela 7- Concentração de E. coli nos reatores da FSB: dados da FBCC e valores de referência ........72
Tabela 8 – Concentração de Enterococcus spp nos reatores da FBCC (NMP/100ml) .........................74
Tabela 9 – Concentração de Salmonella sp. nos reatores da FBCC (UFC/ml) ....................................76
Tabela 10 – Concentração de HAdV nos reatores da FBCC (UFP/ml) ...............................................76
Tabela 11 – Características do inóculo de esterco bovino inserido na FBCC no referido ciclo ............78
LISTA DE QUADROS
ST Sólidos Totais
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................14
2 OBJETIVOS ................................................................................................................................17
2.1 Objetivo Geral ...................................................................................................................17
2.2 Objetivos Específicos .........................................................................................................17
3 REVISÃO DE LITERATURA ...........................................................................................................18
3.1 Histórico da Fossa Séptica Biodigestora .............................................................................18
3.2 Princípios de Funcionamento da Fossa Séptica Biodigestora ..............................................22
3.3 Saneamento Ecológico: conceitos e diretrizes para o tratamento de esgoto doméstico na
área rural ......................................................................................................................................26
3.4 Uso agrícola de esgoto doméstico no Brasil .......................................................................30
3.5 O reúso de efluentes domésticos no contexto da agricultura familiar brasileira .................35
4 METODOLOGIA .........................................................................................................................38
4.1 Perfil das produções acadêmicas sobre a FSB.....................................................................38
4.2 Levantamento e análise de dados secundários acerca do desempenho da FSB no
tratamento de águas fecais ...........................................................................................................40
4.3 Análise do desempenho de uma Fossa Séptica Biodigestora instalada no distrito de
Cachoeira do Campo, Ouro Preto – MG .........................................................................................43
4.3.1 Procedimentos de coleta............................................................................................45
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES ......................................................................................................47
5.1 Análise do perfil das produções acadêmicas sobre a FSB no período de 2001 a 2018 .........47
5.2 Princípios de funcionamento e desempenho da FSB no tratamento de águas fecais para uso
agrícola .........................................................................................................................................53
5.2.1. Características da Fossa Biodigestora de Cachoeira do Campo (FBCC) ........................53
5.2.2. Potencial Hidrogeniônico (pH)....................................................................................53
5.2.3. Temperatura ..............................................................................................................55
5.2.4. Oxigênio Dissolvido ....................................................................................................56
5.2.5. Série de Sólidos..........................................................................................................57
5.2.6. DBO E DQO ................................................................................................................61
5.2.7. Nitrogênio..................................................................................................................64
5.2.8. Fósforo Total ..............................................................................................................67
5.2.9. Indicadores Biológicos................................................................................................70
a) Escherichia coli ..................................................................................................................70
b) Enterococcus spp. ..............................................................................................................74
c) Salmonella sp. ...................................................................................................................75
d) Adenovírus Humanos (HAdV).............................................................................................76
5.3. Análise do ciclo de funcionamento da FSB .........................................................................78
5.4. Reflexões sobre a Fossa Séptica Biodigestora.....................................................................86
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................................92
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................................95
APÊNDICE A – METODOLODIA DE ANÁLISE DE ADENOVÍRUS HUMANOS .........................................104
14
1 INTRODUÇÃO
Desde outubro de 2010, o acesso à água potável e ao saneamento são reconhecidos pela
Organização das Nações Unidas como um direito humano, essencial para a saúde, bem-estar e
qualidade de vida da população em geral (ONU, 2010). Tal reconhecimento configura um
avanço no caminho de sua universalização, ao mesmo tempo em que os números levantados
por esta organização indicam um grande déficit de acesso a estes serviços, sobretudo entre as
populações vulneráveis ou de baixa renda, como é o caso das periferias e comunidades rurais.
De acordo com o Relatório de Acompanhamento dos Objetivos do Milênio, em 2015
aproximadamente 106 milhões de pessoas na América Latina ainda utilizavam estruturas de
saneamento inadequadas, sendo a maior parte desta população habitante da área rural ou
pertencente a grupos pobres e marginalizados (PNUD, 2015). No Brasil, os dados oficiais
(quase sempre superestimados) apontam que em 2012 aproximadamente 28% das residências
na área rural dispunham de fossas sépticas e apenas 5,2% estavam conectadas a rede coleta de
esgoto. Na área urbana – onde historicamente se concentram os investimentos em saneamento
básico – este índice era de 65,3% (PNAD, 2013; ZANCUL, 2016).
Os números apresentados apontam a magnitude dos desafios relacionados à
universalização do saneamento básico no Brasil, chamando atenção para a notável desigualdade
entre os índices do campo e da cidade e para a necessidade de se pensar em uma abordagem
própria para o saneamento rural, que dê conta das condições de pobreza, isolamento e
precariedade dos serviços públicos encontradas no interior do país.
Impulsionados pelas diretrizes da ONU e pelos recursos do Banco Mundial, temos visto
nos últimos anos um esforço crescente em prol da ampliação dos serviços de saneamento na
América Latina, notadamente em suas áreas rurais (MEJÍA et al., 2016). Neste caminho, além
de novas formas de gestão – a maioria baseada na participação comunitária – tem-se estudado
diversas tecnologias sociais que proporcionem o acesso à água potável e ao tratamento de
esgoto a estas populações, considerando principalmente a adaptação à realidade
socioeconômica, cultural e ambiental do local (FUNASA, 2011).
No que diz respeito ao tratamento de esgoto, um dos pontos-chave do desenvolvimento
destas tecnologias é a possibilidade de inserção dos subprodutos do tratamento no ciclo de
produção agrícola, seja por meio de biofertilizantes ou da produção de energia. Neste sentido,
Miller (2006) afirma que o reúso agrícola de águas residuárias pode trazer benefícios
econômicos, sociais e ambientais para as comunidades em que se insere, sendo uma alternativa
sustentável para o aumento da oferta de água e importante elemento do sistema de tratamento
15
e disposição final de esgotos, diminuindo a carga poluente que chega aos corpos hídrico e
reduzindo os custos relacionados ao saneamento.
Dentre os sistemas de tratamento de esgotos que trabalham com o reúso agrícola deste
efluente, encontra-se a Fossa Séptica Biodigestora – FSB, uma tecnologia social desenvolvida
em 2001 pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, no município de São Carlos – SP.
De acordo com Faustino (2007), esta tecnologia promove o tratamento anaeróbio de águas
fecais 1, utilizando para isso duas câmaras de fermentação de 1000 L e uma caixa coletora de
efluentes, interligadas por sistema de sifão. O processo inclui a adição mensal de um inóculo
de esterco bovino na entrada do sistema e tem como objetivo produzir um efluente final
adequado para reúso agrícola, rico em nutrientes (fósforo e nitrogênio) e seguro em termos de
concentração de patógenos.
Desde seu lançamento, a Fossa Séptica Biodigestora vem ganhando visibilidade em
projetos de extensão rural e começa a ser inserida também em políticas públicas de âmbito
estadual e nacional, a exemplo do Programa Rio Rural e do Programa Nacional de Habitação
Rural (SILVA et al., 2018). Um estudo realizado pela Embrapa (SILVA; MARMO &
LEONEL, 2017), indica que no início de 2018 a Fossa Séptica Biodigestora já estava presente
em mais de 11.500 residências rurais, espalhadas em todas as regiões do Brasil.
Dezessete anos após seu surgimento, a FSB já foi alvo de diversas pesquisas, que
buscaram investigar diferentes aspectos de seu funcionamento, como: a adaptação das
comunidades ao manejo do sistema e aceitação do uso agrícola do efluente; a qualidade de seu
efluente final; as vantagens e limitações do uso deste efluente na fertirrigação; dentre outras.
Apesar da heterogeneidade desta produção, a maior parte dos trabalhos relacionados à
eficiência do tratamento limita-se a discutir se o sistema atingiu ou não os resultados esperados
em termos de qualidade do efluente e/ou de melhoria das condições de vida das comunidades,
deixando uma lacuna de conhecimento em relação aos processos envolvidos no funcionamento
da Fossa Séptica Biodigestora.
Tal situação mostra-se desfavorável, na medida em que a FSB tem sido disseminada no
país sem que haja uma regulamentação acerca do reúso agrícola de águas residuárias nem
modelos de gestão eficientes na área rural, que permitam o controle da qualidade do efluente
oriundo deste sistema. Dessa forma, o entendimento de questões relacionadas ao manejo e
condições de funcionamento da FSB, além de servir à sua otimização, deve contribuir para a
redução dos riscos à saúde pública decorrentes do reúso agrícola de seu efluente.
1
Destaca-se aqui a substituição do termo “águas negras” por “águas fecais”, conforme recomendado pelos
materiais do Programa Nacional de Saneamento Rural (PNSR) (BRONZATTO, 2018).
16
2 OBJETIVOS
Objetivo Geral
Objetivos Específicos
3 REVISÃO DE LITERATURA
2
Segundo Gregory (2010), a construção dos primeiros biodigestores na China remontam ao início do século XX
e constituem iniciativa de algumas companhias privadas que tiveram acesso à tecnologia produzida na Índia. Estes
projetos foram incentivados durante o período do Grande Salto Adiante (1958-1960), quando o ditador Mao Tsé-
Tung declarou que o uso do biogás deveria ser popularizado em todo o país; porém, o suporte técnico fornecido
pelo Estado não foi suficiente para levar à frente o movimento, que acabou sendo assumido apenas pela província
de Sichuan. Nesta província, o goveno aperfeiçoou a tecnologia existente até então e iniciou um programa para
sua disseminação, fornecendo treinamento técnico para os agricultores locais e de outras províncias.
Entre 1975 e 1979, o número de digestores em Sichuan cresceu de 400.000 para 5 milhões e, em todo o país, mais
de 7 milhões de digestores domésticos foram construídos entre 1973 e 1978, fazendo com que em 1980 o governo
chinês declarasse o biogás como a "principal alternativa" para lidar com a crise de combustíveis nas comunidades
rurais. Em 2009, o número de biodigestores domésticos na China chegava a 30,5 milhões.
Cabe ressaltar que, além das águas fecais – foco do tratamento realizado pela FSB – os biodigestores chineses e
indianos utilizam como substrato efluentes de suinocultura e/ou resíduos sólidos, produzindo uma quantidade
significativamente maior de biogás e de fertilizante. Em condições ideais, um digestor chinês de 10 m³ pode
fornecer gás suficiente para cozinhar e iluminar uma família de até cinco pessoas. Apesar de também contribuir
com o saneamento em áreas rurais, a experiência chinesa com biodigestores foi alavancada sobretudo pela
necessidade de se criar fontes alternativas de energia em áreas rurais e de de garantir a segurança alimentar destas
populações (HENDERSON, 2009).
19
O ‘modelo inicial’ da Fossa Séptica Biodigestora era composto por três caixas de
cimento amianto ou de plástico, de mil litros, sendo as duas primeiras para tratamento do
efluente e a última para a coleta do efluente tratado (NOVAES et al., 2002). Mesmo mantendo
até hoje a proporção de três caixas de mil litros para uma residência de até cinco pessoas, ao
longo do tempo a FSB passou por algumas modificações em seu material principal (Figura 1).
Em 2004, uma cartilha lançada pela Embrapa Instrumentação Agropecuária falava da
utilização de caixas de fibrocimento ou plástico com cloração no efluente da 3ª caixa, caso esta
fosse preenchida em menos de vinte dias. Ou seja, caso o tempo necessário para a biodigestão
não tivesse sido cumprido (EMBRAPA, 2004). Esta recomendação, bem como a possibilidade
de inserção de um filtro de areia no final do tratamento não estão presentes nos últimos materiais
publicados pela instituição (OTENIO et al., 2014; SILVA; MARMO & LEONEL, 2017)
Figura 1 – Fossas Sépticas Biodigestoras construídas em diversos materiais: a) amianto; b)polietileno; c)fibra de
vidro; d)manilhas de concreto
a) b)
Apesar do uso do amianto ter sido proibido no Brasil apenas em 2017, as declarações
da OIT e OMS sobre o potencial cancerígeno deste material contribuíram para a diminuição do
20
seu uso no país na última década (CASTRO; GIANNASI & NOVELLO, 2003). Além disso,
nos primeiros anos de uso da FSB foi constatado que as caixas de polietileno sofriam
deformação pela pressão do solo, tornando este material pouco adequado para sua confecção.
Portanto, em 2006 a Embrapa lançou uma nova versão da cartilha de 2004, sugerindo,no lugar
de amianto ou plástico, caixas de fibra de vidro ou fibrocimento – materiais que suportam altas
temperaturas, são de baixo custo e que apresentam grande durabilidade (EMBRAPA, 2006).
As modificações sugeridas são reafirmadas quando, em 2010, a Embrapa lança um
manual intitulado “Perguntas e Respostas sobre a Fossa Séptica Biodigestora”, no qual se indica
novamente estes materiais como os mais propícios para a construção do sistema, abrindo
precedente para o uso de alvenaria, desde que estas sejam impermeabilizadas e muito bem
vedadas. Este manual também explicita que não deve ser utilizado o polietileno, devido sua
deformação pela pressão do solo e contato com temperaturas mais elevadas (GALINDO et al.,
2010)
Nesse mesmo ano, a Fundação Banco do Brasil (2010) publicou uma cartilha onde
informa que as caixas devem ter formato arredondado e ser fabricadas em fibra de vidro ou
manilhas de concreto. Com a queda no mercado do fibrocimento, atualmente o principal
material utilizado pela Embrapa para a construção da FSB são as caixas d’água de fibra de
vidro, por serem leves, resistentes e de fácil manejo na instalação (SILVA, MARMO &
LEONEL, 2017).
Além de diversos materiais, foram testadas também variações do inóculo utilizado na
Fossa Biodigestora. Porém, até 2018 o esterco bovino continua sendo considerado o mais eficaz
para este processo de biodigestão. Um dos trabalhos mais detalhados sobre esta questão foi o
de Faustino (2007), que constatou que o uso de esterco ovino em substituição ao esterco de
bovinos, não apresentou a mesma eficiência, tanto do ponto de vista de aspectos físico-
químicos, quanto de desinfecção do efluente.
Outra variação proposta foi a utilização de inóculos comerciais em pó, no caso de fossas
instaladas em comunidades ribeirinhas do Pará, onde é pouco comum a atividade de pecuária
(OLIVEIRA et al., 2018). Até o presente momento não foram encontrados estudos sobre o
funcionamento deste inóculo no referido sistema, nem dados sobre os parâmetros físicos
químicos ou microbiológicos do efluente resultante deste processo
21
3
No âmbito deste trabalho, utiliza-se como conceito de Tecnologia social aquele definido pela RTS (2012) que
as classifica como “produtos, técnicas e/ou metodologias reaplicáveis, desenvolvidas na interação com a
comunidade e que representem efetivas soluções de transformação social”. Segundo Costa (2013) é importante
lembrar que o adjetivo “social” não tem a pretensão de afirmar somente a necessidade de tecnologia para os
pobres ou países subdesenvolvidos, mas de fazer uma crítica ao modelo convencional de desenvolvimento
tecnológico e propor uma lógica mais sustentável e solidária de tecnologia para toda as camadas da sociedade.
22
Dentre os projetos que têm contribuído para a disseminação da FSB em Minas Gerais,
destaca-se o Programa Olhos D’água, desenvolvido pelo Instituto Terra em parceira com a Vale
e BHP Billinton, por meio da Fundação Renova. O projeto pretende recuperar, em 10 anos,
5.000 nascentes na área atingida pelo rompimento da barragem de Fundão e implantar uma FSB
em cada propriedade rural atendida. O projeto está em andamento desde dezembro de 2016 e
já atendeu mais de 217 produtores rurais ao longo da bacia (CESAN, 2017).
Como é uma tecnologia de domínio público, a Fossa Séptica Biodigestora tem sido
implantada e estudada por diversas instituições brasileiras que também contribuem para
avanços no seu funcionamento. Porém, a elaboração deste histórico foi centrada na atuação da
Embrapa devido ela ser, atualmente, a maior fonte de dados sobre o tema e principal
articuladora da inserção da FSB em políticas públicas.
4
Segundo Von Sperling (2005) a base de todo o processo biológico é o contato efetivo entre os organismos e o
material orgânico contido nos esgotos, de tal forma que este possa ser utilizado como alimento para os
microrganismos.
23
Não sendo aproveitado economicamente, o gás produzido é liberado dos reatores por
meio de um tubo de PVC de 25mm, com um encaixe contendo cinco pequenos furos. Portanto,
ao contrário dos biodigestores utilizados nas comunidades rurais da China e Índia, a FSB tem
como principal objetivo, não a produção de energia, mas a decomposição da matéria orgânica
e a adequação do efluente para o reúso agrícola, mantendo altos níveis de nutrientes.
Assim como o metano, a quantidade de matéria orgânica transformada em biomassa
(lodo) na FSB também é muito baixa, fazendo com que grande parte da literatura existente
sobre este sistema sequer mencione a formação de lodo em seu interior (COSTA &
GUILHOTO, 2014). Além disso, diversos materiais produzidos pela Embrapa afirmam que não
é necessário realizar a limpeza periódica da caixa, na medida em que não há acúmulo de
resíduos sólidos (GALINDO et al, 2010).
Na verdade, a questão do crescimento da biomassa na FSB é um ponto ainda sem
consenso na literatura atual. Enquanto alguns autores enfatizam que não há acúmulo de
biomassa no sistema e que o inóculo deve ser inserido uma vez por mês – o que indica que o
seu tempo de retenção celular depende do tempo de detenção hidráulica e que, portanto, a
biomassa seria descartada junto com o efluente – (FBB, 2010; LEONEL; MARTELLI &
SILVA, 2013) outros evidenciam a formação de lodo nas caixas do sistema e, inclusive,
analisam sua composição (FAUSTINO, 2007; PEREIRA, MIREIA APARECIDA BEZERRA
et al., 2018). Neste contexto, há que se considerar que nenhuma pesquisa utilizou uma
metodologia que coletasse o efluente em diferentes profundidades do reservatório, o que dá
margens para o questionamento sobre a existência ou não desta zona de acúmulo e sobre suas
possíveis características.
24
No último manual publicado pela Embrapa, Silva, Marmo e Leonel (2017) afirmam que
“não é necessário que seja efetuada limpeza das caixas, pois o projeto do biodigestor permite
que o efluente concentrado na parte inferior seja transportado para a próxima caixa à medida
que entra mais água no sistema”.
A configuração com dois reatores de 1m³ e vazão de 100L/dia possibilita um TDH
médio de 25 dias, que aumenta caso o número de pessoas na residência seja menor. Em casos
que a fossa necessite atender uma vazão maior do que 100L/dia, recomenda-se a instalação de
novos “módulos de fermentação” (caixas), de forma a manter este TDH e garantir a eficácia do
tratamento (SILVA, MARMO & LEONEL, 2017). Como forma de aumentar a eficiência deste
processo, utiliza-se como catalizador o esterco de ruminantes (sobretudo de bovinos), que deve
ser injetado na entrada do sistema (por meio da válvula de retenção) com uma frequência de 5L
por mês5.
Chernicharo (1997) afirma que os microrganismos envolvidos na digestão anaeróbia são
muito especializados e que cada grupo atua em reações específicas dentro da degradação do
substrato. Considerando que o ideal para estes processos é a utilização de um inóculo oriundo
de um sistema similar ao que se pretende inocular (AMARAL et al., 2008), o esterco de
ruminantes se apresenta como uma boa alternativa para a FSB, devido à presença de
microrganismos essenciais à degradação anaeróbia, além de protozoários, fungos anaeróbios e
micro-organismos metanogênicos do domínio Archaea em abundância (LIN, RASKIN E
STAHL, 1997). Sobre a preferência por esterco bovino, sabe-se que, além da presença de micro-
organismos anaeróbios, estes apresentam alto teor nutritivo; são ricos em macro e
micronutrientes, material lignocelulósicos, carboidratos simples e proteínas. (BARROS et al.,
2009).
De acordo com Campos (1999), os fatores que mais influenciam a operação dos
biodigestores anaeróbios são a temperatura, o pH, a presença de nutrientes e a ausência de
materiais tóxicos no afluente. Considerando que a presença de nutrientes não é um problema
no caso dos efluentes domésticos e que normalmente águas fecais não apresentam materiais
tóxicos, os principais fatores limitantes para o bom funcionamento deste sistema é a temperatura
interna do reator e seu pH.
Chernicharo (1997) afirma que, como os microrganismos não possuem meios de
controlar sua temperatura interna, a temperatura do interior da célula é determinada pela
temperatura externa, sendo este um dos fatores mais importantes na seleção das espécies.
5
A Embrapa recomenda a adição de uma mistura de 10L de esterco fresco + 10L de água no primeiro mês de
funcionamento do sistema e, depois disso, 5L de esterco + 5L de água a cada 30 dias (GALINDO et al., 2010)
25
Segundo o autor, apesar da formação microbiana do metano ocorrer em uma faixa bastante
ampla de temperatura (0º a 97ºC), dois níveis ótimos de temperatura têm sido associados a
digestão anaeróbia: um na faixa mesófila (30 a 35ºC) e outro na faixa termófila (50 a 55ºC).
Porém, apesar destas temperaturas serem desejáveis, o mais importante é que esta se mantenha
estável, para não causar desequilíbrio na fauna microbiana.
Galindo et al. (2010) avalia que a temperatura de funcionamento da FSB depende do
local onde está instalada e da estação do ano, variando geralmente de 20 e 30ºC – o que significa
que o sistema não costuma funcionar em nenhuma das faixas ótimas da digestão anaeróbia.
Como forma de garantir esta temperatura e o isolamento térmico do sistema, recomenda-se a
instalação destas fossas em um ambiente subterrâneo, a vedação do sistema e a pintura das
tampas com tinta asfáltica, facilitando a absorção da radiação do sol.
Para Soares et al. (2016a) os baixos coeficientes de variação das temperaturas máxima
e mínima dos efluentes brutos contidos na FSB’s indicam que esta tecnologia propicia certa
estabilidade ao processo de decomposição anaeróbia da matéria orgânica, ainda que as
temperaturas obtidas no interior do sistema não sejam as mais adequadas para tal
(CHERNICHARO, 1997).
Segundo a Embrapa, uma das maiores vantagens da Fossa Séptica Biodigestora é sua
alta eficiência de remoção de patógenos, possibilitando maior segurança no reúso agrícola do
efluente (NOVAES et al., 2002; GALINDO et al., 2010; SILVA, MARMO & LEONEL.,
2017). Por outro lado, Chernicharo (1997) e Campos (1999) afirmam que uma das principais
desvantagens dos sistemas anaeróbios é justamente a remoção insatisfatória de patógenos e
nutrientes, tornando necessária a adição de um tratamento terciário que corrija esta falha.
Assim, são necessárias investigações mais aprofundadas para entender o desempenho da FSB
na remoção de microrganismos patogênicos, bem como os fatores que possibilitam tal remoção.
26
6
“On-site sanitation”: sistemas de saneamento onde os meios de armazenamento estão contidos dentro da parcela
ocupada pela habitação ou em seus arredores imediatos. Em alguns destes sistemas (por exemplo, latrinas de poço
duplo ou de abóbada), todo o tratamento da matéria fecal acontece também no local. Em outros sistemas (por
exemplo, fossas sépticas, instalações de poço único ou abóbada), o lodo deve ser coletado e tratado fora do local
(WHO, 2006).
27
7
De acordo com o “Guia da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o uso seguro de águas residuárias, excretas
e águas cinzas” (WHO, 2006), a água fecal (blackwater) é definida como uma água residuária separada na fonte,
proveniente dos banheiros, contendo fezes, urina e água de descarga; enquanto que a água cinza (greywater) é
aquela proveniente da cozinha, banheiro (chuveiro e pia) e lavanderia, que geralmente não contém concentrações
significativas de excretas.
Friedler et al (2013) afirma que as águas residuárias domésticas são compostas por três principais resíduos: i)
urina, que contém aproximadamente 80% do nitrogênio, 45% do fósforo e 70% das cargas de potássio; (ii) fezes,
que contém a maioria dos metais pesados, quantidades menores nitrogênio, fósforo e potássio, e a maior parte da
carga microbiológica; e (iii) águas cinzas, que apesar de serem altamente diluídas, concentram a maior parte da
carga de DBO, DQO, COT, e enxofre, e são relativamente pobres em macronutrientes como nitrogênio, fósforo e
potássio.
28
Ridderstolpe (2004) afirma que o reúso da água cinza é relativamente fácil e pode ser
feito com aplicação direta no solo ou para irrigação de árvores, desde que sejam seguidos alguns
critérios de ordem sanitária. Além disso, este efluente pode ser utilizado para irrigação de
jardins residenciais, lavagem de veículos e de áreas impermeáveis e descarga de vasos sanitários
(ERIKSSON et al., 2002).
Conforme dito anteriormente, a implantação e gestão de sistemas de tratamento de
esgoto costuma ser cara e inacessível à grande parte dos núcleos populacionais. Portanto, faz-
se necessário o desenvolvimento de soluções simplificadas, com baixo custo de implantação,
manutenção e que possibilitem o aproveitamento econômico de seus subprodutos (UNESCO,
2015). Tal reaproveitamento constitui o terceiro pilar do EcoSan e se apresenta atualmente
como uma das principais tendências no tratamento de esgotos, notadamente em áreas rurais
(Figura 3).
Figura 3 – Diretrizes do Saneamento Ecológico para a elaboração de tecnologias para tratamento de esgoto em
áreas rurais.
Diretrizes do
Saneamento
Ecológico
Separação na Reúso
fonte
Descentralização
("on-site sanitation")
Segundo Roefs et al. (2016), a segregação na fonte possibilita também uma melhoria
da recuperação de energia, nitrogênio e fósforo, uma vez que as águas estão mais concentradas
e seus fluxos são mais homogêneos. Destaca-se que a água fecal contém cerca de 90% do
nitrogênio, 77% do fósforo e 55% da matéria orgânica, enquanto representa apenas cerca de um
terço do volume de águas residuais municipais (KUJAWA-ROELEVELD & ZEEMAN, 2006).
No aspecto tecnológico, constata-se que não existe um conjunto específico de
tecnologias que se encaixe dentro do paradigma do saneamento ecológico; já que as próprias
tecnologias de saneamento não são sustentáveis por si, mas apenas em relação a como elas são
utilizadas em seu ambiente imediato (LANGERGRABER & MUELLEGGER, 2005). Mesmo
não podendo ser utilizadas como um padrão, existem hoje na América Latina alguns sistemas
de tratamento de águas fecais que vêm obtendo resultados positivos em projetos deste tipo,
como os tanques de evapotranspiração (TEvap’s), reatores anaeróbios compartimentados
(RAC’s), biodigestores com filtro anaeróbio interno e a própria Fossa Séptica Biodigestora.
As diretrizes apresentadas neste item têm sido bastante discutidas, porém ainda pouco
aplicadas no contexto nacional, devido a um conjunto de entraves técnicos e políticos que
permeiam o tema. Dentre estes entraves é importante citar a insuficiência de estudos científicos
acerca de tecnologias alternativas para tratamento de esgoto na área rural e a carência de
30
legislações que estabeleçam padrões de qualidade para o reúso dos subprodutos do esgoto em
nosso país.
De acordo com CALVERT et al.(2004), apesar de ser visto com certo receio por boa
parte da população ocidental, o uso agrícola dos subprodutos do tratamento de esgoto não é
necessariamente uma novidade. O autor afirma que sistemas de saneamento ecológicos têm
sido utilizados há centenas de anos por diversos povos e continuam sendo amplamente
difundidos em algumas partes do leste e sudeste asiático. No ocidente, a cultura de uso destes
subprodutos foi teoricamente esquecida com o advento do sistema de descargas, mas sempre
configurou uma prática inconsciente na maior parte dos países em desenvolvimento, através do
que se chama de “reúso indireto não planejado” da água8 (NATIONAL ACADEMY OF
SCIENCE, 1998).
Esta situação tem sido revertida durante as três últimas décadas, a partir de diversos
fatores de ordem econômica e sociocultural que têm impulsionado o reúso indireto planejado
das águas residuárias domésticas, sobretudo em atividades agrícolas. Segundo Hespanhol
(2006), os principais fatores que têm contribuído para este aumento são:
a) a dificuldade crescente de identificar fontes alternativas de águas para irrigação;
b) o custo elevado de fertilizantes;
c) a segurança de que os riscos de saúde pública e impactos sobre o solo são mínimos, se
as precauções adequadas são efetivamente tomadas;
d) os custos elevados dos sistemas de tratamento necessários para descarga de efluentes
em corpos hídricos receptores;
e) a aceitação sociocultural da prática do reúso agrícola e reconhecimento, pelos órgãos
gestores de recursos hídricos, do valor intrínseco da prática.
Em 2006, a Organização Mundial da Saúde (WHO, 2006) declarou que mais de 10% da
população mundial consumia alimentos produzidos por irrigação com águas residuárias, sendo
8
a. Reúso indireto não planejado: ocorre quando a água utilizada em alguma atividade humana é descarregada no
meio ambiente e novamente utilizada a jusante, em sua forma diluída, de maneira não intencional e não controlada
(ex: lançamento de esgoto em corpos hídricos que serão utilizados como mananciais de abastecimento de água á
jusante)
b. Reúso indireto planejado: ocorre quando os efluentes, depois de tratados, são descarregados de forma planejada
nos corpos de águas superficiais ou subterrâneas, para serem utilizadas a jusante, de maneira controlada, no
atendimento de algum uso benéfico. (LAVRADOR-FILHO, 1987).
31
esta porcentagem ainda maior em países de clima árido e semiárido. A organização destacou
que, em situações de estresse hídrico, as águas residuárias são consideradas recursos valorosos
e que o uso de fertilizantes para a produção agrícola é ainda mais importante. Dessa forma, as
águas fecais e cinzas podem ajudar a atender a demanda de água na agricultura, ao mesmo
tempo em que permitem a preservação de recursos hídricos de alta qualidade para
abastecimento de água potável.
Além de reduzir os impactos ambientais causados pelo lançamento do esgoto no
ambiente, o uso agrícola das águas fecais e cinzas significa a existência de fontes de água
disponíveis durante todo o ano para a irrigação e possibilita o aumento da produção agrícola
sem que haja mais gastos com fertilizantes (WHO, 2006). A substituição dos fertilizantes
químicos pelo efluente tratado pode significar, assim, redução nos custos da produção e um
ganho em termos de saúde pública, na medida em que atenua os impactos ambientais e as
doenças decorrentes do uso indiscriminado destes produtos (FLORENCIO; BASTOS; AISSE,
2006)
Para Bastos et al. (2008), ao mesmo tempo em que não restam dúvidas sobre a
possibilidade de riscos à saúde ligados a práticas de reúso, ainda há muito o que se discutir
sobre a definição de um padrão de qualidade dos efluentes que garanta segurança sanitária deste
reúso. Neste sentido, o autor afirma que
[...] embora esta seja uma prática bastante antiga, apenas recentemente foram se
consolidando as bases técnicas e científicas para o ‘reúso controlado’, entendido como
seguro do ponto de vista sanitário, sustentável do ponto de vista ambiental e viável do
ponto de vista de financeiro. (Bastos et al., 2008, pg.1)
Nas últimas décadas muitos países definiram seus padrões de qualidade para reúso, com
diferentes graus de exigência. Em países desenvolvidos, as diretrizes de reúso costumam ser
bastante rígidas, baseadas em um baixo risco e utilização de tecnologias de alto custo. Por outro
lado, países em desenvolvimento costumam elaborar suas legislações com base nas diretrizes
da OMS, enfatizando a restrição de cultivos ao invés do estabelecimento de padrões explícitos
de qualidade microbiológica (BAZZARELLA, 2005). Os Quadro 1 e Quadro 2 apresentam os
dois principais padrões utilizados como base para regulamentação do reúso agrícola de
efluentes domésticos no mundo: o da U.S. Environmental Protect Agency (USEPA, 2012) –
mais restritivo – e o da Organização Mundial da Saúde (WHO, 2006).
32
pH 6 a 9
Culturas alimentícias não processadas
DBO ≤ 10 mg/L
comercialmente
Secundário + filtração + Turbidez ≤ 2 UNT (1)
Irrigação superficial ou por aspersão de
desinfecção CRT ≥1 mg/L
qualquer cultura, incluindo culturas a serem
CTer: ND (3)
consumidas cruas.
Organismos patogênicos: ND
pH 6 a 9
Culturas alimentícias processadas
DBO ≤ 30 mg/L
comercialmente
SST ≤ 30 mg/L
Irrigação superficial de pomares e vinhedos
Secundário + desinfecção CRT ≥ 1 mg/L
Silvicultura e irrigação de áreas com acesso
CTer ≤ 200 por 100ml (4)
restrito ao público.
pH 6 a 9
Culturas não alimentícias DBO ≤ 30 mg/L
Pastagens para rebanhos de leite(5), Secundário + desinfecção (2) SST ≤ 30 mg/L
forrageiras, cereais, fibras e grãos. CRT ≥ 1 mg/L
CTer ≤ 200 por 100 ml (4)
(1) Turbidez pré-desinfecção, média diária; nenhuma amostra > 5 uT (ou 5 mgL SST L-1). (2) CRT: cloro residual total
após tempo de contato mínimo de trinta minutos; residuais ou tempos de contato mais elevados podem ser necessários para
a garantia de inativação de vírus e parasitas. (3) CTer: coliformes termotolerantes; ND: não detectável; média móvel de sete
dias; nenhuma amostra > 14 CTer por 100 mL. (4) Média móvel de sete dias; nenhuma amostra > 800 CTer por 100 mL;
lagoas de estabilização podem alcançar o critério de qualidade sem a necessidade de des- infecção. (5) O consumo das
culturas irrigadas não deve ser permitido antes de 15 após a irrigação; desinfecção mais rigorosa (≤ 14 CTer por 100 mL)
se o período de 15 dias não for observado.
F 4 104
Restrita G 3 105
H <1 106
(1) Combinação de medidas de proteção à saúde. (A): cultivo de raízes e tubérculos; (B): cultivo de folhosas; (C): irrigação
localizada de plantas que se desenvolvem distantes do nível do solo; (D): irrigação localizada de plantas que se desenvolvem
rentes ao nível do solo; (E): qualidade de efluentes alcançável com o emprego de técnicas de tratamento tais como tratamento
secundário + coagulação +filtração + desinfecção; qualidade dos efluentes avaliada ainda com o emprego de indicadores
complementares (por exemplo, turbidez , SST, cloro residual ; (F): agricultura de baixo nível tecnológico e mão de obra
intensiva; G: agricultura de alto nível tecnológico e altamente mecanizada; (H): técnicas de tratamento com reduzida
capacidade de remoção de patógenos (por exemplo, tanques sépticos ou reatores UASB) associada ao emprego de técnicas
de irrigação com elevado potencial de minimização da exposição (irrigação subsuperficial). (2) Remoção de vírus que
associada a outras medidas de proteção à saúde corresponderia à uma carga de doenças virais tolerável ≤ 10-6 DALY pppa
e riscos menores de infecções bacterianas e por protozoários. (3) Qualidade do efluente (média geométrica durante o período
33
de irrigação) correspondente à remoção de patógenos indicada em (2). (4) No caso de exposição de crianças (15 anos)
recomenda-se um padrão e, ou, medidas complementares mais exigentes: ≤ 0,1 ovo por L, utilização de equipamentos de
proteção individual, tratamento quimioterápico. No caso da garantia da remoção adicional de 1 Log10 na higiene dos
alimentos pode-se admitir ≤ 10 ovos por L. (5) Média aritmética em pelo menos 90 % do tempo, durante o período de
irrigação. A remoção requeria de ovos de helmintos (Log10) depende a concentração presente no esgoto bruto. Com o
emprego de lagoas de estabilização, o tempo de detenção hidráulica pode ser utilizado como indicador de remoção de
helmintos. No caso da utilização de técnicas de tratamento mais complexas (opção E), o emprego de outros indicadores (por
exemplo, turbidez ≤ 2 uT ) pode dispensar a verificação do padrão ovos helmintos. No caso de irrigação localizada, em que
não haja contato da água com as plantas e na ausência de riscos para os agricultores (por exemplo, opção H) o padrão ovos
de helmintos poderia ser dispensável.
Fonte: Bastos et al. (2008) adaptado de WHO (2006).
Embora não exista no Brasil nenhuma legislação defina os padrões para reúso agrícola
de esgoto doméstico (Quadro 3), esta prática atende perfeitamente aos objetivos da Política
Nacional de Recurso Hídricos e é incentivada pelas resoluções nº 54 e nº 121 do Conselho
Nacional de Recursos Hídrico, que estabelecem modalidades, diretrizes e critérios gerais para
a prática de reúso direto não potável de água (CNRH, 2005; CNRH, 2010). Sobre isso, Bastos
et al. (2008, p.2) afirma que
[...] não somente no Brasil, mas em muitos países, a legislação sobre o reúso é
inexistente, muito branda ou muito restritiva, faltando estudos que evidenciem quais
as taxas seguras de aplicação para cada cultura e quais os reais danos cada
contaminante podem ocasionar ao sistema solo-água-planta.
Quadro 3- Dispositivos legais e infra legais que regulamentam o uso agrícola de esgotos sanitários
de Política
Ambiental –
COPAM (MG)
Trata sobre providências e cuidados necessário com o esgoto
de origem doméstica, citando que este esgoto pode ser
reutilizado para fins em que não seja exigido o uso de água
NBR 13.969/ 97
potável, desde que este seja sanitariamente seguro (ex:
lavagem de pisos e veículos, descarga de vasos sanitários e
irrigação de jardins)
Deliberação Dispõe sobre a classificação dos corpos d’água e diretrizes
Normativa Conjunta ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece
COPAM/CERH - as condições e padrões de lançamento de efluentes para o
MG nº 01 Estado de Minas Gerais.
Fonte: (ANA, 2015)
Ovos de
Categoria CTer/ 100ml (4) Observações
helmintos/L (5)
(1) O padrão de qualidade de efluentes expresso apenas em termos de coliformes termotolerantes e ovos de helmintos
aplicam-se ao emprego de sistemas de tratamento por lagoas e por disposição no solo. Admite-se que nesses sistemas a
remoção de (oo)cistos de protozoários é indicada pela remoção de ovos de helmintos. No caso de filtração terciária a turbidez
35
deve ser utilizada como parâmetro indicador da remoção de protozoários. Para a irrigação irrestrita recomenda-se um padrão
de turbidez ≤ 5 uT. Além disso, em sistemas que incluam a desinfecção deve-se recorrer aos parâmetros de controle da
desinfecção (residual desinfetante e tempo de contato) necessários ao alcance do padrão estipulado para coliformes
termotolerantes e para a remoção efetiva de vírus. (2) Irrigação superficial ou por aspersão de qualquer cultura, ou cultivo
hidropônico, inclusive culturas alimentícias consumidas cruas. (3) Irrigação superficial ou por aspersão ou cultivo
hidropônico de qualquer cultura não ingerida crua, inclui culturas alimentícias e não alimentícias, forrageiras, pastagens e
árvores. (4) Coliformes termotolerantes: média geométrica durante o período de irrigação, alternativa e preferencialmente
pode-se determinar E.coli. (5) Nematóides intestinais humanos: média aritmética durante o período de irrigação (6) Barreiras
adicionais de proteção encontradas em agricultura de elevado nível tecnológico, incluindo o emprego de irrigação localizada
e equipamentos de proteção individual. Exclui-se desta nota a irrigação de pastagens e forrageiras destinadas à alimentação
animal. (7) Neste caso não se aplicam os limites estipulados de coliformes e ovos de helmintos, sendo a qualidade do efluente
uma consequência das técnicas de tratamento empregadas
Tendo em conta que a Fossa Séptica Biodigestora é uma tecnologia voltada notadamente
para o tratamento de esgoto em residências rurais (NOVAES, 2002); mais do que entender os
riscos e potencialidades gerais do uso agrícola do esgoto doméstico, faz-se necessário deslindar
esta prática à luz da realidade da agricultura familiar no Brasil e do modelo de tratamento
descentralizado. Assim, visando subsidiar uma discussão mais aprofundada neste aspecto, o
presente item sintetiza as informações sobre o reúso de águas residuárias que dialogam com a
cultura e com os problemas enfrentados pelas comunidades rurais em nosso país.
Considerando que os índices de desenvolvimento humano municipais (IDHM) são
significativamente menores nas áreas rurais do que nas áreas urbanas do Brasil, um dos
primeiros pontos nesta discussão é a comprovada relevância política do reúso de efluentes
domésticos em relação à redução da pobreza, segurança alimentar, dependência de energia e à
proteção da saúde pública e do meio ambiente (WHO, 2006)
Além de configurar um destino adequado ao esgoto nas comunidades rurais – que
historicamente apresentam índices baixíssimos de coleta e tratamento – o reúso agrícola deste
efluente contribui com a diminuição dos gastos que o produtor rural terá na compra de
fertilizantes e simboliza mais um passo no caminho da transição agroecológica, já que contribui
para um ciclo de produção autossuficiente e com o mínimo de impactos ambientais negativos
(PERMINIO, 2013).
Para Hespanhol (2006), o aumento da produção de alimentos pode elevar o nível
nutricional, a qualidade de vida e as condições sociais das populações beneficiadas pelo sistema
de reúso, principalmente em países em desenvolvimento. Contudo, isso deve ser feito com a
segurança adequada, maximizando os ganhos em saúde pública e os benefícios ambientais
decorrentes desta prática.
36
De acordo com a OMS, o uso agrícola de efluentes domésticos oferece riscos tanto aos
consumidores das culturas irrigadas com este efluente, quanto aos seus produtores e à
comunidade local. Portanto, os projetos de reúso devem priorizar métodos de irrigação que
minimizem o contato destes três atores com o efluente e, consequentemente, os riscos de
contaminação microbiológica inerente a esta prática (WHO, 2006).
Para além da escolha do método de irrigação, esta organização listou alguns cuidados
que podem ser tomados pelos agricultores e consumidores com o objetivo de evitar esta
contaminação:
a. Restrição de culturas/produtos irrigados com o efluente doméstico → limitar o uso apenas
às culturas que não são consumidas e àquelas que são sempre processados ou cozidas antes de
serem consumidas;
b. Utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI’s) nas atividades de manejo do
esgoto;
c. Escolha de técnicas de aplicação de resíduos que permitam tempo suficiente para a
inativação dos patógenos no ambiente antes da colheita.
d. Tratamento adequado dos alimentos: lavar, desinfetar e cozinhar os alimentos (no caso dos
consumidores)
e. Controle de vetores de doenças ocasionadas por microrganismos na comunidade onde é feito
o uso do esgoto;
f. Tratamento adequado dos doentes, visando a redução de entradas de patógenos nas águas
residuais.
Se administrados apropriadamente, os sistemas de tratamento de esgotos
descentralizados podem ter um desempenho efetivo, proteger a saúde humana e o meio
ambiente. No entanto, o tratamento de pequenos volumes de água provenientes de fontes
limitadas é desafiador e abre possibilidade para a existência de sistemas mal projetados ou
operados. Isto porque variações significativas na quantidade e qualidade influente podem
ocorrer em curtos períodos de tempo, dependendo dos estilos de vida, hábitos e atividades
cotidianas da comunidade. Consequentemente, são esperadas variações significativas nas
concentrações de vários parâmetros (ex: matéria orgânica, pH, surfactantes e nutrientes),
podendo afetar adversamente a eficiência dos processos biológicos (FRIEDLER & BUTLER,
1996; ZAPATER; GROSS & SOARES, 2011)
Outro fator a ser considerado em projetos de reúso agrícola de efluentes domésticos é o
“nojo”, definido por Rozin et al. (2008) como a sensação de repulsa associada à ingestão
percebida de contaminantes desagadáveis. De acordo com Rosenquist (2005), a reação natural
à sensação de nojo é o comportamento da evitação, o que inclui tanto o contato físico com o
esgoto quanto com o cheiro e visão dele. Dessa forma, mudanças que resultam na diminuição
37
da distancia real ou percebida entre nós e nossos excrementos (ou de outros) pode provocar
uma resistência significativa, comprometendo o sucesso destes projetos (BRANDS, 2014)
Por outro lado, Van Vliet et al. (2011) e Van Vliet & Spaargen (2010) discutem que as
práticas de saneamento em que os excrementos se tornam mais visíveis têm um desafio grande,
mas não intransponível, de adoção. Para eles, fatores como o envolvimento do usuário com o
sistema, funcionalidade e características culturais são variáveis importantes nesta relação.
Sobre a regulamentação do uso agrícola de esgoto no Brasil, Bastos et al.,(2008)
defendem que esta questão cultural deve ser adequadamente dimensionada, porém não deve
servir de argumento para o estabelecimento de padrões excessivamente restritivos ou à mera
proibição de algumas práticas (ex: exemplo do cultivo de produtos comestíveis). Para os
autores, as legislações muito rigorosas podem ser tornar insustentáveis – na medida em que
demandam sistemas de tratamento inacessíveis à população – ao passo que a proibição de
práticas de reúso pode se revelar inócua, já que o reúso (não planejado) indireto ainda é uma
realidade no país, inclusive para a irrigação de produtos comestíveis
38
4 METODOLOGIA
Categoria Descrição
c. Eficiência do tratamento
& uso agrícola do Publicações que agrupavam os objetivos das categorias 1 e 2
efluente
e. projetos de implantação Publicações cujo objetivo principal era apresentar projetos de implantação da
e/ou apropriação da FSB em comunidades rurais, discutir a aceitação/apropriação desta tecnologia
tecnologia ou temas relacionados
9
Critério analisado apenas no caso de publicações referentes às categorias “a”, “b” e “c”.
10
As publicações foram consideradas como vinculadas à Embrapa nos seguintes casos:
a) artigos ou livros em que um ou mais autores mantinham vínculo empregatício com a instituição na época da
publicação;
b) monografias, teses ou dissertações produzidas, orientadas ou co-orientadas por pesquisadores com vínculo
empregatício com a instituição na época da publicação;
c) materiais de qualquer tipo publicados pela editora da Embrapa.
40
g. diretrizes para a
Publicações que tinham como objetivo principal apresentar a FSB e fornecer
construção e manutenção do
informações básicas sobre sua construção e manejo.
sistema
Publicações que não tinha como objetivo principal analisar a FSB, porém
h. descrição da tecnologia relatavam de forma detalhada o seu modo de funcionamento, vantagens,
desvantagens ou outros aspectos do sistema.
i. Fora do Tema Publicações que não se encaixavam em nenhuma das categorias acima.
Destaca-se que, nos casos de pesquisas publicadas mais de uma vez, foi analisada apenas
a publicação mais recente. Assim, nos casos de dissertações de mestrado que já se encontravam
publicadas na forma de artigos em periódicos, foi analisada somente a última fonte. O mesmo
aconteceu com pesquisas disponíveis tanto em anais de congresso quanto em periódicos.
Segundo Nascimento (2018) esta estratégia mostra-se necessária para evitar múltiplas
contagens de um mesmo estudo, mas pode alterar os dados sobre os tipos de publicações
disponíveis e omitir outras informações relevantes para a pesquisa.
voláteis, nitrogênio amoniacal, nitrogênio total kjeldahl e E. coli. A partir destas análises, foram
feitas comparações entre os diversos modelos e formas de manejo do sistema identificados nos
estudos e destas com o exemplar da FSB instalado no distrito de Cachoeira do Campo (Ouro
Preto – MG).
Para que isso fosse possível, as publicações que apresentaram dados sobre dois ou mais
modelos de FSB foram contabilizados duas ou mais vezes, de forma a evidenciar a diferença
de comportamento do sistema de acordo com suas configurações ou formas de manejo. As
principais características das publicações avaliadas neste estudo estão descritas no Quadro 6 a
seguir:
Quadro 6 – Publicações consideradas na análise de dados da literatura
Especificidades do Sistema e
Trabalho Local Tipo de publicação
Metodologia de coleta
• Sistema modificado: entrada pela
parte inferior e saída pela parte superior
dos reatores.
• Esterco inoculado apenas uma vez,
Barboni & Espírito Santo do
Anais de congresso no início do funcionamento.
Rochetto (2014) Pinhal – SP.
• Coleta realizada após 2 meses de
funcionamento.
• Amostras da água fecal bruta (AFB)
e do efluente final (3º reator).
• Compara sistemas inoculados com
esterco bovino e ovino11
• 3 coletas de efluentes em diferentes
Dissertação de
Faustino (2007) São Carlos – SP períodos do ano.
mestrado
• Amostras do 1º reator e do efluente
final (3º reator).
11
As publicações de Faustino (2007) e Campos et al. (2015) apresentam dados sobre duas formas de manejo da
FSB, bastante diferentes entre si. Portanto, cada um deles será tratado no âmbito desta revisão como se fossem
dois estudos:
✓ Faustino (2007) “A”: resultados obtidos com esterco bovino
✓ Faustino (2007) “B”: resultados obtidos com esterco ovino
✓ Campos et al. (2015) “A”: sistema com caixas de polietileno e inoculo artificial
✓ Campos et al. (2015) “B”: sistema com caixas de fibrocimento e inoculado com esterco bovino.
42
12
Todos os demais estudos referem-se às unidades da FSB como “caixas” e afirmam que a função da última unidade
seria apenas acondicionar o efluente. Porém, a partir da constatação de que ocorrem reações químicas nas três
unidades, convencionou-se chama-las, neste trabalho, de reatores.
44
cm). A localização dos pontos de coleta está indicada na Figura 5 e os detalhes das campanhas
realizadas estão descritos nos Quadro 7 e 8.
Conforme observa-se na figura acima, a FBCC apresentava algumas modificações em relação ao sistema
padrão proposto pela Embrapa (SILVA et al., 2007). Dentre elas, as principais são o fato de que, na 1ª caixa,
a entrada do esgoto acontecia pela parte inferior do reservatório; e que na 3ª caixa não havia uma tubulação de
saída, sendo o efluente retirado a cada 20 dias, por meio de uma bomba de sucção.
É importante ressaltar que a 1ª coleta desta campanha foi realizada 18 dias após a inserção
do inóculo no mês de novembro de 2017. Da mesma forma, a 2ª coleta foi realizada 24 dias
após a inserção do inóculo e assim sucessivamente. Desde que foi instalada, a FBCC recebia
mensalmente uma injeção de 20L de esterco. Portanto, partindo do pressuposto de que o dia de
inserção do inóculo é o 1º dia do ciclo, foram obtidas três amostras referentes ao final de um
ciclo e três amostras referentes ao início de outro. Além de doze parâmetros físicos e químicos,
foram analisados quatro parâmetros microbiológicos, com destaque para o Adenovírus Humano
(HAdV) e Enterococcus spp., que estão sendo estudados pela primeira vez neste tipo de sistema.
Quadro 8 – Parâmetros físicos, químicos e microbiológicos utilizados para avaliar o desempenho da FBCC
pH pHmetro Digimed
Oxigênio Dissolvido (OD) Sonda HACH 40 D HQ com eletrodo LBDO101
Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) 5210 B (APHA, 2012)
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Figura 7 - Porcentagem de publicações sobre a FSB obtidas em cada base de dados analisada.
tempo, percebe-se que ainda é muito baixo o número de estudos sobre a FSB publicados em
periódicos de alto impacto ou com maior reconhecimento no meio acadêmico. Após os anais e
artigos científicos, os tipos de publicações mais abundantes foram os Trabalhos de Conclusão
de Curso (TCC’s) e manuais ou cartilhas que tratam de aspectos construtivos e de manejo do
sistema. Ressalta-se que, em se tratando de uma tecnologia social, este último tipo de
publicação é de importante para a disseminação e incorporação de suas práticas na sociedade.
Figura 8 - Tipos de publicações disponíveis sobre a FSB nas bases de dados analisadas
13
No gráfico da Figura 9a este número está identificado na coluna N/A: critério não aplicável.
49
no Mato Grosso do Sul (2º colocado no ranking) possuem relação com a Embrapa Pantanal,
que desde 2010 tem impulsionado o desenvolvimento de pesquisas sobre o tema.
Figura 9 – a) Distribuição das publicações sobre a FSB nos diversos estados brasileiros – classificação quanto ao
local de aplicação da pesquisa. b) Estados nos quais localizavam-se as instituições que produziram as publicações
que continham informações gerais sobre a FSB (coluna N/A).
a) b)
Apesar da FSB ser uma tecnologia social, e, portanto, de domínio público, até hoje a
instituição na qual ela foi desenvolvida continua tomando a frente da maior parte das pesquisas
e projetos de implantação deste sistema. Prova disso é que cerca de 42% de todas as publicações
analisadas neste estudo possuem alguma ligação com a Embrapa.
É possível admitir que a predominância de estudos sobre a FSB no estado de São Paulo
e seus arredores é algo normal, já que a tecnologia foi desenvolvida por pesquisadores desta
região. Porém, esta situação se torna inoportuna na medida em que a FSB tem sido divulgada
como uma das principais alternativas para o tratamento de esgotos domésticos nas áreas rurais
de todo o país, sendo inclusive, citada em políticas públicas de âmbito nacional, como o
Programa Nacional de Habitação Rural (BRASIL, 2017).
Sabendo que um dos principais fatores que influenciam o sucesso de determinada
tecnologia de saneamento rural é sua adequação às características ambientais e socioculturais
do local (AL-SA’ED; MUBARAK, 2006), entende-se como extremamente necessário o
incentivo à formulação de pesquisas voltadas para a aplicabilidade da FSB nas demais regiões
do país.
Partindo para a análise do número de publicações por ano, a Figura 10 demonstra que a
FSB manteve-se numa média de uma a duas publicações por ano, até 2007, quando foram
publicados sete estudos, incluindo a primeira dissertação detalhando as características físicas e
50
químicas do efluente deste sistema (FAUSTINO, 2007). Depois disso, verifica-se um pico de
produtividade no ano de 2010, devido a uma maior atividade do grupo de pesquisa da Embrapa
Pantanal (Corumbá -MS). Neste ano também foram lançadas duas importantes cartilhas
explicativas sobre o sistema, publicadas pela Fundação Banco do Brasil e Embrapa
Instrumentação Agropecuária (BANCO DO BRASIL, 2010; GALINDO et al., 2010). Apesar
da literatura relatar que o sistema foi criado em 2001, não foi encontrado nenhuma publicação
sobre a FSB neste ano.
Até o presente momento, 2014 foi o ano em que mais se produziu estudos sobre a FSB,
com destaque para a publicação do único artigo científico de revisão de literatura encontrado
nesta pesquisa (COSTA & GUILHOTO, 2014) e para o aumento da quantidade de publicações
no estado do Paraná.
Em relação às abordagens das publicações (Figura 11), 36% fazem relatos de projetos
de implantação da FSB, discutindo a apropriação desta tecnologia pelas comunidades, seus
impactos no saneamento básico local, dentro outros aspectos. A segunda abordagem mais
comum é a “descrição da tecnologia”, ou seja, publicações que descrevem o funcionamento da
FSB em seu conteúdo, porém não aplicaram este sistema em nenhum local e apenas reproduzem
dados secundários.
Destaca-se que os estudos relacionados ao desempenho da FSB para o tratamento de
esgoto doméstico e/ou à viabilidade do reúso agrícola de seu efluente somam apenas 29% de
todos os materiais publicados até hoje sobre o assunto (31 publicações no total). Ou seja,
provavelmente existe um maior interesse geral na avaliação de aspectos políticos, econômicos
51
e sociais dos projetos de implantação da FSB do que na análise da eficiência deste sistema e
nos riscos relacionados ao uso agrícola de seu efluente.
Figura 11 – Abordagem dos estudos publicados sobre a FSB no período de 2002 a 2018.
Este fato contraria de certa forma aquilo que foi relatado por van Vliet et al. (2011) na
Holanda, onde as pesquisas que abordam o saneamento a partir das ciências sociais são bastante
escassas se comparadas com os vastos materiais produzidos pelas áreas de engenharia e saúde
pública. Por um lado, tal situação é positiva, já que demonstra uma preocupação crescente com
as “formas de gestão” do saneamento e com o impacto das tecnologias na vida das
comunidades. Por outro, demonstra certa negligência das instituições na avaliação dos
resultados práticos do tratamento realizado pela FSB e no esforço de otimização desta
tecnologia.
Figura 12 – Abordagens principais em cada tipo de publicação
52
final da FSB. Os resultados obtidos por estes estudos estão descritos na Figura 13 como “valores
de referência”.
Figura 13 – pH nos reatores da Fossa Séptica Biodigestora: dados da FBCC e valores de referência
*Legenda: AFB: água fecal bruta; R1: Reator 1; R2: Reator 2; R3: Reator 3
Estes estudos apontam que a Fossa Séptica Biodigestora apresenta um pH médio de 6.95
na entrada do sistema, passando para 7.74 dentro do 1º reator e 8.08 na saída do 3º reator; o que
indica a alcalinização do efluente ao longo do tratamento. Conforme ilustrado na Figura 13 e
na Tabela 01, tal comportamento também foi verificado nas amostras da FBCC, tanto na porção
superior dos reatores, na porção inferior. Para Silva et al. (2007), a alteração do pH de neutro
para alcalino após o tratamento com a FSB pode ser decorrente da degradação de proteínas e
aminoácidos em meio anaeróbio, gerando uma quantidade substancial de amônia, que, ao reagir
com o ácido carbônico em meio aquoso, passa para a forma de hidróxido de amônio.
Tabela 1 - pH médio nos reatores da FSB: amostras da FBCC e valores de referência (da literatura)
Água Fecal Bruta Reator 1 Reator 2 Reator 3
Valores de
6,95 7,74 Não identificado 8,08
referência
FBCC (p = 30cm) 7,42 7,95 8,1 8,39
FBCC ( p=120cm) 7,42 7,86 7,69 8,01
produção de ácidos orgânicos voláteis na parte inferior destes reservatórios, indicando que esta
é uma zona mais reativa, onde os compostos orgânicos complexos ainda não foram totalmente
convertidos em seus produtos finais (VON SPERLING, 2005).
Sobre a adequação do pH destes reatores ao tratamento anaeróbio, Chernicharo (1999)
informa que as bactérias metanogênicas apresentam um crescimento ótimo na faixa de pH entre
6.6 e 7.4, embora seja possível atingir estabilidade na formação de metano em toda a faixa de
6.0 e 8.0. Este dado é reiterado por Speece (1996), que afirma que os reatores anaeróbios são
operados de maneira satisfatória na faixa de pH de 6,5 a 8,2. Portanto, os valores de pH dentro
das FSB se mostraram, de forma geral, adequados para o processo de decomposição em
questão.
Em relação ao uso agrícola deste efluente, os valores de pH, tanto na revisão de literatura
(7.0 a 8.7) quanto nas amostras da FBCC (8.05 a 8.53), estão dentro da faixa de 6 – 9,
estabelecida pela USEPA (2004) como aceitáveis para esta finalidade.
5.2.3. Temperatura
Figura 14 – Temperatura nos reatores da Fossa Séptica Biodigestora: dados da FBCC e valores de referência.
Legenda: AFB: água fecal bruta; R1: Reator 1; R2: Reator 2; R3: Reator 3
Na FBCC, os valores de OD nas amostras dos dois primeiros reatores estão quase
sempre na faixa de 0 a 1 mg/L e a amostra coletada na porção superficial do 3º reator apresenta
concentrações de OD mais altas do que todas as outras (0,99 a 2,4 mg/L). Tal situação era
esperada, na medida em que a carga orgânica volumétrica – que garante a situação de
anaerobiose – deve ser sempre menor no efluente do que no afluente do sistema (VON
SPERLING, 1996).
Além disso, verificou-se que a água fecal bruta apresentou concentração de OD muito
superiores àquelas do interior do reator (devido ter passado por turbulência pouco antes de sua
aferição) e que as amostras do fundo dos reatores apresentaram OD menor do que as da porção
superior, o que pode significa uma maior concentração de matéria orgânica nesta primeira
região.
Quadro 9 – Estudos encontrados na revisão de literatura que contém dados sobre a série de sólidos
ST SST SSV SSF STF STV
Estudo
(mg L-1) (mg L-1) (mg L-1) (mg L-1) (mg L-1) (mg L-1)
Faustino (2007)14 ● ● ●
Soares et al. (2016b) ● ● ●
Galavotti (2011) ● ● ● ● ● ●
Campos et al. (2015)¹ ●
Pereira et al. (2018) ● ● ●
Figura 15 – Série de Sólidos nos reatores da FBCC: efluente coletado a 30 e 120 cm de profundidade. Concentração
expressa em mg.L-1
Legenda: AFB: água fecal bruta; R1: Reator 1; R2: Reator 2; R3: Reator 3
Figura 16 - Série de Sólidos nos reatores da FBCC. Amostras coletadas a 30cm de profundidade. Concentração
expressa em mg.L-1.
Legenda: AFB: água fecal bruta; R1: Reator 1; R2: Reator 2; R3: Reator 3
A FBCC apresentou uma Eficiência de Remoção Global (ERG) média de sólidos totais
de 46%, muito próxima dos 50% e 39% obtidos por Campos (2015) e Galavoti (2011) para este
mesmo sistema; e dos 47,6 % registrados por Dias Postigo et al. (2017) para a fossa séptica
econômica. Cabe ressaltar que a quantificação de sólidos totais no caso de efluentes destinados
à fertirrigação é bastante relevante, já que a irrigação com líquidos contendo altas concentrações
de sólidos pode provocar alteração na capacidade de infiltração de água no solo, devido ao
entupimento dos macroporos e à formação de crostas em sua superfície (OLIVEIRA et al.,
2000).
Quanto ao teor de sólidos em suspensão, a primeira consideração a ser feita é que: ao
comparar os valores descritos na literatura com aqueles das amostras coletadas na FBCC,
percebe-se que apenas as amostras coletadas na profundidade de 30 cm apresentam
correspondência com os valores de sólidos em suspensão de outros estudos (FAUSTINO, 2007;
GALAVOTI, 2011; PEREIRA et al., 2018; SOARES et al., 2016b). Tal situação se repete em
diversos outros parâmetros avaliados e dá indícios de que todos os demais autores coletaram
amostras apenas na porção superior da FSB, ainda que a profundidade de coleta não tenha sido
especificada em nenhuma das pesquisas publicadas. Partindo deste pressuposto, deste momento
em diante serão confrontadas com os valores da literatura somente as amostras da água fecal
bruta e as amostras superficiais.
Diferente do que ocorre com sólidos totais, a concentração de sólidos suspensos na parte
superior da FBCC é maior no 1º reator do que na AFB e diminui ao longo do tratamento,
60
Figura 17 – DBO e DQO nos reatores da Fossa Séptica Biodigestora: valores de referência dispostos no Gráfico
A e dados da FBCC (profundidade = 30 cm) no Gráfico B
A B
Em relação à água fecal bruta, percebe-se que o valores de DBO e DQO na literatura
apresentaram desvio padrão muito amplo, apesar de todos os estudos teoricamente trabalharem
apenas com afluente composto de água, urina e fezes. Nas pesquisas apresentadas, a DBO
média afluente da FSB variou entre 384 mg/L (BARBONI & ROCHETTO, 2014) e 4950 mg/L
(PEREIRA et al., 2018); enquanto que no estudo de Cachoeira do Campo obteve-se uma
15
Conforme explicado anteriormente, os dados da literatura serão comparados somente com aqueles das amostras
coletadas na superfície da FSB modelo. Como em nenhum dos estudos de referência foi especificada a
profundidade das amostras coletadas, as concentrações dos diversos tipos de sólidos nos dados apresentados
permitem inferir que todas dizem respeito ao sobrenadante, e não à fração sólida acumulada no fundo dos reatores.
62
concentração média de 266±16 mg/L. Para a DQO, estes valores ficaram entre 753 e 7936 mg/L
na literatura e 333 a 455 mg/L nos experimentos.
De forma geral, os valores de DBO e DQO afluentes na FBCC estão bem abaixo daquele
descritos na literatura para as águas fecais, tanto nos estudos relacionados à FSB quanto em
outros – como o de Sharma & Kazmi (2015a), que obteve valores de 997 mg/L de DBO e
1352 mg/L de DQO; ou o de Silva et al. (2013), que apresentou DQO de 989 mg/L. Outro
estudo que obteve concentrações de matéria orgânica menores do que as esperadas foi o de
Rebelo (2011), com valor médio de 69 mg/L para DBO e 422 mg/L para DQO. Apesar da autora
ter atribuído estes valores à coleta do afluente em uma zona de menor concentração de matéria
orgânica, no caso da FBCC este argumento não se aplica, haja vista que a água fecal bruta foi
coletada na tubulação de entrada da fossa, em diferentes profundidades.
Quanto à razão DBO/DQO na entrada da FSB, esta apresentou uma média de 57 ± 8 %
na literatura16 e 68 ± 11% nos experimentos da FBCC, valores que comprovam a alta
biodegradabilidade das águas fecais brutas e assemelham-se com aqueles apresentados por
Sharma & Kazmi (2015a). De acordo com Von Sperling (2005), águas residuárias com razão
DBO/DQO > 40% têm porção biodegradável elevada e, portanto, são passíveis de tratamento
por vias biológicas.
Nas amostras da FBCC, a DBO da água fecal bruta diminui cerca de 54% ao adentrar
no Reator 1, enquanto que a relação DBO/DQO passa de 68 para 31%. Percebe-se, portanto,
que a maior parte da matéria orgânica biodegradável foi digerida já na primeira etapa do
tratamento. Até o presente momento, não há nenhum estudo publicado que compare as
concentrações da AFB e do 1º reator. Porém, levanta-se a hipótese de que o alto potencial de
remoção verificado na FBCC tenha relação com a configuração diferenciada de sua tubulação.
Diferente do que ocorre na FSB tradicional (modelo Embrapa), o afluente da FBCC é inserido
a cerca de 15 cm de seu fundo, ou seja, na altura da manta de lodo. De acordo com Chernicharo
(1997), tal configuração possibilita maior contato do afluente com a biomassa e aumenta a
eficiência do tratamento.
16 O estudo de Pereira et al. (2015) apresentou um aumento de 10% na relação DBO/DQO ao longo do tratamento
e eficiência de remoção de DBO de 2%, o que sugere algum desvio no funcionamento do sistema estudado ou erro
de análise laboratorial. Dessa forma, os dados relativos à matéria orgânica de Pereira et al. (2015) foram
desconsiderados no cálculo das médias apresentadas neste item.
63
Tabela 2 - Concentração de DBO e DQO na FSB: valores de referência e FBCC (amostras coletadas em p= 30 cm).
Água Fecal Reator 1 Reator 2 Reator 3 ERI ERG
Bruta (p=30cm) (p=30cm) (p=30cm) (p=30cm) (p=30cm)
FBCC 397 ±61 530 ±220 484 ±145 495 ±219 2,7 ± 37% -36 ± 10
DQO
(mg/L) Valores de
2667±5079 1459±612 - 1199±1743 58 ± 11% 33 ±3%
referência
A diminuição da DBO prossegue ao longo dos reatores, com uma ERI de 54,6 ± 29%
nos experimentos da FBCC e 74 ± 13% na literatura. O estudo que apresentou maior ERI (87%)
foi o de Soares et al. (2016b), que utilizava 04 reatores em série e, portanto, tinha um TDH
maior do que os demais. O que obteve menor ERG foi o de Barboni e Rochetto (2014) – cuja
configuração interna dos tubos era invertida em todas as caixas (entrada por baixo e saída por
cima), propiciando acúmulo do lodo nos reatores ao invés de sua movimentação ao longo do
sistema. Quanto às concentrações efluentes de DBO, estas ficaram entre 59 e 2575 mg/L
(SOARES et al., 2016b; PEREIRA et al., 2018) na literatura, dependendo da concentração
afluente; e entre 8,7 e 92 mg/L na FBCC.
De modo geral, percebe-se que a Fossa Biodigestora apresenta uma eficiência de
remoção de DBO média menor do que outras tecnologias utilizadas para o tratamento de águas
fecais, como o Tanque de Evapotranspiração (DBO:80%), a Fossa Séptica Econômica (DBO:
47%) e o biodigestor pré-fabricado com filtro anaeróbio interno (DBO: 78,9%). (DIAS
POSTIGO et al., 2017; GALBIATI, 2009; SHARMA & KAZMI, 2015b). Contudo, em
condições ideais de funcionamento, este sistema pode atingir até 98% de eficiência (SOARES
et al., 2016b).
Levanta-se a hipótese de que ótima eficiência de remoção de matéria orgânica registrada
pela FBCC (89 ±7%) pode estar ligada ao Tempo de Detenção Hidráulica deste sistema que,
conforme dito anteriormente, é três vezes maior do que o mínimo recomendado pela Embrapa.
São necessários mais estudos correlacionando estes dois fatores para que se tenha uma
discussão mais aprofundada sobre a necessidade de adicionar ou não mais módulos de
fermentação ao sistema original da Embrapa.
64
Conforme descrito na Tabela 2, mesmo com uma notável redução da fração orgânica
biodegradável, a FBCC registra entre a AFB e o R1 um aumento de 76% na concentração de
DQO, seguido de uma redução de apenas 2,7% até o R3. Como o efluente não foi filtrado antes
de sua análise, infere-se que o acréscimo na concentração de DQO após a passagem pelo
sistema é devido principalmente à produção de biomassa não-biodegradável dentro dos
reatores. De acordo com Faustino (2007) a DQO residual presente no efluente demonstrou
efeitos positivos após aplicação no solo, na medida em que aumenta teor de carbono orgânico
total e favorece o desenvolvimento das culturas agrícolas.
A eficiência de remoção de matéria orgânica da FSB foi bastante variável nos estudos
analisados, o que pode estar associado a diversos fatores como: as diferenças nas datas de coleta
(em relação ao dia da inoculação mensal de esterco bovino); a obtenção de amostras em
diferentes fases do processo de biodigestão; a intensidade de uso do vaso sanitário; e a diferença
de microclima dos locais de estudo, que pode ter favorecido ou não o processo de biodigestão.
(SOARES et al., 2016b)
A Tabela 3 informa as concentrações de DBO e DQO relativas às amostras de lodo
coletadas na FBCC. Conforme descrito, a concentração de matéria orgânica no lodo tende a
diminuir ao longo da FSB, apresentando uma redução maior entre o Reator 2 e o Reator 3.
𝐷𝐵𝑂
𝐷𝑄𝑂
(%) 10,8 ±8% 8 ±6% 8,5 ±6,2 -
5.2.7. Nitrogênio
Figura 18- NH4+ nos reatores da Fossa Séptica Biodigestora: dados da FBCC
17
Apenas dois estudos apresentaram dados sobre a eficiência global de remoção do NTK. Como Campos et al.
(2015) apresentou um resultado incoerente em relação a este parâmetro (acúmulo de 135%, passando de 82 mg/L
na AFB para 192 mg/L no efluente), o valor de referência é baseado nos dados de Freitas et al. (2015)
67
apresentado por Gonçalves et al. (2014), de 20± 10mg/L de fósforo em águas fecais contendo
fezes, urina, água e papel higiênico.
Figura 20- Fósforo total nos reatores da Fossa Séptica Biodigestora: valores de referência e dados da FBCC
também foi identificado por Galavoti (2011), Lotfi (2017) e Pereira et al. (2018), que
registraram ERI de 3; 37%; e 61% respectivamente.
Quanto à Eficiência de Remoção Global (ERG) deste nutriente, tanto os dados primários
quanto os secundários configuram valores negativos (expressando acúmulo) e com desvio
padrão muito alto. Este coeficiente depende diretamente da concentração de fósforo na AFB,
que, conforme exposto na Figura 20, é bastante instável.
De acordo com Lotfi (2017), a remoção de fósforo entre o 1º e o 3º reator da FSB está
associada com a capacidade das bactérias incorporaram o fósforo à massa de lodo. Tal hipótese
pôde ser confirmada pelos experimentos realizados na FBCC, que comprovam que a
concentração aumenta nas amostras inferiores na medida em que diminuem nas superiores. Isso
porque, no caminho que os flocos de biomassa percorrem no sistema (passando do R1 para o
R2 e R3) eles incorporam cada vez mais fósforo do sobrenadante, atingindo sua concentração
máxima no último reator.
Segundo Von Sperling (2007), a remoção eficiente de fósforo no tratamento biológico
de esgotos ocorre por meio da desfosfatação seguida da retenção da biomassa; o que ocorreria
somente a partir da alternância entre tratamentos aeróbios e anaeróbio. Considerando tais
condições, não é esperado de um tratamento anaeróbio uma remoção significativa de fósforo.
Porém, nos estudos de Lofti (2017) e Pereira et al. (2018) foi possível observar ERI’s de 30 e
67%, respectivamente, indicando que, por vezes, a FSB pode fugir à esta regra. Cabe ressaltar
que a eficiência de remoção de fósforo no sistema fossa-filtro é menor do que 35% (VON
SPERLING, 2007).
A concentração média de fósforo no efluente da FSB foi 34,7 mg/L ±1,7 nos dados
primários e 35,05 ±18 mg/L nos dados secundários. Tais valores são muito próximos um do
outro e assemelham-se aos 32,3 mg/L encontrados por Sharma et al.(2016) em seu estudo sobre
biodigestores pré-fabricados. Conforme explicitado no item 3.4, a concentração de nitrogênio
e fósforo no efluente não são fatores limitantes para o seu reúso agrícola, sendo inclusive,
desejadas grandes concentrações destes nutrientes.
e valor final de 76,1 ± 37 mg/L no R3. Tais valores estão bem abaixo daqueles descritos por
Sharma et al. (2016), que obteve 296 ± 83 mg/L de fósforo no lodo de seu biodigestor anaeróbio
e dos 250 mg/L considerados como usuais para os lodos de tanques sépticos (METCALF &
EDDY, 2003). Cabe ressaltar que, se a incorporação do fósforo na biomassa ativa é uma forma
de remoção deste nutriente ao longo do tratamento, a concentração de fósforo no lodo é
proporcional à idade do lodo.
Sabendo que a FSB tem como finalidade o tratamento de águas fecais visando sua
adequação aos padrões de reúso agrícola, os microrganismos patogênicos e os indicadores de
contaminação fecal devem ser o cerne da discussão sobre o desempenho desta tecnologia. A
despeito da importância de tais parâmetros, apenas 10 estudos inclusos na revisão de literatura
produziram dados quantitativos acerca deles. Ainda assim, a única a realizar análise de
patógenos foi Soares et al. (2016a), que apresentou as concentrações de Escherichia coli, ovos
de helmintos, Ballantidium coli e Salmonela sp. no afluente e efluente final do sistema. Todos
os outros se ativeram apenas à quantificação do indicador de contaminação fecal mais comum,
isto é, a E. coli.
a) Escherichia coli
Em relação a este indicador, 05 estudos apresentaram dados do afluente e efluente do
sistema; 04 apresentaram dados sobre o Reator 1 e o efluente final; e 01 informou apenas a
concentração de E. coli no efluente final. Dentre eles, os estudos de Novaes (2002)18, Freitas et
al. (2015) e Campos et al. (2015) apresentam a FSB como um sistema de altíssima capacidade
de desinfecção, atingindo até 0 NMP/100 ml em seu efluente final. Devido tais valores serem
muito discrepantes em relação às demais pesquisas sobre a FSB e aos valores típicos de
efluentes de sistemas de tratamento de esgoto em geral (VON SPERLING, 2005), tais
publicações não foram utilizadas como referência nesta discussão. Os dados apresentados em
cada um dos estudos estão dispostos na Figura 21.
18
O comunicado técnico publicado por Novaes et al. (2002) afirma que a concentração de coliformes totais no
efluente da FSB foi de 1100 NMP/100ml em todas as análises realizadas. Para os coliformes fecais, esta foi de
3NMP/100ml nos dois primeiros meses e ausente nos subsequentes. Vale ressaltar que, por ter sido uma das
primeiras publicações sobre a FSB, o estudo de Novaes et al. (2002) tem sido citado em diversos materiais de
divulgação da FSB e em trabalhos científicos, ainda que estes valores pareçam pouco confiáveis se comparados
com os demais estudos que se tem até hoje sobre este sistema.
71
Excetuando-se as três referidas pesquisas, a água fecal bruta apresentou uma média
geométrica de 4,9.108 NMP de E.coli/100ml nos experimentos da FBCC e 4,6.109 NMP de
E.coli/100ml na revisão de literatura. Tais concentrações estão dentro da faixa esperada pera
esgotos domésticos tradicionais (VON SPERLING, 2005) e acima daquelas amostradas em
diversos outros estudos, que registraram valores na ordem de 10 6 a 107 NMP de E.coli/100ml
na água fecal bruta (REBELO, 2011; SILVA et al.; 2013; SHARMA & KAZMI, 2015). Por
outro lado, as concentrações de E. coli identificadas no afluente FBCC estão muito próximas
daquelas registradas por Lanna (2018) na área rural de Ouro Preto, também na ordem de 108 a
1010 NMP/ 100ml. Esta semelhança apenas reforça a hipótese de que a composição da água
fecal varia de acordo com as características culturais e ambientais de cada localidade.
Todos os estudos encontrados na literatura declaram uma remoção de E. coli ao longo do
tratamento, que ocorre em maior ou menor grau, de acordo com a configuração da FSB ou sua
forma de manejo. Dentro do universo analisado, a ERG mínima (0,34 unidades logarítmicas)
foi registrada por Pereira et al. (2018) e a ERI máxima (3,04 Log10) foi registrada por Galavoti
(2011). O primeiro estudo analisou uma FSB padrão, construída e operada de acordo com as
instruções da Embrapa, enquanto que a FSB de Galavoti (2011) já não recebia inóculo e
continha um filtro de areia no lugar do 3º reator; o que auxiliou na remoção de sólidos suspensos
e, consequentemente, dos microrganismos.
Na FBCC, o ERI e o ERG médio foram respectivamente a 0,87 Log10 e 3,63 Log10. Um
fator a ser considerado ao comparar a eficiência FBCC frente a de outros sistemas é seu tempo
de detenção hidráulica (67 dias), quase três vezes maior do que aquele recomendado pela
72
Embrapa (25 dias). Apesar de não haverem estudos correlacionando o TDH da FSB e a
eficiência de remoção de E. coli, entende-se que este TDH atípico favorece os processos de
remoção de patógenos do efluente.
Tabela 7- Concentração de E. coli nos reatores da FSB: dados da FBCC e valores de referência
Água Fecal
Reator 1 Reator 2 Reator 3
Bruta
Estudos de
4,69E+09 3,74E+06 - 5,67E+05
referência
FBCC (30cm) 3,58E+09 2,18E+05 1,47E+05 2,88E+04
FBCC (120cm) - 1,06E+06 2,95E+05 2,16E+05
Conforme descrito na Tabela 7, as concentrações de E. coli nos lodos dos reatores é cerca
de 0,5 unidades logarítmicas maior do que no sobrenadante, o que sugere que parte dos
microrganismos removidos do efluente na verdade foram sedimentados nesta fração. De toda
forma, ainda que as concentrações de E. coli sejam maiores no fundo dos reatores, estas são
sempre menores do que na AFB e tendem a decair também ao longo do tratamento, atingindo
uma ERI média de 0,81 Log10. Este fato comprova a eficiência da FSB na remoção de
73
19
O único estudo que apresentou desempenho insatisfatório em relação a este parâmetro foi o de Barbonni &
Rochetto (2014), no qual os locais de entrada e saída do efluente estavam invertidos. Neste caso, a concentração
de E. coli variou de 2,8.1013 NMP/100ml na AFB a 4,9.1012 NMP/100ml no efluente do sistema.
20
Irrigação superficial ou por aspersão ou cultivo hidropônico de qualquer cultura não ingerida crua, incluindo
culturas alimentícias e não alimentícias, forrageiras, pastagens e árvores.
21
Observar o Quadro 4 na revisão de literatura (pag. 28).
74
b) Enterococcus spp.
Avançando na discussão sobre os riscos de contaminação microbiológica associados ao
efluente da FSB, o estudo realizado na FBCC inclui também os parâmetros “Enterococcus sp.”;
“Salmonella sp” e Adenovírus Humano (HAdV).
Conforme descrito na Figura 23, os Enterococcus apresentaram comportamento próximo
ao que foi observado para a E. coli, com maiores concentrações nas amostras de lodo e remoção
ao longo do tratamento, em ambas as fases dos reatores. A água fecal bruta apresentou
concentração média de 2,1.106 NMP de Enterococcus/100ml, valor ligeiramente mais altos do
que os 104 a 105 NMP/100ml apontados por Von Sperling (2005) como comuns no esgoto
doméstico.
Tal comportamento pode ser explicado por uma maior resistência dos Enterococcus às
condições adversas existentes dentro do reator (METCALF & EDDY, 2003), fazendo com que
o TDH necessário para sua inativação seja maior do que para a E. coli; o que resulta também
em um maior acúmulo destes microrganismos no lodo dos reatores.
A legislação francesa para reúso agrícola de águas residuárias (JORF, 2016), também
baseada nas diretrizes da OMS (WHO, 2006), apresenta a concentração de Enterococccus spp.
como um dos critérios utilizados para a definição de suas classes de uso. Isolando este
parâmetro dos demais critérios utilizados, os valores efluentes obtidos pela FBCC permitiram
o uso do seu efluente para irrigação de: hortaliças, frutíferas e leguminosas transformadas por
um tratamento térmico industrial adaptado; pastagem (desde que os animais estejam distantes
no momento da aplicação); flores vendidas individualmente; viveiros, arbustos e outras culturas
ornamentais; forragem fresca; cereais e outras culturas forrageiras; e culturas frutíferas22.
A diferença de comportamento entre os indicadores E. coli e Enterococcus spp. alerta
para as limitações deste primeiro indicador, que ainda é o mais utilizado no Brasil, mas
apresenta-se como menos resistente do que outros grupos de microorganismos.
c) Salmonella sp.
A análise das amostras da FBCC em relação à Salmonella sp. demonstrou certa
irregularidade de sua presença ao longo das coletas. Contudo, também foi possível perceber a
redução tanto de sua frequência quanto de suas concentrações ao longo dos três reatores.
A Salmonella sp. esteve presente em todas as amostras de AFB coletadas, com
concentração entre 102 e 104 UFC/ml, exatamente na faixa esperada para os esgotos domésticos
segundo Von Sperling (2005).
Também foi identificada a presença deste patógeno em 60% das amostras coletadas no
Reator 01; 40% das amostras do R2; e 20% do R3. Estes valores, em conjunto com as
concentrações apresentadas na Tabela 9, evidenciam a remoção de Salmonella sp. ao longo do
tratamento na FSB, de modo que ela apresentou ausência em 80% das amostras do efluente
final. Tal frequência foi exatamente a mesma do que a encontrada por Soares et al. (2016b) em
seu estudo sobre este sistema.
22 Proibido durante o período de floração até a colheita de frutos não processados, exceto no caso de
irrigação por gotejamento.
76
Segundo Silva (2010), um dos principais fatores que influenciam o comportamento dos
vírus em estações de tratamento de efluentes é o teor de sólidos suspensos nos reatores, já que
estes tendem a adsorvem as partículas virais e ‘ditar’ sua movimentação ao longo do tratamento
(BRADFORD et al., 2006). Comparando o gráfico apresentado na Figura 24, com os valores
77
de SST da Figura 15 percebe-se com clareza essa correlação; que explica tanto a diferença entre
as concentrações de vírus no lodo e no sobrenadante, quanto a “remoção” destes
microrganismos em cada estágio do tratamento.
A persistência dos adenovírus junto ao lodo do reator, ao mesmo tempo que resulta em
uma redução de 2,5Log10 destes patógenos após o tratamento na FSB, torna ainda mais
preocupante a incerteza sobre o destino final do lodo deste sistema. Isto porque a concentração
média de HAdV presente no lodo do Reator 3 é 100 vezes maior do que costuma ser encontrado
em esgotos brutos e 100.000 vezes maior do que a dose infectante para seres humanos (VON
SPERLING, 2005).
78
já que o esterco possui uma concentração de DQO aproximadamente 50 vezes maior do que a
da água fecal bruta.
Enquanto estes dois fatores propiciam um aumento de 350 mg/L na concentração de
biomassa (SSV) do R1, o R2 se mantém estável em relação a este parâmetro e registra
aditamento apenas na concentração de sólidos dissolvidos – o que sugere uma intensificação da
digestão da matéria orgânica neste reator nos primeiros dias do ciclo. Esta hipótese é
confirmada pela Figura 25, no qual observa-se que existe uma diferença de aproximadamente
80 mg/L entre a DBO registrada um dia antes da inserção do esterco e aquela do 11º dia do
ciclo, tanto no R2 quanto no R3.
A inserção do esterco na FBCC resultou em um salto da eficiência de remoção interna
(ERI) de DBO, de 16% – no dia antes da inserção do esterco – para 90% – no 11º dia do ciclo.
A partir deste dia, a eficiência voltou a diminuir, tendendo a atingir concentrações próximas
àquelas verificadas nas primeiras coletas. Com esta constatação, é possível fazer as seguintes
reflexões:
a. O fato da eficiência na remoção de DBO aumentar nos dias subsequentes à adição de
esterco sugere que, caso este inóculo não seja inserido, a FSB tende a se manter – a longo prazo
– nos níveis de remoção verificados antes da inserção do inóculo. Esta tese é corroborada pelos
resultados da FSB de Galavotti (2011) que, mesmo após a passagem do efluente por um filtro
de areia, obteve uma ERI média de 45%. Portanto, a inserção de esterco parece ser importante
para manter uma boa remoção de matéria orgânica no sistema.
b. Se a concentração de DBO no interior dos reatores muda de acordo com o dia do ciclo de
funcionamento da FSB, o período no qual é realizado a coleta influencia diretamente nos dados
apresentados pelas pesquisas, tanto em termos de desempenho do sistema na remoção de
matéria orgânica, quanto em suas concentrações efluentes. Dessa forma, em estudos futuros é
necessário especificar o dia do ciclo em que se coletou a amostra para que possam ser feitas as
comparações necessárias.
Partindo para uma análise do lodo na FSB, percebe-se uma nítida queda na concentração
de sólidos totais de todos os reatores a partir do dia da inserção do inóculo. Portanto, se a carga
afluente anômala de DBO aumentou a concentração de matéria orgânica no sobrenadante do
R1, no fundo deste reator a adição de esterco ocasionou o processo de decaimento endógeno,
aumentando a concentração de microrganismos sem prover substrato o suficiente para o
desenvolvimento de todos. Tal interferência ocasionou um rápido consumo do excedente de
matéria orgânica existente nos lodos e propiciou a autodigestão da massa celular dentro dos três
reatores da FBCC.
80
Diferente do que aconteceu com a DBO da fase líquida, que permaneceu baixa mesmo
vários dias após a adição do esterco, a concentração de SSV nos lodos dos reatores voltou à
suas condições “originais” entre o 8º e o 11º dia do ciclo. Dessa forma, a adição do esterco não
contribuiu de forma concreta para a estabilização da biomassa no sistema, nem em termos de
redução da relação SSV/SST nem de remoção de patógenos.
Em relação à E. coli, os dados obtidos demonstram que a inserção do inóculo ocasionou
um aumento de sua concentração no sobrenadante de todos os reatores, ainda que o esterco
tenha apresentado concentração próxima e até mesmo inferior à da AFB. Tal fato pode estar
ligado à movimentação de sólidos decorrente deste processo, ocasionando um deslocamento
destes microrganismos do lodo para a fração líquida. Comportamento semelhante foi verificado
para os Enterococcus, que aumentaram de concentração apenas na fase líquida do R1 e
mantiveram-se em concentrações estáveis nos outros dois reatores, o que também pode estar
relacionado com o fato de que o inóculo apresenta concentração de Enterococcus spp. 1,06
unidades logarítmicas maior do que a água fecal afluente.
Quantos aos adenovírus e Salmonella sp., identificou-se uma ampla variação de sua
concentração ao longo dos dias coletados, porém não foi possível estabelecer correlação entre
essa e a inserção do inóculo. De qualquer maneira, sendo a E. coli o indicador de contaminação
fecal mais consolidado neste âmbito, a variação de sua concentração efluente ao longo do ciclo
sugere também uma variação do desempenho da FSB em relação à remoção de patógenos.
Assim como para a DBO, esta informação deve ser levada em consideração, tanto em projetos
que preveem a utilização deste efluente como fertilizante quanto em pesquisas científicas
dedicadas a este aspecto.
Outro parâmetro que apresentou comportamento cíclico no sistema foi o oxigênio
dissolvido. Conforme esperado, todas os pontos da FSB apresentaram menor teor de oxigênio
dissolvido no 8º dia do ciclo, quando a atividade microbiológica atingiu sua maior intensidade.
Ademais, esta etapa do trabalho pôde confrontar hipótese levantada no item anterior, de que a
temperatura interna dos reatores é influenciada mais pelo ambiente externo do que pelos
processos de degradação da matéria orgânica (SOARES et al., 2016b). Conforme observa-se
na Figura 30, tanto no lodo quanto na fase líquida, as temperaturas apresentaram valores mais
altos entre o 8º e o 15º dia do ciclo, quando a atividade de degradação da matéria orgânica foi
maior em todos os reatores. Tal fato, porém, não significa necessariamente uma independência
em relação ao meio externo, na medida em que também houve um ligeiro aumento na
temperatura ambiente no referido período. Por fim, não foi possível identificar qualquer
influência do inóculo na concentração de nutrientes nem no pH dos reatores.
81
Figura 25 – Variação das concentrações de ST, SST e SSV ao longo do ciclo da FSB*
Profundidade de 30 cm (sobrenadante)
*Obs: No 18º dia não foram analisadas as amostras de lodo e no 24º dia não foi feita análise de nenhum tipo de sólido.
82
Profundidade de 30 cm (sobrenadante)
Figura 27 - Variação das concentrações de E. coli, Enterococcus spp. e HAdV ao longo do ciclo da FSB*
Profundidade de 30 cm (sobrenadante)
Figura 28- Variação das concentrações de Salmonella, NH +4 e Fósforo Total ao longo do ciclo da FSB
Profundidade de 30 cm (sobrenadante)
H = 120 cm
86
saneamento deve ser robusto o suficiente para ser facilmente mantido com as
limitações da capacidade técnica local, estrutura institucional e recursos
econômicos; 6 Estar alinhado aos princípios do saneamento ecológico: a
implementação bem-sucedida da visão de EcoSan e a aplicação desses
critérios exigem um entendimento do saneamento como um sistema (ESREY
et al., 1998, p.5).
Prevenção de doenças
A avaliação do desempenho da FSB na redução do teor de patógenos do efluente final
foi um dos principais avanços alcançados por meio deste estudo. Conforme descrito no item
5.2.9, a remoção de indicadores biológicos foi bastante satisfatória para um sistema anaeróbio,
atingindo concentrações efluentes de E. coli na ordem de 10³ a 105 NMP/100ml e eficiência de
remoção por volta de 3,6 unidades logarítmicas (Log10). Ademais, foram alcanças eficiências
de remoção de 1,2 unidades logarítmicas para Salmonella sp.; 3,06 para Enterococcus spp. e
2,5 para HAdV.
Se por um lado tal desempenho é superior ao do tanque séptico convencional e da fossa
seca – principais formas de tratamento de esgoto em comunidades rurais brasileiras –, por outro,
é importante lembrar que ele ocorre majoritariamente às custas de sedimentação destes
patógenos no lodo dos reatores. Assim, além da concentração de patógenos no efluente, há que
se considerar também a fração que ficou retida nos reatores e que, em algum momento, deverá
ser tratada. Como a necessidade de remoção da biomassa nos reatores ainda é uma questão sem
consenso na literatura, este fato reforça a importância da realização de pesquisas que
aprofundem o entendimento sobre a cinética das reações na FSB, com ênfase no processo de
respiração endógena – que segundo Silva, Marmo & Leonel (2017) é o mecanismo que
possibilita a não retirada de lodos do sistema.
Apesar dos valores efluentes de E. coli serem, na média, adequados para as categorias
de irrigação restrita, alguns estudos sobre a FSB apresentam valores efluentes próximos ou até
mesmo acima dos limites recomendado pela Organização Mundial da Saúde (WHO, 2006) e
por Bastos et al. (2008). Portanto, dependendo das características do afluente (água fecal bruta),
tais concentrações podem facilmente chegar a níveis não aceitáveis, acarretando em riscos à
saúde pública maiores do que aqueles previstos nestas diretrizes. Outro fator agravante é o
pequeno número de estudos que avaliaram outros indicadores microbiológico no efluente da
FSB, o que dificulta um enquadramento mais adequado destes nas referidas classes de uso. Um
88
exemplo disso é a concentração de ovos de helmintos, que, a despeito de ser um dos principais
parâmetros utilizados pela OMS, só foi avaliado até hoje por uma autora (SOARES et al.,
2016b) e somente em relação à presença/ausência.
Visando contribuir para uma diminuição dos riscos associados ao uso agrícola do
efluente da FSB, sugerem-se os seguintes cuidados adicionais no manejo da FSB:
• Utilização de EPI’s e vestimentas adequadas no momento de contato com o efluente;
• Retirada do efluente preferencialmente por meio de uma bomba se sucção lenta, que
não provoque o revolvimento dos sólidos sedimentados no fundo do Reator 3 e ofereça
ao produtor a possibilidade de visualizar a cor e turbidez do líquido que está sendo
coletado. Dessa forma, será possível identificar visualmente a concentração de sólidos
em suspensão do efluente e interromper a coleta no limite em que ela seja maior do que
a usual, evitando coletar os vírus e bactérias normalmente agregados a estes sólidos.
• Ainda como forma de minimizar os riscos desta atividade, sugere-se que sejam
realizadas mais pesquisas que abordem a concentrações de ovos de helmintos, vírus e
outros patógenos no efluente da FSB, bem como o comportamento destes indicadores
no solo e nos vegetais com ele irrigados. Sabendo que tanto a E. coli quanto os
Enterococcus spp. apresentaram concentrações maiores no período próximo à adição do
esterco, um objeto de estudo interessante seria também o comportamento cíclico destes
microrganismos a longo prazo, buscando a identificação padrões que possibilitem
estipular dias de menor e maior concentração de patógenos, tanto no sobrenadante
efluente quanto no lodo.
Por fim, caso se chegue à conclusão de que é necessária a remoção periódica do lodo
dos reatores, outro desafio – que influenciaria totalmente a viabilidade de implantação da FSB
em áreas rurais – seria desenvolver formas de extração e manejo do lodo, propiciando a inserção
segura deste recurso no ciclo dos nutrientes em propriedades rurais.
89
tornem este sistema mais eficaz na remoção de patógenos seriam importantes para ampliar suas
categorias de uso, atingindo, além de “culturas que se desenvolvem distante do nível do solo”,
hortaliças e plantas medicinais, essenciais para a manutenção da saúde e segurança alimentar
dos agricultores familiares.
As formas de apropriação da FSB e sua “aceitação” em projetos de saneamento rural no
Brasil não puderam ser abordadas de forma qualitativa nesta pesquisa. Para mais informações
sobre o assunto, sugere-se a consulta dos estudos publicados por Ramos (2017); Martinetti
(2015) e Britto (2009).
Simplicidade
A FSB, da forma como se apresenta hoje nas cartilhas e manuais de construção, é um
sistema bastante simples, que utiliza como técnicas de manejo apenas a inserção mensal de
esterco e a retirada do efluente do último reator após o seu preenchimento. Todavia, os
resultados obtidos nesta pesquisa apresentam indícios de que tais técnicas de manejo não
fornecem a segurança adequada aos produtores que a utilizam, na medida em que possibilitam
o contato com um efluente ainda com elevadas concentrações de patógenos. A inserção de
“cuidados adicionais”, conforme sugerido nos itens anteriores, deve agregar certa
complexidade ao manejo do efluente, o que ocasionalmente pode influenciar em sua
acessibilidade e aceitação pela comunidade.
A grande questão é: como tornar seguro e “simples” o reúso agrícola do efluente de um
sistema local, considerando as significativas variações na qualidade e quantidade da água fecal
bruta afluente do sistema? E mais: como viabilizar isso em um país ainda sem uma
regulamentação do reúso agrícola de águas residuárias e sem modelos de gestão em saneamento
adequados à realidade socioeconômica e cultural das áreas rurais? Longe de ser uma razão para
vetar o uso da Fossa Séptica Biodigestora, todos estes desafios devem ser considerados quando
se reflete sobre a simplicidade que se requer para este tipo de sistema.
Ainda no tema simplicidade x eficácia/segurança, outra questão pertinente são as
diversas adaptações construtivas e de manejo identificadas no estudos aqui discutidos (Quadro
6). A exemplo do sistema de Cachoeira do Campo (FBCC), cuja motivação da entrada pela
parte inferior do Reator 1 foi resultado de uma simples “confusão” do pedreiro que a construiu,
estas adaptações são inevitáveis e, inclusive, fazem parte do caráter de Tecnologia Social da
FSB. Ou seja, de uma tecnologia que se propõe “a ser desenvolvida e praticada na interação com a
população e apropriada por ela”(RODRIGUES; BARBIERI, 2008).
91
Tendo em vista o desafio inerente à escolha de tecnologias sociais como propostas para
o tratamento de esgoto em áreas rurais, é importante lembrar que a participação da população
é sempre sugerida como forma de garantir a efetividade da solução tecnológica, pois “a vivência
cotidiana da população com a situação problema, aliada a seus conhecimentos e suas diferentes
formas de saberes, lhes confere capacidade de participar do processo de pesquisa e
desenvolvimento da tecnologia” (COSTA, 2013, p.19).
Partindo deste pressuposto, uma possível alternativa para minimizar os riscos à saúde
associados ao reúso agrícola do efluente da FSB seria o desenvolvimento de métodos
qualitativos – e participativos – de análise deste efluente. Um exemplo disso são os Protocolos
de Avaliação Rápida – PAR de rios, que geram dados representativos da qualidade dos
ecossistemas fluviais ao longo do tempo, sem que sejam necessários custos altos e profissionais
especializados no assunto (BIZZO; MENEZES & ANDRADE, 2014).
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
4. A FBCC apresentou uma capacidade de remoção de 3,63 Log10 para E. coli; 1,2 Log10
para Salmonella sp., 3,06 Log10 para Enterococcus spp. e 2,5 Log10 para HAdV. As
concentrações médias destes indicadores no efluente foram respectivamente 2,8.10 4
NMP/100 ml; 4,57 UFC/ml de Salmonella sp; 1,26.10³ NMP/100ml de Enterococcus spp.
e 1,81.104 UFP/ml de HAdV. Considerando as recomendações da OMS, este efluente pode
ser utilizado para: fertirrigação no caso de culturas que se desenvolvem distantes do nível
do solo (ex: frutíferas); em cultivos de alto nível tecnológico e produção mecanizada; ou
por meio de técnicas de irrigação com elevado potencial de minimização da exposição (ex:
irrigação subsuperficial)
6. Potencialidades da FSB: é uma tecnologia social de baixo custo e simples manejo, capaz
de transformar um efluente que normalmente seria descartado em corpos hídricos em fonte
de nutrientes e matéria orgânica para o solo; obedece aos princípios do saneamento
ecológico; contribui para a autonomia produtiva e segurança alimentar dos agricultores
familiares e para a diminuição do consumo de fertilizantes químicos; ajuda na manutenção
do equilíbrio ambiental nas áreas onde está implantada.
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104
Citotoxicidade amostraL
Para determinação da citotoicidade das amostras, as células A549 foram cultivadas na
densidade 3,0×105 células/ml em placas de 24 poços, durante 24h até atingirem a confluência.
Inicialmente, foram realizadas diluições das amostras em Minimum Essential Medium Eagle
(MEM 1×) nas proporções: 1:10; 1:100 e 1:1000. Em seguida, a monocamada celular foi lavada
uma vez com PBS 1×. Foram inoculados 150 µL das amostras nas respectivas diluições, em
duplicada, permanecendo durante 60 min a 37ºC sob atmosfera de 5% de CO2, com intervalos
105
de 15 min para homogeneização das amostras. Posteriormente, o inóculo foi aspirado e o meio
de manutenção (DMEM high glucose suplementado com 4% de SFB, 2% de antibióticos PS
[(Penicilina G [100 U/ml] e Sulfato de estreptomicina [100 µg/ml]), 2% de Anfotericina B
[0,025 µg/ml], 2% de Cloreto de Magnésio (MgCl2 [25 mM] e 1% de Piruvato de sódio [100
mM]), foi adicionado. Durante o período de 5 dias, foram realizadas observações diárias em
microscópio invertido, a fim de verificar possíveis alterações morfológicas nas células.