Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
RESUMO
ABSTRACT
This work deals with the definition of the term "vaquejada" and its
concept today, given its alleged categorization as a "cultural
tradition". In this context, the main objective is to demonstrate and
analyze the clash between fundamental rights presented in the demand
concerning the law ADI 4.983 / 13 and its consequences. The
1
ROLIM, George Carneiro. Estudante do Curso de Direito da Universidade de Fortaleza.
2
MELO, Thais Vieira Carvalho. Estudante do Curso de Direito da Universidade de Fortaleza.
3
CABRAL, Lucíola Maria de Aquino Cabral. Procuradora do Município de Fortaleza, Professora da
Universidade de Fortaleza. Doutora em Direito Constitucional. Membro do Instituto Brasileiro de
Advocacia Pública. Membro da Associação de Professores de Direito Ambiental – APRODAB.
methodology used was qualitative-explorative based on analysis of
legal documents, scholarly and journalistic texts. It is important to
note that this study is not intended to close any discussion about the
question posed in the ADI referenced, but only to show that the
vaquejada, far from characterizing a cultural tradition, is actually a
practice of abuse against animals. There was a brief comparative study
of the current situation with the Spanish bull race and how this
matter was addressed in that country. It is noted the utmost
importance of the final decision of the Supreme Court on the matter,
while it analyzes the manifestation of Amicus Curiae of such action
before that court. The focus of the discussion is about the
controversies in the vaquejada defense argument as culture and sports
expression at the expense of animal welfare. In defense of animal protection evidence
was gathered from concrete institutional moves for the defense of animal rights in
Brazil, such as committees in the national congress, Law Bar
Association OAB animal protection committees and bill projects aimed
at ensuring animal rights, concluding, eventually in the possibility
of ADI as a means of extend the scope of animal protection,
as well as the possibility of reformulating the federal Law No. 9.605
/ 98, the Environmental Crimes Law, aimed expressly at contemplating
such abusive practices as environmental crime.
1. INTRODUÇÃO
Na verdade, tudo começou aqui pelo Nordeste com o Ciclo dos Currais. É
onde entram as apartações. Os campos de criar não eram cercados. O gado,
criado em vastos campos abertos, distanciava-se em busca de alimentação
mais abundante nos fundos dos pastos. Para juntar gado disperso pelas serras,
caatingas e tabuleiros, foi que surgiu a apartação. Escolhia-se
antecipadamente uma determinada fazenda e, no dia marcado para o início da
apartação, numerosos fazendeiros e vaqueiros devidamente encourados
partiam para o campo, guiados pelo fazendeiro anfitrião, divididos em grupos
espalhados em todas as direções à procura da gadaria. O gado encontrado era
cercado em uma malhada ou rodeador, lugar mais ou menos aberto,
comumente sombreado por algumas árvores, onde as reses costumavam
proteger-se do sol, e nesse caso o grupo de vaqueiros se dividia.
Habitualmente ficava um vaqueiro aboiador para dar o sinal do local aos
companheiros ausentes. Um certo número de vaqueiros ficava dando o cerco,
enquanto os outros continuavam a campear. Ao fim da tarde, cada grupo
encaminhava o gado através de um vaquejador, estrada ou caminho aberto
por onde conduzir o gado para os currais da fazenda. O gado era tangido na
base do traquejo, como era chamada a prática ou jeito de conduzi-lo para os
currais. Quando era encontrado um barbatão da conta do vaqueiro da
fazenda-sede, ou da conta de vaqueiro de outra fazenda, era necessário pegá-
lo de carreira. Barbatão era o touro ou novilho que, por ter sido criado nos
matos, se tornara bravio. Depois de derrubado, o animal era peado e
enchocalhado. Quando a rés não era peada, era algemada com uma algema de
madeira, pequena forquilha colocada em uma de suas patas dianteiras para
não deixa-la correr. Se o vaqueiro que corria mais próximo do boi não
conseguia pega-lo pela bassoura, o mesmo que rabo ou cauda do animal, e
derrubá-lo, os companheiros lhe gritavam: - Você botou o boi no mato!
4
Lei estadual nº 15.299, de 08 de janeiro de 2013, que regulamenta a vaquejada como prática
desportiva e cultural no Estado do Ceará.
(...) É hoje conhecida em todo o mundo, estimulando o incremento do
turismo na região (...). Por seu porte e organização tem alcançado uma
dimensão nacional e internacional, movimentando - sobremaneira - a
economia local, com a geração de vários empregos sazonais.
A regulamentação de tal atividade por meio de lei federal traz uma implicação
direta na concretização desse tipo de evento como atividade economicamente
organizada e estruturada, colocando-a muito além da simples tradição cultural.
Evidencia-se um claro poder de lobby político e econômico por parte de determinados
grupos sociais, visando concretizar e consolidar uma atividade inicialmente considerada
do tipo cultural como modelo puramente econômico.
Com o escopo de contrapor as críticas sociais de cunho ambiental, a Assembleia
Legislativa do Estado do Ceará, aprovou a Lei estadual nº 15. 299/2013, que dispõe
sobra a regulamentação da vaquejada como prática esportiva. Pode-se identificar no
corpo do texto legal, a tendência de abranger e esclarecer sobre os cuidados que os
animais, objetos núcleo da prática, devem receber no ambiente de vaquejada:
Com efeito, a Lei Federal nº 10.220/2001 - a qual não é objeto desta ADI -
considera a vaquejada como esporte profissional (...) Da análise do texto,
resta claro que a só impugnação do dispositivo estadual frustra o objetivo de
combater a atividade da vaquejada, já que ela continuará a encontrar fulcro
em dispositivo legal. Mais do que isso, a própria declaração de
inconstitucionalidade da norma ora impugnada traria um evidente vácuo
normativo, porquanto complemente aquele dispositivo de cunho nacional, o
qual é omisso quanto à preservação da integridade dos animais participantes.
(Manifestação amicus curiae - ADI 4.983/13).
O termo crueldade é a qualidade do que é cruel, que, por sua vez, segundo o
dicionário Aurélio Buarque de Holanda, significa aquilo que se satisfaz em
fazer mal, duro, insensível, desumano, severo, rigoroso, tirano. Diante dessa
denotação, o art. 225, §1º VII, da Constituição Federal busca proteger o
homem e não o animal. Isso porque a saúde psíquica do homem não lhe
permite ver, em decorrência de práticas cruéis, um animal sofrendo.
No que concerne a votação, destaca-se que cinco dos onze ministros do STF
foram em desfavor da autoria, entre eles os ministros Edson Fachin, Gilmar Mendes,
Teori Zavascki, Luiz Fux e Dias Toffoli, estes sendo votos vencidos na decisão final.
Os ministros Marco Aurélio de Melo e Luís Roberto Barroso, assim como a
ministra Rosa Weber, entre outros três, votaram pela procedência da ação, conforme
abaixo:
(...) procedência da ação e afirmou que o dever de proteção ao meio ambiente
(artigo 225 da Constituição Federal) sobrepõe-se aos valores culturais da
atividade desportiva, diante da crueldade intrínseca aplicada aos animais na
vaquejada.(...) Em seu voto, o ministro Barroso reconheceu a importância da
vaquejada como manifestação cultural regional, no entanto, afirmou que esse
fator não torna a atividade imune aos outros valores constitucionais, em
especial ao valor da proteção ao meio ambiente. “A Constituição veda
expressamente práticas que submetam os animais à crueldade (...) (Notícias
STF, 2016, on line).
A ação foi julgada procedente no dia seis de outubro de 2016, data em que os
votos ainda restantes foram dispostos e constatou-se o ganho de causa para a
Procuradoria Geral da República por 6 a 5. Dessa forma, seguiram o relator os ministros
Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e a
presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia. Ficaram vencidos os ministros Edson
Fachin, Teori Zavascki, Luiz Fux, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.
A decisão do Supremo Tribunal Federal nesta ADI vem a confirmar
entendimento em defesa da proteção animal consubstanciado em posicionamentos
anteriores, como na ADI relativa a briga de galo e a da farra do boi.
3.1 - PL 6799/13
Oportuno destacar o que diz a Declaração Universal dos Direitos dos Animais,
promulgada pela UNESCO, em 1978:
PREÂMBULO
Considerando que todo o animal possui direitos,
Considerando que o desconhecimento e o desprezo destes direitos
têm levado e continuam a levar o homem a cometer crimes contra os
animais e contra a natureza,
Considerando que o reconhecimento pela espécie humana do direito
à existência das outras espécies animais constitui o fundamento da
coexistência das outras espécies no mundo,
Considerando que os genocídios são perpetrados pelo homem e há
o perigo de continuar a perpetrar outros.
Considerando que o respeito dos homens pelos animais está ligado
ao respeito dos homens pelo seu semelhante,
Considerando que a educação deve ensinar desde a infância a
observar, a compreender, a respeitar e a amar os animais.
PROCLAMA-SE O SEGUINTE:
Art. 1º - Todos os animais nascem iguais perante a vida e têm os
mesmos direitos à existência.
Art. 2º
1. Todo o animal tem o direito a ser respeitado.
2. O homem, como espécie animal, não pode exterminar os outros
animais ou explorá-los violando esse direito; tem o dever de pôr os
seus conhecimentos ao serviço dos animais.
3. Todo o animal tem o direito à atenção, aos cuidados e à proteção do
homem.
Art. 3º
1. Nenhum animal será submetido nem a maus tratos nem a atos
cruéis.
2. Se for necessário matar um animal, ele deve de ser morto
instantaneamente, sem dor e de modo a não provocar-lhe angústia.
5
FRANCO, Elaine. Artigo disponível na internet:
http://elainefrancoadv.jusbrasil.com.br/artigos/394009666/a-violencia-e-a-tortura-de-animais-
revela-desvio-de-personalidade?ref=topic_feed
humana do direito à existência das outras espécies animais constitui o
fundamento da coexistência das outras espécies no mundo; que os
genocídios são perpetrados pelo homem e há o perigo de continuar a
perpetrar outros; que o respeito dos homens pelos animais está ligado
ao respeito dos homens pelo seu semelhante; e que a educação deve
ensinar desde a infância a observar, a compreender, a respeitar e a
amar os animais.
Matéria publicada na Revista Galileu, destaca que o FBI passará a tratar maus
tratos aos animais como crimes graves 6, conforme se verifica adiante:
6
Artigo disponível na internet: http://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2016/01/o-fbi-passara-
tratar-maus-tratos-aos-animais-como-crimes-graves.html
7
Estudo disponível na internet: albertaspca.org/cruelty
4 A NECESSÁRIA REVISÃO DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS
8
Projetos de Leis do Deputado Federal Ricardo Izar disponíveis na internet:
http://www.ricardoizar.com.br/projetosdelei.asp
CONCLUSÃO
Conclui-se que a ADI em face da Lei estadual nº 17.918/13 mostra-se como via
processual adequada para efetivar a proteção dos animais utilizados nas vaquejadas. Tal
conclusão autoriza, por outro lado, a proibição dessa prática de forma abrangente e,
nesse sentido, a Lei federal nº 10.220/01 encontra-se em descompasso com o
entendimento do Supremo Tribunal Federal.
Como alternativa para banir a prática de atos que importem em maus tratos e/ou
crueldade contra animais, sugere-se incluir na Lei federal nº 9.605/98, Lei de Crimes
Ambientais, um dispositivo proibindo a prática de vaquejada e outras modalidades
desportivas ou culturais, tipificando-as como crime, com o intuito de incluir-las de
forma expressa no rol dos crimes contra a fauna.
A decisão favorável a ADI pelo pleno do STF acaba por criar mais um
precedente, esperando-se que doravante mudanças no entendimento e no tratamento da
9
Observe-se que nenhum dado concreto foi acostado a peça processual do amicus curiae – ABVAQ:
Associação Brasileira da Vaquejada, conforme se verifica no endereço eletrônico do STF.
matéria em todos os estados do país, trazendo a tona uma nova visão do vanguardismo
constitucional sobre a diversidade das ramificações da constituição cidadã e uma
atenção significativa com as demandas modernas da sociedade, notadamente quando se
trata da proteção ambiental.
REFERÊNCIAS
- BRASIL. Lei nº 10.220 (2001). Institui normas gerais relativas à atividade de peão
de rodeio, equiparando-o a atleta profissional. Brasília, DF, Senado, 2001.
- FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 10ª ed.
São Paulo: Saraiva, 2009, p.189/190.
- FRANCO, Elaine. Artigo disponível na internet:
http://elainefrancoadv.jusbrasil.com.br/artigos/394009666/a-violencia-e-a-tortura-
de-animais-revela-desvio-de-personalidade?ref=topic_feed
- Notícias STF, Suspenso julgamento de ADI sobre lei cearense que regulamenta
vaquejada. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=317895>. Acesso
em: 02 de ago. 2016.
- Notícias Câmara, CPI dos Maus-Tratos a Animais quer melhorias nos centros de
zoonoses. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/meio-
ambiente/495478-cpi-dos-maus-tratos-a-animais-quer-melhorias-nos-centros-de-
zoonoses.html>. Acesso em 03 de ago. 2016.
- SERRA, Josep Maria, Cerca del 60% de los españoles se oponen a la tauromaquia,
Disponível em:
<http://www.lavanguardia.com/vida/20160122/301601192081/espanoles-contra-
toros.html>. Acesso em 07 de ago. 2016.