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I a edição —2 0 0 6
3 .0 0 0 exem plares
Revisão
H erm isten M aia Pereira d a C o sta
C lau d ete Á gua de M elo
Editoração
A ssisnet
Capa
M ag no Paganelli
L732r Razão da esperança - teologia para hoje / Leandro Antonio de Lima. São
Paulo: C ultura Cristã, 2006.
ISBN 85-7622-140-3
CD D - 230.44
e
€DITORR CUITURR CRISTÃ
Rua M iguel Teles Jr., 394 - CKP 015 4 0 -04 0 - São M o - SP
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Introdução......................................................................................................... 09
1. A revelação de D eus................................................................................... 13
2. Deus existe?.................................................................................................. 27
3. Conhecendo a D eus....................................................................................39
4. A Trindade: Da teoria à prática.................................................................51
5. Rocha eterna: O Deus imutável............................................................... 67
6. O teu Deus, onde está?...............................................................................77
7. Soberania de Deus ou livre-arbítrio?....................................................... 91
8. Predestinação: Deixando Deus ser D eus.............................................101
9. O Santo de Israel....................................................................................... 121
10. O enigma do m al.....................................................................................135
11. Criação ou evolução?..............................................................................147
12. Voltando ao início: A criação do hom em ......................................... 157
13. Providência: O Deus que trabalha......................................................173
14. Deus de m ilagres..................................................................................... 183
15. A queda: A mãe das tragédias..............................................................199
16. A morte: O último inim igo..................................................................209
17. O lugar dos mortos................................................................................ 217
18. O evento central da história.................................................................227
19. O filho de M aria......................................................................................243
20. A morte do Mediador............................................................................ 253
21. O substituto dos pecadores..................................................................267
22. A extensão da expiação de Cristo........................................................283
23. Ressurreição: A grande vitória.............................................................295
24. Ascensão: A coroação do Rei...............................................................309
25. A salvação pela graça............................................................................. 319
26. Cristo em nós: A união mística............................................................329
27. Muitos chamados, poucos escolhidos.............................................. 339
28. Regeneração: Da morte para a v id a ................................................... 353
29. Conversão: Uma guinada na existência........................................... 363
30. Justos pela f é ..........................................................................................373
31. Santificação: As alturas da f é ..............................................................383
32. A bênção da perseverança..................................................................399
33. O batismo com o Espírito Santo.......................................................409
34. Plenitude espiritual..................................................................................433
35. Mantendo a plenitude.......................................................................... 445
36. Os dons do E spírito............................................................................ 455
37. O pecado contra o Espírito................................................................475
38. A igreja verdadeira............................................................................... 483
39. Os sacramentos e a espiritualidade.....................................................497
40. Adoração: A grande prioridade.........................................................511
41. A ordem do culto..................................................................................525
42. Esperança escatológica........................................................................ 543
43. Imortalidade...........................................................................................561
44. Sinais do fim...........................................................................................569
45. A vinda do inim igo.............................................................................. 581
46. A segunda vinda de Cristo.....................................................................591
47. O Reino m ilenar......................................................................................599
48. A ressurreição fin al.................................................................................615
49. O dia do ju ízo ..........................................................................................623
50. A esperança da eternidade.................................................................... 631
Notas................................................................................................................. 643
Bibliografia...................................................................................................... 667
Prefácio
W W
modo, entendemos que o Espírito Santo nos orienta no estudo dessa Pala
vra. E isso é a verdadeira espiritualidade
A história da igreja tem demonstrado, ao longo dos séculos, que a coisa
que mais destrói a vida e a comunhão autêntica da igreja é a falsa doutrina,
especialmente os falsos ensinos sobre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. O
Senhor Jesus, e especialmente seus apóstolos, demonstraram profunda pre
ocupação com essa questão, e apontavam para o futuro como um tempo
muito conturbado nesse sentido (Mt 24.11; 2Tm 4,3,4). À luz do que temos
visto hoje, percebe-se que eles estavam rigorosamente certos. Entendimen
tos errôneos acerca de Deus têm minado a verdadeira religião nos quatro
cantos do mundo, introduzindo erros e heresias destruidores, tanto na vida
individual do povo de Deus como também em denominações inteiras. Co
nhecer doutrina não é coisa sem importância; é fundamental para os dias
em que vivemos.
O propósito deste trabalho é apresentar, numa linguagem simples e aces
sível, os principais ensinamentos da teologia. Abordamos de forma breve
todas as oito disciplinas da Teologia Sistemática (Introdução, Teontologia,
Antropologia, Cristologia, Soteriologia, Pneumatologia, Eclesiologia e Es-
catologia)5, concentrando-nos nos principais temas da teologia que tenham
interesse para os teólogos e também para as pessoas em geral. De certo
modo, são capítulos avulsos que podem ser lidos em seqüência, ou aleato
riamente, conforme o interesse ou a necessidade da pessoa. O nosso inte
resse não é apenas o conhecimento intelectual sobre essas matérias, mas
também a aplicação prática delas. A nossa busca é pelo conhecimento que
pode e deve influenciar o nosso dia-a-dia, dando-nos maior firmeza na fé,
um relacionamento mais estreito com Deus e uma condição sempre pronta
para dar, a todo aquele que nos pedir, ra%ão da esperança que há em nós,
porém, fazendo isso com temor, mansidão e boa consciência.
A revelação de Deus1
Propósito e progressividade
Uma vez que a integridade da Escritura é assumida, é necessário enten
der como ela surgiu e chegou até nós. Neste capítulo, que talvez seja o mais
“técnico” do livro, veremos muito resumidamente como isso aconteceu.
A revelação especial é o ato divino pelo qual Deus se torna conhecido
de modo redentor ao homem decaído. Sem a revelação, Deus seria eter-
A revelação de Deus 15
M o d o s de revelação
O autor aos Hebreus diz: “Havendo Deus, outrora, falado, muitas vezes
e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, nestes últimos dias, nos falou
pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também
16 Razão da esperança
fez o universo” (Hb 1.1,2). Mesmo antes de a Bíblia ter sido escrita, Deus já
se revelava de modo especial para o seu povo. Dois modos muito usados
por Deus na antiguidade foram: a teofania e a profecia.
Revelação p o r teofania
Teofania, que literalmente significa “manifestação de Deus”, refere-se
aos aparecimentos de Deus, bem como as demonstrações fantásticas do
seu poder. A teofania foi predominante até o período mosaico. Deus se
manifestou a homens como Adão (Gn 2.15-17, 22,23; 3.8), Abraão (Gn
12.2; 28.13) e, especialmente, Moisés. A Bíblia afirma que, depois de Moi
sés, esta não seria mais a maneira “oficial” de revelação (Dt 34.10), embora
alguns homens do Antigo Testamento tenham recebido teofanias, como
Elias, por exemplo. A característica principal da teofania é o apelo ao físico,
ao sensitivo. Deus tomava a forma de um anjo ou de um homem e podia
ser visto, ouvido e até tocado. Evidentemente, essas eram formas temporá
rias, assumidas por Deus para se comunicar com o ser humano.
Revelação p o r profecia
A partir de Moisés, Deus passou a usar mais amplamente um novo modo
de revelação. Ele começou a se revelar por meio de profecia (Nm 12.6-8). A
revelação por profecia é um modo mais indireto de revelação. O profeta
recebia algo de Deus, porém por meio de um sonho ou uma visão. Então,
o profeta tinha a responsabilidade de transmitir ao povo o que ele tinha
visto desse modo. Como sempre havia risco de falsificação, Deus estabele
ceu testes para confirmar o profeta e a profecia. Esses testes eram basica
mente dois, o da veracidade do fato profetizado (Dt 18.20-22) e o da con
formidade com a Palavra escrita (Dt 13.1-5). O tempo predominante dos
profetas se estende da morte de Moisés até João Batista (Mt 11.13).
A função básica do profeta era ser um porta-voz de Deus. Por isso,
geralmente o profeta começava a sua mensagem com a seguinte expressão:
“Assim diz o Senhor...”. Isso indica que o próprio Deus colocava as pala
vras na boca dos profetas (Jr 1.7; Is 51.14; Êx 4.10-12; Dt 18.18). Um deta
lhe que não pode ser esquecido é o caráter orgânico da recepção e da entre
ga da mensagem profética. Os profetas não falavam em transe, mas usavam
os seus próprios recursos, qualidades e talentos para transmitir a mensa
gem de Deus. Esta era, de certo modo, acomodada à personalidade do
profeta.
A revelação de Deus 17
0 proces so de seleção
In spiração m e c â n i c a
Inspiração m e n t a l
A inerrância da Escritura
Quando se diz que a Bíblia é inerrante, isso quer dizer que em tudo o
que a Bíblia ensina, seja religioso, moral, social ou físico, ela é absolutamen
A revelação de Deus 23
A suficiência da Escritura
Com relação ao tema da suficiência da Escritura, é preciso entender que,
na fé reformada, somente a Escritura é a regra de fé e prática. Não há outra
fonte na qual o cristão possa encontrar orientações infalíveis para a sua
vida. A tradição, embora considerada na teologia, não pode ser comparada
com a Escritura. Uma pergunta que normalmente surge quando se pensa
em suficiência da Escritura é: “Ainda há revelação divina hoje?” Nossa po
sição é que não há mais revelações de Deus hoje, pelo menos não em pé de
igualdade com a Bíblia. Entretanto, deve ser dito que a revelação de Deus
continua hoje. Deus se revelou na criação, e essa criação continua apontan
do para Deus. A providência, que é a continuação da criação, ou seja, a
 revelação de Deus 25
Deus existe?1
A pergunta que serve de título para este capítulo pode soar estranha
numa obra de teologia. Porém, trata-se de uma pergunta que os incrédulos
fazem e, talvez, algumas vezes até os crentes. De início, é preciso que se
diga que a existência de Deus é a grande afirmação pressuposta pela Bíblia.
A Bíblia não tenta provar a existência de Deus, ela simplesmente a assume
como um fato. O excelente teólogo reformado Louis Berkhof afirma: “Para
nós a existência de Deus é a grande pressuposição da teologia”.2 De fato,
nenhum teólogo poderia negar a existência de Deus, pois isso o faria auto
maticamente ficar sem profissão. Porém, ao longo da História, filósofos e
teólogos têm debatido sobre a questão sobre se a mente humana pode ter
certeza da existência divina. Será que a existência de Deus é algo que deve
ser aceito somente pela fé? Ou será que é possível, a partir da razão e de
argumentos racionais, provar a existência de Deus?
Desde já é preciso que se admita que a fé é absolutamente necessária
para que se aceite a existência de Deus. Mas o ponto a ser discutido é: Esta
fé se baseia em quê? Além do mais, o que poderia ser excluído desse princí
pio? Quando é que a fé não é necessária? Será que temos provas suficientes
para todas as nossas crenças, sejam religiosas, científicas ou morais? O fato
é que cremos. Crer nada mais é do que exercitar a fé. Nesse sentido, os
defensores de muitas teorias científicas modernas talvez sejam os mais cren
tes. Eles acreditam em teorias, defendem essas teorias fanaticamente, e ela
boram outras teorias com base nelas, O fato é que o ser humano decide em
que crê e em que não crê. Uma pessoa pode ter todas as provas diante de si,
e ainda assim negar a realidade de algum fato, desde que não queira acreditar
nesse fato. Isso pode ser visto facilmente em tempos de eleição para cargos
políticos, ou nos tribunais. Por outro lado, quando alguém deseja crer, nada
o faz mudar de idéia, ainda que as provas sejam escassas. Uma coisa precisa
ficar clara: mesmo que existissem provas explícitas da existência de Deus,
as pessoas não deixariam de negar a existência dele. A questão deste capítu
lo não é a existência da fé em Deus, mas sim a racionalidade dessa fé. Crer
28 Razão da esperança
Naturalismo irracional
O naturalismo está na moda neste mundo moderno. Tudo o que é da
“natureza” é automaticamente mais aceito. As pessoas cultuam a mãe natu
reza, e procuram soluções “naturais” para os seus problemas. A existência
humana também tem sido explicada a partir de elementos naturais. Nesse
sentido, evoluáonismo e naturalismo são sinônimos. Trata-se da tentativa hu
mana de explicar a existência do ser humano sem precisar apelar para o
sobrenatural, para o divino.
S em sentido
Deus que tenha propósitos para este mundo e para a vida do ser humano,
então não existe razão, não existe esperança, e nada faz sentido. A con
clusão lógica e única a que se pode chegar a partir de uma concepção
desse tipo é que não vale a pena viver, pois a vida não tem sentido. Não é
de admirar o desespero de homens e mulheres que se negam a crer na
existência de Deus. De fato, como diz Schaeffer, eles baixaram a linha do
desespero,3 Já não existe mais nada lógico nem coerente. Tudo se tornou
irracional. Eis a razão do estado caótico do mundo moderno, que cons
truiu o seu modo de vida sobre esse frágil alicerce chamado “acaso”. O
assoalho debaixo dos nossos pés treme porque o grande princípio
sustentador da sociedade foi retirado. Deus foi destronado e, no seu lugar,
foi colocado o acaso.
Irracion alism o p u r o
Durante muito tempo as pessoas acreditaram que, com essa afirmação, elas
tinham chegado ao máximo do saber. Até que alguém levantou a seguinte
questão: se toda verdade precisa ser verificável para que seja verdade, então,
essa verdade (a própria declaração) também precisa ser verificável. Se não
há como verificá-la, não há como comprová-la e, então, ela é falsa. Assim,
se é verdade que “toda verdade precisa ser verificável”, então não é verdade
que toda verdade precisa ser verificável. O mesmo pode ser dito do pós-
modernismo que apregoa: “Não existem absolutos”. Se não existem abso
lutos, então essa própria afirmação não pode ser um absoluto. Esses são
exemplos de argumentos autodestrutivos, aos quais Aristóteles, se os co
nhecesse, teria cham ado de sofism as. O naturalism o tam bém é
autodestrutivo. Alvin Plantinga, um filósofo reformado norte-americano,
expôs o argumento da seguinte maneira:9 1) Se o naturalismo é verdadeiro,
então a nossa mente é um produto da evolução. 2) A evolução seleciona
para a sobrevivência; portanto, a mente foi desenvolvida para a sobrevivên
cia, não para conhecer a verdade. 3) Se o naturalismo é verdadeiro, não
temos suficientes razões para acreditar que a nossa mente poderia determiná-
lo como verdadeiro, e o agnosticismo,10 portanto, faria mais sentido. Então,
se o naturalismo fosse verdadeiro, nunca poderíamos constatar isso. Por
tanto, percebe-se que o naturalismo não é uma saída racional para o enigma
da existência do mundo e da vida inteligente. Porém, antes de falar sobre a
explicação teísta, é preciso rebater um argumento bastante usado nos mei
os acadêmicos para se negar a existência de Deus.
A existência do m a l
Sempre que um ateu tenta argumentar contra a existência de Deus, seu
principal argumento é a existência do mal. O argumento consiste das seguin
tes partes: 1) Deus existe, ele é onipotente, onisciente e onipresente e, acima
de tudo, bom. 2) Existe o mal. A questão é: Como um Deus bom, todo-
poderoso e onisciente poderia ter permitido que o mal existisse? Portanto,
ou Deus não é bom por permitir tanta maldade neste mundo, ou ele não é
todo-poderoso, nem sabe todas as coisas, pois devido a um erro seu, por
falta de previsão ou de poder, o mal entrou no mundo. A lógica parece
irrefutável: Se existe o mal, Deus não existe, ou no mínimo ele não é bom,
nem todo-poderoso. Algumas soluções para esse problema não ajudam. Se
dissermos que o mal é independente de Deus, então, Deus não é todo-pode-
roso. Se simplesmente dissermos que Deus é o autor do mal, então, ele não
32 Razão da esperança
é bom. Muitos cristãos não têm resposta para essa argumentação. Todavia, a
solução existe.” Se houver uma terceira razão, que possa ser consistente
tanto com a existência de Deus quanto com a existência do mal, então, anu
laríamos esse argumento. Ou seja, se houver uma razão pela qual Deus, que
é bom, tivesse um bom motivo para tolerar o mal, então, a existência de
Deus e a existência do mal não seriam mutuamente excludentes. Porém, qual
seria essa boa razão pela qual o Deus bom, onisciente, onipresente e onipo
tente teria permitido o mal? Há uma razão: Para a sua glória. A Escritura diz
que todas as coisas existem para a glória de Deus. Deus manifesta a sua
glória ao permitir que o mal exista, pois ele sabe como lidar com ele. A
existência do mal permite, por exemplo, que Deus demonstre a sua miseri
córdia. Se o homem não tivesse caído no pecado, jamais conheceria a mise
ricórdia de Deus na sua plenitude. Deus, que “é amor” (ljo 4.8), demonstra
a intensidade desse amor que o leva a entregar o próprio Filho pelos pecados
dos homens (Jo 3.16). Paulo diz que o fato de Deus ter entregado o seu Filho
para morrer pelos pecadores é a prova do seu amor (Rm 5.8). Se o mal não
existisse, essa prova não seria dada. A encarnação do Filho está intimamente
ligada à existência do mal. Sem o mal, o Logos não precisaria se tornar ho
mem, e o maior e mais espetacular acontecimento da história do universo
não aconteceria: a encarnação (Jo 1.14). Ainda devemos lembrar que uma
criação testada e aprovada é mais valiosa do que uma criação que jamais foi
testada. Nessa linha de argumentação, podemos dizer que o ser humano, que
uma vez caiu no pecado e experimentou todas as mazelas decorrentes disso,
depois de redimido não terá mais a mínima vontade de pecar.'2 Ainda deve
mos observar que a qualidade de um objeto deve ser avaliada primariamente
tendo em vista o seu propósito. A criação de Deus, dentro do seu propósito
eterno e soberano, tinha como característica essencial a possibilidade con
creta e real até mesmo da desobediência a Deus.
Concluímos, então, que a existência do mal não impossibilita a existên
cia de um Deus bom e todo-poderoso. O mal, como tudo o mais, existe
para a glória de Deus. Entretanto, isso não significa que possamos entender
de modo lógico essa questão. Pela lógica humana, sempre haverá lacunas
em qualquer explicação sobre a existência do mal e a existência de Deus,
Não precisamos nos envergonhar de não ter essas respostas plenas, até
porque, para que isso fosse possível, teríamos que ter uma mente igual a de
Deus. O nosso desejo foi demonstrar que a existência do mal não inviabiliza
a existência de Deus.
De acordo com Schaeffer,13 o Cristianismo é o único sistema de crença
que pode dar a resposta para o enigma da existência do mal, embora essa
Deus exisle? 33
não seja uma resposta puramente racional, pois ela parte da fé. Somente o
Cristianismo pode dar essa resposta, porque somente ele crê na desconti-
nuidade da atual condição do homem. O mal não é algo intrínseco ao ho
mem. O homem não foi criado essencialmente mau, mas se tornou assim
por um ato da sua vontade. Como vimos, Deus tolerou o mal porque tinha
bons motivos para isso, porém, o mal não é a condição “normal” do ho
mem. Disso decorre que o mal pode ser combatido no homem, coisa que o
mundo moderno, que vê o mal como algo natural, não pode afirmar, pois
se o homem lutasse contra o mal, estaria lutando contra si mesmo. A evo
lução poderia levar o homem definitivamente para o lado do mal, desde
que isso garantisse a sobrevivência da espécie. De qualquer modo, para a
evolução não faria qualquer diferença, pois não há mal, nem bem, tudo é
fruto do acaso. No Cristianismo, o mal é um intruso que, não obstante
sirva aos propósitos de Deus, no devido tempo será extirpado. E justamen
te o seu caráter de intruso que garante que ele pode deixar de existir.14
Ainda trataremos mais a respeito da origem do mal ao longo deste trabalho.
Uma outra idéia comum e aceita entre os homens é que todo efeito
precisa ter uma causa. E dito que uma obra de arte não surge do nada; ela
precisa de um grande artista. Uma das leis da física é que não há efeito sem
causas. Nesse sentido, o mundo criado é o efeito, enquanto o criador, a
causa. Sendo o mundo tão grandioso como é, necessariamente precisa ter
uma causa grandiosa também. Esse argumento vai além do anterior, que
determina apenas a existência de um ser superior, ao demonstrar que esse
ser superior é também infinito, pois só alguém infinito poderia ter criado
um universo tão grande. Popularmente se diz que o universo é infinito, mas
é claro que de modo absoluto isso não é possível. Somente Deus pode ser
infinito, pois a existência de dois infinitos é uma contradição. O universo,
entretanto é enorme, além da compreensão do homem. A existência de um
universo tão grande pressupõe a existência de um Deus ainda maior. Tem
sido apontado que a falha desse argumento é que, se toda causa tem um
efeito, então, Deus também precisaria ter uma causa. A resposta é que Deus
é a causa de si mesmo, ou seja: a causa não causada. Ele é eterno, isto é,
existe desde toda a eternidade. O valor desse argumento está no fato de dar
uma explicação para a origem de todas as coisas, o que nenhuma outra
teoria consegue de forma mais convincente.
Deus existe? 35
consegue explicar a existência dessa moral. Esse argumento vai além dos
anteriores, pois não só diz que Deus existe, que é infinito, que é sábio, mas
que é um ser moral. Até mesmo Kant, que rejeitava os demais argumentos,
aceitava esse, pois entendia que o caminho próprio da religião era o cami
nho da moral. Para Kant, o homem é um ser moral, e, portanto, deve refle
tir a vida de um Deus moral.
Não achamos que esses argumentos sejam provas definitivas de que
Deus existe. Como já dissemos, em última instância, a fé é necessária para
que se creia na existência de Deus. De qualquer modo, esses argumentos
são úteis para nos ajudar a entender que não é irracional crer na existência
de Deus. Grudem pensa que o “o valor dessas provas reside principalmen
te na superação de algumas objeções intelectuais dos descrentes”,17 e pode
mos acrescentar que elas são úteis para demonstrar a racionalidade da fé.
Portanto, elas não provam que Deus existe, mas provam que a fé em Deus
é razoável, ou seja, que a fé é racional.
Apelo íntim o
Quando as pessoas olham para a natureza, algo acontece dentro delas.
Ninguém, por mais indiferente que seja, consegue olhar para as obras da
natureza sem sentir nada. Ela fala algo. Nem sempre as pessoas conseguem
entender, e muitas vezes distorcem essa voz, mas é inegável que elas a ou
vem.18 A Escritura diz: “Os céus proclamam a glória de Deus, e o firma
mento anuncia as obras de suas mãos. Um dia discursa a outro dia, e uma
noite revela conhecimento a outra noite. Não há linguagem, nem há pala
vras, e deles não se ouve nenhum som; no entanto, por toda a terra se faz
ouvir a sua voz” (SI 19.1-4). A voz da natureza proclama a existência e a
glória do Deus criador. O que se percebe nos chamados argumentos racio
nais é, na verdade, uma sistematização dos efeitos que a natureza produz
nas pessoas quando elas a contemplam. A voz da natureza proclama, sem
usar palavras, a existência de Deus. Como já foi dito, essa voz é tão alta que
ninguém consegue fechar os ouvidos a ponto de suprimi-la totalmente. A
razão disso é porque há um eco dessa voz dentro das pessoas. O Eclesiastes
diz que Deus “pôs a eternidade no coração do homem” (Ec 3.11), ou seja,
existe algo dentro do ser humano que assegura a existência de Deus. E por
isso que nada satisfaz ao homem nesta terra. Por mais que ande atrás de
prazeres e realizações, e consiga tudo o que quer, ao final, se ele parar para
pensar, chegará à conclusão de que tudo não passou de “vaidade e correr
Deus existe? 37
Não havia cidade mais famosa e religiosa no mundo antigo do que Ate
nas. A silhueta dos seus templos majestosos podia ser vista a quilômetros
de distância. Havia estátuas de deuses e deusas no Partenon e em todos os
templos da cidade, até mesmo nos edifícios públicos e comerciais. Os mo
radores construíram um local em que ficava o “Altar dos Doze Deuses”.
Esse altar havia sido edificado para garantir que nenhum deus fosse esque
cido. Talvez esse fosse o altar do “Deus desconhecido”, ao qual eles adora
vam sem conhecer. Paulo falou desse altar quando esteve em Atenas, ten
tando fazer os filósofos entenderem que toda a filosofia e o conhecimento
deles, ã parte da revelação de Deus, não passava de um esforço em “tatear”
em busca do Deus verdadeiro (At 17.27). Muitas pessoas, nos dias de hoje,
à semelhança dos atenienses, adoram um “Deus desconhecido”. Elas se
contentam em freqüentar cultos, participar de rituais, desempenhar fun
ções religiosas em honra a um Deus que na verdade não conhecem.
A passagem de Paulo por Atenas se reveste de um caráter muito interes
sante, pois dois grupos de filósofos (estóicos e epicureus), que eram como
que remanescentes, de segunda linha, dos grandes filósofos do passado,
discutiam temas filosóficos. O fato é que a filosofia, desde os seus dias mais
remotos, sempre se preocupou em responder às perguntas básicas da hu
manidade, como: Quem somos? De onde Viemos? Qual a razão da nossa
existência? Qual é o conhecimento verdadeiro? O curioso é que Paulo, em
poucas palavras, deu respostas simples e precisas a todas essas perguntas.
Deus é a resposta para todos estes questionamentos. Ele demonstrou que
Deus é a origem do ser humano, que a existência humana está sob o con
trole de Deus, que o homem existe para buscar a Deus, mas que é limitado
nesse conhecimento, como um cego que tateia (At 17.24-27). Pela reação,
os filósofos obviamente não gostaram das respostas (At 17.32). Porém, é
um fato que os filósofos mais antigos não tinham dificuldades em admitir a
existência de um ser absoluto como o princípio de todas as coisas. Paulo
disse: Na verdade “Deus não está longe”, porém, quando alguém está cego,
40 Razão da esperança
rém, antes de falar sobre isso, precisamos analisar o que a Bíblia fala a
respeito da incompreensibilidade de Deus. Quando as pessoas têm dificul
dade para entender algo do modo como Deus age, elas lembram-se do
texto de Deuteronômio 29.29: “As coisas encobertas pertencem ao S e n h o r ,
nosso Deus, porém as reveladas nos pertencem, a nós e a nossos filhos,
para sempre, para que cumpramos todas as palavras desta lei”. E um fato
incontestável que Deus não revelou tudo de si. A partir da Bíblia, podemos
concluir que Deus é incompreensível por duas razões. Primeiro porque ele
não revelou tudo de si, e dependemos inteiramente da revelação para
conhecê-lo e saber como ele é. Porém, ainda que ela o revelasse, o fato é
que a natureza divina é tão diferente da nossa, tão mais complexa, e tão
grandiosa que não conseguiríamos entendê-la. Então, a segunda razão é
porque o nosso entendimento é limitado. Somos incapazes de entender a
complexidade do ser de Deus. Sabemos o quanto o ser humano é comple
xo em suas qualidades e defeitos. Costumamos dizer que não entendemos
os outros, e a razão é porque não conhecemos os pensamentos dos outros.
Quando vemos as ações deles, não conseguimos montar o quebra-cabeça.
Isso nos faz pensar na complexidade do ser de Deus. Ele é complexo não
por causa de contradições e falhas como nós, mas pela infinidade de idéias
e propósitos que lhe são próprios.
tanto, é preciso que fique claro que a Bíblia não quer dizer com isso que na
mente de Deus a contradição seja aceitável. E comum, quando nos encon
tramos diante de uma situação aparentemente contraditória, dizermos: “Isso
pode não fazer sentido para nós, mas funciona perfeitamente na mente de
Deus”. Esse raciocínio pode ser perigoso, pois, se o nosso raciocínio é
contraditório, nem mesmo Deus poderá nos socorrer. A mente de Deus
realmente é diferente da nossa, mas isso não quer dizer que ela admita
contradição.3 Sua mente é elevada e trata de questões incompreensíveis
para nós, porém, tudo o que Deus pensa faz sentido e é perfeitamente
lógico.
0 i n co m p a r á v el
nada, como um vácuo”. A definição de vácuo pode ser: “Algo vazio, com
ausência até de ar”. E dessa maneira que Deus considera as superpotênci
as do mundo. Nações como os antigos Impérios da Babilônia, Grécia e
Roma, e poderíamos acrescentar as modernas Alemanha, Rússia e Esta
dos Unidos são, diante de Deus, menos do que nada. Ele é de fato incom
parável. Como compreendê-lo?
M ã os grandes
parte do seu plano. É difícil entender que mesmo este mundo de injustiças,
opressões e violência, não segue um curso independente do plano de Deus.
Sabemos que todas essas coisas acontecem por causa do pecado que en
trou no mundo, mas também sabemos que Deus não assiste a tudo isso de
modo impotente ou impassível. Se ele permite que tudo aconteça desse
modo é porque, de alguma maneira incompreensível para nós, faz parte
dos seus propósitos. O plano de Deus para o mundo e para cada pessoa
pode parecer incompreensível e até mesmo contraditório em certas situa
ções, pois pode se assemelhar a uma grande obra inacabada. Quando pas
samos diante da construção de um prédio em que há uma placa informan
do o que o prédio será, podemos ter dificuldades em imaginar que toda
aquela confusão de materiais e instrumentos, no final, se transformará num
prédio perfeito. Porém, por trás de um prédio bem construído há em geral
um excelente projeto. Na construção de Deus há muitas coisas que pare
cem estar fora do lugar; porém, no final veremos que tudo se encaixa per
feitamente, e que seguiu um projeto perfeito. No momento, entretanto,
não conseguimos ver isso, e assim temos dificuldades para entender os
caminhos de Deus.
A m o r i nco m p re en sí v el
C o nhec im en to revolucionário
Conhece-te a ti m e s m o
Conhecer a Deus implica conhecer a si mesmo, pois Deus é a origem do
homem. Não conhecer a Deus implica não saber de onde viemos, onde
estamos e muito menos para onde vamos. Não conhecer a Deus é nada
entender sobre o mundo, sobre a vida, ou sobre qualquer outra coisa. Nas
palavras de Packer, para aqueles que não conhecem a Deus “o mundo se
torna um lugar estranho, louco, penoso, e viver nele algo decepcionante e
desagradável”.7 Só resta o desespero para quem não conhece a Deus, pois
não conhecer a Deus significa não conhecer coisa alguma, significa viver
uma vida de fracassos, decepções, tropeços e desilusões. Não conhecer a
Deus é viver uma vida inferior à dos animais, pois a Bíblia diz que “o boi
conhece o seu possuidor, e o jumento o dono da sua manjedoura”, mas
com relação a Israel Deus diz tristemente “Israel não tem conhecimento, o
meu povo não entende” (Is 1.3). A filosofia tem demonstrado isso vivida-
mente ao longo dos séculos. Desde os filósofos estóicos e epicureus que
Paulo enfrentou no Areópago, que desejavam alcançar a paz da alma me
diante a imperturbalidade ou por se afastarem dos prazeres, até os moder
nos filósofos nihilistas,8 todos têm rejeitado o conhecimento de Deus, e
desse modo, rejeitaram o conhecimento do homem.
Conclusão: 0 b em su p rem o
Não precisamos adorar um “Deus desconhecido”. Embora seja verdade
que nunca conseguiremos conhecer a Deus plenamente, podemos conhecê-
lo verdadeiramente, e isto, porque ele próprio tem se revelado ao ser huma
no, especialmente através das Escrituras. Mas é preciso ter a coragem de
reconhecê-lo como ele é, e não necessariamente como nós gostaríamos que
Conhecendo a Deus 49
Deus quis mostrar aos seus filhos esse aspecto tão impressionante de
sua essência. Queremos demonstrar que a doutrina da Trindade não é ape
nas um conceito teórico ou desinteressante, mas um elemento essencial da
espiritualidade.
0 monarquismo
Essa heresia surgiu da dificuldade de explicar o elemento divino na pes
soa de Cristo, e mesmo do Espírito Santo, sem cair no erro do triteísmo. O
monarquismo modalista não admitia a existência da Trindade Ontológica
(em essência), mas apenas Econômica (funcional), ou seja, Pai, Filho e Es
pírito Santo são uma única pessoa que se manifestou sucessivamente na
História. Deus se manifestou na pessoa do Pai na criação, na pessoa do
Filho na encarnação e na pessoa do Espírito Santo na regeneração. Já o
monarquismo dinâmico negava a divindade essencial de Jesus, afirmando
que Deus é essencialmente um, e que Jesus havia recebido o dinamis (poder)
de Deus por ocasião do seu batismo, sendo elevado a uma categoria divina.
Esse poder o abandonou poucos instantes antes da sua morte.
0 ar i a n i sm o
O arianismo recebeu esse nome de seu fundador, Ario (250-336 d.C.),
que foi um presbítero da igreja de Alexandria. Ario era essencialmente
unitarista, e negava qualquer possibilidade de haver uma Trindade. Segun
do Ário, somente Deus era eterno, Jesus era uma criatura intermediária
gerada do nada por Deus antes da criação do mundo. Desse modo, o Pai
A Trindade: Da teoria à prática 53
nem sempre foi Pai, pois antes de ter criado o Filho, Deus existia sozinho.
O Filho não é eterno. Segundo Ario, a importância do Filho estava no fato
de que ele foi o instrumento por meio do qual Deus criou todas as coisas e
nada mais. E impossível não associar o arianismo ao que proclamam hoje
os Testemunhas de Jeová.
Os concílios
estava falando nesse momento? Certamente não era com os anjos, pois o
homem não foi feito à semelhança dos anjos, nem os anjos estão no mesmo
nível de Deus.5 E a Bíblia não diz que Deus toma conselho com anjos ou
qualquer outra criatura (Is 40.13,14). A resposta mais plausível é que Deus
falava consigo mesmo dentro da Trindade. Esse entendimento só é possível
ã luz da revelação do Novo Testamento, a qual de uma maneira ainda mais
clara demonstra o relacionamento dentro da Trindade, conforme pode ser
visto nas palavras do próprio Jesus: “Respondeu Jesus: Se alguém me ama,
guardará a minha palavra; e meu Pai o amará, e viremos para ele e faremos
nele morada” (Jo 14.23). O mesmo “nós” dos textos do Antigo Testamento
pode ser visto no relacionamento de Jesus com o Pai.
A repetição dos nomes de Deus na Hênção Araônica. Na bênção araônica le
mos: “O S e n h o r te abençoe e te guarde; o S e n h o r faça resplandecer o seu
rosto sobre ti, e tenha misericórdia de ti; o S e n h o r sobre ti levante o seu
rosto e te dê a paz” (Nm 6.24-26). Três vezes aparece na passagem o título
S e n h o r . À luz da revelação do Novo Testamento, especialmente da bênção
apostólica, na qual as três pessoas estão claramente distintas (2Co 13,13),
conseguimos ver na bênção araônica indícios da Trindade.6
O Anjo do S e n h o r , Uma boa referência do Antigo Testamento a respeito
da Trindade encontra-se na pessoa do Anjo do S e n h o r . O caso é que algu
mas vezes esse Anjo, que deve ser distinguido dos demais anjos, se identifi
ca com o próprio Senhor, enquanto em outras ocasiões ele é distinguido do
Senhor, o que nos leva a pensar em pluralidade de personalidade (Ver Gn
16.7-13; 22.15,16; 31.11-13; Êx 3.2-6; 23.23, 32.34; Nm 20.16). Geralmen
te, associa-se essa figura do Anjo do S e n h o r com a Segunda Pessoa da
Trindade.
Aparecimentos de Deus. Talvez a prova mais evidente do Antigo Testa
mento com relação à Trindade esteja nos aparecimentos de Deus. A Escri
tura do Novo Testamento diz que ninguém jamais viu a Deus (Jo 1.18; 5.37;
6.46; ljo 4.12). Como explicar, então, todos os supostos aparecimentos de
Deus no Antigo Testamento? (Gn 18.1; 28.13; Êx 33.18-23; Dt 34.10). O
próprio João diz: “Ninguém jamais viu a Deus, o Deus unigénito, que está
no seio do Pai, é quem o revelou” (Jo 1.18). João chamou Jesus de Logos
(Jo 1.1) que é traduzido como Palavra ou Verbo, e traz a idéia de fala ou
comunicação. Entendemos, então, que Jesus foi o revelador da pessoa divi
na no Antigo Testamento. Jesus disse que Abraão havia visto o seu dia, pois
ele existia antes de Abraão (Jo 8.56-58), referindo-se com certeza à ocasião
da destruição de Sodoma e Gomorra, quando Abraão viu o Senhor, con
forme relata Gênesis 18.1: “Apareceu o S e n h o r a Abraão nos carvalhais de
56 Razão da esperança
3.16,17). Observe que são mencionados três personagens. Jesus está sendo
batizado, o Espírito está descendo sobre ele, e o Pai está falando dos céus.
Inconfundivelmente, aí estão, simultaneamente as três pessoas da Trindade.
Na Fórmula Batismal. Jesus disse: “Ide, portanto, fazei discípulos de to
das as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito
Santo” (Mt 28.19). Nessa passagem, não somente as três pessoas são cita
das conjuntamente, como a expressão “em nome” está no singular. A Es
critura não diz “batizando-os no nome do Pai, no nome do Filho e no
nome do Espírito Santo”. Há apenas um nome para o Deus que subsiste
em três pessoas.
Na Bênção Apostólica. O texto diz: “A graça do Senhor Jesus Cristo, e o
amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós”
(2Co 13.13). Por que Paulo colocaria esses três nomes em pé de igualdade,
se não os considerasse como pessoas da mesma divindade? Seria Paulo
idólatra? Então, fica claro que a Bíblia afirma a existência da Trindade. Em
Apocalipse 1.4,5 a bênção é pronunciada de forma ligeiramente diferencia
da, mas as três pessoas estão presentes: “Graça e paz a vós outros, da parte
daquele que é, que era e que há de vir, da parte dos sete Espíritos que se
acham diante do seu trono e da parte de Jesus Cristo, a Fiel Testemunha, o
Primogênito dos mortos e o Soberano dos reis da terra”.
Na obra da Salvação. A Escritura mostra em passagens como 1 Pedro
1.1,2 e Judas 20-22, Pai, Filho e Espírito Santo agindo em pé de igualdade
na vida dos crentes na eleição, na redenção e durante todo o processo da
santificação. A Trindade conjuntamente age em favor dos escolhidos.
Na Capacitação da igreja. Nas passagens de ICoríntios 12.4-6 e Efésios
4.4-6 que tratam da maneira como Deus capacita a sua igreja para em uni
dade, desenvolver a sua tarefa no mundo, as três pessoas da Trindade são
mencionadas como sendo a base pela qual a igreja sobrevive e age no mun
do. João 14.16 também faz menção da Trindade, mas nesse caso é o Espí
rito Santo que vem por meio do pedido do Filho ao Pai para substituir o
próprio Filho no meio da igreja.
No Ensino de Cristo. Ao mesmo tempo em que Cristo disse que Deus era
seu Pai que estava no céu (Mt 5.16; 7.21; 11.25-27), ele disse que não eram
a mesma pessoa (Mt 16.27; Jo 10.17), e disse também que era “Um” com
ele (Jo 10.30, 38). A comparação entre as palavras de Jesus nos leva a crer
que a Divindade é composta por mais de uma pessoa. E esse certamente é
o maior argumento bíblico a favor da divindade: a consciência do próprio
Jesus. Ele sabia e demonstrou que era alguém diferente do Pai e, ao mesmo
tempo, “um” com o Pai.
58 Razão da esperança
Entendamos que se nos secretos mistérios das Escrituras nos convém ser
sóbrios e modestos; certamente este que tratamos no presente não requer
menor modéstia e sobriedade, mas é preciso estar de sobreaviso, para
que, nem o nosso entendimento, nem a nossa língua vão além do que a
Palavra de Deus nos tem demonstrado. Por que, como poderá o entendi
mento humano compreender, com sua débil capacidade, a imensa essên
cia de Deus, quando nem sequer consegue determinar com certeza qual é
o corpo do sol, mesmo que todos os dias o vê com seus olhos? Assim
mesmo, como poderá penetrar por si só a essência de Deus, uma vez que
não conhece nem a sua própria? Portanto, deixemos a Deus o poder de
conhecer-se. 8
Definições
Podemos definir a doutrina da Trindade como um Deus em essência,
mas que subsiste em três pessoas distintas. Não há analogia ou ilustração
que possa nos ajudar a entender como isso é possível. No passado, os Pais
da igreja costumavam usar analogias para ajudar a entender a unidade den
tro da Trindade. Falava-se, por exemplo, da união da luz, do calor e do
esplendor numa só substância do sol; da raiz, do tronco e das folhas de uma
planta, ou mesmo do intelecto, da vontade e dos sentimentos na alma hu-
A Trindade: Da teoria à prática 59
Espírito ser soprado por Deus (Jo 20.22). A doutrina de que o Espírito
“procede” do Pai e do Filho levou algum tempo para ser formulada pela
igreja, sendo que somente em 589, no Sínodo de Toledo, foi formulada a
seguinte declaração de fé: “Cremos no Espírito Santo, que procede do Pai
e do Filho”.11 A base bíblica de que o Espírito procede do Pai e do Filho é
João 15.26, bem como as passagens em que o Espírito é chamado de Espí
rito de Cristo ou de Espírito do Filho (Rm 8.9; G1 4.6; Fp 1.19; IPe 1.11).
Berkhof define a “espiração” do Espírito como sendo “o eterno e necessá
rio ato da primeira e da segunda pessoas da Trindade, pelo qual elas, dentro
do Ser Divino, vêm a ser a base da subsistência pessoal do Espírito Santo, e
propiciam à terceira pessoa a posse da substância total da essência divina,
sem nenhuma divisão, alienação ou mudança”.12
precisava criar o universo para se sentir melhor, nem mesmo para experi
mentar algum relacionamento, pois em seu ser, Deus já é completo e
relacionável. Na oração sacerdotal Jesus disse: “E agora, glorifica-me, ó Pai,
contigo mesmo, com a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse
mundo... porque me amaste antes da fundação do mundo” (Jo 17.5,24). Na
verdade, esse por si só, já é um grande argumento em favor da Trindade. Se
a Bíblia diz que Deus é amor (ljo 4.8), então, o que ele amava antes de ter
criado alguma coisa? Deus exercitava o amor a si mesmo, no relacionamen
to trinitário, que por sua vez, veio a ser a base para o relacionamento amo
roso com os homens, que assim, também pode ser chamado de “amor
eterno” (Jr 31.3). Deus expandiu o seu amor intra-trinitário para suas cria
turas, e isso demonstra de modo assombroso como é grande esse seu amor.
Quando Deus nos chama para a fé, na verdade é um convite para mergu
lhar no relacionamento trinitário, aquele relacionamento que as pessoas da
Trindade têm entre si. Jesus disse: “Se alguém me ama, guardará a minha
palavra; e meu Pai o amará, e viremos para ele e faremos nele morada” (Jo
14.23). Deus não precisava criar nada para se sentir mais pleno, mas ainda
assim decidiu criar para dar maior expressão ao relacionamento trinitário.
Somos chamados para participar disso, como Jesus deixou bem claro na
sua oração: “A fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu
em ti, também sejam eles em nós” (Jo 17.21). Dessas passagens é deduzida
a seguinte idéia : O Deus triúno em nós, e nós no Deus triúno, uma comu
nhão com base trinitária. Somos chamados a mergulhar no amor da Trin
dade. Por essa razão, não considerar a Trindade é deixar de entender o
amor de Deus na sua plenitude.
Isso, por sua vez, nos leva a entender o nosso chamado relacional. Jesus
continuou orando ao Pai: “Eu lhes tenho transmitido a glória que me tens
dado, para que sejam um, como nós o somos; eu neles, e tu em mim, a fim
de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu
me enviaste e os amaste, como também amaste a mim” (Jo 17.22,23). E
fácil entender por que a comunhão é tão difícil na igreja. As pessoas bus
cam comunhão por meio de eventos sociais, trabalhos comunitários, músi
cas que incentivam cumprimentos mútuos, etc. Porém, a verdadeira base da
comunhão da igreja é a Trindade. Precisamos entender que fomos chama
dos para refletir o mesmo amor que existe na Trindade. Somos chamados
para mergulhar nesse amor, e ele precisa inundar a nossa vida de tal manei
ra que os outros irmãos recebam os efeitos dele. O próprio sentido da
nossa missão no mundo também está explícito nessas palavras de Jesus.
Queremos que o mundo conheça o evangelho, e para isso fazemos imensas
A Trindade: Da leoria à prática 65
ra e lavou os pés dos discípulos, isso não o tomou menos digno nem me
nos livre, ao contrário.
Diante dessas coisas, concluímos que devemos valorizar mais essa dou
trina. Precisamos nos arrepender por considerar tão pouco esse precioso
ensino da Escritura, e passar a considerar o caráter trinitário do nosso Deus
em nosso relacionamento com ele, com os irmãos e no culto que lhe pres
tamos. Acima de tudo, permanece o fato de que não podemos conhecer
verdadeiramente a Deus se não considerarmos o seu caráter trinitário. Como
diz Bavinck, “somente quando nós contemplamos essa Trindade é que nós
descobrimos quem e o que Deus é”.16
Rocha eterna: 0 Deus imutável
Será que ele tem um temperamento instável como o nosso? Ou será que
Deus é sempre o mesmo, nada o afeta, nada o faz retroceder?
Um conceito necessário
Freqüentemente os escritores bíblicos chamam Deus de “Rocha”.1 En
tre outras coisas, podemos dizer que, quando os escritores usavam esse
termo, eles tinham em mente a idéia de um local seguro, um abrigo, uma
fortaleza. A expressão “rocha” também transmite a idéia de algo que não se
abala com o tempo, algo que permanece, que é eterno. É nesse sentido que
Isaías diz: “Confiai no Senhor perpetuamente, porque o Senhor Deus é
uma rocha eterna” (Is 26.4). O profeta desafia o povo a confiar em Deus
não apenas hoje ou amanhã, mas eternamente, porque o Senhor é eterno e,
como uma rocha, não muda. Por essa razão, Deus é uma fonte eterna de
segurança. Ninguém confia em coisas mutáveis. Não arriscamos o nosso
dinheiro em investimentos instáveis. Não colocamos a nossa confiança em
pessoas cujo temperamento muda da noite para o dia, pois é um fato esta
belecido que segurança está intimamente ligada a estabilidade. Não poderí
amos nos refugiar no esconderijo do altíssimo se ele não fosse uma rocha
eterna. Se Deus não permanecesse firme nos seus propósitos, como pode
ríamos ter certeza de que tudo o que ele disse se cumprirá? Se ele mudasse
de planos a cada momento, de acordo com as inclinações do momento, e
em resposta a situações inesperadas, como saber se sua vontade será feita?
A Rocha Eterna fala de um Deus que não muda de planos, e que não pre
cisa mudar, porque os seus planos não têm falhas. A Rocha Eterna é uma
fonte eterna de segurança.
A doutrina da imutabilidade de Deus é uma das mais importantes para a
fé cristã. Crer num Deus imutável é fundamental para que se mantenha um
sistema racional de fé e coerência bíblica. Deus, na sua essência, jamais so
freu ou sofrerá qualquer mutação. Ele é o mesmo ontem, hoje e eternamen
te (Hb 13.8). Esse é um conceito necessário. E absolutamente necessário
que um ser perfeito seja imutável, pois mudança necessariamente pressupõe
imperfeição. A idéia de progresso ou regresso somente é admitida em al
guém finito e imperfeito. O homem progride ou regride na sua vida porque
não é um ser acabado, não possui perfeições imutáveis e está em constante
aprendizado. Se Deus mudasse algo na sua essência, teria que mudar para
melhor ou para pior.2 Se mudasse para pior estaria se tornando menos per
feito, e se mudasse para melhor, isso significaria que ainda não era perfeito.
Rocha elerna: 0 Deus imutável 69
Sendo um ser absoluto e perfeito, Deus está livre de todas as causas e possi
bilidades de mudanças. Shedd usa a questão do conhecimento para demons
trar que Deus necessariamente não muda: “Uma criatura cresce em conheci
mento em certas direções, e perde conhecimento em outras. Ela adquire
informação e esquece. O criador tem conhecimento infinito a todo instante,
ele nunca aprende ou esquece”.3 Isso pode ser aplicado a todos os atributos
de Deus. Por esse motivo, não podemos imaginar qualquer tipo de mudança
essencial no ser de Deus, e nem precisamos, pois a Escritura é farta em
afirmações a respeito da sua imutabilidade. O próprio nome pessoal com
que Deus se revelou no Antigo Testamento atesta a sua imutabilidade. Ele
disse: “Eu Sou o que Sou” (Êx 3.14). Deus é o eterno “Eu Sou absoluto”.
Ele não é um “vir-a-ser”, como se crê no panteísmo, mas o eterno “Eu Sou”,
conforme a Escritura atesta. O salmista diz: “Eles perecerão, mas tu perma
neces; todos eles envelhecerão como um vestido, como roupa os mudarás, e
serão mudados. Tu, porém, és sempre o mesmo, e os teus anos jamais terão
fim” (SI 102.26,27). Não dá para fazer uma comparação entre Deus e os seus
inimigos porque todos mudam e perecem, mas Deus será o mesmo eterna
mente. O próprio Deus fala por meio de Isaías: “Dá-me ouvidos, ó Jacó, e
tu, ó Israel, a quem chamei; eu sou o mesmo, sou o primeiro e também o
último” (Is 48.12), Deus está chamando o povo a confiar nele por causa de
sua eternidade e imutabilidade. A Escritura afirma que Deus é o “pai das
luzes, em quem não pode existir variação ou sombra de mudança” (Tg 1.17).
Nessa passagem, Tiago está argumentando que todo bem é proveniente de
Deus que sempre foi bom e jamais deixará de ser. Ele nunca deixará de ser
bom porque é impossível que haja qualquer mudança nele, nem sequer uma
sombra. No ser de Deus não existe a possibilidade de mudança.
Deus é imutável na essência do seu ser e também em seus atributos. Sua
onisciência é sempre a mesma, assim como a sua santidade e o seu poder.
Não devemos interpretar mal certas passagens da Escritura; por exemplo,
quando ela fala em santificar ao Senhor ou ao seu nome (Nm 27.14; Is 8.13;
Ez 28.22, IPe 3.15). Com isso a Escritura não está dizendo que devemos
fazer algum acréscimo à santidade que Deus já possui, mas que devemos
render a ele o que lhe é devido. A imutabilidade divina está intimamente
conectada com os demais atributos dele, como, por exemplo, a sua infini
dade, onipotência, eternidade, etc. A imutabilidade é absolutamente neces
sária a fim de que Deus continue sendo o Deus poderoso, absoluto e
confiável que é. Uma única mudança no ser divino ou em seus atributos
afetaria de modo completo a sua divindade, e assim, ele não seria mais o
Deus que é. Por essa razão, a imutabilidade é um conceito necessário.
70 Razão da esperança
Não é tão difícil aceitar que Deus seja imutável no seu Ser, mas e com
relação ao seu modo de agir? Será que ele nunca muda de planos ou atitu
des? Inicialmente, é possível dizer que do simples fato de sua imutabilidade
ontológica (em seu ser), decorre necessariamente que ele também é imutá
vel em suas atitudes. Como imaginar um Ser Imutável que, não obstante,
muda? A fim de entendermos melhor essa questão, podemos dividi-la em
duas seções que demonstram o agir imutável de Deus: ele é imutável nos
seus decretos e nas suas promessas.
Decretos imutáveis
Quando falamos em decretos divinos, estamos nos referindo às deter
minações que tomou desde toda a eternidade. Isso tem a ver com o propó
sito dele com relação a todas as coisas que foram criadas. Como seria se
Deus resolvesse criar todas as coisas sem um propósito definido? Se ele
fosse improvisando tudo, sem objetivos, deixando, como se diz por aí, “a
coisa rolar”? Existe uma teoria cada vez mais aceita entre os evangélicos de
que Deus não conhece o futuro.4 Essa teoria diz que a onisciência de Deus
abarca apenas o passado e o presente, mas não o futuro, porque o futuro
simplesmente não existe. O futuro está totalmente aberto, e Deus e os
homens construirão o futuro num constante ritmo de adaptações e inova
ções. Como o homem freqüentemente frustra a vontade de Deus, Deus
precisa buscar novas soluções. Porém, se as coisas fossem realmente as
sim, teríamos que pensar que o futuro pode não ser como queremos e nem
mesmo como Deus quer. Se nem Deus conhece o futuro, não há qualquer
garantia de que o bem vencerá o mal. Graças à Escritura, não precisamos
mergulhar nesse mundo de incertezas. A Escritura diz que Deus conhece o
futuro porque ele o decretou. Os decretos divinos são a garantia de que a
vontade de Deus finalmente prevalecerá, não a do homem, e muito menos
a de Satanás. A recusa das pessoas em aceitar que Deus tenha decretos é
infundada. Como imaginar um construtor que começa a construir uma
grande obra sem uma planta? Ninguém faz isso, e, se faz, está condenando
a própria obra. Se até os homens que são falíveis e mutáveis, antes de
realizarem qualquer coisa, planejam detalhadamente, por que Deus não
faria isso?
Esses propósitos ou decretos foram formulados por Deus antes da fun
dação do mundo. Ele os concretiza durante a História, nas épocas que
predeterminou. Concluímos, a partir do ensino da Escritura, que Deus de
Rocha eterna: 0 Deus imutável 71
tem controle sobre todas as coisas e sobre si mesmo, por isso ele faz jura
mentos, pois tem poder para cumprir o que jura. Ele não muda. E isso o que
o escritor aos Hebreus tem em mente quando afirma: “Por isso Deus, quan
do quis mostrar mais firmemente aos herdeiros da promessa a imutabilidade
do seu propósito, se interpôs com juramento” (Hb 6.17). O autor aos He
breus diz que “Deus jurou por si mesmo” (Hb 6.13). Ele pode jurar, pois
tem poder para cumprir, e nada pode mudá-lo. Deus nunca precisou fazer
um plano novo; seus planos e propósitos são eternos e imutáveis.
Promessas imutáveis
Deus cumpre todas as promessas que faz. Ele nunca muda as suas pro
messas, pois essa é a expressão natural de sua imutabilidade. Números 23.19
diz: “Deus não é homem, para que minta; nem filho de homem, para que se
arrependa. Porventura, tendo ele prometido, não o fará? Ou, tendo falado,
não o cumprirá?” Porém, não devemos dizer que a fidelidade de Deus é por
nossa causa. Deus não é fiel a alguém, ele é fiel a si mesmo. Se fosse fiel a
nós, então, somente cumpriria as suas promessas desde que nós permane
cêssemos sempre fiéis a ele. Mas a Escritura afirma: “Se somos infiéis, ele
permanece fiel, pois de maneira nenhuma pode negar-se a si mesmo” (2Tm
2.13). Isso jamais deve ser entendido como uma autorização da parte de
Deus para o pecado, pois as conseqüências de todos os pecados que come
termos certamente virão sobre nós mesmos. A passagem está dizendo que
Deus não deixa de cumprir suas promessas, que representam o seu propó
sito, devido a alguma falha humana,6 pois se fosse assim, dificilmente Deus
conseguiria cumprir qualquer promessa sua. Uma passagem clássica que
nos ajuda a entender isso é Malaquias 3.6: “Porque eu, o Senhor, não mudo,
por isso vós, ó filhos de Jacó, não sois consumidos”. Nos tempos de Mala
quias, o povo de Deus havia se desviado dos padrões estipulados por Deus,
especialmente no que se referia aos dízimos e às ofertas (Ml 3.7-12). Entre
tanto, Deus tinha um plano e havia feito promessas a Abraão, Isaque e Jacó.
Embora os “filhos de Jacó” merecessem ser exterminados, Deus os poupa
ria por causa da sua promessa de abençoar todas as famílias da terra em
Abraão e sua descendência. Com relação ao próprio Abraão, Deus demons
trou a imutabilidade das suas promessas na ocasião em que ele, seguindo a
idéia de sua mulher, resolveu ter um filho com a serva Agar. Aquilo foi
desagradável aos olhos do Senhor, mas o Senhor não deixou de cumprir a
promessa que havia feito a Abraão, e no tempo determinado, Isaque nas
Rocha eterna: 0 Deus imutável 73
ceu. Não precisamos ter dúvidas, pois como diz Paulo: “Os dons e a voca
ção de Deus são irrevogáveis” (Rm 11.29).
Aparentes m u d a n ça s em Deus
Alguém dirá: e como ficam as várias passagens da Escritura que afir
mam que Deus se arrependeu de alguma coisa que havia dito e mudou dc
atitude? E como explicar a própria encarnação de Cristo? Como pôde Cris
to ter tomado um corpo humano, morrido e ressuscitado e ainda assim a
essência da Trindade permanecer imutável? Ele voltou para o céu com um
corpo, e ainda assim nada mudou?
Comecemos pelas aparentes mudanças em Deus. Algumas passagens da
Escritura de fato dizem que Deus se arrependeu. Como já foi visto, Gêne
sis 6.5,6, diz isso claramente: “então, se arrependeu o Senhor de ter feito o
homem na terra, e isso lhe pesou no coração”. O mesmo, porém de modo
inverso, pode ser visto em Êxodo 32.14, quando Deus declara o desejo de
exterminar o povo por causa de seu pecado, mas diante da suplica de Moi
sés, a Bíblia diz que: “Então, se arrependeu o Senhor do mal que dissera
havia de fazer ao povo” (Ver Jr 18.8-10; 26.13; Jn 3.9,10; Am 7.1-3). Como
conciliar essas passagens com o conceito de imutabilidade? Para começar a
responder a questão, precisamos fazer uma distinção teológica. Quando
dizemos que Deus é imutável, não estamos querendo dizer que Deus é
imóvel ou impassível. Não se deve confundir imutabilidade com imobilida
de.7 Deus não deve ser descrito como alguém sem movimento, que não se
importa com nada. Se fosse assim, Deus não teria sentimentos, e não pode
ríamos atribuir amor, misericórdia, graça, ou mesmo ira a Deus. Deus não
é imóvel ou impassível, ele está em constante relacionamento com o ser
humano, que por sua vez é essencialmente mutável. Há realmente um rela
cionamento entre Deus e os homens, porém é Deus quem pauta esse rela
cionamento e não o homem, como pretende o teísmo aberto. Isso não quer
dizer que haja alguma mudança em Deus, mas que ele se apresenta a nós da
maneira como o podemos entender. A Escritura diz que Deus tem boca,
nariz, braços, coração, etc. Ela diz que ele inclina os ouvidos para ouvir,
como se de outra maneira não conseguisse. Essas seriam descrições literais
de Deus? Evidentemente que são “antropomorfismos”, ou seja, caracterís
ticas humanas atribuídas a Deus a fim de que possamos compreendê-lo
melhor. E desse modo que devemos interpretar a expressão “Deus se arre
pendeu”. E uma atitude de colocar em linguagem humana algo que é pró-
74 Razão da esperança
homem tinha sobre si a ira de Deus, mas, depois da conversão recebe graça
e misericórdia. Observe que em todos os casos citados acima não foi Deus
quem mudou, mas o homem. Deus apenas agiu em conformidade com o
que havia decretado a respeito das atitudes dos homens, sem nada mudar
do seu ser quanto aos atributos, promessas ou decretos. O famoso caso do
rei Ezequias também se enquadra nessa explicação. Ezequias, depois de
receber um ultimato de Deus de que iria morrer, implorou ao Senhor que
lhe concedesse mais tempo de vida e Deus lhe deu uma sobrevida de quin
ze anos (Is 38.1-8). Ezequias morreria se Deus não interviesse, mas estava
no seu plano intervir, fazendo uso da oração do próprio Ezequias. Isso
tudo faz parte do decreto divino e em nada abala a sua imutabilidade, mas
destaca, de uma maneira impressionante o papel da oração no cumprimen
to dos decretos de Deus. Até porque, se Deus quisesse realmente levar
Ezequias, não teria mandado o profeta avisá-lo.
Falta-nos ainda explicar a encarnação de Cristo, e esta é certamente a
tarefa mais difícil até aqui. A chave para entender a questão é que devemos
entender a encarnação de Cristo como fazendo parte do eterno propósito
de Deus, que foi levado a efeito por um ato da sua vontade. Nesse sentido,
a encarnação não trouxe nada de novo à divindade, pois era algo eterna
mente previsto e predeterminado. As vezes, lemos na Bíblia que Jesus é o
Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo (IPe 1.20; Ap 13.8).
Mas quando foi que Cristo morreu? Para Deus, ou seja, nos seus planos e
decretos, essa morte já estava contada desde o início. O mesmo, portanto,
pode ser dito de sua encarnação. Era algo predeterminado, algo que já fazia
parte da história da Trindade. Nada foi acrescido ou diminuído de Deus
pela encarnação de Cristo, pois ele apenas agiu de acordo com os seus
planos eternos.
Deus sobre as coisas que ainda virão é o mesmo que ele tem sobre as coisas
que já aconteceram. Seu domínio é pleno e completo. Nossa salvação re
pousa sobre esse caráter divino que é imutável. E o caráter de um Deus que
inicia uma obra e a completa, mas não no improviso, em reação aos erros e
vicissitudes de uma construção, pois ele segue o seu plano como um arqui
teto que tem uma planta perfeita. E não é só a planta que é perfeita, mas
também o seu conhecimento e poder para executar o que ele mesmo deter
minou. Se o futuro estivesse “aberto” para Deus, então, toda a certeza so
bre qualquer coisa desapareceria. Não saberíamos sequer se Deus conse
guiria estabelecer os “novos céus e nova terra” que estão prometidos. Tudo
deveria ficar em suspense, e talvez, em vez de orarmos a ele para que nos
ajude, ele teria que pedir a nós que o ajudássemos a cumprir o seu plano.
Ou pelo menos que não o atrapalhássemos. Se Deus mudasse os seus pla
nos, ou melhor, se algo forçasse Deus a mudar os seus planos, como um
mau construtor precisa, a cada momento, consertar os erros cometidos,
não teríamos garantias de que as promessas que estão na Bíblia de fato
aconteceriam. E certo que não precisamos ter medo disso, e o motivo não
é outro senão que Deus é imutável. A imutabilidade de Deus é a garantia de
que todas as suas promessas se cumprirão. Isso nos dá segurança para crer
nele, e podemos mesmo ficar seguros, pois, afinal a Rocha é Eterna.
6
está a bondade e a justiça dele? É sobre isso que queremos falar neste
capítulo —sobre a bondade e a justiça de Deus apesar de todas as tragé
dias que nos cercam.
Devemos crer na bondade de Deus porque a Escritura afirma que ele é
bom. Tiago, ao escrever aos perseguidos e sofridos crentes da dispersão, os
admoestou dizendo: “Toda boa dádiva e todo dom perfeito é lá do alto,
descendo do Pai das luzes, em quem não pode existir variação ou sombra
de mudança” (Tg 1.17). E a certeza da imutabilidade de Deus que nos dá
garantias de sua bondade também. Tiago está dizendo que todo o bem vem
de Deus, porque ele é eterna e imutavelmente bom. Deus jamais muda, e
por isso, concluímos que a sua bondade igualmente jamais muda.
O a m o r de Deus
A gr a ç a de Deus
Um outro modo de dizer que Deus é bom é dizer que ele é gracioso,
pois graça se refere a uma faceta da bondade de Deus. A graça tem sido
80 Razão da esperança
estar cada vez menos atuante no mundo. Frente aos ataques maciços dos
meios de comunicação, a moralidade que dominava a opinião pública tem
recuado. Isso só pode ser uma preparação maligna para a manifestação do
Anticristo e seu reino imoral. São aqueles tenebrosos tempos profetizados
pela Escritura, nos quais o mistério da iniqüidade terá livre curso neste
mundo. Parece que já podemos avistá-los.
Podemos também ver a manifestação da graça comum naquilo que
denominamos cultura. Deus possibilitou ao homem que desenvolvesse
talentos naturais a fim de que, por meio da medicina, da tecnologia, das
artes, etc., pudesse tornar a vida humana menos penosa. Essas coisas não
colaboram para a salvação de ninguém, pois não têm o menor caráter
redentor, sendo simplesmente benefícios que Deus concede aos homens
para tornar a vida humana um pouco melhor. As pessoas podem ser tão
dotadas como Einstein, Shakespeare, Da Vinci, etc., por causa da atuação
da graça comum.
A forma mais sublime, entretanto, de a graça de Deus se manifestar é
por meio do que denominamos “graça especial”. A graça especial refere-
se ao tratamento divino em relação aos seus filhos por meio de Cristo
Jesus. Ela está ligada à redenção, ao contrário da graça comum. É chama
da de “especial” porque não é direcionada a todos os homens. Podemos
definir a graça especial como “a obra do Espírito Santo que efetivamente
move o homem para crer em Jesus Cristo como Salvador”. E por essa
graça que somos salvos, conforme a Bíblia declara expressamente: “Pela
graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; e dom de Deus”
(Ef 2.8), Sem ela, jamais encontraríamos a salvação, pois estamos “mor
tos em delitos e pecados” (Ef 2.1), sendo por natureza “filhos da Ira” (Ef
2.3). Por ela somos “justificados gratuitamente” (Rm 3.24) e recebemos
todos os benefícios espirituais de Deus (Jo 1.16; 2Co 8.9). O fato de a
graça especial ser direcionada apenas para os crentes não significa que
eles sejam menos pecadores do que os perdidos; na verdade, todos são
igualmente pecadores diante de Deus (Rm 3.10,23). A graça especial está
intimamente ligada ao amor eletivo de Deus, o qual será estudado nos
próximos capítulos.
Portanto, podemos fazer a seguinte distinção entre graça comum e es
pecial: a graça comum se dirige a todos os homens e tem a ver com benefí
cios comuns; a graça especial se direciona apenas aos crentes e tem a ver
com a salvação. Ambas as manifestações dessa graça evidenciam a bondade
de Deus para com as suas criaturas.
82 Razão da esperança
A misericórdia de Deus
A pa ci ên cia de Deus
As tragédias do m u n d o
As explicações acima são um resumo do que a Bíblia fala a respeito da
bondade de Deus. Porém, é um fato que elas nem sempre nos dão respos
tas precisas sobre o motivo pelo qual Deus permite as tragédias no mundo.
Porém, queremos insistir que o fato de que Deus demonstra amor, graça,
misericórdia e paciência para com os homens deve ser suficiente para que
aceitemos e entendamos que ele é de fato bom. Somente a fé nos faz aceitar
a bondade divina. Com isso em mente, vamos pensar na questão das tragé
dias que acontecem neste mundo. Será que elas de alguma maneira com
prometem a bondade ou a justiça de Deus?
Conseqüências do Pecado
A primeira coisa que deve ser entendida é que Deus não está satisfeito
com o estado caótico do nosso mundo, e nem foi ele quem desejou que o
84 Razão da esperança
mundo caísse nesse estado. Foi uma escolha deliberada do homem que trou
xe todas as desgraças dessa vida. Quando Adão escolheu pecar, sabia das
conseqüências, pois Deus o havia avisado (Gn 2.17). E, depois do pecado
dele, Deus ordenou a maldição sobre este mundo, dizendo: “Maldita é a terra
por tua causa” (Gn 3.17). Observe que a culpa pela maldição é claramente do
homem. Como conseqüência da maldição, o mundo virou um caos em todos
os sentidos. Os descontroles da natureza e a maldade do homem seriam cons
tantes em toda a história do mundo. A Bíblia diz que a criação “está sujeita à
vaidade, não voluntariamente” (Rm 8.20) e que ela “geme e suporta angústias
até agora” (Rm 8.22), o que nos sugere que todas as catástrofes que aconte
cem neste mundo são conseqüências do pecado. Não pelo pecado de cada
homem, mas pelo estado decaído da humanidade e do mundo. A bondade de
Deus se manifesta justamente pelo fato de que ele poderia ter deixado o
mundo entregue ao seu próprio destino, mas escolheu não fazer isso.4 Deus
providenciou uma redenção completa para este mundo. Chegará o dia em
que a “criação será redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da
glória dos filhos de Deus” (Rm 8.21). Até lá teremos que conviver com as
desgraças desta vida, embora sempre tenhamos em Deus o nosso refúgio
seguro, “bem presente nas tribulações” (SI 46.1).
mente demonstra que Deus permite que venham tribulações sobre a vida
dos crentes a fim de purificar a fé. Assim como Deus quis demonstrar a
Satanás que Jó era fiel não apenas pelos benefícios que concedia a ele, ele
também pode deixar o crente passar dificuldades - e muitas vezes ele faz
isso - , a fim de que se comprove a fidelidade do mesmo. Pedro diz que os
crentes deveriam se alegrar, mesmo que no presente, por breve tempo, se
necessário, fossem contristados por várias provações. Segundo ele, isso acon
teceria “para que, uma vez confirmado o valor da vossa fé, muito mais
preciosa do que o ouro perecível, mesmo apurado por fogo, redunde em
louvor, glória e honra na revelação de Jesus Cristo” (IPe 1.6,7). As prova
ções da vida redundam no louvor de Jesus. Paulo experimentou na sua
própria vida todo tipo de provações e dificuldades. Ele foi várias vezes
açoitado, fustigado com varas, apedrejado, enfrentou naufrágios, perigos
de todo tipo, trabalhos além das forças, fome, sede, frio e nudez (2Co 11.25-
27). Paulo não seria um modelo de fé para muitas igrejas da atualidade. Ele
próprio fez questão de relatar um sofrimento terrível na sua vida, o qual
chamou de “espinho na carne”, que o atormentava, e do qual insistiu com
o Senhor que o livrasse, mas recebeu como resposta: “A minha graça te
basta” (2Co 12.7-9). Deus não retirou o sofrimento, e não adiantaria nada
Paulo dizer “eu sou um filho de Deus, e decreto que este sofrimento desa
pareça”, porque aquele sofrimento era para o bem de Paulo. Era justamen
te essa graça (bondade) que o ensinou a “viver contente em toda e qualquer
situação”. Ele disse que na pobreza ou na riqueza, na honra ou na humilha
ção, na abundância ou na escassez, “tudo posso (a idéia é: suporto tudo)
naquele que me fortalece” (Fp 4.11-13). Curiosamente, esse versículo é um
dos mais usados para defender o triunfalismo supostamente cristão. Os
crentes o citam querendo dizer “eu sou invencível, posso realizar qualquer
coisa”, enquanto Paulo dizia: “eu consigo suportar todo sofrimento deste
mundo porque ele me fortalece”. De fato, Paulo enfrentou todo tipo de
situação, algumas que quase o fizeram desesperar da própria vida (2Co 1.8),
mas jamais deixou de ser fiel, e sua fé foi maravilhosamente amadurecida, a
ponto de poder dizer ao final de seu ministério: “Combati o bom combate,
completei a carreira, guardei a fé” (2Tm 4.7). Nos moldes de Jó, Paulo
descobriu a graça de Deus no sofrimento, e por causa dela podia dizer:
“Quando sou fraco é que sou forte” (2Co 12.10). Infelizmente, o triunfalismo
alegadamente cristão impede que as pessoas tenham as maiores e mais verda
deiras experiências com Deus, e nunca levará uma pessoa a um nível espiri
tual mais elevado. Esse triunfalismo cria crentes mimados, bebês em Cristo
que nunca experimentam o verdadeiro crescimento, pois se recusam a usar
86 Razão da esperança
que fica nas ruas, eu não só comeria, como iria saber que aquilo era bom
para mim”.5 De alguma maneira, as tragédias do mundo contribuem para
que o plano de Deus se concretize.
segundo as suas obras, conforme o que se achava escrito nos livros” (Ap
20.12). Cada ato impróprio do ser humano está registrado nesses livros.
Deus tem todas as provas de todos os crimes. Ninguém poderá apelar
diante desse tribunal,
A recompensa de Deus será dada apenas aos crentes, A justiça de Deus
exige que aqueles que mereceram, sejam recompensados, Porém, a pergun
ta que surge é: Quem mereceu? Está claro na Bíblia que nada merecemos,
pois somos salvos pela graça, não pelas obras, justamente para que não nos
vangloriemos (Ef 2.8,9). O fato é que seremos recompensados pelos méri
tos de Cristo, que nos são imputados, Recebemos a recompensa dele como
se fosse nossa, Ele não só pagou a nossa dívida morrendo por nós, como
conquistou méritos para nós mediante a sua vida de estrita obediência à Lei
de Deus. Para ilustrar isso, poderíamos dizer que ele não só pagou a dívida
que tínhamos com Deus, como ainda deixou um saldo gordo na nossa
conta perante o Altíssimo.6 O Altíssimo, como bom pagador que é, nos
recompensará por isso. E ainda existe a recompensa que receberemos pelas
boas obras que praticamos, aquelas que ele preparou para que andássemos
nelas (Ef 2.10). Essas realmente são obras nossas, mas fomos capacitados
a fazê-las por sua graça (Fp 2,13). No entanto, seremos recompensados por
causa delas, Isso nos faz perceber que toda a recompensa é uma questão de
graça, e não de méritos nossos.
te reconhecidas. Até lá, teremos que viver pela fé, e não pelo que vemos.
Embora as tragédias e as dificuldades da vida nos espantem, no nosso ínti
mo devemos manter a confiança na bondade e na justiça de Deus. Ele está
no céu, no trono, e também está do nosso lado: “Porque assim diz o Alto,
o Sublime, que habita a eternidade, o qual tem o nome de Santo: Habito no
alto e santo lugar, mas habito também com o contrito e abatido de espírito,
para vivificar o espírito dos abatidos e vivificar o coração dos contritos” (Is
57,15). Quando nos perguntarem onde está o nosso Deus, devemos res
ponder: nos céus, observando e julgando todas as ações dos homens, e do
nosso lado, nos fazendo fortes quando somos fracos.
Soberania de Deus ou livre-arbítrio?
homem é responsável pelas suas atitudes, e que ninguém pode alegar igno
rância ou coação em nada do que ele faça ou deixe de fazer,
Paradoxo ou contradição ?
Sempre imaginamos que Deus é mais poderoso do que o homem, mas
nem sempre relacionamos isso com o dia-a-dia, com as decisões que preci
sam ser tomadas a cada momento. Será que a pessoa tem livre-arbítrio para
tomar todas as decisões, ou será que, de alguma maneira, tudo o que a
pessoa decide já foi decidido antes por Deus? Até que ponto Deus é sobe
rano em relação a tudo o que acontece neste mundo, e até que ponto o
homem é responsável pelos seus atos? Ou será que esses dois conceitos são
mutuamente excludentes? Os teólogos têm chamado essa tensão aparente
mente contraditória entre a soberania de Deus e a responsabilidade huma
na de “paradoxo”. Paradoxo pode ser definido como “a junção de dois
pensamentos que parecem contradizer-se”.1 J. I. Packer prefere chamar de
“antinômio”. Ele entende que paradoxo é apenas uma figura de linguagem,
e que, portanto, não faz justiça à essa tensão bíblica.2 De qualquer maneira,
os termos não são tão importantes, desde que se entenda que há uma ten
são exposta na Bíblia entre a soberania de Deus e a responsabilidade huma
na. Trata-se de duas verdades, aparentemente contraditórias, ambas susten
tadas pela Escritura, e que não são realmente contraditórias. Geralmente, as
pessoas vão optar por uma ou por outra. Quem acredita que tudo o que
acontece nesta vida acontece exclusivamente porque o homem toma deci
sões, e é responsável por elas, não consegue imaginar que Deus tenha, na
sua soberania, determinado todas as coisas. Por outro lado, aqueles que
pendem apenas para o lado da soberania de Deus, às vezes, fazem do ho
mem algo como um mero robô, isento de responsabilidades pessoais.
Como já dissemos, essas duas verdades não podem ser realmente contradi
tórias. Quando dois elementos se contradizem, apenas um pode ser verda
deiro, pois é impossível que haja duas verdades contraditórias. Nesse caso,
só podemos admitir que “parece” contradição, por causa da incapacidade da
nossa mente de compreender o todo, mas ambos os elementos são verdadei
ros. A Bíblia diz que Deus é aquele que “faz todas as coisas conforme o
conselho da sua vontade” (Ef 1.11), e que ninguém jamais “resistiu à sua
vontade” (Rm 9.19). Com relação aos homens, Paulo diz que Deus é o Olei
ro que tem direito sobre a massa “para do mesmo barro fazer um vaso para
honra e outro, para a desonra” (Rm 9.21). Essas expressões demonstram
Soberania de Deus ou livre-arbílrio? 93
A vontade de Deus
O ensino bíblico a respeito da “vontade de Deus” é essencial para en
tendermos um pouco mais a respeito do relacionamento entre a soberania
de Deus e a responsabilidade humana. Podemos definir a vontade de Deus
de duas maneiras: absoluta e relativa.
Vontade absoluta
que ainda não sucederam; que digo: o meu conselho permanecerá de pé,
farei toda a minha vontade; que chamo a ave de rapina desde o Oriente e de
uma terra longínqua, o homem do meu conselho. Eu o disse, eu também o
cumprirei; tomei este propósito, também o executarei” (Is 46.9-11). Na
descrição do profeta, Deus é aquele que pode anunciar as coisas antes que
elas acontecem por dois motivos: primeiro porque tem um plano definido,
e segundo, porque tem o poder para realiaá-las. O livro de Daniel também
nos fala sobre a vontade decretiva de Deus: “Todos os moradores da terra
são por ele reputados em nada; e, segundo a sua vontade, ele opera com o
exército do céu e os moradores da terra; não há quem lhe possa deter a
mão, nem lhe dizer: que fazes?” (Dn 4.35). Ninguém pode se levantar para
impedir que Deus faça algo e nem mesmo questioná-lo. Os moradores da
terra nada são perante ele, mas, ao mesmo tempo ele opera por intermédio
deles. Isso é colocado pela Confissão de Westminster da seguinte maneira:
“Desde toda a eternidade e pelo mui sábio e santo conselho de sua própria
vontade, Deus ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, po
rém de modc que nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a
vontade da criatura, nem é tirada a liberdade ou a contingência das causas
secundárias, antes estabelecidas”.4 A vontade decretiva de Deus é a razão
última por que qualquer coisa acontece neste mundo, seja boa ou má. Essa
vontade não pode ser contrariada, pois o eterno propósito de Deus não
pode ser frustrado. Parece óbvio que tudo o que acontece neste mundo,
acontece, no mínimo, porque Deus permitiu. Às vezes, esse aspecto per
missivo da vontade de Deus é o escape dos teólogos para explicar o
inexplicável. Não devemos pensar em Deus como um todo-poderoso pas
sível que simplesmente diz: “Pode ser”. Deus é ativo. Ele é o soberano do
universo. Num simples ato de permitir, está incluído muito mais do que
uma autorização. Porém, a Confissão é clara como a própria Bíblia: Isso
não faz de Deus o autor do pecado.5
Vontade relativa
Há um outro aspecto da vontade de Deus que difere do que estudamos
acima por não ser absoluto. Trata-se da vontade de Deus que os homens
conseguem contrariar. Um aspecto dessa vontade tem a ver com os seus
preceitos e está ligado à Lei de Deus. Nesse sentido, estamos falando da
vontade preceptiva. A vontade preceptiva pode ser também chamada de vonta
de revelada. Ela refere-se aos mandamentos divinos e ao fato de que ele
quer que a sua justiça seja cumprida. Ao contrário da vontade decretiva, a
96 Razão da esperança
0 livre-arbítrio
Uma pergunta que normalmente surge diante disso é: E o livre-arbítrio
do ser humano? Não diz a Bíblia que o ser humano tem livre-arbítrio? Por
mais incrível que possa parecer para muitos, o fato é que a Bíblia não diz
isso. A expressão “livre-arbítrio” não se encontra na Bíblia, e o conceito
popular que se tem dele também não. Especialmente o conceito de que as
pessoas tenham a capacidade de agir absolutamente livres e independentes
de qualquer coisa. Ninguém é independente de Deus. Paulo disse aos filó
sofos gregos que em Deus “vivemos, e nos movemos, e existimos” (At
17.28). Se uma pessoa tivesse a capacidade de agir completamente livre da
influência de Deus, então, ela teria que ser igual a Deus. Nem sequer somos
independentes do meio em que vivemos. A sociedade influencia a nossa
vida, mas isso não significa que sejamos menos responsáveis pelas nossas
atitudes. Uma outra definição de livre-arbítrio seria a capacidade de agir de
modo contrário à própria natureza. Essa definição de livre-arbítrio é mais
exata e pode ser encontrada, pois pelo menos Adão a teve. Adão foi o
único homem que tinha a liberdade de agir de forma contrária à sua nature
za. A natureza de Adão era boa, porém, Deus o capacitou com liberdade
suficiente para escolher tanto o bem quanto o mal. Assim, fazendo uso de
seu livre-arbítrio, ele escolheu o mal. Depois disso, os homens não tiveram
mais esse livre-arbítrio, pois se tornaram maus e sem condições de escolher
o bem. Depois da queda todos os homens se tornaram corruptos, confor
me Deus constata antes de mandar o dilúvio: “Viu o Senhor que a maldade
do homem se havia multiplicado na terra e que era continuamente mau
todo desígnio do seu coração” (Gn 6.5). A Bíblia indica que a corrupção do
pecado passou a todos os seres humanos: “Portanto, assim como por um
só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim tam
bém a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram” (Rm 5.12).
Essa é a terrível constatação que a Bíblia faz de toda a humanidade: “Não
98 Razão da esperança
utilizá-la? Se Deus estabeleceu algo, isso não significa que é o melhor? Afi
nal, quem tem mais capacidade de planejamento, previsão e execução?
Não devemos esquecer que a liberdade humana capacita o homem a
agir somente de acordo com a sua natureza. O homem decaído não pode
escolher algo bom porque não existe nada de bom nele. Ele pode escolher
entre uma coisa pior e outra menos ruim, mas uma vez que a sua natureza
é caída, sempre escolherá coisas coerentes com ela. Ele não pode escolher
o bem (da perspectiva divina) porque a sua natureza é má (Mt 7.18). Para
que o homem escolha o que é certo, Deus precisa mudar a natureza dele,
implantando o princípio de vida espiritual que chamamos de regeneração, e
que capacita o homem a tomar uma decisão por Cristo. Esse princípio de
vida é implantado antes da conversão propriamente dita, e em geral vem
acompanhado do ouvir a Palavra de Deus. Nesse ato, Deus capacita o ho
mem a se converter e a responder com fé à pregação do evangelho.8 O
homem é de fato um agente livre; porém, ele sempre agirá de acordo com
os seus princípios, e em plena conform idade com as disposições e tendên
cias da sua alma. Segundo Berkhof, apesar da queda, o homem não perdeu
essa liberdade, mas perdeu “o poder racional de determinar o procedimen
to, rumo ao bem supremo, que esteja em harmonia com a constituição
moral original de sua natureza”.9
Resta agora pensar no convertido; terá ele livre-arbítrio? O convertido
possui duas naturezas. A nova foi implantada por Jesus por meio da rege
neração, porém a antiga ainda permanece, até porque o homem ainda está
“na carne”. Como tem duas naturezas, ele pode agir tanto segundo uma,
quanto segundo a outra. Propriamente dito, não se trata de livre-arbítrio.
De fato, o convertido não precisa mais agir segundo a carne, como Gálatas
5.16 deixa bem claro: “Andai no Espírito e jamais satisfareis à concupiscên
cia da carne”. O convertido não tem livre-arbítrio porque age segundo a
sua natureza. Quando faz o bem, age segundo o Espírito que está nele;
quando faz o mal, age segundo a carne.
Todas as coisas acontecem de acordo com a vontade de Deus, porém,
precisamos tomar cuidado para não nos tornarmos fatalistas, pois o ser hu
mano não é uma espécie de robô programado. Embora o ser humano não
tenha livre-arbítrio, ele continua sendo um agente livre que faz escolhas de
acordo com a sua vontade. E claro que, em última instância, o decreto de
Deus garante que até mesmo essas decisões serão tomadas de tal modo que o
seu plano maior não seja frustrado, mas o fato é que o ser humano toma essas
decisões conforme a sua vontade. Isaías profetizou que os caldeus invadiriam
Judá; isso estava decretado por Deus, porém, os caldeus invadiram Judá por
100 Razão da esperança
que quiseram fazer isso. Todas as atrocidades que esse povo cometeu ao
invadir Judá aconteceram por causa do espírito maligno desses homens.
Embora estivesse no plano de Deus, a responsabilidade era pessoal. Deus
somente usou Isaías para profetizar o o que de fato já estava decretado, pois
Deus não poderia anunciar algo que corresse o risco de não acontecer. Entre
tanto, os caldeus não agiram em obediência a uma ordem direta de Deus, e
sim, por causa da sua sede de conquistas (ver Is 10.5-15). Os decretos da
vontade soberana de Deus não contrariam a ação livre do homem. Na verda
de, Deus decretou as ações livres dos homens, mas isso não torna os homens
menos livres, nem menos responsáveis pelos seus atos, O decreto de Deus
garante que um determinado evento acontecerá, mas não que Deus o realiza
rá. Nada poderá frustrar o plano de Deus para este mundo, porém, cada
criatura é absolutamente responsável por todas as suas decisões e atitudes.
Predestinação:
Deixando Deus ser Deus
w w
Não existe doutrina que cause mais discussão no mundo cristão evangé
lico do que a doutrina da predestinação. Algumas publicações polêmicas
que circulam nos meios evangélicos chegam a taxar a doutrina de “diabóli
ca”.1E um fato que parte dos cristãos se sente desconfortável ao ouvir falar
dela. O que, afinal de contas, torna essa doutrina tão polêmica? Por que as
pessoas amam ou odeiam a doutrina da predestinação com a mesma inten
sidade?
Podemos dizer que são duas as razões que fazem com que as pessoas
tenham medo de falar em predestinação. Primeiro, porque acreditam que se
a predestinação existe, então, Deus não é justo, pois teria escolhido uns e
não outros sem qualquer motivo aparente. Em segundo lugar, as pessoas se
sentem desconfortáveis com a idéia de que não têm liberdade para escolher
a respeito de sua própria salvação. E o velho grito de independência do ser
humano, tão antigo quanto Adão, que fala mais alto. A verdade é que o
homem sempre terá dificuldades em se submeter ao governo divino. O ser
humano sempre desejará ser o senhor do seu próprio destino, e fará de
tudo para conseguir isso, mesmo que seja preciso destronar Deus. E difícil
para o ser humano deixar Deus ser Deus.
Além disso, afirma-se que crer na predestinação inibe a pregação do
evangelho, pois não haveria razão para pregar se, afinal, todos são predesti
nados para a vida ou para a morte. Ainda, objeta-se que a predestinação
inibe o desenvolvimento do próprio crente, pois se alguém já é predestina
do para a salvação, então, não precisa fazer coisa alguma para garanti-la e,
então, não precisa pensar em santificação ou boas obras. Essas objeções
são dignas de consideração, mas representam um falso entendimento do
que é a doutrina da predestinação da perspectiva bíblica.
A doutrina da predestinação tem um fundo histórico bastante amplo e
controvertido. Agostinho (354-430), um teólogo do século 4o, foi o primei
ro, depois de Paulo, a defendê-la. Aquino2 e Lutero3 falaram sobre a predes-
102 Razão da esperança
cias nesse tipo de pensamento. Uma delas é que, se fosse assim, então não
existiria verdadeira escolha da parte de Deus, mas uma simples constatação
antecipada do que viria a acontecer. Nesse caso, a escolha verdadeira seria
do próprio ser humano, e então, nem haveria a necessidade de a Bíblia falar
em “predestinar”. Pois, se alguém já creria, por que então escolhê-lo? Isso
não parece fazer muito sentido.
Outra inconsistência deve-se ao fato de que, se Deus meramente anteviu
quem seria salvo, escolhendo sob essa ótica exclusiva, então, que garantias
poderia haver de que essa “predestinação” divina realmente viria a acontecer?
Se Deus não intervém com o seu poder para cumprir o seu propósito, a
possibilidade de que seus planos não se cumpram deve ser considerada
como algo real. Caso alguém afirme que o fato de Deus ter previsto garante
que o futuro aconteça mesmo que Deus não atue diretamente, então as
coisas ficam ainda piores, pois haveria uma força, que não é Deus, garantin
do que o futuro aconteça. Essa força seria o acaso. No final das contas, o
acaso estaria governando, e então, tudo não passaria de fato de um
determinismo. Por outro lado, se é Deus que garante, então, isto é predes
tinação segundo a visão calvinista.
Na visão reformada, às vezes se fala em dupla predestinação, que envol
ve a salvação e a condenação. Na dupla predestinação, Deus teria predesti
nado tanto os salvos quanto os perdidos, uns para o céu e outros para o
inferno. Entre os reformados, só os supralapsarianos aceitam a idéia da
dupla predestinação.7 Os infralapsarianos não usam o termo predestinação
ou eleição para a condenação, eles usam preterição, que é a ausência de
predestinação, e não dizem predestinados para condenação ou morte eter
na em referência ao decreto divino, mas preordenados, que é o termo usa
do na Confissão de Westminster. A diferença básica entre infra e
supralapsarianismo tem a ver com a ordem dos decretos divinos. A idéia é
se Deus levou em conta a queda ao decretar a eleição. Trata-se da questão
da lógica (não cronológica) dos decretos. No infralapsarianismo, Deus de
cretou: 1) Criar; 2) Permitir a queda; 3) Escolher para a vida eterna parte da
humanidade decaída e deixar a outra em seus pecados e condenação; 4)
Dar seu filho Jesus para redimir o eleito; 5) Enviar o Espírito para aplicar a
redenção no eleito. No supralapsarianismo, Deus decidiu: 1) Escolher al
guns para a vida e destinar outros para a perdição; 2) Criar; 3) Permitir a
queda; 4) Enviar Cristo para redimir o eleito; 5) Enviar o Espírito para
aplicar a redenção ao eleito.8 Entendemos que a posição infralapsária é mais
bíblica e mais coerente. Nela não há risco de Deus ser o autor do pecado
das pessoas, pois pela lógica, Deus não escolheu pessoas para a vida ou
104 Razão da esperança
para morte antes de decidir que elas poderiam cair. Por isso, quando fala
mos em salvação, o termo correto é eleição, pois somente são eleitos os que
serão salvos. Quando falamos em condenação, o termo correto é preterição,
que significa “passar por alto”, “deixar para trás”. Assim, os salvos são os
eleitos ou predestinados, e os condenados são os preteridos ou não eleitos.
Valorizando as Escrituras
Cada vez menos as pessoas acreditam na Palavra de Deus e a valorizam.
O grande movimento da teologia liberal que inundou os seminários e con
seqüentemente as igrejas, especialmente a partir do século 19, causou o
esfriamento e o esfacelamento da maioria das igrejas protestantes da Euro
pa e dos Estados Unidos, por causa da sua ênfase no estudo da Bíblia com
pressupostos “científicos” e anti-sobrenaturalistas. Uma grande parte da
população cristã mundial deixou de crer na Bíblia como a Palavra de Deus
inerrante e infalível. Por outro lado, os movimentos teológicos do século
20, como a neo-ortodoxia e os movimentos subseqüentes, ou o movimen
to pentecostal e neopentecostal, todos com ênfase no subjetivismo, e que
pareciam ser antídotos contra o liberalismo, caíram no mesmo erro, porém
pelo caminho inverso. Esperando tanto encontrar a Palavra de Deus, aca
baram abandonando a Escritura como única fonte de autoridade, recorren
do ao subjetivismo ou a novas revelações. Hoje vivemos um tempo de
extrema superficialidade. Em poucos lugares a Bíblia é realmente levada a
sério. A moda é usar partes da Bíblia de acordo com o interesse pessoal.
Assim, proliferam as chamadas “caixinhas de promessas”, recheadas de
“boas” palavras para os crentes, contendo apenas parte da revelação de
Deus. A Bíblia tem muito a falar sobre predestinação, mas ainda assim muitas
pessoas se recusam a ouvir. Em muitos casos, as pessoas chegam até a
dizer: “Pode estar na Bíblia, mas eu não posso aceitar que seja assim”. Elas
deixam a Bíblia de lado por causa de seus sentimentos pessoais ou de suas
próprias concepções a respeito da justiça de Deus. Preferem sua opinião
pessoal a respeito de como Deus deve ser do que a opinião da Bíblia. O
velho liberalismo selecionava as porções da Escritura que julgava dignas de
crédito, enquanto abandonava as outras. Hoje não é diferente. O ensino
bíblico sobre a predestinação é muito extenso, pode ser visto de Gênesis a
Apocalipse, e o fato de ser tão rejeitado é só mais uma amostra do quanto
a própria Bíblia é rejeitada na fé e na prática devocional das pessoas.
Predestinação: Deixando Deus ser Deus 105
A necessidade de escolher
Romanos 9 é o grande capítulo bíblico sobre Predestinação. No início
do capítulo, Paulo trata de uma questão muito importante para a sua época:
Se Cristo veio para Israel, por que os israelitas não se converteram? Essa
era uma pergunta crucial para os crentes daquela época, pois se Cristo veio
para cumprir todas as promessas feitas a Israel, então, como justamente Is
rael não reconheceu o Cristo? Teria a Palavra de Deus falhado?
Esse é o questionamento que Paulo tem em mente ao responder: “E
não pensemos que a palavra de Deus haja falhado, porque nem todos os de
Israel são, de fato, israelitas; nem por serem descendentes de Abraão são
todos seus filhos. (Rm 9.6,7). Na visão de Paulo, a descendência de Abraão
verdadeira não é a da “carne”, mas a da promessa (v. 8). Os filhos da pro
messa são, necessariamente, os eleitos. Abraão teve dois filhos, mas Deus
escolheu Isaque, filho de Sara e não Ismael, filho da escrava Agar. Isaque
também teve dois filhos (Esaú e Jacó); porém, Deus escolheu Jacó para ser
o patriarca da nação de Israel.
Com essas escolhas, Deus estava mostrando que, desde o início, a elei
ção foi a ferramenta principal da sua construção. Essa é justamente a res
posta que Paulo dá, a fim de provar que a Palavra de Deus não falhou. Ela
não falhou porque os eleitos foram salvos. Eleitos esses de dentro da pró
pria nação de Israel (Rm 11.5,6). Mas acima de tudo, eleitos de entre todos
os povos. Podemos deduzir, portanto, do entendimento de Paulo, que a
eleição é a garantia de que a Palavra de Deus (as promessas) não falhou.
Nisso vemos a necessidade da escolha por parte de Deus. A predestinação
é absolutamente necessária. Sem ela a Palavra de Deus não seria digna de
crédito. Sem ela, nem mesmo Deus seria digno de crédito, pois para que
Deus tenha a prioridade sobre a criação e sobre o destino do mundo, ne
cessariamente ele tem que fazer escolhas. O Deus da Bíblia é o Deus que
escolhe. Suas escolhas garantem o futuro planejado por ele. Suas escolhas
demonstram a fidelidade de sua Palavra e de suas promessas.
Antes da fu n d a çã o do m undo...
Falando sobre a escolha de Jacó e não de Esaú, Paulo diz: “E ainda não
eram os gêmeos nascidos, nem tinham praticado o bem ou o mal (para que
o propósito de Deus, quanto à eleição prevalecesse, não por obras, mas por
106 Razão da esperança
aquele que chama), já lhe fora dito a ela: o mais velho será servo do mais
moço” (Rm 9.11,12). A eleição não acontece depois do nascimento. Os
gêmeos foram objeto de escolha e preterição antes de terem nascido. Deus
escolheu Jacó em lugar de Esaú antes do nascimento de ambos. Isso está
em perfeita harmonia com o ensino de Efésios 1.3-5, que diz: “Bendito o
Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem abençoado com toda
sorte de bênção espiritual nas regiões celestiais em Cristo, assim como nos
escolheu nele antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis
perante ele; e em amor nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por
meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade” (ênfase acres
centada). Neste texto, Paulo dá muitos detalhes a respeito da eleição. Ele
diz que os crentes são escolhidos “em amor”. O amor de Deus, portanto, é
o motivo da escolha divina. Os crentes são escolhidos “nele”, ou seja “em
Cristo”, pois Cristo é o instrumento da escolha divina. O tempo desta esco
lha é “antes da fundação do mundo”, ou seja, na eternidade. A meta desta
escolha é para que sejam “santos e irrepreensíveis”, e para que sejam adotados
como filhos. A razão última desta escolha é o “beneplácito da sua vonta
de”, e o objetivo último é o “louvor da glória de sua graça”. Todas estas
expressões somadas dão um peso imenso a idéia de que a eleição é pessoal
e incondicional realizada antes da fundação do mundo, ou seja, na eternida
de. E impossível afirmar que o escolhido da passagem de Efésios 1.3-5 é
Jesus e não os crentes. Fazer isso é torcer o significado óbvio do texto que
afirma que “nós” fomos escolhidos.
Quando Jesus contou uma parábola para ilustrar o julgamento final, ele
disse que todas as nações seriam reunidas diante dele, e então, seriam sepa
radas as ovelhas dos cabritos (Mt 25.31-33). Para as ovelhas, Jesus dirá:
“Vinde, benditos de meu Pai! Entrai na posse do reino que vos está prepa
rado desde a fundação do mundo” (Mt 25.34). Para as suas ovelhas, Jesus
tem um reino preparado desde a fundação do mundo. E por isso que Jesus
afirma: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me
seguem” (Jo 10.27). Jesus conhece as suas ovelhas, pois, desde a fundação
do mundo, tem o nome de cada uma delas escrita no Livro da Vida (Ap
17.8). A salvação das ovelhas está decretada antes da fundação do mundo,
por isso, Jesus também disse: “Ninguém pode vir a mim se o Pai que me
enviou não o trouxer” (Jo 6.44). Mais à frente, ele disse a mesma coisa com
palavras diferentes: “Ninguém poderá vir a mim, se isso pelo Pai não lhe
for concedido” (Jo 6.65). Observe que ele disse essas palavras a um grupo
de pessoas que não criam nele. Obviamente, Jesus estava dizendo que elas
não eram escolhidas, e por isso não podiam ir até ele (crer). Para um grupo
Predestinação: Deixando Deus ser Deus 107
de incrédulos, Jesus disse: “Mas vós não credes, porque não sois das mi
nhas ovelhas” (Jo 10.26). A ênfase desta frase não deve ser invertida. Jesus
não disse: “Vós não credes e por isso não sois das minhas ovelhas”, e sim:
“E porque não sois das minhas ovelhas que não credes”. Deus escolheu
aqueles que serão salvos, que irão até ele, desde toda a eternidade, assim
como havia escolhido Jacó e não Esaú antes mesmo de eles terem nascido.
Mas isto não nos diz ainda se Deus levou algo em conta ao escolher as
pessoas, algo que tivesse pré-visto nelas.
Não p o r obras
De acordo com a passagem de Romanos 9, Deus escolheu Jacó e prete
riu Esaú, mas isso não aconteceu por ele ter visto algo neles. Como vimos
acima, os gêmeos ainda não tinham nascido e, Paulo completa, “nem prati
cado o bem ou o mal”. Deus não escolheu Jacó porque viu algo melhor
nele do que em Esaú, pois na verdade, Jacó era tão mau quanto Esaú, e até
podia ser pior. Deus escolheu com base exclusiva no seu propósito, pois é
esse propósito que determina a existência de todas as coisas (Ef 1.11), Ele
não poderia escolher baseado na capacidade humana de escolher, pois a
Bíblia afirma que o homem não tem essa capacidade, uma vez que se en
contra em estado de “morte espiritual” (Ef 2.1). Como vimos, Jesus deixou
bem claro que ninguém pode ir até ele se Deus não o levar. Ele fez questão
de esclarecer para os seus discípulos quem escolheu quem: “Não fostes vós
que me escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós outros e vos
designei para que vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça” (Jo 15.16).
Na língua grega, essa passagem tem uma ênfase extraordinária. Jesus está
afirmando que não havia a mínima chance de os discípulos o escolherem, e
quando lemos os evangelhos, percebemos que de fato foi assim. Jesus en
controu Pedro e João pescando, e os chamou para serem pescadores de
homens (Mt 4.19). Encontrou Levi assentado à coletoria de impostos, e,
sem explicação alguma, simplesmente ordenou a ele que o seguisse (Mc
2.14). Os discípulos responderam ao chamado divino c o m obediência. Sem
esse chamado, eles nunca teriam deixado tudo para segui-lo. De acordo
com a Bíblia, nem sequer temos a capacidade de nos arrepender, pois o
arrependimento é um dom de Deus (At 11.18; ver 2Tm 2.25). Para aqueles
que pensam que a fé é uma obra humana, a Bíblia diz que ela é um dom de
Deus (Ef 2.8). Segundo a Escritura, Deus concede fé aos que são destina
dos para a vida eterna (At 13.48).
108 Razão da esperança
Não somos escolhidos por algo que Deus tenha visto em nós, pois não
há nada de bom no ser humano para ser visto por Deus (SI 14.2,3). Paulo
declarou a seu discípulo Timóteo que Deus “nos salvou e nos chamou com
santa vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria
determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos
eternos” (2Tm 1.9). Não fomos salvos e convocados por coisas boas que
tivéssemos feito, nem mesmo por uma fé pré-visualizada por Deus, a qual
teria que ser algum tipo de obra nossa, mas pela determinação de Deus, a
qual ele tomou antes que o tempo começasse a existir. O próprio texto de
Romanos, a respeito de Esaú e Jacó, se auto-explica, nesse sentido, no pa
rêntese que segue: “Para que o propósito de Deus, quanto à eleição, preva
lecesse, não por obras, mas por aquele que chama” (Rm 9.11). Paulo colo
cou esse parêntese no texto justamente para enfatizar que Deus não levou
em consideração as atitudes posteriores dos homens ao definir o destino
deles. Mas será que há algum motivo pelo qual Deus nos escolheu?
0 verdadeiro motivo: 0 a m o r
Há um motivo pelo qual ele escolheu: o seu amor. A seqüência da passa
gem de Romanos é ainda mais clara, pois diz que antes de os gêmeos nasce
rem, antes que eles tivessem feito qualquer coisa, foi dito: Escolhi o mais
moço (Jacó). Não há como negar, nessa passagem, a preferência de Deus por
Jacó em vez de Esaú. Eleição significa exatamente isso: a preferência divina.
Deus preferiu Jacó em lugar de Esaú, como preferiu todos os demais eleitos
em lugar dos não-eleitos. A questão-chave nisso tudo é o seu amor, confor
me mostra a continuação da passagem: “Como está escrito: amei a Jacó, po
rém me aborreci de Esaú” (Rm 9.13). O amor de Deus pelo seu povo esco
lhido é a grande base da eleição, pois fomos predestinados “em amor” (Ef
1.4). O que motivou esse amor, entretanto, é uma resposta que não temos.
Eleição é Deus escolher alguém que, em absoluto, não merece ser escolhido.
Vemos essa preferência aparentemente injustificada na própria escolha de
Israel no Antigo Testamento, conforme a Bíblia demonstra: “Não vos teve o
Senhor afeição, nem vos escolheu porque fôsseis mais numerosos do que
qualquer povo, pois éreis o menor de todos os povos, mas porque o Senhor
vos amava” (Dt 7.7,8). O motivo da escolha de Israel não foi o mérito da
nação, mas o amor que Deus tinha por ela, um amor eterno (Jr 31.3).
Em geral, quando os arminianos argumentam que a predestinação é
baseada apenas no pré-conhecimento, eles usam o texto de Romanos 8.29
Predestinação: Deixando Deus ser Deus
Senhor e andar nos seus caminhos. De certo modo, eles têm preterido a
Igreja de Deus tanto quanto são preteridos por Deus.
Ele reserva para si o direito de ter misericórdia de quem quer ter misericór
dia. Alguns membros da humanidade caída recebem a graça e a misericór
dia da eleição. Deus ignora o restante, deixando-os em seus pecados. Os
não-eleitos recebem justiça. Os eleitos recebem misericórdia. Ninguém é
tratado com injustiça. Deus não é obrigado a ser misericordioso igualmente
com todos. E decisão dele o quanto será misericordioso.15
H um ild ad e
A primeira implicação que a doutrina da eleição deve produzir em nós
é a humildade. Isso é no mínimo curioso, pois geralmente as pessoas
acham que a eleição conduz ao orgulho. Mas a verdade é que não temos
do que nos orgulhar, pois Deus não nos escolheu porque viu algo de bom
em nós. Ele nos escolheu apesar de sermos seus inimigos. Isso humilha o
nosso coração orgulhoso. Paulo disse que os chamados não eram os mais
ricos e sábios deste mundo (ICo 1.27-29). O que isso significa? Que Deus
não se deixa levar pelas aparências. Nada havia de bom em nós que moti
vasse a escolha divina. Quando um homem escolhe uma esposa, por exem
plo, ele procura aquela que lhe parece ter mais coisas atrativas; entretanto,
Deus não escolheu desse modo, pois escolheu aqueles que não eram os
mais destacados. O motivo, segundo a Bíblia, é para que ninguém se glo
rie. As vezes, vemos os crentes confessarem “nada do que eu faço pode
me salvar”, mas, essa mesma pessoa dirá “sou salvo por que eu disse sim
a Cristo”. A eleição muda essa frase nos nossos lábios, ela humilha o
nosso coração orgulhoso e nos faz dizer: “Eu fui salvo porque Cristo disse
sim para mim”. Outros dizem: “Dê uma chance para Jesus”. Mas será que
é ele quem precisa de uma chance? Definitivamente isso precisa mudar
nos nossos lábios, mas antes precisa mudar no nosso coração. Precisa
mos entender, de uma vez por todas, que não é o homem quem escolhe
ou resolve dar uma chance ao Senhor Jesus, é Jesus quem nos escolheu.
Somos dele porque ele nos escolheu, e não porque nós decidimos fazer
isso. O conhecimento da eleição divina deve nos levar à humildade e não
Predestinação: Deixando Deus ser Deus 115
Ado ração
Santidade
que não recebestes o espírito de escravidão, para viverdes, outra vez, ate
morizados, mas recebestes o espírito de adoção, baseados no qual clama
mos: Aba, Pai” (Rm 8.15). Em outras palavras, o medo da punição é algo
que nós tínhamos antes de ser cristãos. Agora somos filhos, pois “ele
predestinou-nos... para a adoção de filhos” (Ef 1.5). Baseado nessa verda
de, o crente pode olhar para o futuro com destemor, pois tem motivos para
esperar no nome de Deus e na vontade de Deus, Isso nos faz ver que a
eleição é uma dessas doutrinas que reorientam completamente a nossa vida.
A nossa motivação para a santidade baseia-se no fato de que fomos chama
dos para sermos santos (Rm 1.7). Se não vivermos de maneira santa, esta
remos sendo indignos do nosso chamado, ou seja, estaremos provando que
não somos chamados. Um eleito que não vive em santidade é uma contra
dição em termos. Como alguém poderia ser parte de uma “raça eleita, sa
cerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus” (lPd
2.9), sem ser essas coisas? Viver em santidade é algo inevitável para o eleito.
Devemos andar em boas obras de amor e caridade para com o nosso pró
ximo porque Deus “de antemão preparou” para que andássemos nelas (Ef
2.10). Devemos perseverar na nossa meta de ser semelhante a Cristo não
por causa do temor de perder algo, ou pela esperança do lucro, mas porque
fomos “predestinados” para sermos conformes à imagem de seu Filho.
(Rm 8.29). No entendimento de Paulo, Deus nos escolheu “desde o princí
pio para a salvação, pela santificação do Espírito e fé na verdade” (2Ts
2.13). Portanto, fé e santificação são coisas essenciais para a confirmação
da eleição, pois fomos predestinados “para sermos santos e irrepreensíveis
perante ele” (Ef 1.4). Por isso, segundo Colossenses 3.12, devemos reves
tir-nos “como eleitos de Deus, santos e amados, de ternos afetos de miseri
córdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de longanimidade”. A base
da nossa santidade não é o medo de perder alguma coisa, mas a alegria por
saber que todas as coisas já são nossas em Cristo Jesus (ICo 3,21-23). Dian
te de tudo isso, não há como um eleito não viver uma vida de santificação.
Paulo, escrevendo aos crentes de Tessalônica, disse-lhes: “Damos, sem
pre, graças a Deus por todos vós, mencionando-vos em nossas orações e,
sem cessar, recordando-nos, diante do nosso Deus e Pai, da operosidade da
vossa fé, da abnegação do vosso amor e da firmeza da vossa esperança em
nosso Senhor Jesus Cristo, reconhecendo, irmãos, amados de Deus, a vossa
eleição” (lTs 1.2-4). Paulo era muito agradecido a Deus pelos crentes de
Tessalônica porque eles tinham três coisas especiais: fé operosa, amor ab
negado e esperança firme, ou seja, santidade e boas obras. Ele disse que ver
essas coisas naqueles irmãos o levava a reconhecer que eles eram eleitos.
Predeslinação: Deixando Deus ser Deus 117
Oração
Eva ng elism o
Conclusão
Ao contrário de produzir apatia ou desinteresse, a doutrina bíblica da
predestinação é a base para uma vida de humildade, adoração, oração, san
tidade e evangelismo. A eleição não faz com o que o crente cruze os braços,
mas arregace as mangas. E verdade que muitos, confiando na sua suposta
eleição, têm vivido de maneira despreocupada; entretanto, a base de sua
confiança é falsa. Um eleito precisa evidenciar certas coisas na sua vida para
que fique claro que é um eleito.
A despeito de todos os falsos entendimentos, a doutrina da predestina
ção é bíblica e amplamente proveitosa para a vida cristã. A questão crucial
que impede o homem de aceitá-la deve-se ao fato de que, desde o início foi
difícil para o homem deixar Deus ser Deus. Adão e Eva se rebelaram por
que queriam ter direitos iguais aos de Deus. O homem quer sempre tomar
todas as decisões e a idéia de que algo possa fugir ao seu controle lhe é
odiosa. Mas isso é uma grande tolice. Deus é Deus. Ele é o Oleiro, o barro
somos nós, Sempre seremos o barro, por mais que lutemos para inverter
essa ordem. O desejo íntimo de moldar Deus conforme nos apraz é o
nascedouro da idolatria, a qual Deus tanto abomina. Em nossos dias, os
homens têm feito deuses para si de acordo com o seu desejo pessoal, po-
120 Razão da esperança
rém, o Deus verdadeiro, o Deus da Bíblia é aquele que age como a sua
vontade determina, quer os homens aceitem ou não.
O que torna a doutrina da predestinação tão amedrontadora é o falso
entendimento dela, aliado a um falso entendimento da justiça de Deus e do
merecimento dos homens. Precisamos abandonar nossas próprias concep
ções a respeito do que Deus “deveria ser” e aceitar que ele seja aquilo que
ele é. Devemos aceitar que Deus seja o que ele se revelou na Escritura: O
Deus soberano, amoroso e misericordioso, que tem escolhido um povo
para si. Não devemos desprezar a Escritura, pois a Eleição está clara nela.
Entendemos que essa é uma doutrina difícil, porém, acima de tudo, bíblica.
Se ela é bíblica, não devemos ter medo de proclamá-la.
Em vez de deixarmos o nosso coração se encher de incertezas e ques
tionamentos em relação à soberania de Deus, devemos, a exemplo do após
tolo Paulo, terminar este assunto glorificando a Deus por sua soberania.
Paulo encerra toda a discussão sobre a predestinação com as seguintes pa
lavras: “O profundidade da riqueza, tanto da sabedoria como do conheci
mento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis,
os seus caminhos! Quem, pois, conheceu a mente do Senhor? Ou quem foi
o seu conselheiro? Ou quem primeiro deu a ele para que lhe venha a ser
restituído? Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A ele,
pois, a glória eternamente. Amém!” (Rm 11.33-36).
Paulo, apesar de não dar todas as respostas, e de talvez, nem ter todas as
respostas para o assunto “predestinação”, ao invés de questionar os desíg
nios de Deus, se alegrou neles e louvou ao Senhor por seus pensamentos,
caminhos e obras inescrutáveis. Ele não deixou algum senso inadequado de
justiça própria ofuscar o brilho áureo da misericórdia de Deus. Paulo reco
nheceu a soberania e a misericórdia daquele que não deve nada a ninguém,
mas ainda assim tem salvado um povo para si. Este povo é o povo eleito.
Ao Deus dos eleitos, portanto, seja a glória eternamente amém.
9
0 Santo de Israel
íSSSSíJfflBBí,
<1w r^ m r
Mais do que a visão espetacular, João quer descrever a adoração que viu
no céu. De todos os lados e de todas as direções, o louvor se dirige ao que se
assenta no trono. Os quatro seres viventes proclamam de noite e de dia
“Santo, Santo, Santo é o Senhor Deus, o Todo-Poderoso, aquele que era, que
é e que há de vir” (Ap 4.8). Os 24 anciãos aproveitam o momento e se
prostram diante do Deus Santo, adorando-o, entregando suas coroas, e can
tando com todas as forças: “Tu és digno, Senhor e Deus nosso, de receber a
glória, a honra e o poder, porque todas as coisas tu criaste, sim, por causa da
tua vontade vieram a existir e foram criadas” (Ap 4.11). Ambos os grupos
repetem essa adoração ao Cordeiro (Ap 5.8-10), e então, entra em cena um
significativo grupo de anjos, composto de “milhões de milhões e milhares
de milhares” e cantam com uma voz estrondosa “digno é o Cordeiro que foi
morto de receber o poder, e riqueza, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e
louvor” (Ap 5.12), e por fim, toda a criação irrompe em louvor dizendo:
“Àquele que está sentado no trono e ao Cordeiro, seja o louvor, e a honra, e
a glória, e o domínio pelos séculos dos séculos”. Então, os quatro seres vi
ventes selam a cerimônia com um contundente “Amém!”, e os anciãos se
prostram e adoram (Ap 4.14). A visão é estonteante. Quase dá para ouvir o
som de todas aquelas vozes adorando o Deus Santo e Soberano. Esse, sem
dúvida, é um “perfeito louvor” (Mt 21.16). Trata-se de uma visão do futuro,
quando todos os redimidos, junto com todos os anjos e toda a criação louva
rão ao Senhor com todas as forças, numa adoração jamais vista. Esta é a
nossa vocação: somos chamados para a adoração de Deus “na beleza da sua
santidade” (SI 96.9). Um dia ouviremos o som daquela voz que disse a João
“sobe para aqui”, nos convocando também para participarmos desse gigan
tesco coro em honra ao Deus Santo. Porém, de certo modo, tudo isso já está
acontecendo hoje. Deus já é exaltado entre as nações e exaltado na terra (SI
46.10). Ele é exaltado acima dos céus e em toda a terra esplende a sua glória
(SI 57.5). Enquanto estivermos neste mundo, essa é a visão de Deus que
devemos ter, e que mais do que nunca precisamos resgatar. E nosso dever,
portanto, resgatar essa visão correta do Deus que se assenta no trono, desse
Deus glorioso, excelso, sublime e, acima de tudo, santo. Só quando o mundo
evangélico resgatar essa visão, os abusos cessarão.
Isaías também esteve nesse lugar, pelo menos novecentos anos antes de
João. No seu texto, há mais detalhes que nos ajudam a recuperar a visão da
santidade de Deus e que têm aplicações diretas para a nossa vida. Isaías
diz: “No ano da morte do rei Uzias, eu vi o Senhor assentado sobre um
alto e sublime trono” (Is 6.1). Essa é a visão do Soberano, o Santo, aquele
que não se corrompe jamais. Voltando ao tempo de Isaías, somos informa
0 Santo de Israel 12 5
dos que o rei Uzias estava morto. Ele havia sido um bom rei, tendo reinado
durante 52 anos sobre Judá. Ele desempenhou uma importante função no
seu reinado ao reconstruir o reino de Judá, devolver a dignidade, o poderio
militar e econômico da nação. O final do seu reinado, entretanto, foi trági
co; ele morreu leproso pela audácia de ter reclamado para si direitos per
tencentes apenas aos sacerdotes no templo. Foi ferido pelo Senhor por ter
afrontado a sua santidade. A morte do rei foi sentida em Judá, pois um
grande rei havia morrido. Aqueles eram dias de luto, e foi justamente nesse
período que Isaías teve a sua visão. O rei de Judá estava morto, o trono da
nação estava vazio, mas Isaías viu outro trono e um rei que jamais morre e
jamais perde a sua majestade.2 Em sua visão, lá estava o Senhor, assentado
num alto e sublime trono. Não importa a situação do mundo, não importa
quem ocupe os tronos passageiros dos reinos da terra, há um Trono Eter
no, onde impera a Santidade Eterna, esse é o Trono de Deus (SI 11.4). O
mundo passa, mas aquele que habita a eternidade, o alto, o sublime, o
santo, está eternamente assentado no seu trono, imutável e majestoso na
sua santidade.
Não é um absurdo afirmar que os crentes têm tido uma visão extrema
mente debilitada de Deus, em que ele aparece despojado da sua soberania e
de sua santidade. Isso é extremamente perigoso, pois em busca de uma
suposta intimidade com Deus, muitas pessoas têm menosprezado a santi
dade dele. Num certo sentido, realmente fomos chamados para termos
intimidade com Deus, porém, às vezes essa noção é confundida. Vemos
por aí as pessoas dizendo que são íntimas de Jesus, e o tratam com palavras
jocosas e até apelidos. Já ouvimos testemunhos de pessoas que afirmaram
que Jesus vinha até a casa deles e até contava piadas. Francamente, isso
pode ser chamativo, mas não é a visão que a Bíblia apresenta de Deus.
Somos chamados a servir a Deus “com reverência e santo temor; porque o
nosso Deus é fogo consumidor” (Hb 12.28,29). Não podemos nos esque
cer que ele está assentado num alto e sublime trono, que ele é o soberano de
toda a criação. Não vemos qualquer escritor bíblico chamando Deus de
“querido”, ou “meu Jesuzinho”, ou de outras maneiras “íntimas”. Além
disso, intimidade não significa que podemos nos intrometer e desrespeitar
aquele de quem somos íntimos. Nenhum desrespeito pode ser aceito por
Deus com a desculpa de uma suposta “intimidade”. Sem mencionar que a
Escritura não diz que a “intimidade” com o Senhor é o princípio da sabe
doria, mas que o “temor” do Senhor é o princípio da sabedoria (Pv 9.10).
Por outro lado, com os que o temem, Deus se relaciona com intimidade (SI
25.14). Os “íntimos” de Deus são aqueles que o temem e obedecem a ele.
126 Razão da esperança
0 cla m o r excelso
Da sua visão, o profeta descreve em seguida o clamor dos serafins. Ele
pôde ouvi-los clamando: “Santo, Santo, Santo é o Senhor dos Exércitos;
toda a terra está cheia da sua glória” (Is 6.3). Eles não apenas demonstra
vam com atos a santidade de Deus, mas também com palavras. A língua
hebraica é cheia de particularidades interessantes. Em todas as línguas há
maneiras de se enfatizar alguma coisa. Na língua portuguesa, quando que
remos enfatizar uma expressão, a colocamos entre aspas, a sublinhamos ou
então usamos a palavra no grau aumentativo. Assim, se quisermos dizer
que algo é puro em extremo dizemos que é “puríssimo”; se quisermos
dizer que é extremamente santo, dizemos que é “santíssimo”. No hebraico,
isso é demonstrado pela repetição da mesma expressão ou palavra. O que
128 Razão da esperança
A c o m o çã o diante do Santo
Imediatamente após o clamor dos Serafins, o profeta descreve que
houve uma grande comoção no templo: “As bases do limiar se moveram
à voz do que clamava, e a casa se encheu de fumaça” (Is 6.4). Tremor e
fumaça parecem ser elementos comuns na presença de Deus em sua san
tidade. Quando de sua primeira manifestação a Israel no monte Sinai, a
Bíblia diz que “todo o monte Sinai fumegava, porque o Senhor descera
sobre ele em fogo; a sua fumaça subiu como fumaça de uma grande
fornalha, e todo o monte tremia grandemente” (Êx 19.18). Esses ele
mentos indicam a majestade e o poder divinos. E no mínimo curioso que
até os elementos naturais se comovam diante da presença do Santo. A
cena é estarrecedora. Imagine o profeta parado ali diante de toda aquela
cena, e a cada vez que os serafins clamavam, o lugar todo tremia. Lá
estava ele, sozinho, diante da santidade de Deus. Naquele momento, não
foram apenas as paredes que se moveram, o próprio profeta foi movido.
Ele literalmente desabou. Num instante, ele teve uma visão completa de
si mesmo, percebeu toda a sua pecaminosidade, e viu o quanto era indig
no de estar na presença do Deus Santíssimo. Dá para imaginar a sensa
ção de Isaías. De repente, ele foi levado ao templo celestial. A primeira
coisa que viu foi o trono de Deus e o próprio Deus assentado no trono.
Em seguida, viu os Serafins, e para seu espanto, eles não olhavam para o
Senhor, mas ele havia olhado. O cântico deles entra na sua alma como
uma lâmina, pois exalta a santidade de Deus, a qual ele estava profanan
do com a sua presença pecaminosa. As paredes tremem, fumaça encobre
o local, e ele sabe que está condenado. Seu clamor reflete isso: “Ai de
mim! Estou perdido! Porque sou homem de lábios impuros, habito no
meio de um povo de impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o
Senhor dos Exércitos!” (Is 6.5). Ele disse algo como “Ai de mim, eu vou
morrer”. Essas são palavras de alguém que teve plena consciência de que
estava profanando algo extremamente santo. Na presença santa do Se
nhor, sentiu suas forças se esvaírem, e teve uma terrível sensação de morte.
Sentiu-se verdadeiramente perdido, porque sabia ser pecador, tanto quanto
seu povo, e, naquele momento, havia visto o Deus Santo. Esse é o tipo de
sentimento que a santidade de Deus produz nas pessoas. Olhar para Deus
e entender a sua santidade é algo que nos torna menos míopes para en
xergar a nós mesmos. Ver o quanto Deus é Santo ajuda-nos a perceber o
quanto somos pecadores. Deixar esse senso da santidade de Deus inva-
\30 Razão da esperança
dir a nossa vida fará com que tenhamos ódio do pecado, tanto quanto
Deus o odeia.
0 toque da santidade
Muitas pessoas que se aproximaram de Deus sem considerar o seu
pecado pessoal, não tiveram um final feliz, porém, esse não é o caso de
Isaías. Podemos dizer que a sua história teve um final feliz, pois ele não
pereceu, apesar de ter tido um vislumbre da santidade de Deus. A única
explicação para isso é Redenção. E impressionante como a redenção de
corre a partir do reconhecimento do pecado. Deus nada fará para salvar o
homem enquanto esse não reconhecer seus pecados e implorar o seu
perdão. E nosso entendimento que Isaías 6 é uma excelente passagem
messiânica, que esclarece, em termos pertinentes ao Antigo Testamento,
o sistema da salvação que é próprio do Deus da Escritura. Neste estudo,
não podemos deixar de fazer as devidas comparações à luz da revelação
do Novo Testamento.
Não devemos pensar que Deus ignorou o pecado de Isaías, fazendo
vistas grossas às suas transgressões. O Deus de Isaías é o mesmo de Levíti-
co que diz: “Ser-me-eis santos, porque eu, o S e n h o r , s o u santo e separei-
vos dos povos, para serdes meus” (Lv 20.26). Também é o mesmo que
disse a Ezequíel: “A alma que pecar, essa morrerá” (Ez 18.20), e posterior
mente a Paulo: “O salário do pecado é a morte” (Rm 6.23). Deus, o Santo,
não pode admitir o pecador na sua presença. E Isaías não estava fingindo,
ele era realmente pecador. A grande notícia, porém, que a Bíblia nos dá, é
que Deus tem uma solução para o pecado do homem. Deus pode tornar o
homem aceitável diante da sua Santidade. Como vimos na visão de João no
Apocalipse, ao redor do círculo branco há um vermelho, pois o sangue nos
conduz à santidade. O profeta descreve que, depois do momento crucial
em que se sentiu perecendo, um dos serafins vôou em sua direção com uma
brasa tirada do altar com uma tenaz e tocou a boca do profeta dizendo:
“Eis que ela tocou os teus lábios; a tua iniqüidade foi tirada, e perdoado, o
teu pecado” (Is 6.6,7). Esse foi um toque santificador. O toque da brasa,
tão quente que o anjo usou uma tenaz, simbolizava o juízo de Deus sobre a
carne pecaminosa. Isaías recebeu uma pequena demonstração desse juízo,
mas quem o recebeu inteiramente foi Jesus, que suportou todo o peso e o
fogo consumidor da ira de Deus por ter carregado o pecado de seu povo.
Não existe salvação sem juízo, alguém tem que pagar a conta do pecado,
0 Santo de Israel 131
A m issão do santificado
Quando Deus nos santifica com o seu toque, certamente não é para
que fiquemos de braços cruzados. Como já vimos, a primeira reação de
Isaías ao se sentir perdoado e aceito foi dizer: “Eis-me-aqui”. Essa ordem
nunca deve ser invertida. Primeiro a pessoa precisa entender a santidade
de Deus, depois a sua própria pecaminosidade e, em seguida, a redenção
para, só então, ouvir o chamado divino e responder: “Eis-me-aqui”. Só
desse modo ela se torna capacitada para cumprir a difícil tarefa que Deus
reservou para ela . Há muitos obreiros não chamados por Deus que se
auto-enviam ao mundo. Somente aqueles que entenderam o seu chamado
132 Razão da esperança
O enigma do mal
A criação do m u n d o espiritual
Antes mesmo de criar a terra e tudo o que nela há, Deus criou algo do
qual não temos muito conhecimento, exceto pelas poucas indicações que a
Bíblia nos dá. Estamos falando do mundo espiritual. No primeiro versículo
136 Razão da esperança
da Bíblia está escrito: “No princípio criou Deus os céus e a te m ” (Gn 1.1).
O segundo versículo passa a concentrar toda a sua atenção na terra: “A
terra, porém, era sem forma e vazia” (Gn 1.2). A partir daí pouco se fala
sobre o céu. De algum modo, a criação do mundo espiritual está incluída já
no primeiro versículo. O livro de Jó dá a entender que os anjos foram cria
dos antes que a terra fosse feita porque lemos: “Onde estavas tu, quando eu
lançava os fundamentos da terra? Dize-mo, se tens entendimento. Quem lhe
pôs as medidas, se é que o sabes? Ou quem estendeu sobre ela o cordel?
Sobre que estão fundadas as suas bases ou quem lhe assentou a pedra angu
lar, quando as estrelas da alva, juntas, alegremente cantavam, e rejubilavam
todos os filhos de Deus?” (Jó 38.4-7). Sabemos que Deus criou os anjos
antes dos homens, e que houve uma queda no mundo dos anjos, Essa queda
provavelmente aconteceu após o término da criação, uma vez que a Bíblia
diz que, ao terminar a obra, “viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era
muito bom” (Gn 1.31).2 Se tudo era muito bom, isso nos faz pensar que a
queda de Satanás ainda não havia ocorrido. Sabemos que hoje existem duas
classes de anjos, os bons e os maus. Os bons são chamados de “eleitos”.
Os an jos eleitos
Os anjos eleitos (lTm 5.21) foram dotados de uma capacidade de não
serem mais atraídos pelo mal, ou seja, Deus os preserva da queda. Se Deus
não fizesse isso com os anjos que não seguiram Satanás em sua rebelião,
sempre haveria a possibilidade de que algum anjo fosse iludido pelo diabo
e, então, até hoje anjos poderiam abandonar o céu para seguir o dragão,
Isso não acontece porque Deus preserva os seus anjos do pecado por um
processo semelhante ao da eleição dos homens. Já vimos que os homens
são eleitos, porém, são eleitos para serem salvos, pois a queda foi prevista
na eleição. Os anjos eleitos, diferentemente, são eleitos para que não per
cam o estado que já possuem.
A Bíblia diz que os anjos são seres sem corpo (Mt 8.16; Lc 7.21; Lc
24.39) que podem estar em grande quantidade em apenas um lugar ao mes
mo tempo (Lc 8.30).3 Eles não se casam (Mt 22.30), são seres racionais
(2Sm 14.20; Ef 3.10; 2Pe 2.11), extremamente numerosos (Dt 33.2; SI 68.17;
Mt 26.53, Ap 5.11). Eles são classificados em: querubins (Gn 3.24; 2Sm
22.11; SI 18.10; SI 80.1; Ez 1; Ap 4), serafins (Is 6.2, 6), principados, po
testades, tronos e domínios (Ef 3.10; Cl 2.10; Cl 1.16; Ef 1.21; IPe 3.22),4
Apenas dois anjos recebem nomes na Bíblia: Gabriel e Miguel (Dn 8.16;
9.21; Lc 1.19, 26; Jd 9; Ap 12.7). Este último é chamado de o Arcanjo que,
0 enigma do m al 137
literalmente, significa o principal anjo (Jd 9), sendo o comandante dos exér
citos celestiais (Ap 12.7). Esses dados bíblicos a respeito dos anjos nos
mostram que há uma grande diversidade em relação a eles, e que estamos
tratanto de um tema que pode gerar muitas especulações. No tocante a isso,
ficamos com as palavras de Calvino: “Ora, ainda que da diversidade de
nomes concluímos que há várias ordens, todavia, investigá-los mais minu
ciosamente, fixar seu número e determinar suas hierarquias, não seria mera
curiosidade, e, sim, também temeridade ímpia e perigosa”.5
Os anjos têm muitas funções, entre elas a de louvar a Deus (Jó 38.7; Is
6.3; SI 103.20; 148.2; Ap 5.11), que talvez seja a principal. Eles também se
empenham para ajudar os crentes, e se alegram grandemente quando um
pecador se converte (Lc 15.10). Hebreus 1.14 diz que eles “são todos
espíritos ministradores, enviados para serviço a favor dos que hão de
herdar a salvação”. De acordo com essa passagem, de alguma maneira os
anjos ajudam aqueles que serão salvos. Sabemos que não é função dos
anjos pregar o evangelho e, ao contrário do que às vezes se pensa, a Bíblia
não diz que eles desejam pregar, diz apenas que eles desejam saber mais
sobre o assunto (IPe 1.12). De qualquer maneira, eles contribuem ao
obedecer às ordens de Deus. Também é função deles proteger os crentes
(SI 34.7, 35.4,5, 91.11-13, Mt 18.10, At 5.19). A Bíblia diz que Deus pro
videnciou provisão física para Elias (lR s 19.5-7), encorajou Paulo duran
te suas jornadas (At 27.23-25), libertou Pedro da prisão (At 5.19), direcio-
nou Pedro a se encontrar com Cornélio (At 8.26) por intermédio deles.
Uma tarefa peculiar que a Bíblia parece atribuir a eles é a função de enca
minhar os crentes mortos para o céu (Lc 16.22), e no dia do Senhor, serão
eles que reunirão os escolhidos do Senhor (Mt 24.31; Mc 13.27). Eles
também se envolvem com as atividades julgadoras de Deus, como execu
tores. Foram eles que anunciaram a destruição de Sodoma e Gomorra
(Gn 19,12,13). Um deles feriu o Rei Agripa por causa de sua blasfêmia
(At 12.23). Os anjos recolherão os ímpios para os levarem ao inferno (Mt
13.39-42). E função deles derramar os juízos de Deus sobre a terra (Ap
16.2-17), e a voz do Arcanjo anunciará o dia da vinda de Jesus (lTs 4.16).
Portanto, percebemos que os anjos possuem muitas funções e são extre
mamente importantes para a consumação dos propósitos de Deus para
este mundo. Embora não possamos vê-los, e nem precisemos, podemos
ter a certeza de que eles estão sempre próximos, agindo em nosso favor
segundo as ordens de Deus.
138 Razão da esperança
Os an jos decaídos
Como diz Lloyd-Jones, “O diabo, ao cair, tornou-se a cabeça daquela
esfera que se acha fora da vida de Deus, e assim podemos descrevê-la como
o império da morte”.6 Não sabemos como aconteceu a queda dos anjos.
Hoekema está certo ao afirmar que “nada é dito na Escritura a respeito do
tempo ou da natureza da queda dos anjos”.7 Pelo menos não diretamente.
Algumas deduções são possíveis, no entanto, a partir de passagens indire
tas. Sabemos apenas que, de alguma maneira, um grupo de anjos liderados
por Satanás se rebelou contra Deus. Satanás significa “adversário” e é o
grande líder dessa rebelião. Ele recebe muitos nomes na Bíblia, e o mais
conhecido, Lúcifer (portador da luz), não está na Bíblia. Esse nome vem do
latim e era aplicado ao planeta Vênus. O motivo de esse nome ser associado
a Satanás foi porque as versões latinas da Bíblia deram esse nome ao título
“estrela da manhã” que aparece em Isaías 14.12 (no hebraico, Hallel). A
passagem de Isaías diz; “Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filho da
alva! Como foste lançado por terra, tu que debilitavas as nações! Tu dizias
no teu coração: Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o
meu trono e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do
Norte; subirei acima das mais altas nuvens e serei semelhante ao Altíssimo.
Contudo, serás precipitado para o reino dos mortos, no mais profundo do
abismo” (Is 14.12-15). Em geral, essa passagem tem sido entendida como
uma referência à queda de Satanás. O que não pode ser ignorado, entretan
to, é que, em princípio, ela é dirigida ao rei da Babilônia. Trata-se de uma
profecia a respeito do rei da Babilônia e não uma explicação direta sobre a
origem de Satanás. E certo, porém, que o rei da Babilônia tem semelhanças
com Satanás e, no mínimo, é um representante dele na terra. Por esse mo
tivo, é possível que, por detrás do que está sendo dito ao rei da Babilônia,
haja alguma referência ao próprio Satanás. A passagem descreve a queda
desse rei que, em seu orgulho, queria ser semelhante a Deus, e realmente
esse parece ser o motivo principal da queda de Satanás. Outra passagem
que em geral se aplica a Satanás é Ezequiel 28.12-19, que é uma profecia
contra o rei de Tiro. O mesmo que foi dito sobre o rei da Babilônia pode
ser aplicado ao rei de Tiro. A profecia diz: “Assim diz o S e n h o r Deus: Tu és
o sinete da perfeição, cheio de sabedoria e formosura. Estavas no Éden,
jardim de Deus; de todas as pedras preciosas te cobrias: o sárdio, o topázio,
o diamante, o berilo, o ônix, o jaspe, a safira, o carbúnculo e a esmeralda; de
ouro se te fizeram os engastes e os ornamentos; no dia em que foste criado,
foram eles preparados. Tu eras querubim da guarda ungido, e te estabeleci;
0 enigma do m al 139
palavra semeada (Mc 4.15), impedir os servos de Deus e resistir a eles (lTs
2.18, Zc 3.1) e até possuir um corpo humano (Jo 13.27). Uma das afirma
ções mais espantosas sobre Satanás é que ele “detém o poder da morte”
(Hb 2.14). Isso não quer dizer que ele é quem decide quem morre ou deixa
de morrer. Essa é uma prerrogativa divina. O que a passagem está dizendo
é que, por causa do pecado, a morte entrou no mundo. Satanás foi o instru
mento por meio do qual a morte entrou; então, nesse sentido, ele detinha o
poder da morte, porém, por causa do sacrifício de Jesus, Satanás perdeu
esse poder, pelo menos na vida dos salvos,
0 m a l necessário
Uma pergunta que normalmente surge é: Por que Deus permitiu e per
mite a existência de um Satanás? Não há dúvidas de que Deus poderia ter
impedido a queda dos anjos ou mesmo exterminado todos eles a fim de
que não causassem todo o mal que eles vêm causando ao longo das eras.
Essas criaturas são absolutamente perversas, não há um pingo de bondade
ou justiça no caráter de Satanás e seus anjos; eles são absolutamente maus.
Por que Deus permitiria a existência de um ser tão mau no mundo? Essa
pergunta nos faz voltar à questão da própria origem do mal. De onde veio
o mal?
A origem do mal
O mundo antigo sempre acreditou que havia um deus bom e um deus
mau, Modernamente, essa crença denominada dualismo tem ressuscitado
em muitos lugares, especialmente nos movimentos ligados à Nova Era. O
dualismo identifica essas duas forças como iguais e dependentes uma da
outra, como se uma completasse a outra, que não poderia existir sozinha.
Esse conceito está muito longe de ser bíblico. De acordo com a Bíblia,
Satanás não é igual a Deus, Deus é o único soberano, Satanás é uma criatura
rebelde de Deus. Não existe comparação, Deus é o Rei por excelência,
Satanás não passa de um usurpador.
Quanto à origem do mal, talvez essa seja a mais difícil questão a ser
respondida, E um fato que nunca teremos uma resposta satisfatória, pelo
menos não nesta vida. Algumas perguntas que podem ser feitas nos ajudam
a pensar no assunto. De onde veio o mal, se Deus é o criador de todas as
coisas? E Satanás o criador do mal? Como ele teria criado o mal, se ele
142 Razão da esperança
próprio era bom antes de pecar? Para começar a responder, uma coisa pre
cisa ficar absolutamente clara: Deus não é o autor do mal. Seja qual for a
resposta que dermos para a origem do mal, ela precisa necessariamente
excluir Deus, pois se Deus for o autor do mal, não poderia ser o Deus bom
e justo no qual cremos. Deus é o criador de todas as coisas, mas não é o
criador do mal. Então Satanás é o criador do mal? Se Satanás fosse o cria
dor do mal, isso faria dele alguém que realmente está em competição direta
com Deus. A verdade é que o mal não foi necessariamente criado. O que
queremos dizer é que ninguém o criou do nada e de modo específico.
Bancroft diz que o mal é o que pode ser chamado de uma “originaçâo”.51
Ele é fruto do uso de coisas que já existiam, como por exemplo, o livre-
arbítrio, a personalidade e o poder de Satanás. Nesse sentido, Deus dotou
Satanás com essas qualidades e ele as usou para originar o mal. Isso é o
máximo que podemos dizer, é somente até onde podemos ir. Bavinck e
Berkouwer, por outro lado, dizem que o pecado não tem origem, mas só
um início.12 O que eles pretendem dizer com isso é que não podemos de
terminar a origem do pecado e do mal, apenas constatar o seu início. Mui
tos apelam para a expressão de Isaías, em que Deus diz: “Eu formo a luz e
crio as trevas; faço a paz e crio o mal; eu, o S e n h o r , faço todas estas coisas”
(Is 45.7), como uma prova de que Deus é o autor do mal. O contexto da
passagem em questão sugere que esse mal não se refere ao mal último,
metafísico, mas a uma situação específica, que, no caso dos judeus, seria a
vinda dos caldeus contra a nação. Nessa passagem, o mal se refere mais a
algo como a calamidade, e não ao pecado. O fato de a Escritura não dar
explicação direta sobre a origem do mal, mas por outro lado mostrar o
papel do mal, é uma indicação de que este último deve ser o foco da nossa
atenção. A origem do mal sempre será uma incógnita para nós.
0 pr op ós ito do m a l
toda a eternidade, Deus, pelo muito sábio e santo conselho de sua própria
vontade, ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de
modo que nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade da
criatura, nem é tirada a liberdade ou contingência das causas secundárias,
antes estabelecidas” (III, 1). Essa talvez seja a afirmação mais precisa já
formulada sobre a origem de todas as coisas. Há uma tensão admitida na
frase, a de que, por um lado tudo acontece segundo a vontade de Deus, e
por outro, a de que isso não faz de Deus o autor do pecado, nem elimina a
liberdade do homem. A única responsabilidade pelo mal que pode ser atri
buída a Deus é que ele criou um mundo no qual o mal era possível, e isso
para demonstrar a sua glória pelo fato de ele saber lidar com isso, e ao final
conduzir tudo para um fim bom.
A verdade é que a existência do mal segue os propósitos de Deus para
este mundo. Uma coisa precisa ficar clara: Deus não tem nenhum prazer
em Satanás e não compartilha de nenhuma de suas maldades, porém, Deus
pode usar Satanás para cumprir os seus propósitos. Não é que Satanás queira
gentilmente servir a Deus, na verdade, ele luta desesperadamente contra
Deus, mas tal é a soberania do criador, que Satanás, mesmo em sua luta
desesperada, acaba contribuindo para que o supremo propósito de Deus se
realize. Uma das maneiras em que Deus usa o mal é para testar o seu povo.
O teste é uma prova de qualidade. Qualquer produto, para que seja confiável,
precisa ser colocado sob alguma pressão a fim de que a sua resistência seja
confirmada. Os crentes recebem a pressão de Satanás e essa é uma boa
maneira de testá-los. Deus pode também usar Satanás como instrumento
de punição. Satanás é um instrumento de punição divina por causa da mal
dade do mundo, e até dos crentes. Há pelo menos dois casos na Bíblia em
que pessoas foram “entregues a Satanás” como um castigo por seus peca
dos, um crente e um incrédulo (ICo 5.5; lTm 1.20). Como diz Lorraine
Boettner,
As obras de Satanás são tão controladas e limitadas que elas servem aos
propósitos de Deus. Quando Satanás vorazmente deseja a destruição do
ímpio, e diligentemente trabalha para isso, ainda assim a destruição procede
de Deus. Em primeiro lugar é Deus quem decretou que o ímpio sofra, e
Satanás meramente recebe a permissão de trazer essa punição sobre ele. Os
motivos que estão por trás dos propósitos de Deus e aqueles que estão por
trás dos propósitos de Satanás são, é claro, infinitamente diferentes,13
sito. Deus permite a contínua existência de Satanás porque ele é de fato o seu
“chicote” para este mundo, porém, acima de tudo Deus o usará pessoalmen
te para demonstrar o seu poder. Deus fará uma grande demonstração do seu
poder sobre o maior inimigo quando o aprisionar definitivamente no lago de
fogo. Entretanto, Deus já está demonstrando o seu poder sobre Satanás hoje,
ao resgatar as vítimas do império das trevas e levá-las a salvo para o reino
celestial. Ainda podemos dizer que pelo fato de ter deixado que o mal se
originasse, Deus criou a oportunidade de expressar ainda mais plenamente a
sua graça e a sua misericórdia. Esse caráter gracioso e misericordioso de Deus
jamais teria sido demonstrado se o mal não tivesse se originado.
A d u ra çã o do m a l
O mal não é eterno, pois não faz parte da essência das coisas que exis
tem. O mal é um parasita, um impostor, e a certeza de sua existência é a
garantia da sua destruição. O fato de que Deus vencerá o mal torna a exis
tência dele razoável. Deus permitiu o mal para que o seu poder fosse testa
do, mas o mal não terá continuidade na criação de Deus. O mal cumpre um
papel estabelecido por Deus, e quando esse papel se acabar, Deus o elimi
nará e nunca mais permitirá que ele reapareça.
No mundo vindouro, o mal nunca mais será uma possibilidade. Os que
tentam explicar a existência do mal com base no livre-arbítrio não têm
resposta para a seguinte pergunta: O homem poderá novamente pecar? Se
o livre-arbítrio de fato faz parte da constituição humana, sendo essencial
para que o ser humano seja ser humano, não há garantias de nossa salvação
nesta vida e nem na vindoura. Nesta vida, a qualquer momento, podemos
perder a salvação por um ato deliberado da nossa vontade, e mesmo no
futuro, embora não tenhamos mais motivos para pecar, sempre teremos a
possibilidade de pecar, se o livre-arbítrio continuar existindo. Se alguém
quiser afirmar que no futuro o ser humano não terá mais livre-arbítrio,
poderia se perguntar então, por que ele deveria ter hoje? Se no mundo
vindouro não houver livre-arbítrio é porque ele não é tão essencial assim ao
ser humano. De fato não haverá livre-arbítrio no futuro, como não existe
hoje. Deus não permitiria que o mal pudesse de novo entrar na sua criação
e corrompê-la outra vez, pois, no mundo porvir, seus planos para o mundo
já se consumaram. Essa é uma certeza que podemos ter: “A morte já não
existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coi
sas passaram” (Ap 21.4).
0 enigma do mal 145
Na nossa luta contra o mal, seguir a Bíblia sempre será a melhor opção
para não termos surpresas desagradáveis. A atitude do cristão é descrita na
Bíblia como de resistência. Pedro diz: “Sede sóbrios e vigilantes. O diabo,
vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge procurando al
guém para devorar; resisti-lhe firmes na fé, certos de que sofrimentos iguais
aos vossos estão se cumprindo na vossa irmandade espalhada pelo mun
do” (IPe 5.8.9). Tiago compartilha dessa opinião: “Sujeitai-vos, portanto, a
Deus; mas resisti ao diabo, e ele fugirá de vós” (Tg 4.7). Também essa é a
grande explicação de Paulo: “Portanto, tomai toda a armadura de Deus,
para que possais resistir no dia mau e, depois de terdes vencido tudo, per
manecer inabaláveis” (Ef 6.13). Não precisamos ir atrás dele, precisamos
resistir aos ataques dele. Resistência é a palavra de ordem.
11
Criação ou evolução?
Dias ou eras?
Dado o progresso da ciência atualmente, algumas questões importantes
que têm surgido são: Qual é a idade da terra? Quanto tempo Deus levou
para criar o universo?
A primeira consideração que precisa ser feita é que calcular a idade da
terra, a partir de elementos bíblicos, é impossível. Embora um Arcebispo
chamado James Ussher (1581-1656), há cerca de quatro séculos, tenha ten
tado provar que a criação aconteceu no ano 4004 a.G, tendo chegado a esse
Criação ou evolução? 153
número mediante a soma das genealogias relatadas na Bíblia, deve ser dito
que esse número é tão imaginário quanto qualquer outro. E um fato que a
Bíblia não se preocupa em dizer quantos anos a terra tem. Somar gerações
é algo inapropriado, pois não sabemos se a Bíblia cita todas as gerações.
Parece-nos que a Bíblia se preocupa apenas com as principais, como se
percebe da genealogia de Jesus em Mateus. Portanto, não há como dizer, à
luz da Bíblia, qual é a idade da terra,
Diante disso, será que as afirmações dos cientistas de que a terra tem
bilhões de anos é conclusiva? Novamente precisamos nos lembrar que a
ciência é muito limitada para definir coisas tão grandiosas, Nossa tecnolo
gia ainda é muito incipiente, e freqüentemente vemos novas “descobertas”
de cientistas contrariando antigas “descobertas” que, até então, eram tidas
como verdades absolutas. Aliás, algo axiomático na ciência é a sua condição
provisória (Popper). Um dos métodos mais conhecidos usados nos últimos
anos para se saber a idade de algum objeto é do Carbono 14, mas hoje esse
método é bastante questionado, inclusive por muitos cientistas evolucionistas.
Certamente, as gerações vindouras vão rejeitar a teoria da evolução e mui
tas das descobertas “científicas” da atualidade. Um pouco de ceticismo com
relação à ciência não faz mal a ninguém. Além disso, há muitos cientistas
que defendem que a terra tem milhares e não milhões de anos.
O livro do Gênesis diz que o cosmos foi criado em seis dias. Depois do
aparecimento da teoria da evolução, muitos teólogos readaptaram essa crença
a fim de harmonizá-la com a ciência. Uma das primeiras tentativas nesse
sentido foi apelar para o caráter poético do Gênesis. O primeiro capítulo
deixou de ser histórico para ser poético. Como um livro poético, então, os
detalhes não importam, mas sim a sua mensagem. Assim, dizem eles, não
devemos considerar os seis dias como literais, mas a mensagem subjacente,
que afirma ser Deus o criador, não importa em que época nem em quanto
tempo. Porém, considerar o livro do Gênesis como poético é fazer um
ataque muito sério à integridade da Escritura. Muitos conceitos bíblicos
comprovados pelo Novo Testamento se demonstrariam inexistentes. É
importante que se entenda que o Novo Testamento não vê o Gênesis como
um livro poético e sim histórico. Jesus fala de Adão e Eva como persona
gens históricos (Mt 19.3-5), bem como de Abraão, Isaque, Jacó, etc (Lc
13.28). Teria ele se enganado?
Um ataque ainda mais sério à integridade do relato bíblico da criação
veio com a descoberta de um hino babilónico. Nesse hino é destacada a
figura do deus Marduque, que vence o deus Tiamat (que é o oceano), divi
dindo o seu corpo e fazendo dele a terra e o céu.11 Por haver algumas
154 Razão da esperança
semelhanças entre essa história e o relato bíblico, o relato bíblico foi decla
rado como uma cópia daquele. Porém, as diferenças entre os relatos são
muito grandes.12 No relato bíblico não há uma luta de deuses, somente a
figura soberana de Deus aparece. Além disso, por que o hino babilónico
não pode ser uma cópia distorcida do relato bíblico? Ou mesmo ambos
resultados de tradições orais ou escritas que divergiram ao longo do curso
da História?13 Não há problemas em admitirmos que existem relatos ante
riores ao do Gênesis sobre a criação, porém, a inspiração do Espírito Santo
deu ao relato bíblico a certeza da verdade.
Há três teorias mais ou menos aceitas no meio cristão sobre a criação
que fazem com que os seis dias de Gênesis 1 se multipliquem bastante, ou
pelo menos que a semana da criação seja mais extensa. A primeira afirma
que cada dia da criação representa uma era. Baseados na passagem de 2
Pedro 3.8, que afirma que, para o Senhor, um dia é como mil anos, muitos
crentes entendem que cada dia da criação pode representar um longo pe
ríodo de tempo, algo como um “dia geológico”. Outra tese bem aceita por
muitos eruditos considera os dias como sendo de 24 horas, mas admitindo
espaços de tempo entre esses dias.14 Assim, Deus teria agido de maneira
criadora no primeiro dia, em seguida teria se passado um período de tem
po, e novamente Deus teria atuado de maneira criadora no segundo dia.
Entre um dia e outro poderiam ter se passado milhões de anos. Por fim,
podemos citar uma terceira tese, bem menos provável, que vê um longo
espaço de tempo entre os dois primeiros versículos do Gênesis. O primeiro
versículo diz: “No princípio criou Deus os céus e a terra”. O segundo ver
sículo diz: “A terra era sem forma e vazia”, Da primeira declaração para a
segunda haveria um lapso de tempo, talvez de milhões, ou até mesmo bi
lhões, de anos. Alguns inclusive defendem que houve uma pré-criação e
que na terra viviam os anjos (e talvez os dinossauros) e que, depois da
queda dos anjos, a terra tornou-se sem forma e vazia. A partir daí, Deus
teria começado a recriar a terra.15
Há dificuldades com todas essas posições, e, num certo sentido, todas
são especulações, porém não podemos afirmar categoricamente que elas
sejam improváveis. Mas deve ser dito que, para se fazer mais justiça ao ensi
no da Bíblia, precisamos dizer que a interpretação mais plausível é a de que o
mundo foi criado em seis dias literais, num espaço literal de seis dias. O fato
de o sétimo dia ser o de descanso corrobora essa tese, pois certamente esse
dia precisa set um dia literal. Além disso, a palavra “dia” que aparece na
passagem, geralmente tem, na Bíblia, a idéia de um dia de 24 horas, e não é
boa exegese interpretar de outro modo, a menos que o contexto o exija.
Criação ou evolução? 155
Além disso, cada um dos dias citados na criação tem uma tarde e uma
manhã. Fica difícil imaginar uma manhã que dura milhões de anos.
Uma outra explicação que poderia ser dada para a idade da terra é a que
leva em conta a aparência das coisas quando Deus as criou. Deus criou
Adão já um homem adulto. Deus não fez um bebê que cresceu até chegar à
maturidade. Se Adão, no momento em que foi criado, passasse por uma
análise biológica, quantos anos lhe seriam dados? Biologicamente talvez ele
tivesse 20, 30 ou 40. Cronologicamente, porém, tinha alguns segundos.
Quando os cientistas analisam uma pedra ou um fóssil, eles calculam a sua
idade em milhões de anos, mas essa poderia ser sua idade biológica; qual
seria a sua idade cronológica? Deus poderia ter feito a terra nova com idade
de velha. De qualquer modo, não precisamos de todas essas explicações. É
suficiente o fato de que o evolucionismo suscita mais problemas do que
oferece soluções.
Conclusão
Do mesmo modo que a declaração de independência de Adão não o
tornou independente de Deus, assim também a negação do ser humano
moderno não muda o fato de que Deus é o criador do ser humano e de
tudo o que existe. A igreja fará muito bem em continuar crendo em Deus
como o criador de todas as coisas. Não temos resposta para tudo, porém,
não há argumentos suficientes para que essa crença seja modificada. Pensar
que o mundo se originou de um processo evolutivo levanta mais questões
sem solução do que afirmar que Deus foi o seu criador. No final das contas,
mesmo os evolucionistas necessitam de um criador. Portanto, a mensagem
bíblica da criação continua atual e altamente satisfatória para o mundo
moderno, pois não há explicação melhor. O criacionismo é mais racional
do que as teorias científicas. Ser criacionista é a melhor opção.
12
Voltando ao início:
A criação do homem
M a rca registrada
Gênesis 1.26-31 é uma das passagens mais conhecidas da Escritura. E a
narrativa histórica do sexto dia da criação, quando Deus criou o ser huma-
158 Razão da esperança
no. Até então, Deus já havia criado todas as outras coisas, mas somente a
respeito do homem ele disse, “façamos o homem à nossa imagem e seme
lhança”. Hoekema expõe essa questão da seguinte maneira: “Deve-se notar
também que a criação do homem foi precedida por uma deliberação ou
conselho divino: ‘Façamos o homem...’ Isso demonstra novamente a idéia
da singularidade da criação do homem. Esse conselho divino não é men
cionado com relação a nenhuma outra criatura”.2 Como diz Bavinck:
Quando Deus terminou a obra da criação, que incluía o homem, viu que
tudo “era muito bom” (Gn 1.31). Ou seja, Deus não viu qualquer defeito
moral no homem, porque de fato não havia. Havia justiça, santidade e pie
dade em todas as atitudes. Tudo o que o homem fizesse, seria parte da
adoração a Deus. Planejar o futuro, nomear os animais, dar à luz filhos,
construir cidades, escrever músicas, praticar esportes, refletir sobre o signi
ficado de cada coisa, etc., tudo deveria estar centrado em Deus. Além de
perfeição moral, Adão e Eva foram dotados da mesma criatividade do seu
criador. Deus imaginou um mundo perfeito e o trouxe a existência. Ele
criou o mundo do nada (ex nihilo), com tantas variedades de tons, cores e
formatos quantas se poderiam imaginar. Ele criou tanto o mundo macro
como o micro em todos os seus detalhes de forma, tamanho, cor e função.
O plano de Deus era que a humanidade se tornasse imitadora dele nesse
Voltando ao início: A criação do homem 159
sentido. É claro que o homem não poderia criar coisa alguma “do nada”,
mas como foi feito à imagem de Deus, poderia refletir a criativa imaginação
do criador em singular e impressionante imitação. Aprendemos isso do
texto de Gênesis. Deus disse: “Façamos o homem à nossa imagem, confor
me a nossa semelhança; tenha ele domínio...” (Gn 1.26). Observe a expres
são “domínio”. Dominar é algo próprio de Deus, mas o homem que foi
criado à imagem divina também tinha a função de dominar, numa clara
imitação de Deus. Uma das primeiras funções do homem foi dar nome aos
animais (Gn 2.19,20).4 Deus estava estimulando a criatividade do ser hu
mano. Deus queria um imitador seu, mas que tivesse qualidades originais.
Van Groningen diz que “Deus trouxe a humanidade para sua família real.
Ele não lhes concedeu sua deidade; ele os dotou com o privilégio e a res
ponsabilidade de serem cotrabalhadores com ele nas tarefas reais a serem
executadas na criação”.5
Aspectos da i m a g e m Divina
Dicotomia o u tricotomia?
Uma das características mais marcantes do ser humano que foi feito à
imagem de Deus é a sua natureza, que é composta de corpo e alma. Essa é a
visão dicotômica do homem. Mas há muitos que sustentam uma tricotomia,
insistindo que o ser humano é composto de alma, corpo e espírito. A
tricotomia originou-se com os gregos, especialmente Platão. A alma seria o
meio de ligação entre o corpo e a mente (noui)? Entre os cristãos, Irineu
ensinava que, enquanto os incrédulos têm apenas corpo e alma, o crente tem
alma, corpo e espírito, este último criado pelo Espírito Santo. Há duas passa
gens na Escritura que sugerem uma divisão tripartida do homem. Uma delas
é ITessalonicenses 5.23: “O mesmo Deus da paz vos santifique em tudo; e o
vosso espírito, alma e corpo sejam conservados íntegros e irrepreensíveis na
vinda de nos;,o Senhor Jesus Cristo”. A outra é Hebreus 4.12: “Porque a
palavra de Deuü é viva, e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de
dois gumes, e penetra até a ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas,
e é apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração”. Porém, a
dicotomia é mais amplamente defendida pela Bíblia, o que nos leva a pensar
que as passagens acima não estejam ensinando uma divisão tripartida do ser
humano. Parece que Paulo está falando em termos gerais, tentando acumu
lar palavras para expressar a idéia de que o cristão como um todo será guar
dado até o fim.10 O autor aos Hebreus, por outro lado, está falando do poder
Voliando ao início: A criação do homem 161
que a Palavra tem de colocar certas coisas umas contra as outras dentro do
ser humano, Ele não está falando em termos literais, mas enfatizando que a
Palavra penetra nos recônditos mais interiores do nosso ser, trazendo à luz
as razões secretas das nossas ações.11 Como diz Kistemaker, “o escritor re
corre ao simbolismo para dizer que, o que o homem habitualmente não
pode dividir, a Palavra de Deus separa completamente”.12 A dicotomia é a
visão mais bíblica, pois a Bíblia usa indistintamente as palavras alma e espíri
to (Mt 10.28; ICo 7.34; Tg 2.26). Os mesmos sentimentos são atribuídos à
alma e ao espírito (ISm 1.10; Is 54.6; Jo 12.27; 13.21; At 17.16; 2Pe 2.8). O
louvor e o amor de Deus são atribuídos tanto à alma quanto ao espírito (Lc
1.46-47; Mc 12.30). A salvação é associada tanto à alma quanto ao espírito
(Tg 1.21; ICo 5.3,5). A morte é descrita igualmente como a partida da alma
e do espírito (Gn 35.18; lRs 17.21; Mt 10.28; SI 31.5; Mt 27.50; Lc 8.55; Lc
23.46; At 7.59). Os mortos ora são chamados de “almas” ora de “espíritos”
(Mt 10.28; Ap 6.9; Hb 12.23).13 Parece mais certo, portanto, dizer que o ser
humano é composto de corpo e alma. Porém, devemos evitar tratar dessas
coisas como se elas fossem separadas. O ser humano deve ser considerado
como um todo indivisível. Isso não significa que a alma seja mais valiosa do
que o corpo, como pretendia Platão e os gregos. O corpo e a alma possuem
o mesmo valor, e ambos decaíram em Adão e precisam ser redimidos. Por
essa razão, a Bíblia enfatiza a ressurreição. Não basta ao homem estar em
espírito junto de Deus depois da morte; para ser completo, ele precisará ter
de novo o seu corpo e, assim, com corpo e alma restaurados, o ser humano
viverá feliz para sempre...
A d i gn id a d e do ser h u m a n o
Do que foi dito até agora, já dá para perceber que a criação é a chave
para entender o ser humano, Quando pensamos em redenção, precisamos
limitá-la a um certo número de pessoas, pois ela se limita ao número daque
les a quem Deus, no curso da História, moveu e chamou para si mesmo.
Porém, quando pensamos na criação, precisamos incluir tanto cristãos como
não-cristãos, pois todos são criaturas de Deus. Isso quer dizer que todos
são feitos à imagem e semelhança divina. Não é que o ser humano possua
a imagem divina, ele é essa própria imagem.14 Essa é uma das coisas de que
freqüentemente esquecemos. A universalidade da criação que colocou a
imagem divina em todos os seres humanos implica que o nosso próximo,
seja ele o mais obstinado ateu ou a mais dedicada anciã da igreja, foi feito
igualmente à imagem de Deus. Isso é um resultado da criação e não da
162 Razão da esperança
Quem é o ser h u m a n o ?
Nada melhor para entender o ser humano do que ouvir o que o seu
criador tem para dizer a respeito dele. Quando não entendemos uma obra
de arte, a melhor coisa é pedir informações a quem a fez. A Escritura nos
ensina o que o criador tem a dizer sobre o ser humano. No Salmo 8 há uma
pergunta que o ser humano tem tentado responder desde o começo do
mundo. Ela diz respeito à identidade e à razão de existir da humanidade. O
salmista pergunta: “Quando contemplo os teus céus, obra dos teus dedos, e
a lua e as estrelas que estabeleceste, que é o homem, que dele te lembres? E
o filho do homem, que o visites?” (SI 8.3,4). O que é o homem? O mundo
tem oferecido muitas respostas, mas todas têm se demonstrado insatisfatórias
na medida em que elas analisam o ser humano como se ele fosse indepen
dente de Deus. O Salmo 8 não faz isso. Ele analisa o homem em sua relação
com o criador. E esse é o único modo confiável para se entender realmente
quem ou o que é o ser humano.
za da criação. O autor, Davi, muito antes de ser rei em Israel, era pastor de
ovelhas nas regiões montanhosas de Belém. E, como pastor, ele muitas
noites dormiu ao relento, tendo apenas o céu estrelado como cobertura.
Lá, no céu límpido do Oriente, Davi podia contemplar a lua e as estrelas
criadas por Deus, e se admirar diante da grandeza das obras do criador. A
pessoa que já teve a oportunidade de deitar-se numa bela noite estrelada ao
ar livre e contemplar o céu, sabe da sensação de pequenez que toma conta
dela diante da imensidão que os olhos tentam inutilmente captar. Provavel
mente pensando nisso, Davi se perguntou: “Que é o homem?” Diante da
imensidão das coisas que foram criadas, o homem é insignificante. E quan
to mais o ser humano progride no seu conhecimento da criação, mais mo
tivo tem para sentir-se pequenino. Com todas as descobertas científicas que
nos ensinam sobre a imensidão das galáxias e das estrelas incontáveis, bem
como de tudo quanto se esconde dentro do tamanho minúsculo de uma
simples célula, o senso de nossa insignificância diante do todo se acentua.
Porém, o motivo maior que torna o homem insignificante não é a
grandeza da criação, mas a grandeza do seu criador. Esta criação tão grande
e majestosa possui um criador ainda maior e muito mais majestoso. Aquele
que criou todas as estrelas dos céus e é o criador do próprio ser humano
é o único realmente grandioso, e diante dele as pessoas não passam de
sombras.
A gra nd ez a h u m a n a
A partir do versículo 5, entretanto, parece que o autor começa a desdi
zer tudo o que havia dito. Ele passa a falar o quanto o homem é grande e
importante. Porém, se atentarmos cuidadosamente, veremos que não há
contradição alguma. O Salmo nos mostra duas verdades com respeito ao
ser humano. Por um lado, a sua insignificância diante de Deus e de tudo o
que ele é e faz. Por outro, a sua grandeza, por ter sido feito à imagem de
Deus e por ter recebido uma função de suma importância das mãos do
próprio Deus. O salmista diz: “Fizeste-o, no entanto, por um pouco, menor
do que Deus e de glória e de honra o coroaste” (SI 8.5). A maior de todas as
qualidades do ser humano é ser criatura de Deus, feito à sua imagem. Isso
não quer dizer que o homem seja divino, mas antes, que ele foi criado para
refletir perfeitamente o caráter de Deus. Com a queda no pecado, essa ima
gem ficou distorcida, mas não deixou de existir.
O salmista continua: “Deste-lhe domínio sobre as obras da tua mão e
sob seus pés tudo lhe puseste” (SI 8.6). Quando Deus criou o homem,
164 Razão da esperança
determinou que ele tivesse domínio sobre todas as coisas criadas, referin
do-se principalmente ao reino animal e vegetal. O homem deveria ser o
administrador de Deus neste mundo. Nem é preciso dizer que essa função
satisfazia plenamente tanto a Deus, que se deleitava em seu “administra
dor”, quanto ao próprio homem, que se sentia útil e totalmente integrado
com a obra de Deus. Deus criou o homem com a função de representá-lo
perante a criação, e nisso está a grande dignidade do ser humano. A criação,
portanto, dá toda dignidade ao homem. O homem somente tem importân
cia porque Deus existe, e porque ele tem um plano para o homem. Somen
te quando o ser humano reconhece a sua pequenez diante de Deus, e reco
nhece que Deus é gracioso por se relacionar com ele, é que ele vai se sentir
humano de verdade. O humanismo moderno ou antigo é anti-humano,
porque sempre tentou fazer do homem o que ele não é e nem foi planejado
para ser. A Bíblia é um livro humanista no verdadeiro sentido da palavra,
pois coloca o ser humano no seu verdadeiro lugar: criatura de Deus, criado
para o louvor de Deus, e importante por causa disso. O ser humano não é
o centro do universo, Deus é. O homem não se sentirá satisfeito enquanto
ele quiser ser mais do que é. Ele nunca se realizará tentando ocupar o lugar
que é de Deus.
E interessante que, na estrutura da Reforma, nunca sobrou espaço para
glorificar o homem, pois toda a glória devia ser rendida a Deus. A Reforma
pôde proclamar Soli Deo Gloria porque mais do que ninguém ela entendeu o
ser humano. Quando temos uma visão melhor de nós mesmos e de Deus,
diminuímos a nossa importância e aumentamos a dele. É interessante que a
Reforma tenha produzido uma era de grandes pensadores e artistas, mas
ela nunca exaltou o ser humano, antes prostrou o orgulho humano diante
da majestade de Deus. Mas hoje as coisas estão muito mudadas. O ser hu
mano é exaltado e Deus diminuído. Nossos cultos e serviços são freqüente
mente celebrações de nós mesmos mais do que de Deus, há mais entreteni
mento neles do que adoração. Nunca antes, nem mesmo na era medieval,
os cristãos tinham sido tão obsessivos a respeito de si mesmos. Nunca
antes Deus foi tão totalmente esquecido. Gastamos a maior parte do tem
po, como Narciso, contemplando a nossa própria imagem distorcida na
água. Desse modo, o ser humano jamais será entendido, pois fomos criados
à imagem de Deus, mas como a nossa própria imagem foi distorcida pelo
pecado, o melhor modo para nos entendermos é olhar, não para nós mes
mos, mas para o criador, em quem não há qualquer distorsão.
Voltando ao início: A criação do homem 165
0 propósito da criação
Uma teoria popular diz que Deus nos criou porque se sentia sozinho,
porém seria algo inacreditável imaginar que Deus precisasse dos seres hu
manos para preencher um vazio no seu ser. E o homem que possui esse
vazio em decorrência da queda. Como poderia a divina Trindade se sentir
só em meio a milhões e milhões de anjos? Mas mesmo os anjos nunca
foram a base da comunhão trinitária. A Trindade basta a si mesma, pois há
um perfeito relacionamento de amor nela. Não é Deus quem está sozinho
sem o ser humano, é o ser humano quem está sozinho sem Deus.
Uma outra teoria diz que Deus criou os seres humanos porque ele que
ria ter alguém que o amasse de livre vontade. Essa teoria diz que os anjos
amavam a Deus não por livre vontade, mas por compulsão. Isso é dar de
masiado crédito ao ser humano. Além disso, como então boa parte dos
anjos se rebelou contra Deus? (Ver 2Pe 2.4; Jd 6; Ap 12.7).
Alguém pode pensar que esta discussão não tenha muita importância,
mas dela depende a nossa visão da criação e do próprio ser humano. Afinal,
a criação está centrada no ser humano ou está centrada em Deus? Deus
existe para o nosso propósito ou nós existimos para o propósito dele? A
resposta bíblica é que nós existimos por causa dele, para o louvor da sua
glória (Ef 1.6). A Escritura diz que Deus tem prazer nas suas obras. O
Salmo 104 diz: “A glória do Senhor seja para sempre! Exulte o Senhor por
suas obras!” (v. 31). Como o artista se alegra com a sua obra-prima, assim
Deus se alegra com as coisas que criou. Ou seja, todas as coisas existem por
causa dele e não por nossa causa. “Qual é o fim principal do homem?” Essa
é a pergunta número 1 do Breve Catecismo de Westminster, e a resposta é:
“Glorificar a Deus e gozá-lo para sempre”. Existimos para glorificá-lo e
para nos alegrarmos nele. Deus nos criou para ter prazer em nós, e nós, do
mesmo modo, devemos ter prazer nele. E por isso que nos foram dados os
prazeres terrestres. Eles servem para elevar os nossos sentidos para a ver
dadeira alegria nele. Isso significa que a nossa busca por prazeres foi calcu
lada para ser algo como uma motivação para uma busca de Deus. Imagine
a implicação desse tipo de pensamento. Por que será que Israel tinha tantas
festas no seu calendário litúrgico? Pense na história do Deus-homem, que
não somente viu uma bênção na união de um homem e de uma mulher,
mas até mesmo providenciou um milagre a fim de que houvesse vinho para
celebrar aquela ocasião (Jo 2.1-11). Talvez você questione: “Mas nós não
somos ensinados a abandonar o mundo e os seus prazeres”? De fato a
Razão da esperança
BíbHa ensina isso, mas é justamente porque a queda deturpou toda a ordem
da vida. Na verdade, o que estamos querendo afirmar é que o mundo em si
não é o problema, nem mesmo a humanidade em si e os seus prazeres. O
problema é a rebelião do mundo e da humanidade contra o seu criador. Um
antigo culto, conhecido como maniqueísmo, que foi grandemente influen
ciado pelo gnosticismo, afirmava que toda matéria era má e que somente o
espírito era puro. Desse modo, o corpo, a inteligência e os apetites carnais
eram inerentemente demoníacos. Contra isso, o calvinismo afirmou que
toda a depravação, ou os pecados que surgem dela, não se levantam da
natureza, mas da corrupção desta natureza. Portanto, não são naturais, mas
completamente anormais. O problema não é a matéria, mas o pecado. Pre
cisamos considerar o propósito da nossa criação como centrado em Deus.
Ele nos fez para o louvor da sua glória. Somente quando entendemos isso
é que podemos compreender o significado por trás do trabalho e do lazer,
do prazer e da restrição, da vida e da morte, do riso e do temor. A criação
mostra que Deus tem um imenso propósito para a vida de cada ser humano
que é chamado para ser um imitador de Deus.
M a n d a t o espiritual
M a n d a t o social
O aspecto espiritual, visto acima precisava transbordar para todos os
demais aspectos da vida humana, especialmente para o próximo relaciona
mento que Deus instituiu: o relacionamento familiar, que também é cha
mado de Mandato Social.
Mais do que um mandato, a responsabilidade social do homem é uma
bênção de Deus para a sua vida. Veja o que diz a Bíblia: “Criou Deus, pois,
o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os
criou. E Deus os abençoou e lhes disse: sede fecundos, multiplicai-vos,
enchei a terra....” (Gn 1.27,28). Deus lhes deu a bênção de serem fecundos,
de poderem se multiplicar e povoar a terra, também a fim de dominá-la.
Portanto, o mandato social de constituir família, de ter filhos e educá-los no
caminho do Senhor é uma grande bênção para a vida das pessoas. Deus
deu ao homem a bênção do companheirismo. Deus percebeu que não era
bom para o homem permanecer só, e por isso, fez-lhe uma auxiliadora
idônea que o completasse como nenhuma outra criatura poderia fazer (Gn
168 R am o da esperança
M a n d a t o cultural
Im plicações da criação
Há muitas implicações da doutrina da criação, e agora podemos apre
sentar algumas.20 Primeiramente, ela implica respeito pelo semelhante; não
importa se o nosso próximo é um cristão ou não, ele merece respeito. Além
disso, ela implica que tenhamos relacionamentos comuns com não-cristãos
em praticamente todas as esferas da nossa vida; podemos construir carros
juntos, participar de assembléias ou de concílios escolares sem ser adversá
rios, pois de fato a vida civil encontra a sua origem na criação mais que na
redenção. E uma vergonha, para nós evangélicos, que sejam os não-cristãos
que lideram as campanhas contra o aborto, contra a destruição da natureza,
contra as drogas ou contra a Aids. Será que essas funções não deveriam ser
nossas também? Quanto mais nós nos apegarmos à doutrina da criação,
mais seriamente tomaremos a nossa responsabilidade social.
A doutrina da criação também implica alegria no trabalho. A idéia popu
lar é que devemos trabalhar durante a semana para desfrutar do fim de
semana. Porém, Deus estabeleceu o trabalho antes da queda para que ele
fosse santo, algo como um culto a Deus, uma atividade criativa (no sentido
de usar criatividade) como a do próprio Deus. A doutrina da criação nos
manda ter alegria em nosso trabalho, considerando-o algo positivo, louvá
vel e de grande importância. Não faz diferença se alguém é um engenheiro,
um físico nuclear, uma doméstica ou um gari. O trabalho deve ser conside
rado como um chamado de Deus, e todos devem buscar se alegrar nele e
glorificar a Deus, colocando em prática a criatividade da qual Deus os do
tou. Isso significa que um bom cristão deve ser necessariamente um bom
profissional e um bom integrante da família. Se algum desses aspectos fa
lhar, todos falharão.
Finalmente, ela implica que temos o verdadeiro sentido da vida. E so
mente quando entramos em contato com o eterno que o significado desta
vida pode ser adequadamente compreendido. De acordo com a ideologia
científica, não há perspectiva eterna, e por isso tudo é permitido. Porém, a
Escritura nos explica o significado de cada ação diária como fazendo parte
de uma longa trajetória. Numa perspectiva de longo prazo, tudo faz senti
do. Cada cabelo está contado, cada palavra terá que ser explicada, e cada ato
será avaliado. A imagem divina em nós e no próximo deve nortear o nosso
comportamento e acentuar a nossa responsabilidade. A doutrina da criação
nos mostra que é maravilhoso ser humano.
13
Providência:
0 Deus que trabalha
E, quanto a vós outros, até os cabelos todos da cabeça estão contados” (Mt
10.29,30). Se Deus cuida até dos passarinhos, alimentando-os e sustentan
do-os durante toda a vida deles, se Deus sabe até o número de cabelos que
temos na cabeça, então é porque o seu envolvimento com as coisas criadas,
das menores até as maiores, é total.
Diante dessas coisas, como alguém pode crer no acaso ou na sorte? A
conclusão lógica do tema discutido é que não existe algo como a “sorte”, o
“acaso”, ou o “destino”. Ninguém tem a “sorte” de estar vivo, tudo acon
tece por obra da providência de Deus. O próprio envolvimento de Deus
com a criação exclui a possibilidade do panteísmo. Deus não está mistura
do com a criação, ele é separado dela, mas cuida dela até nos mínimos
detalhes. Do mesmo modo, imaginar um Deus que criou o mundo, mas o
abandonou à sua própria sorte é algo absurdo, pois segundo a Bíblia, a
providência de Deus é a causa de o mundo ainda existir. E quanta miseri
córdia há nisso, pois o mundo é rebelde contra Deus; não obstante, Deus o
preserva, fazendo nascer o sol sobre “maus e bons”, e cair “chuvas sobre
justos e injustos” (Mt 5.45). Só o louvor cabe a Deus pela grandiosidade de
sua obra providencial, como faz o salmista: “Cantai ao Senhor com ações
de graças; entoai louvores, ao som da harpa, ao nosso Deus, que cobre de
nuvens os céus, prepara a chuva para a terra, faz brotar nos montes a erva
e dá o alimento aos animais e aos filhos dos corvos, quando clamam” (SI
147.7-9). A providência mostra o cuidado divino com a criação.
0 co n c u r s u s e os atos b o n s ó
Nunca conseguiremos excluir Deus de qualquer coisa que fazemos em
nossa vida. Precisamos nos lembrar que Paulo disse que “nele vivemos, e
nos movemos, e existimos” (At 17.28). Jamais o homem age de maneira
independente de Deus; por isso, todas as boas ações que os crentes prati
cam, são ações que Deus direcionou. Já vimos que, segundo Filipenses 2.13,
Deus opera tanto o querer quanto o realizar para que uma obra seja concre
tizada. O que isso quer dizer é que, se eu faço alguma boa ação, o mérito é do
Senhor. Quem realizou a obra foi eu, mas ela só foi possível porque o Se
nhor me capacitou. E o que Paulo diz sobre o seu próprio trabalho apostó
lico: “Mas, pela graça de Deus, sou o que sou; e a sua graça, que me foi
Providência: 0 Deus que trabalha 177
concedida, não se tornou vã; antes, trabalhei muito mais do que todos eles;
todavia, não eu, mas a graça de Deus comigo” (ICo 15.10). Paulo tinha cons
ciência de duas coisas: da graça de Deus e do seu trabalho árduo. Mas, acima
de tudo, ele sabia que tudo era pela graça. Ele tinha mais resultados do que
os outros apóstolos, e, numa primeira instância, poderia ser dito que foi
porque ele trabalhou mais, mas ele reconhece que tudo acontecia pela graça
de Deus. Assim, tudo o que um crente faz de bom sofre a ação do concursus.
O interessante é que isso pode ser visto também nas boas ações das
pessoas não-regeneradas. Elas também fazem coisas boas, mas evidente
mente que não no sentido de aceitáveis para a salvação, porém boas porque
podem ter resultados benéficos para as pessoas. Podemos ver, na Bíblia,
que mesmo essas ações sofrem o concursus. Ciro, o rei da Pérsia, é um grande
exemplo disso. Isaías escreve algo muito interessante a seu respeito: “Assim
diz o Senhor ao seu ungido, a Ciro, a quem tomo pela mão direita (...). Eu
irei adiante de ti, endireitarei os caminhos tortuosos, quebrarei as portas de
bronze e despedaçarei as trancas de ferro” (Is 45.1,2). Deus está dizendo
que age na vida de Ciro para o ajudar. Em seguida, ele expõe o motivo: “Por
amor do meu servo Jacó e de Israel, meu escolhido, eu te chamei pelo teu
nome e te pus o sobrenome, ainda que não me conheces” (Is 45.4). Deus
usou o imperador Ciro por amor do seu povo, ainda que Ciro não conhe
cesse ao Senhor. Ciro foi usado para que o povo pudesse voltar do cativeiro
da Babilônia para a sua própria terra. O imperador foi o responsável pela
ordem que permitiu a volta do povo, e essa foi uma boa ação, mas ele não
fez isso pensando em agradar a Deus; na verdade, ele estava fazendo uma
manobra política, porém, acima de tudo, estava cumprindo a vontade
decretiva de Deus. Ciro agiu em conformidade com seus próprios interes
ses, mas acabou fazendo algo benéfico para o povo, e nisso ele foi dirigido
por Deus, que agiu na vida de Ciro. Foi uma obra boa de um homem mau,
uma obra realizada por meio do concursus.
Todas as boas ações deste mundo sofrem a ação do concursus de Deus.
Tudo o que acontece de bom, acontece porque duas coisas participaram: a
vontade do homem e a vontade de Deus. Na sua soberania, Deus não anula
a vontade do homem, mas a vontade do homem em hipótese alguma
inviabiliza a vontade de Deus.
0 c o n cu rsu s c os atos m a u s
Não é difícil ver a atuação de Deus nas atitudes boas dos homens, afinal
de contas Deus é bom e é a fonte de todo bem, mas e com relação às coisas
178 Razão da esperança
más que acontecem? Uma das coisas mais difíceis é conciliar a vontade
soberana de Deus com os atos maus das pessoas. Um modo de responder
a essa questão é dizer simplesmente que Deus permite que as pessoas fa
çam coisas más. Em parte, essa resposta está certa, mas as atitudes más dos
homens são permitidas por Deus embora elas firam a sua vontade preceptiva.
Porém, como já estudamos, a vontade preceptiva é apenas um aspecto da
vontade de Deus. Nunca poderemos nos esquecer que ele também tem
uma vontade decretiva. A questão é: Como os atos maus dos homens se
relacionam com os decretos de Deus?
Na Bíblia, podemos ver alguns casos que mostram que mesmo os atos
maus das pessoas não foram feitos independentes de Deus. O concursus pode
ser visto nessas atitudes também. Na sua vontade decretiva, Deus determi
nou tudo o que deve acontecer, inclusive os atos maus dos homens, porém
isso não faz de Deus o autor do pecado deles. Embora certas coisas ruins
estejam decretadas, os homens as fazem de sua própria vontade, e a culpa é
somente deles, porque desejaram fazê-las. Ninguém os obrigou.
A história de José do Egito é novamente útil para entendermos isso.
José era o filho preferido de Jacó e seus irmãos tinham ciúmes dele. Num
certo dia, eles aproveitaram uma ocasião e o venderam a alguns mercadores
que iam para o Egito. Esse foi um ato muito mau da parte dos irmãos. José
enfrentou muitos problemas por causa disso, vindo a tornar-se um escravo
no Egito, e por fim, parou na prisão. Porém, o Senhor agiu na vida de José,
que acabou chegando ao cargo mais importante do Egito logo abaixo de
Faraó. Com isso, anos mais tarde, José pôde ajudar a sua família que passa
va por dificuldades com a grande seca. Quando se encontrou novamente
com seus irmãos, José disse a eles: “Vós, na verdade, intentastes o mal
contra mim; porém Deus o tornou em bem, para fazer, como vedes agora,
que se conserve muita gente em vida” (Gn 50.20). Tal foi o entendimento
de José daquela situação que até mesmo declarou: “Não fostes vós que me
enviastes para cá, e, sim, Deus, que me pôs por pai de Faraó, e senhor de
toda a sua casa” (Gn 45.8). O ato de vender José foi uma ação má dos
irmãos, e eles foram responsáveis por ela. Eles agiram segundo os seus
impulsos pecaminosos, porém, a Bíblia diz que, em última instância, Deus
havia planejado tudo. Deus não foi o autor do pecado dos irmãos, mas agiu
na vida deles, para que o seu propósito maior se cumprisse. Eles fizeram o
que desejavam, pecaram e se tornaram passíveis de punição, mas não deixa
ram de fazer o que Deus desejava. Embora isso não seja fácil de entender,
precisa ser aceito pela fé, pois Deus quis que os irmãos vendessem José,
mas, o pecado foi somente deles, uma vez que ao agir daquele modo, eles
Providência: 0 Deus que trabalha 179
não estavam obedecendo a uma ordem direta de Deus, e sim fazendo a sua
própria vontade pessoal.
Deus atua até mesmo nos atos maus dos próprios homens maus. Sem
pre imaginamos os irmãos de José como membros da aliança, e por isso
não os consideramos ímpios. Mas quando vemos o que a Bíblia fala sobre
o caso de Nabucodonosor, o ímpio rei da Babilônia, percebemos que a
soberania divina não tem limites. Nabocodonosor invadiu Judá e cometeu
todo tipo de atrocidades, porém, a Bíblia diz que Deus é quem o havia
levado e determinado que fizesse aquilo (Jr 25.9-11). Nabucodonosor agiu
em conformidade com a sua iniqüidade, ele queria saciar a sua sede de
conquistas, entretanto, Deus determinou que aquilo acontecesse, tendo usado
a Babilônia, império de Nabucodonosor, segundo os seus propósitos. Deus
declarou a respeito de Babilônia: “Tu, Babilônia, eras meu martelo e mi
nhas armas de guerra; por meio de ti, despedacei nações e destruí reis; por
meio de ti, despedacei o cavalo e o seu cavaleiro; despedacei o carro e o seu
cocheiro; por meio de ti, despedacei o homem e a mulher, despedacei o
velho e o moço, despedacei o jovem e a virgem; por meio de ti, despedacei
o pastor e o seu rebanho, despedacei o lavrador e a sua junta de bois, despe
dacei governadores e vice-reis” (Jr 51.20-23). Deus disse que ele havia feito
toda aquela destruição, porém a Babilônia pagaria, pois havia agido confor
me ela própria desejava: “Pagarei, ante os vossos próprios olhos, à Babilô
nia e a todos os moradores da Caldéia toda a maldade que fizeram em Sião,
diz o Senhor” (Jr 51.24). Babilônia agiu conforme a sua cobiça e deu vazão
à sua própria maldade, entretanto, em última análise, agiu como Deus havia
determinado. Ao mesmo tempo, Babilônia e seu imperador seriam castiga
dos por Deus por causa disso.
Muitos outros casos podem ser considerados e demonstram o concursus
nos atos maus de homens maus, como por exemplo, o caso de Jeroboão
(lR s 14.10; 15.27-30); de Roboão (lRs 12.13-15; 22-24); do rei da Assíria
(Is 10.5-15); de Absalão (2Sm 16.20-23; 12.11,12; 17.14) e de tantos outros
casos que demonstram o mesmo que aconteceu com Nabucodonosor.7Em
todos eles, os homens ímpios agiram conforme os seus desejos pecamino
sos e são culpados por isso, porém, ao agir daquela maneira, estavam fazen
do o que a vontade decretiva de Deus havia determinado, pois estavam
cumprindo propósitos divinos. De todos os casos, o de Judas, que já foi
tratado no capítulo a respeito da Soberania de Deus e da Responsabilidade
Humana, é o mais evidente. Judas cometeu o crime mais maligno de todos
os tempos: ele entregou o Senhor Jesus para ser morto. Mas Judas fez tudo
aquilo que Deus havia predeterminado (Lc 22.21-22). Entretanto, isto não
180 Razão da esperança
desculpa Judas, pois ele fez também aquilo que a sua própria vontade deter
minou. O ato mau de Judas colaborou para que o plano divino de salvar a
humanidade se consumasse. Mas o ato de Judas foi mau e de sua inteira
responsabilidade, ao passo que o propósito de Deus é sempre bom. Isso
nos leva a entender que tudo o que acontece neste mundo acontece debai
xo do olhar e do comando eficaz de Deus. Nada foge ao controle divino,
porém, tudo o que o homem faz, faz de acordo com a sua própria vontade.
O concursus nos ajuda a entender a maneira como Deus age neste mundo e
também como os homens agem. Há uma concorrência entre os dois, po
rém, não uma simples junção equivalente de forças, como se o homem
fizesse metade e Deus o resto. O fato é que Deus age no homem, levando-
o a fazer a Vontade Suprema, mas sem ferir a responsabilidade pessoal por
cada ato seu, e sem ser o autor do pecado deles. Percebemos, portanto, que
a Escritura ensina que Deus está no controle de tudo, e que até mesmo os
pecados dos homens estão no decreto de Deus. Porém, como observa
Hodge, “Esta providência universal de Deus é tudo o que a Bíblia ensina.
Em parte alguma ela tenta informar-nos como Deus governa todas as coi
sas, ou como seu controle eficaz pode conciliar-se com a eficiência das
causas secundárias’5.8 Resta, portanto, aceitar pela fé que de fato é assim,
ainda que não possamos conciliar tudo na nossa mente. Precisamos aceitar
porque esse é o ensino bíblico, e a Bíblia é a verdade.
Deus de milagres
jm j i« .
%i r W
te ficas em relatos de milagres. Não há um único povo que não tenha crença
em intervenções sobrenaturais. Todas as religiões do mundo exibem “pro
vas” de que milagres aconteceram dentro de seus arraiais, e alguns milagres
são supostamente comprovados cientificamente,2 Porém, será que milagres
realmente acontecem? Será que acontecimentos sobrenaturais realmente ocor
rem, ou não passam de mitos e lendas criados pela fértil imaginação das
pessoas que, desejosas de ver algo sobrenatural, exageram nos relatos? Será
que os diversos milagres registrados na Bíblia podem ser considerados verídi
cos? E será que ainda há milagres hoje como nos tempos bíblicos?
Definição de m ilagre
Atualmente, há uma banalização do termo milagre, a palavra perdeu o
sentido verdadeiro. Alguém acerta um objetivo difícil num jogo e ouve-se
a expressão: “Milagre”! Alguém escapa “por um triz” de algum acidente e
isso é chamado de milagre.3 Alguém acerta uma questão difícil numa pro
va e pensa que isso foi um milagre. Na verdade, esses acontecimentos não
são verdadeiros milagres porque podem ser explicados. E certo que, mui
tas vezes, eles são estranhos e não muito rotineiros, porém, são perfeita
mente explicáveis, pois ocorreram por causa da combinação de certos fa
tores. O milagre verdadeiro, porém, sempre será inexplicável da perspecti
va humana. Suas causas não podem estar na natureza ou na simples com
binação de elementos. O milagre é um acontecimento “sobrenatural”, o
que já indica que não pode ser comprovado ou produzido pela natureza.
Nesse senddo, o nascimento de um bebê, por exemplo, não é um milagre,
por mais que esse acontecimento seja grandioso, e até certo ponto, algo
que ultrapassa o entendimento humano. O nascimento de uma criança
pode ser explicado a partir das leis da concepção. Porém, o mesmo não se
pode dizer do nascimento de um bebê de um ventre estéril, pois não há
explicações para isso, a menos que algum tipo de tratamento o explique,
mas então, não seria milagre. E preciso entender que o milagre é um ato
extraordinário de Deus, e que “ele não difere do curso ordinário da nature
za porque requer que Deus exerça o seu poder de modo grandioso, mas
porque ele requer de Deus exerça o seu poder de um modo diferente”.4
Isso é muito importante, pois não significa que Deus precise usar mais do
seu poder para realizar um milagre, do que, por exemplo, fazer o sol apare
cer amanhã. Ambos os acontecimentos dependem da onipotência divina;
a diferença não está no poder, mas no propósito. Os milagres sempre são
Deus de milagres 185
realizados por Deus com algum propósito especial, daí a idéia de provi
dência especial. Hodge define milagre como “Um acontecimento no mun
do externo produzido pela eficiência imediata ou simples volição de Deus”.5
Ele usa essa definição para diferenciar o milagre dos demais atos providen
ciais de Deus, bem como das atuações do Espírito Santo na conversão de
uma pessoa.
Adotamos aqui, a definição de Young:
Explicações inaceitáveis
A explicação que muitos dão para certos milagres bíblicos elimina total
mente a idéia de milagre. Por exemplo, dizem que os israelitas atravessaram
o Mar Vermelho aproveitando um local de pântanos cheio de plantas acima
da água, sobre as quais passaram, em vez de terem atravessado o mar aber
to por Moisés. Em geral, as pessoas que tentam achar uma explicação “ra
cional” para os milagres são direcionadas por pressupostos anti-sobrenatu-
ralistas. Como elas têm dificuldade para aceitar que possam existir aconte
cimentos sobrenaturais, tentam explicar de outra maneira, mas acabam anu
lando a existência do milagre,7 O relato bíblico não dá o menor apoio a
essa idéia, pois diz que os israelitas atravessaram a pé enxuto (Ex 14.29), A
estrela de Belém é outro objeto de reinterpretação. Dizem que foi apenas
um brilho mais intenso de alguma estrela, uma combinação estelar, o plane
ta Vênus, ou o cometa Halley. E preciso que se diga que, se foi apenas isso,
então não aconteceu um milagre realmente. Porém, fica difícil manter essa
explicação diante da afirmação bíblica de que os magos seguiam a estrela,
que por fim parou sobre o local onde Jesus estava (Mt 2.1-9). Um outro
milagre que é reinterpretado é o da multiplicação dos pães e dos peixes 0o
6.1-14). E dito que não teria acontecido um milagre no sentido de algo
extraordinário, mas que, simplesmente o fato de o menino ter repartido o
seu pão e os seus peixes fez com que todos os demais tivessem sido desper
tados para repartir também o alimento que tinham escondido, de modo
que todos puderam se fartar. Essa é mais uma engenhosa explicação huma
na para um milagre divino, mas que é antibíblica e elimina a própria exis-
186 Razão da esperança
tência do milagre, pois “Um milagre que pode ser explicado cientificamen
te não é um milagre em absoluto”.8
Alguns estudiosos afirmam que os milagres são simples exceções da
natureza como a conhecemos. O que isso quer dizer é que se tivéssemos
um conhecimento mais completo da natureza, poderíamos explicá-los de
modo perfeitamente natural. Esse conceito é insustentável não só porque
prevê duas naturezas, bem como porque priva o milagre do seu caráter
excepcional.9 Novamente teríamos que dizer que, se esse fosse o caso, não
haveria milagre no sentido específico da palavra, porque haveria uma expli
cação natural para ele, embora não a conhecêssemos.
Sobrenatural
Necessários
Jesus se manifestou, uma das coisas que ficou bem clara era a sua atuação
miraculosa como comprovação de seu apostolado celestial. Desde o batis
mo, Jesus demonstrou a seus discípulos que eles veriam os céus abertos em
franca atuação, Os milagres de Jesus apontavam para o seu caráter; a idéia
era demonstrar que nele estava o poder sobre as enfermidades, sobre as
dificuldades e sobre a própria morte. Berkhof entende que o milagre está
intimamente ligado à existência do pecado. Ele diz: “A entrada do pecado
no mundo torna necessária a intervenção sobrenatural de Deus no curso
dos eventos, para a destruição do pecado e para a renovação da criação”,13
A síntese dessa idéia é que, como o pecado é algo sobrenatural, no sentido
de que aconteceu fora da naturalidade, Deus precisou agir também de ma
neira sobrenatural. Assim, os milagres seriam uma demonstração divina de
que Deus está agindo firmemente no mundo com propósitos redentores.
Isso se encaixa perfeitamente na definição de providência especial.
Obsessão p o r mila gr es
C onf ir m aç ão da palavra
palavra profética, e fazeis bem em atendê-la, como a uma candeia que bri
lha em lugar tenebroso, até que o dia clareie e a estrela da alva nasça em
vosso coração” (2Pe 1.19,20). A Palavra profética de Deus foi confirmada
de maneira miraculosa e sobrenatural, pois, como diz Calvino, “A impor
tância dos milagres é que eles nos despertam para alguma verdade particu
lar sobre Deus”.15
As três g r a n d e s épocas
M i la g r e s pa ra c o n d e n a ç ã o
Evidência teológica
Não estamos dizendo que milagres não acontecem, mas que não acon
tecem mais milagres iguais, e nem na mesma proporção aos dos tempos
bíblicos. Como o objetivo dos milagres feitos em larga escala era o de au
tenticar a revelação divina, hoje, por não haver mais revelação, não há a
mesma necessidade dos milagres como no passado, pois não vivemos num
período revelacional de Deus, Isso não quer dizer que vivemos numa época
inferior a de nossos antepassados; na verdade, talvez esta seja uma época
até superior, pois já dispomos da revelação completa e registrada, que é a
Escritura Sagrada. Historicamente, a igreja cristã tem defendido o fecha
mento do cânon, ou seja, que o último livro inspirado pelo Espírito Santo
foi o Apocalipse de João e que, após esse livro, não houve outro inspirado.
Isso não quer dizer que Deus não “fale” mais nos dias de hoje, mas que ele
“fala” fazendo uso da revelação que é a sua Palavra. Com o cânon fechado,
não há necessidade de sinais em larga escala para autenticá-lo.
Evidência fa ct u a l
Além disso, há um argumento que pode ser retirado dos fatos. O que
queremos dizer com isso é que esses sinais, conforme os apóstolos realiza
vam, não têm sido vistos nos dias atuais. Alguém pode argumentar: Mas, e
as curas e milagres que estão acontecendo em tantas igrejas evangélicas?
Deve ser dito que o mesmo é reclamado nas igrejas católicas, nos centros
espíritas, e em todas as formas de religião existentes ao redor do mundo.
Muitos “milagres” de hoje são fraudes comprovadas, e a maioria dos que
não foram desmascarados, também não foi comprovada. O tipo de milagre
mais reivindicado hoje é aquele em que o líder religioso dirige-se à congre-
192 Razão da esperança
Evidência bíblica
A Bíblia também indica que os milagres hoje não precisam ser iguais aos
dos tempos apostólicos. Deus manifestou poderes extraordinários quando
quis que o evangelho fosse pregado em todo o mundo. Não é difícil imagi
nar o motivo. Pense bem, como um grupo de galileus, simples pescadores,
levaria a mensagem do evangelho aos confins do mundo, tendo contra si a
mais poderosa instituição que já existiu, o Império Romano? A resposta é:
Na força do poder de Deus. Deus muniu os seus humildes discípulos de
poderes especiais para que eles cumprissem a impossível tarefa, da perspec
tiva humana, de proclamar a mensagem da salvação ao mundo inteiro. Im
pressiona o fato de que, por volta do ano 30 desta era, havia cerca de 120
discípulos que seguiam o Senhor, mas dentro de sessenta anos, o evangelho
já estava nas fronteiras do mundo civilizado, distribuído por todas as cama
das da sociedade, de escravos a nobres, das cidades bárbaras a Roma. Os
milagres abriram as portas para a pregação do evangelho.
Percebe-se, entretanto, que mesmo essas demonstrações de poder não
subsistiram durante todo o ministério apostólico. Deus não parece ter dado
a Paulo, no final do ministério dele, o mesmo poder que ele tinha no início.
A Bíblia diz que, quando Paulo chegou a Efeso, durante dois anos, pregou
a palavra “dando ensejo a que todos os habitantes da Ásia ouvissem a pala
vra do Senhor” (At 19.10). Em seguida, Lucas relata: “E Deus, pelas mãos
de Paulo, fazia milagres extraordinários, a ponto de levarem aos enfermos
lenços e aventais do seu uso pessoal, diante dos quais as enfermidades fugi
am das suas vítimas e os espíritos malignos se retiravam” (At 19.11,12).17
Essa demonstração de poder vinda de Deus tinha como objetivo mostrar
que a pregação de Paulo era verdadeira. Claramente, esse mesmo poder já
Deus de milagres 193
não é visto na vida de Paulo anos mais tarde, quando as igrejas já estavam
organizadas e o evangelho era conhecido em quase todo o mundo. Nem
mesmo seu fiel companheiro Timóteo foi curado por Paulo, como o pró
prio Paulo reconhece: “Não continues a beber somente água; usa um pou
co de vinho, por causa do teu estômago e das tuas freqüentes enfermida
des” (lTm 5.23). Por que Paulo não colocou um avental sobre Timóteo
para que ele fosse curado? Com respeito a outro de seus ajudantes, Paulo
diz: “A Trófimo, deixei-o doente em Mileto” (2Tm 4.20). Se Paulo teve
durante toda a sua vida o poder extraordinário para curar, por que não teria
curado Trófimo? Teria ele perdido a fé? Não é o que parece. Inclusive, é
possível que uma enfermidade tenha sido a maior provação pela qual o
próprio Paulo passou durante o seu ministério. Estamos nos referindo àquilo
que ele chama de “espinho na carne”, e do qual diz que orou três vezes ao
Senhor para que o retirasse dele, mas recebeu uma resposta negativa quan
to à cura, porém positiva quanto a ter forças para resistir: “A minha graça te
basta” (Ver 2Co 12.7-9). Diante dessas evidências bíblicas que muitas vezes
passam despercebidas pelas pessoas, chegamos à conclusão de que Deus
usou milagres de maneira mais concentrada durante o período inicial da
pregação do evangelho e que, aos poucos, as manifestações miraculosas
foram diminuindo. Não que necessariamente elas tivessem cessado, mas
que cumpriram um papel designado por Deus para uma época específica.
Talvez a maior diferença entre aquela época e esta esteja na maneira como
Deus operava milagres naquele tempo e como opera hoje. Então, os após
tolos eram os instrumentos diretos de Deus - eles ordenavam e acontecia.
Hoje, Deus cura pela oração da igreja, porém, hoje como ontem, os mila
gres sempre aconteceram de acordo com a “vontade de Deus”.
As obras m aiores
Um argumento muito usado nos dias atuais para contrariar a noção ex
posta acima é baseado nas palavras de Jesus registradas em João 14.12:
“Em verdade, em verdade vos digo que aquele que crê em mim fará tam
bém as obras que eu faço e outras maiores fará”. Há pregadores dizendo
que podemos realizar milagres maiores do que o próprio Jesus realizou se
tivermos fé suficiente. Entre os feitos de Jesus, lembramos que ele andou
sobre as águas, multiplicou pães, fez tempestades se acalmarem, ressuscitou
um morto de quatro dias, fez um homem andar sobre as águas, devolveu a
visão a cegos de nascença, restaurou paralíticos, etc. Será que alguém na
História ultrapassou o número e a grandeza desses milagres? Não é preciso
194 Razão da esperança
ter dúvidas: ninguém fez sinais maiores do que Jesus. Os apóstolos fizeram
grandes sinais, mas se fizermos duas listas, veremos que eles não se compa
ram com os de Jesus. Em toda a história da igreja ninguém fez sinais como
Jesus. Então, não faz sentido pensar que Jesus estivesse falando em “maio
res obras” como milagres maiores. Porém, não é difícil entender o que
Jesus tem em mente, Quando pensamos que Jesus restringiu o seu ministé
rio apenas à nação de Israel, e que durante todo o seu ministério, cerca de
apenas 120 pessoas se mantiveram fiéis a ele, podemos entender o real
sentido de suas palavras, Num único sermão de Pedro, após o Pentecostes,
se converteram três mil pessoas, e, posteriormente, o evangelho foi levado
pelos apóstolos até os confins da terra. Estas eram as obras maiores, não
milagres maiores, mas uma obra de amplitude maior do que a do próprio
Jesus, Essa obra foi realizada pelos apóstolos, e nós continuamos a realizar
hoje, porém, é o próprio Senhor quem nos capacita. De qualquer modo,
continua sendo obra dele.
justamente para chamar a atenção para a sua mensagem. Jesus operou mui
tos milagres, mas nunca colocou os milagres no centro do seu ministério. O
centro era o seu ensino, era a sua própria pessoa. Quando ele concedeu
autoridade aos discípulos para realizarem sinais, eles voltaram alegres por
causa do poder que agora tinham, mas ele disse que eles deveriam se alegrar
pelo fato de seus nomes estarem escritos no céu (Lc 10.20). Jesus curou o
cego logo após dizer: “Eu sou a luz do mundo” (Jo 8.12; 9.1ss). Quando
multiplicou os pães, ele afirmou: “Eu sou o pão da vida” (Jo 6.1-14,35).
Quando ressuscitou Lázaro, ele disse: “Eu sou a ressurreição e a vida” (Jo
11.25). Seus milagres apontavam para a sua mensagem.
Gradualmente, o mundo tem deixado de ser racionalista para ser
espiritualista. Até bem pouco tempo atrás, tudo o que não podia ser com
provado cientificamente era considerado como uma farsa. Não havia espa
ço para o sobrenatural. Porém, as coisas já não são rigorosamente assim.
Uma prova disso é o movimento da Nova Era. Esse movimento une ciên
cia com mágica. Ao mesmo tempo em que usa a tecnologia, mergulha no
ocultismo. De fato, cada vez mais as pessoas crêem no oculto, no espiritual.
Os livros mais vendidos atualmente são os que visam despertar as pessoas
para a espiritualidade. Livros que falam de anjos, mantras, espiritismo e
toda sorte de ocultismo vendem como água. A cultura moderna está se
movendo rapidamente para a superespiritualidade, ou melhor, para a su
perstição. Isso se torna cada vez mais evidente “à medida que alguns repu
tados cientistas, filósofos e artistas de todos os tipos expressam hostilidade
aberta contra o pensamento racional e voltam-se na direção de uma mistu
ra de mágica e ciência”.18
Vivemos na chamada “terceira onda do Espírito”,19 em que grande ênfa
se é colocada nos sinais e maravilhas, e somente é considerado como evan
gelho verdadeiro aquele que contém o maior sensacionalismo. Essa ênfase
está acontecendo no mundo inteiro. Na igreja, isso já está sendo considera
do como evidência da verdade. Se não existirem sinais e prodígios, Deus não
está se manifestando. Uma característica desse movimento é que ele quase
não fala na Bíblia. O evangelho pregado é praticamente destituído dos ver
dadeiros elementos bíblicos: a cruz e a ressurreição de Cristo. As pessoas
não se importam se as experiências podem ser comprovadas pela Escritura,
ou mesmo se são abertamente confrontadas por ela. A experiência vale por
si mesma. Se algum sinal aconteceu, então elas dizem que é de Deus. Igno
ram que mais de quinze mil pessoas por ano dizem ter sido curadas em
Lourdes. Em cada edição da Sentinela da Ciência Cristã há muitos relatos de
curas. Muçulmanos paquistaneses dizem que um de seus reverenciados san-
Deus de milagres 197
tos, Baba Farid, tem curado pessoas de doenças fatais. Milhares de hindus, a
cada ano, dão testemunho de curas em seus templos. Portanto, se os sinais
comprovam a verdade, todas essas religiões são verdadeiras.
Com tristeza, podemos ver que a tendência evangélica atual é colocar os
milagres no centro de tudo. Livros evangelísticos somente falam de sinais e
não têm uma palavra sobre a cruz de Cristo, sobre santidade ou compro
misso. Sermões evangelísticos deixam a Bíblia de lado para se concentra
rem em ricas e comoventes histórias de milagres pessoais. Somos admoes
tados pela Palavra de Deus a não nos desviarmos da centralidade de Cristo.
Não devemos nos deixar fascinar por nada que queira nos desviar da obra
redentora de Cristo. O conteúdo central da nossa mensagem precisa ser a
do Cristo crucificado, a qual Paulo diz ser escândalo para os judeus que
queriam apenas sinais e loucura para os gregos que buscavam sabedoria
(ICo 1.22,23).
Conclusão
Milagres são intervenções divinas sobrenaturais, mediante as quais Deus
age revogando as leis da natureza, mas de acordo com a sua vontade pré-
estabelecida. Deus age no mundo hoje e sempre, o que não quer dizer que
ele aja sempre da mesma maneira. Os milagres bíblicos tinham o objetivo
de comprovar a veracidade da revelação divina, e esses milagres não têm
mais acontecido nos dias atuais; porém, Deus age de modo sobrenatural
conforme os seus propósitos, curando e beneficiando de várias maneiras.
Não devemos, entretanto, viver somente em busca de milagres, pois Deus
age por meio de causas secundárias, e uma pessoa pode ser curada de cân
cer por meio de um tratamento e não apenas por uma intervenção sobrena
tural. De qualquer modo, o benefício existirá, e terá ocorrido pela provi
dência de Deus. Devemos lembrar que não é certo louvar a Deus mais pelo
milagre do que pela providência. Certa noite, um pastor recebeu o pedido de
uma irmã, membro de sua igreja, para dar um testemunho. Ela testemunhou
que naquele dia, quando estava voltando da cidade vizinha para a sua cida
de, ao parar no sinaleiro, dois homens entraram no carro e apontaram uma
arma para ela. Tratava-se de um assalto. Apavorada, silenciosamente come
çou a orar pedindo por livramento. De repente, sem mais nem menos, ao
parar noutro sinaleiro, os homens desceram do carro e foram embora. De
modo miraculoso, Deus havia livrado a moça do assalto. Esse foi um belo
testemunho, mas ao final do culto o pastor chamou a irmã e disse, “Eu
198 Razão da esperança
também recebi uma graça de Deus hoje, e posso dizer que foi até mesmo
maior do que a sua”. “E mesmo?”, disse a irmã, “O que aconteceu?” O
pastor disse: “Também vim da cidade vizinha, mas nada aconteceu comi
go”. “Eu não entendi”, respondeu a irmã. “Qual foi a graça?” Ele comple
tou: “Nenhum assaltante entrou no meu carro, Deus não permitiu”.
15
Logo eles perceberam o erro que haviam cometido, mas já era muito tarde.
Com vergonha de si mesmos e de Deus, tentaram se esconder dele. Porém,
Deus os encontrou, os interrogou, e eles tentaram se desculpar, tirando a
culpa de si mesmos. Esse é um relato realístico que marca a queda da huma
nidade, mostrando-nos a estratégia do diabo, a fragilidade do ser humano
pós-queda e a misericórdia de Deus em buscar o pecador, oferecendo-lhe
uma possibilidade de redenção.
Rebelde se m causa
A Bíblia diz que Deus, depois de criar o homem à sua imagem e semelhan
ça, o colocou no jardim do Éden, e lhe deu a tarefa de cultivar e guardar esse
jardim. Em seguida, lhe deu uma ordem: “De toda árvore do jardim comerás
livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerá;
porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás” (Gn 2.16,17). Pou
cas vezes pensamos em todos os privilégios que o homem tinha no jardim,
afinal ele poderia comer livremente de todas as árvores que lá havia, com exce
ção de uma. Ou seja, nada lhe faltaria, e ele poderia desfrutar abundantemente
de todas as bênçãos de Deus sempre que quisesse. Essa descrição é útil para
perceber o quanto a queda foi injustificada. Foi uma verdadeira rebelião sem
causa. Isso faz lembrar um pouco dos acontecimentos dos anos 70. Depois
das lutas de resistência às ditaduras ao redor do mundo, um novo tipo de
rebeldia surgiu. Em meio à revolução sexual, musical e intelectual, novos re
beldes começaram a se levantar, os “delinqüentes juvenis sem causa”. Esses
arruaceiros não faziam tumultos em protesto contra alguma injustiça social,
eles simplesmente protestavam pelo simples prazer de protestar. Hoje, igual
mente as pessoas assumem posições de protesto e rebeldia, mas a maioria, no
fundo, não têm causa alguma. A primeira rebelião do ser humano também foi
sem causa, mas isso não significa que seja impossível achar um motivo para a
queda. O impossível é achar um motivo justo, muito embora Satanás tenha
convencido Eva do contrário. Devemos pensar na posição de extremo signifi
cado que Deus conferiu ao homem, feito à sua própria imagem e semelhança;
ele deveria administrar toda a criação, podendo explorar livre e responsavel
mente todos os recursos naturais do cosmos. Deus apenas queria fazer um
teste de fidelidade, e por isso a “árvore do conhecimento do bem e do mal” foi
posta no meio do jardim. Essa era a única exceção, tudo o mais estava à dispo
sição do homem. Parece que é próprio da natureza humana não ver as bênçãos
de Deus quando há algum problema ou restrição.
A queda: A mãe das Iragédias 201
A fuga
A o r i g e m do p ec a d o
Ninguém, ao ser tentado, diga: Sou tentado por Deus; porque Deus não
pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém tenta. Ao contrário, cada
um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz. Então, a
cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez
consumado, gera a morte. Não vos enganeis, meus amados irmãos. Toda
boa dádiva e todo dom perfeito são lá do alto, descendo do Pai das luzes,
em quem não pode existir variação ou sombra de mudança (Tg 1.13-17).
A queda: A mãe das tragédias 203
Independência fracassada
O espírito da nossa época é o de quebra de tabus. As pessoas dizem que
a única coisa que deve ser proibida é proibir. Todos devem ter liberdade
para fazer o que quiser com a própria vida. Porém, será que essas pessoas
que foram liberadas para fazer o que quiserem são realmente livres? As
pessoas são livres para fazer sexo tanto quanto para contrair o vírus da
Aids. Afinal de contas, do que é essa liberação? Que liberdade tem um
viciado em cocaína no fato de poder usar a droga onde e quando bem
quiser? “Seus olhos serão abertos” prometeu Satanás (Gn 3.5), mas, como
diz Horton, “ele sempre foi mentiroso”.8
Na verdade, foi Jesus quem disse: “Ele é o pai da mentira” (Jo 8.44).
Herdeiros de Adão
Estamos todos juntos com Adão e Eva, pois herdamos deles o veneno
do pecado. Ele corre no nosso sangue. E isso o que os teólogos chamam de
pecado original. Adão incluiu a todos na sua decisão, e esta decisão foi fatal
para a raça. A escolha de Adão atingiu a todos, porém, num sentido, não
podemos dizer que cada um de nós é considerado pessoalmente responsá
vel pelo que Adão fez, como se cada um de nós tivesse pecado o pecado de
Adão. O fato é que Adão agiu como nosso representante e, por essa razão,
a sua escolha nos atinge.11 Nesta questão não temos liberdade de escolha.
Uma ilustração útil para entender isso é a da Independência do Brasil. Quan
do Dom Pedro proclamou a independência, nós estávamos incluídos nela.
Nenhum de nós bradou “independência ou morte”, mas todos nós usufru
ímos os efeitos desse brado. Do mesmo modo, Adão foi o nosso represen
tante diante de Deus; ele falou por nós, e, portanto, a queda dele foi a nossa
queda. Seu grito de independência jogou a todos nós na morte. Nenhum
dos efeitos da queda, como pecado, dor, sofrimentos ou tragédias podem
ser atribuídos a Deus. Deus criou o mundo perfeito; foi a escolha delibera
da do homem que trouxe o caos; portanto, a humanidade é absolutamente
responsável por tudo o que acontece de mau neste mundo. E continuamos
a destruir a terra com o processo de exploração desenfreada. A ironia é que
nós poluímos o mundo e colocamos a culpa em Deus quando ocorrem
cataclismas da natureza.12
A queda: A m ãe das tragédias 205
Não somos pecadores apenas por escolha, mas por natureza. Não nas
cemos como se fôssemos uma tabula rasa, ou uma folha em branco, nem
numa zona neutra, mas como inimigos de Deus, sendo “por natureza, fi
lhos da ira” (Ef 2.3). Nós não fazemos o mal meramente, nós somos maus.
Não somente caímos, somos decaídos. Não somente nos perdemos, estamos
perdidos. Pecamos porque a nossa natureza é pecar, somos escravos, pois o
Senhor disse: “Todo o que comete pecado é escravo do pecado” (Jo 8.34).
Não conseguimos abandonar o pecado quando queremos. Na verdade, nem
queremos. Podemos até controlar algumas atitudes pecaminosas, mas não
podemos deixar de ser pecadores.
Totalmente depravados
É claro que isso não significa que cada um de nós faz todo o mal imaginável,
mas significa que temos capacidade para isso. E mais do que isso, significa
que estamos completamente perdidos, pois Deus requer de nós a perfeição
com que nos capacitou quando nos criou; entretanto, não há área em nossa
vida que não tenha sido afetada pelo pecado. De modo algum poderemos dar
o que ele espera de nós. A essa incapacidade de dar a Deus o que ele deseja, os
teólogos têm chamado de “Depravação Total”.13 Isso não representa alguma
incapacidade física, nem significa que as pessoas não consigam fazer algo
bom neste mundo, pois não é uma completa ausência de bem relativo. A
questão é que, para que algo seja aceito por Deus como bom, precisa ter pelo
menos três elementos: fé verdadeira, estar de acordo com a lei de Deus e ser
para a glória de Deus. Nenhum herdeiro de Adão consegue fazer isso natu
ralmente. Uma obra pode parecer boa externamente, mas Deus sabe o que se
passa no coração. Imagine um ladrão que rouba 5,000 e doa 100 para uma
instituição de caridade. Ele é bom por causa disso? Há ateus que negaram o
Cristianismo, mas foram servir às pessoas carentes na África. A depravação
total significa que o homem nunca consegue fazer algo que agrade a Deus, de
modo que Deus resolva salvá-lo por seus méritos. Como diz Berkhof, “numa
palavra, ele é incapaz de fazer qualquer bem espiritual”.14
O homem não peca da pior maneira possível, mas peca em tudo o que
faz, pois o pecado está arraigado em sua natureza. Segundo a Bíblia, o
homem não pode fazer o bem (Mt 7.17,18; ICo 12.3; Jo 15.4,5; Rm 8.7),
não pode entender o bem (At 16.14; 2Co 3.15,16; Jo 8.43; ICo 1.18; ICo
2.14; 2Co 4.3,4), nem desejar o bem (Jo 5.40). Evidentemente, essa é a visão
calvinista do homem. O arminiano pensa diferente, pois vê o homem como
se afogando, gritando desesperadamente por socorro; o calvinista vê o ho-
206 Razão da esperança
mem como afogado no fundo do oceano. Ele nem sabe que necessita de
ajuda. Para salvá-lo, é preciso uma obra sobrenatural de Deus, é necessário
trazê-lo para a superfície e introduzir vida no seu coração,
A doutrina da depravação total explica os problemas do nosso mundo, e
nos diz que a sociedade não resolverá esses problemas básicos até que to
dos nasçam de novo. Porém, nem mesmo a conversão do mundo resolveria
todos os problemas, pois os cristãos continuam pecando. Por outro lado,
essa doutrina nos fala do imenso amor de Deus por nós. Nunca podería
mos ser salvos por nós mesmos, foi somente o seu amor que possibilitou a
nossa salvação.
As folhas da figueira não agradaram a Deus (Gn 3.7,21), Essa foi uma
tentativa humana de esconder a própria nudez que, poderíamos dizer, já era
muito mais do que física. Talvez isso signifique que Deus não se impressi
ona com os nossos jeitinhos. Nossas ofertas não lhe despertam qualquer
interesse, nossa justiça própria nunca passará de “trapos da imundícia” diante
de Deus (Is 64.6). Ele não se agrada das nossas tentativas de agradá-lo, ou
mesmo de nos desculparmos. Enquanto acharmos que as folhas da nossa
justiça própria são suficientes, jamais poderemos ser salvos.
li b e r d a d e que aprisiona
E, o que é mais irônico para nós seres humanos, é que a declaração de
independência foi totalmente fracassada. Ainda precisamos de Deus, pois
“não podemos viver independentemente de Deus mais que um peixe pode
viver independentemente de água”.15 Como o brado às margens do Ipiranga
não tornou o Brasil independente das potências estrangeiras, também o
grito de independência de Adão não o libertou. Ao contrário, o aprisionou
totalmente, pois ele passou a servir ao pecado (Jo 8.34) e, por conseqüên
cia, à Satanás (Ef 2.2). A tão desejosa liberdade nunca veio. Houve um
tempo em que uma propaganda de cigarros era bastante popular. O nome
do cigarro podia ser traduzido como “livre”. E o slogan era: “Cada um na
sua, mas com alguma coisa em comum”. A única coisa que os viciados
tinham em comum era o vício. A liberdade era apenas um sonho.
Conclusão
Aprendemos algumas lições muito importantes com a doutrina bíblica
do pecado. Primeiramente, que o homem depende inteiramente de Deus
para a salvação. De tal modo a queda afetou o ser humano que ele não pode
se salvar por si mesmo, e depende inteiramente de Deus querer e usar a sua
misericórdia para salvá-lo. Essa convicção é necessária para a igreja hoje.
Nós perdermos a visão realística do homem conforme a Bíblia a demons
tra. Vivemos no tempo em que os crentes idolatram líderes religiosos, e se
surpreendem quando vêem esses homens caírem em pecado. Essa doutrina
também nos ensina que não há pessoa boa do ponto de vista de Deus.
Deus não olha para o que nós tentamos fazer, mas para o que nós somos.
Por isso, precisamos abandonar as nossas folhas de figueira e deixar que o
208 Razão da esperança
próprio Deus nos vista com a justiça de Cristo. Finalmente, essa doutrina
glorifica a graça de Deus. Se conhecermos bem o diagnóstico da nossa
doença, podemos nos maravilhar diante da cura. No evangelho, Deus não
oferece apenas uma anestesia para a dor, mas uma cura definitiva, que, a
princípio, pode até mesmo causar algum desconforto, mas que extirpa com
pletamente a doença. Ignorar o pecado, como o mundo moderno tem fei
to, só piora as coisas. E como negar a existência de uma doença gravíssima.
A negação não fará com que ela desapareça.
16
“No dia e m que dela com eres, certam en te m orrerrás" (Gn 2.17).
A o rigem da morte
Pedro faz uma declaração de causar inquietação em todos os que se
sentem imortais: “Pois toda carne é como a erva, e toda a sua glória, como
a flor da erva; seca-se a erva, e cai a sua flor” (IPe 1.24; ver Is 40.6-8). E o
Salmo de Moisés já dizia coisas semelhantes, ao contrastar a eternidade de
Deus com a temporalidade do ser humano:
O significado da morte
A morte é a conseqüência do pecado, mas não uma conseqüência natu
ral. Devemos considerar a morte como um aspecto penal de Deus em rela
ção à desobediência do ser humano. Morte, portanto, antes de qualquer
coisa é punição. Deus disse a Israel: “A alma que pecar, essa morrerá” (Ez
18.4), e Paulo disse aos Romanos: “O salário do pecado é a morte” (Rm
6.23). Como diz Berkhof:
A morte não é descrita como algo natural na vida do homem, mera falha de
um ideal, e sim, assaz decisivamente como algo alheio e hostil à vida huma-
212 Razão da esperança
na: é uma expressão da ira divina (SI 90.7,11), um julgamento (Rm 1.32),
uma condenação (Rm 5.16), uma maldição (G1 3.13), e enche os corações
dos filhos dos homens de temor e tremor, justamente porque é tida como
uma coisa antinatural.4
M o r t e espiritual
M o r t e física
Nesse sentido, a morte deve ser entendida como a separação entre cor
po e alma. Quando a alma deixa o corpo, a morte chegou (Tg 2.26). Nesse
ponto, se cumpre a Palavra que Deus dirigiu ao homem depois do pecado:
“No suor do rosto comcrás o teu pão, até qúe tornes à terra, pois dela foste
formado; porque tu és pó e ao pó tornarás” (Gn 3.19; ver Ec 3.20). Porém,
o Espírito não vira pó, pois como diz o Eclesiastes, o pó volta à terra, mas
o Espírito volta a Deus que o deu (Ec 12.7). A morte física é uma punição
porque o ser humano não foi feito para viver sem corpo. Os gregos antigos
A morte: 0 último inimigo 213
M o r t e eterna
A morte eterna deve ser vista como uma consumação da morte espiri
tual depois da morte física. A morte física vem para todos, mas a morte
eterna somente para os que estão sem Cristo. Nesse ponto, é interessante
pensarmos que a salvação depende de um “novo nascimento” (Jo 3.3).
Quem nasce uma vez morre duas, mas quem nasce duas só morre uma.
Durante essa vida, embora grande parte das pessoas esteja no estado de
“morte espiritual”, mediante a graça comum, Deus lhes concede muitas
bênçãos e restringe o mal. Porém, na morte eterna “as restrições do presen
te desaparecem, e a corrupção do pecado tem a sua obra completa. O peso
total da ira de Deus desce sobre os condenados, e isso significa morte, no
sentido mais terrível da palavra”,6 Morte eterna deve ser associada com o
inferno, e em última instância, com o lago de fogo do Apocalipse.
Dias contados
A morte será a última das conseqüências do pecado a ser retirada do
mundo. No capítulo 15 de 1 Coríntios, o apóstolo Paulo faz uma defesa
magistral da ressurreição de Cristo e dos crentes. Nesse capítulo, ele tam
bém diz muitas coisas a respeito da morte. Primeiramente, ele repete o
ensino de Romanos 5.12-19: “Visto que a morte veio por um homem, tam
bém por um homem veio a ressurreição dos mortos. Porque, assim como,
em Adão, todos morrem, assim também todos serão vivificados em Cris
to” (ICo 15.21,22). Essa promessa de vitória pessoal sobre a morte descan
sa sobre a vitória de Cristo. Ele abriu o caminho para a vitória sobre a
morte e agora os homens podem transitar por ele. Porém, além de ter aber
to o caminho, o Senhor ocupa uma posição de governo em que luta para
214 Razão da esperança
destruir todos os seus inimigos. Paulo diz que o fim só virá “quando hou
ver destruído todo principado, bem como toda potestade e poder” (ICo
15.24). Evidentemente ele está falando de Satanás e suas hostes malignas. A
morte e a ressurreição de Jesus já garantiram a vitória sobre Satanás, tanto
que ele perdeu o seu posto de acusador (Ap 12.10). Porém, ainda falta o dia
quando ele será totalmente esmagado, cumprindo a promessa de Gênesis
3.15, ou como diz Paulo: “Porque convém que ele reine até que haja posto
todos os inimigos debaixo dos pés. O último inimigo a ser destruído é a
morte” (ICo 15.25,26). Os inimigos que assim serão submetidos não são
somente seres inteligentes hostis a Cristo, como também todas as formas
de mal, físicas e morais, já que se inclui especialmente a morte.7 A morte,
na linguagem de Paulo, é justamente o último inimigo. Naquele dia, Cristo
e a morte se encontrarão pela última vez.
O próprio Cristo conheceu muito bem os poderes da morte. Lembra
mos daquela inesquecível cena do Senhor diante do túmulo de Lázaro.
Quando Maria, irmã de Lazaro, se aproximou de Jesus, João relata: “Jesus,
vendo-a chorar, e bem assim os judeus que a acompanhavam, agitou-se no
espírito e comoveu-se. E perguntou: Onde o sepultastes? Eles lhe respon
deram: Senhor, vem e vê! Jesus chorou” (Jo 11.33-35). Essa foi uma das
poucas ocasiões em que Jesus chorou. Qual teria sido o motivo desse cho
ro? Certamente não era um choro de impotência diante das mazelas da
vida. O Senhor que ressuscitaria Lázaro em seguida não precisaria chorar
por isso. Era o choro de alguém que sabia o quanto a morte deteriorou a
perfeita criação de Deus. Era o choro de alguém que definitivamente não se
conformava com a morte. Mais tarde, ele próprio experimentou a fúria da
morte ao ser dependurado no madeiro. Portanto, Jesus sabe mais do que
ninguém o significado dela. Porém, três dias depois, na maior demonstra
ção de poder entre a criação e o fim do mundo, o Senhor derrotou a morte
ao ressuscitar gloriosamente. A partir daquele dia, os dias da morte estão
contados; em breve, o último inimigo cairá definitivamente.
(Rm 8.1). Se Deus quisesse poderia transladar todos os cristãos para o céu,
como fez com Enoque e Elias, sem que passassem pela morte, porém, ele
resolveu deixar que a natureza seguisse o seu curso normal. Apesar de nasci
dos de novo, nossos corpos ainda são decaídos, eles não foram aperfeiçoa
dos, e o motivo disso é que continuamos adoecendo, cansando, suando e
morrendo (Gn 3.19). A morte deve ser vista, no caso do cristão, não como
uma punição, mas como uma conseqüência natural do corpo decaído. Nesse
sentido, ela tem realmente ainda um sentido negativo, porém, ela evoca pelo
menos dois aspectos imensamente positivos. Em primeiro lugar, devemos
considerar que ela abre as portas para a eternidade. No momento da morte,
a alma fica livre de todo o peso da corrupção, e passa a aguardar o dia em
que será reunida ao corpo aperfeiçoado da ressurreição. A morte para o
crente é o portal para uma situação imensamente mais abençoada do que a
presente. Em segundo lugar, embora a morte, em si mesma, continue sendo
um verdadeiro mal natural para os filhos de Deus, na economia da graça ela
se faz subserviente ao seu progresso espiritual e aos melhores interesses do
reino de Deus.8 A expectativa da morte leva o crente a considerar seus dias
e a manter a humildade. O salmista orou: “Ensina-nos a contar os nossos
dias, para que alcancemos coração sábio” (SI 90.12). A consciência da nossa
própria finitude ajuda a exercitar a sabedoria. Assim, a expectativa da morte
é benéfica para o nosso progresso espiritual; ela mostra que os nossos dias
aqui são limitados como tudo o mais nesta vida. E a experiência da morte, de
algum modo, nos será útil na eternidade. Jamais será caso de vergonha, antes
de regozijo, pois o nosso Senhor também a experimentou. Será um motivo
de louvor ao Deus que transforma o mal em bem.
A atitude dos crentes perante a morte deve ser totalmente diferente da
atitude do mundo que não tem esperança. Aos olhos de Deus, a morte dos
crentes não é uma retribuição pelas suas más ações, é algo que causa deleite
no Senhor, pois “preciosa é aos olhos do S e n h o r a morte dos seus santos”
(SI 116.15). Seja a morte de um crente de 100 anos ou de uma criança de
alguns dias, perante os olhos do Senhor, essa morte é preciosa, pois o Se
nhor sabe que o céu é muito melhor. Para nós, é difícil aceitar a idéia de que
uma criança deixe este mundo apenas alguns dias depois de ter nascido.
Porém, devemos nos lembrar que a vida é como a erva, e logo estará mur
cha de qualquer modo. Perante a eternidade, e diante daquele a quem mil
anos é como um dia (SI 90.4), talvez faça pouca diferença viver cem anos ou
alguns minutos.
O entendimento de que a morte nos conduz a um estado superior levou
o apóstolo Paulo a dizer: “Porquanto, para mim, o viver é Cristo, e o mor-
216 Razão da esperança
rer é lucro. Entretanto, se o viver na carne traz fruto para o meu trabalho, já
não sei o que hei de escolher. Ora, de um e outro lado, estou constrangido,
tendo o desejo de partir e estar com Cristo, o que é incomparavelmente
melhor” (Fp 1.21-23). Aqui está um homem que viveu uma das existências
mais gloriosas e, ao mesmo tempo, mais sofridas de todos os tempos. Ape
sar de todo sofrimento, ele não estava desanimado em continuar vivendo.
Porém, ele claramente demonstrou a sua preferência por partir e estar com
Cristo o que, para ele, não tem comparação. Ele desejava entrar naquele
estado de bem-aventurança que João descreveu no Apocalipse: “Então, ouvi
uma voz do céu, dizendo: Escreve: Bem-aventurados os mortos que, desde
agora, morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, para que descansem das suas
fadigas, pois as suas obras os acompanham” (Ap 14.13). Não precisamos
esperar a morte com receio ou angústia no coração, pois ela é um benefício
do Senhor para a nossa vida. Ela não é o fim, por mais que pareça ser. A
seguinte história poderá nos ajudar a entender o que é a morte:
Eis-me numa praia. Um barco, perto de mim, abre as velas brancas ao ven
to e parte em direção ao alto-mar. Esse barco é belo e forte. Fico ali de pé,
a contemplá-lo, até que por fim parece como que uma pequenina mancha,
lá longe, precisamente no lugar em que o mar e o céu parecem juntar-se.
Alguém ao meu lado, diz nesse momento: “Desapareceu”. Desapareceu
para onde? Desapareceu da minha vista, eis tudo. Continua a existir da
mesmíssima maneira que existia quando partiu de junto de mim; e continua
tão capaz, como antes, de levar a sua carga ao porto de destino. O seu
tamanho diminuiu para mim, nada mais; e, precisamente no momento em
que alguém diz ao meu lado “Desapareceu”, noutra praia, lá longe, há ou
tros olhos que esperam a sua chegada e outras vozes prontas a exclamar,
“Ele aí vem”; e é assim a morte. (Autor desconhecido)9
0 sheol e o hades
O Antigo Testamento fala relativamente pouco acerca do estado das
almas depois da morte. Encontramos em alguns livros do Antigo Testa
mento a indicação de que as almas vão para um lugar chamado sheol. Sheol
mais comumente significa “sepultura”. E essa palavra que Jacó disse ser o
218 Razão da esperança
seu destino quando morresse: “Se lhe sucede algum desastre no caminho
por onde fordes, fareis descer minhas cãs com tristeza à sepultura (sheol)”
(Gn 42.38). No entendimento do Antigo Testamento, todos os homens
acabam no sheol. O salmista declara: “Que homem há, que viva e não veja a
morte? Ou que livre a sua alma das garras do sepulcro (sheol)?” (SI 89.48;
Ver 88.3; Os 13.14; Nm 16.33; SI 49.14; SI 9.17).
Se o sheol é o destino de todos os homens, então, ele não deve, nesse
sentido, ter significado positivo ou negativo. A interpretação mais plausí
vel é que significa apenas sepultura, o lugar do esquecimento, a morte no
sentido genérico. Assim, o sheolé absolutamente igual para todos, como o
Eclesiastes deixa bem claro: “Tudo quanto te vier à mão para fazer, faze-
o conforme as tuas forças, porque no além (sheol), para onde tu vais, não
há obra, nem projetos, nem conhecimento, nem sabedoria alguma” (Ec
9.10). Todos os homens, bons ou maus, vão para o sheol, pois ele significa
apenas o estado de morte, não necessariamente de recompensa ou de
punição.
Por outro lado, o Antigo Testamento diz que a morte do justo é mais
digna que a morte do ímpio. Balaão, quando chamado para amaldiçoar Is
rael, demonstrou o seu desejo: “Que eu morra a morte dos justos, e o meu
fim seja como o dele” (Nm 23.10). Se o profeta infiel Balaão desejava mor
rer a morte do justo é porque ela deve ser diferente da morte do perverso,
e, de algum modo, melhor (ver SI 16.11; 73.24). Porém, o que se percebe ao
ler o Antigo Testamento, é que não havia uma doutrina completa sobre o
Estado Intermediário. Isso não representa problema algum, pois entende
mos que a revelação é progressiva, ou seja, Deus não revelou tudo de si de
uma única vez. Porém, o simples fato de haver esperança para o justo de
pois da morte é uma evidência concreta de que, de alguma maneira, os
justos estariam melhor no sheol do que os injustos.
Se o Antigo Testamento usa a palavra sheol para definir o lugar dos mor
tos, o Novo Testamento usa a palavra hades. Na mitologia grega, o hades era
composto de duas partes: a parte mais profunda era o local de punição,
algumas vezes chamado de Tártaro, e o lugar de bênçãos era chamado de
Campos Elisios.2 E difícil encontrar essa idéia no Novo Testamento, pois
aí Hades também significa lugar de punição. Assim, o rico da parábola que
Jesus contou foi para o hades (Lc 16.23). E Jesus disse que Cafarnaum seria
precipitada ao hades por ter recusado sua pregação (Mt 11.23). Igualmente,
Jesus disse aos fariseus que eles dificilmente escapariam da condenação do
hades (Mt 23.33). Todas essas passagens sugerem que, para o Novo Testa
mento, o hades é o lugar de punição, o inferno.
0 lugar dos mortos 219
0 purgatório
A teologia católica afirma que os crentes do Antigo Testamento, antes
da ressurreição de Cristo estavam num lugar chamado Umbus Patrum (limbo
dos pais). Ali eles ficavam sem qualquer sofrimento, porém, sem a felicida
de do paraíso. Quando Jesus ressuscitou, providenciou para que algumas
fossem libertas do limbo e levadas para o céu. Pensa-se que foi enquanto o
seu corpo estava na sepultura que o Senhor foi até o limbo e libertou-as de
lá. Geralmente, a passagem de 1 Pedro 3.18-20 é usada como texto-prova
nesse sentido. Porém, essa obscura passagem pode significar simplesmente
que o Senhor, pelo Espírito e por intermédio de Noé, pregou aos perdidos
enquanto a Arca estava sendo construída. A teologia católica fala também
do Umbus Infantum (limbo das crianças) que seria o lugar para aonde vão
todas as crianças não-batizadas, representando um lugar que, embora não
seja de condenação, também não é de bênção. Evidentemente que a idéia
da existência de um “limbo” não é bíblica, mas criada e sustentada pelos
homens, numa tentativa de minimizar as penas eternas.
A mais conhecida doutrina católica sobre o Estado Intermediário é a do
Purgatório. A doutrina do purgatório formulada pela igreja católica susten
ta a possibilidade de salvação depois da morte. Segundo a teologia católica,
somente os verdadeiramente santos vão diretamente para o céu, onde estão
salvos para sempre, e somente os piores pecadores vão para o inferno,
onde estão perdidos para sempre. Todos os demais seres humanos vão
para o purgatório, que é um local de punição, porém temporário. Depois
que uma alma passa algum tempo sofrendo as penas, literalmente “purgan
do” os seus pecados, pode ir para o céu. Na concepção católica, o fogo do
purgatório é o mesmo fogo do inferno, a única diferença é a duração. Por
isso, nas orações católicas se fala em “levar as almas todas para o céu”, ou
seja, tirá-las do purgatório. Na Idade Média, a doutrina do purgatório foi
muito útil para os cofres da igreja católica. Segundo o ensino oficial, o Papa
ünha poder para libertar as almas de lá, e vendia essa libertação por alguma
quantia de dinheiro. Essa prática ficou conhecida como venda das “indul
gências”. Até hoje, o costume de pagar para “rezar” missas é fundamenta
do no mesmo antigo sistema e, portanto, o purgatório continua rendendo
dividendos. O pagamento pode ser feito pela própria pessoa ou por paren
tes. Aqui também encontramos a origem da “missa de sétimo dia”. Um
questionamento óbvio a essa idéia é que se o pagamento faz com que a
alma saia do purgatório, isso é um favorecimento do rico que pode pagar
220 Razão da esperança
mais missas. Além disso, se o Papa realmente tem poder para tirar as almas
do purgatório, por que bondosamente não faria isso por todas?
A doutrina do purgatório não tem qualquer respaldo bíblico. E uma
formulação humana que serviu e serve aos interesses da igreja católica. A
Escritura não ordena que as pessoas façam qualquer coisa pelos mortos,
exceto sepultá-los (Dt 26.13,14; Lv 19.28). Ao acrescentar a necessidade de
uma reparação humana, a doutrina do purgatório é uma afronta à suficiên
cia da obra de Cristo para a salvação. A Bíblia claramente diz que “aos
homens está ordenado morrerem uma vez, vindo depois disso o juízo”
(Hb 9.27). Quem já foi para o paraíso ou para o inferno não pode mais sair
de lá (Lc 16.26). As únicas passagens da Escritura geralmente usadas para
defender a existência do purgatório são 1 Coríntios 3.15 que fala de ser
salvo através do fogo, e Judas 22,23 que fala de arrebatar os duvidosos do
fogo. Porém, essas passagens nada dizem sobre o purgatório, pois o fogo
deve ser identificado com a própria atividade julgadora de Deus; ele signifi
ca que os salvos serão livrados, no sentido de isentados do fogo.
0 so n o da alm a
Como já vimos, outras seitas insistem que as almas depois da morte
ficam num estado de “sono”, esperando o dia do Juízo. Essa doutrina é
defendida por causa de algumas expressões usadas no Novo Testamento,
como por exemplo, o fato de Jesus ter dito que Lázaro dormia, querendo
dizer que ele estava morto (Jo 11.11,14; ver Mt 9.24; At 7.60; ICo 15.51;
lTs 4.13,14). Apela-se também para as passagens do Antigo Testamento
que descrevem a morte como um estado de inatividade (ver SI 6.5; 115.17;
146.4; Dn 12.2). Porém, essas passagens descrevem o morto apenas do
ponto de vista humano. Além do mais, o que está sendo enfatizado nelas é
o destino do corpo das pessoas e não, necessariamente, da alma. Evidente
mente que o corpo dorme até o dia da ressurreição, no sentido de que fica
na sepultura aguardando aquele dia, porém, a Bíblia não diz que a alma
também dorme, pelo contrário.
Há suficiente ensino na Escritura para que entendamos para onde a
alma vai depois da morte. Jesus contou uma parábola (que pode ser uma
história real) onde há explicações suficientes sobre o lugar das almas depois
da morte (Lc 16.19-31). Havia um homem rico, que vivia para aproveitar
suas riquezas, e um homem pobre chamado Lázaro, que nada tinha para se
consolar. Os dois morreram, mas foram para lugares diferentes. Lázaro foi
0 lugar dos mortos
Quando ele abriu o quinto selo, vi, debaixo do altar, as almas daqueles que
tinham sido mortos por causa da palavra de Deus e por causa do testemu
nho que sustentavam. Clamaram em grande voz, dizendo: Até quando, ó
Soberano Senhor, santo e verdadeiro, não julgas, nem vingas o nosso san
gue dos que habitam sobre a terra? Então, a cada um deles foi dada uma
vestidura branca, e lhes disseram que repousassem ainda por pouco tempo,
até que também se completasse o número dos seus conservos e seus ir
mãos que iam ser mortos como igualmente eles foram.
transe, pelo contrário, ela mesma se assustou quando viu Samuel. Parece
que nem ela estava acreditando no que estava vendo. E possível, embora
não muito provável, que Deus tenha trazido o espírito de Samuel para con
denar o rei Saul (ver Mt 17.1-8: nessa passagem, Moisés e Elias voltaram
para conversar com Jesus), porém, mais tarde Deus deixou bem claro que o
fato de ele ter consultado a feiticeira foi uma das causas de sua própria
morte. Assim está escrito em lCrônicas 10.13,14: “Assim, morreu Saul por
causa da sua transgressão cometida contra o S e n h o r , por causa da palavra
do S e n h o r , que ele não guardara; e também porque interrogara e consulta
ra uma necromante e não ao S e n h o r , que, por isso, o matou e transferiu o
reino a Davi, filho de Jessé”. Portanto, essa passagem, ao contrário de dar
suporte à doutrina espírita, na verdade, a condena. Quem consulta os mor
tos terá que sofrer a ira de Deus.
John Lennon teria dito certa vez: “o Cristianismo acabará. Ele desapa
recerá. Eu não preciso argumentar sobre isso. Eu tenho certeza de que o
tempo provará que é verdade. Agora, nós somos mais populares do que
Jesus”. A expectativa de Lennon não se confirmou, afinal, apesar de toda a
certeza dele. A verdade é que ninguém na história da humanidade foi po
pular e, ao mesmo tempo, tão impopular como Jesus Cristo. Ninguém cau
sou tanto impacto sobre o mundo, Desde que o homem de Nazaré andou
pelas colinas áridas da Terra Santa, o mundo tem reverenciado os seus
ensinamentos e confessado o seu nome, ou, por outro lado, vituperado a
sua pessoa. A vinda de Cristo permanece até hoje como o maior aconteci
mento que este planeta já viu, mas as opiniões a respeito dele são muito
divididas.
Mas afinal quem é Jesus Cristo? Não há como enumerar as respostas
possíveis para essa pergunta. Ela depende do número de pensamentos e
filosofias que existirem no mundo. Pode haver um “Cristo” para cada
tipo de pessoa. Se reuníssemos um grupo de pessoas numa sala e pedísse
mos para que fizessem uma descrição de Cristo, mas que não fosse pare
cida com aquela tradicional das pinturas, certamente apareceria um Cris
to rico, outro pobre, outro mártir, outro oriental, outro negro, outro “sem-
terra”, outro homossexual, outro revolucionário, etc. Porém, qual é o Cristo
verdadeiro?
No século 19, a teologia liberal se lançou numa verdadeira odisséia para
“desenterrar” o Cristo verdadeiro. Foi a chamada “busca pelo Jesus históri
co”. Aqueles teólogos entendiam que os evangelhos haviam distorcido e
“enfeitado” demais o personagem histórico de Jesus de Nazaré.1 Como
não estavam mais dispostos a crer na mensagem dos discípulos, eles se
228 Razão da esperança
0 A nt igo Testamento
A cultura gr ega
Olhando para o mundo daquela época, podemos ver outros modos pelos
quais, aparentemente, Deus preparou a vinda de Jesus. A cultura da época
era bastante propícia para a manifestação de Jesus. Depois da queda da Babi
lônia, o império mundial seguinte foi o de Alexandre o Grande, que espa
lhou a cultura grega levando ao mundo o interesse pela razão, pela medita
ção e pela pesquisa. Os famosos filósofos da antiguidade eram, em sua maio
ria, gregos. Quando Jesus nasceu, o mundo estava impregnado do tipo de
pensamento que deixava as pessoas curiosas por ouvir algo interessante e, ao
mesmo tempo, descontentes com a mitológica religião grega. Quando ouvia
sobre algo mais consistente, o mundo grego acolhia com interesse. Percebe
mos isso pela maneira como as pessoas receberam Paulo em Atenas (ver At
17,16-21). A maior contribuição, porém, da cultura grega foi a sua própria
língua. No tempo de Jesus, o mundo falava praticamente uma só língua, a
0 evenlo ceniral da hislória 231
A cultura r o m a n a
M u i l o m a i s do que u m h o m e m
No Novo Testamento, a divindade de Jesus está muito clara. O Novo
Testamento atribui a Jesus uma série de poderes que somente podem ser
atribuídos a Deus. O próprio Jesus usou, em relação a si mesmo, expres
sões que são conotativamente divinas. Jesus disse aos Judeus: “Antes que
Abraão existisse, Eu Sou” (Jo 8.58). Claramente essa é uma referência à sua
eternidade, e somente Deus é eterno. A própria expressão “Eu Sou”, dessa
passagem, é um eco do que Deus disse a Moisés quando ele se revelou na
sarça ardente: “Eu sou o que sou” (Ex 3.14). Outra declaração surpreen
dente de Jesus foi: “Assim como o Pai tem vida em si mesmo, também
concedeu ao Filho ter vida em si mesmo” (Jo 5.26). Ele está falando de uma
autonomia com relação à vida, e só Deus pode ter isso. Os homens depen
dem totalmente de Deus para ter vida, pois eles não têm vida em si mes
mos. Ao dizer que tinha vida em si mesmo, como Deus, Jesus se equiparou
a Deus. Jesus disse ainda: “Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra”
(Mt 28.18), o que é uma referência clara à sua onipotência. O mesmo pode
ser dito de sua onipresença, pois ele disse: “Eis que estou convosco todos
os dias até à consumação do século” (Mt 28.20). Sua onisciência, por outro
lado, pode ser vista no fato de que ele conhecia os pensamentos dos seres
humanos (Mt 9.4; 12.25; 22.18; Lc 5.22; 6.8).
0 evenlo central da história 233
Jesus era o Verbo (Lagos) que desde o princípio estava com Deus e era Deus.
A tradução “Novo Mundo” das Testemunhas de Jeová fez uma pequena
modificação na passagem, que causa uma grande falha de tradução, afirman
do que a palavra theos, no versículo primeiro que é aplicada a Jesus, está sem o
artigo definido e que, portanto, pode e deve ser lida como “um deus”. Desse
modo, os Testemunhas de Jeová referem-se a Jesus como um deus menor do
que o Deus Supremo. Essa argumentação cria muitos problemas, pois há
passagens na Escritura em que theos é aplicado ao “Deus Supremo” sem o
artigo definido, como por exemplo, Lucas 20.38: “Ora, Deus não é Deus de
mortos, e sim de vivos; porque para ele todos vivem” (ver também Mc 12.27;
Jo 8.54; Fp 2.13; Hb 11.16). Também há muitas outras passagens na Escritura
em que theos aparece, no mesmo contexto, tanto com o artigo como sem ele,
mas referindo-se ao mesmo Deus (Jo 3.2; Rm 1.21; lTs 1.9; IPe 4.10-11).
Em Romanos 9.5, Jesus é chamado de “Deus bendito para todo o
sempre”. Paulo está dizendo que, embora Cristo descenda humanamente
do povo judeu, e, portanto é um judeu, ele é também muito mais do que
um judeu. Ainda que tenha uma natureza humana, ele também tem uma
natureza divina. Ele é Deus.12 Em Tito 2.13, a tradução mais comum do
versículo é: “Aguardando a bendita esperança e a manifestação da glória
do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus”. Claramente, a passagem
chama Jesus de “grande Deus”. Apesar de que alguns têm tentado tradu
zir o texto como “do nosso grande Deus e do Salvador Cristo Jesus”,
tentando fazer uma distinção, isso não faz sentido, pois a partícula “do”
não se encontra no original, e há apenas um artigo indicando uma única
pessoa. Ainda podemos acrescentar que a manifestação esperada é a Se
gunda Vinda de Jesus e não do Deus Pai. Em Hebreus 1.8-12, o Pai fala
com o Filho e lhe chama de “Deus”. Todo o início desse capítulo descre
ve Jesus como “Criador, Sustentador, Dono e Salvador, a quem é atribu
ída adoração pelos habitantes do céu”.13 Esses atributos somente podem
ser de Deus, e, portanto, aqui está mais uma prova da divindade de Jesus.
O mesmo pode ser visto em 2 Pedro 1.1, que deve ser traduzido por:
“Simão Pedro, servo e apóstolo de Jesus Cristo, aos que conosco obtive
ram fé igualmente preciosa na justiça do nosso Deus e Salvador Jesus
Cristo”. E, em 1 João 5.20, embora os unitaristas tentem diminuir o im
pacto dessa passagem que chama Jesus de “o verdadeiro Deus e a vida
eterna”, afirmando que essa frase não pode se referir a Jesus, mas ao Pai,
permanece a evidência gramatical e contextuai de que Jesus é o sujeito
dessas declarações. Não há base para negar, o Novo Testamento catego
ricamente afirma a divindade de Jesus.
0 evento central da história 235
Nascido de m u lh er
Se Jesus é o Filho, o que aponta para a sua divindade, por outro lado
Paulo diz que ele nasceu de mulher, o que enfatiza a sua humanidade. Não
só Jesus veio ao mundo realizar a missão de salvar o homem, como a de
tornar-se ele próprio um homem. Também isso estava no plano de Deus.
Paulo aponta para isso com a expressão “nascido da mulher”. A expressão,
por sua vez, nos conduz ao maior mistério desta vida. Por séculos os teólo
gos têm debatido acerca do mistério cristológico e não têm entendido sufi
cientemente a essência desse Deus que se fez homem. Esta, porém, é a
essência do Cristianismo: Deus adentrou ao tempo e se fez um de nós. Ao
vir para este mundo, Jesus entrou pela porta comum pela qual todos en
tram, nascendo de mulher. O autor do quarto evangelho diz: “O verbo se
fez carne” (Jo 1.14). Tudo isso nos aponta para a real e específica encarna
ção de Cristo, que é o maior de todos os mistérios da teologia e da própria
História. Ele não apenas parecia um homem, ele foi um homem em todos
os sentidos. Não poderia ser diferente, pois se ele veio salvar os homens,
precisava ser também um homem, pois se somente Deus poderia oferecer
um sacrifício de valor infinito, somente um homem poderia pagar como
homem. O adentrar do divino na esfera do humano nos fala da junção do
eterno com o temporal, do especial com o comum. Na plenitude dos tem
pos, Deus enviou o seu Filho, e ele nasceu de mulher.
N as cim en to virginal
Desde o início, a igreja sustentou que Jesus havia nascido sem a coopera
ção do homem. Recentemente essa doutrina tem sido atacada, não por falta
de base bíblica, mas porque contraria os princípios modernos e anti-sobre-
236 Razão da esperança
 h u m a n i d a d e de Je su s
Hoje, poucos discutem a humanidade de Jesus, pois é a sua divindade que
é posta em xeque. Na verdade, há até mesmo uma ênfase exagerada na sua
humanidade, uma tentativa de torná-lo um homem comum, com vitórias e
0 evento central da história 237
0 c u m p r i m e n t o da lei
Jesus deixou bem claro que não estava revogando a lei e nem mesmo
modificando-a com a sua vinda. Suas palavras foram inequívocas: “Não
penseis que vim revogar a lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim
para cumprir” (Mt 5.17). A pregação e o ministério de Jesus sempre esti
veram em total acordo com os preceitos da lei e dos profetas. Jesus não
era um revolucionário como muitos imaginavam, pelo menos não nesse
sentido. A lei tinha destaque e função especial no seu ministério. Isso não
quer dizer que Jesus pensasse, como os fariseus, que a rígida observância
da lei era o único modo de salvação existente. Jesus sabia muito bem que
os homens não conseguem cumprir integralmente essa lei, e sabia tam
bém que o próprio Deus havia estabelecido desde o início um sistema de
sacrifícios, que fazia propiciação pelos pecados cometidos. Ele tanto sa
bia disso que seria o próprio sacrifício que consumaria todo aquele siste
ma (Jo 1.29). É nesse sentido, inclusive, que devemos entender a expres
são: “Não vim para revogar, vim para cumprir”. Ele veio cumprir a lei
tanto ativa quanto passivamente. Ativa no sentido de que obedeceu a
todos e a cada um de seus mandamentos, estatutos e princípios. Passiva
no sentido de que preencheu a exigência penal da lei ao ser executado
como um malfeitor no lugar dos homens. Por isso, ele disse que nem um
“i” ou um “til” passaria até que tudo fosse cumprido. Se o amor de Deus
foi o motivo maior pelo qual Jesus foi enviado ao mundo (Jo 3.16), no
mesmo nível está o zelo pela lei.
A tentação de Je su s
A divindade de Jesus não tornou fácil a tarefa de cumprir a lei, nem
anulou toda possibilidade de tentação. O autor aos Hebreus diz: “Porque
não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fra
quezas; antes, foi ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas
sem pecado” (Hb 4.15). Essa passagem diz que Jesus foi tentado “em todas
as coisas, à nossa semelhança”, ou seja, ele foi submetido a todo tipo de
testes nesta vida, do mesmo modo que qualquer ser humano. Isso era abso
lutamente necessário a fim de que cumprisse sua missão, que não era ape
0 evento central da história 239
Não podia ser de outro modo, não havia outro caminho para evitar a pai
xão. Mistério dc santidade e dc misericórdia! Cristo não podia cair na tenta
ção, nem de fato caiu: não por ter-lhe faltado liberdade, mas precisamente
por causa de sua liberdade, que era uma liberdade para as coisas de Deus, para
os planos Divinos dc salvação e libertação dos homens.19
\
240 Razão da esperança
do registro bíblico sobre Jesus. Porém, têm feito isso sempre de maneira
irresponsável, sem provas e com teorias bastante especulativas e superadas,
à base do sensacionalismo. O que permanece é que todos se importam com
ele. O curioso é que, enquanto os mais eruditos e capacitados pesquisado
res se calam ou falam demais perante o mistério de sua pessoa, pessoas
simples têm a coragem de dizer: Eu o conheço, ele é o Filho de Deus, o
meu Salvador. Até aos dias de hoje o problema ainda é o mesmo que Jesus
já enfrentou em seus dias, quando questionou os seus discípulos sobre a
opinião do povo e deles próprios sobre a sua pessoa. Ele lhes perguntou:
“Quem dizeis que eu sou?” (Mt 16.15). Mateus relata o que os discípulos
responderam: “Uns dizem: João Batista; outros; Elias; e outros: Jeremias,
ou algum dos profetas” (Mt 16.14). A dúvida sempre pairou sobre a verda
deira identidade do homem de N azaré. Os m esm os conceitos
desencontrados vistos no seu tempo podem ser vistos hoje, nas mais diver
sas áreas da teologia, das ciências naturais ou dos conceitos populares. Con
tudo, na passagem de Mateus, o verdadeiro interesse de Jesus não é pela
opinião do povo, mas pela opinião do seu povo. O máximo que lhe interessa
a opinião dos outros é naquela forma que fazia seus discípulos pensarem
sobre o assunto. A pergunta que realmente importa é: “Mas vós, quem
dizeis que eu sou?” (Mt 16.15). Nas palavras de Berkouwer,
Com essa pergunta Cristo não espera ouvir, ao lado dos múltiplos concei
tos que correm a seu respeito, mais uma opinião à altura das demais; pre
tende provocar uma decisão de outra índole, existencial, diretamente correlata
com a verdade vista em sua Pessoa; quer uma resposta que supere toda
consideração teórica, resposta real e única, conforme a realidade dele.22
0 filho de M aria
mento, ele fala contra a preguiça de quem negligencia o que foi revelado.5 A
encarnação de Cristo é um grande mistério para todos nós, mas ela está
revelada na Bíblia, portanto é nossa obrigação e privilégio estudá-la.
0 credo de Calcedônia
Desde o início, a igreja se preocupou em tomar as decisões importantes
por meio de concílios. A origem dessa prática está descrita em Atos 15.6 Os
concílios eram convocados para solucionar problemas na igreja. O Concí
lio de Calcedônia foi convocado para solucionar o impasse cristológico, ou
seja, a questão do entendimento a respeito das duas naturezas de Cristo.
Nesse concílio, em 451, foi formulada a principal declaração feita até hoje
sobre a pessoa de Cristo, Em geral, os estudiosos concordam que, de lá
para cá, pouca coisa foi acrescentada às definições desse concílio. Naquela
época, a igreja lutava com dois problemas internos: O “nestorianismo” e o
“eutiquianismo”. O primeiro era a concepção de que em Cristo havia duas
naturezas separadas, a divina e a humana. Assim, o Deus Cristo e o homem
Cristo eram aspectos separados em Jesus. Certas coisas ele experimentava
como homem e certas coisas como Deus. Já o “eutiquianismo” defendia o
“monofisismo”, ou seja, que Jesus tinha apenas uma natureza a partir da
mistura entre o homem e o Deus. Era como se, em Jesus, existisse uma
“terceira natureza”, diferente da humana e da divina, formada a partir da
mistura dessas duas. O credo formulado no Concílio de Calcedônia rejeita
va ambas as posições:
Naturezas Inseparáveis
Em geral, ouvimos as pessoas dizerem que Jesus é cem por cento Deus
e cem por cento homem. Parece uma boa explicação a princípio, mas no
fundo, é um tanto quanto confusa, pois pode sugerir que ele é, ao mesmo
tempo, duas pessoas, o que não é verdadeiro, ou uma pessoa duzentos por
cento, o que soa estranho. Sempre que usamos analogias, corremos o risco
de esconder mais do que iluminar. Entendendo o risco, nos atrevemos
falar de duas analogias que podem lançar alguma luz sobre o tema. A pri
meira é a da alma humana e a do corpo humano.11 No ser humano há duas
substâncias, a material e a espiritual, que estão unidas, mas não misturadas.
0 filho de M aria 249
Talvez essa seja a chave para interpretar aquela passagem difícil da Escri
tura em que Jesus confessa não saber o dia nem a hora da sua vinda (Mt
24.36). A resposta de que ele, como Deus, sabia, mas, como homem, não
sabia, é demasiadamente simplista e até mesmo pode ser perigosa, pois pode
fazer uma ruptura na pessoa de Cristo. Precisamos entender que ele fez to
das as coisas com a sua pessoa como um todo, que era tanto humana quanto
divina. A única coisa que podemos dizer é que, como homem-Deus ele era,
ao mesmo tempo, onisciente e limitado de conhecimento. Sua onisciência
pode ser vista porque ele conhecia até os pensamentos das pessoas (Mt 9.4;
12.25). Por outro lado, ele não sabia que não havia fruto na figueira (Mc
11.23). Assim também, vemos que ele era, ao mesmo tempo, onipotente e
limitado de poder, até porque se cansava e precisava dormir (Jo 4.6; Lc 8.23),
mas em outras ocasiões andava sobre as águas e ressuscitava os mortos (Mt
14.26; Jo 11.43,44). Podemos não entender bem como isso funciona, e tal
vez o melhor mesmo fosse dizer, “Não sabemos”; porém, o que não pode
mos é dizer, “Isso ele fez como homem e aquilo como Deus”, pois, desse
modo, estaríamos dividindo a pessoa indivisível de Cristo. Hodge diz:
mulheres. A sua escolha para ser a mãe do Filho de Deus não aponta para
o mérito de Maria, mas para a graça de Deus. Como ela própria entendeu e
disse, “A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegrou em
Deus, meu Salvador, porque contemplou na humildade da sua serva. Pois,
desde agora, todas as gerações me considerarão bem-aventurada, porque o
Poderoso me fez grandes coisas. Santo é o seu nome. A sua misericórdia vai
de geração em geração sobre os que o temem” (Lc 1.46-50). Maria rendeu
toda a glória a Deus e o reconheceu como seu Salvador.
Concluímos, portanto, que, na pessoa indivisa do Redentor há duas na
turezas, a divina e a humana. Ele não se esvaziou de nenhuma delas. Essas
naturezas não se misturaram, pois mantiveram as qualidades inerentes de
cada uma, estando em completa unidade. Essa união aponta para o sucesso
da obra redentora de Cristo. Na sua própria pessoa, o Redentor transpôs o
abismo entre Deus e os seres humanos, entre o eterno e o temporal, entre
a justiça e os pecadores. Graças ao verbo que se fez carne (Jo 1.14), pode
mos ter paz com Deus (Rm 5.1).
20
A morte do M ediador
0 M ed ia d o r da aliança
O Cristo humano e divino veio para restabelecer o relacionamento en
tre Deus e os seres humanos. Um mediador somente é necessário quando
existe algum conflito entre duas ou mais partes. A função de um mediador
254 Razão da esperança
Em seus três ofícios, Jesus age como mediador entre Deus e os seres
humanos: “Como profeta ele representa Deus para com o homem, como
sacerdote, ele representa o homem na presença de Deus; e como Rei, ele
exerce domínio e restabelece o domínio original do homem”.5 Cristo é rei
supremo sobre todas as coisas desde toda a eternidade, mas isso diz mais
respeito a seus atributos de soberania. Quando pensamos no ofício real de
Cristo, estamos nos referindo ao governo que ele exerce a partir de sua
obra na cruz. Embora Cristo seja rei desde sempre, depois da sua morte e
ressurreição, ele foi mais uma vez coroado, agora como aquele que tem em
suas mãos o destino do mundo para efeitos redentores. Evidentemente,
trata-se de um reino espiritual. João descreve essa cerimônia de coroação
de Jesus nos capítulos 4 e 5 do Apocalipse, quando Jesus, descrito por um
lado como um Cordeiro (Ap 5.6) e por outro como o Leão da Tribo de
Judá (Ap 5.5), toma o livro da mão direita do que está assentado no Trono
(Ap 5.7), e começa a abrir esse livro que contém os acontecimentos que
consumam o plano redentor de Deus para o mundo. Os efeitos dessa coro
ação levaram Jesus a dizer: “Toda autoridade me foi dada nos céus e na
terra” (Mt 28.18). Aquele que desceu do céu, se fez homem, padeceu a mais
terrível das mortes, agora voltou a seu lugar de glória e assumiu um posto
ainda maior de autoridade (lTm 3.16), Paulo narra toda essa trajetória de
Jesus na sua carta aos Filipenses, numa passagem que bem poderia ser um
cântico dos primeiros cristãos:
Pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser
igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo,
A morte do M ediador 257
dotal de Jesus e de sua oferta: “Com efeito, nos convinha um sumo sacer
dote como este, santo, inculpável, sem mácula, separado dos pecadores e
feito mais alto do que os céus, que não tem necessidade, como os sumos
sacerdotes, de oferecer todos os dias sacrifícios, primeiro, por seus própri
os pecados, depois, pelos do povo; porque fez isto uma vez por todas,
quando a si mesmo se ofereceu” (Hb 7.26,27), A auto-oferta de Jesus tem
um valor incalculável diante de Deus. E o sacerdote perfeito que oferece
um sacrifício perfeito. Isso nunca foi achado no Antigo Testamento e nem
poderia ser. Por isso, o ofício sacerdotal de Cristo torna o seu sacrifício não
só superior a todos os sacrifícios do Antigo Testamento, mas a própria
razão por que aqueles sacrifícios tinham valor.
A obra sacerdotal de Cristo na terra é a base para a sua obra no céu.
Assentado à destra de Deus, Jesus continua intercedendo pelo seu povo
(Rm 8.34). O apóstolo João demonstra claramente esse entendimento: “Fi-
lhinhos meus, estas coisas vos escrevo para que não pequeis. Se, todavia,
alguém pecar, temos Advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo” (ljo
2.1).7 Os advogados humanos tentam provar a inocência do acusado, mas
Jesus sabe que os seus “clientes” não são inocentes. A defesa se baseia no
fato de que Deus não pode punir um mesmo crime duas vezes. Se Jesus já
pagou com o seu sacrifício o pecado do crente, a justiça divina não poderá
mais condená-lo.
doar como nós devemos perdoar, Nós perdoamos porque somos igual
mente pecadores, e se deixarmos de perdoar estaremos, em última instân
cia, negando o perdão a nós mesmos (Mt 6.14,15). Isso não ocorre com
Deus. Ele é absolutamente justo e santo, Se ele tolerar o pecado, estará
abrindo uma exceção que por fim o tornaria tão injusto quanto o homem.
Os ímpios perderão o seu tempo implorando pelo amor de Deus no Juízo
Final, pois o seu amor não pode anular a sua justiça. O amor não pode levá-
lo a transgredir a sua própria lei. Porém, foi justamente esse amor que levou
Jesus a morrer na cruz para satisfazer a justiça divina (Jo 3.16). Só a morte
de Jesus faz justiça ao caráter tanto amoroso como justo de Deus. Deus não
quebra a sua justiça por amor; antes, ele cumpre a justiça em amor, pois
como diz Murray: “De fato a graça reina, mas uma graça reinante à parte da
justiça não é apenas inverossímil, mas também inconcebível”.12
A consciência de Jesus
Nos estudos teológicos modernos, às vezes nega-se que Jesus soubesse
que precisava morrer, mas basta observar os Evangelhos para perceber que
ele sempre teve essa consciência. Quando pela primeira vez os discípulos
liderados por Pedro reconheceram que Jesus era o Cristo, o mestre fez
questão de lhes dizer: “E necessário que o Filho do homem sofra muitas
coisas, seja rejeitado pelos anciãos, pelos principais sacerdotes e pelos escri
bas; seja morto e, no terceiro dia, ressuscite” (Lc 9,22, Mt 16.21). E interes
sante que Jesus tenha dito: “E necessário”. Ele tinha o entendimento de
que precisava morrer pelos pecados dos seres humanos. Pedro, na mesma
ocasião, se ofereceu para dissuadi-lo dessa idéia, conforme Mateus relata:
“E Pedro, chamando-o à parte, começou a reprová-lo, dizendo: Tem com
paixão de ti, Senhor; isso de modo algum te acontecerá” (Mt 16.22). A
reação de Jesus foi imediata: “Arreda, Satanás! Tu és para mim pedra de
tropeço, porque não cogitas das coisas de Deus, e sim das dos homens” (Mt
16,23). A resposta de Jesus refletiu o entendimento de que pelo homem
aquilo jamais aconteceria, mas por Deus, sim. Sua morte era necessária, era
coisa de Deus, ele tinha plena consciência disso. Jesus Cristo não veio enga
nado, ele tinha perfeita consciência do que teria de passar (Is 53). Jesus
sabia que a sua vida de obediência espontânea ao Pai tinha como rota obri
gatória a cruz. Ele sempre soube que não havia desvios nem atalhos, a cruz
era a sua missão, a única alternativa para a salvação do seu povo. Jesus
conhecia as profecias do Antigo Testamento, que, desde Gênesis 3.15, já
A morte do M ediador 261
mim este cálice! Todavia, não seja como eu quero, e sim como tu quetes”
(Mt 26.39). Ele perguntou a Deus se não haveria alguma outra possibilida
de de o mundo ser salvo, sem que precisasse enfrentar a cruz, mas ele mes
mo sabia a resposta, por isso orou novamente: “Meu Pai, se não é possível
passar de mim este cálice sem que eu o beba, faça-se a tua vontade” (Mt
26.42). É evidente, portanto, que Jesus entendia a sua missão de morrer
pelo mundo, como está claro em todas essas passagens.
Outras passagens dos evangelhos sinóticos demonstram a consciência de
Jesus a respeito de sua morte expiatória. Por exemplo, Marcos 10.45: “Pois o
próprio Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a
sua vida em resgate por muitos” (ver Mt 20.28). Se Jesus sabia da necessida
de da sua morte, é inimaginável que não soubesse o propósito dela. Se ele
falou a seus discípulos do serviço, e falou do seu próprio ministério como
serviço, é natural que ele estivesse pensando no cântico do servo de Isaías, e
pensando no seu próprio chamado à luz disso.13 O mesmo pode ser visto
nas palavras de Jesus em Marcos 14.24 (ênfase acrescentada): “Então, lhes
disse: Isto é o meu sangue, o sangue da [nova] aliança, derramado em favor de
muitos” (ver Mt 26.28). A evocação à questão da aliança é fundamental para
entender o sentido do sangue derramado. O Deus que estabeleceu a aliança,
e que assumiu a responsabilidade por ela diante de Abraão, foi o Deus que
enviou o seu Filho para assumir a maldição da aliança. O próprio Deus assu
miu a responsabilidade pelo cumprimento ou pelo não cumprimento da alian
ça.14 Agora, pelo sangue de Cristo, o mediador, a aliança poderia ser renova
da. E nesse sentido que ela é chamada de nova aliança.
Essas passagens demonstram claramente a consciência de Jesus a res
peito da sua morte e, como diz Warfield “as questões críticas que têm sido
levantadas sobre essas passagens são negligentes”.15 Jesus sabia da necessi
dade de sua morte, e do motivo dela.
Ju sto e justificador
A morte de Cristo foi necessária porque somente assim os seres huma
nos poderiam ser perdoados, sem que Deus deixasse de ser justo. Jesus
morreu para conciliar a justiça e o amor de Deus. Talvez a melhor explica
ção bíblica a respeito deste tema se encontre no capítulo 3 de Romanos. Há
algo que Paulo deseja provar: Deus somente pode salvar o homem pecador
por meio de Cristo Jesus, independentemente de obras da lei, e isso não
desfaz a sua justiça. Nesse capítulo, Paulo faz questão de enfatizar a realida
A morte do M ediador 263
de inclinação liberal, pois eles vêm Deus apenas como amor. Baillie é dessa
opinião: “Sua ira não deve ser vista como alguma coisa que precisa ser pro
piciada e assim transformada em amor e misericórdia, mas deve ser identifi
cada com o fogo consumidor do amor inexorável de Deus em relação com
os nossos pecados”.16 Certamente ele tem bastante dificuldade em compre
ender que Deus possa ficar irado contra os pecadores que ele mesmo criou.17
Porém, é um fato bem visível na Bíblia que a ira de Deus se dirige contra o
homem pecador (verjo 3.36; Rm 1.18; 3.5; 9.22; Ef 5.6; Ap 14.10). O sacri
fício expiatório de Cristo faz propiciação pelos pecados dos seres humanos
que crêem, porque satisfaz o requerimento da lei de Deus de que o pecado
fosse julgado e condenado, e assim, ele satisfaz a ira de Deus.
Na cruz, o pecado do homem é julgado e condenado na pessoa de Jesus.
Isso cumpre o requerimento da lei de Deus e, segundo Paulo, explica tam
bém por que de Deus tolerou os pecados “anteriormente cometidos”. Ele
está se referindo aqui aos pecados cometidos na Antiga Dispensação, ou
seja, no Antigo Testamento. Precisamos lembrar que os pecadores do An
tigo Testamento ofereciam sacrifícios pelos seus pecados. Estamos falando
aqui do povo de Israel. Esses sacrifícios não tinham poder, em si mesmos,
de perdoar pecados (Hb 10.1). O fato é que eles apontavam para Cristo e,
na morte de Cristo, encontravam sua razão de ser e sua eficácia. Por esse
motivo, na explicação de Paulo, os pecadores do Antigo Testamento que os
praticavam não foram punidos, e Deus não deixou de ser justo por causa
disso. Desde o início, Deus tinha “em vista a manifestação de sua justiça no
tempo presente” (3.26). O tempo presente representa o momento do sa
crifício de Jesus. Grudem argumenta: “Como Jesus carregava sozinho a
culpa pelos nossos pecados, Deus Pai, o poderoso criador, o Senhor do
Universo, derramou sobre ele a fúria de sua ira: Jesus se tornou objeto do
intenso ódio e da vingança contra o pecado que Deus tinha guardado com
paciência desde o início do mundo”.18 Cristo recebeu sobre si toda a ira
acumulada de Deus. Devemos pensar realmente que
A cruz foi o cálice do castigo eterno, destilada da ira que estava sendo
armazenada desde o pecado de Adão, concentrada numa poção terrível. O
Filho bebeu o cálice da ira para que pudéssemos beber o cálice da salvação.
E quando cie terminou seu cálice, não sobrou nenhuma só gota para nós
que, de forma grata, recebemos o benefício da sua morte.19
Paulo continua: “Para ele mesmo ser justo e justificador daquele que
tem fé em Jesus”. Com a morte de Jesus, Deus continua sendo justo ao
mesmo tempo em que justifica o pecador, a cruz não é algo que influencia
A morte do M ediador 265
o amor de Deus; antes, foi o amor de Deus que a produziu.20 Sem a morte
de Jesus, se Deus justificasse o pecador estaria sendo injusto, e se o conde
nasse, estaria sacrificando o seu amor. A única maneira de estas duas virtu
des divinas, o amor e a justiça, permanecerem intocáveis é por meio da
morte de Jesus. Por essa razão, a morte de Jesus foi absolutamente necessá
ria, pois ela é condizente com o caráter de Deus. Como diz Stott:
Conclusão
Apesar da descrença de muitos, Deus continua salvando os homens pela
loucura da pregação do Cristo crucificado. A dificuldade das pessoas com a
doutrina da morte de Cristo é devida a uma incompreensão do próprio
caráter de Deus. Como diz Lloyd-Jones:
A dificuldade real que as pessoas têm com esta doutrina é geralmente devi
da ao fato de que todo o seu conceito de Deus é inadequado. Ignoram
alguns aspectos do Seu caráter. Enfatizam só um lado, com a exclusão dos
outros. Se elas tomassem a Deus tal como ele é c compreendessem a verda
de acerca dele, suas dificuldades se desvaneceriam.22
Concluímos, portanto, que não havia outro modo de o homem ser salvo
sem que Cristo morresse. A morte do mediador é a grande demonstração
do poder, da soberania, da justiça e do amor de Deus. Acima de tudo, cabe
alegria e louvor a Deus por ter estabelecido o plano da salvação por meio
do sacrifício de Jesus. Não devemos questionar o método de Deus, pois ele,
na sua sabedoria, é o único que tem condições de estabelecer o que é certo.
21
que as outras doutrinas, pois, como diz Benjamin Warfield, toda doutrina
surge mediante “um processo gradual e ordenado”.2 Os pais da igreja tra
taram da expiação, porém havia muitas discordâncías entre eles. O conceito
antigo mais difundido sobre a expiação entendia a morte de Cristo como
um resgate pago a Satanás.3 Essa teoria foi muito popular, especialmente
na igreja antiga. Por mais de mil anos, essa foi a idéia mais aceita sobre a
expiação. Como o próprio nome indica, essa teoria sugere que Jesus pagou
um resgate ao diabo para a libertação dos pecadores. A partir do entendi
mento de que o pecador está sob o domínio de Satanás, sendo este o deus
deste século ou o príncipe deste mundo, Jesus precisou morrer para satisfa
zer às exigências do diabo. Aos poucos, essa teoria caiu em desuso pela falta
de evidência bíblica. A principal falha dessa teoria é colocar Satanás numa
posição praticamente superior à de Deus, como se Deus tivesse que prestar
contas ao diabo.
Anselmo (1033-1109), um arcebispo da Cantuária, foi o primeiro a dar
um tratamento mais amplo para a doutrina da expiação. Segundo Warfield,
“Anselmo estabeleceu para todos os tempos as linhas gerais sobre as quais
há de ser concebida a expiação, quando se pensa nela como uma obra de
libertação do castigo do pecado”.4 Com base nas relações comerciais de
sua época entre senhores e servos, Anselmo argumentou que o pecado
havia ferido a honra de Deus. Essa honra precisava de reparo. A função de
Cristo é obedecer à lei e morrer para satisfazer a honra de Deus. Ele adqui
re para si um mérito muito grande, mas o fato é que ele não precisa desse
mérito, então, pede que o mérito seja derramado sobre o povo.5 O único
problema com essa teoria é que ela deixa de lado a questão da justiça de
Deus, enfatizando apenas a honra de Deus que precisava ser satisfeita. A
seu favor, ela tem o fato de que localiza a expiação em relação ao próprio
Deus. Deus precisava ser satisfeito, e não o diabo.
Muitas outras teorias a respeito da expiação foram desenvolvidas ao
longo da História. A seguir veremos algumas:
Teoria da Influência Moral'. Essa teoria foi formulada por Abelardo em
resposta à teoria de Anselmo. Segundo essa teoria, Deus não tem qualquer
dificuldade em perdoar os homens, ele pode perdoá-los até mesmo sem a
cruz. A cruz é apenas uma demonstração do amor de Deus. Na cruz, Deus
está dizendo que não importa o tamanho do pecado, ele pode perdoar até
mesmo o pecado de matar o seu Filho. A morte de Jesus, segundo essa
teoria, é uma tentativa de amolecer o coração do homem, influenciando-o
moralmente, para que mude de atitude e receba o perdão. Essa é uma teoria
muito popular nos dias de hoje, mas é totalmente antibíblica, pois, embora
0 subsliluto dos pecadores 269
Expiação c o m o substituição
Quando o homem pecou, ele se colocou sob a condenação da lei de
Deus. Ele ficou devendo uma reparação a Deus. Essa reparação é exigida
pela justiça de Deus, que estabeleceu uma lei para ser cumprida e uma pu
nição para quem a descumprisse. Ao contrário do que diz a maioria das
teorias expostas acima, Deus não poderia ignorar a sua lei, pois se fizesse
isso estaria negando um princípio que ele mesmo estabeleceu e, conse
qüentemente, estaria negando a si mesmo. O homem somente poderia fa
zer essa reparação se sofresse eternamente a penalidade fixada pela trans
gressão. De fato, segundo a Bíblia, muitos passarão a eternidade pagando
pelos seus crimes, mas isso exclui a possibilidade da redenção. Deus pode
ria exigir isso de todos os homens, mas em sua misericórdia providenciou
uma maneira de salvar o pecador. Deus designou um substituto para tomar
o lugar do homem no ato de receber a punição. Se alguém objetasse que um
homem só, em lugar do mundo inteiro parece desproporcional, diríamos
que de fato é, mas para o lado de Jesus. Ele, sendo Deus-homem, ofereceu
um sacrifício mais valioso do que se todos os homens fossem sacrificados
ao mesmo tempo. Assim como a intensidade da transgressão depende da
dignidade do ofendido, também o valor do sacrifício segue o mesmo prin
cípio. Não importa a quantidade de sacrifícios, mas o valor deles. O sacrifí
cio de Jesus, o perfeito Deus-homem, é de valor infinito, e, portanto, am
plamente suficiente para salvar todos os homens em todos os tempos, ain
da que, efetivamente não faça isso.
Arão porá ambas as mãos sobre a cabeça do bode vivo e sobre ele confes
sará todas as iniqüidades dos filhos de Israel, todas as suas transgressões e
todos os seus pecados; e os porá sobre a cabeça do bode e envia-lo-á ao
deserto, pela mão de um homem à disposição para isso. Assim, aquele bode
levará sobre si todas as iniqüidades deles para terra solitária; e o homem
soltará o bode no deserto (Lv 16.21,22).
verdadeiros pecadores, mas Deus fez cair sobre Jesus a iniqüidade do povo.
O versículo 8 ainda diz que ele foi ferido pela transgressão do povo. O ver
sículo 10 diz que ele deu a sua alma como oferta pelo pecado. O versículo 11
que ele leva as iniqüidades de seu povo sobre si. E o versículo 12 que ele
levou sobre si o pecado de muitos. A obra expiatória substitutiva do Messias
está bem demonstrada nessa passagem profética.
0 castigo do inferno
Isaías falou sobre a transferência do castigo pelas transgressões do povo
para o Messias. Ele disse: “Ele foi traspassado pelas nossas transgressões e
moído pelas nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele”
(Is 53.5). Se o castigo pela quebra da lei é a morte em todos os sentidos: física
274 Razão da esperança
Desceu ao infer no ?
Existe uma crença de que, durante o período em que Jesus esteve mor
to, ou seja, entre a sexta-feira e o primeiro dia da semana, ele desceu ao
inferno. Isso parece ser visto no próprio Credo Apostólico que diz em
certa altura: “Padeceu sob o poder de Pôncio Pilatos, foi crucificado, mor
to e sepultado; desceu ao Hades”. O Credo surgiu ainda no início da igreja
e refletia os ensinamentos dos apóstolos.13 Porém, a expressão “desceu ao
Hades (inferno)” é bastante discutida. Primeiramente, é preciso que se en
tenda que essa expressão não fazia parte do Credo em suas primeiras ver
sões. A frase “desceu ao inferno” não se encontrava em nenhuma das ver
sões primitivas (nas versões usadas em Roma, no resto da Itália e na África)
até que ela apareceu em uma das duas versões de Rufino em 390 d.C.14 O
próprio Rufino não entendia que a frase significasse que Jesus desceu ao
inferno literalmente, mas à sepultura. De qualquer modo, é somente a par
tir de 650 d.C. que outros começaram a usar a expressão. Considerando
isso, será que essa frase pode ser realmente considerada “apostólica”, uma
vez que o Credo é considerado tão antigo quanto os apóstolos?
A igreja católica romana entende que Jesus, após a sua morte foi para o
U mbus Patrum (Limbo dos Pais). Nesse lugar estavam os santos do Antigo
Testamento, à espera de que Jesus completasse a sua obra redentora, para
0 subsliluto dos pecadores 275
ao inferno ligam essa passagem com a anterior, e dizem que Jesus pregou às
almas dos mortos depois da sua morte. Novamente precisa ser dito que se
isso é verdade, então, a Bíblia estaria sugerindo que a salvação depois da
morte é possível. Devemos, no entanto, buscar outra interpretação para a
passagem. O contexto nos ajuda a entender o que Pedro está querendo
dizer. Pedro está dizendo, a partir do versículo primeiro, que os crentes não
deveriam mais viver em luxúrias como os demais homens, ainda que com
isso ofendessem seus contemporâneos que vivem dessa maneira, e fossem
ultrajados por eles (v. 2-4). Os ultrajadores teriam que prestar contas diante
de Deus que é competente para julgar os vivos e os mortos (v. 5). Por essa
razão, o evangelho foi pregado aos mortos, para que mesmo tendo sido
condenados na carne diante dos homens, fossem vivificados no espírito
por Deus. A passagem não está dizendo que Jesus foi até o inferno e pre
gou aos mortos para salvá-los, mas que os cristãos que estavam mortos, no
momento em que Pedro escrevia aquela carta, ouviram a palavra enquanto
estavam vivos. E que embora tivessem sofrido e até sido mortos na carne,
agora viviam segundo Deus. A frase “foi o evangelho pregado” está no
passado, ao passo que “mortos” está no presente. Eles estavam mortos no
momento em que Pedro estava escrevendo, mas quando a palavra lhes foi
pregada, estavam vivos. Até porque somente poderiam estar vivos para
poderem “ser julgados na carne”. Como poderiam ser julgados na carne se
já estavam mortos? Embora essa seja uma passagem bastante difícil e obs
cura, não é necessário pensar que ela ensine a salvação depois da morte.
0 inferno fo i à cruz
Duas expressões de Jesus não deixam dúvidas de que ele não foi ao
inferno depois da-sua morte. As duas estão relatadas no Evangelho de Lu
cas no capítulo 23. Ao ladrão que estava ao seu lado na cruz e que se arre
pendeu naquele momento ele disse: “Hoje estarás comigo no paraíso” (Lc
23.43). E sua última palavra na cruz foi: “Pai, nas tuas mãos entrego o meu
espírito” (Lc 23.46). Essas passagens parecem sugerir que, se a alma de
Jesus ficou separada do seu corpo enquanto ele estava no sepulcro, certa
mente ela não foi até o inferno, antes pelo contrário foi até o paraíso, até
Deus.16 Quanto ao que Jesus disse a Maria Madalena, após a sua ressurrei
ção, que ainda não havia subido ao Pai (Jo 20.17), devemos entender como
uma referência à sua subida física. Com o corpo ressuscitado, naquela ma
nhã da Páscoa, ele ainda não tinha subido ao céu. Mas nada impede que seu
espírito já tivesse ido até Deus para recepcionar o ladrão convertido.
278 Razão da esperança
Os efeitos da expiação
Os efeitos da expiação são imensos, eles não alcançam apenas o povo de
Deus, mas toda a criação. Todas as coisas existentes, de um modo ou de
outro, foram afetadas pela expiação de Cristo.
280 Razão da esperança
Em relação a Deus
Em relação a o ser h u m a n o
O ser humano, sem sombra de dúvida, foi o grande beneficiado com a
expiação. O homem que por natureza está “morto em delitos e pecados”
(Ef 2.1), que “carece da glória de Deus” (Rm 3.23), a partir da expiação
pode se tornar filho de Deus. Nas palavras de Pedro: “Vós, porém, sois
raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de
Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das
trevas para a sua maravilhosa luz; vós, sim, que, antes, não éreis povo,
mas, agora, sois povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia,
mas, agora, alcançastes misericórdia” (IPe 2.9,10). Essa é a posição que a
expiação de Cristo garante ao povo salvo. Os pecadores, outrora privados
da presença de Deus, agora têm “intrepidez para entrar no Santo dos
Santos, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos con
sagrou pelo véu, isto é, pela sua carne” (Hb 10.19,20). Para resumir, a
expiação garante aos remidos toda sorte de bênção espiritual (Ef 1.3).
Para aqueles que pensam que a expiação deve garantir a todos os homens
a salvação, a Bíblia é bastante clara ao afirmar que Jesus morreu apenas
pelo seu povo.
0 subslilulo dos pecadores 281
Em relação ao diabo
Em relação à criação
A morte de Cristo não foi somente para salvar as pessoas, mas para
renovar a própria terra e tirá-la da maldição do pecado. Literalmente, para
fazer uma nova terra, afinal, ele é o cordeiro que tira o pecado do mundo
(cosmos; Jo 1.29).
Por mais estranho que possa parecer a princípio, de alguma maneira, o
próprio céu também se beneficia da redenção. Estamos falando aqui de
algumas coisas que não entendemos de todo. Mas o autor aos Hebreus diz:
“Era necessário, portanto, que as figuras das coisas que se acham nos céus
se purificassem com tais sacrifícios, mas as próprias coisas celestiais, com
sacrifícios a eles superiores. Porque Cristo não entrou em santuário feito
por mãos, figura do verdadeiro, porém no mesmo céu, para comparecer,
agora, por nós, diante de Deus” (Hb 9.23,24). De algum modo o pecado
que entrou no mundo, e que se originou primeiramente no Diabo e depois
em Adão, tornou necessária a purificação do tabernáculo celestial (Êx 25.40).
Esse lugar celestial precisava ser purificado e Jesus fez isso com o seu san
gue. Não sabemos exatamente que tipo de impureza adentrou o céu, mas
sabemos que Satanás estava lá, e foi expulso por causa da morte, ressurrei
ção e ascensão de Jesus. Pode ser que Paulo tenha isso em mente quando
diz: “E que, havendo feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele,
reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos
céus” (Cl 1.20). Essa passagem está dizendo que Cristo, por meio do seu
sangue reconciliou não somente coisas na terra, mas também no céu. Tal
vez seja essa uma das razões porque a Bíblia diz que haverá não só uma
nova terra, mas também “novos céus” (Is 66.22; 2Pe 3.13; Ap 21.1). Tudo o
que o pecado influenciou terá que ser renovado.
Isso nos remete ao assunto da introdução deste capítulo: A seriedade
com que Deus trata o pecado. O fato de os homens estarem acostumados
com o pecado não o torna menos trágico. Diante de Deus, o pecado é
inaceitável porque fere a sua santidade infinita. Por essa razão, Cristo teve
que ser o nosso substituto. Há muita pregação do evangelho nos nossos
dias que não enfatiza o caráter substitutivo da morte de Jesus. Isso é um
grave erro. As pessoas precisam entender a realidade e a gravidade do seu
pecado, bem como o custo da redenção que foi a morte substitutiva de
Cristo. Uma coisa precisa ficar bem clara: “Onde não há expiação não há
evangelho”.24 O evangelho sem cruz pode ser agradável aos homens, mas
em hipótese alguma agrada a Deus.
22
A tradição reformada
A partir do desenvolvimento da doutrina da expiação na tradição refor
mada (calvinista), que tem a ver com a obra da redenção realizada por Cris
to na cruz, a pergunta “Por quem Cristo morreu?” começou a ter grande
importância.2 Devido ao entendimento de que o sacrifício de Cristo não
apenas possibilita, mas realmente expia, ou seja, perdoa os pecados, a teo
logia reformada sustenta que Cristo morreu exclusivamente pelos pecados
do seu povo. Os teólogos reformados começaram a pensar que a morte de
Cristo não poderia de fato se estender a todos os homens sem exceção. O
que a morte de Cristo poderia fazer por um Judas Iscariotes? Qual teria
sido o benefício de Cristo derramar o seu sangue por alguém que já estava
no inferno quando ele morreu? Como diz Louis Berkhof, “a posição refor
mada é que Cristo morreu com o propósito de real e seguramente salvar os
eleitos, e somente os eleitos. Isso equivale a dizer que ele morreu com o
propósito de salvar somente aqueles a quem ele de fato aplica os benefícios
da Sua obra redentora”.3 Segundo essa interpretação, Cristo não poderia
ter morrido pelos pecados do mundo inteiro, pois, se tivesse feito isso, teria
necessariamente salvo todas as pessoas do mundo inteiro.
A doutrina da expiação limitada ou definida4 é elaborada sobre a doutrina
da eleição ou predestinação. A doutrina da predestinação diz que Deus, desde
toda a eternidade, escolheu para si um número certo e limitado de pessoas, as
quais serão salvas, enquanto preteriu o restante, que deverá pagar pelos seus
próprios pecados. O eminente teólogo reformado Charles Hodge diz:
0 ensino de Jesus
Inicialmente, devemos perceber que Jesus fala em morrer pelas suas
ovelhas. Ele disse: “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas
ovelhas” (Jo 10.11). Nessa passagem, ele está falando do amor do pastor
em contraste com os interesses do mercenário. O pastor dá a vida pelas
ovelhas, enquanto o mercenário, na hora do perigo, foge. Jesus está afir
mando que ele, como bom pastor, iria dar a vida pelas ovelhas. A respeito
dessas ovelhas ele disse: “Conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem
a mim” (Jo 10.14), Em seguida, ele disse: “Ainda tenho outras ovelhas, não
deste aprisco; a mim me convém conduzi-las; elas ouvirão a minha voz;
então, haverá um rebanho e um pastor” (Jo 10.16). Mas certamente essas
ovelhas não eram todas as pessoas do mundo sem exceção. Mais à frente
ele disse para um grupo de incrédulos: “Vós não credes, porque não sois
das minhas ovelhas. As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço,
e elas me seguem” (Jo 10.26,27). A conclusão óbvia que podemos chegar a
partir dessa afirmação de Jesus é que, se aquelas pessoas não eram suas
ovelhas, portanto, ele não morreria por elas, pois ele disse que morreria
pelas suas ovelhas. Então, significa que Jesus não morreu por todas as pes
soas, mas apenas por suas ovelhas. Essa afirmação de Jesus limita o alcance
da expiação. Ele morreu pelo seu povo, pelas suas ovelhas.
Em outras passagens, Jesus deixou claro que morreria não por todos,
mas por muitos: “O Filho do homem, que não veio para ser servido, mas
para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Mt 20.28). Embora o
seu sacrifício tenha poder para salvar a todos, ele mesmo disse que objetiva
mente daria a sua vida em resgate por muitos.10 A mesma linguagem pode
ser encontrada em Hebreus 9.28-, “Também Cristo, tendo se oferecido uma
vez para sempre para tirar os pecados de muitos, aparecerá segunda vez,
sem pecado, aos que o aguardam para a salvação”. Segundo essa passagem,
Cristo se ofereceu objetivamente para “tirar” os pecados de muitos, e é
para esses que ele aparecerá segunda vez. E lógico que ele não poderia tirar
os pecados de todos, senão todos seriam salvos.
Jesus intercedeu apenas por aqueles que considerava seus discípulos. O
capítulo 17 de João transcreve a oração que Jesus fez pouco antes de mor
rer. Nessa oração, ele faz questão de orar pelos seus discípulos: “Manifestei
o teu nome aos homens que me deste do mundo. Eram teus, tu mos confi
aste, e eles têm guardado a tua palavra” (Jo 17.6). Em seguida, Jesus faz
questão de delimitar o escopo de sua oração: “É por eles que eu rogo; não
A exlcnsão da expiação de Crislo 2 87
rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus” (Jo
17.9). Ele estava orando apenas pelos seus discípulos. Uma pergunta per
manece: Por que ele não oraria pelas outras pessoas do mundo, se tivesse
dado a sua vida em resgate delas também? A passagem claramente diz que
ele orou apenas pelos crentes: “Não rogo somente por estes, mas também
por aqueles que vierem a crer em mim, por intermédio da sua palavra” (Jo
17.20). Nesse dia, em Jerusalém, Jesus orou somente pelos seus discípulos
e pelos que ainda viriam a crer nele e se tornariam seus discípulos. Ele não
orou pelo mundo incrédulo. Sua obra de intercessão depende da sua obra
de expiação, pois é só por meio da sua morte que ele pode conceder bene
fícios aos homens. Se ele não orou pelas demais pessoas do mundo é por
que não morreria por elas. Se Jesus tinha em mente dar a sua vida por todas
as pessoas do mundo, então não haveria razão em orar apenas pelos que já
eram ou seriam seus discípulos. Ele deveria orar para que os demais se
tornassem discípulos, mas não foi isso o que ele fez.
vos, pois nessas passagens a expiação de Cristo é descrita como um ato real
de conceder a vida.
A passagem que parece afirmar de modo mais claro que a morte de
Cristo foi pelo mundo inteiro é 1 João 2.2: “E ele é a propiciação pelos
nossos pecados e não somente pelos nossos próprios, mas ainda pelos do
mundo inteiro”. O argumento em favor da expiação definida entende a
expressão “mundo” nessa passagem como uma descrição generalizada,
querendo apontar para um grupo especial, o grupo dos salvos do mundo
inteiro. Não significa cada pessoa do mundo sem exceção, pois caso con
trário, essa propiciação evidentemente salvaria todas as pessoas. E preciso
lembrar que propiciação significa “apaziguar a ira de Deus”. Se Jesus apazi
guou a ira de Deus para cada pessoa do mundo, então, Deus não estaria
mais irado com ninguém, e todos poderiam ir para o céu. Devemos enten
der a expressão “mundo inteiro” como algo que visa fazer um comparativo
com o “filhinhos” do versículo 1: “Filhinhos meus, estas coisas vos escrevo
para que não pequeis. Se, todavia, alguém pecar, temos Advogado junto ao
Pai, Jesus Cristo, o Justo” (ljo 2.1). Os “filhinhos” de João eram aqueles
para quem ele escrevia a carta. Jesus era o Advogado desses filhinhos, pois
fez propiciação por eles, e não somente por eles, mas pelos pecados do
mundo inteiro, ou seja, pelos pecados dos crentes do mundo inteiro (os
outros filhinhos). João liga a propiciação de Jesus com sua obra como ad
vogado diante de Deus. Jesus não pode ser o advogado de todos os ho
mens, senão todos os homens terão todos os seus pecados perdoados.
Outro argumento bastante usado contra a expiação definida é que, se
Cristo morreu apenas por um número limitado de pessoas, isso tornaria im
possível o oferecimento livre do evangelho. O questionamento parece lógico:
Se Cristo não morreu por todos, então, por que o evangelho é oferecido a
todos? Além do mais, há passagens que claramente indicam que Deus deseja
que todos sejam salvos, por exemplo, Ezequiel 33.11: “Tão certo como eu
vivo, diz o S e n h o r Deus, não tenho prazer na morte do perverso, mas em
que o perverso se converta do seu caminho e viva. Convertei-vos, convertei-
vos dos vossos maus caminhos; pois por que haveis de morrer, ó casa de
Israel?” Também 1 Timóteo 2.4 fala algo semelhante: “O qual deseja que
todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verda
de”. E ainda 2 Pedro 3.9: “Não retarda o Senhor a sua promessa, como
alguns a julgam demorada; pelo contrário, ele é longânimo para convosco,
não querendo que nenhum pereça, senão que todos cheguem ao arrependi
mento”. Como harmonizar a noção da expiação definida com essas passa
gens e com a livre oferta do evangelho? Quanto ao questionamento sobre a
290 Razão da esperança
Limitada em alcance ou e m p o d er
Apesar de muitos ficarem surpresos com essa declaração, a verdade é que
todo cristão ortodoxo terá que pôr limites à obra salvífica de Cristo. Pois se
.A extensão da expiação de Cristo 291
alguém crê que Cristo morreu por todas as pessoas deste mundo, entretanto,
nem todas as pessoas deste mundo serão realmente salvas, então, a obra de
Cristo é limitada em seu poder, pois ela não salva efetivamente ninguém.
Entretanto, se alguém crê que a obra de Cristo, embora poderosa o suficien
te para salvar toda e cada pessoa, foi feita apenas em favor do povo escolhi
do, a igreja, então, essa expiação é limitada no seu escopo ou no seu propó
sito, mas não em poder, Se Cristo morreu por pessoas que estão no inferno,
então os seus esforços não podem realmente ser chamados de obra salvífica.
Muitos afirmam que Cristo, ao morrer, não salvou ninguém realmente, ele
apenas tornou os homens salváveis, entretanto, se isso é assim, então não há
real “poder no sangue”. Ao contrário, parece que o poder está na vontade da
criatura, como se a criatura conferisse poder ao sangue de Cristo.
Se Cristo de fato tivesse morrido por todos os homens sem exceção,
então, em muitos casos, ele teria sido impotente, porque apesar de ter dado
a vida por alguma pessoa, talvez essa pessoa acabasse no inferno, Com
relação a isso, ainda poderíamos perguntar: Quando Cristo morreu, já ha
via pessoas no inferno? Sim, todas as pessoas que morreram sem salvação
antes da sua vinda. A pergunta é: Ele morreu por elas também? Parece
ilógico dizer que sim, pois seria um desperdício de um sangue tão precioso.
Teria Cristo morrido por Judas Iscariotes? A Bíblia chama Judas de “o filho
da perdição” (Jo 17.12), e diz que tudo o que aconteceu por meio dele
aconteceu segundo o que as próprias Escrituras haviam profetizado (Mt
26,24). De acordo com a Escritura, Judas não tinha chances de ser salvo,
então, por que Jesus morreria por ele?
A Escritura fala da obra de Cristo em termos definitivos em favor do
salvo. Se ele morreu por todos os homens, então todos os homens precisa
riam de fato ser salvos. Só há duas opções, ou a redenção é limitada no seu
alcance ou é limitada no seu poder. É preferível pensar que ela seja limitada
no alcance, ou seja, que não foi feita para alcançar todos os seres humanos.
Ela não é limitada em poder, pois pode salvar completamente todos aque
les a quem foi destinada. Se dissermos que Cristo morreu por todos os
seres humanos, então limitamos a expiação em seu poder, pois, nesse caso,
ela não consegue salvar todos os homens. A Escritura, entretanto, deixa
bem claro o poder e a eficácia da obra de Cristo. Nesse ponto, é importante
rever algumas passagens bíblicas que descrevem a expiação feita por Cristo
como redenção, propiciação, reconciliação e substituição, as quais descre
vem o que realmente Cristo fez ao morrer na cruz.11
Redenção é provavelmente o principal termo bíblico para descrever a ex
piação. Significa “comprar de volta”, ou “retornar à possessão de alguém
292 Razão da esperança
0 t e s t e m u n h o da Escritura
meu espírito exulta; até o meu corpo repousará seguro. Pois não deixarás
a minha alma na morte, nem permitirás que o teu Santo veja corrupção”
(SI 16.9,10). Igualmente, o profeta Isaías fala que o Servo Sofredor, após
todo o sofrimento que teria que passar, não seria vencido pela morte:
“Todavia, ao S e n h o r agradou moê-lo, fazendo-o enfermar; quando der
ele a sua alma como oferta pelo pecado, verá a sua posteridade e prolon
gará os seus dias; e a vontade do S e n h o r prosperará nas suas mãos” (Is
53.10). O profeta diz que, depois de oferecer a sua alma pelo pecado, o
Messias veria seus dias se prolongarem. Isso só pode ser um anúncio da
sua ressurreição. Como poderia ele ver os seus dias se prolongarem se
estivesse morto? A passagem está sugerindo que, após a morte, o Messias
voltaria à vida.
Para os crentes do Novo Testamento, os registros dos apóstolos e discí
pulos, que testemunharam a ressurreição de Cristo, são suficientes para a
fé. Marcos relata:
Testemunhas oculares
saria pesar cerca de duas toneladas. Porém, a pedra não era o único empe
cilho à saída do túmulo; Mateus diz que foi colocada uma escolta junto ao
sepulcro para impedir que os discípulos roubassem o corpo. A guarda ro
mana era composta de até dezesseis homens. Além disso, essa guarda selou
a pedra (ver Mt 27.65,66). O selo foi provavelmente fornecido por Pilatos e
demonstrava que o túmulo estava sob a proteção do Império Romano. Não
seria fácil roubar o corpo. Não havia a mínima possibilidade de que o
grupinho de desanimados discípulos fosse enfrentar a escolta romana e
retirar o corpo. A punição para a quebra do selo seria a crucificação. Os
judeus admitiram a evidência do túmulo vazio. Existem evidências históri
cas de que eles mandaram mensageiros aos quatro cantos do mundo para
desmentir que Jesus tinha ressuscitado, alegando que os discípulos tinham
roubado o corpo, ou seja, admitiram que o corpo havia desaparecido. O
fato histórico permanece: o corpo sumiu, o túmulo está vazio.
reição de Cristo. E deve ser lembrado que não foi só entusiasmo que eles
demonstraram, foi martírio também. Eles não só colocaram a própria vida
em risco, como realmente morreram pela causa de Cristo, Aparentemente,
o único apóstolo que não foi martirizado foi João,2 todos os demais sofre
ram a morte de mártir. Se negassem a Jesus antes da execução poderiam ser
perdoados, mas não fizeram isso. Alguém até pode defender uma mentira
para benefício próprio, mas quantos estariam dispostos a morrer por uma
mentira? O martírio dos apóstolos é uma evidência poderosíssima da res
surreição de Cristo.
0 fa t o m a i s atestado
Como diz Charles Hodge, “pode-se asseverar com segurança que a res
surreição de Cristo é, ao mesmo tempo, o fato mais importante e mais
autenticado da história do mundo”.3 Esse autor fornece uma série de ra
zões que confirmam isso:4 1) Ela foi predita no Antigo Testamento. 2) Ela
foi predita pessoalmente por Cristo. 3) Tratou-se de um fato facilmente
verificável. 4) Forneceu evidência abundante, apropriada e reiterada de sua
verdadeira ocorrência. 5) As testemunhas do fato de que Cristo foi visto
vivo depois da sua morte na cruz eram numerosas, competentes e, em to
dos os sentidos, dignas de confiança. 6) A sinceridade da convicção delas
foi demonstrada pelos seus sacrifícios, inclusive o de suas vidas, em decor
rência do seu testemunho. 7) Seu testemunho foi confirmado por Deus, ao
dar testemunho juntamente com eles, com sinais e prodígios, com diversos
milagres e com os dons do Espírito Santo. 8) Esse testemunho do Espírito
continua até o tempo atual e é concedido a todos os genuínos filhos de
Deus, porque o Espírito dá testemunho da verdade no coração e na cons
ciência. 9) O fato de que a ressurreição de Cristo tem sido comemorada
como uma observância religiosa do primeiro dia da semana, desde a sua
ocorrência até hoje. 10) Os efeitos produzidos pelo seu evangelho, e a mu
dança que ele tem efetuado no estado do mundo, não admitem nenhuma
outra solução racional além da veracidade da sua morte e subseqüente res
surreição. A igreja cristã é seu monumento desse fato, e todos os crentes
são suas testemunhas.
Josh MacDowell, num excelente livro intitulado A s Evidências da Ressur
reição de Cristo, narra a história de um importante advogado de Harvard, o
Dr. Simon Greenleaf, que decidiu aplicar as regras do direito para o aconte
cimento da ressurreição e acabou convencido de sua veracidade.5 Horton,
contando a mesma história, diz que esse advogado, que fundou a Escola de
Ressurreição: A grande vitória 301
0 co rp o ressuscitado
lo Paulo, possa ser chamado também de corpo espiritual. Não temos con
dições de entender exatamente como é esse corpo, a única coisa que pode
mos dizer é que ele é “material” e “espiritual” ao mesmo tempo. E um
corpo absolutamente perfeito e sem os limites impostos pela fraqueza ou
pelo pecado. A seguinte definição de Hodge é muito útil: “O corpo ressurecto
de Cristo, portanto, tal como existe agora no céu, ainda que retenha a iden
tidade com seu corpo enquanto estava na terra, é glorioso, incorruptível,
imortal e espiritual. Continua ocupando determinada porção de espaço e
retém todas as propriedades essenciais como corpo”.8 A definição de
Berkhof é semelhante: “Sua ressurreição consistiu em que nele a natureza
humana, o corpo e a alma, foi restaurada à sua prístina força e perfeição e
até mesmo elevada a um nível superior, enquanto que o corpo e a alma
foram reunidos num organismo vivo”.9
Por mais que os críticos modernos rejeitem a noção histórica da ressur
reição de Cristo, afirmando ser uma mensagem inventada pelos discípulos,
como diz Ladd, o que deu origem à igreja “foi a crença em um evento
acontecido no tempo e no espaço: Jesus de Nazaré ressuscitou dentre os
mortos. Fé na ressurreição de Jesus é um fato histórico inevitável. Sem essa
evidência não haveria igreja”.10 Foi a certeza da ressurreição que transfor
mou aqueles homens simples da Galiléia em poderosas testemunhas de
Jesus em todo o mundo. A convicção de que Jesus venceu a morte lhes
dava a certeza de que, mesmo que morressem no testemunho, poderiam
experimentar a mesma experiência do Senhor: a vitória sobre a morte.
C o n su m a çã o da redenção
Levando adiante a argumentação do capítulo 15 de 1 Coríntios, Paulo
enfatiza o verdadeiro significado da ressurreição; ele diz: “E, se Cristo não
ressuscitou, é vã a nossa pregação, e vã, a vossa fé” (ICo 15.14). Disso
decorre que a ressurreição de Cristo tem um enorme significado para a fé
crista. Em seguida, ele complementa: “E, se Cristo não ressuscitou, é vã a
vossa fé, e ainda permaneceis nos vossos pecados” (ICo 15.17). A ressur
Ressurreição: A grande vitória 303
Constituiu uma declaração do Pai de que o último inimigo tinha sido venci
do, a pena tinha sido cumprida, e tinha sido satisfeita a condição em que a
vida fora prometida. Foi um símbolo daquilo que estava destinado a suce
der aos membros do corpo místico de Cristo em sua justificação, em seu
nascimento espiritual e em sua bendita ressurreição futura. Relacionou-se
também instrumentalmente com a justificação, a regeneração e a ressurrei
ção final dos crentes.12
Certeza da justificação
A ressurreição está ligada à nossa justificação. Paulo diz que Cristo foi:
“Entregue por causa das nossas transgressões e ressuscitou por causa da
304 Razão da esperança
Possibilidade do n o v o na sci m en to
Podemos dizer, além disso, que é por meio da ressurreição de Jesus que
Deus opera o Novo Nascimento na nossa vida. 1 Pedro 1.3 diz: “Bendito o
Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua muita miseri
córdia, nos regenerou para uma viva esperança, mediante a ressurreição de
Jesus Cristo dentre os mortos”. Regenerou significa literalmente “nos fez
nascer de novo”. Pedro diz que isso foi possível mediante a ressurreição de
Cristo. Em várias de suas passagens, a Bíblia fala do novo nascimento como
um tipo de ressurreição, pois o novo nascimento é uma ressurreição espiri
tual possibilitada pela ressurreição física de Cristo. Paulo diz: “Fomos, pois,
sepultados com ele na morte pelo batismo; para que, como Cristo foi res
suscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também andemos nós
em novidade de vida” (Rm 6.4), Esta novidade de vida é a vida que se
origina com o novo nascimento. Também Efésios 2.6 fala que “juntamente
cüm ele, nos ressuscitou, e nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo
Jesus” (ver também Cl 2.12). Ou seja, já experimentamos uma ressurreição
na nossa vida: o novo nascimento. Isso só foi possível por causa da ressur
reição de Cristo.
Ressurreição: A grande vitória 305
M u d a n ç a d o dia de d es ca n so
O próprio dia de descanso mudou a partir da ressurreição de Jesus. Sa
bemos que no Antigo Testamento os israelitas observavam o sétimo dia
como dia de descanso. Porém, a partir da narrativa da ressurreição de Jesus,
acontecida no primeiro dia da semana, ou seja, no domingo, este passou a
ser o dia de culto e adoração do povo de Deus. Isso pode ser visto porque
há centenas de citações sobre o sábado no Antigo Testamento, mas nem
uma única ordenança sobre ele no Novo. Mas encontramos a declaração de
que os cristãos se reuniam e até celebravam a Ceia do Senhor no primeiro
306 Razão da esperança
dia da semana: “No primeiro dia da semana, estando nós reunidos com o
fim de partir o pão, Paulo, que devia seguir viagem no dia imediato, exorta
va-os e prolongou o discurso até à meia-noite” (At 20.7). Do mesmo modo,
Paulo manda coletar ofertas nesse dia: “No primeiro dia da semana, cada
um de vós ponha de parte, em casa, conforme a sua prosperidade, e vá
juntando, para que se não façam coletas quando eu for” (ICo 16.2). Não foi
preciso um novo mandamento; o acontecimento histórico da ressurreição,
acontecido no primeiro dia da semana, foi suficiente para que a igreja pri
mitiva passasse a guardar esse dia como o Dia do Senhor (Ap 1.10). Sabe
mos isso não apenas dos escritos bíblicos, mas também dos escritores pri
mitivos, dos tempos da igreja pós-apostólica, como Justino,15 Dionísio,
Irineu, e outros que foram inclusive discípulos dos apóstolos. Eles nos di
zem que os cristãos guardavam o primeiro dia da semana. A ressurreição
mudou o dia de descanso e de adoração. É claro que havia uma diferença na
maneira como os cristãos guardavam o domingo, em relação ao modo como
os judeus guardavam o sábado. Para o judeu era uma obrigação legal, para
o cristão um dia de adoração e serviço voluntário.
Esse poder está disponível para transformar dia a dia a vida dos crentes,
para que eles se tornem progressivamente mais semelhantes a Cristo.
"Pelo que t a m b é m D eus o exaltou sob rem a n eira e lhe deu o n o m e que está a cim a de todo
n o m e , p ara q ue a o n o m e de Jes u s se dobre todo jo elh o , n o s céus, na terra e debaixo da terra,
e toda lín g u a c o n fe s s e q ue Je s u s Cristo é Senhor, p ara g ló r ia d e D eus Pai " (Fp 2 .9 -1 1 ).
0 retom o do filho
Não existe lugar melhor do que o nosso lar. Isso é o que quase todos
sentem quando retornam de alguma viagem longa. A ascensão marcou a
volta de Jesus para o seu lar, porém isso não quer dizer que o lar de Jesus
seja em algum lugar no espaço acima de nós. E comum a Escritura descre
ver o céu como acima, mas isso é uma força de expressão. O céu é um lugar
real, mas a sua dimensão é espiritual. Não é só um estado, é um lugar;
porém, não é possível chegar a esse lugar pelo uso de algum meio de trans
porte criado pelo ser humano. Para chegar ao céu, é preciso mudar da di
mensão física para a espiritual.
O Evangelho de João narra a trajetória da vida de Jesus como uma via
gem de ida e de retorno. Ele veio aqui por meio do seu nascimento e voltou
para o seu lugar pela ascensão. Nascimento e ascensão são aspectos opos
tos da manifestação de Cristo. Em João 17, Jesus falou da posição que
ocupava no céu com Deus antes de sua encarnação: “Eu te glorifiquei na
terra, consumando a obra que me confiaste para fazer; e, agora, glorifica-
me, ó Pai, contigo mesmo, com a glória que eu tive junto de ti, antes que
houvesse mundo” ( Jo 17.4,5). E ele completou: “Pai, a minha vontade é
que onde eu estou, estejam também comigo os que me deste, para que
vejam a minha glória que me conferiste, porque me amaste antes da funda
ção do mundo” (Jo 17.24). Antes de vir a este mundo, Jesus desfrutava de
uma posição de glória e amor em seu relacionamento com o Pai, porém,
por algum tempo, ele ficou longe disso, embora não totalmente (exceto
talvez no momento da crucificação). O fato é que, ao adentrar o mundo,
Jesus se esvaziou de algumas de suas prerrogativas. Paulo diz aos Filipen-
ses: “Pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação
o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de
servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura
humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e
morte de cruz” (Fp 2.6-8). Jesus não se esvaziou da sua divindade quando
adentrou o mundo, ele nunca deixou de ser Deus, ele apenas abriu mão de
seu status divino, pois precisava se humilhar como homem. Paulo não está
dizendo que Jesus se esvaziou de sua divindade, mas que ele se esvaziou de
seus direitos divinos, especialmente da sua glória. E, de fato, o carpinteiro
de Nazaré não foi reconhecido como um dos grandes deste mundo. Ainda
que João tenha dito que sua glória pôde ser vista na Encarnação (Jo 1.14), é
Ascensão: a coroação do Rei 311
Miguel e os anjos bons contra Satanás e seus anjos decaídos como uma
descrição da vitória de Jesus na ascensão. João descreveu uma mulher radi
ante que deu à luz um filho varão (Ap 12.1,2). O dragão fez de tudo para
devorar o filho da mulher (Ap 12.3,4), mas o filho foi arrebatado para Deus
até ao seu trono (Ap 12.5). Em seguida, João descreveu a peleja no céu:
“Miguel e os seus anjos pelejaram contra o dragão. Também pelejaram o
dragão e seus anjos; todavia, não prevaleceram; nem mais se achou no céu
o lugar deles. E foi expulso o grande dragão, a antiga serpente, que se cha
ma diabo e Satanás, o sedutor de todo o mundo, sim, foi atirado para a
terra, e, com ele, os seus anjos” (Ap 12.7-9). Com a entronização de Jesus,
o diabo perdeu o seu lugar e com ele todos os seus anjos. Eles foram expul
sos em direção a terra, porém, mesmo na terra não poderão ficar muito
tempo (Ap 12.12). Os inimigos já estão debaixo de seus pés, o esmagamen
to final é apenas questão de tempo.
U m n o v o estado para a h u m a n id a d e
A igreja é a grande beneficiada com a exaltação de Jesus, pois, graças a
essa exaltação, Jesus tem capacitado a sua igreja para a tarefa de evangeliza
ção, o que, de certo modo, também é uma maneira de fazer os inimigos
baterem em retirada. Os dons que ele distribui para o seu povo são frutos
da sua ascensão. Paulo fala disso na carta aos Efésios: “Por isso, diz: Quan
do ele subiu às alturas, levou cativo o cativeiro e concedeu dons aos ho
mens” (Ef 4.8). Os dons que foram dados à igreja para realizar a difícil
tarefa de convencer o mundo e edificar os crentes vêm a nós por causa da
ascensão de Cristo. Sua exaltação era necessária para que pudesse conceder
a seu povo um pouco do seu poder. Paulo tem mais a falar sobre a impor
tância da exaltação de Cristo para a igreja. Ele diz que Deus fez Cristo
“sentar à sua direita nos lugares celestiais, acima de todo principado, e
potestade, e poder, e domínio, e de todo nome que se possa referir, não só
no presente século, mas também no vindouro. E pôs todas as coisas debai
xo dos pés, e para ser o cabeça sobre todas as coisas, o deu à igreja, a qual é
o seu corpo, a plenitude daquele que a tudo enche em todas as coisas” (Ef
1.20-23). Cristo exaltado e assentado à destra de Deus é o governador su
premo de todas as coisas, mas quem se beneficia com isso é a igreja, de
quem ele é a Cabeça. Sua posição de autoridade garante a segurança e a
eficácia de sua igreja durante a peregrinação dela neste mundo. O fato de
Cristo estar no céu não significa que ele esteja limitado ao céu, pois a sua
Ascensão : a coroação do Rei 315
onipresença garante que ele esteja com seu povo todos os dias até a consu
mação do século (Mt 28.20).4
A ascensão de Cristo nos fala de um novo estado para a humanidade. A
humanidade, decaída em Adão, agora passa a ser exaltada em Cristo. É
lógico que isso é privilégio somente dos crentes em Jesus. A Bíblia diz que
Deus, juntamente com Jesus, “nos ressuscitou, e nos fez assentar nos luga
res celestiais em Cristo Jesus” (Ef 2.6). De alguma maneira maravilhosa,
Cristo está no céu assentado à destra de Deus, e nós estamos lá com ele.
Nós não só experimentamos a ressurreição de Cristo, o que foi estudado
no capítulo anterior, como participamos de sua ascensão. O fato de estar
mos espiritualmente assentados com Cristo nos lugares celestiais nos ga
rante uma autoridade de que o homem nunca dispôs, exceto, talvez, no
caso de Adão antes da queda. Não só participamos do combate espiritual,
lutando “contra os principados e potestades, contra os dominadores deste
mundo tenebroso” (Ef 6.12),. como somos armados de armas que “não
são carnais, e sim poderosas em Deus, para destruir fortalezas, anulando
nós sofismas e toda altivez que se levante contra o conhecimento de Deus,
e levando cativo todo pensamento à obediência de Cristo” (2Co 10.4). Tam
bém somos colocados numa posição de juizes deste mundo e até dos anjos
(ICo 6.3). Assim se cumpre em nós aquilo para o que desde o início Deus
nos criou, conforme a Bíblia testemunha do homem: “Fizeste-o, por um
pouco, menor que os anjos, de glória e de honra o coroaste [e o constituíste
sobre as obras das tuas mão?*] (Hb 2.7; ênfase acrescentada). Em Cristo, estamos
exaltados à destra de Deus, fomos elevados a um novo estado, o estado da
ascensão. Essa é uma doutrina maravilhosa e que os crentes precisam apren
der mais. Ela não tem nada a ver com o triunfalismo da teologia da prospe
ridade, é apenas o reconhecimento da nossa posição em Cristo, que nos
traz privilégios e também responsabilidades.
Por fim, poderíamos dizer que a ascensão de Cristo garante também a
nossa própria ascensão física futura. Jesus disse a seus discípulos pouco
antes de sua partida: “Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não
fora, eu vo-lo teria dito. Pois vou preparar-vos lugar. E, quando eu for e vos
preparar lugar, voltarei e vos receberei para mim mesmo, para que, onde eu
estou, estejais vós também” (Jo 14.2,3). Jesus quer levar os seus discípulos
para o mesmo lugar que ele foi. Isso acontecerá na Segunda Vinda, como
Paulo diz: “Porquanto o Senhor mesmo, dada a sua palavra de ordem, ou
vida a voz do arcanjo, e ressoada a trombeta de Deus, descerá dos céus, e os
mortos em Cristo ressuscitarão primeiro; depois, nós, os vivos, os que fi
carmos, seremos arrebatados juntamente com eles, entre nuvens, para o
316 Razão da esperança
encontro do Senhor nos ares, e, assim, estaremos para sempre com o Se
nhor” (lTs 4.16,17). Do mesmo modo que Jesus foi elevado entre nuvens
para o céu, nós também experimentaremos uma ascensão física. Esse esta
do de exaltação, Jesus o descreve simbolicamente em Apocalipse 3.21: “Ao
vencedor, dar-lhe-ei sentar-se comigo no meu trono, assim como também
eu venci e me sentei com meu Pai no seu trono”. Assim como a ressurrei
ção de Jesus garante a nossa própria ressurreição, podemos dizer que a sua
ascensão garante a nossa ascensão.
Conclusão
E comum a tendência de se valorizar a obra que Jesus realizou durante
seus dias aqui na terra e minimizar a obra que ele realiza hoje no céu, mas
as duas são igualmente importantes. Por isso, a ascensão é tão importante
quanto o nascimento ou a paixão de Cristo. Na verdade, uma coisa de
pende da outra. Precisamos ver a obra de Cristo como um todo, e nisso
devemos incluir o nascimento, a vida perfeita, a morte, a ressurreição, a
ascensão, o derramamento do Espírito e a segunda vinda. Todos esses
acontecimentos são igualmente importantes e necessários para a salvação
do povo de Deus. O resumo disso é que tudo o que Jesus realizou foi
absolutamente necessário para que a obra fosse completa, pois todos es
ses acontecimentos são igualmente necessários para a salvação, e nenhum
poderia faltar.
A ascensão de Jesus ao céu foi um acontecimento de importância indi
zível. Ela marca de modo definitivo a passagem de Jesus por este mundo, e
demonstra que a encarnação e o esvaziamento do Filho de Deus não foram
em vão. Ela é a evidência de que a expiação foi realizada e que o sacrifício
foi aceito. Ela demonstra que a vida venceu a morte, e que agora, é só uma
questão de tempo até que todos os elementos do plano de Deus se encai
xem, e conduzam o mundo à consumação.
Assim como sua morte e ressurreição, a ascensão dirige a humanidade
para uma nova posição, para um novo modo de vida. Por meio da sua
ascensão, Jesus assumiu a sua posição de poder e autoridade, de onde go
verna todas as coisas para o cumprimento do plano de Deus. De onde
também intercede e dirige sua igreja, protegendo-a e fortalecendo-a para
que a missão dela seja cumprida integralmente.
O nosso coração deve se alegrar pela posição que Cristo ocupa à destra
de Deus. Também devemos nos esforçar para viver a vida de pessoas exal-
Ascensão: a coroação do Rei 317
tadas que Cristo nos confere por sua ressurreição e ascensão. Ao cristão,
nenhuma vida é digna, a não ser a que é lá do alto. A verdade é que somos
lá de cima. Lá é nosso lar. Portanto, enquanto estivermos aqui, segundo o
apóstolo Paulo, a nossa vida deve ser assim: “Buscai as coisas lá do alto,
onde Cristo vive, assentado à direita de Deus. Pensai nas coisas lá do alto,
não nas que são aqui da terra; porque morrestes, e a vossa vida está oculta
juntamente com Cristo, em Deus”. (Cl 3.1-4). Nada menos do que uma
vida assim pode agradar a Deus e a nós mesmos.
25
A salvação do S enhor
A Escritura ensina a universalidade do pecado. Depois da queda de Adão,
o ser humano mergulhou no pecado e jamais conseguiu e nem desejou se
livrar dele. Jesus descreveu a pessoa que comete pecado como uma escrava
do pecado (Jo 8.34), pois além de não querer deixar de pecar, ela nada pode
fazer para agir de modo diferente. Depois da queda, a natureza humana se
corrompeu total e intensamente, e a contaminação se estendeu a todas as
áreas da vida. Entre as principais conseqüências do pecado está a quebra da
comunhão com Deus. O pecado gerou a separação entre o homem peca
dor e o Deus Santo (Is 59.2). A Escritura ensina também que a universali
dade do pecado trouxe como justo pagamento a morte de todos. Paulo diz
que “o salário do pecado é a morte” (Rm 5.12; 6.23), e Lorraine Boettner
interpreta:
A sentença que foi imposta como resultado do pecado de Adão, inclui mais
do que a decomposição do corpo. A palavra “morte”, usada nas Escrituras
com referência às conseqüências do pecado, inclui toda espécie de mal que é
infligido como castigo desse pecado (...) significa, pois, a miséria eterna do
inferno e, ainda, o antegozo dessas misérias já nos males sofridos nesta vida.2
céu, uma espécie de “atalho”. Se, por um lado, há os que pregam a salvação
pelo legalismo, há, por outro, alguns que têm pavimentado a estrada estreita
que Jesus ensinou, a ponto de torná-la até razoavelmente confortável, quan
do não extremamente fácil. Na Idade Média, foi criado um sistema que fa
cilitava bastante a salvação dos pecadores; tratava-se do sistema das indul
gências. No catolicismo medieval, para se obter o perdão dos pecados era
preciso seguir uma certa ordem. Primeiramente uma pessoa precisava se
arrepender de seus pecados, depois fazer uma confissão perante um sacer
dote e, por fim, cumprir a penitência, que era uma espécie de reparação pelo
erro cometido e que dependia da gravidade da falta. Entretanto, o perdão se
estendia apenas às conseqüências eternas do pecado, ou seja, a única coisa
que ele conseguia era libertar o culpado do inferno. A absolvição não elimi
nava as conseqüências terrenas dos pecados; ela dizia respeito ao sofrimento
que alguém poderia receber como retribuição pelos seus erros. Acreditava-
se que, aqueles que não recebessem todas essas conseqüências nessa vida, as
receberiam no purgatório. Assim, o purgatório era um local intermediário
entre o Céu e o Inferno, onde aqueles que não haviam sido maus o suficiente
para irem para o inferno, e nem bons o bastante para irem diretamente para
o céu, ficavam algum tempo até terem sofrido ou “purgado” os seus peca
dos. A absolvição sacerdotal não eliminava as penas do purgatório, no en
tanto, era ensinado que a igreja tinha poder sobre essas penas, e que o Papa
poderia liberar alguém do purgatório. Acreditava-se que havia um tipo de
depósito de “méritos” conquistados por Cristo e pelos “santos”, e que o
Papa, como depositário desses tesouros, poderia conceder um pouco dele
para os que necessitassem. As indulgências foram usadas nas Cruzadas, onde
os soldados lutavam em troca da remissão dos seus pecados e também dos
pecados dos seus familiares.4
As indulgências foram uma das causas da Reforma Protestante do século
16. Foi contra elas, especialmente, que Martinho Lutero fixou as suas 95
teses na porta da Catedral de Wittenberg em 31 de Outubro de 1517. Na
queles dias, um Arcebispo chamado Albrecht, endividado com alguns no
bres, conseguiu do Papa o direito de vender indulgências na Alemanha. Ele
enviou um dominicano chamado Teztel, que ficou conhecido como um dos
mais hábeis vendedores de indulgências. Esse homem andava pelas ruas das
cidades anunciando que, no momento em que a moeda caía no seu cofre, e
era ouvido o seu tilintar, a alma em favor de quem se havia comprado a
indulgência saía do purgatório. Também eram vendidas indulgências para
pessoas vivas que queriam garantir a própria salvação de sua morte. Emitia-
se até mesmo certificados de garantia, que eram guardados como uma espé-
A salvação pela graça 323
Esforços inúteis
O sistema de indulgências, bem como todos os sistemas antigos ou mo
dernos que tentam encontrar atalhos para o céu, somente existem por causa
da falta de entendimento de como funciona a salvação, e de qual é a natureza
do evangelho. A igreja da Idade Média não entendia ou não queria entender
que a salvação é pela graça. Em meio às trevas daqueles tempos, Lutero
encontrou na carta aos Romanos a resposta para todas as suas angústias. Ele
redescobriu a salvação pela graça, e teve início a Reforma Protestante. Em
Romanos, Paulo diz que o evangelho é a manifestação da Justiça de Deus: “A
justiça de Deus se revela no evangelho” (Rm 1.17), justiça essa que Lutero,
antes da conversão, tanto temia, pois apesar de cumprir rigorosamente to
dos os rituais prescritos pela igreja, nunca se sentia perdoado e nem conse
guia paz de espírito. Quando Lutero entendeu que Deus não exige essa jus
tiça de nós, ao contrário, ele exige de si mesmo, a paz inundou o coração do
monge, pois compreendeu que “o justo viverá por fé” (Rm 1.17). Em Roma
nos 3.21 Paulo diz: “Mas agora, sem lei, se manifestou a justiça de Deus
testemunhada pela lei e pelos profetas”. Há um imenso contraste nessa de
claração - a total depravação do ser humano que é incapaz de agradar a
Deus, e a provisão que o próprio Deus preparou para o ser humano e que
tem se manifestado no evangelho. Os que desejam conquistar a sua salvação
por meio das boas obras podem desistir enquanto é tempo, pois Paulo diz
que “ninguém será justificado diante dele por obras da lei” (Rm 3.20; ver G1
2.16). Portanto, a salvação não pode ser conquistada pela simples obediência
à lei de Deus, pelo motivo de que esse não é o caminho proposto por Deus,
324 Razão da esperança
alcançar a vida eterna, pois isso ele jamais conseguiria, uma vez que nin
guém jamais cumpriu a lei de Deus (Rm 3.10, 20, G1 3.11), mas que, basea
do na justiça de Cristo, Deus pode e efetivamente declara o homem como
justo quando ele crê. Esse ato de declarar é algo completamente gratuito,
pois o homem nada fez para merecer isso, uma vez que tudo provêm da
obra e dos méritos do Senhor Jesus Cristo.
O significado da salvação
A fim de entendermos melhor o que é salvação, podemos listar algumas
características práticas dela na nossa vida.
Receber per dã o co m p le t o
Muitos sabem qual é a experiência de ter uma dívida alta e não ter con
dições de pagá-la. Vivemos num país em que quase é impossível não se
endividar. A instabilidade da economia, os juros altíssimos e o salário cada
vez menor, podem surpreender a qualquer um. Porém, existe uma dívida
muito pior: a nossa dívida com Deus. Cada ação nossa, cada pecado, tudo
está registrado diante de Deus, e Cristo disse que daríamos conta de cada
palavra frívola que dissermos neste mundo (Mt 12.36). No livro do Apoca
lipse, na descrição do Juízo Final, é dito que são abertos os livros que con-
32 6 Razão da esperança
têm cada ato que os homens praticaram, pois tudo foi registrado (Ap
20.11,12). Todos esses pecados formam uma grande dívida espiritual, e ela
será cobrada. Porém, quando Cristo entregou a sua vida na cruz, ele pagou
toda a dívida do seu povo. Ser salvo, portanto, significa ser completamente
perdoado por causa da cruz. Por meio do arrependimento e da fé, pode
mos receber o perdão completo; este perdão é obra de Deus, como Bavinck
assevera: “De fato o perdão de pecados é realizado definitiva e perfeita
mente em Deus, mas nos é dado e apropriado por nós na nossa vida por
meio da fé e do arrependimento”/’ Quase podemos resumir a salvação
como sendo a libertação do pecado. A verdade é que só precisamos de
salvação porque um dia o pecado entrou no mundo. Chafer fala de sermos
livres do pecado em três tempos: passado, presente e futuro.7 Pensando
nisso, podemos dizer que nossos pecados passados são perdoados na cruz
de Cristo, no presente os nossos pecados atuais continuam sendo perdoa
dos e, além disso, pela atuação de Deus na nossa vida, somos
ininterruptamente livrados do poder do pecado; e quanto aos pecados fu
turos, também são perdoados na cruz de Cristo, e um dia, seremos definiti
vamente livres da presença e de qualquer influência do pecado.
o serve. Então, vereis outra vez a diferença entre o justo e o perverso, entre
o que serve a Deus e o que não o serve” (Ml 3.17,18).
A salvação pela graça 327
Quando Cristo morreu, houve um despojamento, mas não foi Jesus quem
foi despojado, e sim, o inimigo. Despojar é uma linguagem militar, e signi
fica saquear o acampamento vencido. Paulo diz que quando Cristo foi cru
cificado, ele removeu o escrito da dívida que era contra nós, e “despojando
os principados e as potestades, publicamente os expôs ao desprezo, triun
fando deles na cruz” (Cl 2.14,15). Esse documento era uma grande força
do inimigo, um tipo de “prova” contra os nossos pecados. O diabo (acusa
dor) nos acusava diante de Deus, mas, agora já não há documento que nos
acuse, e, portanto, Satanás perdeu a sua arma, perdeu os seus trunfos, foi
derrotado e humilhado pela vitória de Cristo. Os crentes em Cristo desfru
tam de uma vitória completa sobre as forças malignas, por isso Paulo escre
ve aos romanos: “Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É
Deus quem os justifica. Quem os condenará?” (8.33,34). Cristo derrotou o
nosso inimigo, e nos dá a sua vitória. Nada mais o diabo poderá fazer con
tra a nossa vida, pois temos a salvação de Cristo e, por essa razão, já somos
mais que vencedores por causa de Jesus (Rm 8.37; Rm 16.20).
Vida eterna
Acima de tudo, salvação significa receber a vida eterna. Não fomos cri
ados para morrer, a morte entrou na nossa existência por causa do pecado.
De certo modo, toda a ação redentora de Deus tem o objetivo de retirar a
morte de sua criação. Por isso, Paulo diz que a morte é o último inimigo a
ser derrotado, e que Cristo a derrotará na ressurreição final (ICo 15.26).
Nenhuma passagem é mais clara em demonstrar a salvação pela graça re
presentando a vida eterna do que Romanos 6.23: “Porque o salário do pe
cado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus,
nosso Senhor”. A morte é conseqüência do (pagamento pelo) pecado, mas
Deus deu um presente ao ser humano, a vida eterna em Cristo Jesus. Em
Jesus está a vida eterna; por isso, João diz que quem tem o Filho tem a vida,
quem não tem o Filho de Deus não tem a vida (ljo 5.12). A vida eterna não
é um dom do futuro, pois segundo a Bíblia, é algo que os crentes já desfrutam
agora. A Bíblia não diz que os crentes terão a vida eterna, mas que eles já a têm
(Jo 3.36).
328 Razão da esperança
Conclusão
Portanto, a salvação é a maior necessidade do ser humano, e não deveria
haver nada neste mundo que fosse mais importante do que a preocupação
com a salvação da própria alma. Não fomos feitos para morrer, pois Deus
nos fez para a eternidade. Em Jesus Cristo, Deus concedeu gratuitamente
salvação a todo aquele que crê. Essa salvação é o maior presente que al
guém pode receber.
Pregar sobre a salvação pela graça mediante a fé, dentro dos moldes
bíblicos, pode ser muito impopular nos dias atuais. Algumas pessoas não
estão interessadas no assunto, enquanto outras entendem que devem con
quistar a salvação por elas mesmas. Elas querem poder dizer: Eu sou salvo
porque eu faço isso ou aquilo. E muito difícil para o ser humano reconhe
cer a sua total incapacidade e descansar em Cristo. Por isso, a salvação é ao
mesmo tempo a coisa mais fácil e a mais difícil de ser obtida. A salvação é
o assunto mais importante a ser considerado pelas pessoas decaídas. Ela
deveria ocupar a nossa mente, os nossos púlpitos, as nossas conversas com
amigos, e até os momentos de insônia. Mais do que bons conselhos sobre
como viver melhor, sobre como ser próspero ou ter saúde, as pessoas pre
cisam aprender sobre a salvação, pois ninguém vive para sempre, e, muitos
só se darão conta da importância disso quando for tarde demais.
26
Em Cristo: Na eternidade
A salvação como “união com Cristo” começa ainda na eternidade. Já
estudamos sobre a doutrina da eleição, agora precisamos entender que a
base para a eleição é a união com Cristo. Segundo a Bíblia, Deus nos
escolheu em Cristo. Anthony Hoekema diz: “Enquanto pensamos sobre o
escopo e a abrangência de nossa união com Cristo, precisamos ver essa
união como estendida por todo o caminho, de eternidade a eternidade”.3
Cristo em nós: A união mística 331
nessa rebelião. De nada adianta as pessoas culparem Adão por sua escolha,
pois, diante de Deus, nós estávamos em Adão. Por isso Paulo declara: “Por
tanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo
pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque
todos pecaram” (Rm 5.12). E Paulo diz em 1 Coríntios 15.22 que “em Adão,
todos morrem”, pois todas as pessoas já nascem com essa realidade de
estar em Adão. Porém, Deus resolveu mandar um segundo Adão, um novo
representante para o seu povo: Jesus Cristo. Do mesmo modo como fomos
incluídos por natureza nas atitudes de Adão, de modo que, suas atitudes
podem ser consideradas como “nossas atitudes”, também espiritualmente
somos incluídos em Cristo, de modo que as atitudes de Cristo passam a ser
“nossas atitudes”. E assim que a Escritura diz, por exemplo, que morremos
e ressuscitamos com Cristo. Paulo diz: “Fomos, pois, sepultados com ele na
morte pelo batismo; para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mor
tos pela glória do Pai, assim também andemos nós em novidade de vida.
Porque, se fomos unidos com ele na semelhança da sua morte, certamente,
o seremos também na semelhança da sua ressurreição, sabendo isto: que
foi crucificado com ele o nosso velho homem” (Rm 6.4-6), Como diz
Horton, “é importante perceber que Cristo não vem para melhorar o anti
go eu, guiar e redirecioná-lo para uma vida melhor; ele vem para nos matar,
a fim de nos ressuscitar em novidade de vida”.6 A morte de Jesus é a nossa
morte e a ressurreição de Jesus é a nossa ressurreição, porque tanto na
morte quanto na ressurreição de Cristo, estávamos nele. E não somente
nisso, mas até mesmo na ascensão, pois em Cristo já estamos assentados
nos lugares celestiais (Ef 2.6). Depois da ressurreição, Jesus ascendeu aos
céus, e agora ele está assentado à destra de Deus. Nossa união mística com
Cristo nos faz estar lá com ele, pois de algum modo estamos assentados
com Cristo nos lugares celestiais. A igreja unida a Cristo foi, como diz
Berkhof, “crucificada com Cristo, morreu com ele, nele ressurgiu dos mor
tos e foi levada a sentar-se com ele nos lugares celestiais”.7
Devemos sempre lembrar que a “união mística” é misteriosa, pois
estamos falando de algo sobrenatural, que não pode ser completamente
racionalizado ou explicado. Hodge tem palavras muito próprias para isso:
E-nos suficiente saber que Cristo e seu povo são realmente um. São tão
verdadeiramente um como a cabeça e os membros do mesmo corpo, e pela
mesma razão; são envolvidos e animados pelo mesmo Espírito. Não se
trata meramente de uma união de sentimentos, idéias e interesses. Esta é só
a conseqüência da união vital na qual as Escrituras põem tanta ênfase.8
Crislo em nós: Â união mística
De fato, a união do crente com Cristo é uma união vital. Cristo e seu
povo compartilham da mesma vida.
Regeneração e m Cristo
Ju stificação e m Cristo
Justificação é o ato divino pelo qual ele coloca sobre o crente a justiça de
Cristo. Desse modo, o pecador passa a ser declarado justo diante de Deus.
Paulo diz: “Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós;
para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus” (2Co 5.21). A expressão
“nele” da passagem é muito enfática. Em Cristo fomos feitos justos. Nossa
justificação depende inteiramente da nossa união com Cristo (ver Fp 3.8,9).
Como diz Michael Horton, “somente Cristo possuía em si mesmo, em sua
essência tanto quanto em suas ações, a justiça que Deus requer da humani
dade. Portanto, somente por meio da união com Cristo pode o crente gozar
da identidade de pertencer a Deus”.12 Ou como diz Bavinck, “a justiça que
nos justifica, portanto, não deve ser separada da pessoa de Cristo”,13 embo
ra sempre deve ser lembrado que Deus nos imputa sua justiça livremente, e
não com base em alguma condição existente.
Adoção e m Cristo
A adoção diz respeito à atitude divina pela qual ele nos adota como
filhos por meio de Cristo Jesus. Isso já estava predestinado, pois Paulo diz
que Deus “nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de
Jesus Cristo” (Ef 1.5). Porém, como Paulo declara: “Vindo, porém, a pleni
tude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a
lei, para resgatar os que estavam sob a lei, a fim de que recebêssemos a
adoção de filhos. E, porque vós sois filhos, enviou Deus ao nosso coração
o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai!” (G14.4-6). Fomos predestina
dos para sermos filhos na eternidade, e Deus concretizou isso dentro do
tempo. Somos filhos em Cristo porque temos o Espírito de Cristo em nós.
Isso nos faz também herdeiros, como Paulo declara: “Ora, se somos filhos,
somos também herdeiros, herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo; se
com ele sofremos, também com ele seremos glorificados” (Rm 8.17). So
mos filhos e herdeiros “em Cristo”.
Santificação e m Cristo
Perseverança e m Cristo
1.22,23, ver Cl 1.18). A função do Cabeça da Igreja é unir cada vez mais os
membros no corpo para que todos cresçam juntamente. Paulo fala extensi
vamente sobre isso em Efésios 4. Ele diz que Jesus, ao subir à destra de
Deus, concedeu dons aos homens, e esses dons foram dados para o
aperfeiçoamente dos santos, para o desempenho do serviço divino, para a
edificação do corpo de Cristo (Ef 4.12). A ordem da edificação da igreja
como corpo de Cristo é a seguinte: “Mas, seguindo a verdade em amor,
cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo, de quem todo o corpo,
bem ajustado e consolidado pelo auxílio de toda junta, segundo a justa
cooperação de cada parte, efetua o seu próprio aumento para a edificação
de si mesmo em amor” (Ef 4.15,16). Entre cada membro do corpo de
Cristo está a Cabeça, e todo relacionamento precisa ser mediado por ela.
Do que se percebe dessa passagem, a comunhão entre os irmãos é essencial
para o crescimento de cada um e do corpo como um todo.
Conclusão
Por isso dissemos que o Cristianismo não é uma religião, mas uma pes
soa, uma única pessoa: Jesus Cristo. Para efeitos de salvação, é como se só
Cristo existisse. Deus não olha para nossas obras, olha para as obras de
Cristo. Deus não olha para nossos pecados, olha para a justiça de Cristo.
Quando Deus nos olha, ele vê Cristo. Todos nós agora fazemos parte dessa
pessoa maravilhosa. Jesus vive nos crentes, ele é a vida dos crentes. Viver o
Cristianismo não é questão apenas de fazer o que Cristo mandou ou seguir
o exemplo dele, é questão de ter o Filho (ljo 5.12), de estar nele (Jo 15.5).
Cristo é o tesouro maior que temos. Nada se compara aos benefícios que
temos nele. A pior situação que alguém pode enfrentar é a de estar “sem
Cristo”. O apóstolo Paulo diz que os crentes de Efeso, antes de conhece
rem a verdade, estavam “sem Cristo, separados da comunidade de Israel e
estranhos às alianças da promessa, não tendo esperança e sem Deus no
mundo” (Ef 2.12). Estar “sem Cristo” é não dispor de nenhuma das bên
çãos de Deus. Em unidade com Cristo, dispomos de uma nova identidade,
a identidade de Jesus. O Cristianismo não é uma religião, é uma pessoa:
Jesus Cristo,
27
Muitos chamados,
poucos escolhidos
M u ito s são ch a m a d o s
Deus estabeleceu que o modo como a salvação que ele providenciou
chegaria às pessoas seria por meio da pregação (ICo 1.21; Rm 10.17). Portan
to, a pregação do evangelho é a primeira coisa que precisamos analisar
antes de falar sobre os aspectos da salvação. Jesus ordenou que pregásse-
340 Razão da esperança
mos o evangelho a toda criatura, porém, a questão que nos surge é: De que
maneira ele deve ser pregado, e quais serão os resultados dessa proclama
ção? Uma outra questão que precisa ser esclarecida é: Se acreditarmos que
Deus escolheu antes da fundação do mundo os que serão salvos, qual é a
ra2ao para pregar o evangelho? E ainda: Se as igrejas de tradição reformada
insistem que Jesus morreu apenas pelo seu povo, qual é a base para oferecer
essa salvação a todas as pessoas sem distinção? Neste capítulo, falaremos
sobre o método, o conteúdo, o objetivo e a intenção do chamado geral, que
é o chamado do evangelho.
0 c h a m a d o evangélico: 0 m ét o do
Jesus contou uma parábola que nos ajuda a entender a maneira correta
de pregar o evangelho. Jesus disse: “O reino dos céus é semelhante a um rei
que celebrou as bodas de seu filho. Então, enviou os seus servos a chamar
os convidados para as bodas” (Mt 22.2,3). Jesus contou essa parábola com
a intenção mostrar aos judeus da sua época o terrível erro que eles estavam
cometendo e as conseqüências que sobreviriam por eles rejeitarem o convi
te da salvação. Na parábola, o rei mandou os servos “chamar os convida
dos”. Isso é uma referência aos judeus, pois eles já haviam sido convidados
para a festa e agora estava chegando a convocação final, Eles foram convi
dados durante todo o tempo do Antigo Testamento pela lei e pelos profe
tas, agora chegava o momento de celebrarem as bodas do Filho de Deus,
pois o Messias prometido, que há tanto tempo eles esperavam, havia chega
do. A palavra “chamar” pode ser traduzida também como convocar. A
pregação do evangelho não é a apresentação de uma possibilidade, e sim
uma ordem para ir. Nada na passagem sugere a idéia de que devemos dizer
às pessoas: “Meu amigo, hoje você pode escolher entre a vida ou a morte;
qual delas você vai aceitar?” O evangelho não oferece a vida ou a morte, o
evangelho convoca as pessoas para a vida, quem não aceita já está na morte.
Hoekema diz: “O convite do evangelho não é algo que deixa a pessoa livre
para aceitar ou declinar, como alguém que é convidado para o futebol, mas
é uma ordem do soberano Senhor de toda a criação que manda que venha
mos a ele para salvação - uma ordem que não pode ser ignorada ao custo
de uma eterna perdição”.1 Os que haviam sido previamente convidados
para as bodas se recusaram a ir, e o rei mandou insistir com eles: “Dizei aos
convidados: Eis que já preparei o meu banquete; os meus bois e cevados já
foram abatidos, e tudo está pronto; vinde para as bodas. Eles, porém, não
se importaram e se foram, um para o seu campo, outro para o seu negócio;
M uitos cham ados, poucos escolhidos 341
0 c h a m a d o evangélico : 0 conteúdo
fio, renúncia e submissão, conforme ele costumava dizer: “Se alguém quer
vir após mim, a si mesmo se negue, dia a dia tome a sua cruz e siga-me” (Lc
9.23). Com isso, percebe-se que a mensagem de Jesus era bem diferente da
mensagem dos tele-evangelistas modernos, e também das pregações de auto-
ajuda que se vê em tantos púlpitos.
Jesus disse ainda que deveríamos ensiná-los a “guardar todas as coisas”
que ele ensinou (Mt 28.20). Portanto, a missão da igreja não é apenas con
verter alguém, mas ensiná-lo, e este ensino não deve ser qualquer ensino, e
sim o ensino de Jesus. A pessoa deve ser chamada a uma vida de obediência
a Palavra de Deus. Como discipuladores, devemos ser como Paulo que
jamais deixou de “anunciar todo o desígnio de Deus” (At 20.27). Jesus
disse: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra; e meu Pai o amará, e
viremos para ele e faremos nele morada. Quem não me ama não guarda as
minhas palavras; e a palavra que estais ouvindo não é minha, mas do Pai,
que me enviou” (Jo 14.23,24). O objetivo do discipulado é fazer crentes
fiéis ao Senhor, crentes que estejam dispostos a guardar as coisas ensinadas.
Um discípulo deve ser ensinado a crer em Jesus, bem como a obedecer a
Jesus, pois não há como receber a Cristo como Salvador sem que também
ele seja Senhor da nossa vida. Portanto, o conteúdo da pregação evangélica
deve se concentrar nos atos redentores de Jesus - especialmente na sua
morte e ressurreição - , deve chamar as pessoas para o arrependimento e à
fé, e para uma vida de compromisso com Deus e sua Palavra.
O c h a m a d o evangélico: O objetivo
Quem deve ser chamado? Segundo a Bíblia, todas as pessoas. Porém,
como fica a questão da eleição? Qual é a razão para chamar a todos? A
razão para chamar a todos é obedecer a uma ordem de Jesus. Ele disse que
o evangelho deveria ser pregado a toda criatura (Mc 16.15). Percebemos
das parábolas analisadas acima que Deus tem um chamado geral para todas
as pessoas. Isso não significa que todas serão salvas, mas que ele deseja que
todas ouçam esse chamado. No final da parábola, Jesus explicou como isso
funcionava: “Porque muitos são chamados, mas poucos, os escolhidos”
(Mt 22.14). O chamado do evangelho é direcionado a um número muito
grande de pessoas, porém, a resposta correta a esse chamado será obtida
apenas nos escolhidos, cujo número é bem menor. O próprio Jesus disse:
“Vinde a mim, todos...” (Mt 11.28). O convite do evangelho não é direcio
nado apenas aos eleitos, mas a todos, embora somente os que entenderem
que estão cansados e sobrecarregados, e se dispuserem a ir a Cristo para
344 Razão da esperança
Tão maravilhoso é o seu amor pela humanidade, que ele poderia salvar a
todos, e que ele mesmo está preparado para dar salvação ao perdido. A
ordem é para ser noticiada, que Deus está pronto para receber todos ao
346 Razão da esperança
arrependimento, então que nenhum se perca (...) Pode ser perguntado aqui:
se Deus não quer que ninguém pereça, por que então muitos perecem? Para
isso, minha resposta é que não há menção, aqui, sobre o decreto secreto de
Deus pelo qual os ímpios são condenados à sua própria ruína, mas somente
de sua própria vontade como tornada conhecida para nós no evangelho.
Pois, ali, Deus estende a mão sem distinção a todos, mas só segura, de modo
a conduzi-los a si, aqueles que ele escolheu antes da fundação do mundo.2
“se negligenciamos este dever, onde está a nossa fé? Onde está o nosso
amor cristão? Se uma pessoa não tem o desejo de fazer o evangelho conhe
cido no mundo inteiro, bem se pode questionar se essa pessoa conhece
mesmo o valor do evangelho”.5
Poucos escolhidos
Jesus disse: “Muitos são chamados, mas poucos, escolhidos” (Mt 22.14).
Agora precisamos meditar na segunda parte desse versículo, e passaremos
a falar sobre o que os teólogos têm chamado de Graça Irresistível, ou Vo
cação Eficaz. E verdade que muitos não gostam do termo “irresistível”,
exatamente porque pensam que pode dar a idéia de que o Espírito Santo
força as pessoas a se converterem. A doutrina da Graça Irresistível nos fala
do modo em que Deus chama as pessoas para a salvação e aplica a obra de
Cristo na vida delas. Segundo essa doutrina, somente as pessoas que foram
chamadas eficazmente serão salvas. Quando falamos, por exemplo, em “cha
mado eficaz”, estamos justamente querendo fazer diferenciação com o cha
mado geral do evangelho, como foi visto acima. Todas as pessoas são cha
madas para ouvir o evangelho, mas nem todas são chamadas eficazmente,
de modo que o aceitarão.
A doutrina da graça irresistível fundamenta-se na Palavra de Deus e nas
doutrinas que já foram estudadas, como a da pecaminosidade humana (morte
espiritual), a da eleição incondicional e a da expiação limitada. A pecamino
sidade humana, também chamada de “Depravação Total”, nos fala da im
possibilidade de o ser humano responder positivamente ao chamado de
Deus. Porém, a eleição diz que alguns deles foram escolhidos para serem
salvos. A expiação limitada (ou definida) diz que Cristo morreu por estes e,
por isso, eles precisam ser chamados de maneira eficaz, para que recebam a
salvação preparada para eles.
0 c h a m a d o gr acio so
0 c h a m a d o per su asivo
Algumas pessoas são contra a doutrina da graça irresistível ou do cha
mado eficaz porque dizem que se for assim, então, o Espírito Santo violen
ta a vontade de uma pessoa ao obrigá-la a aceitar algo que ela não quer.
350 Razão da esperança
A eficácia do c h a m a d o
Quando, naquela manhã, Zaqueu saiu determinado a ver quem era Jesus,
não imaginava o que aconteceria na sua vida. Ele não imaginava que horas
mais tarde seria uma pessoa completamente diferente. Praticamente todo
mundo foi tomado de surpresa naquele dia, pois todos devem ter se espan
tado quando Jesus disse: “Hoje me convém ficar em tua casa". A casa de
Zaqueu não era uma casa comum, era a casa de um rico cobrador de impos
tos. Muitas pessoas haviam sido exploradas dentro daquelas quatro paredes.
Muitos banquetes imorais haviam sido oferecidos pelo anfitrião. Mas Jesus
estava decidido a entrar naquele lugar, e ele não daria apenas uma passadinha,
pois disse “hoje me convémfica r e m tua casa” (ênfase acrescentada). Espiri
tualmente, Jesus nunca mais sairia de lá. Quanta transformação aconteceu na
vida de Zaqueu em apenas uma noite! O texto diz que: “Entrementes Za
queu se levantou e disse ao Senhor: Senhor, resolvo dar aos pobres a metade
dos meus bens; e, se nalguma cousa tenho defraudado alguém, restituo qua
tro vezes mais” (v. 8). Essas não foram palavras da boca para fora; a transfor
mação que ocorreu na vida de Zaqueu quando Jesus o encontrou foi uma
transformação radical. Uma transformação que atingiu a raiz da sua vida, o
centro da sua vontade: o coração. Agora as suas palavras não eram mais
obscenas, ou cheias de extorsão, pois o seu coração havia sido transformado.
Seus lábios não proferiam mais impiedade, porque o seu coração estava lim
po dessas coisas, e agora estava cheio de Jesus (Mt 12,34).
Essa transformação maravilhosa é o que acontece na vida de todo aque
le que Cristo chama. E por isso que pessoas que perseguiam o evangelho,
352 Razão da esperança
Regeneração:
Da morte para a vida
w ilF
Para que uma pessoa seja salva, a primeira coisa que deve acontecer
dentro dela é a regeneração. Segundo a Escritura, os crentes foram escolhi
dos em Cristo antes da fundação do mundo, e são chamados pela pregação
do evangelho, mas, até que Deus lhes abra o entendimento, eles são cegos
para Deus, pois estão mortos para a vida de Deus. Por isso, é preciso que
Deus realize uma obra neles antes mesmo da conversão. Essa obra é cha
mada de regeneração. Por meio dela, nós nos tornamos vivos para Deus, e
somos habilitados à conversão. Na Bíblia, a palavra regeneração pode ser
entendida como a implantação da vida espiritual naqueles que estavam es
piritualmente mortos. É um ato exclusivo de Deus. Essa vida implantada,
de acordo com a Escritura, se manifestará em arrependimento e fé, produ
zindo transformação na pessoa (Jo 3.3; Tg 1.18; IPe 1.23).1
No capítulo anterior falamos sobre a vocação (ou chamado) eficaz. Num
certo sentido, vocação eficaz e regeneração são sinônimas, Esse é o enten
dimento, por exemplo, de Anthony Hoekema, entre muitos outros teólo
gos reformados.2 Realmente, se não são exatamente a mesma coisa, são
difíceis de ser distinguidas. A regeneração dá vida e possibilita a conversão,
conduzindo a uma vida de santificação. A vocação eficaz é um chamado
irresistível a uma vida de comunhão com Cristo, Talvez a diferença seja
que, quando falamos em vocação eficaz, estamos focalizando mais no cha
mado divino, e quando falamos em regeneração estamos falando de algo
que acontece dentro do ser humano.3 Porém, as duas coisas devem ser
vistas como lados de uma mesma moeda. As palavras de Berkhof podem
nos ajudar a entender isso:
A ordem da salvação
Esta discussão, necessariamente, nos leva a pensar na ordem em que a
salvação é aplicada ao crente. Em teologia, fala-se numa “ordem da salva
ção” (em latin ordo salutis). Com isso se pretende estabelecer e distinguir os
vários elementos que compõem a salvação. Alguns estudiosos se esforçam
por estabelecer uma ordem cronológica, isto é, apontando os aspectos da
salvação que se sucedem um a um. Em geral, a ordem mais aceita no meio
reformado é a seguinte: vocação, regeneração, fé e arrependimento, justifi
cação, santificação, perseverança e glorificação. E inegável que a Bíblia apre
senta alguma ordem no que se refere à salvação. Com isso, se quer dizer que
há coisas que realmente vêm antes que outras. Por exemplo, antes de a
Regeneração: Da morte para a vida 355
pessoa experimentar a fé, ela precisa ouvir a Palavra, pois a Escritura diz
que “a fé vem pela pregação” (Rm 10.17). Porém, é um erro pensar que
exista um esquema fixo que possa ser estabelecido de modo cronológico.
Como diz Strong, a “ordem não é cronológica, mas lógica”.7 Quando pen
samos na ordem da salvação, é preciso lembrar das palavras de Berkhof:
Quando falamos de uma ordo salutis, não nos esquecemos de que a ação de
aplicar a graça de Deus ao pecador individual é um processo unitário, mas
simplesmente ressaltamos o fato de que é possível distinguir vários movi
mentos no processo, que a obra de aplicação da redenção segue uma ordem
defmida e m o ável, e que Deus não infunde a plenitude da sua salvação ao
pecador num único ato.8
Despertando os m ortos
Voltemos agora a tratar da regeneração e sua prioridade sobre os demais
aspectos da ordem da salvação. Para entender a regeneração, antes precisa
mos entender a situação do ser humano por natureza. Em Efésios 2.1-3,
Paulo a descreve da seguinte maneira: “Estando vós mortos nos vossos
delitos e pecados, nos quais andastes outrora, segundo o curso deste mun
do, segundo o príncipe da potestade do ar, do espírito que agora atua nos
filhos da desobediência; entre os quais também todos nós andamos outro
ra, segundo as inclinações da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos
pensamentos; e éramos, por natureza, filhos da ira, como também os de
mais”. Nessa passagem, há várias expressões importantes para a nossa dis
cussão. Primeiramente, precisamos observar a declaração de que estáva
mos “mortos”; chamamos isso de morte espiritual, pois embora fisicamen
te vivo, espiritualmente o ser humano está morto. E importante que perce
bamos que Paulo não diz que o ser humano está “doente”, mas morto.
Mortos nos delitos e pecados se refere à corrupção natural do ser humano,
que nasce sob a servidão do pecado e passa toda a vida nessa situação,
cometendo pecado e sendo escravo do pecado (Jo 8.34). Nesse estado, o
358 Razão da esperança
Deus; e os que a ouvirem viverão” (Jo 5.24,25). Só Jesus tem essa voz que
consegue penetrar nos ouvidos de um morto e fazê-lo reviver.
A regeneração e a palavra
Como acontece a regeneração? Em Atos há o relato de um caso que nos
ajuda a entender esse processo. Na cidade de Filipos, Paulo encontrou um
local de oração para pregar a Palavra. Lucas relata: “No sábado, saímos da
cidade para junto do rio, onde nos pareceu haver um lugar de oração; e,
assentando-nos, falamos às mulheres que para ali dnham concorrido. Certa
mulher, chamada Lídia, da cidade de Tiatira, vendedora de púrpura, temente
a Deus, nos escutava; o Senhor lhe abriu o coração para atender às coisas
que Paulo dizia” (At 16.13,14). Enquanto Lídia ouvia a pregação de Paulo,
Deus lhe abriu o coração para atender, ou seja, aceitar as coisas que Paulo
dizia. Isso é regeneração e, geralmente, é assim que ela acontece. Enquanto
alguém está ouvindo a Palavra de Deus, Deus faz a sua voz penetrar nos
ouvidos mortos e implanta a vida espiritual. Então, surge a fé, pois a fé é um
resultado da regeneração. E preciso que se entenda que a fé é fruto da rege
neração, não a sua causa.17 Porque o Senhor abriu o coração de Lídia, ela se
converteu, e a obra do Senhor prosperou em Filipos. Isso nos fala da imensa
importância da pregação da Palavra, pois é geralmente no momento da pre
gação da Palavra que Deus implanta a vida espiritual nas pessoas (Rm 10.17).
Contudo, é comum que duas pessoas ouçam a mesma mensagem, e ape
nas uma se converter. Uma explicação convincente disso só pode estar em
Deus. E nesse sentido não está nem mesmo na Palavra. Já dissemos que,
geralmente, Deus regenera alguém enquanto essa pessoa está ouvindo a Pa
lavra, contudo não podemos dizer que a Palavra pregada seja, estritamente
falando, o instrumento da regeneração. Deus opera a regeneração sem o uso
de meios, ela é um “ato da onipotência imediata de Deus”.18 Para efetuar a
implantação da vida, o Espírito não precisa de nada, mas a Palavra geralmen
te está presente no momento da regeneração. Até porque a conversão, que
logicamente segue a regeneração, precisará da Palavra para que haja fé e arre
pendimento. Nesse sentido, Tiago fala da regeneração pela Palavra: “Pois,
segundo o seu querer, ele nos gerou pela palavra da verdade, para que fôsse
mos como que primícias das suas criaturas”. A expressão “gerar”, nesse caso,
pode ser entendida como todo o processo inicial da salvação, e fica evidente
que Deus usa a Palavra da Verdade para realizar isso. Pedro tem uma expres
são semelhante: “Pois fostes regenerados não de semente corruptível, mas
Regeneração: Da morte para a vida 361
A prioridade da regeneração
Devemos entender a regeneração como a primeira coisa que acontece
no processo em que se evidencia a salvação de uma pessoa. Vimos que a
origem do processo está na eternidade, na eleição. A regeneração acontece
no momento do chamado, quando Deus resolve cumprir na vida de alguém
o seu propósito estabelecido na eleição. Nesse momento, geralmente asso
ciado ao ouvir da pregação da Palavra, Deus implanta um princípio de vida,
que se desenvolverá capacitando a pessoa a responder com arrependimen
to e fé. Regeneração não deve ser confundida com conversão, embora uma
não aconteça sem a outra. A regeneração é o que possibilita a conversão. A
conversão é a manifestação visível (em arrependimento e fé) de que a rege
neração aconteceu. Quando dizemos que uma pessoa convertida é uma
pessoa regenerada, o que se tem em mente é que, para se converter, ela
precisa ser regenerada.
A regeneração é uma obra sobrenatural de Deus que o homem não
consegue produzir, participar, e de certo modo, nem mesmo verificar.
McGregor Wright diz que “a regeneração é um ato instantâneo, que acon
tece de um modo bem profundo, na região subconsciente do mais íntimo
do coração, e é, portanto, não-experiencial”.19 De fato, nunca poderemos
ter certeza do momento em que ela acontece. Conseguimos ver com algu
ma acuracidade quando a conversão ocorre, pois a conversão se revela em
arrependimento e fé, e às vezes produz efeitos emocionais. Porém, a rege
neração é uma experiência impossível de ser sentida ou percebida. Só sabe
remos dela depois que ela já tiver acontecido, pelos frutos que sobrevirão.
Os frutos se demonstrarão em todo o processo da salvação.
Quando entendemos o nosso estado decaído, e a situação de morte
espiritual na qual naturalmente todos estávamos, podemos perceber a obra
maravilhosa que é a regeneração em nós. Quando lembramos que muitos
de nós fomos relutantes em aquiescer ao evangelho, que fomos rebeldes e
quem sabe até perseguidores, vemos quanta misericórdia Deus demons
trou em abrir os nossos olhos, curar a nossa cegueira espiritual e nos fazer
levantar de nossa morte para uma vida junto dele. Devemos louvar a Deus
pelo fato de nos ter dado vida, estando nós mortos espiritualmente. Se ele
não fizesse isso, ficaríamos mortos para sempre.
Conversão:
Uma guinada na existência
Fé salvadora
O outro aspecto fundamental da conversão ou novo nascimento é a fé.
Os israelitas que haviam sido picados pelas serpentes precisavam olhar para
a serpente de bronze para serem curados. Essa era uma atitude de fé, pois
eles precisavam acreditar que, ao olhar para a serpente de bronze, seriam
curados, ou seja, eles precisavam acreditar na provisão de Deus. Ao mesmo
tempo, a situação lhes dava consciência de que nenhuma outra solução era
possível, exceto a que Deus estava providenciando. Jesus falou sobre essa
necessidade de crer na provisão de Deus, quando continuou: “Porque Deus
amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigénito, para que
todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16). Deus
providenciou uma salvação para a humanidade, mas a humanidade não será
salva enquanto não crer nessa provisão. Por essa razão, a fé é absolutamen
te necessária para a salvação (Rm 3.28; Hb 11.6; Jo 6.29; Rm 10.9; Ef 2.8).
Segundo a definição de Hodge, há três tipos de fé: fé morta ou especula
tiva, fé temporal e fé salvífica,3 Fé morta é uma expressão de Tiago que diz “a
fé sem obras é morta” (Tg 2.26). Devemos entender esse tipo de fé como
uma certeza sobre fatos da salvação, mas que não produz real mudança de
vida. E uma fé que consiste de um mero assentimento intelectual oriundo de
uma tradição familiar, ou mesmo de um convencimento por causa das evi
dências divinas da Bíblia, mas como diz Hodge, é uma fé “perfeitamente
compatível com uma vida mundana ou perversa”.4 Alguém que tem esse
tipo de fé nunca sente a necessidade de mudar de vida. Tanto é assim que
Tiago diz que essa fé pode ser encontrada até nos demônios, pois eles acre
ditam na existência de Deus, e até tremem por isso, mas não mudam de
condição (Tg 2.19). Porf é temporal devemos entender a impressão que o evan
gelho causa em algumas pessoas, de modo a deixá-las interessadas por algum
tempo, mas que, como Jesus disse na parábola, “não têm raiz em si mesmo,
370 Razão da esperança
sendo, antes, de pouca duração” (Mt 13.21). Calvino entendia que essa fé
não poderia ser verdadeira, em bora fosse chamada de fé pela Escritura, mas
era fru to do pró p rio coração do hom em . Ele disse: “Tem o coração do h o
m em tantos resquícios de vaidade, tantos esconderijos de m entira, está co
b erto de tão vã hipocrisia, que muitas vezes se engana a si m esm o” .5 Essa fé
não passa de u m autoconvencim ento, e ainda que produza algumas tran sfo r
mações na vida da pessoa, não são transform ações duradouras. A princípio,
um a pessoa assim pode parecer realm ente convertida, mas, a longo prazo,
não aparecerão os frutos duradouros da fé. O terceiro tipo é a f é salvífica ou
salvadora. D e certo m odo, essa é a única que pode realm ente ser chamada de
“fé”. H oekem a define fé salvadora com o “uma resposta ao chamado de Deus
pela aceitação de Cristo pela pessoa toda - isto é, com convicção firm e da
verdade do evangelho e com dependência confiante em D eus, em Cristo,
para a salvação, junto com com prom isso autêntico com Cristo e seu servi
ço”.6 E o ato de olhar para Jesus, e saber lá no fundo do ser que ele é o único
e suficiente salvador, e se entregar a ele para viver nele.
G eralm ente se pensa que a fé verdadeira envolve três conceitos: co n he
cim ento, aceitação e confiança. N ão existe fé verdadeira sem conhecim en
to, pois para que alguém creia em Jesus, ele precisa ter conhecim ento de
Jesus. P regar o evangelho é anunciar fatos com respeito à vida, m orte e
ressurreição de Jesus, ou seja, é dar conhecim ento às pessoas sobre quem é
Jesus e o que ele realizou. A s pessoas precisam ter conhecim ento disso para
que possam verdadeiram ente crer (Rm 10 .13 -17 ). Inclusive existe a necessi
dade de um conhecim ento m ínim o para que alguém possa crer e ser salvo.
O m ínim o que alguém deve conhecer é a sua situação pecam inosa, sua
incapacidade de se salvar p o r si m esm o, o fato de que C risto m o rreu pelos
pecados, e a certeza de que o fato de crer nele pode fazer com que seja
perdoado e salvo. C om o diz H odge, com isso não se pretende dizer que os
m istérios, ou verdades que não se podem com preender, não possam ser
objetos apropriados da fé, o que está em questão não é o entendim ento
com pleto de algo, mas o conhecim ento desse algo, pois “só podem os crer
no que conhecem os, ou seja, no que inteligentem ente aprendem os” .7 O
aspecto de aceitar refere-se à necessidade de concordar com os ensinos da
E scritura a respeito do pecado e da m aneira com o D eus decidiu salvar o
hom em , con cordan do que esse é o único m eio de salvação e aceitando-o
para si. O aspecto de confiança envolve a certeza de que, a partir do m o m en
to que se aceitou a Cristo, a salvação está garantida. Significa descansar na
obra consum ada de C risto e aceitar o que ele fez com o tendo sido feito p o r
nós, e absolutam ente suficiente para a nossa salvação.
Conversão: Uma guinada na existência 371
Conclusão
Portanto, o significado da conversão, de acordo com Jesus é uma trans
formação completa realizada pelo Espírito que muda a essência das pes
soas, manifestando vida onde havia morte, produzindo verdadeiro arre
pendimento e verdadeira fé.11 Quem passa por essa experiência dá uma
verdadeira guinada na existência. Não é simplesmente o fato de mudar de
religião, ou seguir preceitos ensinados pelos homens, mas é ser transforma
do pelo Espírito, para uma nova e superior vida. Por isso, a conversão é sem
sombra de dúvida a experiência mais espetacular que pode existir. Quanto
a Nicodemos, embora no início ele tenha resistido às palavras de Jesus,
sabemos que o seguiu depois (Jo 19.39).
Cabe aqui uma palavra final para muitos que talvez se sintam como
Nicodemos. Talvez já sejam mestres da doutrina, mas percebem que são
inexperientes em relação à graça. Ainda não experimentaram esta vida como
algo que é mais do que a carne. O que Jesus disse para Nicodemus é válido
372 Razão da esperança
Justos pela fé
Declarados justos
A Confissão de Fé de Westminster define justificação como um ato da
livre graça de Deus, por meio do qual ele perdoa todos os nossos pecados
e nos aceita como justos a seus olhos, com base na justiça de Cristo a nós
imputada e recebida pela fé. No entendimento reformado, não seremos
aceitos por Deus porque de algum modo conseguiremos alcançar a santi
dade perfeita, mas porque, embora continuemos pecadores, Deus decla
rou-nos justos. Portanto, pela fé, somos justos diante de Deus, ainda que
continuemos pecadores. A graça não é um poder introduzido em nós para
nos ajudar a nos tornarmos bons, é Deus nos aceitar como bons, embora
ainda sejamos maus. Como diz Hodge, “Deus não declara que o ímpio é
santo; ele declara que, não obstante a sua pecaminosidade e indignidade
Justos pela fé 375
pessoal, ele é aceito como justo com base no que Cristo fez por ele”.2
Estamos falando aqui de termos jurídicos, ou seja, da maneira como uma
pessoa é aceita num tribunal, no caso, o tribunal de Deus, pois como diz
Sproul, trata-se da questão do julgamento diante do supremo tribunal de
Deus.3
Como já dissemos, a igreja católica também concordava que a salvação
era pela graça; entretanto, para ela, essa era uma graça transformadora, ou
seja, a sua função era tornar as pessoas dignas do reino dos céus. A graça,
segundo Roma, transforma injustos em justos, impuros em puros, desobe
dientes em obedientes. Dependendo de como alguém se apropriava e fazia
uso dessa graça, no entendimento de Roma, poderia ser realmente aceito
por Deus. Porém, a Reforma não podia aceitar isso, pois mesmo em um
bom dia, um cristão comum é também ruim, e comete muitas falhas. Ape
sar disso, o cristão não precisa viver cada dia aterrorizado esperando a con
denação, pois ele foi declarado justo por Deus e, por isso, vive cada dia
como se tivesse satisfeito todos os requerimentos da lei de Deus. O concei
to reformado de justificação recebe o nome de justificação forense, que tem
a ver com o ato declarativo de Deus em relação a nós. Sproul o define da
seguinte maneira: “A visão reformada da justificação forense se fundamen
ta no princípio de que, pela imputação da justiça de Cristo, o pecador é
agora feito formalmente, mas não materialmente, justo aos olhos de Deus”.4
Somos justos e somos pecadores, uma coisa “no papel”, outra na prática.
Por imputação, segundo Hodge, devemos entender o ato de “adscrever,
contar a, pôr na conta de alguém”,5 ou seja, o crente é justo, mas ainda é
pecador, ou, como Lutero dizia, “Simultaneamente justo e pecador”. A
igreja católica romana, desde o Concílio de Trento, rejeita essa noção fo
rense de justificação como sendo uma “ficção legal”.6 Roma não consegue
aceitar que uma pessoa possa ser justa e pecadora ao mesmo tempo. Para a
igreja católica romana, ou ela é justa ou é pecadora, mas é óbvio que ela
mantém essa afirmação à custa do evangelho revelado pela Palavra de Deus.
Como diz Sproul, “o evangelho da Bíblia se mantém ou cai mediante o
conceito de imputação”.7 Afinal de contas, a Bíblia é muito clara ao afirmar
que Deus declara o homem justo, embora ele continue pecador. A Escritu
ra diz que “Abraão creu em Deus, e isso lhe foi imputado para justiça” (Rm
4.3), e Paulo continua: “Ora, ao que trabalha, o salário não é considerado
como favor, e sim como dívida. Mas, ao que não trabalha, porém crê na
quele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é atribuída como justiça” (Rm 4.4,5).
Claramente a justiça que Abraão, e todos os crentes, recebem, é uma justiça
forense, ou seja, declarativa. Eles são declarados justos porque são revesti-
376 Razão da esperança
dos da justiça de Cristo, pois “Cristo nos dá sua justiça diante do tribunal de
Deus”,8 e “assim nós podemos permanecer na sua presença como se nós
não tivéssemos pecado, como se nós tivéssemos alcançado a obediência
que Cristo alcançou para nós”.9
Somos declarados justos, porém ainda somos pecadores. Pela falta de
entendimento desse ponto, muitas igrejas contemporâneas se aproximam
bastante da igreja medieval. Muitos crentes modernos são ensinados que
podem amar a Deus perfeitamente e que podem ser justos neste mundo
assim como Cristo é justo. Como na igreja medieval, a graça é novamente
taxada como uma assistência do Espírito Santo a fim de nos ajudar a viver
uma “vida cristã vitoriosa”, o que nos garantirá a salvação. É claro que esse
ensino não é bíblico, e é uma volta ao catolicismo. Não precisamos cumprir
os requerimentos da lei para sermos salvos, até porque ninguém os conse
guiria cumprir plenamente. E se quiséssemos ser salvos pela lei, teríamos
que cumpri-la integralmente, pois Deus não está disposto a nos aceitar com
apenas parte do cumprimento da lei. Nesse sentido, não temos escolha, ou
cumprimos toda a lei ou morremos como culpados. Porém, há um outro
caminho: a justiça de Cristo. Não alcançamos a salvação porque a graça nos
capacitou a cumprir a lei, somos salvos porque Deus decidiu nos salvar
mediante a morte do seu Filho, pois “todos pecaram e carecem da glória de
Deus, sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção
que há em Cristo Jesus” (Rm 3.23,24). Antes de continuarmos a falar sobre
a justificação, precisamos considerar mais um pouco a Lei de Deus.
0 p a p el da lei
Uma das grandes dúvidas dos crentes hoje é: Para que serve a lei? Uma
vez que fomos justificados pela graça de Cristo mediante a fé (Rm 3.21),
haverá ainda qualquer necessidade de obedecer a ela? Se Paulo fala que o
“fim da lei é Cristo”, então devemos entender que Cristo aboliu a lei?
O fato de haver tanta discussão hoje em dia sobre o uso da lei não é
novidade. Desde o início, os cristãos tiveram esse tipo de dificuldade. O
primeiro concílio da história da igreja, que aconteceu em Jerusalém, e está
relatado em Atos 15, foi justamente por esse motivo. Quando os gentios
começaram a se converter ao evangelho, um problema teológico surgiu no
meio da igreja: Deveriam eles se submeter aos requisitos da lei de Moisés,
especificamente à circuncisão? Devido a divergências de entendimento, os
apóstolos e os presbíteros reuniram-se em Jerusalém para examinar a ques
Justos pela fé 377
tão (At 15.6). Depois de muita discussão, eles chegaram à conclusão de que
não era certo impor sobre os gentios convertidos todo o peso da lei judaica.
A circuncisão foi abolida, e apenas algumas normas cerimoniais foram man
tidas para dar bom testemunho perante os demais judeus (At 15.20,21).10
Nada foi dito sobre a questão dos mandamentos, por exemplo, porque não
havia dúvidas a respeito disso. Os mandamentos morais de Deus estavam
lá para serem obedecidos. O concílio de Atos 15 se pronunciou sobre uma
situação específica de uma época específica. Era muito importante que os
gentios convertidos dessem um bom testemunho perante os judeus, por
isso aquelas exigências cerimoniais foram mantidas. Seria um erro querer
aplicá-las aos dias de hoje.
Entretanto, o grande problema que o Novo Testamento faz questão de
combater é a noção de que a lei salva. Para o Novo Testamento, Cristo
salva, e somente ele, por isso Paulo diz: “Ora, sabemos que tudo o que a lei
diz, aos que vivem na lei o diz para que se cale toda boca, e todo o mundo
seja culpável perante Deus, visto que ninguém será justificado diante dele
por obras da lei, em razão de que pela lei vem o pleno conhecimento do
pecado” (Rm 3.19,20). Paulo está apontando para o fato de que, a função
da lei não é, nem nunca foi, salvar. Por isso, escrevendo aos gálatas ele diz:
“De maneira que a lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo, a fim de
que fôssemos justificados por fé. Mas, tendo vindo a fé, já não permanece
mos subordinados ao aio” (G13.24,25). A função da lei é nos levar a Cristo.
Por isso, Paulo argumenta que Cristo tornou os crentes livres, e se eles
quiserem basear sua salvação na obediência a lei, estarão se tornando escra
vos, e se metendo debaixo de um jugo que ninguém jamais suportou (G1
2.16). Por esse motivo, Paulo diz com drasticidade: “Eu, Paulo, vos digo
que, se vos deixardes circuncidar, Cristo de nada vos aproveitará” (G1 5.2).
Se quisessem ser salvos pela lei, estariam pondo de lado o sacrifício de
Cristo, conseqüentemente teriam que guardar toda a lei e não tropeçar
em nenhum ponto (Tg 2.10). Nesse sentido, realmente era a lei ou Cristo,
pois, no sentido de salvação, Cristo é o “fim da lei para justiça de todo o
que crê” (Rm 10.4).
Como uma “preparação para a salvação”, a lei tem o seu primeiro uso
identificado na teologia reformada. Mas há mais dois. O segundo uso é o da
lei como fator de contenção. Este é chamado de “uso político ou civil”.11
Nesse sentido, a lei atende ao propósito de restringir o pecado e promover
a justiça. Essa lei age como refreadora do pecado dos homens. Ela inspira a
formação das próprias leis gerais que regem a maioria das nações do mun
do, e age no interior das pessoas, sob a forma da “consciência”, impedindo
378 Razão da esperança
que os homens pequem tanto quanto poderiam pecar (Rm 2.15). O tercei
ro uso da lei, do modo como é entendido na teologia reformada, é como
“instrumento de santificação”. Nesse sentido, ela seria a norma de vida
para os crentes, um fator de contribuição para a santificação. E claro que
em nada ela contribuiria para a salvação, mas quem já está salvo pode fazer
uso da lei de Deus para se aperfeiçoar cada vez mais no caminho da santi
dade. A lei foi dada desde o início para revelar o caráter e a vontade de
Deus. Sem dúvida, esse é um uso legítimo da lei, mas, nesse caso, não deve
mos pensar apenas nos dez mandamentos e sim na lei moral como um
todo, incluindo os escritos dos profetas, as palavras de Jesus e os ensinos
dos apóstolos.
O que precisa ficar claro desses três usos propostos para a lei é que nada
disso tem a ver com a salvação. A salvação é um dom de Deus. A lei serve
ou para conduzir a Cristo, ou para ajudar quem já está em Cristo, mas a
justificação é pela fé.
Em conexão com o assunto da lei sempre está a questão das obras.
Uma tendência que sempre existiu dentro do Cristianismo provém de
grupos que ensinam a necessidade de observar certos ritos, cerimônias,
costumes ou abstinências como meio de se alcançar a salvação. O homem
nunca se satisfez em confiar somente na graça para a salvação, e por isso
sempre tentou arranjar meios de dar uma “ajudinha” a Deus. Assim, é
ensinado que é preciso crer em Jesus, mas, além disso, se submeter a um
tipo especial de batismo em que a água é o que mais conta. Ou que preci
sa vestir-se de um determinado jeito, não comer certos alimentos, guar
dar este ou aquele dia, etc. Tudo é colocado como sendo uma contribui
ção para a salvação. O que mais se ouve é: Não faça isto, não faça aquilo,
e a religião se torna legalista ao extremo. Isso se deve à falta de entendi
mento bíblico de como a salvação é obtida. O apóstolo Paulo diz: “Pela
graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus”
(Ef 2.8). Qual é, então, a função das obras? A mesma passagem diz que a
salvação é dom de Deus e “não de obras, para que ninguém se glorie”, e
acrescenta “pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas
obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas”
(Ef 2.9,10). Então, não somos salvos p o r causa das boas obras, antes por
causa da graça de Deus, mediante a fé na obra redentora de Cristo, mas
somos salvos para boas obras, e por isso elas são importantes, porque são
demonstrações de que somos salvos. Elas são os frutos da regeneração e
da verdadeira conversão.
Justos pela fé 379
que a justificação nos seja imputada. A igreja católica romana dizia que era
uma mistura de fé e obras; os evangélicos legalistas dizem que é a fé mais
ordenanças específicas; os evangélicos neopentecostais dizem que é a fé
mais a contribuição, mas nós devemos dizer: E só a fé. As obras de qual
quer natureza não passam de um fruto da fé. Um fruto é uma conseqüência
e não um requisito.
tanto, por causa de Cristo, nós fazemos coisas justas porque somos justos
em Cristo. O fruto do Espírito é o resultado da regeneração operada pelo
Espírito na nossa vida, por causa da nossa união com Cristo. Nele fomos
justificados, nele estamos sendo santificados, neles seremos glorificados.
Somos livres em Cristo para obedecer a Deus, pois como diz Bavinck, “o
crente que é justificado em Cristo é a mais livre de todas as criaturas do
mundo. Pelo menos deveria ser”.15
A graça de Deus que nos salva não é uma graça que transforma a nossa
vida com o intento de sermos aceitos diante de Deus. Essa graça nos justi
fica instantaneamente, agora, no tempo presente, pois a justificação ocorre
no início da salvação e não no fim dela. Por isso, não precisa ser relegada
apenas às pessoas moribundas, mas a todos quantos se aproximam de Cris
to. Todos precisam saber que, em Cristo, são aceitos por Deus. Deus vê nos
seus eleitos a justiça de Cristo. Eles, por causa disso, não possuem qualquer
dívida, e ainda por cima, possuem uma inesgotável linha de crédito diante
de Deus. Porém, é verdade que continuam pecando, pois a sua natureza
pecaminosa ainda não foi erradicada; entretanto, já podem realizar boas
obras, pois em Cristo possuem uma nova natureza. Não há risco de que
abusem dessa graça e vivam no pecado, pois se fizessem isso, estariam de
monstrando claramente que jamais conheceram verdadeiramente a graça
de Deus.
31
Santificação: As alturas da fé
Uma obra da graça de Deus, pela qual os que Deus escolheu antes da fun
dação do mundo, para serem santos, são, nesta vida, pela poderosa opera
ção de seu Espírito e pela aplicação da morte e ressurreição de Cristo, ple
namente renovados, segundo a imagem de Deus, tendo as sementes do
arrependimento que conduz à vida, e de todas as outras graças salvíficas
implantadas cm seus corações, e tendo essas graças de tal forma dinamiza
das, aumentadas e fortalecidas, assim eles morrem cada vez mais para o
pecado e ressuscitam para a novidade de vida.1
A m orte do velho h o m e m
A re no va çã o do n o v o h o m e m
Porém, a santificação também é progressiva. O aspecto progressivo deve
ser visto como uma demonstração visível da realidade invisível. Já somos
santos em Cristo Jesus, agora precisamos evidenciar no dia a dia essa reali
dade de santidade. Hoekema define santificação progressiva como: “A gra
ciosa operação do Espírito Santo, que envolve a nossa participação respon
sável, pela qual ele nos livra da poluição do pecado, renova toda nossa
natureza segundo a imagem de Deus, e habilita-nos a viver de forma a
agradá-lo”.5 E Hodge diz: “Portanto, a santificação consiste em duas coi
sas: primeira, a eliminação progressiva dos princípios do mal que ainda
infectam a nossa natureza, e a destruição de seu poder; e, segunda, o cresci
mento do princípio espiritual até controlar os pensamentos, sentimentos e
atos, e conformar a alma segundo a imagem de Cristo”.6 Fomos santifica
dos em Cristo Jesus, mas o pecado ainda habita no nosso corpo e, por isso,
386 Razão da esperança
Obra de Deus e do h o m e m
Deus é o autor da santificação. A Escritura é muito clara ao afirmar isso:
“O mesmo Deus da paz vos santifique em tudo; e o vosso espírito, alma e
corpo sejam conservados íntegros e irrepreensíveis na vinda de nosso Se
nhor Jesus Cristo” (lTs 5.23). Como diz Bavinck, “a santificação, portanto,
é uma obra de Deus, uma obra tanto de sua Justiça, quando de sua Graça.
Ele atribui Cristo e todos os Seus benefícios a nós, e depois ele compartilha
conosco toda a plenitude que está em Cristo”.9 Portanto, Deus é o respon
sável pela santificação do homem, por isso Jesus orou ao Pai: “Santifica-os
na verdade, a tua palavra é a verdade” (Jo 17.17).
Ao mesmo tempo, porém, a santificação é nossa responsabilidade. Pri
mariamente é um dom divino, secundariamente é nossa obrigação. A Bíblia
nos manda aperfeiçoar a santidade: “Tendo, pois, ó amados, tais promessas,
purifiquemo-nos de toda impureza, tanto da carne como do espírito, aper
feiçoando a nossa santidade no temor de Deus” (2Co 7.1). O autor aos He
breus coloca as coisas nestes termos: “Segui a paz com todos e a santifica
388 Razão da esperança
ção, sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hb 12.14). É nossa responsabilida
de buscar a santificação, pois como já demonstramos anteriormente, ela é
necessária porque demonstra que realmente houve conversão. Se alguém
não foi santificado, não foi convertido, e, portanto, não pode ser salvo.
Em Filipenses 2.12,13, encontramos os dois aspectos da santificação
(obra divina e obra humana): “Assim, pois, amados meus, como sempre
obedecestes, não só na minha presença, porém, muito mais agora, na mi
nha ausência, desenvolvei a vossa salvação com temor e tremor; porque
Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua
boa vontade”. Os crentes são chamados a continuar obedecendo e desen
volvendo a salvação com temor e tremor. A frase “desenvolvei a salvação”
só pode se referir ao aspecto da santificação. Eles devem desenvolver algo
que já receberam. Já foram santificados, mas agora precisam evidenciar a
santidade. O aspecto de temor e tremor aponta para a diligência com que
essa tarefa deve ser encarada. Um crente deve fazer todos os esforços ne
cessários para viver em santidade. Ao mesmo em que aponta para isso,
Paulo também explica a origem divina da santificação, dizendo que Deus
opera tanto o querer quanto o realizar. O “querer” é a vontade, e o “reali
zar” é a materialização da vontade. Esses dois aspectos somente acontecem
porque Deus os possibilitou por meio de sua operação, portanto, santifica
ção é obra de Deus e obra do homem.
Distorcendo a lei
S o m b r a s pa ssag eir as
guém vos julgue por causa de...”. As pessoas que acham necessária a obser
vação de certas práticas, costumam julgar os outros. Essas pessoas colocam
ênfase numa série de regulamentações nas quais a observância rígida é ab
solutamente necessária para a salvação, ou pelo menos para a plenitude da
vida cristã. Quando a passagem fala em comida, bebida, dia de festa, lua
nova ou sábados, está se reportando principalmente às práticas do Antigo
Testamento, em que havia regulamentações para todas essas coisas. É pro
vável que, em Colossos, houvesse uma mistura de práticas do Antigo Testa
mento e novas práticas ascéticas, às quais falsos mestres estavam querendo
obrigar os colossenses a obedecer.
Segundo a argumentação de Paulo, as coisas do Antigo Testamento eram
apenas sombras da realidade que já existe e que é Cristo. Assim, não havia
motivos para ordenanças com respeito aos alimentos, uma vez que o pão
da vida já havia vindo (Jo 6.35,48). Não havia necessidade da observância
da páscoa como meio para o aperfeiçoamento espiritual porque “Cristo
nosso Cordeiro pascal já foi imolado” (ICor 5.7). Nem mesmo havia moti
vo para se impor sobre os novos convertidos a observância do sábado
judeu, pois aquele que veio trazer o descanso definitivo já veio (Mt 11.28,29,
Hb 4.8,14). A sombra, ou seja, aquelas práticas do Antigo Testamento que
riam apenas apontar para Cristo, mas agora já se podia ver o próprio “cor
po de Cristo” (v. 17), e por isso elas já não tinham mais razão de ser. E,
como disse Hendriksen “se isso era verdade em relação às regulamentações
do Antigo Testamento, certamente o era muito mais no que tange às regu
lamentação humanas, de caráter ascético que estavam sendo sobrepostas,
acrescentadas e em alguns casos até substitutivas da lei de Deus”.10 Tudo
isso era um grande erro porque, ao ser enfatizada a necessidade dessas
coisas, a plena suficiência de Cristo estava sendo negada.
tianismo, vocês não são crentes verdadeiros”. O curioso é que eles argu
mentam que esses costumes são um sinal de humildade, mas Paulo diz:
Essa humildade é apenas um pretexto, ela é falsa, pois ela quer fazer você
inferior a eles. Um outro argumento usado para convencer os colossenses
era o culto dos anjos. Os anjos eram, na crença dos povos que moravam
próximos dos colossenses, os governadores astrais e operadores de mila
gres. Assim, o nome dos anjos era usado para tentar convencer os crentes a
obedecer àquelas práticas. Um outro argumento eram as visões. Eles dizi
am que haviam recebido aquelas ordens em visões, e assim todos deveriam
obedecer. Se alguém ousasse contradizer, diriam: “Mas tivemos tal e tal
visão”. Isso se parece muito com o sistema de “revelações” em moda atu
almente entre os evangélicos. Segundo Paulo, na verdade estas pessoas eram
“enfatuadas, sem motivo algum, na sua mente carnal”. Enfatuado quer di
zer cheio de si, mas Paulo diz: “cheio de si sem motivo algum”. Essa pessoa
não é espiritual, pois não retém a cabeça (v.19), ou seja, não tem nada a ver
com Cristo. Seus motivos são carnais, não são os motivos de Cristo. Em
Cristo sim, há crescimento para todo o corpo, somente nele, e por meio
dele pode existir o verdadeiro crescimento espiritual que procede de Deus.
0 p e r i g o do retrocesso
S em resultados
M ú o s indispensáveis de santificação
Usos e costumes para nada colaboram na santificação, mas no processo
de nos santificar, Deus faz uso de alguns meios. Os principais são: a Pala
vra, a fé, a oração e a disciplina.
A Palavra de Deus
O principal meio divino para a nossa santificação é a verdade. Jesus
orou: “Santifica-os na verdade” (Jo 17.17; ênfase acrescentada). A verdade,
segundo Jesus, é a própria Palavra de Deus. E por meio da Palavra que
Deus nos santifica. Daí a importância crucial da pregação para o cresci
Santificação: As aliaras da fé 393
A fé
Outro meio apropriado para a nossa santificação é a fé. Muitos podem
pensar que a fé apenas nos conduz à justificação, mas, a verdade é que ela é
necessária para a nossa santificação também. De fato, “o evangelho nada
exige de nós além de fé, a confiança de coração na Graça de Deus em
Cristo. A fé não apenas nos justifica, mas também nos santifica e nos sal
va”.12 Isso equivale a dizer que santificação não é necessariamente questão
de esforço pessoal, mas de fé. Quanto mais fé, mais santos, pois quanto
mais fé, mais desfrutamos dos benefícios de Cristo. A passagem de Atos
26.18 fala dos crentes como sendo “santificados pela fé” em Jesus. Embo
ra, nesse aspecto, a passagem se refira à santificação definitiva que acontece
juntamente com a nossa justificação, também é verdade que pela fé somos
santificados diariamente. O motivo não é difícil de entender. Todo pecado
que o cristão possa cometer, em última instância, é por falta de fé. Jesus
costumava advertir as pessoas com respeito a essa questão de ter fé peque
na. Ele disse que se preocupar primordialmente com questões de comida,
bebida e vestuário era evidência de fé pequena (Mt 6.25-30). Também nos
momentos em que os discípulos estavam desesperados por alguma situa
ção, como quando enfrentavam a tempestade no mar da Galiléia, Jesus
disse que só estavam amendrontados porque eram homens de pequena fé
(Mt 8.26; 14.31). É difícil pecarmos quando a nossa fé e confiança no Se-
394 Razão da esperança
A oração
Um outro aspecto fundamental na santificação é a oração. A oração é o
momento mais íntimo de comunicação com Deus que o homem pode ter.
E o momento em que o ser humano tem uma audiência com Deus, e o
Todo-poderoso condescende em ouvir as suas súplicas. Ela é a chave para
o crescimento espiritual e para a santificação. Porém, infelizmente, o modo
como as pessoas normalmente oram prejudica bastante esse crescimento.
Os discípulos temiam orar de maneira errada, por isso procuraram o mes
tre e lhe pediram que os ensinasse a orar. Jesus ensinou: “Portanto, vós
orareis assim: Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja o teu nome;
venha o teu reino; faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu; o pão
nosso de cada dia dá-nos hoje; e perdoa-nos as nossas dívidas, assim como
nós temos perdoado aos nossos devedores; e não nos deixes cair em tenta
ção; mas livra-nos do mal pois teu é o reino, o poder e a glória para sempre. Amém\”
(Mt 6.9-13; ênfase acrescentada). Ao contrário do que às vezes se pensa,
essa não era uma oração que deveria ser decorada e repetida. E um molde,
um modelo eficaz de oração, ao qual as orações dos crentes devem se con
formar. Por trás desses princípios está o segredo do poder espiritual. Clas
sicamente, a oração que Jesus ensinou tem sido dividida em uma introdu
ção, uma conclusão e sete petições. As três primeiras petições dão toda a
prioridade para a glória de Deus. Isso é no mínimo impressionante, posto
que, freqüentemente, nossas orações se ocupam apenas conosco mesmos.
Quando Jesus ensina a orar pela santificação do nome de Deus, pela vinda
do Reino, e pela consumação da vontade de Deus para o mundo, está de
monstrando que um crente precisa entender que essas coisas têm priorida
Santificação: As alluras da fé 395
A disciplina
Uma das maneiras que Deus usa para nos santificar é sua disciplina.
Hebreus 12.10 diz: “Deus, porém, nos disciplina para aproveitamento, a
fim de sermos participantes da sua santidade”. A expressão “disciplina”
tem a ver com a provisão divina para o nosso crescimento, incluindo as
repreensões, a dor e o sofrimento. Deus permite que isso nos sobrevenha
para que sejamos santos como ele é santo (Lv 20.7; IPe 1.16), Quando
enfrentamos lutas, sofrimentos ou momentos de repreensão, achamos isso
doloroso, e ansiamos pelo momento em que seremos livres dessas coisas.
396 Razão da esperança
O autor aos Hebreus entedia isso: “Toda disciplina, com efeito, no mo
mento não parece ser motivo de alegria, mas de tristeza; ao depois, entre
tanto, produz fruto pacífico aos que têm sido por ela exercitados, fruto de
justiça” (Hb 12.11). Quando na igreja, a disciplina é exercida sobre a vida
das pessoas que cometeram faltas graves, isso pode parecer ofensivo para
muitos que estão poluídos pelo espírito moderno liberal, mas, sem a disci
plina, a pessoa terá grandes dificuldades em se recuperar espiritualmente. A
ausência da disciplina demonstra falta de amor, pois o próprio Deus diz:
“Eu repreendo e disciplino a quantos amo” (Ap 3.19). E o autor aos He
breus lembra: “Mas, se estais sem correção, de que todos se têm tornado
participantes, logo, sois bastardos e não filhos” (Hb 12.8). Como Pai amo
roso, Deus disciplina seus filhos para que mudem de atitudes, para que
sejam santificados.
A bênção da perseverança
U m slo ga n m a l c o m p r e e n d id o
Dentre aqueles que crêem que a salvação não se perde, desenvolveu-se
um slogan para definir bem a posição, que diz “Uma vez salvo, sempre sal
vo”. Estamos convictos de que esse slogan é verdadeiro, mas percebemos
que ele é muitas vezes mal entendido. Ele pode sugerir que uma vez que a
40 0 Razão da esperança
pessoa tomou uma decisão por Cristo, ela pode viver a sua vida irresponsa
velmente, e ao mesmo tempo, plenamente confiante de que jamais poderá
ser condenada. Alguém pode dizer, “Eu tomei uma decisão, Cristo é meu
Salvador, e todos os meus pecados - passado, presente, e futuro - estão
perdoados e esquecidos. Então, eu não tenho que me preocupar mais com
os momentos de fraqueza”. Um famoso teólogo americano, Robert Godfrey,
sarcasticamente caracterizou essa tendência dizendo: “Deus ama perdoar;
eu amo pecar, então isso coopera para um bom relacionamento”,1 E claro
que isso simplesmente não é bíblico.
Para que uma pessoa seja salva, é necessário que aconteça dentro dela
algo grande que Jesus chamou de “novo nascimento” (Jo 3.3). O novo nas
cimento acontece no momento em que o Espírito Santo cria uma nova vida
na nossa alma e, em resposta a isso, demonstramos arrependimento e fé
(conversão). Porém, a salvação é ainda mais do que isso. De fato, no instante
em que Deus efetuou o novo nascimento no nosso ser, somos capacitados a
responder com fé à pregação do evangelho e, então, somos instantaneamen
te justificados. Entretanto, a salvação é um processo, um ato contínuo de
Deus em nos tornar santos, Como vimos, esse processo recebe o nome de
santificação. Para que alguém seja salvo, é necessário que esse processo tenha
sido iniciado na sua vida. Ninguém pode ser justificado sem ser também
santificado. Isso é um bom resumo de tudo o que já vimos até aqui sobre
salvação. A perseverança nada mais é do que levar esse processo até ao fim.
Portanto, para que alguém diga “uma vez salvo, sempre salvo” é preciso
que tenha sido realmente salvo. E, para ser realmente salvo, é preciso que
haja uma transformação, e é necessário que a santificação fique evidenciada
na sua vida. Alguém que não evidencia essas coisas será condenado, não
porque perdeu a salvação, mas porque, na verdade, nunca foi salvo. Todo
tipo de orgulho que a expressão “uma vez salvo, sempre salvo” possa pro
duzir é incompatível com a humildade que é a marca de quem recebeu a
salvação de graça.
Selo de garantia
A partir do próximo capítulo, começaremos a tratar do Espírito Santo. O
Espírito Santo é fundamental para a nossa salvação, mas uma das coisas que
nem sempre entendemos é que o Espírito Santo tem um papel vital na per
severança. Primeiramente, devemos lembrar o ensino bíblico de que o Espí
rito é o selo de garantia do crente. Paulo disse aos Efésios: “Em quem tam
A bênção da perseverança 401
Elo de a m o r inquebrável
Depois de falar da atuação do Espírito, Paulo amplia ainda mais o en
tendimento da nossa segurança. Ele diz: “Sabemos que todas as coisas co-
402 Razão da esperança
operam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chama
dos segundo o seu propósito” (Rm 8.28). A prosperidade e a adversidade, a
felicidade e o sofrimento, as intenções maldosas das pessoas contra os cren
tes, os anjos bons e os anjos maus, as nações, os governos, a chuva, as
montanhas, as nuvens, as estrelas, etc., tudo o que acontece, ainda que seja
mau a princípio, será transformado em bem para aqueles que amam a Deus.
Na sequência da passagem de Romanos, Paulo diz: “E aos que
predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também
justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou” (Rm 8.30), Como
já estudamos, há uma ordem no processo da salvação. São os vários acon
tecimentos que compõe a totalidade da salvação. Esses acontecimentos são
interligados. Não faz sentido alguém ser predestinado, chamado, justifica
do e, depois, perdido. Essa passagem ensina que, quando Deus começa
alguma coisa, ele termina (Fp 1.6). Como já dissemos anteriormente, todos
os acontecimentos de Romanos 8.30 estão no passado. Deus vê o crente
como já tendo passado espiritualmente por todos os estágios (lembrar do
contraste entre o j á e o ainda não). Portanto, é impossível que essa cadeia
seja rompida. Os crentes predestinados foram objeto do amor de Deus
desde toda a eternidade. Este amor não pode se extingüir.
Por essa razão, Paulo declara com toda a convicção: “Que diremos,
pois, à vista dessas coisas? Se Deus é por nós, quem será contra nós?”
(Rm 8.31). O que Paulo quer dizer é que se Deus fez o mais difícil, por
que não faria o mais fácil? Se Jesus já morreu em nosso lugar, por que
Deus não terminaria a obra da salvação na nossa vida? Por isso, Paulo
entende que nada pode nos separar do amor de Cristo. Das sete experiên
cias que Paulo relatou (Rm 8.35), ele já tinha experimentado seis até aque
le momento (2Co 11.23-27) e, pela sétima, foi executado mais tarde. Como
Paulo, somos mais que vencedores em meio a essas coisas, ainda que nem
sempre sejamos livrados delas. E o motivo é o seu amor; somos vencedo
res porque o seu amor por nós permanece. Paulo diz: “Nem a morte”:
Depois da morte, estaremos com Deus. “Nem a vida”: Apesar das distra
ções da vida, podemos estar com Deus. “Nem anjos”: Os anjos bons têm
a função de nos ajudar. “Nem principados”: Os anjos maus tentam, mas
não podem nos afastar. “Nem presente, nem futuro”: Os acontecimentos
não nos fazem perder o amor de Deus e a salvação. “Nem poderes”:
Podem ser poderes de espíritos ou de pessoas, mas não são mais fortes
que o amor de Deus. “Nem altura, nem profundidade”: Acima ou abaixo,
estamos seguros. “Nenhuma outra criatura poderá nos separar do seu
amor”: Nem nós mesmos.
A bênção da perseverança 403
Uma vez salvos, sempre salvos. Nada pode fazer com que percamos a
salvação, pois nada pode nos separar do amor de Deus, Nós somos vence
dores na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza,
na guerra e na paz. Só os crentes são mais que vencedores, pois somente
eles possuem a obra do Espírito Santo na sua vida, somente para eles todas
as coisas cooperam para o bem, somente eles receberam uma salvação per
feita, e nada neste mundo poderá fazer com que percam isso.
A verdadeira segu ra n ça
Muitos acham que depende apenas de si mesmos a tarefa de manter a
salvação. Para estes, bem cabe a repreensão que Paulo fez aos Gálatas: “Sois
assim insensatos que, tendo começado no Espírito, estejais, agora, vos aper
feiçoando na carne?” (G1 3.3). De fato, essas pessoas vêem a sua salvação
em termos de uma decisão que fizeram, e baseiam a certeza de sua salvação
sobre a areia inconstante da vontade humana, Imagine que vida terrível é
essa. Ter o seu desdno eterno pendurado no fino cordão da vontade huma
na, que pode se romper a qualquer momento, pois a vontade humana pode
seguir um curso num minuto e mudá-lo no seguinte. Porém, é bom saber
que as coisas não precisam ser dessa maneira, É bom saber que o nosso
destino eterno não depende apenas da nossa vontade inconstante. E bom
saber que Deus tem um programa e um projeto para a nossa vida e um
interesse todo especial por ela, e que vai executá-lo, e isso depende da von
tade dele e não apenas da nossa.
Não devemos jamais buscar a certeza da nossa salvação nas nossas habi
lidades ou na nossa vida, mas no selo que Deus pôs sobre a nossa vida, o
selo do Espírito Santo que funciona como um penhor da nossa salvação
(Ef 1.13-14). Para que perdêssemos a salvação, teríamos que voltar à antiga
condição de morte espiritual. Mas imagine que tipo de regeneração seria
essa que o Espírito Santo realizaria na vida de alguém, ressuscitando-o e
dando-lhe vida eterna, a qual a pessoa poderia de alguma maneira perder e
voltar a morrer. Então, não seria de fato vida eterna. Será que nós podemos
cometer suicídio espiritual? Certamente que não, pois Pedro diz que nós
fomos “regenerados não de semente corruptível, mas de incorruptível”
(lPd 1.23). A Bíblia fala em “nascer de novo”, mas graças a Deus, não fala
em “morrer de novo”. Do mesmo modo, a Bíblia diz que Deus “nos liber
tou do império das trevas e nos transportou para o reino do Filho do seu
amor” (Cl 1.13). O verbo “libertou” está num tempo verbal grego que
404 Razão da esperança
0 cuidado do p a stor
A Palavra de Deus chama os crentes de ovelhas. Uma ovelha possui um
pastor e esse pastor tem a função de cuidar da ovelha. Ele trabalha para
impedir que ela se perca. Cristo disse: “Eu sou o bom pastor; conheço as
minhas ovelhas, e elas me conhecem a mim... e dou a vida pelas minhas
ovelhas” (Jo 10.14-16). Já dissemos que a função de um pastor é defender e
buscar a ovelha perdida. Cristo havia dito que o mercenário não fazia isso,
pois diante do lobo, o mercenário fugia. Um pastor verdadeiro não fugiria,
antes enfrentaria o lobo. Cristo é ainda mais do que um pastor verdadeiro,
ele é de fato o “supremo pastor” (lPd 5.4), pois deu a própria vida pelas
suas ovelhas. Pensar que ele poderia deixar que alguma delas perecesse é
um absurdo. De fato o próprio Jesus já declarou: “E a vontade de quem me
enviou é esta: que nenhum eu perca de todos os que me deu” (Jo 6.39). O
relacionamento de Cristo com suas ovelhas funciona do seguinte modo:
“Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão, e ninguém as arrebatará da
minha mão” (Jo 10.28). A segurança eterna do crente não é algo que depen
de dele próprio, mas do pastor que cuida dele. Aqueles que consideram a
possibilidade de uma verdadeira ovelha de Cristo se perder para sempre,
desconsideram a capacidade do pastor de cuidar de suas ovelhas.
E possível que, como ovelhas de Cristo, em algum momento nos afaste
mos dele, e nos tornemos ovelhas perdidas. Isso será terrível para nós, mas
ele nunca deixará de nos vigiar; nunca permitirá que nos afastemos para
 bênção da perseverança 405
0 d o m da perseverança
A Escritura diz que “aquele, porém, que perseverar até o fim, esse será
salvo” (Mt 24.13). Berkhof diz que a Perseverança dos Santos tem o “sentido
de que aqueles que Deus regenerou e chamou eficazmente para um estado
de graça não podem cair nem total nem definitivamente, mas certamente
perseverarão nele até o fim e serão salvos para toda a eternidade”.2 A
perseverança é uma bênção, pois é Deus quem a concede. Mesmo que o
crente peque, ele sempre encontrará o perdão em Deus. Segundo a Escri
tura, há apenas um pecado que não tem perdão, o “pecado contra o Espí
rito Santo”.3 Jesus disse que quem blasfemasse contra o Espírito não po
deria ser perdoado (Mt 12.31). João também fala de um pecado a respeito
do qual não se deve sequer orar: “Se alguém vir a seu irmão cometer peca
do não para morte, pedirá, e Deus lhe dará vida, aos que não pecam para
morte. Há pecado para morte, e por esse não digo que rogue” (ljo 5.16). O
pecado que João tem em mente só pode ser o pecado contra o Espírito
Santo, pois é o único que não pode ser perdoado. João continua: “Toda
injustiça é pecado, e há pecado não para morte” (ljo 5,17). Embora toda
injustiça seja pecado, todos os pecados podem ser perdoados, porém João
continua tendo em mente um pecado que não tem perdão, e por isso de
clara: “Sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não vive em peca
do; antes, Aquele que nasceu de Deus o guarda, e o Maligno não lhe toca”
(ljo 5.18). Literalmente, João disse que quem nasceu de Deus não peca. Os
406 Razão da esperança
Não somos fatalistas. Uma vez salvo sempre salvo somente tem valor se
alguém se tornou um filho de Deus. E, para ser salvo, é preciso que eviden
cie na sua vida os frutos dessa salvação. Devemos confiar que somos sal
vos, e enquanto trabalhamos, somos capacitados, pelo Espírito que está em
nós, a permanecer fiel. E verdade que o pecado sempre estará à nossa por
ta, entretanto, sua graça sempre nos ajudará, e por mais endurecidos que
possamos estar em certas situações, se formos de fato “ovelhas do seu
pasto”, Jesus não desistirá de nós (SI 79.13; Ez 34.31). A certeza da salvação
é uma bendita esperança, é algo que, como diz Schaeffer, nos “enche de
alegria, de modo que não tenhamos que ir para a cama todas as noites
repassando os acontecimentos do dia e perguntando-nos ‘será que eu ainda
continuo salvo, ou será que eu me perdi?”6 Poderemos repassar os aconte
cimentos para agradecer as bênçãos e pedir perdão pelos pecados, e depois,
dormir em paz, seguros na mão poderosa do pastor celeste Qo 10.28).
33
Jesus disse: “O vento sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes
donde vem, nem para onde vai; assim é todo o que é nascido do Espírito”
(Jo 3.8), Ele destacou a existência do Espírito como análoga ao vento, de
monstrando a sua invisibilidade, a sua imprevisibiüdade c, ao mesmo tem
po, a sua existência real e abençoadora. A palavra vento e a palavra Espírito
são exatamente a mesma na língua grega,1 e, portanto, nessa passagem Je
sus está fazendo um jogo de palavras. Quando pensamos no Espírito como
alguém semelhante ao vento, entendemos um pouco sobre quem ele é.
Jesus disse: “O vento sopra onde quer”. Quem pode controlar o vento?
Também ninguém pode controlar o Espírito. Em seguida, ele disse: “Ou
ves a sua voz, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai”. De alguma
maneira, podemos senti-lo, embora não possamos vê-lo, nem entendê-lo.
Todos os crentes sabem quem é o Espírito Santo. Ninguém precisa descrevê-
lo para eles, até porque ninguém conseguiria. Todo crente sabe o que é esse
maravilhoso sopro de vida e de paz que preenche a vida e eleva o nosso
cotidiano. Essa “doce presença” inunda a existência do filho de Deus, e o
leva a ter um relacionamento tão íntimo com Deus quanto uma criancinha
pode ter com o seu pai (Rm 8.15).
Por outro lado, percebe-se que há, dentro do Cristianismo, muitas
distorsões a respeito da pessoa e da obra do Espírito Santo. Se, durante
séculos, o Cristianismo pouco falou a respeito do Espírito,2 o século 20 foi
um verdadeiro despertar para o Espírito. Isso aconteceu basicamente por
causa dos movimentos carismáticos que surgiram no início do século e se
estenderam em sucessivas renovações até o fim do século 20. Hoje, as igre
jas pentecostais e neopentecostais são maioria absoluta em vários países do
mundo, inclusive no Brasil. O termo “pentecostal” é uma referência aos
acontecimentos do dia de Pentecostes, quando o Espírito Santo desceu
sobre os discípulos e eles passaram a falar em línguas estranhas (At 2).
Supostos movimentos espirituais têm causado divisões e esfacelamento em
denominações cristãs que tinham o peso de séculos de existência. Na “onda
do Espírito” as pessoas têm tido as mais diversas e até aberrantes manifes-
410 Razão da esperança
com eles, nada duvidando; porque eu os enviei” (At 10.19,20). Nesse caso,
ele não só falou como deu instruções claras e precisas. E também Paulo e
Barnabé foram chamados pela ordem do Espírito: “Disse o Espírito Santo:
Separai-me, agora, Barnabé e Saulo para a obra a que os tenho chamado”
(At 13.2). Aqui ele chama e demonstra preferência, como também faz nou
tra ocasião quando eles tentavam “ir para Bitínia, mas o Espírito de Jesus
não o permitiu” (At 16.7). Ter a capacidade de ensinar também é obra de
alguém que tem personalidade. Jesus disse: “Mas o Consolador, o Espírito
Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas
e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito” (Jo 14.26). Também disse
que ele testemunharia: “Quando, porém, vier o Consolador, que eu vos
enviarei da parte do Pai, o Espírito da verdade, que dele procede, esse dará
testemunho de mim” (Jo 15.26). Mais à frente, Jesus reiterou: “Quando
vier, porém, o Espírito da verdade, ele vos guiará a toda a verdade; porque
não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido e vos anunciará
as coisas que hão de vir” (Jo 16.13). Todas essas capacidades de ensinar,
testemunhar e guiar são exclusivas de uma personalidade, Imaginar que
uma força impessoal fosse capaz de realizar essas coisas não faz sentido.
O Novo Testamento fala ainda sobre a questão de não pecar contra o
Espírito Santo (Mt 12.31), do perigo de resistir ao Espírito Santo (At 7.51),
e do dever de não entristecer o Espírito Santo (Ef 4.30). Como diz Sproul:
“ele nos é apresentado como uma pessoa a quem podemos agradar ou
ofender, que pode amar e ser amado e com quem podemos ter comunhão
pessoal”.4 Todas essas coisas são próprias apenas de uma pessoa. Portanto,
o Espírito Santo não é uma força ou uma energia, ele é uma pessoa, uma
pessoa divina,
A era do Espírito
A vinda do Espírito marcaria uma nova era para o mundo, e especial
mente para a igreja. Há muito tempo Deus vinha anunciando por intermé
dio dos profetas a chegada de uma era espetacular. Essa era foi identificada
como um derramamento especial do Espírito Santo. Apesar de o Espírito
já estar em atividade durante todo o período do Antigo Testamento, como
disse Stott, “mesmo assim, alguns profetas predisseram que nos dias do
Messias, Deus concederia uma difusão liberal do Espírito Santo, nova e
diferente, bem como acessível a todos”.5 Isaías profetizou que depois de
um tempo de muita destruição para o povo de Israel, em que os palácios
seriam abandonados, as cidades ficariam desertas, as torres seriam destruí
das, finalmente, Deus derramaria o “Espírito lá do alto”; então, toda uma
renovação aconteceria (Is 32.14,15). Esse derramar do Espírito passou a
ser uma das grandes expectativas escatológicas do povo de Deus. Isaías fala
ainda: “Porque derramarei água sobre o sedento e torrentes sobre a terra
seca; derramarei o meu Espírito sobre a tua posteridade e a minha bênção,
sobre os teus descendentes” (Is 44.3). Ezequiel foi ainda mais específico
sobre esse derramamento: “Então, aspergirei água pura sobre vós, e ficareis
0 Batismo com o Espírito Santo 413
Capacitações especiais
Mas será que isso quer dizer que o Espírito não agia para a salvação das
pessoas no Antigo Testamento? A esse respeito, um dito de Jesus é bastan
te discutido. Jesus disse certa vez aos apóstolos: “E eu rogarei ao Pai, e ele
vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco, o
Espírito da verdade, que o mundo rião pode receber, porque não no vê,
nem o conhece; vós o conheceis, porque ele habita convosco e estará em
vós” (Jo 14.16,17). Essas palavras de Jesus têm dado margem para muitos
imaginarem que o Espírito Santo não habitasse dentro dos crentes no An
tigo Testamento, especialmente quando consideradas em conjunto com as
palavras de Jesus registradas em João 7.38,39: “Quem crer em mim, como
diz a Escritura, do seu interior fluirão rios de água viva. Isto ele disse com
respeito ao Espírito que haviam de receber os que nele cressem; pois o
Espírito até aquele momento não fora dado, porque Jesus não havia sido
416 Razão da esperança
Em primeiro lugar, pelo fato de que a Velha Dispensação sempre olhava para
a frente, para o dia em que surgiria o Servo do Senhor, sobre quem o Espírito
repousaria em toda a sua plenitude (...) Em segundo lugar, o Antigo Testa
mento prediz que, embora houvesse já naquele tempo uma certa operação do
Espírito Santo, que esse Espírito seria derramado sobre toda a carne.10
Não há sentido em pensar que o Espírito não agisse nos crentes para
salvá-los antes do dia de Pentecostes, pois como diz Stott, “no tempo do
Antigo Testamento, ele estava incessantemente ativo - na criação e na pre
servação do universo, na providência e na revelação, na regeneração de
crentes, e na capacitação de pessoas especiais para tarefas especiais”.11 A
regeneração é impossível sem a atuação do Espírito Santo, então, se havia
crentes no Antigo Testamento, essas pessoas precisavam ter o Espírito.
Encontramos no Salmo 51 uma importante declaração de Davi sobre isso.
Consciente do seu pecado com Bate-Seba, Davi ora a Deus: “Não me
repulses da tua presença, nem me retires o teu Santo Espírito” (v.l 1). Como
diz Lloyd-Jones, “aqui estava um homem sob a velha dispensação, um ho
mem anterior ao Pentecostes, e orou para que Deus não retirasse dele o Seu
Espírito”.12 Se Davi tinha o Espírito Santo, devemos também pensar que
todos os demais crentes, como Abraão, Isaque, Jacó, José, etc., tinham o
Espírito Santo, pois como diz Calvino, “tudo o que o Senhor tinha feito e
sofrido para adquirir salvação para o gênero humano pertencia tanto aos
crentes do Antigo Testamento quanto a nós. E, de fato, eles tinham um
mesmo espírito que nós temos, pelo qual Deus regenera os Seus para a vida
eterna”.13 Porém, há diferença no sentido de que, o derramar do Espírito
era mais restrito. Após o Pentecostes, vemos um derramar generalizado,
especialmente incluindo outros povos.
0 Batismo com o Espírito Santo 417
0 outro Consolador
Para que o Espírito fosse enviado, Jesus precisaria primeiro consumar a
sua obra. Jesus esteve com os discípulos por cerca de três anos. Ele precisa
va partir para o santuário celestial onde continuaria sua obra de intercessão
pelo seu povo até o último dia, mas os discípulos não ficariam sozinhos
nesse ínterim, pois Jesus disse: “Eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro
Consolador” (Jo 14.16). Jesus foi o grande consolador dos seus discípulos.
A palavra grega para consolador é parakletos, e significa literalmente “aquele
que está ao lado de”. Porém, agora, ele precisava partir, e não poderia mais
permanecer ao lado de seus discípulos. Entretanto, não deixaria os seus dis
cípulos sozinhos, pois mandaria um companheiro para eles: o Espírito San
to. A partir desse momento Jesus seria o consolador (parakletos) no céu (ljo
2.1), intercedendo pelos seus discípulos de lá, enquanto o Espírito seria o
consolador (parakletos) na terra, também intercedendo e cuidando dos dis
cípulos aqui (Rm 8.26). Não poderia haver bênção maior para o povo de
Deus do que ter, não um, mas dois “consoladores”.
Por várias vezes, Jesus advertiu seus discípulos de que precisava partir.
Um dos motivos principais é que somente depois da sua partida ele poderia
enviar o outro Consolador (ver Jo 7.38,39). Enquanto Jesus não fosse glo
rificado, o Espírito Santo não poderia ser enviado, por isso Jesus disse aos
discípulos: “Mas eu vos digo a verdade: convém-vos que eu vá, porque, se
eu não for, o Consolador não virá para vós outros; se, porém, eu for, eu vo-
lo enviarei” (Jo 16.7). Era necessário que Cristo subisse aos céus e se assen
tasse à direita do trono de Deus, e assim glorificado, enviasse o Espírito
Santo aos discípulos. E assim iniciasse a obra mundial de conversão e de
consumação dos propósitos de Deus. Este é o sentido principal em que há
diferença entre o Espírito antes e depois do Pentecostes.
Era muitíssimo necessário que o Espírito viesse. Além de substituir Jesus,
ele teria funções extras. Seria sua função lembrar aos discípulos as coisas que
Jesus havia dito (Jo 14.26). Também fazia parte da sua obra convencer o
mundo do pecado, da justiça e do juízo (Jo 18.8). Em tudo isso, o Espírito
não agiria de modo independente, pois a sua função era glorificar o próprio
Jesus, exaltando a sua pessoa, o seu poder e a sua obra (Jo 16.14). Esse é um
ponto de máxima importância, pois é comum, hoje, as pessoas enfatizarem
mais a pessoa e a obra do Espírito Santo do que a do Pai e a do Filho. E
verdade que o Espírito Santo não foi considerado como devia ao longo da
história da igreja, porém, é um erro querer enfatizar a obra do Espírito acima
418 Razão da esperança
0 pentecostes e a redenção
Como já vimos, o Espírito Santo habitava os crentes antes do Pentecos
tes, porém, ele seria dado de modo mais pleno a partir de então. Veja que
Jesus diz que os discípulos já conheciam o Espírito Santo, enquanto o mun
do ainda não o conhecia (v. 17). Isso é mais uma prova de que eles já possu
íam o Espírito Santo. Porém, já vimos que somente depois da partida de
Jesus é que o outro Consolador viria para assumir definitivamente a função
de guiar os discípulos a toda a verdade.
Babel invertida
Para que o derramamento do Espírito acontecesse, Jesus precisava ser
exaltado por meio da sua ascensão. Foi na ascensão, quando se assentou à
0 Batismo com o Bspírilo Sanlo 419
destra de Deus que Cristo recebeu o título de “Cabeça da igreja” (Ef. 1.20-
23). Então, somente depois da sua ascensão ele pôde mandar o Espírito
Santo para ligar os membros a fim de formar um só corpo. Alguém dirá:
Mas, então, não havia igreja no Antigo Testamento? Havia, porém não nos
mesmos termos do Novo Testamento. No dia do Pentecostes aconteceu
algo novo que jamais havia acontecido antes. Nesse dia, a unidade foi esta
belecida. Podemos ver o Pentecostes como um tipo de Babel invertida.
Naquele dia, a igreja composta de todas as nações se reuniu num único
corpo. Foi por isso que o dom de línguas foi concedido. As línguas de todos
os povos foram unidas no dia do Pentecostes, simbolizando a unidade da
igreja em todas as nações, e não mais apenas dentro dos limites de Israel.
As línguas haviam sido divididas por ocasião da torre de Babel como um
juízo de Deus contra a soberba humana, mas no Pentecostes foram reuni
das, demonstrando a unidade do povo de Deus. No Pentecostes, os discí
pulos receberam o Espírito do Cristo glorificado, e assim foram batizados
no corpo de Cristo, ou seja, na igreja. A vinda do Espírito Santo no dia do
Pentecostes foi para a instituição da igreja do Novo Testamento.
0 p e n ú l t i m o a c o n t eci m en t o redentor
C u m p r im en t o Histórico
Atos 2.1-4 tem a sua importância não por causa da festa do Pentecostes
em si, mas pelo fato de que Deus cumpriu mais um acontecimento da
0 Batismo com o Espírito Santo 421
Pentecostes s a m a r i t a n o ?
evangelho tinha sido aceito fora de Jerusalém, e Lucas, que escrevia para
um grego chamado Teófilo, estava querendo mostrar como o evangelho
saiu da exclusividade do ambiente judeu, sob a supervisão dos apóstolos e
com todas as bênçãos do Espírito Santo (Ver At 1.8), e alcançava justamen
te os samaritanos. A ocasião era realmente crucial. Os samaritanos eram
inimigos históricos dos judeus. Será que os crentes judeus iriam aceitá-los?
Ou será que a divisão entre os judeus e os samaritanos permaneceria na
igreja? Certamente foi por esse motivo que Deus reteve, talvez não o batis
mo com o Espírito Santo, mas a manifestação visível dele, até que os após
tolos pudessem verificar a veracidade do acontecimento. Não foi identifi
cado nenhum problema com os samaritanos em si. Nenhuma condição foi
requerida deles, como orar ou buscar o Espírito. O problema também não
está com Filipe, que logo em seguida prega ao eunuco etíope e não foi
necessário que os apóstolos fossem verificar (ver At 8.26-40).19 O proble
ma está no relacionamento entre Jerusalém e Samaria. Está no fato de que
Deus desejava transpor oficialmente uma inimizade histórica. Deus reteve
a manifestação visível do Espírito Santo para que os apóstolos testificassem
que a fé também estava sendo encontrada em Samaria, e assim, autenticas
sem a obra entre os samaritanos. Deus quis que os apóstolos vissem com
os seus próprios olhos a obra no meio deles, para que nunca se dissesse que
os samaritanos não haviam sido incluídos oficialmente na igreja apostólica.
Portanto, não há razão para pensar num segundo Pentecostes, e nem o
acontecimento samaritano deve ser aceito como norma para os crentes em
todos os tempos, pois a sua diferença explica-se perfeitamente por causa da
sua situação histórica.
E q u an to ao s discípulos de Éfeso?
Esse incidente está descrito em Atos 19.1-7. Paulo, na sua terceira via
gem missionária, encontrou alguns supostos discípulos na cidade de Éfeso.
Ele logo lhes perguntou se haviam recebido o Espírito Santo quando cre
ram. Isso já é suficiente para perceber que Paulo vincula o recebimento do
Espírito Santo com o ato de crer. O apóstolo achou que havia algo estra
nho naqueles homens, e logo a sua suspeita veio a se confirmar. Eles res
ponderam que nunca tinham ouvido falar da existência do Espírito Santo.
Eram discípulos de João Batista e não conheciam a verdade plena a respei
to de Jesus. Provavelmente, eles tinham sido ensinados por Apoio, o qual
passou um tempo em Éfeso. O próprio Apoio precisou ser ensinado a
respeito das verdades fundamentais do evangelho, pois conhecia apenas os
ensinos de João Batista (ver At 18.24-28). É difícil imaginar que aquelas
0 Batismo com o Espírito Santo 425
pessoas fossem realmente convertidas. Elas não sabiam que Jesus já tinha
se manifestado, e nada sabiam sobre a vinda do Espírito Santo. Não eram
convertidas, mas tornaram-se com a pregação de Paulo e receberam o dom
do Espírito Santo no mesmo instante. Portanto, o que aconteceu nesse
episódio, longe de ser uma segunda bênção, confirma que o Espírito Santo
é dado no momento da fé.
A qu estão da n o r m a
Precisamos ainda dizer uma palavra a respeito de quão normativos para
formulações doutrinárias são os escritos históricos como, por exemplo, o
livro de Atos. Lucas, ao narrar os acontecimentos daqueles dias, não estava
querendo dizer que tudo aquilo seria norma para todos os tempos. Ele
simplesmente estava narrando as coisas como haviam acontecido e do modo
como tudo podia ser visto. Se tudo o que Lucas escreveu em Atos fosse
norma, então, precisaríamos lançar sortes quando escolhêssemos um novo
pastor (ver At 1.26), e se alguém mentisse para o pastor na entrega dos
dízimos, cairia morto no chão (ver At 5.1-10). Precisamos entender que
certas coisas que a Escritura relata como tendo acontecido a outros não
precisa necessariamente acontecer conosco. Porém, há coisas, por exem
plo, que a Escritura afirma explicitamente como sendo para todos. Entre
tanto, essas coisas podem ser encontradas mais nas cartas, nos sermões de
Jesus, ou nas formulações doutrinárias da Bíblia, e não nas descrições dos
acontecimentos históricos. Portanto, é norma para nós o que a Bíblia nos
ensina diretamente ou de modo proposicional, e não o que ela narra sem
fazer qualquer comentário a respeito. Sempre que a Bíblia narra uma histó
ria sem fazer qualquer comentário, devemos ir às outras partes da Bíblia
que ensinam diretamente para entender o significado desse evento. Caso
contrário, provavelmente estaremos usando a Palavra de Deus de modo
errado. Portanto, não é possível, a partir do acontecimento de Atos 2, dizer
que é a norma para todas as épocas. Até porque poucos insistiriam na ne
cessidade das línguas de fogo ou no som do vento impetuoso. Tudo o que
Lucas colocou no livro de Atos estava dentro do seu plano de demonstrar
o crescimento da igreja desde Jerusalém até Roma, mostrando que esta
igreja impulsionada pelo Espírito Santo não podia ser detida, e seu cresci
mento continuaria apesar de toda a oposição. A intenção de Lucas não era
narrar cada acontecimento como sendo a norma para a igreja em todas as
épocas mas, por meio do todo, mostrar como uma igreja verdadeira é vito
riosa pelo poder do Espírito Santo.
426 Razão da esperança
A fo rç a do "nós"
Na língua original em que o Novo Testamento foi escrito, há uma grande
ênfase na palavra “nós”. Paulo poderia ter escrito a mesma passagem sem
usá-la, e o significado seria o mesmo, mas ele fez questão de dizer “todos nós
fomos batizados em um só Espírito”. Com essa expressão, ele não admite
exceções. Todos os verdadeiros crentes foram batizados no Espírito Santo.
0 Batismo com o Espírito Sanlo 427
E esse não é o único lugar em que isso fica claro. Em Romanos 8.9
Paulo escreveu igualmente “Vós, porém, não estais na carne, mas no Espí
rito, se, de fato, o Espírito de Deus habita em vós. E, se alguém não tem o
Espírito de Cristo, esse tal não é dele”. A passagem é clara: se alguém não
tem o Espírito de Cristo, não pertence a Cristo. Paulo não diz que se al
guém não tem o Espírito é crente de segunda classe, mas que não é de
Cristo, ou seja, não é crente. Não há duas classes de crentes dentro de uma
igreja, todos os verdadeiros crentes foram batizados com o Espírito Santo;
se alguém ainda não foi batizado, não é crente, não pode fazer parte da
igreja, não pertence ao corpo de Cristo, e ainda precisa se converter. Um
outro dado que precisa ser comentado é que nenhum escritor do Novo
Testamento, em lugar algum, manda que o batismo do Espírito Santo seja
buscado. Não há uma única passagem que exorte qualquer cristão a buscar
a experiência do batismo com o Espírito Santo depois da conversão. Isso
não acontece porque é entendimento comum dos escritores bíblicos que
todos os crentes já foram batizados. Devemos considerar seriamente que
seria um grande lapso esquecer de mandar os crentes buscarem esse batis
mo, se de fato ele devesse ser buscado. Porém, não há qualquer método,
ordem, ou mesmo sugestão para buscar ou receber o batismo com o Espí
rito Santo. O motivo é simples: ninguém pede ou busca algo que já possui.
A fo rç a do "todos"
Voltando a 1 Coríntios, Paulo enfatiza que todos já puderam beber do
mesmo Espírito (ICo 12.13). Observe a conexão entre beber em 1 Corín
tios 12.13 e o que foi dito em joão 7.37,38: “No último dia, o grande dia da
festa, levantou-se Jesus e exclamou: Se alguém tem sede, venha a mim e
beba. Quem crer em mim, como diz a Escritura, do seu interior fluirão rios
de água viva. Isto ele disse com respeito ao Espírito que haviam de receber
os que nele cressem”. Quem fosse até Jesus e bebesse receberia o Espírito
Santo quando cresse. Todos os que creram já beberam do Espírito Santo,
ou seja, já foram batizados. Isso demonstra que as palavras de Jesus não são
um desafio para que os incrédulos busquem o Espírito Santo. Elas são um
desafio para que os incrédulos busquem Jesus. Se eles têm sede, Jesus mata
a sede, e o que João e Paulo nos acrescentam é que Jesus mata a sede das
pessoas com o Espírito. Se Paulo entendesse que nem todos os crentes
tinham bebido deste Espírito, não teria usado a palavra todos, pois teria
perdido uma incrível oportunidade de mandar os que ainda não tinham
bebido de buscar esta água.
428 Razão da esperança
A fo rç a d o "um"
Do mesmo modo que a palavra “todos” traz grande ênfase sobre o
batismo como uma experiência comum de todos os crentes, também a
palavra “um” fala de uma experiência única. O ponto central de Paulo em 1
Coríntios 12.13 é que o batismo com o Espírito Santo faz a igreja ser um
corpo. Se houvesse diferentes batismos com o Espírito Santo, poderia ha
ver mais que uma igreja. E Paulo está usando exatamente a doutrina do
batismo com o Espírito Santo para demonstrar a unidade de todos os cren
tes no mesmo corpo, ainda que sejam membros diferentes, individuais e
com funções próprias. Logo, para Paulo, o batismo com o Espírito Santo
era um fator unificador na igreja e, em hipótese alguma, um fator
diferenciador. Ou seja, em total oposição à noção atual de que existem duas
classes de crentes separados pelo batismo com o Espírito Santo, na visão
de Paulo há uma única classe, unida justamente pelo batismo. O batismo
une ao invés de separar. Não existe uma elite e uma periferia espiritual na
igreja. Existe um corpo, que embora possua muitos membros, inclusive
com funções diferentes, tem por princípio que nenhum é superior ou infe
rior. Todos têm a sua importância dentro do corpo (ver 12.14-26), no qual
foram ligados pelo batismo do Espírito.
Jesus batizou em um único Espírito todos os crentes num único corpo,
quer judeus, quer gregos, quer escravos quer livres. Nada poderia ser mais
enfático. De fato não há classes distintas de crentes. Em um Espírito foi
estabelecida uma só igreja. Não há crentes parciais, assim como não há
membros parciais do corpo de Cristo. Gálatas 3.26-28 afirma: “Pois todos
vós sois filhos de Deus mediante a fé em Cristo Jesus; porque todos quantos
fostes batizados em Cristo de Cristo vos revestistes. Dessarte, não pode
haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mu
lher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus”. Todos os crentes em
Cristo se tornaram membros plenos do seu corpo, que é a igreja, no exato
momento em que foram salvos, pois “há somente um corpo e um Espírito,
como também fostes chamados numa só esperança da vossa vocação; há
um só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, o qual
é sobre todos, age por meio de todos e está em todos” (Ef 4.4-6). Graças a
Deus porque a igreja dele não está dividida. Não há divisões ou classes
distintas de crentes dentro da igreja, pois todos os crentes já foram batizados
no mesmo Espírito.
0 Batismo com o Espírito Santo 429
B u sc an do o que já t em ?
Uma grande confusão tem sido causada nas igrejas por líderes que ensi
nam a necessidade de uma segunda obra da graça. Por todos os lados, po
demos ver a frustração e o desapontamento na vida de muitos que ainda
não conseguiram chegar a essa segunda bênção. O problema é que, quando
alguém acha que precisa buscar algo que não tem, certamente deixa de dar
importância ao que já tem. Ora, todos os crentes já possuem a obra da
graça na sua vida e também os meios para alcançar a verdadeira santidade,
mas literalmente abandonam o pássaro na mão para perseguir os que estão
voando. Deixam de valorizar o que Deus já lhes deu para buscar o que não
existe. Assim, rejeitam o maior dom que Jesus nos deu, que foi a vinda do
“outro” Consolador.
0 Espírito e o testem un ho
Finalmente, devemos considerar a missão do Espirito Santo. Ele foi
enviado para capacitar a igreja a desempenhar a tarefa de propagar o Reino
de Deus. Quando lemos o Novo Testamento, percebemos que, até o Pente
costes, os discípulos nunca haviam entendido realmente qual era a ligação
entre Jesus e o reino de Deus. Durante todo o ministério público de Jesus,
eles esperaram pela manifestação física, política-institueional desse reino.
Lembramos que a nação de Israel era dominada pela poderosa Roma, e
freqüentemente apareciam “libertadores” que arrastavam um pouco de povo
para enfrentar suicidamente os poderosos exércitos romanos. A maior es
perança de Israel estava na vinda do Messias, o prometido desde os tempos
mais remotos do Antigo Testamento. Todos esperavam que ele libertasse a
nação da escravidão e a estabelecesse como um reino próspero diante de
quem todos os reinos da terra teriam que se prostrar. Os discípulos acredi
tavam que Jesus fosse o Messias, e, portanto, esperavam que ele, de alguma
maneira tomasse o poder, se assentasse no trono e restabelecesse a monar
quia absoluta de Israel. Todas essas esperanças dos discípulos se acabaram
com a morte de Jesus, entretanto se reacenderam extraordinariamente com
a ressurreição. Em Atos 1.6, os discípulos se dirigem a Jesus e pedem: “Se
nhor, será este o tempo em que restaures o reino a Israel?” Jesus respondeu
que a eles não seria dado conhecer tempos (cronos) e épocas (kairós) que o
Senhor havia reservado exclusivamente para ele, mas, promete mandar o
Espírito Santo que faria deles testemunhas cheias de poder em todo o mun
430 Razão da esperança
pois o número subiu para cinco mil (At 4.4). Deus autenticou a obra deles
conferindo resultados.
Dessa mesma perspectiva, Jesus disse que a vinda do Espírito Santo
faria dos discípulos testemunhas dele. Quando pensamos numa testemu
nha, precisamos ter três coisas em mente. Em primeiro lugar, diz respeito
a alguém que presenciou fatos. Uma testemunha é alguém que esteve pre
sente e pode testificar da exatidão de certos acontecimentos. Os discípulos
possuíam essa característica. Haviam presenciado tudo o que havia aconte
cido e, por mais extraordinário que pudesse parecer, eles tinham certeza
absoluta de que tudo era verdade. Em segundo lugar, uma testemunha é
alguém que fala a respeito do que viu. Alguém que testemunhou, mas que
não se manifesta por medo ou falta de vontade, não é uma testemunha
verdadeira. O Espírito os capacitou para testemunharem. Porém, em ter
ceiro lugar, e talvez seja a maior característica da testemunha, ela sustenta
seu testemunho até o fim. A própria palavra “testemunho” na língua grega
é martyres da qual vem o significado moderno de mártir. O mártir está
disposto a morrer pelo que sustenta. Nada menos do que isso pode ser
chamado de testemunha, e somente a presença do Espírito Santo poderia
habilitar os amedrontados discípulos a se tornarem valorosos mártires (tes
temunhas) do Senhor Jesus. Em resumo, para ser testemunha é necessário
experimentar, falar e sustentar o testemunho até o fim. O Espírito é a
grande testemunha de Cristo, e tornou os discípulos testemunhas também
(Jo 15.26,27).
Jesus ampliou grandemente o horizonte dos discípulos. Eles estavam
pensando num reino restrito a Israel, mas Jesus disse que pretendia que
esse reino se estendesse até aos confins da terra. E essa expansão seria feita
por meio deles. É certo que eles começariam em Jerusalém e nas circunvi
zinhanças da Judéia, mas depois iriam até a desprezada Samaria e por fim
alcançariam os lugares mais longínquos da terra. A responsabilidade dessa
obra e a eficácia do Espírito Santo não foram outorgadas apenas aos discí
pulos que estavam reunidos naquele dia em Jerusalém, pois se estendem a
todos os crentes até a vinda de Jesus. Esse mesmo Espírito está presente na
vida das pessoas, regenerando-as, guiando-as à verdade, dando poder para
viverem uma vida fiel, sendo poderosas testemunhas de Cristo. É muito
discutível que o Espírito esteja realmente presente nos lugares em que há
divisões, concorrência espiritual, aberrações e outras coisas semelhantes
que têm se tornado tão comuns entre os evangélicos, Essas pessoas deve
riam voltar à Palavra de Deus, e desenvolver uma vida equilibrada, com um
objetivo de santidade e testemunho de Jesus. Por outro lado, também aque-
432 Razão da esperança
Plenitude espiritual
Cheios n o v a m e n t e
Santo. Jesus nos explica aqui como essa água pode ser conseguida. Ele dÍ2:
“Quem tem sede venha a mim e beba”, ou seja, o que é necessário é tão
somente, ir a Jesus e beber. O método divino pelo qual podemos ser cheios
do Espírito Santo é o mais simples de todos: basta ter sede, ir a Jesus e beber.
Jesus é o responsável por nos encher do Espírito, isso pode ser feito a qual
quer momento, em qualquer lugar, e em qualquer situação, Uma vez que o
Deus onipresente está sempre conosco, não há qualquer empecilho prático
para que a nossa sede seja saciada agora mesmo. Porém, é preciso ter sede...
M a tu r i d a d e e serviço
cificou” ou “se despojou” do velho homem (Rm 6.6; Cl 3.9). O crente verda
deiro, nesse sentido, não está na carne, mas no Espírito (Rm 8.8,9). Carne
aqui deve ser entendida como a velha natureza pecaminosa herdada de Adão.
Não é a carne no sentido de corpo humano, mas carne no sentido de escra
vidão do pecado. Mas apesar de estar no Espírito, muitas vezes os crentes
têm atitudes carnais, e cedem à tentação da carne, pois ainda estão na carne,
no sentido de “corpo carnal decaído” (ver Fp 1.22,24).
Além da maturidade, o enchimento do Espírito Santo é necessário para
o serviço cristão. Neste ponto, é importante atentarmos para o fato de que,
desde o Antigo Testamento, o Espírito capacitava pessoas para funções
especiais na obra de Deus, como Bezalel, Sansão, Davi e outros. Lembra
mos também que João Batista foi cheio do Espírito Santo desde o ventre
materno para realizar a tarefa de ser o precursor de Cristo (Lc 1.15-17). Os
diáconos escolhidos em Atos 6, para servir às mesas, também eram cheios
do Espírito Santo (At 6.3-5). Barnabé, que serviu junto com Paulo era ho
mem cheio do Espírito Santo (At 11.24). Paulo não poderia ser diferente;
somos informados que, quando ele se converteu e ficou cheio do Espírito
Santo, imediatamente começou a pregar que Jesus era o Filho de Deus (At
9.17, 20). E houve momentos em que, muitos destes foram novamente
enchidos, de acordo com as necessidades da ocasião. Como já vimos, a
igreja ficou cheia do Espírito após as ameaças e, então, com mais intrepidez
anunciou o evangelho (At 4.31,32). Antes disso, Pedro já estava cheio do
Espírito Santo quando encarou o Sinédrio que o julgava (At 4.8). Estêvão
também estava cheio do Espírito Santo no momento em que foi martiriza
do (At 7.55). E Paulo, quando repreendeu Elimas o mágico, estava nova
mente cheio do Espírito (At 13.9). Tudo isso nos aponta para a imensa
necessidade de ser cheio do Espírito Santo para realizar o serviço na obra
de Deus, e nos lembra que o sucesso nessa obra não é “por força, nem por
poder, mas pelo meu Espírito” (Zc 4.6). E impossível realizar a obra de
Deus sem esse enchimento do Espírito, mas a grande notícia é que pode
mos ser cheios a qualquer momento. Quem tem sede, beba.
O fru to do Espírito
A maior consequência da plenitude do Espírito é o desenvolvimento
natural do “fruto do Espírito”. Na igreja, os dons do Espírito são muito
mais populares do que o fruto do Espírito. E fácil vermos as pessoas oran
do por dons, mas raramente vemos alguém orando pelo fruto. O motivo
438 Razão da esperança
disso também não é difícil de saber, pois os dons nos falam de algo extraor
dinário, sugerindo poder e feitos magníficos. O fruto, por outro lado, fala
da dura rotina de evidenciar um caráter transformado. Por causa disso, como
diz Sproul, “os diversos frutos do Espírito parecem estar condenados à
obscuridade, ocultos na sombra dos dons mais preferidos”.5 Porém, se
gundo a Bíblia, a grande evidência de que alguém está cheio do Espírito é o
fruto, e não necessariamente os dons. Isso nos lembra as palavras de Jesus:
“Não pode a árvore boa produzir frutos maus, nem a árvore má produzir
frutos bons. Toda árvore que não produz bom fruto é cortada e lançada ao
fogo. Assim, pois, pelos seus frutos os conhecereis” (Mt 7.18-20). O pró
prio Jesus disse que a evidência de “poder” na vida das pessoas não signifi
ca necessariamente conversão, pois, conforme ele completou: “Muitos,
naquele dia, hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós
profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em
teu nome não fizemos muitos milagres? Então, lhes direi explicitamente:
nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade” (Mt
7.22,23). Para Jesus, o critério da verdadeira conversão não é o “poder” que
alguém manifesta, mas a obediência, a vida realmente transformada. Isso
nos ensina que, mais do que manifestações espirituais, deveríamos buscar a
real transformação de vida que se demonstra por meio de atitudes práticas
de obediência à Palavra de Deus, mediante a plenitude do Espírito.
Gálatas 5.16-25 é a grande passagem da Escritura sobre as obras da
carne e o fruto do Espírito. Paulo faz importantes declarações sobre as
duas coisas e nos dá o segredo para que o fruto do Espírito seja produzido
em nós, que, como já vimos, é andar no Espírito, A palavra “andar” é um
hebraísmo que significa viver continuamente na prática de algo. A figura
bíblica do “andar” é significativa, pois aponta para a nossa realidade diária
de caminhar, deparando com novas e desafiadoras situações, para as quais
o Espírito nos conduzirá de modo seguro conforme a Escritura. Assim, a
Bíblia diz que Enoque e Noé andaram com Deus (Gn 5.24, 9.6). Isso deno
ta toda uma vida de dedicação e fiel cumprimento aos princípios divinos.
Esse apego contínuo ao Espírito Santo que está em nós é a garantia de que
a carne perderá a guerra contra o Espírito. Por sua vez, isso indica que
quando não vivemos dessa maneira, a carne ganhará.
Guerra s e m Irégua
Uma das realidades mais vívidas do crente é a do conflito. Quando nos
convertemos, caímos de pára-quedas em meio a um imenso combate que já
Plenitude espiritual 439
Há u m só fr u t o do Espírito
Precisamos observar que, apesar de termos listado várias características,
há na verdade, apenas um fruto do Espírito. Ainda que, geralmente falemos
em “frutos do Espírito”, a palavra em Gálatas 5.22 está no singular. Os
dons do Espírito são muitos porque caracterizam a diversidade de mem
bros no corpo de Cristo, e, por conseguinte, ninguém tem todos os dons,
mas o fruto não tem essa função, e por isso, cada crente verdadeiro deve
produzir todo o fruto do Espírito. Todo crente tem pelo menos um dom
que lhe foi concedido soberanamente pelo Espírito, além de ter a responsa
bilidade de buscar outros (ver ICo 12.3), porém, como diz Hoekema, “po
demos ser salvos sem muitos dos dons do Espírito, mas não podemos ser
salvos sem o fruto do Espírito”.9 A unidade do fruto do Espírito, portanto,
nos diz que não podemos escolher virtudes, devemos evidenciá-las todas.
Uma pessoa não pode ser apenas “longânima” sem ser “fiel”. Do mesmo
modo, ela não pode evidenciar “amor” sem “domínio próprio”, A plenitu
de do fruto do Espírito é a evidência principal da plenitude do Espírito.
leva à segunda observação, pois para que algo se desenvolva, precisa ser
alimentado. Usando a analogia da natureza, sabemos que uma árvore não
precisa fazer força para produzir frutos, ela precisa dispor dos elementos
necessários, como chuva, boa terra, sol, etc. Do mesmo modo, o crente não
produz fruto forçadamente, mas quando dispõe dos elementos necessários
para isso, como a pregação da Palavra, a comunhão entre os irmãos, a ora
ção, a meditação, etc., essas santas influências do Espírito Santo produzirão
na vida do crente o bendito fruto do Espírito. Esse é o segredo do “andar no
Espírito”. E quem anda no Espírito tem a garantia de não satisfazer as con-
cupiscências da carne (G1 5.16; 25). O segredo do fruto do Espírito é andar
no Espírito. Quando vivemos sob a influência do Espírito Santo que nos é
oferecida por meio da Palavra de Deus, da oração, da comunhão e da igreja,
o fruto do Espírito crescerá e amadurecerá naturalmente em nós. O Espírito
nunca é estéril naquele em que habita, contudo, há um processo gradativo de
maturidade espiritual. O fruto do Espírito não é algo eventual ou esporádi
co, mas gradativo e sistemático. Somos conduzidos dia a dia a frutificar no
Espírito, pois como diz Hoekema: “Se andarmos continuamente no Espíri
to, estaremos continuamente abundando no fruto do Espírito”.10
Mantendo a plenitude
Deus por tudo (5,17,18), de não desprezar as profecias, mas julgá-las, com
o critério da Palavra de Deus, abstendo-se de toda forma do mal (5.20,21).
Portanto, apagar o Espírito é deixar de fazer essas coisas, é não dar a devida
importância ã obra dele, esfriar na prática das virtudes cristãs, da oração e
da Palavra de Deus.
Crentes vazios?
Parece realmente que muitos daqueles que se dizem crentes nos dias de
hoje, na verdade não são. Há um excesso de pessoas nas igrejas que pare
cem ter apenas um conhecimento exterior de Cristo. Calvino dizia que “o
conhecimento externo de Cristo é só uma crença perigosa, não importan
do o quão eloqüentes possam ser as pessoas que o têm”.2 Quando pensa
mos sobre isso, devemos sempre ter uma coisa em mente: Jesus ensinou
que o número dos verdadeiros convertidos não é grande. Ele disse: “Entrai
pela porta estreita (larga é a porta, e espaçoso, o caminho que conduz para
a perdição, e são muitos os que entram por ela), porque estreita é a porta, e
apertado, o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que acertam
com ela” (Mt 7.13,14). Esperar que, como no caso do Brasil, esse imenso
número de pessoas que freqüenta igrejas evangélicas seja todo de converti
dos é ser demasiado crédulo e ir muito além do ensino bíblico. A Bíblia e a
História demonstram que Deus nunca ficou sem um povo, porém, igual
mente demonstram que nem sempre, necessariamente, esse povo foi muito
grande. Quando Elias reclamou a Deus dizendo que era o último dos fiéis,
Deus lhe respondeu dizendo que havia mais sete mil que não haviam do
brado os joelhos perante Baal (lRs 19.18). Sete mil era um número consi
derável, mas perto da maioria apóstata, era um número pequeno.
Por outro lado, há verdadeiros convertidos que não dão o testemunho
que deveriam dar. Isso em hipótese alguma desculpa aqueles que vivem
uma vida medíocre. Aqueles que nasceram de novo herdarão a vida eter
na, apesar de que, muitas vezes, permaneçam como crianças em Cristo,
não obstante o longo tempo de conversão que possuem. Isso não signifi
ca que eles não foram batizados com o Espírito Santo, mas que vivem
uma vida num nível bem inferior de enchimento ao qual o batismo que
receberam lhes possibilita. De certo modo, esses crentes são os que mais
sofrem, pois ao entristecer o Espírito Santo não estão fazendo bem para
si mesmos. Ao viver uma vida medíocre, eles estão “forçando” a sua nova
natureza a um estilo de vida para o qual ela não foi criada, ou melhor,
M antendo a plenitude 447
M a n t e r a unidade do Espirito
A falta de unidade ou de comunhão também entristece o Espírito Santo,
pois “sendo ele ‘um só Espírito’ (2.18; 4.4), a desunião também lhe causará
tristeza”.4 E interessante que, na bênção apostólica, a parte que cabe ao
Espírito Santo é a comunhão. Paulo diz “A graça do Senhor Jesus Cristo, e o
amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós” (2Co
13.13). O Espírito Santo foi enviado para transformar a igreja num corpo,
sendo que é a sua atuação no meio da igreja que une os diferentes membros
em um só corpo. Por isso, quando a unidade ou a comunhão é quebrada, o
Espírito Santo é entristecido, pois o seu objetivo maior não é alcançado. E
nossa função nos esforçar “diligentemente por preservar a unidade do Espí
rito no vínculo da paz” (Ef 4.3). Devemos nos esforçar por manter a unida
de uns com os outros, pois assim não estaremos entristecendo o Espírito
Santo que habita em nós. No contexto da afirmação para não entristecer o
Espírito, Paulo estava falando sobre o mau uso da língua: “Não saia da vossa
boca nenhuma palavra torpe, e sim unicamente a que for boa para edifica
ção, conforme a necessidade, e, assim, transmita graça aos que ouvem” (Ef
4.29). Muitas vezes, o modo como conversamos com as pessoas causa divi
sões sérias na igreja. A palavra “torpe” era usada para frutos ou mesmo
árvores podres. Assim, se aplicada às palavras, refere-se a palavras corruptoras.
Se a nossa boca está deixando sair coisas corruptas, literalmente “podres”,
devemos nos preocupar, pois Jesus disse que a boca fala do está cheio o
coração (Mt 12.34). Mas não é só por meio de palavras que podemos causar
divisões na igreja; isso acontece também por meio de atitudes diretas ou
indiretas, tanto atos como omissões. Todas essas coisas entristecem o Espí
rito Santo, pois ele é o Espírito da unidade e seu único interesse é fazer de
nós um corpo bem estruturado que funcione em perfeita harmonia. Ele
sabe que desse modo estaremos glorificando ao Senhor Jesus, e glorificar ao
Senhor sempre foi a principal atividade do Espírito Santo.
E impressionante ver na Palavra de Deus quantas referências existem
sobre a necessidade de unidade dentro da igreja. E, talvez, hoje este seja o
maior problema dela. Por todos os lados, vemos disputas, conflitos, pessoas
que não “se dão”. E estranho que muitas delas se digam “cheias do Espírito
Santo”, mas na prática se envolvam em todo tipo de competição, discussão e
se demonstrem tão vazias de misericórdia. O padrão do “fazer ao outro o
que deseja que faça a si mesmo” não parece ser muito respeitado nos dias
atuais, apesar de toda a euforia e busca por manifestações espirituais.
450 Razão da esperança
Andar no Espírito
Talvez o principal requisito para manter a plenitude do Espírito é o que
Paulo diz em Gálatas 5.16: “Andai no Espírito e jamais satisfareis à concu
piscência da carne”. As vezes, pensamos que precisamos lutar contra a car
ne para poder vencer o pecado e as tentações. A verdade é que essa luta não
é nossa. Paulo não diz “lutai contra a carne”, porque a luta é do Espírito.
Paulo diz: “Porque a carne milita contra o Espírito, e o Espírito, contra a
carne, porque são opostos entre si; para que não façais o que, porventura,
seja do vosso querer” (G1 5,17). A luta é bastante real, mas não somos
chamados para entrar nela, somos chamados para “andar no Espírito” e ele
fará o resto. Uma ilustração importante disso pode ser tirada de um conhe
cido episódio do Antigo Testamento. Os filhos de Moabe e os filhos de
Amon se uniram contra Judá. O rei Josafá foi avisado da situação, ficou
amedrontado, e se pôs a buscar ao Senhor, ordenando que todo o povo
fizesse o mesmo (2Cr 20.1-4). Josafá se pôs em pé no meio da congregação
e invocou ao Senhor, pedindo que se lembrasse de suas antigas promessas
(2Cr 20.5-11). Josafá reconheceu sua incapacidade de vencer os inimigos
dizendo: “Porque em nós não há força para resistirmos a essa grande mul
tidão que vem contra nós, e não sabemos nós o que fazer; porém os nossos
olhos estão postos em ti” (2Cr 20.12). A resposta do Senhor foi a seguinte:
“Dai ouvidos, todo ojudá e vós, moradores de Jerusalém, e tu, ó rei Josafá,
ao que vos diz o S e n h o r . Não temais, nem vos assusteis por causa desta
452 Razão da esperança
grande multidão, pois a peleja não é vossa, mas de Deus. Amanhã, descereis
contra eles; eis que sobem pela ladeira de Ziz; encontrá-los-eis no fim do
vale, defronte do deserto de Jeruel. Neste encontro, não tereis de pelejar;
tomai posição, ficai parados e vede o salvamento que o S e n h o r v o s dará, ó
Judá e Jerusalém. Não temais, nem vos assusteis; amanhã, saí-lhes ao en
contro, porque o S e n h o r é convosco” (2Cr 20.15-17). No dia da batalha,
Josafá animou o povo com essas palavras: “Ouvi-me, ó Judá e vós, mora
dores de Jerusalém! Crede no S e n h o r , vosso Deus, e estareis seguros; crede
nos seus profetas e prosperareis” (2Cr 20.20). Em seguida, ele ordenou ao
povo que se pusesse a louvar ao Senhor, e isso foi a única coisa que o povo
fez naquele dia. Enquanto o povo louvava ao Senhor, Deus destruiu seus
inimigos (2Cr 20.21-24). Não queremos alegorizar a passagem, até porque
Judá teve que lutar em outras ocasiões, e a própria vida cristã é uma luta
contras as trevas (Ef 6.12), mas essa é uma ilustração muito simples de
como funciona a batalha contra a carne. A carne é mais forte do que nós, e
por nós mesmos, jamais a venceremos. O que temos que fazer é nos colo
car ao lado do Espírito, confiar nele, andar com ele, e ele vencerá a carne
em nosso lugar.
sejais tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a
tentação, vos proverá livramento, de sorte que a possais suportar” (ICo
10.13). Muito mais do que esforços humanos, na luta contra a carne, preci
samos do pleno poder do Espírito. Portanto, não deveríamos parar de orar
enquanto Deus não nos encher dessa plenitude espiritual, especialmente se
a dvermos perdido por causa de algum pecado. Novamente nos vem à
memória o exemplo de Davi. Depois do grave pecado que cometeu, ele
incessantemente orou ao Senhor clamando pelo perdão (SI 51.1,2), confes
sou o seu pecado, áliás, confessou sua vida de pecado (SI 51.3-5), pediu por
purificação (SI 51.7-10), implorou pela permanência do Espírito (SI 51.11),
e pela restituição do testemunho perante os outros (SI 51.12-19). A exem
plo de Davi, nenhum de nós deveria descansar antes que Deus nos restitua
todas essas coisas.
36
Os dons do Espírito
< m m >
Deus capacitou a sua igreja com poderes extraordinários para que ela
desempenhasse, em unidade, a sua missão de proclamação e testemunho
perante o mundo, além do seu próprio crescimento espiritual. A essa
capacitação a Escritura chama de “dons do Espírito Santo”. Tristemente,
porém, a questão dos dons do Espírito tem causado divisões dentro da
igreja de Cristo. Concepções muito diferentes em relação à natureza e ao
uso desses dons causam rupturas, escândalos e confusão em muitas igrejas.
Desse modo, o que Deus deu para servir, e, por conseguinte, para unir as
pessoas, acaba sendo causa de divisões e escândalos. Essa é uma constatação
que não pode ser ignorada, porém isso não deve impedir que estejamos
interessados e que conheçamos bem o assunto dos dons espirituais. De
acordo com a Bíblia, os dons do Espírito foram dados a fim de ajudar a
igreja na tarefa de evangelização e edificação. Eles são as armas mais pode
rosas e variadas que Deus deu à sua igreja a fim de capacitá-la para a missão
que precisa realizar neste mundo. Os capítulos 12 a 14 de 1 Coríntios nos
fornecem a compreensão a respeito deste tema. Paulo trata extensivamente
do assunto porque o mau uso dos dons era um dos grandes problemas da
igreja de Corinto (ICo 1.7). O apóstolo lista uma série de distinções e regu
lamentações para esses dons que, interpretadas a partir do contexto histó
rico, servem de base para a igreja em todos os tempos.
dos no que se refere ao assunto dos dons, e esse também é o nosso esforço
aqui. O primeiro princípio que aprendemos sobre os dons espirituais, por
tanto, é que devemos ser esclarecidos e não ignorantes quanto a eles. O
melhor meio de que dispomos para isso é a Palavra de Deus; devemos,
portanto, estudá-la.
O segundo princípio que está claro na passagem é a questão da diversi
dade dos dons e da unidade do Espírito. Paulo diz: “Ora, os dons são diver
sos, mas o Espírito é o mesmo” (ICo 12.4). Aí encontramos a base para a
unidade e a diversidade da igreja, pois: “A igreja é uma, porque o Espírito
habita em todos os crentes. A igreja é multifaceada, porque o Espírito dis
tribui diferentes dons aos crentes. De forma que o dom do Espírito (que
Deus nos dá) cria a unidade da igreja, e os dons do Espírito (que o Espírito
dá) diversificam o ministério da igreja”.1 Essa é uma afirmação muito im
portante. De fato, todos os crentes são batizados no Espírito Santo, e isso
faz deles um corpo (ICo 12.13), ou seja, uma igreja única e unida. Por outro
lado, o Espírito que habita em todos os crentes distribui dons variados,
criando a diversidade de membros que, não obstante, pertencem ao mesmo
corpo. Nos versículos 4-6 (ICo 12) Paulo usa três palavras diferentes para
os dons, e também lista cada uma das três pessoas da Trindade. A primeira
palavra é charismata (v. 4), que significa “dom da graça de Deus”. A segunda
palavra é diakoniai (v. 5) que representa serviço, ou maneiras de servir. A
terceira palavra é energemata (v. 6) que significa “energias” ou poderes do
Espírito. Isso nos aponta para a origem sobrenatural dos dons, e impede
que pensemos neles como talentos naturais.
O terceiro princípio que a passagem nos ensina é a atividade soberana
do Espírito na distribuição desses dons. Paulo diz: “A manifestação do Es
pírito é concedida a cada um visando a um fim proveitoso” (ICo 12.7). O
dom espiritual não é algo que conquistamos, mas algo que nos é dado ten
do em vista um objetivo. Logo adiante Paulo conclui: “Mas um só e o
mesmo Espírito realiza todas estas coisas, distribuindo-as, como lhe apraz,
a cada um, individualmente” (ICo 12.11). Dom não é questão de escolha
pessoal, pois o Espírito distribui a cada um como é do seu desejo. Isso
certamente tem a ver com a necessidade da igreja. Se os dons são dados
visando a um fim proveitoso, então o Espírito concede soberanamente os
dons mais úteis a um determinado lugar, e a um determinado tempo.2
O princípio seguinte que aprendemos da passagem é que os dons são
distribuídos soberanamente pelo Espírito a cada um. Significa que todos os
crentes necessariamente possuem pelos menos um dom do Espírito. Isso
fica ainda mais óbvio porque Paulo usa o corpo humano como uma analo-
Os dons do Espírito 457
lente” (ICo 12,31). Ele introduz a realidade do amor no uso dos dons espi
rituais, pretendendo dizer que sem o amor, por mais espetaculares que se
jam os dons, eles de nada servirão (ICo 13.1-3).
0 d o m su p rem o
Em muitas congregações, existe uma verdadeira guerra entre os crentes
para um ser mais “espiritual” do que o outro. Todos querem demonstrar a
sua espiritualidade, contando experiências pessoais e buscando sempre al
guma “novidade espiritual”. Quando o apóstolo Paulo listou os dons mais
comuns na igreja de Corinto, ele demonstrou que nem todos tinham o
mesmo dom (ICo 12.29,30). No entanto, enfatizou que todos têm a res
ponsabilidade de buscar os melhores. No entendimento de Paulo, o melhor
dom não era o de línguas. Paulo preferia profecia a línguas, mas entendia
que havia algo ainda mais importante, Ele diz que o caminho do amor seria
a experiência mais espiritual que os corintios poderiam ter. Seu entendi
mento é que, se devemos buscar os melhores dons, há um que sobrepassa
a todos: o amor - o dom supremo. O capítulo 13 de 1 Corintios geralmente
não é bem entendido pelos crentes. É comum que ele seja usado em casa
mentos ou noivados. Porém, a intenção de Paulo, ao colocá-lo entre os dois
capítulos que tratam dos dons espirituais, é justamente demonstrar que to
dos os dons devem ser regidos e mediados pelo amor, e que, sem o amor,
os dons se tornam coisas nulas e perigosas. Portanto, mais do que buscar
dons, Paulo deseja que os crentes busquem o amor, pois desse modo, não
correrão o risco de usarem os dons indevidamente.
O a m o r dá va lor aos do ns
O primeiro argumento de Paulo para demonstrar que o amor é o dom
supremo é que, sem ele, os demais dons são totalmente sem valor. Paulo
diz: “Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver
amor, serei como o bronze que soa ou como o címbalo que retine. Ainda
que eu tenha o dom de profetizar e conheça todos os mistérios e toda a
ciência; ainda que eu tenha tamanha fé, a ponto de transportar montes, se
não tiver amor, nada serei. E ainda que eu distribua todos os meus bens
entre os pobres e ainda que entregue o meu próprio corpo para ser queima
do, se não tiver amor, nada disso me aproveitará” (ICo 13.1-3). Ele diz que,
sem amor, alguém pode falar todas as línguas existentes, ter todo o conhe
Os dons do Espírito 459
cimento, ter uma fé inigualável, ser o mais abnegado dos homens, mas será
tudo em vão. Percebemos que ele usa intencionalmente o exagero a fim de
demonstrar que o amor é mais importante até do que um dom elevado à
categoria máxima. Ao todo, ele lista cinco dons: línguas, profecia, conheci
mento, fé e serviço. Porém, ele exagera esses dons ao máximo. Por isso, ele
eompara “línguas dos homens com línguas dos anjos1 profecia/conhecimento
com todos os mistérios e toda ciêncicr, fé com transportar montes; serviço com
distribuir todos os bens e morrer pelo próximo. As expressões em itálico represen
tam o exagero que Paulo faz de cada dom. Ele quer dizer que ainda que um
dom normal fosse elevado à categoria máxima, sem amor ele seria inútil.
Porém, isso não significa que essa categoria máxima dos dons exista real
mente. Até porque ninguém conhece todos os mistérios e toda a ciência,
ninguém realmente move montes, e ninguém fala a língua dos anjos.
O entendimento errôneo dessa passagem tem levado muitos a dizer que
as línguas que são faladas hoje nas igrejas são “línguas dos anjos”. Como
vimos, Paulo usou a expressão “línguas dos anjos” c o m o um exagero do
dom de línguas normal que é “dos homens”. Ainda deve ser observado que
as línguas descritas em Atos 2.5-11 são de povos ou nações deste mundo.
Se fosse nos nossos dias, seria o alemão, o italiano, o inglês, o russo, o
japonês, etc. A Bíblia não diz que alguém falou língua de anjos no dia de
Pentecostes, e do mesmo modo, a Bíblia não diz que o dom de línguas do
Pentecostes (nações) se transformou num dom angelical. Por fim, ainda
teríamos que fazer a seguinte pergunta: mesmo que houvesse a possibilida
de de falar línguas dos anjos, a passagem também fala nas línguas dos ho
mens, então, por que ninguém fala nas línguas dos homens (outras nações)
nos dias de hoje? Por que só se fala na suposta língua dos “anjos”?
Voltando ao aspecto do amor, isso basta para nos demonstrar o quanto
o amor é fundamental nessa questão dos dons. É muito fácil alguém se
ensoberbecer quando tem algum dom, e usá-lo para benefício de si mesmo
e, por essa razão, ainda que tivesse “superdons”, estes seriam totalmente
inúteis, pois estariam sendo usados sem amor. A expressão que Paulo usa
para amor no texto é ágape. Todos sabem que isso representa um amor
altruísta e totalmente desinteressado cm termos de retornos ou vantagens
pessoais. Porém, o que geralmente as pessoas não sabem é que esse amor
não diz respeito apenas a um tipo de sentimento abstrato. Como diz o Dr.
Augustus N. Lopes, “o apóstolo não está falando aqui de emoções, embora
elas, sem dúvida, possam estar presentes quando esse amor entra em ação;
ele não está falando aqui de sentimentos, mas de um estilo de vida, de uma
atitude que as pessoas decidem tomar com relação à vida, às outras pessoas
460 Razão da esperança
0 a m o r un e os d o ns
tos de inocência, Ele “espera tudo”, ou seja, “confia no próximo, espera dele
o melhor”,7 E, por fim, “tudo suporta”, no sentido de que agüenta todas as
cargas, e enfrenta todas as dificuldades. O resumo disso é que o amor sem
pre está disposto a sofrer em vez de fazer os outros sofrerem. Por isso, ele é
a grande característica do próprio Deus (ljo 4.8). Para salvar os homens,
Deus preferiu ele próprio sofrer, de modo que a Segunda Pessoa encarnou-
se e foi sacrificada na maior prova de amor que este mundo já viu (Rm 5.8).
0 a m o r p e r m a n e c e para s em p r e
Paulo ainda tem algo a dizer a fim de demonstrar que o amor é o “cami
nho sobremodo excelente”. Seu argumento é que o amor jamais desapare
cerá. Ele diz: “O amor jamais acaba; mas, havendo profecias, desaparece
rão; havendo línguas, cessarão; havendo ciência, passará” (ICo 13.8), Os
dons espirituais, por mais importantes que sejam, são temporários, ou seja,
eles cumprem a uma função determinada por Deus. Quando essa função
estiver cumprida, os dons desaparecerão. Mas isso não acontecerá com o
amor, pois mesmo depois da consumação de todas as coisas e do estabele
cimento pleno do Reino de Deus, o amor continuará existindo e sendo o
grande elo entre Deus e os seres humanos, entre estes e Deus, e entre os
próprios seres humanos. Nesse contexto, Paulo cita três dons. Ele fala do
dom de línguas, do dom de profecia, e do dom de conhecimento. Esses três
dons, como todos os demais, um dia deixariam de existir, mas o amor ja
mais deixará de existir, por isso, o amor é mais importante do que todos
eles.8 Os dons são como os andaimes na construção de um prédio; enquan
to o prédio está em construção, eles são necessários, mas quando o prédio
estiver concluído, eles serão removidos; do mesmo modo, quando a igreja
estiver pronta, os dons serão retirados,9 mas o amor permanecerá para
sempre, pois ele é a própria razão da existência da igreja.
Diante das evidências bíblicas e históricas, podemos dizer que o dom de
línguas teve um propósito na história da igreja, e Deus o fez desaparecer
quando esse propósito se cumpriu. Ele foi usado na implantação da igreja e
cessou com a era apostólica. Primeira Coríntios é uma das primeiras cartas
do Novo Testamento, e é a única que traz referência ao dom de línguas.
Nenhuma outra carta diz qualquer coisa sobre línguas, e isso nos leva a
pensar que, quando elas foram escritas, provavelmente o dom já tivesse
cessado. Muitos escritos pós-apostólicos dizem que o dom cessou na era
apostólica. Se acrescentarmos o fato de que não vemos nos dias de hoje as
pessoas falando línguas de outros povos, sem as terem aprendido, pode-
462 Razão da esperança
mente” (ICo 12.11). Portanto, não devemos limitá-lo, nem dizendo que o
Espírito não pode mais conceder dons aos homens, nem dizendo que ele tem
que conceder todos os dons aos homens. Na linha da nossa argumentação
neste trabalho, Deus se serviu dos dons para desempenhar funções específi
cas em épocas específicas. E só ele sabe quais são as capacitações mais ne
cessárias para a sua igreja ao longo da História. Como os dons foram dados
para a edificação da igreja, não faz sentido que Deus os removesse antes de
a igreja estar completamente edificada. Por outro lado, Deus não é obrigado
a agir sempre da mesma maneira. Assim, entendemos que alguns dons ces
saram e outros não, mas é difícil dizer com certeza quais são eles, cxceto
alguns que parecem bem evidentes. Também é preciso fazer alguma distin
ção entre dom e ofício. Alguns dons foram oficializados na igreja primitiva,
como apóstolos, presbíteros e diáconos. O oficial necessariamente tinha o
dom, e, em alguns casos, eram escolhidos diretamente por Deus (apóstolos),
enquanto em outros, eram escolhidos pela igreja (presbíteros). Entendemos
que os ofícios que permanecem são aqueles que a igreja escolhe, como é o
caso de presbíteros e diáconos, e é natural pensar que, para que desempe
nhem esses ofícios, eles precisam ter os dons correspondentes.
igreja (Ef 2.20). Os apóstolos foram chamados pessoalmente por Jesus (Lc
9.1), e lhes foram dados poderes especiais como uma confirmação do seu
apostolado (2Co 12.12; Mc 16.14-18). As qualificações para o ofício estão
listadas em Atos 1.21,22, que diz que a principal característica era a de ter
sido testemunha ocular dos feitos de Jesus desde o batismo de João até a
ascensão. O caso de Paulo é único. Ele foi um apóstolo “fora de tempo”
(ICo 15.8,9), porém, foi comissionado pessoalmente pelo Senhor (At 26.14-
16). Certamente, o dom de apóstolo não existe mais, pois foi usado por
Deus como “fundamento da igreja” (Ef 2.20). Os apóstolos eram portado
res da revelação de Deus e foram responsáveis pela escrita do Novo Testa
mento, e, nesse sentido, foram os sucessores dos profetas do Antigo Testa
mento. Desde que a igreja foi estabelecida, não havia mais necessidade de
les, até porque ninguém mais conseguiria preencher os requisitos de Atos
1.21,22. Apesar de muitos hoje se autodenominarem apóstolos, não deve
mos aceitar as suas reivindicações, pois essas pessoas não preenchem os
requisitos bíblicos. A igreja primitiva não promoveu a eleição de sucessores
para os apóstolos à medida que eles foram morrendo. A igreja católica, por
exemplo, baseia suas doutrinas extrabíblicas na sua suposta “autoridade
apostólica”. Desse modo, doutrinas que não são encontradas na Bíblia,
como a da imaculada conceição ou a da mediação de Maria, são considera
das verdadeiras porque os bispos dizem ter a mesma inspiração dos apósto
los.11 Se aceitarmos que os evangélicos podem ter novas revelações, como
afirmar que os católicos estão errados? Se a Bíblia cede lugar ao subjetivis-
mo pessoal como regra, tudo é permitido. Porém, como diz Stott, “hoje,
Deus não ensina mais a igreja por meio de revelação nova, mas pela expo
sição de sua revelação que foi completada em Cristo e na Bíblia”.12
não há mais profetas hoje como não há apóstolos, pois esses dois ofícios
foram usados por Deus na formação da igreja. Eles foram o fundamento da
igreja (Ef 2.20), num tempo em que a Bíblia ainda não estava completa. Até
a complementação do cânon, o dom de profecia foi importante para a edifi
cação da igreja, pois o profeta recebia revelação direta de Deus e ensinava o
povo, edificando, exortando e consolando (ICo 14.3). Entretanto, mesmo
naquele tempo essas profecias deveriam ser amplamente analisadas e julgadas
(ICo 14.29; lTs 5.20,21; ljo 4.1), porque sempre havia o risco de falsos
profetas aparecerem e falarem coisas do próprio coração, para granjear o
respeito, a admiração e outras vantagens pessoais. Portanto, não é possível
dizer, à luz do Novo Testamento, que esses profetas dispunham da mesma
posição dos apóstolos.13 Parece que a função deles era interpretar o Antigo
Testamento à luz dos acontecimentos mais recentes envolvendo a vida de
Jesus, e também trazer palavras de conforto e direcionamento para a igreja.
Em alguns casos, anunciavam acontecimentos futuros (At 11.28; 21.10,11).
Uma vez que o cânon se completou, não há mais necessidade de reve
lação direta da parte de Deus, e, portanto, não há mais necessidade de pro
fecia. Porém, pergunta-se se não podemos falar em profecia nos dias de
hoje a partir da Palavra de Deus. Nesse ponto, devemos nos lembrar que a
palavra de Deus é a palavra profética. Ainda devemos nos lembrar que João
disse que o “testemunho de Jesus é o Espírito da Profecia” (Ap 19.10), ou
seja, o coração da profecia é anunciar a Jesus. Sempre que pregamos a Pala
vra e anunciamos a Jesus, estamos profetizando. A profecia divina continua
em atuação no mundo por meio da Palavra de Deus, e o Espírito Santo
continua iluminando a nossa mente e o nosso coração para que possamos
discernir a vontade do Senhor,
Evangelista ( Ef 4 . l l ) .
M i la g r e s ( I Co 12.10).
A Bíblia tem muitas coisas a dizer sobre milagres. Percebemos que eles
aconteceram de modo mais concentrado durante três períodos da História:
nos dias de Moisés e Josué; nos dias de Elias, Elizeu e os profetas; nos dias
de Cristo e os apóstolos. O que essas três épocas têm em comum é o fato
de que elas concentraram as maiores porções da revelação divina. Deduzi
mos, a partir disso, que os milagres foram dados para autenticar a mensa
gem em cada um dos períodos mencionados acima. No tempo do Novo
Testamento, os milagres aconteceram para autenticar a mensagem apostó
lica, e assim, conseqüentemente, apontar para a autoridade da Palavra de
Deus. Alguns milagres foram execuções diretas do poder de Deus sobre a
vida de pessoas, como no caso do julgamento de Ananias e Safira (At 5.9-
11) e do julgamento de Elimas o mágico (At 13.8-11). Naqueles dias, algu
Os dons do Espírito 467
Curas ( i Co 12.9)
Línguas ( l Co 12.28)
14.7-9). Ele diz ainda que, quando alguém orava em outra língua, apenas o
seu espírito estava participando, e isso não era desejável, pois a mente tam
bém precisava ser edificada (ICo 14.14-17). Essa última colocação sugere
que a pessoa que falava em línguas não tinha o entendimento do que estava
dizendo. Pensa-se que isso não se encaixe com a descrição do Pentecostes,
mas não há nada na passagem de Atos 2 que sugira que os discípulos enten
diam o que estavam dizendo. Eram os estrangeiros que entendiam, pois
ouviram os discípulos falar nas suas línguas maternas. Também deve ser
dito que essa é a razão pela qual em Atos 2 não havia a necessidade de
intérprete, como Paulo exige em 1 Coríntios 14.27,28. Essa última ocasião
era dentro da igreja, com pessoas da mesma nacionalidade, enquanto a pri
meira foi diante de estrangeiros que já conheciam aquelas línguas (At 2.8).
Por fim, Paulo diz que falava em muitos idiomas, porém, preferia falar na
igreja, em língua compreensível, cinco palavras do que dez mil em língua
incompreensível (ICo 14.18,19). A comparação é bastante sugestiva.
O ataque mais frontal ao uso de línguas sem interpretação na igreja é sua
afirmação de que, falar em línguas denigre o evangelho causando escândalo
entre os incrédulos (ICo 14.23). Porém, como o dom ainda estava em opera
ção naqueles dias, Paulo o regulamenta dizendo: “No caso de alguém falar
em outra língua, que não sejam mais do que dois ou quando muito três, e isto
sucessivamente, e haja quem interprete. Mas, não havendo intérprete, fique
calado na igreja, falando consigo mesmo e com Deus” (ICo 14.27,28). Esta
é uma ordem que não admite objeção. Em hipótese alguma mais do que três
pessoas poderiam falar em línguas no culto. Além disso, deveriam falar uma
após a outra, e nunca simultaneamente. E ainda um terceiro requisito era
necessário: a necessidade de tradução. Sem tradução, sem línguas.
Fé ( ICo 12.9)
fazer alguém mudar de conduta (Jd 3), ou consolar alguém que está numa
situação difícil (At 4,36; 9,27; 15.39).
Esse dom, não tão desejado pelos crentes, refere-se ao ato de dar di
nheiro. Isso pode ser tanto no sentido de contribuir com a obra de Deus,
como ajudar pessoas individualmente que estejam em necessidade. Paulo,
pessoalmente, organizou uma campanha de doações para ajudar os crentes
de Jerusalém (ICo 16.2; 2Co 8,9; Fp 4.10-16),
Sabedoria ( I Co 12.8)
Esse é um dos dons mais importantes para a igreja, e deve ser ligado à
obra de iluminação do Espírito Santo. Tem a ver com a capacidade de dis
cernir os tempos e as épocas, e de agir e falar de maneira sábia, de modo a
conduzir as pessoas para o entendimento da Escritura, e, conseqüentemen
te, da vontade de Deus. Também nisso deve estar incluída a capacidade de
antever problemas e evitar erros.
zer a sua parte, haverá complicações para os demais membros, isso tam
bém acontece na igreja. Quando vemos irmãos errarem e caírem em pe
cado, às vezes ficamos irritados com eles, mas será que nós mesmos não
temos alguma parcela de culpa? Anomalias no corpo surgem quando al
gum órgão não realiza a função que lhe é devida, ou seja, a nossa omissão
pode ser a causa da queda de outrem.
Todos os dons do Espírito foram concedidos aos seres humanos para
benefício da obra de Deus. Os dons são variados e não precisam existir
todos ao mesmo tempo. Deus usa os dons mais necessários conforme as
épocas exigem, mas acima de tudo, conforme a sua soberania determina.
Cada crente tem um dom. Temos, portanto, a responsabilidade de saber
qual é o nosso, e usá-lo para benefício dos outros. Se os dons causam divi
são ou competição, então, das duas uma: Ou eles são falsos, ou as pessoas
estão muito atrasadas na graça. O amor é o ponto de equilíbrio entre os
dons. A existência do amor garantirá um exercício verdadeiro e proveitoso
dos dons espirituais para a igreja de Cristo. O amor garante que a poderosa
locomotiva, que são os dons, nunca saia dos trilhos.
37
30), mas esse foi um ato suicida, pois ele morreu junto. No entanto, Hebreus
o coloca entre os heróis da fé (Hb 11.32). Há casos em que deve ser dito que
o suicídio pode ser o último ato de alguém que realmente pecou contra o
Espírito Santo, como é o caso de Judas (Mt 27.5). Porém, nesse caso, o peca
do foi cometido antes do suicídio, e não foi o suicídio em si. De qualquer
modo, o suicídio de Judas foi a consumação do pecado contra o Espírito.
Santo, mas sim, porque há também no mundo de pecado certas leis e orde
nanças estabelecidas por Deus e por ele mantidas. E no caso desse pecado
particular, a lei e que ele exclui toda a possibilidade de arrependimento,
cauteriza a consciência, endurece o pecador e, assim, torna imperdoável o
pecado.2
A igreja verdadeira
como saber qual é o rumo a seguir? Diante de milhares de novas igrejas que
surgem a todo momento, como saber qual é a igreja verdadeira? Neste
capítulo, queremos investigar os elementos bíblicos que compõem a igreja
verdadeira.
Definição de igreja
A igreja é o povo que pertence ao Senhor, e que tem sido resgatado pelo
sangue de Cristo. Na Bíblia, são usadas várias imagens e expressões para
definir ou descrever a igreja. Ela é o “Corpo de Cristo”, a “família de Deus”,
o “povo de Deus”, “os eleitos”, a “noiva de Cristo”, a “companhia dos
redimidos”, a “comunhão dos santos”, o “novo Israel”, entre outros no
mes.2 Nossa palavra portuguesa - “igreja” - é praticamente uma translite-
ração do termo grego ekklesia que era usado para uma assembléia popular
(ver At 19.32, 39,40). No Novo Testamento, a grande maioria das ocorrên
cias da palavra aparece nas cartas de Paulo (46 vezes de um total de 114).
Foi especialmente Paulo quem formou esse conceito, embora João o use
amplamente no Apocalipse (vinte vezes).
Berkhof define o termo “igreja” da seguinte maneira:
identificar entre impureza e apostasia. Por essa razão, é necessário que saiba
mos identificar quando uma igreja é verdadeira e quando ela é apóstata. Evi
dentemente que, nesse ponto, estamos falando da igreja local, pois a igreja
innvisível de Cisto é sempre perfeita. Assim, historicamente algumas marcas
têm sido sugeridas a fim de indicar a verdadeira igreja. Classicamente, desde
a Reforma, as marcas da verdadeira igreja são: 1) a pregação da Palavra de
Deus, 2) a administração dos sacramentos, e 3) a disciplina eclesiástica.
A p r e g a ç ã o da Palavra de Deus
Aqui estará sempre a principal marca diferenciadora da igreja verdadeira
e da apóstata.10 A maneira como a igreja considera e prega a Palavra é o
sentido mais preciso em que podemos identificar sua fidelidade a Deus. A
verdadeira igreja honra a Palavra de Deus e a considera sua única regra de
fé e prática. Ela não usa de recursos adicionais, nem substitui a Palavra por
técnicas humanas. Ela se apega à Bíblia como um todo, considerando o
ensino bíblico completo, defendendo todas as doutrinas da Escritura. Isso
significa que, sempre que as igrejas negam que a Bíblia seja infalível e
inerrante, estão falhando em exibir uma das marcas de veracidade. Isso
também pode ser visto quando doutrinas fundamentais da Palavra de Deus
como a Trindade, a divindade de Cristo, a justificação pela fé, ou a expiação,
são negadas ou distorcidas. E também quando a Palavra não ocupa o lugar
central que deve ter no culto e na vida da igreja. Sempre que a Palavra cede
espaço ao subjetivismo, a principal marca de autencidade da igreja está sen
do violada. Para sabermos se uma igreja é verdadeira, portanto, basta ouvir
a sua pregação. E lógico que não deveremos esperar perfeição em nenhu
ma igreja quanto à pregação, pois sempre haverá erros e imprecisões dou
trinárias mesmo na igreja mais perfeita deste mundo. Porém, há um limite
além do qual a igreja não poderá ir. Berkhof diz que esse limite é ultrapas
sado quando “artigos fundamentais de fé são negados publicamente, e a
doutrina e a vida já não estão sob o domínio da Palavra de Deus”.11 A
pregação correta da Palavra de Deus é a principal marca da igreja de Jesus.
A a d m in is t ra çã o do s sa c ra m en to s
A administração dos sacramentos está intimamente ligada à pregação au
têntica da Palavra. Os sacramentos não existem separados da Palavra de Deus,
pois sem a Palavra “os sacramentos não são sacramentos”.12 Para a igreja
reformada, eles são “meios de graça” em pé de igualdade com a Palavra de
488 Razão da esperança
A disciplina eclesiástica
Essa prática é necessária para a manutenção da pureza da igreja. Sempre
que uma igreja se descuida da disciplina está admitindo publicamente que
não tem preocupação com a pureza. Apesar de que sempre haverá o risco da
disciplina ser exagerada ou complacente, o fato de ela não existir autoriza o
pecado, portanto a igreja que quiser se manter dentro do padrão bíblico
deverá dar atenção conscienciosa ao exercício da disciplina. A disciplina
mantém a pureza doutrinária e a santidade dos sacramentos. Quando a igreja
relaxa a sua disciplina, ela está minimizando a sua esfera de influência no
mundo. A santidade nos torna relevantes. A disciplina eclesiástica é uma
instituição bíblica que tem sido muito pouco observada em nossos dias. A lei
do “não atirar a primeira pedra” utilizada erroneamente, faz com que as
pessoas deixem de observar a palavra de Deus, que ordena que a Igreja seja
um lugar de disciplina. E preciso, portanto, que o conceito bíblico a respeito
da disciplina eclesiástica seja retomado na igreja, não como um meio de esta
belecer a tirania ou a acepção de pessoas, mas como um modo de manter a
pureza da Igreja e de promover a restauração dos caídos. A disciplina deve
ser aplicada porque ela efetivamente recupera as pessoas. Quando o pecado
não é tratado, a tendência é que ele aumente cada vez mais. A disciplina é o
instrumento de Deus para trazer crescimento espiritual para as pessoas, e
uma forma de garantir um futuro melhor para o pecador. O autor aos He
breus diz que Deus “nos disciplina para aproveitamento, a fim de sermos
participantes da sua santidade” (Hb 12.10). A Igreja deve seguir este exem
A igreja verdadeira 48 9
Doutrina
Foi sem dúvida nesses ensinos que os crentes cheios do Espírito Santo
perseveravam naqueles dias primitivos. Os novos convertidos não estavam
atrás de uma experiência mística tão-somente. Eles queriam exercitar a pró
pria mente, queriam entender todas aquelas coisas maravilhosas que haviam
acontecido em seus dias e que estavam preditas pelos profetas. Eles queriam
aprender o que os apóstolos tinham para lhes ensinar. Por isso, podemos
afirmar que cuidado doutrinário é uma das características marcantes, uma das
principais evidências de que uma igreja está cheia do Espírito Santo. Pois a
igreja primitiva perseverava em aprender doutrina, mas não qualquer doutri
na, e sim a doutrina verdadeira, a doutrina bíblica, pois “o Espírito de Deus
leva o povo a se submeter ã Palavra de Deus”.15 Não há igreja verdadeira sem
a verdadeira pregação bíblica. A igreja que ignora a exposição e aplicação da
Escritura está correndo o mesmo risco de acontecer com ela o que aconteceu
com o povo de Deus no Antigo Testamento, e que Oséias descreve: “O meu
povo está sendo destruído, porque lhe falta o conhecimento” (Os 4.6). Como
diz MacArthur, “A igreja não pode operar na verdade se ela não é ensinada;
crentes não podem praticar princípios que não aprenderam”,16
Comunhão
E interessante que o relato diz que, da mesma maneira que eles perseve
ravam na doutrina, também perseveravam na comunhão. A comunhão não
é algo assim tão fácil de ser mantida. Aprendemos da passagem que comu
nhão, seja com Deus, seja com os irmãos, é uma coisa para ser mantida pela
perseverança, e que isso é uma evidência da plenitude do Espírito. Porém,
será que Lucas está descrevendo que a igreja cristã primitiva vivia um tipo
de “comunismo”? Devemos lembrar que ali perto, a alguns quilômetros a
leste de Jerusalém, em Qumram, havia uma comunidade dos chamados
essênios, que viviam realmente num tipo de comunismo primitivo. Mas,
será que a igreja cristã seguiu o exemplo dessa seita? Não somos incentiva
dos a crer que uma das regras para se entrar na igreja cristã era vender tudo
o que possuía e distribuir aos outros. A passagem não sugere isso. Está
escrito que eles partiam o pão de casa em casa, logo, muitos permaneciam
com suas casas. Em Atos 5, no relato sobre a morte de Ananias e Safira,
Pedro diz a eles: “Conservando-o, porventura não seria teu? E vendido,
não estaria em teu poder?” (v.4), Ou seja, eles eram livres para doar ou
não.17 O próprio fato de Lucas citar o caso de Barnabé que tinha um cam
po e o vendeu, vindo a depositar o dinheiro aos pés dos apóstolos (4.36,37),
indica que este não era um acontecimento tão corriqueiro, pelo simples
492 Razão da esperança
destaque que lhe foi dado.’8 Qual a conclusão que devemos chegar a partir
da passagem? Que Lucas está querendo enfatizar a generosidade dos con
vertidos. Ou seja, eles não deixavam ninguém passar necessidades, colo
cando os seus bens à disposição daqueles que precisassem. Portanto, a ven
da e a partilha eram ocasionais, e em resposta a necessidades específicas.
Quando era realmente necessário, os crentes estavam dispostos a abrir mão
dos seus bens para que os irmãos não perecessem. O amor que eles senti
am por Deus e pelos outros não era um amor só de palavras, mas de atos e
de verdade (ljo 3.18). Quando uma igreja está cheia do Espírito Santo, ela
está cheia do que existe de mais precioso, por isso, ela não tem dificuldade
em se doar. Porém, quando ela não tem o Espírito Santo, os seus valores
são todos materiais, e então ela não quer se desfazer deles. Cristianismo é
essencialmente dar. A igreja cheia do Espírito Santo tem comunhão com
Deus e com os irmãos de maneira prática e com atos específicos, pois isso
evidencia o seu enchimento. Portanto, ação social também é uma evidência
de uma igreja cheia do Espírito.
Adoração
Lucas continua a narrativa dizendo que “em cada alma havia temor; e
muitos prodígios e sinais eram feitos por intermédio dos apóstolos”. O
temor evidencia a sincera reverência que os novos convertidos tinham com
relação a Deus. Já vimos bastante sobre sinais neste livro, e sabemos que
esse tempo foi um tempo de revelações, e os sinais autenticavam a revela
ção. Nessa igreja havia o mover do Espírito Santo em confirmação à pala
vra dos apóstolos. Precisamos encarar o fato de que há certas igrejas em
que nada acontece, ninguém se converte, ninguém é desafiado a uma vida
de compromisso. Uma igreja assim está muito longe do padrão da igreja
apostólica. Numa igreja cheia do Espírito Santo, há um mover deste mes
mo Espírito e a conseqüência disso é a adoração contínua e sincera. A
igreja de Jerusalém era uma igreja preocupada com ensino, com a comu
nhão, mas era principalmente uma igreja que adorava ao Senhor em espíri
to e em verdade.
Lucas diz: “Diariamente perseveravam unânimes no templo, partiam
pão de casa em casa, e tomavam as suas refeições com alegria e singeleza de
coração, louvando a Deus...”. Além do aspecto de comunhão, isso também
pode ser tomado como parte da adoração. O partir do pão refere-se prova
velmente à Ceia do Senhor, que nesse tempo era uma verdadeira refeição
pública. No caso deles, percebemos duas formas de culto. O culto
A igreja verdadeira 493
Crescimento
Conclusão
A igreja verdadeira é a igreja de Deus que existe desde a fundação do
mundo, e que, após o Pentecostes se tornou internacional. Em cada lugar
em que ela se estabeleceu, ela é uma igreja da Palavra, é uma comunidade de
crentes que estão sendo santificados pela disciplina e pela atuação do Espí
rito. Ela utiliza intensamente os meios de graça, cumprindo a sua tarefa
A igreja verdadeira 495
Os sacramentos e a espiritualidade
0 sa cra m en to do batism o
Jesus só estabeleceu dois sacramentos: o Batismo e a Ceia. Ambos têm
o caráter de ser “meio de graça”, porque, pelo que eles simbolizam, e me
diante a operação do Espírito Santo, transmitem a graça de Deus para as
pessoas. Dissemos que um sacramento é um sinal visível de uma graça
invisível. Encontramos uma referência a isso na circuncisão do Antigo
Testamento.
Famílias c o m o alvo
com indivíduos, mas com famílias, Para “você e sua casa” é uma frase co
mum em ambos os testamentos. No caso de Abraão, Deus estabeleceu um
sinal pactuai que fizesse separação entre os filhos dos crentes e os filhos
dos incrédulos. Observe que a circuncisão não apenas representava a sepa
ração, ela era a separação. Deus ordenou que os infantes (de oito dias) em
Israel fossem circuncidados. Abraão creu em Deus e por isso foi justifica
do, Circuncidar o seu filho era uma atitude de fé na promessa de Deus. Por
que será que Deus não esperou que o filho de Abraão tivesse idade sufici
ente para tomar uma decisão por si mesmo? A resposta é simples: “Porque
a salvação não é centrada no homem, mas em Deus’5.4 O foco não é a
nossa escolha, mas a escolha divina. Deus vem para nós e para nossos
filhos em amor e graça e coloca a sua marca de posse no povo do seu pacto.
Para aqueles que argumentam que a pessoa precisa se arrepender e crer
para depois ser batizada, podemos dizer que é assim para os adultos, pois
Deus exigiu isso de Abraão para que fosse circuncidado, mas Deus não
exigiu isso de Isaque. Isaque foi circuncidado porque era um filho do pac
to.5 A fé que Abraão demonstrou era suficiente para que Isaque também
recebesse a marca do pacto,
No Novo Testamento, o interesse de Deus pelas famílias continua. Quando
Pedro pregou um sermão evangelístico no templo após o dia de Pentecostes,
ele declarou: “Pois para vós outros é a promessa, para vossos filhos e para
todos os que ainda estão longe, isto é, para quantos o Senhor, nosso Deus,
chamar” (At 2.39), E interessante que Pedro destaque a questão da promes
sa, Ele próprio identificou a promessa do derramamento do Espírito como
se cumprindo naquele dia, Agora ele fala da promessa de Deus aos filhos em
termos bem parecidos com aqueles que o próprio Deus usou ao estabelecer
a aliança com Abraão. A orientação aqui não está no fato de que Deus espera
que os nossos filhos queiram ter um compromisso com ele, mas no fato de
que é ele quem os chama. O apóstolo Paulo assegura-nos que um pai crente
pode santificar um filho mesmo que o outro cônjuge seja incrédulo, pois
como ele mesmo diz: “Doutra sorte, os vossos filhos seriam impuros; po
rém, agora, são santos” (ICo 7,14). Por que Paulo usa a mesma distinção
veterotestamentária de “puro” e “impuro” para os filhos, se não há diferen
ça entre os filhos dos crentes e os filhos dos incrédulos? Porque certamente
existe uma distinção, Não se pode negar que todos, para que sejam salvos,
precisam crer em Jesus, porém, é um grande erro tratar de modo igual um
filho de crente e um filho do mundo,6 pois a Bíblia demonstra que há dife
rença entre eles, e há uma marca que torna essa distinção clara, e essa marca
é o batismo. A marca da aliança é a própria distinção que existe.
500 Razão da esperança
Aspersão ou Im er sã o?
está em Atos 16, em que o carcereiro convertido e toda a sua família foram
batizados de noite, provavelmente dentro da prisão, ou na casa deles (At
16.33). E muito difícil sustentar o modo por imersão nesses casos.12
Pedro compara o batismo com a experiência do dilúvio quando oito
pessoas foram salvas das águas (lPd 3.20,21). Essas pessoas em hipótese
alguma foram imersas. E Paulo o compara com a experiência dos israelitas
no deserto quando foram “todos batizados, assim na nuvem, como no mar”
(ICo 10.2). A nuvem era a presença de Deus que guiava e seguia os filhos
de Israel (Ex 33.8-11), e o mar era o Mar Vermelho no qual eles atravessa
ram com pé enxuto. Não há qualquer referência à imersão nessas passa
gens, antes como diz Landes, “não se pode dizer que os hebreus foram
imersos na nuvem e no mar, dos egípcios sim, pode-se dizer que foram
imersos no mar e até mesmo submersos, para não mais sair”.13
A passagem mais usada pelos imersionistas é a do badsmo do eunuco
realizado por Filipe: “Então, mandou parar o carro, ambos desceram à água,
e Filipe batizou o eunuco. Quando saíram da água, o Espírito do Senhor
arrebatou a Filipe, não o vendo mais o eunuco; e este foi seguindo o seu
caminho, cheio de júbilo”. Porém, será que essa passagem diz explicita
mente que Filipe afundou o eunuco na água? Ele simplesmente diz que
Filipe batizou o eunuco dentro do rio, mas não diz que Filipe o afundou.
“Descer à água e sair da água” não exigem um “afundar na água”, até por
que ambos fizeram isso, e não parece que os batizadores mergulhassem
juntos com os batizados.14 Significa apenas que Filipe usou a água do rio
para batizar o eunuco.
Geralmente, os imersionistas usam os termos bíblicos que falam da morte
e da ressurreição de Cristo como um batismo para os crentes, para dizer
que é preciso afundar na água para ressurgir para uma nova vida. As passa
gens usadas são Romanos 6.3,4: “Ou, porventura, ignorais que todos nós
que fomos batizados em Cristo Jesus fomos batizados na sua morte? Fo
mos, pois, sepultados com ele na morte pelo batismo; para que, como Cris
to foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também ande
mos nós em novidade de vida”. E também Colossenses 2.12: “Tendo sido
sepultados, juntamente com ele, no batismo, no qual igualmente fostes res
suscitados mediante a fé no poder de Deus que o ressuscitou dentre os
mortos”. Inicialmente precisamos dizer que o batismo que essas passagens
apresentam não é o batismo com água. Esses textos nada falam a respeito
de água. Esse batismo é o batismo espiritual, é o ato de ser unido a Cristo
(união mística). Até porque o sepultamente de Jesus não se parece com um
afundamento nas águas. Jesus mesmo falou a respeito desse batismo pelo
504 Razão da esperança
qual ele teria que passar: “Tenho, porém, um batismo com o qual hei de ser
batizado; e quanto me angustio até que o mesmo se realize!” (Lc 12.50).
Quando Tiago e João pediram que Jesus os colocasse nos primeiros lugares
no seu reino, Jesus lhes respondeu: “Não sabeis o que pedis. Podeis vós
beber o cálice que eu bebo ou receber o batismo com que eu sou batiza
do?” (Mc 10.38). Evidentemente Jesus estava falando de sua morte. Nesse
momento, os discípulos responderam: “Podemos”. E então Jesus retrucou:
“Bebereis o cálice que eu bebo e recebereis o batismo com que eu sou
batizado” (Mc 10.39). Tiago realmente foi morto, mas João não. Porém, os
dois foram batizados na morte e na ressurreição de Jesus. Isso se deu por
meio da união mística, e também da vida de consagração e sofrimento a
que os discípulos se submeteram. Portanto, não há nada na Bíblia que diga
que o batismo com água é o passar da morte para a vida, até porque isso é
algo próprio da regeneração e não do batismo. Senão, teríamos que dizer,
como os católicos, que é o batismo que salva.
O b a tism o e a aliança
Ele chamou Abraão para andar na presença dele, o que era um privilégio
sem igual. Deus chamou Abraão e ordenou que ele fosse “perfeito” (heb:
tamini). Essa expressão não significa necessariamente ausência de defeitos,
mas plenitude, integridade, vida completa. Evidentemente que isso seria
uma conseqüência de andar na presença do “Deus que é suficiente”. Deus
estabeleceu a aliança que era um pacto de fidelidade. A promessa de Deus
foi: Eu te abençoarei, serei o teu Deus. O que Abraão deveria fazer era
guardar a aliança. Ele deveria ter uma atitude de fé ao marcar a sua descen
dência. Caso não fizesse isso, estaria quebrando a Aliança de Deus. Hoje
quando as pessoas renegam o batismo ou não o desejam, não estariam
quebrando a aliança de Deus?
nos salva, mas a que confirma que somos salvos. A Ceia do Senhor não é
uma cerimônia importante apenas porque simboliza algo grande, mas por
que é algo grande.15 Por meio dela, o Senhor nos alimenta espiritualmente,
pois oferece o seu corpo e sangue como um alimento espiritual. A Ceia do
Senhor é a garantia de que somos um povo continuamente perdoado e
alimentado.16
A ceia de Je su s
O s evangelistas relatam a última ceia do Senhor Jesus com seus discípu
los. Jesus sabia que aquela seria a última noite em que poderia estar a sós
com os seus amigos, e escolheu aquela ocasião para conceder um dom
maravilhoso à sua igreja antes da sua partida.
A primeira coisa que percebemos na maneira como o Senhor dirigiu
aquela reunião foi a sua disposição de que todos participassem daquele
momento. Ele ordenou que seus discípulos “comessem e bebessem”. Em
outra ocasião ele já havia declarado: “Em verdade, em verdade vos digo: se
não comerdes a carne do Filho do homem e não beberdes o seu sangue,
não tendes vida em vós mesmos. Quem comer a minha carne e beber o
meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6.53,54).
Obviamente, nessa ocasião, Jesus não estava ensinando nenhum tipo de
canibalismo, ele falava de ter um relacionamento com ele, um relaciona
mento tão íntimo que só poderia ser possível se participássemos dele, se ele
estivesse dentro de nós. Nessa noite, na última ceia, em palavras memorá
veis, ele ordenou que o seu povo participasse da união com ele, que é a
maneira como todas as bênçãos de Deus vêm sobre nós.
O significado dessa cerimônia está intimamente ligado à obra de Jesus.
Jesus disse: “Tomai, comei; isto é o meu corpo. A seguir, tomou um cálice
e, tendo dado graças, o deu aos discípulos, dizendo: Bebei dele todos; por
que isto é o meu sangue, o sangue da nova aliança, derramado em favor de
muitos, para remissão de pecados” (Mt 26.26-28). Poucas expressões têm
sido mais controversas na História do que a expressão de Jesus “isto é o
meu corpo” e “isto é o meu sangue”. Infelizmente, aquilo que foi dito para
unir os crentes, até ao dia de hoje continua separando. Jesus não estava
querendo dizer que aquele pedaço de pão e aquele pouco de vinho eram
fisicamente o corpo e o sangue dele, pois do mesmo modo, muitas vezes
ele disse que era “uma porta”, “a luz”, “o caminho”, e nem por isso estava
dizendo que fisicamente era essas coisas. Ele escolheu dois elementos para
que simbolizassem o que, por meio do seu corpo e do seu sangue, ele rea-
Os sacramentos e a espiritualidade 507
lizaria pelo mundo.17 O seu corpo seria crucificado e o seu sangue derra
mado para poder providenciar redenção para o seu povo. O pão e o vinho
simbolizavam o seu sacrifício. Deve ser dito que apenas simbolizavam, eles
não eram, em si, um sacrifício, pois o sacrifício de Jesus é único e não pode
ser repetido (Hb 10.14), Jesus destacou também o aspecto do sangue ser o
“sangue da aliança”. Desde o início do mundo, Deus estabeleceu uma aliança
com o seu povo. Por várias vezes, Deus renovou essa aliança ao longo das
gerações. Um dos elementos centrais dessa aliança era justamente o sangue.
O sangue simbolizava a expiação, o modo em que os pecados podiam ser
perdoados (Hb 9.22). Quando Jesus disse que o sangue dele era o sangue da
aliança, estava apontando para o modo em que as pessoas foram salvas
desde o início. Os sacrifícios oferecidos no Antigo Testamento eram ape
nas sombras do sacrifício de Jesus e só tinham valor porque, no plano de
Deus, chegaria o momento em que Jesus viria e derramaria o seu sangue
para cumprir a aliança.
O objetivo da ceia é para fins de memória e bênção. O aspecto memo
rial do seu sacrifício pode ser percebido pela expressão que Paulo usa na
sua primeira carta aos Coríntios: “Fazei isto, todas as vezes que o beberdes,
em memória de mim. Porque, todas as vezes que comerdes este pão e
beberdes o cálice, anunciais a morte do Senhor, até que ele venha” (ICo
11.25,26). Devemos entender essas palavras à luz do que o próprio Jesus
disse: “E digo-vos que, desta hora em diante, não beberei deste fruto da
videira, até aquele dia em que o hei de beber, novo, convosco no reino de
meu Pai” (Mt 26.29). O memorial da Ceia do Senhor nos aponta para o
passado e para o futuro. Para o passado, ao se referir à obra que o Senhor
realizou na cruz ao oferecer o seu corpo e o seu sangue como sacrifício que
perdoa definitivamente os nossos pecados. Mas a Ceia do Senhor também
aponta para o futuro, como um tipo de proclamação e expectativa do retor
no de Jesus. Ele disse que só voltaria a participar dessa Ceia quando do seu
retorno. E Paulo, com certeza tendo isso em mente, disse que, ao participar
da ceia, anunciamos a morte do Senhor até que ele venha. Porém, a Ceia
não é apenas memorial, ela é também meio de graça. Quando participamos
dela, estamos espiritualmente unidos ao Senhor, e por meio dessa união,
Deus nos concede suas bênçãos.
Conclusão
É necessário que resgatemos a centralidade e a importância dos sacra
mentos instituídos por nosso Senhor na nossa vida pessoal e na vida da
nossa igreja. Cristo pretendeu que o baüsmo e a Ceia do Senhor fossem
elementos poderosos colocados à nossa disposição para o nosso cresci
mento. Em vez de ficarmos inventando técnicas não-bíblicas para crescer
mos na graça, deveríamos nos aprofundar mais no conhecimento do que o
próprio Cristo nos ordenou que fizéssemos, a fim de que a nossa fé fosse
fortalecida, a nossa esperança renovada e o nosso amor encorajado. Os
sacramentos são meios de graça para o nosso crescimento espiritual. Por
isso, devemos tomar cuidado para nunca nos privarmos do que ele provi
denciou para a nossa vida. Muitos crentes não vêem qualquer coisa interes
sante ao participar da ceia, ou quando assistem a batismos, pois conside
ram-nos rituais destituídos de sentido. Poucos se preparam antes de tomar
do pão e do vinho, e a maioria não faz uso do discernimento. Não admira
que a situação em muitos lugares seja parecida com a de Corinto, havendo
também muitos fracos e doentes e não poucos que dormem (ICo 11,30).
Por fim, devemos eliminar os nossos próprios “meios de graça”. O que
o Senhor providenciou para nós é suficiente. Não devemos ser como as
pessoas que nunca estão satisfeitas com nada, pois o alimento espiritual
que Deus proporcionou para nós deve ser suficiente para saciar as nossas
necessidades espirituais. Ele pode ser simples, mas é o alimento que real
mente sustenta. Todos os novos e sofisticados “sacramentos” que têm sido
inventados pelos homens são, afinal, alimentos prejudiciais à nossa saúde
espiritual. Participar deles pode trazer prazer ou euforia a princípio, mas, a
longo prazo, os efeitos colaterais e as doenças sérias aparecerão. Negligen
ciar os verdadeiros meios de graça que Deus nos concedeu é uma atitude
trágica. Deus exige de nós, os crentes, “o uso diligente de todos os meios
exteriores pelos quais Cristo nos comunica as bênçãos da salvação”.21 Por
tanto, não deixemos de ler, meditar e viver a Palavra de Deus. Devemos
cultivar a prática sincera, fervorosa e submissa da oração, e participar de
modo consciente, alegre e piedoso do culto e da Santa Ceia, extirpando
toda “rotina” ou sentido de obrigação.
40
pria essência. Quando Deus nos chama para adorá-lo, isso não é, como
seria nos seres humanos, uma verdadeira megalomania, mas o reconheci
mento preciso de que ele é, de uma maneira simples, pura e verdadeira, o
soberano do universo, digno de toda a adoração, Quando dizemos que ele
é digno, não é simplesmente porque ele fez algo por merecer, mas porque
ele é digno em sua própria essência. De modo que, quando o homem não
adora a Deus comete um gravíssimo pecado, porque tudo no universo cons
pira para que Deus seja adorado. Quando o homem se aproxima de Deus,
mas a sua única preocupação é consigo mesmo, comete um dos piores
pecados possíveis. De certo modo, está adorando a si mesmo, está adoran
do a criatura em lugar do criador.
O desejo de adoração está presente em todos os seres humanos, mas
eles têm distorcido esse sentimento. É um fato comprovado que esse
desejo não precisa ser adquirido. Isso tem sido suficientemente evidenci
ado pela Antropologia, pela Sociologia, pela Arqueologia, pela Filosofia,
etc. Não existiu nenhuma cultura, ao longo de toda a história do mundo,
que não tenha deixado vestígios de religiosidade. Calvino notou que Cíce
ro já havia afirmado: “Não há povo tão bárbaro, não há gente tão brutal
e selvagem, que não tenha arraigada em si a convicção de que há Deus”.3
E de fato, o culto como conseqüência dessa religiosidade é a atividade
humana mais universal que existe. Esse instinto religioso deve-se à natu
reza comum do homem como criatura de Deus. Deus colocou no ho
mem o desejo de adoração, porque o próprio Deus deseja ser adorado.
Como disse Agostinho: “Criaste-nos para Vós e o nosso coração vive
inquieto, enquanto não repousa em Vós”.4 Porém, muito antes de Agos
tinho, Salomão, o sábio rei de Israel já havia dito: “Tudo fez Deus formo
so em seu devido tempo; também pôs a eternidade no coração do ho
mem, sem que este possa descobrir as obras que Deus fez desde o princí
pio” (Ec 3.11). Ou seja, há algo dentro do ser humano que o dispõe a
buscar o eterno. Porém, por causa do pecado, ele tem fracassado comple
tamente em todas as tentativas de adoração, e tem transformado essa
adoração em idolatria. Por isso, o desejo natural de adorar não é suficien
te, pois é uma tentativa decaída e separada de Cristo, a qual Deus não
pode aceitar (Jo 14.6; At 4.12; Hb 10.19-22). Portanto, é preciso que haja
um novo chamado de Deus para a adoração, capacitando o ser humano
para isso, justificando-o, por meio dos méritos de Jesus, e purificando-o,
para que tenha “mãos limpas e coração puro” e assim possa permanecer
diante da sua presença (SI 24.4).
514 Razão da esperança
Ofertas inaceitáveis
Regras claras
Deus dita as regras para a adoração, e o lugar em que estas regras estão
claras é a Escritura, Podemos dizer que a igreja tem autoridade para estabe
lecer a ordem da adoração, mas não tem a liberdade de introduzir novos
elementos além dos que Deus ordenou, Como está escrito em Deuteronô-
mio 4.2: “Nada acrescentareis à palavra que vos mando, nem diminuireis
dela, para que guardeis os mandamentos do Senhor vosso Deus, que eu vos
mando”. A passagem de Deuteronômio 12.32, também adverte: “Tudo o
que eu te ordeno, observarás; nada lhe acrescentarás nem diminuirás”. Como
MacArthur observou, tanto a passagem anterior quanto essa de Deutero
nômio “aparecem no contexto de leis dadas para regulamentar o culto e
limitam todas as formas de culto a que é expressamente ordenada na lei”.7
O culto, portanto, deve se derivar de elementos que estão na Palavra de
Deus, nada pode ser acrescentado, nem diminuído.
Aqui, deparamos com um problema sério. Como atrairemos pessoas
para o culto? Para muitos, isso deve ser feito tornando-o agradável para
aqueles que participarem dele. Evidentemente que nada na Bíblia contraria
a idéia de que o culto seja agradável, mas a questão mais importante é:
516 Razão da esperança
0 p r o b l e m a da falta de sinceridade
John MacArtur Jr. ainda cita um outro tipo sutil, mas falso, de cultuar a
Deus. Ele diz que é “cultuar o Deus verdadeiro com atitude interior erra
da”.10 Essa é a forma de culto falso mais difícil de ser identificada. MacArthur
diz o seguinte: “Mesmo com a eliminação de todos os deuses falsos, de
todas as imagens do Deus verdadeiro e de todos os modos individuais con
cebidos, o culto ainda será inaceitável se a atitude do coração não for a
correta”.11 O culto, ou a adoração, é a expressão máxima de fé por parte do
crente. Por isso, o culto que não é oferecido de todo o coração só pode ser
abominável ao Senhor. Assim, o Senhor condenou o povo de Israel pela
boca do profeta Isaías: “Este povo só se aproxima de mim, e com a sua
boca e com os seus lábios me honra, mas o seu coração está longe de mim
e o seu temor para comigo consiste só em mandamentos de homens, que
maquinalmente aprendeu...” (Is 29.13). Quando o que está nos lábios não
está no coração, nossas palavras são vazias, e Deus não pode aceitar, ainda
51 8 Razão da esperança
sábia do povo de Deus. Deus não só advertiu ao povo de Israel para que não
imitasse os pagãos, como ordenou que destruísse todos os lugares de culto
pagão (Dt 7.5; 12.2,3). E claro que isso é uma ordem que deve ser entendida
dentro do seu contexto, mas que, de qualquer modo, deixa claro que o cami
nho do crente passa longe do caminho do mundo em termos de adoração.
Por mais que as técnicas mundanas pareçam ajudar a igreja a crescer, ou
tornem o culto mais agradável para os homens, elas não garantem a bênção
de Deus, ao contrário. Vamos considerar agora as principais influências
seculares que podem ser identificadas no culto dos nossos dias.
0 existencialismo
0 hum anism o
O humanismo é um sistema de pensamento no qual o ser humano e os
seus interesses ocupam o centro. O ser humano é o objetivo de toda a
existência, é a medida padrão de todas as coisas, como já afirmava Protágoras.
Assim, todas as decisões éticas e práticas dependem do ser humano, e não
de Deus.14 O ser humano é o único objeto digno de adoração, pois cada
pessoa um tem um “deus dentro de si”. Uma palavra que pode ser sinôni
ma de “humanismo” é “egocentrismo”, ou seja, tudo deve ser centralizado
no ser humano e nos seus desejos. Esse é o modo pelo qual o humanismo
tem influenciado o culto cristão, fazendo com que o ser humano tenha
toda a importância, e, portanto, tudo deve estar voltado para ele. As pes
soas esperam que cada parte do culto satisfaça algum desejo particular seu.
O que importa é a busca pela felicidade, e o que menos tem importância é
a santidade. O sentir-se bem é elevado à mais alta categoria, enquanto o
comprometimento desce à mais baixa. A lei da satisfação pessoal predomi
na, c cada indivíduo pensa mais em si mesmo do que no grupo, e muito
menos em Deus. Se Deus existe, ele tem a obrigação de satisfazer os nossos
desejos, pois é como se Deus existisse por nossa causa e não nós por causa
dele. O culto humanista dos nossos dias não pensa primeiro em Deus, ou
em como ele deseja ser adorado, mas no ser humano, e em como ele pode
se sentir melhor no culto.
0 pragmatismo
0 hedonismo
A expressão “hedonismo” vem da palavra grega hedone, que quer dizer
“prazer”, ou “deleite”. Nesse sistema, o principal, ou mesmo único objeti
vo da vida humana é a obtenção do prazer, paralelamente à tentativa de
evitar a dor ou o sofrimento. Assim, todos os recursos são usados para que
a dor seja evitada e o prazer, que representa ou é o objetivo da felicidade,
seja alcançado. Existe uma relação direta entre essa maneira de pensar e a
prática comum em muitas liturgias. O prazer e o sentir-se bem são almeja
dos. Muitas igrejas são decoradas como se fossem o céu, em que todo tipo
de enfeite sugere paz e tranqüilidade, e todo tipo de sensação ruim, como
por exemplo, a tristeza pelo pecado, é totalmente expurgada, tanto do am
biente como da mensagem. A vitória e a realização pessoal são os ingredi
entes apelativos desse tipo de culto. O hedonismo se manifesta também na
falsa asseveração teológica de que o crente não pode passar por dificulda
des, não pode ter doenças, pois essas coisas são ruins, causam dor, e os
crentes são mais que vencedores em Cristo, e por isso merecem uma vida
melhor. Nada que possa levar as pessoas a se sentirem mal deve ser evoca
do. Não se fala em pecado ou santidade de vida.
0 r a cion a li sm o
são muitas vezes aplicados ao culto cristão, quando se exclui toda possibili
dade de manifestação sobrenatural, ou mesmo de sentimentos e sensações
que contrariem a razão. Muitos dos cultos cristãos são tão racionaüstas que
não deixam espaço para a presença de Deus.
A verdade é que nossas liturgias estão cheias de existencialismo,
humanismo, pragmatismo, hedonismo, racionalismo e diversas outras
distorções advindas do secularismo. A igreja tem imitado o mundo em qua
se tudo. Copiamos as músicas, as vestes, o linguajar, as práticas, etc. E im
pressionante como estamos longe do padrão estabelecido por Jesus. Ele
disse que deveríamos ser “sal” e “luz” (Mt 5.13,14). A principal caracterís
tica desses dois elementos é que eles influenciam o ambiente em que se
encontram. Isso faz parte da própria essência deles. Porém, hoje a igreja
influencia bem menos o mundo do que é influenciada por ele. O resultado
de tudo isso é óbvio: não há adoração. E quando não há adoração, estamos
sozinhos no templo. E como o templo fica vazio quando Deus não está lá
com sua presença santa e abençoadora, ainda que milhares de pessoas este
jam naquele lugar! Perdemos a presença de Deus, e todos os benefícios
dela, como a capacidade de nutrir, edificar, desafiar e iluminar os membros
da igreja no que diz respeito à espiritualidade. São incalculáveis as bênçãos
que perdemos e o prejuízo espiritual que sofremos quando oferecemos um
culto distorcido, influenciado pelo secularismo.
de Israel, para que, por minha glória, sejam santificados” (Êx 29.43). Entre
tanto, é na Nova Dispensação que o povo de Deus tem muito maior acesso
à presença de Deus. No tabernáculo e no templo, somente uma vez ao ano,
no dia da expiação, o sumo sacerdote podia entrar no Santo dos Santos,
que era o lugar em que estava a presença de Deus. Porém, quando Cristo
morreu na cruz do Calvário, o véu que separava o Santo dos Santos do
Santo Lugar se rasgou ao meio (Mt 27.51), demonstrando que agora, os
crentes purificados pela expiação que há no sangue de Jesus têm o privilé
gio de, a qualquer hora, entrar na presença do Santo Deus (ver Hb 10.19-
22). Ou seja, a igreja pode ter a certeza de que, quando se reúne em nome
de Cristo não está vivendo de ilusões,16 pois Cristo está presente.
A. W. Tozer, há muitos anos chamou o culto de “a jóia perdida da igre
ja”.17 Parece que, até hoje, essa jóia ainda não foi achada. Muitas coisas nos
nossos tempos modernos têm sido enfatizadas, mas o verdadeiro culto está
meio fora de moda. Vivemos no tempo das chamadas “células bíblicas”,
que em si, são um bom meio de pregar o evangelho, mas que, quando mal
dirigidas, levam as pessoas a pensar que o culto público comunitário não é
necessário. Também vivemos nos tempos das inovações, no tempo das “es
colhas”, em que cada um escolhe o tipo de igreja que lhe seja conveniente,
de acordo com a melhor oferta. Nos últimos anos, aconteceu uma grande
mudança na sociedade que afetou a igreja. O mundo passou da “Era da
Exposição”, onde as pessoas comuns se reuniam com o fim de dialogar,
ponderar e trocar idéias, para a “Era do Show Business, em que o que impor
ta é o entretenimento. A dramatização, os filmes e a televisão colocaram o
show business no centro da nossa vida. Nesse show, a verdade é irrelevante, o
que realmente importa é se estamos sendo ou não entretidos.18 Deus já não
é o centro, e a sua Palavra já não é mais autoridade máxima. A presença de
Deus está esquecida. Essa presença é o bem maior que alguém pode rece
ber. Quando as pessoas vão às igrejas com a intenção de apenas obter al
gum benefício particular, e se esquecem que adorar a Deus na beleza da sua
santidade é a razão do culto (SI 29.2), não estão apenas desagradando a
Deus, estão também perdendo a melhor de todas as bênçãos.
41
A ordem do culto
Requisitos indispensáveis
Antes de tratar dos elementos propriamente ditos, falaremos ainda de
alguns conceitos que tomam a forma de requisitos para o culto. Ou seja,
são requisitos básicos que Deus requer do adorador para que ele possa
aceitar o seu culto, Sem eles, o culto não será aceito, independentemente de
sua ordem. Não pretendemos listar todos os requisitos indispensáveis, ape
nas aqueles que entendemos ser os mais urgentes para a presente época.
526 Razão da esperança
A necessidad e de santidade
O primeiro requisito é a santidade. No Antigo Testamento, a questão da
santidade como pré-requisito fundamental à adoração se expressa princi
palmente a partir da questão do termo “impuro”. A impureza desqualificava
o adorador para se encontrar com Deus, significando que ele não estava
preparado para se apresentar diante do Senhor.1 E interessante que muitas
práticas, no caso de Israel, deixavam o povo “impuro”. E muitas delas eram
inevitáveis, como, por exemplo, cuidar dos mortos, dar à luz, etc. Entretan
to, nem por isso as pessoas tinham desculpas para se aproximar de Deus.
Deus queria que o povo entendesse que ele é completamente diferente dos
seres humanos, e exige santidade de quem se aproxima dele, uma santidade
não meramente de intenções. O povo precisava entender a exigência de
santidade por dois motivos. Como já foi dito, em primeiro lugar, para que o
povo entendesse que não poderia se aproximar de maneira irreverente ou
presunçosa diante do Senhor. E, em segundo lugar, para que Israel enten
desse que era um povo completamente diferente de todas as outras nações.
Isso porque somente um povo separado para Deus poderia prestar adora
ção ao Deus Santo.
Assim, não há como chegarmos à sua presença se os nossos motivos e
também os nossos atos externos não são santos e puros. E inútil argumen
tarmos que a única coisa importante é a atitude interior do coração, pois
Deus exige santidade completa. Portanto, a nossa postura deve ser santa,
tanto quanto os nossos pensamentos; toda a nossa vida deve ser santa. A
santidade de Deus precisa nos afetar de tal modo que não nos apresente
mos diante dele descuidadamente, mas que sejamos tomados de tal reve
rência a ponto mesmo de confessar como Jó: “Eu te conhecia só de ouvir,
mas agora os meus olhos te vêem. Por isso me abomino, e me arrependo
no pó e na cinza” (Jó 42.5,6). Diante da santidade de Deus e da nossa
condição pecaminosa, não nos resta outra atitude a não ser demonstrar
toda reverência e suplicar a sua graça, a fim de que ele nos habilite a lhe
prestar um culto aceitável.2 Definitivamente, Deus não está disposto a acei
tar “iniqüidade associada ao ajuntamento solene” (Is 1.13).
condição decaída do ser humano é tal que ele não pode permanecer nem
um instante sequer na presença de Deus, sem alguém que sirva de interme
diário.3 Deus estabeleceu Jesus Cristo como o único mediador entre si e os
seres humanos (lTm 2.5). Jesus é o mediador porque ele representa tanto
Deus quanto os próprios seres humanos, uma vez que, na sua pessoa con
vivem tanto a natureza humana na sua perfeição, quanto a divina. Somos
aceitos por Deus “em Jesus”, e não podemos, portanto, nos apresentar
diante de Deus “sem Jesus”.
Uma das passagens que melhor expressam a mediação de Jesus com
respeito ao culto é Hebreus 13.15-21. O versículo 15 diz: “Por meio de
Jesus, pois, ofereçamos a Deus, sempre, sacrifício de louvor, que é o fruto
dos lábios que confessam o seu nome”. E os versículos 20,21 dizem: “Ora,
o Deus da paz, que tornou a trazer dentre os mortos a Jesus, nosso Senhor,
o grande Pastor das ovelhas, pelo sangue da eterna aliança, vos aperfeiçoe
em todo o bem, para cumprirdes a sua vontade, operando em vós o que é
agradável diante dele, por Jesus Cristo, a quem seja a glória para todo o
sempre. Amém!” O ensino implícito na passagem é bem perceptível: o
verdadeiro culto precisa ser oferecido a Deus por meio de Jesus Cristo, pois
é somente por meio de Cristo que algo pode ser agradável a Deus.
A mesma idéia da passagem acima se encontra em 1 Pedro 2.5: “Tam
bém vós mesmos, como pedras que vivem, sois edificados casa espiritual
para serdes sacerdócio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais
agradáveis a Deus por intermédio de Jesus Cristo”. O próprio termo “sa
cerdote” implica oferecer culto; logo, essa passagem passa a idéia da obri
gatoriedade do culto. A função do sacerdote é oferecer sacrifícios, entre
tanto, já não há sacrifício a ser oferecido, uma vez que Jesus ofereceu um
sacrifício completo, mas resta algo que pode ser agradável a Deus, que
são os sacrifícios espirituais oferecidos por intermédio de Jesus Cristo.
Por isso, nem toda adoração é aceitável diante de Deus, somente aquela
que é feita por meio de Jesus. O nosso culto, que em si mesmo não teria
qualquer valor, se torna algo grandioso e sublime quando mediado por
Jesus Cristo.
tempo para cultuar a Deus. Expressar amor toma tempo. Expressar devo
ção toma tempo. E necessário tempo para expressar adoração e para nos
colocarmos sob completa submissão a Deus, como é expresso em vários
atos de adoração”.4 Esse tempo precisa ser separado tanto antes quanto
durante o momento da adoração pública. E preciso que as pessoas se aper
cebam da necessidade que têm de se achegar até a presença de Deus e dos
benefícios recebidos por meio disso. E certo que Deus quer ser louvado,
entretanto, ele não é o maior beneficiado na adoração, uma vez que não
acrescentamos nada que ele já não possua. Nós somos grandemente bene
ficiados porque recebemos coisas que necessitamos em grandíssima escala.
Por isso, as pessoas honram a Deus quando chegam para a adoração famin
tas e em atitude de expectativa, cônscias da sua necessidade, esperando a
ação de Deus. Como afirmou John Owen:
Não há nada vital na religião e na adoração de tais pessoas. Elas nada espe
ram, nada recebem, e nada acontece com elas. Vão à casa de Deus, não com
o propósito de terem um encontro com Deus, não com o desejo de espera
rem nEle, isso nem passa por suas mentes, nem entra em seus corações que
algo possa acontecer num culto. Dizem: É que sempre fazemos isso no
domingo de manhã. E nosso costume. E nosso hábito. É uma coisa certa a
fazer. Mas a idéia de que Deus possa subitamente visitar seu povo c descer
sobre ele, a emoção de estar na presença de Deus e sentir sua proximidade,
e seu poder, nunca entra em sua imaginação,
A necessidad e de c o m u n h ã o
O culto público é apresentado pela igreja como corpo de Cristo. A ca
racterística marcante do corpo é que ele é constituído de membros que
fazem parte um do outro, e que são todos submissos à Cabeça, que é Cris
to. Logo, tudo no culto envolve comunhão. E se não houver comunhão
entre os membros e a Cabeça, e também em relação aos próprios membros
entre si, não há culto. A comunhão dos crentes na Bíblia é acentuada pelo
uso da expressão “uns aos outros”. Por causa da comunhão em Cristo,
Paulo incentiva os crentes a acolher “uns aos outros” (Rm 15.7), amar e
suportar “uns aos outros” (Ef. 4.2, 15, 16; 5.2), a não julgar “uns aos ou
tros” (Rm 14.3,13), a edificar “uns aos outros” (Rm 14.19).8 Sem dúvida o
culto é vertical, pois ele é prestado a Deus e não às pessoas, mas sem uma
vida de comunhão e serviço feito “uns aos outros”, a adoração não vai
subir muito alto.
Em Romanos 15.1-7 encontramos a seguinte admoestação de Paulo:
Ora, nós que somos fortes devemos suportar as debilidades dos fracos e
não agradar-nos a nós mesmos. Portanto, cada um de nós agrade ao próxi
mo no que é bom para edificação. Porque também Cristo não se agradou a
si mesmo; antes, como está escrito: As injúrias dos que te ultrajavam caíram
sobre mim. Pois tudo quanto, outrora, foi escrito para o nosso ensino foi
escrito, a fim de que, pela paciência e pela consolação das Escrituras, tenha
mos esperança. Ora, o Deus da paciência e da consolação vos conceda o
mesmo sentir de uns para com os outros, segundo Cristo Jesus, para que
concordemente e a uma voz glorifiqueis ao Deus c Pai de nosso Senhor
530 Razão da esperança
Jesus Cristo. Portanto, acolhei-vos uns aos outros, como também Cristo
nos acolheu para a glória de Deus.
Elementos indispensáveis
Agora devemos pensar nos elementos que são indispensáveis ao culto
verdadeiro. Precisamos buscar isso na Palavra de Deus; porém, o Novo
Testamento não nos fornece um modelo específico de liturgia no qual pos
samos identificar os elementos que compõem uma liturgia bíblica. Entre
tanto, a partir do estudo de diversas passagens da Palavra de Deus, pode
mos chegar a quatro elementos que são comuns, ou básicos na liturgia bí
blica. São eles: Instrução, Oração, Louvor e Ceia do Senhor. Precisamos
ainda considerar as atitudes por meio de gestos e posturas na adoração que
são descritas pela Bíblia.
Instr ução
Oração
Louvor
 ceia d o Sen h or
Da igreja primitiva nos vêm o ensino de que os crentes “perseveravam
na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações”
(At 2.42). No grego, o artigo definido precede o substantivo “pão” o que
indica que os cristãos participavam de “o pão” separado para o sacramen
to da comunhão (ver 20,11; ICo 10.16)”.19 Isso significa que a ceia era
celebrada regularmente. Em Trôade, os cristãos estavam reunidos no pri
meiro dia da semana com o fim de partir o pão (At 20.7), sendo que o texto
parece demonstrar um vínculo quase automático entre o “dia do Senhor”
e o “partir do pão”.20 Na Primeira Carta aos Coríntios, quando Paulo os
admoesta sobre os cuidados que eles deveriam ter com respeito à Ceia do
Senhor, ele dá a entender que eles faziam isso sempre. Ele diz: “Nisto,
porém, que vos prescrevo, não vos louvo, porquanto vos ajuntais, não para
melhor; e sim para pior” (ICo 11.17). E, no versículo 20, ele acrescenta:
“Quando, pois, vos reunis no mesmo lugar, não é a ceia do Senhor que
comeis”. A pressuposição básica era de que sempre que a igreja se reunia,
eles participavam da Ceia.
O relato mais completo e antigo que temos de uma reunião cristã foi
feito por Justino, no século 2o, e nos mostra que a Ceia era servida domini-
calmente:
No dia que se chama sol, celebra-se uma reunião de todos os que moram
nas cidades ou nos campos, e aí se lêem, enquanto o tempo permite, as
Memórias dos Apóstolos ou os escritos dos profetas. Quando o leitor ter
mina, o presidente faz uma exortação e convite para imitarmos esses belos
exemplos. Em seguida, levantamo-nos todos juntos e elevamos as preces.
Depois de terminadas, como já dissemos, oferece-se pão, vinho e água, e o
presidente, conforme suas forças, faz igualmente subir a Deus suas preces e
ações de graças e todo povo exclama, dizendo: Amém! Vem depois a distri
buição e participação feita a cada um dos alimentos consagrados pela ação
de graças e seu envio aos seus ausentes pelos diáconos.21
Calvino cria que a Ceia deveria ser celebrada pelo menos uma vez por
semana. Ele escreve na sua obra magna: “Deixando, pois, de lado todo este
sem fim de cerimônias e pompas, a Santa Ceia poderia ser administrada
santamente, com freqüência, ou ao menos uma vez na semana...”.22 Porém
sabemos que ele não fez disso uma regra, tanto que, por decisão do
Consistório de Genebra, a Ceia não pôde ser realizada dominicalmente, mas
apenas quatro vezes ao ano: no Natal, na Páscoa, no Pentecostes e no pri
A ordem do culto 535
Gestos e posturas
saltério (SI 81.2); tamboril (SI 81.2); lira (Is 5.12), etc. Portanto, não há nada
que impeça o uso de instrumentos variados no louvor do Senhor, porém,
não se deve pensar que o simples fato de haver instrumentos é suficiente
para que haja verdadeiro louvor. Devemos lembrar que o verdadeiro lou
vor não precisa de instrumentos, nem de muitos gestos, mas simplesmente
de um coração sincero, afinal, Jesus disse que Deus pode tirar um “perfeito
louvor da boca de pequeninos e crianças de peito” (Mt 21.16).
Nessa questão dos elementos do culto, a igreja precisa colocar em práti
ca o exercício do amor cristão que ajuda a solucionar as divergências que
não são tão importantes. Divergências sempre surgirão enquanto gostos
pessoais estiverem envolvidos, e muitas vezes é difícil identificar quando
nós mesmos estamos querendo ser bíblicos ou apenas defendendo as nos
sas preferências pessoais. Por isso, o critério do amor se faz necessário.
João Calvino percebeu isso muito bem:
O amor visa à edificação e não à divisão, e Paulo já dizia que o amor não
busca o proveito próprio (ICor 13.5), antes o bem comum. Desse modo,
em questões que não são essenciais, que não estão explícitas na Bíblia, e que
não envolvem a majestade de Deus ou o próprio caráter do cristão, como
Calvino sugere, não precisamos ser excessivamente rígidos. Calvino, no es
tabelecimento da ordem do culto, realmente não foi dogmático, pois enten
dia que muitos detalhes poderiam ser modificados a critério da congrega
ção, mas jamais esteve disposto a tolerar abusos.28
 ordem do culto 539
Características indispensáveis
Já falamos de requisitos e elementos indispensáveis à adoração pública,
agora falaremos de suas características indispensáveis,29 A adoração que a
igreja oferece a Deus é sublime na sua essência, No encontro entre Deus e
seu povo, Deus fala com o seu povo a verdade eterna e imutável, e o seu
povo responde com adoração. Todos os elementos que compõem esse acon
tecimento majestoso são sublimes em sua essência, e tornam todo o ato do
culto algo maravilhoso.
H um ild ad e
Espiritualidade
Jesus disse: “Deus é Espírito, e importa que seus adoradores o adorem
em espírito e em verdade”. (Jo 4.24). Por isso, todo “formalismo” no senti
do pejorativo da palavra é condenado na adoração. Cultuar a Deus de modo
540 Razão da esperança
Formosura
Sem dúvida, a partir dos tempos do Novo Testamento, o que menos
importa na adoração pública é o local. A preocupação é com a qualidade
dessa adoração. O nome de Deus já foi adorado de modo perfeitamente
satisfatório nas catacumbas pela igreja primitiva, e em outros lugares igual
mente provisórios ao longo dos séculos. Na adoração pública não há espa
ço para arte por amor à arte. Todo ornamento que cause distração deveria
ser evitado na igreja. Nunca deve um sentido de satisfação estética, obtida
pelo ritmo de instrumentos, ou pela entonação perfeita de algum coral, ou
ainda por qualquer outro recurso estético como uma luz colorida que se
infiltra por algum vitral, ser confundido com o verdadeiro espírito de ado
ração. Porém, isso não significa que se deva excluir da igreja todo e qual
quer objeto que seja belo, ou ornamentado, ou mesmo simbólico. Os san
tuários do Antigo Testamento e seus mobiliários foram feitos segundo o
modelo dado pelo próprio Deus (Nm 8.4), e sem dúvida eles eram belíssimos,
como também eram belas as roupas dos sacerdotes. Por isso, entendemos
que o lugar e os acessórios de adoração da igreja cristã, de acordo com as
A ordem do cullo 541
Festividade
A alegria é uma das marcas da verdadeira adoração. E claro que pode
haver cultos especiais de humilhação e confissão de pecados, principal
mente em tempos de calamidades e guerras, entretanto, mesmo nesses
momentos, a igreja não pode deixar de demonstrar a sua alegria. A alegria
do cristão independe das circunstâncias externas. Essa alegria se baseia ape
nas no Senhor (Fp 4.4). Há uma passagem bíblica que ilustra bem essa
questão de alegria incondicional. Em Atos 16, na cidade de Filipos, Paulo e
Silas foram aprisionados, açoitados e lançados no cárcere. Com os pés pre
sos no tronco, “por volta da meia-noite, oravam e cantavam louvores a
Deus” (At 16.25), Eles conseguiam louvar a Deus mesmo em meio a gran
de sofrimento. Essa idéia bíblica com respeito à alegria é o próprio espírito
da adoração que realmente agrada a Deus. Não o adoramos apenas quando
tudo está bem. Nós o adoramos pelo que ele é, e pelo que nós somos por
sua graça. No momento do culto, não nos aproximamos de um Deus irado,
mas de um Deus gracioso. Somos como um filho que se aproxima de um
pai e não como um criminoso diante do juiz, pois todos os nossos pecados
foram levados por Jesus. A consciência dessas coisas deve nos acompanhar
durante o culto. O reconhecimento sincero disso torna alegre o nosso espí
rito, enche-nos de gozo, e Deus se agrada grandemente dessa disposição.
No culto, como disse Karl Barth, a igreja “troca sua roupa de trabalho pela
roupa de festa”.31 No momento da adoração pública, todas essas coisas
precisam estar patentes na nossa mente, e o desejo de adorar ao Senhor
com alegria precisa permear toda a comunidade. Como disse o psicólogo
542 Razão da esperança
cristão Larry Crabb, “os portadores da imagem (de Deus) precisam mudar
de uma forma que os capacite a uma alegria de Deus, mais profunda, mais
adoradora, mais íntima...”32 Certamente, todo benefício será nosso, e Deus
se agradará do nosso louvor, como de um aroma suave.
Conclusão - Equilíbrio
Para que o culto seja aceito por Deus, ele precisa ter as características
que a Bíblia diz que ele tem. Porém, a Bíblia não deixou claro como deve
funcionar cada detalhe. No Antigo Testamento isso estava muito claro, pois
os rituais realizados no templo estavam prescritos detalhadamente. O fato
de Deus não prescrever como deve ser o culto no Novo Testamento já
indica que ele deseja algo muito simples. Todo tipo de rituaüsmo ou exces
so deve ser deixado de lado. Deve-se priviligiar a clareza, a espiritualidade, a
alegria e a reverência. O fato de que as igrejas tenham liturgias diferentes
umas das outras não significa que apenas uma esteja certa. Porém, os prin
cípios básicos devem ser seguidos. O Novo Testamento ensina uma tensão
que deve ser mantida para que a adoração seja bíblica. Há duas passagens
que devem ser consideradas conjuntamente. A primeira é: “Não apagueis o
Espírito” (lTs 5.19). A segunda é: “Tudo, porém, seja feito com decência e
ordem” (ICo 14.40). Pelo contexto das passagens, percebe-se que Paulo
está falando sobre o culto. A tensão entre esses dois conceitos pode nos
levar ao tão desejado equilíbrio na adoração. Primeiramente, devemos to
mar cuidado para não apagar o Espírito. Há o perigo de controlarmos a
adoração de tal modo que não sobra espaço para o Espírito se manifestar.
Assim, o culto se torna tão-somente uma obra humana. Porém, o culto que
agrada a Deus e que faz diferença na vida das pessoas precisa ter muito
mais do que simplesmente a participação humana. No nosso culto, o Espí
rito precisa ter liberdade para agir. Porém, isso não significa que o Espírito
vai trazer confusão, pois a decência e a ordem são igualmente característi
cas do culto verdadeiro. O Espírito não vai produzir coisas indecentes e
desordenadas no culto, até porque Deus não é Deus de confusão, mas de
paz (ICo 14.33). Se, no nosso culto, ao Espírito for dada a liberdade de agir
e a Palavra for respeitada, tudo será agradável ao Senhor e profundamente
edificante para as pessoas. Não ocorrerão abusos nem irracionalidade; por
outro lado, haverá o verdadeiro fervor e a devoção que são próprios de
redimidos.
42
Esperança escatológica1
l4RM =-
A s e m e n t e da m u l h e r
momento, Deus demonstrou que seus planos para a raça humana não esta
vam acabados. Dirigindo-se a Satanás, o grande causador da queda, Deus
disse: “Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu
descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar” (Gn 3.15).
Essa promessa ecoa por todas as partes subseqüentes da Bíblia. Como diz
Hoekema, “a partir deste ponto, tudo na revelação do Antigo Testamento
olha para a frente, aponta para a frente, e ansiosamente aguarda o redentor
prometido”.4 Desde o início, Deus prometeu para Satanás que chegaria o
dia em que um descendente da mulher lhe esmagaria a cabeça. Essa foi a
espera mais angustiante para o inimigo de Deus. A cada bebê que nascia em
Israel, o seu medo aumentava, pois no rosto de cada criança que nascia, a
ameaça de seu fim poderia estar desenhada. A cada nova promessa trazida
por algum profeta sobre o nascimento do Messias, Satanás se revolvia pen
sando que o seu dia finalmente havia chegado. Por isso, o seu desespero e a
sua fúria em tentar impedir a vinda do Messias. João descreve esse desespe
ro de Satanás em tentar impedir a vinda do Messias em Apocalipse 12. Ele
descreve um grande sinal no céu, em que uma mulher vestida de sol tinha a
lua debaixo dos pés e uma coroa de doze estrelas na cabeça. A mulher
estava grávida, e sofria tormentos para dar à luz. João em seguida descreve:
“Viu-se, também, outro sinal no céu, e eis um dragão, grande, vermelho,
com sete cabeças, dez chifres e, nas cabeças, sete diademas. A sua cauda
arrastava a terça parte das estrelas do céu, as quais lançou para a terra; e o
dragão se deteve em frente da mulher que estava para dar à luz, a fim de lhe
devorar o filho quando nascesse” (Ap 12.3,4). Quem é essa mulher que
João viu? E a igreja. Mais especificamente a igreja do Antigo Testamento
(Israel), mas também é a igreja do Novo Testamento, embora isso somente
fique claro em Apocalipse 12.13-18. A descrição que João faz da mulher é
algo que vai além da própria imaginação. Ela é radiante e gloriosa. Deve
mos lembrar que Deus vê a igreja dessa maneira. A mulher está grávida. Ela
vai dar à luz a um filho. Sabemos que esse Filho é o próprio Senhor Jesus, e
que esta gravidez da mulher é uma referência às várias profecias a respeito
do nascimento do Messias, feitas desde o início do mundo. Em seguida,
entra em cena um monstro de proporções titânicas. É um dragão, uma
imensa serpente alada. Logo imaginamos um monstro terrível, cruel, feroz,
maligno, cheio de garras e de aparência assustadora. Quem é esse monstro?
E a mesma serpente que se apresentou no Éden com aparência bem menos
terrível. É Satanás, o grande inimigo do povo de Deus. Agora, ele se apresenta
como um dragão vermelho com sete cabeças coroadas e dez chifres, sim
bolizando o seu vasto poder e a autoridade que ele usurpou. Ele é tão
546 Razão da esperança
grande e tão poderoso que um movimento da sua cauda arrasta um terço das
estrelas do céu. Este é o inimigo que a igreja enfrenta. Mas o que ele está
fazendo ali diante da mulher? Ele quer devorar o filho que vai nascer. Trata-
se de uma referência a todas as vezes que Satanás tentou impedir que Jesus
viesse ao mundo. Ele sempre esteve diante da mulher num esforço titânico
para impedir que o menino nascesse e crescesse, pois ele sabia que o nasci
mento desse menino significaria o seu fim. A mulher representa Israel que
deu à luz o Senhor Jesus. Agora entendemos que a luta do dragão começou
ainda no jardim do Éden, desde a primeira promessa divina dirigida ao pró
prio Satanás de que um descendente da mulher esmagaria a cabeça da ser
pente (Gn 3.14,15). O maligno empreendeu todos os seus esforços para
impedir a vinda desse descendente. Ao longo da Bíblia, encontramos deze
nas de ocasiões em que esse monstro terrível agiu fazendo de tudo para
impedir a vinda do Messias (2Rs 11.1-3). Seu último ato desesperado foi por
meio de Herodes, no extermínio dos inocentes em Belém (Mt 2.16-18). Po
rém, o prometido já havia nascido e estava longe dali (Ap 12.5).
Se Satanás esperava a vinda do Prometido com propósitos obscuros,
Israel tinha outros propósitos nessa espera. A expectativa de Israel foi se
aguçando a respeito da vinda de alguém que os libertaria. São centenas de
profecias do Antigo Testamento que falam sobre a vinda desse Libertador
(Gn 22.18; 26.4; 28.14; Dt 18.15; SI 110.4; Is 7.14; Zc 9.9; etc). Em Gênesis
49, Deus indicou uma das tribos como a escolhida para a realização do seu
propósito. O velho Jacó abençoou seus filhos, mas tinha uma bênção espe
cial para um deles. Ele disse: “Judá, teus irmãos te louvarão; a tua mão
estará sobre a cerviz de teus inimigos; os filhos de teu pai se inclinarão a ti.
Judá é leãozinho; da presa subiste, filho meu. Encurva-se e deita-se como
leão e como leoa; quem o despertará? O cetro não se arredará de Judá, nem
o bastão de entre seus pés, até que venha Siló; e a ele obedecerão os povos”
(Gn 49.8-10). Posteriormente, João identificou o cumprimento dessa pro
fecia na pessoa de Jesus, chamando-o de “Leão da tribo de Judá” (Ap 5.5).
Muitos anos depois de Jacó ter abençoado Judá, o Senhor identificou a
família da tribo de Judá da qual nasceria o Salvador. Isso aconteceu.quando
Davi estava muito angustiado porque não havia no reino um local próprio
onde Deus pudesse ser adorado e sua arca guardada. Davi se dispôs a fazer
uma casa, um templo para Deus. Naquele momento o Senhor não aceitou
que Davi construísse, porém, lhe fez uma promessa: “Quando teus dias se
cumprirem e descansares com teus pais, então, farei levantar depois de ti o
teu descendente, que procederá de ti, e estabelecerei o seu reino. Este edificará
uma casa ao meu nome, e eu estabelecerei para sempre o trono do seu
Esperança escatológica 547
reino” (2Sm 7.12,13). Apesar de essa promessa ter sido cumprida parcial
mente na pessoa de Salomão, ela se estende para muito além dele, até che
gar ao tempo em que um homem assumisse um reino eterno. Por trás dessa
promessa pessoal a Davi estava uma promessa escatológica. Portanto, como
diz Hoekema, “em resumo, podemos dizer que o crente veterotestamentário
aguardava um redentor, de maneiras diversas e pelo sentido de várias figu
ras, que deveria vir em algum tempo futuro (ou nos últimos dias, para usar
uma figura de linguagem comum ao Antigo Testamento) para redimir o seu
povo e, também, para ser uma luz aos gentios”.5 Deus anunciou de várias
maneiras a vinda do Redentor. Ele fez isso de forma especial, indicando a
tribo e a família da qual esse descendente viria.
A no va aliança
Vários elementos foram aos poucos sendo acrescentados e desenvolvi
dos dentro da expectativa escatológica de Israel. Um deles foi o da renova
ção da aliança numa nova e eterna aliança. O tema da aliança é central à bíblia
toda, pois estrutura a própria mensagem bíblica. Percebemos que, do início
ao fim do mundo, a aliança é sempre levada em conta por Deus, e é seu modus
operandi. A aliança estabelecida com Adão, e renovada com Noé, Abraão,
Moisés e Davi, era a base do relacionamento de Israel com Deus. Porém, a
dificuldade dos homens de se manterem fiéis à aliança fez com que Deus
indicasse a idéia de uma nova aliança. Uma aliança perfeita que não pudesse
ser quebrada. Esta nova aliança é evocada especialmente por Jeremias:
Eis aí vêm dias, diz o S e n h o r , em que firmarei nova aliança com a casa de
Israel e com a casa de Judá. Não conforme a aliança que fiz com seus pais, no
dia em que os tomei pela mão, para os tirar da terra do Egito; porquanto eles
anularam a minha aliança, não obstante eu os haver desposado, diz o S e n h o r .
Porque esta é a aliança que firmarei com a casa de Israel, depois daqueles dias,
diz o S e n h o r : Na mente, lhes imprimirei as minhas leis, também no coração
lhas inscreverei; eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo (Jr 31.31-33).
Assim, Israel sonhava com o dia em que o Senhor estabelecesse essa nova
aliança, e conseqüentemente, um novo tipo de relacionamento com Deus.
A restauração de Israel
A idéia da aliança restaurada sugeria também a restauração da nação de
Israel. Uma coisa estava ligada à outra. Se Deus restaurasse a aliança e a
fizesse etema, então, a nação de Israel também seria transformada e glorificada.
Precisamos lembrar que, desde o início da formação da nação, Deus havia
prometido que ela seria uma bênção para todas as famílias da terra (ver Gn
12.1-3). Porém, toda a apostasia de Israel levou fatalmente o povo a receber
de Deus a maldição da aliança. Esta maldição, que se consumou no exílio,
quando a nação perdeu o direito a terra, não veio de uma hora para outra.
Durante um tempo muito longo, Deus advertiu o povo por intermédio dos
profetas que diziam que, se o povo não se arrependesse e mudasse de atitu
de, Deus mandaria o juízo sobre eles. Porém, percebe-se que, nas próprias
advertências desses profetas, sempre esteve incluída uma promessa de res
tauração para o remanescente fiel. Um exemplo disso vem do chamamento
de Isaías. Naquele momento, Deus demonstrou que o profeta teria um mi
nistério de condenação, pois ele profetizaria até que a nação fosse de todo
destruída (Es 6.9-12). Porém, Deus já antevia a salvação de um remanescen
te, pois disse: “Mas, se ainda ficar a décima parte dela, tornará a ser destruí
da. Como terebinto e como carvalho, dos quais, depois de derribados, ainda
fica o toco, assim a santa semente é o seu toco” (Is 6.13). O “toco” que
permaneceria, como permanece depois que uma floresta é queimada, era a
“santa semente”, o povo escolhido, o remanescente fiel. Este remanescente
seria salvo. Um aspecto importante a respeito desse remanescente é que ele
é chamado de f i e l ? Deus nunca prometeu restaurar toda a nação, apenas a
parte fiel (Is 10.22). A nação renovada seria elevada à categoria de líder das
nações. Por intermédio de Isaías, Deus fez uma promessa fantástica: “Nos
últimos dias, acontecerá que o monte da Casa do S e n h o r será estabelecido
no cimo dos montes e se elevará sobre os outeiros, e para ele afluirão todos
os povos” (Is 2.2; Ver Mq 4.1). Portanto, Israel esperava a restauração como
um dos aspectos de sua esperança escatológica.
Ainda é preciso que entendamos o alcance da promessa divina de res
taurar Israel. A luz do Novo Testamento, essas promessas escatológicas
feitas ao Israel remanescente devem ser identificadas com a igreja. Paulo
diz: “Mas, relativamente a Israel, dele clama Isaías: Ainda que o número dos
filhos de Israel seja como a areia do mar, o remanescente é que será salvo”
Esperança escalológica 549
(Rm 9.27). Logo adiante, ele diz que esse remanescente é a parte de Israel
que faz parte da igreja, e que é salvo pela graça: “Assim, pois, também
agora, no tempo de hoje, sobrevive um remanescente segundo a eleição da
graça” (Rm 11.5). Os demais teriam uma chance, mas precisariam se arre
pender: “Eles também, se não permanecerem na incredulidade, serão en
xertados; pois Deus é poderoso para os enxertar de novo” (Rm 11.23). No
final, todo o Israel (crentes de todas as épocas) será salvo (Rm 11.26). Per
cebemos assim, como Manson nesse ponto, acertadamente conclui, “que a
escatologia profética está já no caminho de se tornar mais individual do que
nacional visto como cada um pode tornar-se um dos que pertencem ao
Remanescente - o verdadeiro Israel - pelo seu ato de arrependimento e
pela sua vida de fidelidade a Jeová e obediência à Palavra do Senhor”.7
0 d e r r a m a m e n t o do Espírito
Aos poucos, a restauração de Israel passou a estar ligada à idéia de que o
Espírito de Deus seria derramado naquele momento. Seria por meio desse
Espírito que o Senhor levaria Israel à sua posição idealizada. Desse modo,
um derramamento do Espírito passou a fazer parte da expectativa escatoló-
gica de Israel. Isaías fala de um tempo de muita destruição para o povo de
Deus, mas que duraria, segundo ele, “até que se derrame sobre nós o Espíri
to lá do alto; então, o deserto se tornará em pomar, e o pomar será tido por
bosque; o juízo habitará no deserto, e a justiça morará no pomar. O efeito da
justiça será paz, e o fruto da justiça, repouso e segurança, para sempre” (Is
32.15-17). Joel é o profeta que liga de maneira mais clara o derramamento
do Espírito com os acontecimentos escatológicos. Ele profetiza: “E aconte
cerá, depois, que derramarei o meu Espírito sobre toda a carne; vossos fi
lhos e vossas filhas profetizarão, vossos velhos sonharão, e vossos jovens
terão visões; até sobre os servos e sobre as servas derramarei o meu Espírito
naqueles dias. Mostrarei prodígios no céu e na terra: sangue, fogo e colunas
de fumaça. O sol se converterá em trevas, e a lua, em sangue, antes que
venha o grande e terrível Dia do S e n h o r ” Ql 2.28-31). O derramamento do
Espírito sobre toda a carne refere-se ao caráter universal desse derramamen
to que não mais seria restrito ao povo de Israel. Os prodígios no céu e na
terra demonstram de maneira clara que ele está falando do fim dos tempos.
Tudo isso aconteceria antes do “dia do Senhor”. Não é difícil entender por
que o derramamento do Espírito estava ligado à esperança escatológica de
Israel. O Espírito de Deus sobre alguém sempre significou capacitação Qz
6.34; 14.6; 2Cr 15.1; Is 42.1). Na reconstrução do templo depois do exílio,
550 Razão da esperança
0 dia do S enhor
Eis que vem o Dia do S e n h o r , dia cruel, com ira e ardente furor, para con
verter a terra em assolação e dela destruir os pecadores. Porque as estrelas e
constelações dos céus não darão a sua luz; o sol, logo ao nascer, se escurece
rá, e a lua não fará resplandecer a sua luz. Castigarei o mundo por causa da
sua maldade e os perversos, por causa da sua iniqüidade... Portanto, farei
estremecer os céus; e a terra será sacudida do seu lugar, por causa da ira do
S e n h o r dos Exércitos e por causa do dia do seu ardente furor (Is 13.9-13).
profetas trataram de alertar que esse dia poderia ser “amargo”. Amós disse:
“Ai de vós que desejais o Dia do S e n h o r ! Para que desejais vós o Dia do
S e n h o r ? É dia de trevas e não de luz” (Am 5.18). Desejar o “dia do Se
nhor” sem estar preparado para esse dia não é uma atitude inteligente. De
qualquer maneira, sempre havia a esperança de que um remanescente fosse
salvo. Esse remanescente seria a coroa das nações. Não deve ser ignorado
que, da perspectiva da maioria das pessoas do Israel do Antigo Testamento,
a escatologia estava ligada ã restauração da nação de Israel, e, por essa ra
zão, mais um conceito foi sendo adquirido, o de que Deus estabeleceria seu
reino em toda a terra.
0 reino de Deus
A idéia do “Reino de Deus” é mais desenvolvida no Novo Testamento,
porém, percebemos que o Antigo Testamento também fala sobre o Reino.
Num sentido, o Reino de Deus no Antigo Testamento é identificado com a
soberania de Deus, pois ele é o grande rei que reina sobre todos (SI 29.10;
47.2; 97.1; Is 6.5; Jr 46.18). Porém, juntamente com o Messias prometido
viria um reino prometido. Isaías profetizou:
Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu; o governo está sobre
os seus ombros; e o seu nome será: Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte,
Pai da Eternidade, Príncipe da Paz; para que se aumente o seu governo, e
venha paz sem fim sobre o trono de Davi e sobre o seu reino, para o estabe
lecer e o firmar mediante o juízo e a justiça, desde agora e para sempre. O
zelo do S e n h o r dos Exércitos fará isto (Is 9.6,7).
Talvez a promessa mais escatológica de todas para Israel tenha sido dada
por Isaías. Falando sobre a futura restauração de Israel a partir de um rema
nescente, Deus diz que pouparia uma parte de Israel (Is 65.8), e que faria a
descendência de Jacó e o herdeiro de Judá possuir os montes de Deus onde
os eleitos habitariam (Is 65.9). Porém, a transformação seria muito maior do
que simplesmente o estabelecimento de um reino temporal no qual habitasse
a paz. Ele diz: “Pois eis que eu crio novos céus e nova terra; e não haverá
lembrança das coisas passadas, jamais haverá memória delas” (Is 65.17).
Evidentemente, as proporções descritas pela passagem são cósmicas, porém,
ainda assim são descritas em termos que a mente humana possa conceber:
Mas vós folgareis e exultareis perpetuamente no que eu crio; porque eis que
crio para Jerusalém alegria e para o seu povo, regozijo. E exultarei por causa
de Jerusalém e me alegrarei no meu povo, e nunca mais se ouvirá nela nem
voz de choro nem de clamor. Não haverá mais nela criança para viver pou
cos dias, nem velho que não cumpra os seus; porque morrer aos cem anos
é morrer ainda jovem, e quem pecar só aos cem anos será amaldiçoado.
Eles edificarão casas e nelas habitarão; plantarão vinhas e comerão o seu
fruto. Não edificarão para que outros habitem; não plantarão para que ou
tros comam; porque a longevidade do meu povo será como a da árvore, e
os meus eleitos desfrutarão de todas as obras das suas próprias mãos. Não
trabalharão debalde, nem terão filhos para a calamidade, porque são a pos
teridade bendita do S e n h o r , e os seus filhos estarão com eles. E será que,
antes que clamem, eu responderei; estando eles ainda falando, eu os ouvi
rei. O lobo e o cordeiro pastarão juntos, e o leão comerá palha como o boi;
pó será a comida da serpente. Não se fará mal nem dano algum em todo o
meu santo monte, diz o S k n h o r ( I s 65.18-25).
pátria celestial (Fp 3.20; Hb 11.16), e sua nação fica no mundo vindouro.
Desse modo, percebemos que todos os elementos escatológicos que confi
guravam a esperança de Israel encontram, em algum grau, cumprimento no
Novo Testamento. Porém, faltam detalhes de todos eles. Nesse ponto, pre
cisamos nos lembrar de um dos conceitos mais importantes da escatologia,
que é a tensão entre o j á e o ainda não. Toda a nossa vida cristã se desenvolve
à luz dessa tensão. De todas as bênçãos conquistadas por Jesus, por um
lado podemos dizer que j á dispomos delas, porém, por outro, que ainda não
totalmente. Assim, j á somos salvos, porém ainda não desfrutamos da salva
ção completa no sentido de ter um novo e perfeito corpo. Do mesmo modo,
j á somos santos (Ef 1.11), porém, ainda não totalmente santificados. Pen
sando em escatologia, de fato todas as promessas de Deus feitas a Israelj á
foram cumpridas na pessoa e na obra de Jesus e da igreja, porém, ainda não
totalmente, porque os planos completos de Deus para a igreja não foram
de todo realizados.
A escatologia do Novo Testamento é construída, portanto, sobre a es
catologia do Antigo Testamento. Por essa razão, livros como o Apocalipse
são em grande parte baseados no Antigo Testamento, e nem sequer podem
ser entendidos sem ele. A escatologia do Novo Testamento não surge do
nada, ela assume a escatologia do Antigo Testamento, entendendo que boa
parte das predições escatológicas antigas já foram cumpridas, porém, olha
para o futuro para a consumação do plano de Deus para o Israel na igreja.
Os últi m o s dias
ministério de cura (Mt 8.16,17; Is 53.4), sua rejeição por parte de seu povo
(Jo 1.11; Is 53.3), sua entrada triunfal em Jerusalém (Mt 21.4-5; Zc 9.9), sua
venda por trinta moedas de prata (Mt 26,15; Zc 11.12), sua crucificação (Jo
19.34; Zc 12.10), suas roupas sendo sorteadas pelos soldados (Mc 15.24; SI
22.18), seu sepultamento no túmulo de um rico (Mt 27.57-60; Is 53.9), sua
ressurreição (At 2.24-32; SI 16.10) e sua ascensão (At 1.9; SI 68.18),9
Porém, há muitas outras evidências de que o Novo Testamento inaugura
os últimos dias. A pregação de Jesus no início do seu ministério (e também
João Batista) já apontava para a instalação dessa nova era, Mateus relata que:
“Passou Jesus a pregar e a dizer: Arrependei-vos, porque está próximo o
reino dos céus” (Mt 4.17). E, do mesmo modo, Marcos relata as palavras de
Jesus: “O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo; arrependei-
vos e crede no evangelho” (Mc 1.15), Devemos pensar que, nos evangelhos,
as expressões “reino dos céus” e “reino de Deus” são sinônimas, Ladd diz
que “a maior parte da escatologia de Jesus, conforme registrada pelos sinódcos,
tem a ver com os acontecimentos relacionados à vinda do Reino de Deus
escatológico”.10 E, de fato, como vimos acima, o estabelecimento do Reino
de Deus era uma das expectativas escatológicas de Israel, Jesus disse que, em
sua pessoa, o Reino de Deus estava sendo estabelecido, e, portanto, o tempo
do fim já estava presente com a sua vinda. Paulo tinha esse mesmo entendi
mento. Ele escreveu aos Gálatas: “Vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus
enviou seu Filho” (G1 4.4). Por “plenitude do tempo” Paulo refere-se ao
momento escatológico que foi a vinda de Jesus. O autor aos Hebreus con
corda com essa idéia, pois diz que Jesus “ao se cumprirem os tempos, se
manifestou uma vez por todas, para aniquilar, pelo sacrifício de si mesmo, o
pecado” (9.26). E Pedro evoca a mesma idéia: “Pelo precioso sangue, como
de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo, conhecido, com
efeito, antes da fundação do mundo, porém manifestado no fim dos tempos,
por amor de vós (IPe 1.19,20). A vinda de Jesus e sua manifestação é a
chegada do “fim dos tempos”. Paulo usa ainda a expressão “fim dos sécu
los” para a era que se iniciou no Novo Testamento. Ele diz: “De nós outros
sobre quem os fins dos séculos têm chegado” (ICo 10.11). João usa outra
expressão para indicar o momento escatológico vivido; ele fala sobre a últi
ma hora: “Filhinhos, já é a última hora; e, como ouvistes que vem o anticris-
to, também, agora, muitos anticristos têm surgido; pelo que conhecemos
que é a última hora” (ljo 2.18). Todas essas expressões apontam para a mes
ma realidade: o caráter de cumprimento escatológico do Novo Testamento
em relação ao plano de Deus fixado no Antigo Testamento. Os últimos dias
começaram com a vinda de Jesus.
556 Razão da esperança
0 últim o dia
O entendimento de que o Novo Testamento já é um cumprimento
escatológico do Antigo Testamento levou alguns estudiosos a falarem
sobre uma “escatologia realizada”. Porém, como diz Hoekema, é preferí
vel falar numa “escatologia inaugurada”," pois ela não está totalmente
realizada. H. Berkhof diz que “o Novo Testamento nada sabe de uma
escatologia futurista ou de uma escatologia realizada, senão de uma esca
tologia em realização”.12 Nesse ponto, é necessário entender que, segun
do o Novo Testamento, “os últimos dias” já começaram, porém nem
tudo está cumprido, ainda falta o “úldmo” desses “últimos dias”. A ex
pressão “ultimo dia” não pode ser encontrada no Antigo Testamento,
pois ela é própria do Novo Testamento. Jesus disse: “E a vontade de
quem me enviou é esta: que nenhum eu perca de todos os que me deu;
pelo contrário, eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6.39). Nessa passa
gem, Jesus une o último dia à ressurreição (ver Jo 11.24). Em outra passa
gem, ele ligou o último dia ao julgamento: “Quem me rejeita e não recebe
as minhas palavras tem quem o julgue; a própria palavra que tenho profe
rido, essa o julgará no último dia” (Jo 12.48). O “último dia” será o último
deste mundo como o conhecemos, mas será o primeiro do mundo por
vir. Sobre este “mundo porvir”, a Bíblia usa expressões como “mundo
vindouro” ou “era vindoura”. Em Efésios, Paulo fala do “século vindou
ro” como um tempo da demonstração do poder e da glória de Deus (Ef
1.21; 2.7). Sobre a “era vindoura”, Jesus diz que somente os “dignos” a
alcançarão (Lc 20.35).
O último dia deve ser entendido ainda em termos de consumação do
que já foi inaugurado. Nesse sentido, Jesus ordenou que seus discípulos
pregassem o evangelho em todo o mundo, garantindo-lhes que estaria
com eles “todos os dias até à consumação do século” (Mt 28.20). Essa
consumação do século é o último dia, o momento em que Deus comple
tará a sua obra. Jesus também descreveu esse momento como uma ceifa:
“A ceifa é a consumação do século, e os ceifeiros são os anjos” (Mt 13.39).
Ele se referia ao momento em que os santos seriam separados dos ímpios
(Mt 24.3).
Podemos resumir essa questão da seguinte maneira:
da por vir, e por isso também diz: o último dia ainda não está chegando; a
era final ainda não chegou.13
0 Espírito escatológico
Espírito”. Por causa disso ele foi justificado, não pode mais ser condenado,
e o preceito da lei já se cumpriu nele (Rm 8.1-4). Daí a sua insistência para
que os crentes vivam uma vida “no Espírito”, uma vez que não são mais
devedores à carne (Rm 8.5-13). No versículo 14, Paulo introduz um detalhe
de máxima importância em termos de escatologia: “Pois todos os que são
guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus”. E ele continua: “Porque
não recebestes o espírito de escravidão, para viverdes, outra vez, atemoriza
dos, mas recebestes o espírito de adoção, baseados no qual clamamos: Aba,
Pai. O próprio Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de
Deus” (Rm 8.15,16). E a habitação do Espírito em nós que configura a
nossa “adoção” como filhos de Deus. E o testemunho interior desse mes
mo Espírito que nos dá a certeza da nossa filiação. Em seguida, Paulo con
tinua de modo lógico: “Ora, se somos filhos, somos também herdeiros,
herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo” (Rm 8.17). Um filho é logi
camente também um herdeiro. A habitação do Espírito em nós faz com
que sejamos herdeiros de Deus. Isso se parece bastante com a idéia de
“selo” e “penhor” que já citamos. Porém, Paulo tem mais coisas a dizer:
“Porque para mim tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente
não podem ser comparados com a glória a ser revelada em nós” (Rm 8.18).
Esse versículo aponta para o fato de que, apesar de sermos herdeiros, ainda
não recebemos a herança, pois ainda vivemos num tempo de sofrimento, e
a glória permanece no futuro. Dos versículos 19-22 ele fala que toda a
criação deseja experimentar essa glória, e que ela não está satisfeita com a
atual situação, e então, continua: “E não somente ela, mas também nós, que
temos as primícias do Espírito, igualmente gememos em nosso íntimo, aguar
dando a adoção de filhos, a redenção do nosso corpo” (Rm 8.23). Digno de
nota nesse versículo é a expressão “primícias”. No Antigo Testamento, ela
significava os primeiros frutos do campo ou dos rebanhos que eram ofere
cidos a Deus (Dt 18.4; 26.2; Nm 10.35-37).15 No seu comentário desse
versículo, Dunn conclui: “Novamente a clara nota escatológica não pode
ser ignorada: a colheita final (Is 27.12; Joel 3.13; Mt 3.12; Lc 3.17; G1 6.8),
iniciada pela ressurreição (ICo 15.20, 23) de Cristo já está a caminho”.16
Ou seja, Jesus ressuscitou dos mortos e a sua ressurreição é reconhecida
como “as primícias” (ICo 15.20). Assim, nós que ainda não ressuscitamos
corporalmente, desfrutamos das primícias porque o Espírito está em nós e
nos dá uma pequena demonstração do que será a vida da ressurreição. Nes
sa vida, ele nos ajuda a vencer o pecado (Rm 8.12), nos auxilia em nossas
fraquezas (Rm 8.26,27), e nos aponta para uma realidade muito superior,
quando a colheita for efetuada. Calvino tem palavras muito edificantes so
Esperança escalológica 559
bre este assunto para os crentes: “Ele deseja que se ergam pela expectativa
da bem-aventurança futura e superem todos os seus atuais sofrimentos,
tendo sua mente posta acima de sua imediata condição, de maneira que não
considerem o que são agora, e, sim, o que serão depois”.17 A habitação do
Espírito no crente é uma realidade escatológica, é o poder do futuro que
irrompeu no presente. E a certeza do futuro que transforma o presente.
Não poderíamos deixar de considerar ainda a questão do elemento
capacitador. Como vimos, o Espírito no Antigo Testamento representava
primordialmente capacitação divina sobre a vida das pessoas. Depois da
ressurreição, Jesus ordenou a seus discípulos: “Eis que envio sobre vós a
promessa de meu Pai; permanecei, pois, na cidade, até que do alto sejais
revestidos de poder” (Lc 24.49). Em Atos, o próprio Lucas descreve outra
vez esse evento, com palavras ainda mais específicas: “Recebereis poder, ao
descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em
Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra” (At
1.8). Este mesmo Espírito é dado a todos aqueles que se convertem e pas
sam a pertencer a Cristo (Rm 8.9). Assim, o poder de Deus para o cumpri
mento da missão divina de expandir o Reino de Deus é concedido a cada
crente. Quando desenvolvemos a nossa missão como igreja, pregando a
Palavra de Deus, batizando ou celebrando a Ceia do Senhor, estamos pro
clamando uma mensagem escatológica e vivendo no presente algo do escaton.
Conclusão
A esperança escatológica é a base da nossa fé. A Bíblia é um livro de
escatologia do início ao fim. Infelizmente, nos dias atuais, a pessoas têm se
esquecido de quão maravilhosa é essa esperança. O secularismo e o materi
alismo que invadiram as igrejas impedem a maioria das pessoas de pensar no
futuro, de ansiar pela libertação final. Estamos estabelecidos demais nesta
terra, a ponto de esquecermos que somos “estrangeiros e peregrinos” aqui
(IPe 2.11). Por outro lado, para muitos a escatologia é realmente apenas um
apêndice no estudo da teologia. E apenas uma tentativa especulativa de olhar
para os eventos do futuro, como se fosse possível “adivinhar” o que vai
acontecer depois. A escatologia bíblica sugere muito mais do que isso. A
esperança do futuro se manifesta poderosamente no presente, de maneira
que o “porvir” já pode ser experimentado, em alguma medida, agora.
43
Imortalidade
dos Exércitos se declara aos meus ouvidos, dizendo: Certamente, esta mal
dade não será perdoada, até que morrais, diz o Senhor, o S enhor dos Exér
citos” (Is 22.14). Essa é a garantia de que as nossas atitudes fazem diferen
ça. Essa é a garantia de que este mundo tem sentido, e a vida não é vazia e
ilusória. Deus declara que não deixará as coisas passarem despercebidas.
Ele é o Senhor do destino, é o justo e final retribuidor, e pode nos encher
de esperança e paz. A justiça existe; ainda que seja uma justiça que pode, no
final, causar dano, ela é melhor do que se não existisse nenhuma. Essas
foram as palavras do Juiz: “Digo-vos que de toda palavra frívola que profe
rirem os homens, dela darão conta no Dia do Juízo” (Mt 12.36). A lei máxi
ma dessa vida é: “Aquilo que o homem semear isso também ceifará” (G1
6.7), ainda que não ceife nesta vida. Só isso pode dar sentido à existência.
F enôm en o universal
Existência co ntin u ad a
O fato de tornarmos a viver, não é, nem mais maravilhoso, nem mais mis
terioso do que o fato de estarmos agora a viver. A verdadeira maravilha
será, antes, o fato de agora existirmos, depois de não termos tido qualquer
espécie de existência durante uma eternidade passada. Muito mais incrível
do que o fato de, existindo atualmente, continuarmos a existir é o de, não
tendo existido, agora existirmos.4
A na logia da natureza
Outro argumento é tirado a partir de uma analogia com a natureza.
Nesta, há um ciclo de morte e renascimento. No outono, as folhas caem e
morrem, mas na primavera elas reaparecem. As mesmas plantas que pareci
am mortas sob o gelo, ressurgem esplendorosamente verdes e floridas.
Quando nos lembramos que a natureza também revela Deus e seus atribu
tos (SI 19.1-4; Rm 1.20), percebemos que essas analogias tiradas da nature
za têm o seu valor. Não estaria Deus, por meio dessa renovação da nature
za, dando uma demonstração ao homem da renovação da vida após a mor
te? Outra idéia que tiramos das coisas naturais, e que nos ajuda a entender
essa questão da continuidade da vida, é a própria concepção científica de
que, na natureza nada se perde, tudo se transforma. Nenhum elemento
desaparece completamente, apenas deixa de existir de uma forma para rea
parecer de outra. Quando queimamos um pedaço de madeira, os elemen
Imortalidade 565
Ordem e pr op ós ito
Berkhof fala ainda do argumento “teleológico”/1A palavra “teleológico”
se refere à questão do “propósito” para a existência das coisas. De modo
geral,o mundo demonstra um senso de organização e propósito. Isso, inclu
sive, é um argumento a favor da existência do próprio Deus, pois a existência
de “metas” ou “objetivos” pressupõe um planejador. O fato é que a vida
humana sempre parece incompleta. As maiores realizações sempre parecem
ficar no meio do caminho. O homem jamais consegue chegar ao ideal de
coisa alguma. A partir disso, pensa-se que a alma não poderia deixar de exis
tir, pois, caso contrário, essas aspirações nunca se completariam, e o propó
sito que parece existir para todas as coisas simplesmente não existiria.
A Escritura e a imortalidade
Os argumentos citados acima são úteis, porém, a prova máxima para o
cristão a respeito da imortalidade é o que a Escritura diz. O Espírito Santo
testemunha no interior de cada crente sobre a veracidade e a confiabilidade
da Escritura, de modo que o crente se sente seguro ao meditar nas promes
sas e no ensino da Bíblia.
Conceito de imortalidade
Como vimos, a imortalidade é uma crença comum da humanidade, e
como diz Berkhof, “esta idéia de imortalidade da alma está em perfeita
566 Razão da esperança
Sinais do fim
As categorias de sinais
Portanto, os sinais dos tempos são indicações divinas para que a vinda
de Jesus não nos pegue de surpresa, Jesus disse:
572 Razão da esperança
Ou seja, Jesus disse a seus discípulos que quando eles vissem certas
coisas acontecerem, deveriam ficar de sobreaviso, porque o Senhor poderia
voltar a qualquer momento. Com relação à expressão de Jesus de que tudo
aconteceria “naquela geração”, muitas dificuldades têm surgido. Aqueles
que se esforçam por achar contradições na Escritura vêem aqui um prato
cheio para as suas especulações, Eles ousam afirmar que Jesus se enganou,
pois pensava que o reino se consumaria logo.1 Por outro lado, MacArthur
e os pré-milenistas não hesitam em afirmar que a palavra “geração” se refe
re ao povo de Israel, assim o povo, ou geração de Israel continuaria existin
do até o fim.2 Essa é uma interpretação confessional, mas parece ser um
tanto quanto artificial. Apesar do fato de Jesus ter anunciado coisas que
extrapolam em muito à destruição do templo, devendo realmente ser con
sideradas próprias de sua segunda vinda, não há razão para não interpretar
o versículo 34 como uma referência à destruição de Jerusalém, que aconte
ceu cerca de quarenta anos depois que ele proferiu essas palavras.3 Esse
evento evocava o maior de todos os eventos, que seria a segunda vinda de
Jesus. A destruição de Jerusalém simbolizava a destruição do mundo. Por
tanto, geração seria uma referência àquela geração.4
Quando consideramos todos os tipos de sinais que estão profetizados
pela Bíblia, podemos organizá-los em três categorias.
De qualquer modo, esse sinal não foi dado para ajudar a datar a vinda de
Jesus, ele funciona muito mais como um incentivo à própria pregação do
evangelho. Quanto mais pregamos o evangelho no mundo, é como se esti
véssemos “apressando” a vinda de Jesus (2Pe 3.12), pois estaremos de
monstrando um desejo intenso de que ele venha, envolvendo a idéia de
diligenciar com zelo, solicitude, urgência, etc. Isso revela uma pressa
prazerosa daquilo que terá de ocorrer. Não é que adiantaremos o dia da
vinda, pois esse dia está marcado por Deus, mas para nós, ele ficará cada
vez mais perto.
Importante também é a eficácia dessa pregação. Jesus diz que ela serve
de testemunho para o mundo. No contexto, Jesus estava falando sobre apos
tasia, portanto, isso nos leva a crer que essa pregação talvez não redunde
em grandes efeitos, no sentido de conversões em massa. De qualquer ma
neira, ela servirá de testemunho para o mundo, pois deixará as pessoas
rebeldes ainda mais indesculpáveis.
O outro grande sinal da graça de Deus como evidenciando o fim dos
tempos é a restauração de Israel, Paulo trata disso nos capítulos 9-11 de
Romanos. A passagem central para a discussão é Romanos 11.25,26: “Por
que não quero, irmãos, que ignoreis este mistério (para que não sejais pre
sumidos em vós mesmos): que veio endurecimento em parte a Israel, até
que haja entrado a plenitude dos gentios. E, assim, todo o Israel será salvo,
como está escrito: Virá de Sião o Libertador e ele apartará de Jacó as impi
edades”, Por causa dessa promessa e de muitas outras do Antigo Testa
mento, muitos esperam um momento final em que a nação de Israel se
converterá totalmente a Cristo. Os defensores de uma corrente teológica
chamada dispensacionalismo acreditam que, depois da vinda de Cristo e o
arrebatamento da igreja, Deus voltará a sua atenção novamente para Israel.
O povo de Israel, naquele momento, se converterá a Cristo que reinará de
Jerusalém sobre o mundo durante mil anos, Há muitos outros estudiosos
que, embora não sejam dispensacionalistas, aguardam que Deus conceda
uma chance futura para a nação de Israel. Antes de qualquer coisa, é evi
dente que Deus pode conceder uma chance especial a Israel se ele quiser,
porém, entendemos que Paulo não está falando sobre isso em Romanos 11.
Desde o capítulo 9, Paulo está tentando explicar por que nem todos os
israelitas se converteram a Cristo. Parecia estranho aos estrangeiros que se
converteram, o fato de os judeus permanecerem em oposição ao Senhor
Jesus. A resposta de Paulo é: “E não pensemos que a palavra de Deus haja
falhado, porque nem todos os de Israel são, de fato, israelitas; nem por
serem descendentes de Abraão são todos seus filhos” (Rm 9.6,7). Paulo
57 4 R azão da esperança
parte, até que haja entrado a plenitude dos gentios, e assim, todo Israel será
salvo (Rm 11,25,26). A melhor maneira de entender isso é que todo o Is
rael, no sentido de todos os eleitos de Israel serão salvos no fim. Esse “no
fim” não significa depois que os gentios se converterem. Paulo não diz que
os gentios se converterão e depois todo o Israel será salvo, mas que Deus
endureceu Israel para que os gentios fossem enxertados “e assim”, ou seja,
dessa maneira, todo Israel será salvo, Seria estranho pensar que Deus con
cedesse uma chance especial exclusiva para os habitantes de Israel que esti
verem vivos na vinda de Jesus, em detrimento de todos os demais que vive
ram antes. Do mesmo modo, não parece justo identificar apenas os israeli
tas vivos na vinda de Jesus como sendo “todo o Israel”. Eles serão apenas
um fragmento do Israel de Deus. Além disso, se Deus juntará a plenitude
dos gentios durante todo esse tempo, por que a plenitude de Israel não
pode seguir paralela? Parece melhor, portanto, entender que “todo o Is
rael” significa não todos os descendentes físicos de Israel que estarão vivos
na vinda de Jesus, mas todos os eleitos de Israel em todos os tempos. E a
soma de todos os remanescentes de Israel.
A responsabilidade de vigiar
Como dissemos, Jesus não apontou sinais para assustar, e sim para que
estivéssemos preparados. No livro de Mateus, temos o registro de várias
parábolas que Jesus contou no final de seu sermão escatológico, que nos
ajudam a entender a necessidade de olhar para os sinais e ficar vigilantes.
Ele diz que dois poderão estar juntos no campo, mas um ser levado por
Deus e o outro abandonado (Mt 24.40). Também duas mulheres poderão
estar juntas moendo e só uma ser levada (Mt 24.41). Proximidade física não
adiantará nada naquele dia, é preciso vigilância. Como ninguém sabe em
qual dia o Senhor vem, todos devem vigiar (Mt 24.42), como um pai de
família que não sabe quando o ladrão vem, e, portanto, deve estar sempre
de prontidão (Mt 24.43).
Em seguida, Jesus contou duas parábolas para ilustrar ainda mais a ne
cessidade de vigilância. Ele falou do servo que, pensando que o seu senhor
demoraria, começou a se aproveitar da situação. Porém, quando ele menos
esperasse, o senhor viria e o puniria (Mt 24.45-51). E fala também das
virgens que esperavam o noivo. Cinco delas levaram azeite suficiente para
as lâmpadas e cinco não. As cinco que levaram puderam entrar na festa das
bodas, mas as cinco que não levaram ficaram de fora (Mt 25.1-12). E Jesus
arremata: “Vigiai, pois, porque não sabeis o dia nem a hora” (Mt 25.13).
Um outro aspecto importante que Jesus enfatizou em relação a estar
preparado para a sua vinda, foi a necessidade de administrar responsavel
mente os bens concedidos por ele (Mt 25.14-30). Jesus contou a parábola
Sinais do fim 579
A vinda do inimigo
<lw r''l5lP
A co n s u m a ç ã o do m al
Paulo explicou: “Irmãos, no que diz respeito à vinda de nosso Senhor
Jesus Cristo e à nossa reunião com ele, nós vos exortamos a que não vos
demovais da vossa mente, com facilidade, nem vos perturbeis, quer por
espírito, quer por palavra, quer por epístola, como se procedesse de nós,
supondo tenha chegado o Dia do Senhor. Ninguém, de nenhum modo, vos
engane, porque isto não acontecerá sem que primeiro venha a apostasia e
seja revelado o homem da iniqüidade, o filho da perdição” (2Ts 2.1-3). A
manifestação desse inimigo de Deus é a consumação da apostasia que ca
racterizará os dias que antecederão a volta de Jesus. A grande tribulação que
redundará em extrema perseguição aos cristãos dará vazão à apostasia, pois
os crentes nominais e mesmo aqueles que por interesse pessoal se infiltraram
na igreja de Cristo, abandonarão a fé que professaram. Estes certamente
seguirão o Anticristo, recebendo a marca do seu nome. Nesse tempo, have
rá necessidade de perseverança como nunca houve, pois o homem da ini
qüidade, segundo Paulo, “se opõe e se levanta contra tudo que se chama
Deus ou é objeto de culto, a ponto de assentar-se no santuário de Deus,
ostentando-se como se fosse o próprio Deus” (2Ts 2.4). Ele não só perse
gue os seguidores de Deus, como se fará passar por Deus. Nesse sentido,
ele é Anticristo, pois “anti” pode significar tanto algo contrário, como con
corrente. Desde os dias do apóstolo Paulo, o mundo já vem sendo prepara
do pelas forças malignas, para a manifestação do grande inimigo do povo
de Deus. Paulo já dizia: “Com efeito, o mistério da iniqüidade já opera e
aguarda somente que seja afastado aquele que agora o detém; então, será,
de fato, revelado o iníquo, a quem o Senhor Jesus matará com o sopro de
sua boca e o destruirá pela manifestação de sua vinda” (2Ts 2.7,8). O que
detém o inimigo provavelmente seja a pregação do Evangelho, pois o pró
prio Jesus disse que o Evangelho precisava ser pregado em todo o mundo
antes do fim (Mt 24.14). Paulo descreve ainda que o inimigo terá à sua
disposição todo o poder do diabo para enganar as pessoas:
A primeira besta
A se g u n d a besta
A segunda besta, que surge da terra, é uma imitação do Cordeiro de
Deus (Ap 13.11-18). Em tudo ela se parece com algo bom, mas intimamen
te é um agente do diabo, Portanto, a segunda besta é a mentira de Satanás
com aparência de verdade (2Co 11.14). Ela simboliza todos os falsos profe
A vinda do inimigo 585
tas em cada nova época que a igreja vive. Eles vêm disfarçados como ove
lhas, mas interiormente são lobos vorazes (Mt 7.15). Cristo disse: “Levan-
tar-se-ão muitos falsos profetas e enganarão a muitos” (Mt 24.11). A segun
da besta é a falsa religião que, de mãos dadas com o Estado, desvia as
pessoas do Deus verdadeiro. As duas bestas trabalham em perfeita coope
ração, e serão os dois grandes instrumentos do dragão. Elas são a sustenta
ção do ministério maligno do “homem da iniqüidade”. Por meio do poder
político e da religião, o Anticristo vai controlar toda a terra. Elas estão
unidas e, em alguns casos, até aparentemente uma contra a outra, mas o
objetivo é sempre o mesmo: enganar. Isso já acontecia nos dias de João. O
sacerdote pagão defendia e dava seu apoio ao poder secular do Estado na
sua perseguição aos crentes. Os sacerdotes defendiam que “César era Se
nhor”, e recorriam até mesmo a embustes e pseudomilagres para enganar
as pessoas, a fim de que adorassem a estátua do Imperador.4 Porém, sejam
falsos ou verdadeiros os sinais, a intenção é a mesma: “Enganar, se possí
vel, os próprios eleitos” (Mt 24.24).
0 n ú m e r o da besta
des são dirigidas para a besta e não para Deus, N ão é preciso que seja um a
m arca literal, assim com o a m arca do batism o tam bém não é literal. U m a
m arca literal seria fácil de ser identificada e talvez não surpreendesse nin
guém. E p ro vável que a m arca da besta seja m uito mais discreta e sutil, N o
nosso entendim ento, a m arca da besta em toda a H istória é o secularism o e
a falsa religião que dom inam a vida das pessoas. O u seja, é o m undo com o
ele é. A pessoa que tem a m arca da besta é um filho deste m undo, que vive
de acordo com o padrão, ou a fo rm a deste m undo (Rm 12.2), Essa pessoa
está contente com a sua m aneira m undana de viver. Q uanto ao significado
do núm ero 6 6 6 , to d o tipo de cálculo ou estatística se to rna totalm ente in
fundado. Jam ais poderem os decifrá-lo, pois talvez, ele não deva ser real
m ente decifrado. A única consideração que podem os fazer é que seis é
núm ero de hom em , ou seja, representa o hom em decaído. E interessante
que o h om em tenha sido criado no sexto dia. E possível que os cristãos
prim itivos tivessem alguma referência que os ligasse mais diretam ente aos
fatos, m as para nós, isto é algo com pletam ente inacessível. E p o r que o fato
de alguém não possuir este núm ero o im pede de com prar ou ven d er algu
m a coisa? A n tes de resp on der a essa pergunta, é preciso o b servar que o
texto não diz que o crente não poderá desenvolver nenhum m eio de sobre
vivência. Será que não será possível nem m esm o plantar e colher? E fazer
negócios de com pra e vend a entre os p róprios crentes?
Possivelm ente todas essas perguntas estejam erradas, exatam ente p o r
que seguem a linha errada de raciocínio. Mas a solução pode ser mais sim
ples do que se imagina. O que o texto está querendo dizer é que vai ficar
cada vez mais difícil um crente sobreviver honestam ente neste mundo. Se
ele não faz parte do sistema, se ele não sonega, suborna, usa pesos e m edi
das falsos, e outros m eios ilícitos que todos praticam , pode acabar ficando
sem lucros, pois todos estão fazendo isso. A lé m do mais, se ele se recusa a
fazer trabalhos ilícitos para os patrões, p od e perder o em prego. E tudo vai
p io rar grandem ente nos últim os dias. O crente que quiser perm anecer fiel
terá que se recusar a aceitar a m arca do m undo (Ap 14.9-12).
Porém , além dessas considerações, não devem os descartar a possibilida
de de haver um a m arca física im posta pelo go vern o do Anticristo. A igreja
deve ficar atenta a tudo o que acontecer, P orém , ela não precisa se assustar
com tudo o que circula pela internet ou é escrito em livros, que apontam
para um a m arca visível. Se perm anecerm os na E scritura não serem os enga
nados. Essa é a nossa segurança.
A vinda do inimigo 581
Que m é o Anticristo?
como reis, com a besta, durante uma hora. Têm estes um só pensamento e
oferecem à besta o poder e a autoridade que possuem. Pelejarão eles contra
o Cordeiro, e o Cordeiro os vencerá, pois é o Senhor dos senhores e o Rei
dos reis; vencerão também os chamados, eleitos e fiéis que se acham com
ele”. Os dez reis simbolizam todos os reis que se aliarão à besta e ao Anti-
cristo para lutar contra o Cordeiro, mas serão derrotados. O mundo estará
do lado do Anticristo, e perderá com ele. A derrota acontecerá na batalha
do Armagedom.
A batalha do A rm a ged o m
O Anticristo usará toda a sua força para perseguir os santos de Deus.
Ele é a consumação do mal e tentará, de todas as maneiras, destruir o povo
de Deus. Ele usará de todos os métodos para fazê-los negar o seu Senhor.
Quando ele se manifestar, será o tempo de provação mais tenebroso que a
igreja já enfrentou em todas as eras. O tempo da perseguição é limitado, e
até mesmo “abreviado”, pois Jesus disse: “Nesse tempo haverá grande tri
bulação, como desde o princípio do mundo até agora não tem havido e
nem haverá jamais. Não tivessem aqueles dias sido abreviados, ninguém
seria salvo; mas, por causa dos escolhidos, tais dias serão abreviados” (Mt
24.21,22). O que abreviará esses dias será a própria vinda do Senhor Jesus.
No momento da sua vinda, ele destruirá o iníquo com o sopro de sua boca
e pela manifestação da sua vinda (2Ts 2.8).
Segundo o Apocalipse, o Anticristo será destruído na batalha do Arma
gedom. A palavra “Armagedom” vem do livro de Juizes capítulos 4 e 5.
Naquele tempo, o povo de Deus era pequeno diante dos inimigos, mas na
batalha que ocorreu no monte do Megido, os inimigos de Israel foram
derrotados. Portanto, o Armagedom é o símbolo de todas as batalhas nas
quais os crentes são inferiores aos seus inimigos, mas recebem livramento
do Senhor. Quando o seu povo é oprimido, Deus intervém para libertá-lo
e derrotar os inimigos. A maior dessas batalhas acontecerá no momento da
vinda de Cristo. Quando o seu povo estiver experimentando o auge da
perseguição, o Senhor descerá do céu para livrá-los (Ex 3.7,8). Apocalipse
16.12-16 descreve um ajuntamento de reis e de exércitos sob a liderança do
Anticristo. Eles se reúnem para lutar contra o Senhor, e se ajuntam no lugar
chamado Armagedom. A batalha do Armagedom é mais bem descrita em
Apocalipse 19.11-21 e 20.7-15. No capítulo 19, João vê o céu aberto e o
Senhor Jesus montado no cavalo branco descendo, seguido de todos os
A vinda do inimigo 589
exércitos celestes (Ap 19.11-14). Um anjo chama as aves dos céus para um
banquete (Ap 19,17,18). Na terra, o Anticristo e seus aliados estão congre
gados, esperando pela batalha (Ap 19.19). Entretanto, a batalha é muito
rápida. O inimigo é esmagado sem qualquer esforço da parte do Senhor, O
Anticristo é lançado no lago de fogo, os homens que o seguiram são mor
tos, e as aves tiveram o seu banquete (Ap 19.20,21).
A certeza que temos é que o grande inimigo do povo de Deus, o Anti
cristo, cairá na vinda de Jesus. Porém, durante o tempo que Deus lhe con
ceder para realizar seus planos malignos, ele será praticamente invencível.
A igreja não poderá resistir ao seu poder, pois está escrito que ele terá
poder para lutar contra os santos e os vencer (Ap 13.7). Porém, quando a
situação parecer insustentável para o povo de Deus, de repente se verá um
sinal no céu, e como um relâmpago que sai do Oriente e vai até o Ocidente,
o Senhor voltará com forte clangor de trombeta (Mt 24.27-30). Naquele
momento o Anticristo será aniquilado, sem demora ou resistência; o Se
nhor simplesmente o esmagará, e libertará o seu povo.
A última tentativa do m al
Uma das questões que nos propusemos a responder neste estudo diz
respeito à razão pela qual Deus permite a manifestação do Anticristo. Como
já vimos, a Bíblia diz que algo o impede de se manifestar. Paulo explicou:
“Com efeito, o mistério da iniqüidade já opera e aguarda somente que seja
afastado aquele que agora o detém; então, será, de fato, revelado o iníquo, a
quem o Senhor Jesus matará com o sopro de sua boca e o destruirá pela
manifestação de sua vinda” (2Ts 2.7,8). O “mistério da iniqüidade” que já
opera, refere-se ao movimento do mal no mundo. São os planos do malig
no, os quais ele vem executando desde o início da criação, numa tentativa
insana de vencer a batalha contra Deus. São planos misteriosos ou secretos,
pois os homens não têm acesso a eles, O inimigo age na espreita, oculto nas
trevas, espalhando a sua influência nefasta por toda a humanidade. Ele es
craviza os poderosos e os miseráveis, faz com que todos sigam o curso do
mundo que ele mesmo estabeleceu (Ef 2.2). Porém, apesar de todo o mal
que ele provoca, o fato é que ele não provoca toda o mal que poderia provo
car. E a razão disso é que algo o impede de agir livremente.6 E nesse senti
do que os amilenistas entendem o aprisionamento de Satanás em Apocalip
se 20.1-3. E também as próprias palavras de Jesus sobre a sua atividade de
“amarrar o valente” (Mc 3.27). Deus não tem deixado o inimigo agir livre
590 Razão da esperança
m ente no m undo, mas parece que pouco tem po antes da vin da de Jesus, ele
finalm ente terá oportunidade para isso. A vinda do A n ticristo consum ará
todas as atividades malignas neste mundo. Será, num sentido, a últim a e a
m aior m anifestação do mal. D eus perm itirá que esse inim igo finalm ente se
m anifeste, num a espécie de encarnação maligna, para que fique bem claro
que D eus é soberano. Essa m anifestação do inimigo, em vez de destruir os
planos de D eus, na verdade segue os planos de Deus. E está nesses planos
que ele seja destruído no m om ento da vinda de Jesus.
C oncluindo, não sabem os quando o A n ticristo se m anifestará, mas bem
pode ser que ele já esteja às portas. Todas essas transform ações mundiais
que têm acontecido no cam po da econom ia, da tecnologia, da política, da
religião e da m oral, sugerem que o m undo está sendo preparado para a
vin da desse hom em . E stritam ente falando, talvez esse seja o único dos si
nais que apontam a vinda de Jesus que ainda não se cum priu. Porém , ao
que tudo indica, não deve estar m uito longe. D evem os ficar atentos, p o
rém , não há m otivos para sobressaltos, nem para atitudes desesperadas.
N ão devem os acreditar em tudo o que a imaginação das pessoas diz sobre
o A n ticristo ou sobre a m arca da besta. C onfiantes em D eus, atentos e
diligentem ente estudando a sua Palavra, devem os viver em paz neste m un
do, pois o S en hor não perm itirá que sejam os tentados além das nossas
forças (1 C o 13 .13).
46
Parece que o Cristianismo dos dias atuais não se interessa muito pela
volta do Senhor. Antigamente, a igreja tinha uma expectativa pela vinda
gloriosa do Senhor Jesus. Os hinos, os corinhos e a pregação daqueles dias
eram permeados por expressões que apontavam para a vinda do Senhor
em poder e grande glória. Por que será que o Cristianismo de hoje pratica
mente não se interessa mais pela vinda de Jesus? Pela mesma razão por que
não se importa muito com o céu. Antigamente, a pregação do evangelho
dizia mais ou menos o seguinte: creia em Jesus e você será livre do inferno
e poderá ir para o céu. Mas a pregação de hoje diz: aceite Jesus e você será
próspero, não terá mais doenças, e Deus fará todo tipo de milagres para
você. O foco de antigamente era o céu, o de hoje é a terra. Antigamente,
Deus livrava do inferno, hoje livra do fracasso, da falência, da enfermidade,
etc. Em meio a isso tudo, a segunda vinda de Jesus tem perdido o interesse.
A Bíblia descreve a segunda vinda como a grande libertação dos cris
tãos. Em meio à tribulação e à perseguição, o Senhor voltará para livrar o
seu povo dos seus inimigos e de todo o sofrimento e mal que este mundo
oferece. Mas, hoje se diz que, quando alguém se converte, poderá ter uma
boa casa, carros, um bom emprego, casa na praia, etc. Hoje se diz que
quando alguém se converte, não terá mais problemas de saúde, nem fami
liar ou emocional. Sofrimento e mal eram palavras comuns dos cristãos da
igreja primitiva, mas não são palavras da igreja do século 21. E, por isso, a
pregação de hoje não tem mais espaço para a segunda vinda de Cristo, e,
por essa razão, boa parte dos cristãos vive como se Jesus não fosse voltar.
Para os cristãos autênticos, entretanto, o evento mais esperado continua
sendo a segunda vinda de Jesus. O cristão verdadeiro sabe que este mundo
sempre será um lugar traiçoeiro e perigoso para alguém que deseja ser fiel;
por essa razão, a glória dos reinos deste mundo já não brilha tanto aos seus
olhos (Mt 4.8,9). Não que o crente seja alguém que não goste desta vida.
Esta vida é um dom de Deus, e um crente experimenta alegria verdadeira
aqui (sempre - Fp 4.4,11), mas o cristão verdadeiro sabe que momentos de
calmaria logo podem virar tempestades, e, por isso, a sua esperança maior
592 Razão da esperança
A g r a n d e tribulação
Jesus disse que os últimos dias seriam tempos de grande tribulação. Há
um sentido em que a tribulação marca todos os períodos da igreja, Sempre
há provações, perseguições e dificuldades a serem vencidas pelos crentes,
porém, o Senhor falou de uma “grande tribulação” em Mateus 24.21,22:
“Porque nesse tempo haverá grande tribulação, como desde o princípio do
mundo até agora não tem havido e nem haverá jamais. Não tivessem aqueles
dias sido abreviados, ninguém seria salvo; mas, por causa dos escolhidos, tais
dias serão abreviados”. A tribulação que Jesus descreve é extraordinária, pois
a sua intensidade é superior a todos os outros momentos de tribulação na
História. Ao mesmo tempo, a tribulação é abreviada, ou seja, interrompida,
O que interrompe essa tribulação? A vinda de Cristo para resgatar seu povo.
Alguns estudiosos pré-milenistas acreditam que a igreja será arrebatada
antes da tribulação. Segundo esse entendimento, Jesus virá nas nuvens e
arrebatará a sua igreja. Depois do arrebatamento da igreja, haverá sete anos
de tribulação na terra, que são identificados com a septuagésima semana de
Daniel (Dn 9.27). Durante esses sete anos, Deus permitirá o aparecimento
do Anticristo e todo tipo de perseguição aos cristãos nominais e à nação de
Israel. Também haverá juízos terríveis sobre os habitantes da terra, inclusi
ve a parte não-salva da igreja. Depois dos sete anos, o Senhor voltará com
a sua igreja, Israel se converterá e Deus estabelecerá o milênio,1 O maior
argumento contra essa idéia é o simples fato de que as passagens da Escri
tura que descrevem a tribulação não dizem que a igreja será livre dela. Como
já vimos, quando Jesus anunciou a grande tribulação, disse que ela seria
abreviada por causa dos eleitos. Então, certamente eles estarão no meio
dela. Paulo diz aos crentes de Tessalônica que eles não deveriam esperar a
vinda de Jesus antes do aparecimento do Anticristo (lTs 2.1-3). De que
adiantaria Paulo lhes avisar sobre isso, se não houvesse possibilidade de
eles estarem na terra quando o Anticristo aparecesse? Na verdade, a tribu
lação existirá por causa da igreja. Por que haveria tribulação para incrédulos
A Segunda Vinda de Cristo 593
cular ou privada, a sua vinda será totalmente pública, de modo que todo
olho o verá (Ap 1.7).
A Bíblia descreve a vinda do Senhor como um evento único, mas mui
tos crentes têm imaginado que haverá mais de uma vinda do Senhor. Como
já dissemos, especialmente aqueles que crêem na existência literal do milê
nio (pré-tribulacionistas), pensam em mais de uma vinda. Segundo estes, a
primeira vinda do Senhor será para o seu povo. Depois de sete anos, ele virá
com o seu povo para a batalha contra os ímpios e o estabelecimento do
Reino, Alguns chegam a dizer que, no fim do milênio, haverá outra vinda
do Senhor para destruir o diabo.3 A Bíblia, porém fala de uma única vinda
de Cristo, a qual será visível a todas as pessoas (Ap 1.7). Essa vinda será
tanto para os seus santos como com seus santos, porém, num único evento.
Ele vem para seus santos, pois vem resgatá-los da tribulação. Porém, ele
também vem com os seus santos (lTs 3,13), porque, conforme Paulo diz em
ITessaloniscenses 4.14, o Senhor trará os que dormem com ele na sua vin
da. Então, isso significa que Jesus trará com ele aqueles que tiverem morrido
e os fará ressuscitar no momento do arrebatamento. Por essa razão, Paulo
disse que os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro (lTs 4.13-17),
Acima de tudo, é preciso destacar que a segunda vinda de Jesus será uma
vinda em glória e poder. Quando aqui esteve pela primeira vez, Jesus foi o humil
de carpinteiro de Nazaré que sofreu pelos pecados dos homens. Na segunda
vinda, como ele próprio disse, retornará “sobre as nuvens do céu com poder e
muita glória” (Mt 24.30). João anteviu profeticamente essa volta. Uma de suas
descrições mais impressionantes está no capítulo 19 de Apocalipse. Ele diz:
A colheita e a vin d i m a
No capítulo 14 de Apocalipse há outra descrição do arrebatamento. A
partir do versículo 13, começa a descrição de uma colheita. Primeiro, os
mortos sobem à presença de Deus acompanhados de suas obras. Depois
há a visão da ceifa. O próprio Senhor Jesus recolhe os seus escolhidos que
A Segunda Vinda de Cristo 597
são guardados no seu celeiro (Ap 14.14-16; ver Mt 3.12). Trata-se de mais
uma descrição do arrebatamento. Simbolicamente, Deus recolhe o seu povo
como trigo para o celeiro. E, por fim, vem a vindima (Ap 14.17-20). Isso se
refere à destruição dos ímpios. As uvas serão esmagadas no lagar da ira de
Deus. E a consumação de todos os indescritíveis flagelos que cairão sobre
o mundo ímpio, mas a igreja já partiu, a noiva já está segura nos braços do
seu esposo.
As bodas do Cordeiro
No capítulo 19, novamente o Apocalipse descreve o arrebatamento. Um
coro de “Aleluias” anuncia que chegaram as bodas do Cordeiro (Ap 19.1-
9). Para entender bem o que isso significa, é necessário um pouco de co
nhecimento a respeito do sistema de casamento judaico,4 Primeiro vinham
os esponsais. Era o contrato de casamento propriamente dito. A partir desse
dia, o noivo e a noiva eram legalmente marido e mulher, porém ainda não
viviam juntos. Depois, vinha o intervalo. Nesse período, o noivo pagava ao
pai da noiva o dote dela, se ainda não tivesse feito isso. Então, vinha a
procissão, que era quando a noiva se preparava para o noivo, vestindo-se da
melhor maneira. Também o noivo se preparava para a noiva. O noivo ia até
o lar da noiva, a recebia e a conduzia até o novo lar, ou ao lar dos pais dele.
Por fim, chegavam as bodas, que incluía a ceia nupcial. Cristo desposou a
igreja, ela é sua noiva. O dote ele pagou com o seu próprio sangue. O inter
valo foi o período entre a primeira e a segunda vinda, Agora chegou a hora
das bodas, ou seja, do momento do encontro. Ele vem buscar a sua noiva,
O g r a n d e en con tro
A passagem da Escritura que descreve o arrebatamento de modo mais
claro é ITessalonicenses 4.13-17. Paulo está falando sobre a situação dos
mortos em Cristo. Alguns pensam que eles estão perdidos, mas Paulo afir
ma que não, pois Deus, no dia da vinda de Cristo, “primeiro” ressuscitará
os mortos em Cristo, Devemos observar que não se trata de uma ressurrei
ção antes da ressurreição dos ímpios. Os ímpios nem são citados nessa
passagem, mas a palavra “primeiro” é colocada aí por causa da situação dos
crentes que estiverem vivos na segunda vinda. Paulo diz que os mortos em
Cristo ressuscitarão primeiro e, então, nós seremos arrebatados juntamente
com eles, para encontrar o Senhor nos ares. Quando Paulo descreve esse
“encontro nos ares”, ele usa a linguagem da sua época que descreve o en-
598 Razão da esperança
0 Reino milenar
Correntes milenistas
Há basicamente quatro posições em relação ao milênio. São elas: o
Amilenismo, o Pós-Milenismo, o Pré-Milenismo Histórico e o Pré-Milenismo
Dispensacionalista. O termo “amilenismo”, como diz Hoekema, “não é muito
feliz”,1 porque sugere que não existe um milênio. Os amilenistas acreditam
no milênio de Apocalipse 20, porém não acham que ele diga respeito a um
reino de mil anos literais que Cristo estabelecerá na terra depois da sua vin
da. O amilenismo entende que o milênio de Apocalipse 20 já está em ativida
de neste momento, pois começou com a primeira vinda de Jesus e terminará
na segunda vinda com a instauração dos novos céus e nova terra. Por isso,
para o amilenismo, o milênio não é literal, mas espiritual. O pós-Milenismo
600 Razão da esperança
defende que o milênio também antecede a segunda vinda, porém, acha que
será um tempo de prosperidade e paz advinda da pregação do evangelho em
todo o mundo. Para o pós-milenismo, o mundo se tornará gradativamente
um lugár muito bom, onde o mal será reduzido ao mínimo e as nações coo
perarão entre si, cristianizando o mundo todo. No final dessa era gloriosa,
Satanás será solto, e então, Jesus voltará e o destruirá. O pré-milenismo his
tórico interpreta literalmente a passagem de Apocalipse 20.1-10, e entende
que o milênio será estabelecido na segunda vinda de Jesus, e será um reino
de mil anos sobre a terra, onde o Senhor regerá as nações com cetro de
ferro, minimizará o mal existente e estabelecerá uma era de ouro, reinando a
partir de Jerusalém. Ao final do milênio, Satanás será solto e convencerá as
nações a fazerem guerra contra Jerusalém. Então, descerá fogo do céu e
consumirá as nações rebeldes. Em seguida, o Senhor estabelecerá o juízo e o
tempo eterno. O pré-milenismo dispensacionalista se parece com o pré-
milenismo histórico em sua expectativa por um milênio futuro e literal, po
rém difere dele quanto a detalhes específicos. O dispensacionalismo distin
gue pelo menos duas vindas de Jesus, a primeira para o arrebatamento dos
salvos, e a segunda depois de sete anos de tribulação para o estabelecimento
do milênio. No dispensacionalismo há um tratamento diferente entre a igre
ja e Israel. Mesmo no milênio, esses dois grupos serão distinguidos. O dis
pensacionalismo entende que a igreja é uma espécie de parêntesis na história
de Deus com Israel. Na primeira vinda de Jesus, o evangelho foi oferecido
aos judeus, mas como eles o rejeitaram, Deus o ofereceu aos gentios e for
mou a igreja, porém no fim, ele voltará a tratar com Israel. Uma das caracte
rísticas principais do pré-milenismo, seja histórico ou dispensacionalista é a
interpretação literal das passagens do Antigo Testamento sobre a restaura
ção de Israel, e também do livro do Apocalipse.
O seguinte quadro nos ajuda a entender as diferenças entre esses quatro
sistemas:2
Amilenismo Pós Pré-M. Pré-M.
Milenismo Histórico Dispens.
Segunda Vinda Evento Evento Arrebatamen Segunda vinda
simples, simples, to e segunda em duas fases.
nenhuma nenhuma vinda simultâ Cristo retorna
distinção entre distinção entre neos. Cristo para buscar a
arrebatamento arrebatamento retorna para sua igreja e
e segunda e segunda estabelecer o para estabele
vinda. Inicio vinda. Início Milênio. cer o Milênio
do Estado do Estado depois de sete
Eterno. Eterno. anos.
0 reino m ilenar 601
0 ap risiona m en to de Satanás
A passagem de Apocalipse 20.1-3 descreve o aprisionamento de Sata
nás. Ela diz: “Então, vi descer do céu um anjo; tinha na mão a chave do
abismo e uma grande corrente. Ele segurou o dragão, a antiga serpente,
que é o diabo, Satanás, e o prendeu por mil anos; lançou-o no abismo,
fechou-o e pôs selo sobre ele, para que não mais enganasse as nações até se
completarem os mil anos. Depois disto, é necessário que ele seja solto
pouco tempo”. Devemos lembrar que isso foi escrito para os cristãos do
século Io. Nesse tempo, em que os cristãos morriam diariamente nos cir
cos e nos anfiteatros romanos, parecia realmente que Satanás estava ven
cendo, mas João escreve para mostrar os cristãos que a situação não era o
que parecia ser.
0 va lenle a m a r r a d o 3
Sequência n ã o - cr o n o ló g i ca
como se João contasse a mesma história pelo menos sete vezes, porém, a
cada vez, acrescentasse detalhes que não constavam nas descrições anteri
ores. E somente no último ciclo, ou seja, quando ele reconta a história pela
última vez, que ela fica completa. A divisão que Hendriksen propõe é a
seguinte: Primeira Seção: “Cristo no meio dos sete candeeiros” (Ap 1-3);
Segunda Seção: “A Visão do céu e dos Sete Selos” (Ap 4-7); Terceira Se
ção: “As Sete Trombetas” (Ap 8-11); Quarta Seção: “O Dragão Persegui
dor” (Ap 12-14); Quinta Seção: “As Sete Taças” (Ap 15-16); Sexta Seção:
“A queda da Babilônia” (Ap 17-19); Sétima Seção: “A Grande Consuma
ção” (Ap 20-22).6 De fato, no capítulo 20 se inicia uma nova seção que vai
descrever outra vez a dispensação cristã como um todo, desde a primeira
vinda de Jesus até a sua segunda vinda e o juízo final, como fizeram todas
as seis seções ou ciclos anteriores. Repare que a segunda vinda de Cristo e
o julgamento do mundo haviam sido anunciados em todas as seis seções
anteriores. Veja como o sexto selo na segunda seção descreve o fim do
mundo em cores vívidas (6.12-17). Do mesmo modo, na sétima trombeta
da terceira seção, a consumação de todas as coisas é claramente descrita
(11.15-19). E esse acontecimento é também descrito em 14.14-20 no final
da quarta seção, com o acréscimo de detalhes de como será a separação
entre os crentes e os ímpios. Observe que nessa passagem os crentes são
ceifados e recolhidos ao celeiro, enquanto os ímpios são pisados como se
fossem uvas. Assim também o sétimo flagelo da quinta seção descreve o
fim de tudo, mas aqui é pela primeira vez descrita uma batalha antes do
fim, a batalha do Armagedom (16.12-21). Porém, a explicação mais clara
dessa batalha está no final da sexta seção, em que o cavaleiro montado no
cavalo branco desce para destruir os exércitos do diabo e dos seus aliados.
Portanto, João está recontando pela sétima e última vez como acontecerá a
derrota do mal.
E muito difícil que Apocalipse 20 seja uma descrição do que acontece
depois de Apocalipse 19, pois no capítulo 19 já aconteceu a consumação.
Os ímpios foram vindimados na batalha do Armagedom e os homens re
beldes foram mortos (19,21). No capítulo 20, a história é recontada a fim
de explicar como será destruído o último inimigo - Satanás —, e assim,
todos os detalhes se completam. Em defesa dessa posição, Hendriksen
mostra o paralelo que há entre os capítulos 11-14 e 20-22.7
606 Razão da esperança
Apocalipse 11 a 14 Apocalipse 20
12.5-12. Em conexão com o nas 20.1-3. Satanás é atado e lançado no
cimento, morte ascensão e coro abismo; seu poder sobre as nações
ação de Cristo, Satanás é lançado é reprimido. Ao invés de as nações
do céu. Suas acusações perderam conquistarem a igreja, esta é que co
toda aparência de verdade. meça a conquistar as nações.
14.2-6; 12.14-18. Um longo perío 20.2. Um longo período de poder
do de poder e constante testemu exercido pela igreja. Satanás tem
nho por parte da igreja, que é sus estado amarrado. Ele permanece
tentada “longe da face da serpente”. amarrado por mil anos, ou seja, a
A influência do diabo é restringida. dispensação cristã inteira.
11.7-14; 13.7. Um período muito 20.7-10. Um período muito curto
curto da mais severa perseguição. da mais severa perseguição: Sata
Este é o pouco tempo de Satanás: nás dirige o exército de Gogue e
a mais terrível e também a final ma Magogue contra a igreja. Esta é a
nifestação do poder perseguidor do Batalha do Armagedom.
Anticristo.
Os santos reinam
Em seguida, Apocalipse 20.4-6 narra um reinado milenar. Aqueles que
seguem uma abordagem cronológica do capítulo 20, dizem que todos esses
acontecimentos seguem o 19. Então, na segunda vinda de Jesus, Satanás
seria preso, e, em seguida, haveria a primeira ressurreição e os crentes reina
riam com Cristo por mil anos na terra. Depois desses mil anos, haveria a
segunda ressurreição somente dos ímpios para o juízo. Nossa dificuldade
com esta interpretação já foi descrita acima. Não cremos que o capítulo 20
seja uma seqüência do 19, mas que ele dá início a um novo ciclo. Vimos que
a derrota e a prisão de Satanás já aconteceram na primeira vinda de Jesus.
Tronos n o céu
com Cristo na terra, mas “almas” (Ap 20.4). Ele diz que viu tronos e, sen
tados nesses tronos, aqueles que têm a autoridade para julgar. Quem se
assenta nesses tronos? São as almas que João viu. O texto grego não con
tém a expressão “vi ainda”, como se se tratasse de um grupo diferente
daquele que está assentado nos tronos. Diz simplesmente: “E as almas dos
decapitados por causa do testemunho de Jesus e da Palavra de Deus, tantos
quantos não adoraram a besta, nem tampouco a sua imagem, e não recebe
ram a marca na fronte e na mão; e viveram e reinaram com Cristo durante
os mil anos” (Ap 20.4). Observe que essas almas estão “vivendo” com
Cristo e reinando por mil anos. A expressão “e viveram” (no grego e^esan)
não significa necessariamente “e ressuscitaram”, até porque a palavra grega
“ressuscitaram” é outra (anastásei). A passagem nos diz que as almas dos
que morreram estão “vivendo” e reinando com Cristo por mil anos, que é
o tempo inteiro da dispensação cristã, desde a primeira até a segunda vinda
de Cristo. Além disso, esses tronos certamente devem estar no céu, pois
como diz W J. Grier, “sempre que se faz referência a tronos, no Apocalipse,
quer se trate do de Cristo, quer dos de seu povo, são localizados no céu”.8
(Ver Ap 4.4). E como diz Kistemaker, “o vocabulário de tronos, juízo e
almas representa uma cena celestial”.9 Quando João diz que os restantes
dos mortos não reviveram “até que se completassem os mil anos” e chama
o acontecimento de “viver” de primeira ressurreição, ele não está dizendo
que isso vai acontecer depois do milênio. Aliás, a palavra “reviveram” é a
mesma usada para “viveram” no versículo anterior. O que João quer dizer é
que os mortos sem Cristo continuaram mortos física e espiritualmente e,
depois do milênio, eles vão ressuscitar, mas para entrar na morte eterna.
Portanto, a primeira ressurreição aqui é o “viver” com Cristo no céu. Os
ímpios não vão “viver” com Cristo no céu até o dia da ressurreição final.
Aquele que tem parte na primeira ressurreição (espiritual) vai para o céu, e
não precisa temer a segunda morte que é o lago de fogo. Nem seria preciso
falar algo assim se os cristãos já estivessem com o seu novo corpo aqui na
terra. Em resumo: “Os que pertencem a Cristo morrem uma vez, porém
ressurgem duas vezes (espiritual e fisicamente), enquanto os que o têm
rejeitado ressurgem uma vez, porém morrem duas vezes (física e espiritual
mente)”.10 As pessoas que João viu no céu (decapitados como Paulo e João
Batista) ascenderam espiritualmente ao céu (primeira ressurreição), e res
suscitarão fisicamente na vinda de Jesus. As pessoas que morrem sem Cris
to não vão para o céu (não têm parte na primeira ressurreição), mas ressus
citarão na vinda de Jesus para o grande julgamento.
608 R azão da esperança
A situa çã o do s m or to s
que não morreram, mas ainda estavam vivos quando Cristo retornou”.11
Porém, quando lembramos que João está querendo explicar justamente a
situação dos mártires, toda dificuldade desaparece.
N úm er o s não-lilerais
A últim a batalha
Em Apocalipse 20.7-10 há a descrição da rebelião final, na qual Satanás
reúne as nações para pelejarem contra o Senhor. Que batalha é essa, se no
capítulo 19 os inimigos de Cristo já foram destruídos? Que nações são
essas cujo número é como a areia do mar, se os homens já foram mortos
em Apocalipse 19.21? Na verdade, não são batalhas diferentes, mas duas
610 Razão da esperança
0 c u m p r im en to das profecias do AT
Talvez a maior razão de os pré-milenistas insistirem num reino literal e
terreno de mil anos seja por causa da visão deles das profecias do Antigo
Testamento. Como já dissemos, não há qualquer passagem que fale em mil
anos de reino, mas os pré-milenistas olham para as profecias de Isaías, Eze
quiel, Amós, Zacarias e outros, que falam sobre um futuro glorioso para
Israel, e imaginam que isso acontecerá numa volta futura de Israel das vári
as nações ao redor do mundo, para a terra da promessa. Eles pensam que
isso precisa se cumprir literalmente. Nesse sentido, vêem o retorno de Is
rael para a Palestina, depois da Segunda Guerra Mundial, como um indício
do cumprimento histórico das profecias. A intepretação amilenista entende
que essas profecias se cumpriram literalmente na volta de Israel do cativei
ro da Babilônia, ou se cumprem espiritualmente na igreja que é o Israel no
Novo Testamento, ou ainda se cumprem no novo céu e nova terra. Não há
a necessidade de um reino milenar para que elas se cumpram.
0 reino m ilenar 611
Dificuldades adicionais
Falar num milênio terreno envolve algumas contradições adicionais: Por
que razão, depois de os crentes terem ressuscitado, eles ainda teriam que
viver mil anos numa terra imperfeita? De certo modo, as coisas não seriam
muito diferentes do que são hoje. Somos convertidos e desejamos uma
nova era, porém ainda temos que sofrer com este mundo decaído. Imagine
pessoas já ressuscitadas ainda tendo que viver numa terra decaída. Outra
coisa estranha é a idéia de que haverá pessoas com corpo glorificado viven
do junto com pessoas sem corpo glorificado. Que tipo de relacionamento
poderia existir entre essas pessoas? Umas morrem, outras são eternas. E
como podem as nações se rebelarem contra o Senhor depois do milênio na
soltura de Satanás? Não terá adiantado nada os mil anos de prosperidade
do Senhor na terra? Finalmente, é muito estranha a idéia de haver salvação
depois da vinda do Senhor. Como serão salvos os ímpios durante o milê
nio? Eles terão que ouvir o evangelho e crer? A Bíblia diz que fé é acreditar
no que não pode ser visto (Hb 11.1), mas naquele momento todos verão
Jesus reinando de um trono terreno em Jerusalém. Isso seria injusto, se
considerarmos que todos os demais que viveram antes do milênio tiveram
que crer com bem menos evidência. Se for dito que não há salvação no
milênio, então, a necessidade de ele existir cai ainda mais. Embora não pos
samos ser dogmáticos, porque o Senhor conduzirá a História segundo o
seu propósito, essas observações demonstram que a existência de um milê
nio literal traz mais complicações do que soluções.
614 Razão da esperança
A ressurreição final
0 dia da ressurreição
Classicamente, se tem acreditado que a ressurreição acontecerá no últi
mo dia, no momento da segunda vinda de Jesus. Naquele dia ressuscitarão
os justos e também os ímpios. Portanto, haverá apenas uma ressurreição.
Aqueles que defendem um reino de mil anos depois da vinda de Jesus acre
ditam que haverá pelo menos duas ressurreições. A primeira ressurreição
acontecerá na vinda de Jesus e será a ressurreição exclusiva dos crentes.
Após mil anos de reino, acontecerá a segunda ressurreição, que será a res
surreição dos ímpios para o Juízo Final. Essa é uma interpretação literalista
baseada em Apocalipse 20.4,5: “Vi ainda as almas dos decapitados por cau
sa do testemunho de Jesus, bem como por causa da palavra de Deus, tantos
quantos não adoraram a besta, nem tampouco a sua imagem, e não recebe
ram a marca na fronte e na mão; e viveram e reinaram com Cristo durante
mil anos. Os restantes dos mortos não reviveram até que se completassem
os mil anos. Esta é a primeira ressurreição”. Quando essa passagem é inter
pretada literalmente, parece realmente ensinar que há duas ressurreições
físicas, uma antes do milênio (dos salvos) e outra depois do milênio (dos
perdidos). Primeiramente precisamos dizer que as coisas podem realmente
ser dessa maneira. Deus é soberano sobre o futuro e pode estabelecer as
coisas como ele quiser. Porém, nos parece que essa passagem não deve ser
interpretada literalmente. E o motivo é simples: o livro do Apocalipse como
um todo não deve ser interpretado literalmente. O Apocalipse é um livro
repleto de símbolos, e muitas vezes buscar o sentido literal de sua simbologia
leva a inconvenientes. Parece-nos que não devemos pensar que a passagem
esteja falando em ressurreição física. E nossa convicção, como já demons
tramos no capítulo anterior, que ela está falando de uma ressurreição espi
ritual. O versículo 4 diz “vi as almas”. Ele não diz “vi pessoas com corpos”.
Essas almas viveram e reinaram com Cristo durante mil anos. A palavra
“viveram” (grego: e^esan) aqui não significa “ressuscitaram”, mas simples
mente “continuaram a viver”. A passagem diz ainda que o restante dos
mortos não viveu, ou seja, continuaram mortos; não é dito que eles não
ressuscitaram. E nosso entendimento que a passagem está falando das pes
soas que morrem e suas almas vivem com Cristo e reinam com ele durante
mil anos. Esse tempo deve ser entendido como todo o tempo da dispensa-
ção cristã antes da vinda de Jesus. Devemos lembrar que João está falando
de coisas que ele viu no céu, quando para lá subiu numa visão (Ap 4.1). O
versículo 5 chama isso de “primeira ressurreição” não porque há uma “se
A ressurreição final 617
Uma só ressurreição
Porém, o fato é que o ensino bíblico não faz distinção entre várias res
surreições. Desde o Antigo Testamento, a Bíblia deixa bem claro que have
rá apenas uma ressurreição, que acontecerá no último dia. Daniel disse:
“Muitos dos que dormem no pó da terra ressuscitarão, uns para a vida
eterna, e outros para vergonha e horror eterno” (Dn 12.2), Não há qual
quer indicação de duas ressurreições nessa passagem, que é a mais impor
tante do Antigo Testamento a respeito da ressurreição. Ela simplesmente
diz que haverá um dia quando os mortos ressuscitarão. A diferença não é a
ressurreição em si, mas o destino dos homens. Os crentes irão para a vida
eterna, enquanto os ímpios para a vergonha e o horror eterno. A mesma
idéia pode ser vista no capítulo 5 de João. Jesus disse: “Não vos maravilheis
disto, porque vem a hora em que todos os que se acham nos túmulos ouvi
rão a sua voz e sairão: os que tiverem feito o bem, para a ressurreição da
vida; e os que tiverem praticado o mal, para a ressurreição do juízo” (Jo
5.28,29). Jesus não diz que haverá duas ressurreições em momentos dife
rentes, Ele diz que virá a hora (singular) em que todos os que estão mortos
ouvirão a voz do Senhor e sairão. Porém, uns irão para a vida eterna e
outros para o juízo. Jesus não faz qualquer distinção temporal, nessa passa-
618 Razão da esperança
Ora, ainda vos declaramos, por palavra do Senhor, isto: nós, os vivos, os
que ficarmos até à vinda do Senhor, de modo algum precederemos os que
dormem. Porquanto o Senhor mesmo, dada a sua palavra de ordem, ouvida
a voz do arcanjo, c ressoada a trombeta de Deus, descerá dos céus, e os
mortos cm Cristo ressuscitarão primeiro; depois, nós, os vivos, os que ficar
mos, seremos arrebatados juntamente com eles, entre nuvens, para o en
contro do Senhor nos ares, e, assim, estaremos para sempre com o Senhor
(vs. 15-17).
Paulo fala de uma prioridade dos crentes mortos em relação aos que
estiverem vivos na segunda vinda. Ele diz que os mortos ressuscitarão pri
meiro. Evidentemente, a dúvida dos crentes de Tessalônica era se os cren
tes mortos teriam a mesma vantagem dos vivos na vinda de Jesus. Paulo
escreve para demonstrar que os mortos terão os mesmos privilégios.2 No
momento em que o Senhor voltar, e a voz do céu chamar os mortos, eles
ressuscitarão e serão arrebatados primeiro, depois os vivos os seguirão. Paulo
não diz que eles serão arrebatados antes que os ímpios mortos. Aqui, Paulo
A ressurreição final 619
nada fala sobre a ressurreição dos ímpios, porque esse não é seu assunto no
momento.3 Porém, assim como Jesus disse que quando os mortos ouvissem
a sua voz sairiam do túmulo, uns para a vida eterna e outros para a condena
ção (Jo 5.28,29), podemos entender que, no mesmo momento, quando os
crentes ouvirem a voz do Senhor e ressuscitarem para o arrebatamento, os
ímpios também ouvirão a voz e ressuscitarão para a condenação.
Em 2 Tessaloniscenses, Paulo também falou sobre a manifestação futu
ra do Senhor, trazendo ao mesmo tempo alívio para os crentes e juízo para
os ímpios. Ele diz:
dos livros que foram abertos, e outra pela questão da inscrição no Livro da
Vida. A passagem diz que, quem não foi achado inscrito no livro da Vida
foi lançado no lago de fogo. Se somente estivessem ali os perdidos, não
haveria necessidade nenhuma de se abrir o Livro da Vida, pois bastariam os
livros das obras. Além do mais, pareceria estranho que, no Juízo Final, esti
vessem apenas os perdidos. Embora os salvos não sejam julgados no senti
do de ter definido o seu destino eterno nesse julgamento, pois isso já acon
teceu em vida (Jo 3.18), eles são julgados pelas suas atitudes, que lhes garan
tirá galardão. Quanto aos ímpios, a necessidade da ressurreição deles, como
o Apocalipse demonstra, é por questão de justiça, pois a morte deve, em
sua máxima extensão, e com todo o seu peso, ser imposta sobre os ímpios.5
Todos os mortos estarão no juízo daquele dia. Portanto, haverá apenas um
dia para a ressurreição, e naquele dia, os salvos ressuscitarão para a vida
eterna, e os ímpios para a destruição eterna.
eles. Neste mundo, temos padrões de beleza muito diferentes. Alguns são
considerados mais belos do que os outros, e muitos sofrem por causa disso.
A ressurreição nos garante que, um dia, essas diferenças não mais existirão,
pelo simples fato de que todos os salvos terão um corpo perfeito.
O corpo é muito importante. Isso deve nos influenciar também no
evangelismo, pois não devemos ter preocupação apenas com a alma das
pessoas, mas devemos pregar o evangelho para o ser humano como um
todo, preocupados com a salvação da alma e com a preservação do corpo.
Não há problema algum em ser doador de órgãos, por exemplo, pois Deus
não necessita de um corpo completo para nos ressuscitar. Assim como o
governo japonês, que separou as cabeças dos corpos dos cristãos, não po
deria impedir a ressrreição, ainda que todo o nosso corpo seja destruído,
Deus pode fazê-lo voltar do nada, para uma forma perfeita.
49
0 dia do juízo
Pela maneira como as pessoas vivem, parece que não há muita vanta
gem em ser honesto neste mundo. Parece que os ímpios são até mais felizes
do que os crentes. Ao contrário dos filmes e novelas que sempre mostram
um final feliz, na vida cotidiana os assassinos ficam fora da prisão, os trafi
cantes moram em mansões, os golpistas do INSS não devolvem o dinheiro
c os fraudulentos fogem com altas quantias de dinheiro para o exterior.
Porém, os pais de família mal conseguem comprar o leite para os filhos, os
trabalhadores honestos deixam grande parte do pequeno salário para o
governo por causa dos impostos, e as pessoas de bem são atingidas por
balas perdidas. Da perspectiva humana, está muito difícil ver a diferença
entre o justo e o perverso, conforme Malaquias dizia (Ml 3.18), exceto que
o perverso parece que sempre leva vantagem.
Jó era um homem atribulado. Além da doença, das perdas familiares,
dos prejuízos materiais, ele ainda tinha que agüentar a importunação dos
seus amigos. Os amigos de Jó eram adeptos de uma teologia extrema
mente simplista. Para eles, o justo era recompensado em vida e o perver
so punido, e ponto final.1 Quando eles viram o estado calamitoso de Jó,
não tiveram dúvidas: toda aquela justiça e retidão que Jó demonstrava,
era pura aparência. Se Jó estava sendo punido, então, não era tão justo
como parecia. Daí, terem resolvido “ajudá-lo”. Para eles, a tarefa era muito
simples: bastava convencer Jó de seus pecados, então, ele se arrependeria,
e lhe seria devolvida a saúde e a prosperidade. Essa é uma visão muito
simplista da vida, mas é a visão da maioria das pessoas. O fato é que há
mais coisas entre o céu a terra do que as consequências imediatas dos
nossos atos. E impossível que uma pessoa receba todo o mal que merece
em vida, ou mesmo o bem. Por essa razão, é preciso que haja um “Juízo
Final”.
624 Razão da esperança
pois ele queria decisão de vida. Decisão que envolvesse profunda mudança
de caráter. Um discípulo deve se parecer ao máximo com o Mestre.
Da passagem citada acima, fica bastante evidente que, no mesmo julga
mento, estarão os salvos e os perdidos. Na verdade, o objetivo desse julga
mento é justamente demonstrar a diferença de destino que há entre esses
dois grupos. No dia do Juízo, que está descrito em Apocalipse 20, o qual
em seguida estudaremos, todas as pessoas, inclusive os crentes, estarão. O
fato de já estarmos salvos por Cristo, não retira a necessidade de compare
cer perante o Juízo. Por outro lado, não significa que haja algum risco de
condenação para os que estão em Cristo Jesus (ljo 4.17). Paulo diz que nós,
os crentes, teremos que comparecer perante o tribunal de Cristo (2Co 5.10).
Do mesmo modo, Hebreus 10.30 diz que Deus julgará o seu povo. E Ro
manos 14.10 diz que compareceremos perante o tribunal de Deus. Tudo
isso deve ser identificado com o mesmo dia do Juízo. O grande Juiz daquele
dia também já está designado: Jesus Cristo. Por sua obra de redenção, ele
conquistou o direito de julgar (Jo 5.27; At 10.42; Fp 2.10; 2Tm 4.1).
justo e honesto. Ele diz: “Com efeito, inutilmente conservei puro o coração
e lavei as mãos na inocência. Pois de contínuo sou afligido e cada manhã,
castigado” (vs. 13,14). Essa é a expressão de alguém que não tem mais
esperança. Ele diz: foi tudo inútil, de nada adiantou eu me esforçar por
viver uma vida reta, pois isso só me trouxe ainda mais desgraças, mas os
ímpios estão sempre seguros, Com uma dor lancinante, o salmista chegou à
conclusão de que não existia justiça. E inegável que qualquer um pode che
gar a essa conclusão, se analisar os fatos apenas da perspectiva humana.
As coisas só começaram a mudar para o salmista quando ele foi até o
santuário de Deus, e nas próprias palavras dele, atinou “com o fim deles”
(v. 17). Ele se lembrou de que Deus tem um juízo sobre todos os homens, e
entendeu que o fim dos ímpios está sempre à porta: “Tu certamente os
pões em lugares escorregadios e os fazes cair na destruição. Como ficam de
súbito assolados, totalmente aniquilados de terror! Como ao sonho, quan
do se acorda, assim, ó Senhor, ao despertares, desprezarás a imagem deles”
(vs. 18-20). O salmista entendeu o quanto a posição do ímpio é insegura. A
qualquer momento, a calamidade pode se abater sobre ele, e ele não tem em
quem se refugiar. A qualquer momento, ele poderá ser tragado pela morte
e todas as suas esperanças se dissiparão. Portanto, a prosperidade e a segu
rança dele são totalmente ilusórias. O salmista entendeu que os ímpios não
têm qualquer segurança, pois, a qualquer momento, Deus pode lhes pedir a
conta (Lc 12.15-21).
Por outro lado, ele começou a ver a sua própria situação com outros
olhos. E verdade que passava por aflições, mas tinha algo que os prósperos
ímpios não tinham: “Todavia, estou sempre contigo, tu me seguras pela
minha mão direita. Tu me guias com o teu conselho e depois me recebes na
glória. Quem mais tenho eu no céu? Não há outro em quem eu me compraza
na terra. Ainda que a minha carne e o meu coração desfaleçam, Deus é a
fortaleza do meu coração e a minha herança para sempre” (vs. 23-26). A
convição de um Deus no céu que faz a diferença também na terra, encheu
o coração desse homem de esperança. A alegria voltou ao seu coração. A
confiança no Juiz que sabe julgar retamente sempre foi a marca dos verda
deiros crentes (SI 50.6; 96.10).
O gra n d e ju lg a m e n t o
O fim dos ímpios acontecerá, segundo a Bíblia, no dia do Juízo Final. A
justiça de Deus garante que todos terão um julgamento justo. O Juízo Final
0 dia do juízo 621
vai deixar bem claro o quanto Deus é justo, quando todos os ímpios forem
condenados por suas obras. O livro do Apocalipse contém a mais impres
sionante descrição do juízo do último dia:
perdoados”,5 como disse Jesus, nesse dia, teremos que dar conta de cada
palavra frívola (Mt 12.36).
As obras, porém, não são a base da salvação ou da condenação de nin
guém. O que decide é o nome estar ou não inscrito no livro da vida, confor
me a passagem assegura: “E, se alguém não foi achado inscrito no livro da
vida, esse foi lançado para dentro do lago do fogo” (v. 15). Além do aspecto
da eleição, aqui deve ser lembrada a obra da redenção. Todos os seres hu
manos são pecadores e estão automaticamente condenados, mas o Senhor
providenciou uma salvação para todo aquele que crê, na pessoa de Jesus
Cristo, que assumiu o pecado do ser humano e foi condenado por ele.
Assim, as pessoas que crêem são as que têm o nome escrito no livro da
vida. No dia do Juízo Final, o livro da vida é aberto e quem tem o nome
inscrito nele vai habitar os novos céus e a nova terra. Quem não tem o
nome inscrito, será lançado no lago de fogo, que é o inferno definitivo. No
Juízo Final, todos já chegam com o destino eterno determinado, pois já
houve um pré-julgamento em vida, quando aceitaram ou recusaram a sal
vação em Jesus Cristo. A Bíblia deixa isso bem claro: “Quem nele crê não é
julgado; o que não crê já está julgado, porquanto não crê no nome do
unigénito Filho de Deus” (Jo 3.18). Isso quer dizer que o julgamento final é
mais uma questão de pôr as coisas em pratos limpos do que, propriamente
dito, decidir sobre a salvação das pessoas. O Juízo Final é absolutamente
necesário por uma questão de justiça. É o momento sublime, quando a
ordem do universo for restaurada, e todo mal for punido de modo público
e definitivo.
Há uma função para as obras nesse Juízo: recompensa ou punição. Isso
vale tanto para os salvos como para os perdidos. A Bíblia ensina que as obras
dão galardão aos salvos, ou seja, quanto mais as pessoas viverem segundo a
vontade de Deus nesta vida, mais recompensa terão no céu (Mt 5.12; 6.1; Mc
9.41; ICo 3.14; 2Jo 1.8; Ap 11.18; 22.12). E se há um galardão para os salvos,
é possível que haja um “galardão às avessas” para os perdidos. Talvez o que
está escrito nos livros abertos não só justifique a condenação dos ímpios,
como também implique diferentes níveis de condenação (Lc 12.47,48), em
bora todos sejam lançados no mesmo lago de fogo e de lá jamais saiam.
Ainda deve ser dito que o padrão para o julgamento final não será igual para
todos. Embora a entrada no céu dependa unicamente da fé em Jesus Cristo,
a Bíblia deixa claro que, das pessoas que receberam mais benefícios de Deus,
será exigido mais (Lc 12.48; Mt 11.22). As pessoas que não conheceram a
Bíblia serão julgadas segundo o padrão da revelação natural e da própria lei
da consciência que Deus imprimiu no coração delas (Rm 2.12-16).
0 dia do juízo 629
Conclusão
O dia do Juízo será o dia da manifestação suprema da Justiça de Deus.
Nesse dia, as ovelhas serão separadas dos cabritos, os ímpios receberão a
pena devida por seus pecados, e os salvos desfrutarão da eterna bem-aven-
turança por terem confiado no Senhor e dependido inteiramente dele. Nes
se dia, ficará muito evidente a diferença “entre o justo e o perverso, entre o
que serve a Deus e o que não o serve” (Ml 3.18). Na verdade, quando
Malaquias escreveu isso, o próprio Deus já havia demonstrado a razão des
sa diferença. O povo de Israel estava questionando o Senhor. Eles diziam:
“Inútil é servir a Deus; que nos aproveitou termos cuidado em guardar os
seus preceitos e em andar de luto diante do S e n h o r dos Exércitos? Ora,
pois, nós reputamos por felizes os soberbos; também os que cometem im
piedade prosperam, sim, eles tentam ao S e n h o r e escapam” (Ml 3.14,15).
Como se percebe, a questão da justiça sempre foi uma grande dúvida dos
fiéis. Porém, a resposta do Senhor é muito clara: “Eles serão para mim
particular tesouro, naquele dia que prepararei, diz o S e n h o r dos Exércitos;
poupá-los-ei como um homem poupa a seu filho que o serve. Então, vereis
outra vez a diferença entre o justo e o perverso, entre o que serve a Deus e
o que não o serve” (Ml 3.17,18; ênfase acrescentada). No dia do grande
julgamento, aqueles que temem ao Senhor, serão tratados como “tesouro
particular”, como verdadeiros “filhos”. Os ímpios não desfrutarão desse
benefício. Se hoje a diferença pende para o lado dos ímpios, pois não ve
mos os ímpios sendo punidos como deviam, naquele dia as coisas serão
muito diferentes. Por outro lado, isso é um consolo para as pessoas que
sofrem injustamente. Elas não devem se angustiar quando os “amigos de
Jó ” tentarem colocá-las para baixo dizendo que “se você está mal é porque
está em pecado”. Essa maneira simplista de ver a vida ignora que a Bíblia
não diz “o aqui se faz aqui se paga”, mas “o que se planta, colhe”, ainda que
a colheita não seja de todo realizada nesta vida, para bem ou para mal (SI
126.5,6; Pv 22.8).
50
A esperança da eternidade
Tudo o que foi estudado até aqui nos trouxe para este ponto final e
essencial da nossa esperança. A certeza de um “destino eterno” é o que dá
valia a tudo o que foi estudado até este momento. Todas as doutrinas con
sideradas acima são importantes e verdadeiras, porque levam à considera
ção do destino eterno. Se a nossa existência se resumisse apenas a esta vida,
seríamos, nas palavras do apóstolo Paulo, “os mais infelizes de todos os
homens” (ICo 15.19). Toda a nossa teologia, esperança e fé seriam fúteis e
sem nenhum sentido, se a única coisa que nos restasse fosse esta vida. Seria
sem sentido falar em revelação, em soberania de Deus, em expiação de
Cristo, em salvação, igreja, ou escatologia, se a vida atual fosse a única for
ma de existência a que estamos confinados.
O destino eterno se refere ao estado de existência que os seres humanos
experimentarão depois da ressurreição dos mortos e do juízo final. Por
isso, de certa maneira, somente aí começará a eternidade para os homens, e
só então todos terão plena consciência disso. Será uma forma de existência
bastante diferente da atual. E possível que o próprio conceito de tempo
não exista mais, não pelo menos, como o conhecemos hoje. Todos os ho
mens existirão eternamente, porém, o destino dos perdidos e o destino dos
salvos serão muito diferentes.
Tentativas de m i n i m i z a r o j u l g a m e n t o de Deus
Uma questão que normalmente surge com respeito à punição dos ímpios
é a duração dela. A repugnância de muitos pela idéia de uma eternidade de
punição levou naturalmente ao pensamento de que o estado de punição
não pode ser eterno. Essa idéia não é nova. A doutrina católica do purgató
rio já é uma tentativa de minimizar os efeitos do julgamento divino. O
purgatório seria um lugar intermediário entre o céu e o inferno para onde a
maioria das pessoas iria depois da morte. Assim, apenas um número pe
queno iria para o inferno. Conforme a doutrina católica, todos os que estão
no purgatório têm chances de “purgar” os seus pecados e pagar pelos seus
crimes, podendo, depois de algum tempo, ir para o céu. A partir dessa pers
pectiva, provavelmente um número bem pequeno, ao final, seria eterna
mente perdido.
Um outro modo de minimizar o julgamento de Deus é o universalismo
soteriológico. Essa é a idéia de que, no fim das contas, todos serão salvos.
Os universalistas acreditam que a existência de um inferno seria algo in
compatível com o amor e a bondade de Deus. Sendo assim, Deus em seu
imenso poder, achará alguma maneira de salvar todas as pessoas. Na histó
ria da igreja, houve até defensores de que o próprio diabo e seus anjos
serão, de algum modo, salvos no fim.1 Alguns universalistas até concordam
que pode haver algum tempo de punição para os ímpios, mas que, no fim,
todos serão salvos. É evidente que, para manter essa posição, a Bíblia terá
que ser deixada de lado; por essa razão, essas idéias geralmente fluem dos
movimentos de teologia liberal, que desconsideram a inspiração e a iner-
rância da Escritura. Somente se o pecado do homem não for tão terrível
como a Bíblia o descreve, e somente se o sacrifício de Jesus for algo sem
valor, é que o universalismo soteriológico poderia ser viável.
Existe também a crença na extinção da alma. Como o próprio nome
sugere, os perdidos seriam aniquilados, ou seja, reduzidos a um estado de
não-existência. Essa posição é diferente do universalismo porque não de
fende a salvação dos ímpios, mas diz que o inferno não é eterno. Depois da
morte e do julgamento, os ímpios serão lançados no inferno, onde serão
A esperança da eternidade 633
0 casti go eterno
Como já dissemos em outros capítulos, devemos deixar o futuro nas
mãos de Deus. Não cabe a nós determinar como deverá ser o futuro. Se
Deus quiser aniquilar os ímpios, ele o fará, e não caberá a nenhum de nós
qualquer questionamento. Porém, da perspectiva da interpretação bíblica
tradicional, parece muito difícil sustentar a doutrina do aniquilamento. Por
mais que este seja um tema difícil, e que talvez, todos nós até desejássemos
que houvesse um aniquilamento, o fato é que, a menos que estejamos inter
pretando erroneamente os textos bíblicos, os ímpios realmente passarão a
eternidade sendo punidos no inferno.
Há um número muito grande de passagens bíblicas que falam sobre o
inferno. Há pelo menos cinqüenta textos da Escritura que falam direta
mente do inferno ou da punição que os ímpios receberão. Nesse momento,
a nossa intenção é nos concentrarmos nas passagens que falam sobre a
duração dessa punição. Em Mateus 18.8, Jesus fala sobre um “fogo eter
no”. Ele diz: “Portanto, se a tua mão ou o teu pé te faz tropeçar, corta-o e
lança-o fora de ti; melhor é entrares na vida manco ou aleijado do que,
tendo duas mãos ou dois pés, seres lançado no fogo eterno”. A imagem de
um fogo queimando eternamente leva necessariamente à idéia de que o
lugar de punição dos ímpios é eterno. Não haveria razão para o fogo ser
eterno se, em algum momento, os ímpios simplesmente deixassem de exis
tir. No capítulo 25 de Mateus, Jesus volta a falar sobre este assunto. Ele fala
sobre a ocasião do julgamento final, quando separará as ovelhas dos cabri
tos: “Então, o Rei dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-
vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus
anjos” (v.41). Logo à frente, ele explica o que significa esse estado: “E irão
63 4 Razão da esperança
estes para o castigo eterno, porém os justos, para a vida eterna” (v.46). Jesus
chama o castigo dos ímpios de “eterno”, e o compara com a recompensa
dos salvos que é a vida “eterna”. Se o castigo dos ímpios não for eterno,
então, a vida dos salvos também pode não ser eterna. No Evangelho de
Marcos, temos algumas expressões ainda mais fortes de Jesus sobre o esta
do de eterna punição dos ímpios. Ele diz: “E, se tua mão te faz tropeçar,
corta-a; pois é melhor entrares maneta na vida do que, tendo as duas mãos,
ires para o inferno, para o fogo inextinguível [onde não lhes morre o ver
me, nem o fogo se apaga]” (Mc 9.43,44). Por três vezes Jesus fala desse
fogo inextinguível e desse verme que corrói e nunca morre. Ele está retra
tando o sofrimento interior, pelo verme, e exterior pelo fogo. Ambos os
sofrimentos, segundo Jesus, são eternos. E possível que as expressões usa
das pela Bíblia, como fogo, verme, trevas, etc., não devam ser entendidas
literalmente. Pode ser uma maneira de expressar em língua compreensível
coisas incompreensíveis para o homem. Porém, o elemento de duração
está bem claro nas passagens: é eterno.
Uma das passagens bíblicas mais claras sobre a punição eterna é 2
Tessaloniscenses 1.9: “Estes sofrerão penalidade de eterna destruição, ba
nidos da face do Senhor e da glória do seu poder”. Paulo está, evidente
mente falando sobre os ímpios, e sobre o que eles enfrentarão na segunda
vinda de Jesus. A penalidade deles será “eterna destruição”, sendo banidos
da face do Senhor. A própria expressão “banidos” sugere continuar existin
do, mas “longe de”. Eles existirão eternamente banidos da face do Senhor
em destruição eterna. O Apocalipse descreve um outro aspecto desse sofri
mento eterno: “Também esse beberá do vinho da cólera de Deus, prepara
do, sem mistura, do cálice da sua ira, e será atormentado com fogo e enxo
fre, diante dos santos anjos e na presença do Cordeiro. A fumaça do seu
tormento sobe pelos séculos dos séculos, e não têm descanso algum, nem
de dia nem de noite, os adoradores da besta e da sua imagem e quem quer
que receba a marca do seu nome. (Ap 14.10,11). Parece haver uma contra
dição nessa passagem em relação à anterior, mas elas estão apenas enfati
zando faeetas diferentes do sofrimento dos ímpios. Eles estarão ao mesmo
tempo “banidos da face do Senhor” e “atormentados na presença do Se
nhor”. O banimento se refere à impossibilidade de acessar o favor divino.
Por outro lado, terão que encarar a face de ira do Cordeiro, porque são
merecedores da condenação. Para entendermos esse contraste entre o aban
dono e a presença de Deus, devemos nos lembrar do que aconteceu com
Jesus na cruz. O próprio Jesus confessa que sofreu um abandono de Deus
(Mt 27.46). Então, num sentido, Deus abandonou o seu Filho na cruz, pois
A esperança da eternidade 635
virou o seu rosto de Jesus; isso significa que não mais o sustentou com a
sua graça. Porém, noutro sentido, o olhar de Deus permaneceu sobre Jesus,
mas era o olhar de ira. Do mesmo modo, os perdidos não estarão na pre
sença de Deus, entendendo-se essa presença como favor, mas estarão na
presença de Deus, entendendo-se essa presença como ira. Com relação à
duração da penalidade que virá aos que se submetem à marca da besta, a
passagem diz que a fumaça do seu tormento sobe pelos séculos dos sécu
los, e não têm descanso algum nem de dia nem de noite. Respeitando o
simbolismo da passagem, a duração eterna da punição está muito evidente.
Qualquer outra interpretação teria que forçar o seu sentido natural. Portan
to, diante dessas passagens bíblicas, fica muito difícil sustentar idéias como
“universalismo” ou “aniquilamento”.
Senhor já havia prometido: “Pois eis que eu crio novos céus e nova terra; e
não haverá lembrança das coisas passadas, jamais haverá memória delas”
(v. 17). E João viu numa visão o cumprimento dessa promessa: “Vi novo
céu e nova terra, pois o primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já
não existe” (Ap 21.1). Após todos os cataclismas finais, quando Deus exer
cer a sua justiça sobre o mundo decaído, e julgar todas as pessoas, ele reno
vará toda a sua criação, incluindo a terra e o céu. Essa é a grande expectati
va do povo de Deus.
A renovação da terra
Deus sempre se importou com a terra. O relato da criação diz: “No prin
cípio, criou Deus os céus e a terra. A terra, porém...” (Gn 1.1,2). Daí para a
frente, a terra ocupa o centro das atenções. Desde o início, a preocupação
principal do Espírito Santo foi revelar como a terra surgiu, e poucos detalhes
foram dados a respeito do céu. No plano de Deus, a terra foi o lugar ideali
zado para a habitação dos homens. Desde o começo, Deus planejou que a
terra fosse o lugar onde o ser humano se realizaria: “Também disse Deus:
Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; tenha
ele domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais
domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis que rastejam pela
terra” (Gn 1.26). Foi somente quando o homem transgrediu a ordem de
Deus, que Deus amaldiçoou a terra: “E a Adão disse: Visto que atendeste a
voz de tua mulher e comeste da árvore que eu te ordenara não comesses,
maldita é a terra por tua causa; em fadigas obterás dela o sustento durante os
dias de tua vida” (Gn 3.17). Porém, sempre esteve no plano de Deus restau
rar a terra. Por essa razão, Jesus foi enviado a este mundo. Ele veio aqui para
retirar a maldição. Não é sem motivo que João Batista tenha chamado Jesus
de “o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (Jo 1.29). Evidente
mente que Jesus não tira os pecados de todas as pessoas do mundo, pois a
Bíblia não ensina o universalismo, porém Jesus tira o pecado do mundo (gre
go: cosmos), porque veio aqui para eliminar os efeitos do pecado sobre este
mundo, Ele assumiu a antiga maldição, pois fez-se maldito ao ser pendurado
num madeiro (G1 3.13). O sacrifício de Jesus não apenas salva os pecadores,
mas é a fonte da restauração da própria terra amaldiçoada pelo pecado. Por
isso, Paulo fala da expectativa da criação:
Deus (ver Lc 13.28). Mas nada poderá nos fazer sofrer, porque lá não há
mais qualquer tipo de sofrimento (ver Ap 21.4).
Cabe ainda uma palavra sobre a recompensa dos justos. Segundo a Bí
blia, os justos desfrutarão da vida eterna. Porém, a eternidade não é a carac
terística única dessa vida, pois, no sentido temporal, mesmo os ímpios vive
rão eternamente no inferno. E a qualidade dessa vida eterna que se destaca.
Os santos desfrutarão da presença eterna e benéfica de Deus, experimen
tando a vida na sua plenitude, “sem nenhuma das imperfeições e dos dis
túrbios da presente vida”.4 Uma das principais bem-aventuranças dos habi
tantes do futuro universo é que verão a Deus. Jesus disse: “Bem-aventura
dos os limpos de coração, porque verão a Deus” (Mt 5.8). E João diz: “Ama
dos, agora, somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que havere
mos de ser. Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a
ele, porque haveremos de vê-lo como ele é” (ljo 3.2). Poderemos ver a
plena presença de Deus na face de Cristo. Esta, sem dúvida, será nossa
maior recompensa.
No futuro, quando adentrarmos a nova terra e o novo céu, desfrutare
mos de todas as bênçãos de Deus na sua plenitude. Não haverá qualquer
separação entre a terra e o céu e, conseqüentemente, nenhuma separação
entre o ser humano e Deus. Todos os crentes ressuscitados ou transforma
dos adentrarão as portas da eternidade, e viverão sempre a glorificar a Deus
e ao Cordeiro. Essa é a nossa grande e bendita esperança. Quando estiver
mos lá, poderemos louvar a Deus infinitamente pela revelação, pela criação,
pela redenção, e até pela queda, que nos fez conhecer mais da sua graça.
Porém, ao mesmo tempo em que olhamos para o futuro e nos enchemos
de esperança, precisamos viver plenamente o presente. Para dar a ratção da
esperança não basta apenas ter conhecimento intelectual das coisas que aqui
foram estudadas, é preciso praticar, pois toda a nossa vida precisa ser trans
formada pela esperança. Como disse Calvino: “A esperança não é mais do
que o alimento e a força da fé”.5
Notas
Introdução
Jo ã o C alv in o , A s Pastorais, São P aulo : P aracleto s, 1998, ( lT m 6.3), p. 164-165.
V er M ich ael H o rto n , As Doutrinas da Maravilhosa Graça, p. 19.
A liste r M c G rath en te n d e q ue a elitização da teo lo g ia tem sid o um a das co isas m ais p reju d iciais nestes
dias m o d ern o s. E le diz: “ O d istan ciam en to do m u n d o acad êm ico das realid ad es da v id a d iária está
estrita m en te ligad o , ao m en o s n a p ercep ção p o p u lar, co m o elitism o d o m u n d o a cad êm ico ” (A lister E.
M c G rath . “T h e o lo g y and T h e F u tu res o f E v an g eiicalism ” . In The futures o f Evangelicalism. O rg. C raig
B arth o lo m cw , R o b in P a rry c A n d rew W est, p. 27).
V er Jo h n Sto tt, A Mensagem de Atos> p. 87.
A In tro d u ç ã o , ta m b é m ch a m ad a d e P ro lc g ô m e n a , trata d o s assu n to s in tro d u tó rio s à teo lo g ia . A
T eo n to lo g ia estu d a o ser e as o b ras de D eus. A A n tro p o lo gia é o estu d o d o se r h u m an o , d a criação e da
q u ed a à lu z da E scritu ra. A C risto lo g ia estu d a a pesso a e a o b ra de C risto. A So terio lo gia é o estu d o da
salvação con qu istad a e aplicada. A P neum ato lo gia estuda a pesso a e a obra do E spírito Santo. A E clesiologia
estu d a a ig reja e os m eio s de g raç a. A E scato lo gia d iz respeito ao estu do d as ú ltim as coisas.
Capítulo 1
O s teó lo g o s ch a m am a p rim eira das oito d iscip lin as da teologia sistem ád ea de Introdução ou Prolcgomena.
T rata-se da p arte q ue trata das questõ es in tro d u tó rias à teo lo g ia, co m o a R evelação (G eral e E sp ecial), os
pressu p o sto s filo só fico s, a fu nção e o m éto d o d a teologia, etc. N este trabalho , sim p lificam o s b astan te
essa p a rte , tratan d o ap en as da questão da R evelação, e m ais esp ecificam en te d a R evelação E special.
D eix am o s de lad o tod o tipo d e esp ecu laçõ es o u naturalism o.
A n selm o falou so b re a necessid ad e de en ten d er a fé, e que isso é u m tipo de “ d esejo ” da fé (Ver K arl
B a rth , F é em Basca de Compreensão, p. 28).
A p ersp ectiv a ad o tad a aq u i é de q ue a fé po d e ser co m p reen d id a, p o rém , não no sen d d o ilu m in ista de
q ue se crê ap en as no que se po d e co m p re en d er (Ver Stan ley J. G renz & R o ger E . O lso n , Teologia do Século
20, p. 16). M u ito s asp ecto s da fé p erm an ece m além da co m p reen são h u m an a, m as jam ais receb em o s
p erm issão para c ru z a r os braços.
A revelação g e ra l, q u e tam b ém é ch am ad a de revelação natu ral, diz resp eito à revelação q ue D eu s faz de
si m esm o e que p o d e se r v ista n a n atu reza, no m o d o com o D eus co n d u z a H istó ria e na p ró p ria co n sti
tu ição do ser hu m ano . O p ro p ó sito d essa revelação não é red im ir, m as d em o n strar a g ló ria de D eu s
co m o cria d o r (ver SI 19 .1 -6 ; Rm 1.18-32). A E scritu ra d iz que os “ céu s p ro clam am a g ló ria dc D eu s” (SI
19.1), e q u e D eu s re v e lo u a su a d iv in d ad e e os seus atrib u to s p o r m eio das co isas q u e foram criad as (R m
1.20). P o rtan to , a criação é a u m a m an eira de D eu s m an ifestar a su a ex istên cia e a sua g ló ria p ara as
p esso as. N o en tan to , d ev em o s o b serv ar que a revelação natural é sem pre sobrenatural no sen tid o dc que
p arte sem p re d elib erad am e n te de D eus.
P ara u m a ex celen te ex p o sição so bre In sp iração e In errân cia da B íb lia, ver: H erm isten M aia P ereira da
C o sta, A Inspiração e Inerrância das Escrituras. São P aulo : E d ito ra C ultura C ristã, 1998.
O s au tó grafo s são os escrito s o rigin ais, os q ue saíram da pen a dos escritores.
Capítulo 2
A m atéria estu d ad a a p a rtir d este cap ítu lo faz p arte d a d iscip lin a q ue os teó lo go s ch am am de Teontologia.
E la d iz re sp eito ao estu d o d o ser e. d as obras de D eus.
L o u is B e rk h o f, Teologia Sistemática , p. 2 2 . O p ró p rio B e rk h o f n ã o a d m ite u m a a c e ita ç ã o c eg a da
e x istê n c ia de D eu s p e la fé. B e r k h o f a d m ite q ue a fé n ã o é u m a fé c e g a , m as b a se a d a em p ro v as.
S e g u n d o ele, e ssa s p ro v a s v e m em p rim e iro lu g a r d a E s c ritu ra e em se g u n d o lu g a r d a re v e la ç ã o g e ra l
(pp. 2 2 ,2 3 ).
O co n ceito de F ran cis Sch aeffer é m u ito in teressan te. E le traça u m a lin h a e a cham a de lin h a do d eses
p ero. A cim a da lin h a, ficam os q ue acred itam em ab so lu to s; ab aixo da lin h a ficam os q u e já não crêem
cm abso luto s. N a su a o b ra O Deus que Intervêmi pp. 2 5-88, Sch aeffer define a o rd em p ela q u al as pesso as
co m eçaram a u ltra p a ssa r a lin h a do desesp ero . S egun d o ele, tudo co m eço u com a F ilo so fia, d ep o is foi a
v ez da A rte, d ep o is a M ú sica, d ep o is a C u ltu ra G eral e, p o r fim , a T eologia. Q u an d o se d eixou de
644 Razão da esperança
a cred ita r em ab so lu to s, e D eu s é ab so lu to p o r ex celên cia, nào restou co isa algum a para crer, d c m o do
q u e só resta o d esesp ero o u o nihilism o.
4 T eísm o é a cren ça em D eu s co m o o rig in ad o r e su sten tad o r de toda a criação.
5 B ertran d R u ssel, Why I Am N ot a Christian. N ova Y ork: Sim o n and Sch u ster, 1957, p 107. A pud A lvin
P lan tin ga. W ananted Christian R eltef p. 227.
6 A b rah am K u yp er, Calvinismo, p. 137-138.
7 A b ra h a m K u yp er, Calvinismo , p. 122.
8 A b rah am K u yp er, Calvinismo, p. 123.
9 O d esen v o lv im en to d essa tese de P lan tin ga pode se r en co n trad o in Jam es F. S en n ett, The Analytic Tbeist
—A n Alvin Plantinga Reader, pp. 72-96. O argu m en to a segu ir segue a ab o rd agem d e Jo h n C o o p er, co n fo r
m e su a A p o stila de A u la (nào p u b licad a), de um m ó d u lo de C o sm o visão R efo rm ad a, lecio n a d o no
C en tro P re sb iteria n o d c P ó s-G rad u aç ão A n d rew Ju m p e r —SP, em 2002. Jo h n C o o p er segue a a rg u m en
tação d e P la n tin g a , seu colega.
10 A teoria q u e d iz q ue n ad a p o d e ser con hecid o .
11 V er Ja m e s F. S en n ett, The Analytic Tbeist - A n Alvin Plantinga Keader; pp. 22-49.
12 É claro q u e isso nào será o p rin cip al elem en to a im p ed ir o p ecad o do h o m em . O p ró p rio D eu s é q uem
g a ra n tirá q ue o h o m em restau rad o n ào to rn e a cair.
13 F ran cis S ch aeffer, O Deus que se Revela, pp. 68,69.
14 O m al d eix ará d e e x istir não p o rq ue será an iq uilad o , m as p o rq ue será co n fin ad o a u m a prisão, o lago dc
fo go , d e on d e jam ais p o d erá sair para ex erce r in flu ê n cia no vam ente (A p 20.14).
15 P ara u m a an álise m ais co m p leta dos argu m en to s co m p o n to s favoráveis e crítico s, ver: C h arles H o d ge,
Teologia Sistemática, pp. 153-180.
16 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática , pp. 175,176.
17 W ayne G ru d em , Teologia Sistemática, p.lOO.
18 E stam o s cien tes d o a cirra d o d eb ate ex isten te entre os teó lo g o s re fo rm ad o s a re sp eito d a cap acid ad e
h u m an a de re co n h e c e r a ex istên cia da d iv in d ad e a p a rtir da re v e lação g eral. Q u an d o a q u estào se refere
ao s “ efeito s n o étic o s d o p ec ad o ” , é d ifíc il en c o n trar co n co rd ân cia, m esm o entre refo rm ad o s. Q u estõ es
co m o : “ É p o ssív el co n h ecer a D eus p o r m eio d as o b ras d a n atu rez a?” ; “E x iste a p o ssib ilid ad e de se fazer
teo lo g ia n a tu ra l?” ; “A té que p o n to a razão hu m an a é in ad eq u ad a p ara co n h ecer D eu s?” ; cau sam tensões
a té m esm o en tre os m ais ard o ro so s d efen so res da R efo rm a. P o d em o s d izer q u e, h isto ricam en te , os
teó lo g o s re fo rm a d o s, q uan to a essa questão , b asicam en te têm se en fileirad o atrás de d u as p o siçõ es: 1)
O s efeito s são tão d ev astad o res que im p ed em que o h o m em o b ten h a co n h ecim e n to n ào d isto rcid o
so b re D eu s à p arte d a re v e lação esp ecial. 2) O s efeito s nào são tão terríveis a p o n to d e im p ed ir q u e o
h o m em tenh a algu m en ten d im en to d e D eus a p artir d a revelação n atu ral; o p ro b lem a está na su a re sp o s
ta v o litiv a a essa revelação. O s q ue d efen d em a p rim eira p o sição são g eralm en te co n h ecid o s p elo no m e
de “ P rc ssu p o sicio n alista s,> o u “ F id eístas” , c entre os seus m ais co n h ecid o s defen so res está C o rn eliu s
V an T il, um teó lo g o d e W estm instcr, q ue n eg a a p o ssib ilid ad e de co n h ecim en to v erd ad eiro d e D eu s à
p a rte da re v e lação esp ecial (V er C o rn eliu s V an T il, The Defense o f the Vaith. F ilad élfia: P re sb y te rian &
R e f o rm e d , 1 9 5 5 , p. 2 6 2 ). A se g u n d a p o siç ã o c c o m u m e n tc d e n o m in a d a “ E v id e n c ia lis m o ” o u
“T ra d icio n a lism o ” , e assu m e u m lad o b em op osto . N essa lin h a en co n tram o s B en jam m in B. W arfield ,
q u e faz p arte d a esco la c h am ad a “ O ld P rin çeto n ” , e que d efen d e a tese de q u e o in créd u lo p o d e fo rm u lar
u m a teo lo g ia a p a rtir da revelação geral, sem a n ecessid ad e d a revelação esp ecial (Ver B. B. W arfield. The
Inspiration and Authority o f the Bible, pp. 73-78. V er tam b ém B. B. W arfield. Studiesin Theology. N o va York:
O xfo rd U n iv ersity P ress, 1932, pp. 110,111).
19 A g o stin h o , The Cottfessions o f Saint Augustin, I. t .
20 Jo ã o C alv in o , Institucion de la Religion Cristiana, I, 5 ,1 2 .
21 A lv in P la n tin g a , Warranted Christian Belief p. 175,
22 F ran cis S ch aeffer, O Deus Q ue Se Revela, p 52.
2,1 H crm an n B av in ck , Teologia Sistemática, p. 17.
Capítulo 3
1 R. C. S p ro u l, Verdades Essenciais da F é Cristã. C ad ern o I, p. 33.
2 M esm o K an t aceitava a id éia d a existência de D eus, e entendia que ela po dia ser estab elecida a p artir do
senso de m o ral da hum anid ad e. Porém , K an t fez u m d esserviço à teologia e à p ró p ria filosofia, ao relegar
D eu s à catego ria do “n ú m en o ” . D esse m o d o, D eu s não po deria ser realm en te con hecido , po is ficaria em
o u tra dim ensão. K an t, c sua critica da razão pura, abriu espaço p ara o s filósofos relativistas d os n o ssos dias.
Notas 645
3 C f R. C. S p ro u l, Verdades Essenciais da F é Cristã, C ad ern o I, p. 43. P o rém , não se deve co n fu n d ir con tra-
d ição co m parad o xo . C o n trad ição refere-se a d ois elem en to s m u tuam en te excluden tes. Q u an d o a nossa
teo lo g ia é co n tra d itó ria , n em D eu s a p o d erá harm o n izar. Ü p arado xo tem a ver, p o rém , co m o g ra u do
co n h ecim en to . A lg o para nós po d e p a recer co n trad itó rio sim p lesm en te p elo fato de q u e nào tem o s
co n d içõ es d e en te n d ê-lo plen am en te. E assim q u e se re lacio n am as d o u trin as da so b eran ia de D eu s e da
resp o n sab ilid ad e h u m an a, send o am bas en fatizad as pela E scritu ra, co m o v ere m o s adian te. A o m esm o
tem p o em q ue D eu s é so b eran o , o h o m em é resp o n sáv el p elo s seus atos. N isso n ào h á co n trad ição ,
ap en as u m parad o xo . P o d em o s ch am ar tam b ém esse co n ceito de “p arad o xo ló g ico ’*.
4 H . C. C am p o s, O Ser de Deus e os seus Atributos, p. 69.
5 D av id S. C la rk , Compêndio de Teologia Sistemática , p. 64.
6 W ayne G ru d em , Teologia Sistemática, p. 103.
7 J. I. P acker, O Conhecimento de Deus. p. 11.
8 A p alav ra “ n ih il” é latin a e sign ifica “n ad a” . A filo so fia nih ílista não vê sign ificad o em co isa alg u m a, e
en ten d e q u e a v id a nào tem q u alq u er sen tid o o u propósito.
Capítulo 4
1 D. M . L lo yd -Jo n es, Deus o Pui, Deus o Filho , p. 114.
2 H erm an B av in ck , Our Rtasonable Faith, p. 145.
3 P ara u m a ex celen te ex p o sição a respeito dos co n flito s a resp eito da T rin d ad e d esse p erío d o , v er L o uis
B erk h o f, Historia de l^as Doctrinas Cristianas, pp. 47-119.
4 N o C o n cílio d e T o led o (589 d .C .) foi acrescen tad a a ex p ressão “e d o F ilh o ” , resu m in d o a d o u trin a da
ig reja O cid e n tal de q u e o E sp írito p ro ced e do Pai e d o F ilh o con jun tam ente.
5 V er G erard V an G ro n in g en , Criação e Consumação, V ol I, p. 32.
6 E m b o ra algu n s v eja m na re p etição d o s ad jetivo s “ san to , san to , san to ” em Isaías 6.3 u m in d icio claro da
T rin d ad e, não d esejam o s ir tào lo n g e, po is na lín gu a h eb raica a re p etição v isa en fa tiza r o q u e está sendo
dito. O m esm o talvez n ào p o ssa ser d ito de D an iel 9.19 e Isaías 33.22.
7 V er ex celen te estu d o so b re e ssa p assag em in H erm an B av in ck , The Doctrine oj God> pp. 2 65,266 . P ara um a
o p in ião c o n trá ria , v er Jo h n S tto t, 1,11,111 João - Introdução e Comentário, p .l 55.
8 Jo ã o C alv in o , Instituías , 1 , 13, 21.
9 B e rk h o f fala d a d iferen ça en tre “ essên c ia” e “ su b stân cia” e d a ten d ê n cia m o d ern a d e n ão u sar os dois
term o s com o sin ô n im o s p elo fato de q u e, n a ig reja O rien tal, “ su b stân cia” trad u zia tanto “ o u sia” com o
“h ip o sta sis” , sen d o , p o rtan to , u m term o am b ígu o (V er L. B erk h o f, Teologia Sistemática, pp. 88,89).
10 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática^ p. 95.
11 A ig re ja o rien tal (C ató lica O rtod oxa) nu n ca aceito u essa form ulação.
12 L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 98.
13 V er A u gu stu s N. L o p es, O Culto Espiritual, pp. 64,65.
14 D. M . L h o yd -Jo n es, Deus o Pai, Deus o Filho, pp. 122,123.
15 R ica rd o B arb o sa d e S o u sa, O Caminho do Coração, p. 80.
16 H erm an B a v in ck , Teologia Sistemática, p. 155.
Capítulo 5
1 V er 2 S am u el 2 2 .2 ; Salm o 18.2; H ab acu qu e 1.12.
2 V er L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 61.
3 W illia m G. T. S h ed d , Dogmatic Theology, p. 347.
4 E ssa teo ria é d en o m in ad a “ teísm o a b e rto ” , ou teologia relacion al.
5 V er W illia m G. X S h ed d , Dogmatic Theology, p. 397.
6 Ê n ecessário q ue se en ten d a q ue há pro m essas in co n d icio n ais e prom essas con dicio nais de D eus. A qui,
estam o s tratan d o das pro m essas in co n d icio n ais; m ais à frente falarem os so bre as prom essas condicionais.
7 V er L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 62.
8 A . W P in k , Los Atributos de Dios, p. 52.
Capítulo 6
1 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 74.
2 W illiam H en d rik sen , Mateus , V ol. 1, p. 441.
6 46 Razão da cspenmça
Capítulo 7
1 A n th o n y H o ek em a, Salvos Pela Grafa , p. 11.
2 V er J. I. P acker, A Evangelização e a Soberania de Deus, pp. 16-18.
3 E sse co n fo rto só será po ssív el se a q uestão nu nca for an alisad a m ais p ro fu n d am en te , e se os elem en tos
b íb lico s nu n ca fo rem ab o rd ad o s com h o nestidade.
4 C o n fissão de F é, III, 1.
5 V er L o ra in e B o ettn er, The Reformed Doctrine o f Prédestination , p. 242.
6 C itad o p o r A n th o n y H o ek em a, Criados à Imagem de Deus, p. 150.
7 R icard o B arb o sa de S o u sa, O Caminho do Coração, p. 163.
8 E sse co n ceito será estu d ad o m ais à frente.
9 L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, pp. 230,231.
Capítulo 8
1 O Jo rn a l Folha Universal da Ig reja U niversal d o R eino de D eu s u sou esse term o.
2 Á q u in o (1 2 2 5 -1 2 7 4 ) escrev eu : .O co n ceito d e p red estin a çã o p ressu p õ e a eleição , e esta , o a m o r (..,).
P o r o n d e , to d o s os p red estin a d o s sào eleito s e am ad o s. (S. T om ás de A q u in o , Suma Teolósica, V ol. L
1 .23.4. p. 2 3 5 ).
3 L u tero , falan d o so b re a p red estin ação , disse: “D u as co isas o b rigam à p regação da pred estin ação . A
p rim eira é a h u m ilh a çã o do n o sso orgu lh o e o re co n h ecim en to da graç a de D eu s; e a segu n d a é a
n a tu rez a da fé crista em si m esm a ” (M artín h o L u tero, De Servo Arbitrio, in E. G o rd o n R u p p c P h ilip S.
W atso n (orgs.), L uther and Erasmm: F m W iü and Salvation, p. 137).
4 M u ito s re jeitem a id éia d e q ue a Confissão de Westminster se ja realm en te u m a co n fissão calv in ista, po is
acred itam q u e os teó lo g o s p u ritan o s m o d ificaram o p en sam en to de C alvino. N o en tan to , en ten d em o s
q u e, a C F W re fle te co n sisten tem en te o p en sam en to do re fo rm a d o r d e G en eb ra. T ratam o s um p o u co
d esse assu n to n a n o ssa d issertação d e m estrad o ; v er u m resu m o da m esm a na re vista Fides Reformata-.
L e an d ro A n to n io de L im a , “ C alv in o E n sin o u a E x p iação L im itad a?” , vol. 9, n . l , 2 0 0 4 , São P aulo : C en
tro de P ó s-G rad u aç ão A n d rew Ju m p e r, p. 77-99.
5 C o n fissão de F é d e W estm in ster, III, 3.
ó V er S ta n le y J. G ren z e R o ger E . O ison, A Teologia do Século 20, p. 87. B ru n n er (1 889-19 66), o u tro teólogo
d a n eo -o rto d o x ia, en ten d ia q ue p red estin ação é apen as u m a q uestão de fé; assim , aqu ele q u e crê é eleito
e aq n ele q ue n ã o crê é repro vad o . A co n cep ção d e B ru n n er é m uito p ró x im a da d e A rm ín io . V er S tan ley
J. G renz e R o ger E . O iso n , A Teologiado Século 20,p. 101.
7 P ara v er a ap licação d esses term o s antes e d ep o is da R efo rm a , v er F red H . K lo o ster, Su p ralap sarism o , in
W alter A . E lw ell (org,), Enciclopédia Histórico-Teológiça da Igreja Cristã, V ol. III, p. 4 2 4 -4 2 5 ; S u p ra lap su m , in
R ich ard A . M u ller, Dictionaty o} luttin and Greek Theological Terms, p. 292.
8 V er L o rain e B o etn er, The Reformed Doctrine o f Prédestination , pp. 126,127. V er tam b ém L o uis B erk h o f,
Teologia Sistemática, pp. 119-121.
9 R . C. S p ro u l, Eleitos de Deus, p. 125.
10 R. C. S p ro u l, Eleitos de Deus , p. 126.
11 Jo ã o C alv in o , O I J m dos Salmos, Vol. 2, (SI 3 6 .5 ), p. 128.
12 E n ten d em o s q ue a p reterição é o ato d iv in o de ab an d o n ar os seres h u m an o s ao s seus p ró p rio s pecados.
Ju n ta m en te eo m esse ato d e p reterir, e stá a d isp o sição de co n d en ar os h o m en s pelos seus pecado s, o que,
às v ezes, os teó lo g o s ch am am de p ré-c o n d en ação (Ver L o uis B erkh o f, Teologia Sistemática, p. 117).
13 A . A . H o d ge , Esboços de Theologia, p. 67. (E d ição de 1895).
14 V er R. C . S p ro u l, Eleitos de Deus, p. 128
15 11. C. S p ro u l, Verdades Essenciais da F é Cristã, C ad ern o 2, p. 56.
16 R. C. S p ro u l, Eleitos de Deus, p. 136.
Nolas 647
Capítulo 9
1 V er W illia m H en d rik scn , Mais que Vencedores, p. 107.
2 V er R. C, S p ro u l, A Santidade de Deus, p. 29.
3 H o d g e en ten d e q ue os serafin s, ao o ferecer um a h o m en agem p erp etu a à san tid ad e d iv in a, estão re p re
se n tan d o todo o u n iv erso (ver C harles H o d ge, Teologia Sistemática, p. 312).
4 V er R. C . S p ro u l, A Santidade de Deus, p. 34.
5 L u iz B erk h o f, Teologia Sistemática, p.76.
6 D. M . L lo yd -Jo n es, Deus o Pai, Deus o Pilho, p. 97.
7 J. R id d erb o s, Isaias: Introdução e Comentário, p. 95.
8 M u ito s talvez p referissem q ue ele tivesse d ito “sed e p ró sp ero s po rq ue eu sou p ró sp e ro ” .
Capítulo 10
1 A b lasfêm ia seria d izer q u e D eu s é o au to r do m al, e a h eresia p o deria ser o d u alism o , o u seja, d izer q ue
o m al c etern o e in d ep en d en te com o D eu s (Ver G. C. B erko uw er, Doutrina Bibltca do Pecado,p. 21).
2 V er L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 148.
3 E ssa p a ssa g em se re fe re aos esp írito s m alignos. P orém , antes de se reb elarem , eles fo ram anjos.
4 E sses títulos tam b ém são aplicad os aos an jo s decaídos.
5 Jo à o C alv in o , Efésios, p. 46, E f 1.21.
6 D. M . L lo yd -Jo n es, D e/ff o Pai, Deus o Filho, p. 436.
7 A n th o n y H o ek em a, Criados à Imagem de Deus, p. 140.
8 V er L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 222.
9 B erk o u w er o ferece ex celen te argu m en tação co n tra essa teoria em A Doutrina Bíblica do Pecado, p. 62-75.
10 V er L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 149.
11 V er E . H . B an cro ft, Teologia Elementar, p. 307.
12 V er G. C. B erk o u w er, Doutrina Biblica do Pecado, p. 79. A in d a assim , deve h aver um a origem .
13 L o ra in e B o ettn er, The K efom ed Doetrine o f Predestination, p. 243.
14 D eve ser en ten d id o q u e o lib eralism o nào n egav a apen as a e x istên cia de S atan ás, m as co m p ro m cd a toda
a re v e lação b íb lica.
15 D. M . L lo yd -Jo n es, O Combate Cristão, p. 90.
16 J. C alv in o , Efésios, p. 190, E fésio s 6.12.
Capítulo 11
1 N ó s nos atrev em o s a c o n d n u ar in sistin d o n a auto ria m o saica do P en tateu co ap esar d e toda a arg u m en
tação d a crítica m o d ern a no sen ü d o con trário. P or m u ito tem p o , os crítico s eru d ito s assu m iam a d efin i
ção de W ellh au sen (184 4 -1 9 1 8 ) de q u e o P en tateu co era co m p o sto de q u atro tipos de m ateriais ou
fo n tes: A fo n te “J ” o u J a v ista , a fonte “ E ” o u E lo h ista, a fon te “D ” ou D cu tero n ô m ia e a fon te P ou
648 Razão da esperança
S a cerd o ta l. P o rém , o s p ró p rio s estu d o s c rítico s têm lan çad o d ú vid as a resp eito d essa teo ria, co m o a d m i
te o p ró p rio G o rd o n W cn ham , po is as discu ssões so bre esse assu n to têm su rgid o d en tro do p ró p rio
c o ração da crítica (G o rd o n W en ham , Word tíiblicalCommentary, Volume 1: Genesis 1-15, In tro d u cd o n ). N ão
h á razões co n v in cen tes para nào a cred itar q u e Je su s so ub esse q uem escreveu o P en tateu co , c ele disse
q ue fo i M o isés (ver L c 24.44).
2 A m áx im a ltex nihilo nibiífiP é v erd ad eira, po is “ nad a v em do nada” . V er ex celen tes argu m en to s sobre
isso em Dogmatic Theology, de W illiam G. 'f. Sh ed d , p. 467.
3 R. C . S p ro u l, Verdades Essenciais da F é Cristã , C ad ern o 1, p. 54.
4 A id é ia d a ev o lu ção já foi su sten tad a p o r filó so fos g re g o s antigos, com o, po r exem plo , T ales de M ileto.
N o século 17, h o m en s co m o S w am m erd an (1 6 3 7 -1 7 8 5 ), L eib n iz, D id ero t, R o b ert C h a m b ert tam b ém a
d efen d eram . Foi P lerb ert S p en cer quem in tro d u ziu a idéia do ev o lu cio n ism o na co m u n id ad e científica.
5 H á u m a d iferen ça en tre m acro cv o lu ção e m icro ev o lu çào . T rata-se d e d u as teorias: a p rim eira p o stu la que
to d as as eo isas su rg iram d a evolu ção, en q u an to a segun d a en fatiza o fato de q ue, d e certo m o d o , m u itas
co isas ev o lu em neste m und o . A m acro ev o lu ção é d ecid id am en te an tib íb lica, m as a m icro ev o lu ção ap a
re n tem en te não co n traria os p rin cíp io s bíb lico s, afinal o h o m em realm en te se ad ap ta a v ário s h ab itats e
co n d içõ es d iferen tes, e há u m p ro g resso claro n a h istó ria da hu m an id ad e, q u e é atestad o p ela p ró p ria
B íblia.
6 A lister M c G ra th , O Deus Desconhecido: Em Busca da 'Realização 'Espiritual, São P aulo : L o yo la, 2 00 1, p. 23.
7 C h arles H o d ge, Teologia Sistemática, p. 180.
8 J. G resh am M a ch en , Vision Cristiana D el Nombre, p. 123.
9 O m esm o p o d e ser d ito de o u tro s cien tistas fam o so s d o p assad o , co m o Jo h a n n e s K ep ler, L eo n h ard
E u ler, Ja m e s C lark M ax w e ll, Ja m e s P re sco tt Jo u le, W erher Von B raun. O s filó so fo s g re g o s P latão e
A ristó teles tam b ém su sten tav am a idéia de q ue o u n iv erso foi criado.
10 P ara u m a ab o rd a g em in tere ssan te do ev o lu cio n ism o q ue ajuda a en te n d er os p rin cip ais p ressu p o sto s
d ele, b em com o algu m as resp o stas para os seus q u estio n am en to s, v er Como Derrotar o Evolucionismo com
Mentes Abertas, d e P h illip E . Jo h n so n . São P aulo: E d ito ra C u ltu ra C ristã, 2000.
11 P au lo J. A ch te m ier, biarper’s Bible Dictionaty, (tó p ico “T ia m a t”).
12 V er G érard V an G ro n in g en , Criação e Consumação, V ol I, pp. 407-408.
13 P ara u m a ex p o sição d e n arrativ as m íticas sem elh an tes entre cu ltu ras ver, de D avid E. A u n e, WordBiblkal
Commentary, Volume 52b: Révélation 6-16, (R ev 12.1).
14 O p ró p rio V an G ro n in g en d efen d e essa teoria (ver G érard V an G ro n in g en , Criação e Consumação, V ol I, p.
56-57).
15 É p reciso q ue se en ten d a q ue o “cao s” o rig in al d escrito pela B íb lia, o “ sem fo rm a c v a z ia ” n ào co n tém
n ec essariam en te a id cia d e “ m al” . Pode sig n ifica r apen as q ue a terra não era p ró p ria para ser h ab itad a e,
en tão , D eu s a to rn o u p ró p ria (Ver G érard V an G ro n in g en , Criação e Consumação, V ol. 1, p. 47).
Capítulo 12
1 V er M ich ael H o rto n , A s Doutrinas da Maravilhosa Graça, p 25. P arte d a ab o rd agem a segu ir p o d e se r v ista
nessa o b ra d e H o rto n (pp. 25-39).
2 A n d io n y H o ek em a, Criados à Imagem de Deus, p. 24.
3 H e rm a n B av in ck , OurReasonable Vaith, p. 184.
4 E in teressan te q ue, en q u an to o h o m em foi su b m isso a D eus, o resto da criação foi su b m isso ao ho m em .
P o rém , d ep o is d a q u ed a tud o isso m u d o u (ver Jo h n L. D agg, M anual de Teologia, p. 119).
5 G érard V an G ro n in g en , Criação e Consumação, V ol 1, p. 85.
6 V er G érard V an G ro n in g en , Criação e Consumação, V ol 1, p. 84.
7 G érard V an G ro n in g en , Criação e Consumação, V ol 1, p. 85.
8 J. G resh am M a ch en , Vision Cristiana dei Homhre, p. 145-146.
9 V er A n th o n y H o ek em a, Criados à Imagem de Deus> p. 228.
10 J. G resh am M ach en , Vision Cristiana dei Hombre, p. 143.
11 A n th o n y H o ek em a, Criados à Imagem de Deus, p. 230.
12 S im o n J. K istem ak c r, Hebreus, p. 144.
13 E ssa s o b serv açõ es p o d em ser en c o n trad as in A n th o n y H o ek em a, Criados à Imagem de Deus, p. 2 29-2 30.
14 V d . M o rto n H . S m ith , Systematic Theology, p. 238.
15 M ich ael H o rto n , A s Doutrinas da Maravilhosa Graça, p 30.
16 U m a ó tim a ex p o sição so b re os três m an d ato s, e q ue serv iu de base p ara este texto, p o d e ser en co n trad a
em Família da Aliança , d e H a rriet e G érard G ro n in g en , pp. 55-199.
17 A n th o n y H o ek em a, Criados à Imagem de Deus, p. 222.
Noicis 649
Capítulo 13
1 L o uis B crk h o f, Teologia Sistemática, P. 165.
2 V er W illia m G. T. S h ed d , Dogmatk Theology, V ol I. p. 528.
3 D c certo m o d o , isso ap en as reflete o q u e algu n s teó lo g o s tem en ten dido co m o sendo o p rin cip a l po n to
d a d iscu ssão teo ló g ica (e q uem sab e até filo só fica) em todo s os tem p os: o re lacio n am en to en tre a tran s
c e n d ên cia c a im a n ên cia divin a. Stan ley J. G rens e R o ger E. O lson m o stram co m o a v isào d eseq u ilib rad a
entre essas d u as características d ivin as, ao lo n g o da h istó ria da teo lo g ia, tem criad o tantos p ro b lem as
p ara os estu d o s teo ló g ico s (Stan ley J. G ren s e R o ger H. O lso n , A Teologia do Século 20, p. 9-11). A teologia
d a R efo rm a p ro cu ro u m an ter u m eq u ilíb rio en tre a tran scen d ên cia, ou seja, D eu s com o aq u ele a b so lu ta
m en te sep arad o , a u to -su ficien te , e q u e nào p recisa do m u n d o ; c a im an ên cia, o u seja, D eus q ue se
relacio n a co m o m u n d o , q u e está p resen te na criação e está envo lvido nos aco n tecim en to s da histó ria
h u m an a. O Ilu m in ism o co lo co u essas cren ças em xeq u e, d estru in d o o eq uilíb rio clássico. O lib eralism o
teo ló g ico (S ch lc icrm ach er, R itsch l, H arnack) ten to u d ar u m a resp o sta ao Ilu m in ism o , m as en fatizo u
ex a g era d a m en te a im an ên cia divin a. A n co -o rto d o xia (B arth , B ru n n er, B u ltm an n ), cm revo lta co n tra o
lib eralism o , fo i ao o u tro ex trem o e ex agero u na tran scen d ên cia. D e lá p ara cá, q uase rodas as novas
teo lo g ias re ag em ao lib eralism o o u à n eo -o rto d o xia e se po larizam cm ex trem o s, com o p o r exem plo , o
n co lib era lism o se cu la r dc P a u lT ilic h (1 8 8 6 -1 9 6 5 ), a T eologia do P ro cesso d e T eilh ard de C h ard in (1881-
1955) e d e A. N. W h iteh ead (1 8 6 1 -1 9 4 7 ), o rad icalism o d e D ietrich B o n h o effcr (19 0 6 -1 9 4 5 ), a T eologia
da E sp eran ça d c Jü rg c n M o ltm an n e W o lfh art P an n cm b erg, a T eo lo gia da L ib ertação em todas as suas
ra m ifica çõ es (n eg ra , la tin o -am erican a, fem in ista). D c u m m o d o o u de o utro , o eq u ilíb rio en tre tran scen
d ên c ia e im a n ên cia nào tem sid o alcan çad o , com o na R efo rm a. Isso p o d e ser visto tam bém n o s m o v i
m en to s ain d a m ais m o d ern o s com o a “ teologia da p ro sp erid ad e” , a ‘‘teologia relacio n ar* (ou teísm o
ab erto ), e todo o m o vim en to carism ád co.
4 L o uis B crk h o f, Teologia Sistemática, p. 170 .
5 L o ra in e B o ettn er, The lieform ed Doctrine o f Predestination , p. 247.
6 U m a ex celen te ex p o sição so b re o concursus p o d e ser v ista cm H . C. C am pos, O Ser de Deus e as Suas Obras
- A Providência e a Sua Realização Histórica>pp. 292-315.
7 U m a b o a ex p o sição d c algu m as d essas p assagen s está in L o ra in e B o ettn er, The Keformed Doctrine o f
Predestination , p. 2 4 3 -2 4 8 .
8 C h a rles H o d ge , Teologia Sistemática , p. 439.
9 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática , p. 433.
10 P arece-n o s o p o rtu n o d ar u m a palavra a respeito do fatalism o c do d eterm in ism o . A m b o s os co n ceito s
são p a recid o s; en tretan to , eles se d istin gu em pelo seguin te: o fatalism o a firm a q ue ex iste u m a força
ex tern a d eterm in a n te dc to d o s os aco n tecim en to s. E sse co n ceito gera no h o m em u m a atitu d e de co n
fo rm ism o e in d iferen ça , v isto q ue n ad a q u e p o ssa d eseja r ou fazer afeta o cu rso dos aco n tecim en to s:
tud o o co rre d e m o d o in falív el. O d eterm in ism o en sin a apen as q ue, para cad a fato h á sem p re razõ es que
o d eterm in a ra m , crian d o u m a relação de cau sa c efeito , se m se p reo cu p ar co m a “ cau sa p rim eira” ; esse
co n ceito é u sad o a m p lam en te n o s div erso s cam p os das ciências.
Capítulo 14
1 E rlic L e n s C ésar, O que D eusje^ por mim podefa%er p o r você, p. 98-100.
2 O V atican o ex ig e essa co m p ro v ação para can o n izar o san to q ue realizo u o m ilagre.
3 N a v erd ad e, essa b an alizaçào é p o r cau sa do sign ificad o técn ico da palavra m ila g re, p o is etim o lo g ica-
m en te, um aco n tecim en to co m o esse p o d eria ser ch am ad o d c m ila g re, p o is, a p alav ra deriva d e “ m arav i
lh a r” o u algo q u e p ro d u z esp an to (V er C h arles H o d ge, Teologia Sistemática , p. 459).
4 W illia m G. T. S h ed d , Dogmatic Theology, Vol. 1, p, 533.
5 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática , p. 459.
6 E . J. Y o un g, Daniel, in F. D av id so n (org.), Novo Comentárioda Bíblia, p. 821 b.
7 A teo lo g ia lib era l do século 19, ced en d o à p ressão da ciên cia, rejeito u a ex istên cia d e m ilagres e p ro cu ro u
“ d em itizar” a B íb lia, o u seja, re tirar os m ilagres para ten tar en c o n trar a v erd ad e q ue estaria esco n dida.
A ssim , a teo lo g ia lib e ra l se lan ço u à b u sca do Je su s h istó rico , p en san d o q ue o C risto d escrito pelos
ev an gelh o s n ào fo sse o v erd ad eiro , po r cau sa do so b ren aturalism o . B u lttm an n , u m teó lo g o d a nco-
650 Razão da esperança
o rto d o x ia, p o r o u tro lad o , en ten d eu , jun to com m u ito s ou tro s, q ue a b u sca p elo Je su s h istó rico cra
im p o ssív el. E le p ro p ô s q ue, em v ez dc “d cm id z a r” a B íb lia, ela deveria ser “ d esm ito lo gizad a” . Isso não
sign ifica re tirar o s m ito s, m as in terp retá-lo s, p ara q ue a m en sagem d eles falasse ao ho m em m o derno . V er
R u d o lf B u ltm a n n , Demitologiiçação, S ão L eo p o ld o : E d ito ra S in o d al, 1999. M as dc q u alq u er m o d o , am bas
as esco las re jeita m a h isto ricid ad e do m ilagre.
8 H en d rik van R iessen , Enfoque Cristiano dc la Ciência, p. 66.
9 V er L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 175.
10 W illia m G. T. S h ed d , Dogmatk Theology, p, 535.
11 V er W illia m G. T. S h e d d , Dogmatk Theology, p. 540. E v id en tem en te q u e foi co n tra a n a tu rez a no caso
esp ecífico dc L ázaro. O s d em ais m o rto s p erm an ece ram no p ro cesso de deco m po sição. N esse sentido, a
n atu rez a geral n ão foi afetada.
12 A d efin ição dc H o d ge, v ista acim a, p arece co n trariar essa noção. H o d ge não aceita q u e D eu s u se m eios
para re aliza r m ilag res, m as nesse caso teríam o s q ue rem o v er v ário s a co n tecim en to s b íb lieo s da catego ria
d e m ilagres, com o, p o r exem plo , as p ragas no E gito , o u a pesca m aravilh o sa. H o d ge p refere ch am ar
esses aco n tecim en to s d c “p ro v id en ciais” e não m ilagres abso luto s (Ver C h arles H odge, Teologia Sistemá
tica^ p. 466).
13 L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 176,
u C h arles H o d ge , Teologia Sistemática, p. 473.
15 Jo à o C alv in o , Romanos, p. 500, R o m anos 15.18.
í(i Ver W aync G ru d em , Teologia Sistemática , pp. 291 -2 9 7 . G ru d em argu m en ta b astan te co n v in cen tem en te
co n tra a cessação dos m ilagres, p o rem , ele p arece não v er q u alq u er d iferen ça entre o tem po dos ap ó sto
lo s c os n o sso s dias, o q u e sem d ú v id a é ign o rar os fatos.
17 V eja o u tro s m ilagres im p ressio n an tes de P au lo re gistrad o s em A to s 1 3.6 -12 ; 1 4.8 -18 ; 16 .1 6 -1 8 ; 19.8-11;
28.1-6. O b serv e q u e eles estão asso ciad o s m ais ao início da p regação ap o stó lica em algum lu g ar novo.
18 Jo h n H . A rm stro n g , “ E v an g elism o dc P o d er” , cm Religião de Poder. org. p o r M ich acl S co tt H o rto n , p. 59.
19 E ste n o m e foi d ad o p o r P eter W agner, p ro fesso r dc m issõ es do Sem in ário E ullcr nos E stad o s U nidos.
S eg u n d o ele, a p rim eira o n d a v eio no eom eço do sceulo 20 co m o su rg im en to do p en teco stalism o . A
se g u n d a o n d a a co n teceu em m ead o s d o s an o s 7 0 , c , a p artir d o s anos 90 a terceira e m ais p o d ero sa on da
d o esp írito está atuando.
C apítu lo 15
Capítulo 16
1 L o ra in e B o ettn et, Imortalidade , p. 10.
2 J. I. P acker, Vocábulos de Deus, p. 185.
3 A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro , p. 108.
4 L ouis B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 676.
5 A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro, p. 108.
6 L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 262.
7 C h arles H o d ge , / Corintios, p. 305 (IC o 15.25).
8 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 676.
9 C itad o p o r L o rain e B o ettn cr, Imortalidade, p. 32.
Capítulo 1 7
1 A s religiõ es n ào -cristàs, com o po r exem plo , o B u d ism o, o In d u ísm o e o lsla m ism o , tam bcm falam da
vida ap ó s a m o rte.
2 V er C h arles P fciffer (org.), Wyciiffi Bible Ençydopedia , V erbete: H ades.
3 A B íb lia p arece assu m ir q u e Sam u el estav a falando (IS m 28.1 5 ,16 ). A referên cia ao ju lgam en to de Saul
está c o rreta (IS m 2 8 .1 7 ,1 8 ). E Israel acab o u realm en te cain d o nas m ào s dos filisteus, e Sau l e seus filhos
fo ram m o rto s (I S m 28.19. V er IS m 3 1.1-6). O cu m p rim en to in d ireto da p ro fecia p o d e sc r v isto desse
m o d o. P o r isso , algun s en ten d em q u e D eus p erm itiu q ue Sam u el vo ltasse para ju lgar Saul.
4 A té m esm o a lógica está co n tra o E spiritism o. Im agine u m a alm a q ue tem q u e re en ca rn ar su cessiv am en
te p a ra se ap erfeiço ar, m as q ue sem pre ca rrega o s e rro s da v id a anterior. Isso é p io r do q ue dever p ara u m
b a n c o co m juro s altíssim o s; a p esso a m al co n segue p agar os juros, q ue d izer do cap ital? A lé m disso, se a
v isâo e sp írita e sd v esse certa, en tào u m cren te fiel estaria certo em co n tin u ar sendo u m cren tc fiel. Sc ele
for b em fiel e re alizar b o as obras, co m o d eve fazer, po is sào fru tos de sua con versão , p ro gred irá de
q u alq u er m odo. O co n trário n à o é v erd ad eiro para o espírita. Seg u n d o a B íblia, aqu ele q ue nào se co n ver
ter a Je su s está perd id o. P ortanto, até a lógica ensina a co n tin u ar cren te em Jesus.
Capítulo 18
1 O s principais teólogos desse período foram Sch eleierm acher, A lbrecht Ritschl c A d o lf H arnack (ver Louis
B erkhof, Teologia Sistemática, pp. 309-310; Stanley J. G rens e R o ger E. O lson, Teologia do Sêatlo XX> pp. 43-71).
2 D o n ald M . B aillie, Deus Estava em Cristo, p. 169.
3 G. C. B erk o u w er, A Pessoa de Cristo, p. 86.
4 A leg o ria foi um a m an e ira d e in terp retação m uito co m um usada p elo s Pais da Ig reja , q u e p ro cu ravam o
sen tid o o cu lto d o texto, sem m u ita p reo cu p ação co m o sc n d d o literal. O lh ava-se sem p re o lad o m ísdeo
d e um a p a ssa g em , e assim palav ras, frases ou situ ações eram in terp retad as num sen d d o q ue extrap o lava
to talm en te o asp ecto literal da p assagem bíblica.
5 G. C. B erk o uw er, y*l Pessoa de Cristo, p. 87.
6 U m o u tro asp ecto in tere ssan te é q u e o g re g o é u m a lín gu a b astan te d esen v o lvid a para a an tigu id ad e,
com u m g rau d e p recisã o b astan te elevado. Isso co n trib u iu para a p reserv açao e a in teg rid a d e o rig in al d a
m en sag em do N o vo T estam en to q u an d o foi cie trad u zid o para outras línguas.
7 W illiam H en d rik sen , Gálatas, p. 229-230,
8 A d o lf P o h l, Carta aos Gálatas, p. 143.
9 H erm an R id d erb o s, A Teologia do Apóstolo Paulo, p. 48.
lü G. C. B erk o uw er, A Pessoa de Cristo, p. 134.
11 R o b ert M . B o w m an Jr., Por Q ue Devo Crer na Trindade ~ Uma Resposta às Testemunhas de Jeová , p. 91.
12 V er W illia m H en d rik sen , Romanos, p. 347.
13 R o b ert M . B o w m an Jr ., Por Q ue Devo Crer na Trindade - Uma Resposta às Testemunhas de Jeová , p. 101.
14 L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 319.
15 V er R .C . S p ro u l, Doutrinas Centrais da Fé Cristã , L ivro I, p. 79.
16 G. C. B erk o uw er, A Pessoa de Cristo, p. 174.
17 R .C . S p ro u l, A Glória de Cristo, p. 67. V er T am b ém Boa Pergunta, p. 34.
18 E ssa re sp o sta p arece estran h a, m as nós tam b ém d izem o s q ue ele tinha e não tinha o n isciên cia, p o is ao
m esm o tem p o em q u e co n h ecia os pen sam en to s d o s ho m en s, n ào sab ia a d ata da sua vinda.
652 Razão àa esperança
Capítulo 19
1 M illard J. E rick so n , Introdução à Teologia Sistemática , p. 300.
2 V er J.N .D . K elly, 1 e 11 Timóteo e Tilo., p. 89.
3 V er W illia m H en d rik sen , 1 y 2 Timóteo y Ti/o, pp. 158-162.
4 G. C. B erk o u w er, A Pessoa de Cristo, p. 248.
5 Jo à o C alv in o , A s Instituías, (111.21.1-3). V er G. C. B erk o u w er, A Pessoa de Cristo , p.250.
6 A tos 15 n arra a p rim eira v ez cm q ue a ig re ja se re u n iu em concílio. O s ap ó sto lo s e os p resb ítero s se
re u n iram em Je ru sa lé m para tratar da questão da circu n cisão dos gen tio s.
7 E x traíd o d e J.N .D . K elly, Doutrinas Centrais da Fé Cristã, p. 256.
8 V er H . G riffith , “ N estó rio , N e s to m n is m o ” , In EHTJC , III, p. 18.
9 V er L o ren zo P erro n e, “ D e N icéia (325) a C alced ô n ia (451)” , in G iu sep pe A lb erin g o (org.), História dos
Concílios Ecumênicos, p. 74.
10 N ào ig n o ra m o s o fato d e q ue o título “F ilh o d o h o m em ” ten h a co n o taçõ es m essiân icas e até divin as.
C u llm an n a firm a q u e a n o çào de F ilho do h o m em é m ais am p la do q ue q u alq u er outra, e d escreve a ob ra
to ta l de Je su s (v er O scar C u llm an , Cristotogia do Novo Testamento , p. 181).
11 H o d g e fala b astan te d essa analo gia, em b o ra reco n h eça q ue toda an alo gia é in co m p leta q u an d o se refere
à p esso a d e C risto. V er C h arles H o d ge, Teologia Sistemática, pp. 764,765.
12 H o ek em a d isco rd a d a id eia d e q u e h á d u as n atu rezas no cren te. E le d efen d e q ue o regen erad o tem
apen as u m a n atu reza: a esp iritual. A n atu reza carn al foi cru cificad a com C risto. E le ex p lica o p ec ad o que
co n tin u a a h a b ita r na carn e co m o u m a co n seq ü ên cia d o viver com o ho m em (ver A n th o n y H o ek em a,
Salvos pela Graça, pp. 2 1 6 -2 2 1 ).
13 D ev em o s lem b ra r q u e, n esse po nto, n ào há sem elh an ças co m a d o u trin a da T rindade. N a T rin d ad e, há
u m D eu s, m as h á três p esso as, haven do só u m a natu reza, a divin a. N o se r de Je su s, há ap en as u m a
p esso a, m as d u as n atu rezas, a d iv in a e a hu m an a.
14 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática , p. 766.
15 V er C h arles H o d ge , Teologia Sistemática, p. 772.
16 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática , p. 772.
17 A p esso a d e Je su s é de fato tean tró p ica, po is há d u as n atu rezas n essa ú n ica pesso a. Porém , a n atu reza
n ào é tean tró p ica, ela c d u p la: hu m an a e d ivina.
18 A u gu stu s H . S tro n g , Teologia Sistemática , Vol. 2, p. 350. N a R efo rm a, calvinistas e luteranos se d eb ateram em
torno da q uestão dos atribu tos divinos na pessoa h um ana de Jesus. E stam os falando aqu i p rin cipalm ente
d a d isp uta existente quan to ao relacion am ento das naturezas de C risto em sua p esso a, p articu larm en te
ligad as à in terp retação d a p resen ça de C risto na Ceia. O s luteranos defen diam u m a espécie de com un icação
d e atribu tos entre a n atureza d ivin a e a natureza h um ana de Jesus. A ssim , a natu reza divina co m un ico u à
natu reza h u m an a de Je su s o atributo d a o nipresença. D esse m odo, Je su s se tornou fisicam en te onipresente.
Isso é cham ad o de “ u biqü id ad e” do corpo de Cristo. E ssa foi a m aneira q ue L u tero encontrou para d efen
d er a presen ça física de Je su s n a C eia, com b ase na expressão : “ Isto é o m eu co rp o ” . U m a vez q ue, segundo
as id éias de L u tero, Jesu s se tornou fisicam ente on ip resente p o r causa da co m un icação de atributos, então,
no m o m en to da C eia, o corpo físico de Je su s está “con su b stan ciado ” com o corpo de Cristo. Para os
calvin istas, essa m istura d e naturezas na pesso a de C risto se p arecia m uito com a antiga heresia de E utico,
q ue m istu rava as natu rezas hu m an a c divina de C risto, criando u m a espécie de terceira n atu reza, su sten tan
d o o m o nofisism o. O s calvin istas acusavam os luteranos de serem nco-eutiquianos. P or o utro lado, a
afirm ação dos calvin istas de que o corpo d e Je su s estava no céu, enquanto o seu E spírito estava na terra
soava à h eresia nesto rian a, e os luteran o s acu savam os calvin istas de serem n eo nestoriano s. E n tretan to , a
p o sição calvin ista não é nestoriana, m as em con form id ad e com calcedôn ia, cm q u e as n aturezas de C risto
estão u nid as, p o rém nào m isturadas. A natu reza divina é on ip resente, m as a h um ana não é.
19 C h arles H o d ge, Teologia Sistemática , pp. 774,7 7 5 .
20 H erm an B av in ck , Teologia Sistemática , p. 359.
21 W ayne G ru d em , Teologia Sistemática , p. 462.
22 V er G. C. B erk o u w er, A Pessoa de Cristo , p. 219.
23 E m 39 2 d .C ., p ela p rim eira vez, M aria foi d eclarad a p erp etu am en te v irg em p elo p ap a Siríaco , m as so
m en te no C o n cilio d e T ren to, em 1547, isso foi co n sid erad o u m d o g m a católico, e so m en te em 1854 o
N oJíís 653
p a p a P io IX d ecla ro u M aria to talm en te livre de p ec ad o s d u ran te toda a sua v id a. A d eclaração d esse Papa
foi: “N ó s, p ela au to rid a d e de no sso S en h o r Je su s C risto, sob a b ên ção dos ap ó sto lo s P edro e P au lo c po r
n o ssa p ró p ria au to rid ad e, d eclaram o s, p ro n u n ciam o s e defin im o s q ue a d o u trin a q ue assegu ra q u e a
B en d ita V irg e m M a ria d esd e o p rim eiro m o m en to de sua co n cep ç ão foi, p ela sin gu lar g raç a e p riv ilégio
d o T o d o -p o d ero so D eu s, em v ista d o s m érito s d e C risto Je su s o S alvad o r da raça h u m an a, p reserv ad a
im u n e de to d a m ácu la d e p ecad o origin ar*. O Papa L eão X III, em 1891, na en c íc lica Octobri Mense d ecla
ro u q ue “ O E tern o F ilh o d e D eu s, q u an d o q u is tom ar a n atu reza d e h o m em para re d en ção e g lo rificação
da h u m an id ad e, (...) n ão fez sem p rim eiro ter o ab so luto livre co n sen tim en to de su a esco lh id a m ã e (...)
então» assim co m o n in g u ém p o d e ir ao su p rem o P ai sen ão p o r m eio do F ilho, é certo q ue, n in g u ém pode
ir ao F ilh o sen ão p o r m eio da M ãe (...) M aria é a ú n ica, M aria é digna d e todo lo u v o r; ela é p o d ero sa, m ãe
d o to d o -p o d ero so D e u s” . E m 1892, esse m esm o P apa, na en cíclica M agnos D ei Ma/ris declaro u : “E la
p erm a n ece so b re tod as as o rd en s de an jo s e ho m en s, e so m en te ela está p ró x im a de C risto ” . N a en cíclica
M ystici Corporis C hm ti , d e 1943, o Papa P io X II d eclaro u q ue M aria foi im u n e de todo p ec ad o ; o fereceu
o seu filh o no G ó lg o ta ao P ai; o b teve o d erram ar d o E sp írito S an to no P en te co ste s; p ro v id en cia cu id ad o
m a tern o p ara a ig re ja ; e rein a n o s céu s com C risto. E m 1950 ele d eclaro u: “ E la co n q u isto u a m o rte e foi
elev ad a co m co rp o e alm a p ara a g ló ria dos céu s, o n d e com o R ain h a rein a re fu lg en te à d ireita d o seu
F ilho... N ó s p ro clam am o s e d efin im o s esse d ogm a revelad o p o r D eu s q u e a im acu lad a M ãe d e D eus,
M aria sem p re V irgem , q u an d o o cu rso de su a v id a terren a se acab o u , foi to m ad a co m co rp o e alm a para
a g ló ria dos céu s” . T u d o isso foi co n firm a d o p elo C o n cílio V atican o II. (V er P au l E n ns, The Moody
Hatidbook o f Theology, P arte 4, Cap. 37).
Capítulo 2 0
1 C h arles H o d gc , Teologia Sistemática, p. 822.
2 D. M . L lo yd -Jo n es, Deus o Pai, Deus o Filho, p. 375.
3 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática , p. 829.
4 Jo ã o C alv in o , Institutas, 111,15,2.
5 L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 358.
6 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 366.
7 D eve se r n o tad o q ue tan to Je su s q u an to o E spírito S an to re ceb em o títu lo de parakletos (ad v o gad o ou
co n so lad o r). O E sp írito Santo é o ad v o gad o d e C risto n a terra e dos pró p rio s cren tes c o n tra o m undo ,
e C risto é o a d v o gad o d o s crentes no céu ju n to a D eu s e co n tra Satanás.
s E m b o ra os d ias d e N o c re p resen tem , teo lo g icam en te, os p io res dias q ue este m u n d o já viu. D eu s en tre
g o u o ser h u m an o ao seu pró p rio p ecad o , e o h o m em foi lib erad o para se r tão m au q u an to po ssível.
D ep o is d o d ilú v io , D eu s im p ô s restriçõ es ao ser hu m ano , e não p erm ite q ue ele ch egu e facilm en te ao
lim ite d a m ald ad e. Je su s d isse, p o rém , q ue lo g o an tes de sua v in d a, o m u n d o vo ltaria a ser se m elh an te ao
m u n d o d o s d ias de N o é (M t 2 4.3 7 -3 9 ).
9 F ran cis S ch aeffer, A Obra Consumada de Cristo, p. 70.
10 A p rim eira c o m p licação co m essa id éia c q u e o ser h u m an o nu n ca co n seg u iria o ferecer a D eu s um
v erd a d eiro arrep en d im en to . O en sin o b íb lico é q ue o a rrep en d im e n to é u m d om d e D eu s (ver A t 11.18;
R m 2 .4 ; 2T m 2.25).
11 Jo h n S to tt, A Cru% de Cristo , p. 55.
12 Jo h n M u rray, Redenção: Consumada e Aplicada, p. 19.
13 V er D o n ald A. H agn er, Word Biblieal Commentary, Volume 33b: Matthew 14-28, M t 20,26.
14 N a p a ssa g em em q u e D eu s renova a aliança com A b raão , ele m an d a A b raão o rg a n iza r u m a cerim ô n ia
co m u m d aq u eles d ias q ue sim b o lizav a u m pacto. A nim ais eram co rtad o s ao m eio e as m etad es eram
co lo cad as u m as d efro n te às o utras, d eix an d o u m co rred o r ao m eio. O s p ro p o n en tes p assavam jun tos
pelo m eio d o s an im ais assum in d o a resp o n sab ilid ad e em caso de q u eb ra do p acto , q ue seria a m o rte. N o
caso d e A b raão , D eu s p asso u so zin h o pelo m eio dos ped aço s, assum in d o in teiram en te a re sp o n sa b ilid a
de (G n 15.9-17).
15 B. B. W arfteld, Biblieal Fotmdations, p. 193.
16 D o n ald M . B aillie, Deus Estava em Cristo, p. 216.
17 V er W ayne G ru d em , Teologia Sistemática, p. 478.
18 W ayne G ru d em , Teologia Sistemática , p. 477.
19 M ich ae l H o rto n , Creio , p. 100.
20 V er D .M . L lo yd -Jo n es, Deus o Pai, Deus o Filho, p. 426.
21 Jo h n Sto tt, A Cru% de Cristo, p. 116.
22 D. M . L lo yd -Jo n es, Deus o Pai, Deus o Filho, p. 425.
65 4 Razão da esperança
Capítulo 21
1 F ran cis S ch aeffcr, A Obra Consumada de Cristo, p. 75.
2 B en jam im B. W arficld , lu i Personay I^a Obra de Cristo^ p. 324.
3 B en jam im B. W arfield , La Personay l^a Obra de Cristo, pp. 306,307.
4 B en jam im B. W arfield , La Personay Iuj Obra de Cristo, p. 324.
5 A n selm o argu m en ta ex ten siv am en te so b re esse assun to no seu livro CurD eo Piomo? O livro d e A n selm o
tem fo rm a d e d iálo go en tre ele m esm o e B oso, u m de se m discípu los. B o so faz as p ergu n tas e A n selm o
as resp o n d e. N a co sm o lo gia d e A n selm o , D eus crio u o m u n d o para a sua g ló ria e, q uan d o o ser h u m an o
p eco u , a h o n ra d e D eu s foi ferida. Isso foi um in sulto à sua h o n ra c algum a satisfação p recisav a ser dada.
A ssim , Je su s C risto realizo u um sacrifício em prol da h o n ra de D eus. (Ver B en g t H ãg g lu n d , História da
Teologia, pp. 146-148).
6 P ara o u tras teo rias a re sp eito d a ex p iação , v er R o b ert L e th am , The Work o f Christ, pp. 159-175.
7 B. B. W arfield , Bib/icaiFoundations, pp. 169,170.
8 B a illie d iz q ue “ o tem a do sacrifício no an tigo Israel é b asta n te co m p licad o c co n tro v ertid o ” . E le nao
en ten d e q u e os p ec ad o s grav es eram ab so lv id o s pelos sacrifícios. (Ver D o n ald M . B aillie, Deus Estava em
Cristo, pp. 200,201).
9 C h arles H o d gc , 'Teologia Sistemática, p, 855.
1(1 V er L o uis B erk h o f, 'Teologia Sistemática , p. 378.
n j. C alvino., Ímtiínción, I II.8.1.
12 Jo ào C alv in o , A Verdadeira Vida Cristã, p. 45. “E le nào so m en te pad eceu co n stan te aflição , m as tam bém
q u e toda a sua v id a foi u m a esp écie d e cru z p erp étu a ” (Joào C alvino, A s Instituías, (1541), IV.17).
13 O C red o dos A p ó sto lo s tem a sua o rig em no C red o R o m ano A n d g o , elab o rad o no sécu lo 2o, tendo
algum as d eclaraçõ es d o u trin árias acrescen tad as no d eco rrer dos p rim eiro s séculos, c h e g an d o à sua for
m a atu a l p o r v o lta d o sécu lo 7o. V er J. N. D. K elly, Primitivos Credos Cristianos, p. 125ss.; P. S ch aff, The
Creeds o f Christendom, V ol. í , pp. 19-22; II. 45-55.
14 W ayn e G ru d em , Teologia Sistemática , p. 489.
15 V er L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática , pp. 342,343.
10 B e rk h o f p refere falar q u e a alm a de Je su s ficou num estado passivo c nao ativo (v er L o uis B erkh o f,
Teologia Sistemática, p. 343).
17 O C atecism o de H eid elb erg na respo sta à P ergu n ta 37 diz: “ Q u e C risto, em co rp o e alm a, d u ran te toda
a su a v id a n a terra, m as p rin cip alm en te no final, su p o rto u a ira de D eu s co n tra o p ecad o d e todo o
gên ero h u m a n o ” .
18 M ich ael H o rto n , Creio, p. 99.
19 jo ã o C alv in o , ínstitutas, (11,16,10).
20 Jo ã o C alv in o , ínstitutas , (11,16,10).
21 H erm an B av in ck , Teologia Sistemática, p. 401.
22 B e rk h o f en fatiza q ue, a in d a assim , o am o r do P ai nao se retirou do F ilh o , o q u e p o r certo é v erd ad e (ver
L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 340).
23 C ab e ainda um a explicação à q uestão d o C redo A postólico. A inda q ue a expressão não se encontre nas
versões m ais antigas, ela se encaixa n a seqüência das expressões. O C redo faz u m a e sp écie de seqüência em
“V ” p ara d em o n strar a trajetória d e Cristo. A p rim eira d eclaração sobre Jesu s c: “C reio cm Jesu s C risto seu
único filho, n o sso Sen h o r” . E ssa afirm ação aponta p ara a divin dade de Jesus. A seguin te, para a encarnação,
q u e representa u m po n to abaixo: “ Q ue foi con cebid o pelo p o d er do E sp írito S an to ” . A p róxim a m ais um
po n to abaixo : “N asceu da v irgem M aria” . E continua a descida: “ P adeceu sob P ôn cio P ilato s” . D esce ainda
m ais: “Foi crucificad o, m o rto e sepu ltad o” . A próxim a expressão rep resen ta o po nto m ais inferio r de
todos: “D esceu ao h ad es” . D aí co m eça a subida: “R essuscitou ao terceiro dia. Subiu aos céus. E stá assen
tado à d ireita de D eu s Pai T odo-Poderoso. D o nd e há de v ir p ara ju lgar os vivos c o s m ortos...” . P ortanto, a
expressão “ D esceu ao h ad es” quer ind icar o p o nto m áxim o da h u m ilhação de C risto antes d e sua exaltação.
E la sign ifica sim p lesm en te: E steve sob o po d er da m o rte em todos os sentidos.
24 Ja m e s D en n ey, The Death o f Cbnst, p. 157.
Capítulo 22
1 N o s estad o s am erican o s em q ue ex iste a pen a de m o rte, so m ente o g o ve rn a d o r p o d e, n u m a ligação
telefô n ica d e ú ltim a h o ra, su star a execu ção do con denado.
Noíns 655
2 N o sécu lo 17, a teo lo g ia esco lástica p ro testan te p ro d u ziu ex ten sas obras so b re a expiação. U m a das m ais
co n h ecid as foi a do p u ritan o Jo h n O w en , q u e tratou ex ten siv am en te da q u estão da ex p iação lim itada.V er
Jo h n O w en , Por Q uem Cristo Morreu? (P u b licaçõ es E v an gélicas Selecio n ad as). E ssa o b ra é u m a versão
sim p lificad a e c o n d en sad a do clássico The Death o f Death in the Christ’s Death (1616-1684). V er W illiam H .
G o old (org.), The Works o f John Owen , V ol X . L iv ro I.
3 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 395.
4 O s teó lo g o s re fo rm a d o s u sam am bas as ex p ressõ es para a d o u trin a. A ex p ressão “d efin id a ” parece
m elh o r p elo fato d e q u e não faz p arecer q ue a ex p iação de C risto seja lim itad a em po der. A idéia c q u e a
ex p iação c d efin id a em re la çã o aos eleito s, m as não lim itad a em p o der. N este trabalho , há u m a p referên
cia p elo term o “ ex p iação d efin id a” , em b o ra não seja d escartad o o term o “ex p iação lim itad a” .
5 C h arles H o d gc , Teologia Sistemática, p. 892.
6 C o n fissão de Fé de W estm inster, V III.V.
7 O s cin co p o n to s do a rm in ian ism o sào: d ep rav ação p arcial, eleição co n d icio n al, ex p iação ilim itad a, g raç a
resistív el e p o ssib ilid a d e de p erd a d a salvação.
B O s C ân o n es d e D o rt, II.IIL
9 O s C ân o n es d e D o rt, I1.V U I. E ssa lin h a de argu m en tação é co n sid erad a calvin ista. O no m e “ calv in ista”
v em d o re fo rm a d o r Jo ã o C alvino (1 5 0 9 -1 5 6 4 ), que foi o gran d e sistem atiz ad o r da R efo rm a P ro testan te.
E le p ro d u ziu u m a v asta o b ra teológica p o r m eio de co m en tário s d a S agrad a E scritu ra, tratad o s teo ló g i
cos, serm õ es e cartas. Su a ob ra m agn a, as Instituías, é gera lm en te co n sid erad a a m aio r o b ra teo ló g ica da
R efo rm a P ro testan te, e um a das m ais im p o rtan tes da H istó ria. Jo ã o C alvino , ap esar d e p o ssiv elm en te ter
b asead o boa p arte d a su a teologia n a o b ra do céleb re A go stin h o , é co n sid erad o o Pai da T eo lo g ia R efo r
m ad a, e tod o o sistem a refo rm ad o d ep en d e essen cialm en te dos ensinos do re fo rm a d o r de G en ebra,
P o rém , a q u estão q u e se tem lev an tad o nos últim o s tem p os é se C alvino co n co rd aria com todo s os cinco
p o n to s do calv in ism o , esp ecialm en te o q u e fala da ex p iação lim itada. N a m in h a d issertação de m estrado,
pro cu ro d em o n stra r q u e a d o u trin a d a ex p iação lim itad a tem sua b ase em C alvin o (V er L e an d ro A nto nio
L im a, Uma Apologia <ia Expiação Definida em Calvino. São P aulo : C en tro P re sb iterian o d e P ó s-G rad u ação
A n d rew Ju m p e r, 200 2 ). P ara um a rtigo com essa exp o sição resu m id a ver L e an d ro A nto nio de L im a,
“ C alv in o E n sin o u a exp iação L im itad a?” , São P aulo : R evista Fides Reformata , Vol 9, n . l , 2 00 4, pp. 77-99.
10 Q u an to à ap aren te co n trad ição entre os “m u ito s” de Je su s e os “p o u co s” q ue en tram p ela p o rta estreita
(M t 7 .1 3 ,1 4 ), é p reciso q ue se en ten d a q ue a so m a dos salvos, cm todo s os tem p os, p ela m o rte d e Je su s,
fo rm a “ m u ito s” , p o rém , o n ú m ero de salvos, em cad a ép o ca, certam en te fo rm a o g ru p o dos “ p o u co s” ,
esp ecialm en te em co m p aração com o nú m ero de nào-salvos.
11 Esses conceitos são b aseados n a exposição de M ichael H orton, A s Doutrinas da Maravilhosa Graça, pp. 130,131.
Capítulo 23
1 Jo sh M c D o w ell, Evidência que Uxige um Veredito, p. 239,240.
2 Jo ã o , en tretan to , foi p risio n eiro na terrível Ilh a de Patm os.
3 C h arles H o d gc, Teologia Sistemática, p. 951.
4 C h arles H o d gc, Teologia Sistemática , p. 951.
5 Jo s h M aeD ovvell, A s Evidências da Ressurreição de Cristo, pp. 25-26.
6 V er M ich ael H o rto n , Creio, p. 111-112.
7 W ayne G ru d em , Teologia Sistemática, p. 512.
H C h arles H o d ge. Teologia Sistemática , p. 953.
9 L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 347.
10 G eo rge E ld o n L ad d , Teologia do Novo Testamento, p. 303.
11 L ew is S p e rry C h afer, Teologia Sistemática, V ol 5-6, p. 218.
12 L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 347.
13 W illiam H cn d fik se n , Romanos, p. 184.
14 W illia m H en d rik sen , Romanos, p. 184.
15 Ju stin o (1 0 0 -1 6 7 d .C .), p o r v o lta do ano 150, fez a m ais co m p leta d escrição do cu lto na Ig reja P rim itiva,
o n d e ele se re fe riu ao d o m in go com o dia de culto: “N o dia q ue se cham a d o so l [d o m in go ], celeb ra-se
u m a reu n ião de to d o s os q ue m o ram nas cid ad es ou nos cam p os, e aí se Icem , en q u an to o tem p o o
p erm ite , as M e m ó rias d o s ap ó sto lo s [quatro E vangelhos] o u o s escritos dos p ro fetas....” . (Ver Ju stin o de
R o m a, 1 Apologia, 67.7 . p. 83-84). Ju stin o in clu siv e ex p lico u a razão d e a Igreja g u a rd a r o d o m in go :
“ C eleb ram o s essa reu n ião g era l no dia do so l, p o rq ue foi o p rim eiro dia em q ue D eu s, tran sfo rm an d o as
trevas e a m a téria , fez o m u n d o , e tam bém o d ia em q ue Je su s C risto, no sso Salv ad o r, ressu scito u dos
m o rto s” (Ju stino d e R o m a, I Apologia, 67. pp. 83-84). U m o u tro d o cu m en to q ue atesta a an tigü id ad e da
656 Razão da esperança
Capítulo 2 4
1 V er W ayne G ru d em , Teologia Sistemática, p. 517.
2 H crm an B av in ck , Teologia Sistemática, p. 408.
3 M ich acl H o rto n , Creio, p. 138.
4 E n tretan to , n ào d ev em o s p e n sa r q ue ele esteja “ fisicam en te” entre nós, co m o sc o seu c o rp o físico fosse
on ip resen te. S eg u n d o o calv in ism o , a natu reza d iv in a dc Je su s c o n ip resen te, m as a su a n atu reza h u m an a
nào c, p o rq ue nào há co m u n ic aç ão dc atrib u to s entre as natu rezas dc Je su s. N a R efo rm a, u m a lo n g a
d iscu ssão so h rc isso sc esta b eleceu e n tte lu teran o s e calv in istas. A te m esm o um ca tecism o su rg iu , p a ta
ten tar fazer a co n ciliação entre as d u as p artes: o C atecism o dc H cidclbcrg. E sse catecism o foi fo rm u lad o
p ara estab elecei: u m co n sen so , p o rem , suas id éias em relação à C eia do S e n h o r in clin a m -se m u ito m ais
para a teo lo g ia refo rm ad a, O C atecism o dá um d estaq u e im en so à a sce n são d c Je su s, p o is h á só u m a
p erg u n ta so b re a re ssu rreição c quatro so bre a ascen são , c com o no ta K lo o stcr, isso a p o n ta, ev id e n te
m en te p ara a questão do d eb a te so bre as natu rezas dc Je su s à lu z d a d iscu ssão a resp eito da C eia do
S en h o r (ver F rcd H . K lo o stcr, y-4 Mighty Comfort - The Christian Faith Acording to the Heidelberg Catechism , p.
53). A P erg u n ta 4 7 do C atec ism o an tecip a u m a d ú v id a e p ro vável o b je ção : Sc C risto está no ccu , então ,
co m o ele p ô d e ter d ito q ue estaria co n o sco todos os dias até a co n su m ação do sé cu lo ? A re sp o sta é:
“S eg u n d o sua natu reza h u m an a, nào está ago ra na terra, m as segu n d o sua d iv in d ad e, m ajestad e, g raç a e
esp írito , jam ais sc afasta de n ó s” . D esd e o m o m en to da asccnsào, Je su s nào está m ais fisicam en te entre
nós. N ào h á q u a lq u er co m u n icação dc atrib u to s na p esso a dc Je su s. A n atu rez a h u m an a p erm a n ece
h u m an a c nào re ceb eu o a trib u to da o n ip resen ça. J á a n atu reza d ivin a que se m p re foi o n ip resen te está
cm todo lu g a r ao m esm o tem po. É n esse sen tid o q ue Je su s está p resen te en tre nós.P or cau sa dc sua
o n ip resen ça d iv in a , ele está co n o sco todo s os d ias até o fim do m undo.
Capítulo 25
1 N este p o n to , in iciam o s os estu d o s so b re o q ue os teó lo g o s ch am am dc Soteriologia. E o estu d o a respeito
d a salv açào c o m o d o co m o 6 ap licad a na v id a das p esso as. O s cap ítu lo s an terio res trataram da C risto lo -
gia, isto e, d a p esso a dc C risto e de sua obra. A go ra, falarem os so bre com o essa o b ra d c C risto c aplicada
a nós, o u se ja , co m o so m o s salvos. A C risto lo g ia falou so bre a o b ra ex tern a d c D eu s p ara n o s salv ar; a
S o te rio lo gia fala da ob ra d a salv açào q ue D eus realiza dentro dc nós.
2 L o rain e B o ettn cr, imortalidade, p. 13.
3 C om isso nào q u erem o s d izer q u e Satanás q uis im p ed ir q ue Je su s m o rresse na cruz. Satan ás tentou
im p ed ir a red en ção , m as n em ele sabia exatam ente co m o Je su s faria isso.
4 A p rática d as “ in d u lg ên cia s” é b em an tiga na igreja ro m an a; nin g u ém sab e ao certo q u an d o cia teve
início. S c h a ff diz q ue, até cerca dc 1150, a estru tu ra sacram en tal das in d u lg ên cia s n ào estav a co m p leta
m en te desenvolvid as (D. S. Sch aff, Nossa Crença e a de Nossos Pais>p. 329 ), E m n o v em b ro d c 1095J pela
p rim eira v ez , foi p ro m etid a a in d u lgên cia p len ária p elo p ap a U rb an o Tl (1 0 8 8 -1 0 9 9 ), no S ín o d o dc
C lc rm o n t na F ran ça, a todo s aqu eles q ue p articip a ssem , p o r p u ra d cv o çào , d a P rim e ira C ru zad a em
Je ru sa lé m .
5 R. C. M c G re g o r W righ t, A Soberania Banida , p. 102.
6 H crm an n B a v in ck , Teologia Sistemática, p. 462,
7 L e w is S p c rry C h afcr, Teologia Sistemática, Vol 7 -8, p. 234.
Capítulo 2 6
1 V er A u gustus H . Stro n g, Teologia Sistemática , vol. 2, p. 497.
V er L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 449. A inda q ue tu do isso d ev a se r v isto dc u m a persp ectiva
p u ram e n te esp iritu al, p o is C risto e o cren te p erm an ecem com o p esso as d istin tas, su as p erso n alid ad es
nào sc fundiram .
3 A n th o n y H o ck cm a, Salvos Pela Graça, p. 62.
Nolas 657
Capítulo 2 7
1 A n th o n y H o ek em a, Salvos Pela Graça, p. 76.
2 Jo ã o C alv in o , Commeníaty on the Second Bspistle o f Peter; 2 P ed ro 3.9.
3 Jo ã o C alv in o , A s Institutas, (1 5 4 1 ), 111.8.
4 A n th o n y H o ek em a, Salvos Pela Graça, p. 86.
5 J. C. R yle, Meditações no Evangelho de Mateus, p. 261,
6 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática, p. 990.
7 V er M ich ael H o rto n , A s Doutrinas da Maravilhosa Graça , p. 137. A lgu m as ab o rd agen s do restan te deste
estu d o p o d em se r en c o n trad as no cap ítu lo “ G raça E m b riagan te” , desse m esm o livro.
8 H e rm an n B av in ck , Teologia Sistemática, p. 462.
9 A u gu stu s H . S tro n g , Teologia Sistemática, vol. 2 p. 493.
10 R. C. M c G reg o r W righ t, A Soberania Banida, p. 143.
11 H e rm an n B av in ck , Teologia Sistemática, p. 458.
Capítulo 28
1 A E scritu ra fala ain d a d a re g en eraç ão num sentid o m ais am plo, in d ican d o a restau ração final da criação,
q u e aco n tecerá na segu n d a v in d a d e Jesu s (M t 19.28). O p ró p rio C alv in o u so u a palavra co m o u m
sin ô n im o d o p ro cesso total d e ren o v ação da v id a e crescim en to espiritual d o cristão (ver R. C. M c G rcgo r
W righ t, A Soberania Banida, p. 145).
2 A n th o n y H o ek em a, Salvos Pela Graça, p. 111.
3 V er L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 473. B e rk h o f d iz q ue a re g en eraç ão age de d en tro , en q u an to a
v o ca çã o age de fora.
4 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 473.
5 V er L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 473-474.
6 O Rev. H erm isten co m p ô s o segu in te q u ad ro co m p arativ o entre os diversos teó lo g o s re fo rm ad o s: Char
les Hodge (1 7 9 7 -1 8 7 8 ) 1. V ocaçào. 2. R egeneração . 3. Fé. 4. Ju stificação . 5. San tificação . W. G, T. Shedd
(18 2 0 -1 8 9 4 ) 1. R egen eração . 2. C onversão. 3. Ju stificação . 4. San tificação . R .L . Dabney (1820-1898) 1.
V o cação E ficaz. 2. Fé. 3, U n ião com C risto. 4. Ju stificação . 5. A rrep en d im en to . 6. S an tificação e B oas
O bras. 7. P ersev eran ça d o s S a n t o s .^ . A. Hodge (1823-1886) 1. V ocação E ficaz. 2. R egeneração . 3. Fé. 4.
U n iào M ística. 5. A rrep en d im en to . 6. Ju stificação . 7. A d oção . 8. S an d ficação 9. P erseveran ça dos Santos.
Abraham Kuyper ( 1837-1 9 2 0 ) I . Ju stificação . 2. R egeneração . 3. V ocação. 4. C onversão. 5. Fé. 6. S a n tifica
ção. Herman Bavinck (1 8 5 4 -1 9 2 1 ) 1. V ocaçào C ristã/ R egen eração . 2. F é/ A rrep en d im en to . 3. Ju stificação .
4. San tificação / G lo rificação . Louis Berkhof (1873-1957) 1. U n ião M ística. 2. R eg en eração / V o cação E fi
caz. 3. C o n v ersão : A rrep en d im en to e Fé. 4. Ju stificação . 5. San tificação . 6. P ersev eran ça d o s Santos.
Herman Hoeksema (1886-1965) 1. R egeneração . 2. V ocação E ficaz. 3. Fé. 4. C onversão. 5. Ju stifica çã o . 6.
S an tificação . 7. P ersev eran ça c P reservação . 8. G lo rificação . JohnM urrqy (189 8-19 74) 1. V ocaçào. 2. R e
gen eração . 3. Fé e A rrep en d im en to . 4. Ju stificação . 5. A d o ção . 6. S an tificação . 7. P erseveran ça. 8. G lori-
658 Razão da esperança
Capítulo 2 9
5 H erm an n B av in ck , Teologia Sistemática, p. 479.
2 A n th o n y H o ek em a, Salvos Pela Graça , p. 133. C alv in o d izia: “A rrep en d im en to sign ifica q ue n o s retiram o s
d e n ó s m esm o s e n o s co n v ertem o s a D eus, e, tend o ab an d o n ad o a n o ssa p rim eira fo rm a de p en sa r e de
q uerer, a ssu m im o s u m a nova.” (Joào C alvino. As ínstitutas, (1541), I I .5).
3 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática, p. 1077.
4 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática, p. 1077.
5 Jo ã o C alv in o , ínstitutas, III.2.10.
6 A n th o n y H o ek em a, Salvos Pela Graça , p. 147.
7 C h arles H o d ge, Teologia Sistemática, p. 1089.
8 R. C. M c G re g o r W righ t, A Soberania Banida , p. 144.
9 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática, p. 1057.
10 C itad o p o r K in R id d leb arg er. “ O q ue 6 Fé?” , cm Cristo Senhor, org. p o r M ich ael H o rto n , p. 99. V eja
tam b ém a ex p o sição ex egética de Jo e l R. B eek e no a rtigo “A R elação da Fe co m a Ju stific a ç à o ” , em
Justificação pela Fé Somente , p. 51, a an álise da ex p ressão “p ela fé” . E le argu m en ta q u e, ex egeticam en te,
jam ais p o d eria se lo c a liz a r n a fé o p o d er de salvação, m as no o b jeto da fe, q u e é C risto. N essa m esm a
o b ra, Jo h n G erstn er, no a rtigo “A N atu rez a da F e Ju stifica d o ra ” , diz: “A ssim , a B íb lia está n o s en sin an d o
q u e a fé q u e salva não é u m a o b ra. E la não tem v alo r esp iritu al cm si. M ais p recisam en te, a v erd ad eira
ig reja cristã n ão en sin a ju stificação p ela fe. E la en sin a a justificação p o r C risto ” (pp. 87-88).
11 B av in ck d iz: “A ssim com o, p elo lad o da m en te, a fe é o fru to d a regen eração , assim tam h ém , pelo lad o da
vo n ta d e, o arrep en d im e n to é a ex p ressão da n o v a v id a ” . H erm an n B a v in ck , Teologia Sistemática, p. 475.
Capítulo 30
1 V er M ich ae l H o rto n , A s Doutrinas da Maravilhosa Graça, p. 153.
2 C h arles H o d ge, Teologia Sistemática, p. 1115.
3 V er R. C. S p ro u l, “A N atu rez a F o ren se d a Ju stific a ç ã o ”, em Justificação Pela Fé Somente, p. 27.
4 V er R. C. S p ro u l, “A N atu reza F orense da Ju stific a ç ã o ”, em Justificação Pela Fé Somente, p. 33.
5 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática, p. 1133.
6 V er R. C. S p ro u l, “A N atu reza F o ren se d a Ju stific a ç à o ”, em Justificação Pela l'é Somente, p. 37.
7 V er R. C. S p ro u l, “A N atu rez a F o ren se da Ju stific a ç ã o ”, cm Justificação Pela F é Somente, p. 37.
8 V er R . C. S p ro u l, “A N atu rez a F o ren se d a Ju stifica çà o ”, em Justificação Pela Fé Somente, p. 38.
9 H erm an n B a v in ck , Teologia Sistemática, p. 500.
10 M esm o a a b ste n ção de “relaçõ es sexu ais ilícitas” (v. 29) tinha u m fim cerim o n ial, q u e ap o n tava para
algun s tip o s de u n iõ es co n ju gais p ro ib id as, co m o a de p aren tes p róxim os (L v 18.1-30).
11 Jo ã o C alv in o , A s Ínstitutas, (1541), IV.16.
12 H e rm an n B a v in ck , Teologia Sistemática, p. 496.
13 H erm an n B av in ck , Teologia Sistemática, p. 503.
14 G eo rge W h ite fic ld , Cristo: Sabedoria, Justiça, Santificação, Redenção, p. 8.
15 H erm an n B av in ck , Teologia Sistemática, p. 514.
Nolas 659
Capítulo 3 1
1 C atecism o M a io r d c W cstm in ster, P ergu n ta 75.
2 J. 1. P acker, A Redescoberta da Santidade, p. 14.
3 A n th o n y H o ek em a, Salvos Pela Graça, p. 211.
4 P or essa razão, a B íb lia ch am a os cren tes de san to s (SI 16.3 ; A t 9 .3 2 ; Um 16.2; 2C o 8.4; E f 1.1; Cl 1.2;
lT m 5 .1 0 ; H b 6 .1 0 ; J d 3; A p 11.18).
5 A n th o n y H o ek em a, Salvos Pela Graça, p. 199.
6 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática, p. 1188.
7 H erm an n B a v in ck , Teologia Sistemática, p. 521.
8 A u gu stu s H. S tro n g, Teologia Sistemática, vol. 2, p. 506.
H erm an n B a v in ck , Teologia Sistemática, p. 523.
10 W iliia m H cn d rik sen , Colossenses e Filemom, p. 158.
11 W iliia m H cn d rik sen , Colossenses e Vilemom, pp. 167-168.
12 H e rm an n B a v in ck , Teologia Sistemática, p. 529.
13 H erm an n B a v in ck , Teologia Sistemática, p. 522.
14 J. C alvino , Catecismo de Genebra, P ergu ntas 255 e 256.
Capítulo 32
1 C itad o p o r M ich ael H o rto n , A s Doutrinas da Maravilhosa Graça, p. 192.
2 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, p 549.
3 T ratarem o s d esta q u estão m ais à frente.
4 R. C. M c G reg o r W righ t, A Soberania banida, p. 149.
5 A u gu stu s H . S tro n g , Teologia Sistemática , v o l, 2 p. 631.
6 F ran cis S ch aeffer, A Obra Consumada de Cristo, p. 232.
Capítulo 33
1 N o g r e g o c a p alav ra “pneumd\ N o h eb raico “ruacti" c esp írito e tam b ém é vento.
2 N o in íc io d a ig re ja , a p re o c u p a ç ã o p rin c ip a l foi co m a p esso a d e C risto , em b o ra o E sp írito S an to
ten h a re c e b id o aten ção . D u ra n te a R e fo rm a , a o b ra do E sp irito S a n to foi e n fa tiz a d a , esp e c ia lm e n te
p o r C alv in o , q u e re d e sc o b riu o seu p a p e l n a a p lica çà o d a salv ação . P o rém , n o s estu d o s p o ste rio re s da
te o lo g ia s is te m á tic a , a p esso a e a o b ra d o E sp írito n em sem p re m e re c e ram u m a seção p ró p ria . G era l
m e n te , ele foi e stu d a d o ju n to com a T rin d a d e o u d en tro da so tcrio lo g ia . S in c la ir B. F erg u so n , no
en ta n to , en te n d e q ue o E sp írito S an to n ão ficou esq u e c id o n o s escrito s d o s g ran d e s teó lo g o s, p o is
C alv in o , O w cn , K u yp er e o u tro s se d e d ic a ra m na a b o rd a g e m da d o u trin a do E sp írito S an to , o q ue
co n c o rd am o s p ro n ta m e n te (V er S in c la ir B. F ergu so n . O E s p ír it o S a n to . Sào P au lo : E d ito ra O s P u ri
ta n o s, 2 0 0 0 , p. 9 -1 0 ).
3 R. C. S p ro u l, O Mistério do Espírito Santo , p. 17.
4 R. C. S p ro u l, O Mistério do Espírito Santo, p. 19.
5 Jo h n S to tt, Batismo e Plenitude do Espírito Santo, p. 17.
6 F. D. B ru n cr, Teologia do Espírito Santo, p. 126.
7 V er Jo h n Sto tt, Batismo e Plenitude do Espírito Santo, p. 20.
8 C h arles H o d ge , Teologia Sistemática, p. 395.
9 W ayne G ru d em , Teologia Sistemática , p. 533.
10 H erm an n B av in ck , Teologia Sistemática, p. 424.
11 Jo h n Stocc, Batismo e Plenitude do Espírito Santo, p. 17.
12 D. M . L lo yd -Jo n es, Deus o Espírito Santo, p. 45.
13 Jo ã o C alv in o , A s Institutas, (1541), 11.7.
14 D. M . L lo yd -Jo n es, Deus o Espírito Santo, p. 31.
15 D. M . L lo yd -Jo n es, Deus o Espírito Santo, p. 31.
16 P o r isso, algun s q u estio n am o pró p rio term o “ p en tcco stal” ,d izen d o q u e n ào faz sentido dentro de u m a
term in o lo gia crista, p o is, se o E sp írito San to tivesse sid o enviad o p o r o casiào da P ásco a, então haveria
crcn tcs “ p a sco a is” ?
17 V er A lan R ich ard so n , Introdução a Teologia do Novo Testamento, p. 119.
660 Razão da esperança
18 O s sam aritan o s eram h a b ita n tes d e S am aria, u m a pro v ín cia q ue, no passado, havia sido u n id a a Ju d á . N o
A n tig o T estam en to , o rein o d e Israel era co m p o sto d e doze tribos. Q u an do o re in o se d ivid iu , d ep o is do
rein ad o d e S alo m ão , Ju d á co n stitu iu u m rein o sep arad o , o R ein o d o S u l, en q u an to a m aio ria das ou tras
tribo s fo rm o u o R ein o d o N o rte , que ficou co n h ecid o com o Sam aria.
19 V er F. D. B ru n er, Teologia do Espírito Santo, p. 137.
20 F. D. B ru n er. Teologia do Espírito Santo, 148.
21 F. D. B ru n er, Teologia do Espirito Santo, p. 151.
Capítulo 34
1 J o h n S to tt, Batismo e Plenitude do Espírito Santo , p. 35.
2 Jo h n S to tt, Batismo e Plenitude do Espírito Santot p. 44.
3 A . A . H o ek em a, Salvos pela Graça, p. 58.
4 L o u is B crk h o f, Teologia Sistemática, p. 541.
5 R. C. S p ro u l, O Mistério do Espírito Santo , p. 163.
6 R . C. S p ro u l, O Mistério do Espírito Santo , p. 164.
7 Jo h n S to tt, Batismo e Plenitude do Espirito Santo, p. 56.
8 Jo h n S to tt, Batismo e Plenitude do Espirito Santo , p. 56.
9 A n th o n y H o ek em a, Salvos Pela Graça, p. 51.
10 A . A . H o ek em a, O Cristão Toma Consciência do Seu Valor, p. 53.
u Jo à o C alv in o , Instituías, II.2 .1 9 .
•2 R. C . S p ro u l, Verdades Essenciais da Fé Cristã, V ol 2, p. 15.
13 E d w in H . Palmei-, E l Espiritu Santo , p. 68.
14 C .H . S p u rg co n , Firmes na Verdade, p. 72.
Capítulo 35
1 V er Jo h n S to tt, Batismo e Plenitude do Espírito Santo , p. 46.
2 Jo à o C alv in o , A Verdadeira Vida Cristãy p. 25. C alv in o diz ainda: “P au lo su sten ta q ue aq u ele falso co n h e
cim en to q u e se ex a lta acim a d a sim p les e h u m ild e d o u trin a d a p ied ad e nào é d e form a algu m a eo n h eci-
m en to ” (Joào C alv in o , A s Pastorais, p. 186, lT m 6.20).
3 B illy G rah am , O Espírito Santo, p. 123.
4 Jo h n S to tt, A Mensagem de Efésios, p. 139.
5 Jo h n S to tt, Batismo e Plenitude do Espírito Santo , p. 40.
Jo h n S to tt, Batismo e Plenitude do Espírito Santo, p. 42.
Capítulo 36
1 Jo h n S to tt, Batismo e Plenitude do Espírito Santo, p. 64.
2 D ev em o s c o n sid era r isso ju n tam en te co m a id éia de b u scarm o s os m elh o res d o n s (IC o 12.31). É n o ssa
fu nção b u sc arm o s os m elh o res, m as d ev em o s en te n d er q ue D eu s n o s dará o q ue é m elhor.
3 D. M . L lo yd -Jo n cs, Deus o Espírito Santo. p. 345.
4 Jo à o C alv in o , A Verdadeira Vida Cristã , p. 36.
5 A u gu stu s N. L o p es, O Culto Espiritual, p. 139.
6 Jo à o C alv in o , Primeira Cotintios, p. 396 (IC o 13.4).
7 C h arles H o d g e , Comentário de I Coríntios, p. 25 0 (IC o 13.7).
8 H á u m d etalh e q u e geralm en te passa d esp erceb id o nessa p a ssagem , m as q u e m erece co n sid eração da
n o ssa p arte. É a m an eira eo m o os três d on s listad o s segun d o P au lo ch egarão ao fim . P au lo d iz q ue todo s
os d o n s so m en te irão d u rar ate a v in d a d o “ q u e e p erfeito ” (IC o 13.10). A in terp retação m ais p lau sív el
d essa ex p re ssão d ev e ser cm relação à S eg u n d a V in d a d e Jesu s. É a p erfeição da era v in d o u ra , n a q u a l os
d o n s esp iritu ais n ào serão m ais n ecessário s, p o rém , o am o r co n tin uará sendo. O q u e ch am a a aten ção é
o tratam en to d iferen ciad o q u e P au lo co n ced e ao s três d on s listad o s acim a. E le diz: “p ro fecias, d esap a re
cerão (grego : katargetesontai)>K, “língu as, cessarão (g re g o : pausontai)” ; “ciên cia, p assará (grego : katergetesetai)”
(I C o 13.8). P crccb e-sc q ue a palavra para o m o d o co m o as lín gu as acab arão nào é a m esm a p ara com o
a p ro fecia e o co n h ecim e n to d esap arecerão . N a v erd ad e, a ex p ressão g ram atica l é um verb o n a voz
m éd ia, q u e em relação a o b jeto s im p lica ação reflex iv a, cuja trad u ção p o d eria ser: “ cessarão p o r si m e s
m a s” . E q u an d o , no v ersícu lo seguin te, ele diz “ p o rq ue cm parte, eo n h ccem o s e, cm p arte, p ro fetiza-
Notas 661
Capítulo 37
1 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 255.
2 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 255.
3 E d w in H . P alm er, E / Espiritu Santo, p. 14.
4 Jo ã o C alv in o , Exposição de ITebreus, p. 153, H b 6.4.
Capítulo 38
1 R u d o lf B u ltm an n , Teologia do Novo Testamento, p. 534.
2 V er R . C. S p ro u l, Verdades Essenciais da l 7e' Cristã , C ad ern o 3, p. 7.
3 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, p.561.
4 A C o n fissão d e F é de W estm instcr, X XV . 1.
3 V er W illia m M acD o n a ld , Cristo Amou a igreja, p.11-12.
6 V er G co rgc E ld o n L a d d , Teologia do Novo Testamento , p. 324.
7 V er F. F. B ru ce, Hechos de Los Apósteles, p. 346.
8 E im possível con cord ar com B ultm ann que entende que, no C ristianism o prim itivo o sacram ento de m odo
algum era um sím bolo, m as u m a celebração q ue realizava m ilagres (R udolf Bultm ann. Teologia do Novo Testa
mento, p. 186). O sím bolo estava m uito presente tendo em m ente o p ano de fundo do A n tigo T estam ento.
9 C o m o d iz B erk h o f, “ a igreja d o N o vo T estam en to e a d a an tiga d isp en sação são essen cialm en te u m a só ”
(L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 574).
10 P ara m u ito s, a p regação da P alavra é a “ ú n ica” m arca da ig re ja v erd ad eira. E m b o ra ela seja a re g ra p ara a
a d m in istraç ão d o s sacram en to s e p ara a d iscip lin a eclesiástica, en ten d em o s q u e essas d u as ú ltim as tam
b ém são m arcas. P o rém , sacram en to s e d iscip lin a n ão ex istem sep arad o s da p regação da P alavra de D eu s
(V er L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 580).
u L o u is B erk h o f. Teologia Sistemática, p. 581.
662 Razão da esperança
Capítulo 39
1 V er M ich ael H o rto n , A s Doutrinas da Maravilhosa Graça, p. 201.
2 V er H c n n a n H o ek sem a , ReJot'med Dogmatàs, pp. 632-634.
3 V er L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática , pp. 609,610.
4 M ich ael H o rto n , As Doutrinas da Maravilhosa Graça, p. 208.
5 P ierre C h. M a reei, E l Bautismo, Sacramento D el Pacto de Grada, p. 216.
6 W illia m H en d rik sen , E l Pacto de Gracia, pp. 27,28.
7 A o b a tiza r crian ças, os ap ó sto lo s estav am in teiram en te d en tro d a tradição ju d aica q ue b atizava os filhos
d o s p ro sé lito s (ver O sca r C ullm an n , Das Origens do Evangelho à Formação da Teologia Cristã , p. 131).
8 V er W illia m H en d rik sen , E l Pacto de Grada, p. 29.
9 Jo ã o C alv in o , A s Instituías, (1541), III.11.
10 C onferir u m a excelente argum entação, nesse sentido, em De la insígnia cristiana, d e Charles H odge, pp. 10-23.
11 E ssas p a ssa g en s falam dc b atism o s co m o ab lu çõ es, que eram riruais de p u rificação . E les praticavam
esses ritu ais cm cop os, jarro s, vaso s d c m etal e cam as. A id éia de afu n d ar u m a cam a n u m rio p arece
estran h a.
12 P h ilp p c L an d es d em o n stra com o os Pais da igreja en te n d iam q ue a palavra b atizar p o d eria sin gificar
“ d erra m a r águ a” . E le lista d iversos textos d a p atrística p ara co m p ro v ar isso, O s pais d a ig re ja falam so bre
p esso as q ue receb iam o b atism o em seus leito s (ver P hilippe L an d es, Estudos Sobre o Batismo — O modo de
Administrá-lo , pp. 84-90).
u P h ilip p e L a n d es, Estudos Sobre o Batismo - O modo de Administrá-lo, p. 67.
14 A p rep o sição g re g a “ e i s q ue L u cas usa para d izer q ue F ilip e e o eu n u co d esceram à águ a, de aco rd o com
v á ria s o u tras v ezes cm q ue ela é u sad a no N ovo T estam en to , não sign ifica n ecessariam en te “ p ara d en tro
d c ” , co m o no sen tid o d e afu n d ar (A t 16.16; L c 8.2 6 ; J o 7.8).
15 V er M ich ae l H orto n,^4.r Doutrinas da Maravilhosa Graça, p. 215.
Jo ão C alvino, A s Instituías, (1541), IV.12, em que o refo rm ad o r diz ainda, “ O batism o é u m só e jam ais deve
ser repetido, m as a C eia é distribuída m uitas vezes, a fim de que aqueles que um a vez foram recebidos e
inseridos na igreja entendam que são continuam ente alim entados c refeitos ou renovados po r Jesu s C risto” .
17 E s p e c ia lm e n te d u ra n te a R e fo rm a , a q u e s tã o da C e ia fo i b a s ta n te d is c u tid a , R o m a d e fe n d ia a
Transubstanciação, q u e foi d efin id a no Q u arto C o n cílio L atcran en se em 1215. Isso sign ifica q u e a su b stân
cia do p ão e d o v in h o era m iracu lo sam en te tran sfo rm ad a na su b stân cia d o co rp o c do san gu e d o Sen hor,
de m o d o q u e já não d ev eriam ser v isto s co m o p ão e vinho , em b o ra p a recessem ser. L u tero crio u ou tra
teo ria q ue ficou co n h ecid a com o Consubstanciação. O s lu teran o s d efen d iam u m tipo d e co m u n ic aç ão de
atrib u to s entre a n atu reza d iv in a e a natu reza h u m an a de Jesu s. A ssim , a n atu rez a d iv in a co m u n ico u à
n atu reza h u m an a d e Je su s o atrib u to d a o n ip resen ça. D esse m o d o , Je su s teria se to rn ado fisicam en te
o n ip resen te. Isso c ch am ad o dc u b iqü id ad e do co rp o de C risto. E ssa foi a m an eira q ue L u tero en co n tro u
p ara d efen d er a p resen ça física d e Je su s n a C eia, b asead o na ex p ressão : “Isto e o m eu co rp o ” . U m a vez
q u e, segu n d o as id eias d e L u tero, Jesu s se to m o u fisicam en te o n ip resen te p o r cau sa da co m u n icação de
Nolas 663
Capítulo 40
1 J. J. V on A llm en , O Culto Cristão - Teologia e Prática, p. 60.
2 C itad o p o r Jo h n F. M acA rth u r, Jr., Com Vergonha do Evangelho, p.73.
3 Jo ã o C alv in o , Jnstitutas, 1.3.1.
4 A go sd n h o , The Confessions o f Saint Augustin, 1. 1.
5 Jo ã o C alv in o , Instituías, 1.3,1.
6 R . B. K u iper, E l Cuerpo Glorioso de Cristo, p. 325,
7 Jo h n M aeA rtu r, Jr., Kedescobrindo o Ministério Pastoral, p. 268.
8 E d ifíc il sab er o sign ificad o p reciso de N eu stã; po d e ser “ d eu s de b ro n z e” , de aco rd o co m a d efin ição do
B D B (’TheAbridgedBrom-Driver-Btiggs ITebmv-English Lexicon o f the Old Testament, org. p o r R ichard W hitaker,
v erb ete “ N eu stã ”), o u u m o b jeto feito d e bronze, segun d o o EnhancedStrong} s I^exicon, verb ete “ N eu stà ” .
9 Jo hn M aeA rtu r, Jr., Kedescobrindo o MinistérioP astoral p. 268.
10 Jo h n M a eA rtu r, Jr., Kedescobrindo o Ministério Pastoral\ p. 268.
11 Jo h n M a eA rtu r, Jr ., Kedescobrindo o Ministério Pastoral,\ p. 268.
12 V ald ecí d o s San to s ap o n ta q u atro co rren tes filo só ficas q u e têm in flu en ciad o gran d em en te a p o stu ra dos
cren tes n a ad o ração : O existen cialism o , o hum an ism o , o d eísm o e o p ragm atism o . V er V aldeci dos
San to s, “ R efled n d o S o b re a A d o ração e o C ulto C ristã o ” , R evista V‘ides Keformata , pp. 141-143.
13 Isso n ão sign ifica q u e, para q ue o culto seja v erd ad eiro , tenh am os q ue “n o s sen tir m a l” . A p en as, o po nto
a ser en ten d id o aq u i e o da p rio rid ad e. A p rio rid ad e do cu lto não é o “ sen tir-se b em ” , m as ad o rar a D eus.
14 V er R . N. C h am p lin e J. M . B en tes, Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia , Vol. 3, p. 178.
15 Jo h n R. W. S to tt, Crer é Também Pensar ; p. 30.
10 V er J. J. V on A llm en , O Culto Cristão, p. 26.
17 V er Jo h n F. M acA rth u r, Jr., Kedescobrindo oM inistério Pastoral.\ p. 277.
18 V er Jo h n F. M acA rth u r, Jr., Com Vergonha do Evangelho, p.73ss.
Capítulo 41
1 V er W alter C. K aiser, Jr., 'Teologia do Antigo Testamento , p. 121.
2 V er D w ig h t L. M o ody, Prevailing Prayer; Whaí Hinderes It?, pp. 14,15.
3 Ver Jo ã o C alv in o , Institutas, I I .6.1-2.
4 H a rrie t e G erard V an G ro n in g en , A Familia da Aliança, p. 215.
C itad o p o r J. I. P acker, Entre os Gigantes de Deus , p. 274.
6 D. M . L lo yd -Jo n es, Avivamento , pp. 75,76.
7 B ên ção aqui não é no se n d d o m o d ern o de re ceb er algu m b en efício físico de D eus. A qui, b en ção é a
pró p ria p resen ça de D eus.
8 V er P au l E n n s, í(Fello\vship” , em The Moody Handbook o f Theology. V er T am b ém J. D. D o u glas, O Novo
Dicionário da Bíblia , V o lu m e único, p. 310.
9 Jo h n F. M a cA rth u r Jr ., Romanos (15.6).
10 J. I. P acker., Entre os Gigantes de Deus, pp. 274,275.
11 V er Jo h n Sto tt. Eu Creio na Pregação, p. 51.
12 Jo h n F. M acA rth u r Jr ., Com Vergonha do Evangelho, pp. 117,118,130.
13 Jo h n B u n yan e T h o m a s G o o d w in , La Qraciôn, p. 5.
14 W illia m H en d rik sen , Colosenses e Filemon, p. 189ss.
15 V er R ich ard C. T ren ch , Synonyms o f The N ew Testament, par. L X X V III. E tam bém W illiam H en d rik sen ,
Colosenses e Filemon, p. 189. Para u m a a b o rd agem m ais recen te d este assu n to v er R alp h P. M artin , Colossm-
ses e Filemon, pp. 126-128.
664 Razão da esperança
Capítulo 42
1 C h eg a m o s ago ra à ú ltim a d iscip lin a d a T eo lo g ia S istem ática, ch am ad a de liscatologia. E la d iz re sp eito ao
estu d o da d o u trin a das “ú ltim as co isas” .
2 Jü rg e n M o ltm an n , Teologia da Esperança, p. 22.
3 G erard V an G ro n in g en , Criação e Consumação, p. 29.
4 A n th o n y H o ek cm a, A Bíblia e o Futuro, p. 11.
5 A n tho ny H o ek cm a, A Bíblia e o Futuro, p. 13.
6 V er A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Euturo, p. 15.
7 T. W M an so n , O Ensino de Jesus, p. 249.
8 A n th o n y H o ek cm a, A Bíblia e o Futuro , p. 20.
9 V er A n th o n y H o ek cm a, A Bíblia e o Futuro , p. 25.
G co rg e E . L a d d , Teologia do Novo Testamento , p. 184.
11 V er A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro, p. 28.
12 H en d rik u s B erk h o f, La Doctrina deJEspíritu Santo, p. 118.
13 A n th o n y H o ek em a, Bíblia e o Futuro, p. 30.
14 C itad o p o r A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro , p. 79.
b V er A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro , p.83.
16 Ja m e s D. G. D u n n , Word BiblicalCommentary, Volume 38a: Romans 1-8 (R m 8 .23 ).
17 Jo ã o C alv in o , Romanos, p. 287 (R m 8.23).
Capítulo 43
1 L o ra in e B o ettn er, Imortalidade, p. 67.
2 V er L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 679.
3 L o rain e B o ettn er, Imortalidade, p. 71.
4 L o rain e B o ettn er, Imortalidade, pp. 61,62.
5 V er L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 679.
6 V er L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 680.
7 L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 678.
8 C h arles H o d gc , Teologia Sistemática , p. 1548.
Notas 665
Capítulo 44
1 B u ltm an n e G o p p elt n ão h esitam em d iz er q ue Je su s se eq uiv o co u , po is esses an ú n cio s nu n ca teriam se
co n cretizad o . (V er L eo n h ard G o p p elt, Teologia do Novo Testamento, p. 92). E sses estu d io so s nào estão
p reo cu p ad o s co m a v eracid ad e h istó rica d as ex p ressõ es de Je su s, p ara cies o q ue im p o rta é a m en sagem .
J, Je rem ia s tam bém en ten d e q u e Je su s esp erav a a m an ifestação final d o rein o co m o im in en te, m as e n te n
de q ue Je su s acred itav a q ue D eu s p o d eria ad iar essa v in d a o u an tecip á-la, em re sp o sta à o ração das
p esso as (ver J. Je rem ias. Teologia do Novo Testamento , pp. 218,219).
2 J o h n F. M a cA rth u r, Jr ., The M acArthur N ew Testament Commentaiy, Matthew (M t 24 .3 4 ). N o en tan to ,
M a cA rth u r ad m ite q ue d ev am ser co n sid erad o s tam b ém os gen tio s vivos n a v in d a de Jesu s.
3 V er A d o lf P o h l, Evangelho de Marcos, p. 379.
4 V er D o n ald A . H agner, Word Biblical Commentaiy, Volume 33b: Matthew 14-28 (M t 24.3 4).
5 A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro, p. 217.
Capítulo 45
1 M u ito s estu d io so s en ten d em q ue essa é u m a b atalh a m ítica, à sem elh an ça d e várias b atalh as entre anjos
e d em ô n io s d as lite ratu ras prim itivas (ver D av id E. A u n e, Word Biblical Commentaiy, Volume 52b: Kcvelation
6-16 (A p 12.7-9)). É p referív el pen sar que ele está d escrev en d o , em term o s sim b ó lico s, co m o é p ró p rio
d a lite ra tu ra ap o c alíp tica , a gran d e v itó ria de C risto so b re os p rin cip ad o s e po testades.
2 A s ex p re ssõ es “ u m tem p o, tem p os e m etad e de u m tem p o ” , “ 1.260 d ias” , “ três an o s e m eio ” referem -se
a u m m esm o p erío d o d e tem po. E a d isp cn saçào crista total, d esd e a p rim eira até a segun d a vin d a. E um
p erío d o m u ito lo n g o , d u ran te o qual Satan ás p ersegue a igreja.
3 V er W illia m H en d rik sen , Mais que Vencedores, pp. 175-181.
4 V er W illia m H en d rik sen , Mais que Vencedores, p. 178.
5 W illia m H en d rik sen , M ais que Vencedores, p. 181.
6 D iv ersas teo rias têm sid o ap resen tad as para ex p licar a en igm ática ex p ressão de P au lo “ aqu ele q u e ago ra
o d e té m ” . A m issão d e P aulo , o E sp írito Santo , o Im p ério R om ano, são algum as d elas (ver F. F. B ruce.
Word Biblical Commentaiy, Volume 45: 1 & 2 Thessalonians, (2Ts 2.7)). E m ais p ro v áv el q ue se trate do ato
div in o d e re strin g ir o m al, que será lib erad o q uan d o S atan ás fo r so lto da p risão d o s m il anos.
Capítulo 46
1 V er P a u l E n n s, The Moody Handbook o f Theology\T o p ico ; “D isp en satio n al P re m illen n ia lism ” . V er tam b ém
A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro, pp. 221,2 2 2 .
2 A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro, p. 228.
3 A lgu n s p ré-m ilen istas a cred itam n u m a ú n ica v in d a de C risto, e n esse p o n to estão em co n fo rm id ad e com
a E scritu ra. V er L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, pp. 701,702.
4 V er W illia m H en d rik sen , Mais que Vencedores, pp. 211-213.
5 V er F. F. B ru ce, Word Biblical Commentaiy, Volume45: 1 <&2 Thessalonians (lT s 4.17).
Capítulo 47
1 A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro, p. 223.
2 O q u ad ro é retirad o de P aul E n ns, The Moody Handbook o f Theology, T ó p ico : “A m illen n ialism ” .
3 A ex p o sição a se gu ir segue, em lin h as gerais, W illiam H en d rik sen , M ais que Vencedores, pp. 217-2 25.
4 V er S im o n K istem ak er, Apocalipse, pp. 673,674.
5 V er W J. G ricr, O M aior de Todos os Acontecimentos, pp. 126,127.
6 V er W illia m H en d rik sen , Mais que Vencedores, pp. 26-35.
7 W illia m H en d rik sen , M ais que Vencedores, p. 218.
8 W. J. G rier, O M aior de Todos os Acontecimentos, p. 128.
9 S im o n IC istcm akcr, Apocalipse, p. 675.
10 S im o n K istem ak er, Apocalipse, p. 680.
11 A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro , p. 244.
12 W. J. G rier, O M aior de Todos os Acontecimentos, p. 36.
13 A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro, p. 274.
666 Razão da esperança
14 O u tras p assagen s que p o d em se r in terp retad as n esse sentid o sem su gerir a idéia do m ilên io sào: je re m ia s
2 3 .3 -8 ; E zeq u iel 3 4 .1 2 ,1 3 ; E zeq u iel 3 6 .2 4 ; Z acarias 8.7,8; A m ó s 9.14 ,15, etc,
Capítulo 48
1 O p ré-m ilen ism o d isp cn sacio n alista d efen d e q ue, d ep o is do arreb atam en to da ig re ja , h averá sete anos de
trib u laçào na terra, q u an d o jud eus e gen tio s se co n verterão . O s q ue tiverem m o rrid o n esse período,
terão d e ressu scitar.
2 F. F. B ru ce, Word Biblical Commentary, Volume 45: 1 <&2 Thessalonians (lT s 4.15).
3 A ssim co m o ele nào d isse n ad a em 1 C o rín tio s 15.23, onde d escreve apen as a re ssu rreição d o s salvos.
E le está falan d o p ara a ig re ja , c nào q uis en trar em d etalh es so bre a ressu rreição d o s ím pios. P o rém , pelo
sim p les fato de nào ter sid o m en cio n ad a, isso nào sign ifica q u e a ressu rreição dos ím p io s a co n tecerá
n u m o u tro m o m ento.
4 L o uis B erk h o f, Teologia Sistemática^ p. 730.
5 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática , p. 729.
6 J á ab o rd am o s este tóp ico no cap ítu lo so bre a ressu rreição de Cristo.
7 H en d rik sen e n te n d e q u e a ex p ressão “ esp írito ” q ue Je su s u so u (gr. Psykê), in d ica a en tid ad e in visível do
h o m em co n sid erad o em su a relação co m D eu s (W illiam H en d riksen , Mateo , p. 964).
Capítulo 49
1 E m algu m a m ed id a, essa id éia está certa. D eu s realm en te p u n e o m al e re co m p en sa o bem nesta vida,
p o rém , d e m o d o algu m em term o s ab so lu to s (ver L o uis B erkh o f, Teologia Sistemática, p. 735).
2 U m a ex celen te ex p o sição so bre o tem a no S alm o 73 p o d e ser en co n trad a em Por que Prosperam os ímpios?,
de D. M . L lo yd -jo n es, Sào P aulo : P u b licaçõ es E v an gélicas Selecio n ad as, 1983.
3 S im o n K istem ak c r, Apocalipse, p. 685.
4 V er L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática , pp. 737,738.
5 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática, p. 738.
Capítulo 50
1 H o ek em a eita o p ai d a ig re ja O rígen es (185-254) co m o d efen so r d essa po sição.V er A n th o n y H o ek em a,
A Bíblia e o Futuro, p. 355.
2 A n th o n y H o ek em a, A Bíblia e o Futuro, p. 365.
3 A d o lf P o h l, Apocalipse de João II , p. 279.
4 L o u is B erk h o f, Teologia Sistemática^ p. 743.
5 J. C alv in o , A s Instituías, I II.2,43.
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Razão da esperança
Leandro Antonio de Lima é A obra do Rev. Leandro Antonio de Lima
ministro presbiteriano, bacharel é um tratado de Teologia que aborda de
em teologia pelo Seminário forma sistemática, profunda, simples e
Presbiteriano Rev. José Manoel prática diversos tópicos da chamada
da Conceição - SP, mestre em Teologia Sistemática sem perder o seu
Teologia pelo Centro propósito de ser compreensível e edifi
Presbiteriano de Pós-Graduação cante.
Andrew Jumper - SR autor de Partindo da autoridade inerrante e
diversos artigos e de lições infalível das Escrituras, o autor se propõe a
para revistas de Escola apresentar a razão da nossa esperança
Dominical desta editora. (1 Pe 3.15,16), fundamentando-a não em
lendas ou ficções, mas na Palavra de Deus,
que nos fala do nosso passado, orienta
nosso presente e nosso futuro. Desse
modo, o autor, de maneira séria e
corajosa, vai expondo diante de nós
tópicos difíceis da Teologia, demonstrando
com fidelidade bíblica caminhos que
podemos seguir de modo coerente com a
Palavra.
(Adaptado do Prefácio)
Teologia Sistemática/Doutrina
ISBN 85-7622-140-3