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Direito Comercial I 2017/2018

O Direito Comercial é o sistema jurídico-normativo que


disciplina de modo especial os atos de comércio e os comercian-
tes. Trata-se de um regime especial de direito privado que se
aplica aos atos de comércio e aos comerciantes e que se traduz,
especialmente, na regra da solidariedade das obrigações deriva-
das de atos mercantis (100.º CCom), o regime especial das dívi-
das dos comerciantes casados (15.º CCom), o regime especial dos
juros comerciais, e o regime dos comerciantes (18.º CCom).

Os Atos de Comércio podem ser objetivos ou subjetivos,


se qualificados pela lei como tal ou se praticados por um comer-
ciante e estiverem conexionados com a atividade mercantil do
sujeito que os pratica.

No entanto, pode dizer-se que os atos de comércio são


factos jurídicos voluntários, pelo que incluem contratos, negó-
cios jurídicos unilaterais, simples atos jurídicos e factos jurídicos
ilícitos.

Os atos de comércio objetivos constam, em termos de


conceito, no artigo 2.º primeira parte do CCom – “são aqueles
que se acharem especialmente regulados neste código”. Isto
consiste numa definição por enumeração implícita porque não
explicita neste artigo quais os atos, antes remete para outros pre-
ceitos.

Ainda assim, sendo o código de 1888, não faria sentido ba-


sear a comercialidade dos atos num código datado. Desta forma,
o artigo 2.º primeira parte deve ser interpretado extensivamente
por forma a abarcar outras leis comerciais: o próprio código fala
em “lei comercial”; a carta de lei que aprovou o CCom diz que

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Direito Comercial I 2017/2018

toda a modificação ao código se considera parte integrante do


mesmo.

Por isto, são considerados atos de comércio objetivos: os


que constem do CCom; os que constem de leis substitutivas ou
modificativas do CCom; os que constem de leis que se autoquali-
fiquem como comerciais; os atos que sejam análogos por analo-
gia legis ou iuris a outros comerciais.

[Há atos que constam de leis substitutivas ou modificati-


vas do CCom, mas não se consideram objetivamente comerciais.
E.g.: o contrato de associação em participação, constante do ca-
pítulo II do DL 231/81. Não se exige que o associante seja comer-
ciante ou que a sua atividade seja comercial; o artigo 22.º/1 diz
que não se presume a solidariedade dos créditos e dos débitos.]

Os atos que constem de leis que se autoqualifiquem como


comerciais também se consideram objetivamente comerciais.

E.g.: o NRAU contém disposições especiais de arrenda-


mento para fins comerciais. Por isso, serão objetivamente co-
merciais os atos de locação e trespasse de estabelecimento co-
merciais.

E.g.: as condições de acesso à atividade seguradora e res-


seguradora estão reguladas no DL 144/2006. No seu artigo 10.º,
fala-se em “atos de comércio” e em “estabelecimentos comerci-
ais”. As sociedades que exploram a atividade comercial devem
ser constituídas na forma de sociedades comerciais. Ora, as soci-
edades comerciais dedicam-se à prática de atos de comércio (ar-
tigo 1.º/2 CSC).

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Além dos casos agora vistos, podemos também recorrer à


analogia legis ou iuris no que diga respeito às lacunas de qualifi-
cação (as lacunas de regulação admitem expressamente recurso
à analogia no artigo 3.º, i.e., para atos que a lenha já tenha qua-
lificado como comerciais).

O recurso à analogia para qualificação de atos como co-


merciais não é pacífico: há autores que apontam a letra da lei
(que não a admite expressamente), o argumento histórico (o
CCom Espanhol, onde o preceito se baseou, admite a analogia e
nós não o “transpusemos” na sua totalidade) e o argumento da
segurança jurídica.

No entanto, não concordamos: a letra da lei é inconclu-


dente; o argumento histórico vê-se, hoje, ultrapassado; o valor
da justiça e da razoabilidade imperam sobre o da segurança.

Para a analogia legis, podemos apontar, como exemplo, as


empresas de construção de casas (230.º/6 CCom) cujo regime se
aplica a outras obras; o regime da locação financeira de móveis
(no DL 149/95, lei que se autoqualifica como comercial) terá de
se aplicar aos contratos de locação financeira de imóveis.

No que diz respeito à analogia iuris – retira-se, da disci-


plina de atos conhecidamente mercantis um princípio geral de
direito que engloba os atos não qualificado como tal –, podemos
estender o regime do contrato de agência aos contratos de con-
cessão e de franquia – pelo princípio geral de direito mercantil de
que os atos de intermediação nas trocas são objetivamente co-
merciais; do contrato de trespasse e locação de estabelecimento

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ser qualificado como comercial retira-se um princípio geral de di-


reito mercantil em que os negócios sobre empresas comerciais
são atos objetivamente comerciais.

O artigo 230.º CCom prevê outros casos de atos objetiva-


mente comerciais quando estes sejam praticados no seio de uma
organização de meios que tenha como objetivo uma atividade
produtiva para troca. As “empresas” de que fala o 230.º devem
ser interpretadas no sentido de um conjunto de atos comerciais
objetivos enquadrados organizativamente. E não apenas os atos
ali elencados, mas todos os outros que sejam praticados na ex-
ploração, ainda que indireta, dessas empresas.

Por exemplo, peguemos no artigo 230.º/2 CCom – forne-


cimento, em épocas diferentes, de géneros mediante preço con-
vencionado. Por interpretação extensiva, podemos englobar
nesta qualificação as empresas de fornecimento de gás, água e
eletricidade; por analogia legis, o fornecimento de serviços (de-
vido ao risco/álea análoga ao contrato de avença); por analogia
iuris, a prestação de serviços (princípio de que as empresas de
serviços serão, em regra, comerciais.

Os atos de comércio subjetivos, qualificados como tal na


segunda parte do artigo 2.º CCom, “são os atos dos comerciantes
que não forem de natureza exclusivamente civil e se o contrário
do próprio não resultar”.

Podemos, assim, dizer que, para se praticar atos subjeti-


vamente comerciais, se tem de ser comerciante, de acordo com
o artigo 13.º CCom – as pessoas que, com capacidade de praticar
esses atos, façam disso profissão e as sociedades comerciais. (Ca-
pítulo dedicado em exclusivo aos comerciantes infra).

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Os atos não podem ter natureza exclusivamente civil, isto


é, têm de se tratar de atos que, na sua essência e em abstrato,
sejam conexionáveis com o comércio jurídico, i.e., não são dirigi-
dos a auxiliar, promover ou levar a cabo o exercício do comércio
do sujeito que os pratica (assim não serão o casamento, a perfi-
lhação, a designação de tutor, etc.).

Quanto à doação e quanto à responsabilidade civil por fac-


tos ilícitos, põe-se a dúvida. Mas diremos que sim a ambos: em
especial quanto à doação, ela deverá ser remuneratória ou ter
fins reclamísticos; quanto aos factos ilícitos, se forem levados a
cabo no exercício do comércio.

Para que seja subjetivamente comercial, do próprio ato


não pode resultar a não ligação com o exercício do comércio. Este
requisito é apurado em concreto e “próprio ato” deve ser enten-
dido em termos amplos – não significa apenas o facto jurídico,
mas as circunstâncias que lhe sejam concomitantes de acordo
com a teoria da impressão do destinatário (ainda que não res-
peite a forma do negócio).

Os atos de comércio podem, ainda, ser autónomos (quali-


ficados como mercantis em si mesmo) ou acessórios (ligam-se a
outros atos mercantis), formais (atos utilizáveis por qualquer
pessoa, ainda que a sua causa não seja comercial – e não levam
à qualificação de um sujeito como comerciante) ou substanciais
(têm uma causa mercantil); bilaterais (comercial em relação a
ambas as partes) ou unilaterais (comercial em relação a apenas
uma parte).

Mas, então, o que faz de alguém comerciante e que im-


portância tem essa qualificação?

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Um comerciante pratica atos subjetivamente comerciais;


as dívidas comerciais dos comerciantes casados presumem-se
contraídas no exercício dos respetivos comércios; a prova de cer-
tos factos é facilitada; há prazos especiais relativos a prescrição;
existem obrigações especiais para comerciantes – adotar firma,
ter escrituração, fazer inscrever no registo comercial; dar balanço
e prestar contas.

Os comerciantes podem ser pessoas singulares. Nesse


caso, terão de, para isso, ter capacidade de exercício de direitos.
No entanto, os incapazes também podem ser qualificados como
comerciantes: se forem representados por quem de direito e
com autorização do MP de acordo com o 1889.º/1/c CC e o co-
mércio se faça em seu nome.

Os sujeitos devem fazer da prática desses atos sua profis-


são, i.e., devem fazer o exercício de atividade comercial ou prá-
tica de atos de comércio (excetuando os atos subjetivamente co-
merciais – porque pressupõem a qualidade de comerciante, não
a atribuem – e os atos formalmente comerciais) com profissiona-
lidade, de modo habitual e sistemático. Não necessita, ainda as-
sim, de ser a única, a principal, ser exercida continuamente ou
ininterruptamente.

Existe ainda um requisito implícito: o de fazer o comércio


em nome próprio. Este requisito é importante para afastar a qua-
lificação de comerciante dos trabalhadores de um comerciante.

O início da qualidade de comerciante poderá depender de


um ou vários atos, mas sempre a partir daquele(s) que revele(m)
o propósito e a possibilidade-probabilidade de certo sujeito se
dedicar ao exercício habitual de uma atividade comercial. E.g.:

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celebração de um contrato de agência; prática de atos destina-


dos à exploração de uma empresa, ainda que esta não tenha
aberto.

Mas os comerciantes também podem ser pessoas coleti-


vas. Nesse caso, dispõe o 13.º/2 CCom que são comerciantes as
sociedades comerciais e estatui o artigo 1.º/2 CSC que são socie-
dades comerciais as que têm por objeto a prática de atos de co-
mércio e adotem um dos tipos legais previstos. As sociedades co-
merciais adquirem o estatuto de comerciante a partir do seu re-
gisto, quando adquirem personalidade jurídica (5.º CSC).

As sociedades civis sob a forma comercial não se dedicam


à prática de atos de comércio, logo, não serão comerciantes. As
cooperativas com objeto comercial podem ser consideradas co-
merciantes.

Debrucemo-nos agora sobre os sujeitos não qualificáveis


como comerciantes.

Primeiro, não são comerciantes aqueles que não se dedi-


quem a atividades qualificadas de mercantis – a agricultura
(230.º§1 e 464.º/3/4), o artesanato (230.º§1 e 464.º/3 CCom), os
profissionais liberais e suas sociedades e trabalhadores autóno-
mos (artes).

Não são comerciantes as PCPúblicas – podem praticar atos


de comércio de forma habitual e sistemática, mas a interpreta-
ção extensiva do artigo 17.º CCom veda-lhes essa qualificação.

As associações e fundações de direito privado de fim de-


sinteressado podem praticar atos de comércio, mas não podem
ser comerciantes.

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Existem, depois, sujeitos legalmente inibidos da profissão


de comerciante.

As entidades coletivas de que fala o 14.º/1 CCom podem


praticar atos de comércio se respeitarem os limites das suas atri-
buições – princípio da especialidade do fim. Aqui se incluem as
associações de fim desinteressado, as associações de fim interes-
sado, mas ideal, as associações de fim interessado económico
não lucrativo (sindicatos, etc.).

Se praticarem atos de comércio de forma reiterada e su-


cessiva, os seus atos podem ir contra o princípio da especialidade
do fim, pelo que serão nulos. Ora, a qualificação de comerciante
não se pode basear na prática de atos nulos – pode, ainda, levar
à extinção da PC a pedido do MP ou interessado.

Quanto às pessoas singulares, encontramos incompatibi-


lidades com o comércio profissional, i.e., impossibilidades legais
do exercício do comércio por um sujeito que desempenhe certas
funções ou se encontre em determinada situação jurídica.

Elas podem ser de direito privado, se são relativas (remo-


víveis) e parciais (porque são, usualmente, proibições de concor-
rência) – e englobam-se, nestas, os gerentes, sócios, administra-
dores de sociedades, etc. –, ou de direito público, se são absolu-
tas e gerais – abarcam os magistrados judiciais e do MP, militares
em serviço, órgãos de soberania.

Se praticarem atos de comércio, eles tornam-se, ainda as-


sim, comerciantes, porque se cumprem os requisitos do artigo
13.º CCom e os atos por eles praticados são plenamente válidos
e eficazes. Simplesmente, acarretam outras sanções, como a des-
tituição do cargo, responsabilidade civil, penas disciplinares, etc.
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No contexto de uma situação de insolvência declarada ju-


dicialmente como culposa, podem existir outras pessoas inibidas
da prática de atos de comércio de forma profissional. Mas, para
isso, temos de falar um pouco daquilo que é a insolvência.

[A insolvência é um processo de execução universal que visa satisfa-


zer conjuntamente os credores de um devedor. Ela pode consistir na liquida-
ção dos bens da massa insolvente ou na elaboração de um plano de insolvên-
cia, competindo aos credores a escolha por uma destas alternativas.

Existem várias pessoas sujeitas à insolvência: as singulares ou coleti-


vas (1.º grupo), os sujeitos de natureza coletiva, mas não personalizada (2.º
grupo) e os património autónomos (3.º grupo). Assim se vê que não são só
os comerciantes que estão sujeitos à declaração de insolvência.

Alguém está numa situação de insolvência quando está impossibili-


tado de cumprir a maioria das suas obrigações – insolvência atual – ou
quando o próprio devedor se apresenta à insolvência porque antevê ser pro-
vável o incumprimento das suas obrigações no momento do seu venci-
mento.]

A declaração de insolvência produz diversos efeitos, entre


os quais a privação do devedor administrar os bens integrantes
da massa, ele deixa de ter esse poder, que passa para o adminis-
trador de insolvência. Se o devedor produzir atos (de comércio
ou não) de administração e disposição da massa insolvente, eles
são ineficazes, mas podem, caso favoreçam os credores, ser rati-
ficados pelo administrador de insolvência.

A insolvência culposa é aquela que foi criada ou agravada


em consequência de atuação com dolo ou culpa grave do deve-
dor, dos administradores de facto ou de direito ou dos TOC ou
ROC nos 3 anos anteriores ao processo de insolvência. Essa de-
claração afeta os culpados da seguinte forma: respondem os res-

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petivos patrimónios pelos créditos não satisfeitos pela massa in-


solvente (responsabilidade solidária); ficam inibidos da prática de
atos de comércio de forma profissional e do exercício de cargos
em sociedade comercial ou civil, etc. durante o período de 2 a 10
anos.

No entanto, podem praticar atos de comércio, já que não


se trata de uma incapacidade, qualidade ou característica pessoal
que impeça a profissão de comércio. É, antes, uma incompatibi-
lidade absoluta, e, se violar a proibição, não se torna comerciante
por razões de tutela do crédito e do comércio e porque esse es-
tatuto corresponderia a um impedimento declarado por ordem
judicial.

Analise-se agora, em termos muito breves, o estatuto dos


comerciantes.

Os comerciantes, de acordo com o artigo 18.º CCom, têm


a obrigação de adotar firma1, que é o signo individualizador dos
comerciantes. A constituição da firma deve obedecer ao RRNPC
e aos princípios lá plasmados.

O princípio da verdade diz que os elementos componentes


da firma devem ser verdadeiros e não induzir em erro sobre a
identificação, natureza ou atividade do seu titular.

O princípio da novidade e da exclusividade diz que as fir-


mas devem ser distintas e não suscetíveis de confusão ou erro
com outras que tenham o mesmo âmbito de exclusividade.

1
Páginas 169-187 do doutor Coutinho de Abreu.

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O princípio da capacidade distintiva diz que as firmas hão


de ser constituídas por forma a desempenhar uma função dife-
renciadora.

O princípio da unidade diz que o comerciante devem ado-


tar uma só firma (excetua-se o EIRL, se tiver outras atividades
mercantis).

O princípio da licitude diz que não pode conter expressões


proibidas por lei ou ofensivas da moral e dos bons costumes.

Os comerciantes devem realizar escrituração.2

Os comerciantes devem estar inscritos no registo comer-


cial. O registo comercial publicita factos respeitantes a determi-
nados sujeitos tendo em vista a segurança no tráfego jurídico.
Essa publicitação obedece ao princípio da tipicidade (os factos e
entidades sujeitos a registo são os previstos na lei, no artigo
1.º/10 CRC) e ao princípio da instância (ele efetua-se a pedido
dos interessados).

Os efeitos produzidos pelo registo são os seguintes: pre-


sume-se que a relação jurídica existe nos termos em que está de-
finida; é um requisito de eficácia dos factos em relação a tercei-
ros (sem ele, os factos só têm eficácia inter partes e respetivos
herdeiros); e é constitutivo, em certos casos, como na constitui-
ção de sociedades.

As dívidas comerciais de cônjuges comerciantes presu-


mem-se contraídas no exercício do respetivo comércio, pelo que,
pelo artigo 1691.º CC, são da responsabilidade de ambos o côn-

2
Páginas 187-197 do doutor Coutinho de Abreu.

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juges casados em regime de comunhão de bens as dívidas con-


traídas por qualquer deles, salvo se se provar que não foram con-
traídas em proveito comum do casal.

Este é um regime tutelador do comércio e dos credores,


respondendo os bens comuns do casal e solidariamente os bens
próprios de qualquer um deles (1695.º CC).

Os credores só têm de provar que o sujeito contraente das


dívidas é comerciante e que a dívida é comercial. Assim, pre-
sume-se que a dívida foi contraída no exercício do comércio para
efeitos de aplicação do 1691.º CC.

Os devedores, por seu lado, podem provar que3: 1) a dí-


vida não é comercial; 2) a dívida é comercial, mas não foi contra-
ída no exercício do comércio; 3) que não foi contraída para pro-
veito comum do casal4. Desta forma, afastam a presunção do
15.º CCom e assim não se aplica o 1691.º CC.

As Empresas

Existem diversas aceções daquilo que é uma empresa.

Uma noção económica de empresa, resultante da sobre-


posição de várias propostas e posterior reconhecimento de quais
os elementos coincidentes entre a maioria, é a seguinte: uma
empresa é uma organização de fatores produtivos que produz
bens destinados à troca com vista a obtenção de lucro.

3
Basta provar um!
4
Muito difícil de provar: casos de separação de facto; casos de compra por preço exagerado a amante-
vendedor.

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Em sentido jurídico, podemos dizer que uma empresa


pode assumir um sentido subjetivo e um outro objetivo.

A empresa em sentido jurídico e subjetivo diz respeito às


empresas como sujeitos jurídicos que exercem uma atividade
económica que consiste na oferta (não gratuita) de bens ou ser-
viços num determinado mercado. Esta noção aparece muito no
direito da concorrência (e.g., imagine-se uma norma que diga
que “a empresa não pode concorrer…” – aqui, a empresa é vista
como um sujeito).

A empresa em sentido jurídico e objetivo diz respeito à


empresa enquanto estruturas produtivo-económicas que são
objeto de direitos ou negócios jurídicos.

Serão empresas comerciais aquelas cujo objeto se traduza


na realização de atos objetivamente mercantis – o que, na nossa
ótica, e baseados em argumentos legalistas, exclui as empresas
agrícolas, artesanais, entre outras.

Além de negociável, o estabelecimento (quase sempre si-


nónimo de “empresa”) é um valor ou bem económico, transpes-
soal (porque incindível de um sujeito-titular), duradouro, reco-
nhecível e irredutível.

É, ainda, um bem complexo, porque composto de vários


elementos.

Assim, serão elementos empresariais os fatores produti-


vos e os bens que identificam a empresa como tal. Os fatores
produtivos podem, de uma maneira geral, reconduzir-se às coi-

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sas corpóreas (imóveis, móveis, mercadorias, etc.), coisas incor-


póreas (patentes, modelos de utilidade, etc.), bens não-coisificá-
veis (prestações de trabalho, know-how, etc.).

Noutra categoria caem os valores de exploração da em-


presa.

Estes são constituídos, em parte, pelas relações de facto


que são externas à empresa, i.e., não se inserem no processo pro-
dutivo e na organização produtiva, e.g., as relações com financi-
adores e fornecedores.

A própria organização, sendo de meios, não se confunde


com eles nem ela própria é elemento componente da empresa;
é, sim, um modo de ser ou de estar dos meios empresariais, que
estão interrelacionados.

As relações de clientela não serão elementos empresari-


ais, não tanto por não serem um objeto de um direito real ou
absoluto, mas por não estarem inseridas estrutural-funcional-
mente na organização empresarial; são, antes, uma consequên-
cia dessa mesma organização.

No que diz respeito aos créditos, diremos que não são ele-
mentos empresariais se não tiverem como objeto um meio que
seja um verdadeiro elemento empresarial. E.g., o crédito de uma
quantia não será elemento empresarial; no entanto, já o será se
o crédito for de uma matéria-prima essencial ao processo produ-
tivo. Os débitos não serão, igualmente, elementos empresariais.

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No tocante aos contratos, não são elementos empresari-


ais se os seus objetos imediatos5 não forem elementos empresa-
riais. Como já foi visto, os contratos que consistam em prestações
de facto e essas prestações se incluam no processo produtivo
(e.g., prestações laborais) são elementos empresariais.

O dinheiro também não é elemento empresarial. Não por-


que seja um bem neutro, incapaz de ser caracterizador, mas por
ser exterior ao processo produtivo e à organização empresarial.
Será, no entanto, elemento das empresas de capital, de crédito
ou financeiras, ou de seguros, como bem se percebe.

Assim se conclui que os bens de um estabelecimento ou


elementos empresariais são os seus fatores produtivos e os bens
que identificam a empresa.

Os fatores produtivos estão numa relação de intercomu-


tabilidade ou comutatividade. Estão articulados com vista à exe-
cução de um fim. Trata-se de uma organização que corresponde
a um todo maior que a mera soma das partes, com propriedades
novas ou emergentes, que projeta no público a imagem de um
bem novo.

Mesmo que ainda não esteja a funcionar, podemos já ter


um estabelecimento comercial se se revelar apto a realizar um
fim económico e produtivo. Ele apenas ainda não tem valores de
exploração. Mas havendo estabelecimento, já há aviamento – ca-
pacidade produtiva, aptidão para realizar o fim para que foi cri-
ado.

5
Relembre-se que o objeto imediato de uma obrigação será de dare, facere e de pati. Os objetos media-
tos serão, por exemplo, numa compra e venda, o bem que se vende.

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Mas e se, além de faltarem valores de exploração, falta-


rem elementos empresariais? Poderemos ter já um estabeleci-
mento, ainda que não esteja pronto a entrar em funcionamento,
se estivermos perante um conjunto de bens heterogéneos e
complementares organizados com vista à prossecução de um
fim. E essa organização cria no público a imagem de um bem
novo. Só em concreto se pode dizer quais os bens integrantes
deste âmbito mínimo do estabelecimento enquanto objeto ne-
gociável.

Outro caso: a empresa já entrou em funcionamento,


tendo já valores de exploração, consequência do aviamento da
empresa. A empresa depende, então, menos dos seus elementos
empresariais e mais desses valores de exploração. Se houver um
negócio que transmita a empresa e exclua certos bens, continua
a tratar-se de um negócio sobre aquela empresa?

O conjunto dos bens transmitidos tem de ser suficiente de


modo a poder continuar a perceber-se estar-se perante a em-
presa X. Tem de ser respeitado aquele âmbito mínimo de en-
trega – todos os bens estrutural-funcionalmente organizados
com vista o processo produtivo e necessários a exprimir a perma-
nência do sistema-todo diferente das partes.

Pode, ainda, acontecer haver a destruição parcial dos ele-


mentos de um estabelecimento. Os restantes elementos conti-
nuam na esfera patrimonial do sujeito: podem restar patentes,
mercas, a firma, contratos de trabalho, o “know-how”; continua
com alguns valores de exploração, como clientes, fornecedores,
etc. Se tais elementos exprimirem a permanência de um estabe-
lecimento, continuamos a ter uma empresa.

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Então, pode dizer-se que o estabelecimento é uma coisa


móvel, nos termos dos artigos 202.º/1 e 205.º/1 CC. É uma coisa
incorpórea porque, quer integre bens materiais ou imateriais,
não é igual à soma das partes – é uma organização que possui
individualidade e qualidades próprias.

Por ser uma coisa, pode afirmar-se a coexistência de um


direito de propriedade sobre o todo e outros direitos de proprie-
dade sobre as partes.

O estabelecimento responde pelas dívidas do seu proprie-


tário, quer elas resultem da exploração do estabelecimento ou
não.

Existe, no entanto, uma exceção a esta regra: os EIRL 6. Os


EIRL são patrimónios autónomos ou separados do restante patri-
mónio do comerciante individual. É um bem jurídico unitário (o
património consubstancia-se no estabelecimento), pelo que
pode ser objeto de direitos reais e obrigacionais ou de atos jurí-
dicos unitários. Os bens afetados ao estabelecimento só respon-
dem pelas dívidas contraídas na exploração do EIRL; pelas dívidas
do EIRL respondem somente os seus bens.

Em jeito de conclusão, repetimos o conceito geral de em-


presa em sentido objetivo: unidade jurídica fundada em organi-
zação de meios que constituem um instrumento de exercício re-
lativamente estável e autónomo de uma atividade de produção
para a troca.

6
Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada.

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O Trespasse

O trespasse é a transmissão da propriedade do estabele-


cimento com caráter definitivo por negócio intervivos. Ele pode
ser oneroso – para efeitos de preferência do senhorio ou para
efeitos de liquidação de sociedade, casos em que será necessari-
amente oneroso7 – ou gratuito.

Quanto à forma, exige-se apenas o simples escrito por


uma diversidade de razões: primeiramente, a interpretação ex-
tensiva do artigo 1112.º/3 CC (se a comunicação ao senhorio da
transmissão da posição de arrendatário tem de ser feito por es-
crito, igualmente terá de o ser o próprio negócio de trespasse); a
transmissão de firma, marca e logótipo exigir escrito (44.º/1 e /4
RRNPC e 31.º/5 e /6 e 304.º-P/3 CPI); a comunicação ao senhorio
da transmissão do estabelecimento a funcionar em local arren-
dado deve ser acompanhada de cópia do contrato de trespasse,
o que supõe um contrato reduzido a escrito (1112.º/3 CC última
parte).

Há agora que falar acerca dos âmbitos de entrega do tres-


passe.

O âmbito mínimo diz respeito a todos os bens necessários


ou essenciais à identificação da empresa-objeto do negócio. Se
desrespeitado, não há trespasse – o que se transmite, nessa hi-
pótese, são os bens singulares do estabelecimento. Não é possí-
vel, em abstrato, apontar que elementos fazem parte deste âm-
bito mínimo. Só em concreto, e dependendo da empresa em

7
Estão em causa interesses patrimoniais de terceiros.

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questão, se pode determinar quais são os elementos empresari-


ais obrigatoriamente incluídos no negócio sob pena de não se
qualificar como trespasse.

O âmbito natural é o conjunto dos bens que se transmite


no silêncio das partes, isto é, caso as partes digam apenas que se
trespassa “a empresa”. Assim, podemos dizer que se transmitem
os logótipos e marcas (artigos 304.º-P/3 e 31.º/5 CPI). Quanto a
outros bens integrantes da empresa, exige-se uma maior refle-
xão: se a empresa é uma organização de elementos para o exer-
cício de uma atividade produtiva destinada à troca e é um bem
jurídico unitário, deve transmitir-se o complexo de bens que
compõe a empresa – os elementos empresariais, incluindo o
know-how, já que, como vimos, ele faz parte da organização e do
processo produtivo, está inserido estrutural-funcionalmente na
empresa. Existe, por isso, o dever de comunicação desse know-
how ao trespassário.

No que diz respeito aos prédios, não há razões que con-


tendam com a inclusão dos mesmos no âmbito natural, uma vez
que são, muitas vezes, caracterizadores ou feitos “à medida” da
empresa.

Quanto à forma do negócio de trespasse que envolva


transmissão de prédios, há que dizer que se basta com o docu-
mento simples. E esta conclusão assenta em vários argumentos:
o DL 64-A/2000; a regra da escritura pública OU documento par-
ticular autenticado desde 2008; e a unidade dos negócios de tres-
passe e transmissão do imóvel.

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Direito Comercial I 2017/2018

No que diz respeito às prestações laborais e respetivos


contratos em que se fundam, também se transmitem, pela
norma do artigo 285.º/1 CT.

O (possível, mas não necessário) contrato de arrenda-


mento do imóvel onde funciona o estabelecimento também é
transmitido, havendo cessão da posição contratual que não ca-
rece de autorização do senhorio. O mesmo vale para a posição
contratual do locatário financeiro. Mas este regime merece ulte-
riores considerações.

Diz o artigo 1112.º CC que o trespassante arrendatário


pode ceder a sua posição contratual sem autorização do senho-
rio. Trata-se de uma norma especial que tutela a circulação ne-
gocial dos estabelecimentos.

Mas, caso não haja trespasse, aplicam-se as normas gerais


dos artigos 1059.º/2, 1038.º/f e 424.º e ss. CC. Por outras pala-
vras, exige-se o consentimento do senhorio.

E diz o 1112.º/2 CC que não há trespasse caso a transmis-


são não seja acompanhada da transferência das instalações,
utensílios, mercadorias ou outros elementos que integram o es-
tabelecimento (alínea a)) ou quando a transmissão vise o exercí-
cio, no prédio arrendado, de outro ramo de comércio ou indús-
tria ou seja afetado, de uma forma geral, a outro destino.

Esta norma do 1112.º/2/a deve ser interpretada corretiva-


mente. Como já se disse, não é necessário que se transmitam to-
dos os bens do estabelecimento para que haja trespasse. Sim-
plesmente, tem de se respeitar o âmbito mínimo, i.e., têm de se
transmitir os bens que tornam a empresa num bem novo e iden-

20
Direito Comercial I 2017/2018

tificável como tal, que se consubstancie numa organização pro-


dutiva de meios destinados à troca. Ridicularizando, e imagi-
nando que as partes excluíram do âmbito do trespasse de um
restaurante os guardanapos, não será por não se transmitirem os
guardanapos que não haverá trespasse.

Só provando que esse âmbito mínimo foi desrespeitado


pode o senhorio resolver o contrato por não ter ocorrido, de
facto, um trespasse. Considerar-se-á não haver trespasse caso já
houvesse, ao momento do negócio, intenção de dar outro des-
tino ao prédio, como diz a alínea b) do referido artigo. Esta inten-
ção pode ser desvelada através da teoria da impressão do desti-
natário ou pode ser revelada por factos posteriores.

O artigo 1112.º/5 tem, em si, uma causa autónoma de re-


solução do contrato de arrendamento por parte do senhorio.
Neste caso, houve, de facto, trespasse, mas o senhorio resolve o
contrato porque o estabelecimento não se mantém o mesmo.

E há uma grande diferença nos dois regimes: no que toca


ao 1112.º/2, não há trespasse, pelo que haverá direito de indem-
nização do senhorio por responsabilidade contratual (em relação
ao trespassante) e responsabilidade extracontratual (em relação
ao trespassário), além de haver resolução de contrato. Já no
1112.º/5 CC, há trespasse válido, pelo que não haverá direito de
indemnização, apesar de o senhorio poder, ainda assim, resolver
o contrato.

A cessão da posição contratual não é eficaz em relação ao


senhorio enquanto não lhe for comunicada por escrito, com có-
pia do contrato de trespasse para se garantir que houve, de facto,

21
Direito Comercial I 2017/2018

um trespasse e para efeitos de preferência do senhorio. Vejam-


se os artigos 424.º/2, 1038.º e 1112.º/3 CC a este ensejo.

O senhorio pode, neste caso, resolver o contrato com base


na falta de comunicação se isso lhe causar danos (e.g., queria atu-
alizar a renda e não o pôde fazer). Não basta, portanto, a falta de
comunicação no prazo de 15 dias, essa falta tem de causar danos
ao senhorio. Na verdade, nem mesmo a falta de comunicação por
1 mês parece ser fundamento de resolução – isto porque é o
prazo que o regime da locação de estabelecimento impõe para a
comunicação ao senhorio de que o seu imóvel, onde funciona o
estabelecimento locado, está a ser gozado por outra pessoa (ar-
tigo 1083.º/2/e CC e 1109.º/2 CC).

Regressando aos âmbitos de entrega, nomeadamente, ao


âmbito natural, importa referir outros direitos de crédito que o
trespassário tenha ao momento da celebração do negócio, como
o uso de patentes, marcas de licença e exploração, locação de
coisas móveis (1059.º/2 CC) e empréstimo de coisas móveis
(1135.º/f CC). Neste caso, diremos que não fazem parte do âm-
bito natural, pelo que não se transmitem no silêncio das partes.

Falemos agora do âmbito convencional. Como se vem


percebendo, as partes podem, num negócio de trespasse, incluir
certos elementos da empresa e/ou excluir outros. Já sabemos
que não se podem excluir os elementos que integram o âmbito
mínimo de entrega, sem os quais não há, verdadeiramente, tres-
passe. Mas quais são os elementos que as partes podem incluir
além dos elementos constantes do âmbito natural?

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Direito Comercial I 2017/2018

Por estipulação ad hoc, pode ser transmitida a firma


(44.º/1 RRNPC), o logótipo ou marca se incluírem o nome do tres-
passante8 (35.º CPI) e os créditos cujos objetos imediatos não se-
jam meios do estabelecimento (não são meios empresariais, mas
podem ser transmitidos – 577.º CC).

Os contratos ligados à exploração da empresa (cujos obje-


tos imediatos não sejam elementos do estabelecimento – e.g.,
contratos de fornecimento, financiamento, etc.) não fazem parte
do âmbito convencional porque precisam da aceitação da con-
traparte do trespassante, i.e., de um terceiro. O mesmo se passa
com os débitos: precisam da autorização do credor, pelo que não
dependem só das partes no contrato de trespasse e, por isso, não
fazem parte do âmbito convencional– artigos 424.º e 595.º CC.

No entanto, quanto aos débitos, excetuam-se as dívidas a


trabalhadores e coimas aplicadas pela prática de contraordena-
ções laborais, que podem integrar o âmbito convencional.

Existe, ainda, por efeito do contrato de trespasse, uma


obrigação implícita e supletiva de não concorrência.

Esta obrigação de não concorrência recai sobre o trespas-


sante (e seu cônjuge e filhos que conheçam os meandros negoci-
ais) num certo espaço durante um certo período de tempo. É cre-
dor desta obrigação de non facere o trespassário e seus sucessi-
vos adquirentes.

A obrigação de não concorrência funda-se no princípio da


boa-fé, no princípio da equidade, nos usos do comércio, mas, so-
bretudo, na obrigação de proporcionar o gozo pacífico da coisa.

8
Caso não incluam o nome, fazem parte do âmbito natural, como vimos.

23
Direito Comercial I 2017/2018

Isto porque o alienante conhece as características organi-


zativas da empresa e mantinha relações pessoais com fornece-
dores, clientes, etc.

Relativamente às sociedades, caso seja uma sociedade a


trespassante, alguns sócios podem ficar impedidos de concorrer:
aqueles que possuem os conhecimentos indispensáveis a uma
concorrência qualificada.

Mas quais são, então, os limites? A obrigação abrangerá


os lugares delimitados pelo raio de ação do estabelecimento e
pelo tempo suficiente para se consolidarem os valores de orga-
nização da empresa por parte de um adquirente razoavelmente
diligente.

Impede-se, desta forma, o trespassante de adquirir esta-


belecimento com objetivo similar, de desempenhar funções em
empresa com objeto similar e de entrar em sociedade com
objeto idêntico.

Esta obrigação de não concorrência é supletiva, pelo que


pode ser afastada pelas partes em convenção ad hoc.

Quanto à tutela deste direito do trespassário, valem as


normas respeitantes ao incumprimento das obrigações do CC: in-
demnização por perdas e danos (798.º), a resolução do contrato
(801.º/2), a ação de cumprimento (817.º), a sanção pecuniária
compulsória (829.º-A) ou a exigência do encerramento do esta-
belecimento (829.º).

A Locação de Estabelecimento

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Direito Comercial I 2017/2018

Vimos que o estabelecimento pode ser trespassado, mas


há, também, a possibilidade de ele ser locado.

A locação de estabelecimento é o contrato pelo qual uma


das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de
um estabelecimento mediante retribuição.

Deve obedecer à forma escrita sob pena de nulidade e


aplica-se-lhe o regime especial do arrendamento para fins não
habitacionais com as devidas alterações.

Nomeadamente, as partes estipulam a duração do con-


trato, tendo este o prazo de 5 anos no silêncio das partes
(1110.º/2 CC); as partes estipulam o regime de denúncia (no caso
de silêncio das partes, só pode ser operada pelo locatário, exceto
se o prazo for de 5 anos, caso em que terá de o fazer com um ano
de antecedência); as partes podem prever a prorrogação do con-
trato – não se aplica o 1096.º CC. Se não o previrem, caduca o
contrato no fim do prazo.

No que diz respeito aos âmbitos de entrega, já sabemos


que o âmbito mínimo tem de ser respeitado, pois só com os ele-
mentos que o integram se identifica a empresa como tal.

O âmbito natural engloba a generalidade dos meios em-


presariais pertencentes em propriedade ao locador, o logótipo e
as marcas (os artigos 31.º/5 e 304.º-P/3 falam em transmissão,
mas também aqui há transmissão, só que temporária).

No que diz respeito aos bens de que o locador é titular em


termos obrigacionais, transmite-se a posição de empregador

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Direito Comercial I 2017/2018

(285.º/3 CT), o gozo do prédio, o gozo das coisas em locação fi-


nanceira, o gozo de coisas em aluguer9 e as patentes, modelos de
utilidade e licenças de exploração (também aqui não é necessário
consentimento escrito do licenciante porque o direito não é alie-
nado).

O know-how terá, obviamente, de fazer parte do âmbito


natural, como verdadeiro elemento empresarial que é.

Também a firma integrará o âmbito natural.

Juridicamente, deve entender-se que a propriedade dos


meios empresariais fica com o locador porque a empresa é um
bem unitário, não se podendo implicar um direito locatício sobre
o bem único-empresa e direitos de propriedade sobre as partes.
Trata-se, antes, de um poder-dever de exploração do cessioná-
rio. Este poder implica o consumo e alienação de elementos em-
presariais. Sendo um dever, pode o cedente ou locador do esta-
belecimento resolver o contrato com base em incumprimento.

Existe, também aqui, uma obrigação de não-concorrência.


Mas esta é diferente daquela que estudámos acerca do tres-
passe. Temos de distinguir dois momentos.

No que diz respeito ao tempo enquanto o contrato vigora,


a obrigação de não-concorrência recai sobre ambos. O locador
deve, como vimos, assegurar o gozo pacífico da coisa, mas o lo-
catário, tendo o poder-dever de exploração da empresa ou esta-
belecimento, diminuiria muito o valor deste caso concorresse
“contra si mesmo”. Além disso, pode dizer-se que tal violaria o

9
Viu-se, a propósito do trespasse, que não faziam sequer parte do âmbito convencional as posições con-
tratuais cujos objetos imediatos não fossem meios do estabelecimento, porque se precisaria da autoriza-
ção da contraparte, de um terceiro. Na locação de estabelecimento, não se passa assim: o cedente conti-
nua a ser locatário dos bens, simplesmente cede o gozo, pelo que não necessita de autorização do locador.

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Direito Comercial I 2017/2018

dever de manutenção e restituição da coisa por parte do locatá-


rio (nos termos do 1043.º CC).

Terminado o contrato, o ex-locatário não fica obrigado a


não concorrer por respeito ao princípio da liberdade económica.
De facto, deve o locador tomar em conta esses riscos antes de
locar o estabelecimento.

Quando o locador cede o gozo do estabelecimento que


funciona em prédio próprio, ele não arrenda o imóvel. Trata-se
de um negócio unitário com objeto também unitário, pelo que o
locatário não passa a arrendatário ou subarrendatário.

Caso o prédio do estabelecimento seja arrendado, não é


necessário o consentimento do senhorio. Apenas lhe tem de ser
comunicada a cessão do gozo do imóvel no prazo de um mês,
sendo-lhe ineficaz a cessão se não for respeitado o prazo e, com
isso, lhe cause danos. “Se a falta de comunicação, pela sua gravi-
dade ou consequências, tornar inexigível ao senhorio a manuten-
ção do contrato, pode este resolver o contrato de arrendamento.

Os Títulos de Crédito

A lei portuguesa não dá uma noção de títulos de crédito,


nem existe sequer um regime geral dos títulos de crédito. Se exis-
tisse um regime assim, o problema da noção seria muito mais
premente.

Não obstante, diz Vivante que um título de crédito é um


documento necessário para exercitar o direito literal e autónomo
nele mencionado. Vamos decompor esta definição.
27
Direito Comercial I 2017/2018

Antes de mais, o título de crédito é um documento, que


desempenha uma função de legitimação. O documento é neces-
sário para o exercício do direito nele mencionado porque, en-
quanto o título existe, o exercício do direito está subordinado à
detenção e exibição do próprio título. É por haver uma tutela par-
ticular da posição do detentor que se facilita a circulação desse
mesmo crédito, na medida em que o título lhe confere legitima-
ção para o exercício do direito. Isto facilita a transmissão porque
o adquirente não se irá importar como é que o título foi parar às
mãos do transmitente, só sabe que é a si que a prestação deve
ser realizada.

A literalidade da letra do documento é essencial para a


determinação do conteúdo, limites e modalidade do direito. E
compreende-se que assim seja quanto a documentos que permi-
tem a circulação do direito neles mencionado para que um ter-
ceiro possa confiar.

Mas se a letra é decisiva, esta não tem de dizer tudo. Por


exemplo, num título de ação, a socialidade terá de ser confor-
mada pelo contrato de sociedade e pela lei, além do documento.
Aí, o documento é um título incompleto, visto não conter a indi-
cação de todos os direitos que confere.

A autonomia consiste no facto de se dever considerar que


o direito surgia como que de novo na esfera do possuidor de boa-
fé, direito que não pode ser restringido ou destruído em virtude
das relações existentes entre os antigos possuidores e devedo-
res. Diz-se que o direito é autónomo porque é adquirido, pelo

28
Direito Comercial I 2017/2018

título de crédito, de um modo originário, isto é, independente-


mente da titularidade do seu antecessor e possíveis vícios dessa
anterior titularidade.

A circulabilidade traduz-se na aptidão do título para circu-


lar de acordo com as regras próprias que a favorecem. No en-
tanto, esta nota vai como que implícita na literalidade e autono-
mia, visto que estas duas características não valem nas relações
imediatas.

Os títulos de crédito ganharam importância pela necessi-


dade de tornar mais fácil e segura a circulação de créditos. Deste
modo, podemos apontar algumas funções dos títulos de crédito
em geral: função de transmissão e função de legitimação, nos
termos já vistos acima.

Os títulos de crédito podem conferir ao seu portador um


direito a uma prestação em dinheiro, um direito de natureza real
sobre coisas ou podem ser títulos de participação, se represen-
tam uma participação numa determinada pessoa coletiva.

Depois, podemos classificá-los quanto ao modo normal de


transmissão: títulos ao portador se se transmitem pela simples
entrega do título (não revelam no texto o nome do titular, evi-
dentemente); títulos à ordem se se transmitem por endosso, fi-
cando a constar do título um comprovativo da transmissão e
identificando o primeiro titular, pelo que se pode construir, a par-
tir dele, uma cadeia de endossos; títulos nominativos se exigem
a intervenção do emitente para a sua transmissão (caso das soci-
edades que têm de “aprovar” sócios novos).

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Direito Comercial I 2017/2018

A letra é um documento em papel que contém uma ordem


de pagamento de uma quantia determinada dada pelo sacador
ao sacado e à ordem do tomador.

A letra de câmbio permite, desde logo, diferir no tempo a


realização de um pagamento. Em vez de pagar na altura, o acei-
tante pagará uma quantia na data do vencimento da letra, pelo
que ela funciona como instrumento de crédito. Por outro lado, o
tomador pode obter imediatamente o pagamento através, desig-
nadamente, do desconto. Por último, a letra, constituindo título
executivo, permite o recurso ao processo executivo para obter o
pagamento.

Com o saque da letra de câmbio, o próprio sacador torna-


se obrigado cambiário perante o tomador porque é garante da
aceitação e do pagamento da letra perante o tomador e posteri-
ores portadores da mesma. Por isso se diz que, atendendo a que
o sacador assume o papel de garante, é ele o obrigado inicial.

É possível que o sacador dê a ordem de pagamento a si


mesmo, caso em que será, também o sacado, mas também é pos-
sível que o sacador saque a letra à sua própria ordem, ficando na
posição de tomador.

A letra pode conter outros negócios cambiários, como o


aceite, em que o sacado faz sua a responsabilidade pelo paga-
mento da letra e aceita a ordem contida no saque, tornando-se
obrigado principal; o endosso, negócio que transmite a letra, em
que o endossante se torna, em princípio, garante da aceitação e
do pagamento da letra; ou o aval, em que alguém garante o pa-
gamento da letra, no todo ou em parte, por parte de algum dos
restantes obrigados cambiários.

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Direito Comercial I 2017/2018

No entanto, para ser válida, a letra tem de verificar alguns


requisitos externos, constantes do artigo 1.º da LULL. Se algum
destes não estiver presente no documento, à partida, não temos
um documento válido como letra. Não é, porém, essa a conse-
quência se faltar a indicação da época de pagamento, o lugar de
pagamento e o lugar onde a letra foi passada – artigo 2.º.

Desta forma, podemos falar de requisitos essenciais e ou-


tros não essenciais. Serão requisitos não essenciais aqueles que
podem, nos termos do artigo 2.º LULL, ser suprimidos.

Mas mesmo no caso em que faltem requisitos essenciais,


importa saber se houve ou não um acordo de preenchimento da
letra. Se faltar esse acordo, estamos perante uma letra incom-
pleta, documento que não vale como letra.

Caso haja acordo de preenchimento, falamos de uma letra


em branco, a sua imperfeição é passageira, porque vai ser preen-
chida. Para ser válida, terá de ter, desde o início, a palavra letra
e a assinatura do sacador e essa assinatura deverá ter sido colo-
cada com o propósito de se obrigar cambiariamente.

Se foi celebrado um acordo de preenchimento, esse pacto


só é oponível nas relações imediatas. A violação do acordo de
preenchimento não é oponível aos portadores mediatos, salvo se
a tenha adquirido de má-fé ou cometido culpa grave – artigo 10.º
LULL.

Se o portador mediato, no entanto, recebe a letra em


branco e acaba de a preencher, ele não merece a tutela do artigo
10.º, isto porque, até ao preenchimento da letra com os elemen-
tos essenciais, ela não vale como tal. Neste sentido, pode dizer-

31
Direito Comercial I 2017/2018

que o endossado é representante do endossante quanto ao con-


trato de preenchimento, pelo que pode ver o subscritor opor-lhe
as mesmas exceções que podia opor a este.

Podem fazer-se cópias de uma mesma letra, para diminuir


o risco de perda do título e de facilitar a negociação da letra. O
pagamento de uma das vias de letra extingue a obrigação. Po-
rém, se o sacado colocou o aceite em mais do que uma via, será
responsável pelo pagamento de cada uma delas que tenha o seu
aceite. Assim, terá todo o interesse em exigir a restituição de to-
das as vias com o seu aceite.

Os sujeitos que surjam na letra como obrigados cambiá-


rios devem ter capacidade para se obrigar pela sua declaração.
Essa incapacidade eventual pode ser suprida nos termos legais.
A falta de capacidade para se obrigar por letras é, em regra, opo-
nível ao portador.

Os negócios cambiários podem ser realizados por intermé-


dio de representantes. Mas os representantes que atuarem sem
poderes ou no excesso de poderes de representação ficam obri-
gados em virtude da letra que assinaram. Não parece de excluir
a possibilidade de ratificação por parte do representado caso o
representante atuem sem ou com excesso de poderes.

No que diz respeito às sociedades comerciais e seus ge-


rentes, devemos relembrar o formalismo rigoroso de que depen-
dem as letras pela necessidade de proteção dos portadores me-
diatos. Por isso mesmo, interrogamo-nos acerca do sentido de
invocar esse rigor formal quanto tal invocação tem lugar pelo
obrigado cambiário em prejuízo do portador mediato (que se

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Direito Comercial I 2017/2018

queria proteger com aquele formalismo) e para impedir o re-


curso a circunstâncias exteriores ao documento. O acórdão de
uniformização de jurisprudência n. º1/2002 diz que, não havendo
indicação da qualidade de gerente com a utilização de “gerente”
ou outras equivalentes, mas podendo aquela indicação ser reti-
rada de factos que “com toda a probabilidade o revelem”, não se
vê razão para existir um vício de forma.

O saque é a ordem de pagamento que o sacador dá ao sa-


cado. Pelo saque, o sacador cria a letra de câmbio. Aquela ordem
de pagamento, já vimos, deve se pura e simples. Daí que a ordem
não possa estar subordinada a condições: não se compatibiliza a
característica da literalidade com a necessidade de o portador
mediato ter de investigar se as condições de pagamento estariam
verificadas ou não.

A quantia tem de ser determinada, e não apenas deter-


minável, pela mesma razão – livrar o portador mediato de inves-
tigações fora do título.

Com o saque, o sacador garante também a aceitação e o


pagamento da letra, sendo responsável solidário com o acei-
tante, endossante ou avalista, nos termos do artigo 47.º LULL.

Porém, de acordo com o 9.º LULL, o sacador pode exone-


rar-se da garantia de aceitação, mas nunca da garantia de paga-
mento.

O aceite é a declaração pela qual o sacado se obriga a pa-


gar a letra à data do vencimento. Se não aceitar a letra, o sujeito
indicado como sacado não fica obrigado, mas poderá ter de in-
demnizar o sacador se antes se tinha comprometido a aceitar a

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Direito Comercial I 2017/2018

letra. Como é o aceitante que se obriga a pagar a letra na data do


seu vencimento, é considerado o obrigado principal.

A apresentação ao aceite deve ter lugar até à data do ven-


cimento. A apresentação que então se faça ao sacado, depois
dessa data, deve ser para pagamento.

O aceite é dado na própria letra com a palavra aceite e


com a assinatura do aceitante. No entanto, a simples assinatura
do sacado na parte anterior da letra valerá com aceite.

O aceite deve ser puro e simples, mas permite-se o aceite


parcial da importância sacada.

A letra pode ser, no entanto, não aceite – o sacado só se


torna obrigado cambiário através do aceite. A recusa de aceite
pelo sacado deve ser comprovado por um protesto realizado
pelo portador pela falta de aceite. Uma vez que a recusa de aceite
implica o vencimento antecipado da letra, o portador pode exer-
cer os seus direitos de ação contra os outros obrigados.

O endosso é o modo normal de transmissão dos direitos


da letra. Esta transmissão não necessita de ser comunicada ao
devedor, o que constitui uma diferença importante relativa à ces-
são de créditos. Tal endosso deve constar da letra ou de folha
ligada à letra e deve ser assinada pelo endossante.

Com o endosso, dá-se uma nova ordem de pagamento ao


sacado – assim se vê que o endosso constitui um novo saque. O
primeiro endosso deve ser realizado pelo tomador e os seguintes
pelos sucessivos endossados. Desta forma se garante uma série
ininterrupta de endossos. O detentor de uma letra é considerado

34
Direito Comercial I 2017/2018

portador legítimo se justifica o seu direito por uma série ininter-


rupta de endossos.

O endossante garante a aceitação e o pagamento da letra


perante os posteriores portadores, caso não haja cláusula em
contrário (pode só transmitir os direitos na letra, mas tem de o
dizer expressamente).

O endosso em branco é aquele que é realizado sem a


menção da pessoa a favor da qual há a nova ordem de paga-
mento. Este endosso em branco não afeta a regularidade da ca-
deia de endossos.

O portador de uma letra que a tenha recebido através de


endosso em branco pode mantê-la consigo tal e qual, preencher
o espaço em branco com o seu nome ou de outrem, endossar em
branco mais uma vez. Nalguns destes casos, como se percebe, a
letra começará a funcionar como um título ao portador.

O aval é um negócio cambiário pelo qual o sujeito que


emite a declaração garante o pagamento da letra, no todo ou em
parte, por um dos obrigados cambiários. O avalista pode ser um
sujeito que não teve até aí qualquer intervenção no título de cré-
dito, ou pode ser alguém que já é signatário da letra. Nesta última
hipótese, o aval agrava a responsabilidade o signatário.

A indicação da pessoa por quem o avalista dá o aval deve


ser expressa. Se essa indicação não é dada, deve entender-se que
o aval é dado pelo sacador. No entanto, esta presunção é ilidível
– nas relações imediatas, pode provar-se que o aval sem indica-
ção do avalizado foi prestado a favor de outra pessoa que não o
sacador. Nas relações mediatas, compreende-se que, para tutela

35
Direito Comercial I 2017/2018

dos interesses relacionados com a circulação da letra, a presun-


ção não possa ser ilidida.

O avalista responde nos mesmos termos em que responde


aquele por quem é dado o aval. O avalista não é, contudo, um
fiador, porque assume uma obrigação cambiária: uma obrigação
que se reveste das notas caracterizadoras deste tipo de obriga-
ções. Desde logo, o avalista fica sub-rogado nos direitos emer-
gentes do pagamento da letra contra os que sejam obrigados
cambiários para com a pessoa por quem deu o aval.

Podemos falar de uma verdadeira independência das


obrigações cambiárias, no sentido em que os vícios que afetem
uma das obrigações cambiárias não se transmitem às dos outros
subscritores. Pretende-se, mais uma vez, garantir a circulabili-
dade, tornando desnecessárias verificações que a prejudicariam.
Por outro lado, o endossante deve contar com a possibilidade de,
antes de si, se encontrarem obrigados cambiários que, afinal, não
respondem. Contudo, aquele endossante fica obrigado perante
o endossado e posteriores portadores legítimos, a menos que
proíba um novo endosso, de acordo com o 15.º LULL.

A obrigação cambiária é abstrata porque independente


da sua causa: esta é-lhe indiferente e a obrigação cambiária pode
servir qualquer causa. Desta forma, o devedor cambiário não
pode invocar perante o portador vícios das anteriores relações
causais (por exemplo, vício de uma compra e venda), a menos
que o portador, ao adquirir a letra, tenha querido prejudicar o
devedor – não basta saber desse prejuízo, tem de o querer.

36
Direito Comercial I 2017/2018

Por isso se diz que a obrigação cambiária é abstrata: por-


que se abstrai dos eventuais vícios de outras relações causais an-
teriores e que não se conectem com o portador. Inclusive, a boa-
fé de um portador sana a má-fé de anteriores portadores.

No que diz respeito ao vencimento, uma letra pode ser


sacada à vista (pagável à apresentação), a um certo termo de
vista (vence decorrido um certo prazo a contar da data de aceite
ou do protesto pela falta de aceite), a um certo termo de data
(vence decorrido um certo prazo a contar da data em que a letra
foi passada) ou pagável em dia fixado (indica o preciso dia em
que vence).

No entanto, a lei prevê casos em que o pagamento pode


ser exigido antes do vencimento, no artigo 43.º LULL: quando
houve recusa, total ou parcial, de aceite; teve lugar a declaração
de falência do sacado; foi declarado falido o sacador de letra não
aceitável.

O pagamento pode ser exigido pelo portador legítimo da


letra – ele é legítimo se provar uma série ininterrupta de endos-
sos. E o pagamento da letra no vencimento liberta das suas obri-
gações aquele que paga. A apresentação a pagamento é, em re-
gra, feita ao sacado, pois é a este que o sacador dá a ordem de
pagamento contida na letra. O sacado que paga pode exigir a en-
trega da letra e a quitação correspondente. E pode inclusive rea-
lizar um pagamento parcial, que o portador não pode recusar,
mas não pode, nesse caso, o sacado exigir a entrega da letra.

Também qualquer dos coobrigados que pagou pode exigir


a entrega da letra com o respetivo protesto e um recibo. De

37
Direito Comercial I 2017/2018

acordo com o 48.º LULL, o portador da letra pode exigir ao de-


mandado não apenas o pagamento da quantia constante da le-
tra, mas também dos juros estipulados.

O protesto por falta de aceite ou por falta de pagamento


consiste num ato formal de comprovação da recusa de aceite ou
de pagamento. Na falta desse protesto por parte do portador da
letra, ele perde os direitos de ação contra endossantes, sacador
e outros coobrigados – artigos 44.º LULL.

O desconto bancário é o contrato pelo qual um banco an-


tecipa a um cliente (portador da letra) a importância correspon-
dente a um crédito ainda não vencido que esse cliente detém so-
bre um terceiro, sendo deduzido dessa quantia o juro devido pelo
tempo que falta para o vencimento de crédito e as comissões a
que houver lugar. Este contrato é uma operação de banco, pelo
que é objetivamente comercial nos termos do 362.º CCom.

Se o aceitante, obrigado principal, não paga quando devia,


o portador da letra tem contra ele uma ação cambiária, que é
conhecida como ação direta. Como o será, também, a ação con-
tra o avalista do aceitante, pois o avalista responde da mesma
maneira que o avalizado.

Por sua vez, a ação que o portador da letra tem contra os


endossantes, sacador e outros obrigados é designada ação de re-
gresso e todos aqueles são obrigados de regresso. Mas, para que
o portador possa demandar em via de regresso esses sujeitos em
caso de falta de aceite ou de falta de pagamento, tem de fazer o
correspondente protesto dentro dos prazos legais.

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Os aceitantes, endossantes, sacador e avalistas são solida-


riamente responsáveis para com o portador, que os pode acionar
como bem entender.

Contudo, esta responsabilidade solidária difere daquela


prevista nos artigos 512.º e ss. CC. Desde logo porque, se um dos
signatários da letra da letra que não seja o aceitante a paga, tem
o direito de acionar o aceitante, o sacador, os anteriores endos-
santes e os avalistas destes para exigir a “soma integral que pa-
gou” – 49.º/1 LULL.

Quanto ao aceitante, caso o haja, não precisa de verificar


os prazos legais do 53.º LULL. No entanto, mesmo as ações contra
o aceitante relativa à letra aceite prescrevem em três anos a con-
tar do seu vencimento.

Já as ações do portador contra endossantes e sacador, que


são obrigados de garantia, prescrevem no prazo de um ano a con-
tar do protesto feito em tempo útil ou da data do vencimento.

Se algum dos obrigados de garantia paga a letra, pode exi-


gir o pagamento dos anteriores endossantes ou sacador, mas
essa ação prescreve em seis meses a contar do dia em que o en-
dossante pagou a letra ou em que ele próprio foi acionado – 70.º
LULL.

Com isto se vê que os prazos de prescrição podem variar


consoante a posição que se ocupa na cadeia cambiária.

Não é por prescrever a ação que prescreve o crédito, pois


pode subsistir, ainda, a relação fundamental.

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Os sinais distintivos das empresas e produtos

Estudaremos agora, brevemente, alguns sinais distintivos


de empresas (logótipos e recompensas) e de produtos (marcas,
denominações de origem e indicações geográficas. Estes sinais,
apesar de serem designados por “sinais de comércio” muitas ve-
zes, não se limitam a ser usados por comerciantes, daí a sua in-
clusão no direito industrial ou da propriedade industrial. Não
obstante, torna-se importante estudá-los porque são, como
vimos, muitas vezes, elementos empresariais.

O logótipo é o signo suscetível de representação gráfica


para distinguir entidade ou sujeito e, eventualmente, estabeleci-
mentos deste (304.º-A e -B CPI). O logótipo serve, primordial-
mente, para distinguir sujeitos que prestem serviços ou produ-
zam bens destinados ao mercado.

O sujeito titular de logótipo não tem de ser empresário ou


sequer comerciante. Mas, se for empresário, é natural que use
logótipo para individualizar o seu estabelecimento. Por isto, di-
zemos que o logótipo é um sinal distintivo bifuncional: distingue
sujeitos e estabelecimentos.

Curiosamente, um mesmo sujeito, que só pode ter uma


firma ou denominação, pode ter vários logótipos, talvez para per-
mitir que um sujeito com diversos estabelecimentos individualiza
cada um com o seu logótipo.

A marca é um signo suscetível de representação gráfica


destinado a distinguir certos produtos de outros produtos idên-
ticos ou afins. Não têm de pertencer a uma empresa, assim como
podem pertencer a mais que uma empresa; de acordo com o

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225.º CPI, o direito ao registo da marca cabe a quem nisso tenha


legítimo interesse.

A doutrina tradicional dizia que as marcas tinham uma


função distintiva que equivale a uma função de indicação de ori-
gem ou proveniência dos produtos, origem essa entendida de
forma estrita por alguns autores (daquela empresa) e de forma
ampla para outros (daquele grupo).

No entanto, esta conceção falha nas marcas coletivas de


certificação e nos casos em que é legítimo dois ou mais sujeitos
não ligados usarem a mesma marca. A função distintiva das mar-
cas não se confunde ou identifica com a indicação de origem ou
proveniência. O titular e os utentes legítimos da marca comuni-
cam por ela ao público algo respeitante a produtos. Comunicam,
no mínimo, que os produtos assinalados com a marca são produ-
tos individualizados e distintos (ainda que a diferença resida tão-
só no signo!).

As marcas têm, também, uma função de garantia de qua-


lidade direta e autonomamente tutelada pelo direito. Isto é ob-
servável no 269.º/2/b CPI, que diz que o registo da marca caduca
se tornar suscetível de induzir o público em erro, nomeadamente
acerca da qualidade do produto ou serviço. Com isto não se im-
pede a melhoria de qualidade ou se torna ilícita pioras não essen-
ciais ou sensíveis de qualidade. Mas as diminuições de qualidade
suscetíveis de induzir o público em erro já poderão fazer caducar
o registo da marca.

Poderemos, ainda, falar de uma função atrativa ou publi-


citária excecional das marcas de prestígio, marcas que, embora

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radicadas em determinados produtos, se libertam da função dis-


tintiva e aparecem como símbolos de excelência. Esta função é
especialmente tuteada no 242.º CPI.

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