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Guerra do Iraque - Fundamentos Jurídicos do Uso da Força

Embora a presente guerra no Iraque suscite reflexão sobre vários


temas jurídicos, designadamente a questão das leis da guerra no que se
refere ao tratamento de civis ou prisioneiros de guerra ou a questão do
julgamento de eventuais crimes de guerra, crimes contra a humanidade ou do
crime de agressão, centrar-me-ei apenas, neste breve comentário, na
questão do fundamento jurídico da intervenção armada na cena internacional.

A Carta das Nações Unidas foi o culminar, sob a forma de tratado, de


esforços no sentido de controlar o uso da força na cena internacional que se
intensificavam, pelo menos, desde os finais do século XIX, com a 1a
Conferência da Paz da Haia de 1899, e que se foram progressivamente
afirmando com o sistema instituido no Pacto da Sociedade das Nações (SdN)
e, posteriormente, na Carta do Atlântico. A guerra foi sendo limitada no
decurso deste período, desde a proibição da mesma para cobrança de
dívidas e a necessidade de declaração ou ultimatum, nas convenções
resultantes das duas Conferências da Paz da Haia, até à necessidade de um
processo prévio de submissão ao Conselho do Sociedade das Nações, a
tribunal arbitral ou ao Tribunal Permanente de Justiça Internacional, no Pacto
da SdN e à sua rejeição em termos gerais na Carta do Atlântico.

Contudo, a ilegalização do uso da força como princípio geral e


fundamental da organização mundial surge apenas com o art. 2° n°4 da Carta
da ONU1, que afirma: “A Organização e os seus membros, para a realização
dos objectivos do artigo 1, agirão de acordo com os seguintes princípios: 4)
Os membros deverão abster-se nas suas relações internacionais de recorrer
à ameaça ou ao uso da força, quer seja contra a integridade territorial ou a
independência política de um Estado, quer seja de qualquer outro modo
incompatível com os objectivos das Nações Unidas;”. Este artigo insere-se
numa estrutura global da Carta que assenta sobre o pilar básico da
necessidade da paz mundial, como é patente no seu primeiro artigo, que
estatui: “Os objectivos das Nações Unidas são: 1) Manter a paz e a
segurança internacionais e para esse fim: tomar medidas colectivas eficazes
para prevenir e afastar ameaças à paz e reprimir os actos de agressão, ou
outra qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos, e em
conformidade com os princípios da justiça e do Direito Internacional, a um
ajustamento ou solução das controvérsias ou situações internacionais que
possam levar a uma perturbação da paz;”.

O artigo 2° n° 4 converteu-se também, ao longo dos tempos,


provavelmente na única norma incontestada de jus cogens, isto é, uma
norma imperativa que, no dizer do art. 53° da Convenção de Viena sobre
Direito dos Tratados de 1969 “… é a que for aceite e reconhecida pela
comunidade internacional dos Estados no seu conjunto como norma à qual
nenhuma derrogação é permitida e que só pode ser modificada por uma nova

1
A Carta da ONU, cuja tradução oficial para português consta do Diário da República I Série
A n° 117, de 22 de Maio de 1991, pode ser consultada em numerosas colectâneas e, nas
suas versões autênticas, na página das Nações Unidas na internet, www.un.org. Aliás, todos
os outros documentos referidos neste artigo podem ser consultados na dita página.
norma de Direito Internacional geral com a mesma natureza”, tendo, por isso,
uma força acrescida, reconhecida por toda a comunidade internacional.

A Carta admitiu apenas raras excepções à proibição do uso da força: a


legítima defesa (art. 51°), a autorização dada pelo Conselho de Segurança ao
abrigo do Capítulo VII, designadamente, o seu artigo 42°, as medidas contra
um estado inimigo (da 2a Guerra Mundial), nos arts. 53°e 107°, entretanto já
caducadas e objecto de eliminação numa resolução já aprovada, que entrará
em vigor quando se realizar a esperada revisão geral da Carta, e, dentro de
certos condicionalismos, a acção de organizações regionais (arts. 53° e 54°)
quando sob autoridade do Conselho de Segurança. Como estas duas últimas
excepções ou não estão em vigor ou se subsumem a autorização do
Conselho de Segurança, as únicas excepções substantivas existentes são,
por isso, a legítima defesa e a autorização do Conselho de Segurança, que
passarei a analisar. De notar, apenas, em termos prévios, que, como
excepções que são a uma regra geral, que, aliás, constitui o princípio básico
sobre que assenta todo o edifício jurídico de segurança mundial, não podem,
segundo regras básicas de Direito, ser interpretadas de modo extensivo mas
apenas literalmente ou mesmo de modo restritivo.

Afirma o artigo 51°: “Nada na presente Carta prejudica o direito


inerente de legítima defesa individual ou colectiva, no caso de ocorrer um
ataque armado contra um membro das Nações Unidas, até que o Conselho
de Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da
paz e segurança internacionais. As medidas tomadas pelos membros no
exercício desse direito de legítima defesa serão comunicadas imediatamente
ao Conselho de Segurança e não deverão, de modo algum, atingir a
autoridade e a responsabilidade que a presente Carta atribui ao Conselho
para levar a efeito, em qualquer momento, a acção que julgar necessária à
manutenção ou ao restabelecimento da paz e da segurança internacionais.”.
Apesar de rios de tinta terem corrido sobre o alcance deste direito, parece
que só fica coberta a situação de resposta a um ataque já ocorrido (contra o
estado em si ou contra um outro estado que pede ajuda) , tendo ainda parte
considerável da doutrina e prática estatal aceite a possibilidade de legítima
defesa se o ataque for iminente (algumas das versões oficiais da Carta, entre
as quais a francesa, podem apontar neste sentido) e não for possível ser
repelido de outro modo. A ideia de que poderia existir intervenção armada
para prevenir uma possibilidade de um ataque, designadamente porque o
Estado em causa se está a armar e pode ser uma ameaça, nunca teve o
mínimo acolhimento na doutrina ou jurisprudências internacionais, sobretudo
devido aos abusos a que se presta.

Por seu lado, no Capítulo VII, “Acção em caso de ameaça à paz,


ruptura da paz e acto de agressão”, o art. 42° estatui: “Se o Conselho de
Segurança considerar que as medidas previstas no artigo 41 [sanções não
militares] seriam ou demonstraram ser inadequadas, poderá levar a efeito,
por meio de forças aéreas, navais ou terrestres, a acção que julgar
necessária para manter ou restabelecer a paz e a segurança
internacionais…”. Este artigo tem sido entendido como incluindo a
autorização para forças armadas de um ou vários Estados intervirem, já que
nunca foram criadas forças armadas das Nações Unidas.

Sendo este o quadro apresentado pelo tratado fundacional da ordem


internacional, já que a Carta se encontra, hierarquicamente, numa posição
superior aos restantes tratados (como consta do art. 103°, que afirma que
“No caso de conflito entre os membros das Nações Unidas em virtude da
presente Carta e as obrigações resultantes de qualquer outro acordo
internacional, prevalecerão as obrigações assumidas em virtude da presente
Carta”), vejamos quais os argumentos jurídicos invocados pelos aliados como
justificativos da guerra no Iraque.

Os discursos dos dirigentes americanos apontam, fundamentalmente,


para três razões justificativas: a ligação do Iraque ao terrorismo internacional,
a existência de armas de destruição maciça que o regime utilizaria e,
finalmente, o perigo para a segurança mundial, reconhecido pela aprovação
pelo Conselho de Segurança da resolução 1441 (2002). O único memorando
jurídico que parece ter vindo a público, oriundo do Procurador-Geral do Reino
Unido, apresenta, contudo, uma base algo diferente, que assenta na ligação
entre a resolução 1441 (2002) e as resoluções 678 (1990) e 687 (1991),
referentes à 1a Guerra do Golfo.

No que se refere às razões apresentadas em comunicações políticas


como justificação jurídica, a mais fraca é, provavelmente, a da ligação ao
terrorismo internacional, não só porque os factos não a comprovaram (até
agora, o único campo de eventual treino de terroristas descoberto situa-se no
norte do Iraque, numa área controlada exclusivamente pelos curdos) mas
também porque, a existir, não poderia ser considerada como “um ataque” aos
Estados Unidos, dando origem a legítima defesa e não existiu nenhuma
resolução do Conselho de Segurança que autorizasse a intervenção armada
no Iraque por este motivo. Aliás, é curioso notar que a resolução 1368 (2001),
que permite, no seu n° 5, que sejam tomados todos os passos necessários
para responder aos ataques do 11 de Setembro e combater todas as formas
de terrorismo, e que justificou juridicamente a intervenção no Afeganistão,
nunca foi invocada nesta crise, certamente pela dificuldade de provar a
ligação do regime de Saddam ao terrorismo internacional.

Relativamente ao argumento da existência de armas de destruição


maciça (armas nucleares, químicas, biológicas e radiológicas), o mesmo
poderá apenas servir de modo de persuasão do Conselho de Segurança (o
que se não veio a verificar), já que não é, obviamente, a existência de armas
ou o seu potencial uso que origina a legítima defesa (o que implicaria,
evidentemente, intervenções, desde logo, nos países com armas nucleares)
mas apenas o uso concreto das mesmas, sob a forma de um ataque. A outra
justificação teria que passar pelo convencimento do Conselho de Segurança
de que estas armas seriam uma ameaça à paz, nos termos do art. 39° (“O
Conselho de Segurança determinará a existência de qualquer ameaça à paz,
ruptura da paz ou acto de agressão e fará recomendações ou decidirá que
medidas deverão ser tomadas de acordo com os artigos 41 e 42, a fim de
manter ou restabelecer a paz e a segurança internacionais.”) e da
correspondente aprovação através de uma resolução, o que não sucedeu.
Claro que a questão factual da existência ou da possibilidade de uso dessas
armas tem que ser igualmente levada em consideração, tanto mais que o
Iraque não as usou, nem mesmo em legítima defesa contra as tropas aliadas.

Finalmente, há nos discursos políticos frequentes referências a uma


autorização que já teria sido dada pelo Conselho na resolução 1441 ,
sobretudo nos seus números 2, em que decide “…conceder ao Iraque, por
esta resolução, uma oportunidade final para cumprir as suas obrigações de
desarmamento de acordo com as resoluções relevantes do Conselho”, 4, em
que “…o não cumprimento, pelo Iraque, em qualquer altura, desta resolução
e de cooperar completamente na sua implementação constituirão uma
violação material adicional das suas obrigações..” e, sobretudo 13, em que o
Conselho “Recorda, neste contexto, que avisou repetidas vezes o Iraque que
enfrentará consequências sérias em resultado da violação continuada das
suas obrigações;”. As referidas “consequências sérias” foram interpretadas
como uma autorização para intervenção armada e apresentadas como
justificação nos discursos políticos. Contudo, não existe qualquer precedente
nas resoluções do Conselho de Segurança no sentido de esta expressão
poder ser interpretada deste modo e, pelo contrário, existem numerosas
resoluções em que essa autorização é expressamente referida (como no
caso da intervenção da INTERFET em Timor, por exemplo) ou, pelo menos,
em que é feita referência a “todas as medidas necessárias” (como o caso do
Afeganistão), tendo sido aceite que as militares também estariam aí incluidas.

Uma outra prova de que a resolução 1441 não confere, por si só,
mesmo aos olhos dos aliados, legalidade para a intervenção, reside na
justificação jurídica que é dada para a mesma pelo Procurador-Geral
britânico, Lord Goldsmith, único memorando público sobre esta questão, que
veio a ser assumido pelos Estados Unidos. O argumento recorre a duas
resoluções do tempo da 1a Guerra do Golfo, afirmando que, pela resolução
678 (1990), o Conselho de Segurança autorizou o uso da força contra o
Iraque para que se retirasse do Kuwait, pela resolução 687 (1991), que
consagrou o cessar fogo, impôs obrigações de desarmamento ao Iraque que
não foram cumpridas, como consta da res. 1441 (2002), que afirma que o
Iraque continua em violação das mesmas, o que faz com que a res. 678 volte
a vigorar, já que o cessar-fogo só suspendeu mas não fez terminar a
possibilidade de uso da força.

Este argumento, que tenta aplicar às resoluções do Conselho de


Segurança a teoria dos tratados internacionais da Convenção de Viena sobre
Direito dos Tratados de 1969 (uma técnica altamente discutível e nunca antes
tentada), sofre ainda da falha fundamental de que a resolução 678 não se
refere à paz e segurança na região mas, muito concretamente, à invasão do
Kuwait e à autorização da força para retirada das forças iraquianas desse
país. Mesmo que se referisse à referida paz na região, teria ainda que ser
provado que o Iraque, com duas zonas de exclusão aérea, longas sanções
económicas e militares e com inspecções em curso patrocinadas pelas
Nações Unidas e pela Agência Internacional de Energia Atómica, constituia
um perigo para a região.
Finalmente, não havendo justificação jurídica para esta intervenção,
levanta-se a questão séria de esta ser, para o Direito existente, uma violação
do art. 2° n°4 da Carta, definida como “agressão” pela resolução 3314 (XXIX
1974) da Assembleia Geral. Esta resolução, por porvir da Assembleia Geral,
não tem um carácter obrigatório mas, por ter sido aprovada sem votos contra
e ter sido invocada como direito pelo Tribunal Internacional de Justiça,
designadamente no julgamento do caso da Nicarágua contra os Estados
Unidos (“Actividades Militares e Paramilitares na e contra a Nicarágua”, de
1986), pode ser hoje tida como a estatuição jurídica dos actos que constituem
agressão. No seu art. 5 n°2, afirma: “Uma guerra de agressão é um crime
contra a paz internacional”.

Muito se tem também escrito e reflectido sobre a desadequação do


nosso Direito Internacional face a uma ordem mundial em mudanças
profundas e há um consenso relativamente generalizado de que é necessário
modificar normas, conceitos e instituições. Contudo, até agora, tem também
sempre havido um consenso de que essas mudanças deverão contar com a
concordância dos vários actores da cena internacional e que terá que existir
um corpo de normas que se aplique de modo geral e indiscriminado a
situações várias e não uma mera ratificação casuística de acções dos
detentores do poder mundial. Trata-se da escolha por um mundo em que o
Direito e as instituições por ele criadas servem de limite a abusos de poder e
de veículo para realização de aspirações de indivíduos e povos: parece que
esse objectivo foi tão arduamente conseguido, ao longo dos séculos, que não
podemos hoje prescindir dele.

Paula Escarameia

Membro da Comissão de Direito Internacional da ONU


Professora de Direito Internacional – ISCSP, Universidade Técnica de Lisboa

Lisboa, 12 de Abril de 2003

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