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Ensaio final – O Edifício Yacoubian (2006, Marwan Hassen)

Por Ana C Salmont

I. Coloque o filme escolhido historicamente, tanto em termos ddo período


em que foi feito, quanto do período que ele representa.
O filme escolhido para estudar foi o Edifício Yacoubian. Sua construção de-
pende de diferentes momentos da história recente do Egito, mas com relativa es-
tabilidade. A narrativa se baseia num livro de 2002, o Yacoubian Building, escrito
por Alaa Al Aswany, que se passa em 1994. É possível saber que a história acon-
tece nesse ano porque logo no começo presenciamos uma reunião de pauta do
jornalista, que menciona o ataque a Naguib Mahfouz. A produção, no entanto, pro-
vavelmente acontece em 2005, já que o filme estreia no Festival de Berlim em
fevereiro de 2006. O que marca 2005 é a eleição presidencial, pela primeira vez na
história da república egípcia. Anteriormente, o parlamento escolhia um possível
presidente e a população decidia se apoiava ou não a candidatura da pessoa.
Esse período, entre 1982 até 2011, o Egito viveu sob o governo de Hosni Muba-
rak, militar não-livre com diretrizes bem diplomáticas. Logo no começo de seu
governo, ele manteve as políticas de seu antecessor, que incluía relações diplo-
máticas com Estados Unidos da América, Israel e o resto do mundo árabe, mas
apenas em seu governo, ele foi capaz de equilibrar essa relação entre Israel e ou-
tros países árabes (não todos, no entanto). É curioso observar que o Egito é o país
com maior ódio popular a Israel, mesmo se relacionando politicamente com ele.
A sociedade egípcia vive um momento de relativa estabilidade nesse mo-
mento. Com subsídios de itens básicos e relativa liberdade de expressão, pode-se
dizer que é um momento próspero exceto para os religiosos fundamentalistas,
que são proibidos de participar de cargos políticos e, por fim, tomam parte de ata-
ques terroristas, o que prejudica o turismo do país, grande fonte econômica.

II. Para o seu filme selecionado (O Edifício Yacoubian), discuta as escolhas de


mise-en-scène (arquitetura, cenários, figurinos, adereços, estilos de atua-
ção, etc.) que o diretor fez. Compare a mise-en-scène de outros filmes exi-
bidos para o curso.
O filme trata de diferentes personagens e acompanha a narrativa diferente de
cada um. É muito divertido ver como que foi construída uma ambientação para
cada história, como a caracterização de certos personagens mudavam com a nar-
rativa e como algumas escolhas de cenários diziam muito sobre a história.
Um item que chama muita atenção é o uso de sequências externas. É notável
que o personagem que aparece mais em externas é Taha, o menino que queria ser
policial mas acaba se juntando as forças islâmicas. O primeiro plano em que ele
aparece, ele está dentro do prédio, limpando o chão com seu pai, demonstrando
como ele é alguém que faz o que lhe é esperado e tenta ao máximo atender as
expectativas, tentando ser um bom profissional enquanto ajuda o pai nas tarefas
profissionais. No seu último plano de atuação, no entanto, ele está no meio da rua,
em um tiroteio. Vejo esse uso dos espaços abertos como um símbolo da mistura
de liberdade e rebeldia que ele pode sentir ao fazer parte do movimento islâmico,
como no período em que ele faz parte do acampamento islâmico, no meio do de-
serto, que talvez, pensando numa estrutura de narrativa clássica, seja o ápice da
história de Taha, muito dessa rebeldia pelos planos com sua nova esposa, onde
ele aparece numa cena de sexo. As vestimentas são outro ponto marcante para
vários personagens, mas vejo no garoto o caso mais explícito, porque ele começa
com roupas seculares, como o terno, onde ele fica idêntico a qualquer rapaz do
ocidente, poderia ser um contador de São Paulo ou economista de Nova Iorque, o
rosto sem barba. Nesse momento, ele me lembra muito o núcleo de personagens
de In the Last Days of the City (2016), por adotar esse visual secular. Talvez fosse
pela cópia, mas na cena em que ele usa terno, eu mal consegui identificar carac-
terísticas físicas que o configurasse numa etnia árabe, como é possível ver no
Pasha Zaki ou em Basoina que, mesmo sem roupas tradicionais islâmicas, con-
sigo ver traços marcantes da etnia árabe. A mudança parte do encontro com o
sacerdote no templo, logo após ser rejeitado da polícia. Depois disso, o encontra-
mos barbado, após a tortura, sem barba e traumatizado, fazendo parte do acam-
pamento islã completamente caracterizado como um muçulmano do mais este-
reotipado já visto e, no fim, vestido com roupas mais ocidentais, contudo com
uma blusa de gola alta, o que denota que ele não abandona por completo a ideia
das roupas muçulmanas.
Outras situações de roupas que caracterizam muito o personagem é Bosaina,
que começa como noiva de Taha, virgem e termina como esposa de Pasha Zaki.
Ela aparece primeiro com um chalé sobre um vestido rosa, reclamando sobre
abuso de seus antigos patrões. Ao ouvir a reclamação da mãe, ela tira o chalé.
Depois, quando ela pede para voltar o noivado com Taha, está toda de branco, bem
angelical. Ao procurar emprego, usa uma blusa florida com rosa e amarelo, uma
blusa das mesmas cores com a qual ela é abusada pelo chefe e é a mais provo-
cante usada por ela. Quando é contratada para trabalhar para Zaki, está de verme-
lho e ao começar a trabalhar para ele, adota branco e cores bem claras. Na cena
em que Zaki e Bosaina praticam sexo, ela está de rosa. É por sua roupa rosa que
eu concluo que o casal não chegou a praticar o ato, porque se tivesse, ela poderia
ter usado rosa. E no final, em seu casamento, ela usa branco, que tradicionalmente
é usado por noivas que casam virgens.
Pensando no caso de Bosaina, podemos pensar em outras duas personagens
que destoam completamente dela: Rabaab, a garçonete ladra do começo do filme,
que usa sua sensualidade de uma forma que me lembrou muito a personagem
principal de Estação Central de Cairo e Dawlat, a irmã de Zaki. Nenhuma das duas
simbolizam personagens bondosas e virtuosas como Bosaina demonstra a maior
parte do tempo. Vale dizer que o filme não tem uma dualidade entre bem e mal.
Entretanto, Dawlat usa cores muito escuras na maior parte do tempo. Na primeira
cena em que ela aparece, usa roupas vermelhas e depois pretas. E ela está o tempo
todo com cigarro na mão, o que é algo bem vilanesco. Já Rabaab está o tempo todo

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de vermelho. Ela não é uma personagem que aparece por muito tempo no filme,
então suas roupas já deixam muito claro quem ela é, sempre muito apertadas e
sensuais. Quando ela troca, que é pela camisola preta, é momentos antes de ela
roubar Pasha Zaki.
As escolhas de ângulos é um ponto muito incrível de se observar no filme. Por
vários momentos, tive a impressão de estar espiando uma cena que não era para
eu ver, como na conversa entre o sacerdote e Taha, quando o comerciante Haj
conhece sua segunda esposa, Suad, na conversa entre Basoina e Taha antes de
ele se candidatar para polícia, Fanous e seu irmão alugando um apartamento ou
o jornalista Hatem no seu primeiro encontro com Abd Rabbo.
O primeiro e segundo encontro entre Hatem e Abd Rabbo são duas cenas que
eu gostaria de comparar melhor, inclusive porque diz muito sobre a relação entre
os dois. Na primeira situação, eles se encontram em um bar mais lotado, cheio e
com um ambiente mais aconchegante e popular, tive a impressão de que ali seria
um bar bem comum, não um lugar que se levaria para o primeiro encontro român-
tico, enquanto o segundo já tem essa característica. A fotografia também se altera
um pouco de um para o outro. As duas sequências começam apresentando o am-
biente, uma de forma que parece ser mais informal, seguindo as cadeiras, mos-
trando o redor e o outro mostrando a mesa e depois um plano geral dos dois na
mesa chique. A forma de retratar o diálogo também difere; o primeiro encontro
parte de dois planos mostrando os dois se aproximando, algumas falas jogando
com plano/contra-plano, mas a maior parte mostrando os dois juntos em quadro.
Na segunda sequência, o diálogo já é em sua maior parte plano/contra-plano. Os
dois planos, no entanto, fazem a maioria de seus enquadramentos como se esti-
véssemos espionando os personagens. Outra observação sobre a relação ao casal
que tive foi sobre a luz: quando os dois se conhecem, estão numa rua escura e,
enquanto Hatem conversa com Abd Rabbo, eles caminham para frente, onde há
mais luz e, já próximo ao fim do filme, quando Abd Rabbo vai embora com a famí-
lia, Hatem fica por um momento com o muito escuro.
Os espaços físicos são essenciais para o filme, já que estamos, por muitas ve-
zes, nas casas dos personagens. O espaço principal é o prédio Yacoubian, o cená-
rio principal onde a maioria das histórias contadas se passam. É um edifício an-
tigo, de um período de grande influência europeia. O prédio e sua história são re-
ais, desde o começo com a elite do Cairo até a atualidade em decadente, que tem
seu momento icônico com o elevador preso. Outras situações sociais convivendo
também tornam isso claro, mas é algo para ser tratado quando for pensar nos per-
sonagens ou na narrativa. É interessante pensar num espaço como ponto de con-
vergência ao contar várias histórias, coisa que acontece também em Estação Cen-
tral de Cairo (1958).
Outra sequência, logo no início, que despertou minha atenção pela fotografia
é quando Zaki chega em casa depois de ser assaltado. Sua irmã grita com ele e a
câmera dá um zoom in, meio que realçasse a culpa que Zaki sente por deixar tal
situação acontecer.

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As casas destoam bastante, principalmente pensando na história da segunda
esposa de Haj. Sua casa em Alexandria tinha muitas pessoas, o sofá parecia des-
confortável e a sala parecia pequena. Já depois do casamento, ela tem um apar-
tamento enorme apenas para ela, com uma cama suntuosa e um banheiro grande.
A casa de Taha também chama atenção, principalmente por lembrar a casa do
menino de Portas Fechadas (1999), pequena e um pouco escura. A casa que Hatem
aluga para a família de Abd Rabbo já parece maior e mais iluminada, enquanto a
casa de Bosaina parece a menor de todas e mais entulhada. O apartamento de
Pasha Zaki e seu escritório todos denotam riqueza, assim como todos os ambien-
tes que Haj se encontra. O único momento em que Haj aparece em um lugar mais
pobre é quando ele tem o sonho erótico.
As atuações são muito boas, os personagens principais entregam como se re-
almente fossem os personagens. A cena em que Bosaina é abusada por seu chefe
e nós só vemos o seu rosto demonstra toda a sua habilidade em atuação. A se-
gunda esposa de Haj, Suad, também entrega muita bem, na discussão sobre se
casaria ou não, durante o banho, vejo muito sua tristeza e os sacrifícios que ela
fez. Em Haj, vejo um nervosismo que não sei bem se pertence ao personagem. O
ator que faz Zaki parece ser aquela pessoa que vejo em tela o tempo todo, muito
expansivo, simpático e um tanto sedutor. O ator de Taha é muito versátil e traba-
lhou em todos os momentos, desde os momentos tensos e dramáticos com Bo-
saina até ao treinamento de exército. A atriz de Dawlat é boa também, já que ela
fez um ótimo trabalho em conquistar meu ódio pela personagem. E Hatem tam-
bém, o que fica muito evidente na cena em que ele culpa os pais pela sua vida. É
engraçado porque o ator que o interpreta criança já não é tão bom quanto ele, cri-
ando um certo contraste.
Acredito que o filme sabe dialogar muito bem o figurino, os cenários e atuação
com os personagens e a narrativa, reforçando sinais que poderiam se passar des-
percebidos.

III. Discuta o uso do som no filme selecionado.


O filme faz um uso incrível dos recursos sonoros. Ele usa de ruídos de uma
forma muito realista de se ver e em alguns momentos, a música que começa die-
gética e acaba de forma não-diegética ou vice-versa, ou só está lá não-diegetica-
mente para dar o tom da cena.
A música foi algo que chama muito forte desde o começo, porque não só nos
créditos ela está presente, mas na hora em que um narrador conta a história do
Edifício Yacoubian, uma música acompanha, que denota aventura ou algo épico,
seguindo muito bem o que o narrador conta. O bar da primeira sequência já conta
com uma música que está fora da diegese e se sobrepõe a música diegética do
bar.
A televisão também é algo presente que vemos tanto em tela quanto sonora-
mente, logo no começo, quando Bosaina assiste a um filme, logo no final, quando
ela começa a se relacionar com Zaki.

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Um som ruidoso que chama muita atenção e é incrível de se ouvir é o terço de
Haj quando ele está com o sacerdote ou quando ele está com o ministro, tentando
entrar no Parlamento. Parece uma ironia ele usar o terço e depois obrigar a se-
gunda esposa a abortar, além de praticar o tráfico de drogas e ser participante da
corrupção no governo egípcio. Mostra bem a hipocrisia do personagem.
Os momentos de Taha também merecem um destaque interessante. Ele co-
meça conversando com um sacerdote islâmico e medita entre o término com Bo-
saina e uma vida voltada para a religião. Um plano mostrando o cenário de Cairo
é acompanhado pelo som de pássaros diegético e logo começa uma música dra-
mática, criando um certo suspense pré-protesto. Um crescer da música, um certo
dinamismo e um tom de ação, com uma bateria e algo épico é acompanhado pela
entrada de caminhões de polícia que irão contra o protesto em que Taha está. A
sequência volta para a manifestação, deixando os toques dramáticos mais mar-
cados. O corte entre o plano dos polícias e o plano de Taha gritando “Islâmico!
Nem ocidental, nem oriental!” tem um som de crescente bem marcado justo na
troca que marca que haverá um confronto entre os dois grupos, isso pouco antes
do tom dramático que compõe a cena com os gritos dos manifestantes. No meio
dos gritos, o som abaixa um pouco antes de assumir uma batida de ação, marcada
por um som mais rápido, com batidas fortes que lembram filmes de ação, um som
que cria suspense e compõe o ambiente sonoro em conjunto com os gritos dos
manifestantes. Existe um som dramático crescente nesse momento, até que am-
bulância toca e um confronto épico parece se formar sonoramente. Algumas ba-
tidas de bateria marcam uma mudança drástica e os policiais começam a se mo-
vimentar; os planos encolhem muito e a montagem adquire uma maior veloci-
dade; a música começa a tomar mais espaço que os gritos de manifestantes até o
momento em que o portão se abre e só ouvimos a música não diegética. Nesse
momento, a música assume um papel de realçar a ação que acontece em tela mas
também diminuir o horror de toda aquela agressão. O filme não se detém nos por-
tões e na central da agressão, mas segue Taha, que foge de alguns policiais. Ao
sair do núcleo da confusão com um corte para a perseguição de Taha, o som as-
sume outra característica. Se antes parecia com um filme de ação de luta, ele
muda para um filme de ação de corrida, algo que provavelmente ouviríamos em
Velozes e Furiosos. Tem um saxofone em certo momento e uma guitarra muito
marcada; vejo aí a diferença, se antes o que marcava era uma batida forte, prova-
velmente de bateria, agora é uma guitarra que marca essa perseguição.
Outra cena de Taha que merece atenção é seu treinamento no deserto, que
também faz uso dessa trilha que realça o que há em tela e nos poupa de ruídos
que possam ser desagradáveis sem perder nada da narrativa. E um ruído de
marca sonora mas que também acresce narrativamente de forma muito mar-
cante é o isqueiro do torturador de Taha, que aparece quando ele está vendado,
mas na hora da vingança, ele se lembra exatamente do som.
Um momento sonoro muito importante também é a cena de Christine no pi-
ano. Apesar de ser uma música diegética, a limpeza do som e ausência de sons

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ambientes criam uma sequência que parece de musical, com certa suspensão de
realidade.
Na casa de Hatem, quando Abd Rabbo vai dormir lá pela primeira vez, o som
do vinho sendo aberto e servido é algo que cria uma realidade no filme que per-
mite uma imersão muito grande no universo diegético. Até o arranhar da garrafa
no copo é audível. Quando Hatem coloca a fita para tocar, começa um pouco alto,
mas logo o som que a televisão emite adquire uma distância, respeitando o espaço
fílmico.
A cena em que Bosaina é abusada por seu chefe tem um agudo muito forte um
pouco antes de ele aparecer e a levar para o quarto, que já cria esse incomodo com
a cena. Apesar do som também marcar como um filme de horror, é mais agradá-
vel do que se ouvíssemos o som real que a cena emitiria, com todos os ruídos. E
no banheiro, um ambiente sonoro composto pela queda da água, roupa esfre-
gando e o choro de Bosaina concluem o teor da sequência, bem trágico.
O som do apartamento de Haj sendo redecorado, a rua quando estamos no te-
lhado, o chuveiro no banho de Suad ou no banho de Haj, os talheres nos restau-
rantes, Haj dando brilho no sapato, a cena de Pasha Zaki soltando o cabelo de Bo-
saina ou o choro de Bosaina quando eles são presos são todos muito marcantes e
criam um ambiente sonoro que facilitam a imersão no filme, com muitas músicas
usadas para criar a ambientação da cena, sem usar sons diegéticos e, ao usar os
ruídos diegéticos, aproveitá-los e saber como coloca-los.

IV. Discuta a estratégia narrativa de seu filme selecionado (O Edifício Yacou-


bian) – o modo como a história contada – e o efeito que a maneira de con-
tar tem na sua recepção/compreensão do filme e seus principais temas.
O filme adota um estilo de narrativa que, antes, eu só havia visto em produtos
audiovisuais muito específicos, como novelas, seriados e alguns filmes de comé-
dia romântica, como Estação Central de Cairo (Cairo Station, 1958), Simplesmente
Amor (Love Actually, 2003), Idas e Vindas do Amor (Valentine’s Day, 2010) e Noite
de Ano Novo (New Year’s Eve, 2011) que explora diversas narrativas e todas elas
recebem uma quantidade igual ou muito parecida de atenção. Ou seja, é possível
reeditar todos esses filmes (Edifício Yacoubian incluso) para que a narrativa te-
nha apenas um personagem principal. É muito interessante ver assuntos tão sé-
rios e relevantes sendo tratados nesse formato diferente, além de divertido, por-
que prende sua atenção do começo ao fim.
O filme trata de diversos assuntos, mas vejo como o principal a decadência
social do Egito ou como o mundo imperialista afetou aquela sociedade. Pensando
em dados históricos, o prédio é construído num período de intensa influência bri-
tânica no país, quando reis ainda existiam e depois é tomado por militares, que é
onde começa sua decadência e perde o seu prestígio, talvez por lembrar tanto um
período que o Oficiais Livres gostariam de superar. O período do governo de Mu-
barak, no entanto, retorna um pouco para esse regime de influência externa,

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dessa vez dos Estados Unidos e o capitalismo (pense que ouve um período de re-
lações com a URSS).
O prédio Yacoubian abriga os mais diversos tipos de pessoas que esse período
histórico gerou, sendo um prédio que permite uma proximidade grande entre di-
ferentes classes sociais. Conhecemos alguém que conseguiu superar as adversi-
dades sociais e se tornar rico (de forma ilegal, mas alcançou), um jornalista ho-
mossexual no qual todos os vizinhos sabem de sua sexualidade mas não se im-
portam e um pasha que não exerce sua profissão e, apesar de se valorizar e ser
considerado como alguém importante, muitos outros não o levam a sério.
Tenho grandes dificuldades em demonstrar minha opinião em relação a fil-
mes de culturas muito diferentes a minha porque tenho construções sociais com-
pletamente diferentes a dos criadores do filme e a do público-alvo. Vários assun-
tos tratados no filme são condenados pelos meus princípios.
Um exemplo claro disso é toda a relação entre Abd Rabbo e Hatem. É questio-
nável a forma que Hatem encontra para ter um relacionamento homossexual. Ele
demora muito tempo para deixar claro para o policial suas intenções verdadeiras
e o embebeda para que o moço faça sexo com ele. É desconfortável a posição que
Hatem deixa Abd Rabbo, e entendo a posição da mulher dele quando ela reclama
do perfume e dos shorts de dormir. Vejo que começa como uma relação abusiva
e se torna uma troca comercial, o que é muito estranho quando pensamos que ele
fica realmente magoado quando Abd Rabbo vai embora. Toda a história de Hatem
é perturbadora, a culpabilização da mãe dele por ele ser gay parece que reforça a
ideia de que é errado ser homossexual ou como se fosse uma doença que poderia
ter sido prevenida se a mãe ou o pai tivessem dado mais atenção a ele.
No entanto, a história de Bosaina já é mais agradável para mim, apesar de Zaki
me incomodar um pouco. Ela tem algo de Cinderela na sua história, menina pobre
que encontra o príncipe rico e acaba casada e feliz para sempre. Acredito que a
recusa dela em fazer parte da vida de Taha como uma esposa muçulmana num
viés mais tradicional da religião possa ser condenado por quem faça parte de uma
comunidade islâmica, mas vejo como um símbolo de independência e me lembra
muito a mãe de Portas Fechadas (1999), que também prefere adotar uma conduta
secular e ter sua liberdade.
Aprecio muito como as histórias se entrelaçam e como algumas outras são
contadas por um momento efêmero mas recebem uma atenção na construção da
linguagem que parece realmente o principal da história. Como Fanous conse-
guindo o apartamento para seu irmão. Depois dessa cena, quase não vemos Fa-
nous, mas naquele momento, ele é o personagem principal do filme todo. O núcleo
do bar e a família de Bosaina também recebem essa atenção quando preciso e cria
um mundo diegético muito maior do que o que vemos na tela.
A história de Haj e a de Zaki, vejo como dois lados de uma montanha. Enquanto
Zaki nasceu em berço de ouro e é considerado um fracasso no momento da his-
tória (tanto que a própria irmã o processa), Haj começou como engraxate e se
torna membro do parlamento egípcio. Claro que as questões morais de cada um

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são questionáveis em pontos diferentes, Haj aceita tráfico e tratar mulheres como
objetos, enquanto Zaki já vive no abuso de bebidas e sexo casual fora do casa-
mento. Os dois se complementam, mas vemos que tem certo desprezo um ao ou-
tro, principalmente quando Zaki vê Haj na televisão, discursando no parlamento,
e faz comentários sobre depreciativos, expressando sua opinião sobre o vizinho.
Tanto que o fim dos dois não poderiam ser mais opostos; Haj consegue o que quer,
tendo de pagar um preço altíssimo por isso e perdendo sua segunda esposa no
processo, e Zaki encontra um amor para sua vida e se livra do processo de sua
irmã.
A história de Taha é a mais trágica, o garoto estudioso que queria ser policial,
casar com sua vizinha e ter uma vida próspera, quando é negado de participar da
polícia e se volta para religião. Ele se envolve demais com o movimento político
islâmico e acredito que poderia ter se dado bem na universidade, mas gosto de
sua história e vejo como ela poderia ser um filme de ação emocionante de acom-
panhar.
As vidas no prédio Yacoubian que conhecemos são das mais diversas: ro-
mance, chantagem, corrupção, extremismo religioso e tragédia, a única coisa que
falta para tornar um filme completo é um núcleo cômico, o que não faz falta por
ter a força de prender o espectador na tela, curioso para saber se a próxima se-
quência é sobre seu personagem favorito.

V. O filme trabalha para construir a identificação do público com um prota-


gonista ou subverte a identificação?
O filme tem uma grande variedade de personagens e acredito que é possível
se identificar vários deles ou pelo menos um, já que o que é mais marcante em
suas personalidades individuais são as características pessoais, os debates in-
ternos em relação a escolha e coisas um tanto universais.
Taha se volta para religião depois que seu plano inicial dá errado, tendo até um
debate interno para se decidir se abraçaria a luta política ou se continuaria com a
vida que tinha planejado, indo à universidade e se casando com Bosaina. A esco-
lha pela religião, apesar de gerar dificuldades, não é uma escolha errada, tanto que
ele tem seus momentos de glória no acampamento. Não é possível criticá-lo
como errado porque ele escolheu por um caminho que falasse com seu coração.
Hatem é um personagem mais incompreensível para mim, mas acredito que
é porque ele é o que vive numa realidade mais distinta da minha. Apesar de não
ser uma sociedade que proíba a homossexualidade, é algo condenável e muito
escondido. Não devia haver bares gays em Cairo de 1994, ainda mais com tantos
movimentos islâmicos firmemente contra. O que vemos da personalidade dele,
no entanto, é um homem generoso, intelectual e determinado. Ele insiste a todo
momento em ter Abd Rabbo por perto. Inclusive Zaki reconhece no jornalista um
grande homem. Talvez ele seja mesmo, e seus problemas são realmente na hora

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de se relacionar. Apesar de ter passado boa parte do filme tendo sentimentos con-
flitantes em relação a ele, quando ele morre, eu me sinto triste. Não acredito que
a morte dele fosse a resposta. Gostaria que ele encontrasse um amante que o cor-
respondesse e estivesse em posição de igual e não a morte.
Dawlat já considero como uma antagonista. As roupas, o cigarro e os gritos
constroem uma personagem fácil de detestar, ela é irritante e gananciosa.
Haj foi o personagem com o qual tive mais dificuldade de me relacionar. Ape-
sar de não entender Hatem, eu o respeito, mas Haj despertou um certo desgosto
em mim. Ele é hipócrita com o terço o tempo todo na mão enquanto pratica tráfico
de drogas, ganhando dinheiro a custas de doença alheia (tomando o vício a drogas
como uma doença), disposto a raptar a própria esposa para obriga-la a fazer um
aborto e se divorciando dela no final, isso sem mencionar que ele a escondeu no
apartamento por um longo período de tempo e não a permitiu ver o filho, escon-
dendo toda sua existência do resto da família. É um homem que cede facilmente
a seus desejos mais infantis, como fazer parte do parlamento ou fumar haxixe
mesmo que seja proibido pela religião. Sua existência é irritante por saber que
existem muitos outros como ele. O final, de saber que metade de seu dinheiro se-
ria usurpado, me agradou um pouco.
Zaki e Bosaina são, de longe, meus personagens favoritos. Bosaina passa por
mal bocado e, como já mencionado, vejo um complexo de Cinderela na sua vida.
Ela é trabalhadora e tenta se respeitar frente a sociedade, sem se tornar uma fa-
nática religiosa. Ela valoriza sua liberdade e suas escolhas e ganhou minha sim-
patia muito rápido, além de ter um cabelo lindo. Zaki demorou um tempo maior
para me conquistar, ele é mulherengo, alcoólatra e fumante, além de fazer parte
de uma classe social falida e ser zombado por isso (como Hatem e o moço que
entrega o processo fazem), mas ao ver a maneira com que ele tratava seus iguais
e quão controlado ele era perto de sua irmã louca, criei um certo carinho por ele e
senti toda a emoção da cena em que Zaki solta o cabelo de Bosaina.
Outros personagens secundários também são muito valorosos, como Rabaab,
que chama muita atenção no começo do filme, parece ser alguém adorável mas é
má. Christine, apoiadora, grande amiga de Zaki, que em sua primeira cena apa-
rece toda de branco, cantando, bem angelical. Fanous, que temos pouco tempo
para conhecer, mas que funciona como um certo alivio cômico em sua cena. Ma-
laak, mal caráter que ajuda Dawlat a entrar no escritório de Zaki. E Abd Rabbo que
aproveita todos os luxos que Hatem o fornece e vê o relacionamento como uma
troca econômica, um personagem que eu não vi tantas características, meio abo-
balhado e muito fixo na sua religião, que esquece rapidamente.

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VI. Qual é a sua avaliação do filme selecionado? Você acha que efetivamente
realiza o que você acredita que se propõe a fazer? Em sua resposta, com-
pare o filme a pelo menos dois outros filmes exibidos para o curso.
O Edifício Yacoubian tem várias narrativas, todas elas muito densas, o que o
torna um filme cativante e divertido de se ver, porque o uso das músicas para dar
o tom de diversas cenas tira um pouco de toda tensão emocional que carrega.
Essa habilidade de saber dosar os gêneros cinematográficos em cada sequência
e cada núcleo torna muito divertido e até educativo assistir esse filme, porque é
uma visão de mundo muito diferente da minha, por exemplo.
Uma das primeiras coisas que pensei ao começar a ver o filme era qual a pro-
posta, porque tinha lido que se concentraria no prédio e quando os créditos come-
çam e tem aquela introdução, a ideia é de que vivenciaríamos algum período do
prédio, focando apenas nele. Qual não foi minha surpresa ao viver outros ambi-
entes da Cairo de 1994, com muitas externas, podendo conhecer um pouco da ci-
dade. Acho que a proposta era usar o Edifício Yacoubian como pano de fundo, mas
ele se tornou um ponto de convergência e expandiu suas histórias para diferentes
espaços, o que eu vejo como um enorme acréscimo para o espectador.
Nesse último ponto, ele diverge muito de Estação Central de Cairo, que é um
filme que também segue narrativas diferentes assim como Edifício Yacoubian,
mas enquanto a película de 1958 se passa toda em um dia na estação, os persona-
gens do prédio são representados em um grande recorte de tempo (tanto que a
barba de Taha cresce, é feita, cresce e depois é cortada de novo, e Suad até engra-
vida).
A pobreza, ao contrário de Portas Fechadas, toma um caminha muito seme-
lhando. Talvez já tenha mencionado, mas vejo a mãe de Portas Fechadas uma
personagem muito similar a Bosaina, enquanto vejo em Taha o personagem do
filho. Até a moradia é parecida, os dois morando no telhado.
Apesar da fotografia da cópia disponível, Edifício Yacoubian foi um filme de
grande acréscimo para poder pensar nas diferenças e semelhanças entre cultu-
ras, como influências externas afetam países diferentes de formas iguais, permi-
tindo até me reconhecer na tela de um filme feito num lugar tão distante.

Fontes
https://www.nbcnews.com/id/7034848/ns/world_news/t/egyptian-leader-or-
ders-election-amendment/#.U8hrS_ldX9U, acesso em set/2018
https://internacional.estadao.com.br/noticias/geral,os-30-anos-de-hosni-muba-
rak-no-poder,678003, acesso em set/2018
http://enb.iisd.org/cairo.html, acesso set/2018
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https://diplomatique.org.br/de-nasser-a-mubarak/, acesso set/2018
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