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Signos de Nordestinidade: Análise da representação das identidades

sociais nordestinas presentes nos filmes Vidas Secas (1963) e Coronel


Delmiro Gouveia (1977)1

SANTOS, Ana Jamille Nunes 2


Graduanda em Comunicação Social/Jornalismo em Multimeios,UNEB/BA
SANTO, Cíntia S. do Espírito3
Graduanda em Comunicação Social/Jornalismo em Multimeios,UNEB/BA
PAIVA, Carla C. da S.
4
Graduação em Comunicação Social
Mestre em Educação e Contemporaneidade, UNEB/BA

No cinema nacional, uma significativa expressão de estereótipos revela nas telas


traços históricos de dominação econômica e política. Os filmes brasileiros, com temas
relacionados ao nordeste, possuem uma clara associação entre a região, a pobreza e a seca,
compondo identidades sociais dependentes de determinados signos de nordestinidade.
Compreendendo a nordestinidade como a resultante de diversas identidades sociais
nordestinas , ou seja, uma representação imprudente que seleciona e esquematiza uma única
interpretação sobre a identidade regional (PAIVA, 2005), percebe-se que, fortemente
influenciado pela literatura, o cinema nacional das décadas de 1960 e 1970 reflete o
discurso literário que ajudou na composição do ideário de identidade do país.
Segundo Oliveira (2000), no Brasil, a literatura encontrou na natureza elementos
que ajudaram a manter uma referência de unidade dentro do Brasil. Essa abordagem é a
chave para perceber na forte utilização literária e por conseqüência no cinema a razão da
posterior exploração da temática nordestina pela ótica das suas características referentes à
natureza.
Dentro dessa compreensão, pode-se perceber a razão de assimilação a natureza
ríspida e ao homem forte, um complementando o outro, como um fator de compensação da
realidade debilitadora. "A força de seu habitante aparece relacionada à capacidade de
interagir com a natureza múltipla. O cabra - o cangaceiro - aparece como a encarnação do
herói sertanejo" (OLIVEIRA, 2000, p.60 ).
Diante disso, Euclides da Cunha (1995) pode ser considerado como uma das
matrizes do olhar sobre o sertão ao tentar transmitir este mundo para o público leitor,
propagando também a sensação de sentir-se estrangeiro em seu próprio país. Euclides passa
1
Este artigo foi construído a partir dos primeiros resultados obtidos com os projetos de pesquisa "Signos de
nordestinidade: análise da representação das identidades sociais nordestinas presentes nos filmes da década de
sessenta" e "Signos de nordestinidade: análise da representação das identidades sociais nordestinas presentes
nos fllmes da década de setenta".
2
Bolsista de Iniciação Científica da FAPESB-Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado da Bahia.
3
Bolsista de Iniciação Científica da FAPESB-Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado da Bahia.
4
Professora Orientadora.
a duvidar da existência de um país único, tomando como referência não somente a distância
espacial, mas a distância temporal. Por conseguinte, alguns signos de nordestinidade
destacados no seu livro Os Sertões (1995) são comumente utilizados no cinema e na
literatura brasileira. Muitos se eternizaram e são encontrados não só através desses meios,
mas também em matérias jornalísticas, em discursos políticos e cotidianamente na vida de
alguns nordestinos: A idéia do sertanejo como homem forte.
Ao longo do tempo e das produções cinematográficas, a representação do sertanejo
como um "homem forte" é traduzida pela violência, pelo estereótipo de "cabra macho" e a
figura de Lampião, atrelada a este predicado, transfigura o nordestino em um homem
agressivo. Parâmetro dentro da literatura, do jornalismo, do cinema e de tudo aquilo que faz
menção ao nordestino, sua identidade e sua sociabilidade, esta pesquisa acredita que a idéia
e descrição sobre o nordestino de Euclides da Cunha foram deturpadas e se eternizaram de
forma pejorativa no imaginário popular.
Considerando que a obra cinematográfica, além de poder ser "lida" e analisada
como um texto, pode retratar "um eixo temático, uma questão ou um problema como
referência para a interpretação de significações que emergem de diferentes estruturas
narrativas" (DUARTE, 1995, p.210), com o intuito de analisar os signos de nordestinidade
e os estereótipos contidos nos filmes Vidas Secas (1963) e Coronel De/miro Gouveia
(1977), este estudo busca analisar que tipos de representações sociais ou construções
simbólicas foram formadas do tipo regional categorizado como "nordestino" no cinema
brasileiro das décadas de 1960 e 1970.
Para tanto, com base na teoria das representações sociais,foram analisado os
conteúdos dos filmes corpus deste artigo (FONSECA JUNIOR, 2005), promovendo
inferências a partir das três perspectivas do sertão presentes na literatura brasileira. Vale
ressaltar, que essas produções nacionais são, portanto, o primeiro diagnóstico que
fundamenta o estudo, servindo como base para posteriores análises filmicas.
De acordo com a autora Lúcia Lippi Oliveira (2000), três abordagens de sertão
podem ser verificadas na literatura brasileira. A primeira, o sertão como paraíso que se
expressa basicamente no romantismo. A segunda forma de lidar com o sertão que o associa
ao inferno: o destempero da natureza, o desespero dos que por ela perambulam (retirantes,
cangaceiros, volante, beatos), a violência como código de conduta e o fanatismo são os
principais traços apontados. Por fim, o sertão como purgatório: o lugar de passagem, de
travessia, definido pelo exercício da liberdade e pela dramaticidade da escolha de cada um.
No cinema brasileiro, percebe-se uma tendência em mesclar essas perspectivas
literárias, pois as narrativas estão, sobretudo, relacionadas no imaginário euclidiano.
Destarte, pretende-se demonstrar que a análise das representações formadas no cinema é
capaz de produzir significados importantes na nossa convivência social. Os personagens
estereotipados são muitas vezes campos de fuga que trazem como dificuldade o fato de que
padronizar, muitas vezes, significa perder a variedade existente e tomar as diferenças
fatores insignificantes.
As vidas secas de Fabiano e sua família: o sertanejo como um forte e o sertão como
purgatório e inferno

Adaptado da obra de Graciliano Ramos, o filme Vidas Secas (1963) dirigido por
Nelson Pereira dos Santos, busca recriar nas telas o sofrimento vivenciado pela família de
retirantes em sua peregrinação pelo sertão. Considerado por muitos como a melhor
adaptação literária brasileira para o cinema, o referido filme iniciou um novo período na
cinematografia nacional. Foi o primeiro a dar um novo tratamento aos temas relacionados
ao nordeste com um caráter diferente que não disfarçava a pobreza, ao contrário a
evidenciava também na estética e na abordagem.
Apresentado como uma denuncia a sociedade brasileira sobre o descaso com o
nordeste, Vidas Secas é um filme politizado, inserido na proposta das obras de sua década
que chegaram para discutir os problemas sociais brasileiros. As obras cinematográficas da
década de 1960 estão relacionadas ao movimento conhecido como "Cinema Novo",
capitaneado pelo baiano Glauber Rocha. Nessa época, o cinema iniciava um período de
significativa transformação, a comicidade das chanchadas aos poucos foi sendo substituída
por novas abordagens, às mazelas nacionais não seriam mais escondidas, como se tentou na
década de 1950. A pobreza, o sofrimento, as lutas camponesas e até mesmo o messianismo
apareciam de forma criativa e engajada politicamente nas telas.
De acordo com Júlio César Lobo (2003), na medida em que o cinema alterava suas
abordagens, a construção da identidade nordestina foi variando através dos tempos. Em sua
avaliação, este pesquisador aponta que inicialmente o nordestino era apresentado como um
personagem secundário dentro das comédias musicais (chanchadas), revelando um
preconceito às avessas, cômico e engraçado. Já com a chegada das produções em meados
dos anos 1960, essa realidade inicia seu processo de transformação, a busca pela definição
da identidade nacional leva para o cinema o nordeste e suas representações, definido por
Ismail Xavier (1985) como algo em que:
A atualidade era a realidade brasileira, vida era engajamento ideológico,
criação era buscar uma linguagem adequada às condições precárias e
capaz de exprimir uma visão desalienadora, critica, da experiência social
(p.l4).
Cronologicamente demarcado, a narrativa do filme Vidas Secas inicia em 1940,
apresentando a seguinte abertura:
Este filme não é apenas a transposição fiel para o cinema de uma obra
imortal da literatura brasileira. É antes de tudo, um depoimento sobre uma
dramática realidade social de nossos dias e extrema miséria que escraviza
27 milhões de nordestinos e que nenhum brasileiro digno pode mais
ignorar.
Essa mensagem de Vidas Secas, mesmo tendo recorrido ao passado para
exemplificar os problemas vivenciados no nordeste, mantêm o tom de denuncia reclamando
providencias.
Recriação de uma obra escrita, o filme, segue uma tendência comum do cinema
brasileiro que buscou, e ainda busca, na literatura, matéria prima para sua construção. A
narrativa fílmica começa como no livro homônimo, com a família de retirantes e sua cadela
de estimação vagando pelo sertão, suportando o violento destino supostamente imposto
pelo destempero da natureza. A ausência de diálogos é marcante, as conversas são raras,
curtas e pouco exploradas, tomando as expressões faciais e corporais muito mais
reveladoras das angústias dos personagens ou como explicou Ordilei Dias Pereira (2006)
O homem pobre rural pintado pelo filme tem seus diálogos reduzidos a um
balbucio lingüístico, sons monossilábicos, exprimindo a miséria do
vaqueiro e sua família em poucas palavras, visto que são confinados nos
níveis mínimos de sobrevivência (p.Ol).
Fabiano (Átila Lório), o provedor da família, é mais um vaqueiro em busca de
sustento. "Forte", bruto e de rígidos valores morais, este personagem serve como
referencial básico da demonstração de um estereótipo do homem sertanejo com seus traços
marcantes. Um retrato da contribuição inegável de Euclides da Cunha na concretização do
imaginário do sertanejo:
atravessou a mocidade numa intercadência de catástrofes, fez-se homem
quase sem ter sido criança. Salteou-o logo, intercalando-lhe aguras nas
horas festivas da infância, o espanto das secas no sertão. É um condenado
a vida. Compreendeu-se envolvido em combate sem tréguas, exigindo-lhe
imperiosamente a convergência de todas as energias. Fez-se forte, esperto,
resignado e prático, aprestou-se, cedo, para a luta (pág 83).
Perceber em Fabiano o perfil euclidiano, significa reconhecer a construção de uma
representação da identidade social nordestina a partir dessa contribuição literária. Em Vidas
Secas, assim como nas demais produções cinematográficas realizadas na década de 1960, a
busca pela identidade do povo brasileiro passa pela idéia de que o cinema deve assumir seu
caráter social. Dessa maneira, buscava-se o que o país possuía de genuíno, de verdadeiro, e
muitas vezes encontravam essa vertente na representação do homem nordestino.
Através da análise dessas maneiras de representar o nordestino, é fácil perceber a
visão estereotipada das obras. O processo de estereotipia acontece, segundo o pesquisador
Julio César Lobo(2003), após a montagem de uma matriz que posteriormente tem traços
característicos duplicados, destacados e reproduzidos em série, mesmo quando esses traços
são absolutamente descontextualizados do seu processo gerador. No caso de Vidas Secas, a
matriz histórica surge com a importação da obra literária de Graciliano e das referências
euclidianas.
Andando pelo sertão e enfrentando dificuldades impostas pela natureza hostil, os
membros da família de retirantes não se sentem cidadãos, são bichos, vivem no mato,
escondidos e, portanto, excluídos. A fome, principal adversidade, os obriga a comer até
mesmo o papagaio de estimação e se conformar com o infortúnio por ter garantido a
sobrevivência. Ao perceber a possível chegada das chuvas, mesmo sem a autorização do
proprietário, uma casa abandonada lhes serve como abrigo, seu dono, um coronel
interpretado por Jofre Soares, aceita a proposta de trabalho de Fabiano que teria corno
pagamento urna rês para cada quatro nascidas sob os cuidados do vaqueiro.
O período da estada da família na fazenda pode ser percebido corno a fase associada
ao sertão inferno. Os próprios personagens em suas falas repetem essa constatação, o
destempero da natureza é reclamado constantemente por Sinhá Vitória, (Maria Ribeiro),
sempre repetindo que o lugar, suas vidas, e a condição em que se encontram é um inferno.
Na tentativa de entender o significado da palavra inferno, pronunciada por urna benzedeira,
o menino maior questiona a sua mãe se ela já havia estado nesse lugar, ofendida ela
reclama com o menino e desconta suas angustias na criança. Com as poucas palavras que
serviram de explicação, o menino tenta recriar em seu imaginário o que seria inferno,
olhando para o sol, para as árvores secas e para a sua própria mãe repete, de forma
afirmativa, a resposta de Sinhá Vitória: "-Inferno, espeto quente, muito fogo, inferno".
Após enfrentar as limitações conferidas pelo mundo "capitalizado", corno juros,
impostos e até mesmo sua condição de inferioridade perante as autoridades oficiais,
Fabiano precisa partir rumo à cidade, onde a modernidade poderia lhes dar a dignidade que
o sertão para os bichos nunca ofereceu.
A família segue sem rumo, vagando pelo sertão purgatório explicitado por Oliveira
(2000) corno
Um lugar de passagem, de travessia, definido pelo exercício da liberdade e
pela dramaticidade da escolha de cada um. Identificado como lugar de
penitência e de reflexão, o sertão aparece como reino a ser desencantado e
decifrado (p.62).

Corno proposta final a leitura do filme Vidas Secas, compreende-se que a


industrialização é exposta corno solução para o problema social da seca. Os personagens
continuam a peregrinação rumo à cidade grande, onde, corno dizia Sinhá Vitória, haveria
estudo para os meninos e "coisas bonitas para se ver", um lugar em que não estariam
isolados e conseqüentemente deixariam à condição de bichos.
O discurso regionalista da seca, do banditismo, do cangaço, dos coronéis, dos
engenhos, e até mesmo do lugar exótico, foi, também, fortemente explorado pelo cinema
brasileiro nesta obra, solidificando a imagem de um nordeste do atraso. E mesmo quando se
retrata o nordeste positivamente, corno urna região de belezas naturais e do consumo
turístico, há em volta estereotipias corno sendo um lugar excêntrico e diferente. Estas
construções simbólicas têm produzido mais a consciência das distinções do que a da
integração (Oliveira, 2000). Destarte, o filme Coronel De/miro Gouveia (1977), de Geraldo
Samo, é um exemplo das produções nacionais no que tange a figura coronelistíca e a
inviabilidade ou não aceitação por parte dos políticos e empresários, para urna
industrialização e progresso no sertão nordestino.
O poder coronelista: O sertão é o paraíso?

Ambientado no Recife e depois no sertão pernambucano e alagoano, o filme


Coronel Delmiro Gouveia (1977) narra a história do comerciante e idealizador da primeira
hidrelétrica do Brasil. Ao contrário de muitas produções cinematográficas nacionais que
retratam o nordeste como uma região do atraso, sem perspectivas industriais, Coronel
Delmiro Gouveia aborda a capacidade e vontade de desenvolvimento da região, porém é
notório que a industrialização do nordeste não é bem aceita, nem se dá de forma amigável.
O filme é narrado por quatro personagens que tiveram proximidade com Delmiro
Gouveia (Rubens de Falcon). Cada narrador, utilizando o recurso da voz over, que segundo
Mary Ann Doane (1983), está ligada ao corpo do herói, destaca um traço da personalidade
do coronel.
O corpo atua como suporte invisível tanto para o uso de voz-over em
flashback como para um monologo interior. Apesar da voz-over em
flashback efetuar um deslocamento temporal em relação ao corpo, a voz
freqüentemente volta ao corpo como uma forma de desfecho narrativo.
Alem disto, a voz-over com freqüência, apenas inicia a estória e é
subseqüentemente substituída pelo dialogo sincrônico, permitindo à
diegese falar por si mesma (p.466)

A primeira narradora é sua segunda esposa, Eulina (Sura Berditchevski), que ver no
marido um herói romântico sem perspectivas de mudanças no casamento e do lugar onde
moram. Em seguida, o coronel Ulisses Luna (Jofre Soares) o caracteriza como um homem
forte por enfrentar um poderoso político nordestino. No depoimento de Lionelo lona (Nildo
Parente), parceiro de Delmiro nos seus negócios, o coronel é apresentado como um
sonhador, um idealista. Por fim, vem o relato de Zé Pó (José Dumont), funcionário da
fábrica de linhas de Delmiro Gouveia, que o descreve como exemplo de empreendedor,
pois permitiu ao povo nordestino sonhar com o progresso no sertão.
Uma festa de virada de ano inicia o filme e Delmiro é apresentado ao telespectador.
Logo em seguida todos são surpreendidos com a noticia de que o Dérbi, comércio
construído pelo coronel que vendia todo tipo de mercadoria pela metade do preço estava
sendo incendiado. Através da construção do Dérbi, Delmiro Gouveia conquistava o povo,
entretanto, provocava a ira do governador e de alguns políticos do Recife no início do
século XX. Por já ter desacatado o ex-vice-presidente do Brasil e por conta das suas
desavenças com o Governador de Pernambuco, Delmiro é obrigado a fugir do Recife e ir
para o sertão pernambucano levando consigo, Eulina, a filha do governador que se
apaixona por ele e lhe daria, posteriormente, três filhos.
Segundo Albuquerque (2005), o coronel dono de um poder sem limites, que casava,
batizava, mandava soltar e prender, que tinha a seu dispor a vida de homens e a virgindade
das mulheres, parece povoar os sonhos de muitos no país. No caso de Delmiro, trata-se de
um poder privado paralelo ao público com maior influência sobre os homens porque
oferecia ao povo nordestino, possibilidades de melhoria de vida que o Governo, até então,
não proporcionava.
A princípio, o filme parece enaltecer a figura do Coronel Delrniro. O telespectador é
apresentado a um homem que visava o progresso da região nordeste, além de ajudar os
mais necessitados, lhes concedendo comida barata (através do Derbi); urna perspectiva de
trabalho que não seja na roça (através da fábrica de linhas) e um possível futuro com luz e
água em casa (através da hidrelétrica). Além disso, o filme pretende mostrar o nordeste sob
outra ótica das produções que até então representavam de forma estigmatizada a região e
seus "personagens" (cangaceiro, coronel, retirante, beato, entre outros). Porém, alguns
resquícios dos signos nordestinos de "irnprodutividade", pobreza e atraso são
diagnosticados no filme.
A composição filrnica se dá, portanto, através de estereótipos recorrentes no cinema
nacional, corno: os vaqueiros com suas roupas típicas; o nordeste corno a região sem
perspectivas industriais; a religiosidade através da rezadeira; o coronelisrno corno poder
maior do nordeste. Para Tolentino (2001):
Se os termos em pauta fossem tradição, bravura, folclore, o Nordeste
comportaria o que havia de melhor. Mas, em se tratando de progresso
civilização, valores modernos - respeito à lei oficial, às autoridades
estabelecidas, ao direito constitucional -, era tudo que não deveríamos
mostrar (p.67).

Tanto em Coronel De/miro Gouveia como em Vidas Secas encontram-se tais signos
de nordestinidade. Trata-se de filmes de décadas distintas que apresentam o mesmo
imaginário estigmatizado do nordeste.
Um dos ternas correlacionados ao nordeste cinematográfico encontrado em Coronel
De/miro Gouveia é a vingança corno justiça Urna evidencia presente na cena em que
Delrniro se encontra na estação de trem com dois empregados do coronel Ulisses e o
delegado o leva preso sob as acusações de falência fraudulenta, sedução e rapto de menor.
Um dos jagunços tenta intervir na prisão e leva um tiro do policial, vindo a morrer. Ulisses
Luna e vários outros empregados a cavalo e armados cercam a delegacia e, após urna
"conversa" do coronel Ulisses com o delegado, Delrniro é solto. O jagunço que havia
escapado na estação aponta ao seu patrão o policial que havia atirado no seu companheiro e
com o aval de Ulisses, a "justiça" é cumprida.
"A violência é transformada em espetáculo perdendo qualquer papel na história. O
direito estará aliado aos valores do mundo moderno e a condenação, aos que representam o
mundo do atraso, da permanência" (TOLENTINO, 2001, p.90). E o mundo do atraso é,
pois, o coronelisrno, o poder primeiro do nordeste acima da política e da própria lei e essa
autoridade no filme ratifica esse suposto poder.
O coronel, para Vitor Nunes Leal (1975), exerce urna ampla jurisdição sobre seus
dependentes compondo rixas e desavenças e proferindo, às vezes, verdadeiros
arbitramentos, que os interessados respeitam. Ainda segundo Leal, o coronel detém, com ou
sem caráter oficial, extensas funções policiais, de que freqüentemente se desincurnbe com a
sua pura ascendência social, mas que eventualmente pode tomar efetivos com o auxílio de
empregados, agregados ou capangas. Ascendência, essa que resulta da sua qualidade de
proprietário rural e até mesmo, como no caso de Delmiro Gouveia, de comerciante e
empresário exportador.
Paralelos ao tema central, circundam as figuras "tipicamente" nordestinas, como a
rezadeira e os vaqueiros, por exemplo, que compõem o cenário filmico. Na cena em que
essas figuras aparecem, Delmiro é submetido a um ritual de reza como proteção contra os
males e os inimigos após a sua saída da cadeia. À sua volta estão os vaqueiros que cantam e
dançam celebrando a sua liberdade. São signos de nordestinidade que, segundo Mamede
(1992), pertencem ao campo da estética que se constitui em um corpo complexo de norma,
símbolos, mitos e imagens que operam suas construções em nível do universo imaginário.
Tais signos apenas salientam de qual ambiente se refere, já que são elementos conhecidos
como característicos do nordeste ou como afirma Albuquerque (200 1) ''uma verdadeira
idealização do popular da experiência folclórica, da produção artesanal, tidas sempre como
mais próximas da verdade da terra" (p.77).
O sertão como paraíso, para Lúcia Lippi Oliveira (2000), seria expresso através do
romantismo. Essa característica é encontrada no personagem de Delmiro, ele não ver a
natureza como inimiga, mas sim como aliada, pois é através do que ela proporciona que o
coronel idealiza o progresso, como por exemplo: a hidrelétrica, graças à cachoeira em pleno
sertão e a fábrica de linhas, graças a plantação de algodão. Esse romantismo de Delmiro é
ratificado no diálogo que tem com seu parceiro o empresário Lionelo lona, quando este
afirma ao coronel que "suas idéias quem as realiza sou eu, mentindo, inventando lucros e
evitando impostos. Você fica com as idéias, mas o trabalho sujo é meu". Por mais que
Delmiro se apresente como um idealizador do progresso no sertão, há sempre a sua volta
alguém que diz que isso não é possível numa região seca e inóspita. A cada tentativa e/ou
realização do seu projeto progressista vai conquistando antagonistas às suas ações.
Para Xavier citado por Tolentino (2001), seria uma visão burguesa da história que
toma o progresso como bom em si mesmo, supondo-o acima dos indivíduos e das suas
condições sociais específicas, de modo a reduzir as contradições a uma dicotomia entre
forças arcaicas e modernas. Porém, essas forças arcaicas foram vencidas não porque
quisessem perder, mas sim porque o progresso não foi "permitido" no nordeste como em
Recife quando o Dérbi foi incendiado, e Delmiro, no filme, acusa o governador do Estado
de Pernambuco e o ex-vice-presidente do Brasil por esta impossibilidade de crescimento
nordestino.
No sertão, após sua morte, veio o fim e a destruição da fábrica de linhas, ordenado
pelo representante da empresa inglesa Machine Cottons. Através do último narrador, Zé Pó,
fica explícito o pensamento de todos os trabalhadores que viam uma possibilidade de
emprego diferente do trabalho rural e do progresso na região nordeste e como esse "sonho"
foi interrompido. Ele diz "o povo daqui nunca esqueceu o coronel. A fraqueza do coronel é
que ele era só, sozinho mesmo e aí atiraram nele e mataram a fábrica. Tenho pra mim que
ele foi como um exemplo pra nós tudo".
Apesar do filme, aparentemente, ou na sua maioria relatar a história do Coronel
Delmiro Gouveia como um empreendedor, temas estereotipados e "folclóricos" sobre o
nordeste, também, foram incluídos na narrativa, como os vaqueiros, a religiosidade, o poder
coronelista, a simplicidade do povo, a submissão da mulher, enfim temas recorrentes no
cinema nacional sobre o nordeste e seu povo. Estes signos servem para facilitar a absorção
da identidade regional pelas camadas que se buscava integrar à nova sociedade em
gestação. Seria uma forma, portanto, de "perpetuar estados de espíritos".
(ALBUQUERQUE, 2001, p.78).

Considerações finais

A partir da análise dos filmes das décadas de 1960 e 1970, foi possível perceber que
as construções simbólicas sobre o nordestino seguem uma idéia equivocada da matriz
euclidiana, adaptando da literatura uma identidade regional nordestina atrelada ao não-
desenvolvimento do nordeste, através do discurso da seca, da região inóspita, sem lei, da
terra do "cabra macho", valente desprovido de inteligência, de uma região que visa o
progresso, mas não tem auxílio.

A manipulação interesseira dos recursos destinados às obras contra as


secas e a obtenção de favores políticos, via clientelismo, eram fatos
conhecidos, mas não chegavam a afetar a imagem de sofrimento da região
( ...) O discurso da seca foi, portanto, competentemente elaborado,
divulgado e assimilado. Quaisquer outras relações causais tinham
dificuldade de se impor como idéia corrente (CASTRO apud MAMEDE,
1992, p.).

Assim os filmes Vidas Secas (1963) e Coronel De/miro Gouveia (1977) são
exemplos de como as produções cinematográficas brasileiras, ao retratarem o nordeste,
terminam por destacar temas estigmatizados pela literatura. Independente do filme ser uma
adaptação literária (Vidas Secas) ou narrar uma história com aspectos documentais
(Coronel De/miro Gouveia), o cinema brasileiro não abandona estereótipos. Estas obras
fílmicas acabam por estancar a vida nordestina em temas desgastados e repetidos omitindo
a diversidade presente na região do nordeste.

Referências

ALBUQUERQUE JUNIOR, D.M. de. Cabra da Peste! In: Nossa História. Rio de Janeiro,
ano 2, n° 17, março 2005

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