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L C

ENTRE TEXTOS

4ª edição • São Paulo


2018

1
LINGUAGENS, CÓDIGOS
e suas t e c n o l o g i a s
tu ra e In te rp re ta ç ã o d e Textos
Gra mática, Litera ira
Almeira Go nçalves e Pércio Luis Ferre
Lucas Limberti, Murilo de
© Hexag Sistema de Ensino, 2018
Direitos desta edição: Hexag Sistema de Ensino. São Paulo, 2018
Todos os direitos reservados.

Autores
Lucas Limberti
Murilo de Almeida Gonçalves
Pércio Luis Ferreira
Diretor geral
Herlan Fellini
Coordenador geral
Raphael de Souza Motta
Responsabilidade editorial
Hexag Sistema de Ensino
Diretor editorial
Pedro Tadeu Batista
Revisora
Maria Cristina Lopes Araújo
Pesquisa iconográfica
Stephanie Lippi Antonio
Programação visual
Hexag Sistema de Ensino

Editoração eletrônica
Claudio Guilherme da Silva
Eder Carlos Bastos de Lima
Fernando Cruz Botelho de Souza
Matheus de Oliveira Ferretti
Raphael de Souza Motta
Raphael Campos Silva
Stephanie Lippi Antonio

Projeto gráfico e capa


Raphael Campos Silva

Foto da capa
pixabay (http://pixabay.com)

Impressão e acabamento
Meta Solutions

ISBN: 978-85-9542-019-9

Todas as citações de textos contidas neste livro didático estão de acordo com a legislação, tendo por fim único e exclusivo o
ensino. Caso exista algum texto, a respeito do qual seja necessária a inclusão de informação adicional, ficamos à disposição
para o contato pertinente. Do mesmo modo, fizemos todos os esforços para identificar e localizar os titulares dos direitos sobre
as imagens publicadas e estamos à disposição para suprir eventual omissão de crédito em futuras edições.
O material de publicidade e propaganda reproduzido nesta obra está sendo usado apenas para fins didáticos, não represen-
tando qualquer tipo de recomendação de produtos ou empresas por parte do(s) autor(es) e da editora.

2018
Todos os direitos reservados por Hexag Sistema de Ensino.
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CEP: 04043-300
Telefone: (11) 3259-5005
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CARO ALUNO

O Hexag Medicina é referência em preparação pré-vestibular de candidatos à carreira de Medicina. Desde 2010, são centenas de aprovações nos principais
vestibulares de Medicina no Estado de São Paulo, Rio de Janeiro e em todo Brasil. O material didático foi, mais uma vez, aperfeiçoado e seu conteúdo enri-
quecido, inclusive com questões recentes dos relevantes vestibulares de 2018.
Esteticamente, houve uma melhora em seu layout, na definição das imagens, criação de novas seções e também na utilização de cores.
No total, são 105 livros e 6 cadernos de aula.
O conteúdo dos livros foi organizado por aulas. Cada assunto contém uma rica teoria, que contempla de forma objetiva e clara o que o aluno realmente
necessita assimilar para o seu êxito nos principais vestibulares do Brasil e Enem, dispensando qualquer tipo de material alternativo complementar. Todo livro é
iniciado por um infográfico. Esta seção, de forma simples, resumida e dinâmica, foi desenvolvida para indicação dos assuntos mais abordados nos principais
vestibulares, voltados para o curso de medicina em todo território nacional.
O conteúdo das aulas está dividido da seguinte forma:
TEORIA
Todo o desenvolvimento dos conteúdos teóricos, de cada coleção, tem como principal objetivo apoiar o estudante na resolução de questões propos-
tas. Os textos dos livros são de fácil compreensão, completos e organizados. Além disso, contam com imagens ilustrativas que complementam as explicações
dadas em sala de aula. Quadros, mapas e organogramas, em cores nítidas, também são usados, e compõem um conjunto abrangente de informações para o
estudante, que vai dedicar-se à rotina intensa de estudos.
TEORIA NA PRÁTICA (EXEMPLOS)
Desenvolvida pensando nas disciplinas que fazem parte das Ciências da Natureza e suas Tecnologias e Matemática e suas Tecnologias. Nesses
compilados nos deparamos com modelos de exercícios resolvidos e comentados, aquilo que parece abstrato e de difícil compreensão torna-se mais acessível
e de bom entendimento aos olhos do estudante.
Através dessas resoluções é possível rever a qualquer momento as explicações dadas em sala de aula.
INTERATIVIDADE
Trata-se do complemento às aulas abordadas. É desenvolvida uma seção que oferece uma cuidadosa seleção de conteúdos para complementar o
repertório do estudante. É dividido em boxes para facilitar a compreensão, com indicação de vídeos, sites, filmes, músicas e livros para o aprendizado do aluno.
Tudo isso é encontrado em subcategorias que facilitam o aprofundamento nos temas estudados. Há obras de arte, poemas, imagens, artigos e até sugestões
de aplicativos que facilitam os estudos, sendo conteúdos essenciais para ampliar as habilidades de análise e reflexão crítica. Tudo é selecionado com finos
critérios para apurar ainda mais o conhecimento do nosso estudante.
INTERDISCIPLINARIDADE
Atento às constantes mudanças dos grandes vestibulares, é elaborada, a cada aula, a seção interdisciplinaridade. As questões dos vestibulares de
hoje não exigem mais dos candidatos apenas o puro conhecimento dos conteúdos de cada área, de cada matéria.
Atualmente há muitas perguntas interdisciplinares que abrangem conteúdos de diferentes áreas em uma mesma questão, como biologia e química,
história e geografia, biologia e matemática, entre outros. Neste espaço, o estudante inicia o contato com essa realidade por meio de explicações que relacio-
nam a aula do dia com aulas de outras disciplinas e conteúdos de outros livros, sempre utilizando temas da atualidade. Assim, o estudante consegue entender
que cada disciplina não existe de forma isolada, mas sim, fazendo parte de uma grande engrenagem no mundo em que ele vive.
APLICAÇÃO NO COTIDIANO
Um dos grandes problemas do conhecimento acadêmico é o seu distanciamento da realidade cotidiana no desenvolver do dia a dia, dificultando o
contato daqueles que tentam apreender determinados conceitos e aprofundamento dos assuntos, para além da superficial memorização ou “decorebas” de
fórmulas ou regras. Para evitar bloqueios de aprendizagem com os conteúdos, foi desenvolvida a seção "Aplicação no Cotidiano". Como o próprio nome já
aponta, há uma preocupação em levar aos nossos estudantes a clareza das relações entre aquilo que eles aprendem e aquilo que eles têm contato em seu
dia a dia.
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES
Elaborada pensando no Enem, e sabendo que a prova tem o objetivo de avaliar o desempenho ao fim da escolaridade básica, o estudante deve
conhecer as diversas habilidades e competências abordadas nas provas. Os livros da “Coleção vestibulares de Medicina” contêm, a cada aula, algumas dessas
habilidades. No compilado “Construção de Habilidades”, há o modelo de exercício que não é apenas resolvido, mas sim feito uma análise expositiva, descre-
vendo passo a passo e analisado à luz das habilidades estudadas no dia. Esse recurso constrói para o estudante um roteiro para ajudá-lo a apurá-las na sua
prática, identificá-las na prova e resolver cada questão com tranquilidade.
ESTRUTURA CONCEITUAL
Cada pessoa tem sua própria forma de aprendizado. Geramos aos estudantes o máximo de recursos para orientá-los em suas trajetórias. Um deles
é a estrutura conceitual, para aqueles que aprendem visualmente a entender os conteúdos e processos por meio de esquemas cognitivos, mapas mentais e
fluxogramas. Além disso, esse compilado é um resumo de todo o conteúdo da aula. Por meio dele, pode-se fazer uma rápida consulta aos principais conteúdos
ensinados no dia, o que facilita sua organização de estudos e até a resolução dos exercícios.
A edição 2018 foi elaborada com muito empenho e dedicação, oferecendo ao aluno um material moderno e completo, um grande aliado para o seu
sucesso nos vestibulares mais concorridos de Medicina.
Herlan Fellini
ÍNDICE
GRAMÁTICA E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS
Aulas 1 e 2: Funções da linguagem e variação linguística 7
Aulas 3 e 4: Semântica: elementos de análise 55
Aulas 5 e 6: Os sons da fala e ortografia 93
Aulas 7 e 8: Formação de palavras 121
Aulas 9 e 10: Artigo, substantivo e adjetivo 161

LITERATURA
Aula 1: A arte literária e o estudo dos gêneros 207
Aula 2: Trovadorismo: a literatura da Idade Média 237
Aula 3: Humanismo e Classicismo 263
Aula 4: Classicismo: Camões épico e lírico 291
Aula 5: Quinhentismo e Barroco 315
INFOGRÁFICO:
Abordagem da GRAMÁTICA E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS nos
principais vestibulares.

FUVEST - Dentre os temas abordados neste caderno, os temas de maior incidência no


vestibular da Fuvest são a semântica e a formação de palavras. Os demais temas são de
aplicação esporádica, requerendo atenção a ortografia e a variação linguística.

LD
ADE DE ME
D

UNICAMP - Dentre os temas abordados neste caderno, os


U

IC
FAC

INA

BO
1963
T U C AT U
temas de maior incidência no vestibular da Unicamp são
variação linguística e semântica. Os demais temas são de
aplicação esporádica, requerendo atenção à ortografia e a
formação de palavras.

UNESP - Dentre os temas abordados


neste caderno, os temas de maior
incidência no vestibular da Unesp são UNESP - Dentre os temas abordados neste caderno,
ortografia, formação de palavras e os temas de maior incidência no vestibular da Unifesp
semântica. Os demais temas são de são formação de palavras e classes de palavras. Os
aplicação esporádica, requerendo atenção demais temas são de aplicação esporádica, requerendo
a variação linguística. atenção a ortografia e a semântica.

ENEM / UFRJ - Dentre os temas abordados neste caderno, os temas de maior


incidência no vestibular da UFRJ são funções da linguagem e variação linguística. Os
demais temas são de aplicação esporádica, requerendo atenção a semântica.

UERJ - Dentre os temas abordados neste caderno, os temas de maior


incidência no vestibular da UERJ são semântica e classes de palavras. Os
demais temas são de aplicação esporádica, requerendo atenção a variação
linguística e a formação de palavras.
Aulas 1e2

Funções da linguagem
e variação linguística
Competências 1, 2, 5, 7 e 8
Habilidades1, 4, 5, 6, 7, 8, 17, 21, 22, 23,
24, 25, 26 e 27
Competência 1 – Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para
sua vida.
H1 Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como elementos de caracterização dos sistemas de comunicação.
H2 Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de comunicação e informação para resolver problemas sociais.
H3 Relacionar informações geradas nos sistemas de comunicação e informação, considerando a função social desses sistemas.
H4 Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação.
Competência 2 – Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) (LEM) como instrumento de acesso a informações e a outras
culturas e grupos sociais.
H5 Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM ao seu tema.
H6 Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus mecanismos como meio de ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e culturas.
H7 Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e seu uso social.
H8 Reconhecer a importância da produção cultural em LEM como representação da diversidade cultural e linguística.
Competência 3 – Compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da
identidade.
H9 Reconhecer as manifestações corporais de movimento como originárias de necessidades cotidianas de um grupo social.
H10 Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em função das necessidades cinestésicas.
Reconhecer a linguagem corporal como meio de interação social, considerando os limites de desempenho e as alternativas de adaptação para
H11
diferentes indivíduos.
Competência 4 – Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e
da própria identidade.
H12 Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos artistas em seus meios culturais.
H13 Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos.
H14 Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos.
Competência 5 – Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante
a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção.
H15 Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.
H16 Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário.
H17 Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional.
Competência 6 – Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da
realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação.
H18 Identificar os elementos que concorrem para a progressão temática e para a organização e estruturação de textos de diferentes gêneros e tipos.
H19 Analisar a função da linguagem predominante nos textos em situações específicas de interlocução.
H20 Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a preservação da memória e da identidade nacional
Competência 7 – Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas.
H21 Reconhecer em textos de diferentes gêneros, recursos verbais e não-verbais utilizados com a finalidade de criar e mudar comportamentos e hábitos.
H22 Relacionar, em diferentes textos, opiniões, temas, assuntos e recursos linguísticos.
H23 Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.
Reconhecer no texto estratégias argumentativas empregadas para o convencimento do público, tais como a intimidação, sedução, comoção,
H24
chantagem, entre outras.
Competência 8 – Compreender e usar a língua portuguesa como língua materna, geradora de significação e integradora da organização
do mundo e da própria identidade.
H25 Identificar, em textos de diferentes gêneros, as marcas linguísticas que singularizam as variedades linguísticas sociais, regionais e de registro.
H26 Relacionar as variedades linguísticas a situações específicas de uso social.
H27 Reconhecer os usos da norma padrão da língua portuguesa nas diferentes situações de comunicação.
Competência 9 – Entender os princípios, a natureza, a função e o impacto das tecnologias da comunicação e da informação na sua vida
pessoal e social, no desenvolvimento do conhecimento, associando-o aos conhecimentos científicos, às linguagens que lhes dão suporte,
às demais tecnologias, aos processos de produção e aos problemas que se propõem solucionar.
H28 Reconhecer a função e o impacto social das diferentes tecnologias da comunicação e informação.
H29 Identificar pela análise de suas linguagens, as tecnologias da comunicação e informação.
H30 Relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento que elas produzem
Funções da linguagem

A língua não é um fim em si, mas apenas um meio

Roman Jakobson
Toda comunicação apresenta uma variedade de funções, sendo uma dominante, de acordo com o enfoque que o
destinador/emissor quer dar ou do efeito que quer causar no destinatário/receptor. As funções da linguagem são
as seguintes:
§§ Emissor – emite a mensagem, codificando-a em palavras;
§§ Receptor – recebe a mensagem e a decodifica, ou seja, apreende a ideia;
§§ Mensagem – aquilo que é comunicado, o conteúdo da comunicação;
§§ Código – sistema linguístico escolhido para transmissão e recepção da mensagem;
§§ Referente – contexto em que se encontram o emissor e o receptor;
§§ Canal – meio pelo qual a mensagem é transmitida;

§§ Emotiva ou expressiva – centralizada no emissor, ressalta sua opinião, trata das emoções; prevalece a 1ª
pessoa do singular (eu), interjeições e exclamações; é a linguagem das biografias, memórias, poesias líricas
e cartas de amor.
Desencanto
Eu faço versos como quem chora
De desalento... de desencanto...
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.

Meu verso é sangue. Volúpia ardente...


Tristeza esparsa... remorso vão...
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.

E nestes versos de angústica rouca,


Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.
Eu faço versos como quem morre...
(Manuel Bandeira)

9
§§ Referencial – centralizada no referente, pois o emissor oferece informações da realidade; objetiva, direta,
denotativa, prevalecendo a 3ª pessoa do singular (ele/ela); é a linguagem usada nos textos científicos, arte
realista, notícias de jornal.
“Aumenta a pressão sobre o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, para que ele permita uma investigação
independente sobre os aparentes erros dos seus serviços de inteligência no que se refere às armas de des-
truição em massa do Iraque. A indicação do governo americano, também questionado sobre a sua avaliação
da ameaça iraquiana, de que um inquérito pode ser aberto no país, reforçou o argumento dos críticos de
Blair. O Partido Conservador britânico deverá apresentar nesta semana uma moção pedindo a investigação.”
Fonte: Folha de S. Paulo - 02-02-2004

§§ Conativa ou apelativa – centralizada no receptor; o emissor procura influenciar o comportamento do


receptor; como o emissor se dirige ao receptor, é comum o uso da 2ª pessoa do singular (tu), do pronome
de tratamento você ou do nome do próprio receptor, além de vocativos e imperativos; usada nos discursos,
sermões e propagandas que se dirigem diretamente ao consumidor.

§§ Fática – utilizada para testar o canal, para manter o contato físico ou psicológico com o interlocutor.

§§ Metalinguística – é a linguagem utilizada para falar da própria linguagem; a linguagem como fazer artístico;
põe em evidência a forma da mensagem, ou seja, preocupa-se mais em “como dizer” do que com “o que dizer”.

Razão de ser

Escrevo. E pronto.
Escrevo porque preciso
preciso porque estou tonto.
Ninguém tem nada com isso.
Escrevo porque amanhece.
E as estrelas lá no céu
Lembram letras no papel,
Quando o poema me anoitece.
A aranha tece teias.
O peixe beija e morde o que vê.
Eu escrevo apenas.
Tem que ter por quê?
(Paulo Leminski)

10
§§ Poética – é a linguagem que põe em evidên-
cia a forma como a mensagem é veiculada. Está
mais interessada nos aspectos estéticos, na bele-
za e nos enfeites atribuídos à mensagem.
Sem
Mim
Ando
Com
Igo
Sigo
Sem
Origem geográfica do falante
Com
Ando Pelo fato de ser falada em várias regiões, a língua por-
(Arnaldo Antunes)
tuguesa apresenta grandes variações regionais que
modificam o vocabulário utilizado, na forma como as
palavras são pronunciadas e até na ordem em que elas
Variação linguística aparecem em uma oração. A leguminosa conhecida por
muitos como aipim recebe o nome de mandioca ou ma-
Variações linguísticas são as peculiaridades que a lín-
caxeira em muitas outras regiões do Brasil.
gua adquire com o tempo em função do seu uso por
comunidades específicas.

Contexto de conversação
Conforme a situação em que nos encontramos ao falar
ou escrever, mudamos o nosso trato com a linguagem.
A cada instante, utilizamos a língua de uma maneira
particular, uma vez que nos adaptamos ao contexto em Idade do falante
que estamos. Como exemplo, agimos diferentemente
quando nos dirigimos aos nossos pais ou quando fala- A idade do falante é também um aspecto importante
mos com nossos amigos; escrevemos na escola de um nos estudos de variação linguística, que está relacio-
modo diferente daquele que escrevemos nos aplicativos nado ao fato de as línguas variarem de acordo com o
de comunicação. Isso significa que precisamos dominar passar do tempo. O português nem sempre foi como
várias modalidades do português. é atualmente, portanto, pessoas de idades diferentes
aprenderam a falar em épocas diferentes e apresentam
Pronominais um modo de falar que reflete essa variação.
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro.
(Oswald ANDRADE, Obras completas,
v. 6-7. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1972.)

11
Aspectos sociais §§ formas contraídas
Exemplo: prof, med, refri, facul
A classe social à qual pertence o falante é um aspecto §§ afastamento das regras gramaticais.
que pode estar intimamente interligado ao seu grau de Exemplo: Eu vi ele.
escolaridade, ou seja, tal situação social pode influen-
§§ possibilidade de adequar o discurso de acordo
ciar a variação linguística dos falantes.
com as reações dos ouvintes.

b. Língua escrita: recorre a sinais de pontuação e


de acentuação para exprimir os recursos rítmicos
e melódicos da oralidade:
§§ uso de descrições ricas;
§§ obedece às regras gramaticais com maior
rigor;
§§ sinais de pontuação e acentuação para trans-
mitir a expressividade oral;
Linguagem formal versus linguagem §§ frases longas, apesar de também poder usar
informal
frases curtas;
a. Norma culta/padrão: é a denominação dada §§ uso de vocabulário mais amplo e cuidadoso;
à variedade linguística dos membros da classe §§ conectivos e estruturas sintáticas para garan-
social de maior prestígio dentro da classe literária. tir a coesão textual.
*Não se trata da única forma correta.
b. Linguagem informal/popular: é a denomi-
nação dada à variedade linguística utilizada no
cotidiano, e que não exige a observância total da
gramática.

Língua falata versus língua escrita


a. Língua falada/oral: dispõe de um número in-
contável de recursos rítmicos e melódicos – ento-
nação, pausas, ritmo, fluência, gestos – porque,
claro, o emissor (pessoa que fala ou transmite
uma mensagem numa dada linguagem) está
presente fisicamente. Algumas das característi-
cas principais são:
§§ frequência da ocorrência de repetições, hesi-
tações e bordões de fala (“Pois, eu aaa... eu
acho que... pronto, não sei...“, "Cara, o que
é isso, cara?");
§§ frases curtas;
§§ frases inacabadas, porque foram cortadas ou
interrompidas;
§§ uso frequente da omissão de palavras.
Exemplo: Eu vou com minha mãe e com meu
pai; empresta o seu caderno?

12
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Vídeo Para entender metalinguagem – Porta dos fundos


Fonte: Youtube
Percebidos no próprio vídeo a que assistimos.
É o código operando sobre o próprio código.
uma empresa de produção de vídeos, os efei-
tos dos referidos cortes começam a serque um
dos atores enuncia a necessidade de se fazer
cortes de gastos em certas funções de O vídeo
tem seu enredo suportado pela função meta-
linguística. Nele, ao mesmo tempo em

Vídeo Para entender Variação situacional – Porta dos fundos


Fonte: Youtube
Por meio desse esquete conseguimos enten-
der o que seria (ou o que poderia ser) uma
variante situacional (registro linguístico vin-
culado a um contexto). Um dos atores utiliza
uma linguagem profissional de grande espe-
cificidade, que não permite que seu interlo-
cutor o compreenda de modo adequado.

Filme Para entender Variação situacional – Porta dos fundos

O longa-metragem aborda as estratégias persuasivas de um lobista da indústria


do tabaco dos EUA.

Filme O auto da compadecida (Guel Arraes, 2000)

Através das aventuras dos nordestinos João Grilo (Matheus Nachtergaele) e Chicó
(Selton Mello), é possível ter contato com a variante nordestina própria do sertão
da Paraíba.

14
OUVIR

Músicas
- Segue o seco - Marisa Monte

15
INTERDISCIPLINARIDADE

Variação linguística e literatura


Conto - Pega ela (Ferréz)
Este conto emprega uma série de termos próprios da periferia da cidade de São Paulo. Os elementos
são de natureza fonológica, morfológica, sintática e lexical.
Longe, hein?
É estrada, nego, é assim mesmo.
E como anda a Suzana?
A loira tá da hora.
Firmeza?
Por que a pergunta?
Saudade de ver vocês dois, porra.
Lipo, há quanto tempo a gente se conhece?
Acho que mais de dez.
Põe dez nisso, tu começou a andar comigo aos 12.
É mesmo, só de baralho temos vários.
As madrugadeiras no bar do Domingos, né?
Pode crer. Então faz mais de 15 anos, tu tá com quanto?
25.
Então tem isso não, tem uns 13.
Pode crer, Alemão, desde o dia em que te vi quis ser teu amigo.
Por quê, carái?
Porque você sempre foi o linha de frente, né?
Pode crer, mas você já demonstrava apetite.
É, mas esse carái não chega.
Vive com o carái na boca.
Piada antiga, hein, nego?
Lipo?
O quê?
Você sempre foi firmeza comigo.
Ih! Esses papos me incomodam, o que pega?
Pega nada não.
É entre você e a Suzana?
Não.
Ah!
Ah! O quê?
Nada não, parece que tá boladão.

16
Estou mesmo, tem uns papos paralelos aí.
Envolvendo quem? Posso saber?
Você mesmo. Pára com essas coisas, Alemão, o que pega?
Aquela mina lá do irmão.
Ih! Deixa isso quieto.
Por quê?
Tô a fim de falar não.
Mas temos que falar.
...
Temos que falar.
Pra que remoer?
Temos que sumariar.
Vamos parar para mijar?
Vamos.
Ah! Nada mais gostoso do que mijar.
Ainda mais nesse mato verde, queria viver aqui.
É mesmo.
É, ficar de boa, andar de cavalo, plantar uns barato''
Lipo, você comeu a mulher do cara?
Alemão, carái, você é meu irmão, guarda essa porra.
Guardo não nego, vamos ter que sumariar. Mas que carái é esse?
Sei não, sei que o cara era irmão, vai ter que sumariar.
Mas catei não.
Catou.
Catei...
Fala logo, porra.
Carái, Alemão, engatilhou o bagulho, você é meu irmão.
Irmão eu sou, só que também dos outros, você sabe o código.
Mas...
Mas o que, fala? Tá bom, eu dei um beijo.
Pára de palhaçada, carái, eu vou te assassinar.
Faz isso comigo não, Alemão, ela que me beijou.
Tu ficou lá para ser guardado, não para catar a mulher do irmão.
Mas essa vadia, eu tava no banheiro e...
Fala tudo, porra!
Eu tava tomando banho, ela entrou, tava de espartilho e o carái, eu dei um beijo.
Sinto muito, Lipo.
Fala!
É o Alemão.
E aí?
Matei meu melhor amigo, meu companheiro, só que sua mulher também vacilou.
Eu sei, vou dar um coro nela.
Não basta, eu perdi meu irmão, você vai ter que matar ela.
Mas ela tá grávida.
Foda-se, de repente nem é seu, cê sabe o código, se não pegar, a gente pega vocês.
Tá, tá bom, carái, vou pegar.
(“Pega ela”, In: Ninguém é inocente em São Paulo) 17
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES

HABILIDADE 1 - Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como elemen-


tos de caracterização dos sistemas de comunicação.

A habilidade em questão trabalha com aquilo que os linguistas chamam de “teorias da


comunicação”. Mais precisamente, o ENEM se vale da habilidade H1 para formular ques-
tões vinculadas ao tema das Funções da linguagem, tema no qual o vestibulando deve ser
capaz de identificar algum tipo de uso linguístico não apenas do ponto de vista teórico
(por exemplo: função emotiva, função apelativa, função metalinguística, entre outras),
mas também do ponto de vista da funcionalidade expressiva desse tipo linguístico (o que
esse tipo linguístico propõe? Convencer o interlocutor? Expor uma informação sem
emoção?).

HABILIDADE 26 - Relacionar as variedades linguísticas a situações específicas de uso social.

Quando estudamos as habilidades do ENEM de forma mais detida, vemos que suas
descrições apresentam alguns verbos que explicitam de modo mais claro aquilo que o
vestibulando encontrará em uma questão. No caso da habilidade que aqui analisaremos
(H26), o verbo de abertura é “relacionar”. Isso significa que, não basta simplesmente
identificarmos as variantes linguísticas. É necessário também que saibamos relacionar (e,
consequentemente, “avaliar”) essas variantes em determinadas situações-problema (rela-
cionar a certos contextos ou vivências).

Não podemos nos esquecer também de que, para obter um bom desempenho na prova
do ENEM, é imprescindível sabermos diferenciar usos linguísticos mais “descontraídos”,
vinculados à gramática descritiva (e aplicados na comunicação mais informal), daqueles
usos mais “sérios”, referentes à gramática normativa (e que, inevitavelmente, estarão
presentes em qualquer vestibular).

18
MODELO 1

(Enem 2017)

TEXTO I
Fundamentam-se as regras da Gramática Normativa nas obras dos grandes escrito-
res, em cuja linguagem as classes ilustradas põem o seu ideal de perfeição, porque
nela é que se espelha o que o uso idiomático estabilizou e consagrou.

LIMA, C. H. R. Gramática normativa da língua portuguesa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1989.

TEXTO II
Gosto de dizer. Direi melhor: gosto de palavrar. As palavras são para mim corpos
tocáveis, sereias visíveis, sensualidades incorporadas. Talvez porque a sensualidade
real não tem para mim interesse de nenhuma espécie – nem sequer mental ou de
sonho -, transmudou-se-me o desejo para aquilo que em mim Cria ritmos Verbais,
ou os escuta de Outros. Estremeço se dizem bem. Tal página de Fialho, tal página de
Chateaubriand, fazem formigar toda a minha vida em todas as veias, fazem-me
raivar tremulamente quieto de um prazer inatingível que estou tendo. Tal página,
até, de Vieira, na sua fria perfeição de engenharia sintáctica, me faz tremer como
um ramo ao vento, num delírio passivo de coisa movida.

PESSOA, F. O livro do desassossego. São Paulo: Brasiliense, 1986.

A linguagem cumpre diferentes funções no processo de comunicação. A função que


predomina nos textos I e II
a) destaca o “como” se elabora a mensagem, considerando-se a seleção, combinação e
sonoridade do texto.
b) coloca o foco no “com o quê” se constrói a mensagem, sendo o código utilizado o seu
próprio objeto.
c) focaliza o “quem” produz a mensagem, mostrando seu posicionamento e suas
impressões pessoais.
d) orienta-se no “para quem” se dirige a mensagem, estimulando a mudança de seu
comportamento.
e) enfatiza sobre “o quê” versa a mensagem, apresentada com palavras precisas e
objetivas.

19
ANÁLISE EXPOSITIVA

Habilidade 1

A questão apresentada exige que o vestibulando localize a função da


linguagem que opera nos dois textos, mas não a partir do nome da
função, e sim de sua definição. Se observarmos com cuidado, cada uma
das alternativas discute um tipo de função da linguagem diferente. Por
exemplo, a alternativa C diz que a função predominante nos textos I e
II “focaliza o “quem” produz a mensagem, mostrando seu posiciona-
mento e suas impressões pessoais”. Ora, se nos lembrarmos das defini-
ções que abarcam as funções, perceberemos que a alternativa C fala a
respeito da “função emotiva”. Se tomarmos como exemplo a alternativa
D, que diz que a função da linguagem predominante “orienta-se no
“para quem” se dirige a mensagem, estimulando a mudança de seu
comportamento”, veremos que a definição apresentada diz respeito à
“função apelativa” da linguagem. Desse modo, basta que o vestibulando
aplique seus conhecimentos teóricos sobre os textos para perceber que
ambos os textos discutem usos de palavras por meio de palavras. São
textos que falam sobre recursos textuais. Logo, temos um código que
discute o próprio código (nossa função metalinguística). O que nos leva
à resposta que discute “com o que” se constrói a mensagem.

Alternativa B

20
MODELO 2

(Enem) Lisboa: aventuras

tomei um expresso
cheguei de foguete
subi num bonde
desci de um elétrico
pedi um cafezinho
serviram-me uma bica
quis comprar meias
só vendiam peúgas
fui dar a descarga
disparei um autoclisma
gritei "ó cara!"
responderam-me «ó pá»
positivamente
as aves que aqui gorjeiam não gorjeiam como lá.

PAES, J. P. A poesia está morta mas juro que não fui eu. São Paulo: Duas Cidades, 1988.

No texto, a diversidade linguística é apresentada pela ótica de um observador que


entra em contato com uma comunidade linguística diferente da sua. Esse observa-
dor é um
a) falante do português brasileiro relatando o seu contato na Europa com o português
lusitano.
b) imigrante em Lisboa com domínio dos registros formal e informal do português
europeu.
c) turista europeu com domínio de duas variedades do português em visita a Lisboa.
d) português com domínio da variedade coloquial da língua falada no Brasil.
e) poeta brasileiro defensor do uso padrão da língua falada em Portugal.

21
ANÁLISE EXPOSITIVA

Habilidade 26

No poema de José Paulo Paes, o autor nos apresenta uma situação em


que um falante de português brasileiro evidencia um certo “choque”
linguístico que ocorre no momento em que estabelece contato com a
variante lusitana do português. Podemos notar que o referido “choque”
se dá em situações bastante cotidianas, como a entrada em um veículo
de transporte público (que no Brasil seria “bonde”, mas em Portugal é
conhecido como “elétrico”), ou mesmo um simples pedido de um “cafe-
zinho” (chamado “bica” em Portugal). É importante notar que o poema
parece transmitir a ideia de que o eu lírico apresenta alguma “surpresa”
em relação à descoberta das variantes lusitanas, o que eliminaria as
possibilidades de resposta vinculadas à ideia de um sujeito que tenha
“domínio de variante lusitana”. Outro ponto relevante está no fato de
que o exercício trabalha quase que essencialmente com a dinâmica
informal da linguagem. Um bom exemplo disso é o vocativo “ó cara”,
cuja versão portuguesa seria “ó pá”.

Alternativa A

22
ESTRUTURA CONCEITUAL

GRAMÁTICA GRAMÁTICA
NORMATIVA DESCRITIVA

FONÉTICA E
FONOLOGIA TEORIA DA
COMUNICAÇÃO

MORFOLOGIA

SINTAXE
VARIAÇÃO
LINGUÍSTICA & FUNÇÕES DA
LINGUAGEM

SEMÂNTICA - DIATÓPICA - EMOTIVA


- DIACRÔNICA - APELATIVA
- DIAFÁSICA - REFERENCIAL
- DIASTRÁTICA - FÁTICA
- DIAMÉSICA - POÉTICA
- METALINGUÍSTICA

23
E.O. Aprendizagem 1. (Ufrgs) Considere as afirmações abaixo, so-
bre a construção de uma educação de quali-
dade.
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 3 QUESTÕES I. Uma educação de qualidade deve, no que
A variação linguística é uma realidade que, concerne à variação linguística, questio-
embora razoavelmente bem estudada pela nar as reações sociais advindas da percep-
sociolinguística, pela dialetologia e pela lin- ção da língua como fenômeno homogêneo.
guística histórica, provoca,em geral, reações II. O desafio, para uma educação de qualida-
sociais muito negativas. O senso comum tem de, está em preparar a escola para comba-
escassa1 percepção de que a língua é um fe- ter a discriminação que tem origem nas
nômeno heterogêneo, que alberga grande diferenças entre as variedades linguísti-
variação e está em mudança contínua. Por cas.
isso, costuma folclorizar2 a variação regio- III. As variedades linguísticas próprias ao do-
nal; demoniza3 a variação social e tende a mínio da leitura, escrita e fala nos espaços
interpretar as mudanças como sinais de públicos, que devem ser ensinadas pela
deterioração4 da língua. O senso comum não escola, são as que não sofreram variações
se dá bem com a variação linguística e chega, sociais.
muitas vezes, a explosões5 de ira e a gestos Segundo o texto, quais estão corretas?
de grande violência simbólica diante de fa- a) Apenas I.
tos de variação. Boa parte de uma educação b) Apenas II.
de qualidade6 tem a ver precisamente com c) Apenas I e II.
o ensino de língua – um ensino7 que garan-
d) Apenas II e III.
ta o domínio das práticas socioculturais de
e) I, II e III.
leitura, escrita e fala nos espaços públicos.
E esse domínio8 inclui o das variedades lin-
guísticas historicamente identificadas como 2. (Ufrgs) Assinale a alternativa que contém
as mais próprias a essas práticas – isto é, as uma afirmação correta, de acordo com o sen-
variedades escritas e faladas que devem ser tido do texto.
identificadas como constitutivas da chamada a) O senso comum costuma perceber a língua
norma culta. Isso pressupõe, inclusive, uma como um fenômeno heterogêneo que alber-
ampla discussão sobre o próprio conceito de ga grande variação e está em mudança con-
norma culta e suas efetivas características9 tínua.
no Brasil contemporâneo. b) Os gestos de grande violência simbólica
Parece claro hoje que o domínio dessas va- constituem-se em fatos de variação linguís-
riedades caminha junto com o domínio tica.
das respectivas práticas socioculturais. Pa- c) O conceito de norma culta e suas caracterís-
rece claro também, por outro lado, que ticas no Brasil contemporâneo são alvos de
não se trata apenas de desenvolver uma explosões de ira diante de fatos de variação
pedagogia10 que garanta o domínio das práti- linguística.
cas socioculturais e das respectivas varieda- d) Uma pedagogia que regule o domínio das
des linguísticas. Considerando o grau de re- variedades ditas populares deve ser privile-
jeição social das variedades ditas populares11, giada.
parece que o que nos desafia12 é a construção
e) A heterogeneidade linguística do Brasil deve
de toda uma cultura escolar aberta à crítica da
ser compreendida para que se possa cons-
discriminação13 pela língua e preparada para
truir uma cultura escolar aberta à crítica da
combatê-la, o que pressupõe uma adequada
compreensão da heterogeneidade14 linguís- discriminação pela língua.
tica do país, sua história social e suas ca-
racterísticas atuais. Essa compreensão15 deve 3. (Ufrgs) Segundo o texto, a sociedade conce-
alcançar, em primeiro lugar, os próprios edu- be a variação e a mudança linguística como
cadores e, em seguida, os educandos. negativas.
Como fazer isso? Como garantir a dissemi- Assinale a alternativa que contém palavras
nação dessa cultura na escola e pela escola, ou expressões que ilustram essa concepção.
considerando que a sociedade em que essa a) escassa (ref. 1), explosões (ref. 5) e ensino
escola existe não reconhece sua cara linguís- (ref. 7)
tica e não só discrimina impunemente pela b) folclorizar (ref. 2), demoniza (ref. 3) e dete-
língua, como dá sustento explícito a esse rioração (ref. 4)
tipo de discriminação? Em suma, como cons- c) qualidade (ref. 6), domínio (ref. 8) e carac-
truir uma pedagogia da variação linguística? terísticas (ref. 9)
d) pedagogia (ref. 10), desafia (ref. 12) e com-
Adaptado de: ZILLES, A. M; FARACO, C. A.
In: ZILLES, A. M; FARACO, C. A, Orgs., Pedagogia preensão (ref. 15)
da variação linguística: língua, diversidade e) populares (ref. 11), discriminação (ref. 13) e
e ensino. São Paulo: Parábola, 2015. heterogeneidade (ref. 14)

24
4. (Insper) 5. (IFPE)

Texto I BRASI DE CIMA E BRASI DE BAXO (Fragmento)


Barreira da língua Meu compadre Zé Fulô,
Cenário: um posto de saúde no interior do Meu amigo e companhêro,
Faz quase um ano que eu tou
Maranhão.
Neste Rio de Janêro;
– Buenos dias, señor, o que siente? – per-
Eu saí do Cariri
gunta o médico.
Maginando que isto aqui
– Tô com dor no bucho, comi uma tapioca Era uma terra de sorte,
reimosa, me deu um empachamento danado. Mas fique sabendo tu
Minha cabeça ficou pinicando, deu até um Que a miséra aqui no Su
farnizim no juízo. É esta mesma do Norte.
– Butcho? Tapiôka? Empatchamiento? Pini-
cón? Far new zeen??? Tudo o que procuro acho.
O trecho acima é de uma piada que circula no Eu pude vê neste crima,
Hospital das Clínicas de São Paulo sobre as Que tem o Brasi de Baxo
dificuldades de comunicação que os médicos E tem o Brasi de Cima.
estrangeiros deverão enfrentar nos rincões Brasi de Baxo, coitado!
do Brasil. (...) É um pobre abandonado;
(Claúdia Colucci, Folha de S. Paulo, 03/07/2013.) O de Cima tem cartaz,
Um do ôtro é bem deferente:
Texto II Brasi de Cima é pra frente,
Brasi de Baxo é pra trás.
No texto “Barreira da língua”, a jornalista
Cláudia Collucci reproduz uma piada ouvi- Aqui no Brasil de Cima,
da no Hospital das Clínicas, em São Paulo, Não há dô nem indigença,
para criticar a iniciativa do governo de abrir Reina o mais soave crima
a possibilidade de que médicos estrangeiros De riqueza e de opulença;
venham a trabalhar no Brasil. Faltou dizer Só se fala de progresso,
duas obviedades ululantes para qualquer Riqueza e novo processo
De grandeza e produção.
brasileiro:
Porém, no Brasi de Baxo
1. A maioria dos ilustres médicos que traba-
Sofre a feme e sofre o macho
lham no Hospital das Clínicas teria tantas
A mais dura privação.
dificuldades quanto um estrangeiro para
entender uma frase recheada de regiona- Brasi de cima festeja
lismos completamente desconhecidos nas Com orquestra e com banquete,
rodas das classes média e alta por onde De uísque dréa e cerveja
circulam; Não tem quem conte os rodete.
2. A quase totalidade deles não tem o menor Brasi de baxo, coitado!
interesse em mudar para uma comunida- Vê das casa despejado
de carente, seja no interior do Maranhão, Home, menino e muié
seja num vilarejo amazônico, e lá exercer Sem achá onde morá
sua profissão. (...) Proque não pode pagá
(José Cláuver de Aguiar Júnior, “Painel do O dinhêro do alugué.
leitor”, Folha de S. Paulo, 04/07/2013) No Brasi de Cima anda
As trombeta em arto som
De acordo com o Texto II, os regionalismos Ispaiando as propaganda
usados na piada transcrita no Texto I De tudo aquilo que é bom.
a) seriam de difícil compreensão para qualquer No Brasi de Baxo a fome
Matrata, fere e consome
brasileiro.
Sem ninguém lhe defendê;
b) demonstram variações geográficas e sociais O desgraçado operaro
do idioma. Ganha um pequeno salaro
c) são imprecisos, pois são usados apenas em Que não dá pra vivê.
comunidades carentes.
d) dificultam a comunicação apenas entre bra- Inquanto o Brasi de cima
sileiros e estrangeiros. Fala de transformação,
e) indicam que o português é falado do mesmo Industra, matéra-prima,
modo em qualquer lugar. Descobertas e invenção,

25
No Brasi de Baxo isiste 6. (Epcar(Afa)) A MAÇÃ DE OURO
O drama penoso e triste
Da negra necissidade; A Apple supera a Microsoft em valor de mer-
cado, premiando o espírito visionário e li-
É uma coisa sem jeito
bertário de Steve Jobs
E o povo não tem dereito
A Microsoft e a Apple vieram ao mundo pra-
Nem de dizê a verdade. ticamente ao mesmo tempo, em meados dos
anos 1970, criadas na garagem de jovens es-
No Brasi de Baxo eu vejo tudantes. Mas as empresas não trilharam ca-
Nas ponta das pobre rua minhos paralelos. A Microsoft desenvolveu o
O descontente cortejo sistema operacional mais popular do mundo e
De criança quage nua. rapidamente se tornou uma das maiores cor-
Vai um grupo de garoto porações americanas, rivalizando com gigan-
Faminto, doente e roto tes da velha indústria. A Apple, ao contrário,
Mode caçá o que comê demorou a decolar. Fazia produtos inovado-
Onde os carro põe o lixo, res, mas que vendiam pouco. Isso começou a
Como se eles fosse bicho mudar quando Steve Jobs, um de seus funda-
Sem direito de vivê. dores, que fora afastado nos anos 80, assumiu
o comando criativo da empresa, em 1996. A
Apple estava à beira da falência e só ganhou
Estas pequenas pessoa,
sobrevida porque recebeu um aporte de 150
Estes fio do abandono,
milhões de dólares de Microsoft. Jobs iniciou
Que veve vagando à toa o lançamento de produtos genuinamente re-
Como objeto sem dono, volucionários nas áreas que mais crescem na
De manêra que horroriza, indústria de tecnologia. Primeiro com o iPod
Deitado pela marquiza, e a loja virtual iTunes. Depois vieram o iPho-
Dromindo aqui e aculá ne e, agora, o iPad. Desde o início de 2005,
No mais penoso relaxo, o preço das ações da empresa foi multipli-
É deste Brasi de Baxo cado por oito. 3Na semana passada, a Apple
A crasse dos Marginá. alcançou o cume. Tornou-se a companhia de
tecnologia mais valiosa do mundo, superan-
Meu Brasi de Baxo, amigo, do a Microsoft. Na sexta-feira, a empresa de
Pra onde é que você vai? Jobs tinha valor de mercado de 233 bilhões
Nesta vida do mendigo de dólares, contra 226 bilhões de dólares da
Que não tem mãe nem tem pai? companhia de Bill Gates.
2
A Marca, para além da disputa pessoal entre
Não se afrija, nem se afobe,
os maiores gênios da nova economia, coroa a
O que com o tempo sobe,
estratégia definida por Jobs. Quando ele re-
O tempo mesmo derruba; tornou à Apple, tamanha era a descrença no
Tarvez ainda aconteça futuro da empresa que Michael Dell, funda-
Que o Brasi de Cima desça dor da Dell, afirmou que o melhor a fazer era
E o Brasi de Baxo suba. fechar as portas e devolver o dinheiro a seus
[...] acionistas. Hoje, a Dell vale um décimo da
(ASSARÉ, Patativa do. Melhores poemas. Seleção de Apple. 1O mérito de Jobs foi ter a presciência
Cláudio Portella. São Paulo: Global, 2006. p. 329-332) do rumo que o mercado tomaria.
BARRUCHO, Luís Guilherme & TSUBOI, Larissa. A maçã de
Ao observar a variedade linguística e o nível ouro. In: Revista Veja, 02 de jun. 2010, p.187. Adaptado.
de linguagem utilizados no poema, é correto
caracterizar o eu lírico como Mesmo em um texto em que haja o predo-
a) um cidadão escolarizado que vive em um mínio da função referencial da linguagem, é
grande centro urbano, pois utiliza muitas possível identificar passagens em que o au-
gírias. tor, mais que transmitir informações sobre
b) uma pessoa idosa porque, no vocabulário a realidade, apresenta seu posicionamento,
utilizado, aparecem palavras ou expressões ou seja, deixa transparecer um juízo de valor
que remetem a uma variação histórica. em relação ao referente. Em todas as alter-
c) um cidadão sertanejo pouco escolarizado, já nativas isso acontece, EXCETO em:
que sua linguagem guarda singularidades re- a) “O mérito de Jobs foi ter a presciência do
gionais e se distancia do registro culto. rumo que o mercado tomaria.” (ref. 1)
d) um cidadão escolarizado que faz uso de um b) “A Apple supera a Microsoft em valor de
vocabulário técnico com o objetivo de ser mercado, premiando o espírito visionário e
compreendido pelo grupo do qual faz parte. libertário de Steve Jobs.” (subtítulo)
e) um estudante que utiliza a variedade colo- c) “A Marca, para além da disputa pessoal entre
quial da língua a fim de criticar a sociedade os maiores gênios da nova economia, coroa a
na qual está inserido. estratégia definida por Jobs.” (ref. 2)

26
d) “Na semana passada, a Apple alcançou o ( )
cume. Tornou-se a companhia de tecnologia
mais valiosa do mundo, superando a Micro-
soft.” (ref. 3)

7. (Fac. Albert Einstein)

Trecho A
Todavia, importa dizer que este livro é es-
crito com pachorra, com a pachorra de um
homem já desafrontado da brevidade do sé-
culo, obra supinamente filosófica, de uma
filosofia desigual, agora austera, logo brin-
calhona, coisa que não edifica nem destrói,
não inflama nem regela, e é todavia mais do
que passatempo e menos do que apostolado.

Trecho B
Tu tens pressa de envelhecer, e o livro anda
devagar; tu amas a narração direta e nutri-
da, o estilo regular e fluente, e este livro e
o meu estilo são como os ébrios, guinam à
direita e à esquerda, andam e param, res-
mungam, urram, gargalham, ameaçam o céu,
escorregam e caem.

Os trechos acima, do romance Memórias Pós-


tumas de Brás Cubas, de Machado de Assis,
apresentam, ambos, dominantemente lin-
guagem de idêntica função, ou seja,
a) Metalinguística, por explicitar os conteúdos

do livro e explicar a forma de produção de
( )
seu estilo.
b) Conativa, por incidir persuasivamente sobre
o leitor e convencê-lo da verdade da obra.
c) Poética, por usar significativo processo de
seleção e de combinação das palavras, carac-
terizando a montagem estética do texto.
d) Referencial, por informar dominantemente
sobre a filosofia do livro e os movimentos
pachorrentos do autor.

8. (G1 - ifsp 2017) Sobre funções da lingua-


gem, correlacione as colunas. ( )
Coluna 1
1. Metalinguagem.
2. Função Referencial.
3. Função Conativa.
4. Função Expressiva.

Coluna 2
( )


Assinale a alternativa que apresenta a sequ-
ência correta.
a) 2 – 1 – 3 – 4
b) 4 – 1 – 3 – 2
c) 3 – 1 – 4 – 2
d) 3 – 2 – 4 – 1
e) 2 – 4 – 1 – 3

27
9. (IFSP) Observe o texto adaptado abaixo. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
Leia o texto abaixo para responder à(s)
questão(ões) a seguir.
EVOCAÇÃO DO RECIFE
(...)
A vida não me chegava pelos jornais nem pe-
los livros
Vinha da boca do povo na língua errada do
povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do
Brasil
Ao passo que nós
O que fazemos
É macaquear
A sintaxe lusíada
O zika vírus foi identificado no Brasil pela (...)
primeira vez no final de abril por pesqui- BANDEIRA, M. Estrela da vida inteira. 20ª Edição.
sadores da Universidade Federal da Bahia Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. 448 p.
(UFBA). Pertencente à mesma família dos
vírus da dengue e da febre amarela, o zika
é endêmico de alguns países da África e do 1
0. (G1 - ifpe 2017) Devido à primazia que se
sudeste da Ásia. Veja perguntas e respostas tem concedido à língua padrão, muitos con-
sobre a doença: sideram a “língua do povo” a que se refere
Como ocorre a transmissão? o poema como incorreta. Este fenômeno de
Assim como os vírus da dengue e do chikun- atribuir menor valor a determinadas varie-
gunya, o zika também é transmitido pelo dades da língua denomina-se
mosquito Aedes aegypti. A prevenção, por- a) variação sociocultural.
tanto, segue as mesmas regras aplicadas a b) variação regional.
essas doenças. Evitar a água parada, que os c) bairrismo.
mosquitos usam para se reproduzir, é a prin- d) preconceito linguístico.
cipal medida. e) preconceito de classe.
Quais são os sintomas?
Os principais sintomas da doença provoca-
da pelo zika vírus são febre intermitente,
erupções na pele, coceira e dor muscular.
E.O. Fixação
Segundo a infectologista Rosana Richtmann,
a boa notícia é que o zika vírus é muito me- 1. (Epcar) MULHER BOAZINHA
nos agressivo que o vírus da dengue: não há (Martha Medeiros)
registro de mortes relacionadas à doença. A
evolução é benigna e os sintomas geralmen- Qual o elogio que uma mulher adora receber?
te desaparecem espontaneamente em um Bom, se você está com tempo, pode-se listar aqui
período de 3 até 7 dias. uns setecentos: mulher adora que verbalizem
Como é o tratamento? seus atributos, sejam eles físicos ou morais.
Não há vacina nem tratamento específico Diga que ela é uma mulher inteligente, e ela
para a doença. Segundo informações do Mi- irá com a sua cara.
nistério da Saúde, os casos devem ser trata- Diga que ela tem um ótimo caráter e um cor-
dos com o uso de paracetamol ou dipirona po que é uma provocação, e ela decorará o
para controle da febre e da dor. Assim como seu número.
na dengue, o uso de ácido acetilsalicílico (as-
Fale do seu olhar, da sua pele, do seu sorriso,
pirina) deve ser evitado por causa do risco
da sua presença de espírito, da sua aura de
aumentado de hemorragias.
mistério, de como ela tem classe: ela achará
É correto afirmar que, no que tange às fun-
ções da linguagem, o texto acima é um exem- você muito observador e lhe dará uma cópia
plo de Função da chave de casa.
a) Referencial ou Denotativa. Mas não pense que o jogo está ganho: man-
b) Expressiva ou Emotiva. ter o cargo vai depender da sua perspicácia
c) Apelativa ou Conativa. para encontrar novas qualidades nessa mu-
d) Fática. lher poderosa, absoluta. Diga que ela cozinha
e) Metalinguística. melhor que a sua mãe, que ela tem uma voz

28
que faz você pensar obscenidades, que ela é Há, no texto, o predomínio da variante co-
um avião no mundo dos negócios. loquial da língua. O único trecho abaixo que
Fale sobre sua competência, seu senso de NÃO corrobora com essa afirmativa é:
oportunidade, seu bom gosto musical. a) “Nunca teve um chilique.”
Agora quer ver o mundo cair? b) “Descreve aí uma mulher boazinha.”
Diga que ela é muito boazinha. c) “Pitchulinha é coisa de retardada.”
Descreva aí uma mulher boazinha. d) “Ser boa é bom, ser boazinha é péssimo.”
Voz fina, roupas pastel, calçados rente ao chão.
Aceita encomendas de doces, contribui para a 2. (Epcar) O Sal da Terra
igreja, cuida dos sobrinhos nos finais de se-
mana. Anda!
Disponível, serena, previsível, nunca foi vis- Quero te dizer nenhum segredo
ta negando um favor. Falo desse chão, da nossa casa
Nunca teve um chilique. Vem que tá na hora de arrumar
Nunca colocou os pés num show de rock. Tempo!
É queridinha. Quero viver mais duzentos anos
Pequeninha. Quero não ferir meu semelhante
Educadinha. Nem por isso quero me ferir
Enfim, uma mulher boazinha.
Fomos boazinhas por séculos. Vamos precisar de todo mundo
Engolíamos tudo e fingíamos não ver nada, Pra banir do mundo a opressão
ceguinhas. Para construir a vida nova
Vamos precisar de muito amor
Vivíamos no nosso mundinho, rodeadas de
A felicidade mora ao lado
panelinhas e nenezinhos.
E quem não é tolo pode ver
A vida feminina era esse frege: bordados,
paredes brancas, crucifixo em cima da cama, A paz na Terra, amor
tudo certinho. O pé na terra
Passamos um tempão assim, comportadi- A paz na Terra, amor
nhas, enquanto íamos alimentando um de- O sal da
sejo incontrolável de virar a mesa.
Quietinhas, mas inquietas. Terra!
Até que chegou o dia em que deixamos de És o mais bonito dos planetas
ser as coitadinhas. Tão te maltratando por dinheiro
Ninguém mais fala em namoradinhas do Tu que és a nave nossa irmã
Brasil: somos atrizes, estrelas, profissionais. Canta!
Adolescentes não são mais brotinhos: são Leva tua vida em harmonia
garotas da geração teen. E nos alimenta com seus frutos
Ser chamada de patricinha é ofensa mortal. Tu que és do homem, a maçã
Pitchulinha é coisa de retardada.
Quem gosta de diminutivos, definha. Vamos precisar de todo mundo
Ser boazinha não tem nada a ver com ser ge- Um mais um é sempre mais que dois
Pra melhor juntar as nossas forças
nerosa.
É só repartir melhor o pão
Ser boa é bom, ser boazinha é péssimo.
Recriar o paraíso agora
As boazinhas não têm defeitos.
Para merecer quem vem depois
Não têm atitude.
Conformam-se com a coadjuvância. Deixa nascer, o amor
PH neutro. Deixa fluir, o amor
Ser chamada de boazinha, mesmo com a me- Deixa crescer, o amor
lhor das intenções, é o pior dos desaforos. Deixa viver, o amor
Mulheres bacanas, complicadas, batalhado- O sal da terra
GUEDES, Beto. Disponível em: www.mundojovem.com.br/
ras, persistentes, ciumentas, apressadas, é musicas/o-sal-da-terra-beto-guedestransito.
isso que somos hoje. Acesso em: 18/04/2016.
Merecemos adjetivos velozes, produtivos,
enigmáticos.
As “inhas” não moram mais aqui.
Foram para o espaço, sozinhas.
(Disponível em: http://pensador.uol.com.br/
frase/NTc1ODIy. Acesso em 28/03/14)

29
Assinale a opção que contém uma informa- criança, a receita, simples indicação de uma
ção correta sobre a canção “O Sal da Terra”. fórmula, mostra como preparar um alimento;
a) A função apelativa é predominante no texto. b) pela composição da mensagem − I admite
b) Apenas a linguagem padrão foi empregada ilustração, a receita não admitiria.
em toda a canção. c) não podem ser aproximados sob nenhum cri-
c) Foi utilizado, no texto, apenas pronome de se- tério, pois, fazendo parte de universos ab-
gunda pessoa gramatical para se referir à Terra. solutamente distintos − como o comprovam
d) A canção foi escrita apenas para dois interlo- tanto o assunto de cada um, quanto o estilo
cutores: a Terra e o Tempo. adotado em cada um deles −, jamais estarão
inseridos em contextos comunicativos iguais
ou somente parecidos.
3. (Puccamp)
d) apresentam traços distintos em sua com-
TEXTO I posição, como se nota pelo emprego do im-
perativo (em I) e do infinitivo (na receita);
CAPÍTULO 8 entretanto, essa específica diferença não
AS EXTREMIDADES impede o reconhecimento de que partilham
a mesma finalidade de instruir o receptor.
8.4 OS PÉS e) implicam obrigatoriedade do interlocutor em
cumprir o que está minuciosamente descrito
2. O limpador de para-brisas
em cada um dos textos, mas distinguem-se:
Posição: sentada com os braços atrás do cor-
em I, a prática vem investida de caráter lú-
po e as mãos apoiadas no chão
dico, pelo tipo específico de destinatário da
− Gire os tornozelos para dentro e para fora;
mensagem, enquanto a receita remete a ati-
− Levante e abaixe os calcanhares mantendo
as barrigas das pernas no chão (os dois jun- vidade rotineira e desgastante.
tos; depois um de cada vez).
4. (IFCE) Leia os textos a seguir.

Texto I

Nova Poética
Manuel Bandeira

Vou lançar a teoria do poeta sórdido.


Poeta sórdido:
Aquele em cuja poesia há a marca suja da
vida.
TEXTO II Vai um sujeito,
Sai um sujeito de casa com a roupa de brim
RECEITA DE ARROZ-DOCE TRADICIONAL branco
INGREDIENTES [muito bem engomada, e na primeira esqui-
1 litro e meio de leite na passa um
2 xícaras de arroz branco (já lavado) [caminhão, salpica-lhe o paletó ou a calça de
3 xícaras de açúcar uma nódoa de lama:
Canela em pau (uso e quantidade a gosto) É a vida
1 lata de leite condensado O poema deve ser como a nódoa no brim:
Fazer o leitor satisfeito de si dar o desespero
MODO DE PREPARO [...]
Cozinhar o arroz no leite, juntamente com a
canela. Texto II
20 minutos depois, mexer de tempos em A característica da oralidade radiofônica, en-
tempos, acrescentar o açúcar, deixar mais tão, seria aquela que propõe o diálogo com
20 minutos e logo em seguida acrescentar o o ouvinte: a simplicidade, no sentido da es-
leite condensado e deixar mais 20 minutos.
colha lexical; a concisão e coerência, que se
Colocar em uma linda travessa.
traduzem em um texto curto, em linguagem
Levando em conta os gêneros dos textos, é coloquial e com organização direta; e o ritmo,
correto afirmar: O texto I e o texto II marcado pelo locutor, que deve ser o mais na-
a) têm como objetivo sugerir ao leitor a reali- tural (do diálogo). É esta organização que vai
zação de uma tarefa, apresentando o passo “reger” a veiculação da mensagem, seja ela
a passo da atividade; em ambos os casos, o interpretada ou de improviso, com objetivo
executor não tem espaço para livre escolha. de dar melodia à transmissão oral, dar emo-
b) distinguem-se totalmente: a) pela intenção ção, personalidade ao relato de fato.
da mensagem − I busca informar o interlo- (VELHO, A. P. M. A linguagem do rádio multimídia.
cutor acerca de cuidados com a saúde da Disponível em: www.bocc.ubi.pt. Acesso em 15/01/2017)

30
Encontramos nos textos I e II, respectiva- 6. (Epcar)
mente, as funções
a) conotativa e fática. FAVELÁRIO NACIONAL
b) metalinguística e referencial. (Carlos Drummond de Andrade)
c) emotiva e referencial.
d) fática e conotativa. Quem sou eu para te cantar, favela,
e) poética e conotativa. Que cantas em mim e para ninguém
a noite inteira de sexta-feira
5. (IFCE) Leia os textos abaixo e indique a e a noite inteira de sábado
alternativa que contém, respectivamente, a E nos desconheces, como igualmente não te
classificação correta quanto à função da lin- conhecemos?
guagem neles predominante. Sei apenas do teu mau cheiro:
Texto I Baixou em mim na viração,
“Entendo que poesia é negócio de grande direto, rápido, telegrama nasal
responsabilidade, e não considero honesto anunciando morte... melhor, tua vida.
rotular-se de poeta quem apenas verseje por ...
dor de cotovelo, falta de dinheiro ou mo- Aqui só vive gente, bicho nenhum
mentânea tomada de contato com as forças tem essa coragem.
líricas do mundo, sem se entregar aos tra- ...
balhos cotidianos e secretos da técnica, da Tenho medo. Medo de ti, sem te conhecer,
leitura, da contemplação e mesmo da ação.
Medo só de te sentir, encravada
Até os poetas se armam, um poeta desarma-
Favela, erisipela, mal do monte
do é, mesmo, um ser à mercê de inspirações
fáceis, dócil às modas e compromissos.” Na coxa flava do Rio de Janeiro.
(Carlos Drummond de Andrade) Medo: não de tua lâmina nem de teu revólver
nem de tua manha nem de teu olhar.
Texto II Medo de que sintas como sou culpado
“Quando criança, e depois adolescente, fui e culpados somos de pouca ou nenhuma ir-
precoce em muitas coisas. Em sentir um am- mandade.
biente, por exemplo, em apreender a atmos-
Custa ser irmão,
fera íntima de uma pessoa. Por outro lado,
longe de precoce, estava em incrível atraso custa abandonar nossos privilégios
em relação a outras coisas importantes. Con- e traçar a planta
tinuo, aliás, atrasada em muitos terrenos. da justa igualdade.
Nada posso fazer: parece que há em mim um Somos desiguais
lado infantil que não cresce jamais”. e queremos ser
(Clarice Lispector) sempre desiguais.
E queremos ser
Texto III
bonzinhos benévolos
comedidamente
sociologicamente
mui bem comportados.
Mas, favela, ciao,
que este nosso papo
está ficando tão desagradável.
vês que perdi o tom e a empáfia do começo?
...
(ANDRADE, Carlos Drummond de, Corpo.
Rio de Janeiro: Record. 1984)

Nos versos: “Mas, favela, ciao, / que este


nosso papo / está ficando tão desagradável
a) Referencial – apelativa – poética. / vês que perdi o tom e a empáfia do come-
b) Fática – poética – apelativa. ço?”, verifica-se a presença das funções de
c) Metalinguística – emotiva – poética. linguagem
d) Poética – metalinguística – emotiva. a) apelativa e referencial.
e) Metalinguística – referencial – emotiva.
b) poética e referencial.
c) metalinguística e apelativa.
d) fática e emotiva.

31
7. (Epcar) O BOM HUMOR FAZ BEM PARA SAÚDE necessária e faz parte da natureza humana.
O humor pode variar da depressão (o extre-
O bom humor é, antes de tudo, a expressão mo da tristeza) até a mania (o máximo da
de que o corpo está bem euforia). Esses dois estados são manifesta-
(Por Fábio Peixoto) ções de doenças e devem ser tratados com a
ajuda de psiquiatras e remédios que regulam
“Procure ver o lado bom das coisas ruins.”
a produção de substâncias no cérebro. Uma
Essa frase poderia estar em qualquer livro de
em cada quatro pessoas tem, durante a vida,
auto ajuda ou parecer um conselho bobo de
pelo menos um caso de depressão que mere-
um mestre de artes marciais saído de algum
ceria tratamento psiquiátrico.
filme ruim. Mas, segundo os especialistas
Enquanto as consequências deletérias do
que estudam o humor a sério, trata-se do
mau humor são estudadas há décadas, não
maior segredo para viver bem.
faz muito tempo que a comunidade científi-
(...)
ca passou a pesquisar os efeitos benéficos do
O bom humor é, antes de tudo, a expressão de
bom humor. O interesse no assunto surgiu há
que o corpo está bem. Ele depende de fato-
vinte anos, quando o editor norte-americano
res físicos e culturais e varia de acordo com a
Norman Cousins publicou o livro Anatomia
personalidade e a formação de cada um. Mas,
de uma Doença, contando um impressionan-
mesmo sendo o resultado de uma combina-
te caso de cura pelo riso. Nos anos 60, ele
ção de ingredientes, pode ser ajudado com
contraiu uma doença degenerativa que ata-
uma visão otimista do mundo. “Um indivíduo ca a coluna vertebral, chamada espondilite
bem-humorado sofre menos porque produz ancilosa, e sua chance de sobreviver era de
mais endorfina, um hormônio que relaxa”, apenas uma em quinhentas.
diz o clínico geral Antônio Carlos Lopes, da Em vez de ficar no hospital esperando para
Universidade Federal de São Paulo. Mais do virar estatística, ele resolveu sair e se hos-
que isso: a endorfina aumenta a tendência de pedar num hotel das redondezas, com au-
ter bom humor. Ou seja, quanto mais bem- torização dos médicos. Sob os atentos olhos
-humorado você está, maior o seu bem-estar de uma enfermeira, com quase todo o cor-
e, consequentemente, mais bem-humorado po paralisado, Cousins reunia os amigos
você fica. Eis aqui um círculo virtuoso, que para assistir a programas de “pegadinhas”
Lopes prefere chamar de “feedback positivo”. e seriados cômicos na TV. Gradualmente foi
A endorfina também controla a pressão san- se recuperando até poder voltar a viver e a
guínea, melhora o sono e o desempenho sexu- trabalhar normalmente. Cousins morreu em
al. (Agora você se interessou, né?) 1990, aos 75 anos. Se Cousins saiu do hos-
Mas, mesmo que não houvesse tantos benefí- pital em busca do humor, hoje há muitos
cios no bom humor, os efeitos do mau humor profissionais de saúde que defendem a en-
sobre o corpo já seriam suficientes para jus- trada das risadas no dia a dia dos pacientes
tificar uma busca incessante de motivos para internados.
ficar feliz. Novamente Lopes explica por quê: Uma boa gargalhada é um método ótimo de
“O indivíduo mal-humorado fica angustiado, relaxamento muscular. Isso ocorre porque os
o que provoca a liberação no corpo de hor- músculos não envolvidos no riso tendem a
mônios como a adrenalina. Isso causa palpi- se soltar – está aí a explicação para quando
tação, arritmia cardíaca, mãos frias, dor de as pernas ficam bambas de tanto rir ou para
cabeça, dificuldades na digestão e irritabi- quando a bexiga se esvazia inadvertidamen-
lidade”. A vítima acaba maltratando os ou- te depois daquela piada genial. Quando a
tros porque não está bem, sente-se culpada e risada acaba, o que surge é uma calmaria ge-
fica com um humor pior ainda. Essa situação ral. Além disso, se é certo que a tristeza aba-
pode ser desencadeada por pequenas tragé- la o sistema imunológico, sabe-se também
dias cotidianas – como um trabalho inaca- que a endorfina, liberada durante o riso,
bado ou uma conta para pagar –, que só são melhora a circulação e a eficácia das defesas
trágicas porque as encaramos desse modo. do organismo. A alegria também aumenta a
Evidentemente, nem sempre dá para achar capacidade de resistir à dor, graças também
graça em tudo. Há situações em que a tris- à endorfina.
teza é inevitável – e é bom que seja assim. Evidências como essa fundamentam o traba-
“Você precisa de tristeza e de alegria para lho dos Doutores da Alegria, que já visitaram
ter um convívio social adequado”, diz o psi- 170.000 crianças em hospitais. As invasões
quiatra Teng Chei Tung, do Hospital das Clí- de quartos e UTIs feitas por 25 atores ves-
nicas de São Paulo. “A alegria favorece a in- tidos de “palhaços-médicos” não apenas
tegração e a tristeza propicia a introspecção aceleram a recuperação das crianças, mas
e o amadurecimento.” Temos de saber lidar motivam os médicos e os pais. A psicóloga
com a flutuação entre esses estágios, que é Morgana Masetti acompanha os Doutores há

32
sete anos. “É evidente que o trabalho diminui a medicação para os pacientes”, diz ela.
O princípio que torna os Doutores da Alegria engraçados tem a ver com a flexibilidade de pen-
samento defendida pelos especialistas em humor – aquela ideia de ver as coisas pelo lado bom.
“O clown não segue a lógica à qual estamos acostumados”, diz Morgana. “Ele pode passar por um
balcão de enfermagem e pedir uma pizza ou multar as macas por excesso de velocidade.” Para se
tornar um membro dos Doutores da Alegria, o ator passa num curioso teste de autoconhecimento:
reconhece o que há de ridículo em si mesmo e ri disso. “Um clown não tem medo de errar – pelo
contrário, ele se diverte com isso”, diz Morgana. Nem é preciso mencionar quanto mais de saúde
haveria no mundo se todos aprendêssemos a fazer o mesmo.
(Disponível em: super.abril.com.br/saúde/bom-humor-faz-bem-saude-441550.shtml. Acesso em: 11 de abril de 2015.)

Assinale a alternativa que associa corretamente o trecho do texto à função da linguagem em pre-
dominância.
a) “Procure ver o lado bom das coisas ruins.” – (Função Emotiva)
b) “Um indivíduo bem-humorado sofre menos porque produz mais endorfina...” – (Função Conativa)
c) “Agora você se interessou, né?” – (Função Fática)
d) “Nos anos 60, ele contraiu uma doença degenerativa que ataca a coluna vertebral ...” – (Função Ex-
pressiva)

8. (IFPE) Responda à questão com base na tirinha abaixo.

No último balão da tirinha de Maurício de Sousa, o autor escreveu “mais” em vez de “mas” na
tentativa de representar, na escrita, a forma como a personagem Chico Bento, supostamente,
pronunciaria a conjunção adversativa. Existem diversas formas e níveis de variação linguística,
justamente porque somos influenciados por diversos fatores, tais como: região, escolaridade, faixa
etária, contexto comunicativo, papel social etc.
Com base nesses pressupostos, assinale a alternativa que representa uma variante linguística ca-
racterística do falar popular mineiro.
a) “Aquele fi duma égua só me deixou aperreado”.
b) “Protesto, meritíssimo! A testemunha não havia falado da agressão.”
c) “Capaz, guri! Só tava de bobeira contigo, bagual!”
d) “Uai? Cê já chegô, sô? Peraí, que eu já tô saíno!”
e) “Aquela mina é firmeza, mano!”

9. (Uff) Começou a fazer vento com nois dois a palestrar


TEXTO I Filomena ficou beba de tanto se balançar
A Rede Veia Eu vi o punho da rede começar a se quebrar
Luiz Queiroga e Cel. Ludugero A rede veia comeu foi fogo
Só com nois dois pra lá e pra cá
Eu tava com a Felomena A rede tava rasgada e eu tive a impressão
Ela quis se refrescar Que com tanto balançado nois terminava no chão
O calor tava malvado Mas Felomena me disse, meu bem vem mais
Ninguém podia aguentar pra cá
Ela disse meu Lundru A rede veia comeu foi fogo
Nós vamos se balançar Foi com nois dois pra lá e pra cá
Disponível em http://www.luizluagonzaga.mus.br/index.
A rede veia comeu foi fogo
php?option=com_content&task=view&id=&&&Itemid= 103
Foi com nois dois pra lá e pra cá Acessado em: 02 ago 2011.

33
TEXTO II TEXTO IV
Pescaria Nina
Dorival Caymmi Chico Buarque

Ô canoeiro, Nina diz que tem a pele cor de neve


bota a rede, E dois olhos negros como o breu
bota a rede no mar Nina diz que, embora nova
ô canoeiro, Por amores já chorou
bota a rede no mar. Que nem viúva
Cerca o peixe, Mas acabou, esqueceu
bate o remo,
puxa a corda, Nina adora viajar, mas não se atreve
colhe a rede, Num país distante como o meu
ô canoeiro, Nina diz que fez meu mapa
puxa a rede do mar. E no céu o meu destino rapta
Vai ter presente pra Chiquinha O seu
ter presente pra laiá,
Nina diz que se quiser eu posso ver na tela
canoeiro, puxa a rede do mar.
A cidade, o bairro, a chaminé da casa dela
Cerca o peixe,
bate o remo, Posso imaginar por dentro a casa
puxa a corda, A roupa que ela usa, as mechas, a tiara
colhe a rede, Posso até adivinhar a cara que ela faz
ô canoeiro, Quando me escreve
puxa a rede do mar. Nina anseia por me conhecer em breve
Louvado seja Deus, Me levar para a noite de Moscou
ó meu pai. Sempre que esta valsa toca
Disponível em: http://www.miltonnascimento. Fecho os olhos, bebo alguma vodca
com.br/#/obra. Acessado em: 02 ago 2011. E vou
Disponível em: http://www.chicobuarque.com.br/
TEXTO III construcao/mestre.asp?pg=nina_2011.htm
A Rede Acessado em: 02 ago 2011.
Lenine e Lula Queiroga
Uma língua varia em função de aspectos
Nenhum aquário é maior do que o mar sociais, localização geográfica e uso de di-
Mas o mar espelhado em seus olhos ferentes registros, ligados às situações de
Maior me causa o efeito comunicação.
De concha no ouvido Marque a alternativa que analisa correta-
Barulho de mar mente a ocorrência de variação linguística
Pipoco de onda nos textos.
Ribombo de espuma e sal a) O verso “Nós vamos se balançar” (Texto 1,
Nenhuma taça me mata a sede linha 6) apresenta um exemplo da modalida-
Mas o sarrabulho me embriaga de culta da língua, revelada no emprego dos
Mergulho na onda vaga pronomes.
E eu caio na rede, b) No verso “A rede veia comeu foi fogo” (Texto
Não tem quem não caia 1, linha 7), a grafia da palavra sublinhada
E eu caio na rede, procura reproduzir pronúncia comum em
Não tem quem não caia algumas regiões do Brasil (veia por velha),
que exemplifica uma variação fonética.
Às vezes eu penso que sai dos teus olhos o
feixe c) Em: “E eu caio na rede / Não tem quem não
De raios que controla a onda cerebral do peixe caia” (Texto III, linhas 11 – 12), o emprego
do verbo ter é marca do registro culto da
Nenhuma rede é maior do que o mar língua, utilizado preferencialmente na mo-
Nem quando ultrapassa o tamanho da Terra dalidade escrita.
Nem quando ela acerta, d) Em: “Vai ter presente pra Chiquinha” (Texto
Nem quando ela erra II, linha 12), o nome “Chiquinha” exemplifi-
Nem quando ela envolve todo o Planeta ca o uso do registro informal, utilizado, so-
Explode e devolve pro seu olhar bretudo, em documentos oficiais e sermões
O tanto de tudo que eu tô pra te dar religiosos.
Se a rede é maior do que o meu amor e) No verso: “Posso até adivinhar a cara que
Não tem quem me prove ela faz” (Texto IV, linha 16) a palavra cara
Se a rede é maior do que o meu amor exemplifica uma variação de registro linguís-
Não tem quem me prove tico predominante em situações formais.
Disponível em: http://www.lenine.com.br/faixa/a-rede-1
Acessado em: 02 ago 2011.

34
1
0. (ITA) Gosto de olhar as capas das revistas para ser promovido no trabalho? Nada. 5Di-
populares no supermercado nestes tempos cas culturais de leitura, filmes, música, en-
de corrida do ouro da classe C. A classe C é tão, nem pensar.
uma versão sem neve e de biquíni do Yukon Cada vez que vejo pesquisas dizendo que a
do tio Patinhas quando jovem pato. Lembro mídia impressa está em baixa penso nestas
do futuro milionário disneyano enfrentando revistas. A internet oferece grátis à classe
a nevasca paraobter suas primeiras patacas. C um cardápio ainda pobre, mas bem mais
Era preciso conquistar aquele território com farto. Será que a nova classe média quer
a mesma sofreguidão com que se busca, ago- realmente ler estas revistas? A vendagem
ra, fincar a bandeira do consumo no seio dos delas é razoável, mas nada impressionante.
emergentes brasileiros. São todas inspiradas nas revistas populares
Em termos jornalísticos, é sempre aquela inglesas, cuja campeã é a “Take a Break”. A
concepção de não oferecer o biscoito fino fórmula é a mesmade uma “Sou + Eu”: die-
para a massa. É preciso dar o que a classe C tas, histórias reais de sucesso ou escabrosas
quer ler – ou o que se convencionou a pensar e distribuição de prêmios. Além deste tipo
que ela quer ler. Daí as políticas de didatis- de abordagem também fazem sucesso as pu-
mo nas redações, com o objetivo de deixar blicações de fofocas de celebridades ou sobre
o texto mastigado para o leitor e tornar es- programas de TV – aqui, as novelas.
tanque a informação dada ali. Como se não Sei que deve ser utopia, mas gostaria de
fosse interessante que, ao não compreender ver publicações para a classe C que ensinas-
algo, ele fosse beber em outras fontes. 1Hoje, sem as pessoas a se alimentar melhor, que
com a Internet, é facílimo, está ao alcance mostrassem como a obesidade anda perigo-
da vista de quase todo mundo. sa no Brasil porque se come mal. Atacando,
Outro aspecto é seguir ao pé da letra o que inclusive, refrigerantes, redes de fast food
dizem as pesquisas na hora de confeccionar e guloseimas, sem se preocupar em perder
uma revista popular. Tomemos como exem- anunciantes. Que priorizassem não as die-
plo a pesquisa feita por uma grande editora tas, mas a educação alimentar e a importân-
sobre “a mulher da classe C” ou “nova classe cia de fazer exercícios e de levar uma vida
média”. Lá, ficamos sabendo que: a mulher saudável. Gostaria de ver reportagens ensi-
da classe C vai consumir cada vez mais ar- nando as mulheres da classe C a se sentirem
tigos de decoração e vai investir na reforma bem com seu próprio cabelo, muitas vezes
de casa; que ela gasta muito com beleza, so- cacheado, em vez de simplesmente copiarem
bretudo o cabelo; que está preocupada com as famosas. Que mostrassem como é possível
a alimentação; e que quer ascender social e se vestir bem gastando pouco, sem se impor-
profissionalmente. É com base nestes núme- tar com marcas.
ros que 2a editora oferece o produto – a re- Gostaria de ler reportagens nas revistas para
vista – ao mercado de anunciantes. Normal. a classe C alertando os pais para que vejam
Mas no que se transformam, para o leitor, menos televisão e convivam mais com os
estes dados? Preocupação com alimentação? filhos. Que falassem da necessidade de ti-
Dietas amalucadas? A principal chamada de rar as crianças do computador e de levá-las
capa destas revistas é alguma coisa esdrúxu- para passear ao ar livre. Que tivessem dicas
la como: “perdi 30 kg com fibras naturais”, de livros, notícias sobre o mundo, ciências,
“sequei 22 quilos com cápsulas de centelha artes – é possível transformar tudo isso em
asiática”, “emagreci 27 kg com florais de informação acessível e não apenas para co-
Bach e colágeno”, “fiquei magra com a dieta nhecedores, como se a cultura fosse patri-
da aveia” ou “perdi 20 quilos só comendo mônio das classes A e B. Gostaria, enfim, de
linhaça”. Pelo amor de Deus, quem é que vai ver revistas populares que fossem feitas para
passar o dia comendo linhaça? 3Estão con- ler de verdade, e que fizessem refletir. Mas
fundindo a classe C com passarinho, só pode. a quem interessa que a classe C tenha suas
Quer reformar a casa? Nada de dicas de de- próprias ideias?
coração baratas e de bom gosto. O objetivo é
(Cynara Menezes, 15/07/2011, em: http://www.
ensinar como tomar empréstimo e comprar cartacapital.com.br/politica/o-que-quer-a-classe-c)
móveis em parcelas. Ou então alguma coisa
“criativa” que ninguém vai fazer, 4tipo uma Das opções abaixo, a única que não apresen-
parede toda de filtros de café usados. Juro ta linguagem informal é
que li isso. A parte de ascensão profissional a) Hoje, com a Internet, é facílimo, está ao al-
vem em matérias como “fiquei famosa ven- cance da vista de quase todo mundo. (ref.1)
dendo bombons de chocolate feitos em casa” b) [...] a editora oferece o produto – a revista –
ou “lucro 2500 reais por mês com meus do- ao mercado de anunciantes. Normal. (ref.2)
ces”. Falar das possibilidades de voltar a es- c) Estão confundindo a classe C com passari-
tudar, de ter uma carreira ou se especializar nho, só pode. (ref.3)

35
d) [...] tipo uma parede toda de filtros de café trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou
usados. [...]. (ref.4) por outros meios, todas as oportunidades e
e) Dicas culturais de leitura, filmes, música, facilidades, para preservação de sua saúde
então, nem pensar. (ref.5) física e mental e seu aperfeiçoamento moral,
intelectual, espiritual e social, em condições
de liberdade e dignidade.
E.O. Complementar Art. 4 – Nenhum idoso será objeto de qual-
quer tipo de negligência, discriminação,
1. (Epcar) violência, crueldade ou opressão, e todo
atentado aos seus direitos, por ação ou por
RETRATO omissão, será punido na forma da lei.
(Disponível em: www.planalto.gov.br/ccvil_03/
Eu não tinha este rosto de hoje,
leis/2003/L10.741.htm. Acesso em 15/01/2017.)
Assim calmo, assim triste, assim magro,
Nem estes olhos tão vazios, LEITE DERRAMADO
Nem o lábio amargo
Eu não tinha estas mãos sem força, “Um homem muito velho está num leito de
Tão paradas e frias e mortas; hospital. E desfia a quem quiser ouvir suas
Eu não tinha este coração memórias. Uma saga familiar caracterizada
Que nem se mostra. pela decadência social e econômica, tendo
Eu não dei por esta mudança, como pano de fundo a história do Brasil dos
Tão simples, tão certa, tão fácil: últimos dois séculos.”
– em que espelho ficou perdida Não sei por que você não me alivia a dor.
a minha face? Todo dia a senhora levanta a persiana com
(MEIRELES, Cecília. Obra Poética de Cecília
bruteza e joga sol no meu rosto. Não sei que
Meireles. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1958.) graça pode achar dos meus esgares, é uma
pontada cada vez que respiro. Às vezes as-
piro fundo e encho os pulmões de um ar
ENVELHECER insuportável, para ter alguns segundos de
(Arnaldo Antunes/Ortinho/Marcelo Jeneci)
conforto, expelindo a dor. Mas bem antes
A coisa mais moderna que existe nessa vida da doença e da velhice, talvez minha vida já
é envelhecer fosse um pouco assim, uma dorzinha chata a
A barba vai descendo e os cabelos vão caindo me espetar o tempo todo, e de repente uma
pra cabeça aparecer lambada atroz. Quando perdi minha mulher,
foi atroz. E qualquer coisa que eu recorde
Os filhos vão crescendo e o tempo vai dizen-
agora, vai doer, a memória é uma vasta fe-
do que agora é pra valer
rida. Mas nem assim você me dá os remé-
Os outros vão morrendo e a gente aprenden-
dios, você é meio desumana. Acho que nem
do a esquecer
é da enfermagem, nunca vi essa cara sua por
Não quero morrer pois quero ver como será
aqui. Claro, você é a minha filha que estava
que deve ser envelhecer
na contraluz, me dê um beijo. Eu ia mesmo
Eu quero é viver para ver qual é e dizer ve-
lhe telefonar para me fazer companhia, me
nha pra o que vai acontecer
ler jornais, romances russos. Fica essa tele-
(...)
visão ligada o dia inteiro, as pessoas aqui
não são sociáveis. Não estou me queixando
Pois ser eternamente adolescente nada é de nada, seria uma ingratidão com você e
mais *démodé com os ralos fios de cabelo com o seu filho. Mas se o garotão está tão
sobre a rico, não sei por que diabos não me interna
[testa que não para de crescer em uma casa de saúde tradicional, de reli-
Não sei por que essa gente vira a cara pro giosas. Eu próprio poderia arcar com viagem
presente e esquece de aprender e tratamento no estrangeiro, se o seu marido
Que felizmente ou infelizmente sempre o não me tivesse arruinado.
tempo vai correr. (BUARQUE, Chico. Leite derramado. São Paulo:
(...) Companhia das Letras, 2009, p. 10-11.)

Nos textos em geral, manifestam-se simulta-


*démodé: fora de moda
neamente várias funções da linguagem. No
entanto, sempre há o predomínio de uma
ESTATUTO DO IDOSO (fragmentos)
sobre as outras. Após a leitura dos textos,
Art. 2 – O idoso goza de todos os direitos assinale a alternativa correta.
fundamentais inerentes à pessoa humana, a) No texto, “Estatuto do Idoso”, a função da
sem prejuízo da proteção integral de que linguagem predominante é a metalinguística,

36
porque há uma explicação do código, o qual aniversário e batizado. Ao juiz devo muito do
é o foco do discurso. pouco que sei, a essas conversas noturnas no
b) O texto “Envelhecer” tem o canal como ele- passeio de sua casa; devo-lhe respeito e gra-
mento de destaque, logo o predomínio é da tidão. Quando ele, com a voz solene e o gesto
função fática da linguagem. preciso, esclarece-me uma dúvida, naquele
c) O referente é o elemento que se sobressai momento tudo parece-me claro e fácil, ne-
sobre os demais no trecho do livro "Leite nhuma objeção me assalta. Depois que o dei-
derramado", caracterizando o predomínio da xo, porém, e ponho-me a pensar no assunto,
função informativa sobre a poética. vão-se a facilidade e a evidência, como, por
d) A função poética se destaca no poema "Re- exemplo, nesse caso da verdade. Volta tudo
trato", tendo em vista a preocupação do a ser obscuro e difícil, busco recordar as ex-
enunciador em enfatizar a mensagem. plicações do meritíssimo e não consigo. Uma
trapalhada. Mas, como duvidar da palavra de
2. (IFCE) De como o narrador, com certa expe- homem de tanto saber, as estantes entulha-
riência anterior e agradável, dispõe-se a re- das de livros, códigos e tratados? No entan-
tirar a verdade do fundo do poço. to, por mais que ele me explique tratar-se
apenas de um provérbio popular, muitas ve-
zes encontro-me a pensar nesse poço, certa-
Minha intenção, minha única intenção,
mente profundo e escuro, onde foi a verdade
acreditem! é apenas restabelecer a verdade.
esconder sua nudez, deixando-nos na maior
A verdade completa, de tal maneira que ne-
das confusões, a discutir a propósito de um
nhuma dúvida persista em torno do coman-
tudo ou de um nada, causando-nos a ruína,
dante Vasco Moscoso de Aragão e de suas ex-
o desespero e a guerra.
traordinárias aventuras.
Poço não é poço, fundo de um poço não é o
fundo de um poço, na voz do provérbio isso
“A verdade está no fundo de um poço”, li
significa que a verdade é difícil de revelar-
certa vez, não me lembro mais se num livro
-se, sua nudez não se exibe na praça pública
ou num artigo de jornal. Em todo caso, em
ao alcance de qualquer mortal. Mas é o nosso
letra de forma, e como duvidar de afirma-
dever, de todos nós, procurar a verdade de
ção impressa? Eu, pelo menos, não costumo
cada fato, mergulhar na escuridão do poço
discutir, muito menos negar, a literatura e
até encontrar sua luz divina.
o jornalismo. E, como se isso não bastasse,
“Luz divina” é do juiz, como aliás todo o
várias pessoas gradas repetiram-me a frase,
parágrafo anterior. Ele é tão culto que fala
não deixando sequer margem para um erro em tom de discurso, gastando palavras bo-
de revisão a retirar a verdade do poço, a si- nitas, mesmo nas conversas familiares com
tuá-la em melhor abrigo: paço (“a verdade sua digníssima esposa, dona Ernestina. “A
está no paço real”) ou colo (“a verdade se es- verdade é o farol que ilumina minha vida”,
conde no colo das mulheres belas”), polo (“a costuma repetir-se o meritíssimo, de dedo
verdade fugiu para o Polo Norte”) ou povo em riste, quando, à noite, sob um céu de in-
(“a verdade está com o povo”). Frases, todas contáveis estrelas e pouca luz elétrica, con-
elas, parece-me, menos grosseiras, mais ele- versamos sobre as novidades do mundo e de
gantes, sem deixar essa obscura sensação de nosso subúrbio. Dona Ernestina, gordíssima,
abandono e frio inerente à palavra “poço”. lustrosa de suor e um tanto quanto débil
O meritíssimo dr. Siqueira, juiz aposentado, mental, concorda balançando a cabeça de
respeitável e probo cidadão, de lustrosa e elefante. Um farol de luz poderosa, ilumi-
erudita careca, explicou-me tratar-se de um nando longe, eis a verdade do nobre juiz de
lugar-comum, ou seja, coisa tão clara e sabi- direito aposentado.
da a ponto de transformar-se num provérbio, Talvez por isso mesmo sua luz não penetre
num dito de todo mundo. Com sua voz grave, nos escaninhos mais próximos, nas ruas de
de inapelável sentença, acrescentou curioso canto, no escondido beco das Três Borboletas
detalhe: não só a verdade está no fundo de onde se abriga, na discreta meia-sombra de
um poço, mas lá se encontra inteiramente uma casinha entre árvores, a formosa e riso-
nua, sem nenhum véu a cobrir-lhe o corpo, nha mulata Dondoca, cujos pais procuraram
sequer as partes vergonhosas. No fundo do o meritíssimo quando Zé Canjiquinha desa-
poço e nua. pareceu da circulação, viajando para o sul.
Dr. Alberto Siqueira é o cimo, o ponto culmi- Passara Dondoca nos peitos, na frase pito-
nante da cultura nesse subúrbio de Periperi resca do velho Pedro Torresmo, pai aflito, e
onde habitamos. É ele quem pronuncia o dis- largara a menina ali, sem honra e sem di-
curso do Dois de Julho na pequena praça e o nheiro:
de Sete de Setembro no grupo escolar, sem – No miserê, doutor juiz, no miserê...
falar noutras datas menores e em brindes de O juiz deitou discurso moral, coisa digna de

37
ouvir-se, prometeu providências. E, à vista um poço não é o fundo de um poço, na voz
do tocante quadro da vítima a sorrir entre do provérbio isso significa que a verdade é
lágrimas, afrouxou um dinheirinho, pois, difícil de revelar-se, sua nudez não se exi-
sob o peito duro da camisa engomada do be na praça pública ao alcance de qualquer
magistrado, pulsa, por mais difícil que seja mortal.” prevalece a seguinte função da lin-
acreditar-se, pulsa um bondoso coração. Pro- guagem:
meteu expedir ordem de busca e apreensão a) conativa ou apelativa.
do “sórdido dom-juan”, esquecendo-se, no b) expressiva ou emotiva.
entusiasmo pela causa da virtude ofendida, c) fática.
de sua condição de aposentado, sem promo- d) referencial ou informativa.
tor nem delegado às ordens. Interessaria no e) metalinguística.
caso, igualmente, seus amigos da cidade. O
“conquistador barato” teria a paga mereci- 3. (IFCE) Seria o fogo em minha casa? Corre-
da... riam risco de arder todos os meus manus-
E foi ele próprio, tão cônscio é o dr. Siqueira critos, toda a expressão de toda a minha
de suas responsabilidades de juiz (embora vida? Sempre que esta ideia, antigamente,
aposentado), dar notícias das providências à simplesmente me ocorrera, um pavor enor-
família ofendida e pobre, na moradia distan- me me fazia estarrecer. E agora reparei de
te. Dormia Pedro Torresmo, curando a cacha- repente, não sei já se com pasmo ou sem
ça da véspera; labutava no quintal, lavando pasmo, não sei dizer se com pavor ou não,
roupa, a magra Eufrásia, mãe da vítima, e a que me não importaria que ardessem. Que
própria cuidava do fogão. 13Desabrochou um fonte – que fonte secreta mas tão minha – se
sorriso nos lábios carnudos de Dondoca, tí- me havia secado na alma?
mido mas expressivo, o juiz fitou-a austero, (Fernando Pessoa: Barão de Teive: a educação do insólito.)
tomou-lhe da mão:
– Venho pra repreendê-la... As interrogações como autoquestionamento
– Eu não queria. Foi ele... – choramingou a e o emprego da primeira pessoa do singular,
formosa. de verbos no futuro do pretérito, elaborando
– Muito malfeito – segurava-lhe o braço de hipóteses, são marcas textuais referentes
carne rija. a) a uma busca de testar a eficiência do canal
Desfez-se ela em lágrimas arrependidas e o de comunicação, medindo o nível do contato
juiz, para melhor repreendê-la e aconselhá- no ambiente comunicativo, e caracterizam a
-la, sentou-a no colo, acariciou-lhe as faces, função fática da linguagem.
beliscou-lhe os braços. Admirável quadro: a b) ao apelo à atenção ou tentativa de persua-
severidade implacável do magistrado tempe- são dirigida ao decodificador da mensagem,
rada pela bondade compreensiva do homem. e caracterizam a função conativa ou apelati-
Escondeu Dondoca o rosto envergonhado no va da linguagem.
ombro confortador, seus lábios faziam cóce- c) à emotividade ou à expressividade do enun-
gas inocentes no pescoço ilustre. ciador da mensagem, e caracterizam a fun-
Zé Canjiquinha nunca foi encontrado, em ção emotiva ou expressiva da linguagem.
d) à conceituação, à referência e à informação
compensação Dondoca ficou, desde aquela
objetiva do elemento temático da mensa-
bem-sucedida visita sob a proteção da justi-
gem, e caracterizam a função referencial da
ça, anda hoje nos trinques, ganhou a casinha
linguagem.
no beco das Três Borboletas, Pedro Torresmo e) a uma explicação, definição e análise dos ele-
deixou definitivamente de trabalhar. Eis aí mentos do código da mensagem, e caracteri-
uma verdade que o farol do juiz não ilumina, zam a função metalinguística da linguagem.
foi-me necessário mergulhar no poço para
buscá-la. Aliás, para tudo contar, a inteira
4. (ifal) Oficina irritada
verdade, devo acrescentar ter sido agradá-
Eu quero compor um soneto duro
vel, deleitoso mergulho, pois no fundo desse
como poeta algum ousara escrever.
poço estava o colchão de lã de barriguda do
Eu quero pintar um soneto escuro,
leito de Dondoca onde ela me conta – depois
seco, abafado, difícil de ler.
que abandono, por volta das dez da noite, a
prosa erudita do meritíssimo e de sua volu- Quero que meu soneto, no futuro,
mosa consorte – divertidas intimidades do não desperte em ninguém nenhum
preclaro magistrado, infelizmente impró- prazer.
prias para letra de fôrma.
(AMADO, Jorge. Os velhos marinheiros: duas histórias do E que, no seu maligno ar imaturo,
cais da Bahia. 23.ed. São Paulo: Martins, p. 71-73). ao mesmo tempo saiba ser, não ser.

No fragmento: “Poço não é poço, fundo de Esse meu verbo antipático e impuro

38
há de pungir, há de fazer sofrer, vou ganhar um salário decente e 16acho que
tendão de Vênus sob o pedicuro. logo, logo estarei pronta para alugar o meu
próprio cantinho. Decidi: amo as meninas,
Ninguém o lembrará: tiro no muro, mas quero, preciso morar sozinha. Pelo bem
cão mijando no caos, enquanto Arcturo, da nossa amizade.
claro enigma, se deixa surpreender. Para dar uma ideia do caos que é nossa con-
(ANDRADE, Carlos Drummond de. Antologia poética.
vivência, outro dia cheguei em casa e vi re-
39.ed.Rio de Janeiro: Record, 1998. p. 188)
pousando no chão da microssala, repetindo,
Com base na leitura do poema de Carlos no chão da microssala, vários, de novo, vários
Drummond e nos seus conhecimentos acerca objetos. Foi difícil desviar deles. Primeiro, pas-
das funções da linguagem, assinale a alter- sei raspando por um CD do Nando Reis, depois,
nativa correta. quase pisei na caixa do CD do Nando com um
a) Estão presentes as funções poética e me- disco de funk dentro, na caixa do DVD de Sex
talinguística da linguagem, uma vez que o and the City, numa lixa de unha, num papel de
texto chama a atenção para o arranjo singu- bala, num ventiladorzinho portátil, num tênis
lar da mensagem e discute o código. amarelo imundo, num pedaço de papel com
b) Estão presentes as funções fática e poética um número de telefone anotado e em entupi-
da linguagem, pois, no texto, há o teste do dos sacos de roupa suja.
canal e um arranjo singular da mensagem. – A gente precisa comprar uma máquina de
c) Está presente apenas a função poética, já lavar roupa para essa casa! Ou 22tomar vergo-
que o texto, sendo um poema, não permite nha na cara e lavar a roupa! A gente não pode
a presença de outra função da linguagem. achar normal esses sacos estarem no meio da
d) Estão presentes as funções referencial e poé- sala há uma semana! – reclamei, antes de di-
tica, porque, no texto, a atenção recai tanto zer boa-noite para as minhas amigas.
sobre o referente quanto sobre a mensagem. – Não cabe máquina de lavar aqui no aparta-
e) Estão presentes as funções poética e cona- mento – disseram-me as duas calmamente.
tiva, já que há uma centralidade, ao mesmo A casa estava um horror.
tempo, na mensagem e no receptor. Nós três somos terríveis juntas.
19
A Helô, então, é sem noção. É capaz de deixar
5. (UEM) A minha mãe falava sério! durante dias uma maçã comida sobre a pia da
– Isso aqui é um chiqueiro! Não acredito que cozinha.
você trocou nossa 21casa superacolhedora, lim- Isso porque a lixeirinha fica ao lado da tor-
píssima e sempre arrumadíssima por essa po- neira.
cilga. Fala sério, Maria de Lourdes! - exaspe- Andando irritada, pisei forte e ouvi um níti-
rou-se minha mãe, mãos na cintura, a última do e crocante “créééc”.
vez que veio me visitar. – Quanto farelo, gente! Quem foi que comeu
15
Eu nunca encontro palavras para dizer nessas biscoito sem pratinho embaixo? Cadê o aspi-
horas. Durante seus ataques, prefiro me reco- radorzinho que a minha mãe deu pra gente?
lher ao mais puro silêncio de consentimento. As duas começaram a rir.
Estou há sete meses dividindo com a Helô e a Permaneci séria, eu estava muito brava,
Bené um ridiculamente pequeno apartamento. muito brava.
Bem disse minha mãe, nada cabe no apar- – Malu! 20Desestressa! - disse Helô.
tamento. Nada mesmo! Sinceramente, eu e – Comemos sem pratinho, sim, depois a gen-
as meninas mal cabemos no “apertamento”, te limpa – completou Bené.
como chamamos carinhosamente nosso lar- – Depois quando?
-microlar. – Depois...
Para piorar, a Helô é superbagunceira, eu sou - Que biscoito foi? De polvilho? – eu quis sa-
a megabagunceira e a Bené é hiperbagunceira. ber.
Bené, aliás, tem um outro probleminha que é – Arrã – fizeram as duas, sapecas.
bem chatinho: vive com o namorado antipático – Tem ainda? – Rendi-me à gula e à bagunça.
para cima e para baixo. Outro dia o sem graça Comi o último do pacote e acabei rindo com
me viu de calcinha e sutiã antes de uma festa. elas. Eu até gosto de bagunça. Sempre gostei.
18
Quer mico maior que esse? Morri de vergo- Mas o apê estava tão bagunçado que tinha
nha. Ele morreu de rir. Palhaço! ultrapassado até o meu nível permitido de
Morar longe de casa não tem sido exatamente bagunça.
o paraíso que eu imaginava, mas dias melhores – Pô, gente, assim não dá! A gente precisa
virão. Serei efetivada no meu estágio 17(oba!), tomar vergonha na cara. Nossa casa está uma
7
zona!
(Adaptação do capítulo do livro Fala sério,
professor! Rio de Janeiro: Rocco, 2006)

39
Ao produzir um texto, o autor procura ade- 2. (Ufes)
quá-lo aos seus prováveis interlocutores. As-
sinale o que for correto a respeito do registro TEXTO 1
linguístico e da variedade do português uti- O NAVIO NEGREIRO
lizados no texto. Negras mulheres, suspendendo às tetas
01) Em “Eu nunca encontro palavras para dizer Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
nessas horas” (ref.15), a autora demonstra
Outras, moças... mas nuas, espantadas,
preocupação em utilizar o registro mais ade- No turbilhão de espectros arrastadas,
quado para falar com sua mãe. Em ânsia e mágoa vãs.
02) A autora procura aproximar alguns enun- (Castro Alves)
ciados das características da língua falada,
TEXTO 2
como, por exemplo, o emprego de expressões
e de interjeições típicas da oralidade, como 7
em, respectivamente, “acho que logo, logo Eu não sou eu nem sou o outro,
estarei pronta” (ref.16), “(oba!)” (ref.17) e Sou qualquer coisa de intermédio:
“- Pô, gente, assim não dá!” (ref.20). Pilar da ponte de tédio
04) A autora procura atingir um público forma- Que vai de mim para o Outro.
(Mário de Sá-Carneiro)
do por adolescentes e/ou jovens, uma vez
que utiliza expressões típicas desse público, TEXTO 3
como, por exemplo “Quer mico maior que OS ARREDORES FLOREM
esse” (ref.18), “A Helô, então, é sem noção” Os arredores florem:
(ref.19) e “Desestressa” (ref.20). figos, nervos, libélulas
a criarem nas águas
08) A autora pretende atingir também um pú-
os brevíssimos movimentos.
blico adulto com as falas da mãe da narra-
(Paulo Roberto Sodré)
dora-personagem, nas quais se observa o
emprego do português padrão culto, como, Com base nos elementos constitutivos do ato
por exemplo, em “casa superacolhedora, lim- de comunicação, Roman Jakobson estabele-
ceu seis funções da linguagem (e a ênfase
píssima e sempre arrumadíssima” (ref.21). de cada uma delas): referencial (ênfase no
16) A utilização de expressões coloquiais como assunto; no conteúdo), emotiva (ênfase no
“tomar vergonha na cara” (ref.22) e até vul- emissor; no sujeito), conativa (ênfase no re-
gares como “zona” (ref.7) evidencia o re- ceptor; no interlocutor), poética (ênfase na
gistro informal segundo o qual o texto foi forma; na construção), metalinguística (ên-
produzido. fase no código; na autorreferência) e fática
(ênfase no canal; no contato).
Escolha um dos textos, indique e explique a
E.O. Dissertativo ocorrência de uma dessas funções.

3. (Ufrj) ........................................................
1. (Ufrj) – Que frio! – gorjeou Henriqueta, muito co-
quete em seu redingote de golas de pelego,
"Minha impressão é que a cultura popular já que graciosamente envergara por cima da
ganhou a parada... Há 30 ou 40 anos, quando camisola cor-de-rosa, – Fecha, fecha, Bodu-
a gente discutia sobre música popular brasi- zinho, que este frio me mata! Que estavas a
fazer lá fora com este frio, queres constipar-
leira, sobre os novos baianos velhos, sobre -te e matar-me de cuidados?
a questão da técnica, a bossa nova, dizia-se – Já falas como uma portuguesa, é admirável
que a cultura de massa ia invadir e tomar como tens talento para essas coisas! – disse
conta de tudo. Agora, 1não apenas os baia- Bonifácio Odulfo, encantado. – E estás linda
nos, mas outros, inclusive os "rapistas", se como uma princesa! Minha princesinha por-
impuseram, independentemente da cultura tuguesa!
de massas, e estão tendo a revanche, num – Mas nunca falei lá muito à brasileira.
– Isto é verdade, sempre tiveste uma ma-
movimento de baixo para cima..."
neira de falar muito distinta, foi uma das
(Santos, Milton. Território e sociedade - entrevista. primeiras coisas que primeiro me atraiu em
2ª ed. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2000.)
ti. E teu pai, o velho barão, fala exatamente
como um português.
Nesse trecho de entrevista, Milton Santos faz
– Disto ele sempre fez questão. Costuma di-
uso de uma linguagem coloquial. zer que, pela voz, sempre saberão que ele
Com base nos dois primeiros períodos do nunca andou no meio dos pretos e que se
texto 3, retire dois exemplos que comprovem formou em Coimbra.
a afirmação acima. Justifique sua resposta. ..................................................................
(RIBEIRO, João Ubaldo. VIVA O POVO BRASILEIRO.
4aed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 1984. p.469)

40
Toda língua apresenta variação regional e português avaliados pelo MEC começavam a
social, não se podendo afirmar que uma va- abordar os fenômenos da variação linguís-
riante seja superior a outra. tica, o caráter inevitavelmente heterogêneo
Transcreva a passagem do diálogo em que de qualquer língua viva falada no mundo, a
melhor se observa um julgamento de valor mudança irreprimível que transformou, tem
que contraria essa afirmação e revela pre- transformado, transforma e transformará
conceitos sociais e culturais. qualquer idioma usado por uma comunidade
humana. Somente com uma abordagem as-
4. (Ufmg) Leia estes textos, em que se aborda sim as alunas e os alunos provenientes das
a aprovação pelo MEC do livro Por uma vida chamadas “classes populares” poderão se re-
melhor e se discutem questões relacionadas conhecer no material didático e não se sen-
ao ensino da língua materna: tir alvo de zombaria e preconceito [...]
Nenhum linguista sério, brasileiro ou es-
TEXTO 1
trangeiro, jamais disse ou escreveu que os
Falando errado
estudantes usuários de variedades linguís-
Morro e não consigo ver tudo. Na quadra da ticas mais distantes das normas urbanas de
vida em que nos encontramos, esta expres- prestígio deveriam permanecer ali, fechados
são popular se torna latente. O Ministério em sua comunidade, em sua cultura e em sua
da Educação aprova o uso do livro “Por uma língua. O que esses profissionais vêm ten-
vida melhor”, da “Coleção Viver, Aprender”, tando fazer as pessoas entenderem é que de-
cujo conteúdo ensina o aluno a falar erra- fender uma coisa não significa automatica-
do. É isso mesmo! A justificativa tem uma mente combater a outra. Defender o respeito
certa pompa ao criar um novo apêndice lin- à variedade linguística dos estudantes não
guístico, quando fundamenta que o aluno do significa que não cabe à escola introduzi-los
ensino fundamental deve aprender a usar aomundo da cultura letrada e aos discursos
a “norma popular da língua portuguesa”. que ela aciona. Cabe à escola ensinar aos
Os autores da obra defendem o uso da “lín- alunos o que eles não sabem! Parece óbvio,
gua popular” afirmando que a “norma culta mas é preciso repetir isso a todo momento.
não leva em consideração a chamada língua O mais divertido (para mim, pelo menos, tal-
viva”. Ora, ora! Temos, aí, tempos revolucio- vez por um pouco de masoquismo) é ver os
nários, que implicam novas regras na comu- mesmos defensores da suposta “língua cer-
nicação e expressão. Há poucas semanas ta”, no exato momento em que a defendem,
foi o surgimento de projeto de lei que de-
empregar regras linguísticas que a tradição
termina a extinção de palavras estrangeiras
normativa que eles acham que defendem
em escritas oficiais e em publicidades. Ago-
rejeitaria imediatamente. Pois ontem, ven-
ra, em documento oficial - um livro aceito
do o Jornal das Dez, da GloboNews, ouvi da
pelo MEC -, escreve-se errado para ensinar
boca do sr. Carlos Monforte essa deliciosa
a falar errado. Assim sendo, não poderemos
criticar a [...] a quantidade de lastimáveis pergunta: “Como é que fica então as concor-
programas no horário nobre da televisão e dâncias?”. Ora, sr. Monforte, eu lhe devolvo
outras barbaridades perpetradas à cultura a pergunta: “E as concordâncias, como é que
brasileira. ficam então?
SANTOS, Milton. Jornal do Comércio, 17/5/2011. Disponível BAGNO, Marcos. Disponível em: <http://marcosbagno.com.
em: <http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=62332>. br/site/?page_id=745>. (Fragmento).
(Fragmento) Acesso em: 20 jun. 2011.
Acesso em: 20 jun. 2011.
a) Explicite o ponto de vista defendido em cada
TEXTO 2 texto e cite argumentos que os autores mo-
Polêmica ou ignorância? bilizam para defender sua posição.
b) No final do texto 2, o autor cita a fala de
Discussão sobre livro didático só revela igno-
um jornalista como exemplo que contraria
rância da grande imprensa
a gramática normativa. Identifique a regra
[...] Polêmica? Por que polêmica, meus se- gramatical a que se refere o autor e explique
nhores e minhas senhoras? Já faz mais de por que ela não foi respeitada na fala do jor-
quinze anos que os livros didáticos de língua nalista citado.
portuguesa disponíveis no mercado e avalia- c) Reescreva a frase do jornalista, de modo a
dos e aprovados pelo Ministério da Educação adequá-la à norma do português padrão.
abordam o tema da variação linguística e do d) Explique por que o autor do texto qualifica
seu tratamento em sala de aula. [...] a situação de emprego da frase do jornalista
Já no governo FHC, sob a gestão do mi- como “divertida”.
nistro Paulo Renato, os livros didáticos de

41
5. (Ufrj) 1500 atenções.
EURICÃO: Você, que foi noiva dele. Eu, não!
A imaginação do senhor BENONA: Isso são coisas passadas.
Flutua sobre a baía. EURICÃO: Passadas para você, mas o prejuí-
As pitangas e os cajus zo foi meu. Esperava que Eudoro, com todo
Descansam o dia inteiro.
aquele dinheiro, se tornasse meu cunhado.
O céu, de manhã à tarde,
Era uma boca a menos e um patrimônio a
Faz pinturas de baú.
mais. E o peste me traiu. Agora, parece que
O Pão de Açúcar sonhou
ouviu dizer que eu tenho um tesouro. E vem
Que um carro saiu da Urca
louco atrás dele, sedento, atacado de verda-
Transportando com amor
deira hidrofobia. Vive farejando ouro, como
Meninas muito dengosas,
Umas, nuinhas da silva, um cachorro da molest’a, como um urubu,
Outras, vestidas de tanga, atrás do sangue dos outros. Mas ele está en-
E mais outras, de maillot. ganado. Santo Antônio há de proteger mi-
Chega um índio na piroga, nha pobreza e minha devoção.
(SUASSUNA, A. O santo e a porca.
Tira uma gaita do cinto, Rio de Janeiro: José Olympio, 2013.)
Desfia um lundu tão bom
Que uma índia sai da onda,
Nesse texto teatral, o emprego das expres-
Suspende o corpo no mar.
sões “o peste” e “cachorro da molest’a” con-
Nasce ali mesmo um garoto
Do corpo moreno dela, tribui para
No dia seguinte mesmo a) marcar a classe social das personagens.
O indiozinho já está b) caracterizar usos linguísticos de uma região.
De arco e flecha na mão c) enfatizar a relação familiar entre as persona-
Olhando pro fim do mar gens.
De repente uma fragata d) sinalizar a influência do gênero nas escolhas
Brotou do chão da baía, vocabulares.
Sai um velho de tamancos, e) demonstrar o tom autoritário da fala de uma
Fica em pé no portaló, das personagens.
Dá um grito: "Bofé, vilões!
Descobrimos um riacho 2. (Enem) Poema tirado de uma notícia de jor-
E a fruta aqui é bem boa." nal
No mesmo instante o garoto João Gostoso era carregador de feira livre e
Lhe respondeu "Sai, azar! morava no morro da Babilônia num barracão
"Despede uma flecha no velho sem número.
Cheiinho de barbas brancas, Uma noite ele chegou no bar Vinte de No-
Pensa que é Dão Sebastião, vembro
Dá um tremor no seu corpo Bebeu
E zarpou para Lisboa. Cantou
(MENDES, Murilo. POESIA COMPLETA E PROSA. Rio Dançou
de Janeiro: Nova Aguilar. 1994. pp. 143-144)
Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas
Murilo Mendes procura trazer para seu poe- e morreu afogado.
ma diversas marcas de "brasilidade". (BANDEIRA, M. Estrela da vida inteira: poesias
a) Qual o verso em que dois recursos linguís- reunidas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1980.)
ticos, próprios da linguagem coloquial, for-
No poema de Manuel Bandeira, há uma res-
mam uma só unidade de sentido?
significação de elementos da função referen-
b) Reescreva o verso de modo mais formal, sem
cial da linguagem pela
alteração do sentido.
a) atribuição de título ao texto com base em
uma notícia veiculada em jornal.
E.O. Enem b) utilização de frases curtas, características de
textos do gênero jornalístico.
c) indicação de nomes de lugares como garan-
1. (Enem) PINHÃO sai ao mesmo tempo que tia da veracidade da cena narrada.
BENONA entra. d) enumeração de ações, com foco nos eventos
BENONA: Eurico, Eudoro Vicente está lá fora acontecidos à personagem do texto.
e quer falar com você. e) apresentação de elementos próprios da notí-
EURICÃO: Benona, minha irmã, eu sei que cia, tais como quem, onde, quando e o quê.
ele está lá fora, mas não quero falar com ele.
BENONA: Mas Eurico, nós lhe devemos certas

42
3. (Enem 2017) Sítio Gerimum Professora – olha se você parte do princí-
Este é o meu lugar [...] pio... que a língua portuguesa não é só re-
Meu Gerimum é com g gras gramaticais... não se você se apaixona
Você pode ter estranhado pela língua que você... já domina que você
Gerimum em abundância já fala ao chegar na escola se o teu professor
Aqui era plantado cativa você a ler obras da literatura. ... obras
E com a letra g da/dos meios de comunicação... se você tem
Meu lugar foi registrado. acesso a revistas... é... a livros didáticos...
OLIVEIRA, H. D. Língua Portuguesa. a... livros de literatura o mais formal o e/o
n. 88. fev. 2013 (fragmento) difícil é porque a escola transforma como eu
já disse as aulas de língua portuguesa em
análises gramaticais.
Nos versos de um menino de 12 anos, o em-
prego da palavra “Gerimum" grafada com a
letra “g” tem por objetivo TEXTO II
a) valorizar usos informais caracterizadores da
Entrevistadora – Vou conversar com a profes-
norma nacional.
sora A. D. O português é uma língua difícil?
b) confirmar o uso da norma-padrão em con-
Professora – Não, se você parte do princí-
texto da linguagem poética.
pio que a língua portuguesa não é só regras
c) enfatizar um processo recorrente na trans-
gramaticais. Ao chegar à escola, o aluno já
formação da língua portuguesa.
domina e fala a língua. Se o professor moti-
d) registrar a diversidade étnica e linguística
vá-lo a ler obras literárias, e se tem acesso a
presente no território brasileiro.
revistas, a livros didáticos, você se apaixona
e) reafirmar discursivamente a forte relação do
pela língua. O que torna difícil é que a esco-
falante com seu lugar de origem.
la transforma as aulas de língua portuguesa
4. (Enem) O acervo do Museu da Língua Por- em análises gramaticais.
tuguesa é o nosso idioma, um “patrimônio (MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita: atividades
de retextualização. São Paulo: Cortez, 2001).
imaterial” que não pode ser, por isso, guar-
dado e exposto em uma redoma de vidro. As- O Texto I é a transcrição de uma entrevista
sim, o museu, dedicado à valorização e difu- concedida por uma professora de português
são da língua portuguesa, reconhecidamente a um programa de rádio. O Texto II é a adap-
importante para a preservação de nossa tação dessa entrevista para a modalidade
identidade cultural, apresenta uma forma escrita.
expositiva diferenciada das demais institui- Em comum, esses textos
ções museológicas do país e do mundo, usan- a) apresentam ocorrências de hesitações e re-
do tecnologia de ponta e recursos interativos formulações.
para a apresentação de seus conteúdos. b) são modelos de emprego de regras gramati-
(Disponível em: www.museulinguaportuguesa.org.br. cais.
Acesso em: 16 ago. 2012). c) são exemplos de uso não planejado da lín-
gua.
De acordo com o texto, embora a língua por-
d) apresentam marcas da linguagem literária.
tuguesa seja um “patrimônio imaterial”,
e) são amostras do português culto urbano.
pode ser exposta em um museu. A relevân-
cia desse tipo de iniciativa está pautada no
6. (Enem) Exmº Sr. Governador:
pressuposto de que
a) a língua é um importante instrumento de Trago a V. Exa. um resumo dos trabalhos
constituição social de seus usuários. realizados pela Prefeitura de Palmeira dos
b) o modo de falar o português padrão deve ser Índios em 1928.
divulgado ao grande público. [...]
c) a escola precisa de parceiros na tarefa de va-
ADMINISTRAÇÃO
lorização da língua portuguesa.
Relativamente à quantia orçada, os telegra-
d) o contato do público com a norma-padrão
mas custaram pouco. De ordinário vai para
solicita o uso de tecnologia de última geração.
e) as atividades lúdicas dos falantes com sua eles dinheiro considerável. Não há vereda
própria língua melhoram com o uso de re- aberta pelos matutos que prefeitura do inte-
cursos tecnológicos. rior não ponha no arame, proclamando que
a coisa foi feita por ela; comunicam-se as
5. (Enem) TEXTO I datas históricas ao Governo do Estado, que
não precisa disso; todos os acontecimentos
Entrevistadora – eu vou conversar aqui com políticos são badalados. Porque se derrubou
a professora A. D. ... o português então não é a Bastilha – um telegrama; porque se dei-
uma língua difícil? tou pedra na rua – um telegrama; porque o

43
deputado F. esticou a canela - um telegrama. a) “Naturalmente/ Ela sorria/ Mas não me dava
(Palmeira dos Índios, 10 de janeiro de 1929. trela”.
GRACILlANO RAMOS) b) “Tomavam banho/ Na minha frente/ Para
(RAMOS, G. Viventes das Alagoas. São
sair com outro cara”.
Paulo: Martins Fontes, 1962.)
c) “Surgiram outras/ Naturalmente/ Sem nem
O relatório traz a assinatura de Graciliano olhar a minha cara”.
Ramos, na época, prefeito de Palmeira dos d) “Escolhia qualquer um/ Lançava olhares/
Índios, e é destinado ao governo do estado Debaixo do meu nariz”.
de Alagoas. De natureza oficial, o texto cha- e) “É natural que toda atriz/ Presentemente
ma a atenção por contrariar a norma previs- represente/ Muito para mim”.
ta para esse gênero, pois o autor
8. (Enem) Entrevista com Marcos Bagno
Pode parecer inacreditável, mas muitas das
a) emprega sinais de pontuação em excesso. prescrições da pedagogia tradicional da lín-
b) recorre a termos e expressões em desuso no gua até hoje se baseiam nos usos que os es-
português. critores portugueses do século XIX faziam
c) apresenta-se na primeira pessoa do singular, da língua. Se tantas pessoas condenam, por
para conotar intimidade com o destinatário. exemplo, o uso do verbo “ter” no lugar do
d) privilegia o uso de termos técnicos, para de- verbo “haver”, como em “hoje tem feijoa-
monstrar conhecimento especializado. da”, é simplesmente porque os portugueses,
e) expressa-se em linguagem mais subjetiva, em dado momento da história de sua língua,
com forte carga emocional. deixaram de fazer esse uso existencial do
verbo “ter”.
No entanto, temos registros escritos da épo-
7. (Enem 2017) As atrizes
ca medieval em que aparecem centenas des-
Naturalmente ses usos. Se nós, brasileiros, assim como os
Ela sorria falantes africanos de português, usamos até
Mas não me dava trela hoje o verbo “ter” como existencial é porque
Trocava a roupa recebemos esses usos de nossos ex-coloniza-
Na minha frente dores. Não faz sentido imaginar que brasilei-
E ia bailar sem mais aquela ros, angolanos e moçambicanos decidiram se
Escolhia qualquer um juntar para “errar” na mesma coisa. E assim
Lançava olhares acontece com muitas outras coisas: regên-
Debaixo do meu nariz cias verbais, colocação pronominal, concor-
Dançava colada dâncias nominais e verbais etc. Temos uma
Em novos pares língua própria, mas ainda somos obrigados
Com um pé atrás a seguir uma gramática normativa de outra
Com um pé a fim língua diferente. Às vésperas de comemorar-
Surgiram outras mos nosso bicentenário de independência,
Naturalmente não faz sentido continuar rejeitando o que
Sem nem olhar a minha cara é nosso para só aceitar o que vem de fora.
Tomavam banho Não faz sentido rejeitar a língua de 190 mi-
Na minha frente lhões de brasileiros para só considerar certo
Para sair com outro cara o que é usado por menos de dez milhões de
Porém nunca me importei portugueses. Só na cidade de São Paulo te-
Com tais amantes mos mais falantes de português que em toda
a Europa!
[...]
(Informativo Parábola Editorial, s/d.)
Com tantos filmes
Na minha mente Na entrevista, o autor defende o uso de for-
É natural que toda atriz mas linguísticas coloquiais e faz uso da nor-
Presentemente represente ma de padrão em toda a extensão do texto.
Muito para mim Isso pode ser explicado pelo fato de que ele
a) adapta o nível de linguagem à situação co-
CHICO BUARQUE. Carioca. Rio de Janeiro:
Biscoito Fino, 2006 (fragmento). municativa, uma vez que o gênero entrevis-
ta requer o uso da norma padrão.
Na canção, Chico Buarque trabalha uma de- b) apresenta argumentos carentes de compro-
terminada função da linguagem para marcar vação científica e, por isso, defende um pon-
a subjetividade do eu lírico ante as atrizes to de vista difícil de ser verificado na mate-
que ele admira. A intensidade dessa admira- rialidade do texto.
ção está marcada em: c) propõe que o padrão normativo deve ser

44
usado por falantes escolarizados como ele, é uma palavra que já me está a pôr com dores
enquanto a norma coloquial deve ser usada de cabeça até porque, no fundo, a única coisa
por falantes não escolarizados. que eu queria era escrever um poema sobre a
d) acredita que a língua genuinamente bra- rapariga do café. A solução, então, é mudar
sileira está em construção, o que o obriga de café, e limitar-me a escrever um poema
a incorporar em seu cotidiano a gramática sobre aquele café onde nenhuma rapariga se
normativa do português europeu. pode sentar à mesa porque só servem café
e) defende que a quantidade de falantes portu- ao balcão.
guês brasileiro ainda é insuficiente para aca- (JÚDICE, N. Matéria do Poema. Lisboa: D. Quixote, 2008.)
bar com a hegemonia do antigo colonizador.

9. (Enem) Assum preto O texto traz em relevo as funções metalin-


guística e poética. Seu caráter metalinguís-
Tudo em vorta é só beleza tico justifica-se pela
Sol de abril e a mata em frô a) discussão da dificuldade de se fazer arte ino-
Mas assum preto, cego dos óio vadora no mundo contemporâneo.
Num vendo a luz, ai, canta de dor b) defesa do movimento artístico da pós-mo-
dernidade, típico do século XX.
Tarvez por ignorança
c) abordagem de temas do cotidiano, em que a
Ou mardade das pió
arte se volta para assuntos rotineiros.
Furaro os óio do assum preto
d) tematização do fazer artístico, pela discus-
Pra ele assim, ai, cantá mio
são do ato de construção da própria obra.
Assum preto veve sorto e) valorização do efeito de estranhamento cau-
Mas num pode avuá sado no público, o que faz a obra ser reco-
Mil veiz a sina de uma gaiola nhecida.
Desde que o céu, ai, pudesse oiá

E.O. UERJ
(GONZAGA, L.; TEIXEIRA, H. Disponível em: www.
luizgonzaga.mus.br. Acesso em: 30 jul. 2012).

As marcas da variedade regional registradas


pelos compositores de Assum preto resultam
Exame de Qualificação
da aplicação de um conjunto de princípios
ou regras gerais que alteram a pronúncia, a 1. (UERJ)
morfologia, a sintaxe ou o léxico. No texto, é O tempo em que o mundo tinha a nossa idade
resultado de uma mesma regra a Nesse entretempo, ele nos chamava para
a) pronúncia das palavras “vorta” e “veve”.
escutarmos seus imprevistos improvisos.
b) pronúncia das palavras “tarvez” e “sorto”.
As estórias dele faziam o nosso lugarzinho
c) flexão verbal encontrada em “furaro” e “cantá”.
d) redundância nas expressões “cego dos óio” e crescer até ficar maior que o mundo.1 Ne-
“mata em frô”. nhuma narração tinha fim, o sono lhe apa-
e) pronúncia das palavras “ignorança” e “avuá” gava a boca antes do desfecho. Éramos nós
que recolhíamos seu corpo dorminhoso. Não
lhe deitávamos dentro da casa: ele sempre
10. (Enem) Lusofonia
recusara cama feita. Seu conceito era que a
rapariga: s.f., fem. de rapaz: mulher nova; morte nos apanha deitados sobre a moleza
moça; menina; (Brasil), meretriz. de uma esteira. Leito dele era o puro chão,
Escrevo um poema sobre a rapariga que está lugar onde a chuva também gosta de deitar.
sentada no café, em frente da chávena de Nós simplesmente lhe encostávamos na pa-
café, enquanto alisa os cabelos com a mão. rede da casa. Ali ficava até de manhã. Lhe
Mas não posso escrever este poema sobre encontrávamos coberto de formigas. Parece
essa rapariga porque, no brasil, a palavra ra- que os insectos gostavam do suor docicado
pariga não quer dizer o que ela diz em por- do velho Taímo. Ele nem sentia o corrupio do
tugal. Então, terei de escrever a mulher nova formigueiro em sua pele.
do café, a jovem do café, a menina do café, − Chiças: transpiro mais que palmeira!
para que a reputação da pobre rapariga que Proferia tontices enquanto ia acordando.
alisa os cabelos com a mão, num café de lis- Nós lhe sacudíamos os infatigáveis bichos.
boa, não fique estragada para sempre quan- Taímo nos sacudia a nós, incomodado por lhe
do este poema atravessar o atlântico para dedicarmos cuidados.
desembarcar no rio de janeiro. E isto tudo Meu pai sofria de sonhos, saía pela noite de
sem pensar em áfrica, porque aí lá terei de olhos transabertos.2 Como dormia fora, nem
escrever sobre a moça do café, para evitar o dávamos conta. Minha mãe, manhã seguinte,
tom demasiado continental da rapariga, que é que nos convocava:

45
− Venham: papá teve um sonho! elas, queria modificar a opinião dos meus
E nos juntávamos, todos completos, para es- concidadãos, obrigá-los a pensar de outro
cutar as verdades que lhe tinham sido reve- modo, a não se encherem de hostilidade e
ladas.3 Taímo recebia notícia do futuro por má vontade quando encontrarem na vida um
via dos antepassados. Dizia tantas previsões rapaz como eu e com os desejos que tinha há
que nem havia tempo de provar nenhuma. dez anos passados. Tento mostrar que são le-
Eu me perguntava sobre a verdade daquelas gítimos e, se não merecedores de apoio, pelo
visões do velho, estorinhador como ele era. menos dignos de indiferença.
− Nem duvidem, avisava mamã, suspeitan- Entretanto, quantas dores, quantas angús-
do-nos. tias! Vivo aqui só, isto é, sem relações in-
E assim seguia nossa criancice, tempos afo- telectuais de qualquer ordem.2 Cercam-me
ra. Nesses anos ainda tudo tinha sentido:4 a dois ou três bacharéis idiotas e um médico
razão deste mundo estava num outro mundo mezinheiro, repletos de orgulho de suas car-
inexplicável. Os mais velhos faziam a ponte tas que sabe Deus como tiraram. (...) Entre-
entre esses dois mundos. (...) tanto, se eu amanhã lhes fosse falar neste
Mia Couto livro – que espanto! que sarcasmo! que críti-
Terra sonâmbula. São Paulo, Cia das Letras, 2007. ca desanimadora não fariam. Depois que se
foi o doutor Graciliano, excepcionalmente
Este texto é uma narrativa ficcional que se
simples e esquecido de sua carta apergami-
refere à própria ficção, o que caracteriza
nhada, nada digo das minhas leituras, não
uma espécie de metalinguagem.
falo das minhas lucubrações intelectuais a
A metalinguagem está melhor explicitada no
ninguém, e minha mulher, quando me de-
seguinte trecho:
moro escrevendo pela noite afora, grita-me
a) As estórias dele faziam o nosso lugarzinho
do quarto:
crescer até ficar maior que o mundo. (ref. 1)
– Vem dormir, Isaías! Deixa esse relatório
b) Meu pai sofria de sonhos, saía pela noite de
para amanhã!3
olhos transabertos. (ref. 2)
De forma que não tenho por onde aferir se
c) E nos juntávamos, todos completos, para es-
as minhas Recordações preenchem o fim a
cutar as verdades que lhe tinham sido reve-
que as destino; se a minha inabilidade lite-
ladas. (ref. 3)
rária está prejudicando completamente o seu
d) Nesses anos ainda tudo tinha sentido: (ref. 4)
pensamento. Que tortura! E não é só isso:
envergonho-me por esta ou aquela passagem
2. (UERJ) em que me acho, em que me dispo em frente
Recordações do escrivão Isaías Caminha de desconhecidos, como uma mulher públi-
Eu não sou literato, detesto com toda a pai- ca... Sofro assim de tantos modos, por causa
xão essa espécie de animal. O que observei desta obra, que julgo que esse mal-estar, com
neles, no tempo em que estive na redação do que às vezes acordo, vem dela, unicamente
O Globo, foi o bastante para não os amar, nem dela. Quero abandoná-la; mas não posso ab-
os imitar. São em geral de uma lastimável li- solutamente. De manhã, ao almoço, na cole-
mitação de ideias,1 cheios de fórmulas, de toria, na botica, jantando, banhando-me, só
receitas, só capazes de colher fatos detalha- penso nela. À noite, quando todos em casa se
dos e impotentes para generalizar, curvados vão recolhendo, insensivelmente aproximo-
aos fortes e às ideias vencedoras, e antigas, -me da mesa e escrevo furiosamente. Estou
adstritos a um infantil fetichismo do estilo e no sexto capítulo e ainda não me preocupei
guiados por conceitos obsoletos e um pueril em fazê-la pública, anunciar e arranjar um
e errôneo critério de beleza. Se me esforço bom recebimento dos detentores da opinião
por fazê-lo literário é para que ele possa ser nacional. Que ela tenha a sorte que merecer,
lido, pois quero falar das minhas dores e dos mas que possa também, amanhã ou daqui
meus sofrimentos ao espírito geral e no seu a séculos, despertar um escritor mais hábil
interesse, com a linguagem acessível a ele. É que a refaça e que diga o que não pude nem
esse o meu propósito, o meu único propósi- soube dizer.
to. Não nego que para isso tenha procurado (...) Imagino como um escritor hábil não sa-
modelos e normas. Procurei-os, confesso; e, beria dizer o que eu senti lá dentro. Eu que
agora mesmo, ao alcance das mãos, tenho os sofri e pensei não o sei narrar. Já por duas
autores que mais amo. (...) Confesso que os vezes, tentei escrever; mas, relendo a página,
leio, que os estudo, que procuro descobrir achei-a incolor, comum,4 e, sobretudo, pouco
nos grandes romancistas o segredo de fazer. expressiva do que eu de fato tinha sentido.
Mas não é a ambição literária que me move LIMA BARRETO
(Recordações do escrivão Isaías Caminha. São Paulo:
ao procurar esse dom misterioso para animar
Penguin Classics Companhia das Letras, 2010.)
e fazer viver estas pálidas Recordações. Com

46
O texto de Lima Barreto explora o recurso da representação rompesse seu cordão umbili-
metalinguagem, ao comentar, na sua ficção, cal, gerando essas duas metades − signifi-
o próprio ato de compor uma ficção. Esse re- cante e significado.
curso está exemplificado principalmente em: Houve esse tempo? Quando não havia po-
a) São em geral de uma lastimável limitação de esia porque a poesia estava em tudo o que
ideias, (ref. 1) se dizia? Quando o nome da coisa era algo
b) Vivo aqui só, isto é, sem relações intelec que fazia parte dela, assim como sua cor, seu
tuais de qualquer ordem. (ref. 2) tamanho, seu peso? Quando os laços entre
c) – Vem dormir, Isaías! Deixa esse relatório os sentidos ainda não se haviam desfeito,
para amanhã! (ref. 3) então música, poesia, pensamento, dança,
d) Já por duas vezes, tentei escrever; mas, imagem, cheiro, sabor, consistência se con-
relendo a página, achei-a incolor, comum, jugavam em experiências integrais, associa-
(ref. 4) das a utilidades práticas, mágicas, curativas,
religiosas, sexuais, guerreiras?
3. (UERJ) Pode ser que essas suposições tenham algo
de utópico, projetado sobre um passado pré-
-babélico, tribal, primitivo. Ao mesmo tem-
po, cada novo poema do futuro que o pre-
sente alcança cria, com sua ocorrência, um
pouco desse passado.
Lembro-me de ter lido, certa vez, um comen-
tário de Décio Pignatari, em que ele chamava
a atenção para o fato de, tanto em chinês
como em tupi, não existir o verbo ser, en-
quanto verbo de ligação. Assim, o ser das
coisas ditas se manifestaria nelas próprias
(substantivos), não numa partícula verbal
A perspicácia, de RENÉ MAGRITTE (1936).
http://rene-magritte-paintings.blogspot.com
externa a elas, o que faria delas línguas poé-
ticas por natureza, mais propensas à compo-
Pode-se definir “metalinguagem” como a sição analógica.
linguagem que comenta a própria lingua-
Mais perto do senso comum, podemos aten-
gem, fenômeno presente na literatura e nas
tar para como colocam os índios americanos
artes em geral.
falando, na maioria dos filmes de cowboy
O quadro A perspicácia, do belga René Magrit-
− eles dizem “maçã vermelha”, “água boa”,
te, é um exemplo de metalinguagem porque:
“cavalo veloz”; em vez de “a maçã é verme-
a) destaca a qualidade do traço artístico
lha”, “essa água é boa”, “aquele cavalo é ve-
b) mostra o pintor no momento da criação
c) implica a valorização da arte tradicional loz”. Essa forma mais sintética, telegráfica,
d) indica a necessidade de inspiração concreta aproxima os nomes da própria existência
− como se a fala não estivesse se referindo
àquelas coisas, e sim apresentando-as (ao
4. (UERJ) Sobre a origem da poesia
mesmo tempo em que se apresenta).
A origem da poesia se confunde com a ori- No seu estado de língua, no dicionário, as
gem da própria linguagem. palavras intermedeiam nossa relação com as
Talvez fizesse mais sentido perguntar quan- coisas, impedindo nosso contato direto com
do a linguagem verbal deixou de ser poesia. elas. A linguagem poética inverte essa rela-
Ou: qual a origem do discurso não poético, ção, pois, vindo a se tornar, ela em si, coisa,
já que, restituindo laços mais íntimos entre oferece uma via de acesso sensível mais di-
os signos e as coisas por eles designadas, a reto entre nós e o mundo.
poesia aponta para um uso muito primário
(...)
da linguagem, que parece anterior ao perfil
Já perdemos a inocência de uma linguagem
de sua ocorrência nas conversas, nos jornais,
nas aulas, conferências, discussões, discur- plena assim. As palavras se desapegaram das
sos, ensaios ou telefonemas. coisas, assim como os olhos se desapegaram
Como se ela restituísse, através de um uso dos ouvidos, ou como a criação se desapegou
específico da língua, a integridade entre da vida. Mas temos esses pequenos oásis − os
nome e coisa − que o tempo e as culturas poemas − contaminando o deserto da refe-
do homem civilizado trataram de separar no rencialidade.
decorrer da história. (ARNALDO ANTUNES
A manifestação do que chamamos de poesia www.arnaldoantunes.com.br)
hoje nos sugere mínimos flashbacks de uma
possível infância da linguagem, antes que a

47
No último parágrafo, o autor se refere à ple- morre-se ali que é uma praga.
nitude da linguagem poética, fazendo, em — Homem, eu da cirurgia não entendo mui-
seguida, uma descrição que corresponde à to...
linguagem não poética, ou seja, à linguagem — Pois já não disse que sabe também sangrar?
referencial. — Sim...
Pela descrição apresentada, a linguagem re- — Então já sabe até demais.
ferencial teria, em sua origem, o seguinte No dia seguinte saiu o nosso homem pela
traço fundamental: barra fora: a fortuna tinha-lhe dado o meio,
a) o desgaste da intuição cumpria sabê-lo aproveitar; de oficial de
b) a dissolução da memória barbeiro dava um salto mortal a médico de
c) a fragmentação da experiência navio negreiro; restava unicamente saber
d) o enfraquecimento da percepção fazer render a nova posição. Isso ficou por
sua conta.

E.O. Objetivas Por um feliz acaso logo nos primeiros dias


de viagem adoeceram dois marinheiros;
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) chamou-se o médico; ele fez tudo o que sa-
bia... sangrou os doentes, e em pouco tempo
1. (Fuvest) Todas as variedades linguísticas são estavam bons, perfeitos. Com isto ganhou
imensa reputação, e começou a ser estimado.
estruturadas, e correspondem a sistemas e
Chegaram com feliz viagem ao seu destino;
subsistemas adequados às necessidades de
tomaram o seu carregamento de gente, e
seus usuários. Mas o fato de estar a língua
voltaram para o Rio. Graças à lanceta do nos-
fortemente ligada à estrutura social e aos so homem, nem um só negro morreu, o que
sistemas de valores da sociedade conduz a muito contribuiu para aumentar-lhe a sólida
uma avaliação distinta das características reputação de entendedor do riscado.
das suas diversas modalidades regionais, (Manuel Antônio de Almeida. Memórias
sociais e estilísticas. A língua padrão, por de um sargento de milícias.)
exemplo, embora seja uma entre as muitas
variedades de um idioma, é sempre a mais A linguagem de cunho popular que está pre-
prestigiosa, porque atua como modelo, como sente tanto na fala das personagens quanto
norma, como ideal linguístico de uma co- no discurso do narrador do romance de Man-
munidade. Do valor normativo decorre a sua uel Antônio de Almeida, está mais bem exem-
função coercitiva sobre as outras variedades, plificada em:
com o que se torna uma ponderável força a) “quando tem pouco que fazer”; “cumpria
contrária à variação. sabê-lo aproveitar”.
(Celso Cunha. Nova gramática do português b) “Foi a sua salvação”; “a que o marujo per-
contemporâneo. Adaptado.) tencia”.
c) “saber fazer render a nova posição”; “Chega-
De acordo com o texto, em relação às demais ram com feliz viagem ao seu destino”.
variedades do idioma, a língua padrão se d) “puxar conversa”; “entendedor do riscado”.
comporta de modo e) “adoeceram dois marinheiros”; “sólida repu-
a) inovador. tação”.
b) restritivo.
c) transigente. 3. (Unifesp) ESTE INFERNO DE AMAR
d) neutro. Este inferno de amar – como eu amo!
e) aleatório.
Quem mo pôs aqui n’alma... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
2. (Fuvest) Todo o barbeiro é tagarela, e prin- Que é a vida – e que a vida destrói –
cipalmente quando tem pouco que fazer; Como é que se veio a atear,
começou portanto a puxar conversa com o Quando – ai quando se há-de ela apagar?
freguês. Foi a sua salvação e fortuna. (Almeida Garret)
O navio a que o marujo pertencia viajava
para a Costa e ocupava-se no comércio de
Nos versos de Garrett, predomina a função
negros; era um dos combóis que traziam for- a) metalinguística da linguagem, com extrema
necimento para o Valongo, e estava pronto valorização da subjetividade no jogo entre o
a largar. espiritual e o profano.
— Ó mestre! disse o marujo no meio da con- b) apelativa da linguagem, num jogo de sen-
versa, você também não é sangrador? tido pelo qual o poeta transmite uma forma
— Sim, eu também sangro... idealizada de amor.
— Pois olhe, você estava bem bom, se qui- c) referencial da linguagem, privilegiando-se a
sesse ir conosco... para curar a gente a bordo; expressão de forma racional.
d) emotiva da linguagem, marcada pela não

48
contenção dos sentimentos, dando vazão ao 5. (Unesp) A questão toma por base um texto
subjetivismo. de Millôr Fernandes (1924-2012).
e) fática da linguagem, utilizada para expressar Os donos da comunicação
as ideias de forma evasiva, como sugestões. Os presidentes, os ditadores e os reis da Es-
panha que se cuidem porque os donos da co-
4. (Unicamp 2017) No dia 21 de setembro de municação duram muito mais. Os ditadores
2015, Sérgio Rodrigues, crítico literário, co- abrem e fecham a imprensa, os presidentes
mentou que apontar no título do filme Que xingam a TV e os reis da Espanha cassam o
horas ela volta? um erro de português “revela rádio, mas, quando a gente soma tudo, os
visão curta sobre como a língua funciona”. E donos da comunicação ainda tão por cima.
justifica: Mandam na economia, mandam nos intelec-
tuais, mandam nas moças fofinhas que que-
rem aparecer nos shows dos horários nobres
“O título do filme, tirado da fala de um per- e mandam no society que morre se o nome
sonagem, está em registro coloquial. Que não aparecer nas colunas.
ano você nasceu? Que série você estuda? e Todo mundo fala mal dos donos da comuni-
frases do gênero são familiares a todos os cação, mas só de longe. E ninguém fala mal
brasileiros, mesmo com alto grau de esco- deles por escrito porque quem fala mal deles
laridade. Será preciso reafirmar a esta altura por escrito nunca mais vê seu nome e sua
do século 21 que obras de arte têm liberdade cara nos “veículos” deles. Isso é assim aqui,
para transgressões muito maiores? Pretender na Bessarábia e na Baixa Betuanalândia. Pa-
que uma obra de ficção tenha o mesmo grau rece que é a lei. O que também é muito justo
de formalidade de um editorial de jornal ou porque os donos da comunicação são seres
relatório de firma revela um jeito autoritário lá em cima. Basta ver o seguinte: nós, pra
de compreender o funcionamento não só da sabermos umas coisinhas, só sabemos delas
língua, mas da arte também.” pela mídia deles, não é mesmo? Agora vocês
(Adaptado do blog Melhor Dizendo. Disponível em http:// já imaginaram o que sabem os donos da co-
www.melhordizendo.com/a-que-horas-ela-volta-em-
municação que só deixam sair 10% do que
que-ano-estamos-mesmo/.Acesso em: 08/06/2016.)
sabem?
Entre os excertos de estudiosos da lingua- Pois é; tem gente que faz greve, faz revo-
gem reproduzidos a seguir, assinale aquele lução, faz terrorismo, todas essas besteiras.
que corrobora os comentários do post. Corajoso mesmo, eu acho, é falar mal de
a) Numa sociedade estruturada de maneira dono de comunicação. Aí tua revolução fica
complexa a linguagem de um dado grupo xinfrim, teu terrorismo sai em corpo 6 e se
social reflete-o tão bem como suas outras você morre vai lá pro fundo do jornal em
formas de comportamento. (MATTOSO CÂ- quatro linhas.
MARA JR., Joaquim. História da Linguística. (Millôr Fernandes. Que país é este?, 1978.)
Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1975.)
b) A linguagem exigida, especialmente nas au- No último período do texto, a discrepância
las de língua portuguesa, corresponde a um dos possessivos teu e tua (segunda pessoa
modelo próprio das classes dominantes e das do singular) com relação ao pronome de tra-
categorias sociais a elas vinculadas. (CAMA- tamento você (terceira pessoa do singular)
CHO, Roberto Gomes. O sistema escolar e justifica-se como
o ensino da língua portuguesa. São Paulo: a) possibilidade permitida pelo novo sistema
Alfa, 29, p. 1-7, 1985.) ortográfico da língua portuguesa.
c) Não existe nenhuma justificativa ética, b) um modo de escrever característico da lin-
política, pedagógica ou científica para con- guagem jornalística.
tinuar condenando como erros os usos lin-
c) emprego perfeitamente correto, segundo a
guísticos que estão firmados no português
gramática normativa.
brasileiro. (BAGNO, Marcos. Nada na língua
d) aproveitamento estilístico de um uso do dis-
é por acaso: por uma pedagogia da variação
curso coloquial.
linguística. São Paulo: Editorial, 2007.)
d) Aquele que aprendeu a refletir sobre a e) intenção de agredir com mau discurso os do-
linguagem é capaz de compreender uma nos da comunicação.
gramática – que nada mais é do que o resul-
tado de uma (longa) reflexão sobre a língua.
(GERALDI, João Wanderley. Linguagem e en-
sino: exercícios de militância e divulgação.
Campinas: Mercado das Letras; Associação de
Leitura do Brasil, 1996.)

49
E.O. Dissertativas É deste Brasi de Baxo
A crasse dos marginá.

(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) Meu Brasi de Baxo, amigo,


Pra onde é que você vai?
Nesta vida do mendigo
1. (Fuvest) Leia este texto:
Que não tem mãe nem tem pai?
A correção da língua é um artificialismo, con- Não se afrija, nem se afobe,
tinuei episcopalmente. O natural é a incorreção. O que com o tempo sobe,
Note que a gramática só se atreve a meter O tempo mesmo derruba;
o bico quando escrevemos. Quando falamos, Tarvez ainda aconteça
afasta-se para longe, de orelhas murchas. Que o Brasi de Cima desça
(Monteiro Lobato, Prefácios e entrevistas.) E o Brasi de Baxo suba.

a) Tendo em vista a opinião do autor do texto, Sofre o povo privação


Mas não pode recramá,
pode-se concluir corretamente que a língua
Ispondo suas razão
falada é desprovida de regras? Explique su-
Nas coluna do jorná.
cintamente. Mas, tudo na vida passa,
b) Entre a palavra “episcopalmente” e as ex- Antes que a grande desgraça
pressões “meter o bico” e “de orelhas mur- Deste povo que padece
chas”, dá-se um contraste de variedades Se istenda, cresça e redrobe,
linguísticas. Substitua as expressões colo- O Brasi de Baxo sobe
quiais, que aí aparecem, por outras equiva- E o Brasi de Cima desce.
lentes, que pertençam à variedade padrão.
Brasi de Baxo subindo,
2. (Unesp) A seguir, poema do repentista cea- Vai havê transformação
rense Patativa do Assaré (1909-2002) e uma Para os que veve sintindo
passagem do livro O discípulo de Emaús de Abondono e sujeição.
Murilo Mendes (1901-1975): Se acaba a dura sentença
E a liberdade de imprensa
Brasi de Cima e Brasi de Baxo Vai sê legá e comum,
Em vez deste grande apuro,
[...] Todos vão tê no futuro
Inquanto o Brasi de Cima
Fala de transformação, Um Brasi de cada um.
Industra, matéra prima, Brasi de paz e prazê,
Descobertas e invenção, De riqueza todo cheio,
No Brasi de Baxo isiste Mas, que o dono do podê
O drama penoso e triste Respeite o dereito aleio.
Da negra necissidade; Um grande e rico país
É uma cousa sem jeito Munto ditoso e feliz,
E o povo não tem dereito Um Brasi dos brasilêro,
Nem de dizê a verdade. Um Brasi de cada quá,
Um Brasi nacioná
No Brasi de Baxo eu vejo Sem monopolo istrangêro.
Nas ponta das pobre rua (Patativa do Assaré. Cante lá que eu canto cá. 6.ª Ed. Crato:
Vozes/Fundação Pe. Ibiapina/Instituto Cultural do Cariri.
O descontente cortejo Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1986.)
De criança quage nua.
Vai um grupo de garoto O Discípulo de Emaús
Faminto, doente e roto
Mode caçá o que comê A harmonia da sociedade somente poderá
Onde os carro põe o lixo, ser atingida mediante a execução de um có-
Como se eles fosse bicho digo espiritual e moral que atenda, não só
ao bem coletivo, como ao bem de cada um. A
Sem direito de vivê.
conciliação da liberdade com a autoridade é,
Estas pequenas pessoa, no plano político, um dos mais importantes
Estes fio do abandono, problemas. A extensão das possibilidades de
Que veve vagando à toa melhoria a todos os membros da sociedade,
Como objeto sem dono, sem distinção de raças, credos religiosos,
De manêra que horroriza, opiniões políticas, é um dos imperativos da
Deitado pela marquiza, justiça social, bem como a apropriação pelo
Dromindo aqui e aculá Estado dos instrumentos de trabalho coletivo.
No mais penoso relaxo, (Murilo Mendes. Poesia completa e prosa. Rio
de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994.)

50
Patativa do Assaré criou um discurso poemático peculiar, que estiliza a fala popular e rural. Por
isso, ao escrever seus poemas, usa também suas próprias normas ortográficas, bem como “regras”
gramaticais desse linguajar do povo. Releia atentamente a terceira estrofe do poema e a reescreva
em discurso considerado culto, sem se preocupar com a quebra do ritmo ou da rima.

3. (Unicamp) É sabido que as histórias de Chico Bento são situadas no universo rural brasileiro.

a) Explique o recurso utilizado para caracterizar o modo de falar das personagens na tira.
b) É possível afirmar que esse modo de falar caracterizado na tira é exclusivo do universo rural brasileiro?
Justifique.

4. (Unicamp)

a) Qual é o pressuposto da personagem que defende o acordo ortográfico entre os países de língua por-
tuguesa? Por que esse pressuposto é inadequado?
b) Explique como, na tira acima, esse pressuposto é quebrado.

51
5. (Unicamp) O texto " O FMI vem aí. Viva o
FMI ", do articulista Luiz Nassif, publicado Gabarito
na revista ÍCARO, está redigido no português
culto característico do jornalismo, e contém,
inclusive, um bom número de expressões tí-
E.O. Aprendizagem
picas da linguagem dos economistas, como 1. C 2. E 3. B 4. B 5. C
"desequilíbrio conjuntural", "royalties",
6. D 7. A 8. C 9. A 10. E
"produtos primários", "política cambial". No
entanto, contém também termos ou expres-
sões informais, como na seguinte frase: "Há
um ou outro caso de mudanças estruturais
E.O. Fixação
no mundo que deixa os países COM A BROXA 1. D 2. A 3. D 4. B 5. C
NA MÃO". 6. D 7. C 8. D 9. B 10. A

Leia o trecho abaixo, que é parte do mesmo


artigo, e responda às questões: E.O. Complementar
1. D 2. E 3. C 4. A
Países já chegam ao FMI com todos esses im-
passes, denotando a incapacidade de suas 5. 02 + 04 + 16 = 22
elites de chegarem a fórmulas consensuais
para enfrentar a crise - mesmo porque essas
fórmulas implicam prejuízos aos interesses E.O. Dissertativo
de alguns grupos poderosos. Aí a burocracia 1. A linguagem coloquial pode ser exemplifi-
do FMI deita e rola. Há, em geral, economis- cada pelo uso de: "(ganhou a) parada", "a
gente". Trata-se de usos frequentes em uma
tas especializados em determinadas regiões
entrevista.
do globo. Mas, na maioria das vezes, as fór-
2. Texto 1 – funções: referencial (informação)
mulas aplicadas aos países são homogêne- e poética (forma).
as, burocráticas, de quem está por cima da Texto 2 – funções: emotiva (ênfase no emis-
carne-seca e não quer saber de limitações de sor), poética (forma) e metalinguística (de-
ordem social ou política. (...) Sem os recur- finição).
sos adicionais do Fundo, a travessia de 1999 Texto 3 – funções: poética (forma), referen-
seria um inferno, com as reservas cambiais cial (informação).
se esvaindo e o país sendo obrigado ou a fe- 3. "Costuma dizer que, pela voz, sempre sabe-
char sua economia ou a entrar em parafuso. rão que ele nunca andou no meio dos pretos
O desafio maior será produzir um acordo que e que se formou em Coimbra." (últimas li-
obrigue, sim, o governo e Congresso a acele- nhas).
rarem as reformas essenciais 4.
a) No texto 1, Milton Santos critica ironica-
(ÍCARO, 170, out. 1998).
mente a distribuição do livro “Por uma
a) Transcreva outras três expressões do trecho vida melhor” no ensino público, alegan-
que tenham a mesma característica de infor- do que o seu conteúdo teria por finali-
dade ensinar o aluno a falar “errado”,
malidade.
valorizando desta forma a norma culta e
b) Substitua as referidas expressões por outras,
desprezando as outras variantes linguís-
típicas da linguagem formal. ticas. Segundo o autor, este fato consti-
tuiria uma agressão à cultura do país já
tão maltratada em programas de televi-
são ou outros veículos de comunicação.
No texto 2, Marcos Bagno alerta para o
caráter preconceituoso de tal afirmação,
pois o livro em questão pretende apenas
incluir no aprendizado da Língua Portu-
guesa as variedades linguísticas estigma-
tizadas pelas gramáticas normativas, de
maneira a colocar em pé de igualdade os
instrumentos de comunicação das cha-
madas “classes populares” e os usados
pelas classes urbanas consideradas de
prestígio.

52
b) Na pergunta “Como é que fica então as Que causam horror
concordâncias?”, Carlos Monforte trans- Deitados sob marquises,
gride uma das regras da gramática nor- Dormindo aqui e acolá
mativa que exige concordância do verbo No mais penoso abandono,
com o seu sujeito. É deste Brasil de Baixo
c) “Como é que ficam, então, as concordân- A classe dos marginais.
cias?”. 3.
d) Marcos Bagno assinala ironicamente a a) O recurso consiste em reproduzir, na es-
crita, o dialeto caipira.
transgressão gramatical de uma pessoa
b) Não, pois o dialeto caipira aparece em
que defende acirradamente a adequação
outras formas da linguagem coloquial, e
da fala às regras impostas pela gramáti- é encontrado nos grandes centros.
ca normativa e diverte-se com a evidente 4.
contradição. a) O pressuposto é que o acordo ortográfico
5. promoveria a unidade da língua em todos
a) No verso 11: "Umas, nuinhas da silva". os países lusófonos. O acordo contempla
b) Umas, completamente nuas. apenas a ortografia e não interfere nos
aspectos morfossintáticos ou lexicais que
caracterizam a relação da língua e seus
E.O. Enem falantes com a região onde se desenvolve
1. B 2. E 3. E 4. A 5. E a sua cultura, razão pela qual é inadequa-
do o pressuposto do personagem. Embora
6. E 7. E 8. A 9. B 10. D se possa unificar a ortografia, as vari-
antes sempre existirão.
b) Ao desconhecer o significado de “peú-
E.O. UERJ gas”(*) e “bica”(**) e estranhar a pa-
lavra “bicha”(***) no contexto da frase
Exame de Qualificação (termos usados no português europeu e
1. A 2. D 3. B 4. C não no Brasil), o personagem fica confu-
so, pois verifica que não houve unificação
do idioma como afirmara anteriormente.
E.O. Objetivas (*) meias
(**) café
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) (***) fila
1. B 2. D 3. D 4. C 5. D 5.
A informalidade encontra-se
a) em: 1. "deita e rola";
2. "de que está por cima da carne seca"; e
E.O. Dissertativas 3. "entrar em parafuso".
b) 1. "faz o que lhe agrada";
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) 2. "ter todo poder"; e
1.
3. "ficar desorientado".
a) Usando a ironia, Monteiro Lobato parte
da hipótese que, se a linguagem coloquial
é desprovida de regras e a linguagem es-
crita é subordinada às regras da gramáti-
ca normativa, então conclui que “a cor-
reção da língua é um artificialismo”.
Este raciocínio é falacioso, pois tanto a
linguagem coloquial como a escrita man-
têm vínculos com a gramática, embora
sob aspectos diferentes: a primeira com
a gramática discursiva, a segunda, com a
gramática normativa.
b) Apenas as expressões “Meter o bico” e
“orelhas murchas” pertencem ao uni-
verso da linguagem coloquial e poderiam
ser substituídas, segundo a variedade
padrão, por “intrometer-se” e “humil-
hada”, respectivamente.
2.
Estas pequenas pessoas,
Estes filhos do abandono,
Que vivem vagando à toa
Como objetos sem dono,

53
Aulas 3e4

Semântica:
elementos de análise
Competências 5, 6, 7 e 8
Habilidades 17, 18, 21 ,24 e 27
Competência 1 – Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para
sua vida.
H1 Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como elementos de caracterização dos sistemas de comunicação.
H2 Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de comunicação e informação para resolver problemas sociais.
H3 Relacionar informações geradas nos sistemas de comunicação e informação, considerando a função social desses sistemas.
H4 Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação.
Competência 2 – Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) (LEM) como instrumento de acesso a informações e a outras
culturas e grupos sociais.
H5 Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM ao seu tema.
H6 Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus mecanismos como meio de ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e culturas.
H7 Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e seu uso social.
H8 Reconhecer a importância da produção cultural em LEM como representação da diversidade cultural e linguística.
Competência 3 – Compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da
identidade.
H9 Reconhecer as manifestações corporais de movimento como originárias de necessidades cotidianas de um grupo social.
H10 Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em função das necessidades cinestésicas.
Reconhecer a linguagem corporal como meio de interação social, considerando os limites de desempenho e as alternativas de adaptação para
H11
diferentes indivíduos.
Competência 4 – Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e
da própria identidade.
H12 Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos artistas em seus meios culturais.
H13 Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos.
H14 Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos.
Competência 5 – Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante
a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção.
H15 Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.
H16 Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário.
H17 Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional.
Competência 6 – Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da
realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação.
H18 Identificar os elementos que concorrem para a progressão temática e para a organização e estruturação de textos de diferentes gêneros e tipos.
H19 Analisar a função da linguagem predominante nos textos em situações específicas de interlocução.
H20 Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a preservação da memória e da identidade nacional
Competência 7 – Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas.
H21 Reconhecer em textos de diferentes gêneros, recursos verbais e não-verbais utilizados com a finalidade de criar e mudar comportamentos e hábitos.
H22 Relacionar, em diferentes textos, opiniões, temas, assuntos e recursos linguísticos.
H23 Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.
Reconhecer no texto estratégias argumentativas empregadas para o convencimento do público, tais como a intimidação, sedução, comoção,
H24
chantagem, entre outras.
Competência 8 – Compreender e usar a língua portuguesa como língua materna, geradora de significação e integradora da organização
do mundo e da própria identidade.
H25 Identificar, em textos de diferentes gêneros, as marcas linguísticas que singularizam as variedades linguísticas sociais, regionais e de registro.
H26 Relacionar as variedades linguísticas a situações específicas de uso social.
H27 Reconhecer os usos da norma padrão da língua portuguesa nas diferentes situações de comunicação.
Competência 9 – Entender os princípios, a natureza, a função e o impacto das tecnologias da comunicação e da informação na sua vida
pessoal e social, no desenvolvimento do conhecimento, associando-o aos conhecimentos científicos, às linguagens que lhes dão suporte,
às demais tecnologias, aos processos de produção e aos problemas que se propõem solucionar.
H28 Reconhecer a função e o impacto social das diferentes tecnologias da comunicação e informação.
H29 Identificar pela análise de suas linguagens, as tecnologias da comunicação e informação.
H30 Relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento que elas produzem
Semântica – elementos de análise
Já que se fala a todo o momento de semântica no curso de Gramática, nada melhor do que apresentá-la logo no
início do material de Interpretação (já que ela é parte essencial dos processos interpretativos). A semântica é o cam-
po de estudos linguísticos que cuida dos significados das palavras e dos textos. Ela está presente em praticamente
todos os outros campos gramaticais (com exceção dos estudos básicos de fonética e fonologia, ligados à ortografia
e à acentuação). Pode ter certeza de que, onde há acepções de sentido, há semântica.
Além de sua presença em várias áreas da Gramática, a semântica possui seus próprios elementos de análise,
que conheceremos a seguir.

Sinonímia
Ocorre sinonímia quando temos palavras com significados idênticos ou muito semelhantes a outras.

§§ Cão = cachorro
§§ Jerimum = abóbora

A sinonímia tem forte relação com a paráfrase (possibilidade de se reconstruir uma frase ou texto com
outras palavras similares) e nos ajuda nos processos de coesão textual (por meio de sinônimos, evitamos a re-
petição de termos em um texto).

Antonímia
Ocorre antonímia quando temos palavras com significados contrários a outras.

§§ Bonito ≠ feio
§§ Alto ≠ baixo

Homonímia
Ocorre homonímia quando temos palavras de grafia igual ou pronúncia igual, mas com significado diferente. Isso
nos dá três tipos de homônimos:
1. Homônimo homófono heterógrafo (pronúncia igual – grafia diferente)
Exemplo: acento (marca gráfica de tonalidade) e assento (local para se sentar)

2. Homônimo homógrafo heterófono (escrita igual – pronúncia diferente)


Exemplo: jogo (substantivo) e jogo (verbo)

3. Homônimo homófono homógrafo (pronúncia igual – escrita igual)


Exemplo: rio (substantivo) e (eu) rio (verbo)

Paronímia
Temos parônimos quando as palavras são muito parecidas, mas seus sentidos são diferentes.
Exemplos: comprimento (largura) e cumprimento (saudação)
discriminar (separar) e descriminar (absolver)

57
Polissemia Na primeira, temos comer sendo usado na sua acepção
mais comum, que é alimentar-se. Já no segundo caso, te-
Temos polissemia em palavras que preservam sua classe mos o verbo comer sendo usado para “figurar” a ideia
gramatical, mas que possuem significados múltiplos. de alguém comendo poeira, mas não porque isso esteja
ocorrendo de verdade, e sim porque se tenta passar a
Exemplos: natureza (meio ambiente) e natureza (es- ideia de que o piloto passou tão rápido pelo adversário
sência de algo) que levantou poeira, e quem está atrás a teria “comido”.
banco (local onde se senta) e banco (insti- No primeiro caso, a palavra comer foi usada em
tuição financeira) seu sentido dito literal, ou o sentido padrão (primeiro)
dessa palavra. Quando isso ocorre, temos uma palavra
em sentido denotativo. Já no segundo exemplo, o verbo
Hiperonímia e hiponímia
comer foi usado em sentido figurado, tentando figurar/re-
São fenômenos que operam relações de abrangência presentar uma situação (alguém comendo poeira). Quan-
do isso ocorre, temos uma palavra em sentido conotativo.
entre palavras (palavras que englobam outras ou que
são englobadas). As palavras que englobam são conhe-
Sentido denotativo
cidas como hiperônimos; as englobadas, como hipôni-
mos.
Como vimos anteriormente, entende-se por sentido de-
notativo o sentido primeiro de uma palavra. Seu sentido
Exemplos: Comprei um bacalhau para preparar na
básico, de dicionário. Entender bem o funcionamento
semana santa. Esse peixe é bastante salgado. (Peixe
do sentido denotativo nos ajudará, mais adiante, a en-
é uma palavra mais abrangente, que dá conta de ba-
tender como são operados alguns processos de inter-
calhau e de outros diversos peixes, portanto, podemos
pretação em gêneros textuais do português, como os
afirmar que peixe é hiperônimo de bacalhau, e bacalhau
textos científicos e também os jornalísticos, que são
é hipônimo de peixe.)
textos cujo objetivo é transmitir informações exatas e
Houve um aumento da gasolina. Esse fato
precisas ao leitor. Um texto denotativo evita palavras às
deixou os brasileiros irritados. (Fato é uma palavra que
quais se possam atribuir sentidos variados. Pensando no
dá conta de aumento da gasolina, portanto, podemos
que aprendemos na aula anterior, os textos denotativos
afirmar que fato é hiperônimo do trecho sublinhado.)
evitam trabalhar com textos polissêmicos.

Sentido conotativo
Denotação e conotação
Entende-se por sentido conotativo aquele que explora
É dentro do campo da semântica que verificamos tam- os múltiplos significados que uma palavra pode ter.
bém os processos de denotação e conotação, fenôme- Em um texto conotativo, não importa muito o sentido
nos linguísticos que nos permitem entender a amplitude primeiro da palavra, e sim a sua capacidade de “su-
de significação existente em nossa língua, ou, em ter- gerir” interpretações variadas. Os gêneros que habi
mos mais claros, é o estudo da denotação e da conota- tualmente trabalham com conotações são os literários
ção que nos permite perceber o quanto os significados (prosa, poesia, crônica, entre outros) e as canções. Mas
podem variar por conta do interesse dos interlocutores. também podemos encontrar esse sentido em outros
Vejamos alguns exemplos: tipos de gênero, dependendo das intenções do autor.
§§ Filho, você tem que comer todo seu jantar, ou Costumam ser textos de natureza mais complexa, que
não terá sobremesa. exigem um trabalho de leitura mais profundo, para
§§ O piloto fez o adversário comer poeira. que se possa apreender o que o autor quis expressar
nas entrelinhas da mensagem. Trabalha-se aqui com
É possível perceber nas frases apresentadas que
conhecimentos amplos de vocabulário.
o verbo ‘comer’ foi usado com dois sentidos diferentes.

58
APLICAÇÃO NO COTIDIANO

Abaixo, temos algumas imagens retiradas do “Pequeno dicionário ilustrado de expressões idiomáticas”.
Nelas vemos a representação de algumas expressões populares famosas, usadas diariamente por diver-
sas pessoas no Brasil. Essas imagens compõem um divertido painel denotativo de composições historica-
mente empregadas no sentido conotativo.

(“Pequeno dicionário ilustrado de expressões idiomáticas” - Everton Ballardin e Marcelo Zocchio) - Editora DBA - 1999
60
INTERDISCIPLINARIDADE

Nessas canções há varias relações semânticas conotativas

De repente Califórnia (Lulu Santos) Que o caminho te fortaleceu


Garota eu vou pra Califórnia É sobre ser abrigo
Viver a vida sobre as ondas E também ter morada em outros corações
Vou ser artista de cinema E assim ter amigos contigo
O meu destino é ser star... Em todas as situações

O vento beija meus cabelos A gente não pode ter tudo


As ondas lambem minhas pernas Qual seria a graça do mundo se fosse assim?
O sol abraça o meu corpo Por isso, eu prefiro sorrisos
Meu coração canta feliz... E os presentes que a vida trouxe
Pra perto de mim
Eu dou a volta, pulo o muro
Mergulho no escuro Não é sobre tudo que o seu dinheiro
Sarto de banda É capaz de comprar
Na Califórnia é diferente, irmão E sim sobre cada momento
É muito mais do que um sonho... Sorrindo a se compartilhar
Também não é sobre correr
Trem bala (Ana Vilela) Contra o tempo pra ter sempre mais
Não é sobre ter Porque quando menos se espera
Todas as pessoas do mundo pra si A vida já ficou pra trás
É sobre saber que em algum lugar
Segura teu filho no colo
Alguém zela por ti
Sorria e abraça teus pais
É sobre cantar e poder escutar
Enquanto estão aqui
Mais do que a própria voz
Que a vida é trem-bala, parceiro
É sobre dançar na chuva de vida
E a gente é só passageiro prestes a partir
Que cai sobre nós
Laiá, laiá, laiá, laiá, laiá
É saber se sentir infinito
Laiá, laiá, laiá, laiá, laiá
Num universo tão vasto e bonito
É saber sonhar Segura teu filho no colo
E, então, fazer valer a pena cada verso Sorria e abraça teus pais
Daquele poema sobre acreditar Enquanto estão aqui
Que a vida é trem-bala, parceiro
Não é sobre chegar no topo do mundo
E a gente é só passageiro prestes a partir
E saber que venceu
É sobre escalar e sentir

61
Estrutura Conceitual

SEMÂNTICA

GRAMÁTICA GRAMÁTICA
NORMATIVA DESCRITIVA

- SINONÍMIA
FONÉTICA E FONOLOGIA - ANTONÍMIA
- HOMONÍMIA
- POLISSEMIA
- NÃO ESTABELECEM - PARONÍMIA
RELAÇÕES DE SENTIDO - HIPERONÍMIA
Oposição
- HIPONÍMIA

62
E.O. Aprendizagem Essa arte do bem pensar deve orientar nos-
sas emoções e condecorar nossas conquistas.
Pensar para não sofrer, eis um dos lemas
1. (UEPB) Do texto, abaixo, é possível concluir centrais dessa atividade interrogante que
que o termo “chatear” foi usado: tem por finalidade nos fazer encontrar a sa-
bedoria do feliz. Por ser uma arte, todos a
desejam, mas apenas uns poucos a atingem.
E esses são os sábios, aqueles que conse-
guem monitorar com destreza as artimanhas
do viver, fugindo das seduções do efêmero e
dos negativismos atuais. Sabemos que mui-
ta gente não gosta de pensar, mas podemos
aprender a gostar dessa atividade, já que
todo amor é um aprendizado, fruto de um
persistente esforço. Não existe gratuidade
na vida. Toda pessoa doadora sabe disso. Ela
dá porque recebe, ama porque é amada.
Há outro desafio fundamental para a vida
a) de maneira ambígua, sem nenhuma pista que o ser humano teima em não assumir em
que possa ajudar na busca dos sentidos do sua amplitude: as implicações ecológicas da
termo. nossa relação com o planeta. Conseguimos
b) de forma figurada, exemplificando unica- avanços significativos na esfera da política
mente a polissemia da linguagem. e da educação, em geral, mas na área dos
c) com o sentido literal do termo, ocasionando sistemas econômicos pouca coisa foi con-
uma redundância. quistada. O sistema global de produção con-
d) com mais de um sentido, cuja alteração se tinua agindo como se os objetivos a alcançar
faz perceber pelos recursos linguísticos e vi- fossem os mesmos de 200 anos atrás. O fre-
suais que servem de pistas para o entendi- nesi do crescimento a qualquer custo atinge
mento do texto. todos os recantos da Terra. A roda acelera-
e) de forma equivocada, pois não existe um da desde o século XIX não pode parar. Para
haver riqueza, é preciso produzir, consumir,
destinatário declarado a quem se dirige a
obter lucro, criar mais trabalho, produzir e
mensagem.
repetir tudo de novo numa ciranda sem fim.
Acreditam que, quanto mais consumirmos,
2. (UEL) “Que pode uma criatura senão, mais trabalho criamos, mais o país pode se
entre criaturas, amar? desenvolver. O modelo consumista de pro-
Amar e esquecer, dução da atualidade é ‘ecocida’ em sua na-
Amar e malamar, tureza e antiecológico em sua finalidade. O
Amar, desamar, amar? planeta não mais suporta tamanha pressão
Sempre e até de olhos vidrados, amar?” sobre os seus já limitados recursos. Os ecolo-
gistas lançam pelos quatro cantos do mundo
A palavra ATÉ, no texto de Carlos Drummond seus gritos de alarme. Mas os donos do poder
de Andrade, tem o mesmo valor semântico industrial tapam os ouvidos a essas lamenta-
que em: ções. É impossível pensarmos em crescimen-
a) O marinheiro chegou ATÉ o porto ao ama- to e sustentabilidade num sistema em que a
nhecer. obsolescência é planejada e o desperdício é o
b) A polícia, ATÉ agora, não conseguiu capturar motor da reposição. Quase todos agem como
os fugitivos. se os recursos fossem ilimitados. É lógico que
c) As apurações estaduais foram suspensas ATÉ todos nós precisamos consumir, mas consu-
segunda ordem. mo para suprir nossas necessidades e não
d) Saveiro Geração III. Resiste a tudo, ATÉ a para satisfazer o poço sem fundo dos nossos
você. desejos. Todo o sistema global de produção
e) 12 ATÉ 18 dias sem juros no cheque especial. atual aposta na ideia de que o supérfluo é
Tarifas que podem chegar a zero. mais importante do que o necessário.
Concluindo, podemos afirmar que a reflexão
filosófica nos ajuda a encontrar uma luz no
3. (CFTMG) Filosofar para preservar
meio do túnel antes que o dique se rompa e a
O modelo consumista de produção da atuali- inundação esmague todos. Filosofar é apon-
dade é ecocida em sua natureza e antiecoló- tar expectativas e, nesse aspecto, todas as
gico em sua finalidade pessoas de bom senso devem, com urgência,
Alfeu Trancoso * utilizar a reflexão para propor novos cami-
Filosofar é fazer pensar, refletir sobre como nhos ou uma saída para o impasse civilizató-
gerenciar melhor nossas escolhas cotidianas. rio em que nos encontramos. Urge lutarmos

63
por uma sociedade mais verde, mais intera- do Facebook. Isso sem contar a imensa quan-
tiva com a natureza. Devemos saber que a tidade de textos apócrifos, muitas vezes até
luta ecológica não é somente uma luta para opostos ao pensamento do presumido autor,
a preservação da espécie humana, mas de to- falsamente presumido. A graça está no fato
das as espécies do planeta, já que somos fios de que todos, agora, têm opinião sobre tudo.
da mesma rede interativa que forma o tecido − Mas isso não é bom?
da vida na Terra. O gigante, depois da maldição de Netuno,
tornou-se um ser impaciente.
(*) Ambientalista e professor de Filosofia da PUC Minas O fato, em si, não tem importância alguma.
(Disponível em: <http://www.revistaecologico. O problema é que muita gente lê a enxur-
com.br>. Acesso em: 10 set. 2013.) rada de bobagens que aparecem na internet
não como opinião, mas como conhecimento.
A passagem em que as palavras foram em- O Platão, por exemplo, afirmava que opinião
pregadas em sentido literal é (doxa) era o falso conhecimento. O conhe-
a) “Não existe gratuidade na vida.” cimento verdadeiro (episteme) depende de
b) “A roda acelerada desde o século XIX não estudo profundo, comprovação metódica,
pode parar.” teste de validade. Essas coisas de que se vale
c) “(...) e não para satisfazer o poço sem fundo em geral a ciência.
dos nossos desejos.” O mal que há nessa “democratização” dos
d) “(...) somos fios da mesma rede interativa veículos é que se formam crenças sem fun-
que forma o tecido da vida na Terra.” damento, mudam-se as opiniões das pesso-
as, afirmam-se absurdos em que muita pes-
4. (IFSUL) soa ingênua acaba acreditando. Sim, porque
estudar, comprovar metodicamente, testar a
Agora todo mundo tem opinião
validade, tudo isso dá muito trabalho.
Meu amigo Adamastor, o gigante, me apa- O Adamastor não estava muito convencido
receu hoje de manhã, muito cedo, aqui na da justeza4 dos meus argumentos, mas o café
biblioteca, e disse que vinha a fim de um tinha terminado e ele se despediu.
cafezinho. Mentira, eu sei. Quando ele vem (Texto de Menalton Braff, publicado em 03 de
abril de 2015. Disponível em: <http://www.
tomar um cafezinho é porque está com algu- cartacapital.com.br/cultura/agora-todo-mundo-tem-
ma ideia borbulhando em sua mente. opiniao-7377.html>. Acesso em: 20 abr. 2015.)
E estava. Depois do primeiro gole e antes do
segundo, café muito quente, ele afirmou que A significação das palavras não é fixa. Elas
concorda plenamente com a democratização podem variar, estabelecendo novos concei-
da informação. Agora, com o advento da in- tos por meio de associações, dependendo de
ternet, qualquer pessoa, democraticamente, seu emprego em uma frase. Dessa forma, na
pode externar aquilo que pensa. construção de sentido de um texto, as pa-
Balancei a cabeça, na demonstração de uma lavras podem ser empregadas em sentido
quase divergência, e seu espanto1 também denotativo/literal e/ou conotativo/figurado.
me espantou. Como assim, ele perguntou, Analisando o texto, qual alternativa apre-
está renegando a democracia? Pedi com senta palavra que foi empregada com senti-
modos a meu amigo que não embaralhas- do conotativo?
se as coisas. Democracia não é um termo a) espanto (referência 1).
divinatório2, que se aplique sempre, em b) divinatório (referência 2).
qualquer situação. c) enxurrada (referência 3).
Ele tomou o segundo gole com certa avidez e d) justeza (referência 4).
queimou a língua.
Bem, voltando ao assunto, nada contra a de-
5. (IFSP) O padeiro
mocratização dos meios para que se divul-
guem as opiniões, as mais diversas, mais Levanto cedo, faço a higiene pessoal, ponho
esdrúxulas, mais inovadoras, e tudo o mais. a chaleira no fogo para fazer café e abro a
É um direito que toda pessoa tem: emitir porta do apartamento − mas não encontro o
opinião. pão costumeiro. No mesmo instante me lem-
O que o Adamastor não sabia é que uns dias bro de ter lido alguma coisa nos jornais da
atrás andei consultando uns filósofos, al- véspera sobre a “greve do pão dormido”. De
guns antigos, outros modernos, desses que resto não é bem uma greve, é um lockout,
tratam de um palavrão que sobrevive até os greve dos patrões, que suspenderam o traba-
dias atuais: gnoseologia. Isso aí, para dizer lho noturno; acham que obrigando o povo a
teoria do conhecimento. tomar seu café da manhã com pão dormido
Sim, e daí?, ele insistiu. conseguirão não sei bem o que do governo.
O mal que vejo, continuei, não está na Está bem. Tomo meu café com pão dormi-
enxurrada3 de opiniões as mais isso ou aquilo do, que não é tão ruim assim. E enquanto
na internet, e principalmente com a chegada tomo café vou me lembrando de um homem

64
modesto que conheci antigamente. Quando da chuva ou do sol a pino de verão. Esses
vinha deixar pão à porta do apartamento ele desocupados matam o tempo jogando porri-
apertava a campainha, mas, para não inco- nha, ou lendo os jornais velhos que mamãe
modar os moradores, avisava gritando: amontoa num canto, sentados nos degraus
– Não é ninguém, é o padeiro! do escadote com que ela alcança as pratelei-
Interroguei-o uma vez: como tivera a ideia ras altas. Já quando fazem o obséquio de me
de gritar aquilo? liberar o espaço, de tempos em tempos entro
Ele abriu um sorriso largo. Explicou que para olhar as estantes onde há de tudo um
aprendera aquilo de ouvido. Muitas vezes lhe pouco, em boa parte remessas de editores
acontecera bater a campainha de uma casa e estrangeiros que têm apreço pelo meu pai.
ser atendido por uma empregada ou por uma Num reduto de literatura tão sortida, como
outra pessoa qualquer, e ouvir uma voz que bem sabem os habitués de sebos, fascina a
perspectiva de por puro acaso dar com um
vinha lá de dentro perguntando quem era;
livro bom. Ou by serendipity, como dizem
e ouvir a pessoa que o atendera dizer para
os ingleses quando na caça a um tesouro se
dentro: “não é ninguém, não senhora, é o
tem a felicidade de deparar com outro bem,
padeiro”. Assim ficara sabendo que não era
mais precioso ainda. Hoje revejo na mesma
ninguém... prateleira velhos conhecidos, algumas de-
Ele me contou isso sem mágoa nenhuma, zenas de livros turcos, ou búlgaros ou hún-
e se despediu ainda sorrindo. Eu não quis garos, que papai é capaz de um dia querer
detê-lo para explicar que estava falando com destrinchar. Também continua em evidência
um colega, ainda menos importante. Naque- o livro do poeta romeno Eminescu, que papai
le tempo eu também, como os padeiros, fazia ao menos tentou ler, como é fácil inferir das
trabalho noturno. Era pela madrugada que folhas cortadas a espátula. Há uma edição
deixava a redação do jornal, quase sempre em alfabeto árabe das Mil e Uma Noites que
depois de uma passagem pela oficina – e ele não leu, mas cujas ilustrações admirou
muitas vezes saía já levando na mão um dos longamente, como denunciam os filetes de
exemplares rodados, o jornal ainda quenti- cinzas na junção das suas páginas coloridas.
nho da máquina, como pão saído do forno. Hoje tenho experiência para saber quantas
Ah, eu era rapaz, eu era rapaz naquele tem- vezes meu pai leu um mesmo livro, posso
po! E às vezes me julgava importante por- quase medir quantos minutos ele se deteve
que no jornal que levava para casa, além de em cada página. E não costumo perder tem-
reportagens ou notas que eu escrevera sem po com livros que ele nem sequer abriu, en-
assinar, ia uma crônica ou artigo com o meu tre os quais uns poucos eleitos que mamãe
nome. O jornal e o pão estavam bem cedi- teve o capricho de empilhar numa ponta de
nho na porta de cada lar; e dentro do meu prateleira, confiando numa futura redenção.
coração eu recebi uma lição daquele homem Muitas vezes a vi de manhãzinha compade-
entre todos útil e entre todos alegre; “não é cida dos livros estatelados no escritório, com
ninguém, é o padeiro!”. especial carinho pelos que trazem a foto do
E assoviava pelas escadas. autor na capa e que papai despreza: parece
(Rubem Braga. Ai de ti, Copacabana. Rio de
disco de cantor de rádio.
(Chico Buarque. O irmão alemão. 1 ed. São
Janeiro: Editora do Autor, 1960. Adaptado)
Paulo. Companhia das letras. 2014. p. 60-61.
A expressão − pão dormido − foi empregada Texto adaptado com o acréscimo do título.)
com sentido
a) denotativo, indicando que os padeiros, por A obra O irmão alemão, último livro de Chi-
causa da greve, adulteraram a receita do co Buarque de Holanda, tem como móvel da
pão. narrativa a existência de um desconhecido
irmão alemão, fruto de uma aventura amo-
b) denotativo, indicando que o pão entregue
rosa que o pai dele, Sérgio Buarque de Ho-
aos moradores estava fora de validade.
landa, tivera com uma alemã, lá pelo final
c) conotativo, indicando que o pão a ser consu-
da década de 30 do século passado. Exata-
mido não estava fresco.
mente quando Hitler ascende ao poder na
d) conotativo, indicando que os padeiros redu- Alemanha. Esse fato é real: o jornalista, his-
ziram o trabalho noturno durante a greve. toriador e sociólogo Sérgio Buarque de Ho-
e) conotativo, indicando que a massa do pão landa, na época, solteiro, deixou esse filho
precisa descansar para que o fermento aja. na Alemanha. Na família, no entanto, não
6. (Uece) se falava no assunto. Chico teve, por acaso,
conhecimento dessa aventura do pai em uma
A garagem de casa
reunião na casa de Manuel Bandeira, por co-
Com o portão enguiçado, e num convite1 a
mentário feito pelo próprio Bandeira.
ladrões de livros, a garagem de casa lembra Foi em torno da pretensa busca desse pre-
uma biblioteca pública permanentemente tenso irmão que Chico Buarque desenvolveu
aberta para a rua. Mas não são adeptos de sua narrativa ficcional, o seu romance.
literatura os indivíduos que ali se abrigam
65
Sobre a obra, diz Fernando de Barros e Silva: – mas qual? 1onde o ímã que atraia uma boa
“o que o leitor tem em mãos [...] não é um limalha? onde a farinha que proverá o pão
relato histórico. Realidade e ficção estão aqui substancioso? O relógio está correndo e o as-
entranhadas numa narrativa que embaralha sunto não vem. Cronos, cronologia, crônica,
sem cessar memória biográfica e ficção”. tempo, tempo, tempo... Que tal falar da falta
O substantivo “convite” (ref. 1) tem, no tex- de assunto? Mas isso já aconteceu umas três
to, o mesmo sentido que tem no enunciado vezes... Há cronista que abre a Bíblia em bus-
seguinte: ca de um grande tema: os mandamentos, um
a) Um convite formal a Alberto o obrigará a faraó, o Egito antigo, as pragas, as pirâmides
abandonar sua confortável neutralidade e a erguidas pelo trabalho escravo? Mas como
tomar partido nessa questão. atualizar o interesse em tudo isso? O leitor
b) A falta de compromisso de alguns professo- de jornal ou de revista anda com mais pressa
res é um convite à malandragem dos alunos.
do que nunca, e, aliás, está munido de um
c) O convite para a sua festa será entregue com
celular que lhe coloca o mundo nas mãos a
antecedência. Não há, pois, motivo para tan-
qualquer momento.
ta preocupação.
Sim, a internet! O Google! É a salvação. Lá vai
d) O show será gratuito. A Secretaria de Cultura
estará distribuindo os convites até a véspera o cronista caçar assunto no computador. Mas
do espetáculo. aí o problema fica sendo o excesso: ele digita,
por exemplo, “Liberdade”, e 5lá vem a estátua
nova-iorquina com seu facho de luz saudan-
7. (FMP) As palavras podem ser empregadas no
do os navegantes, ou o bairro do imigrante
sentido literal ou no sentido figurado.
japonês em São Paulo, ou a letra de um hino
O trecho da obra de Graciliano Ramos que
cívico, ou um tratado filosófico, até mesmo
se caracteriza pela presença de linguagem
o “Libertas quae sera tamen*” dos inconfi-
figurada é:
dentes mineiros... Tenta-se outro tema geral:
a) “Não me ajeitava a esse trabalho: a mão se-
gurava mal a caneta, ia e vinha em sacu- “Política”. Aí mesmo é que não para mais:
didelas, a pena caprichosa fugia da linha, vêm coisas desde a polis grega até um poema
evitava as curvas, rasgava o papel, andava à de Drummond, salta-se da política econômi-
toa como uma barata doida, semeando bor- ca para a financeira, chega-se à política de
rões.” RAMOS, G. Infância. 9. ed. São Paulo: preservação de bens naturais, à política eco-
Martins, 1972, p. 135. lógica, à partidária, à política imperialista, à
b) “A mulher gorda chamou-me, deu-me uma política do velho Maquiavel, ufa.
cadeira, examinou-me a roupa, o couro ca- Que tal então a gastronomia, mais na moda
beludo, as unhas e os dentes. Em seguida do que nunca? O velho bifinho da tia ou o
abriu a caixinha branca, retirou o folheto: saudoso picadinho da vovó, receitas domésti-
— Leia.” RAMOS, G. Infância. 9. ed. São cas guardadas no segredo das bocas, viraram
Paulo: Martins, 1972, p. 135. nomes estrangeiros, sob molhos complicados,
c) “Atrás da loja, de quatro portas, duas em de apelido francês. Nesse ramo da alimenta-
cada frente, havia o armazém de ferragens ção há também que considerar o que sejam
e o depósito de milho, onde eu e minhas produtos transgênicos, orgânicos, as ameaças
irmãs brincávamos.” RAMOS, G. Infância. 9. do glúten, do sódio, da química nociva de
ed. São Paulo: Martins, 1972, p. 72. tantos fertilizantes. Tudo muito sofisticado e
d) “Datam desse tempo as minhas mais antigas atingindo altos níveis de audiência nos pro-
recordações do ambiente onde me desen- gramas de TV: já seremos um país povoado
volvi como um pequeno animal. Até então por cozinheiros, quer dizer, por chefs de cui-
algumas pessoas, ou fragmentos de pessoas, sine?**
tinham se manifestado, mas para bem dizer
Temas palpitantes, certamente de interesse
viviam fora do espaço.” RAMOS, G. Infância.
público, estão no campo da educação: há, por
9. ed. São Paulo: Martins, 1972, p. 26.
exemplo, quem veja nos livros de História
e) “Na cidade ainda não havia hotéis, e à tar-
dinha, ao chegar o trem, quase diariamente uma orientação ideológica conduzida pelos
nos apareciam carregadores que transporta- autores; há quem defenda uma neutralidade
vam bagagens.” RAMOS, G. Infância. 9. ed. absoluta diante de fatos que seriam indiscu-
São Paulo: Martins, 1972, p. 256. tíveis. Que sentido mesmo tiveram a abolição
da escravatura e a proclamação da República?
E o suicídio de Getúlio Vargas? E os aconteci-
8. (Puccamp) Cronista sem assunto
mentos de 1964? Já a literatura e a redação
Difícil é ser cronista regular de algum pe andam questionadas como itens de vestibu-
riódico. Uma crônica por semana, havendo lar: mas sob quais argumentos o desempenho
ou não assunto... É buscar na cabeça uma lu- linguístico e a arte literária seriam dispensá-
zinha, uma palavra que possa acender toda veis numa formação escolar de verdade?
uma frase, um parágrafo, uma página inteira Enfim, 10o cronista que se dizia sem assunto

66
de repente fica aflito por ter de escolher um Considerada a situação em que está inseri-
no infinito cardápio digital de assuntos. Que do, o segmento que NÃO está empregado em
esperará ler seu leitor? Amenidades? Algu- sentido figurado é:
ma informação científica? A quadratura do a) “Onde o ímã que atraia uma boa limalha?”
círculo encontrada pelo futebol alemão? A (ref. 1)
situação do cinema e do teatro nacionais, b) “lá vem a estátua nova-iorquina com seu fa-
dependentes de financiamento por incenti- cho de luz saudando os navegantes.” (ref. 5)
vos fiscais? Os megatons da última banda de c) “Houve época em que bastava ao cronista
rock que visitou o Brasil? O ativismo político ser poético.” (ref. 12)
das ruas? Uma viagem fantasiosa pelo inte- d) “tudo podia virar uma valsa melancólica ou
rior de um buraco negro, esse mistério maior um tango arrebatador.” (ref. 13)
tocado pela Física? A posição do Reino Unido e) “o cronista que se dizia sem assunto de re-
diante da União Europeia? pente fica aflito por ter de escolher um no
12
Houve época em que bastava ao cronista infinito cardápio digital de assuntos.” (ref. 10)
ser poético: o reencontro com a primeira na-
moradinha, uma tarde chuvosa, um passeio
pela infância distante, um amor machucado, 9. (CPS) Thomas Edison, o gênio da lâmpada
13
tudo podia virar uma valsa melancólica ou [...] (Thomas) Edison tinha na cabeça a ideia
um tango arrebatador. Mas hoje parece que de conseguir uma luz suave como a do gás e
estamos todos mais exigentes e utilitaristas, que apresentasse mais vantagens. O resulta-
e os jovens cronistas dos jornais abordam do, a lâmpada elétrica, foi a invenção que Ihe
criticamente os rumores contemporâneos, daria mais problemas e trabalho. À primeira
valem-se do vocabulário ligado a novos com- vista, o desafio parecia simples: tratava-se de
portamentos, ou despejam um humor ácido achar um material que ficasse incandescente
em seus leitores, num tempo sem nostalgia quando a corrente elétrica passasse por ele
e sem utopias. e depois disso, fazer com esse material um
É bom lembrar que o papel em que se impri- fio fino, um filamento. Como outros inven-
mem livros, jornais e revistas está sob ame- tores, Edison acreditava que esse filamento
aça como suporte de comunicação. O mesmo precisaria ficar isolado dentro de um bulbo
ocorre com o material das fitas, dos CDs e de vidro do qual o ar tivesse sido retirado,
DVDs: o mundo digital armazena tudo e pro- pois o oxigênio facilita a combustão. Mesmo
paga tudo instantaneamente. Já surgem in- no vácuo, porém, todas as dezenas e deze-
contáveis blogs de cronistas, onde os autores nas de filamentos diferentes testados pela
discutem on-line com seus leitores aspectos equipe de Edison queimavam em poucos mi-
da matéria tratada em seus textos. A intera- nutos. Durante mais de um ano, ele e seus
tividade tornou-se praticamente uma regra: assistentes fizeram e testaram filamentos de
há mesmo quem diga que a própria noção de todos os materiais possíveis e imagináveis.
De experiência em experiência, chegaram ao
autor, ou de autoria, já caducou, em função
fio de algodão carbonizado.
da multiplicidade de vozes que se podem
Foi, literalmente, uma ideia luminosa. Acesa
afirmar num mesmo espaço textual. Num
a 21 de outubro de 1879, a lâmpada brilhou
plano cósmico: quem é o autor do Universo?
horas seguidas. Absorvido pelo experimento,
Deus? O Big Bang? A Física é que explica tudo
Edison não pregou olho enquanto isso. [...]
ou deixemos tudo com o criacionismo?
(Disponível em: <http://tinyurl.com/zw3g5a9>
Enquanto não chega seu apocalipse profis- Acesso em: 16.02.2016. Adaptado.)
sional, o cronista de periódico ainda tem
emprego, o que não é pouco, em tempo de A linguagem conotativa preza pelo emprego
crise. Pois então que arrume assunto, e um das palavras em sentido figurado ou simbólico.
bom assunto, para não perder seus leitores. Assinale a alternativa em que o autor faz uso
Como não dá para ser sempre um Machado de desse tipo de linguagem.
Assis, um Rubem Braga, um Luis Fernando a) “tratava-se de achar um material que ficasse
Veríssimo, há que se contentar com um mí- incandescente”
nimo de estilo e uma boa escolha de tema. A b) “o ar tivesse sido retirado, pois o oxigênio
variedade da vida há de conduzi-lo por um facilita a combustão”
bom caminho; é função do cronista encontrar c) “filamentos diferentes testados pela equipe
algum por onde possa transitar acompanhado de Edison queimavam em poucos minutos”
de muitos e, de preferência, bons leitores. d) “Durante mais de um ano, ele e seus assis-
tentes fizeram e testaram filamentos”
(Teobaldo Astúrias, inédito)
e) “Edison não pregou olho enquanto isso”
* Liberdade ainda que tardia.
** chefes de cozinha.

67
1
0. Categorias
Esse princípio é explicitado por quatro cate-
gorias gerais – a da quantidade das informa-
ções dadas, a de sua verdade, a de sua perti-
nência e a da maneira como são formuladas,
que constituem as máximas conversacionais.
(...)
Não são regras

Pode-se infringir uma máxima para não


transgredir outra, cujo respeito é considera-
Na charge, para efeito de humor, faz-se um do mais importante.
jogo de palavras No exemplo que segue, a resposta do inter-
a) parônimas, com isso a personagem reclama locutor viola a máxima da quantidade para
do assento da poltrona na qual está sentada. não desobedecer à da qualidade:
b) homônimas, porém a personagem erra ao – Onde João trabalha? Ele saiu daquela fir-
afirmar que a forma verbal não leva acento. ma?
c) sinônimas, e a personagem está de fato di-
– No Rio de Janeiro.
zendo que a grafia correta é doi e não dói.
Com efeito, quem pergunta quer de fato
d) ambíguas, pois é difícil saber se a persona-
saber é a firma onde João presta serviços.
gem reclama da poltrona e da escrita ou as
A resposta mais vaga permite inferir que o
enaltece.
interlocutor não sabe exatamente onde João
e) antônimas, pois cada uma das grafias (assen-
trabalha.
to/acento) remete a um sentido da oposição
dói/doi. Pode-se explorar a infringência de uma má-
xima com vistas a criar um dado efeito de
sentido. Por exemplo, a ironia é a exploração
E.O. Fixação de uma transgressão da máxima da qualida-
de. O que o texto irônico está dizendo não é
1. (Uemg) Os princípios da conversa verdade. Deve-se entendê-lo pelo avesso. No
José Luiz Fiorin
exemplo que segue, “modesto” quer dizer o
oposto:
As condições gerais de linguagem que per- “‘Tenho uma voz conhecida, então não é
mitem fazer inferências na troca verbal qualquer narrador, é o Falabella contando a
história’, diz o modesto autor-locutor”
Uma anedota conhecida conta que um agen-
(+ Miguel Falabella) (Veja, 11/1/2012, p. 109)
te alfandegário pergunta a um passageiro
que desembarcara de um voo internacional
e passava pela aduana: MÁXIMAS CONVERSACIONAIS
– Licor, conhaque, grapa...?
Máximas da quantidade
O passageiro responde:
a) Que sua contribuição contenha o tanto de
– Para mim, só um cafezinho.
informação exigida;
A graça da piada reside no fato de que o pas-
b) Que sua contribuição não contenha mais
sageiro fez, propositadamente ou não, uma
informação do que é exigido.
inferência errada nessa situação de comu-
nicação. Inferiu que o fiscal aduaneiro lhe Máximas da qualidade (da verdade)
oferecia um digestivo, como no final de uma a) Que sua contribuição seja verídica;
refeição num restaurante, quando, na rea- b) Não diga o que pensa que é falso;
lidade, a inferência correta é se ele trazia c) Não afirme coisa de que não tem provas.
alguma bebida alcoólica na bagagem. Ele
violou o princípio de pertinência que rege o Máxima da relação (da pertinência)
uso da linguagem. Fale o que é concernente ao assunto tratado
Chama-se inferência pragmática aquela que (seja pertinente).
resulta do uso dos princípios que governam Máximas de maneira
a utilização da linguagem na troca verbal. Seja claro.
Paul Grice (1975) postula que um princípio a) Evite exprimir-se de modo obscuro;
de cooperação preside à comunicação. Ele b) Evite ser ambíguo;
enuncia-se assim: sua contribuição à comu- c) Seja breve (evite a prolixidade inútil);
nicação deve, no momento em que ocorre, d) Fale de maneira ordenada.
estar de acordo com o objetivo e a direção http://revistalingua.com.br/textos/100/
em que você está engajado. artigo304577-1.asp. (Adaptado).

68
A textualidade tem a referenciação como um suspendeu a resposta. Espiou manso para
de seus princípios. Trata-se de um processo mim, me acenando de vir também, por uns
pelo qual introduzimos ideias no texto e as passos. Temi a ira de nossa mãe, mas obe-
recuperamos, por meio de recursos diversos. deci, de vez de jeito. O rumo daquilo me
Um dos recursos muito utilizados é a sino- animava, chega que um propósito perguntei:
nímia, que consiste no emprego de palavras “– Pai, o senhor me leva junto, nessa sua
com sentidos semelhantes, de modo a evitar canoa?” 4Ele só retornou o olhar em mim, e
a repetição desnecessária. Em relação aos me 2botou a bênção, com gesto me mandan-
pares de palavras a seguir, marque V (verda- do para 3trás. Fiz que vim, mas ainda virei,
deiro) para os pares de sinônimos corretos e na grota do mato, para saber. Nosso pai en-
F (falso) para os pares de sinônimos incorre- trou na canoa e desamarrou, pelo remar. E a
tos, de acordo com o texto. canoa saiu se indo – a sombra dela por igual,
( ) anedota – piada feito um jacaré, comprida longa.
( ) agente alfandegário – fiscal aduaneiro (Guimarães Rosa, J. Ficção completa. Rio de
( ) infringência – transgressão Janeiro: Nova Aguilar, 1994, p. 409.)
( ) máxima – regra
I. “No diário” (ref.1) é o mesmo que “no
( ) interlocutor – narrador
cotidiano”.
A sequência CORRETA é: II. “Botou” (ref.2) é um antônimo informal
a) V – F – V – F – V. de “deu”.
b) V – V – V – F – F. III. “Trás” (ref.3) tem um homônimo de clas-
c) F – V – F – F – V. se diferente.
d) V – F –F –F – V. IV. “Esbravejar” (ref.4) é sinônimo perfeito
de “irritar-se”.
Assinale a opção que apresenta as afirma-
2. (PUC) A TERCEIRA MARGEM DO RIO ções corretas.
1 Nosso pai era homem cumpridor, ordei- a) I, II e III, somente.
ro, positivo; e sido assim desde mocinho e b) II, III e IV, somente.
menino, pelo que testemunharam as diver- c) II e IV, somente.
sas pessoas sensatas, quando indaguei a in- d) Todas estão corretas.
formação. Do que eu mesmo me alembro, ele e) I e III, somente.
não figurava mais estúrdio nem mais tris-
te do que os outros, conhecidos nossos. Só 3. (PUC) A coragem (...) só se torna uma 12vir-
quieto. Nossa mãe era quem regia, e que ra- tude quando a serviço de outrem ou de uma
lhava 1no diário com a gente - minha irmã, causa geral e generosa. Como traço de cará-
meu irmão e eu. Mas se deu que, certo dia, ter, a coragem é, sobretudo, uma fraca sen-
nosso pai mandou fazer para si uma canoa. sibilidade ao medo, seja por ele ser pouco
2 Era a sério. Encomendou a canoa espe- sentido, seja por ser bem suportado, ou até
cial, de pau de vinhático, pequena, mal com provocar prazer. É a coragem dos estouvados,
a tabuinha da popa, como para caber justo dos brigões ou dos 10impávidos, a coragem
o remador. Mas teve de ser toda fabricada, dos “durões”, como se diz em nossos filmes
escolhida forte e arquejada em rijo, própria policiais, e todos sabem que a virtude pode
para dever durar na água por uns vinte ou não ter nada a ver com ela.
trinta anos. Nossa mãe jurou muito contra Isso quer dizer que ela é, do ponto de vis-
a ideia. Seria que, ele, que nessas artes não ta moral, totalmente indiferente? Não é tão
vadiava, se ia propor agora para pescarias simples assim. Mesmo numa situação em
e caçadas? Nosso pai nada não dizia. Nossa que 3eu agiria apenas por 11egoísmo, pode-se
casa, no tempo, ainda era mais próxima do estimar que a ação generosa (por exemplo,
rio, obra de nem quarto de légua: o rio por o combate contra um agressor, em vez da
aí se estendendo grande, fundo, calado que súplica) manifestará maior domínio, maior
sempre. Largo, de não se poder ver a forma dignidade, maior 14liberdade, 15qualidades
da outra beira. E esquecer não posso, do dia moralmente significativas e que darão à co-
em que a canoa ficou pronta. ragem, como que por retroação, algo de seu
3 Sem alegria nem cuidado, nosso pai en- valor: sem ser sempre moral, em sua essên-
calcou o chapéu e decidiu um adeus para a cia, a coragem é aquilo sem o que, não há
gente. Nem falou outras palavras, não pegou dúvida, qualquer moral seria impossível ou
matula e trouxa, não fez nenhuma recomen- sem efeito. Alguém que se entregasse total-
dação. Nossa mãe, a gente achou que ela mente ao medo que lugar poderia deixar aos
ia 4esbravejar, mas persistiu somente alva seus deveres? (...) O medo é egoísta. A co-
de pálida, mascou o beiço e bramou: “– Cê vardia é egoísta. (...) Como virtude, ao con-
vai, ocê fique, você nunca volte!” Nosso pai trário, a coragem supõe sempre uma forma

69
de desinteresse, de 8altruísmo ou de 9gene- – muito menos um livro da sexta série, um
rosidade. Ela não exclui, sem dúvida, uma manual de instruções, um horário de ônibus,
certa 16insensibilidade ao medo, até mesmo o documento de uma hipoteca ou um progra-
um gosto por ele. Mas não os supõe neces- ma eleitoral.
sariamente. Essa coragem não é a ausência As rodas dentadas da pobreza, ignorância,
do medo, é a capacidade de superá-lo, quan- falta de esperança e baixa auto estima se en-
do ele existe, por uma vontade mais forte e grenam para criar um tipo de máquina do
mais generosa. Já não é (ou já não é apenas) fracasso perpétuo que esmigalha os sonhos
fisiologia, é força de alma, diante do peri- de geração a geração. Nós todos pagamos o
preço de mantê-la funcionando. O analfabe-
go. Já não é uma paixão, é uma virtude, é a
tismo é a sua cavilha.
condição de todas. Já não é a coragem dos
Ainda que endureçamos os nossos corações
durões, é a coragem dos doces, e dos heróis. diante da vergonha e da desgraça experi-
(André Comte-Sponville. Pequeno tratado
das grandes virtudes. p. 55 a 57.) mentadas pelas vítimas, o ônus do analfabe-
tismo é muito alto para todos os demais – o
A propósito do sentido de certos vocábulos custo de despesas médicas e hospitalização,
no texto, afirma-se: o custo de crimes e prisões, o custo de pro-
1. “impávidos” (ref. 10) significa “destemi- gramas de educação especial, o custo da pro-
dos” e poderia ser substituído por “va- dutividade perdida e de inteligências poten-
lentes” sem prejuízo à coerência da frase. cialmente brilhantes que poderiam ajudar a
2. “egoísmo” (ref. 11) e “altruísmo” (ref. solucionar os dilemas que nos perseguem.
8) são antônimos. Frederick Douglass ensinou que a alfabetização
3. “virtude” (ref. 12) inclui, em seu sentido é o caminho da escravidão para a liberdade. Há
muitos tipos de escravidão e muitos tipos de li-
amplo, os sentidos de “dignidade” (ref.
berdade. Mas saber ler ainda é o caminho.
13), “liberdade” (ref. 14), “qualidades”
(ref. 15) e “generosidade” (ref. 9). (Carl Sagan. O caminho para a liberdade.
In: O mundo assombrado pelos demônios: a
4. Na composição das palavras “desinteres- ciência vista como uma vela no escuro.)
se” (ref. 7) e “insensibilidade” (ref. 16),
há elementos de valor semântico equiva- “Rebeldes” tem como antônimo “dóceis”; “ti-
lente. ranos” tem como sinônimo “autocratas”. Assi-
As afirmativas corretas são, apenas: nale a alternativa em que o par de antônimos
e o de sinônimos, nesta ordem, está correto.
a) 1 e 2.
a) Vangloriavam e orgulhavam; heresia e ateísmo.
b) 2 e 3. b) Perpétuo e efêmero; súditos e vassalos.
c) 1, 2 e 3. c) Líder e ideólogo; engrenam e engatam.
d) 1, 2 e 4. d) Ônus e compromisso; esmigalha e esfacela.
e) 2, 3 e 4. e) Dilemas e certezas; insuflar e esvaziar.

4. (FGV) Os tiranos e os autocratas sempre com-


preenderam que a capacidade de ler, o co- 5. (Udesc) RIQUEZA
nhecimento, os livros e os jornais são poten- 1 Foi problema que sempre me interessou,
cialmente perigosos. Podem insuflar ideias esse de ser rico – quer dizer, ter em mãos as
independentes e até rebeldes nas cabeças de possibilidades de poder e os privilégios que
seus súditos. O governador real britânico da o dinheiro dá – é o sonho universal das cria-
colônia de Virgínia escreveu em 1671: turas. Todo o mundo precisa, quer dinheiro,
Graças a Deus não há escolas, nem imprensa o pobre para enganar a miséria, o rico para
livre; e espero que não [as] tenhamos nestes ficar riquíssimo, o pecador para satisfazer
[próximos] cem anos; pois o conhecimento seus desejos, o santo para as suas caridades.
introduziu no mundo a desobediência, a he- E isso não é para admirar, pois o dinheiro re-
resia e as seitas, e a imprensa divulgou-as e presenta realmente o denominador comum
publicou os libelos contra os melhores gover- de tudo que tem valor material nesta vida,
nos. Que Deus nos guarde de ambos! inclusive coisas de caráter subjetivo, como o
Mas os colonizadores norte-americanos, poder, o prestígio, o renome, etc. Diz que até
compreendendo em que consiste a liberdade, o amor.
não pensavam assim. 2 Tudo isso é o dinheiro. E contudo não
Em seus primeiros anos, os Estados Unidos há coisa mais limitada do que o dinheiro, a
se vangloriavam de ter um dos índices mais riqueza. Pois que ele só nos vale até certo
elevados – talvez o mais elevado – de cida- ponto, ou seja, até se chocar com os limites
dãos alfabetizados no mundo. dessa coisa intransponível que se chama a
Atualmente, os Estados Unidos não são o natureza humana.
líder mundial em alfabetização. Muitos dos 3 Você, por exemplo, que tem o seu con-
que são alfabetizados não conseguem ler, tadíssimo orçamento mensal, para você
nem compreender material muito simples dinheiro é um sonho, representa mundos

70
impossíveis – conforto, luxo, viagens, pra- 6. (Uece) O texto é um excerto de Baú de Ossos
zeres – o ilimitado. (volume 1), do médico e escritor mineiro Pe-
4 Querer uma coisa e simplesmente assi- dro Nava. Inclui-se essa obra no gênero me-
nar um cheque para obter. Um jardim, um morialístico, que é predominantemente nar-
apartamento de luxo, um grande automó- rativo. Nesse gênero, são contados episódios
vel, ou mesmo o seu avião particular. Boi- verídicos ou baseados em fatos reais, que fi-
tes, teatros, Nova Iorque, Paris! A roda da caram na memória do autor. Isso o distingue
grã-finagem internacional, que também se da biografia, que se propõe contar a história
chama café-society ou os idle-rich, os ricos de uma pessoa específica.
ociosos, Jogar bridge com a Duquesa de Win- O meu amigo Rodrigo Melo Franco de Andra-
dsor, dançar com o Ali Khan. de é autor do conto “Quando minha avó mor-
5 Entretanto é bom notar que isso tem reu”. Sei por ele que é uma história autobio-
um limite bastante rígido. Fora uma cota gráfica. Aí Rodrigo confessa ter passado, aos
de prazeres e conquistas sociais, no fundo
11 anos, por fase da vida em que se sentia
mais subjetivas do que objetivas, além não
profundamente corrupto. Violava as promes-
se pode ir. A riqueza, sendo capaz de nos
sas feitas de noite a Nossa Senhora; mentia
proporcionar apenas o que está à venda, não
nos pode dar nada de genuíno, de autêntico, desabridamente; faltava às aulas para tomar
de natural. Se você perde a perna num aci- banho no rio e pescar na Barroca com com-
dente, o dinheiro lhe dará a melhor perna panheiros vadios; furtava pratinhas de dois
artificial do mundo – mas artificial. Tanto no mil-réis... Ai! de mim que mais cedo que o
milionário como no pobrezinho com perna amigo também abracei a senda do crime e
de pau, o coto mutilado é o mesmo, porque a enveredei pela do furto... Amante das artes
natureza não se vende. E assim, quem com- plásticas desde cedo, educado no culto do
pra cabelos supostos não pode esperar razoa belo, eu não pude me conter. Eram duas co-
velmente senão uns postiços, como já dizia leções de postais pertencentes a minha pri-
José de Alencar. E quem fura um olho, pos- ma Maria Luísa Palleta. Numa, toda a vida de
sua embora o dinheiro do Rockefeller, terá Paulo e Virgínia – do idílio infantil ao navio
que se arranjar com um olho de vidro, como desmantelado na procela. Pobre Virgínia,
qualquer de nós. dos cabelos esvoaçantes! Noutra, a de Joana
6 Moralidade: Não tenha inveja dos ricos. d’Arc, desde os tempos de pastora e das vozes
Não tenha inveja de ninguém, que é melhor. ao da morte. Pobre Joana dos cabelos em cha-
Mas se quer invejar, inveje o simples abas- ma! Não resisti. Furtei, escondi e depois de
tado que pode satisfazer as suas necessida- longos êxtases, com medo, joguei tudo fora.
des e, na medida do possível, alguns dos seus Terceiro roubo, terceira coleção de postais –
sonhos. E quando nem a abastança pode ser a que um carcamano, chamado Adriano Mer-
atingida, um bom consolo para o pobre é pen- lo, escrevia a uma de minhas tias. Os cartões
sar que, quer com o seu salário mínimo, quer eram fabulosos. Novas contemplações solitá-
com as rendas vertiginosas do tubarão, tanto rias e piquei tudo de latrina abaixo. Mas o
um como o outro estão trancados nesta nossa
mais grave foi o roubo de uma nota de cinco
mesma prisão de carne, este “saco de tripas”
mil-réis, do patrimônio da própria Inhá Lu-
de que falava o velho Gorki; e se dentro dele
ísa. De posse dessa fortuna nababesca, com-
pouco podemos, fora dele, então, nada nos
adianta, nem dinheiro, nem grandeza, nem prei um livro e uma lâmpada elétrica de ta-
poderio. Aí, só a terra fria, nada mais. manho desmedido. Fui para o parque Halfeld
(Raquel de Queiroz. Cem crônicas escolhidas.
com o butim de minha pirataria. Joguei o
São Paulo: Siciliano, 1993, p.151-3.) troco num bueiro. Como ainda não soubesse
ler, rasguei o livro e atirei seus restos em
Marque a proposição VERDADEIRA em relação um tanque. A lâmpada, enorme, esfregada,
ao sentido atribuído às palavras no texto. não fez aparecer nenhum gênio. Fui me
a) No parágrafo 2, “dinheiro” e “riqueza” não desfazer de mais esse cadáver na escada da
foram empregadas com equivalência de sen- Igreja de São Sebastião. Lá a estourei, tendo
tido. a impressão de ouvir os trovões e o morro
b) A expressão “coisa intransponível”, (par. 2), do Imperador desabando nas minhas costas.
é sinônimo da expressão “natureza huma- Depois dessa série de atos gratuitos e deli-
na”. tos inúteis, voltei para casa. Raskólnikov. O
c) A palavra “sonho” (par. 3), é antônimo de mais estranho é que houve crime, e não cas-
“mundos impossíveis”. tigo. Crime perfeito. Ninguém desconfiou.
d) A palavra “genuíno” (par. 5), foi empregada Minha avó não deu por falta de sua cédula.
como sinônimo de “autêntico” (par.5 ). Eu fiquei por conta das Fúrias de um remor-
e) A expressão “cabelos supostos” (par. 5), é so, que me perseguiu toda a infância, veio
uma forma pejorativa de cabelos “postiços” comigo pela vida afora, com a terrível im-
(par.5). pressão de que eu poderia reincidir porque

71
vocês sabem, cesteiro que faz um cesto... Está correta, de cima para baixo, a seguinte
Só me tranquilizei anos depois, já médico, sequência:
quando li num livro de Psicologia que só se a) V, F, F, V, V, V.
deve considerar roubo o que a criança faz b) F, F, V, V, F, F.
com proveito e dolo. O furto inútil é fisio- c) V, V, V, F, F, F.
lógico e psicologicamente normal. Graças a d) V, V, F, V, V, V.
Deus! Fiquei absolvido do meu ato gratuito...
(Pedro Nava. Baú de ossos. Memórias 1. p. 308 a 310.) 8. (G1 – cp2) A terra dos meninos pelados
1
Graciliano Ramos
Sinônimo é um vocábulo que, em determina-
do texto, apresenta significado semelhante 2
Havia um menino diferente dos outros me-
ao de outro e que pode, em alguns contextos, ninos: tinha o olho direito preto, o esquerdo
ser usado no lugar desse outro sem alterar o azul e a cabeça pelada. 3Os vizinhos manga-
sentido da sentença. Hiperônimo é um vocá- vam dele e gritavam:
bulo ou um sintagma de sentido mais gené- – 4Ó pelado!
rico em relação a outro. Ele abarca vocábulos Tanto gritaram que ele se acostumou, achou
de sentidos menos genéricos ou mais especí- o apelido certo, deu para se assinar a carvão,
ficos. Hipônimo é um vocábulo menos geral nas paredes: Dr. Raimundo Pelado. 5Era de
ou mais específico, cujo sentido é abarcado bom gênio e não se zangava; mas os garotos
pelo sentido do hiperônimo. Considere a or- dos arredores fugiam ao vê-lo, escondiam-se
dem em que foram distribuídos os vocábulos por detrás das árvores da rua, mudavam a
do excerto transcrito a seguir e assinale a voz e perguntavam que fim tinham levado os
opção correta: “abracei a senda do crime e cabelos dele. 6Raimundo entristecia e fecha-
enveredei pela do furto...”. va o olho direito. 7Quando o 8aperreavam de-
a) Os vocábulos roubo e furto são sinônimos e mais, aborrecia-se, fechava o olho esquerdo.
um pode substituir o outro, indistintamen- E a cara ficava toda escura.
te, em qualquer contexto.
9
Não tendo com quem entender-se, Raimun-
b) Crime é hiperônimo de furto. Isso significa do Pelado falava só, e os outros pensavam
que o sentido do vocábulo crime é mais ge- que ele estava malucando. Estava nada!
nérico do que o sentido do vocábulo furto.
10
Conversava sozinho e desenhava na calça-
c) Nesse contexto, a inversão da posição dos da coisas maravilhosas do país de Tatipirun,
vocábulos crime e furto seria aceitável: onde não há cabelos e as pessoas têm um
“abracei a senda do furto e enveredei pela olho preto e outro azul.
do crime”. RAMOS, Graciliano. Alexandre e outros heróis.
Rio de Janeiro: Record, 1987, p. 104.
d) Sendo vereda um caminho estreito e enve-
redar, seguir por uma vereda, seria lógico 1
O alagoano Graciliano Ramos é um dos au-
dizer “abracei a vereda do crime e enveredei tores mais importantes da Literatura Brasi-
pelo caminho do furto”. leira.
8
aperreavam – chateavam.
7. (UEC) No trecho “abracei a senda do crime
e enveredei pela do furto...”, foi empregada Releia o seguinte trecho do texto de Graci-
linguagem figurada. Assinale V ou F, confor- liano Ramos:
me seja verdadeiro ou falso o que se diz so- “Os vizinhos mangavam dele e gritavam”
bre esse trecho. (ref. 3).
( ) O sentido primeiro do vocábulo “senda” é Qual das alternativas a seguir apresenta um
caminho. sinônimo para o verbo sublinhado no trecho
( ) No texto, o vocábulo “senda” foi emprega- acima?
do para indicar aquilo que é feito habitual- a) Os vizinhos concordavam com ele e grita-
mente; prática observada; hábito, rotina. vam.
( ) O trecho foi composto com duas metáfo- b) Os vizinhos zombavam dele e gritavam.
ras: uma expressa pelo vocábulo “senda” c) Os vizinhos fugiam dele e gritavam.
e outra pelo vocábulo “furto”. d) Os vizinhos batiam nele e gritavam.
( ) O substantivo “senda” e o verbo enve-
redar (“enveredei”) formam uma única
metáfora, a metáfora do caminho. 9. (Upe) TEXTO 1
( ) Em linguagem não metafórica, teríamos “Vamos celebrar nossa justiça
algo como o que segue: comecei a praticar A ganância e a difamação
crimes, mais especificamente o furto. Vamos celebrar os preconceitos
( ) O verbo abraçar (“abracei”), usado tam- O voto dos analfabetos
bém em sentido figurado, fortalece a me- Comemorar a água podre
táfora do caminho, pois, dentre as várias E todos os impostos
acepções desse verbo, estão as de envol- Queimadas, mentiras
ver, tomar como seu, adotar. E sequestros...”

72
TEXTO 2 podem descuidar da inflação. Se eu fosse
cunhar uma frase digna de um porta-voz da
“Há manifestantes representando policiais, bufunfa, eu diria (parafraseando uma outra
que defendem a votação da PEC (Proposta de máxima trivializada pela repetição): "O pre-
Emenda à Constituição) 300, que estabele- ço da estabilidade é a eterna vigilância".
ce o piso nacional para policiais militares e Entretanto, a estabilidade não deve se con-
bombeiros. Outro grupo representa médicos verter em estagnação. Ou seja, o que quere-
que querem a derrubada do veto ao projeto mos é a estabilidade da moeda nacional, mas
de lei do Ato Médico; e um terceiro bloco é
não a estabilidade dos níveis de produção e
formado por profissionais de 13 categorias
de emprego.
da área de saúde que defendem a manuten-
A aceleração do crescimento não parece tra-
ção do veto.”
zer grande risco para o controle da inflação.
Com base nos textos 1 e 2, analise as afirma-
Ela não tem nada de excepcional. O Brasil
tivas a seguir:
está se recuperando de um longo período de
I. A linguagem literária é predominante-
mente referencial, visto que é de nature- crescimento econômico quase sempre me-
za complexa e ambivalente. díocre, inferior à média mundial e bastan-
II. A denotação está presente no texto 1, te inferior ao de quase todos os principais
pois as palavras possuem sentidos mais emergentes.
precisos. O Brasil apenas começou a tomar um certo
III. O texto 1 é polissêmico por ser literário e impulso. Não vamos abortá-lo por medo da
passível de provocar interpretações dife- inflação.
(Folha de S.Paulo, 13.09.2007. Adaptado)
renciadas.
IV. A expressão “... celebrar nossa justiça...” Segundo o Dicionário Aurélio, 2.a edição,
é produzida com ironia pelo eu lírico. p. 1781, o primeiro sentido da expressão
V. A sigla PEC 300, utilizada no texto 2, pos- "vira-lata" é cão de rua, sem raça determi-
sui sentido figurado e gera dubiedade na nada. Pode-se afirmar que, no texto, essa ex-
compreensão. pressão em
Estão CORRETAS
– O nosso complexo de "vira-lata" tem múl-
a) I, II e III.
tiplas facetas.–
b) I, II e IV.
a) repete o sentido dicionarizável e revela o
c) II, III e IV.
mau gosto estilístico do autor, o que torna a
d) II, IV e V.
frase pouca adequada ao contexto.
e) III, IV e V.
b) contrapõe-se ao sentido dicionarizável e in-
dica a visão positiva que se tem da economia
10. (Fgv) ESTAMOS CRESCENDO DEMAIS ? brasileira.
O nosso "complexo de vira-lata" tem múlti- c) emprega-se em sentido figurado, em con-
plas facetas. Uma delas é o medo de crescer. formidade com a definição apresentada pelo
Sempre que a economia brasileira mostra dicionário.
um pouco mais de vigor, ergue-se, sinistro, d) traduz no seu sentido próprio a incapacida-
um coro de vozes falando em "excesso de de dos profissionais de avaliar os dados da
demanda" "retorno da inflação" e pedindo economia brasileira.
medidas de contenção. e) encontra-se empregada em sentido figurado
O IBGE divulgou as Contas Nacionais do se- e mostra um sentimento de insegurança dos
gundo trimestre de 2007. Não há dúvidas que avaliam a economia.
de que a economia está pegando ritmo. O
crescimento foi significativo, embora tenha
ficado um pouco abaixo do esperado. O PIB
cresceu 5,4% em relação ao segundo trimes-
E.O. Complementar
tre do ano passado. A expansão do primeiro
semestre foi de 4,9% em comparação com 1. (Uel) Os pares acidente/incidente; cheque/
igual período de 2006.(...) xeque; vultoso/vultuoso; verão/estio são,
Aturma da bufunfa não pode se queixar. respectivamente:
Entre os subsetores do setor serviços, o seg- a) sinônimos, homônimos, parônimos e antôni-
mento que está "bombando" é o de interme- mos.
diação financeira e seguros - crescimento de b) parônimos, homônimos, parônimos e sinôni-
9,6%. O Brasil continua sendo o paraíso dos mos.
bancos e das instituições financeiras. c) parônimos, parônimos, sinônimos e sinôni-
Não obstante, os porta-vozes da bufunfa fi- mos.
nanceira, pelo menos alguns deles, parecem d) homônimos, homônimos, parônimos e sinô-
razoavelmente inquietos. Há razões para esse nimos.
medo? É muito duvidoso. Ressalva trivial: é e) sinônimos, parônimos, sinônimos e antôni-
claro que o governo e o Banco Central nunca mos.

73
2. (UFRGS) Viagens, cofres mágicos com pro- centena de anos, neste mesmo lugar, outro
messas sonhadoras, não mais 5revelareis viajante pranteará o desaparecimento do
6
vossos tesouros intactos! Hoje, quando ilhas que eu poderia ter visto e que me escapou.
polinésias afogadas em concreto se transfor- (Adaptado de: LÉVI-STRAUSS, C. Tristes trópicos.
mam em porta-aviões ancorados nos mares São Paulo: Cia. das Letras, 1996. p. 38-44.)
do Sul, quando as favelas corroem a África,
Assinale a alternativa que apresenta o sinô-
quando a aviação 9avilta a floresta ameri-
nimo adequado para a respectiva palavra do
cana antes mesmo de poder 7destruir-lhe a
texto, considerando o contexto em que esta
virgindade, de que modo poderia a pretensa
é empregada.
10
evasão da viagem conseguir outra coisa que
não 14confrontar-nos 15com as formas mais a) avilta (ref. 9) − degrada
miseráveis de nossa existência histórica? b) evasão (ref. 10) – falta
18
Ainda 22assim, compreendo a paixão, a c) soçobrar (ref. 11) – definhar
loucura, o equívoco das narrativas de via- d) encetado (ref. 12) – preparado
gem. Elas 16criam a ilusão daquilo 1que não e) carece (ref. 13) – prescinde
existe mais, mas 2que ainda deveria existir.
Trariam nossos modernos Marcos Polos, das 3. (UFRGS) O que havia de tão revolucionário
mesmas terras distantes, desta vez em for- na Revolução Francesa? Soberania popular,
ma de fotografias e relatos, as especiarias liberdade civil, igualdade perante a lei – as
morais 3de que nossa sociedade experimenta palavras hoje são ditas com tanta facilidade
uma necessidade aguda ao se sentir 11soço- que somos incapazes de imaginar seu cará-
brar no tédio? ter explosivo em 1789. Para os franceses do
É assim que me identifico, viajante procu- Antigo Regime, os homens eram desiguais, e
rando em vão reconstituir o exotismo com o a desigualdade era uma boa coisa, adequada
auxílio de fragmentos e de destroços. 19En- à ordem hierárquica que fora posta na natu-
tão, 26insidiosamente, a ilusão começa a te- reza pela própria obra de Deus. A liberdade
cer suas armadilhas. Gostaria de ter vivido significava privilégio – isto é, literalmente,
no tempo das verdadeiras viagens, quando “lei privada”, uma prerrogativa 13especial
um espetáculo ainda não estragado, conta- para fazer algo negado a outras pessoas.
minado e maldito se oferecia em todo o seu O rei, como fonte de toda a lei, distribuía
esplendor. 20Uma vez 12encetado, o jogo de privilégios, pois havia sido ungido como o
conjecturas não tem mais fim: quando se de- agente de Deus na terra.
veria visitar a Índia, em que época o estu- Durante todo o século XVIII, os filósofos do
do dos selvagens brasileiros poderia levar a Iluminismo questionaram esses pressupos-
conhecê-los na forma menos alterada? Teria tos, e os panfletistas profissionais conse-
sido melhor chegar ao Rio no século XVIII? guiram 14empanar a aura sagrada da coroa.
Cada década para 23trás 29permite 27salvar Contudo, a desmontagem do quadro mental
um costume, 28ganhar uma festa, 17partilhar do Antigo Regime demandou violência ico-
uma crença suplementar. noclasta, destruidora do mundo, revolucio-
21
Mas conheço bem demais os textos do pas- nária.
sado para não saber que, me privando de um Seria ótimo se pudéssemos associar a Revo-
século, renuncio a perguntas dignas de enri- lução exclusivamente à Declaração dos Direi-
quecer minha reflexão. E eis, diante de mim, tos do Homem e do Cidadão, mas ela nas-
o círculo intransponível: quanto menos as ceu na violência e imprimiu seus princípios
culturas tinham condições de se comunicar em um mundo violento. Os conquistadores
entre si, menos também os emissários 8res- da Bastilha não se limitaram a destruir um
pectivos eram capazes de perceber a riqueza símbolo do despotismo real. Entre eles, 150
e o significado da diversidade. No final das foram mortos ou feridos no assalto à prisão
contas, sou prisioneiro de uma 32alternativa: e, quando os sobreviventes apanharam o di-
30
ora viajante antigo, confrontado com um retor, cortaram sua cabeça e desfilaram-na
prodigioso espetáculo do qual quase tudo por Paris na ponta de uma lança.
lhe escapava 24– ainda pior, inspirava tro- Como podemos captar esses momentos de
ça ou desprezo 25–, 31ora viajante moderno, loucura, quando tudo parecia possível e o
correndo atrás dos vestígios de uma realida- mundo se afigurava como uma tábula rasa,
de desaparecida. Nessas duas situações, sou apagada por uma onda de comoção popular
perdedor, pois eu, que me lamento diante e pronta para ser redesenhada? Parece in-
das sombras, talvez seja impermeável ao ver- crível que um povo inteiro fosse capaz de se
dadeiro espetáculo que está tomando forma levantar e transformar as condições da vida
neste instante, mas 4para cuja observação, cotidiana. Duzentos anos de experiências
meu grau de humanidade ainda 13carece da com admiráveis mundos novos tornaram-
sensibilidade necessária. 33Dentro de alguma -nos 15céticos quanto ao planejamento social.

74
Retrospectivamente, a Revolução pode pare- Entretanto, Ford ia recebendo e lendo rela-
cer um prelúdio ao totalitarismo. tórios. E estes contavam histórias diferentes
Pode ser. Mas um excesso de visão histórica das que figuravam nos frontispícios dos jor-
retrospectiva pode distorcer o panorama de nais: definhavam as seringueiras pelo exces-
1789. Os revolucionários franceses não eram so de sol e pela falta de umidade e de humo.
nossos contemporâneos. E eram um conjunto Estavam murchando ao sol da região. À falta
de pessoas não excepcionais em circunstân- de proteção das sombras da floresta tropi-
cal, o exército de seringueiras de Mr. Ford ia
cias excepcionais. Quando as coisas se desin-
morrer ao sol. Triunfava o desordenado da
tegraram, eles reagiram a uma necessidade
selva contra a disciplina do seringal.
imperiosa de dar-lhes sentido, ordenando a Devemos concluir daí que na Amazônia seja
sociedade segundo novos princípios. Esses de todo impossível 21estabelecer florestas
princípios ainda permanecem como uma de- homogêneas ou que o grande vale seja de
núncia da tirania e da injustiça. Afinal, em todo impróprio para o florescimento de uma
que estava empenhada a Revolução France- grande civilização? Ainda não. Por enquanto,
sa? Liberdade, igualdade, fraternidade. a conclusão a tirar é outra. Na verdade, o que
(Adaptado de: DARNTON, Robert. O beijo de Lamourette. se fez nas margens do Tapajós foi transplan-
In: ____. O beijo de Lamourette: mídia, cultura e tar para o trópico a técnica, os métodos e os
revolução. São Paulo: Cia. das Letras, 2010. p. 30-39.) processos de resultados comprovados apenas
em climas temperados ou frios – a ciência e
Assinale a alternativa que apresenta sinôni- a técnica do cultivo da terra próprias para
mos para as palavras especial (ref. 13), em- os trópicos estão ainda em fase empírica e
panar (ref. 14) e céticos (ref. 15), no con- 22
elementar.
texto em que ocorrem. (Adaptado de: MOOG, Vianna. Bandeirantes e
a) notável – anular – descrentes pioneiros; paralelo entre duas culturas. 9. ed. Rio
b) maravilhosa – embaçar – desfavoráveis de Janeiro: Civilização Brasileira, 1969. p. 27.)
c) exclusiva – obscurecer – descrentes
Assinale a alternativa em que a segunda pala-
d) exclusiva – anular – incrédulos
vra constitui sinônimo adequado da primeira,
e) notável – obscurecer – desfavoráveis considerando o contexto em que esta ocorre.
a) apropriadas (ref. 18) – conquistadas
4. (UFRGS) Por volta de 1928, Henry Ford de- b) emissários (ref. 19) – mandatários
batia-se com uma ideia fixa: queria encon- c) desfecho (ref. 20) – clímax
trar uma fórmula salvadora para o problema d) estabelecer (ref. 21) – localizar
do suprimento da borracha para sua indús- e) elementar (ref. 22) – básica
tria. Estava cansado de aturar os preços que
os ingleses de Ceilão lhe impunham. Como? 5. (Uff) 1Em 1º de janeiro de 1502, uma expe-
Plantando borracha na Amazônia. Não havia dição portuguesa chegou, pela primeira vez,
o súdito inglês Henry Wickham transporta- à região do que hoje é a costa carioca. 2Quan-
do às escondidas para a Inglaterra as mudas do entraram na Baía de Guanabara e navega-
da seringueira da Amazônia? Tudo estava ram em suas águas, os portugueses acharam
em organizar seringais homogêneos em ter- que era a foz de um grande rio, prontamente
ras 18apropriadas. Por conseguinte, rumo ao chamado por eles de Rio de Janeiro. 3Poste-
riormente, descobriram que, na verdade, se
Brasil, rumo à Amazônia.
tratava de uma baía, que foi renomeada.
O Brasil exultou. E logo o governo brasileiro 4
A grandiosidade da Baía de Guanabara,
recebe os 19emissários de Ford como costuma hoje, limita-se a seu tamanho e à sua histó-
receber os americanos em geral: de braços ria. Embora seja berço da cidade do Rio, tes-
abertos. Começa o trabalho. A mata resiste, temunha e protagonista de muitos dos mais
mas recua ao passo que os tratores vão fa- importantes acontecimentos relacionados à
zendo a derrubada para a clareira, já as casas cidade e ao país, a enorme baía parece cho-
começam a surgir, o hospital, os postos de rar. 5Em seus mais de 500 anos, ela agoniza
higiene, as quadras de tênis, as mansões dos enquanto o descaso impera e propostas efe-
diretores. Dentro da floresta amazônica, o tivas para sua preservação e recuperação não
ianque fizera surgir uma nova cidade. E tudo saem do papel.
caminhava como convinha. Três mil caboclos http://www.educacaopublica.rj.gov.br/
cultura/especiais/guanabara/intro.htm
trabalhavam; um milhão de pés de serin-
gueira eram plantados. A floresta arquejava, O texto apresenta fatos, dados e datas, ca-
mas cedia. E quando, decorridos apenas dois racterizando-se como um exemplo de lin-
anos, as seringueiras começam a despontar guagem informativa. No entanto, como re-
em pelotões, em batalhões, em regimentos, curso de estilo para ênfase de determinados
ninguém mais tem dúvida sobre o 20desfecho aspectos, destacam-se palavras com sentido
da luta. figurado.

75
Identifique a passagem que apresenta exem- 2. (Fgv)
plo de palavra usada em linguagem figurada.
a) Em 10. de janeiro de 1502, uma expedição Texto I
portuguesa chegou, pela primeira vez, à re- QUAL O PODER DA LEITURA NESTES TEMPOS
gião do que hoje é a costa carioca. (ref. 1) DIFÍCEIS?
b) Quando entraram na Baía de Guanabara e
navegaram em suas águas, os portugueses Hoje, é possível dizer que o mundo inteiro é
acharam que era a foz de um grande rio, um “espaço em crise”. Uma crise se estabele-
(ref. 2) ce de fato quando transformações de caráter
c) Posteriormente, descobriram que, na verda- brutal – mesmo se preparadas há tempos -,
de, se tratava de uma baía, que foi renome- ou ainda uma violência permanente e gene-
ada. (ref. 3) ralizada, tornam extensamente inoperantes
d) A grandiosidade da Baía de Guanabara, hoje, os modos de regulamentação, sociais e psí-
limita-se a seu tamanho e à sua história. quicos, que até então estavam sendo prati-
(ref. 4) cados. Ora, a aceleração das transformações,
e) Em seus mais de 500 anos, ela agoniza en- o crescimento das desigualdades, das dispa-
quanto o descaso impera e propostas efeti- ridades, a extensão das migrações alteraram
vas para sua preservação e recuperação não ou fizeram desaparecer os parâmetros nos
saem do papel. (ref. 5) quais a vida se desenvolvia, vulnerabilizan-
do homens, mulheres e crianças, de maneira
obviamente bastante distinta, de acordo com
E.O. Dissertativo os recursos materiais, culturais, afetivos de
que dispõem e segundo o lugar onde vivem.
Para boa parte deles, no entanto, tais crises
1. (Ufrrj) FIM DA 2a GUERRA MUNDIAL - BOM- se manifestam em transtornos semelhantes.
BA ATÔMICA Vividas como rupturas, ainda mais quando
SESSENTA ANOS DE TERROR NUCLEAR são acompanhadas da separação dos próxi-
mos, da perda da casa ou das paisagens fa-
Destruídas por bombas, Hiroshima e Naga- miliares, as crises os confinam em um tempo
saki hoje lideram luta contra essas armas imediato – sem projeto, sem futuro –, em
Domingo, 31 de julho de 2005 - O GLOBO um espaço sem linha de fuga. Despertam fe-
Gilberto Scofield Jr.
ridas antigas, reativam o medo do abandono,
Enviado especial Hiroshima, Japão
abalam o sentimento de continuidade de si e
"Shizuko Abe tinha 18 anos no dia 6 de a autoestima. Provocam, às vezes, uma per-
agosto de 1945 e, como todos os jovens ja- da total de sentido, mas podem igualmente
poneses durante a Segunda Guerra Mundial, estimular a criatividade e a inventividade,
ela havia abandonado os estudos para se de- contribuindo para que outros equilíbrios
dicar ao esforço de guerra. Era um dia claro sejam forjados, pois em nosso psiquismo,
e quente de verão e às 8h, Shizuko e seus co- como disse René Kaës, uma “crise libera, ao
legas iniciavam a derrubada de parte das ca- mesmo tempo, forças de morte e forças de
sas de madeira do centro de Hiroshima para regeneração”. “O desastre ou a crise são tam-
tentar criar um cordão de isolamento antiin- bém, e sobretudo, oportunidades”, escreve-
ram Chamoiseau e Glissant, após a passagem
cêndio no caso de um bombardeio incendiá-
de um ciclone. “Quando tudo desmorona ou
rio aéreo. Àquela altura, ninguém imaginava
se vê transformado, são também os rigores
que Hiroshima seria o 2laboratório de outro
ou as impossibilidades que se veem transfor-
tipo de bombardeio, muito mais devastador
mados. São os improváveis que, de repente,
e letal, para o qual os abrigos antiincêndio
se veem esculpidos por novas luzes”.
foram inúteis".
A leitura pode garantir essas forças de vida?
"Hiroshima, Japão. Passear pelas ruas de O que esperar dela – sem vãs ilusões – em
Hiroshima hoje – 60 anos depois da tra- lugares onde a crise é particularmente in-
gédia que matou 140 mil pessoas e deixou tensa, seja em contextos de guerra ou de
cicatrizes eternas em outros 60 mil, numa repetidas violências, de deslocamentos de
população de 400 mil – é nunca esquecer o populações mais ou menos forçados, ou de
passado. Apesar de rica e moderna com seus vertiginosas recessões econômicas?
1,1 milhão de habitantes circulando em bem Em tais contextos, crianças, adolescentes e
cuidadas ruas e avenidas, os monumentos às adultos poderiam redescobrir o papel dessa
vítimas do terror atômico estão em todos os atividade na reconstrução de si mesmos e,
lugares". além disso, a contribuição única da literatu-
A palavra "laboratório" (ref. 2) foi usada ra e da arte para a atividade psíquica. Para a
no texto em sentido figurado. Explique esse vida, em suma.
sentido, tendo em vista o contexto ao qual a Michèle Petit, A arte de ler ou como resistir
reportagem se refere. à adversidade. São Paulo: ed. 34, 2009.

76
Texto II certo. Os protótipos, assim que conseguiram
algum dinheiro, fretaram um avião para Dis-
Paradoxalmente, o caos em que a humani- neyworld.
dade corre o risco de mergulhar traz em seu A preservação natural da classe média brasi-
bojo sua própria e última oportunidade. Por leira evitaria coisas constrangedoras como a
quê? Para começar, porque a proximidade do recente reunião da classe realizada em São
perigo favorece as instâncias de conscien- Paulo, à qual, de vários pontos do Brasil,
tização, que podem então multiplicar-se, compareceram dezessete pessoas. As outras
ampliar-se e fazer surgir uma grande po- cinco não conseguiram crédito para a pas-
lítica de salvação do mundo. E, sobretudo, sagem. A reunião teve de ser transferida
pela seguinte razão: quando um sistema é do Morumbi para a mesa de uma pizzaria,
incapaz de resolver seus problemas vitais, ou e ninguém pediu vinho. Uma proposta para
ele se desintegra, ou é capaz, dentro de sua que a classe fizesse greve nacional para cha-
própria desintegração, de metamorfosear-se mar a atenção do país para a sua crescente
num metassistema mais rico, capaz de bus- insignificância foi rejeitada sob a alegação
car soluções para esses problemas. de que ninguém iria notar. Fizeram uma
Edgar Morin, http://www.comitepaz.org.br coleta para financiar a eleição de represen-
tantes da classe média na Assembleia Cons-
Responda o que se pede.
tituinte, mas acabaram devolvendo os 10
a) Apesar do texto II abordar um tema genérico
cruzeiros. A única resolução aprovada foi a
e o texto I, um tema mais específico, é pos-
de que, para evitar a perseguição, todos se
sível identificar no conteúdo de ambos algu-
despojassem de sinais ostensivos de serem
ma ideia comum? Justifique sua resposta.
da classe média, como carro pequeno etc., e
b) Sem provocar alterações no sentido do texto
passassem a viver como pobres. Aí não seria
II, que sinônimos poderiam substituir, res-
rebaixamento social, seria disfarce. No fim
pectivamente, as palavras “Paradoxalmente”
os garçons se cotizaram e deram uma gorjeta
(início do texto) e “metamorfosear-se” (fi-
para os integrantes da mesa.
nal do texto)?
Cenas lamentáveis têm ocorrido também
com ex-membros da classe média que, pas-
3. (Ufpe) A vida é CURTA. CURTA! sando para uma classe inferior, não sabem
Num jogo de linguagem, os dois termos des- como se comportar e são alvo de desprezo de
tacados têm sentidos diferentes. pobres tradicionais, que os chamam de "no-
a) Indique um sinônimo para cada um dos ter- vos pobres".
mos. – Viu aquela ali? Quis fazer caneca de lata
b) Reescreva os períodos, explicitando, por de óleo e não sabe nem abrir um buraco com
meio de um conectivo, a relação semântica prego.
estabelecida entre os dois. – E usa lata de óleo de milho.
– Metida a pouca coisa...
– Já viram ela num ônibus? Não sabe empur-
4. (Pucrj) A CLASSE
rar a borboleta com a anca enquanto briga
A eliminação gradual da classe média brasi- com o cobrador.
leira, um processo que começou há anos mas – E não conta o troco!
que de uns tempos para cá assumiu propor- – 3Berço é berço, minha filha.
ções catastróficas, a ponto de a classe média Alguns pobres menos preconceituosos ainda
brasileira ser hoje classificada pelas Nações tentam ajudar os novos pobres a evitar suas
Unidas como uma espécie em extinção, junto gafes.
com o mico-rosa e a foca-focinho-verde, está – Olhe, não leve a mal...
preocupando autoridades e conservacionis- – O quê?
tas nacionais. Estudam-se medidas para aca- – É o seu jeito de falar.
bar com o massacre indiscriminado que vão – Diga-me.
desde o estabelecimento de cotas anuais – – Você às vezes usa o 1pronome oblíquo mui-
só uma determinada parcela da classe média to certo.
poderia ser abatida durante uma temporada – Mas...
– até a criação de santuários onde, livre de – Aqui na vila, pronome oblíquo certo pega
impostos extorsivos e protegida de contra- mal.
cheques criminosos e custos predatórios, a – Sei.
classe média brasileira se reproduziria até – E outra coisa...
recuperar sua antiga força 2numérica, e nu- – O quê?
merária. Uma espécie de reserva de merca- – Os seus discos.
do. A tentativa de recriar a classe média bra- – O toca-discos foi a única coisa que eu con-
sileira em laboratório, como se sabe, não deu segui salvar quando me despejaram.

77
− Eu sei. Mas Julio Iglesias?! bate um bolão. Segundo um estudo recente
(Luís Fernando Veríssimo - COMÉDIAS do grupo EurOlive, formado por instituições
DA VIDA PÚBLICA - 17/07/85) de cinco países europeus, os polifenóis do
azeite de oliva ajudam a frear a oxidação do
"A única resolução aprovada foi a de que,
colesterol LDL, considerado perigoso. Quan-
para evitar a perseguição, todos se despojas- do isso ocorre, reduz-se o risco de placas de
sem de sinais ostensivos de serem da classe gordura na parede dos vasos, a temida ate-
média, como carro pequeno etc., e passassem rosclerose – doença por trás de encrencas
a viver como pobres. Aí não seria rebaixa- como o infarto.
mento social, seria disfarce." Escreva duas (MANARINI, T. Saúde é vital. n. 347, fev. 2012 (adaptado).)
frases em que a palavra "aí" esteja emprega-
da com o valor semântico e de uso: Para divulgar conhecimento de natureza
a) igual ao do trecho acima; científica para um público não especializa-
b) diferente do trecho acima; do, Manarini recorre à associação entre voca-
Contextualize, se necessário, para deixar o bulário formal e vocabulário informal. Alte-
significado inquestionavelmente claro em ra-se o grau de formalidade do segmento no
cada caso. texto, sem alterar o sentido da informação,
com a substituição de
a) “dá um chega pra lá no diabete” por “manda
5. (Ufmg) Analise este "slogan" de uma em-
embora o diabete”.
presa gráfica:
b) “esquentar a cabeça” por “quebrar a cabeça”.
O NOSSO PRODUTO É UMA BOA IMPRESSÃO c) “bate um bolão” por “é um show”.
Explique de que modo se explora, nesse "slo- d) “juntinhos” por “misturadinhos”.
gan", a polissemia. e) “por trás de encrencas” por “causadora de
problemas”.

E.O. Enem 3. (Enem 2017) TEXTO I


Criatividade em publicidade: teorias e refle-
1. (Enem 2017) Nuances xões
Euforia: alegria barulhenta. Felicidade: ale-
Resumo: O presente artigo aborda uma ques-
gria silenciosa.
tão primordial na publicidade: a criativida-
Gravar: quando o ator é de televisão. Filmar:
de. Apesar de aclamada pelos departamentos
quando ele quer deixar claro que não é de
de criação das agências, devemos ter a cons-
televisão.
ciência de que nem todo anúncio é, de fato,
Grávida: em qualquer ocasião. Gestante: em
criativo. A partir do resgate teórico, no qual
filas e assentos preferenciais.
os conceitos são tratados à luz da publicida-
Guardar: na gaveta. Salvar: no computador.
de, busca-se estabelecer a compreensão dos
Salvaguardar: no Exército.
temas. Para elucidar tais questões, é analisa-
Menta: no sorvete, na bala ou no xarope.
da uma campanha impressa da marca XXXX.
Hortelã: na horta ou no suco de abacaxi.
As reflexões apontam que a publicidade cria-
Peça: quando você vai assistir. Espetáculo:
tiva é essencialmente simples e apresenta
quando você está em cartaz com ele. uma releitura do cotidiano.
DUVIVIER, G. Folha de S. Paulo, 24 mar. 2014 (adaptado).
DEPEXE, S.D. Travessias: Pesquisas em Educação.
Cultura, Linguagem e Artes, n. 2, 2008.
O texto trata da diferença de sentido entre
vocábulos muito próximos. Essa diferença é TEXTO II
apresentada considerando-se a(s)
a) alternâncias na sonoridade.
b) adequação às situações de uso.
c) marcação flexional das palavras.
d) grafia na norma-padrão da língua.
e) categorias gramaticais das palavras.

2. (Enem) Azeite de oliva e óleo de linhaça:


uma dupla imbatível.
Rico em gorduras do bem, ela combate a obe-
sidade, dá um chega pra lá no diabete e ain-
da livra o coração de entraves.
Ninguém precisa esquentar a cabeça caso não
seja possível usar os dois óleos juntinhos, no
mesmo dia. Individualmente, o duo também

78
Os dois textos apresentados versam sobre o dicionários unilíngues são os tipos mais co-
tema criatividade. O Texto I é um resumo de muns de dicionários. Em nossos dias, eles se
caráter científico e o Texto II, uma homena- tornaram um objeto de consumo obrigatório
gem promovida por um site de publicidade. para as nações civilizadas e desenvolvidas.”
De que maneira o Texto II exemplifica o con- (Maria T. Camargo Biderman. O dicionário-padrão
ceito de criatividade em publicidade apre- da língua. Alta (28), 2743, 1974 Supl.)
sentado no Texto l?
a) Fazendo menção ao difícil trabalho das mães d)
em criar seus filhos.
b) Promovendo uma leitura simplista do papel
materno em seu trabalho de criar os filhos.
c) Explorando a polissemia do termo “criação”.
d) Recorrendo a uma estrutura linguística sim-
ples.
e) Utilizando recursos gráficos diversificados.

4. (Enem) e) “Humorismo é a arte de FAZER CÓCEGAS NO
RACIOCÍNIO dos outros. Há duas espécies de
humorismo: o trágico e o cômico. O trágico
é o que não consegue fazer rir; o cômico é
o que é verdadeiramente trágico para se fa-
zer.”
(Leon Eliachar. Disponível em: www.mercadolivre.
com.br. Acesso em: julho de 2005.)

6. (Enem) A DANÇA E A ALMA


A DANÇA? Não é movimento,
O efeito de sentido da charge é provocado súbito gesto musical.
pela combinação de informações visuais e É concentração, num momento,
recursos linguísticos. No contexto da ilustra- da humana graça natural.
ção, a frase proferida recorre à No solo não, no éter pairamos,
a) polissemia, ou seja, aos múltiplos sentidos
nele amaríamos ficar.
da expressão “rede social” para transmitir a
ideia que pretende veicular. A dança – não vento nos ramos;
b) ironia para conferir um novo significado ao seiva, força, perene estar.
termo “outra coisa”. Um estar entre céu e chão,
c) homonímia para opor, a partir do advérbio novo domínio conquistado,
de lugar, o espaço da população pobre e o onde busque nossa paixão
espaço da população rica. libertar-se por todo lado...
d) personificação para opor o mundo real pobre Onde a alma possa descrever
ao mundo virtual rico. suas mais divinas parábolas
e) antonímia para comparar a rede mundial de sem fugir à forma do ser,
computadores com a rede caseira de descan-
por sobre o mistério das fábulas.
so da família. (Carlos Drummond de Andrade. Obra completa.
Rio de Janeiro: Aguilar, 1964. p. 366.)
5. (Enem) O termo (ou expressão) destacado
que está empregado em seu sentido próprio, O poema “A Dança e a Alma” é construído
denotativo ocorre em com base em contrastes, como “movimen-
a) “(...) to” e “concentração”. Em uma das estrofes,
É de laço e de nó o termo que estabelece contraste com solo é:
De gibeira o jiló a) éter.
Dessa vida, CUMPRIDA A SOL (...)” b) seiva.
(Renato Teixeira. Romaria. Kuarup
c) chão.
Discos. setembro de 1992).
d) paixão.
b) “Protegendo os inocentes e) ser.
é que Deus, sábio demais,
põe CENÁRIOS diferentes
nas impressões digitais.”
(Maria N. S. Carvalho. Evangelho da Trova. /s.n.b.)

c) “O DICIONÁRIO-PADRÃO da língua e os

79
7. (Enem) significado inadequado a um termo ou ex-
pressão, e isso pode levar a certos resultados
inesperados, como se vê nos quadrinhos a
seguir.

Nessa historinha, o efeito humorístico ori-


gina-se de uma situação criada pela fala da
Rosinha no primeiro quadrinho, que é:
a) Faz uma pose bonita!
b) Quer tirar um retrato?
c) Sua barriga está aparecendo!
d) Olha o passarinho!
e) Cuidado com o flash!
O humor presente na tirinha decorre princi-
palmente do fato de a personagem Mafalda: 1
0. (Enem) O autor do texto abaixo critica, ain-
a) atribuir, no primeiro quadrinho, poder ilimi- da que em linguagem metafórica, a socieda-
tado ao dedo indicador. de contemporânea em relação aos seus hábi-
b) considerar seu dedo indicador tão importan- tos alimentares.
te quanto o dos patrões.
c) atribuir, no primeiro e no último quadrinhos, “Vocês que têm mais de 15 anos, se lembram
um mesmo sentido ao vocábulo “indicador”. quando a gente comprava leite em garrafa,
d) usar corretamente a expressão “indicador de na leiteira da esquina? (...)
desemprego”, mesmo sendo criança. Mas vocês não se lembram de nada, pô? Vai
e) atribuir, no último quadrinho, fama exagera- ver nem sabem o que é vaca. Nem o que é lei-
da ao dedo indicador dos patrões. te. Estou falando isso porque agora mesmo
peguei um pacote de leite – leite em pacote,
8. (Enem) Nas conversas diárias, utiliza-se fre- imagina, Tereza! – na porta dos fundos e es-
quentemente a palavra “próprio” e ela se tava escrito que é pasterizado, ou pasteuri-
ajusta a várias situações. Leia os exemplos zado, sei lá, tem vitamina, é garantido pela
de diálogos: embromatologia, foi enriquecido e o escam-
I. A Vera se veste diferente! bau.
— É mesmo, é que ela tem um estilo PRÓ- Será que isso é mesmo leite? No dicionário
PRIO. diz que leite é outra coisa: ‘Líquido branco,
II. A Lena já viu esse filme uma dezena de contendo água, proteína, açúcar e sais mi-
vezes! Eu não consigo ver o que ele tem nerais’. Um alimento pra ninguém botar de-
de tão maravilhoso assim. feito. O ser humano o usa há mais de 5.000
— É que ele é PRÓPRIO para adolescente. anos. É o único alimento só alimento. A car-
III. Dora, o que eu faço? Ando tão preocupada ne serve pro animal andar, a fruta serve pra
com o Fabinho! Meu filho está impossí- fazer outra fruta, o ovo serve pra fazer outra
vel! galinha (...) O leite é só leite. Ou toma ou
— Relaxa, Tânia! É PRÓPRIO da idade. bota fora.
Com o tempo, ele se acomoda. Esse aqui examinando bem, é só pra botar
Nas ocorrências I, II e III, “próprio” é sinô- fora. Tem chumbo, tem benzina, tem mais
nimo de, respectivamente, água do que leite, tem serragem, sou capaz
a) adequado, particular, típico. de jurar que nem vaca tem por trás desse
b) peculiar, adequado, característico. negócio.
c) conveniente, adequado, particular. Depois o pessoal ainda acha estranho que os
d) adequado, exclusivo, conveniente. meninos não gostem de leite. Mas, como não
e) peculiar, exclusivo, característico. gostam? Não gostam como? Nunca tomaram!
Múúúúúúú!”
9. (Enem) Em uma conversa ou leitura de (FERNANDES, Millôr. O Estado de S.
um texto, corre-se o risco de atribuir um Paulo, 22 de agosto de 1999.)

80
A palavra embromatologia usada pelo autor é: seu pai descobrir, ele te mata, esse menino é
a) um termo científico que significa estudo dos filho de quem, cuidado que homem não pres-
bromatos. ta, não pode dar confiança, não vai pra casa
b) uma composição do termo de gíria “embro- dele, homem gosta é de mulher difícil, tem
mação” (enganação) com bromatologia, que que se dar valor, homem é tudo igual, segu-
é o estudo dos alimentos. ra esse homem, não fuxica, não mexe nas
c) uma junção do termo de gíria “embromação” coisas dele, tem coisa que é melhor a gente
(enganação) com lactologia, que é o estudo não saber, não pergunta demais que ele te
das embalagens para leite. abandona, o que os olhos não veem o cora-
d) um neologismo da química orgânica que ção não sente, quando é que vão casar, ele tá
significa a técnica de retirar bromatos dos te enrolando, morar junto é casar, quando é
laticínios. que vão ter filho, ele tá te enrolando, barriga
e) uma corruptela de termo da agropecuária pontuda deve ser menina, é menina.
que significa a ordenha mecânica. (DUVIVIER, Gregorio. Folha de S. Paulo, 16/09/2013.)

A crônica de Gregorio Duvivier é construída


E.O. UERJ em um único parágrafo com uma única fra-
se. Essa frase começa e termina pela mesma
Exame de Qualificação expressão: é menina.
Em termos denotativos, a menina, referida no
final do texto, pode ser compreendida como:
1. (UERJ) É MENINA a) filha da primeira
É menina, que coisa mais fofa, parece com b) ideal de pureza
o pai, parece com a mãe, parece um joelho, c) mulher na infância
upa, upa, não chora, isso é choro de fome, d) sinal de transformação
isso é choro de sono, isso é choro de chata,
2. (UERJ)
choro de menina, igualzinha à mãe, achou,
1 Escreverei minhas “Memórias”, fato mais
sumiu, achou, não faz pirraça, coitada, tem
frequentemente do que se pensa observado
que deixar chorar, vocês fazem tudo o que
no mundo industrial, artístico, científico e
ela quer, isso vai crescer mimada, eu queria
sobretudo no mundo político, onde muita
essa vida pra mim, dormir e mamar, apro-
gente boa se faz elogiar e aplaudir em bri-
veita enquanto ela ainda não engatinha, isso
lhantes artigos biográficos tão espontâneos,
daí quando começa a andar é um inferno,
como os ramalhetes e as coroas de flores que
daqui a pouco começa a falar, daí não para
as atrizes compram para que lhos atirem na
mais, ela precisa é de um irmão, foi só falar,
cena os comparsas comissionados.1
olha só quem vai ganhar um irmãozinho, to-
2 Eu reputo esta prática muito justa e muito
mara que seja menino pra formar um casal,
natural; porque não compreendo amor e ainda
ela tá até mais quieta depois que ele nasceu,
amor apaixonado mais justificável do que aque-
parece que ela cuida dele, esses dois vão ser
le que sentimos pela nossa própria pessoa.
inseparáveis, ela deve morrer de ciúmes, ele
3 O amor do eu é e sempre será a pedra
já nasceu falante, menino é outra coisa, des-
angular da sociedade humana, o regulador
de que ele nasceu parece que ela cresceu, já
dos sentimentos, o móvel das ações, e o farol
tá uma menina, quando é que vai pra creche,
do futuro: do amor do eu nasce o amor do lar
ela não larga dessa boneca por nada, já po-
doméstico, deste o amor do município, deste
dia ser mãe, já sabe escrever o nomezinho,
o amor da província, deste o amor da nação,
quantos dedos têm aqui, qual é a sua prince-
anéis de uma cadeia de amores que os tolos
sa da Disney preferida, quem você prefere, o julgam que sentem e tomam ao sério, e que
papai ou a mamãe, quem é o seu namoradi- certos maganões envernizam, mistifican-
nho, quem é o seu príncipe da Disney prefe- do a humanidade para simular abnegação e
rido, já se maquia nessa idade, é apaixona- virtudes que não têm no coração e que eu
da pelo pai, cadê o Ken, daqui a pouco vira com a minha exemplar franqueza simplifi-
mocinha, eu te peguei no colo, só falta ficar co, reduzindo todos à sua expressão origi-
mais alta que eu, finalmente largou a bone- nal e verdadeira, e dizendo, lar, município,
ca, já tava na hora, agora deve tá pensando província, nação, têm a flama dos amores
besteira, soube que virou mocinha, ganhou que lhes dispenso nos reflexos do amor em
corpo, tenho uma dieta boa pra você, a dieta que me abraso por mim mesmo: todos eles
do ovo, a dieta do tipo sanguíneo, a dieta são o amor do eu e nada mais. A diferença
da água gelada, essa barriga só resolve com está em simples nuanças determinadas pela
cinta, que corpão, essa menina é um peri- maior ou menor proporção dos interesses e
go, vai ter que voltar antes de meia-noite, o das conveniências materiais do apaixonado
seu irmão é diferente, menino é outra coisa, adorador de si mesmo.
vai pela sombra, não sorri pro porteiro, não (MACEDO, Joaquim Manuel de. Memórias do sobrinho
sorri pro pedreiro, quem é esse menino, se o de meu tio. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.)

81
Observe o emprego da expressão “coroa de nacional, com tudo o que tem de violência
flores” em: naturalizada e corriqueira, tratamento de-
I. “... como os ramalhetes e as coroas de flo- gradante dado aos pobres, estupidez elevada
res que as atrizes compram para que lhos ao cúmulo, ignorância bruta transformada
atirem na cena os comparsas comissiona- em trapalhada 8transcendental, além de um
dos.” (ref.1) índice grotesco de métodos de camuflagem
II. e desaparição de pessoas. Pois assim como
10
Amarildo é aquele que desapareceu das vis-
tas, e não faz muito tempo, Cláudia é aquela
que subitamente salta à vista, e ambos soam,
queira-se ou não, como o verso e o reverso
do mesmo.

Quanto aos sentidos conotativo e denotativo


da expressão “coroa de flores”, pode-se afir- O acaso da queda de Cláudia dá a ver algo
mar que: do que não pudemos ver no caso do desa-
a) “coroa” tem valor denotativo nos dois textos parecimento de Amarildo. A sua passagem
b) “flores” em valor denotativo nos dois textos meteórica pela tela é um desfile do carnaval
c) “flores” e “coroa” têm valor conotativo na de horror que escondemos. Aquele carro é
tira de Maurício de Sousa o carro alegórico de um Brasil, de um certo
d) “flores” e “coroa” têm valor conotativo no Brasil que temos que lutar para que não se
texto de J. Manuel de Macedo transforme no carro alegórico do Brasil.
(José Miguel Wisnik
Disponível em: oglobo.globo.com, 22/03/2014.)
3. (UERJ) O ARRASTÃO
Estarrecedor, nefando, inominável, infame.
3
aplainada − nivelada
Gasto logo os adjetivos porque eles fracas-
4
praxe − prática, hábito
sam em dizer o sentimento que os fatos im-
6
surrealistas − participantes de movimento
põem. Uma trabalhadora brasileira, descen- artístico do século 20 que enfatiza o papel
dente de escravos, como tantos, que cuida de do inconsciente
quatro filhos e quatro sobrinhos, que parte 7
recalcada − fortemente reprimida
para o trabalho às quatro e meia das manhãs 8
transcendental − que supera todos os limites
de todas as semanas, que administra com o 10
Amarildo − pedreiro desaparecido na fave-
marido um ganho de mil e seiscentos reais, la da Rocinha, no Rio de Janeiro, em 2013,
que paga pontualmente seus carnês, como depois de ser detido por policiais
milhões de trabalhadores brasileiros, é ba-
leada em circunstâncias não esclarecidas no "É uma imagem verdadeiramente surreal"
Morro da Congonha e, levada como carga no (ref. 5)
porta-malas de um carro policial a pretexto
de ser atendida, é arrastada à morte, a céu Na argumentação desenvolvida pelo autor, a
aberto, pelo asfalto do Rio. imagem do porta-malas do carro da polícia
Não vou me deter nas versões apresentadas expressa sentidos ambivalentes em relação
pelos advogados dos policiais. Todas as vozes à violência.
terão que ser ouvidas, e com muita atenção Esses sentidos podem ser definidos como:
à voz daqueles que nunca são ouvidos. Mas, a) achar − perder
antes das versões, o fato é que esse porta- b) socorrer − redimir
-malas, ao se abrir fora do script, escanca- c) esconder − revelar
rou um real que está acostumado a existir d) orientar − desorientar
na sombra.
O marido de Cláudia Silva Ferreira disse que,
se o porta-malas não se abrisse como abriu 4. (UERJ) Medo e vergonha
(por obra do acaso, dos deuses, do diabo), O medo é um evento poderoso que toma o
esse seria apenas “mais um caso”. Ele está
nosso corpo, nos põe em xeque, paralisa al-
dizendo: seria uma morte anônima, 3aplai-
guns e atiça a criatividade de outros. Uma
nada pela surdez da 4praxe, pela invisibi-
pessoa em estado de pavor é dona de uma
lidade, uma morte não questionada, como
tantas outras. energia extra capaz de feitos incríveis.
5
É uma imagem verdadeiramente surreal, Um amigo nosso, quando era adolescente,
não porque esteja fora da realidade, mas aproveitou a viagem dos pais da namora-
porque destampa, por um “acaso objeti- da para ficar na casa dela. Os pais voltaram
vo” (a expressão era usada pelos 6surrea- mais cedo e, pego em flagrante, nosso Ro-
listas), uma cena 7recalcada da consciência meu teve a brilhante ideia de pular, pelado,
do segundo andar. Está vivo. Tem hoje essa

82
incrível história pra contar, mas deve se lem- a) literal e figurado
brar muito bem da vergonha. b) geral e particular
Me lembrei dessa história por conta de ou- c) descritivo e irônico
tra completamente diferente, mas na qual d) ambíguo e polissêmico
também vi meu medo me deixar em maus
lençóis. 5. (UERJ) O tempo em que o mundo tinha a
Estava caminhando pelo bairro quando re- nossa idade
solvi explorar umas ruas mais desertas. De
repente, vejo um menino encostado num Nesse entretempo, ele nos chamava para
muro. Parecia um menino de rua, tinha seus escutarmos seus imprevistos improvisos.
15, 16 anos e, quando me viu, fixou o olhar e As estórias dele faziam o nosso lugarzinho
apertou o passo na minha direção. Não pes- crescer até ficar maior que o mundo. Nenhu-
tanejei. Saí correndo. Correndo mesmo, na ma narração tinha fim, o sono lhe apagava
mais alta performance de minhas pernas. a boca antes do desfecho. Éramos nós que
No meio da corrida, comecei a pensar se ele recolhíamos seu corpo dorminhoso. Não lhe
iria mesmo me assaltar. Uma onda de ver- deitávamos dentro da casa: ele sempre re-
gonha foi me invadindo. O rapaz estava me cusara cama feita. Seu conceito era que a
vendo correr. E se eu tivesse me enganado? morte nos apanha deitados sobre a moleza
E se ele não fosse fazer nada? Mesmo que de uma esteira. Leito dele era o puro chão,
fosse. Ter sido flagrada no meu medo e pre- lugar onde a chuva também gosta de deitar.
conceito daquela forma já me deixava numa Nós simplesmente lhe encostávamos na pa-
desvantagem fulminante. rede da casa. Ali ficava até de manhã. Lhe
Não sou uma pessoa medrosa por excelência, encontrávamos coberto de formigas. Parece
mas, naquele dia, o olhar, o gesto, alguma que os insectos gostavam do suor docicado
coisa no rapaz acionou imediatamente o mo- do velho Taímo. Ele nem sentia o corrupio do
tor de minhas pernas e, quando me dei con- formigueiro em sua pele.
ta, já estava em disparada. − Chiças: transpiro mais que palmeira!
Fui chegando ofegante a uma esquina, os Proferia tontices enquanto ia acordando.
motoristas de um ponto de táxi me pergun-
8
Nós lhe sacudíamos os infatigáveis bichos.
taram o que tinha acontecido e eu, um tan- Taímo nos sacudia a nós, incomodado por lhe
to constrangida, disse que tinha ficado com dedicarmos cuidados.
medo. Me contaram que ele vivia por ali, to-
2
Meu pai sofria de sonhos, saía pela noite de
mando conta dos carros. Fervi de vergonha. olhos transabertos. Como dormia fora, nem
O menino passou do outro lado da rua e, per- dávamos conta. Minha mãe, manhã seguinte,
cebendo que eu olhava, imitou minha corri- é que nos convocava:
dinha, fazendo um gesto de desprezo. Tive − Venham: papá teve um sonho!
vontade de sentar na 1guia e chorar. Ele só E nos juntávamos, todos completos, para es-
tinha me olhado, e o resto tinha sido produ- cutar as verdades que lhe tinham sido re-
to legítimo do meu preconceito. veladas. Taímo recebia notícia do futuro por
Fui atrás dele. Não consegui carregar tama- via dos antepassados. Dizia tantas previsões
nha 2bigorna pra casa. “Ei!” Ele demorou a que nem havia tempo de provar nenhuma.
virar. Se eu pensava que ele assaltava, 6ele Eu me perguntava sobre a verdade daquelas
também não podia imaginar que eu pedis- visões do velho, estorinhador como ele era.
− Nem duvidem, avisava mamã, suspeitan-
se desculpas. Insisti: “Desculpa!” Ele virou.
do-nos.
7
Seu olhar agora não era mais de ladrão, e
E assim seguia nossa criancice, tempos afo-
sim de professor. Me perdoou com um sinal
ra. Nesses anos ainda tudo tinha sentido: a
de positivo ainda cheio de desprezo. Fui pra
razão deste mundo estava num outro mundo
casa pelada, igual ao Romeu suicida.
(Denise Fraga inexplicável. Os mais velhos faziam a ponte
Folha de S. Paulo, 08/01/2013) entre esses dois mundos. (...)
(Mia Couto
1
guia − meio-fio da calçada Terra sonâmbula. São Paulo: Cia das Letras, 2007.)
2
bigorna − bloco de ferro para confecção de
Ao dizer que o pai sofria de sonhos (ref. 2) e
instrumentos
não que ele sonhava, o autor altera o signifi-
Na última frase da crônica, a autora corre- cado corrente do ato de sonhar.
laciona dois episódios. Em ambos, aparece o Este novo significado sugere que o sonho
atributo “pelado(a)”. No entanto, esse atri- tem o poder de:
buto tem significado diferente em cada um a) distrair
dos episódios. b) acalmar
No texto, o significado de cada termo se ca- c) informar
racteriza por ser, respectivamente: d) perturbar

83
6. (UERJ) RIOS SEM DISCURSO penetra esta casca espessa e vem ferir cá
dentro a sensibilidade embotada.
Quando um rio corta, corta-se de vez Cinquenta anos! Quantas horas inúteis! Con-
o discurso-rio de água que ele fazia; sumir-se uma pessoa a vida inteira sem sa-
cortado, a água se quebra em pedaços, ber para quê!
em poços de água, em água paralítica. Comer e dormir como um porco! Como um
Em situação de poço, a água equivale
porco! Levantar-se cedo todas as manhãs e
a uma palavra em situação dicionária:
sair correndo, procurando comida! 4E depois
isolada, estanque no poço dela mesma,
guardar comida para os filhos, para os netos,
e porque assim estanque, estancada;
e mais: porque assim estancada, muda, para muitas gerações. Que estupidez! (...)
e muda porque com nenhuma comunica, Coloquei-me acima da minha classe, creio
porque cortou-se a sintaxe desse rio, que me elevei bastante. Como lhes disse,
o fio de água por que ele discorria. fui guia de cego, vendedor de doce e tra-
balhador alugado. Estou convencido de que
O curso de um rio, seu discurso-rio, nenhum desses ofícios me daria os recursos
chega raramente a se reatar de vez, intelectuais necessários para engendrar esta
um rio precisa de muito fio de água narrativa. Magra, de acordo, mas em mo-
para refazer o fio antigo que o fez. mentos de otimismo suponho que há nela
Salvo a grandiloquência de uma cheia pedaços melhores que a literatura do Gon-
lhe impondo interina outra linguagem, dim. Sou, pois, superior a mestre Caetano e
um rio precisa de muita água em fios a outros semelhantes. Considerando, porém,
para que todos os poços se enfrasem: que os enfeites do meu espírito se reduzem
se reatando, de um para outro poço, a farrapos de conhecimentos apanhados sem
em frases curtas, então frase e frase, escolha e mal cosidos, devo confessar que a
até a sentença-rio do discurso único superioridade que me envaidece é bem mes-
em que se tem voz a seca ele combate. quinha.
(NETO, João Cabral de Melo. Antologia poética. (...)
Rio de Janeiro: José Olympio, 1973.) Quanto às vantagens restantes – casas, ter-
ras, móveis, semoventes, consideração de
“Em situação de poço, a água equivale a uma
políticos, etc. – é preciso convir em que tudo
palavra em situação dicionária:”
está fora de mim.
Se, no poema, “poço” equivale a “dicioná-
Julgo que me desnorteei numa errada.
rio”, “rio” equivale ao seguinte elemento
(GRACILIANO RAMOS
linguístico: São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2004.)
a) texto
b) verso Desde então procuro descascar fatos, aqui
c) regência sentado à mesa da sala de jantar (ref. 1)
d) vocabulário Na sentença acima, o processo metafórico se
concentra no verbo “descascar”.
No contexto, a metáfora expressa em “des-
7. (UERJ) De repente voltou-me a ideia de cascar” tem o seguinte significado:
construir o livro. (...) a) reduzir
1
Desde então procuro descascar fatos, aqui b) denunciar
sentado à mesa da sala de jantar (...). c) argumentar
Às vezes, entro pela noite, passo tempo sem d) compreender
fim acordando lembranças. Outras vezes não
me ajeito com esta ocupação nova.
Anteontem e ontem, por exemplo, foram
dias perdidos. Tentei debalde canalizar para
E.O. UERJ
termo razoável esta prosa que se derrama
como a chuva da serra, e o que me apareceu
Exame Discursivo
foi um grande desgosto. Desgosto e a vaga
compreensão de muitas coisas que sinto. 1. (UERJ) MULHER AO ESPELHO
Sou um homem arrasado. Doença? Não. Gozo
Hoje, que seja esta ou aquela,
perfeita saúde. (...) Não tenho doença ne-
pouco me importa.
nhuma.
Quero apenas parecer bela,
O que estou é velho. Cinquenta anos pelo S.
pois, seja qual for, estou morta.
Pedro. Cinquenta anos perdidos, cinquenta
anos gastos sem objetivo, a maltratar-me Já fui loura, já fui morena,
e a maltratar os outros. O resultado é que já fui Margarida e Beatriz.
endureci, calejei, e não é um arranhão que Já fui Maria e Madalena.

84
Só não pude ser como quis. expectativa, medo, alegria, excitação. Alto-
-falantes comandando ordens, convocando
Que mal faz, esta cor fingida nadadores, apostas, previsões, torcida, gri-
do meu cabelo, e do meu rosto, taria. Nada da paz quase bucólica da piscina
se tudo é tinta: o mundo, a vida, nos dias de treino – o rigor e a monotonia
o contentamento, o desgosto? dos exercícios, de manhã e de tarde, o longo,
Por fora, serei como queira lento e meticuloso esforço durante meses e
a moda, que me vai matando. meses, para ganhar décimos de segundo na
Que me levem pele e caveira luta contra o cronômetro. Refugiado no ves-
ao nada, não me importa quando. tiário, enrolado em cobertor, Eduardo aguar-
dava o momento de sua prova, ouvindo, lá
Mas quem viu, tão dilacerados, fora, os aplausos da multidão. Logo chegaria
olhos, braços e sonhos seus, a sua vez. Chico, o roupeiro, aparecia para
e morreu pelos seus pecados, dar-lhe a notícia da competição.
falará com Deus. – Estamos ganhando. Daqui a pouco é você.
Falará, coberta de luzes, (...) 2Sua emoção se traduzia em longos bo-
do alto penteado ao rubro artelho. cejos, o medo era quase náusea, a expectati-
Porque uns expiram sobre cruzes, va era uma ilusória, persistente e irresistí-
outros, buscando-se no espelho. vel vontade de urinar. A multidão voltava a
(MEIRELES, Cecília. Poesia Completa. Rio de aplaudir, lá fora. – “Daqui a pouco é você”.
Janeiro: Civilização Brasileira, 1973.) Nunca saía do vestiário antes da hora de nadar.
– Quanto está a água hoje? – perguntava ao
O uso de palavras e expressões cotidianas, roupeiro.
neste texto, é carregado de sentido simbó- Era o único nadador que não interrompia os
lico. treinos no inverno, sozinho, a água gelada, a
a) Uma expressão utilizada no poema possui um piscina fechada aos sócios. (...) Nadar era di-
sentido correspondente ao da expressão “da fícil, ficava cada vez mais difícil... Onde quer
cabeça aos pés”. que surgisse um recordista, logo surgia outro
Retire-a do texto. para abaixar-lhe o recorde. (...)
b) Na 3a estrofe, o substantivo “tinta” se refere – Marciano, a sua vez! – vinham lhe avisar.
a uma expressão que o antecede. 3
Nada a fazer. Ali estava ele, pronto para o
Transcreva essa expressão e indique a cono- sacrifício, convocado como um condenado
tação que o substantivo “tinta” adquire no para a execução. Ia seguindo em direção à
texto. mesa dos juízes, para assinar a súmula, sem
olhar para os lados. Sentia que todos os
olhos o seguiam, ouvia vagamente os aplau-
2. (UERJ) O ENCONTRO MARCADO sos, procurava ignorar tudo, concentrar-se.
Vontade de dormir, de desistir, fugir, sair
Eduardo e a vida sadia. Seu Marciano tornou-
correndo, esquecer aquele suplício. Medo. Os
-se sócio do clube, o filho praticava natação.
outros também se sentiriam assim, fragili-
– Por que você não joga basquete? – sugeria
zados pela emoção, sucumbidos pela espera?
Letícia. – Natação é tão sem graça...
Munira-se de alguns minutos de descanso e
– Porque natação não depende de ninguém,
solidão, curtidos em agonia no vestiário –
só de mim.
era a sua reserva. Ali fora, os nervos se es-
Em seis meses era o melhor nadador de sua
bandalhariam ante o que o aguardava – que
categoria, e ameaçava já o recorde dos adul-
viesse imediatamente.
tos.
– Mostra a essa gente, Eduardo.
Uma espécie diferente de emoção – a de
– É pra valer!
poder contar consigo mesmo, e de se saber,
– Capricha, menino.
numa competição, antecipadamente vence-
– Está bem, está bem...
dor. Os entendidos sacudiam a cabeça, ad-
Deslumbrado pela luz dos refletores, despro-
mirados:
tegido e nu, ia caminhando para o sacrifício.
– Quem diria, esse menino...
(Fernando Sabino
Era uma espécie de êxtase: fazer de simples O encontro marcado. Rio de Janeiro: Record, 2012.)
prova de natação, a que ninguém o obriga-
va, uma disputa em que parecia empenhar Nada a fazer. Ali estava ele, pronto para o sa-
o destino, fazer da arrancada final uma luta crifício, convocado como um condenado para
contra o cansaço, em que a vida parecia que- a execução. Ia seguindo em direção à mesa
rer prolongar-se além de si mesma. dos juízes, para assinar a súmula, sem olhar
Dia de competição. As luzes da piscina ace- para os lados. (ref. 3)
sas, as arquibancadas cheias. Ambiente de Cite dois vocábulos desse fragmento que

85
revelam o sentimento que a prova de natação Nem o remorso
provoca em Eduardo. Em seguida, com base De ter vivido.
no último parágrafo, indique um recurso (RICARDO REIS
Pessoa, Fernando. Obra poética. Rio
utilizado pelo narrador para enfatizar esse de Janeiro: Aguilar, 1999.)
sentimento.
1
plácidas - calmas
3. (UERJ) Mestre
2
incautos - desprevenidos
3
conforme calha - conforme seja
Mestre, são 1plácidas
Todas as horas Na 1ª estrofe do poema, para construir o
Que nós perdemos, sentido geral do texto, o poeta faz uma refe-
rência à expressão perder tempo, dando-lhe,
Se no perdê-las,
entretanto, outro sentido, diferente do usual.
Qual numa jarra, Explique o sentido usual da expressão perder
Nós pomos flores. tempo e apresente, também, o sentido que
essa mesma expressão assume no poema.

Não há tristezas
Nem alegrias E.O. Objetivas
Na nossa vida.
Assim saibamos, (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
Sábios 2incautos,
Não a viver, 1. (Unesp) A questão a seguir focaliza uma pas-
sagem de um artigo de José Francisco Botel-
Mas decorrê-la,
ho e uma das ilustrações de Carlo Giovani a
Tranquilos, plácidos,
esse artigo.
Tendo as crianças
Por nossas mestras, Compaixão
E os olhos cheios Considerada a maior de todas as virtudes
De Natureza... por religiões como o budismo e o hindu-
ísmo, a compaixão é a capacidade humana
À beira-rio, de compartilhar (ou experimentar de forma
À beira-estrada, parcial) os sentimentos alheios — princi-
3
Conforme calha, palmente o sofrimento. Mas a onipresença
Sempre no mesmo da miséria humana faz da compaixão uma
Leve descanso virtude potencialmente paralisante. Afoga-
De estar vivendo. dos na enchente das dores alheias, podemos
facilmente cair no desespero e na inação.
O tempo passa, Por isso, a piedade tem uma reputação con-
Não nos diz nada. turbada na história do pensamento: se al-
Envelhecemos. guns a apontaram como o alicerce da ética e
Saibamos, quase da moral, outros viram nela uma armadilha,
Maliciosos, um mero acréscimo de tristeza a um Uni-
Sentir-nos ir. verso já suficientemente amargo. Porém,
vale lembrar que as virtudes, para funcio-
Não vale a pena narem, devem se encaixar umas às outras:
Fazer um gesto. quando aliado à temperança, o sentimento
Não se resiste de comiseração pelas dores do mundo pode
Ao deus atroz ser um dos caminhos que nos afastam da
Que os próprios filhos cratera de Averno*. Dosando com prudência
Devora sempre. uma compaixão potencialmente infinita, é
possível sentirmos de forma mais intensa a
Colhamos flores. felicidade, a nossa e a dos outros — como
Molhemos leves alguém que se delicia com um gole de água
As nossas mãos fresca, lembrando-se do deserto que arde lá
Nos rios calmos, fora. Isso tudo pode parecer estranho, mas
Para aprendermos o fato é que a denúncia da compaixão segue
Calma também. um raciocínio bastante rigoroso.
O sofrimento — e todos concordam — é algo
Girassóis sempre ruim. A compaixão multiplica o sofrimento
Fitando o sol, do mundo, fazendo com que a dor de uma
Da vida iremos criatura seja sentida também por outra. E o
Tranquilos, tendo que é pior: ao passar a infelicidade adiante,

86
ela não corrige, nem remedia, nem alivia a pós-industrial porque confronta o modelo de
dor original. Como essa infiltração universal produção que dominava até o final do sécu-
da tristeza poderia ser uma virtude? No sé- lo XX. Esse modelo industrial é baseado na
culo I a.C., Cícero escreveu: “Por que sentir repetição, em formatar e embalar. Por trás
piedade, se em vez disso podemos simples- disso, a ideia é obter a máxima produção – o
mente ajudar os sofredores? Devemos ser que, para produtos em geral, funciona muito
justos e caridosos, mas sem sofrer o que os bem. Quando esses parâmetros são aplicados
outros sofrem”. à arte, a venda do produto (por exemplo, o
disco) depende do conteúdo (a canção). A
(*) Os romanos consideravam a cratera vul- canção que vai resultar nessa “produção máx-
cânica de Averno, situada perto de Nápoles, ima” é buscada por meio de um equilíbrio
como entrada para o mundo inferior, o mun- entre criatividade e uma fórmula de sucesso
do dos mortos, governado por Plutão. que desperte o interesse do público. Como es-
tudos ainda não conseguiram decifrar como
direcionar a criatividade de uma maneira que
certamente despertará esse interesse (e max-
imizará a produção), a opção normalmente
costuma ser pela solução mais simples.
“Cada um tem descoberto suas fórmulas e
possibilidades, pois tudo tende a ser cada vez
menos homogêneo”, opina o baiano Lucas
Santtana, que realizou seus discos recentes às
próprias custas. “Claro que ainda existe uma
distância em relação aos artistas chamados
mainstream”, continua. “Mas você muda o
tamanho da escala e já está tudo igual em ter-
mos de business. A pergunta é se essa geração
faz uma música para esse grande mercado ou
Assinale a alternativa que contém três se ela está formando um novo público. Outra
vocábulos usados como sinônimos ao longo pergunta é se o grande mercado na verdade
do fragmento: não passa de uma imposição de uma máfia
a) compaixão, piedade, comiseração. que dita o que vai ser popular.”
b) virtude, sofrimento, piedade. (Galileu, março de 2013. Adaptado.)
c) compaixão, miséria, dor. Em seu depoimento no artigo, o músico Lu-
d) piedade, temperança, prudência. cas Santtana sugere que o grande mercado
e) sofrimento, virtude, miséria.
talvez não passe da imposição de uma máfia.
O termo máfia, nesse caso, foi empregado no
2. (Unesp) A questão a seguir toma por base sentido de
uma passagem do artigo “Os operários da a) domínio dos partidos políticos sobre o mer-
música livre”, de Ronaldo Evangelista. cado musical, privilegiando tudo o que in-
Desde o final do século XX, toda a engrena- teresse apenas ao poder público.
gem industrial do mercado musical passa b) organização criminosa com origem na Itália,
por intensas transformações, como o surgi- com poderosas ramificações pelo mundo in-
mento e disseminação de novas tecnologias, teiro.
em grande parte gratuitas, como os arquivos c) sindicato de grandes músicos brasileiros que
MP3s, as redes de compartilhamento destes visa impedir a ascensão e o sucesso de músi-
arquivos, mecanismos torrents, sites de arma- cos mais jovens.
zenamento de conteúdo, ferramentas de pub- d) grupos anarquistas constituídos para tumul-
licação on-line – tudo à disposição de quem tuar e desmoralizar os músicos mais jovens e
quisesse dividir com os outros suas canções a música popular brasileira.
e discos favoritos. A era pós-industrial atin- e) organização que emprega métodos imorais e
giu toda a indústria do entretenimento, mas ilegais para impor seus interesses em deter-
o braço da música foi quem mais sofreu, es-
minada atividade.
pecialmente as grandes gravadoras multina-
cionais, as chamadas majors, que sofreram
um declínio em todas as etapas de seu antigo TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
negócio, ao mesmo tempo em que rapidam-
ente se aperfeiçoavam ferramentas baratas e Vivendo e...
caseiras de produção que diminuíam a distân- Eu sabia fazer pipa e hoje não sei mais. Du-
cia entre amadores e profissionais. vido que se hoje pegasse uma bola de gude
A era digital é também chamada de conseguisse equilibrá-la na dobra do dedo

87
indicador sobre a unha do polegar, quanto (ref. 4).
mais jogá-la com a 1precisão que tinha quan- c) “trajetória elíptica” (ref. 5) / “mínima mar-
do era garoto. (...) gem de erro” (ref. 6).
Juntando-se as duas mãos de um determi- d) “puro instinto” (ref. 7) / “complicados cál-
nado jeito, com os polegares para dentro, e culos” (ref. 8).
assoprando pelo buraquinho, tirava-se um e) “habilidade perdida” (ref. 9) / “artes que
silvo bonito que inclusive variava de tom nos abandonaram” (ref. 10).
conforme o posicionamento das mãos. Hoje
não sei mais que jeito é esse. Eu sabia a 2fór- 5. (Unesp 2017) Para responder à questão a se-
mula de fazer cola caseira. Algo envolvendo guir, leia a crônica “Anúncio de João Alves”,
farinha e água e 3muita confusão na cozinha, de Carlos Drummond de Andrade (1902-
de onde éramos expulsos sob ameaças. Hoje 1987), publicada originalmente em 1954.
não sei mais. A gente começava a contar de-
pois de ver um relâmpago e o número a que Figura o anúncio em um jornal que o amigo
chegasse quando ouvia a trovoada, multipli- me mandou, e está assim redigido:
cado por outro número, dava a 4distância ex- À procura de uma besta. – A partir de 6 de
ata do relâmpago. Não me lembro mais dos outubro do ano cadente, sumiu-me uma
números. (...) besta vermelho-escura com os seguintes car-
Lembro o orgulho com que consegui, pela acterísticos: calçada e ferrada de todos os
primeira vez, cuspir corretamente pelo espa- membros locomotores, um pequeno quisto
ço adequado entre os dentes de cima e a pon- na base da orelha direita e crina dividida em
ta da língua de modo que o cuspe ganhasse duas seções em consequência de um golpe,
distância e pudesse ser mirado. Com prática, cuja extensão pode alcançar de quatro a seis
conseguia-se controlar a 5trajetória elíptica centímetros, produzido por jumento.
da cusparada com uma 6mínima margem de Essa besta, muito domiciliada nas cercani-
erro. Era 7puro instinto. Hoje o mesmo feito as deste comércio, é muito mansa e boa de
requereria 8complicados cálculos de balísti- sela, e tudo me induz ao cálculo de que foi
ca, e eu provavelmente só acertaria a frente roubada, assim que hão sido falhas todas as
da minha camisa. Outra 9habilidade perdida. indagações.
Na verdade, deve-se revisar aquela an- Quem, pois, apreendê-la em qualquer parte e
tiga frase. É vivendo e .................... . Não a fizer entregue aqui ou pelo menos notícia
falo daquelas coisas que deixamos de fazer exata ministrar, será razoavelmente remu-
porque não temos mais as condições físicas nerado. Itambé do Mato Dentro, 19 de no-
e a coragem de antigamente, como subir em vembro de 1899. (a) João Alves Júnior.
bonde andando – mesmo porque não há mais Cinquenta e cinco anos depois, prezado João
bondes andando. Falo da sabedoria des- Alves Júnior, tua besta vermelho-escura,
perdiçada, das 10artes que nos abandonaram. mesmo que tenha aparecido, já é pó no pó.
Algumas até úteis. Quem nunca desejou ain- E tu mesmo, se não estou enganado, repou-
da ter o cuspe certeiro de garoto para acertar sas suavemente no pequeno cemitério de It-
em algum alvo contemporâneo, bem no olho, ambé. Mas teu anúncio continua um modelo
e depois sair correndo? Eu já. no gênero, se não para ser imitado, ao me-
(Luís F. Veríssimo, Comédias para se ler na escola.) nos como objeto de admiração literária.
3
Reparo antes de tudo na limpeza de tua
3. (Fuvest) A palavra que o cronista omite no linguagem. Não escreveste apressada e to-
título, substituindo-a por reticências, ele a scamente, como seria de esperar de tua
emprega no último parágrafo, na posição condição rural. Pressa, não a tiveste, pois o
marcada com pontilhado. Tendo em vista o animal desapareceu a 6 de outubro, e só a 19
contexto, conclui-se que se trata da palavra de novembro recorreste à Cidade de Itabira.
a) desanimando. Antes, procedeste a indagações. Falharam.
b) crescendo. 5
Formulaste depois um raciocínio: houve
c) inventando. roubo. Só então pegaste da pena, e traçaste
d) brincando. um belo e nítido retrato da besta.
e) desaprendendo. 6
Não disseste que todos os seus cascos es-
tavam ferrados; preferiste dizê-lo “de to-
4. (Fuvest) Um dos contrastes entre passado e dos os seus membros locomotores”. Nem
presente que caracterizam o desenvolvimen- esqueceste esse pequeno quisto na orelha e
to do texto manifesta-se na oposição entre essa divisão da crina em duas seções, que
as seguintes expressões: teu zelo naturalista e histórico atribuiu com
a) “precisão” (ref. 1) / “fórmula” (ref. 2). segurança a um jumento.
b) “muita confusão” (ref. 3) / “distância exata” Por ser “muito domiciliada nas cercanias

88
deste comércio”, isto é, do povoado e sua feirinha semanal, inferiste que não teria fugido, mas
antes foi roubada. Contudo, não o afirmas em tom peremptório: “tudo me induz a esse cálculo”.
Revelas aí a prudência mineira, que não avança (ou não avançava) aquilo que não seja a evidência
mesma. É cálculo, raciocínio, operação mental e desapaixonada como qualquer outra, e não denún-
cia formal.
Finalmente – deixando de lado outras excelências de tua prosa útil – a declaração final: quem a
apreender ou pelo menos “notícia exata ministrar”, será “razoavelmente remunerado”. Não prom-
etes recompensa tentadora; não fazes praça de generosidade ou largueza; acenas com o razoável,
com a justa medida das coisas, que deve prevalecer mesmo no caso de bestas perdidas e entregues.
Já é muito tarde para sairmos à procura de tua besta, meu caro João Alves do Itambé; entretanto
essa criação volta a existir, porque soubeste descrevê-la com decoro e propriedade, num dia remo-
to, e o jornal a guardou e alguém hoje a descobre, e muitos outros são informados da ocorrência.
Se lesses os anúncios de objetos e animais perdidos, na imprensa de hoje, ficarias triste. Já não há
essa precisão de termos e essa graça no dizer, nem essa moderação nem essa atitude crítica. Não
há, sobretudo, esse amor à tarefa bem-feita, que se pode manifestar até mesmo num anúncio de
besta sumida.
(Fala, amendoeira, 2012.)

Está empregado em sentido figurado o termo destacado no seguinte trecho:


a) “Formulaste depois um raciocínio: houve roubo.” (ref. 5)
b) “Reparo antes de tudo na limpeza de tua linguagem.” (ref. 3)
c) “Reparo antes de tudo na limpeza de tua linguagem.” (ref. 3)
d) “Não disseste que todos os seus cascos estavam ferrados;” (ref. 6)
e) “Não disseste que todos os seus cascos estavam ferrados;” (ref. 6)

E.O. Dissertativas
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
1. (Fuvest) Considere o seguinte texto, para atender ao que se pede:

O orgulho é a consciência (certa ou errada) do nosso próprio mérito; a vaidade, a consciência (cer-
ta ou errada) da evidência do nosso próprio mérito para os outros. Um homem pode ser orgulhoso
sem ser vaidoso, pode ser ambas as coisas, vaidoso e orgulhoso, pode ser — pois tal é a natureza
humana — vaidoso sem ser orgulhoso. É difícil à primeira vista compreender como podemos ter
consciência da evidência do nosso mérito para os outros, sem a consciência do nosso próprio méri-
to. Se a natureza humana fosse racional, não haveria explicação alguma. Contudo, o homem vive
a princípio uma vida exterior, e mais tarde uma interior; a noção de efeito precede, na evolução
da mente, a noção de causa interior desse mesmo efeito. O homem prefere ser exaltado por aquilo
que não é, a ser tido em menor conta por aquilo que é. É a vaidade em ação.
(Fernando Pessoa, Da literatura europeia.)

a) Considerando-a no contexto em que ocorre, explique a frase “o homem vive a princípio uma vida ex-
terior, e mais tarde uma interior”.
b) Reescreva a frase “O homem prefere ser exaltado por aquilo que não é, a ser tido em menor conta por
aquilo que é”, substituindo por sinônimos as expressões sublinhadas.

2. (Fuvest) Examine a tirinha e responda ao que se pede.

a) O sentido do texto se faz com base na polissemia de uma palavra. Identifique essa palavra e explique
por que a indicou.

89
b) A tirinha visa produzir não só efeito humorístico mas também efeito crítico. Você concorda com essa
afirmação? Justifique sua resposta.

3. (Unicamp) Na sua coluna diária do Jornal Folha de S. Paulo de 17 de agosto de 2005, José Simão
escreve: “No Brasil nem a esquerda é direita!”.
a) Nessa afirmação, a polissemia da língua produz ironia. Em que palavras está ancorada essa ironia?
b) Quais os sentidos de cada uma das palavras envolvidas na polissemia acima referida?
c) Comparando a afirmação “No Brasil nem a esquerda é direita” com “No Brasil a esquerda não é direita”,
qual a diferença de sentido estabelecida pela substituição de ‘nem’ por ‘não’?

4. (Unicamp) Em um jornal de circulação restrita, vemos, na capa, a seguinte chamada:

Inspire
saúde!
Sem fumar,
respire
aliviado!

No interior do Jornal, a matéria começa da seguinte forma: “Desperte o não fumante que há em
você!”, seguida logo adiante de “O fumante passivo – aquele que não fuma, mas frequenta ambi-
entes poluídos pela fumaça do cigarro – também tem sua saúde prejudicada.”
(Jornal da Cassi - Publicação da Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil, ano IX, n0. 40, junho/julho de 2004).

Levando em consideração os trechos citados, observamos, na chamada da capa, um interessante


jogo polissêmico.
a) Apresente dois sentidos de ‘Inspire’ em ‘Inspire saúde!’. Justifique.
b) Apresente dois sentidos de ‘aliviado’ em ‘respire aliviado!’. Justifique.

5. (Fuvest) O ano nem sempre foi como nós o conhecemos agora. Por exemplo: no antigo calendário
romano, abril era o segundo mês do ano. E na França, até meados do século XVI, abril era o pri-
meiro mês. Como havia o hábito de dar presentes no começo de cada ano, o primeiro dia de abril
era, para os franceses da época, o que o Natal é para nós hoje, um dia de alegrias, salvo1 para quem
ganhava meias ou uma água-de-colônia barata. Com a introdução do calendário gregoriano, no
século XVI, primeiro de janeiro passou a ser o primeiro dia do ano e, portanto, o dia dos presentes.
E primeiro de abril passou ser um falso Natal – o dia de não se ganhar mais nada.
Por extensão, o dia de ser iludido. Por extensão, o Dia da Mentira.
(Luís F. Veríssimo, As mentiras que os homens contam. Adaptado.)

a) Tendo em vista o contexto, é correto afirmar que o trecho “meias ou uma água-de-colônia barata” deve
ser entendido apenas em seu sentido literal? Justifique sua resposta.
b) Crie uma frase que contenha um sinônimo da palavra “salvo” (ref.1), mantendo o sentido que ela tem
no texto.

Gabarito
E.O. Aprendizagem
1. D 2. D 3. A 4. C 5. C

6. B 7. A 8. C 9. E 10. B

E.O. Fixação
1. B 2. E 3. D 4. B 5. B

6. B 7. D 8. B 9. C 10. E

E.O. Complementar
1. B 2. A 3. C 4. E 5. E

90
E.O. Dissertativo
1.
Analisando o sentido denotativo do vocábulo "laboratório" (lugar onde se fazem experiências, tra-
balhos ou investigações científicas) e que era a primeira vez na História que uma bomba atômica
era lançada, pode-se concluir que a cidade de Hiroshima e sua população foram usadas como uma
espécie de "cobaias" não de um experimento científico, mas de um ato político cruel.
2.
a) Sim, pois ambos exprimem a possibilidade de enfrentar e reverter situações difíceis. O texto I
defende a tese de que as adversidades podem ser oportunidade e motivo de superações indivi-
duais, e o texto II expressa a mesma opinião relativamente às tragédias que a Humanidade en-
frenta na atualidade, como referido no excerto “o desastre ou a crise são também e, sobretudo,
oportunidades”.
b) Preservando o sentido do texto, os termos “paradoxalmente” e “metamorfosear-se” poderiam
ser substituídos por “contraditoriamente” e “transformar-se”, respectivamente.
3.
a) A vida é rápida. Aproveite!
b) A vida é curta, portanto curta!
4.
a) Seria bom que todas as escolas tivessem o mesmo nível de qualidade. Aí todos os alunos teriam
as mesmas oportunidades.
b) Não deixe a bicicleta aí, porque atrapalha a passagem.
5.
A palavra "impressão" possui dois sentidos: um relacionado à qualidade do trabalho (no caso, a
impressão gráfica) feito pela empresa gráfica e outro relacionado à imagem positiva que o material
em si passará ao cliente.

E.O. Enem
1. B 2. E 3. C 4. A 5. C

6. A 7. C 8. B 9. D 10. B

E.O. UERJ
Exame de Qualificação
1. A 2. B 3. C 4. A 5. D

6. A 7. D

E.O. UERJ
Exame Discursivo
1.
a) do alto penteado ao rubro artelho
b) cor fingida. Associa-se à ideia de falsidade, aparência ou superficialidade
2. Na verdade, há três vocábulos representativos: sacrifício; condenado e execução. Todos passam a sen-
sação de estresse e de medo. Porém, à guisa da proposta, dois vocábulos já bastam.
Os recursos estilísticos usados pelo narrador são o uso dos adjetivos “desprotegido” e “nu”, en-
fatizando a ideia de vulnerabilidade e de medo. Também deve-se reparar na repetição da palavra
“sacrifício”, passando a ideia do pavor e da impotência por que passa qualquer ser vivo diante do
abate.
3.
Na linguagem usual, a expressão “perder tempo” tem sentido negativo, sugerindo ações inúteis,
ou seja, desenvolver atividades sem proveito algum. No poema, a mesma expressão é vista de ma-
neira positiva, no sentido de vivenciar melhor o tempo que se tem ou aceitar a passagem natural
do tempo.

91
E.O. Objetivas o significado de se estar livre dos males
causados pelo fumo e tranquilo em rela-
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) ção aos males que o fumo poderia causar
nos outros. O primeiro significado tem a
1. A 2. E 3. E 4. D 5. C
ver com o físico, e o segundo tem a ver
com o moral.
5.
E.O. Dissertativas a) Não, a referência a “meias ou uma água-
de-colônia barata” é usada ironicamente
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) em sentido figurado, aludindo a um pre-
1. sente banal, adquirido sem grande en-
a) Na frase, o autor considera que, em pri- volvimento ou preocupação em causar sat-
meiro lugar, o ser humano busca recon- isfação à pessoa a quem vai ser oferecido.
hecimento de seus feitos pelo outro, evi- b) Qualquer frase que contivesse os termos
denciando sua vaidade. Posteriormente, “exceto”, “à exceção de” ou “afora” man-
ele se volta para si e reconhece seus atos, teria a noção de exclusão que a palavra
gerando, ou não, o orgulho, preocupan- “salvo” expressa no terceiro período
do-se então consigo. do texto, como por exemplo: Todos os
b) O homem prefere ser elogiado, valoriza- países da América Latina possuem faixa
do, enaltecido etc. por aquilo que não é a litorânea, exceto Bolívia e Paraguai.
ser menosprezado, desvalorizado, deses-
timado etc. por aquilo que é.
2.
a) Trata-se da palavra “veículo”, que pode
significar meio usado para transportar
ou conduzir pessoas, coisas, animais ou
algo capaz de transmitir, propagar algo.
No texto, o humor ocorre porque Mafalda
troca um sentido pelo outro.
b) Sim. O sentido crítico da tirinha provém
da associação entre os ruídos emanados
do televisor, que sugerem o conteúdo vio-
lento e “apelativo” da programação, e a
ideia de cultura.
3.
a) A ironia está presente nas palavras “es-
querda” e “direita”.
b) Esquerda: “tendência política ligada
a reivindicações populares, trabalhis-
tas, socialistas ou comunistas”. Direita:
“tendência política conservadora ou re-
acionária em relação às reformas sociais”
e, como adjetivo, “correta, honesta.” A
polissemia criada pelo autor ironiza os
partidos de esquerda que não agem com
honestidade.
c) “Nem”, no contexto, expressa a ideia de
adição e significa “inclusive não”, “tam-
bém não”, ou seja, dá uma ideia de que
todos são desonestos, inclusive a esquer-
da. Já o sentido de “não” é apenas de ne-
gação e entende-se que a esquerda não é
honesta.
4.
a) Inspirar, em “Inspire saúde”, pode sig-
nificar: “sorver, absorver”, introduzindo
(ar) nos pulmões, e “infundir, incutir”.
No sentido 1, o sujeito é o receptor ou
beneficiário da ação; no sentido 2, ele é o
agente responsável pela disseminação da
saúde.
b) Aliviado, em “Respire aliviado”, pode ter

92
Aulas 5e6

Os sons da fala e ortografia


Competências 1 e 5
Habilidades 1, 2, 3 e 17
Competência 1 – Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para
sua vida.
H1 Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como elementos de caracterização dos sistemas de comunicação.
H2 Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de comunicação e informação para resolver problemas sociais.
H3 Relacionar informações geradas nos sistemas de comunicação e informação, considerando a função social desses sistemas.
H4 Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação.
Competência 2 – Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) (LEM) como instrumento de acesso a informações e a outras
culturas e grupos sociais.
H5 Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM ao seu tema.
H6 Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus mecanismos como meio de ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e culturas.
H7 Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e seu uso social.
H8 Reconhecer a importância da produção cultural em LEM como representação da diversidade cultural e linguística.
Competência 3 – Compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da
identidade.
H9 Reconhecer as manifestações corporais de movimento como originárias de necessidades cotidianas de um grupo social.
H10 Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em função das necessidades cinestésicas.
Reconhecer a linguagem corporal como meio de interação social, considerando os limites de desempenho e as alternativas de adaptação para
H11
diferentes indivíduos.
Competência 4 – Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e
da própria identidade.
H12 Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos artistas em seus meios culturais.
H13 Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos.
H14 Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos.
Competência 5 – Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante
a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção.
H15 Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.
H16 Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário.
H17 Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional.
Competência 6 – Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da
realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação.
H18 Identificar os elementos que concorrem para a progressão temática e para a organização e estruturação de textos de diferentes gêneros e tipos.
H19 Analisar a função da linguagem predominante nos textos em situações específicas de interlocução.
H20 Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a preservação da memória e da identidade nacional
Competência 7 – Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas.
H21 Reconhecer em textos de diferentes gêneros, recursos verbais e não-verbais utilizados com a finalidade de criar e mudar comportamentos e hábitos.
H22 Relacionar, em diferentes textos, opiniões, temas, assuntos e recursos linguísticos.
H23 Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.
Reconhecer no texto estratégias argumentativas empregadas para o convencimento do público, tais como a intimidação, sedução, comoção,
H24
chantagem, entre outras.
Competência 8 – Compreender e usar a língua portuguesa como língua materna, geradora de significação e integradora da organização
do mundo e da própria identidade.
H25 Identificar, em textos de diferentes gêneros, as marcas linguísticas que singularizam as variedades linguísticas sociais, regionais e de registro.
H26 Relacionar as variedades linguísticas a situações específicas de uso social.
H27 Reconhecer os usos da norma padrão da língua portuguesa nas diferentes situações de comunicação.
Competência 9 – Entender os princípios, a natureza, a função e o impacto das tecnologias da comunicação e da informação na sua vida
pessoal e social, no desenvolvimento do conhecimento, associando-o aos conhecimentos científicos, às linguagens que lhes dão suporte,
às demais tecnologias, aos processos de produção e aos problemas que se propõem solucionar.
H28 Reconhecer a função e o impacto social das diferentes tecnologias da comunicação e informação.
H29 Identificar pela análise de suas linguagens, as tecnologias da comunicação e informação.
H30 Relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento que elas produzem
Antes de começarmos esta aula, vamos diferenciar fonologia de fonética e definir fonema, grafema e sílaba.
§§ Fonologia é um ramo central da linguística que estuda os sistemas de sons da língua; trata da maneira
como os sons funcionam nas línguas.
§§ Fonética é o estudo dos sons da fala; investiga principalmente a natureza física de tais sons. Trata-se de uma
disciplina que é estudada tanto pela linguística, quanto pela fonoaudiologia..
§§ Fonema é cada uma das unidades sonoras básicas de uma língua, e sua representação gráfi-
ca é a letra ou grafema. Os fonemas são classificados em vogais (a; e; i; o; u), consoantes
(b; c; d; f; g; h; j; k; l; m; n; p; q; r; s; t; v; w; x; y; z) e semivogais (i; u; w; y).
§§ Sílaba é o fonema ou conjunto de fonemas que pronunciamos em uma única emissão de voz. As palavras
são constituídas por uma ou mais sílabas.

Encontros vocálicos e consonantais


§§ Ditongo é o encontro de uma vogal e uma semivogal na mesma sílaba. Quando a vogal antecede a semi-
vogal, ocorre um ditongo decrescente; e quando a vogal aparece depois da semivogal, ocorre um ditongo
crescente.

Exemplos de ditongos decrescentes:


pai [ay]
mau [aw]
ór-gão [ão] – ditongo nasal
Exemplos de ditongos crescentes:
á-gua [wa]
cá-rie [ye]
qua-dra-do [wa]

§§ Tritongo é o encontro vocálico de uma semivogal, uma vogal e outra semivogal, nessa ordem, na mesma
sílaba.
Exemplos de tritongos:
U-ru-guai [way]
en-xa-guei [wey]
de-lin-quiu [wiw]

§§ Hiato é o encontro vocálico de duas vogais, em sílabas separadas. Isso ocorre porque a segunda vogal é
tônica.

Exemplos de hiatos:
sa-ú-de
sa-í-da
Mo-ó-ca

95
§§ Dígrafo é o encontro de duas letras que represen-
tam um único som. Pode ocorrer na mesma sílaba
Regras de acentuação
(nh; lh; ch; qu; gu) ou em sílabas separadas (rr; ss;
xc; xs; sc; sç). Há também os dígrafos nasais, que Monossílabas
são formados pelas vogais nasais seguidas de “m”
ou “n”. Levam acento agudo ou circunflexo as palavras monos-
sílabas terminadas em:
Exemplos de dígrafos:
ni-nho / ma-lha-do §§ a(s) – já; lá; vás
con-tra-che-que §§ e(s) – fé; lê; pés
que-da / gui-tar-ra §§ o(s) – pó, dó; pós
car-ro-ça
as-sas-si-na-to Oxítonas
ex-ce-ção
ex-su-dar São as palavras que possuem a última sílaba tônica. Le-
cres-ci-men-to vam acento agudo ou circunflexo as palavras oxítonas
des-ço terminadas em:

§§ a(s) – vatapá; carajás; cajás


§§ e(s) – você; café; cafunés
Observação: §§ o(s) – jiló; avô; carijós
§§ em / ens – também; ninguém; armazéns
“QU” e “GU” são dígrafos somente quando,
seguidos de “e” e “i”, representam os fonemas /g/
e /k/. Nesses casos, a letra “u” não corresponde a
nenhum fonema.
Paroxítonas
São as palavras que possuem a penúltima sílaba tônica.
Há também outros tipos de encontros consonan- Levam acento agudo ou circunflexo as palavras paroxí-
tais inseparáveis, cuja segunda consoante é “l” ou “r”. tonas terminadas em:
§§ i(s) – júri; lápis; tênis
Exemplos:
§§ us – vênus; vírus; ônus
blo-co / bran-co
§§ r – caráter; revólver; mártir
cla-ro / cro-mo
§§ l – útil; amável; têxtil
drá-ge-a
§§ x – tórax; fênix; ônix
flo-co / fres-co
§§ n – éden; hífen; líquen
a-glo-me-ra-do / gra-ma
§§ um/uns – álbum; álbuns; médium
pla-nal-to / pre-po-si-ção
§§ ão(s) – órgão; órgãos; órfão
a-tlas / tri-bu-to
§§ ã(s) – órfã; ímã; imãs
li-vro
§§ ps – bíceps; fórceps
Além dos encontros que não aparecem muito: §§ on(s) – rádon; rádons
gno-mo; pti-a-li-na; pneu-má-ti-co; mne-mô-ni-co;
psi-có-ti-co; tme-se.
O termo ortografia vem do grego orthographia
Proparoxítonas
(orthós = correto, direito; graphia = escrever) e, portan- São as palavras que possuem a antepenúltima sílaba
to, significa escrita correta das palavras. É o con- tônica. Todas as palavras proparoxítonas levam acento
junto de regras estabelecidas pela gramática normativa agudo ou circunflexo.
que define a grafia correta das palavras e do uso dos
sinais gráficos.

96
Casos especiais i. A 3a pessoa de alguns verbos se grafa da seguin-
a. São sempre acentuadas as palavras oxítonas te maneira:
com os ditongos abertos grafados “éis”, “éu(s)” quando termina em “em” (monossílabas).
ou “ói(s)”. Exemplos: tem / têm; vem / vêm.
Exemplos: anéis; herói; chapéu. quando termina em “ém”.
b. Não são acentuadas as palavras paroxítonas Exemplos: contém / contêm; convém / convêm
com os ditongos abertos “ei” e “oi”, uma vez quando termina em “ê” e derivados:
que existe oscilação em muitos casos entre a Exemplos: crê / creem; revê / reveem
pronúncia aberta e fechada.
j. Levam acento agudo ou circunflexo as palavras
Exemplos: assembleia; proteico; alcaloide.
terminadas por ditongo oral (que não é nasal)
c. Não se acentuam os encontros vocálicos fechados. átono crescente ou decrescente.
Exemplos: pessoa; canoa; voo. Exemplos: ágeis; espontâneo; ignorância.
k. Leva acento agudo ou circunflexo a forma verbal
Observação: terminada em “a”, “e” e “o” tônicos, seguidas
Se o verbo estiver no futuro (mesóclise), pode- de “la(s)” e “lo(s)”.
rá haver dois acentos: amá-lo-íeis. Exemplos: movê-lo; fá-los; sabê-lo-emos.
l. Leva acento agudo a vogal tônica “i” das formas
d. Não levam acento gráfico as palavras paroxí- verbais oxítonas terminadas em “air” e “uir”,
tonas que, tendo respectivamente vogal tônica quando seguidas de “la(s)” e “lo(s)”, caso em
aberta ou fechada, são homógrafas de artigos, que perdem o “r” final.
contrações, preposições e conjunções átonas. Exemplos: atraí-los; possuí-lo.
Exemplos: para (verbo e preposição); pelo m. Não levam acento os prefixos paroxítonos termi-
(substantivo e preposição) nados em “r” e “i”.
e. Levam acento agudo o “i” e “u”, quando re- Exemplos: super-homem; semicírculo.
presentam a segunda vogal tônica de um hiato, n. Leva acento circunflexo diferencial a sílaba tôni-
desde que não formem sílaba com “r”, “l”, “m”, ca da 3a pessoa do singular do pretérito perfeito
“n” e “z” ou não estejam seguidos de “nh”. “pôde”, para distinguir-se de “pode”, forma da
Exemplos: viúva; raízes (raiz); faísca. mesma pessoa do presente do indicativo.
f. Não leva acento a vogal tônica dos ditongos
“iu” e “ui”. Ortografia de
Exemplos: caiu; retribuiu; tafuis.
algumas palavras
g. Não serão acentuadas as vogais tônicas “i” e
“u” das palavras paroxítonas quando essas vo-
Algumas palavras e termos da língua portuguesa causam
gais estiverem precedidas de ditongo decrescen-
sérios problemas de grafia devido a semelhanças sono-
te.
ras. Selecionamos alguns desses casos, para que você
Exemplos: maoista; baiuca; bocaiuva.
não corra mais riscos durante a elaboração de textos.
h. Serão acentuadas as vogais tônicas “i” e “u”
das palavras oxítonas quando, mesmo precedi-
das de ditongo decrescente, estão em posição acerca de / cerca de / a
final, sozinhas na sílaba, ou seguidas somente cerca de / há cerca de
de “s”. §§ acerca de – a respeito de (Falaremos acerca dos
Exemplos: Piauí; teiú; tuiuiús. acontecimentos do mês passado.);
§§ cerca de – aproximadamente; durante (Cerca de
40 mil torcedores estavam no estádio.);

97
§§ a cerca de – ideia de distância (Ela se encontra a cerca de dez metros de mim.);
§§ há cerca de – aproximadamente, no tempo passado.

afim de / a fim de
§§ afim de – afinidade; semelhança
§§ a fim de – com finalidade, objetivo de

em vez de / ao invés de
§§ em vez de – em lugar de
§§ ao invés de – ao contrário de

nenhum / nem um
§§ nenhum – nada; ninguém
§§ nem um – um só que fosse

por que / porque / por quê / porquê


§§ por que – utilizado em frases interrogativas diretas e indiretas (no começo ou meio da sentença); motivo
pelo qual, por qual razão; quando preposição mais conjunção integrante
§§ porque (conjunção) – utilizado em respostas; por esta razão
§§ por quê – utilizado em frases interrogativas diretas e indiretas (sozinhas ou no fim da sentença)
§§ porquê (substantivo) – a causa, o motivo

se não / senão
§§ se não – caso não (conjunção + advérbio); não se (pronome + advérbio)
§§ senão – defeito (substantivo); mas também (conjunção); caso contrário (conjunção); exceto (preposição)

98
INTERATIVI
A DADE

ACESSAR

Sites Aplicativo - Acordo ortográfico 2016

Para quem desejar saber mais sobre o acordo ortográfico, o aplicativo “Acordo ortográfico 2016”
(Beartouch Software) reúne as modificações e as versões anteriores dos termos alterados. Com esse
aplicativo você pode consultar as novas regras de ortografia de forma rápida e prática. O melhor de
tudo é que você não precisa estar conectado à internet. Disponível para iOS, Windows e Android.

100
INTERDISCIPLINARIDADE

As canções abaixo têm seus versos encerrados por palavras proparoxítonas:

Construção (Chico Buarque) Formato mínimo (Skank)


Amou daquela vez como se fosse a última Começou de súbito
Beijou sua mulher como se fosse a última A festa estava mesmo ótima
E cada filho seu como se fosse o único Ela procurava um príncipe
E atravessou a rua com seu passo tímido Ele procurava a próxima
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas Ele reparou nos óculos
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Ela reparou nas vírgulas
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Ele ofereceu-lhe um ácido
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe E ela achou aquilo o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música Os lábios se tocaram ásperos
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado Em beijos de tirar o fôlego
E flutuou no ar como se fosse um pássaro Tímidos, transaram trôpegos
E se acabou no chão feito um pacote flácido E ávidos, gozaram rápido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego Ele procurava álibis
Amou daquela vez como se fosse o último Ela flutuava lépida
Beijou sua mulher como se fosse a única Ele sucumbia ao pânico
E cada filho como se fosse o pródigo E ela descansava lívida
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
O medo redigiu-se ínfimo
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
E ele percebeu a dádiva
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego Declarou-se dela, o súdito
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe Desenhou-se a história trágica
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina Ele, enfim, dormiu apático
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo Na noite segredosa e cálida
E tropeçou no céu como se ouvisse música Ela despertou-se tímida
E flutuou no ar como se fosse sábado Feita do desejo, a vítima
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago Fugiu dali tão rápido
Morreu na contramão atrapalhando o público Caminhando passos tétricos
Amou daquela vez como se fosse máquina Amor em sua mente épico
Beijou sua mulher como se fosse lógico Transformado em jogo cínico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro Para ele, uma transa típica
E flutuou no ar como se fosse um príncipe O amor em seu formato mínimo
E se acabou no chão feito um pacote bêbado O corpo se expressando clínico
Morreu na contramão atrapalhando o sábado. Da triste solidão, a rubrica.

101
E.O. Aprendizagem 3. (COL. Naval) Aumenta o número de adultos
que não consegue focar sua atenção em uma
única coisa por muito tempo. São tantos os
1. (IFSP) De acordo com a norma padrão da estímulos e tanta a pressão para que o en-
Língua Portuguesa, assinale a alternativa em torno seja completamente desvendado que
que todas as palavras devam ser acentuadas aprendemos a ver e/ou fazer várias coisas ao
de acordo com a mesma regra de acentuação mesmo tempo. Nós nos tornamos, à seme-
do vocábulo sublinhado na placa abaixo. lhança dos computadores, pessoas multita-
refa, não é verdade?
Vamos tomar como exemplo uma pessoa di-
rigindo. 4Ela precisa estar atenta aos veícu-
los que vêm atrás, ao lado e à frente, à ve-
locidade média dos carros por onde trafega,
às orientações do GPS ou de programas que
sinalizam o trânsito em tempo real, 6às in-
formações de alguma emissora de rádio que
comenta o trânsito, ao planejamento men-
tal feito e refeito várias vezes do trajeto que
deve fazer para chegar ao seu destino, aos
semáforos, faixas de pedestres etc.
Quando me vejo em tal situação, eu me lem-
bro que dirigir, após um dia de intenso tra-
a) Facil/animo (substantivo)/apendice balho no retorno para casa, já foi uma ativi-
b) Ingenuo/varzea/magoa (substantivo) dade prazerosa e desestressante.
c) Virus/alcoolatra/unico O uso da internet ajudou a transformar nos-
d) Alibi/antibiotico/monossilabica sa maneira de olhar para o mundo. Não mais
observamos os detalhes, por causa de nossa
e) Album/maniaco/amidala
ganância em relação a novas e diferentes in-
formações. Quantas vezes sentei em frente
2. (UTFPR) O texto abaixo apresenta inadequa- ao computador para buscar textos sobre um
ções, de acordo com a norma padrão. A(s) tema e, de repente, me dei conta de que es-
questão(ões) a seguir analisa(m) alguns tava em temas que em nada se relacionavam
desses problemas. com meu tema primeiro.
Aliás, a leitura também sofreu transforma-
No caminho de Montevideo, dirigindo pela
ções pelo nosso costume de ler na internet.
rota beira-mar obrigatóriamente voce vai
Sofremos de uma tentação permanente de
passar pelo porto de Montevideo, lá existe
um mercado muito sofisticado com ótimos pular palavras e frases inteiras, apenas para
restaurantes. Vale [à pena] uma parada para irmos direto ao ponto. O problema é que al-
almoçar no El Palenque, um dos melhores guns textos exigem a leitura atenta de pala-
restaurantes do Uruguai para comer carnes, vra por palavra, de frase por frase, para que
é incrivel lá dentro! Paramos para conhecer, faça sentido. 5Aliás, não é a combinação e a
mas não almoçamos no El Palenque dessa sucessão das palavras que dá sentido e bele-
vez, pois estavamos com o almoço marcado za a um texto?
na Bodega Bousa e depois a visita a vinicola. 3
Se está difícil para nós, adultos, focar nossa
Seguimos viagem pela rota 5 em direção a atenção, imagine, caro leitor, para as crian-
Bodega Bousa (fique atento as placas, pois ças. Elas já nasceram neste mundo de 8profu-
voce pode passar despercebido por elas). são de estímulos de todos os tipos; elas são
(Disponível em: http://cozinhachic.com/ exigidas, desde o início da vida, a dar conta
diario-de-viagemmontevideo-vinicolas-e- de várias coisas ao mesmo tempo; elas são
restaurantes. Acesso em 16/01/2017). estimuladas com diferentes objetos, sons,
imagens etc.
No texto há algumas palavras com erro de
Aí, um belo dia elas vão para a escola. Profes-
acentuação gráfica. Assinale a alternativa sores e pais, a partir de então, querem que
que registra todas elas com os erros corri- as crianças prestem atenção em uma única
gidos. coisa por muito tempo. E quando elas não
a) Obrigatoriamente, você, incrível, estávamos, conseguem, reclamamos, levamos ao médico,
vinícola, você. arriscamos hipóteses de que sejam portado-
b) Montevidéo, obrigatóriamente, você, pôrto, ras de síndromes que exigem tratamento etc.
estávamos, você. A maioria dessas crianças sabe focar sua
c) Você, incrível, estávamos, você, pôrto. atenção, sim. Elas já sabem usar progra-
d) Você, incrível, estávamos, vinícola, você. mas complexos em seus aparelhos eletrô-
e) Montevidéo, obrigatoriamente, você, incrí- nicos, brincam com jogos desafiantes que
vel, vinícola, você. exigem atenção constante aos detalhes e, se

102
deixarmos, passam horas em uma única ati- Ocorreu-lhe desde logo que ao americano po-
vidade de que gostam. deria parecer estranha tal amizade, e mais
Mas, nos estudos, queremos que elas pres- ainda incompatível com a ética ianque a ser
tem atenção no que é preciso, e não no que mantida nas funções que passara a exercer.
gostam. E isso, caro leitor, exige a árdua Lembrou-se num átimo que o americano em
aprendizagem da autodisciplina. Que leva geral tem uma coisa muito séria chamada
tempo, é bom lembrar. preconceito racial e seu critério de julga-
As crianças precisam de nós, pais e professo-
mento da capacidade funcional dos subor-
res, para começar a aprender isso. Aliás, boa
parte desse trabalho é nosso, e não delas. dinados talvez se deixasse influir por essa
Não basta mandarmos que elas prestem aten- odiosa deformação. Por via das dúvidas cor-
ção: isso de nada as ajuda. 13O que pode aju- respondeu ao cumprimento de seu amigo da
dar, por exemplo, é analisarmos o contexto maneira mais discreta que lhe foi possível,
em que estão 7quando precisam focar a aten- mas viu em pânico que ele atravessava a rua
ção e organizá-lo para que seja favorável a e vinha em sua direção, sorriso aberto e bra-
tal exigência. E é preciso lembrar que não se ços prontos para um abraço.
pode esperar toda a atenção delas por muito Pensou rapidamente em se esquivar – não
tempo: o ensino desse quesito no mundo de dava tempo: o americano também se detive-
hoje é um processo lento e gradual. ra, vendo o preto aproximar-se.
(SAYÃO, Rosely. Profusão de estímulos.
Era seu amigo, velho companheiro, um bom
Folha de S. Paulo, 11 fev. 2014.)
sujeito, dos melhores mesmo que já conhe-
Assinale a opção em que as palavras desta- cera – acaso jamais chegara sequer a se lem-
cadas recebem, respectivamente, a mesma brar que se tratava de um preto? Agora, com
classificação quanto à acentuação gráfica o gringo ali a seu lado, todo branco e sar-
que as palavras sublinhadas em “Se está di- dento, é que percebia pela primeira vez: não
fícil para nós, adultos [...]. Elas já, nasceram podia ser mais preto. Sendo assim, tivesse
neste mundo de profusão de estímulos[...].” paciência: mais tarde lhe explicava tudo, ha-
(ref. 3). veria de compreender. Passar fome era mui-
a) “Ela precisa estar atenta aos veículos que
to bonito nos romances de Knut Hamsun, li-
vêm atrás, ao lado e à crente, à velocidade
dos depois do jantar, e sem credores à porta.
média dos carros [...].” (ref. 4)
b) “Aliás, não é a combinação e a sucessão das Não teve mais dúvidas: virou a cara quando
palavras que dá sentido a um texto?” (ref. 5) o outro se aproximou e fingiu que não o via,
c) “[...] às informações de alguma emissora de que não era com ele.
rádio que comenta o trânsito, ao planeja- E não era mesmo com ele.
mento mental [...].” (ref. 6) Porque antes de 9cumprimentá-lo, talvez ain-
d) “[...] quando precisam focar a atenção e da sem 8tê-lo visto, o sambista abriu os braços
organizá-lo para que seja favorável a tal exi- para acolher o americano – também seu ami-
gência. E é preciso lembrar [...].“ (ref. 7) go.
e) “[...] profusão de estímulos [...]; elas são (SABINO, Fernando. A mulher do vizinho. 7. ed.
exigidas, desde o início da vida, a dar conta Rio de Janeiro: Record, 1962. p.163-4.)
de várias coisas [...].” (ref. 8)
Assinale a alternativa correta relativamente
4. (CFTSC) PRETO E BRANCO à acentuação gráfica das palavras sublinha-
das no texto.
Perdera o emprego, chegara a passar fome, a) O pronome ninguém (ref. 6) recebe acento
sem que 6ninguém soubesse: por constran- por ser uma monossílaba tônica terminada
gimento, afastara-se da roda 7boêmia escri-
em em.
tores, jornalistas, um sambista de cor que
vinha a ser o seu mais velho que antes costu- b) O substantivo boêmia (ref. 7) é acentuado
mava frequentar companheiro de noitadas. por ser palavra proparoxítona.
De repente, a salvação lhe apareceu na forma c) A combinação da forma verbal ter com o
de um americano, que lhe oferecia um em- pronome oblíquo o, resultou em tê-lo (ref.
prego numa agência. Agarrou-se com unhas 8), que é acentuado por se tratar de paroxí-
e dentes à oportunidade, vale dizer, ao ame- tona terminada em o.
ricano, para garantir na sua nova função d) A forma verbal cumprimentá (ref. 9) é acen-
uma relativa estabilidade. tuada porque, ao associar-se ao pronome o,
E um belo dia vai seguindo com o chefe pela
perdeu o r final, tornando-se uma oxítona
rua 10México, já distraído de seus passados tro-
peços, mas tropeçando obstinadamente no in- terminada em a.
glês com que se entendiam – quando vê do ou- e) O substantivo México (ref. 10) recebe acento
tro lado da rua um preto agitar a mão para ele. porque é uma palavra importada, que preci-
Era o sambista seu amigo. sa manter o acento original.

103
5. (IFAL) Assinale a alternativa em que as pa- a) estóico – proíbe – vôo
lavras, que completam a frase abaixo, estão b) hotéis – usuário – volátil
acentuadas corretamente. c) troféus – retórico – hífen
Os tabloides que eles __________, __________ d) herói – alcoólico – têm
manchetes curtas que todos __________.
a) leem – tem – veem 8. (IFAL) Cientistas americanos apresentaram
b) lêm – teem – vêm ontem resultados preliminares de uma va-
c) leem – têm – veem cina contra o fumo. O medicamento impede
d) leem – têm – vêm
que a nicotina – componente do tabaco que
e) lêm – tem – veem
causa dependência – chegue ao cérebro. Em
ratos vacinados, atéda nicotina injetada dei-
6. (COL. Naval) Em que opção a acentuação do xou de atingir o sistema nervoso central.
termo destacado está correta? (O Globo,18/12/99.)
a) A prática da leitura constrói cidadãos capa-
zes de entender criticamente a realidade. Analise as afirmativas a seguir:
b) De acordo com o texto, pessoas que lêem, I. A palavra “cérebro” é paroxítona.
desenvolvem o raciocínio e falam melhor. II. “Cientistas” é, no texto, uma palavra
c) Quando o conferencista enfatizou a impor-
masculina, haja vista a concordância do
tância da leitura, foi ovacionado pela pla-
téia. adjetivo que a acompanha.
d) A ignorância prepotente deforma por estag- III. A palavra “até” é monossílabo tônico.
nação, pois o indivíduo pára de questionar. IV. A palavra “até” é oxítona terminada em
e) Se os livros são fundamentais na formação “e”, por isso é acentuada.
das pessoas, é bom que se averigúem as cau- V. No texto, há três palavras oxítonas que
sas da diminuição da leitura. não são acentuadas graficamente: dei-
xou, atingir e central.
7. (IFSUL) A partir da entrada em vigor do Estão corretas.
Acordo Ortográfico, a palavra assembleia a) apenas II e IV.
passou a ser grafada sem acento agudo. Qual b) apenas II, IV e V.
é a alternativa em que um ou mais vocábu- c) apenas I e III.
los, segundo as regras do Acordo Ortográfico, d) apenas III e V.
foi(ram) acentuado(s) INDEVIDAMENTE? e) apenas IV e V.

9. (IFSC)

Com relação à acentuação gráfica das palavras no texto, é CORRETO afirmar:


a) A palavra por (quinto quadrinho) deveria ter recebido acento diferencial por se tratar de uma forma verbal.
b) A palavra parabéns (terceiro quadrinho) recebe um acento diferencial porque está no plural.
c) A palavra ótima (terceiro quadrinho) recebe acento por ser proparoxítona.
d) A palavra me (primeiro quadrinho) deveria ter recebido acento, por ser monossílabo tônico terminado em e.
e) O acento na palavra é (terceiro quadrinho) pode ser classificado como diferencial, porque não há regra que
justifique seu uso.

1
0. (UTFPR) Em qual alternativa todas as palavras em negrito devem ser acentuadas graficamente?
a) Atraves de uma lei municipal, varias pessoas recebem ingressos gratis para o cinema.
b) É dificil correr atras do prejuizo sozinho.
c) Aqui, em Foz do Iguaçu, a dengue esta sendo um grande problema de saude publica.
d) O bisneto riscou os papeizinhos com o lapis.
e) O padrão economico do juiz é elevado.

104
E.O. Fixação O reconhecimento da homoafetividade como
união estável foi levado _____ efeito pelo
Supremo Tribunal Federal no ano de 2011,
1. (Imed) em decisão unânime e histórica. Agora esta
ADIANTE SEGUIU A JUSTIÇA é a realidade: homossexuais casam, têm fi-
Maria Berenice Dias lhos, ou seja, podem constituir família.
Ativismo judicial? Não, interpretação da Car-
Durante séculos, ninguém ­titubeava em res- ta Constitucional segundo um punhado de
ponder: família, só tem uma – a 2constituí- princípios fundamentais. É a Justiça cum-
da pelos sagrados laços do matrimônio. Aos prindo o seu papel de fazer justiça, mesmo
noivos era imposta a obrigação de se multi- diante da lacuna legal.
plicarem até a morte, mesmo na tristeza, na
Da inércia, passou o Legislativo, dominado
pobreza e na doença. Tanto que se falava em
por autointitulados profetas religiosos, a re-
débito conjugal.
agir.
Esse modelito se manteve, ao menos na apa-
Não foi outro o intuito do Estatuto da Fa-
rência, _____ expensas da integridade física
e psíquica das mulheres, que se mantinham mília, que acaba de ser aprovado pela co-
dentro de casamentos esfacelados, pois as- missão especial na Câmara dos Deputados
sim exigia a sociedade. Tanto que o casamen- (PL 6.583/2013). Tentar limitar o conceito
to era indissolúvel. As pessoas até podiam se de família à união entre um homem e uma
desquitar, mas não podiam se casar de novo. mulher, além de afrontar todos os princípios
Caso encontrassem um par, tornavam-se fundantes do Estado, impõe um retrocesso
concubinos e alvos de punições. social que irá retirar direitos de todos aque-
As mudanças foram muitas: vagarosas, mas les que não se encaixam neste conceito limi-
significativas. As causas, incontáveis. No tante e limitado.
entanto, o resultado foi um 10só. O conceito Mas _____ mais. Proceder ao cadastramento
de família mudou, se esgarçou. O casamento das entidades familiares e criar Conselhos
perdeu a sacralidade e permanecer dentro da Família é das formas mais perversas de
dele deixou de ser uma imposição social e excluir direito à saúde, à assistência psi-
uma obrigação legal. cossocial, à segurança pública, que são as-
Veio o 11divórcio. Antes, porém, o 12purgató- seguradas somente às entidades familiares
rio da separação, que exigia que se identi-
reconhecidas como tal. Limitar acesso à De-
ficassem causas, punindo-se os culpados. A
fensoria Pública e à tramitação prioritária
liberdade total de casar e descasar chegou
dos processos à entidade familiar definida
somente no ano de 2006.
na lei, às claras tem caráter punitivo.
A lei regulamentava exclusivamente o casa-
mento. Punia com o silêncio toda e qualquer O conceito de família mudou. E onde pro-
modalidade de estruturas familiares que se curar a sua definição atual? Talvez na frase
afastasse do modelo “oficial”. piegas de Saint-Exupéry: na responsabilida-
E foi assumindo a responsabilidade de jul- de decorrente do afeto.
(Zero Hora, Caderno PrOA, 27-09-2015.)
gar que os 14juízes começaram a alargar o
conceito de família. As mudanças chegaram Sobre o uso de acento gráfico em vocábulos
_____ Constituição Federal, que enlaçou no
do texto, analise as afirmações que seguem:
conceito de família, outorgando-lhes espe-
I. Em constituída (ref. 2) e juízes (ref. 14),
cial proteção, outras estruturas de convívio.
a letra i recebe acento gráfico por razões
Além do casamento, trouxe, de forma exem-
plificativa, a união estável entre um homem distintas.
e uma mulher e a chamada família parental: II. aparência (ref. 3) e purgatório (ref. 12)
um dos pais e seus filhos. recebem acento gráfico em virtude da
mesma regra.
Adiante ainda seguiu a Justiça. Reconheceu
III. As palavras só (ref. 10) e divórcio (ref.
que o rol constitucional não é exaustivo, e
continuou a reconhecer como família outras 11) são acentuadas a fim de marcar a so-
estruturas familiares. Assim as famílias ana- noridade da vogal o.
parentais, constituídas somente pelos filhos, Quais estão INCORRETAS?
sem a presença dos pais; as famílias paren- a) Apenas I.
tais, decorrentes do convívio de pessoas com b) Apenas II.
vínculo de parentesco; bem como as famílias c) Apenas III.
homoafetivas, que são as formadas por pes- d) Apenas I e II.
soas do mesmo sexo. e) Apenas I e III.

105
2. (IFPE) UMA REVISÃO DE DADOS RECENTES 3. (COL. Naval) Assinale a opção na qual as pa-
SOBRE A MORTE DE LÍNGUAS lavras foram acentuadas pelo mesmo motivo
que “aritméticos”, “prioritária”, “cálculos”
Linguistas preveem que metade das mais de- e “Taubaté”, respectivamente.
mil línguas faladas no mundo desaparecerá a) rotatória, cólica, vermífugo, Maringá.
em um século – uma taxa de extinção que su- b) hebdomadário, ausência, andrógino, Itajaí.
pera as estimativas mais pessimistas quanto c) farmacêutico, ípsilon, síndrome, Piauí.
à extinção de espécies biológicas. (...) d) alaúde, húngaro, déspota, Grajaú.
Segundo a Unesco, 96% da população mun- e) anêmona, glúten, nômade, Tribobó.
dial falam só 4% das línguas existentes. E
apenas 4% da humanidade partilha o res-
tante dos idiomas, metade dos quais se en- 4. (IFSC) Texto 1: Livro
contra em perigo de extinção. Entre 20 e 30
Eu me livro daquele garoto chato
idiomas desaparecem por ano – uma média
Com um livro enfiado no meu nariz
de uma língua a cada duas semanas. (...)
Fingindo achar a história feliz.
A perda de línguas raras é lamentável por
(MARIA, Selma. Isso isso. São Paulo: Peirópolis, 2010. s/p.)
várias razões. Em primeiro lugar, pelo in-
teresse científico que despertam: algumas Texto 2
questões básicas da linguística estão longe
de estar inteiramente resolvidas. E essas lín-
guas ajudam a saber quais elementos da gra-
mática e do vocabulário são realmente uni-
versais, isto é, resultantes das características
do próprio cérebro humano.
A ciência também tenta reconstruir o per-
curso de antigas migrações, fazendo um le-
vantamento de palavras emprestadas, que
ocorrem em línguas sem qualquer parentes-
co. Afinal, se línguas não aparentadas par-
tilham palavras, então seus povos estiveram
em contato em algum momento.
Um comunicado do Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) diz
que “o desaparecimento de uma língua e de
seu contexto cultural equivale a queimar um
livro único sobre a natureza”. Afinal, cada
povo tem um modo único de ver a vida. Por Considerando a posição da sílaba tônica e as
exemplo, a palavra russa mir significa igual- regras de acentuação das palavras, assinale a
mente “aldeia”, “mundo” e “paz”. É que, alternativa CORRETA:
como os aldeões russos da Idade Média ti- a) As palavras “garoto”, “história”, “feliz” e
nham de fugir para a floresta em tempos de “nariz”, do texto 1, são palavras proparoxí-
guerra, a aldeia era para eles o próprio mun- tonas, e “livro”, “dicionário”, “terminar” e
do, ao menos enquanto houvesse paz. “nunca”, do texto 2, são palavras oxítonas.
(Disponível em: <http://revistalingua.com.br/textos/116/a- b) As palavras “história”, do texto 1, e “dicio-
morte-anunciada-355517-1.asp>. Acesso em 28 set. 2015.) nário”, do texto 2, não deveriam estar acen-
tuadas, porque os acentos agudos não fazem
No início do texto, aparece a forma verbal
mais parte do português brasileiro.
“preveem”, que perdeu o acento circunflexo
c) A palavra “história”, do texto 1, é uma pa-
após o último acordo ortográfico. lavra paroxítona e está corretamente acen-
Assinale a única alternativa em que todas as tuada; e “você”, do texto 2, é uma palavra
palavras seguem o padrão de acentuação de- oxítona e deve ser acentuada da mesma for-
terminado pelo referido acordo. ma que “café”, “dendê”.
a) Eu fui à feira e comprei cinco pêras e três d) As palavras “história”, do texto 1, e “dicio-
maçãs. nário”, do texto 2, foram acentuadas corre-
b) A sonda espacial acabou de descobrir um tamente, mas possuem regras de acentuação
novo asteróide. diferentes, porque a primeira é considerada
c) Joana d’Arc é uma mártir da Guerra dos Cem paroxítona e, a segunda, proparoxítona.
anos. e) As palavras “nariz” e “feliz”, do texto 1, de-
d) Ele, estranhamente, saiu sem cumprimentar veriam estar acentuadas assim como as pa-
a platéia. lavras “terminar”, “ler”, “grosso” e “nunca”,
e) O Brasil acabou de enviar uma equipe de do texto 2, que deveriam receber acento cir-
pesquisa ao pólo Sul. cunflexo.

106
5. (IFSC) claridade do dia, sem que ninguém pudesse
evitá-la.
Moleques de carrinho corriam em todas as
direções, atropelando-se uns aos outros.
Queriam salvar as mercadorias que trans-
portavam. Não era o instinto de proprieda-
de que os impelia. Sentiam-se responsáveis
pelo transporte. E no atropelo da fuga, paco-
tes rasgavam-se, melancias rolavam, tomates
esborrachavam-se no asfalto. Se a fruta cai
no chão, já não é de ninguém; é de qualquer
um, inclusive do transportador. Em ocasiões
de assalto, quem é que vai reclamar uma
penca de bananas meio amassadas?
– Olha o assalto! Tem um assalto ali adiante!
O ônibus na rua transversal parou para as-
suntar. Passageiros ergueram-se, puseram o
nariz para fora. Não se via nada. O motoris-
ta desceu, desceu o trocador, um passageiro
Sobre o texto apresentado na tirinha é COR- advertiu:
RETO afirmar que: – No que você vai a fim de ver o assalto, eles
a) O pronome “vocês”, no primeiro quadrinho, assaltam sua caixa.
é acentuado por ser uma palavra paroxítona Ele nem escutou. Então os passageiros tam-
terminada em s. bém acharam de bom alvitre abandonar o ve-
b) A forma verbal “é”, que aparece no segundo ículo, na ânsia de saber, que vem movendo o
e quinto quadrinhos, é acentuada com base homem, desde a idade da pedra até a idade
na regra que manda acentuar as palavras do módulo lunar.
monossílabas tônicas terminadas em e (no Outros ônibus pararam, a rua entupiu.
quarto quadrinho não tem é). – Melhor. Todas as ruas estão bloqueadas.
c) O substantivo “país”, no segundo quadri- Assim eles não podem dar no pé.
nho, recebe acento porque é uma palavra – É uma mulher que chefia o bando!
oxítona terminada em is. – Já sei. A tal dondoca loura.
d) O substantivo “país”, no segundo quadri- – A loura assalta em São Paulo. Aqui é a mo-
nho, recebe acento diferencial para não ser rena.
– Uma gorda. Está de metralhadora. Eu vi.
confundido com o adjetivo “pais”.
– Minha Nossa Senhora, o mundo tá virado!
e) A regra que justifica o acento no pronome – Vai ver que está é caçando marido.
“ninguém”, que aparece no segundo e ter- – Não brinca numa hora dessas. Olha aí san-
ceiro quadrinhos, também justifica que se gue escorrendo!
acentue o advérbio “ontem”, opcionalmente. – Sangue nada, tomate.
Na confusão, circularam notícias diversas.
6. (IFSC) ASSALTO O assalto fora a uma joalheria, as vitrinas
tinham sido esmigalhadas a bala. E havia
Na feira, a gorda senhora protestou a altos joias pelo chão, braceletes, relógios. O que os
brados contra o preço do chuchu: bandidos não levaram, na pressa, era agora
– Isto é um assalto! objeto de saque popular. Morreram no míni-
Houve um rebuliço. Os que estavam perto mo duas pessoas, e três estavam gravemente
fugiram. Alguém, correndo, foi chamar o feridas.
guarda. Um minuto depois, a rua inteira, Barracas derrubadas assinalavam o ímpeto
atravancada, mas provida de admirável ser- da convulsão coletiva. Era preciso abrir ca-
viço de comunicação espontânea, sabia que minho a todo custo. No rumo do assalto, para
se estava perpetrando um assalto ao banco. ver, e no rumo contrário, para escapar. Os
Mas que banco? Havia banco naquela rua? grupos divergentes chocavam-se, e às vezes
Evidente que sim, pois do contrário como trocavam de direção: quem fugia dava mar-
poderia ser assaltado? cha à ré, quem queria espiar era arrastado
– Um assalto! Um assalto! – a senhora conti- pela massa oposta. Os edifícios de aparta-
nuava a exclamar, e quem não tinha escuta- mentos tinham fechado suas portas, logo
do escutou, multiplicando a notícia. Aquela que o primeiro foi invadido por pessoas que
voz subindo do mar de barracas e legumes pretendiam, ao mesmo tempo, salvar o pelo
era como a própria sirene policial, documen- e contemplar lá de cima. Janelas e balcões
tando, por seu uivo, a ocorrência grave, que apinhados de moradores, que gritavam:
fatalmente se estaria consumando ali, na – Pega! Pega! Correu pra lá!

107
– Olha ela ali! boêmia. Na definição de Antenor Nascentes:
– Eles entraram na kombi ali adiante! vida despreocupada e alegre, vadiação, es-
– É um mascarado! Não, são dois mascara- túrdia, vagabundagem. Aplicou-se depois o
dos! termo, especializadamente, à vida desorde-
Ouviu-se nitidamente o pipocar de uma nada e sem preocupações de artistas e escri-
metralhadora, a pequena distância. Foi um tores mais dados aos prazeres da noite que
deitar-no-chão geral, e como não havia es- aos trabalhos do dia. Eis um exemplo clássico
paço, uns caíam por cima de outros. Cessou o do que se chama degenerescência semântica.
ruído. Voltou. Que assalto era esse, dilatado De limpo gentílico – natural ou habitante da
no tempo, repetido, confuso? Boêmia – boêmio acabou carregado de todas
– Olha o diabo daquele escurinho tocando essas conotações desfavoráveis.
A respeito do substantivo boêmia, vale dizer
matraca! E a gente com dor de barriga, pen-
que a forma de uso, ao menos no Brasil, é
sando que era metralhadora!
boemia, acento tônico em -mi-. E é natural
Caíram em cima do garoto, que soverteu na
que assim seja, considerando-se que -ia é
multidão. A senhora gorda apareceu, muito
sufixo que exprime condição, estado, ocu-
vermelha, protestando sempre: pação. Conferir: alegria, anarquia, barbaria,
– É um assalto! Chuchu por aquele preço é rebeldia, tropelia, pirataria... Penso que so-
um verdadeiro assalto! bretudo palavras como folia e orgia devem
(ANDRADE, Carlos Drummond. Assalto. In: Para gostar ter influído na fixação da tonicidade de bo-
de ler. Vol. 3. SÃO PAULO: Ática, 1979. p. 12-14.)
emia. Notar também o par abstêmio/abste-
Em relação à acentuação gráfica, leia e anali- mia. Além do mais, a prosódia boêmia estava
se as seguintes afirmações: prejudicada na origem pelo nome 10próprio
Boêmia: esses boêmios não são os que vivem
I. As palavras notícias, relógio, ânsia e con-
na Boêmia...
trário são acentuadas por serem paroxíto-
(LUFT, Celso Pedro. Boêmios, Boêmia e boemia. In: O
nas e terminarem em ditongo.
romance das palavras. São Paulo: Ática, 1996. p. 30-31.)
II. Os vocábulos pé, lá, aí e já recebem acen-
to tônico por serem monossílabos tôni- Considere os pares de palavras abaixo.
cos. 1. puídos (ref. 7) e indivíduo (ref. 8)
III. As palavras veículo, módulo, ímpeto e 2. Boêmia (ref. 9) e próprio (ref. 10)
ônibus recebem acento gráfico por serem 3. deus-dará (ref. 11) e Daí (ref. 12)
proparoxítonas. Em quais pares as palavras respeitam a mes-
Assinale a alternativa CORRETA. ma regra de acentuação ortográfica?
a) Apenas as afirmações I e III são verdadeiras. a) Apenas 1.
b) Apenas a afirmação II é verdadeira. b) Apenas 2.
c) Apenas as afirmações I e II são verdadeiras. c) Apenas 3.
d) Apenas as afirmações II e III são verdadeiras. d) Apenas 1 e 2.
e) Todas as afirmações são verdadeiras. e) Apenas 1 e 3.

7. (UFRGS) No século XV, viu-se a Europa in- 8. (COL. Naval) Quando a rede vira um vício
vadida por uma raça de homens que, vin-
dos ninguém sabe de onde, se espalharam Com o titulo “Preciso de ajuda”, fez-se um
em bandos por todo o seu território. Gente desabafo aos integrantes da comunidade Vi-
inquieta e andarilha, deles afirmou Paul de ciados em Internet Anônimos: “Estou muito
Saint-Victor que era mais fácil predizer o dependente da web, Não consigo mais viver
........ das nuvens ou dos gafanhotos do que normalmente. Isso é muito sério”. Logo ob-
seguir as pegadas da sua invasão. Uns riso- teve resposta de um colega de rede. “Estou
nhos despreocupados: passavam a vida es- na mesma situação. Hoje, praticamente vivo
quecidos do passado e descuidados do futu- em frente ao computador. Preciso de ajuda.”
ro. Cada novo dia era uma nova aventura em O diálogo dá a dimensão do tormento pro-
busca do escasso alimento para os manter vocado pela dependência em Internet, um
naquela jornada. Trajo? No mais completo mal que começa a ganhar relevo estatístico,
........: ........ sujos e 7puídos cobriam-lhes os à medida que o uso da própria rede se disse-
corpos queimados do sol. Nômades, aventu- mina. Segundo pesquisas recém-conduzidas
reiros, despreocupados – eram os boêmios. pelo Centro de Recuperação para Dependên-
Assim nasceu a semântica da palavra boê- cia de Internet, nos Estados Unidos, a parce-
mio. O nome gentílico de 9Boêmia passou a la de viciados representa, nos vários países
aplicar-se ao 8indivíduo despreocupado, de estudados, de 5% (como no Brasil) a 10%
existência irregular, relaxado no vestuário, dos que usam a web – com concentração na
vivendo ao 11deus-dará, à toa, na vagabun- faixa dos 15 aos 29 anos. Os estragos são
dagem alegre. 12Daí também o substantivo enormes. Como ocorre com um viciado em

108
álcool ou em drogas, o doente desenvolve por se definir, a internet proporciona um
uma tolerância que, nesse caso, o faz ficar ambiente favorável para que eles se expres-
on-line por uma eternidade sem se dar conta sem livremente”. No perfil daquela minoria
do exagero. Ele também sofre de constantes que, mais tarde, resvala no vicio se vê, em
crises de abstinência quando está desconec- geral, uma combinação de baixa autoestima
tado, e seu desempenho nas tarefas de na- com intolerância à frustração. Cerca de 50%
tureza intelectual despenca. Diante da tela deles, inclusive, sofrem de depressão, fobia
do computador, vive, aí sim, momentos de social ou algum transtorno de ansiedade. É
rara euforia. Conclui uma psicóloga america- nesse cenário que os múltiplos usos da rede
na: “O viciado em internet vai, aos poucos, ganham um valor distorcido. Entre os que já
perdendo os elos com o mundo real até de-
têm o vicio, a maior adoração é pelas redes
sembocar num universo paralelo – e comple-
de relacionamento e pelos jogos on-line, so-
tamente virtual”.
bretudo por aqueles em que não existe noção
Não é fácil detectar o momento em que al-
de começo, meio ou fim.
guém deixa de fazer uso saudável e produ-
tivo da rede para estabelecer com ela uma Desde 1996, quando se consolidou o pri-
relação doentia, como a que se revela nas meiro estudo de relevo sobre o tema, nos
histórias relatadas ao longo desta reporta- Estados Unidos, a dependência em internet
gem. Em todos os casos, a internet era ape- é reconhecida – e tratada – como uma doen-
nas “útil” ou “divertida” e foi ganhando um ça. Surgiram grupos especializados por toda
espaço central, a ponto de a vida longe da parte. “Muita gente que procura ajuda ainda
rede ser descrita agora como sem sentido. resiste à ideia de que essa é uma doença”,
Mudança tão drástica se deu sem que os pais conta um psicólogo. O prognóstico é bom:
atentassem para a gravidade do que ocorria. em dezoito semanas de sessões individuais e
“Como a internet faz parte do dia a dia dos em grupo, 80% voltam a níveis aceitáveis de
adolescentes e o isolamento é um compor- uso da internet. Não seria factível, tampou-
tamento típico dessa fase da vida, a famí- co desejável, que se mantivessem totalmente
lia raramente detecta o problema antes de distantes dela, como se espera, por exemplo,
ele ter fugido ao controle”, diz um psiquia- de um alcoólatra em relação à bebida. Com a
tra. A ciência, por sua vez, já tem bem ma rede, afinal, descortina-se uma nova dimen-
peados os primeiros sintomas da doença. De são de acesso às informações, à produção de
saída, o tempo na internet aumenta – até conhecimento e ao próprio lazer, dos quais,
culminar, pasme-se, numa rotina de catorze em sociedades modernas, não faz sentido se
horas diárias, de acordo com o estudo ame- privar. Toda a questão gira em torno da dose
ricano. As situações vividas na rede passam,
ideal, sobre a qual já existe um consenso
então, a habitar mais e mais as conversas.
acerca do razoável: até duas horas diárias,
É típico o aparecimento de olheiras profun-
no caso de crianças e adolescentes. Quanto
das e ainda um ganho de peso relevante, re-
antes a ideia do limite for sedimentada, me-
sultado da frequente troca de refeições por
sanduíches – que prescindem de talheres e lhor. Na avaliação de uma das psicólogas, “Os
liberam uma das mãos para o teclado. Grada- pais não devem temer o computador, mas,
tivamente, a vida social vai se extinguindo. sim, orientar os filhos sobre como usá-lo de
Alerta outra psicóloga: “Se a pessoa começa forma útil e saudável”. Desse modo, reduz-
a ter mais amigos na rede do que fora dela, -se drasticamente a possibilidade de que, no
é um sinal claro de que as coisas não vão futuro, eles enfrentem o drama vivido hoje
bem”. pelos jovens viciados.
Os jovens são, de longe, os mais propensos a (Silvia Rogar e João Figueiredo. In: Revista
extrapolar o uso da internet. Há uma razão Veja, 24 de março de 2010.)
estatística para isso – eles respondem por
Assinale a opção cujas palavras são, respec-
até 90% dos que navegam na rede, a maior
tivamente, acentuadas pela mesma justifi-
fatia –, mas pesa também uma explicação de
fundo mais psicológico, à qual uma recen- cativa das que aparecem destacadas em “Na
te pesquisa lança luz. Algo como 10% dos avaliação de uma das psicólogas, ‘os pais não
entrevistados (viciados ou não) chegam a devem temer o computador, mas, sim, orien-
atribuir à internet uma maneira de “aliviar tar os filhos sobre como usá-lo de forma útil
os sentimentos negativos”, tão típicos de e saudável’.” (4° parágrafo)
uma etapa em que afloram tantas angústias a) Família, incluí-lo, saída.
e conflitos. Na rede, os adolescentes sentem- b) Prognóstico, atrás, fútil.
-se ainda mais à vontade para expor suas c) Plausível, alguém, factível.
ideias. Diz um outro psiquiatra: “Num mo- d) Alcoólatra, razoável, vício.
mento em que a própria personalidade está e) Múltiplos, amá-la, intolerância.

109
9. (UFRGS) Darwin passou quatro meses no 1
0. (EPCAR) QUARTO DE DESPEJO
Brasil, em 1832, durante a sua 2célebre via-
gem a bordo do Beagle. Voltou impressiona- “O grito da favela que tocou a consciência do
do com o que viu: “5Delícia é um termo 17in- mundo inteiro”
suficiente para exprimir as emoções sentidas 2 de MAIO de 1958. Eu não sou indolente. Há
por um naturalista a 8sós com a natureza em tempos que eu pretendia fazer o meu diario.
uma floresta brasileira”, escreveu. O Brasil, Mas eu pensava que não tinha valor e achei
11
porém, aparece de forma menos 21idílica que era perder tempo.
em seus escritos: “Espero nunca mais voltar ...Eu fiz uma reforma para mim. Quero tratar
a um 12país escravagista. O estado da enorme as pessoas que eu conheço com mais aten-
população escrava deve preocupar todos os ção. Quero enviar sorriso amavel as crianças
que chegam ao Brasil. Os senhores de escra- e aos operarios.
vos querem ver o negro romo outra espécie, ...Recebi intimação para comparecer as 8 ho-
mas temos todos a mesma origem.” ras da noite na Delegacia do 12. Passei o dia
Em vez do gorjeio do 6sabiá, o que Darwin catando papel. A noite os meus pés doiam
guardou nos ouvidos foi um som 3terrível tanto que eu não podia andar.
que o acompanhou por toda a vida: “13Até Começou chover. Eu ia na Delegacia, ia le-
hoje, se eu ouço um grito, lembro-me, com var o José Carlos. A intimação era para ele. O
dolorosa e clara memória, de quando pas- José Carlos tem 9 anos.
sei numa casa em Pernambuco e ouvi urros 3 de MAIO. ...Fui na feira da Rua Carlos de
14
terríveis. Logo entendi que era algum po- Campos, catar qualquer coisa. Ganhei bas-
bre escravo que estava sendo torturado,” tante verdura. Mas ficou sem efeito, porque
Segundo o 4biólogo Adrian Desmond, “a via- eu não tenho gordura. Os meninos estão ner-
gem do Beagle, para Darwin, foi menos 41im- vosos por não ter o que comer.
portante pelos 15espécimes coletados do que 6 de MAIO. De manhã não fui buscar agua.
pela 16experiência de testemunhar os horro- Mandei o João carregar. Eu estava contente.
res da escravidão no Brasil. De certa forma, Recebi outra intimação. Eu estava inspira-
ele escolheu focar na descendência comum da e os versos eram bonitos e eu esqueci de
ir na Delegacia. Era 11 horas quando eu re-
do homem justamente para mostrar que to-
cordei do convite do ilustre tenente da 12ª
das as raças eram iguais e, desse modo, en-
Delegacia.
fim, objetar àqueles que insistiam em dizer
...o que eu aviso aos pretendentes a política,
que os negros pertenciam a uma espécie di-
é que o povo não tolera a fome. É preciso co-
ferente e inferior à dos brancos”. Desmond
nhecer a fome para saber descrevê-la.
acaba de lançar um estudo que mostra a pai-
Estão construindo um circo aqui na Rua Ara-
xão abolicionista do cientista, revelada por guaia, Circo Theatro Nilo.
seus 7diários e cartas pessoais. “A extensão 9 de MAIO. Eu cato papel, mas não gosto.
de seu interesse no combate à ciência de Então eu penso: Faz de conta que estou so-
cunho racista 9é surpreendente, e pudemos nhando.
detectar um ímpeto moral por 10trás de seu 10 de MAIO. Fui na Delegacia e falei com o
trabalho sobre a evolução humana – uma Tenente. Que homem amavel! Se eu soubesse
crença na ‘irmandade racial’ que tinha ori- que ele era tão amavel, eu teria ido na Dele-
gem em seu ódio ao escravismo e que o levou gacia na primeira intimação.
a pensar numa descendência comum.” (...) O Tenente interessou-se pela educação
(HAAG, C. O elo perdido tropical. Pesquisa dos meus filhos. Disse-me que a favela é um
FAPESP, n. 159, p. 80 - 85, maio 2009.)
ambiente propenso, que as pessoas tem mais
Assinale a alternativa em que as três pala- possibilidades de delinquir do que tornar-se
vras são acentuadas graficamente pela mes- util a patria e ao país. Pensei: se ele sabe
ma razão. disso, porque não faz um relatorio e envia
a) célebre (ref. 2) - terrível (ref. 3) - biólogo para os politicos? O Senhor Janio Quadros, o
(ref. 4) Kubstchek, e o Dr Adhemar de Barros? Agora
b) Delícia (ref. 5) - sabiá (ref. 6) - diários (ref. 7) falar para mim, que sou uma pobre lixeira.
c) sós (ref. 8) - é (ref. 9) - trás (ref. 10) Não posso resolver nem as minhas dificul-
d) porém (ref. 11) - país (ref. 12) - Até (ref. 13) dades.(...) O Brasil precisa ser dirigido por
e) terríveis (ref. 14) - espécimes (ref. 15) - ex- uma pessoa que já passou fome. A fome tam-
periência (ref. 16) bem é professora. Quem passa fome aprende
a pensar no proximo e nas crianças.
11 de MAIO. Dia das mães. O céu está azul
e branco. Parece que até a natureza quer
homenagear as mães que atualmente se

110
sentem infeliz por não realizar os desejos a) “...as pessoas tem mais possibilidades de de-
de seus filhos. (...) O sol vai galgando. Hoje linquir...”
não vai chover. Hoje é o nosso dia. (...) A b) “Pretendia comprar um pouco de farinha
D. Teresinha veio visitar-me. Ela deu-me 15 para fazer um virado.”
cruzeiros. Disse-me que era para a Vera ir c) “Nas prisões os negros eram os bodes expia-
no circo. Mas eu vou deixar o dinheiro para torios.”
comprar pão amanhã, porque eu só tenho 4 d) “...os meus pés doiam tanto que eu não po-
cruzeiros.(...) Ontem eu ganhei metade da dia andar.”
cabeça de um porco no frigorifico. Comemos
a carne e guardei os ossos para ferver. E com
o caldo fiz as batatas. Os meus filhos estão E.O. Complementar
sempre com fome. Quando eles passam mui-
ta fome eles não são exigentes no paladar. 1. (IFSUL) Crônica parafraseada de uma Síria
(...) Surgiu a noite. As estrelas estão ocultas. em guerra
O barraco está cheio de pernilongos. Eu vou
acender uma folha de jornal e passar pelas Ela abre os olhos. Não fosse o cheiro horrível
paredes. É assim que os favelados matam de morte, o silêncio seria até agradável, mas
mosquitos. o olfato a lembra que não há paz – nem pes-
13 de MAIO. Hoje amanheceu chovendo. É soas, vizinhos, crianças. A trégua na manhã-
um dia simpatico para mim. É o dia da Abo- zinha não traz esperança. Tão somente lhe
lição. Dia que comemoramos a libertação permite descansar o corpo, mas não a mente.
dos escravos. Nas prisões os negros eram os As lembranças da noite anterior ainda pro-
duzem sobressaltos. Bombas, casas caindo e
bodes expiatorios. Mas os brancos agora são
soldados gritando.
mais cultos. E não nos trata com desprezo.
Levanta-se, bebe o pouco da água que restou
Que Deus ilumine os brancos para que os pre-
do copo ao lado da cama. Já não é tão lim-
tos sejam feliz. (...) Continua chovendo. E eu pa, nem farta como antes. Sempre um gosto
tenho só feijão e sal. A chuva está forte. Mes- amargo misturado com
mo assim, mandei os meninos para a esco- Abre a geladeira, e só encontra comida enla-
la. Estou escrevendo até passar a chuva para tada e congelada. E mesmo não tão congela-
mim ir lá no Senhor Manuel vender os ferros. da assim, já que os cortes diários de eletrici-
Com o dinheiro dos ferros vou comprar arroz dade derretem as camadas de gelo.
e linguiça. A chuva passou um pouco. Vou Os sobrinhos ainda dormem, e ela tenta orar.
sair. (...) Eu tenho dó dos meus filhos. Quan- Não consegue. A mente desconcentra-se fa-
do eles vê as coisas de comer eles brada: Viva cilmente. Em uma prece fragmentada, pede
a mamãe!. A manifestação agrada-me. Mas a Deus descanso e trégua. E faz a oração sem
eu já perdi o habito de sorrir. Dez minutos pensar muito. Não precisa; é a mesma oração
depois eles querem mais comida. Eu man- das últimas semanas.
dei o João pedir um pouquinho de gordura a Ela não quer sair de casa. Não é teimosia,
Dona Ida. Mandei-lhe um bilhete assim: é falta de opção. “Para onde ir?”, pergunta,
“Dona Ida peço-te se pode me arranjar um com uma voz desesperançosa. Está tão con-
pouquinho de gordura, para eu fazer sopa fusa que não consegue imaginar saídas.
para os meninos. Hoje choveu e não pude ca- Nem a piedade de enterrar os mortos o go-
verno permite. Cadáveres estão espalhados
tar papel. Agradeço. Carolina”
pelas ruas. As forças de Assad 3impediram de
(...) Choveu, esfriou. É o inverno que chega.
sepultar ou mesmo remover os restos mor-
E no inverno a gente come mais. A Vera co-
tais. Ou seja, mesmo viva, ela não tem como
meçou a pedir comida. E eu não tinha. Era fugir da morte escancarada diante de seus
a reprise do espetaculo. Eu estava com dois olhos. Não é fácil acreditar na vida, quando
cruzeiros. Pretendia comprar um pouco de a realidade grita o contrário.
farinha para fazer um virado. Fui pedir um Se não podem sepultar os mortos, os sobre-
pouco de banha a Dona Alice. Ela deu-me a viventes tentam ao menos ajudar a curar as
banha e arroz. Era 9 horas da noite quando feridas dos machucados. Não podem levá-los
comemos. aos hospitais da cidade, já que há um medo
E assim no dia 13 de maio de 1958 eu lutava generalizado de que o governo prenda os fe-
contra a escravatura atual – a fome! ridos como se fossem prisioneiros de guerra.
(DE JESUS, Carolina Maria. Quarto de Despejo.) Resta improvisar atendimento nos campos.
Não bastasse a precariedade do atendimen-
Pode-se afirmar que um recorrente problema to, não há medicamentos suficientes.
encontrado no texto, no que se refere ao uso Rebeca, de 32 anos, é trabalhadora autôno-
da língua padrão, está relacionado à acen ma. Ou melhor, 4era. Agora já não sabe mais
tuação gráfica. Assinale a alternativa em que o que é e o que faz em sua cidade Damasco,
esse fato NÃO ocorre. capital da Síria.

111
Crônica parafraseada do depoimento de uma aí a sua maior fraqueza, já quedessa vege-
moradora da capital da Síria (identificada tação foi destruída pelo homem. A ave, que
apenas pela letra “R”) ao jornal Folha de também era encontrada em Minas Gerais,
São Paulo, de quarta-feira, dia 25. A Síria hoje só pode ser vista no Espírito Santo.
está em revolta há 16 meses contra a dita- “A extinção está associada à destruição se-
dura de Bashar al-Assad. Nos últimos dias, o cular da Mata Atlântica, porque a espécie só
confronto contra os rebeldes se acirrou e as sobrevive em florestas muito bem conser-
mortes aumentaram. vadas”, diz o biólogo Edson Ribeiro Luiz,
(Disponível em: <http://ultimato.com.br/sites/ coordenador de projetos da SAVE Brasil, ONG
fatosecorrelatos/2012/07/26/cronica-parafraseada-de-
ligada à Bird Life International, que tem
uma-siria-em-guerra/>. Acesso em: 14 set. 2015.)
como foco a proteção das aves brasileiras.
Sobre a acentuação gráfica, são feitas as se- “Em território capixaba, onde existe apenas
guintes afirmações: um bloco de vegetação preservado, elas ten-
I. As palavras horrível, agradável e fácil se- dem a ficar ilhadas.”
guem a regra de acentuação gráfica das A luta para proteger a ave ganhou força no
oxítonas. mês passado, quando aconteceu no Estado o
II. Os vocábulos só, há e já recebem acento Avistar, principal evento de observação de
gráfico em decorrência de regras distin- pássaros do país. Tendo na saíra-apunhalada
tas. o seu símbolo, a festa foi o incentivo que
III. A presença ou a ausência do acento grá- faltava para que o Instituto Estadual de Meio
fico na palavra e é determinante para a Ambiente (IEMA) estabelecesse o prazo de
classificação gramatical desse vocábulo. março de 2016 para a constituição da re-
IV. As palavras levá-las, diários, contrário se- serva. A decisão final, porém, continua nas
guem a regra de acentuação gráfica das mãos do governo.
paroxítonas. (Disponível em: <http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia/
Está(ão) correta(s) a(s) afirmativa(s) ambientalistaspressionam- governo-capixaba-a-proteger-
a) I, III e IV apenas. ave-sairaapunhalada>. Acesso em: 13/11/2015.)
b) II e IV apenas.
Quanto à acentuação das palavras, assinale a
c) I, II, III e IV.
afirmação verdadeira.
d) III apenas.
a) Os vocábulos “é”, “já” e “só” recebem acento
por constituírem monossílabos tônicos fe-
2. (ESPCEX) Assinale a alternativa cujo vocá- chados.
bulo só pode ser empregado com acento grá- b) As palavras “saíra”, “destruída” e “aí” acen-
fico.
tuam-se pela mesma razão.
a) Diálogo
c) Acentuam-se “simpática”, “centímetros”,
b) Até
“simbólica” porque todas as paroxítonas são
c) Análogo
acentuadas.
d) É
d) A palavra “tendem” deveria ser acentuada
e) Música
graficamente, como “também” e “porém”.
e) O nome “Luiz” deveria ser acentuado gra-
3. (IFAL) À beira da extinção, ave saíra-apu- ficamente, pela mesma razão que a palavra
nhalada tem rara chance de se recuperar na “país”.
natureza
A saíra-apunhalada (o nome faz referên- 4. (IFSUL)
cia à mancha vermelha no peito do pássa-
ro, que se assemelha a uma “punhalada”) é Texto 1
uma ave simpática de dez centímetros, com
O PREÇO DE SER DE VERDADE
plumagem branca e cinza. A alcunha, que
Fernanda Pinho
na origem só fazia referência ao visual da
espécie, agora serve bem como indicação Acabei de ler um livro que me marcou bas-
simbólica do perigo pelo qual passa a saíra: tante. Chama-se “A Extraordinária Garota
estimativas indicam que só existem 50 delas Chamada Estrela”, do autor Jerry Spinelli.
na natureza. Para protegê-la, ONGs e órgãos Estrela tem um rato de estimação, fica fe-
ambientalistas do governo lutam para que liz quando seu time faz cesta no basquete
seja criada uma reserva florestal de 5 mil (mas quando o outro time pontua, também),
hectares na região serrana capixaba. distribui cartões de aniversários para desco-
A saíra-apunhalada vive em bandos e se ali- nhecidos, usa as roupas de que gosta (e isso
menta de pequenos insetos e frutos. Ela vive pode ser um vestido que esteve na moda du-
no alto de florestas da Mata Atlântica, e está zentos anos atrás), tenta trazer um pouco de

112
alegria tirando canções de seu ukulele que Texto 2
leva sempre a tiracolo. Num primeiro mo-
mento, junto com o impacto de sua chegada COMO NASRUDIN CRIOU A VERDADE
Nasrudin (Khawajah Nasr Al-Din)
à escola nova, Estrela desperta simpatias.
Afinal, este livro nada mais é que uma deli-
– As leis não fazem com que as pessoas fi-
cada e verdadeira metáfora da vida.
quem melhores – disse Nasrudin ao rei.
E a princípio somos assim. Grandes admi-
– Elas precisam, antes, praticar certas coisas
radores da autenticidade. Capazes de fazer
de maneira a entrar em sintonia com a ver-
discursos inflamados defendendo a liberda-
dade interior, que se assemelha apenas leve-
de de cada um fazer o que quiser, respei- mente à verdade aparente. O rei, no entanto,
tar as próprias convicções, seguir o que seu decidiu que ele poderia, sim, fazer com que
coração manda, persistir nos seus sonhos, as pessoas observassem a verdade, que po-
manter relações com quem se sente à von- deria fazê-las observar a autenticidade – e
tade, construir seu próprio caminho. Lindo, assim o faria. O acesso a sua cidade dava-se
maravilhoso. Se ficar só no discurso, melhor através de uma ponte. Sobre ela, o rei orde-
ainda. nou que fosse construída uma forca. Quando
Porque, em algum momento, Estrela vai le- os portões foram abertos, na alvorada do dia
vantar suspeitas. “Ninguém pode ser tão le- seguinte, o chefe da guarda estava a postos
gal assim”. E da suspeita para a rejeição se em frente de um pelotão para testar todos os
passa num piscar de olhos. Por que ninguém que por ali passassem. Um edital fora ime-
pode ser “tão legal assim”? Porque ser legal diatamente publicado: “Todos serão interro-
demais implica ser diferente e a gente pode gados. Aquele que falar a verdade terá seu
até admirar pessoas que fazem tudo o que ingresso na cidade permitido. Caso mentir,
“dá na telha”, desde que mantenham uma será enforcado". Nasrudin, na ponte entre
distância de segurança de nós, por favor. alguns populares, deu um passo à frente e
começou a cruzar a ponte.
E, veja bem, quando eu falo de gente que
– Aonde o senhor pensa que vai? – pergun-
faz tudo o que “dá na telha”, eu não estou
tou o chefe da guarda.
me referindo a nada que possa machucar ou
– Estou a caminho da forca – respondeu Nas-
prejudicar o outro de alguma forma. Estou
rudin, calmamente. – Não acredito no que
falando de atitudes inocentes, mas que, por está dizendo!
sair da previsibilidade, são tratadas quase – Muito bem, se eu estiver mentindo, pode
como se fossem atos imperdoáveis. me enforcar.
Gente que dança como se ninguém estives- – Mas se o enforcarmos por mentir, faremos
se olhando, que ignora a uniformização das com que aquilo que disse seja verdade!
vitrines e faz a própria moda, que se recusa – Isso mesmo – respondeu Nasrudin, sentin-
a fazer social em ambientes inóspitos, que do-se vitorioso. – Agora vocês já sabem o que
fala a verdade quando questionada, que dá é a verdade: é apenas a sua verdade.
abraços de dez minutos, que ri na hora que (Disponível em: <http://metaforas.com.br/como-
tem vontade de rir, que chora na hora que nasrudin-criou-a-verdade>. Acesso em: 14 abr.2015.)
tem vontade de chorar, que fala “eu te amo”
Nos textos 1 e 2, aparecem várias palavras
quando sente que ama, que escolheu não
acentuadas graficamente.
perder tempo com quem lhe faz mal, que
Em que alternativa as palavras seguem a re-
muda o rumo da própria vida, que ignora
gra de acentuação das oxítonas?
as etiquetas e as convenções. Sabe essa gen- a) terá, juízo, ninguém.
te louca, sem noção, desvairada, sem juízo, b) fazê-las, através, será.
perturbada? Então, elas não são nada disso. c) vocês, construída, previsível.
São apenas pessoas autênticas e verdadeiras, d) imperdoáveis, metáfora, você.
que se respeitam muito (e só quem se res-
peita muito é capaz de respeitar o outro). 5. (IFAL) COMO PREVENIR A VIOLÊNCIA DOS
Elas não estão fazendo nada de mau. Nada ADOLECENTES
que irá prejudicar você ou quem quer que
seja. E por que te incomodam tanto? Bom, “(...) Quando deparo com as notícias sobre
apenas optaram optaram por fazer o que ti- crimes hediondos envolvendo adolescen-
nham vontade, e não o que você, preso em tes, como o ocorrido com Felipe Silva Caffé
seu mundo limitado e previsível, esperava. e Liana Friedenbach, fico profundamente
(Disponível em: <http://www.cronicadodia.com.
triste e constrangida. Esse caso é consequ-
br/2014/10/o-preco-de-ser-de-verdade-fernanda- ência da baixa valorização da prevenção pri-
pinho.html>. Acesso em: 7 abr. 2015.) mária da violência por meio das estratégias

113
cientificamente comprovadas, facilmente luta contra a mortalidade infantil, a desnu-
replicáveis e definitivamente muito mais trição e a violência intrafamiliar contou com
baratas do que a recuperação de crianças e a contribuição dessa enorme rede de solida-
adolescentes que comentem atos infracio- riedade da Pastoral da Criança. (...)”
nais graves contra a vida. “(...) A segunda área da maior importância
Talvez seja porque a maioria da população nessa prevenção primária da violência envol-
não se deu conta e os que estão no poder nos vendo crianças e adolescentes é a educação,
três níveis não estejam conscientes de seu
a começar pelas creches, escolas infantis e
papel histórico e de sua responsabilidade le-
gal de cuidar do que tem de mais importante de educação fundamental e de nível médio,
à nação: as crianças e os adolescentes, que que devem valorizar o desenvolvimento do
são o futuro do país e do mundo. raciocínio e a matemática, a música, a arte, o
A construção da paz e a prevenção da violên- esporte e a prática da solidariedade humana.
cia dependem de como promovemos o desen- As escolas nas comunidades mais pobres
volvimento físico, social, mental, espiritual e deveriam ter dois turnos, para darem con-
cognitivo das nossas crianças e adolescentes, ta da educação integral das crianças e dos
dentro do seu contexto familiar e comunitá- adolescentes; deveriam dispor de equipes
rio. Trata-se, portanto, de uma ação inter- multiprofissionais atualizadas e capacitadas
setorial, realizada de maneira sincronizada a avaliar periodicamente os alunos. Urgente
em cada comunidade, com a participação das é incorporar os ministérios do Esporte e da
famílias, mesmo que estejam incompletas ou Cultura às iniciativas da educação, com ati-
desestruturadas (...)” vidades em larga escala e simples, baratas,
“(...) Em relação às crianças e adolescentes facilmente replicáveis e adaptáveis em todo
que cometeram infrações leves ou modera- o território nacional. (...)”
das – que deveriam ser mais bem expressas “(...) Com relação à idade mínima para a
– seu tratamento para a cidadania deveria maioridade penal, deve permanecer em 18
ser feito com instrumentos bem elaborados e anos, prevista pelo Estatuto da Criança e do
colocados em prática, na família ou próxima Adolescente e conforme orientações da ONU.
dela, com acompanhamento multiprofissio- Mas o tempo máximo de três anos de reclu-
nal, desobstruindo as penitenciárias, verda- são em regime fechado, quando a criança ou
deiras universidades do crime. (...)” o adolescente comete crime hediondo, mes-
“(...) A prevenção primária da violência ini- mo em locais apropriados e com tratamento
cia-se com a construção de um tecido social multiprofissional, que urgentemente preci-
saudável e promissor, que começa antes do sam ser disponibilizados, deve ser revisto.
nascer, com um bom pré-natal, parto de qua- Três anos, em muitos casos, podem ser ab-
lidade, aleitamento materno exclusivo até solutamente insuficientes para tratar e pre-
seis meses e o complemento até mais de um parar os adolescentes com graves distúrbios
ano, vacinação, vigilância nutricional, edu- para a convivência cidadã. (...)”
cação infantil, principalmente propiciando o (Zilda Arns Neumann, 69, médica pediatra e sanitarista;
desenvolvimento e o respeito à fala da crian- foi fundadora e coordenadora nacional da Pastoral da
ça, o canto, a oração, o brincar, o andar, o Criança. Publicado em: Folha de S. Paulo, 26/11/2003.).
jogar; uma educação para a paz e a nãovio-
lência. Foram retiradas do texto as seguintes palavras
A pastoral da criança, que em 2003 comple- acentuadas: ministérios, replicáveis, adaptá-
ta 20 anos, forma redes de ação para mul- veis, máximo, distúrbios, convivências.
tiplicar o saber e a solidariedade junto às Assinale a alternativa que melhor justifica a
famílias pobres do país, por meio de mais de acentuação gráfica.
230 mil voluntários, e acompanhou no ter- a) De todas as palavras destacadas, somente
ceiro trimestre deste ano cerca de 1,7 milhão “máximo” não se insere na mesma regra de
de crianças menores de seis anos e 80 mil acentuação gráfica.
gestantes, de mais de 1,2 milhão de famí- b) Todas as palavras mencionadas seguem o
lias, que moram em 34.784 comunidades de mesmo padrão ou regra de acentuação gráfica.
3.696 municípios do país. c) Com exceção de “máximo” e “convivência”,
O Brasil é o país que mais reduziu a mortali- que são proparoxítonas, as demais palavras
dade infantil nos últimos dez anos; isso, sem são acentuadas pelo mesmo motivo.
dúvida, é resultado da organização e univer- d) Três regras de acentuação contemplam as
salização dos serviços de saúde pública, da palavras supracitadas: a das proparoxítonas,
melhoria da atenção primária, com todas as a das paroxítonas terminadas em ditongos e
limitações que o SUS possa ainda possuir, as que terminam em hiato, que, no caso em
da descentralização e municipalização dos análise, trata-se da palavra “convivência”.
recursos e dos serviços de saúde. A intensa e) Todas são proparoxítonas.

114
E.O. Dissertativo a) Tendo como base a frase da moça, explique o
que ela quis dizer e o que o rapaz entendeu.
b) Explique, do ponto de vista fonológico, o
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES que gerou a interpretação do rapaz.
O artista Juan Diego Miguel apresenta a ex-
posição Arte e Sensibilidade, no Museu Bra- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
sileiro da Escultura (MUBE) de suas obras
que acabam de chegar no país. E dizem que rola um texto na internet com
Seu sentido de inovação tanto em temas minha assinatura baixando o pau no “Big
como em materiais que elege é sempre de Brother Brasil”.
uma sensação extraordinária para o espec- Não fui eu que escrevi.
tador. Não poderia escrever nada sobre o “Big Bro-
Juan Diego sensibiliza-se com os materiais ther Brasil”, a favor ou contra, porque sou
que nos rodeam e lhes da vida com uma na- um dos três ou quatro brasileiros que nunca
turalidade impressionante, encontrando li- o acompanharam.
berdade para buscar elementos no fauvismo O pouco que vi do programa, de passagem,
de Henri Matisse, no cubismo de Pablo Pi- zapeando entre canais, só me deixou per-
casso e do contemporâneo de Juan Gris. Uma plexo: o que, afinal, atraía tanto as pessoas
arte que está reservada para poucos. – além do voyeurismo* natural da espécie –
Exposição: de 03 de agosto à 02 de setembro das 10 às 19h. numa jaula de gente em exibição?
Também me dizem que, além de textos meus
1. (FGV) O artista Juan Diego Miguel apresenta que nunca escrevi, agora frequento a inter-
a exposição Arte e Sensibilidade, no Museu net com um Twitter.
Brasileiro da Escultura (MUBE) de suas obras Aviso: não tenho tuiter, não recebo tuiter,
que acabam de chegar no país. não sei o que é tuiter.
Seu sentido de inovação tanto em temas como E desautorizo qualquer frase de tuiter atri-
em materiais que elege é sempre de uma sen- buída a mim a não ser que ela seja absoluta-
sação extraordinária para o espectador. mente genial. Brincadeira, mas já fui obri-
Juan Diego sensibiliza-se com os materiais gado a aceitar a autoria de mais de um texto
que nos rodeam e lhes da vida com uma na- apócrifo (e agradecer o elogio) para não cau-
turalidade impressionante, encontrando li- sar desgosto, ou até revolta. Como a daquela
berdade para buscar elementos no fauvismo senhora que reagiu com indignação quando
de Henri Matisse, no cubismo de Pablo Pi- eu inventei de dizer que um texto que ela
casso e do contemporâneo de Juan Gris. Uma lera não era meu:
arte que está reservada para poucos. — É sim.
(Exposição: de 03 de agosto à 02 de — Não, eu acho que...
setembro das 10 às 19h.) — É sim senhor!
Concordei que era, para não apanhar. O
Explique a importância da regra do acento
curioso, e o assustador, é que, em textos de
diferencial, baseando-se na frase – Juan
outros com sua assinatura e em tuiters fal-
Diego sensibiliza-se com os materiais [...] e
sos, você passa a ter uma vida paralela den-
lhes da vida com uma naturalidade impres-
tro das fronteiras infinitas da internet.
sionante.
É outro você, um fantasma eletrônico com
opiniões próprias, muitas vezes antagônicas,
2. (Fgv) Nossa língua registra as palavras "es-
sobre o qual você não tem nenhum controle,
pectador" e "expectador". Explique a dife-
— Olha, adorei o que você escreveu sobre o
rença de sentido dessas palavras.
“Big Brother”. É isso aí!
— Não fui eu que...
3. (Fgv) Leia o texto.
— Foi sim!
"Cuidado com as palavras
(Luiz Fernando Veríssimo, http://oglobo.
Uma moça se preparou toda para ir ao ensaio globo.com, 30.01.2011. Adaptado.)
de uma escola de samba.
Chegando lá, um rapaz suado pede para dan- * voyeurismo: forma de curiosidade mórbida
çar e, para não arrumar confusão, ela aceita. com relação ao que é privativo, privado ou
Mas o rapaz suava tanto que ela já não estava íntimo.
suportando mais. Assim, ela foi se afastando
e disse: 4. (Uftm)
– Você sua, hein!!! a) O que o contraste das grafias Twitter e tui-
Ele puxou-a, lascou um beijo e respondeu: ter, em destaque no texto, revela sobre o
– Também vô sê seu, princesa!!!" ponto de vista do autor acerca desse meio de
(www.mundodaspiadas.com/ comunicação virtual?
arquivo/2006-2-1.html. Adaptado)

115
b) É correto afirmar que o autor reage com bom mensagens de muitos leitores): por que se
humor e resignação diante do fato de lhe acentua 'raízes', mas não se acentua 'raiz'?"
atribuírem a autoria de textos que não es- (www2.uol.com.br/linguaportuguesa/artigos.)
creveu? Justifique, transcrevendo e comen-
tando um ou mais trechos do texto. a) Considerando o contexto social, cultural e
ideológico, por que o erro do painel teve
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO grande repercussão?
b) Responda à pergunta que foi enviada ao pro-
COMPOSIÇÕES INFANTIS fessor Pasquale por seus leitores.
O comportamento
2. (Unesp) A questão toma por base uma pas-
O comportamento é uma coisa que a mamãe sagem do romance Canaã, de Graça Aranha
diz que não suporta o meu mas eu é que não (1868-1931), e uma tira de Henfil (1944-
entendo o dela. Uma hora ela me dá uma 1988).
porção de beijinhos, outra hora ela me põe
de castigo o dia todo. Uma vez ela diz que eu CANAÃ
sou tudo lá na vida dela, outra vez ela grita: – Hoje – disse Milkau quando chegaram a
"Que menino mais impossível, você vai ver um trecho desembaraçado da praia –, de-
só quando seu pai chegar!" Tem umas oca- vemos escolher o local para a nossa casa.
siões que ela chora muito porque não sabe – Oh! não haverá dificuldade, neste deserto,
mais o que fazer comigo e outras eu ouvo ela de talhar o nosso pequeno lote... – desden-
dizendo pras visitas que "o meu, felizmente, hou Lentz.
é muito bonzinho e muito carinhoso." Eu já – Quanto a mim, replicou Milkau, uma ligei-
desconfio que a mamãe é a médica e a monstra.
http://www.memoriaviva.com.br/ocruzeiro/ O
ra inquietação de vago terror se mistura ao
CRUZEIRO, 3 maio 1959. Acesso: abril 2007. prazer extraordinário de recomeçar a vida
pela fundação do domicílio, e pelas minhas
5. (Ufmg) REESCREVA esse texto, fazendo as próprias mãos... O que é lamentável nesta
adaptações necessárias para ajustá-lo à nor- solenidade primitiva é a intervenção inútil
ma padrão da língua escrita. do Estado...
– O Estado, que no nosso caso é o agrimensor
Felicíssimo...
E.O. Dissertativas – Não seria muito mais perfeito que a terra e
as suas coisas fossem propriedade de todos,
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) sem venda, sem posse?
– O que eu vejo é o contrário disto. É antes a
1. (Unifesp) O Museu da Língua Portuguesa venalidade de tudo, a ambição, que chama a
foi inaugurado em São Paulo, em março de ambição e espraia o instinto da posse. O que
2006. Na ocasião, houve um erro num pai- está hoje fora do domínio amanhã será a pre-
nel, conforme a imagem: sa do homem. Não acreditas que o próprio ar
que escapa à nossa posse será vendido, mais
tarde, nas cidades suspensas, como é hoje a
terra? Não será uma nova forma da expansão
da conquista e da propriedade?
– Ou melhor, não vês a propriedade tornar-
se cada dia mais coletiva, numa grande ânsia
de aquisição popular, que se vai alastrando e
que um dia, depois de se apossar dos jardins,
dos palácios, dos museus, das estradas, se
estenderá a tudo?... O sentimento da posse
morrerá com a desnecessidade, com a su-
pressão da ideia da defesa pessoal, que nele
tinha o seu repouso...
Sobre isso, Pasquale Cipro Neto escreveu: – Pois eu – ponderou Lentz –, se me fixar
"Na última segunda-feira, foi inaugurado na ideia de converter-me em colono, dese-
o Museu da Língua Portuguesa. Na terça, a jarei ir alargando o meu terreno, chamar a
imprensa deu destaque a um erro de acen- mim outros trabalhadores e fundar um novo
tuação presente num dos painéis do museu núcleo, que signifique fortuna e domínio...
(grafou-se 'raiz' com acento agudo no 'i'). Porque só pela riqueza ou pela força nos
Vamos ao que conta (e que foi objeto das emanciparemos da servidão.

116
– O meu quinhão de terra – explicou Milkau Tomando como referência o sistema ortográ-
– será o mesmo que hoje receber; não o am- fico, explique por que o cartunista Henfil,
pliarei, não me abandonarei à ambição, fica- ao aportuguesar, com intenção irônica, a ex-
rei sempre alegremente reduzido à situação pressão inglesa my brother, colocou o acento
de um homem humilde entre gente simples. agudo em Bróder.
Desde que chegamos, sinto um perfeito en-
cantamento: não é só a natureza que me se- 3. (Unesp)
duz aqui, que me festeja, é também a suave
contemplação do homem. Todos mostram a O QUE EU LHE DIZIA
sua doçura íntima estampada na calma das Não sei se é certo ou não o que eu li outro dia,
linhas do rosto; há como um longínquo af- Onde, já não me lembra, ó minha noiva ama-
astamento da cólera e do ódio. Há em todos da:
uma resignação amorosa... Os naturais da – “A posse faz perder metade da valia
terra são expansivos e alvissareiros da feli- À cousa desejada.”
cidade de que nos parecem os portadores...
Os que vieram de longe esqueceram as suas Não sei se após haver saciado no meu peito,
amarguras, estão tranquilos e amáveis; não Quando houver de possuir-te, esta ardente
há grandes separações, o próprio chefe troca paixão,
no lar o seu prestígio pela espontaneidade Eu sentirei em mim, de gozo satisfeito,
niveladora, que é o feliz gênio da sua raça. Menor o coração.
Vendo-os, eu adivinho o que é todo este País
– um recanto de bondade, de olvido e de paz. Sei que te amo, e a teus pés a minh’alma
Há de haver uma grande união entre todos, abatida
não haverá conflitos de orgulho e ambição, Beija humilde e feliz o grilhão que a tortura;
a justiça será perfeita; não se imolarão víti- Sei que te amo, e este amor é toda a minha
mas aos rancores abandonados na estrada vida,
do exílio. Todos se purificarão e nós também Toda a minha ventura.
nos devemos esquecer de nós mesmos e dos
Talvez haja entre mim que os passos te
nossos preconceitos, para só pensarmos nos
acompanho,
outros e não perturbarmos a serenidade de-
E a abelha que a zumbir vai procurar a flor,
sta vida...
(Graça Aranha. Canaã, 1996.) – Alma ou asas movendo – o mesmo fluido
estranho, seja instinto ou amor;

Talvez o que eu presumo irradiação divina,


Minha nobre paixão, meu fervoroso afeto,
Por sua vez o sinta o verme da campina,
O inseto ao pé do inseto...
(ALBERTO DE OLIVEIRA. Poesias - segunda série.
Rio de Janeiro: H. Garnier, 1906, p. 20-21.)

No terceiro verso da quarta estrofe, o eu-


poemático escreve “o mesmo fluido estra-
nho”. Considerando que o vocábulo “fluido”
foi adequadamente empregado, explique por
que o poeta não poderia ter usado a forma
acentuada “fluído”.

4. (Unesp) O acolhimento que dispensou aos


seus projetos o excelentíssimo senhor minis-
tro do Fomento Nacional, animou o russo a
improvisar novos processos que levantassem
a pecuária no Brasil. Xandu, com o cotovelo
direito sobre a mesa e a mão respectiva na
testa, considerava Bogóloff com espanto e
enternecido agradecimento.
– Ah! Doutor! disse ele. O senhor vai dar
uma glória imortal ao meu ministério.
– Tudo isso, Excelência, é fruto de longos e
acurados estudos.
Xandu continuava a olhar embevecido o russo
admirável; e este aduziu com toda convicção:

117
– Por meio da fecundação artificial, Excelên- Ergueu-se e trouxe Bogóloff até à porta do
cia, injectando germens de uma em outra gabinete, com o seu passo de reumático.
espécie, consigo cabritos que são ao mesmo Dentro de dias Grégory Petróvitch Bogóloff
tempo carneiros e porcos que são cabritos ou era nomeado diretor da Pecuária Nacional.
carneiros, à vontade. (Afonso Henriques de Lima Barreto. Numa e a Ninfa.)
Xandu mudou de posição, recostou-se na ca-
deira; e, brincando com o monóculo, disse: PREOCUPAÇÃO COM CIGARRO.
– Singular! O doutor vai fazer uma revolução QUE FAZER?
nos métodos de criar! Não haverá objecções Quando você acende um cigarro, acende
quanto à possibilidade, à viabilidade? também uma preocupação?
– Nenhuma, Excelência. Lido com as últimas Bem, se você anda preocupado mas gosta
descobertas da ciência e a ciência é infalível. muito de fumar, quem sabe você muda para
– Vai ser uma revolução!... um cigarro de baixos teores de nicotina e al-
– É a mesma revolução que a química fez na catrão?
agricultura. Penso assim há muitos anos, Quer uma ideia? Century.
mas não me tem sido possível experimentar Century é diferente dos outros cigarros de
os meus processos por falta de meios; en- baixos teores, por motivos fundamentais.
tretanto, em pequena escala já fiz. Century jogou lá embaixo a nicotina e o al-
– O quê? catrão, mas não acabou com seu prazer de
– Uma barata chegar ao tamanho de um rato. fumar.
– Oh! Mas... não tem utilidade. Isto só foi possível, evidentemente, graças
– Não há dúvida. Uma experiência ao meu a uma cuidadosa seleção de fumos do mais
alcance, mas, logo que tenha meios... alto grau de pureza e suavidade.
– Não seja essa a dúvida. Enquanto eu for E à competência do filtro especial High Air
ministro, não lhe faltarão. O governo tem Dilution, consagrado internacionalmente.
muito prazer em ajudar todas as tentativas Não é o cigarro sob medida para você tam-
nobres e fecundas para o levantamento das bém?
indústrias agrícolas. Pense nisto.
– Agradeço muito e creia-me que ensaiarei (Texto de publicidade de cigarros de
outros planos. Tenho outras ideias! início da década de 1980.)
– Outras? fez em resposta o Xandu.
No quinto parágrafo do texto de Lima Bar-
– É verdade. Estudei um método de criar
reto ocorre a palavra “germens”, paroxítona
peixes em seco.
terminada em “-ns”, que aparece grafada
– Milagroso! Mas ficam peixes?
corretamente sem nenhum acento gráfico.
– Ficam... A ciência não faz milagres. A cousa
Tomando por base esta informação,
é simples. Toda a vida veio do mar, e, devido
a) explique a razão pela qual se escreve no plu-
ao resfriamento dos mares e à sua concentra-
ral “germens” sem acento gráfico, enquanto
ção salina, nas épocas geológicas, alguns dos
a forma do singular “gérmen” recebe tal ac-
seus habitantes foram obrigados a sair para
ento.
a terra e nela criarem internamente, para a
b) apresente outro vocábulo de seu conheci-
vida de suas células, meios térmicos e sali-
mento em que se observa essa mesma dife-
nos iguais àqueles em que elas viviam nos rença de acentuação gráfica entre a forma do
mares, de modo a continuar perfeitamente
singular e a forma do plural.
a vida que tinham. Procedo artificialmente
da forma que a cega natureza procedeu,
eliminando, porém, o mais possível, o factor
tempo, isto é: provoco o organismo do peixe
a criar para a sua célula um meio salino e
térmico igual àquele que ele tinha no mar.
– É engenhoso!
– Perfeitamente científico.
Xandu esteve a pensar, a considerar um tem-
po perdido, olhou o russo insistentemente
por detrás do monóculo e disse:
– Não sabe o doutor como me causa admi-
ração o arrojo de suas ideias. São originais
e engenhosas e o que tisna um pouco essa
minha admiração, é que elas não partam de
um nacional. Não sei, meu caro doutor, como
é que nós não temos desses arrojos! Vivemos
terra à terra, sempre presos à rotina! Pode ir
descansado que a República vai aproveitar as
suas ideias que hão de enriquecer a pátria.

118
Gabarito comportamento, mas eu é que não entendo
o dela. Uma hora, ela me dá uma porção de
beijinhos; outra hora, põe-me de castigo. Em
algumas ocasiões, ela fala que eu sou tudo
E.O. Aprendizagem na vida dela, no entanto, em outras, ela grita
1. B 2. A 3. D 4. D 5. C comigo, fala que sou um menino impossível
e que, quando o meu pai chegar, verei que
6. A 7. A 8. B 9. C 10. A me acontecerá. Há umas ocasiões nas quais
ela chora muito por não saber o que fazer
comigo; em outras, eu a ouço dizer às visi-
E.O. Fixação tas que sou muito bonzinho e carinhoso. Por
isso, desconfio que a minha mãe seja a mé-
1. E 2. C 3. E 4. C 5. B
dica e a monstra.
6. A 7. B 8. B 9. C 10. B

E.O. Dissertativas
E.O. Complementar (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
1. D 2. C 3. B 4. B 5. A 1.
a) Por se tratar do museu da língua portu-
guesa.
E.O. Dissertativo b) A palavra "raiz" não deve ser acentuada
por ser uma oxítona terminada em "Z." –
1.
A falta de acento na forma tônica dá (verbo ra-iz.
dar) leva o leitor a ler a preposição "de" con- No caso de raízes, há o acento por haver
traída com o artigo "a", o que gera obscurida- um "i" tônico, formando hiato, sozinho
de e incoerência no texto e obriga o leitor a re- na sílaba - ra-í-zes.
ler o trecho, buscando descobrir-lhe o sentido. 2. A colocação de acento agudo na palavra
2.
ESPECTADOR é substantivo; denomina aque- “bróder” obedece à regra de acentuação das
le que presencia um fato, que observa algo palavras paroxítonas terminadas em “r”.
ou assiste a um espetáculo. 3. A forma acentuada da palavra fluído caracter-
EXPECTADOR é adjetivo ou substantivo; refe- iza o particípio do verbo fluir, e sua utilização
re-se àquele que se mantém na expectativa, não é adequada ao contexto do poema. Além
à espera de algo. disso, o texto é formado por quartetos rigoro-
3. samente metrificados, com estrofes de três
a) A moça quis dizer que o rapaz transpirava versos alexandrinos (ou dodecassílabos) e um
muito. O rapaz entendeu que ela estava hexassílabo. Para manter a regularidade mé-
manifestando o desejo de ser dele. trica, o poeta utilizou o substantivo “fluido”
b) O rapaz entendeu a frase da moça - "Você (com um ditongo, o que o caracteriza como
sua" – como se fosse "Vou ser sua". A uma palavra de duas sílabas). Dessa maneira,
confusão fonológica deveu-se ao fato de o verso apresenta a seguinte escansão:
o rapaz ter tomado a frase da moça pela Al/ma ou/a/sas/mo/ven/do o/mes/mo/flui/
pronúncia popular. do es/tra/nho
4. 4.
a) O destaque do termo “tuiter” enfatiza a a) Acentuam-se as palavras paroxítonas ter-
falta de prática do autor na rede social a mindadas em “-n” ; por isso, acentua-
que está associada a palavra inglesa “twit- se gérmen. As palavras terminadas em
ter” provocada pelo desinteresse que o au- “-ns”, porém, acentuam-se quando são
tor nutre por esse tipo de comunicação. oxítonas (parabéns, por exemplo). Ob-
b) Sim, Luís Fernando Veríssimo reage com serve-se que as palavras terminadas em
bom humor e resignação à autoria incor- “-ens” são quase sempre formas de plural
reta que lhe é atribuída. O fato de afirmar das palavras que, no singular, terminam
que concordou só para não ser submetido em “-em”. A regra de acentuação das oxí-
a violência física executada por uma se- tonas manda que elas sejam acentuadas
nhora confere humor ao texto e demonstra quando terminadas em “-em” seguido ou
a submissão do autor perante a situação. não de “-s”. Conclusão: a regra para acen-
tuar gérmen é uma e a que faz com que
5.
COMPOSIÇÕES INFANTIS não se acentue germens é outra.
Comportamento b) Hífen - hifens.

Minha mãe diz que não suporta o meu

119
COMO AMAR EPAS
PARA GOES SASS
REST TEMO I M PA
EINS MENT SSAA
TANT OAMA SSIM
eluz I S QU PASS
Q UEA EAME AMEM

MEMO M ORI OR I A
R I A A AMOR ASSA
F L O R DEMA SSI N
Aulas 7e8

Formação de palavras
Competências 1, 5 e 8
Habilidades 1, 2, 3, 4, 17, 26 e 27
Competência 1 – Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para
sua vida.
H1 Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como elementos de caracterização dos sistemas de comunicação.
H2 Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de comunicação e informação para resolver problemas sociais.
H3 Relacionar informações geradas nos sistemas de comunicação e informação, considerando a função social desses sistemas.
H4 Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação.
Competência 2 – Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) (LEM) como instrumento de acesso a informações e a outras
culturas e grupos sociais.
H5 Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM ao seu tema.
H6 Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus mecanismos como meio de ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e culturas.
H7 Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e seu uso social.
H8 Reconhecer a importância da produção cultural em LEM como representação da diversidade cultural e linguística.
Competência 3 – Compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da
identidade.
H9 Reconhecer as manifestações corporais de movimento como originárias de necessidades cotidianas de um grupo social.
H10 Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em função das necessidades cinestésicas.
Reconhecer a linguagem corporal como meio de interação social, considerando os limites de desempenho e as alternativas de adaptação para
H11
diferentes indivíduos.
Competência 4 – Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e
da própria identidade.
H12 Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos artistas em seus meios culturais.
H13 Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos.
H14 Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos.
Competência 5 – Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante
a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção.
H15 Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.
H16 Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário.
H17 Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional.
Competência 6 – Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da
realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação.
H18 Identificar os elementos que concorrem para a progressão temática e para a organização e estruturação de textos de diferentes gêneros e tipos.
H19 Analisar a função da linguagem predominante nos textos em situações específicas de interlocução.
H20 Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a preservação da memória e da identidade nacional
Competência 7 – Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas.
H21 Reconhecer em textos de diferentes gêneros, recursos verbais e não-verbais utilizados com a finalidade de criar e mudar comportamentos e hábitos.
H22 Relacionar, em diferentes textos, opiniões, temas, assuntos e recursos linguísticos.
H23 Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.
Reconhecer no texto estratégias argumentativas empregadas para o convencimento do público, tais como a intimidação, sedução, comoção,
H24
chantagem, entre outras.
Competência 8 – Compreender e usar a língua portuguesa como língua materna, geradora de significação e integradora da organização
do mundo e da própria identidade.
H25 Identificar, em textos de diferentes gêneros, as marcas linguísticas que singularizam as variedades linguísticas sociais, regionais e de registro.
H26 Relacionar as variedades linguísticas a situações específicas de uso social.
H27 Reconhecer os usos da norma padrão da língua portuguesa nas diferentes situações de comunicação.
Competência 9 – Entender os princípios, a natureza, a função e o impacto das tecnologias da comunicação e da informação na sua vida
pessoal e social, no desenvolvimento do conhecimento, associando-o aos conhecimentos científicos, às linguagens que lhes dão suporte,
às demais tecnologias, aos processos de produção e aos problemas que se propõem solucionar.
H28 Reconhecer a função e o impacto social das diferentes tecnologias da comunicação e informação.
H29 Identificar pela análise de suas linguagens, as tecnologias da comunicação e informação.
H30 Relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento que elas produzem
Estrutura das palavras
§§ Radical (morfema lexical): é a parte que tem significado e é comum às palavras cognatas, também
consideradas da mesma família.
Exemplos: terra; terreiro; terrestre; enterrar

§§ Vogal temática: é a vogal que aparece depois do radical, “ajudando” as palavras a receber outro signifi-
cado. Aparece nos verbos, definindo se são de 1a, 2a ou 3a conjugação.
Exemplo: amar = am + a + r, onde “am” é o radical, “a” é a vogal temática de 1a conjugação e “r” é a
desinência de infinitivo.

§§ Tema: é a junção do radical + vogal temática ou desinência nominal.


§§ Desinências: indicam gênero e número, para desinência nominal, e indicam tempo e pessoa, para desinên-
cia verbal. As desinências nominais caracterizam as variações de substantivos, adjetivos e certos pronomes
quanto ao gênero (masculino e feminino) e número (singular e plural). As desinências verbais indicam as va-
riações dos verbos em pessoa (1a, 2a ou 3a), número (singular e plural) e tempo (presente, passado e futuro).

§§ Afixos: são elementos que se juntam ao radical para formar novas palavras. Podem aparecer antes do
radical – prefixos – ou depois do radical – sufixos.

§§ Palavras primitivas: são aquelas que não derivam de outras.


Exemplos: pedra; noite

§§ Palavras derivadas: são aquelas que derivam de outras.


Exemplos: pedreiro; anoitecer

§§ Palavras simples: são aquelas que possuem apenas um radical.


Exemplos: couve; flor

§§ Palavras compostas: são aquelas que possuem mais de um radical.


Exemplo: couve-flor

Processos de formação
Basicamente, as palavras da língua portuguesa são formadas pelos processos de composição e derivação, mas
também por onomatopeia, neologismo e hibridismo.

Formação por composição


Nos processos de formação de palavras por composição, ocorre a junção de dois ou mais radicais. Palavras com
significados distintos formam uma nova palavra com um novo significado.
Exemplo: guarda (flexão do verbo guardar; sentinela) + roupa (vestuário) = guarda-roupa (mobiliário)
São dois os processos de formação por composição:

123
§§ Composição por justaposição: quando não ocorre a alteração fonética das palavras. A justaposição
também pode ocorrer por hifenização.
Exemplos: girassol (gira + sol); guarda-chuva (guarda + chuva)

Fonte: <http://veredasdalingua.blogspot.com.br/2011/09/processos-de-formacao-de-palavras-ii.html>. Acesso em 16/01/2017.

§§ Composição por aglutinação: quando ocorre alteração fonética, em decorrência da perda de elementos
das palavras.
Exemplos: aguardente (água + ardente); embora (em + boa + hora)

Formação por derivação


No processo de formação por derivação, a palavra primitiva (primeiro radical) sofre acréscimo de afixos. São cinco
os tipos de formação por derivação.
§§ Derivação prefixal: acréscimo de prefixo à palavra primitiva.
Exemplo: in-capaz
§§ Derivação sufixal: acréscimo de sufixo à palavra primitiva.
Exemplo: papel-aria
§§ Derivação parassintética: acréscimo simultâneo de prefixo e sufixo à palavra primitiva.
Exemplo: en-triste-cer
§§ Derivação regressiva: ocorre redução da palavra primitiva. Nesse processo, formam-se substantivos abs-
tratos por derivação regressiva de formas verbais.
Exemplo: ajuda (substantivo abstrato da derivação regressiva do verbo ajudar)
§§ Derivação imprópria: ocorre a alteração da classe gramatical da palavra primitiva.
Exemplos: (o) jantar – de verbo para substantivo; (um) Judas – de substantivo próprio para comum

Hibridismo
No processo de formação por hibridismo, as palavras compostas ou derivadas são constituídas por elementos
originários de línguas diferentes:
§§ grego + latim: automóvel e monóculo
§§ latim + grego: sociologia, bicicleta
§§ árabe + grego: alcaloide, alcoômetro
§§ tupi + grego: caiporismo
§§ africano + latim: bananal
§§ africano + grego: sambódromo
§§ francês + grego: burocracia

124
Neologismo

Fonte: <http://veredasdalingua.blogspot.com.br/2011/09/processos-de-formacao-de-palavras-ii.html>. Acesso em 16/01/2017.

Neologismo é o nome dado ao processo de criação de novas palavras ou palavras da própria língua portuguesa
que adquirem um novo significado. Exemplos:
§§ Originalmente, a palavra bonde significava certo veículo utilizado como meio de transporte. Hoje, na varie-
dade linguística utilizada por falantes inseridos no estilo do funk carioca, foi dado um novo significado para
a palavra bonde: turma, galera.
§§ É comum formar verbos a partir de palavras do meio da informática, como googlar (procurar no Google),
twittar (escrever no Twitter) ou resetar (de reset).

O grande escritor brasileiro João Guimarães Rosa, em sua literatura, criou tantos neologismos, que existe
um dicionário para todas as palavras inventadas por ele, o Dicionário Rosiano.

125
APLICAÇÃO NO COTIDIANO

TABELA:

A tabela abaixo traz os significados de alguns prefixos e radicais, alguns frequentemente usados no dia a dia.

Prefixos latinos
Prefixos Significados Exemplos
a-, ab-, abs- Afastamento, separação Abstenção, abdicar
a-, ad-, ar-, as- Aproximação, direção Adjunto, advogado, arribar, assentir
ambi- Ambiguidade, duplicidade Ambivalente, ambíguo
ante- Anterioridade Anteontem, antepassado
aquém- Do lado de cá Aquém-mar
bene-, bem- Excelência, bem Beneficente, benfeitor
bis-, bi- Dois, duas vezes, repetição Bípede, binário, bienal
com- (con-), co- (cor-) Companhia, contiguidade Compor, conter, cooperar
contra- Oposição Controvérsia, contraveneno
cis- Posição, aquém de Cisandino, Cisalpino
de-, des- Separação, privação, negação, Deportar, demente, descrer, decair, decrescer, demolir
movimento de cima para baixo
dis- Separação, negação Dissidência, disforme
e- ,em- ,em- Introdução, superposição Engarrafar, empilhar
e-, es-, ex- Movimento para fora, privação Emergir, expelir, escorrer, extrair, exportar, esvaziar, esconder, explodir
extra- Posição exterior, excesso Extraconjugal, extravagância
intra-, Posição interior Intrapulmonar, intravenoso
i-, im-, in- Negação, mudança Ilegal, imberbe, incinerar
infra- Abaixo, na parte inferior Infravermelho, infraestrutura,
intra-, intro- Movimento para dentro Imersão, impressão, inalar, intrapulmonar, introduzir
justa- Posição ao lado Justalinear, justapor
o-, ob- Posição em frente, oposição Obstáculo, obsceno, opor, ocorrer
per- Movimento através de Perpassar, pernoite
pos- Ação posterior, em seguida Pós-datar, póstumo
pre- Anterioridade, superioridade Pré-natal, predomínio
pro- Antes, em frente, intensidade Projetar, progresso, prolongar
preter-, pro- Além de, mais para frente Prosseguir
re- Repetição, para trás Recomeço, regredir
retro- Movimento mais para trás Retrospectivo

126
Prefixos gregos
Prefixos Significados Exemplos
acro- Alto Acrobata, acrópole
aero- Casa Aerodinâmica
agro- Campo Agrônomo, agricultura
antropo- Homem Antropofagia, filantropo
homo- Igual Homônimo, homógrafo
idio- Próprio Idioma, idioblasto
macro-, megalo- Grande, longo Macronúcleo, megalópole
metra- Mãe, útero Endométrio, metrópole
meso- Meio Mesóclise, mesoderma
micro- Pequeno Micróbio, microscópio
mono- Um Monarquia, monarca
necro- Morto Necrópole, necrofilia, necropsia
nefro- Rim Nefrite, nefrologia
odonto- Dente Odontalgia, odontologia
oftalmo- Olho Oftalmologia, oftalmoscópio
onto- Ser, indivíduo Ontologia
orto- Correto Ortópteros, ortodoxo, Ortodontia
pneumo- Pulmão Pneumonia, dispneia

127
Radicais gregos
Prefixos Significados Exemplos
-agogo O que conduz Demagogo, pedagogo
-alg, -algia Sofrimento, dor Analgésico, cefalalgia, lombalgia
-arca O que comanda Monarca, heresiarca
-arquia Comando, governo Anarquia, autarquia, monarquia
-cracia Autoridade, poder Aristocracia, plutocracia, gerontocracia
-doxo Que opina Paradoxo, heterodoxo
-dromo Corrida, pista Hipódromo
-fagia Ato de comer Antropofagia, necrofagia
-fago Que come Antropófago, necrófago
-filo, -filia Amigo, amizade Bibliófilo, xenófilo, lusofilia
-fobia Inimizade, ódio, temor Xenofobia
-fobo Aquele que odeia Xenófobo, hidrófobo
-gamia Casamento Monogamia, poligamia
-gene Que gera, origem Heterogéneo, alienígena
-gênese Geração Esquizogênese, metagênese
-gine Mulher Andrógino, ginecóforo
-grafia Descrição, escrita Caligrafia, geografia
-gono Ângulo Pentágono, eneágono
-latria Que cultiva Idolatria
-log, -logia Que trata, estudo Psicólogo, andrologia
-mancia Adivinhação Cartomante, quiromancia
-mani Loucura, tendência Megalomaníaco
-mania Loucura, tendência Cleptomania
-metro Que mede Barômetro, termômetro
-morfo Forma, que tem a forma Amorfa, zoomórfico
-onimo Nome Sinônimo, topônimo
-polis, -pole Cidade Metrópole
-potamo Rio Mesopotâmia, hipopótamo
-ptero Asa Helicóptero
-scopia O que faz ver Endoscopia, telescópio
-sofia Sabedoria, saber Filosofia, teosofia
-soma Corpo Cromossomo
-stico Verso Monóstico, dístico
-teca Lugar, coleção Biblioteca, hemeroteca
-terapia Cura, tratamento Hidroterapia
-tomia Corte, divisão Vasectomia, anatomia
-topo lugar Topografia, topônimo
-tono Tom Barítono, monótono

128
Radicais latinos
Prefixos Significados Exemplos
aristo- Melhor Aristocracia
arqueo- Antigo Arqueologia, arqueólogo
anthos- Flor Antologia, crisântemo, perianto
atmo- Ar Atmosfera
auto- Mesmo, próprio Autoajuda, autômato
baro- Peso, pressão Barômetro, barítono
biblio- Livro Bibliófilo, biblioteca
bio- Vida Biologia, anfíbio
caco- Mau Cacofonia, cacoete
cali- Belo Caligrafia, calígrafo
carpo- Fruto Pericarpo
céfalo- Cabeça Cefalópodes, cefaleia, acéfalo
cito- Célula Citoplasma, citologia
copro- Fezes Coprologia, coprófagas
cosmo- Mundo Microcosmo, cosmonauta
crono- Tempo Cronômetro, diacrônico
dico- Em duas partes Dicotomia, dicogamia
eno- Vinho Enologia, enólogo
entero- Intestino Enterite, disenteria
etno- Povo Étnico, etnia, etnografia
filo-, filia- Amigo, amizade Filósofo, filantropia
fono- Som, voz Fonética, disfônica
gastro- Estômago Gastrite, gastronomia
hemo- Sangue Hemorragia, hemodiálise
hidro- Água Hidravião, hidratação
higro- Úmido Higrófito, higrômetro
hipo- Cavalo Hipódromo, hipopótamo
-ambulo Que anda Noctâmbulo, sonâmbulo
-cida Que mata Fraticida, inseticida
-cola Que habita Arborícola, silvícola
-cultura Que cultiva Triticultura, vinicultura
-evo Idade Longeva, longevidade
-fero Que contém ou produz Mamífero, aurífero
-fico Que faz ou produz Benéfico, maléfico
-forme Que tem a forma Cordiforme, uniforme
-fugo Que foge Vermífugo, centrífugo
-grado Grau, passo Centígrado
-luquo Que fala Ventríloquo

129
Prefixos gregos
Prefixos Significados Exemplos
-paro Que produz Ovíparo
-pede Pé Velocípede, bípede
-sono Que soa Uníssono
-vago Que vaga Noctívago
-voro Que come Carnívoro, herbívoro, onívoro

130
POEMA

Diversonagens suspersas (Paulo Leminski)

Neste poema, o autor joga com os diferentes sentidos produzidos por morfemas iguais ou semelhantes.

Meu verso, temo, vem do berço.


Não versejo porque eu quero,
versejo quando converso
e converso por conversar.
Pra que sirvo senão pra isto,
pra ser vinte e pra ser visto,
pra ser versa e pra ser vice,
pra ser a super-superfície
onde o verbo vem ser mais?

Não sirvo pra observar.


Verso, persevero e conservo
um susto de quem se perde
no exato lugar onde está.

Onde estará meu verso?


Em algum lugar de um lugar,
onde o avesso do inverso
começa a ver e ficar.
Por mais prosas que eu perverta,
não permita Deus que eu perca
meu jeito de versejar.
(Paulo Leminski, in: Toda Poesia)

132
ESTRUTURA CONCEITUAL

GRAMÁTICA
NORMATIVA

ESTUDO DOS PROCESSOS DE


MORFOLOGIA FORMAÇÃO DE PALAVRAS CLASSES DE
PALAVRAS

FORMAÇÃO DE PALAVRAS
ARTIGO
SUBSTANTIVO
ADJETIVO
VERBO
DERIVAÇÃO COMPOSIÇÃO ADVÉRBIO
PRONOME
NUMERAL
PREPOSIÇÃO
CONJUNÇÃO
FORMAÇÃO DE FORMAÇÃO DE INTERJEIÇÃO
PALAVRAS PALAVRAS
A PARTIR DE COM MAIS
UM ÚNICO RADICAL DE UM RADICAL

SUFIXAL
JUSTAPOSIÇÃO
PREFIXAL
AGLUTINAÇÃO
IMPRÓPRIA
REGRESSIVA
PARASSINTÉTICA

133
E.O. Aprendizagem A pipoca é um milho mirrado,subdesenvolvido.
Fosse eu agricultor ignorante, e se no meio
dos meus milhos graúdos aparecessem aque-
las espigas nanicas, eu ficaria bravo e tra-
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
taria de me livrar delas. Pois o fato é que,
A PIPOCA sob o ponto de vista do tamanho, os milhos
Rubem Alves da pipoca não podem competir com os mi-
lhos normais. Não sei como isso aconteceu,
A culinária me fascina. De vez em quando eu mas o fato é que houve alguém que teve a
até me até atrevo a cozinhar. Mas o fato é que ideia de debulhar as espigas e colocá-las
sou mais competente com as palavras que numa panela sobre o fogo, esperando que
com as panelas. Por isso tenho mais escrito assim os grãos amolecessem e pudessem ser
sobre comidas que cozinhado. Dedico-me a comidos. Havendo fracassado a experiência
algo que poderia ter o nome de “culinária com água, tentou a gordura. O que aconte-
literária”. Já escrevi sobre as mais variadas ceu, ninguém jamais poderia ter imaginado.
entidades do mundo da cozinha: cebolas, Repentinamente os grãos começaram a es-
ora-pro-nóbis, picadinho de carne com to- tourar, saltavam da panela com uma enorme
mate feijão e arroz, bacalhoada, suflês, so-
barulheira. Mas o extraordinário era o que
pas, churrascos. Cheguei mesmo a dedicar
acontecia com eles: os grãos duros quebra-
metade de um livro poético-filosófico a uma
-dentes se transformavam em flores brancas
meditação sobre o filme A festa de Babette,
e macias que até as crianças podiam comer.
que é uma celebração da comida como ritual
O estouro das pipocas se transformou, então,
de feitiçaria. Sabedor das minhas limitações
de uma simples operação culinária, em uma
e competências, nunca escrevi como chef.
festa, brincadeira, molecagem, para os risos
Escrevi como filósofo, poeta, psicanalista e
de todos, especialmente as crianças. É muito
teólogo – porque a culinária estimula todas
divertido ver o estouro das pipocas!
essas funções do pensamento.
E o que é que isso tem a ver com o candom-
As comidas, para mim, são entidades oníri-
blé? É que a transformação do milho duro em
cas. Provocam a minha capacidade de sonhar.
pipoca macia é símbolo da grande transfor-
Nunca imaginei, entretanto, que chegaria
mação porque devem passar os homens para
um dia em que a pipoca iria me fazer sonhar.
Pois foi precisamente isso que aconteceu. que eles venham a ser o que devem ser. O
A pipoca, milho mirrado, grãos redondos e milho da pipoca não é o que deve ser. Ele
duros, me pareceu uma simples molecagem, deve ser aquilo que acontece depois do es-
brincadeira deliciosa, sem dimensões me- touro. O milho da pipoca somos nós: duros,
tafísicas ou psicanalíticas. Entretanto, dias quebra-dentes, impróprios para comer, pelo
atrás, conversando com uma paciente, ela poder do fogo podemos, repentinamente,
mencionou a pipoca. E algo inesperado na nos transformar em outra coisa − voltar a
minha mente aconteceu. Minhas ideias co- ser crianças!
meçaram a estourar como pipoca. Percebi, Mas a transformação só acontece pelo poder
então, a relação metafórica entre a pipoca do fogo. Milho de pipoca que não passa pelo
e o ato de pensar. Um bom pensamento nas- fogo continua a ser milho de pipoca, para
ce como uma pipoca que estoura, de forma sempre. Assim acontece com a gente. As
inesperada e imprevisível. A pipoca se reve- grandes transformações acontecem quando
lou a mim, então, como um extraordinário passamos pelo fogo. Quem não passa pelo
objeto poético. Poético porque, ao pensar ne- fogo fica do mesmo jeito, a vida inteira. São
las, as pipocas, meu pensamento se pôs a dar pessoas de uma mesmice e dureza assombro-
estouros e pulos como aqueles das pipocas sas. Só que elas não percebem. Acham que
dentro de uma panela. o seu jeito de ser é o melhor jeito de ser.
Lembrei-me do sentido religioso da pipoca. Mas, de repente, vem o fogo. O fogo é quan-
A pipoca tem sentido religioso? Pois tem. do a vida nos lança numa situação que nun-
Para os cristãos, religiosos são o pão e o vi- ca imaginamos. Dor. Pode ser fogo de fora:
nho, que simbolizam o corpo e o sangue de perder um amor, perder um filho, ficar do-
Cristo, a mistura de vida e alegria (porque ente, perder um emprego, ficar pobre. Pode
vida, só vida, sem alegria, não é vida...). ser fogo de dentro. Pânico, medo, ansiedade,
Pão e vinho devem ser bebidos juntos. Vida depressão – sofrimentos cujas causas igno-
e alegria devem existir juntas. Lembrei-me, ramos. Há sempre o recurso aos remédios.
então, de lição que aprendi com a Mãe Stella, Apagar o fogo. Sem fogo o sofrimento di-
sábia poderosa do candomblé baiano: que a minui. E com isso a possibilidade da grande
pipoca é a comida sagrada do candomblé... transformação.

134
Imagino que a pobre pipoca, fechada dentro 1. (Efomm) No que tange ao processo de for-
da panela, lá dentro ficando cada vez mais mação de palavras, o termo destacado que se
quente, pense que sua hora chegou: vai mor- enquadra como formação-regressiva aparece
rer. De dentro de sua casca dura, fechada em na opção
si mesma, ela não pode imaginar destino a) As comidas, para mim, são entidades oní-
diferente. Não pode imaginar a transforma- ricas. Provocam a minha capacidade de so-
ção que está sendo preparada. A pipoca não nhar.
imagina aquilo de que ela é capaz. Aí, sem b) Um bom pensamento nasce como uma pipo-
aviso prévio, pelo poder do fogo, a grande ca que estoura, de forma inesperada e im-
transformação acontece: pum! − e ela apare- previsível.
ce como uma outra coisa, completamente di- c) É que a transformação do milho duro em pi-
ferente, que ela mesma nunca havia sonha- poca macia é símbolo da grande transforma-
do. É a lagarta rastejante e feia que surge do ção (...)
casulo como borboleta voante. d) O estouro das pipocas se transformou, en-
Na simbologia cristã o milagre do milho de tão, de uma simples operação culinária (...)
pipoca está representado pela morte e res- e) O milho da pipoca somos nós: duros, quebra-
surreição de Cristo: a ressurreição é o estou- -dentes, impróprios para comer (...)
ro do milho de pipoca. É preciso deixar de
ser de um jeito para ser de outro. “Morre e 2. (Cefet)
transforma-te!” − dizia Goethe.
Em Minas, todo mundo sabe o que é piruá. A INTERNET E A MORTE DA IMAGINAÇÃO
Falando sobre os piruás com os paulistas Jacques Gruman
descobri que eles ignoram o que seja. Al- “Nunca entendi essa obsessão por sorrisos em fotografias.
Deve ser um conluio com os dentistas.”
guns, inclusive, acharam que era gozação (Nora Tausz Rónai)
minha, que piruá é palavra inexistente. Che-
guei a ser forçado a me valer do Aurélio para Reza uma antiga lenda que dois reinos es-
confirmar o meu conhecimento da língua. tavam em guerra. Os perdedores acabaram
Piruá é o milho de pipoca que se recusa a condenados ao confinamento do outro lado
estourar. Meu amigo William, extraordinário dos espelhos, um primitivo mundo virtual em
professor-pesquisador da Unicamp, especia- que eram obrigados a reproduzir tudo o que
lizou-se em milhos, e desvendou cientifi- os vencedores faziam. A luta dos derrotados
camente o assombro do estouro da pipoca. passava a ser como escapar daquela prisão.
Com certeza ele tem uma explicação cientí- O genial Lee Falk inspirou-se nesta narrativa
fica para os piruás. Mas, no mundo da poe- para criar, na década de 1940, O mundo do
sia as explicações científicas não valem. Por espelho, para mim uma das mais aterrorizan-
exemplo: em Minas “piruá” é o nome que se tes histórias do Mandrake. Espelhos foram,
dá às mulheres que não conseguiram casar. aliás, protagonistas de algumas sequências
Minha prima, passada dos quarenta, lamen- cinematográficas assustadoras. Bóris Karlo-
tava: “Fiquei piruá!” Mas acho que o poder ff, um clássico do gênero, aproveitou muito
metafórico dos piruás é muito maior. Piruás bem o medo que, desde crianças carregamos,
são aquelas pessoas que, por mais que o fogo de que nossos reflexos nos espelhos ganhem
esquente, se recusam a mudar. Elas acham autonomia. Ui! Já imaginaram se isso virasse
que não pode existir coisa mais maravilhosa realidade? Teríamos de conviver com nossos
do que o jeito delas serem. Ignoram o dito de opostos, um estranhamento no mínimo des-
Jesus: “Quem preservar a sua vida perdê-la- confortável. Os quadrinhos exploraram o as-
-á.” A sua presunção e o seu medo são a dura sunto também na série do Mundo bizarro, do
casca do milho que não estoura. O destino Super-Homem. Era um nonsense pouco habi-
delas é triste. Vão ficar duras a vida inteira. tual no universo previsível dos super-heróis.
Não vão se transformar na flor branca macia. Estava pensando nos estranhamentos do
Não vão dar alegria para ninguém. Termina- mundo moderno quando me deparei com uma
do o estouro alegre da pipoca, no fundo da pequena nota de jornal. Encenava-se a ópera
panela ficam os piruás que não servem para Carmen, de Bizet, no Theatro Municipal do
nada. Seu destino é o lixo. Quanto às pipocas Rio. Suponho que a plateia, que pagou caro,
que estouraram, são adultos que voltaram a estava mergulhada na história e na interpre-
ser crianças e que sabem que a vida é uma tação da orquestra e dos solistas. Não é que
grande brincadeira... um cidadão saca seu iPad e passa um tempão
Disponível em http://www.releituras.com/rubemalves_ checando os e-mails, dedinhos nervosos para
pipoca.asp.
Acessado em 31 de mai. 2016. cima e para baixo, com a tela iluminando a
penumbra indispensável para a fruição plena
Obs.: O texto foi adaptado às regras do Novo do espetáculo? Como esse tipo de desrespeito
Acordo Ortográfico. está entrando na “normalidade”, apenas uma

135
pessoa esboçou reação. Uma espécie de an- em linha reta, que começa assim: “Nunca
gústia semelhante à incontinência urinária conheci quem tivesse levado porrada. Todos
se espalha como praga nas relações pessoais os meus conhecidos têm sido campeões em
e no uso dos espaços público e privado. Tudo tudo”. Mais adiante: “Arre, estou farto de se-
passou a ser urgente. Todos os torpedos, e- mideuses. Onde é que há gente nesse mun-
-mails e chamadas no celular viraram priori- do?”.
dade, casos de vida ou morte. Interrompem- A praga narcísica desembarcou nas camas.
-se conversas para olhar telinhas e telonas, Leio que nova moda é fazer selfies2 depois
desrespeitando interlocutores. Como este do sexo. O casal transa, mas isso não bas-
tipo de patologia tende a se diversificar, já há ta. É urgente compartilhar! Tira-se uma foto
gente que conversa e olha o computador ao da aparência de ambos, coloca-se no Insta-
mesmo tempo, como aqueles lagartos esquisi- gram e ... pronto. O mundo inteiro será tes-
tos cujos olhos se movimentam sem aparente temunha de um momento íntimo, talvez o
coordenação. Outros participam de reuniões mais íntimo de todos. Meu estranhamento
sem desligar sua tralha eletrônica (na verda- vai ao paroxismo. É a esse mundo que per-
de, não estão nas reuniões). Especialistas em tenço? Antigamente, era costume dizer que
informática previram que, num futuro não o que não aparecia na televisão não existia.
muito distante, chips serão implantados no Atualizando a frase: pelo visto, o que não
corpo. Estão atrasados. Corpos já pertencem está na rede não existe. É a universalização
a máquinas. A vida é controlada a distância do movimento apenas muscular, sem senti-
e por outros. do, leviano, rapidamente perecível.
Outro estranhamento vem da inundação de Durante o exílio, o poeta argentino Juan Gel-
imagens, aflição que chamo de galeria dos man passou um bom tempo sem conseguir
sem imaginação. Enxurradas de fotos inva- escrever. A inspiração não vinha. Disse ele:
dem o espaço virtual, a enorme maioria delas “A poesia é uma senhora que nos visita ou
sem o menor significado e perfeitamente des- não. Convocá-la é uma impertinência inútil.
cartáveis. O Instagram recebe 60 milhões de Durante uns bons quatro anos, o choque do
fotos por dia, ou seja, quase 700 fotos por se- exílio fez com que essa senhora não me visi-
gundo! Fico pensando no sorriso irônico ou, tasse”. Quando, finalmente, a senhora chega,
quem sabe, no horror em estado bruto, que tudo muda, como narra o poeta: “A visita é
Cartier-Bresson1 esboçaria se esbarrasse nis- como uma obsessão. Uma espécie de ruído
so. Ele, que procurava a poesia nos pequenos junto ao ouvido. Escrevo para entender o que
gestos, no cotidiano que se desdobrava em está acontecendo”. Não consigo imaginar
surpresas, nos reflexos impensados, jamais uma serenidade como essa no mundo vir-
empilharia a coleção de sorrisinhos forçados tual. Tudo nasce e morre antes de ser com-
que caracteriza a obsessão pelos clics. pletamente absorvido. Cada novidade passa
Essa história dos sorrisos foi muito bem no- a ser vital, filas se formam nas madrugadas
tada pela Nora Rónai, que citei logo no início. nas portas de lojas que começam a vender
Vivemos a era das aparências. Com a multipli- modelos mais avançados de produtos ele-
cação das imagens, vem a obrigação de “estar trônicos. Não dá pra esperar um dia, muito
bem”. Afinal de contas, quem vai querer se menos uma hora. O silêncio e a introspecção
exibir no Facebook ou nas trocas de mensa- são guerrilheiros no habitat plugado. Estou
gens com uma ponta de melancolia ou, pelo me alistando neste exército de Brancaleone.3
menos, um suspiro de realidade? O mundi- 1. Henri Cartier-Bresson: (França 1908-
nho virtual exige estado de êxtase perma- 2004), fotógrafo do século XX, considerado
nente. Uma persona que não passa de ilusão. por muitos como o pai do fotojornalismo.
Criatividade não quer dizer tristeza, claro, 2. fazer selfies: selfie é uma palavra em in-
mas certamente precisa incorporá-la como glês, um neologismo com origem no ter-
tijolo construtor da nossa personalidade. O mo self-portrait, que significa autorretra-
resto é fofoca. Eric Nepomuceno, tradutor e to, e é uma foto tirada e compartilhada
escritor, fez o seguinte comentário sobre seu na internet. Normalmente uma selfie é
amigo Gabriel Garcia Márquez, que acabara tirada pela própria pessoa que aparece na
de morrer: “Tudo o que ele escreveu é revela- foto, com um celular que possui uma câ-
dor da infinita capacidade de poesia contida mera incorporada, com um smartphone,
na vida humana. O eixo, porém, foi sempre por exemplo.
o mesmo, ao redor do qual giramos todos: a 3. O Incrível Exército de Brancaleone (em
solidão e a esperança perene de encontrar italiano: L’armata Brancaleone): é um fil-
antídotos contra essa condenação”. Nada me italiano de 1966, do gênero comédia.
que essas maquininhas onipresentes pos- Foi dirigido por Mario Monicelli. O Exér-
sam registrar, elas que jamais entenderiam cito de Brancaleone é considerado um
a fina ironia de Fernando Pessoa no Poema clássico italiano, que retrata os costumes

136
da cavalaria medieval através da comédia para sua sobrevivência. As mudanças de
satírica. É um filme inspirado em Dom comportamento social foram sempre prece-
Quixote, do espanhol Miguel de Cervan- didas de mudanças físicas de local. Por mais
tes. que a rua não seja um local para viver, já que
(Disponível em: <http://www.cartamaior.com.br/?/Opiniao/ se trata de um ambiente público, de passa-
A-morte-da-imaginacao/ gem e não de permanência, ela acaba sen-
30783>. Acesso em: 16 ago. 2014.) do, senão única, a mais viável opção. Alguns
pensadores já apontam que a habitação é um
O emprego do diminutivo nos termos em
ponto base e adquire uma importância para
destaque NÃO tem valor irônico em:
harmonizar a vida. O pensador Norberto Elias
a) “O mundinho virtual exige estado de êxtase
comenta que “o quarto de dormir tornou-se
permanente.”
uma das áreas mais privadas e íntimas da
b) “Os quadrinhos exploraram o assunto tam-
vida humana. Suas paredes visíveis e 37in-
bém na série do Mundo bizarro, do Super-
visíveis vedam os aspectos mais ‘privados’,
-Homem.”
‘íntimos’, irrepreensivelmente ‘animais’ da
c) “Nada que essas maquininhas onipresentes
nossa existência à vista de outras pessoas”.
possam registrar, elas que jamais entende-
O modo como essas pessoas 27constituem o
riam a fina ironia de Fernando Pessoa no Po-
único espaço que lhes foi permitido indica
ema em linha reta ...”
que conseguiram transformá-lo em “seu lu-
d) “Ele, que procurava a poesia nos pequenos
gar”, que aproximaram, cada um à sua ma-
gestos, no cotidiano que se desdobrava em neira, dois mundos nos quais estamos 32in-
surpresas, nos reflexos impensados, jamais seridos: o público e o privado.
empilharia a coleção de sorrisinhos força-
RODRIGUES, Robson. Moradores de uma terra
dos que caracteriza a obsessão pelos clics.” sem dono. (fragmento adaptado) In: http://
e) “Não é que um cidadão saca seu iPad e passa sociologiacienciaevida.uol.com.br/ESSO/edicoes/32/
um tempão checando os e-mails, dedinhos artigo194186-4.asp. Acesso em 21/8/2014.
nervosos para cima e para baixo, com a tela
iluminando a penumbra indispensável para a
fruição plena do espetáculo?” 3. (Pucrs) Analise as afirmações sobre o senti-
do e a formação das palavras no texto.
I. Há uma relação de sinonímia entre “res-
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO significam” (ref. 26) e “constituem” (ref.
27).
Responda a) questão com base no texto 1.
II. “calçadas” (ref. 28) está para “ruas” (ref.
29) assim como “cômodos” (ref. 30) está
TEXTO 1 para “casas” (ref. 31).
Entre o espaço público e o privado III. A relação entre “Excluídos” (ref. 12) e
12
Excluídos da sociedade, os moradores de “inseridos” (ref. 32) é a mesma que se
estabelece entre “individualização” (ref.
rua 26ressignificam o único espaço que lhes
33) e “separação” (ref. 34).
foi permitido ocupar, o espaço público,
IV. As palavras “intimidade” (ref. 35), “ina-
transformando-o em seu “lugar”, um espaço
bitável” (ref. 36) e “invisíveis” (ref. 37)
privado. Espalhados pelos ambientes cole-
têm o mesmo prefixo.
tivos da cidade, fazendo comida no asfalto,
Estão corretas apenas as afirmativas
arrumando suas camas, limpando as calça-
a) I e II.
das como se estivessem dentro de uma casa:
b) I e III.
assim vivem os moradores de rua. Ao andar
c) I e IV.
pelas ruas de São Paulo, vemos essas pessoas
d) II e III.
dormindo nas 28calçadas, passando por situa-
e) II, III e IV.
ções constrangedoras, pedindo esmolas para
sobreviver. Essa é a realidade das pessoas
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
que fazem da rua sua casa e nela constroem
sua 35intimidade. Assim, a ideia de 33indi- O que havia de tão revolucionário na Revolu-
vidualização que está nas 31casas, na 34se- ção Francesa? Soberania popular, liberdade
paração das coisas por 30cômodos e quartos civil, igualdade perante a lei – as palavras
que servem para proteger a intimidade do hoje são ditas com tanta facilidade que so-
indivíduo, ganha outro sentido. O viver nas mos incapazes de imaginar seu caráter ex-
29
ruas, um lugar aparentemente 36inabitável, plosivo em 1789. Para os franceses do An-
tem sua própria lógica de funcionamento, tigo Regime, os homens eram desiguais, e a
que vai além das possibilidades. desigualdade era uma boa coisa, adequada à
A relação que o homem estabelece com o es- ordem hierárquica que fora posta na natu-
paço que ocupa é uma das mais importantes reza pela própria obra de Deus. A liberdade

137
significava privilégio – isto é, literalmente, ( ) pressupostos (ref. 9)
12
“lei privada”, uma prerrogativa especial ( ) planejamento (ref. 10)
para fazer algo negado a outras pessoas. ( ) totalitarismo (ref. 11)
O rei, como fonte de toda a lei, distribuía 1. contém sufixo que forma substantivos a
privilégios, pois havia sido ungido como o partir de verbos
agente de Deus na terra. 2. contém prefixo com sentido de negação
Durante todo o século XVIII, os filósofos 3. contém prefixo que designa anteriorida-
do Iluminismo questionaram esses pressu- de
postos, e os panfletistas profissionais con- 4. contém sufixo que designa movimentos
seguiram empanar a aura sagrada da coroa. ideológicos
Contudo, a desmontagem do quadro mental
A sequência correta de preenchimento dos
do Antigo Regime demandou violência ico-
parênteses, de cima para baixo, é
noclasta, destruidora do mundo, revolucio-
a) 4 – 2 – 3 – 1.
nária.
b) 3 – 1 – 2 – 4.
Seria ótimo se pudéssemos associar a Revo-
c) 2 – 3 – 1 – 4.
lução exclusivamente à Declaração dos Direi-
d) 1 – 4 – 2 – 3.
tos do Homem e do Cidadão, mas ela nas-
e) 1 – 2 – 3 – 4.
ceu na violência e imprimiu seus princípios
em um mundo violento. Os conquistadores
da Bastilha não se limitaram a destruir um 5. (Ufrgs) Ao referir-se à ideia de “lei priva-
símbolo do despotismo real. Entre eles, 150 da” como uma explicação literal de privilé-
foram mortos ou feridos no assalto à prisão gio (ref. 12), o autor está fazendo referência
e, quando os sobreviventes apanharam o di- à origem latina dessa palavra, relacionada
retor, cortaram sua cabeça e desfilaram-na a algumas das formas que tomava, naque-
por Paris na ponta de uma lança. la língua, a palavra equivalente a lei – por
Como podemos captar esses momentos de exemplo, legis.
loucura, quando tudo parecia possível e o Considere as seguintes palavras do portu-
mundo se afigurava como uma tábula rasa, guês.
apagada por uma onda de comoção popular 1. legal
e pronta para ser redesenhada? Parece in- 2. legião
crível que um povo inteiro fosse capaz de se 3. legítimo
levantar e transformar as condições da vida 4. legível
cotidiana. Duzentos anos de experiências Quais têm também relação semântica com a
com admiráveis mundos novos tornaram-nos palavra lei, revelando, por sua forma, a ori-
céticos quanto ao planejamento social. Re- gem latina?
trospectivamente, a Revolução pode parecer a) Apenas 1 e 3.
um prelúdio ao totalitarismo. b) Apenas 1, 3 e 4.
Pode ser. Mas um excesso de visão histórica c) Apenas 2 e 3.
retrospectiva pode distorcer o panorama de d) Apenas 2 e 4.
1789. Os revolucionários franceses não eram e) 1, 2, 3 e 4.
nossos contemporâneos. E eram um conjunto
de pessoas não excepcionais em circunstân- 6. (Cefet) NO MUNDO DOS ANIMAIS
cias excepcionais. Quando as coisas se desin-
As relações entre os humanos e as demais
tegraram, eles reagiram a uma necessidade
espécies viventes têm merecido a atenção de
imperiosa de dar-lhes sentido, ordenando a
escritores, artistas e intelectuais. Essas rela-
sociedade segundo novos princípios. Esses
ções, que não primam pela ética, são o objeto
princípios ainda permanecem como uma de-
de estudo da professora e escritora mineira
núncia da tirania e da injustiça. Afinal, em Maria Esther Maciel.
que estava empenhada a Revolução France- Quando os estudos sobre “animais e literatu-
sa? Liberdade, igualdade, fraternidade. ra” passaram a ser feitos de modo sistemá-
Adaptado de: DARNTON, Robert. O beijo de Lamourette.
tico no Brasil?
In: ____. O beijo de Lamourette: mídia, cultura e
revolução. São Paulo: Cia. das Letras, 2010. p. 30-39. Maria Esther Maciel: Só recentemente; an-
tes, havia trabalhos esparsos. Além disso, a
abordagem se circunscrevia à visão do ani-
4. Na coluna acima, estão quatro palavras reti- mal como símbolo, metáfora ou alegoria
radas do texto; na coluna abaixo, descrições do humano, mais restrita à análise textual.
relacionadas à formação dessas palavras. Hoje, percebe-se uma ampliação desse enfo-
Associe corretamente a coluna da esquerda que, que deixa os limites do texto literário
à da direita. para ganhar um viés transdisciplinar, em di-
( ) desiguais (ref. 8) álogo com a filosofia, biologia, antropologia,

138
psicologia. Aliás, esse entrelaçamento de libertário, manifestando cumplicidade com
saberes em torno da questão animal cresceu esses outros viventes e a recusa da violência
em várias partes do mundo, propiciando a contra humanos e não humanos. Já os es-
difusão de um novo campo de investigação critores do final do século 20 e início do 21
crítica denominado “estudos animais”. A li- lidam com a questão dos animais sob o peso
teratura tem conquistado espaço importante de uma realidade marcada por catástrofes
nesse campo, graças sobretudo a escritores/ ambientais, extinção de espécies, experiên-
pensadores como John M. Coetzee, John Ber- cias biotecnológicas, expansão das granjas e
ger e Jacques Derrida, que souberam aliar, fazendas industriais etc.
de modo criativo, literatura, ética e política Como a senhora vê o futuro dos animais?
no trato da questão animal. Pelo jeito como as coisas andam, preocupo-
Como a senhora explica esse interesse cres- -me com a possibilidade de os animais livres
desaparecerem da face da Terra. Ficariam
cente pelo tema?
apenas os bichos criados em reservas e ca-
Há um conjunto de fatores. Impossível não
tiveiros, os expostos em zoológicos, os “pro-
considerar as preocupações de ordem eco-
duzidos” em granjas e fazendas industriais
lógica, que movem a sociedade contempo-
para viver uma vida infernal e morrer logo
rânea. Há também uma tomada de consci- depois, além dos animais domésticos, ades-
ência mais explícita por parte de escritores, trados e humanizados ao extremo.
artistas e intelectuais dos problemas éticos Há quem diga que até mesmo estes estão fa-
que envolvem nossa relação com os animais dados a desaparecer, dando lugar a animais-
e com o próprio conceito de humano. Além -robôs, que já existem no Japão.
disso, a noção de espécie e a divisão hierár- A humanidade tem destruído florestas, di-
quica dos viventes têm provocado discussões zimado povos indígenas, exterminado es-
ético-políticas relevantes, que acabam por pécies animais. Apesar da preocupação de
contaminar as artes e a literatura. A isso se ativistas com o destino do planeta, falta em-
soma a tentativa, por parte dos humanos, de penho político dos governos para frear essa
recuperar sua própria animalidade, que por destruição generalizada.
muito tempo foi reprimida em nome da ra- Minha utopia é que a humanidade possa um
zão e do antropocentrismo. dia fazer mea-culpa em relação aos crimes
Por que é importante para a humanidade re- já cometidos contra os índios, os animais, a
fletir sobre a animalidade? natureza. Mas, pelo que vejo, essa questão
Ao refletir sobre a animalidade, a humani- continuará a ser um grande desafio ético e
dade pode repensar o próprio conceito de político para a nossa civilização.
humano e reconfigurar a noção de vida. Por Seus estudos sobre animalidade a influen-
muito tempo, nosso lado animal foi recalca- ciaram em seu modo de vida?
do em nome da razão e de outros atributos Não consigo desvincular o trabalho do meu
tidos como próprios do homem. Quem ler modo de vida. Se cheguei ao tema dos ani-
os tratados de filosofia e teologia escritos mais, foi por causa do meu apreço por eles.
ao longo dos séculos verá que a definição Há anos não como carne, por causa da me-
de humano e humanidade se forjou à cus- mória do tempo em que passava temporadas
ta da negação da animalidade humana e da na fazenda do meu pai, no interior de Minas
exclusão/marginalização dos demais seres Gerais. Vivia perto de vacas, porcos, aves, ca-
que compartilham conosco o que chamamos valos, cachorros. Toda vez que via carne de
de vida. Acho que os humanos precisam se vaca na mesa, me lembrava do olhar bovi-
reconhecer animais para se tornarem verda- no. Já a visão da carne de porco me trazia a
deiramente humanos. imagem dos porquinhos espertos e afetuosos
É possível identificar modos diferentes de com que eu brincava. Foi assim também com
“explorar” a figura do animal na produção as aves, os coelhos e outros bichos. Como
literária? fui sempre muito tocada pelo olhar animal,
Na literatura brasileira, podemos falar de decidi não comê-los mais. Ainda mantive
três momentos incisivos. No primeiro, está peixes e frutos do mar, mas deixei de comer
Machado de Assis, que escreveu no auge várias espécies ao saber de seus hábitos.
do racionalismo cientificista do século 19, Recuso também ovos de granja, em repúdio
quando os princípios cartesianos já tinham à situação absurda das aves nos espaços de
legitimado no Ocidente a cisão entre huma- confinamento das fazendas industriais. Meu
nos e não humanos, e os animais eram vis- projeto de vida, certamente influenciado por
tos como máquinas. No século 20, a partir meus estudos, é parar de consumir também
dos anos 30, autores como Graciliano Ramos, carne de peixe. Chegarei lá.
João Alphonsus, Guimarães Rosa e Clarice
(MACIEL, Maria Esther. No mundo dos animais.
Lispector marcam um novo momento, ao li- Entrevista a Roberto B. de Carvalho. Ciência Hoje,
dar, cada um a seu modo, com as relações 21 nov. 2012. Disponível em <http://cienciahoje.
entre homens e animais sob um enfoque uol.com.br>. Acesso em: 05 nov. 2013.)

139
Entre os vocábulos extraídos do texto, aquele o considerava “essencialmente esquisito” e
no qual a sílaba “re” funciona como um pre- “estranhamente falho como ser humano”, e
fixo que traduz ideia de repetição é se sentia desconcertado com a grosseria de
a) “recusa”. Jobs e sua tendência a funcionar “ora no
b) “refletir”. modo de dizer que você era um merda, ora
c) “recuperar”. no de tentar seduzi-lo”. Jobs, por sua vez,
d) “relevantes”. via em Gates uma estreiteza enervante.
e) “reconfigurar”. Suas diferenças de temperamento e persona-
lidade iriam levá-los para lados opostos da
linha fundamental de divisão na era digital.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
Jobs era um perfeccionista que adorava estar
GATES E JOBS no controle e se comprazia com sua índole
Quando as órbitas se cruzam intransigente de artista; ele e a Apple se
tornaram exemplos de uma estratégia digi-
Em astronomia, quando as órbitas de duas tal que integrava solidamente o hardware, o
estrelas se entrecruzam por causa da inte- software e o conteúdo numa unidade indis-
ração gravitacional, tem-se um sistema bi- sociável. Gates era um analista inteligente,
nário. Historicamente, ocorrem situações calculista e pragmático dos negócios e da
análogas quando uma era é moldada pela tecnologia; dispunha-se a licenciar o softwa-
relação e rivalidade de dois grandes astros re e o sistema operacional da Microsoft para
orbitando: Albert Einstein e Niels Bohr na um grande número de fabricantes.
física no século XX, por exemplo, ou Thomas Depois de trinta anos, Gates desenvolveu
Jefferson e Alexander Hamilton na condução um respeito relutante por Jobs. “De fato, ele
inicial do governo americano. Nos primeiros nunca entendeu muito de tecnologia, mas ti-
trinta anos da era do computador pessoal, a nha um instinto espantoso para saber o que
partir do final dos anos 1970, o sistema es- funciona”, disse. Mas Jobs nunca retribuiu
telar binário definidor foi composto por dois valorizando devidamente os pontos fortes de
indivíduos de grande energia, que largaram Gates. “Basicamente Bill é pouco imaginati-
os estudos na universidade, ambos nascidos vo e nunca inventou nada, e é por isso que
em 1955. acho que ele se sente mais à vontade agora
Bill Gates e Steve Jobs, apesar das ambições na filantropia do que na tecnologia”, disse
semelhantes no ponto de convergência da Jobs, com pouca justiça. “Ele só pilhava des-
tecnologia e dos negócios, 5tinham origens pudoradamente as ideias dos outros.”
bastante diferentes e personalidades radi- (ISAACSON, Walter. Steve Jobs: a biografia. São Paulo:
calmente distintas. Companhia das Letras, 2011. p. 189-191. Adaptado)
À diferença de Jobs, Gates entendia de pro-
gramação e tinha uma mente mais prática,
mais disciplinada e com grande capacidade
de raciocínio analítico. Jobs era mais intui-
tivo, romântico, e dotado de mais instinto
para tornar a tecnologia usável, o design
agradável e as interfaces amigáveis. Com sua
mania de perfeição, era extremamente exi-
gente, além de administrar com carisma e
intensidade indiscriminada. Gates era mais
metódico; as reuniões para exame dos pro-
dutos tinham horário rígido, e ele chegava
ao cerne das questões com uma habilidade
ímpar. Jobs encarava as pessoas com uma in-
tensidade cáustica e ardente; Gates às vezes
não conseguia fazer contato visual, mas era
essencialmente bondoso.
“Cada qual se achava mais inteligente do 7. (Epcar (Afa)) Assinale a opção correta
que o outro, mas Steve em geral tratava Bill quanto à análise das palavras abaixo, em
como alguém levemente inferior, sobretu- destaque, retiradas do texto
do em questões de gosto e estilo”, diz Andy a) Os termos indissociável e intransigente são
Hertzfeld. “Bill menosprezava Steve porque formadas somente pelo processo de deriva-
ele não sabia de fato programar.” Desde o co- ção prefixal.
meço da relação, 6Gates ficou fascinado por b) As palavras ímpar e saída seguem a regra de
Jobs e com uma ligeira inveja de seu efei- acentuação gráfica das vogais i e u tônicas
to hipnótico sobre as pessoas. Mas também

140
dos hiatos. tradições. (...)
c) Na frase, “... tinham... personalidades radi- O que cola mesmo aqui são os ensinamentos
calmente distintas.” (ref. 5), o termo distin- de líderes como o ex-presidente (gozado, o
tas é sinônimo de notáveis. “ex” enganchou aqui no teclado, quase não
d) Nas palavras destacadas em “... Gates ficou sai), que, em várias ocasiões, torceu o na-
fascinado por Jobs e com uma ligeira inve- riz para denúncias de corrupção e disse que
ja de seu efeito hipnótico...” (ref. 6), há, aqui era assim mesmo, sempre tinha sido
respectivamente, dígrafo, dígrafo e encontro feito assim e não ia mudar a troco de nada.
consonantal. E assumia posturas coerentes com esse pon-
to de vista. (...)
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO Contudo, quando se descobre mais um caso
Reforma na corrupção de corrupção, a vida republicana fica bagun-
çada, as coisas não andam, perde-se trabalho
Como previsto, já arrefece o mais recente em investigações, gasta-se tempo prendendo
debate sobre corrupção. Ainda se discute, e soltando gente e a imprensa, que só serve
sem muito entusiasmo, a absolvição de uma para atrapalhar, fica cobrando explicações,
deputada que foi filmada recebendo um 3di- embora já saibamos que explicações serão:
nheirinho suspeito, mas isso aconteceu an- primeiro desmentidos e em seguida pro-
tes de ela ser deputada, de maneira que não messas de pronta e cabal investigação, com
vale. Além da forte tendência de os parla- a consequente punição dos culpados. Não
mentares não punirem os seus pares, havia acontece nada e perdura essa situação mo-
o risco do precedente. Não somente o voto é nótona, que às vezes paralisa o País.
indecentemente secreto nesses casos, como A realidade se exibe diante de nós e não a
o precedente poderia xpor os pescoços de vemos. Em lugar de querer suprimir nossas
vários outros deputados. O que o deputado práticas seculares, que hoje tanto prosperam,
faz enquanto não é deputado não tem im- por que não aproveitá-las em nosso favor?
portância, mesmo que ele seja tesoureiro dos (...) O brasileiro preocupado com o assunto
ladrões de Ali Babá. já pode sonhar com uma corrupção moderna,
Aliás, me antecipando um pouco ao que pre- dinâmica e geradora de empregos e renda.
tendo propor, me veio logo uma ideia prática E não pensem que esqueci as famosas clas-
para acertar de vez esse negócio de deputa- ses menos favorecidas, como se dizia antiga-
do cometendo crimes durante o exercício do mente. O mínimo que antevejo é o programa
mandato. Às vezes – e lembro que errar é hu- Fraude Fácil, em que qualquer um poderá
mano – o sujeito comete esses 2crimezinhos habilitar-se ao exercício da boa corrupção,
distraído. Esquece, em perfeita boa-fé, que em seu campo de ação favorito. Acho que dá
exerce um mandato parlamentar e aí perpe- certo, é só testar. E ficar de olho, para não
tra a falcatrua. Fica muito chato para ele, se deixar que algum corrupto corrupto passe a
ele for flagrado, e seus atos podem sempre mão no fundo todo, assim também não vale.
vir à tona, expostos pela imprensa impatrió- João Ubaldo Ribeiro, O Estado de São Paulo. Disponível em:
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,reforma-
tica. Não é justo submeter o deputado a essa na-corrupcao,768238,0.htm. Acesso em: 04-9-2011.
tensão permanente, afinal de contas, ele é
gente como nós.
8. (Upf) O autor fala em “crimezinhos” (ref.
Minha ideia, como, modéstia à parte, costu-
2), repetindo uma estratégia já usada, quan-
mam ser as grandes ideias, é muito simples:
do se refere a “dinheirinho” (ref. 3). No
os deputados usariam uniforme. Não daria
contexto em que aparecem, as duas ocorrên-
muito trabalho contratar (com dispensa de
cias de diminutivo:
licitação, dada a urgência do projeto), um
a) Representam uma minimização do destaque
estúdio de alta-costura francês ou italiano,
que a mídia tem dado aos episódios de cor-
ou ambos, para desenhar esse uniforme.
rupção.
Imagino que seriam mais de um: o de traba-
b) Indicam a versão daquele que é flagrado
lho, usado só excepcionalmente, o de gala, o
em situações comprometedoras, tentando
de visitar eleitores e assim por diante. En-
livrar-se do peso da infração.
quanto estiver de uniforme, o deputado é
c) Marcam a ironia em relação aos corruptos,
responsabilizado pelos seus atos ilícitos ou
que exploram a boa-fé do eleitor com vistas
indecorosos. Mas, se estiver à paisana, não
à sua promoção pessoal.
se encontra no exercício do mandato e, por-
d) Deixam implícita a informação de que não se
tanto, pode fazer o que quiser. (...)
deve confiar nos dados apresentados pelos
Mas isso é um mero detalhe, uma providên-
envolvidos em escândalos financeiros.
cia que melhor seria avaliada no conjunto
e) Denotam a avaliação do autor acerca da im-
de uma reforma séria, que levasse em con-
portância dos crimes perpetrados contra os
ta nossas características culturais e nossas
cofres públicos.

141
9. (IFSP) No português, encontramos varieda- estudo publicado ontem no periódico cien-
des históricas, tais como a representada na tífico Journal of Investigative Dermatology,
cantiga trovadoresca de João Garcia de Gui- no entanto, identificou um mecanismo mo-
lhade, ilustrada a seguir. lecular em células da pele que pode estar por
trás deste processo, abrindo caminho para o
Non chegou, madre, o meu amigo, desenvolvimento de novos tratamentos para,
e oje est o prazo saido! se não impedir, pelo menos retardar o enve-
Ai, madre, moiro d’amor! lhecimento delas e, talvez, as de outros teci-
Non chegou, madre, o meu amado, dos e órgãos do corpo.
e oje est o prazo passado! Na pesquisa, cientistas da Universidade
Ai, madre, moiro d’amor! de Newcastle, no Reino Unido, analisaram
amostras de células da pele de vinte e sete
E oje est o prazo saido! doadores com entre seis eanos, tiradas de
Por que mentiu o desmentido? locais protegidos do Sol, para determinar
Ai, madre, moiro d’amor! se havia alguma diferença no seu compor-
tamento com a idade. Eles verificaram que,
E oje, est o prazo passado!
quanto mais velha a pessoa, menor era a
Por que mentiu o perjurado?
atividade de suas mitocôndrias, as “4usinas
Ai, madre, moiro d’amor!
de energia” de nossas células. Essa queda,
Considerando a terceira estrofe, assinale a porém, era esperada, já que há décadas a re-
alternativa que apresenta uma palavra for- dução na capacidade de geração de energia
mada por parassíntese. por essas 7organelas celulares e na sua efi-
a) desmentido ciência neste trabalho com o tempo é uma
b) prazo das principais vertentes nas teorias sobre
c) saido envelhecimento.
d) d’amor /.../
e) moiro (BAIMA, César. O Globo, 27 de fev. 2016, p. 24.)

Ao abordar um tema científico em um jor-


1
0. (UFSM) Leia o fragmento a seguir.
nal, é comum a prática de empregar recur-
[...] a capoeira, a guardiã do jogo, da 7brin- sos para torná-lo mais acessível e, portanto,
cadeira, do faz de conta que 8luta, mas joga mais atraente aos leitores comuns, não acos-
com o outro, que simula um 9golpe e tira 4o tumados ao discurso científico. Observa-se
outro para dançar e que tem uma vincula- que o texto “Promessa contra sinais da ida-
ção étnica e racial com o percurso e o lugar de”, com tal finalidade, apresenta os seguin-
da negritude em nosso país, acabou, em al- tes recursos, EXCETO:
gumas escolas, ensinada sob o 10controle da a) emprego de título chamativo, cuja ideia de
11
esportivização, com regras e pontuações. uma “promessa” contra o envelhecimento
(Orientações Curriculares para o Ensino Médio. funciona como elemento de persuasão para
Secretaria de Educação Básica. Brasília: Ministério os leitores.
da Educação, v. 1, 2008, p. 231.) b) introdução narrativo-descritiva – conside-
O substantivo que, formado com o auxílio de rando os dois períodos iniciais do texto –,
um sufixo, conota no fragmento um processo com a finalidade de situar o tema como pre-
desvantajoso à prática da capoeira na escola é sente na realidade do leitor.
a) brincadeira (ref. 7). c) utilização da metáfora “usinas de energia”
b) luta (ref. 8). (ref. 4) para explicar, de maneira simbólica e
c) golpe (ref. 9). mais acessível, a atividade das mitocôndrias.
d) controle (ref. 10). d) uso do diminutivo com sentido afetivo no
e) esportivização (ref. 11). termo “organelas” (ref. 7), com o objetivo
de criar proximidade entre o leitor e o tema.

E.O. Fixação 2. (Efomm) FELICIDADE CLANDESTINA


(Clarice Lispector)

Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos


1. (Epcar) PROMESSA CONTRA SINAIS DA IDADE
excessivamente crespos, meio arruivados.
O tempo passa, e com ele os sinais da ida- Tinha um busto enorme, enquanto nós to-
de vão se espalhando pelo nosso organismo. das ainda éramos achatadas. Como se não
Entre eles, os mais evidentes ficam estam- bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por
pados em nossa pele, e rostos, na forma de cima do busto, com balas. Mas possuía o que
rugas, flacidez e perda de elasticidade. Um qualquer criança devoradora de histórias

142
gostaria de ter: um pai dono de livraria. Ela sabia que era tempo indefinido, enquan-
Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até to o fel não escorresse todo de seu corpo
para aniversário, em vez de pelo menos um grosso. Eu já começara a adivinhar que ela
livrinho barato, ela nos entregava em mãos me escolhera para eu sofrer, às vezes adivi-
um cartão-postal da loja do pai. Ainda por nho. Mas, adivinhando-me mesmo, às vezes
cima era de paisagem do Recife mesmo, onde aceito: como se quem quer me fazer sofrer
morávamos, com suas pontes mais do que esteja precisando danadamente que eu sofra.
vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa,
palavras como “data natalícia” e “saudade”. sem faltar um dia sequer. Às vezes ela dizia:
Mas que talento tinha para a crueldade. Ela pois o livro esteve comigo ontem de tarde,
toda era pura vingança, chupando balas com mas você só veio de manhã, de modo que o
barulho. Como essa menina devia nos odiar, emprestei a outra menina. E eu, que não era
nós que éramos imperdoavelmente boniti- dada a olheiras, sentia as olheiras se cavan-
nhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. do sob os meus olhos espantados.
Comigo exerceu com calma ferocidade o seu Até que um dia, quando eu estava à porta
sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem no- de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa
tava as humilhações a que ela me submetia: a sua recusa, apareceu sua mãe. Ela devia
continuava a implorar-lhe emprestados os estar estranhando a aparição muda e diária
livros que ela não lia. daquela menina à porta de sua casa. Pediu
Até que veio para ela o magno dia de come- explicações a nós duas. Houve uma confusão
çar a exercer sobre mim uma tortura chi- silenciosa, entrecortada de palavras pouco
nesa. Como casualmente, informou-me que elucidativas. A senhora achava cada vez mais
possuía As reinações de Narizinho, de Mon- estranho o fato de não estar entendendo.
teiro Lobato. Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se
Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para a filha e com enorme surpresa excla-
para se ficar vivendo com ele, comendo-o, mou: mas este livro nunca saiu daqui de casa
dormindo-o. E completamente acima de mi- e você nem quis ler!
nhas posses. Disse-me que eu passasse pela E o pior para essa mulher não era a desco-
sua casa no dia seguinte e que ela o empres- berta do que acontecia. Devia ser a desco-
taria. berta horrorizada da filha que tinha. Ela nos
Até o dia seguinte eu me transformei na pró- espiava em silêncio: a potência de perversi-
pria esperança da alegria: eu não vivia, eu dade de sua filha desconhecida e a menina
nadava devagar num mar suave, as ondas me loura em pé à porta, exausta, ao vento das
levavam e me traziam. ruas de Recife. Foi então que, finalmente se
No dia seguinte fui à sua casa, literalmente refazendo, disse firme e calma para a filha:
correndo. Ela não morava num sobrado como você vai emprestar o livro agora mesmo. E
eu, e sim numa casa. Não me mandou entrar. para mim: “E você fica com o livro por quan-
Olhando bem para meus olhos, disse-me que to tempo quiser.” Entendem? Valia mais do
havia emprestado o livro a outra menina, e que me dar o livro: “pelo tempo que eu qui-
que eu voltasse no dia seguinte para buscá- sesse” é tudo o que uma pessoa, grande ou
-lo. Boquiaberta, saí devagar, mas em breve pequena, pode ter a ousadia de querer.
a esperança de novo me tomava toda e eu Como contar o que se seguiu? Eu estava es-
recomeçava na rua a andar pulando, que era tonteada, e assim recebi o livro na mão. Acho
o meu modo estranho de andar pelas ruas de que eu não disse nada. Peguei o livro. Não,
Recife. Dessa vez nem caí: guiava-me a pro- não saí pulando como sempre. Saí andando
messa do livro, o dia seguinte viria, os dias bem devagar. Sei que segurava o livro gros-
seguintes seriam mais tarde a minha vida so com as duas mãos, comprimindo-o contra
inteira, o amor pelo mundo me esperava, an- o peito. Quanto tempo levei até chegar em
dei pulando pelas ruas como sempre e não casa, também pouco importa. Meu peito es-
caí nenhuma vez. tava quente, meu coração pensativo.
Mas não ficou simplesmente nisso. O plano Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia
secreto da filha do dono de livraria era tran- que não o tinha, só para depois ter o sus-
quilo e diabólico. No dia seguinte lá estava to de o ter. Horas depois abri-o, li algumas
eu à porta de sua casa, com um sorriso e o linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui
coração batendo. Para ouvir a resposta cal- passear pela casa, adiei ainda mais indo co-
ma: o livro ainda não estava em seu poder, mer pão com manteiga, fingi que não sabia
que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu onde guardara o livro, achava-o, abria-o por
como mais tarde, no decorrer da vida, o dra- alguns instantes. Criava as mais falsas difi-
ma do “dia seguinte” com ela ia se repetir culdades para aquela coisa clandestina que
com meu coração batendo. era a felicidade. A felicidade sempre iria
E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. ser clandestina para mim. Parece que eu já

143
pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Em março de 1962, desembarcávamos do
Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma Aviso Rio das Contas na ponte de atracação
rainha delicada. do Colégio Naval, como integrantes de mais
Às vezes sentava-me na rede, balançando- uma Turma desse tradicional estabelecimen-
-me com o livro aberto no colo, sem tocá- to de ensino da Marinha do Brasil.
-lo, em êxtase puríssimo. Não era mais uma Ainda que a ansiedade persistisse oprimindo
menina com um livro: era uma mulher com o peito dos novos e orgulhosos Alunos do Co-
o seu amante. légio Naval, não posso negar que a tristeza,
Com base no texto acima, responda à(s) que antes havia ocupado espaço em nossos
questão(ões) a seguir. corações, era naquele momento substituída
Assinale a opção em que o processo de for- pelo contentamento peculiar dos vitoriosos.
mação da palavra sublinhada é diferente dos E o sentimento de perda, experimentado
demais. por ocasião das despedidas, provara-se equi-
a) Mas possuía o que qualquer criança devo- vocado: às nossas caras famílias de origem
radora de histórias gostaria de ter: um pai agregava-se uma nova, a Família Naval, com-
dono de livraria. posta pelos recém-chegados companheiros; e
b) Até que veio para ela o magno dia de come- às respectivas cidades de nascimento, como
çar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. a minha bucólica Bom Jardim, juntava-se,
c) Mas que talento tinha para a crueldade. naquele instante, a bela e graciosa enseada
Batista das Neves em Angra dos Reis, como
d) Comigo exerceu com calma ferocidade o seu
mais tarde se agregaria à histórica Villegagnon
sadismo.
em meio à sublime baía de Guanabara.
e) Como casualmente, informou-me que pos-
Ao todo foram seis anos de companheirismo
suía As reinações de Narizinho, de Monteiro
e feliz convivência, tanto no Colégio como
Lobato.
na Escola Naval. Seis anos de aprendizagem
científica, humanística e, sobretudo, militar-
3. (Esc. Naval) Laivos de memória -naval. Seis anos entremeados de aulas, fes-
tivais de provas, práticas esportivas, remo,
“... e quando tiverem chegado, vitoriosa- vela, cabo de guerra, navegação, marinharia,
mente, ordem-unida, atividades extraclasses, re-
ao fim dessa primeira etapa, creativas, culturais e sociais, que deixaram
mais ainda se convencerão de que marcas indeléveis.
abraçaram uma carreira difícil, Estes e tantos outros símbolos, objetos e
árdua, cheia de sacrifícios, acontecimentos passados desfilam hoje,
mas útil, nobre e, sobretudo bela.” deliciosa e inexoravelmente distantes, em
(NOSSA VOGA, Escola Naval, Ilha de Villegagnon, 1964.) meio a saudosos devaneios.
Ainda como alunos do Colégio Naval, os con-
Há quase 50 anos, experimentei um misto tatos preliminares com a vida de bordo e as
de angústia, tristeza e ansiedade que meu primeiras idas para o mar – a razão de ser da
jovem coração de adolescente soube suportar carreira naval.
com bravura. Como Aspirantes, derrotas mais longas e as
Naquela ocasião, despedia-me dos amigos
primeiras descobertas: Santos, Salvador, Re-
de infância e da família e deixava para trás
cife e Fortaleza!
bucólica cidadezinha da região serrana flu-
Fechando o ciclo das Viagens de Instrução, o
minense. A motivação que me levava a aban-
donar gentes e coisas tão caras era, naquele tão sonhado embarque no Navio-Escola. Via-
momento, suficientemente forte para respal- gem maravilhosa! Nós, da Turma Míguens,
dar a decisão tomada de dar novos rumos à Guardas-Marinha de 1967, tivemos a oportu-
minha vida. Meu mundo de então se tornara nidade ímpar e rara de participar de um cru-
pequeno demais para as minhas aspirações. zeiro ao redor do mundo em 1968: a Quinta
Meus desejos e sonhos projetavam horizon- Circum-navegação da Marinha Brasileira.
tes que iam muito além das montanhas que Após o regresso, as platinas de Segundo-
circundam minha terra natal. -Tenente, o primeiro embarque efetivo e o
Como resistir à sedução e ao fascínio que a verdadeiro início da vida profissional – no
vida no mar desperta nos corações dos jo- meu caso, a bordo do cruzador Tamandaré, o
vens? inesquecível C-12. Era a inevitável separação
Havia, portanto, uma convicção: aquelas da Turma do CN-62/63 e da EM-64/67.
despedidas, ainda que dolorosas – e despedi- Novamente um misto de satisfação e ansie-
das são sempre dolorosas – não seriam certa- dade tomou conta do coração, agora do jo-
mente em vão. Não tinha dúvidas de que os vem Tenente, ao se apresentar para servir a
sonhos que acalentavam meu coração pouco bordo de um navio de nossa Esquadra. Após
a pouco iriam se converter em realidade. proveitosos, mas descontraídos estágios de

144
instrução como Aspirante e Guarda-Marinha, Em que opção encontra-se uma palavra, cujo
quando as responsabilidades eram restritas processo de formação é o mesmo do termo
a compromissos curriculares, as platinas de destacado em “[...] o tão sonhado embarque
Oficial começariam, finalmente, a pesar for- [...].” (11º parágrafo)
te em nossos ombros. Sobre essa transição a) “[...] circundam minha terra [...].” (2º pará-
do status de Guarda-Marinha para Tenente, grafo)
o notável escritor-marinheiro Gastão Penal- b) “[...] não seriam certamente em vão.” (4º
va escrevera com muita propriedade: “... é a parágrafo)
fase inesquecível de nosso ofício. Coincide c) “E o sentimento de perda [...].” (6º parágrafo)
exatamente com a adolescência, primavera d) “Seis anos entremeados de aulas, [...].” (7º
da vida. Tudo são flores e ilusões... Depois parágrafo)
começam a despontar as responsabilidades, e) “[...] o notável escritor-marinheiro [...].”
as agruras de novos cargos, o acúmulo de de- (13º parágrafo)
veres novos”.
E esses novos cargos e deveres novos, que TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
foram se multiplicando a bordo de velhos
e saudosos navios, deixariam agradáveis e Quem nunca fotoxopou?
duradouras lembranças em nossa memória.
Com o passar dos tempos, inúmeros Conve- FALA-SE HOJE em Facebook, Google e iPho-
ses e Praça d’ Armas, hoje saudosas, foram se ne com a mesma combinação de fascínio e
incorporando ao acervo profissional-afetivo terror que um dia já se falou de Motorola e
de cada um dos integrantes daquela Turma Nokia. Tudo se move rápido demais no mun-
de Guardas-Marinha de 1967. do digital, e são poucas as empresas que
Ah! Como é gratificante, ainda que melancó- conseguem permanecer competitivas ao lon-
lico, repassar tantas lembranças, tantos ter- go dos anos. Apesar de o Vale do Silício ter
mos expressivos, tanta gíria maruja, tantas
aquele ar hollywoodiano de terra de opor-
tradições, fainas e eventos tão intensamente
tunidades, contam-se nos dedos empresas
vividos a bordo de inesquecíveis e saudosos
navios... longevas como uma Adobe, uma Dell, uma
E as viagens foram se multiplicando ao lon- Amazon.
go de bem aproveitados anos de embarque, Por ter grande mobilidade, a concentração
de centenas de dias de mar e de milhares de poder e influência no mundo digital sur-
de milhas navegadas em alto mar, singran- ge tão rápido quanto desaparece, a ponto
do as extensas massas líquidas que formam de ser cada vez mais difícil encontrar quem
os grandes oceanos, ou ao longo das águas fique na liderança por uma mísera década.
Na virada do século não havia Friendster,
costeiras que banham os recortados lito-
Myspace nem Orkut, o grande buscador era
rais, com passagens, visitas e arribadas em
o Yahoo!, seguido pelo Lycos. E a internet
um sem-número de enseadas, baías, barras,
móvel estava a cargo de empresas inovadoras
angras, estreitos, furos e canais espalhados
como Palm e Kyocera.
pelos quatro cantos do mundo, percorridos
O usuário de produtos digitais é cada vez
nem sempre com mares bonançosos e ventos
mais volúvel e pragmático. Novos produtos e
tranquilos e favoráveis.
serviços podem até seduzi-lo com propagan-
Inúmeros foram também os portos e cidades
da, design e preço. Mas a relação dificilmen-
visitadas, não só no Brasil como no exterior,
te será mantida se a marca não se renovar
o que sempre nos proporciona inestimáveis
com a velocidade esperada, pouco importa
e valiosos conhecimentos, principalmente
sua fatia de mercado. Kodak e Sony que o
graças ao contato com povos diferentes e até
digam. Mesmo que ainda sejam gigantescas,
mesmo de culturas exóticas e hábitos às ve-
já não têm o apelo de outrora.
zes totalmente diversos dos nossos, como os
A melhor lição de empresas bem-sucedidas
ribeirinhos amazonenses ou os criadores de
em relacionamentos de longo prazo é a do
serpentes da antiga Taprobana, ex-Ceilão e
bom e velho Photoshop, vendendo saúde em
hoje Sri Lanka. seus 22 anos de idade e 12 plásticas (oops,
Como foi fascinante e delicioso navegar por versões). Como o Google, ele é sinônimo de
todos esses cantos. Cada novo mar percor-
categoria e verbo. Mas também é adjetivo,
rido, cada nova enseada, estreito ou porto
visitado tinha sempre um gosto especial de substantivo, pejorativo e indicativo de reto-
descoberta... Sim, pois, como dizia Câmara ques fotográficos, mencionado com familia-
Cascudo, “o mar não guarda os vestígios das ridade até por quem não faça ideia de como
quilhas que o atravessam. Cada marinheiro ele funciona. Ao contrário do AutoCAD, que é
tem a ilusão cordial do descobrimento”. oito anos mais velho, mas desconhecido fora
(CÉSAR, CMG William Carmo. Laivos de memória. In: de seu nicho, o Photoshop é unanimidade.
Revista de Villegagnon, Ano IV, nº 4, 2009. p. 42-50.) Folha de S. Paulo, 26/03/2012.

145
4. (Insper) Quanto às variações exploradas a através de destinos singulares, de situações
partir do termo “Photoshop”, é correto afir- singulares, de épocas singulares”. É essa a
mar que razão por que as 19obras-primas atravessam
a) o neologismo do título foi formado pelo séculos, sociedades e nações.
mesmo processo que o termo “design”, pre- Agora chegamos à parte mais humana da in-
sente no texto. clusão: a inclusão do outro para a compreen-
b) como adjetivo, o valor depreciativo do termo são humana. A compreensão nos torna mais
“fotoxopado” decorre exclusivamente do su- generosos com relação ao outro, e o crimi-
fixo “-ado” agregado ao radical. noso não é unicamente mais visto como cri-
c) as palavras formadas a partir do estrangei- minoso, como o Raskolnikov de Dostoievsky,
rismo “photoshop” constituem jargões res- como o Padrinho de Copolla.
tritos à área de informática. A literatura, o teatro e o cinema são os me-
d) a grafia abrasileirada de “fotoxopou”, dife- lhores meios de compreensão e de inclusão
rentemente de “hollywoodiano”, no 1.º pa- do outro. Mas a compreensão se torna provi-
rágrafo, é uma prova de que o software se sória, esquecemo-nos depois da leitura, da
popularizou no mundo. peça e do filme. Então essa compreensão é
e) apesar de não ter sido mencionado no tex- que deveria ser introduzida e desenvolvida
to, também seria possível transformar “Pho- em nossa vida pessoal e social, porque servi-
toshop” em advérbio de modo: “fotoxopal- ria para melhorar as relações humanas, para
mente”. melhorar a vida social.
(MORIN, Edgar. A inclusão: verdade da literatura.
5. (UFRGS) Hoje os conhecimentos se estrutu- In: RÕSING, Tânia et al. Edgar Morin: religando
fronteiras. Passo Fundo: UPF, 2004. p. 13-18)
ram de modo fragmentado, separado, com-
partimentado nas disciplinas. Essa situação Na coluna acima, estão palavras retiradas do
impede uma visão global, uma visão funda- texto; na coluna abaixo, descrições relacio-
mental e uma visão complexa. 13”Complexi- nadas à formação de palavras.
dade” vem da palavra latina complexus, que Associe corretamente a coluna da esquerda
significa a compreensão dos elementos no com a da direita.
seu conjunto. ( ) complexidade (refs. 13, 14, 15 e 16)
As disciplinas costumam excluir tudo o que ( ) definição (ref. 17)
se encontra fora do seu campo de especiali- ( ) insuportáveis (ref. 18) sufixo formador
zação. A literatura, no entanto, é uma área de adjetivos a partir de verbos.
que se situa na inclusão de todas as dimen- ( ) obras-primas (ref. 19)
sões humanas. Nada do humano lhe é estra- 1. Constituída por composição através de
nho, estrangeiro. justaposição.
A literatura e o teatro são desenvolvidos 2. Constituída por prefixo com sentido de
como meios de expressão, meios de conhe- negação e sufixo formador de adjetivos a
cimento, meios de compreensão da 14com- partir de verbos
plexidade humana. Assim, podemos ver o 3. Constituída por sufixo formador de subs-
primeiro modo de inclusão da literatura: a tantivo a partir de adjetivo.
inclusão da 15complexidade humana. E va- 4. Constituída por sufixo formador de subs-
mos ver ainda outras inclusões: a inclusão da tantivo a partir de verbo.
personalidade humana, a inclusão da subje- 5. Constituída por aglutinação, tendo em
tividade humana, e, também, muito impor- vista a mudança silábica de um dos ele-
tante, a inclusão; do estrangeiro, do margi-
mentos do vocábulo.
nalizado, do infeliz, de todos que ignoramos
A sequência correta de preenchimento dos
e desprezamos na vida cotidiana.
parênteses, de cima para baixo, é
A inclusão da 16complexidade humana é ne- a) 4 – 3 – 2 – 1.
cessária porque recebemos uma visão mu- b) 3 – 4 – 2 – 5.
tilada do humano. Essa visão, a de homo c) 4 – 3 – 1 – 5.
sapiens, é uma 17definição do homem pela d) 3 – 4 – 2 – 1.
razão; de homo faber, do homem como tra- e) 3 – 2 – 1 – 5.
balhador; de homo economicus, movido por
lucros econômicos. Em resumo, trata-se de
uma visão prosaica, mutilada, que esquece 6. (Imed) Dia da Proclamação da República
o principal: a relação do sapiens/demens, da
razão com a demência, com a loucura. ____ exatos 125 anos, em 15 de novembro
Na literatura, encontra-se a inclusão dos de 1889, foi proclamada a república do Bra-
problemas humanos mais terríveis, coisas sil.
18
insuportáveis que nela se tornam suportá- Na época, o país era governado por D. Pedro
veis. Harold Bloom escreve: ”Todas as gran- II e passava por grandes problemas, em razão
des obras revelam a universalidade humana da abolição da escravidão, em 1888.

146
Como os negros não trabalhavam mais nas Avalie as seguintes afirmações a respeito da
lavouras, os 3imigrantes começaram a ocupar palavra imigrantes (ref. 3):
seus lugares, plantando e colhendo, mas co- I. É formada apenas por prefixação, assim
bravam pelos trabalhos realizados, o que ge- como a palavra imprensa (ref. 9).
rou insatisfação nos proprietários de terras. II. O prefixo – ante(s) exprime origem.
As perdas também foram grandes para os III. Migração, migrar e emigrar são suas cog-
coronéis, pois ________ gasto uma enorme natas.
quantidade de dinheiro investindo nos es- Quais estão corretas?
cravos, e o governo, após a abolição, não pa-
a) Apenas I.
gou nenhuma indenização a eles.
b) Apenas II.
A guerra do Paraguai (1864 a 1870) também
ajudou na luta contra o regime monárquico c) Apenas III.
no Brasil. Soldados brasileiros se aliaram aos d) Apenas I e II.
exércitos do Uruguai e da Argentina, rece- e) Apenas II e III.
bendo orientações para implantarem a repú-
blica no Brasil. 7. (UFSM) Guia verde politicamente incorreto
Os movimentos republicanos também já Nem ecochatos nem ecocéticos. Não existem
aconteciam no país, a 9imprensa trazia po- verdades absolutas na sustentabilidade. Há
litização ____ população civil, para lutarem sempre alguma sujeira escondida debaixo do
pela libertação do país dos domínios de Por-
tapete – e soluções em lugares que ninguém
tugal. Com isso, vários partidos teriam sido
esperava.
criados, desde 1870. (HORTA, Maurício. Guia verde politicamente
A Igreja também teve sua participação para incorreto. Superinteressante, dez. 2011, p. 57.)
que a república do Brasil fosse proclamada.
Dois bispos foram nomeados para 12acatarem Considerando eco como um radical grego
as ordens de D. Pedro II, tornando-se seus que significa casa, hábitat, as palavras “eco-
subordinados, mas não aceitaram tais impo- chatos” e “ecocéticos” são formadas por
sições. Com isso, foram punidos com pena de __________. A primeira representa o gru-
prisão, levando _____ igreja _____ ir contra po dos __________ e a outra, o grupo dos
o governo. __________ no que se refere a atividades
Com as tensões aquecendo o mandato de D. sustentáveis.
Pedro II, o imperador dirigiu-se com sua fa-
mília para a cidade de Petrópolis, também Assinale a alternativa que preenche adequa-
no estado do Rio de Janeiro. damente as lacunas.
16
Porém seu afastamento não foi nada favo- a) composição – enfadonhos – descrentes
rável, fazendo com que fosse posto em prá- b) derivação prefixal – insistentes – desconfiados
tica um golpe militar, onde o Marechal Deo- c) aglutinação – desgostosos – descrentes
doro da Fonseca conspirava a derrubada de d) neologismo – aborrecidos – preocupados
D. Pedro II. e) derivação parassintética – insistentes – crí-
Boatos de que os responsáveis pelo plano ticos.
seriam presos fizeram com que a armada
acontecesse, recebendo o apoio de mais de
8. (ESPCEX) Ao se alistar, não imaginava que
seiscentos soldados.
No dia 15 de novembro de 1889, ao passar o combate pudesse se realizar em tão curto
pela Praça da Aclamação, o Marechal, com prazo, embora o ribombar dos canhões já se
espada em punho, declarou que, a partir da- fizesse ouvir ao longe.
quela data, o país seria uma república. Quanto ao processo de formação das palavras
Dom Pedro II recebeu a notícia de que seu sublinhadas, é correto afirmar que sejam,
governo havia sido derrubado e um decreto respectivamente, casos de
o expulsava do país, juntamente com sua fa- a) prefixação, sufixação, prefixação, aglutina-
mília. Dias depois, voltaram a Portugal. ção e onomatopeia.
Para governar o Brasil República, os respon- b) parassíntese, derivação regressiva, sufixa-
sáveis pela conspiração montaram um go- ção, aglutinação e onomatopeia.
verno provisório, mas o Marechal Deodoro c) parassíntese, prefixação, prefixação, sufixa-
da Fonseca permaneceu como presidente do ção e derivação imprópria.
país. Rui Barbosa, Benjamin Constant, Cam-
d) derivação regressiva, derivação imprópria,
pos Sales e outros foram escolhidos para for-
sufixação, justaposição e onomatopeia.
mar os ministérios.
(Jussara de Barros. Disponível em: http://www. e) parassíntese, aglutinação, derivação regres-
brasilescola.com. Acesso em: 16/01/2017) siva, justaposição e onomatopeia.

147
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO ( ) As palavras idílica (ref. 21) e dolorosa
(ref. 22) apresentam sufixos que formam
Darwin passou quatro meses no Brasil, em adjetivos a partir de substantivos.
1832, durante a sua célebre viagem a bor- ( ) O emprego de diferentes sufixos para o
do do Beagle. Voltou impressionado com o mesmo radical em escravidão (ref. 23) e
escravismo (ref. 24) serve, no texto, para
que viu: “Delícia é um termo 17insuficiente
expressar, respectivamente, a ideia de
para 19exprimir as emoções sentidas por um
“situação resultante de uma ação” e de
naturalista a sós com a natureza em uma flo- “movimento socioideológico”.
resta brasileira”, escreveu. O Brasil, porém, A sequência correta de preenchimento dos
aparece de forma menos 21idílica em seus es- parênteses, de cima para baixo, é
critos: “Espero nunca mais voltar a um país a) F – V – V – V.
escravagista. O estado da enorme população b) V – F – V – F.
escrava deve preocupar todos os que chegam c) V – V – F – F.
ao Brasil. Os senhores de escravos querem d) F – V – F – V.
ver o negro romo outra espécie, mas temos e) F – F – V – V.
todos a mesma origem.”
Em vez do gorjeio do sabiá, o que Darwin 1
0. (Esc. Naval) VELHO MARINHEIRO
guardou nos ouvidos foi um som terrível que
o acompanhou por toda a vida: “Até hoje, se Homenagem aos marinheiros
eu ouço um grito, lembro-me, com 22doloro- de sempre... e para sempre.
sa e clara memória, de quando passei numa Sou marinheiro porque um dia, muito jovem,
casa em Pernambuco e ouvi urros terríveis. estendi meu braço diante da bandeira e jurei
Logo entendi que era algum pobre escravo lhe dar minha vida.
que estava sendo torturado,” Naquele dia de sol a pino, com meu novo uni-
Segundo o biólogo Adrian Desmond, “a via- forme branco, senti-me homem de verdade,
gem do Beagie, para Darwin, foi menos im- como se estivesse dando adeus aos tempos
portante pelos espécimes coletados do que de garoto. Ao meu lado, as vozes de outros
pela experiência de testemunhar os horrores jovens soavam em uníssono com a minha, vi-
da 23escravidão no Brasil. De certa forma, ele brantes, e terminamos com emoção, de pei-
tos estufados e orgulhosos. Ao final, minha
escolheu focar na 20descendência comum do
mãe veio em minha direção, apressada em
homem justamente para mostrar que todas
me dar um beijo. 20Acariciou-me o rosto e
as raças eram iguais e, desse modo, enfim,
disse que eu estava lindo de uniforme. O dia
objetar àqueles que 18insistiam em dizer que
acabou com a família em festa; eu lembro-
os negros pertenciam a uma espécie diferen-
-me bem, fiquei de uniforme até de tarde...
te e inferior à dos brancos”. Desmond aca-
Sou marinheiro, porque aprendi, naquela
ba de lançar um estudo que mostra a paixão
Escola, o significado nobre de companhei-
abolicionista do cientista, revelada por seus
rismo. Juntos no sofrimento e na alegria,
diários e cartas pessoais. “A extensão de seu
um safando o outro, leais e amigos. Apren-
interesse no combate à ciência de cunho ra- di o que é civismo, respeito e disciplina, no
cista é surpreendente, e pudemos detectar princípio, exigidos a cada dia; depois, como
um ímpeto moral por trás de seu trabalho parte do meu ser e, assim, para sempre. A
sobre a evolução humana – urna crença na cada passo havia um novo esforço esperando
‘irmandade racial’ que tinha origem em seu e, depois dele, um pequeno sucesso. Minha
ódio ao 24escravismo e que o levou a pensar vida, agora que olho para trás, foi toda de
numa descendência comum.” pequenos sucessos. A soma deles foi a minha
Adaptado de: HAAG, C. O elo perdido tropical. carreira.
Pesquisa FAPESP, n. 159, p. 80 - 85, maio 2009. 19
No meu primeiro navio, logo cedo, percebi
que era novamente aluno. Todos sabiam das
9. (Ufrgs) Assinale com V (verdadeiro) ou F coisas mais do que eu havia aprendido. Só
(falso) as afirmações a seguir sobre elemen- que agora me davam tarefas, incumbências,
tos de formação de palavras do texto. e esperavam que eu as cumprisse bem. Pou-
( ) As palavras insuficiente (ref. 17) e in- co a pouco, passei a ser parte da equipe, a
sistiam (ref. 18) apresentam o mesmo ser chamado para ajudar, a ser necessário.
prefixo em sua formação. Um dia vi-me ensinando aos novatos e dei-
( ) A comparação da palavra exprimir (ref. -me conta de que me tornara marinheiro, de
19) com imprimir e da palavra descen- fato e de direito, um profissional! O navio
dência (ref. 20) com ascendência permi- passou a ser minha segunda casa, onde eu
te que se postule um radical comum para permanecia mais tempo, às vezes, do que na
cada um dos pares. primeira. Conhecia todos, alguns mais até do

148
que meus parentes. Sabia de suas manhas, dias da ativa e morro de saudades. 18Que bom
cacoetes, preocupações e de seus sonhos. se pudesse voltar ao começo, vestir aquele
Sem dar conta, meu mundo acabava no cos- uniforme novinho – até um pouco grande,
tado do navio. ainda recordo – Jurar Bandeira, ser beijado
A soma de tudo que fazemos e vivemos, pelo pela minha falecida mãe...
navio, é uma das coisas mais belas, que só Sei que, quando minha hora chegar, no úl-
há entre nós, em mais nenhum outro lugar. timo instante, verei, em velocidade desco-
Por isso sou marinheiro, porque sei o que é nhecida, o navio com meus amigos, minha
espírito de navio. mulher, meus filhos, singrando para sempre,
Bons tempos aqueles das viagens, dávamos indo aonde o mar encontra o céu... e, se São
um duro danado no mar, em serviço, postos Pedro estiver no portaló, direi:
de combate, adestramento de guerra, dia e – Sou marinheiro, estou embarcando.
noite. O interessante é que em toda nossa (Autor desconhecido. In: Língua portuguesa:
vida, quando buscamos as boas recordações, leitura e produção de texto. Rio de Janeiro:
elas vêm desse tempo, das viagens e dos na- Marinha do Brasil, Escola Naval, 2011. p. 6-8)
vios. 16Até as durezas por que passamos são
saborosas ao lembrar, talvez porque as ven- Glossário
cemos e fomos adiante. Portaló: abertura no casco de um navio, ou
É aquela história dos pequenos sucessos. passagem junto à balaustrada, por onde as
A volta ao porto era um acontecimento gos- pessoas transitam para fora ou para dentro,
toso, sempre figurando a mulher. Primeiro a e por onde se pode movimentar carga leve.
mãe, depois a namorada, a noiva, a esposa.
Muita coisa a contar, a dizer, surpresas de Em que opção o autor, ao reportar-se ao pas-
carinho. A comida preferida, o abraço aper- sado, emprega um termo cujo sufixo tem va-
tado, o beijo quente... e o filho que, na au- lor intensificador?
sência, foi ensinado a dizer papai. a) “Até as durezas por que passamos são sabo-
No início, eu voltava com muitos retratos, rosas ao lembrar [...].” (ref. 16)
principalmente quando vinha do estrangei- b) “Quando saí de bordo, parei no portaló, vol-
ro, depois, com o tempo, eram poucos, até tei-me para a bandeira [...].” (ref. 17)
que deixei de levar a máquina. Engraçado, c) “Que bom se pudesse voltar ao começo, ves-
vocês já perceberam que marinheiro velho tir aquele uniforme novinho [...].” (ref. 18)
dificilmente baixa a terra com máquina fo- d) “No meu primeiro navio, logo cedo, percebi
tográfica? Foi assim comigo. que era novamente aluno.” (ref. 19)
Hoje os navios são outros, os marinheiros e) “Acariciou-me o rosto e disse que eu estava
são outros – sinto-os mais preparados do que lindo de uniforme.” (ref. 20)
eu era – mas a vida no mar, as viagens, os
portos, a volta, estou certo de que são iguais.
Sou marinheiro, por isso sei como é.
Fico agora em casa, querendo saber das coi-
E.O. Complementar
sas da Marinha. E a cada pedaço que ouço
1. (ESPCEX) Responda, na sequência, os vo-
de um amigo, que leio, que vejo, me dá um
cábulos cujos prefixos ou sufixos correspon-
orgulho que às vezes chega a entalar na gar-
dem aos seguintes significados:
ganta. Há pouco tempo, voltei a entrar em
QUASE; ATRAVÉS; EM TORNO DE; FORA; SI-
um navio. Que coisa linda! Sofisticado, lim-
MULTANEIDADE
píssimo, nas mãos de uma tripulação que só
a) hemisfério; trasladar; justapor; epiderme;
pode ser muito competente para mantê-lo
parasita
pronto. Do que me mostraram eu não sabia
b) semicírculo; metamorfose; retrocesso; ultra-
muito. Basta dizer que o último navio em
passar; circunavegação
que servi já deu baixa. 17Quando saí de bor-
c) penumbra; diálogo; periscópio; exogamia;
do, parei no portaló, voltei-me para a ban-
sintaxe
deira, inclinei a cabeça... e, minha garganta
d) visconde; ultrapassar; unifamiliar; progra-
entalou outra vez.
ma; multinacional
Isso é corporativismo; não aquele enxova-
lhado, que significa o bem de cada um, pro- e) pressupor; posteridade; companhia; abdicar;
tegido à custa do desmerecimento da insti- ambivalente
tuição; mas o puro, que significa o bem da
instituição, protegido pelo merecimento de 2. (UEPG) CONSUMO TAMBÉM É ATO POLÍTICO
cada um.
Sou marinheiro e, portanto, sou corporati- Diz o Houaiss que o capitão Charles C.
vista. Boycott (1832-1897), um rico proprietário
Muitas vezes a lembrança me retorna aos irlandês, no outono de 1880, recusando-se a

149
baixar o preço que cobrava pelo arrendamen- situação dos francesesvésperas da Revolução
to de suas terras, foi vítima de represália, de 1789, quando havia miséria generalizada
tendo os agricultores da época se articula- no campo. Na época, a França era de longe o
do para não negociar com ele. Daí a palavra país mais populoso da Europa: por volta de
“boycott” e, em português, boicote. 1700, já contava com mais de 20 milhões de
Quaseanos depois, o termo em inglês ganhou habitantes, enquanto o Reino Unido tinha
uma espécie de antônimo, o “buycott”. Numa pouco mais de 8 milhões de pessoas. A 8po-
livre tradução seria a compra orientada de pulação francesa se expandiu em ritmo cres-
produtos. cente ao longo do século XVIII, aproximando-
A partir disso, a pesquisadora Michele Mi- -se dos 30 milhões. Tudo leva a crer que esse
cheletti, da Karlstad University, na Suécia, dinamismo demográfico, desconhecido nos
defende que o ato de consumo pode se trans- séculos anteriores, contribuiu para a estagna-
formar em ativismo político, pois, segundo ção dos salários no campo e para o aumento
ela, a falta de uma regulamentação global dos rendimentos associados à 11propriedade
transferiu para os consumidores parte da da terra, sendo, portanto, um dos fatores que
responsabilidade sobre o mercado. Por meio levaram Revolução Francesa. Para evitar que
de “boycotts” e de “buycotts”, é possível aos torvelinho similar vitimasse o Reino Unido,
consumidores forçar mudanças no sistema Malthus argumentou que toda assistência aos
produtivo e colaborar, utilizando o seu poder 15
pobres deveria ser suspensa de imediato e
de compra, a fim de atenuar problemas como
a taxa de natalidade deveria ser severamente
a exploração da mão de obra, o desrespeito
controlada.
ambiental e os desvios éticos e políticos de
Já David Ricardo, que publicou em 1817 os
grandes empresas.
seus Princípios de economia política e tribu-
O “buycotter” é o consumidor politizado,
tação, preocupava-se com a evolução do pre-
informado, responsável. Micheletti cita es-
tudos que mostram que, na Suécia, o percen- ço da terra. Se o crescimento da população
tual de cidadãos que se envolveu em algum e, consequentemente, da produção agrícola
tipo de “consumo politizado” nosmeses an- se prolongasse, a terra tenderia a se tornar
teriores à pesquisa era deNo Brasil, não che- escassa. De acordo com a lei da oferta e da
gava aA pesquisadora concluiu que o resulta- procura, o preço do bem escasso – a terra –
do está vinculado ao nível de informação e deveria subir de modo contínuo. No limite,
aos recursos disponíveis dos consumidores. os donos da terra receberiam uma parte cada
“É um movimento basicamente da classe mé- vez mais significativa da renda nacional, e o
dia”, afirma. restante da população, uma parte cada vez
(Disponível em: https://br.noticias.yahoo.com/ mais reduzida, destruindo o equilíbrio social.
blogs/plinio-fraga/consumo-tambem-e-ato- De fato, o valor da terra permaneceu alto por
politico-130126426.html. Acesso em 30/03/2015.) algum tempo, mas, ao longo de século XIX,
caiu em relaçãooutras formas de riqueza, à
Quanto aos processos de formação de pala-
medida que diminuía o peso da agricultura
vras, assinale o que for correto.
na renda das nações. Escrevendo nos anos de
01) Boicote – empréstimo: palavra estrangeira
aportuguesada. 1810, Ricardo não poderia antever a impor-
02) Mão de obra – composição por justaposição. tância que o progresso tecnológico e o cresci-
04) Atenuar – derivação parassintética. mento industrial teriam ao longo das décadas
08) Agricultores – composição por hibridismo. seguintes para a evolução da distribuição da
renda.
(PIKETTY, T. O Capital no Século XXI. Trad. de M. B. de
3. (UFRGS) Quando a economia 2política clássica Bolle. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2014. p. 11-13.)
nasceu, no Reino Unido e na França, ao final
do século XVIII e início do século XIX, a ques- Assinale a alternativa em que as três pala-
tão da distribuição da renda já se encontrava vras possuem um radical que está relaciona-
no centro de todas as análises. Estava claro do com a noção de “povo”.
que transformações radicais entraram em a) política (ref. 2) – publicou (ref. 5) – popula-
curso, propelidas pelo crescimento 4demográ- ção (ref. 8)
fico sustentado – inédito até então – e pelo b) política (ref. 2) – população (ref. 8) – pobres
início do êxodo rural e da Revolução Indus- (ref. 15)
trial. Quais seriam as consequências sociais c) demográfico (ref. 4) – publicou (ref. 5) – po-
dessas mudanças? pulação (ref. 8)
Para Thomas Malthus, que 5publicou em 1798 d) demográfico (ref. 4) – publicou (ref. 5) –
seu Ensaio sobre o princípio da população, propriedade – (ref. 11)
não restava dúvida: a superpopulação era uma e) demográfico (ref. 4) – propriedade (ref. 11)
ameaça. Preocupava-se especialmente com a – pobres (ref. 15)

150
4. (UFRGS) No século XV, viu-se a Europa in- Quais estão corretas?
vadida por uma raça de homens que, vin- a) Apenas I.
dos ninguém sabe de onde, se espalharam b) Apenas III.
em bandos por todo o seu território. Gen- c) Apenas I e II.
te inquieta e andarilha, deles afirmou Paul d) Apenas II e III.
de Saint-Victor que era mais fácil predizer e) I, II e III.
o das nuvens ou dos gafanhotos do que se-
guir as pegadas da sua invasão. Uns risonhos
5. (Uel) A questão refere-se ao romance O ou-
despreocupados: passavam a vida esquecidos
tro pé da sereia, de Mia Couto.
do passado e descuidados do futuro. Cada
novo dia era uma nova aventura em busca A crítica literária tem aproximado o moçam-
do escasso alimento para os manter naque- bicano Mia Couto do brasileiro Guimarães
la jornada. Trajo? No mais completo sujos e Rosa, em particular pelo fato de ambos em-
puídos cobriam-lhes os corpos queimados do pregarem neologismos em suas obras.
sol. Nômades, aventureiros, despreocupados No trecho “as mãos calosas, de enxadachim”,
– eram os boêmios. extraído do conto “Fatalidade”, de autoria
Assim nasceu a semântica da palavra boê- do autor brasileiro, o neologismo “enxada-
mio. O nome gentílico de Boêmia passou a chim” é construído pelo mesmo processo de
aplicar-se ao indivíduo despreocupado, de formação de palavras utilizado pelo autor
existência irregular, relaxado no vestuário, moçambicano para a criação de
vivendo ao deus-dará, à toa, na vagabunda- a) vitupérios.
gem alegre. Daí também o substantivo bo- b) bebericava.
êmia. Na definição de Antenor Nascentes: c) tamanhoso.
vida despreocupada e alegre, vadiação, es- d) mudançarinos.
túrdia, vagabundagem. Aplicou-se depois o e) malfadado.
termo, especializadamente, à vida desorde-
nada e sem preocupações de artistas e escri-
tores mais dados aos prazeres da noite que
aos trabalhos do dia. Eis um exemplo clássico E.O. Dissertativo
do que se chama degenerescência semântica.
De limpo gentílico – natural ou habitante da
1. (FGV) MÃE
Boêmia – boêmio acabou carregado de todas
essas conotações desfavoráveis.
Mãe – que adormente este viver dorido.
A respeito do substantivo boêmia, vale dizer
E me vele esta noite de tal frio,
que a forma de uso, ao menos no Brasil, é
E com as mãos piedosas até o fio
boemia, acento tônico em -mi-. E é natural
Do meu pobre existir, meio partido...
que assim seja, considerando-se que -ia é
sufixo que exprime condição, estado, ocupa- Que me leve consigo, adormecido,
ção. Conferir: 16alegria, 18anarquia, barbaria, Ao passar pelo sítio mais sombrio...
17
rebeldia, tropelia, 20pirataria... Penso que Me banhe e lave a alma lá no rio
sobretudo palavras como folia e 19orgia de- Da clara luz do seu olhar querido...
vem ter influído na fixação da tonicidade de
boemia. Notar também o par abstêmio/abs- Eu dava o meu orgulho de homem – dava
temia. Além do mais, a prosódia boêmia es- Minha estéril ciência, sem receio,
tava prejudicada na origem pelo nome pró- E em débil criancinha me tornava,
prio Boêmia: esses boêmios não são os que
vivem na Boêmia... Descuidada, feliz, dócil também,
(LUFT, Celso Pedro. Boêmios, Boêmia e boemia. In: O
Se eu pudesse dormir sobre o teu seio,
romance das palavras. São Paulo: Ática, 1996. p. 30-31.)
Se tu fosses, querida, a minha mãe!
Considere as seguintes afirmações sobre as (Antero de Quental. Antologia, 1991)
relações morfológicas que se estabelecem
com palavras do texto. Analisando os termos empregados no texto,
I. alegria (ref. 16) e rebeldia (ref. 17) são explique
palavras derivadas de adjetivos, assim a) o sentido que assumem os termos “vele”
como valentia. (primeira estrofe) e “débil” (terceira estro-
II. anarquia (ref. 18) e orgia (ref. 19) são fe);
palavras que, apesar de apresentarem a b) o processo de derivação do termo destacado
terminação -ia, não derivam de outras em “Do meu pobre existir, meio partido...”
palavras. (primeira estrofe) e o sentido que o sufixo
III. pirataria (ref. 20) é palavra derivada de confere ao termo destacado em “E em débil
substantivo, assim como chefia. criancinha me tornava,” (terceira estrofe).

151
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO tentaram imitar esses nativos e foram reco-
lhidos ao hospital da ilha. Os cabecences-
“A loucura (...), objeto de meus estudos, era -para-baixo, como foram denominados à fal-
até agora uma ilha perdida no oceano da ra- ta de melhor classificação, têm vida longa e
zão; começo a suspeitar que é um continente.” desconhecem a gripe e a depressão.
(ASSIS, Machado de. O Alienista. In: Obra Completa. Vol. (ANDRADE, Carlos Drummond de. Prosa Seleta.
II, Conto e Teatro. Org. por Afrânio Coutinho, 4a ed. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2003. p. 150)
Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1979. p. 260)

TEXTO I
2. (Ufrj) No texto II, identifica-se o povo da
UM COMEÇO MUITO LOUCO ilha de Ossevaolep por um neologismo: cabe-
“Ora, a mente é dita sã”, escreveu Erasmo cences-para-baixo.
em O elogio da loucura (1509), “desde que a) Identifique os processos de formação de pa-
controle adequadamente todos os órgãos do lavras utilizados para a criação desse neolo-
corpo”. Embora escrita quase 500 anos atrás gismo.
num tratado em defesa do cristianismo, essa b) Considerando o conhecimento que os ob-
frase expressa mais ou menos nossas supo- servadores têm do povo de Ossevaolep, res-
sições modernas sobre a sanidade. Em pri- ponda: por que se afirma, no texto II, que
meiro lugar, que a sanidade é uma qualidade o neologismo foi criado “à falta de melhor
da mente, não do corpo (não descrevemos os classificação”?
corpos das pessoas como sãos ou insanos).
Em segundo lugar, que é a função da mente TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
sã controlar o corpo, e portanto que o cor-
po ficaria descontrolado - ou pelo menos O EX- CINECLUBISTA
fazendo coisas proibidas - se não estivesse (João Gilberto Noll)
sob a égide da mente. Em terceiro lugar, que
o corpo é não só o tipo de objeto que pode Aquele homem meio estrábico, ostentando
ser controlado, como também o tipo de ob- um mau humor maior do que realmente po-
jeto que pode ser adequada ou inadequada- deria dedicar a quem lhe cruzasse o caminho
mente controlado; portanto, o que a mente e que agora entrava no cinema, numa se-
sã implica acima de tudo é adequação. E por gunda-feira à tarde, para assistir a um filme
fim, mas não menos importante, há um fa- nem tão esperado, a não ser entre pingados
tor temporal envolvido. Para ter sanidade amantes de cinematografias de cantões os
precisamos de uma mente, e precisamos de mais exóticos, aquele homem, sim, sentou-
uma mente para controlar um corpo que de -se na sala de espera e chorou, simplesmen-
outro modo seria insano, mas a mente é dita te isso: chorou. Vieram lhe trazer um copo
sã, como dizia Erasmo, apenas “desde que” d’água logo afastado, alguém sentou-se ao
controle os órgãos do corpo. A sugestão é lado e lhe perguntou se não passava bem,
que a sanidade é precária, não uma condição mas ele nada disse, rosnou, passou as nari-
permanente. A questão passa a ser não só se nas pela manga, levantou-se num ímpeto e
a mente sã pode controlar o corpo, mas por assistiu ao melhor filme em muitos meses,
quanto tempo. só isso. Ao sair do cinema, chovia. Ficou sob
(PHILLIPS, Adam. Louco para ser normal. a marquise, à espera da estiagem. Tão ab-
Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p. 63) sorto no filme que se esqueceu de si. E não
soube mais voltar.
TEXTO II

OS DIFERENTES 3. (Ufrj) O vocábulo “ex-cineclubista” resulta


Descobriu-se na Oceania, mais precisamente da aplicação de quatro processos de forma-
na ilha de Ossevaolep, um povo primitivo, ção de palavras. Identifique-os, valendo-se
que anda de cabeça para baixo e tem vida de elementos constitutivos desse vocábulo.
organizada.
É aparentemente um povo feliz, de cabeça TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
muito sólida e mãos reforçadas. Vendo tudo
ao contrário, não perde tempo, entretanto, Eram cinco horas da manhã e o cortiço acor-
em refutar a visão normal do mundo. E o que dava, abrindo, não os olhos, mas a sua infi-
eles dizem com os pés dá a impressão de se- nidade de portas e janelas alinhadas.
rem coisas aladas, cheias de sabedoria. [...]
Uma comissão de cientistas europeus e Daí a pouco, em volta das bicas era um zun-
americanos estuda a linguagem desses ho- zum crescente; uma aglomeração tumultuosa
mens e mulheres, não tendo chegado ainda de machos e fêmeas. Uns, após outros, lava-
a conclusões publicáveis. Alguns professores vam a cara, incomodamente, debaixo do fio

152
de água que escorria da altura de uns cinco pode ser lida de trás pra frente, mas pode ser
palmos. O chão inundava-se. As mulheres lida na vertical, na horizontal, de baixo pra
precisavam já prender as saias entre as co- cima, de cima pra baixo, girando os olhos em
xas para não as molhar; via-se-lhes a tosta- redor deste quadrado:
da nudez dos braços e do pescoço, que elas SATOR
despiam, suspendendo o cabelo todo para o AREPO
alto do casco; os homens, esses não se pre- TENET
ocupavam em não molhar o pelo, ao contrá- OPERA
rio metiam a cabeça bem debaixo da água e ROTAS
esfregavam com força as ventas e as barbas,
fossando e fungando contra as palmas da Essa frase latina polivalente foi criada pelo
mão. escravo romano Loreius 200 anos antes de
(Aluísio Azevedo. O cortiço.) Cristo, e tem dois significados: “O lavra-
dor mantém cuidadosamente a charrua nos
sulcos” e/ou “o lavrador sustém cuidadosa-
4. (Ufscar) Há, no texto, palavras derivadas mente o mundo em sua órbita”. Osman Lins
por sufixação, como “tumultuosa” e “nu- construiu o romance “Avalovara” (1973) em
dez”. torno desse palíndromo.
a) Dê dois exemplos de palavras derivadas com Muita gente sabe o que é um caligrama –
o sufixo da primeira. aqueles textos que existiam desde a Grécia
b) Dê mais dois exemplos de palavras derivadas em que as letras e frases iam desenhando
com o sufixo da outra. o objeto a que se referiam – um vaso, um
ovo, ou então, como num autor moderno tipo
Apollinaire, as frases do poema se inscreven-
E.O. UERJ do em forma de cavalo ou na perpendicular
imitando o feitio da chuva.
Exame Discursivo Mas pouca gente sabe o que é um lipograma.
Lipo significa tirar, aspirar, esconder. Por-
tanto, um lipograma é um texto que sofreu
1. (UERJ) DESENCONTRÁRIOS
a lipoaspiração de uma letra. O autor resolve
Mandei a palavra rimar, esconder essa letra por razões lúdicas. Já o
ela não me obedeceu. grego Píndaro havia escrito uma ode, sem a
Falou em mar, em céu, em rosa, letra “s”. Os autores barrocos no século XVII
em grego, em silêncio, em prosa. também usavam este tipo de ocultação, por-
Parecia fora de si, que estavam envolvidos com o ocultismo,
a sílaba silenciosa. com a cabala e com a numerologia.
Por que estou dizendo essas coisas?
Mandei a frase sonhar, Culpa da Internet.
e ela se foi num labirinto. Esses jogos verbais que vinham sendo feitos
Fazer poesia, eu sinto, apenas isso. desde as cavernas agora foram potencializa-
Dar ordens a um exército, dos com a informática. Dizia eu numa en-
para conquistar um império extinto. trevista outro dia que estamos vivendo um
(PAULO LEMINSKI GÓES, F.; MARINS, A. (Orgs.) paradoxo riquíssimo: a mais avançada tecno-
Melhores poemas de Paulo Leminski. São Paulo: Global, 2001. logia eletrônica está resgatando o uso lúdico
da linguagem e uma das mais arcaicas ativi-
Considere a formação da palavra “Desencon-
dades humanas – a poesia. Os poetas, mais
trários”, título do poema de Paulo Leminski.
que quaisquer outros escritores, invadiram
Separe seus elementos mórficos. Em segui-
a Internet. Se em relação às coisas prosaicas
da, nomeie o primeiro morfema que a com-
se diz que a vingança vem a cavalo, no caso
põe e indique seu significado.
da poesia a vingança veio a cabo, galopando
eletronicamente. Por isto que toda vez que
2. (UERJ) BRINCAR COM PALAVRAS – NOS JO- um jovem iniciante me procura com a angús-
GOS VERBAIS, EXERCÍCIOS DE LITERATURA tia de publicar seu livro, aconselho-o logo:
Você sabe o que é um palíndromo? “Meu filho, abra uma página sua na Inter-
net para não mais se constranger e se sentir
É uma palavra ou mesmo uma frase que pode constrangido diante dos editores e críticos.
ser lida de frente pra trás e de trás pra frente Estampe seu texto na Internet e deixe rolar”.
mantendo o mesmo sentido. Por exemplo, em (ROMANO, Affonso de Sant’Anna. O Globo, 15/09/1999.)
português: “amor” e “Roma”; em espanhol:
“Anita lava la tina”. Ou, então, a frase latina: Você sabe o que é um palíndromo? (par. 1)
“Sator arepo tenet opera rotas”, que não só Por que estou dizendo essas coisas? (par. 7)

153
Observando os parágrafos compreendidos falar alto, sem freio nos dentes, sem medir
entre as perguntas acima, identifique: consideração, seja em compartimento do go-
a) a função da linguagem predominante nesses verno, seja em sala de desembargador. Trato
parágrafos e justifique sua reposta; as partes no macio, em jeito de moça. Se não
b) o processo de formação de palavras comum recebo cortesia de igual porte, abro o peito:
aos termos OCULTAÇÃO e OCULTISMO e expli- – Seu filho da égua, que pensa que é?
que a diferença de sentido entre eles. Nos currais do Sobradinho, no debaixo do
capotão de meu avô, passei os anos de pe-
3. (UERJ) quenice, que pai e mãe perdi no gosto do
primeiro leite. Como fosse dado a fazer ga-
TEXTO I ratujações e desabusado de boca, lá num in-
verno dos antigos, Simeão coçou a cabeça e
Olhava eu o meu avô como se fosse ele o en- estipulou que o neto devia ser doutor de lei:
genho. A grandeza da terra era a sua gran- – Esse menino tem todo o sintoma do povo
deza. Fixara-se em mim a certeza de que o da política. É invencioneiro e 2linguarudo.
mundo inteiro estava ali dentro. Não podia (...)
haver nada que não fosse do meu avô. Lá ia o (CARVALHO, J. C. O coronel e o lobisomem.
gado para o pastoreador, e era dele; lá saíam Rio de Janeiro: José Olympio, 1978.)
os carros de boi a gemer pela estrada ao peso
das sacas de lã ou dos sacos de açúcar, e tudo Observe as seguintes palavras:
“lobisomem” (ref. 1)
era dele; lá estavam as negras da cozinha, os
“linguarudo” (ref. 2)
moleques da estrebaria, os trabalhadores do Identifique o processo de formação de cada
eito, e tudo era dele. O sol nascia, as águas uma delas, segundo o seu emprego no texto.
do céu se derramavam na terra, o rio cor-
ria, e tudo era dele. Sim, tudo era do meu
avô, o velho Bubu, de corpo alto, de barbas,
de olhos miúdos, de cacete na mão. O seu
E.O. Objetivas
grito estrondava até os confins, os cabras do
eito lhe tiravam o chapéu, o Dr. José Maria
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
mandava buscar lenha para a sua cozinha no
Corredor, e a água boa e doce nas suas ver- 1. (Unicamp 2017)
tentes. Tudo era do meu avô Bubu, o “Velho”
da boca dos trabalhadores, o Cazuza da ve-
lha Janoca, o papai da Tia Maria, o meu pai
da Tia Iaiá. A minha impressão firme era de
que nada havia além dos limites do Corre-
dor. Chegavam de longe portadores de outros
engenhos. Ouvia apitar o trem na linha de
ferro. Apesar de tudo, só havia de concreto
mesmo o Engenho Corredor. (...)
(REGO, J. L. Meus verdes anos. In: Ficção completa.
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1976.)

TEXTO II

A bem dizer, sou Ponciano de Azeredo Furta-


do, coronel de patente, do que tenho honra
e faço alarde. Herdei do meu avô Simeão ter- Do ponto de vista da norma culta, é correto
ras de muitas medidas, gado do mais gordo, afirmar que “coisar” é
pasto do mais fino. Leio no corrente da vista a) uma palavra resultante da atribuição do
e até uns latins arranhei em tempos verdes sentido conotativo de um verbo qualquer ao
da infância, com uns padres-mestres a dez substantivo “coisa”.
tostões por mês. Digo, modéstia de lado, b) uma palavra resultante do processo de su-
fixação que transforma o substantivo “coisa”
que já discuti e joguei no assoalho do Foro
no verbo “coisar”.
mais de um doutor formado. Mas disso não c) uma palavra que, graças a seu sentido uni-
faço glória, pois sou sujeito lavado de vai- versal, pode ser usada em substituição a
dade, mimoso no trato, de palavra educada. todo e qualquer verbo não lembrado.
Já morreu o antigamente em que Ponciano d) uma palavra que resulta da transformação
mandava saber nos ermos se havia um caso do substantivo “coisa” em verbo “coisar”,
de 1lobisomem a sanar ou pronta justiça a reiterando um esquecimento.
ministrar. Só de uma regalia não abri mão
nesses anos todos de pasto e vento: a de

154
2. (Unifesp) Casimiro de Abreu pertence à ge- O processo de formação de palavras verifica-
ração dos poetas que morreram prematura- do em “estrutural” (2.° parágrafo) também
mente, na casa dos vinte anos, como Álvares está presente em
de Azevedo e outros, acometidos do “mal” a) “futuro” (1.° parágrafo).
byroniano. Sua poesia, reflexo autobiográfi- b) “portanto” (2.° parágrafo).
co dos transes, imaginários e verídicos, que c) “momento” (3.° parágrafo).
d) “plasticidade” (4.° parágrafo).
lhe agitaram a curta existência, centra-se
e) “origem” (3.° parágrafo).
em dois temas fundamentais: a saudade e
o lirismo amoroso. Graças a tal fundo de ju- 4. (Unifesp) Examine a tira.
venilidade e timidez, sua poesia saudosista
guarda um não sei quê de infantil.
(Massaud Moisés. A literatura brasileira
através dos textos, 2004.)

Os substantivos do texto derivados pelo mes-


mo processo de formação de palavras são:
a) juvenilidade e timidez.
b) geração e byroniano. O efeito de humor na situação apresentada
c) reflexo e imaginários. decorre do fato de a personagem, no segun-
d) prematuramente e autobiográfico. do quadrinho, considerar que “carinho” e
e) saudade e infantil. “caro” sejam vocábulos
a) derivados de um mesmo verbo.
3. (UNIFESP 2018) Leia um trecho do artigo b) híbridos.
“Reflexões sobre o tempo e a origem do Uni- c) derivados de vocábulos distintos.
verso”, do físico brasileiro Marcelo Gleiser, d) cognatos.
para responder à próxima questão. e) formados por composição.
Qualquer discussão sobre o tempo deve começar
5. (Unifesp) _________ dois meses, a jornalis-
com uma análise de sua estrutura, que, por
falta de melhor expressão, devemos chamar de ta britânica Rowenna Davis, 25 anos, foi
“temporal”. É comum dividirmos o tempo em furtada. Só que não levaram sua carteira ou
passado, presente e futuro. O passado é o que seu carro, mas sua identidade virtual. Um
vem antes do presente e o futuro é o que vem hacker invadiu e tomou conta de seu e-mail
depois. Já o presente é o “agora”, o instante e – além de bisbilhotar suas mensagens e
atual. Isso tudo parece bastante óbvio, mas ter acesso a seus dados bancários – passou a
não é. Para definirmos passado e futuro, pre- escrever aos mais de 5 mil contatos de Row-
cisamos definir o presente. Mas, segundo nossa enna dizendo que ela teria sido assaltada em
separação estrutural, o presente não pode ter Madri e pedindo ajuda em dinheiro.
duração no tempo, pois nesse caso poderíamos Quando ela escreveu para seu endereço de e-
definir um período no seu passado e no seu fu- mail pedindo ao hacker ao menos sua lista
turo. Portanto, para sermos coerentes em nos- de contatos profissionais de volta, Rowenna
sas definições, o presente não pode ter duração
teve como resposta a cobrança de R$ 1,4 mil.
no tempo. Ou seja, o presente não existe! A
discussão acima nos leva a outra questão, a da Ela se negou a pagar, a polícia não fez nada.
origem do tempo. Se o tempo teve uma origem, A jornalista só retomou o controle do e-mail
então existiu um momento no passado em que porque um amigo conhecia um funcionário do
ele passou a existir. Segundo nossas modernas provedor da conta, que desativou o processo
teorias cosmogônicas, que visam explicar a ori- de verificação de senha criado pelo invasor.
gem do Universo, esse momento especial é o (Galileu, dezembro de 2011.)
momento da origem do Universo “clássico”. A Assinale a alternativa em que, na reescrita
expressão “clássico” é usada em contraste com do trecho, houve alteração da classe gram-
“quântico”, a área da física que lida com fenô-
atical da palavra em destaque.
menos atômicos e subatômicos. [...] As desco-
a) ... mas sua identidade virtual. = mas sua
bertas de Einstein mudaram profundamente identificação virtual.
nossa concepção do tempo. Em sua teoria da b) ... que desativou o processo de verificação
relatividade geral, ele mostrou que a presença de senha... = ... o qual desativou o processo
de massa (ou de energia) também influencia de verificação de senha...
a passagem do tempo, embora esse efeito seja c) Só que não levaram sua carteira... = Só que
irrelevante em nosso dia a dia. O tempo rela- não levaram a carteira dela...
tivístico adquire uma plasticidade definida pela d) ... a jornalista britânica Rowenna Davis, 25
realidade física à sua volta. A coisa se complica anos, foi furtada. = a britânica Rowenna
quando usamos a relatividade geral para de-
Davis, 25 anos, foi furtada.
screver a origem do Universo.
e) ... e ter acesso a seus dados bancários... =
(Folha de S.Paulo, 07.06.1998.)
... e ter acesso a seus dados do banco...

155
E.O. Dissertativas 3. (UNICAMP 2018) Enquanto viveu em Portu-
gal, o escritor Mário Prata reuniu centenas de
vocábulos e expressões usados no português
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) falado na Europa que são diferentes dos ter-
mos correspondentes usados no português do
1. (Unicamp) Os textos abaixo foram retirados Brasil. Reproduzimos abaixo um dos verbetes
da coluna “Caras e bocas”, do Caderno Aliás, de seu dicionário.
do jornal O Estado de S. Paulo:
“A intenção é salvar o Brasil.” Ana Paula Descapotável é outra palavra que em portu-
Logulho, professora e entusiasta da segunda guês faz muito mais sentido do que em bra-
“Marcha da Família com Deus pela Liber- sileiro. Não é mais claro dizer que um carro é
dade”, que pede uma intervenção militar descapotável, do que conversível? (Mário Pra-
no país e pretendeu reeditar, no sábado, a ta, Dicionário de português: schifaizfavoire.
passeata de 19 de março de 1964, na capi- São Paulo: Editora Globo, 1993, p. 48.)
tal paulista, contra o governo do Presidente a) Identifique os dois afixos que formam a pa-
João Goulart. lavra “descapotável” a partir do substantivo
“Será um evento esculhambativo em hom- “capota” (cobertura de um automóvel) e ex-
enagem ao outro de São Paulo.” José Caldas, plique a função de cada um.
organizador da “Marcha com Deus e o Diabo b) Explique por que o autor considera, com cer-
na Terra do Sol”, convocada pelo Facebook to humor, que a palavra “descapotável” do
para o mesmo dia, no Rio de Janeiro. português europeu faz mais sentido de que
(O Estado de S. Paulo, 23/03/2014, Caderno Aliás, E4. )
o termo“conversível”, usado no português
a) Descreva o processo de formação de palavras brasileiro.
envolvido em “esculhambativo”, apontando o
tipo de transformação ocorrida no vocábulo. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
b) Discorra sobre a diferença entre as expressões
“evento esculhambado” e “evento esculham- UM CHAMADO JOÃO
bativo”, considerando as relações de sentido
João era fabulista?
existentes entre os dois textos acima.
fabuloso?
2. (Unicamp) A sobrevivência dos meios de fábula?
comunicação tradicionais demanda foco ab- Sertão místico disparando
soluto na qualidade de seu conteúdo. A in- no exílio da linguagem comum?
ternet é um fenômeno de desintermediação.
Projetava na gravatinha
E que futuro aguardam os meios de comu-
a quinta face das coisas
nicação, assim como os partidos políticos e
inenarrável narrada?
os sindicatos, num mundo desintermediado?
Um estranho chamado João
Só nos resta uma saída: produzir informação
para disfarçar, para farçar
de alta qualidade técnica e ética. Ou fazemos
o que não ousamos compreender?
jornalismo de verdade, fiel à verdade dos
fatos, verdadeiramente fiscalizador dos po-
(...)
deres públicos e com excelência na presta-
ção de serviços, ou seremos descartados por Mágico sem apetrechos,
um consumidor cada vez mais fascinado pelo civilmente mágico, apelador
aparente autocontrole da informação na de precípites prodígios acudindo
plataforma virtual. a chamado geral?
(Carlos Alberto di Franco, Democracia demanda
jornalismo independente. O Estado de S. (...)
Paulo, São Paulo, 14/10/2013, p. A2.)
Ficamos sem saber o que era João
a) “Desintermediação” é um termo técnico do e se João existiu
campo da comunicação. Ele se refere ao fato deve pegar.
de que os meios de comunicação tradicionais (Carlos Drummond de Andrade, em Correio da
Manhã, 22/11/1967, publicado em Rosa, J. G.
não mais detêm o monopólio da produção
“Sagarana”. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.)
e distribuição de mensagens. Considerando
esse “mundo desintermediado”, identifique
duas críticas ao jornalismo atual formuladas 4. (Unicamp) Na segunda estrofe, há dois pro-
pelo autor. cessos muito interessantes de associação de
b) Os processos de formação de palavras en- palavras. Em “inenarrável/narrada” encon-
volvidos no vocábulo “desintermediação” tramos claramente um processo de deriva-
não ocorrem simultaneamente. Tendo isso ção. Em “disfarçar/farçar”, temos a sugestão
em mente, descreva como ocorre a formação de um processo semelhante, embora “farçar”
da palavra “desintermediação”. não conste dos dicionários modernos.

156
a) Relacione o significado de “inenarrável” com o
processo de sua formação; e o de “farçar”, na Gabarito
relação sugerida no poema, com “disfarçar”.
b) Explique como esses processos contribuem
na construção dos sentidos dessa estrofe.
E.O. Aprendizagem
1. D 2. B 3. A 4. C 5. A
5. (Fuvest) Leia com atenção o seguinte texto: 6. E 7. D 8. B 9. A 10. E
A onipresença do olho mágico da televisão
no centro da vida doméstica dos brasileiros,
com o 1poder (imaginário) de tudo mostrar
e tudo ver que os espectadores lhe atribuem,
E.O. Fixação
vem provocando curiosas alterações nas re- 1. D 2. B 3. C 4. E 5. D
lações entre o público e o privado. Durante 6. C 7. A 8. B 9. A 10. C
pelo menos dois séculos, o bom gosto bur-
guês nos ensinou que algumas coisas não
se dizem, não se mostram e não se fazem E.O. Complementar
em público. Essas mesmas coisas, até então
1. C 2. 1 + 2 + 4 + 8 = 15 3. C
reservadas ao espaço da privacidade, hoje
ocupam o centro da cena televisiva. Não 4. E 5. D
que o bom gosto burguês deva ser tomado
como referência indiscutível da 2ética que
regula a vida em qualquer sociedade. Mas a E.O. Dissertativo
inversão de padrões que pareciam tão con- 1.
venientemente estabelecidos nos países do a) O verbo “velar”, segundo o contexto, sig-
Ocidente dá o que pensar. No mínimo, po- nifica “zelar por alguém”. O adjetivo “dé-
demos concluir que a burguesia do terceiro bil” significa “frágil”.
milênio já não é a mesma que ditou o bom b) Ocorre derivação imprópria em “Do meu
comportamento dos dois séculos passados. pobre existir, meio partido...”, uma vez
No máximo, supõe-se que os fundamentos que o verbo “existir” foi empregado como
do contrato que ordenava a vida social en- substantivo, inclusive acompanhado pelo
tre os séculos XIX e XX estão profundamente adjetivo “pobre”.
abalados, e já vivemos, sem nos dar conta, O sufixo diminutivo em “criancinha”
em uma sociedade pós-burguesa, num sen- confere afetividade ao substantivo crian-
tido semelhante ao do que chamamos uma ça, caracterizada no poema como alguém
sociedade pós-moderna. frágil.
Maria R. Kehl, in Bucci e Kehl, Videologias: 2.
ensaios sobre televisão.
a) composição por justaposição e derivação
sufixal.
a) O que a autora do texto quer dizer, quando b) Os observadores criaram um neologismo
se refere ao “poder de tudo mostrar e tudo superficialmente, pois eles não consegui-
ver” (ref.1), atribuído à televisão, como ram alcançar um conhecimento aprofun-
“imaginário”? dado sobre o povo Ossevaolep.
b) Indique a palavra do primeiro período que 3.
O termo “ex-cineclubista” é resultado de
tem o mesmo significado do prefixo que en- quatro processos de formação de palavras:
tra na formação da palavra “onipresença”. redução/abreviação vocabular (cinecinema),
c) Indique uma palavra ou expressão do texto composição (cine + clube), derivação sufixal
que corresponda ao sentido da palavra “éti- (cineclube + ista) e derivação prefixal (ex +
ca” (ref.2). cineclubista).

4.
a) amorosa, horrorosa, cremosa, leitosa.
b) aridez, timidez, surdez, altivez .

E.O. UERJ
Exame Discursivo
1.
A palavra “desencontrários” é formada
por derivação, processo através do qual de
uma palavra se formam outras, por meio
da agregação de certos elementos que lhe

157
alteram o sentido, mas sempre se referin- b) O prefixo – des tem o sentido de nega-
do ao valor semântico da palavra primiti- ção, de ação contrária. O também prefixo
va. Assim, há duas possibilidades para a -inter tem o sentido de entre. O radical
formação da palavra em questão, conside- é -mediar. O sufixo -ção é utilizado para
rando o radical, prefixos e sufixos e desi- formar um substantivo a partir de um
nências flexionais: des+en+contr+ ário+s; verbo. Sendo assim, o processo de forma-
des+en+contr+ari+o+s. “Des” é um prefixo ção é de dois prefixos + radical + sufixo,
que indica negação. para a criação do neologismo.
2.
3.
a) Função metalinguística.
a) A palavra descapotável se constitui a par-
Uma dentre as justificativas:
– Os parágrafos explicam os significados tir do seguinte processo:
das palavras. §§ derivação parassintética (des + capota + ar);
– Os parágrafos contêm definição de pa- §§ derivação sufixal (sufixo vel encaixado ao
lavras por outras palavras. elemento anterior);
A agregação do sufixo vel faz cair o r da
b) Derivações sufixal ou sufixação. desinência verbal.
OCULTAÇÃO é o ato de ocultar e OCULTIS- b) O adjetivo descapotável, usado no portu-
MO designa crença, doutrina ou seita. guês europeu, faz referência a um veículo
3.
lobisomem: composição por aglutinação cuja capota pode ser recolhida. Em por-
linguarudo: derivação sufixal
tuguês brasileiro, a referência ao mesmo
tipo de veículo é dada pela palavra conver-
E.O. Objetivas sível. O autor considera que a primeira op-
ção apresenta um sentido mais adequado,
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) pois ela indicaria de modo mais adequado
1. B 2. A 3. D 4. D 5. D o fato de o veículo possuir uma capota. Já
a segunda opção, poderia nos dar a sensa-
ção de que o veículo, por ser conversível,
E.O. Dissertativas pode ser inteiramente modificado.
4.
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) a) No primeiro caso, a palavra “inenarrável”
1. significa “o que não pode ser narrado”.
a) Trata-se de uma derivação sufixal: “escul- A ideia de negação está no prefixo “in-”
hambativo” é uma palavra formada pelo (derivação prefixal). Porém, o elemento
acréscimo de um sufixo (-ivo) ao verbo ao qual se junta o prefixo é o adjetivo
“esculhambar”.
“enarrável”, que os dicionários, na sua
b) Apesar de derivarem do mesmo verbo
maioria, não costumam registrar. A pala-
(“esculhambar”), os adjetivos mencio-
nados diferem quanto ao seu significa- vra geralmente usada é “narrável”, o que
do. Evento “esculhambado” é sinônimo resulta em “inarrável”. Isso ocorre por
de “desorganizado, desmoralizado”; já haver dois verbos, “narrar” e “enarrar”,
evento “esculhambativo” é aquele que com o mesmo sentido.
“desmoraliza, satiriza” o evento anterior. No segundo caso, como o significado de
“disfarçar” é “encobrir”, “ocultar”, “ta-
2. par”, o vocábulo primitivo do qual ele
a) O autor faz críticas implícitas ao jornal- seria formado, por processo de derivação
ismo atual, quando diz que só resta ao jor- prefixal, seria “farçar”, que tem como
nalista que convive rotineiramente com significado oposto “revelar”, “manifes-
a internet: produzir informação de alta tar”. Mas essa velação não é absoluta, já
qualidade técnica e ética, fiel à verdade que a semelhança sonora entre “farçar”
dos fatos, verdadeiramente fiscalizadora e “farsa” sugeriria que João é capaz de
dos poderes públicos e com excelência na dizer o indizível, fazendo com que o mis-
prestação de serviços, comentário em que tério do “que não ousamos compreender”
se subentende que na era da frugalidade permaneça vivo em sua literatura.
virtual, nem todo jornalista produz infor- b) Na segunda estrofe, a ideia pretendida é
mações com alto teor ético e de qualidade. a de que João consegue realizar o impos-
O autor alerta que para os dias atuais, a sível. O processo de derivar um vocábulo
única maneira do jornalismo sobreviver à de outro “inexistente”, que se observa
internet é primando pela fidelidade da in- nos pares inenarrável/enarrável e disfar-
formação e dos fatos, a fim de prestar um çar/farçar, mostra o poder que o ficcio-
serviço confiável e essencial à sociedade. nista tem de realizar o “irrealizável”.

158
5.
a) O uso dos parênteses destaca o termo “ima-
ginário” no contexto da frase, para enfati-
zar que a televisão produz o efeito ilusório
de que as imagens transmitidas ao especta-
dor passivo representam a realidade.
b) O prefixo “oni” significa “tudo”, termo
que é repetido na frase “tudo mostrar e
tudo ver”.
c) Define-se ética como o conjunto de prin-
cípios, normas e regras que visem a um
comportamento moral exemplar, o que é
sugerido na expressão “bom comporta-
mento”.

159
Aulas 9 e 10

Artigo, substantivo
e adjetivo
Competências 1, 5 e 8
Habilidades 1, 2, 3, 4, 17, 26 e 27
Competência 1 – Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para
sua vida.
H1 Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como elementos de caracterização dos sistemas de comunicação.
H2 Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de comunicação e informação para resolver problemas sociais.
H3 Relacionar informações geradas nos sistemas de comunicação e informação, considerando a função social desses sistemas.
H4 Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação.
Competência 2 – Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) (LEM) como instrumento de acesso a informações e a outras
culturas e grupos sociais.
H5 Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM ao seu tema.
H6 Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus mecanismos como meio de ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e culturas.
H7 Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e seu uso social.
H8 Reconhecer a importância da produção cultural em LEM como representação da diversidade cultural e linguística.
Competência 3 – Compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da
identidade.
H9 Reconhecer as manifestações corporais de movimento como originárias de necessidades cotidianas de um grupo social.
H10 Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em função das necessidades cinestésicas.
Reconhecer a linguagem corporal como meio de interação social, considerando os limites de desempenho e as alternativas de adaptação para
H11
diferentes indivíduos.
Competência 4 – Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e
da própria identidade.
H12 Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos artistas em seus meios culturais.
H13 Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos.
H14 Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos.
Competência 5 – Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante
a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção.
H15 Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.
H16 Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário.
H17 Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional.
Competência 6 – Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da
realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação.
H18 Identificar os elementos que concorrem para a progressão temática e para a organização e estruturação de textos de diferentes gêneros e tipos.
H19 Analisar a função da linguagem predominante nos textos em situações específicas de interlocução.
H20 Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a preservação da memória e da identidade nacional
Competência 7 – Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas.
H21 Reconhecer em textos de diferentes gêneros, recursos verbais e não-verbais utilizados com a finalidade de criar e mudar comportamentos e hábitos.
H22 Relacionar, em diferentes textos, opiniões, temas, assuntos e recursos linguísticos.
H23 Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.
Reconhecer no texto estratégias argumentativas empregadas para o convencimento do público, tais como a intimidação, sedução, comoção,
H24
chantagem, entre outras.
Competência 8 – Compreender e usar a língua portuguesa como língua materna, geradora de significação e integradora da organização
do mundo e da própria identidade.
H25 Identificar, em textos de diferentes gêneros, as marcas linguísticas que singularizam as variedades linguísticas sociais, regionais e de registro.
H26 Relacionar as variedades linguísticas a situações específicas de uso social.
H27 Reconhecer os usos da norma padrão da língua portuguesa nas diferentes situações de comunicação.
Competência 9 – Entender os princípios, a natureza, a função e o impacto das tecnologias da comunicação e da informação na sua vida
pessoal e social, no desenvolvimento do conhecimento, associando-o aos conhecimentos científicos, às linguagens que lhes dão suporte,
às demais tecnologias, aos processos de produção e aos problemas que se propõem solucionar.
H28 Reconhecer a função e o impacto social das diferentes tecnologias da comunicação e informação.
H29 Identificar pela análise de suas linguagens, as tecnologias da comunicação e informação.
H30 Relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento que elas produzem
O artigo
O artigo é a palavra que se antepõe a um substantivo (é um marcador pré-nominal), com a função inicial de
determiná-lo, ou indeterminá-lo. São classificados em dois grupos: definidos e indefinidos

§§ Artigos definidos: determinam o substantivo de maneira precisa. São eles: o(s), a(s)
Exemplo: Preciso que você me traga a cadeira branca.
(o artigo definido marca a necessidade de se pegar uma cadeira determinada).

§§ Artigos indefinidos: determinam o substantivo de maneira vaga/imprecisa. São eles: um (uns), uma(s)
Exemplo: Preciso que você me traga uma cadeira branca.
(o artigo indefinido marca a necessidade de se pegar uma cadeira qualquer, indeterminada).

Artigo combinado com preposições


A contração de artigos com preposições é um movimento essencial para demarcação de sentido dos artigos em
construções textuais. Muitas vezes, fazer ou não fazer a contração do artigo com a preposição pode alterar signifi-
cativamente o entendimento que se tem de um texto. Esses eventos textuais serão discutidos no próximo tópico (O
artigo aplicado ao texto). Ficaremos aqui com as possibilidades de contração do artigo com a preposição.

Artigo
Preposições
o, os à, às * um, uns uma, umas
a ao, aos à, às * --- ---
de do, dos da, das dum, duns duma, dumas
em no, nos na, nas num, nuns numa, numas
por pelo, pelos pela, pelas --- ---
* A junção de “A” preposição + “A” artigo é o que dá origem ao fenômeno da Crase, que será discutido em momento oportuno.

O artigo aplicado ao texto


O artigo talvez seja uma das classes gramaticais mais subestimadas da língua portuguesa, e isso ocorre, principal-
mente, pelo fato de, em âmbito escolar, ser apresentado apenas em suas características estruturais mais básicas,
sem o devido aprofundamento semântico ou textual que os vestibulares costumam abordar. Por esse motivo, apre-
sentaremos a seguir as aplicações textuais do artigo.

Artigo como marcador de quantidade


A presença ou ausência do artigo pode servir como quantificador de elementos.
Exemplos:
Ele trocou o dinheiro em casa de câmbio da Rua do Ouvidor (a ausência de artigo indica que há mais de 1 casa
de câmbio na rua).
Ele trocou o dinheiro na casa de câmbio da Rua do Ouvidor (a presença de artigo indica que há apenas uma casa
de câmbio na rua).

163
Artigo como marcador de convívio/intimidade
A presença ou ausência do artigo pode servir como algo que marca certos afetos em relação aos indivíduos.

Exemplos:
A gerência será assumida por Gerson Soares, do almoxarifado (a ausência de artigo indica distanciamento
de Gerson, marcando o fato de que, possivelmente, nem todos o conhecem).

A gerência será assumida pelo Gerson Soares, do almoxarifado (a presença de artigo indica intimidade com
Gerson, podendo marcar uma conversa entre pessoas que conhecem o Gerson).

Artigo marcando conhecimento ou desconhecimento


de substantivos
Os artigos definido e indefinido podem marcar o conhecimento ou o desconhecimento de certos assuntos condu-
zidos por substantivos. Por exemplo:
Exemplos:
Foi localizado o jovem serial killer que havia fugido da cadeia (o artigo definido nos transmite a ideia de que
a notícia da fuga do jovem era de conhecimento dos leitores; ou seja, o substantivo era conhecido).

Foi localizado um jovem serial killer que havia fugido da cadeia (o artigo indefinido nos transmite a ideia de
que a fuga do jovem era novidade para os leitores; ou seja, o substantivo era desconhecido).

Artigo como particularizador ou generalizador


Exemplos:
Garfield é um gato (o artigo indefinido marca a ideia de que Garfield é mais um entre os vários gatos no
mundo; ou seja, generaliza o substantivo).

Garfield é o gato (O artigo definido marca a ideia de que Garfield é um gato especial em relação a outros
gatos; ou seja, particulariza e destaca o substantivo).

Artigo como marcador de coerência textual


Para marcarmos coerência textual, muitas vezes nos valemos das capacidades de determinação e indeter-
minação dos artigos.
Exemplos: Um rapaz magrinho apareceu em casa ontem vendendo umas bíblias. O rapaz era bem simpá-
tico, estava bem vestido, mas me irritou quando...

No exemplo apresentado, constatamos que quando precisamos introduzir uma informação que nosso in-
terlocutor desconhece, nos valemos primeiro de um artigo indefinido, e depois de apresentado o substantivo (no
caso, o rapaz) começamos a demarcá-lo a partir do artigo definido. Há também outra possibilidade de organização:
Exemplos:
– Então, como é o sítio?
– Bem, é um sítio antigo, retiramos a água do poço, mas é bastante tranquilo...
Nesse segundo exemplo, a coerência textual é definida quando é apresentado um substantivo definido que
nosso interlocutor conhece. Para satisfazer a demanda de explicação, o interlocutor abre sua explicação marcando
o substantivo com artigo indefinido.

164
Substantivo e adjetivo
Nessa aula estudaremos duas classes de palavras que estabelecem relações definitivas para o entendimento futuro
dos processos sintáticos. São elas o substantivo e o adjetivo.

Substantivo
É a classe de palavras variável que dá nome aos seres, objetos e coisas em geral.

Classificação
§§ Próprios: nomeiam a totalidade dos seres de uma espécie (designação genérica) ou o indivíduo único de
determinada designação específica. Ex: Paulo / Pedro / Roma / Folha de S.Paulo.
§§ Comuns: nomeiam, sem distinção, todo e qualquer ser de uma espécie. Ex: cadeira / porta / sala.
§§ Concretos: nomeiam os seres de existência concreta, real, palpável (a pedra ou a porta, por exemplo) e
também seres dos quais já se constituiu uma imagem histórica (a bruxa ou a fada, por exemplo).
§§ Abstratos: nomeiam sentimentos/sensações, elementos não palpáveis. Ex: maldade / compaixão / beijo.

Flexões de substantivos
Número

Os substantivos podem se flexionar por número, indicando quantidades de certos termos/elementos. Existe, a prin-
cípio, uma regra geral, e também algumas variantes que são apresentadas a seguir:
§§ Regra geral: o plural dos substantivos terminados em vogal ou ditongo exige o acréscimo do sufixo mar-
cador de plural “-s”:
Exemplos: cadeira > cadeiras / mãe > mães / perna > pernas
§§ Substantivos terminados em ”-ão”:
1. fazem o plural em “-ãos”:
Exemplos: cidadão > cidadãos / irmão > irmãos / órgão > órgãos
2. fazem o plural em “-ães”:
Exemplos: escrivão > escrivães / cão > cães / alemão > alemães
3. fazem o plural em “-ões”:
Exemplos: canção > canções / gavião > gaviões / botão > botões
§§ Substantivos terminados em consoantes:
1. R, -Z e -N fazem o plural em -es: mar > mares - rapaz > rapazes
2. substantivos oxítonos terminados em -s e -z fazem o plural em -es: país > países - raiz > raízes
3. substantivos paroxítonos terminados em -s são invariáveis: atlas > atlas - lápis > lápis
4. substantivos terminados em -al, -el, -ol e -ul substituem no plural o -l por -is: animal > animais
5. substantivos oxítonos terminados em -il fazem o plural em -s: ardil > ardis funil > funis
6. substantivos paroxítonos terminados em -il fazem o plural em -eis: fóssil > fósseis

165
Gênero

Os substantivos podem se flexionar também por gênero, indicando quantidades de certos termos/elementos. Tam-
bém existe uma regra geral e algumas variantes a serem observadas:
§§ Regra geral: o feminino dos substantivos é formado pela substituição da desinência “-o” (masculino)
pela desinência “-a” (feminino). São conhecidos como substantivos biformes, pois possuem duas formas
diferentes para designação de gênero:
Exemplos: menino > menina / garoto > garota

Há também substantivos biformes formados por radicais diferentes:


Exemplos: homem > mulher / cavalheiro > dama
§§ Substantivos uniformes: são aqueles que apresentam uma única forma para marcação de gênero:
1. Epicenos: usados para nomes de animais de um gênero só que designam ambos os sexo:
Exemplos: A águia - A mosca - O condor - O gavião

Observação:
Caso haja necessidade de especificar o sexo do animal, juntam-se aos substantivos os adjetivos
macho ou fêmea:
Exemplos: gavião macho - gavião fêmea; tatu macho - tatu fêmea

2. Comum de dois: a marcação de gênero é feita exclusivamente pelos artigos. O substantivo se mantém:
Exemplos: o agente > a agente
o gerente > a gerente
3. Sobrecomuns: designam ambos os sexos com forma masculina ou feminina:
Exemplos: a criança / a testemunha / a vítima
4. Flexão de grau: Os substantivos se flexionam por grau, e marcam aumento ou diminuição:
Grau normal: homem, boca
Grau aumentativo: homenzarrão, bocarra
Grau diminutivo: homenzinho, boquinha
Grau diminutivo / aumentativo sintético: chapeuzinho, chapelão, homúnculo / homenzarrão, bo-
quinha / bocarra
Grau diminutivo / aumentativo analítico: junta-lhe um adjetivo que indique aumento ou diminui-
ção: boca grande, homem pequeno

Adjetivo
É a palavra que acompanha e modifica o substantivo, podendo caracterizá-lo ou qualificá-lo.

Nomes substantivos e nomes adjetivos


No contexto de uma frase, é possível identificar palavras de outras classes, entre elas os adjetivos, que se transfor-
mam em nomes (substantivos) desde que precedidas de um artigo:
Exemplos: o jovem desempregado > um desempregado jovem

166
Adjetivos pátrios e gentílicos

§§ Derivados de substantivos, os adjetivos que indicam a nacionalidade de pessoas e coisas são chamados
pátrios: brasileiro, mineiro, paranaense, paulista, português.

§§ Os que indicam etnias e povos são os adjetivos gentílicos: israelita, semita, gaúcho, carioca, potiguar, euro-
peu, africano, etc.

Adjetivos pátrios compostos

Luso-brasileiro, euro-asiático, teuto-brasileiro, afro-americano, franco-suíço, hispano-americano, austro-húngaro,


indo-europeu, anglo-americano...

Flexão do adjetivo
§§ Número: o adjetivo toma a forma singular ou plural do substantivo que ele determina:
Exemplos: aluno estudioso > alunos estudiosos
aluna aplicada > alunas aplicadas
perfume francês > perfumes franceses

§§ Plural dos adjetivos compostos: apenas o último elemento vai para o plural:
Exemplos: clínicas médico-dentárias
institutos ítalo-brasileiros

Observação 1:
Há uma exceção: surdo-mudo > surdos-mudos

Observação 2:
São invariáveis os adjetivos referentes a cores, se o último elemento ou ambos forem substantivos:
blusas vermelho-sangue, vestidos cor de rosa, blusas verde-limão

§§ Grau dos adjetivos:


1. Comparativo: indica determinada qualidade em grau igual, superior ou inferior a outra:
Exemplos: Pedro é tão estudioso como (ou quanto) Rodrigo.
Pedro é mais estudioso que Rodrigo.
Pedro é menos estudioso que Rodrigo.

2. Superlativo:
Pode indicar determinada qualidade em grau elevado (superlativo absoluto):
Exemplos: Pedro é inteligentíssimo.
Rodrigo é muito inteligente.

Pode indicar determinada qualidade em grau mais ou menos elevado em comparação à totalidade dos seres
(superlativo relativo):
Exemplos: João é o aluno mais estudioso da classe. (superlativo relativo de superioridade)
João é o aluno menos estudioso da classe. (superlativo relativo de inferioridade)

167
Substantivos e adjetivos aplicados ao texto
Tanto os substantivos quanto os adjetivos têm importantíssimas aplicações textuais, que serão exploradas em
gêneros textuais variados. Vejamos como funcionam:

Substantivo e texto
A construção de um texto depende essencialmente dos substantivos, pois é deles que parte o processo de referen-
cialidade. Entende-se por referencialidade a capacidade que os substantivos têm de apontar para os elementos
do mundo que compõem sentido, e também de fazer com que esses sentidos sejam construídos à medida que
novos substantivos apareçam no texto. O movimento de referencialidade parte de 3 pressupostos importantes:
§§ Introdução / construção: apresenta um substantivo no texto, não apenas o introduz, como constitui uma
ideia. É a partir desse substantivo que o texto se constrói.
§§ Retomada / manutenção: usam-se outros substantivos muito similares ao primeiro, que permitem reto-
mar a ideia inicialmente apresentada (o que contribui para a manutenção de sentido)
§§ Desfocalização: é o momento do texto em que entram em cena novos substantivos que tomam o foco
para si e ampliam os sentidos do texto.

Adjetivo e texto
Os adjetivos exercem o importante papel de conduzir os processos descritivos de um texto. Em termos mais claros,
os adjetivos são responsáveis por compor sentenças que, por exemplo, caracterizem os personagens de uma narra-
tiva (suas roupas, atitudes) ou que apresentem detalhes a respeito de uma localização (detalhes de uma cidade, ou
ambiente florestal), entre outras caracterizações. Em textos literários brasileiros do período romântico, por exemplo,
havia a necessidade de se evidenciar características que valorizassem a nação, por esse motivo encontramos obras
em que há grandes processos de adjetivação, caracterizando o ambiente brasileiro (o livro Iracema, de José de
Alencar, é um grande exemplo).

168
INTERATIVI
A DADE

LER

No primeiro, o autor trabalha com os sentidos das palavras “autor” e


“defunto” em diferentes classes gramaticais.
Capítulo I - ÓBITO DO AUTOR
Algum tempo hesitei se devia estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto
é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto
o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me leveram
a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um
autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a
segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Moisés, que
também contou a sua morte, não a pôs no introito, mas no cabo: diferença
radical este livro e o Pentateuco.

170
170
APLICAÇÃO NO COTIDIANO

Vanessa Teixeira, aluna do curso de letras da UERJ, produziu uma crônica acerca das múltiplas funções do
adjetivo.
A vida com os adjetivos (por Vanessa Gomes Teixeira)
Acabo de inventar um movimento novo de libertação. Resolvi libertar a classe de palavras mais injustiça-
da da língua portuguesa, os adjetivos. Não apenas por esse motivo, mas também porque eles são os seres
mais bipolares da nossa gramática.
Os adjetivos são tão bipolares que, se não modificarem o substantivo, mudam de classe, como no caso:
“Esse homem está doente” e “O doente foi atendido pelo médico”. Na primeira frase, a palavra “doente”
funciona como adjetivo, porque modifica o substantivo “homem”; na segunda, como substantivo, pois
não muda ninguém, apenas designa o ser sobre o qual queremos falar. Outro exemplo são as frases “O
menino rápido comeu seu lanche” e “O menino comeu rápido seu lanche”. Na primeira, “rápido” é
adjetivo porque atribui uma característica ao menino citado; já na segunda frase, a palavra desempenha
o papel de advérbio porque, nessa sentença, “rápido” não está se relacionando com o substantivo
“menino” e sim expressando o modo como ele comeu. O adjetivo muda tanto que, além de mudar o
substantivo, ele pode modificar seu próprio sentido – dependendo da posição que ocupa: a expressão
“uma menina pobre”, por exemplo, tem o sentido diferente da expressão “uma pobre menina”, mesmo
sendo ambas compostas pelas mesmas palavras.
Segundo as gramáticas tradicionais, a definição de adjetivo é “palavra que modifica o substantivo,
atribuindo-lhe uma característica”. Vendo dessa forma, ele parece apenas um figurante, que serve de
apoio para o protagonista que “designa os seres em geral”. Mas será que ele é somente um acessório?
O parceiro do adjetivo é o substantivo, classe que tem sua própria independência. Substantivos têm seu
sentido completo, adjetivos precisam dos nomes com que irão se relacionar. Porém, não são apenas enfei-
tes, pois afinal são os termos que dão a personalidade de tudo que existe no mundo.
Se a primeira coisa que fizemos foi nomear as coisas, a segunda, com certeza, foi caracterizá-las. Se os
substantivos nos permitem categorizar e organizar o mundo, os adjetivos nos permitem especificar esse
mundo no qual vivemos. Eles também nos possibilitam esclarecer qual a posição em que nos colocamos
ao construir uma sentença e qual é a nossa intenção ao expressá-la. Falar “A menina viu o menino” é bem
diferente de “A menina insensível viu o menino triste”. Isso ocorre porque os adjetivos nos permitem
demonstrar qual é a nossa visão ao analisarmos uma pessoa ou situação.
Outro recurso que também nos ajuda no processo de posicionamento é a capacidade que essa classe
de palavras tem de comparar dois seres ou ressaltar uma qualidade: assim como o comparativo dos subs-
tantivos, o superlativo dos adjetivos nos ajuda a individualizar o nome, apresentando características que
somente eles possuem ou que eles têm em maior quantidade do que resto do grupo.
De modo geral, os adjetivos não qualificam apenas os nomes, eles transformam a regra em exceção, ou
seja, transformam um simples “mais um” em algo único no mundo. Isso porque todos somos categoriza-
dos como objetos ou seres, homens ou animais, machos ou fêmeas; mas cada um de nós possui caracte-
rísticas que nos diferenciam do resto, aquelas que ninguém mais tem e que nos fazem ser exatamente
quem somos.

Disponível em: http://blogclaudiocezarhenriques.blogspot.com.br/2011/11/cronica-09.html


171
INTERDISCIPLINARIDADE

Canção: Esse cara (Caetano Veloso) Canção: O nome das coisas (Karnak)
A canção é composta por substantivos de diferen-
A canção, em seu refrão, recorre às propriedades
tes naturezas.
semânticas do emprego dos artigos: “Ele é o
Nomes se dão às coisas
homem Nomes se dão
Eu sou apenas uma mulher”. Nomes se dão às pessoas
Nomes se dão
Nomes se dão aos deuses na imensidão do céu
ESSE CARA
Nomes se dão aos barquinhos na imensidão do
Ah! Que esse cara tem me consumido mar
A mim e a tudo que eu quis Nomes se dão às doenças na imensidão da dor
Com seus olhinhos infantis Nomes se dão às crianças na imensidão do amor
You and me
Como os olhos de um bandido Salame
Ele está na minha vida porque quer Batata
Eu estou pra o que der e vier Barata
Bigorna
Ele chega ao anoitecer
Casa
Quando vem a madrugada ele some Comida
Ele é quem quer Bicho
Paçoca
Ele é o homem
Tampinha de caneta
Eu sou apenas uma mulher Bolinha de sabão
Rabo de galo
Circo
Pão
Conchinha de galinha
Coxinha do mar
Linha
Palito
Terra
Água
Ar
Seriema
Tatu
Merthiolate
Saci
Rocambole de laranja
Revista

172
Gibi Biga
Pipoca Mocreia
Margarina Apolo
Lentilha Nostradamus
Leitão Filarmônica
Carrinho de feira Marisa
Terremoto Biriba
Furacão Pelé
Centopeia Afrodite
Isqueiro José
Cefaleia Filho
Blefarite Veleiro
Cimento Alá
Colar Deus
Risole Salomão
Rinite Peixe
Armário Pão
Geladeira
Furadeira
Cobertor
Ladeira
Pedreira
Fogueira
Extintor
Jeton
Bazuca
Suporte
Argamassa
Fio de nylon
Lamparina
Chocolate
Queratina
Juliana
Cadarço
Picareta
Beija-flor
Convidados
Esfiha
Chupeta
Fruta-cor
Trompete
Arame
Hepatite
Fax-símile
Chocalho
Geleia 173
ESTRUTURA CONCEITUAL

GRAMÁTICA
NORMATIVA

ESTUDO DOS PROCESSOS DE


MORFOLOGIA FORMAÇÃO DE PALAVRAS

PALAVRA VARIÁVEL
CLASSE DAS QUE ESPECIFICA
O SUBSTANTIVO,
PALAVRAS CARACTERIZANDO-O

ADJETIVO

SUBSTANTIVO
ARTIGO

PALAVRA VARIÁVEL QUE


DÁ NOME A SERES REAIS,
PALAVRA VARIÁVEL IMAGINÁRIOS OU IDEIAS
QUE SE ANTEPÕE
AO SUBSTANTIVO,
DETERMINANDO-O

174
E.O. Aprendizagem 2. (Ufrgs) A notícia saiu no The Wall Street Jour-
nal: a "ansiedade 1superou a depressão como
problema 2de saúde mental predominante nos
EUA". Para justificar o absurdo, o autor da
1. (IFAL) 77% dos pais americanos culpam o matéria recorre a 3um psicoterapeuta e a um
videogame por expor os filhos à violência 4
sociólogo. O primeiro descreve "ansiedade
Será que videogames tornam as crianças como 5condição dos privilegiados" que, livres
mais agressivas? Com certeza, você já ouviu de ameaças reais, se dão ao luxo de "olhar para
essa questão por aí. Afinal, a polêmica exis- dentro" e criar medos irracionais; o segundo
te há muito tempo. 2Por enquanto, a ciên- diz que "vivemos na era mais segura da huma-
nidade" e, no entanto, "desperdiçamos bilhões
cia não tem uma resposta definitiva sobre
de dólares 6em medos bem mais ampliados do
o tema. 3Estudos recentes apontam que eles que seria 7justificável". Sem meias palavras,
não podem ser culpados pela violência in- 8
os peritos dizem algo mais ou menos assim:
fantil. 4Já outros afirmam que eles alteram a os americanos estão nadando em 9riqueza e,
atividade cerebral e deixam as pessoas mais como não têm do que se queixar, adquiriram
insensíveis. o costume neurótico 10de 11desentocar medos
Mas, segundo uma pesquisa realizada pela
12
irracionais para projetá-los no 13admirável
Common Sense Media e divulgada nesta sema- mundo novo ao redor.
A explicação impressiona pela ingenuida-
na, os pais americanos não têm dúvidas: 77%
de ou pela má-fé. Ninguém contrai o 14"Mau
deles culpam jogos, filmes e a TV por man- hábito" 15de olhar para 16dentro de si do dia
ter uma cultura de violência entre as crian- para a noite. A obsessão consigo não é um
ças. Os dados mostram também que os pais efeito colateral 17do modo de vida atual; é um
aprovam medidas mais rigorosas para manter dos seus mais 18indispensáveis ingredientes.
os filhos longe de conteúdos violentos: 688% O crescimento exagerado do interesse pelo
acreditam que anúncios violentos não deve- "mundo interno" e pelo 19corpo é a 20contra-
riam ser veiculados durante programas com partida do desinteresse ou hostilidade pelo
"mundo externo" e pelos outros. Diz o 21ca-
grande audiência infantil e 91% apoiam que
tecismo: só confie em seu corpo e sua mente.
só possam ser exibidos trailers com a mesma 22
O resto é 23concorrente; o resto está sempre
classificação indicativa do filme. cobiçando e disputando seu emprego, seu
“Os pais estão claramente preocupados com sucesso, seu patrimônio e sua saúde. Sentir
o impacto que a violência na mídia pode ter medo e ansiedade, em condições semelhan-
em suas crianças”, diz 7James Steyer, criador tes, é um estado emocional perfeitamente ra-
e CEO da empresa responsável pela pesquisa. cional e inteligível.
Em bom português, sentir-se condenado a
Além dos jogos de videogame, outras pre- 24
jamais ter repouso físico ou 25mental, sob
ocupações dos pais são o bullying (92%) o pena de perder a saúde, a 26longevidade, a
acesso a armas (75%) e os níveis atuais de forma física, o desempenho 27sexual, o em-
crime (86%). prego, a casa, a segurança na velhice, pode ser
E você, o que acha desse assunto? um inferno em vida para os pobres ou para os
(Disponível em: http://super.abril.com.br/blogs/ ricos. Os 28candidatos à ansiedade são, assim,
superblog/ 77-dos-pais-americanos-culpam-o-videogame- bem mais numerosos e bem menos ociosos do
por-expor-os-filhos-a-violencia. Acesso em: 16/01/2017.) que pensam o 29psicoterapeuta e o sociólogo.
Considere as seguintes afirmações acerca do
As palavras em destaque estão com função uso de artigos.
de substantivos ou adjetivos, exceto na al- I. Caso tivéssemos "uma condição" em vez
ternativa de "condição" (ref. 5) haveria alteração
a) Por enquanto, a ciência não tem uma res- no sentido global da frase
II. O artigo indefinido "uns" poderia subs-
posta definitiva sobre o tema. (ref. 2)
tituir o definido (ref. 8) "os", sem que
b) Estudos recentes apontam que eles não houvesse alteração no sentido da frase
podem ser culpados pela violência infantil. em questão.
(ref. 3) III. As duas ocorrências do artigo definido
c) Já outros afirmam que eles alteram a ati- "o" anteposto às palavras "psicoterapeu-
vidade cerebral e deixam as pessoas mais ta" e "sociólogo" (ref. 29) poderiam ser
substituídas por um indefinido sem mu-
insensíveis. (ref. 4) dar o sentido da frase.
d) 88% acreditam que anúncios violentos não Quais estão corretas?
deveriam ser veiculados durante programas a) Apenas I.
com grande audiência infantil (ref. 6). b) Apenas II.
e) James Steyer, criador e CEO da empresa res- c) Apenas I e III.
d) Apenas II e III.
ponsável pela pesquisa. (ref. 7)
e) I, II e III.

175
3. (IFAL) tem, porém o melhor fruto que nela se pode
Paraí-ba (Céceu) fazer me parece que será salvar esta gente e
Pê – a – pá esta deve ser a principal semente que vossa
Erre – a – ra – í alteza em ela deve lançar.
Bê – a – bá
Paraíba O trecho apresentado é preponderantemente
descritivo. A classe de palavras que apare-
Paraíba do norte, do caboclo forte
ce associada a esse tipo textual é o adjetivo.
Do homem disposto esperando chover
São exemplos de palavras dessa classe, no
Da gente que canta com água nos olhos
texto, as seguintes:
Chorando e sorrindo, querendo viver a) ...porém a terra em si é de muito bons ares...
Do sertão torrado, do gado magrinho b) Águas são muitas e infindas.
Do açude sequinho, do céu tão azul c) ...dar-se-á nela tudo por bem das águas que
Do velho sentado num banquinho velho tem...
Comendo com gosto um prato de angu d) ...o melhor fruto que nela se pode fazer me
Acende o cachimbo, dá uma tragada parece que será salvar esta gente...
Não sabe de nada da vida do sul e) ...esta deve ser a principal semente que vos-
Pê – a – pá sa alteza em ela deve lançar.
Erre – a - ra – í
Bê – a – bá
Paraíba 5. (UEG) CELULARES EXPLOSIVOS, IDEIAS NEM
Paraíba do norte que tem seu progresso TANTO
Que manda sucesso pra todo país
Sou uma nulidade no uso do celular. Mal co-
Que sente a presença da mãe natureza
nheço a senha para tirar as mensagens lá de
Que vê a riqueza nascer da raiz
Que acredita em Deus, também no pecado dentro e, pelo que vejo, meu aparelho é forte
Que faz do roçado a sua oração candidato a uma dessas explosões que têm
E ainda confia no seu semelhante acontecido ultimamente.
E vai sempre avante em busca do pão Pinóquio não primava pela responsabilidade
O pão que é nosso, que garante a vida nos compromissos assumidos, mas seu Grilo
Terrinha querida do meu coração Falante, de cartola e guarda-chuva, conhecia
Pê – a – pá as virtudes da polidez e da adequação. Não
Erre – a – ra – í tomava a palavra antes de um minúsculo pi-
Bê – a – bá garro de advertência.
Paraíba Inseto mutante, o celular está para o grilo de
(Ramalho, Zé. Duetos. BMG. São Paulo, 2004. CD-ROM.) Pinóquio um pouco como a guitarra elétrica
para o antigo violão. Adota os tons mais es-
Na frase: Do velho sentado num banquinho tridentes, descabelados e imperativos, a que
velho, observa-se: as pessoas obedecem numa coreografia alu-
a) Nas duas vezes em que a palavra VELHO apa- cinada. A pose mais estudada da grã-fina se
rece, ela tem a função de substantivo. estilhaça em aflição e pânico enquanto ela
b) Nas duas vezes em que a palavra VELHO apa- remexe na bolsa à procura do aparelho; o ta-
rece, ela tem a função de adjetivo. xista mais inerte e distraído pula ao menor
c) Primeiramente, VELHO tem a função de subs- toque, como se tivesse uma aranha dentro do
tantivo; depois, tem a função de adjetivo. carro. E nem se sabia que aquilo era carrega-
d) Primeiramente, VELHO tem a função de adje- do de dinamite.
tivo; depois, tem a função substantivo. (COELHO, M. Folha de S. Paulo., São Paulo,
e) No texto, nas duas vezes em que a palavra 10 maio 2006, p. E 10. Ilustrada.)
VELHO aparece não assume nem a função de
adjetivo, nem de substantivo. No texto, o artigo definido pode ser identifi-
cado em todas as orações a seguir, EXCETO em:
4. (IFSP) Esse texto do século XVI reflete um a) “Não tomava a palavra”
momento de expansão portuguesa por vias b) “Mal conheço a senha”
marítimas, o que demandava a apropriação c) “é forte candidato a uma dessas explosões”
de alguns gêneros discursivos, dentre os d) “ela remexe na bolsa à procura do aparelho”
quais a carta. Um exemplo dessa produção é
a Carta de Caminha a D. Manuel. Considere a TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
seguinte parte dessa carta:
Nela [na terra] até agora não pudemos saber Esparadrapo
que haja ouro nem prata... porém a terra em
si é de muito bons ares assim frios e tem- Aquele restaurante de bairro é do tipo sim-
perados como os de Entre-Doiro-e-Minho. patia/classe média. Fica em rua sossegada, é
Águas são muitas e infindas. E em tal ma- pequeno, limpo, cores repousantes, comida
neira é graciosa que querendo-a aproveitar, razoável, preços idem, não tem música de
dar-se-á nela tudo por bem das águas que triturar os ouvidos. O dono senta-se à mesa

176
da gente, para bater um papo leve, sem in- Ameaçaram, pintaram e bordaram. Foi muito
timidades. desagradável.
Meu relógio parou. Pergunto-lhe quantas ho- — E afinal?
ras são. — Cansei de explicar a eles que não havia co-
— Estou sem relógio. fre, nunca houve, como é que eu podia inven-
— Então vou perguntar ao garçom. tar cofre naquela hora?
Ele também está sem relógio. — Ficaram decepcionados, imagino.
— E o colega dele, que serve aquela mesa? — Não senhor. Disseram que tinha de haver
— Ninguém está com relógio nesta casa. cofre. Eram cinco, inclusive a moça de bota
— Curioso. É moda nova? e revólver, querendo me convencer que tinha
— Antes de responder, e se o senhor permi- cofre escondido na parede, no teto, embaixo
te, vou lhe fazer, não propriamente um pedi- do piso, sei lá.
do, mas uma sugestão. — E o resultado?
— Pois não. — Este — e baixou a cabeça, onde, no cocuru-
— Não precisa trazer relógio, quando vier to, alvejava a estrela de esparadrapo.
jantar. — Oh! Sinto muito. Não tinha notado. Feliz-
— Não entendo. mente escapou, é o que vale. Dê graças a Deus
— Estamos sugerindo aos nossos fregueses por estar vivo.
que façam este pequeno sacrifício. — Já sei. Sabe que mais? Na polícia me per-
— Mas o senhor podia explicar... guntaram se eu tinha seguro contra roubo. E
— Sem querer meter o nariz no que não é da eu pensando que meu seguro fosse a polícia.
minha conta, gostaria também que trouxesse Agora estou me segurando à minha maneira,
pouco dinheiro, ou antes, nenhum. deixando as coisas lá em casa e convidando os
— Agora é que não estou pegando mesmo fregueses a fazer o mesmo. E vou comprar um
nada. cofre. Cofre pequeno, mas cofre.
— Coma o que quiser, depois mandamos re- — Para que, se não vai guardar dinheiro nele?
ceber em sua casa. — Para mostrar minha boa-fé, se eles volta-
— Bem, eu moro ali adiante, mas e outros, rem. Abro imediatamente o cofre, e verão que
os que nem se sabe onde moram, ou estão de não estou escondendo nada. Que lhe parece?
passagem na cidade? — Que talvez o senhor precise manter um
— Dá-se um jeito. estoque de esparadrapo em seu restaurante.
— Quer dizer que nem relógio nem dinhei- ANDRADE, Carlos Drummond de. Esparadrapo. In Para
ro? gostar de ler. v. 3. Crônicas. São Paulo: Ática, 1978.
— Nem joias. Estamos pedindo às senhoras
que não venham de joia. É o mais difícil, mas 6. (G1 – ifsc) Assinale a alternativa cuja palavra
algumas estão atendendo. poderia substituir de maneira CORRETA o ad-
— Hum, agora já sei. jetivo – “obtuso” (ref. 6), sem que houvesse
— Pois é. Isso mesmo. O amigo compreen- alteração considerável no sentido da frase.
de... a) teimoso
— Compreendo perfeitamente. b) apressado
Desculpa ter custado um pouco a entrar na c) insensível
jogada. Sou meio 6obtuso quando estou com d) agressivo
fome. e) estúpido
— Absolutamente. Até que o amigo com-
preendeu sem que eu precisasse dizer tudo. 7. (ESPCEX) Assinale a única opção em que a
Muito bem. palavra “a” é artigo.
— Mas me diga uma coisa. Quando foi isso? a) Hoje, ele veio a falar comigo.
— Quarta-feira passada. b) Essa caneta não é a que te emprestei.
— E como foi, pode-se saber? c) Convenci-a com poucas palavras.
— Como podia ser? Como nos outros lugares, d) Obrigou-me a arcar com mais despesas.
no mesmo figurino. Só que em ponto menor. e) Marquei-te a fronte, mísero poeta.
— Lógico, sua casa é pequena. Mas levaram
o quê? 8. (UFRRJ)Mãos dadas
— O que havia na caixa, pouquinha coisa. 1ª estrofe
Eram 9 da noite, dia meio parado. Não serei o poeta de um mundo caduco.
— Que mais? Também não cantarei o mundo futuro.
— Umas coisinhas, liquidificador, relógio de Estou preso à vida e olho meus companheiros.
pulso, meu, dos empregados e dos fregueses. Estão taciturnos mas nutrem grandes espe-
— An. (Passei a mão no pulso, instintiva- ranças.
mente.) Entre eles, considero a enorme realidade.
— O pior foi o cofre. O presente é tão grande, não nos afastemos.
— Abriram o cofre? Não nos afastemos muito, vamos de mãos da-
— Reviraram tudo, à procura do cofre. das.

177
2ª estrofe figuram anualmente na lista de vencedores
Não serei o cantor de uma mulher, de uma da competição desde 2006, quando o primei-
história, ro e o segundo lugares da classe “regular”
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisa- ficaram, respectivamente, com as equipes
gem vista da janela, Uai-So-Fly, da Universidade Federal de Mi-
não distribuirei entorpecentes ou cartas de nas Gerais (UFMG), e Tucano, da Universida-
suicida. de Federal de Uberlândia (UFU). Pouco an-
Não fugirei para as ilhas nem serei raptado tes, em 2004, o grupo CEAV-UAV, também da
por serafins. UFMG, havia conquistado o vice-campeona-
O tempo é a minha matéria, o tempo presen- to. Nessa categoria, os participantes devem
te, os homens presentes, a vida presente. construir aeronaves com dimensões totais
(ANDRADE, Carlos Drummond de. Reunião. Rio
de Janeiro: J. Olympio, 1974. p. 55.) de, no máximo, metros, capazes de decolar
na distância máxima de metros, com o uso
Os adjetivos “caduco” (primeiro verso) e “ta- de motores elétricos limitados à potência de
citurnos” (quarto verso) significam, respec- 1000 watts. O uso de materiais compostos –
tivamente, como fibra de carbono ou vidro – é vetado na
a) doente e falantes. estrutura dos aviões.
b) ultrapassado e tristes.
Já na classe “micro”, os protótipos devem
c) fraco e joviais.
d) caído e solidários. ter dimensões reduzidas e pesar, em mé-
e) passageiro e prolixos. dia, gramas. Além disso, a equipe precisa
transportar a aeronave dentro de um tubo de
15,3 centímetros de diâmetro. Quanto me-
9. (UFRJ) nor o comprimento do tubo, mais pontos são
ganhos. As aeronaves também têm de usar
motores elétricos e decolar por lançamento
manual. Foi nesta categoria que a Trem Ki
Voa (TKV), da UFSJ, subiu pela primeira vez
no pódio da Aerodesign East Competition.
A equipe micro teve sua participação inicia-
da em 2010, por iniciativa de estudantes do
curso de Engenharia Mecânica. “De lá para
cá, participamos de todas as competições,
sendo vice-campeões nacionais em 2012 e
2014 e vice-campeões mundiais em 2015”,
conta o professor Cláudio Pellegrini, orien-
tador do grupo, que conta com o apoio do
Programa Santos Dumont, da FAPEMIG. O
edital batizado com o nome do “pai da avia-
ção”, natural de Minas Gerais, estimula o
BONS (IN)VENTOS
espírito empreendedor de alunos de gradua-
Universitários mineiros se destacam no de- ção, por meio do financiamento de projetos
senvolvimento de protótipos de aviões focados em iniciação tecnológica. O apoio
Alessandra Ribeiro financeiro abrange a participação de equi-
pes em competições de caráter educacional,
“Urrú! É pão de queijo!”. O grito de come- como as promovidas pela SAE.
moração tornou-se recorrente na premiação A TKV é “filha caçula” da equipe regular da
do campeonato anual promovido nos Esta- UFSJ, a Coiote, criada em 2001. Três anos
dos Unidos pela Sociedade de Engenheiros mais tarde, as duas se unificaram e decidi-
da Mobilidade (SAE, na sigla em inglês), a ram adotar a alcunha Trem Ki Voa, uma refe-
Aerodesign East Competition. O desafio con- rência (ou reverência) ao dialeto mineiro. Os
siste em projetar e construir aeronaves ra- nomes das equipes, aliás, demonstram o nível
diocontroladas, com capacidade de transpor- de criatividade dos participantes. Na mesma
tar cargas. Na última edição, encerrada em universidade, a NoizAvua, que reúne estudan-
março, com a participação de 75 grupos das tes das engenharias Civil, Mecatrônica e de
Américas, da Ásia e da Europa, duas equipes Telecomunicações do campus Alto Paraopeba,
mineiras alcançaram o segundo lugar, em di- estreou em 2012 na SAE Brasil Aerodesign,
ferentes categorias: a Uirá, da Universidade competição brasileira que garante a classifi-
Federal de Itajubá (Unifei), na classe “regu- cação ao desafio internacional. Já na primeira
lar”, e a Trem Ki Voa, da Universidade Fede- participação, o grupo recebeu menção honro-
ral de São João del-Rei (UFSJ), na “micro”. sa por apresentar o melhor projeto não cus-
Instituições mineiras de ensino superior teado. Desde então, já conseguiu patrocínios

178
pontuais, um deles também viabilizado pelo é bandido morto (a vingança é uma festa,
programa da FAPEMIG. dizia Nietzsche).
“Para esses estudantes, o projeto e a cons- Situação contrária é encontrada na Noruega.
trução de uma aeronave de carga não tripu- Considerada pela ONU, em 2012, o melhor
lada controlada a distância é uma oportuni- país para se viver (1º no ranking do IDH) e,
dade única de testar seus conhecimentos, de de acordo com levantamento feito pelo Ins-
modo a desenvolver a capacidade de traba- tituto Avante Brasil, o 8º país com a menor
lhar em equipe e integrar os conhecimen- taxa de homicídios no mundo, lá o sistema
tos adquiridos ao longo das várias unidades carcerário chega a reabilitar 80% dos crimi-
curriculares, por vezes tão distintas, de seu nosos, ou seja, apenas 2 em cada 10 presos
curso”, avalia Cláudio Pellegrini (...). O pro- voltam a cometer crimes; é uma das meno-
fessor ressalta que isso vale, inclusive, para res taxas de reincidência do mundo. Em uma
os estudantes sem formação específica em prisão em Bastoy, chamada de ilha paradisí-
aeronáutica – caso das equipes da UFSJ. “A aca, essa reincidência é de cerca de 16% en-
participação também desenvolve a autono- tre os homicidas, estupradores e traficantes
mia no aprendizado, característica essencial que por ali passaram. Os EUA chegam a re-
em um mercado de trabalho em constante gistrar 60% de reincidência e o Reino Unido,
mudança”, acrescenta. 50%. A média europeia é 50%.
(MINAS FAZ CIÊNCIA, jun/jul/ago de 2015. P. 31-2.) A Noruega associa as baixas taxas de reinci-
dência ao fato de ter seu sistema penal pau-
Releia a frase: tado na reabilitação e não na punição por
“Na última edição, encerrada em março, com vingança ou retaliação do criminoso. A re-
a participação de 75 grupos das Américas, abilitação, nesse caso, não é uma opção, ela
da Ásia e da Europa, duas equipes mineiras é obrigatória. Dessa forma, qualquer crimi-
alcançaram o segundo lugar, em diferentes noso poderá ser condenado à pena máxima
categorias: a Uirá, da Universidade Federal prevista pela legislação do país (21 anos),
de Itajubá (Unifei), na classe “regular”, e a e, se o indivíduo não comprovar estar total-
Trem Ki Voa, da Universidade Federal de São mente reabilitado para o convívio social, a
João del-Rei (UFSJ), na “micro”.” pena será prorrogada, em mais 5 anos, até
Na frase acima, “micro” exerce a função de que sua reintegração seja comprovada.
adjetivo. Entretanto, não está explicito o O presídio é um prédio, em meio a uma flo-
substantivo que ele qualifica, que seria: resta, decorado com grafites e quadros nos
a) classe. corredores, e no qual as celas não possuem
b) avião. grades, mas sim uma boa cama, banheiro
c) edição. com vaso sanitário, chuveiro, toalhas bran-
d) grupo. cas e porta, televisão de tela plana, mesa,
e) equipe. cadeira e armário, quadro para afixar papéis
e fotos, além de geladeiras. Encontra-se lá
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: uma ampla biblioteca, ginásio de esportes,
campo de futebol, chalés para os presos re-
Noruega como Modelo de Reabilitação de Cri-
ceberem os familiares, estúdio de gravação
minosos
de música e oficinas de trabalho. Nessas ofi-
O Brasil é responsável por uma das mais al- cinas são oferecidos cursos de formação pro-
tas taxas de reincidência criminal em todo o fissional, cursos educacionais, e o trabalha-
mundo. No país, a taxa média de reincidên- dor recebe uma pequena remuneração. Para
cia (amplamente admitida, mas nunca com- controlar o ócio, oferecer muitas atividades,
provada empiricamente) é de mais ou me- de educação, de trabalho e de lazer, é a es-
nos 70%, ou seja, 7 em cada 10 criminosos tratégia.
voltam a cometer algum tipo de crime após A prisão é construída em blocos de oito celas
saírem da cadeia. cada (alguns dos presos, como estuprado-
Alguns perguntariam "Por quê?". E eu per- res e pedófilos, ficam em blocos separados).
gunto: "Por que não?" O que esperar de um Cada bloco tem sua cozinha. A comida é for-
sistema que propõe reabilitar e reinserir necida pela prisão, mas é preparada pelos
aqueles que cometerem algum tipo de cri- próprios detentos, que podem comprar ali-
me, mas nada oferece, para que essa situação mentos no mercado interno para abastecer
realmente aconteça? Presídios em estado de seus refrigeradores.
depredação total, pouquíssimos programas Todos os responsáveis pelo cuidado dos de-
educacionais e laborais para os detentos, tentos devem passar por no mínimo dois
praticamente nenhum incentivo cultural, anos de preparação para o cargo, em um
e, ainda, uma sinistra cultura (mas que di- curso superior, tendo como obrigação fun-
verte muitas pessoas) de que bandido bom damental mostrar respeito a todos que ali

179
estão. Partem do pressuposto que, ao mos- não restava dúvida: a superpopulação era
trarem respeito, os outros também aprende- uma ameaça. Preocupava-se especialmente
rão a respeitar. com a situação dos franceses vésperas da
A diferença do sistema de execução penal Revolução de 1789, quando havia miséria
norueguês em relação ao sistema da maio- generalizada no campo. Na época, a França
ria dos países, como o brasileiro, americano, era de longe o país mais populoso da Europa:
inglês, é que ele é fundamentado na ideia por volta de 1700, já contava com mais de
de que a prisão é a privação da liberdade, e 20 milhões de habitantes, enquanto o Rei-
pautado na reabilitação e não no tratamento no Unido tinha pouco mais de 8 milhões de
cruel e na vingança. pessoas. A população francesa se expandiu
O detento, nesse modelo, é obrigado a mos- em ritmo crescente ao longo do século XVIII,
trar progressos educacionais, laborais e com- aproximando-se dos 30 milhões. Tudo leva a
portamentais, e, dessa forma, provar que crer que esse dinamismo demográfico, des-
pode ter o direito de exercer sua liberdade conhecido nos séculos anteriores, contribuiu
novamente junto à sociedade. para a 10estagnação dos salários no campo e
A diferença entre os dois países (Noruega e para o aumento dos rendimentos associados
Brasil) é a seguinte: enquanto lá os presos à propriedade da terra, sendo, portanto, um
dos fatores que levaram Revolução France-
saem e praticamente não cometem crimes,
sa. Para evitar que torvelinho 13similar viti-
respeitando a população, aqui os presos
masse o Reino Unido, Malthus argumentou
saem roubando e matando pessoas. Mas es-
que toda assistência aos pobres deveria ser
sas são consequências aparentemente cola-
suspensa de imediato e a taxa de natalidade
terais, porque a população manifesta muito
deveria ser severamente controlada.
mais prazer no massacre contra o preso pro- Já David Ricardo, que publicou em 1817 os
duzido dentro dos presídios (a vingança é seus Princípios de economia política e tribu-
uma festa, dizia Nietzsche). tação, preocupava-se com a evolução do pre-
LUIZ FLÁVIO GOMES, jurista, diretor-presidente ço da terra. Se o crescimento da população
do Instituto Avante Brasil e coeditor do Portal e, consequentemente, da produção agrícola
atualidadesdodireito.com.br. Estou no blogdolfg.com.br. se prolongasse, a terra tenderia a se 18tornar
** Colaborou Flávia Mestriner Botelho, socióloga escassa. De acordo com a lei da oferta e da
e pesquisadora do Instituto Avante Brasil. procura, o preço do bem escasso – a terra –
FONTE: Adaptado de http://institutoavantebrasil.com.br/ deveria subir de modo contínuo. No limite,
noruega-como-modelo-de-reabilitacao-de-criminosos/.
os donos da terra receberiam uma parte cada
Acessado em 17 de março de 2017. vez mais significativa da renda nacional, e
o 20restante da população, uma parte cada
1
0. (Espcex (Aman) 2018) "(...) uma sinistra cul- vez mais reduzida, destruindo o equilíbrio
tura de que bandido bom é bandido morto." social. De fato, o valor da terra permaneceu
O adjetivo em destaque apresenta, no texto, alto por algum tempo, mas, ao longo de sé-
o significado de: culo XIX, caiu em relação outras formas de
a) errada riqueza, à medida que diminuía o peso da
b) maligna agricultura na renda das nações. Escrevendo
c) desprezível nos anos de 1810, Ricardo não poderia an-
d) forte tever a importância que o progresso tecno-
e) correta lógico e o crescimento industrial teriam ao
longo das décadas seguintes para a evolução
da distribuição da renda.

E.O. Fixação
(PIKETTY, T. O Capital no Século XXI. Trad. de M. B. de
Bolle. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2014. p.11-13.)

Geralmente, substantivos denotam seres ou


1. (UFRGS) Quando a 1economia política clás- coisas. Às vezes, no entanto, podem denotar
sica nasceu, no Reino Unido e na França,
ação ou processo. Assinale a alternativa que
ao final do século XVIII e início do século
contém um substantivo que, no texto, deno-
XIX, a questão da distribuição da renda já
se encontrava no centro de todas as análi- ta processo.
ses. Estava claro que transformações radicais a) economia (ref. 1)
entraram em curso, propelidas pelo cresci- b) estagnação (ref.10)
mento demográfico sustentado – inédito até c) similar (ref. 13)
então – e pelo início do êxodo rural e da Re- d) tornar (ref. 18)
volução Industrial. Quais seriam as consequ- e) restante (ref. 20)
ências sociais dessas mudanças?
Para Thomas Malthus, que publicou em 1798
seu Ensaio sobre o princípio da população,

180
2. (Unesp) A questão a seguir abordam um O agiota, o leiteiro, o turco,
poema de Raul de Leoni (1895-1926). 1
o médico uma vez por mês,
2
o bilhete todas as semanas
A alma das cousas somos nós...
branco! mas a esperança sempre verde.
Dentro do eterno giro universal
A mulher que trata de tudo
Das cousas, tudo vai e volta à alma da gente,
e a felicidade.
Mas, se nesse vaivém tudo parece igual (ANDRADE, Carlos Drummond de. Alguma poesia.
Nada mais, na verdade, São Paulo: Companhia das Letras, 2013.)
Nunca mais se repete exatamente...
Considerando os aspectos linguísticos no re-
Sim, as cousas são sempre as mesmas na cor- ferido texto, verifica-se que,
rente a) em “o médico uma vez por mês” (ref. 1), o
Que no-las leva e traz, num círculo fatal; vocábulo destacado classifica-se como arti-
O que varia é o espírito que as sente go por acrescentar uma noção particular ao
Que é imperceptivelmente desigual, substantivo a que está associado.
Que sempre as vive diferentemente, b) no verso “e a mulher que trata de tudo”, há
E, assim, a vida é sempre inédita, afinal... uma oração que pode ser substituída pelo
Estado de alma em fuga pelas horas, adjetivo tratante, sem provocar alteração no
Tons esquivos e trêmulos, nuanças sentido do texto.
Suscetíveis, sutis, que fogem no Íris c) no segundo verso “sendo uma ainda de
Da sensibilidade furta-cor... colo.”, a forma verbal introduz uma explica-
E a nossa alma é a expressão fugitiva das ção que caracteriza o cotidiano familiar.
cousas d) do ponto de vista semântico, utilizou-se um
E a vida somos nós, que sempre somos ou- processo de enumeração, ao longo do poe-
tros!... ma, no qual predomina uma classe de pala-
Homem inquieto e vão que não repousas! vras cuja função primordial é designar.
Para e escuta: e) no verso “o bilhete todas as semanas” (ref.
Se as cousas têm espírito, nós somos 2), “todas” está adverbializado pela presen-
Esse espírito efêmero das cousas, ça do artigo.
Volúvel e diverso,
Variando, instante a instante, intimamente,
4. (Uece) A GARAGEM DE CASA
E eternamente,
Dentro da indiferença do Universo!... Com o portão enguiçado, e num convite a la-
(LEONI, Raul. Luz mediterrânea, 1965.)
drões de livros, a 4garagem de casa lembra
uma biblioteca pública permanentemente
Indique o verso em que ocorre um adjetivo
aberta para a rua. Mas não são adeptos de
antes e outro depois de um substantivo:
a) O que varia é o espírito que as sente literatura os indivíduos que ali se abrigam
b) Mas, se nesse vaivém tudo parece igual da chuva ou do sol a pino de verão. 8Esses
c) Tons esquivos e trêmulos, nuanças desocupados matam o tempo jogando porri-
d) Homem inquieto e vão que não repousas! nha, ou lendo os jornais velhos que mamãe
e) Dentro do eterno giro universal amontoa num canto, sentados nos degraus
do escadote com que ela alcança as pratelei-
ras altas. Já quando fazem o obséquio de me
3. (Uema) Leia o poema a seguir extraído da
liberar o espaço, de tempos em tempos entro
obra Alguma poesia, de Carlos Drummond de
para olhar as estantes onde há de tudo um
Andrade, em que o autor descreve o cotidia-
pouco, em boa parte remessas de editores
no familiar.
estrangeiros que têm apreço pelo meu pai.
FAMÍLIA Num reduto de literatura tão sortida, como
Três meninos e duas meninas, bem sabem os habitués de sebos, fascina a
sendo uma ainda de colo. perspectiva de por puro acaso dar com um
A cozinheira preta, a copeira mulata, livro bom. Ou by serendipity, como dizem
o papagaio, o gato, o cachorro, os ingleses quando na caça a um tesouro se
as galinhas gordas no palmo de horta tem a felicidade de deparar com outro bem,
e a mulher que trata de tudo. mais precioso ainda. Hoje revejo na mesma
prateleira velhos conhecidos, algumas de-
A espreguiçadeira, a cama, a gangorra, zenas de livros turcos, ou búlgaros ou hún-
o cigarro, o trabalho, a reza, garos, que papai é capaz de um dia querer
a goiabada na sobremesa de domingo, destrinchar. Também continua em evidência
o palito nos dentes contentes, o livro do poeta romeno Eminescu, que papai
o gramofone rouco toda noite ao menos tentou ler, como é fácil inferir das
e a mulher que trata de tudo. folhas cortadas a espátula. Há uma edição

181
em alfabeto árabe das Mil e Uma Noites que Está correto o que se diz em
ele não leu, mas cujas ilustrações 15admirou a) I e II apenas.
longamente, como denunciam os filetes de b) I, II e III.
cinzas na junção das suas páginas coloridas. c) I e III apenas.
Hoje tenho experiência para saber quantas d) II apenas.
vezes meu pai leu um mesmo livro, posso
quase medir quantos minutos ele se deteve
5. (CP2) ITALIANO CAPTA SONS DA NATUREZA
em cada página. E não costumo perder tem-
PARA CRIAR MÚSICAS
po com livros que ele nem sequer abriu, en-
tre os quais uns poucos eleitos que mamãe Se a quantidade de instrumentos musicais
teve o capricho de empilhar numa ponta de tocados por Diego Stocco não é infinita, com
prateleira, confiando numa futura redenção. certeza é incontável. Para ele fazer música
Muitas vezes a vi de manhãzinha compade- com uma coisa, basta que ela exista. Galhos,
cida dos livros estatelados no escritório, com folhas, frutas, areia, casca de tronco de ár-
especial carinho pelos que trazem a foto do vore, sementes, até uma abelha que passe-
autor na capa e que papai despreza: parece ava entre as flores participam da gravação
disco de cantor de rádio. do músico. Nas mãos do italiano, qualquer
(Chico Buarque. O irmão alemão. 1 ed. São Paulo.
jardim vira uma orquestra. Para fazer suas
Companhia das letras. 2014. p. 60-61.)
composições em parceria com a natureza,
A obra O irmão alemão, último livro de Chi- vários métodos de captação são utilizados.
co Buarque de Holanda, tem como móvel da Quase sempre, os objetos acabam se trans-
narrativa a existência de um desconhecido formando em elementos de percussão.
irmão alemão, fruto de uma aventura amo- Ele posiciona microfones perto de uma árvo-
rosa que o pai dele, Sérgio Buarque de Ho- re, por exemplo, e, após um breve teste para
landa, tivera com uma alemã, lá pelo final descobrir qual o som provocado pelos movi-
da década de 1930 do século passado. Exa- mentos, começa a chacoalhar os galhos e ba-
tamente quando Hitler ascende ao poder na tucar no tronco, como se fosse um bongô. Às
Alemanha. Esse fato é real: o jornalista, his- vezes, pequenos microfones são acoplados
toriador e sociólogo Sérgio Buarque de Ho- aos seus dedos, fazendo com que qualquer
landa, na época, solteiro, deixou esse filho impacto seja ampliado na hora. Mas o mé-
na Alemanha. Na família, no entanto, não todo mais curioso, com certeza, é o estetos-
se falava no assunto. Chico teve, por acaso, cópio. Diego pluga o aparelho em um micro-
conhecimento dessa aventura do pai em uma fone e o encosta na casca da árvore. Assim
reunião na casa de Manuel Bandeira, por co- que ele bate no tronco, o que se ouve é um
mentário feito pelo próprio Bandeira. som grave, saído diretamente das entranhas
Foi em torno da pretensa busca desse pre- daquela planta.
tenso irmão que Chico Buarque desenvolveu Quando ele termina de experimentar as so-
sua narrativa ficcional, o seu romance. noridades do jardim, é tudo uma questão de
Sobre a obra, diz Fernando de Barros e Silva: edição.
“o que o leitor tem em mãos [...] não é um Apesar de ter virado notícia, a ideia de uti-
relato histórico. Realidade e ficção estão aqui lizar elementos naturais para criar uma can-
entranhadas numa narrativa que embaralha ção não é exatamente nova. Desde os tempos
sem cessar memória biográfica e ficção”. em que o homem morava em cavernas, ele já
Considere a expressão “a garagem de casa” fazia músicas com os elementos ao seu redor.
(ref. 4) e o que se diz sobre ela. (...)
I. O emprego do vocábulo casa sem a deter- Hermeto Pascoal, um dos músicos mais in-
minação do artigo definido, como aconte- ventivos que o Brasil já viu, fazia coisa pa-
ce no texto, indica que a casa é da pessoa recida desde os tempos de criança, em 1940.
que fala. Ele transformava cano de mamona de jeri-
II. A introdução do artigo definido antes do mum em pífano (tipo de flauta) e adorava
substantivo casa – garagem da casa – in- fazer música com os barulhos da lagoa perto
dicaria não só que o falante não é o pro- de sua casa.
prietário da casa, ou pelo menos não a (...)
habita, mas também que o referente casa, (Disponível: http://revistagalileu.globo.com/Revista/Comm
representado no texto pelo vocábulo casa, on/0,,EMI30817917770,0ITALIANO+CAPTA+SONS+DA+NATUR
EZA+PARA+CRIAR+MUSICAS.html. Acesso em 23 nov. 2013.)
já aparecera no texto, portanto não seria
novo para o leitor.
III. A introdução do artigo indefinido um an- Lê-se no texto que “Se a quantidade de ins-
tes do substantivo casa – garagem de uma trumentos musicais tocados por Diego Stocco
casa – indicaria que o referente casa, re- não é infinita, com certeza é incontável”.
presentado pelo vocábulo casa, ainda não Considerando a leitura da reportagem, as-
aparecera no texto, portanto seria novo sinale a alternativa que representa, res-
para o leitor. pectivamente, o valor semântico dos dois

182
adjetivos no contexto. o que é civismo, respeito e disciplina, no
a) desmesurada/ imensa princípio, exigidos a cada dia; depois, como
b) ilimitada/ inumerável parte do meu ser e, assim, para sempre. A
c) ilimitada/ numerável cada passo havia um novo esforço esperando
d) abrangente/ magnífica e, depois dele, um pequeno sucesso. Minha
vida, agora que olho para trás, foi toda de
pequenos sucessos. A soma deles foi a minha
6. ARTE SUPREMA carreira.
Tal como Pigmalião, a minha ideia No meu primeiro navio, logo cedo, percebi
que era novamente aluno. Todos sabiam das
Visto na pedra: talho-a, domo-a, bato-a;
coisas mais do que eu havia aprendido. Só
E ante os meus olhos e a vaidade fátua
que agora me davam tarefas, incumbências,
Surge, formosa e nua, Galateia.
e esperavam que eu as cumprisse bem. Pou-
Mais um retoque, uns golpes... e remato-a; co a pouco, passei a ser parte da equipe, a
Digo-lhe: “Fala!”, ao ver em cada veia ser chamado para ajudar, a ser necessário.
Sangue rubro, que a cora e aformoseia... Um dia vi-me ensinando aos novatos e dei-
E a estatua não falou, porque era estatua. -me conta de que me tornara marinheiro, de
fato e de direito, um profissional! O navio
Bem haja o verso, em cuja enorme escala passou a ser minha segunda casa, onde eu
Falam todas as vozes do universo, permanecia mais tempo, às vezes, do que na
E ao qual também arte nenhuma iguala: primeira. Conhecia todos, alguns mais até do
que meus parentes. Sabia de suas manhas,
cacoetes, preocupações e de seus sonhos.
Quer mesquinho e sem cor, quer amplo e terso, Sem dar conta, meu mundo acabava no cos-
Em vão não e que eu digo ao verso: “Fala!” tado do navio.
E ele fala-me sempre, porque e verso. A soma de tudo que fazemos e vivemos, pelo
(Júlio César da Silva. Arte de amar. São Paulo: navio, é uma das coisas mais belas, que só
Companhia Editora Nacional, 1961.) há entre nós, em mais nenhum outro lugar.
Por isso sou marinheiro, porque sei o que é
Aponte a alternativa que indica o número do
espírito de navio.
verso em que aparecem dois adjetivos liga-
Bons tempos aqueles das viagens, dávamos
dos por um conectivo aditivo:
um duro danado no mar, em serviço, postos
a) Verso 3.
de combate, adestramento de guerra, dia e
b) Verso 4.
c) Verso 5. noite. O interessante é que em toda nossa
d) Verso 7. vida, quando buscamos as boas recordações,
e) Verso 11. elas vêm desse tempo, das viagens e dos na-
vios. Até as durezas por que passamos são
saborosas ao lembrar, talvez porque as ven-
7. (Esc. Naval) cemos e fomos adiante.
VELHO MARINHEIRO É aquela história dos pequenos sucessos.
A volta ao porto era um acontecimento gos-
Homenagem aos marinheiros
toso, sempre figurando a mulher. Primeiro a
de sempre... e para sempre.
mãe, depois a namorada, a noiva, a esposa.
Sou marinheiro porque um dia, muito jovem, Muita coisa a contar, a dizer, surpresas de
estendi meu braço diante da bandeira e jurei carinho. A comida preferida, o abraço aper-
lhe dar minha vida. tado, o beijo quente... e o filho que, na au-
Naquele dia de sol a pino, com meu novo uni- sência, foi ensinado a dizer papai.
forme branco, senti-me homem de verdade, No início, eu voltava com muitos retratos,
principalmente quando vinha do estrangei-
como se estivesse dando adeus aos tempos
ro, depois, com o tempo, eram poucos, até
de garoto. Ao meu lado, as vozes de outros
que deixei de levar a máquina. Engraçado,
jovens soavam em uníssono com a minha, 22
vocês já perceberam que marinheiro velho
vibrantes, e terminamos com emoção, de
dificilmente baixa a terra com máquina foto-
peitos estufados e orgulhosos. Ao final, mi- gráfica? Foi assim comigo.
nha mãe veio em minha direção, apressada Hoje os navios são outros, os marinheiros
em me dar um beijo. Acariciou-me o rosto e são outros – sinto-os mais preparados do que
disse que eu estava lindo de uniforme. O dia eu era – mas a vida no mar, as viagens, os
acabou com a família em festa; eu lembro- portos, a volta, estou certo de que são iguais.
-me bem, fiquei de uniforme até de tarde... Sou marinheiro, por isso sei como é.
Sou marinheiro, porque aprendi, naquela Fico agora em casa, querendo saber das coi-
Escola, o significado nobre de companhei- sas da Marinha. E a cada pedaço que ouço
rismo. Juntos no sofrimento e na alegria, de um amigo, que leio, que vejo, me dá um
um safando o outro, leais e amigos. Aprendi orgulho que às vezes chega a entalar na

183
garganta. Há pouco tempo, voltei a entrar d) Os navios e seus homens preparavam-se para
em um navio. Que coisa linda! Sofisticado, cumprir um longo percurso, de acordo com a
limpíssimo, nas mãos de uma tripulação que derrota traçada. / Os navios e seus homens
só pode ser muito competente para mantê-lo preparavam-se para cumprir um percurso
pronto. Do que me mostraram eu não sabia longo, de acordo com a derrota traçada.
muito. Basta dizer que o último navio em e) Antigamente, o recebimento de uma mensa-
que servi já deu baixa. Quando saí de bordo, gem simples aplacava as saudades dos mari-
nheiros. / Antigamente, o recebimento de
parei no portaló, voltei-me para a bandeira,
uma simples mensagem aplacava as sauda-
inclinei a cabeça... e, minha garganta enta-
des dos marinheiros.
lou outra vez.
Isso é corporativismo; não aquele enxova-
lhado, que significa o bem de cada um, pro- 8. (UFRGS) O que havia de tão revolucionário
tegido à custa do desmerecimento da insti- na Revolução Francesa? Soberania popular,
tuição; mas o puro, que significa o bem da liberdade civil, igualdade perante a lei – as
instituição, protegido pelo merecimento de palavras hoje são ditas com tanta facilidade
cada um. que somos incapazes de imaginar seu cará-
Sou marinheiro e, portanto, sou corporati- ter explosivo em 1789. Para os franceses do
vista. Antigo Regime, os homens eram desiguais, e
Muitas vezes a lembrança me retorna aos a desigualdade era uma boa coisa, adequada
dias da ativa e morro de saudades. Que bom à ordem hierárquica que fora posta na natu-
se pudesse voltar ao começo, vestir aquele reza pela própria obra de Deus. A liberdade
uniforme novinho – até um pouco grande, significava privilégio – isto é, literalmen-
ainda recordo – Jurar Bandeira, ser beijado te, “lei privada”, uma prerrogativa especial
pela minha falecida mãe... para fazer algo negado a outras pessoas.
Sei que, quando minha hora chegar, no úl- O rei, como fonte de toda a lei, distribuía
timo instante, verei, em velocidade desco- privilégios, pois havia sido ungido como 16o
nhecida, o navio com meus amigos, minha agente de Deus na terra.
mulher, meus filhos, singrando para sempre, Durante todo 17o século XVIII, os filósofos do
indo aonde o mar encontra o céu... e, se São Iluminismo questionaram esses pressupostos,
Pedro estiver no portaló, direi: e os panfletistas profissionais conseguiram
– Sou marinheiro, estou embarcando. empanar a aura sagrada da coroa. Contudo,
(Autor desconhecido. In: Língua portuguesa:
a desmontagem do quadro mental do Antigo
leitura e produção de texto. Rio de Janeiro: Regime demandou violência iconoclasta, des-
Marinha do Brasil, Escola Naval, 2011. p. 6-8) truidora do mundo, revolucionária.
Seria ótimo se pudéssemos associar 18a Re-
Glossário volução exclusivamente à Declaração dos Di-
Portaló: abertura no casco de um navio, ou reitos do Homem e do Cidadão, mas ela nas-
passagem junto à balaustrada, por onde as ceu na violência e imprimiu seus princípios
pessoas transitam para fora ou para dentro, em um mundo violento. Os conquistadores
e por onde se pode movimentar carga leve. da Bastilha não se limitaram a destruir um
símbolo do despotismo real. Entre eles, 150
Em “[...] vocês já perceberam que marinhei-
foram mortos ou feridos no assalto à prisão
ro velho dificilmente baixa a terra [...] .”
e, quando os sobreviventes apanharam o di-
(ref. 22), a posição do adjetivo é importan- retor, cortaram sua cabeça e desfilaram-na
te, pois, se escrevêssemos “velho marinhei- por Paris na ponta de uma lança.
ro”, o valor semântico seria outro. Em que Como podemos captar esses momentos de
opção a troca de posição dos termos implicou loucura, quando tudo parecia possível e o
uma mudança semântica? mundo se afigurava como uma tábula rasa,
a) Os marinheiros, em seus uniformes brancos, apagada por uma onda de comoção popular
destacam-se nas paradas militares. / Os ma- e pronta para ser redesenhada? Parece in-
rinheiros, em seus brancos uniformes, desta- crível que um povo inteiro fosse capaz de se
cam-se nas paradas militares. levantar e transformar as condições da vida
b) Os alunos gostavam de ouvir as narrativas cotidiana. Duzentos anos de experiências
tradicionais sobre os perigos do mar. / Os com admiráveis mundos novos tornaram-nos
alunos gostavam de ouvir as tradicionais céticos quanto ao planejamento social. Re-
narrativas sobre os perigos do mar. trospectivamente, a Revolução pode parecer
c) Depois de muito tempo longe de casa, os ho- um prelúdio ao totalitarismo.
mens do mar sentem falta de uma comida Pode ser. Mas um excesso de visão histórica
gostosa. / Depois de muito tempo longe de retrospectiva pode distorcer o panorama de
casa, os homens do mar sentem falta de uma 1789. Os revolucionários franceses não eram
gostosa comida. nossos contemporâneos. E eram um conjunto

184
de pessoas não excepcionais em circunstân- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
cias excepcionais. Quando as coisas se desin-
tegraram, eles reagiram a uma necessidade A MEMÓRIA E O CAOS DIGITAL
imperiosa de dar-lhes sentido, ordenando a Fernanda Colavitti
sociedade segundo novos princípios. Esses
princípios ainda permanecem como uma de- A era digital trouxe inovações e facilidades
para o homem que superou de longe o que a
núncia da tirania e da injustiça. Afinal, em
ficção previa até pouco tempo atrás. Se antes
que estava empenhada a Revolução France-
precisávamos correr em busca de informa-
sa? Liberdade, igualdade, fraternidade. ções de nosso interesse, hoje, úteis ou não,
(DARNTON, Robert. O beijo de Lamourette. In: ____.
O beijo de Lamourette: mídia, cultura e revolução.
elas é que nos assediam: resultados de lo-
São Paulo: Cia. das Letras, 2010. p. 30-39.) terias, dicas de cursos, variações da moeda,
ofertas de compras, notícias de atentados,
Considere as seguintes ocorrências de artigo ganhadores de gincanas, etc. Por outro lado,
enquanto cresce a capacidade dos discos rí-
no texto.
gidos e a velocidade das informações, o de-
I. O artigo definido na referência 16. sempenho da memória humana está ficando
II. O artigo definido singular na referência 17. cada vez mais comprometido. Cientistas são
III. O artigo definido na referência 18. unânimes ao associar a rapidez das informa-
Quais poderiam ser omitidos, preservando a ções geradas pelo mundo digital com a res-
correção de seus contextos? trição de nosso "disco rígido" natural. Eles
a) Apenas I. ressaltam, porém, que o problema não está
b) Apenas II. propriamente nas novas tecnologias, mas no
c) Apenas III. uso exagerado delas, o que faz com que dei-
d) Apenas I e II. xemos de lado atividades mais estimulantes,
como a leitura, que envolvem diversas fun-
e) I, II e III.
ções do cérebro. Os mais prejudicados por
esse processo têm sido crianças e adolescen-
9. (CFTRJ) tes, cujo desenvolvimento neuronal acaba
sendo moldado preguiçosamente.
TEXTO III
LAMA Responda sem pensar: qual era a manche-
Mauro Duarte te do jornal de ontem? Você lembra o nome
da novela que antecedeu o Clone? E quem
Pelo curto tempo que você sumiu era o técnico da Seleção Brasileira na Copa
do Mundo de 1994? Não ter uma resposta
Nota-se aparentemente que você subiu
imediata para essas perguntas não deve ser
Mas o que eu soube ao seu respeito causa de preocupação para ninguém, mas
Me entristeceu ouvi dizer exemplifica bem o problema constatado pela
Que pra subir você desceu, você desceu fonoaudióloga paulista Ana Maria Maaz Al-
Todo mundo quer subir varez, que há mais de 20 anos estuda a rela-
A concepção da vida admite ção entre audição e recordação.
Ainda mais quando a subida A pedido de duas empresas, ela realizou uma
Tem o céu como limite pesquisa para saber o que estava ocorrendo
Por isso não adianta estar no mais alto de- com os funcionários que reclamavam com
grau da fama frequência de lapsos de memória. Foram
entrevistados 71 homens e mulheres, com
Com a moral toda enterrada na lama
idade de 18 e 42 anos. A maioria dos es-
(Clara Nunes. O canto das três raças. EMI-Odeon, 1976)
quecimentos era de natureza auditiva, como
nomes que acabavam de ser ouvidos ou as-
A produção de um texto poético resulta de
suntos discutidos. (Por falar nisso, responda
uma criteriosa seleção vocabular. No texto, sem olhar no parágrafo anterior: você lem-
trabalhou-se com dois campos semânticos: bra o nome da pesquisadora citada?)
subir x descer. Relacionando-se esses verbos Ana Maria descobriu que os lapsos de me-
a substantivos, de acordo com esse texto, a mória resultavam basicamente do excesso de
única associação coerente é: informação em consequência do tipo de tra-
a) subir: lama, limite. balho que essas pessoas exerciam nas empre-
b) descer: limite, degrau. sas, e do pouco tempo que dispunham para
c) subir: fama, moral. processá-las, somados à angústia de querer
d) descer: lama, moral. saber mais e ao excesso de atribuições. "Elas
não se detinham no que estava sendo dito
(lido, ouvido ou visto) e, consequentemente,
não conseguiam gravar os dados na memó-
ria", afirma.
(Fonte Internet: Superinteressante, 2001).

185
1
0. (Uece) Assinale a alternativa em que todas Muitos dirão que não estou sendo simpáti-
as expressões destacadas têm valor de adje- ca. Não escrevo para ser agradável, mas para
tivo. partilhar com meus leitores preocupações
a) Era DIGITAL trouxe inovações e FACILIDADES sobre este país com suas maravilhas e suas
QUE SUPERARAM o QUE PREVIA a ficção. mazelas, num momento fundamental em
b) Deixemos DE LADO atividades QUE ENVOL- que, em meio a greves, justas ou desatina-
VEM DIVERSAS funções DO CÉREBRO. das, [...] se delineia com grande inteligência
c) Hoje, ÚTEIS ou não, as informações É QUE e precisão a possibilidade de serem punidos
nos assediam. aqueles que não apenas prejudicaram mone-
d) Responda qual era a manchete DO JORNAL tariamente o país, mas corroeram sua moral,
DE ONTEM. e a dignidade de milhões de brasileiros. Está
sendo um momento de excelência que nos
devolve ânimo e esperança.
(Revista Veja, de 26.09.2012. Adaptado).
E.O. Complementar Sabe-se que o adjetivo é uma palavra que
modifica o substantivo e que sua posição
1. (IFSP) BUSCANDO A EXCELÊNCIA mais comum no português é a de suceder
Lya Luft esse substantivo. Assinale o efeito de senti-
do que a autora consegue com o emprego do
Estamos carentes de excelência. A mediocri- adjetivo antecedendo o substantivo em “as
dade reina, assustadora, implacável e per- infelizes cotas” (2º parágrafo).
sistentemente. Autoridades, altos cargos, a) produz uma sonoridade mais adequada ao
líderes, em boa parte desinformados, de- trecho.
sinteressados, incultos, lamentáveis. Alunos b) provoca o estranhamento do leitor, pois al-
que saem do ensino médio semianalfabetos gumas cotas são felizes.
e assim entram nas universidades, que aos c) antecipa que nem todas as cotas são infeli-
poucos – refiro-me às públicas – vão se tor- zes, como se poderia esperar.
nando reduto de pobreza intelectual. d) oferece pistas ao leitor de seu posiciona-
mento crítico sobre o assunto das cotas.
As infelizes cotas, contras as quais tenho es- e) exemplifica a situação da educação do país,
crito e às quais me oponho desde sempre, empregando inadequadamente o termo.
servem magnificamente para alcançarmos
este objetivo: a mediocrização também do
ensino superior. Alunos que não conseguem 2. (Uel) VESTIBULAR
raciocinar porque não lhes foi ensinado,
numa educação de brincadeirinha. E, porque Vestibular, aquilo que o Ministério da Edu-
não sabem ler nem escrever direito e com cação estuda agora extinguir, é um brasilei-
naturalidade, não conseguem expor em letra rismo para algo que em Portugal costuma ser
ou fala seu pensamento truncado e pobre. chamado de exame de acesso à universidade.
[...] E as cotas roubam a dignidade daqueles Trata-se de um adjetivo que se substantivou,
que deveriam ter acesso ao ensino superior num processo semelhante ao que ocorreu
por mérito [...]. Meu conceito serve para co- com celular, qualificativo de telefone, que
tas raciais também: não é pela raça ou cor, tenta – e na maioria das vezes consegue –
sobretudo autodeclarada, que um jovem deve expulsar a palavra principal de cena sob uma
conseguir diploma superior, mas por seu es- pertinente alegação de redundância, toman-
forço e capacidade. [...] do para si o lugar de substantivo. Pois o exa-
me vestibular, de tão consagrado no vocabu-
Em suma, parece que trabalhamos para faci- lário de gerações e gerações de estudantes
litar as coisas aos jovens, em lugar de edu- brasileiros que perderam o sono por causa
cá-los com e para o trabalho, zelo, esforço, dele, acabou conhecido como vestibular só.
busca de mérito, uso da própria capacidade E qualquer associação remota com a palavra
e talento, já entre as crianças. O ensino nas que está em sua origem – vestíbulo – se per-
últimas décadas aprimorou-se em fazer os deu nesse processo.
pequenos aprender brincando. Isso pode ser Quando ainda era claramente um adjetivo,
bom para os bem pequenos, mas já na escola ficava mais fácil perceber a metáfora que,
elementar, em seus primeiros anos, é bom com certa dose de pernosticismo, levou a pa-
alertar, com afeto e alegria, para o fato de lavra vestibular a ser escolhida para qualifi-
que a vida não é só brincadeira, que lazer car o processo de seleção de candidatos ao
e divertimento são necessários até à saúde, ensino superior. Vestíbulo (do latim vestibu-
mas que a escola é também preparação para lum) é, na origem, um termo de arquitetura
uma vida profissional futura, na qual have- que significa pórtico, alpendre ou pátio ex-
rá disciplina e limites – que aliás deveriam terno, mas que pode ser usado também, em
existir em casa, ainda que amorosos. sentido mais amplo, para designar um átrio,

186
uma antessala, qualquer cômodo ou ambien- erro de revisão a retirar a verdade do poço, a
te de passagem entre a porta de entrada e o situá-la em melhor abrigo: paço (“a verdade
corpo principal de uma casa, apartamento, está no paço real”) ou colo (“a verdade se es-
palácio ou prédio público. Para quem prefere conde no colo das mulheres belas”), polo (“a
uma solução anglófona, estamos falando de verdade fugiu para o Polo Norte”) ou povo
hall ou lobby. (“a verdade está com o povo”). Frases, todas
Como é um ambiente de transição entre o elas, parece-me, menos grosseiras, mais ele-
lado de fora e o lado de dentro, vestíbulo gantes, sem deixar essa obscura sensação de
ganhou ainda por extensão, em anatomia, o abandono e frio inerente à palavra “poço”.
sentido de “cavidade que dá acesso a um ór- O meritíssimo dr. Siqueira, juiz aposentado,
gão oco” (Houaiss). Antes de ser admitido no respeitável e probo cidadão, de lustrosa e
vocabulário da educação, “sistema vestibu- erudita careca, explicou-me tratar-se de um
lar” já tinha aplicação na linguagem médica lugar-comum, ou seja, coisa tão clara e sabi-
como nome dos pequenos órgãos situados na da a ponto de transformar-se num provérbio,
entrada do ouvido interno, responsáveis por num dito de todo mundo. Com sua voz grave,
nosso equilíbrio. de inapelável sentença, acrescentou curioso
(RODRIGUES, S. Vestibular. Disponível em: <http:// detalhe: não só a verdade está no fundo de
revistadasemana.abril.uol.com.br/edicoes/81/ um poço, mas lá se encontra inteiramente
palavradasemana/materia_ palavradasemana_431845.
shtml>. Acesso em: 6 jun. 2009.)
nua, sem nenhum véu a cobrir-lhe o corpo,
sequer as partes vergonhosas. No fundo do
poço e nua.
Com base no texto, considere as afirmativas O dr. Alberto Siqueira é o cimo, o ponto cul-
a seguir: minante da cultura nesse subúrbio de Peri-
I. Ao afirmar que vestibular é um brasilei- peri onde habitamos. É ele quem pronuncia
rismo, o autor se posiciona contraria- o discurso do Dois de Julho na pequena pra-
mente à sua extinção pelo Ministério da ça e o de Sete de Setembro no grupo escolar,
Educação. sem falar noutras datas menores e em brin-
II. O autor não condena o uso do estrangei- des de aniversário e batizado. Ao juiz devo
rismo “lobby” no lugar do brasileirismo muito do pouco que sei, a essas conversas
“vestibular”. noturnas no passeio de sua casa; devo-lhe
III. O adjetivo “vestibular” que, devido ao respeito e gratidão. Quando ele, com a voz
uso, acabou sendo substantivado, é deri- solene e o gesto preciso, esclarece-me uma
vado da palavra “vestíbulo”. dúvida, naquele momento tudo parece-me
claro e fácil, nenhuma objeção me assalta.
IV. O autor considera pertinente a alegação
Depois que o deixo, porém, e ponho-me a
de redundância para explicar o processo
pensar no assunto, vão-se a facilidade e a
de substantivação do termo “celular”.
evidência, como, por exemplo, nesse caso da
Assinale a alternativa correta.
verdade. Volta tudo a ser obscuro e difícil,
a) Somente as afirmativas I e II são corretas.
busco recordar as explicações do meritís-
b) Somente as afirmativas II e IV são corretas. simo e não consigo. Uma trapalhada. Mas,
c) Somente as afirmativas III e IV são corretas. como duvidar da palavra de homem de tanto
d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas. saber, as estantes entulhadas de livros, có-
e) Somente as afirmativas I, III e IV são corretas. digos e tratados? No entanto, por mais que
ele me explique tratar-se apenas de um pro-
3. (IFCE) De como o narrador, com certa expe- vérbio popular, muitas vezes encontro-me a
riência anterior e agradável, dispõe-se a re- pensar nesse poço, certamente profundo e
tirar a verdade do fundo do poço escuro, onde foi a verdade esconder sua nu-
Minha intenção, minha única intenção, dez, deixando-nos na maior das confusões,
acreditem! é apenas restabelecer a verdade. a discutir a propósito de um tudo ou de um
A verdade completa, de tal maneira que ne- nada, causando-nos a ruína, o desespero e a
nhuma dúvida persista em torno do coman- guerra.
dante Vasco Moscoso de Aragão e de suas ex- Poço não é poço, fundo de um poço não é o
traordinárias aventuras. fundo de um poço, na voz do provérbio isso
“A verdade está no fundo de um poço”, li significa que a verdade é difícil de revelar-
certa vez, não me lembro mais se num livro -se, sua nudez não se exibe na praça pública
ou num artigo de jornal. Em todo caso, em ao alcance de qualquer mortal. Mas é o nosso
letra de forma, e como duvidar de afirma- dever, de todos nós, procurar a verdade de
ção impressa? Eu, pelo menos, não costumo cada fato, mergulhar na escuridão do poço
discutir, muito menos negar, a literatura e até encontrar sua luz divina.
o jornalismo. E, como se isso não bastasse, “Luz divina” é do juiz, como aliás todo o
7
várias pessoas gradas repetiram-me a fra- parágrafo anterior. Ele é tão culto que fala
se, não deixando sequer margem para um em tom de discurso, gastando palavras

187
bonitas, mesmo nas conversas familiares Escondeu Dondoca o rosto envergonhado no
com sua digníssima esposa, dona Ernesti- ombro confortador, seus lábios faziam cóce-
na. “A verdade é o farol que ilumina minha gas inocentes no pescoço ilustre.
vida”, costuma repetir-se o meritíssimo, de Zé Canjiquinha nunca foi encontrado, em
dedo em riste, quando, à noite, sob um céu compensação Dondoca ficou, desde aquela
de incontáveis estrelas e pouca luz elétrica, bem-sucedida visita sob a proteção da justi-
conversamos sobre as novidades do mundo ça, anda hoje nos trinques, ganhou a casinha
e de nosso subúrbio. Dona Ernestina, gor- no beco das Três Borboletas, Pedro Torresmo
díssima, lustrosa de suor e um tanto quanto deixou definitivamente de trabalhar. Eis aí
débil mental, concorda balançando a cabeça uma verdade que o farol do juiz não ilumina,
de elefante. Um farol de luz poderosa, ilumi- foi-me necessário mergulhar no poço para
nando longe, eis a verdade do nobre juiz de buscá-la. Aliás, para tudo contar, a inteira
direito aposentado. verdade, devo acrescentar ter sido agradá-
Talvez por isso mesmo sua luz não penetre
vel, deleitoso mergulho, pois no fundo desse
nos escaninhos mais próximos, nas ruas de
poço estava o colchão de lã de barriguda do
canto, no escondido beco das Três Borboletas
leito de Dondoca onde ela me conta – depois
onde se abriga, na discreta meia-sombra de
que abandono, por volta das dez da noite, a
uma casinha entre árvores, a formosa e riso-
prosa erudita do meritíssimo e de sua volu-
nha mulata Dondoca, cujos pais procuraram
o meritíssimo quando Zé Canjiquinha desa- mosa consorte – divertidas intimidades do
pareceu da circulação, viajando para o sul. preclaro magistrado, infelizmente impró-
Passara Dondoca nos peitos, na frase pito- prias para letra de forma.
resca do velho Pedro Torresmo, pai aflito, e (AMADO, Jorge. Os velhos marinheiros: duas histórias do
cais da Bahia. 23. ed. São Paulo: Martins, s.d., p. 71-73)
largara a menina ali, sem honra e sem di-
nheiro: Em “(...) várias pessoas gradas repetiram-me
– No miserê, doutor juiz, no miserê...
a frase (...)”, – ref. 7 – é correto afirmar-se,
O juiz deitou discurso moral, coisa digna de
de acordo com o texto, acerca do vocábulo
ouvir-se, prometeu providências. E, à vista
do tocante quadro da vítima a sorrir entre destacado, que se trata de um
lágrimas, afrouxou um dinheirinho, pois, a) substantivo e tem o mesmo significado de
sob o peito duro da camisa engomada do “vontades”, “desejos”.
magistrado, pulsa, por mais difícil que seja b) substantivo e tem o mesmo significado de
acreditar-se, pulsa um bondoso coração. Pro- “passos”, “marchas”, “andaduras”.
meteu expedir ordem de busca e apreensão c) adjetivo e tem o mesmo significado de “in-
do “sórdido dom-juan”, esquecendo-se, no signes”, “importantes”, “ilustres”.
entusiasmo pela causa da virtude ofendida, d) adjetivo e tem o mesmo significado de
de sua condição de aposentado, sem promo- “grandes”, “desenvolvidas”.
tor nem delegado às ordens. Interessaria no e) adjetivo e tem o mesmo significado de “es-
caso, igualmente, seus amigos da cidade. O forçadas”, “lutadoras”.
“conquistador barato” teria a paga merecida...
E foi ele próprio, tão cônscio é o dr. Siqueira
de suas responsabilidades de juiz (embora 4. (Uece) PORTÃO
aposentado), dar notícias das providências à
família ofendida e pobre, na moradia distan- O portão fica bocejando, aberto
te. Dormia Pedro Torresmo, curando a cacha- para os alunos retardatários.
ça da véspera; labutava no quintal, lavando Não há pressa em viver
roupa, a magra Eufrásia, mãe da vítima, e a nem nas ladeiras duras de subir,
própria cuidava do fogão. Desabrochou um 1
quanto mais para estudar a insípida carti-
sorriso nos lábios carnudos de Dondoca, tí- lha.
mido mas expressivo, o juiz fitou-a austero, Mas se o pai do menino é da oposição,
tomou-lhe da mão: à 2ilustríssima autoridade municipal,
– Venho pra repreendê-la... prima por sua vez da 3sacratíssima
– Eu não queria. Foi ele... – choramingou a autoridade nacional,
formosa. 4
ah, isso não: o vagabundo
– Muito malfeito – segurava-lhe o braço de
ficará mofando lá fora
carne rija.
Desfez-se ela em lágrimas arrependidas e o e leva no boletim uma galáxia de zeros.
juiz, para melhor repreendê-la e aconselhá- A gente aprende muito no portão
-la, sentou-a no colo, acariciou-lhe as faces,
fechado.
beliscou-lhe os braços. Admirável quadro: a (ANDRADE, Carlos Drummond de. In: Carlos
severidade implacável do magistrado tempe- Drummond de Andrade: Poesia e Prosa. Editora
rada pela bondade compreensiva do homem. Nova Aguilar:1988. p. 506-507.)

188
Atente ao que é dito sobre o vocábulo “insí- iglu branco, em cima de um monte branco.
pida” (ref. 1). No céu, nuvens brancas esvoaçam e à direita
I. Foi empregado na acepção de sem graça, aparecem duas árvores brancas com as flores
desinteressante, monótono. brancas da primavera”. Logo adiante estava
II. Foi empregado no seu sentido literal, não “O abridor de latas”, “Pela primeira vez no
figurado. Brasil um conto inteiramente em câmera
III. A mudança da posição desse adjetivo para lenta” – narrando um piquenique de tarta-
depois do substantivo não alteraria o sig- rugas que durava uns 1.500 anos. Mais pra
nificado do substantivo. frente, esta quadra: “Essa pressa leviana/
Está correto o que se afirma somente em Demonstra o incompetente/ Por que fazer o
a) I e II. mundo em sete dias/ Se tinha a eternidade
b) III. pela frente?”.
c) I e III. Lendo aquelas páginas, que reuniam o tra-
d) II. balho jornalístico do Millôr entre 1943 e
1973, compreendi que não estava sozinho
em meu estranhamento: a vida era mesmo
5. (Insper) QUEM RI POR ÚLTIMO RI MILLÔR
absurda, mas a resposta mais lógica para a
Eu tinha 15 anos, havia tomado bomba, era falta de sentido não era o desespero, e sim
virgem e não via, diante da minha incompe- o riso. Percebi, como se não bastasse, que se
tência para com o sexo oposto, a mais remota agregasse alguma graça aos meus resmungos
possibilidade de reverter a situação. poderia fazer daquele incômodo uma profis-
Em algum momento entre a oitava série e são. Dos 19 anos até hoje, jamais paguei uma
o primeiro colegial, todos os meus colegas conta de luz de outra forma.
haviam adotado roupas diferentes, gírias, Uma pena nunca ter conhecido o Millôr pes-
trejeitos ao falar e ao gesticular, mas eu con- soalmente, não ter podido apertar sua mão
tinuava igual – era como se houvesse faltado e agradecer-lhe por haver me sussurrado ao
na aula em que os estilos foram distribuídos ouvido, quando eu mais precisava escutar,
e estivesse condenado a viver para sempre a única verdade que há debaixo do céu: se
numa espécie de limbo social, feito de incer- Deus não existe, então tudo é divertido.
tezas, celibato e moletom. (Antonio Prata. Folha de S. Paulo. 04/04/2012.)
O mundo, antes um lugar com regras claras
Na passagem “... os bons meninos não ga-
e uma razoável meritocracia, havia perdido
nhavam uma coroa de louros – nem ao me-
o sentido: os bons meninos não ganhavam
nos, vá lá, uma loura coroa...”, o autor faz
uma coroa de louros – nem ao menos, vá
um jogo de palavras, cujo sentido está mais
lá, uma loura coroa –, era preciso acordar
bem explicado em:
às 6h15 para estudar química orgânica e os
a) Os adjetivos “louros” e “loura”, no contexto
adultos ainda queriam me convencer de que
em que foram empregados, apresentam os
aquela era a melhor fase da vida.
mesmos sentidos, sofrendo apenas variação
Claro, observando-os, era óbvia a razão da
na flexão de gênero e de número.
nostalgia: seres de calças bege e pager no
b) A escolha do substantivo “coroa”, nas duas
cinto, que gastavam seus dias em papinhos
ocorrências do texto, deve-se ao fato de que
de elevador, sem ambições maiores do que
o cronista pretende assinalar um registro
um carro novo, um requeijão com menos co-
formal da linguagem.
lesterol, o nome na moldura de funcionário
c) A locução adjetiva “de louros” e o substanti-
do mês e ingressos para o Holiday on Ice no
vo “loura” foram empregados pelo autor com
fim de semana.
a finalidade de criar uma antítese.
Em busca de algum consolo, me esforçava
d) A palavra “coroa” é um substantivo, mas em
para bater o recorde jamaicano de consumo
cada ocorrência exerce uma diferente função
de maconha, mas, em vez de ter abertas as
sintática: objeto indireto e adjunto adnomi-
portas da percepção – ou o que quer que fi-
nal, respectivamente.
zesse com que meus amigos se divertissem e
e) Os termos “louros” e “loura” têm semelhan-
passassem meia hora rachando o bico, sei lá,
ças gráficas e sonoras e, apesar de parecerem
de um amendoim –, só via ainda mais escan-
ser o masculino e o feminino da mesma pa-
caradas as portas da minha inadequação. Foi
lavra, apresentam significações diferentes.
então, meus caros, que eu vi a luz – e a luz
veio na forma de um livro; “Trinta anos de
mim mesmo”, do Millôr Fernandes.
A primeira página que eu abri trazia um
quadrado em branco, com a seguinte legen-
da: “Uma gaivota branca, trepada sobre um

189
E.O. Dissertativo entre “nós” e “eles”. Essa demarcação de
fronteiras, essa separação e distinção, su-
põem e, ao mesmo tempo, afirmam e rea-
1. (UFJF) A IDENTIDADE E A DIFERENÇA: O PO- firmam relações de poder. (...)Os pronomes
DER DE DEFINIR “nós” e “eles” não são, aqui, simples catego-
rias gramaticais, mas evidentes indicadores
A identidade e a diferença são o resultado de
de posições-de-sujeito fortemente marcadas
um processo de produção simbólica e discur- por relações de poder: dividir o mundo so-
siva. (...) A identidade, tal como a diferença, cial entre “nós” e “eles” significa classificar.
é uma relação social. Isso significa que sua O processo de classificação é central na vida
definição – discursiva e linguística – está su- social.
jeita a vetores de força, a relações de poder. Ele pode ser entendido como um ato de sig-
Elas não são simplesmente definidas; elas nificação pelo qual dividimos e ordenamos o
são impostas. Não convivem harmoniosa- mundo social em grupos, em classes. A iden-
mente, lado a lado, em um campo sem hie- tidade e a diferença estão estreitamente re-
rarquias; são disputadas. lacionadas às formas pelas quais a sociedade
Não se trata, entretanto, apenas do fato de produz e utiliza classificações.
que a definição da identidade e da diferença As classificações são sempre feitas a partir
seja objeto de disputa entre grupos sociais do ponto de vista da identidade. Isto é, as
simetricamente situados relativamente ao classes nas quais o mundo social é dividido
poder. Na disputa pela identidade está en- não são simples agrupamentos simétricos.
volvida uma disputa mais ampla por outros Dividir e classificar significa, neste caso,
recursos simbólicos e materiais da socie- também hierarquizar. Deter o privilégio de
dade. A afirmação da identidade e a enun- classificar significa também deter o privilé-
ciação da diferença traduzem o desejo dos gio de atribuir diferentes valores aos grupos
diferentes grupos sociais, assimetricamente assim classificados.
situados, de garantir o acesso privilegiado A mais importante forma de classificação é
aos bens sociais. A identidade e a diferença aquela que se estrutura em torno de oposi-
estão, pois, em estreita conexão com rela- ções binárias, isto é, em torno de duas classes
ções de poder. O poder de definir a identi- polarizadas. O filósofo francês Jacques Der-
dade e de marcar a diferença não pode ser rida analisou detalhadamente esse processo.
separado das relações mais amplas de poder. Para ele, as oposições binárias não expres-
A identidade e a diferença não são, nunca, sam uma simples divisão do mundo em duas
inocentes. classes simétricas: em uma oposição binária,
Podemos dizer que onde existe diferenciação um dos termos é sempre privilegiado, rece-
– ou seja, identidade e diferença – aí está bendo um valor positivo, enquanto o outro
presente o poder. A diferenciação é o pro- recebe uma carga negativa. “Nós” e “eles”,
cesso central pelo qual a identidade e a di- por exemplo, constitui uma típica oposição
ferença são produzidas. Há, entretanto, uma binária: não é preciso dizer qual termo é,
série de outros processos que traduzem essa aqui, privilegiado. As relações de identida-
diferenciação ou que com ela guardam uma de e diferença ordenam-se, todas, em torno
estreita relação. São outras tantas marcas da de oposições binárias: masculino/feminino,
presença do poder: incluir/excluir (“estes branco/negro, heterossexual/homossexual.
pertencem, aqueles não”); demarcar fron- Questionar a identidade e a diferença como
teiras (“nós” e “eles”); classificar (“bons e relações de poder significa problematizar os
maus”; “puros e impuros”; “desenvolvidos e binarismos em torno dos quais elas se orga-
primitivos”; “racionais e irracionais”); nor- nizam.
malizar (“nós somos normais; eles são anor- Fixar uma determinada identidade como a
mais”). norma é uma das formas privilegiadas de
A afirmação da identidade e a marcação da hierarquização das identidades e das dife-
diferença implicam, sempre, as operações de renças. A normalização é um dos processos
incluir e de excluir. Como vimos, dizer “o mais sutis pelos quais o poder se manifesta
que somos” significa também dizer “o que no campo da identidade e da diferença. Nor-
não somos”. A identidade e a diferença se malizar significa eleger – arbitrariamente –
traduzem, assim, em declarações sobre quem uma identidade específica como o parâmetro
pertence e sobre quem não pertence, sobre em relação ao qual as outras identidades são
quem está incluído e quem está excluído. avaliadas e hierarquizadas. Normalizar sig-
Afirmar a identidade significa demarcar nifica atribuir a essa identidade todas as ca-
fronteiras, significa fazer distinções entre o racterísticas positivas possíveis, em relação
que fica dentro e o que fica fora. A identida- às quais as outras identidades só podem ser
de está sempre ligada a uma forte separação avaliadas de forma negativa. A identidade

190
normal é “natural”, desejável, única. A for- conferidas diferentes marcas em diferentes
ça da identidade normal é tal que ela nem tempos, espaços, conjunturas econômicas,
sequer é vista como uma identidade, mas grupos sociais, étnicos, etc. Não é portanto
simplesmente como a identidade. Parado- algo dado a priori nem mesmo é universal: o
xalmente, são as outras identidades que são corpo é provisório, mutável e mutante, sus-
marcadas como tais. Numa sociedade em que cetível a inúmeras intervenções consoante o
impera a supremacia branca, por exemplo, desenvolvimento científico e tecnológico de
“ser branco” não é considerado uma identi- cada cultura bem como suas leis, seus códi-
dade étnica ou racial. Num mundo governa- gos morais, as representações que cria sobre
do pela hegemonia cultural estadunidense, os corpos, os discursos que sobre ele produz
“étnica” é a música ou a comida dos outros e reproduz.
países. É a sexualidade homossexual que é Um corpo não é apenas um corpo. É também
“sexualizada”, não a heterossexual. A força o seu entorno. Mais do que um conjunto de
homogeneizadora da identidade normal é músculos, ossos, vísceras, reflexos e sensa-
diretamente proporcional à sua invisibilidade. ções, o corpo é também a roupa e os acessó-
Na medida em que é uma operação de dife- rios que o adornam, as intervenções que nele
renciação, de produção de diferença, o anor- se operam, a imagem que dele se produz, as
mal é inteiramente constitutivo do normal. máquinas que nele se acoplam, os sentidos
Assim como a definição da identidade de- que nele se incorporam, os silêncios que por
pende da diferença, a definição do normal ele falam, os vestígios que nele se exibem, a
depende da definição do anormal. Aquilo educação de seus gestos... enfim, é um sem
que é deixado de fora é sempre parte da de- limite de possibilidades sempre reinventa-
finição e da constituição do “dentro”. A de- das e a serem descobertas. Não são, portan-
finição daquilo que é considerado aceitável, to, as semelhanças biológicas que o definem
desejável, natural é inteiramente dependen- mas, fundamentalmente, os significados cul-
te da definição daquilo que é considerado turais e sociais que a ele se atribuem.
abjeto, rejeitável, antinatural. A identidade (GOELLNER, Silvana Vilodre. A produção cultural
hegemônica é permanentemente assombra- do corpo. In: LOURO, Guacira Lopes (Org.) Corpo,
gênero e sexualidade; um debate contemporâneo
da pelo seu Outro, sem cuja existência ela
na educação. Petrópolis: Vozes, 2003. p.28-29)
não faria sentido. Como sabemos desde o
início, a diferença é parte ativa da formação TEXTO II
da identidade. A NÃO ACEITAÇÃO
(SILVA, Tomaz Tadeu. A produção social da identidade e da
diferença. In: SILVA, Tomaz Tadeu (Org. e Trad.). Identidade e Desde que começou a envelhecer realmente
diferença: a perspectiva dos estudos culturais. começou a querer ficar em casa. Parece-me
Petrópolis: Vozes, 2000. p. 73-75.
que achava feio passear quando não se era
Leia o fragmento a seguir: mais jovem: o ar tão limpo, o corpo sujo de
“A força da identidade normal é tal que ela gordura e rugas. Sobretudo a claridade do
nem sequer é vista como uma identidade, mar como desnuda. Não era para os outros
mas simplesmente como a identidade”. (pe- que era feio ela passear, todos admitem que
núltimo parágrafo) os outros sejam velhos. Mas para si mesma.
No trecho destacado, qual é o efeito de sen- Que ânsia, que cuidado com o corpo perdido,
tido determinado pelo uso dos artigos inde- o espírito aflito nos olhos, ah, mas as pupi-
finido e definido acima negritados? las essas límpidas.
Outra coisa: antigamente no seu rosto não se
via o que ela pensava, era só aquela face des-
2. (UFRJ) TEXTO I tacada, em oferta. Agora, quando se vê sem
querer ao espelho, quase grita horrorizada:
A PRODUÇÃO CULTURAL DO CORPO mas eu não estava pensando nisso! Embora
Pensar o corpo como algo produzido na e fosse impossível e inútil dizer em que rosto
pela cultura é, simultaneamente, um desa- parecia pensar, e também impossível e inútil
fio e uma necessidade. Um desafio porque dizer no que ela mesma pensava.
rompe, de certa forma, com o olhar natu- Ao redor as coisas frescas, uma história para
ralista sobre o qual muitas vezes o corpo é a frente, e o vento, o vento... Enquanto seu
observado, explicado, classificado e tratado. ventre crescia e as pernas engrossavam, e os
Uma necessidade porque ao desnaturalizá-lo cabelos se haviam acomodado num penteado
revela, sobretudo, que o corpo é histórico. natural e modesto que se formara sozinho.
Isto é, mais do que um dado natural cuja (LISPECTOR, Clarice. A descoberta do mundo. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. p. 291)
materialidade nos presentifica no mundo,
o corpo é uma construção sobre a qual são

191
a) Do primeiro parágrafo do texto I, retire os "Ora, a mente é dita sã", escreveu Erasmo
quatro adjetivos que melhor caracterizam a
noção de corpo nele apresentada. em O elogio da loucura (1509), "desde que
b) Estabeleça a relação entre esses adjetivos e a controle adequadamente todos os órgãos do
temática central do texto II. corpo". Embora escrita quase 500 anos atrás
num tratado em defesa do cristianismo, essa
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO frase expressa mais ou menos nossas supo-
sições modernas sobre a sanidade. Em pri-
Na verdade, à primeira vista, seu aspecto era meiro lugar, que a sanidade é uma qualidade
de um velho como tantos outros, de idade in- da mente, não do corpo (não descrevemos os
definida, rugas, cabelos brancos, uma barba corpos das pessoas como sãos ou insanos).
que lhe dará um vago ar de sabedoria e res- Em segundo lugar, que é a função da mente
peitabilidade. Mas uma certa agilidade e o sã controlar o corpo, e portanto que o cor-
porte ereto darão a impressão de que, apesar po ficaria descontrolado - ou pelo menos
da aparência de velho, o viajante guardará fazendo coisas proibidas - se não estivesse
o vigor da juventude. E os olhos... ah, o bri- sob a égide da mente. Em terceiro lugar, que
lho dos olhos será absolutamente sem idade, o corpo é não só o tipo de objeto que pode
um brilho deslumbrado como o de um bebê, ser controlado, como também o tipo de ob-
curioso como o de um menino, desafiador jeto que pode ser adequada ou inadequada-
como o de um jovem, sábio como o de um mente controlado; portanto, o que a mente
homem maduro, maroto como o de um velhi- sã implica acima de tudo é adequação. E por
nho bem-humorado que conseguisse somar fim, mas não menos importante, há um fa-
tudo isso. tor temporal envolvido. Para ter sanidade
(MACHADO, Ana Maria. O CANTO DA PRAÇA.
Rio de Janeiro: Salamandra, 1986.)
precisamos de uma mente, e precisamos de
uma mente para controlar um corpo que de
outro modo seria insano, mas a mente é dita
3. (Ufrj) Confronte os trechos destacados nos
sã, como dizia Erasmo, apenas "desde que"
trechos A e B.
controle os órgãos do corpo. A sugestão é
A que a sanidade é precária, não uma condição
"apesar da aparência DE VELHO" permanente. A questão passa a ser não só se
B a mente sã pode controlar o corpo, mas por
"seu aspecto era DE UM VELHO COMO TANTOS quanto tempo.
(PHILLIPS, Adam. Louco para ser normal.
OUTROS" Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p. 63)
"maroto como o DE UM VELHINHO BEM-HU-
MORADO"
TEXTO II
a) Como se justifica a ausência de artigo no tre-
cho destacado no trecho A?
OS DIFERENTES
b) No trecho B, o artigo indefinido tem seu
sentido reiterado em um dos dois trechos Descobriu-se na Oceania, mais precisamente
destacados. na ilha de Ossevaolep, um povo primitivo,
Que recurso linguístico é responsável por que anda de cabeça para baixo e tem vida
essa reiteração? Explique sua resposta. organizada.
É aparentemente um povo feliz, de cabeça
TEXTOS PARA A PRÓXIMA QUESTÃO muito sólida e mãos reforçadas. Vendo tudo
ao contrário, não perde tempo, entretanto,
"A loucura (...), objeto de meus estudos, era
em refutar a visão normal do mundo. E o que
até agora uma ilha perdida no oceano da ra-
eles dizem com os pés dá a impressão de se-
zão; começo a suspeitar que é um continen-
rem coisas aladas, cheias de sabedoria.
te."
Uma comissão de cientistas europeus e
(ASSIS, Machado de. O Alienista. In: Obra Completa. Vol.
II, Conto e Teatro. Org. por Afrânio Coutinho, 4a ed.
americanos estuda a linguagem desses ho-
Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1979. p. 260) mens e mulheres, não tendo chegado ainda
a conclusões publicáveis. Alguns professores
tentaram imitar esses nativos e foram reco-
TEXTO I lhidos ao hospital da ilha. Os cabecences-
-para-baixo, como foram denominados à fal-
UM COMEÇO MUITO LOUCO ta de melhor classificação, têm vida longa e
desconhecem a gripe e a depressão.
(ANDRADE, Carlos Drummond de. Prosa Seleta.
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2003. p. 150)

192
4. (Ufrj) No texto II, há diversos sintagmas de todas as semanas, que administra com o
nominais – construções com núcleo subs- marido um ganho de mil e seiscentos reais,
tantivo acompanhado ou não de termos com que paga pontualmente seus carnês, como
função adjetiva – que caracterizam o "povo milhões de trabalhadores brasileiros, é ba-
primitivo". leada em circunstâncias não esclarecidas no
a) Retire do texto dois desses sintagmas. Morro da Congonha e, levada como carga no
b) A caracterização normalmente atribuída a porta-malas de um carro policial a pretexto
um povo primitivo como não evoluído não de ser atendida, é arrastada à morte, a céu
se confirma no texto II. Justifique essa afir- aberto, pelo asfalto do Rio.
mativa, utilizando os sintagmas escolhidos Não vou me deter nas versões apresentadas
no item a. pelos advogados dos policiais. Todas as vozes
terão que ser ouvidas, e com muita atenção à
TEXTOS PARA A PRÓXIMA QUESTÃO voz daqueles que nunca são ouvidos. Mas, an-
tes das versões, o fato é que esse porta-malas,
A MARIA DOS POVOS, SUA FUTURA ESPOSA ao se abrir fora do script, escancarou um real
Discreta, e formosíssima Maria, que está acostumado a existir na sombra.
Enquanto estamos vendo a qualquer hora, O marido de Cláudia Silva Ferreira disse que,
Em tuas faces a rosada Aurora, se o porta-malas não se abrisse como abriu
Em teus olhos e boca o Sol, e o dia: (por obra do acaso, dos deuses, do diabo),
esse seria apenas “mais um caso”. Ele está
Enquanto com gentil descortesia dizendo: seria uma morte anônima, 3aplai-
O ar, que fresco Adônis te namora, nada pela surdez da 4praxe, pela invisibi-
Te espalha a rica trança voadora, lidade, uma morte não questionada, como
Quando vem passear-te pela fria: tantas outras.
É uma imagem verdadeiramente surreal, não
Goza, goza da flor da mocidade, porque esteja fora da realidade, mas porque
Que o tempo trata a toda ligeireza, destampa, por um “acaso objetivo” (a ex-
E imprime em toda flor sua pisada. pressão era usada pelos 6surrealistas), uma
cena 7recalcada da consciência nacional, com
Oh não aguardes, que a madura idade,
tudo o que tem de violência naturalizada e
Te converta essa flor, essa beleza,
corriqueira, tratamento degradante dado aos
Em terra, em cinza, em pó, em sombra, em
pobres, estupidez elevada ao cúmulo, igno-
nada.
rância bruta transformada em trapalhada
(MATOS, Gregório de. Poemas escolhidos - Seleção de
José Miguel Wisnik. 2ª ed. São Paulo: Cultrix, [s.d.])
8
transcendental, além de um índice grotes-
co de métodos de camuflagem e desaparição
de pessoas. Pois assim como 10Amarildo é
5. (Ufrj) O texto se constrói por meio da opo- aquele que desapareceu das vistas, e não faz
sição entre dois campos semânticos, espe- muito tempo, Cláudia é aquela que subita-
cialmente no contraste entre a primeira e a mente salta à vista, e ambos soam, queira-se
última estrofes. ou não, como o verso e o reverso do mesmo.
O acaso da queda de Cláudia dá a ver algo
Explicite essa oposição e retire, dessas es- do que não pudemos ver no caso do desa-
trofes, dois vocábulos com valor substantivo parecimento de Amarildo. A sua passagem
– um de cada campo semântico –, identifi- meteórica pela tela é um desfile do carnaval
de horror que escondemos. 11Aquele carro é
cando a que campo cada vocábulo pertence.
o carro alegórico de um Brasil, de um certo
Brasil que temos que lutar para que não se
E.O. UERJ transforme no carro alegórico do Brasil.
(José Miguel Wisnik. O arrastão. Disponível em: oglobo.

Exame de Qualificação globo.com, 22/03/2014. Acesso em 16/01/2017)

3
aplainada − nivelada
1. (UERJ) O ARRASTÃO
4
praxe − prática, hábito
6
surrealistas − participantes de movimento
Estarrecedor, nefando, inominável, infame. artístico do século 20 que enfatiza o papel
Gasto logo os adjetivos porque eles fracas- do inconsciente
sam em dizer o sentimento que os fatos im- 7
recalcada − fortemente reprimida
põem. Uma trabalhadora brasileira, descen- 8
transcendental − que supera todos os limites
dente de escravos, como tantos, que cuida de 10
Amarildo − pedreiro desaparecido na fave-
quatro filhos e quatro sobrinhos, que parte la da Rocinha, no Rio de Janeiro, em 2013,
para o trabalho às quatro e meia das manhãs depois de ser detido por policiais

193
Aquele carro é o carro alegórico de um Bra- do pranto que tenho chorado. Tenha embora
sil, de um certo Brasil que temos que lutar Lisboa os seus mil e um atrativos, ó eu quero
para que não se transforme no carro alegóri- a minha terra; quero respirar o ar natal (...).
co do Brasil. (ref. 11) Nada há que valha a terra natal. 1Tirai o índio
A sequência do emprego dos artigos em “de do seu ninho e apresentai-o d’improviso em
um Brasil” e “do Brasil” representa uma re- Paris: será por um momento fascinado dian-
lação de sentido entre as duas expressões, te dessas ruas, desses templos, desses már-
intimamente ligada a uma preocupação so- mores; mas depois falam-lhe ao coração as
cial por parte do autor do texto. lembranças da pátria, e trocará de bom grado
ruas, praças, templos, mármores, pelos cam-
Essa relação de sentido pode ser definida
pos de sua terra, pela sua choupana na encos-
como:
ta do monte, pelos murmúrios das florestas,
a) ironia
pelo correr dos seus rios. Arrancai a planta
b) conclusão dos climas tropicais e plantai-a na Europa: ela
c) causalidade tentará reverdecer, mas cedo pende e murcha,
d) generalização porque lhe falta o ar natal, o ar que lhe dá
vida e vigor. Como o índio, prefiro a Portugal
e ao mundo inteiro, o meu Brasil, rico, ma-
2. (UERJ) TEXTO I jestoso, poético, sublime. Como a planta dos
1 Escreverei minhas “Memórias”, fato mais trópicos, os climas da Europa enfezam-me a
frequentemente do que se pensa observado existência, que sinto fugir no meio dos tor-
no mundo industrial, artístico, científico e mentos da saudade.
(ABREU, Casimiro de. Obras de Casimiro de
sobretudo no mundo político, onde muita Abreu. Rio de Janeiro: MEC, 1955.)
gente boa se faz elogiar e aplaudir em bri-
lhantes artigos biográficos tão espontâneos, TEXTO III
1como os ramalhetes e as coroas de flores
LADAINHA I
que as atrizes compram para que lhos atirem
na cena os comparsas comissionados. Por se tratar de uma ilha deram-lhe o nome
2 Eu reputo esta prática muito justa e mui- de ilha de Vera Cruz.
to natural; porque não compreendo amor e Ilha cheia de graça.
ainda amor apaixonado mais justificável do
Ilha cheia de pássaros.
que aquele que sentimos pela nossa própria
Ilha cheia de luz.
pessoa.
3 O amor do eu é e sempre será a pedra Ilha verde onde havia
angular da sociedade humana, o regulador mulheres morenas e nuas
dos sentimentos, o móvel das ações, e o farol anhangás a sonhar com histórias de luas
do futuro: do amor do eu nasce o amor do lar e cantos bárbaros de pajés em poracés baten-
doméstico, deste o amor do município, deste do os pés.
o amor da província, deste o amor da nação,
anéis de uma cadeia de amores que os tolos Depois mudaram-lhe o nome
julgam que sentem e tomam ao sério, e que pra terra de Santa Cruz.
certos maganões envernizam, mistifican- Terra cheia de graça
do a humanidade para simular abnegação e Terra cheia de pássaros
virtudes que não têm no coração e que eu Terra cheia de luz.
com a minha exemplar franqueza simplifi-
co, reduzindo todos à sua expressão origi- A grande Terra girassol onde havia guerrei-
nal e verdadeira, e dizendo, lar, município, ros de tanga e onças ruivas
província, nação, têm a flama dos amores [deitadas à sombra das árvores
que lhes dispenso nos reflexos do amor em [mosqueadas de sol.
que me abraso por mim mesmo: todos eles Mas como houvesse, em abundância,
são o amor do eu e nada mais. A diferença certa madeira cor de sangue cor de brasa
está em simples nuanças determinadas pela e como o fogo da manhã selvagem
maior ou menor proporção dos interesses e fosse um brasido no carvão noturno da pai-
das conveniências materiais do apaixonado sagem,
adorador de si mesmo.
(MACEDO, Joaquim Manuel de. Memórias do sobrinho e como a Terra fosse de árvores vermelhas
de meu tio. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.) e se houvesse mostrado assaz gentil,
deram-lhe o nome de Brasil.
TEXTO II
Brasil cheio de graça
Já dois anos se passaram longe da pátria. Dois Brasil cheio de pássaros
anos! Diria dois séculos. E durante este tempo Brasil cheio de luz.
tenho contado os dias e as horas pelas bagas (RICARDO, Cassiano. Seleta em prosa e verso.

194
Rio de Janeiro: José Olympio, 1975.) estranho e ímpar sugere que cada ser huma-
no não se conhece completamente.
Nos trechos a seguir, está em destaque um Isto acontece porque cada indivíduo pode
sintagma formado de substantivo e adjetivo. ser caracterizado como:
A única alternativa em que a inversão das a) solitário
duas palavras também poderia inverter sua b) singular
classe gramatical é: c) intolerante
a) “... reduzindo todos à sua EXPRESSÃO ORIGI- d) indiferente
NAL...” (texto I)
b) “... conveniências materiais do APAIXONADO
ADORADOR de si mesmo.” (texto I) 4. (UERJ) O ARRASTÃO
c) “Arrancai a planta dos CLIMAS TROPICAIS e
plantai-a na Europa...” (texto II) Estarrecedor, nefando, inominável, infame.
d) “... a sonhar com histórias de luas e CANTOS Gasto logo os adjetivos porque eles fracas-
BÁRBAROS de pajés...” (texto III) sam em dizer o sentimento que os fatos im-
põem. Uma trabalhadora brasileira, descen-
dente de escravos, como tantos, que cuida de
3. (UERJ) IGUAL-DESIGUAL quatro filhos e quatro sobrinhos, que parte
para o trabalho às quatro e meia das manhãs
Eu desconfiava: de todas as semanas, que administra com o
todas as histórias em quadrinho são iguais.
marido um ganho de mil e seiscentos reais,
Todos os filmes norte-americanos são iguais.
Todos os filmes de todos os países são iguais. que paga pontualmente seus carnês, como
Todos os best-sellers são iguais milhões de trabalhadores brasileiros, é ba-
Todos os campeonatos nacionais e interna- leada em circunstâncias não esclarecidas no
cionais de futebol são Morro da Congonha e, levada como carga no
iguais. porta-malas de um carro policial a pretexto
Todos os partidos políticos de ser atendida, é arrastada à morte, a céu
são iguais. aberto, pelo asfalto do Rio.
Todas as mulheres que andam na moda Não vou me deter nas versões apresentadas
são iguais. pelos advogados dos policiais. Todas as vozes
Todas as experiências de sexo terão que ser ouvidas, e com muita atenção
são iguais. à voz daqueles que nunca são ouvidos. Mas,
Todos os sonetos, gazéis, virelais, sextinas e
antes das versões, o fato é que esse porta-
rondós são iguais
1
e todos, todos -malas, ao se abrir fora do script, escanca-
2
os poemas em verso livre são enfadonha- rou um real que está acostumado a existir
mente iguais. na sombra.
O marido de Cláudia Silva Ferreira disse que,
Todas as guerras do mundo são iguais. se o porta-malas não se abrisse como abriu
Todas as fomes são iguais. (por obra do acaso, dos deuses, do diabo),
3
Todos os amores, iguais iguais iguais. esse seria apenas “mais um caso”. Ele está
Iguais todos os rompimentos. dizendo: seria uma morte anônima, 3aplai-
A morte é igualíssima. nada pela surdez da 4praxe, pela invisibi-
Todas as criações da natureza são iguais. lidade, uma morte não questionada, como
Todas as ações, cruéis, piedosas ou indife- tantas outras.
rentes, são iguais. É uma imagem verdadeiramente surreal, não
Contudo, o homem não é igual a nenhum ou- porque esteja fora da realidade, mas porque
tro homem, bicho ou coisa. destampa, por um “acaso objetivo” (a ex-
pressão era usada pelos 6surrealistas), uma
Ninguém é igual a ninguém. cena 7recalcada da consciência nacional, com
4
Todo ser humano é um estranho tudo o que tem de violência naturalizada e
5
ímpar. corriqueira, tratamento degradante dado aos
(Carlos Drummond de Andrade pobres, estupidez elevada ao cúmulo, igno-
Nova reunião: 19 livros de poesia. Rio rância bruta transformada em trapalhada
de Janeiro: José Olympio, 1985. 8
transcendental, além de um índice grotes-
– best-sellers – livros mais vendidos co de métodos de camuflagem e desaparição
– gazéis, virelais, sextinas, rondós – tipos de de pessoas. Pois assim como 10Amarildo é
poema aquele que desapareceu das vistas, e não faz
muito tempo, Cláudia é aquela que subita-
Todo ser humano é um estranho ímpar. (ref. mente salta à vista, e ambos soam, queira-se
4 e 5) ou não, como o verso e o reverso do mesmo.
No contexto, a associação dos adjetivos O acaso da queda de Cláudia dá a ver algo

195
do que não pudemos ver no caso do desa- lassidão? Estou grávida e não sei de quem.
parecimento de Amarildo. A sua passagem Vou parir aqui entre os mairuns, este é pro-
meteórica pela tela é um desfile do carnaval blema. Se problema existe, porque isto bem
de horror que escondemos. Aquele carro é pode ser uma solução. Com um filho crescen-
o carro alegórico de um Brasil, de um certo do mairum eu não me integraria mais nesse
Brasil que temos que lutar para que não se mundo que eu quero fazer meu? Ser a mãe
transforme no carro alegórico do Brasil. de fulaninho não será para mim como para
(José Miguel Wisnik. O arrastão um homem ser o pai de fulano? Os homens
Disponível em. oglobo.globo.com, aqui mudam de nome quando têm um filho
22/03/2014. Acesso em: 16/01/2017.) homem. Maxihú é o pai de Maxi. Teró por
3
aplainada − nivelada muito tempo Jaguarhú. Eu seria Iuicuihí se
4
praxe − prática, hábito minha filha se chamasse Iucui? Ou Mairahú
6
surrealistas − participantes de movimento se meu filho pudesse chamar-se Maíra? Será
artístico do século 20 que enfatiza o papel que pode? Melhor é que seja menina: Iuicui.
(RIBEIRO, Darcy. Maíra. Rio de Janeiro:
do inconsciente
Record, 1990, p. 372-3.)
7
recalcada − fortemente reprimida
8
transcendental − que supera todos os limites O emprego do adjetivo “coitado” (ref.1),
10
Amarildo − pedreiro desaparecido na fave- referindo-se a Isaías, tem relação com o se-
la da Rocinha, no Rio de Janeiro, em 2013, guinte fato:
depois de ser detido por policiais a) Isaías não é índio nem cristão.
b) Inimá está grávida dele.
No início do texto, ao expressar sua indignação c) Isaías é um ser mítico.
em relação ao tema abordado, o autor apresen- d) Inimá não gosta dele.
ta uma reflexão sobre o emprego de adjetivos.
Essa reflexão está associada à seguinte ideia:
a) o fato exige análise criteriosa
b) o contexto constrói ambiguidade E.O. Objetivas
c) a linguagem se mostra insuficiente
d) a violência pede descrição cuidadosa (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
5. (UERJ) O mal de Isaías é ser ambíguo. Ser e
não ser. Não é índio, nem cristão. Não é ho- TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
mem, nem deixa de ser, 1coitado. Ser dois é
A(s) questão(ões) aborda(m) um fragmen-
não ser nenhum. Mas está acima de suas for-
to de um artigo de Mônica Fantin sobre o
ças. Ele não pode deixar de participar de um
uso dos tablets no ensino, postado na se-
nós comigo que é excludente dos mairuns
ção de blogues do jornal Gazeta do Povo em
e que quase me ofende. Também não pode
16.05.2013:
sentir consigo mesmo que ele é apenas um
mairum entre os outros. O pobre não para
de escarafunchar a cuca, se aclarando e se TABLETS NAS ESCOLAS
confundindo cada vez mais. Este casamento
com Inimá. Será que ele gosta dela?(...) Ou seja, não é suficiente entregar equipa-
Outro dia fiquei muito tempo atrás dele, no mentos tecnológicos cada vez mais moder-
pátio, confundida com toda gente que se nos sem uma perspectiva de formação de
junta ali, na hora do pôr do sol, para comer qualidade e significativa, e sem avaliar os
e conversar. Vi bem que ele não falava com programas anteriores. O risco é de cometer
ninguém e que ninguém falava com ele. Nem os mesmos equívocos e não potencializar as
Inimá. Ouvi depois, ouvi bem que ele mur- boas práticas, pois muda a tecnologia, mas
murava sozinho. Cheguei mais perto e ouvi as práticas continuam quase as mesmas.
melhor; era uma ladainha em latim, como as Com isso, podemos nos perguntar pelos de-
de meu pai: safios da didática diante da cultura digital: o
Tra-lá-lá, ora pro nobis tablet na sala de aula modifica a prática dos
Tre-lé-lé, ora pro nobis professores e o cotidiano escolar? Em que
Vamos ver se, agora de noite, nesse balan- medida ele modifica as condições de apre-
ço de rede, eu me esqueço dos outros para ndizagem dos estudantes? Evidentemente
pensar em mim. Preciso me concentrar no isso pode se desdobrar em inúmeras outras
meu problema. Tentei pensar o dia inteiro, questões sobre a convergência de tecnolo-
sem conseguir. Há dias que é assim. Até pa- gias e linguagens, sobre o acesso às redes na
rece que já não sou capaz. Será a gravidez sala de aula e sobre a necessidade de media-
que me deixa lânguida? De onde virá essa ções na perspectiva dos novos letramentos e

196
alfabetismos nas múltiplas linguagens. de redação, quando todos deviam compor
Outra questão que é preciso pensar diz re- um texto para outdoor, sobre uma fotografia
speito aos conteúdos digitais. Os conteúdos da célebre cabra de Picasso: “Beba leite de
que estão sendo produzidos para os tablets cabra em pó!”. Como todos rissem, o autor
realmente oferecem a potencialidade do da frase emendou: “Beba leite em pó de ca-
bra!”.
meio e sua arquitetura multimídia ou apenas
estão servindo como leitores de textos com Pior a emenda do que o soneto.
os mesmos conteúdos dos livros didáticos? (Flávia de Barros Carone. Morfossintaxe, 1986. Adaptado.)
Quem está produzindo tais conteúdos digi-
tais? De que forma são escolhidos e compar- 3. (Unifesp) De acordo com o texto, a ordem
tilhados? estrutural diz respeito à macroestrutura da
Ou seja, pensar na potencialidade que o tab- frase e a ordem linear à manifestação con-
let oferece na escola – acessar e produzir creta, palavra após palavra, dos constituin-
imagens, vídeos, textos na diversidade de tes da oração. Assinale a alternativa em que,
formas e conteúdos digitais – implica em no par de palavras em destaque, em texto de
repensar a didática e as possibilidades de Paulo Cesarino Costa, publicado na Folha de
experiências e práticas educativas, midiáti- S.Paulo de 02.08.2012, há coincidência en-
cas e culturais na escola ao lado de questões tre essas duas ordens.
econômicas e sociais mais amplas. E isso a) Exceto pelo fato de que dividirão, com ou-
necessariamente envolve a reflexão crítica tras dezenas de esportes, as atenções de TVs
sobre os saberes e fazeres que estamos pro- e rádios, portais de internet, jornais e revis-
duzindo e compartilhando na cultura digital. tas nos próximos dias numa rara disputa, de
(Tablets nas escolas. Disponível em: www. onde sairão dois retratos do Brasil.
gazetadopovo.com.br. Acesso em: 16/01/2017.) b) Nas paredes do Instituto Moreira Salles, pode-
-se ver diferentes concepções de fotojorna-
1. (Unesp) No último período do texto, os ter- lismo: da beleza pouco comprometida com a
mos saberes e fazeres são veracidade de Jean Manzon à objetividade
a) adjetivos. das imagens de guerra de Luciano Carneiro.
b) pronomes. c) Num mundo cada vez mais dominado pela re-
c) substantivos. produção eletrônica e imagética dos aconteci-
d) advérbios. mentos, há uma interessante oportunidade
e) verbos. de resgatar o momento em que a imagem co-
meçou a questionar o poder da palavra.
d) A revista O Cruzeiro seguia a cartilha da re-
2. (Unesp) adjetivo midiático, empregado no
vista norte-americana Life, que preconizava
feminino plural (midiáticas), diz respeito a
“um novo jornalismo, no qual as imagens
a) diversidade de tipos de tablets.
formam o texto e as palavras ilustram as ima-
b) programas e projetos educacionais.
gens”.
c) questões econômicas e sociais.
e) Serão 11 estrelas na tela, mas os ministros
d) meios de comunicação de massa. do STF e suas capas negras pouco têm a ver
e) variedade dos recursos tecnológicos. com os 11 amarelinhos de Mano Menezes na
busca do ouro olímpico.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
Quando o falante de uma língua depara um 4. (Unesp) Leia o poema de Tomás Antônio
conjunto de duas palavras, intuitivamente é Gonzaga (1744-1810).
levado a sentir entre elas uma relação sintá-
18
tica, mesmo que estejam fora de um contexto
mais esclarecedor. Não vês aquele velho respeitável,
que à muleta encostado,
Assim, além de captar o sentido básico das apenas mal se move e mal se arrasta?
duas palavras, o receptor atribui-lhes uma Oh! quanto estrago não lhe fez o tempo,
gramática – formas e conexões. Isso aconte- o tempo arrebatado,
ce porque ele traz registrada em sua mente
que o mesmo bronze gasta!
toda a sintaxe, todos os padrões conexionais
possíveis em sua língua, o que o torna capaz Enrugaram-se as faces e perderam
de reconhecê-los e identificá-los. As duas pa- seus olhos a viveza:
lavras não estão, para ele, apenas dispostas
voltou-se o seu cabelo em branca neve;
em ordem linear: estão organizadas em uma
já lhe treme a cabeça, a mão, o queixo,
ordem estrutural.
nem tem uma beleza
A diferença entre ordem estrutural e ordem das belezas que teve.
linear torna-se clara se elas não coincidem,
como nesta frase que um aluno criou em aula Assim também serei, minha Marília,

197
daqui a poucos anos, holandesa está propondo um desafio que
que o ímpio tempo para todos corre. muitos poderão considerar impossível: 1ficar
Os dentes cairão e os meus cabelos. 99 dias sem dar nem uma “olhadinha” no
Ah! sentirei os danos, Facebook. O objetivo é medir o grau de fe-
que evita só quem morre. licidade dos usuários longe da rede social.
O projeto também é uma resposta aos experi-
Mas sempre passarei uma velhice mentos psicológicos realizados pelo próprio
muito menos penosa. Facebook. A diferença neste caso é que o tes-
Não trarei a muleta carregada, te é completamente voluntário.
descansarei o já vergado corpo Ironicamente, para poder participar, o usuá-
na tua mão piedosa, rio deve trocar a foto do perfil no Facebook e
na tua mão nevada. postar um contador na rede social.
Os pesquisadores irão avaliar o grau de satis-
As frias tardes, em que negra nuvem
fação e felicidade dos participantes no 33º
os chuveiros não lance,
dia, no 66º e no último dia da abstinência.
irei contigo ao prado florescente:
Os responsáveis apontam que os usuários do
aqui me buscarás um sítio ameno,
Facebook gastam em média 17 minutos por
onde os membros descanse,
dia na rede social. Em 99 dias sem acesso, a
e ao brando sol me aquente.
soma média seria equivalente a mais de 28
Apenas me sentar, então, movendo horas, 2que poderiam ser utilizadas em “ati-
os olhos por aquela vidades emocionalmente mais realizadoras”.
vistosa parte, que ficar fronteira, (http://codigofonte.uol.com.br. Adaptado.)
apontando direi: — Ali falamos,
5. (Unifesp) Examine as passagens do primei-
ali, ó minha bela,
ro parágrafo do texto:
te vi a vez primeira.
§§ “Uma organização não governamental
Verterão os meus olhos duas fontes, holandesa está propondo um desafio”
nascidas de alegria; §§ “O objetivo é medir o grau de felicidade
farão teus olhos ternos outro tanto; dos usuários longe da rede social.”
então darei, Marília, frios beijos A utilização dos artigos destacados justifica-
na mão formosa e pia, -se em razão
que me limpar o pranto. a) da generalização, no primeiro caso, com a
introdução de informação conhecida, e da
Assim irá, Marília, docemente especificação, no segundo, com informação
meu corpo suportando nova.
do tempo desumano a dura guerra. b) de informações novas, nas duas ocorrências,
Contente morrerei, por ser Marília motivo pelo qual são introduzidas de forma
quem, sentida, chorando mais generalizada.
meus baços olhos cerra. c) de informações conhecidas, nas duas ocor-
(Tomás Antônio Gonzaga. Marília de Dirceu e mais rências, sendo possível a troca dos artigos
poesias. Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora, 1982.)
nos enunciados, pois isso não alteraria o
sentido do texto.

Observe os seguintes vocábulos extraídos da d) da retomada de informações que podem ser


sétima estrofe do poema: facilmente depreendidas pelo contexto, sen-
I. ternos. do ambas equivalentes semanticamente.
II. frios. e) da introdução de uma informação nova, no
III. pia. primeiro caso, e da retomada de uma infor-
IV. pranto. mação já conhecida, no segundo.
As palavras que aparecem na estrofe como
adjetivos estão contidas apenas em:
a) I e II.
b) I e III.
E.O. Dissertativas
c) I, II e III.
d) I, II e IV.
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
e) II, III e IV.
1. (Fuvest)
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: E não há melhor resposta
que o espetáculo da vida:
Você conseguiria ficar 99 dias sem o Facebook? vê-la desfiar seu fio,
que também se chama vida,
Uma organização não governamental ver a fábrica que ela mesma,

198
teimosamente, se fabrica, Penso às vezes nisto coloridamente. E aquela
vê-la brotar como há pouco frase de que “homem de gênio desconheci-
em nova vida explodida; do” é o mais belo de todos os destinos, tor-
mesmo quando é assim pequena na-se-me inegável; parece-me que esse é não
a explosão, como a ocorrida; só o mais belo, mas o maior dos destinos.
mesmo quando é uma explosão (FERNANDO PESSOA. Páginas íntimas e de auto-
como a de há pouco, franzina; interpretação. Lisboa: Edições Ática, [s.d.], p. 66-67.)
mesmo quando é a explosão
Na crônica apresentada, Fernando Pessoa
de uma vida severina.
atribui três características negativas à celeb-
(João Cabral de Melo Neto, Morte e vida severina)
ridade, descrevendo-as no segundo, terceiro
a) A fim de obter um efeito expressivo, o poeta e quarto parágrafos. Releia esses parágrafos
utiliza, em “a fábrica” e “se fabrica”, um sub- e aponte os três substantivos empregados
stantivo e um verbo que têm o mesmo radi- pelo poeta que sintetizam essas característi-
cal. cas negativas da celebridade.
Cite da estrofe outro exemplo desse mesmo
recurso expressivo. 3. (Unesp) A questão a seguir toma por base
b) A expressividade dos seis últimos versos uma passagem do romance O coronel e o
decorre, em parte, do jogo de oposições entre lobisomem, de José Cândido de Carvalho
palavras. (1914-1989).
Cite desse trecho um exemplo em que a Como disse, rolava eu no capim, pronto a dar
oposição entre as palavras seja de natureza ao caso solução briosa, na hora em que o que-
semântica. relante apresentou aquela risada de pouco-
caso e deboche:
2. (Unesp) CRÔNICA DA VIDA QUE PASSA – Quá-quá-quá...
Não precisou de mais nada para que o gênio
Às vezes, quando penso nos homens céle-
dos Azeredos e demais Furtados viesse de vela
bres, sinto por eles toda a tristeza da celeb-
solta. Dei um pulo de cabrito e preparado es-
ridade.
A celebridade é um plebeísmo. Por isso deve tava para a guerra do lobisomem. Por descar-
ferir uma alma delicada. É um plebeísmo go de consciência, do que nem carecia, cha-
porque estar em evidência, ser olhado por mei os santos de que sou devocioneiro:
todos inflige a uma criatura delicada uma – São Jorge, Santo Onofre, São José!
sensação de parentesco exterior com as cria- Em presença de tal apelação, mais brabento
turas que armam escândalo nas ruas, que apareceu a peste. Ciscava o chão de soltar ter-
gesticulam e falam alto nas praças. O homem ra e macega no longe de dez braças ou mais.
que se torna célebre fica sem vida íntima: Era trabalho de gelar qualquer cristão que não
tornam-se de vidro as paredes de sua vida levasse o nome de Ponciano de Azeredo Furta-
doméstica; é sempre como se fosse excessivo do. Dos olhos do lobisomem pingava labareda,
o seu traje; e aquelas suas mínimas ações –
em risco de contaminar de fogo o verdal ad-
ridiculamente humanas às vezes – que ele
quereria invisíveis, coa-as a lente da celeb- jacente. Tanta chispa largava o penitente que
ridade para espetaculosas pequenezes, com um caçador de paca, estando em distância de
cuja evidência a sua alma se estraga ou se bom respeito, cuidou que o mato estivesse
enfastia. É preciso ser muito grosseiro para ardendo. Já nessa altura eu tinha pegado a
se poder ser célebre à vontade. segurança de uma figueira e lá de cima, no
Depois, além dum plebeísmo, a celebridade galho mais firme, aguardava a deliberação
é uma contradição. Parecendo que dá valor e do lobisomem. Garrucha engatilhada, só pe-
força às criaturas, apenas as desvaloriza e as dia que o assombrado desse franquia de tiro.
enfraquece. Um homem de gênio desconhe- Sabidão, cheio de voltas e negaças, deu ele
cido pode gozar a volúpia suave do contraste de executar macaquice que nunca cuidei que
entre a sua obscuridade e o seu gênio; e pode,
um lobisomem pudesse fazer. Aquele par de
pensando que seria célebre se quisesse, me-
dir o seu valor com a sua melhor medida, brasas espiava aqui e lá na esperança de que
que é ele próprio. Mas, uma vez conhecido, eu pensasse ser uma súcia deles e não uma
não está mais na sua mão reverter à obscuri- pessoa sozinha. O que o galhofista queria é
dade. A celebridade é irreparável. Dela como que eu, coronel de ânimo desenfreado, fosse
do tempo, ninguém torna atrás ou se desdiz. para o barro denegrir a farda e deslustrar a
E é por isto que a celebridade é uma fraqueza patente. Sujeito especial em lobisomem como
também. Todo o homem que merece ser céle- eu não ia cair em armadilha de pouco pau.
bre sabe que não vale a pena sê-lo. Deixar-se No alto da figueira estava, no alto da figuei-
ser célebre é uma fraqueza, uma concessão ra fiquei. Diante de tão firme deliberação, o
ao baixo-instinto, feminino ou selvagem, de vingativo mudou o rumo da guerra. Caiu de
querer dar nas vistas e nos ouvidos. dente no pé de pau, na parte mais afunilada,

199
como se serrote fosse: seguia ao arrepio das correntes, ou embatia
– Raque-raque-raque. nas cachoeiras que tombam dos socalcos dos
Não conversei – pronto dois tiros levantaram planaltos, ele levava os sertanistas, sem uma
asa da minha garrucha. Foi o mesmo que es- remada, para o rio Grande e daí ao Paraná
palhar arruaça no mato todo. Subiu asa de e ao Paranaíba. Era a penetração em Minas,
tudo que era bicho da noite e uma sociedade em Goiás, em Santa Catarina, no Rio Gran-
de morcegos escureceu o luar. No meio da al- de do Sul, no Mato Grosso, no Brasil inteiro.
gazarra, já de fugida, vi o lobisomem pulan- Segundo estas linhas de menor resistência,
do coxo, de pernil avariado, língua sobres- que definem os lineamentos mais claros da
saída na boca. Na primeira gota de sangue a expansão colonial, não se opunham, como ao
maldição desencantava, como é de lei e dos norte, renteando o passo às bandeiras, a es-
regulamentos dessa raça de penitentes. No terilidade da terra, a barreira intangível dos
raiar do dia, sujeito que fosse visto de perna descampados brutos.
trespassada, ainda ferida verde, podia con- Assim é fácil mostrar como esta distinção de
tar, era o lobisomem. ordem física esclarece as anomalias e con-
(O coronel e o lobisomem, 1980.) trastes entre os sucessos nos dous pontos do
Explique a razão pela qual o narrador atribui país, sobretudo no período agudo da crise
o adjetivo “verde” ao substantivo ferida, no colonial, no século XVII.
último período do texto. Enquanto o domínio holandês, centralizan-
do-se em Pernambuco, reagia por toda a
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO costa oriental, da Bahia ao Maranhão, e se
travavam recontros memoráveis em que, so-
OS SERTÕES lidárias, enterreiravam o inimigo comum as
nossas três raças formadoras, o sulista, ab-
A Serra do Mar tem um notável perfil em
solutamente alheio àquela agitação, revela-
nossa história. A prumo sobre o Atlântico
va, na rebeldia aos decretos da metrópole,
desdobra-se como a cortina de baluarte des-
medido. De encontro às suas escarpas emba- completo divórcio com aqueles lutadores.
tia, fragílima, a ânsia guerreira dos Caven- Era quase um inimigo tão perigoso quanto
dish e dos Fenton. No alto, volvendo o olhar o batavo. Um povo estranho de mestiços le-
em cheio para os chapadões, o forasteiro vantadiços, expandindo outras tendências,
sentia-se em segurança. Estava sobre ameias norteado por outros destinos, pisando, reso-
intransponíveis que o punham do mesmo luto, em demanda de outros rumos, bulas e
passo a cavaleiro do invasor e da metrópo- alvarás entibiadores. Volvia-se em luta aber-
le. Transposta a montanha - arqueada como ta com a corte portuguesa, numa reação te-
a precinta de pedra de um continente - era naz contra os jesuítas. Estes, olvidando o ho-
um isolador étnico e um isolador histórico. landês e dirigindo-se, com Ruiz de Montoya
Anulava o apego irreprimível ao litoral, que a Madri e Díaz Taño a Roma, apontavam-no
se exercia ao norte; reduzia-o a estreita faixa como inimigo mais sério.
de mangues e restingas, ante a qual se amor- De feito, enquanto em Pernambuco as tropas
teciam todas as cobiças, e alteava, sobrancei- de van Schkoppe preparavam o governo de
ra às frotas, intangível no recesso das matas, Nassau, em São Paulo se arquitetava o drama
a atração misteriosa das minas... sombrio de Guaíra. E quando a restauração
Ainda mais - o seu relevo especial torna-a em Portugal veio alentar em toda a linha a
um condensador de primeira ordem, no pre- repulsa ao invasor, congregando de novo os
cipitar a evaporação oceânica. combatentes exaustos, os sulistas frisaram
Os rios que se derivam pelas suas verten- ainda mais esta separação de destinos, apro-
tes nascem de algum modo no mar. Rolam veitando-se do mesmo fato para estadearem
as águas num sentido oposto à costa. Entra- a autonomia franca, no reinado de um minu-
nham-se no interior, correndo em cheio para to de Amador Bueno.
os sertões. Dão ao forasteiro a sugestão irre-
Não temos contraste maior na nossa histó-
sistível das entradas.
ria. Está nele a sua feição verdadeiramente
A terra atrai o homem; chama-o para o seio
nacional. Fora disto mal a vislumbramos nas
fecundo; encanta-o pelo aspecto formosíssi-
cortes espetaculosas dos governadores, na
mo; arrebata-o, afinal, irresistivelmente, na
Bahia, onde imperava a Companhia de Jesus
correnteza dos rios.
com o privilégio da conquista das almas, eu-
Daí o traçado eloquentíssimo do Tietê, dire-
triz preponderante nesse domínio do solo. femismo casuístico disfarçando o monopólio
Enquanto no S. Francisco, no Parnaíba, no do braço indígena.
(EUCLIDES DA CUNHA. Os sertões. Edição
Amazonas, e em todos os cursos d'água da crítica de Walnice Nogueira Galvão. 2 ed. São
borda oriental, o acesso para o interior Paulo: Editora Ática, 2001, p. 81-82.)

200
4. (Unesp) Um dos aspectos em que Euclides da Cunha busca alguns de seus melhores efeitos é o
da adjetivação, que torna seu discurso ao mesmo tempo vário e expressivo, razão pela qual alguns
o consideram, comparando-o com poetas ainda ativos em sua época, um "prosador parnasiano".
Releia com atenção o último parágrafo do texto apresentado e, a seguir, aponte três dos adjetivos
que nele ocorrem.

5. (Unicamp) Gramática
Composição de Sandra Peres e Luiz Tatit (Palavra Cantada)

O substantivo Um homem de letras Nosso verbo ser Todo barbarismo


É o substituto Dizendo ideias É uma identidade É o português
do conteúdo Sempre se inflama Mas sem projeto Que se repeliu

O adjetivo Um homem de ideias E se temos verbo O neologismo


É a nossa impressão Nem usa letras Com objeto É uma palavra
sobre quase tudo Faz ideograma É bem mais direto Que não se ouviu

O diminutivo Se altera as letras No entanto falta Já o idiotismo


É o que aperta o mundo E esconde o nome Ter um sujeito É tudo que a língua
E deixa miúdo Faz anagrama Pra ter afeto Não traduziu

O imperativo Mas se mostro o nome Mas se é um sujeito Mas tem idiotismo


É o que aperta os outros Com poucas letras Que se sujeita Também na fala
e deixa mudo É um telegrama Ainda é objeto De um imbecil

a) Nessa letra de música são atribuídos sentidos às classificações gramaticais. Escolha duas delas e expli-
que o sentido explorado, justificando sua pertinência ou não.
b) Nas duas últimas estrofes, há um deslocamento no uso de 'idiotismo'. Explique-o.

201
Gabarito vocábulos representativos desses campos
semânticos são aurora, sol, dia, flor, beleza
versus terra, cinza, pó, sombra, nada.
E.O. Aprendizagem
1. B 2. A 3. C 4. E 5. C E.O. UERJ
6. E 7. E 8. B 9. A 10. B Exame de Qualificação
1. D 2. B 3. B 4. C 5. A
E.O. Fixação
1. B 2. E 3. D 4. B 5. B
E.O. Objetivas
6. B 7. E 8. A 9. D 10. D
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
1. C 2. D 3. E 4. C 5. E
E.O. Complementar
1. D 2. C 3. C 4. C 5. E
E.O. Dissertativas
E.O. Dissertativo (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
1. Enquanto o artigo indefinido expressa uma 1.
ideia genérica de pluralidade, sugerindo que a) Nota-se o mesmo recurso em “fio” e “des-
a identidade normal representa uma entre fiar”, ou seja, substantivo e verbo forma-
outras identidades (uma parte do todo), o dos a partir de um mesmo radical.
artigo definido, delimitando o nome, sugere b) Exemplo de oposição semântica se dá en-
a ideia de singularidade, de tal modo que a tre os termos explosão e franzina ou ex-
identidade normal é caracterizada como um plosão e pequena. A palavra “explosão”
cria a expectativa de potência, ampli-
padrão único e “natural”.
tude, grandiosidade; os adjetivos fran-
2.
zina (o mesmo que enfraquecida, débil)
a) Os quatro adjetivos são: histórico, provi-
e pequena contrariam essa expectativa,
sório, mutável e mutante. configurando a oposição semântica.
b) No texto II é abordada a transformação 2.
As três características negativas que Fer-
do corpo, que, com o passar dos anos, nando Pessoa atribui à celebridade são rep-
muda e envelhece, assim como mostram resentadas pelos substantivos “plebeísmo”,
os adjetivos do texto I: o corpo é “históri- “contradição” e “fraqueza”.
co, provisório, mutável e mutante”. 3.
O termo “verde” designa metaforicamente o
3. estado da ferida: ainda está no começo, ou
a) Não se quis caracterizar o substantivo ve- seja, é recente.
lho, deixando-o no sentido geral. 4.
Há cinco adjetivos no último parágrafo. Pos-
b) A comparação "como tantos outros". síveis respostas: "maior", "nacional", "espe-
"Tantos outros" reitera o sentido de in- taculosas", "casuístico", "indígena".
determinação do artigo indefinido. 5.
4. a) O autor estabelece intertextualidade com
a) vida organizada; povo feliz; (povo) de ca- algumas definições gramaticais ao apre-
beça muito sólida e mãos reforçadas: ca- sentar os seus próprios conceitos sobre
beça muito sólida; mãos reforçadas; coi- determinados termos e explora poetica-
sas aladas; (coisas) cheias de sabedoria; mente essa relação. Nas duas primeiras
vida longa; os cabecences-para-baixo. estrofes, por exemplo, apresenta subs-
b) Os sintagmas (citados na questão ante- tantivo como “substituto do conteúdo”
e adjetivo como a nossa impressão sobre
rior) no texto II trazem uma conotação
quase tudo. A associação é pertinente, na
positiva, ou seja, estão relacionados à
medida em que a gramática conceitua o
felicidade, à sabedoria, à organização, à
primeiro como a classe de lexema que no-
longevidade, o que contrasta com a carac- meia os seres, ou seja, tudo o que existe,
terização normalmente atribuída a "povo e o segundo como a classe que caracteriza
primitivo". o substantivo, associando-lhe muitas ve-
5. Os dois campos semânticos presentes na cos- zes aspectos subjetivos (“nossa impres-
trução do poema indicam aspectos positivos são sobre quase tudo”).
e negativos: juventude versus maturidade; b) Uma expressão idiomática ou idiotismo é
beleza versus decrepitude; nascimento ver- um conjunto de palavras que se caracte-
sus morte; luminosidade versus sombra. Os riza por não ser possível identificar seu

202
significado mediante o sentido literal
dos termos analisados individualmente,
por serem associadas a gírias ou contex-
tos culturais específicos a certos grupos
de pessoas que se distinguem pela classe,
idade, região, profissão ou outro tipo de
afinidade. Na penúltima estrofe, o autor
ao associar o termo à “fala de um imbe-
cil” amplia o significado da palavra: au-
sência total de inteligência, estupidez,
insânia.

203
INFOGRÁFICO:
Abordagem da LITERATURA nos principais vestibulares.

FUVEST - A maior parte das questões de literatura da Fuvest refere-se às obras obrigató-
rias. Neste caderno, você encontrará alguns desses exercícios de anos anteriores sobre
o HUMANISMO, bem como questões sobre as estéticas medieval, clássica e barroca.

LD
ADE DE ME
D
UNICAMP - A maior parte das questões de literatura da
U

IC
FAC

INA

BO
1963
T U C AT U
Unicamp refere-se às obras obrigatórias. Neste caderno,
você encontra alguns desses exercícios de anos anteriores
sobre o HUMANISMO e o CLASSICISMO.

UNESP - Como a Unesp não possui uma lista


obrigatória de livros, os exercícios deste UNIFESP - Como a Unifesp não possui uma lista
vestibular contemplam o conhecimentos das obrigatória de livros, os exercícios deste vestibular
escolas literárias, bem como de seus contemplam o conhecimentos das escolas literárias,-
principais representantes. Neste caderno, bem como de seus principais representantes. Neste
estão presentes questões sobre TROVADORIS- caderno, estão presentes questões sobre TROVADORIS-
MO, HUMANISMO, CLASSICISMO E BARRO- MO, HUMANISMO, CLASSICISMO e BARROCO.
CO.

ENEM / UFRJ - Como o ENEM não possui uma lista obrigatória de livros, os exercícios
deste exame contemplam o conhecimentos das escolas literárias, bem como de seus
principais representantes.

UERJ - Neste caderno, você encontrará exercícios da UERJ apenas nas aulas 1 e 2.
O Vestibular da UERJ não exige os demais conteúdos contidos neste livro.
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Aula 1

A arte literária e
o estudo dos gêneros
Competência 5
Habilidades 15, 16 e 17
Competência 1 – Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para
sua vida.
H1 Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como elementos de caracterização dos sistemas de comunicação.
H2 Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de comunicação e informação para resolver problemas sociais.
H3 Relacionar informações geradas nos sistemas de comunicação e informação, considerando a função social desses sistemas.
H4 Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação.
Competência 2 – Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) (LEM) como instrumento de acesso a informações e a outras
culturas e grupos sociais.
H5 Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM ao seu tema.
H6 Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus mecanismos como meio de ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e culturas.
H7 Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e seu uso social.
H8 Reconhecer a importância da produção cultural em LEM como representação da diversidade cultural e linguística.
Competência 3 – Compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da
identidade.
H9 Reconhecer as manifestações corporais de movimento como originárias de necessidades cotidianas de um grupo social.
H10 Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em função das necessidades cinestésicas.
Reconhecer a linguagem corporal como meio de interação social, considerando os limites de desempenho e as alternativas de adaptação para
H11
diferentes indivíduos.
Competência 4 – Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e
da própria identidade.
H12 Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos artistas em seus meios culturais.
H13 Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos.
H14 Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos.
Competência 5 – Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante
a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção.
H15 Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.
H16 Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário.
H17 Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional.
Competência 6 – Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da
realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação.
H18 Identificar os elementos que concorrem para a progressão temática e para a organização e estruturação de textos de diferentes gêneros e tipos.
H19 Analisar a função da linguagem predominante nos textos em situações específicas de interlocução.
H20 Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a preservação da memória e da identidade nacional
Competência 7 – Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas.
H21 Reconhecer em textos de diferentes gêneros, recursos verbais e não-verbais utilizados com a finalidade de criar e mudar comportamentos e hábitos.
H22 Relacionar, em diferentes textos, opiniões, temas, assuntos e recursos linguísticos.
H23 Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.
Reconhecer no texto estratégias argumentativas empregadas para o convencimento do público, tais como a intimidação, sedução, comoção,
H24
chantagem, entre outras.
Competência 8 – Compreender e usar a língua portuguesa como língua materna, geradora de significação e integradora da organização
do mundo e da própria identidade.
H25 Identificar, em textos de diferentes gêneros, as marcas linguísticas que singularizam as variedades linguísticas sociais, regionais e de registro.
H26 Relacionar as variedades linguísticas a situações específicas de uso social.
H27 Reconhecer os usos da norma padrão da língua portuguesa nas diferentes situações de comunicação.
Competência 9 – Entender os princípios, a natureza, a função e o impacto das tecnologias da comunicação e da informação na sua vida
pessoal e social, no desenvolvimento do conhecimento, associando-o aos conhecimentos científicos, às linguagens que lhes dão suporte,
às demais tecnologias, aos processos de produção e aos problemas que se propõem solucionar.
H28 Reconhecer a função e o impacto social das diferentes tecnologias da comunicação e informação.
H29 Identificar pela análise de suas linguagens, as tecnologias da comunicação e informação.
H30 Relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento que elas produzem
O que é arte?

Arte é um conceito historicamente muito discutido. Um estudo de Literatura que se pretenda aprofundado deve
levar em consideração os sentidos da arte e notadamente a análise técnica dela. A palavra literatura é de origem
latina e significa “arte de escrever”. Portanto, conjugar essa relação entre arte e escrita é o primeiro passo para
dar corpo à maneira de divulgar os valores culturais que estruturam uma sociedade e uma civilização. Entender
os conhecimentos científicos, filosóficos, místicos e artísticos de um dado contexto é de fato conhecer o próprio
homem e compreender sua identidade.
O filósofo Aristóteles considerava que a arte era uma maneira de “imitar” (mimesis, do grego) a realidade
do homem, que, em seus vários suportes, cria essa possibilidade de fazê-lo pensar sua própria vida, autoconhecer-
-se, encontrar-se como ser humano, observar criticamente a realidade, divertir-se e sonhar.
Da Antiguidade Clássica à Idade Moderna e Contemporânea, a arte se manifesta em vários suportes – mú-
sica, pintura, literatura, dança, escultura e teatro. Funciona como elemento transformador da consciência humana.
O artista, esse criador, cria e recria realidades, expressa valores estéticos com beleza, harmonia e equilíbrio e
estrutura-se à luz de um contexto de circulação, de transformação, de um agente e de um público.
No decorrer dos tempos, esses conceitos foram se transformando sem perder sua lógica. Seja na perfeição
e harmonia das formas da Antiguidade Clássica (período greco-latino), seja no teocentrismo medieval, com suas
relações de vassalagem, seja no século XIX, com suas utopias românticas, seja nas vanguardas artísticas do século XX.
Emoções humanas, alegrias e angústias, ideologias, religião, luta social e cultura sempre perpassaram e frequenta-
ram os conceitos estéticos da arte e da literatura.

A Literatura é um mundo aberto ao mesmo tempo


às múltiplas reflexões sobre a história do mundo,
sobre as ciências naturais, sobre as ciências socioló-
gicas, sobre a antropologia cultural, sobre os prin-
cípios éticos, sobre política, economia, ecologia (...)
MORIN, Edgar. Meus demônios. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997.

O que nos leva a ir ao cinema, a um show, à biblioteca, ao museu e, principalmente, a ler um livro? A
resposta está no reflexo da própria condição humana, no processo de identificação do homem com a arte. Essa
atitude transforma só pelo fato de estarmos refletindo, primeira condição da arte. Esse ponto de partida, indepen-

209
dentemente de sua presumível qualidade, é uma forma O essencial em Literatura é estabelecer uma relação
de compreender o mundo que nos cerca. de sentido entre as palavras e os leitores, para tanto, os escri-
É impossível não se identificar com o eu lírico, a voz tores se valem de uma série de recursos técnicos que elevam
do poema, ao lermos versos como este, de Manuel Bandeira: essa linguagem ao conceito de arte, diferindo, por exemplo,
de um texto informativo ou instrucional, o texto literário
O Bicho deve explorar o potencial significativo e sonoro das palavras,
(Manuel Bandeira) bem como os aspectos ora denotativos, em sua literalidade
de dicionário, ora conotativos em que as palavras adquirem
Vi ontem um bicho novo sentido a fim de produzir efeito artístico.
Na imundice do pátio O poder de explorar os sentidos coloca essas
Catando comida entre os detritos. palavras em situações inusitadas, criando imagens com
Quando achava alguma coisa, as figuras de linguagem nas quais o escritor “desenha”
Não examinava nem cheirava: para o leitor comparações que concretizam as emoções.
Engolia com voracidade. Como no uso da metáfora, que aproxima dois elementos
O bicho não era um cão, num contexto específico, transferindo de um para outro
Não era um gato, suas características. Como no exemplo a seguir, de Má-
Não era um rato. rio Quintana, em que a “inspiração” é comparada, por
O bicho, meu Deus, era um homem. metáfora, a “um pássaro que pousa no livro que lês”.

Os poemas são pássaros que chegam


não se sabe de onde e pousam
Comunicação e linguagem no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam voo
A Literatura leva em consideração o emprego de ima- como de um alçapão.
gens criadas a partir das palavras. Eles não têm pouso
nem porto;
A palavra está sempre alimentam-se um instante em cada
carregada de um conteúdo ou par de mãos e partem.
sentido ideológico ou vivencial. E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem.
no maravilhado espanto de saberes
São Paulo: Hucitec, 1998. que o alimento deles já estava em ti...
Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005, p. 469.

Essa linguagem artística respeita alguns parâ-


metros, condicionamentos sociais e culturais, que lhe Prosa e poesia
oferecem a dimensão de suas verdades e o melhor
modo de dizê-las. À análise literária cabe construir um Prosa e poesia são dois elementos constitutivos desse
processo de comunicação segundo o qual “o que” está processo de comunicação literária que ganha formas di-
sendo dito tenha estreita relação com o “como” está ferentes. A prosa é mais referencial e se vale do uso do
sendo dito. É dessa simbiose que se estabelece uma es- texto corrido organizado da esquerda para a direita no
papel ocidental sem preocupação com a forma, apenas
tética específica, atrelada a um contexto específico, e se
com o conteúdo e a linhas cheias.
nomeia uma dada escola literária específica.
Já o poema está primordialmente preocupado
com a forma e adquire, no decorrer da história, várias
Tudo o que nos rodeia e que foi cria-
estruturas a partir da lógica do verso, que é a linha do
do pela mão do homem, todo o mundo
poema, e de um conjunto deles, denominado estrofe. Es-
da cultura, diferentemente do mun-
tão imersos num trabalho de ritmo e rimas que podem
do da natureza, tudo isso é produto da
ou não seguir padrões de tamanho e convenção. O termo
imaginação e da criação humana.
“poesia”, “poética” e “poeta” derivam dos termos dos
VYGOTSKY, Lev S. Pensamento e linguagem.
São Paulo: Martins Fontes, 1987. grego poíesis, poiêtikê, poiêtês, que significam criar.

210
O que é gênero literário? como o pedido de inspiração do poeta às musas para
contar a história de Odisseu, que passou por terríveis
provações até desfazer as muralhas de Troia:
Gênero é o modo como se veicula a mensagem lite-
rária, o padrão a ser utilizado na composição artística. Musa, reconta-me os feitos do herói astucioso
Há grandes diferenças entre o conteúdo e a forma dos que muito peregrinou, dês que esfez as muralhas sagra-
textos. Um poema não se confunde com um conto, e um das de Troia; muitas cidades dos homens viajou, conhe-
romance segue padrões bastante próprios em relação a ceu seus costumes, como no mar padeceu sofrimen-
uma peça de teatro, por exemplo. tos inúmeros na alma,para que a vida salvasse e a de
Na Antiguidade Clássica, Aristóteles conceituou seus companheiros a volta.
Homero. Odisseia. Tradução de: Carlos Alberto Nunes.
conteúdo como elemento constitutivo da representação 5. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1997. Coleção Universidades.
das paixões, das ações e do comportamento humano. A
forma desse conteúdo, a princípio aplicada apenas à po-
A estrutura do poema épico
esia, compreende três gêneros: épico, lírico e dramático.
É dividido em partes, chamadas cantos, que,
por sua vez, são divididos em:
§§ Proposição:
O texto apresenta o tema e o herói.
§§ Invocação:
O texto pede inspiração à musa (divindade
inspiradora da poesia).
§§ Narração:
Narração das aventuras do herói.
§§ Conclusão ou Epílogo:
Encerramento das aventuras e conclusão
dos feitos heroicos.

Odisseu e Penélope
As epopeias são divididas em “clássicas ou pri-
O gênero épico márias” ou de “imitação ou secundárias”.

Épico é derivado do grego épos que, entre outras coisas, Epopeias clássicas ou primárias
significa palavra, verso, discurso. Esse gênero, também
chamado de epopeia, nasceu com a Ilíada e a Odisseia, A estrutura dos poemas de Homero serviu de inspiração
de Homero. Oriundo das tradições orais, elas contam his- para outros poetas, como o latino Virgílio, em Eneida
tórias que auxiliam o homem a entender a trajetória de (19 a.C.), e Camões, em Os Lusíadas (1572). A Odisseia
seus povos. É característica das narrativas mais antigas a e a Ilíada, de Homero, são textos clássicos que inspira-
simbolização dos ideais coletivos de um povo na figura ram e sistematizaram regras e estruturas formais para
de um herói imerso numa grande aventura, numa guerra os demais.
ou num acontecimento histórico. O eu lírico da epopeia
relaciona-se diretamente com a sociedade. A imagem do
herói é constituída de uma representação de seu povo,
cujo comportamento exemplar vai caracterizá-lo como
figura predestinada a cumprir determinada missão.
Narrados de maneira elevada e com vocabulário
grandiloquente e solene, os assuntos históricos sofrem
influência do imaginário e não se privam de recorrer à
imaginação, bem como à mitologia.
Na cena inicial da Odisseia, de Homero, é possí-
vel identificar características primordiais do texto épico, Eneias foge em direção à península Itálica.

211
Nesse tipo de texto, os deuses são apresentados Menos grandiosos que os da epopeia, seus te-
como seres reais que são tomados por sentimentos hu- mas dizem respeito ao mundo interior do eu lírico, aos
manos e podem tanto prejudicar como ajudar o herói, de- sentimentos, ao individualismo, às relações consigo
pendendo do seu estado emocional e da preponderância mesmo. Pronomes e verbos vêm normalmente na pri-
do tema narrado. Outro aspecto importante é perceber a meira pessoa do singular e predominam as emoções,
preocupação do poeta em relacionar as ações do herói rimas, ritmo, sonoridade das palavras, metáforas, repeti-
com o povo a que pertence a fim de criar uma divulgação ções, entre outras figuras de linguagem, que trazem aos
da identidade pátria. versos musicalidade e suavidade.
O gênero lírico é subdividido em: soneto, elegia,
Epopeias de imitação ou secundárias ode, madrigal, écloga etc. São formas poéticas mais
afeitas ao gênero lírico.
Entre os anos 30 e 19 a.C., o poeta latino Virgílio escre-
§§ Soneto – forma lírica bastante conhecida, é
veu a Eneida, considerada a “epopeia nacional dos ro-
manos”. No classicismo renascentista, o português Luís composta de catorze versos, com dois quartetos
de Camões escreveu Os Lusíadas, um dos mais conheci- e dois tercetos.
dos poemas épicos de imitação. Nele, são reveladas as
aventuras e peripécias do herói Vasco da Gama, primei- Soneto da fidelidade
(Vinicius de Moraes)
ro navegante que cruzou o Cabo da Boa Esperança, ao
sul da África, e levou os portugueses às Índias por uma
De tudo ao meu amor serei atento
nova rota comercial. Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

As transformações do herói §§ Elegia – poema em tom triste e fúnebre origi-


1. Na Ilíada e na Odisseia, o herói é guiado pelas nado na Grécia antiga. Caracterizam as digres-
divindades. sões moralizantes destinadas a ajudar ouvintes
2. Na Eneida e em Os Lusíadas, o herói é represen- ou leitores a suportar momentos difíceis da vida,
tante de um povo.
como a morte de um ente querido ou de uma
3. Em Robson Crusoé e em O conde de Monte Cris-
personalidade pública.
to, o herói é humano e individual.
Elegia na sombra
O gênero lírico Fernando Pessoa (2 jun. 1935)

Esse gênero nasceu na Grécia antiga, cujos poemas Lenta, a raça esmorece, e a alegria
eram acompanhados musicalmente pela lira. É o gênero É como uma memória de outrem. Passa
centrado na expressão do “eu poético” ou “eu poemá- Um vento frio na nossa nostalgia
tico” – voz que fala no poema, não necessariamente E a nostalgia torna-se desgraça.
correspondente à voz do autor. Pesa em nós o passado e o futuro.

212
Dorme em nós o presente. E a sonhar o poeta trata de imitar a mosca,
A alma encontra sempre o mesmo muro, mas o gato
E encontra o mesmo muro ao despertar. quer ser só gato
Quem nos roubou a alma? Que bruxedo e todo gato é gato
De que magia incógnita e suprema do bigode ao rabo,
Nos enche as almas de dolência e medo do pressentimento à ratazana viva,
Nesta hora inútil, apagada e extrema? da noite até os seus olhos de ouro.

Os heróis resplandecem a distância Não há unidade


Num passado impossível de se ver como ele,
Com os olhos da fé ou os da ância. não tem
Lembramos névoa, sombras a esquecer. a lua nem a flor
tal contextura:
é uma coisa
Que crime outrora feito, que pecado
só como o sol ou o topázio,
Nos impôs esta estéril provação
e a elástica linha em seu contorno
Que é indistintamente nosso fado
firme e sutil é como
Como o pressente nosso coração?
a linha da proa de uma nave.
(...) Os seus olhos amarelos
Como – longínquo sopro altivo e humano! – deixaram uma só ranhura
Essa tarde monótona e serena para jogar as moedas da noite.
Em que, ao morrer, o imperador romano Oh pequeno
Disse: Fui tudo, nada vale a pena. imperador sem orbe,
conquistador sem pátria,
§§ Ode – poema lírico de exaltação e homenagem, mínimo tigre de salão, nupcial
também originado na Grécia antiga, destina- sultão do céu
do ao canto. Composto de estrofes e de versos das telhas eróticas,
iguais em tom alegre, entusiástico e de louvação. o vento do amor
na intempérie
Ode do gato reclamas
(Pablo Neruda) quando passas
e pousas
Os animais foram quatro pés delicados
imperfeitos, no solo,
compridos de rabo, tristes cheirando, desconfiando
de cabeça. de todo o terrestre,
Pouco a pouco se foram porque tudo
compondo, é imundo
fazendo-se paisagem, para o imaculado pé do gato.
adquirindo pintas, graça voo. Oh fera independente
O gato, da casa, arrogante
só o gato vestígio da noite,
apareceu completo preguiçoso, ginástico
e orgulhoso: e alheio,
nasceu completamente terminado, profundíssimo gato,
anda sozinho e sabe o que quer. polícia secreta
O homem quer ser peixe e pássaro, dos quartos,
a serpente quisera ter asas, insígnia
o cachorro é um leão desorientado, de um desaparecido veludo,
o engenheiro quer ser poeta, certamente não há
a mosca estuda para andorinha, enigma na tua maneira,

213
talvez não sejas mistério, O que eu adoro em ti,
todo o mundo sabe de ti e pertences Não é a mãe que já perdi.
ao habitante menos misterioso Não é a irmã que já perdi.
talvez todos o acreditem, E meu pai.
todos se acreditem donos,
O que eu adoro em tua natureza,
proprietários, tios
Não é o profundo instinto maternal
de gato, companheiros,
Em teu flanco aberto como uma ferida.
colegas,
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza.
discípulos ou amigos do seu gato.
O que eu adoro em ti – lastima-me e consola-me!
Eu não. O que eu adoro em ti, é a vida.
Eu não subscrevo.
Eu não conheço o gato.
§§ Écloga – poema ambientado no campo, pastoril
Tudo sei, a vida e o seu arquipélago,
e bucólico.
o mar e a cidade incalculável,
a botânica
o gineceu com os seus extravios, Écloga IV (v. 52-59)
(Virgílio)
o pôr e o menos da matemática,
os funis vulcânicos do mundo,
Vê como, com os séculos por vir, tudo se alegra.
a casca irreal do crocodilo,
A última parte desta vida seja-me tão longa,
a bondade ignorada do bombeiro,
o atavismo azul do sacerdote, que para dizer os feitos não me falte alento!
mas não posso decifrar um gato. O trácio Orfeu não poderá vencer-me nestes cantos,
Minha razão resvalou na sua indiferença, nem Lino, ainda que a Orfeu a mãe Calíope socorra
os seus olhos têm números de ouro. e por seu turno a Lino dê assistência o belo Apolo.
Se competir comigo o próprio Pã, por juiz a Arcádia,
§§ Madrigal – composição poética elegante cujos dar-se-á por vencido o próprio Pã, por juiz a Arcádia.
temas invocam atos heroicos e pastoris.
Natureza das rimas
Madrigal melancólico
(Manuel Bandeira) §§ Ricas – entre palavras de classes gramaticais
diferentes:
O que eu adoro em ti,
Cristina e ensina
Não é a tua beleza.
A beleza, é em nós que ela existe. §§ Pobres – entre palavras de mesma classe
A beleza é um conceito. gramatical:
E a beleza é triste. Precisava esconder sua afeição...
Não é triste em si, Na Idade Média, uma imortal paixão
Mas pelo que há nela de fragilidade e de incer-
teza.
§§ Toantes – entre sons vocálicos repetidos:
O que eu adoro em ti,
Não é a tua inteligência. hora e bola; saltava e mata
Não é o teu espírito sutil,
§§ Aliterantes – entre sons consonantais idênti-
Tão ágil, tão luminoso,
cos ou semelhantes:
– Ave solta no céu matinal da montanha.
Nem é a tua ciência vozes, veladas, veludosas, vozes/
Do coração dos homens e das coisas. vagam nos velhos vórtices velozes
O que eu adoro em ti, §§ Consoantes – entre sons e letras repetidos:
Não é a tua graça musical,
Sucessiva e renovada a cada momento, terra e serra;
Graça aérea como o teu próprio pensamento. amoníaco e zodíaco;
Graça que perturba e que satisfaz. rutilância e infância

214
§§ Esdrúxulas – entre palavras proparoxítonas: Disposição das rimas no poema
É um flamejador, dardânico
§§ Mistas – sem posição regular:
uma explosão de rápidas ideias,
De uma, eu sei, entretanto 1,
que com um mar de estranhas odisseias
Que cheguei a estimar 2
saem-lhe do crânio escultural, titânico!... Por ser tão desgraçada 3!
(Cruz e Sousa)
Tive-a hospedada 3 a um canto 1
Do pequeno jardim 4;
§§ Agudas – entre palavras oxítonas: Era toda riscada 3
dó e só; fez e vez; ti e vi De um traço cor de mar 2
E um traço carmesim 4.
§§ Preciosas – entre palavras combinadas: (Alberto de Oliveira)
múmia e resume-a; réstea e veste-a;
águia e alague-a; estrela e vê-la §§ Emparelhadas (AABB):
No rio caudaloso que a solidão retalha A,
§§ Versos brancos – verso sem rimas.
na funda correnteza na límpida toalha A,
deslizam mansamente as garças alvejantes B;
Irene no Céu nos trêmulos cipós de orvalho gotejantes B...
(Manuel Bandeira)
(Fagundes Varela)

Irene preta
§§ Interpoladas ou opostas (ABBA):
Irene boa
Irene sempre de bom humor. Mais de mil anos-luz já separado A,
Naquela hora, do meu pensamento B.
Imagino Irene entrando no céu:
O filme de uma vida, ínfimo momento B,
– Licença, meu branco! E São Pedro bonachão:
O derradeiro instante havia impregnado A.
– Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.
§§ Alternadas ou cruzadas (ABAB):
Classificação das rimas Amor, essência da vida A,
é uma expressão de Deus B.
§§ Monossílabos: uma sílaba. Alma, não fique perdida A!
Ele luz os dias seus B.
§§ Dissílabos: duas sílabas.

§§ Trissílabos: três sílabas. Classificação dos versos


§§ Tetrassílabos: quatro sílabas.
§§ Monossílabos – uma única sílaba:
§§ Pentassílabos: cinco sílabas ou redondilha menor.
Ru/a
§§ Hexassílabos: seis sílabas. tor/ta
Lu/a
§§ Heptassílabos: sete sílabas ou redondilha maior. mor/ta
§§ Octossílabos: com oito sílabas. Tu/a
por/ta
§§ Eneassílabos: nove sílabas.

§§ Decassílabos: dez sílabas. §§ Dissílabos – duas sílabas:


Tu,/ on/tem
§§ Hendecassílabos: onze sílabas.
na/ dan/ça
§§ Dodecassílabos: doze sílabas ou alexandrino. que/ can/sa
vo/a/vas
§§ Verso bárbaro: mais de doze sílabas. com as/ fa/ces
em/ ro/sas

215
for/mo/sas §§ Octossílabos – oito sílabas:
de/ vi/vo No ar/ so/sse/ga/do, um/ si/no/ can/ta
car/mim Um/ si/no/ can/ta/ no ar/ som/bri/o
(Casimiro de Abreu)
(Olavo Bilac)

§§ Trissílabos – três sílabas:


§§ Eneassílabos – nove sílabas:
Vem/ a au/ro/ra
Ó/ gue/rrei/ros/ da/ ta/ba sa/gra/da,
pre/ssu/ro/sa
Ó/ gue/rrei/ros/ da/ tri/bo tu/pi
cor/ de/ ro/sa
Fa/lam/ deu/ses/ nos/ can/tos/ de/ pia/ga!
que/ se/co/ra
Ó/ gue/rrei/ros,/ meus/ can/tos/ ou/vi!
de/ car/mim
(Gonçalves Dias)
as/ es/tre/las
que e/ram/ be/las
têm/ des/mai/os §§ Decassílabos ou Medida Nova – dez sílabas:
já/ por/ fim A/mo/-te, ó/ cruz, /no/ vér/ti/ce/ fir/ma/da
(Gonçalves Dias)

§§ Hendecassílabos – onze sílabas:


§§ Tetrassílabos – quatro sílabas:
Não/ te/nho/ na/da/ com i/sso/ nem/ vem/ fa/lar
O in/ver/no/ bra/da Eu/ não/ con/si/go en/ten/der/ sua/ ló/gi/ca
for/çan/do as/ por/tas Mi/nha/ pa/la/vra/ can/ta/da/ po/de es/pan/tar
Oh!/ Que/ re/voa/da E a/ seus/ ou/vi/dos/ pa/re/cer/ e/xó/ti/ca.
de/ fo/lhas/ mor/tas (Caetano Veloso)
o/ vem/to es/pa/lha
por/ so/bre o/ chão/... §§ Dodecassílabos ou Alexandrinos – doze
(Alphonsus de Guimarães)
sílabas:

§§ Pentassílabos ou redondilha menor – cinco A/ ca/sa/ que/ foi/ mi/nha,/ ho/je é/ ca/sa/ de/ Deus.
sílabas: Traz/ no/ topo u/ma/ cruz./ A/li/ vi/vi/ com os/ meus
(Aberto de Oliveira)
Meu/ can/to/ de/ mor/te,
Gue/rrei/ros/ ou/vi §§ Bárbaros – mais de doze sílabas:
Sou/ fi/lho/ das/ sel/vas
Nas/ sel/vas/ cres/ci; Nun/ca /co/nhe/ci /quem/ ti/ve/sse/ le/va/do/
po/rra/da.
Gue/rrei/ros/ des/cen/do
Da/ tri/bo/ tupi To/dos os/ meus/ co/nhe/ci/dos/ têm/ si/do/
(Gonçalves Dias) cam/pe/ões/ em/ tudo.
(Fernando Pessoa)

§§ Hexassílabos – seis sílabas:


E o/ ca/va/lei/ro/ pa/ssa
an/te a/ som/bria/ por/ta O gênero dramático
da/ lú/gu/bre/ des/gra/ça
(Alphonsus de Guimarães)
A característica e a finalidade primordiais do gênero
§§ Heptassílabos ou redondilha maior – sete dramático (do grego drân: agir) é ser levado à represen-
sílabas: tação, à “ação”.
Compreende o gênero teatral, cuja encenação,
An/tes/ de a/mar,/ eu/ di/zi/a
no entanto, escapa à alçada da literatura propriamente.
pa/ra/ cor/tar/ na/ ra/iz
es/ta/ cons/tan/te a/go/ni/a O eu poético relaciona-se com um tu/vós, segunda pes-
pre/ci/so a/mar/ al/gum/ di/a soa do discurso, a plateia. O texto dramático pressupõe
a/man/do,/ se/rei/ fe/liz. essa plateia, que o vivencia e tem probabilidade de fruir
(Menotti del Picchia) emoções mediante a representação do texto.

216
§§ Comédia
Enfatiza o comportamento ridículo do ser hu-
mano mediante exposição e crítica de costumes
sociais. Exemplos: O doente imaginário, de Mo-
lière; A tempestade, de Shakespeare; e Lisístrata,
de Aristófanes.
Caracterizam o gênero dramático a ausência de
§§ Drama
narrador, o discurso direto – estrutura dialogada – e as
A peça funde tragédia e comédia sem, no en-
rubricas – instruções que sinalizam ao diretor e aos ato-
res a postura no palco, o tom de voz etc. tanto, que a história caminhe para resultados
Em vez do narrador, o texto dramático conta a irreversíveis. Em geral, trata de fatos do coti-
história pretendida mediante diálogo entre os persona- diano com final feliz ou não, mas com trajetória
gens, que estabelecem com o público uma relação direta, intrigante, de difícil solução. Exemplo: Leonor de
a fim de comprometê-lo emocionalmente com a história Mendonça, de Gonçalves Dias; e Macário, de Ál-
contada e os personagens dela. O termo teatro deriva do vares de Azevedo.
grego théatron, que significa “ver”, “contemplar”.
Esse gênero subdivide-se em tragédia, comédia, §§ Auto
drama, auto e farsa. Peça teatral curta regularmente com temática
§§ Tragédia religiosa e moralizante e com finalidade cate-
Conta histórias cujos resultados são destruti- quética, que discute conceitos abstratos e sim-
vos e irreversíveis. Em geral baseada em mitos bólicos. Exemplo: O auto da barca do inferno, de
e histórias já conhecidas do público, a tragédia Gil Vicente.
pretende causar no espectador terror, piedade,
catarse, enfim: “descarga de desordens emo- §§ Farsa
cionais ou afetos desmedidos a partir da expe- Peça teatral de crítica social que apresenta per-
riência estética oferecida pelo teatro, música e sonagens e situações caricaturadas sem preocu-
poesia”. Personagens lutam contra forças mais pação com o questionamento de valores. Exem-
poderosas que elas, que, em princípio, são venci- plo: A farsa de Inês Pereira, de Gil Vicente.
das regularmente com a morte. Sugestão: Édipo
Rei, de Sófocles.

217
O gênero narrativo §§ Apólogo
Historinha entre objetos inanimados com moral
Oriunda do gênero épico, a narrativa organiza uma his- implícita ou explícita. Um apólogo, de Macha-
tória levando em consideração aspectos primordiais de do de Assis, trata da conversa entre uma agulha
e uma linha que discutem sobre a importância
sua estrutura: apresentação, desenvolvimento, clímax e
delas. Observe o último parágrafo em que está
desfecho.
implícita a moral:
Os gêneros narrativos apresentam-se como:
“Parece que a agulha não disse nada; mas um
§§ Conto alfinete, de cabeça grande e não menor experi-
Narrativa curta centrada em um único aconteci- ência, murmurou à pobre agulha:
mento. Apresenta uma ação que se encaminha – Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir ca-
para uma tensão (clímax) entre personagens, minho para ela e ela é que vai gozar da vida,
delimitados num tempo e espaço reduzidos. enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze
Exemplos: Amor, de Clarice Lispector; O menino como eu, que não abro caminho para ninguém.
do boné cinzento, de Murilo Rubião; e A causa Onde me espetam, fico.
secreta, de Machado de Assis. Contei esta história a um professor de melanco-
lia, que me disse, abanando a cabeça:
§§ Novela
– Também eu tenho servido de agulha a muita
Narrativa situada entre a brevidade do conto e linha ordinária!”
a longevidade do romance. Exemplos: A hora e
§§ Fábula
a vez de Augusto Matraga, de Guimarães Rosa;
Difere do apólogo, uma vez que seus persona-
e Os crimes da rua Morgue, de Edgar Allan Poe.
gens são animais. Esse gênero teve ilustres cul-
§§ Crônica tores na literatura ocidental, como Esopo, Fedro
Narrativa breve baseada na vida cotidiana, deli- e La Fontaine, cujas fábulas estão reunidas em
mitada por tempo cronológico curto, em lingua- doze livros.
gem coloquial e leve toque de humor e crítica.
Exemplos: Comédias da vida privada – 101 crô-
nicas escolhidas, de Luís Fernando Veríssimo.

§§ Romance
Narrativa longa que discorre sobre um grande con-
flito central que dá origem a outros secundários,com
preendendo vários personagens em constante
conflito psicológico, envolvidos pela trama que
caminha para um clímax. Exemplos: Grande ser-
tão: veredas, de Guimarães Rosa; São Bernardo,
de Graciliano Ramos; e O senhor dos anéis, de
J.R.R. Tolkien.

§§ Anedota
Relato de um acontecimento curioso ou engra-
çado. Como o provérbio, a anedota, além da
tradição oral, vem inserida em textos literários.
Exemplos: O asno de ouro, do escritor latino
Apuleio, é uma constelação de pequenas aven-
turas picantes.

218
LER

tt
Livros
O que é literatura – Marisa Lajolo
Definir o que é, o que não é e o que pode ser literatura
depende do ponto de vista, do sentido que a palavra tem
para cada um, da situação na qual se discute o que é litera-
tura.

Literatura para quê? – Antoine Compagnon


Nesta obra, Antoine Compagnon propõe-se a responder à
pergunta que intitula sua aula inaugural no Collège de
France – ‘Literatura para quê?’. O livro pretende ser uma
reflexão sobre os poderes da literatura que colocam em
relevo a convicção de que o texto literário ainda cumpre
uma função no mundo do início do século XXI.

Gêneros Literários – Angélica Soares


As manifestações poéticas mais remotas já mostram a
tendência para classificar as obras literárias conforme a
realidade que retratam, pelo uso de mecanismos de estru-
turação semelhantes.

220
Estrutura Conceitual

Arte Literária

Gênero Épico Gênero Lírico Gênero Narrativo Gênero Dramático

Contam histórias que Gênero centrado na Oriundo do gênero


Conhecido como gênero
auxiliam o homem a expressã do “eu épico, organiza uma
teatral, sua produção é
compreender sua poético” ou “eu lírico” história a partir de
destinada à representação
trajetória características variadas

(Trabalho com (Trabalho com sonetos, (Trabalho com (Trabalho com


as epopeias) elegias, odes...) romance, conto...) textos teatrais)

221
E.O. Aprendizagem Só a dor enobrece e é grande e é pura.
Aprende a amá-la que a amarás um dia.
Então ela será tua alegria,
1. O gênero dramático, entre outros aspectos, E será ela só tua ventura...
apresenta como característica essencial:
a) a presença de um narrador. A vida é vã como a sombra que passa
b) a estrutura dialógica. Sofre sereno e de alma sombranceira
c) o extravasamento lírico. Sem um grito sequer tua desgraça.
d) a musicalidade. Encerra em ti tua tristeza inteira
e) o versilibrismo. E pede humildemente a Deus que a faça
Tua doce e constante companheira...
2. O soneto é uma das formas poéticas mais Manuel Bandeira
tradicionais e difundidas nas literaturas oci-
dentais; expressa, quase sempre, conteúdo: 4. Pelo entendimento que se faz do poema, po-
a) dramático. de-se perceber que:
b) satírico. a) O poema tenta convencer as pessoas que
c) lírico. têm um mal a se acostumar com ele, amar a
d) épico. dor e sofrer em silêncio, sem fazer alarde.
e) cronístico. b) O poema tenta convencer as pessoas a denun-
ciar todo e qualquer mal que as atormenta.
3. Leia o poema abaixo, de Gregório de Matos c) Há uma tentativa insistente do poeta em
Guerra. mudar o comportamento das pessoas que
têm um mal, no sentido de que elas preci-
Soneto
sam buscar socorro e solidariedade dos in-
Rubi, concha de perlas peregrina, divíduos, porque a sociedade sempre tem
Animado cristal, viva escarlata, piedade dos enfermos.
Duas safiras sobre lisa prata, d) Há um desejo do poeta em buscar a solidarie-
Ouro encrespado sobre prata fina. dade e compreensão das pessoas em relação à
Este o rostinho é de Caterina; dor que ele sente, pois, segundo ele, a vida é
E porque docemente obriga, e mata, um bem precioso que precisa ser preservado.
Não livra o ser divina em ser ingrata, e) O poeta, sendo modernista, na verdade, está
E raio a raio os corações fumina. somente jogando com as palavras, para dar
um efeito sonoro e rímico.
Viu Fábio uma tarde transportado
Bebendo admirações, e galhardias,
5. Analisando quanto ao gênero literário, pode-
A quem já tanto amor levantou aras:
mos dizer que o poema “Renúncia” tem um
Disse igualmente amante, e magoado: caráter:
Ah muchacha gentil, que tal serias, a) romanesco.
Se sendo tão formosa não cagaras! b) objetivista.
MATOS, Gregório de. Antologia. c) lírico.
Porto Alegre: L&MP, 2006, p. 165. d) dramático.
e) épico.
Aponte o gênero literário a que pertence
o texto.
a) Crônica 6. Analisando a passagem “procura curtir sem
b) Poesia erótico-irônica queixa o mal que te crucia” (versos 1 e 2),
c) Poesia religiosa percebe-se:
d) Paródia sacra a) Um sentido contraditório, pois quando se
e) Poesia encomiástica fala em “curtir”, imagina-se uma coisa boa.
b) Que o poeta apela para as pessoas se queixa-
rem das coisas ruins da vida.
Com base no poema abaixo, responda às
c) Um sentido convergente, pois o poeta deixa
questões de 4 a 6.
claro que em todo bem há sempre um frag-
Renúncia mento de mal.
d) Que as pessoas devem viver também o mal,
Chora de manso e no íntimo... Procura mas devem se queixar sempre dele.
Tentar curtir sem queixa o mal que te crucia: e) Um sentido contraditório, pois o poeta deixa
O mundo é sem piedade e até riria claro que não se pode viver o bem e o mal ao
Da tua inconsolável amargura. mesmo tempo.

222
Leia o trecho do poema para responder a III. O gênero épico compreende textos sobre
questão a seguir. acontecimentos grandiosos protagoniza-
dos por heróis.
Moça de Goiatuba IV. Em literatura, o romance e a novela são
formas narrativas pertencentes ao gêne-
Mal rompeu o dia – a moça
ro dramático.
Foi levar café com leite
Estão corretas apenas as afirmativas
Para o filho do patrão,
a) I e II.
Sentada à beira da cama,
b) I e IV.
Como fez sempre, esperava,
c) II e III.
Como fez sempre, que o moço
d) III e IV.
lhe reclamasse mais pão.
Mas o moço não queria 9. Gênero dramático é aquele em que o artista
nem pão nem café com leite. usa como intermediária entre si e o públi-
Queria – e com que paixão co a representação. A palavra vem do grego
dentro dos olhos! – queria-lhe drao (fazer) e quer dizer ação. A peça teatral
os peitinhos em botão. é, pois, uma composição literária destinada
Daí o moço pediu-lhe à apresentação por atores em um palco, atu-
que se deitasse com ele
ando e dialogando entre si. O texto dramáti-
um pouco... que assim veria
co é complementado pela atuação dos atores
que era bom o colchão.
no espetáculo teatral e possui uma estrutura
Mas a moça riu e disse
que não tinha precisão, específica, caracterizada:
pois era dia e de noite 1. pela presença de personagens que devem
tinha dormido um tantão. estar ligados com lógica uns aos outros e
Daí o moço pediu-lhe à ação;
que ela tirasse o vestido 2. pela ação dramática (trama, enredo), que
depois a combinação é o conjunto de atos dramáticos, manei-
depois deitasse na cama ras de ser e de agir das personagens en-
que era bem quente o colchão. cadeadas à unidade do efeito e segundo
Mas a moça riu e disse uma ordem composta de exposição, con-
não estar com frio não flito, complicação, clímax e desfecho;
que o vestido que vestia 3. pela situação ou ambiente, que é o con-
tirar não podia não junto de circunstâncias físicas, sociais,
que a patroa foi quem disse espirituais em que se situa a ação;
que devia ter vergonha 4. pelo tema, ou seja, a ideia que o autor
e cobrir-se com vestido, (dramaturgo) deseja expor, ou sua inter-
calcinha e combinação... pretação real por meio da representação.
E se foi, deixando moço Adaptado de: COUTINHO, A. Notas de teoria literária.
a se torcer de paixão. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1973.
E quando foram chamá-lo,
o moço tinha dormido Considerando o texto e analisando os ele-
e não acordou mais não. mentos que constituem um espetáculo tea-
[...] tral, conclui-se que:
SOUZA, Afonso Félix de. Nova antologia poética. a) a criação do espetáculo teatral apresenta-se
Goiânia: Cegraf UFG, 1991, p. 78. como um fenômeno de ordem individual, pois
não é possível sua concepção de forma coletiva.
b) o cenário onde se desenrola a ação cênica
7. Uma característica incomum ao gênero lírico
é concebido e construído pelo cenógrafo de
presente neste trecho do poema é: modo autônomo e independente do tema da
a) a representação da totalidade da vida. peça e do trabalho interpretativo dos atores.
b) a expressão direta de personagens. c) o texto cênico pode originar-se dos mais
c) a narração de uma história. variados gêneros textuais, como contos, len-
d) o uso da prosa. das, romances, poesias, crônicas, notícias,
e) o emprego da prosa poética. imagens e fragmentos textuais, entre outros.
d) o corpo do ator na cena tem pouca impor-
8. (G1 - cftmg 2015) Sobre os gêneros literá- tância na comunicação teatral, visto que o
mais importante é a expressão verbal, base
rios, afirma-se:
da comunicação cênica em toda a trajetória
I. O gênero dramático abrange textos que do teatro até os dias atuais.
tematizam o sofrimento e a aflição da e) a iluminação e o som de um espetáculo cê-
condição humana. nico independem do processo de produção/
II. Textos pertencentes ao gênero lírico pri- recepção do espetáculo teatral, já que se tra-
vilegiam a expressão subjetiva de estados ta de linguagens artísticas diferentes, agre-
interiores. gadas posteriormente à cena teatral.

223
1
0. “Na serra de Ibiapaba, numa de suas encos- ( ) Espécie narrativa entre literatura e jor-
tas mais altas, encontrei um jegue. Estava nalismo, subjetiva, breve e leve, na qual
voltado para o lado e me pareceu que descor- muitas vezes autor, narrador e protago-
tinava o panorama. Mas quando me aproxi- nista se identificam.
mei, percebi que era cego.” a) II – I – V – III – IV
Oswaldo França Júnior, em As Laranjas Iguais. b) II – I – IV – V – III
c) II – I – III – V – IV
O fragmento é representante do gênero: d) I – II – V – III – IV
a) lírico.
e) I – IV – II – V – III
b) épico.
c) narrativo.
d) dramático. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
e) Nenhuma das opções acima.
O momento do amor
(João do Rio)
E.O. Fixação O conselheiro é um homem encantador.
Baudelaire dizia: “Cá temos um homem que
1. Assinale V (verdadeiro) ou F (falso). Sobre
fala do seu coração – deve ser um canalha”.
literatura, gênero e estilo literários, pode-se
O conselheiro não fala do seu coração, mas
dizer que:
é um homem sensível. Com 75 anos, teso,
( ) tanto no verso quanto na prosa pode ha-
bem vestido, correto, possuidor de doze ne-
ver poesia. tos e cinco bisnetos, a sua conversa é sempre
( ) todo momento histórico apresenta um cheia de alegria e de mocidade. Outra noite,
conjunto de normas que caracteriza suas estávamos no seu salão, e de repente rompeu
manifestações culturais, constituindo o na rua um “zépereira”.
estilo da época. O conselheiro exclamou:
( ) o texto literário é aquele em que predo- – Eh! Eh! As coisas esquentam!
minam a repetição da realidade, a lingua- Como o conselheiro é idoso, pensei vê-lo ata-
gem linear, a unicidade de sentido. car os costumes e o carnaval. Para gozar da
( ) no gênero lírico, os elementos do mundo sua simpatia, refleti:
exterior predominam sobre os do mundo – Temos cada vez mais a dissolução da moral!
interior do eu poético. – Quem lhe fala nisso? – indagou o conse-
lheiro. Talvez por ter sido sempre um ho-
2. Relacione as espécies literárias abaixo com
mem moral nunca precisei de descompor os
suas respectivas características dispostas
costumes para julgar-me sério. Sabe o que eu
subsequentemente e assinale a alternativa
sinto quando ouço um “zé-pereira”?
correta:
– Francamente, conselheiro...
I. Poema lírico
– Sinto que chega o grande momento do
II. Conto
amor no rio...
III. Crônica
– De fato, a liberdade dos costumes.
IV. Romance – Heim?
V. Texto teatral – Sim, os préstitos, as cortesãs, a promiscui-
( ) Modalidade de texto literário que oferece
dade, as meninas de pijama cantando versos
uma amostra da vida através de um epi-
pouco sérios, os lança-perfumes, a bacanal...
sódio, um flagrante ou instantâneo, um
– Meu filho, quando se chega a uma certa
momento singular e representativo; pos-
idade, o resultado é tudo. Se quisermos ver
sui economia de meios narrativos e den-
nos três dias de carnaval a folia como de-
sidade na construção das personagens.
pravação, posso garantir que as brincadeiras
( ) À intensidade expressiva desse tipo de
texto literário, à sua concentração e ao de antanho com o entrudo, os banhos d’água
seu caráter imediato, associa-se, como fria, o porta-voz eram livres como as de hoje
traço estético importante, o uso do ritmo com os lança-perfumes, os confetes e as ser-
e da musicalidade. pentinas. Mas não se trata disso. Trata-se de
( ) Essa modalidade de texto literário pren- coisa mais séria. Eu casei aos 18 anos, isto
de-se a uma vasta área de vivência, faz- é, há quase 58 anos fiz a loucura de tomar
-se geralmente de uma história longa e por esposa a minha querida Genoveva. Mas,
apresenta uma estrutura complexa. passado o primeiro ano, essa alucinação cau-
( ) Nos textos do gênero, o narrador parece sou-me tal pasmo que resolvi estudar-lhe as
estar ausente da obra, ainda que, muitas causas. E descobri.
vezes, se revele nas rubricas ou nos diá- – Quais foram?
logos; neles impõe-se rigoroso encadea- – Uma só: o momento do amor!
mento causal. – Conselheiro!

224
– Há uma época no Rio absolutamente amorosa, quer no tempo da monarquia, quer na República.
Consultei estatísticas, observei, indaguei, procedi a inquéritos pessoais... Sabe qual é essa época? A
do carnaval! Note você como aumentam os casamentos nos meses seguintes ao carnaval. A maioria
das inclinações, dos namoros que terminam em casório, começam no carnaval. Três meses depois
estava casado. Cinco dos meus filhos namoraram no carnaval. Minha filha Berenice com 30 anos
arranjou o marido que lhe faz a vida feliz, no carnaval. Nove dos meus netos seguiram a regra...
– Mas, conselheiro, se é verdade o que V. Exa. diz, era o caso de fazer uns quatro carnavais por ano...
– Não daria resultado, meu amigo. O carnaval é uma embriaguez d´alegria. Quem se embriaga
uma vez por ano não está acostumado. Quem se embriaga quatro, raciocina na bebedeira. Veneza
acabou pelo abuso da máscara. Nós acabaríamos pelo abuso do “zé-pereira”. Mas uma vez por ano
é bem o verão impetuoso do desejo, o momento do amor.
Depois suspirando:
– Aproveite-o você. Eu infelizmente não posso mais. A velhice é como o maître d’hotel da vida.
Indica ao cliente o prato ótimo do cardápio e não o come.

3. (FEI) O texto pertence ao gênero conhecido por:


a) conto.
b) romance.
c) crônica.
d) reportagem.
e) novela.

4. (Cesgranrio 2011) Associe os gêneros literários às suas respectivas características.

1 – Gênero lírico () Exteriorização dos valores e sentimentos coletivos


2 – Gênero épico () Representação de fatos com presença física de atores
3 – Gênero dramático () Manifestação de sentimentos pessoais predominando, assim, a função emotiva

A sequência correta, de cima para baixo, é


a) 3 – 2 – 1
b) 2 – 3 – 1
c) 2 – 1 – 3
d) 1 – 3 – 2
e) 1 – 2 – 3

TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO.

Joaquim Maria Machado de Assis é cronista, contista, dramaturgo, jornalista, poeta, novelista,
romancista, crítico e ensaísta.
Em 2008, comemora-se o centenário de sua morte, ocorrida em setembro de 1908. Machado de
Assis é considerado o mais canônico escritor da Literatura Brasileira e deixou uma rica produção
literária composta de textos dos mais variados gêneros, em que se destacam o conto e o romance.
Segue o texto desse autor, em poesia.
A Carolina
Querida, ao pé do leito derradeiro
Em que descansas dessa longa vida,
Aqui venho e virei, pobre querida,
Trazer-te o coração do companheiro.
Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro
Que, a despeito de toda a humana lida,
Fez a nossa existência apetecida
E num recanto pôs um mundo inteiro.
Trago-te flores, - restos arrancados
Da terra que nos viu passar unidos,
São pensamentos idos e vividos.
Que eu, se tenho nos olhos mal feridos
Pensamentos de vida formulados,
São pensamentos idos e vividos.
(Machado de Assis)

225
5. (Ibmecrj) Ao avaliarmos o texto quanto a Sim, a internet! O Google! É a salvação. 4Lá
seu gênero literário, podemos afirmar que vai o cronista caçar assunto no computador.
ele pertence: Mas aí o problema fica sendo o excesso: ele
a) Ao gênero narrativo, pois conta a história digita, por exemplo, “Liberdade”, e 5lá vem
triste do poeta. a estátua nova-iorquina com seu facho de
b) Ao gênero lírico, pois expressa os sentimen- luz saudando os navegantes, ou o bairro do
tos do eu-poético. imigrante japonês em São Paulo, 6ou a letra
c) Ao gênero dramático, pois evidencia o dra- de um hino cívico, ou um tratado filosófico,
ma sentimental do poeta. até mesmo o “Libertas quae sera tamen*”
d) Ao gênero épico, pois exterioriza e narra as dos inconfidentes mineiros... Tenta-se outro
emoções do eu-lírico de forma grandiloquente. tema geral: “Política”. Aí mesmo é que não
e) Ao gênero descritivo pois descreve os deta- para mais: vêm coisas desde a polis grega até
lhes do contexto físico da cena. um poema de Drummond, salta-se da política
econômica para a financeira, chega-se à polí-
6. Sobre a arte literária, considere as seguintes tica de preservação de bens naturais, à políti-
afirmações: ca ecológica, à partidária, à política imperia-
I. ao escrever, o escritor é obrigado a man- lista, à política do velho Maquiavel, ufa.
ter um compromisso – ser fiel à realida- Que tal então a gastronomia, mais na moda
de, compondo um verdadeiro retrato do do que nunca? 7O velho bifinho da tia ou o
mundo; saudoso picadinho da vovó, receitas domés-
II. ao ler obra literária, um dos aspectos que ticas guardadas no segredo das bocas, vira-
o leitor deve levar em conta é a visibili- ram nomes estrangeiros, sob molhos com-
dade – capacidade de imaginar sensivel- plicados, de apelido francês. Nesse ramo da
mente o que se lê; alimentação há também que considerar o
III. a literatura é a arte da palavra, razão
que sejam produtos transgênicos, orgânicos,
pela qual não há fórmulas pré-concebidas
as ameaças do glúten, do sódio, da química
para se construir, por exemplo, um bom
nociva de tantos fertilizantes. Tudo muito
poema.
sofisticado e atingindo altos níveis de audi-
Quais estão corretas?
ência nos programas de TV: já seremos um
a) Apenas I.
país povoado por cozinheiros, quer dizer, por
b) Apenas II.
chefs de cuisine?**
c) Apenas II e III.
d) Apenas III. Temas palpitantes, certamente de interesse
e) I, II e III. público, estão no campo da educação: há, por
exemplo, quem veja nos livros de História
uma orientação ideológica conduzida pelos
E.O. Complementar autores; 8há quem defenda uma neutralidade
absoluta diante de fatos que seriam indiscu-
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: tíveis. 9Que sentido mesmo tiveram a abolição
da escravatura e a proclamação da República?
Cronista sem assunto E o suicídio de Getúlio Vargas? E os aconteci-
Difícil é ser cronista regular de algum peri- mentos de 1964? Já a literatura e a redação
ódico. Uma crônica por semana, havendo ou andam questionadas como itens de vestibu-
não assunto... É buscar na cabeça uma lu- lar: mas sob quais argumentos o desempenho
zinha, uma palavra que possa acender toda linguístico e a arte literária seriam dispensá-
uma frase, um parágrafo, uma página intei- veis numa formação escolar de verdade?
ra – mas qual? 1Onde o ímã que atraia uma Enfim, 10o cronista que se dizia sem assun-
boa limalha? ²Onde a farinha que proverá o
to de repente fica aflito por ter de escolher
pão substancioso? O relógio está correndo e
um no infinito cardápio digital de assuntos.
o assunto não vem. Cronos, cronologia, crô-
Que esperará ler seu leitor? 11Amenidades?
nica, tempo, tempo, tempo... Que tal falar da
falta de assunto? Mas isso já aconteceu umas Alguma informação científica? A quadratura
três vezes... Há cronista que abre a Bíblia em do círculo encontrada pelo futebol alemão?
busca de um grande tema: os mandamentos, A situação do cinema e do teatro nacionais,
um faraó, o Egito antigo, as pragas, as pirâ- dependentes de financiamento por incenti-
mides erguidas pelo trabalho escravo? Mas vos fiscais? Os megatons da última banda de
como atualizar o interesse em tudo isso? O rock que visitou o Brasil? O ativismo polí-
leitor de jornal ou de revista anda com mais tico das ruas? Uma viagem fantasiosa pelo
pressa do que nunca, ³e, aliás, está munido interior de um buraco negro, esse mistério
de um celular que lhe coloca o mundo nas maior tocado pela Física? A posição do Reino
mãos a qualquer momento. Unido diante da União Europeia?

226
12
Houve época em que bastava ao cronista d) investimento no caráter experimental e de
ser poético: o reencontro com a primeira na- vanguarda da linguagem literária.
moradinha, uma tarde chuvosa, um passeio e) submissão do texto à realidade de alguma
pela infância distante, um amor machucado, política a ser tomada como paradigma.
13
tudo podia virar uma valsa melancólica ou
um tango arrebatador. Mas hoje parece que TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
estamos todos mais exigentes e utilitaristas,
e os jovens cronistas dos jornais abordam Filme-enigma de Christopher Nolan gera
criticamente os rumores contemporâneos, discussões sobre significado e citações ocul-
valem-se do vocabulário ligado a novos com- tas ou óbvias em sua trama onírica
portamentos, ou despejam um humor ácido
em seus leitores, 14num tempo sem nostalgia
e sem utopias.
É bom lembrar que o papel em que se impri-
mem livros, jornais e revistas está sob amea-
ça como suporte de comunicação. 15O mesmo
ocorre com o material das fitas, dos CDs e
DVDs: o mundo digital armazena tudo e pro-
paga tudo instantaneamente. Já surgem in- Certa vez o sábio taoísta Chuang Tzu sonhou
contáveis blogs de cronistas, onde os autores que era uma borboleta. Ao acordar, entretan-
discutem on-line com seus leitores aspectos to, ele não sabia mais se era um homem que
da matéria tratada em seus textos. A intera- sonhara ser uma borboleta ou uma borboleta
tividade tornou-se praticamente uma regra: que agora sonhava ser um homem.
há mesmo quem diga que a própria noção Será que Dom Cobb está sonhando? Será
de autor, ou de autoria, já caducou, em fun- que a vida real é esta mesma ou somos nós
ção da multiplicidade de vozes que se podem que sonhamos?
afirmar num mesmo espaço textual. Num Alguns podem ir ao cinema para assistir A
plano cósmico: quem é o autor do Univer- Origem, de Christopher Nolan (Batman – O
so? Deus? O Big Bang? A Física é que explica Cavaleiro das Trevas) e achar tão chato que
tudo ou deixemos tudo com o criacionismo? vão sonhar de verdade, dormindo na fase de
Enquanto não chega seu apocalipse profissio- sono REM. Mas outros estão sonhando acor-
nal, o cronista de periódico ainda tem empre- dados. Em blogs, sites e grupos de discussão,
go, o que não é pouco, em tempo de crise. Pois os já fanáticos pelo filme de Nolan apontam
então que arrume assunto, e um bom assun- referências (de mitologia grega), veem cita-
to, para não perder seus leitores. Como não ções (de Lost), tecem teorias malucas e cons-
dá para ser sempre um Machado de Assis, um piratórias (o sonho dentro do sonho).
Rubem Braga, um Luis Fernando Veríssimo, Alguns acusam o diretor de copiar filmes
há que se contentar com um mínimo de estilo os mais variados, de Blade Runner (1982)
e uma boa escolha de tema. A variedade da a eXistenZ (1999), de se inspirar em 2001
vida há de conduzi-lo por um bom caminho; é – Uma Odisseia no Espaço (1968) e até de
função do cronista encontrar algum por onde roubar a ideia de um quadrinho do Tio Pati-
possa transitar acompanhado de muitos e, de nhas de 2002.
preferência, bons leitores. O fato é que Nolan acertou o alvo. E ele sabia
(Teobaldo Astúrias, inédito) do potencial “nerdístico” de seu filme. Tanto
é que cogitou mudar a canção que toca no
* Liberdade ainda que tardia.
filme todo, Non, Je Ne Regrette Rien, com
** chefes de cozinha.
Edith Piaf, porque uma das atrizes escala-
1. (Puccamp 2017) Na frase “A variedade da das, Marion Cotillard, havia vivido a cantora
vida há de conduzi-lo por um bom cami- francesa em um filme de 2007. (...)
nho; é função do cronista encontrar algum Além da música, uma boa diversão de A Ori-
por onde possa transitar acompanhado de gem é identificar os objetos impossíveis dei-
muitos e, de preferência, bons leitores”, fica xados por Nolan ao longo do filme. A escada
ressaltado o seguinte aspecto essencial do de Penrose, criada pelo psiquiatra britânico
gênero literário de que se está tratando: Lionel Penrose, aparece diversas vezes na
a) intenção moralizante da narrativa, de modo tela – e também inspirou o quadro que tenta
a garantir a boa formação do leitor/cidadão. explicar facetas do longa.
b) exploração de um tema de interesse geral Melhor ir ver o filme e não pensar em escadas...
colhido entre experiências da vida comum. No que você está pensando agora?
c) multiplicação dos mais variados estilos num Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.
mesmo texto pedagógico. br/fsp/ilustrad/ fq1908201010.htm>.

227
2. (Insper) O texto permite afirmar que o po- De acordo com a leitura dos fragmentos,
tencial “nerdístico” do filme: explicite:
a) está associado às marcas de metalinguagem.
b) advém da trama onírica que induz ideias 1. A lembrança que o eu poético faz alusão.
subliminares.
c) resulta das fortes referências intertextuais. 2. Como são construídos os traços épico e lírico.
d) origina-se da mistura entre realidade e ficção.
e) decorre da associação entre o sonho e a
escada de Penrose. TEXTO PARA AS PRÓXIMAS DUAS QUESTÕES

A um passarinho
3. (Uern) A palavra serve para comunicar e in-
Para que vieste
teragir. E também para criar literatura, isto
Na minha janela
é, criar arte, provocar emoções, produzir
Meter o nariz?
efeitos estéticos. Se foi por um verso
(Português: linguagens: volume 1: ensino médio / (...)
William Roberto Cereja, Thereza Cochar Magalhães.
Não sou mais poeta
– 5.ed. – São Paulo: Atal, 2005. p. 27.)
Ando tão feliz!
(Vinicius de Moraes)
A partir da definição anterior, pode-se afir-
mar que a linguagem literária
a) pressupõe objetividade e clareza diante da 3. Segundo o texto, qual é a condição funda-
sua função utilitária. mental para a condição poética?
b) não permite que haja dupla interpretação a
respeito do assunto tratado. 4. A que gênero literário pertence o texto?
c) é organizada de modo que a plurissignifica- Identifique a que gênero pertencem os tex-
ção esteja presente no texto. tos das questões 5, 6 e 7. Aponte duas carac-
d) tem por objetivo esclarecer acerca de um terísticas que justifiquem sua resposta.
assunto relacionado à realidade
5. Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
E.O. Dissertativo Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
(Casimiro de Abreu)

Leia as estrofes do poema “O prato azul-


-pombinho”, de Cora Coralina para respon- 6. Lavínia: (sacode Vicente) Vicente! Não ouve
der às questões 1 e 2. o apito do trem? Desistiu de ir?
Vicente: Não. Eu vou. Preciso ir. Eu mando
Minha bisavó – que Deus a tenha em glória – notícias.
Lavínia: Amanhã mesmo?
sempre contava e recontava
Vicente: Amanhã. Adeus.
em sentidas recordações
Lavínia: Adeus.
de outros tempos (Jorge de Andrade, Beijam-se com amor.)
a estória de saudade
daquele prato azul-pombinho. 7. A casa inteira recebeu a carta com muita
Era uma estória minuciosa. alegria. Ricardo vinha do Recife passar uns
Comprida, detalhada. dias com eles. Há anos que se fora. Ainda
Sentimental. quase menino, sumira-se do engenho sem
Puxada em suspiros saudosistas ninguém saber para onde. Ricardo fugiu.
(José Lins do Rego)
e ais presentes.
E terminava, invariavelmente,
8. (Pucrj) A amizade
depois do caso esmiuçado:
Já farto da vida, dos anos na flor,
“– Nem gosto de lembrar disso...”
O peito me rala pungente saudade;
É que a estória se prendia
Traído nas crenças, traído no amor,
aos tempos idos em que vivia Meu canto recebe, celeste amizade.
minha bisavó
que fizera deles seu presente e seu futuro. Poeta e amante, eu um mundo sonhei
[...] Repleto de gozos, um mundo ideal,
CORALINA, Cora. Melhores poemas de Cora Coralina. Seleção Quando terna outrora a mulher que eu amei
de Darci F. Denófrio. São Paulo: Global, 2004, p. 47. A mim me jurara ser sempre leal.

228
Ó tu, meu amigo, permite que um pouco A felicidade do pobre parece
A fronte recline nu m peito de irmão; A grande ilusão do carnaval
Enxuga, se podes, o pranto do louco, A gente trabalha o ano inteiro
Que em paga de afetos só teve a traição! Por um momento de sonho
Pra fazer a fantasia
Em tempos felizes, num dia formoso, De rei, ou de pirata, ou jardineira
Pra tudo se acabar na quarta-feira
Na relva sentados, bem juntos, unidos,
No peito encostado seu rosto mimoso, Tristeza não tem fim
A ingrata me dava sorrisos… fingidos! Felicidade sim...

Ai! crente, eu beijava seus lábios corados A felicidade é como a gota


Com beijos ardentes, com beijos de amor, De orvalho numa pétala de flor
Brilha tranquila
E Laura jurava que, quando apartados,
Depois de leve oscila
Viver não queria, morreria de dor! E cai como uma lágrima de amor.
Partir foi preciso… abracei-a chorando… A minha felicidade está sonhando
E Laura chorou!… eu de dor solucei… Nos olhos da minha namorada
Mas tempos depois que, contente voltando... É como esta noite
Julgava beijá-la, já não a encontrei! Passando, passando
Em busca da madrugada
Mulher enganosa, quebraste essas juras Falem baixo, por favor...
Que em prantos me deste diante de Deus! Pra que ela acorde alegre com o dia
Mas tu não te lembras que as faces impuras, Oferecendo beijos de amor.
Que os lábios corados roçaram os meus?!
Tristeza não tem fim
Poeta e amante, eu um mundo sonhei Felicidade sim...
Repleto de gozos, um mundo ideal… MORAES, Vinicius de e JOBIM, Tom. Vinicius
Fugiram os sonhos que eu tanto afaguei, de Moraes – Literatura Comentada São Paulo:
Abril Educação, 1980. p.71 e 72.
Como flor tombada por um vendaval.
Errante vagando por vales sombrios Determine o gênero literário predominante
Co’a mente em delírio, em cruel ansiedade; no texto, justificando com dois aspectos que
A morte buscando nas águas dos rios, o caracterizam.
Me disse uma voz: – «Inda resta a amizade!
Esquece esse fogo, esse amor, um delírio
Que aqui te cavava profundo jazigo;
Ao mundo de novo, termina o martírio, E.O. Enem
A fronte reclina num peito de amigo.»
– Ao mundo voltei, esqueci os amores 1. (Enem)
No peito apagando uma forte paixão;
Agora a amizade mitiga-me as dores, Texto I: Chão de esmeralda
Sê tu meu amigo, serei teu irmão!
Agosto, 1853. Me sinto pisando
ABREU, Casimiro de. Disponível em: <https:// Um chão de esmeraldas
archive.org/details/obrascompletasd00abregoog>. Quando levo meu coração
Acesso em: 10 set. 2014. À Mangueira
a) Há no poema de Casimiro de Abreu a exal- Sob uma chuva de rosas
tação da amizade como um sentimento de Meu sangue jorra das veias
compreensão, acolhida e apoio. E tinge um tapete
Comente com suas próprias palavras os mo- Pra ela sambar
tivos que levaram o eu poético a valorizar a É a realeza dos bambas
amizade como um contraponto à tristeza, à Que quer se mostrar
solidão e ao delírio. Soberba, garbosa
b) Determine o gênero literário predominante
no texto. Minha escola é um cata-vento a girar
É verde, é rosa
Oh, abre alas pra Mangueira passar
9. (Pucrj) A felicidade
Tristeza não tem fim BUARQUE, C.; CARVALHO, H.B. Chico Buarque de Mangueira.
Marola Edições Musicais Ltda. BMG. 1997. Disponível em:
Felicidade sim... <www.chicobuarque.com.br>. Acesso em: 30 abr. 2010.

A felicidade é como a pluma Texto II


Que o vento vai levando pelo ar
Voa tão leve Quando a escola de samba entra na Marquês
Mas tem a vida breve de Sapucaí, a plateia delira, o coração dos
Precisa que haja vento sem parar. componentes bate mais forte e o que vale é a

229
emoção. Mas, para que esse verdadeiro espe- anos, não resistiu e caiu na calçada da Rua
táculo entre em cena, por trás da cortina de da Abolição, quase esquina com a Padre Viei-
fumaça dos fogos de artifício, existe um ver- ra, no centro da cidade, ontem por volta do
dadeiro batalhão de alegria: são costureiras, meio-dia. O homem ainda tentou apoiar-se
aderecistas, diretores de ala e de harmonia, no guarda-chuva que trazia, mas não conse-
pesquisador de enredo e uma infinidade de guiu. Aos populares que tentaram socorrê-lo
profissionais que garantem que tudo esteja não conseguiu dar qualquer informação.
perfeito na hora do desfile. c) Eu logo vi que podia se tratar de um ataque.
AMORIM, M.; MACEDO, G. O espetáculo dos bastidores. Eu vinha logo atrás. O homem, todo apru-
Revista de Carnaval 2010: Mangueira. Rio de mado, de guarda-chuva no braço e cachimbo
Janeiro: Estação Primeira de Mangueira, 2010. na boca, dobrou a esquina e foi diminuindo
o passo até se sentar no chão da calçada. Al-
Ambos os textos exaltam o brilho, a beleza, a gumas pessoas que passavam pararam para
tradição e o compromisso dos dirigentes e de ajudar, mas ele nem conseguia falar.
todos os componentes com a escola de sam- d) Vítima
ba Estação Primeira de Mangueira. Uma das Idade: entre 40 e 45 anos
diferenças que se estabelece entre os textos Sexo: masculino
é que: Cor: branca
a) o artigo jornalístico cumpre a função de Ocorrência: Encontrado desacordado na Rua
transmitir emoções e sensações, mais do que da Abolição, quase esquina com Padre Viei-
a letra de música. ra. Ambulância chamada às 12h34min por
b) a letra de música privilegia a função social homem desconhecido. A caminho.
de comunicar a seu público a crítica em re- e) Pronto-socorro? Por favor, tem um homem
lação ao samba e aos sambistas. caído na calçada da rua da Abolição, quase
c) a linguagem poética, no Texto I, valoriza esquina com a Padre Vieira. Ele parece des-
imagens metafóricas e a própria escola, en- maiado. Tem um grupo de pessoas em vol-
quanto a linguagem, no Texto II, cumpre a ta dele. Mas parece que ninguém aqui pode
função de informar e envolver o leitor. ajudar. Ele precisa de uma ambulância rápi-
d) ao associar esmeraldas e rosas às cores da es- do. Por favor, venham logo!
cola, o Texto I acende a rivalidade entre esco-
las de samba, enquanto o Texto II é neutro.
e) o Texto I sugere a riqueza material da Manguei-
ra, enquanto o Texto II destaca o trabalho na E.O. UERJ
escola de samba.
Exame de Qualificação
2. (Enem) Dario vinha apressado, guarda-chuva
no braço esquerdo e, assim que dobrou a es- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
quina, diminuiu o passo até parar, encostan- Ciência e Hollywood
do-se à parede de uma casa. Por ela escorre-
gando, sentou-se na calçada, ainda úmida da
5
Infelizmente, é verdade: explosões não fa-
chuva, e descansou na pedra o cachimbo. zem barulho algum no espaço. Não me lembro
Dois ou três passantes rodearam-no e inda- de um só filme que tenha retratado isso direi-
to. 6Pode ser que existam alguns, mas se exis-
garam se não se sentia bem. Dario abriu a
tirem não fizeram muito sucesso. 10Sempre
boca, moveu os lábios, não se ouviu resposta.
vemos explosões gigantescas, estrondos fan-
O senhor gordo, de branco, sugeriu que devia
tásticos. Para existir ruído é necessário um
sofrer de ataque. meio material que transporte as perturbações
Adaptado de: TREVISAN, D. Uma vela para Dario. Cemitério que chamamos de ondas sonoras. Na ausên-
de Elefantes. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964. cia de atmosfera, ou água, ou outro meio, as
perturbações não têm onde se propagar. 7Para
No texto, um acontecimento é narrado em
um produtor de cinema, a questão não passa
linguagem literária. Esse mesmo fato, se re-
pela ciência. Pelo menos não como prioridade.
latado em versão jornalística, com caracte- Seu interesse é tornar o filme emocionante, e
rísticas de notícia, seria identificado em: explosões têm justamente este papel; roubar
a) Aí, amigão, fui diminuindo o passo e tentei o som de uma grande espaçonave explodindo
me apoiar no guarda-chuva... mas não deu. torna a cena bem sem graça.
Encostei na parede e fui escorregando. Foi 11
Recentemente, o debate sobre as liberdades
mal, cara! Perdi os sentidos ali mesmo. Um científicas tomadas pelo cinema tem aqueci-
povo que passava falou comigo e tentou me do. O sucesso do filme O dia depois de amanhã
socorrer. E eu, ali, estatelado, sem conseguir (The day after tomorrow), faturando mais de
falar nada! Cruzes! Que mal. meio bilhão de dólares, e seu cenário de uma
b) O representante comercial Dario Ferreira, 43 idade do gelo ocorrendo em uma semana, em

230
vez de décadas ou, melhor ainda, centenas de c) verdade e verossimilhança
anos, 9levantaram as sobrancelhas de cientis- d) particularização e universalismo
tas mais rígidos que veem as distorções com
desdém e esbugalharam os olhos dos espec- 2. (UERJ) Observe atentamente os dois trechos
tadores (a maioria) que pouco ligam se a ci-
transcritos a seguir.
ência está certa ou errada. Afinal, cinema é
diversão. “... o objetivo da poesia (e da arte literária
15
Até recentemente, defendia a posição mais em geral) não é o real concreto, o verdadei-
rígida, que filmes devem tentar ao máximo ro, aquilo que de fato aconteceu, mas sim o
ser fiéis à ciência que retratam. Claro, isso verossímil, o que pode acontecer, considera-
sempre é bom. Mas não acredito mais que do na sua universalidade.”
seja absolutamente necessário. 1Existe uma SILVA,Vítor M. de A. Teoria de Literatura.
diferença crucial entre um filme comercial e Coimbra: Almedina, 1982.
um documentário científico. 12Óbvio, 2docu-
mentários devem retratar fielmente a ciên- Verossímil. 1. Semelhante à verdade; que pa-
cia, educando e divertindo a população, mas rece verdadeiro. 2. Que não repugna à verda-
filmes não têm necessariamente um compro- de, provável.
misso pedagógico. 13As pessoas não vão ao ci- FERREIRA. A. B. de Holanda, Novo Dicionário Aurélio da
nema para serem educadas, ao menos como Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
via de regra.
A partir da leitura de ambos os fragmentos,
Claro, 3filmes históricos ou mesmo aqueles fi-
pode-se deduzir que a obra literária tem o
éis à ciência têm enorme valor cultural. Outros
seguinte objetivo:
educam as emoções através da ficção. 14Mas,
a) opor-se ao real para afirmar a imaginação cria-
se existirem exageros, eles não deverão ser
criticados como tal. Fantasmas não existem, dora
mas filmes de terror sim. Pode-se argumen- b) anular a realidade concreta para superar
tar que, no caso de filmes que versam sobre contradições aparentes
temas científicos, 4as pessoas vão ao cinema c) construir uma aparência de realidade para
esperando uma ciência crível. Isso pode ser expressar dado sentido
verdade, mas elas não deveriam basear suas d) buscar uma parcela representativa do real
conclusões no que diz o filme. No mínimo, o para contestar sua validade
cinema pode servir como mecanismo de aler-
ta para questões científicas importantes: o TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
aquecimento global, a inteligência artificial,
a engenharia genética, as guerras nucleares, Sobre a origem da poesia
os riscos espaciais como cometas ou asteroi-
A origem da poesia se confunde com a ori-
des etc. 8Mas o conteúdo não deve ser levado
gem da própria linguagem.
ao pé da letra. 16A arte distorce para persua- Talvez fizesse mais sentido perguntar quan-
dir. E o cinema moderno, com efeitos espe- do a linguagem verbal deixou de ser poesia.
ciais absolutamente espetaculares, distorce Ou qual a origem do discurso não poético,
com enorme facilidade e poder de persuasão. já que, restituindo laços mais íntimos entre
O que os cientistas podem fazer, e isso está os signos e as coisas por eles designadas,
virando moda nas universidades norte-ame- a poesia aponta para um uso muito primá-
ricanas, é usar filmes nas salas de aula para rio da linguagem, que parece anterior ao
educar seus alunos sobre o que é cientifica- perfil de sua ocorrência nas conversas, nos
mente correto e o que é absurdo. Ou seja, usar jornais, nas aulas, conferências, discussões,
o cinema como ferramenta pedagógica. 17Os discursos, ensaios ou telefonemas. Como se
alunos certamente prestarão muita atenção, ela restituísse, através de um uso específico
muito mais do que em uma aula convencio- da língua, a integridade entre nome e coi-
nal. Com isso, será possível educar a popu- sa − que o tempo e as culturas do homem
lação para que, no futuro, um número cada civilizado trataram de separar no decorrer
vez maior de pessoas possa discernir o real da história.
do imaginário. A manifestação do que chamamos de poesia
MARCELO GLEISER hoje nos sugere mínimos flashbacks de uma
Disponível em: <www1.folha.uol.com.br>. possível infância da linguagem, antes que a
representação rompesse seu cordão umbili-
1. (UERJ) A oposição entre “ciência” e cal, gerando essas duas metades − significan-
“Hollywood”, expressa no título do artigo de te e significado. Houve esse tempo? Quando
Gleiser, corresponde a outra oposição bas- não havia poesia porque a poesia estava em
tante estudada no campo da literatura, que tudo o que se dizia? Quando o nome da coi-
se verifica entre: sa era algo que fazia parte dela, assim como
a) acontecimento e opinião sua cor, seu tamanho, seu peso? Quando os
b) historicismo e atualidade laços entre os sentidos ainda não se haviam

231
desfeito, então música, poesia, pensamento,
dança, imagem, cheiro, sabor, consistência E.O. UERJ
se conjugavam em experiências integrais,
associadas a utilidades práticas, mágicas, Exame Discursivo
curativas, religiosas, sexuais, guerreiras?
Pode ser que essas suposições tenham algo TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
de utópico, projetado sobre um passado pré-
O DIREITO À LITERATURA
-babélico, tribal, primitivo. Ao mesmo tem-
po, cada novo poema do futuro que o pre- 1
Chamarei de literatura, da maneira mais am-
sente alcança cria, com sua ocorrência, um pla possível, todas as criações de toque poéti-
pouco desse passado. Lembrome de ter lido, co, ficcional ou dramático em todos os níveis
certa vez, um comentário de Décio Pignatari, de uma sociedade, em todos os tipos de cul-
em que ele chamava a atenção para o fato de, tura, desde o que chamamos folclore, lenda,
tanto em chinês como em tupi, não existir o até as formas mais complexas e difíceis da
verbo ser, enquanto verbo de ligação. Assim, produção escrita das grandes civilizações.
o ser das coisas ditas se manifestaria nelas Vista deste modo a literatura aparece clara-
próprias (substantivos), não numa partícula mente como manifestação universal de to-
verbal externa a elas, o que faria delas lín- dos os homens em todos os tempos. Não há
guas poéticas por natureza, mais propensas povo e não há homem que possa viver sem
à composição analógica. ela, isto é, sem a possibilidade de entrar em
Mais perto do senso comum, podemos aten- contato com alguma espécie de fabulação*.
tar para como colocam os índios americanos Assim como todos sonham todas as noites,
falando, na maioria dos filmes de cowboy ninguém é capaz de passar as vinte e qua-
− eles dizem “maçã vermelha”, “água boa”, tro horas do dia sem alguns momentos de
“cavalo veloz”; em vez de “a maçã é verme- entrega ao universo fabulado. 2O sonho as-
lha”, “essa água é boa”, “aquele cavalo é ve- segura durante o sono a presença indispen-
loz”. Essa forma mais sintética, telegráfica, sável deste universo, independentemente da
aproxima os nomes da própria existência nossa vontade. E durante a vigília a criação
− como se a fala não estivesse se referin- ficcional está presente em cada um de nós,
do àquelas coisas, e sim apresentandoas (ao como anedota, história em quadrinhos, no-
mesmo tempo em que se apresenta). No seu ticiário policial, canção popular. Ela se ma-
estado de língua, no dicionário, as palavras nifesta desde o devaneio no ônibus até a
intermedeiam nossa relação com as coisas, atenção fixada na novela de televisão ou na
impedindo nosso contato direto com elas. A leitura seguida de um romance.
linguagem poética inverte essa relação, pois, Ora, se ninguém pode passar vinte e quatro
vindo a se tornar, ela em si, coisa, oferece horas sem mergulhar no universo da ficção e
uma via de acesso sensível mais direto entre da poesia, a literatura concebida no sentido
nós e o mundo. (...) amplo a que me referi parece corresponder a
Já perdemos a inocência de uma linguagem uma necessidade universal, que precisa ser sa-
plena assim. As palavras se desapegaram tisfeita e cuja satisfação constitui um direito.
das coisas, assim como os olhos se desape- Podemos dizer que 3a literatura é o sonho
garam dos ouvidos, ou como a criação se de- acordado das civilizações. Portanto, assim
sapegou da vida. Mas temos esses pequenos como não é possível haver equilíbrio psíquico
oásis − os poemas − contaminando o deserto sem o sonho durante o sono, talvez não haja
da referencialidade. equilíbrio social sem a literatura. Deste modo,
Arnaldo Antunes. <www.arnaldoantunes.com.br>. ela é 4fator indispensável de humanização e,
sendo assim, confirma o homem na sua hu-
3. (UERJ) No último parágrafo, o autor se re- manidade, inclusive porque atua em grande
fere à plenitude da linguagem poética, fa- parte no subconsciente e no inconsciente.
zendo, em seguida, uma descrição que cor- Cada sociedade cria as suas manifestações
responde à linguagem não poética, ou seja, à ficcionais, poéticas e dramáticas de acordo
linguagem referencial. com os seus impulsos, as suas crenças, os
Pela descrição apresentada, a linguagem re- seus sentimentos, as suas normas, a fim de
ferencial teria, em sua origem, o seguinte fortalecer em cada um a presença e atuação
traço fundamental: deles. Por isso é que nas nossas sociedades
a) o desgaste da intuição. a literatura tem sido um instrumento pode-
roso de instrução e educação, entrando nos
b) a dissolução da memória.
currículos, sendo proposta a cada um como
c) a fragmentação da experiência.
equipamento intelectual e afetivo.
d) o enfraquecimento da percepção. Antonio Candido - Adaptado de Vários
escritos. São Paulo: Duas Cidades, 1995.

* fabulação − ficção

232
1. (UERJ) Chamarei de literatura, da maneira (...) Sendo o objeto da literatura a própria
mais ampla possível, (ref. 1) condição humana, aquele que a lê e a com-
O trecho acima parte de uma pressuposição preende se tornará não um especialista em
que o próprio autor contesta: a de que existiria análise literária, mas um conhecedor do ser
uma maneira restrita de definir a literatura. humano. Que melhor introdução à compre-
Identifique outro exemplo do primeiro pa- ensão das paixões e dos comportamentos
rágrafo que contenha uma pressuposição e humanos do que uma imersão na obra ,dos
explique em que ela consiste. grandes escritores que se dedicam a essa ta-
refa há milênios? E, de imediato: que melhor
preparação pode haver para todas as profis-
2. (UERJ) O autor afirma que a literatura é fa- sões baseadas nas relações humanas? Se en-
tor indispensável de humanização e, sendo tendermos assim a literatura e orientarmos
assim, confirma o homem na sua humani- dessa maneira o seu ensino, que ajuda mais
dade, (ref. 4). preciosa poderia encontrar o futuro estu-
Cite dois argumentos que ele apresenta no dante de direito ou de ciências políticas, o
texto para chegar a essa conclusão. futuro assistente social ou psicoterapeuta, o
historiador ou o sociólogo? Ter como profes-
sores Shakespeare e Sófocles, Dostoievski e
E.O. Objetivas Proust não é tirar proveito de um ensino ex-
cepcional? E não se vê que mesmo um futuro
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) médico, para exercer o seu ofício, teria mais
a aprender com esses mesmos professores do
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 4 QUESTÕES: que com os manuais preparatórios para con-
curso que hoje determinam o seu destino?
A literatura em perigo Assim, os estudos literários encontrariam o
seu lugar no coração das humanidades, ao
A análise das obras feita na escola não deve- lado da história dos eventos e das ideias,
ria mais ter por objetivo ilustrar os conceitos todas essas disciplinas fazendo progredir o
recém-introduzidos por este ou aquele lin- pensamento e se alimentando tanto de obras
guista, este ou aquele teórico da literatura, quanto de doutrinas, tanto de ações políticas
quando, então, os textos são apresentados quanto de mutações sociais, tanto da vida
como uma aplicação da língua e do discur- dos povos quanto da de seus indivíduos.
so; sua tarefa deveria ser a de nos fazer ter Se aceitarmos essa finalidade para o ensino
acesso ao sentido dessas obras — pois postu- literário, o qual não serviria mais unicamen-
lamos que esse sentido, por sua vez, nos con- te à reprodução dos professores de Letras, po-
duz a um conhecimento do humano, o qual demos facilmente chegar a um acordo sobre
importa a todos. Como já o disse, essa ideia o espírito que o deve conduzir: é necessário
não é estranha a uma boa parte do próprio incluir as obras no grande diálogo entre os
mundo do ensino; mas é necessário passar homens, iniciado desde a noite dos tempos e
das ideias à ação. Num relatório estabeleci- do qual cada um de nós, por mais ínfimo que
do pela Associação dos Professores de Letras, seja, ainda participa. “É nessa comunicação
podemos ler: “O estudo de Letras implica o inesgotável, vitoriosa do espaço e do tempo,
estudo do homem, sua relação consigo mes- que se afirma o alcance universal da literatu-
mo e com o mundo, e sua relação com os ra”, escrevia Paul Bénichou. A nós, adultos,
outros.” Mais exatamente, o estudo da obra nos cabe transmitir às novas gerações essa
remete a círculos concêntricos cada vez mais herança frágil, essas palavras que ajudam a
amplos: o dos outros escritos do mesmo au- viver melhor.
tor, o da literatura nacional, o da literatura Tzvetan Todorov. A literatura em perigo. 2. ed. Trad.
mundial; mas seu contexto final, o mais im- Caio Meira. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009, p. 89-94.
portante de todos, nos é efetivamente dado
pela própria existência humana. Todas as 1. (Unesp) Ter como professores Shakespeare
grandes obras, qualquer que seja sua origem, e Sófocles, Dostoievski e Proust não é tirar
demandam uma reflexão dessa dimensão.
proveito de um ensino excepcional?
O que devemos fazer para desdobrar o sen-
Esta questão levantada por Todorov, no con-
tido de uma obra e revelar o pensamento do
texto do terceiro parágrafo, significa:
artista? Todos os “métodos” são bons, desde
a) O conhecimento enciclopédico desses auto-
que continuem a ser meios, em vez de se tor-
res, manifestado em suas obras, equivale a
narem fins em si mesmos. (...)
um verdadeiro curso universitário.
(...)
b) Por se tratar de autores de nacionalidades
e épocas diferentes, a leitura de suas obras
traz conhecimentos importantes sobre seus
respectivos países.

233
c) Esses autores escreveram com a intenção perda relevante de sentido:
fundamental de passar ensinamentos para a) uma imitação da obra.
seus contemporâneos e a posteridade. b) uma paráfrase da obra.
d) A leitura das obras desses autores, que fo- c) uma censura da obra.
calizam admiravelmente o homem e o hu- d) uma transformação da obra.
mano, seria de excepcional utilidade para os e) uma leitura da obra.
estudantes de relações humanas.
e) A leitura desses autores não acrescenta nada
de excepcional ao ensino.
E.O. Dissertativas
2. (Unesp) No segundo parágrafo do fragmen-
to apresentado, Todorov afirma que Todos os
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
“métodos” são bons, desde que continuem a
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
ser meios, em vez de se tornarem fins em si
mesmos. A questão a seguir toma por base uma Tra-
O autor defende, com essa afirmação, o argu- gédia em um Ato, assinada pelo escritor, tra-
mento segundo o qual o verdadeiro valor de dutor e desenhista Millôr Fernandes (1924),
um método de análise literária e publicada pela primeira vez em “O pif-paf”
a) consiste em ser exato e perfeito, superior a (O CRUZEIRO, 1945).
todos os demais.
b) está em ser completo: quando terminar a O CAPITALISMO MAIS REACIONÁRIO
análise, nada mais deve restar a explicar.
Tragédia em um ato
c) consiste em servir de instrumento adequado
Personagens - o patrão e o empregado
à análise e interpretação da obra.
Época - atual
d) reside no fato de que, depois de aplicado,
deve ser substituído por outro melhor.
e) é mostrar mais suas próprias virtudes que as
ATO ÚNICO
da obra focalizada.
Empregado - Patrão, eu queria lhe falar se-
3. (Unesp) Observe as seguintes opiniões refe- riamente. Há quarenta anos que trabalho na
rentes ao ensino de literatura. empresa e até hoje só cometi um erro.
I. O estudo de obras literárias na escola tem Patrão - Está bem, meu filho, está bem. Mas
como objetivo fundamental ensinar os de agora em diante tome mais cuidado.
fundamentos da Linguística. (Pano bem rápido)
II. A análise das obras feita na escola deve (In: FERNANDES, Millôr. TRINTA ANOS DE MIM
levar o estudante a ter acesso ao sentido MESMO. Rio de Janeiro: Nórdica, 1974, p. 15).
dessas obras.
III. O objetivo do ensino da literatura na es- 1. (Vunesp) A tragédia, no sentido clássico, é
cola não é formar teóricos da literatura. uma obra fortemente dramática, inspirada
IV. De nada adianta a leitura das obras lite- na lenda ou na história, e que põe em cena
rárias sem a prévia fundamentação das personagens envolvidos em situações que
teorias literárias. desencadeiam desgraças. Em sua função po-
Das quatro opiniões, as que se enquadram na ética, destina-se também a infundir o terror
argumentação manifestada por Todorov em e a piedade. Considerando essa definição, re-
seu texto estão contidas apenas em: leia o texto de Millôr Fernandes e, a seguir:
a) I e II. §§ interprete por que apenas esse diálogo
b) I e III. entre os dois personagens poderia carac-
c) II e III. terizar uma tragédia, segundo o autor; e
d) I, II e III. §§ interprete um sentido conotativo da ex-
e) II, III e IV. pressão “meu filho”, nas palavras do per-
sonagem patrão.
4. (Unesp) Que melhor introdução à compre-
ensão das paixões e dos comportamentos
humanos do que uma imersão na obra dos
grandes escritores que se dedicam a essa ta-
refa há milênios?
Com base no fato de que a palavra “imer-
são”, usada na expressão uma imersão na
obra, caracteriza uma metáfora, indique a
alternativa que elimina essa metáfora sem

234
Gabarito E.O. UERJ
Exame de Qualificação
E.O. Aprendizagem 1. C 2. C 3. C
1. B 2. C 3. B 4. A 5. C

6. A 7. C 8. C 9. C 10. C E.O. UERJ


Exame Dissertativo
1.
O trecho em que o autor menciona e se re-
E.O. Fixação fere a uma definição estrita de literatura é:
desde o que chamamos de folclore, lenda,
1. V-V-F-F 2. b 3. C 4. b
até as formas mais complexas e difíceis da
5. b 6. C produção escrita das grandes civilizações. A
menção a formas mais complexas e difíceis
E.O. Complementar da produção escrita pressupõe que as que
foram mencionadas anteriormente, como o
1. B 2. C 3. C folclore e a lenda, são formas simples ou me-
nos complexas.
E.O. Dissertativo 2.
Dois dos argumentos:
1.
A lembrança a que o eu poético faz alusão é §§ literatura aparece claramente como ma-
o “prato azul-pombinho”. nifestação universal de todos os homens
2.
O traço “épico” se constrói pelo ato de a bi- em todos os tempos.
savó contar e recontar estórias minuciosas e §§ Não há povo e não há homem que possa
detalhadas de outros tempos. Já o traço “líri- viver sem ela, isto é, sem a possibilidade
co” é construído a partir de uma perspectiva de entrar em contato com alguma espécie
subjetiva, atrelada às emoções. de fabulação.
3.
A condição fundamental do texto está pauta- §§ assim como não é possível haver equi-
da na ideia de infelicidade, tristeza e angús- líbrio psíquico sem o sonho durante o
tia. sono, talvez não haja equilíbrio social
4.
O texto pertence ao gênero lírico. sem a literatura.
5.
Gênero lírico. A temática abordada parte de §§ Cada sociedade cria as suas manifestações
um “eu” e nela seu estado subjetivo se vale ficcionais, poéticas e dramáticas de acor-
de uma emoção, de um estado da alma. do com os seus impulsos, as suas crenças,
6.
Gênero dramático. Os personagens estabele- os seus sentimentos, as suas normas.
cem diálogo por meio de suas falas, as rubri-
cas. Há ausência de narrador.
7.
Gênero narrativo. Há um narrador que conta E.O. Objetivas
uma história. Além disso, há uma menção (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
a estruturas básicas deste gênero: persona- 1. D 2. C 3. C 4. E
gens, espaço e tempo.
8.
a) A amizade é mais valorizada que o amor, E.O. Dissertativas
porque logo nos primeiros versos o eu
poético lamenta as desilusões amorosas (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
sofridas quando ainda jovem. Por outro 1.
O diálogo poderia caracterizar tragédia, uma
lado, a amizade representa o amor sem vez que se centra em um conflito a partir de
cobranças, sincero, sem medo de ser traí- uma situação que pode desencadear desgra-
do. Representa a estabilidade amorosa, o ça. A sensibilidade do leitor pode recair so-
acolhimento e a aceitação. bre o terror e a piedade após o contato com
b) Trata-se do gênero lírico. a cena. No sentido conotativo, a expressão
9.
Lírico. Centralidade do eu lírico na constru- “meu filho” por parte do patrão demonstra
ção do poema, predomínio do tom intimista, uma postura paternalista assumida por ele.
criação de uma atmosfera emocional e fusão
do sujeito com o objeto.

E.O. Enem
1. C 2. B

235
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Aula 2

Trovadorismo:
a literatura da Idade Média
Competência 5
Habilidades 15, 16 e 17
Competência 1 – Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para
sua vida.
H1 Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como elementos de caracterização dos sistemas de comunicação.
H2 Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de comunicação e informação para resolver problemas sociais.
H3 Relacionar informações geradas nos sistemas de comunicação e informação, considerando a função social desses sistemas.
H4 Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação.
Competência 2 – Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) (LEM) como instrumento de acesso a informações e a outras
culturas e grupos sociais.
H5 Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM ao seu tema.
H6 Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus mecanismos como meio de ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e culturas.
H7 Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e seu uso social.
H8 Reconhecer a importância da produção cultural em LEM como representação da diversidade cultural e linguística.
Competência 3 – Compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da
identidade.
H9 Reconhecer as manifestações corporais de movimento como originárias de necessidades cotidianas de um grupo social.
H10 Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em função das necessidades cinestésicas.
Reconhecer a linguagem corporal como meio de interação social, considerando os limites de desempenho e as alternativas de adaptação para
H11
diferentes indivíduos.
Competência 4 – Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e
da própria identidade.
H12 Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos artistas em seus meios culturais.
H13 Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos.
H14 Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos.
Competência 5 – Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante
a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção.
H15 Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.
H16 Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário.
H17 Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional.
Competência 6 – Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da
realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação.
H18 Identificar os elementos que concorrem para a progressão temática e para a organização e estruturação de textos de diferentes gêneros e tipos.
H19 Analisar a função da linguagem predominante nos textos em situações específicas de interlocução.
H20 Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a preservação da memória e da identidade nacional
Competência 7 – Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas.
H21 Reconhecer em textos de diferentes gêneros, recursos verbais e não-verbais utilizados com a finalidade de criar e mudar comportamentos e hábitos.
H22 Relacionar, em diferentes textos, opiniões, temas, assuntos e recursos linguísticos.
H23 Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.
Reconhecer no texto estratégias argumentativas empregadas para o convencimento do público, tais como a intimidação, sedução, comoção,
H24
chantagem, entre outras.
Competência 8 – Compreender e usar a língua portuguesa como língua materna, geradora de significação e integradora da organização
do mundo e da própria identidade.
H25 Identificar, em textos de diferentes gêneros, as marcas linguísticas que singularizam as variedades linguísticas sociais, regionais e de registro.
H26 Relacionar as variedades linguísticas a situações específicas de uso social.
H27 Reconhecer os usos da norma padrão da língua portuguesa nas diferentes situações de comunicação.
Competência 9 – Entender os princípios, a natureza, a função e o impacto das tecnologias da comunicação e da informação na sua vida
pessoal e social, no desenvolvimento do conhecimento, associando-o aos conhecimentos científicos, às linguagens que lhes dão suporte,
às demais tecnologias, aos processos de produção e aos problemas que se propõem solucionar.
H28 Reconhecer a função e o impacto social das diferentes tecnologias da comunicação e informação.
H29 Identificar pela análise de suas linguagens, as tecnologias da comunicação e informação.
H30 Relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento que elas produzem
Contexto
Todo o imaginário feudal de príncipes, princesas, reis e seus reinados são elementos fundamentais para situar o
trovadorismo na história. Os castelos e sua nobreza, os cavaleiros e seus duelos em guerras e torneios compõem
o cenário da Idade Média, quando se desenvolve essa primeira escola literária após a queda do Império Romano.
Com a tomada de Constantinopla pelos turcos, em 1453, capital do Império Romano do Oriente, tem início
a Idade Média. Morto o imperador Carlos Magno, em 814, o poder central ficara enfraquecido e a sociedade passa-
ra a se organizar em torno de grandes propriedades de terra, com o poder centralizado na figura do senhor feudal.
A Literatura portuguesa tem início, de fato, com o trovadorismo. Antes disso, há documentos de produções
na região e na península Ibérica, mas não de fato portuguesa.

O nascimento da literatura portuguesa


Entre 1139 e 1140, Portugal se separou do reino de
Leão e Castela para se tornar um estado independen-
te. D. Afonso Henriques assumiu o reinado e lutou pela
manutenção da independência de Portugal frente aos
intentos de Castela. Essa separação política não rompeu
os profundos laços econômicos, sociais e culturais com
o resto da península Ibérica. O mais forte desses laços
era a língua: o galego-português. Em 1179, o Papa Ale-
xandre II reconhece a independência do Reino Lusitano.
A origem do trovadorismo é essencialmente pro-
vençal, do sul da França, e galega, de Castela, em pleno
feudalismo, precisamente dos séculos XII ao XIII.
O primeiro texto literário galego-português foi
a Cantiga da Ribeirinha, também conhecida como
Cantiga da Guarvaia, de Paio Soares de Taveirós. Su-
põe-se ter sido composta em 1198 ou 1189, o mais an-
tigo texto e marca do início do trovadorismo português.

239
Religião e cultura
A Igreja Católica cresceu, acumulou vastas extensões de terra, enriqueceu e concentrou um significativo poder reli-
gioso e secular. Essa herança conviveu com mudanças na ordem social que tiveram expressão também significativa
na literatura do período.
Uma importante manifestação do poder da Igreja medieval foi seu controle quase absoluto da produção cultural.
Como a circulação dos textos dependia da sua reprodução manuscrita, quase sempre feita sob encomenda, a
divulgação da cultura tornava-se ainda mais difícil, uma vez que o número de cópias em circulação era bem pequeno.
O uso do latim como língua literária, outra herança do longo período de dominação romana na Europa,
também contribuía para dificultar o acesso aos textos. Poemas e canções eram compostos em latim por monges
eruditos que vagavam de feudo em feudo para divulgarem suas composições. A maior parte dessa produção abor-
dava temas religiosos.

Cantiga da Ribeirinha Cantiga da Ribeirinha (tradução)


No mundo non me sei parelha, Não há no mundo ninguém que se compare
mentre me for’ como me vay, a mim em infelicidade, enquanto a minha vida
ca já moiro por vos e ay! continuar assim, porque morro por vós e, ai,
mia senhor branca e vermelha, minha senhora branca e de faces rosadas,
queredes que vos retraya quereis que vos retrate quando vos vi sem manto.
quando vus eu vi em saya! Mau dia foi esse em que me levantei,
Mao dia me levantei porque vos vi tão bela! [ou seja: melhor seria
que vus enton non vi fea! se vos tivesse visto feia].

E, mia senhor, des aquel di’, jay! E, minha senhora, desde aquele dia, ai,
me foi a mi muyn mal, tudo para mim foi muito mal,
e vos, filha de don Paay mas vós, filha D. Paio
Moniz, e ben vus semelha Moniz, parece-vos muito bem que eu tenha
d’aver eu por vós guarvaya e vós uma garvaia [manto de luxo] quando
pois eu, mia senhor, d’alfaya nunca recebi de vós o simples
nunca de vos ouve nem ei valor de uma correia.
valia dua correa.
(Paio Soares de Taveiros)

240
O poder feudal
A sociedade medieval organizou-se em torno dos gran-
des proprietários de terra, os senhores feudais.
Uma pequena corte passou a se reunir com esse
senhor feudal. Dela faziam parte membros da nobreza,
cavaleiros, camponeses livres e servos. Estavam unidos
por uma relação de dependência pessoal: a vassalagem.
O servilismo dos vassalos a seu suserano e dos
fiéis a Deus deu origem ao princípio básico da litera-
tura medieval: a afirmação da total subserviência de
um trovador à sua dama, em se tratando dos temas da
poesia, ou de um cavaleiro à sua donzela, no caso das
novelas de cavalaria.

Circulação e agentes do discurso


O objetivo da maioria das manifestações artísticas medievais era persuadir as pessoas a temer a Deus e submetê-
-las à soberania da Igreja. Teatro, pintura, escultura e literatura e toda manifestação artística estava a serviço dos
ensinamentos religiosos e do comportamento cristão.
Nas cortes dos senhores feudais, centros de atividade artística da Europa medieval, exibiam-se jograis: reci-
tadores, cantores e músicos ambulantes eram contratados pelo senhor para divertir a corte. As cantigas apresenta-
das pelos jograis eram quase sempre compostas por nobres, autodenominados trovadores, uma vez praticantes da
arte de trovar. Trovador, do francês trouver, significa encontrar, e refere-se ao compositor da cantiga, quem encontra
a música que se encaixa no poema.
Em razão disso, enquanto nos mosteiros e nas abadias circulavam os textos escritos em latim, nos castelos e
nas cortes circulava a literatura oral, produzida em língua local, voltada para o deleite dos homens e das mulheres
da nobreza com o intuito de legitimar o novo papel social assumido pelos cavaleiros.

241
O código do amor cortês
Os termos que definiam as relações feudais foram trans-
postos para as cantigas, caracterizando a linguagem do
trovadorismo: a mulher era a senhora, o homem era o
seu servidor. Eram muito prezadas a generosidade, a
lealdade e, acima de tudo, a cortesia.
As cantigas de amor do trovadorismo desenvol-
vem um mesmo tema: o sofrimento provocado pelo amor
não correspondido – a “coita de amor”. Como o princípio
do amor cortês é a idealização da dama pelo trovador, os
textos não manifestam a expectativa de correspondência
amorosa.
As cantigas satíricas passeiam por muitos temas,
sempre expressando um olhar crítico sobre a conduta
de nobres, homens e mulheres, nas esferas individual e
social. É bastante comum os trovadores ridicularizarem
um nobre que se envolve com uma serviçal ou que não
percebe a traição da esposa.

A vassalagem impressa na linguagem


Outra característica dessa produção literária manifesta-se na obediência a regras no uso de termos que definiam
a vassalagem amorosa. Empregava-se uma série de termos e expressões para nomear a dama: senhor, mia senhor,
senhor fremosa, em razão da posição que ela ocupava socialmente.
Além disso, e em razão das castas imóveis e da sociedade organizada mediante trocas, os cidadãos não
ascendiam socialmente e não desenvolviam a intelectualidade. Quase a totalidade da população era analfabeta, o
que contribuiu muito para que a literatura se vinculasse à tradição oral, unindo poesia e música.

242
Tipos de cantiga
As cantigas trovadorescas são divididas em dois grupos: as líricas, que falam de sentimento e são subdivididas em
cantigas de amor e de amigo; e as cantigas satíricas, intencionalmente críticas e cômicas, também subdivididas em
cantigas de escárnio e de maldizer.

Cantigas de amor
Líricas
Cantigas de amigo
Cantigas

Cantigas de escárnio
Satíricas
Cantigas de maldizer

Líricas
A poesia lírica diz respeito à lira, instrumento musical da Antiguidade clássica que acompanhava as canções, ex-
pressando sentimentos.

Cantiga de amor

As cantigas de amor são especialmente dedicadas à mulher


amada pelo trovador, amor esse que não era correspondi-
do. Ela pertence a uma classe superior a sua. Em função
da imobilidade social das castas, esse amor era proibido e
dava origem à “coita”, que significa sofrimento.
Os trovadores se valem de um eu lírico mas-
culino que é pobre e declara seu amor impossí-
vel, por isso sofrido e submisso à dama. A chamada
“vassalagem amorosa”.
Possui poucas repetições de versos e ausência de
paralelismo por se propor mais elevada e de estrutura
complexa em linguagem refinada, normalmente de ori-
gem provençal.
O eu lírico apresentado é masculino, ou
seja, o trovador expressa seus sentimentos em relação
à mulher amada que é, invariavelmente, de classe supe-
rior à do trovador.
A linguagem usada é mais refinada, evitam-se os refrões e as repetições, e, por serem assim mais
sofisticadas, chamavam-se cantigas de maestria ou mestria.
Os termos usados pelo trovador para se referir à mulher amada são sempre no masculino: mia senhor,
fremosa senhor, mia don (dona).
O trovador se queixa da indiferença da mulher amada, coita amorosa.
O amor é sempre cortês, mesmo porque a distância social entre o amante e a amada não permitia que
houvesse atrevimentos de qualquer ordem.

243
Cantiga d’amor Cantiga de amor (tradução)
Quantos an gran coita d’amor Quantos o amor faz padecer
eno mundo, qual hoj’ eu ei, penas que tenho padecido
querrían morrer, eu o sei, querem morrer e não duvido
o averrian én sabor. que alegremente queiram morrer.
Mais mentr’ eu vos vir’, mia senhor, Porém enquanto vos puder ver,
sempre m’eu querria viver, vivendo assim eu quero estar
e atender e atender! e esperar, e esperar!
Pero já non posso guarir, Sei que a sofrer estou condenado
ca já cegan os olhos meus e por vós cegam os olhos meus.
por vos, e non me val i Deus Não me acudis; nem vós, nem Deus
nen vos; mais por vos non mentir, Mas, se sabendo-me abandonado,
enquant’eu vos, mia senhor, vir’, ver-vos, senhora, me for dado.
sempre m’eu querria viver, vivendo assim eu quero estar
e atender e atender! e esperar, e esperar!
E tenho que fazen mal-sen Esses que veem tristemente
quantos d’amor coitados son desamparada sua paixão
de querer sa morte, se non querendo morrer, loucos estão.
ouveron nunca d’amor ben Minha fortuna não é diferente;
com’eu faç’. E, senhor, por én porém eu digo constantemente:
sempre m’eu querria viver, vivendo assim eu quero estar
e atender e atender! e esperar e esperar!
(Garcia de Guilhade)

Cantiga de amigo

As cantigas de amigo falam de uma relação amo-


rosa concreta que aconteceu entre pessoas simples,
que vivem no campo e partem de um eu lírico femi-
nino. O tema central dessas cantigas é o desejo, o
que leva a crer que a relação amorosa já aconteceu,
diferentemente das de amor, que são impossibilita-
das pelas castas sociais diferentes.
De origem galega (Ibérica), ela é mais popu-
lar e por isso mais repetitiva, possui muitos refrões
e paralelismo com uma estrutura simples e um amor
terreno.
Esta voz feminina expressa desejo pela au-
sência do amigo (namorado ou amado) e relaciona-
-se com elementos da natureza para clamar seu
retorno. O ambiente campesino corrobora para
construir esse sentimento que é sempre comparti-
lhado com a mãe, as amigas e damas de companhia.

244
Além disso, em função de sua temática, elas são §§ Pastorelas
também divididas em: Oi (ouvi) oj’eu ua pastor andar.
§§ Alvas
du (onde) cavalgava per ua ribeira,
Levantou-s’a velida (a bela)
Levantou-s’à alva; e o pastor estava i senlheira. (sozinha)
e vai lavar camisas a ascondi-me póla escuitar...
e no alto (no rio) (Airas Nunes de Santiago)
vai-las lavar à alva (de madrugada)
(D. Dinis)

§§ Bailias 1. O eu lírico das cantigas de amigo é sem-


E no sagrado em vigo pre feminino, canta a saudade do amado dis-
bailava corpo velido (uma linda moça) amor ei! tante.
(Martim Codax) 2. Há uso de repetições de palavras, de ver-
§§ Romarias sos inteiros.
Pois nossas madres van a San Simon de Val 3. O homem amado é de classe superior à da
de Prados candeas queimar (pagar promessas) mulher que canta.
nós, as menininhas, punhemos d’andar (vamos 4. O amigo/amado, a que se referem as cantigas,
[passear) deve ser entendido como amante/namorado.
§§ Barcarolas ou Marinhas 5. A mulher queixa-se [à natureza] de ter perdido o
Vi eu, mia madr’, andar amado ou se distanciado dele.
as barcas e no mar, 6. Geralmente tais cantigas são dialogadas.
e moiro de amor!
(Nuno Fernandes Tomeol) 7. A cantiga de amigo se vale de descrição.

Cantiga de amigo Cantiga de amigo (tradução)


– Ai flores, ai flores do verde piño, – Ai, flores do verde pinheiro,
se sabedes novas do meu amigo? sabeis notícias do meu namorado?
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
Ai flores, ai flores do verde ramo, Ai flores, ai flores, do verde ramo,
se sabedes novas do meu amado? Sabeis notícias do meu amado?
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
Se sabedes novas do meu amigo, Sabeis notícias do meu namorado,
aquel que mentiu do que pôs comigo? Aquele que mentiu sobre o que combinou comigo?
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
Se sabedes novas do meu amado, Sabeis notícias do meu amado,
aquel que mentiu do que mi á jurado? Aquele que mentiu sobre o que jurou?
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
– Vós me perguntades pelo voss’ amigo? Vós perguntais pelo vosso namorado?
E eu ben vos digo que é san’e vivo E eu bem vos digo que está são e vivo:
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
Vós me perguntades pelo voss’ amado? Vós perguntais pelo vosso amado?
E eu ben vos digo que é viv’ e sano: E eu bem vos digo que está vivo e são.
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
E eu ben vos digo que é san’e vivo, E eu bem vos digo que está são e vivo
e será vosc’ant’o prazo saído. e estará convosco antes do prazo combinado:
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
E eu ben vos digo que é viv’e sano, E eu bem vos digo que está vivo e são
e será vosc’ant’o prazo passado. e estará convosco antes de terminar o prazo:
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
(Dom Dinis)

245
Satíricas En Santiago seend’albergado,
en mia pousada chegaron romeus
preguntei-os e disseron: “par Deus,
As cantigas satíricas fazem críticas ao comporta-
muito levade-lo caminh’ errado,
mento das pessoas em suas ações sociais, usavam o
ca, se verdade quiserdes achar,
humor e o vocabulário chulo para denunciar alguns outro caminho conven a buscar,
nobres e damas. ca non saben aqui d’ela mandado.
Além disso, a sátira se estendia a instituições
sociais, censurava os males da sociedade ou dos indiví- Cantigas de maldizer
duos, quase tudo com tom sarcástico, irônico e obsceno.
Elas podem ser de escárnio ou de maldizer. Nas cantigas de maldizer, o trovador utiliza um voca-
bulário agressivo para fazer uma crítica direta e clara,
Cantigas de escárnio identificando o nome das pessoas satirizadas. Essa
linguagem de baixo calão, palavrões e até vocabulá-
A principal característica da cantiga de escárnio é o fato rio erótico aconteciam, pois eram proferidas nas ruas,
de ela ser indireta, especialmente por ser declamada em praças públicas e feiras livres. Os significados eram
no ambiente palaciano. O efeito satírico que caracteriza explícitos e não poupavam nenhuma instituição social:
essas cantigas é obtido por meio de ironias, trocadilhos atacavam o clero, as freiras, os fidalgos e toda a sorte
e jogos semânticos. De modo geral, ridicularizam o com- de pessoas que, dentro de suas classes, indiquem deca-
portamento de nobres ou denunciam as mulheres que dência moral.
não seguem o código do amor cortês.
A sátira indireta sublima o nome da pessoa cri- §§ Maldizer
ticada e sempre explora os duplos sentidos e os tro- (Afonso Eanes do Coton)

cadilhos. Seus significados normalmente são implícitos,


velados e comedidos. Marinha, o teu folgar
tenho eu por desacertado,
§§ Escárnio (sirventes – moral) e ando maravilhado
(Airas Nunes, clérigo compostelano) de te não ver rebentar;
pois tapo com esta minha
Por que no mundo mengou a verdade, boca, a tua boca, Marinha;
punhei un dia de a ir buscar; e com este nariz meu,
e, u por ela fui preguntar tapo eu, Marinha, o teu;
disseron todos: “alhur lá buscade, com as mãos tapo as orelhas,
ca de tal guisa se foi a perder os olhos e as sobrancelhas,
que non podemos en novas haver tapo-te ao primeiro sono;
nen já non anda na irmandade.” com a minha piça o teu cono;
Nos mosteiros dos frades regrados e como o não faz nenhum,
a demandei e disseron-m’assi: com os colhões te tapo o cu.
“non busquedes vós a verdad’ aqui, E não rebentas, Marinha?
ca muitos anos havemos passados
que non morou nosco, per boa fé,
nen sabemos ond’ela agora esté Três cancioneiros
e d’al havemos maiores cuidados.”
E en Cistel, u verdade soía Três cancioneiros concentram boa parte da produção
sempre morar, disseron-me que non conhecida dos séculos XII, XIII e XIV: Cancioneiro da
morava i, havia gran sazon, Ajuda, Cancioneiro da Biblioteca Nacional e Cancionei-
nen frade d’i já a non conhocia, ro da Vaticana.
nen o abade outro si estar Os cancioneiros são manuscritos, coletâneas de
sol non queria que fôss’i pousar, cantigas com características variadas e escritas por di-
e anda já fora da abadia. versos autores. Os mais importantes são:

246
Cancioneiro da Ajuda Cancioneiro da Vaticana
Coleção de poesias em galego-português do final do Compilado na Itália no século XV – encontra-se na Bi-
século XIII, influenciadas pela lírica provençal. Recebe o blioteca do Vaticano.
nome de “da Ajuda” por se conservar na biblioteca do Chama-se da Vaticana porque foi encontrado na
Palácio Nacional da Ajuda, em Lisboa. Biblioteca do Vaticano, em Roma, onde foi preservado.
É o mais antigo de todos e é também o menos
completo, compreende apenas cantigas anteriores ao Levad’, amigo, que dormides as manhãas frias;
reinado do “rei trovador”, D. Dinis. todalas aves do mundo d’amor dizian:
leda m’ and’ eu.
Ondas do mar de Vigo,
Se vistes meu amigo? Levad’, amigo, que dormide’-las frias manhãas;
E, ai Deus, ele virá cedo? todalas aves do mundo d’amor cantavan:
Ondas do mar levado, leda m’ and’ eu.
se vistes meu amado?
E ai, Deus ele virá cedo? Toda-las aves do mundo d’ amor diziam;
Se vistes meu amigo, do meu amor e do voss’ en ment’ avian:
aquele por quem suspiro? leda m’ and’ eu.
E, ai Deus, ele virá cedo? Toda-las aves do mundo d’ amor cantavan;
Se vistes meu amado, do meu amor e do voss’ i enmentavan:
por quem tenho muito cuidado? leda m’ and’ eu.
E, ai Deus, ele virá cedo?
Do meu amor e do voss’ en ment’avian;
Cancioneiro da Biblioteca Nacional vós lhi tolhestes os ramos en que siian:
leda m’ and’ eu.
Antes chamado de Cancioneiro Colocci-Brancuti – foi
compilado na Itália por volta de 1525-1526. Adquirido Do meu amor e do voss’ i enmentavam;
pelo Estado português e depositado na Biblioteca Na- vos lhi tolhestes os ramos en que pousavam
cional de Lisboa, em 1924. leda m’ and’ eu.
Essa coletânea de cantigas trovadorescas é tam- Vós lhi tolhestes os ramos en que siian
bém conhecida como Collocci-Brancuti. e lhis secastes as fontes en que bevian:
leda m’ and’ eu.
Em gram coita, senhor,
que peior que mort’é, Vós lhi tolhestes os ramos en que pousavam
vivo, per boa fé, e lhis secastes as fontes u se banhavan:
e polo voss’amor leda m’ and’ eu.
esta coita sofr’eu
por vós, senhor, que eu No final do século XIII, Portugal conheceu os
vi polo meu gran mal; “cantares” de D. Dinis (1261-1325), comumente conhe-
e melhor mi será
cido como “o rei trovador”. Seus poemas encontram-se
de morrer por vós já;
coletados no Cancioneiro da Vaticana e no da Biblioteca
e, pois meu Deus non val,
esta coita sofr’eu Nacional. D. Dinis é autor de uma das mais conhecidas
por vós, senhor, que eu cantigas medievais portuguesas: Ai flores, ai flores
polo meu gran mal vi, do verde pinho.
e mais mi val morrer Existem repetições, expedientes típicos das can-
ca tal coita sofrer tigas de amigo: a moça enamorada dirige-se à natureza
pois por meu mal assi
(pinheiros) e essa lhe responde às perguntas sobre o
esta coita sofr’eu
por vós, senhor, que eu namorado.
vi por gran mal de mi Esta é a mais famosa cantiga de d. Dinis, tendo
pois tan coitad’and’eu. gerado, inclusive, a epígrafe de Fernando Pessoa.

247
As novelas de cavalaria

As novelas de cavalaria são os primeiros romances, ou seja, longas narrativas em verso, surgidas no século XII.
Elas contam as aventuras vividas pelos cavaleiros andantes e tiveram origem com o declínio do prestígio da poesia
dos trovadores.
Estão organizadas em três ciclos, de acordo com o tema que desenvolvem e com o tipo de herói
que apresentam:

§§ Ciclo clássico: novelas que narram a guerra de Troia e as aventuras de Alexandre, o Grande. O ciclo recebe
essa denominação porque seus heróis vêm do mundo clássico mediterrâneo.

§§ Ciclo arturiano ou bretão: histórias envolvendo o rei Arthur e os cavaleiros da Távola Redonda. Nessas
novelas, podem ser identificados vários núcleos temáticos: a história de Percival, a história de Tristão e Isol-
da, as aventuras dos cavaleiros da corte do rei Arthur e a demanda do Santo Graal.

§§ Ciclo carolíngio ou francês: histórias sobre o rei Carlos Magno e os 12 pares de frança.
Dos três ciclos, o arturiano permanece como um dos temas literários mais explorados, sendo objeto de
romances, poemas, filmes e óperas até hoje.
No trecho a seguir, extraído de A demanda do Santo Graal, Galaaz chega à Távola Redonda.

Como Galaaz entrou no paço e acabou o assento perigoso.


(A demanda do Santo Graal, manuscrito do século XIII)

Eles [...] olharam e viram que todas as portas do paço se fecharam e todas as janelas, mas não escureceu
por isso o paço, porque entrou um tal raio de sol, que por toda a casa se estendeu. E aconteceu então uma grande
maravilha, não houve quem no paço não perdesse a fala; e olhavam-se uns aos outros e nada podiam dizer, e não
houve alguém tão ousado, que disso não ficasse espantado; mas não houve quem saísse do assento, enquanto
isto durou. Aconteceu que entrou Galaaz armado de loriga e brafoneiras e de elmo e de suas divisas de veludo
vermelho; e, após ele, chegou o ermitão, que lhe rogara que o deixasse andar com ele, e trazia um manto e uma
gamacha de veludo vermelho em seu braço.
Mas tanto vos digo que não houve no paço quem pudesse entender por onde Galaaz entrara, que em sua
vinda não abriram porta nem janela. Mas do ermitão não vos digo, porque o viram entrar pela porta grande. E

248
Galaaz, assim que chegou ao meio do paço, disse de
modo que todos ouviram:
– A paz esteja convosco.
E o homem bom pôs as vestes que trazia sobre
um tapete, e foi ao rei Arthur e disse-lhe:
– Rei Arthur, eu trago o cavaleiro desejado,
aquele que vem da alta linhagem do rei Davi e de
José de Arimateia, pelo qual as maravilhas desta terra
e das outras terão fim.
E com isto que o homem bom disse, ficou o rei
muito alegre. E disse:
– Se isto é verdade, sede bem-vindo. E bem vin-
do seja o cavaleiro, porque este é o que há de dar cabo
às aventuras do santo Graal. Nunca foi feita nesta corte
tanta honra como lhe nós faremos; e quem quer que
ele seja, eu queria que lhe fosse muito bem, pois de tão
alta linhagem vem como dizeis.
– Senhor, disse o ermitão, cedo o vereis em bom
começo.
Então fê-lo vestir os panos que trazia e foi as-
sentá-lo no assento perigoso. E disse:
– Filho, agora vejo o que muito desejei, quando vejo o assento perigoso ocupado.
[...]
O cavaleiro de quem Merlim e todos os profetas falaram. O rei, assim que viu no assento perigoso o cavalei-
ro de quem Merlim e todos os profetas falaram na Grã-Bretanha, então bem soube que aquele era o cavaleiro por
quem seriam acabadas as aventuras do reino de Logres, e ficou com ele tão alegre e tão feliz que bendisse a Deus:
Deus, bendito sejas tu que te aprouve de tanto viver eu que, em minha casa, visse aquele de quem todos os
profetas desta terra e das outras profetizaram, tão longo tempo há já.
[...]

249
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Filme O sétimo selo - Direção: Ingmar Bergman - 1959

Após dez anos, um cavaleiro (Max Von Sydow) retorna das Cruzadas e encontra o
país devastado pela peste negra. Sua fé em Deus é sensivelmente abalada e
enquanto reflete sobre o significado da vida, a Morte (Bengt Ekerot) surge a sua
frente querendo levá-lo, pois chegou sua hora.

Filme O nome da rosa - Direção: Jean-Jacques Annaud - 1986

Em 1327, William de Baskerville (Sean Connery), um monge franciscano, e Adso


von Melk (Christian Slater), um noviço, chegam a um remoto mosteiro no norte da
Itália. William de Baskerville pretende participar de um conclave para decidir se a
Igreja deve doar parte de suas riquezas, mas a atenção é desviada por vários assas-
sinatos que acontecem no mosteiro.

Filme Cruzada - Direção: Ridley Scott - 2005

Balian (Orlando Bloom) é um jovem ferreiro francês, que guarda luto pela morte de
sua esposa e filho. Ele recebe a visita de Godfrey de Ibelin (Liam Neeson), seu pai,
que é também um conceituado barão do rei de Jerusalém e dedica sua vida a
manter a paz na Terra Santa.

250
ACESSAR

Sites
cantigas.fcsh.unl.pt

LER

tt
Livros
A lírica trovadoresca. Segismundo Spina

Seria preciso, segundo Segismundo Spina, retomar o mesmo


entusiasmo com que o Romantismo abraçou o mundo
encantado da poesia das catedrais e dos duelos sarracenos
da Idade Média, cujos trovadores formam, no século XII, o
primeiro capítulo da história literária da Europa moderna.

251
INTERDISCIPLINARIDADE
APLICAÇÃO NO COTIDIANO
Artes plásticas

Obras medievais

O sepultamento de Cristo (iluminura medieval) “Madonna e o Menino” de Duccio, pintor italiano do período gótico
(c.1255-1319)

252
Estrutura Conceitual
Idade Média Idade Moderna

Trovadorismo Humanismo Classicismo Barroco

Crescimento da
cultura cristã

Regime Feudal

Arte literária ainda


vinculada à música

253
E.O. Aprendizagem b) “a literatura do amor cortês” refletiu a ver-
dade sobre a vida privada medieval.
c) a servidão amorosa e a idealização da mulher foi
1. É correto afirmar sobre o Trovadorismo que: o grande tema da poesia produzida por vilões.
a) os poemas são produzidos para ser encenados. d) o amor cortês foi uma prática literária que aos
b) as cantigas de escárnio e maldizer têm te- poucos modelou o perfil do homem civilizado.
máticas amorosas. e) nas cantigas medievais mulheres e homens sub-
c) nas cantigas de amigo, o eu lírico é sempre metem-se às maneiras refinadas da cortesia.
feminino.
d) as cantigas de amigo têm estrutura poética
complicada. TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
e) as cantigas de amor são de origem nitida-
mente popular. ]Cantiga de Amor[
Senhora minha, desde que vos vi,
2. Leia atentamente o texto abaixo. lutei para ocultar esta paixão
Com’ousará parecer ante mi que me tomou inteiro o coração;
o meu amigo, ai amiga, por Deus, mas não o posso mais e decidi
e com’ousará catar estes meus que saibam todos o meu grande amor,
olhos se o Deus trouxer per aqui, a tristeza que tenho, a imensa dor
pois tam muit’há que nom veo veer que sofro desde o dia em que vos vi.
mi e meus olhos e meu parecer? Já que assim é, eu venho-vos rogar
Com’ousará parecer ante mi, de Dom Dinis. que queirais pelo menos consentir
Disponível em: <http://pt.wikisource. que passe a minha vida a vos servir (...)
org/wiki/Com%27ousar%C3%A1_parecer_ Afonso Fernandes Disponível em:<
ante_mi>. Acesso em: 5 dez. 2012. www.caestamosnos.org/ efemerides/118>.
per = por; tam = tão; nom = não; veer = ver;
mi = mim, me parecer = semblante 4. Observando-se a última estrofe, é possível
afirmar que o apaixonado:
Sobre o fragmento anterior, pode-se afirmar
a) se sente inseguro quanto aos próprios senti-
que pertence a uma cantiga de:
mentos.
a) amor, pois o eu lírico masculino declara a
b) se sente confiante em conquistar a mulher
uma amiga o sentimento de amor que tem
por ela. amada.
b) amigo, pois o eu lírico feminino expressa a c) se declara surpreso com o amor que lhe de-
uma amiga a falta de seu amigo por quem dica a mulher amada.
sente amor. d) possui o claro objetivo de servir sua amada.
c) amor, pois o eu lírico é feminino e acha que e) conclui que a mulher amada não é tão pode-
seu amor não deve voltar para os seus braços. rosa quanto parecia a princípio.
d) amigo, pois o eu lírico masculino entende
que só Deus pode trazer de volta sua amiga 5. Uma característica desse fragmento, tam-
a quem não vê há muito tempo. bém presente em outras cantigas de amor do
e) amor, pois o eu lírico feminino não consegue Trovadorismo, é:
enxergar o amor que sente por seu amigo. a) a certeza de concretização da relação amorosa.
b) a situação de sofrimento do eu lírico.
3. “A literatura do amor cortês, pode-se acres- c) a coita de amor sentida pela senhora amada.
centar, contribuiu para transformar de al- d) a situação de felicidade expressa pelo eu lírico.
gum modo a realidade extraliterária, atua e) o bem-sucedido intercâmbio amoroso entre
como componente do que Elias (1994)* cha- pessoas de camadas distintas da sociedade.
mou de processo civilizador. Ao mesmo tem-
po, a realidade extraliterária penetra pro- 6. (G1 - ifsp) Assinale a alternativa correta no
cessualmente nessa literatura que, em parte, que se refere às cantigas de amor trovado-
nasceu como forma de sonho e de evasão.” rescas.
Revista de Ciências Humanas, Florianópolis, EDUFSC, a) Nas cantigas de amor, o eu lírico masculino
v. 41, n. 1 e 2, p. 83-110 Cf. ELIAS, N. O Processo lamenta a ausência da mulher amada, que
Civilizador. Rio de Janeiro: Zahar, 1994, v.1. lhe é indiferente e que, por mais que seja
vista por ele como superior, pertence às
Interprete o comentário acima e, com base classes populares.
nele e em seus conhecimentos acerca do li- b) Nas cantigas de amor, o eu lírico masculino
rismo medieval galego-português, marque a manifesta insistentemente a coita, isto é,
alternativa correta: o sofrimento de amor, repleto de impulsos
a) as cantigas de amor recriaram o mesmo am- eróticos que lhe laceram o corpo e que con-
biente palaciano das cortes galegas. ferem aos poemas uma aura sardônica.

254
c) Nas cantigas de amor, o eu lírico feminino 1
0. As narrativas que envolvem as lutas dos cru-
manifesta a falta que sente do amigo – isto zados envolvem sempre um herói muito en-
é, do homem amado – invocando-o por meio gajado na luta pela cristandade, podendo ser
de composições de matriz popular que se a um só tempo frágil e forte, decidido e ter-
caracterizam por construções paralelísticas. no, furioso e cortes. No entanto, com relação
d) Nas cantigas de amor, o eu lírico masculino à mulher amada, esse herói é sempre:
confessa a coita, isto é, o sofrimento amo- a) indiferente.
roso por uma dama que lhe é inacessível b) infiel.
c) devotado.
devido à diferença social que existe entre ele
d) indelicado.
e ela. e) ausente.
e) Nas cantigas de amor, a distância social exis-
tente entre o eu lírico masculino e a mulher
amada a quem ele se dirige permite entrever
que já grassava na sociedade portuguesa a
E.O. Fixação
ascensão social pelo trabalho.
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS DUAS QUESTÕES
7. Sobre a poesia trovadoresca em Portugal, é
INCORRETO afirmar que: Texto I
Ondas do mar de Vigo,
a) refletiu o pensamento da época, marcada
se vistes meu amigo!
pelo teocentrismo, o feudalismo e valores E ai Deus, se verrá cedo!
altamente moralistas.
b) representou um claro apelo popular à arte, Ondas do mar levado,
se vistes meu amado!
que passou a ser representada por setores
E ai Deus, se verrá cedo!
mais baixos da sociedade. (Martim Codax)
c) pode ser dividida em lírica e satírica.
d) em boa parte de sua realização, teve influ- Obs.: verrá = virá; levado = agitado
ência provençal.
e) as cantigas de amigo, apesar de escritas por Texto II
trovadores, expressam o eu lírico feminino. Me sinto com a cara no chão, mas a verdade
[precisa
8. Assinale a alternativa INCORRETA a respeito ser dita ao menos uma vez: aos 52 anos eu
das cantigas de amor. [ignorava
a admirável forma lírica da canção paralelística
a) O ambiente é rural ou familiar.
(…).
b) O trovador assume o eu lírico masculino: é o
homem quem fala. O “Cantar de amor” foi fruto de meses de
c) Têm origem provençal. [leitura
d) Expressam a “coita” amorosa do trovador, dos cancioneiros. Li tanto e tão seguidamente
por amar uma dama inacessível. [aquelas
e) A mulher é um ser superior, normalmente deliciosas cantigas, que fiquei com a cabeça
pertencente a uma categoria social mais ele- cheia de “velidas” e “mha senhor” e “nula ren”;
sonhava com as ondas do mar de Vigo e com
vada que a do trovador.
[romarias
a San Servando. O único jeito de me livrar da
9. Assinale a alternativa INCORRETA a respeito obsessão era fazer uma cantiga.
do Trovadorismo em Portugal: (Manuel Bandeira)
a) Durante o Trovadorismo, ocorreu a separação
entre a poesia e a música. 1. Assinale a afirmativa correta sobre o texto I.
b) Muitas cantigas trovadorescas foram reuni- a) Nessa cantiga de amigo, o eu lírico masculino
das em livros ou coletâneas que receberam o manifesta a Deus seu sofrimento amoroso.
nome de cancioneiros. b) Nessa cantiga de amor, o eu lírico feminino
dirige-se a Deus para lamentar a morte do
c) Nas cantigas de amor, há o reflexo do rela-
ser amado.
cionamento entre senhor e vassalo na socie- c) Nessa cantiga de amigo, o eu lírico masculi-
dade feudal: distância e extrema submissão. no manifesta às ondas do mar sua angústia
d) Nas cantigas de amigo, o trovador (sempre pela perda do amigo em trágico naufrágio.
um homem) escreve o poema assumindo o d) Nessa cantiga de amor, o eu lírico masculi-
papel feminino. no dirige-se às ondas do mar para expressar
sua solidão.
e) Nessa cantiga de amigo, o eu lírico feminino
dirige-se às ondas do mar para expressar sua
ansiedade com relação à volta do amado.

255
2. No texto II, o autor: Quem te viu, quem te vê
a) manifesta sua resistência à obrigatoriedade
de ler textos medievais durante o período de Você era a mais bonita das cabrochas dessa ala
formação acadêmica. Você era a favorita onde eu era mestre-sala
b) utiliza a expressão “cabeça cheia” para de- Hoje a gente nem se fala, mas a festa continua
preciar as formas linguísticas do galaico-por- Suas noites são de gala, nosso samba ainda
tuguês, como “mha senhor” e “nula ren”. é na rua
c) relata circunstâncias que o levaram a compor Hoje o samba saiu procurando você
um poema que recupera a tradição medieval. Quem te viu, quem te vê
d) emprega a palavra “cancioneiros” em subs- Quem não a conhece não pode mais ver pra crer
tituição a “poetas”, uma vez que os textos Quem jamais a esquece não pode reconhecer
medievais eram cantados. [...]
e) usa a expressão “deliciosas cantigas” em sen- Chico Buarque
tido irônico, já que os modernistas considera-
ram medíocres os estilos do passado. A cantiga do rei D. Dinis, adaptada por Natá-
lia Correia, e a canção de Chico Buarque de
3. Marque V, para verdadeiro, e F, para falso. Holanda expressam a seguinte característica
( ) As cantigas de maldizer e de escárnio trovadoresca:
pertencem à lírica trovadoresca. a) a vassalagem do trovador diante da mulher
amada que se encontra distante.
( ) As cantigas de amigo possuem um am-
b) a idealização da mulher como símbolo de um
biente palaciano e o eu lírico é feminino,
amor profundo e universal.
apesar de serem escritas por homem.
c) a personificação do samba como um ser que
( ) As cantigas de amor possuem um am- busca a plenitude amorosa.
biente palaciano e suas características d) a possibilidade de realização afetiva do tro-
principais são a vassalagem amorosa e a vador em razão de estar próximo da pessoa
coita de amor. amada.
( ) A canção da Ribeirinha iniciou o trovado-
rismo português.
5. Endechas à escrava Bárbara
( ) As cantigas de amigo, em geral, possuem
um eu lírico feminino, apesar de serem Aquela cativa,
escritas por homens. A temática princi- que me tem cativo
pal, quase sempre, é o sofrimento da mu- porque nela vivo,
lher pelo amado que partiu. já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa
4. (Ueg) Senhora, que bem pareceis! em suaves molhos,
Se de mim vos recordásseis que para meus olhos
que do mal que me fazeis fosse mais formosa.
me fizésseis correção, Uma graça viva,
quem dera, senhora, então que neles lhe mora,
que eu vos visse e agradasse. para ser senhora
de quem é cativa.
Ó formosura sem falha Pretos os cabelos,
que nunca um homem viu tanto onde o povo vão
para o meu mal e meu quebranto! perde opinião
Senhora, que Deus vos valha! que os louros são belos.
Por quanto tenho penado Pretidão de Amor,
seja eu recompensado tão doce a figura,
vendo-vos só um instante. que a neve lhe jura
que trocara a cor.
De vossa grande beleza Leda mansidão
da qual esperei um dia que o siso acompanha;
grande bem e alegria, bem parece estranha,
só me vem mal e tristeza. mas bárbara não.
Sendo-me a mágoa sobeja,
deixai que ao menos vos veja endechas = versos em redondilha menor
no ano, o espaço de um dia. (cinco sílabas); molhos = feixes; leda = riso-
nha; Vão = fútil.
Rei D. Dinis
CORREIA, Natália. Cantares dos trovadores galego-
Em sua obra, Camões continua a tradição da
portugueses. Seleção, introdução, notas e adaptação de conduta amorosa das cantigas medievais.
Natália Correia. 2. ed. Lisboa: Estampa, 1978. p. 253. Nela, a mulher amada era considerada:

256
a) responsável pelas contradições e insatisfa- d) Em teu louvor, Senhora, estes meus versos
ções do homem. E a minha Alma aos teus pés para cantar-te,
b) símbolo do amor erótico. E os meus olhos mortais, em dor imersos,
c) incapaz de levar o homem a atingir o Bem. Para seguir-lhe o vulto em toda a parte.
d) um ser impuro e prejudicial ao homem. (Alphonsus de Guimaraens)
e) uma pessoa superior, fonte de virtudes.
e) Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
6. Senhor feudal
amar e esquecer
Se Pedro Segundo amar e malamar,
Vier aqui amar, desamar, amar?
Com história (Manuel Bandeira)
Eu boto ele na cadeia. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
(Oswald de Andrade)
Ondas do mar de Vigo
O título do poema de Oswald remete o leitor
à Idade Média. Nele, assim como nas canti-
gas de amor, a ideia de poder retoma o con- Ondas do mar de Vigo,
ceito de: se vistes meu amigo?
a) fé religiosa. e ai Deus, se verrá cedo?
b) relação de vassalagem.
c) idealização do amor.
d) saudade de um ente distante. Ondas do mar levado,
e) igualdade entre as pessoas. se vistes meu amado?
e ai Deus, se verrá cedo?
7. (IFSP) A poesia do Trovadorismo português
tem íntima relação com a música, pois era Se vistes meu amigo,
composta para ser entoada ou cantada, sem- o por que eu sospiro?
pre acompanhada de instrumental, como o e ai Deus, se verrá cedo?
alaúde, a viola, a flauta, ou mesmo com a
presença do coro.
A respeito dessa escola literária, assinale a Se vistes meu amado,
alternativa correta. o por que hei gram coidado?
a) Os principais trovadores utilizavam a guitar- e ai Deus, se verrá cedo?
ra elétrica para acompanhar a exibição. Obs.: verrá: virá
b) As composições dividem-se em dois grandes Martim Codax
grupos: líricas e satíricas.
c) Os principais trovadores são: Padre Antônio 9. (Mackenzie 2017) Pode-se afirmar que per-
Vieira e Camões.
tence ao mesmo tipo de poema trovadoresco de
d) O Trovadorismo é uma escola literária con-
temporânea. “Ondas do mar de Vigo” APENAS a alternativa:
e) São exemplos de Cantigas Satíricas as Canti- a) Dona fea, nunca vos eu loei/en meu tro-
gas de Amor e de Amigo. bar, pero muito trobei;/mais ora já un bon
cantar farei,/en que vos loarei toda via;/e
8. (ESPM) O amor cortês foi um gênero pratica- direi-vos como vos loarei:/dona fea, velha e
do desde os trovadores medievais europeus. sandia! (Joan Garcia de Guilhade)
Nele a devoção masculina por uma figura fe- b) Quer’eu en maneira provençal/fazer agora
minina inacessível foi uma atitude constante. un cantar d’amor/e querrei muit’i loar mia
A opção cujos versos confirmam o exposto é: senhor, a que prez nem fremusura non fal,/
a) Eras na vida a pomba predileta nem bondade, e mais vos direi en: tanto fez
(...) Eras o idílio de um amor sublime. Deus comprida de ben/que mais que todas
Eras a glória, – a inspiração, – a pátria, las do mundo val. (D. Dinis)
O porvir de teu pai! c) A melhor dona que eu nunca vi,/per bõa fé,
(Fagundes Varela) nem que oí dizer,/ e a que Deus fez melhor pa-
b) Carnais, sejam carnais tantos desejos, recer,/mia senhor est, e senhor das que vi,/ de
Carnais sejam carnais tantos anseios, mui bom preço e de mui bom sem,/per bõa fé,
Palpitações e frêmitos e enleios e de tod’outro bem, de quant’eu nunca doutra
Das harpas da emoção tantos arpejos... dona oí. (Fernão Garcia Esgaravunha)
(Cruz e Sousa) d) Quantos ham gram coita d’amor/eno mun-
c) Quando em meu peito rebentar-se a fibra, do, qual hoj’eu hei,/ querriam morrer, eu o
Que o espírito enlaça à dor vivente, sei,/e haveriam en sabor;/mais, mentr’eu
Não derramem por mim nenhuma lágrima vos vir, mia senhor,/ sempre m’eu querria
Em pálpebra demente. viver/ e atender e atender. (João Garcia de
(Álvares de Azevedo) Guilhade)

257
e) Que coita tamanha ei a sofrer,/por amar d) Valorizou recursos formais que tiveram não
amigu’e non o ver!/E pousarei sô lo avela- apenas a função de produzir efeito musical,
nal. (Nuno Fernandes Torneol) como também a função de facilitar a memo-
rização, já que as composições eram trans-
1
0. (G1 - ifsp 2017) Inspiradas na poesia pro- mitidas oralmente.
vençal, as cantigas trovadorescas são consi- e) Tanto no plano temático como no plano ex-
deradas as primeiras manifestações literá- pressivo, esse estilo de época absorveu a in-
rias portuguesas. O movimento literário em fluência dos padrões estéticos greco-romanos.
que elas surgiram ficou conhecido como Tro-
vadorismo. Sobre o Trovadorismo, assinale a TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
alternativa correta.
a) As cantigas trovadorescas foram transmiti- SONETO DE SEPARAÇÃO
das apenas em cópias e recolhidas somente
em duas importantes antologias, denomina- De repente do riso fez-se o pranto
das Cancioneiros, únicos documentos que Silencioso e branco como a bruma
restam para o conhecimento do Trovadoris- E das bocas unidas fez-se a espuma
mo: Cancioneiro da Ajuda e Cancioneiro da E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
Biblioteca Nacional.
b) O Trovadorismo foi um movimento artístico De repente da calma fez-se o vento
literário que predominou no século XVII, na Que dos olhos desfez a última chama
Europa. Esse estilo surgiu em Roma, na Itália, E da paixão fez-se o pressentimento
se expandiu por outros países da Europa, como E do momento imóvel fez-se o drama.
Portugal, logo após seu surgimento, mas foi na
Espanha que ele se tornou vigoroso. De repente, não mais que de repente
c) Em Portugal, as cantigas trovadorescas são Fez-se de triste o que se fez amante
classificadas em cantigas líricas (cantigas de E de sozinho o que se fez contente
amor e cantigas de amigo) e cantigas satíricas
(cantigas de escárnio e cantigas de maldizer). Fez-se do amigo próximo o distante
d) No Trovadorismo, o pensamento religio- Fez-se da vida uma aventura errante
so, espiritualista, predominante na época, De repente, não mais que de repente.
numa visão teocentrista (em que Deus, do (Vinícius de Morais)
grego Teos, está no centro das preocupações
humanas), dá lugar a uma visão antropo-
centrista (em que o homem, do grego an- 2. (Faap) Releia com atenção a última estrofe:
thropos, está no centro das realizações do
universo humano). “Fez-se de amigo próximo o distante
e) As características formais e temáticas das Fez-se da vida uma aventura errante
cantigas de amigo eram: influência das canti- De repente, não mais que de repente”.
gas provençais, originárias do sul da França;
eu lírico masculino que evoca a mulher ama- Tomemos a palavra AMIGO. Todos conhecem o
da usando a forma de tratamento “Minha se- sentido com que esta forma linguística é usu-
nhora” (“Mia senhor”, “Mia dona”); exaltação almente empregada no falar atual. Contudo,
das virtudes da beleza da amada inatingível; na Idade Média, como se observa nas cantigas
e predomínio do sentimento amoroso. medievais, a palavra AMIGO significou:
a) colega

E.O. Complementar b) companheiro


c) namorado
d) simpático
1. Assinale a afirmativa correta com relação ao e) acolhedor
Trovadorismo.
a) Um dos temas mais explorados por esse es- 3
. Assinale a afirmação falsa sobre as cantigas
tilo de época é a exaltação do amor sensual de escárnio e mal dizer:
entre nobres e mulheres camponesas. a) A principal diferença entre as duas modali-
b) Desenvolveu-se especialmente no século XV dades satíricas está na identificação ou não
e refletiu a transição da cultura teocêntrica da pessoa atingida.
para a cultura antropocêntrica. b) O elemento das cantigas de escárnio não é
c) Devido ao grande prestígio que teve durante temático, nem está na condição de se omitir
toda a Idade Média, foi recuperado pelos po- a identidade do ofendido. A distinção está
etas da Renascença, época em que alcançou no retórico do “equívoco”, da ambiguidade e
níveis estéticos insuperáveis. da ironia, ausentes na cantiga de maldizer.

258
c) Os alvos prediletos das cantigas satíricas d) Ai, dona feia, foste-vos queixar de que nun-
eram os comportamentos sexuais (homosse- ca vos louvei em meu trovar; e umas trovas
xualidade, adultério, padres e freiras libidi- vos quero dedicar em que louvada de toda
nosos), as mulheres (soldadeiras, prostitu- maneira sereis; tal é o meu louvar: dona
tas, alcoviteiras e dissimuladas), os próprios feia, velha e sandia!
poetas (trovadores e jograis eram frequente- (João Garcia de Guilhade)
mente ridicularizados), a avareza, a corrup-
ção e a própria arte de trovar. 2. “Ua dona, nom digu’eu qual,
d) As cantigas satíricas perfazem cerca de uma non agoirou ogano mal
quarta parte da poesia contida nos cancionei- polas oitavas de Natal:
ros galego-portugueses. Isso revela que a li- ia por as missa oir e
berdade da linguagem e a ausência de precon- ouv’un corvo carnaçal,
ceito ou censura (institucional, estética ou e non quis da casa sair...”
pessoal) eram componentes da vida literária (Joan Airas de santiago, século XIII)
no período trovadoresco, antes de a repressão
inquisitorial atirá-las à clandestinidade. O fragmento acima pertence a uma cantiga
e) Algumas composições satíricas do Cancionei- de escárnio. Por que não pode ser classifica-
ro Geral e algumas cenas dos autos gilvicen- do como uma cantiga de maldizer?
tinos revelam a sobrevivência, já bastante
atenuada, da linguagem livre e da violência 3. Leia a música e responda as questões.
verbal dos antigos trovadores.
Atrás da Porta
4. Nas cantigas de amor: Quando olhaste bem nos olhos meus
a) o trovador expressa um amor à mulher ama- E o teu olhar era de adeus
da, encarando-a como um objeto acessível a Juro que não acreditei, eu te estranhei
seus anseios. Me debrucei sobre teu corpo e duvidei
b) o trovador velada ou abertamente ironiza E me arrastei e te arranhei
personagens da época. E me agarrei nos teus cabelos
c) o “eu-lírico” é feminino, expressando a sau- Nos teu peito, teu pijama
dade da ausência do amado. Nos teus pés ao pé da cama
d) o poeta pratica a vassalagem amorosa, pois, Sem carinho, sem coberta
em postura platônica, expressa seu amor à No tapete atrás da porta
mulher amada. Reclamei baixinho
e) existe a expressão de um sentimento femini- Dei pra maldizer o nosso lar
no, apesar de serem escritas por homens. Pra sujar teu nome, te humilhar
E me vingar a qualquer preço
Te adorando pelo avesso
E.O. Dissertativo Pra mostrar que ainda sou tua
(Chico Buarque)
1. Os textos abaixo são de cantigas medievais
e foram adaptados para o português atual. a) Quais os sentimentos que podemos ver nessa
Identifique cada uma de acordo com as ca- música?
racterísticas das cantigas de amor, de amigo, b) A pessoa, que “fala” na música, é um ho-
mem ou uma mulher? Justifique.
de escárnio ou de maldizer.
a) A dona que eu sirvo e que muito adoro mos-
trai-ma, ai Deus! pois eu vos imploro se não,
dai-me a morte.
(Bernardo de Bonaval)
E.O. Objetivas
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
b) Trovas não fazeis como provençal mas como
Bernardo, o de Bonaval. O vosso trovar não 1. (Unifesp) Leia a cantiga seguinte, de Joan
é natural. Garcia de Guilhade.
Ai de vós, com ele e o Demo aprendestes.
Em trovardes mal, vejo eu o sinal das loucas Un cavalo non comeu
ideias em que empreendestes. Por isso, D. á seis meses nen s’ergueu
Pero, em Vila-Real, mais prougu’a Deus que choveu,
Fatal foi a hora em que tanto bebestes. creceu a erva,
(D. Afonso X, o Sábio) e per cabo si paceu,
e já se leva!
c) Ai flores, ai flores do verde ramo, se sabe- Seu dono non lhi buscou
des novas do meu amado? Ai, Deus, onde cevada neno ferrou:
ele está? mai-lo bon tempo tornou,
(D. Dinis) creceu a erva,

259
e paceu, e arriçou,
e já se leva! E.O. Dissertativas
Seu dono non lhi quis dar
cevada, neno ferrar; (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
mais, cabo dum lamaçal
creceu a erva, 1. (Fuvest) “Coube ao século XIX a descober-
e paceu, e arriç’ar, ta surpreendente da nossa época lírica. Em
e já se leva! 1904, com a edição crítica e comentada do
(CD Cantigas from the Court of Dom Dinis. Cancioneiro da Ajuda, por Carolina Michaëlis
harmonia mundi, usa, 1995.) de Vasconcelos, tivemos grande visão de
A leitura permite afirmar que se trata de conjunto do valiosíssimo espólio descober-
uma cantiga de: to.” (Costa Pimpão)
a) escárnio, em que se critica a atitude do dono a) Qual é essa “primeira época lírica” portu-
do cavalo, que dele não cuidara, mas graças guesa?
ao bom tempo e à chuva, o mato cresceu e o b) Que tipos de composições poéticas se culti-
animal pôde recuperar-se sozinho. vam nessa época?
b) amor, em que se mostra o amor de Deus
com o cavalo que, abandonado pelo dono, As questões de 2 a 5 tomam por base uma
comeu a erva que cresceu graças à chuva e cantiga do trovador galego Airas Nunes, de
ao bom tempo. Santiago (século XIII), e o poema Confessor
c) escárnio, na qual se conta a divertida his- Medieval, de Cecília Meireles (1901-1964).
tória do cavalo que, graças ao bom tempo e
Cantiga
à chuva, alimentou-se, recuperou-se e pôde,
então, fugir do dono que o maltratava. Bailemos nós já todas três, ai amigas,
d) amigo, em que se mostra que o dono do ca- So aquestas avelaneiras frolidas [floridas],
valo não lhe buscou cevada nem o ferrou por E quem for velida [formosa], como nós, velidas,
causa do mau tempo e da chuva que Deus Se amigo amar,
mandou, mas mesmo assim o cavalo pôde So aquestas [estas] avelaneiras frolidas
recuperar-se. Verrá [virá] bailar.
e) mal-dizer, satirizando a atitude do dono que Bailemos nós já todas três, ai irmanas [irmãs],
ferrou o cavalo, mas esqueceu-se de alimen- So aqueste [este] ramo destas avelanas,
tá-lo, deixando-o entregue à própria sorte E quem for louçana, como nós, louçanas
para obter alimento. [formosa],
Se amigo amar,
2. (Fuvest) Sobre o Trovadorismo em Portugal, So aqueste ramo destas avelanas [avelaneiras]
é correto afirmar que: Verrá bailar.
a) sua produção literária está escrita em galego Por Deus, ai amigas, mentr’al [enquanto ou-
ou galêgo-português e divide-se em: poesia tras coisas] non fazemos,
(cantigas) e prosa (novelas de cavalaria). So aqueste ramo frolido bailemos,
b) utilizou largamente o verso decassílabo por- E quem bem parecer [tiver belo aspecto],
que sua influência é clássica. como nós parecemos Se amigo amar,
c) a produção poética daquela época pode ser di- So aqueste ramo so lo que bailemos
vidida em lírico-amorosa e prosa doutrinária. Verrá bailar.
d) as cantigas de amigo têm influência provençal. SANTIAGO, Airas Nunes de. In: SPINA, Segismundo.
Presença da Literatura Portuguesa – I. Era Medieval.
e) a prosa trovadoresca tinha claro objetivo de 2. ed. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1966.
divertir a nobreza, por isso têm cunho satírico.
Confessor Medieval (1960)
3. (Fuvest) O Trovadorismo, quanto ao tempo
em que se instala: Irias à bailia com teu amigo,
a) tem concepções clássicas do fazer poético. Se ele não te dera saia de sirgo [seda]?
b) é rígido quanto ao uso da linguagem que, Se te dera apenas um anel de vidro
geralmente, é erudita. Irias com ele por sombra e perigo?
c) estabeleceu-se num longo período que dura Irias à bailia sem teu amigo,
10 séculos. Se ele não pudesse ir bailar contigo?
d) tinha como concepção poética a epopeia, a Irias com ele se te houvessem dito
louvação dos heróis.
Que o amigo que amavas é teu inimigo?
Sem a flor no peito, sem saia de sirgo,
e) reflete as relações de vassalagem nas canti-
Irias sem ele, e sem anel de vidro?
gas de amor.
Irias à bailia, já sem teu amigo,
E sem nenhum suspiro?
MEIRELES, Cecília. Poesias completas de Cecília Meireles.
v.8. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1974.

260
2. (Unesp) A leitura da cantiga de Airas Nunes
e do poema “Confessor Medieval”, de Cecí- Gabarito
lia Meireles, revela que este poema, mesmo
tendo sido escrito por uma poeta moder-
nista, apresenta intencionalmente algumas E.O. Aprendizagem
características da poesia trovadoresca, como 1. C 2. B 3. D 4. D 5. B
o tipo de verso e a construção baseada na
repetição e no paralelismo. 6. D 7. B 8. A 9. A 10. C
Releia com atenção os dois textos e, em se-
guida estabeleça as identidades que há entre
o terceiro verso da cantiga de Airas Nunes e E.O. Fixação
o terceiro verso do poema de Cecília Meireles
1. E 2. C 3. F-F-V-V-V 4. A 5. A
no que diz respeito ao número de sílabas e
às posições dos acentos. 6. B 7. B 8. D 9. E 10. C

3. (Unesp) Tanto na cantiga como no poema de


Cecília Meireles verificam-se diferentes per- E.O. Complementar
sonagens: um eu-poemático, que assume a
1. D 2. C 3. B 4. D
palavra, e um interlocutor ou interlocutores
a quem se dirige. Com base nesta informa-
ção, releia os dois poemas e, a seguir indique
o interlocutor ou interlocutores do eu-poe-
E.O. Dissertativo
1.
mático em cada um dos textos.
a) cantiga de amor
b) cantiga de maldizer
4. (Unesp) Considerando-se que o último ver- c) cantiga de amigo
so da cantiga caracteriza um diálogo entre d) cantiga de escárnio
personagens; considerando-se que a palavra 2.
O fragmento não pode ser considerado uma
“abutre” grafava-se “avuytor”, em portu- cantiga de maldizer, pois não é direta. Não é
guês arcaico; e considerando-se que, de acor- possível identificar a pessoa criticada, além
do com a tradição popular da época, era pos- de apresentar vocabulário comedido.
sível fazer previsões e descobrir o que está 3.
oculto, comendo carne de abutre, mediante a) Os sentimentos abordados na canção es-
estas três considerações: tão atrelados ao sofrimento frente à par-
a) Identifique o personagem que se expressa em tida da pessoa amada.
discurso direto, no último verso do poema; b) É tipicamente uma cantiga de amigo,
b) Interprete o significado do último verso, no pois, ao falar da pessoa amada, o eu lírico
contexto do poema. se revela como uma mulher, apesar de ter
sido escrita por um homem.
5. (Unesp) O paralelismo é um dos recursos
estilísticos mais comuns na poesia líricoa- E.O. Objetivas
morosa trovadoresca. Consiste na ênfase de
uma ideia central, às vezes repetindo ex- (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
pressões idênticas, palavra por palavra, em 1. A 2. A 3. E
séries de estrofes paralelas. A partir destas
observações, releia o texto de Estêvão Coelho
e responda:
a) O poema se estrutura em quantas séries de
estrofes paralelas? Identifique-as.
b) Que ideias centrais são enfatizadas em cada
série paralelística?

261
E.O. Dissertativas
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
1.
a) O Trovadorismo.
b) As cantigas líricas e satíricas.
2.
No que diz respeito à metrificação, os ver-
sos indicados em ambos os textos são iguais,
logo chamados de hendecassílabos. Eles são
acentuados nas quintas e nas décimas pri-
meiras sílabas.
3.
O eu lírico feminino na cantiga se dirige a
duas moças (amigas e irmãs), estabelecen-
do com elas interlocução de sua fala. Já no
poema, o eu lírico apresenta-se como um
homem, um confidente que faz perguntas
à moça apaixonada, mantendo com ela uma
lógica de interlocução.
4.
a) A personagem que se expressa em discur-
so direto é a “mulher”.
b) A personagem considera o poeta um vi-
dente, pois ele descobre no último verso
o seu sofrimento amoroso.
5.
a) O poema se estrutura em duas séries: as
duas primeiras estrofes e as duas estrofes
seguintes.
b) Na primeira estrofe, o foco se dá nos afa-
zeres da mulher. Já na segunda, a temá-
tica recai sobre seu sofrimento.

262
© Peter Paul Rubens/Wikimedia Commons

Aula 3

Humanismo e Classicismo
Competência 5
Habilidades 15, 16 e 17
Competência 1 – Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para
sua vida.
H1 Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como elementos de caracterização dos sistemas de comunicação.
H2 Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de comunicação e informação para resolver problemas sociais.
H3 Relacionar informações geradas nos sistemas de comunicação e informação, considerando a função social desses sistemas.
H4 Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação.
Competência 2 – Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) (LEM) como instrumento de acesso a informações e a outras
culturas e grupos sociais.
H5 Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM ao seu tema.
H6 Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus mecanismos como meio de ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e culturas.
H7 Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e seu uso social.
H8 Reconhecer a importância da produção cultural em LEM como representação da diversidade cultural e linguística.
Competência 3 – Compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da
identidade.
H9 Reconhecer as manifestações corporais de movimento como originárias de necessidades cotidianas de um grupo social.
H10 Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em função das necessidades cinestésicas.
Reconhecer a linguagem corporal como meio de interação social, considerando os limites de desempenho e as alternativas de adaptação para
H11
diferentes indivíduos.
Competência 4 – Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e
da própria identidade.
H12 Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos artistas em seus meios culturais.
H13 Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos.
H14 Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos.
Competência 5 – Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante
a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção.
H15 Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.
H16 Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário.
H17 Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional.
Competência 6 – Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da
realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação.
H18 Identificar os elementos que concorrem para a progressão temática e para a organização e estruturação de textos de diferentes gêneros e tipos.
H19 Analisar a função da linguagem predominante nos textos em situações específicas de interlocução.
H20 Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a preservação da memória e da identidade nacional
Competência 7 – Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas.
H21 Reconhecer em textos de diferentes gêneros, recursos verbais e não-verbais utilizados com a finalidade de criar e mudar comportamentos e hábitos.
H22 Relacionar, em diferentes textos, opiniões, temas, assuntos e recursos linguísticos.
H23 Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.
Reconhecer no texto estratégias argumentativas empregadas para o convencimento do público, tais como a intimidação, sedução, comoção,
H24
chantagem, entre outras.
Competência 8 – Compreender e usar a língua portuguesa como língua materna, geradora de significação e integradora da organização
do mundo e da própria identidade.
H25 Identificar, em textos de diferentes gêneros, as marcas linguísticas que singularizam as variedades linguísticas sociais, regionais e de registro.
H26 Relacionar as variedades linguísticas a situações específicas de uso social.
H27 Reconhecer os usos da norma padrão da língua portuguesa nas diferentes situações de comunicação.
Competência 9 – Entender os princípios, a natureza, a função e o impacto das tecnologias da comunicação e da informação na sua vida
pessoal e social, no desenvolvimento do conhecimento, associando-o aos conhecimentos científicos, às linguagens que lhes dão suporte,
às demais tecnologias, aos processos de produção e aos problemas que se propõem solucionar.
H28 Reconhecer a função e o impacto social das diferentes tecnologias da comunicação e informação.
H29 Identificar pela análise de suas linguagens, as tecnologias da comunicação e informação.
H30 Relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento que elas produzem
Humanismo

DORÉ, Gustave. Demônios confrontando Dante e Virgílio. Ilustração para o livro A divina Comédia (Inferno), de Dante Alighieri,
publicado em 1885 – Biblioteca de Artes Decorativas (Paris, França). A ilustração reflete a confiança dos humanistas.
Dante e Virgílio enfrentam os demônios por meio da razão, que os ajuda a afastar as “trevas” do pensamento vinculado à Idade Média.

[...] os humanistas consideravam a Antiguidade


afastada deles no tempo (tudo o que fosse velho ti-
nha para eles um interesse especial), mas espiritual-
mente próxima, ao passo que a Idade Média estava
mais próxima no tempo, mas extremamente distan-
te em muitos aspectos [...].
DRESDEN, Sem. O Humanismo no renascimento.
Tradução de Daniel Gonçalves. Porto: Inova. p. 55.

Cronologia do Humanismo
Início: nomeação de Fernão Lopes, em 1418, como o cronista-mor da Torre do Tombo.
Fim: em 1527, com a chegada do poeta Sá de Miranda, da Itália, com a Medida Nova (verso decassílabo).

Contexto
O Humanismo foi um movimento artístico e intelectual
que se estabeleceu como uma transição entre o teo-
centrismo da Idade Média e o pensamento antropocên-
trico do Renascimento, que surgiu na Itália no final da
Idade Média (século XIV). A organização social passou
por uma reformulação, e nas áreas mais longínquas aos
feudos medievais passaram a surgir pequenas cidades
que funcionavam de forma independente do poder ab-
soluto dos monarcas, eram os burgos e seus habitantes,
os burgueses.
A lógica dos humanistas era colocar em primei-
ro plano o próprio ser humano, o que os afastava do
teocentrismo medieval. Muitos camponeses, atraídos Monteriggioni - Burgo (Itália)

265
pelas promessas de prosperidade, transferiram-se para Projeto literário
os burgos, estas cidades ou vila medievais normalmente
muradas e associadas a um mosteiro ou castelo, onde O abandono da subordinação ao Clero e o resgate dos
começaram a trabalhar como pequenos mercadores. valores clássicos fazem com que ganhe força um olhar
Em função da substituição da sociedade do es- mais racional sobre o mundo, buscando na Ciência
cambo e das trocas pelo surgimento do comércio e, pri- uma explicação para os fenômenos até então atribui-
dos a Deus.
mordialmente, da moeda, o homem se viu rompendo
O contexto de produção é o mesmo do Trovado-
com a lógica feudal das castas imóveis. Diante da possi-
rismo, mas em função do desenvolvimento intelectual
bilidade de ascensão social passaram a investir mais em
vindo da ampliação cultural promovida pela burguesia,
si, num individualismo que colocava o próprio homem os textos passam a ser escritos para ser lidos e não mais
e sua busca por poder e acúmulo em primeiro plano, cantados, como seguia a tradição oral das cantigas. A
surgindo, assim, a burguesia. partir do início da produção de livros na Europa, sobre-
tudo com a invenção da gráfica, por Johann Gutenberg,
por volta de 1450, a Literatura ganha com obras que
permitem ao escritor se valer de novos recursos técnicos
de escrita e linguagem, sem ficarem presos à oralidade
e à memória, como faziam até então. Para se ter uma
ideia, surge na Alemanha em 1455, o primeiro livro im-
presso por Gutemberg, a Bíblia.

Portugal e sua produção

Lucca – Burgo (Itália) Os reis e nobres da Dinastia de Avis (1385-1580) tor-


naram Portugal mais poderoso e rico com o início da
Essas transformações que começaram a ocorrer expansão marítima em Portugal, que surge ao mesmo
na Europa do fim da Idade Média fizeram com que a tempo em que se funda a Torre do Tombo, em 1418,
vida nas cidades fosse retomada e o comércio inten- que foi um importante centro de registro e documen-
sificado, provocando maior interação entre pessoas de tação da época. Destaca-se a figura de Fernão Lopes,
diferentes segmentos da sociedade. A riqueza passou nomeado o cronista-mor da Torre do Tombo, em 1434,
a ser associada ao capital obtido pelo comércio e não sendo responsável por escrever e catalogar as Crôni-
mais à terra, como ocorria na sociedade feudal. cas historiográficas. Surge uma poesia desvinculada da
música, chamada de Poesia Palaciana, com Garcia de
Com o enriquecimento da burguesia, em função
Resende e sua compilação de poetas no “Cancioneiro
do comércio, surge a necessidade de um investimento
Geral”, de 1516.
na própria formação cultural, para que se pudesse admi- Destaca-se, também, a figura de Gil Vicente na
nistrar a riqueza acumulada. A arte ganha com isso, pois produção teatral, sendo um importante representante
com a formação intelectual, fruto da lógica comercial, da cultura e sociedade da época.
o burguês passa a investir em cultura, aprende a ler e
a contar, algo que, até então, só era feito pela Igreja e
pelos grandes soberanos. Aos poucos, os leigos come- Crônica historiográfica
çam a conquistar um papel importante na produção e,
principalmente, na circulação de cultura.
(Fernão Lopes)
A busca por uma formação levou à redescoberta Fernão Lopes é importante pois é a partir do registro de
de textos e autores da Antiguidade Clássica, considera- suas crônicas historiográficas que se marca o início do
da uma fonte de saber a respeito do ser humano, resga- Humanismo em Portugal. Dezesseis anos após ter sido
tando, assim, a visão antropocêntrica, característica da nomeado o guarda-mor da Torre do Tombo, em 1434,
cultura greco-latina. ele é nomeado cronista-mor do reino. Ele foi o primeiro

266
grande prosador da Literatura Portuguesa e contribuiu tadas nos salões da nobreza, onde aconteciam os Se-
decisivamente para o desenvolvimento da Língua Portu- rões. Do ponto de vista temático, esses poemas ainda
guesa moderna ao criar uma visão de mundo indepen- idealizavam o amor e suas desilusões, mas sem o exa-
dente das imposições do clero. gero trovadoresco. Do ponto de vista formal, a mudan-
ça é nítida no que diz respeito à constituição de uma
Língua Portuguesa sem tantas influências provençais e
galegas, fato esse que contribuiu para o aperfeiçoamen-
to da linguagem com técnicas como as aliterações, o
jogo de palavras, a conotação e a ambiguidade. Além
disso, explorou-se o metro fixo das Redondilhas (Me-
dida Velha).

Lopes escreveu três crônicas:


§§ Crônica de El-Rei D. Pedro I: compilação e
crítica dos principais acontecimentos do reino de
D. Pedro I. Nesse volume, encontra-se o relato
do episódio da morte de Inês de Castro, amante
do rei, assassinada a mando de D. Afonso IV, pai
de D. Pedro.
§§ Crônica de El-Rei D. Fernando: reconstitui-
ção do período que se inicia com o casamento
de D. Fernando com Dona Leonor Teles e encer-
Inês de Castro, sob o olhar de Garcia de Resende.
ra-se com a Revolução de Avis.
§§ Crônica de El-Rei D. João: dividida em duas Por conta do desenvolvimento do contexto de
partes; a primeira começa com a morte de D. circulação literária, ou seja, com mais pessoas sabendo
Fernando, em 1383, e termina com a revolução ler, mais se consumia literatura, portanto surgiram al-
que leva D. João ao trono português; na segunda guns escritores como Bernadim Ribeiro, Duarte de Brito,
parte é descrito o reinado de D. João até 1411. Nuno Pereira, porém o mais importante foi Garcia de
Fernão Lopes distinguia-se dos demais cronistas Resende, pois ficou responsável, além de escrever, por
pela importância que dava ao povo. Essa opção compilar boa parte da poesia humanista portuguesa.
do cronista exemplifica o seu espírito humanista.
Esses poemas foram organizados em um único volume,
o Cancioneiro Geral, em 1516.
Poesia palaciana
(Garcia de Resende) Medida Velha

§§ Redondilhas maiores: versos com metrifi-


A grande novidade da poesia palaciana é que ela se
cação de 7 sílabas poéticas.
desvinculou da tradição oral das cantigas trovadorescas §§ Redondilhas menores: versos com metrifi-
e foi escrita para ser lida e declamada. Ela consistia em cação de 5 sílabas poéticas.
composições coletivas, produzidas para serem apresen-

267
A poesia reunida por Garcia de Resende no filho, o futuro rei D. João III. Em seus 71 anos de vida,
Cancioneiro Geral traz algumas diferenças importan- Gil Vicente se manteve em cena durante 34 anos e tes-
tes em relação à lírica dos trovadores galego-portu- temunhou muitas modificações ocorridas em Portugal,
gueses quanto ao uso de formas poéticas regulares, viu, por exemplo, seu país sair de uma sociedade agrária
como: e tornar-se uma potência naval, comercial e militar.
§§ a trova: composta de duas ou mais quadras de
versos de sete sílabas e rimas ABAB;
§§ o vilancete: composto de um mote (motivo de
dois ou três versos) seguido de voltas ou glosas
(estrofes em que o mote é desenvolvido) de sete
versos;
§§ a cantiga: composta de um mote de quatro ou
cinco versos e de uma glosa de oito ou dez ver-
sos, com repetição total ou parcial do mote no
fim da glosa;
§§ a esparsa: composta de uma única estrofe de
oito, nove ou dez versos de seis sílabas métricas.
Exemplo de poema compilado no Cancioneiro
Geral:

Entre mim mesmo e mim


não sei que se ergueu
que tão meu inimigo sou.
Acredita-se que ele tenha nascido por volta de
Uns tempos com grande engano 1495. Pouco se conhece de sua vida particular e acre-
vivi eu mesmo comigo, dita-se que tenha se mantido distante de exageros e
agora no maior perigo
modismos, mas sabe-se que ele legou à sociedade uma
se me descobre maior dano.
vasta obra teatral, com forte caráter moralizante, em
Caro custa um desengano,
embora este não me tenha matado que a religião aparece como padrão e referência de
quão caro que me custou! comportamento, a partir da qual se julgam as virtudes e
os erros dos humanos.
De mim me sou feito outro, Viveu a transição dos valores medievais para os
entre o cuidado e cuidado renascentistas, trazendo, de um lado, a crença teocên-
está um mal derramado, trica na providência divina e, de outro, a crítica de cos-
que por mal grande me veio.
tumes, como a audácia humanista fundindo o antigo ao
Nova dor, novo receio
foi este que me tomou, moderno.
assim me tem, assim estou.
(Bernardim Ribeiro)

Ridendo castigat mores

O teatro de Gil Vicente A arte teatral vicentina tem caráter moralizante, pois en-
foca os desvios comportamentais inseridos num contex-
O grande nome do teatro no Humanismo é Gil Vicen- to em que a religião católica era o padrão de compor-
te, considerado o pai do teatro em Portugal. Escrita em tamento. No entanto, sua crítica sempre se voltava para
1502, sua primeira peça foi Auto da Visitação, em os sujeitos e não para as instituições, principalmente as
homenagem à rainha D. Maria pelo nascimento de seu religiosas.

268
A evidente intenção na maioria de suas obras §§ Farsas: peças de caráter crítico, utilizam como
é criar o riso crítico, usando a máxima latina ridendo personagens tipos populares e desenvolvem-se
castigat mores, ou seja, rindo castiga-se a moral em torno de problemas da sociedade. As mais
sem fazer distinção de classe, seja rico, pobre, plebeu populares são a Farsa de Inês Pereira, história de
ou nobre, todos eram sua matéria-prima e recebiam a uma jovem que vê no casamento a sua chance
mesma força de suas críticas. de ascensão social, e O velho da horta, que ridi-
O teatro vicentino coloca no centro da cena erros culariza a paixão de um velho casado por uma
de ricos e pobres, nobres e plebeus. O autor denuncia os jovem virgem.
exploradores do povo, como o fidalgo, o sapateiro e o
agiota no Auto da barca do inferno; e ridiculariza os O velho da horta (1512)
velhos que se interessam por mulheres mais jovens na
farsa O velho da horta. A farsa gira em torno dos amores de um velho e uma
Um recurso muito explorado por Gil Vicente é o mocinha que vai até sua horta “buscar cheiros para a
uso de alegorias, ou seja, de representações por meio de panela”.
personagens ou objetos, de ideias abstratas, geralmente O velho a corteja e apaixona-se por ela. Uma
relacionadas aos vícios e às virtudes humanas. Assim, alcoviteira, aproveitando-se da situação, põe-se a tirar a
no Auto da barca do inferno, o agiota traz consigo uma fortuna do Velho e o deixa na miséria.
bolsa cheia de moedas que representa, alegoricamente, Leia um trecho:
a sua ganância.
[...]
Outro recurso são os tipos sociais, nos quais são
Entra a moça na horta e diz o velho: Senhora, benza-vos
elencadas figuras que formam um quadro da socieda-
Deus!
de portuguesa da época, como papas, fidalgos, juízes,
MOÇA: Deus vos mantenha, senhor.
onzeneiros, alcoviteiras, prostitutas, espertalhões, tolos,
VELHO: Onde se criou tal flor? Eu diria que nos céus.
mulheres ambiciosas, clérigos, frades etc.
MOÇA: Mas no chão.
Afastou-se totalmente dos gêneros de grande
VELHO: Pois damas se acharão que não são vosso sa-
prestígio no teatro da Antiguidade Clássica, ou seja, a
pato!
tragédia e a comédia são caracterizadas por três uni-
MOÇA: Ai! Como isso é tão vão, e como as lisonjas são-
dades: ação, tempo e lugar. Gil Vicente, ao contrário,
de barato!
caracteriza sua obra pela amplitude temática, maior
VELHO: Que buscais vós cá, donzella, senhora, meu co-
duração da ação cênica, maior número de atores em
ração?
cena e despreocupação com grande cenário para que
MOÇA: Vinha ao vosso hortelão, por cheiros para a pa-
possa justapor espaços com mais facilidade. Além disso,
nella.
misturava no registro de fala tanto o erudito como o
VELHO: E a isso vinde vós, meu paraíso. Minha senhora,
popular, o dito “elevado” com o “baixo”.
e não a aí?
As obras de Gil Vicente costumam ser divididas
MOÇA: Vistes vós! Segundo isso, nenhum velho não
em três tipos:
tem siso natural.
§§ Autos pastoris (éclogas): gênero a que per- VELHO: Ó meus olhinhos garridos, minha rosa, meu ar-
tencem algumas das primeiras obras do autor. minho!
Algumas dessas peças têm caráter religioso, MOÇA: Onde he vosso ratinho? Não tem os cheiros co-
como o auto pastoril português; lhidos?
§§ Autos de moralidade: gênero em que Gil Vi- VELHO: Tão depressa vinde vós, minha condensa, meu
cente se celebrizou. Suas peças mais conhecidas amor, meu coração!
são os da trilogia das barcas (Auto da barca do MOÇA: Jesus! Jesus! Que cousa he essa? E que prá-
inferno, Auto da barca do purgatório e Auto da tica tão avessa da razão! Falai, falai doutra maneira!
barca da glória) e o Auto da alma. Mandai-me dar a hortaliça.

269
VELHO: Grão fogo de amor me atiça, ó minha alma ver- um fio condutor melhor configurado que as produções
dadeira! anteriores de Gil Vicente.
MOÇA: E essa tosse? Amores de sobreposse serão os da O enredo é simples: uma jovem sonhadora pro-
vossa idade; o tempo vos tirou a posse. cura, por meio do casamento com um homem que sai-
VELHO: Mais amo que se moço fosse com a metade. ba tanger viola, fugir à rotina doméstica. Despreza a
MOÇA: E qual será a desastrada que atende vosso proposta de Pero Marques, filho de um camponês rico,
amor? homem tolo e ingênuo, e aceita se casar com Brás da
Mata, escudeiro pelintra e pobretão. No entanto, os so-
VELHO: Ó minha alma e minha dor, quem vos tivesse
nhos da heroína são logo desfeitos, porque o marido
furtada!
revela sua verdadeira personalidade, maltratando-a e
MOÇA: Que prazer! Quem vos isso ouvir dizer cuidará
explorando-a. Brás da Mata vai para a África e lá vem
que estais vós vivo, ou que estais para viver!
a falecer. Inês, ensinada pela dura experiência, toma
VELHO: Vivo não no quero ser, mas cativo!
consciência da realidade e aceita se casar com Pero
[...]
Marques, seu primeiro pretendente. Depressa também
a jovem aceita a corte de um falso ermitão. A farsa ter-
A farsa de Inês Pereira (1523)
mina com o marido (cantado por ela como cuco, gamo
e cervo, tradicionalmente concebidos como símbolos
A farsa de Inês Pereira é considerada a mais complexa
do homem traído) levando-a às costas (asno que me
peça de Gil Vicente. Ao apresentá-la, o teatrólogo portu-
carregue) até a gruta em que vive o ermitão, para um
guês diz:
encontro nada ingênuo.
A seguinte farsa de folgar foi represen- Leia um trecho:
tada ao muito alto e mui poderoso rei D. INÊS PEREIRA: Quien con veros pena y muere qué hará
João, o terceiro do nome em Portugal, no cuando no os viere? 1
seu Convento de Tomar, na era do Senhor FALADO: Renego deste lavrar e do primeiro que o usou 2
1523. O seu argumento é que, porquan- ao diabo que o eu dou que tam mau é d’aturar.
to duvidavam certos homens de bom sa- Oh, Jesus! Que enfadamento, e que raiva, e que tor-
ber, se o Autor fazia de si mesmo estas mento, que cegueira, e que canseira! 3 Eu hei-de buscar
obras, ou se as furtava de outros autores, maneira d’algum outro aviamento 4.
lhe deram este tema sobre que fizes-
Coitada, assi hei-de estar encerrada nesta casa como
se: é um exemplo comum que dizem:
panela sem asa que sempre está num lugar?
Mais vale asno que me leve que
E assi hão-de ser logrados 5 dou dias amargurados, que
cavalo que me derrube.
E sobre este motivo se fez esta farsa.
eu possa estar cativa 6 em poder de desfiados? 7
Antes o darei ao Diabo que lavrar mais nem pontada;8
A obra pode ser dividida em cinco partes: a pri- já tenho a vida cansada de jazer sempre dum cabo. 9
meira é um retrato da rotina na qual se insere a pro- Todas folgam e eu não, todas vêm e todas vão onde
tagonista; a segunda reflete a situação da mulher na querem, senão eu. Hui! E que pecado é o meu, Oh que
sociedade da época, cujos registros são dados pela mãe dor de coração!
de Inês, pela própria Inês e por Lianor Vaz; a terceira Esta vida é mais que morta. Sou eu coruja ou
mostra o comércio casamenteiro, representado pelos ju- corujo, ou sou algum caramujo,10 que não sai senão à
deus comerciantes e pelo arranjo matrimonial-mercantil porta? E quando me dão algum dia licença, como a bu-
de Inês com Brás da Mata; a quarta considera o ca- gia,11 que possa estar à janela é já mais que a Madane-
samento, o despertar para a realidade, contrapondo-a la 12 quando achou a aleluia.
1. Quem, vendo-vos, sofre e morre que fará se vos não vir?
ao sonho que embalava as fantasias da protagonista
2. Amaldiçoado seja o trabalho doméstico e quem o inventou.
e; finalmente, a quinta parte reflete a realidade brutal 3. Que trabalho cansativo e sem propósito.
4. Aviamento: solução.
da qual Inês, experiente e vivida, procura tirar proveito 5. Lograr: desfrutar, aproveitar.
próprio. A peça apresenta uma situação concreta, com 6. Ao afirmar que desfruta (aproveita) os dias presa em casa,
sempre bordando e costurando, Inês ironiza a vida enfadonha a
uma personagem bem delineada psicologicamente e que está submetida.

270
7. Desfiados: tecidos para bordar e costurar. vida a entrar na barca do inferno, pois, sendo represen-
8. Que vá tudo ao Diabo, não darei nem mais um ponto no
bordado. tante religioso, crê que teria perdão. Foi, porém, conde-
9. Estou cansada de estar sempre cativa, condenada às mesmas
e repetitivas tarefas, como as panelas que estão sempre depen-
nado ao inferno por falso moralismo religioso.
duradas em uma mesma posição. Brísida Vaz, feiticeira e alcoviteira, é recebida
10. Ao comparar-se à coruja e ao caramujo, Inês ressalta,
respectivamente, os seguintes lamentos: não participa da vida pelo diabo, que lhe diz que seu o maior bem são “seis-
social e é prisioneira da própria casa.
11. Bugia: macaca.
centos virgos postiços”. Virgo é hímen, representa a
12. Madanela: Madalena, personagem bíblica. virgindade. Compreendemos que essa mulher prostituiu
muitas meninas virgens, e “postiço” nos faz acreditar
Auto da barca do inferno (1514) que enganara seiscentos homens, dizendo que tais me-
ninas eram virgens. Brísida Vaz tenta convencer o anjo
O Auto da barca do inferno representa o juízo final cató- a levá-la na barca do céu inutilmente. Ela é condenada
lico de forma satírica e com forte apelo moral. O cenário por prostituição e feitiçaria.
é uma espécie de porto, onde se encontram duas barcas: A seguir, é a vez do judeu, que chega acom-
uma com destino para o inferno, comandada pelo diabo,
panhado por um bode. Encaminha-se direto ao diabo,
e a outra, com destino para o paraíso, comandada por
pedindo para embarcar, mas até o diabo recusa-se a
um anjo. Ambos os comandantes aguardam os mortos,
levá-lo. Ele tenta subornar o diabo, porém este, com
que são as almas que seguirão para o paraíso ou para
a desculpa de não transportar bodes, o aconselha a
o inferno.
procurar outra barca. O judeu fala, então, com o anjo,
Os mortos começam a chegar e um fidalgo é o
porém não consegue aproximar-se dele: é impedido,
primeiro. Ele representa a nobreza, e é condenado ao
inferno por seus pecados, tirania e luxúria. O diabo or- acusado de não aceitar o cristianismo. Por fim, o diabo
dena ao fidalgo que embarque. Este, arrogante, julga-se aceita levar o judeu e seu bode, mas não dentro de sua
merecedor do paraíso, pois deixou muita gente rezando barca, e, sim, rebocados.
por ele. Recusado pelo anjo, encaminha-se, frustrado, Durante o reinado de Dom Manuel, de 1495-
para a barca do inferno; mas tenta convencer o diabo a 1521, muitos judeus foram expulsos de Portugal, e os
deixá-lo rever sua amada, pois esta “sente muito” sua que ficaram tiveram que se converter ao cristianismo,
falta. O diabo destrói seu argumento, afirmando que ela sendo perseguidos e chamados de “cristãos novos”. Ou
o estava enganando. seja, Gil Vicente segue, nessa obra, o espírito da época.
Um agiota chega a seguir e é condenado ao in- O corregedor e o procurador, representantes do
ferno por ganância e avareza. Tenta convencer o anjo a judiciário, chegam, a seguir, trazendo livros e processos.
ir para o céu pedindo ao diabo que o deixe voltar para Quando convidados pelo diabo a embarcarem, come-
pegar a riqueza que acumulou, mas é impedido e acaba çam a tecer suas defesas e encaminham-se ao anjo.
na barca do inferno.
Na barca do céu, o anjo os impede de entrar: são con-
O terceiro indivíduo a chegar é o parvo (um tolo,
denados à barca do inferno por manipularem a justiça
ingênuo). O diabo tenta convencê-lo a entrar na barca
em benefício próprio. Ambos farão companhia à Brísida
do inferno; quando o parvo descobre qual é o destino
Vaz, revelando certa familiaridade com a cafetina – o
dela, vai falar com o anjo. Este, agraciando-o por sua
que nos faz crer ter havido trocas de serviços entre eles.
humildade, permite-lhe entrar na barca do céu.
O próximo a chegar é o enforcado, que acredita
A alma seguinte é a de um sapateiro, com todos
os seus instrumentos de trabalho. Durante sua vida en- ter perdão para seus pecados, pois em vida foi julgado e
ganou muitas pessoas, e tenta enganar também o dia- enforcado. Mas também é condenado a ir para o inferno
bo. Como não consegue, recorre ao anjo, que o condena por corrupção.
como alguém que roubou do povo. Por fim, chegam à barca quatro cavaleiros que
O frade é o quinto a chegar cantarolando com lutaram e morreram defendendo o cristianismo. Estes
sua amante. Sente-se ofendido quando o diabo o con- são recebidos pelo anjo e perdoados imediatamente.

271
O bem e o mal

Todos os personagens que têm como destino o inferno chegam trazendo consigo objetos terrenos, representando
seu apego à vida; por isso, tentam voltar. Os personagens a quem se oferece o céu são cristãos e puros. O mundo
aqui ironizado é maniqueísta: o bem e o mal, o bom e o ruim são metades de um mundo moral simplificado. O Auto
da barca do inferno faz parte de uma trilogia (Autos da barca da glória, do inferno e do purgatório). Escrito em
versos de sete sílabas poéticas, possui apenas um ato, dividido em várias cenas. A linguagem entre os personagens
é coloquial – e é através das falas que podemos classificar a condição social de cada um dos personagens.
Leia um trecho:

[Vêm Quatro Cavaleiros cantando, os quais trazem cada um a Cruz de Cristo, pela qual Senhor e acrescentamento
de Sua santa fé católica morreram em poder dos mouros. Absoltos a culpa e pena per privilégio que os que assi
morrem têm dos mistérios da Paixão d’Aquele por Quem padecem, outorgados por todos os Presidentes Sumos
Pontífices da Madre Santa Igreja. E a cantiga que assi cantavam, quanto a palavra dela, é a seguinte:]
Cavaleiros: À barca, à barca segura, barca bem guarnecida, à barca, à barca da vida! Senhores que trabalhais pela
vida transitória, memória, por Deus, memória deste temeroso cais! À barca, à barca, mortais, Barca bem guarneci-
da, à barca, à barca da vida! Vigiai-vos, pecadores, que, depois da sepultura, neste rio está a ventura de prazeres
ou dolores! À barca, à barca, senhores, barca mui nobrecida, à barca, à barca da vida!
[E passando per diante da proa do batel dos danados assi cantando, com suas espadas e escudos, disse o Arrais
da perdição desta maneira:]
Diabo: Cavaleiros, vós passais e não perguntais onde vais?
1o CAVALEIRO: Vós, Satanás, presumis? Atentai com quem falais!
2o CAVALEIRO: Vós que nos demandais? Sequer conhece-nos bem: morremos nas Partes d’Além, e não queirais
saber mais.
DIABO: Entrai cá! Que cousa é essa? Eu não posso entender isto!
CAVALEIROS: Quem morre por Jesus Cristo não vai em tal barca como essa!
[Tornaram a prosseguir, cantando, seu caminho direito à barca da Glória, e, tanto que chegam, diz o Anjo:]
ANJO: Ó cavaleiros de Deus, a vós estou esperando, que morrestes pelejando por Cristo, Senhor dos Céus! Sois
livres de todo mal, mártires da Santa Igreja, que quem morre em tal peleja merece paz eternal.
[E assim embarcam.]

272
Classicismo

O Nascimento da Vênus, de Botticelli, Galeria degli Ufizzi, Florença.

Cronologia do Classicismo
Início (1527): chegada de Sá de Miranda à Portugal, com a Medida Nova.
Fim (1580): morte de Camões e união da península Ibérica.

Contexto
Nos séculos XV e XVI, a visão teocêntrica do mundo, que caracterizou a Idade Média, cede lugar ao antropocen-
trismo, ou seja, o Homem e a Ciência vão para o centro dos acontecimentos e do universo. O Renascimento marca
o apogeu dessa era, que se propõe a iluminar com a razão as trevas da civilização medieval.

Comércio

O fascínio pela vida nos meios urbanos fez com que a sociedade buscasse cada vez mais os prazeres que o dinheiro
podia propiciar. O comércio entre as nações da Europa cresceu e a burguesia mercantil não aceitava que a produ-
ção agrária estivesse voltada apenas para a subsistência e desejava buscar o comércio exterior entre as nações.

Renascimento

O Renascimento foi uma decorrência natural do Huma-


nismo. O seu significado nas artes é reflexo de transfor-
mações radicais sucedidas no Oriente, ao se emancipar
do velho sistema feudal. A certeza de que o ser huma-
no é uma força racional, capaz de dominar e de trans-
formar o Universo, levou o europeu a uma identificação
com a cultura clássica, que valorizava a vida terrena. O
mundo, as pessoas e a vida passaram a ser vistos sob
o prisma da razão.
Vista panoramica de Florença - palco do Renascimento
273
O palco
A Itália foi onde essa tendência renascentista apareceu com mais intensidade, sendo o palco deste retorno ao
mundo da Antiguidade Clássica, ou seja, fez renascer os ideais de valorização dos gregos e latinos, desde meados
do século XIII, dos esforços individuais, da perfeição, da superioridade humana e da razão como parâmetro de
observação e interpretação da realidade.

Pintura, escultura e arquitetura

Na pintura, um dos principais traços do Renascimento foi a noção de perspectiva e a tematização de elementos da
Antiguidade Clássica, bem como a humanização do tema sacro. A técnica era levada em conta acima de tudo, o
sombreado realçava a ideia de volume dos corpos. Também teve início a utilização da tela e a tinta a óleo.
Na escultura, o que mais chama a atenção é a busca pela representação ideal do homem, normalmente
retratado nu a fim de exaltar as formas humanas.
A arquitetura também teve influência dos traços clássicos, retratando a figura humana e o conceito de be-
leza dos templos construídos de maneira harmônica, normalmente coberta por uma cúpula.
Entre os artistas mais importantes da arte renascentista estão Leonardo da Vinci (1452-1519), Michelange-
lo (1475-1564) e Rafael Sanzio (1483-1520).

Monalisa, de Leonardo da Vinci. Pietà, de Michelangelo.


Museu do Louvre, Paris, França.

Literatura

O poeta Dante Alighieri, autor da Divina comédia, introduziu o verso decassílabo – chamado de “a medida nova”,
em contraponto à redondilha, considerada como “medida velha”. O poeta Francesco Petrarca, criador do soneto,
influenciou vários poetas europeus, entre o quais o inglês William Shakespeare e os portugueses Luís Vaz de Ca-
mões e Sá de Miranda.

274
Leia um soneto de Francesco Petrarca: O marco de seu início se dá em 1527, quando o
poeta Sá de Miranda retorna de sua incursão pela Itália
Se a minha vida do áspero tormento
renascentista e introduz em Portugal novas formas de
E tanto afã puder se defender,
Que por força da idade eu chegue a ver composição. Ele trouxe a postura amorosa, o soneto e,
Da luz do vosso olhar o embaciamento, principalmente, a forma fixa do verso decassílabo cha-
E o áureo cabelo se tornar de argento, mado de Medida Nova, o Dolce Stil Nuovo (o doce estilo
E os verdes véus e adornos desprender, novo) criado pelo escritor italiano Francesco Petrarca.
E o rosto, que eu adoro, empalecer,
Que em lamentar me faz medroso e lento,
Tendências fundamentais
E tanta audácia há de me dar o Amor,
Que vos direi dos martírios que guardo, §§ Criação e imitação
Dos anos, dias, horas o amargor. Retomado do princípio aristotélico da mimese,
Se o tempo é contra este querer em que ardo, ou seja, da reprodução os comportamentos hu-
Que não o seja tal que à minha dor manos por intermédio da arte.
Negue o socorro de um suspiro tardo.
§§ Racionalismo
O desenvolvimento de um raciocínio completo
Sá de Miranda
sobre os temas abordados, inclusive o amor. Na
Em Portugal, considera-se como marco inicial do Clas- poesia, essa tentativa de conciliar razão e emo-
sicismo o ano de 1527, data em que o poeta Sá de Mi- ção se apresentou por meio de uma figura de
randa regressou da Itália, de onde trouxe as inovações linguagem chamada “paradoxo”.
literárias do Renascimento italiano, introduzindo-as em §§ Humanismo e ideal de beleza
Portugal. O encerramento desse primeiro período clás- Recriação da natureza humana por meio de um
sico ocorre em 1580, ano da morte de Camões e do ideal de beleza, proporção, harmonia e simetria.
domínio espanhol sobre Portugal.
Além do Classicismo, há dois outros períodos §§ Universalismo
clássicos: o Barroco, momento em que Portugal é do- A busca por novos territórios, expansão marítima.
minado e governado pela Espanha, e o Arcadismo, O homem quer se colocar acima da natureza e,
que avança até a segunda década do século XIX. automaticamente, acima de Deus. O planeta Ter-
ra passa a ser um espaço de dominação humana.

Características do Classicismo
O Classicismo queria recuperar a “classe” dos autores
antigos a partir do cultivo dos valores greco-latinos,
inclusive da mitologia pagã, própria dos antigos. Isso
levou os poetas renascentistas a recorrer às entidades
mitológicas para pedir inspiração, simbolizar emoções,
exemplificar comportamentos. Pastores, deuses, deusas
e ninfas estão presentes nas obras de arte e na literatura
renascentista de forma natural, convivendo até mesmo
com tradições cristãs, herdadas da época medieval.
É hora de o ser humano se orgulhar de suas con-
quistas terrenas. O homem descobre que a Terra é redon-
da e passa ter um olhar universalista sobre a realidade.

275
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Vídeo Documentário português sobre a obra Os lusíadas

Fonte: Ensina RPT

Vídeo Documentário português sobre Camões

Fonte: Ensina RPT

276
LER

tt
Livros
Lírica – Luís de Camões – Massaud Moisés
Considerado o maior poeta lírico português de todos os tempos, sua
poesia lírica é marcada por uma dualidade: ora revela textos de nítida
herança tradicional portuguesa, ora sua poesia se enquadra na medida
nova renascentista.

Os lusíadas – Edição Comentada por Otoniel Mota


Os Lusíadas é uma obra poética do escritor Luís Vaz de Camões, conside-
rada a epopeia portuguesa por excelência.

Dicionário de Luís de Camões – Vítor Aguiar e Silva


O Dicionário de Luís de Camões, obra concebida sob a coordenação do
prof. Vítor Aguiar e Silva, constitui um vasto e rico Thesaurus da camonís-
tica contemporânea.

277
INTERDISCIPLINARIDADE
Artes plásticas

Obras renascentistas

Sepultamento de Cristo de Michelangelo, 1507 Madonna, de Rafael, circa 1505-1506

Episódio - Inês de Castro

Morte de Inês ou Drama de Inês de Castro, de Columbano Bordalo Pinheiro, século XIX

278
Estrura Conceitual
Idade Média Idade Moderna

Trovadorismo Humanismo Classicismo Barroco

destaque: Processo de enriquecimento


- Gil Vicente da burguesia

Maior contato com obras


produzidas na antiguidade

279
E.O. Aprendizagem 3. Gil Vicente escreveu o Auto da Barca do In-
ferno em 1517, no momento em que eclodia
na Alemanha a Reforma Protestante, com a
1. As diferenças etárias são, muitas vezes, causa crítica veemente de Lutero ao mau clero do-
de violência simbólica. Considerando isso, as- minante na Igreja. Nesta obra, há a figura do
sinale os versos em que as frases expressam, frade, severamente censurado como um sa-
de forma explícita, o tema básico de O Velho da cerdote negligente. Indique a alternativa cujo
Horta, fundamentado neste tipo de violência. conteúdo NÃO se presta a caracterizar, na re-
ferida peça, os erros cometidos pelo religioso.
a) Branca Gil: Todos os santos marteirados
a) Não cumprir os votos de celibato, mantendo
Socorrei ao marteirado a concubina Florença.
Que morre de namorado. b) Entregar-se a práticas mundanas, como a dança.
b) Moça: E essa tosse? c) Praticar esgrima e usar armamentos de guer-
Amores de sobreposse ra, proibidos aos clérigos.
Serão os de vossa idade: d) Transformar a religião em manifestação for-
mal, ao automatizar os ritos litúrgicos.
O tempo vos tirou a posse.
e) Praticar a avareza como cúmplice do fidalgo,
c) Branca Gil: Eu folgo ora de ver e a exploração da prostituição em parceria
Vossa mercê namorado; com a alcoviteira.
Que o homem bem criado
Té na morte o há de ser. 4. O teatro de Gil Vicente caracteriza-se por ser
d) Velho: Porém, amiga, fundamentalmente popular. E essa caracte-
Se nesta minha fadiga rística manifesta-se, particularmente, em
Vós não sois medianeira, sua linguagem poética, como ocorre no tre-
cho a seguir, de o Auto da Barca do Inferno.
Não sei que maneira siga, Ó Cavaleiros de Deus,
Nem que faça, nem que diga, A vós estou esperando,
Nem que queira. Que morrestes pelejando
e) Parvo: Dono, dizia minha dona, Por Cristo, Senhor dos Céus!
Que fazeis vós cá te a noite? Sois livres de todo o mal,
Mártires da Madre Igreja,
2. Gil Vicente, criador do teatro português, Que quem morre em tal peleja
realizou uma obra eminentemente popular. Merece paz eternal.
Seu Auto da Barca do Inferno, encenado em No texto, fala final do Anjo, temos no con-
1517, apresenta, entre outras característi- junto dos versos:
cas, a de pertencer ao teatro religioso alegó- a) variação de ritmo e quebra de rimas.
rico. Tal classificação justifica-se por: b) ausência de ritmo e igualdade de rimas.
c) alternância de redondilha maior e menor e
simetria de rimas.
d) redondilha menor e rimas opostas e emparelhadas.
e) igualdade de métrica e de esquemas das pa-
lavras que rimam.

5. Considerando a peça Auto da Barca do In-


ferno como um todo, indique a alterna-
tiva que melhor se adapta à proposta do
teatro vicentino.
a) Preso aos valores cristãos, Gil Vicente tem
como objetivo alcançar a consciência do
homem, lembrando-lhe que tem uma alma
para salvar.
b) As figuras do Anjo e do Diabo, apesar de ale-
a) ser um teatro de louvor e litúrgico em que o
góricas, não estabelecem a divisão manique-
sagrado é plenamente respeitado.
ísta do mundo entre o Bem e o Mal.
b) não se identificar com a postura anticleri- c) As personagens comparecem nesta peça de
cal, já que considera a Igreja uma instituição Gil Vicente com o perfil que apresentavam
modelar e virtuosa. na terra, porém apenas o Onzeneiro e o Par-
c) apresentar estrutura baseada no maniqueísmo vo portam os instrumentos de sua culpa.
cristão, que divide o mundo entre o Bem e o Mal, d) Gil Vicente traça um quadro crítico da so-
e na correlação entre a recompensa e o castigo. ciedade portuguesa da época, porém poupa,
d) apresentar temas profanos e sagrados e reve- por questões ideológicas e políticas, a Igreja
lar-se radicalmente contra o catolicismo e a e a Nobreza.
instituição religiosa. e) Entre as características próprias da dramaturgia
e) aceitar a hipocrisia do clero e, criticamente, de Gil Vicente, destaca-se o fato de ele seguir ri-
justificá-la em nome da fé cristã. gorosamente as normas do teatro clássico.

280
6. O argumento da peça Farsa de Inês Pereira, de Gil a) V, V, V, F.
Vicente, consiste na demonstração do refrão popu- b) V, F, V, V.
lar “Mais quero asno que me carregue que cavalo c) F, V, V, F.
que me derrube”. Identifique a alternativa que NÃO d) V, V, F, F.
corresponde ao provérbio, na construção da farsa: e) V, F, F, V.
a) A segunda parte do provérbio ilustra a experiên-
cia desastrosa do primeiro casamento.
b) O escudeiro Brás da Mata corresponde ao ca- valo, 9. Diabo, Companheiro do Diabo, Anjo, Fidalgo,
animal nobre, que a derruba. Onzeneiro, Parvo, Sapateiro, Frade, Florença,
c) O segundo casamento exemplifica o primeiro ter- Brísida Vaz, Judeu, Corregedor, Procurador,
mo, asno que a carrega. Enforcado e Quatro Cavaleiros são personagens
d) O asno corresponde a Pero Marques, primeiro pre- de Auto da barca do inferno, de Gil Vicente.
tendente e segundo marido de Inês. Analise as informações a seguir e selecione a
e) Cavalo e asno identificam a mesma personagem alternativa incorreta, cujas características não
em diferentes momentos de sua vida conjugal. descrevam adequadamente a personagem:
a) Onzeneiro idolatra o dinheiro, é agiota e
7. Em relação ao Auto da Barca do Inferno de Gil usurádo; de tudo que juntara, nada leva para
Vicente, considere as seguintes afirmações. a morte, ou melhor, leva a bolsa vazia.
I. Trata-se de um grande painel que satiriza b) Frade representa o clero decadente e é sub-
a sociedade portuguesa de seu tempo. jugado por suas fraquezas: mulher e esporte;
II. Representa a transição da Idade Média leva a amante e as armas de esgrima.
para o Renascimento, guardando traços c) Diabo, capitão da barca do inferno, é quem
dos dois períodos. apressa o embarque dos condenados; é dissi-
III. Sugere que o Diabo, ao julgar justos e pe- mulado e irônico.
cadores, tem poderes maiores que Deus. d) Anjo, capitão da barca do céu, é quem elogia
Quais estão corretas? a morte pela fé; é austero e inflexível.
a) Apenas I. e) Corregedor representa a justiça e luta pela
b) Apenas I e II. aplicação íntegra e exata das leis; leva pa-
c) Apenas I e III.
péis e processos.
d) Apenas II e III.
e) I, II e III.
10. Em meados do século XIV, a poesia trovado-
8. (IFSP) Considere o trecho para responder à ques- resca entra em decadência, surgindo, em seu
tão. lugar, uma nova forma de poesia, totalmente
No final do século XV, a Europa passava por gran- distanciada da música, apresentando ama-
des mudanças provocadas por invenções como a durecimento técnico, com novos recursos es-
bússola, pela expansão marítima que incremen- tilísticos e novas formas poemáticas, como a
tou a indústria naval e o desenvolvimento do co- trova, a esparsa e o vilancete.
mércio com a substituição da economia de sub- Assinale a alternativa em que há um trecho
sistência, levando a agricultura a se tornar mais representativo de tal tendência.
intensiva e regular. Deu-se o crescimento urbano, a) Non chegou, madre, o meu amigo,
especialmente das cidades portuárias, o floresci- e oje est o prazo saido!
mento de pequenas indústrias e todas as demais Ai, madre, moiro d’amor!
mudanças econômicas do mercantilismo, inclusi- b) Êstes olhos nunca perderán,
ve o surgimento da burguesia. senhor, gran coita, mentr’eu vivo fôr;
Tomando-se por base o contexto histórico da épo- e direi-vos fremosa, mia senhor,
ca e os conhecimentos a respeito do Humanismo, dêstes meus olhos a coita que han:
marque (V) para verdadeiro ou (F) para falso e choran e cegan, quand’alguém non veen,
assinale a alternativa correta. e ora cegan por alguen que veen.
( ) O Humanismo é o nome que se dá à produção c) Meu amor, tanto vos amo,
escrita e literária do final da Idade Média e que meu desejo não ousa
início da moderna, ou seja, parte do século XV desejar nehua cousa.
e início do XVI. Porque, se a desejasse,
( ) Fernão Lopes é um importante prosador do logo a esperaria,e se eu a esperasse,
Humanismo português. Destacam-se entre sei que vós anojaria:
suas obras: Crônica Del-Rei D. Pedro I, Crônica mil vezes a morte chamo
Del-Rei Fernando e Crônica de El-Rei D. João. e meu desejo não ousa
( ) Gil Vicente é um importante autor do teatro desejar-me outra cousa.
português e suas principais obras são: Auto da d) Amigos, non poss’eu negar
Barca do Inferno e Farsa de Inês Pereira. a gran coita que d’amor hei,
( ) Gil Vicente é um autor não reconhecido ca me vejo sandeu andar,
em Portugal, em virtude de sua prosa e e con sandece o direi:
documentação histórica não participarem os olhos verdes que eu vi
da cultura portuguesa. me fazen ora andar assi.

281
e) Ai! dona fea, foste-vos queixar b) A proposta do teatro vicentino alegórico –
por (que) vos nunca louv’em meu cantar; especialmente a Trilogia das Barcas – era a
mais ora quero fazer um cantar, montagem de peças complexas, de lingua-
em que vos loarei toda via; gem rebuscada, distante do falar popular,
e vedes como vos quero loar. para criticar, nos termos da moral medie-
dona fea, velha e sandia! val, os homens do povo.
c) A imagem cômica, mas condenável, de um
frade que canta, dança e namora, trazen-
E.O. Fixação do consigo uma dama, é exemplo cabal do
pressuposto das peças de Gil Vicente de
que, rindo, é possível corrigir os costumes.
1. (IFSP) Leia o texto abaixo, um trecho do d) O frade terá como destino o inferno porque é
Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente, homem “mundanal”, ligado aos gozos do mun-
para assinalar a alternativa correta no que do material, em cujo pano de fundo percebe-
se refere à obra desse autor e ao Humanis- -se o sistema de valores do homem medieval,
mo em Portugal. para o qual não há salvação após a morte.
Nota: foram feitas pequenas alterações no e) O sistema de valores que pode ser entrevis-
trecho para facilitar a leitura. to nas peças de Gil Vicente, e especialmen-
Vem um Frade com uma Moça pela mão, e um te no Auto da Barca do Inferno, revela uma
1
broquel e uma espada na outra, e um casco mentalidade avessa aos valores da Idade
debaixo do 2capelo; e, ele mesmo fazendo a Média.
baixa, começou de dançar, dizendo:
2. Em relação a Gil Vicente, é incorreto dizer que:
Tai-rai-rai-ra-rã; ta-ri-ri-rã;
FRADE ta-rai-rai-rai-rã; tai-ri-ri-rã: tã-tã; a) recebeu, no início de sua intensa atividade
ta-ri-rim-rim-rã. Huhá! literária, influência de Juan del Encina.
DIABO Que é isso, padre?! Que vai lá? b) sua primeira produção teatral foi “Auto dos
Reis Magos”.
FRADE Deo gratias! Sou cortesão.
c) suas obras se caracterizaram, antes de tudo,
DIABO Sabes também o tordião?
por serem primitivas e populares.
FRADE Por que não? Como ora sei!
d) suas obras surgiram para entretenimento
Pois entrai! Eu tangerei nos ambientes da corte portuguesa.
DIABO e faremos um serão.
Essa dama é ela vossa? e) seu teatro caracterizou-se por observações
satíricas às camadas sociais da época.
Por minha a tenho eu,
FRADE
e sempre a tive de meu
Fizestes bem, que é formosa! 3. (Uepa) Analise os trechos abaixo, retirados
DIABO E não vos punham lá grosa da peça Pranto de Maria Parda, de Gil Vicen-
no vosso convento santo? te, e assinale aquele que comunica ao leitor
FRADE E eles fazem outro tanto! uma visão preconceituosa de caráter racial.
Que cousa tão preciosa... a) Eu só quero prantear
DIABO
Entrai, padre reverendo! este mal que a muitos toca;
FRADE Para onde levais gente? que estou já como minhoca
Pera aquele fogo ardente que puseram a secar.
DIABO
que não temestes vivendo. b) Ó bebedores irmãos
Juro a Deus que não te entendo! que nos presta ser cristãos,
FRADE
E este hábito não me vale?
pois nos Deus tirou o vinho?
Gentil padre mundanal,
DIABO c) Martim Alho, amigo meu,
a Belzebu vos encomendo!
Martim Alho, meu amigo,
1
broquel e casco – respectivamente, escudo tão seco trago o umbigo
e armadura para cabeça – são elementos por como nariz de Judeu.
meio dos quais o autor descreve o frade. d) Ó Rua da Mouraria,
2
capelo – chapéu ou capuz usado pelos re- quem vos fez matar a sede
ligiosos.
pela lei de Mafamede
3
pôr grosa – censurar.
com a triste da água fria?
a) O destino do frade é exemplar no que se
e) Devoto João Cavaleiro
refere à principal característica da obra de
Gil Vicente: a crítica severa, de sabor re- que pareceis Isaías,
nascentista, à Igreja Católica, de cuja mo- dai-me de beber três dias,
ral se distancia a obra do dramaturgo. e far-vos-ei meu herdeiro.

282
4. Inspirando-se na Antiguidade Clássica (Grécia- 8. O culto aos valores universais – o Belo, o
-Roma), o Renascimento valorizava o homem, Bem, a Verdade e a Perfeição – e a preocupa-
refletindo mesmo uma visão antropocêntrica do ção com a forma aproximaram o Classicismo
mundo. Esse movimento teve origem: de duas escolas literárias posteriores. Apon-
a) na França. te a alternativa que identifica essas escolas:
b) na Alemanha. a) Barroco e Simbolismo.
b) Arcadismo e Parnasianismo.
c) na Espanha.
c) Romantismo e Modernismo.
d) em Portugal. d) Trovadorismo e Humanismo.
e) na Itália. e) Realismo e Naturalismo.

5. Nós outros pintores queremos pelos movi- 9. Não se relaciona à medida nova:
mentos do corpo mostrar os movimentos da a) versos decassílabos.
alma (...) Convém, portanto que os pintores b) influência italiana.
tenham um conhecimento perfeito dos movi- c) predileção por formas fixas.
d) sonetos, tercetos, oitavas e odes.
mentos do corpo e os aprendam da natureza
e) cultura popular, tradicional.
para imitar, por mais difícil que seja os múl-
tiplos movimentos da alma. 1
0. São características das obras do Classicismo:
ALBERTI, L. B. Della Pintura, livro II; 1453. a) o individualismo, a subjetividade, a idealiza-
In: TENENTI, Alberto. Florença na época dos ção, o sentimento exacerbado.
Médici. São Paulo: Perspectiva, 1973.
b) o egocentrismo, a interação da natureza com
o eu, as formas perfeitas.
Este fragmento de texto referente à arte re-
c) o contraste entre o grotesco e o sublime, a
nascentista ajuda a explicar:
valorização da natureza, o escapismo.
a) a influência do pensamento religioso na pin- d) a observação da realidade, a valorização do
tura renascentista que objetivava a manu- eu, a perfeição da natureza.
tenção do teocentrismo. e) a retomada da mitologia pagã, a pureza das
b) a desvinculação entre arte e religião a partir formas, a busca da perfeição estética.
da negação da existência da alma.
c) a aliança entre arte e religião na medida em E.O. Complementar
que a arte representaria a concretização dos
conceitos religiosos. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
d) a proibição da igreja de que os pintores re-
Tanto de meu estado me acho incerto
presentassem o ser humano.
que em vivo ardor tremendo estou de frio;
e) a necessidade do estudo da anatomia para a sem causa, juntamente choro e rio;
produção de obras cada vez mais perfeitas. o mundo todo abarco e nada aperto. [...]
Se me pergunta alguém por que assim ando,
6. Identifique a alternativa que não contenha respondo que não sei; porém suspeito
ideais clássicos de arte. que só porque vos vi, minha Senhora.
a) Universalismo e racionalismo. (Camões)
b) Formalismo e perfeccionismo. 1. Assinale a alternativa correta acerca do texto.
c) Obediência às regras e modelos e contenção a) O fragmento exemplifica traço estilístico ca-
do lirismo. racterístico da estética barroca que, de certa
d) Liberdade de criação e predomínio dos im- forma, já está latente na lírica camoniana: a
linguagem marcada por paradoxos.
pulsos pessoais.
b) Nesses versos, o poeta, embora renascentis-
e) Valorização do homem (do aventureiro, do ta, afasta-se dos cânones estéticos da época,
soldado, do sábio e do amante) e verossimi- como, por exemplo, o ideal de beleza artísti-
lhança (imitação da verdade e da natureza). ca associado à harmonia da composição.
c) Observa-se, nas estrofes, a retomada de al-
guns expedientes retóricos típicos da Idade
7. O Classicismo propriamente dito, tem por li-
Média, como, por exemplo, o confessionalis-
mites cronológicos, em Portugal, as datas de: mo amoroso em linguagem ostensivamente
a) 1500 e 1601. emotiva.
b) 1434 e 1516. d) O texto é exemplo eloquente de que Camões
inovou a lírica portuguesa ao tematizar o
c) 1502 e 1578.
platonismo amoroso, caracterizado pela
d) 1527 e 1580. “coita de amor” e ausência de contato direto
e) 1198 e 1434. entre amante e amada.

283
e) Nos versos, confirma-se a tese de que, na Ó gente temerosa, não te espantes,
obra camoniana, o amor é concebido como Que este dia deitou ao Mundo a vida
graça divina, apesar de ser representado Mais desgraçada que jamais se viu!
como uma intensa experiência erótica. CAMÕES, Luis Vaz de. 200 sonetos. Porto Alegre: L&PM, 1998.

2. (Insper) 3. (Ufjf-pism) No poema de Camões a visão de


Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, mundo expressa pelo eu lírico está baseada
muda-se o ser, muda-se a confiança; na ideia de:
todo o mundo é composto de mudança, a) alegria de viver.
tomando sempre novas qualidades. b) valorização da natureza.
c) sentimento órfico.
Continuamente vemos novidades,
diferentes em tudo da esperança; d) manifestação divina.
do mal ficam as mágoas na lembrança, e) desconcerto do mundo.
e do bem (se algum houve), as saudades.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
O tempo cobre o chão de verde manto,
que já coberto foi de neve fria, e, enfim, Reinando Amor em dois peitos,
converte em choro o doce canto. tece tantas falsidades,
que, de conformes vontades,
E, afora este mudar-se cada dia,
outra mudança faz de mor espanto, faz desconformes efeitos.
que não se muda já como soía*. Igualmente vive em nós;
(Luís Vaz de Camões) mas, por desconcerto seu,
vos leva, se venho eu,
*soía: imperfeito do indicativo do verbo
me leva, se vindes vós.
soer, que significa costumar, ser de costume
(Camões)
Assinale a alternativa em que se analisa cor-
retamente o sentido dos versos de Camões. 5. Assinale a alternativa CORRETA acerca do texto.
a) O foco temático do soneto está relacionado a) Exemplifica o padrão poético do Classicismo
à instabilidade do ser humano, eternamente renascentista, na medida em que tematiza o
insatisfeito com as suas condições de vida e amor, utilizando-se da chamada “medida nova”.
com a inevitabilidade da morte. b) Embora apresente versos redondilhos, de
b) Pode-se inferir, a partir da leitura dos dois tradição medieval, a linguagem dos versos
tercetos, que, com o passar do tempo, a re- revela contenção emotiva, traço estilístico
cusa da instabilidade se torna maior, graças valorizado na Renascença.
à sabedoria e à experiência adquiridas. c) Revela influência das cantigas medievais,
c) Ao tratar de mudanças e da passagem do pela sonoridade das rimas e linguagem emo-
tempo, o soneto expressa a ideia de circu- tiva própria da “coita de amor”.
laridade, já que ele se baseia no postulado d) É um texto do Humanismo, pois traz uma re-
da imutabilidade. flexão filosófica sobre o sentimento amoro-
d) Na segunda estrofe, o eu lírico vê com pessi- so, afastando-se, assim, da influência greco-
mismo as mudanças que se operam no mun- -romana.
do, porque constata que elas são geradoras e) Antecipa o estilo barroco do século XVII
de um mal cuja dor não pode ser superada. devido à sua linguagem prolixa, em que se
e) As duas últimas estrofes autorizam concluir notam ousadas inversões sintáticas e metá-
que a ideia de que nada é permanente não foras obscuras.
passa de uma ilusão.

TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:


O dia em que nasci moura e pereça
O dia em que nasci moura e pereça,
Não o queira jamais o tempo dar;
Não torne mais ao Mundo, e, se tornar,
Eclipse nesse passo o Sol padeça.
A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça,
Mostre o Mundo sinais de se acabar,
Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,
A mãe ao próprio filho não conheça.
As pessoas pasmadas, de ignorantes,
As lágrimas no rosto, a cor perdida,
Cuidem que o mundo já se destruiu.

284
E.O. Dissertativo TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO

Os bons vi sempre passar


TEXTO PARA AS PRÓXIMAS DUAS QUESTÕES No Mundo graves tormentos;
E pera mais me espantar
Tanto de meu estado me acho incerto, Os maus vi sempre nadar
Que em vivo ardor tremendo estou de frio; Em mar de contentamentos.
Sem causa, justamente choro e rio, Cuidando alcançar assim
O mundo todo abarco e nada aperto. O bem tão mal ordenado,
É tudo quanto sinto, um desconcerto; Fui mau, mas fui castigado,
Da alma um fogo me sai, da vista um rio; Assim que só pera mim
Agora espero, agora desconfio, Anda o Mundo concertado.
Agora desvario, agora acerto. Luís de Camões: Ao desconcerto do Mundo. In: Obra
Completa. Rio de Janeiro: Aguilar Editora, 1963, p. 475-6.
Estando em terra, chego ao Céu voando;
Numa hora acho mil anos, e é jeito
Que em mil anos não posso achar uma hora. 4. (Ufscar) Este curto poema de Camões com-
Se me pergunta alguém por que assim ando, põe-se de partes correspondentes ao desta-
Respondo que não sei; porém suspeito que dado às personagens (o eu poemático e
Que só porque vos vi, minha Senhora. os outros). Quanto ao significado, o poema
(Luís Vaz de Camões)
baseia-se em antíteses desdobradas, de tal
maneira trançadas que parecem refletir o
1. Identifique no texto características formais “desconcerto do mundo”. Posto isso,
que permitem incluí-lo no Classicismo. a) Identifique a antítese básica do poema e
mostre os seus desdobramentos.
2. Camões utiliza-se, neste soneto, do verso de-
b) Explique a composição do texto com base
cassílabo. Suponha que alguém lhe provasse
nas rimas.
tal fato com a seguinte escansão:

Es/ tan/ do/ em/ te/ rra, 5. (IFSP) Quem foram os Mecenas no Renas-
1 2 3456 cimento Cultural?
che/ go ao/céu/ voan/ do
7 8 9 10

Você concordaria ou não? Por quê? 6. (Ufscar) Observe a figura e responda.

TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO

Soneto 168

O tempo acaba o ano, o mês e a hora,


A força, a arte, a manha, a fortaleza;
O tempo acaba a fama e a riqueza,
O tempo o mesmo tempo de si chora;

O tempo busca e acaba o onde mora


Qualquer ingratidão, qualquer dureza;
Mas não pode acabar minha tristeza,
Enquanto não quiserdes vós, Senhora.

O tempo o claro dia torna escuro


E o mais ledo prazer em choro triste;
O tempo, a tempestade em grão bonança.

Mas de abrandar o tempo estou seguro


O peito de diamante, onde consiste
A pena e o prazer desta esperança.
O Homem Vitruviano,
CAMÕES, Luís de. Obra completa. Rio de
Leonardo da Vinci (1452-1519).
Janeiro: Nova Aguilar, 2003, p. 545.

a) A qual concepção artística pertence?


3. (UFJF) Explique em que consiste a “esperan- b) Quais as ideias da época que podem ser
ça” do eu lírico, mencionada no último verso identificadas nesse desenho?
do “Soneto 168”, de Camões.

285
E.O. Enem E.O. Objetivas
1. (Enem) LXXVIII (Camões, 1525?-1580) (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
Leda serenidade deleitosa, 1. (Fuvest) Considere as seguintes afirmações so-
Que representa em terra um paraíso;
bre o Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente:
Entre rubis e perlas doce riso;
I. O auto atinge seu clímax na cena do Fi-
Debaixo de ouro e neve cor-de-rosa;
dalgo, personagem que reúne em si os
Presença moderada e graciosa, vícios das diferentes categorias sociais
Onde ensinando estão despejo e siso anteriormente representadas.
Que se pode por arte e por aviso, II. A descontinuidade das cenas é coerente
Como por natureza, ser fermosa; com o caráter didático do auto, pois faci-
lita o distanciamento do espectador.
Fala de quem a morte e a vida pende,
III. A caricatura dos tipos sociais presentes
Rara, suave; enfim, Senhora, vossa;
no auto não é gratuita nem artificial, mas
Repouso nela alegre e comedido:
resulta da acentuação de traços típicos.
Estas as armas são com que me rende Está correto apenas o que se afirma em:
E me cativa Amor; mas não que possa a) I.
Despojar-me da glória de rendido. b) II.
CAMÕES, L. Obra completa. c) II e III.
Rio de janeiro: Nova Aguilar, 2008. d) I e II.
e) I e III.

2. (Fuvest) Indique a afirmação correta sobre o


Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente:
a) É intrincada a estruturação de suas cenas,
que surpreendem o público com o inespera-
do de cada situação.
b) O moralismo vicentino localiza os vícios não
nas instituições, mas nos indivíduos que as
fazem viciosas.
c) É complexa a crítica aos costumes da época,
já que o autor é o primeiro a relativizar a
distinção entre o Bem e o Mal.
d) A ênfase desta sátira recai sobre as persona-
SANZIO, R. (1483-1520) A mulher com o unicórnio. gens populares, as mais ridicularizadas e as
Roma, Galleria Borghese. Disponível em: <www.
arquipelagos.pt>. Acesso em: 29 fev. 2012. mais severamente punidas.
e) A sátira é aqui demolidora e indiscriminada,
A pintura e o poema, embora sendo produ- não fazendo referência a qualquer exemplo
tos de duas linguagens artísticas diferentes, de valor positivo.
participaram do mesmo contexto social e
cultural de produção pelo fato de ambos: 3. (Fuvest) Caracteriza o teatro de Gil Vicente:
a) apresentarem um retrato realista, eviden- a) A revolta contra o cristianismo.
ciado pelo unicórnio presente na pintura e b) A obra escrita em prosa.
pelos adjetivos usados no poema. c) A elaboração requintada dos quadros e cená-
b) valorizarem o excesso de enfeites na apresen- rios apresentados.
tação pessoa e na variação de atitudes da mu- d) A preocupação com o homem e com a religião.
lher, evidenciadas pelos adjetivos do poema. e) A busca de conceitos universais.
c) apresentarem um retrato ideal de mulher mar-
cado pela sobriedade e o equilíbrio, eviden- TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
ciados pela postura, expressão e vestimenta Para responder à(s) questão(ões) a seguir,
da moça e os adjetivos usados no poema. leia o excerto de Auto da Barca do Inferno
d) desprezarem o conceito medieval da idea- do escritor português Gil Vicente (1465?-
lização da mulher como base da produção 1536?). A peça prefigura o destino das al-
artística, evidenciado pelos adjetivos usados mas que chegam a um braço de mar onde se
no poema. encontram duas barcas (embarcações): uma
e) apresentarem um retrato ideal de mulher destinada ao Paraíso, comandada pelo anjo,
marcado pela emotividade e o conflito inte- e outra destinada ao Inferno, comandada
rior, evidenciados pela expressão da moça e pelo diabo.
pelos adjetivos do poema.

286
Vem um Frade com uma Moça pela mão 8
mundanal: mundano.
[…]; e ele mesmo fazendo a 1baixa come- 9
detença: demora.
çou a dançar, dizendo 10
avença: acordo.
Frade: Tai-rai-rai-ra-rã ta-ri-ri-rã;
11
ser pingado: ser pingado com gotas de gor-
Tai-rai-rai-ra-rã ta-ri-ri-rã; dura fervendo (segundo o imaginário popular,
Tã-tã-ta-ri-rim-rim-rã, huha! processo de tortura que ocorreria no inferno).
DIABO: Que é isso, padre? Quem vai lá?
FRADE: 2Deo gratias! Sou cortesão. 4. (Unesp) No excerto, o escritor satiriza, sobretudo,
DIABO: Danças também o 3tordião? a) a compra do perdão para os pecados cometidos.
FRADE: Por que não? Vê como sei. b) preocupação do clero com a riqueza material.
DIABO: Pois entrai, eu 4tangerei c) o desmantelamento da hierarquia eclesiástica.
e faremos um serão. d) a concessão do perdão a almas pecadoras.
E essa dama, porventura? e) o relaxamento dos costumes do clero.
FRADE: Por minha a tenho eu,
e sempre a tive de meu. 5. (Unesp) Assinale a alternativa cuja máxi-
DIABO: Fizeste bem, que é lindura! ma está em conformidade com o excerto e
Não vos punham lá censura com a proposta do teatro de Gil Vicente.
no vosso convento santo? a) “O riso é abundante na boca dos tolos.”
Frade: E eles fazem outro tanto! b) “A religião é o ópio do povo.”
DIABO: Que preciosa 5clausura! c) “Pelo riso, corrigem-se os costumes.”
Entrai, padre reverendo! d) “De boas intenções, o inferno está cheio.”
FRADE: Para onde levais gente? e) “O homem é o único animal que ri dos ou-
DIABO: Para aquele fogo ardente tros.”
que não temestes vivendo.
FRADE: Juro a Deus que não te entendo!
E este 6hábito não me 7val? E.O. Dissertativas
DIABO: Gentil padre 8mundanal,
a Belzebu vos encomendo! (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
FRADE: Corpo de Deus consagrado!
Pela fé de Jesus Cristo, 1. (Unicamp) Os excertos abaixo foram extraídos
que eu não posso entender isto! do Auto da barca do inferno, de Gil Vicente.
Eu hei de ser condenado? (...) FIDALGO: Que leixo na outra vida
Um padre tão namorado quem reze sempre por mi.
e tanto dado à virtude? DIABO: (...) E tu viveste a teu prazer,
Assim Deus me dê saúde, cuidando cá guarecer
que eu estou maravilhado! por que rezem lá por ti!(...)
DIABO: Não façamos mais 9detença ANJO: Que querês?
embarcai e partiremos; FIDALGO: Que me digais,
tomareis um par de remos. pois parti tão sem aviso,
FRADE: Não ficou isso na 10avença. se a barca do paraíso
DIABO: Pois dada está já a sentença! é esta em que navegais.
FRADE: Por Deus! Essa seria ela? ANJO: Esta é; que me demandais?
Não vai em tal caravela FIDALGO: Que me deixes embarcar.
minha senhora Florença? sô fidalgo de solar,
Como? Por ser namorado é bem que me recolhais.
e folgar c’uma mulher? ANJO: Não se embarca tirania
Se há um frade de perder, neste batel divinal.
com tanto salmo rezado?! FIDALGO: Não sei por que haveis por mal
DIABO: Ora estás bem arranjado! Que entr’a minha senhoria.
FRADE: Mas estás tu bem servido. ANJO: Pera vossa fantesia
DIABO: Devoto padre e marido, mui estreita é esta barca.
haveis de ser cá 11pingado… FIDALGO: Pera senhor de tal marca
nom há aqui mais cortesia? (...)
(Auto da Barca do Inferno, 2007.)
ANJO: Não vindes vós de maneira
1
baixa: dança popular no século XVI. pera ir neste navio.
2
Deo gratias: graças a Deus. Essoutro vai mais vazio:
3
tordião: outra dança popular no século XVI. a cadeira entrará
4
tanger: fazer soar um instrumento. e o rabo caberá
5
clausura: convento. e todo vosso senhorio.
6
hábito: traje religioso. Vós irês mais espaçoso
7
val: vale. com fumosa senhoria,

287
cuidando na tirania 3. (Fuvest) E chegando à barca da glória, diz ao
do pobre povo queixoso; Anjo:
e porque, de generoso, BRÍSIDA: Barqueiro, mano, meus olhos, pran-
desprezastes os pequenos, cha a Brísida Vaz!
achar-vos-eis tanto menos ANJO: Eu não sei quem te cá traz...
quanto mais fostes fumoso. (…) BRÍSIDA: Peço-vo-lo de giolhos!
SAPATEIRO: (...) E pera onde é a viagem? Cuidais que trago piolhos,
DIABO: Pera o lago dos danados. anjo de Deus, minha rosa?
SAPATEIRO: Os que morrem confessados, Eu sou Brísida, a preciosa,
onde têm sua passagem? que dava as môças aos molhos.
DIABO: Nom cures de mais linguagem! A que criava as meninas
Esta é a tua barca, esta! para os cônegos da Sé...
(...) E tu morreste excomungado: Passai-me, por vossa fé,
não o quiseste dizer. meu amor, minhas boninas,
Esperavas de viver, olhos de perlinhas finas! (...)
VICENTE, Gil. Auto da barca do inferno.
calaste dous mil enganos...
tu roubaste bem trint’anos a) No excerto, a maneira de tratar o Anjo, em-
o povo com teu mester. (...) pregada por Brísida Vaz, relaciona-se à ati-
SAPATEIRO: Pois digo-te que não quero! vidade que ela exercera em vida? Explique
DIABO: Que te pês, hás-de ir, si, si! resumidamente.
SAPATEIRO: Quantas missas eu ouvi, b) No excerto, o tratamento que Brísida Vaz dis-
não me hão elas de prestar? pensa ao Anjo é adequado à obtenção do que
DIABO: Ouvir missa, então roubar, ela deseja – isto é, levar o Anjo a permitir que
é caminho per’aqui. ela embarque? Por quê?
VICENTE, Gil. Auto da barca do inferno.
In: BERARDINELLI, Cleonice (Org.). Antologia do teatro de Gil Vicente. 4. (Unicamp) Leia agora as seguintes estrofes,
Rio de Janeiro: Nova Fronteira; Brasília: INL, 1984, p. 57-59 e 68-69. que se encontram em passagens diversas de a
a) Por que razão específica o fidalgo é condenado Farsa de Inês Pereira, de Gil Vicente:
a seguir na barca do inferno? E o sapateiro? INÊS: Andar! Pero Marques seja!
b) Além das faltas específicas desses persona- Quero tomar por esposo
gens, há uma outra, comum a ambos e bastan- quem se tenha por ditoso
te praticada à época, que Gil Vicente condena. de cada vez que me veja.
Identifique essa falta e indique de que modo Por usar de siso mero,
ela aparece em cada um dos personagens. asno que leve quero,
e não cavalo folão;
antes lebre que leão,
2. (Unicamp) Leia o diálogo a seguir, de Auto antes lavrador que Nero.
da Barca do Inferno. PERO: I onde quiserdes ir
DIABO: Cavaleiros, vós passais vinde quando quiserdes vir,
e não perguntais onde is? estai quando quiserdes estar.
CAVALEIRO: Vós, Satanás, presumis? Com que podeis vós folgar
Atentai com quem falais! que eu não deva consentir?
OUTRO CAVALEIRO: Vós que nos demandais? (Nota: folão, no caso, significa “bravo”, “fogoso”)
Siquer conhecê-nos bem.
Morremos nas partes d’além, a) A fala de Inês ocorre no momento em que
e não queirais saber mais. aceita casar-se com Pero Marques, após o ma-
logrado matrimônio com o escudeiro. Há um
VICENTE, Gil. Auto da Barca do Inferno.
trecho nessa fala que se relaciona literalmen-
In: BERARDINELLI, Cleonice. (Org.). Antologia
do Teatro de Gil Vicente. Rio de Janeiro: Nova te com o final da peça. Que trecho é esse?
Fronteira; Brasília: INL, 1984, p. 89. Qual é o pormenor da cena final da peça que
ele está antecipando?
a) Por que o cavaleiro chama a atenção do Diabo? b) A fala de Pero, dirigida a Inês, revela uma ati-
tude contrária a uma característica atribuída
b) Onde e como morreram os dois Cavaleiros?
ao seu primeiro marido. Qual é essa caracte-
c) Por que os dois passam pelo Diabo, sem se rística?
dirigir a ele?
5. (Fuvest)
Quando da bela vista e doce riso,
tomando estão meus olhos mantimento, 1

tão enlevado sinto o pensamento


que me faz ver na terra o Paraíso.

288
Tanto do bem humano estou diviso, 2
que qualquer outro bem julgo por vento; Gabarito
assi, que em caso tal, segundo sento, 3
assaz de pouco faz quem perde o siso.
Em vos louvar, Senhora, não me fundo, 4 E.O. Aprendizagem
porque quem vossas cousas claro sente, 1. B 2. C 3. E 4. E 5. A
sentirá que não pode merecê-las.
Que de tanta estranheza sois ao mundo, 6. E 7. E 8. A 9. E 10. C
que não é d’estranhar, Dama excelente,
que quem vos fez, fizesse Céu e estrelas.
Camões, ed. A.J. da Costa Pimpão
E.O. Fixação
1. C 2. B 3. C 4. E 5. E
1. Tomando mantimento = tomando consciência
2. Estou diviso = estou separado, apartado 6. D 7. D 8. B 9. E 10. E
3. Sento = sinto
4. Não me fundo = não me empenho
a) Caracterize brevemente a concepção de mu- E.O. Complementar
lher que este soneto apresenta. 1. A 2. D 3. E 4. B
b) Aponte duas características desse soneto
que o filiam ao Classicismo, explicando-as
sucintamente. E.O. Dissertativo
1. As características formais são de um “sone-
to”, com versos decassílabos (dez sílabas).
2. Não, pois a escansão apresentada contém
erros que descaracterizam o verso decassí-
labo. Portanto, o correto é: Es/ tan/ do em/
te/ rra/ che/ go ao/ céu/ vo/ an(do).
3. Na segunda estrofe, o eu lírico revela com quem
conversa, uma Senhora que tem o poder de aca-
bar com a sua tristeza quando quiser. Assim, o
eu lírico mostra que se sente triste por uma não
correspondência amorosa com essa senhora.
Dessa forma, resta mostrar-se esperançoso de
que com o passar do tempo a senhora se tornará
menos dura e corresponderá ao seu amor.
4.
a) A antítese centra-se na relação entre os
“bons” e os “maus”. Os desdobramentos
da antítese são a punição e a recompen-
sa, que se dá da seguinte forma: aqueles
que merecem recompensa são punidos;
aqueles que merecem punição são pre-
miados. É por isso que, segundo o poeta,
o mundo está “desconcertado”.
b) O poema é composto de uma só estrofe
com dez versos. As rimas estão dispos-
tas de forma alternada e justaposta: aba
abc; dd cd. Em relação ao valor são ri-
mas pobres (eufonia entre palavras da
mesma classe gramatical) e ricas (classe
gramatical diferente).
5. Ricos mercadores burgueses, principalmente
italianos, que usavam a sua riqueza para fi-
nanciar artistas e encomendar obras de artes.
6.
a) Renascimento ou Renascença.
b) O antropocentrismo e o cientificismo que
se opunham ao teocentrismo e o misticis-
mo do período anterior ao Renascimento
(Idade Média), considerada a “Idade das
Trevas” culturais pelos contemporâneos
da Renascença.

289
E.O. Enem 4.
a) O trecho “asno que me leve quero”. O per-
1. C sonagem Pero Marques age como “asno”
duas vezes: a primeira quando serve de
E.O. Objetivas cavalgadura e a segunda, por não saber
da traição de Inês.
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) b) O primeiro marido de Inês, o Brás da Mata
1. C 2. B 3. D 4. E 5. C não a tratava bem, agia de modo agressi-
vo, já Pero dava a ela total liberdade.
5.
E.O. Dissertativas a) A beleza é convertida em Beleza pura, logo
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) a mulher é vista não como companheira,
1. mas como um ser angelical que leva ao
a) O fidalgo está vestido com um longo man- “mundo das ideias” e à divindade.
to vermelho e vem acompanhado de um b) É característica do Classicismo o soneto
criado que segura uma cadeira, símbolos composto por dois quartetos e dois ter-
da vaidade e a arrogância. O sapateiro, cetos e a medida nova (versos decassíla-
por sua vez, transporta o avental e as for- bos). Além disso, há no texto figuras de
mas para fazer sapatos, símbolos da ex- linguagem como o hipérbato e a seleção
ploração interesseira da classe burguesa lexical.
comercial. Motivos pelos quais são conde-
nados à barca do inferno.
b) Ambos personagens acreditavam que os
rituais recomendados pela Igreja Católi-
ca para salvação da alma eram garantias
para entrar no céu, o que é contrariado
pelo diabo. O fidalgo argumenta de que
deixou na terra alguém rezando por ele
“Que leixo na outra vida/quem reze sem-
pre por mi” – e o sapateiro diz ter ido à
missa e se confessado antes de morrer,
o que para ele garantiria sua entrada no
céu – “Os que morrem confessados,/onde
têm sua passagem?”, “Quantas missas eu
ouvi,/ não me hão elas de prestar?”.
2.
a) O cavaleiro alega ter sacrificado a vida em
nome de Deus e do Cristianismo, por isso
estava assegurada sua entrada na barca
do anjo e ida para o paraíso.
b) Os cavaleiros morreram em luta contra
os que não acreditavam no Cristianismo,
numa Cruzada.
c) Não se dirigem ao diabo, pois tem certeza
que sua entrada no céu está garantida,
uma vez que lutaram nas cruzadas em de-
fesa dos Cristianismo.
3.
a) A personagem Brísida Vaz era alcovitei-
ra, portanto era uma espécie de cafetina
e agenciava mulheres para a prostituição.
Logo, sua linguagem demonstra caracte-
rísticas de sua atividade, pois ela escolhe
palavras e termos específicos de quem quer
seduzir o Anjo. Por exemplo, “meu amor”,
“olhos de perlinhas finas”, “anjo de Deus”,
“minha rosa”, “minhas boninas”.
b) O tratamento com o anjo deixa claro o
apego ao universo pecaminoso da sedu-
ção e prostituição, portanto a postura de
Brísida Vaz é inadequada.

290
© José Veloso Salgado

Aula 4

Classicismo:
Camões épico e lírico
Competência 5
Habilidades 15, 16 e 17
Competência 1 – Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para
sua vida.
H1 Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como elementos de caracterização dos sistemas de comunicação.
H2 Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de comunicação e informação para resolver problemas sociais.
H3 Relacionar informações geradas nos sistemas de comunicação e informação, considerando a função social desses sistemas.
H4 Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação.
Competência 2 – Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) (LEM) como instrumento de acesso a informações e a outras
culturas e grupos sociais.
H5 Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM ao seu tema.
H6 Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus mecanismos como meio de ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e culturas.
H7 Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e seu uso social.
H8 Reconhecer a importância da produção cultural em LEM como representação da diversidade cultural e linguística.
Competência 3 – Compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da
identidade.
H9 Reconhecer as manifestações corporais de movimento como originárias de necessidades cotidianas de um grupo social.
H10 Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em função das necessidades cinestésicas.
Reconhecer a linguagem corporal como meio de interação social, considerando os limites de desempenho e as alternativas de adaptação para
H11
diferentes indivíduos.
Competência 4 – Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e
da própria identidade.
H12 Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos artistas em seus meios culturais.
H13 Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos.
H14 Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos.
Competência 5 – Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante
a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção.
H15 Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.
H16 Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário.
H17 Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional.
Competência 6 – Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da
realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação.
H18 Identificar os elementos que concorrem para a progressão temática e para a organização e estruturação de textos de diferentes gêneros e tipos.
H19 Analisar a função da linguagem predominante nos textos em situações específicas de interlocução.
H20 Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a preservação da memória e da identidade nacional
Competência 7 – Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas.
H21 Reconhecer em textos de diferentes gêneros, recursos verbais e não-verbais utilizados com a finalidade de criar e mudar comportamentos e hábitos.
H22 Relacionar, em diferentes textos, opiniões, temas, assuntos e recursos linguísticos.
H23 Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.
Reconhecer no texto estratégias argumentativas empregadas para o convencimento do público, tais como a intimidação, sedução, comoção,
H24
chantagem, entre outras.
Competência 8 – Compreender e usar a língua portuguesa como língua materna, geradora de significação e integradora da organização
do mundo e da própria identidade.
H25 Identificar, em textos de diferentes gêneros, as marcas linguísticas que singularizam as variedades linguísticas sociais, regionais e de registro.
H26 Relacionar as variedades linguísticas a situações específicas de uso social.
H27 Reconhecer os usos da norma padrão da língua portuguesa nas diferentes situações de comunicação.
Competência 9 – Entender os princípios, a natureza, a função e o impacto das tecnologias da comunicação e da informação na sua vida
pessoal e social, no desenvolvimento do conhecimento, associando-o aos conhecimentos científicos, às linguagens que lhes dão suporte,
às demais tecnologias, aos processos de produção e aos problemas que se propõem solucionar.
H28 Reconhecer a função e o impacto social das diferentes tecnologias da comunicação e informação.
H29 Identificar pela análise de suas linguagens, as tecnologias da comunicação e informação.
H30 Relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento que elas produzem
Luis Vaz de Camões
Camões teria nascido em 1524 ou 1525, provavelmente na cidade de Lis-
boa (talvez Coimbra ou Santarém), descendente de uma família da peque-
na nobreza. Estudou numa das mais conceituadas instituições de Portugal,
a Universidade de Coimbra. Em sua juventude, tornou-se um leitor voraz
de Homero, Virgílio, Ovídio e Petrarca. Lutando contra os mouros em 1549,
acabou por perder a o olho direito.
Sua biografia é um tanto quanto nebulosa e cheia de confusões.
Em 1552, foi preso por ter brigado com Gonçalo Jorge, que era oficial
da corte, e sai perdoado da cadeia conquanto servisse militarmente Por-
tugal na Índia. Em 1556 é nomeado “provedor-mor dos bens de defun-
tos ausentes” em Macau, então colônia de Portugal. Durante os nove
anos que passou na cadeia, começou a escrever Os Lusíadas. Acusado
de desviar bens enquanto provedor-mor, vai para Goa a fim de se defen-
der das acusações. Na viagem, seu navio naufraga na foz do Rio Mekong
(Indochina) e diz a lenda que ele se salvou e deixou sua companheira chinesa, Dinamene, morrer afogada, com a
desculpa de salvar o manuscrito de Os Lusíadas, que já estava em sua fase final. Viveu na miséria, foi preso outra
vez, agora em Moçambique, por causa de dívidas, e voltou a Lisboa no ano de 1569 com a ajuda de amigos.
Em 1572 publica Os Lusíadas, sua obra prima, e recebe uma pensão anual de 15 mil réis oferecida por Dom
Sebastião. Morre pobre em 10 de junho de 1580. Curiosamente, o herói da poesia portuguesa expira com o início
do declínio do poderio imperial de Portugal, mesmo ano da União da Península Ibérica, quando o país fica sob o
domínio da coroa espanhola.
Em 1595 é publicada a obra Rimas, com uma compilação de sua obra lírica, de versos redondilhos elabora-
dos à maneira medieval, e também seus sonetos decassílabos de influência petrarquiana.
Leia o poema que Camões escreveu por ocasião da morte de Dinamene:

Alma minha gentil, que te partiste


Tão cedo desta vida descontente,
Repousa lá no Céu eternamente,
E viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento Etéreo, onde subiste,


Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente,
Que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer-te


Alg’a cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,

Roga a Deus, que teus anos encurtou,


Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou.
CAMÕES, Luís Vaz de. In: Sonetos.

293
Camões épico

Engenho e arte
A obra épica Os Lusíadas, publicada no reinado de Dom
Sebastião em 1572, é a mais importante epopeia em
língua portuguesa, teve como modelos estruturais as
epopeias da Antiguidade: a Ilíada e a Odisseia, do po-
eta grego Homero, e a Eneida, do poeta latino Virgílio.
Entretanto, Camões introduziu uma novidade, pois, em
Os Lusíadas, o herói é coletivo, ou seja, é o povo
português; ao contrário do que ocorre nas epopeias
modelares, em que um relevante herói individual se so-
bressai (a exemplo de Aquiles, Ulisses e Eneias). Essa
modalidade de escrita passou a ser chamada de epo-
Estátua de Luís de Camões, na praça Luís de Camões, Bairro Alto, Lisboa;
peia secundária.
ao fundo o edifício onde se localiza o Consulado do Brasil em Lisboa
Na narrativa épica camoniana, o herói, Vasco da Disponivel em:<https://commons.wikimedia.org/wiki/
Gama, comandante da expedição que buscou o cami- File:Camoes_2.jpg.
Acessado em: Dez.2015
nho marítimo para as Índias, tem seu espaço compar-
tilhado com os portugueses, o povo heroico português,
Estrutura da obra
como o próprio título da epopeia indica.
Camões era cristão e desejava expressar em seu A obra de Camões apresenta 8.816 versos decassíla-
poema a expansão da fé cristã no mundo. Por isso, a bos, divididos em 1.102 estrofes, todas em oitava-rima,
presença de Deus e a referência a milagres e santos organizada em dez cantos. Cada canto, na epopeia, cor-
do cristianismo são constantes em sua obra. Contudo, responde a um capítulo das obras em prosa. Além disso,
como nas epopeias que Camões tomou por modelo – existem outras cinco partes:
Odisseia, Ilíada e Eneida –, há nela também a presença 1. Proposição (canto I, estrofes 1 a 3)
dos deuses do Olimpo. Eles interferem na narrativa de
O poeta apresenta o que vai cantar, ou seja, o
Os Lusíadas procurando auxiliar ou prejudicar os por- tema dos feitos heroicos dos ilustres barões de
tugueses no cumprimento de seus objetivos. Enquanto Portugal, o herói, Vasco da Gama, e o destino
Vênus e Marte, por exemplo, tentam protegê-los, outros da viagem.
deuses, como Netuno e Baco, procuram impedir o cum-
primento da rota planejada – o primeiro porque zela As armas e os barões assinalados
Que, da ocidental praia lusitana,
pelo seu poderio nos mares, e o segundo, pelo seu do-
Por mares nunca dantes navegados
mínio no Oriente.
Passaram ainda além da Taprobana
Os Lusíadas conseguiu conciliar, portanto, a mi- Em perigos e guerras esforçados,
tologia pagã (fruto do gosto renascentista pelo estudo Mais do que prometia a força humana,
da cultura pagã) e a mitologia cristã (ideologia pessoal E entre gente remota edificaram
do autor). Isso, porém, valeu a Camões problemas com Novo reina, que tanto sublimaram;
barões = homens ilustres
a Inquisição e tratamento com muita reserva por parte
ocidental praia lusitana = Portugal
dos críticos de sua época. Taprobana = ilha de Ceilão, limite oriental do mundo conhecido

294
2. Invocação (canto I, estrofes 4 e 5) §§ o de Inês de Castro, amante do príncipe D. Pe-
O poeta invoca as Tágides, ninfas do rio Tejo, pe- dro assassinada a mando do rei (canto III);
dindo a elas para inspirá-lo na composição da §§ o das críticas do velho da praia do Restelo
obra. (canto IV); e
E vós, Tágides minhas, pois criado
§§ do gigante Adamastor (canto V), que é uma
Tendes em mim um novo engenho ardente,
personificação dos perigos enfrentados pelos na-
Dai-me agora um som alto e sublimado,
vegantes aos transporem o Cabo das Tormentas.
Um estilo grandíloquo e corrente,
Por fim, A ilha dos amores (canto IX), com o ero-
3. Dedicatória ou oferecimento tismo de seus símbolos, conclamando os portugueses a
(canto I, estrofes 6 a 18) contemplarem a “Máquina do Mundo”.
O poeta dedica seu poema a D. Sebastião, rei
de Portugal na época em que o poema foi pu- Episódio de “Inês de Castro”
blicado, visto como a esperança de propagação (canto III, estrofes 118 a 135)
da fé cristã e continuação dos grandes feitos de
Portugal.
Ouvi: vereis o nome engrandecido
Daqueles de quem sois senhor superno
E julgareis qual é mais excelente,
Se ser do mundo rei, se de tal gente.
superno = supremo

4. Narração (canto I, estrofe 19 até canto X,


estrofe 144)

O poeta relata a viagem propriamente dita dos A morte de Inês de Castro, de Karl Briullov, século XIX.
portugueses ao Oriente. Essa é, portanto, a parte
mais longa do relato e vários são os episódios O rei Afonso retorna a sua terra natal, depois do intento
que nela se destacam. O desenrolar dos fatos vitorioso sobre os mouros esperando ser recebido com
começa In Media Res, ou seja, no meio da ação, honras de vitória e, principalmente, de paz, mas é obri-
quando Vasco da Gama e sua esquadra se diri- gado a contornar uma revolta popular com o triste e
gem ao Cabo da Boa Esperança. A seguir, alguns memorável caso da desventura de dona Inês de Castro.
dos mais importantes relatos da obra. Este é considerado um episódio lírico interno ao
No canto II, depois de terem passado por
texto épico, em que uma verdadeira história de amor
dificuldades no mar, os portugueses, com o au-
portuguesa é inserida em Os Lusíadas com o claro intui-
xílio da deusa Vênus, aportam na África, onde
to de registrar esta que foi uma das histórias de amor
são recebidos pelo rei de Melinde, que pede a
mais bonitas e verdadeiras já contadas pela humanida-
Vasco da Gama que conte a história de Portu-
de. Leia um trecho:
gal. Esse é o pretexto encontrado por Camões
para pôr na fala de sua personagem as histórias
Traziam-na os horríficos algozes
que envolvem a fundação do Estado português: Ante o Rei, já movido a piedade;
a Revolução de Avis, a morte de Inês de Castro e Mas o povo, com falsas e ferozes
a partida dos portugueses para o Oriente. Razões, a morte crua o persuade,
Esse relato de Vasco da Gama se estende Ela, com tristes e piedosas vozes,
até o canto IV, momento em que os portugueses Saídas só da mágoa e saudade
seguem viagem. Nele, três episódios merecem Do seu Príncipe e filhos, que deixava
destaque: Que mais que a própria morte magoava

295
Episódio do “Velho do Restelo” Mas um velho, de aspeito venerado,
(canto IV, estrofes 90 a 104) Que ficava nas praias, entre a gente,
Postos os olhos em nós, meneando
Três vezes a cabeça, descontente,
A voz pesada um pouco alevantando,
Que nós o mar ouvimos claramente,
Co’um saber só de experiências feito,
Tais palavras tirou do experto peito:

Episódio “O gigante Adamastor”


(canto V, estrofes 37 a 60)

Nesse episódio, a esquadra de Vasco da Gama está


contornando a África quando um gigante monstruo-
Torre de Belém, Lisboa, Portugal.
so emerge do mar, proferindo ameaças e profecias de
naufrágios das naus, em decorrência do atrevimento de
O episódio do Velho do Restelo representa um conflito
Vasco da Gama e de sua tripulação ter invadido aquele
ideológico contra os intentos portugueses. Como toda
território de domínio do gigante, nunca antes navegado.
lógica narrativa, o desenrolar da aventura passa por
Vasco da Gama não se intimida e inicia um diá-
processos conflituosos e, nesse caso, ele assume for-
logo com o gigante, que se identifica como Adamastor.
ma de um conflito entre a visão conservadora, daquele
Ele conta que era um Titã e que um dia se apaixonou
que fica, no caso o velho que com seu cajado maldiz por Tétis, mulher do deus Peleu. Enganado por ela, caiu
as grandes navegações, e os ideias universalistas dos em uma armadilha, após submetê-la a um “amor for-
argonautas portugueses. çoso”, foi condenado por Netuno e como castigo foi
O velho simboliza os ideais medievais e, com transformado em uma enorme e imóvel montanha.
suas palavras, diz que aqueles que quiserem fama e Adamastor é, na verdade, uma personificação do
glória acima dos valores religiosos e, sobretudo cató- Cabo das Tormentas. O episódio representa a superação
licos, seriam punidos com um futuro negativo. Os por- do medo, dos perigos do mar e das crendices medie-
tugueses enfrentam este posicionamento e conquistam vais pelos portugueses que circulavam socialmente. É
os mares apesar das críticas do velho. No entanto, sabe- representativo do ponto de vista do engrandecimento
-se que o velho tem sua razão quanto à ambição dos do povo português que, apesar do temor e do desco-
reis portugueses, que colocam acima de qualquer coisa nhecimento, enfrentou os obstáculos e os perigos do
mar, vencendo-os e triunfando.
“fama” e “glória” e que levariam Portugal a sua futura
derrocada. O velho é aquele que fica, que é terra, que [...]
conserva posição em detrimento da fluidez prática do Porém já cinco Sóis eram passados
lançar-se ao mar de Vasco da Gama e sua esquadra. Que dali nos partíramos, cortando
Leia um trecho: Os mares nunca de outrem navegados,
Prosperamente os ventos assoprando,
Qual vai dizendo: – Ó filho, a quem eu tinha Quando uma noite, estando descuidados
Só pra refrigério e doce amparo Na cortadora proa vigiando,
Desta cansada já velhice minha Uma nuvem, que os ares escurece,
Que em choro acabará, penosos e amaro Sobre nossas cabeças aparece.
Por que me deixas, mísera e mesquinha?
Tão temerosa vinha e carregada,
Por que de mim te vás, o filho caro, Que pôs nos corações um grande medo;
A fazer o funéreo enterramento Bramindo, o negro mar de longe brada,
Onde sejas de peixe mantimento? Como se desse em vão nalgum rochedo.
[...] – “Ó Potestade (disse) sublimada:

296
Que ameaço divino ou que segredo Episódio “A Ilha dos Amores”
Este clima e este mar nos apresenta, (canto IX, estrofes 68 a 95)
Que mor cousa parece que tormenta?”
[...]
Não acabava, quando uma figura
Se nos mostra no ar, robusta e válida,
De disforme e grandíssima estatura;
O rosto carregado, a barba esquálida,
Os olhos encovados, e a postura
Medonha e má, e a cor terrena e pálida;
Cheios de terra e crespos os cabelos,
A boca negra, os dentes amarelos.
Tão grande era de membros, que bem posso
Certificar-te que este era o segundo
De Rodes estranhíssimo Colosso, As Nereidas (Ninfas) da Ilha dos Amores
Que um dos sete milagres foi do mundo.
Cum tom de voz nos fala, horrendo e grosso, Nos cantos de VI a IX, os portugueses chegam a Calicu-
Que pareceu sair do mar profundo. te, na Índia, e têm problemas com os mouros. Preparam-
Arrepiam-se as carnes e o cabelo,
-se, então, para voltar para Portugal, mas, devido a seus
A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo!
esforços e à sua coragem, são premiados por Vênus, que
E disse: – “Ó gente ousada, mais que quantas lhes oferece uma passagem pela Ilha dos Amores, onde
No mundo cometeram grandes cousas, podem livremente amar as ninfas, lideradas por Tétis.
Tu, que por guerras cruas, tais e tantas, Além disso, a Ilha dos Amores celebra a virilidade dos
E por trabalhos vãos nunca repousas, argonautas portugueses com o erotismo de seus símbo-
Pois os vedados términos quebrantas los levando-os a refletir sobre a “Máquina do Mundo”.
E navegar meus longos mares ousas,
Todo o fervor religioso em defesa dos portugueses que
Que eu tanto tempo há já que guardo e tenho,
Nunca arados de estranho ou próprio lenho; tentavam impor aos infiéis mouros sua fé cristã não im-
pediu a utilização do erotismo no episódio que foi bene-
[...] ficiado por uma deusa pagã, a Venus, que durante todo
– “Eu sou aquele oculto e grande Cabo o poema protege os portugueses, em contraposição a
A quem chamais vós outros Tormentório, Baco (o Dionísio dos gregos), que tinha tudo para ser
Que nunca a Ptolomeu, Pompónio, Estrabo,
favorável a essa situação, por ser o deus do vinho, mas
Plínio, e quantos passaram, fui notório.
que, na obra, é constituído como inimigo dos portugue-
Aqui toda a Africana costa acabo
Neste meu nunca visto Promontório, ses, uma vez que seu desregramento e representação
Que para o Pólo Antártico se estende, por chifres e rabo o aproximava da imagem do diabo
A quem vossa ousadia tanto ofende. utilizada pela Igreja Católica.
cinco sóis = cinco dias; esquálida = suja, desalinhada;
colosso = uma das setes maravilhas do mundo, a está-
Oh, que famintos beijos na floresta!
tua do deus Apolo, em Rodes, na Grécia; Tormentório = E que mimoso choro que soava
Cabo das Tormentas; Ptolomeu = astrônomo grego; Pom-
pónio = geógrafo romano; Estrabo = geógrafo grego. Que afagos tão suaves! Que ira honesta,
Que em risinhos alegres se tornava!
O que mais passam na manha e na sesta,
Que Vênus com prazeres inflamava,
Melhor é experimentá-lo que julgá-lo,
Mas julgue-o quem não pode exeprimentá-lo.
A Ilha dos Amores, na visão de Jorge Golaço.

297
5. Epílogo rene; no mundo das ideias, tudo é eterno, imutável. O
amor ideal, de acordo com Platão, é um sentido essen-
É a conclusão do poema (estrofes 145 a 156 do cialmente puro e desprovido de paixões, ao passo que
canto X), em que o poeta demonstra cansaço e, estas são essencialmente cegas, materiais, efêmeras e
em tom melancólico e pessimista, aconselha ao falsas.
rei e ao povo português que sejam fiéis à pátria
Em Camões, percebe-se o conflito entre o sen-
e ao cristianismo.
timento espiritual, idealizado, e o sentimento de ma-
nifestação carnal. O amor é, dessa forma, complexo,
Camões lírico contraditório. Esse duplo enfoque do amor é bastante
acentuado no soneto Amor é fogo que arde sem se ver.

Amor é fogo que arde sem se ver,


“Tu, só tu, puro amor” é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
A obra lírica de Camões compreende poemas feitos na
é dor que desatina sem doer.
medida velha e na medida nova. A medida velha obe-
É um não querer mais que bem querer;
dece à poesia de tradição popular, na forma e no conte-
é um andar solitário entre a gente;
údo. São exploradas as redondilhas, de cinco ou de sete
é nunca contentar-se de contente;
sílabas (menor ou maior, respectivamente).
é um cuidar que ganha em se perder.
Quanto à medida nova, os poemas em medida
É querer estar preso por vontade;
nova são relacionados à tradição clássica: sonetos, éclo-
é servir a quem vence, o vencedor;
gas, elegias, oitavas, sextinas. Quanto ao conteúdo, a
é ter com quem nos mata, lealdade.
poesia lírica clássica se relaciona com o petrarquismo.
Mas como causar pode seu favor
Francesco Petrarca foi o responsável por fixar a forma
nos corações humanos amizade,
do soneto, no século XIV; o conteúdo de sua poesia
se tão contrário a si é o mesmo Amor?
delineia um lirismo amoroso platônico, relacionado in- Amor é fogo que arde sem se ver.
dissoluvelmente a uma mulher inacessível, Laura, a que In: CAMÕES, Luís Vaz de. Lírica. São Paulo: Cultrix, 1976.

dedicou perto de 360 sonetos, no seu Cancioneiro.


Dessa forma, o amor que uma pessoa sente por
outra não passa de uma manifestação particular e im-
perfeita de algo superior, universal e perfeito: o Amor-
A lírica amorosa -ideal, grafado com A maiúsculo.
É dessa concepção que advém o amor neopla-
O tema amoroso é explorado na lírica camoniana sob
tônico dos humanistas e renascentistas: quanto mais o
dupla perspectiva. Com frequência, aparece o amor sen-
amor por uma pessoa estiver desvinculado de prazeres
sual, próprio da sensualidade renascentista, inspirada
físico-sensoriais e se aproximar do amor-ideal, maior e
no paganismo da cultura greco-latina. Predomina, po-
mais puro será. É o que se observa nas 1a e 2a estrofes
rém, o amor neoplatônico, espécie de extensão e apro-
do soneto de Camões:
fundamento da tradição da poesia medieval portuguesa
ou da poesia humanista italiana, em que o amor e a Transforma-se o amador na cousa amada,
mulher se configuram como idealizados e inacessíveis. por virtude do muito imaginar;
não tenho, logo, mais que desejar,
Na poesia lírica camoniana, tal qual no modelo
pois em mim tenho a parte desejada.
legado por Petrarca, o amor é um sentimento que eleva
o homem, tornando-o capaz de atingir o Bem, a Beleza Se nela está minha alma transformada,
que mais deseja o corpo de alcançar?
e a Verdade, de acordo com a filosofia platônica. Para
Em si somente pode descansar,
Platão, a realidade se divide em “mundo dos sentidos”
pois consigo tal alma está ligada.
e “mundo das ideias”. No mundo sensorial, nada é pe-

298
Mas esta linda e pura semideia, Vendo o triste pastor que com enganos
que, como um acidente em seu sujeito, Lhe fora assim negada a sua pastora,
assim como a alma minha se conforma, Como se a não tivera merecida;
está no pensamento como ideia: Começa de servir outros sete anos,
[E] o vivo e puro amor de que sou feito, Dizendo: – Mais servira, se não fora
como a matéria simples busca a forma. Para tão longo amor tão curta a vida!
(Lírica, cit., p.109) Sete anos de pastor Jacó servia.
In: CAMÕES, Luis Vaz de. Lírico. São Paulo: Cultrix, 1976.

Nessas estrofes iniciais do poema, a realização


No primeiro quarteto, o pastor Jacó serve a La-
amorosa se dá por meio de imaginação. Não é preciso
ter a pessoa amada fisicamente, basta tê-la em pen- bão porque deseja Raquel. O segundo quarteto mostra
samento. Tendo-a, em si, na imaginação, o eu lírico se o desejo frustrado de Jacó, quando Labão lhe entrega a
transforma na pessoa amada, confunde-se com ela e, irmã mais velha, Lia. Humilde, por um amor ideal, pla-
dessa forma, já a tem. tônico, o pastor se dispõe a trabalhar outros sete anos,
Observe, porém, que, nas duas últimas estrofes, e assim indefinidamente para comprovar sua fidelidade
o poeta abandona o neoplatonismo e, com uma compa- amorosa.
ração, manifesta seu desejo físico pela mulher amada:
do mesmo modo que toda matéria busca uma forma, o
seu amor puro, amor-ideia, busca o objeto desse amor, A mutabilidade e o mun-
ou seja, a mulher real. do desconcertante
Esses sentimentos contraditórios, bem como cer- A perfeição do mundo das ideias é contrastada por Camões
to pessimismo existencial que marca a poesia lírica de com as imperfeições do mundo terreno. Em sua obra lírica,
Camões, fogem ao espírito harmonioso e racional do nota-se que a vida humana está condicionada a essas imper-
Renascimento e prenunciam o movimento literário do feições, enquanto o espírito busca outros horizontes. Desse
século XVII: o Barroco. Esse período de transição entre contraponto, resulta uma visão pessimista da vida, que brota
Renascimento e o Barroco é chamado, nas artes plásti- dos problemas existenciais do próprio poeta, de suas frustra-
cas, de Maneirismo; por isso, alguns críticos consideram ções e atribuições.
como traços maneiristas certas características da lírica
de Camões. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o Mundo é composto de mudança,
Um amor para sempre Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
O soneto Sete anos de pastor Jacó servia, é uma amos- Diferentes em tudo da esperança;
tra marcante do amor platônico, que tem duração ide- Do mal ficam as mágoas na lembrança,
alizada, independentemente de realização física. Esse E do bem, se algum houve, as saudades.
poema de Camões narra o episódio bíblico em que Jacó O tempo cobre o chão de verde manto,
trabalha para Labão, visando casar-se com sua filha Ra- Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
quel, mas acaba recebendo a irmã dela, Lia.
E, afora este mudar-se cada dia,
Sete anos de pastor Jacob servia Outra mudança faz de mor espanto:
Labão, pai de Raquel, serrana bela; Que não se muda já como soía.
Mas não servia ao pai, servia a ela, CAMÕES, Luís Vaz de. 200 Sonetos. Porto Alegre: L&PM. 1998.
E a ela só por prêmio pretendia.
Os dias, na esperança de um só dia,
Passava, contentando-se com vê-la;
Porém o pai, usando de cautela,
Em lugar de Raquel lhe dava Lia.

299
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Vídeo Documentário português sobre a obra Os lusíadas

Fonte: Ensina RPT

Vídeo Documentário português sobre Camões

Fonte: Ensina RPT

300
LER

tt
Livros
Lírica – Luís de Camões – Massaud Moisés
Considerado o maior poeta lírico português de todos os tempos, sua
poesia lírica é marcada por uma dualidade: ora revela textos de nítida
herança tradicional portuguesa, ora sua poesia se enquadra na medida
nova renascentista.

Os lusíadas – Edição Comentada por Otoniel Mota


Os Lusíadas é uma obra poética do escritor Luís Vaz de Camões, conside-
rada a epopeia portuguesa por excelência.

Dicionário de Luís de Camões – Vítor Aguiar e Silva


O Dicionário de Luís de Camões, obra concebida sob a coordenação do
prof. Vítor Aguiar e Silva, constitui um vasto e rico Thesaurus da camonís-
tica contemporânea.

301
INTERDISCIPLINARIDADE
Artes plásticas

Os Portugueses e as Ninfas na Ilha dos Amores (ilustração do episódio do Canto IX de Os Lusíadas de Camões, de Bordalo Pinheiro, século XIX.

Nos ombros de um Tritão ... vai Dione, composição alusiva ao Canto II (est. XXI) de
Os Lusíadas de Camões, figurando Dione e um grupo de ninfas num mar revolto,
perto do casco de uma caravela de Bordalo Pinheiro, século XIX.

302
Estrutura Conceitual
Idade Média Idade Moderna

Trovadorismo Humanismo Classicismo Barroco

Camões Camões
Épico Lírico

Trabalho do Maior produção


autor com a epopeia de sonetos

303
E.O. Aprendizagem b) “Inês de Castro” caracteriza, dentro da epo-
peia camoniana, o gênero lírico porque é um
episódio que narra os amores impossíveis
1. Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as
entre Inês e seu amado Pedro.
afirmações a seguir, relacionadas aos Cantos
c) Restelo era o nome da praia em frente ao
I a V da epopeia Os Lusíadas, de Camões.
templo de Belém, de onde partiam as naus
( ) A presença do elemento mitológico é
portuguesas nas aventuras marítimas.
uma forma de reconhecimento da cultura
d) tanto “Inês de Castro” quanto “O Velho do
clássica, objeto de admiração e imitação
Restelo” são episódios que ilustram poeti-
no Renascimento.
camente diferentes circunstâncias da vida
( ) A disputa entre os deuses Vênus e Baco,
portuguesa.
da mitologia clássica, é um recurso lite-
e) o Velho, um dos muitos espectadores na
rário de que Camões faz uso para criar o
praia, engrandecia com sua fala as façanhas
enredo de Os Lusíadas.
dos navegadores, a nobreza guerreira e a
( ) Do Canto I ao Canto V, leem-se as peripé-
máquina mercantil lusitana.
cias da viagem dos portugueses até sua
chegada à Índia, quando eles tomam pos-
4. Com os versos “Cantando espalharei por toda
se daquela terra. a parte,/ Se a tanto me ajudar o engenho e
( ) No Canto II, lê-se a narração da viagem a arte.”, Camões explica que o propósito de
dos portugueses a Melinde, cujo rei pede a Os Lusíadas é divulgar os feitos portugue-
Camões que conte a história de Portugal. ses. Sobre esse poema épico, só é INCORRETO
afirmar que:
A sequência correta de preenchimento dos
a) se trata da maior obra literária do quinhen-
parênteses, de cima para baixo, é:
tismo português.
a) V – V – V – F
b) Camões sofre a clara influência dos clássicos
b) V – F – F – V
greco-latinos.
c) F – V – F – V
c) há forte presença do romantismo, devido
d) F – F – V – F
ao nacionalismo.
e) V – V – F – F
d) como epopeia moderna, há momentos de crí-
tica à nação e ao povo.
2. Assinale a alternativa que completa correta- e) louva não apenas o homem português, mas
mente a afirmação seguinte: o homem renascentista.
O movimento desenvolveu-se no apogeu po-
lítico de Portugal; consiste numa concepção TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
artística baseada na imitação dos modelos Antes de concluir este capítulo, fui à jane-
clássicos gregos e latinos. Nele, o pensa- la indagar da noite por que razão os sonhos
mento lógico predomina sobre a emoção, e hão de ser assim tão tênues que se esgarçam
a estrutura da composição poética obedece ao menor abrir de olhos ou voltar de corpo,
a formas fixas, com a introdução da medida e não continuam mais. A noite não me res-
nova, que convive com a medida velha das pondeu logo. Estava deliciosamente bela, os
formas tradicionais. morros 1palejavam de luar e o espaço morria
Trata-se do: de silêncio. Como eu insistisse, declarou-
a) Modernismo. -me que os sonhos já não pertencem à sua
b) Barroco. jurisdição. Quando eles moravam na ilha
c) Romantismo. que Luciano lhes deu, onde ela tinha o seu
d) Classicismo. palácio, e donde os fazia sair com as suas
e) Realismo. caras de vária feição, dar-me-ia explicações
possíveis. Mas os tempos mudaram tudo. Os
3. Dos episódios “Inês de Castro” e “O Velho sonhos antigos foram aposentados, e os mo-
dernos moram no cérebro da pessoa. Estes,
do Restelo”, da obra Os Lusíadas, de Luiz de
ainda que quisessem imitar os outros, não
Camões, NÃO é possível afirmar que:
poderiam fazê-lo; a ilha dos Sonhos, como
a) “O Velho do Restelo”, numa antevisão pro-
a dos Amores, como todas as ilhas de todos
fética, previu os desastres futuros que se
os mares, são agora objeto da ambição e da
abateriam sobre a Pátria e que arrastariam a rivalidade da Europa e dos Estados Unidos.
nação portuguesa a um destino de enfraque- Machado de Assis. Dom Casmurro.
cimento e marasmo. 1. palejavam: tornavam pálidos

304
5. Assinale a alternativa que apresenta frag- 7. (IFSP) Considerando o Classicismo em Portu-
mento da epopeia camoniana, extraído do gal, assinale a alternativa correta.
episódio “A ilha dos amores”, a que o texto a) Os Lusíadas é a principal obra lírica de Ca-
faz referência. mões e o tema central é o sofrimento por um
a) Volve a nós teu rosto sério,/ Princesa do amor não correspondido.
Santo Graal,/ Humano ventre do Império,/ b) Os Lusíadas tem como temática a descoberta
Madrinha de Portugal. do Brasil e a relação entre o colonizador e o
b) Ali, em cadeiras ricas, cristalinas,/ Se assen- índio.
tam dous e dous, amante e dama;/ Noutras, c) Luís Vaz de Camões é o principal autor do
à cabeceira, de ouro finas,/ Está co’a bela Classicismo em Portugal e destacou-se por
deusa o claro Gama. sua produção épica e lírica.
c) Se encontrares louvada uma beleza,/ Marília, d) Uma característica dos versos de Camões é
não lhe invejes a ventura,/ que tens quem que eles não apresentam uma métrica, são
leve à mais remota idade/ a tua formosura. livres e brancos.
d) Este lugar delicioso, e triste,/ Cansada de e) Uma característica de Camões é que ele des-
viver, tinha escolhido/ Para morrer a míse- prezava Portugal e o povo português.
ra Lindóia.
e) Choraram da Bahia as ninfas belas,/ Que na-
dando a Moema acompanhavam;/ E vendo TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
que sem dor navegam delas,/ À branca praia
com furor tornavam. Leia o trecho de Os Lusíadas.
Tão temerosa vinha e carregada,
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO Que pôs nos corações um grande medo;
As questões adiante baseiam-se no poema Bramindo, o negro mar de longe brada,
épico Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões, do Como se desse em vão nalgum rochedo,
qual se reproduzem, a seguir, três estrofes. – Ó Potestade, disse, sublimada:
Que ameaço divino ou que segredo
Mas um velho, de aspeito venerando, Este clima e este mar nos apresenta,
Que ficava nas praias, entre a gente,
Postos em nós os olhos, meneando Que mor coisa parece que tormenta?
Três vezes a cabeça, descontente, Não acabava, quando uma figura
A voz pesada um pouco alevantando, Se nos mostra no ar, robusta e válida,
Que nós no mar ouvimos claramente, De disforme e grandíssima estatura;
C’um saber só de experiências feito, O rosto carregado, a barba esquálida,
Tais palavras tirou do experto peito: Os olhos encovados, e a postura
Medonha e má e a cor terrena e pálida;
“Ó glória de mandar, ó vã cobiça Cheios de terra e crespos os cabelos,
Desta vaidade a quem chamamos Fama! A boca negra, os dentes amarelos.
Ó fraudulento gosto, que se atiça (NEVES, João Alves das e TUFANO, Douglas. Luís
C’uma aura popular, que honra se chama! de Camões. São Paulo: Moderna, 1980.)
Que castigo tamanho e que justiça
Fazes no peito vão que muito te ama! 8. (IFSP) Considere a afirmação a seguir.
Que mortes, que perigos, que tormentas, Na segunda estrofe predomina a ________, e o
Que crueldades neles experimentas! trecho selecionado evidencia que Camões optou
por versos ________ ao escrever Os Lusíadas.
Dura inquietação d’alma e da vida As lacunas devem ser preenchidas, correta e
Fonte de desamparos e adultérios, respectivamente, por
Sagaz consumidora conhecida a) descrição ... alexandrinos.
De fazendas, de reinos e de impérios! b) dissertação ... alexandrinos.
Chamam-te ilustre, chamam-te subida, c) narração ... pentassílabos.
Sendo digna de infames vitupérios; d) descrição ... decassílabos.
Chamam-te Fama e Glória soberana, e) narração ... decassílabos.
Nomes com quem se o povo néscio engana.”

6. Entre os versos “Chamam-te ilustre, cha-


mam-te subida,/ Sendo digna de infames
vitupérios”, a relação que se estabelece é de:
a) oposição.
b) explicação.
c) causa.
d) modo.
e) conclusão.

305
9. Fala do Velho do Restelo ao Astronauta a) Saramago não faz referências críticas aos va-
(José Saramago) lores éticos ou existenciais, detendo-se na
questão da guerra e do progresso.
Aqui na terra a fome continua b) Fernando Pessoa estabelece uma relação irô-
A miséria e o luto nica com o texto camoniano, pois parodia
A miséria e o luto e outra vez a fome o tom grandiloquente da fala do Velho do
Acendemos cigarros em fogos de napalm Restelo, valendo-se de apóstrofes.
E dizemos amor sem saber o que seja. c) Os versos de Fernando Pessoa se assemelham
Mas fizemos de ti a prova da riqueza, aos do episódio do Velho de Restelo pela au-
sência de personificação.
Ou talvez da pobreza, e da fome outra vez,
d) Saramago e Fernando Pessoa não se valeram
E pusemos em ti nem eu sei que desejos da perfeição formal camoniana, o que in-
De mais alto que nós, de melhor e mais puro, valida o teor intertextual, que compreende
No jornal soletramos de olhos tensos apenas estrutura e conteúdo.
Maravilhas de espaço e de vertigem. e) Saramago apresenta uma crítica universali-
Salgados oceanos que circundam zante que retoma o alerta feito pelo Velho
Ilhas mortas de sede onde não chove. do Restelo, atualizando-o.
Mas a terra, astronauta, é boa mesa
(E as bombas de napalm são brinquedos)
Onde come brincando só a fome
E.O. Fixação
Só a fome, astronauta, só a fome
TEXTOS PARA AS PRÓXIMAS TRÊS QUESTÕES.
Mar Português Texto I
(Fernando Pessoa)
Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
Ó mar salgado, quanto do teu sal É um contentamento descontente;
São lágrimas de Portugal! É dor que desatina sem doer.
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram! É um não querer mais que bem querer;
Quantas noivas ficaram por casar É solitário andar por entre a gente;
Para que fosses nosso, ó mar! É nunca contentar-se de contente;
Valeu a pena? Tudo vale a pena É cuidar que se ganha em se perder;
(Camões)
Se a alma não é pequena.
Que quer passar além do Bojador Texto II
Tem que passar além da dor. Amor é fogo? Ou é cadente lágrima?
Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Pois eu naufrago em mar de labaredas
Mas nele é que espelhou o céu. Que lambem o sangue e a flor da pele acendem
Quando o rubor me vem à tona d’água.
Os Lusíadas E como arde, ai, como arde, Amor,
(Camões) Quando a ferida dói porque se sente,
E o mover dos meus olhos sob a casca
Ó glória de mandar, ó vã cobiça Vê muito bem o que devia não ver.
Desta vaidade a quem chamamos Fama! (Ilka Brunhilde Laurito)
Ó fraudulento gosto, que se atiça
C´uma aura popular que honra se chama! 1. Assinale a alternativa correta sobre o texto II.
Que castigo tamanho e que justiça a) A liberdade formal dos quartetos, associada
Fazes no peito vão que muito te ama! à contenção emotiva, é índice da influência
Que mortes, que perigos, que tormentas, parnasiana.
Que crueldades neles experimentas! b) Por seguir os princípios estéticos clássicos,
sua expressão é de teor mais universalista
Os textos de Fernando Pessoa e de José Sara- que individualista.
mago são intertextuais em relação ao episódio
c) O caráter reflexivo das interrogativas iniciais
do Velho do Restelo. Refletindo sobre a visão
impede que a linguagem seja marcada por
destes dois autores lusos, assinale a correta:
índices de emotividade.
d) Recupera, do estilo camoniano, a preferência
por imagens paradoxais, como, por exemplo,
mar de labaredas.
e) Vale-se de recursos estilísticos conquistados
pelos modernistas, como, por exemplo, ver-
sos decassílabos e expressão coloquial.

306
2. Assinale a alternativa correta. Se me pergunta alguém porque assim ando,
a) O texto I, com sua regularidade formal, re- Respondo que não sei, porém suspeito
cupera do texto II o rígido padrão da estéti- Que só porque vos vi, minha Senhora.
ca clássica. CAMÕES, Luís de. Luís de Camões – Lírica.
b) Os dois textos, ao negarem uma concepção 5. ed. São Paulo: Cultrix,1976. p.117.
carnal do amor, enaltecem o platonismo
Analise as assertivas.
amoroso.
I. No verso: “Que só porque vos vi, minha
c) O texto I e o texto II são convergentes no
Senhora”, pode-se depreender que há um
que se refere à concepção do sentimento
diálogo com as cantigas de amigo.
amoroso.
II. No verso: “Estando em terra, chego ao
d) O texto II contesta o texto I no que se refere Céu voando”, pode-se depreender que há
ao ponto de vista sobre o amor. uma ideia de exagero com o objetivo de
e) Os dois textos convergem quanto à forma e à expressar intensidade, ou seja, uma figu-
linguagem, mas divergem quanto ao conteúdo. ra de linguagem conhecida como hipér-
bole.
3. Assinale a alternativa correta sobre o texto I. III. Pode-se afirmar que há uma figura de lin-
a) Expressa as vivências amorosas do eu lírico guagem conhecida como metonímia nos
em linguagem emotivo-confessional. seguintes versos: “Agora espero, agora
b) Apresenta índices de linguagem poética desconfio;/ Agora desvario, agora acerto”.
marcada pelo racionalismo do século XVI. IV. Quanto ao soneto apresentado, pode-se
c) Conceitua o amor de forma unilateral, re- afirmar que a escolha do léxico e a estru-
velando o intenso sofrimento do coração tura formal remetem à atitude clássica.
apaixonado. Pode-se afirmar, ainda, que a inquietação
d) Notam-se, em todos os versos, imagens poé- do eu lírico manifesta-se por meio das
ticas contraditórias, criadas a partir de subs- antíteses, por exemplo: “ardor x frio”;
tantivos concretos. “terra x Céu”, entre outros.
e) Conceitua positivamente o amor corres- É correto o que se afirma em
pondido e, negativamente, o amor não cor- a) I e II, apenas.
respondido. b) III e IV, apenas.
c) II e IV, apenas.
d) I, III e IV, apenas.
4. (Uespi) Muitas são as formas fixas que foram
cultivadas por Camões. Muitas dessas formas e) II e III, apenas.
também foram praticadas por outros poetas
do Quinhentismo português, a exemplo de 6
. Assinale a incorreta sobre Camões:
Sá de Miranda e Antônio Ferreira. Assim, a) Sua obra compreende os gêneros épico, líri-
dentre as formas literárias que compõem a co e dramático.
poética de Camões, quais não podemos assi- b) A lírica de Camões permaneceu praticamente
nalar como cultivadas pelo poeta? inédita. Sua primeira compilação é póstuma,
a) Odes e elegias. datada de 1595, e organizada sob o título
b) Figurados e canto real. de As Rimas de Luis de Camões, por Fernão
c) Oitavas e écoglas. Rodrigues Lobo Soropita.
d) Redondilhas e epopeia. c) Sua lírica compõe-se exclusivamente de re-
e) Canções e sextinas.
dondilhas e sonetos.
d) Apesar de localizada no período clássico-re-
5. (Ifsp) Leia o soneto abaixo, de Luís de Camões. nascentista, a obra possui citações barrocas.
Soneto e) Representa o amadurecimento de língua
portuguesa, sua estabilização e a maior ma-
Luís de Camões nifestação de sua excelência literária.
Tanto de meu estado me acho incerto,
Que em vivo ardor tremendo estou de frio;
Sem causa, juntamente choro e rio,
O Mundo todo abarco e nada aperto.
É tudo quanto sinto um desconcerto:
Da alma um fogo me sai, da vista um rio;
Agora espero, agora desconfio;
Agora desvario, agora acerto.
Estando em terra, chego ao Céu voando;
Num’hora acho mil anos, e é de jeito
Que em mil anos não posso achar um’hora.

307
7. Ainda sobre Camões, assinale a incorreta: 2. Sobre o poema Os Lusíadas, é incorreto afir-
a) Não há um texto definitivo de lírica camo- mar que:
niana. Atribuem-se-lhe cerca de 380 compo- a) quando a ação do poema começa, as naus
sições líricas, destacando-se os cerca de 200 portuguesas estão navegando em pleno Oce-
sonetos, alguns de autoria controversa. ano Índico, portanto no meio da viagem.
b) Camões teria reunido sua lírica sob o titu- b) na Invocação, o poeta se dirige às Tágides,
lo de O Parnaso Lusitano, que se perdeu, e ninfas do rio Tejo.
do qual há algumas referências nas cartas c) Na ilha dos Amores, após o banquete, Tétis
do poetas. conduz o capitão ao ponto mais alto da ilha,
c) As redondilhas de Camões seguem os mol- onde lhe descenda a “máquina do mundo”.
des da poesia palaciana do Cancioneiro d) Tem como núcleo narrativo a viagem de Vas-
Geral de Garcia de Resende e, mesmo na co da Gama, a fim de estabelecer contato
medida velha, o poeta superou seus con- marítimo com as Índias.
temporâneos e antecessores. e) É composto em sonetos decassílabos, man-
tendo em 1.102 estrofes o mesmo esquemas
d) A lírica na medida velha, tradicional, me-
de rimas.
dieval, vale-se dos motes glosados, das re-
dondilhas e são de cunho galante, alegre
3. O desejo de criar um novo mundo, um rei-
madrigalesco.
e) A principal diferença entre a poesia lírica e no feliz não se concretizou. Em vez disso,
a poesia épica é formal e manifesta-se na os navegadores praticaram atos violentos no
utilização de versos de diferentes metros. processo das conquistas. Em que versos o Gi-
gante Adamastor refere-se a essa violência:
a) Sabes que quantas naus esta viagem
8. Não são modalidade da medida nova:
Que tu fazes, fizeram, de atrevidas,
a) canção e elegia.
Inimiga terão estas paragem.
b) soneto e ode.
b) Chamei-me Adamastor, e fui na guerra
c) erceto e oitava.
Contra o que vibra os raios da Vulcano
d) écloga e sextina.
c) Mas, conquistando as ondas do oceano
e) trova e vilancete.
Fui capitão domar por onde andava
A armada de Netuno, que eu buscava
E.O. Complementar d) Ouve os danos de mim que apercebidos
Estão a te sobejo atrevimento
Por todo o largo mar e pela terra
1. Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as Que inda hás de subjulgar com dura guerra.
afirmações a seguir, referentes ao “Canto V” e) Comecei a sentir o Fado inimigo
de “Os Lusíadas”, de Luís de Camões. Por meus atrevimentos, o castigo.
( ) Vasco da Gama conta ao rei africano a
partida da terra portuguesa, onde a tri- 4. Os gêneros literários são empregados com fi-
pulação deixa o coração e as mágoas. nalidade estética. Leia os textos a seguir.
( ) Ao descrever Adamastor, Vasco da Gama
cita, entre as características do gigante, a Busque Amor novas artes, novo engenho,
barba esquálida, os olhos encovados e os Para matar-me, e novas esquivanças;
cabelos crespos. Que não pode tirar-me as esperanças,
( ) Paulo da Gama, irmão de Vasco, narra a Que mal me tirará o que eu não tenho.
Camões, L. V. de. Sonetos. Lisboa: Livraria
viagem dos lusos até Melinde. Clássica Editora. 1961. Fragmento.
( ) O aventureiro Fernão Veloso, ao ser ata-
cado por etíopes, volta correndo para jun- Porém já cinco sóis eram passados
to dos companheiros, cena que empresta Que dali nos partíramos, cortando
humor ao poema épico. Os mares nunca doutrem navegados,
( ) O poeta Luís de Camões assume a narra- Prosperamente os ventos assoprando,
ção do poema para elogiar a tenacidade Quando uma noite, estando descuidados
portuguesa. Na cortadora proa vigiando,
Uma nuvem, que os ares escurece,
A sequência correta de preenchimento dos Sobre nossas cabeças aparece.
parênteses, de cima para baixo, é: Camões, L. V. Os Lusíadas. Abril Cultural,
a) F – F – V – F – V 1979. São Paulo. Fragmento.
b) V – F – F – V – V
c) F – V – F – V – F Assinale a alternativa que apresenta, respec-
d) V – V – F – V – F tivamente, a classificação dos textos.
e) F – F – V – F – F a) Épico e lírico.
b) Lírico e épico.
c) Lírico e dramático.
d) Dramático e épico.

308
E.O. Dissertativo Como fosse impossíbil alcançá-la
Pela grandeza feia de meu gesto,
Determinei por armas de tomá-la
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO E a Dóris este caso manifesto.
Partimo-nos assim do santo templo De medo a deusa então por mi lhe fala;
Que nas praias do mar está assentado, Mas ela, c’um fermoso riso honesto,
Que o nome tem da terra, para exemplo, Respondeu: ‘Qual será o amor bastante
Donde Deus foi em carne ao mundo dado. De ninfa, que sustente o dum gigante?”
Certifico-te, ó Rei, que se contemplo Camões, Os Lusíadas
Como fui destas praias apartado,
Cheio dentro de dúvida e receio, Nas estrofes acima, extraídas do episódio do
Que a penas nos meus olhos ponho o freio. Adamastor, observamos o amor entre o Gi-
Camões, Os Lusíadas, Canto 4º - 87. gante e Tétis, a “Princesa das Águas”. A par-
tir disso, responda:
1. (Ufscar) O trecho faz parte do poema épico a) Como se manifesta, no texto, o amor do gi-
“Os Lusíadas”, escrito por Luís Vaz de Ca- gante, e como Tétis reage a esse amor?
mões e narra a partida de Vasco da Gama, b) Quem é, no poema de Camões, o gigante
para a viagem às Índias. Adamastor?
a) Em que estilo de época ou época histórica se
situa a obra de Camões? TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
b) Para dizer que o nome do templo é Belém, Ca-
mões faz uso de uma perífrase: “Que o nome Os bons vi sempre passar
tem da terra, para exemplo,/ Donde Deus foi No Mundo graves tormentos;
em carne ao mundo dado”. Em que outro tre- E pera mais me espantar
cho dessa estrofe Camões usa outra perífrase? Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.
2.
Cuidando alcançar assim
“Amor é fogo que arde sem se ver;
O bem tão mal ordenado,
É ferida que dói e não se sente
É um contentamento descontente; Fui mau, mas fui castigado,
É dor que desatina sem doer;” Assim que só pera mim
Lírica de Camões, seleção, prefácio e Notas de Anda o Mundo concertado.
MASSAUD MOISÉS, São Paulo: Cultrix, 1963. Luís de Camões: Ao desconcerto do Mundo. In: Obra
Completa. Rio de Janeiro: Aguilar Editora, 1963, p. 475-6.
“Terror de te amar num sítio tão frágil como
o mundo.
4. (Ufscar) O poema está composto com versos
Mal de te amar neste lugar de imperfeição
de sete sílabas e na forma conhecida como
Onde tudo nos quebra e emudece
“esparsa” que, junto com outras, constituía
Onde tudo nos mente e nos separa.” o estoque de formas medievais que muitos
Sophia de Mello Breyner Andresen, “Terror poetas clássicos de Portugal, dentre os quais
de te amar”. In: Antologia Poética.
Camões, continuaram usando no século XVI
Dos dois textos transcritos, o primeiro é de e que se denominavam de “medida velha”.
Luís Vaz de Camões (século XVI) e o segun- Além dessas formas, Camões usou as italia-
do, de Sophia de Mello Breyner Andresen nizantes ou clássicas, que se denominavam
(século XX). Compare-os, discutindo, através de “medida nova”.
de critérios formais e temáticos, aspectos a) Cite outra forma de “medida velha” usada
em que ambos se aproximam e aspectos em por Camões.
que ambos se distanciam um do outro. b) Cite duas formas de “medida nova”.

3. (UFJF) Leia o fragmento a seguir e respon- A respeito do epílogo de Os Lusíadas, respon-


da ao que se pede. da às próximas duas questões.
“Amores da alta esposa de Peleu Não mais, musa, não mais, que a lira tenho
Me fizeram tomar tamanha empresa. Destemperada e a voz enrouquecida,
Todas as deusas desprezei do céu, E não do canto, mas de ver que venho
Só por amar das águas a princesa. Cantar a gente surda e endurecida.
Um dia a vi co’as filhas de Nereu, O favor com que mais se acende o engenho
Sair nua na praia: e logo presa Não nos dá a pátria, não, que está metida
A vontade senti de tal maneira No gosto da cobiça e na rudeza
Que inda não sinto cousa que mais queira. Duma austera, apagada e vil tristeza (...)

309
5. d) Embora surja como uma voz discordante em
a) Indique os sentidos que os substantivos “favor” relação ao propósito de exaltação das Nave-
e “engenho” possuem no verso 5. gações apresentado pelo narrador épico, o
b) Faça um breve teor do texto, comparando-o discurso do Velho do Restelo mostra-se coe-
com o teor da proposição. rente com uma ideologia defensora da vida
junto à Pátria e à Família.
e) A opinião do Velho do Restelo em relação às
E.O. Objetivas Navegações é, ao mesmo tempo, reacionária,
uma vez que defende a conservação dos va-
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) lores humanitários e familiares, e arrojada,
já que o personagem prevê com sabedoria os
1. (Fuvest) Leia o trecho de Memorial do con- desastres que resultariam das viagens.
vento, de José Saramago.
Já vai andando a récua dos homens de Arga- 3. (Fuvest) Na lírica de Camões:
nil, acompanham-nos até fora da vila as in- a) o metro usado para a composição dos sone-
felizes, que vão aclamando, qual em cabelo, tos é a redondilha maior.
Ó doce e amado esposo, e outra protestando, b) encontram-se sonetos, odes, sátiras e autos.
Ó filho, aquém eu tinha só para refrigério e c) cantar a Pátria é o centro das preocupações.
doce amparo desta cansada já velhice minha, d) encontra-se uma fonte de inspiração de mui-
não se acabavam as lamentações, tanto que tos poetas brasileiros do século XX.
os montes de mais perto respondiam, quase e) a Mulher é vista em seus aspectos físicos,
movidos de alta piedade. despojada de espiritualidade.

Em muitas passagens do trecho transcrito, o


narrador cita textualmente palavras de um
episódio de Os Lusíadas, visando a criticar o
E.O. Dissertativas
mesmo aspecto de vida de Portugal que Ca- (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
mões, nesse episódio, já criticara. O episódio
camoniano citado e o aspecto criticado são, 1. (Fuvest)
respectivamente: Oh! Maldito o primeiro que, no mundo,
a) O Velho do Restelo; posição subalterna da Nas ondas vela pôs em seco lenho!
mulher na sociedade tradicional portuguesa.
Digno da eterna pena do Profundo,
b) Aljubarrota; a sangria populacional provoca-
da pelos empreendimentos coloniais portu- Se é justa a justa Lei que sigo e tenho!
gueses. Nunca juízo algum, alto e profundo,
c) Aljubarrota; o abandono dos idosos decor- Nem cítara sonora ou vivo engenho,
rente dos empreendimentos bélicos, maríti- Te dê por isso fama nem memória,
mos e santuários. Mas contigo se acabe o nome e a glória.
d) O Velho do Restelo; o sofrimento popular de- Camões, Os Lusíadas
corrente dos empreendimentos dos nobres.
e) Inês de Castro; e o sofrimento feminino cau- a) Considerando esse trecho da fala do velho
sado pelas perseguições das Inquisições. do Restelo no contexto da obra a que per-
tence, explique os dois primeiros versos, es-
clarecendo o motivo da maldição que, neles,
2. (Fuvest) Sobre o episódio do Velho do Reste- é lançada.
lo, assinale a alternativa correta: b) Nos quatro últimos versos, está implicada
a) O discurso do Velho do Restelo tem significa- uma determinada concepção da função da
do complexo, na medida em que sua opinião arte. Identifique essa concepção, explican-
se apresenta de maneira obscura: ele conde- do-a brevemente.
na certos aspectos da expansão ultramarina
ao mesmo tempo em que exalta o poderio TEXTOS PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
bélico de Portugal. JACÓ ENCONTRA-SE COM RAQUEL
b) Trata-se de um episódio de intensidade dra-
Depois disse Labão a Jacó: Acaso, por seres
mática, dadas as circunstâncias em que a
meu parente, irás servir-me de graça? Dize-
cena ocorre e ao conteúdo do discurso pro-
-me, qual será o teu salário? Ora Labão ti-
ferido pela personagem, que nada mais é do
nha duas filhas: Lia, a mais velha, e Raquel,
que a opinião do próprio autor da epopéia.
c) A veemência do discurso do Velho do Restelo a mais moça. Lia tinha olhos baços, porém
reside no apelo feito pelo próprio aspecto Raquel era formosa de porte e de semblan-
físico do personagem, que indica a sabedo- te. Jacó amava a Raquel, e disse: Sete anos
ria acumulada por quem se tornou, com o te servirei por tua filha mais moça, Raquel.
decorrer dos anos, humilde e resignado. Respondeu Labão: Melhor é que eu te dê, em
vez de dá-la a outro homem; fica, pois, co-
migo.

310
Assim, por amor a Raquel, serviu Jacó sete 3. (Fuvest) Os paradoxos do sentimento amoroso
anos; e estes lhe pareceram como poucos constituem um dos temas favoritos de sua po-
dias, pelo muito que a amava. Disse Jacó a esia lírica, exercitada sobretudo nos sonetos.
Labão: Dá-me minha mulher, pois já venceu a) De que poeta se trata?
o prazo, para que me case com ela. Reuniu, b) Indique um texto do poeta em que este sen-
pois, Labão todos os homens do lugar, e deu timento contraditório se manifesta.
um banquete. À noite, conduziu a Lia, sua
filha, e a entregou a Jacó. E coabitaram. (...) 4. (Fuvest) Camões escreveu obra épica ou lírica?
Ao amanhecer, viu que era Lia, por isso disse Justifique sua resposta, exemplificando com
Jacó a Labão: Que é isso que me fizeste? Não obras do autor.
te servi por amor a Raquel? Por que, pois,
me enganaste? Respondeu Labão: Não se faz
assim em nossa terra, dar-se a mais nova an- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
tes da primogênita. Decorrida a semana des- A(s) questão(ões) seguintes tomam por base a
ta, dar-te-emos também a outra, pelo traba- oitava estrofe do “Canto VI” de OS LUSÍADAS,
lho de mais sete anos que ainda me servirás. de Luís de Camões (1524?-1580), e o poema A
Concordou Jacó, e se passou a semana des- ONDA, de Manuel Bandeira (1886-1968).
ta; então Labão lhe deu por mulher Raquel,
sua filha. (...) E coabitaram. Mas Jacó amava OS LUSÍADAS, VI, 8
mais a Raquel do que a Lia; e continuou ser- No mais interno fundo das profundas
vindo a Labão por outros sete anos. Cavernas altas, onde o mar se esconde,
(Gênesis, 29,15-30 BÍBLIA SAGRADA Trad. João Ferreira de Lá donde as ondas saem furibundas,
Almeida. Rio de Janeiro: Sociedade Bíblica do Brasil, 1962.) Quando às iras do vento o mar responde,
Netuno mora e moram as jucundas
SONETO 88 Nereidas e outros Deuses do mar, onde
Sete anos de pastor Jacó servia As águas campo deixam às cidades
Labão, pai de Raquel, serrana bela; Que habitam estas úmidas Deidades.
Mas não servia ao pai, servia a ela, CAMÕES, Luís de. Os Lusíadas. Lisboa:
Imprensa Nacional, 1971. p. 195.
Que a ela só por prêmio pretendia.
Os dias, na esperança de um só dia, A ONDA
Passava, contentando-se com vê-la; a onda anda
Porém o pai, usando de cautela, aonde anda
Em lugar de Raquel lhe dava Lia. a onda?
a onda ainda
Vendo o triste pastor que com enganos
ainda onda
Lhe fora assi[m] negada a sua pastora, ainda anda
Como se a não tivera merecida, aonde?
Começa de servir outros sete anos, aonde?
Dizendo: -Mais servira, se não fora a onda a onda
BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira. Rio
Pera tão longo amor tão curta a vida! de Janeiro: José Olympio, 1966. p. 286.
(CAMÕES. OBRA COMPLETA. Rio de
Janeiro: Aguilar, 1963, p. 298.)

5. (Unesp) O poema épico de Camões, entre ou-


2. (Unesp) O racionalismo é uma das caracte- tros ingredientes da epopeia clássica, apre-
rísticas mais frequentes da literatura clássi- senta o chamado ‘maravilhoso’, que consiste
ca portuguesa. A logicidade do pensamento na intervenção de seres sobrenaturais nas
quinhentista repercutiu no rigor formal de ações narradas. Quando tais seres perten-
seus escritores, e no culto à expressão das cem ao universo da Mitologia Clássica, diz-se
“verdades eternas”, sem que isto implicasse ‘maravilhoso pagão’; quando pertencem ao
tolhimento da liberdade imaginativa e poé- universo do Cristianismo, diz-se ‘maravilho-
tica. Com base nestas observações, releia os so cristão’. Com base nesta informação:
dois textos apresentados e: a) identifique o tipo de ‘maravilhoso’ presente
a) aponte um procedimento literário de Camões na oitava de Os Lusíadas; e
que comprove o rigor formal do classicismo; b) comprove sua resposta com exemplos da
b) indique o dado da passagem bíblica que, por própria estrofe.
ter sido omitido por Camões, revela a prática
da liberdade poética e confere maior carga
sentimental ao seu modo de focalizar o mes-
mo episódio.

311
6. (Fuvest) Responda às seguintes questões so-
bre “Os Lusíadas”, de Camões:
E.O. Dissertativo
1.
a) Identifique o narrador do episódio no qual
está inserida a fala do Velho do Restelo. a) A obra de Luis Vaz de Camões situa-se no
b) Compare, resumidamente, os principais valo- período renascentista português (Classi-
res que esse narrador representa, no conjun- cismo) do século XVI (1527-1580).
to de “Os Lusíadas”, aos valores defendidos b) O verso “santo templo / Que nas praias
pelo Velho do Restelo, em sua fala. do mar está assentado” é uma outra re-
ferência perifrástica à Torre de Belém,
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO “caravela fendida no mar”, e marco co-
memorativo das navegações portugue-
Cessem do sábio Grego e do Troiano sas, erigido à saída do Rio Tejo, em esti-
As navegações grandes que fizeram; lo manuelino.
Cale-se de Alexandre e de Trajano 2.
Aproximam-se de duas maneiras, uma pela
A fama das vitórias que tiveram;
temática do amor e outra pela utilização de
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram. anáforas. E distanciam-se pela metrificação
Cesse tudo o que a Musa antiga canta, (versos decassílabos em Camões e livres em
Que outro valor mais alto se alevanta. Andresen) e pela maneira que a temática do
amor é abordada (em Camões o amor é im-
7. (Unesp) A oitava anterior constitui a terceira pessoal, e em Andresen é pessoal).
estrofe de OS LUSÍADAS, de Luís de Camões, 3.
poema épico publicado em 1572, obra máxi- a) Há pelo gigante Adamastor um amor sem
ma do Classicismo português. O tipo de verso limites pela “Princesa das Águas”. É ca-
que Camões empregou é de origem italiana paz de forçá-la a amá-lo. Tétis, por sua
e fora introduzido na Literatura Portuguesa vez, mensura quanto deve ser o amor
algumas décadas antes, por Sá de Miranda. para amar um gigante.
Quanto ao conteúdo, o poema OS LUSÍADAS b) No poema de Camões, o Cabo das Tormen-
toma como ponto de referência um episódio tas é personificado na figura do Gigante
da História de Portugal. Baseado nestes co- Adamastor.
mentários e em seus próprios conhecimen- 4.
tos, releia a estrofe citada e indique: a) Camões utiliza-se do “vilancete”, cuja
a) o tipo de verso utilizado (pode mencionar modalidade poética inicia-se por um
simplesmente o número de sílabas métricas); mote (assunto) e glosa (desenvolvimento
b) o episódio da História de Portugal que serve do assunto propostos)
de núcleo narrativo ao poema. b) O soneto é a forma de “medida nova”
usada por Camões. Entre outras formas,
há: elegia, oitavas, ode, sextina...
Gabarito 5.
a) O substantivo “favor” significa: condição
favorável propícia, “inspiração”. Já “en-
E.O. Aprendizagem genho” é capacidade de criar, realizar,
produzir com arte, com talento.
1. E 2. D 3. E 4. C 5. B b) O epílogo faz a crítica a uma “gente surda e
6. A 7. C 8. D 9. E endurecida” de hoje, ao da proposição, que
exalta o “ilustre feito humano” de ontem.

E.O. Fixação
1. D 2. D 3. B 4. B 5. C E.O. Objetivas
6. C 7. E 8. E (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
1. D 2. D 3. D

E.O. Complementar
1. D 2. E 3. D 4. B

312
E.O. Dissertativas 6.
a) O narrador do episódio em questão é Vas-
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp) co da Gama, o herói do poema, que, em
1. dada altura da fábula, assume a função
a) Trata-se do do canto IV de “Os Lusíadas” de personagem-narrador.
em que Camões engrandece as conquistas b) O herói Vasco da Gama representa o herói
de Portugal na África e na Índia. O eu lí- épico da aventura lusitana e especialmen-
rico é o Velho do Restelo que, no início,
te a lógica de expansão marítima e co-
logo nos dois primeiros versos, amaldiçoa
quem primeiro içará velas a uma embar- mercial do Império Lusitano, que implica
cação, para com ela se atirar aos mares da a dilatação da fé cristã e do comércio oci-
conquista, do poder e da glória. O que se dental. Vasco da Gama representa o proje-
vê é uma postura que repudia a expansão to político da Dinastia de Avis, que aplica
mercantil portuguesa, opondo-se à “justa os valores racionalistas e as conquistas da
lei” e que só traria desgraça a Portugal. ciência no desenvolvimento do comércio.
b) Os quatro últimos versos da estrofe mos- O Velho do Restelo, que é uma persona-
tram o desejo condenatório de que aquele
gem alegórica, representa os valores me-
que se aventurar aos mares jamais viesse
dievais contrários às navegações portu-
a ter recompensa da glória ou da posteri-
dade. Dons estes que nada valem quando guesas, pois achava que aquilo tudo era
isentos da moral e da virtude. Logo, veri- apenas desejo de poder. O Velho pode ser
fica-se que, para o Velho, a concepção do entendido como manifestação do ideal da
valor da arte está atrelada aos princípios Dinastia de Borgonha presa à ordem feu-
éticos e à tradição. dal, logo ainda teocêntrica e vinculada à
2. economia agrária.
a) A opção pelos versos decassílabos e a es- 7.
trutura rímica petrarquiana. a) Decassílabo.
b) O poeta Camões omite que Jacó casou-se com b) A viagem de Vasco da Gama às Índias.
Lia e, depois de uma semana, com Raquel.
3.
a) Luis Vaz de Camões
b) “Amor é fogo que arde sem se ver”
4.
O poeta Luis Vaz de Camões escreveu tan-
to obra épica quanto lírica. O poema épico
Os Lusíadas, foi publicado em 1572 e narra
a viagem de Vasco da Gama às Índias, bem
como a História de Portugal e de seus reis. Os
poemas líricos – sonetos, elegias, cantigas,
redondilhas e estão contemplados em sua
fase lírica e estão compilados na obra Rimas,
de 1595 (publicação póstuma).
5.
a) Em função da presença de figuras mitoló-
gicas, trata-se do “maravilhoso pagão”.
b) “Netuno mora e moram as jucundas Ne-
reidas e outros Deuses do mar, onde”.

313
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Aula 5

Quinhentismo e Barroco
Competência 5
Habilidades 15, 16 e 17
Competência 1 – Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para
sua vida.
H1 Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como elementos de caracterização dos sistemas de comunicação.
H2 Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de comunicação e informação para resolver problemas sociais.
H3 Relacionar informações geradas nos sistemas de comunicação e informação, considerando a função social desses sistemas.
H4 Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação.
Competência 2 – Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) (LEM) como instrumento de acesso a informações e a outras
culturas e grupos sociais.
H5 Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM ao seu tema.
H6 Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus mecanismos como meio de ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e culturas.
H7 Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e seu uso social.
H8 Reconhecer a importância da produção cultural em LEM como representação da diversidade cultural e linguística.
Competência 3 – Compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da
identidade.
H9 Reconhecer as manifestações corporais de movimento como originárias de necessidades cotidianas de um grupo social.
H10 Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em função das necessidades cinestésicas.
Reconhecer a linguagem corporal como meio de interação social, considerando os limites de desempenho e as alternativas de adaptação para
H11
diferentes indivíduos.
Competência 4 – Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e
da própria identidade.
H12 Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos artistas em seus meios culturais.
H13 Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos.
H14 Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos.
Competência 5 – Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante
a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção.
H15 Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.
H16 Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário.
H17 Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional.
Competência 6 – Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da
realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação.
H18 Identificar os elementos que concorrem para a progressão temática e para a organização e estruturação de textos de diferentes gêneros e tipos.
H19 Analisar a função da linguagem predominante nos textos em situações específicas de interlocução.
H20 Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a preservação da memória e da identidade nacional
Competência 7 – Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas.
H21 Reconhecer em textos de diferentes gêneros, recursos verbais e não-verbais utilizados com a finalidade de criar e mudar comportamentos e hábitos.
H22 Relacionar, em diferentes textos, opiniões, temas, assuntos e recursos linguísticos.
H23 Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.
Reconhecer no texto estratégias argumentativas empregadas para o convencimento do público, tais como a intimidação, sedução, comoção,
H24
chantagem, entre outras.
Competência 8 – Compreender e usar a língua portuguesa como língua materna, geradora de significação e integradora da organização
do mundo e da própria identidade.
H25 Identificar, em textos de diferentes gêneros, as marcas linguísticas que singularizam as variedades linguísticas sociais, regionais e de registro.
H26 Relacionar as variedades linguísticas a situações específicas de uso social.
H27 Reconhecer os usos da norma padrão da língua portuguesa nas diferentes situações de comunicação.
Competência 9 – Entender os princípios, a natureza, a função e o impacto das tecnologias da comunicação e da informação na sua vida
pessoal e social, no desenvolvimento do conhecimento, associando-o aos conhecimentos científicos, às linguagens que lhes dão suporte,
às demais tecnologias, aos processos de produção e aos problemas que se propõem solucionar.
H28 Reconhecer a função e o impacto social das diferentes tecnologias da comunicação e informação.
H29 Identificar pela análise de suas linguagens, as tecnologias da comunicação e informação.
H30 Relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento que elas produzem
Observe, na tabela abaixo, os períodos literários do Brasil Colônia.

Quinhentismo (1500-1601) Barroco (1601-1768) Neoclassicismo (1768-1836)

O primeiro documento escrito foi a Carta de


Publicação do poema épico Prosopopeia, de Publicação de Obras Poéticas, de Cláudio
Pero Vaz de Caminha, destinada a Dom Ma-
Bento Teixeira. Manuel da Costa.
nuel, rei de Portugal.

Florescimento da chamada literatura de


Poesias lírica, religiosa e satírica, de Atuação do Grupo Mineiro em Vila Rica,
informação, cujo objetivo era descrever
Gregório de Matos, em Salvador, Bahia. Minas Gerais.
para a Corte portuguesa a terra descoberta.

Desenvolvimento da literatura de ca- Oratória doutrinária do padre Antônio


Poesia árcade de Cláudio Manuel da Cos-
tequese, com a finalidade de doutrinar Vieira, em Salvador, Maranhão, e outras
ta (sonetos).
os indígenas. áreas do Nordeste brasileiro.

Tomás Antônio Gonzaga escreve Marília de


Textos de teatro com teor catequético. Sermões, do padre Antônio Vieira
Dirceu.

Poesia épica indianista: O Uraguai, de


Produção de poesia religiosa. Conceptismo e cultismo. Basílio da Gama, e Caramuru, de Santa
Rita Durão.

José de Anchieta é o principal expoente da


Contexto de reformas religiosas. A natureza é a base temática.
literatura catequética.

Quinhentismo ou Literatura colonial


A literatura brasileira
floresceu em duas fases
O período é didaticamente chamado de Quinhentis-
mo brasileiro e os documentos produzidos durante
esse tempo não podem ser considerados literatura ar-
tística, mas manifestações literárias, uma vez que
não são criações de caráter artístico, e sim produtos de
observações ora objetivas, ora subjetivas.
Esse primeiro período da história da nossa lite-
ratura, chamado Quinhentismo, começou em 1500, ano
em que Pero Vaz de Caminha, escrivão da frota de
Pedro Álvarez Cabral, enviou a Dom Manuel I a famosa
Carta. Ela comunica ao soberano o “achamento” (esse
era o termo usado na época) das terras brasileiras. No
século XVI, os textos produzidos no Brasil ligam-se a
Descobrimento, de Cândido Portinari (1956).
duas necessidades práticas principais da empresa colo-
nizadora portuguesa: fornecer informação sobre a nova
terra e converter os indígenas ao cristianismo. Nessa literatura de valor principalmente documental, encontram-se
elementos importantes para a compreensão das origens históricas e literárias do Brasil.
A primeira fase corresponde ao período do Brasil colonial, durante os séculos XVII e XVIII. Naquela época,
uma da primeiras vozes da literatura brasileira foi a do poeta Gregório de Matos e Guerra, instalado em Salva-
dor, no século XVII. Durante o século XVIII, Minas Gerais acompanhou a produção de poetas sediados em Vila Rica
(atual Ouro Preto), Mariana, São João Del-Rei, cidades vinculadas ao ciclo do ouro e pedras preciosas.
A segunda fase da literatura brasileira nasceu na época do Brasil independente, a partir de 1822.

317
Não se pode falar em uma literatura “do Brasil”, como característica do país naquele período, mas em
literatura “no Brasil”, uma literatura ligada ao Brasil, que denota as ambições e as intenções do homem europeu.
Divide-se em literatura informativa e literatura jesuítica. O Quinhentismo serviu de inspiração literária para
alguns poetas e escritores do Romantismo – Gonçalves Dias, José de Alencar – e do Modernismo – Oswald de
Andrade, Murilo Mendes.

Literatura de informação
A expansão ultramarina europeia levou inúmeros viajantes às terras recém-descobertas ou exploradas da Ásia, Áfri-
ca e América com a missão de produzir relatórios informativos sobre essas terras e aspectos exóticos e pitorescos
de seus habitantes. Esses relatórios, denominados “crônicas de viagem”, têm caráter mais histórico do que literário,
e a linguagem é predominantemente referencial ou denotativa.
A Carta, de Pero Vaz de Caminha, considerada o primeiro documento da literatura no Brasil, inaugurou a
chamada literatura informativa: manifestações literárias de considerável valor histórico e profundo caráter docu-
mental sobre o Brasil, escritas por cronistas e viajantes estrangeiros. Descrevem e informam sobre a nova colônia
portuguesa, salientando a conquista material e a exaltação da terra nova. Estes relatos visavam a satisfazer a
curiosidade e a imaginação dos europeus.
Na literatura informativa encontram-se do-
© Albert Eckhout/Wikimedia Commons

cumentos, cartas e relatórios de navegantes, admi-


nistradores, missionários e autoridades eclesiásticas.
Descrevem e exaltam a flora, a fauna e os índios do
Brasil, bem como o exotismo e a exuberância de um
mundo tropical. Também predomina o registro referen-
cial da linguagem que reflete tal louvor à terra com o
emprego exagerado de adjetivos no superlativo, bem
como modelos clássicos e renascentistas que tendem
à erudição.
Os textos informativos formam um painel da
vida dos anos iniciais do Brasil Colônia, dando notícias
dos primeiros contatos entre os europeus e a realidade
da nova terra. A opulência da flora e da fauna impres-
sionou vivamente o colonizador, enquanto o modo de
vida dos indígenas foi motivo de muita curiosidade e de
incompreensão – os colonizadores nunca abandonaram
sua concepção de que eram donos de uma cultura supe-
rior no interior do próprio sistema colonial. Esses textos
cumpriam, acima de tudo, uma finalidade prática.
Índio tapuia. Eckhout, A. (1610-1666)
§ Carta, de Pero Vaz da Caminha, escrita em 1500;
§ Diário de navegação, de Pero Lopes de Souza, escrito entre 1530 e 1532, durante a expedição de Martim
Afonso de Sousa;
§ História da Província de Santa Cruz e Tratado da Terra do Brasil, de Pero de Magalhães Gandavo, ou Gân-
davo, publicados, respectivamente, em 1576 e 1826;
§ Tratado descritivo do Brasil em 1587 ou Notícias do Brasil, de Gabriel Soares de Sousa, publicado em 1851.

318
§ Diálogos das grandezas do Brasil (1618), atribuídos a Ambrósio Fernandes Brandão, e a História do Brasil
(1627), de Frei Vicente do Salvador, publicados no século XVII.
Para a história da literatura brasileira, a literatura informativa adquire importância principalmente como
fonte de temas e formas para momentos literários posteriores: o Romantismo e o Modernismo.

Pero Vaz de Caminha

Escrivão da frota de Pedro Álvares Cabral, Caminha escreveu a Dom Manuel, rei de Portugal, no dia 1o de maio de
1500, a Carta – de inestimável valor histórico e de razoável valor literário –, em que comunica o "descobrimento"
do Brasil.

Lendo a Carta

A Carta enviada ao rei Dom Manuel é uma espécie de “certidão de nascimento” do Brasil, pois foi o primeiro do-
cumento escrito nestas terras. É o texto que marca o princípio da literatura brasileira.
A Carta de Caminha, embora escrita nos primórdios da colonização (1500), só veio a ser impressa em 1817,
na Corografia Brasílica, pela imprensa Régia do Rio de Janeiro.

Primeiro trecho
Senhor, posto que o Capitão-mor desta vossa frota, e assim os outros Capitães escrevam a Vossa Alteza a notícia
do achamento desta vossa terra nova, que nesta navegação agora se achou, não deixarei de também dar disso
minha conta a Vossa Alteza, assim como eu melhor puder, ainda que – para o bem contar e falar – o saiba pior
que todos faze! [...] Tome Vossa Alteza, porém, minha ignorância por boa vontade, e creia bem por certo que, para
aformosear nem afear, não porei aqui mais do que aquilo que vi e me pareceu.
[...]
Então seguimos nosso caminho por este mar de longo até terça-feira de Oitavas de Páscoa, que foram 21
dias de abril, quando topamos alguns sinais de terra [...] a saber: Em primeiro lugar um monte grande, muito alto
e redondo e outras serras mais baixas ao sul dele; e terra rasa, com grandes arvoredos. Ao mesmo monte alto
pôs o Capitão o nome de Monte Pascoal; e à terra – Terra de Vera Cruz.

Segundo trecho
© Tonyjeff/Wikimedia Commons

Dali avistamos homens que andavam pela praia, obra


de sete ou oito, segundo disseram os navios pequenos,
por chegarem primeiro. Então lançamos fora os batéis
e esquifes, e vieram logo todos os capitães das naus
a esta nau do Capitão-mor, onde falaram entre si. E
o Capitão-mor mandou em terra no batel a Nicolau
Coelho para ver aquele rio. E tanto que ele começou
de ir para lá, acudiram pela praia homens, quando
aos dois, quando aos três, de maneira que, ao che-
gar o batel à boca do rio, já ali havia dezoito ou vinte
homens. Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma
Carta original de Pero Vaz de Caminha.

319
que lhes cobrisse suas vergonhas. Nas mãos traziam arcos com suas setas. Vinham todos rijos sobre o batel; e
Nicolau Coelho lhes fez sinal que pousassem os arcos. E eles os pousaram.
Ali não pôde deles haver fala, nem entendimento de proveito, por o mar quebrar na costa. Somente deu-lhes
um barrete vermelho e uma carapuça de linho que levava na cabeça e um sombreiro preto. Um deles deu-lhe um
sombreiro de penas de ave, compridas, com uma copazinha de penas vermelhas e pardas como de papagaio; e
outro deu-lhe um ramal grande de continhas brancas, miúdas, que querem parecer de aljaveira, as quais peças
creio que o Capitão manda a Vossa Alteza, e com isto se volveu às naus por ser tarde e não poder haver deles
mais fala, por causa do mar. [...]

Terceiro trecho

A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus,
sem nenhuma cobertura. Nem estimam de cobrir ou de mostrar suas vergonhas; e nisso têm tanta inocência como
em mostrar o rosto. Ambos traziam os beiços de baixo furados e metidos neles seus ossos brancos e verdadeiros,
de comprimento duma mão travessa, da grossura dum fuso de algodão, agudos na ponta como um furador. Mete-
mnos pela parte de dentro do beiço; e a parte que lhes fica entre o beiço e os dentes é feita como roque de xadrez,
ali encaixado de tal sorte que não os molesta, nem os estorva no falar, no comer ou no beber.
Os cabelos seus são corredios. E andavam tosquiados, de tosquia alta, mais que de sobrepente, de boa gran-
dura e rapados até por cima das orelhas. E um deles trazia por baixo da solapa, de fonte a fonte para detrás, uma
espécie de cabeleira de penas de ave amarelas, que seria do comprimento de um coto, mui basta e mui cerrada,
que lhe cobria o toutiço e as orelhas. E andava pegada aos cabelos, pena e pena, com uma confeição branda
como cera (mas não o era), de maneira que a cabeleira ficava mui redonda e mui basta, e mui igual, e não fazia
míngua mais lavagem para a levantar.
O Capitão, quando eles vieram, estava sentado em uma cadeira, bem vestido, com um colar de ouro mui
grande ao pescoço, e aos pés uma alcatifa por estrado. Sancho de Tovar, Simão de Miranda, Nicolau Coelho, Aires
Correia, e nós outros que aqui na nau com ele vamos, sentados no chão, pela alcatifa. Acenderam-se tochas. En-
traram. Mas não fizeram sinal de cortesia, nem de falar ao Capitão nem a ninguém. Porém um deles pôs olho no
colar do Capitão, e começou de acenar com a mão para a terra e depois para o colar, como que nos dizendo que
ali havia ouro. Também olhou para um castiçal de prata e assim mesmo acenava para a terra e novamente para
o castiçal como se lá também houvesse prata.
CAMINHA, Pero Vaz de. Carta ao rei D. Manuel.
In: VOGT, Carlos; LEMOS, J.A. Guimarães de. Ironistas e viajantes.
São Paulo: Abril Educação, s.d. (Coleção Literatura Comentada.)

Pero de Magalhães Gândavo

Autor de O Tratado da Terra do Brasil e da História da Província de Santa Cruz, compostas em louvor ao clima, à
terra e à paisagem, e que estimulam a imigração do leitor.

Uma planta se dá também nesta Província, que da ilha de São Tomé, com a fruita da qual se ajudam muitas
pessoas a sustentar a terra. Esta planta é mui tenra e não muito alta, não tem ramos senão umas folhas que serão
seis ou sete palmos de comprido. A fruita dela se chama banana. Parecem-se na feição com pepinos, criam-se em
cachos. Esta fruita é mui saborosa, e das boas, que há na terra: tem uma pele como de figo (ainda que mais dura)
a qual lhe lançam fora quando a querem comer: mas faz dano à saúde e causa febre a quem se desmanda nela.
GÂNDAVO, Pero de Magalhães. História da Província de Santa Cruz.

320
Leia também este trecho da História da Província Santa Cruz, e observe que Gândavo traz aqui uma inver-
tida noção sobre a língua dos indígenas, além de fazer uma descrição minuciosa sobre o tipo físico do silvícola.

Estes índios são de cor baça, e cabelo corredio; têm o


rosto amassado, e algumas feições dele à maneira de
chinês. Pela maior parte são bem dispostos, rijos e de
boa estatura; gente mui esforçada, e que estima pouco
morrer, temerária na guerra, e de muito pouca conside-
ração: são desagradecidos em grande maneira, e mui
desumanos e cruéis, inclinados a pelejar, e vingativos
por extremo.
Vivem todos mui descansados sem terem outros
pensamentos senão comer, beber, e matar gente, e por
isso engordam muito, mas com qualquer desgosto pelo
conseguinte tornam a emagrecer, e muitas vezes pode
deles tanto a imaginação que se algum deseja a morte,
ou alguém lhe mete em cabeça que há de morrer tal dia
ou tal noite não passa daquele termo que não morra.
São mui inconstantes e mudáveis: creem de ligei-
ro tudo aquilo que lhes persuadem por dificultoso e im-
possível que seja, e com qualquer dissuasão facilmente
o tornam logo a negar. São mui desonestos e dados à
sensualidade, e assim se entregam aos vícios como se Ilustração que retrata Pero Magalhães de Gândavo descrevendo
neles não houvera razão de homens: ainda que todavia animais novos.
em seu ajuntamento os machos e fêmeas têm o devido
resguardo, e nisto mostram ter alguma vergonha.
A língua de que usam, toda pela costa, é uma: ainda que em certos vocábulos difere n’algumas partes; mas
não de maneira que se deixem uns aos outros de entender: e isto até a altura de vinte e sete graus, que daí por
diante há outra gentilidade, de que nós não temos tanta notícia, que falam já outra língua diferente. Esta de que
trato, que é geral pela costa, é mui branda, e a qualquer nação fácil de tomar. Alguns vocábulos há nela de que
não usam senão as fêmeas, e outros que não servem senão para os machos: carece de três letras, convém a saber,
não se acha nela F, nem L, nem R, coisa digna de espanto porque assim não tem Fé, nem Lei, nem Rei e desta
maneira vivem desordenadamente sem terem além disto conta nem peso, nem medida.
GÂNDAVO, Pero de Magalhães. In: VOGT, Carlos; LEMOS. J. A. Guimarães de, Op. Cit.

Literatura de formação ou jesuítica


© Victor Meirelles/Wikimedia Commons

Ao lado da prosa informativa, ocorreram manifesta-


ções em poesia e teatro escritas por jesuítas, com a
finalidade de catequizar os índios. A essa produção
chamamos de literatura de formação, em decorrência
do aspecto didático que apresenta.

Primeira missa no Brasil. Victor Meirelles (1861).


321
Padre José de Anchieta (1534-1597)

© Benedito Calixto/Wikimedia Commons


Padre José de Anchieta

Nessa categoria, merece destaque o padre jesuíta que veio ao Brasil para desenvolver o trabalho missionário de
converter os índios ao Cristianismo. Em 1554, fundou a cidade de São Paulo. Escreveu poemas, crônicas, sermões
e textos teatrais, ora didáticos, ora lírico-religiosos.
Anchieta dominava bem latim, espanhol, português e tupi. Sua linguagem era simples e direta. Escreveu a
primeira gramática tupi-guarani: Arte de gramática da língua mais usada na costa brasileira.
Dentre suas obras, sobressaem os autos Quando no Espírito Santo, se recebeu uma relíquia das onze mil Virgens;
Na Vila de Vitória; Auto de São Lourenço; e o poema De Beata Virgine Dei Madre Maria (À beata Virgem Maria
Mãe de Deus).
Veio ao Brasil com a segunda leva de jesuítas na esquadra de Duarte da Costa, segundo Governador-Geral
do Brasil. Em 1554, participou da fundação do colégio, onde também foi professor, na Vila de São Paulo de Pirati-
ninga, núcleo da futura cidade que receberia o nome de São Paulo. Exerceu o cargo de provincial dos jesuítas, entre
os anos de 1577 e 1587. Escreveu cartas, sermões, poesias, a gramática da língua mais falada na costa brasileira
(o tupi) e peças de teatro, tornando-se representante do Teatro Jesuítico no Brasil.
Sua obra é considerada a primeira manifestação literária em terras brasileiras. A coleção das obras completas do padre
José de Anchieta é dividida em três gêneros: poesia, prosa e obras sobre Anchieta, que somam um total de dezessete volumes.
Leia abaixo A Santa Inês, um dos poemas mais conhecidos de José de Anchieta.

Cordeirinha linda, Nossa culpa escura Vinde mui depressa


como folga o povo fugirá depressa, ajudar o povo,
porque vossa vinda pois vossa cabeça pois com vossa vinda
lhe dá lume novo! vem com luz tão pura. lhe dais lume novo.

Cordeirinha santa, Vossa formosura Vós sois, cordeirinha,


de Iesu querida, honra é do povo, de Iesu formoso,
Vossa santa vinda porque vossa vinda mas o vosso esposo
o diabo espanta lhe dá lume novo. já vos fez rainha,

Por isso vos canta, Virginal cabeça Também padeirinha


com prazer, o povo, pola fé cortada sois de nosso povo,
porque vossa vinda com vossa chegada, pois, com vossa vinda,
lhe dá lume novo. já ninguém pereça. lhe dais lume novo.
PORTELA, Eduardo (Org.). José de Anchieta: poesia. Rio de Janeiro: Agir, 1959.

322
Bosques
Todo o Brasil é um jardim em frescura e bosque
Disponível em <http://warburg.chaa-unicamp.com.br>.

e não se vê em todo o ano árvores nem erva seca. Os


arvoredos se vão às nuvens de admirável altura e gros-
sura e variedade de espécies. Muitos dão bons frutos e
o que lhes dá graça é que há neles muitos passarinhos
de grande formosura e variedade e em seu canto não
dão vantagem aos rouxinóis, pintassilgos, colorinos, e
canários de Portugal e fazem uma harmonia quando
um homem vai por este caminho, que é para louvar
ao Senhor, e os bosques são tão frescos que os lindos
e artificiais de Portugal ficam muito abaixo. Há mui-
tas árvores de cedro, áquila, sândalos e outros paus de
bom olor e várias cores e tantas diferenças de folhas e
flores que para a vista é grande recreação e pela muita
variedade não se cansa de ver
José de Anchieta. Cartas, informações, fragmen-
tos históricos e sermões. Informação da Província
Padre Anchieta, óleo sobre tela, de Cândido Portinari (1954). do Brasil para nosso padre – 1585. Rio de Janei-
ro: Civilização Brasileira, 1933, p. 430-431.

O texto revela uma visão exuberante da natureza do Brasil, semelhante à manifestada na Carta, de Pero Vaz
de Caminha. Os aspectos enfatizados contemplam a flora e a fauna, a grandeza e a variedade do arvoredo e o
encantamento pelos pássaros. A riqueza e a vitalidade do Brasil contrastam com as paisagens de Portugal. Entre
as riquezas do Brasil arroladas no texto, apenas o sândalo, originário da Índia, provavelmente não existia aqui. O
deslumbramento pela natureza do Novo Mundo marcou época tanto no período Brasil Colônia até o período pós-
-Independência.

O poema manifesta o confronto entre o bem e o mal com bastante simplicidade. A chegada de Santa
Inês espanta o diabo e, graças a ela, o povo revigora sua fé. Os versos de cinco sílabas (redondilha menor) dão
ritmo ligeiro ao texto, retomando a métrica das cantigas medievais. A linguagem é clara, as ideias são facilmente
compreensíveis e o ritmo traz musicalidade ao poema, o que contribui para envolver o leitor/ouvinte, bem como
sensibilizá-lo para a mensagem religiosa.

Padre Manuel de Nóbrega

A pedido de Dom João III, integrou a escala de Tomé de Sousa, primeiro Governador Geral do Brasil, o padre Ma-
nuel da Nóbrega, que chefiou o primeiro grupo de jesuítas vindos ao Brasil, em 1549.
Ferrenho defensor da liberdade dos índios, favoreceu os aldeamentos, cultivou a música como auxiliar da
evangelização, promoveu o ensino primário nas escolas de ler e escrever e fundou, pessoalmente, os colégios de
Salvador, Pernambuco e São Paulo, origem da futura cidade, e do Rio de Janeiro, onde exerceu o cargo de reitor.
Depois de colaborar com a expulsão dos estrangeiros da baía de Guanabara, contribuiu para a valorização do poder
central e para a unificação política do território nacional.
Seus pensamentos estão expressos nas Cartas, nos Apontamentos e, sobretudo, no Diálogo sobre a conver-
são do Gentio, de sua autoria.

323
Barroco ou Seiscentismo

© Michelangelo Merisi da Caravaggio/Wikimedia Commons


A dúvida de São Tomé, de Caravaggio.

Contexto
Os embates religiosos

O movimento denominado Barroco ou Seiscentismo aconteceu no segundo período clássico e designou generi-
camente todas as manifestações artísticas produzidas no século XVII até meados do século XVIII. O estilo barroco
sucede o movimento religioso conhecido como Reforma Protestante, liderado pelo teólogo alemão Martinho
Lutero (1483-1546).
A proposta de reformar ensinos teológicos e comportamentos morais da Igreja, baseados exclusivamente

A Reforma Protestante foi um movimento reformista cristão iniciado em 1517 por Martinho Lutero. Ele
apresentou 95 teses, mediante as quais protestava contra a Igreja Católica. À luz delas, propôs uma reforma
baseada em cinco princípios:
1. somente a fé;
2. somente a Escritura;
3. somente Cristo;
4. somente a graça; e
5. somente a glória de Deus.
Lutero denunciou os abusos e equívocos do catolicismo da época, entre eles atos de corrupção, como venda
de indulgências a troco do perdão dos pecados e da salvação eterna. O protestantismo nasceu em decorrência da
resistência à Igreja Católica

no ensino bíblico, provocou a reação da Igreja católica, àquelas alturas já sem muito espaço e poder. A Reforma
dividiu os cristãos. Na tentativa de evitar a perda de fiéis, a Igreja fortaleceu o Tribunal da Inquisição, que passou
a investigar crimes contra a fé católica e deu início à Contrarreforma, com a fundação da Companhia de Jesus
pelo espanhol Inácio de Loyola.
Nas artes, em reação ao primeiro período clássico que revolucionou o teocentrismo medieval, à luz e sob
inspiração dos valores terrenos e humanistas da Antiguidade greco-romana, triunfou o Barroco, que se opôs ao
Humanismo Renascentista em busca do elo perdido da tradição cristã.

324
O contexto português: a união da península Ibérica

Em 1580, Portugal foi anexado à Espanha, em razão do desaparecimento do rei português Dom Sebastião – que
não deixou descendentes diretos –, na batalha de Alcácer-Quibir, na África, em 1578. O rei espanhol Felipe II, um
dos parentes mais próximos de Dom Sebastião, foi proclamado monarca dos lusitanos e deu início à dinastia Filipina
em Portugal, que se estendeu até 1640.

Sucessivamente, três reis espanhóis adotaram o nome Felipe (I, II e III). Foi em dezembro de 1640, que Por-
tugal retomou sua independência, quando o duque de Bragança foi coroado rei, com o nome de Dom João IV, e
cujo reinado durou até 1656.

Na Europa seiscentista, Portugal e Espanha configuraram o modelo de absolutismo católico, que patrocinou
a Contrarreforma, recrudesceu a perseguição aos infiéis pela Inquisição e exigiu obediência ao Index Librorum
Prohibitorum, uma relação de livros proibidos publicada pela Igreja Católica.
Sob dominação filipina, o Barroco português foi significativamente influenciado pelo espanhol, principal
foco irradiador dessa estética que expressa a espiritualidade e o teocentrismo medievais misturados ao racionalis-
mo e ao antropocentrismo herdados do Renascimento.

A arte barroca
© Michelangelo Merisi da Caravaggio/Wikimedia Commons

A ceia em Emaús, de Caravaggio.

O barroco português ocorre em uma Europa impactada pelas grandes navegações dos anos 1500, pelas grandes
conquistas, pela explosão da Reforma Protestante e pelo poder monárquico absolutista. Ele traduz o drama do
homem “entre o céu e a Terra”, atormentado pela fé, pela existência após a morte, pelo julgamento de atos pra-
ticados durante o “trânsito terreno”.
No final dos anos quinhentos e início dos anos seiscentos, conviem dois modos de ver o mundo: o paganis-
mo renascentista em decadência e a religiosidade barroca emergente. A expressão plástica barroca caracteriza-se
pela exacerbação dos tons mais altos e mais coloridos e das texturas mais ricas: mais decoração, mais luz e sombra
em busca deliberada de efeitos.

325
Cultismo e conceptismo

Duas tendências de estilo, no entanto, manifestam-se no Barroco: o cultismo e o conceptismo. Aquele, mais
próprio da poesia, e este, da prosa, sem, no entanto, excluírem-se no conjunto da criação literária. Uma mesma obra
tanto pode pender para uma delas quanto apresentar traços de ambas as tendências.
§ Cultismo – preferência pelo rebuscamento formal da linguagem em jogos de palavras, figuras de lingua-
gem, vernáculo preciosista, efeitos sensoriais – cor, som, forma, volume, sonoridade, imagens eloquentes e
fantasiosas. Conhecer é descrever mediante sensações nada econômicas. Metáforas, antíteses, sinestesias,
trocadilhos, dicotomias e hipérbatos povoam os textos barrocos. A realidade é retratada de forma indireta,
centrada na habilidade verbal do escritor.
A tendência do Barroco cultista também recebeu o nome de gongorismo, cujo escritor mais eloquente foi
o poeta espanhol Luis de Gôngora.

O todo sem a parte não é todo,


A parte sem o todo não é parte,
Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
Não se diga que é parte sendo todo.

Em todo sacramento está Deus todo,


E todo assiste inteiro em qualquer parte,
E feito em partes todo em toda a parte,
Em qualquer parte sempre fica o todo.

O braço de Jesus não seja parte,


Pois que feito Jesus em parte todo,
Assiste cada parte em sua parte.

Não se sabendo parte deste todo,


Um braço, que lhe acharam, sendo parte,
Nos disse as partes todas deste todo.

§ Conceptismo (do espanhol concepto, ideia) – linguagem pautada no raciocínio e no pensamento lógico,
em analogias, histórias ilustrativas etc. Argumentos centrados na inteligência e na razão em busca da con-
cisão e da coesão, sempre disciplinados pela lógica e seus mecanismos oferecidos pelos silogismos e sofis-
mas. Tal tendência também recebeu o nome de quevedismo, graças ao estilo marcante do poeta espanhol
Francisco Gómez de Quevedo.

[...]
Pinta-se o amor sempre menino, porque ainda que passe dos setes anos [...] nunca chega à idade de uso
da razão. Usar de razão e amar são duas coisas que não se juntam. A alma de um menino que vem a ser? Uma
vontade com afetos e um entendimento sem uso. Tal é o amor vulgar. Tudo conquista o amor, quando conquista
uma alma; porém o primeiro rendido é o entendimento. Ninguém teve a vontade, febricitante, que não tivesse o
entendimento frenético. O amor deixara de variar, se for firme, mas não deixara de tresvariar, se é amor. Nunca
o fogo abrasou a vontade, que o fumo não cegasse o entendimento. Nunca houve enfermidade no coração, que
não houvesse fraqueza no juízo.
Padre Antonio Vieira. Sermão do Mandato

326
Características do Barroco literário
O Barroco se traduz como uma arte tensa que oscila entre opostos, marcada pela crise de valores, contradições en-
tre o espírito cristão, antiterreno e teocêntrico, e o espírito renascentista, antropocêntrico, racionalista e mundano.

Conflitos e descontentamentos existenciais

A indefinição entre o divino e o terreno traduz-se em conflito e descontentamento existencial humano. São comuns
os temas pessimistas, as advertências sobre a brevidade da vida, a ênfase na dor e na vergonha de permanecer em
pecado. A relação com a vida terrena é pessimista, só minorada com a crença na vida celeste. O tema da penitência
é constantemente enfatizado pelo martírio da dor.

Ideias em confronto

No Barroco predomina o gosto pela aproximação de realidades em oposição; a submissão e a vida recatada
propostas pela Igreja contrarreformista em contraposição aos desejos humanos e materiais, à possibilidade de
ascensão social, propiciada pelo momento histórico, contrapõe-se a impossibilidade da estrutura social fechada.
Temas constantemente contraditórios, oscilantes entre matéria e amor, carne e espírito, amor ideal e amor humano.
© Divulgação

Cristo bailarino. Madeira com vestígios de policromia. Aleijadinho (1781-1790).

Tendência ao dualismo e ao culto do contraste

No intuito de aproximar opostos, a visão do universo dualista é, ao mesmo tempo, mística e sensual, religiosa e
erótica, espiritual e humana. O homem vive em conflito com o mundo. Para traduzi-lo, abundam antíteses, metá-
foras, sinestesias e hipérboles.
Disponível em <http://interata.squarespace.com>

Detalhe preciosista de igreja barroca.

327
O estilo barroco europeu do século XVII recebeu denominações particulares em cada país:
§ Espanha – gongorismo, originado do nome do poeta Luis de Gôngora (1561-1627).
§ Inglaterra – eufuísmo, derivado do nome da obra Euphues, or the anatomy of wit, do escritor John Lyly
(1554-1606).
§ Itália – marinismo, derivado do nome de Gianbattista Marino (1569-1625).
§ França – preciosismo, em razão do exagero da forma preciosista, afetada e extremamente rebuscada na
corte do rei Luis XIV.
§ Alemanha – silesianismo, estilo característico dos escritores da região da Silésia.

O Barroco em Portugal
O Barroco português conviveu com um país que vivia uma crise de identidade, uma vez que estava sob o domínio
político da Espanha. Dois aspectos ressaltam a produção literária desse período: o esforço dos portugueses de pre-
servar sua cultura e língua e a Contrarreforma, que deu à produção literária amplo caráter religioso, por exemplo
as obras do padre Antônio Vieira, principal escritor português do século XVII.
Em 1580, dois fatos significativos marcaram a vida cultural e política de Portugal: a morte de Camões e a
passagem do país para o domínio espanhol (1580-1640).
A literatura e as artes portuguesas foram influenciadas pelas manifestações culturais espanholas, que co-
nheceram nesse período o “século de ouro” – Cervantes, Gôngora, Quevedo, Lope de Vega e Calderón de La
Barca são importantes escritores desse período. O florescimento do Barroco em Portugal não se deu com a mesma
intensidade que na Espanha. Como forma de resistência política ao domínio espanhol, os escritores portugueses
procuraram preservar a língua e a cultura lusitanas. Assumiram uma postura saudosista, valorizando personagens
e escritores do passado heroico recente: Vasco da Gama, Dom Sebastião, Camões.
Influenciado pela Contrarreforma, o Barroco português também ganhou fortes matizes religiosos, bem
como em todos os países ibéricos. A atuação da Companhia de Jesus e do Tribunal da Inquisição, instaurado em
Portugal em meados do século XVI, completaram o quadro cultural lusitano daquele período religioso e austero.

O Barroco no Brasil
O marco inicial do Barroco brasileiro data de 1601, quando Bento Teixeira publicou o poema épico
Prosopopeia, com estrofes em oitava rima e versos decassílabos, tal qual Os Lusíadas, de Camões, cujo modelo ele
seguiu de perto.
Embora naquela época não houvesse um público leitor significativo no Brasil, a poesia barroca ganhou
impulso com a fundação de várias academias literárias entre os anos de 1720 e 1750. Vicejaram por todo o século
XVII e início do século XVIII, mas foram sufocadas pela fundação da academia chamada Arcádia Ultramarina,
em 1768, e pela ascensão da poesia árcade.

Peculiaridades do Barroco brasileiro

Embora o Barroco brasileiro esteja ligado aos modelos lusitano e espanhol, peculiaridades diferenciam-no
destes.
Durante todo o século XVII, sob o domínio espanhol, continuavam a chegar ao Brasil imigrantes atraídos
pela riqueza, portugueses e demais europeus, e interessados na exploração da terra. Foi o caso dos franceses,
que tentaram dominar o Maranhão no começo do século XVII.

328
A presença estrangeira mais marcante, no entanto, foi a dos holandeses. Enviado pela Companhia das
Índias Ocidentais com o fim de controlar o comércio do açúcar nordestino, o general de origem alemã Johann
Maurits, conhecido como conde Maurício de Nassau, desembarcou no Brasil, em Recife, em 1637, quando já se
estabilizara o domínio holandês nas colônias portuguesas, iniciado em 1624.
Nassau trouxe consigo uma equipe cultural com pintores, arquitetos, escritores, naturistas, médicos, astrólo-
gos etc., com o objetivo de documentar as terras ocupadas pela Holanda e angariar investimentos europeus para
a produção açucareira.
Com Nassau, Recife sofreu uma verdadeira reformulação urbana: jardins, lagos, palácio para sua acomo-
dação na ilha de Antônio Vaz, uma cidade inteira foi modelada a seu gosto. A cidade Maurícia, ao lado de Recife,
entre a foz do rio Capibaribe e Beberibe, emergiu sob sua administração.
As marcas desse tempo ficaram registradas em pinturas e desenhos de Frans Post, encarregado das paisa-
gens e feitos do Governador-Geral, e Albert Eckout, responsável pelo registro dos tipos humanos, da fauna e flora
da “Nova Holanda”, nome de Pernambuco naquela época.
Frans Post tinha apenas 24 anos quando chegou ao Brasil. Morador de Recife entre 1637 e 1644, acompa-
nhou a movimentada campanha do governador, documentando a paisagem e registrando portos e fortificações do
Maranhão à Bahia.
© Divulgação

Aleijadinho

Um Barroco miscigenado

O mundo colonial brasileiro do século XVII não foi influenciado apenas pelo Barroco português, mas, sobretudo,
foi pressionado economicamente, graças à imensa exploração de riquezas naturais, de ouro, principalmente. Em
razão disso, o Barroco brasileiro tornou-se uma manifestação miscigenada das culturas europeia, negra e nativa. Os
espaços do Brasil colonial que lhe serviram de cenário foram principalmente o Nordeste e o estado de Minas Gerais.
Ligado ao ciclo da cana-de-açúcar, o Barroco nordestino aproximou-se da aristocracia rural, exuberante e
pomposa, e refletiu-se na riqueza das construções eclesiásticas e nas amplas acomodações das casas-grandes.
A cidade de Salvador, na Bahia, ainda conta com cerca de 80 igrejas e vários solares e casarões inspirados
no Barroco.
No século XVIII, o Barroco mineiro sobrepujou o da metrópole portuguesa, notadamente nas cidades au-
ríferas de Minas Gerais. Naquela região, sobressaíram as notáveis obras do escultor e arquiteto Antonio Francisco
Lisboa (1730-1814), o Aleijadinho, cujo trabalho pautou-se pela experiência com materiais locais – pedra-sabão e
madeira. O pintor Manuel da Costa Ataíde (1762-1830) deixou mostras de seu talento em pinturas e afrescos nos
tetos e laterais de igrejas mineiras.

329
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Filme O Brasil de Pero Vaz caminha – Direção: Bruno Laet - 2011

Vencedor do Prêmio SESC Rio de Fomento à Cultura, em


2010 – na categoria Novos Talentos, Cinema Documen-
tário –, O Brasil de Pero Vaz caminha se baseia naquele
que é considerado o primeiro documento histórico e
literário do Brasil: a carta de Pero Vaz de Caminha.

Filme Caravaggio – Direção: Derek Jarman - 1986

A curta vida do pintor italiano Michelangelo Merisi da Caravaggio (Nigel


Terry) desde a infância e decepções do início da carreira até os últimos
sucessos, a amizade com um cardeal e a relação destrutiva com um
lutador (Sean Bean) e sua namorada (Tilda Swinton).

Filme 1492 - A CONQUISTA DO PARAÍSO

Vinte anos da vida de Colombo, desde quando se convenceu de que o


mundo era redondo, passando pelo empenho em conseguir apoio financei-
ro da Coroa espanhola para sua expedição, o descobrimento em si da Amé-
rica, o desastroso comportamento que os europeus tiveram com os habi-
tantes do Novo Mundo e a luta de Colombo para colonizar um continente
que ele descobriu por acaso, além de sua decadência na velhice.

330
LER

tt
Livros
Dialética da colonização – Alfredo Bosi
Em capítulos que vão de Anchieta à indústria cultural, Alfredo Bosi, o
conceituado autor da clássica História concisa da literatura brasileira,
persegue com sensibilidade as formas históricas que enlaçaram coloniza-
ção, culto e cultura. Dialética da colonização é o resultado deste percurso
sui generis na história do pensamento brasileiro.

O barroco – Victor Lucien Tapié


Dividido em duas seções, "Concepções Barrocas" e "Experiências Barro-
cas", o volume examina esse fenômeno de arte notadamente nos séculos
XVII e XVIII, sem esconder do leitor observações realmente novas e suges-
tivas concernentes ao estilo, que muitos reputam ser de glória, outros
digno dos períodos de decadência, mas que, todavia, emprestou às
cidades históricas de Minas o seu fausto e o ar sempiterno que ressumam.

331
INTERDISCIPLINARIDADE

Artes plásticas

Projeto para a fachada da Igreja de São Francisco, em São João del-Rei (Aleijadinho)

Retábulo da capela-mor da Igreja de São Francisco, em São João del-Rei (Aleijadinho)

332
Estrutura Conceitual
Literatura de informação
e literatura jesuítica

Pero Vaz de Caminha e


José de Anchieta

Idade Média Idade Moderna

Quinhentismo
Trovadorismo Humanismo Classicismo
Barroco

Movimento vinculado a
conflitos de cunho religioso

Uso de antíteses
e paradoxos

Cultismo e conceptismo

333
E.O. Aprendizagem TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
A partida de Belém, como Vossa Alteza sabe,
foi segunda-feira, 9 de março. [...] E domin-
1. “A feição deles é serem pardos, um tanto
go, 22 do dito mês, às dez horas, pouco mais
avermelhados, de bons rostos e bons nari-
zes, bem feitos. Andam nus, sem cobertura ou menos, houvemos vista das ilhas de Cabo
alguma. Nem fazem mais caso de encobrir Verde, ou melhor, da ilha de S. Nicolau [...]. E
ou deixa de encobrir suas vergonhas do que assim seguimos nosso caminho por este mar
de mostrar a cara. Acerca disso são de grande de longo, até que, terça-feira das Oitavas de
inocência. Ambos traziam o beiço de baixo Páscoa, que foram vinte e um dias de abril,
furado e metido nele um osso verdadeiro, estando da 8dita ilha obra de 660 léguas, se-
de comprimento de uma mão travessa, e da gundo os pilotos diziam, 1topamos alguns si-
grossura de um fuso de algodão, agudo na nais de terra, os quais eram muita quantida-
ponta como um furador.” de de 5ervas compridas, a que os 4mareantes
Carta de Pero Vaz de Caminha. Disponível em: <www. chamam 6botelho [...]. E quarta-feira seguin-
dominiopublico.com.br>. Acesso em: 4 dez. 2012. te, pela manhã, topamos aves a que chamam
7
fura-buxos. Neste dia, a horas de véspera,
O trecho acima pertence a um dos primei-
ros escritos considerados como pertencentes
2
houvemos vista de terra! 9Primeiramente
à literatura brasileira. Do ponto de vista da dum grande monte, mui alto e redondo [...];
evolução histórica, trata-se de literatura: ao monte alto o capitão pôs o nome de 3O
a) de informação. Monte Pascoal, e à terra, A Terra de Vera Cruz.
b) de cordel. Carta de Pero Vaz de Caminha ao rei de Portugal
c) naturalista.
d) ambientalista. 3. Assinale a alternativa CORRETA acerca do texto.
e) árcade. a) Trata-se de documento histórico que inau-
gura, em Portugal, um novo gênero literário:
2. O movimento literário que retrata as ma- a literatura epistolar.
nifestações literárias produzidas no Brasil b) Exemplifica a literatura produzida pelos je-
à época de seu descobrimento e durante o suítas brasileiros na colônia e que teve como
século XVI, é conhecido como Quinhentismo objetivo principal a catequese do silvícola.
ou Literatura de Informação. c) Apesar de não ter natureza especificamente
Analise as proposições em relação a este período. artística, interessa à história da literatura
I. A produção literária no Brasil, no século brasileira na medida em que espelha a lin-
XVI, era restrita às literaturas de viagens guagem e a respectiva visão de mundo que
e jesuíticas de caráter religioso. nos legaram os primeiros colonizadores.
II. A obra literária jesuítica, relacionada às d) Pertence à chamada crônica histórica, pro-
atividades catequéticas e pedagógicas,
duzida no Brasil durante a época colonial,
raramente assume um caráter apenas ar-
com objetivos políticos: criar a imagem de
tístico. O nome mais destacado é o do pa-
dre José de Anchieta. um país soberano, emancipado, em condi-
III. O nome Quinhentismo está ligado a um ções de rivalizar com a metrópole. É um dos
referencial cronológico − as manifesta- exemplos de registros oficiais escritos por
ções literárias no Brasil tiveram início em historiadores brasileiros durante o século
1500, época da colonização portuguesa − XVII, nos quais se observam, como caracte-
e não a um referencial estético. rística literária, traços do estilo barroco.
IV. As produções literárias neste período
prendem-se à literatura portuguesa, in- 4. Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as
tegrando o conjunto das chamadas lite- afirmações a seguir sobre a Literatura de In-
raturas de viagens ultramarinas, e aos formação no Brasil.
valores da cultura greco-latina. ( ) A carta de Pero Vaz de Caminha, enviada ao
V. As produções literárias deste período rei D. Manuel I, circulou amplamente entre
constituem um painel da vida dos anos
a nobreza e o povo português da época.
iniciais do Brasil colônia, retratando os
( ) Os textos informativos apresentavam, em
primeiros contatos entre os europeus e a
realidade da nova terra. geral, uma estrutura narrativa, pois esta
Assinale a alternativa correta. se adaptava melhor aos objetivos dos au-
a) Somente as afirmativas I, IV e V são verdadeiras. tores de falar sobre coisas que viam.
b) Somente a afirmativa II é verdadeira. ( ) Os textos que informavam sobre o Novo
c) Somente as afirmativas I, II, III e V são ver- Mundo despertavam grande curiosidade
dadeiras. entre o público europeu, estando os de
d) Somente as afirmativas III e IV são verdadeiras. Américo Vespúcio entre os mais divulga-
e) Todas as afirmativas são verdadeiras. dos no início do século XVI.

334
( ) Pero de Magalhães Gandavo é o autor A suposta ameaça 7à fibra natural não é o
dos textos “Tratado da Terra do Brasil” e desajeitado e-book, mas o papel eletrônico,
“História da Província Santa Cruz a que uma ‘folha’ que você carregaria dobrada no
Vulgarmente chamamos de Brasil”. bolso. Ela seria capaz de mostrar o jornal do
A sequência correta de preenchimento dos dia – com vídeos, fotos e notícias 8atualiza-
parênteses, de cima para baixo, é: das –, o livro que você estivesse lendo ou
a) V – F – V – V. qualquer informação antes impressa. Tudo
b) V – F – F – F.
ali. Desde os anos 70, está no ar a 5ideia de
c) F – V – V – V.
papel eletrônico, mas as últimas novidades
d) F – F – V – V.
e) V – V – F – F. são de duas semanas atrás. Cientistas holan-
deses anunciaram que estão perto de criar
5. Todas as alternativas são corretas sobre o Pa- uma tela com ‘quase todas’ as propriedades
dre José de Anchieta, EXCETO: do papel: 3leveza, flexibilidade, 4clareza, etc.
a) Foi o mais importante jesuíta em atividade A novidade que deixa o invento um pouco
no Brasil do século XVI. mais palpável está nos transistores. No papel
b) Foi o grande orador sacro da língua portu- do futuro, eles não serão de 6silício, mas de
guesa, com seus sermões barrocos. plástico – que é maleável e barato.
c) Estudou o tupi-guarani, escrevendo uma car- Os holandeses dizem já ter um protótipo que
tilha sobre a gramática da língua dos nativos. mostra imagens em movimento em uma tela
d) Escreveu tanto uma literatura de caráter in-
de duas polegadas, ainda que de qualidade
formativo como de caráter pedagógico.
e) Suas peças apresentam sempre o duelo entre
1
’meia-boca’.
anjos e diabos. 2
Mas não vá celebrando o fim do desmata-
mento e do peso na mochila. A expectativa
6. Sobre José de Anchieta é incorreto afirmar que: é que um papel eletrônico mais ou menos
a) cultivou especialmente os autos, buscan-
convincente apareça só daqui a cinco anos.
do, na alegoria, tornar mais acessíveis às
Folha de S. Paulo, 17 dez. 2001. Folhateen, p. 10.
mentes indígenas os conceitos e os dogmas
do cristianismo.
b) no teatro, o “Auto de São Lourenço” des- 8. (IFCE) Em uma das opções, a afirmação refe-
taca-se como obra catequética de influên- re-se ao Barroco.
cia medieval. a) O homem se mostra feliz consigo mesmo e se
c) na poesia lírica encontram-se suas mais belas
acha o centro do mundo.
composições, expressivas de uma fé profunda.
b) As mensagens dos textos revelam que o ho-
d) apesar de pautada na língua e na cultura do
mem está angustiado e dividido entre o bem
índio, sua produção literária não se caracteri-
e o mal, a matéria e o espírito.
za como literatura já tipicamente brasileira.
c) O estilo era simples e, nos textos, prevalecia
e) sua obra teatral, marcadamente alegórica
a objetividade.
e antirreligiosa, moldou-se nos padrões re-
d) Os textos traziam mensagens de otimismo e
nascentistas.
baseavam-se no princípio de “gozar a vida”.
e) Os escritores, embora vivessem na cidade,
7. (IFSP) O culto exagerado da forma, o rebus-
recomendavam a vida no campo.
camento, a riqueza de pormenores, o conflito
entre o profano e o sagrado são características:
a) do Renascimento. 9. (FGV) Foi um movimento literário do século
b) da Ilustração. XVII, nascido da crise de valores renascen-
c) do Realismo. tistas. Caracteriza-se na literatura pelo culto
d) do Barroco. dos contrastes, a preocupação com o porme-
e) do Simbolismo. nor e a sobrecarga de figuras como a metáfo-
ra, as antíteses, hipérboles e alegorias. Essa
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO linguagem conflituosa reflete a consciência
dos estados contraditórios da condição hu-
VELHO PAPEL PODE ESTAR COM OS ANOS
mana. Trata-se do:
CONTADOS
a) Romantismo.
Já imaginou, daqui a algumas décadas, seu b) Trovadorismo.
neto lhe perguntando o que era papel? Pois c) Humanismo.
é, alguns pesquisadores já estão trabalhando d) Realismo.
para que esse dia chegue logo. e) Barroco.

335
1
0. (UFRGS) Assinale com V (verdadeiro) ou F Está(ão) correta(s):
(falso) a afirmações abaixo sobre os dois a) apenas I.
grandes nomes do barroco brasileiro. b) apenas I e II.
( ) A obra poética de Gregório de Matos os- c) apenas III.
cila entre os valores transcendentais e d) apenas I e III.
os valores mundanos, exemplificando as e) apenas II e III.
tensões do seu tempo.
( ) Os sermões do Padre Vieira caracterizam- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
-se por uma construção de imagens des- UMAS E OUTRAS
dobradas em numerosos exemplos que vi-
sam a enfatizar o conteúdo da pregação. Se uma nunca tem sorriso
( ) Gregório de Matos e o Padre Vieira, em É pra melhor se reservar
seus poemas e sermões, mostram exacer- E diz que espera o paraíso
bados sentimentos patrióticos expressos E a hora de desabafar
em linguagem barroca. A vida é feita de um rosário
( ) A produção satírica de Gregório de Matos e o Que custa tanto a se acabar
tom dos sermões do Padre Vieira represen- Por isso, às vezes ela para
tam duas faces da alma barroca no Brasil. E senta um pouco pra chorar
( ) O poeta e o pregador alertam os contem- Que dia! Nossa!
porâneos para o desvio operado pela retó- Pra que tanta conta
rica retumbante e vazia. Já perdi a conta de tanto rezar.
A sequência correta de preenchimento dos Se a outra não tem paraíso
parênteses, de cima para baixo, é: Não dá muita importância, não.
a) V – F – F – F – F. Pois já forjou o seu sorriso
b) V – V – V – V – F. E fez do mesmo profissão
c) V – V – F – V – F. A vida é sempre aquela dança
d) F – F – V – V – V. Onde não se escolhe o par
e) F – F – F – V – V. Por isso, às vezes ela cansa
E senta um pouco pra chorar

E.O. Fixação
Que dia! Puxa!
Que vida danada
Tem tanta calçada pra se caminhar.
1. A chamada atividade literária das primeiras Mas toda santa madrugada
décadas de nossa formação histórica carac- Quando uma já sonhou com Deus
terizou-se por seu cunho pragmático estrito, E a outra, triste enamorada.
seja a circunscrita ao parâmetro jesuítico, Coitada, já deitou com os seus,
seja a decorrente de viagens de reconheci- O acaso faz com que essas duas,
mento e informação da terra. Que a sorte sempre separou,
São representantes dos dois tipos de ativida- Se cruzem numa mesma rua
de literária referidos no excerto acima: Olhando-se com a mesma dor.
a) Gregório de Matos e Cláudio Manuel da Costa. Que dia! Nossa!
b) Antônio Vieira e Tomás Antônio Gonzaga. Pra que tanta conta
c) José de Anchieta e Gabriel Soares de Sousa. Já perdi a conta de tanto rezar...
d) Bento Teixeira e Gonçalves de Magalhães. Que dia! Puxa!
e) Basílio da Gama e Gonçalves Dias. Que vida danada
Tem tanta calçada para se caminhar.
2. (UFSM) A desarmonia e a contradição são Outro dia! Puxa!
características predominantes no Barroco. Que vida comprida
Observe os fragmentos poéticos de Gregório Pra que tanta vida
de Matos, a seguir transcritos, e verifique Pra gente viver...
Que dia...
qual(quais) confirma(m) essas características.
BUARQUE DE HOLANDA, Chico. Umas e outras.
I. “Amanheceu o dia prometido,/famoso, In: Grandes sucessos de Chico Buarque. LP,
alegre, claro e prazenteiro;/bom dia, dis- Premier/RGE, 1962. l.2. faixa 6.
se eu, para viagem.”
II. “O ódio é da alma infame companhia/a
paz deixou-a Deus à cristandade;/mas ar- 3. (CFTCE) Há, no texto, uma característica tí
rastar por força uma vontade,/em vez de pica do estilo de época chamado:
caridade é tirania.” a) Barroco.
III. “De que pode servir falar quem cala?/ b) Trovadorismo.
Nunca se há de falar o que se sente,/Sem- c) Arcadismo.
pre se há de sentir o que se fala.” d) Classicismo.

336
e) Literatura de Informação ou dos Jesuítas. 8. (Santa Casa) A preocupação com a brevidade
da vida induz o poeta barroco a assumir uma
4. (CFTMG) O Barroco, estilo dominante no sé- atitude que:
culo XVII, relaciona-se à(ao): a) descrê da misericórdia divina e contesta os
a) ideal do liberalismo e da democracia no valores da religião.
Ocidente. b) desiste de lutar contra o tempo, menospre-
b) evolucionismo, com sua doutrina de seleção zando a mocidade e a beleza.
natural.
c) se deixa subjugar pelo desânimo e pela apa-
c) Contra-Reforma, na tentativa de retomar a
tia dos céticos.
tradição cristã.
d) se revolta contra os insondáveis desígnios
d) reaproximação do autor com a natureza se-
rena e bucólica. de Deus.
e) quer gozar ao máximo seus dias, enquanto a
5. (CFTMG) São características do Barroco, exceto: mocidade dura.
a) sentimento repleto de contradições.
b) soberania da razão em detrimento do conflito. 9. Com referência ao Barroco, todas as alterna
c) linguagem obscura e expressão indireta das tivas são corretas, exceto:
ideias. a) O Barroco estabelece contradições entre es-
d) tempo interligado ao fim da beleza e ao pírito e carne, alma e corpo, morte e vida.
tema da morte. b) O homem centra suas preocupações em seu
próprio ser, tendo em mira seu aprimora-
6. (UFV) Considere as afirmações que se se- mento, com base na cultura greco-latina.
guem. Todas elas vinculam a poesia de Gre- c) O Barroco apresenta, como característica
gório de Matos aos princípios estéticos e ide-
marcante, o espírito de tensão, conflito en-
ológicos do Barroco brasileiro, EXCETO:
tre tendências opostas: de um lado, o teo-
a) A vertente lírica da poética de Gregório de
centrismo medieval e, de outro, o antropo-
Matos cultuou o amor feito de pequenos
afetos, da meiga ternura e dos torneios gen- centrismo renascentista.
tis, tendo como cenário o ambiente campes- d) A arte barroca é vinculada à Contrarreforma.
tre e pastoril. e) O Barroco caracteriza-se pela sintaxe obscu-
b) O “Boca do Inferno” insurgiu-se não só con- ra, uso de hipérbole e de metáforas.
tra os desmandos administrativos e políti-
cos da Bahia do século XVII, mas contra o 1
0. No Brasil, o Barroco foi introduzido por
próprio ser humano, que, na concepção do qual poeta:
poeta, é por natureza corrupto e mau. a) Gregório de Matos.
c) Os poemas religiosos de Gregório de Matos b) Mário de Andrade.
fundiram a contemplação da divindade, o
c) Bento Teixeira.
complexo de culpa, o desejo de arrependi-
d) Camões.
mento e o horror de ser pó, sensações, enfim,
frequentes no atormentado espírito barroco. e) Bocage
d) O significado social do Barroco brasileiro foi

E.O. Complementar
marcante, uma vez que a poesia de Gregório
de Matos revestiu-se de alto sentido crítico
aos vícios e violências da sociedade colonial.
e) A produção literária de Gregório de Matos 1. (Fatec) “...milhões de palavras ditas com es-
dividiu-se entre a temática lírico-religiosa e forço de pensamento.”
uma visão crítica das mazelas sociais oriun- Essa passagem do texto faz referência a um
das do processo de colonização no Brasil. traço da linguagem barroca presente na obra
de Vieira; trata-se do:
7. Escolha a alternativa que completa de forma a) gongorismo, caracterizado pelo jogo de ideias.
correta a frase abaixo:
b) cultismo, caracterizado pela exploração da
A linguagem _____, o paradoxo, _____ e o re-
sonoridade das palavras.
gistro das impressões sensoriais são recursos
c) cultismo, caracterizado pelo conflito entre
linguísticos presentes na poesia _____.
a) simples – a antítese – parnasiana fé e razão.
b) rebuscada – a antítese – barroca d) conceptismo, caracterizado pelo vocabulário
c) objetiva – a metáfora – simbolista preciosista e pela exploração de aliterações.
d) subjetiva – o verso livre – romântica e) conceptismo, caracterizado pela exploração
e) detalhada – o subjetivismo – simbolista das relações lógicas, da argumentação.

337
2. Assinale a alternativa INCORRETA. ( ) O Barroco é o primeiro grande período
a) Na obra de José de Anchieta, encontram-se artístico no Brasil. Nas artes plásticas há
poesias seguindo a tradição medieval e textos destaque para a figura do Aleijadinho; na
para teatro com clara intenção catequista. Literatura, para o poeta Gregório de Ma-
b) A literatura informativa do Quinhentismo tos Guerra.
brasileiro empenha-se em fazer um levan- ( ) O Neoclassicismo, movimento estético
tamento da terra, daí ser predominante- propenso a um retorno aos ideais es-
mente descritiva. pirituais e artísticos do Renascimento,
c) A literatura seiscentista reflete um dualis- corresponde a uma tendência contrária
mo: o ser humano dividido entre a matéria e ao barroquismo.
o espírito, o pecado e o perdão. ( ) No texto barroco, a linguagem é retorci-
d) O Barroco apresenta estados de alma ex- da, com bastantes jogos verbais, enfati-
pressos através de antíteses, paradoxos, in- zando a prolixidade e o estilo confuso.
terrogações. ( ) No texto neoclássico, a linguagem é ra-
e) O Conceptismo caracteriza-se pela linguagem cional, as imagens são conhecidas e repe-
rebuscada, culta, extravagante, enquanto o tidas (chavões, lugares-comuns).
Cultismo é marcado pelo jogo de ideias, se- ( ) No Barroco, tanto quanto no Neoclassicis-
guindo um raciocínio lógico, racionalista. mo, os poetas abordaram aspectos como
dúvida, angústia e tédio, sob a forma de
3. O soneto a seguir é representativo da estética: um sentimentalismo lacrimoso.
Não vira em minha vida a formosura,
Ouvia falar nela cada dia, 5. (UEL) O século XVI deve ser reconhecido, na
E ouvida me incitava, e me movia história da literatura brasileira, como um
A querer ver tão bela arquitetura: período de:
a) manifestações literárias voltadas basicamen-
Ontem a vi por minha desventura te para a informação sobre a colônia e para a
Na cara, no bom ar, na galhardia catequese dos nativos.
De uma mulher, que em anjo se mentia; b) amadurecimento dos sentimentos nacio-
De um sol, que se trajava em criatura: nalistas que logo viriam a se expressar no
Romantismo.
Matem-me, disse eu, vendo abrasar-me,
c) exaltação da cultura indígena, tema cen-
Se esta cousa não é, que encarecer-me
tral dos poemas épicos de Basílio da Gama e
Sabia o mundo, e tanto exagerar-me!
Santa Rita Durão.
Olhos meus, disse então por defender-me, d) esgotamento do estilo e dos temas barrocos,
Se a beleza heis de ver para matar-me, superados pelos ideais estéticos do Arcadismo.
Antes olhos cegueis, do que eu perder-me. e) valorização dos textos cômicos e satíricos,
a) barroca. em que foi mestre Gregório de Matos.
b) simbolista.
c) romântica.
d) parnasiana. E.O. Dissertativo
e) árcade.
1. Leia estes trechos:
4. (UFPE) Observe: TRECHO 1
“Descoberto em 1500, no século que, em Colombo sabe perfeitamente que as ilhas já
Portugal, dominava o Classicismo, o Brasil, têm nome, de uma certa forma, nomes na-
por muitas causas, não teve condições de dar turais (mas em outra acepção do termo) as
início à colonização e ao processo cultural. palavras dos outros, entretanto, não lhe in-
Entre as raras manifestações literárias do sé- teressam muito, e ele quer rebatizar os luga-
culo, destaca-se o teatro jesuítico. res em função do lugar que ocupam em sua
A obra de colonização do Brasil, iniciada descoberta, dar-lhes nomes justos a nomea-
propriamente por Martim Afonso em 1530, ção, além disso, equivale a tomar posse.
já pelos inconvenientes do sistema, já por TODOROV, Tzevetan. A conquista da América.
outros motivos fáceis de entender, mais di- São Paulo: Martins Fontes, 1993. p. 27.
ficultosa se tornaria, não fosse a colaboração
oportuna e decisiva dos jesuítas.” TRECHO 2
Faraco e Moura, em Língua e Literatura [...] e a quarta-feira seguinte, pela manhã,
topamos aves a que chamam fura-buchos
A partir de então, surgem dois movimentos e neste dia, a horas de véspera, houvemos
que ainda não podem ser considerados lite- vista de terra, a saber: primeiramente dum
ratura propriamente brasileira. grande monte mui alto e redondo, e de outras

338
serras mais baixas ao sul dele, e de terra chã TEXTO PARA AS QUESTÕES 8 E 9
com grandes arvoredos: ao qual monte alto o
MULHER AO ESPELHO
Capitão pôs nome o Monte Pascoal, e à terra
a Terra da Vera Cruz. Hoje, que seja esta ou aquela,
CAMINHA. Pero Vaz de. Carta ao Rei Dom ManueI. pouco me importa.
Belo Horizonte: Crisálida, 2002. p. 17. Quero apenas parecer bela,
pois, seja qual for, estou morta.
Explicite, comparando os dois trechos, a re-
lação existente entre os atos de nomear e Já fui loura, já fui morena,
tomar posse. já fui Margarida e Beatriz.
Já fui Maria e Madalena.
2. A partir da leitura do texto Carta a el-Rei Só não pude ser como quis.
Dom Manuel sobre o achamento do Brasil, Que mal faz, esta cor fingida
responda: como é a descrição dos primeiros do meu cabelo, e do meu rosto,
índios feita por Pero Vaz de Caminha no li- se tudo é tinta: o mundo, a vida,
toral brasileiro? o contentamento, o desgosto?
Por fora, serei como queira
3. A respeito de Padre Anchieta, responda:
a moda, que me vai matando.
além da vinda para o Brasil para auxiliar na
Que me levem pele e caveira
catequização dos índios mediante a compo-
ao nada, não me importa quando.
sição de peças de teatro, qual a outra maior
contribuição com relação à difusão da educa- Mas quem viu, tão dilacerados,
ção dos índios tupis feita pelo jesuíta? olhos, braços e sonhos seus,
e morreu pelos seus pecados,
4. Quais foram as duas manifestações literárias falará com Deus.
do Quinhentismo no Brasil? Falará, coberta de luzes,
do alto penteado ao rubro artelho.
5. Quem começou a literatura de informação? Porque uns expiram sobre cruzes,
Qual era o seu objetivo? outros, buscando-se no espelho.
MEIRELES, Cecília. Poesias Completa. Rio de
6. Como os jesuítas se aproximaram dos po- Janeiro: Civilização Brasileira, 1973.

vos indígenas? A temática e alguns procedimentos caracte-


rísticos do Barroco no século XVII foram re-
7. (UFV) Leia atentamente o texto: tomados no poema de Cecília Meireles.
Que és terra, homem, e em terra hás de tornar-te,
Te lembra hoje Deus por sua Igreja; 8. O questionamento das concepções do senso
De pó te faz espelho, em que se veja comum quanto à vaidade sugere uma preo-
A vil matéria, de que quis formar-te. cupação também existente entre os autores
Lembra-te Deus, que és pó para humilhar-te, barrocos. Identifique, no poema, um aspecto
E como o teu baixel sempre fraqueja da vaidade apresentado negativamente e ou-
Nos mares da vaidade, onde peleja, tro apresentado positivamente.
Te põe à vista a terra, onde salvar-te.
Alerta, alerta, pois, que o vento berra. 9. O jogo de oposições entre conceitos era um
Se assopra a vaidade e incha o pano, dos recursos característicos da literatura
Na proa a terra tens, amaina e ferra. barroca. Indique um contraste próprio do
Todo o lenho mortal, baixel humano, Barroco que predomina no texto.
Se busca a salvação, tome hoje terra,
Que a terra de hoje é porto soberano. 1
0. Explique quais são as diferenças entre as
MATOS, Gregório de. Poemas escolhidos. modalidades barrocas do cultismo e do
São Paulo: Cultrix, 1997. p. 309.
conceptismo.
Gregório de Matos expressou em sua obra
toda a tensão do século XVII, ao abordar
os temas predominantes do Barroco. Iden-
tifique no poema elementos que atestam o
comprometimento do poeta com o respectivo
momento literário.

339
E.O. Enem 2.

1. Leia estes trechos:


TEXTO I
Andaram na praia, quando saímos, oito ou dez
deles; e daí a pouco começaram a vir mais. E
pareceme que viriam, este dia, à praia, qua-
trocentos ou quatrocentos e cinquenta. Al-
guns deles traziam arcos e flechas, que todos
trocaram por carapuças ou por qualquer coi-
sa que lhes davam. […] Andavam todos tão
bem-dispostos, tão bem feitos e galantes com
suas tinturas que muito agradavam.
CASTRO, S. A carta de Pero Vaz de Caminha.
Porto Alegre: L&PM, 1996.

TEXTO II BARDI, P. M. Em torno da escultura no Brasil.


São Paulo: Banco Sudameris Brasil, 1989.

Com contornos assimétricos, riqueza de detalhes


nas vestes e nas feições, a escultura barroca no Bra-
sil tem forte influência do rococó europeu e está
representada aqui por um dos profetas do pátio do
Santuário do Bom Jesus de Matosinho, em Congo-
nhas, (MG), esculpido em pedra-sabão por Aleijadi-
nho. Profundamente religiosa, sua obra revela:
a) liberdade, representando a vida de mineiros à
procura da salvação.
b) credibilidade, atendendo a encomendas dos no-
bres de Minas Gerais.
c) simplicidade, demonstrando compromisso com a
PORTINARI, C. O descobrimento do Brasil. 1956. Óleo
contemplação do divino.
sobre tela, 199 × 169 cm. Disponível em: <www. d) personalidade, modelando uma imagem sacra
portinari.org.br>. Acesso em: 12 jun. 2013. com feições populares.
e) singularidade, esculpindo personalidade do reina-
Pertencentes ao patrimônio cultural brasi- do nas obras divinas.
leiro, a carta de Pero Vaz de Caminha e a
obra de Portinari retratam a chegada dos
portugueses ao Brasil. Da leitura dos textos,
constata-se que: E.O. Objetivas
a) a carta de Pero Vaz de Caminha representa (Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
uma das primeiras manifestações artísticas
dos portugueses em terras brasileiras e pre- 1. (Unicamp) Em carta ao rei D. Manuel, Pero Vaz
ocupa-se apenas com a estética literária. de Caminha narrou os primeiros contatos entre
b) a tela de Portinari retrata indígenas nus com os indígenas e os portugueses no Brasil: “Quan-
corpos pintados, cuja grande significação é do eles vieram, o capitão estava com um colar de
a afirmação da arte acadêmica brasileira e a ouro muito grande ao pescoço. Um deles fitou o
contestação de uma linguagem moderna.
colar do Capitão, e começou a fazer acenos com
c) a carta, como testemunho histórico-político,
a mão em direção à terra, e depois para o colar,
mostra o olhar do colonizador sobre a gente
como se quisesse dizer-nos que havia ouro na ter-
da terra, e a pintura destaca, em primeiro
ra. Outro viu umas contas de rosário, brancas, e
plano, a inquietação dos nativos.
acenava para a terra e novamente para as contas e
d) as duas produções, embora usem linguagens
para o colar do Capitão, como se dissesse que da-
diferentes – verbal e não verbal –, cumprem
riam ouro por aquilo. Isto nós tomávamos nesse
a mesma função social e artística.
sentido, por assim o desejarmos! Mas se ele que-
e) a pintura e a carta de Caminha são mani-
ria dizer que levaria as contas e o colar, isto nós
festações de grupos étnicos diferentes, pro-
não queríamos entender, porque não havíamos de
duzidas em um mesmo momentos histórico,
retratando a colonização. dar-lhe!”
Adaptado de Leonardo Arroyo, A carta de Pero Vaz de Caminha.
São Paulo: Melhoramentos; Rio de Janeiro: INL, 1971, p. 72-74.

340
Esse trecho da carta de Caminha nos permite con- A respeito da tela e do texto, é correto afirmar
cluir que o contato entre as culturas indígena e que
europeia foi a) demonstram a submissão da monarquia por-
a) favorecido pelo interesse que ambas as partes tuguesa à contra-reforma católica.
demonstravam em realizar transações comerciais: b) expressam o encantamento dos europeus
os indígenas se integrariam ao sistema de colo- com a exuberância natural da terra.
nização, abastecendo as feitorias, voltadas ao co- c) atestam, como documentos históricos, o ca-
mércio do pau-brasil, e se miscigenando com os ráter conflituoso dos primeiros contatos en-
colonizadores. tre brancos e índios.
b) guiado pelo interesse dos descobridores em ex- d) representam o índio sem idealização, reser-
plorar a nova terra, principalmente por meio da vando-lhe lugar de destaque no quadro, o
extração de riquezas, interesse que se colocava que era pouco comum.
acima da compreensão da cultura dos indígenas, e) apresentam uma leitura do passado na qual os
que seria quase dizimada junto com essa popula- portugueses figuram como portadores da civiliza-
ção. ção.
c) facilitado pela docilidade dos indígenas, que se
associaram aos descobridores na exploração da 3. (Unesp) A efervescência que conheceram
nova terra, viabilizando um sistema colonial cuja
nas Minas [Gerais, do século XVIII] as artes
base era a escravização dos povos nativos, o que
e as letras também teve feição peculiar. Pela
levaria à destruição da sua cultura.
primeira vez na Colônia buscava-se solução
d) marcado pela necessidade dos colonizadores de própria para a expressão artística.
obterem matéria-prima para suas indústrias e am- Laura Vergueiro.
pliarem o mercado consumidor para sua produção Opulência e miséria das Minas Gerais, 1983.
industrial, o que levou à busca por colônias e à
São exemplos do que o texto afirma:
integração cultural das populações nativas.
a) a pintura e a escultura renascentistas.
b) a poesia e a pintura românticas.
2. (Unesp) Observe a figura e leia o texto.
c) a arquitetura barroca e a poesia árcade.
d) a literatura de viagem e a arquitetura gótica.
e) a música romântica e o teatro barroco.

4. (Fuvest) O barroco no Brasil foi


a) uma manifestação artística de caráter reli-
gioso limitada às regiões de mineração.
b) uma expressão artística de origem europeia
reelaborada e adaptada às condições locais.
c) um estilo original na pintura, mantendo a
tradição manuelina nas edificações.
d) uma criação artística popular predominante
em todo o Brasil colônia e no império.
e) uma produção artística, imposta pelo modelo
Reprodução da tela Primeira Missa no
Brasil. Vítor Meireles, 1861.
absolutista português, na época da mineração.

Chantada a Cruz, com as Armas e a divisa de TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES


Vossa Alteza, que primeiramente lhe pre-
garam, armaram altar ao pé dela. Ali disse Neste mundo é mais rico, o que mais rapa:
missa o padre Frei Henrique (...). Ali estive- Quem mais limpo se faz, tem mais carepa:
ram conosco (...) cinquenta ou sessenta de- Com sua língua ao nobre o vil decepa:
les, assentados todos de joelhos, assim como O Velhaco maior sempre tem capa.
nós. (...) [Na terra], até agora, não pudemos
saber que haja ouro, nem prata, nem coisa 5. (Unifesp) Nos versos, o eu lírico deixa evi-
alguma de metal (...) Porém, o melhor fruto dente que:
que dela se pode tirar me parece que será a) Uma pessoa se torna desprezível pela ação do nobre.
salvar esta gente. E esta deve ser a principal b) O honesto é quem mais aparenta ser desonesto.
semente que Vossa Alteza em ela deve lançar. c) Geralmente a riqueza decorre de ações ilícitas.
Pero Vaz de Caminha. Carta do Achamento d) As injúrias, em geral, eliminam as injustiças.
do Brasil, 10.05.1500. e) O vil e o rico são vítimas de severas injustiças.

341
6. (Unifesp) Levando em consideração que,
em sua produção literária, Gregório de Ma- Gabarito
tos dedicou-se também à sátira irreverente,
pode-se afirmar que os versos se marcam: E.O. Aprendizagem
a) Pelo sentimentalismo, fruto da sintonia do
1. A 2. C 3. C 4. D 5. B
eu lírico com a sociedade.
b) Pela indiferença, decorrente da omissão do 6. E 7. D 8. B 9. E 10. C
eu lírico com a sociedade.
c) Pelo negativismo, pois o eu lírico condena a
sociedade pelo viés da religião. E.O. Fixação
d) Pela indignação, advinda de um ideal mora- 1. C 2. E 3. A 4. C 5. B
lizante expresso pelo eu lírico.
e) Pela ironia, já que o eu lírico supõe que to- 6. A 7. B 8. E 9. B 10. C
das as pessoas são desonestas.
E.O. Complementar
E.O. Dissertativas 1. E 2. E 3. A 4. V V V V F 5. A

(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)


E.O. Dissertativo
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO 1.
Além da acepção de “dar nome aos seres”,
o verbo “nomear” pode ser entendido como
A(s) quest(ões) a seguir toma(m) por base o designar alguém para um cargo, dar direi-
“Soneto LXVII” (“Considera a vantagem que to de posse. É com este sentido que Todorov
os brutos fazem aos homens em obedecer a Tzevetan o utiliza para analisar o compor-
Deus”), de Dom Francisco Manuel de Melo tamento do colonizador ao apoderar-se das
(1608-1666). terras que pertenciam a povos com culturas
Quando vejo, Senhor, que às alimárias1 e linguagens diferentes. Ao substituir os no-
Da terra, da água, do ar, – peixe, ave, bruto –, mes originais dos aborígines pelos dos do-
Não lhe esquece jamais o alto estatuto minadores, impõe-se ao dominado a neces-
Das leis que lhes pusestes ordinárias; sidade do ensino da nova língua que passa
a ser usada como instrumento para posse do
E logo vejo quantas artes2 várias novo território.
O homem racional, próvido3 e astuto, 2.
A primeira menção aos índios se inicia no
Põe em obrar, ingrato e resoluto, trecho “E dali avistamos homens que anda-
Obras que a vossas leis são tão contrárias: vam pela praia, uns sete ou oito, segundo
Ou me esquece quem sois ou quem eu era; disseram os navios pequenos que chegaram
Pois do que me mandais tanto me esqueço, primeiro.” A partir de então, Caminha pro-
Como se a vós e a mi não conhecera. cede com a descrição dos nativos e se mostra
impressionado com a beleza e com o aspecto
Com razão logo por favor vos peço
diferente dos índios, principalmente no que
Que, pois homem tal sou, me façais fera,
concerne ao vestuário, ao cabelo, à cor da
A ver se assi melhor vos obedeço.
A tuba de Calíope, 1988. pele e aos adereços do corpo. Caminha tam-
bém se mostra impressionado com o fato de
1
alimária: animal irracional. que os índios não pareciam incomodados ao
2
arte: astúcia, ardil. mostrar suas partes íntimas o que, segundo
3
próvido: providente, que se previne, Caminha, era um sinal de inocência.
previdente, precavido. 3.
Uma das maiores contribuições do Padre An-
chieta foi a elaboração da primeira gramáti-
1. (Unesp) Que contraste é explorado pelo po- ca da língua tupi (a mais falada pelos índios
ema como base da argumentação? Justifique na costa brasileira) para auxiliar os catequi-
sua resposta. Considerando também outros zadores na evangelização.
aspectos, em que movimento literário o poe-
4.
O Quinhentismo pode ser identificado em
ma se enquadra? duas etapas: A literatura de informação pro-
duzida pelos navegantes para relatar suas
viagens, e a literatura jesuítica que tinha o
objetivo de catequizar os povos indígenas.
5.
A literatura de informação começou com a
Carta de Pero Vaz Caminha para o rei de Por-
tugal D. Manuel, relatando sobre as caracte-
rísticas da nova terra.

342
6. Os jesuítas se aproximaram dos índios usan-
do peças teatrais, criando cantigas e tradu-
zindo textos para a língua tupi e/ou guarani.
7. O poeta tem consciência de que o mundo
terreno é efêmero e vão; o sentimento de
nulidade diante do poder divino, como em:
"lembra-te Deus, que és só para humilhar-
-te".
8. A moda que destrói o corpo e a alma de quem
a segue.
A consciência da destruição pela vaidade
elevará o indivíduo até Deus.
9. Um dentre os contrastes:
§§ vida e morte
§§ juventude e velhice
§§ essência e aparência
10. O Cultismo consiste em o jogo de palavras,
preciosismo vocabular, erudição e rebusca-
mento da forma. O conceptismo pauta-se em
argumentos que se centram na razão, conci-
so, ordenado sob os mecanismos da lógica.

E.O. Enem
1. C 2. D

E.O. Objetivas
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp))
1. B 2. E 3. C 4. B 5. C
6. D

E.O. Dissertativas
(Unesp, Fuvest, Unicamp e Unifesp)
1. O contraste explorado pelo poema como base
da argumentação é entre o animal, que, por
ser irracional, obedeceria a Deus sem questio-
namentos, e o homem, cuja racionalidade leva
à prática de obras contrárias às leis divinas. O
culto aos contrastes, que costuma culminar no
uso de aliterações e paradoxos, é uma caracte-
rística típica do barroco e vem acompanhado
de outros aspectos comuns a esse movimento:
como a temática religiosa, consequência do
teocentrismo da Contrarreforma católica, o
cultismo (exemplificado pelas inversões sin-
táticas) e o conceptismo (evidenciado pelo
jogo lógico-argumentativo).

343

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