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RESENHAS
ANTROPOLOGIA E PODER Wolf – “Uma autobiografia intelectual” –, o que
confere ao livro Antropologia e poder – contri-
WOLF, Eric R. Sob o olhar multidimensional: antropolo- buições de Eric R. Wolf uma totalidade significa-
gia e poder.
tiva sobre a obra de um pensador contemporâ-
Gey Espinheira neo que muito contribuiu para o estatuto de
modernidade da antropologia contemporânea.
INTRODUÇÃO
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mas que privilegiou como campos de preocupa- logia americana e que se volta para o estudo das
ção intelectual. A disposição dos capítulos per- relações complexas no mundo contemporâneo.
mite que o autor seja conhecido por si mesmo, Um autor sem fronteiras temáticas ou
através de uma autobiografia, pela abordagem epistemológicas
da complexidade que toma como foco uma soci- Pode-se dizer que Eric R. Wolf passou a
edade complexa: “México, parentesco, amizade ser conhecido no Brasil por seu trabalho sobre o
e relações patrono-cliente”. A vida rural é trata- campesinato, considerado um clássico escrito em
da na analise de “tipos de campesinato latino- 1966 (Peasants), traduzido como “Sociedade cam-
americano, como uma discussão tomada como ponesa”, mas, mesmo assim, por um público res-
preliminar, centrada em comunidades campo- trito de estudiosos da temática agrária sob o ân-
nesas corporadas, fechadas na Mesoamérica e em gulo da antropologia. Os organizadores do livro
Java Central”. “Aspectos específicos dos sistemas reconhecem que agora ampliam as possibilida-
de Plantations no Novo Mundo: subculturas das des de conhecimento da obra de Wolf com este
comunidades e classes sociais e fases do proces- livro-coletânea de textos, mas também um
so rural na América Latina” são capítulos que mapeamento das preocupações intelectuais do
“explicam a complexidade e a vida rural”. autor, tanto no que concerne a campos de estu-
“Nação, nacionalismo e etnicidade” abor- do como na formulação teórica das ciências hu-
da “A formação da nação: um ensaio de formu- manas, mais particularmente a antropologia. É
lação”, a “Virgem de Guadalupe: um símbolo lembrado o seu instigante artigo, polêmico des-
nacional mexicano”, “Nacionalismo camponês de o título, com as idéias desenvolvidas sobre a
em um vale dos Alpes” e “Etnicidade e naciona- antropologia contemporânea: “they divide and
lidade”. subdivide, and call it anthropology” (eles divi-
Para além desses campos de abordagem, dem e subdividem e lhe dão o nome de antropo-
em que se observam as pesquisas empíricas e as logia) (Wolf, 1980).
revisões teóricas, contribuições para uma antro- A sensibilidade de Eric R. Wolf para as
pologia que incorpora a moderna concepção da ciências sociais, e mais particularmente para a
globalização e do poder, Eric. R. Wolf faz impor- antropologia, foi manifestada como uma orien-
tantes incursões no campo mesmo da teoria das tação, ao ouvir uma conferência de Norberto
ciências sociais, transgredindo fronteiras e abrin- Elias, da qual uma conclusão lhe foi marcante e
CADERNO CRH, Salvador, v. 17, n. 40, p. 143-146, JAn./Abr. 2004
do espaço para uma antropologia da complexi- ele confessa: “a idéia de que o indivíduo nasce
dade. dentro de uma rede estabelecida de pessoas e
No bloco final do livro, “Teoria”, os orga- que sua pessoa é um fenômeno social foi uma
niza-dores selecionaram contribuições significa- revelação e abriu meus olhos para as ciências
tivas do autor e, por que não dizer, radicais, na sociais” (Wolf, p.60), como é ressaltada pelos
seguinte seqüência: “Os antropólogos america- organizadores do livro, extraindo-a da autobio-
nos e a sociedade americana”; “Os moinhos da grafia intelectual, que é um capítulo do livro.
desigualdade: uma abordagem marxiana”; Cul- A perspectiva dos estudos da formação
tura: panacéia ou problema?”; “Inventando a da nação é mais um campo em que Wolf faz
sociedade”; “Encarando o poder: velhos insights, provocações aos antropólogos e contribui deci-
novas questões” e “Trabalho de campo e teoria”. sivamente para dar à antropologia uma abertura
Como última parte, os organizadores apre- maior para a compreensão das sociedades com-
sentam as publicações do autor, permitindo ao plexas, a partir da construção de modelos na for-
leitor entrar em contado com o universo de Eric ma de tipo ideal abrangente, capaz de conter os
R. Wolf, um dos mais importantes incorporadores elementos e as fases do processo de constituição
da perspectiva marxiana e marxista da antropo- da nação. De forma simplificada, o esquema de
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constituição da nação abrange três aspectos prin- e com a abertura de novas orientações teóricas
cipais: “ecologia, estrutura social e caráter da que atualizam a antropologia na contemporanei-
aculturação interna, em termos de três estágios dade.
de desenvolvimento: (1) desenvolvimento nuclear A estruturação do livro, ajudada pela apre-
localizado; (2) extensão e consolidação territorial; sentação de seus organizadores e pela autobio-
(3) a nação”. (p. 203). grafia intelectual, completam uma visão ampla
Na explicação sobe etnicidade e naciona- e, ao mesmo tempo, densa do pensamento e da
lidade, a ênfase recai na idéia de construção so- orientação teórica e metodológica das pesquisas
cial histórica da etnicidade e da nacionalidade, desenvolvidas no campo da compreensão da
na percepção dos elementos comuns utilizados questão dos camponeses como tipos específicos,
na formação das nações: “as formas simbólicas assim como das singularidades de comunidades,
da formação da nação foram bem semelhantes: na técnica da confrontação de diferentes reali-
bandeiras, emblemas, feriados, monumentos, dades de comunidades em termos de seus ar-
canções, teatro; a construção de uma estética ranjos culturais, como é o caso do estudo sobre
nacional; a exaltação de uma língua padrão...”. o “Nacionalismo camponês em um vale dos Al-
Pelo viés das observações e de estudos compara- pes”.
tivos, a exemplo do que fez ao estudar o “Nacio- A perspectiva antropológica de Eric Wolf
nalismo camponês em um vale dos Alpes”, as trouxe contribuições importantes para a formu-
proximidades e diferenças culturais, políticas, lação de uma teoria antropológica do estudo das
tecnológicas e ecológicas são levadas em consi- sociedades complexas, sobretudo quando faz a
deração para ressaltar as formas como as comu- distinção entre o interior e o exterior, o dentro e
nidades assumem seus “nacionalismos”. Essa for- o fora, no que poderíamos falar de local e global,
ma de proceder assemelha-se, de algum modo, à em que a permanência e as transformações são
metodologia de Norberto Elias, que, ao elaborar reconhecidas como interconexões entre esses
estudos em pequenas comunidades, procura “iso- dois universos produtores de cultura e de figu-
lar” aspectos que se expressam em grandes soci- ração social em uma dada sociedade.
edades: “grosso modo, a pesquisa indicou que os Um outro aspecto demonstrativo da for-
problemas em pequena escala do desenvolvimen- mulação de modelos explicativos de Wolf, so-
to de uma comunidade e os problemas em larga bretudo quando se volta para as sociedades com-
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