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EDUCAÇÃO

DOMICILIAR

Volume 1














































Charlotte Mason









EDUCAÇÃO DOMICILIAR

Volume 1














Título original: Home Education
Autora: Charlotte Mason
Tradutor: Marcos Zamith
Revisora: Juliana Roberta Baptista
Capa: Marco Mancen

Dados Internacionais
de Catalogação na Publicação (CIP)

M398e MASON, Charlotte.
Educação Domiciliar.
Volume 1. 2ª ed.
Pindamonhangaba, SP: Verbum,
2018.

ISBN: 978-85-53036-04-2
(coleção)
ISBN: 978-85-53036-07-3
(volume 1)

CDD-370

Índice para catálogo sistemático:

1. Educação 370




Editora Verbum
Pindamonhangaba, SP, Brasil
Telefone: (12) 3645-3114
E-mail: info@editoraverbum.com.br
www.editoraverbum.com.br

Todos os direitos reservados

SUMÁRIO

PARTE I
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
1. UM MÉTODO DE EDUCAÇÃO
2. A HERANÇA DA CRIANÇA
3. OFENDENDO AS CRIANÇAS
4. DESPREZANDO AS CRIANÇAS
5. ATRAPALHANDO AS CRIANÇAS
6. CONDIÇÕES DA ATIVIDADE CEREBRAL SAUDÁVEL
7. “O REINO DA LEI” NA EDUCAÇÃO

PARTE II
VIDA FORA DE CASA PARA AS CRIANÇAS
1. TEMPO DE CRESCIMENTO
2. “PASSEIO TURÍSTICO”
3. “PINTURA DE IMAGEM”
4. FLORES E ÁRVORES
5. “CRIATURAS VIVAS”
6. HISTÓRIAS TRADICIONAIS DO CAMPO E LIVROS DE
NATURALISTAS
7. A CRIANÇA OBTÉM CONHECIMENTO
MEDIANTE OS SEUS SENTIDOS
8. A CRIANÇA DEVE SE FAMILIARIZAR
COM OBJETOS NATURAIS
9. GEOGRAFIA FORA DE CASA
10. A CRIANÇA E A MÃE NATUREZA
11. JOGOS FORA DE CASA ETC.
12. CAMINHADAS EM TEMPO RUIM
13. VIDA DE “ÍNDIO PELE-VERMELHA”
14. AS CRIANÇAS EXIGEM AR DO CAMPO

PARTE III
“O HÁBITO SÃO DEZ NATUREZAS”
1. A EDUCAÇÃO BASEADA NA LEI NATURAL
2. AS CRIANÇAS NÃO TÊM PODER
DE SE AUTOCONVENCER
3. O QUE É A “NATUREZA”?
4. O HÁBITO PODE SUPLANTAR A “NATUREZA”
5. A COLOCAÇÃO DE DIRETRIZES DE HÁBITO
6. A FISIOLOGIA DO HÁBITO
7. A FORMAÇÃO DE UM HÁBITO – “FECHE A PORTA ATRÁS DE
VOCÊ”
8. “HÁBITOS” INFANTIS
9. EXERCÍCIOS FÍSICOS

PARTE IV
ALGUNS HÁBITOS DA MENTE – ALGUNS HÁBITOS MORAIS
1. O HÁBITO DA ATENÇÃO
2. OS HÁBITOS DE APLICAÇÃO ETC.
3. O HÁBITO DE PENSAR
4. O HÁBITO DE IMAGINAR
5. O HÁBITO DE LEMBRAR
6. O HÁBITO DA EXECUÇÃO PERFEITA
7. ALGUNS HÁBITOS MORAIS
8. VERACIDADE



PARTE V
AULAS COMO INSTRUMENTOS DE EDUCAÇÃO
1. A MATÉRIA E O MÉTODO DAS AULAS
2. O JARDIM DE INFÂNCIA
COMO UM LUGAR DE EDUCAÇÃO
3. MAIS CONSIDERAÇÕES
SOBRE O JARDIM DE INFÂNCIA
4. LEITURA
5. A PRIMEIRA AULA DE LEITURA
6. LENDO PELA VISTA E PELO SOM
7. RECITAÇÃO
8. LENDO PARA CRIANÇAS MAIS VELHAS
9. A ARTE DE NARRAR
10. ESCRITA
11. TRANSCRIÇÃO
12. ORTOGRAFIA E DITADO
13. REDAÇÃO
14. AULAS DE BÍBLIA
15. ARITMÉTICA
16. FILOSOFIA NATURAL
17. GEOGRAFIA
18. HISTÓRIA
19. GRAMÁTICA
20. FRANCÊS
21. ARTE PICTÓRICA

PARTE VI
A VONTADE – A CONSCIÊNCIA – A VIDA DIVINA
NA CRIANÇA
1. A VONTADE
2. A CONSCIÊNCIA
3. A VIDA DIVINA NA CRIANÇA

APÊNDICE
QUESTÕES PARA USO DOS ESTUDANTES


























Apresentação

A história da educadora britânica Charlotte Mason (1842-1923) tomou
rumo na área de educação quando aos dezesseis anos ficou órfã. Ela então se
matriculou na Sociedade Doméstica e Colonial (Home and Colo-nial Society)
para a formação de professores e seu desempenho foi tal que ganhou um
certificado de primeira classe.
Ensinou por mais de dez anos na Escola Davison em Worthing na
Inglaterra onde começou a desenvolver a sua visão de uma “educação liberal
para todos”. Para entender o que era considerado “liberal” para Charlotte,
devemos levar em conta o cenário da época em que ela viveu. Naquela época, as
crianças inglesas eram educadas de acordo com a classe social, ou seja, os mais
pobres aprendiam um ofício, enquanto os mais ricos aprendiam artes e literatura,
consideradas essenciais para ser uma pessoa livre. Mas Charlotte tinha em vista
uma educação farta e ampla para todas as crianças, independente da classe
social.
Seu amor e carinho para com as crianças guiou-a para algumas ideias
inovadoras, poderíamos dizer que revolucionárias para seu tempo. Logo ela
ganhou destaque e foi convidada para lecionar e palestrar na Faculdade de
Treinamento de Professores Bispo Otter (Bishop Otter Tea-cher Training
College) em Chichester, Inglaterra, onde ficou por mais de cinco anos.
Considerando o período histórico da industrialização, a neces-sidade de mais
operários e menos mentes criativas e pensantes, Charlotte trouxe à tona verdades
maravilhosas sobre a educação, acima de tudo o papel da mãe na vida de seus
filhos.
Em seus anos lecionando ali, ela percebeu que os pais poderiam ser
ajudados se entendessem alguns princípios básicos sobre a educação infantil.
Então, Charlotte ministrou uma série de palestras, que foram posteriormente
publicadas sob o título “Educação Domiciliar” (Home Edu-cation) com esse
intuito. A partir dessas palestras, foi formada a União Educacional de Pais
(Parents’ Educational Union), que se expandiu rapi-damente. Procurando manter
o contato entre os membros desse grupo, surgiu uma revista: a “Revisão dos
Pais” (Parents’ Review). Diante desses fatos já podemos imaginar o impacto que
a Charlotte causou.
Estamos vivendo tempos em que educar não segue o real sentido da
palavra, que podem nos lembrar um pouco do cenário em que a Char-lotte viveu,
tempos em que a individualidade e a personalidade eram arrancadas pela raiz.
Vivemos a educação do molde único segundo a qual toda e qualquer criança que
não se enquadre nela ou é deixada de lado ou sofre as consequências de quem se
enquadra. Muitas crianças estão famin-tas por conhecimento e mesmo assim são
obrigadas diariamente a cum-prirem as intermináveis tarefas e a se submeterem
aos livros textos de um sistema que não as alimenta, mas as subjuga.
Quando me tornei mãe e optamos pelo modelo de ensino domi-ciliar,
comecei a estudar e procurar sobre as diferentes metodologias, mas sempre
buscando algo voltado para o ensino clássico sob a ótica cristã. Nessas minhas
pesquisas e estudos, encontrei a metodologia proposta pela Charlotte Mason. É
reconfortante ler tudo o que ela escreveu sobre a edu-cação. Seu amor pelas
crianças é o delicioso e irresistível perfume de seus livros, e como Michael
Sadler escreveu: “Ela jogou um feixe de luz pela terra”.
Ela escreveu este livro baseado em seus muitos anos de expe-riência na
área de educação, onde ela elaborou a teoria, avaliou e testou na prática tudo o
que no livro está. Charlotte tinha uma profunda preocu-pação com que as
crianças desenvolvessem um amor duradouro pela aprendizagem. A metodologia
de Charlotte foi inspirada na palavra latina “educare”, que significa “alimentar e
nutrir”.
Ela afirma que a mente das crianças é um solo frutífero e que devemos
usar livros de qualidade para semear neste solo, não livros de linguagem
abobalhada ou meramente livros que diminuem e subestimam as crianças, mas
livros vivos, ricos. Ao dizer isso me vem à memória a frase de William Butler
Yeates: “Educação não é o preenchimento de um balde, mas o acender de um
incêndio”. As crianças não precisam de quan-tidade de informação e sim
qualidade. Não devemos subestimar nossas crianças. Elas podem muito mais do
que somos capazes de imaginar.
Charlotte nos mostra que a criança é uma pessoa com todas as
possibilidades e capacidades inclusas, tanto com tendências para o bem como
para o mal, ela reconhece que somos pecadores, algo que nos soa como óbvio,
mas muitas vezes os adultos deixam de considerar esse fato. As crianças não são
adultos incompletos, como muitos pensam: as crianças se tornam adultos. O que
elas precisam é serem guiadas, receberem nutri-ção adequada e oportunidade.
A metodologia dela se baseia no tripé: “a Educação é uma atmos-fera,
uma disciplina, uma vida”. A atmosfera do lar é uma prioridade. As condições, o
clima, as circunstâncias que envolvem esse ambiente corres-pondem a um terço
da educação. Quando ela menciona que a educação é uma disciplina, ela se
refere à formação de hábitos que, assim como o oleiro molda seus vasos, a mãe
molda os hábitos em seus filhos. E a grande alegria e refrigério é que a Charlotte
nos diz que formar esses bons hábitos não é tarefa difícil! E ela não somente diz
isso, ela nos diz como entender o processo fisiológico e mental da formação de
hábitos e como fazê-lo. Por fim, “A educação é uma vida” significa inspirar a
criança a aprender, res-peitando sua personalidade, sendo, ao mesmo tempo, um
modelo de amor à aprendizagem.
Ao oferecermos um grande banquete variado de assuntos para as
crianças através de vivências ao ar livre, literatura, obras de arte, poesia e várias
outras ferramentas de altíssima qualidade, tudo buscando ensinar a criança como
um todo, mente e alma, tudo deve ser abordado de forma a promover o amor à
aprendizagem.
Mesmo ao tratar de temas como história, línguas estrangeiras e ciência,
Charlotte Mason criou uma forma de instigar e ajudá-los a serem
interessantíssimos e vívidos. A ampla variedade de assuntos é extrema-mente
atrativa em si mesma, mas isso não é tudo o que o método acarreta. Ele também
se desdobra nas abordagens sobre a forma como as crianças aprendem e envolve
outros objetivos educacionais.
Charlotte foi sem dúvida uma mulher usada por Deus para fazer a
diferença, no seu tempo e ainda hoje. Uma mulher que não separou sua vida
entre secular e vida cristã, mas viveu para a glória de Deus e impactou todos à
sua volta. Ela desenvolveu suas observações e conceitos educacionais durante a
juventude e o mais surpreendente é que, mesmo após muitos anos trabalhando
com crianças, ela continuou firme em sua filosofia. Este livro que tens em tuas
mãos, caro leitor, é muito precioso. Aqui ela colocou seus estudos, sua
experiência, mas acima de tudo foi escrito no temor de Deus. Como a própria
Charlotte diz: “o conhecimento de Deus é o principal conhecimento e o fim
principal da educação”.

Rachel L. A. Haswell



Prefácio à Coleção de Educação Domiciliar

A perspectiva educacional é bem nebulosa e depressiva, tanto em casa
quanto fora. Essa ciência deve ser uma parte muito importante da educação: o
ensino de latim, de línguas modernas, de matemática tem de ser reformados; a
natureza e as atividades manuais devem ser postas a serviço do treinamento do
olho e da mão; meninos e meninas têm de aprender a escrever inglês[1], e por
esse motivo têm de saber algo de história e literatura; e, por outro lado, a
educação tem de ser mais técnica e utilitária. Esses, e outros como esses, são os
gritos de urgência que temos em campo. Mas não temos nenhum princípio
unificador, nenhuma meta definida. De fato, nenhuma filosofia da educação.
Como um córrego não pode se erguer mais alto do que a sua fonte, então é
provável que nenhum esforço filosófico possa se erguer acima de todo o
esquema de pensamento que lhe dá nascimento. E talvez seja essa a razão de
todas as falhas a partir de nós: desaparecimentos, fracassos e desapontamentos
que mar-cam os nossos registros educacionais.
Aqueles de nós que gastaram muitos anos perseguindo a visão benigna
e elusiva da Educação, percebem que as suas abordagens são reguladas por uma
lei, e que essa lei ainda tem de ser evocada. Podemos discernir os seus
contornos, mas nada mais. Sabemos que ela é pene-trante. Não há parte da vida
caseira ou do trabalho escolar de uma criança que a lei não penetre. Também é
esclarecedor mostrar o valor, ou a falta de valor, de milhares de sistemas e
recursos. Não é somente uma luz, mas é uma medida fornecer um padrão pelo
qual todas as coisas, pequenas e grandes, pertencendo ao trabalho educacional,
têm de ser testadas. A lei é liberal, assumindo que tudo seja verdadeiro, honesto
e de boa reputação, e não oferece limite ou impedimento, salvo no que o excesso
causa prejuízo. E o caminho indicado pela lei é contínuo e progressivo, sem
estágio de transição do berço ao túmulo, exceto se a maturidade assumir a auto-
direção regular para a qual a imaturidade foi formada. Sem dúvida
descobriremos, quando apreendermos a lei, que certos pensadores alemães –
Kant, Herbart, Lotze, Froebel – estão justificados. Como dizem, é neces-sário
acreditar em Deus. Portanto, o conhecimento de Deus é o principal
conhecimento e o fim principal da educação. Por mais uma característica
poderemos reconhecer essa lei perfeita da liberdade educacional quando ela for
evidente. Disse-se: “A melhor ideia que podemos formar da verdade absoluta é
que ela é viável para satisfazer toda condição pela qual pode ser testada.”
Esperaremos isso da nossa lei: que satisfaça todo teste de experi-mento e todo
teste de investigação racional.
Não tendo recebido as tabelas da nossa lei, caímos de volta sobre
Froebel ou sobre Herbart. Ou, se pertencemos a uma outra escola, sobre Locke
ou Spencer. Mas não estamos satisfeitos. Um descontentamento – esse é um
descontentamento divino? – está sobre nós. E com certeza saudaremos uma
filosofia da educação viável, eficaz, como uma libertação a partir de muita
perplexidade. Antes que essa grande libertação venha a nós, é provável que
muitos esforços experimentais tenham se desenvol-vido, tendo mais ou menos as
características de uma filosofia; notavel-mente, tendo uma ideia central, de um
corpo de pensamento com vários membros trabalhando em harmonia vital.
Tal teoria da educação, que não precisa ser cuidadosa para se chamar de
um sistema de psicologia, tem de estar em harmonia com os movimentos de
pensamento da época; tem de considerar a educação não como um
compartimento fechado, mas como sendo tanto parte da vida quanto do
nascimento ou crescimento, casamento ou trabalho. E tem de deixar o pupilo
ligado ao mundo em muitos pontos de contato. É verdade que educadores já
estão ansiosos para estabelecer tal contato em diversas direções, mas os seus
esforços permanecem sobre um axioma aqui e uma ideia ali, e não há uma base
de pensamento unificadora ampla para apoiar o todo.
Os tolos se apressam onde os anjos temem pisar. E a esperança de que
possa haver esforços experimentais por uma filosofia da educação e que todos
eles nos levarão mais perto da magnum opus[2] me encoraja a lançar essa
tentativa. O pensamento central, ou melhor, o corpo de pensa-mento que
consequentemente encontrei, é o fato meio óbvio de que a criança é uma pessoa
com todas as possibilidades e capacidades inclusas na personalidade. Alguns
membros que se desenvolvem a partir desse núcleo foram explorados de tempos
em tempos por pensadores educa-cionais e existem vagamente no senso comum
geral: uma noção aqui, uma outra ali. Uma tese, que talvez seja nova – a de que
A Educação é a Ciên-cia das Relações –, parece-me resolver a questão do
programa de estudos, por mostrar que o objetivo da educação é pôr uma criança,
tanto quanto seja possível, no toque animador da vida da Natureza e do
pensamento. Acrescente a isso uma ou duas chaves para o autoconhecimento, e a
juventude educada vai em frente com alguma ideia de autodomínio, com
algumas buscas e muitos interesses vitais. A minha escusa por me arriscar a
oferecer uma solução ao problema da educação, ainda que experimental e de
passagem, é dupla. Entre trinta e quarenta anos, eu trabalhei sem pausa para
estabelecer uma teoria da educação filosófica que funcionasse. E, em seguida,
cada artigo da fé educacional que ofereço chegou por pro-cessos indutivos. E foi,
eu penso, verificado por uma longa e vasta série de experimentos. No entanto, é
com sincera modéstia que me arrisco a ofere-cer os resultados desse longo
trabalho, pois sei que nesse campo há muitos trabalhadores muito mais capazes e
especialistas do que eu. Os anjos que temem pisar, tão precária é a colocação dos
pés!
Mas, se pelo menos pour encourager les autres[3], eu acrescento uma
curta sinopse da teoria da educação avançada nos volumes da Coleção Educação
Domiciliar.
O tratamento não é metódico, mas incidental. Aqui um pouco, ali um
pouco, conforme me parecesse mais provável satisfazer as ocasiões de pais e
professores. Devo acrescentar que, ao longo de diversos anos, vários ensaios
foram preparados para o uso da Parents National Education Union, na esperança
de que essa Sociedade pudesse presenciar um corpo mais ou menos coerente de
pensamento educacional.
“A consequência da verdade é ótima. Portanto, o juízo dela não tem de
ser negligente.” (Whichcote)

1. Crianças nascem pessoas.
2. Elas não nascem boas ou más, mas com possibilidades para o bem
ou para o mal.
3. Os princípios de autoridade, por um lado, e de obediência, por outro
lado, são naturais, necessários e fundamentais; mas...
4. Esses princípios são limitados pela consideração devida à persona-
lidade das crianças, que não tem de ser prejudicada, seja por medo
ou amor, sugestão ou influência, ou brincadeira indevida sobre
qualquer desejo natural.
5. Portanto, somos limitados a três instrumentos educacionais: a
atmosfera do meio ambiente, a disciplina do hábito e a apresen-
tação de ideias vivas.
6. Pelo ditado “A Educação é uma atmosfera” não se quer dizer que
uma criança deva estar isolada no que pode ser chamado de um
“meio ambiente infantil”, especialmente adaptado e preparado; mas
que devemos levar em consideração o valor educacional da
atmosfera da sua casa natural, tanto com respeito às pessoas quanto
às coisas, e devemos deixá-la viver livremente nas suas condições
apropriadas. Causar a queda do seu mundo a um nível de “criança”
invalida uma criança.
7. Por “Educação é uma disciplina” quer-se dizer a disciplina dos
hábitos formados definitiva e seriamente, sejam hábitos da mente,
sejam do corpo. Os fisiologistas nos dizem sobre a adaptação da
estrutura cerebral a sequências de pensamentos habituais, isto é, a
nossos hábitos.
8. Do ditado “A Educação é uma vida” depreende-se a necessidade do
intelectual e do moral, assim como do sustento físico. A mente se
alimenta de ideias, logo as crianças devem ter um programa de
estudos generoso.
9. Mas a mente não é um receptáculo dentro do qual ideias têm de ser
soltas, cada ideia sendo adicionada a uma “massa de aper-cepção”
do seu tipo, ficando a doutrina herbartiana do interesse sobre a
teoria.
10. Ao contrário, a mente de uma criança não é um mero saco para
sustentar ideias, mas é, caso se possa permitir a figura, um orga-
nismo espiritual, com um apetite por todo conhecimento. Essa é a
sua dieta apropriada, com a qual é preparada para lidar, e que pode
digerir e assimilar conforme o corpo faz coisas de comer.
11. Essa diferença não é um trocadilho verbal. A doutrina herbartiana
coloca a ênfase da educação – o preparo do conhecimento ao incitar
pedaços, apresentados na devida ordem – sobre o professor. As
crianças ensinadas sob esse princípio estão em perigo de receber
muito ensino com pouco conhecimento. E o axioma do professor é
“O que uma criança aprende importa menos do que como ela
aprende”.
12. Mas, acreditando que a criança normal tenha capacidades mentais
que a ajustam para lidar com todo conhecimento adequado a ela,
temos que lhe dar um programa de estudos completo e generoso,
somente tomando o cuidado com que o conhecimento oferecido a
ela seja vital, isto é, que os fatos não sejam apresentados sem as
suas ideias informadoras. Fora dessa concepção vem o princípio de
que...
13. “A Educação é a Ciência das Relações”, isto é, que uma criança tem
relações naturais com um vasto número de coisas e pensamentos.
Então temos que formá-la com exercícios físicos, natureza, arte-
sanato, ciência e arte, e com muitos livros vivos, pois sabemos que o
nosso negócio não é lhe ensinar tudo sobre tudo, mas ajudá-la a
tornar válidas tantas quantas sejam possíveis.

“Aquelas primeiras afinidades inatas,
Que ajustam a nossa nova existência a coisas existentes[4].”

14. Há também dois segredos de autodomínio moral e intelectual que
devem ser oferecidos às crianças. A esses podemos chamar O
Caminho da Vontade e O Caminho da Razão.

15. O Caminho da Vontade – Deve-se ensinar às crianças:
(a) Que distingam entre “eu quero” e “eu ordeno[5]”.
(b) Que o caminho para ordenar seja mudar os nossos pensa-mentos
daquilo que desejamos mas não ordenamos.
(c) Que a melhor maneira de mudar os nossos pensamentos é pensar ou
fazer alguma coisa muito diferente, divertida ou interessante.
(d) Que, após um repouso neste caminho, a vontade retorna ao seu
trabalho com novo vigor.

(Esse auxílio da vontade nos é familiar como diversão, cuja função
é nos aliviar por um tempo do esforço da vontade, de modo que
possamos “querer” novamente com força aumentada. O uso da
sugestão – mesmo da autossugestão – como uma ajuda para a
vontade deve ser reprovado, por tender a invalidar e estereotipar o
caráter. Pareceria que a esponta-neidade é uma condição de
desenvolvimento, e que a natureza humana precisa da disciplina do
fracasso tanto quanto do sucesso.)

16. O Caminho da Razão – Devemos também ensinar às crianças não
“depender” (confiantemente demais) “do seu próprio entendi-
mento”, porque a função da razão é dar demonstração lógica: (a) da
verdade matemática; e (b) de uma ideia inicial, aceita pela von-tade.
No primeiro caso, a razão talvez seja um guia infalível, mas no
segundo nem sempre é segura, pois, se a ideia inicial está certa ou
errada, a razão irá confirmá-la por meio de provas incontes-táveis.
17. Portanto, deve-se ensinar às crianças, conforme se tornem maduras
o suficiente para entender esse ensino, que a responsa-bilidade
principal que permanece com elas como pessoas é a aceita-ção ou
rejeição das ideias iniciais. Para ajudá-las nessa escolha, devemos
lhes dar princípios de conduta e um amplo leque do conhecimento
apropriado a elas.
Esses princípios (15, 16 e 17) devem preservar as crianças de algum
pensamento frouxo e ação negligente que fazem com que a maioria de
nós viva num nível mais baixo do que precisamos.
18. Não devemos permitir que cresça uma separação entre a vida
intelectual e a “espiritual” das crianças, mas devemos ensinar-lhes
que o Espírito Divino tem acesso constante aos seus espíritos e é
seu ajudante contínuo em todos os interesses, deveres e alegrias da
vida.


A Coleção “Educação Domiciliar” é assim chamada a partir do título
do primeiro volume e não por lidar, inteira ou principal-mente, com
educação “em Casa” em oposição a “na Escola”.
Prefácio

Minha tentativa no volume seguinte é sugerir aos pais e profes-sores um
método de educação que se apoie numa base da lei natural, e que, nesse sentido,
toque nos deveres de uma mãe com os seus filhos. Ao me arriscar a falar sobre
esse último assunto, faço-o com a mais sincera deferência às mães, acreditando
que, nas palavras de um sábio mestre de homens, “a mulher recebe do Espírito
do Próprio Deus as intuições sobre o caráter da criança, a capacidade de apreciar
a sua força e a sua fraqueza, a faculdade de invocar uma e sustentar a outra, onde
reside o mistério da educação, à parte da qual todas as suas regras e medidas são
completa-mente vãs e ineficazes[6].” Mas, somente à proporção que uma mãe
tiver esse insight peculiar no que diz respeito aos seus próprios filhos, ela irá, eu
penso, sentir a necessidade de um conhecimento dos princípios gerais de
educação, fundados sobre a natureza e as necessidades de todas as crianças. E
esse conhecimento da ciência da educação nem a melhor das mães obterá de
cima, visto que frequentemente não o recebemos como um dom para o qual
temos os meios de conseguir pelos nossos próprios esforços.
Arrisco-me a esperar que os professores de crianças novas também
possam achar este volume útil. O período da vida de uma criança entre o seu
sexto e nono ano de idade deve ser usado para colocar a base de uma educação
liberal e do hábito de ler para a instrução. Durante esses anos, a criança deve
entrar no domínio do conhecimento, em muitas direções boas, de um modo
sereno, consecutivo – o que não é ficar apegado ao meio mais ou menos
empolgante das aulas orais. Eu espero que, de qualquer modo, os professores
possam considerar interessante e estimulante a abordagem (a partir de um novo
ponto de vista) das “matérias de instrução” banais apropriadas para crianças
pequenas. E possivelmente os métodos que esse ponto de vista novo indica
podem se provar sugestivos e úteis.
O objeto particular deste volume, como um membro da Coleção
“Educação Domiciliar”, é mostrar o suporte da fisiologia do hábito para a
educação – visto que certos hábitos físicos, intelectuais e morais são uma
qualidade valiosa para uma criança – e o que pode ser feito para a forma-ção
desses hábitos. Eu tomo a liberdade de reconhecer a minha dívida ao Mental
Physiology[7], do Dr. Carpenter, pelo ensino valioso sobre o assunto dos hábitos
contidos em uns dois ou três capítulos daquela obra. Eu também renovaria a
minha gratidão àqueles amigos médicos que fizeram uma revisão cuidadosa e
hábil para essas partes da obra, dado que se apoia numa base fisiológica.
Devo acrescentar que há uns vinte anos (1885) a maior parte deste
volume foi entregue como Lectures to Ladies[8], em cuja forma os papéis foram
originalmente publicados (1886) sob o título que ainda é mantido. As palestras
VII, VIII e o Apêndice do volume original foram transferidos deste a outros
volumes da Coleção. O todo foi revisado muito cuidado-samente, e muitos
assuntos novos foram introduzidos, especialmente na Parte V, Lessons as
Instruments of Education[9], que agora oferece uma introdução razoavelmente
completa a métodos de ensino de matérias adequadas a crianças entre as idades
de seis a nove anos.
O restante do volume tenta lidar com o todo da educação, desde a
infância até o nono ano de vida.
C. M. Mason.
Scale How, Ambleside,
1905.


























EDUCAÇÃO DOMICILIAR

Volume 1





























































PARTE I


ALGUMAS CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

O desejo crescente pelo trabalho que prevalece entre mulheres
instruídas não é menos importante que o sinal do status mais alto que ganharam.
O mundo quer o trabalho dessas mulheres. E logo, conforme a educação se torna
mais geral, veremos todas as mulheres com a capa-cidade de trabalhar entrando
nas classificações de mulheres trabalha-doras, com tarefas definidas, horas fixas,
por salários, pelo prazer e honra de fazer um trabalho útil se elas não estão sob a
necessidade de ganhar dinheiro.

As crianças são um bem público
Ora, aquele trabalho que é da maior importância para a sociedade é a
criação e a instrução das crianças – na escola, certamente, mas muito mais em
casa, porque, mais do que qualquer coisa, são as influências domésticas
exercidas sobre a criança que determinam o caráter e a carreira do futuro homem
ou mulher. É uma grande coisa ser pai ou mãe: não há promoção, dignidade com
que comparar. Os pais de apenas uma criança podem estar gostando do que
provará ser uma bênção para o mundo. Mas então, confiados com tal encargo,
eles não são livres para dizer “Eu posso fazer como quiser com os meus próprios
filhos.” Na verdade, as crianças devem ser consideradas menos uma propriedade
pessoal do que bens públicos, postas nas mãos dos pais, de maneira que eles
possam fazer o máximo delas para o bem da sociedade. E essa responsabilidade
não é igualmente dividida entre os pais: é sobre as mães do presente que o futuro
do mundo depende, mesmo num grau maior do que sobre os pais, porque são as
mães que têm a direção exclusiva dos primeiros anos das crianças, os mais
impressionantes. É por isso que ouvimos tão frequentemente sobre grandes
homens que tiveram boas mães, ou seja, mães que educaram os seus filhos por si
mesmas, e não transferiram o seu dever mais sério a pessoas indiferentes.

As mães devem “um amor refletido” aos seus filhos
“A mãe é qualificada”, diz Pestalozzi[10], “e qualificada pelo Próprio
Criador para se tornar o agente principal no desenvolvimento do seu filho. [...] e
o que é exigido dela é: um amor refletido [...]. Deus deu à tua criança todas as
faculdades da nossa natureza, mas o grande ponto permanece não decidido:
como serão empregados esse coração, essa cabeça, essas mãos? A que serviço
eles serão dedicados? A resposta à questão envolve uma futu-ridade de
felicidade ou infelicidade para uma vida tão querida a ti. O amor materno é o
primeiro agente na educação.”
Estamos acordando para os nossos deveres, e, à medida que as mães se
tornam mais bem instruídas e eficientes, sem dúvida elas irão sentir mais
fortemente que a educação dos seus filhos durante os primei-ros seis anos de
vida é um trabalho difícil de ser confiado a quaisquer mãos senão as suas
próprias. E elas o assumirão como a sua profissão, isto é, com a diligência, a
regularidade e a pontualidade que os homens apli-cam nos seus trabalhos
profissionais.

A formação de crianças “terrivelmente defeituosas”
Diz o Sr. Herbert Spencer[11]: “A formação física, moral e intelectual das
crianças é terrivelmente defeituosa. E em grande medida é assim, porque os pais
são desprovidos daquele conhecimento pelo qual essa formação pode ser guiada
corretamente sozinha. O que se deve esperar quando um dos problemas mais
intricados é tomado por aqueles que mal deram uma consideração ao princípio
do qual a sua solução depende? Para fazer sapatos ou construir casas, para a
gestão de um navio ou de um motor de locomotiva, uma longa aprendizagem é
necessária. Então o desdobramento de um ser humano no corpo e na mente é um
processo tão relativamente simples, de modo que alguém possa dirigir ou regular
sem nenhum preparo, qualquer que seja? Se não – se o processo, com uma
exceção, é mais complexo do qualquer um na Natureza, e a tarefa de lhe prestar
uma assistência é uma dificuldade insuperável –, não é loucura não prover tal
tarefa? Melhor sacrificar realizações do que omitir essa instrução totalmente
essencial... Algum entendimento dos primeiros prin-cípios da fisiologia e das
verdades elementares da psicologia é indispen-sável para a educação correta das
crianças.
Eis os fatos indiscutíveis: que o desenvolvimento das crianças na mente
e no corpo segue certas leis; que, a menos que essas leis estejam em alguma
medida ajustadas pelos pais, a morte é inevitável; que, a menos que elas estejam
ajustadas em grande medida, sérios defeitos físicos e mentais têm de ocorrer; e
que somente quando elas estão completamente ajustadas uma maturidade
perfeita pode ser alcançada. Então julgue se todos que algum dia possam ser pais
não devem se esforçar com alguma ansiedade para aprender o que essas leis
são.”

Como os pais geralmente procedem
Os pais começam instintivamente considerando o seu filho como uma
tábua não escrita, a qual é preenchida com grandes explanações quanto ao que
eles escreverão lá. Aos poucos, aparecem traços de disposi-ção: a criança tem
pequenos modos próprios, e, inicialmente, toda nova exibição de personalidade é
uma surpresa deliciosa. Para nós, é neces-sariamente maravilhoso que a criança
mostre prazer à vista do seu pai, que a face dela esteja em simpatia com a sua
mãe. Mas a maravilha envelhece. Os seus pais estão acostumados ao fato quando
chega o tempo em que a criança se mostra um ser humano completo como eles
mesmos: com afeições, desejos, capacidades. Levando ao seu livro, talvez, como
um pato à água, ou aos jogos que o tornarão um homem. A noção de fazer tudo
pela criança (com que os pais começaram) gradualmente diminui. Tão logo ela
mostre que tem um jeito de ser próprio, ela é estimulada a assumi-lo. Os pais não
têm deleite maior do que assistir à individualidade do seu filho se desdobrar
como uma flor se desdobra. Mas Otelo perde a sua ocupação. Quanto mais a
criança modela o seu próprio curso, menos os pais agem, além de alimentá-la
com comida conveniente, quer de amor, quer de pensamento, quer de carne
corporal e bebida. E aqui, podemos notar, os pais precisam somente de
suprimento. A criança sabe bem como se apropriar. O cuidado principal dos pais
é que aquilo que eles devem suprir seja saudável e nutritivo, quer na forma de
livros de imagens, de lições, de colegas, de pão e leite, quer de amor da mãe.
Isso é a educação conforme a maioria dos pais entendem: com mais de carne,
mais de amor, mais de cultura, de acordo com o seu tipo e grau. Eles deixam os
seus filhos sozinhos, permitindo que a natureza humana se desenvolva segundo
as suas próprias diretrizes, modificada pelos fatos do meio ambiente e da
descendência.
Nada poderia ser melhor para a criança do que essa “inatividade
magistral” na medida do possível. Está bem que se deva deixá-la crescer a ser
ajudada a crescer de acordo com a sua natureza. E, contanto que os pais não
deem um passo que a estrague, muita bondade e nenhum prejuízo muito evidente
vêm por deixá-la sozinha. Mas essa filosofia de “deixe-o ser”, enquanto cobre
uma parte, não cobre a parte séria do chamado dos pais, não toca os incessantes
esforços extenuantes sobre as diretrizes da lei que vão à produção de um ser
humano no seu melhor.
Nada que diga respeito à criança é trivial. As suas palavras e modos
aparentemente tolos são plenos de significado para o sábio. É no infinitamente
pequeno que temos que estudar o infinitamente grande. E as vastas
possibilidades e a direção certa da educação são indicadas no livro aberto dos
pensamentos da pequena criança.
Uma geração atrás, um grande professor entre nós nunca se cansou de
reiterar isso no plano divino: “a família é a unidade da nação” – não o indivíduo,
mas a família. Há um grande ensino na frase, mas isso permanece na superfície.
O todo é maior do que a parte; o todo contém a parte, deve à parte, ordena a
parte. E sendo assim as crianças são proprie-dade da nação, a serem educadas
para a nação conforme seja melhor para a nação, e não de acordo com o capricho
de pais individuais. A lei é para a punição dos malfeitores, para o louvor
daqueles que agem bem. Assim, praticamente, os pais têm muito jogo livre. Mas
é bom que nos lembremos de que as crianças são um bem nacional, cuja
educação diz respeito a todos – mesmo àquelas pessoas não casadas e sem filhos
cuja parte no jogo é aquela um pouco enfadonha de “assistir sem se envolver”.





1. UM MÉTODO DE EDUCAÇÃO

Métodos tradicionais de educação
Nunca foi mais necessário para os pais encarar por si mesmos essa
questão da educação em todas as suas relações. Até agora, as crianças foram
educadas principalmente com métodos tradicionais. A experiência dos nossos
ancestrais, flutuando num vasto número de máximas educa-cionais, é transmitida
boca a boca. E poucas ou muitas dessas máximas formam o código educacional
de toda casa.
Mas nós dificilmente compreendemos quão completamente está se
realizando na teoria da educação uma revolução melhorando a ciência. As
tradições dos mais velhos foram tentadas e consideradas insuficientes. Haverá
muito tempo antes que os axiomas da nova escola passem à aceitação comum. E
no meio tempo os pais são postos sobre os seus pró-prios recursos e têm de
determinar mesmo o peso dos princípios e adotar um método, da educação por si
mesmos.
Por exemplo, de acordo com o código anterior, uma mãe pode usar o
seu chinelo de vez em quando, para bom efeito e sem culpa. Mas agora, a pessoa
da criança, quer correta ou incorretamente, é considerada sagrada, e a inflição de
dor para propósitos morais geralmente não é permitida.
Ainda, a velha regra para a mesa da criança era “quanto mais simples,
melhor, e que a fome traga o molho”. Agora, a dieta das crianças tem de ser pelo
menos tão nutritiva e tão variada quanto a dos seus antepassados. E o apetite, o
desejo por certos tipos de comida, até então uma tendência a ser reprimida, agora
está dentro de certos limites: da guia mais digna de confiança dos pais ao
arranjar uma dieta prescrita para os seus filhos.
Foi um princípio do antigo regime as crianças serem educadas para
aguentar a dureza. “Nunca serei um marinheiro se não puder encarar o vento e a
chuva.”, disse um amiguinho de cinco anos que foi tirado numa noite amarga
para ver uma procissão com luz de tocha. E, ainda que tremendo com o frio, ele
recusou o abrigo de uma cabana. Hoje, a cabana é tudo. É proibido que as
crianças sofram de fadiga ou exposição.
A velha teoria se resume a: as crianças devem agir conforme sejam
ordenadas, prestar atenção aos seus livros e ter prazer contanto que nada fique no
caminho. Agora, deve-se considerar mais os prazeres da criança do que os seus
deveres.
Primeiramente, elas eram educadas em submissão. Agora, os mais
velhos dão lugar, e o mundo é feito para as crianças. O povo inglês rara-mente
vai tão longe quanto os pais daquela história em French Home Life[12], que
chegaram uma hora atrasados a uma festa de jantar, porque a sua menina de três
anos desejou se despir e ir para a cama quando quis, e puderam se deslocar
quieta e secretamente somente quando a criança adormeceu. Não vamos tão
longe, mas esse é o sentido no qual estamos nos movendo. Não é uma questão a
ser decidida improvisadamente: o quanto as novas teorias de educação são sábias
e humanas, o efeito de mais conhecimento fisiológico e psicológico amplamente
difundido e o quanto eles apenas favorecem o culto à criança ao qual todos nós
estamos sucumbindo.
De qualquer maneira, não é demais dizer que pais que não sigam
razoavelmente um método de educação, plenamente arquitetado, falhem – agora
mais do que nunca – em satisfazer as exigências que os seus filhos têm sobre
eles.

Método: um caminho para um fim
Método implica duas coisas: um caminho para um fim e um progresso
passo a passo naquele caminho. Além disso, o seguimento de um método
implica uma ideia, uma imagem mental, do fim ou do objetivo a ser atingido. O
que você propõe que a educação deva efetuar no e para o seu filho? Ainda, o
método é natural; fácil, produtivo, discreto, simples, como os caminhos da
própria Natureza. Entretanto, atento, cuidadoso, todo penetrante, todo forçoso.
Com o fim da educação em vista, o método põe a maioria dos assuntos
improváveis a serviço de acarretar aquele fim. Mas sem mais mecanismo
cansativo do que o sol emprega quando faz os ventos soprarem e as águas
fluírem somente pelo brilho. Os pais que veem o seu caminho – isto é, a força
exata do método – para educarem o seu filho farão uso de toda circunstância da
vida da criança quase sem intenção da sua própria parte, de tão fácil e
espontâneo que é um método de educação baseado na Lei Natural. Se a criança
come ou bebe, se ela vem ou vai ou brinca – o tempo todo ela está sendo
educada, ainda que esteja pouco ciente disso, como ela está do ato de respirar.
Sempre há o perigo de que um método de bona fide[13] se degenere num mero
sistema. O Método de Jardim de Infância, por exemplo, merece o nome por ter
sido concebido e aperfeiçoado por educadores de grande coração para ajudar a
evolução multifacetada do ser humano mais complexo, vivo, crescente. Mas que
miséria inexpressiva se torna o sistema nas mãos de praticantes igno-rantes!

Um sistema mais fácil do que um método
Um “sistema de educação” é uma fantasia tentadora, mais ainda, por
algumas razões, do que um método, porque ele é comprometido com resultados
calculáveis mais definidos. Mediante um sistema, certos desen-volvimentos
podem ser provocados pela observância de dadas regras. Taquigrafia, dança,
como passar em exames, como se tornar um bom contador ou uma mulher da
sociedade: todos podem ser aprendidos em sistemas.
O sistema – a observância de regras até o hábito de fazer certas coisas,
de se comportar de certas formas, é confirmada e, portanto, a arte é adquirida – é
tão bem-sucedido em atingir resultados precisos, que não espanta que haja
inumeráveis tentativas de pôr em dificuldades o campo inteiro da educação até
os limites de um sistema.
Se um ser humano fosse uma máquina, a educação não poderia lhe fazer
mais do que colocá-lo em ação nas formas prescritas. E o trabalho do educador
seria simplesmente adotar um bom sistema funcional ou um conjunto de
sistemas.
Mas o educador tem de lidar com um ser que age sobre si mesmo, que
se autodesenvolve, e o seu negócio é guiar e assistir a produção do bem latente
naquele ser, a dissipação do mal latente, a preparação da criança para tomar o
seu lugar no mundo da sua melhor forma, com toda a capa-cidade para o bem
que há nela, desenvolvida numa potência.
Embora o sistema seja muito útil como um instrumento de edu-cação,
um “sistema de educação” é pernicioso, por produzir somente ação mecânica em
vez do crescimento vital e do movimento de um ser vivo.
É válido apontar as características divergentes de um sistema e de um
método, porque os pais se deixam ser levados com suficiente frequên-cia por
algum “sistema” plausível, cujo objetivo é produzir desenvolvi-mento numa
direção – dos músculos, da memória, da faculdade de racio-cínio – e ficar
contentes, como se aquele simples desenvolvimento fosse uma educação
completa. Essa satisfação fácil surge da lentidão da natureza humana, para a qual
qualquer esquema definido é mais agra-dável do que a atenção constante, a ação
imprevista, chamadas quando o todo da existência de uma criança deve ser
usado como o meio da sua educação. Mas quem é suficiente para uma educação
tão compreensiva, tão incessante? Pais podem estar querendo se submeter a
qualquer traba-lho definido para o bem do seu filho. Mas estar sempre atendendo
o seu benefício, sempre inventando que as circunstâncias o divertirão para o seu
bem, é a parte de um deus e não de um homem! Uma objeção razoável o
bastante, se alguém olha a educação como uma série sem fim de esforços
independentes, cada qual a ser arquitetada e realizada no calor do mo-mento.
Mas o fato é que poucos princípios essenciais amplos cobrem o campo todo – e
esses uma vez completamente aproveitados. É tão fácil e natural agir sobre eles
quanto é agir sobre o nosso conhecimento de fatos, como aquele fogo que
queima e aquela água que flui. O meu empreen-dimento nisso e os capítulos
seguintes serão para pôr esses poucos princípios fundamentais diante de você
nas suas relações práticas. En-quanto isso, consideremos uma ou duas questões
preliminares.


2. A HERANÇA DA CRIANÇA

A criança no centro
E primeiro consideremos onde e o que o pequeno ser é, aquele que é
confiado ao cuidado dos pais humanos. Uma tábua sobre a qual escrever? Um
galho para ser dobrado? Uma cera para ser moldada? Muito provavel-mente,
mas ele é muito mais: um ser pertencente a uma herança muito maior do que a
nossa, como se fosse um príncipe comprometido com o fornecimento de
cuidados aos camponeses. Ouça a estimativa de Words-worth[14] sobre a herança
da criança:




“Our birth is but a sleep and a forgetting:
The soul that rises with us, our life's Star,
Hath had elsewhere its setting,
And cometh from afar:
Not in entire forgetfulness,
And not in utter nakedness,
But trailing clouds of glory do we come
From God, who is our home:
Heaven lies about us in our infancy!

* * * * *

Thou, whose exterior semblance doth belie
Thy Soul's immensity;
Thou best Philosopher, who yet dost keep
Thy heritage, thou Eye among the blind,
That, deaf and silent, read'st the eternal deep,
Haunted for ever by the eternal mind, —
Mighty Prophet! Seer blest!
On whom those truths do rest,
Which we are toiling all our lives to find,
Thou, over whom thy Immortality
Broods like the Day, a Master o'er a Slave,
A Presence which is not to be put by;
Thou little Child, yet glorious in the might
Of heaven-born freedom on thy being's height[15]

* * * * *







“O nosso nascimento é somente um sono e um esquecimento:
A alma que surge conosco, a nossa Estrela da vida,
Teve a sua colocação em outro lugar,
E vem de longe;
Não em total esquecimento,
E não em completa nudez,
Mas, seguindo nuvens de glória, vimos mesmo
De Deus, que é o nosso lar:
O céu se encontra ao nosso redor na nossa infância!

* * * * *

Tu, cujo semblante exterior esconde mesmo
A imensidão da tua Alma;
Tu, melhor Filósofo, que no entanto manténs mesmo
A tua herança; tu, Olho entre cegos,
Que, surdo e silencioso, lês a profundidade eterna,
Perseguido para sempre pela mente eterna –
Poderoso Profeta! Bendito vidente!
Sobre quem aquelas verdades descansam mesmo,
As quais estamos labutando todas as nossas vidas para encontrar;
Tu, sobre quem a tua Imortalidade
Medita como o Dia, um Senhor sobre um Escravo,
Uma Presença que não deve ser poupada;
Tu, pequena Criança, no entanto gloriosa na poderosa
Liberdade de nascidos do céu, sobre a altura do teu ser”

* * * * *

E assim por diante, através do todo daquela grande ode, que, logo após
a Bíblia, mostra o insight mais profundo no que é peculiar às crianças na sua
natureza e herança. “Porque o Reino dos céus é para aqueles que se lhes
assemelham[16].” “Se não vos transformardes e vos tornardes como cri-ancinhas,
não entrareis no Reino dos céus[17].” “Quem é o maior no Reino dos céus[18]?” “E
Ele chamou uma criancinha e colocou-a no meio deles[19].” Eis a estimativa
divina da herança da criança. Vale a pena para os pais ponderar cada declaração
nos Evangelhos sobre as crianças, despojando-se da noção de que esses ditados
pertencem, em primeiro lugar, às pessoas adultas que se tornaram como
criancinhas. O que esses ditados profundos são, e o quanto eles podem significar,
está além da nossa alçada discutir aqui. Eles apenas aparecem para cobrir bem
mais do que as alegações de Wordsworth para as crianças na sua capacidade
mais sublime:

“Seguindo nuvens de glória, vimos mesmo
De Deus, que é o nosso lar.”

Código de educação nos Evangelhos
Pode surpreender os pais que não deram muita atenção ao assunto
descobrir também um código de educação nos Evangelhos, expressamente posto
por Cristo. É resumido em três mandamentos, e todos os três têm um caráter
negativo, como se a coisa principal exigida das pessoas adultas fosse que elas
não devessem causar qualquer tipo de prejuízo às crianças: Preste atenção para
que não OFENDAS, não DESPREZES, não ATRA-PALHES um destes
pequeninos.
Assim, execute as três leis educacionais do Novo Testamento, que,
quando examinadas separadamente, parecem-me cobrir todo o auxílio que
podemos dar às crianças e todo o dano de que podemos preservá-las, isto é, tudo
o que estiver incluído na formação de uma criança, no caminho que ela deve
seguir. Olhemos essas três grandes leis como proibitivas, a fim de clarificar o
motivo para a consideração de um método de educação; pois, uma vez definido
conosco o que não podemos fazer, somos enormemente ajudados a ver o que nós
podemos fazer, e temos que fazer. Mas, na verda-de, o positivo está incluso no
negativo; e o que estamos obrigados a fazer pela criança, no que estamos
proibidos de fazer para o seu prejuízo.





3. OFENDENDO AS CRIANÇAS

Ofensas
O primeiro e o segundo éditos divinos parecem incluir os nossos
pecados de ato e de omissão contra as crianças: nós as ofendemos quando
fazemos por elas aquilo que não deveríamos ter feito; nós as desprezamos
quando deixamos de fazer o que deveríamos ter feito pelo bem delas. Uma
ofensa, nós sabemos, é literalmente um obstáculo, aquele no qual o cami-nhante
tropeça e lhe faz cair. As mães sabem o que é limpar o chão de todo obstáculo
quando um bebê dá as suas corridinhas inconstantes de cadeira a cadeira, de um
par de braços amáveis a outro. A perna de mesa, sobre o chão o brinquedo de
criança, o qual causou uma queda e um grito lamen-tável, é uma coisa a ser
deplorada. Por que alguém não o pôs fora do caminho, de modo que o bebê não
devesse tropeçar? Mas a criancinha está saindo ao mundo com passos
cambaleantes incertos em muitas direções. Há causas de tropeços não tão fáceis
de remover como um escabelo ofen-sivo, e ai daquele que faça a criança cair!

As crianças nascem obedientes à lei
“Bebê malcriado!”, diz a mãe. E os olhos da criança baixam, e um rubor
surge sobre o pescoço e a testa. É muito lindo, muito “engraçado”, algumas
pessoas pensam, e dizem “Bebê malcriado!” quando o bebê é docilmente bom
para entretê-las com a vista da alma infantil crescendo visivelmente perante os
seus olhos. Mas o que significa essa exibição de sentimento, de consciência, na
criança, antes que qualquer ensinamento humano lhe possa ter atingido? Não
menos que isto: que ela nasceu como um ser obediente à lei, com um senso de
pode, e tem que, de certo e errado. É assim que as crianças são enviadas ao
mundo com o aviso: “Preste atenção para que não ofendas nenhum desses
pequeninos[20].” E, sendo assim, quem não encontrou meninas e meninos
grandes, os filhos de pais sensatos, que ainda não sabem o que significa ter que,
que não são movidos por deveria, cujos corações não sentem tumulto pelo
solene nome do Dever, que não conhecem regra de vida maior do que “Eu
quero” e “Eu não quero”, “Eu gosto” e “Eu não gosto”? Que o céu ajude os pais
e filhos quando chegarem a isso!
Mas como aconteceu que o bebê, com um senso agudo de certo e errado
mesmo quando ele pode entender pouco da fala humana, se tornasse um menino
ou menina já provando “a maldição do coração sem lei”? Por graus lentos, um
pouco aqui e um pouco ali, como tudo o que é bom ou mau no caráter vem a
passar. “Malcriado!”, diz a mãe de novo, quando uma mãozinha é introduzida na
tigela de açúcar e um par de olhos travessos procura o dela furtivamente, para
medir, conforme fazem infali-velmente, o quão longe o gatuno pode ir. É muito
divertido. A mãe “não pode evitar rir”. E permite que a pequena transgressão
passe. E – aquilo em que a mãe não pensou – uma ofensa, uma causa de tropeço,
foi lançada no caminho da sua criança de dois anos de idade. Ela já aprendeu que
aquilo que é “malcriado” pode ser feito com impunidade, e ela continua
melhorando o seu conhecimento. É desnecessário continuar. Todos sabem os
passos pelos quais os “nãos” da mãe vêm a ser desconsiderados; a sua recusa
provocou consentimento. A criança aprendeu a acreditar que ela não tem nada a
superar senão o desafeto da sua mãe. Se ela escolhe deixar a criança fazer isso e
aquilo, não há razão por que a mãe não deva. A criança pode fazer com que a
mãe escolha deixá-la fazer a coisa proibida, e então ela pode fazer isso. O
próximo passo no assunto não é grande demais para os juízos infantis: se a mãe
da criança fizer o que a mãe escolher, claro que a criança fará o que a criança
escolher, se a criança puder. E daqui para a frente a vida da criança se torna uma
luta sem fim para conseguir o seu próprio caminho. Uma luta a qual os pais estão
bem certos de que piorará, tendo muitas coisas para pensar, enquanto a criança
se cola persistentemente à coisa que toma a sua imaginação pelo momento.

Elas têm de perceber que os seus governantes são mo-vidos pela
lei
Onde está o início dessa complicação, estragando de modo parecido as
vidas de pais e filhos? Nisto: que a mãe não começou com um senso de dever
suficiente. Ela se considerou livre para permitir e não permitir, para dizer e
desdizer, à vontade, como se a criança fosse sua para fazer com esta o que
quisesse. A criança nunca descobriu um fundo de ter que atrás das decisões da
mãe. A criança não sabe que a mãe não tem que deixá-la quebrar os brinquedos
da irmã, engolir o bolo, estragar o prazer de outras pessoas, porque essas coisas
não são certas. Faça que a criança perceba que os seus pais são movidos pela lei
tanto quanto ela, que eles não podem simplesmente permitir que ela faça as
coisas que foram proibidas, e a criança se submete com a mansidão doce que
pertence à sua idade. Dar razões a uma criança geralmente é inviável e é um
sacrifício de dignidade parental; mas a criança é rápida o bastante para ler o “tem
que” e o “deve-ria” que a governam, no rosto e na maneira da sua mãe, e no fato
de que a mãe não deve ser movida a partir de uma resolução sobre qualquer
questão de certo e errado.

Os pais podem ofender os seus filhos desrespeitando as leis da
saúde
Isso, permitir a criança no que é errado, é somente uma das muitas
maneiras pelas quais a mãe amável pode ofender o seu filho. Através da
ignorância, ou obstinação, que é pior, a mãe pode não somente permitir o errado
na criança, mas fazer errado pela criança. Ela pode lançar um obstáculo no
caminho da vida física do filho, dando-lhe comida insalubre, deixando que
durma e viva em quartos mal ventilados, desconsiderando quaisquer ou todas as
leis simples da saúde – ignorância da qual dificil-mente deve ser escusada, em
face dos esforços feitos pelos cientistas para trazer esse conhecimento necessário
ao alcance de todos.

E sobre a vida intelectual
Quase tão ruim é a forma como a vida intelectual da criança pode ser
arruinada no seu princípio por um círculo de aulas monótonas, que perdem
tempo, nas quais o progresso definitivo é a última coisa a ser feita ou esperada, e
que, tão longe de educar em qualquer sentido verdadeiro, neutralizam os seus
talentos de uma forma que ela nunca se restabeleça. Muitas meninas,
especialmente, deixam a sala de aula domiciliar com um desgosto por todas as
maneiras de aprendizagem, uma aversão pelo esfor-ço mental, a qual perdura
pela sua vida toda e que é o motivo por que ela cresce lendo pouco, apenas
romances inúteis, e falando o dia todo sobre as suas roupas.

E sobre a vida moral
E as suas afeições – os movimentos do tenro coração infantil extro-
vertido –, como são tratadas? Há poucas mães que não fazem esforços para
valorizar as afeições da família; mas, quando a criança vai se relacionar com
estranhos, máximas e motivos terrenos alguma vez cortaram o mal pela raiz do
amor infantil? Muito pior do que isso é quando o amor da criança não encontra
saídas dentro da sua casa: quando ela é a criança simples e apagada da família e
é deixada no frio, enquanto a afeição dos pais é esbanjada no resto. Claro que ela
não ama os seus irmãos e irmãs, que monopolizam o que deveria ser dela
também. E como ela amará os seus pais? Ninguém sabe a angústia real que
muitas crianças sofrem no quarto de crianças por isso, nem quantas vidas são
amarguradas e estra-gadas por meio da supressão dessas afeições infantis. Disse-
me uma se-nhora um tempo atrás: “A minha infância foi miserável pelo carinho
apaixonado da minha mãe pelo meu irmão pequeno. Não houve um dia em que
ela não me tenha deixado infeliz por ir ao quarto de criança para acariciá-lo e
brincar com ele. E o tempo todo ela não tinha uma palavra, nem um olhar, nem
um sorriso para mim, nada mais, como se eu não estivesse no quarto. Eu nunca
superei isso. Ela é muito gentil comigo agora, mas eu nunca me sinto muito
natural com ela. E como nós, irmão e irmã, podemos nos sentir um pelo outro
como se tivéssemos crescidos juntos em amor no quarto de criança?”


4. DESPREZANDO AS CRIANÇAS

As crianças devem ter o melhor das suas mães
Suponha que uma mãe possa ofender o seu filho. Como é possível que
ela o despreze? “Desprezar: ter uma baixa opinião de, subestimar” – assim diz o
dicionário. E, na verdade, por mais que possamos nos deleitar com as crianças,
nós, pessoas adultas, temos uma opinião deficiente demais delas. Se a mãe não
subestimou o seu filho, ela o deixaria a uma babá ignorante durante os primeiros
anos quando a sua natureza inteira está, como a placa sensível do fotógrafo,
continuamente recebendo impres-sões indeléveis? Não, a menos que essa babá
seja boa para a criança. Muito provavelmente, para pessoas formadas não
resolveria ter as suas crianças sempre em torno delas. A sociedade constante dos
seus pais poderia ser estimulante demais para a criança. E a mudança frequente
de pensamento, e a sociedade com outras pessoas, torna a mãe mais fresca para
os seus filhos. Mas eles devem ter o melhor da sua mãe, as suas horas mais
frescas, mais brilhantes, enquanto, ao mesmo tempo, ela é cuidadosa ao escolher
as suas babás deles sabiamente, formá-las cuidadosamente e manter um olho
vigilante sobre tudo o que acontece no quarto de criança.

Cuidadora
A simples grosseria e rudeza no cuidado da cuidadora causam à criança
sensível um dano duradouro. Muitas crianças deixam o quarto de criança com o
seu senso moral embotado e com uma alienação do seu Pai celestial que pode
durar por toda a sua vida. Pois o senso moral da criança é excessivamente
rápido. Ela tem todos os olhos e ouvidos para o mais leve ato ou palavra de
injustiça, decepção, matreirice. A sua cuidadora lhe diz: “Se você for um bom
menino, eu não irei contar.” E a criança aprende que as coisas podem ser
escondidas da sua mãe, que deveria ser para ela como Deus, conhecendo todo o
seu bem e mal. E não é como se a criança notasse os escorregões dos mais
velhos com aversão. Ela sabe melhor, é verdade, mas então ela não confia nas
suas próprias intuições. Ela modela a sua vida em qualquer padrão posto perante
ela. E, com a nódoa fatal da natureza humana sobre ela, está mais pronta a imitar
um mau padrão do que um bom. Dê-lhe uma cuidadora que seja grosseira,
violenta e trapa-ceira, e, antes que a criança seja capaz de falar claramente, ela
terá apre-endido essas disposições.

Os defeitos das crianças são sérios
Uma das maneiras pelas quais os pais são aptos a ter uma opinião
deficiente demais dos seus filhos é no assunto dos seus defeitos. Uma criancinha
mostra algum traço feio – ela é gulosa e engole a porção de guloseimas da sua
irmã tanto quanto a sua; ela é vingativa, pronta para morder ou lutar contra a
mão que a ofende; ela conta uma mentira. Não, ela não tocou a tigela de açúcar
ou o pote de gelatina. A mãe protela o dia mau: ela sabe que algum dia terá que
considerar a criança por aquelas ofensas, mas no meio tempo diz a si mesma:
“Oh, desta vez não importa. Ela é muito pequena e saberá melhor pouco a
pouco.” Para não colocar a coisa em bases mais elevadas, que dias felizes para si
mesma e para os seus filhos asseguraria a mãe, se ela se mantivesse de olho em
vez de deixar as águas rolarem! Se a mãe define na sua própria mente que a
criança nunca age erroneamente sem estar ciente do seu agir errado, ela verá que
a criança não é nova demais para ter o seu defeito corrigido ou prevenido. Lide
com uma criança na sua primeira ofensa, e um olhar sério é o suficiente para
condenar a pequena transgressora. Mas deixe passar até que seja formado um
hábito de agir mal, e a cura será lenta. Então a mãe não terá chance até que ela
tenha, ao contrário, formado na criança um hábito de agir bem. Rir de
temperamentos feios e deixá-los passar porque a criança é pequena é semear o
vento.


5. ATRAPALHANDO AS CRIANÇAS

O relacionamento de uma criança com Deus Todo-Poderoso
A maneira mais fatal de desprezar a criança cai sob a terceira lei
educacional dos Evangelhos. Deve-se negligenciar e fazer pouco caso do seu
relacionamento natural com Deus Todo-Poderoso. “Deixai vir a mim estas
criancinhas[21]”, diz o Salvador, como se isto fosse a coisa natural para as
crianças fazerem, aquilo que fazem quando não são atrapalhadas pelos mais
velhos. E talvez não seja uma coisa muito bonita acreditar neste mundo
redimido, onde, assim como o bebê se volta à sua mãe ainda que não tenha o
poder de dizer o seu nome, como as flores se voltam ao sol, os corações das
crianças se voltam ao seu Salvador e Deus, com deleite e confiança
inconscientes.

A teologia da pré-escola
Agora escute o que acontece em muitas pré-escolas: “Deus não o ama,
seu malcriado, menino mau!”, “Ele o enviará ao lugar ruim, mau.”, e assim por
diante. E esse é todo o ensinamento prático sobre os caminhos do seu
“Amante[22] todo-poderoso” que a criança tem! Nunca uma palavra de como
Deus ama e valoriza as crianças pequenas o dia todo e preenche-lhes as horas
com alegria. Acrescente a isso orações superficiais apáticas, discussões inúteis
sobre as coisas divinas na presença delas, uso leviano de palavras santas, poucos
sinais pelos quais a criança possa ler que as coisas de Deus são mais para os seus
pais do que quaisquer coisas do mundo, e a criança é estorvada, tacitamente
proibida de “vir a Mim” – e isso, frequentemente, por pais que nas profundezas
dos seus corações não desejam nada comparado a Deus. O prejuízo está naquela
mesma subes-timação tola das crianças, na noção de que elas não podem ter uma
vida espiritual até que os seus mais velhos desejem acender a chama.


6. CONDIÇÕES DA ATIVIDADE CEREBRAL SAUDÁVEL

Tendo acabado de olhar para a larga região do terreno proibido, estamos
preparados para considerar o que é, definitiva e positivamente, que a mãe deve
ao seu filho sob o nome de “Educação”.

Todo o trabalho da mente significa o cansaço do cé-rebro
Em primeiro lugar, as capacidades mais educáveis da criança – a sua
inteligência, a sua vontade, os seus sentimentos morais – têm o seu assento no
cérebro. Isto é, como o olho é o órgão da visão, o cérebro, ou alguma parte dele,
é o órgão do pensamento e da vontade, do amor e da adoração. As autoridades
divergem no tocante ao quão longe é possível localizar as funções do cérebro,
mas pelo menos isto parece bem claro: que nenhuma das funções da mente são
realizadas sem atividade real na massa de matéria nervosa cinza e branca
chamada de “cérebro”. Ora, isso não é um problema para o fisiologista sozinho,
mas para todos os pais de família, porque aquele cérebro maravilhoso, por meio
do qual fazemos o nosso pensamento, deve agir saudavelmente e em harmonia
com a ação salutar dos membros, deve agir somente sob tais condições de
exercício, descanso e nutrição, como a saúde segura em todas as outras partes do
corpo.

Exercício
A maioria de nós se encontrou com algumas pessoas excêntricas e
muitas bem bobas, no que diz respeito a quem a questão se força: essas pessoas
nasceram com menos capacidade cerebral do que outras? Prova-velmente não.
Mas se foi permitido que elas crescessem sem o hábito diário dos trabalhos
moral e mental apropriados, se foi permitido que elas perdessem tempo durante a
juventude sem os esforços de pensamento e vontade regulares e sustentados, o
resultado seria o mesmo, e o cérebro, que deveria ter sido revigorado pelo
exercício diário, tornou-se fraco e débil como um braço saudável ficaria após ser
carregado por anos numa tipoia. O grande cérebro ativo não está contente com a
ociosidade inteira. Ele define diretrizes para si mesmo e trabalha agitadamente. E
o homem ou a mulher se tornam excêntricos porque todo o esforço mental, como
o moral, tem de ser prosseguido sob a disciplina das regras. Um escritor sagaz
sugeriu que a indolência mental pode ter sido em alguma medida a causa
daqueles ataques deploráveis de perturbação e depressão dos quais o pobre
Cowper sofreu, o fazer de versos graciosos quando a “porção de larva” não lhe
proporcionou a quantidade de labor mental necessário para o seu bem-estar.
A conclusão disso é: não deixe que as crianças passem um dia sem
esforços distintos, intelectuais, morais, volitivos. Deixe-as se fortalecerem para
entender. Deixe-as se convencerem de fazer e suportar. Deixe-as fazer o certo
com o sacrifício do fácil e do prazer. E isso por muitas razões maiores, mas, em
primeiro lugar e mais baixo, que o mero órgão físico da mente e da vontade
possa crescer vigoroso com o trabalho.

Descanso
Tão importante quanto isso é que o cérebro tenha o seu devido
descanso, ou seja, descanse e trabalhe alternadamente. E aqui duas
considerações entram em jogo. Em primeiro lugar, quando o cérebro está ativo
no trabalho, ele é tratado como é todo outro órgão do corpo nas mesmas
circunstâncias, isto é, um grande suprimento adicional de sangue é atraído à
cabeça para a alimentação do órgão que está gastando a sua substância em
trabalho duro. Ora, não há uma quantidade indefinida do que no momento
chamaremos de sangue excedente nos recipientes. O suprimento é regulado
sobre o princípio de que somente um conjunto de órgãos será excessivamente
ativo de uma vez: ora os membros, ora os órgãos digestivos, ora o cérebro. E
todo o sangue no corpo que pode ser poupado vai ao suporte daqueles órgãos
que, por ora, estão num estado de labor.




Descanso após as refeições
A criança acabou de jantar. Esta é a refeição do dia que mais
severamente sobrecarrega os seus órgãos digestivos, pois, por duas ou três horas
depois, muito trabalho estará prosseguindo nesses órgãos, e o sangue que pode
ser poupado de outro lugar estará presente para ajudar. Agora, mande a criança
sair para uma caminhada longa imediatamente após a janta: o sangue vai às
extremidades do trabalho e a comida é deixada meio digerida. Dê à criança um
curso regular dessas jantas e caminhadas, e ela crescerá dispéptica. Coloque-a
nos seus livros após uma refeição pesada e o caso será tão ruim quanto. O
sangue que deveria estar ajudando na digestão da refeição vai ao cérebro,
trabalhando.
Com efeito, as horas para as aulas devem ser cuidadosamente
escolhidas após períodos de descanso mental – sono ou jogo, por exemplo – e
quando não há atividade excessiva em qualquer outra parte do sistema. Assim
sendo, a manhã, após o café da manhã (a refeição mais leve, cuja digestão não é
uma força pesada), é o melhor tempo para as aulas e todo tipo de trabalho
mental. Se a tarde toda não pode ser poupada para o recreio fora de casa, esse é o
tempo para tarefas mecânicas como costura, desenho, treinos. Os talentos das
crianças são brilhantes o bastante à noite, mas o inconveniente para o trabalho
noturno é que o cérebro, uma vez excitado, está inclinado a continuar os seus
trabalhos além da hora de dormir, e sonhos, insônia e sono difícil se aplicam à
pobre criança que esteve em trabalho até o último minuto. Se as crianças mais
velhas têm de trabalhar de noite, elas devem ter pelo menos uma ou duas horas
sociais agradáveis antes de irem para a cama. Mas, de fato, temos essa dívida
com as crianças: abolir a “preparação” da noite.

Mudança de ocupação
Diz Huxley: “Não há no presente nenhuma prova satisfatória de que a
manifestação de qualquer tipo particular de faculdade mental seja especialmente
atribuída ou conectada à atividade de qualquer região particular dos hemisférios
cerebrais.”, um dictum[23] contra os frenologistas, mas chegando-nos em
autoridade alta demais para ser debatido. Não é possível localizar as
“faculdades” – para dizer que se tem cuidado com essa fração do cérebro e amor
musical pela outra. Mas esse tanto é certo e é muito importante para o educador:
o cérebro, ou alguma porção dele, fica exausto quando qualquer função dada foi
exercitada por muito tempo. A criança tem feito cálculos por algum tempo e está
ficando inexplicavel-mente idiota: remova a sua lousa e faça-a ler uma história, e
encontrar-se-ão os seus talentos frescos de novo. A imaginação, que não tem
parte nos cálculos, é chamada ao jogo pela aula de história, e a criança traz um
poder vivamente inesgotável para o seu novo trabalho. Os horários escola-res
geralmente são feitos com uma visão para dar ao cérebro da criança uma
variedade de trabalho. Mas o segredo do cansaço que as crianças frequentemente
mostram na sala escolar doméstica é que tal mudança judiciosa de aulas não é
planejada.

Nutrição
Ainda, o cérebro não pode fazer o seu trabalho bem, a menos que esteja
abundante e apropriadamente nutrido. Alguém fez um cálculo de quantos gramas
de cérebro serviram para a produção de uma obra – digamos Paradise Lost[24];
quantos gramas para uma outra obra, e assim por diante. Sem entrar na
aritmética mental dessa natureza, podemos dizer com segurança que toda espécie
de atividade intelectual gasta os tecidos do cérebro. Uma rede de recipientes
fornece uma quantidade enor-me de sangue ao órgão, para repará-lo por essa
perda de material. E o vigor e a saúde do cérebro dependem da qualidade e da
quantidade desse fornecimento de sangue.

Certas causas afetam a qualidade do sangue
Ora, a qualidade do sangue é afetada por três ou quatro causas. Em
primeiro lugar, o sangue é elaborado a partir da comida: quanto mais nutritiva e
fácil a digestão da comida, mais vitais serão as propriedades do sangue. A
comida também tem de ser variada, uma dieta mista, porque vários ingredientes
são exigidos para reparar os vários gastos nos tecidos. As crianças são incríveis
gastadoras. As suas idas e vindas sem fim, as suas inquietações, a sua energia, os
próprios manejos das suas línguas, tudo significa custo de substância: a perda
não é apreciável, mas elas perdem algo para cada saída repentina, dentro ou fora
de casa. Sem dúvida, o ganho de potência que resulta do exercício é mais do que
a compensação para a perda de substância; todavia deve-se prontamente fazer
essa perda boa. E não somente o corpo da criança é mais ativo,
proporcionalmente, do que o do homem: o cérebro da criança, se compa-rado ao
do homem, está em perpétua agitação de esforço. Calcula-se que, ainda que o
cérebro de um homem não pese mais do que um quadragésimo do seu corpo, um
quinto ou um sexto do seu complemento todo de sangue vai alimentar esse órgão
delicado e intensamente ativo. Mas, no caso da criança, uma proporção
consideravelmente maior do sangue que está nela é gasto com o sustento do seu
cérebro. E o tempo todo, com essas deman-das excessivas sobre ela, a criança
tem de crescer! Não meramente para reparar a perda, mas para produzir nova
substância no cérebro e no corpo.

No tocante às refeições
Qual é a conclusão óbvia? Que a criança deve ser bem alimentada.
Metade das pessoas com baixa vitalidade com quem deparamos são as vítimas
de alimentação deficiente durante a sua infância. E isso mais frequentemente
porque os seus pais não estavam então alerta ao seu dever a esse respeito, não
estavam numa posição de proporcionar aos seus filhos a dieta necessária ao seu
pleno desenvolvimento físico e ao mental. Refeições regulares nos intervalos
geralmente não partidos: janta, nunca mais do que cinco horas após o café da
manhã; almoço formal, desneces-sário; comida animal, uma vez certamente, em
alguma forma mais leve, duas vezes ao dia – são as sugestões do senso comum
seguidas na maioria das casas bem reguladas. Mas não é a comida que é comida,
mas a comida que é digerida que nutre o corpo e o cérebro. E aqui passam
muitas consi-derações de modo que nós somente podemos olhar para duas ou
três das mais óbvias. Todos sabem que as crianças não devem comer pastel ou
carne de porco ou carnes fritas ou queijo ou comida rica, altamente aroma-tizada
de qualquer descrição; que pimenta, mostarda e vinagre, molhos e temperos
devem ser proibidos, com novo pão, bolos ricos e geleias, como ameixa ou
groselha, nos quais o casaco de couro da fruta é preservado; que leite, ou leite e
água, e esta não quente demais, ou chocolate, é a melhor bebida para crianças, e
que elas devem ser educadas a não beber até que tenham terminado de comer;
que a fruta fresca no café da manhã é inesti-mável; que, servindo o mesmo fim,
o mingau de aveia, o melado e a gordu-ra do bacon torrado são valiosas comidas
para o café da manhã; e que um copo de água também, tomado como a última
coisa à noite e a primeira coisa de manhã, é útil para promover aqueles hábitos
regulares dos quais muitos confortos da vida dependem.

Conversa nas refeições
É desnecessário insistir em tudo isso e em muitas coisas do mesmo tipo.
Mas outra vez deixe-me dizer: é a comida digerida que nutre o sistema, e as
pessoas podem esquecer o quão longe as condições mentais e morais afetam os
processos de digestão. O fato é que os sucos gástricos que agem como solventes
para os mantimentos, só são secretados livremente quando a mente está numa
estrutura alegre e contente. Se a criança desgosta da sua janta, ela a engole, mas
a digestão daquela refeição desa-gradável é um processo trabalhoso, muito
impedido. Se a refeição for comi-da em silêncio, sem variação de conversa
agradável, a criança perde muito do “bem” da sua janta. Portanto, não é uma
questão de amimá-las absolu-tamente, mas uma questão de saúde, de nutrição
devida, que as crianças gostem da sua comida, e que as suas refeições sejam
comidas em alegria, ainda que, a propósito, o entusiasmo jubiloso seja tão
pernicioso quanto o seu oposto, por destruir aquele conteúdo exato, alegre, da
mente favorável aos processos de digestão. Nenhum esforço deve ser poupado
para tornar as horas de encontro em torno da mesa da família as mais brilhantes
do dia. Supõe-se permitir-se que as crianças se sentem à mesma mesa com os
seus pais. E, se for possível, que as deixem fazer assim em toda refeição, à
exceção da janta tardia. A vantagem às pessoinhas é incalculável. Eis a
oportunidade dos pais para educá-las nas maneiras e na moral, para con-solidar o
amor de família e acostumar as crianças a hábitos, como o de mastigação
completa, por exemplo – tão importante para a saúde quanto para a propriedade.

Variedade nas refeições
Mesmo dados os arredores agradáveis e a comida excelente, os re-
quisitos dessas pequenas pessoas exigentes não estão plenamente satis-feitos:
assim como a sua comida deve ser simples, elas têm de ter varie-dade. Uma
carne de carneiro toda terça-feira, a mesma fria às quartas-feiras e picada às
quintas-feiras, pode ser comida muito boa. Mas a criança que tem essa dieta
semana após semana está nutrida inadequadamente, simplesmente porque ela
está cansada disso. A mãe deve planejar um revezamento para os seus filhos que
durará pelo menos uma quinzena, sem a mesma janta ocorrendo duas vezes. O
peixe, especialmente se a criança o come sem carne acompanhada, é excelente
como uma mudança, ainda mais por ser rico em fósforo – um alimento valioso
para o cérebro. As sobremesas de crianças merecem uma boa dose de
consideração, porque estas comumente não ligam para comidas gordurosas, mas
preferem obter a vivacidade dos seus corpos a partir do amido e do açúcar das
suas sobremesas. Mas dê-lhes variedade. Não deixe ser “tapioca eterna”. Mes-
mo para o chá e o café da manhã, a mãe sábia não diz “Eu sempre dou às minhas
crianças” e coisas assim. Elas não devem ter qualquer coisa “sem-pre”. Toda
refeição deve ter alguma surpresinha. Mas essa é a forma de fazê-las pensar
muito sobre o que comerão e beberão? Ao contrário: são as crianças subnutridas
que são gulosas e inadaptadas para confiar em qual-quer delicadeza incomum.

O ar, tão importante quanto a comida
A qualidade do sangue depende quase tanto do ar que respiramos
quanto da comida que comemos. No curso de cada dois ou três minutos, todo o
sangue no corpo passa através de inúmeras ramificações dos pulmões, por
nenhum outro propósito senão este: durante o instante da sua passagem, ele deve
ser conduzido pelo oxigênio contido no ar que é levado aos pulmões no ato de
respirar. Mas o que pode acontecer ao sangue no curso de uma exposição de tão
curta duração? Apenas isto: o caráter inteiro, a própria cor do sangue é
modificado. Ele entra nos pulmões estragado, não mais capaz de sustentar a
vida. Ele os deixa, um fluido puro e vital. Agora observe: o sangue só é
plenamente oxigenado quando o ar contém a sua proporção completa de
oxigênio. E todo objeto respirando e queimando recolhe algum oxigênio da
atmosfera. Daí a im-portância de arejar as crianças diariamente e lhes dar
exercícios abun-dantes com pulmão e membros ao ar não viciado, não
empobrecido.

As crianças caminham todo dia
As crianças caminham todo dia. Elas nunca ficam fora menos que uma
hora quando o tempo está bom. Isso é melhor que nada. Então é isto: uma
professora de uma escola do leste de Londres nota a aparência pálida de umas
das suas melhores alunas.
– Você jantou alguma coisa, Nellie?
– Si-im (com hesitação).
– O que você jantou?
– A mãe deu à Jessie e a mim meio pêni[25] para comprar as nossas
jantas e compramos uma pequena quantidade de gotas de anis. Elas duram mais
do que o pão (com um apelo nos seus olhos contra uma possível censura pela
extravagância).
As crianças não se desenvolvem no seu melhor com gotas de anis para a
janta, nem diariamente com uma primeira bebida do dia. Possivelmente, a
ciência levará para casa mais e mais o fato de que a vida animal, fechada sob
cobertura, é suportada sob condições artificiais, assim como é a vida da planta
numa casa de vidro. Aqui é onde a maioria das nações continentais têm
vantagem sobre nós: elas mantêm o hábito da vida fora de casa.
Consequentemente, o francês, o alemão, o italiano, o búl-garo médio é mais
alegre, mais simples e mais duro do que o inglês médio. O clima? Por causa de
se poder estar fora “mais horas no dia e mais dias no ano” na Inglaterra do que
“em qualquer outro país”, Carlos II – e ele sabia – não fez uma declaração pelo
clima da Inglaterra? Perdemos de vista o fato de que nós não somos como aquela
personagem histórica que “viveu de nada exceto suprimentos alimentares e
bebida”. “Você não pode viver de ar!”, dizemos ao doente que não pode comer.
Não, não podemos viver de ar, mas, se temos que escolher entre os três
mantenedores de vida, o ar nos apoiará pelo maior tempo. Sabemos tudo sobre
isso. Estamos mortalmente enfastiados do assunto. Deixe apenas o rabo do seu
olho pegar “oxigenação” numa página e o órgão bem treinado pulará aquele
parágrafo por vontade própria. Não há necessidade de contar ao aluno de
Macaulay ou a qualquer outro: como o sangue do corpo é levado aos pulmões e
lá se espalha numa enorme extensão de inumeráveis “tubos”, de maneira que
possa ser exposto momentaneamente ao oxigênio no ar; como o ar é feito para
soprar sobre o sangue, e assim se espalhar prontamente, pela ação como bramido
da respiração; como o ar penetra as paredes muito finas dos tubos; e então, veja,
uma transmutação mágica (ou química). O despejo sem valor do sistema se torna
instantaneamente o rico fluido vivificante, cuja função é construir os tecidos do
músculo e nervo. E o Próspero[26] que veste o capote? Oxigênio é o seu nome. E
a maravilha que ele efetua dentro de nós cerca de quinze vezes durante um
minuto possi-velmente é sem paralelo na toda a organização das maravilhas que
nós “somamos” com familiaridade fácil, registrando “vida” e carregando um
criptograma.

O oxigênio tem as suas limitações
Sabemos tudo sobre isso. O que talvez esqueçamos é que mesmo o
oxigênio tem a sua limitação: nada pode agir senão onde está, e – seria perda de
tempo tentar – é verdade para esse gás vital como para outros assuntos. Fogo,
lâmpada e seres que respiram são todos consumidores do oxigênio que os
sustenta. Qual a consequência? Ora, esse elemento, que está presente na razão de
vinte e três partes para cem no ar puro, é sujeito ao enorme consumo dentro de
quatro paredes de uma casa, onde o ar é mais ou menos estacionário. Não estou
falando apenas agora da viciação do ar, mas somente do consumo do seu
elemento que sustenta a vida. Pense ainda no consumo pesado do oxigênio que
tem de suportar a multidão de fogos e muitos seres que respiram congregados
numa grande cidade! “Qual a consequência?” é uma pergunta estritamente vital.
O ho-mem pode apreciar a plena medida da existência alegre e vigorosa possível
a ele somente quando o seu sangue está completamente arejado. E isso acontece
quando o ar que ele inala contém o seu pleno complemento de oxigênio. É
demais dizer que aquela vitalidade é reduzida, outras coisas sendo iguais, à
medida que as pessoas são habitantes de casa em vez de habitantes ao ar aberto?
O ar empobrecido sustenta a vida num nível baixo e fraco, donde, nas grandes
cidades, a estatura decai, o peito se contrai, os homens dificilmente vivem para
ver os filhos dos seus filhos. Verdade, nós temos necessidade de ter casas como
abrigo do tempo de dia e para o descanso à noite. Mas, à medida que cessarmos
de tornar as nossas casas “confortáveis”, conforme as considerarmos meramente
como abrigos necessários quando não pudermos estar do lado de fora, aprecia-
remos ao máximo a vitalidade vigorosa possível a nós.

Ar não modificado
Os pais das crianças da cidade com face pálida pensam nessas coisas!
As crianças mais corajosas que se alimentam das sobras das ruas ficam em
melhor situação (e com aparência mais saudável) a esse respeito do que os seus
queridos, porque elas têm mais da primeira coisa essencial da vida: o ar. Há
alguma circulação de ar mesmo nas favelas da cidade. E a criança que passa os
seus dias nas ruas é mais bem suprida com oxigênio do que aquela que passa a
maior parte das suas horas no ar não modificado de um apartamento espaçoso.
Mas não é o ar das ruas que as crianças querem. É o delicioso ar do campo que
dá vida. O gasto das crianças ao viver excede enormemente o gasto do adulto. A
atividade sem fim da criança, enquanto desenvolve músculos, é mantida às
custas de grande desperdício de tecido. É o sangue que carrega material para o
reparo dessa perda. A criança tem de crescer, cada parte sua, e é o sangue que
leva material para a construção de novos tecidos. Ainda, sabemos que o cérebro,
fora de toda a proporção ao seu tamanho, é o grande consumidor do suprimento
de sangue; mas o cérebro da criança, com a sua atividade ávida, com o seu
crescimento duplicado, é insaciável nas suas demandas!

“Eu alimento a Alice com chá de carne”
“Eu alimento a Alice com chá de carne, óleo de fígado de bacalhau e
todos os tipos de coisas nutritivas, mas é muito desalentador: a criança não
ganha carne!” É provável que, por vinte e duas das vinte e quatro horas, Alice
respire o ar empobrecido e mais ou menos viciado, fechado dentro das quatro
paredes de uma casa. A criança está praticamente faminta, pois a comida que ela
come é muito imperfeita e inadequada-mente convertida no sangue arejado que
alimenta os tecidos do corpo.
E se ela está sofrendo de inanição corporal, que tal a mente ávida, ativa,
curiosa, faminta da menininha? “Oh, ela tem as suas aulas regular-mente todo
dia.” Provavelmente, mas aulas que lidam com palavras, so-mente com os signos
das coisas, não são o que as crianças querem. Não há conhecimento tão
apropriado para os primeiros anos de uma criança como aquele do nome, da
aparência e do comportamento in situ[27] de todo objeto natural que ela pode
conseguir. “Ele fez assim as Suas obras maravilhosas de modo que eles
devessem ser tidos em lembrança[28].”






Lucy de Wordsworth

“Three years she grew in sun and shower,
Then Nature said, ‘A lovelier flower
On earth was never sown;
This child I to myself will take;
She shall be mine, and I will make
A lady of my own.

* * * * *

“’She shall be sportive as the fawn,
That wild with glee across the lawn
Or up the mountain springs;
And hers shall be the breathing balm,
And hers the silence and the calm
Of mute, insensate things.

* * * * *

“’The stars of midnight shall be dear
To her; and she shall lean her ear
In many a secret place
Where rivulets dance their wayward round,
And beauty born of murmuring sound
Shall pass into her face.’”











“Três anos ela cresceu no sol e no banho,
Então a Natureza disse: ‘Uma flor mais amável
Sobre a terra nunca foi semeada.
Essa criança, eu a tomarei para mim mesmo.
Ela será minha, e eu farei
Uma dama minha.

* * * * *

“’Ela será esportiva como o corço,
Aquele silvestre com alegria pelo gramado
Ou nas nascentes em cima da montanha.
E dela será o bálsamo que respira,
E dela, o silêncio e a calma
Das coisas mudas, insensatas.

* * * * *

“’As estrelas da meia-noite serão queridas
Por ela; e ela conduzirá o seu ouvido
Em muitos lugares secretos
Onde regatos dançam o seu círculo incerto,
E a beleza nascida do som murmurante
Passará no seu rosto.’”

Arejamentos internos
Teremos ocasião de falar mais completamente sobre arejamentos fora de
casa, mas os arejamentos dentro de casa são verdadeiramente muito importantes,
pois, se os tecidos forem nutridos com sangue impuro por todas as horas que a
criança gasta na casa, o prejuízo não será conser-tado nos intervalos mais curtos
gastos fora de casa. Ponha dois ou três corpos que respiram, assim como fogo e
gás, numa sala, e é incrível o quão rápido o ar fica viciado – salvo se for
constantemente renovado, isto é, salvo se a sala for bem ventilada. Nós sabemos
o que virá do ar fresco e reclamamos que uma sala parece estar com bugigangas,
mas sente-se numa sala por uns minutos e você se acostuma às suas inutilidades.
Os sentidos não são mais um guia seguro.
Ventilação
Portanto, uma provisão regular tem de ser feita para a ventilação das
salas a despeito dos sentimentos dos seus companheiros. Pelo menos uma
distância pequena de janela aberta no teto, dia e noite, torna uma sala
toleravelmente segura, porque ela permite o escapamento do ar vicia-do, o qual,
sendo leve, ascende, deixando a sala pelo influxo do ar mais frio, mais fresco,
por rachaduras e fissuras nas portas e chãos. Uma cha-miné aberta é um
ventilador útil, embora não suficiente. É desnecessário dizer que a interrupção
das chaminés nos dormitórios é suicídio. É parti-cularmente importante
acostumar as crianças a dormirem com uma pole-gada[29] ou duas, ou mais, de
janela aberta por todo o ano – quanto mais você gostar no verão.

Ar noturno salutar
Há uma noção popular de que o ar noturno é insalubre. Mas se se
considerar que o ar salutar é aquele que contém o seu complemento pleno de
oxigênio, e não mais do que o seu complemento muito pequeno de gás
carbônico, e que todos os objetos queimantes – fogo, caldeira, lâmpada de gás –
emitem gás carbônico e consomem oxigênio, ver-se-á que o ar notur-no, em
circunstâncias comuns, é mais salutar do que o diurno, simples-mente porque há
um consumo menos esgotante do seu gás vital. Quando as crianças estão fora de
um cômodo que geralmente ocupam, quarto de criança diurno ou sala de café da
manhã, eis a oportunidade de arejá-lo completamente, abrindo bem as janelas e
as portas e produzindo uma corrente de ar completa.

Luz solar
Mas não é somente ar, e ar puro, que as crianças têm de ter, se o seu
sangue deve ser da “mais fina qualidade”, conforme os anúncios. O sangue bem
saudável é excessivamente rico em pormenores, corpos verme-lhos como discos,
conhecidos como glóbulos vermelhos, que em circunstân-cias favoráveis são
produzidos livremente no próprio sangue. Ora, observa-se que pessoas que
vivem muito na luz solar são de um semblante corado, isto é, muitíssimos desses
glóbulos vermelhos estão presentes no seu sangue, enquanto as pobres almas que
vivem em celas e vielas sem sol têm as suas peles da cor do papel castanho
esbranquiçado. Portanto, conclui-se que a luz e a luz solar são favoráveis à
produção dos glóbulos vermelhos no sangue. Portanto – e esse próximo
“portanto” é apenas um passo para a mãe – os cômodos devem estar no lado
ensolarado da casa, com um aspecto meridional se possível. De fato, a casa toda
deve ser mantida leve e bri-lhante para o seu bem. Árvores e anexos que
obstruem a luz solar e tornam os quartos das crianças escuros devem ser
removidos sem hesi-tação.

Transpiração livre
Trata-se de outro ponto a ser notado a fim de assegurar que o cérebro
seja nutrido por sangue saudável. O sangue recebe e se livra dos restos dos
tecidos. E um dos agentes mais importantes por meio do qual ele faz esse
trabalho necessário de limpador é a pele. Milhões de poros invisíveis perfuram a
pele, cada um com uma boca de um tubo minucioso muito dobrado. E cada poro
é empregado sem um momento de interrupção, enquanto o corpo está com
saúde, descarregando a transpiração – isto é, as sobras dos tecidos – sobre a
pele.

Transpiração insensível
Quando a descarga é excessiva, ficamos cientes da umidade sobre a
pele. Mas, cientes disso ou não, a descarga está sempre prosseguindo. E mais: se
ela for reprimida ou se uma porção considerável da pele for coberta, de modo
que se torne impermeável, a morte será a consequência. É por isso que pessoas
morrem em consequência de escaldadura ou queimas que danificam uma grande
superfície da pele, ainda que não toquem nenhum órgão vital. São fechadas
multidões de tubos minuciosos que devem carregar materiais nocivos do sangue.
E, ainda que a superfície remanescente da pele e outros órgãos excretores tomem
trabalho extra sobre eles, é impossível tornar boa a perda do que pode ser
chamado de consumo eficiente sobre uma área considerável. Portanto, se o
cérebro deve ser devidamente nutrido, é importante manter a superfície inteira da
pele numa condição de lançar fora livremente as excreções do sangue.




Banho diário e trajes porosos
Seguem duas considerações: primeira, a necessidade do banho diário,
seguida de fricção vigorosa da pele. É desnecessário dizer uma palavra aqui.
Mas possivelmente não é tão bem entendido que as crianças devam ser vestidas
completamente com trajes porosos que aceitem a passagem instantânea das
exalações da pele. Por que mulheres delicadas desmaiam ou de algum modo “se
sentem tontas” quando era costume ir à igreja com casacos de pele de foca? Por
que as pessoas que dormem de bruços, ou mesmo embaixo de colchas de seda ou
de algodão, não se levantam refrescadas? Por uma causa: as suas cobertas
impediram a passagem da transpiração insensível, e assim atrapalharam a pele na
sua função de aliviar o sangue de impurezas. É surpreendente que muitas
pessoas experimentem uma perda constante de vitalidade a partir de nenhuma
outra causa senão o caráter inadequado das suas roupas. As crianças não podem
ser melhor vestidas inteiramente do que em trajes de lã livremente tecidos,
flanelas e sarjas, de espessuras variadas para o uso no verão e no inverno. As
roupas de lã têm outra vantagem sobre os materiais de algodão e linho além de
serem porosas: a lã é um mau condutor, logo não permite muito escapamento
livre do calor animal. E é absorvente, portanto alivia a pele das sensações
meladas que seguem a transpiração insensível. Deveríamos ser melhores nisso se
pudéssemos trocar de ideias para dormir na lã, descartando linho ou algodão em
favor de lençóis feitos de algum material de lã levemente tecido.
Poderíamos dizer mais sobre essa única questão, a nutrição devida do
cérebro, da qual depende a própria possibilidade de educação saudável. Mas algo
terá sido efetuado se for tão clara a razão por que somente duas ou três regras
práticas de saúde não podem ser evitadas sem um senso de quebra da lei.
Receio que o leitor possa estar inclinado a pensar que eu estou
solicitando a sua atenção, pela maior parte do tempo, para alguns assuntos
fisiológicos – o estágio mais baixo da escada da educação. Pode ser o estágio
mais baixo, entretanto ele é o estágio mais baixo, o passo necessário para todo o
resto. Porque não é demais dizer que, no nosso pre-sente estado, a vida e o
progresso intelectuais, morais e mesmo espirituais, dependem grandemente de
condições físicas. Isto é, não que aquele que tenha um físico bom seja
necessariamente um homem bom ou esperto, mas que o homem bom e esperto
requer muita substância animal para compensar o gasto de tecido acarretado no
exercício da sua virtude e do seu intelecto. Por exemplo, é mais fácil ser amável,
gentil, cândido, com ou sem uma dor de cabeça ou um ataque de neuralgia?


7. “O REINO DA LEI” NA EDUCAÇÃO

Senso comum e boas intenções
Além disso, embora essa cultura física do cérebro possa ser somente a
base da educação, o método dela indica o que deve ser o método de toda
educação, ou seja, progresso ordenado, regulado, sob a guia da Lei. A razão pela
qual a educação faz tão menos do que deveria é apenas esta: que, em nove de
dez casos, os bons pais sensíveis confiam demais no seu senso comum e nas suas
boas intenções, esquecendo que esse tem de estar com o esforço de se instruírem
na natureza do caso. E aqueles esforços bem-intencionados rendem pouco, se
eles não continuam em obediência às leis divinas para serem estudados em
muitos casos, não na Bíblia, mas nos fatos da vida.

Vidas obedientes à lei frequentemente mais inocentes do que vidas
piedosas
É uma vergonha para pessoas crentes que muitos, cuja maior profissão é
aquela que eles não conhecem, portanto não acreditam, produz-zam mais vidas
inocentes, mais livres das falhas de temperamento, do vício do egoísmo, do que
muitas pessoas sinceramente religiosas. É um fato que defrontará com as
crianças aos poucos, e um dos quais elas exigirão uma explicação. E mais: é um
fato que terá mais peso – quando ele defrontar com elas na pessoa de uma
personagem que elas não podem senão estimar e amar – do que todo o
ensinamento doutrinário que elas tiveram nas suas vidas. Isso me parece o perigo
ameaçador àquela depen-dência confessada e lealdade a Deus Todo-Poderoso
que nós reconhecemos como a religião: não a maldade, mas a bondade de uma
escola que se recusa a admitir qualquer dependência e lealdade assim.
A minha percepção desse perigo é a minha razão de oferecer o pouco
que tenho a dizer sobre o assunto da educação – a minha percepção do perigo e a
garantia que sinto de que afinal não é um grande perigo, mas um de que os pais
da classe culta sejam competentes para lidar, e são precisamente as únicas
pessoas que podem lidar com isso.

“Mente” e “matéria” igualmente governadas pela lei
Quanto a essa moralidade superior de alguns não crentes, supondo que
nós concedamos, o que isso importa? Apenas isto: que o universo da mente,
como o universo da matéria, é governado por leis de Deus não escritas; que a
criança não pode soprar bolhas de sabão ou pensar nos seus pensamentos
esvoaçantes senão em obediência às leis divinas; que toda segurança, progresso e
sucesso na vida vêm da obediência à lei, às das ciências mental, moral ou física,
ou daquela ciência espiritual que a Bíblia revela; que é possível verificar leis e
mantê-las sem reconhecer o Legis-lador; e que aqueles que verificam mesmo e
guardam qualquer lei divina herdam a bênção devida à obediência, qualquer que
seja a sua atitude em relação ao Legislador – assim como é aquecido o homem
que sai à luz brilhante do sol, ainda que ele possa fechar os seus olhos e se
recusar a vê-lo. Por outro lado, aqueles que não se esforçam para estudar os
princípios que governam a ação humana e o pensamento humano perdem as
bênçãos da obediência a certas leis, embora possam herdar as melhores bênçãos
que vêm do relacionamento reconhecido com o Legislador.

O antagonismo à lei mostrado por algumas pessoas religiosas
Essas últimas bênçãos são tão indizivelmente satisfatórias, que com
frequência o crente que gosta delas não quer mais. Ele abre a sua boca e atrai na
sua respiração a alegria que ele tem na lei, é verdade. Mas é a lei da vida
espiritual somente. Com relação às outras leis de Deus que governam o universo,
às vezes ele tem uma atitude de antagonismo, quase de resistência, digna de um
infiel.
Que ele seja temerosa e maravilhosamente feito não é nada para ele. Ele
não se importa com saber como o cérebro funciona, nem quanto mais a essência
sutil que chamamos de mente evolui e se desenvolve em obediência às leis. Há
mentes piedosas às quais cheira descrença um desejo de olhar dentro dessas
coisas, como se fosse desonrar o Todo-Poderoso perceber que Ele carrega as
Suas obras gloriosas mediante leis gloriosas. Eles não terão que ver com leis
exceto as leis do reino da graça. No meio tempo, o não crente, que não procura
auxílios sobrenaturais, dispõe-se a descobrir e se conformar com todas as leis
que regulam a vida natural – físicas, mentais, morais –, todas as leis de Deus, de
fato, exceto aquelas da vida espiritual de que o crente se apropria como a sua
herança peculiar. Mas essas leis deixadas a Esaú também são leis de Deus, e a
observância delas é atendida com essas bênçãos, de maneira que os filhos dos
crentes dizem: “Veja, como é que esses que não reconhecem a Lei como sendo
de Deus são melhores do que nós que reconhecemos?”

Os pais têm de se inteirar dos princípios da fisiologia e da ciência
moral
Agora, os pais crentes não têm direito de colocar essa dificuldade
crucial aos seus filhos. Eles não têm direito, por exemplo, de orar para que os
seus filhos possam ser verdadeiros, diligentes, justos, e ao mesmo tempo de
negligenciar se familiarizarem com aqueles princípios da ciência moral, cuja
observância irá guiar na verdade, na diligência e na justiça de caráter. Pois isso
também é a lei de Deus. Observe, não no conhecimento de Deus, a coisa pela
qual melhor vale viver: nenhuma ciência mental e nenhuma ciência moral estão
comprometidas com revelar isso. O que eu afirmo é que essas ciências têm a sua
parte a desempenhar na educação da raça humana e que os pais não podem
desconsiderá-las com impu-nidade. O meu empreendimento neste e nos
seguintes volumes da coleção será esboçar grosso modo um método de educação
que, por estar numa base de lei natural, pode parecer, sem presunção, herdar a
bênção divina. Qualquer esboço que eu possa oferecer neste curto espaço tem de
ser muito imperfeito e muito incompleto, mas uma dica aqui e ali pode ser o
bastante para pôr pais inteligentes sobre diretrizes proveitosas para pensar com
relação à educação dos seus filhos.











PARTE II


VIDA FORA DE CASA PARA AS CRIANÇAS


1. TEMPO DE CRESCIMENTO

Refeições fora de casa
As pessoas que vivem no campo sabem muito bem o valor do ar fresco,
e os seus filhos vivem fora de casa, com intervalos para dormir e comer. Quanto
ao último, mesmo as pessoas do campo não fazem uso pleno das suas
oportunidades. Em dias bons, quando está morno o bastante para sentar fora com
xales, por que não servir fora de casa chá e café da manhã, tudo menos uma janta
quente? Porque somos uma geração extenuada, ficando com os nervos à flor da
pele. E cada hora despendida ao ar livre é um ganho claro, tendendo ao aumento
da capacidade do cérebro, do vigor corporal e ao alongamento da própria vida.
Aqueles que sabem o que é ter pele exaltada e cérebro latejante deliciosamente
acalmados pelo toque fresco do ar são inclinados a fazer uma nova regra de vida:
“Nunca esteja dentro de casa quando você pode estar corretamente fora.”
Além do ganho de uma ou duas horas ao ar livre, isto deve ser
considerado: refeições tomadas al fresco[30] geralmente são alegres, e não há
nada como alegria para converter carne e bebida em sangue e tecido saudáveis.
O tempo todo, também, as crianças estão armazenando memó-rias de uma
infância feliz. Cinquenta anos a partir daí elas verão as sombras dos galhos
fazendo padrões sobre a toalha de mesa branca. E a luz solar, o riso das crianças,
o zumbido das abelhas e o perfume das flores estão sendo guardados para após o
descanso.


Para os habitantes nas cidades e nos subúrbios
Mas são somente as pessoas que vivem, por assim dizer, nos seus
próprios jardins que podem fazer uma prática de dar chá aos seus filhos fora de
casa. Para o restante e a maioria de nós, que vive nas cidades ou nos subúrbios
das cidades, isto está incluído na questão maior: Quanto tempo diário ao ar livre
as crianças devem ter? E como é possível lhes assegurar isso? Neste tempo de
extraordinária pressão socioeducativa, talvez o primeiro dever de uma mãe com
os seus filhos seja lhes assegurar um tempo de crescimento tranquilo, uma vida
receptiva e passiva de seis anos completos, a parte desperta da vida, gasta, na
maior parte do tempo, fora no ar fresco. E isso não para o ganho da saúde do
corpo sozinho. Corpo e alma, coração e mente são nutridos com comida
conveniente a eles, quando os filhos são deixados sozinhos, deixados a viver sem
fricção e sem estímulo entre influências felizes que os inclinam a serem bons.

Possibilidades de um dia ao ar livre
Diz uma mãe judiciosa: “Faço questão de mandar meus filhos para fora,
se o tempo permite, por uma hora no inverno e duas horas por dia nos meses de
verão.” Isso é bom, mas não o bastante. Em primeiro lugar, não os envie. Se for
de algum modo possível, leve-os, pois, embora as crianças devam ser deixadas
muito consigo mesmas, há uma grande tarefa a ser feita e outra grande a ser
prevenida durante essas longas horas ao ar livre. E devem ser longas horas: não
duas, mas quatro, cinco ou seis horas eles devem ter em todo dia toleravelmente
bom, de abril até outubro. “Impossível!”, diz uma mãe exausta que vê o seu
caminho para os seus filhos não mais que uma hora diária ou aproximadamente
isso sobre as calçadas dos quarteirões da vizinhança de Londres. Deixe-me
repetir: eu me arrisco a sugerir não o que seja praticável em qualquer casa, mas o
que me parece absolutamente melhor para as crianças. E isso na fé de que as
mães realizem maravilhas, uma vez que estejam convencidas de que as
maravilhas são exigidas delas. Uma jornada de vinte minutos de trem ou de
ônibus e uma cesta de almoço tornarão um dia no campo possível à maioria dos
habitantes da cidade. E se um dia, por que não muitos? Mesmo todo dia
conveniente?
Supondo que as tenhamos apanhado, o que deve ser feito com essas
horas douradas para que todas fiquem agradáveis? Elas devem ser gastas com
algum método ou a mãe ficará sobrecarregada e as crianças, aborrecidas. Há uma
grande tarefa a ser realizada nessa grande fração do dia das crianças. Elas têm de
ser mantidas num ânimo alegre o tempo todo ou elas perderão um fortalecimento
e refresco mantidos para elas pelo ar abençoado. Elas têm de ser deixadas
sozinhas, deixadas consigo mesmas um bom tanto, para assimilarem o que
puderem da beleza da terra e dos céus. Porque, dos males da educação moderna,
poucos são piores do que este: o cacarejo perpétuo dos mais velhos deixa a pobre
criança sem um momento, sem um pequeno espaço, onde se maravilhar e
crescer. Ao mesmo tempo, aqui está a oportunidade da mãe para treinar o olho
que vê, o ouvido que ouve, e soltar sementes de verdade na aberta alma infantil
que germinará, florescerá e dará frutos, sem ajuda adicional ou conheci-mento
dela. Então, há muito a ser feito subindo na árvore ou se aninhando nas urzes,
mas o desenvolvimento muscular vem de modos mais ativos. E uma hora ou
duas devem ser gastas com jogo vigoroso. E por fim, e verdadeiramente menos,
uma aula ou duas têm de ser dadas.

Sem livros de história
Vamos supor que a mãe e os filhos chegaram a um ar livre ventoso, “onde
sempre parece tarde”. Em primeiro lugar, entreter as pessoinhas não é a sua
função. Não deve haver livros de história, contos, pouca conversa conforme o
possível, e isso para algum propósito. Quem pensa em divertir crianças com
conto ou conversa num circo ou numa pantomima? E aqui não há exposição
infinitamente maior para o seu deleite? A nossa sábia mãe chegou: primeiro
manda as crianças dispararem o seu espírito numa galopada silvestre, com grito,
alô e algazarra, e qualquer extra-vagância que venha às suas cabeças juvenis.
Não há distinção entre grande e pequeno. O último adora seguir na esteira dos
seus mais velhos e, nas aulas ou jogos, pegar e fazer de acordo com a sua
pequena capa-cidade. Quanto ao bebê, ele está na bem-aventurança: despido dos
seus trajes, ele chuta e rasteja, agarra a grama, ri um suave riso de bebê e
assimila o seu pequeno conhecimento de formatos e propriedades à sua própria
moda maravilhosa: vestido numa roupa de lã, longa e solta, que não está em pior
estado para o pior uso que possa fazer.



2. “PASSEIO TURÍSTICO”

Aos poucos os outros voltam à sua mãe, e, enquanto os talentos estão
frescos e os olhos entusiásticos, ela os envia a uma expedição de exploração:
quem pode ver mais, e contar mais, sobre um outeiro acolá ou um ribeiro, uma
barreira ou um bosquezinho. Esse é um exercício que alegra as crianças e pode
ser interminavelmente variado, continuado com o espírito de um jogo, no
entanto com a exatidão e o cuidado de uma aula.

Como ver
Descubra tudo o que você puder sobre aquela cabana ao pé da colina,
mas não bisbilhote demais. Logo eles estarão de volta e haverá uma miríade de
rostos empolgados, uma confusão de línguas e observações aleatórias lançadas
esbaforidamente ao ouvido da mãe.
– Há colmeias.
– Vimos muitas abelhas indo para uma só.
– Há um jardim comprido.
– Sim, e há girassóis nele.
– E galinha e galo, margaridas e amores-perfeitos.
– E há uma grande quantidade de uma flor azul bonita com folhas
ásperas, mãe. O que a senhora supõe que seja?
– Borragem para as abelhas, muito provavelmente. Elas são
apaixonadas por isso.
– Oh, e há maçã e pera e ameixas de um lado. Há um pequeno caminho
até o meio, sabe.
– Em qual lado da mão estão as árvores frutíferas?
– À direita. Não, à esquerda. Deixe-me ver: qual é a minha mão para o
dedal? Sim, é o lado da mão direita.
– E há batatas e repolhos, e hortelã, e coisas no outro lado.
– Onde estão as flores, então?
– Oh, elas estão nas beiradas, descendo cada lado do caminho.
– Mas não contamos à mãe sobre a maravilhosa macieira. Acho que há
milhões de maçãs nela, todas maduras e rosadas!
– Um milhão, Fanny?
– Bem, muitas, mãe. Eu não sei quantas.
E assim por diante, indefinidamente: a mãe, gradualmente, tendo uma
descrição completa da cabana e do seu jardim.
Usos educacionais de “passeio turístico”
Tudo isso é brincadeira para as crianças, mas a mãe está fazendo um
trabalho inestimável. Ela está formando as suas capacidades de observação e
expressão, aumentando o seu vocabulário e a sua gama de ideias, dando-lhes o
nome e os usos de um objeto no momento certo, quando elas perguntam “O que
é isso?” e “Para que serve?”. Está formando os seus filhos em hábitos
verdadeiros, fazendo-os cuidadosos para ver o fato e declará-lo exatamente, sem
omissão ou exagero. A criança que des-creve “Uma árvore grande, subindo a um
ponto, com um tanto de folhas redondas. Não é uma árvore agradável para
sombra, porque todos os ramos sobem.” merece aprender o nome da árvore e
qualquer coisa que a sua mãe tenha para lhe contar sobre ela. Mas a pequena
desastrada, que falha em deixar claro se ela está descrevendo um olmo ou uma
faia, não deve ser estimulada. A sua mãe não deve mover um pé para ver a
árvore dela. Nenhuma persuasão deve levá-la a falar disso, até que, desesperada,
ela saia e volte com alguma anotação mais certa: casca áspera ou suave, folhas
ásperas ou suaves. Então a mãe considera, pronuncia e, cheia de euforia, leva-a
para ver por si mesma.

Observação discriminante
Gradualmente, as crianças aprenderão discriminantemente todas as
características das paisagens com as quais elas estão familiarizadas. E pense que
fruição deliciosa para alguém de idade mais velha ou mediana é uma série de
imagens retratadas, característica por característica, no brilho ensolarado da
mente de uma criança! O triste sobre as lembranças de infância da maioria das
pessoas é que elas ficam embaçadas, distor-cidas, incompletas, não mais
prazerosas de se olhar do que uma xícara fraturada ou uma roupa rasgada. E a
razão é: não que as velhas cenas sejam esquecidas, mas que elas nunca foram
plenamente vistas. Na época, não havia mais do que uma impressão nebulosa de
que tais e tais objetos estivessem presentes, e naturalmente, após um lapso de
anos, raramente podem ser lembradas aquelas características das quais a criança
não estava cognizant[31] quando os viu diante de si.


3. “PINTURA DE IMAGEM”

Método
É tão prazerosa essa faculdade de tirar fotografias mentais, imagens
exatas, das “belezas da Natureza” pelas quais andamos pelo mundo pela
suavidade de ver, que vale a pena exercitar as crianças de uma outra maneira
para esse fim, mantendo em mente, no entanto, que elas vejam o próximo e o
pormenor – mas isso somente pode ser feito com um esforço de olhar para o
maior e para o distante. Faça as crianças olharem bem para algum trecho da
paisagem, então feche-lhes os olhos e chame a imagem diante delas. Se qualquer
porção dela estiver embaçada, é melhor que elas vejam de novo. Quando tiverem
uma imagem perfeita diante dos olhos delas, faça-as dizer o que elas veem.
Assim: “Eu vejo uma lagoa. Ela é rasa neste lado, mas profunda no outro. As
árvores vêm à beira da água naquele lado, e você pode ver as suas folhas verdes
e os ramos tão claramente na água que você pensaria haver uma floresta
embaixo. Quase tocando as árvores na água está um pedaço do céu azul com
uma suave nuvem branca. E, quando você olha para cima, você vê aquela mesma
nuvem pequena, mas com uma grande porção de céu em vez de um pedaço,
porque não há árvores lá em cima. Há lírios amarelos amáveis em torno da
distante beirada da lagoa. E duas ou três das grandes folhas redondas estão
viradas como velas para embarcações. Perto de onde estou de pé, três vacas vêm
beber e uma foi para longe na água, quase ao seu pescoço.” Etc.

Esforço sobre a atenção
Esse também é um exercício com o qual as crianças se alegram, como
envolve, porém, um esforço sobre a atenção, é cansativo e somente deve ser
empregado de vez em quando. No entanto, vale muito a pena dar às crianças o
hábito de pegar um pouco da paisagem de cor dessa forma, porque é o esforço de
lembrar e reproduzir que é cansativo, enquanto o ato todo prazeroso de ver,
completamente e em detalhes, provavelmente será repetido inconscientemente
pela criança, de quem às vezes é exigido reproduzir o que ela vê, até que ele se
torne um hábito.



Vendo completamente e em detalhes
Inicialmente, as crianças irão querer uma ajudinha na arte de ver. A mãe
dirá “Veja o reflexo das árvores! Pode haver uma floresta embaixo da água. O
que aquelas folhas de pé lhe lembram?” e assim por diante, até que as crianças
tenham notado os pontos salientes da cena. Até a mãe mesma aprenderá duas ou
três cenas e as descreverá com os olhos fechados para a diversão das crianças. E
essas são pequenas mímicas, e ao mesmo tempo tão simpáticas, que qualquer
toque gracioso e imaginativo que ela lançar às suas descrições será reproduzido
com variações nas descrições das crianças.
As crianças sentirão prazer nesse jogo de pintar imagem muito mais se a
mãe introduzi-lo descrevendo alguma grande galeria de imagens que ela viu –
imagens de montanhas, urzais, mares tempestuosos, campos arados, criancinhas
jogando, uma velha mulher tricotando – e continuar a dizer que, embora ela não
pinte as suas imagens em telas e não as ponha em quadros, ela carrega consigo
apenas essa galeria de imagens. Porque, quando quer que veja algo amável ou
interessante, ela olha para isso até que ela tenha a imagem no seu “olho da
mente”. E então a leva embora consigo, a sua própria imagem para sempre, uma
imagem “à vista” quando ela quiser.

Uma forma de consolo e descanso
Seria difícil superestimar esse hábito de ver e armazenar como um meio
de consolo e suavização. Os mais ocupados de nós têm feriados quando nós
tiramos o corpo fora e ficamos cara a cara com a Natureza para sermos curados e
abençoados por:

“O bálsamo que respira,
E dela, o silêncio e a calma
Das coisas mudas, insensatas.”

“The breathing balm,
The silence and the calm
Of mute, insensate things.”

Esse refrescamento imediato está aberto a todos conforme a sua medida,
mas é um erro supor que todos sejam capazes de levar embora uma imagem
refrescante daquilo que lhes dá prazer. Somente poucos podem dizer com
Wordsworth sobre as cenas que visitaram:

“Essas formas belas,
Por uma longa ausência, não foram a mim
Como é uma paisagem ao olho de um homem cego.
Mas com frequência, em quartos solitários, e no meio do ruído
Das vilas e cidades, eu lhes devi,
Em horas de cansaço, sensações doces,
Sentidas no sangue, e sentidas pelo coração;
E passando ainda dentro da minha mais pura mente
Com renovação tranquila.”


“These beauteous forms,
Through a long absence, have not been to me
As is a landscape to a blind man’s eye:
But oft, in lonely rooms, and ‘mid the din
Of towns and cities, I have owed to them,
In hours of weariness, sensations sweet,
Felt in the blood, and felt along the heart;
And passing even into my purer mind
With tranquil restoration: […][32]”

Contudo, isso não é grande dom poético que o restante de nós tenha que
estar contente para admirar, senão uma recompensa comum por fazer esforço no
ato de ver, sendo que os pais podem fazer uma grande coisa para conceder aos
seus filhos.
A mãe tem de ter cuidado com o modo como ela estraga a simplicidade,
o caráter objetivo do prazer da criança, tratando as suas pequenas descrições
como proezas de esperteza a serem repetidas ao seu pai ou aos visitantes. Seria
melhor ela fazer um voto para se suprimir, “não dizer nada a ninguém”, na sua
presença de qualquer forma, ainda que a criança deva mostrar-se um poeta nato.

4. FLORES E ÁRVORES

As crianças devem conhecer as colheitas do campo
Durante esse “passeio turístico” e “pintura de imagem”, ocorrerão
oportunidades para familiarizar as crianças com objetos e trabalhos rurais. Se há
fazendas ao alcance, elas devem conhecer o prado e o pasto, o trevo, o nabo e o
milharal, sob todos os aspectos, desde a lavoura até fazer as colheitas.

Flores do campo e a história de vida de plantas comuns
Polígala, eufrásia, Ononis repens, erva coalheira, salgueiro, toda flor
silvestre que cresce na sua vizinhança, elas devem conhecer muito bem. Devem
ser capazes de descrever a folha (o seu formato, tamanho, se cresce da raiz ou do
tronco da árvore, a maneira de florescer), um conjunto de flores, uma flor
simples, um cravo etc. E, uma vez que tiverem o entendimento de uma flor
silvestre de maneira que nunca possam esque-cê-la ou confundi-la, devem
examinar o local onde a encontram, de sorte que elas conhecerão para o futuro
em que tipo de chão procurar tal e tal flor. “Encontraremos tomilho silvestre
aqui!”, “Oh, este é o local para malmequer-dos-brejos. Temos que vir aqui na
primavera.” Se a mãe não for uma grande botânica, ela achará Wild Flowers[33]
da senhorita Anne Pratt[34] muito útil, com as suas placas coloridas, semelhantes
o bastante para identificar as flores pelos nomes ingleses comuns, fatos e
imaginações agradáveis com as quais as crianças se alegram. A fim de fazer
coleções de flores silvestres para os diversos meses, pressione-as e suba-as quase
sobre os quadrados do cartucho com o nome inglês, habitat e data de descoberta
de cada. Isso proporciona muita ocupação satisfatória e, conco-mitantemente,
muita formação útil. Melhor ainda é acostumar as crianças a desenhar
cuidadosamente, com pincel, flores que lhes interessam – a planta inteira quando
possível.



O estudo das árvores
As crianças logo devem se tornar íntimas das árvores também. Devem
pegar meia dúzia de árvores, carvalho, olmo, freixo, faia, na sua nudez de
inverno, e levá-las para serem os seus amigos por um ano. No inverno, elas
observarão as leves tranças da bétula, os braços em nó do carvalho, o
crescimento robusto do sicômoro. Elas podem esperar para aprender os nomes
das árvores até que as folhas venham. Pouco a pouco, conforme a primavera
avança, veja um endurecimento geral e a aparência da vida nos ramos nus
parados. A vida se agita no mistério do brotamento das folhas, um ninho de
delicadas folhas recém-nascidas repousando no calor aveludado dentro de
muitos invólucros à prova d’água. O carvalho e o olmo, a faia e a bétula, cada
um tem a sua própria maneira de dobrar e empacotar os seus folhetos. Observe a
“limeira germinada com cor de rubi” e o freixo com o seu belo pé de veado de
um botão, não verde, mas preto.

“Mais preto do que botões de freixo na frente de março.”

“More black than ashbuds in the front of March[35].”

As estações devem ser seguidas
Mas é difícil manter o ritmo com as maravilhas que se revelam na
“generosa e suave estação”. Existem as candeias penduras e as pequenas flores
do pistilo rubi-vermelho da aveleira – blocos de flores, ambos, dois tipos numa
árvore simples; as suaves candeias com estame e sem pistilo do salgueiro; a
quebra festiva de todas as árvores em folhagem adorável; o aprendizado de
padrões das folhas conforme elas saem; e a nomeação das árvores a partir desse
e de outros sinais. Então as flores vêm, cada uma fechada apertadamente no
caixão delicado que chamamos de botão, tão habilmente envolvidos quanto as
folhas nos seus botões, mas menos cuida-dosamente guardadas, pois essas
“doces lactâncias” atrasam a sua vinda em grande parte até que a terra tenha um
leito morno para oferecer, e o sol, uma recepção gentil.




Leigh Hunt sobre as flores
Diz Leigh Hunt[36]: “Suponha que as próprias flores fossem novas!
Suponha que elas acabaram de chegar ao mundo, uma doce recompensa para
alguma bondade nova... Imagine o que sentiríamos quando víssemos o primeiro
tronco lateral se deslocando do tronco principal e estendendo uma folha. Como
deveríamos assistir à folha revelando gradualmente a sua pequena mão graciosa.
Então uma outra, então uma outra. Então uma delas dando indicações da
novidade surpreendente: um botão! Então, esse botão misterioso gradualmente
se revelando como uma folha, nos maravi-lhando, nos encantando, quase nos
alarmando com deleite, como se não soubéssemos que encantamento devia
acontecer; até que enfim, em toda a sua beleza mágica, e voluptuosidade
odorosa, e elaboração misteriosa de escultura carinhosa e vivente, brilha para a
frente a flor corante.” As flores, é verdade, não são novas, mas o são as crianças.
E é culpa dos seus mais velhos se toda nova flor a que as crianças vão não lhes
seja uma Picciola[37], um mistério da beleza a ser assistido dia a dia com
admiração e deleite indizíveis.
Enquanto isso, perdemos a vista daquela meia dúzia de árvores da
floresta que as crianças assumiram como um tipo de camaradagem pelo ano. Em
seguida, elas têm o prazer de descobrir que as grandes árvores também têm
flores, amiúde da mesma tonalidade que as suas folhas, e que algumas árvores
protelam ter as suas folhas até que as suas flores tenham vindo e ido. Pouco a
pouco, há o fruto, e a descoberta de que toda árvore – com exceções que elas
ainda não precisam aprender – e toda planta dá fruto, “fruto e semente segundo a
sua espécie[38]”. Tudo isso é conhecimento velho para as pessoas de mais idade,
mas um dos segredos do educador é não apresentar nada como conhecimento
velho, mas pôr-se na posição da criança, maravilhar-se e admirar com ela, pois
cada milagre comum que a criança vê com os seus próprios olhos naquele
momento a torna um outro Newton[39].

Calendários
É um plano capital que as crianças possuam um calendário: a primeira
folha de carvalho, o primeiro girino, a primeira prímula, a primeira candeia, as
primeiras amoras maduras, onde todos foram vistos e quando. No próximo ano,
elas saberão quando e onde procurar os seus favoritos, e em todos os anos
estarão em condição de acrescentar novas observações. Pense no gosto e no
interesse, o objeto, que tal prática dará a caminhadas diárias e pequenas
excursões. Dificilmente há um dia quando não se pode esperar que algum amigo
pegue um primeiro “Em Casa”.

Diários da natureza
Assim que conseguir mantê-lo por si mesma, um diário da natu-reza é
uma fonte de prazer para uma criança. A caminhada de todo dia lhe dá algo no
qual entrar: três esquilos num alerce, uma gralha voando através de um campo,
uma lagarta subindo numa urtiga, uma lesma comendo uma folha de repolho,
uma aranha caindo de repente sobre o chão, onde ela encontrou uma hera
terrestre, como estava crescendo e quais plantas estavam crescendo consigo,
como uma trepadeira ou uma hera fazem para subir. Ocorrem inumeráveis
assuntos para a criança inteligente gravar. Enquanto ela é bem nova (cinco ou
seis anos), começa a ilustrar as suas anotações livremente com desenhos a
pincel. Inicialmente, ela deve ter uma pequena ajuda ao misturar as cores – no
caminho dos princípios, não das direções. Não se deve dizer-lhe para usar agora
isso e agora aquilo, mas “conseguimos o roxo misturando assim e assim”, e
então ela deve ser deixada sozinha para conseguir o matiz certo. Quanto ao
desenho, sem dúvida há o tempo e o lugar para a instrução, porém o seu diário
da natureza produzirá um dente-de-leão, uma papoula, uma marga-rida, uma íris
com as suas folhas, impelida pelo desejo de representar o que ela vê, com vigor
surpreendente e correção.
Um livro de exercício com capa dura serve como um diário da natureza,
mas é necessário cuidado ao escolher o papel que atenda tanto a escrita quanto o
desenho a pincel.
“Não consigo parar de pensar”
“Mas eu não posso parar de pensar. Eu não posso fazer minha mente
sossegar.” Pobre menininha! Todas as crianças lhe devem um agra-decimento
por dar voz às suas aflições estultas. E nós, pessoas adultas, temos tão pouca
imaginação que mandamos um menininho com um cére-bro excessivamente
ativo brincar por si mesmo no jardim a fim de fugir do cansaço das aulas. Pouco
sabemos sobre como as pessoas de cérebro enxa-meiam por dentro e por fora e
se apressam!

“O (cérebro) humano é como uma pedra de moinho, ficando sempre
redondo e redondo;
Se não tiver nada mais para moer, ele deve ser ele mesmo moído[40].”

Ponha a criança num trabalho definido de todo jeito. Mas veja: faça-a
trabalhar com coisas e não com signos: as coisas da Natureza nos seus próprios
lugares, prado e sebe, bosque e orla.


5. “CRIATURAS VIVAS”

Um campo de interesse e deleite
Então, quanto às “criaturas vivas”, aqui está um campo de interesse e
deleite ilimitados. Os animais domesticados logo são levados à companhia gentil
pelas pessoinhas. Talvez elas vivam longe demais do “campo real” para esquilos
e coelhos selvagens para lhes ser mais do que um sonho de possíveis deleites.
Mas certamente há uma lagoa ao alcance, pela estrada ou de trem, onde girinos
podem ser pegos e carregados para casa numa garrafa, alimentados e vistos por
todas as suas mudanças: barbatanas desaparecendo, rabos ficando mais e mais
curtos, até que enfim não haja mais nada de rabo, e uma rãzinha bem atrevida as
olhe no rosto. Mostre qualquer pedra casual e você pode chegar a uma colônia
de formigas. Sempre soubemos que nos convém considerar as suas maneiras e
sermos sábios, mas agora pense em tudo o que o Sr. Avebury[41] nos disse para
fazer aquela formiga de doze anos de seu conhecimento realmente uma
personagem. Então há as abelhas. Alguns de nós podem ter ouvido o recente
Dean Farrar[42] descrever aquela aula na qual ele estava presente, sobre “Como
age a pequena abelha ocupada”: o professor brilhante, mas as crianças não
responsivas; não tinham absolutamente interesse nas abelhi-nhas ocupadas. Ele
suspeitava da razão e, questionando a turma, desco-briu que nenhum deles
jamais viu uma abelha. “Nunca viu uma abelha! Pense por um momento, disse
ele, no quanto isso implica.” E então fomos movidos por uma imagem eloquente
da vida infantil triste na qual abelhas, pássaros e flores estão todos fechados.
Mas quantas crianças estão ali que não vivem nas favelas de Londres, no entanto
são incapazes de distinguir uma abelha de uma vespa, ou mesmo uma abelha
“simples” de uma abelha de mel!

As crianças devem ser estimuladas a assistir
As crianças devem ser estimuladas a assistir, paciente e quieta-mente,
até que elas aprendam algo dos hábitos e da história da abelha, formiga, vespa,
aranha, lagarta peluda, libélula e o que quer que seja de maior crescimento que
venha ao seu caminho. “As criaturas nunca têm quaisquer hábitos enquanto eu
estou olhando!”, reclama uma meni-ninha em algum livro de história, mas isso
foi culpa sua. Os vivos olhos brilhantes com os quais as crianças são benditas
são feitos para ver, e ver nos fazeres das criaturas pequenas demais para a
observação sem ajuda das pessoas mais velhas. Pode-se levar formigas sob
observação caseira da seguinte maneira: pegue dois pedaços de vidro de 30 cm²,
três faixas de vidro de 11,5 polegadas[43] de comprimento e uma faixa de 1
polegada de comprimento, todos esses com ¼ de polegada de largura. O vidro
tem de ser cuidadosamente cortado de modo que se ajuste exatamente. Coloque
as quatro faixas de vidro sobre uma das chapas de vidro e fixe num quadrado
exato, deixando ½ polegada aberta, com adesivo ou qualquer fixador bom.
Pegue aproximadamente 20 formigas de um formigueiro (as formigas amarelas
são as melhores, visto que as vermelhas tendem a ser briguen-tas), alguns ovos e
uma rainha. A rainha será tão grande quanto uma formiga comum, e assim pode
ser facilmente vista. Pegue um pouco da terra do formigueiro. Ponha a terra com
as suas formigas e ovos sobre a chapa de vidro e fixe a outra chapa acima,
deixando somente o buraco pequeno em um canto feito pela faixa mais curta,
que deve ser parado com um pouco de lã de algodão. As formigas estarão
irrequietas por quarenta e oito horas talvez, mas então começarão a instalar e
arranjar a terra. Remova o plugue de lã uma vez por semana e substitua-o após
duas ou três gotas de mel nele. Uma vez em três semanas remova o plugue para
gotejar com uma seringa aproximadamente dez gotas de água. Isso não será
necessário no inverno enquanto as formigas estão adormecidas. Esse “ninho”
durará por anos.
Com relação ao horror que algumas crianças mostram de besouro,
aranha, minhoca, isso geralmente é um engano pego das pessoas adultas. As
crianças de Kingsley corriam atrás do seu “papai” com uma “minhoca
deliciosa”, um “adorável sapo”, um “doce besouro”, carregados carinhosa-mente
em ambas as mãos. Há antipatias reais a não serem superadas, como o próprio
horror de Kingsley a aranhas, mas as crianças que estão acostumadas a segurar e
admirar lagartas e besouros desde a sua primei-ra infância não darão atenção a
horrores afetados. A criança que gasta uma hora assistindo aos modos de alguma
nova “larva” que encontrou será ainda uma pessoa de marca. Faça que tudo o
que encontrar a respeito disso seja posto no seu diário – pela sua mãe, se lhe for
um trabalho escrever –, onde o encontre, o que está fazendo ou lhe parece estar
fazen-do. A sua cor, formato, pernas. Algum dia, ela cruzará com o nome da
cria-tura e reconhecerá a descrição de uma velha amiga.

A força da opinião pública na casa
Algumas crianças nascem naturalistas, com uma inclinação herda-da
talvez de um ancestral desconhecido. Mas toda criança tem um interes-se natural
nas coisas viventes, e é função dos seus pais estimulá-lo, pois apenas poucas
crianças são uniformes para se sustentar em face da opi-nião pública. E se elas
virem que as coisas que lhes interessam são indife-rentes ou nojentas para você,
o prazer desaparece nelas, e aquele capítulo no livro da Natureza lhes fica
fechado. É provável que a Natural History of Selborne[44] nunca tivesse sido
escrita se o pai do naturalista não costu-masse levar os seus meninos em
expedições diárias de forrageamento, quando nem uma coisa movente ou
crescente, nem um calhau ou seixo em milhas de Selborne escapava do seu
exame ardente. Audubon[45], o ornito-logista americano, é um outro exemplo do
efeito desse tipo de formação inicial. Diz ele: “Quando eu mal aprendia a andar e
articular aquelas primeiras palavras sempre tão cativantes aos pais, as produções
da Natu-reza que se espalham por todo lugar foram constantemente apontadas
para mim... O meu pai geralmente acompanhava os meus passos, conse-guia
aves e flores para mim, e apontava os movimentos elegantes dos primeiros, a
beleza e a suavidade da sua plumagem, as manifestações do seu prazer, ou a sua
percepção de perigo, e as formas sempre perfeitas e trajes esplêndidos das
últimas. Ele falava da partida e retorno das aves com a estação, descrevia as suas
perseguições, e, mais lindo que tudo, a sua mudança de libré, empolgando-me
assim a estudá-las e a erguer a minha mente em direção ao seu grande Criador.”

O que as crianças da cidade podem fazer
As crianças da cidade podem ter grande prazer ao assistir aos caminhos
dos pardais – conhecendo avezinhas, facilmente domadas por uma doação de
migalhas – e os seus dias fora as levarão ao caminho de novas conquistas. Mas
muito pode ser feito com pardais. Um amigo escreve: “Você viu o homem nos
jardins das Tulherias[46] alimentando e falando com dúzias deles? Eles se sentam
sobre o seu chapéu, as suas mãos e se alimentam nos seus dedos. Quando ele
ergue os seus braços, eles se agitam e então ficam de novo sobre ele e em torno
dele. Eu o vi chamar um pardal a uma distância pelo nome e recusar comida a
todos os outros até que o petit chou[47], um pardal muito sarapintado, foi ao seu
pedaço destinado. Outros tiveram os seus nomes e vieram a chamado, mas eu
não pude ver nenhuma característica distintiva. E a multidão de pardais na
caminhada, bancos e trilhos, formou um público muito atento à brilhante
conversa francesa que os manteve em constante movimento conforme eram, um
aqui e outro ali, convidados a ir a um pedaço tentador. Verda-deiramente, um
São Francisco e os pássaros!”
Da criança que não conhece a forma corpulenta e o peito manchado do
sabiá, o voo gracioso da andorinha, o bico amarelo da ave preta, o jorro da
canção que a cotovia despeja de cima, deve-se quase ter pena como daquelas
crianças de Londres que “nunca viram uma abelha”. Uma com-quista prazerosa,
fácil de pegar, é a lagarta peluda. O momento de pegá-la é quando é vista se
desorganizando no chão muito apressada. Ela está à procura de lugares calmos
para se deitar. Ponha-a numa caixa e cubra a caixa com rede, através da qual
você pode assistir às suas operações. A comida não importa: ela tem outras
coisas para tratar. Pouco a pouco, ela tece uma espécie de tenda ou rede (para
dormir), dentro da qual ela se retira. Você pode ver através dela e assistir a ela,
talvez no mesmo mo-mento quando a sua pele se divide em pedaços, deixando-a,
por meses a vir, uma massa em formato de ovo sem qualquer sinal de vida. Por
fim, a coisa viva dentro quebra do seu embrulho e aí está a mariposa de tigre,
batendo asas frágeis contra a rede. A maioria das crianças de seis anos teve esse
gosto da experiência de um naturalista, e vale a pena falar disso somente porque,
em vez de ser meramente uma diversão inofensiva, é uma peça valiosa de
educação, de mais uso para a criança do que a leitura de um livro inteiro de
história natural, ou muita geografia e latim. Pois o mal é que as crianças
obtenham o seu conhecimento da história natural, como todos os seus
conhecimentos, em segunda mão. Elas estão tão saciadas com as maravilhas que
nada as surpreende. E elas estão tão pouco habi-tuadas a ver por si mesmas, que
nada as interessa. A cura para essa condição blasée[48] é deixá-las sozinhas um
pouco, e então começar com novas diretrizes. Pobres crianças, não é culpa delas
se não são como deve-riam ser: ardentes alminhas curiosas, todas empolgadas
para explorar tanto desse mundo maravilhoso conforme possam, conforme o seu
primeiro negócio na vida.




“Reza melhor aquele que ama melhor
Todas as coisas tanto grandes quanto pequenas;
Pois o amado Deus que nos ama,
Ele fez e ama a todos.”


“He prayeth best who loveth best
All things both great and small;
For the dear God who loveth us,
He made and loveth all[49].”

O conhecimento da natureza: o mais importante para crianças
novas
Seria bom se nós, pessoas com autoridade, pais e todos os que fazem o
serviço de pais, pudéssemos ter a ideia de que não há espécie de conhecimento a
ser obtido nesses primeiros anos tão valioso às crianças quanto aquele que elas
obtêm por si mesmas do mundo onde vivem. Faça-as entrar uma vez em contato
com a Natureza, e se formará um hábito que será uma fonte de prazer pela vida.
Todos fomos chamados a ser natura-listas, cada um no seu grau, e é
indesculpável viver num mundo tão cheio das maravilhas da vida das plantas e
dos animais e não ligar para nada disso.

Formação mental de uma criança naturalista
Considere também qual formação mental sem paralelo a criança-
naturalista está conseguindo para qualquer estudo ou chamada sob o sol: a
capacidade da atenção, da discriminação, da perseguição paciente, cres-cendo
com o seu crescimento – para o que elas não se ajustarão? Além disso, a vida é
tão interessante para ela, que não tem tempo para as faltas de temperamento que
geralmente têm a sua fonte no ennui[50]. Não há razão por que deva ser
facilmente aborrecida ou emburrada ou obstinada quando ela é sempre mantida
bem entretida.

Trabalho da natureza especialmente valioso para me-ninas
Eu digo “ele[51]” pela força do hábito, como falando do sexo representativo,
mas, verdadeiramente, que ela deva estar familiarizada com a Natureza é uma
questão de infinitamente mais importância à menininha: é ela que é mais tentada
a ceder a gênios ruins (como criança e mulher), porque o tempo pesa sobre as
suas mãos. Ela, cujos hábitos mentais mais preguiçosos, desnecessários, querem
a espora e o freio de uma séria perseguição envolvente; cuja saúde mais frágil
requer ser apoiada por uma vida fora de casa cheia de empolgação saudável.
Além disso, para as meninas, pequenas e grandes, é a gentileza mais verdadeira
elevá-las de si mesmas e fora do círculo de interesses pessoais mesquinhos e
rivalidades que também frequentemente orlam as suas vidas. E então com quem
senão as garotas isso tem de ficar para modelar as gerações que ainda nascerão?


6. HISTÓRIAS TRADICIONAIS DO CAMPO E LIVROS DE
NATURALISTAS

Reverência pela vida
Então é aconselhável ensinar às crianças os elementos da ciência
natural, da biologia, da botânica, da zoologia? No geral, não. Mesmo a
dissecação de uma flor é dolorosa para uma criança sensível, e, durante os
primeiros seis ou oito anos de vida, eu não as ensinaria nenhuma botânica que
necessitasse da arrancada de flores em pedaços. Muito menos deve-se permitir
que elas prejudiquem ou destruam qualquer forma (não nociva) de vida animal.
A reverência pela vida, como um dom maravilhoso e im-pressionante, que uma
criança cruel pode destruir, mas nunca pode res-taurar, é uma lição de prima
importância para a criança:

“Deixe o conhecimento crescer de mais a mais;
Mas que mais reverência em nós habite[52].”
A criança que vê a sua mãe com toque reverente levanta uma
campainha-branca inicial aos seus lábios, aprende uma lição maior do que os
“livros impressos” podem ensinar. Daqui a anos, quando as crianças estiverem
velhas o bastante para entender que a ciência mesma é sagrada num sentido e
exige alguns sacrifícios, todas as “informações comuns” que elas estiverem
juntando até então, e os hábitos de observação que tiverem adquirido, formarão
um alicerce capital para uma educação científica. No meio tempo, deixe-as
considerar os lírios do campo e as aves domésticas do ar.

Classificação imperfeita em primeira mão
Por conveniência ao descrever, elas devem ser capazes de nomear e
distinguir pétalas, sépalas e assim por diante. E elas devem ser estimuladas a
fazer essas classificações imperfeitas como podem com o seu leve conhecimento
tanto das formas de animal quanto de vegetal. Plantas com formato de coração
ou folhas com formato de colher, com folhas inteiras ou divididas; folhas com
veias entrecruzadas e folhas com veias direitas; flores com formato de sino e
flores com formato de cruz; flores com três pétalas, com quatro, com cinco;
árvores que mantêm as suas folhas o ano todo e árvores que as perdem no
outono; criaturas com coluna vertebral e criaturas sem; criaturas que comem
grama e criaturas que comem carne, e assim por diante. Fazer coleções de folhas
e flores, apertadas e ajustadas, e arrumadas conforme a sua forma, proporciona
muito prazer, e o que é melhor: formação valiosa ao notar as diferenças e
semelhanças. Padrões desse tipo de classificação de folhas e flores serão
encontrados em todo livrinho de botânica elementar.
A capacidade de classificar, discriminar, distinguir entre coisas que
diferem, está entre as maiores faculdades do intelecto humano, e nenhuma
oportunidade de cultivá-lo deve ser desperdiçada. Mas uma classificação saída
dos livros, que a criança não faz por si mesma, não cultiva nenhuma capacidade
senão a da memória verbal. E uma frase ou duas de tâmil[53], ou de outra língua
desconhecida, aprendidas serviriam a esse propósito também.

Usos de livros de “naturalistas”
O uso real de livros de naturalistas nesse estágio é dar à criança
vislumbres prazerosos no mundo das maravilhas onde ela vive, e revelar os tipos
de coisas a serem vistas pelos olhos curiosos e preenchê-la com o desejo de fazer
descobertas por si mesma. Existem muitas coisas, tudo leitura prazerosa, muitas
delas escritas por cientistas, no entanto exigindo pouco ou nenhum
conhecimento científico para a apreciação.

Mães e professores devem saber sobre a Natureza
A mãe não pode se dedicar demais a esse tipo de leitura, não somente
porque ela pode ler fofoquinhas aos seus filhos sobre assuntos com que
depararam, mas porque ela pode responder às suas perguntas e direcionar as suas
observações. E não somente a mãe, mas qualquer mulher que provavelmente
gastará uma ou duas horas na sociedade das crianças, deve fazer-se senhora
desse tipo de informação. As crianças a adorarão por ela saber o que elas querem
saber, e quem sabe ela pode dar a sua inclinação pela vida a alguma mente jovem
designada a fazer grandes coisas para o mundo.


7. A CRIANÇA OBTÉM CONHECIMENTO
MEDIANTE OS SEUS SENTIDOS

O ensino da Natureza
Veja uma criança de pé contemplando alguma visão nova para ela – um
arado no trabalho, por exemplo – e você verá que ela fica tão natu-ralmente
ocupada quanto um bebê no peito. De fato, ela está tomando o alimento
intelectual que a faculdade operante do seu cérebro exige nesse período. Nos
seus anos iniciais, a criança é todo olhos: ela observa, ou mais verdadeiramente,
ela percebe, chamando a vista, o toque, o gosto, o cheiro e ouvindo o seu auxílio,
de maneira a poder aprender tudo o que é detec-tável para ela acerca de toda
coisa nova que vem sob a sua observação. Todos sabem como um bebê apalpa
com dedinhos suaves, e carrega à sua boca, e bate de modo que possa produzir o
som que há nele, a colher ou a boneca que pessoas adultas altivas lhe dão para
“mantê-lo quieto”. A criança está nas suas aulas e está estudando tudo sobre isso
a uma velocidade completamente surpreendente para o fisiologista, que
considera o quanto está implicado no ato de “ver”, por exemplo: que para a
criança pequena, como para o adulto cego restaurado à visão, inicialmente não
há diferença entre uma imagem plana e um corpo sólido; que as ideias de forma
e solidez não são obtidas pela visão absolutamente, mas são os juízos da
experiência.
Então pense nas vagas passagens que o pequeno punho faz antes de
perseguir o objeto de desejo, e você vê que ela aprende os paradeiros das coisas,
não tendo ainda ideia de direção. E por que ela chora para a lua? Por que ela
almeja igualmente um cavalo ou uma mosca doméstica como um brinquedo
apropriado? Porque longe e perto, grandes e pequenas, são as ideias que ela
ainda tem de compreender. A criança tem verdadei-ramente uma grande coisa a
fazer antes que esteja numa condição de “acreditar com os próprios olhos”; mas
a Natureza ensina tão gentil, gra-dual e persistentemente, que a criança nunca
está acabada, e prossegue juntando pequenas reservas de conhecimento sobre o
que quer que seja que chegue diante de si.
E esse é o processo que a criança deve continuar para os primeiros
poucos anos da sua vida. Agora é o tempo de armazenamento que deve ser gasto
ao colocar imagens de coisas familiares. Pouco a pouco, ela terá que conceber
coisas que nunca viu: como pode fazer isso senão pela compa-ração com coisas
que viu e conhece? Pouco a pouco, será chamada a refle-tir, entender, raciocinar.
Que material ela terá, a menos que tenha uma revista de fatos aos quais ir? A
criança que observou o quão alto nos céus o sol está ao meio-dia num dia de
verão, o quão baixo ao meio-dia num dia de meio inverno, pode conceber o
grande calor dos trópicos embaixo de um sol vertical e entender que o clima de
um lugar depende grandemente da altura mediana que o sol atinge no horizonte.

Pressão excessiva
Muito se disse ultimamente sobre o perigo da pressão excessiva, de
exigir trabalho mental demais de uma criança de tenra idade. O perigo existe,
porém não reside em dar demais à criança, senão em lhe dar a coisa errada a
fazer, o tipo de trabalho para o qual o atual estado do seu desen-volvimento
mental não se ajusta a ela. Quem espera que um menininho erga 25 kg[54]? Mas
dê à criança o trabalho que a Natureza lhe destinou, e o tanto que ela pode
conseguir com facilidade é praticamente ilimitado. Quem é que viu uma criança
cansada de ver, de examinar à sua própria maneira coisas não familiares? Esse é
o tipo de nutrição mental para a qual ela tem um apetite ilimitado, porque é esse
o alimento da mente sobre o qual, para o presente, ela está destinada a crescer.

Aulas práticas
Agora, quão longe esse desejo por sustento natural é satisfeito? Na pré-
escola e no jardim de infância, por aulas práticas, o que é bom na medida do
possível, mas às vezes é como aquele feijão por dia com que o homem francês
alimentou o seu cavalo. A criança em casa tem mais coisas novas trazidas sob a
sua atenção, supondo-se que com menos método. Nem em casa, nem na escola
muito esforço é feito para colocar diante da criança a abundante “festa de olhos”
que as suas necessidades exigem.

Uma criança aprende a partir das “coisas”
Nós, pessoas mais velhas, em parte por causa do nosso intelecto mais
maduro, em parte por causa da nossa educação defeituosa, conse-guimos a maior
parte do nosso conhecimento por meio das palavras. Faze-mos a criança
aprender da mesma maneira, e a vemos aborrecida e lenta. Por quê? Porque é só
com poucas palavras no uso comum que ela associa um significado definido.
Todo o restante não lhe é mais do que vocábulos de uma língua estrangeira. Mas
coloque-a frente a frente com uma coisa, e ela será vinte vezes tão rápida quanto
você sobre aquilo. O conhecimento de coisas voa à mente de uma criança como
limalhas de aço ao ímã. E, pari passu[55] com o seu conhecimento das coisas, o
seu vocabulário cresce, pois é uma lei da mente que, o que conhecemos, nós
lutamos para expressar. Esse fato conta para muitas das questões das crianças
aparentemente sem objetivo. Elas estão em investigação não de conhecimento,
mas de palavras para expressar o conhecimento que elas têm. Agora, considere
que desper-dício culpável de energia intelectual é calar uma criança, abençoada
com essa capacidade desmesurada de ver e saber, nas quatro paredes de uma
casa, ou nas ruas sombrias de uma cidade. Ou suponha que se deixe que ela
corra livre no campo onde há muito para ver: é quase tão ruim deixar essa
grande faculdade da criança se dissipar em observações aleatórias por falta de
método e direção.

A percepção de beleza vem a partir do primeiro con-tato com a
Natureza
Não há fim para o fornecimento de informações comuns, obtidas de tal
maneira que nunca serão esquecidas e com as quais uma criança inteligente pode
se modelar antes que comece a sua carreira escolar. O menino que pode lhe
contar improvisadamente onde encontrar cada uma da meia dúzia das mais
graciosas bétulas, os três ou quatro freixos mais finos na vizinhança da sua casa,
tem na vida chance de doze contra um em comparação com uma inteligência
mais baixa, mais lenta que não dife-rencia um olmo de um carvalho – não
meramente chances de sucesso, mas chances de uma vida maior, mais feliz, pois
é curioso como certos senti-mentos são ligados com a mera observação da
Natureza e de objetos naturais. Diz o Dr. Carpenter: “O senso estético do belo,
do sublime, do harmonioso, na sua forma mais elementar, parece conectar-se
imediata-mente com as percepções que surgem do contato das nossas mentes
com a Natureza externa.”, enquanto ele cita o Dr. Morrell, que diz ainda mais
forçosamente que “Todos aqueles que mostraram uma apreciação notável de
forma e beleza datam as suas primeiras impressões desde um período que
permanece muito além da existência de ideias definidas ou instrução verbal.”

A maioria dos homens adultos perde o hábito da obser-vação
Assim, devemos algo ao Sr. Evans por levar consigo a sua filhinha Mary
Anne nos seus longos percursos de negócios, entre as agradáveis travessas de
Warwickshire. A garotinha se levantou entre os joelhos do seu pai, vendo muito
e dizendo pouco. E o resultado foram as cenas da vida rural em Adam Bede e
The Mill on the Floss[56]. Wordsworth, criado entre as montanhas, torna-se um
profeta da Natureza, enquanto Tennyson traça um imaginário sem fim a partir
dos níveis dos condados do leste onde ele foi criado. O pequeno David
Copperfield foi “uma criança muito obser-vadora, não obstante”, diz ele. “Eu
acho que a memória da maioria de nós pode ir mais tempos atrás do que a
maioria de nós supõe, assim como eu acredito que a capacidade de observação
em diversas crianças muito novas seja muito maravilhosa pela sua proximidade e
precisão. De fato, eu acho que se pode dizer com maior propriedade que a
maioria dos homens adultos que são notáveis a esse respeito não perdeu a
faculdade, mas sim a adquiriu. O bastante, conforme eu geralmente observo
esses homens re-tendo um certo frescor, gentileza e capacidade de ser agradado,
que tam-bém são uma herança que preservaram da sua infância.” – em cujo
comen-tário Dickens faz o seu herói falar uma filosofia sã assim como um senso
gentil.


8. A CRIANÇA DEVE SE FAMILIARIZAR
COM OBJETOS NATURAIS

Uma “criança observadora” deve ser posta no caminho das coisas
dignas de observação
Mas qual é a utilidade de ser uma “criança muito observadora”, se você
não é colocado no caminho das coisas dignas de se observar? E aqui está a
diferença entre as ruas de uma cidade e as vistas e os sons do campo. Há muito
para ser visto numa cidade, e as crianças acostumadas aos caminhos das ruas se
tornam inteligentes o bastante em agilidade. Mas os fragmentos de informação a
serem pegos numa cidade são isolados. Eles não esperam por nada mais, nem
vêm a nada mais. A informação pode ser conveniente, mas ninguém é o mais
sábio por saber que lado da rua está a casa de Smith e que curva conduz à loja de
Thompson.

Todo objeto natural: um membro de uma série
Agora, pegue um objeto natural, não importa qual, e você está
estudando um de um grupo, um membro de uma série. Qualquer que seja o
conhecimento que você consiga sobre ele está muito em direção à ciência que
inclui todos do seu tipo. Quebre um galho na primavera. Você nota um anel de
madeira em torno de um centro da parte branca da casca, e aí num relance você
tem uma marca distintiva de uma grande divisão do mundo vegetal. Você pega
um seixo. As suas bordas são perfeitamente lisas e arredondadas. “Por quê?”,
você pergunta. Está desgastado pela água, pelo tempo. E aquele pequeno seixo o
coloca face a face com a desintegração, a força, mais do que qualquer outra, a
que devemos os aspectos do mundo que chamamos de pitorescos: vale profundo
entre montanhas, ravina, vale, colina. Não é necessário que seja dita à criança
qualquer coisa sobre desin-tegração ou dicotiledônea, mas apenas que ela deve
observar a madeira e a parte branca da casca no graveto castanho-claro, a
redondeza agradável do seixo. Pouco a pouco, ela aprenderá a orientação dos
fatos com os quais ela já está familiarizada – uma coisa muito diferente de
aprender o motivo de os fatos nunca ficarem sob a sua atenção.

O poder passará mais e mais para as mãos dos cientistas
Enquanto toma algumas dores todo dia, é infinitamente valioso para a
mãe assegurar, em primeiro lugar, que os seus filhos gastem horas diárias entre
objetos rurais e naturais. E, em segundo lugar, infundir neles, ou ainda, nutrir
neles o amor à investigação. Diz Kingsley: “Digo-o deliberadamente como um
estudante de sociedade e de história: o poder passará mais e mais para as mãos
dos cientistas. Eles governarão e agirão – com cuidado, podemos esperar, e
modestamente, e com caridade –, porque, ao aprender o verdadeiro
conhecimento, eles também terão apren-dido a sua própria ignorância, e a
vastidão, a complexidade, o mistério da Natureza. Mas eles também poderão
governar, poderão agir, pois eles tomaram a preocupação de aprender os fatos e
as leis da Natureza.”

A intimidade com a Natureza se dirige ao bem-estar pessoal
Mas permitir que elas nadem com a correnteza é o menor dos benefícios que
essa formação inicial confere às crianças. Um amor à Natureza, implantado tão
cedo de modo que de hoje em diante lhes pare-cerá ter nascido com elas,
enriquecerá as suas vidas com interesses puros, buscas atrativas, saúde e bom
humor. Diz o mesmo escritor: “Eu vi o homem jovem de paixões ferozes e
atrevimento incontrolável gastar saudavelmente aquela energia que diariamente
ameaçava mergulhá-lo na imprudência, se não no pecado, caçando e coletando,
por rochas e brejos, neve e tempestade, todo pássaro e ovo da floresta vizinha...
Eu vi a jovem beleza de Londres, entre toda a empolgação e tentação de luxo e
adulação, com o seu coração puro, e a sua mente ocupada num boudoir[57] cheio
de conchas e fósseis, flores e algas marinhas, mantendo-se impoluta do mundo,
considerando os lírios dos campos do campo, como crescem.”


9. GEOGRAFIA FORA DE CASA

Pequenas coisas podem ensinar grandes coisas
Após essa longa digressão, com a intenção de informar às mães a
importância suprema de causar nos seus filhos um amor à Natureza e aos objetos
naturais – uma primavera profunda para enviar águas puras aos lugares mais
secos da vida após a morte –, temos que retornar à mãe que deixamos fora de
casa todo esse tempo, esperando saber o que ela deve fazer em seguida. Esta
nossa terra agradável não deve ser negligenciada na educação das crianças fora
de casa. “Como você consegue tempo para tanto?” “Oh, eu deixo disciplinas sem
valor educacional; eu não ensino geografia, por exemplo.”, disse um jovem
teórico avançado com todos os tipos de certificados.

Geografia pictórica
Mas a mãe, que conhece melhor, encontrará uma centena de
oportunidades para ensinar geografia a propósito: uma lagoa de pato é um lago
ou um mar dentro da terra; qualquer ribeiro servirá para ilustrar os grandes rios
do mundo; uma pequena colina cresce numa montanha – um sistema alpino; um
bosquezinho castanho-claro sugere florestas poderosas da Amazônia; um
pântano com juncos, os arrozais da China; um prado, as pradarias sem limites do
Ocidente; as bonitas flores roxas das malvas comuns é um texto sobre o qual
suspender os campos de algodão dos Estados do Sul. De fato, o campo inteiro da
geografia pictórica – os mapas podem esperar até depois – pode ser coberto
dessa maneira.



A posição do sol
E não somente isso. Deve-se ensinar às crianças observar a posição do
sol nos céus de hora a hora, e, pela sua posição, dizer a hora do dia. Claro que
elas quererão saber por que o sol é um viajante infatigável, e assim mantém um
conto maravilhoso, que elas também podem aprender na “idade da fé”: os
tamanhos relativos do sol e da terra, e a natureza e os movimentos da última.

Nuvens, chuva, neve e granizo
“Nuvens e chuva, neve e granizo, ventos e vapores, cumprindo a Sua
Palavra.” – todos são mistérios do dia a dia aos quais a mãe será chamada para
explicar fielmente, ainda que simplesmente. Há certas ideias que as crianças
devem obter de dentro de um raio de caminhada da sua própria casa se elas
devem ter um entendimento real dos mapas e dos termos geográficos.
A distância é uma dessas. E a ideia de distância deve ser ligada pelo que
as crianças consideram uma operação deliciosa. Uma criança caminha no seu
passo usual. Alguém mede e lhe diz a extensão do seu passo, e então ela mede os
passos dos seus irmãos e irmãs. Então essa caminhada, essa distância, aqui e ali,
é solenemente regulada, e resulta uma pequena soma: tantas polegadas ou pés
cobertos por cada passo são iguais a tantas jardas na distância inteira[58]. Várias
distâncias curtas em torno da casa da criança devem ser medidas dessa maneira.
E quando a ideia de cobrir uma distância estiver completamente estabelecida, a
ideia de vezes como um meio de medida deve ser introduzida. O tempo tomado
para andar cem jardas deve ser anotado. Tendo descoberto que se levam dois
minutos para andar cem jardas, as crianças estarão aptas para o próximo passo:
que se elas tiverem andado por trinta minutos, a cami-nhada deve medir mil e
quinhentas jardas. Em trinta e cinco minutos, elas teriam caminhado uma
milha[59], ou ainda, mil setecentas e cinquenta jardas. E elas poderiam acrescentar
mais dez jardas, que fariam uma milha. Quanto mais longas as pernas, mais
longo o passo, e a maioria das pessoas adultas pode andar uma milha em vinte
minutos.


Direção
Quando elas estiverem um pouco familiarizadas com a ideia de
distância, a de direção deve ser introduzida. O primeiro passo é fazer as crianças
observadoras do progresso do sol. A criança que observa o sol por um ano e
anota, ou dita para si mesma, as vezes do nascer e do pôr do sol pela maior parte
do ano, e os pontos do nascer e do pôr do sol, terá assegu-rado uma base para
uma boa quantidade de conhecimento definitivo. Essa observação deve
compreender o reflexo da luz do sol, a luz da noite refle-tida por janelas do leste,
a luz da manhã por janelas do oeste, o compri-mento e a intensidade variáveis de
sombras, a causa das sombras a ser estudada pelo formato da sombra mediante
uma figura entre uma persiana e uma vela. Ela também deve associar as horas
quentes do dia com o sol acima da cabeça, e as horas frias da manhã e da noite
com um sol baixo. E deve ser lembrada de que, se ela ficar bem diante do fogo,
ela sente o calor mais do que se estivesse num canto da sala. Quando ela estiver
preparada para uma pequena observação do curso do sol, ela estará pronta para
assimilar a ideia de direção, que depende inteiramente do sol.

Leste e oeste
Claro que as primeiras duas ideias são de que o sol nasce no leste e se
põe no oeste. A partir desse fato, ela será capaz de dizer a direção na qual os
lugares próximos da sua própria casa, ou as ruas da sua própria cidade,
encontram-se. Peça-lhe para ficar de maneira que a sua direita esteja em direção
ao leste, onde o sol nasce, e a sua esquerda, em direção ao oeste, onde o sol se
põe. Então, ela está olhando para o norte e as suas costas, para o sul. Todas as
casas, ruas e cidades sobre a sua mão direita estão ao seu leste. Aquelas sobre a
esquerda, ao oeste. Os lugares aos quais ela tem de andar para frente para
alcançar estão ao seu norte, e os lugares atrás dela estão ao sul. Se ela estiver
num lugar novo para ela onde nunca viu o sol nascer ou se pôr, e quer saber à
qual direção uma certa estrada vai, ela tem de notar em qual direção a sua
própria sombra cai às doze horas no relógio, porque ao meio-dia as sombras de
todos os objetos caem em direção ao norte. Então, se ela se virar para o norte, ela
terá, como antes, o sul atrás de si, o leste sobre a sua mão direita, o oeste sobre a
sua esquerda. Ou, se ela se virar para o sol ao meio-dia, ela se virará para o sul.

Prática em encontrar direção
Isso lançará uma luz interessante à criança sobre os nomes das nossas
grandes estradas de ferro. Uma criança pode ficar pronta para notar as direções
dos lugares por uma pequena prática. Faça-a notar aonde cada janela da sua sala
escolar está voltada, ou as janelas de cada cômodo na sua casa. As colunas das
casas pelas quais ela passa nas suas caminhadas, e quais são os lados norte, sul,
leste e oeste das igrejas que ela conhece. Ela logo estará preparada para notar a
direção do vento, notando a fumaça das chaminés, o movimento dos ramos,
milho, grama etc. Se o vento sopra do norte, “o vento do norte sopra mesmo e
teremos neve.” Se ele soprar do oeste, um vento do oeste, nós esperaremos
chuva. Um cuidado tem de ser tomado nesse ponto para clarificar à criança que o
vento é nomeado após o local de onde vem, e não a partir do ponto em direção
ao qual ele sopra, assim como ela é inglesa porque nasceu na Inglaterra, e não
francesa porque vai à França. Agora as ideias de distância e direção podem ser
combinadas. Esse prédio está duzentas jardas a leste de um portão; essa vila,
duas milhas a oeste. Logo, ela passará pela dificuldade de que um lugar não está
exatamente a leste ou oeste, norte ou sul. É bom deixá-la dar, de uma maneira
aproximada, a direção de lugares como: “mais a leste do que a oeste”, “muito
perto do leste, mas não tanto”, “a meio caminho entre leste e oeste”. Ela
valorizará os meios exatos de expressão muito mais por ter sentido necessidade
deles.
Mais tarde, ela deve ser introduzida nas maravilhas da bússola do
marinheiro, deve ter a sua própria pequena bússola de bolso, e deve observar os
quatro pontos cardeais e todos os outros pontos. Isso lhe proporcionará os nomes
para as direções que ela achou difícil descrever.

Bússola
Então, ela deve fazer certas repetições com a bússola desta forma:
mande-a segurar o N da bússola em direção ao norte. “Então, com a bússola na
sua mão, gire em direção ao leste, e você verá uma coisa notável. A agulhinha se
move também, mas se move por si mesma na outra direção. Gire para o oeste, e
de novo a agulha se move na direção oposta àquela na qual você se move. Ainda
que você gire um pouco, um tremorzinho da agulha resulta do seu movimento. E
você olha para ela, querendo saber como a coisinha pôde perceber que você se
moveu, quando você mal sabia por você mesmo. Caminhe reto em qualquer
direção, e a agulha fica exatamente constante. Só exatamente constante, porque
você tem certeza, sem intenção, de se mover um pouco à direita ou à esquerda.
Dê uma volta muito lentamente, um pouquinho por vez, começando do norte e
se virando ao leste, e você pode fazer a agulha também se mover em torno de um
círculo. Ela se move na direção oposta à sua, pois ela está tentando voltar ao
norte do qual você está se virando.”

Fronteiras
Tendo as crianças conseguido a ideia de direção, será bem fácil
introduzir a de fronteiras: tal e tal campo de nabo, por exemplo, está limitado
pela autoestrada ao sul, pela plantação de trigo ao sudeste, uma cerca a nordeste,
e assim por diante. As crianças entendem gradativa-mente a ideia de que as
fronteiras de um dado espaço são simplesmente tudo o que toque em todo lado.
Assim, um trigo pode tocar um outro sem qualquer linha divisória, portanto um
trigo faz fronteira com o outro. É bom que as crianças tenham noções claras
sobre esse assunto, ou, mais tarde, ficarão perdidas quando aprenderem que esse
condado tem esta e aquela “fronteira”. Junto a espaços fronteiros, sejam eles
vilas, cidades, lagoas, campos etc, as crianças devem ser levadas a notar os
vários trigos surgidos no distrito, ora terras de pasto e ora milharais, que modos
de rochas aparecem, e quantos tipos de árvores crescem na vizinhança. Pois, de
todo campo ou outro espaço que é examinado, elas devem desenhar um plano
rústico na areia, dando o formato aproximado, e colocando letras nas direções
como N, S, L etc.

Planos
Pouco a pouco, quando elas tiverem aprendido a desenhar planos em
casa, ocasionalmente medirão o comprimento de um campo e desenha-rão o seu
plano de acordo com a escala, substituindo uma polegada por cinco ou por dez
jardas. Os planos de chão de jardins, estábulos, casa etc. podem suceder.

Geografia local
É provável que a própria vizinhança da criança lhe dê oportunidades para
aprender os significados de colina e vale pequeno, piscina e ribeiro, bacia
hidrográfica, corrente, cama, bancos, afluentes de um ribeiro, as posições
relativas de vilas e cidades. E toda essa geografia local ela tem de ser capaz de
imaginar simplesmente num plano feito com giz sobre uma rocha ou com
caminhada no pedregulho, percebendo as distâncias relativas e as situações dos
lugares que ela marca.


10. A CRIANÇA E A MÃE NATUREZA

A mãe tem de refrear muita fala
Um programa assim amplo alerta a mãe? Com desalento, ela se vê
falando por aquelas cinco ou seis horas inteiras, e, mesmo assim, não chega à
décima parte do ensino arranjado por ela? Ao contrário, quanto menos falar,
melhor. E quanto à quantidade do trabalho educacional a ser conseguido, é a
fábula do pêndulo ansioso de novo: é verdade que há incontáveis “instantes” a
serem usados, mas sempre haverá um segundo de tempo para usar, e não mais do
que um instante deve ser usado em qualquer segundo dado.

Fazendo um novo conhecimento
As rápidas pessoinhas terão feito o seu jogo, quer de “passeio turístico”,
quer de “pintura de imagem”, em mais ou menos quinze minutos. Para o estudo
dos objetos naturais, um “Olhe!” ocasional, um exame atento do objeto por parte
da própria mãe, um nome dado, um comentário – de doze palavras – feito no
momento certo, e as crianças começarão um novo conhecimento que elas
processarão por si mesmas. E não mais do que uma ou duas dessas apresentações
deve ocorrer num dia simples.
Agora, veja quanto lazer é deixado! A dificuldade real da mãe será
prevenir-se de muita conversa com as crianças e impedi-las de se ocupa-rem
consigo. Há poucas coisas mais doces e mais preciosas para a criança do que
conversa infantil divertida com a sua mãe, mas uma coisa é melhor: a comunhão
com a Mãe maior, para a qual a criança e ela devem ser deixadas por si mesmas.
Isso é realmente algo delicioso a assistir: a mãe lê o seu livro ou tricota a sua
meia, verificando todas as tentativas de fazer uma conversação. A criança olha
para cima numa árvore ou para baixo numa flor – fazendo nada, pensando em
nada. Ou leva uma vida de pássaro entre os galhos, ou faz travessuras em êxtase
sem rumo. Ações bem tolas, irracionais, mas o tempo todo uma moldagem está
prosse-guindo: a Natureza está fazendo a sua parte, com a promessa:

“Essa criança, eu tomarei para mim mesmo.
Ela será minha, e eu farei
Uma dama minha.”


“This child I to myself will take;
She shall be mine, and I will make
A lady of my own.”

WORDSWORTH

Duas coisas permitidas à mãe
Existe uma coisa que a mãe se permitirá fazer como intérprete entre a
Natureza e a criança, porém com frequência não maior do que uma vez por
semana ou uma vez por mês, e com olhar e gesto de deleite em vez de fluência
de palavras de melhoramentos: ela apontará à criança algum toque especial de
amabilidade no colorir ou no agrupamento na paisagem ou nos céus. Uma outra
coisa que ela fará, mas muito raramente, e com reverência filial sensível (muito
provavelmente ela dirá as suas orações e delas falará, pois tocar nessa área com
palavras duras é ferir a alma da criança): ela apontará para alguma flor amável
ou árvore graciosa, não somente como bela, senão como um pensamento belo de
Deus, no qual podemos acreditar que Ele encontra prazer contínuo e que Lhe
apraz ver os seus filhos humanos rejubilando. Essa semente de simpatia com o
pensamento divino semeada no coração da criança vale muitos sermões que o
homem pode escutar daqui para frente, muito da “divindade” que possa ler.


11. JOGOS FORA DE CASA ETC.

As horas animadas voam. E ainda há pelo menos uma aula no
programa, para não dizer nada sobre uma ou duas horas para jogos à tarde. A
consideração de uma aula é pouco convidativa após a discussão de muito do que
seja mais interessante, e realmente mais importante. Mas precisa ser somente
uma pequena aula, de dez minutos, e o leve intervalo e o esforço de atenção
darão a maior vivacidade ao prazer e ao lazer que sucedem.

A aula de francês
A aula diária de francês[60] é aquela que não deve ser omitida. As
crianças devem estudar francês oralmente, escutando e repetindo palavras e
frases no idioma. Devem começar bem novas, de modo que a diferença de
sotaque não as atinja e que repitam a nova palavra francesa como se fosse inglês,
e usá-la livremente. Devem estudar poucas – duas ou três, cinco ou seis – novas
palavras francesas diariamente, e, ao mesmo tempo, as palavras antigas devem
ser mantidas em uso. Esses são pontos que devem ser considerados mais
completamente a partir daqui. No meio tempo, é tão importante manter a língua
e o ouvido familiares com os vocábulos france-ses que nenhuma aula deve ser
omitida. No entanto, a aula de francês pode se ajustar ao espírito das outras
ocupações fora de casa. A meia dúzia de palavras pode ser as partes: folhas,
ramos, latido, tronco de uma árvore, ou as cores das flores, ou os movimentos do
pássaro, da nuvem, do carneiro, da criança. De fato, as novas palavras francesas
devem ser apenas uma outra forma de expressão para as ideias que para o
momento preenchem a mente da criança.

Jogos barulhentos
Após o almoço, os jogos da tarde são uma parte importante das ações do
dia para as crianças mais velhas, conquanto provavelmente as mais novas
tenham se desgastado por essa hora com a inquietação incessante por meio da
qual a Natureza fornece o devido desenvolvimento do tecido muscular nelas.
Deixe-as dormir no ar doce e despertar refres-cadas. Enquanto isso, as crianças
mais velhas jogam. Quanto mais elas correm, gritam e sacodem os seus braços,
mais saudável é o jogo. E essa é uma razão por que as mães devem carregar os
seus filhos a lugares solitários, onde eles possam usar os seus pulmões até a
capacidade dos seus corações sem o risco de irritar alguém. A estrutura muscular
dos órgãos da voz não é considerada suficientemente. As crianças adoram se
saciar em berros, gritos e alôs, e esse jogo “rude” e “barulhento”, com os quais
os seus mais velhos não têm muita paciência, não é nada mais do que a maneira
de a Natureza fornecer o devido exercício dos órgãos, de cujo poder operante
dependem grandemente a saúde e a felicidade do futuro da criança. As pessoas
falam de “pulmões fracos”, “peito fraco”, “garganta fraca”, mas talvez não
ocorra a todos que pulmões e garganta fortes comumente devem ser tidos nos
mesmos termos que um braço ou pulso forte: por exercício, treino, uso, trabalho.
Ainda, se as crianças podem “dar voz” musicalmente, e mais ritmicamente ao
som das suas próprias vozes, quanto mais melhor. A esse respeito, as crianças
francesas são melhores do que as inglesas. Elas dançam e cantam centenas de
cantigas – brincadeiras, sem dúvida, mímica de casamentos e enterros, como as
crianças brincavam muito tempo atrás na feira de Jerusalém.

Rondes[61]
Antes de as inovações puritanas nos tornarem um povo sério e
circunspecto, os moços e as moças ingleses de todas as idades dançavam
pequenos dramas na vila verde, acompanhando-se com as palavras e ares de tais
rodas como as crianças francesas cantam hoje. Nós ainda temos algumas delas –
para serem ouvidas nos prazeres da escola dominical e outras reuniões de
crianças – e elas são dignas de serem preservadas: “Vieram três duques andando
a cavalo, cavalo, cavalo.”; “Laranjas e limões, dizem os sinos de São
Clemente.”; “Aqui vamos nós juntando nozes em maio.”; “O que fez o meu
pobre prisioneiro?[62]” e muitas mais, todas postas a deliciosos ares de canto da
maneira que pezinhos saltitam alegremente. Pela titilação agradável das palavras
– duques, nozes, laranjas –, quem não poderia acompanhar a melodia dessas
ideias?
Os promotores do sistema de jardim de infância fizeram muito ao
introduzir jogos assim, ou ainda, de um tipo mais educacional. Mas não é um
fato que as brincadeiras de canto do jardim de infância podem ser um pouco
idiotas? Além disso, é duvidoso o quanto as brincadeiras mais bonitas,
aprendidas na escola e com uma professora, segurarão as crianças como o fazem
as brincadeiras que foram passadas de mão a mão através de uma cadeia sem fim
de crianças, e não serão absolutamente encon-trados nos livros impressos.

Pular corda e peteca
Críquete, tênis e rodas são os jogos por excelência se as crianças têm
idade o bastante para jogá-los, tanto quanto dar jogos harmoniosos livres aos
músculos, e também servir o maior propósito moral dos jogos ao levar as
crianças sob a disciplina das regras. Mas a pequena família que temos em vista,
todas abaixo de nove anos, dificilmente estará disposta a jogos científicos.
Corridas e caçadas, “etiqueta”, “siga meu líder” e qual-quer jogo traquino que
possam inventar, serão mais para as suas mentes. Ainda melhores são a argola, a
bola, a peteca e a inestimável corda de pular. Para a corda, o melhor uso é pular
com a sua própria, lançando-a para trás em vez de para frente, de sorte que a
tendência do movimento seja expandir o peito. Peteca é um jogo bom,
proporcionando oportunidade para a ambição e a concorrência. A sua biógrafa
pensa que vale a pena dizer que a Srtª. Austen podia se manter em “concha e
bola” mais de cem vezes, para a admiração dos sobrinhos e sobrinhas. De
maneira seme-lhante, qualquer façanha para manter a peteca pode ser notada
como um evento de família, com o fito de que as crianças possam ser disparadas
com ambição para se sobressair num jogo que proporciona uma brincadeira
muito graciosa e vigorosa a quase todo músculo da parte superior do corpo, e
tem esta grande recomendação: que pode ser tanto jogada dentro de casa quanto
fora. A melhor brincadeira é manter a peteca com uma raquete em cada mão, de
modo que os músculos em cada lado sejam levados igual-mente à brincadeira.
Mas “ordenar” jogos de crianças é uma perda frívola de palavras, pois aqui a
moda é tão suprema e arbitrária quanto nas ques-tões de capô e crinolina.

Escalada
A escalada não é um divertimento muito a favor das mães: roupas
rasgadas, joelhos sangrando e botas esfregadas em buracos, para não dizer nada
dos riscos mais sérios – são bons argumentos contra essa forma de deleite. Mas
na verdade o exercício é tão admirável – o corpo sendo arre-messado em
posturas graciosas sem fim, que levam cada músculo à brinca-deira – e o
treinamento em coragem, cuidado e recurso tão inestimável que é uma pena que
árvores, penhascos e paredes sejam proibidos até para meninas pequenas. A mãe
pode fazer bastante coisa para evitar acidentes sérios, acostumando as crianças
mais novas a façanhas pequenas de saltar e subir, a fim de que aprendam, ao
mesmo tempo, coragem e precaução a partir das suas próprias experiências e
fiquem menos inclinadas a seguir a condução de colegas cautelosos demais.
Depois, é melhor a mãe ter a ideia de compartilhar os sentimentos da galinha que
chocou uma ninhada de pintinhos, lembrando-se de que um gritinho e um súbito
“Desça já!”, “Tommy, você vai quebrar o seu pescoço!” dão um choque nervoso
à criança e provavelmente causará a queda que estava intencionava impedir por
alarmar o Tommy de toda a presença da sua mente. Sequer barco e natação não
estão fora do alcance de crianças criadas na cidade, em dias quando todos vão
num passeio de verão à vizinhança do mar ou de águas no interior. E então há
banhos de natação na maioria das cidades. Seria bom se a maioria das crianças
de sete anos fosse ensinada a nadar, não somente para a possível utilidade da
arte, mas para lhes dar um meio a mais de movimento, portanto de deleite.

Vestuário
O estrago de roupas não precisa ser grande se as crianças estiverem vestidas
para as suas pequenas excursões como elas devem estar, em roupas feitas
simplesmente de algum material de lã tecida frouxamente, sarja ou flanela. A lã
tem muitas vantagens sobre o algodão, e mais ainda sobre o linho, como um
material de vestuário. Principalmente porque é um mau condutor, isto é, não
permite que o calor do corpo saia tão livremente nem que o calor do sol entre tão
livremente. Portanto, a criança na lã, que ficou aquecida no jogo, não sofre um
calafrio de uma perda repentina do seu calor, como sofre a criança em roupas de
linho. Além disso, ela está mais fresca na luz solar e mais quente na sombra.








12. CAMINHADAS EM TEMPO RUIM

Caminhadas no inverno tão necessárias quanto no verão
Tudo o que dissemos até agora se aplica ao tempo de verão, que é uma
preocupação para nós! – uma quantidade muito limitada e incerta na nossa parte
do mundo. A questão do exercício fora de casa no inverno e no tempo úmido é
realmente mais importante, pois quem pudesse não estaria no exterior no tempo
de verão? Se as crianças devem ter o que é o melhor para elas, devem ficar duas
ou três horas todo dia ao ar aberto por todo o inverno; digamos uma hora e meia
de manhã e o mesmo tanto de tarde.

Prazeres ligados à geada e à neve
Quando a geada e a neve estão no chão, as crianças têm momentos
muito festivos, com escorregamento, bola e construção de neve. Mas mesmo nos
dias frequentes quando está sujo embaixo do pé e enfadonho acima da cabeça,
elas devem ser mantidas interessadas e alertas, para que o coração possa fazer o
seu trabalho alegremente e um brilho grato seja mantido por todo o corpo, apesar
das nuvens e do tempo frio.

Observações de inverno
Tudo o que foi dito sobre “passeio turístico” e “pintura de imagem”, a
pequena conversa francesa e observações a serem anotadas no diário de família,
pertence tanto ao tempo de inverno quanto ao de verão. E não há fim para as
coisas serem vistas e anotadas. A festa chega a uma grande árvore que elas
julgam, pela sua construção, ser um carvalho – aí vai ao diário. E, quando as
folhas saem, as crianças vão de novo ver se estão certas. Muitos pássaros
chegam à vista mais livremente no tempo frio, visto que são levados à busca de
comida.








“O gado lamenta nos cantos, onde a cerca
Os oculta, […]”

“[…] o sol, com a esfera avermelhada
Ascendendo, incendeia o horizonte;”

“[...] toda erva e toda folha espiralada
Estica uma extensão de sombra sobre o campo,”

“Os pardais piam, e abandonam os beirais acolhedores”

“A toutinegra ainda gorjeia, mas está contente
Com notas finas e mais que a metade suprimida.
Satisfeita com a sua solidão, e luz esvoaçante
De borrifo a borrifo, onde ela repousa ela se agita
De muitos galhos as gotas de gelo suspensas
Que tilintam nas folhas murchas abaixo.”

“The cattle mourn in corners, where the fence
Screens them, […]”

“[…] the sun, with ruddy orb
Ascending, fires the horizon;”

“[…] every herb and every spiry blade
Stretches a length of shadow o’er the field,”

“The sparrows peep, and quit the sheltering eaves”

“The redbreast warbles still, but is content
With slender notes and more than half suppressed.
Pleased with his solitude, and flitting light
From spray to spray, where’er he rests he shakes
From many a twig the pendant drops of ice,
That tinkle in the withered leaves below.”[63]
Não há razão pela qual a caminhada de inverno da criança não deva ser
tão fértil nas observações como as do poeta. De uma forma, é possível, de fato,
ver mais no inverno, porque as coisas a serem vistas não se acumulam.

Hábito da atenção
Ademais, as caminhadas de inverno, seja na cidade, seja no campo, dão
grandes oportunidades para cultivar o hábito da atenção. O famoso ilusionista
Robert-Houdin[64] relata na sua autobiografia que ele e o seu filho passavam
rapidamente na frente da janela de uma loja – a de uma loja de brinquedos, por
exemplo – e cada um lançava um olhar atento a ela. A alguns passos além, cada
um pegava um papel e um lápis do seu bolso e experimentavam quem conseguia
enumerar o maior número de objetos momentaneamente vistos ao passar. O
menino surpreendeu o seu pai com a rapidez de apreensão, frequentemente
sendo capaz de escrever quarenta objetos, enquanto o seu pai mal podia alcançar
trinta. No seu retorno para verificar a sua declaração, dificilmente o filho tinha
cometido um engano. Eis uma dica para um divertimento grandemente
educacional para muitas caminhadas de inverno.

Caminhadas pesadas em clima úmido
E quanto aos dias úmidos? O fato é que a chuva, salvo a mais pesada,
realmente não prejudica as crianças se elas estiverem apropriada-mente vestidas.
Mas todo tipo de roupa à prova d’água deve ser proibido, porque a textura que
não aceitará chuva não permitirá o escapamento da transpiração insensível. E um
segredo para a saúde das pessoas que não têm doença orgânica é o pronto
transporte das coisas decaídas e nocivas descarregadas pela pele.




Roupas exteriores
As crianças devem ter roupas de chuva de lã – feitas de sarja grossa, por
exemplo – para serem trocadas no momento em que elas retornarem de uma
caminhada, e então não há o risco de pegar um resfriado. Esse é o senso comum
sobre o assunto. Roupas úmidas são postas sobre a cabeça de um paciente com
febre. Pouco a pouco, as roupas secam e são novamente molhadas: o que houve
com a água? Ela evaporou e, ao evaporar, carregou muito calor da cabeça febril.
Agora, o que alivia a pele quente da febre é apenas uma coisa a ser evitada nas
circunstâncias comuns. Ficar molhada até a pele não pode causar à criança um
prejuízo maior que um banho, se as roupas úmidas não secarem sobre ela, ou
seja, se a água não evaporar, transportando muito calor do seu corpo no
processo. É a perda do calor animal que é seguida por “resfriados”, e não o
“umedecimento”, que as mães estão prontas para lamentar. Mantenha uma
criança ativa e feliz na chuva, e ela não consegue nada senão um bem da sua
caminhada. O caso é outro se a criança já tem um resfriado. Então um exercício
ativo pode aumentar qualquer inflamação já estabelecida.
Eu não sei se é mais do que uma bela fantasia de Richter que um banho de
primavera seja um tipo de banho elétrico e um meio muito potente de saúde.
Certamente, a chuva limpa a atmosfera – um fato de considerável importância
nas cidades grandes e nos seus arredores. Mas é suficiente para o nosso
propósito provar que a chuva não precisa causar prejuízo, pois o exercício diário
abundante no ar fresco é de tal importância vital às crianças que realmente nada
senão a doença deve mantê-las dentro de casa. Um simples tempo e uma
caminhada distante são suficien-temente alegres para um dia úmido, dado que,
tomada com bom humor, a própria chuva batendo é animadora. A “longa
corrida” do menino de escola, isto é, uma caminhada constante a passo rápido,
de vez em quando virando uma corrida, é um exercício capital, mas uma atenção
deve ser dada às capacidades da criança, que não tem de estar cansada.

Precauções
Concomitantemente, nunca se deve permitir que as crianças se sintam
ou fiquem de pé em roupas úmidas. E aqui está o uso das capas de chuva à prova
d’água: mantê-las secas em curtas viagens à igreja, ou escola, ou casa do
vizinho, onde não possam mudar muito as suas roupas.

13. VIDA DE “ÍNDIO PELE-VERMELHA”

Escotismo
O livrinho de Baden Powell[65] sobre escotismo nos coloca numa nova
trilha. Centenas de famílias fazem expedições alegres, muito mais educativas do
que imaginam, onde o escotismo é a ordem do dia.
Por exemplo, um partido de quatro ou mais se encontra numa emboscada –
a melhor a ser feita, que é montada após muita consideração. O inimigo vigia.
Primeiro ele encontra a emboscada e então a sua habili-dade é mostrada ficando
no toque de alerta do inimigo sem ser descoberto. Mas toda família deve possuir
o escotismo na ausência da possibilidade de ir ao caminho da guerra com um
índio pele-vermelha. O mal da vida pronta que levamos é que nós não
discernimos os sinais dos tempos. Uma inteligência alerta ao que continua no
mundo de ar aberto é um grande bem, e, conforme nos simpatizarmos
profundamente com o esforço feito para depor o ninho da ave, nós perderemos,
se não formos cuidadosos, uma das poucas coisas que podemos chamar de
treinamento de “índio pele-vermelha” ainda dentro do nosso alcance.

Perseguição a pássaros
Mas a “perseguição” a pássaros, para adaptar um nome, é muito mais
empolgante e prazerosa do que aninhar pássaros, e conseguimos o nosso júbilo
sem custo de dor a outras coisas vivas. Toda a habilidade de um bom escoteiro
entra em jogo. Pense no quão empolgante é rastejar silenciosamente como
sombras atrás dos arbustos ao lado do rio sobre mãos e joelhos, sem mexer um
galho ou um seixo, até que você chegue a uma jarda de um par de maçaricos; e
então, ficando baixo, assistir às suas corridinhas delicadas, bons truques de
cabeça e rabo, e ouvir a música da sua chamada. E aqui vem a verdadeira alegria
da perseguição a pássaros. Se nos meses de inverno as crianças ficarem
razoavelmente familiarizadas com as notas dos nossos pássaros residentes, no
início do próximo verão elas poderão “perseguir” algum propósito. As notas e
canções em junho são bem embaraçantes, mas o plano é escolher aqueles de que
você tem bas-tante certeza e então seguir os outros. A chave para um
conhecimento dos pássaros é o conhecimento das suas notas, e a única maneira
de conseguir isso é seguir qualquer nota da qual você não esteja certo. A alegria
de seguir a pista de uma canção ou nota até a sua fonte é a alegria de um
“achado”, uma posse pela vida.
Mas a perseguição aos pássaros somente deve ser feita sob certas
condições. Você não somente tem de ser “o mais quieto-tímido”, como tam-bém
não deve deixar um pensamento sussurrar, pois se você se deixar pensar sobre
qualquer outra coisa, todo o jogo prazeroso da vida de pássa-ro passará por você
sem ser visto. Ou melhor, as próprias notas do pássaro não serão ouvidas.
Eis duas caminhadas de pássaro comunicadas por um amante de pássaros:
“Ouvimos uma nota como a de um tentilhão, apenas mais lenta, e olhamos
para cima nos galhos do freixo para tentar rastrear o pássaro pelo
estremecimento súbito de um graveto aqui, um outro ali. Encontramos um
caminho íngreme, rochoso que nos levou quase ao nível dos topos das árvores, e
então tivemos uma boa visão da pequena garriça tímida de salgueiro procurando
comida atarefadamente. Uma nota da próxima árvore como um borbulhar de
canção nos levou mais longe, e então encontramos a garriça da floresta, vimo-la
como que com a cabeça voltada para cima e, borbulhando a garganta, ela emitiu
o seu trinado.
Um estouro jubiloso de canção veio de um arbusto por perto, e rastejamos
para encontrar uma toutinegra de cabeça preta com a crista erguida girando em
torno com empolgação, no êxtase da canção. Nós esperamos e a seguimos até a
sua próxima estação pelo seu toque leve sobre os galhos. Um grito penetrante
rouco de uma outra árvore anunciou um verdilhão, e fizemos uma longa caça
para ter um vislumbre seu. Mas ele veio para um graveto excepcional, e então
ouvimos a sua bela canção, que eu nunca teria adivinhado que fosse sua se não o
tivéssemos visto. Uma notinha aguda nos fez ver os troncos de árvore, e, com
suficiente certeza, havia uma trepadeira subindo em torno de um freixo,
emitindo a sua nota o tempo todo.
Num outro dia, ficamos atrás de uma parede da qual podíamos examinar
um campo que fica ao lado do lago. Havia a batuíra verde com a sua crista
alegre, correndo e dando bicadas, e, conforme ela bicava, tive-mos uma vista do
sinal luminoso rosado embaixo do seu rabo. Nós aguar-damos, esperando por
mais, pois as batuíras ficam tão paradas que elas se perdem nos seus arredores.
Mas alguém tossiu, e lá se foram as batuíras, uma dúzia delas, com o seu insulto
enfadonho: “Por que vocês não nos deixam em paz?” A sua aflição despertou
outros pássaros, e nós vimos uma narceja subir da beira da água, um lugar
pantanoso, com voos apressados em zigue-zague. Ela fez um longo círculo e se
posicionou não muito além de onde subiu. Os maçaricos subiram, dois voando
perto da beira da água, assobiando o tempo todo. Pelo lado de uma ravina
pequena vimos uma lavandisca, e em seguida um giro na luz solar nos mostrou o
peito amarelo da lavandisca amarela. Um som alto perto de nós puxou os nossos
olhos para a parede, e lá estava uma lavandisca manchada com bico cheio,
esperando para se livrar de nós antes de visitar o seu ninho na parede. Nós
rastejamos para longe e nos abrigamos atrás de uma árvore, e, após alguns
minutos esperando, nós a vimos entrar no seu buraco. Uma conver-sa fiada brava
por perto (como uma vassoura em persianas!) direcionou os nossos olhos a uma
garriça marronzinha sobre a parede com o rabo para cima, mas num minuto ela
desapareceu como um camundongo pelo lado.”
Este é de um outro amante de pássaros:
“Agora, elas [as crianças] estão começando a se importar mais com os
pássaros do que com os ovos, e a sua primeira questão em vez de ser ‘Como é
um ovo?’ geralmente é ‘Como é um pássaro?’. Fizemos uma grande busca pelos
Pássaros Britânicos de Morris para identificar os pássaros que vimos e deixar
bem certos os pontos duvidosos.
“Mas agora quanto aos pássaros. Os cartaxos-comuns abundam nos brejos.
Eu me espetei até os meus joelhos ficando de pé num trecho de arbusto
escutando-o e assistindo ao primeiro que eu visse, mas eu fui bem recompensado
e vi pelo menos quatro pares de uma vez. Você conhece os pássaros? Os pássaros
machos são amiguinhos bonitos, cabeça e máscara pretas, colarinho branco,
peito ruivo e costas cinzas-escuras ou marrons. Eles têm uma cançãozinha
bonita, um pouco mais longa do que a de um tentilhão, além do grito de
tagarelice quando são perturbados. Eles não fazem voos longos e voarão
lentamente no ar como um mosquiteiro. As andorinhas das barreiras têm
diversos buracos nos penhascos. Tentamos ver quão fundo cavavam para
construir os seus ninhos; entretanto, ainda que pusesse o meu braço acima dos
cotovelos em diversos buracos deser-tos, eu não podia atingir o fim. Acho que os
meus favoritos são as touti-negras de canavial. Conheço pelo menos quatro
pares. E quando eu podia induzir as crianças a ambas pararem de falar por
alguns minutos, podía-mos vê-las pulando para cima e para baixo
audaciosamente nos canaviais e cantando à nossa vista plena.”
Esse é o tipo de coisa que os perseguidores de pássaros fazem – e que
perda têm aquelas crianças não criadas na arte suave em que o olho se satisfaz
com ver, e não há ganância para colecionar, não há instinto de matar do caçador,
no entanto há um júbilo de posse por toda a vida.


14. AS CRIANÇAS EXIGEM AR DO CAMPO

A proporção essencial de oxigênio
Todos sabem que a respiração de ar que perdeu pouco da sua devida
proporção de oxigênio é a condição essencial da vida vigorosa e de um físico
bom. Além disso, tudo aquilo que produz calor – seja do animal, seja do fogo, da
vela, da lâmpada de gás – fá-lo às custas do oxigênio na atmosfera – um banco
extraído por todo objeto que respira e queima. Em situações em que muita
respiração e queima prosseguem, há um consumo terrível desse gás vital. O
consumo pode ser tão excessivo de modo que não haja mais oxigênio o
suficiente no ar para suportar a vida animal, e a morte sucede. Onde o consumo é
menos excessivo, mas ainda grande, a vida animal pode ser suportada, e as
pessoas vivem uma vida flácida, fraca, num estado de vitalidade baixa.

Excesso de gás carbônico
Também sabemos que toda respiração e todo objeto queimando expele
um gás prejudicial: o gás carbônico. Uma proporção muito pequena desse gás
está presente no ar atmosférico mais puro, e essa proporção pequena é saudável.
Mas aumente essa quantidade pela ação de fornalhas, fogos, seres vivos,
lâmpadas de gás, e o ar se torna insalubre, na proporção da quantidade de gás
carbônico supérfluo que ele contém. Se a quantidade for excessiva – como
quando muitas pessoas se aconchegam numa pequena sala sem ventilação –, a
morte rápida por sufocação é o resultado.




Ar não viciado, não empobrecido
Por essas razões, não é possível apreciar a plenitude da vida numa
cidade. Para pessoas adultas, o estímulo da vida urbana faz algo para produzir a
impureza do ar urbano, enquanto, por outro lado, pessoas do campo muito
frequentemente perdem as suas vantagens pelo hábito de lentidão mental no qual
se deixam cair. Mas para as crianças – que não somente respiram, mas crescem;
que exigem, proporcionalmente, mais oxigênio do que os adultos precisam para
os processos vitais –, é absoluta-mente cruel não lhes dar correntes abundantes
de ar não viciado, não empobrecido, amiúde, se não diariamente – o tipo de ar
que pode ser obtido somente longe das cidades.

Luz solar
Esse é somente um dos motivos por que, pela saúde sozinha, é de
primeira importância dar às crianças longos dias no campo aberto. Elas querem
luz, luz solar, assim como ar. As pessoas do campo são mais rudes do que as da
cidade. Os mineiros são amarelados, assim como os habi-tantes de celas e vales
sem sol. O motivo é que, para assegurar o brilho rude da saúde perfeita, certas
mudanças têm de acontecer no sangue – cuja natureza levaria muito tempo para
explicar aqui – e que essas mudanças, marcadas pela produção de glóbulos
vermelhos, parecem acon-tecer mais favoravelmente sob a influência de luz
solar abundante. E mais: homens da ciência estão começando a suspeitar de que
não somente os raios de luz coloridos do espectro solar, mas os raios escuros de
calor, e os raios químicos, auxiliam a vitalidade de maneiras ainda não de todo
entendidas.

Um ideal físico para uma criança
Havia uma imagem encantadora em Punch um tempo atrás de dois
menininhos dando a sua opinião sobre inglês-francês à nova empre-gada
doméstica da sua mãe. Dois nobres amiguinhos, cada um reto como um dardo,
sem corpo supérfluo, olhos bem abertos, cabeça ereta, peito expandido, o corpo
inteiro cheio de primavera mesmo em repouso. Valia a pena olhar, mesmo que
apenas sugerindo o tipo de físico que sentimos prazer em ver numa criança. Sem
dúvida, a criança herda a maior parte do que é a esse respeito como em todo o
resto; mas isto é o que educar pode efetuar, com algumas limitações: a criança
nasceu com certas tendências naturais, e, consoante a sua educação, cada
tendência pode incorrer num defeito da pessoa ou do caráter, ou numa graça
cognata. Portanto, ainda vale a pena ter um ideal físico para a criança de alguém.
Não fugir, por exemplo, com a noção de que necessariamente é uma boa criança
uma criança gorda. Esta pode facilmente ser produzida. Mas os olhos brilhan-tes,
o afeto aberto, o passo saltitante, os tons claros como um sino, os movi-mentos
ágeis e graciosos que caracterizam uma criança bem-educada, são o resultado
não do bem-estar corporal somente, senão também da “mente e alma se
harmonizando” com uma inteligência rápida, treinada, e com uma natureza
moral habituada à “alegria do autocontrole”.





























PARTE III


“O HÁBITO SÃO DEZ NATUREZAS”


1. A EDUCAÇÃO BASEADA NA LEI NATURAL

Um cérebro saudável
O que eu desejo estabelecer perante o leitor é um método de educação
baseado sobre a lei natural. Em primeiro lugar, consideremos algumas condições
a serem observadas com uma visão para manter o cérebro em ordem operante
saudável, visto que é sobre a posse de um cérebro ativo, devidamente nutrido, de
que depende a possibilidade de uma educação sadia.

Vida fora de casa
Ao desenvolver um método de educação, a consideração da vida fora de
casa vem em segundo lugar, pois o meu objetivo é mostrar: que a função
principal da criança – o seu papel no mundo durante os primeiros seis ou sete
anos da sua vida – é descobrir tudo o que puder, a respeito de tudo aquilo que
vier sob a sua atenção, por meio dos seus cinco sentidos; que ela tem um apetite
insaciável por conhecimento obtido dessa forma, portanto que o empenho dos
pais deve ser colocá-la no caminho de livre-mente ter conhecimento da Natureza
e dos objetos naturais; que, de fato, a educação intelectual da criança nova está
no livre exercício da capacidade de percepção, porquanto os primeiros estágios
do esforço mental são marcados pela atividade extrema dessa capacidade; e que
a sabedoria do educador é seguir a condução da Natureza na evolução do ser
humano completo.
O próximo assunto a se considerar – um pouco seco psicologica-mente –
parece-me, todavia, ser muito digno de atenção, por atingir a parte mais
importante de um método de educação razoável.

Hábito, o instrumento pelo qual os pais trabalham
“O hábito são dez naturezas!” Se eu pudesse apenas fazer os outros verem
com os meus olhos o quanto significa esse ditado para o educador! Como o
hábito, nas mãos da mãe, é comparável à roda para o ceramista, à faca para o
entalhador – o instrumento pelo qual ela produz o projeto que já concebeu no seu
cérebro. Observe: o material está ali para começar. A sua roda não permitirá que
o ceramista produza uma xícara de porcelana a partir de uma argila grosseira,
mas o instrumento é tão necessário quanto o material ou o projeto. É
desagradável alguém falar de si, porém, se o leitor me permite, eu gostaria de
examinar os passos pelos quais eu fui levada a olhar o hábito como a guisa pela
qual os pais podem fazer quase qualquer coisa que escolherem para o seu filho.
Aquilo que se tornou a ideia dominante na vida de uma pessoa, se for lançada de
repente a uma outra, não transmite grande profundidade ou peso de significado à
segun-da pessoa – ela quer chegar a isso por degraus, ver os passos pelos quais o
outro viajou. Portanto, arriscar-me-ei a mostrar como eu cheguei à minha
posição atual (um dos três pontos de vista possíveis): a formação de hábi-tos é
educação, e a Educação é a formação de hábitos.


2. AS CRIANÇAS NÃO TÊM PODER
DE SE AUTOCONVENCER

Uma cul-de-sac[66] educacional
Alguns anos atrás, eu estava acostumada a ouvir “O hábito são dez
naturezas.”, entregue pelo púlpito pelo menos um domingo dentre quatro. À
época, eu tinha acabado de começar a lecionar e era jovem e entusias-mada no
meu trabalho. Para a minha mente, era uma grande coisa ser uma professora. Era
impossível, mas aquela professora devia deixar a sua marca nas crianças. Sua
própria era a falha se algo tivesse ido mal, se alguma criança fosse mal na escola
ou fora dela. Não havia grau de responsabilidade ao qual o ardor juvenil fosse
igual. Contudo, ainda que com todo esse zelo, o decepcionante era que nada
extraordinário acontecia. As crianças eram boas no geral, porque elas eram os
filhos de pais que tinham sido educados com algum cuidado, porém era claro
que elas se comportavam muito conforme a sua natureza. As falhas que tinham,
elas mantinham. As virtudes que tinham eram exercitadas tão agitadamente
quanto antes. A menininha boa, mansa, ainda contava lorotas. A criança
brilhante, generosa, era incuravelmente ociosa. Nas aulas, era a mesma coisa: a
criança preguiçosa continuava preguiçosa, a criança aborrecida não ficava mais
brilhante. Era muito decepcionante. Sem dúvida, as crianças “entravam” – um
pouco. Mas cada uma delas tinha em si os fazeres de um caráter nobre, de uma
mente fina, e onde estava a alavanca para erguer cada um desses mundinhos?
Tem de haver tal alavanca. Essa roda de moinho de geografia e francês, história
e cálculos, nada mais era do que brincar na educação, pois quem se lembra dos
pedaços de conhecimento com que trabalhou quando criança? E a aplicação de
umas poucas horas na vida adulta não efetuaria mais do que um pesado trabalho
anual em qualquer matéria na infância? Se a educação deve assegurar o
progresso passo a passo do indivíduo e da raça, ela tem de significar algo além e
acima do penoso caminho diário em pequenas tare-fas que passam pelo nome.

Amor, lei e religião como forças educacionais
Procurando orientação na literatura da educação, aprendi muito de
várias fontes, apesar de eu não ter conseguido encontrar o que me parecesse um
guia confiável, ou seja, um guia cujo pensamento abrangesse as possibilidades
contidas na natureza humana de uma criança, e, ao mesmo tempo, que medisse o
escopo da educação. Vi como o ensino reli-gioso ajudava as crianças, dava-lhes
poder e motivos para o esforço contínuo e elevava os seus desejos para coisas
melhores. Eu vi o quão longe a lei restringia o mal e o amor impelia ao bem.
Mas, com esses grandes auxílios de fora e de cima, ainda havia o senso
depressivo de trabalhar na educação no escuro. O avanço feito pelos jovens no
poder moral, e mesmo no intelectual, era como o de uma porta nas suas dobra-
diças: um balanço para frente hoje e para trás de novo amanhã, com pouco
progresso sensível de ano a ano, além daquele de ser capaz de fazer cálculos
mais duros e ler livros mais difíceis.


Por que as crianças são incapazes de esforço constante
A consideração foi o motivo do claro fracasso: havia um brilho
aquecido de bondade no coração de cada criança, mas todas elas eram incapazes
de esforço constante, porque não tinham força de vontade, ne-nhum poder para
fazer aquilo que elas sabiam que deviam fazer. Com efeito, aqui vêm as funções
dos pais e professores: eles podem fazer a criança fazer aquilo que ela não tem o
poder de se compelir. Mas era uma formação pobre que mantinha a criança
dependente da influência pessoal. É assunto da educação encontrar alguma
forma de suprir essa fraqueza de vontade, que é a desgraça da maioria de nós
assim como das crianças.

As crianças devem ser preservadas do esforço de de-cisão
Aquele esforço de decisão é o mais exaustivo da vida, foi bem dito pelo
púlpito. E se isso é verdade sobre nós mesmos, mesmo quando a decisão é sobre
desperdiçar assuntos de ida e vinda, comprar ou não comprar; certamente não é
só deixar para as crianças todo o trabalho de um esforço de vontade sempre que
elas tiverem de escolher entre o certo e o errado.


3. O QUE É A “NATUREZA”?

“O hábito são dez naturezas.” continuou sendo proclamado nos meus
ouvidos. E finalmente chegou até mim em casa como um ditado importante, o
qual poderia conter o “Abre-te, Sésamo![67]” que eu estava buscando. Em
primeiro lugar, o que é a Natureza e o que é precisamente o Hábito?
É uma coisa surpreendente, quando consideramos, o que uma criança é
– independentemente de raça, país ou parentes – simplesmente no seu direito de
nascimento como um ser humano.
Todas as pessoas nascem com os mesmos desejos primários
Que todos nós temos os mesmos instintos e apetites, estamos
preparados para aceitar; mas que os princípios de ação que governam todos os
homens em todo lugar sejam primariamente os mesmos, é um pouco
surpreendente. Por exemplo: os mesmos desejos mexem no peito do selvagem e
do sábio igualmente; o desejo de conhecimento, que se mostra na curiosidade da
criança sobre as coisas e o uso ávido dos seus olhos, é igualmente ativo em todo
lugar; o desejo de sociedade, que você pode ver em dois bebês apresentados um
ao outro e todos ansiosos com regozijo e simpatia, é a causa, da mesma maneira,
de comunidades de vila entre tribos selvagens e do encontro filosófico dos
estudados; em todo lugar é sentido o desejo de estima – é um poder maravilhoso
nas mãos do educa-dor, fazendo uma palavra de elogio ou de culpa mais
poderosa, como um motivo além de qualquer medo, esperança de punição ou
recompensa.

E as afeições
E não são apenas os mesmos desejos. Todas as pessoas, em todo lugar,
têm as mesmas afeições e paixões que atuam da mesma forma sob provocação
semelhante: júbilo e pesar, amor e ressentimento, benevolên-cia, simpatia, medo
e muito mais, são comuns a todos nós. Assim também a consciência, o senso de
dever.

Conteúdo da noção mais elementar da natureza humana
O Dr. Livingstone menciona que a única adição a qual ele se sentiu
chamado a fazer para o código moral de certas tribos de Zambeze (embora eles
cumprissem pouco a sua própria lei) foi que um homem não devia ter mais do
que uma mulher. “Difamação, mentira, ódio, desobediência aos pais, negligência
deles”: sabia-se que todos eram pecados desses povos escuros aos quais o ensino
civilizado ou cristão nunca chegara antes. Não somente é um senso de dever
comum à humanidade, mas a consciência mais profunda de Deus, conquanto tal
consciência pudesse ser vaga. E tudo isso e muito mais fazem a noção mais
elementar da natureza humana.


Natureza plus[68] hereditariedade
Então, a hereditariedade vem, e aqui, se me permite, estão dez
naturezas: quem lidará com a criança que é ressentida, ou teimosa, ou
imprudente, porque nasceu nela a natureza da sua mãe ou do seu avô? Pense no
truque do olho, na ação da mãe, repetidos de pai para filho; na característica
peculiar da caligrafia, rastreável, conforme a Srtª. Power Cobbe nos diz ser o
caso na sua família, por exemplo, por cinco gerações; no temperamento artístico,
o gosto pela música ou desenho, corrida em famílias: encontrar-se-á certamente
aqui a Natureza, confirmada, selada, firmada, prova completa, dir-se-ia, contra
qualquer tentativa de alterá-la ou modificá-la.

Plus as condições físicas
E, uma vez mais, as condições físicas vêm à força. A criança
insignificante, débil e o moleque robusto que nunca adoece necessaria-mente
têm de diferir um do outro na força dos seus desejos e emoções.

Natureza humana: a soma de certos atributos
Portanto, os desejos naturais, afeições e emoções comuns à raça inteira;
as tendências que cada família tem por descendência; e aquelas peculiaridades
que o indivíduo deve à sua própria constituição de corpo e cérebro – a natureza
humana, a soma de tudo isso, distingue-se como um caso forte. Tanto assim que
somos inclinados a pensar que o melhor a se fazer é deixá-la sozinha, deixar
cada criança desenvolver-se sem impedi-mentos, de acordo com os elementos do
caráter e da disposição que estão nela.

A criança não deve ser deixada à sua natureza humana
É precisamente isso que metade dos pais no mundo, e três quartos dos
professores, estão contentes em fazer. E qual é a consequência? Que o mundo
está avançando, mas o progresso, para a maior parte, está entre as poucas
crianças cujos pais assumiram a educação delas seriamente. Enquanto o restante,
que aceitou ficar onde estava – não é mais ou não é melhor que aquilo que a
Natureza fez –, age como um entrave pesado, pois, realmente, o fato é que eles
não ficam onde estavam. É imutavel-mente verdade que a criança que não está
sendo constantemente elevada a um nível mais e mais alto afundará a um nível
mais e mais baixo. Por conseguinte, é tanto dever dos pais educar o seu filho na
força moral, no propósito e na atividade intelectual, quanto é alimentá-lo e vesti-
lo. E isso apesar da sua natureza, se tem de ser assim. É verdade que aqui e ali as
circunstâncias intervêm e “tornam num homem” o menino cujos pais falharam
em discipliná-lo, mas isso é uma ajuda casual com que o educa-dor não pode
contar com garantia.
Eu estava começando a ver o meu caminho – todavia, não da dificuldade
psicológica, a qual, até onde eu sabia, bloqueava o caminho a qualquer educação
real; mas agora pude pôr o meu dedo no lugar, e aquilo era algo assim:
A vontade da criança é lamentavelmente débil, mais fraca nas crianças dos
fracos, mais forte nas crianças dos fortes, mas muito dificil-mente contada como
um poder na educação.
A natureza da criança – a sua natureza humana – sendo a soma do que ela
é como um ser humano, e o que ela está no direito do valor do qual ela vem, e o
que ela é como o resultado da sua constituição física e mental – essa natureza é
incalculavelmente forte.

Problema diante do educador
Semelhante problema é dar à criança o controle sobre a sua própria
natureza, habilitá-la a se segurar tanto com relação aos traços que chamamos de
bons quanto com os que chamamos de maus. Um homem naufraga na rocha a
qual ele cresceu pensando ser a sua virtude caracte-rística: a sua magnanimidade,
por exemplo.

A graça divina trabalha sobre as diretrizes do esforço humano
Procurando a solução desse problema, eu não subestimo a graça divina.
Muito pelo contrário. Mas nem sempre nos damos conta do fato de que a graça
divina é exercida sobre as diretrizes do esforço humano ilu-minado; de que, por
exemplo, os pais (que têm problema para entender o que eles devem fazer para
educar o seu filho) merecem, e com certeza conseguem, ajuda de cima; e de que
Rebecca, digamos, não tivesse direito de criar o seu filho para ser “seu pobre
vermezinho, Jacó[69]”, na confiança de que a graça divina, falando
reverentemente, fizesse-o sobreviver. Sendo um homem piedoso, filho de pais
piedosos, ele sobreviveu, mas os seus dias – ele reclama no fim – foram “poucos
e maus”.

A confiança dos pais não tem de ser indiferente
E, de fato, isso é o que muitos pais cristãos esperam: eles deixam uma
criança crescer livre como a amora selvagem, deixando sem controle o que quer
que esteja nela – espinho, flor grosseira, fruta insípida – confian-do, eles lhe
dirão, em que a graça de Deus podará, escavará e sustentará ramos rebeldes que
ficam inclinados. E a sua confiança nem sempre está mal colocada, mas o pobre
homem aguenta a angústia, despedaça-se no processo de recuperação que os seus
pais poderiam lhe ter poupado, se eles tivessem treinado os primeiros rebentos
desenvolvidos pouco a pouco no caráter da criança.
Então, a Natureza, forte como é, não é invencível. E, no seu melhor, não se
deve permitir que a Natureza ande desenfreada. Freios e rédeas, mão e voz,
conseguirão o máximo do empenho dela se o treina-mento dela for feito em
tempo. Mas deixe a Natureza correr selvagem, como os pôneis da floresta: nem
o esporão nem o chicote irão quebrá-la.


4. O HÁBITO PODE SUPLANTAR A “NATUREZA”

“O hábito são dez naturezas.” Se isso é verdade, forte como a natureza
é, o hábito não somente é forte como também dez vezes mais forte. Então aqui
temos um mais forte que a criança, capaz de superar esse forte homem armado.

O hábito se relaciona com as diretrizes da Natureza
Mas o hábito se relaciona com as diretrizes da Natureza: a criança
covarde habitualmente mente de maneira a fugir da culpa; a criança amável tem
uma centena de hábitos afetuosos; a criança afável tem o hábito de dar; a criança
egoísta, o de guardar. Funcionando assim confor-me a natureza, o hábito é
simplesmente a natureza em ação, tornando-se forte pelo exercício.

Mas o hábito pode ser uma alavanca
Mas o hábito, para ser a alavanca para erguer a criança, tem de trabalhar
contra a natureza, ou de qualquer modo independentemente dela.
Claramente, começamos a olhar o funcionamento do hábito sobre essas
diretrizes. Os exemplos se amontoam sobre nós: existem crianças formadas em
hábitos cuidadosos, que nunca sujam as suas roupas; aquelas formadas em
hábitos reservados, que nunca falam do que é feito em casa e respondem
perguntas indiscretas com “Eu não sei.”; existem crianças criadas com hábitos
corteses, que dão caminho aos seus mais velhos com graça gentil, e mais
prontamente para a pobre mulher com a cesta do que para a dama bem vestida; e
existem as crianças formadas com hábitos de má vontade, que nunca oferecem
dar, ir ou fazer.

Uma mãe forma os hábitos dos seus filhos involuntaria-mente
Hábitos como esses – bons, maus ou indiferentes – são naturais às
crianças? Não; mas eles são o que as mães criaram. E na verdade não há nada
que uma mãe não possa educar no seu filho, e dificilmente há uma mãe em
qualquer lugar que não tenha uns dois ou três – ora manias, ora princípios – que
os seus filhos nunca violem. Assim, chega-se a isto: dada uma mãe com visões
liberais sobre o assunto da educação, e ela simples-mente não pode evitar
atribuir as suas próprias visões aos hábitos dos seus filhos; por outro lado, dada
uma mãe cuja pergunta final é “O que as pessoas dirão? O que as pessoas
pensarão? Como vai parecer?”, e as crianças crescem com hábitos de parecer e
não de ser – elas se contentam em parecer bem vestidas, com bons modos e bem-
intencionadas às pessoas de fora, com muito pouco esforço por causa de beleza,
ordem e bondade em casa, e nos olhos de cada um.

O hábito força a Natureza a novos canais
O poder extraordinário do hábito ao forçar a natureza em novos canais
dificilmente exige esclarecimento. Só temos que ver um menino pequeno num
circo, andando sobre dois pôneis sem arreios, com um pé sobre as costas de
cada; ou uma dança encantadora de pantomima no ar; ou um palhaço se
comportando como uma bola de borracha; ou qualquer uma das milhares de
façanhas de habilidade e destreza que pagamos com os nossos xelins para ver –
façanhas mentais bem como corporais, embora, felizmente, essas sejam mais
raras – para ficarmos convencidos de que exatamente qualquer coisa pode ser
conquistada por formação, isto é, pelo cultivo de hábitos persistentes. E o poder
do hábito não é visto nos seres humanos somente. O gato vai em busca da sua
janta sempre na mesma hora e no mesmo lugar, ou seja, se for usual alimentá-lo
em um local. De fato, o hábito do lugar é tanto para o gato, que frequentemente
ele preferirá morrer de fome a renunciar à casa à qual ele está acostumado.
Quanto ao cachorro, ele é ainda mais um “pacote de hábitos” do que o seu
senhor. Espalhe as migalhas de pão para os pardais às nove horas toda manhã, e
às nove horas eles virão para o café da manhã, com ou sem migalhas de pão.
Darwin se inclina a pensar que o terror e a evitação mostrados ao homem pelas
aves selvagens e animais inferiores é simples-mente uma questão de hábito
transmitido. Ele nos conta como ele desem-barcou em certas ilhas do Pacífico
onde as aves nunca viram o homem antes. Elas o encontraram inesperadamente e
voaram sobre ele totalmente sem medo. Para estar mais perto de casa, qual
evidência do senhorio do hábito é mais triste e mais opressiva do que, por
exemplo, os hábitos persistidos do bêbado, a despeito da razão, da consciência,
do propósito, da religião, de todo motivo que deveria influenciar um ser
pensante?

Pais e professores têm de atribuir diretrizes de hábito
Tudo isso não é nada novo. Sempre soubemos que “o uso é a segunda
natureza” e que “o homem é um pacote de hábitos”. Não foi o fato, mas a
aplicação do fato e a fisiologia do hábito que foram ideias novas e valiosas
demais para mim, e espero que possam ser de algum uso para o leitor. Por
exemplo, foi novo para mim perceber que cabe aos pais e aos professores
atribuir diretrizes de hábitos sobre os quais a vida da criança pode ir doravante
com poucos solavancos ou erros e pode avançar na direção certa com o mínimo
de esforço.




5. A COLOCAÇÃO DE DIRETRIZES DE HÁBITO

“Comece e a coisa será terminada!”
É infalivelmente verdadeiro sobre todo hábito mental e moral:
terminada, não nas diretrizes que você prevê e intenciona, mas nas diretrizes
apropriadas e necessárias àquele hábito particular. Na frase “cerebração
inconsciente”, somos levados face a face ao fato de que qual-quer que seja a
semente de pensamento ou sentimento que se implante numa criança – seja pela
herança, seja pela formação inicial –, ela cresce, completa-se e gera segundo a
sua espécie, até como faz um organismo corpóreo. É algo maravilhoso e lindo
perceber uma ideia quando a própria ideia é uma boa – desenvolvendo dentro de
você pela sua própria harmo-nia, encontrar a sua caneta escrevendo frases cuja
sequência lógica lhe apraz, mesmo que na concepção da qual você não tivesse
tomado parte consciente. Quando o escritor experiente “vacila” nesse costume,
ele sabe que até então, no tocante à execução das palavras, ao ordenamento das
ideias, o seu trabalho não precisará de revisão. Isso é tão boa coisa que a
persistente falácia da razão infalível se estabeleceu ali. O filósofo, que sente
prazer ao observar os modos da sua própria mente, é um pensador de altos
pensamentos e está apto a esquecer que o pensamento que polui um homem se
comporta precisamente da mesma maneira que aquele que purifica: tanto um
quanto outro se desenvolve, amadurece e aumenta conforme a sua espécie.

Pensamos conforme estamos acostumados a pensar
Como isso se sustenta no trabalho prático de educar as crianças? Desta
maneira: nós pensamos conforme estamos acostumados a pensar. Ideias vêm,
vão e continuam num tráfego incessante na rotina – vamos chamá-la assim – que
você lhes fez na própria substância do nervo do cérebro. Deliberadamente, você
não intenciona pensar esses pensamentos. De fato, você pode objetar fortemente
à sequência que estão tomando (duas “sequências” de pensamento prosseguindo
a um e mesmo tempo!), e, obje-tando, você pode bloquear o caminho, tolerar o
“Sem Estrada” em letras grandes e compelir a multidão ocupada do mundo
cerebral a tomar uma outra rota. Mas quem é capaz dessas coisas? Não a criança,
imatura na vontade, fraca no poder moral, desacostumada às armas da batalha
espiritual. Ela depende dos seus pais. Cabe a eles iniciar os pensamentos que ela
pensará, os desejos que estimará, os sentimentos que aceitará. Apenas iniciar.
Nada mais lhes é permitido. Mas a partir dessa iniciação resultarão os hábitos de
pensamento e de sentimento que governam o homem, quer dizer, o seu caráter.
Contudo, isso não é supor demais, sendo que, resumindo grosso modo tudo o
que entendemos por hereditariedade, uma criança nasce com o seu futuro nas
suas mãos? Sem dúvida, uma criança nasce com as tendências que devem
formatar o seu futuro, mas toda tendência tem as suas estradas filiais, o seu
efeito bom ou mau. E pôr uma criança na trilha certa para a realização das
possibilidades inerentes a ela é a vocação dos pais.

Direção de diretrizes de hábito
Essa relação do hábito com a vida humana – como os trilhos sobre os
quais corre uma locomotiva – talvez seja a mais sugestiva e útil ao educador,
pois, assim como no geral, é mais fácil para a locomotiva seguir o seu caminho
sobre os trilhos do que uma fugida desastrosa deles, também é mais fácil para a
criança seguir as diretrizes de hábito cuidado-samente definidas do que delas
fugir pondo-se em risco. A consequência é que o fato de colocar diretrizes para o
inexplorado país do futuro da criança é muito sério e de responsabilidade dos
pais. Cabe-lhes considerar bem as trilhas sobre as quais a criança deve viajar
com proveito e prazer, e, ao longo dessas trilhas, pôr diretrizes convidativamente
suaves e fáceis, de maneira que o pequeno viajante vá a elas a toda velocidade
sem parar para considerar se escolherá ou não ir por esse caminho.

Hábito e livre-arbítrio
Mas supondo: que o fazer de uma certa ação – uma ou duas vezes numa
sequência ininterrupta – forme um hábito que seja tão fácil de seguir quanto não;
que persista ainda mais no hábito sem lapsos e se torne uma segunda natureza
bem difícil de se livrar; que continue ainda mais, pelo curso de anos, e o hábito
tenha a força de dez naturezas (você não pode quebrá-lo sem causar-se uma
violência real); que você garanta tudo isso e também que seja possível formar na
criança o hábito de fazer e dizer, até de pensar e sentir, tudo quanto seja
desejável fazer ou dizer, pensar ou sentir – você não tira o livre-arbítrio da
criança, não faz dela um mero autômato por essa cultura excessiva?

O hábito regula noventa e nove por cento dos nossos pensamentos
e atos
Em primeiro lugar, se você escolher ou não ter qualquer dificuldade
sobre a formação dos seus hábitos, é o hábito de todo modo que governará
noventa e nove por cento da vida da criança: ela é o mero autômato que você
descreve. Quanto à criança se tornar a criatura de hábito, não cabe aos pais
determinarem. Todos somos meras criaturas de hábito. Nós pensamos os nossos
pensamentos acostumados, fazemos a nossa pequena conversa usual, damos uma
volta simples – a tarefa comum –, sem realmente qualquer esforço
autodeterminante da vontade. Se não fosse assim – se tivéssemos que pensar,
deliberar sobre cada operação do banho ou da mesa – não valeria a pena ter a
vida. O perpétuo esforço repetido de decisão nos desgastaria. Mas sejamos
agradecidos: a vida não é assim trabalhosa. Para cada cem vezes que agimos ou
pensamos, não é necessário escolher, querer, digamos, mais do que uma vez. As
pequenas emergências que compelem um ato de vontade cairão nas vidas das
crianças tão frequentemente quanto nas nossas. Não podemos preservá-las disso,
nem é desejável que o façamos. O que podemos fazer por elas é assegurar que
elas tenham hábitos os quais as conduzirão a caminhos de ordem, propriedade e
virtude, em vez de deixar a sua roda da vida fazer rotinas feias em lugares
lamacentos.

Hábito: poderoso mesmo com o que a vontade decide
E então, mesmo nas emergências, em cada dificuldade repentina e
tentação que exijam um ato de vontade, ora, a gerência ainda pode fun-cionar
sobre as diretrizes do hábito familiar. O menino que estava acostu-mado a
encontrar tanto proveito quanto prazer nos seus livros, não cai facilmente em
caminhos indolentes por ser atraído por um colega de escola indolente. A menina
que foi cuidadosamente formada para falar a verdade exata simplesmente não
pensa numa mentira como um meio fácil de sair de uma situação crítica, mesmo
que possa ser covarde.
Mas, afinal, essa doutrina do hábito é mais do que um tratamento empírico
dos sintomas da criança? Por que o agir de uma ação ou o pensar de um
pensamento, digamos, um tanto de vezes numa sucessão ininter-rupta, tem
alguma tendência a fazer do agir daquela ação ou do pensar daquele pensamento
uma parte da natureza da criança? Podemos aceitar a doutrina como um ato de fé
que está na experiência, mas, se podemos descobrir a raison d’être[70] dessa
enorme força do hábito, seria possível trabalhar sobre a colocação de hábitos
com propósito e método reais.


6. A FISIOLOGIA DO HÁBITO

Um trabalho do Dr. Carpenter talvez tenha sido o primeiro que me deu a
pista que eu procurava. Em sua Mental Physiology – um livro muito interessante,
a propósito –, ele desenvolve a analogia entre a atividade mental e a física e
mostra que a correspondência realmente é devida a uma correspondência em
causa.

Tecidos crescentes se formam para modos de ação
A doutrina da escola que o Dr. Carpenter representa declarada
resumidamente: os tecidos, como o tecido muscular, por exemplo, subme-tem-se
a gastos e a reparos constantes. Mesmo aqueles modos de ação muscular que
julgamos naturais para nós, como andar e ficar ereto, na realidade são resultados
de uma educação laboriosa, tanto quanto os muitos modos de ação que
conscientemente adquirimos, como escrever ou dançar, mas os modos adquiridos
se tornam perfeitamente fáceis e natu-rais. Por quê? Porque a lei dos tecidos
constantemente crescentes é que eles se formam de acordo com os modos de
ação exigidos deles. Num caso em que o cérebro está repetidamente enviando
aos músculos, sob o controle nervoso conforme estão, a mensagem para ter uma
certa ação feita, aquela ação se torna automática no centro mais baixo, e a
sugestão mais fraca de fora vem produzi-la sem a intervenção do cérebro. Dessa
forma, as juntas e os músculos da mão da criança muito rapidamente se
acomodam ao modo de ação exigido deles ao manter e guiar a caneta. Observe:
não é que a criança aprende com a sua mente a usar a sua caneta, apesar dos seus
músculos, senão que os músculos recentemente crescidos tomam forma de
acordo com a ação exigida deles. E aqui está a explicação de todas as proezas do
saltimbanco que parecem simplesmente impossíveis ao observador destreinado.
Elas lhe são impossíveis, porque as suas juntas e músculos não têm as mesmas
capacidades que foram produzidas no saltimbanco por um processo de formação
inicial.
Portanto, as crianças devem aprender a dançar, nadar etc., numa
idade jovem
Assim como meras atividades corporais. E aqui temos o motivo por que
as crianças devem aprender a dançar, passear, nadar, fazer calistenia, toda forma
de atividade que requer um treinamento dos músculos, numa idade jovem. O fato
é que os músculos e as juntas não têm de meramente se conformar aos novos
usos, mas crescer num padrão modificado. E esse crescimento e adaptação
acontecem com a maior felicidade na juventude inicial. Claro, o homem cujos
músculos mantiveram o hábito de adaptação pega novos jogos, novos exercícios
musculares, sem trabalho muito grande. Mas ensine um lavrador a escrever, e
você vê a enorme dificuldade física que os músculos não acostumados a crescer
têm ao fazê-lo para qualquer novo tipo de esforço. Aqui vemos o quão
importante é ficar de olho nos hábitos de enunciação, nos movimentos da cabeça
e assim por diante, os quais a criança está formando hora a hora. A cotovelada, a
curvatura, a afirmação indistinta não são um mero truque a ser deixado a bel-
prazer “quando ela estiver mais velha e souber melhor”, porém estão o tempo
todo crescendo nela, tornando-se uma parte de si mesma, porque está regis-trado
na própria substância da sua medula espinhal. A parte do seu sistema nervoso
onde a consciência reside (o cérebro) há muito tempo deu uma ordem
permanente, e estas são as complicações da administração: lembrar a ordem
significaria a absoluta reconstrução das partes envol-vidas. E para corrigir maus
hábitos de fala, por exemplo, não será suficiente que a criança pretenda e tente
falar claramente. Ela não será capaz de agir assim habitualmente até que algum
grau de novo cresci-mento tenha acontecido nos órgãos da voz, enquanto ela
esteja fazendo esforços para formar o novo hábito.

Hábitos morais e mentais deixam a sua marca sobre tecidos físicos
Mas praticamente todos sabem que o corpo, e toda parte do corpo,
acomoda-se muito prontamente aos usos a que é colocado. Nós sabemos que, se
uma criança se acostuma a ficar sobre um pé, empurrado assim um ombro, o
hábito provavelmente terminará na curvatura da espinha. Per-mitir ombros
inclinados, consequentemente peito contraído, é preparar o caminho para uma
doença no pulmão. As consequências físicas desse tipo de hábito são tão
evidentes que não podemos ficar cegos com relação à causa e ao efeito. O que
estamos menos preparados para admitir é que os hábitos que não parecem estar
em qualquer sentido físico – um hábito impertinente, verdadeiro ou ordenado –
também devem deixar a sua marca sobre um tecido físico, e que a enorme força
do hábito provavel-mente é devida a esse efeito físico. Entretanto, quando
consideramos que o cérebro, o cérebro físico, é o órgão, delicado demais, por
meio do qual nós pensamos, sentimos, desejamos, amamos, odiamos e
adoramos, não é surpreendente que esse órgão seja modificado pelo trabalho que
tem a fazer. Para pôr o assunto pitorescamente, é como se toda sequência de
pensamentos familiares fizesse uma rotina na substância nervosa do cérebro
dentro da qual os pensamentos correm levemente por vontade sua e fora da qual
eles só podem ser pegos por um esforço da vontade.

Sequências de pensamentos persistentes
Assim, a patroa da casa sabe que, quando os seus pensamentos estão
livres para tomar o seu próprio curso, eles correm aos cuidados da casa ou da
despensa, ao jantar de amanhã ou ao vestuário de inverno. Ou seja, o
pensamento corre à rotina que foi, por assim dizer, usada para ele por repetição
constante. Os pensamentos da mãe correm aos seus filhos, os do pintor às
pinturas, os do poeta aos poemas. Aqueles do chefe ansioso da casa aos cuidados
do dinheiro, talvez, até em tempos de pressão atípica, os pensamentos batem,
batem, batem naquela rotina bem gasta de caminhos e meios e recusam correr
em qualquer outro canal, até que o pobre homem perca a sua razão,
simplesmente porque ele não pode tirar os seus pensamentos daquele canal feito
na substância do seu cérebro. E, de fato, “a loucura permanece daquela forma”
para todos nós, no ataque persis-tente de qualquer sequência de pensamentos
sobre o tecido cerebral. Orgulho, ressentimento, ciúme, uma invenção sobre a
qual um homem trabalhou, uma opinião que ele concebeu, qualquer sequência
de pensa-mentos que ele não tenha mais o poder de redirecionar, colocarão em
perigo a sua sanidade.

Regeneração incessante do tecido cerebral
Se nós amamos, odiamos, pensamos, sentimos, adoramos, às custas do
esforço físico real da parte do cérebro e da consequente perda de tecido, quão
enorme tem de ser o trabalho daquele órgão com o qual nós de fato fazemos
tudo, mesmo muitos daqueles atos cuja execução final cai para as mãos ou pés!
É verdade. E para reparar esse gasto excessivo, o cérebro consome a maior parte
da nutrição fornecida para o corpo. Como já vimos, um sexto ou um quinto de
todo o sangue no corpo vai reparar o gasto na casa do rei. Em outras palavras,
um novo tecido cerebral está sendo constantemente formado a uma velocidade
surpreendente: pergun-ta-se em que idade a criança não tem mais qualquer parte
daquele cérebro com o qual nasceu.
O novo tecido repete o antigo, mas não muito exatamente, assim como um
novo crescimento muscular se adapta a qualquer exercício exigido dele. Então o
novo tecido cerebral deve “crescer” para qualquer hábito de pensamento à força
durante o tempo de crescimento – “pensamento” aqui incluindo, claro, todo
exercício de mente e de alma. “O cérebro do homem cresce aos modos de
pensamento nos quais ele está habitualmente exercitado”, diz um hábil
fisiologista. Ou nas palavras do Dr. Carpenter: “Qualquer sequência de ação
mental que foi frequente-mente repetida tende a se perpetuar, de sorte que nos
vemos automatica-mente prontos a pensar, sentir ou agir, sob circunstâncias
semelhantes, sem qualquer propósito conscientemente formado ou antecipação
de resultados. Pois não há razão para considerar o cérebro como uma exceção ao
princípio geral de que, enquanto cada parte do organismo tende a se formar de
acordo com o modo no qual é habitualmente exercitada, essa tendência será
particularmente forte no aparato nervoso, em virtude daquela regeneração
incessante que é a própria condição da sua atividade funcional. De fato, ele mal
admite a dúvida de que todo estado de consciência ideacional que é muito forte
ou habitualmente repetido deixa uma impressão orgânica sobre o cérebro.
Portanto, o mesmo estado pode ser reproduzido em qualquer tempo futuro em
correspondência a uma sugestão ajustada para estimulá-lo.”

Ações reflexas artificiais podem ser adquiridas
Ou para usar a maneira de Huxley de colocar o caso:
“Pela ajuda do cérebro, podemos adquirir uma infinidade de ações reflexas
artificiais, quer dizer, uma ação pode exigir toda a nossa atenção e toda a nossa
volição pela sua primeira, segunda ou terceira realização, mas, por repetição
frequente, ela se torna, de uma maneira, parte da nossa organização e é
realização sem volição ou mesmo consciência.
“Como todos sabem, um soldado leva muito tempo para aprender o seu
treino – por exemplo, colocar-se na atitude de ‘atenção’ no instante em que a
palavra de comando é ouvida. Mas após um tempo o som da palavra dá
surgimento ao ato, quer o soldado esteja pensando nela, quer não. Ainda que não
possa ser verdadeira, há uma história suficientemente confiável de um
brincalhão prático que, vendo um veterano exonerado levando a sua janta para
casa, de repente gritou “Atenção!”, ao que o homem instantaneamente abaixou
as suas mãos e perdeu a sua carne de carneiro e batatas na sarjeta. O treino fora
total e os seus efeitos se incor-poraram na estrutura nervosa do homem.
A possibilidade de toda educação (da qual a repetição militar é somente
uma forma particular) é baseada na existência dessa capacidade que o sistema
nervoso possui de organizar ações conscientes em mais ou menos inconscientes,
ou em reflexos, operações. Pode-se colocar como uma regra: se dois estados
mentais forem chamados juntos, ou em sucessão, com a devida frequência e
vivacidade, a produção subsequente de um deles será suficiente para chamar o
outro, e isso quer desejemos, quer não.”

Educação intelectual e moral
“O objetivo da educação intelectual é criar tais associações indis-
solúveis das nossas ideias das coisas, na ordem e relação que elas ocorrem na
natureza. O objetivo de uma educação moral é unir fixamente as ideias de feitos
maus com as de dor e degradação e de ações boas com as de prazer e nobreza.”
Mas é a interligação íntima da mente e da matéria o mais direta-mente
importante ao educador: a ideia de que pusemos amplamente sob a figura de
uma rotina (de forma alguma apurada cientificamente). Dado que a direção
constante dos pensamentos produz um certo conjunto nos tecidos do cérebro,
esse conjunto é o primeiro traço da rotina ou caminho, uma linha de menor
resistência, ao longo da qual a mesma impressão, feita uma outra vez, achará
mais fácil viajar do que tomar um outro caminho. Então surge uma prioridade
para qualquer dado hábito de ação ou pensamento.




O caráter afetado pela modificação do tecido cerebral
Qual a consequência? Ora, que a conformação real do cérebro da
criança depende dos hábitos que os pais permitem ou estimulam; e que os
hábitos da criança produzem o caráter do homem, porque, estabelecidos certos
hábitos mentais, a sua natureza é continuar para sempre a menos que sejam
substituídos por outros hábitos. Aqui está um fim para a filosofia fácil do “Isso
não importa.”, “Oh, ela superará isso.”, “Ela saberá melhor pouco a pouco.”,
“Ela é tão jovem. O que podemos esperar?” e assim por diante. Todo dia, toda
hora, os pais estão passiva ou ativamente for-mando aqueles hábitos nas crianças
dos quais, acima de qualquer coisa, o caráter futuro e a conduta dependem.

Influência externa
E aqui vem a consideração da influência externa. Em nove de dez vezes,
começamos a fazer uma coisa porque vemos alguém fazer isso. Continuamos a
fazer isso, e aí está o hábito! Se nos é tão fácil começar um hábito novo, é dez
vezes mais fácil para as crianças. E essa é a dificuldade real na questão da
educação do hábito. É necessário que a mãe esteja sempre alerta para ir rápido
ao mau hábito que os seus filhos podem emprestar dos empregados ou de outras
crianças.


7. A FORMAÇÃO DE UM HÁBITO – “FECHE A PORTA
ATRÁS DE VOCÊ”

“Faça a próxima coisa.”

“Perca esse dia vadiando, e será a mesma história
Amanhã; e a próxima, mais retardia:
A indecisão traz os seus próprios atrasos,
E os dias estão perdidos, lamentando sobre dias perdidos.”





“Lose this day loitering, and ‘twill be the same story
To-morrow; and the next, more dilatory:
The indecision brings its own delays,
And days are lost, lamenting o’er lost days,”

diz Marlowe[71], que, como muitos de nós, conheceu a miséria da indolência
intelectual que não pode dar-se firmeza para “Faça a próxima coisa.” Nenhuma
questão que diga respeito à educação de criança pode, concebi-velmente, ser
trivial, mas essa, de demora, é muito importante. Vimos que o esforço de decisão
é o maior esforço da vida. Não o agir da coisa, mas o construir a mente com
relação a que coisa fazer primeiro. É comumente esse tipo de indolência mental,
nascida da indecisão, que leva a hábitos ociosos. Como a criança lenta deve ser
curada? Com o tempo? Ela saberá melhor quando ficar mais velha? Nada disso.
“E a próxima, mais demo-rada” será a história dos seus dias, exceto por
vigorosos esforços ocasio-nais. Punições? Não. A sua pessoa retardia é uma
fatalista. “O que não pode ser curado tem de ser suportado.”, ela diz, mas ela
suportará sem qualquer esforço para curar. Recompensa? Não. Para ela, a
recompensa é uma punição apresentada sob um outro aspecto: a possível
recompensa que percebe como real. Aí está, dentro da sua compreensão, por
assim dizer. Ao renunciar a recompensa, ela é punida. E suporta a punição. O
que sobra para ser experimentado quando nem o tempo, nem a recom-pensa,
nem a punição é efetiva? Aquela panaceia: “Um costume supera outro.” Essa
lentidão arraigada é um hábito a ser suplantado somente pelo hábito contrário, e
a mãe tem de se devotar, por algumas semanas, a essa cura tão constante e
incansavelmente quanto ela se devotaria ao cuidado da sua criança toda com
sarampo. Tendo apontado em algumas palavras sérias – quanto menos, melhor –
as misérias que têm de surgir dessa falta, e o dever de superá-la, e tendo assim
conseguido a vontade (tristemente débil) da criança no lado do agir certo, ela
simplesmente vê que, por semanas juntas, a falta não torna a suceder. A criança
vai se vestir para uma caminhada. Ela sonha com a atadura das suas botas – a
etiqueta nos seus dedos posta no ar médio –, mas a sua consciência está desperta.
Mas está constrangida a olhar para cima, e o olho da sua mãe está sobre ela,
esperançoso e expectante. Responde à rédea e continua. No meio do cami-nho,
na atadura da segunda bota, há uma outra pausa, mais curta dessa vez.
Novamente, ela olha para cima e de novo continua. As pausas se tornam
menores dia a dia, os esforços mais constantes, a vontade do jovem imaturo está
sendo fortificada, o hábito da ação pronta adquirido. Após aquela primeira
conversa, a mãe faria bem se contivesse mais uma palavra sobre o assunto. O
olho (expectante, não repreensivo), e onde a criança está longe num sonho, o
toque mais leve possível, são os únicos instrumentos efetivos. Pouco a pouco,
– Você acha que pode ficar pronto em cinco minutos hoje sem mim?
– Oh, sim, mãe.
– Não diga ‘sim’ a menos que você esteja bem certo.
– Eu tentarei.
E ela tenta e tem êxito. Agora, a mãe ficará tentada a relaxar os seus
esforços: negligenciar uma pequena indolência porque a sua querida criança tem
tentado muito duramente. Isso é absolutamente fatal. O fato é que o hábito
indolente fez um registro apreciável na própria substância do cérebro da criança.
Durante as semanas de cura, um novo crescimento es-tava obstruindo a velha
trilha, e a trilha de um novo hábito estava sendo formada. Permitir qualquer
reversão ao velho mau hábito é largar todo esse ganho. Formar um bom hábito é
o trabalho de algumas semanas. Guardá-lo é um trabalho incessante, mas de
forma alguma um cuidado ansioso. Mais uma palavra: a ação pronta da parte da
criança deve ter a recompensa de lazer absoluto, tempo para fazer exatamente
como lhe agrada, não garantido como um favor, mas decorrente (sem quaisquer
palavras) como um direito.

Hábito: um deleite em si mesmo
À exceção dessa desvantagem, a formação de hábitos nas crianças não é
tarefa trabalhosa, pois a recompensa vai de mãos dadas com o trabalho. Tanto
que é como colocar um centavo com a certeza do retorno imediato de um real[72].
Pois o hábito é um deleite em si mesmo. A pobre natureza humana tem ciência
da facilidade que é repetir a ação de qualquer coisa sem esforço. Logo, a
formação de um hábito, o sentido de esforço gradualmente reduzido num dado
ato, é prazeroso. Às vezes, nisso, as mães dão com os burros n’água: elas perdem
de vista o fato de que um hábito, mesmo um bom hábito, torna-se um prazer real.
E, quando a crian-ça realmente formou o hábito de fazer uma certa coisa, a sua
mãe imagina que o esforço lhe é tão grande quanto o primeiro, que é virtude nela
continuar fazendo esse esforço, e que ela merece, por recompensa, um pequeno
relaxamento. Ela lhe permitirá conseguir o novo hábito apesar das dificuldades
algumas vezes, e então continuar de novo. Mas não está continuando. Está
começando de novo, e começando em face dos obstá-culos. O “pequeno
relaxamento” que ela permitiu à criança significou a formação de um outro
hábito contrário, que tem de ser superado antes que a criança volte aonde estava
antes.
Na verdade, essa simpatia equivocada por parte das mães é a única coisa
que torna isso um empreendimento trabalhoso para formar uma criança nos bons
hábitos, pois é a natureza da criança ganhar hábitos tão agradavelmente quanto o
bebê ganha o leite da sua mãe.

Tato, vigilância e persistência
Por exemplo, para escolher um hábito de consequência não muito
grande, exceto como uma questão de consideração para outros: a mãe deseja que
o seu filho adquira o hábito de fechar a porta atrás de si quando ele entra ou
deixa um cômodo. Tato, vigilância e persistência são as qualidades que ela tem
de cultivar em si mesma. E, com esses, ela se espantará com a prontidão com
que a criança assimila o novo hábito.

Estágios na formação de um hábito
Ela diz, numa voz brilhante, amigável:
– Johnny, quero que você se lembre de algo com toda a sua força: nunca
entre ou saia de uma sala onde alguém esteja sentado sem fechar a porta.
– Mas se eu esquecer, mãe?
– Eu tentarei lembrá-lo.
– Mas talvez esteja com muita pressa.
– Você sempre tem de ter tempo para fazer isso.
– Mas por quê, mãe?
– Porque não é educado com as pessoas na sala deixá-las
desconfortáveis.
– Mas se eu sair de novo naquele mesmo minuto?
– Ainda assim, feche a porta, quando entrar. Você pode abri-la de novo
para sair. Você acha que pode se lembrar?
– Eu tentarei, mãe.
– Muito bem. Eu verei quantos poucos ‘esqueci’ você comete.
Por duas ou três vezes, o Johnny se lembra. E então ele sai como um tiro.
Na metade da escada, antes que a sua mãe tenha tempo de chamá-lo de volta, ela
não grita “Johnny, volte e feche a porta!” porque sabe que uma convocação
desse tipo é exasperadora para mais ou para menos. Ela vai à porta e chama
agradavelmente “Johnny!”, que esqueceu tudo sobre a porta. Ele se pergunta o
que a sua mãe quer, e, agitado pela curiosidade, volta, encontra-a sentada e
aplicada como antes. Ela olha para cima, lança um olhar para a porta e diz: “Eu
disse que tentaria lembrá-lo.”. “Oh, eu esqueci.”, diz o Johnny, considerando a
sua honra. E ele fecha a porta naquela vez, e na próxima, e na próxima.
Mas o sujeitinho realmente não tem muita força para lembrar, e a mãe terá
que adotar muitos artifícios pequenos para lembrá-lo. Mas ela tomará cuidado
com duas coisas: que ele nunca escape sem fechar a porta e que ela nunca deixe
o assunto ser uma causa de atrito entre ela e a criança, tomando a linha do seu
aliado amigavelmente para ajudá-lo con-tra aquela sua má memória. Pouco a
pouco, digamos, depois de fechar vinte vezes a porta sem nenhuma omissão, o
hábito começa a ser formado. O Johnny fecha a porta de verdade. E com prazer a
sua mãe assiste a ela entrar na sala, fechar a porta, tirar algo da mesa e sair,
fechando a porta de novo.

O estágio perigoso
Agora que o Johnny sempre fecha a porta, a alegria e o triunfo da sua
mãe começam a ser misturados com piedade irracional. Ela diz para si mesma:
“Pobre criança, é muito bom da parte dele tomar tanta dor por uma coisa
pequena, só porque ele se oferece!” Ela pensa que o tempo todo a criança está
fazendo um esforço para o seu bem, perdendo de vista o fato de que o hábito se
tornou fácil e natural e de que, com efeito, o Johnny fecha a porta sem saber que
ele age assim. Agora vem o momento crítico. Algum dia, o Johnny é tomado
com algum novo prazer de modo que o hábito, ainda não formado inteiramente,
perde a sua forte influência. E ele está na metade da escada antes de pensar na
porta. Então, ele pensa mesmo nisso, com uma picada de consciência forte o
bastante, não para enviá-lo de volta, mas para fazê-lo parar um momento para
ver se a sua mãe o chamará de volta. Ela notou a omissão e está dizendo para si
mesma: “Pobre garotinho, ele foi tão bom com isso todo esse tempo. Eu o
liberarei dessa vez.” Do lado de fora, ele falha em ouvir, digamos, o chamado da
sua mãe a ele mesmo – frase fatal! –, “Oh, não importa.”, e passa rápido.
Na próxima vez, ele deixa a porta aberta, mas não é um “esqueci”. A sua
mãe o chama de volta de um modo um pouco fraco. O seu ouvido sagaz capta a
fraqueza do seu tom, e, sem voltar, ele grita: “Oh, mãe, estou com tanta pressa.”,
e ela não diz mais nada, e o libera. Novamente ele se apressa, deixando a porta
muito aberta. “Johnny!”, numa voz de alerta. “Vou sair de novo num minuto,
mãe.” E, após dez minutos vasculhando, ele sai mesmo, esquecendo-se de fechar
a porta. E a facilidade mal calculada da mãe perdeu cada pé no chão que tinha
ganhado.


8. “HÁBITOS” INFANTIS

Todo o grupo de hábitos, metade físicos e metade morais, dos quais
dependem a propriedade e o conforto da vida diária, é recebido passiva-mente
pela criança, isto é, ela faz muito pouco para formar esses hábitos por si mesma,
mas o seu cérebro recebe impressões daquilo que ela vê sobre ela. E tais
impressões tomam forma como os seus próprios hábitos muito fortes e mais
duradouros.

Alguns ramos da educação infantil
Limpeza, ordem, capricho, regularidade, pontualidade, são todos
“ramos” da educação infantil. Devem estar em torno da criança como o ar que
respira, e ela os assumirá como que inconscientemente. Nem é preciso dizer uma
palavra sobre a necessidade de limpeza delicada no quarto de crianças. Os bebês
têm a sua porção de banho e lavar-se ilimitadamente é feito por conta deles.
Mas, de fato, escrupulosas como são as mães da classe culta, uma grande
quantidade fica com as cuidadoras, e é preciso muita vigilância para assegurar
que não haverá o menor odor em torno do bebê ou qualquer pertence seu, e que
as cuidadoras sejam mantidas cheirosas e inteiramente arejadas. Uma grande
dificuldade é que ainda existem algumas cuidadoras pertencentes a uma classe à
qual uma janela aberta é uma abominação. E uma outra dificuldade é que nem
todas sabem o significado dos odores: elas não podem ver “um cheiro”, conse-
quentemente não é fácil persuadi-las de que um cheiro é um problema –
partículas microscópicas que a criança recebe com toda respiração que faz.

Um nariz sensitivo
A propósito, uma coisa muito importante sobre a educação física para
uma criança é treinar nela um nariz sensitivo: narinas que farejam o menor “ar
parado” numa sala ou o menor odor ligado a roupas ou móveis. Parece que o
sentido do olfato nos foi dado não somente como uma possibilidade de prazer,
mas como um tipo de sinal de perigo para nos alertar da presença de matéria
nociva. Entretanto, muitas pessoas parecem atravessar o mundo todo sem um
nariz mesmo. E o fato tende a mostrar que uma percepção rápida de olfato é uma
questão de educação e hábito. O hábito é facilmente formado. Estimule as
crianças a notarem se a sala onde entram “cheira” muito fresco quando saem do
ar aberto, a observar a diferença entre o ar da cidade e o ar mais fresco mais
longe. E treine-as para perceber o menor traço de odores agradáveis ou
inofensivos.

O bebê é onipresente
Retornando ao cuidado. Seria uma grande coisa se a cuidadora pudesse
ser impressionada com a noção de que o bebê é onipresente e de que ele não só
vê e sabe tudo, como também manterá, por toda a sua vida, a marca de tudo o
que ele vê:

“Se há um buraco em todos os seus casacos,
Eu lhe aconselho que o observe;
Uma criança está no meio das suas anotações,
E, fé, ela imprimirá isso:”


“If there’s a hole in a’ your coats,
I pray ye, tent it;
A chiel’s amang ye taking’ notes,
And, faith, he’ll prent it[73]:”

“Imprima-o” no seu próprio cérebro, à guisa de um tipo para os seus
hábitos futuros. Essa noção por parte da cuidadora pode fazer algo para
assegurar a limpeza que vai além do avental limpo. Um ou dois pedacinhos de
ordem que a cuidadora afeta não devem ser elogiados pela limpeza: o fazer a
cama para o cuidado cedo de manhã e o dobrar as roupas das crianças quando
elas as tiram à noite. É bom traçar uma linha para o cuidado do dia à noite,
suspender as roupinhas fora para um arejamento, livrar-se da transpiração
insensível com que se encheram durante o dia. Pela mesma razão, as camas e as
roupas de cama devem ser viradas ao ar por algumas horas antes que estejam
prontas.

Limpeza pessoal como um hábito inicial
Se houver uma, a mesa de cuidado deve ser mantida tão escrupulo-
samente boa quanto a da sala de jantar. A criança que se senta a uma toalha de
mesa amassada e manchada, ou que usa uma colher de metal descolorida, está
degradada por tanto. As crianças também devem ser estimuladas a uma boa
limpeza das suas próprias pessoas. Todos vimos a mão de bebê elegante
alongada para ser lavada. Ela teve um borrão e a criança não gosta disso. Que
eles possam ser tão particulares quando forem grandes o bastante para lavarem
as suas próprias mãos! Não que devam estar sempre limpas e apresentáveis. As
crianças adoram “enrolar” e devem ter grandes aventais para o propósito. Elas
são todas como aquele pequeno príncipe francês que menosprezou os seus
presentes de aniver-sário e tentou duramente que fosse permitido fazer queridas
tortas de lama com o menino na sarjeta. Deixe-as fazer as suas tortas de lama
livremente, mas que sejam ávidas para remover todo traço de sujeira e que o
façam por si mesmas. Pode-se ensinar às crianças novas a tomar cuidado com as
suas unhas e a limpar os cantos dos olhos e orelhas. Quanto a se sentar à mesa
com mãos não lavadas e cabelo despenteado, com certeza nenhuma criança
decente pode fazer isso. As crianças devem receber cedo os seus próprios
materiais de limpeza, acostumar-se a ter prazer real no banho e se cuidar. Não há
razão por que uma criança de cinco ou seis anos não deva ficar totalmente limpa
sem toda aquela tortura da sopa nos olhos, puxada geral e empurrão que as
crianças odeiam. Não é de admirar. Além do mais, a criança não tem o hábito do
banho diário até que ela possa fazê-lo por si mesma. E é importante que esse
hábito seja formado antes que a era negligente da vida escolar comece.

Modéstia e pureza
As operações do banho proporcionam à mãe oportunidades para dar o
ensino e a formação necessários aos hábitos da decência e de um senso de
modéstia. Deixar a sua jovem criança viver e crescer na simplicidade à Éden
talvez seja o curso mais tentador e natural para a mãe. Mas, ai! Nós não vivemos
no Jardim, e quiçá seja bom que a criança seja formada desde o início até as
condições sob as quais ela deve viver. Para a criança mais nova, assim como
para os nossos primeiros pais, há aquilo que é proibido. Na idade da obediência
total, faça-a saber que não é todo o seu corpo que Deus Todo-Poderoso lhe
permite falar, pensar, exibir, manusear, salvo para fins de limpeza. Isso será mais
fácil para a mãe se esta falar do coração, pulmões etc, que também não devemos
olhar ou manusear, mas que foram tão fechados nas paredes de carne e osso que
não podemos chegar a eles. Aquilo que nos é deixado aberto é deixado assim
como um teste de obediência, de maneira semelhante àquela árvore no Jardim do
Éden. E num e noutro caso, a desobediência é tratada com certa perda e ruína.

O hábito da obediência e o sentido da honra
O sentido de proibição, do pecado em desobediência, será uma
maravilhosa salvaguarda contra o conhecimento do mal para a criança criada nos
hábitos da obediência. E ainda mais efetivo será o sentido de honra, de um
encargo a manter – o motivo das injunções apostólicas sobre esse assunto. Que a
mãe renove esse encargo com fervor, digamos, na véspera de cada aniversário,
fazendo a criança sentir que, por obediência nesse assunto, ela pode glorificar a
Deus com o seu corpo. Faça-a vigiar contra toda abordagem do mal. E faça-a
rezar diariamente para que cada um dos seus filhos possa ser mantido na pureza
por aquele dia. Ignorar as possibilidades do mal nessa condição é expor a criança
a riscos terríveis. Ao mesmo tempo, seja lembrado que aquelas palavras que se
destinavam a impedir possam elas mesmas ser a causa do mal, e que uma vida
cheia de interesses e atividades saudáveis está entre as medidas preventivas mais
seguras da depravação secreta.

Ordem essencial
O que foi dito sobre limpeza se aplica também à ordem: ordem no
cuidado e hábitos ordenados no quarto de crianças. Uma coisa sob essa frente: o
quarto de crianças não deve ser o hospital para os deficientes ou receber a
mobília desgastada da casa. Copos rachados, pratos quebrados, jarros e bules de
chá com canos fraturados devem ser banidos. A criança deve ser educada para
pensar que, uma vez que um artigo fique feio por causa de sujeira ou fratura, ele
está estragado e tem de ser substituído. E essa regra se provará realmente
econômica, pois, quando as crianças e os empregados descobrirem que as coisas
não “servem” mais após algum dano descuidado, eles aprendem a ser
cuidadosos. Mas, em todo caso, crescer usando recursos imperfeitos e disformes
é um detrimento real para as crianças.
O prazer que as pessoas adultas têm ao esperar as crianças é realmente
uma fonte proveitosa de travessura. Por exemplo, nesse assunto de hábitos
ordenados: quem não conhece o lixo que as crianças deixam para ser limpo
depois delas uma dúzia de vezes ao dia, no quarto de criança, jardim, sala de
desenho, onde quer que os seus pezinhos inquietos as carreguem? Somos um
pouco sentimentais sobre brinquedos espalhados e ramos de flores desbotados, e
todos os sinais da presença de crianças. Mas o fato é que o hábito sem lei da
dispersão não deve ser permitido que aumente nas crianças. Todos condenam a
mãe de uma família cujas gavetas sejam caóticas, cujas posses estejam jogadas
sem cuidado. Mas pelo menos parte da culpa deve ser transferida à sua mãe. Não
é como uma mulher que apreendeu um hábito miserável que destrói o conforto,
se não a felicidade, da sua casa. Permitiu-se que o hábito da desordem crescesse
nela desde criança e a sua parcela de culpa é a falha dela em curar-se.

A criança de um casal deve guardar os seus brinquedos
A criança de um casal deve ser ensinada a pegar e repor os seus
brinquedos. Comece cedo. Faça que lhe seja um prazer, parte da sua brincadeira,
abrir o seu armário e pôr de volta a boneca ou o cavalo, cada um no seu lugar.
Faça que ela sempre guarde as suas coisas por rotina, e é tão surpreendente o
quão rápido um hábito de ordem é formado, que tornará agradável à criança
guardar os seus brinquedos, estimulando-a a ver coisas no lugar errado. Mais
dores serão tomadas para cultivar esse hábito importante se os pais somente
virem a moralidade da ordem – essa ordem no quarto de bebê se torna
escrupulosidade na vida adulta, e a educação necessária para formar o hábito não
é relativamente mais do que um tique-taque ocasional do relógio, que marca o
tempo passado por conta própria e sem problemas.

Esmero, aparentado da ordem
O esmero é parente da ordem, mas não é bem a mesma coisa. Ele
implica não somente “um lugar para tudo e tudo no seu lugar”, mas também tudo
num lugar apropriado de modo a produzir um bom efeito. De fato, o gosto entra
em cena. A garotinha não tem de somente pôr as suas flores na água, mas
arranjá-las de bom modo, e não tem de se desanimar com alguma caneca ou
jarro rude de cozinha, ou algum vaso rosa horrível, mas tem de ter um jarro ou
um vaso gracioso na forma e harmonioso na cor, embora seja apenas uma
bobagem barata. Da mesma forma, tudo no quarto de bebê deve ser “esmerado”,
isto é, agradável e ajustado. E as crianças devem ser estimuladas a fazer arranjos
esmerados e efetivos nas suas próprias pequenas propriedades. Nada grosseiro
na letra de forma, no livro de imagens ou no brinquedo deve ser admitido. Nada
para viciar o gosto de uma criança ou introduzir um peso de coisa comum na sua
natureza. Por outro lado, seria difícil estimar a influência de polidez, de
elevação, de uma ou duas obras de arte bem escolhidas, por mais que sejam uma
reprodução barata.

Regularidade
A importância da regularidade na educação infantil é começar a ser bem
geralmente reconhecido. A despeito dos seus choros, a jovem mãe sabe que ela
tem de pôr o seu bebê na cama na hora devida, ainda que ela o deixe chorar duas
ou três vezes, a fim de que, para o resto da sua vida de bebê, ele possa pôr-se a
dormir docemente no escuro sem protesto. Mas um bom tanto de absurdo é
falado sobre o motivo dos choros da criança: supõe-se que ela quer a sua mãe, ou
a sua cuidadora, ou a sua garrafa, ou a luz, e ser “um sujeitinho conhecedor”,
conforme a sua cuidadora, do fato de que, se ela chorar por essas coisas, ela os
obterá.



Hábitos de tempo e lugar
O fato é: a criança já formou um hábito de vigília ou de alimen-tação
em horas impróprias e fica tão intranquila nos seus hábitos sendo quebrados
como um gato numa mudança de habitação. Quando ela se submete alegremente
à nova regulação, é porque o novo hábito está formado, e é, por seu turno, a
fonte de satisfação. De acordo com o Dr. Carpenter, “A regularidade deve
começar ainda na vida infantil, com relação aos momentos de alimentar,
repousar etc. O hábito corporal assim formado ajuda grandemente a formatar o
hábito mental num período posterior. Por outro lado, nada tende mais a gerar um
hábito de auto-indulgência do que alimentar uma criança simplesmente porque
ela chora. É maravilhoso o quão cedo as ações de uma criança nova (como os
filhotes de cachorro ou cavalo) harmonizam-se com a ‘formação’ sistemática
judi-ciosamente exercitada.” O hábito da regularidade é tão atrativo às crian-ças
mais velhas quanto às mais novas. Quando o programa usual falha, os dias são,
nós sabemos, os dias quando as crianças estão prontas para serem malcriadas.


9. EXERCÍCIOS FÍSICOS

Importância do cotidiano
O assunto do treinamento natural dos olhos e músculos foi tomado bem
completamente no tratamento da “Vida Fora de Casa”. Eu apenas acrescentarei
que, para dar prazer à criança com movimento leve e fácil – a espécie de deleite
no manuseio do seu próprio corpo que um bom cavaleiro encontra ao manejar o
seu cavalo –, dança, repetição, calistenia, algum tipo de exercício físico
judicioso, devem fazer parte da rotina de todo dia. A repetição sueca é
particularmente valiosa, e muitos exercícios são bem apropriados para a pré-
escola. Certas qualidades morais entram em cena com movimentos de alerta,
atenção olho a olho, respostas prontas e inteligentes, mas frequentemente
acontece que boas crianças falham nesses pontos por carência de treinamento
físico.



Exercício repetitivo das boas maneiras
Faça-as passar pela repetição das boas maneiras. Deixe-as ensaiar
ceninhas na brincadeira: Mary, a senhora que está perguntando o caminho para o
mercado. Harry, o menino que a encaminha, e assim por diante. Faça-as passar
por uma repetição de posição: olhos direitos, mãos paradas, cabeças para cima.
Elas inventarão centenas de situações e o comporta-mento adequado para cada, e
terão em grande conta dicas lançadas para a sua orientação. Mas essa espécie de
repetição deve ser tentada enquanto as crianças são jovens, antes que a tirania da
mauvaise honte[74] se estabe-leça. Estimule-as a admirar, a ter orgulho de leves
movimentos saltitantes e a se afastar de uma maneira de andar pesada e de ação
grosseira dos membros.

Treinamento do ouvido e da voz
O treinamento do ouvido e da voz é uma parte importante demais da
cultura física. Faça as crianças repetirem sons vocais puros, na enun-ciação de
consoantes finais. Não as deixe falar “andano e falano”, “di-ia bo-om”, “me-ni-
nos le-gais”[75]. Faça com que elas pronunciem palavras difíceis –
“imperturbabilidade”, “ipecacuanha”, “antananarivo” – com precisão afiada após
uma simples ouvida, ao produzir diversos sons de cada vogal e os das consoantes
sem as vogais anexas. Ensinado oralmente, o francês é valioso demais para
proporcionar um treinamento tanto para o ouvido quanto para a voz.

O hábito da música
Quanto ao treinamento musical, seria difícil dizer o quanto isso passa
pelo gosto musical herdado e a habilidade é o resultado da oitiva e produção de
sons musicais constantes, do hábito da música, com que cresce a criança de
pessoas musicais. O Sr. Hullah afirmava que a arte de cantar é inteiramente um
hábito treinado, que toda criança pode ser, e deve ser, formada para cantar.
Claro, o hábito transmitido deve ser levado em conta. É uma pena que a
formação musical que a maioria das crianças tem é de caráter aleatório, que elas
não sejam formadas, por exemplo, por exercícios de ouvido e de voz
cuidadosamente ordenados, para produzir e distinguir tons e intervalos musicais.

Deixe as crianças sozinhas
Concluindo, deixe-me dizer que a educação do hábito é bem-sucedida à
medida que permite que a mãe deixe os seus filhos sozinhos, não os
importunando com comandos e direções perpétuos – um incêndio de “Faça” e
“Não Faça” –, mas deixando-os seguirem o seu próprio caminho e crescerem,
tendo primeiro assegurado que eles irão pelo caminho certo e crescerão com
objetivos proveitosos. É verdade que o jardineiro “escava e aduba”, poda e treina
a sua árvore de pêssego, porém isso ocupa uma fração pequena da vida da
árvore. Em todo o resto de tempo, os ares suaves e a luz solar, as chuvas e os
orvalhos jogam em torno dela e respiram sobre ela, entram na sua substância e o
resultado são pêssegos. Mas deixe o jardineiro negligenciar a sua parte, e os
pêssegos não serão melhores que abrunhos.
























PARTE IV


ALGUNS HÁBITOS DA MENTE – ALGUNS HÁBITOS
MORAIS

Uma ciência da educação
Permita-me dizer uma vez mais que me arrisco a escrever sobre
assuntos que apresentam a educação domiciliar com a maior deferência às mães,
acreditando que, em virtude do seu insight peculiar sobre as dispo-sições dos
seus próprios filhos, elas são abençoadas tanto com o conheci-mento, quanto
com o poder para lidar com eles, que observadores só podem admirar de longe.
Ao mesmo tempo, há uma coisa como a ciência da educação, que não vem por
intuição. Com esse conhecimento, é possível educar uma criança inteiramente de
acordo com a lei natural, o qual também é lei divina. Preservando-a, há uma
grande recompensa.

A educação no hábito favorece uma vida fácil
Vimos por que o hábito, por exemplo, é uma força maravilhosa na vida
humana. Considero essa visão do hábito muito estimulante, por dar razoabilidade
científica às conclusões já alcançadas pela experiência comum. É agradável
saber que, mesmo na vida madura, por um pequeno esforço persistente, é
possível adquirir um hábito desejável. É bom, se não agradável, saber também
com que facilidade fatal podemos cair em maus hábitos. Mas o mais confortável
na visão desse hábito é que ele cai no nosso amor natural a uma vida fácil. Não
estamos relutantes em fazer esforços no início com a segurança de que pouco a
pouco as coisas irão suavemente. E é justamente com isso que o hábito é, num
grau extra-ordinário, comprometido a efetuar. A mãe que tenta duramente dotar
os seus filhos com bons hábitos assegura para si mesma dias suaves e fáceis,
enquanto aquela que deixa os seus hábitos tomarem conta de si mesmos tem uma
vida cansativa de atrito sem fim com as crianças. Ela está gritando o dia todo:
“Faça isso!” e eles não fazem; “Faça aquilo!” e eles fazem outra coisa. Você diz:
“Mas se o hábito é tão poderoso, seja para dificultar, seja para ajudar a criança, é
fatigante pensar em todos os hábitos a que a pobre mãe tem de se dedicar. Ela
nunca ficará à vontade com os seus filhos?”

Treinar no hábito se torna um hábito
Aqui, novamente, está um exemplo daquela fábula do pêndulo ansioso,
oprimido pelo pensamento do número de tiques que ele deve dar. Mas os tiques
devem ser entregues tique a tique, e sempre haverá um segundo de tempo para
dar tique. A mãe se dedica à formação de um hábito por vez, fazendo não mais
do que ficar de olho naqueles já formados. Se ela ficar assustada pelo
pensamento de trabalho excessivo, que limite o número de bons hábitos que ela
se disporá a formar. A criança que começa a vida, digamos, com vinte hábitos
bons, começa com um certo capital do qual ela disporá para um proveito sem
fim conforme os anos prossigam. A mãe que desconfia do seu próprio poder de
esforço constante pode bem ter conforto em dois fatos. Em primeiro lugar, ela
mesma adquire o hábito de treinar os seus filhos num dado hábito, de maneira
que, pouco a pouco, este não se torna um problema, mas sim um prazer para ela.
Em segundo lugar, os hábitos da criança mais fixos e dominantes são aqueles
pelos quais a mãe não faz esforço duro, mas que a criança assimila para si
mesma através da sua observação atenta de tudo o que é dito e feito, sentido e
pensado, na sua casa.

Hábitos inspirados na atmosfera caseira
Já consideramos um grupo de metade de hábitos físicos – ordem,
regularidade, capricho – que as crianças absorvem de um jeito, por assim dizer.
Mas isso não é tudo: hábitos de gentileza, cortesia, bondade, candu-ra, respeito
por outras pessoas – ou hábitos bem diferentes desses – são inspirados pela
criança como a própria atmosfera da sua casa, o ar no qual ela vive e pelo qual
tem de crescer.






1. O HÁBITO DA ATENÇÃO

Agora, vamos passar à consideração de um grupo de hábitos mentais
afetados pelo treinamento direto em vez do exemplo.
Primeiro, colocamos o hábito da atenção, porque os maiores dons
intelectuais, para o seu valor, dependem da medida na qual o seu dono cultivou o
hábito da atenção. Para explicar por que esse hábito é de importância suprema,
temos que considerar a operação de uma ou duas leis do pensamento. Mas, no
meio tempo, apenas se lembre da fixidez da atenção com a qual o homem
profissional treinado – o advogado, o médico, o homem das letras – escuta uma
história indireta, joga fora a almofada, captura os fatos, vê a tolerância de cada
circunstância e expressa o caso com claridade e método novos. E contraponha
isso ao olho vagante e a respostas aleatórias do mal-educado. E você vê que
diferenciar as pessoas consoante o seu poder de atenção é empregar um teste
legítimo.

Uma mente à mercê de associações
Então, consideremos a natureza e as funções da atenção. A mente nunca
fica indolente, com a possível exceção do estado de coma. As ideias estão
sempre passando pelo cérebro, de dia e de noite, dormindo ou andan-do, louco
ou são. Nós temos uma grande coisa sobre nós mesmos quando supomos que
somos os autores e os destinadores dos pensamentos que pensamos. O máximo
que podemos fazer é dar direção a essas sequências de pensamentos nos
momentos relativamente menores, quando estamos regulando os pensamentos
dos nossos corações. Vemos nos sonhos – a rápida dança de ideias através do
cérebro durante o sono mais leve – como as ideias se seguem umas às outras de
uma maneira geral. Nas vadiices do delírio, nas fantasias do louco, nas
inconsideradas conversas infantis e no balbucio do velho homem, vemos a
mesma coisa, isto é, a lei segundo a qual as ideias percorrem a mente quando são
deixadas em si mesmas. Você fala com uma criança sobre um copo: você deseja
provocar uma curiosidade apropriada sobre como o copo é feito e quais são os
seus usos. Nada disso. Ela vagueia ao sapatinho de cristal da Cinderela. Então
ela lhe conta sobre a sua avó que lhe deu um barco. Então sobre o barco no qual
o Tio Harry foi para o Estados Unidos. Então ela se pergunta por que você não
usa óculos, deixando que você adivinhe que o Tio Harry usa. Mas os
excursionismos da criança não são excêntricos. Seguem uma lei: a lei da
associação de ideias, pela qual qualquer ideia apresentada à mente manda de
volta alguma outra ideia que a qualquer tempo foi associada a ela – como o
cristal e o sapato da Cinderela. E isso novamente: alguma ideia associada a ela.
Agora, essa lei da associação de ideias é uma boa serva e uma má senhora. Ter
esse auxílio ao recordar os eventos do passado, os compromissos do presente, é
um benefício infinito. Mas ficar à mercê das associações, não ter poder para
pensar no que escolhemos quando escolhe-mos, mas só quando algo “põe isso
dentro da nossa cabeça”, não é ser melhor do que um imbecil.

Atenção vagante
Um esforço vigoroso da vontade deve nos permitir, a qualquer tempo,
ajustar os nossos pensamentos. Sim, mas uma vontade autoper-suadida é a flor
de um caráter desenvolvido. E enquanto uma criança não tem um caráter do qual
falar, mas somente uma disposição natural, quem terá zumbidos de uma aula de
geografia ou um sofá de boneca de um verbo francês? Eis o segredo do
aborrecimento da sala de aula domiciliar: as crianças estão pensando o tempo
todo sobre algo além das suas aulas. Ou ainda, elas estão à mercê de milhares de
fantasias que volteiam nos seus cérebros, cada uma na sequência da última.
Disse uma menininha à sua governanta: “Oh, senhorita Smith, há tantas coisas
mais interessantes para pensar do que as aulas!”
Onde está o prejuízo? Nisto: não apenas que as crianças estejam perdendo
tempo, apesar de ser uma pena, mas que elas estejam formando um hábito
mental irregular e reduzindo a sua própria capacidade pelo esforço mental.

O hábito da atenção a ser cultivado na infância
Então, a ajuda não está na vontade da criança, mas no hábito da atenção,
um hábito a ser cultivado mesmo na infância. Não obstante os seus maravilhosos
poderes de observação, um bebê não tem capacidade de atenção. Num minuto, o
brinquedo fechado cai dos dedinhos desatentos e o olhar vagante acende uma
nova alegria. Mas mesmo nesse estágio o hábito da atenção pode ser treinado: o
brinquedo desconsiderado é pego, e, com “Que bonitinho!” e uma apresentação
boba, a mãe mantém os olhos do bebê fixados por alguns minutos – e essa é a
sua primeira lição na atenção. Mais tarde, conforme vimos, a criança deseja ver e
lidar com todo objeto que venha ao seu caminho. Mas veja-a nas suas
investigações: ela passa rapidamente de coisa a coisa com menos propósito do
que uma borboleta entre flores, ficando em nada pelo tempo suficiente para
extrair o benefício daquilo. É o papel da mãe suprir a faculdade de observação
rápida da criança com o hábito da atenção. Ela tem de ver que a criança não
passa rápido disso àquilo, mas olha uma coisa por bastante tempo para ter um
entendimento real daquilo.
A pequena Margaret está fixando os olhos redondos numa margarida que
ela colheu? Num segundo, a margarida será jogada fora, e um seixo ou um
ranúnculo encantarão a pequena donzela. Mas a mãe aproveita o momento feliz.
Ela faz a Margaret ver que a margarida é um olho amarelo brilhante com cílios
brancos ao redor dela, que o dia todo ela permanece lá na grama e olha para
cima para o grande sol, nunca piscando como a Margaret piscaria, mas mantendo
os seus olhos bem abertos. E é por isso que se chama margarida[76], “o olho do
dia”, porque o seu olho está sempre olhando para o sol, que faz o dia. E o que a
Margaret acha que ela faz à noite, quando não há sol? Ela faz o que meninos e
meninas fazem: ela apenas fecha o seu olho com as suas pestanas brancas
decoradas com rosa e vai dormir até que o sol volte novamente de manhã. A essa
altura, a margarida ficou interessante para a Margaret. Ela olha para a margarida
com olhos grandes depois que a sua mãe terminou de falar, e então, muito
provavelmente, abraça-a contra o seu peito ou lhe dá um leve beijinho. Assim, a
mãe inventará formas de envolver cada objeto no mundo da criança com
interesse e prazer.

Atenção a “coisas”; palavras, um aborrecimento
Mas o cabo de guerra começa com as lições da sala de aula. Mesmo a
criança que tenha ganhado o hábito da atenção a coisas, acha as palavras um
aborrecimento. Esse é um ponto de inflexão na vida da criança e o momento
para o tato e a vigilância da mãe. Em primeiro lugar, nunca deixe a criança
perder tempo sobre um caderno ou uma conta, sentar-se sonhando com o seu
livro diante de si. Quando uma criança ficar sem entender uma lição, é hora de
colocá-la de lado. Faça-a realizar uma outra lição tão diferente da última quanto
possível, e então volte com humor fresco à sua tarefa inacabada. Se a mãe ou a
governanta foi imprudente o bastante para deixar a criança devanear uma lição,
ela tem de empregar o seu humor para que a criança se saia bem. Claro, a lição
tem de ser feita, mas deve sê-lo brilhante e agradavelmente à criança.

Aulas atrativas
O professor deve ter algum conhecimento dos princípios de educação;
deve saber quais disciplinas são mais apropriadas para a criança, considerando a
sua idade, e como tornar essas matérias atrativas; também deve saber como
variar as aulas, de maneira que cada capacidade da mente da criança descanse
após o esforço e alguma outra capacidade seja chamada à tona. Deve saber como
estimular a criança ao esforço através do seu desejo de aprovação, de destaque,
de avanço, do seu desejo de conhecimento, do seu amor aos seus pais, do seu
senso de dever, de tal maneira que nenhum conjunto de motivos seja
indevidamente chamado à tona ferindo o caráter da criança. Mas o perigo ao
qual ela tem de estar especialmente sensível é a substituição de qualquer outro
desejo natural por aquele do conhecimento, que é igualmente natural e adequado
para todos os propósitos da educação.

Horário, trabalho definido num dado tempo
Terei oportunidades para entrar em alguns desses assuntos mais tarde.
Enquanto isso, olhemos para uma sala de aula domiciliar gerida sobre princípios
sólidos. Em primeiro lugar, há um horário, escrito razoa-velmente, para que a
criança saiba o que ela tem de fazer e quanto tempo cada aula deve durar. Essa
ideia de trabalho definido para ser terminado num dado tempo é valiosa para a
criança, não somente para formá-la com hábitos de ordem, como também com
diligência. Ela aprende que um momento não é “tão bom quanto outro”, que não
há tempo certo deixado para o que não é feito no seu próprio tempo. E só esse
conhecimento faz uma grande diferença para prender a atenção da criança ao seu
trabalho. Ainda, as aulas são curtas, raramente mais do que vinte minutos para
crianças abaixo de oito anos. E isso por duas ou três razões. A percepção de que
não há muito tempo para as suas contas ou a sua leitura mantém o espírito da
criança alerta e ajuda a fixar a sua atenção. Ela tem tempo para estudar apenas o
tanto de cada disciplina que lhe é bom para assimilar de uma vez. E, se as aulas
são judiciosamente alternadas, a criança passa pelas da manhã sem nenhum sinal
de aborrecimento: digamos, contas primeiro, enquanto o cérebro está bem
fresco; depois, escrita ou leitura; algum exercício mais ou menos mecânico, para
um descanso. E assim por diante: o programa variando um pouco de dia a dia,
mas o mesmo princípio por toda a parte: primeiro uma lição de “pensar”, e segue
uma lição “aplicada”.
Mesmo com aulas regulares e aulas curtas, um estímulo adicional pode ser
ocasionalmente necessário para prender a atenção da criança. O seu desejo de
aprovação pode pedir o estímulo, não somente de uma palavra de elogio, mas de
algo no formato de uma recompensa para assegurar os seus maiores esforços.
Agora, as recompensas devem ser dadas à criança com base num princípio:
devem ser consequências natu-rais da sua boa conduta.

Uma recompensa natural
Qual é a consequência natural do trabalho feito bem e rapida-mente?
Não é a apreciação de um lazer mais amplo? Espera-se que o menino faça dois
cálculos corretos em vinte minutos. Ele os faz em dez minutos. Os dez minutos
restantes são seus, justamente ganhos, durante os quais ele deve se sentir livre
para uma saída no jardim ou qualquer deleite que escolha. A sua tarefa de escrita
é produzir seis Ms perfeitos. Ele escreve seis linhas somente com um bom M em
cada linha; o tempo para a aula de escrita acabou e ele não tem nada para si. Ou
ele consegue apontar seis bons Ms na sua primeira linha e tem o resto do tempo
para desenhar barcos a vapor e trens em estrada de ferro. Essa possibilidade de
deixar as crianças se ocuparem de diversas maneiras nos poucos minutos que
elas possam ganhar no fim de cada aula, é a compensação que a sala de aula
domiciliar oferece para o entusiasmo que a simpatia pelos números e a
competição devem dar ao trabalho escolar.

Competição
Quanto à competição, é um meio muito potente de estimular e manter a
atenção das crianças. Objeta-se frequentemente que um desejo de superar, de
fazer melhor do que outros, implica um gênio desamoroso, que o educador deve
reprimir em vez de cultivar. Boas notas de algum tipo geralmente são as
recompensas daqueles que fazem melhor, e alega-se que essas boas marcas
frequentemente sejam a causa de rivalidade injusta. Ora, o fato é: as crianças
estão sendo formadas para viver no mundo, e nele todos nós realmente
conseguimos boas notas de um tipo ou outro – prêmio ou elogio ou ambos,
conforme superemos outros, seja no futebol ou tênis, seja na pintura de imagem
ou criação de poema. Existem invejas e corações incendiosos entre aqueles que
ficam em segundo lugar. Assim tem sido desde o início, e sem dúvida será até o
fim. Se a criança sairá a um mundo competitivo, ora, pode ser bom que ela seja
criada numa escola competitiva. Mas aqui é onde entra o trabalho da mãe. Ela
pode ensinar o seu filho a ser o primeiro sem vaidade e a ser o último sem
amargura, ou seja, ela pode educá-lo numa doação de amor e simpatia de
coração de sorte que a alegria pelo sucesso do seu irmão tire o ferrão do seu
próprio fracasso e que a tristeza pelo fracasso do seu irmão não deixe espaço
para a autoglorificação. Ainda, se um sistema de notas for usado como um
estímulo à atenção e ao esforço, as boas notas devem ser dadas pela conduta em
vez da esperteza, isto é, elas devem estar ao alcance de todos: toda criança pode
conseguir a sua nota por pontualidade, ordem, atenção, diligência, obediência,
gentileza. Logo, notas desse tipo podem ser dadas sem perigo de deixar uma
irritante sensação de injustiça no peito da criança que falha. A competição se
torna suicida quando é usada como incentivo ao esforço intelectual, porque o
desejo de conhecimento diminui à medida que o desejo de superação se torna
ativo. Na verdade, notas de qualquer tipo, mesmo para conduta, distraem a
atenção das crianças do seu devido trabalho, que é em si mesmo suficientemente
interessante para assegurar um bom comportamento bem como a atenção.

A afeição como um motivo
Que ela deva trabalhar duro para agradar aos seus pais, que fazem tanto
por ela, é um motivo justo para dar à criança de tempos em tempos, mas não
com muita frequência. Se a mãe faz acordos com os sentimentos do seu filho, se
“Faça isso ou aquilo para agradar à mamãe.”, “Não decep-cione a pobre
mamãe.” etc. são postos amiúde à criança como a razão de agir certo, uma
relação sentimental, que tanto os pais quanto a criança acharão embaraçante, é
estabelecida. Os motivos verdadeiros da ação serão obscurecidos e a criança que
não esteja disposta a parecer desamo-rosa terminará sendo falsa.

Atratividade do conhecimento
Com certeza, o meio mais óbvio de acelerar e manter a atenção das
crianças se encontra na atratividade do próprio conhecimento e no apetite real
pelo conhecimento com que elas são dotadas. Mas será visto em muitas salas de
aula o quão bem-sucedidos são os professores imperfeitos ao curarem crianças
de qualquer desejo de saber. No entanto, mais tarde eu terei uma oportunidade
para algumas palavras sobre esse assunto.

O que é a atenção?
É evidente que a atenção não é uma “faculdade” da mente. De fato, é
muito duvidoso o quão longe várias operações da mente são descritas como
“faculdades”. A atenção mal é uma operação da mente, mas simplesmente o ato
pelo qual a força mental inteira é aplicada ao assunto em mãos. Esse ato, de
trazer a mente inteira para lidar, pode ser treinado num hábito pela vontade do
pai, ou mãe ou professor, que atrai e mantém a atenção da criança por meio de
um motivo suficiente.

Atenção autopersuadida
Conforme a criança fica mais velha, ela é ensinada a lidar com a sua
própria vontade, a tornar-se atenta, apesar das sugestões mais convidativas de
fora. Deve-se ensinar a ela que sinta um certo triunfo ao mover-se para fixar os
seus pensamentos. Faça-a saber qual é a dificul-dade real, como estar pensando
incessantemente é a natureza da sua mente, mas como os pensamentos, se
deixados por si, sempre correrão de uma coisa a outra e que a luta e a vitória
exigidas dela são fixar os seus pensamentos sobre a tarefa em mãos. “Você fez o
seu dever.”, com um olhar de simpatia da sua mãe, é uma recompensa para a
criança que fez esse esforço na força da sua vontade crescente. Mas não se pode
ter muito em mente que a atenção seja, numa grande medida, o produto da mente
educada, isto é, só se pode ter atenção à medida que se tem a capacidade
intelectual de desenvolver o tópico.
É impossível exagerar a importância desse hábito da atenção. Para citar
palavras de peso, está “dentro do alcance de todos e deve ser o objetivo
primordial de toda disciplina mental.”, pois, quaisquer que sejam os dons
naturais da criança, é somente à proporção que o hábito da aten-ção é cultivado
nela que ela é capaz de fazer uso deles.

O segredo da pressão excessiva
Se é somente para preservar da depreciação, de uma contenda perpétua
entre dever e inclinação, vale a pena que a mãe garanta que a sua criança nunca
tenha uma aula na qual ela não ponha o seu coração. E isso não é um
empreendimento difícil. A questão é: estar de olho desde o início contra a
formação do hábito contrário da desatenção. Muita coisa foi dita ultimamente
sobre a pressão excessiva e nós olhamos para uma ou duas das causas cujos
efeitos levam esse nome. Mas, na verdade, uma das causas mais abundantes de
um cérebro cozido demais é uma falha no hábito da atenção. Suponho que todos
nós estejamos prontos para admitir que não são as coisas que fazemos, mas as
coisas que falhamos em fazer que nos cansam, com o sentido da omissão, com a
preocupação da pressa para atingir as nossas tarefas. E essa é quase a única
causa do fracasso no trabalho no caso do estudante saudável: um espírito vagante
dificulta que uma aula seja plenamente tida no momento certo. Essa aula se torna
um pesadelo, continuamente deficiente a partir de então e nunca lá. E o sentido
da perda tenta o jovem estudante mais do que tentaria a recepção atenta de uma
dúzia de aulas.

A tarefa de casa do estudante
No assunto da tarefa de casa, os pais ainda podem ser de grande
utilidade para os seus meninos e meninas depois que começarem a ir à escola
diurna. Não para ajudá-los. Isso não seria necessário. Mas suponhamos um caso:
“A pobre Annie não termina as suas aulas até nove e meia. Ela realmente tem
muito a fazer.”, “O pobre Tom está nos seus livros até as dez horas. Nunca
vemos nada das crianças à noite.”, dizem os pais angustiados. E eles deixam as
crianças continuarem num curso que é absolutamente desastroso tanto para a
saúde corporal quanto para a capacidade cerebral.

Tratamento domiciliar saudável para o devaneio
Ora, a falha raramente está nas aulas, mas nas crianças. Elas devaneiam
nos seus livros e um pequeno tratamento domiciliar saudável deve curá-las desse
mal-estar. Permita-lhes no máximo uma hora e meia para a sua tarefa de casa.
Trate-as tacitamente como inadimplentes se não aparecerem no fim daquele
tempo. Não se traia com palavra ou olhar de simpatia. E, no momento em que o
tempo das aulas tiver acabado, faça que comecem algum jogo prazeroso ou livro
de histórias no escritório. Pouco a pouco, elas descobrirão que é possível
terminar as lições em tempo para afinal garantir uma noite agradável. E as lições
serão feitas de maneira muito melhor pelo fato de que a atenção concentrada lhes
terá sido oferecida. Ao mesmo tempo, o costume de dar tarefa de casa, de
qualquer maneira para crianças abaixo de catorze anos, deve ser enorme-mente
desaprovado. As crianças perdem o benefício de uma combinação de vida
doméstica e escolar. E um esquema inteiro de trabalho escolar pode ser realizado
nas horas da manhã.

Recompensas e punições devem ser consequências relativas à
conduta
Ao considerar os meios de prender a atenção, tem sido necessário se
referir à disciplina – a maneira de lidar com recompensas e punições –, um
assunto com que toda babá ou governanta principiante se sente muito
competente para lidar. Mas isso também tem o seu aspecto científico: há uma lei
pela qual todas as recompensas e punições são reguladas. Elas devem ser
naturais, ou, de qualquer maneira, serem as consequências relativas à conduta.
Sem prejuízo à criança tanto quanto seja possível, devem imitar o tratamento que
tal e tal conduta merece e recebe na vida adulta. A Srtª. Edgeworth[77], na sua
história de Rosamond em The Purple Jar, atinge o princípio certo, embora o
incidente seja bastante extra-vagante. Meninas geralmente não anseiam por
jarras roxas nas janelas de farmacêuticos. Mas que soframos pela nossa teimosia
por conseguir o que é desnecessário, andando sem o que é necessário, é
precisamente uma das lições de vida que todos temos que aprender. Portanto, é o
tipo certo de lição para ensinar a uma criança.

Consequências naturais e educativas
É evidente que administrar recompensas e punições sobre esse princí-
pio requer uma consideração paciente e uma determinação constante por parte da
mãe. Ela tem de considerar consigo de qual falta de disposição proveio o mau
comportamento da criança. Ela tem de direcionar a sua punição àquela falha e se
fortalecer para ver o seu filho sofrer uma perda presente para um benefício seu
duradouro. De fato, uma punição pequena real em excesso é necessária onde as
crianças são criadas com cuidado. Mas isso acontece continuamente: a criança
que agiu bem ganha alguma recompensa natural (como aqueles dez minutos no
jardim), que a criança perde, se age pior. E a mãe tem de fortificar a si mesma e a
criança para suportar essa perda. Se ela iguala as duas crianças, comete um erro
sério, não contra a criança que age bem, mas contra a inadimplente, cuja falha
ela deliberadamente estimula a repetir. Ao colocar o seu filho sob a disciplina
das consequências, a mãe tem de usar muito tato e discrição. Em muitos casos, a
consequência natural da falha da criança é precisa-mente aquela que é a sua
função evitar, enquanto que, ao mesmo tempo, ela procura alguma consequência
relacionada à falha que terá uma orientação educativa sobre a criança. Por
exemplo, se um menino negli-gencia os seus estudos, as consequências naturais
são que ele permaneça ignorante, mas permitir que ele aja assim seria
negligência criminal por parte dos pais.


2. OS HÁBITOS DE APLICAÇÃO ETC.

Rápido esforço mental
Os hábitos da atividade mental e da aplicação são treinados pelos
próprios meios empregados para cultivar o da atenção. A criança pode insistir
diligentemente através do seu trabalho e assim ser treinada para um rápido
esforço mental. A professora mesma tem de estar alerta e es-perar respostas
instantâneas, pensamento veloz, trabalho rápido. A tarta-ruga se atrasará atrás da
lebre, mas a tartaruga tem de ser treinada a se mover, todo dia um pouquinho
mais rápido. Tenha em vista garantir cons-tantemente a rapidez de apreensão e
execução, e a coisa vai mais longe para conseguir isso.




O zelo tem de ser estimulado
Também a aplicação. É obrigatório não se permitir que a criança entre no
humor com o qual ela diz: “Oh, eu estou tão cansado de cálculos.” ou “de
história”. O seu zelo tem de ser estimulado. E sempre tem de haver uma
perspectiva agradável diante dela. E a aplicação constante, incansável ao
trabalho, deve ser tida como honrada, enquanto são vigiados a atenção e o
esforço irregulares, enfraquecidos.


3. O HÁBITO DE PENSAR

As operações de uma onça-parda incluídas no pensar
O trabalho real do cérebro é conhecido pelos psicólogos sob vários
nomes e dividido em várias operações. Vamos chamá-lo de “pensar”, que, para
propósitos educacionais, é suficientemente exato. Contudo, por “pen-sar”, vamos
dizer um esforço mental consciente e real, e não as fantasias que esvoaçam sem
esforço pelo cérebro. Esse é um tipo de exemplo citado pelo arcebispo
Thomson[78] nas suas Laws of Thought: “Quando o capitão Head estava viajando
pelos pampas da América do Sul, um dia o seu guia de repente o parou, e,
apontado alto no ar, gritou: ‘Uma onça-parda!’ Sur-preso com tal exclamação,
acompanhado de tal ato, ele ergueu os seus olhos, e com dificuldade percebeu,
numa altura imensurável, um voo de condores à grande altura em círculos, num
local particular. Debaixo desse local, bem longe da sua vista ou da do guia, pôs-
se a carcaça de um cavalo, e sobre ela estava, conforme o guia bem sabia, uma
onça-parda, que os condores estavam olhando com inveja da sua altura aérea. O
sinal das aves foi para ele o que a vista da onça-parda sozinha teria sido para o
viajante: uma garantia completa da sua existência.
Aqui estava um ato de pensamento que não custa nenhum problema ao
pensador, que lhe foi fácil como lançar os seus olhos para cima, entretanto
exigiria de nós, não acostumados ao assunto, muitos passos e algum labor. A
vista dos condores o convenceu de que havia alguma carcaça ou outra. Mas
como ficaram rodando longe dela, em vez de descer rápido à sua festa, ele supôs
que alguma fera os tivesse antecipado. Foi um cachorro ou um chacal? Não. Os
condores não temeriam se afastar ou compartilhar. Tem de ser alguma fera
grande, e, como havia onças-pardas na vizinhança, ele concluiu que havia uma
aqui.” E todos esses passos de pensamento são resumidos nas palavras “Uma
onça-parda”.
Esse é o tipo de coisa pela qual as crianças devem passar, mais ou
menos, em toda aula: um traçado de efeito a partir da causa ou da causa a partir
do efeito; uma comparação de coisas para descobrir em que são semelhantes e
em que diferem; uma conclusão quanto às causas ou conse-quências a partir de
certas premissas.


4. O HÁBITO DE IMAGINAR

O sentido do incongruente
Todas as suas aulas proporcionarão algum escopo para algum leve
exercício da capacidade de pensamento das crianças, algumas mais e algumas
menos, e as aulas têm de ser judiciosamente alternadas, de maneira que quanto
mais esforços mecânicos aconteçam mais estrita-mente intelectuais sejam, e que
o exercício agradável da imaginação, ainda, suceda esforços da razão. A
propósito, é uma pena quando o senso do ridículo é cultivado nos livros infantis
às custas de coisas melhores. Alice in Wonderland[79] é uma deliciosa festa de
absurdos que nenhum de nós, velhos ou jovens, poderia se dar ao luxo de
poupar. Mas é duvidoso se a criança que a lê tem as imaginações deliciosas, a
percepção do desconhecido, com que ela lê The Swiss Family Robinson[80].
Esse ponto é digno de consideração junto a livros de Natal para as
pessoinhas. Livros de “comicidade” não cultivam nenhuma capacidade senão o
sentido do incongruente, e, embora a vida seja a mais divertida para a posse
desse sentido, quando cultivado em excesso, ele é apto a mostrar-se um hábito
impertinente. Diogenes and The Naughty Boys of Troy[81] é irresistível, mas não é
o tipo de coisa que as crianças viverão, e “interpretarão”, já que todos nós
interpretamos Robinson Crusoe[82] encon-trando as pegadas. Elas têm de ter
“livros engraçados”, mas não dê às crianças leituras absurdas demais.

Histórias triviais; histórias de imaginação
Ainda, histórias de feriado de Natal, de George e Lucy, de
divertimentos, de pontos fracos, de virtudes das crianças na sua própria condição
de vida, não deixam nada para a imaginação. As crianças sabem tudo sobre tudo
tão bem que nunca lhes ocorre brincar nas situações em qualquer um desses
contos ou mesmo lê-los mais duas vezes. Mas deixe-as ter contos da imaginação,
cenas postas em outras terras e outros tempos, aventuras heroicas, fugas
extremamente estreitas, deliciosos contos de fadas nos quais elas nunca são
asperamente puxadas pelo impossível – mesmo onde tudo é impossível, e elas
sabem disso, no entanto acreditam.

Imaginação e grandes concepções
E isso não meramente pelo divertimento das crianças. É impos-sível que
a posteridade possa guardar para nós uma geração abençoada com pouca
imaginação, e, até agora, a menos capaz de grandes concepções e esforços
heroicos, pois é somente conforme temos isso em nós, para deixar uma pessoa
ou uma causa preencher o palco todo da mente, para a exclusão da auto-
ocupação, que somos capazes de grandes ações de coração em nome daquela
pessoa ou causa. Os nossos romancistas dizem que não há nada deixado para
imaginar e que, portanto, uma descrição realista das coisas como são é tudo o
que lhes está aberto. Mas a imaginação não é nada se não for criativa, a menos
que veja não somente o que é aparente, mas o que é concebível, e o que é
poeticamente apropriado em dadas circunstâncias.

A imaginação cresce
Ora, a imaginação não desce, totalmente florescida, para tomar posse de
uma casa vazia. Como toda outra capacidade da mente, ela é o germe mais
simples de uma capacidade com que começar, e cresce pelo que ela consegue. E
a infância, a idade da fé, é o tempo para a sua alimen-tação. As crianças devem
ter o júbilo de viver em terras distantes, em outras pessoas, em outras épocas –
uma dupla existência deliciosa. E elas encontrarão esse júbilo na maior parte dos
seus livros de história. Além disso, as suas aulas de história e geografia devem
cultivar-lhes as capa-cidades conceituais. Se a criança não viver nos tempos da
sua aula de história, não estiver em casa nos climas que o seu livro de geografia
des-creve, ora, essas aulas falharão no seu propósito. Mas deixe as aulas fazerem
o seu melhor. A galeria de imagens da imaginação fica pobremen-te pendurada
se a criança não tiver encontrado o seu caminho nos reinos da fantasia.

Pensar vem pela prática
Consideraremos mais tarde como as várias aulas das crianças devem ser
controladas a fim de induzir hábitos de pensar. Mas por ora isto: assim como
escrever ou patinar, pensar vem pela prática. A criança nunca pensou, nunca
pensa mesmo e provavelmente nunca pensará – pois não existem pessoas o
bastante que passam pelo mundo sem qualquer exercício deliberado das suas
próprias habilidades? A criança tem de pensar, chegar à razão das coisas por si
mesma, todo dia da sua vida e mais cada dia do que o dia anterior. Cabe tanto às
crianças quanto aos pais inverter esse processo educacional. A criança pergunta
“Por quê?” e o pai e a mãe respondem, muito orgulhosos dessa evidência de
pensamento no seu filho. Há uma leve mostra de especulação mesmo ao se
perguntar “Por quê?”, mas é o esforço mais leve e mais superficial o pensamento
que o cérebro produz. Deixe os pais perguntarem “Por quê?” e a criança produz
a resposta, se ela puder. Depois que ela girou o assunto várias vezes na sua
mente, não há prejuízo ao lhe dizer o motivo – e ela se lembrará disso. Toda
caminhada deve oferecer algum problema complicado para as crianças
pensarem: “Por que aquela folha flutua na água e esse seixo afunda?”, e assim
por diante.


5. O HÁBITO DE LEMBRAR

Lembrar e rememorar
A memória é o armazém de qualquer conhecimento que possua-mos. E
é pelo fato dos estoques armazenados na memória que nós nos classificamos
como seres inteligentes. As crianças aprendem para que pos-sam se lembrar.
Muito do que aprendemos e experimentamos na infância e mais tarde nós não
podemos reproduzir, no entanto formou a base do conhecimento posterior.
Noções e opiniões posteriores surgiram daquilo que uma vez aprendemos e
conhecemos. Esse é o nosso patrimônio escon-dido, cujo interesse apreciamos,
embora sejamos incapazes de o perceber. Ainda, muito do que aprendemos e
experimentamos não somente é retido no armazém da memória, como também é
o nosso patrimônio disponível: nós podemos reproduzir, rememorar sob
demanda. Essa memória que pode ser traçada pelo ato da rememoração é o nosso
dote mais valioso.

Uma memória “espúria”
Há um terceiro tipo de memória (espúria): fatos e ideias flutuando no
cérebro que, todavia, não fazem parte dele e que são segregados em forma de
gotas num esforço simples, como quando um advogado produz todo o seu
conhecimento de um caso na sua síntese, e então se esquece de contar sobre isso,
ou quando o estudante estuda sofregamente para um exame, anota o que ele
estudou e, veja, foge do seu olhar fixo para sempre. Conforme Ruskin[83]
expressa: “Eles estudam sofregamente para passar e não para saber, eles passam
e não sabem.” Assim, esse advogado deve ser capaz de encerrar o caso sobre o
qual ele cessou de se ocupar; o editor, o livro que ele rejeitou. Está bom assim. E
essa arte de esquecer tem os seus usos. E quanto ao estudante que tem pouco de
sobra após o trabalho de um ano, senão o seu lugar numa lista de chamada?

Memória: um registro na substância do cérebro
É impossível dizer aqui qualquer coisa adequada sobre o assunto da
memória, mas tentemos responder a duas ou três questões que se apresentam por
cima. Como chegamos a “nos lembrar” realmente? Como ganhamos a
capacidade de utilizar fatos lembrados, isto é, rememorar? E sob que condições o
conhecimento é adquirido de maneira que nem serve para o crescimento do
cérebro e da mente, nem está disponível sob demanda, mas está levemente
armazenado no cérebro por algum período curto, e então é abandonado num
simples arremesso? Estamos interes-sados numa invenção maravilhosa: um
instrumento que grava palavras faladas e entregará, digamos daqui a um século,
um discurso ou uma palestra nas mesmas palavras e nos mesmos tons do falante.
Esse instrumento é aquela função do cérebro chamada memória, pela qual
impressões recebidas pelo cérebro são gravadas mecanicamente – pelo menos,
essa é a teoria mais bem aceita agora pelos fisiologistas. Ou seja, a mente faz
cognição de certos fatos e a substância nervosa do cérebro grava a cognição.

Feita sob quais condições
Agora, surge a questão: sob que condições essa impressão de fato ou
evento é feita sobre a substância do cérebro? O registro é permanente? E o
cérebro é capaz de receber um número indefinido dessas impressões? Tanto pela
experiência comum quanto de um número infinito de exemplos citados por
psicólogos, parece que qualquer objeto ou ideia que seja considerado com
atenção faz um tipo de impressão no cérebro que, segundo se diz, fixa-se na
memória. Em outras palavras, por um instante, dê uma atenção focada a
qualquer coisa que seja, e aquela coisa será lembrada. Ao descrever esse efeito, a
expressão comum é apurada além da sua intenção. Nós dizemos: “Tal e tal vista
ou som, ou sensação, causou uma forte impressão em mim.” E isso é
precisamente o que aconteceu: detenha a atenção sobre qualquer fato ou
incidente, então aquele fato ou incidente é lembrado. Ele é impresso sobre a
substância cerebral. A inferência é clara. Você quer que uma criança se lembre?
Prenda a sua atenção toda, o olhar fixo da sua mente, por assim dizer, ao fato a
ser lembrado, então ela lembrará. Por uma espécie de processo fotográfico,
aquele fato ou ideia é “tirado” pelo seu cérebro, e, quando se tornar um homem
velho, talvez a memória dele lampejará por ele.
A rememoração e a lei da associação
Mas não é o suficiente ter um lampejo de rememoração incidental-
mente. Nós queremos ter o poder de rememorar à vontade. E para isso algo mais
é necessário do que um ato ocasional de atenção produzindo uma impressão
solitária. Supondo, por exemplo, que por um bom ensino você prenda a atenção
da criança ao verbo avoir[84]. Ela se lembrará dele, quer dizer, algum crescimento
infinitamente leve do tecido cerebral gravará e reterá aquele verbo francês. Mas
um verbo não é nada. Você quer que a criança estude francês, e para isso você
tem de não só fixar a sua atenção sobre cada aula nova, mas cada uma tem de ser
vinculada com a última de maneira que seja impossível para ela rememorar uma
sem a outra seguinte na sequência. O efeito físico desse método parece ser que
cada novo crescimento do tecido cerebral é, por assim dizer, posto sobre o
último. Ou seja, para expressar figurativamente, uma certa região do cérebro
pode ser concebida como sendo recoberta com francês. Isso é fazer um uso
prático daquela lei da associação de ideias da qual alguém de má vontade se
tornaria desmancha-prazeres. E é a negligência dessa lei que invalida muito
ensino bom. O professor fica feliz por produzir uma impres-são solitária que só é
rememorada conforme seja influenciada por uma sugestão casual, considerando
que ele deve fabricar as ligações de uma corrente para tirar o seu balde do poço.
Provavelmente, o leitor pode ter ouvido, ou ouviu, um Dr. Pick, que fundou um
sistema realmente filosófico de mnemônica sobre esses dois princípios: de
atenção e de associação. Tudo o que podemos pensar da sua aplicação disso, o
princípio que ele declarou é o certo.

Toda aula tem de mandar a última voltar
Faça que toda aula ganhe toda a atenção da criança, e faça que toda aula
nova seja tão entrelaçada com a última de maneira que uma tenha que mandar a
outra voltar. Essa, ainda, manda voltar aquela ante-rior a si, e assim por diante
até o início.





Sem limite para a capacidade de registro do cérebro
Mas o “levemente vem, levemente vai” de uma mera memória verbal
não segue essas regras. A criança faz o seu exercício de cor, repete-o como um
papagaio, e, veja, foi-se. Não há absolutamente registro disso no cérebro. Para
segurar esse registro, tem de haver tempo, tempo para aquele olhar completo da
mente que chamamos de atenção e para o crescimento do tecido cerebral à nova
ideia. Dadas essas condições, parece não haver limite de quantidade para a
capacidade de registro do cérebro. Salvo desta forma: uma menina aprende
francês e fala razoavelmente bem. Quando ela virar uma avó, terá esquecido
inteiramente, sem deixar uma palavra. Quando esse é o caso, o seu francês ficou
em desuso. Ela não teve o hábito de ler, ouvir ou falar francês desde a juventude.
Daí é evidente que, para prender diretamente aquele registro de francês impresso
no seu cérebro, o caminho deveria ter sido mantido aberto por frequentes idas e
vindas.

Mas vínculos de associação: uma condição de rememo-ração
Adquirir conhecimento ou capacidade, qualquer que seja, e então deixá-
lo crescer enferrujado num canto negligenciado do cérebro é praticamente inútil.
Onde não existem correntes de associações para tirar o balde do poço é a mesma
coisa se não houvesse água lá. No tocante a como formar essas ligações, cada
disciplina sugerirá um método adequado. A criança tem uma aula sobre a Suíça
hoje e uma sobre a Holanda amanhã, e uma é ligada à outra pelo próprio fato de
que os dois países mal têm algo em comum: o que um tem, o outro não tem.
Ainda, a associação será de semelhança e não de contraste. Na nossa própria
experiência, descobrimos que as cores, os lugares, os sons, os odores chamam de
volta pessoas ou eventos, mas ligações dessa ordem sensitiva mal podem ser
empregadas na educação. A ligação entre duas coisas quaisquer tem de ser
encontrada na natureza das coisas associadas.





6. O HÁBITO DA EXECUÇÃO PERFEITA

O hábito de produzir uma obra imperfeita
“Jogue perfeição em tudo o que fizer.” é um conselho com o qual uma
família pode ser criada com grande vantagem. Nós, ingleses, como uma nação,
pensamos muito nas pessoas e muito pouco nas coisas, trabalho, execução. As
nossas crianças têm permissão para fazer as suas figuras ou as suas letras, os
seus pontos de costura, as suas roupas de bonecas, a sua pequena carpintaria, de
qualquer maneira, com a noção de que elas farão melhor pouco a pouco. Outras
nações – os alemães e os franceses, por exemplo – olham para a questão
filosoficamente, e sabem que, se as crianças tiverem o hábito de produzirem uma
obra imperfeita, os homens e as mulheres indubitavelmente manterão esse
hábito. Eu me lembro de ter gostado do trabalho de uma classe de
aproximadamente quarenta crianças, de seis e sete anos, numa escola de Ensino
Fundamen-tal I em Heidelberg. Elas estavam fazendo uma lição de escrita,
acompa-nhada por uma boa quantidade de ensino oral de um mestre, que
escreveu cada palavra no quadro negro. Pouco a pouco, mostraram as chapas, e
eu não observei nenhuma letra falha ou irregular em todas as quarenta chapas. O
mesmo princípio de “perfeição” devia ser discernido numa exibi-ção recente de
trabalho escolar feito em toda a França. Nenhum trabalho falho foi mostrado,
com a escusa de que era o trabalho de crianças.

Uma criança deve executar perfeitamente
Não se deve dar nenhum trabalho a uma criança de maneira que ela não
possa executá-lo perfeitamente. Assim, a perfeição deve ser exigida dela como
uma rotina. Por exemplo, estabelece-se que ela faça uma cópia de traços e
permite-se que ela mostre chapas em todos os tipos de superfícies e todos os
tipos de intervalos. O seu senso moral está viciado, o seu olho está prejudicado.
Dê-lhe seis traços para copiar. Faça-a trazer não uma chapa, mas seis traçados
perfeitos, a distâncias regulares e em superfícies regulares. Se ela produzir um
par defeituoso, faça-a apontar o defeito e perseverar até que tenha produzido a
sua tarefa. Se ela não fizer isso hoje, faça-a continuar amanhã e no próximo dia,
e, quando apare-cerem os seis traços perfeitos, faça que a ocasião seja de triunfo.
Assim, com as tarefinhas de pintar, desenhar ou construir, ela se ajusta – que seja
bem feito tudo o que ela fizer. Um castelo de cartas instável é uma coisa da qual
se envergonhar. Muito junto desse hábito de “trabalho perfeito” é o de terminar
tudo o que é pego na mão. Raramente se deve permitir que uma criança empenhe
a sua mão num novo empreendimento até que o último esteja terminado.


7. ALGUNS HÁBITOS MORAIS

Obediência
É decepcionante que, a fim de cobrir absolutamente a base, tenha-mos
que tratar daqueles hábitos morais que a mãe deve cultivar nos seus filhos, de
uma maneira delicada e adequada. Mas o ponto a ser mantido em mente é que
tudo o que já foi dito sobre o cultivo do hábito se aplica com a maior força
possível a cada um desses hábitos.

Todo o dever de uma criança
O primeiro e infinitamente mais importante é o hábito da obediência.
De fato, a obediência é o dever todo da criança, e por essa razão todo outro dever
é cumprido como uma questão de obediência aos seus pais. Não somente isso: a
obediência é o dever todo do homem – obediência à consciência, à lei, à direção
divina.
Foi bem observado que cada uma das três tentações registradas de nosso
Senhor no deserto é uma sugestão não de um ato de pecado manifesto, mas de
um ato de obstinação, que se coloca diretamente oposto à obediência e fora do
qual provém toda aquela tolice que é muito ligada ao coração de uma criança.

Obediência: dever não acidental
Ora, se os pais percebem que a obediência não é mero dever acidental,
cujo cumprimento é uma questão que se encontra entre si mesmos e a criança,
mas que eles são o agente indicado para formar a criança para a obediência
inteligente do autoconvencimento, do ser humano obediente à lei, eles verão que
não têm direito de se abster da obediência do seu filho, e que todo ato de
desobediência na criança é uma condenação direta do progenitor. Além disso,
eles verão que o motivo da desobediência da criança não é a injunção arbitrária
“Faça isso, ou aquilo, porque eu mandei.”, mas o motivo da injunção apostólica
“Crianças, obedeçam aos seus pais no Senhor, pois isso é o certo.”

As crianças têm de ter o desejo de obedecer
É somente à medida que a vontade da criança está no ato de obediência
que ela obedece porque o seu senso de certo a faz desejar obede-cer apesar das
tentações à desobediência – não de coação, mas de boa vontade –, que o hábito é
formado, o que permitirá, daqui por diante, que a criança use a força da sua
vontade contra as suas inclinações quando essas a conduzem a condutas
desregradas. Diz-se que os filhos de pais que são mais estritos na obediência
exata ficam doentes frequentemente. E que órfãos e outras crianças pobres
abandonadas criados sob disciplina estrita somente esperam a sua oportunidade
para violar a autoridade. Exata-mente assim, porque, nesses casos, não existe
formação gradual da criança no hábito da obediência, nem alistamento gradual
da sua vontade no lado do serviço doce e uma oferta de submissão do livre-
arbítrio à lei maior. As pobres crianças simplesmente são intimidadas à
submissão à vontade, isto é, à boa vontade de um outro. Não absolutamente,
“porque é o certo”. Somente porque é conveniente.

Espere obediência
A mãe não tem outro dever mais sagrado do que o de formar o seu bebê
para a obediência instantânea. Agir assim não é tarefa difícil. A criança ainda
está “puxando nuvens de glória... de Deus, que é o seu lar.” O princípio da
obediência está dentro dela, esperando ser chamado ao exercício. Não há
necessidade de avaliar a criança, ou ameaçá-la, ou usar qualquer modo de
violência, pois os pais são investidos com autoridade que a criança
intuitivamente reconhece. É suficiente dizer “Faça isso” num tom sossegado,
com autoridade, e esperar que seja feito. A mãe frequente-mente perde o seu
controle sobre as crianças visto que elas detectam no tom da sua voz que ela não
espera eles obedecerem aos seus comandos. Ela não pensa o suficiente sobre a
sua posição, não tem confiança o bastante na sua própria autoridade. A grande
fortaleza da mãe está no hábito da obediência. Se ela começar exigindo que os
seus filhos sempre lhe obede-çam, ora, eles sempre agirão assim por rotina. Mas
faça-os pegar a extre-midade fina da fatia, faça-os descobrir que eles podem agir
diferentemente de obedecer, e uma luta aflitiva inicia, que comumente termina
nas crian-ças fazendo o que é certo aos seus próprios olhos.
Isso é o tipo de coisa que é fatal: as crianças estão num escritório e um
visitante é anunciado.
– Você tem de subir agora.
– Oh, querida mãe, deixe-nos ficar na janela do canto. Ficaremos
quietinhos como camundongos!
A mãe, ao contrário, orgulha-se das boas maneiras dos seus filhos, e eles
ficam. Não estão quietos, claro. Mas esse é o menor dos males. Eles tiveram
sucesso ao agir como queriam, não conforme foram mandados, e eles não
colocarão os seus pescoços sob o jugo novamente sem uma luta. São em
pequenas questões que a mãe piora.
– Hora de dormir, Willie!
– Oh, mamãe, só me deixe terminar isso.
E a mãe consente, esquecendo que o caso em questão não tem
consequência. A coisa que importa é que a criança esteja diariamente
confirmando um hábito de obediência pela repetição ininterrupta de atos de
obediência. É surpreendente o quão esperta a criança é para encontrar formas de
livrar o espírito, enquanto ela observa a letra.
– Mary, entre.
– Sim, mãe.
Mas a sua mãe chama quatro vezes antes que Mary venha.
– Ponha de lado os seus tijolos.
E os tijolos são postos de lado com lentos dedos relutantes.
– Você sempre tem de lavar as suas mãos quando você ouve o primeiro
sino.
A criança obedece por aquela vez, e não mais.
Para evitar essas exibições de teimosia, desde o início a mãe insistirá numa
obediência que é imediata, alegre e duradoura – salvo por lapsos de memória por
parte da criança. Tardia, sem vontade, quase não vale ter a obediência ocasional.
E é enormemente mais fácil dar à criança o hábito da obediência perfeita nunca
lhe permitindo qualquer outra coisa do que obter essa mera obediência formal
por um exercício constante de autoridade. Pouco a pouco, quando ele tiver idade
o bastante, tome a criança com confiança. Faça-a saber que coisa nobre é ser
capaz de fazer, num minuto e brilhantemente, a própria coisa que ela preferiria
não fazer. Para garantir esse hábito da obediência, a mãe tem de exercitar grande
autolimitação. Ela é obrigada a nunca dar um comando que não pretenda ver
realizado plenamente. E não tem de pôr sobre os seus filhos cargas, pesos, de
comando amontoado sobre comando para serem carregados.

A lei assegura a liberdade
Pode-se confiar com uma boa dose de liberdade nas crianças que são
formadas para aperfeiçoar a obediência: elas recebem algumas direções que elas
sabem que não têm de desobedecer. E quanto ao restante, elas são deixadas a
aprender como direcionar as suas próprias ações, mesmo às custas de alguns
pequenos azares. E não são infernizadas com um tiroteio perpétuo de “Faça
isso.” e “Não faça aquilo!”

8. VERACIDADE

É desnecessário dizer uma palavra sobre o dever da veracidade. Mas a
formação da criança no hábito da veracidade estrita é um outro problema que
exige cuidado delicado e escrúpulo por parte da mãe.

Três causas para mentir: todas viciosas
O vício de mentir causa: falta de cuidado ao apurar a verdade, falta de
cuidado ao declarar a verdade e uma intenção deliberada para enganar. Que
todas as três sejam viciosas, é evidente pelo fato de que o caráter de um homem
pode ser arruinado pelo que é não mais do que uma declaração descuidada por
parte de um outro. O falante repete uma observação prejudicial sem tomar o
problema para analisá-lo cuidadosa-mente. Ou ele repete o que ouviu ou viu com
tão pouco cuidado para proferir a verdade de maneira que a sua declaração não
se torna melhor do que uma mentira.

Somente um tipo prejudicial às crianças
Ora, dos três tipos de mentira, na verdade somente o terceiro é
prejudicial às crianças. No primeiro e no segundo, elas têm permissão. Dizem-
lhe que viu “muitos” cachorros sarapintados na cidade – na verda-de, viram dois;
que “todos os meninos” estão colecionando brasões – conhecem três que estão
fazendo isso; que “todo mundo” diz que o Jones é um “dedo-duro” – o fato é que
ouviram o Brown dizer isso. Essas saídas da veracidade estrita são de
importância delicada, de modo que a mãe pode deixá-las passar como “tagarelice
de crianças”, mas, na verdade, esse lapso está sempre danificando o senso de
verdade da criança: uma lâmina que facilmente perde a avidez do seu corte.

Precisão de declaração
A mãe que educa o seu filho para a precisão estrita de declaração a
respeito de coisas pequenas e grandes a fortifica contra as tentações das formas
mais grossas de mentir. Ela não irá colorir um conto imediata-mente conforme o
seu próprio gosto, suprimir fatos, equivocar-se, quando a declaração do fato
simples tiver se tornado um hábito atado e quando ela não tiver tido a permissão
de formar o hábito vicioso contrário de jogar com palavras rápida e soltamente.

Exagero e embelezamentos ridículos
Duas formas de prevaricação, muito tentadoras para a criança, exigirão
uma grande vigilância por parte da mãe: a de exagerar e a de pintar uma história
com embelezamentos ridículos. Ainda que uma cir-cunstância descrita pela
criança possa ser divertida, a mãe sem piedade tem de desmontar a história de
tudo sobre e acima da verdade nua, pois, de fato, uma reputação de brincalhão é
muito adquirida pela perda daquela dignidade de caráter, na criança ou no
homem, que acompanha o hábito da veracidade estrita. Felizmente, é possível
ser humorístico, sem qualquer sacrifício da verdade.

Reverência etc.
Quanto à reverência, à consideração pelos outros, ao respeito às pessoas
e propriedades, eu somente posso instar a importância de um cultivo cuidadoso
dessas qualidades morais – as marcas distintivas de uma natureza refinada – até
que se tornem hábitos da vida da criança. E mais: porque um temperamento
autoassertivo, agressivo, que se procura, é apenas característico demais dos
tempos nos quais vivemos.

Temperamento: nascido numa criança
No entanto, estou ansiosa para dizer algumas palavras sobre o hábito do
temperamento doce. É muito costumeiro julgar o temperamento como
constitucional, aquele que nasceu em você e não deve nem ser ajudado nem
atrapalhado. “Oh, ela é um ser pequeno de bom tempera-mento. Nada a
incomoda!”, “Oh, ele tem o temperamento do seu pai. A menor coisa que sai ao
contrário o faz perder as estribeiras.” são tipos de comentários que ouvimos
constantemente.

Não temperamento, mas tendência
Sem dúvida é verdade que as crianças herdam uma certa tendência à
irascibilidade ou à amabilidade, à irritabilidade, ao desconten-tamento, à
rabugice, ao emburramento, ao murmúrio e à impaciência; ou ao ânimo, à
confiabilidade, ao bom humor, à paciência e à humildade. É também verdade
que a felicidade ou a infelicidade da criança e do homem, bem como o conforto
ou o tormento das pessoas que vivem consigo, depende da preponderância de
qualquer uma dessas qualidades, isto é, do temperamento. Todos nós
conhecemos pessoas que possuem integridade e muitas virtudes excelentes e que
são intoleráveis com os seus pertences. A raiz do mal não é que essas pessoas
tenham nascido mal-humoradas, ou rabugentas, ou invejosas – isso poderia ser
corrigido –, mas que permiti-ram que elas crescessem com essas disposições.
Aqui, como em qualquer lugar, o poder do hábito é inestimável: cabe aos pais
corrigir a torcedura original, ainda mais se é deles que a criança pega, e ao
mundo mandar melhor o seu filho, com um temperamento regular, feliz,
inclinado a fazer as coisas melhores, olhar para o lado bom, atribuir os motivos
melhores e mais gentis aos outros e não fazer alegações extravagantes por conta
própria – fonte fértil de temperamentos feios. E isso porque a criança nasceu
com não mais que certas tendências.

Os pais têm de corrigir a tendência por um novo hábito de
temperamento
É por força do hábito que uma tendência se torna um temperamento. E
cabe à mãe dificultar a formação de temperamentos doentios, fazer crescer bons
temperamentos. Não é difícil fazer isso en-quanto o semblante da criança for um
livro aberto para a sua mãe; e ela lê os pensamentos do seu coração antes que a
própria criança esteja ciente deles. Lembrando que todo pensamento invejoso,
murmuroso, descontente, deixa uma trilha na própria substância do cérebro da
criança para esses pensamentos correrem de novo e de novo – que essa trilha,
essa rotina, por assim dizer, está sempre se abrindo e se aprofundando com o
tráfego de pensamentos feios. O cuidado da mãe é dificultar no princípio a
formação de qualquer trilha assim. Ela vê dentro da alma do seu filho, vê o
tempera-mento mau no ato de se erguer. Agora é a sua oportunidade.

Mude os pensamentos da criança
Que mudem os pensamentos da criança antes que o mau temperamento
tenha tempo de se desenvolver num sentimento consciente, muito menos num
ato. Leve-a para fora de casa, mande-a ir buscar ou carregar algo, conte-lhe ou
mostre-lhe algo interessante – numa palavra: dê-lhe algo mais para pensar, mas
tudo de uma maneira natural e sem que a criança perceba que está sendo tratada.
Como cada pedaço de emburramento deixa lugar na mente da criança para um
outro pedaço de emburramento sucedê-lo, cada pedaço evitado pelo tato da mãe
tende a obliterar os maus traços dos primeiros temperamentos emburrados. Ao
mesmo tempo, a mãe é cuidadosa para estabelecer uma estrada para o curso livre
de todos os pensamentos e sentimentos doces e geniais.
Eu tenho oferecido sugestões não para um curso de formação intelectual e
moral, mas somente para a formação de certos hábitos que devem ser, por assim
dizer, os trabalhos duros do caráter. Mesmo com esse programa limitado, eu
deixei inobservados muitos assuntos totalmente importantes como aqueles
alcançados. Na presença de um constrangi-mento de riquezas, foi necessário
adotar algum princípio de seleção. E achei bom permanecer em considerações
que não me parecessem deixar o seu peso todo com pais escolarizados, em vez
daqueles cuja força toda pessoa previdente reconhece.














PARTE V


AULAS COMO INSTRUMENTOS DE EDUCAÇÃO


1. A MATÉRIA E O MÉTODO DAS AULAS

Parece-me que vivemos numa época de pedagogia, que nós da profissão
do ensino estamos inclinados a tomar muito sobre nós e que os pais estão
prontos para ceder a responsabilidade da direção, bem como da instrução real,
mais do que é sadio para as crianças.

Os pais devem refletir sobre o assunto da instrução
Estou prestes a solicitar a sua atenção a um assunto que os pais estão
acostumados a deixar muito nas mãos do professor ou da governanta quando eles
mesmos não instruem os seus filhos. Quero dizer a escolha dos assuntos para a
instrução e as maneiras de lidar com esses assuntos. Os professores são as
pessoas que, mais do que outros, têm se dado à conside-ração do que uma
criança deve estudar e como fazê-lo, mas os pais também devem ter pensado
nesse assunto, e, mesmo quando não profes-sem ou ensinem os seus filhos,
devem ter as suas próprias opiniões cuida-dosamente formadas com relação ao
assunto e ao método da sua educação intelectual – e isso para o bem do professor
como também das crianças. Nada dá mais vitalidade e propósito ao trabalho do
professor do que a certeza de que os pais dos seus estudantes o acompanham.
Mesmo quando as crianças vão a escolas onde pessoas qualificadas
ensinam, algum insight da parte dos pais é útil para dificultar que o professor
caia num sulco, valorizando a proficiência nesta ou naquela matéria por si
mesma, e não conforme afete as crianças. Mas nos primei-ros dias da sala de
aula domiciliar, é iníquo deixar a jovem governanta, com pouca qualificação
além do seu francês ou alemão nativo, ou inglês escasso, esboçar um curso para
si mesma e seus preços. Que as crianças percam o seu tempo, é o menor dos
males que se acumulam: elas estão formando hábitos mortos contra o esforço
intelectual. E, pouco a pouco, quando forem à escola, as aulas irão além da sua
compreensão, o trabalho deslizará pelos seus dedos e as suas capacidades de
resistência passiva desnortearão os professores mais árduos.

A casa: o melhor terreno de crescimento para crianças novas
A mesma coisa: quaisquer que sejam as vantagens do jardim de infância
ou de outras escolas para criancinhas, a sala de aula domiciliar deve ser o melhor
terreno de crescimento para elas. E sem dúvida seria assim, se a mãe tivesse a
liberdade de se dedicar à instrução dos seus filhos, mas ela raramente está livre
para agir. Se ela pode viver numa cidade, pode mandá-las à escola quando
tiverem seis anos de idade; se vive no campo, ela tem de ter uma governanta. E a
dificuldade é conseguir uma mulher que não só tenha entendimento dos assuntos
os quais ela se encarregará de ensinar, mas também que entenda, em alguma
medida, a natureza da criança, a arte e os objetivos da educação; uma mulher
capaz de extrair o máximo das crianças sem desperdício de capacidade ou de
tempo. Essa rara avis[85] não se apresenta em resposta a todo anúncio; e, na falta
de uma professora formada, a mãe tem de se encarregar de formar a governanta,
isto é, ela pode completar com o seu próprio insight o conhecimento e a
experiência escassos da jovem professora. “Gostaria que ensinasse as crianças a
ler, assim e assim, porque...” ou “estudar história de tal maneira que as aulas
possam ter tais e tais efeitos.” Meia hora de conversa desse tipo com uma
governanta sensível assegurará o trabalho de um mês inteiro para as crianças,
bem direcionado, de modo que muito é feito em pouco tempo, com uma margem
mais larga possível garantida para brincar e se exercitar ao ar livre.

Três questões para a mãe
Mas se a mãe deve dar à governanta as suas visões com relação ao
ensino da escrita, do francês, da geografia, ela mesma tem de ter visões
definidas. Tem de se perguntar seriamente: por que as crianças têm de estudar
mesmo? O que devem estudar? Como devem estudar? Se ela se der ao trabalho
de encontrar uma resposta definitiva e considerada para cada uma dessas três
perguntas, ela estará numa posição de direcionar os estudos dos seus filhos. E, ao
mesmo tempo, ficará surpresa por descobrir que três quartos do tempo e trabalho
ordinariamente gastos pela criança nas suas aulas é tempo perdido e energia
gasta.

As crianças aprendem a crescer
Por que as crianças têm de estudar? Por que comemos? Não é para que
o corpo possa viver, crescer e ser capaz de realizar as suas funções?
Precisamente assim a mente tem de ser sustentada e desenvolvida medi-ante a
comida conveniente a ela, o pabulum[86] mental do conhecimento assimilado.
Ainda, o corpo é desenvolvido não somente por meio do próprio sustento, mas
pelo exercício apropriado de cada um dos seus membros.
Outro dia, uma jovem mãe comentou comigo que antes do seu
casamento tinha braços finos que nunca gostava de exibir, mas um forte bebê de
cinco meses a curou daquilo: ela podia sacudi-lo e erguê-lo com facilidade e
agora podia mostrar braços bem arredondados a qualquer pessoa. E, assim como
os membros crescem fortes com exercícios, também o esforço intelectual com
uma dada capacidade da mente torna aquela capacidade efetiva. As pessoas
costumam negligenciar o fato de que a mente tem o seu alimento: nós
aprendemos que podemos conhecer, não que podemos crescer. Daí o ditado de
lições feito papagaio, o abarrota-mento de fatos mal digeridos para exames,
todas as formas de assimilar conhecimento que a mente não assimila.

Tratamento do material de conhecimento
Por outro lado, especialistas podem atribuir importância demais a
diversos exercícios das “faculdades” mentais. Nós deparamos com livros sobre
ensino, com aulas traçadas de maneira elaborada, nos quais certo trabalho é
ordenado às faculdades de perspectiva, certo trabalho à imagi-nação, ao juízo, e
assim por diante. Ora, essa doutrina das faculdades, que repousa sobre uma falsa
analogia entre a mente e o corpo, está a caminho do limbo onde os “choques” do
frenologista agora descansam em paz. A mente pareceria una e indivisível,
dotada de capacidades múltiplas. E esse tipo de tratamento do material de
conhecimento é desnecessário para a criança saudável, cuja mente é capaz de
autodireção e de se aplicar ao seu próprio trabalho sobre a parcela de
conhecimento entregue à mente. Quase toda disciplina que o senso comum
aponta como apropriada para a instru-ção de crianças proporcionará exercício
para todas as suas capacidades, se apresentados apropriadamente.

As crianças aprendem a ter ideias
Em segundo lugar, a criança tem de estudar a fim de que as ideias
possam ser livremente semeadas no solo frutífero da sua mente. “Ideia, a
imagem ou quadro formado pela mente de qualquer coisa externa, seja sensível,
seja espiritual.” – assim diz o dicionário. Portanto, se a função do ensino é
modelar a criança com ideias, qualquer ensino que não a faça possuir uma nova
imagem mental perdeu a sua meta até então. Agora, pense no caminho apático
no qual as crianças frequentemente se arrastam pela leitura e mesas, geografia e
cálculos, e ver-se-á que é uma coisa rara, para qualquer parte de qualquer aula,
que elas brilhem com a vivacidade que deixa para trás uma imagem mental. Não
é demais dizer que uma manhã na qual uma criança não recebe uma ideia nova é
uma manhã desperdiçada, mesmo que o pequeno estudante tenha se mantido
perto dos seus livros.

As ideias crescem e produzem segundo a sua espécie
O dicionário me parece escassear a verdade na sua definição do termo
“ideia”. Uma ideia é mais do que uma imagem ou um quadro. É, por assim dizer,
um germe espiritual dotado de força vital, isto é, com capaci-dade para crescer e
produzir segundo a sua espécie. É próprio da natureza da ideia crescer: como o
germe vegetal esconde aquilo pelo qual vive, assim, implante razoavelmente
uma ideia na mente da criança e ela esconderá o seu próprio alimento, crescerá e
carregará frutos na forma de uma sucessão de ideias aparentadas. Sabemos a
partir da nossa expe-riência: que a nossa atenção seja forçosamente direcionada
a alguma personagem pública, a alguma teoria sensacional, e, depois de dias,
esta-remos continuamente ouvindo ou lendo alguma coisa que suporta esse
mesmo assunto, como se todo o mundo estivesse pensando sobre o que ocupa os
nossos pensamentos. O fato é que aquela nova ideia que recebe-mos está no ato
do crescimento e está a ponto de chegar ao seu alimento apropriado. Esse
processo de alimentação continua com avidez peculiar na infância, e o
crescimento de uma ideia na criança é proporcionalmente rápido.

Scott e Stephenson trabalhavam com ideias
Scott[87] teve uma ideia, um grupo inteiro de ideias, dos contos e baladas
da fronteira, o folclore da zona rural, do qual a sua infância foi alimentada: as
suas ideias cresceram e produziram, e os romances de Wa-verley são o fruto que
elas trazem. George Stephenson[88] fez pequenos motores de barro com o seu
companheiro Thomas Tholoway. Pouco a pouco, quando se tornou um
engenheiro, aquele estava sempre assistindo ao seu motor, limpando-o,
estudando-o. Um motor foi a sua ideia dominan-te a qual se desenvolveu em
nada menos que uma locomotiva.

O valor das ideias dominantes
Mas como essa teoria do caráter vital e frutífero das ideias se põe diante
da educação da criança? Desta forma: dê ao seu filho uma simples ideia valiosa e
você terá feito mais para a sua educação do que se tivesse posto na sua mente a
carga de centenas de informações, pois a criança que cresce com algumas ideias
dominantes tem a sua autoeducação fornecida pela sua carreira balizada.

As aulas têm de modelar as ideias
Para a recepção de uma ideia, a mente tem de estar numa atitude de
atenção ansiosa, e consideramos em algum outro lugar como garantir esse
estado. Mais uma coisa: uma ideia simples pode ser uma posse tão preciosa em
si mesma, tão proveitosa, que os pais não podem permitir que a seleção de ideias
da criança seja um assunto fortuito. As suas aulas devem modelá-la com tais
ideias como também se dirigirão para a sua educação posterior.

As crianças aprendem a ter conhecimento
Mas não é somente para assegurar o devido crescimento intelec-tual e
modelação da sua mente com ideias que a criança tem de estudar: a noção
comum – a de que ela estuda para ter conhecimento – também é verdadeira,
tanto que nenhum conhecimento deve ser tão precioso como aquele ganho na
infância, nenhum conhecimento posterior é tão clara-mente registrado no
cérebro, nem tão útil, quanto a fundação daquele a seguir. Ao mesmo tempo, a
capacidade da criança para o conhecimento é muito limitada. Pelo menos a esse
respeito, a sua mente é apenas um frasquinho com um gargalo estreito. Por
conseguinte, cabe aos pais ou ao professor derramar ali somente o melhor.

Conhecimento diluído
Mas pobres crianças. Tão frequentemente elas são mal usadas pelos
seus melhores amigos na questão do conhecimento oferecido a elas. Pessoas
adultas que não são mães falam e pensam muito mais infantil-mente do que a
criança nos seus esforços para abordar a sua mente. Se uma criança fala um
disparate, é porque os seus mais velhos têm o hábito de lhe falar disparates.
Deixe-a por si mesma, e os seus comentários serão sábios e sensíveis até onde a
sua pequena experiência guiá-la. Raramente as mães depreciam os seus filhos.
Elas são íntimas demais das suas pessoinhas e têm, portanto, respeito demais por
elas. Mas professores profissionais, sejam os escritores de livros, sejam os
ministradores de aulas, são muito sujeitos a apresentar um simples grão de
conhecimento puro num galão inteiro de conversa, impondo sobre a criança o
trabalho de discernir o grão e de extraí-lo da enchente sem valor.

O conhecimento do Dr. Arnold quando era criança
No geral, as crianças que crescem entre os seus mais velhos e não
recebem absolutamente o que é chamado de livros de criança se saem melhor no
que são capazes de colher por si mesmas da literatura das pessoas adultas. Assim
se conta sobre o Dr. Arnold: que quando ele tinha três anos de idade ele recebeu
como um presente do seu pai a History of England de Smollett[89] como uma
recompensa pela precisão com que ele passou pelas histórias conectadas com os
retratos e quadros de reinos sucessivos – um passatempo que provavelmente
estabeleceu o fundamento do grande amor por história que o distinguiu na vida
adulta. Quando ocupava a cadeira professoral em Oxford, é-nos dito que ele
fazia citações das Lectures on History do Dr. Priestley[90] – citações verbalmente
precisas, podemos acreditar, pois esse era o hábito da sua mente; além disso,
uma criança tem pouca habilidade de refazer o seu assunto. E isso embora não
tivesse o livro nas mãos desde que era uma criança de oito anos de idade. Sem
dúvida, foi uma criança excepcional. E tudo o que eu sustento é que, se a sua
leitura tivesse sido o tipo de tolice diluída que é comumente empurrada sobre as
crianças, ter-lhe-ia sido impossível citar passagens por uma semana, muito
menos uns dois anos de anotação, após a leitura.

A literatura apropriada para crianças
Esse tipo de literatura fraca para as crianças, tanto em qualquer história
quanto nos livros didáticos, é o resultado de um processo reacio-nário. Não
muito tempo atrás, a impressão atual era de que as crianças tinham pouco
entendimento, mas memória prodigiosa para fatos. Datas, números, regras,
catecismos de conhecimento, muita informação em par-celas pequenas, devia ser
o material adequado para a educação de uma criança. Nós mudamos tudo isso e
pusemos nas mãos das crianças livros didáticos com imagens bonitas e falas
fáceis, quase tão boas quanto livros de história. Mas afinal não vemos que
estamos apenas dando as mesmas pílulas pequenas de conhecimento na forma de
um solvente fraco e abun-dante. Professores, e mesmo pais, que são cuidadosos
o bastante com a dieta das suas crianças, são tão imprudentes quanto ao tipo de
alimento mental oferecido a elas que eu estou excessivamente ansiosa para
firmar uma consideração sobre essa questão: aulas e literatura apropriadas para
as pessoinhas.

Quatro testes que devem ser aplicados às aulas das crianças
Então vemos que as aulas das crianças devem fornecer material para o
seu crescimento mental, exercitar as diversas capacidades das suas mentes,
moldá-las com ideias proveitosas e lhes proporcionar conhecimen-to, realmente
valioso para o seu próprio bem, preciso e interessante, do tipo que a criança
possa lembrar como um homem com proveito e prazer. Antes de aplicar esses
testes às várias disciplinas na quais as crianças são comumente instruídas, posso
lhe lembrar de dois ou três pontos que eu tentei estabelecer nas páginas
precedentes:

Résumé[91] de seis pontos já considerados

a) Que o conhecimento mais valioso para a criança seja aquele obtido com
os seus próprios olhos, ouvidos e dedos (sob direção) ao ar livre;
b) Que não sejam permitidas que as alegações da sala de aula invadam o
direito da criança de ansiar por horas de exercício e investigação diários;
c) Que a criança seja levada diariamente, se possível, a cenas – brejo ou
pasto, parque, terra comum, costa – onde ela possa encontrar novas
coisas para examinar, e assim acrescentar ao seu armazém de
conhecimento real. Que a observação da criança seja direciona-da à flor
ou ao pedregulho, à ave ou à árvore. Que, de fato, ela se empenhe em
juntar as informações comuns que são a base do conhecimento
científico;
d) Que a brincadeira, brincadeira vigorosa e saudável, seja, por sua vez, tão
importante quanto as aulas, com respeito tanto à saúde corporal quanto à
capacidade do cérebro;
e) Que a criança, ainda que sob supervisão, seja deixada muito a si mesma:
tanto para que possa ir ao trabalho no seu próprio cami-nho sobre as
ideias que ela recebe, quanto para que possa ser mais aberta às
influências naturais;
f) Que a felicidade da criança seja condição para o seu progresso. Que as
suas aulas sejam alegres e que as ocasiões de atrito na sala de aula sejam
censuradas com nobreza.

Prometendo tanto, agora vamos considerar: o que a criança deve estudar
e como deve ser ensinadas.


2. O JARDIM DE INFÂNCIA
COMO UM LUGAR DE EDUCAÇÃO

Mãe: a melhor Kindergärtnerin[92]
Nem é preciso discutir aqui os méritos do jardim de infância. O sucesso
dessa escola exige raras qualidades da professora: alta cultura, algum
conhecimento de psicologia e da arte da educação, simpatia intensa com as
crianças, muito tato, muito senso comum, muita informação comum, muito
“júbilo de natureza” e muita capacidade de governar. Numa palavra, o método
do jardim de infância é bem planejado para levar a criança en rapport[93] com
uma inteligência superior. Com esse ser superior para conduzi-la, o jardim de
infância é lindo: “É como um céuzinho embai-xo.” Mas ponha uma mulher
comum encarregada de tal escola, que os presentes, jogos e ocupações
concebidos encantadoramente se tornarão muitos instrumentos de ensino
grosseiro. Se a própria essência do método do jardim de infância é a influência
pessoal, uma espécie de mesmerismo espiritual, a consequência é que a mãe é
naturalmente a melhor Kinder-gärtnerin, pois quem melhor que ela para ter o
tato, a simpatia, o senso comum, a cultura, indispensáveis?




Portanto, a pré-escola não precisa ser um jardim de infância
Embora toda mãe devesse ser uma Kindergärtnerin, no sentido em que
Froebel[94] empregaria o termo, a consequência não é que toda pré-escola deva
ser um jardim de infância regularmente organizado. De fato, o maquinário do
jardim de infância é nada mais que um dispositivo para assegurar a realização de
certos princípios educacionais, e é função da mãe chegar a alguns desses e
trabalhar conforme os métodos de Froebel – ou os seus próprios. Por exemplo,
no jardim de infância, os sentidos da criança são cuidadosa e progressivamente
formados: ela olha, escuta, aprende pelo toque; obtém ideias de tamanho, cor,
forma, número; é ensinada a copiar fielmente, expressar-se exatamente. E, nessa
formação dos sentidos, a criança se dedica ao método que formata para si mesma
nos seus primeiros estudos sobre anel ou bola.

Campo de conhecimento circunscrito demais
Mas é possível que a capacidade maravilhosa da criança de obter
conhecimento mediante os seus sentidos possa ser subestimada; que o campo
possa ser circunscrito demais; e que, durante os primeiros seis ou sete anos nos
quais poderia ter se familiarizado intimamente com as propriedades e a história
de todo objeto natural dentro do seu alcance, ela tenha obtido ideias exatas, é
verdade: poder distinguir um romboide de um pentágono, uma cor primária de
uma secundária, aprender a ver tão verdadeiramente de maneira que possa copiar
o que vê num papel dobrado ou numa palha entrelaçada. Mas isso às custas de
muito daquele conheci-mento real do mundo externo que, em nenhuma época da
sua vida, ela estará tão ajustada para adquirir. Consequentemente, enquanto a
exata formação bem graduada do jardim de infância pode ser de valor, a mãe se
empenhará em dá-la a propósito, e de modo algum deixará atrapalhar aquela
formação mais ampla dos sentidos, para assegurar aos seus filhos um dever
primordial.
Ainda, no jardim de infância, a criança é posta sob certas tarefas somente à
medida que tem competência para realizá-las, e então, o que quer que seja que
ela tenha que fazer, espera-se que o faça perfeitamente. Eu vi uma criança de
quatro anos de idade se ruborizar e parecer como autocondenada porque dobrou
um pedaço de papel irregularmente, como se fosse descoberta numa falsidade.
Mas a mãe ou a cuidadora é bem capaz de garantir que os pequenos ofícios da
criança sejam perfeitamente executados, e – aqui é um ponto importante – sem
que o menor sinal de ansiedade preocupante possa ser observado no trabalho das
crianças para agradar àquela deusa sorridente, a sua “Kindergärtnerin”.

Treinamento de um olho justo e uma mão fiel
As “ocupações” do jardim de infância proporcionam oportunidades para
a formação nesse tipo de fidelidade, mas ocorrem milhares de oportunidades
assim na casa. Se fosse possível, em bobeiras como arrumar a toalha de uma
mesa ou um quadro, pendurar uma toalha, empacotar uma encomenda – toda
mãe séria inventa milhares de formas de formar no seu filho um olho justo e uma
mão fiel. Todavia, como um meio de formação metódica, bem como de trabalho
feliz, a introdução de alguns jogos e ocupações do jardim de infância na creche
pode ser permitida, dado que a mãe não depende deles, mas faz todas as
ocupações da criança facilitarem os propósitos da sua educação.

“Doçura e luz” no jardim de infância
A criança respira uma atmosfera de “doçura e luz” no jardim de
infância. Você vê o garoto de rua robusto de cinco anos endurecer as suas costas
e recusar ser uma rã saltitante, e a Kindergärtnerin vem com gentileza serena,
pega-o pela mão e o conduz fora do círculo. Ele não é tratado como um ofensor:
ele só não escolhe fazer como os outros fazem, portanto ele não é querido lá. Na
próxima vez, ele ficará bastante contente por ser uma rã. Aqui temos o princípio
para a disciplina da creche. Não trate a pequena contumácia da criança muito
seriamente. Não assuma que ela está sendo malcriada. Apenas deixe-a fora
quando ela não estiver preparada para agir em harmonia com o restante. Evite
atrito, e, acima de tudo, não a deixe perturbar a atmosfera moral com toda a
gentileza e serenidade. Remova-a da companhia dos outros quando ela estiver
sendo o que as cuidadoras chamam de “cansativa”.
Mais uma vez, o jardim de infância professa tomar conta da alegria da
natureza da criança. Permita-lhe expressão plena e livre para o contentamento
que há nela, sem o “barulho” que segue se ela é deixada a si mesma para
encontrar uma saída para a sua vida exuberante. Essa união de júbilo e gentileza
é o próprio temperamento a ser cultivado na creche. O comportamento
barulhento permitido às vezes nas crianças é desnecessário – dentro de casa, de
qualquer forma. Mas mesmo uma ausência momentânea de luz solar sobre os
rostos das suas crianças será uma causa mais grave de dificuldade para a mãe.
No geral, podemos dizer que alguns dos princípios que devem governar a
formação do jardim de infância são precisamente aqueles nos quais toda mãe
séria se encarrega de criar na sua família, enquanto são desnecessárias as
práticas do jardim de infância – somente formas, entre outras, de realizar esses
princípios, e capazes de se tornar estereotipadas e grosseiras; mas podem ser
adotadas, até que elas se adequem convenientemente com o esquema geral da
mãe para a educação da sua família.


3. MAIS CONSIDERAÇÕES
SOBRE O JARDIM DE INFÂNCIA

A infância de Tolstói[95]
Possivelmente, não há campo de pesquisa conhecido no qual tão pouco
trabalho disponível tenha sido como naquele coberto pela palavra “crianças”. A
“terra justa” está embaixo dos nossos próprios olhos, mas quem quer que a
mapeie tem de escrever “inexplorada” através de vastos espaços. Pessoas sérias
começam a suspeitar de que os enganos que cometemos por meio dessa
ignorância são graves e danosos. Por exemplo, todos os nossos esquemas de
educação não estão fundados no pressuposto de que a mente de uma criança – o
seu “homem que pensa, que sente” – começa “muito pequena” e se torna grande
com o crescimento do seu corpo? Não podemos dizer se de fato esse é o caso. As
crianças se mantêm a si mesmas de um modo geral, não obstante os seus modos
de vencer e confidências francas. Mas se por acaso um de nós pega uma criança
mostrada a outra, ela fica surpresa por descobrir que a primeira tem de longe a
inteligência mais aguçada, os pensamentos mais sábios, a maior alma das duas.
Quando o gênio pode erguer a máscara e nos mostrar uma criança, ele faz um
serviço que, no nosso atual estado de pensamento, dificilmente podemos elogiar.
E quando o gênio ou a simplicidade, ou ambos, tiver-nos dado esses estudos o
suficiente para generalizar, sem dúvida reconsideraremos o assunto inteiro e
ficaremos no mínimo desani-mados pelo que temos posto sobre as crianças em
nome da educação. O Conde de Tolstói nos dá, em Infância, Adolescência e
Juventude[96], um retrato infantil inconfundível, uma miniatura na qual uma mãe
pode ver o seu filho e reconhecer o que e quanto há nele:

“Como a nossa própria mãe querida[97],”

O amiguinho escreve, nos versos que faz para o aniversário da sua avó.
E então, quando os versos vêm a ser lidos, ah! A humilhação da alma pela qual
ele passa, e quão seguramente ele espera que o pai e a avó o considerem um
hipócrita. “Por que eu escrevi isso? Ela não está aqui e não era necessário
mencioná-la. Eu amo a vovó, é verdade. Eu a reverencio, mas ainda assim ela
não é a mesma. Por que eu escrevi isso? Por que eu menti?” Esse é o tipo de
coisa que existe nas crianças. Reconhecemos isso conforme lemos, e nos
lembramos dos dias escuros, infantis quando nós também tínhamos um “órgão
de verdade” tão requintadamente delicado. E a recordação deve acelerar a nossa
reverência das consciências carinhosas das crianças.

“A História de uma Criança”
Enquanto falo desse assunto, gostaria de mencionar um outro livro que
contém a autorrevelação de uma criança: uma criança que uma vez foi, para
prestar depoimento, convocada do abismo escuro do tempo. Esse é o tipo de
estudo de uma criança que é realmente precioso, porque não deve ser tido em
outros termos senão em nos lembrar a nossa própria infância, vivificando-a,
reproduzindo-a, por mera força da capacidade imaginativa. Essa é absolutamente
a única forma de entrar em simpatia com crianças, pois elas, com todas as suas
confidências francas e tagarelices imediatas, são pessoinhas bastante
inescrutáveis, que nunca dizem a ninguém o tipo de coisa que leem nessa
“História”. Não há necessidade de um contar ao outro, pois outras crianças
sabem, e, quanto a contar aos adultos, são completamente persuadidas de que
nenhum adulto, nem mesmo a mãe, poderia entender. O Otto poderia, talvez, e as
confidências serão colocadas no ouvido de um cachorro sobre o que a mãe
amável se explica em vão.

“Cada uma na sua esfera escondida de júbilo ou angústia,
Os nossos espíritos eremitas habitam, e vão além;
Os nossos olhos veem tudo em torno em melancolia ou calor,
As suas próprias matizes, frescas emprestadas do coração.”


“Each in his hidden sphere of joy or woe,
Our hermit spirits dwell, and range apart;
Our eyes see all around in gloom or glow,
Hues of their own, fresh borrow’d from the heart[98].”

E esse caso é ainda mais notável com crianças do que com nós mesmos.
É uma lei da nossa natureza contra a qual é absolutamente inútil lutar, e os
nossos únicos meios de intimidade verdadeira com uma criança são o poder de
recuperar a nossa própria infância – um poder que somos capazes de deixar
escapulir como se não tivesse importância vital. Isso a Srtª. Margaret Deland nos
ajuda a fazer: nós reconhecemos os nossos eus velhos, com uma diferença, em
Ellen. Tão irracionais, inconsequentes, amáveis e heroicos, e geralmente
cansativos ao mundo adulto, eram os nossos próprios impulsos de muito tempo
atrás, ao qual nós olhamos de volta com ternura, mas raramente com
complacência. Se, após ler “A História de uma Criança”, nos posicionamos um
pouco mais humilde e timidamente, prontos para acreditar mais do que vemos,
ora, isso não nos fará nenhum mal: abençoa e ajuda as crianças. Gostaríamos de
divergir de uma palavra da autora. A Srtª. Deland pensa que pode ser saudável
para os mais velhos entender as crianças melhor, mas para as crianças, ora, ela
pensa que a maioria de nós cresce maravilhosamente bem apesar dessa e de
todas as outras dificuldades. Em certo sentido, isso é verdade, mas, em outro,
uma das coisas mais tristes na vida é o problema do esplêndido material infantil
no lugar comum, uma maturidade desinteressante, de um tipo para o qual o
mundo parece nem ser o melhor nem o pior.
A infância de Tolstói e a da pequena heroína Srtª. Deland parece-riam
ser um clamor distante do “jardim de infância”, porém, na verdade, essas duas
revelações do que as crianças são levam a nossa controvérsia a um ponto.
Dizem-nos que “mas ontem, na Universidade de Edimburgo, a maior
figura na Faculdade foi o Sr. James Simpson, o descobridor do clorofórmio. No
outro dia, o bibliotecário da Universidade pediu ao seu sucessor e sobrinho,
Professor Simpson, que fosse à biblioteca e pegasse os livros sobre a sua
disciplina que não era mais necessária. E a sua resposta ao bibliotecário foi esta:
‘Pegue todo livro-texto que tenha mais que dez anos de idade e ponha no
porão.’’’ Conforme a educação seja uma ciência, a verdade ainda que de dez –
muito mais, cem – anos atrás não é a verdade toda de hoje.
“Pensamentos além dos seus pensamentos àqueles importantes videntes
foram dados.”, e, à medida que a urgência do esforço educacional nos pressionar,
haverá o ardor do nosso apreço, a diligência do nosso trabalho, daquelas
verdades que grandes pioneiros, Froebel e o restante, conquistaram por nós por
não menos que um insight profético. Mas ai dos anseios da natureza humana
preguiçosa! Podemos não ter um papa educacional. Temos que pensar por nós
mesmos, assim como fazer dar certo, aquelas coisas que pertencem à criação
perfeita das nossas crianças.

O que devemos a Froebel
Nós reverenciamos Froebel. Compartilhamos de muitos grandes
pensamentos seus. Não podemos dizer “emprestar”, porque alguns, como as
relações da criança com o universo, são pelo menos tão velhos quanto Platão.
Outros pertencem à prática e experiência universais, e isso mostra a sua retidão
psicológica. Froebel juntou pensamentos e práticas difusos num sistema, mas fez
algo maior que isso. Ele ergueu um altar para o entusiasmo da infância sobre o
qual a chama, desde então, nunca se foi. A verdadeira Kindergärtnerin é a artista
entre as professoras. Ela é preen-chida com a inspiração do seu trabalho, e
provavelmente a maioria das professoras sinceras pegaram algo do seu fervor,
alguma percepção da beleza da infância e do deleite encantador do trabalho
verdadeiramente educacional.

Requisitos de uma pessoa
No entanto, eu faço uma ressalva. O nosso primeiro cuidado deve ser
preservar a individualidade, dar um divertimento à personalidade das crianças.
Agora, as pessoas não crescem num jardim, muito menos numa estufa. É um
benefício duvidoso para uma pessoa ter condições muito cuidadosamente
adaptadas às suas necessidades. A luz solar e a sombra bem convenientes, a poda
e a formação, são boas para uma planta cujos usos são subordinados, por assim
dizer, às necessidades e prazeres do seu dono. Mas uma pessoa que tem outros
usos no mundo, e a mãe ou a professora que a considera como uma planta e a si
mesma como a jardi-neira, somente será preservada de erros graves pela força da
natureza humana em si mesma e na criança.

A Natureza como uma educadora
A noção de suprir a Natureza desde o berço é perigosa. A Natureza nos
pede um pouco de guia, um pouco de restrição, muita observação reverente.
Mas, além disso, é sabedoria dos pais deixar as crianças tanto quanto possível à
Natureza e “a um Poder maior do que a própria Natu-reza”.

O perigo de subestimar a inteligência das crianças
Aqueles de nós que viram um garoto de rua de sete anos usando rodas
de Catarina[99] rua abaixo, ou um grupo de garotinhas dançando com um realejo,
ou garotinhos e garotinhas numa soleira dando aos seus bebês o que Dickens
chama “alimentação seca”, ou uma garotinha enviada pela sua mãe para fazer
quatro compras cuidadosas com seis centésimos de libra e levar para casa o
troco, não estão prontos para acreditar que os desenvolvimentos físico, mental e
moral esperam, por assim dizer, o ensi-no do jardim de infância. De fato, estou
inclinada a questionar se, com o interesse de pôr um sistema em prática, a
encantadora Kindergärtnerin não está às vezes em perigo de subestimar
enormemente a inteligência das suas crianças. Eu conheço uma pessoa de três
anos que foi encontrada sozinha no escritório por alguém que telefonou. Era
primavera e a pessoa que telefonou pensou estar se entretendo com conversa
sobre “carneiri-nhos” bonitos. Mas um par de grandes olhos azuis estava fixo
sobre ela e uma pessoa solene fez esta observação solene: “Não é uma coisa má
demais ver um porco morto?” Esperamos que ela nunca tenha visto a morte de
um porco ou mesmo ouvido sobre isso, mas ela fez um protesto tão efetivo
contra o disparate como qualquer mulher da sociedade faria. Bôeres e
montinhos, russos e japoneses, Treasure Island[100], Robinson Crusoe e o seu
homem Friday, a Batalha das Termópilas[101], Ulisses e os Pretendentes[102]: esses
são os tipos de coisas com que as crianças brincam juntas por mês. Mesmos as
crianças de três e quatro anos que estão começando a andar manterão as suas
próprias coisas bravamente com os seus irmãos e irmãs. E, se as pessoinhas
tivessem o hábito de dizer como se sentem, talvez aprendêssemos que elas se
entediam com os bons jogui-nhos nos quais elas brincam como cordeiros, batem
as barbatanas e giram os seus dedos como borboletas.

Todos nós gostamos de ser bem-humorados
Diz o leitor: “Mas as crianças fazem todas essas coisas tão praze-rosa e
alegremente no jardim de infância!” É uma coisa curiosa da natureza humana
que todos gostemos de ser controlados por pessoas que se esforçam para usar as
nossas afabilidades. Até um cachorro pode ser tolamente sentimental. E se nós,
que somos mais velhos, temos as nossas fraquezas desse tipo, impressiona pouco
que as crianças possam ser aduladas para fazer qualquer coisa por pessoas cujas
abordagens a elas sempre sejam encantadoras. É verdade que “W. V.”, a criança
que o mundo aprendeu a amar, cantava as suas canções de jardim de infância
com mãozinhas acenando no “ar tão azul”, mas isso foi para o deleite e a
desilusão dos mais velhos quando a hora de dormir chegou. “W. V.” tinha
maiores pensamentos outras vezes.

Os professores medeiam demais
Provavelmente, ainda existem jardins de infância onde uma grande
quantidade de disparates é dita na canção e na história, em que a professora
concebe que cumprir a sua função ao máximo é fazer poemas para as crianças
por si mesma e compor tons para o seu canto para desenhar imagens para
admirarem. As crianças podem ecoar a queixa de “o mundo” de Wordsworth e
dizer que a professora está demais conosco, tarde e cedo. Tudo é direcionado,
esperado, sugerido. Nenhuma outra personalidade fora do livro, da imagem ou
da canção. Não. Nem mesmo a da própria Natureza pode chegar às crianças sem
a mediação da profes-sora. Nenhum espaço é deixado para a espontaneidade ou
iniciação pes-soal por parte sua.

O perigo do magnetismo pessoal
A maioria de nós está enganada pelas nossas virtudes. E todo o zelo e
entusiasmo da Kindergärtnerin talvez seja a sua pedra de tropeço. “Mas as
crianças são tão felizes e boas!” Precisamente. O infantário domi-ciliar de modo
algum é uma cena de paz, e me arrisco a pensá-lo como um melhor lugar de
crescimento. Agrada-me ver que um froebeliano eminente proteste contra o
elemento de magnetismo pessoal na professora, mas há, ou houve, uma boa
quantidade desse elemento no jardim de infância bem-sucedido. E todos
sabemos como perdemos vigor e individualidade sob esse tipo de influência.
Mesmo à parte desse elemento de charme, duvido se a propriedade da vida de se
autoajustar no jardim de infância seja boa para as crianças.

“Jardim de infância”: uma falsa analogia
O mundo sofreu naquela manhã quando o nome feliz de “jardim de
infância” se sugeriu ao maior entre os “pais” educacionais. Sem dúvida, foi
simples e adequado na sua primeira intenção por significar uma vida de jardim
fora de casa para as crianças. Mas uma falsa analogia dificultou ou matou mais
do que um sistema filosófico: a criança se tornou uma planta num jardim bem
ordenado. A analogia apelou para a mente alemã ordenada, científica, que não
aprova muito o movimento irregular, espon-tâneo de qualquer espécie. Cultura,
estímulo justo, doçura e luz se torna-ram as características principais de um
ótimo código educacional. Do encanamento ao quadro e daí ao canteiro de
flores, a plantinha consegue na devida proporção o que é bom para ela. Ela
cresce de uma maneira parecida, em classificações ordenadas. E na estação
adequada desenvolve a sua flor.
Ora, imaginar uma pessoa, por qualquer analogia que seja, é perigoso e
enganador. Não há nada na natureza proporcional à pessoa. Porque a analogia da
planta do jardim é mais atrativa, ela é a mais enganadora. Manifestações de
propósito numa planta são maravilhosas e deliciosas, mas numa pessoa essas
manifestações são simplesmente nor-mais. O efeito de qualquer pensamento é
necessariamente moldado por aquele pensamento, e ter um jardim cultivado
como o plano básico do nosso pensamento educacional ou não significa
absolutamente nada, o que seria errado o Mestre supor, ou significa interferência
indevida com o desenvolvimento espontâneo de um ser humano.

“Brincadeiras maternas”: enérgicas demais para uma criança
Comecemos com as “brincadeiras maternas”, uma doce concepção,
trabalhada muito amavelmente. Mas consideremos: um bebê está requin-
tadamente ciente de todo humor da sua mãe – o rostinho se obscurece com pesar
ou sorri com júbilo em resposta à expressão dela. Os dois deixados a si mesmos
fazem brincadeiras raras. A criança pula e puxa, exulta e dá gargalhada,
engatinha, chuta e faz gluglu com júbilo. E no meio de toda a brincadeira lhe é
ensinado o que não pode fazer. Mãos e pés, pernas e braços, dedos e dedões
estão continuamente indo enquanto ela está consciente. Boca, olhos e orelhas
estão curiosos. Tudo é brincadeira sem intenção e a mãe brinca com o bebê tão
contente quanto ele. A Natureza se senta quietamente e vê que toda a brincadeira
é realmente trabalho. E o desenvolvimento de todo tipo está continuando num
ritmo maior durante os dois primeiros anos de vida do que em qualquer período
semelhante da vida adulta – desenvolvimento suficiente e não demais, pois o
bebê é um dorminhoco desordenado. Então vem o educador e oferece mais um
pouco. As novas brincadeiras são tão bonitas, e pegar aquele bebê também pode
ser fazer os seus próprios pulos e batidas sem significado e desajeitados. Mas um
trabalho real está sendo posto sobre a criança em acréscimo ao trabalho mais
pesado de dois anos que a sua vida conhecerá. A sua simpatia pela mãe é tão
aguda que esta percebe algo enérgico na nova brincadeira, apesar de todos os
sorrisos e conversa agradável. A criança responde com tentativa, grande
conforme ela seja pequena. Os seus cen-tros nervosos e o poder cerebral foram
indevidamente taxados, alguma alegria de viver foi tirada dela, e, embora a
resposta do seu bebê à educa-ção direta seja muito encantadora, a criança tem
menos poder latente deixado para as futuras chamadas da vida.

A sociedade dos seus iguais: estimulante demais para uma criança
Sigamos a pessoinha ao jardim de infância, onde ela tem o estímulo dos
colegas de classe da sua própria idade. Certamente é estimulante. Para nós,
nenhuma sociedade é tanto assim como aquela de diversas pessoas da nossa
idade e posição. Essa é a grande alegria da vida de faculdade. Uma alegria
saudável para todas as pessoas jovens por um tempo limitado. Mas as pessoas de
vinte anos têm, ou deveriam ter, algum comando sobre os seus centros de
inibição. Elas não devem permitir a dissipação da potência nervosa causada por
muito estímulo social. Entre-tanto, mesmo as pessoas de vinte anos não são
sempre iguais à tarefa de autodomínio ao provocar circunstâncias. Então, o que
se deve esperar de pessoas de dois, três, quatro, cinco anos? Que a pessoinha
pareça mais imperturbável, senão não há garantia contra a empolgação interna.
O choque e o lampejo dos nossos iguais de vez em quando agitam a saúde. Mas
para a vida cotidiana, a sociedade mista dos mais velhos, juniores e iguais, que
temos numa família, dá ao mesmo tempo o maior repouso e o maior espaço para
o desenvolvimento individual. Todos nos admiramos com o bom senso, a
razoabilidade, a diversão e a desenvoltura mostrados por uma criança na sua
própria casa quando comparados com a mesma criança na vida escolar.


O perigo de suplantar a Natureza
O perigo se esconde no jardim de infância, na medida exata da
completude e beleza da sua organização. É possível suplementar a Nature-za tão
habilidosamente de maneira que corremos algum risco de suplantá-La, privando-
A de espaço e tempo para afazer o Seu próprio trabalho do Seu próprio jeito. “Vá
ver o que o Tommy está fazendo e diga-lhe que ele está proibido.” não é uma
doutrina sadia. O Tommy deve ser livre para fazer aquilo de que ele gosta com
os seus membros e a sua mente por todas as horas do dia quando não estiver se
sentando bem às refeições. Ele deve correr e pular, saltar e cair, ficar com o seu
rosto assistindo a uma minhoca ou de costas assistindo às abelhas numa limeira.
A Natureza cuidará dele e lhe dará instigações de desejo para conhecer muitas
coisas. E alguém tem de contar conforme ele queira saber. E fazer muitas coisas.
E alguém deve ser capaz de colocá-lo no caminho. E ser muitas coisas, perversas
e más – e alguém deve dar direção.

Importância da iniciativa pessoal
Aqui chegamos ao cerne real da questão do jardim de infância. A mãe
ocupada diz que não tem tempo livre para ser aquele alguém, e a criança andará
selvagem e adquirirá maus hábitos. Mas nós não temos que fazer do hábito um
fetiche. Educação é uma vida assim como uma disciplina. Saúde, força e
agilidade, olhos brilhantes e movimentos de alerta vêm de uma vida livre, fora
de casa, se puder ser. E quanto aos hábitos, não existe hábito ou poder tão útil ao
homem ou à mulher quanto o da iniciativa pessoal. A desenvoltura que permitirá
a uma família de crianças inventar os seus próprios jogos e ocupações pela
extensão de um dia de verão vale mais na vida adulta do que uma boa
quantidade de conhecimento sobre cubos e hexágonos. E isso vem não da
contínua inter-venção por parte da mãe, mas de muita inatividade magistral.

Pais e professores têm de semear oportunidades
O erro educacional da nossa época é que acreditamos demais nos
mediadores. Ora, a Natureza é a sua própria mediadora, encarrega-se de
encontrar trabalho para os olhos e ouvidos, gosto e toque. Ela picará o cérebro
com problemas e o coração com sentimentos. E a parte da mãe ou da professora
nos primeiros anos (de fato, por toda a vida) é semear oportunidades, e então
manter no segundo plano, pronto com uma mão para guiar ou restringir somente
quando elas são mal-intencionadas. As mães se esquivam do seu trabalho e o
põem, como diriam, em mãos melhores que as suas próprias, porque não
reconhecem que aquele sábio “deixar sozinho” é a principal coisa pedida a elas,
vendo que toda mãe tem na Natureza uma empregada toda suficiente, que
organiza músculos e sentidos para o devido trabalho e o devido descanso da
mente.
De uma forma, as crianças dos pobres têm chances melhores do que as dos
ricos. Aquelas têm educação fora das maneiras caseiras. Mas existe uma grande
quantidade de ensino a ser obtido de um quarto infantil sabiamente ordenado, e
as suas próprias pessoas pequenas e posses deviam, como eu disse, proporcionar
muita formação de “jardim de infância” à pequena família em casa. Aos seis ou
sete anos, aulas definitivas devem começar, e essas não precisam ser
enfraquecidas ou servidas com geleia para as inteligências agudas que, destarte,
serão levadas a suportá-las.

Filhos únicos
Mas e quanto aos filhos únicos ou à criança grande demais para brincar
com o seu irmão bebê? Certamente, o jardim de infância é um grande benefício
para eles! Talvez, mas uma criança de casa de campo como uma companhia ou
uma jovem babá animada podem ser melhores. Uma criança terá se ensinado
pintar, colar, cortar papel, tricotar, tecer, martelar e serrar, fazer coisas amáveis
na argila e areia, construir castelos com os seus tijolos. Possivelmente, também
terá se ensinado ler, escrever e fazer cálculos, além de adquirir conhecimento e
noções sem fim sobre o mundo onde vive, quando tiver seis ou sete anos. O que
eu defendo é que ela fará essas coisas porque escolherá (dado que seja mantido
diante dela o padrão de perfeição nos seus pequenos trabalhos).

Deve-se permitir alguma ordem na vida da criança
Os detalhes da vida familiar lhe darão o descanso de uma vida
ordenada. Mas, para o descanso, a criança deve ter mais tempo de crescimento
livre do que é possível na escola mais encantadora. O fato de que as aulas
pareçam brincadeira não é recomendação: elas apenas querem a liberdade da
brincadeira e a percepção do seu próprio ordenamento que pertence à
brincadeira. A maioria de nós tem pouca oportunidade o bastante para o
ordenamento das nossas vidas. Então é bom tirar muito dos anos que podem ser
dados às crianças para ganhar essa experiência jubilosa.

Helen Keller
Eu acho que quanto eu disse sobre o desenvolvimento natural como
oposto a qualquer sistema muito cuidadosamente organizado é apoiado por uma
contribuição recente, de valor único, à ciência da educação. Quero dizer a
autobiografia de Helen Keller[103].
Quando ela tinha dezenove meses de idade, Helen tinha uma doença
severa, devido à qual perdeu a visão e a audição, consequente-mente a fala. Ela
nunca recuperou os sentidos perdidos e, aqui, devemos dizer, era uma alma
quase inviolavelmente selada, à qual não havia aproximação senão através do
sentido simples do toque. Entretanto, o livro dessa senhora, escrito com as suas
próprias mãos sozinhas (ela usou uma máquina de escrever), mal revisado, deve
ser classificado como um clássico pela pureza e fecundidade do estilo,
independentemente do interesse vital do assunto. Como o milagre foi realizado?
Da sua infância, a própria Helen diz que, exceto por umas poucas impressões,
“as sombras da casa-prisão” a envolviam. Mas sempre havia rosas e ela tinha o
sentido do olfato. E havia amor – mas ela não estava amando então. Quando
tinha sete anos, a Srtª. Sullivan foi a ela. Essa mesma senhora ficou cega por
alguns anos e esteve no Instituto Perkins, fundado por aquele Dr. Howe, que
liberou a inteli-gência de Laura Bridgman[104]. Mas a Srtª. Sullivan não é uma
mera produção de qualquer instituição. Ela é uma pessoa de boa sanidade e
salubridade, confiando à sua iniciativa pessoal e ciente desde o início de que o
seu trabalho era liberar a personalidade da sua pequena pupila e de modo algum
sobrepor a sua própria. “Assim, eu vim do Egito”, diz a Srtª. Keller à chegada da
sua professora, e a voz que ela ouviu do Sinai foi: “Conhecimento é amor, luz e
visão.” E então segue aquela épica incrível e apaixonante que diz como tudo foi
feito, como a única palavra “água” era a chave que abria as portas da mente da
criança, enquanto a palavra “amor” abria aquelas do coração fechado. A partir
daí muitas palavras novas vieram todo dia com multidões de ideias. E não é
demais dizer que essa criança aprisionada e desolada entrou numa grande
herança de pensa-mento e conhecimento, de alegria e visão, como atingem
poucos de nós do mundo que vê e ouve. O instrumento nessa grande libertação
foi nada mais que o alfabeto manual familiar, seguido, no curso do tempo, de
livros erguidos e braile.

A Srtª. Sullivan sobre sistemas de educação
Como todas as grandes descobertas, essa, de uma alma, foi marcada
pela simplicidade em todas as suas etapas. A Srtª. Sullivan tinha pouco amor
pelos psicólogos e suas maneiras, não tinha experimentos, não tratava a sua
pupila como fenômeno, mas como uma pessoa. Ela diz: “Não, eu não quero
quaisquer materiais do jardim de infância... Estou começan-do a suspeitar de
todos os sistemas de educação elaborados e especiais. Eles me parecem ser
construídos sobre a suposição de que toda criança é um tipo de idiota que tem de
ser ensinado a pensar, sendo que, se a criança é deixada a si mesma, pensará
mais e melhor; se menos, de um modo colorido. Deixe-a ir e vir livremente,
faça-a tocar coisas reais e combinar as suas impressões para si mesma, em vez
de sentar dentro de casa a uma mesinha redonda, enquanto uma professora com
voz doce sugere que ela construa uma parede de pedra com os seus blocos de
madeira, faça um arco-íris de tiras de papel colorido ou plante árvores de palha
em vasos de flores com contas. Esse ensino preenche a mente com associações
artificiais que têm de ser livradas antes que a criança possa desenvolver ideias
independentes de experiências reais.” É uma ótima coisa ter um estudo de
educação como se fosse de nova maneira, no qual vemos o triunfo da mente, não
somente sobre obstáculos naturais aparen-temente insuperáveis, mas sobre a
parede morta da educação sistema-tizada: um impedimento mais completo a
qualquer criança pobre do que os seus graves defeitos provados a Helen Keller.



O jardim de infância no Estados Unidos
Essa questão do jardim de infância, como o lugar apropriado para a
educação de crianças jovens, é tão importante que eu gostaria de recomendar aos
pais e professores o exame do assunto contido nos rela-tórios especiais
publicados pelo Conselho de Educação.
Temos que ir ao Estados Unidos para testemunhar a apoteose da teoria
educacional. Digo teoria em vez de prática porque a mente america-na, como a
francesa, parece-me severamente lógica, bem como generosa-mente impulsiva.
Uma teoria chega, é liberalmente entretida e é definida para funcionar com as
devidas aplicações numa escala magnífica, aspi-rando a fazer aquilo que
permanece nela para a educação de um grande povo. A ciência educacional no
Estados Unidos parece ser dedutiva em vez de indutiva. As teorias são
traduzidas em experimentos com zelo e generosidade verdadeiramente
imponentes. Por outro lado, uma teoria indutiva da educação chega mediante
experimentos longos, lentos, varia-dos e laboriosos que revelam, um pouco aqui
e um pouco ali, uma verdade universal. Talvez os americanos tenham escolhido
o caminho mais fácil e no fim também experimentem a sua teoria. O sistema do
jardim de infância exemplifica o que quero dizer. Apesar do seu nome
alemão[105], o jardim de infância não é um produto comum na pátria. Foi no
Estados Unidos que as ideias de Froebel receberam o seu maior
desenvolvimento, de modo que o jardim de infância se tornou um culto e o
ótimo professor, um profeta. Mas o impulso se esgotou. De qualquer maneira
tem se enfra-quecido.

O Sr. Thistleton Mark sobre o jardim de infância
De acordo com o Sr. Thistleton Mark, cujo trabalho competente sobre
Moral Education in American Schools[106] oferece material para muita reflexão
proveitosa, “Mesmo um froebeliano estacionário é levado a ter um apoio melhor
do que o ipse dixit[107] do grande reformador. A palavra ‘jardim de infância’ não é
mais um substantivo próprio significando sempre e em todo lugar a coisa una,
única, original e idêntica. É um substantivo comum e como tal tem a garantia de
um lugar mais permanente no discurso americano.” Quer dizer, o pensamento
educacional no Estados Unidos está tendendo para a concepção ampla e natural
expressa na frase “a educação é uma vida”. Mas eu gostaria que os educadores
desistissem do nome “jardim de infância”. Não consigo evitar de pensar que seja
algo de uma tensão para mentes conscienciosas desenhar a capa da doutrina
froebe-liana e praticar concepções mais amplas e mais animadoras que estão no
exterior hoje. Mesmo a prática do jardim de infância revolucionada tem de sofrer
de memória e do hábito da fraqueza, como são apontados pelo Dr. Stanley Hall
nas seguintes palavras:

O Dr. Stanley Hall sobre o jardim de infância
“A mais nova orientação intelectual decadente dos froebelianos
americanos é a ênfase agora posta sobre as brincadeiras maternas como o auge
da sabedoria do jardim de infância. Essas são representadas por poemas muito
crus, música e pinturas indiferentes, ilustrando certos incidentes da vida infantil
que acreditam ser de significância fundamental e típica. Eu li esses em alemão e
em inglês, arranhei a música e dei um breve curso de palestras do ponto de vista
simpático, tentando pôr neles todo o vinho novo de significado que eu podia
pensar. Mas sou levado à conclusão de que, se eles não são positivamente
insalubres e danosos à criança, e produtivos de hábitos intelectuais
anticientíficos e não filosóficos no professor, devem ser substituídos de longe
por coisas melhores dispo-níveis agora.
“Um outro erro cardeal do jardim de infância é a intensidade da sua
devoção a presentes e ocupações. Ao elaborá-los, Froebel mostrou grande
sagacidade, mas o esquema, conforme foi deixado pelas suas próprias mãos, foi
uma expressão muito inadequada das suas ideias educacionais, mesmo para o
seu tempo. Ele o considerou uma gramática perfeita do jogo e um alfabeto das
indústrias. E nessa opinião estava completamente errado. O jogo e a indústria
estavam então relativamente não desenvolvidos. E enquanto os seus dispositivos
eram beneficentes para as crianças camponesas na zona rural, eles lideravam os
interesses da cidade moderna: uma criança muito pálida e uma vida irreal.” Com
essas declarações importantes, eu tenho que concluir um exame superficial da
questão mais importante: “O jardim de infância é a melhor base de formação
para uma criança?”


4. LEITURA

Hora de ensinar a ler: uma questão aberta
A leitura se apresenta primeiro entre as lições a serem usadas como
instrumentos de educação, apesar de estar aberta a discussão se a criança deve
adquirir a arte inconscientemente, da sua infância adiante, ou se o esforço deve
ser adiado até que ela tenha, digamos, seis ou sete anos, e então seja feita com
vigor. Numa carta valiosa, endereçada ao seu filho John, temos a maneira de
ensinar a ler adotada por aquela mãe exemplar, a mãe dos Wesleys:

O plano da Srª. Wesley
“Não ensinaram nenhum deles a ler até cinco anos de idade, exceto a
Kezzy, em cujo caso eu estava indeferida. E ela levou mais anos para aprender
do que qualquer um dos outros em meses. A maneira de ensinar foi esta: no dia
antes de a criança começar a estudar, a casa estava em ordem, o trabalho de
todos apontava para eles e foi dada uma ordem de que ninguém entraria no
cômodo das nove às doze ou das duas às cinco, que eram as nossas horas
escolares. À criança foi permitido um dia em que estudasse as suas letras, e cada
uma delas naquela hora sabia mesmo todas as suas letras, grandes e pequenas,
exceto a Molly e a Nancy, que estavam um dia e meio antes de que as soubessem
perfeitamente, pelo que eu as considerei então muito aborrecidas. Mas o motivo
por que pensei isso foi que o restante as aprendeu tão prontamente. E o seu
irmão Samuel, que foi a primeira criança a quem eu ensinei, aprendeu o alfabeto
em poucas horas. Ele tinha cinco anos no dia dez de fevereiro. No dia seguinte,
começamos a estudar, e, assim que ele aprendeu as letras, começou no primeiro
capítulo do Gênesis. A ele foi ensinado soletrar o primeiro versí-culo, depois ler
repetidas vezes até que pudesse ler imediatamente sem hesitação. E assim por
diante, o segundo versículo etc., até que ele pegou dez versículos para uma lição,
que fez rapidamente. A Páscoa chegou naquele ano, e, pela semana após o
Pentecostes, ele podia ler um capítulo muito bem, pois lia continuamente e tinha
uma memória prodigiosa, sendo que não consigo me lembrar de ter lhe dito a
mesma palavra duas vezes. O que era ainda mais estranho: qualquer palavra que
tivesse aprendido na sua lição, ele a conhecia onde quer que a visse, fosse na sua
Bíblia, fosse em qualquer outro livro. Por meio disso, ele aprendeu muito rápido
a ler um autor inglês bem.”
Deseja-se muito que mães sérias mantenham com mais frequência registro
dos métodos que empregam com os seus filhos, com alguma anotação definitiva
do sucesso deste ou daquele plano.
Muitas pessoas consideram que aprender a ler numa língua tão cheia de
anomalias e dificuldades como a nossa própria seja uma tarefa que não deva ser
imposta tão cedo à mente infantil. Mas, na verdade, poucos de nós podem se
recordar como ou quando aprendemos a ler, pois tudo o que sabemos veio pela
natureza, como a arte de correr. E não só isso, mas as mães das classes instruídas
não sabem como os seus filhos aprenderam a ler. “Oh, ele aprendeu sozinho.” é
todo o relato que a mãe pode dar da proficiência do pequeno Dick. Donde é claro
que essa noção da dificuldade extrema do aprendizado da leitura é gerada pelos
mais velhos em vez das crianças. Não existiriam livrinhos intitulados “Lendo
Sem Lágrimas”, se às vezes as lágrimas não fossem derramadas na aula de
leitura. Mas, realmente, quando esse é o caso, a culpa é da professora.

O alfabeto
Quanto às suas letras, a criança geralmente ensina a si mesma. Ela tem a
sua caixa de letras de marfim e pega o “P” para “pudim”, “M” para “melro”, “C”
para “cavalo”[108], grandes e pequenas, e conhece ambas. Mas o aprendizado do
alfabeto deve ser um meio de cultivar a observação da criança: ela tem de olhar
o que vê. Faça um “B” grande no ar e faça-a nomeá-lo. Então faça que ela
realize um “O” redondo, um “S” torto, um “T” para Tommy, e você nomeia as
letras conforme o dedinho as forma com traços instáveis no ar. Fazer as letras
pequenas de memória é mais um trabalho de arte e exige mais observação
cuidadosa por parte da criança. Uma bandeja de areia é útil nesse estágio. A
criança desenha o seu dedo corajosamente através da areia e então põe um fundo
no seu “D”. E veja: a sua primeira redação ao fazer uma linha reta e uma curva.
Mas são inter-mináveis os dispositivos para fazer o aprendizado do “A B C”
interessante. Não há ocasião para apressar a criança. Deixe-a aprender uma
forma por vez e conhecê-la tão bem de maneira que ela possa pegar os Ds,
digamos, grandes e pequenos, numa página de impressão grande. Faça-a dizer
“d” para “dedo”, “dente”, “dia”, desta forma: “d-edo”, “d-ente”[109], prolongando
o som da consoante inicial, e enfim soando o “d” sozinho, não “de”, mas “d”, o
simples som da consoante tão separado quanto possível da vogal seguinte.
Deixe a criança sozinha, e ela aprenderá o alfabeto por si mesma, mas
poucas mães conseguem resistir ao prazer de ensiná-lo. E não há razão por que
devessem, pois esse tipo de aprendizado não é mais que jogo para a criança. E se
o alfabeto for ensinado ao pequeno estudante, a sua apreciação tanto da forma
quanto do som será cultivada. Quando ela deve começar? Quando a sua caixa de
letras começar a interessá-la. O bebê de dois anos frequentemente poderá
nomear meia dúzia de letras. E não há nada contra isso contanto que encontrar e
nomear as letras lhe seja um jogo. Mas ela não tem de ser impelida, exigida a se
exibir, aborrecida a encontrar letras quando o seu coração está numa outra
brincadeira.

Criação de palavras
Os primeiros exercícios de criar palavras serão muito agradáveis à
criança. Exercícios tratados como um jogo, que ensinem as capacidades das
letras, serão melhores para começar do que frases reais. Pegue duas das suas
letras e forme a sílaba “em”: diga-lhe que ela é a palavra que usamos quando
dizemos “em casa”, “em sala de aula”. Então acrescente “b” a “em”: “bem”; “c”
a “em”: “cem”; “sem”, “tem”, “vem”, e assim por diante. Primeiro, faça a
criança dizer no que a palavra se torna com cada consoante inicial com “em” a
fim de fazer “tem”, “vem”, “cem”[110]. Faça todas as sílabas serem palavras reais
que ela conhece. Coloque as palavras numa coluna e faça-a ler. Faça isso com os
sons de vogal curta em combinação com cada consoante, e a criança aprenderá
ler dezenas de palavras de três letras e dominará os sons de vogal curta com
consoantes iniciais e finais sem esforço. Bem antes, ela fará a lição por si
mesma. “Quantas palavras você pode fazer com ‘im’ e uma outra letra, com ‘oi’
e uma outra letra?”[111] etc. Não a apresse.


Criação de palavras com vogais longas etc.
Quando esse tipo de exercício se torna tão fácil que não seja mais
interessante, faça que os sons longos das vogais sejam aprendidos da mesma
forma. Use as mesmas sílabas de antes com um final “a”. Assim, “em” se torna
“Ema”, e conseguimos “gema”, “lema”, “tema” etc. Pode-se dizer à criança que
num “tema” o “e” é longo; “e” em “cem” é um “e” curto[112]. Ela construirá os
novos conjuntos de palavras com muita facili-dade, auxiliada pela experiência
que ganhou nas aulas anteriores.
Então o mesmo tipo de coisa com o final “ndo”: “ando”, “endo”, “indo”,
“ondo”, como em “andando”, “comendo”, “rindo”, “pondo”. O “m” inicial como
“mas”, “mesmo”; o “m” final como “bom”, “com”, “dom”, “som” e assim por
diante[113], através de combinações intermináveis que elas mesmas sugerirão. Isso
não é leitura, mas prepara a base para ela. As palavras não serão mais estranhas,
objetos perplexos, quando as crianças as encontrarem numa linha impressa.
Exija que ela pronuncie as palavras que ela faz com tal acabamento e distinção
de modo que ela mesma possa ouvir e contar os sons de uma dada maneira.

Soletração inicial
Acostume-a desde o início a fechar os seus olhos e soletrar a palavra
que fez. Isso é importante. Ler não é soletrar, nem é necessário soletrar para ler
bem. Mas o bom soletrador é a criança cujo olho é veloz o bastante para pegar as
letras que compõem a palavra, no ato de ler uma palavra, e isso é um hábito a ser
adquirido desde o início. Acostume-a a olhar as letras na palavra e ela fará isso
sem esforço.
Se as palavras sempre fossem feitas num dado padrão em inglês, se a
mesma letra sempre representasse os mesmos sons, aprender a ler seria um
assunto fácil, pois a criança logo adquiriria os poucos elementos dos quais todas
as palavras, nesse caso, seriam compostas. Mas muitas das nossas palavras
inglesas são, cada uma, uma lei de si mesma: não há nada para isso, mas a
criança tem de aprender a conhecê-las à vista. Ela tem de reconhecer “qual”
palavra, precisamente como reconhece o “B”, por-que ela a viu antes, olhou para
ela com interesse, de sorte que o padrão da palavra está estampado no seu
cérebro retentor. Esse processo continua lado a lado com o outro: o aprendizado
das capacidades das letras. Porque quanto mais variedade você puder lançar nas
suas aulas de leitura, mais a criança gostará delas. Aulas de fazer palavras a
ajudam a ter interesse inteligente nas palavras, mas o seu progresso na arte de ler
depende principalmente das lições de “ler à vista”.

Lendo à vista
A professora tem de se contentar com proceder muito lentamente,
assegurando a base embaixo dos seus pés conforme ela vai. Diga:

“Brilha, brilha, estrelinha,
Quero ver você brilhar[114].”

É a primeira aula. Apenas essas duas linhas. Leia a passagem para a
criança muito lentamente, docemente, com expressão exata, para que lhe seja
agradável ouvir. Aponte para cada palavra conforme você lê. Depois, aponte
para “brilha”, “ver”, “estrelinha”, “você”[115], e espere a criança pronunciar cada
palavra no verso tomado indiscriminadamente. Depois, quando ela mostrar que
sabe cada palavra por si mesma, e não antes, faça-a ler as duas linhas com
enunciação e expressão claras. Desde o início, insista na leitura clara, bonita e
não deixe a criança cair numa monotonia triste, não mais agradável para ela do
que para o seu ouvinte. Claro, nesse momento ela é capaz de dizer as duas
linhas. E faça-a dizê-las de modo claro e bonito. Na aula seguinte, ela estudará o
resto do poemi-nha.

A leitura de prosa
Nesse estágio, as suas aulas de leitura têm de avançar bem lenta-mente,
de modo que ela possa aprender bem os seus exercícios de leitura, tanto prosa
quanto poesia, como aulas de recitação. Serão sugeridos ime-diatamente
pequenos poemas apropriados para serem estudados dessa forma, mas talvez a
prosa seja melhor, no geral, por oferecer mais pala-vras do uso cotidiano, de
origem saxã[116] e de ortografia anômala. São muito apropriadas fábulas curtas e
uma prosa graciosa, simples, como temos nas Parables from Nature[117] da Srª.
Gatty, e, ainda melhor, nas prosas e poemas da Srª. Barbauld[118]. Mesmo para as
suas primeiras aulas de leitura, é desnecessário pôr bobagens nas mãos das
crianças.
Mas ainda não terminamos a aula de leitura sobre “Brilha, brilha,
estrelinha.” Por duas ou três páginas com uma boa fonte clara, a criança deve
caçar “estrelinha”, “você”, “brilhar”[119], cada uma das palavras que aprendeu, até
que a palavra que ela conhece olhe para ela como o rosto de um amigo numa
multidão de estranhos e ela seja capaz de decalcá-la em qualquer lugar. Para que
ela não fique cansada da busca, a professora deve guiá-la desprevenida à linha
ou parágrafo em que ocorre a palavra que ela quer. A criança já acumulou um
pequeno capital. Sabe oito ou dez palavras tão bem que as reconhecerá em
qualquer lugar. E a aula prova-velmente foi de dez minutos.
A próxima aula de “leitura à vista” começará com uma caça por palavras
familiares, e então:

“Faz de conta que é só minha
Só pra ti irei cantar.”

deve ser passada da mesma maneira. Já que a soletração é simplesmente a arte
de ver as letras numa palavra, como vemos as características de um rosto, diga à
criança: “Você pode soletrar ‘só’?”[120] – ou qualquer outra pala-vra curta. Ela é
posta na sua determinação, e, se ela falhar desta vez, este-ja certo de que ela será
capaz de pronunciar a palavra quando você lhe pedir na próxima vez. Mas não
deixe que ela aprenda a soletrar ou mesmo dizer as letras alto com a palavra
diante dela.
Com relação a entender o que elas leem, as crianças estarão cheias de
brilho, anotações, perguntas inteligentes e pegarão essa parte da aula nas suas
próprias mãos. De fato, a professora terá de estar prevenida para não deixar que
a tirem da matéria.

Pronúncia cuidadosa
Provavelmente, as pessoinhas terão de ser detidas na pontuação da
pronúncia. Elas têm de realizar “alto”, “céu”, “gosto”, “mundo” com precisão
delicada. Sem dúvida elas quererão se apressar e dizer “minha” como “mia”,
assim como reduzirão “história” a “stória”[121]. Mas aqui está uma outra
vantagem do progresso lento e constante: a declaração de cada palavra recebe a
devida atenção e a criança é formada no hábito da enun-ciação cuidadosa. Todo
dia aumenta o número de palavras que ela é capaz de ler à vista. E quanto mais
palavras ela já souber, mais longa ficará a sua leitura a fim de proporcionar as
dez ou doze palavras novas que ela deve dominar todo dia.

O trabalho de um ano
“Mas que progresso de caracol!”, você tende a dizer. Não tão lento,
afinal de contas. Dessa forma, sem trabalho considerável, a criança apren-derá
de duas a três mil palavras durante um ano. Em outras palavras, ela aprenderá a
ler, pois o domínio desse número de palavras a conduzirá confortavelmente pela
maioria dos livros que caírem no seu caminho.

Método comum
Agora, compare o progresso estável, o interesse e a vivacidade
constantes dessas aulas com o cansaço mortal da aula de leitura comum. A
criança tropeça numa ou duas páginas numa monotonia entediante sem
expressão, com enunciação imperfeita. Ela chega a uma palavra que não conhece
e a soletra. Isso não lança luz sobre o assunto e a palavra lhe é dita. Ela a repete,
mas, como não fez esforço mental para segurá-la, na próxima vez que ela
encontrar a palavra, o mesmo processo será passado. A aula de leitura daquele
dia chega a um fim. O aluno ficou miseravel-mente aborrecido e não adquiriu
uma palavra nova. Finalmente, de alguma maneira aprende a ler por mera força
da repetição. Mas considere que abuso da sua inteligência é um sistema de
ensino que o faz passar por um trabalho diário com pouco ou nenhum resultado,
e lhe dá um desgosto pelos livros antes que tenha aprendido a usá-los.

5. A PRIMEIRA AULA DE LEITURA

(Duas mães trocam ideias)

– Você não quer dizer que iria direto às palavras de três ou quatro
sílabas antes que uma criança soubesse as suas letras?
– É possível ler palavras sem conhecer o alfabeto, assim como você
conhece um rosto sem escolher as suas características. Porém nós aprendemos
não somente nomes, mas os sons das letras antes de come-çarmos a ler palavras.
– Os nossos filhos aprendem as suas letras sem qualquer ensino. Nós
sempre mantemos conosco uma gaveta de mesa rasa, com o fundo coberto de
areia em meia polegada[122] de profundidade. Antes de serem dois, os bebês
fazem um “O” redondo, um “S” torto, um “T” para Tommy, e assim por diante,
com dedinhos incertos, curtos e gordos. Os filhos mais velhos ensinam os
menores como se fosse um jogo.
– A areia é importante! Temos vários aparelhos, mas nenhum tão bom
como esse. As crianças adoram agir. As linhas engraçadas, instáveis que o
dedinho faz na areia são dez vezes interessantes como os formatos que o olho vê.
– Mas a leitura! Eu não consigo ultrapassar três sílabas na primeira aula.
Ora, é como ensinar valsa a uma criança mais velha de doze meses.
– Você diz isso porque esquecemos que um grupo de letras não é mais
do que o signo de uma palavra, enquanto uma palavra é somente o signo vocal
de uma coisa ou de um ato. É assim que a criança aprende. Primeiro, ela tem a
noção da mesa. Vê diversas mesas. Descobre que elas têm pernas, que você pode
embaralhar as letras. Muito frequentemente, elas têm capas que você pode puxar.
E nelas muitas coisas permanecem, boas e agradáveis para que um bebê goste.
Às vezes também você pode puxar essas coisas da mesa e elas descem com um
estrondo, o que é bom. As pessoas adultas chamam essa coisa agradável, cheia
de muitos interes-ses, de “mesa”. E, pouco a pouco, o bebê diz “mesa” também.
E a palavra “mesa” vem significar, de uma maneira vaga, tudo isso para ela. “Ao
redor da mesa”, “em cima da mesa”, e assim por diante, formam parte da ideia
de “mesa” para ela. Da mesma forma, o bebê faz rimas quando a sua mãe canta.
Ela diz: “Bebê, cante.” E, pouco a pouco, noções de “cante”, “beije”, “ame”,
alvorecem no seu cérebro.
– Sim, os queridos! E é surpreendente como uma criança conhece
muitas palavras mesmo antes de poder falá-las: “gatinho”, “bonequinha”,
“carro”, logo lhe transmitem ideias interessantes.
– É isso. Faça a criança se interessar pela coisa e logo ela apren-derá o
signo sonoro para ela, isto é, o seu nome. Agora, eu defendo que, quando ela for
um pouco mais velha, deverá aprender o signo formal, isto é, a palavra escrita –
com base no mesmo princípio. É muito mais fácil para uma criança ler “pudim
de ameixa”[123] do que ler “para, para”, porque “pudim de ameixa” transmite uma
ideia bem mais interessante.
– Pode ser, mas e quando ela chegar às palavras de três ou quatro
sílabas? O que você fará enquanto ela estiver nas palavras de uma sílaba – na
verdade, de duas ou três letras?
– Eu realmente nunca devo colocá-la em palavras de uma sílaba.
Quanto maior a palavra, mais impressionante a sua aparência, portanto mais fácil
ela é para ler, sob a condição de que a ideia transmitida seja sempre interessante
a uma criança. É triste ver uma criança inteligente trabalhando duramente numa
aula de leitura infinitamente abaixo da sua capacidade, “ta, te, ti, to, tu”, ou na
melhor das hipóteses: “A pata nada.”[124] Como começaríamos a ler alemão, por
exemplo, trabalhando duramente sobre todas as combinações concebíveis de
letras, arranjadas sem base em algum princípio, mas na semelhança de som? Ou,
pior ainda, que as nossas leituras sejam graduadas de acordo com o número de
letras que cada palavra contém? Ficaríamos perdidos numa neblina sem
esperança diante de uma página de palavras de três letras todas tristemente seme-
lhantes, sem características distintivas para o olho captar. Mas e a criança? “Oh,
bem... As crianças são diferentes. Sem dúvida, é bom que as crianças moam
nesse moinho!” Mas essa é apenas uma das muitas formas pelas quais as
crianças são oprimidas desnecessária e cruelmente!
– Você está assumindo uma superioridade moral! Contudo, eu não acho
que estou convencida. É muito mais fácil para uma criança soletrar “boi, boi”[125]
do que soletrar “pudim de ameixa, pudim de ameixa”.
– Mas soletrar e ler são duas coisas diferentes. Você tem de aprender a
soletrar para escrever palavras, não para lê-las. Uma criança está passando por
uma aula de leitura e soletra “t-o-s-s-e”. Você diz “tosse” e ela repete. Por força
da repetição, ela finalmente aprende a associar a aparência da palavra com o som
e diz “tosse” sem soletrar. E você acha que ela chegou a “tosse” através do “t-o-
s-s-e”. Nada disso. “Tosse” se soletra como “t-o-s-e”[126].
– Sim, mas “tosse” tem um “S” mudo, e um “SS” com o som de só um
“S”[127]. Eu garanto que aí está uma grande dificuldade. Se pelo menos não
houvesse letras mudas e se todas as letras tivessem o mesmo som, na verdade
estaríamos lendo com facilidade. As pessoas fonéticas têm algo a dizer por si
mesmas.
– Você concordaria com o escritor de um artigo em diversas análises
importantes: “‘chuva’ deveria ser escrita e impressa como ‘xuva’; ‘casa’ como
‘caza’, ‘luz’ como ‘lus’, ‘massa’ como ‘masa’ ou ‘maça’, e assim por diante[128].
Tudo isso se baseia na ideia errada de que ao ler nós olhamos as letras que
compõem uma palavra, pensamos nos seus sons, os combinamos e formamos a
palavra. Não fazemos nada do tipo. Aceitamos uma palavra, escrita ou impressa,
simplesmente como o símbolo de uma palavra com a qual estamos acostumados
a falar. Se a palavra é nova para nós, podemos tentar fazer algo com as letras,
mas sabemos muito bem que isso é um tiro no escuro, que temos cuidado com
não dizer a nova palavra até que tenhamos ouvido alguém dizê-la.
– Sim, mas as crianças são diferentes.
– Com as crianças, é o mesmo, “apenas mais”. Se quiséssemos,
poderíamos quebrar uma palavra nos seus sons ou pôr certos sons juntos para
fazer uma palavra. Mas esses são esforços além do alcance das crian-ças.
Primeiramente, elas aprendem a conhecer uma palavra pela sua apa-rência, e,
quanto mais atraente esta parecer, mais fácil será reconhecê-la, uma vez que a
palavra impressa sempre seja uma que elas já conheçam muito bem pelo som e
pelo sentido.
– Não está claro ainda. Suponhamos que você me diga, passo a passo,
como você daria a sua primeira aula de leitura. Um exemplo ajuda muito.
– Muito bem. O Bobbie teve a sua primeira aula ontem, no seu sexto
aniversário. A aula foi parte da celebração. A propósito, eu acho que é uma boa
ideia começar um novo estudo com uma criança no seu aniver-sário, ou algum
grande dia. Ela começa considerando o novo estudo um privilégio.
– Isso é um acerto. Mas continue. O Bobbie conhecia as suas letras?
– Sim, ele as tinha pegado, como você diz, mas eu tinha sido cuidadosa
para não permitir quaisquer leituras pequenas. Você sabe como a Susanna
Wesley costumava se retirar à sua sala com a criança que devia fazer a sua
primeira aula de leitura e não aparecer de novo por algumas horas, até que o
menino saísse capaz de ler uma boa parte do primeiro capítulo do Gênesis? Bem,
a primeira aula de leitura do Bobbie também foi uma ocasião solene, porque a
preparávamos por uma ou duas semanas. Primeiro, eu comprei uma dúzia de
cópias de um centésimo de libra da History of Cock Robin[129] – boa fonte em
negrito, imagens ruins, que cortamos.
Então tivemos um dia de pré-escola com colagem: colando as folhas
sobre papel de desenhar comum, seis para o lado de baixo e seis para o outro, de
maneira que agora tínhamos seis cópias completas, e não doze.
Então cortamos somente a primeira página, de todas as seis cópias,
linha por linha e palavra por palavra. Nós juntamos as palavras e as pusemos
numa caixa, e os nossos preparos estavam completos.
Agora quanto à aula. O Bobbie e eu ficamos fechados na sala de manhã.
Eu sempre uso uma lousa para ensinar as crianças. Eu escrevo “Cock Robin”
com uma boa “impressão” clara a mão. O Bobbie vê com mais interesse porque
ele conhece as suas letras. Apontando para a palavra, eu digo “Cock Robin” e ele
repete.
Então as palavras na caixa são espalhadas sobre a mesa e ele encontra
meia dúzia de “Cock Robin” com grande facilidade.
Fazemos a mesma coisa com “pardal”, “flecha”, “disse”, “matou”,
“quem”, e assim por diante, até que todas as palavras no verso tenham sido
aprendidas. As palavras na lousa aumentam numa coluna, que o Bob lê de lá
para cá, e de todo jeito, exceto quando as palavras correm no verso.
Então ele arruma as palavras soltas em colunas como aquela na lousa.
Depois em colunas que ele mesmo inventou e lê.
Finalmente, a alegria culminante (a aula toda foi uma delícia!): ele
encontra entre as palavras soltas, no meu ditado:

“– Quem matou Cock Robin?
– Eu, disse o Pardal,
Com o meu arco e flecha,
Eu matei Cock Robin.”


“– Who killed Cock Robin?
– I, said the Sparrow,
With my bow and arrow,
I killed Cock Robin.”

arranjando as palavras na forma de verso. Então, eu ainda tinha uma cópia não
utilizada, cujo verso o Bob teve o prazer de ler, e o fez para trás e para frente.
Enquanto ele viver, ele saberá aquelas doze palavras.
– Sem dúvida foi uma aula agradável, mas pense em todas as colagens e
recortes!
– Sim, isso é complicado. Gostaria que algum editor nos fornecesse o
que queremos: poesia infantil, com boa fonte em negrito, com caixas de palavras
soltas para combinar, uma caixa separada, ou uma divisão, para cada página, de
maneira que a criança não possa ser confundida por ter muitas palavras para
caçar. A questão é que ela deve ver, e olhar, a palavra nova muitas vezes, de
sorte que o seu formato fique impresso no seu cérebro.
– Entendo, mas ela só consegue ler “Cock Robin”. Ela não tem
capacidade geral de leitura.
– Ao contrário, ela lerá aquelas dozes palavras onde quer que as
encontre. Suponha que aprenda dez palavras por dia: em meio ano terá pelo
menos seiscentas palavras. Ela saberá ler um pouco.
– Excelente. Suponha que os seus filhos se lembrem de tudo o que
aprenderam. No final de uma semana, o meu filho se lembraria de “Cock
Robin”, talvez, mas o resto teria desaparecido!
– Oh, mas nós guardamos o que temos! Quando tivermos dominado as
palavras do segundo verso, o Bob terá percorrido o primeiro no livro, nomeando
palavras aqui e ali conforme eu as aponto. Leva menos de um minuto e a base é
segura.
– A primeira aula foi longa?
– Desculpe-me por dizer que ela durou meia hora. O interesse da
criança me tentou a fazer mais do que eu deveria.
– Tudo isso soa muito atrativo, um tipo de jogo, mas não consigo ficar
satisfeita com que uma criança aprenda a ler sem saber as capaci-dades das
letras. Você vê constantemente uma criança soletrar uma pala-vra para si mesma
e então pronunciá-la; mais ainda, se lhe ensinaram cuidadosamente os sons das
letras – não simplesmente os seus nomes.
– Naturalmente, pois, apesar de muitas das nossas palavras inglesas
serem, cada uma, uma lei em si mesma, outras oferecem uma chave para um
grupo inteiro, como “flecha” nos dá “flech-ada”, “flech-inha”, “flech-eiro”[130].
Porém temos dias alternados: um para leitura, outro para construção de palavras.
E essa é uma forma de assegurar a variedade e, assim, o interesse alegre que é o
segredo real do sucesso.


6. LENDO PELA VISTA E PELO SOM

Aprender a ler é trabalho duro
Provavelmente, aquele todo vago que chamamos “Educação” não
oferece mais dificuldade e tarefa repelentes do que aquilo em que toda criança é
(ou deveria ser) posta: a tarefa de aprender a ler. Percebemos o trabalho disso
quando algum homem adulto faz um esforço heroico para remediar uma
ignorância vergonhosa, mas esquecemos o quão contrário à Natureza é para uma
criancinha ocupar-se com hieróglifos entediantes – todos tão entediantemente
semelhantes! – quando o mundo está repleto de objetos interessantes que ela está
curiosa para conhecer. Mas não podemos escusar o nosso Tommy volátil, nem é
bom para ele que o façamos. É muito necessário que ele saiba ler, e não somente
isso: a disciplina da tarefa é completamente saudável para o homenzinho. Ao
mesmo tempo, reconheçamos que aprender a ler é um trabalho duro para muitas
crianças e façamos o que podemos para tornar a tarefa fácil e convidativa.

Conhecimento de símbolos arbitrários
Em primeiro lugar, tenhamos em mente que a leitura não é uma ciência
nem uma arte. Mesmo que fosse, as crianças ainda devem ser a primeira
consideração do educador. Mas não são. Aprender a ler não é mais que pegar,
como podemos, um conhecimento de certos símbolos arbi-trários para objetos e
ideias. Não existem absolutamente “passos” certos e necessários para ler. Cada
um conduz ao próximo. Não existe início, meio e fim verdadeiros. Pois os
símbolos arbitrários que temos que conhecer a fim de ler não são letras, mas
palavras. A título de exemplo, considere as diferenças delicadas do som
representado pela letra “o” na última frase. Analisar e classificar os sons de “o”
em “pois”, “símbolos”, “conhecer”, “ordem”, “ao”, “não” e “vocábulos”[131] é
um estudo curioso, não especial-mente útil, para um filólogo, mas trabalhoso e
inapropriado para uma criança. É hora de encararmos o fato de que as letras que
compõem uma palavra inglesa são cheias de interesse filológico e de que o seu
estudo será uma parte valiosa da educação pouco a pouco. Porém, no meio
tempo, som e signo da letra estão tão soltamente casados em inglês, que basear o
ensino da leitura somente nos sons das letras é dar à criança muito trabalho
analítico, muita confusão mental, devido às irregularidades da língua. E uma
pequena pressão moral ao fazer o som de uma letra numa dada palavra cai sob
qualquer um dos “sons” que lhe foram ensinados.
Definitivamente, o que propomos ao ensinar uma criança a ler?: (a) que ela
saiba pela vista, digamos, algumas milhares de palavras; (b) que seja capaz de
construir palavras novas com os elementos dessas. Faça-a aprender dez palavras
novas por dia, e em vinte semanas, em alguma medida, ela será capaz de ler, sem
qualquer pergunta quanto ao número de letras numa palavra. Pela segunda parte,
e menos importante, da nossa tarefa, a criança tem de saber os sons das letras e
adquirir capacidade para lançar sons dados em novas combinações.
O que queremos é uma ponte entre os interesses naturais da crian-ça e
aqueles símbolos arbitrários com que ela tem de se familiarizar e os quais ,
conforme vimos, são palavras, e não letras.

Esses símbolos devem ser interessantes
A criança se importa com coisas, não palavras. A sua capacidade
analítica é muito pequena. A sua faculdade de observação é excessiva-mente
rápida e aguçada. Nada lhe é pequeno demais. Ela espiará o olho de uma mosca.
Nada é intricado demais. Ela se delicia em quebra-cabeças. Mas a coisa que
aprende a conhecer por olhar para ela é algo que lhe interessa. Aqui temos a
chave para a leitura. Nenhuma combinação sem sentido de letras – nada de “cla,
cle, cli, clo, clu”, nada de “ta, te, ti, to, tu”[132] – deve-lhe ser apresentada. Desde
o início, a criança deve ser ensina-da a considerar a palavra impressa conforme
ela já considera a palavra falada: como o símbolo do fato ou da ideia de interesse
pleno. Quão fácil é ler “peito vermelho da ave[133]”, “retângulos e margaridas”. O
número de letras nas palavras não é problema. As palavras mesmas transmitem
essas ideias interessantes de maneira que a sua forma e aparência gerais se fixam
no cérebro da criança pela mesma lei da associação de ideias que torna fácil ligar
os objetos aos seus nomes falados. Tendo posto uma palavra fixa na cavilha
segura da ideia transmitida, a criança usará o seu conhecimento dos sons das
letras para criar outras palavras contendo os mesmos elementos com grande
interesse. Quando ela souber “bola”, ela estará bem pronta para fazer “mola”,
trocando o “b” pelo “m”[134].

A primeira aula do Tommy
Mas o exemplo é melhor do que o preceito e mais convincente do que o
raciocínio mais salutar. Essa é a espécie de aula de leitura que temos em vista. O
Tommy conhece as suas letras pelo nome e pelo som, mas ele não conhece mais.
Hoje ele será lançado bem no meio da leitura, sem absolutamente quaisquer
“passos”, porque a leitura nem é uma arte nem uma ciência, e provavelmente
não tem início. Tommy aprenderá a ler hoje:

“Eu gosto de gatinho,
Sua pele é tão morna.”


“I like little pussy,
Her coat is so warm.”

e ele saberá aquelas nove palavras tão bem que será capaz de lê-las onde quer
que possam ocorrer daqui para frente e sempre.
Diz um leitor: “Oh, sim, como na aula do ‘Cock Robin’. Garanta que o
princípio seja o som – e há mais a ser dito sobre ambos os lados da questão –,
mas garanta. Quem no mundo poderia atravessar toda a cola-gem, o corte e a
bagunça geral preparatórios para a grande aula? Não. O método dos livros só
pode ser melhor em segundo lugar, mas livros já prontos têm de servir para mim.
Eu não tenho tempo para fazer os meus próprios instrumentos.”
Tenho que reconhecer que o corte e a colagem foram muito desa-jeitados,
mas a aula atingiu o seu propósito porque induziu um bom amigo à educação, a
ter uma deliciosa caixa de “gatinho” preparada para nós: palavras soltas, fonte
grande legal, duas linhas num saco. Qualquer pes-soa que aprenda “gatinho”
como deve ser aprendido saberá pelo menos cem palavras. Não um estoque
comercial ruim para um iniciante. Todas elas são palavras boas e úteis que
queremos todo dia. Há uma objeção. Contrações como “eu tô[135]” são, na melhor
das hipóteses, feias, e eu espero que, nas aulas de palavras baseadas em
“gatinho”, sejam escolhidas as peças em que esse defeito seja evitado.

Passos
E agora começamos. Material: a caixa do Tommy de letras soltas, a
nova caixa “Gatinho”, lápis e papel ou, muito melhor, lousa e giz. Nós
escrevemos com boa escrita grande “gatinho”. O Tommy vê com interesse. Ele
conhece as letras e provavelmente as diz conforme as escrevemos. Além disso,
ele está preparado para o grande evento da sua vida: ele sabe que começará a
aprender a ler hoje. Mas ainda não pedimos nada do seu conhecimento prévio.
Nós simplesmente lhe dizemos que a palavra é “gatinho”. Interesse imediato: ele
conhece a coisa, gatinho, e o símbolo escrito é agradável aos seus olhos
porquanto está associado com uma ideia existente na sua mente. É-lhe dito para
olhar para a palavra “gatinho” até que ele tenha certeza de que a saberia
novamente. Depois ele faz “gatinho” a partir da memória com as suas próprias
letras soltas. Depois o saquinho contendo as nossas duas linhas em palavras
soltas é virado e ele encontra a palavra “gatinho”. E, finalmente, a folhinha com
o poema impresso nela lhe é mostrada, e ele descobre “gatinho” – mas ainda não
tem permissão para executar a rima. “o, pelo, o, pequeno, gosto, como, do, é,
dele, morno, eu, tão”[136] são ensinados da mesma forma, em menos tempo do
que leva descrever a aula. Quando cada palavra nova for aprendida, o Tommy
fará uma coluna das antigas e lerá para cima e para baixo e vice-versa a coluna
na lousa.

Lendo frases
Agora ele sabe palavras, mas ainda não pode ler frases. Agora para o
prazer da leitura. Ele encontra no nosso ditado, entre as suas palavras soltas,
“gatinho – é – morno”, coloca-as na ordem de “leitura”, uma após a outra, e
então lê a frase. Júbilo, como de alguém que encontrou um novo planeta! E de
fato o Tommy encontrou um novo poeta. Depois, “o-pelo-dele-é-morno”, “o-
gatinho-é-tão-pequeno”, “eu-gosto-do-gatinho”, “o-gatinho-é-pequeno-como-o-
pelo-dele”, e assim por diante, por meio de mais uma dú-zia de arranjinhos. Se a
rima puder ser mantida em segredo até que o todo seja trabalhado será muito
melhor. Fazer os versos com as suas próprias palavras soltas dará ao Tommy um
sentido delicioso de que conhecimento é poder, como poucas ocasiões
proporcionarão na vida adulta. De qualquer modo, a leitura é para ele um deleite
daí em diante e, na verdade, exigirá muita má administração para fazer com que
ele a odeie.

A segunda aula do Tommy
O Tommy promete a si mesmo uma outra aula de leitura no dia
seguinte, mas em vez disso tem uma aula de soletração, conduzida um pouco
desta forma:
Ele faz a palavra “pato” com as suas letras, de memória se puder. Caso
contrário, com a palavra padrão. Diga “pato” lentamente. Dê o som do “p”. “Tire
o ‘p’ e o que temos?” Uma ajudinha obterá dele “ato”. Como você faria “mato”
(diga a palavra muito lentamente, trazendo o som do “m”). Ele conhece os sons
das letras e diz “m-ato” prontamente. “Pr-ato”, dois sons acrescentados, que
você o conduz a encontrar. “G-ato”: ele lhe dará o “g”, e achará a palavra “gato”
uma nova palavra encantadora de saber. “T-ato”, ele facilmente decide sobre o
som do “t”; uma conversinha sobre o tato; as outras palavras são familiares
demais para precisar de explicação. Sem dúvida, o Tommy irá querer propor
“tatu” e temos de fazer uma confissão completa e dizer: “Não, ‘tatu’ é soletrado
com outras letras”, as quais, todavia, não lhe dizemos agora. Dessa forma, ele
chega a aprender incidentalmente e muito gradualmente que diferentes grupos de
letras podem valer para os mesmos sons. Mas não lhe pedimos para generalizar.
Só fazemos perceber o fato de que “tat-u” não é soletrado pelo símbolo que
expressamos por “tato”. “Trato”: ele será capaz de dar os sons das letras iniciais,
e “trato” de novo chama para uma conversinha – uma outra palavra interessante.
Ele fez um grupo de palavras com as suas letras, e ali está na lousa numa coluna,
desta forma:

p-ato
t-ato
g-ato
pr-ato
tr-ato
m-ato

Ele lê a coluna para cima e para baixo e vice-versa. Toda palavra tem um
significado e carrega uma ideia. Depois, as palavras soltas que ele conhece são
viradas e nós ditamos novas frases, que ele arranja: “eu-gosto-do-gato-dela”, “o-
pequeno-pato-é-morno”, e assim por diante, fazendo as novas palavras com
letras soltas[137].
Palavras desconhecidas
Agora, uma nova experiência. Nós ditamos “gatinho no mato[138]”.
Consternação! O Tommy não sabe “no”. “Coloque contadores para as pala-vras
que você não sabe. Logo elas podem vir às nossas aulas.” E o Tommy tem um
desejo e uma necessidade, ou seja, um apetite pelo aprendizado.

Como as combinações têm sons diferentes
Lidamos com as palavras restantes da mesma maneira: “pequeno” dá
“pequenada”, “pequenez”, “pequeninos”. “Gatinho”, “é”, “eu” e “dele” não dão
palavras novas. “Gosto” dá “posto” e “rosto”. “Tão” dá “não”, “são”. De
“morno”, obtemos “forno”, “torno”. Nós pronunciamos “ôrno” em “torno”. O
Tommy percebe que essa pronúncia está errada e grosseira e vê que todas essas
palavras soavam como “ôrno”, exceto “torno” – isto é, ele vê que o mesmo
grupo de letras não precisa sempre ter o mesmo som. Porém não lhe pedimos
para fazer uma anotação desse pedaço novo de conhecimento. Deixamos que
cresça nele gradualmente, após muitas experiências.[139]
A essa altura, ele tem dezoito palavras novas na lousa donde fazer novas
frases com as nove palavras soltas de “gatinho”. “A pequenada dele é pequena”,
“O forno dele é morno” e assim por diante. Mas tomemos cuidado para que as
frases façam sentido. “O tato dele é torno” é absurdo e realmente não deve ser
considerado. As palavras novas do Tommy são escritas no seu “caderno-de-
anotações” escrito a mão, para que ele possa fazer um balanço das suas posses
na forma de palavras.

Formação moral ao ler lições
No dia seguinte, fazemos as duas últimas linhas da estrofe, como no
início. Dificilmente essas linhas proporcionam qualquer material para uma aula
de soletração; assim, na nossa próxima aula, continuamos com o segundo verso.
Mas o nosso estoque de palavras está crescendo. À medida que continuamos,
podemos fazer um número quase ilimitado de frases pequenas. Se temos que
usar contadores de vez em quando, ora, isso somente estimula o nosso apetite
pelo conhecimento. Quando o Tommy tiver trabalhado “gatinho”, ele terá um
estoque grande de palavras, terá capacidade considerável para formar novas
palavras com combinações familiares, terá coragem de formar todo o
“aprendizado” e terá um senso de que resultados deliciosos estarão bem dentro
do alcance. Além do mais, ele aprende a ler de uma forma que lhe proporciona
alguma formação moral. Não há tropeço, não há hesitação desde o início, mas
atenção brilhante e conquista perfeita. A sua aula de leitura é uma delícia, da
qual ele está privado quando chega à aula com um ânimo preguiçoso, arrastado.
Insiste-se em enunciação e precisão perfeitas. E quando ele chegar a arranjar o
todo da riminha nas suas palavras soltas e a ler (a mais deliciosa de todas as
aulas), a sua leitura terá de ser uma recitação perfeita e acabada. Eu acredito que
essa seja uma forma de senso comum prático para ensinar a ler em inglês. Pode
ser proveitoso para a criancinha alemã trabalhar possivelmente por todas as
combinações entediantes de letras antes de ter qualquer alegria ao “ler”, pois,
onde quer que essas combinações ocorram, elas terão os sons que a criança
aprendeu laboriosa-mente. O fato de que o inglês é anômalo com respeito à
conexão entre sinal e som felizmente nos exonera de forçar essa trituração triste.






7. RECITAÇÃO

“A arte das crianças”
Sobre esse assunto, não posso fazer mais do que encaminhar o leitor à
Recitation[140], do Sr. Arthur Burrell. Esse livro pretende ser um manual para os
professores do Ensino Fundamental I. Desejo que ele possa ser amplamente
usado por esses professores e também que possa se tornar um manual de família,
ainda que muitas aulas não sejam usadas nos lares instruídos. Dificilmente há
algum “assunto” tão instrutivo e tão elevatório como aquele que o Sr. Burrell
felizmente descreveu como “A arte das crianças”. Todas as crianças a possuem
para recitar. É um dom aprisionado esperando para ser libertado, como Ariel no
pinheiro[141]. Nesse volume muito sério e metódico, somos possuídos pelos
encantamentos certos. Use-os devidamente e fora da dificuldade dos passos
infantis mais comuns em direção ao artista-criança, uma fada delicada, que fará
rir e fará chorar. O grande Sr. Walter não “balançou de um lado para o outro,
soluçando a sua suficiência” à fala do seu animalzinho de estimação sobre:

“Pois estou doente, e capaz de lágrimas;
Oprimida com o erro, portanto cheia de lágrimas;
Uma viúva, sem marido, sujeita a lágrimas;
Uma mulher, naturalmente nascida para as lágrimas;”?


“For I am sick, and capable of fears;
Oppressed with wrong, and therefore full of fears;
A widow, husbandless, subject to fears;
A woman, naturally born to fears;”[142]?

Marjorie Fleming, para ter certeza, era uma criança genial, mas nesse livro
aprendemos por quais passos cuidadosamente graduados pode-se ensinar a uma
criança que não seja um gênio, nem mesmo nascida de pais cultos, a fina arte da
fala bonita e perfeita. Mas esse é somente o pri-meiro passo na aquisição de “A
arte da criança”. A criança deve falar pensamentos belos tão belamente, com tal
realização delicada de cada nuance de significado, que ela se torna para o
ouvinte a intérprete do pen-samento do autor. Agora, considere que apreciação,
simpatia, capacidade de expressão isso implica e você garantirá que “A arte da
criança” é, como Steele disse da sociedade da sua esposa, “uma educação liberal
em si mesma”. Objeta-se: “As crianças são papagaios! Elas falam uma coisa
conforme ouvem falar; quanto a dar-se ao trabalho de ‘apreciar’ e ‘inter-pretar’,
nada disso!” A maior verdade do estilo de recitação de “My name is Norval”;
mas por todo esse volume a criança é conduzida a encontrar a justa expressão de
pensamento para si mesma. Nunca se permite que o pobre professor defina um
padrão: “Diga isso como eu digo.” As ideias são mantidas bem dentro do alcance
da criança e a expressão é a sua própria. Ela é pega com astúcia, a sua travessura
é pressionada ao serviço, ela en-contra dúzias de maneiras de dizer “Eu não
irei”, é conduzida astutamente ao ponto de se expressar. E ela faz isso, para a sua
própria surpresa e prazer. As peças dadas aqui para a recitação são uma fonte de
novas ale-grias. “Wynken, Blynken and Nod”, “Miss Lilywhite’s Party” e “The
Two Kittens” forçariam qualquer criança a recitar. Experimente uma peça sim-
ples com as marcações e sugestões do autor, e você descobrirá que existe tanta
diferença entre o resultado e a leitura comum em voz alta quanto existe numa
composição musical tocada com ou sem as marcas de expres-são do compositor.
Espero que os meus leitores treinem os seus filhos na arte da recitação. Nos
próximos dias, ainda mais do que nos nossos, será certo que todos os homens e
mulheres instruídos serão capazes de falar efetivamente em público. E, ao
aprender a recitar, você aprende a falar.

Memorização
Recitação e comprometimento com a memória não são necessa-
riamente a mesma coisa, e é bom acumular a memória de uma criança com uma
boa quantidade de poesia, aprendida sem labor. Alguns anos atrás, por acaso
visitei uma casa. A dona da casa tinha noções educacionais pró-prias, sob as
quais estava criando uma sobrinha. Ela me apresentou com uma grande folha
toda escrita com títulos de poemas, alguns deles longos e difíceis: Tintern
Abbey[143], por exemplo. Ela me disse que a sua sobrinha podia repetir qualquer
um daqueles poemas que eu lhe pedisse, e que ela nunca aprendeu um verso
simples de cor na sua vida. A menina repetia mesmo diversos poemas na lista, de
maneira muito bonita e sem hesita-ção. E então a senhora revelou o seu segredo.
Ela achou que fez uma des-coberta, e eu achei também. Ela lia um poema todo
para E. Então, no dia seguinte, enquanto a menininha estava fazendo um vestido
de boneca, talvez, ela o lia de novo. Mais uma vez no dia seguinte, enquanto o
cabelo de E. estava sendo penteado. Ela fez cerca de seis ou mais leituras,
confor-me o comprimento do poema, às vezes e em momentos inesperados, e no
fim E. podia dizer o poema que ela não estudou.
Desde então tentei o plano e achei efetivo. A criança não tem de tentar
lembrar ou dizer o verso para si mesma, mas, na medida do possível, apresentar
uma mente aberta para receber uma impressão de interesse. Meia dúzia de
repetições deve dar às crianças posse de poemas como “Dolly and Dick”, “Do
You Ask What the Birds Say?”, “Little Lamb, How Made Thee?” e afins. Os
ganhos desse método de aprendizagem são que o limite do gosto da criança não
é tirado pelas repetições desgastantes de verso a verso e também que o hábito de
fazer imagens mentais seja inconscientemente formado.
Lembro-me de uma vez discutir esse assunto com a antiga Srtª. Anna
Swanwick em alguma conexão com Browning do qual não me lembro; mas
durante a conversa um incidente extremamente curioso aconteceu. Uma senhora,
uma sobrinha da Srtª. Swanwick, disse que após uma longa doença, durante a
qual ela não tinha permissão de fazer nada, leu Lycidas[144] por completo, como
um primeiro tratamento a si mesma enquanto uma convalescente. Ela ficou
surpresa por se ver no dia seguinte repetindo para si mesma longas passagens.
Então tentou o poema inteiro e descobriu que podia dizê-lo, como resultado
dessa leitura simples, pois ela não tinha estudado o poema antes da sua doença,
nem lido com atenção particular. Ela estava muito eufórica pelo tesouro que
conseguiu. E para testar as suas capacidades, ela leu o Paradise Lost inteiro,
livro a livro, e com o mesmo resultado: ela podia repeti-lo livro a livro após uma
leitura simples! Ela se enriqueceu adquirindo outros tesouros durante a sua
convalescença; contudo, como a sua saúde voltou e a sua mente ficou preo-
cupada com muitos empenhos, ela achou que não tinha mais essa capa-cidade
surpreendente. É possível que a mente desembaraçada de uma criança seja tão
livre para pegar e tão forte para segurar imagens lindas vestidas de palavras
lindas quanto foi a dessa senhora durante a sua recuperação. Mas deixe-me dizer
novamente: todo esforço desse tipo, ainda que inconsciente, significa uso e gasto
da substância cerebral. Deixe a criança ficar inculta até ter seis anos, e então,
nessa questão da memori-zação, como em outras, tente só um pouco, e faça que
os poemas que a criança estuda sejam simples e dentro do alcance do seu próprio
pensa-mento e imaginação. Ao mesmo tempo, quando há tanta poesia nobre
dentro do entendimento de uma criança, é uma pena que se permita que ela
aprenda bobeiras!


8. LENDO PARA CRIANÇAS MAIS VELHAS

Ao ensinar a ler, como em outras questões, c’est le premier pas qui
[145]
coute . A criança, a quem foi ensinado ler com cuidado e deliberação até que
tenha dominado as palavras de um vocabulário limitado, geralmente faz o resto
por si mesma. A atenção dos seus professores deve ser fixada em dois pontos:
que ela adquira o hábito da leitura e que ela não caia nos hábitos desleixados de
leitura.

O hábito da leitura
O defeito mais comum e monstruoso na educação de agora é que as
crianças falham em adquirir o hábito da leitura. O conhecimento lhes é
transmitido por aulas e conversa, mas o hábito aplicado de usar livros como um
meio de interesse e prazer não é adquirido. Esse hábito deve ser iniciado cedo,
tão cedo quanto a criança possa realmente ler. Deve ler por si mesma e para si
mesma história, lendas, contos de fada e outros assuntos apropriados. Desde o
início, ela deve ser formada para pensar que uma leitura de qualquer aula é o
bastante para habilitá-la a narrar o que leu, e dessa forma obterá o hábito da
leitura lenta, cuidadosa, inteli-gente, mesmo quando é silenciosa, que ela lê com
um olho o significado completo de cada frase.
Lendo alto
Ela também deve ter prática de ler alto principalmente os livros que está
usando para o trabalho do seu curso. Eles devem incluir uma boa quantidade de
poesia. Acostumá-la à realização delicada de matizes de significado e
especialmente fazê-la ciente de que as palavras são bonitas em si mesmas, que
elas são uma fonte de prazer e dignas da nossa honra, e que uma palavra bonita
merece ser dita de maneira bonita, com uma certa fluidez de tom e precisão de
afirmação. Crianças bem novas estão abertas a esse tipo de ensino, transmitidos,
não numa aula, mas por uma palavra de vez em quando.

Limitação
Além disso, o professor não deve confiar em estabelecer, por assim
dizer, uma cópia ao ler para a imitação das crianças. Elas realmente imitam com
prontidão suficiente, pegando truques de ênfase e ação de uma forma divertida;
mas esses são meros truques, uma macaqueação da inteligência. A criança tem
de expressar o que ela sente para ser a autora do significado. E esse tipo de
leitura inteligente vem somente do hábito de ler com entendimento.

Lendo para crianças
É uma delícia para as pessoas mais velhas ler em voz alta para as
crianças, mas isso deve ser somente um agrado e luxo ocasionais, permi-tidos
antes da hora de dormir, por exemplo. Temos que nos lembrar da inércia natural
da mente de uma criança: dar-lhe o hábito de ler e ela constantemente se esquiva
do trabalho de ler por si mesma. De fato, todos nós gostamos de ser alimentados
com a nossa carne intelectual, ou deve-mos ler e pensar mais por nós mesmos e
sermos menos ansiosos para correr atrás de palestras.

Questões sobre o assunto
Quando uma criança está lendo, não deve ser importunada com
questões relacionadas ao significado do que leu, a significação dessa ou daquela
palavra. O que é irritante para pessoas mais velhas é igualmente irritante para as
crianças. Além disso, não tem o menor efeito que elas possam dar o significado
de toda palavra que lerem. Só se chega de uma forma a um conhecimento de
significados, isto é, um vocabulário amplo e correto: pelo hábito da leitura.
Inconscientemente, uma criança obtém o significado de uma palavra nova a
partir do contexto; se não for na primeira vez que encontrá-la, então será na
segunda ou terceira. Mas ela está à espreita e descobrirá para si mesma o sentido
de qualquer expres-são que não entenda. Perguntas diretas sobre o assunto que
uma criança leu são sempre um erro. Faça-a narrar o que leu ou alguma parte
dele. Ela gosta desse tipo de reprodução consecutiva, mas abomina toda pergunta
de natureza enigmática. Se tem de haver enigmas, que seja a tarefa da crian-ça
perguntar ao professor para lhe direcionar a resposta. Perguntas que levam a um
tema lateral ou a uma visão pessoal são permitidas, porque interessam às
crianças: “O que você teria feito no lugar dele?”

Livros didáticos
Uma criança não iniciou a sua educação até que tenha adquirido o
hábito de ler por si mesma, com interesse e prazer, num certo nível, livros –
completamente com a sua inteligência. Agora estou falando dos seus livros
didáticos, que podem ser todos escritos num estilo de disparates insuportáveis,
provavelmente porque são escritos por pessoas que nunca encontraram uma
criança. Todos os que conhecem as crianças sabem que elas não falam bobagens,
não gostam disso e preferem aquilo que apela ao seu entendimento. Os seus
livros didáticos devem oferecer assunto para a sua leitura, quer em voz alta, quer
para si mesmas. Portanto, elas devem ser escritoras com capacidade literária.
Quanto ao assunto desses livros, lembremo-nos de que as crianças podem
assumir ideias e princípios – sejam estes morais, sejam mecânicos – tão rápida e
claramente quanto nós mesmos fazemos (talvez mais ainda). Mas processos,
listas e resumos detalhados enfraquecem o limite da mente delicada de uma
criança. Logo, a seleção dos seus primeiros livros didáticos é um assunto de
muita impor-tância, porque cabe a eles dar às crianças a ideia de que o
conhecimento é supremamente atrativo e de que a leitura é deliciosa. Uma vez
estabele-cido numa criança o hábito de ler o seu livro didático com prazer, a sua
educação não é completada, mas assegurada. Ela continuará por conta própria,
apesar dos obstáculos que a escola muito comumente lança no seu caminho.



Hábitos desleixados; desatenção
Eu já falei da importância de uma simples leitura. Se uma criança não é
capaz de narrar o que leu uma vez, não a deixe ter a noção de que ela pode ler de
novo ou de que a isso é obrigada. Um olhar de leve pesar por haver uma lacuna
no seu conhecimento a convencerá. A capacidade de ler com perfeita atenção
não será ganha pela criança a quem permitem divagar nas suas aulas. Por essa
razão, as aulas de leitura têm de ser curtas. Dez ou quinze minutos de atenção
fixa é o suficiente para as crianças das idades que temos em vista. E uma aula
dessa duração permi-tirá que uma criança percorra duas ou três páginas do seu
livro. A mesma regra quanto à duração de uma aula se aplica às crianças cujas
lições são lidas a elas, porque ainda não são capazes de ler por si mesmas.

Enunciação sem cuidado
Ao ler em voz alta, é importante que as crianças façam o uso devido dos
órgãos vocais, e, por esse motivo, uma aula de leitura deve ser introduzida por
dois ou três exercícios simples de respiração, como, por exemplo, uma longa
inspiração com lábios fechados e uma expiração lenta com a boca aberta. Se uma
criança lê pelo nariz, é bom consultar um médico. Pode ser necessária uma
operação para adenoides, que raramente é aflitiva e deve ser realizada quando as
crianças são novas. Pronúncia provinciana e enunciação desleixada têm de ser
evitadas. Devem curar esses defeitos a prática nos sons de vogais puras e o
respeito pelas palavras que não permitirão que o seu ser seja precipitadamente
arrui-nado. A propósito, bem poucas crianças comumente enunciam de maneira
bonita, porque uma palavra grande é uma nova conquista de que elas gostam e
que aproveitam ao máximo. Os nossos esforços devem ser direcionados para
fazer as crianças mais velhas terem palavras em alta estima.
O hábito de “prestar atenção aos seus pontos” vem da leitura inteligente. O
entendimento de uma criança sobre a passagem a levará à opinião correta.





9. A ARTE DE NARRAR

Crianças narram por natureza
Narrar é uma arte como fazer poesia ou pintar, porque está ali, na mente
de toda criança, esperando ser descoberto. E não é o resultado de qualquer
processo de educação disciplinar. Uma ordem criativa o faz existir. “Faça-a
narrar”, e a criança narra, fluentemente, abundantemente, em sequência
ordenada, com detalhes ajustados e gráficos, com uma esco-lha simples de
palavras, sem verborreia ou tautologia, tão logo possa falar com facilidade.
Permite-se que esse dom incrível com o qual as crianças normais nascem fique
inculto na sua educação. O Bobbie chegará em casa com uma narrativa heroica
de uma luta que ele viu entre “Duke” e um cachorro na rua. É maravilhoso! Ele
viu tudo e conta tudo com vigor esplêndido no tom verdadeiramente épico, mas
é tão enraizado o nosso desprezo pelas crianças que não vemos nada nisso senão
o jeito infantil e tolo do Bobbie! Ao passo que aqui, se tivermos olhos para ver e
graça para construir, está o plano de ação da sua educação.
Até que ele tenha seis anos, faça o Bobbie narrar somente quando e o que
ele tiver uma ideia. Ele não tem de ser chamado para dizer qualquer coisa. Esse é
o segredo das longas conversas estranhas a que assistimos com diversão entre
criaturas de dois, quatro e cinco anos? É possível que elas narrem enquanto
ainda são inarticuladas e que a outra pessoa inarticulada compreenda tudo? Elas
nos experimentam, pobres mais velhos queridos, e respondemos “Sim.”,
“Realmente!”, “Você pensa assim?” ao balbucio de cujo significado não temos
compreensão. Que isso seja conforme possa ser: daquilo que continua na região
escura do “abaixo de dois”, não temos segurança. Mas espere até que o
amiguinho tenha palavras e ele “contará” sem fim a quem quer que seja que
escute o conto, mas, por escolha, aos seus próprios camaradas.

Essa capacidade deve ser usada na sua educação
Peguemos os bens que os deuses fornecem. Quando a criança tiver seis
anos, não mais cedo, faça-a narrar o conto de fada que lhe foi lido, episódio por
episódio, ouvindo cada um; a história da Bíblia lida para ela nas palavras da
Bíblia; a história de animal bem escrita; ou tudo sobre outras terras de algum
volume como The World at Home[146]. O menino de sete anos de idade terá
começado a ler por si mesmo, mas tem de obter a maior parte do seu alimento
intelectual de ouvido certamente, mas lido para ele a partir de livros. Geografia,
esboços da história antiga, Robinson Crusoe, The Pilgrim’s Progress[147],
Tanglewood Tales[148], Heroes of Asgard[149] e muitos afins o ocuparão até que
tenha oito anos. Os pontos a serem mantidos em mente são que ele não deve ter
livro que não seja um clássico de criança, e que, dado o livro certo, ele não tem
de ser diluído com conversa ou quebrado com perguntas, mas dado ao menino
nas devidas proporções como carne saudável para a sua mente, na plena
confiança de que a mente de uma criança é capaz de lidar com a sua comida
adequada.
A criança de oito ou nove anos é capaz de desafiar o mais sério material de
conhecimento, mas o nosso negócio para o momento é com o que as crianças
abaixo de nove anos podem narrar.

Método da lição
Em todo caso, a leitura deve ser consecutiva a um livro bem escolhido.
Antes que a leitura do dia comece, a professora deve conversar um pouco (e
fazer as crianças falarem) sobre a última aula, com poucas palavras sobre o que
será lido, a fim de que as crianças possam se animar por expectativa, mas devem
ter cuidado com a explicação e, especialmente, com antecipar a narrativa. Então,
pode ler duas ou três páginas, o bastante para incluir um episódio. Depois disso,
chama as crianças para narrarem – em turnos, se houver muitas crianças. Elas
não somente narram com ânimo e precisão, mas têm êxito ao pegar o estilo do
seu autor. Não é sábio importuná-las com correções. Elas podem começar com
uma cadeia de “e” sem fim, mas logo elas deixam isso, e as suas narrações se
tornam boas o bastante no estilo e composição para serem postas num “livro
impresso”!
Essa espécie de aula de narração não deve ocupar mais do que quinze
minutos.
O livro deve ser sempre profundamente interessante, e, quando a narração
acabar, deve haver uma conversinha na qual os pontos morais são trazidos,
imagens mostradas para ilustrar a aula ou diagramas dese-nhados na lousa.
Assim que as crianças forem capazes de ler com facili-dade e fluência, elas leem
as suas próprias lições, seja em voz alta, seja silenciosamente, com uma vista
para a narração. Porém, onde for neces-sário fazer omissões, como nas narrativas
do Antigo Testamento e nas Vidas[150] de Plutarco por exemplo, será melhor que
a professora sempre leia a lição que deve ser narrada.


10. ESCRITA

Realização perfeita
Posso oferecer somente algumas dicas sobre o ensino da escrita, embora
muito possa ser dito. Primeiro, faça que a criança em toda aula realize algo
perfeitamente: um traço, um traço curvo, uma letra. Faça que a aula de escrita
seja curta. Ela não deve durar mais que cinco ou dez minutos. A facilidade na
escrita vem com a prática, mas isso tem de ser garantido mais tarde. Enquanto
isso, o que deve ser evitado é o hábito do trabalho sem cuidado: um “M”
corcunda, um “O” angular.

Escrevendo
Mas a criança deve ter prática da letra de imprensa antes de começar a
escrever. Primeiro, faça-a escrever a mais simples das letras maiúsculas com
curvas simples e linhas retas. Quando puder fazer as letras maiúsculas e grandes,
com alguma firmeza e decisão, ela poderá continuar para as letras menores – “de
forma” como no tipo que chamamos “itálico” apenas na vertical – tão simples
quanto possíveis, e grandes.



Passos ao ensinar
Que o traço seja aprendido primeiro; depois o traço curvo; depois as
letras nas quais a curvatura do traço seja um elemento – “N”, “M”, “V”, “W”,
“R”, “H”, “P”, “Y”; depois o “O” e as letras cuja curva seja um elemen-to: “A”,
“C”, “G”, “E”, “X”, “S”, “Q”; depois as letras como laço: “B”, “L”, “F”, “T”
etc. Uma letra deve ser perfeitamente formada num dia, e no dia seguinte as
mesmas formas elementares repetidas numa outra letra, até que se tornem
familiares. Cópias paulatinas: três ou quatro letras que elas aprenderam
agrupadas numa palavra – “HOMEM”, “TIA”. A lição é a produção da palavra
escrita uma vez sem uma simples falha em qualquer letra. Nesse estágio, o giz e
a lousa são melhores do que a caneta e o papel, assim como é bom que a criança
deva apagar e apagar até que os seus próprios olhos estejam satisfeitos com a
palavra ou a letra que ela escre-veu.
Pouco precisa ser dito sobre os estágios posteriores. Assegure-se de que a
criança comece fazendo letras perfeitas e nunca permita que ela faça letras
defeituosas. O restante fará por si mesma. Quanto a “uma boa le-tra”, não a
apresse. A sua “caligrafia” virá pouco a pouco do caráter que está nela, mas,
como uma criança, não se pode dizer, estritamente falando, que ela tenha caráter.
Providencie boas cópias diante dela e veja que ela imita o seu modelo
obedientemente: a aula de escrita não tem muitas linhas ou “uma cópia” – isto é,
uma página de escrita – mas uma linha simples que é, na medida do possível,
exatamente uma cópia das características providen-ciadas. A criança pode ter de
escrever diversas linhas antes que tenha êxito ao produzir isso.

Letra de forma
Se ela escreve em livros com títulos de copperplate[151] (que, no geral,
devem ser evitados), a discriminação deve ser exercitada na escolha desses. Em
muitos deles, a escrita é péssima e as letras são adornadas com floreios que
aumentam o trabalho do aluno, mas de jeito nenhum melho-ram o seu estilo.
Mais uma palavra: não apresse a criança com a “letra pequena”. É desnecessário
que ela trabalhe muito o que é chamado de “letra grande”, mas a “letra de
forma”, o tamanho médio, deve ser conti-nuado até que ela faça as letras com
facilidade. É muito mais fácil uma criança entrar num rabisco irregular por meio
da “letra pequena” do que sair dele de novo. Nisso, como em tudo, o cuidado do
educador tem de ser dado, não somente para a formação dos hábitos bons, mas
para a preven-ção dos hábitos maus.

Uma “nova caligrafia”
Alguns anos atrás, eu ouvi de uma senhora que estava elaborando,
mediante o estudo do italiano antigo e outros manuscritos, um “sistema de
caligrafia bonita” que poderia ser ensinado às crianças. Eu esperei pacien-
temente, ainda que com alguma urgência, pela produção desse novo tipo de
“caderno de caligrafia”. A necessidade por tal esforço era muito grande, pois a
escrita comum nitidamente ensinada a partir de cadernos de cali-grafia
existentes, ainda que meticulosos e legíveis, não pode senão ter um efeito muito
vulgarizador, tanto no escritor, quanto no leitor de tal manus-crito. Enfim a Srª.
Robert Bridges teve sucesso no seu empreendimento tedioso e difícil. E esse
caderno para professores os permitirá que ensinem aos seus alunos um estilo de
escrita agradável para adquirir, porque é bonito de ver. É surpreendente quão
rápido as crianças novas, mesmo aquelas já confirmadas na escrita “feia”,
chegam a essa “nova caligrafia”.
Mas o propósito da Srª. Bridges em A New Handwriting[152] será melhor
entendido por algumas passagens citadas, com a sua permissão, do seu prefácio:
“As dez gravuras anexas são destinadas principalmente àqueles que ensinam a
escrita: poucas palavras, tanto de apologia quanto de explicação, são necessárias
para introduzi-las. Eu sempre fui interes-sada em caligrafia e, após ter me
familiarizado com o gótico italianizado do século XVI, conscientemente alterei a
minha letra para alguma semelhan-ça com as suas formas e caráter geral. Com a
escrita acontecendo para agradar, frequentemente me pediram para fazer
alfabetos e cópias, e fui solicitada por professores profissionais para ter um
caderno como esse impresso, de modo que eles pudessem usá-lo nas suas
escolas. Uma pessoa nunca pode se satisfazer muito ao fazer os modelos para
outros copiarem, mas essas gravuras são bem o que eu pretendi, apesar de
algumas delas, devido à minha inexperiência, terem sofrido na reprodução...
Primeiro uma criança tem de controlar a sua mão e limitá-la a obedecer ao
seu olho. Nesse estágio mais inicial, quaisquer formas simples servirão ao
propósito. Logo, pode-se argumentar posteriormente que as formas são sempre
indiferentes e que o pleno domínio da letra pode também ser atingido copiando
tanto maus modelos como bons. Mas dificilmente isso pode acontecer: o caderno
de caligrafia comum, cujo objetivo parece ser economizar as partes componentes
das letras, não pode treinar a mão conforme mais formatos variados existam.
Nem essa unifor-midade, exclusiva da beleza, oferece bom treinamento ao olho.
Além do mais, devo dizer que a variedade e a beleza da forma são atrativas,
mesmo às criancinhas, e que a tentativa de criar algo que as interesse aplaude e
coroa os seus esforços monumentais com um prazer que não pode ser procurado
na tarefa de copiar formatos monótonos. Mas não posso dizer se tal letra, como
essa mostrada aqui, serve tão facilmente quanto maior o modelo uniforme para o
desenvolvimento de uma cursiva rápida, útil. E é possível que as degradações,
inevitáveis no hábito da escrita rápida, pos-sam produzir um mero desarranjo,
quase a pior reprovação da caligrafia. Algumas das melhores letras inglesas de
hoje são uma cursiva rápida tão boa quanto alguém possa desejar, e esta mostra
pontos de beleza real. No entanto essas letras são raras e são somente aquelas
que têm, como dize-mos, caráter, o que provavelmente quer dizer que o escritor
teria feito bem para si mesmo sob qualquer sistema, enquanto as letras comuns,
que são o efeito natural da antiga escrita do caderno de caligrafia, degradadas
por pressa, parecem dever a sua feiura comum ao tipo ruim do qual elas
brotaram. E os escritores, quando têm ocasião de escrever bem, descobrem que
podem fazer só um pouco melhor, e só se prova que a pressa não era a causa real
da sua má escrita.”

Como usar
O método de usar a Handwriting da Srª. Bridges, que achamos o mais
eficaz, é praticar cada forma sobre a lousa a partir da gravura, e depois usar o
lápis, e depois ainda caneta e tinta. Pouco a pouco, as crian-ças serão
promovidas a transcrever pequenos poemas e assim por diante, nessa escrita
muito agradável.
Títulos devem ser evitados, já que as crianças falham em usar as formas do
título na sua escrita comum. Às vezes objeta-se que essa caligra-fia um tanto
elaborada e bonita interferirá com uma “letra” característica, mas me parece que
ter uma base bonita, em vez de uma comum, para a caligrafia é um grande
ganho.


11. TRANSCRIÇÃO

Valor da transcrição
A primeira prática da escrita apropriada para crianças de sete ou oito
anos não deve ser a escrita ou o ditado de letra, senão a transcrição, um trabalho
lento e bonito, para o qual a New Handwriting deve ser preferida, conquanto
talvez algumas das características mais ornamen-tadas possam ser omitidas com
proveito.
A transcrição deve ser uma introdução à ortografia. As crianças devem ser
estimuladas a olhar para a palavra, ver uma imagem dela com os seus olhos
fechados e então escrever de cor.

As crianças devem transcrever passagens favoritas
Um certo sentido de posse e deleite pode ser adicionado a esse
exercício, se é permitido que as crianças escolham o seu verso favorito num e
noutro poema para a transcrição. Isso é melhor do que escrever um poema
favorito, um exercício que aborrece as pessoinhas antes que seja terminado. Mas
um livro deles mesmos, feito dos seus próprios versos escolhidos, deve lhes dar
prazer.

Letra de forma pequena; linhas duplas pautadas
Linhas duplas pautadas, letra de forma pequena, devem ser usadas
primeiramente, já que as crianças estão ansiosas para escrever a “letra pequena”
muito pequena, e, uma vez que tenham caído nesse hábito, não é fácil conseguir
uma escrita boa. Um senso de beleza na sua escrita e nas linhas que elas copiam
deve afetar esse estágio do seu trabalho com prazer. Não mais que dez ou quinze
minutos devem ser dados às primeiras aulas de escrita. Se elas forem maiores, as
crianças ficam cansadas e des-leixadas.
Posição para escrever
Quanto à posição para escrever, as crianças devem se sentar de maneira
que a luz as atinja a partir da esquerda. E a escrivaninha ou a mesa devem estar
numa altura confortável.
Seria um grande ganho se as crianças fossem ensinadas desde o início a
segurar a caneta entre o primeiro e o segundo dedo, firmando-a com o dedão.
Essa posição evita a tensão desconfortável sobre os músculos produzida pela
maneira comum de segurar uma caneta – uma tensão que causa cãibra no
escritor nos dias posteriores quando houver muita escrita a ser feita. A caneta
deve ser segurada numa posição confortável, em vez de perto da ponta, com
dedos e dedão mais ou menos inclinados, e a mão permanecendo sobre o papel.
Deve-se permitir também ao escritor que se apoie com a mão esquerda sobre o
papel e escreva numa posição fácil, com a cabeça inclinada, mas não com uma
figura corcovada. Seria desneces-sário dizer que a parte achatada da ponta deve
ser usada se as crianças não têm um feliz talento de fazer marcas de aranha com
a ponta segurada lateralmente. Em todas as aulas de escrita, deve ser feito o uso
livre da lousa tanto pela professora quanto pelas crianças, a título de modelo e
prática.

Escrivaninhas
As melhores escrivaninhas que conheço são aquelas recomendadas pelo
Dr. Roth: escrivaninhas simples que podem ser erguidas ou abaixa-das, movidas
para trás ou para frente, com assento, costas e almofada traseira e descansos para
os pés. Podem existir outras tão boas, ainda melhores, no mercado, mas essas
parecem atender a todo propósito.

Mesa das crianças
Para as criancinhas, é um bom plano ter uma mesa da altura certa feita
pelo carpinteiro da casa, até o topo da mesa, consistindo de duas folhas com
dobradiças. Essas folhas abrem no meio e revelam um tipo de caixa no espaço
que frequentemente é usado como uma gaveta, o próprio topo da mesa fazendo
as tampas da caixa. Esse receptáculo para os livros das crianças, materiais de
escrita etc., é mais facilmente mantido, arru-mado por elas mesmas, do que uma
gaveta ou caixa comum.


12. ORTOGRAFIA E DITADO

De todos os exercícios perniciosos nos quais as crianças gastam as suas
horas escolares, o ditado, conforme praticado comumente, talvez seja o mais
pernicioso. Isso porque as pessoas tardam a entender que não há parte de um
trabalho da criança na escola que algum princípio filosófico não esteja na base.

Uma causa fértil de má grafia
A prática comum é a professora ditar uma passagem, frase por frase,
repetindo cada uma, talvez, três vezes sob tiroteio de perguntas dos nossos
escritores. Toda linha tem erros de grafia: um, dois, três, talvez. A professora
consciente risca com o seu lápis esses erros ou os sublinha sole-nemente com
tinta vermelha. As crianças se corrigem de várias maneiras. Às vezes trocam os
livros e cada uma corrige os erros da outra, copiando a palavra do livro ou da
lousa. Algumas professoras sem conhecimento ainda fazem as crianças copiarem
o seu próprio erro com a correção, que no fim é escrita três ou quatro vezes,
aprendida e soletrada à professora. A profes-sora fica surpresa com a pura
teimosia que faz com que os mesmos erros sejam repetidos muitas vezes, a
despeito de todos esses esforços cuidado-sos.

A razão fundamental da ortografia
Mas o fato é que o talento de soletrar depende da capacidade que o olho
possui de “tirar” (num sentido fotográfico) uma imagem detalhada de uma
palavra. E essa é uma capacidade e hábito que têm de ser cultivados nas crianças
desde o início. Quando elas lerem “gato”, têm de ser estimu-ladas a verem a
palavra com os seus olhos fechados. E o mesmo hábito as permitirá formar a
imagem “Termópilas”. Essa formação de imagens das palavras sobre a retina
parece ser a única estrada real para a ortografia. Um erro cometido uma vez e
corrigido conduz a uma dúvida temerosa para o resto da vida de uma pessoa,
com relação a qual forma foi errada e qual é a certa. A maioria de nós é
assombrada por alguma dúvida: por exemplo, se “exceção” é com “ç” ou
“ss”[153]. E a dúvida surgiu de uma correção. Uma vez que o olho vê uma palavra
mal grafada, aquela imagem permanece. E se também há a imagem da palavra
corretamente grafada, ficamos perple-xos com relação a qual é qual. Agora
vemos por que não poderia haver uma maneira mais engenhosa de fazer maus
soletradores do que o “ditado” como ele é comumente ensinado. Toda palavra
mal grafada está em ima-gem no cérebro da criança, não sendo apagada pela
grafia certa. Portanto, é função da professora impedir a falsa grafia e, se um erro
foi cometido, escondê-lo, por assim dizer, de modo que a impressão não se fixe.

Passos de uma aula de ditado
As aulas de ditado, conduzidas de tal forma como a seguinte, geral-
mente resultam em boa grafia. Uma criança de oito ou nove anos prepara um
parágrafo; as crianças mais velhas, uma, duas ou três páginas. A criança prepara
por si mesma, olhando para a palavra da qual não tem certeza, e depois vendo-a
com os seus olhos fechados. Antes de começar, a professora pergunta que
palavras a criança acha que precisará da sua atenção. Geralmente ela sabe, mas a
professora pode apontar qualquer palavra provável de ser a causa do tropeço. A
criança deixará a sua profes-sora saber quando estiver pronta. Esta pergunta se
há quaisquer palavras das quais ela não tenha certeza. Coloca essas uma a uma
na lousa, dei-xando a criança olhar até ter uma imagem e então apaga a palavra.
Se qualquer criança ainda estiver com dúvida, deverá ser chamada para colo-car
na lousa a palavra de que não tem certeza. A professora se prepara para apagar a
palavra, quando uma letra errada começa a aparecer, e ainda ajuda a criança a ter
uma imagem mental. Então faz o ditado, frase por frase, cada frase repetida uma
vez. Ela dita com vistas a apontar o que se espera que as crianças façam
conforme escrevem, mas ela não tem de lhes dizer “vírgula”, “ponto e vírgula”
etc. Após o tipo de preparo que des-crevi, que leva dez minutos ou menos,
raramente há um erro na grafia. Se houver, valerá a pena que a professora esteja
observando os deslizes no papel timbrado quando for colocada a palavra errada,
de maneira que a sua imagem possa ser apagada na medida do possível. No final
da aula, a criança deverá estudar de novo a palavra errada no seu livro, até que
ela diga ter certeza e a escreva corretamente no papel timbrado.
Uma aula como essa assegura a boa cooperação das crianças, que sentem
tomar a sua devida parte nela. E também as prepara para a se-gunda condição da
boa grafia, que é muita leitura combinada com o hábito de imaginar as palavras
conforme são lidas.
A grafia analfabeta geralmente é um sinal de leitura escassa, mas, às vezes,
de leitura apressada sem o hábito de ver as palavras que são passadas por cima.
Não se deve perder de vista a ortografia nos outros estudos das crianças,
embora elas não devam ser importunadas para soletrar. Por exemplo, é bom
escrever um nome próprio difícil na lousa no curso de leituras de história ou
geografia, apagando a palavra quando as crianças dizem que podem vê-la. Todo
o segredo da ortografia está no hábito de visualizar as palavras de cor, e as
crianças têm de ser formadas para visualizar no curso da sua leitura. Elas gostam
dessa maneira de aprender a soletrar.


13. REDAÇÃO

O texto de George Osborne
Que pessoa prodigiosamente bem estudada e encantadora o Rev.
Lawrence Veal foi, Mestre de George! Disse Amelia: “Ele sabe tudo. Ele diz que
não existe lugar no bar ou no senado a que Georgy não possa aspirar. Olhe aqui.”
E ela foi à gaveta do piano e tirou uma redação de George. Esse grande esforço
de gênio, que ainda está na posse da mãe de Georgy, é conforme segue:
“Sobre o Egoísmo. – De todos os vícios que degradam o caráter
humano, o Egoísmo é o mais odioso e desprezível. Um amor indevido ao eu leva
aos crimes mais monstruosos e ocasiões das maiores desgraças tanto nos Estados
quanto nas Famílias. Assim como um homem egoísta empo-brecerá a sua família
e com frequência a levará à ruína, um rei egoísta leva o seu povo à ruína e com
frequência o mergulha na guerra. Exemplo: o egoísmo de Aquiles[154], conforme
mencionado pelo poeta Homero[155], oca-sionou milhões de aflições aos gregos.
O egoísmo de Napoleão Bonaparte tardio ocasionou inumeráveis guerras na
Europa e o fez perecer numa ilha miserável, a de Santa Helena no Oceano
Atlântico.
Vemos por esses exemplos que não devemos consultar o nosso próprio
interesse e ambição, mas que devemos considerar os interesses dos outros assim
como os nossos.
George S. Osborne
Athene House, 24 de abril de 1827”
Disse a mãe encantada: “Pense nele (George tinha 10 anos) escrevendo
esse texto e citando os gregos também, na sua idade.”
E a Srª. George Sedley pode ficar bem encantada. Muitas mães hoje não
se satisfariam com esse esforço literário? De que Thackeray pode estar rindo?
Ou na verdade ele nos dá esse pequeno “tema” como um tour de force[156]?

Uma futilidade educacional
Acredito que esse grande professor de moral lança aqui um desafio
sobre uma falácia educacional que é aceita, mesmo no século XX. Essa
futilidade é a extração da redação original dos alunos e alunas. A função própria
da mente do jovem aluno é colher material para as generalizações da vida adulta.
Se pedem a uma criança para generalizar, isto é, escrever uma redação sobre um
tema abstrato, um duplo erro lhe é feito. Ela é levada perante uma parede de
pedra, sendo-lhe pedido que faça o que lhe é impossível. E isso é desestimulante.
Mas um dano moral pior lhe acontece quando, não tendo pensamento próprio a
oferecer sobre o assunto, ela junta esses clichês conforme chegaram ao seu
caminho e oferece o todo como a sua “redação”, um esforço que põe uma tensão
sobre a sua cons-ciência enquanto aborrece a sua vaidade. Nestes dias, os
mestres não põem conscientemente a sua mão no trabalho dos seus pupilos como
fez aquele mestre “prodigiosamente bem estudado e encantador” que fez a
educação de George Osborne. Mas talvez sem saber eles deem as ideias que o
hábil aluno aproveita para “colar” na “redação” que ele odeia. Às vezes fazem
mais: ensinam deliberadamente as crianças a “construírem uma frase” e a
“ligarem frases”.

Aulas de redação
Eis uma lista de exercícios preliminares (ou melhor, uma parte de uma
série, que numera 40) destinada a ajudar uma criança a escrever uma redação
sobre “Um Guarda-Chuva” de um livro de uma das nossas melhores editoras:




Passo 1

1. O que você é?
2. Como você conseguiu o seu nome?
3. Quem usa você?
4. O que você foi uma vez?
5. Como era na época?
6. Onde você foi obtido ou encontrado?
7. De que coisa ou materiais você é feito?
8. De que fontes você vem?
9. Quais são as suas partes?
10. Você é feito, adulto ou ajustado?

***

Passo 2

“Eu sou um guarda-chuva e sou usado por muitas pessoas, jovens e
idosas.
O meu nome vem de uma palavra que significa ‘chuva’[157].
O bastão talvez tenha vindo da América e é bem suave, plano e polido,
para que o anel metálico possa deslizar facilmente para cima e para baixo no
bastão.
As minhas partes são uma moldura e uma capa. A minha moldura
consiste de um bastão de aproximadamente um metro, arames e uma tira
deslizante de metal. Na parte mais baixa do bastão está uma virola e um anel de
aço. Isso preserva a parte final de ser gasta quando estou a andar.

***

Passo 3

Agora use ele, é e era, em vez de eu, tenho, meu e sou.

***

Exercício

Agora escreva a sua própria descrição sobre ele.


Tal ensino: um perigo público
E esse é um trabalho destinado aos Padrões VI e VII! Isto é, esse tipo de
coisa é o esforço literário final a ser exigido das crianças nas nossas séries
iniciais!
Os dois volumes (que eu cito perto do fim do volume segundo e mais
avançado) não devem ser condenados à forca como excepcionalmente ruins.
Alguns anos atrás, foi feita a terrível descoberta de que, tanto no Ensino
Fundamental quanto no Médio, a “redação” era terrivelmente de-feituosa,
portanto mal ensinada. Desde então, muitos volumes foram pro-duzidos, mais ou
menos nas linhas indicadas na citação acima, e editores importantes não
perceberam que oferecer ao público, com a sanção do seu nome, obras desse
caráter esterilizador e prejudicial é uma ofensa contra a sociedade. O corpo de
uma criança é sagrado aos olhos da lei, mas as suas capacidades intelectuais
podem ser aniquiladas com essa dieta de fome, e nada dito! O pior disso é que
tanto os autores quanto os editores em todo caso agem sobre a falácia de que o
esforço bem-intencionado é sempre desculpável, se não louvável. Eles não
percebem que nenhum esforço é permissível para a educação das crianças sem
uma concepção inteligente, tanto das crianças quanto do que a educação
significa.


A “redação” vem por natureza
De fato, as aulas de “redação” devem seguir o modelo daquele famoso texto
sobre “Cobras na Irlanda”, “Não há nenhuma”. Para as crianças abaixo de nove
anos, a questão da redação se resolve na questão da narração, variada por algum
exercício simples como escrever e narrar uma peça, escrever o relato inteiro de
uma caminhada que fizeram, uma lição que estudaram ou algum assunto simples
que conheçam. Antes de ter dez anos, as crianças que tinham o hábito de usar
livros escreverão bem: um inglês vigoroso com facilidade e liberdade. Isto é, se
elas não foram impe-didas por instruções. É bom para elas nem mesmo aprender
regras para a colocação de pontos e letras maiúsculas até que notem como essas
coisas ocorrem nos seus livros. A nossa função é fornecer às crianças material
para as suas aulas e deixar o manuseio desses materiais para elas mes-mas. Se
acreditarmos nisso, a redação é tão natural quanto pular e correr para as crianças
que puderam fazer o uso devido dos livros. Em primeiro lugar, elas devem narrar
e irão redigir mais tarde com suficiente pronti-dão. Porém não se deve ensinar-
lhes “redação”.


14. AULAS DE BÍBLIA

As crianças gostam da Bíblia
Nós somos capazes de acreditar que as crianças não podem se interessar
pela Bíblia a menos que as suas páginas sejam diluídas: trans-formadas no inglês
desarranjado que preferimos lhes oferecer. Eis uma anedota sugestiva da infância
da Srª. Harrison, uma do par de donzelinhas quacrianas[158] apresentada a nós na
Autobiography[159] de Mary Howitt[160], a mais conhecida das irmãs. “Um dia, ela
encontrou o seu caminho numa sala de madeira. Ali viu uma antiga Bíblia e,
virando as suas folhas ama-relas, chegou a palavras que ela não tinha ouvido nas
leituras usuais de manhã: os capítulos de abertura de São Lucas – que o seu pai
objetou ler em voz alta – e o capítulo de encerramento do Apocalipse. A imagem
primorosa do nascimento da Grande Criança em um capítulo e a beleza da
descrição da Nova Jerusalém no outro foram captadas pela menininha ansiosa de
seis anos com um êxtase que, ela costumava dizer, nenhum romance nos anos
posteriores jamais produziu.”
E aqui está uma menção de uma criança de cinco anos: “Os
pequenininhos leem todo dia os eventos da Semana Santa comigo. Z. é
indizivelmente interessante na sua profundidade, interesse reverente, quase
empolgação.”
Provavelmente, somos bem incapazes de medir a receptividade religiosa
das crianças. No entanto, a sua justeza para apreender as coisas profundas de
Deus é um fato com o qual somos chamados a “lidar pruden-temente” e com
reverência. E isso porque, uma vez que ninguém pode apreciar mais plenamente
do que o “darwinista[161]”, a atitude de pensa-mento e sentimento na qual você
põe uma criança é o fator vital na sua educação.

Devem conhecer o texto da Bíblia
As crianças entre seis e nove anos devem ter um conhecimento
considerável do texto bíblico. Aos nove anos, elas devem ter lido porções de
narrativa simples (e apropriadas) do Antigo Testamento e, digamos, duas dos
evangelhos.
Por várias razões o Antigo Testamento deve ser lido para as crianças. As
histórias do evangelho podem ser lidas por elas mesmas assim que puderem lê-
las de maneira bonita. É um erro usar paráfrases do texto. O bom rolo[162] do
inglês bíblico atrai as crianças com uma música cativante. E provavelmente elas
reterão pela vida a sua primeira concep-ção das cenas bíblicas e também as
mesmas palavras nas quais essas cenas são retratadas. Isso é uma grande fruição.
Metade da conversa inte-ligente que ouvimos hoje e metade da intranquilidade
que subjaz a essa conversa são devidas a uma completa e perfeita ignorância do
texto bíblico. Os pontos de ataque são apresentados às mentes dos homens nus e
recortados, sem atmosfera, perspectiva, proporção, até que a Bíblia chegue a
significar para muitos a fala da jumenta de Balaão ou o sol pairante sob o
comando de Josué.
Mas faça que nas imaginações das crianças sejam armazenadas as
imagens, que as suas mentes sejam nutridas com palavras das histórias das
Escrituras que se revelam gradualmente, e elas chegarão a olhar um largo
horizonte dentro do qual pessoas e eventos assumem um formato no seu devido
lugar e devida proporção. Gradualmente, elas verão que o mundo é um palco
onde a bondade de Deus está continuamente se empe-nhando com a teimosia do
homem; que alguns homens heroicos tomarão o lado de Deus e que outros, tolos
e obstinados, opõem-se a Ele. O fogo do entusiasmo se acenderá no seu peito e
as crianças também tomarão o seu lado, sem muita exortação ou qualquer
pensamento ou fala de experiência espiritual.

Verdade essencial e acidental
Se tal e tal narrativa é um mito, se uma parábola ou uma circuns-tância
realmente ocorreu, essas questões não afetam a mente sincera de uma criança,
porque elas não têm nada a ver com as questões centrais. É muito bom levar
diante das crianças, no curso das suas leituras da Bíblia, toda luz nova que a
pesquisa moderna coloque no nosso caminho. Quanto mais pudermos ajudá-las
neste caminho, mais vívido e mais real o ensino da Bíblia se tornará a elas. Mas,
de qualquer modo, as crianças podem reivindicar essa graça nas nossas mãos:
que elas não sejam perturbadas por questões de autenticidade na sua leitura da
Bíblia mais do que na sua leitura da história inglesa. Faça-as ouvir a história do
Jardim do Éden, por exemplo, conforme esteja lá. Podemos ainda deixá-las saber
a história do homem que foi pescar e encontrou uma pérola grande. Isso porque
a coisa que interessa em ambas as histórias são as verdades essenciais que elas
incorporam e não os meros acidentes de tempo e espaço. É concebível que a
“pérola de grande preço” fosse um assunto de conversa corrente naquele tempo.
Um assim chamado “fato” aproveitado por Nosso Senhor para fazer dele o
veículo para a verdade essencial. Se acreditarmos nisso, talvez as mentes das
crianças sejam mais aptas do que as nossas próprias para se apropriarem e
lidarem com a verdade. Pouco a pouco elas perceberão e descartarão, se
necessário, as circunstâncias acidentais com que a verdade está vestida. Mas
sejamos muito prudentes com a nossa própria ação. Lembremo-nos de que nem
nós nem as crianças podemos suportar a luz branca da verdade nua. Se, por
exemplo, temos êxito em destruir a roupagem que cobre a história da primeira
queda – a árvore e o seu fruto, a serpente tentadora, a mulher complacente –, não
temos em mãos nenhu-ma outra roupagem para as verdades fundamentais da
responsabilidade, tentação, pecado. E, uma vez descobertas, sem vestimenta que
possamos usar, as próprias verdades com certeza escaparão do nosso alcance.
Ao ensinar narrativas bíblicas às crianças, não precisamos nos esforçar
para discriminar entre verdade essencial e acidental – a verdade que interpreta as
nossas próprias vidas e a que diz respeito somente ao tempo, lugar e
circunstâncias adequadas à narrativa. As crianças mesmas discernirão e se
manterão firmes no essencial, enquanto o meramente aci-dental escapa da sua
memória assim como da nossa. Portanto, faça que as mentes das jovens crianças
sejam bem armazenadas com as belas narra-tivas do Antigo Testamento e dos
evangelhos. Porém, a fim de que essas histórias possam lhes ser sempre frescas e
deliciosas, tem de ser tomado cuidado para que o ensino da Bíblia não aborreça
as suas mentes. As crianças podem ficar mais aborrecidas do que nós mesmos. E
muitas revol-tas foram acarretadas pela ênfase indevida com a Bíblia, o tempo
todo, mesmo na idade pré-escolar. No entanto nós não estamos considerando a
vida religiosa das crianças, mas a sua educação por aulas. E as suas aulas
bíblicas devem ajudá-las a perceber nos primeiros dias que o conhecimento de
Deus é o principal conhecimento, logo as suas aulas bíblicas são as suas
principais aulas.

Método das aulas da Bíblia
O método dessas aulas é muito simples. Leia em voz alta para as
crianças alguns versos cobrindo, se possível, um episódio. Leia reverente-mente,
cuidadosamente e com justa expressão. Então peça que as crianças narrem o que
escutaram tão próximo quanto possível das palavras da Bíblia. É curioso como
prontamente elas pegam o ritmo do inglês bíblico, majestoso e simples. Então
converse com elas sobre a narrativa à luz da pesquisa e da crítica. Faça que o
ensinamento moral e espiritual as atinja sem muita aplicação pessoal. Não
conheço melhor auxílio para o ensino a crianças novas do que a Bible for the
Young[163], de Canon Paterson Smyth. O Sr. Smyth traz tanto a crítica quanto a
pesquisa moderna para apresen-tar, de maneira que as crianças ensinadas a partir
dos seus manuaizinhos não se assustem quando lhes disserem que o mundo não
foi feito em seis dias. E, ao mesmo tempo, elas estarão bem certas de que o
mundo foi feito por Deus. O ensinamento moral e espiritual nesses manuais está
sobre diretrizes gerais e convincentes. É um bom plano ler ocasionalmente em
voz alta a lição do Sr. Smyth sobre o assunto após a passagem bíblica ter sido
narrada. As crianças estão mais prontas para se apropriar das lições que não
estejam diretamente niveladas nelas mesmas, enquanto a profes-sora faz o
ensino por conta própria pelo interesse com que lê, pelas imagens e pelas outras
ilustrações que ela mostra e pelos seus comentários de conversa.

Ilustrações de imagem
As imagens no Novo Testamento Ilustrado são, ao mesmo tempo,
reverentes e reais, uma combinação incomum, e as crianças gostam delas
enormemente. Seria bom para elas ter somente o pedaço do evangelho que estão
lendo, mas talvez deva ser protegido (e honrado) por uma capa bordada. Uma
Bíblia esfarrapada não é uma visão sadia para as crianças. Os Santos Evangelhos
com Ilustrações desde os Antigos Mestres publica-dos pela S.P.C.K. é admirável.
O estudo dessas imagens como são repro-duzidas aqui deve ser uma parte
valiosa da educação de uma criança. Não é uma coisa leve perceber como o
Nascimento e a visita dos Homens Sábios preencheram a imaginação dos antigos
Mestres, e com que reverência e deleite excessivos eles se estenderam sobre
cada detalhe da história sagrada. Essa espécie de impressão não deve ser tida a
partir de qualquer tratamento atualizado ou ilustrações atualizadas. E a criança
que tem isso nos primeiros dias terá um substratum[164] de sentimento reverente
àquilo em que sua fé deve repousar. Mas é bom deixar as imagens contarem a
sua própria história. As crianças devem estudar um assunto silenciosa-mente por
alguns minutos. E então, sendo a imagem removida, dizer o que viram nela. Será
descoberto que elas não perderam nenhum pequeno detalhe reverente ou
sugestivo que o artista pensou bem para incluir.
As várias publicações da R.T.S.[165] emitidas na série de Bypaths of Bible
Knowledge[166] serão tidas como muito úteis pelo professor como pesquisa
moderna de ilustração. Particularmente, Fresh Light from the Ancient
Monuments[167], do professor Sayce, e The Dwellers on the Nile[168] , de Budge.

Recitações da Bíblia
O aprendizado de cor de passagens bíblicas deve começar enquanto as
crianças são bem novas: seis ou sete anos. É uma coisa deliciosa ter passagens
lindas, confortantes e inspiradoras guardadas na memória. E não podemos dizer
quando e como essa semente pode brotar, crescer e dar fruto. Mas o aprendizado
da parábola do filho pródigo, por exemplo, não deve ser posto sobre as crianças
como um peso. A parábola inteira deve ser lida para elas de um modo a trazer a
beleza e ternura dela. E então, dia a dia, a professora recita uma passagem curta,
talvez dois ou três versos, repetindo-os umas três ou quatro vezes até que as
crianças pensem que os sabem. Então, mas não antes, faça-as recitar a passagem.
No dia seguinte, as crianças recitarão o que elas já aprenderam e assim por
diante, até serem capazes de dizer a parábola inteira.


15. ARITMÉTICA

O valor educacional da Aritmética
De todos os seus primeiros estudos, talvez nenhum seja mais im-
portante para a criança como um meio de educação do que o da aritmética. É de
importância relativamente pequena que ela faça cálculos, mas o uso daquelas
funções que o “cálculo” chama à cena é uma grande parte da educação, tanto que
os advogados da matemática e da língua como instru-mentos da educação, até
recentemente, dividiam o campo bem por igual entre si.
O valor prático da aritmética para pessoas em toda classe da vida passa
sem observação. Mas o uso do estudo na vida prática é o menor dos seus usos. O
valor principal da aritmética, como aquele da matemática superior, está no
treinamento que ela proporciona às capacidades de raciocínio e nos hábitos de
insight, prontidão, precisão, veracidade intelec-tual que ela engendra. Não há
uma disciplina na qual o bom ensino realize mais, como não há nenhuma na qual
o ensino desleixado tenha mais resul-tados perniciosos. A multiplicação não
produz a “resposta certa”, então o menino tenta a divisão. Isso falha de novo,
mas a subtração pode tirá-lo do pântano. Não há nenhum “tem que ser” para ele
que ele não veja que um processo, e somente um processo, possa dar o resultado
exigido. Agora, uma criança que não saiba qual regra aplicar a um problema
simples dentro da sua compreensão foi mal ensinada desde o início, embora ela
possa produzir ardis de cálculos bem certos na multiplicação ou divisão longa.

Problemas na compreensão da criança
Como deve ser assegurado esse insight, esse exercício das capaci-dades
de raciocínio? Chame a criança para pequenos problemas dentro da sua
compreensão desde o início, em vez de cálculos estabelecidos. A jovem
governanta se delicia ao estabelecer um nobre “cálculo de divisão longo” –
953.783.465 / 873 – que preencherá a lousa da criança e a manterá ocupa-da por
uma boa meia hora. E quando tiver acabado, e a criança estiver acabada também,
feito o trabalho inútil, o cálculo não estará certo afinal: as duas últimas figuras
no quociente estão erradas e o resto é falso. Mas ela não pode fazer isso de novo
– não tem de ser desestimulada por dizer que está errado. Assim, “quase certo” é
o veredito, um julgamento inad-missível em aritmética. Em vez dessa tarefa
laboriosa, que não dá um es-copo para o esforço mental, e no qual ela finalmente
vai ao mar a partir do puro desejo de atenção, diga-lhe:
“O Sr. Jones enviou seiscentas e sete, e o Sr. Stevens, oitocentas e
dezenove maçãs para serem divididas entre os vinte e sete meninos na escola na
segunda-feira. Quantas maçãs cada um deles recebeu?”
Aqui ela tem de fazer a si mesma certas perguntas: “Quantas ma-çãs
juntas? Como descobrirei? Então eu tenho que dividir as maçãs em vinte e sete
pilhas para descobrir a quantidade de cada menino.” Quer di-zer, a criança
percebe quais regras ela tem de aplicar para conseguir a informação exigida. Ela
está interessada. O trabalho continua rapidamen-te. O cálculo é feito sem tempo
e provavelmente está certo, porque a aten-ção da criança está concentrada no seu
trabalho. O cuidado tem de ser tomado para dar à criança esses problemas
conforme ela possa trabalhar, mas que sejam difíceis o bastante para lhe causar
algum pequeno esforço mental.
Demonstrar
O próximo ponto é demonstrar tudo demonstrável. A criança pode
aprender a tabela de multiplicação e fazer um cálculo de subtração sem qualquer
insight na análise racional de qualquer um dos dois. Ela pode ainda se tornar um
bom aritmético, aplicando regras apropriadamente, sem ver a razão delas. Porém
a aritmética se torna um treinamento matemático elementar somente à medida
que a razão de todo processo esteja clara para a criança. 2 + 2 = 4 é um fato
autoevidente, admitindo pouca demonstração, mas 4 x 7 = 28 pode ser provado.
Ela tem um saco de feijões. Coloca quatro linhas com sete feijões em cada.
Adiciona as linhas desta forma: 7 e 7 são 14, e 7 são 21, e 7 são 28. Quantos
setes em 28? 4. Logo, está certo dizer 4 x 7 = 28. E a criança vê que a
multiplicação é apenas uma maneira curta de fazer adição.
Um saco de feijões, de fichas ou de botões deve ser usado em todas as
aulas da aritmética inicial. E a criança deve ser capaz de trabalhar com eles
livremente e ainda adicionar, subtrair, multiplicar e dividir mental-mente, sem a
ajuda de botões ou feijões, antes que seja posta a “fazer cálculos” na lousa.
Ela pode arrumar uma tabela de adição com os seus feijões desta forma:

0 0 0 = 3
feijões
0 0 0 0 = 4
feijões
0 0 0 0 0 = 5
feijões

e se exercitar com esta até que possa dizer, primeiro sem contar, e depois sem
olhar para os feijões, que 2 + 7 = 9 etc.
Assim com 3, 4, 5 – cada um dos dígitos. Conforme ela aprende cada linha
da sua tabela de adição, exercita-se com objetos imaginários: “4 maçãs e 9
maçãs”, “4 nozes e 6 nozes” etc. E finalmente com números abstratos: 6 + 5, 6 +
8.
Uma tabela de subtração é realizada simultaneamente à tabela de adição.
Conforme ela realiza cada linha das adições, passa pela mesma base, apenas
tirando um feijão, ou dois feijões, em vez de adicionar, até que seja capaz de
responder bem prontamente: 2 de 7? 2 de 5? Após realizar cada linha da adição
ou subtração, pode pôr na sua lousa com os sinais apropriados, isto é, se ela
aprendeu a fazer figuras. Será descoberto que se requer um esforço mental muito
maior por parte da criança captar a ideia de subtração do que a de adição, e a
professora tem de se contentar com ir devagar: um dedo de quatro dedos, uma
noz de três nozes e assim por diante, até que aquela saiba o que está prestes a
fazer.
Quando a criança pode adicionar e subtrair números bem livre-mente até
vinte, as tabelas de multiplicação e divisão podem ser realiza-das com feijões,
tanto como 6 x 12. Isto é, “duas vezes seis são doze” será verificado mediante
duas linhas de feijões, seis feijões numa linha.
Quando a criança puder dizer prontamente, sem mesmo um olhar para os
seus feijões, 2 x 8 = 16, 2 x 7 = 14 etc., ela pegará 4, 6, 8, 10, 12 feijões e os
dividirá em grupos de dois. Então, quantos dois em 10, em 12, em 20? E assim
por diante, com cada linha da tabela de multiplicação realizada.

Problemas
Agora ela está pronta para problemas mais ambiciosos. Assim, “Um
menino tinha duas vezes dez maçãs. Quantas pilhas de quatro ele poderia fazer?”
Ela poderá trabalhar com números diversificados, como 7 + 5 – 3. Se tiver de
usar feijões para conseguir a sua resposta, deixe-a. Mas estimule-a a trabalhar
com feijões imaginários, como um passo em direção a trabalhar com números
abstratos. O ensino cuidadosamente graduado e o esforço mental diário por parte
da criança nessa etapa inicial pode ser o meio de desenvolver uma capacidade
matemática real e certamente promoverá os hábitos da concentração e esforço da
mente.

Notação
Quando a criança pode trabalhar bem livremente com números
pequenos, uma dificuldade séria tem de ser encarada: o seu completo domínio do
qual dependerá a sua apreciação da aritmética como uma ciência. Em outras
palavras, do qual dependerá o valor educacional de todos os cálculos que possa
fazer doravante. Ela tem de entender o nosso sistema de notação. Aqui, como
antes, é melhor começar com o concreto: faça a criança ter a ideia de dez
unidades num dez, depois de ela ter dominado a ideia mais facilmente
demonstrável de cem centavos num real[169].
Faça-a ter uma pilha de centavos, digamos cento e dez. Aponte a
inconveniência de carregar esse dinheiro pesado a lojas. Um dinheiro mais leve é
usado: o real. Quantos centavos valem um real? Quantos reais, então, ela pode
ter para os seus cento e dez centavos? Ela o divide em pilhas de cinquenta e
descobre que tem duas pilhas e dez centavos sobrando. Isto é, cento e dez
centavos são (ou valem) um real e dez centavos. Eu compro cento e quarenta
gramas de bolachas a um centavo por grama. Elas custam cento e quarenta
centavos, mas o lojista me dá uma conta de 1 real e 40 centavos. Mostre à
criança como separar: os centavos, que valem menos, à direita, e os reais, que
valem mais, à esquerda[170].
Quando a criança for capaz de trabalhar livremente com reais e centavos e
de entender que 2 na coluna de figuras à direita é centavo e 2 na coluna à
esquerda é real, apresente-lhe a noção de dezenas e unidades, contentando-se
com trabalhar muito gradativamente. Conte-lhe sobre povos não civilizados que
podem contar somente até cinco – que dizem “cinco-cinco feras na floresta”,
“cinco-cinco peixes no rio”, quando querem expressar um número imenso. Nós
podemos contar tanto: o dia todo por anos sem chegar ao fim dos números que
podemos nomear, mas afinal temos poucos números com que contar e bem
poucas figuras para ex-pressá-los. Temos somente nove figuras e um zero.
Podemos pegar a primeira figura e o zero para expressar um outro número, dez.
Mas depois disso temos que começar de novo até que obtenhamos duas dezenas.
Então, de novo, até que alcancemos três dezenas e assim por diante. Nós
chamamos duas dezenas de “vinte”, três dezenas de “trinta”, que vêm do latim “-
ginta”[171]. Mas se eu vir a figura 4, como saberei se significa quatro dezenas ou
quatro unidades? De um modo muito simples. As dezenas têm um lugar próprio.
Se você vir a figura 6 no lugar da dezena, você sabe que significa sessenta. As
dezenas sempre são postas atrás das unidades. Quando você vir duas figuras
ficando lado a lado, assim “55”, a figura da esquerda quer dizer tantas dezenas,
ou seja, o segundo 5 significa a quantidade de dezenas tanto quanto a quantidade
do primeiro.
Faça que a criança trabalhe com dezenas e unidades somente até que tenha
dominado a ideia do valor de dez vezes da segunda figura à esquerda e iria rir
pela tolice de escrever “7” na segunda coluna das figuras, sabendo que desse
modo ele vira setenta. Então ela estará pronta para a mesma espécie de
repetições com centenas. E assimilará a nova ideia prontamente se o princípio
lhe foi claro: que cada passagem à esquer-da significa um aumento de dez vezes
no valor de um número. Enquanto isso, não lhe “dê” cálculos. Nunca a faça
trabalhar com figuras cujas nota-ções estejam além do seu alcance. E quando ela
chegar a “carregar” um cálculo de adição ou multiplicação, não a deixe dizer que
carrega “dois” ou “três”, mas “duas dezenas” ou “três centenas”, conforme seja o
caso.

Pesando e medindo
Se a criança não conseguir a base embaixo dos seus pés nessa fase, ela
sempre trabalhará a aritmética conforme a regra do dedão. Sob o mesmo
princípio, faça-a aprender “pesos e medidas” medindo e pesando. Faça-a ter
escalas e pesos, areia ou arroz, papel e barbante, e pesar, e erguer, em parcelas
feitas perfeitamente, gramas, quilogramas[172] etc. Ain-da que elas não sejam
aritméticas, as parcelas são educativas e propor-cionam um exercício
considerável de julgamento bem como de nitidez, de habilidade e de rapidez. De
maneira semelhante, faça-a trabalhar com me-dida de centímetro e metro[173] e
desenhar as suas tabelas para si mesma. Faça-a não somente medir e pesar tudo
em torno de si que aceite tal trata-mento, mas faça-a usar o seu julgamento sobre
questões de medida e peso. Quantos metros tem a toalha de mesa? Quantos
centímetros de compri-mento e largura tem um mapa ou uma pintura? Quanto
ela supõe que um livro pese para que vá pelo correio? O tipo de prontidão a ser
ganho assim é valioso nos negócios da vida e só por essa razão deve ser
cultivado na criança. Enquanto está empenhado em medir e pesar quantidades
concre-tas, o estudioso está preparado para ter a sua primeira ideia de uma
“fração”, meio metro, quinze centímetros etc.

A aritmética como um meio de formação
A aritmética é valiosa como um meio de formar as crianças nos hábitos
da precisão estrita; contudo, a engenhosidade que faz essa ciência exata tender a
nutrir hábitos mentais desleixados, uma desconsideração da verdade e da
honestidade comum, vale admiração! O copiar, o agilizar, o contar, o ajudar nas
dificuldades, o trabalhar com um olho para a resposta que ela conhece, que são
permitidos na aula de aritmética, sob uma professora menos qualificada, são o
suficiente para viciar uma crian-ça. E tão ruim quanto esses é o hábito de
permitir que um cálculo esteja quase certo, duas figuras erradas e assim por
diante e deixar a criança trabalhar nisso novamente. Pronuncie um cálculo errado
ou certo – não pode ser algo entre os dois. Aquilo que é errado tem de
permanecer errado. A criança não tem de ser deixada com a noção de que o
errado pode ser remendado no certo. O futuro está diante dela: ela pode fazer o
próximo cálculo certo. A professora sábia tomará isso como a sua função para
ver que criança faz e começa com uma nova esperança. Mas o cálculo errado
tem de ser apenas deixado de lado. Por conseguinte, o seu progresso deve ser
cuidadosamente graduado. Mas não há disciplina na qual a professora tenha uma
consciência mais deliciosa de extrair do dia a dia uma nova capacidade na
criança. Não lhe ofereça uma muleta: é na sua própria capacidade que ela tem de
ir. Dê-lhe cálculos curtos, em palavras em vez de figuras, e estimule-a no
entusiasmo que produz atenção concentrada e trabalho rápido. Faça que a sua
aula de aritmética lhe seja um exercício diário no pensamento claro e na
execução rápida, cuidadosa, e o seu cresci-mento mental será tão óbvio quanto
mudas germinando na primavera.

O ABC da Aritmética
Em vez de entrar mais a fundo no assunto de ensinar aritmética
elementar, gostaria de referir o leitor a The ABC of Arithmetic[174], dos Srs.
Sonnhenschein & Nesbit. Os autores descobriram o seu método sobre a seguinte
passagem da Lógica de Mill[175]:
“As verdades fundamentais da ciência do Número, todas se encontram
sobre a evidência do sentido. Elas são provadas mostrando aos nossos olhos e
aos nossos dedos que qualquer número dado de objetos, dez bolas por exemplo,
pode, por separação e rearranjo, exibir ao nosso sentido todos os conjuntos
diferentes de números cujo cálculo seja igual a dez. Todos os métodos
melhorados de ensinar aritmética a crianças procedem de um conhecimento
desse fato. Todos os que desejam transportar a mente da criança consigo ao
estudar aritmética, todos os que desejam ensinar números e não meras cifras,
agora a ensinam através da evidência dos sentidos da maneira que descrevemos.”
Eu acho que aqui podemos traçar a fonte solidária de fraqueza num
excelente manual de modo superante. É bem verdade que as verdades
fundamentais da ciência do número, todas se encontram sobre a evidência do
sentido, porém, tendo usado olhos e dedos sobre dez ou vinte bolas, sobre dez
nozes, ou folhas, ou ovelhas, ou outras coisas, a criança formou a associação de
um número dado com objetos e também é capaz de conceber a associação de
vários outros números com objetos. De fato, ela começa a pensar em números e
não em objetos, isto é, começa a matemá-tica. Portanto, eu tendo a pensar que
um sistema elaborado de faixas estreitas de madeira num barril, cubos etc., em
vez de dezenas, centenas, milhares, enganam por embaraçar a mente da criança
com um ensino excessivo e por fazer a ilustração ocupar um lugar mais
proeminente do que a coisa ilustrada.
Dominós, feijões, figuras gráficas desenhadas na lousa e afins são, por
outro lado, auxílios para a criança quando lhe é necessário conceber um grande
número com o material de uma coisa pequena. Mas ver um símbolo dos grandes
números e trabalhar com ele são coisas bem diferen-tes.
Com a insignificante exceção acima, que não interfere absoluta-mente no
uso dos livros, nada pode ser mais delicioso do que a análise cuidadosa dos
números e da bela gradação do trabalho: “somente uma dificuldade por vez
sendo apresentada à mente.” Os exemplos e os proble-minhas só poderiam ter
sido inventados pelos escritores em simpatia com as crianças. Eu aconselho o
leitor que está interessado no ensino da aritmética a voltar-se ao trabalho do Sr.
Sonnenschein sobre The Teaching of Arithmetic in Elementary Schools[176] num
dos volumes publicados pela Secretaria de Educação.

Preparação para a matemática
Nos “quarenta” e “cinquenta” sustentava-se correntemente que a visão
contínua dos sinais externos e visíveis (formas e figuras geométricas) gerassem a
graça interna e espiritual do gênio matemático, ou, de qualquer modo, de uma
inclinação à matemática. Mas os pedagogos daqueles dias esqueceram – quando
deram às crianças caixas de “forma” de cubos presos, hexágonos, pentágonos e
outras coisas, em todo espaço de sala de aula disponível – a imensa capacidade
de ficar aborrecido, que é comum a todos nós e é muito mais fortemente
desenvolvida nas crianças do que nas pessoas adultas. Os objetos que nos
aborrecem, ou as pessoas que nos aborrecem, parecem ocupar um lugar brando
na mente, e o pensamento se afasta deles com aversão doentia. Dickens nos
mostrou o patos disso na sala de aula dos pequenos Gradgrinds, que foi
generosa-mente suprido com objetos de esboço intransigente. Ruskin expõe a
falácia mais genialmente. Sem dúvida as formas geométricas abundam: os
esque-letos cuja beleza vívida, em contorno e gesto, na colina e planta, é a
cobertura. E o esqueleto é lindo e maravilhoso para a mente que já entrou nos
portais da geometria. Mas não se deve apresentar o esqueleto às crianças, mas
sim as formas vívidas que o cobrem. Além disso, não é um método inverso
familiarizar o olho da criança com padrões feitos pelas suas bússolas, costurados
sobre a sua carta, na esperança de que a forma gerará a ideia? Para o novato,
provavelmente é a regra de que a ideia tem de gerar a forma, e qualquer sugestão
de uma ideia a partir de uma forma vem somente para os iniciados. Eu não penso
que qualquer preparação direta para a matemática seja desejável. A criança, que
pôde pensar e não foi obrigada a estudar na última hora, saudará o novo estudo
com prazer quando o tempo devido chegar a ela. A razão pela qual as
matemáticas são um grande estudo é porque ali existe na mente normal uma
afinidade e capacidade para esse estudo, e uma elaboração grande demais, seja
de ensino, seja de preparação, tem, eu penso, uma tendência para tirar o controle
dessa maneira de interesse intelectual.


16. FILOSOFIA NATURAL

Uma base de fatos
Sobre o ensino da Filosofia Natural, apenas lembrarei o leitor do que foi
dito num capítulo anterior: que não há parte da educação de uma criança mais
importante do que aquela na qual ela deve pôr, pela sua própria observação, uma
vasta base de fatos para o conhecimento científico no futuro. Ela tem de viver
horas diariamente ao ar aberto e, na medida do possível, no campo; tem de olhar
e tocar e escutar; tem de ser rápida para anotar, conscientemente, toda
peculiaridade de hábito ou estrutura na fera, na ave ou no inseto, a maneira de
crescimento e frutificação de toda planta. Ela tem de se acostumar a perguntar
por quê: por que o vento sopra? Por que o rio flui? Por que uma folha é viscosa?
E não se apresse para lhe responder às suas perguntas. Faça-a pensar as suas
dificuldades tanto quanto a sua pequena experiência alcance. Acima de tudo,
quando você for ao resgate, que não seja na fórmula “curta e grossa” de alguns
pequenos livros-texto miseráveis. Faça-a ter todo o insight disponível e você
descobrirá que, acerca de muitas questões científicas, a criança pode ser levada
imediatamente ao nível do pensamento moderno. Não a emba-race com
nomenclatura científica demais. Se ela descobrir por si mesma (ajudada, talvez,
por uma questão condutora ou duas), comparando uma ostra e o seu gato, que
alguns animais têm coluna vertebral e alguns não, é menos importante que ela
aprenda os termos “vertebrado” e “inverte-brado” do que classificar os animais
que ela encontre de acordo com essa diferença.

Olhos e Sem olhos
O método desse tipo de instrução é mostrado em Evenings at Home[177],
em que “Olhos e Sem Olhos[178]” vão caminhar. Sem Olhos chega em casa
aborrecido. Ele não viu nada, não se interessou por nada. En-quanto que Olhos
está todo ávido para discutir centenas de coisas que o interessaram. Conforme já
tentei apontar, esse tipo de instrução para si mesmo é simplesmente a natureza de
uma criança: a função dos pais é lhe proporcionar oportunidades abundantes e
variadas e direcionar as suas observações, de sorte que, conhecendo pouco dos
princípios da classificação científica, ela está, inconscientemente, modelando-se
com os materiais para essa classificação. É desnecessário repetir o que já foi dito
sobre esse assunto, mas, de fato, o futuro do homem ou da mulher depende
muito largamente do estoque de conhecimento real reunido e dos hábitos de
observação inteligente adquiridos pela criança. Diz o Sr. Herbert Spencer: “Você
acha que a rocha redonda marcada com arranhões paralelos inspira tanta poesia
numa mente ignorante quanto na mente do geólogo, que sabe que sobre essa
rocha uma geleira deslizou há um milhão de anos? A verdade é que aqueles que
nunca entraram nas buscas científicas estão cegos ao máximo sobre a poesia pela
qual estão cercados. Quem quer que seja que na juventude não tenha colhido
plantas e insetos não sabe metade do prestígio que vielas e balsas podem
assumir.”

Princípios
Nesse sentido, gostaria de recomendar The Sciences[179], do Sr. Holden.
O Estados Unidos vem à tona com um livro escolar depois do meu próprio
coração. “The Sciences” é um título ameaçador, mas, desde a era dos Scientific
Dialogues[180], de Joyce, não encontrei nada nas mesmas linhas que tornasse tão
ajustada uma abordagem à mente sensível e inteligente de uma criança. Isso é o
que podemos chamar de um livro “em primeira mão”. Com certeza o
conhecimento foi todo adquirido, e depois assimilado, e o Sr. Holden escreve
livremente a partir do seu próprio conhecimento, tanto do seu assunto quanto dos
seus leitores. O livro foi lançado na forma de conversações entre crianças –
simples conversações sem enchimento. Cerca de trezentos tópicos são tratados:
dunas de areia, bloco de gelo, vulcão, dragagem, furacão, ecos, prisma, sino de
mergulho, Via Láctea e, devo dizer, tudo mais? Mas a habilidade incrível do
autor é mostrada no fato de que não há nada desconexo e nada apressado no
trata-mento de qualquer tópico, e cada um cai natural e facilmente sob a frente
de algum princípio que ele elucida. Muitos experimentos simples são in-cluídos.
O autor insiste em que sejam realizados pelas próprias crianças. Eu me arrisco a
citar de um prefácio singularmente sábio um vade-mécum para professores:
“O objetivo do presente volume é apresentar capítulos para serem lidos na
escola ou em casa os quais materialmente expandirão a perspec-tiva das crianças
americanas no domínio da ciência e das aplicações da ciência às artes e à vida
diária. Em nenhum sentido é um livro-texto, embora os princípios fundamentais
subjacentes às ciências tratadas aqui sejam postos. O seu objetivo principal é
ajudar a criança a entender o mundo material ao redor dela.

Ser compreendido pelas crianças
Todos os fenômenos naturais são ordenados. São governados pela lei.
Não são mágicos. Eles são compreendidos por alguém. Por que não pela própria
criança? Não é possível explicar todo detalhe de uma locomo-tiva a um pupilo
jovem, mas é perfeitamente praticável explicar os princí-pios dela para que essa
máquina, como outras, torne-se um mero caso especial de certas leis gerais bem
entendidas. O plano geral do livro é despertar a imaginação, transferir
conhecimento útil, abrir as portas para a sabedoria. A sua meta especial é
estimular a observação e provocar um interesse vivo e duradouro no mundo que
se encontra ao nosso redor.
As ciências da astronomia, física, química, meteorologia e fisiogra-fia são
tratadas tão completa e profundamente quanto as condições permi-tem. E as
aulas que ensinam são reforçadas por exemplos tomados de coisas familiares e
importantes. Por exemplo, na astronomia a ênfase é posta sobre fenômenos que a
própria criança pode observar e ela é instruída a como lidar com isso. O nascer e
o pôr das estrelas, as fases da lua, os usos do telescópio são explicados em
palavras simples. O mistério desses e outros assuntos não é mágico, como a
criança supõe inicialmente. Aqui a sua atenção é direcionada a mistérios mais
profundos. Meros fenômenos são tratados como casos especiais de leis muito
gerais. O mesmo processo é seguido na exposição de outras ciências.
“Fenômenos familiares, como os do vapor, das sombras, da luz refletida,
dos instrumentos musicais, dos ecos etc., são referidos às suas causas
fundamentais. Quando quer que sejam desejáveis, simples experi-mentos são
descritos e completamente ilustrados e todos estes podem mui-to bem ser
repetidos na sala de aula... O volume é o resultado de uma crença sincera de que
muito pode ser feito para ajudar jovens crianças a compreender o mundo
material onde vivem e de um desejo para ter parte num trabalho tão digno de se
fazer.”
Junto a isso, não posso deixar de citar um artigo (Parents’ Re-view[181],
abril de 1904) do Rev. H. H. Moore lidando com um esquecido pioneiro de uma
educação racional e o seu experimento. Esse pioneiro foi o Rev. Richard Dawes,
uma vez reitor da paróquia de King’s Somborne, Hampshire, que, em 1841,
trabalhou com o problema da educação racional numa vila agrícola, onde ele
encontrou a população incomumente ignorante e desvalorizada. A história toda é
de grande interesse, mas a nossa preocupação é com a questão da Filosofia
Natural, a parte mais importante do ensino dado nessa escola.

Conforme ensinado numa escola da vila
O Sr. Dawes explicou desta forma o seu objetivo: “Eu visei a ensinar o
que fosse proveitoso e interessante a pessoas na posição que as crianças
provavelmente fossem ocupar na vida. Visei a que fossem ensina-das o que pode
ser chamado de filosofia das coisas comuns da vida do dia a dia. Mostrou-se a
elas o quanto há de interessante e que lhes é vantajoso conhecer, junto a objetos
naturais com os quais elas têm familiaridade. Explicaram-lhes, e elas se
familiarizaram, os princípios de uma variedade de fenômenos naturais, bem
como os princípios e a construção de vários instrumentos de um tipo útil. Uma
viagem prática foi dada a tudo para que os usos e frutos do conhecimento que
elas estavam adquirindo nunca fossem perdidos de vista.” Uma lista de algumas
disciplinas inclusas nesse tipo de ensino será o melhor comentário no esquema
do Sr. Dawes:
“Algumas propriedades do ar, explicando como a sua pressão lhes permite
bombear água, para diverti-las com esguichos e armas de brinque-do, sugando
água através de um canudo; explicando também os princípios e a construção de
um barômetro, a bomba comum, o sino de mergulho, um par de foles. Esse ar se
expande pelo calor, colocando-se uma bexiga meio soprada perto do fogo,
quando as rugas desaparecem. Por que a fumaça da chaminé às vezes sobe
facilmente no ar, às vezes não; por que há uma corrente de ar em cima da
chaminé, embaixo da porta e em direção ao fogo. O ar como um veículo de som
e, ora, o clarão de uma arma de fogo distante é visto antes que o tiro seja ouvido;
como calcular a distância de uma tempestade acompanhada de trovoada e raios;
a diferença nas veloci-dades segundo as quais diferentes materiais conduzem o
som. A água e as suas propriedades, os seus estados sólido, fluido e vaporoso;
por que tubos de água são queimados pelo frio intenso; por que o gelo se forma e
flutua na superfície de lagos e não no fundo; por que a tampa de chaleira pula
quando a água está fervendo no fogo; os usos para os quais o poder de vapor é
aplicado; a evolução gradual do motor a vapor, mostrada por modelos e
diagramas; como as suas roupas são secas e por que sentem frio sentando em
roupas úmidas; por que uma cama úmida é tão perigosa; por que um corpo flutua
na água, e outro afunda; as diferentes densidades do mar e água fresca; por que,
ao ir à escola numa manhã fria, às vezes veem uma quantidade de água no vidro
e por que no lado de dentro e não no de fora; por que, num dia gelado, o seu
hálito é visível como vapor; as substâncias que a água sustenta na solução, e
como o seu beber água é afetado pelo tipo de solo pelo qual passou. O orvalho, o
seu valor e as condições necessárias para a sua formação; colocando porções
iguais de lã seca no cascalho, vidro e grama e pesando-as na manhã seguinte. O
calor e as suas propriedades; como é que o ferreiro pode ajustar aros de ferro tão
firmemente nas rodas de carroças e carrinhos de mão; que precauções têm de ser
tomadas ao colocar trilhos de ferro de ferrovias e ao construir pontes de ferro
etc.; por que, na mesma temperatura, alguns sentem mais frio ao nosso toque do
que outros; por que um vidro às vezes quebra quando a água quente é posta nele,
e se um vidro grosso ou fino seria mais sujeito a rachar; por que a água pode ser
fervida numa chaleira de papel ou numa casca de ovo sem ser queimada. Os
metais, as suas fontes, propriedades e usos; modo de os separar do minério. A
luz e as suas pro-priedades, ilustrada por prismas etc.; adaptação do olho; causas
da miopia e hipermetropia. Os princípios mecânicos das ferramentas mais comu-
mente usadas, a pá, o arado, o machado, a alavanca etc.”
Pode surpreender a alguns que leem cuidadosamente a lista acima que
esses assuntos devam ter sido ensinados às crianças de Ensino Fundamental I de
escola rural. Mas é um fato inegável que foram ensina-dos na escola de King’s
Somborne, e de maneira tão bem-sucedida que as crianças ficaram interessadas e
se beneficiaram do ensino. Em resposta à objeção de que esses assuntos estão
acima da compreensão dos jovens, o Sr. Dawes disse: “A marca distintiva das
leis da Natureza são a sua extrema simplicidade. Sem dúvida ela pode exigir um
intelecto de uma ordem maior para fazer a descoberta dessas leis. Entretanto,
uma vez evoluídos, eles estão dentro da capacidade de uma criança. Em suma, os
princípios da filosofia natural são os princípios do senso comum, e, se ensinados
de uma maneira simples e de senso comum, serão rapidamente entendidos e
avidamente observados pelas crianças. E será descoberto que com alunos mesmo
de dez a doze anos de idade muito pode ser feito para formar hábitos de
observação e investigação.” Eu penso que esse fato sugere algumas aulas
práticas valiosas para aqueles que têm a responsa-bilidade de decidir que
assuntos incluir num sistema educacional para crianças.
Ao ler esse experimento notável, sentimos que imediatamente temos que
defender um homem, todo informado como o tardio Dean Dawes, para ensinar
os nossos próprios Jack e Elsie. Mas isso é algo de que ter ciência: o que essas
jovens pessoas devem saber. E o Sr. Holden fez um bom tanto para nós. Alguns
capítulos em The Sciences podem estar além das crianças abaixo de nove anos,
mas elas poderão dominar um bom tanto. Uma coisa deve ser levada em conta:
nada deve ser feito sem o seu devido experimento. A propósito, o nosso antigo
amigo, os Scientific Dia-logues, de Joyce, se ainda deve ser considerado,
descrevem um vasto número de experimentos fáceis e interessantes que as
crianças podem realizar por si mesmas.


17. GEOGRAFIA

Valor educacional
Na minha opinião, a geografia é uma disciplina de alto valor
educacional, apesar de não o ser porque proporcione os meios da formação
científica. A geografia não apresenta os seus problemas – e esses dos mais
interessantes – e não proporciona materiais para classificação, porém é somente
a geografia física que cai dentro da definição de uma ciência e mesmo essa é
mais um compêndio dos resultados de diversas ciências do que uma ciência
mesma. Mas o valor peculiar da geografia reside na sua adequação para
alimentar a mente com ideias e para modelar a imagi-nação com imagens. Neste
lugar está o valor educacional da geografia.

Conforme comumente ensinado
Agora, como a disciplina é comumente ensinada? A criança estuda os
nomes das capitais da Europa, ou dos rios da Inglaterra, ou dos cumes das
montanhas da Escócia, em algum livro-texto miserável, com compri-mento em
quilômetros, altura em metros[182] e população, encontrando os nomes no mapa
ou não, conforme a sua professora esteja mais ou menos disposta ao seu
trabalho. Pobre coleguinha! A aula lhe é um trabalho duro, mas, à proporção que
vai à educação – isto é, o desenvolvimento da capaci-dade, o modelamento da
mente –, a criança estaria melhor empenhada assistindo ao progresso de uma
mosca através da janela de vidro. Mas, você dirá, a geografia tem um uso além
desse estritamente educativo. Todos querem o tipo de informação que a aula de
geografia proporciona. Isso é verdade, e deve-se ter isso em mente na sala de
aula. A aula de geografia da criança deve modelar o tipo de informação que
pessoas adul-tas tomam cuidado de possuir. Agora, pense realmente quão
irracionais somos nessa questão. Nada nos convencerá a ler um livro de viagem
a menos que seja interessante, gráfico, com um sabor de aventura pessoal.
Mesmo quando estamos andando por aí com o Murray em mãos, pulamos os
fatos e figuras secos e lemos os pedaços pictóricos sugestivos. Essas são as
espécies de coisas que gostamos de saber e lembramos com facilidade. Mas nada
desse aborrecimento para a pobre criança, por favor. Não a faça ter pequenas
frases pictóricas sobre as quais ela possa sonhar. Fatos, nomes e figuras: esses
lhe são o pabulum[183]!

A geografia deve ser interessante
Mas, você diz, essa espécie de conhecimento, apesar de poder ser um
labor para a criança adquirir, é útil na vida adulta. Nada disso, e por esta razão:
nunca foi realmente recebido pelo cérebro, nunca foi além da nebulae[184]
flutuante da mera memória verbal da qual já tive ocasião de falar. A maioria de
nós já passou por um certo número de trabalhos penosos à guisa das aulas de
“geografia”, mas de quanto nos lembramos? Apenas as partes agradáveis que
ouvimos de amigos viajados, a respeito do Reno, ou Paris, ou Veneza, ou
pedaços de The Voyages of Captain Cook[185], ou outras histórias agradáveis de
viagem e aventura. Começamos a ver as diretrizes que temos que seguir ao
ensinar geografia. Para propósitos educativos, a criança deve estudar tal
geografia e de tal manei-ra, de sorte que a sua mente, em consequência, esteja
suprida de ideias, a sua imaginação de imagens. Para propósitos práticos, tem de
estudar tal geografia somente porque, considerada a natureza da sua mente, ela
será capaz de lembrar. Em outras palavras, tem de estudar o que lhe interessa. A
operação educativa e prática num sulco e a aula de geografia se tornam a
ocupação mais encantadora do dia da criança.

Como começar
Mas como começar? Em primeiro lugar, a criança tem as suas noções
rudimentares de geografia conforme ela tem as suas primeiras noções de ciência
natural, naquelas longas horas fora de casa cuja impor-tância já vimos. Uma
poça alimentada por um simples corte nos campos explicará a natureza de um
lago, transportará a criança aos adoráveis lagos dos Alpes, ao grande Lago
Africano de Livingstone, onde ela se deliciava vendo os seus filhos remando.
Junto a isso, chegará uma grande quantidade de conversa agradável sobre
lugares, “geografia pictórica”, até que a criança saiba por nome e natureza os
grandes rios e montanhas, desertos e planícies, as cidades e países do mundo. Ao
mesmo tempo, ela tem as suas primeiras noções de um mapa a partir de um
esboço rude, poucas linhas simples e pontos, feitos com lápis e papel, ou melhor
ainda, com um bastão na areia ou pedregulho. “Essa linha torta é o Reno, mas
você tem de imaginar as jangadas, a ilha com a Torre dos Ratos, a Ilha das Irmãs
e o restante. Aqui estão as colinas, com os seus castelos arruinados. Agora deste
lado, agora daquele lado. Esse ponto é Colônia” etc. De maneira especial, faça
essas conversas cobrirem todo o cenário da casa e interesses com os quais você
esteja familiarizado, de sorte que, pouco a pouco, quando olhar para o mapa da
Inglaterra, ela encontre um número de nomes familiares que lhe sugiram
paisagens, lugares onde “a mãe esteve”: as ilhotas arborizadas, floridas, do
Tâmisa; os leves declives de Sussex, deliciosos para correr e rolar, com tapete
macio de relva e campânulas acenando; os pântanos de York ou Devon; e sempre
lhe dê um rascunho de mapa da rota que você tomou numa dada jornada.

O que depois?
Dê-lhe em seguida conhecimento íntimo, com os detalhes mais
completos, de qualquer país ou região do mundo, qualquer condado ou distrito
do seu próprio país. Não é necessário que nesse estágio ela estude o que se
chama a “geografia” dos países da Europa, os continentes do mundo – meras
sequências de nomes na maior parte do tempo. Ela pode estudar isso, mas é
toleravelmente certo que ela não se lembrará deles. Mas faça-a estar em casa em
qualquer região simples; faça-a ver, com os olhos da mente, as pessoas no seu
trabalho e nas suas brincadeiras, as flores e os frutos nas suas estações, as feras,
cada uma no seu habitat; e faça-a ver tudo simpaticamente, isto é, faça-a seguir
as aventuras de um viajante; e ela conhece mais, fica mais bem modelada com
ideias do que se tivesse aprendido todos os nomes em todos os mapas. O “modo”
desse tipo de ensino é muito simples e óbvio: leia para ela ou leia por ela, ou
seja, leia pedaço por pedaço e diga conforme você lê: Tropical World de
Hartwig[186], Polar World[187] do mesmo autor, Missionary Travels, de
Livingstone[188], Unbeaten Tracks in Japan da Srª. Bishop[189] – na verdade,
qualquer livro de viagem interessante, bem escrito. Pode ser necessário deixar de
lado uma boa parte, mas toda anedota ilustrativa, todo pedaço de descrição é
muito para a educação da criança. Aqui, como em todo lugar, a questão não é
quantas coisas ela sabe, mas quanto sabe de cada coisa.




Mapas
Os mapas têm de ser cuidadosamente usados nesse tipo de trabalho: um
mapa esboçado seguindo o progresso do viajante para ser finalmente comparado
a um mapa completo da região; e a professora exigirá uma descrição de tal e tal
cidade, de tal e tal distrito, marcados no mapa, de modo a testar e confirmar o
conhecimento exato da criança. Dessa maneira, esta consegue noções
inteligentes de geografia física. No curso das suas leituras, cai na descrição de
um vulcão, de uma geleira, de um cânion, de um furacão. Ouve tudo em volta,
pergunta e aprende o como e o porquê de tais fenômenos no momento em que o
seu interesse é estimulado. Em outras palavras, a criança aprende conforme os
seus mais velhos escolhem aprender por si mesmos, apesar de raramente permiti-
rem-na andar em caminhos tão agradáveis.

Que conhecimento geral uma criança de nove anos deve ter
Supondo que, entre o sexto e o nono ano de idade da criança, meia
dúzia de livros padrão de viagem bem escolhidos tenham sido lidos com ela
dessa forma, ela terá ganhado ideias distintas dos contornos, produções e modos
dos povos, de toda grande região do mundo; terá feito um armazém de
conhecimento confiável, valioso, que durará por toda a sua vida; e, além disso,
terá feito algo para adquirir um gosto por livros e hábito de leitura. Livros como
Lady Brassey’s Voyage in the “Sunbeam”[190] devem ser evitados, por cobrir
muitas áreas e provavelmente por causar uma confusão de ideias.

Conhecimento particular
Mas estamos considerando as aulas como “Instrumentos de Educação”.
E o tipo de conhecimento de mundo que indiquei será trans-mitido por leituras
na “Hora das Crianças” e em outros momentos em vez de aulas. Não conheço
nada tão bom quanto o velho World at Home[191], de Mary e Elizabeth Kirby
(para aulas) para crianças entre seis e sete anos. À medida que estas ouvem,
querem saber, admiram, imaginam e podem ainda “interpretar” centenas de
situações. As primeiras ideias de geo-grafia, as aulas sobre lugar, que devem
fazer a criança observadora da geografia local, das características da sua própria
vizinhança, das suas alturas e buracos, das terras de plano horizontal, dos seus
córregos e lagoas, devem ser ganhas, conforme vimos, fora de casa e devem
prepará-la para uma certa quantidade de generalizações, ou seja, ela tem de ser
capaz de descobrir definições de rio, ilha, lago, assim por diante e deve fazer
isso para si mesma numa bandeja de areia ou desenhá-las na lousa.

Definições
Mas as definições devem vir de maneira que sejam gravadas as suas
experiências. Antes que lhe ensinem o que é um rio, ela tem de ter assistido a um
rio e observado que ele flui; e assim por diante com o restante.
As crianças facilmente simulam conhecimento. E nesse ponto a professora
terá que ser cuidadosa com que nada que a criança receba seja mero palavreado,
mas que toda generalização seja trabalhada um tanto desta forma: a criança
observa um fato, como, por exemplo, uma larga extensão de chão liso. A
professora amplifica. A criança lê no seu livro sobre as pampas, os países lisos
do nordeste da Europa, a Holanda da nossa própria costa oriental e,
gradualmente, está preparada a receber a ideia de uma planície e mostrá-la na
sua bandeja de areia.

Ideias fundamentais
Quando ela tiver sete anos, ou antes, ver-se-á na necessidade de mais
conhecimento. Ela leu sobre países quentes e países frios, observou as estações,
o nascer e o pôr do sol, disse a si mesma:

“Brilha, brilha, estrelinha,
Quero ver você brilhar![192]”

sabe algo sobre oceano e mar, viu a maré entrar e sair, viu muitos mapas
esboçados, fez alguns para si e sem dúvida notou as linhas cruzadas sobre um
mapa “adequado”. Quer dizer, a sua mente está preparada para o co-nhecimento
nas várias direções. Há várias coisas relativas à geografia que ela realmente quer
saber.
O formato e movimentos da Terra são ideias fundamentais, no en-tanto
difíceis de compreender. Porém a dificuldade é de um tipo que au-menta com os
anos.
O princípio em cada caso é suficientemente simples. E uma criança não se
preocupa, como os seus mais velhos, com a magnitude enorme da escala sobre a
qual operações no espaço são realizadas. É provável que a vívida imaginação de
uma criança a ponha num nível com o matemático ao lidar com o sistema
planetário, com o comportamento e o caráter da Terra, com as causas das
estações e muito mais.

Significado de um mapa
Depois, ainda, a geografia deve ser estudada principalmente a partir de
mapas. Leituras e conversas pictóricas lhe introduzem o assunto, mas logo,
conforme as suas aulas de geografia se tornem definidas, estas devem ser
estudadas, em primeiro lugar, a partir do mapa. Esse é um princípio importante a
se ter em mente. A criança que não tem ideias a partir da consideração do mapa,
digamos da Itália ou da Rússia, não tem conhecimento de geografia, mesmo que
seja capaz de produzir muitos fatos acerca de lugares. Por conseguinte, ela deve
começar esse estudo apren-dendo o significado de um mapa e como usá-lo. Tem
de aprender a fazer um desenho da sua sala de aula etc., de acordo com a escala,
continuar o desenho de um campo, considerar como fazer o desenho da sua
cidade, e ser levada gradualmente da ideia de um desenho àquela ideia de um
mapa, sempre começando com a noção de um explorador que encontra a terra e
a mede. E, por meio do sol e das estrelas, é capaz de anotar onde está na
superfície da terra: leste ou oeste, norte ou sul.
Agora, ela chegará ao significado das linhas de latitude e longitude.
Aprenderá como o mar e a terra são mostrados num mapa, como os rios e
montanhas são representados. E tendo aprendido os seus pontos de direção e o
uso da sua bússola e sabendo que os mapas são sempre feitos como se o
observador estivesse olhando para o norte, ela poderá dizer um bom tanto sobre
a situação, direção e afins, em dias muito antigos. As ideias fundamentais da
geografia e o significado de um mapa são assuntos bem apropriados para formar
uma introdução atrativa para o estudo. Alguns deles devem despertar o interesse
delicioso que liga à mente da criança aquilo que é maravilhoso, incompreensível,
enquanto as aulas de mapa conduzem a esforços mecânicos igualmente
deleitáveis. É apenas quando apresentados à criança pela primeira vez na forma
de conhecimento velho e conclusões já não usadas que os fatos ensinados nessas
aulas lhe parecem secos e repulsivos. Um esforço deve ser feito para tratar o
assunto com o tipo de interesse e frescor simpáticos que atraem as crianças a um
novo estudo.


18. HISTÓRIA

Um armazém de ideias
Muito do que foi dito sobre o ensino da geografia se aplica igualmente
ao da história. Aqui também está um assunto que deve ser para a criança um
armazém inesgotável de ideias, deve enriquecer os aposentos da sua Bela Casa
com mil tableaux[193], patéticas e heroicas, e deve formar nela,
imperceptivelmente, princípios pelos quais a partir de então ela julgará o
comportamento das nações e governará a sua própria conduta como alguém de
uma nação. Isso é o que o estudo da história deve fazer pela criança, mas o que
ela obterá da miserável pequena crônica de inimizades, batalhas e morte que lhe
é apresentada ao modo de “um reino”: ainda mais repelentes, porque arrepiam
com datas? Quanto às datas, nunca vêm certas. Ela pode conseguir as dezenas e
as unidades, porém as centenas se perderão. E como ela colocará os eventos
certos no reino certo, quando, para ela, um rei difere de outro somente em
número, um período de outro somente em data? Mas ela tropeça nisso. Lê no seu
livrinho de história agradável, tagarela, todos os reinos de todos os reis, desde
William, o Conquistador, até William IV e de volta aos dias som-brios do
governo britânico. E com que resultado? Este: possivelmente que nenhuma
forma de deformar o julgamento da criança, de preenchê-la com noções cruéis,
preconceitos limitados, seja mais bem-sucedida do que car-regá-la por algum
curso de história inglesa. E ainda mais se esse livrinho-texto for de tom moral ou
religioso e se encarregar de apontar a moral assim como gravar o fato. Sem
dúvida, o ensinamento moral cai dentro da província da história, mas o volume
pequeno que a criança usa não propor-ciona oportunidade para a discussão justa
e razoável sobre a qual decisões morais devem ser baseadas, nem a criança é
grande o bastante para ser posta na atitude judicial que tal decisão supõe.

“Pinceladas” perniciosas
O erro fatal está na noção de que ela tem de aprender “pinceladas” ou
uma edição de bebê de toda a história da Inglaterra, ou de Roma, assim como ela
tem de cobrir a geografia do mundo todo. Ao contrário, faça-a protelar
agradavelmente pela história de um homem simples, um período curto, até que
considere que os pensamentos daquele homem estejam em casa nos moldes
daquele período. Ainda que esteja lendo e pensando sobre o tempo de vida de
um homem simples, ela está realmente ficando intimamente familiarizada com a
história de uma nação inteira, por uma era toda. Faça-a gastar um ano de
intimidade feliz com Alfredo, “o contador de verdades”[194], com o Conquistador,
com Ricardo e Saladino ou com Henrique V – Henry V, de Shakespeare – e o seu
exército vitorioso. Faça-a conhecer o grande povo e o povo comum, os modos da
corte e os da multidão. Faça-a saber o que outras nações estavam fazendo
enquanto nós em casa estávamos fazendo desta ou daquela maneira. Se ela vier a
pensar que as pessoas de uma outra época eram mais verdadeiras, de maior
coração, de mente mais simples do que os contemporâneos, que o povo de
alguma outra terra foi, alguma vez, de qualquer forma, melhor do que nós, ora,
melhor para ela.

Então a maioria dos livros de história é escrita para crianças
Para a questão desse ensino inteligente de história, em primeiro lugar
evite quase todos os livros de história escritos expressamente para crianças e, em
seguida, todos os compêndios, esquemas, resumos, quais-quer que sejam. Pois
os resumos, considerando que parte do estudo de história esteja adequada para se
realizar na educação da criança, não há uma palavra a ser dita em favor dele. E
quanto ao que se chamam de livros infantis, as crianças de pais instruídos podem
entender a história escrita com habilidade literária e não são atraídas pela tolice
de livrinhos de história de leitura fácil. Dado um salto criterioso, uma boa
quantidade das mães livres que parafraseiam estão bastante prontas, e as crianças
podem ser levadas através dos primeiros poucos volumes de uma história da
Inglaterra bem escrita, ilustrada, popular, digamos até os Tudors[195]. Durante
essa leitura, uma boa quantidade de questionamentos a elas a partir deles será
necessária, tanto para prender a sua atenção quanto para fixar os fatos. Isso é o
mínimo a ser feito. Mas melhor do que isso seriam informações mais completas,
mais detalhes gráficos acerca de duas ou três épocas anteriores.

A história antiga de uma nação melhor ajustada para crianças
A história antiga de uma nação é bem melhor ajustada do que os seus
registros posteriores para o estudo das crianças, porque a história se move sobre
umas poucas linhas amplas, simples, enquanto o estadista, à proporção que
existe, não é mais do que os esforços de uma mente enge-nhosa para dar conta
de circunstâncias. O Sr. Freeman forneceu uma interessante história inglesa
antiga para crianças – mas no geral não é melhor levá-las direto à fonte, onde for
possível? Nesses primeiros anos, enquanto não há exames à frente e as crianças
podem ir sem pressa, faça-as ter o espírito da história nelas pela leitura, pelo
menos, de uma antiga crônica escrita por um homem que viu, soube algo,
escreveu a respeito disso, e não o obteve em segunda mão. Esses livros antigos
são mais fáceis e mais agradáveis de ler do que a maioria dos trabalhos
modernos sobre história, porque os escritores sabem pouco sobre a “dignidade
da história”. Murmuram agradavelmente como um riacho da floresta, contam-lhe
“tudo sobre isso”, mexem seu coração com a história de um grande evento,
diver-tem-no com espetáculos públicos e apresentações, tornam-no familiar com
as grandes pessoas e amigável com as mais humildes. São exatamente a coisa
certa para as crianças, cujas almas ansiosas querem chegar a pes-soas viventes
atrás das palavras do livro de história, sem se preocupar mesmo com progresso,
ou estatutos, ou sobre qualquer coisa, salvo pes-soas, por cuja ação a história é,
para a mente da criança, nada mais que uma fase conveniente. Uma criança que
dessa maneira for levada através de um velho cronista simples terá uma base
melhor para toda a formação histórica do que se ela soubesse todas as datas,
nomes e fatos que sempre foram amontoados para os exames.

Algumas crônicas antigas
Primeira na ordem do tempo, e cheia da maior leitura cativante, é a
História Eclesiástica da Inglaterra, do Venerável Beda[196], que, escrevendo sobre
si mesmo no século VII, diz: “Sempre me foi doce aprender, ensinar e escrever.”
Diz o professor Morley: “Ele nos deixou uma história dos primeiros anos da
Inglaterra, sucinta, no entanto bastante morna com vida; como um negócio, no
entanto como uma criança no seu tom; prática e espiritual de uma vez,
simplesmente justa, e a obra de um estudioso verdadeiro, aspirando amor a Deus
e ao homem. Devemos a Beda sozinho o conhecimento do muito que é mais
interessante na nossa história inicial.” Guilherme de Malmesbury[197] (século XII)
diz sobre Beda: “Que quase todo o conhecimento de eventos passados estava
enterrado na mesma sepultura consigo.” E ele não é um mau juiz, pois, nas suas
Chroni-cles of the Kings of England[198], considera-se que ele mesmo levou à
perfei-ção a arte de fazer crônica. Ele é especialmente vívido e gráfico sobre
eventos contemporâneos – a história da horrível guerra civil de Estêvão e
Matilda. Enquanto isso, há Asser, que escreve a vida de Alfredo, que lhe é amigo
e trabalhador camarada. Diz: “Parece-me certo explicar um pouco mais
completamente o que ouvi do meu senhor Alfred.” Ele nos diz como: “Quando
eu cheguei à sua presença na vila real, chamada Leonaford, fui honrosamente
recebido por ele e permaneci consigo aquele tempo na sua corte
aproximadamente oito meses, durante os quais eu lia para ele quaisquer livros de
que ele gostasse e os que ele tivesse em mãos. Pois esse é o seu costume mais
usual, tanto de noite quanto de dia, entre as suas muitas outras ocupações da
mente e do corpo, seja para ele mesmo ler livros, seja para escutar enquanto
outros os leem.” Quando ele não estava presente para ver por si mesmo, como na
batalha de Ashdown[199], Asser se esforçou para conseguir o testemunho de
testemunhas oculares. “Mas Alfred, conforme nos foi dito por aqueles que
estavam presentes e não contariam uma inverdade, marchou prontamente com os
seus homens para lhes dar uma batalha, pois que o Rei Ethelred permaneceu um
longo tempo na sua tenda em oração.” Depois há as Crônicas das Cruzadas,
narrativas contemporâneas das cruzadas de Richard Coeur de Lion, de Richard
de Devizes, Geoffrey de Vinsany e da cruzada de São Luís, do Senhor John de
Joinville.
É desnecessário estender a lista. Tal crônica antiga num ano, ou os pedaços
ajustados dessa crônica, e a imaginação da criança fica inflamada, a sua mente,
repleta de ideias. Ela falou daqueles que eles mesmos viram e ouviram. E o
caminho de fato no qual os antigos monges contam as suas histórias é
exatamente o que as crianças preferem. Afinal de contas, você pode colocar
quaisquer contornos maçantes nas suas mãos e elas farão a história por si
mesmas.

Era dos mitos
Mas toda nação tem a sua era heroica antes que a história autêntica
inicie. Naqueles dias, esses foram gigantes na terra e a criança quer saber sobre
eles. Ela tem todo o direito de se deleitar nesses mitos clássicos, já que os
possuímos como uma nação. E é um pouco difícil sobrecarregá-la numa
companhia de selvagens pintados, dando-lhe a sua primeira introdução ao seu
povo. É tornar a sua visão do passado áspero e insignificante uma pintura
chinesa. Mas o que deve ser feito? Se alguma vez tivemos uma era homérica,
nós, sendo um povo prático, não perdemos todo o registro desta? Eis uma outra
dívida que temos com aqueles velhos cronistas monges: os ecos de algum
passado escuro, rico, desceu, de qualquer maneira, ao século XX. Caíram sobre
o ouvido de um sacerdote galês, um Godofredo de Monmouth[200]. E enquanto
Guilherme de Malmes-bury estava escrevendo a sua admirável History of the
Kings of En-gland[201], o que fazia Godofredo senão compor as tradições do povo
numa History of the British Kings[202] ordenada, alcançando de volta todo o
caminho ao Rei Brut, o neto de Eneias? Como ele soube de reis de que nenhum
outro historiador ouviu é uma questão sobre a qual ele é um pouco astuto. Ele
diz que a obteve toda “[d]aquele livro na língua britânica que Walter,
arquidiácono de Oxford, apresentou da Bretanha.” Seja como for, aqui lemos
sobre Gorboduc, Rei Lear, Merlin, Uther Pendragon e, o melhor de todos, Rei
Artur, o escritor fazendo “o dedinho do seu Artur mais forte do que as costas de
Alexandre, o Grande.” De fato, aqui está o tesouro pelo qual as crianças devem
ser livres em dez anos antes que leiam Idylls of the King[203]. No entanto, algum
cuidado deve ser exercitado ao ler Godofredo de Monmouth. As suas histórias
de maravilha são deliciosas, mas quando ele abandona o maravilhoso e os
romances livre-mente sobre fatos históricos e personagens, torna-se um guia
atordoador. Muitas dessas “crônicas”, escritas em latim pelos monges, devem ser
tidas em inglês legível. O único cuidado a ser observado é que a mãe deve passar
o seu olho sobre as páginas antes que as leia em voz alta. (A Biblioteca do
Antiquário de Bohn inclui Beda, Guilherme de Malmesbury, as Six Old English
Chronicles[204], do Dr. Giles – Asser e Godofredo de Monmouth sendo dois deles
– Crônicas das Cruzadas etc.
Ainda, Froissart[205] mesmo, o mais delicioso dos cronistas, “doma” em
torno da corte da Rainha Filipa, quando ele escolheu estar na Inglaterra: de quem
mais a criança deve obter a história das guerras francesas? E tanto assim para
quanto haja tempo. Segundo o princípio de que, quando quer que seja praticável,
a criança deve ter as suas primeiras noções de um dado período, não a partir do
historiador moderno, do comentador e do revisor, mas a partir das fontes
originais da história, os escritos dos contemporâneos. Contudo, a mãe tem de
exercer discrimina-ção na sua escolha das “Crônicas” iniciais, visto que todas
não são igual-mente confiáveis.

As Vidas de Plutarco
Da mesma forma, leituras das Vidas de Plutarco proporcionarão o
melhor preparo para o estudo da história grega ou romana. Alexandre, o Grande,
é algo mais do que um nome para a criança que lê este tipo de coisa:
“Quando o cavalo Bucéfalo foi oferecido em venda a Felipe, pelo preço de
treze talentos (= £ 2518, 15s.), o rei, com o príncipe e muitos outros, foram ao
campo ver uma prova feita para ele. O cavalo parecia muito viciado e
ingovernável e estava assim por sofrer ao ser montado, de maneira que ele não
suportaria que lhe falassem, mas virava ferozmente sobre todos os criados.
Felipe ficou contrariado quando o trouxeram o cavalo tão selvagem e
ingovernável e lhes declarou para levá-lo. Mas Alexandre, que o observou bem,
disse:
“– Que cavalo eles estão perdendo por carência de habilidade e espírito
para manejá-lo!
“Inicialmente, Felipe não notou isso, mas sobre o príncipe repetindo
frequentemente a mesma expressão e mostrando grande inquie-tação, ele disse:
“– Jovem homem, você encontra falha nos seus mais velhos como se
você soubesse mais que eles ou poderia manejar o cavalo melhor.
“– E eu certamente poderia, respondeu o príncipe.
“– Se não puder andar a cavalo, que perda submeterá pelo seu tumulto?
“– Pagarei como preço o cavalo.
“Toda a companhia riu disso, porém o rei e o príncipe – concor-dando
sobre a perda, Alexandre correndo ao cavalo e segurando a rédea – viraram-no
ao sol, pois ele observou, parece, que a sombra que caía peran-te o cavalo e se
movia continuamente conforme ele se movia, perturbava-o enormemente.
Enquanto a sua selvageria e fúria duravam, ele se manti-nha falando-lhe
suavemente e afagando-o. Após isso, ele gentilmente dei-xou cair a sua capa,
saltou levemente sobre as suas costas e teve o seu assento muito seguro. Então,
sem puxar as rédeas muito duramente, ou usando chicote ou esporão, colocou-o
atrás. Tão logo percebeu que a sua inquietação diminuiu e que ele queria apenas
correr, pô-lo num pleno galope e o empurrou tanto com a voz quanto com o
esporão.
“Inicialmente, Felipe e toda a sua corte ficaram numa grande aflição por
ele. E um profundo silêncio ocorreu. Mas quando o príncipe o virou e o trouxe
de volta seguro, todos eles o receberam com exclamações altas, exceto o seu pai,
que chorou de alegria, e beijando-o disse:
“– Procura um outro reino, meu filho, que possa ser valioso para as tuas
habilidades, pois a Macedônia é pequena demais para ti.”
Aqui, novamente, na inimitável tradução do Norte, conseguimos o tipo
de apresentação gráfica vívida que faz a “história” tão real para a criança quanto
são as aventuras de Robinson Crusoe.
Resumindo, saber tanto quanto elas podem sobre um curto período é
bem melhor para as crianças do que saber os “esquemas” de toda a história. E,
em segundo lugar, as crianças são bem capazes de assumir ideias inteligentes em
linguagem inteligente e de modo nenhum devem ser excluídas do melhor que é
escrito no período em torno do qual elas estão.

Livros de História
Não é fácil mesmo escolher os livros de história certos para as crianças.
Conforme vimos, simples resumos de fatos têm de ser evitados. E devemos ser
igualmente cuidadosos para evitar generalizações.
Nos primeiros anos da vida, a função natural da mente é reunir o material
de conhecimento com uma vista àquele mesmo trabalho de generalização que é
próprio da mente adulta. Um trabalho que todos nós devemos carregar até certo
ponto para nós mesmos.
As nossas mentes são tão pobremente modeladas que aceitamos as
conclusões apresentadas a nós sem objeção, mas, de qualquer maneira, nós
podemos evitar dar às crianças opiniões curtas e grossas sobre o curso da história
enquanto elas ainda são jovens. O que elas querem são detalhes gráficos com
relação a eventos e pessoas sobre os quais a imaginação vai trabalhar. E opiniões
tendem a se formar a passos lentos conforme o co-nhecimento cresce.
Talvez mais do que outros, o Sr. York Powell atingiu o ensino certo para
jovens crianças que tenho em vista. No prefácio às suas Old Stories from British
History[206], ele diz: “O autor escolheu essas histórias porque considerou que
divertissem e agradassem aos seus leitores e lhes dá ao mesmo tempo algum
conhecimento das vidas e pensamentos dos seus antepassados. Para esse fim,
não escreveu somente sobre gente grande – reis, rainhas e generais –, mas
também sobre pessoas simples e crianças. Sim, aves e feras também.” E temos a
história do Rei Lear e Cú Chulainn[207], do Rei Canuto e poeta Otter, de Havelock
e Ubba e muito mais, todas histórias bravas e gloriosas. De fato, o Sr. York
Powell nos dá um perfeito tesouro nos seus dois pequenos volumes de Old
Stories and Sketches from British History[208], que são os melhores para o nosso
propósito, porque as crianças podem lê-los por si mesmas assim que forem
capazes de ler realmente. Essas histórias, escritas em inglês bom e simples, e
com um certo charme de estilo, se prestam-se admiravelmente à narração.
Na verdade, é mais interessante ouvir crianças de sete ou oito anos
atravessarem uma longa história sem perder um detalhe, colocando cada evento
na sua ordem certa. Essas narrações nunca são uma reprodução servil do
original. A individualidade de uma criança brinca com o que ela gosta, e a
história vem dos seus lábios, não precisamente como o autor a conta, mas com
um certo espírito e coloração que expressam o narrador. A propósito, é muito
importante que se permita que as crianças narrem da sua própria maneira e não
sejam detidas ou ajudadas com palavras e expressões do texto.
Uma narração deve ser original conforme venha da criança, isto é, a sua
própria mente devia ter agido sobre o assunto que recebeu.
Narrações que são meras façanhas da memória são bem sem valor.
Eu já falei sobre as espécies de crônicas antigas com as quais as crianças
devem ser alimentadas, porém aquelas frequentemente são muito di-fusas para
oferecer um bom assunto para a narração. E é bom ter bastantes historinhas
ajustadas para esse propósito.
Gostaria de mencionar dois outros volumes com os quais as crianças se
deleitam, que alimentam um sentimento patriótico e colocam uma ampla base
para o conhecimento histórico. Quero dizer Tales from St. Paul’s e Tales from
Westminster Abbey, da Srª. Frewen Lord[209]. É uma coisa linda e deliciosa
informar as crianças com esses contos até a abadia ou à catedral de São Paulo e
fazê-las identificar por si mesmas os lugares consagrados aos seus heróis. Elas
sabem tanto e estão tão cheias de vívido interesse que os seus mais velhos
assistem instruídos e inspirados. Sem dúvida, existem multidões de contos e
esquemas históricos para crianças, e alguns deles, como Prisoners of the Tower
da Srtª. Brooke-Hunt[210], são muito bons. Mas que a mãe tome cuidado: não há
nada que exija mais tato delicado e simpatia compreensível com as crianças do
que esse assunto aparentemente simples de escolher os seus livros didáticos e
especial-mente, talvez, os seus livros didáticos de história.
Muitas crianças de oito ou nove anos estarão bem preparadas para ler com
prazer A History of England[211], de H. O. Arnold Forster, que há muito tempo
ganhou o seu impulso no campo da literatura educacional. Nisso, como em
assuntos de política mais imediata, o Sr. Arnold Forster tem o dom de ver um
defeito e um remédio, uma omissão e os meios de supri-la. Ele viu que as
crianças inglesas cresciam sem qualquer conheci-mento das condições sob as
quais viviam e das leis que as governavam. Mas desde a aparição de The Citizen
Reader e The Laws of Every-day Life[212], mudamos tudo isso.
A History of England, ou, como as crianças a chamam, History, ignorando
o fato de que há qualquer outra história menos a da Inglaterra, até então foi
apresentada aos jovens como “esquemas de datas e fatos, ou como coleções de
histórias românticas, com pouca coerência e menos resultados nas sortes do
país.” O Sr. Arnold Forster diz no seu prefácio que ele “é relutante a introduzir o
seu livro com qualquer título repelente como ‘Um Resumo’ ou ‘Um Esquema da
História Inglesa’”.
Esses títulos parecem no seu rosto implicar que são excluídos o elemento
de interesse e o romance inseparáveis da vida e dos fazeres dos indivíduos e que
uma tabela cronológica amplificada foi feita para fazer o dever pela história. Mas
ler a história inglesa e falhar em perceber que está repleta de interesse, cintilante
com episódio e cheia de incidente dramático é perder todo o prazer e a maior
parte da instrução que o seu estudo, se buscado apropriadamente, pode dar.” O
autor preenche a sua palavra subentendida, e a sua obra é, arrisco-me a dizer, tão
“repleta de interesse, cintilante com episódio e cheia de incidente dramático”
quanto seja possível, considerando as limitações impostas sobre ela pelos fatos
que ele escreve para leitores não instruídos, e nos dá uma vista da História
Inglesa toda num volume agradável, abundante e sabiamente ilustrado, de umas
oitocentas páginas. Quão revelador e lúcido isso é, por exemplo, e como todos
nós desejamos que tivéssemos atravessado esse parágrafo nos nossos primeiros
estudos de arquitetura: “Na página 23, temos imagens de duas janelas. Uma
delas é o que é chamada de janela pontuda. Todos os arcos nela sobem a um
ponto. Ela foi construída muito tempo antes do período Tudor. A outra foi
construída no tempo da Rainha Elisabete. Nela, o eixo vertical da janela sobe
direto ao topo sem formar um arco. Esse estilo de construir uma janela é
chamado de Estilo Perpendicular, porque os eixos verticais da janela são
‘perpendiculares’. Algumas das construções mais famosas na Inglaterra
construída sobre os tempos do Tudors, no estilo perpendicular, são a King’s
College Chapel[213], Cambridge, e Hatfield House, a residência do Marquês de
Salisbury, em Hertfordshire.” O Sr. Arnold Forster fez nesse volume para as
crianças e os iletrados o que o professor Green fez na sua Shorter History of
England[214] para alunos um tanto mais avançados, despertando muitos para o
fato de que a história é um objeto de estudo extasiante. Essa é uma introdução
real à história real. Os retratos são uma característica especialmente valiosa da
obra.

Datas
A fim de dar definibilidade ao que logo pode se tornar um
conhecimento bem amplo de história, monte uma folha de papel cartucho e
divida-a em vinte colunas, deixando o primeiro século da era cristã ficar no
meio. E faça cada coluna restante representar um século a.C. ou d.C., conforme
seja o caso.
Então deixe a própria criança escrever, ou estampar, conforme possa, os
nomes das pessoas com que ela vier na ordem devida, no seu próprio século.
Não precisamos nos preocupar no momento com datas mais exatas, mas
essa simples tabela dos séculos sugerirá um panorama gráfico à mente da
criança, que verá eventos na sua ordem do tempo.


Ilustrações pelas crianças
Leituras de história proporcionam material admirável para narração. E
as crianças gostam de narrar o que leram ou ouviram. Elas também adoram fazer
ilustrações. Pediu-se às crianças que estavam lendo Júlio César[215] (e também as
Vidas de Plutarco) que fizessem uma imagem da sua cena favorita, e o resultados
mostraram o poder extraordinário de visualização que as pessoinhas possuem. É
claro que aquilo que visuali-zam, ou imaginam claramente, elas conhecem. É
uma posse de vida.
Os desenhos das crianças em questão são psicologicamente interes-santes
por mostrar o que vários pontos, e às vezes obscuros, apelam à mente de uma
criança. E também que as crianças têm o mesmo prazer intelectual como pessoas
de mente culta ao trabalhar novos palpites e sugestões. Os desenhos, seja dito,
deixam muito a desejar, mas têm isso em comum com a arte dos povos
primitivos: eles contam a história direta e vividamente. Uma menina de nove
anos e meio pinta Júlio César conquis-tando a Bretanha. Ele anda numa
carruagem montada em gadanhas, está vestido de azul, e porções do céu azul
aqui e ali dão a cor complementar. Na distância, um soldado planta o estandarte
suportando a águia romana, preta num chão rosa.
No primeiro plano, é um combate mão a mão entre romano e bretão, cada
um tendo uma espada de comprimento enorme. Outras figuras são diversamente
empregadas.
Uma outra nos dá Antônio[216] “fazendo o seu discurso após a morte de
César.” Essa menina, mais velha, dá-nos arquitetura. Você olha através de um
arco, que conduz a uma rua do lado, e, no primeiro plano, Antônio fica numa
plataforma, na cabeceira de uma linha de degraus de mármore. A atitude de
Antônio expressa indignação e desprezo. Embaixo, está vestindo a toga uma
multidão de romanos, cujas atitudes mostram várias sombras de consternação e
desalento. Atrás, está de uniforme o servo de Antônio, segurando o cavalo do
seu senhor. E na plataforma, na parte de trás de Antônio, encontra-se César, com
a púrpura real lançada sobre ele. O valor principal do desenho, como tal, é que
ele conta a história.
Uma outra menina desenha Calpúrnia[217] pedindo a César que não vá ao
Senado. César fica armado e perturbado, enquanto Calpúrnia segura a sua mão
estendida com as suas duas conforme ela se ajoelha diante dele, a sua face
erguida em súplica. A sua roupa noturna azul e solta e o seu longo cabelo
dourado dão cor à imagem. Essa artista tem catorze anos, e o desenho é o melhor
feito.
Um outro artista apresenta Bruto[218] e Pórcia[219] no pomar com uma
“parede austral” de tijolo vermelho, balanços e duas figuras dignificadas que
dificilmente contam a sua história.
Uma outra criança nos dá a cena no fórum: César sentado na púrpura real,
Bruto se ajoelhando diante dele e Casca[220] ficando atrás da sua cadeira com a
mão esticada segurando um punhal, dizendo “Falai, mãos, por mim.”, enquanto
César diz “Bruto não se ajoelha inutilmente?”
Ainda, temos Lúcio brincando com Bruto na tenda. Bruto, armado de
cabeça levantada, sentado num banquinho, está tentando em vão ler, enquanto
Lúcio, uma figura bonita, sentado diante dele, toca a harpa. As duas sentinelas,
também plenamente armadas, são esticadas sobre o chão em sono profundo.
Uma outra nos dá Cláudio vestido como uma mulher no festival de
mulheres: as senhoras com olhos notáveis e cada uma carregando uma tocha
queimando.
Uma outra, imagens, com grande espírito: César lendo a sua história para
gauleses conquistados, que ficam em filas na encosta escutando o grande homem
com paciência exemplar.
Nessas ilustrações originais (diversas delas de crianças mais velhas do que
as que temos em vista aqui), temos um exemplo das várias imagens que se
apresentam às mentes das crianças durante a leitura de uma grande obra. E um
olhar simples na mente de uma criança nos convence da importância de manter
aquela mente com carne forte. A ima-ginação não mexe com a sugestão do fraco.
Muita coisa diluída também é frequentemente posta nas mãos das crianças.


“Brincando” com a história
As crianças têm outras formas de expressar as concepções que as
preenchem quando elas estão devidamente alimentadas. Elas brincam com as
aulas de história, vestem-se, fazem tableaux, interpretam cenas. Ou elas têm um
palco e os seus bonecos atuam, enquanto elas pintam o cenário e falam os
discursos. Não há fim para os modos de expressão que as crianças encontram
quando há qualquer coisa nelas para expressar.
O erro que cometemos é supor que a imaginação seja alimentada pela
natureza ou que ela funcione na dieta insípida dos livros de histórias das
crianças.
Faça a criança ter a carne que ela exige nas suas leituras de história e na
literatura que naturalmente gira em torno dessa história, e a imaginação se
ativará sem qualquer ajuda nossa. A criança viverá em detalhes mil cenas das
quais ela somente consegue o mais simples palpite.


19. GRAMÁTICA

Gramática: um estudo difícil
Aqui falarei muito pouco sobre a gramática do latim e do inglês. Em
primeiro lugar, a gramática, sendo um estudo de palavras e não de coisas, de
maneira alguma é atrativa para a criança, nem a criança deve ser apressada nela.
A gramática inglesa, ainda, dependendo como depende da posição e conexão
lógica das palavras, é peculiarmente difícil para ela compreender. Nesse sentido,
a gramática latina é mais fácil. Uma mudan-ça na forma, no formato da palavra,
para denotar um caso, é o que uma criança pode ver com o seu olho corporal,
portanto é mais simples para ela do que ideias abstratas de caso nominativo e
objetivo conforme temos em inglês. Por conseguinte, se nesse estágio ela estudar
não mais que as decli-nações e um verbo ou dois, é bom que deva estudar esse
tanto, só para ajudá-la a ver o que seria a gramática inglesa quando se trata de
uma mu-dança no caso ou modo, contudo não mostra mudança na forma de uma
palavra.




Gramática latina
Sobre o ensino da gramática latina, acho que não posso fazer melhor do
que mencionar um livro para iniciantes que é realmente útil. Crianças de oito e
nove anos pegam esse First Latin Course (Scott e Jones[221]) muito
agradavelmente. No entanto, é uma questão aberta se é desejável começar latim
numa idade tão cedo.

Gramática inglesa: um estudo lógico
Como a gramática inglesa é um estudo lógico, lida com frases e
posições que as palavras ocupam nelas em vez de palavras e o que estas são no
seu próprio direito, é melhor que a criança comece com a frase e não com as
partes do discurso, isto é, que ela estude um pouco do que é chama-do análise de
frases antes que aprenda a analisar. Devem aprender a dividir frases simples na
coisa de que falamos e o que dizemos sobre isso – “O gato se senta no canto do
fogão.” – antes que ela se perca no nevoeiro de pessoa, modo e parte do
discurso.
“Então eu peguei o próximo livro. Era sobre gramática. Ele dizia coisas
extraordinárias sobre substantivos, verbos, partículas, pronomes, particípios,
casos objetivos e modos subjuntivos.
Perguntou o Rei:
– O que são todas essas coisas?
– Eu não sei, Sua Majestade.
E a Rainha não sabia, mas disse que seria muito apropriado para as
crianças estudarem.
– Isso as manteria quietas.”
É tão importante que as crianças não fiquem desconcertadas como ficaram
confusos esse Rei e Rainha, de sorte que eu acrescento algumas aulas de
gramática introdutórias, uma vez que um simples exemplo é frequentemente
mais útil do que muitos preceitos.





Duas aulas de gramática

Aula 1

Palavras postas juntas a fim de fazer sentido formam o que é chamado
de frase.
“Barley aveias cadeira realmente boa e cereja.” não é uma frase, porque
não faz sentido.
“Tom disse a sua lição.” é uma frase.
Ela é uma frase, porque nos diz algo sobre Tom.
Toda frase fala de algo ou alguém e nos diz algo sobre aquilo de que
fala.
Então, uma frase tem duas partes: (1) a coisa de que falamos; (2) o que
dizemos sobre isso.
Na nossa frase, nós falamos de “Tom”.
Dizemos sobre ele que “aprendeu a sua lição”.
A coisa de que falamos geralmente é chamada de sujeito, o que significa
exatamente aquilo sobre o que falamos.
Às vezes as pessoas dizem “O sujeito da conversa era assim e assado.”,
que é uma outra forma de dizer “A coisa sobre o que nós estávamos falando era
assim e assado.”
Para ser aprendido:
Palavras postas juntas a fim de fazer sentido formam uma frase. Uma
frase tem duas partes: aquela de que falamos e o que dizemos sobre isso. Aquilo
de que falamos é o sujeito.

Exercícios da Aula 1

1. Coloque a primeira parte em:
__________ tem um nome longo.
__________ está quebrado.
__________ não pode fazer os seus cálculos.
__________ brincou por uma hora;

Etc.


2. Coloque a segunda parte em:
Aquele pobre menino __________.
Meu irmão Tom __________.
O vaso para plantas quebrado __________.
Pão e geleia __________.
A cesta de ferramentas de Brown __________.

Etc.

3. Coloque seis diferentes sujeitos para cada meia frase em 1.

4. Faça seis frases diferentes com cada sujeito em 2.

5. Diga que parte da frase está faltando e complete-a:

Foi consertado
A faca de Tom
Aquele cachorrinho
Cortou o seu dedo
Comeu fruta demais
Meu livro novo
As gotas de neve no nosso jardim

Etc.
N.B.: Seja cuidadoso para chamar a primeira parte de cada frase de sujeito.
Desenhe uma linha embaixo do sujeito de cada frase em todos os
exercícios.

Aula 2

Podemos fazer uma frase com apenas duas palavras: o nome da coisa de
que falamos e o que dizemos sobre ela.

John escreve.
Aves cantam.
Mary costura.

Nós falamos sobre “John”. Sobre ele, dizemos que “escreve”. Nós
falamos sobre “aves”. Sobre elas, dizemos que “cantam”.
Essas palavras – “escreve”, “cantam”, “costura” –, todas vêm do mesmo
grupo de palavras e as palavras nesse grupo são as principais palavras de todas
por esta razão: nós não podemos fazer sentido, logo não podemos fazer uma
frase sem usar pelo menos uma delas.
Elas são chamadas de verbos, que significam palavras, porque são as
principais palavras de todas.
Um verbo sempre diz a alguém sobre duas coisas a respeito do sujeito.
Ele diz o que o sujeito é, como:

Eu estou com fome.
A cadeira está quebrada.
As aves estão felizes.

ou diz o que o sujeito faz, como:

Alice escreve.
O gato mia.
Ele telefona.

Para ser aprendido:
Nós não podemos fazer uma frase em um verbo. Verbo significa
palavra. Verbos são as palavras principais. Verbos mostram que o sujeito é algo:

Ele está adormecido.

ou faz algo:

Ele corre.






Exercícios sobre a Aula 2

1. Coloque um verbo “estar”:

Mary _____ adormecida.
Meninos _____ roucos.
Meninas _____ quietas.
Ele _____ em primeiro ontem.
Eu _____ pequeno[222].
Tom e George _____ rodando antes da janta.
Nós _____ ocupados amanhã.
Ele _____ punido.

Etc.

2. Faça três frases com cada um dos seguintes verbos: está, estão,
estava, estou, estávamos, estará[223].

3. Faça seis frases com os verbos “estar” em cada uma.

4. Coloque um verbo “fazer” em:

Tigres _____.
O menino com o pônei _____.
Meus primos _____.

Etc.

5. Faça vinte frases sobre:

Aquele menino com saiote escocês

com verbos mostrando o que ele faz.


6. Encontre os verbos e diga se são de “ser” ou de “fazer”.

O sol brilhante se levanta sobre a colina.
Nós fomos embora.
Você é meu primo
George vai à escola.
Ele pegou a sua lousa.
Nós somos sete.

7. Conte quantos verbos você usa na sua conversa nos próximos dez
minutos.

8. Escreva cada verbo que você puder encontrar nesses exercícios e
desenhe uma linha embaixo dele.


20. FRANCÊS

O francês deve ser adquirido como o inglês é: não como uma gramática,
mas como uma fala viva. Treinar o ouvido para distinguir e os lábios para
produzir os vocábulos franceses é uma parte valiosa da educação dos sentidos e
uma que dificilmente pode ser empreendida tão cedo. Ainda, todas as pessoas
instruídas devem ser capazes de falar francês. O Sr. Lyon Playfair, uma vez
falando numa conferência sobre mestres franceses, lamentou comovidamente a
nossa degeneração a esse respeito, e citou como exemplo a escola de gramática
de Perth para mos-trar que, numa escola escocesa no século XVI, exigia-se que
os meninos falassem latim durante as horas escolares e o francês em todos os
outros momentos. Mal há uma outra nação civilizada tão lenta para adquirir
línguas estrangeiras como nós ingleses do tempo atual. Porém, provavel-mente,
a falha se encontra mais na maneira como começamos o estudo do que em
qualquer incapacidade natural para línguas.
Com relação ao francês, por exemplo, as nossas dificuldades são duplas:
a carência de um vocabulário e um certo embaraço ao produzir sons não
familiares. É evidente que esses dois impedimentos devam ser removidos na
primeira infância. A criança nunca deve ver palavras fran-cesas impressas até
que tenha aprendido a dizê-las com tanta facilidade e prontidão como se fossem
em inglês. O desejo de dar combinações de letras impressas, os sons com que
elas lidariam nas palavras inglesas, é a causa real da nossa dificuldade nacional
ao pronunciar o francês. Ainda, o vocabulário da criança deve crescer
constantemente, digamos, na média de meia dúzia de palavras por dia. Pense em
mil e quinhentas palavras num ano! A criança que tem esse número de palavras e
sabe como aplicá-las pode falar francês. Claro, a sua professora tomará o
cuidado, ao dar pala-vras, de dar expressões idiomáticas também. E conforme
ela aprende no-vas palavras, estas são postas em frases e mantidas em uso no dia
a dia. Um caderno de anotações no qual ela insira as novas palavras e frases da
criança facilmente permitirá que a professora faça isso. A jovem criança não tem
vergonha boba de dizer palavras francesas. Ela as pronuncia sim-plesmente
como se fossem em inglês.
Mas é muito importante que ela adquira um sotaque puro desde o início.
Geralmente, não é recomendável que jovens crianças inglesas sejam postas nas
mãos de uma governanta ou cuidadora francesa. Mas não seria possível para
meia dúzia de famílias, digamos, contratar uma senhora francesa, que usaria
meia hora diariamente com cada família?

O método do Sr. Gouin
Um esforço sério está sendo feito para abordar o estudo das línguas
estrangeiras racional e cientificamente. Não hesito dizer que a obra do Sr. Gouin
(The Art of Teaching and Studying Languages[224]) é a tentativa mais importante
que tem sido feita para levar o estudo das línguas para dentro da esfera da
educação prática. Na verdade, a grande reforma nos nossos métodos de ensino
de línguas modernas deve a sua origem a essa notável obra. A ideia inicial, de
que temos que adquirir uma língua nova como uma criança adquire a sua língua-
mãe, é absolutamente certa, seja certa ou não a tentativa de seguir essa ideia
analisando a língua num certo número, digamos quinze, de “séries” exaustivas.
Ainda, é incontestável que o ouvido, e não o olho, seja o órgão físico para
apreender uma língua, assim como é verdade que é pela boca, e não pelo ouvido,
que nos apropriamos da comida. Se o livro do Sr. Gouin estabelecer somente
esses dois pontos, será uma contribuição valiosa para o pensamento educa-
cional. Igualmente importante é a sua terceira posição: de que o verbo é a chave
para a frase, e mais, é a ponte viva entre pensamento e ação. Ele também
sustenta que a criança pensa em frases, não em palavras; que as suas frases têm
uma sequência lógica; que essa sequência é uma por vez – por exemplo, a ordem
das operações no crescimento de uma planta ou a moagem de milho em um
moinho; que, conforme a criança percebe as operações, ela tem uma absoluta
necessidade de expressá-las; que o seu ouvido solicita, a sua memória aprecia, a
sua língua reproduz as palavras que dizem a coisa que ela pensa.
Sem dúvida o método do Sr. Gouin deve ser mais bem-sucedido do que
qualquer outro ao banhar o aluno (criança ou homem) no pensamento alemão ou
francês. Se você ficar o dia todo tentando exercitar uma “série” em francês,
digamos, você chega a pensar em francês, a sonhar em francês, a falar em
francês. Além do mais, a pessoa tem um senso delicioso de que finalmente o
caminho está claro para nós para conduzir todo o ensino na língua estudada.
Você tem as “Séries de Arte”, “Séries de Abelha”, “Rio”, “Séries de
Personagem”, “Séries de Poeta” e quaisquer séries que gostar. Você pensa a
coisa na ordem do tempo e da sequência natural. Você pega os verbos,
substantivos certos e esses epítetos porque são necessários, têm consequências
apropriadas e em poucas frases incríveis, frases muito cur-tas também,
conectadas por “e”, e você disse tudo o que é essencial ao assunto. A coisa toda é
uma surpresa constante, como o jogo das crianças que desenterra a coisa mais
extraordinária e remota que você possa pensar por meio de mais ou menos uma
dúzia de questões.

As “Séries”
Assim, a língua aprendida pelo método do Sr. Gouin é “uma educação
liberal em si mesma”. A pessoa aprende como são poucas e simples, no final das
contas, as concepções de que a mente humana é consciente e como são poucas e
simples as palavras necessárias para ex-pressá-las, pondo o simples palavreado
de lado.
Você realmente aprende a pensar na nova língua, porque não tem mais do
que impressões vagas sobre esses atos ou fatos na sua língua-mãe.
Você manda os seus pensamentos na nova língua, e, tendo feito assim, as
palavras que os expressam são uma posse inalienável.
Eis um exemplo de uma “Série” elementar, mostrando como “a criada
acende o fogo”:

A criada pega uma caixa de fósforos Pega
Ela abre a caixa de fósforos Abre
Ela tira um fósforo Tira
Ela fecha a caixa de fósforos Fecha
Ela raspa o fósforo na capa Raspa
O fósforo pega fogo Pega fogo
O fósforo solta fumaça Solta fumaça
O fósforo flameja Flameja
O fósforo queima Queima
E espalha um cheiro de queimar pela cozinha Espalha
A criada se curva ao canto do fogão Curva-se
Põe para fora a sua mão Põe para fora
Põe o fósforo embaixo das aparas Põe
Segura o fósforo embaixo das aparas Segura
As aparas pegam fogo Pegam fogo
A criada deixa ir o fósforo Deixa ir
Fica de pé novamente Fica de pé
Olha para o seu fogo queimando Olha
E põe de volta a caixa de fósforos no seu lugar Põe de volta

Mas qualquer tentativa de citar dá uma ideia incerta e insatis-fatória
dessa importante obra.

Como a criança aprende?
O que quer que possa ser dito dos métodos do Sr. Gouin, os passos
pelos quais ele chega a eles são indubitavelmente científicos. Ele aprende a
partir de uma criança:
“Infelizmente, até o presente, a criança foi um enigma banal com que
nunca tivemos preocupação o suficiente para decifrar ou examinar...”
A criancinha, que com dois anos não declara nada senão excla-mações sem
sentido, com três anos se encontra na posse de uma língua completa. Como ela
realiza isso? Esse milagre admite explicação ou não? É um problema sobre o
qual existe uma possibilidade de encontrar uma quantidade desconhecida?... O
órgão da língua – pergunta a criancinha – não é o olho: é o ouvido. O olho é feito
para cores, não para sons e pala-vras... Essa tensão, contínua e contrária à
natureza, do órgão da visão, a precipitação forçada do ato visual, produziu o que
estava inclinado a pro-duzir, uma doença da vista.”
Isso se refere aos trabalhos hercúleos do Sr. Gouin na tentativa de aprender
alemão. Ele conheceu o “Método” de todos, aprendeu o dicionário inteiro e no
fim descobriu que ele não sabia uma palavra de alemão “como é falado”.
Ele retornou à França, após uma ausência de dez meses, e descobriu que o
seu sobrinho pequeno – que era uma criança de dois anos e meio, ainda incapaz
de falar – fez no intervalo o que o seu tio tinha notavelmente falhado em fazer.
“Eu pensei:
– O quê! Essa criança e eu temos trabalhado pelo mesmo tempo, cada
um numa língua. Ele – brincando em volta da sua mãe, correndo atrás de flores,
borboletas e pássaros, sem desgaste, sem esforço aparente, sem mesmo estar
ciente desse trabalho – é capaz de dizer tudo o que pensa, expressar tudo o que
vê, entender tudo o que ouve; e quando ele começou o seu trabalho, a sua
inteligência ainda era uma futuridade, um vislumbre, uma esperança. E eu,
versado nas ciências, versado na filosofia, armado com uma vontade poderosa,
dotado de memória poderosa... não cheguei a nada, ou a praticamente nada!”
“A ciência linguística da faculdade me decepcionou, desorientou-me. O
método clássico, com a sua gramática, o seu dicionário e as suas traduções, é
uma ilusão.” “Para surpreender o segredo da Natureza, eu tenho que assistir a
essa criança.”
O Sr. Gouin assiste à criança. A obra em questão é o resultado das suas
observações.
O método de ensino pode ser variado, parcialmente porque aquele
recomendado pelo Sr. Gouin exige um perfeito comando da língua france-sa, e
os professores que são desconfiados encontram um método de conver-sação
fundado no livro e imagem mais fáceis de trabalhar e talvez também eficientes.
As pessoas pensam mais ou menos assim, porém, seja como for, é ao Sr. Gouin
que devemos a ideia fundamental.
É satisfatório encontrar princípios, que declaramos continuamen-te,
enunciados nesta obra muito considerável. Por exemplo: “Se alguém aprende
francês sem ser capaz de ler – como a criança aprende –, não haverá maior
dificuldade ao pronunciar em francês do que pronunciar palavras em inglês. ‘E
quanto à ortografia?’, você perguntará. A ortogra-fia? Você a aprenderia como a
jovem criança francesa aprende, assim como você mesmo aprendeu a ortografia
inglesa, dez vezes mais difícil do que a francesa. E isso sem deixar o estudo da
ortografia estragar a sua pronún-cia já adquirida. Além disso, a ortografia é uma
coisa que pode ser refor-mada – a pronúncia dificilmente mesmo. Nós temos de
escolher entre os dois males.”
O Sr. Gouin fala da possibilidade de uma criança pegar uma outra
língua – mesmo o chinês de uma cuidadora chinesa. E as suas palavras me
lembram de um exemplo extraordinário, da facilidade de uma criança ao pegar
línguas, que uma vez veio diante de mim. Tendo chance de falar em público
sobre três criancinhas, todas de três anos, pertencentes a diferen-tes famílias, em
que um progenitor era inglês e o outro alemão, eu disse que essas três
criancinhas do meu conhecimento poderiam cada uma dizer tudo o que tivessem
a dizer, expressar a gama toda das suas ideias, com igual facilidade e fluência
nas duas línguas. No encerramento do encontro, um cavalheiro presente veio e
endossou as minhas observações. Ele disse que tinha um filho cuja esposa era
uma senhora alemã e que agora era uma missionária em Badgá. Eles têm um
filho de três anos e o seu filho fala três línguas com fluência perfeita: inglês,
alemão e árabe! Sem dúvida a criança esquecerá duas das três, e isso não é
argumento para ensinar línguas estrangeiras para bebês, mas certamente prova de
que a aquisição de uma língua estrangeira não precisa apresentar dificuldades
insuperá-veis a qualquer um de nós.


21. ARTE PICTÓRICA

Estudo das pinturas
A formação das crianças em arte deve proceder sobre duas linhas. A
criança de seis anos deve começar tanto a expressar-se quanto a apreciar, e a sua
apreciação deve ser boa no avanço da sua capacidade de expressar o que ela vê
ou imagina. Logo, é uma coisa lamentável quando a apreciação das crianças é
exercida somente sobre litogravuras coloridas dos seus livros de pinturas ou do
“número de Natal”. Mas o leitor dirá: “Uma criança nova não consegue apreciar
arte. São somente a cor e o sentimento de uma pintura que a atingem. Uma
apresentação vividamen-te colorida do aniversário do Bobbie ou a Boneca
Quebrada da Barbara encontrarão o seu caminho diretamente no seu ‘negócio e
coração’”. Diz o leitor: “Portanto, a Natureza indica a espécie de arte apropriada
para as crianças!” Mas, na verdade, as mentes das crianças e dos seus mais
velhos semelhantes se acomodam ao que é posto no seu caminho. E, se as crian-
ças apreciam o vulgar e o sentimental na arte, é porque esse é o modo de arte a
que elas se habituaram. Deram-se a um menininho de aproxima-damente nove
anos (com muitos outros) reproduções de mais ou menos meia dúzia de pinturas
de Jean-François Millet[225] para estudar durante um curso escolar. No fim, pediu-
se às crianças que descrevessem uma dessas pinturas de que elas mais gostaram.
Claro que elas fizeram isso, e fizeram-no bem. Isto é o que um menininho que eu
mencionei fez: “Eu gostei mais do Semeador. O semeador está semeando
sementes. A pintura é toda escura exceto em cima no lado direito onde há um
homem arando o campo. Enquanto ele está arando o campo, o semeador semeia.
Este pegou um saco na sua mão esquerda e semeia com a sua mão direita. Ele
tem obstáculos de madeira. Semeia aproximadamente às seis horas da manhã.
Você pode ver a sua cabeça melhor do que as suas pernas e corpo, porque está
contra a luz.”
Uma menininha de sete anos prefere o “Angelus” e diz: “A pintura é sobre
pessoas nos campos, um homem e uma mulher. Perto da mulher, está uma cesta
com algo dentro. Atrás dela, está um carrinho de mão. Eles estão orando. O
homem está com o seu chapéu em mão. Você pode dizer que é noite, porque o
carrinho de mão e a cesta estão carregados.”

Deve ser regular
Quando as crianças começarem as aulas regulares (ou seja, assim que
têm seis anos), esse tipo de estudo das pinturas não deverá ser deixado ao léu,
mas elas devem pegar um artista após o outro, curso por curso, e estudar
silenciosamente mais ou menos meia dúzia de reprodu-ções dessa obra durante o
curso.
Os pequenos esboços de memória que eu citei mostram os seus estudos,
mas esse é o menor dos ganhos. Não conseguimos medir a influ-ência que um ou
outro artista tem sobre o senso de beleza da criança, sobre a sua capacidade de
ver, como numa pintura, as vistas comuns da vida. Ela está enriquecida mais do
que sabemos ao ter realmente olhado mesmo para uma simples pintura. É um
erro pensar que a cor é muito necessária para as crianças nos seus estudos de
arte. Elas acham cor em muitos lugares e ficam contentes, no momento, com a
forma e sentimento nas suas pinturas. A propósito, para decorações de sala de
aula, não co-nheço nada melhor do que as pinturas de Fitzroy, especialmente as
das Quatro Estações, onde você tem beleza, tanto de linha quanto de cor, e
sentimento poético. Também gostaria de citar o conselho de Ruskin: que as
crianças inglesas devem ser educadas com os livros de pinturas para crianças de
Jean Richter, o Unser Vater, Sontag e o restante.
Eu acrescento anotações de uma aula a respeito de conversas sobre
pinturas lecionada a crianças de oito e nove anos, para mostrar como essa
espécie de aula pode proceder.

Conversa sobre pintura

Objetos

1. Continuar a série de pinturas de Landseer[226] que as crianças estão
tendo na escola.
2. Aumentar o seu interesse nas obras de Landseer.
3. Mostrar a importância do seu conhecimento de animais.
4. Ajudá-las a ler uma pintura verdadeiramente.
5. Aumentar as suas capacidades de atenção e observação.

Passo 1. – Pergunte às crianças se elas se lembram sobre o que foi a sua
última conversa a respeito de pintura e que artista foi famoso pela pintura de
animal. Diga-lhes que Landseer tinha conhecimento de animais quando ele era
bem jovem. Que tinha cachorros como animais de estima-ção e, porque os
amava, estudou-os, e também os seus hábitos, de maneira que pôde pintá-los.
Passo 2. – Dê-lhes a pintura “Alexandre e Diógenes” para olhar e lhes
peça que descubram tudo o que puderem sobre ela por si mesmas e que pensem
pensar que ideia o artista teve na sua mente e que ideia ou ideias ele quis que a
sua pintura nos transmitisse.
Passo 3. – Após três ou quatro minutos, leve a pintura embora e veja o
que as crianças observaram. Então pergunte-lhes: o que os cachor-ros diferentes
lhes sugerem; a força do mastim representando Alexandre; a dignidade e
estabilidade dos cães de caça na sua retaguarda; o olhar do conselheiro sábio em
face do compositor; o olhar desdenhoso do cão de toca com pelo áspero na
banheira. Pergunte às crianças se notaram alguma coisa na pintura que mostre o
tempo do dia. Por exemplo, as ferramentas lançadas para baixo ao lado da cesta
do trabalhador, sugerindo a refeição do meio-dia, e a brilhante luz solar sobre os
cachorros, que projetam uma sombra na banheira, mostra que aquilo deve ser em
torno do meio-dia.
Passo 4. – Faça-as ler o título e diga quaisquer fatos que conheçam
sobre Alexandre e Diógenes. Então conte-lhes que Alexandre foi um grande
conquistador que viveu de 356 a 323 a.C., famoso pelas bata-lhas que venceu
contra a Pérsia, Índia e pela costa do Mediterrâneo. Ele era muito orgulhoso,
forte e arrogante. Diógenes foi um filósofo cínico. Ex-plique cínico pela
ilustração da lenda de Alexandre e Diógenes. E a partir dela descubra qual
cachorro representa Alexandre e qual representa Dió-genes.
Passo 5. – Faça as crianças desenharem as principais linhas da pintura,
em cinco minutos, com um lápis e um papel.

Ilustrações originais
De tempos em tempos, falei das ilustrações originais desenhadas pelas
crianças. Pode ser útil acrescentar anotações de uma aula mostrando o tipo de
ajuda ocasional que um professor pode dar nesse tipo de trabalho. Mas, de uma
maneira geral, deixe as crianças por si mesmas.

Objetivos

1. Ajudar as crianças a fazer imagens mentais claras a partir da
descrição e a reproduzi-la na pintura.
2. Aumentar a sua capacidade de imaginação.
3. Ajudá-las nas suas ideias de forma e cor.
4. Aumentar o seu interesse na história de Beowulf[227] fazendo-as
ilustrar uma cena a partir do livro que estão lendo.
5. Apresentar a sua ideia de uma criatura desconhecida (Grendel[228]).
Passos

Passo 1. – Desenhar a partir das crianças o que elas sabem do poema
Beowulf e do próprio herói.
Passo 2. – Diga-lhes quaisquer pontos que elas possam perder na
história, contanto que elas tenham lido (quer dizer, até a morte de Grendel).
Passo 3. – Ler a descrição do traje naquela época e o relato de morte de
Grendel (inclusive três pinturas possíveis).
Passo 4. – Desenhar a partir das crianças quais imagens mentais elas
fizeram. E reler a passagem.
Passo 5. – Fazê-las produzir a sua imagem mental com pincel e tinta.
Passo 6. – Mostrar-lhes a “ilustração original” de Beowulf, de George
Morrow, em Heroes of Chivalry and Romance[229].

Aulas de desenho
Mas diz o leitor: “Para as suas aulas de desenho reais, suponho que você
use ‘gotas’?” – ou seja, salpicos de tinta feitos com a ponta do pincel, que
assumem uma forma oval. Acho que as gotas têm um uso: elas dão certa
liberdade ao usar cor. Senão as “gotas” me parecem uma espécie de aparato de
arte que uma criança adquire com uma boa dose de trabalho e que, por
combinações adequadas em flores, e assim por diante, ela pode produzir efeitos
além da sua capacidade legítima como uma artista, em-quanto que o tempo todo
ela pode fazer isso sem uma partícula do senti-mento pelo objeto natural o qual é
a própria alma da arte. O poder da criação efetiva por uma espécie de truque
esperto mutila aqueles sensores delicados da natureza de uma criança pela qual
ela apreende a arte.
Diz Ruskin: “Deixe o olho apenas descansar sobre um pedaço áspero de
galho pela forma curiosa durante uma conversa com um amigo, descansar, ainda
que inconscientemente, e mesmo que a conversa seja esquecida, mesmo que toda
circunstância conectada a ela seja tão comple-tamente perdida para a memória
como se não tivesse sido, o olho irá, pela vida inteira depois, ter um certo prazer
nesses galhos que não teve antes, um prazer tão delicado, um traço de
sentimento tão delicado, de modo a nos deixar completamente inconscientes do
seu poder peculiar, mas indes-trutível por qualquer raciocínio, daí em diante uma
parte da nossa consti-tuição.”
Isso é o que desejamos fazer para as crianças ao ensiná-las dese-nhar: fazer
com que o olho descanse, não inconsciente, mas consciente-mente, sobre algum
objeto de beleza que deixará nas suas mentes uma imagem de deleite por todas
as suas vidas por vir. Crianças de seis e sete anos desenham galhos brotando de
carvalho e freixo, faia e alerce, com tal fidelidade tenra à cor, ao tom e ao gesto,
que os pequenos desenhos brutos são em si mesmos coisas de beleza.

As crianças têm “arte” nelas
Da mesma forma que com muitas outras coisas numa criança, com arte
nós temos que acreditar que ela está lá ou nunca a encontraremos. Mais uma vez:
eis uma Ariel delicada a quem é nossa parte livrar dos seus vínculos. Portanto,
pegamos um graveto ou uma flor crescente diante de uma criança e a fazemos
lidar com ela conforme queira. Ela descobrirá a sua própria maneira de formar e
colorir, e a nossa ajuda pode ser muito limitada no início com esses assuntos
técnicos, como a mistura de cores e coisas parecidas. Para que não possamos
impedir a liberdade da criança ou atrapalhar a libertação da arte que está nela,
temos que ser cuidadosos para não oferecer quaisquer auxílios na forma de
linhas-guia, pontos e outras muletas. E ela também deve trabalhar no meio mais
fácil, isto é, com pincel para pintar ou com carvão, e não com um grafite. Caixas
de cores baratas devem ser evitadas. As crianças merecem o melhor, e uma meia
dúzia de canudos de cores realmente boas durará um longo tempo e satisfará o
olho dos pequenos artistas.

Modelagem de argila
Enquanto falamos da formação das crianças em arte, pode ser bom dar
uma palavra para a modelagem de argila. Ninhos de passarinhos arrumados,
cestas de ovos etc., são inúteis na forma de desenvolvimento da arte e logo
cessam de serem divertidos. A principal coisa que a profes-sora tem de fazer é
mostrar à criança como preparar a sua argila para expelir bolhas de ar e lhe dar a
ideia de fazer uma pequena plataforma para o seu trabalho, de maneira que desde
o início possa ter um efeito artístico. Então ponha diante dela uma maçã, uma
banana, uma noz brasileira ou algo parecido. Faça-a não pegar um caroço de
argila e espremê-lo no formato, mas construir o formato que ela deseja pedaço
por pedaço. A sua própria percepção artística se vale da força na maçã, da dobra
no sapato da criança, das pequenas anotações de expressão nos objetos que
quebram a uniformidade e servem para a arte.

O piano e o canto
Eu tenho de encerrar com o senso decepcionante de que assuntos de
importância na educação da criança foram deixados fora de conta e de que
nenhum assunto foi adequadamente tratado.
Sobre certos assuntos de peculiar valor educacional – música, por exemplo
–, eu não disse nada, em parte por falta de espaço e em parte porque, se a mãe
não tivesse em si o “Isso!” do Sr. Joshua Reynolds[230], palpites de um estranho
não produziriam o sentimento de arte que é a condição de sucesso nessa espécie
de ensino. Se possível, faça as crianças desde o início estudarem sob artistas,
amantes do seu trabalho. É um erro sério deixar a criança colocar o fundamento
do que quer que seja que ela possa fazer no futuro sob professores mecânicos
mal qualificados, que não atiçam nela o entusiasmo que é a vida da arte. Junto ao
canto, gostaria de mencionar os efeitos educacionais admiráveis do método Dó
Móvel[231]. Por ele, as crianças aprendem de uma forma mágica a produzir um
sinal para o som e um som para o sinal, isto é, elas não podem somente ler
música, mas podem escrever as notas ou fazer os devidos sinais de mão, as notas
de uma passagem cantada para elas. Ouvido e voz são igual e simultanea-mente
cultivados.
O método The Child Pianist[232], da Srª. Curwen, é trabalhado, com
cuidado preciso, sobre as mesmas diretrizes, ou seja, o conhecimento da cri-ança
sobre a teoria musical e o seu ouvido treinando manter o ritmo com a sua
capacidade de execução, parecem livrar-se do tédio mortal de “praticar”.

Trabalhos manuais e repetições
Não é possível fazer mais do que mencionar mais dois assuntos
importantes – trabalhos manuais e repetições –, que devem formar uma parte
regular da vida diária de uma criança. Para o treinamento físico, nada é tão bom
quanto a Repetição Sueca de Ling[233] e um pouco dos primeiros exercícios estão
ao alcance das crianças abaixo de nove anos. A dança e as várias repetições
musicais se emprestam à graça do movimento e dão mais prazer às pessoinhas,
mesmo que com menos treinamento cien-tífico.
Os trabalhos manuais mais bem ajustados para crianças abaixo de nove
anos me parecem ser cadeiras de palhinha, caixa de papelão, cesto, tapete de
Esmirna, cortinas japonesas, escultura em cortiça, modelos em tela de pintura
grosseira mostrando uma variedade de pontos, costura fácil, tricô (agulhas
grandes e lã) etc. Os pontos a se manterem em mente nos trabalhos manuais das
crianças são: (a) que elas não sejam ocupadas para fazer futilidades como ervilha
e bastão, tapetes de papel e afins; (b) que lhes seja ensinado lenta e
cuidadosamente o que devem fazer; (c) que não seja permitido aquele trabalho
desleixado; (d) e que, por conseguinte, o trabalho das crianças seja mantido bom,
dentro do seu âmbito.
Ao concluir esta breve revisão dos assuntos apropriados à educação
intelectual de uma criança, posso esperar que o suficiente foi dito para mostrar a
necessidade de uma consideração séria por parte da mãe, antes que ela permita
que pequenos livros didáticos indistintos sejam postos nas mãos dos seus filhos
ou que confiem em pessoas mal qualificadas para atingir métodos de ensino por
si mesmas?







PARTE VI


A VONTADE – A CONSCIÊNCIA – A VIDA DIVINA
NA CRIANÇA


1. A VONTADE

O governo da Alma Humana
Agora temos que considerar um assunto de importância indes-critível
para cada ser chamado a sustentar uma vida razoável aqui, com a esperança de
uma vida mais completa futuramente. Quero dizer o governo do reino da Alma
Humana. Toda criança que vive tempo o suficiente no mundo é gradualmente
envolvida nessa alta função, e é função dos seus pais instruí-la nos seus deveres
e formá-la nas suas tarefas. Ora, o governo desse reino da Alma Humana, assim
como o de alguns estados bem orde-nados, é continuado em três câmaras, cada
qual com as suas próprias funções, exercitadas não por uma multidão de
conselheiros, mas por um simples ministro.

Poder executivo investido na vontade
A Vontade se senta na mais externa das três câmaras. Como aquele
centurião[234] romano, ele tem soldados embaixo de si: diz a esse homem “vai”, e
ele vai; a um outro, “venha”, e ele vem; a um terceiro, “faça isso”, e ele faz. Em
outras palavras, o poder executivo está investido na vontade. Se a vontade tem o
hábito da autoridade, se ela entrega os seus mandatos no tom que obriga a
obediência, de qualquer maneira o reino está em unidade consigo mesmo. Se a
vontade é fraca, de conselhos incer-tos, a pobre Alma Humana é rasgada com
desordem e rebelião.

O que é a vontade?
Eu não sei o que é a vontade. Parece ser um fato ultimato, sem admitir
uma definição. Porém existem alguns assuntos sobre os quais aqueles que têm a
educação dos filhos nas suas mãos cometem mais erros nocivos. Portanto, vale a
pena considerar, conforme possamos, quais são as funções da vontade e quais
são as suas limitações.

As pessoas podem passar a vida sem um ato deliberado de
vontade
Em primeiro lugar, a vontade não entra necessariamente em cena em
qualquer um dos aspectos nos quais até agora consideramos a criança. Ela pode
refletir e imaginar; ser mexida pelo desejo de conhecimento, de poder, de
distinção; pode amar e estimar; pode formar hábitos de atenção, obediência,
diligência, preguiça, involuntariamente, isto é, sem sempre pretender, intentar,
querer essas coisas para si mesma. Até agora isto é verdade: que há pessoas que
vivem as suas vidas sem um ato de vontade deliberada, pessoas amáveis e
maleáveis, por um lado, cercadas por cir-cunstâncias favorecedoras, e pobres
almas, por outro lado, a quem as circunstâncias não preservaram, que ficaram à
deriva das suas amarras e dificilmente devem ser nomeadas por aqueles a quem
elas pertencem. De forma alguma, grandes capacidades intelectuais implicam
uma vontade com controle. Lemos como Coleridge teve que ser cuidado, porque
ele tinha tão pouca força de vontade. Os seus pensamentos eram tão poucos sob
a sua própria volição quanto as suas ações, e a boa conversa que as pessoas
foram ouvir não era mais do que um derramamento sem fim de ideias conectadas
por nenhuma outra ligação senão aquela da associação, ainda que a sua mente
fosse tão boa, que as suas ideias fluíssem metodicamente – do seu próprio
acordo, por assim dizer.

Caráter: o resultado da conduta regulada pela vontade
Não é necessário dizer uma palavra sobre a dignidade e força de caráter
que uma vontade confirmada dá aos seus possuidores. De fato, o caráter é o
resultado da conduta regulada pela vontade. Nós dizemos que fulano tem um
grande caráter, e um outro é sem caráter. E poderíamos ex-pressar o fato
igualmente dizendo que fulano tem uma vontade vigorosa, e um outro não tem
força de vontade. Todos sabemos sobre vidas, ricas em dons e graças, que foram
destruídas pela falta de uma vontade determi-nada.

Três funções da vontade
A vontade é a controladora das paixões e emoções, a diretora dos
desejos, a governante dos apetites. Mas observe: as paixões, os desejos, os
apetites, já estão lá, e a vontade reúne força e vigor somente conforme é
exercitada na repressão e direção deles, pois, embora a vontade pareça ser de
natureza puramente espiritual, ela se comporta como qualquer membro do corpo
nisto: que ela se torna vigorosa e capaz à proporção que é devida-mente
alimentada e apropriadamente empregada.

Uma limitação da vontade desconsiderada por alguns romancistas
É verdade que o vilão de um romance é, ou ainda, costumava ser, uma
pessoa interessante, porque ele sempre era dotado de uma vontade poderosa que
agia, não por controlar as suas paixões violentas, mas por auxiliá-las e instigá-
las. O resultado era um ser diabólico fora do modo comum da natureza. E não é
de admirar, pois, de acordo com a lei natural, o membro que não cumpre as suas
próprias funções é punido pela perda de poder. Se ele não cessar de ser, torna-se
como se não existisse. E a vonta-de, sendo posta no assento de autoridade, não é
capaz de transferir as suas forças à turba. A desordem seria temerosa demais –
assim como quando os poderes executivos de um estado são pegos por uma
multidão turbulenta e há tiroteios nas estradas e enforcamentos desde as
lanternas, confusão infinita em todo lugar.

Os pais caem nesse erro metafísico grave
Estou ansiosa para trazer diante de vocês esta limitação da vontade para
as suas funções devidas, porque os pais frequentemente caem no erro metafísico
que vimos no escritor de romance. Eles admiram uma vontade vigorosa, e
acertadamente. Eles sabem que se o seu filho deve deixar a sua marca no mundo,
tem de ser pela força de vontade. Qual a consequência? O bebê chora com
ataques por um brinquedo proibido, e a mãe diz: “Ele tem uma vontade forte.” O
camaradinha permanece berran-do na rua e não irá nem para cá nem para lá com
a sua cuidadora, mono-polizará os brinquedos das suas irmãs, tudo por causa
dessa “vontade forte”. Agora chegamos a uma divergência de opinião: por um
lado, os pais decidem que, qualquer que seja a consequência, a vontade da
criança não deve ser quebrada, assim todos os seus caprichos têm de passar sem
repressão; por outro lado, a decisão é que a vontade da criança tem de ser
quebrada sob todos os riscos, e o pobre serzinho é sujeito a uma rodada triste de
punição e repressão.

A obstinação indica a carência de força de vontade
Mas o tempo todo ninguém percebe que o problema da criança é a
simples falta de vontade. Ela está num estado de “obstinação” absoluta – palavra
um tanto infeliz que usamos para descrever o estado no qual a vontade não tem
poder de controle. Se houvesse tal palavra, a “desvon-tade” descreveria esse
estado mais verdadeiramente. Agora, essa confusão nas mentes de muitas
pessoas, entre o estado de obstinação e o de ser dominado pela vontade, conduz
a resultados enganosos mesmo em circuns-tâncias nas quais a obstinação não é
promovida nem a criança indevida-mente reprimida. Ela conduz à negligência
do devido cultivo e treinamento da vontade, aquela posse quase divina do
emprego do qual todo outro dom – seja beleza ou gênio, força ou habilidade –
depende para o seu valor.

O que é a obstinação?
Então, o que é a obstinação, se não um exercício da vontade?
Simplesmente isto: remova freios e rédeas – isto é, o controle da vontade – dos
apetites, dos desejos, das emoções, e a criança que emoldurou o seu passatempo
– seja ressentimento, ciúme, desejo de poder, desejo de pro-priedade – será uma
outra Mazeppa, nascida com a velocidade do rápido e a força do forte e
absolutamente sem poder para ajudar-se. Apetite, pai-xão, não há limite para o
seu poder e a sua persistência, se a marca apon-tada for removida. E é esse
ímpeto de apetite e de paixão, essa determi-nação aparente para ir num caminho
e não noutro, que é chamado de obstinação e equivocado por um exercício da
vontade. Enquanto a deter-minação é só aparente, a criança de fato é apressada
sem resistência, porque aquela força opositora que deve balancear o seu caráter
está subdesenvolvida e destreinada.


A vontade tem funções superiores e inferiores
A vontade tem as suas funções superiores e inferiores, que podem ser
chamadas de morais e mecânicas. E essa vontade que, por falta de prática,
cresceu flácida e débil no exercício das suas funções mais altas, ainda pode ser
capaz de ordenar essas coisas como ir e vir, sentar e ficar de pé, falar e refrear a
conversa.

A vontade: não uma faculdade moral
Ainda, apesar de ser impossível conseguir excelência moral de caráter
sem a atuação de uma vontade vigorosa, a vontade mesma não é uma faculdade
moral, e um homem pode conseguir grande força de vonta-de em consequência
de esforços contínuos na repressão ou direção dos seus apetites ou desejos – e
ainda ser um homem sem valor. Quer dizer, ele pode estar se preservando em
ordem de motivos indignos, pelo bem das aparências, pelo seu próprio interesse,
mesmo pelo ferimento de uma outra pessoa.

Uma vontade disciplinada necessária ao caráter cris-tão heroico
Mais uma vez, apesar de uma vontade disciplinada não ser uma
condição necessária da vida cristã, aquela é necessária para o desenvol-vimento
do caráter cristão heroico. Um Gordon, um Havelock, uma Florence Nightingale,
um São Paulo, não poderiam ser outra pessoa senão uma pessoa de vontade
vigorosa. Nesse sentido, como em todos os outros, o Cristianismo atinge as
almas mais fracas. Existe uma maravilhosa “Madalena” de Guido[235] no
Louvre[236], com uma boca que claramente nunca foi posta para qualquer
intenção pelo bem ou mal – um rosto mais baixo moldado pelo seguimento
desamparado da inclinação do momento. Mas você olha acima para os olhos,
que estão erguidos para encontrar o olhar dos olhos não mostrados na pintura, e
o semblante está transfigurado, a face inteira está inflamada com uma paixão por
serviço, amor e auto-entrega. A graça divina pode realizar tudo isso nas almas
fracas e de má vontade, e então elas farão o que puderem. Mas a sua capacidade
de serviço é limitada pelo seu passado. Não tanto a criança da mãe cristã, cujo
maior desejo é formá-la para a vida cristã. Quando a criança desper-tar para a
consciência de quem ela é e a quem serve, a mãe a terá pronta para aquele
importante serviço, com toda faculdade em formação: um homem de guerra
desde a sua juventude. Acima de tudo, com uma vontade eficiente para querer e
fazer a Sua boa alegria.

A única faculdade prática do homem
Antes de considerarmos como formar essa “única faculdade prática do
homem”, temos que saber como a vontade opera – como ela gere o ordenamento
de tudo o que é feito e pensado no reino da Alma Humana. “Você não consegue
fazer com que você mesmo faça o que quer fazer?”, diz Guy, em The Heir of
Redclyffe[237], ao pobre Charlie Edmonston, que nunca teve o hábito de fazer com
que ele mesmo fizesse algo. Sem dúvida existem aqueles que nem mesmo
chegaram a querer, mas a maioria de nós deseja fazer bem. O que queremos
saber é: como fazer com que nós mesmos faça-mos que nós desejemos. E aqui
está a linha que divide as pessoas eficien-tes das não eficientes, as grandes das
pequenas, as boas das bem-intencio-nadas e respeitáveis. É à proporção de um
homem ter autocontrole, de poder se autopersuadir, que ele é capaz de agir,
mesmo com seu próprio prazer; que ele pode depender de si mesmo e ter certeza
da sua própria ação nas emergências.

Como a vontade opera
Agora, como esse autocrata de confiança se comporta? É com um
severo “Farás”, “Não farás”, que o sujeito é coagido à obediência? De maneira
alguma. É por uma mostra plausível de razões, junção de moti-vos? Também
não. Desde que o Sr. John Stuart Mill nos ensinou que “tudo o que o homem faz
ou pode fazer com o assunto” é “mover uma coisa para ou a partir de outra”, não
precisamos ficar surpresos se os grandes resulta-dos morais são acarretados pelo
que parecem meios inadequados. E um pouquinho de experiência com pré-
escola mostrará, melhor do que muita fala, o que é possível para a vontade. Um
bebê cai, sofre uma má colisão e chora lastimavelmente. A cuidadora experiente
não “beija o lugar para sarar” ou mostrar qualquer dó pelo problema da criança.
Isso tornaria o problema pior. Quanto mais ela tiver pena, mais ele soluçará. Ela
se apressa em “mudar os seus pensamentos”, então ela fala. Ela o leva até a
janela para ver os cavalos, dá-lhe o seu livro de imagens de animais de
estimação, o seu brinquedo mais preferido, e a criança se detém no meio do
soluço, ainda que ela esteja realmente machucada. Agora isso, da cuida-dora que
conhece, é precisamente o papel que a vontade exerce para o homem. É pela
força de vontade que um homem pode “mudar os seus pensamentos”, transferir a
sua atenção de um sujeito de pensamento para outro, e isso com um choque de
força mental do qual ela é indistintamente consciente. E isso é o suficiente para
salvar e fazer um homem: esse poder de fazer-se pensar somente naquelas coisas
que ele decidiu de antemão serem boas de pensar.

O caminho da vontade; incentivos
Os seus pensamentos estão vagando em prazer proibido, para o
impedimento do seu trabalho. Ela se detém e deliberadamente fixa a sua atenção
naqueles incentivos que têm o maior poder de fazê-la trabalhar, o lazer e o prazer
que seguem o trabalho honesto, o dever que a ata ao cumprimento da sua tarefa.
Os seus pensamentos correm na ranhura que ela quer que eles corram, e o
trabalho não é mais um esforço.

Diversão
Ainda, uma leve ofensa chamou uma inundação de sentimentos
ressentidos. Fulano não devia ter feito isso, ele não tinha o direito, foi medíocre
e assim por diante, através de todas as coisas duras que estamos prontos o
bastante para dizer com os nossos corações de um ofensor contra o nosso amour-
propre[238]. Mas o homem sob o controle da sua própria vontade não permite que
isso continue. Ele não luta consigo mesmo e diz: “Isso é muito errado em mim.
Fulano não é tão culpado, afinal.” Ele não está pronto para isso ainda, mas
apenas se obriga a pensar em algo mais: o último livro que leu, a próxima carta
que tem de escrever, qualquer coisa interessante o bastante para distrair os seus
pensamentos. Quando ele se permitir voltar à causa da ofensa, veja que todo o
rancor se foi, e ele pode olhar para o assunto com a indiferença de uma terceira
pessoa. E isso é verdade não só pelos surgimentos de ressentimentos, mas por
toda tentação que aflige a carne e o espírito.

Mudança de pensamento
Ainda, a mesmice dos seus deveres, o gasto de fazer a mesma coisa de
novo, preenche-a com desgosto e abatimento, e ele relaxa os seus esforços. Mas
não se ele for um homem sob o poder da sua vontade pró-pria, porque ele
simplesmente não se permite um descontentamento vão. Está sempre no seu
poder dar-se algo agradável, algo fora de si mesmo, pensar, e ele age assim. E,
dado o que chamamos de um “esquema mental feliz”, nenhum trabalho é
laborioso.

O caminho da vontade deve ser ensinado às crianças
É algo para saber o que fazer conosco quando estamos ocupados, e o
conhecimento desse caminho da vontade é até agora o segredo de uma vida feliz,
que vale muito comunicar às crianças. Você está zangado? Mude os seus
pensamentos. Está cansado de tentar? Mude os seus pensamentos. Você está
ansiando por coisas que não tem? Mude os seus pensamentos. Existe um poder
dentro de você, a sua vontade própria, que lhe permitirá voltar a sua atenção dos
pensamentos que o fazem infeliz e errado para os pensamentos que o fazem feliz
e certo. E esse é o caminho extremamente simples no qual a vontade age. Esse é
o único segredo do poder sobre si mesmo que o homem forte empunha. Ele pode
se obrigar a pensar no que escolhe e não se permitirá pensamentos que gerem
prejuízos.

O poder da vontade implica o poder da atenção
Mas você percebe que, embora a vontade seja todo-poderosa dentro de
certos limites, esses são apenas limites estreitos afinal. Muito tem de ir antes, e
com uma vontade vigorosa se deve ter um poder de governo da conduta. Por
exemplo, o homem tem de ter adquirido o hábito da atenção, a grande
importância que já consideramos. Há pessoas com inteligência de ave, que não
têm capacidade de pensar com conexão por cinco minutos sob qualquer pressão,
de dentro ou de fora. Se elas nunca foram treinadas para aplicar o todo das suas
faculdades mentais a um dado assunto, ora, nenhuma energia da vontade,
supondo que a tenham, o que é impossível, poderia fazê-las pensar
constantemente pensamentos da sua própria esco-lha ou da escolha de outra
pessoa. Eis como encaixam as partes da fábrica intelectual: o poder da vontade
implica o poder da atenção. E antes que os pais possam começar a treinar a
vontade da criança, ela tem de ter come-çado a formar em si o hábito da atenção.

O hábito pode frustrar a vontade
Ainda, nós já consideramos a facilidade fatal no mal, o impulso para o
bem, que o hábito dá. O hábito é o aliado ou o oponente, muito frequentemente o
frustrador, da vontade. O bêbado infeliz quer mesmo com a força existe nele. Ele
afasta os olhos da sua mente a partir da vista da sua armadilha. Assiduamente se
enche com outros pensamentos. Mas, ai, os seus pensamentos só correrão na
ranhura acostumada do desejo, e o hábito é forte demais para a sua vontade
fraca. Todos sabemos algo dessa luta entre o hábito e a vontade em questões
menos vitais. Quem está sem algum hábito demorado, procrastinado, de algum
modo cansativo, que está em luta quase diária com a vontade retificada? Mas eu
já disse tanto sobre o dever dos pais de facilitar o caminho dos seus filhos
entregando-lhes as diretrizes de hábitos úteis, que é desnecessário dizer mais
uma palavra aqui sobre o hábito como um aliado ou um entrave da vontade.

O uso razoável de um instrumento tão efetivo
E, mais uma vez, somente o homem de razão cultivada é capaz de ser
governado por uma vontade bem direcionada. Se o seu entendimento não
mostrar boa causa pela qual ele faça alguma leitura sólida todo dia, pela qual ele
se agarre à fé dos seus pais, pela qual ele assuma os seus deveres como um
cidadão, o movimento da sua vontade será fraco, flutu-ante e muito estéril de
resultados. E, na verdade, o pior pode acontecer: ele pode adotar uma noção
birrenta, ou mesmo viciada, e realizar um bom tanto de engano pelo que ele
sente ser um esforço virtuoso da vontade. Os pais podem arriscar colocar o poder
da vontade nas mãos do seu filho somente à medida que ele se treine para fazer
um uso razoável de um instrumento tão eficiente.




Como fortalecer a vontade
Consideraremos num instante uma outra limitação da vontade. Mas
supondo que os pais se esforcem para que a criança esteja num estado
apropriado para usar a sua vontade, como ela fortalecerá essa vontade, de
maneira que pouco a pouco a criança possa empregá-la para controlar a sua
própria vida? Já falamos da importância de formar a criança no hábito da
obediência. Ora, a obediência é valiosa somente na medida em que aju-da a
criança a fazer com que ela mesma faça aquilo que sabe que deve fazer. Todo
esforço de obediência que não lhe dá um sentido de conquista sobre as suas
próprias inclinações ajuda a escravizá-la. Ela ressentirá a perda da sua liberdade
esbarrando na autoridade quando ela puder. Esse é o segredo para malograr
muitas crianças estritamente educadas. Mas peça a sua cooperação, deixe-a
destinar ou intentar de coração fazer a coisa que lhe é oferecida, e então é a
própria vontade da criança que a está movendo, e não a sua. Ela começou o
maior esforço, a maior realização da vida humana: o fazer, o convencer-se. Faça-
a saber o que ela está prestes a fazer, faça-a apreciar um senso de triunfo e da sua
congratulação, sempre que ela buscar os seus pensamentos de volta ao seu
cálculo cansativo, sempre que ela fizer as suas mãos terminarem o que
começaram, sempre que ela arremessar o cachorro preto das suas costas e
produzir um sorriso de um rosto turvado.

O hábito do autodomínio
Então, como foi dito antes, faça-a saber o segredo do querer; faça-a
saber que, por um esforço da vontade, ela pode voltar os seus pensamentos à
coisa na qual ela quer pensar: as suas aulas, as suas orações, o seu trabalho, e
longe das coisas nas quais ela não deve pensar. De fato, ela pode ser uma
coleguinha valente e forte, pode fazer com que ela mesma pense naquilo de que
gosta. E faça-a tentar pequenos experimentos, de maneira que, se uma vez ela
tiver os pensamentos certos, o resto cuidará de si mesmo, e ela terá certeza de
agir certo então. Se ela se sentir zangada, com pensamentos malcriados lhe
chegando, o plano será: pensar duro sobre outra coisa, algo legal – o seu
próximo aniversário, o que pretende fazer quando adulta. Não tudo isso de uma
vez, claro. Mas linha por linha, preceito por preceito, aqui um pouco e ali um
pouco, conforme a oportunidade surge. Faça-a conseguir o hábito de gerir-se,
controlando-se, e é surpreendente quanta capacidade de autoconvencimento uma
criança bem jovem exibirá. “Contenha-se, Tommy.”, uma vez eu ouvi uma tia
sábia dizer a um menino de quatro anos. E o Tommy conteve-se, ainda que ele
estivesse fazendo uma terrível algazarra por algum problema pequeno.

Educação da vontade: mais importante do que a do in-telecto
Todo esse tempo, a vontade da criança está sendo tanto treinada quanto
fortalecida. Ela está aprendendo como e quando usar a sua vontade, e a vontade
está se tornando mais vigorosa e capaz a cada dia. Deixe-me acrescentar um ou
dois pensamentos sábios da Introduction to Mental Philosophy, do Dr.
Morell[239]: “A educação da vontade é realmente de longe mais importante, por
formatar o destino do indivíduo, do que a do intelecto... Teoria e doutrina,
inculcação de leis e proposições, por si mesmas nunca conduzirão ao hábito
uniforme da ação certa. É fazendo que aprendemos a fazer, superando que
aprendemos a superar, e todo ato certo que fazemos saltar de princípios puros –
seja pela autoridade, preceito ou exemplo – terá um peso maior na formação do
caráter do que toda a teoria no mundo.”


2. A CONSCIÊNCIA

A consciência é juíza e legisladora
Mas de forma alguma a vontade se queixa sozinha do governo do reino
da Alma Humana. Verdade, a vontade maneja o poder executivo. É somente pelo
querer que conseguimos fazer. Mas há uma capacidade maior atrás, cujo
mandato a vontade não faz mais do que expressar. A consciência é suprema na
câmara interior. A consciência é a legisladora e declara o “Farás” e o “Não
farás!” sobre o qual a vontade toma a ação. O juiz também, perante quem a alma
que ofende é convocada. E do “Tu és o homem” da consciência não há apelo.



“Eu sou, eu devo, eu posso, eu quero”
“Eu sou, eu devo[240], eu posso, eu quero”. Esses são os passos daque-la
escada de Santo Agostinho[241] pela qual nós

“nos levantamos nas pedras
Dos nossos egos mortos para coisas maiores[242].”

“Eu sou”: nós temos a capacidade de nos conhecermos. “Eu devo”: nós
temos dentro de nós um juiz moral, a quem nos sentimos sujeitos e que aponta e
exige de nós a nossa responsabilidade. “Eu posso”: não estamos cientes da
capacidade de fazer aquilo que percebemos que devemos fazer. “Eu quero”: nós
determinamos exercitar aquela capacidade com uma volição que é em si mesma
um passo na execução daquilo que nós queremos. Aqui está uma corrente bela e
perfeita, e a maravilha é que, tão requintadamente constituído como ele é para o
agir certo, o erro ainda é possível para o homem. Mas não é a minha função falar
aqui sobre os mistérios infelizes do pecado e tentação. Você verá que é por causa
das possibilidades de ruína e perda que se espalham em toda vida humana que eu
estou colocando sobre os pais o dever de preservar os seus filhos pelos meios
postos nas suas mãos. Talvez não seja demais dizer que 99% das vidas perdidas
se encontram à porta dos pais que não fizeram um esforço de libertá-las da
preguiça, dos apetites sensuais, da teimosia, nenhum esforço para fortificá-las
com os hábitos de uma vida boa.

Inércia dos pais não completada pela graça divina
Nós vivemos num mundo redimido, e a graça infinita e o auxílio de
cima cuidam de todo esforço corretamente direcionado na formação das
crianças. Porém eu não vejo muita base para esperar que a graça divina
interferirá como uma substituta de toda e qualquer capacidade que esco-lhermos
deixar sem uso ou mal direcionada. No mundo físico, nós não esperamos que
milagres compensem a nossa negligência com o uso dos meios. O corpo
raquítico, o membro deformado, pelo qual a criança tem de agradecer aos seus
pais, permanecem com ela durante a vida, ainda que ela possa ter que agradecer
a Deus por muito mais. E uma vontade fraca, maus hábitos, uma consciência não
instruída, ficam por aí com um homem cristão durante a sua vida, porque os seus
pais falharam no seu dever com ele e não teve força o suficiente em si mesmo
para suprir a sua omissão.

Consciência: um guia não infalível
Por exemplo, nessa questão da consciência, o hábito laissez-faire[243] dos
seus pais é a causa do erro e dano reais para muitas crianças. Os pais são gratos
por acreditar que o seu filho nasce com uma consciência. Espe-ram que a sua
conduta possa ser governada daí. E o resto eles deixam. A criança e a
consciência podem resolver isso entre elas. Ora, isso é supor que uma
consciência plenamente informada nasce num corpo infantil ou que ela cresce,
como o cabelo e os membros, com o crescimento do corpo, e não está sujeita a
condições de progresso espiritual apropriadas para si mesma. Em outras
palavras, supõe-se que a consciência é um guia infalível, uma ilusão à qual as
pessoas se agarram apesar do senso comum e da experiência cotidiana das coisas
erradas que os homens fazem a partir de motivos conscienciosos. Os caprichos
da consciência não instruí-da são tão familiares de modo a ter feito surgir
provérbios populares: “Honra entre ladrões”, “Filtrar um mosquito e engolir um
camelo[244]”, que apontam para casos de consciência enganada. Enquanto que “O
desejo é o pai do pensamento.”, “O pior cego é aquele que não quer ver.”,
apontam para casos ainda mais comuns, nos quais um homem intencionalmente
engana a sua consciência na aquiescência.

Mas um poder real
Então, se a consciência não for um guia infalível; se ela passar de olhos
vendados por ofensas hediondas e descer pesadamente sobre um mero
trocadilho, um dízimo da hortelã, arruda e todos os tipos de ervas, e
negligenciando os assuntos mais importantes sobre a lei[245]; se a consciên-cia for
passível de ser enganada, persuadida a chamar o mal de bem e o bem de mal,
quando o Desejo for o advogado especial diante do tribunal, onde estará o seu
uso, esse junco quebrado? Afinal, essa legisladora auste-ra do coração não é
mais do que uma ficção do cérebro? A sua consciência não é mais do que você
acaba pensando sobre as suas próprias ações e aquelas de outras pessoas? Ao
contrário, essas aberrações da consciência talvez sejam a prova mais forte de que
ela existe como um poder real. Como Adam Smith[246] bem disse: “A autoridade
suprema da consciência é sentida e tacitamente reconhecida pelo pior, não menos
do que pelo me-lhor, dos homens, pois mesmo aqueles que jogaram fora toda a
hipocrisia sofrem com o mundo para esconder o seu caráter real dos seus
próprios olhos.”

Aquele sentido espiritual pelo qual conhecemos o bem e o mal
O que é a consciência, quão longe permanece nos sentimentos, quão
longe na razão, quão longe é independente de ambos, se há questões obscuras
que não são necessárias para resolver propósitos práticos. Mas esse tanto é
evidente: que a consciência é tanto uma parte essencial da natureza humana
como são as afeições e a razão e que é aquele senso espiritual pelo qual nós
temos conhecimento do bem e do mal. Essa criança de seis meses de idade, que
ainda não pode falar, exibe as operações da consciência. Um olhar reprovador a
fará descer os seus olhos e esconder o seu rosto. Mas observe: dessa maneira, a
mãe pode cobri-la com confusão mediante um experimento quando a criança é
totalmente dócil. A pobre pequena consciência não educada se ergue, todavia, e a
condena na pala-vra de outro.
Fatos como esse fornecem um olhar da responsabilidade espantosa que
está com os pais. A criança vem ao mundo com uma faculdade moral, um órgão
delicado por meio do qual ela discerne o sabor do bem e do mal e ao mesmo
tempo tem a percepção de deleite no bom (nela mesma ou outros), de
repugnância e aversão ao mal. Mas pobre criança: ela é como um navegador que
não sabe como usar a sua bússola. Nasceu para amar o bem e odiar o mal, mas
não tem conhecimento real do que seja o bem e do que seja o mal. Ela não põe fé
nas intuições que tem, mas se deixam ceder na simplicidade à condução dos
outros. A admiração que Deus Todo-Pode-roso possa ter até então para deixar a
própria construção de um ser imor-tal nas mãos de pais humanos só é
correspondida pela admiração de que os pais humanos possam aceitar essa
confiança divina apenas com uma consideração da sua significância.

A consciência de uma criança: uma capacidade não de-senvolvida
em vez de uma autoridade suprema
Olhando para a consciência na criança mais como uma capacidade não
desenvolvida do que como uma autoridade suprema, a questão é: como esse
senhor da vida nascente deve ser educado até as suas maiores funções de
informar a vontade e decretar a conduta? Pois, apesar de que a cons-ciência mal
ensinada possa cometer gafes fatais e um homem possa causar uma carnificina
entre os fiéis porque a sua consciência ordena, nenhum homem jamais alcançou
uma vida piedosa, correta e sóbria, salvo se foi governado por uma boa
consciência: uma consciência não somente com a capacidade de discernir o bem
e o mal, mas formada para perceber as qualidades dos dois. Muitos homens
podem ter a grande sensibilidade de gosto que os qualifica como
experimentadores de chá, mas é somente à medida que eles têm experiência nas
qualidades dos chás que o seu bom gosto vale para os seus empregadores e vale
uma fonte de renda para si mesmos.

A consciência não instruída
Tanto com a educação da vontade, como com a educação da
consciência, ambas dependem muito do que houve antes. O refinamento da
consciência não pode coexistir com a ignorância. O selvagem não educado tem
os seus escrúpulos nos quais não podemos entrar. Não conseguimos entender
nesta época como foi que os horrores da Rebelião Indiana[247] surgiram da
simples suspeita de que a mistura de banha de porco e gordura de bife tenha sido
usada para lubrificar os cartuchos distribuídos aos sipaios. Esses escrúpulos que
estão além do alcance das nossas ideias, nós chamamos superstições ou
preconceitos, e são relutantes em olhar para a conduta como conscienciosa,
mesmo quando provocados pela cons-ciência não instruída – a menos que até
agora sejam razoáveis e certos em si mesmos.

Os processos implicados numa decisão “conscienciosa”
Portanto, está claro que antes que a consciência esteja numa posição de
pronunciar o seu veredito sobre os fatos de um dado caso, a razão cultivada tem
de rever os prós e contras. O juízo prático tem de balançá-los, decidindo qual
tem o maior peso. A atenção tem de levar todas as capacidades da mente para
assumir a questão. Os hábitos da ação certa têm de carregar os sentimentos, têm
de fazer o agir certo parecer o mais fácil e o mais agradável. Nesse meio tempo,
o desejo é clamoroso, mas a consciência, o juiz imparcial, devidamente
informada em pleno tribunal dos méritos do caso, decide pelo certo. A vontade
executa o veredito da consciência. Nos vereditos da consciência está o homem
consciencioso, de cujas ações e opiniões você pode ter certeza antecipadamente,
e então em que se tornam esses procedimentos elaborados? Essa é a exata
vantagem de uma consciência instruída com base numa inteligência formada. O
juiz está sempre sentando, o conselho está sempre no local.

A consciência instruída: quase sempre certa
Aqui está, de fato, um bom motivo para a formação ampla da
inteligência da criança. Ela quer a maior cultura que você pode lhe dar, baseada
em hábitos cuidadosamente formados, a fim de que ela possa ter uma
consciência sempre alerta, apoiada por toda capacidade da mente. E essa
consciência é a própria flor de uma vida nobre. A consciência instruí-da pode
afirmar que é, se não infalível, de qualquer modo quase sempre certa.
Geralmente, ela não é madura até que o homem seja maduro. Pes-soas jovens,
ainda que com a mente certa e ansiosas, podem errar, princi-palmente porque
fixam a sua atenção demais em algum dever, alguma teoria de vida, às custas de
muito além disso.





A boa consciência de uma criança
Mas mesmo a criança, com a consciência e as capacidades crescen-tes,
é capaz de dizer: “Não, eu não posso. Não seria certo.”, “Sim, eu quero, porque é
certo.” E uma vez capaz de dar alguma dessas respostas às solicitações que a
atacam, a criança é capaz de viver, pois o restante, o desenvolvimento e o que
pode ser chamado de ajuste da consciência, man-terá o ritmo com o seu
crescimento intelectual. Mas permitindo que uma boa quantidade de várias
disciplinas tenha que assegurar aquela eflores-cência final de uma boa
consciência, o que deve ser feito para a formação da própria consciência,
acelerando o gosto espiritual para que a menor soupçon[248] do mal seja detectada
e rejeitada?

Crianças brincam com questões morais
Não há uma parte da educação mais legal e delicada do que essa, nem
qualquer uma na qual pessoas adultas estejam mais aptas a tropeçar. Todo mundo
sabe como é cansativo discutir qualquer questão moral boa com crianças; como
elas empregam trocadilhos, sugerem uma centena de explicações ou evasões
engenhosas, falham em ser abaladas ou em admi-rar no lugar certo. De fato,
brincam com a questão toda. Ou, o que ainda é mais cansativo, são
excessivamente severas e corretas, e “lidar com a condenação ao redor” com
muita cordialidade e boa vontade. Pais sensíveis frequentemente ficam aflitos
com essa falta de consciência nas crianças, mas elas não são muito culpadas. A
consciência madura exige ser apoiada pelo intelecto maduro, e as crianças não
têm nem um nem outro. Discus-sões do tipo devem ser suprimidas. As crianças
não devem ser estimuladas a dar as suas opiniões sobre questões de certo e
errado. E os livrinhos não devem ser postos nas suas mãos, que autoritariamente
se pronunciam sobre conduta.

A Bíblia: a principal fonte de ideias morais
Seria bom se a discrição da Bíblia a esse respeito fosse observada pelos
escritores de livros infantis, seja de fábula, seja de história[249]. A criança ouve a
história de José (com reservas) lida a partir da Bíblia, que raramente oferece
comentário ou explicação. Não é preciso lhe dizer o que era “mau” e o que era
“bom”. Não há necessidade de pressionar o ensino em casa (ou a Bíblia teria
sido escrita em vão) e ações boas e más não carregam testemunhas consigo. Faça
que todas as circunstâncias da leitura diária da Bíblia – a leitura consecutiva, do
primeiro capítulo do Gênesis em diante, com omissões necessárias – sejam
deliciosas para a criança. Faça-a estar no quarto da sua mãe, nos braços dela.
Faça que aqueles quinze minutos sejam um doce lazer e sóbria alegria, sendo
permitido que todo o interesse da criança vá à história sem distrair consi-
derações morais. E então quanto menos conversa melhor. A história mer-gulhará
e trará o seu próprio ensinamento, um pouco agora e mais todo ano conforme ela
seja capaz de entendê-la. Uma vez essa história será nela um crescimento
constante, uma ideia moral frutificativa.

Histórias fixam a atenção sobre a conduta
A Bíblia (isto é, as suas partes apropriadas), primeira e suprema. Mas
qualquer pintura verdadeira da vida, seja um conto de feitos dourados, seja de
vida humana culpável e briguenta, traz alimento à consciência crescente. A
criança ganha o hábito de fixar a sua atenção sobre a conduta. Inicialmente, as
ações são pesadas para ela pelas suas consequências, mas gradualmente a sua
consciência adquire capacidade de discriminação, e tal e tal comportamento é
mau ou bom para ela quaisquer que sejam as consequências. E esse silêncio da
faculdade moral acontece mais seguramente se for evitada a distração da
tagarelice sobre o assunto. Pois mil movimentos pequenos de vaidade,
curiosidade e simples amor à conversa são facilmente chamados à cena e tiram a
atenção da ideia moral que deve ser transmitida à consciência. É muito
importante, ainda, que não se permita que a criança condene a conduta das
pessoas ao redor dela. Não é a questão se ela está certa ou errada no seu veredito.
O hábito de culpar certamente embotará a sua consciência, amortecerá a sua
sensibi-lidade à ordem “Não julgueis, e não sereis julgados[250].”

A ignorância da consciência de uma criança
Mas e a própria conduta da criança? Ela, com segurança, poderá ser
chamada a olhar para isso? A sua conduta, inclusive as suas palavras, sim, mas
os seus motivos não. Nada tem de ser feito para induzir o mau hábito da
introspecção. Além disso, ao pôr a criança para considerar os seus modos, o
respeito tem de ser mantido pela extrema ignorância da consciência infantil, um
grau de ignorância desconcertante para as pes-soas adultas quando elas a
descobrem por acaso, o que não é frequente; pois as crianças, ainda que
tagarelem demais e tenham modos amigáveis e amáveis, vivem muito para si
mesmas. Elas cometem sérias ofensas contra a verdade, a modéstia, o amor, e
não sabem que agiram errado, enquanto um peso absurdo de transgressão oprime
as suas almas. As crianças se morderão e machucarão cruelmente, farão roubos
insignificantes, farão coisas chocantes de modo que os seus pais temerão que
tenham naturezas muito más. Não é necessariamente assim. É simplesmente que
a consciên-cia não ensinada não vê fronteira clara entre o certo e o errado e pode
errar tanto de um lado quanto de outro. Uma vez eu vi uma criança de doze anos
que estava se esgotando com grande aflição porque ela temia ter cometido “o
pecado imperdoável”, assim disse ela (como ela pegou a frase, ninguém soube).
E foi este: que ela estava fazendo as suas orações sem se ajoelhar na cama! A
ignorância das crianças sobre as questões mais comuns de certo e errado é
realmente patética. No entanto, muito frequen-temente elas são tratadas como se
soubessem tudo sobre isso, porque “elas têm consciências”, como se a
consciência fosse algo mais do que um órgão espiritual esperando por direção!

Instruindo a consciência: gentileza
Que as crianças ajam mal intencionalmente, é um outro problema e, ai,
não requer prova. Tudo o que estou passando é a real necessidade que existe ali
de instruí-las no seu dever. E isso sem desorganização mesmo, mas regular e
progressivamente. Por exemplo, a gentileza é, diga-mos, o assunto de instrução
esta semana. Existe uma das conversas com a mãe que as crianças amam – uma
conversa curta é melhor – sobre genti-leza. Gentileza é amor, mostrando-se em
ato e palavra, olhar e maneira. Uma fonte de amor, fechada e escondida no
coração de um menininho, não faz ninguém muito bom. O amor tem de
borbulhar como a nascente, fluir num córrego e então é gentileza. Depois
seguirão curtas conversas diárias sobre modos gentis, para irmãos e irmãs, para
companheiros de brinca-deira, para pais, para amigos adultos, para criados, para
pessoas com dor e problema, para criaturas burras, para pessoas que não vemos,
mas podemos pensar nelas. Todos em angústia, o pagão. Dê à criança um
pensamento por vez e toda vez algum exemplo amável de gentileza de amor que
aquecerá o seu coração com o desejo de fazer semelhante.
Tome a parábola de Nosso Senhor do “bom samaritano[251]” como um
modelo de instrução na moral. Faça a história e a conversa tornarem as crianças
competidoras da virtude e então lhes dê o “Vai, e faze tu o mesmo.”, a lei. Tendo
lhes apresentado a ideia de gentileza em muitos aspectos, termine com a lei: seja
gentil, ou “Amai-vos mutuamente com afeição terna e fraternal[252].” Faça-as
saber que essa é a lei de Deus para crianças e para pessoas adultas. Agora, a
consciência está instruída, os sentimentos estão alistados no lado da
responsabilidade, e se a criança for educada para quebrar a lei da gentileza, uma
lei que ela conhece, a sua consciência a condenará. Não dê às crianças exemplos
dissuasivos de erro, por causa das tristes propensões da natureza humana, mas
sempre lhes conte sobre os belos “Feitos Dourados”, pequenos e grandes, que as
comoverão como chamadas de trombeta para a batalha da vida.

A consciência feita eficaz pela disciplina
Seja cortês, seja cândido, seja grato, seja atencioso, seja verda-deiro.
Existem aspectos do dever suficientes para ocupar a atenção da mãe e da criança
por todo dia da vida infantil. E o tempo todo a ideia de dever está sendo
formada, e a consciência está sendo educada e desenvolvida. Ao mesmo tempo,
a mãe exercita a vigilância amigável de um anjo da guarda, sendo vigilante, não
para pegar a criança tropeçando, mas para guiá-la na realização do dever que ela
já fez amavelmente aos seus olhos, pois é somente à medida que fazemos aquilo
que aprendemos a fazer que nos tornamos fortes no fazer. Conforme ela instrui o
seu filho no dever, ensina-o a escutar a voz da consciência como também a voz
de Deus: um “Faça isso.” ou “Não faça isso.” dentro do coração, a serem
obedecidos com plena garantia. Objeta-se que estamos tornando infalível não a
consciência divinamente implantada, mas a mesma consciência feita eficaz pela
disciplina. É assim mesmo. Em todo departamento da vida, físico ou espi-ritual,
o esforço humano parece ser a condição da energização divina. Tem de existir
um alongamento adiante de um braço murcho antes que ele receba força. E
temos todas as razões para acreditar que a consciência instruída, sendo fielmente
seguida, é divinamente iluminada.
3. A VIDA DIVINA NA CRIANÇA

“O próprio pulso da máquina”
É evidente que nós ainda não atingimos

“O próprio pulso da máquina[253]”

Hábitos, sentimentos, razão, consciência. Nós os seguimos nos intervalos
mais particulares da vida infantil. Um age sobre o outro, mas qual age sobre o
último? Qual age sobre eles todos? Diz um escritor que procurou nas coisas
profundas de Deus: “É por um Rei que os nossos espíritos pedem, a fim de guiá-
los, discipliná-los, uni-los um ao outro; dar-lhes uma vitória sobre si mesmos,
uma vitória sobre o mundo. É por um Sacerdote que os nossos espíritos pedem, a
fim de erguê-los acima de si mesmos ao seu Deus e Pai, para fazê-los
participantes da sua natureza, colegas de trabalho num testemunho autêntico de
que Ele é tanto o Sacer-dote quanto o Rei dos Homens.”

Os pais têm algum poder para entronar o Rei
Nós vimos que a consciência é eficaz somente à medida que é movida a
partir de dentro, a partir daquela mais interna câmara da Alma Humana, aquele
Santo dos Santos, os segredos que são conhecidos somen-te pelo Sumo
Sacerdote, que “não precisava que qualquer homem Lhe dissesse, pois Ele sabia
o que estava no homem.” No entanto, é necessário que reunamos as migalhas do
fato e inferência e colocamos em ordem esse conhecimento conforme o
tenhamos, pois as chaves mesmo dessa câmara mais interna estão colocadas nas
mãos dos pais, e é uma grande coisa no seu poder entronar o Rei, introduzir o
Sacerdote, pelo qual todo humano pede.

As funções e a vida da alma
Tomamos como garantido na fala comum que toda alma é uma “alma
viva”, uma alma completamente desenvolvida, completamente cres-cida. Porém
a linguagem da Bíblia e a da experiência geral parecem apon-tar para conclusões
surpreendentes. Foi dito sobre um grande poeta – com quanta justiça não é a
questão aqui – que, se pudéssemos supor que qualquer ser humano fosse feito
sem uma alma, ele seria uma tentativa abortiva, pois enquanto ele tivesse razão,
imaginação, paixões, todos os apetites e desejos de um ser inteligente, ele não
parecia exercer nenhuma das funções da alma. Ora, quais são essas funções, cuja
suspensão chama a própria existência da alma de um homem em questão? Temos
que voltar ao axioma de Agostinho: “A alma do homem é para Deus, como Deus
é para a alma.” A alma tem um apetite: pelas coisas de Deus. Respira um ar, o
hálito, o Espírito de Deus. Tem um desejo: o conhecimento de Deus. Somente
uma alegria: na face de Deus. “Eu quero viver na Luz de um Semblante que
nunca cessa de sorrir para mim” é a linguagem da alma. A ação direta da alma é
toda voltada a Deus, com uma ação reflexa em direção os homens. A fala da
alma é a oração e o louvor, a mão direita da alma é a fé, a luz da alma é o amor,
o amor de Deus derramado sobre ela. Observe que essas são as funções, essa, a
vida da alma, as únicas funções, a única vida que pode ter: se ela não as tiver,
não tem capacidade de se virar de lado e encontrar a “vida da sua mão” em
qualquer outro lugar. Como a consciência, a vontade, a razão, são ineficientes até
serem nutridas com a sua devida comida, exercitadas nas suas devidas funções,
assim também a alma. E a sua câmara é sombria, com portas com teia de aranha
e janelas turvas, até que desperte para a sua devida vida. Porém não muito vazia,
porque existe a alma nascente. E o despertar na vida acontece, às vezes com o
choque repentino, o milagre gracioso, que chama-mos conversão. Às vezes,
quando os pais querem, a alma da criança se expande com um crescimento
gentil, doce e um desdobramento gradual como o de uma flor. Existem almas
entorpecidas que, no entanto, estão vivas. Existem almas fracas, doentes, que no
entanto estão vivas. E existem almas que jamais se movimentam em direção a
Deus.

O que é a vida da alma?
Essa vida da alma, o que é? Vida comunicada, como quando alguém
acende uma tocha no fogo? Talvez, mas é algo mais íntimo, mais indizível: “Eu
sou a Vida.”, “Nele havia a vida, e a vida era a luz dos homens.”, “Permanecei
em mim e Eu permanecerei em vós.[254]” A verdade é tão inefável para ser
declarada em quaisquer palavras, salvo por aquelas dadas a nós. Mas significa
isto pelo menos: que a alma viva não habita sozinha no seu lugar. Esse lugar se
torna o templo do Deus vivo. “Em verdade, o Senhor está neste lugar, e eu não o
sabia! Quão terrível é este lugar![255]”

Os pais têm de apresentar a ideia de Deus à alma da criança
Mas esse único mistério, essa união e comunhão de Deus e da alma,
como pais humanos podem se atrever a se intrometer nisso? O que podem fazer?
Como podem promovê-la? E não há todos os riscos de que eles possam pôr mãos
rudes sobre a arca? Em primeiro lugar, não cabe aos pais escolher se tentarão ou
não apressar e nutrir essa vida divina no seu filho. Agir assim é o seu dever e
serviço obrigatórios. Se negligenciar ou falhar nisso, não tenho muita certeza do
quanto importa que tenham cumprido os seus deveres nas culturas física, moral e
mental do seu filho, exceto à medida que, conforme a criança esteja mais
ajustada no culto divino, a vida divina deva ser despertada nela. Porém o que os
pais podem fazer? Apenas isto e nada mais: podem apresentar a ideia de Deus à
alma da criança. Aqui, como por todo o seu universo, Deus Todo-Poderoso opera
por meios aparentemente inadequados. Quem diria que uma abelha pudesse
produzir macieiras? Entretanto, uma abelha voa de uma macieira cheia do pólen
das suas flores: isso ela inconscientemente deposita nos estigmas das flores da
árvore seguinte a que ela chegar. A abelha vai, mas o pólen permanece, mas com
toda a extensão do estilete entre ela e o óvulo imaturo abaixo. Isso não importa.
O óvulo não tem a capacidade de atingir o grão de pólen, mas este envia um tubo
delgado, dentro do tubo do estilete. O óvulo é atingido. Veja, então, o fruto, com
a sua semente, e, se gostar, as futuras macieiras! Aceite a parábola: os pais são
pouco melhores nesse assunto do que as abelhas desmioladas. É a sua função
depositar, por assim dizer, dentro do alcance da alma da criança alguma ideia
proveitosa de Deus. A alma imatura não faz nenhum esforço para essa ideia, mas
a Palavra viva alcança, toca a alma – e há vida, crescimento e beleza, flor e fruto.


Não têm de fazer esforços disparatados
Arrisco-me a lhe pedir para olhar, por uma vez, para esses misté-rios
divinos a partir do mesmo ponto de vista filosófico que tomamos a respeito de
todas as capacidades e funções da criança, em parte porque é instrutivo ver como
os mistérios da vida religiosa aparecem quando ela é olhada sem a sua própria
esfera; em parte porque eu desejo levantar, por etapas ininterruptas, à suprema
função dos pais na educação do seu filho. Pois aqui falha a semelhança da abelha
e da macieira. Os pais não têm de fazer esforços disparatados, tolos. Como esse
é o maior dever imposto a eles, é também o mais delicado. E eles terão a
necessidade infinita de fé e oração, tato e critério, humildade, gentileza, amor e
juízo sãos, se quise-rem apresentar o seu filho a Deus e o pensamento Deste à
alma daquele.

Deus apresentado às crianças como um exator e pu-nidor
Foi bem dito: “Se pensarmos em Deus como um exator e não um
doador, exatores e não doadores nós nos tornaremos.” No entanto, não é esta a
luz na qual Deus é mais comumente posto diante das crianças: um faraó
exigindo a sua história de tijolos, tijolos de bom comportamento e ação correta?
Os pais deliberadamente não apresentam Deus como um exator, para apoiar a
fragilidade do seu próprio governo? E eles não declaram livremente, por parte de
Deus, ameaças que eles relutariam em declarar por sua própria parte? Ainda, que
criança não ouviu da sua cuidadora isto, proferido com muita energia: “Deus não
o ama, seu menino malcriado! Ele o enviará ao lugar ruim!” E esses dois
pensamentos de Deus, como um exator e um punidor, criam, com suficiente
frequência, toda a ideia que a pobre criança tem do seu Pai no céu. Que fruto
pode vir disso senão aversão, o afastamento da criança do rosto do seu Pai? E se,
em vez disso, fosse-lhe dado o pensamento bem expresso nas palavras “A
gentileza de Deus que perdoa tudo”?

Os pais têm de selecionar ideias inspiradoras
Esses são apenas dois dos muitos pensamentos dissuasivos de Deus
comumente apresentados à tenra alma. E a mãe, que percebe que o coração do
seu filho pode estar irrevogavelmente virado contra Deus pelas ideias Dele
absorvidas na pré-escola, sentirá a necessidade de pensamento sério e cuidadoso
e resolução definida, quanto a qual ensinamento o seu filho receberá sobre esse
assunto importantíssimo. Provavelmente, ela proibirá qualquer menção do Nome
Divino às crianças, exceto pelos seus pais, explicando ao mesmo tempo que faz
isso porque se preocupa muito com que os seus filhos não tenham senão os
pensamentos certos sobre esse grande assunto. É melhor que as crianças recebam
algumas ideias vitais para que as suas almas possam crescer do que uma grande
quantidade de ensino indefinido.

Temos que ensinar somente o que sabemos
Como selecionar alguns pensamentos despertadores do Deus infinito? A
seleção não é tão difícil de fazer como pareceria à primeira vista. Em primeiro
lugar, temos que ensinar aquilo que sabemos, sabemos pela vida da alma, não
com qualquer conhecimento simples da mente. Agora, da vasta massa das
doutrinas e preceitos da religião, descobriremos que existem somente poucas
verdades vitais que tomamos no nosso ser de maneira que vivemos nelas: essa
pessoa, essas verdades; aquela pessoa, aquelas verdades; alguns de nós, não mais
do que uma verdade simples. Uma ou mais, essas são as verdades que temos que
ensinar às crianças, porque elas virão diretamente dos nossos corações com o
entusiasmo da convicção que raramente falha em levar a sua própria ideia à vida
espiritual de uma outra pessoa. Não existe fonte mais frutífera do que seja muito
para descrever a infidelidade infantil do que as palavras mortas irreais que são
postas sobre as crianças sobre as melhores coisas, com uma solenidade artificial
de tom e maneira intencionada a construir pela falta de significado vivo nas
palavras. Deixe que os pais que conhecem somente uma coisa a partir de cima
ensinem ao seu filho aquela coisa. Chegará mais a ela quando a criança estiver
pronta para mais.

Ajuste e ideias vitais
Ainda, existem algumas ideias da vida espiritual mais apropriadas do
que outras para a vida e necessidades da criança. Assim, Cristo, o doador de
Alegria, é mais para ela do que Cristo, o Consolador.
E existem algumas ideias que são como o pão do dia a dia da alma, sem as
quais a vida e o crescimento são impossíveis. Todos os outros ensinamentos
podem ser adiados até que as necessidades da criança a levem a eles. Porém
quem quer que envie o seu filho à vida sem essas ideias vitais da vida espiritual
o envia adiante com uma alma dormente, ainda que possa ser bem instruído em
teologia.

O conhecimento de Deus distinto da moralidade
Ainda, o conhecimento de Deus é distinto da moralidade, ou o que as
crianças chamam de “ser bom”, embora “ser bom” decorra desse conheci-mento.
Mas faça-os vir na sua ordem certa. Não pregue à criança até o aborrecimento
sobre “ser boa” como aquilo que ela deve a Deus, sem deixar primeiro sobre ela
um pouco daquele conhecimento que a tornará boa.
Não estamos mais sofrendo um embaraço de riquezas. Essas limitações
fecham tanto o ensino comum sobre as coisas divinas que a questão se torna
mais “O que ensinaremos?” do que “Como escolheremos?”.

Os momentos e o modo da instrução religiosa
As próximas considerações que pesarão sobre a mãe são as dos
momentos e o modo desse ensino nas coisas de Deus. É melhor que esses
ensinamentos sejam raros e preciosos do que frequentes demais e levemente
valorizados. Melhor do que aquele que a criança deve ser enchida com a simples
vista do alimento espiritual, rudemente servido. Ao mesmo tempo, ela tem de ser
fortalecida na fé, e as suas aulas devem ser regulares e progressivas. E aqui tudo
depende do tato da mãe. O ensinamento espiritual, como o odor soprado das
flores, depende de que maneira o vento sopra. De vez em quando, ocorre um
momento sagrado, sentido como sagrado pela mãe e pela criança, quando as
duas estão juntas: esse é o momento para uma palavra profundamente sentida e
suavemente falada a respeito de Deus, conforme a ocasião surgir. Poucas
palavras precisam ser ditas. Nenhuma exortação mesmo. Apenas o lampejo da
convicção da alma da mãe à alma da criança. O “Pai Nosso” é o pensamento
posto assim sobre a alma da criança? Talvez não haverá mais do que um
encontro simpático de olhos de hoje em diante, entre a mãe e a criança, sobre
milhares de mostras do amor do “Pai Nosso”. Mas a ideia está crescendo,
tornando-se parte da vida espiritual da criança. Isso é tudo: nenhuma rotina de
ensinamento espiritual. Um medo de muitas palavras, que podem abafar o fogo
da vida sagrada. Muita autolimitação mostrada ao permitir que oportunidades
aparentes passem. E o tempo todo, o propósito mais ansioso de coração, e um
esquema definido para a edificação da criança na fé. Não é preciso acrescentar
que, para fazer um outro uso das palavras de Nosso Senhor, “Essa espécie não se
pode expulsar senão pela oração[256].” É como se a mãe obtivesse sabedoria
liberalmente de cima, de modo que ela seja habilitada para essa tarefa divina.

A leitura da Bíblia
Uma palavra sobre a leitura da Bíblia. Eu acho que nós cometemos um
erro ao enterrar o texto embaixo dos nossos comentários e aplicações sem fim.
Além disso, eu duvido que pegar versos individuais e triturá-los na criança até
que cessem de ter qualquer significado para ela não seja nada senão um
impedimento à vida espiritual. A Palavra é cheia de força vital, capaz de aplicar-
Se. Uma semente, leve como lanugem de cardo, soprada na alma da criança terá
raízes para baixo e gerará fruto para cima. O que se exige de nós é: que
implantemos um amor à Palavra; que os momentos mais deliciosos do dia da
criança sejam aqueles quando a sua mãe lê para ela, com doce simpatia e santa
alegria na voz e nos olhos, as lindas histórias da Bíblia; e de vez em quando na
leitura ocorrerá uma daquelas convicções, passando da alma da mãe à alma da
criança, na qual está a vida do Espírito. Deixe que a criança cresça, para que

“Novos pensamentos de Deus, novas esperanças do céu[257]”

sejam uma alegria para ela também. Coisas a serem contadas primeiro entre as
bênçãos de um dia. Acima de tudo, não leia a Bíblia para a criança, não deixe
que quaisquer palavras das Escrituras sejam ocasiões para condená-la à forca por
suas falhas. É a função do Espírito Santo converter do pecado, e Ele é capaz de
usar a Palavra para esse propósito, sem o risco daquele endurecimento de
coração no qual resultam frequente-mente os nossos negócios desajeitados.
O conteúdo para esse ensino das coisas divinas virá de todas as convicções
próprias da mãe. Eu tentarei falar somente de uma ou duas daquelas verdades
vitais sobre as quais a vida espiritual tem de se sustentar.
Pai e Doador
“Pai nosso, que estais no céu,” talvez seja a primeira ideia de Deus que
a mãe apresentará ao seu filho: Pai e Doador, de quem vem diretamente toda a
alegria de todo dia. “Que aniversário feliz o nosso Pai deu ao meu menininho!”,
“As flores estão vindo de novo. O nosso Pai cuidou da vida das plantas por todo
o inverno frio!”, “Escute a cotovia! É uma maravilha como o nosso Pai pode pôr
tanta alegria no coração de um passarinho.”, “Graças a Deus por fazer a minha
menininha tão contente e feliz!” Desse pensamento, vem a oração, a declaração
livre do coração da criança, mais frequentemente em agradecimento, pelos
menininhos, dos dias contados do que no desejo. As palavras não importam.
Qualquer forma simples que a criança possa entender funcionará. O
levantamento em direção a Deus do coração infantil é a verdadeira oração. O
dever também vem desse pensamento: o feliz reconhecimento da dívida de culto
e obediência a um Pai tão gracioso e benigno. Não Aquele que extorque culto na
ponta da espada, por assim dizer, mas Aquele a quem os Seus filhos correm para
obedecer.

A essência do Cristianismo é a lealdade a uma Pessoa
Cristo, o nosso Rei. Eis um pensamento para abrir as fontes do amor e
da lealdade, os tesouros da fé e da imaginação, atados à criança. A própria
essência do Cristianismo é a lealdade pessoal, lealdade ardente ao nosso
adorável Chefe. Nós assentamos outros fundamentos: regeneração, sacramentos,
justificação, obras, fé, a Bíblia, qualquer um deles, ainda que necessário à
salvação no seu devido lugar e proporção, pode se tornar uma religião sobre
Cristo e sem Cristo. E agora nos chegou um tempo de peneiração, e pessoas
sérias recusam conhecer qualquer coisa acerca dos nossos sistemas religiosos.
Eles escrevem todas as nossas crenças orto-doxas como coisas não
reconhecíveis. Talvez isso aconteça por causa de, ao pensar muito sobre a nossa
salvação, termos apagado a vista de nosso Rei, o fato divino que nenhuma alma
de homem a quem ela é apresentada pode ignorar. Na ideia de Cristo, está a vida.
Faça o pensamento Dele entrar em contato uma vez com a alma e ela se ergue,
um poder vivo, independente de todos os formulários do cérebro. Vamos salvar o
Cristianismo para as nossas crianças levando-as à fidelidade a Cristo, o Rei.
Como? Como os antigos cavaleiros criavam filhos e filhas, na lealdade e
reverência arden-tes por príncipes não muito dignos? Os seus próprios corações
estavam cheios disso. Os seus lábios falavam disso. Os seus atos proclamavam
isso. O estilo das suas roupas, o anel das suas vozes, a carruagem das suas
cabeças: tudo era uma proclamação de devoção sem limites ao seu rei e à sua
causa. Aquela guerra civil, qualquer outra coisa que fez, ou deixou de fazer,
deixou uma parábola para o povo cristão. Se um príncipe Stuart pudesse
comandar tal medida de lealdade, que diríamos do “Chefe entre dez mil, o
completamente amável”?
Jesus, o nosso Salvador. Aqui está um pensamento a ser provocado
ternamente diante da criança nos momentos de miséria que seguem a ação
errada.
– Meu pobre menino, você foi muito malcriado hoje! Você poderia
evitar isso?
Com soluço:
– Não, mãe.
– Suponho que não, mas existe um jeito de ajudar.
E então a mãe conta ao filho como o Senhor Jesus é o nosso Salvador,
porque Ele nos salva dos nossos pecados. É uma questão duvi-dosa quando a
criança aprenderá primeiro a “História da Cruz”. Pensa-se que seria muito
deleitável iniciar com Moisés e os profetas: passar pela história do Antigo
Testamento, traçando o desdobramento gradual da obra e caráter do Messias; e
depois, quando as suas mentes estiverem cheias da expectativa dos judeus, levar
a elas o mistério do Nascimento em Belém, a humilhação da Cruz. Mas talvez
nenhum ganho no frescor da apresenta-ção funcionasse para as crianças por não
terem crescido com as associa-ções do Calvário e Belém sempre presentes nas
suas mentes. Uma coisa nesse sentido: não é bom conceder às crianças uma
familiaridade descui-dada com o Nome de Jesus ou o uso de hinos cujo tom não
seja reverente. “Vós me chamais Mestre e Senhor e dizeis bem, porque Eu o
sou[258].”
A habitação de Cristo é um pensamento particularmente ajustado para as
crianças, porque a sua grande fé não pisa em falso no mistério, a sua imaginação
salta prontamente à maravilha de que o próprio Rei habite no coração de uma
criancinha. “Como saberei que Ele virá, mãe?”. “Quando você for bem gentil,
doce e feliz, é porque Cristo está dentro.


E quando Ele vier, ele fará o seu rosto tão bom,
Os seus amigos estarão felizes e dirão: ‘O Rei está lá[259].’”

Eu não tentarei indicar mais nenhuma das verdades vitais que a mãe cristã
apresentará à criança, tendo paciência até que elas floresçam e se nutram, e a sua
alma será um jardim muito frutífero que o Senhor terá abençoado. Mas mais uma
vez: “Essa espécie não se pode expulsar senão pela oração.”



























APÊNDICE

QUESTÕES PARA USO DOS ESTUDANTES


PARTE I

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

1. Mostre que as crianças são um bem público. Qual a consequência?
2. Que questões Pestalozzi coloca para as mães?
3. Qual é o argumento do Sr. Herbert Spencer para o estudo da edu-
cação?
4. Como os pais geralmente procedem?
5. Qual é a parte árdua do trabalho dos pais?

1. UM MÉTODO DE EDUCAÇÃO

1. Compare quatro ou cinco teorias mais antigas com posteriores e
talvez noções mais seguras.
2. Aponte características opostas de um sistema e de um método.
3. Por que um sistema é tentador para os pais?

2. A HERANÇA DA CRIANÇA

1. Os que os dizeres do Evangelho indicam sobre as crianças?
2. Quais são os três mandamentos do código de educação do Evan-
gelho?

3. OFENDENDO AS CRIANÇAS

1. Distinga “ofender” de “desprezar” crianças.
2. O que deve ser dito dos pais cujos filhos não têm “senso de dever”?
3. Trace os passos pelos quais o “não” de uma mãe chega a ser igno-
rado.
4. Por que os próprios pais têm de ser impelidos pela lei?
5. Mostre que os pais podem ofender os seus filhos ignorando as leis
da saúde.
6. Ignorando as leis da vida intelectual.
7. Da vida moral.

4. DESPREZANDO AS CRIANÇAS

1. Mostre que as crianças podem ser desprezadas na escolha de uma
cuidadora.
2. Por tomar as suas falhas muito levemente.

5. ATRAPALHANDO AS CRIANÇAS

1. De que maneiras os pais podem atrapalhar o acesso dos seus filhos a
Deus?

6. CONDIÇÕES DA ATIVIDADE CEREBRAL SAUDÁVEL

1. Qual é a primeira condição da educação bem-sucedida?
2. Mostre que esforços diários, intelectuais, morais e físicos são ne-
cessários para as crianças.
3. Sobre que princípio é regulado o fornecimento de sangue?
4. Mostre a importância do descanso após as refeições.
5. Qual é a melhor hora para as aulas? Por quê?
6. Sobre que princípio um horário deve ser arrumado?
7. Mostre que a atividade cerebral é afetada pela alimentação.
8. Sob que condições a comida aumenta a qualidade vital do sangue?
9. Por que a comida tem de ser variada?
10. Mostre por que as crianças são gastadoras de vitalidade.
11. Dê algumas dicas úteis a respeito das refeições.
12. Por que deve haver conversa nas refeições?
13. Dê algumas regras para assegurar a variedade.
14. Mostre que o ar é tão importante quanto a comida.
15. O que você tem a dizer sobre a caminhada diária das crianças?
16. O que significa a oxigenação do sangue?
17. Mostre que o oxigênio tem as suas limitações.
18. Quais são os perigos de um ar não modificado em salas espaçosas?
19. “Eu alimento a Alice com chá de carne.” Por quê?
20. E quanto à mente da Alice?
21. Quais são as alegrias de Lucy de Wordsworth?
22. Mostre o perigo de salas abafadas.
23. Que princípio tem de regular a ventilação?
24. Por que o ar da noite é saudável?
25. A necessidade de luz solar depende de que fatos físicos?
26. Mostre que a pele faz muito trabalho de limpadora.
27. Por que pessoas morrem de escaldadura ou queimas externas?
28. Por que um banho diário é necessário?
29. Dê algumas instruções sobre vestir crianças.

7. “O REINO DA LEI” NA EDUCAÇÃO

1. Qual deve ser o método de toda educação?
2. Por que o senso comum e as boas intenções não são suficientes?
3. Como podemos encontrar o perigo à religião o qual surge de vidas
inocentes de algumas pessoas não religiosas?
4. Relate a moralidade superior desses não crentes.
5. Mostre que todo cumprimento da lei traz a sua recompensa.
6. Mostre que os pais não devem colocar dificuldades críticas aos seus
filhos.
7. Por que os pais devem estudar ciência mental e moral?















PARTE II

VIDA FORA DE CASA PARA AS CRIANÇAS

1. TEMPO DE CRESCIMENTO

1. Por que a vida fora de casa para crianças novas é especialmente
importante nestes dias?
2. Quais são os ganhos das refeições fora de casa?
3. O que pode ser realizado por habitantes em cidades e periferias?
4. Quais cinco ou seis pontos devem ser lembrados num dia ao ar
livre?
5. E quanto a livros de história ou a contar histórias nessas ocasiões?
6. E quanto ao “bebê”?

2. “PASSEIO TURÍSTICO”

1. Dê um exemplo de “passeio turístico”.
2. Quais cinco ou seis usos educacionais podem ser feitos do “passeio
turístico”?
3. Mostre o valor de discriminar a observação.

3.“PINTURA DE IMAGEM”

1. O que significa “pintura de imagem”?
2. Dê um exemplo.
3. Mostre o valor desse exercício.
4. Que cuidado tem de ser mantido em mente?
5. Que hábito inestimável essa brincadeira tende a formar?
6. Qual é o papel da mãe nessa brincadeira?
7. Qual é a recompensa depois de se esforçar no ato de ver?

4. FLORES E ÁRVORES

1. Com que colheitas de campo as crianças podem se familiarizar na
sua vizinhança?
2. O que uma criança deve saber sobre qualquer flor selvagem da sua
vizinhança?
3. Como as crianças devem fazer o estudo das árvores?
4. Mostre como as estações devem ser seguidas nesse estudo.
5. O que Leigh Hunt diz sobre flores?
6. Que uso deve ser feito de calendários e cadernos?
7. E quanto à criança que diz “Não consigo parar de pensar.”?

5. “CRIATURAS VIVAS”

1. Que parte do prazer nas criaturas vivas pode ser assegurada para os
habitantes da cidade?
2. De quais “criaturas” as crianças podem observar os hábitos?
3. Que pontos sobre um inseto as crianças devem observar?
4. Como White of Selborne e Audubon conseguiram a sua tendência
para a natureza?
5. O que as crianças da cidade podem fazer ao conseguir um conheci-
mento das “criaturas vivas”?
6. Mostre que o conhecimento da natureza é o mais importante para as
crianças novas.
7. Que capacidades intelectuais são treinadas na criança naturalista?
8. Mostre que o trabalho da natureza é especialmente valioso para
meninas.

6. HISTÓRIAS TRADICIONAIS DO CAMPO E LIVROS DE NATU-
RALISTAS

1. Deve-se ensinar às crianças os elementos da ciência natural?
2. Mostre o valor das classificações irregulares.
3. Compare-as com as classificações estudadas nos livros.
4. Quais são os usos dos livros dos naturalistas?
5. Nomeie alguns.
6. Por que as mães e os professores devem ter algum conhecimento da
natureza?




7. A CRIANÇA OBTÉM CONHECIMENTO MEDIANTE OS SEUS
SENTIDOS

1. A partir do comportamento de um bebê, mostre que uma criança
obtém conhecimento mediante os seus sentidos.
2. Caracterize o ensino da Natureza.
3. Onde está o perigo da pressão excessiva?
4. Por que as aulas práticas são ineficientes?
5. Por que a criança aprende mais a partir das coisas?
6. Dê alguns exemplos mostrando que um senso de beleza vem a partir
do primeiro contato com a natureza.
7. O que Dickens diz sobre o assunto das capacidades de observação
de uma criança?

8. A CRIANÇA DEVE SE FAMILIARIZAR COM OBJETOS NATU-RAIS

1. Compare a cidade e o campo com relação às coisas dignas de obser-
vação.
2. Como afeta a educação o fato de que todo objeto natural é um
membro de uma série?
3. “O poder passará mais e mais para as mãos dos cientistas”. Como
isso influencia pais e professores?
4. De que maneiras a intimidade com a natureza se dirige ao bem-estar
pessoal?

9. GEOGRAFIA FORA DE CASA

1. Mostre que coisas pequenas podem sugerir coisas grandes na
geografia pictórica.
2. O que se deve ensinar às crianças para observarem a posição do sol?
3. E quanto às nuvens, chuva, neve e granizo?
4. Mostre como, compassadamente, uma criança deve ter a ideia de
distância.
5. Qual é o primeiro passo para um conhecimento de direção?
6. Que prática uma criança deve ter ao encontrar a direção?
7. Que compasso você lhe daria?
8. Como uma criança deve ter a noção de fronteiras?
9. Quando ela deve começar a fazer “planos”?
10. Que ideias geográficas ela deve obter a partir da sua própria
vizinhança?

10. A CRIANÇA E A MÃE NATUREZA

1. Por que a mãe tem de se refrear de muita conversa?
2. Como um novo conhecimento começou?
3. Quais são as duas coisas permitidas à mãe?

11. JOGOS FORA DE CASA ETC.

1. Por que a aula de francês não deve ser omitida?
2. Por que as crianças se saciam em gritos e berros fora de casa?
3. Como as rodas devem ser preservadas?
4. Quais são as melhores formas de pular corda e jogar peteca?
5. O que deve ser dito sobre escalada?
6. E quanto ao vestuário?

12. CAMINHADAS EM TEMPO RUIM

1. Por que as caminhadas de inverno são tão necessárias quanto as de
verão?
2. Que prazeres são ligados à geada e à neve?
3. Como as crianças podem ser mantidas alertas em dias tediosos?
4. Como o inverno se empresta à observação?
5. Por que longas caminhadas a pé em clima úmido são saudáveis e
necessárias?
6. Que tipo de roupas exteriores é necessário? Por quê?
7. Que precauções devem ser mantidas em mente?

13. VIDA DE “ÍNDIO PELE-VERMELHA”

1. O que você entende por “escotismo”? Mostre-lhe o valor.
2. Descreva uma perseguição a pássaros.
3. De que maneiras essas coisas devem proporcionar formação?
14. AS CRIANÇAS EXIGEM AR DO CAMPO

1. Como a proporção essencial de oxigênio pode ser diminuída?
2. Como o excesso de gás carbônico é produzido?
3. Por que as crianças, especialmente, precisam de ar não viciado, não
empobrecido?
4. Mostre que as crianças exigem luz solar.
5. Descreva um ideal físico para uma criança e mostre o uso de ter
esse ideal.





























PARTE III

“O HÁBITO SÃO DEZ NATUREZAS”

1. A EDUCAÇÃO BASEADA NA LEI NATURAL

1. Mostre que um cérebro saudável e uma vida fora de casa são
condições de educação.
2. Mostre que o hábito é o instrumento pelo qual os pais trabalham.

2. AS CRIANÇAS NÃO TÊM PODER DE SE AUTOCONVENCER

1. Mostre que a educação é comumente uma rua sem saída.
2. Nomeie três grandes forças educacionais.
3. Por que essas forças não são suficientes?
4. Por que as crianças são incapazes de esforço constante?
5. Por que as crianças novas devem ser, em alguma medida, preser-
vadas do esforço de decisão?

3. O QUE É A “NATUREZA”?

1. O que podemos declarar sobre a criança como um ser humano?
2. Mostre que todas as pessoas nascem com os mesmos desejos
primários.
3. E afeições.
4. Nomeie os afetos comuns a todos nós.
5. O que a noção mais elementar de natureza humana inclui?
6. O que você tem a dizer sobre a força da natureza mais a heredita-
riedade?
7. Que espécies de diferenças as condições físicas podem acarretar?
8. A natureza humana é cálculo do quê?
9. Por que a criança não tem de ser deixada à sua natureza humana?
10. Qual é o problema diante do educador?
11. Mostre que a graça divina opera sobre as diretrizes do esforço
humano.
12. Por que a confiança dos pais não tem de ser indiferente?

4. O HÁBITO PODE SUPLANTAR A “NATUREZA”

1. Mostre que o hábito se relaciona com as diretrizes da Natureza.
2. Como o hábito tem de funcionar para ser uma alavanca?
3. Mostre que uma mãe forma os hábitos dos seus filhos involuntaria-
mente.
4. Exemplifique o fato de que o hábito pode forçar a natureza a novos
canais.
5. Para qual fim os pais e professores têm de entregar as diretrizes do
hábito?

5. A COLOCAÇÃO DE DIRETRIZES DE HÁBITO

1. Mostre que os pais iniciam os hábitos de pensamento e sentimento
dos seus filhos pelo seu próprio comportamento.
2. A educação no hábito interfere no livre-arbítrio?
3. Mostre quão bom é que o hábito governe os nossos pensamentos.
4. Mostre que o hábito é poderoso mesmo quando a vontade decide.

6. A FISIOLOGIA DO HÁBITO

1. Exemplifique o fato de que tecidos crescentes se formam aos modos
de ação exigida deles.
2. Mostre completa e exatamente por que as crianças devem apren-der
a dançar, a nadar etc., numa idade nova.
3. A força dos hábitos morais é devida provavelmente a qual fato?
4. Mostre o perigo de sequências de pensamentos persistentes.
5. O que a regeneração incessante do tecido cerebral implica para o
educador?
6. Mostre que adquirir ação reflexa artificial em certas direções é uma
grande parte da educação.
7. Quais são as metas da educação intelectual e moral?
8. Mostre que o caráter é afetado pela modificação adquirida do tecido
cerebral.
9. Mostre a necessidade de cuidado com relação a influências
externas.

7. A FORMAÇÃO DE UM HÁBITO – “FECHE A PORTA ATRÁS DE
VOCÊ”

1. O que resta ser tentado quando nem o tempo, a recompensa ou a
punição são eficientes ao curar um mau hábito?
2. Mostre que o hábito é um deleite em si mesmo.
3. Mostre que a simpatia equivocada é um obstáculo na formação dos
hábitos.
4. Quais são as qualidades necessárias na mãe que formaria hábitos
nos seus filhos?
5. Quais são os estágios na formação de um hábito?
6. Qual é o estágio perigoso?

8. “HÁBITOS” INFANTIS

1. Mostre a necessidade de limpeza no quarto de criança.
2. Como a limpeza, a ordem etc., educam uma criança?
3. Por que a formação de um nariz sensitivo é uma parte importante da
educação?
4. Por que as cuidadoras devem saber que o bebê é onipresente?
5. Mostre que a limpeza pessoal deve ser um hábito inicial.
6. Como os pais podem abordar os assuntos de modéstia e pureza?
7. Mostre como o hábito de obediência e o senso de honra são salva-
guardas.
8. Que modo de vida é a melhor salvaguarda?
9. Dê algumas sugestões com relação à “ordem” no quarto de criança.
10. Mostre como e por que a criança de dois anos deve guardar os seus
brinquedos.
11. Distinga entre limpeza e ordem.
12. Que ocasiões existem para a regularidade com uma criança?
13. Mostre que a irregularidade conduz à autoindulgência.

9. EXERCÍCIOS FÍSICOS

1. Mostre a importância de exercícios físicos diários.
2. Que qualidades morais aparecem em movimentos de alerta?
3. Sugira uma repetição de boas maneiras.
4. Como você treinaria o ouvido e a voz?
5. Como o hábito da música pode ser cultivado?
6. Mostre que a mãe que forma hábitos pode deixar os seus filhos
sozinhos.


































PARTE IV

ALGUNS HÁBITOS DA MENTE – ALGUNS HÁBITOS MORAIS
1. O que um conhecimento da ciência da educação pode efetuar?
2. Mostre que a educação do hábito favorece uma vida fácil.
3. Mostre como os trabalhos da mãe são facilitados pelo fato de que a
formação dos hábitos se torna um hábito.
4. Exemplifique alguns hábitos inspirados na atmosfera caseira.

1. O HÁBITO DA ATENÇÃO

1. Por que o hábito da atenção é de importância suprema?
2. Exemplifique mentes à mercê de associações.
3. A partir da literatura do hábito, dê exemplos de dispersar a atenção.
4. Onde está o prejuízo da atenção dispersa?
5. Como o hábito da atenção pode ser cultivado na criança?
6. Como você cultivaria atenção às aulas?
7. Que princípios ajudam o professor a fazer aulas atrativas?
8. Mostre o valor do trabalho definido num dado tempo.
9. Sobre que princípio um horário tem de ser esquematizado?
10. Qual é a recompensa natural da atenção nas aulas?
11. O que deve ser dito pela e contra a competição?
12. Qual é o risco de empregar a afeição como um motivo?
13. Mostre que a atratividade do conhecimento é um motivo suficiente
para o aprendiz.
14. O que é a atenção?
15. Como você induziria a atenção autopersuadida?
16.
Qual é o segredo da pressão excessiva?
17.
Como os pais podem ser úteis na tarefa de casa do estudante?
18.
Descreva um tratamento domiciliar saudável para o “devaneio”.
19.
O que você tem a dizer sobre a disciplina das consequências?
20.
Mostre que as recompensas e as punições devem ser consequências
de condutas relativas em vez de naturais.
21. Distinga entre as consequências naturais e educativas.


2. OS HÁBITOS DE APLICAÇÃO ETC.

1. Como o esforço mental rápido pode ser assegurado?
2. Como o zelo pode ser estimulado?

3. O HÁBITO DE PENSAR

1. Dê o exemplo do pensamento citado.
2. Que operações estão inclusas no “pensar”?

4. O HÁBITO DE IMAGINAR

1. Qual é o duplo perigo de muitos livros ministrando o sentido do
incongruente?
2. Mostre que histórias triviais não deixam nada para a imaginação.
3. De que maneira histórias da imaginação proporcionam uma segun-
da vida às crianças?
4. Mostre que podemos ter grandes concepções somente à medida que
temos imaginação.
5. A imaginação cresce sobre o quê?
6. Que aulas devem alimentar a imaginação?
7. Por quê?
8. Mostre o valor educativo dos livros de histórias certos.
9. Como você promoveria o hábito de pensar?

5. O HÁBITO DE LEMBRAR

1. Distinga entre lembrar e rememorar.
2. Descreva o que é chamado aqui de uma memória “espúria”.
3. Qual a consequência do fato de que a memória é um registro na
substância cerebral?
4. Feito sob que condições?
5. Mostre que a rememoração depende da lei ou da associação de
ideias.
6. Qual é a condição para rememorar um curso de aulas?
7. Dadas quais condições podemos dizer que não existe limite para a
capacidade de gravar do cérebro?
8. Mostre que ligações de associação são uma condição de rememo-
ração. Onde elas devem ser descobertas?

6. O HÁBITO DA EXECUÇÃO PERFEITA

1. Qual erro nacional nos afasta do esforço de dar perfeição a tudo o
que fazemos?
2. Mostre o perigo do hábito de produzir uma obra imperfeita.
3. Como uma criança pode ser ensinada a executar perfeitamente?

7. ALGUNS HÁBITOS MORAIS

1. Qual é todo o dever de uma criança?
2. Qual é o estado oposto à obediência?
3. Mostre que os pais não têm direito de se abster da obediência.
4. Qual é o verdadeiro motivo para a obediência?
5. Relate o fato de que crianças criadas estritamente são frequente-
mente malsucedidas.
6. Por que pais e professores podem esperar obediência?
7. Como as crianças podem ser educadas a “fazer conforme
escolherem”?
8. Que espécie de obediência é de valor duradouro para a criança?
9. Como as crianças podem ser formadas para a liberdade?

8. VERACIDADE

1. Quais são as causas da mentira?
2. Mostre que todos os tipos de mentira são viciosas.
3. Como é isso que só um tipo é prejudicial às crianças?
4. Como você formaria uma criança na declaração com precisão?
5. Como você lidaria com o exagero?
6. Com embelezamentos ridículos?
7. Mostre que a reverência, a consideração etc., reclamam atenção es-
pecial nestes dias.
8. O temperamento nasce numa criança?
9. Mostre que não o temperamento, mas a tendência “nasce”.
10. Como os pais têm de corrigir essa tendência?
11. Mostre completamente a eficácia de mudar os pensamentos da
criança.
12. Distinga entre mudar os pensamentos de uma criança e trans-mitir-
lhe o pensamento que você pretende que ela pense.


































PARTE V

AULAS COMO INSTRUMENTOS DE EDUCAÇÃO

1. A MATÉRIA E O MÉTODO DA AULAS

1. Discuta a afirmação “Esta é uma ‘era de pedagogia’”.
2. Por que os pais têm de refletir sobre o assunto da instrução?
3. Mostre que a casa é a melhor base de crescimento para crianças
novas.
4. Por que uma mãe tem de ter visões definidas?
5. Quais são as três questões para a mãe?
6. Mostre que as crianças aprendem a crescer.
7. Mostre que qualquer tratamento do material do conhecimento é
desnecessário para uma criança saudável.
8. O que é uma ideia?
9. Mostre que uma ideia se alimenta, cresce e produz.
10. O que o Sr. Walter Scott e George Stephenson faziam cada um com
uma ideia?
11. Mostre o valor das ideias dominantes.
12. Por que as aulas têm de fornecer ideias?
13. Que qualidade de conhecimento as crianças devem ter?
14. Qual é o mal do “conhecimento diluído”?
15. Exemplifique a capacidade de uma criança de ter conhecimento (Dr.
Arnold).
16. Qual é o dano dos livros didáticos com imagens bonitas e falas
fáceis?
17. Quais são os quatro testes que devem ser aplicados às aulas das
crianças?
18. Faça um resumo de seis pontos já considerados.

2. O JARDIM DE INFÂNCIA COMO UM LUGAR DE EDUCAÇÃO

1. Mostre que a mãe é a melhor professora de jardim de infância.
2. Como a criança pode obter educação da sua vida diária a partir da
pré-escola?
3. Mostre que a busca da criança por conhecimento real pode ser
impedida pela professora do jardim de infância.
4. Mostre que um olho justo e uma mão fiel podem ser formados em
casa.
5. Em que aspectos a professora do jardim de infância dá uma dica da
disciplina devida para a pré-escola?
6. Que temperamento deve ser cultivado na pré-escola?
7. A que conclusão geral podemos chegar quanto aos princípios e
práticas do jardim de infância?

3. MAIS CONSIDERAÇÕES SOBRE O JARDIM DE INFÂNCIA

1. Que anedota de criança é citada a partir da Infância, Adolescência e
Juventude de Tolstói?
2. Por que histórias como A História de uma Criança da Srtª. Deland
são valiosas?
3. O que devemos a Froebel?
4. O que podemos aprender da verdadeira professora do jardim de
infância?
5. Comente sobre “As pessoas não crescem num jardim.”
6. Mostre que nós temos que deixar oportunidade para o trabalho da
natureza na educação.
7. Dê exemplos mostrando a inteligência das crianças.
8. Relate o prazer que as crianças têm nos jogos do jardim de infância.
9. De que maneiras os professores mediam muito?
10. Mostre o perigo do magnetismo pessoal no professor.
11. Mostre completamente que o nome “jardim de infância” implica
uma falsa analogia.
12. O que pode ser dito com relação às “brincadeiras maternas” de
Froebel?
13. A sociedade de um grande número de seus iguais em idade é o
melhor para uma criança nova?
14. Mostre o perigo de suplantar a natureza.
15. O que você diria com relação à importância da iniciativa pessoal?
16. De que maneiras os pais e professores têm de semear oportuni-
dades?
17. “Somente” as crianças têm proveito do jardim da infância?
18. De que maneiras se deve permitir às crianças alguma ordem nas
suas vidas?
19. Dê algumas das aulas que podemos aprender a partir da
autobiografia de Helen Keller.
20. A quais conclusões a Srtª. Sullivan, professora de Helen Keller,
chega com relação aos sistemas de educação?
21. Relate o sucesso do jardim de infância no Estados Unidos.
22. Que mudanças o Sr. Thistleton Mark observa?
23. Dê alguns comentários do Dr. Stanley Hall.

4. LEITURA

1. Discuta a questão da idade na qual as crianças devem aprender a ler.
2. Como a Srª. Westey ensinava os seus filhos a lerem?
3. Dê alguns palpites para ensinar o alfabeto.
4. Como você introduziria uma criança à criação de palavras?
5. Descreva uma aula com criação de palavras com vogais longas etc.
6. Como as primeiras aulas de leitura da criança devem ajudá-la a
soletrar?
7. Dê os passos de uma aula de leitura sobre “Brilha, brilha, estre-
linha”.
8. Por que a prosa é melhor de alguns modos do que o verso para as
primeiras aulas?
9. Descreva uma segunda aula de leitura sobre “Brilha, brilha, estre-
linha”.
10. Mostre que o progresso lento e constante tende à enunciação cuida-
dosa.
11. Mostre quanto uma criança pode ganhar no trabalho de um ano
sobre essas diretrizes.
12. Compare esse progresso constante com a maneira casual pela qual
as crianças geralmente aprendem a ler.

5. A PRIMEIRA AULA DE LEITURA

(Duas Mães Trocam Ideias)

6. LENDO PELA VISTA E PELO SOM

1. Por que aprender a ler é um trabalho difícil?
2. Quais são os símbolos que as crianças têm de aprender?
3. O que nós definitivamente propomos ao ensinar uma criança a ler?
4. Os símbolos que ela aprende podem ser interessantes?
5. Descreva os estágios de uma aula sobre “Eu gosto de gatinho”.
6. Como o Tommy aprende a ler frases?
7. Descreva a primeira aula de soletração do Tommy.
8. Como você lidaria com o fato de que combinações semelhantes têm
sons diferentes?
9. Mostre que a sua aula de leitura deve proporcionar formação mo-ral
para uma criança.

7. RECITAÇÃO

1. O que devemos objetivar ao ensinar as crianças a recitar?
2. Como devemos proceder?
3. O que devemos evitar?
4. Por que podemos esperar o sucesso?
5. Distinga entre recitar e memorizar.
6. Mostre que as crianças têm uma capacidade natural para a memo-
rização.
7. Como você as ensinaria a memorizar um poema?

8. LENDO PARA CRIANÇAS MAIS VELHAS

1. A professora tem de se encarregar de quais dois pontos?
2. Qual é o defeito mais comum e monstruoso na educação atual?
3. Como nós podemos corrigir esse defeito?
4. Quais pontos exigem atenção quando a criança está lendo em voz
alta?
5. Com o que a professora tem de ser cuidadosa para evitar?
6. O que deve ser dito a favor e contra a leitura para crianças?
7. As crianças devem ser questionadas sobre o significado do que elas
leram?
8. Por que não?
9. Sugira um teste melhor da sua inteligência.
10. Por que a seleção dos primeiros livros didáticos de uma criança é
uma questão de grande importância?
11. Que regra geral deve ajudar na escolha deles?
12. Como a atenção das crianças pode ser prendida durante uma aula de
leitura?
13. Dê duas ou três dicas com relação à pronúncia cuidadosa.

9. A ARTE DE NARRAR

1. Prove a partir da sua própria observação que as crianças narram por
natureza.
2. Como essa capacidade deve ser usada na educação delas?
3. Quais pontos têm de ser mantidos em mente com relação às
narrações de uma criança?
4. Descreva o método de uma aula.

10. ESCRITA

1. Como você evitaria o hábito do trabalho sem cuidado?
2. Que impressão uma criança deve fazer antes de escrever?
3. Quais estágios devem ser seguidos ao ensinar a escrita?
4. O que deve ser dito sobre títulos de cobre?
5. Por que as crianças devem praticar letra de mão?
6. Quais argumentos são avançados em favor de uma caligrafia
bonita?
7. O que deve ser dito para uma base bonita para a caligrafia carac-
terística?
8. Sugira um modo de usar A New Handwriting.

11. TRANSCRIÇÃO

1. Mostre o uso da transcrição antes que as crianças escrevam o
ditado.
2. O que as crianças devem transcrever?
3. Como a transcrição deve ajudar as crianças a soletrar?
4. Por que letras de mão e linhas duplas devem ser usadas?
5. Descreva a posição apropriada para a escrita.
6. Como as crianças devem segurar as suas canetas?
7. Quais são os pontos de uma boa escrivaninha?
8. Descreva uma mesa escolar para criancinhas.

12. ORTOGRAFIA E DITADO

1. Mostre como o ditado pode ser uma causa de má grafia.
2. Qual é a razão fundamental da ortografia?
3. Quais são os passos de uma aula de ditado conforme deve ser?
4. Mostre claramente que princípio está envolvido.
5. Quais são as duas causas da grafia analfabeta?

13. REDAÇÃO

1. Mostre que a exigência de redação original de alunos e alunas é
uma futilidade.
2. E um prejuízo moral para as crianças.
3. Exemplifique o tipo de ensino que deve ser considerado como um
perigo público.
4. A redação “vem por natureza” sob qual condição?

14. AULAS DE BÍBLIA

1. Exemplifique a receptividade religiosa das crianças.
2. Que conhecimento bíblico as crianças de nove anos devem ter?
3. O que você diria com relação às narrativas bíblicas feitas no inglês
moderno?
4. Mostre por que as crianças devem se familiarizar com o texto.
5. Que concepção deve gradualmente se revelar a elas?
6. Distinga entre verdade essencial e acidental.
7. Em qual evento pode ser dito que as próprias verdades segura-
mente escaparão da nossa compreensão?
8. Por que deve ser tomado cuidado para que o ensino da Bíblia não
envelheça as mentes das crianças?
9. Descreva o método de uma aula de Bíblia.
10. Que uso você faria de ilustrações?
11. O que deve ser aprendido quanto à aprendizagem de cor das pas-
sagens bíblicas?
15. ARITMÉTICA

1. Por que a aritmética é importante como um meio de educação?
2. Como você testaria o conhecimento de princípios de uma criança?
3. Por que cálculos longos são prejudiciais?
4. Que exercício mental um problema deve oferecer?
5. Que cuidado tem de ser observado?
6. Como a aritmética pode se tornar uma formação elementar na
matemática?
7. Como uma criança deve demonstrar “4 x 7 = 28”?
8. Como você usaria botões, feijões etc.?
9. Mostre como você ensinaria uma criança a executar uma tabela de
adição e subtração com cada dedo.
10. Quando você introduziria as tabelas de multiplicação e divisão?
11. Como você ensinaria a divisão?
12. Qual é o passo entre trabalhar com coisas e com números abstra-
tos?
13. Como você introduziria o nosso sistema de notação?
14. Por quê?
15. Mostre como você lidaria com dezenas.
16. Quanto tempo uma criança deve trabalhar com dezenas e unidades
somente?
17. O que deve seguir?
18. Que regra tem de ser observada inteiramente?
19. Como você aplicaria o mesmo princípio a pesos e medidas?
20. Que função exercem as parcelas nesse estágio e por quê?
21. Mostre como a criança deve usar a regra do pé.
22. Como você exercitaria o seu juízo quanto a medidas e pesos?
23. Como ocorrer a ideia de uma fração nesse trabalho com quanti-
dades concretas?
24. Qual deve ser o valor moral do estudo da aritmética?
25. Como o professor menos qualificado insinua um desrespeito à
verdade e à honestidade comum nesse estudo?
26. Como você lida com um cálculo “errado”?
27. O que a aula diária de aritmética deve ser para as crianças?
28. Discuta O ABC da Aritmética.
29. O que deve ser dito contra acostumar crianças novas à vista de
formas e figuras geométricas?

16. FILOSOFIA NATURAL

1. Mostre que a infância é o tempo para reunir materiais para clas-
sificação.
2. O que o Sr. Herbert Spencer diz quanto ao valor das buscas cientí-
ficas?
3. Mostre que as crianças são capazes de compreender princípios.
4. Mencione alguns fenômenos que elas podem entender pronta-
mente.
5. A partir das disciplinas ensinadas com sucesso numa escola de vila,
escreva uma lista de perguntas que crianças inteligentes sejam
capazes de responder.
6. “Os princípios da filosofia natural são os princípios do senso
comum.” Mostre como essa afirmação pode ser uma chave para a
nossa prática educacional.

17. GEOGRAFIA

1. Onde reside o valor educacional peculiar da geografia?
2. Como a geografia é comumente ensinada?
3. Que tipo de informação sobre lugares as crianças e as pessoas
adultas gostam?
4. Por que a geografia aprendida na escola é de pouco uso na vida
adulta?
5. O que uma criança deve aprender em geografia?
6. Como ela teve obter as suas noções rudimentares?
7. Como os mapas devem ser apresentados às crianças?
8. Por que uma criança deve ser feita “em casa” em alguma região?
9. Por que é bom seguir os passos de um viajante?
10. Mencione alguns livros úteis junto a isso.
11. Como os mapas devem ser usados nesse tipo de trabalho?
12. Como uma criança deve obter a sua primeira noção de uma geleira,
de um cânion etc.?
13. Que curso de leitura os pais podem almejar entre o quinto e décimo
ano de idade de uma criança?
14. Como as crianças novas devem ter as suas aulas no lugar?
15. Como elas devem chegar a definições?
16. Que ideias fundamentais uma criança deve receber?
17. Como ela deve ser introduzida ao significado de um mapa?

18. HISTÓRIA

1. Qual é o valor intelectual e moral da história quanto ao assunto
educacional?
2. O que deve ser dito sobre os modos usuais de ensinar história
inglesa?
3. E se o livrinho-texto for moral ou religioso no tom?
4. Qual é o erro fatal com relação ao ensino inicial de história?
5. Qual é o melhor caminho?
6. O que uma criança deve saber sobre o período no qual viveu qual-
quer pessoa sobre quem está lendo?
7. Que ganho moral ela pode ter a partir desse conhecimento íntimo?
8. Que espécies de livros têm de ser evitados?
9. O que é o mínimo que deve ser feito para introduzir as crianças à
história da Inglaterra?
10. Por que a história inicial de uma nação é melhor adaptada para as
crianças do que os seus registros posteriores?
11. Por que as crônicas antigas são proveitosas para ler para elas?
12. Nomeie e comente algumas crônicas sobre as quais o conhecimento
das crianças deve permanecer.
13. Que efeito sobre uma criança a leitura dessas crônicas antigas deve
ter?
14. Mostre que as crianças devem conhecer algo da era heroica da sua
própria nação.
15. Que uso pode ser feito da História dos Reis Britânicos de Geoffrey
de Monmouth?
16. De qual autoridade uma criança deve obter a história das guerras
francesas?
17. Por que as Vidas de Plutarco oferecem o melhor preparo para o
estudo da história grega e romana?
18. Dê dois conselhos que regulem o ensino de história.
19. Sobre quais princípios os livros de história para crianças devem ser
selecionados?
20. Mencione um ou dois livros que se emprestam à narração.
21. Comente sobre a História da Inglaterra, do Sr. Arnold Forster.
22. Como você ajudaria as crianças a ter clareza com relação às datas?
23. Mencione duas ou três formas pelas quais as mentes das crianças
funcionam se os seus livros de história são da devida qualidade.

19. GRAMÁTICA

1. Por que a gramática é desinteressante para uma criança?
2. Por que a gramática inglesa é peculiarmente difícil?
3. Mostre que a gramática latina é mais fácil.
4. Mostre que o latim proporciona algum auxílio no aprendizado da
gramática inglesa.
5. Por que uma criança deveria começar com uma frase e não com
partes do discurso?
6. Escreva anotações de uma ou duas aulas introdutórias.

20. FRANCÊS

1. Como o francês deve ser adquirido?
2. Mostre que a aprendizagem do francês é uma educação dos senti-
dos.
3. Quais são as nossas duas dificuldades ao falar francês?
4. Mostre que esses impedimentos devem ser removidos na infância.
5. Como?
6. Como se pode lidar com a dificuldade do sotaque?
7. Qual meia dúzia de princípios o Sr. Gouin deixou claros para nós?
8. Mostre que o método das séries permite que uma criança pense na
nova língua.
9. Trace completamente os passos pelos quais o autor realizou a sua
teoria.
10. Como ele trata a dificuldade de ortografia?
11. Exemplifique a facilidade com que uma criança aprende uma lín-
gua nova.


21. ARTE PICTÓRICA

1. Sobre quais duas diretrizes a formação em arte das crianças deve
proceder?
2. Como as conversas sobre pintura devem ser reguladas?
3. Que ganhos podemos esperar desse tipo de ensino?
4. Discuta o uso de manchas nas primeiras aulas de desenho.
5. Qual deve ser a nossa meta nessas aulas?
6. As crianças têm “arte” nelas. Como esse fato afeta o nosso ensino?
7. O que devemos manter em mente ao ensinar modelagem de argila
às crianças?
8. Nomeie métodos de ensino de canto e de piano que devem ser reco-
mendados.
9. Que exercícios físicos você recomendaria?
10. Nomeie alguns trabalhos manuais apropriados para crianças novas.





















PARTE VI

A VONTADE – A CONSCIÊNCIA – A VIDA DIVINA
NA CRIANÇA

1. A VONTADE

1. Como é realizado o governo da Alma Humana?
2. Mostre que o poder executivo está investido na vontade.
3. O que é a vontade?
4. Em que sentidos as pessoas podem passar a vida sem um ato
deliberado da vontade?
5. Mostre que o caráter é o resultado da conduta regulada pela
vontade.
6. Quais são as três funções da vontade?
7. Que limitação da vontade é desconsiderada por certos roman-cistas?
8. Mostre que os pais tropeçam nesse erro metafísico.
9. Mostre que a obstinação indica falta de força de vontade.
10. O que é a obstinação?
11. Quais são as funções superiores e inferiores da vontade?
12. Mostre que a vontade nem sempre age pelo bem.
13. Mostre que uma vontade disciplinada é necessária ao caráter
heroico cristão.
14. Como você distinguiria entre pessoas eficientes e não eficientes?
15. Como a vontade opera?
16. Mostre como incentivos, diversão, mudança de pensamento são
diversos auxílios para a vontade.
17. O que deve ser ensinado às crianças quanto ao “caminho da
vontade”?
18. Mostre que o poder da vontade implica o poder de atenção.
19. Mostre que o hábito pode frustrar a vontade.
20. Mostre a necessidade de um instrumento tão eficiente para o uso
razoável.
21. Por qual linha de conduta os pais devem fortalecer as vontades dos
seus filhos?
22. Como as crianças podem ser ensinadas a se dominarem?
23. Mostre que a educação da vontade é mais importante do que a do
intelecto.

2. A CONSCIÊNCIA

1. Quais são as funções da consciência?
2. O que está implicado em “Eu sou, eu devo, eu posso, eu quero”?
3. Qual erro é cometido pelos pais inertes com relação à graça divina?
4. Mostre que a consciência não é um guia infalível.
5. Como Adam Smith exemplifica o fato de que a consciência é um
poder real?
6. O que sabemos sobre a consciência?
7. Distinga entre uma consciência nascente e uma formada.
8. Mostre que o refinamento da consciência não pode coexistir com a
ignorância.
9. Quais são os processos implicados numa decisão “conscienciosa”?
10. O que pode ser dito sobre a consciência instruída?
11. O que se pode esperar da boa consciência de uma criança?
12. Mostre que as crianças brincam com questões morais.
13. Como você transmitiria quaisquer ideias morais contidas na Bíblia a
uma criança?
14. Mostre o uso de histórias na formação da consciência.
15. Mostre a extrema ignorância da consciência de uma criança.
16. Como você instruiria crianças no dever da “gentileza”, por
exemplo?
17. O que deve ser dito sobre a consciência feita eficiente pela disci-
plina?

3. A VIDA DIVINA NA CRIANÇA

1. Qual é o “próprio pulso da máquina”?
2. Mostre que os pais têm algum poder para entronar o Rei.
3. Defina, conforme puder, as funções da alma.
4. O que é a vida da alma?
5. Mostre, pelo exemplo da abelha e da macieira, o que é o papel dos
pais ao despertar a vida divina no seu filho.
6. Mostre onde falha a semelhança entre a abelha e a macieira.
7. Deus é mais frequentemente apresentado às crianças por quais duas
ideias dissuasivas?
8. Que precauções uma mãe tem de tomar para assegurar que os seus
filhos obtenham ideias inspiradoras de Deus?
9. Que considerações devem nos ajudar a selecionar os pensamentos
rápidos apropriados para crianças?
10. Como você selecionaria ideias apropriadas e vitais?
11. Mostre o perigo de confundir “ser bom” com conhecer a Deus.
12. Que cuidados a mãe observará quanto aos momentos e o modo da
instrução religiosa?
13. Faça algumas sugestões para a leitura da Bíblia.
14. Como uma mãe poderia dar ao seu filho a ideia de Deus como Pai e
Doador?
15. Como as crianças podem ser educadas na fidelidade a Cristo?
16. Como você levaria para casa o pensamento do seu Salvador para as
crianças?
17. Mostre que a habitação de Cristo é um pensamento adequado para
as crianças.

[1]
Língua-mãe que a autora tem em vista. (N. E.)
[2]
“Grande obra”, em língua latina. (N. T.)
[3]
“Para encorajar os outros”, em língua francesa. (N. T.)
[4]
“To those first-born affinities that fit
Our new existence to existing things.”

The Prelude, Book 1, Childhood and School-time (William Wordsworth) (N. E.)
[5]
“I want” e “I will” no original em inglês, traduzidos aqui respectivamente por “eu quero” e “eu ordeno”.
(N.T.)
[6]
O Rev. F. D. Maurice.
[7]
Fisiologia Mental. (N. T.)
[8]
Palestras a Senhoras. (N. T.)
[9]
Lições como Instrumentos da Educação. (N. T.)
[10]
Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827): reformador educacional suíço, que defendeu a educação dos
pobres e enfatizou métodos de ensino projetados para fortalecer as próprias habilidades dos estudantes. O
método de Pestalozzi se tornou amplamente aceito e a maioria dos seus princípios foram absorvidos na
educação elementar moderna. (N. E.)
[11]
Herbert Spencer (1820-1903): sociólogo e filósofo inglês, defensor prematuro da teoria da evolução,
que atingiu uma influente síntese de conhecimento, defendendo a proeminência do indivíduo sobre a
sociedade e da ciência sobre a religião. (N. E.)
[12]
Vida Doméstica Francesa. (N. T.)
[13]
“Boa fé”, em língua latina. (N. T.)
[14]
William Wordsworth (1770-1850): poeta inglês cujas Lyrrical Ballads, escritas com Samuel Taylor
Coleridge, ajudaram a lançar o movimento romântico inglês. (N. E.)
[15]
Ode: Intimations of Immortality from Recollections of Early Childhood, V, VIII (William Wordsworth)
(N. E.)
[16]
Mt 19:14. (N. E.)
[17]
Mt 18:3. (N. E.)
[18]
Mt 18:1. (N. E.)
[19]
Mt 18:2 (N. E.)
[20]
Referência a Mt 18:10. (N. E.)
[21]
Mt 19:14. (N. E.)
[22]
“Amante” não com o sentido daquele que tem relações extramatrimoniais com outra pessoa, mas no
sentido de “aquele que ama”. (N. T.)
[23]
“Dito”, em língua latina. (N. T.)
[24]
Paradise Lost: poema épico em versos brancos. Uma das obras literárias tardias do poeta puritano
inglês John Milton (1608-1674). (N. E.)
[25]
Pêni: moeda divisionária que até 1971 representou a duodécima parte do xelim e corres-ponde
atualmente à centésima parte da libra. (N. E.)
[26]
Próspero: em The Tempest de Shakespeare, o duque de Milão exilado, que é um mágico.
(N. E.)
[27]
“No local”, em língua latina. (N. T.)
[28]
Sl 104:5. (N. E.)
[29]
1 polegada = 2,54 cm. (N. E.)
[30]
“Ao ar livre”, em língua italiana. (N. T.)
[31]
“Ciente”, em língua francesa. (N. T.)
[32]
Lines Composed a Few Miles above Tintern Abbey, On Revisiting the Banks of the Wye during a Tour.
July 13, 1798 (William Wordsworth) (N. E.)
[33]
Flores Silvestres. (N. T.)
[34]
Anne Pratt (1806-1893): dos artistas botânicos, uma das mulheres mais famosas da sua época. Escreveu
vinte livros ilustrados sobre Botânica direcionados principalmente a um público popular. (N. E.)
[35]
The Gardener’s Daughter (Alfred Tennyson) (N. E.)
[36]
Leigh Hunt (1784-1859): ensaísta, crítico, jornalista e poeta inglês.
[37]
Picciola: título da obra clássica de Joseph Xavier Boniface Saintine (1798-1865), que lhe proporcionou
fama e dinheiro. A história é contada requintadamente: um jovem nobre, enquanto prisioneiro de Estado na
fortaleza de Fenestrella, encontra uma pequena planta saltando entre as pedras da sua corte. Ele a vê, ama-a,
torna-a sua companheira e é gradual-mente regenerado pela sua revelação a ele da lei natural e divina.
Picciola foi republicada mais de quarenta vezes e traduzida a muitas línguas. (N. E.)
[38]
Gn 1:11. (N. E.)
[39]
Isaac Newton (1642-1727): físico e matemático inglês, que foi a figura culminante da revolução
científica do século XVII. (N. E.)
[40]
“The human (brain) is like a millstone, turning ever round and round;
If it have nothing else to grind, it must itself be ground.”

O aforismo poético original de Henry Wadsworth Longfellow (1807-1882) é:

“THE RESTLESS HEART
A millstone and the human heart are driven ever round;
If they have nothing else to grind, they must themselves be ground.” (N. T.)

[41]
John Lubbock, 1º Barão Avebury (1834-1913): banqueiro, político e naturalista que promoveu com
êxito uma dúzia de medidas de alguma importância no Parlamento, mas talvez tenha sido melhor conhecido
pelos seus livros sobre arqueologia e entomologia. (N. E.)
[42]
Frederic William Farrar (1831-1903): escritor religioso inglês popular e autor de um ro-mance
sentimental da vida escolar, Eric, or, Little by Little (1858). (N. E.)
[43]
1 polegada = 2,54 cm. (N. E.)
[44]
Gilbert White (1720-1793): naturalista e clérigo inglês, autor de The Natural History and Antiquities of
Selborne (1789), a primeira obra sobre história natural a atingir o status de um clássico inglês. (N. E.)
[45]
John James Audubon (1785-1851): ornitologista, artista e naturalista que se tornou espe-cialmente bem
conhecido pelos seus desenhos e pinturas de aves norte-americanas. (N. E.)
[46]
Palácio das Tulherias: residência real francesa adjacente ao Louvre em Paris antes que fosse destruída
por incêndio culposo em 1871. (N. E.)
[47]
“Queridinho”, em língua francesa. (N. T.)
[48]
“Entediada”, em língua francesa. (N. T.)
[49]
Fragmento de The Rime of the Ancient Mariner (Samuel Taylor Coleridge) (N. E.)
[50]
“Tédio”, em língua francesa. (N. T.)
[51]
No texto original em língua inglesa, a autora utiliza o pronome “he” (ele) para se referir a “child”
(criança). (N. T.)
[52]
“Let knowledge grow from more to more,
But more of reverence in us dwell;”

Fragmento de In Memoriam A. H. H. OBIIT MDCCCXXXIII (Alfred Tennyson) (N. T.)
[53]
Tâmil: língua da família linguística dravídica, falada principalmente na Índia. (N. E.)
[54]
Tradução literal: “[...] erga metade de 112 libras [a hundredweight]?”
Obs: 112 libras = 50,80 kg. (N. T.)
[55]
“Simultaneamente”, “a par”, em língua latina. (N. T.)
[56]
Adam Bede (1859) e The Mill on the Floss (1860): duas grandes obras da romancista vitoriana inglesa
Mary Ann, cujo pseudônimo é “George Eliot”. Os romances foram traduzidos respectivamente como O
Carpinteiro do Vale dos Fenos e O Moinho à Beira do Rio. (N. E.)
[57]
“Pequeno salão elegante”, em língua francesa. (N. T.)
[58]
Polegada = 2,54 cm; pé = 30,48 cm; jarda = 0,91 m. (N. E.)
[59]
Milha = 1,6 m. (N. E.)
[60]
Durante o século XVII, o francês substituiu o latim como a língua da diplomacia e relações
internacionais. Ele manteve esse papel até meados do século XX quando foi substituído pelo inglês. (N. E.)
[61]
“Rodas”, em língua francesa. (N. T.)
[62]
No original: “There came three dukes a-riding, a-riding, a-riding”; “Oranges and lemons, say the bells
of St. Clement’s”; “Here we come gathering nuts in May”; “What has my poor prisoner done?” (N. T.)
[63]
Fragmentos de The Task, Livros V e VI, de William Cowper. (N. E.)
[64]
Jean-Eugène Robert-Houdin (1805-1871): mágico francês, considerado o pai do ilusionismo moderno.
Foi o primeiro mágico a usar eletricidade. Interessou-se pela mágica desde a infância. Os seus livros
influentes, grandemente baseados sobre as melhores ideias dos seus predecessores, explicam a arte da
mágica e dão lições passo a passo. Eles incluem uma autobiografia (1857), Confidences d’un
prestidigitateur (1859) e Les Secrets de la prestidigi-tation et de la magie (1868). (N. E.)
[65]
Robert Baden-Powell (1857-1941): oficial do exército britânico que se tornou um herói na guerra sul-
africana de 1899-1902. Mais tarde se tornou famoso como fundador dos Escoteiros, uma organização,
originalmente para meninos de 11 a 14 ou 15 anos, que objetivava desen-volver neles boa cidadania,
comportamento cavalheiresco e habilidades em várias atividades fora de casa. (N. E.)
[66] “Rua sem saída”, em língua francesa. (N. T.)
[67]
“Abre-te, Sésamo!”: comando verbal usado para abrir a porta que leva a uma caverna onde quarenta
ladrões esconderam o seu saque e foram vistos secretamente por Ali Babá, o herói de Ali Babá e os
Quarenta Ladrões, uma das mais bem conhecidas histórias em As Mil e uma Noites. (N. E.)
[68] “Mais”, em língua francesa. (N. T.)
[69]
Is 41:14. (N. E.)
[70]
“Razão de ser”, em língua francesa. (N. T.)
[71]
Christopher Marlowe (1564-1593): poeta elisabetano e o antecessor de Shakespeare mais importante no
drama inglês. A sua peça mais famosa é The Tragicall History of Dr. Faustus. (N. E.)
[72]
No original: “[...] it is like the laying out of a penny with the certainty of the immediate return of a
pound.” (N. T.)
[73]
Fragmento de On the Late Captain Grose’s Peregrinations Thro’ Scotland de Robert Burns. (N. E.)
[74]
“Vergonha ruim”, em língua francesa. (N. T.)
[75]
No original: do not let them speak of ‘walkin and ‘talkin’,’ of a ‘fi-ine da-ay,’ ‘ni-ice boy-oys.’ (N. T.)
[76]
No original: And that is why it is called daisy, ‘day’s eye,’ because its eye is always looking at the sun
which makes the day.

Etimologia de “daisy”: no inglês antigo, “dægesege”, a partir de “dæges eage”, “day’s eye” (o olho do dia),
porque as pétalas abrem ao amanhecer e fecham ao anoitecer. (N. T.)
[77]
Maria Edgeworth (1767-1849): escritora anglo-irlandesa conhecida pelas suas histórias infantis e por
seus romances sobre a vida irlandesa. Publicou as suas histórias infantis em 1796 como The Parent’s
Assistant, que contém The Purple Jar. As crianças que aparecem nelas, especialmente a impetuosa
Rosamond, são as primeiras crianças reais na literatura inglesa desde Shakespeare. (N. E.)
[78]
William Thomson (1819-1890): arcebispo de York, autor de An Outline of the Necessary Laws of
Thought: a Treatise on Pure and Applied Logic (Um Esboço das Leis do Pensamento Necessárias: um
Tratado sobre a Lógica Pura e Aplicada). (N. E.)
[79]
Alice’s Adventures in Wonderland: romance de Lewis Carroll (1832-1898), publicado em 1865. É uma
das obras de ficção em língua inglesa mais bem conhecidas e mais populares, bem como um dos melhores
exemplos do gênero literário nonsense. Na história, Alice adormece num campo e sonha que segue um
Coelho Branco até um buraco. Ela passa por muitas aventuras bizarras com criaturas ilógicas e estranhas.
(N. E.)
[80]
The Swiss Family Robinson: romance para crianças completado e editado por Johann Rudolf Wyss
(1782-1830) e que atingiu popularidade mundial. Na história, um pastor, a sua esposa e seus quatro filhos
naufragam numa ilha nas Índias Orientais. Apesar de terem perdido tudo, reconstruíram a sua vida na ilha,
e, quando o resgate chegou, o recusaram, preferindo o seu refúgio e vida feliz. (N. E.)
[81]
Diogenes and the Naughty Boys from Corinth (em alemão, Diogenes und die Bösen Buben von
Korinth). A obra contribuiu significativamente para a popularidade do seu autor, Wilhelm Busch (1832-
1908), pintor e poeta alemão, melhor conhecido pelos seus desenhos. (N. E.)
No original em língua inglesa, consta “Troy” em vez de “Corinth”. (N. T.)
[82]
Robinson Crusoe: romance de Daniel Defoe (1660-1731), primeiramente publicado em Londres em
1719. A primeira maior obra de ficção de Defoe introduziu duas das personagens mais duradouras na
literatura inglesa: Robinson Crusoe e Friday. Defoe misturou tradições da autobiografia espiritual puritana
com um exame minucioso insistente da natureza dos seres humanos como criaturas sociais. Ele também
usou componentes de literatura de viagem e histórias de aventuras: ambas impulsionaram a popularidade do
romance. Robinson Crusoe foi um sucesso popular na Grã-Bretanha. (N. E.)
[83]
John Ruskin (1819-1900): crítico inglês de arte, arquitetura e sociedade. Foi um pintor dotado e um
distinto estilista de prosa. (N. E.)
[84]
“Ter”, em língua francesa. (N. T.)
[85]
Rara avis in terra, em língua latina: expressão do autor romano Juvenal (Sátiras, VI, 165) que se diz a
propósito de tudo que é singular, extraordinário. (N. T.)
[86]
“Alimento”, em língua latina. (N. T.)
[87]
Sir Walter Scott (1771-1832): romancista, poeta, historiador e biógrafo escocês frequente-mente
considerado tanto o inventor quanto o maior praticante do romance histórico. Desde os seus primeiros anos,
gostava de escutar os relatos e histórias dos seus parentes mais velhos a respeito da fronteira escocesa. Em
meados de 1790, interessou-se pelo Romantismo alemão, romances góticos e baladas da fronteira escocesa.
Em 1813, descobriu o manuscrito inacaba-do de um romance que começou em 1805, e no início do verão
de 1814, com extraordinária velocidade, escreveu quase que o seu romance inteiro intitulado Waverley. Foi
um dos casos raros e afortunados na história da literatura de algo original e poderoso ser imediatamente
reconhecido e apreciado pelo grande público. Scott deu seguimento a Waverley com toda uma série de
romances históricos estabelecidos na Escócia, que agora são conhecidos como os romances “Waverley”.
Romance após romance, na série “Waverley” clarifica-se que a tradição mais antiga, heroica, dos clãs de
jacobitas escoceses não tinha lugar no mundo moderno. Os verdadeiros heróis dos romances de Scott não
são cavaleiros que lutam, mas advogados, fazendeiros, comerciantes e pessoas simples que andam com os
seus negócios alheios às alegações e amarras emocionais de um passado heroico. (N. E.)
[88]
George Stephenson (1781-1848): engenheiro inglês e principal inventor da locomotiva ferroviária. (N.
E.)
[89]
Tobias George Smollett (1721-1771): romancista satírico escocês. Em Londres, ele definiu um
compromisso de traduzir Don Quixote a partir do espanhol e essa tradução foi publicada em 1755. No início
de 1756, ele se tornou editor de The Critical Review, um jornal de Tory e da igreja, e ao mesmo tempo
escrevia a sua Complete History of England, que foi financeira-mente bem-sucedida. Essa obra aliviou a
pressão que ele sentiu na sua vida adulta. (N. E.)
[90]
Joseph Priestley (1733-1804): clérigo inglês, teórico político e cientista físico cuja obra contribuiu para
avanços na política liberal, no pensamento religioso e na química experimen-tal. Ele é melhor lembrado
pela sua contribuição para os gases químicos. Foi premiado por realizações como os seus escritos Theory of
Language and Universal Grammar (Teoria da Linguagem e Gramática Universal) e Lectures on History
and General Policy (Palestras sobre História e Política Geral). (N. E.)
[91]
“Resumo”, em língua francesa. (N. T.)
[92] “Professora de jardim de infância”, em língua alemã. (N. T.)
[93]
“A estar em contato”, em língua francesa. (N. T.)
[94]
Friedrich Froebel (1782-1852): educador alemão, fundador do jardim de infância e um dos
reformadores educacionais mais influentes do século XIX. Foi influenciado por Jean-Jacques Rousseau e
Pestalozzi. Sinceramente religioso, tendia ao Panteísmo e foi chamado de místico da natureza. A
“autoatividade” e o jogo como fatores essenciais na educação de crianças fo-ram as suas contribuições mais
importantes para a teoria educacional. O papel do professor não era fazer a criança repetir ou ser doutrinada,
mas ser estimulada a se expressar através do jogo, tanto em atividades individuais quanto em grupo.
Técnicas educacionais modernas no jardim de infância e pré-escola devem muito a ele. (N. E.)
[95] Liev Tolstói (1828-1910): autor russo, um mestre da ficção realista e um dos maiores romancistas do
mundo. Tolstói é melhor conhecido pelas suas duas obras mais longas, Guerra e Paz e Anna Karenina, que
são comumente consideradas entre os melhores romances já escritos. (N. E.)
[96]
Nesta trilogia, que talvez sejam as obras mais autobiográficas de Tolstói, descreve-se a vida interior das
personagens. As três histórias formam um painel da Rússia czarista. (N. E.)
[97]
No original: “Like our own dear mother,”. (N. T.)
[98]
Loneliness (John Keble) (N. E.)
[99]
Catherine wheel: um fogo de artifício redondo unido a um bastão e que gira. (N. T.)
[100]
Treasure Island: romance de aventura clássico de Robert Louis Stevenson (1850-1894), publicado na
forma de livro em 1883. Embora não seja o primeiro livro sobre piratas, é considerado por muitas pessoas
como o melhor. O livro introduziu a um grande público con-ceitos indispensáveis como marinheiros de uma
perna só, navios de vela negra, mapas do tesouro marcados com um “X”, a assustadora mancha negra,
papagaios gritando “dólares espanhóis” (pieces of eight) e 15 homens em cima do peito do homem morto
cantando “Yo-ho-ho, e uma garrafa de rum”. (N. E.)
[101]
Batalha das Termópilas: foi realizada entre uma aliança de cidades-estados gregas, condu-zidas pelo
Rei Leônidas de Esparta, e o Império Persa de Xerxes I por três dias, durante a segunda invasão persa da
Grécia. (N. E.)
[102]
Referência à Odisseia, poema do grego Homero, cujo assunto são as aventuras de Ulisses ao retornar à
pátria, após a tomada de Troia. Depois de 20 anos desde que Ulisses deixou o seu palácio, a sua esposa
Penélope tinha alguma esperança de que ele retornasse, ainda que muitos o considerassem morto. Muitos
pretendentes foram cortejar “a viúva”. (N. E.)
[103]
Helen Adams Keller (1880-1968): autora e educadora americana que foi cega e surda. A sua educação
e formação representam uma realização extraordinária na educação de pessoas com essas deficiências. Aos
19 meses, Keller foi afligida por uma doença, possivelmente escarlatina. Tendo desenvolvido habilidades
nunca conquistadas por qualquer pessoa seme-lhantemente deficiente, Keller começou a escrever sobre
cegueira, um tabu nas revistas femi-ninas à época. Ela escreveu sobre a sua vida em muitos livros. (N. E.)
[104]
Laura Dewey Bridgman (1829-1889): a primeira pessoa cega e surda no mundo falante do inglês que
aprendeu a se comunicar usando soletração com dedos e palavra escrita. Bridgman foi bem conhecida pela
sua habilidade de conversas com professores, família, parceiros e um público curioso. Aos dois anos,
contraiu escarlatina, que lhe fez perder os sentidos da audição, da visão, do olfato e do paladar. Apesar das
suas deficiências sensoriais, ela adquiriu uma forma de gestos rudimentares para se comunicar com a sua
família. Sua instrução formal terminou em 1850, onde aprendeu história, literatura, matemática e filosofia.
(N. E.)
[105]
“Kindergarten”, conforme usado na língua inglesa. (N. T.)
[106]
Educação Moral nas Escolas Americanas. (N. T.)
[107]
Expressão latina que na Retórica significa uma proposição ou sentença dogmática ou não provada que
é aceita somente pela autoridade de quem a afirmou. (N. T.)
[108]
No original: “[...] picks out p for pudding, b for blackbird, h for horse, […]”. (N. T.)
[109]
No original: “Let him say d for duck, dog, doll, thus: d-uck, d-og, […]”. (N. T.)
[110]
No original: “Take up two of his letters and make the syllable ‘at’: tell him it is the word we use when
we say ‘at home’, ‘at school’. Then put b to ‘at’ – bat; c to ‘at’ – cat; fat, hat, mat, sat, rat, and so on. First,
let the child say what the word becomes with each initial consonant to ‘at’, in order to make hat, pat, cat.”
(N. T.)
[111]
No original: “’How many words can you make with ‘en’ and another letter, with ‘od’ and another
letter?” (N. T.)
[112]
No original: “[...] use the same syllables as before with a final e; thus ‘at’ becomes ‘ate’, and we get
late, pate, rate, etc. The child may be told that a in ‘rate’ is long a; a in ‘rat’ is short a.” (N. T.)
[113]
No original: “Then the same sort of thing with final ‘ng’ – ‘ing’, ‘ang’, ‘ong’, ‘ung’; as in ring, fang,
long, sung: initial ‘th’, as then, that; final ‘th’, as with, pith, hath, lath, and so on, […]”. (N. T.)
[114]
No original:
“Twinkle, twinkle, little star,
How I wonder what you are,” (N. T.)
[115]
No original: “Then point to ‘twinkle’, ‘wonder’, ‘star’, ‘what’ […]”. (N. T.)
[116]
A Inglaterra foi invadida por diversas tribos saxônicas. A língua inglesa está no grupo das línguas
germânicas, mais particularmente germânicas ocidentais. (N. E.)
[117]
Parábolas da Natureza. (N. T.)
[118]
Anna Laetitia Barbauld (1743-1825): escritora, poetisa e editora britânica, cujos melhores escritos são
sobre temas políticos e sociais. A sua poesia pertence essencialmente à tradição do verso meditativo do
século XVIII. Os seus poemas mais importantes incluem Corsica (1768) e The Invitation (1773). (N. E.)
[119]
No original: “little, star, you, are”. (N. T.)
[120]
No original: “Can you spell sky?” (N. T.)
[121]
No original: “’diamond’, they will no doubt wish to hurry over, and say as ‘di’mond’, just as they will
reduce ‘history’ to ‘hist’ry’.” (N. T.)
[122]
1 polegada = 2,54 cm. (N. T.)
[123]
No original: “plum-pudding”.
[124]
No original: “[...] below his capacity – ath, eth, ith, th, uth – or, at the very best, ‘The cat sat on the
mat.” (N. T.)
[125]
No original: “cat, cat”. (N. T.)
[126]
No original: “[...] spells c o u g h; you say ‘cough’, and she repeats. By dint of repetition, she learns at
last to associate the look of the word with the sound, and says ‘cough’ without spelling it; and you think she
has arrived at ‘cough’ through c o u g h. Not a bit of it; c o f spells cough!” (N. T.)
[127]
No original: “Yes; but ‘cough’ has a silent u, and a gh with the sound of f.” (N. T.)
[128]
No original: “‘Plough ought to be written and printed plow; through, thru; enough, enuf; ought, aut or
ort’; and so on.” (N. T.)
[129]
História do Pisco-de-Peito-Ruivo Macho. (N. T.)
[130]
No original: “[...] as arrow gives us sp arrow, m arrow, h arrow; […]”. (N. T.)
[131]
No original: “to analyse and classify the sounds of ‘o’ in ‘for’, ‘symbols’, ‘know’, ‘order’, ‘to’, ‘not’
and ‘words’ […]”. (N. T.)
[132]
No original: “[…] no ath, eth, ith, oth, uth, […]”. (N. T.)
[133]
No original: “robin redbreast”. (N. T.)
[134]
No original: “When he knows ‘butter’ he is quite ready to make ‘mutter’ by changing the b for an m.”
(N. T.)
[135]
No original: “I’ll”. (N. T.)
[136]
No original: “Coat, little, like, is, her, warm, I, so”. (N. T.)
[137]
No original: “He makes the word ‘coat’ with his letters, from memory if he can; if not, with the pattern
word. Say ‘coat’ slowly; give the sound of the c. ‘Take away c, and what have we left?’ A little help will get
‘oat’ from him. How would you make ‘boat’ (say the word very slowly, bringing out the sound of b). He
knows the sounds of the letters, and says b-oat readily; fl-oat, two added sounds, which you lead him to find
out; g-oat, he will give you the g, and find goat a charming new word to know; m-oat, he easily decides on
the sound of m; a little talk about moat; the other words are too familiar to need explanation. Tommy will,
no doubt, offer ‘note’ and we must make a clean breast of it and say, ‘No, note is spelt with other letters’;
but what other letters we do not tell him now. Thus he comes to learn incidentally and very gradually that
different groups of letters may stand for the same sounds. But we do not ask him to generalise; we only let
him have the fact that n-oat does not spell the symbol we express by ‘note.’ ‘Stoat’ – he will be able to give
he sounds of the initial letters, and stoat again calls for a little talk – another interesting word. He has made
a group of words with his letters, and there they are on the black-board in a column, thus

c-oat
m-oat
g-oat
fl-oat
st-oat
b-oat

He reads the column up and down and cris-cras; every word has a meaning and carries an idea. Then the
loose words he knows are turned out, and we dictate new sentences, which he arranges: ‘I-like-her-goat’;
‘her-little-stoat-is-warm’, and so on, making the new words with loose letters.” (N. T.)
[138]
No original: “pussy in the boat”. (N. T.)
[139]
No original: “[...] ‘little’ gives brittle, tittle, skittle: pussy, is, I, and her, give no new words. ‘Like’ give
mike and pike. ‘So’ gives no, do (the musical ‘do’), and lo! From ‘warm’ we get arm, harm, charm, barm,
alarm; we pronounced warm as arm. Tommy perceives that such a pronunciation is wrong and vulgar, and
sees that all these words are sounded like ‘arm’, but not one of them like ‘warm’” (N. T.)
[140]
Recitação. (N. T.)
[141]
Ariel: o “espírito aéreo” em The Tempest, de William Shakespeare. A bruxa Sycorax, que antigamente
governava a ilha onde a peça acontece, aprisionou o recalcitrante Ariel num pi-nheiro. (N. E.)
[142]
King John, Ato III, Cena I, Linhas 12-15. (William Shakespeare) (N. E.)
[143]
Lines written a few miles above Tintern Abbey (William Wordsworth) (N. E.)
[144]
Lycidas: poema de John Milton (1608-1674) escrito em 1637 que lamenta a perda de um jovem
homem virtuoso e promissor prestes a embarcar numa carreira de clérigo. Milton adotou convenções da
elegia pastoral clássica (Lícidas foi um pastor nas Écoglas de Virgílio) e medita sobre a fama, o significado
da existência e o julgamento celestial. (N. E.)
[145]
“É o primeiro passo que custa”, em língua francesa. (N. T.)
[146]
The World at Home de Mary e Elizabeth Kirby. (N. E.)
[147]
The Pilgrim’s Progress: alegoria religiosa do escritor inglês John Bunyan (1628-1688), uma visão
simbólica da peregrinação do bom homem através da vida. Sem dúvida, a alegoria cristã mais famosa ainda
impressa. (N. E.)
[148]
Tanglewood Tales for Girls and Boys: coleção de histórias de crianças de Nathaniel Hawthorne (1804-
1864) publicada em 1853. O livro compreende seis mitos gregos. Porque Hawthorne considerou que os
mitos originais fossem impuros e inapropriados para o seu público-leitor, ele alterou histórias como a
sedução de Ariadne por Teseu e a abdução de Perséfone por Pluto. (N. E.)
[149]
The Heroes of Asgard de A. & E. Keary. (N. E.)
[150]
Vidas Paralelas: coleção de biografias influente de famosos soldados, legisladores, orado-res e homens
de Estado gregos e romanos, escritas pelo escritor grego Plutarco (46-120) próximo do fim da sua vida. (N.
E.)
[151]
Um estilo fino, elegante, de letra. (N. E.)
[152]
A New Handwriting for Teachers: “Uma Caligrafia para Professores”. As atitudes da Srª. Bridges
foram influenciadas pelo Movimento de Artes e Artesanato (Arts and Craft Movement) – um movimento
estético inglês da segunda metade do século XIX que repre-sentou o início de uma nova apreciação das
artes decorativas por toda a Europa – e pelo trabalho de William Morris – um artesão e poeta inglês cujos
projetos e outras artes decorativas geraram o Movimento de Artes e Artesanato na Inglaterra e
revolucionaram o gosto vitoriano – no renascimento do que ela denominou “o gótico italianizado” do século
XVI. (N. E.)
[153]
No original: “Most of us are haunted by some doubt as to whether ‘balance’, for instance, should have
one ‘l’ or two;” (N. T.)
[154]
Aquiles: na mitologia grega, o mais bravo, o mais bonito e o maior guerreiro do exército de
Agamemnon na Guerra de Troia. Segundo uma das histórias não homéricas sobre a sua infância, sua mãe,
Tétis, mergulhou-o nas águas do Rio Estige, pelo qual ele se tornou invul-nerável, exceto pela parte do seu
calcanhar que sua mãe o segurou: o notório “calcanhar de Aquiles”. (N. E.)
[155]
Homero: suposto autor da Ilíada e Odisseia, dois grandes poemas épicos da Grécia Antiga, cujo
impacto ainda reverbera na cultura ocidental. (N. E.)
[156]
“Façanha”, em língua francesa. (N. T.)
[157]
No original: “I get my name from a word which means a shade.” (N. T.)
[158]
Quacre: membro de uma seita protestante (Sociedade de Amigos) fundada na Inglaterra, no século
XVII, e difundida principalmente no EUA. (N. E.)
[159]
Autobiografia. (N. T.)
[160]
Mary Howitt (1799-1888): uma das escritoras mais graciosas, versáteis e volumosas da primeira
metade do século. As suas obras poéticas variam por uma vasta gama. Ela tratou de muitos assuntos e
escreveu em muitos estilos, mas uma característica pode ser encontrada em todos: uma naturalidade
deliciosa e uma imaginação graciosa. Dentre os muitos poemas que escreveu, The Spider and the Fly (A
Aranha e a Mosca) pode ser citado como o poema mais bem conhecido. (N. E.)
[161]
Charles Darwin (1809-1882): naturalista inglês cuja teoria científica da evolução pela seleção natural
se tornou o fundamento dos estudos modernos sobre evolução. On the Origin of Species (A Origem das
Espécies) foi um livro que influenciou profundamente a sociedade e o pensamento ocidentais. (N. E.)
[162]
Rolo: a forma comum de livro nos tempos bíblicos. (N. E.)
[163]
Bíblia para os Jovens. (N. T.)
[164]
“Substrato”, em língua latina. (N. T.)
[165]
The Religious Tract Society. (N. E.)
[166]
As Vielas do Conhecimento da Bíblia. (N. T.)
[167]
Nova Luz a partir de Monumentos Antigos. (N. T.)
[168]
Os Habitantes no Nilo. (N. T.)
[169]
No original: “[...] of twelve pence in one shilling.” (N. T.)
[170]
No original: “Let him have a heap of pennies, say fifty: point out the inconvenience of carrying such
weighty money to shops. Lighter money is used – shillings. How many pennies is a shilling worth? How
many shillings, then, might he have for this fifty pennies? He divides them into heaps of twelve, and finds
that he has four such heaps, and two pennies over; that is to say, fifty pence are (or are worth) four shillings
and two pence. I buy then pounds of biscuits at fivepence a pound; they cost fifty pence, but the shopman
gives me a bill for 4s. 2d.; show the child how to put down: the pennies, which are worth least, to the right;
the shillings, which are worth more, to the left.” (N. T.)
[171]
Triginta (30), quadraginta (40), quinquaginta (50) etc, na língua latina.
No original: “We call two tens, twenty, three tens, thirty, because ‘ty’ (tig) means ten.” (N. T.)
[172]
No original: “[...] in perfectly made parcels, ounces, pounds, etc.” (N. T.)
[173]
No original: “[...] foot-rule and yard measure, [...]”. (N. T.)
[174]
O ABC da Aritmética. (N. T.)
[175]
John Stuart Mill (1806-1873): filósofo e economista inglês, expoente do Utilitarismo. Permanece como
um lógico e teórico ético de interesse duradouro. A System of Logic (Um Sistema de Lógica), em dois
volumes, foi publicado em 1843. O Livro VI é a sua tentativa valente de formular uma lógica das ciências
humanas, incluindo história, psicologia e socio-logia. (N. E.)
[176]
O Ensino de Aritmética no Ensino Fundamental I. (N. T.)
[177]
Evenings at Home (Noites em Casa) ou The Juvenile Budget Opened (A Coleção Juvenil Aberta):
coleção de seis volumes de histórias escritas por John Aikin (1747-1822) e pela sua irmã Anna Laetitia
Barbauld (1743-1825). É um exemplo de literatura infantil e de estima geral para a instrução e
entretenimento de jovens. (N. E.)
[178]
“Eyes and No-Eyes”, título de uma das histórias da obra. (N. T.)
[179]
The Sciences (As Ciências): uma introdução às ciências, de Edward Holden, a qual desper-ta a
imaginação, transmite conhecimento útil e abre as portas para a sabedoria. (N. E.)
[180]
Scientific Dialogues (Diálogos Científicos): obra em 6 volumes de Jeremiah Joyce (1764-1816).
Subtítulo: destinados para a instrução e o entretenimento de jovens, na qual os primei-ros princípios das
filosofias natural e experimental são completamente explicados. Tópicos: Mecânica, Astronomia,
Hidrostática, Pneumática, Ótica, Magnetismo, Eletricidade e Galva-nismo ou Voltaísmo. (N. E.)
[181]
Revisão dos pais. (N. T.)
[182]
No original: “with length in miles, and height in feet,” (N. T.)
[183]
“Alimento”, em língua latina. (N. T.)
[184]
“Névoa”, em língua latina. (N. T.)
[185]
“As Viagens do Capitão Cook”: as três viagens de descoberta de Cook que aconteceram entre 1768 e
1779 estão entre as realizações mais notáveis na história da exploração. James Cook (1728-1779) foi um
capitão britânico naval, navegador e explorador que navegou as vias marítimas e costas do Canadá,
conduziu três expedições ao Oceano Pacífico abrangendo desde os campos de gelo da Antártida ao Estreito
de Bering e desde as costas da América do Norte à Austrália e Nova Zelândia. (N. E.)
[186]
The Tropical World: aspects of man and nature in the equatorial regions of the globe (O Mundo
Tropical: aspectos do homem e da natureza nas regiões equatoriais do globo) de G. Hartwig (1813-1880).
(N. E.)
[187]
The Polar World: a popular description of man and nature of the arctic and antarctic regions of the
globe (O Mundo Polar: uma descrição popular do homem e da natureza das regiões ártica e antártica do
globo). (N. E.)
[188]
Missionary Travels and Researches in South Africa (Viagens Missionárias e Pesquisas na África do
Sul) de David Livingstone (1813-1873), que foi um explorador e missionário escocês que exerceu uma
influência formativa nas atitudes ocidentais em relação à África. (N. E.)
[189]
Unbeaten Tracks in Japan (Caminhos Inexplorados no Japão), crônica fantástica das viagens de
Bishop no Japão. Isabella Lucy Bird Bishop (1831-1904), a autora, foi um nome de família no século XIX e
uma das maiores exploradoras de todos os tempos. (N. E.)
[190]
Lady Brassey's Three Voyages in the Sunbeam (As Três Viagens da Srª. Brassey no Raio Solar) de
Anna Brassey (1839-1887), viajante e autora vitoriana enormemente popular.
(N. E.)
[191]
Mundo em casa. (N. T.)
[192]
No original:
“Twinkle, twinkle, little star,
How I wonder what you are!” (N. T.)
[193]
“Pinturas”, em língua francesa. (N. T.)
[194]
Alfred the Great: the Truth Teller, Maker of England, 848-899 (Alfredo, o Grande: o Conta-dor de
Verdades, Construidor da Inglaterra, 848-899) de Beatrice Adelaide Les (1858-1940), tutora na faculdade
Somerville, Oxford e historiadora. (N. E.)
[195]
Casa de Tudor: uma dinastia real inglesa de origem galesa que deu 5 soberanos à Inglaterra: Henrique
VII, seu filho Henrique VIII, seguido pelos três filhos de Henrique VIII: Eduardo VI, Maria I e Elisabete I.
(N. E.)
[196]
Historia Ecclesiastica Gentis Anglorum (História Eclesiástica do Povo Inglês) do Venerável Beda
(672/3-735): escrita em 731 d.C., a obra de Beda inicia com um esquema da geografia e história da
Bretanha romana. Continua contando sobre reis e bispos, monges e freiras que ajudaram a desenvolver o
governo e a religião anglo-saxões durante os anos cruciais de formação do povo inglês. (N. E.)
[197]
Guilherme de Malmesbury (1090-1143): foi Educado em Malmesbury, onde se tornou monge. Desde a
juventude mostrou inclinação à história. Teve o ofício de bibliotecário. Gesta Pontificum, que deve muito a
Beda, é a fonte na qual todos os escritores posteriores da histó-ria eclesiástica inicial da Inglaterra se
basearam principalmente. O seu método, também derivado de Beda, era recontar eventos a fim de mostrar a
sua causa e efeito, e, ao retornar a esse princípio sadio, ele fez um grande avanço nas obras dos seus
predecessores. (N. E.)
[198]
Chronicle of the Kings of England: From the Earliest Period to the Reign of King Stephen (Crônica
dos Reis da Inglaterra: Desde o Período Mais Primitivo até o Reino do Rei Estêvão). (N. E.)
[199]
Batalha de Ashdown: Alfredo, o Grande, conduziu o exército do seu irmão, Rei Ethelred de Wessex,
numa batalha vitoriosa contra os dinamarqueses invasores. (N. E.)
[200]
Godofredo de Monmouth (?-1155): cronista medieval inglês cuja maior obra, Historia regum
Britanniae (História dos Reis da Bretanha), trouxe a figura de Artur à literatura euro-peia. (N. E.)
[201]
História dos Reis da Inglaterra. (N. T.)
[202]
História dos Reis Britânicos. (N. T.)
[203]
Idylls of the King (Idílios do Rei): tratamento poético da lenda arturiana por Alfred Tennyson (1809-
1892). (N. E.)
[204]
Seis Velhas Crônicas Inglesas. (N. T.)
[205]
Jean Froissart (1333?-1400): poeta medieval e historiador da corte cujas Crônicas do século XIV
permanecem o documento mais importante e detalhado dos tempos feudais na Europa e a melhor exposição
contemporânea dos ideais de cavalaria e cortesia. (N. E.)
[206]
Antigas Histórias da História Britânica. (N. T.)
[207]
Cú Chulainn, também chamado de Cuchulain, Cuchulinn ou Cuchullin: mítico herói irlandês. É para a
mitologia irlandesa o que Aquiles é para a mitologia grega. Ambos os bravos guerreiros foram invencíveis
na batalha e eram semideuses. (N. E.)
[208]
Velhas Histórias e Esboços da História Britânica. (N. T.)
[209]
Tales from St. Paul’s Cathedral (Contos da Catedral de São Paulo) e Tales from West-minster Abbey
(Contos da Abadia de Westminster), de Frewen Lord. (N. E.)
[210]
Prisoners of the Tower of London (Prisioneiros da Torre de Londres), de Violet Brooke-Hunt (1870-
1910), escritora, trabalhadora social e ativista política. (N. E.)
[211]
Uma História da Inglaterra. (N. T.)
[212]
O Leitor Cidadão e As Leis da Vida Cotidiana. (N. T.)
[213]
Capela do Colégio do Rei. (N. T.)
[214]
A Short History of the English People (Uma Curta História do Povo Inglês), de John Richard Green
(1837-1883). A obra foi notável pela sua abordagem ampla, estilo simples, generosidade de perspectiva e
atenção aos aspectos sociais, econômicos e intelectuais da história nacional. Foi aumentada em The History
of the English People (A História do Povo Inglês). (N. E.)
[215]
Júlio César (100? a.C.-44 a.C.): celebrado general e estadista romano, conquistador da Gália, vencedor
na guerra civil de 49-45 a.C. e ditador que estava lançando uma série de reformas políticas e sociais quando
foi assassinado por um grupo de nobres na Casa Senado nos idos de março. César mudou o curso da história
do mundo greco-romano decisiva e irre-versívelmente. (N. E.)
[216]
Marco Antônio (83 a.C.-30 a.C.): general romano sob Júlio César, que, com Cleópatra, rainha do
Egito, foi derrotado por Otaviano. (N. E.)
[217]
Calpúrnia Pisônia (77 a.C.-?): esposa de Júlio César. (N. E.)
[218]
Marco Júnio Bruto (85 a.C.-42 a.C.): político romano, um dos líderes na intriga que assas-sinou Júlio
César. (N. E.)
[219]
Pórcia Catão (70 a.C.-42 a.C.): esposa de Bruto. (N. E.)
[220]
Públio Casca (?-42 a.C.): um dos assassinos de Júlio César. (N. E.)
[221]
A First Latin Course (Um Primeiro Curso de Latim), de Ernest Howard Scott e Frank Jones. (N. E.)
[222]
No original: “I _____ a little boy.” (N. T.)
[223]
No original: “Is, are, should be, was, am, were, shall be, will be.” (N. T.)
[224]
The Art of Teaching and Studying Languages (A Arte de Ensinar e Estudar Línguas), de François
Gouin (1831-1896). (N. E.)
[225]
Jean-François Millet (1814-1875): pintor francês renomado por seus sujeitos camponeses, seu principal
interesse. (N. E.)
[226]
Edwin Henry Landseer (1802-1873): pintor e escultor britânico melhor conhecido pelas suas pinturas
de animais. Landseer aprendeu a desenhar com o seu pai e estudou na Acade-mia Real. As suas pinturas de
animais eram baseadas em sólido conhecimento de anatomia. (N. E.)
[227]
Beowulf: poema heroico, a maior realização da literatura em inglês antigo e a mais antiga épica
vernacular europeia. “Beowulf” é o nome do herói escandinavo. Não há evidência de um Beowulf histórico,
mas algumas personagens, lugares e eventos no poema podem ser histori-camente verificados. A obra foi
traduzida para o inglês moderno. (N. E.)
[228]
Grendel: uma criatura monstruosa derrotada por Beowulf no poema Beowulf. É descen-dente do Caim
bíblico, exilado e condenado a vagar pela face da terra. (N. E.)
[229]
Heroes of Chivalry and Romance (Heróis da Cavalaria e do Romance), de Alfred John Church e
George Morrow. George Morrow (1869-1955) foi um cartunista e ilustrador de livro. Viveu a maior parte da
sua vida adulta na Inglaterra. (N. E.)
[230]
Joshua Reynolds (1723-1792): pintor de retrato e esteticista que dominou a vida artística inglesa no
meio e fim do século XVIII. Seus retratos do rei e da rainha nunca foram conside-rados um sucesso e
raramente pintava para eles. A técnica de Reynolds nem sempre foi inteiramente perfeita, consequentemente
muitas das suas pinturas foram afetadas. (N. E.)
[231]
Método Dó Móvel: John Curwen (1816-1880) foi educador britânico de música e fundador do sistema
de notação musical Dó Móvel, que concentra a atenção do estudante nos sons relacionados à notação de
uma maneira sistemática. (N. E.)
[232]
The Teacher’s Guide to Mrs. Curwen’s Pianoforte Method (The Child Pianist): Being a Practical
Course of the Elements of Music (O Guia do Professor para o Método de Piano da Srª. Curwen (A Criança
Pianista): Sendo um Curso Prático dos Elementos da Música) de Annie Jessy Curwen (1845-1932) (N. E.)
[233]
Repetição Sueca: um sistema de ginástica sueca inventado na virada do século XIX por Pehr Henrik
Ling (1776-1839), um instrutor de esgrima no sul da Suécia. (N. E.)
[234]
Centurião: o principal comandante profissional nos exércitos da Roma antiga e seu impe-rio. (N. E.)
[235]
Guido Reni (1575-1642): antigo pintor italiano barroco, distinto pelo idealismo clássico dos seus feitos
de assuntos mitológicos e religiosos. (N. E.)
[236]
Museu do Louvre: museu nacional e galeria de arte da França, em Paris. É o museu de arte mais
visitado do mundo, com uma coleção que abrange obras desde a civilização antiga até meados do século
XIX. (N. E.)
[237]
The Heir of Redclyffe (O Herdeiro de Redclyffe): o primeiro sucesso de Charlotte Mary Yonge (1823-
1901), cujo herói tornou a bondade atrativa e romântica. A autora foi uma ro-mancista inglesa que dedicou
os seus talentos de escritora ao serviço da igreja. (N. E.)
[238]
“Amor-próprio”, em língua francesa. (N. T.)
[239]
An Introduction to Mental Philosophy, on the Inductive Method (Uma Introdução à Filoso-fia Mental,
sobre o Método Indutivo) de John Daniel Morell (1816-1891). (N. E.)
[240]
“Ought”, na língua inglesa. “Dever” usado para dizer que é necessário ou desejável realizar a ação
expressa pelo verbo. (N. T.)
[241]
Santo Agostinho (354-430): bispo de Hipona de 396 a 430, um dos padres latinos da Igreja e talvez o
pensador cristão mais significativo após São Paulo. A adaptação de Santo Agos-tinho do pensamento
clássico ao ensino cristão criou um sistema teológico de grande poder e influência duradoura. Dentre seus
numerosos escritos, os mais importantes são Confissões e A Cidade de Deus. (N. E.)
[242]
No original:
“rise on stepping stones
Of our dead selves to higher things.” (N. T.)
[243]
“Deixe fazer”, em língua francesa. (N. T.)
[244]
Expressão presente em Mt 23:24. (N. E.)
[245]
Referência a Mt 23:23. (N. E.)
[246]
Adam Smith (1723-1790): filósofo social e economista político escocês. Após dois séculos, Adam
Smith permanece uma figura muito elevada na história do pensamento econômico. The Theory of Moral
Sentiments (A Teoria dos Sentimentos Morais) foi a sua primeira obra e um real avanço científico. Ela
mostra que as nossas ideias e ações morais são um produto da nos-sa própria natureza como criaturas
sociais. Ela argumenta que essa psicologia social é um guia melhor para a ação moral do que a razão. (N.
E.)
[247]
Rebelião Indiana: rebelião generalizada, mas malsucedida, contra o governo britânico na Índia em
1857-58. (N. E.)
[248]
“Suspeita”, em língua francesa. (N. T.)
[249]
No original: “whether of story or history”. Dado o desuso do vocábulo “estória” em língua portuguesa
(correspondente a “story” em língua inglesa), optou-se por traduzir “story” como “fábula”, com o sentido de
“narrativa de ficção”. (N. T.)
[250]
Mt 7:1. (N. E.)
[251]
Lc 10:29-37. (N. E.)
[252]
Rm 12:10. (N. E.)
[253]
“The very pulse of the machine”: verso do poema She Was a Phantom of Delight (Ela Era um Fantasma
de Deleite), de William Wordsworth (1770-1850). (N. E.)
[254]
Jo 14:6; Jo 1:4; Jo 15:4. (N. E.)
[255]
Gn 28:16-17. (N. E.)
[256]
Mc 9:19. (N. E.)
[257]
“New thoughts of God, new hopes of heaven” de New Every Morning is the Love (Toda Nova Manhã é
o Amor) de John Keble (1792-1866), sacerdote, teólogo e poeta anglicano. (N. E.)
[258]
Jo 13:13. (N. E.)
[259]
No original:
“And when He comes, He makes your face so fair,
Your friends are glad, and say, ‘The King is there.’” (N. T.)

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